Dissertação_Liana Porto

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
INSTITUTO COPPEAD DE ADMINISTRAÇÃO
LIANA PORTO PEREIRA
BELEZA E ENVELHECIMENTO: a visão de um grupo de dermatologistas
sobre seus pacientes e os produtos anti-idade.
RIO DE JANEIRO
2011
2
LIANA PORTO PEREIRA
BELEZA E ENVELHECIMENTO: a visão de um grupo de dermatologistas
sobre seus pacientes e os produtos anti-idade.
Dissertação de mestrado apresentada ao
Programa
de Pós-Graduação em
Administração, Instituto COPPEAD de
Administração, Universidade Federal do
Rio de Janeiro, como parte dos requisitos
necessários à obtenção do título de
Mestre em Administração.
Orientadora: Letícia Moreira Casotti, D.Sc.
RIO DE JANEIRO
2011
3
LIANA PORTO PEREIRA
BELEZA E ENVELHECIMENTO: a visão de um grupo de dermatologistas
sobre seus pacientes e os produtos anti-idade.
Dissertação de mestrado apresentada ao
Programa
de Pós-Graduação em
Administração, Instituto COPPEAD de
Administração, Universidade Federal do
Rio de Janeiro, como parte dos requisitos
necessários à obtenção do título de
Mestre em Administração.
Orientadora: Letícia Moreira Casotti, D.Sc.
Aprovada em
_________________________________________
Leticia Moreira Casotti, D.Sc. (COPPEAD/UFRJ)
_________________________________________
Maribel Suarez, D.Sc. (COPPEAD/UFRJ)
_________________________________________
Claudia Pereira, Dr.Sc. (PUC/RJ)
RIO DE JANEIRO
2011
4
AGRADECIMENTOS
À Professora Letícia Casotti por sua competente e dedicada orientação, e por me
motivar nos momentos mais difíceis dessa pesquisa.
À Cátedra L’Oréal de Comportamento do Consumidor e ao CAPES por seu apoio à
pesquisa.
Às professoras Maribel Suarez, Gisela Taschner e Claudia Pereira por aceitarem o
convite de participar da banca examinadora.
À Cida e à Lucianita pela ajuda diária na secretária acadêmica durante o período do
mestrado. À Eliane por estar sempre disponível ao auxiliar na busca de artigos e
livros essenciais para a construção dessa dissertação.
Às empresas entrevistadas por cederem seu tempo e por permitirem utilizar os
relatos como material de apoio para o roteiro.
Aos médicos dermatologistas por disponibilizarem seu valioso tempo, por dividirem
comigo suas histórias de profissão e seus sentimentos, e por indicarem outros
colegas de profissão para participar desse estudo.
Aos meus pais, Sylvia e Albucacis, por apoiarem a minha decisão de cursar um
mestrado em tempo integral.
À minha mãe, Sylvia, por me auxiliar com os artigos relativos à bioética, por fazer a
revisão de ortografia, por solicitar que amigas dermatologistas participassem do
estudo e por estar sempre presente me estimulando a escrever essa dissertação.
À minha irmã Andréa por estar sempre disponível para ajudar na revisão de
literatura e de ortografia e ao meu irmão Bruno, que mesmo de longe, sempre se
interessou pelo andamento desse trabalho.
Ao Marcio, companheiro sempre presente, pelo carinho diário e por tornar o caminho
dessa pesquisa mais leve.
5
Aos meus tios e primos que procuraram compreender minha ausência nas reuniões
familiares. Ao meu primo Vinicius, hoje também aluno do COPPEAD, que me
incentivou em cada etapa da pesquisa.
À turma de 2009, especialmente, às queridas amigas, Bianca Carvalho, Fernanda
Rios, Fernanda Romano, Letícia Eboli, Maria Cecília Galli e Marta Abrão, que
estiveram sempre presentes em todos os momentos alegres e difíceis do mestrado.
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RESUMO
BELEZA E ENVELHECIMENTO: a visão de um grupo de dermatologistas
sobre seus pacientes e os produtos anti-idade. Orientadora: Leticia Moreira
Casotti. Rio de Janeiro: UFRJ/COPPEAD, 2009. Dissertação (Mestrado em
Administração).
Essa pesquisa de caráter exploratório procurou compreender, através de entrevistas
em profundidade, como um grupo de médicos dermatologistas, que são
considerados
importantes
influenciadores
no
consumo
de
tratamentos
antienvelhecimento, percebem a beleza, o processo de envelhecimento de seus
pacientes e sua relação com o consumo de serviços e produtos de beleza, mais
especificamente, os cremes anti-idade, produtos escolhidos como representantes da
busca do rejuvenescimento. Como base de apoio para a interpretação dos relatos
dos entrevistados, a revisão de literatura foi construída dentro dos seguintes temas:
identidade, beleza, envelhecimento e a bioética médica. Os relatos sugerem que a
beleza do rosto pode ser mais importante que do corpo, principalmente, para as
mulheres mais velhas. Parecem haver diferenças entre o modo como os
dermatologistas mais jovens e mais velhos tratam a cosmiatria. Assim, observa-se
que os mais velhos são mais críticos quanto a busca excessiva pelo
rejuvenescimento e pela beleza, embora algumas contradições nos relatos
aconteceram independente das diferenças: eles percebem que algumas pacientes
sofrem ao almejar ter uma aparência jovem que já não é possível, mas ao mesmo
tempo, julgam os tratamentos anti-idade positivos para a auto-estima da mulher. Os
entrevistados demonstram que fazem uma distinção de valor entre os produtos que
são considerados dermocosméticos e os cosméticos. Os dermatologistas parecem
valorizar as marcas de cremes anti-idade que realizam pesquisas científicas
constantemente e que entendem que as ações de marketing devem ser
direcionadas a eles através dos congressos e visitas e não ao público leigo.
Palavras-chave: Envelhecimento. Beleza. Produtos anti-idade.
7
ABSTRACT
BEAUTY AND AGING: the vision of a group of dermatologists on their patiens and
anti-aging products.
Orientadora: Leticia Moreira Casotti. Rio de Janeiro:
UFRJ/COPPEAD, 2009. Dissertação (Mestrado em Administração).
This exploratory research sought to understand, through depth interviews, how a
group of dermatologists, that are considered an important influencers in the
consumption of anti-aging treatments, observe beauty, the aging process of their
patients and their relation with the consumption of beauty services and products,
more specifically, anti-aging cream, products chosen as representative of the search
for rejuvenation. As a support for the interpretation of the interviews, the literature
review was built within the following themes: identity, beauty, aging and medical
bioethics. The speeches suggest that the beauty face may be more important that of
the body, specially, for older women. There appear to be differences between how
younger and older dermatologists deal with cosmiatry. Thus, it is observed that the
older are more critical towards to the excessive search for rejuvenation and beauty,
thought a few contradictions in the speeches occurred regardless of differences: they
notice that a few patients suffer when they aim an young appearance that is no
longer possible, but, at same time, judge that anti-aging treatments are positive for
the self-esteem of women. The interviewees referred that they make a distinction
between products that are considered dermocosmetics and cosmetics. The
dermatologists seem to value the brands of anti-aging creams that develop scientific
researches constantly; and that understand that the marketing actions should be
directed to dermatologists, through congress and visits, and not to the lay public.
Keywords: Aging. Beauty. Anti-aging products.
8
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 - Sumário das abordagens Positivista e Interpretativista................ 47
Quadro 2 - Resumo dos entrevistados........................................................... 50
Quadro 3 - Categorias de descrição e categorias de análise......................... 62
Quadro 4 - Valores da cultura carioca............................................................ 74
Quadro 5 - As duas faces do envelhecimento................................................ 83
Quadro 6 - Caminhos dos tratamentos anti-idade.......................................... 86
9
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 10
1.1 RELEVÂNCIA DO TEMA.................................................................................... 10
1.2 OS INFLUENCIADORES DE OPINIÃO.............................................................. 12
1.3 ORGANIZAÇÃO DO ESTUDO ........................................................................... 14
2 REVISÃO DE LITERATURA ................................................................................. 16
2.1 IDENTIDADE....................................................................................................... 16
2.2 BELEZA: UMA BREVE HISTÓRIA .................................................................... 20
2.2.1 O Corpo ............................................................................................................ 25
2.2.2 Cosméticos e cosmocêuticos ........................................................................... 28
2.3 ENVELHECIMENTO ........................................................................................... 32
2.3.1 O consumo e o envelhecimento ....................................................................... 35
2.3.2 As dificuldades do envelhecimento .................................................................. 39
2.4 A BIOÉTICA MÉDICA......................................................................................... 41
3. METODOLOGIA ................................................................................................... 46
3.1 NATUREZA DA PESQUISA ............................................................................... 46
3.2 SELEÇÃO DOS ENTREVISTADOS ................................................................... 49
3.3 COLETA DE DADOS .......................................................................................... 51
3.3.1 Cenário do estudo ............................................................................................ 52
3.3.2 Desenvolvimento do roteiro.............................................................................. 52
3.3.3 Dificuldades do campo ..................................................................................... 58
3.4 ANÁLISE DE DADOS ......................................................................................... 59
3.4.1 Limitações do método ...................................................................................... 60
4. ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DAS INFORMAÇÕES ....................................... 62
4.1 Motivações para trabalhar com beleza........................................................... 63
4.2 BELEZA .............................................................................................................. 65
4.2.1 Beleza X Saúde Mental .................................................................................... 71
4.2.2 Beleza e ciclo de vida....................................................................................... 72
4.3 RELAÇÃO MÉDICO- PACIENTE ....................................................................... 74
4.3.1 Gerenciando expectativas ................................................................................ 77
4.3.2 Conflitos da bioética na cosmiatria................................................................... 78
4.3.3 A questão do comércio no meio médico .......................................................... 80
4.4 ENVELHECIMENTO ........................................................................................... 81
4.4.1 A idade ............................................................................................................. 84
4.5 PRODUTOS ANTI-IDADE .................................................................................. 87
4.5.1 As marcas pesquisadas ................................................................................... 92
4.6 O NÃO CONSUMO DE PRODUTOS ANTI-IDADE ............................................ 95
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................. 99
Referências Bibliográficas ................................................................................... 106
ANEXO .................................................................................................................... 111
ANEXO 1- Roteiro semi-estruturado para entrevista com empresa ................. 111
ANEXO 2 - Roteiro semi-estruturado da entrevista com dermatologistas ...... 112
ANEXO 3 – Entrevistas com dermatologistas .................................................... 113
10
1 INTRODUÇÃO
Esse estudo tem como principal objetivo compreender a visão de um grupo
dermatologistas sobre o processo de envelhecimento de seus pacientes e sua
relação com o consumo de serviços e produtos de beleza, mais especificamente, foi
dado maior destaque aos cremes anti-idade como produtos que representam a
busca do rejuvenescimento ou não envelhecimento. Trata-se de uma pesquisa
exploratória que utilizou metodologia qualitativa com uso de entrevistas em
profundidade.
1.1 RELEVÂNCIA DO TEMA
A Cátedra L’Oréal de Comportamento do Consumidor no Instituto Coppead da UFRJ
tem apoiado estudos sobre diferentes temas associados a beleza, como pode ser
observado nos trabalhos de Campos (2010) sobre o consumo de cosméticos em
gerações de mulheres do subúrbio carioca; de Casotti et al. (2008) sobre os
diferentes tempos da beleza; de Borelli (2009) sobre o consumo de cirurgia plástica
por mulheres jovens; de Amui (2006) sobre o consumo de cremes cosméticos de
luxo; de Rosário (2006) sobre o não consumo das tinturas de cabelo; e de Fontes
(2009) sobre o consumo de bens e serviços de beleza pelo ponto de vista
masculino, dentre outros.
Essas pesquisas e o presente estudo tiveram como importante referencial o campo
das Ciências Sociais que aparecem muitas contribuições sobre o tema beleza, e
também sobre envelhecimento (GOLDENBERG e RAMOS, 2002; LIPOVETSKY,
2007;
GOLDENBERG,
2007,
2009;
BOUZÓN,
2008;
BEAUVOIR,
1990;
dermatologistas
como
VIGARELLO, 2006).
Não
foram
encontrados
estudos
relacionando
os
influenciadores de opinião em relação a produtos cosméticos na literatura de
Marketing e Comportamento do Consumidor ou nas Ciências Sociais. Enquanto a
moda e a beleza são temas que despertam o interesse dos pesquisadores no
contexto do mercado de luxo, dos jovens e do fenômeno social das tribos
(LIPOVETSKY e ROUX, 2008; AMUI, 2006; PEREIRA, 2003; PEREIRA, 2008); os
estudos do envelhecimento são mais recorrentes quando se referem às questões
11
públicas, como aposentadoria e saúde da terceira idade (DEBERT, 2004; BARROS,
2007; OMS, 2005).
A Organização das Nações Unidas (ONU) define que as pessoas passam a ser
consideradas idosas após os 60 anos de idade. Contudo, a Organização Mundial da
Saúde (2005) propõe que a idade cronológica pode não ser um marcador para
definir as mudanças que acompanham o envelhecimento, fatores como o estado de
saúde do indivíduo também devem ser considerados.
A população com mais de 60 anos de idade é a faixa que mais cresce na população,
em relação à outras faixas etárias, em quase todos os países do mundo. Esse fato é
resultado do aumento da expectativa de vida, somado ao declínio das taxas de
fertilidade em diversos países. Até o ano de 2025, o Brasil será o sexto país do
mundo em número de idosos; sendo que, entre os anos de 1980 e 2000 a população
mundial, com mais de 60 anos, cresceu 7,3 milhões, totalizando mais de 14,5
milhões em 2000. Já, nos Estados Unidos, o grupo de pessoas acima de 45 anos
tem crescido cerca de três vezes mais que o restante da população, fato que está
implicando em um aumento do consumo de produtos anti-idade (OMS, 2005;
GENDLER e RIZZO, 2009). Segundo Debert (2004), os indivíduos na meia-idade
são, provavelmente, quem mais consome produtos ligados ao rejuvenescimento,
uma conseqüência de seu poder aquisitivo.
Com a forte demanda por corpos e rostos dentro de padrões estéticos e com
crescente aumento dos idosos na população mundial, os temas beleza e
envelhecimento passaram a fazer parte do dia-a-dia da sociedade brasileira. O
Brasil tem, atualmente, um papel representativo no mercado de beleza mundial,
“exportando” modelos brasileiras que atingem reconhecimento internacional, como
pode ser observado navegando pelo site models.com1. As brasileiras despontam,
principalmente, no ranking das modelos com seis entre as 20 mulheres mais sexy do
mundo, com uma brasileira - Adriana Lima no topo da lista e Gisele Bunchen
aparece como a modelo mais bem paga do mundo.
Nesse contexto, mulheres de meia-idade buscam o consumo de diversos
cosméticos onde se incluem os cremes anti-idade, tratamentos estéticos, como a
1
Disponível em: www.models.com . Acessado em: 19 set. 2011.
12
toxina botulínica, os preenchedores e o laser antienvelhecimento, as cirurgias
plásticas, ou seja, diferentes tipos de tratamentos que tornem sua aparência mais
jovem
(GENDLER
e
RIZZO,
2009;
GOLDENBERG
e
RAMOS,
2002;
GOLDENBERG, 2005).
Nesse cenário, o fenômeno dos cosmocêuticos influencia a indústria de cosméticos
e os consultórios de dermatologia, representando a área da dermatologia que se
expande mais rapidamente. Esses produtos estão sendo utilizados pelos
dermatologistas como um auxílio aos procedimentos médicos (DRAELOS, 2009).
Grande parte dos mitos dos cosmocêuticos são referentes ao processo de
envelhecimento. Por exemplo, a melhora da aparência através de tratamentos com
cosmocêuticos é percebida como uma questão cosmética e não farmacêutica pela
população. Contudo, os produtos farmacêuticos e os cosmocêuticos podem estar
convergindo auxiliando assim a prescrição de procedimentos anti-idade (DRAELOS,
2009)
1.2 OS INFLUENCIADORES DE OPINIÃO
O desejo de adequação ou de identificação com grupos é a primeira motivação para
determinar o consumo. À medida que certos grupos ou pessoas ganham poder, a
submissão dos demais participantes do grupo aumenta. Por exemplo, quando
alguém demonstra conhecimento de determinado assunto, outros consumidores
passam a reconhecer a influência. Esse fatores podem configurar um grupo de
referência, que pode ser definido como:
“um indivíduo ou um grupo, real ou imaginário, concebido como capaz de
ter relevância significativa para avaliações, aspirações ou comportamento
de um indivíduo” (Machan, apud Salomon, 2011, p.408)
Existem três formas pelas quais os consumidores são influenciados por um grupo de
referência: informativa, utilitária e expressiva de valor. A informação sobre um bem
de consumo ou uma marca podem ser transmitidas por profissionais que se
relacionam com o produto, por associações ou por grupos de especialistas. Já a
influência utilitária está relacionada ao desejo de satisfazer a expectativa de
terceiros. O consumidor é influenciado ao conhecer a preferência de outros com os
quais ele interage socialmente, como amigos ou familiares. Por último, o consumidor
busca em um bem de consumo ou em uma marca o valor que deseja associar sua
13
imagem, com a intenção de afetar o modo como outros o vêem. O consumo ocorre,
pois a marca possui características que o indivíduo gostaria de ter ou porque se
identifica com pessoas que apresentam o produto na publicidade. Contudo, a
influência dos grupo de referência é menor em certos tipos de produto, como os
considerados de baixo risco percebido.
Ainda, diferentes poderes são associados à uma pessoa ou à um grupo de
referência. Pode-se notar que os médicos são dotados do poder legítimo, onde a
sociedade lhes concede o poder através de um acordo social: sendo o jaleco branco
um símbolo indicativo de credibilidade. Além disso, o poder do conhecimento
também é conferido aos médico. Cada profissional da medicina detém o
conhecimento da especialidade médica a qual dedicou seus estudos. Os
dermatologistas possuem o conhecimento necessário para aconselhar sobre as
questões associadas à pele, incluindo o conhecimento sobre a estética.
Na sociedade de consumo uma figura que desempenha um papel importante são os
líderes de opinião: pessoas que se tornam referências no consumo de uma classe
de produtos. Esses indivíduos têm a capacidade de influenciar comportamento e
atitude de terceiros, podendo ser ou não compradores do produto que indicam.
Apesar do fácil acesso às informações, os consumidores tendem a pedir auxílio ao
líder de opinião, que é um especialista naquele assunto. Um exemplo, no universo
da estética, são os blogs de beleza que recebem milhares de acessos de mulheres
que desejam se informar sobre determinadas marcas de maquiagem, cosméticos
anti-idade, ou outros produtos que prometem torná-las mais belas. Quem
desempenha esse papel tende a ter valores e crenças semelhantes às do
consumidor que solicita ajuda.
Contudo, os líderes de opinião não recebem recompensa por seu aconselhamento,
diferentemente do consumidor substituto. Essa figura está presente em uma classe
de intermediários de marketing, orientando a compra dos consumidores comuns.
Pode-se notar que o dermatologista se encaixa nessa classificação, ao fornecer uma
consulta de estética para as consumidoras de beleza. Logo, esse profissional pode
exercer grande influência no consumo de produtos anti-idade.
14
Desse modo, o consumidor pode renunciar às diversas etapas da tomada de
decisão do consumo do produto, como a avaliação de alternativas por influência dos
dermatologistas. Observa-se que um grande erro de alguns profissionais de
marketing é ignorar esse consumidor substituto, pois algumas mensagens são mais
eficientes se forem transmitidas diretamente para os substitutos (SALOMON, 2011).
Esse estudo procurou conhecer e ouvir o que pensa esse grupo de referencia e
também formador de opinião - os dermatologistas - sobre a beleza, seu consumo
através de marcas, serviços e produtos como os cremes anti-idade.
1.3 ORGANIZAÇÃO DO ESTUDO
Este estudo está dividido em cinco capítulos: introdução, revisão de literatura,
metodologia, análise e interpretação dos dados, e considerações finais. O primeiro
capítulo, a introdução, aborda brevemente o assunto tratado nessa pesquisa e
busca justificar sua relevância.
Na revisão bibliográfica, investigou-se temas que contribuíram como base para a
pesquisa, auxiliando na definição das questões do roteiro de entrevistas e na
interpretação de seus resultados. A construção da revisão de literatura desse estudo
apóia-se nas teorias da formação da identidade e sua relação com o consumo,
seguindo com noções sobre a beleza, para, então, abordar o envelhecimento.
Encerrando o capítulo, optou-se por discorrer sobre a ética na medicina, que é um
assunto importante no campo da dermatologia.
O capítulo de metodologia propõe um estudo de natureza interpretativista. Nesse
capítulo são descritos os métodos utilizados na pesquisa de campo, os
procedimentos de coleta e análise de dados; além das dificuldades encontradas no
campo e das limitações da abordagem escolhida.
O quarto capítulo trata da análise e da interpretação dos dados, ou seja, os
resultados da pesquisa de campo. Os resultados são organizados de acordo com
seis temas, reunidos a partir das categorias utilizadas para a descrição das
entrevistas: motivações para trabalhar com beleza, a beleza, a relação médicopaciente, o envelhecimento e o não consumo de produtos anti-idade.
15
Por fim, o quinto capítulo propõe uma reflexão sobre os principais achados
provenientes do capítulo de análise e da interpretação dos dados, trazendo
sugestões para pesquisas futuras.
16
2 REVISÃO DE LITERATURA
O capítulo de revisão de literatura tem o objetivo de suportar teoricamente a
pesquisa desenvolvida. Para isso a autora se apoiou em quatro temas principais:
identidade, beleza, envelhecimento e ética.
Na primeira parte é discutido o conceito de identidade no mundo contemporâneo,
sua relação com o consumo. Em seguida, a história da beleza é apresentada,
destacando a valorização da beleza física pela sociedade atual e a noção do corpo
como algo gerenciável. Posteriormente, é descrita uma breve evolução da história
dos cosméticos: que vai desde a sua função de disfarçar os defeitos do rosto, a
função mai recente de alterar a aparência, visando a juventude. Logo, aborda-se a
questão do processo de envelhecimento, discutindo as dificuldades da velhice. Por
último, trata-se da bioética médica, um tema relevante quando são abordadas
questões da relação médico-paciente.
2.1 IDENTIDADE
Há milhares de anos o homem busca uma resposta para a pergunta: “Quem sou
eu?”. Discutir a identidade e o self é uma tentativa de compreender como os seres
humanos se autodefinem (MCCRAKEN, 2003).
Existem diferentes correntes de pensamento sobre a formação da identidade: para
sociólogos pós-modernos como Bauman (2001) ela é fragmentada, ou seja, o
indivíduo possui diferentes identidades, dependendo do contexto em que se
encontra. Por outro lado, Campbell (2006) e Mittal (2006), parecem concordar que a
identidade é única e há uma busca constante pelo self real. Esses autores estudam
a identidade do ponto de vista do comportamento do consumidor. Na tese de
Campbell (2006) a constante busca da identidade pode acarretar mudanças de
gosto ao longo dos anos. Entretanto, ele acredita que a identidade seja única, e que
essas mudanças sejam um caminho necessário para sua aproximação mais fiel do
self.
Na literatura de comportamento do consumidor, há diversas teorias sobre a
formação da identidade, todavia um ponto em comum é a importância dada ao
consumo para seu desenvolvimento. De acordo com Campbell (2006), a identidade
17
não é apenas determinada por filiação, classe ou status de grupos, como
provavelmente ocorria no começo do século XX, pois a experiência do consumo
assumiu papel fundamental na busca pela identidade na sociedade contemporânea
(CAMPBELL, 2006; BELK,1988; MITTAL, 2006).
Na proposta de Mittal (2006) o termo utilizado para se referir à identidade é o
“autoconceito” que, de acordo com o autor, é o modo como o indivíduo se vê e é
formado por seis componentes: cinco deles fazem parte do self sem posse e um do
eu-estendido. Cada componente varia em importância e em proporção para cada
indivíduo. O “self sans possession” é formado por corpo, valores e caráter, sucesso
e competência, papéis sociais e traços da personalidade; o eu-estendido é composto
por objetos que fazem parte da vida do consumidor. A proposta feita anteriormente
por Belk (1988) difere um pouco da de Mittal (2006) quanto aos componentes do euestendido e self central. Belk (1988) também associa ao eu-estendido “itens” como
pessoas, lugares e grupos; partes do corpo e órgãos vitais, por exemplo, quando
ocorre uma doação de um órgão.
Belk (1988) analisa que a busca pela definição da identidade ocorre de diferentes
maneiras ao longo da vida. O autor afirma que cada geração tem um jeito próprio de
buscar seu self central: enquanto bebês, as pessoas começam a entender que
existe um limite físico que é seu corpo, é a primeira vez que percebem que são
seres únicos e não uma continuação de sua mãe. Quando crianças, elas passam a
se reconhecer a partir das reações de outras crianças, por exemplo, ao perceber
que um brinquedo é motivo de inveja. Na adolescência e na idade adulta a
identidade é gerenciada pelas posses do indivíduo. Por último, pessoas com idade
avançada buscam um senso de continuidade e de preparação da morte, também,
através de suas posses.
McCracken (2003) também relata que a posse é um elemento importante para a
definição da identidade. O autor descreve como os processos dos rituais de posse e
de arrumação contribuem para que os significados, que definem o consumidor,
sejam extraídos dos bens. Logo, esses objetos passam a “categorizar, cultivar idéias
e sustentar estilos de vida, construir noções de si e criar mudanças sociais”
(MCCRACKEN, 2003), participando do eu-estendido.
18
No entanto, nem todos os objetos consumidos são parte do eu-estendido (MITTAL,
2006). Apenas se uma pessoa percebe o bem como posse e consegue se definir
através dele, esse será parte de seu self. Mittal (2006) sugere o exemplo do uso
intenso de um cosmético anti-idade: mesmo que o consumidor o use todos os dias,
não é certo que será parte do eu-estendido. Seria preciso que o componente “corpo”
fosse importante para esse indivíduo e através do cosmético transmitisse seus
desejos, como um estilo se vida. Belk (1988) mostra que os bens que são parte do
eu-estendido quando afirma que a perda ou o roubo de um objeto geram um enorme
sentimento de vazio. Isso ocorre, pois o bem ausente era uma parte do indivíduo.
Ahuvia (2005) concorda com Belk (1988) ao afirmar que quando a relação do ser
humano com um bem é de amor, muito tempo e energia são gastos com a sua
compra; e mesmo após sua aquisição, eles continuam sendo muito importantes para
o self. Já quando a relação com o produto é de paixão o maior envolvimento ocorre
durante a espera pela compra do produto, o qual passa a não fazer mais sentido na
vida do indivíduo depois que é adquirido (BELK et al., 2003).
Na construção da identidade descrita por Campbell (2006), a variedade de produtos
e as possibilidades de consumo permitem que o indivíduo teste seus gostos e,
desse modo, e assim construa seu autoconceito. De acordo com o autor, a
individualidade de cada um é consolidada por sua combinação de gostos. A
liberdade de escolha é mais comum nas sociedades mais individualistas e é útil para
que o consumidor possa definir seus gostos dentre as diversas categorias culturais e
desse modo encontrar sua identidade ideal (MCCRACKEN, 2003).
Essas escolhas de consumo apresentadas por Campbell (2006) e McCracken (2003)
estão associadas a muitas emoções. Ahuvia (2005) destaca, dentre os sentimentos,
que o amor é comumente percebido nas descrições dos consumidores em sua
pesquisa. Esse sentimento teve uma atenção especial da autora por acreditar que
objetos e pessoas amados influenciam no senso do self.
Nos achados de Ahuvia (2005) esses objetos amados estão relacionados a eventos
importantes da vida, ajudam a resolver conflitos de identidade e tem uma forte
associação simbólica em relação a outras pessoas ou outros tempos. Dessa forma,
Ahuvia (2005) e McCracken (2003) concordam sobre a importância dos significados
19
extraídos dos bens sendo utilizados como marcadores de tempo, espaço e ocasião
para a construção da identidade. Além disso, os objetos ajudam a definir os gostos
em meio às categorias culturais de classe, status, gênero, idade, ocupação e estilo
de vida que há na sociedade.
No início de sua pesquisa, Ahuvia (2005) acreditava em uma mudança constante da
identidade e no vazio gerado por um consumo sem sentido. Entretanto, baseando-se
em seus achados, concordou com Belk (1988) que o consumo pode dar sentido a
vida. Apesar disso, Ahuvia (2005) sugere que o self, como essência do ser humano,
é uma visão romântica de alguns autores.
Segundo essa autora, as forças sociais contemporâneas fazem com que uma
identidade coerente seja difícil de ser atingida, o que gera os conflitos de identidade.
No entanto, ela afirma que os objetos ajudam a resolver esses conflitos já que
podem
carregar significados importantes do passado e de um estilo de vida
desejado no futuro, ao mesmo tempo. Como exemplo, Ahuvia (2005) cita como uma
bolsa vintage pode ser relevante por lembrar a mãe ou a avó e ao mesmo tempo
fazer um estilo cool.
De acordo com sua teoria, os conflitos de identidade podem ser resolvidos de três
formas: quando há duas partes da identidade antagônicas, uma pode prevalecer,
havendo rejeição da outra; a segunda forma de solução é criar uma identidade
intermediária, que seja nula em relação às duas anteriores; e por último, há uma
síntese das identidades, onde o melhor é tentar tirar o que há de melhor das duas e
criar novas escolhas (AHUVIA, 2005).
Mittal (2006) parece concordar com Ahuvia (2005) sobre a existência de conflitos de
identidade na sociedade contemporânea. Para o autor, a percepção dos outros é
importante para o self e pode levar a uma tensão na identidade a partir da diferença
de valores atribuída por cada indivíduo aos componentes que fazem parte do self.
Por exemplo, se uma pessoa se reconhece por seus feitos profissionais; ao julgar o
outro ela irá fazê-lo por suas realizações na trabalho. Contudo, se esse outro
considerar mais importante, em sua escala de valores, as formas de seu corpo,
haverá um conflito entre o primeiro indivíduo e aquele que o julga. Desse modo, para
solucionar essa questão, Mittal (2006) sugere que a pessoa mude seu grupo de
20
referência; ou que ensine ao outro quem realmente é; ou corrigindo a percepção do
outro a partir do consumo de produtos que reflitam o “eu” real.
2.2 BELEZA: UMA BREVE HISTÓRIA
Ao longo dos anos cada povo reconheceu a beleza naquilo que considerou
agradável contemplar, independentemente da existência de um sentimento de
desejo. Apesar de alguns traços da beleza serem igualmente valorizados em
qualquer cultura e época, seu conceito sofreu mudanças durante a história (ECO,
2010; WOLF, 1992; LIPOVETSKY, 2007).
Em religiões matriarcais que dominaram o Mediterrâneo entre cerca de 25.000 a.C.
e 700 a.C, as mulheres mantinham o domínio social a partir do valor dado à beleza
masculina. Do mesmo modo, na pré-história e em algumas sociedades selvagens,
eram os homens que se preocupavam com a estética. Porém, para esses povos, os
adornos eram mais ligados às simbologias e às identidades da tribo do que à beleza
(LIPOVETSKY, 2007).
Já na antiguidade clássica, os homens detinham tanto o controle da sociedade
quanto a soberania da beleza, suas formas eras consideradas perfeitas. Por isso, o
sexo masculino era considerado superior, o que era motivo para incentivar o
comportamento homossexual nessa cultura. Tanto na Grécia quanto em outras
civilizações antigas, a beleza da mulher era um sinal de perigo e sedução. Contudo,
os gregos não as percebiam as formas femininas tão belas quanto as formas
masculinas. Até a metade do século V, as representações femininas tinham as
formas de seu corpo masculinizadas. (LIPOVETSKY, 2007).
A associação de beleza feminina à temas negativos continuou no período medieval,
quando os artistas retratavam o diabo na figura de uma mulher bonita ou de uma
serpente. Apenas nos séculos XV e XVI, com o Renascimento, a superioridade
estética do sexo feminino em relação ao masculino foi reconhecida. Esse momento
é o marco de uma mudança de conceito, pois a mulher é colocada em um pedestal e
sua beleza é comparada a perfeição divina, o que transforma a beleza estética em
uma questão nobre e a torna um objeto de estudo. Porém, as mulheres que não
faziam parte da aristocracia, nessa época, eram valorizada pela fertilidade, força
física e capacidade de trabalho, já que o sustento era oriundo do trabalho de toda a
21
família. Assim, não havia uma divisão do que era belo e o que era bom, esses
conceitos acabavam sendo utilizados da mesma forma ao caracterizar essas
mulheres menos favorecidas (LIPOVETSKY, 2007; ECO, 2010; WOLF, 1992).
Posto isso, pode-se afirmar que a divisão entre classes trabalhadoras e nobres foi
uma condição necessária para a estruturação de uma sociedade onde a beleza
estética feminina é valorizada. No entanto, em um primeiro momento, apenas a
aparência física das mulheres de classes abastadas tinha valor, com isso a fidalguia
conseguia se distinguir estabelecendo uma relação de poder perante a sociedade.
Nesse contexto, os aristocráticas mantinham suas mulheres ociosas, despendendo
seu tempo com práticas de beleza e estética, já que o trabalho era algo para os
homens que não precisam se preocupar com a estética (LIPOVETSKY, 2007).
Esse quadro social sofreu uma mudança na primeira metade do século XIX, com a
Revolução Industrial. A construção da família de classe média baseada em uma
unidade de trabalho desmoronou, o que acarretou em conseqüências como: redução
no tamanho das famílias, alfabetização das mulheres, consolidação do culto à
domesticidade e do código de beleza para uma nova classe de mulheres ociosas.
Na sociedade, a aparência ideal tornou-se uma obsessão para as mulheres logo que
tiveram acesso à imagem de beldades, o que ocorreu com o advento das
tecnologias de produção em massa, como fotografias. Antes da Revolução Industrial
a mulher não havia experimentado uma competição de sua aparência com um ideal
de beleza difundido (WOLF, 1992).
“Desde a Revolução Industrial, as mulheres ocidentais da classe média vêm
sendo controladas tanto por ideais e estereótipos quanto por restrições de
ordem material.” (WOLF, 1992, p. 18)
Posteriormente, o movimento das mulheres no pós-guerra foi responsável por outra
reestruturação social. O modelo de dominação masculina mantido através da
responsabilidade feminina por tarefas domésticas e de barreiras a educação, por
exemplo, foi desestruturado nesse momento. Assim, as mulheres conseguiram um
espaço mais justo em diversos áreas da sociedade. Porém, um mundo feminino
alternativo de cuidados com a beleza ocupou esse espaço, estabelecendo um
conceito de beleza que possui regras próprias tão repressoras quanto os elementos
de controle sociais anteriores. Logo, na sociedade ocidental moderna, a beleza
22
tornou-se um conjunto de crenças capaz de manter o domínio masculino a partir de
um eficiente controle psicológico (WOLF, 1992).
Para Wolf (1992), a beleza é definida por símbolos de comportamentos que uma
cultura considera adequados - como foi a virgindade no início do século XX - e não
por aspectos físicos, assim cada civilização tem um conceito do que é belo. Desse
modo, é incorreta a idéia que o padrão de beleza atual é originário de uma única
mulher ideal platônica, como muitos crêem (DION, BERSCHEID e WALSTER,
1972).
Uma grande diferença entre a sociedade contemporânea e outras sociedades não é
a existência de um padrão de beleza, mas a responsabilidade que é atribuída a uma
pessoa por ser ou não bela. Espera-se do indivíduo um domínio sobre os cuidados
com seu corpo em relação à saúde, à forma e à aparência, pois o desleixo pode ser
considerado uma violação moral. Desse modo, o controle sobre o corpo faz parte da
formação da identidade do indivíduo moderno, que passa a se sentir responsável
por gerenciá-lo como um objeto. Isso abrange, inclusive, decisões como fazer ou
não uma cirurgia cosmética. Contudo, esse controle pode ser perdido quando a
pessoa é colocada em uma situação de ansiedade em que questiona sua própria
identidade. Logo, alguns transtornos relacionados à aparência, como a anorexia, a
bulimia e a depressão, são consequência da insegurança em relação à própria
imagem provocada por uma sociedade que valoriza a aparência e que impõe
padrões de beleza (DION, BERSCHEID e WALSTER, 1972; ASKEGAARD et al.,
2002; LIPOVETSKY 2007; NOVAES, 2008).
Pode-se dizer que o exagero das imagens de beleza das revistas e das
supermodelos que aparecem constantemente na mídia elevam o ideal de beleza a
um padrão tão alto e inalcançável que as mulheres “comuns” sentem-se diminuídas.
Assim, não importa o quanto elas busquem melhorar a alimentação e fazer
exercícios, elas não são satisfeitas com a própria aparência. Independentemente se
é uma mulher considerada bela ou feia, o grau de insatisfação é sempre alto e
grande parte considera-se gorda (LIPOVETSKY, 2007).
Para Wolf (1992), essa insegurança que Lipovetsky avalia é originada pelo
enfraquecimento do psicológico feminino, que favorece a dominação masculina no
23
âmbito social. Contudo, a autoconfiança da mulher não está, unicamente,
relacionada à questão da aparência, já que a insatisfação com à estética não diminui
a ambição profissional e intelectual. As mulheres modernas buscam cada vez mais
igualdade profissional ao sexo masculino, ou seja, seu desejo é ser bela e ao
mesmo tempo bem-sucedida profissionalmente (LIPOVETSKY, 2007).
Enquanto Wolf (1992) analisa que na cultura ocidental questiona-se que uma única
mulher possa possuir beleza e inteligência ao mesmo tempo, duvidando que
mulheres belas podem atingir poder profissional; Dion, Berscheid e Walster (1972)
acreditam que as pessoas mais atraentes têm melhores oportunidades de serem
felizes e bem sucedidas. Já Lipovetsky (2007) observa que a beleza é essencial
para que as estrelas de cinema e as manequins se igualem aos homens tanto em
notoriedade pública quanto em ganhos financeiros no século XX. Ao contrário de
outras épocas, a beleza das manequins é admirada, principalmente, pelas próprias
mulheres que se espelham em sua aparência jovem e esbelta. O desejo de ser igual
a essas manequins favorece o crescimento econômico das indústrias de dietas,
cosméticos e cirurgias estéticas. Assim, nesse novo ciclo histórico que se baseia na
profissionalização da beleza, há um incremento no consumo de massa de imagens e
de produtos de estética. A exaltação da beleza contemporânea promove as marcas
que relacionam seu nome à estética (LIPOVETSKY, 2007; WOLF, 1992).
As revistas femininas acompanharam a mudança do papel feminino na sociedade e
o processo de massificação da beleza. Desde o século XIX, foram escritos artigos
para as mulheres sobre os movimentos de expansão da alfabetização feminina, as
mudanças da vida doméstica, a entrada no mercado de trabalho e o aumento do
poder aquisitivo das mulheres de diversas classes, além de outros fatores que
levaram à democratização da beleza junto com a avanço da tecnologia. Nos dias
atuais, as revistas especializadas em saúde e moda apresentam matérias sobre o
padrão de corpo ideal e como atingi-lo. As representações femininas de beleza são
expostas na publicidade para estimular o consumo de correção da aparência, ao
invés de proporcionar prazer pela contemplação da estética. A quantidade de
imagens de beleza que aparecem diariamente induzem as leitoras a desejarem
consumir produtos que estão cercados de fantasia que os cosméticos são
milagrosos trazem beleza e juventude do dia para a noite. Se no princípio o foco das
24
revistas era a indumentária, com o passar dos anos, precisaram escrever sobre o
corpo, para recuperar o público que estava se desinteressando pelas revistas
femininas. Assim, as mulheres são influenciadas pela mídia que descreve os ideais
de beleza (NOVAES, 2008; LIPOVETSKY, 2007; WOLF, 1992).
Eco (2010), diferentemente de outros autores, acredita que não se pode definir
apenas um ideal estético na contemporaneidade. O autor afirma que o mass media
é democrático no século XX, pois diferentes tipos de beleza são apreciados. Wolf
(1992) e Novaes (2008) não concordam e sugerem que as revistas apresentam uma
comparação de mulheres reais com um ideal de beleza que deve ser seguido. Essas
mesmas revistas femininas publicam propagandas e matérias que exaltam os
produtos cosméticos. Com a hiperexposição e avanço tecnológico, a beleza livrou-se
de diversos limites: a produção de produtos cosméticos que era artesanal passou a
ser industrializada, consequentemente, todas as camadas sociais passaram a ser
atingidas pelo mercado da beleza; as práticas de beleza e conselhos de beleza
também se difundiram para todas as classes da sociedade; a beleza feminina livrouse da associação negativa com o vício e a sedução; os cuidados com a beleza são
legítimos cada vez mais cedo e continuam em voga até cada vez mais tarde, não há
mais idade para uma mulher bela; a beleza pode ser atingida com recursos artificiais
como a cirurgia plástica; a exaltação do belo sexo não é mais apenas dos artistas,
mas é também de toda a imprensa, moda e cosméticos (LIPOVETSKY, 2007).
A beleza representa valores diferentes para os sexos feminino e masculino. Apesar
de o consumo da beleza pelo sexo masculino ter tido uma considerável expansão, a
partir dos anos 90, não alterou a hegemonia feminina. Os papéis estéticos
continuam indiscutivelmente separados desde o nascimento, os bebês do sexo
feminino já são agraciados com elogios relacionados a sua beleza enquanto os do
sexo masculino são qualificados como fortes ou ativos. Para uma mulher ser
considerada bela, necessariamente, ela precisa ter uma aparência jovem, no entanto
há diversos homens grisalhos que continuam charmosos. Mesmo atributos que são
mais valorizados no parceiro é diferente para homens e mulheres. Enquanto os
homens consideram a beleza física uma das principais características femininas, a
mulher valoriza bastante a inteligência masculina (LIPOVETSKY, 2007; WOLF,
1992; GOLDENBERG e RAMOS 2002; GOLDENBERG 2005, 2006, 2009)
25
2.2.1 O Corpo
Em cada sociedade o corpo desempenha um papel distinto e é julgado por aspectos
diferentes, dependendo da lente cultural de quem o observa. Assim, o padrão de
beleza do corpo feminino é uma função dos valores de cada época. Quando a
importância da mulher em uma sociedade se limitava a sua capacidade de
reprodução, as formas mais redondas eram consideradas belas. Já na sociedade
moderna, “a paixão pela magreza pode traduzir, no plano estético, o desejo de
emancipação da mulher” (LIPOVETSKY, 2007, p. 139), pois a magreza do corpo
representa um rompimento com essa identidade feminina exclusivamente ligada a
maternidade. Ao contrário de outros tempos, a mulher contemporânea é
independente e tem uma vida profissional ativa (ECO, 2010; LIPOVETSKY, 2007;
MCCRAKEN, 2003).
A aparência e a identidade sexual são as primeiras interações entre o indivíduo e a
sociedade, sendo a roupa o elemento de ligação. Através da vestimenta, a negação
ou aceitação das transições de fases da vida podem ser percebidas. Isso ocorre
principalmente no universo feminino, onde as mulheres gastam grande parte de seu
tempo com assuntos e consumo relacionados à moda. Em algumas sociedades, a
indumentária se adéqua ao envelhecimento das mulheres e é utilizada para disfarçar
aquilo que incomoda no corpo. No entanto, em locais como o Rio de Janeiro, onde
um corpo jovem é desejado em qualquer idade, mães e filhas costumam usar
roupas, semelhantes com a intenção de evidenciar o corpo (DION, BERSCHEID,
WALSTER 1972; TWIGG, 2007; GOLDENBERG, 2006).
Assim, a utilidade das roupas na sociedade carioca é destacar as formas do corpo
sexy, jovem, magro e em boa forma (GOLDENBERG, 2009). Desse modo, o corpo
torna-se a verdadeira roupa:
“(...) além do corpo ser muito mais importante do que a roupa, ele é a
verdadeira roupa: é o corpo que deve ser exibido, moldado, manipulado,
trabalhado, costurado, enfeitado, escolhido, construído, produzido, imitado.
É o corpo que entra e sai da moda. A roupa, neste caso, é apenas um
acessório para a valorização e exposição deste corpo da moda.”
(GOLDENBERG, 2006, p.118)
26
Esse corpo trabalhado e moldado passa a ser distintivo na sociedade. Ele é o
símbolo do esforço feito para atingir o modelo ideal; é uma grife, pelo
reconhecimento da superioridade daquele que o possui; e é considerado um premio
quando se assemelha ao ideal de perfeição, alcançado através de esforços e
artifícios que vão de exercícios físicos a cirurgias (GOLDENBERG, 2009). Desse
modo, aquele que trabalha para ter um corpo firme sem celulites e culotes merece o
ter o corpo perfeito. Ademais é admirável aqueles que têm o domínio soberano
sobre suas próprias formas. (LIPOVETSKY, 2007).
Apesar de o corpo ser um componente do self, a importância que ele representa
para a identidade varia de acordo com o contexto social e a cultura de cada
indivíduo (MITTAL, 2006). Desse modo, a busca pelo rejuvenescimento e pela
manutenção das formas é natural em cidades onde o corpo é muito exposto ao ar
livre, como o Rio de Janeiro, pois ele é parte central no processo de envelhecimento,
em que o tônus muscular e a pele são bastante afetados, por exemplo. Além disso,
o processo de envelhecimento é percebido como uma fatalidade ou como uma
imperfeição da natureza. Logo, todos os possíveis meios de atingir o corpo ideal e
rígido, resistente à ação do tempo são válidos. (ASKEGAARD et al., 2002;
LIPOVETSKY, 2007).
Para algumas mulheres, o corpo torna-se um objeto gerenciável que é submetido a
cirurgias plásticas, tratamentos anti-idade e prática de exercício, na tentativa de
evitar o envelhecimento: é o corpo como um capital. Assim, em pesquisa com
mulheres jovens que se submeteram à cirurgia plástica, Borelli (2009) observa que
há um receio com as “gordurinhas” e celulites que podem aparecer no corpo das
entrevistadas. O objetivo de algumas mulheres é manter o corpo como o conhecem,
evitando as mudanças causadas pela idade, pois o não reconhecimento do próprio
corpo pode levar a um sentimento de perda de um bem, fato que poderia atingir o
self (MITTAL, 2006; GOLDENBERG, 2006, 2007, 2009).
Assim, o interesse das mulheres por novidades de estética é relacionado com seu
desejo de controlar as formas e a idade do corpo. No universo feminino cada novo
tratamento cosmético representa mais uma possibilidade de ajustar o corpo ao ideal
de beleza difundido na cultura. Ideal que foi sendo construído na mente das
mulheres desde crianças, com belas princesas de histórias infantis, mostrando que a
27
beleza é uma característica superior e louvável. Ademais, os concursos de beleza,
fotografias de moda, produtos cosméticos continuam exaltando a importância da
aparência principalmente na identidade feminina (LIPOVETSKY, 2007). No entanto,
Paulson (2008) refere que o consumo de terapias de beleza também traz benefícios
para o campo emocional do self, além de melhorar a aparência física. Ele considera
que o maior ganho das terapias de beleza é psicológico, independentemente da
faixa etária.
Já, o estudo de Clarke, Griffin (2007), demonstra que as mulheres pesquisadas com
idade próxima dos 70 anos procuram aceitar o envelhecimento e a perda da beleza
física. Elas se esforçam para se distanciarem dos valores de beleza que a sociedade
dissemina. Já as mulheres que estão em seus 50 anos consideram o
envelhecimento sem o uso de produtos estéticos é inaceitável, resistindo ao nãoconsumo da beleza. Algumas mulheres mencionaram que sem as intervenções
estéticas
a
aparência
não
se
adequaria
ao
modo
como
se
sentem,
independentemente da idade cronológica. Desse modo, elas buscam gerenciar o
processo de envelhecimento.
Wolf (1992) considera que o anseio de aparentar uma imagem idealizada por uma
massa feminina é contraditória à idéia de individualidade difundida pela sociedade
atual. Contudo, Lipovestky (2007) parece discordar dessa visão, observando que
apesar de a homogeneização da beleza feminina parecer contraditória com o valor
de individualidade do mundo ocidental moderno, existem muitos e diferentes
caminhos para se chegar ao corpo ideal. Desse modo, cada conjunto de escolhas
que a mulher faz é personalizada, mesmo que ela seja expostas às novidades do
mercado que são lançadas diariamente para optar pelo melhor caminho. Na
sociedade contemporânea, cada cidadão tem o direito de escolher, experimentar,
questionar e rejeitar os produtos cosméticos apresentados no mercado. O livre
acesso às informações propagadas pelos meios de comunicação fazem parte da
construção de ideais estéticos e da formação de opinião popular sobre tratamentos
estéticos (LIPOVETSKY, 2007; GOLDENBERG, 2006, 2009).
Apesar de certa obsessão em massa em torno da magreza, há um fracasso na
sociedade em fazer com que todos tenham esse autocontrole: disfunções
alimentares, obesidade, exercícios que não são feitos regularmente são todos
28
exemplos da falta de controle sobre o corpo, que pode criar culpa e ansiedade. A
exigência da beleza ideal e jovem é mais rigorosa com as mulheres que as antigas
amarras ditadas pela a sociedade em relação ao campo sexual, a indumentária e ao
dever da maternidade. Assim, o invés de uma sociedade com corpos perfeitos, “o
universo do consumo exacerba os desejos e favorece os impulsos e manias
passageiras, aumenta a aversão aos esforços regulares e austeros” (LIPOVETSKY,
2007, p. 147).
2.2.2 Cosméticos e cosmocêuticos
A preocupação feminina em parecer jovem não é um fenômeno recente, porém os
cuidados com a aparência, antigamente, limitavam-se a disfarçar a idade com o uso
de maquiagens e penteados. No antigo Egito, a maquiagem era utilizada para
marcar bem os olhos, como pode ser observado em algumas representações de
mulheres importantes nessa sociedade como Cleópatra e Nefertiti. Sabe-se que
grande parte das substâncias coloridas que esse povo usava como maquiagem
eram venenosas (LIPOVETSKY, 2007; KURY, 2000).
Desde a antiguidade clássica, a arte da maquiagem era vista como uma trapaça
desonesta das mulheres e uma arma de sedução, com o uso de certas substâncias
para disfarçar seus defeitos. A Renascença foi o período onde a elite européia mais
utilizou a maquiagem. A mulher dessa época também costumava enfeitar seu corpo
com objetos da ourivesaria, preocupava-se com o cabelo, que frequentemente era
pintado de loiro, e utilizava produtos cosméticos. Nesse período, o recato da igreja
foi deixado de lado e o clima de luxúria e sedução circulava livremente na
aristocracia. Tanto homens quanto mulheres escondiam a pele com pós e pastas
brancas, enquanto os tons coloridos eram utilizados na bochecha, lábios e olhos
para realçar a brancura (ECO, 2000; LIPOVETSKY, 2007; KURY, 2000).
Durante milênios os cosméticos foram exclusivos de uma elite social. Apenas no
século XX os produtos de estética deixaram de ser privilégio de classes sociais mais
abastadas. A produção em massa possibilitou o acesso da população aos produtos
de beleza. Desse modo, o consumo dos cosméticos aumentou nos anos 20 e 30: o
batom fez grande sucesso a partir de 1918 e os bronzeadores e esmaltes de unha
nos anos 30. Contudo, foi na secunda metade do século XX que o crescimento do
29
mercado dos produtos de beleza teve um grande avanço e passou a fazer parte do
consumo diário em razão do aumento do nível de vida e do avanço cientifico dos
métodos industriais (LIPOVETSKY, 2007).
Por todo o século passado, o ideal da mulher longilínea e esbelta, e a busca por
uma aparência jovem nortearam a estética feminina. Na cultura brasileira,
particularmente em cidades como o Rio de Janeiro, o corpo e as perfeição das
formas são reverenciados no dia-a-dia da população. Um reflexo da valorização da
aparência por essa sociedade é o crescimento do mercado de cosméticos,
procedimentos estéticos e cirurgias plásticas. De 1996 a 2010 a indústria de higiene
pessoal, perfumaria e cosméticos (HPPC) cresceu significativamente mais rápido
que a economia do país: enquanto o PIB cresceu em média 3,1% a.a., HPPC teve
um aumento médio de 10,4% a.a.. Ademais, o Brasil se apresenta como um grande
consumidor mundial; em 2010, o país representou o terceiro maior mercado
consumidor de HPPC com um faturamento de US$ 37,4 bilhões, representando 15%
do faturamento dos 10 maiores países consumidores, e o quarto maior mercado em
produtos relacionados a pele. A cada dia aparecem mais produtos e serviços que
prometem bem-estar, saúde e beleza (LIPOVETSKY, 2007; ASKEGAARD et al.,
2002; ABIHPEC, 2010).
Os cosméticos são utilizados em todo o corpo, mas principalmente no rosto, para
embelezar, melhorar a aparência e corrigir defeitos superficiais. Assim, os produtos
destinados à higiene e à beleza são considerados cosméticos (HOUAISS, 2001).
Apenas no século XX os produtos estéticos passaram a ter a função de conservar o
corpo, além de disfarçar seus defeitos. Não havia tecnologia, até esse momento,
que cumprisse o papel de preservar a aparência. Assim, pode-se notar que o
interesse pelo rejuvenescimento do corpo através de práticas que conservam um
corpo esbelto e jovem é algo recente. Desde o aparecimento de tecnologias
rejuvenescedoras, as revistas femininas foram invadias por matérias que ressaltam
a magreza e o culto a beleza. Com a valorização do corpo jovem, as técnicas de
prevenção passaram a ser mais importantes que as técnicas de camuflagem
(LIPOVETSKY, 2007).
Nesse momento, os laboratórios passaram a comercializar uma outra categoria de
produtos estéticos: os cosmocêuticos, que são produtos caracterizados pelo
30
“funcionamento de ingredientes biologicamente ativos na barreira cutânea e na
saúde da pele” (DRAELOS, 2009, p. 2). A eficácia desses produtos dependem de
sua formulação, que deve veicular o ativo para que tenha uma ação biologicamente
ativa para a pele. Os cosmocêuticos mais básicos são os limpadores, hidratantes e
protetores solar. Entre os mais sofisticados encontram-se os seruns anti-idade,
esfoliantes e cremes auto-bronzeadores. Possivelmente, os cosmocêuticos do futuro
serão hidratantes moduladores de células, mascaras de regeneração de colágenos
e pílulas estimuladoras de melanina (DRAELOS, 2009).
No mercado atual, alguns cosmocêuticos são vendidos como cosméticos. Para
verificar a eficácia do produto são necessários os testes clínicos, que são uma
importante arma para os dermatologistas. De qualquer modo, esses produtos têm
uma ação limitada e seu efeito é determinado pela capacidade de melhorar a pele.
Nenhum hidratante tem a capacidade de melhorar as rugas profundas da face, eles
apenas minimizam sua aparência. Já os clareadores necessitam de, no mínimo, seis
semanas para melhorar a pele (DRAELOS, 2009).
Os cosmocêuticos já foram considerados produtos de luxo, porém atualmente, são
indicados como produtos complementares aos produtos farmacêuticos. Os
dermatologista utilizam os cosmocêuticos com a intenção de minimizar efeitos
colaterais dos farmacêuticos e de trazer benefícios para a pele. Interessante que
muitos consumidores acreditam que o preço dos produtos de estética está
diretamente ligado à qualidade do produto, porém, essa afirmativa não é sempre
verdadeira. Os componentes mais caros do produto são sua apresentação
(embalagem) e sua fragrância. Esses componentes tem relação apenas com a
estética do produto e não com sua eficácia (DRAELOS, 2009).
Com o avanço da tecnologia no mercado da beleza e a possibilidade da manutenção
da juventude por um maior período de tempo, pode-se observar que duas normas
passam a dominar o universo feminino na sociedade contemporânea: o antipeso e o
antienvelhecimento. Alguns sinais apontam para o contínuo crescimento da
valorização da beleza e juventude do corpo: já em 1997, o consumo dos produtos
anti-idade e antirrugas ultrapassavam o consumo de maquiagens; e a busca pela
cirurgia plástica com a intenção de rejuvenescimento mostra-se cada vez mais
frequente (LIPOVETSKY, 2007).
31
Nesse cenário, os produtos antienvelhecimento passaram a fazer parte do euestendido de algumas mulheres. Contudo, apenas quando o corpo representa um
componente importante da identidade da mulher e através desses produtos ela
consegue expressar um certo estilo de vida os cosméticos fazem parte de sua
identidade. Assim, os bens de consumo são utilizados como símbolos que servem
para categorizar idéias, conservar um estilo de vida e definir, em parte, o self
(MITTAL, 2006 ; MCCRAKEN, 2003).
Casotti, Suarez e Campos (2008), a partir de um estudo feito no Rio de Janeiro, com
mulheres de classe mais alta, relatam que o modo como a mulher consome os
produtos de beleza pode variar com o ciclo de vida. As mudanças de rotina e a
percepção do envelhecimento do corpo influenciam no modo como as mulheres se
relacionam com os cosméticos. As mais jovens que estão no fim da adolescência e
iniciam seu percurso no mercado de trabalho desejam resultados imediatos, pois o
momento presente é o importante. Assim, podem valorizar o bronzeado exagerado,
mesmo conhecendo a importância do filtro solar. Posteriormente, há o grupo de
mulheres que estão no mercado de trabalho, porém não possuem filhos. Essas
mulheres percebem que precisam administrar seu tempo no dia-a-dia, que é
bastante corrido, pois já estão preocupadas com a ação do tempo em seu corpo e
pensam em prevenir contra o envelhecimento. Elas gostam de experimentar, porém
não tem o costume de utilizar os cosméticos se não estiverem ao alcance da visão.
O terceiro grupo, são as mulheres que são mães e profissionais que sentem que o
corpo está mudando pelo envelhecimento. Seu tempo é escasso e por isso não
podem perder tempo com diversos produtos, elas escolhem os cosméticos pela
praticidade. Por último, as autoras contam que depois de uma certa idade, com os
filhos já não tão dependentes, as mulheres passaram a ter mais tempo livre para se
cuidarem. Ademais, são mulheres que estão se aposentando ou diminuíram sua
jornada de trabalho, o que também libera tempo para se cuidarem. Esse grupo têm
mais consciência do seu envelhecimento e se preocupam em utilizar produtos que
busquem prevenir a ação do tempo. Essas consumidoras experimentam diversos
produtos mas são mais exigentes e sofisticadas que em outros períodos da vida.
32
2.3 ENVELHECIMENTO
As primeiras pesquisas feitas sobre o envelhecimento se referiam ao desgaste
fisiológico do corpo, com o objetivo de encontrar um meio para retardá-lo.
Posteriormente, iniciaram-se estudos do campo das ciências sociais, mostrando que
a velhice é, na verdade, uma construção sociocultural. Assim, o entendimento da
idade não se faz apenas de uma forma cronológica, mas também é relacionado ao
significado cultural de uma idade, à percepção da autoimagem e ao sentimento de
cada indivíduo (LOGAN, WARD, SPITZE, 1992; DEBERT, 2004), segundo
Baudrillard (2008):
“O estatuto do corpo é um fato de cultura. Ora, seja em que cultura for, o
modo de organização de relação ao corpo reflete o modo de relação às
coisas e das relações sociais.” (p. 168)
Além disso, a identidade do indivíduo também é sustentada pelas relações com
terceiros, onde o olhar do outro exerce um importante papel:
“a velhice parece mais claramente para os outros, do que para o próprio
sujeito; ela é um novo estado de equilíbrio biológico: se a adaptação se
opera sem choques, o indivíduo que envelhece não a percebe.” (Beauvoir,
1990, p. 348)
Goldenberg (2009) narra suas dificuldades e crises ao perceber a própria velhice se
aproximando, uma preocupação que teve início no momento em que sua
dermatologista percebeu sinais da idade em seu rosto. Assim, a partir da visão de
outra pessoa a autora passou a se olhar de modo diferente e enxergar rugas onde
nunca tinha notado. O self pode ter sido influenciado no momento em que outra
pessoa a percebeu diferente do que ela sempre havia se visto.
Na sociedade atual, o comportamento parece definir os marcadores de tempo
melhor que a idade cronológica. De acordo com Simone de Beauvoir (1990), não há
um acordo quanto ao início da velhice, nem um ritual passagem para essa fase da
vida, como um dia foi a aposentadoria. Assim, a velhice passa a ser relacionada à
autonomia do indivíduo e a idade cronológica perde um pouco de sua importância
em uma sociedade onde a aparência e o comportamento jovem permeiam diversas
idades (DEBERT, 1997, 2004).
33
Barak et al. (2008) observam que a idade cognitiva e a idade desejável são
inferiores à idade cronológica das mulheres pesquisadas nas culturas da Korea,
China e Índia. Apesar de elas fazerem parte de uma cultura que demonstra um
grande respeito e admiração pelos mais velhos – o que levaria à aceitação do
envelhecimento -, as mulheres orientais também têm o desejo de se manterem
jovens. Portanto, o sentimento que essas mulheres têm em relação a sua idade não
difere muito das mulheres americanas. Percebe-se, então, que o desejo de ser
jovem e manter a aparência jovem parece ser global.
Em outro estudo, Logan, Ward e Spitze (1992) perceberam que entre pessoas de
mesma idade cronológica podem existir diferenças de percepção em relação à fase
da vida que estão passando. Apesar da maioria dos entrevistados de 55 anos
entenderem que estão na meia-idade, alguns se intitulam jovens e outros velhos.
Isso ocorre pois, as experiências e preocupações acumuladas durante a vida
acabam influenciando na percepção da idade. Se foram experiências árduas, a
probabilidade de a pessoa se sentir mais velha é maior. O autores concluem que o
sentimento em relação à idade é um produto da idade cronológica, do estado de
saúde e das experiências da vida. Além disso, a categoria de idade com a qual o
entrevistado se identificou está associada à sua auto-estima. Aqueles que tem uma
baixa auto-estima sente-se mais velho. Ainda, as pessoas pesquisadas pelos
autores, classificados na categoria de idosos, são menos felizes e apresentam uma
menor satisfação na vida, sugerindo que a transição da meia-idade para a velhice é
uma experiência negativa.
Os avanços da medicina, a melhor política de saúde pública e a disseminação dos
conceitos de nutrição permitiram o aumento da expectativa de vida no século XX. A
longevidade do indivíduo somada ao envelhecimento de uma parcela da população
chamada de baby boomers resultaram no crescimento do número de idosos e em
mudanças no quadro demográfico (MOSHINS, BERNHARDT, 2003; LEVENTHAL,
1997).
Estudos do IBGE (2008) demonstram que os idosos serão uma grande parcela da
população brasileira já em 2020 e, em 2050, haverão mais idosos do que crianças
no Brasil. Esse fato aponta para a necessidade de maior atenção com o segmento
da população mais velha. Mesmo após a primeira década do século XXI, Casotti,
34
Campos e Borelli (2011) reconhecem que empresas ainda valorizam o segmento
jovem em detrimento ao segmento de pessoas mais velhas.
Nota-se que a mudança da configuração etária da população afeta os governos, os
indivíduos e as instituições. Contudo, pensar que o problema da velhice ganhou
destaque, exclusivamente, pela maior representatividade do número de idosos na
sociedade seria perder a chance de observar “mudanças culturais nas formas de
pensar e gerir a experiência cotidiana, o tempo e o espaço, as idades e os gêneros,
o trabalho e o lazer [...]” (DEBERT, 2004, p.13). Como consequência dessas
mudanças culturais, a velhice deixou de representar apenas uma fase do ciclo vida,
desmembrando-se em etapas intermediárias como a meia-idade, terceira idade e
aposentadoria ativa; enquanto a juventude parece ter se tornado a etapa mais longa
desse ciclo, pois crianças estão virando jovens mais cedo e os jovens tornam-se
adultos cada vez mais tarde (CASOTTI, CAMPOS E BORELLI, 2011).
Até os anos 80 o mercado de consumo era orientado para o público jovem, mais
especificamente, para pessoas com até 50 anos de idade. As empresas acreditavam
que as pessoas mais velhas tinham limitações econômicas e, por isso, eram
insignificantes. No entanto, ao ser publicado o primeiro artigo, na Harvard Business
Review, dimensionando o tamanho do mercado da população madura e
demonstrando seu poder de compra, os empresários perceberam que estavam
negligenciando um grupo importante de consumidores. Porém, na tentativa de
recuperar esse mercado, as empresas cometeram inúmeros erros de marketing pela
falta de informações necessárias para tomar decisões, como anúncios para pessoas
de 50 e 60 anos com imagens de velhos deprimidos e carentes (MOSHINS,
BERNHARDT, 2003).
Parece haver uma discordância entre Moshins e Bernhardt (2003) e Leventhal
(1997) quanto a importância dada aos consumidores mais velhos pelas empresas,
nos anos 1990. Enquanto Moshins e Bernhardt (2003) percebem que houve um
movimento de valorização desse público, com mensagens e produtos desenvolvidos
especificamente para atingir esse segmento; Leventhal (1997) relata que, para
muitas empresas, esses consumidores representavam um grupo de pessoas velhas,
vulneráveis, com baixo poder de consumo e solitárias.
35
Contudo Debert (2004) observa que, desde os anos 1990, a mídia parece apoiar a
crença de que a velhice é um momento de privilégios, em que os idosos podem
realizar sonhos e colocar em prática projetos que foram adiados por causa das
obrigações da vida adulta. Nesse cenário, muitos profissionais de marketing já
perceberam a complexidade e a diversidade do grupo de consumidores mais velhos
(MOSHINS E BERNHARDT, 2003)
2.3.1 O consumo e o envelhecimento
A construção da identidade das pessoas que vivem na sociedade atual é baseada
em seus hábitos de consumo. Contudo, até a metade do século XX, o trabalho e a
ocupação do indivíduo tinham papéis centrais no self e eram determinantes para o
status social do indivíduo. Já no mundo contemporâneo, são as posses e o estilo de
vida que definem a posição social. Portanto, a identidade e a percepção de terceiros
em relação à uma pessoa está mais ligada ao seu consumo que ao seu trabalho
(RANSOME, 2005). Como observado por McCraken:
“O sistema de consumo supre os indivíduos com materiais culturais
necessários à realização de suas variadas e mutantes idéias do que é
ser um homem ou uma mulher, uma pessoa de meia-idade ou um
idoso (...) Todas essas noções culturais estão concretizadas nos bens,
e é através de sua posse e uso que o individuo as assimilas em sua
própria vida.” (2003, p. 119)
Na sociedade baseada no consumo as pessoas costumam buscar experiências de
consumo para satisfazer diferentes prazeres e necessidades (RANSOME, 2005).
Como visto na pesquisa de Logan, Ward e Spitze (1992), o consumo hedônico de
produtos relacionados a beleza levam a uma sensação de bem-estar, o que faz com
que o sentimento de juventude reapareça. Nesse cenário, surge um conflito entre a
idade cronológica e a idade sentida, o que Simone de Beauvoir (1990) chamou de
“contradição intransponível”.
Para o mercado de consumo a idade sentida por uma pessoa é mais importante que
a idade cronológica. Assim, a intensidade do envolvimento com o consumo de
produtos de beleza tem relação com a percepção do próprio envelhecimento. As
celulites, manchas de sol, rugas, dificuldade para emagrecer e fios brancos, são
alguns sinais do envelhecimento percebido pelas mulheres. De acordo com Simone
de Beauvoir (1990), apenas com os sinais do envelhecimento aparentes o indivíduo
reconhece o próprio envelhecimento:
36
“Quando jovens, ou na força da idade, não pensamos, como Buda, que já
somos habitados pela nossa futura velhice: ela está separada de nós por
um tempo tão longo que, aos nossos olhos, confunde-se com a eternidade;
este futuro longínquo nos parece irreal.” (p. 11)
Do mesmo modo, Casotti, Campos e Borelli (2011) comentam que ao sentir as
primeiras mudanças no corpo, causadas pelo avanço da idade, as jovens tomam
consciência do envelhecimento, que até então não parecia ser um fato real, e
passam a inserir alguns produtos estéticos em seu dia-a-dia.
As conquistas no campo da estética trazem a cada dia novos tratamentos e
procedimentos que prometem para mulheres mais velhas a pele de uma jovem de
20 anos de idade. Na tentativa de “enganar” a passagem do tempo, todos os artifício
valem o risco para rejuvenescer, mesmo que possa significar o comprometimento da
saúde. Assim, o corpo bem torneado e sexy é construído através de muito esforço.
Os tratamentos de beleza que vão de cremes à cirurgias plásticas moldam um corpo
que é considerado “natural” e superior ao de outros indivíduos que não possuem
esse corpo esculpido ou aos que já estão com o corpo envelhecido (GOLDENBERG,
2007, 2009).
Debert
(2004),
assim
como
Goldenberg
(2007,
2009)
observou
que
a
responsabilidade pela imagem e pelo envelhecimento é do indivíduo, que tem
tratamento cosméticos, ginástica, vitaminas e plásticas para rejuvenescer cada vez
mas acessíveis. As autoras observam que o corpo natural é aquele “naturalmente
construído”, sem imperfeições que chegam com o avanço da idade. Desse modo, a
juventude passa a ser um valor que todos desejam, e não mais uma faixa etária
definida cronologicamente.
Contudo, Clarke e Griffin (2007) parecem encontrar uma diferença no que é
considerado envelhecimento “natural” e “não-natural” no conceito das mulheres
pesquisada, entre 50 e 70 anos de idade. Essas mulheres consideram que
procedimentos cosméticos mais invasivos levam ao envelhecimento “não natural”;
enquanto o envelhecimento “natural” pode englobar o uso de cremes anti-rugas,
tingimento de cabelo, ou seja, de tratamentos não invasivos. Para elas, esses
tratamentos são utilizados para a manter sua feminilidade e atração física. Apesar
de considerarem essencial disfarçar a idade com os tratamentos estéticos, elas
analisam que aquelas mulheres que não consomem nenhum tipo de tratamento são
37
puras, autênticas e admiráveis. Ainda, de acordo com os autores, a publicidade, os
manuais de auto-ajuda e especialistas em saúde são os primeiros a passar uma
imagem de que imperfeições no corpo não são naturais, nem imutáveis, portanto,
podem ser corrigidas, é como uma “ditadura da juventude”.
Segundo Goldenberg e Ramos (2002) o final do século XX e início do XXI são
momentos da história onde o culto e a obsessão pelo corpo passaram a fazer parte
da cultura brasileira. Mulheres de grande sucesso como a Gisele Bündchen e
algumas atrizes da Globo são exemplos de um padrão beleza social. Mulheres de 50
anos posam nuas na revista Playboy demonstrando a possibilidade de manter
perfeição e juventude na meia-idade. Esse comportamento pode ser um reflexo do
aprisionamento da liberdade, onde, teoricamente, as pessoas têm livre escolha
sobre o corpo, porém há uma constante pressão para seguir o padrão de beleza e
juventude estipulado pela sociedade (BAUMAN, 2001).
Na sociedade de consumo o corpo se tornou o objeto de salvação, ocupando o lugar
da alma na função moral e ideológica. Ser bela é uma qualidade fundamental para
aquelas que cuidam do rosto como da alma (BAUDRILLARD, 2008) em uma
sociedade em que a beleza está diretamente ligada à juventude. Por exemplo, Bayer
(2005) avalia que apenas mulheres com menos de 40 anos são modelo de beleza e
sucesso.
Assim, marcas como Lacôme e Helena Hubstein prometem uma aparência jovem
conferindo imagens manipuladas de peles perfeitas às embalagens dos seus
produtos. No entanto, Wolf (1992) considera absurdo tratar as imagens que
aparecem na mídia, visando apagar os sinais de idade das mulheres, pois isso
significaria apagar a identidade e a história das mulheres. Do mesmo modo, tentar
apagar os sinais da idade com tratamentos e procedimentos estéticos, e cirurgias
plásticas pode ser compreendido como uma violência contra a mulher.
A manipulação de imagens em meios de comunicação leva as consumidoras a se
iludirem, ao acreditar que mulheres de 60 ou 70 anos que aparecem na mídia não
possuem
rugas.
Com
isso,
para
algumas
mulheres,
a
expectativa
do
rejuvenescimento passa a ser algo inalcançável. Em outros casos, os produtos de
estética servem como pontes para as esperanças. Nesse processo, os objetos são
38
utilizados para recobrar o significado que foi, em algum momento, deslocado em
tempo ou espaço. Desse modo, os produtos rejuvenescedores servem como um
meio de renovar a expectativa consumistas de certas mulheres (WOLF,1992;
MCCRACKEN, 2003).
Como um instrumento de transmissão dos significados da imagem ideal e de
juventude, as empresas de cosméticos passam a explorar de forma efetiva a
publicidade. Assim, muitas revistas mantêm uma coluna sobre os novos produtos de
beleza, onde são encontradas promessas de juventude eterna. Por exemplo, a
revista Vogue apresenta constantes lançamentos: o novo extrato Vitamina C para a
pele continuar lisa (VOGUE 357, 2008); os ativos extraídos de aranhas coreanas, o
peeling desenvolvido em Bagdá e o laser indolor (VOGUE 326, 2005); a maçã suíça
que possui células-tronco extremamente resistentes, com poder regenerador
(VOGUE 376, 2009) Quando a equivalência simbólica é bem sucedida, o
consumidor que lê a mensagem atribui àquele bem de consumo as propriedades
que lhe foram transferidas (MACCRAKEN, 2003). O movimento de significados pode
ser visualizado na figura abaixo:
Figura 1.
Fonte: MCCRAKEN, 2003
Assim, os meios de comunicação transmitem em suas mensagens não só mulheres
jovens, magras e belas, mas também meios de rejuvenescer ou de prevenir os
sinais da idade cada vez mais cedo. Como resultado, muitas consumidoras
39
começam os tratamentos ainda na juventude, através de cremes e procedimentos
cosméticos (DEBERT, 2004; WOLF, 1992), ou se submetem à cirurgias plásticas
(BORELLI, 2009)
Geriatras e cientistas sociais especialistas em envelhecimento afirmam que a
juventude é um bem que todos podem conquistar através de medidas preventivas.
Eles reforçam o discurso de que a falta de beleza e de saúde é uma conseqüência
da falta de cuidados durante a vida (DEBERT, 2004).
Nesse universo, Debert (2004) comenta sobre a importância de três atores sociais
para um envelhecimento saudável: os gerontólogos, que são experts no assunto, a
mídia e as pessoas mais velhas. O primeiro grupo estuda de perto o processo
envelhecimento. A mídia, ao debater amplamente o assunto, tem um papel
fundamental para abertura de novos mercado de consumo para esse segmento. Por
último, as pessoas de mais idade estão tomando consciência que precisam aprender
a lidar com o envelhecimento no contexto social atual.
2.3.2 As dificuldades do envelhecimento
Para Debert (2004), não é possível afirmar que a velhice já teve sua idade de Ouro,
já que não há provas conclusivas de que houve uma época em que os mais velhos
eram valorizados na sociedade. Na segunda metade do século XX, a velhice era
considerada decadente e havia a ausência de um papel social para o idoso. Desde
essa época, o envelhecimento passou a ser percebido e tratado como um processo
de perdas que levam a decadência do indivíduo; os mais velhos eram esquecidos ou
tratados como um fardo.
Contudo, o indivíduo não inicia o processo de envelhecimento no momento em que
nasce; enquanto as falhas do organismo forem insignificantes para a vida do sujeito
ou compensadas pelo organismo de algum modo, não se poderá falar em
envelhecimento. Apenas quando se apresenta um declínio real da parte física ou
psicológica, o ser humano começa a envelhecer. Nos tempos atuais, os indivíduos
são responsabilizados pela própria aparência e saúde; e as situações de abandono
e dependência são consideradas conseqüência de uma falta de estilo de vida
adequado (DEBERT, 2004; BEAUVOIR, 1990).
40
Tanto no trabalho quanto na vida social é notado um preconceito contra aqueles que
envelhecem, como exemplo, muitas empresas incentivam a aposentadoria antes do
tempo, oferecendo benefícios e cortando os altos salários dos funcionários antigos.
Nesse sentido, a aparência rejuvenescida pode fazer com que os profissionais
consigam manter seu valor por mais tempo (DEBERT, 2004; BEAUVOIR, 1990).
Logan, Ward, Spitze (1992) perceberam por seu estudo que pessoas que se
classificam na categoria de idosos são menos felizes e apresentam uma menor
satisfação com a vida, sugerindo que a transição no ciclo de vida para a velhice é
uma experiência negativa. Já a meia-idade é percebida como uma fase que as
pessoas se sentem mais influentes, embora a associação com o declínio físico e o
sentimento negativo em relação ao envelhecimento seja evidente.
Apesar do medo do envelhecimento por grande parte da população, a velhice não
está ligada apenas a símbolos negativos. Cada vez mais os indivíduos parecem
compactuar com a idéia de que a velhice pode ser uma fase de realização das
atividades que foram adiadas ao longo da vida por causa das responsabilidades da
fase adulta. Aqueles que se enquadram na meia-idade ou que já têm uma idade
avançada podem libertar-se de obrigações com a família para se dedicar à novas
realizações, que, de certa forma, reforçam a própria identidade. Algumas pessoas
demonstram um desejo de viver bem, mantendo uma boa aparência. (LOGAN,
WARD, SPITZE, 1992; BAYER, 2005).
Para Goffman (apud JENKINS, 2008) o individuo é representado por sua presença
física no mundo. Segundo esse autor, o corpo, mais particularmente o rosto,
representa a interação do eu com o mundo, podendo tanto interagir no meio público
quanto no privado. Logo, não é simples aceitar a mudança na aparência que ocorre
com o processo de envelhecimento.
McCraken (2003) sugere que as idéias e valores de sociedade estão repletos de
significados culturais. “De acordo com os quais vão sendo organizados, avaliados e
construídos” (p. 105) os fenômenos sociais que são substanciados nos objetos de
consumo. Tal idéia é bem descrita nas pesquisas de Goldenberg (2009), onde a
autora traça um paralelo entre as idéias e os valores relacionados ao
envelhecimento das mulheres alemãs e brasileiras. A partir de cultura de cada país,
41
ficam claras as diferenças de pensamento e modo de vida, esse fenômeno passa a
ser evidenciado na forma como essas mulheres lidam com certos bens de consumo,
como a vestimenta.
Goldenberg (2008) analisa o discursos das mulheres de 50 anos do Brasil e da
Alemanha e percebe algumas diferenças em seus discursos. As idéias de falta,
invisibilidade e aposentadoria foram comentadas apenas pelas brasileiras. As
alemãs parecem perceber o lado positivo da idade em termos profissionais,
intelectuais e culturais. Essas mulheres não tem uma preocupação em parecer
jovem ou com o corpo, sua atenção é com a qualidade de vida e consideram uma
imaturidade a busca pelo rejuvenescimento e a não aceitação e valorização da
idade.
Entre as mulheres brasileiras pesquisadas foram percebidos três discursos: o da
“falta”, pela falta de homens interessantes de sua idade que tenham um
comportamento compatível com sua idade. Elas relatam que, normalmente, os
homens de 50 anos, agem como garotões e procuram mulheres mais novas. O
discurso da “invisibilidade”, quando chegam aos 50 anos e não tem mais o corpo
jovem, magro e sexy, elas percebem que não são mais paqueradas e não recebem
elogios e por isso se sentem invisíveis. Por último, a autora classificou o discurso de
“aposentaria” aquelas mulheres que, apesar de continuarem interessante aos olhos
masculinos, preferem deixar de praticar sua sexualidade por não se sentirem bem
com seu corpo. Segundo a autora são discursos que representam os medos e
inseguranças provenientes do envelhecimento, onde essas mulheres sentem-se
vítimas. Entretanto, há um outro grupo de brasileiras que sente que ganhou
liberdade, tolerância, sentem-se mais maduras. Elas passaram a cuidar mais de si
mesmas e buscam o que há de melhor em si mesmas. Desse modo, apesar de as
brasileiras serem aparentemente mais jovens e estarem em melhor forma que as
alemãs, elas são psicologicamente mais afetadas pelo processo de envelhecimento,
sentindo-se desvalorizadas (GOLDENBERG, 2009).
2.4 A BIOÉTICA MÉDICA
No capítulo de revisão de literatura buscou-se conhecimentos relativos à identidade
dos consumidores ou pacientes, como no caso dessa pesquisa, ao mesmo tempo
em que se procurou refletir sobre temas complexos como beleza e envelhecimento,
42
tanto para os consumidores quanto para a especialidade médica denominada
dermatologia. Os dermatologistas parecem sentir dificuldades em distinguir aspectos
da cosmética e da prática médica, podendo surgir conflitos de interesse no dia-a-dia
da profissão e uma crença da população de que a dermatologia tornou-se mais uma
especialidade cosmética do que médica. A constatação dessas dificuldades levou a
uma busca de melhor entendimento de questões éticas relativas às praticas médicas
(GENDLER E RIZZO, 2009).
Segundo Kottow (1995), a bioética é o conjunto de conceitos, argumentos e normas
que valorizam e justificam eticamente os atos humanos que podem determinar a
morte de um ser humano. Já para Schramm (2002), a bioética, também chamada de
“ética prática”, visa “dar conta” dos conflitos e controvérsias morais implicados pelas
práticas no âmbito das Ciências da Vida e da Saúde.
Tais conflitos surgem das interações humanas e devem encontrar soluções para os
conflitos de interesses e de valores, recorrendo apenas a negociação entre agentes
morais considerados cognitiva e eticamente competentes. Pode-se dizer que a
bioética tem três função principais: descritiva, que descreve e analisa os conflitos;
normativa com relação a tais conflitos, tanto no sentido de proscrever os
comportamentos que podem ser considerados reprováveis quanto de prescrever
aqueles considerados corretos; e protetora, no sentido bastante intuitivo, de
amparar, quando possível, todos os envolvidos em alguma disputa de interesses e
valores, priorizando, quando necessário, os mais “fracos” (SCHRAMM, 2002).
Sgreccia (1996) discorre sobre os quatro princípios intrínsecos à bioética: o princípio
da Não Maleficência, da Beneficência, de Respeito à Autonomia e de Justiça.
De acordo com o princípio de Não Maleficência, o profissional de saúde tem o dever
de, intencionalmente, não causar mal e/ou danos a seu paciente. Considerado por
muitos como o princípio fundamental da tradição hipocrática da ética médica. Tratase, portanto, de um mínimo ético, um dever profissional, que, se não cumprido,
coloca o profissional de saúde numa situação de má-prática ou prática negligente da
medicina. A Não Maleficência tem importância porque, muitas vezes, o risco de
causar danos é inseparável de uma ação ou procedimento que está moralmente
indicado. No exercício da medicina este é um fato muito comum, pois quase toda
43
intervenção diagnóstica ou terapêutica envolve um risco de dano. Do ponto de vista
ético, este dano pode estar justificado se o benefício esperado com o resultado de
um exame for maior que seu risco. Quanto maior o risco de causar dano, maior e
mais justificado deve ser o objetivo do procedimento para que
este possa ser
considerado um ato eticamente correto.
O princípio da Beneficência significa que temos a obrigação moral de agir para o
benefício do outro. Este conceito, quando é utilizado na área de cuidados com a
saúde, significa fazer o que é melhor para o paciente, não só do ponto de vista
técnico-assistencial, mas também do ponto de vista ético. É usar todos os
conhecimentos e habilidades profissionais a serviço do paciente, considerando, na
tomada de decisão, a minimização dos riscos e a maximização dos benefícios do
procedimento a realizar. O princípio da Beneficência obriga o profissional de saúde
a ir além da Não Maleficência (não causar danos intencionalmente) e exige que ele
contribua para o bem estar dos pacientes, promovendo ações: para prevenir e
remover o mal ou dano que, neste caso, é a doença e a incapacidade; e para fazer o
bem, entendido aqui como a saúde física, emocional e mental. É preciso avaliar a
utilidade do ato, pesando benefícios versus riscos e/ou custos.
A Autonomia é a capacidade de uma pessoa decidir fazer ou buscar aquilo que ela
julga ser o melhor para si mesma. Para que isso ocorra são necessárias duas
condições fundamentais: a capacidade para agir intencionalmente, o que pressupõe
compreensão, razão e deliberação para decidir coerentemente entre as alternativas
apresentadas e liberdade, no sentido de estar livre de qualquer influência
controladora para esta tomada de posição. Já o respeito à Autonomia significa ter
consciência do direito da pessoa possuir um projeto de vida próprio, de ter seus
pontos de vista e opiniões, de fazer escolhas autônomas, de agir segundo seus
valores e convicções. Respeitar a autonomia é, em última análise, preservar os
direitos fundamentais do homem, aceitando o pluralismo ético-social que existe na
atualidade. A aliança terapêutica entre o profissional de saúde e seu paciente e o
consentimento para a realização de diagnósticos, procedimentos e tratamentos se
baseiam no respeito ao princípio de Autonomia. Este princípio obriga o profissional
de saúde a dar ao paciente a mais completa informação possível, indicando as
opções, seus benefícios, seus riscos e seus custos para que a pessoa compreenda
de forma adequada o problema.
44
O princípio da Justiça está associado, especificamente, com as relações entre
grupos sociais, diferentemente dos princípios da beneficência, da não maleficência e
da autonomia, que pressupõe uma relação interpessoal entre o profissional de
saúde e seu paciente. Por esse princípio entende-se que é um direito do cidadão
igualdade nas oportunidades de acesso aos bens comuns. Com a crescente
socialização dos cuidados com a saúde, as dificuldades de acesso e o alto custo dos
serviços de saúde, as questões relativas à justiça social são cada dia mais
relevantes para que o direito à saúde seja respeitado. Neste contexto, o conceito de
justiça deve fundamentar-se na premissa que as pessoas têm direito a um mínimo
decente de cuidados com sua saúde (SGRECCIA, 1996).
De acordo com Dawnie et al. (2000) as ‘humanidades médicas’ deveriam ser
inseridas à formação universitária e à educação continuada. Essa abordagem prevê
a incorporação de elementos das ciências humanas (filosofia, psicologia,
antropologia, literatura) na formação e na prática dos profissionais de saúde. As
humanidades médicas possibilitam aperfeiçoar a comunicação médico-paciente ao
levar os médicos a repensarem a qualidade da assistência, a personalização dessa
relação, humanizando as atividades médicas.
Os atores envolvidos na relação médico-paciente têm um papel ativo nessa
interação composta por componentes pertencentes à diversas dimensões, as ações
de observar, mudar e reorganizar padrões. A dimensão dialética dessa relação é
influenciada tanto por seus membros, como também pelo contexto onde ocorrem
(CAPRARA et al., 2006). Desse modo, a narrativa encoraja e melhora o julgamento
clínico. A narrativa de caso médico vai além da história clínica convencional, supre
temas que não seriam possíveis conhecer apenas com o prontuário, nem o relato de
caso publicado. Por exemplo, na dermatologia Gendler e Rizzo (2009) afirmam que
a comunicação e a educação são os fatores mais importantes da relação com o
paciente, para ajudá-lo a optar pelo melhor tratamento, entre as diversas
possibilidades apresentadas pelo mercado. São questões complexas e subjetivas,
como a percepção do adoecimento e do envelhecimento, as repostas à doença ou
às práticas da cosmiatria, as dificuldades e esperanças depositadas na relação
médico-paciente, aceitação ou rejeição do tratamento indicado e os significados da
enfermidade ou questões estéticas na vida do paciente. Essas questões, associadas
à avaliação clínica, auxilia o médico a compreender que o significado que ele dá à
45
doença e à outros problemas do paciente, como profissional, não é igual ao que tem
na vida do paciente (GROSSMAN e CARDOSO, 2006).
46
3. METODOLOGIA
O capítulo de metodologia tem o objetivo de esclarecer a decisão do paradigma
utilizado para orientar a pesquisa, além de descrever as etapas do estudo, desde
contato com o fenômeno social à metodologia utilizada para a análise das
entrevistas e suas limitações.
Para que a pesquisa tenha importância científica, ao escolher o tema, o pesquisador
deve pensar no motivo pelo qual a questão deve ser estudada. Assim, as perguntas
corretas no início do projeto são definitivas para determinar a relevância da pesquisa
(WITKOWSKI, JONE, 2006). O estudo procurou responder questões referentes aos
temas de beleza, envelhecimento e produtos anti-idade, a seguinte pergunta foi
central no desenvolvimento da pesquisa:
Qual a visão de um grupo de dermatologistas sobre o conceito de beleza, sobre
o processo de envelhecimento e sobre o uso de procedimentos e produtos antiidade?
Para apoiar essa pergunta principal foram elaboradas algumas perguntas
secundárias:
•
Como os dermatologistas vêem a beleza?
•
Como os dermatologistas percebem o processo de envelhecimento em suas
pacientes de diferentes faixas de idade?
•
Como os dermatologistas avaliam o uso de cremes anti-idade?
•
Como dermatologistas avaliam diferentes marcas de produtos anti-idade
disponíveis no mercado?
3.1 NATUREZA DA PESQUISA
Uma pesquisa científica é guiada por um paradigma que melhor se adéqua ao
estudo proposto. No campo do marketing dois paradigmas têm papel de destaque: o
positivista e o interpretativista (HUDSON, OZANNE, 1988). Muitos estudiosos
costumam comparar essas duas abordagens elegendo a priori a que consideram
mais coerente para orientar seu estudo (BAHL, MILNE, 2006; BAUER et al., 2002).
47
No entanto, Cova e Elliott (2008) observam que é mais importante entender o
problema primeiro, e posteriormente escolher a abordagem mais indicada para guiar
a pesquisa. Esses autores incentivam que esses dois paradigmas sejam utilizados
de modo colaborativo, para que possam ser alcançados resultados de maior
qualidade.
Com o objetivo de compreender melhor a filosofia que permeia a abordagem
positivista e a interpretativista, Hudson e Ozanne (1988) analisam suas diferenças
quanto às crenças sobre a natureza da realidade e dos seres sociais, e o modo
como buscam o conhecimento (Quadro 1). Contudo, esses autores não tem a
intenção de escolher qual é a melhor, apenas desejam pontuar as características de
cada paradigma.
Quadro 1 - Sumário das abordagens Positivista e Interpretativista
Premissas
Positivista
Interpretativista
Ontológica
Natureza da realidade
• Objetiva, tangível
• Socialmente Construída Múltipla
• Única
• Holística
• Fragmentável
• Contextual
• Divisível
Natureza dos seres
sociais
• Determinística
• Voluntarista
• Reativa
• Proativa
Axiológica
Objetivo principal
• Explicação
• Compreensão
• Predição
Epistemológica
Conhecimento Gerado
Visão de Casualidade
• Generalista
• Independe de data e de contexto
• Existência de causa real
• Específico
• Datado
• Depende do contexto
• Múltipla
• Simultânea
• Interativo
• Dualista
Relação do pesquisador • Separação
• Ponto de observação privilegiado
Fonte: HUDSON, OZANNE, 1988
• Cooperativo
• Ponto de observação não
privilegiado
48
No paradigma interpretativista a realidade é socialmente construída, tanto no âmbito
do indivíduo quanto do grupo. Assim, cada pessoa ou grupo percebe e interage com
a realidade de modo diferente, fazendo com que o ser humano seja um agente
modificador do meio. O modo de enxergar a realidade é diferente para cada pessoa
ou grupo, tornando-a múltipla e podendo sofrer constantes mudanças. Já na
abordagem positivista, a realidade é única para todos, independentemente de
momento e lugar. Ainda, pode ser fragmentada, ou seja, pode ser dividida em
componentes que poderão ser estudados separadamente. Nesse paradigma, as
modificações ocorrem primeiro no meio e os indivíduos sofrem influência como
agentes passivos (HUDSON, OZANNE, 1988).
De acordo com Hudson e Ozanne (1988), na abordagem interpretativista busca-se a
compreensão das relações humanas. Não há conceitos certos ou errados, mas uma
interpretação
do
fenômeno
em
diversas
dimensões
que
será
discutida
posteriormente entre pesquisadores, podendo coexistir múltiplas interpretações, sem
que seja necessário escolher apenas uma. Dessa forma, uma pesquisa, apenas
abre uma discussão para diferentes interpretações de um fenômeno, é o início do
exercício de interpretação de uma realidade que é extremamente complexa. Apesar
de haver grande liberdade na execução da pesquisa, já que a pesquisa pode sofrer
alteração conforme a necessidade do pesquisador, seus resultados gerados estão
limitados àquele contexto e tempo onde foi feita (HUDSON, OZANNE, 1988).
O método de condução da pesquisa e o tipo de conhecimento gerado devem estar
de acordo com os princípios do paradigma escolhido para o estudo. De modo geral,
os métodos qualitativos são os mais escolhidos para a coleta de dados e a análise
quando guiados pelo paradigma interpretativista. Já os pesquisadores que defendem
o positivismo, utilizam constantemente, métodos quantitativos em seus trabalhos
(BAHL e MILNE, 2006). No entanto, Bahl e Milne (2006) concordam com Hudson e
Ozanne (1988) ao afirmarem que o paradigma escolhido para conduzir um estudo
não pode ser deduzido apenas pelo método utilizado. Portanto, tanto os métodos
qualitativos podem ser usados em estudos positivistas quanto quantitativos em
estudos interpretativistas desde que as características da filosofia da pesquisa sejam
respeitadas.
49
Este estudo encontra no paradigma interpretativista e na pesquisa qualitativa, de
caráter exploratório, as características adequadas para o desenvolvimento de um
estudo que busca compreender como médicos dermatologistas vêem a beleza, o
envelhecimento, os produtos anti-idade e seus pacientes. Segundo Malhotra (2006)
a pesquisa exploratória também contempla, como características, a versatilidade e a
flexibilidade durante seu desenvolvimento. Ao mesmo tempo, foram encontrados
poucos trabalhos que tratassem tanto de beleza quanto de envelhecimento, sendo
aconselhável utilizar a pesquisa exploratória, considerando o pouco conhecimento
construído sobre o assunto (MALHOTRA, 2006).
3.2 SELEÇÃO DOS ENTREVISTADOS
Os sujeitos desse estudo são 16 médicos (Quadro 2) para os quais foram adotados
os seguintes critérios de inclusão: que se especializaram em dermatologia; que
fazem atendimento em cosmiatria; que atuam em hospitais e consultórios da cidade
do Rio de Janeiro e Niterói.
As primeiras cinco entrevistas foram realizadas com dermatologistas que tive acesso
por indicação de parentes e amigos. Posteriormente, os próprios dermatologistas
indicaram colegas da mesma área, até que se chegou ao número de 16
dermatologistas entrevistados. O processo, desde conseguir o contato telefônico
com os dermatologistas, marcar um horário em suas agendas, até efetivar essas 16
entrevistas ocorreu em um período de quatro meses. Solicitei aos médicos que
indicassem o melhor horário e o dia para a entrevista, com a intenção de interferir
minimamente em suas rotinas.
Num estudo qualitativo, o critério para a definição dos sujeitos que irão compor a
amostra a ser estudada não é numérico. De acordo com Bauer e Aarts (2002) e
Gaskell (2002), em um estudo qualitativo devem-se realizar entrevistas em número
suficiente até que se observe a reincidência dos dados, a denominada saturação.
Quando chega-se a esse ponto, novas entrevistas não melhoram a qualidade do
estudo, porém podem fazer com que o pesquisador deixe escapar algum detalhe
pelo tamanho do corpus da pesquisa, em que depoimentos escritos se perdem e o
autor necessita recorrer à sua memória. Por essas razões, o número dos sujeitos
50
entrevistados foi definido com o decorrer da pesquisa, enquanto apareceram novos
elementos relevantes para o estudo.
A idéia inicial do projeto era pesquisar a relação das consumidoras de meia-idade
com produtos que prometessem o rejuvenescimento. Os temas beleza e
envelhecimento seriam tratados através do consumo de um produto que faz parte do
dia-a-dia da mulher e representa tanto a promessa do rejuvenescimento quanto o
desejo de ficar bonita: os cosméticos anti-idade. A pesquisadora tinha interesse em
conhecer melhor os motivos que levam as mulheres a “lutar” contra o
envelhecimento e compreender os sentimentos que teriam com durante esse
processo.
No entanto, na primeira entrevista com uma dermatologista, onde se desejava obter
informações
que
auxiliassem
o
roteiro
final,
surgiram
informações
muito
interessantes sobre os cremes anti-idade e sobre a conduta médica durante a
consulta. Somado a esse fato, não foram encontrados artigos que analisassem a
ligação de dermatologistas com o comportamento do consumo de beleza e
envelhecimento. Assim, optou-se por mudar o sujeito do estudo e ao invés da
consumidoras finais a pesquisa foi feita com os influenciadores de opinião no
consumo de produtos anti-idade.
Como se pode observar no quadro abaixo, obteve-se um grupo de entrevistados
caracterizados pela diversidade em relação às fases da carreira, à formação e ao
sexo:
Quadro 2 – Resumo dos entrevistados
Nome
Idade
Local da entrevista
Formação
Cidade/Bairro da
entrevista
Ana
40
Inst. de Puericultura e Pediatria
Martagão Gesteira
Especialização
Fundão
Bianca
51
Consultório Médico
Especialização/
Mestrado
Ipanema
Carla
56
Consultório Médico
Especialização/
Doutorado
Botafogo
Elaine
40
Consultório Médico
Especialização/
Mestrado
Botafogo
51
Local da entrevista
Formação
Cidade/Bairro da
entrevista
26
Hospital Universitário Antonio Pedro
Especialização
(cursando)
Niterói (Centro)
Gabriela
27
Consultório Médico
Helena
26
Hospital Universitário Antonio Pedro
Especialização
(cursando)
Niterói (Centro)
Isis
26
Hospital Universitário Antonio Pedro
Especialização
(cursando)
Niterói (Centro)
Joana
28
Consultório Médico (Hospital)
Especialização
Barra da Tijuca
Hospital Universitário Clementino
Fraga Filho
Especialização/
Pós-doutorado
Fundão
Nome
Idade
Flávia
Kátia
Especialização
(cursando)
Urca
Lucia
52
Hospital Universitário Clementino
Fraga Filho
Especialização/
Doutorado
Fundão
Mario
29
Consultório Médico
Especialização
Copacabana
Nadia
32
Consultório Médico
Especialização
Botafogo
Olga
32
Centro de Estética
Especialização
Barra da Tijuca
Paulo
45
Consultório Médico
Especialização/
Mestrado
Centro
Rafael
41
Policlínica Ronaldo Gazolla
Especialização/
Mestrado
Lapa
3.3 COLETA DE DADOS
Os estudiosos de pesquisa do consumidor têm utilizado por anos os dados
provenientes de entrevistas em seus estudos. As entrevistas podem variar desde
não-estruturadas, onde são esperadas respostas abertas, a um questionário bem
estruturado. O modo de abordagem em entrevistas também pode ser variado. Na
abordagem direta objetivo é rapidamente exposto, sendo diretamente declarado ou
percebido pelas questões abordadas. Além disso, entrevistas orais especialmente
úteis para que o consumidor possa contar sobre sua vida de forma detalhada,
lembrando-se de experiências ordinárias do cotidiano (WITKOWSKI, JONES, 2006;
MALHOTRA, 2006).
A pesquisa desse estudo foi realizada através de entrevistas em profundidade, de
abordagem aberta e com roteiro semi-estruturado. O tema do estudo é de natureza
52
exploratória, sendo que as respostas podem ser complexas e contraditórias, em
muitas situações. Nesse tipo de entrevista, o estudioso procura compreender as
motivações, atitudes e sentimentos que afloram relacionados a um tópico. As
conversas são realizadas individualmente, podendo se estender de 30 minutos a
mais de 1 hora (MALHOTRA, 2006).
3.3.1 Cenário do estudo
A pesquisa foi realizada na cidade do Rio de Janeiro, de onde sou moradora. Esta
informação torna-se importante, pois a cidade é uma referência mundial de culto ao
corpo, como descrito na musica de Toni Garrido sobre a população carioca: “corpos
malhados, sorrisos talhados...”. Nessa cidade, a estética é muito valorizada e o
corpo é um instrumento importante na construção da identidade de seus habitantes,
como retrata Goldenberg (2007) em suas pesquisas sobre a população carioca.
Assim, o Rio de Janeiro é um local onde o estudo da beleza e do envelhecimento é
importante para o entendimento do comportamento de seus moradores.
Solicitei aos médicos que os encontros fossem realizados nos locais onde consultam
os pacientes que os procuram para fins estéticos, contudo alguns profissionais
preferiram agendar a entrevista em hospitais públicos, em que atendem a população
com menor poder aquisitivo. Desse modo, os locais das entrevistas foram ou
consultórios médicos, ou clínicas de estética, ou hospitais públicos onde esses
profissionais trabalham. Nos dois primeiros espaços, algumas entrevistas foram
feitas no horário de almoço, outras em horário vago entre duas consultas ou no final
do dia de trabalho. No terceiro, as entrevistas ocorreram durante o plantão, entre os
atendimentos. É importante mencionar que alguns residentes não possuem
consultório particular e, por isso, trabalham com a cosmiatria no próprio hospital em
que cursam sua especialização.
3.3.2 Desenvolvimento do roteiro
O roteiro da pesquisa semi-estruturado (ANEXO 1) foi construído com base em dois
temas principais: envelhecimento e beleza, seguidos de questões sobre os produtos
anti-idade, um bem de consumo que reúne tanto os significados do envelhecimento
quanto os da beleza.
53
Inicialmente, com a intenção de compreender melhor o tema envelhecimento, assisti
os filmes “Chega de Saudade” e “Conduzindo Miss Dayse”. O primeiro se passa na
cidade Rio de Janeiro, em um baile de terceira idade em que são retratados temas
como o desejo sexual e a percepção de ter tornado-se invisível, termo que
Goldenberg
(2008)
descreve
como
um
dos
sentimentos
originados
pelo
envelhecimento. O segundo filme retrata a transformação de uma senhora que
sentia-se amargurada e considerava que sua vida estava acabada, por causa de sua
idade avançada, até que descobre as alegrias da vida na terceira idade ao conhecer
um novo amigo, seu motorista. Esses textos culturais (HISHMAN, SCOTT e WELLS,
1998) possibilitaram minhas primeiras notas para a elaboração de um roteiro, pois a
atenção maior foi dada aos aspectos conceituais que incluíram beleza e
envelhecimento.
Também foram importantes para a elaboração do roteiro dissertações de mestrado e
teses de doutorado que apresentam a beleza e os sentimentos presentes em seu
consumo como assunto principal, realizadas com o apoio da Cátedra L’Oreal de
comportamento do consumidor dentro do centro de estudos de consumo do
COPPEAD/UFRJ (BORELLI, 2009; FONTES, 2009; SILVA, 2006;
AMUI, 2006;
ROSÁRIO, 2006; CAMPOS, 2010). Além desses trabalhos, artigos que tratam da
beleza, do envelhecimento e do consumo hedônico (MCCRAKEN, 2003;
CAMPBELL, 2006; DAHAR e WERTENBROCH, 2000; HIRSCHMAN e HOLBROOK,
1982) e livros como de “A reinvenção da velhice” (DEBERT, 2004) e “Coroas”
(GOLDENBERG, 2008) foram essenciais para a elaboração das questões do roteiro.
De forma que fosse possível uma aproximação com os produtos anti-idade, foram
realizadas duas entrevistas com empresas do mercado de beleza: a primeira com
profissionais que gerenciam a marca La Roche-Posay e a segunda com uma
diretora da marca Mary Key, ambas com atuação no Brasil. Nessas entrevistas,
utilizou-se um roteiro (ANEXO 2) bem abrangente que serviu como base para o
roteiro final.
Contudo, após a decisão de realizar a pesquisa com os dermatologistas, o roteiro
sofreu pequenas alterações após as primeiras entrevistas com a finalidade de
adequá-lo aos interesses do estudo e à compreensão dos demais dermatologistas a
serem entrevistadas. Algumas questões também foram ignoradas em algumas
54
entrevistas por considerar que o entrevistado havia abordado o assunto em outro
momento, evitando o desgaste do entrevistado. Por exemplo, a pergunta sobre as
pacientes de meia-idade foi ignorada em algumas entrevistas, pois ao questionar
sobre a mulher de 50, muitos profissionais já explanavam o que pensam sobre as
pacientes de meia idade. Outra pergunta que foi modificada durante a entrevista foi
a questão das marcas que os dermatologistas tinham preferência em prescrever:
alguns dermatologistas pareciam ter receio em apontá-las, logo falam das
substâncias que consideravam eficazes. Nesse sentido as figuras apresentadas
foram bastante úteis, pois acabavam revelando quais marcas preferiam e o por quê.
Além disso, a primeira entrevistada sugeriu inserir no estudo a avaliação das
farmácias de manipulação, que desempenham um papel importante nesse mercado.
De fato, essa recomendação foi de grande valia para a coleta de dados e capítulo de
análise da pesquisa.
Ainda, como se desejava estudar idades marcantes para o envelhecimento no ciclo
de vida, foram selecionadas as idades de 30 anos, em que os primeiros sinais do
envelhecimento surgem, e de 50 anos, onde se inicia a famosa crise da meia-idade
para muitas mulheres.
3.3.2.1 Imagens dos produtos selecionados
Ao ler e assistir a defesa de dissertação de Fontes (2009), a pesquisadora percebeu
o benefício do uso de técnicas projetivas (BODDY, 2005). Fontes (2009) utilizou
fotos de modelos para que seus entrevistados falassem sobre beleza mais a
vontade. Desse modo, escolheu-se fazer um exercício projetivo ao final do roteiro
semi-estruturado, mostrando imagens de embalagens de alguns de cosméticos antiidade. Objetivou-se incentivar os dermatologista a falarem mais abertamente o que
pensam sobre cada marca de produtos anti-idade a partir das imagens: cosméticos,
dermocosméticos e nutri-concentrado de beleza.
As marcas foram escolhidas com a intenção de se obter uma diversidade de
posicionamentos, por serem reconhecidas no mercado e serem consideradas
inovadoras pelo senso comum. Desse modo, foram selecionadas as seguintes
marcas:
55
a) Avon – A empresa está presente no mercado de cosméticos há 125 anos, com
uma receita anual de mais de 10 bilhões. Há 53 anos a Avon chegou no Brasil
com seu canal de vendas porta-a-porta. Seus produtos atingem diversas
camadas sociais e estão presentes em mais de 100 países.
Figura 2. cosmético anti-idade Avon Renew
b) Dermage – A empresa começou suas atividades em 1978, porém apenas em
1990 a marcar Dermage foi lançada. No início trabalhavam apenas com
fórmulas manipuladas, e, recentemente, passaram a comercializar uma seus
produtos cosméticos através de uma linha industrializada, por meio de venda
direta. A marca é voltada para a classe médica e seus pacientes.
Figura 3. dermocosmético anti-idade industrializado Dermage
c) Innéov - Essa marca é fruto de uma união entre L’Oréal e Nestlé, desde 2002.
Seu produto é um “nutri-concentrado de beleza” com ingredientes ativos que
melhoram a condição da pele, cabelo e unhas, em formato de pílula. A marca é
considerada
inovadora
nos
tratamentos
de
beleza;
no
Brasil
são
comercializados os nutracêuticos: Fermeté (antirrugas), Nutri-care (contra a
56
queda capilar) e Solar (contra o fotoenvelhecimento). Contudo, em outros
países, como a França, há produtos para nove diferentes finalidades.
Figura 4. nutracêutico anti-idade Innéov
d) La Roche-Posay – É uma marca da L’Oréal, pertencendo à linha de cosmética
ativa dessa empresa. Na produção de seus dermocosméticos é utilizada uma
água termal proveniente da cidade La Roche Posay, na França. Sua estratégia
promocional é direcionada, principalmente, aos dermatologistas, porém
também comercializam diretamente nos pontos de venda.
Figura 5. dermocosmético anti-idade La Roche-Posay
e) Lancôme – A marca também é parte do portfólio da L’Oréal, porém faz parte da
linha de cosmético de luxo e, portanto, direcionada para as classes
econômicas mais altas. Está no mercado mundial há 75 anos, e há 20 anos
está presente no Brasil. Como estratégia, procura proporcionar experiências
ligadas às emoções e às sensações.
57
Figura 6. cosmético anti-idade Lancôme
f) Natura – A Natura é uma marca brasileira presente em sete países da América
Latina e na França. A empresa atinge à diversas camadas sociais, distribuindo
seus produtos através de suas revendedoras. O prazer e o bem-estar são
presentes na promoção de seus cosméticos, inclusive dos cosméticos
antiidade da linha Chronos.
Figura 7. cosmético anti-idade Natura Chonos
g) Vichy – A Vichy foi criada em 1931 na França. Atualmente, a marca pertence à
L’Oréal e sua estratégia promocional é direcionada aos dermatologistas. Seus
dermocosméticos possuem água termal de Vichy em sua fórmula e a marca
está em um movimento de as texturas dos produtos estão sendo adaptadas às
peles brasileiras.
58
Figura 8. dermocosmético anti-idade Vichy
As marcas não foram, necessariamente, apresentadas na mesma ordem para todos
os dermatologistas da pesquisa.
Estudos indicam que os indivíduos são incapazes de receber ilimitadas informações
em um período de tempo. Após um determinado número elementos armazenados
na mente, o cérebro passa a não funcionar normalmente, como afirma o psicólogo
Dr. George A. Miller de Harvard (apud RIES e TROUT, 1986). Desse modo,
descobriu-se que o número sete é o máximo com que as pessoas conseguem lidar.
Por isso, é um número popular nas listas de coisas que não se deve esquecer, como
as sete maravilhas do mundo. Logo, a partir dessa afirmativa foram, selecionadas
sete marcas para o roteiro, evitando criar dificuldades durante a entrevista (RIES e
TROUT, 1986).
3.3.3 Dificuldades do campo
Algumas variáveis do estudo que não puderam ser controlados pela pesquisadora
podem ter dificuldade seu andamento. As entrevistas estavam planejadas para
acontecer no ambiente onde o objeto do estudo é, cotidianamente, abordado pelos
entrevistado, ou seja, nos consultórios médicos. Desse modo, o entrevistado
“entraria no clima” da pesquisa mais naturalmente, facilitando o acesso à memórias
de histórias e à sensações referentes ao tema de estudo.
Por uma limitação de tempo, no entanto, algumas as entrevistas aconteceram em
hospitais públicos, onde eles também trabalham. Nesses locais, o ambiente não
parece ser propicio para falar sobre estética, pois dificilmente os dermatologistas
59
tratam dessa questão com pacientes de mais baixa-renda além do ambiente ser
precário, em termos de conforto e tranquilidade para abordar o tema.
Outra dificuldade que surgiu na pesquisa de campo foram as constantes
interrupções de telefones, secretárias e mesmo de outros médicos, em algumas
entrevistas. O dermatologista pesquisado acabava perdendo o foco no assunto e era
necessário reintroduzir a mesma pergunta de diversas maneiras, para que a
conversa voltasse a fluir. Além disso, a entrevista acontecia em um espaço na
agenda do dermatologista, que tinha, em geral, pacientes para atender depois.
Desse modo, havia uma limitação do tempo que o dermatologia podia ceder para a
conversa. Uma das entrevistas precisou ser feita em duas etapas, com uma
interrupção para duas consultas. A primeira parte estava correndo um ritmo bom e o
entrevistado estava mais relaxado para responder as perguntas e após a interrupção
já não foi possível restabelecer o mesmo clima. Por último, os dermatologistas que
foram entrevistados no final do dia de trabalho pareciam cansados e abatidos.
3.4 ANÁLISE DE DADOS
A análise do discurso apresenta quatro características principais: a preocupação da
análise refere-se ao conteúdo do texto e da fala e no modo como o conteúdo é
organizado; a linguagem do discurso é construída socialmente e sua elaboração é
escolhida entre diversas possibilidades; o discurso é uma prática social inserida em
um contexto interpretativo e tem uma determinada função; por último, o discurso é
um modo de persuadir outros a compartilharem uma visão semelhante do mundo
(GILL, 2002).
A análise dos dados coletados através das entrevistas em profundidade ocorreu em
quatro etapas: transcrição, descrição de cada entrevista por categorias, revisão das
categorias para análise do discurso e reunião dos discursos dos entrevistados por
categorias de análise para sua interpretação.
As 16 entrevistas foram transcritas na íntegra, sendo bem detalhadas para que as
características centrais da fala não fossem perdidas, resultando em 382 páginas de
transcrição dos dermatologistas somado a 28 páginas referentes a entrevista com
uma empresa de cosméticos. A pesquisadora precisou ler as transcrições diversas
60
vezes, “mergulhando no material estudado”, para definir quais categorias deveriam
ser descritas para que, então, os dados fossem interpretados (GILL, 2002).
A análise da pesquisa foi realizada através da interpretação dos dados sociais
coletados, os quais foram construídos no processo de comunicação. A pesquisadora
procurou perceber padrões nas entrevistas tanto suas diferenças quanto as
consistências. Além de preocupar-se com a função das falas dos entrevistados
(BAUER et al., 2002; GILL, 2002). “A análise do discurso exige rigor, a fim de
produzir um sentido analítico dos textos a partir de sua confusão fragmentada e
contraditória” (GILL, 2002, p.255)
Na coleta dos dados, a pesquisadora procurou ter atenção com as falas falsas, isto
é, quando o entrevistado não fala o que pensa, mas o que acha que o entrevistador
gostaria de escutar. Quando as falas falsas passam despercebidas podem acarretar
em erros de interpretação dos dados sociais. Ainda, a pesquisadora deve perceber e
analisar os silêncios como parte do conteúdo a ser interpretado (BAUER et al., 2002;
GILL, 2002).
Para facilitar a leitura do trabalho, alguns trechos das entrevistas sofreram uma
revisão, a fim de torná-los mais inteligíveis, uma vez que a passagem da linguagem
oral para a escrita envolve mecanismos de transcrição, que, muitas vezes, tornam
as sentenças difíceis de compreender.
3.4.1 Limitações do método
Por último, é necessário comentar algumas limitações do método proposto nesse
estudo. O número de entrevistados nesse estudo exploratório não pretendeu ser
representativo, portanto, as achados do trabalho não podem ser generalizado para
outros grupos (AAKER et al., 2004; MALHOTRA, 2006).
Além disso, outras limitações do método decorrem do fato de o entrevistado relatar
histórias e trazer informações que ocorreram em outro contexto, em tempo e
espaço; de uma possível distorção da realidade pelo entrevistado; e do entrevistado
descrever seu relato baseado nos valores pertencentes ao seu self. Esses fatores
podem levar o pesquisador a realizar interpretações equivocadas da realidade
estudada. Além disso, em entrevistas em profundidade o pesquisador pode
61
interpretar de forma enviesada o discurso dos entrevistados, analisando os dados
sob seu ponto de vista (AAKER et al., 2004; GASKELL, 2002).
62
4. ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DAS INFORMAÇÕES
O capítulo investiga os discursos dos 16 dermatologistas provenientes da pesquisa
de campo, de natureza exploratória. Para a interpretação dos resultados a autora
buscou um embasamento teórico na revisão de literatura.
A organização da análise será feita baseada nas categorias já identificadas na
descrição das entrevistas. Contudo, algumas categorias foram reunidas por
guardarem uma relação próxima, como pode ser visto no quadro a seguir:
Quadro 3 – Categorias de descrição e categorias de análise
Categorias de descrição
Categorias de análise
• A decisão de trabalhar com dermatologia
(cosmiatria) e o público com
quem
• Motivações para trabalhar com beleza
trabalha
• Conceito de beleza: como define a beleza
e descreve uma mulher bonita
• Beleza
• Como percebem o comportamento em
relação a beleza na sociedade carioca
• A relação entre médico e paciente
• A relação entre médico e paciente
• O processo de envelhecimento
• Mulher de 30, mulher de 50: como são
• O envelhecimento
suas pacientes em cada estágio da vida
• Os cremes anti-idade: o que pensam
sobre sua funcionalidade
• Industrializado
X
Manipulado:
qual
preferem e quais são seus prós e contras
• Os produtos anti-idade
• As Marcas: o que pensam das marcas
apresentadas – Avon (Renew), Dermage
Innéov,
La
Roche-Posay,
Lancôme,
Natura (Chronos) e Vichy
• O não consumo de cosmético anti-idade
• O não consumo de cosmético anti-idade
63
4.1 MOTIVAÇÕES PARA TRABALHAR COM BELEZA
Embora alguns entrevistados do grupo do estudo possam ter utilizado mais de um
critério de escolha ao decidir seguir a dermatologia, foi possível observar, a partir de
seus relatos sobre a carreira, que a questão financeira foi um critério mais enfatizado
por aqueles que terminaram o curso de medicina mais recentemente.
Mudanças de uma sociedade centrada no trabalho para uma sociedade onde o
consumo da beleza assume um papel de destaque (RANSOME, 2005) parecem ter
movido dermatologistas e seus pacientes na direção da especialização da beleza.
No discurso dos dermatologistas mais jovens, o papel social desempenhado pelo
trabalho de médico dá lugar a motivações como a qualidade de vida e a questão
financeira como explicam os entrevistados:
“Olha só, com dermatologia na verdade não foi muito motivação não, foi
meio que por uma escolha de qualidade de vida... era uma coisa que me
irritava um pouco assim, porque eu queria fazer terapia intensiva, mas parte
de medicina aqui era um pouco mais pesada em termos de plantão, eu
sabia que eu ia ter que viajar [...]. E aí o meu marido atualmente veio fazer
residência em cirurgia geral que era o que eu queria fazer, porque uma das
minhas opções também era fazer plástica [...] porque eu não gostava
exatamente da cirurgia, gostava do procedimento, não é só consulta [...]. E
aí quando eu fui fazer dermatologia - porque aí eu comecei a pensar
realmente em qualidade de vida, em plantão e tal - porque como ele já é
médico, ele começou a falar isso para mim, ‘Bruna, dois médicos dando
plantão, a gente vai ter dificuldade com as crianças, se a gente quiser ter
filho e tal’ [...]”. (NADIA)
“Se eu falar para você que eu vou fazer só dermatologia clínica eu estou
ferrada, não tem outro jeito.” (OLGA)
“Estética entrou como uma opção até certo ponto financeira. Sem dúvida
nenhuma hoje o dermatologista que não faz a parte estética perde o melhor
campo financeiro que ele tem.” (MARIO)
“[...] eu dou aula na Estácio [...] e a procura lá é muito grande por
dermatologia e a maioria dos alunos que procuram...já procuram visando
estética. Existe uma crença que estética dá muito dinheiro [...]” (PAULO)
“Eu vejo que hoje em dia os colegas não estão muito preocupados, pelo
contrário, estão preocupados com o retorno financeiro [...] Aí quando você
começa a entrar nisso é uma avalanche e cada vez você vai botando seu
limite para mais longe e quando você abre o olho você já está
absolutamente prostituído profissionalmente.” (LUCIA)
Outros critérios que aparecem no discurso do grupo pesquisado são a história de
vida do próprio dermatologista, que teve problemas relacionados a doenças
dermatológicas, e a influência de professores.
64
Eu sempre tive problema de pele. Eu comecei a faculdade tendendo a fazer
dermatologia. [...] Eu sou quase um atlas de dermatologia. Desde pequeno
eu sempre tive muitos problemas com acne [...]. (MARIO)
“Na verdade eu ia fazer endocrinologia e aí eu comecei a conversar com um
professor meu no posto de saúde que eu trabalhava e eu fiquei apaixonada
por dermatologia clínica foi quando eu resolvi fazer dermatologia mesmo, a
parte de doença.” (OLGA)
No entanto, observa-se que, embora essas motivações iniciais estejam ligadas a
dermatologia clínica (tratamento de doenças), é a cosmiatria que parece prevalecer
no dia-a-dia do consultório de um dermatologista recém formado pela demanda do
mercado.
Apesar dos entrevistados concordarem que existem vantagens financeiras em
trabalhar com a estética como subespecialidade, os mais velhos parecem ter mais
dificuldade em falar nessas vantagens financeiras abertamente:
“A gente pensa que a clínica de dermatologia hoje [...] é voltada para o
paciente de convênio... que não paga no consultório [...]. Vem ao consultório
para tratar verruga, para tratar acne e desperta (interesse) para aqueles
métodos (de estética). Eu tenho dificuldade para vender produto estético,
né?! Produto estético que eu digo é tratamento estético, eu prefiro que os
paciente me questionem [...]” (PAULO)
“[...] minha consulta é relativamente cara, é um tipo de paciente
diferenciado, que pode fazer esses tratamentos, porque todos são
tratamentos caros porque os produtos bons são muito caros. [...] Paciente
de cosmética vem procurando o médico pelo nome, aqui no consultório. Às
vezes ele vai num médico de convenio que nunca ouviu falar e vê que o
médico faz, às vezes dá certo e às vezes não dá. É esse tipo de doente que
atendo aqui para a parte de cosmética.” (CARLA)
Bianca recupera um pouco da história da especialidade e relata que o estudo da
cosmiatria foi inicialmente rejeitado no campo acadêmico e Lucia faz críticas ao
caminho trilhado por pacientes e se declara da “linha antiga”. Elas confirmam assim
as mudanças ou motivações recentes da especialidade:
“Na verdade a formação do dermatologista, eu sou mais da linha antiga, não
visava muito isso, cuidar da pele e tal. Mais ou menos nos anos 90
lentamente essa coisa veio mudando. Não sei se antecede a isso. Acho que
foi nos anos 90 que isso começou a mudar. Me lembro de congressos
iniciais onde se falava muito nisso, deu um grande salto qualitativo com
relação a esse conhecimento estético [...] quando comecei a ingressar a
gente começou a ter informação pelos congressos, colegas e por leitura da
parte estética. Dentro da universidade era visto como uma coisa não muito
boa [...]
[...] Estética ficaria até mais envolvido no início com a acne, a acne acaba
deixando uma cicatriz e acaba dando um dano. A pontinha do trabalho
65
maior que se tinha era fazer um peeling, mesmo assim a gente fazia
escondido porque o serviço não podia fazer.” (Bianca)
“Eles procuram pedindo estética e eu não faço estética para todo mundo.
[...] Assim, aos 30 anos de profissão me reservo o direito de me selecionar o
direito do que eu não quero fazer em estética. Então, estética, a parte
supérflua eu não gosto, eu gosto da estética que está dentro do
envelhecimento, que está dentro de você melhorar a qualidade de vida, mas
não aquela coisa da busca alucinada pelos anos de vida perdida, a pessoa
tem 60 anos e quer aparentar 20. Isso não.” (Lucia)
Logo, pode-se pensar que o significado cultural intrínseco ao conceito de
dermatologia foi “culturalmente” reconstruído ao longo dos anos (MCCRAKEN,
2003). Mais recentemente, a questão da beleza e do rejuvenescimento passaram a
fazer parte da caracterização dessa especialidade médica. Possivelmente, os
dermatologistas mais velhos do grupo foram formados em uma época em que a
cosmiatria não era valorizada no meio médico, o que pode ter como conseqüência
uma menor identificação com os tratamentos estéticos.
Percebe-se, talvez pela resistência em trabalhar com a cosmiatria e pela consciência
da mudança que vem ocorrendo na dermatologia, que há uma maior crítica dos
médicos mais velhos entrevistados em relação a “banalização” do tratamento
estético. Há relatos de pacientes que sofreram iatrogenias pela busca incessante da
beleza:
“[...] comecei a ter as pacientes voltando para eu consertar os problemas.
Eles comentavam que acabavam procurando pessoas que não estavam
habilitadas, não sabiam fazer e voltavam para eu consertar. Então comecei
a ficar expert em complicação nas minhas próprias pacientes. Resolvi no
meu consultório ter, eu faço um pouco da parte cosmética e tenho pessoas,
dermatologistas altamente qualificados em procedimentos específicos e que
eu indico, mas elas é que fazem.” (CARLA)
“Porque houve uma invasão no território da estética por outras
especialidades. Têm cursos de pós-graduação em medicina estética que
são feitos, geralmente, aos sábados. Então, o médico está na sua
especialidade durante a semana, faz este curso aos sábado, e depois de
um tempo se sente apto a fazer os procedimentos estéticos. [...] Tem
pediatra, tem anestesista, tem cirurgião; as especialidades cirúrgicas são de
mais fácil adaptação, porque há a formação cirúrgica quando ele vai fazer
um procedimento estético. Agora aquelas especialidades clínicas sem
nenhuma experiência cirúrgica... ai, às vezes vê-se algumas aberrações.”
(PAULO)
4.2 BELEZA
Quando foi pedido para que conceituassem beleza, o grupo mostrou certo
desconforto, o que já havia sido percebido em outros trabalhos de pesquisa
66
(BORELLI, 2009; FONTES, 2009; CASOTTI, SUAREZ e CAMPOS, 2006). Os
entrevistados iniciavam os relatos com conceituações que se distanciavam das
características estéticas, apesar de serem profissionais treinados para analisar
questões físicas na pele. Talvez, o receio dos dermatologistas em parecerem fúteis,
por pensar que a beleza tem um forte relação com a aparência física, os levassem a
falar sobre beleza através das questões emocionais.
Logo, a aparência exterior e o lado interior (qualidades) do indivíduo passaram a
coexistir na definição de beleza e “o bem-estar se tornou princípio do
embelezamento” (VIGARELLO, 2006, p. 184). Em concordância com Vigarello
(2006), notou-se que os termos “bem-estar”, “conforto com sua aparência”,
“harmonia”, “combinação das coisas”, “um movimento que vem de dentro” e “saúde
mental” foram utilizados repetidamente pelos dermatologistas do grupo como o
conceito de beleza:
“Para mim beleza é uma coisa muito complexa, é um conjunto de coisas, é
uma saúde física, porque tem que ser uma saúde por dentro e por fora para
ser a beleza; e uma saúde mental também, você tem que ter uma saúde
mental, emocional, um equilíbrio. Aí entra todas aquelas coisas que todo
mundo fala e que é verdade; ter uma alimentação saudável, ter atitudes
saudáveis, ser alegre, ser feliz, ser agradável. Então tudo isso completa a
beleza. [...] Então é isso, é uma pessoa que você goste de falar, goste de
conversar, goste de ver, goste de ouvir.” (KÁTIA)
“Meu conceito de beleza, por isso até que...eu acho que tenho dificuldade
de entender produtos estéticos. Porque beleza pra mim engloba a saúde
mental principalmente...então, beleza é o bem-estar físico, social, mental.”
(PAULO)
“Têm pessoas que se você analisar friamente, você vai achar que são
feias, no entanto a pessoa está transparecendo uma coisa de beleza. [...]
Tem uma frase em inglês que a gente usou até num congresso que eu
organizei, foi um congresso mundial de dermatologia cosmética, em 2000,
diz assim: Looking good, feeling good, quer dizer, se você está se sentindo
aparentemente bem você está se sentindo bem e o oposto também, se você
está feeling good você acaba looking good.” (CARLA)
Esse conceito é bem definido no comentário de Carla sobre o slogan do congresso
internacional de dermatologia cosmética, Looking good, feeling good, e está de
acordo com o texto cultural encontrado em diversas propagandas de cosméticos nas
revistas femininas como a da Natura, “Desperta a calma, desperta
o silêncio”;
L’Oreal Paris, “Porque você vale muito”; Nívea, “Beleza é aproveitar a vida”; Clarins,
67
“Clarins torna a vida mais bela” 2. Contudo, Borelli (2009), em sua pesquisa,
questiona essa definição que não se enquadra à realidade das mulheres
pesquisadas que se submetem a cirurgia plástica, pois elas não se sentem
confortáveis com sua aparência, mesmo sentido bem-estar.
Outras formas de contornar a dificuldade de descrição de atributos estéticos foi, por
exemplo, trazer o tema para a realidade médica, definindo beleza pelas
características de uma
pele saudável, ou mesmo utilizar as artistas como um
exemplo de padrão de beleza:
“Tem os corpos esculturais, eu não gosto da beleza dos manequins, acho
que as pessoas são magras esquálidas, parecem Biafra, a beleza da mulher
brasileira que é um pouco mais roliça, tipo Luiza Brunet, acho muito mais
interessante do que da Gisele Bundchen.” (BIANCA)
Interessante que um dos entrevistados (RAFAEL) mostrou seu conflito quando
perguntado sobre o conceito de beleza. Inicialmente, ele relata que a harmonia das
formas é a beleza “como um todo”, nesse sentido o dermatologista considera que
existem “pessoas idosas bonitas”. No entanto, ao falar de sua percepção de beleza
incluindo em seu discurso, de forma espontânea, a atração sexual, ele consegue
descrever de forma objetiva os atributos de uma mulher que lhe interessa: “de
cabelos longos, lisos, bonitos” e afirma que ela precisa ter mais sex appeal do que
formas perfeitas. Assim, o entrevistado sugere as dificuldades na conceituação da
beleza.
Se o pedido para que conceituassem beleza parece ter trazido certas inseguranças,
a pergunta que se seguia buscava a descrição de uma mulher bonita, o que
possibilitou depoimentos mais diretos e concretos sobre a valorização da beleza:
“ [...] todo mundo vai dizer que a pessoa tem que ser alta para ser bonita, é
verdade, tem que ser magra para ser bonita, é verdade, tem que ter uma
pele bonita para ser bonita, é verdade, tem que ter um olho brilhante para
ser bonita, é verdade, tem que ter um cabelo também com brilho, isso é
verdade. Então essas coisas são um padrão que você não tem como fugir,
isso é um padrão que existe mesmo de beleza. (KÁTIA)
“O cabelo bonito, bem cuidado. Os olhos, é... os olhos bonitos, a simetria da
face, o corpo sem excesso... muito magra, muito gorda. [...] Uma nádega
um pouco eminente no meu caso. Eu acho os seios fartos. Eu acho bonito.
É o rosto afinado, o nariz não tão grande.” (RAFAEl)
2
Propagandas das revistas Vogue (maio, 2011; agosto, 2010; outubro 2008) e Marie Claire (outubro,
2008; março, 2009)
68
“Então vamos tentar descrever um padrão que eu acho bonito. Eu acho
muito bonito cabelo assim claro, ou loiro escuro, como preferir. Pouco mais
para o cacheado do que para o liso, um liso ondulado, né?! Um olho mel. O
rosto, eu acho que um rosto fino é um rosto bonito, com traços finos. Alta e
que tenha uma proporção boa: mama, quadril, glúteos, essas coisas assim,
uma proporção boa e nada exagerado.” (HELENA)
Já Bianca acredita que uma mulher bonita na sociedade atual não se encaixaria no
padrão de beleza de quando era jovem. Apesar de alguns traços da beleza serem
igualmente valorizados em qualquer cultura e época, o conceito de beleza sofreu
mudanças durante a história (ECO, 2010; LIPOVETSKY, 2007). A entrevistada se
considera “filha da época da Leila Diniz” quando as mulheres mais cheinhas e com
mais contornos, sem exageros, eram consideradas belas.
Porém, Eco (2010) afirma que não se pode definir apenas um ideal estético. Os
depoimentos, quando os entrevistados pareciam mais relaxados, sugerem que eles
admitem os padrões estéticos. Anotou-se expressões como “ser magra”, “olhos
brilhantes”, “cabelo bem cuidado”, “simetria”, “rosto afinado”. Alguns dermatologistas
pesquisados demonstraram concordar com o autor, já que creem na existência de
mais de um padrão de beleza e atribuem as diferenças de padrão à cultura de cada
local. Ademais, parece haver uma crítica de alguns entrevistado aos concursos de
beleza e às marcas que procuram eleger apenas um padrão de beleza:
“[...] beleza é uma coisa cultural.... eu acho triste você ver que o mundo, a
sociedade em geral, tende a uniformizar esse aspecto. Eu adoro concurso
de miss Brasil e miss universo, eu sempre assisto; mas ao mesmo tempo eu
não concordo tanto, porque é uma mulher no Brasil tem curvas, tem aquele
aspecto do mulherão, tem uma perna mais grossa, um bumbum maior e nos
Estados Unidos é uma mulher mais reta, mais magra, com um peito maior,
que é mais branca. Então, como você considerar quem é a mais bonita no
mundo.” (GABRIELA)
“Eu acho que a beleza é subjetiva porque tem muita mulher bonita loira,
muita mulher bonita morena, muita mulher bonita baixa, não existe um
protótipo, mas aquela pessoa que anda com o peito aberto, que ela fala
com segurança. [...] Um desfile em Nova Iorque ou um desfile da Victoria
Secrets no Japão, você pode ver aqui. Então acaba uniformizando a beleza.
(FLÁVIA)
Novamente a existência de padrões estéticos e sua importância parecem se
confirmar quando os dermatologistas da pesquisa comentam que a mídia interfere
diretamente em seu dia-a-dia. Eles afirmam que precisam estar atentos a tudo o que
aparece em revistas e programas de televisão sobre cosméticos, pois, certamente,
as pacientes irão questioná-los ou chegar ao consultório pedindo certo produto e
69
procedimento. Alguns estudiosos já haviam escrito sobre essa influência,
observando que as revistas especializadas em saúde e moda publicam
regularmente matérias exibindo o padrão de corpo ideal e apresentando exercícios
físicos e tratamentos estéticos para atingi-lo. As mídias costumam estimular o
consumo de correção da aparência pelo consumo de produtos que estão cercados
de fantasia e prometem a juventude (LIPOVETSKY, 2007; WOLF, 1992).
“A gente brinca que a Veja é revista de dermatologia, sempre sai coisa de
dermato, em 3 ou 4 edições de intervalo sai uma coisa de dermato. A gente
fala que dermatologista tem que ler a Veja e quando sai a Veja, elas (as
pacientes) vêm: ‘viu aquela reportagem? Quero fazer’, normalmente são
coisas super caras e não acessíveis a todo mundo, às vezes não tem nem
efeito comprovado.” (ANA)
“Acho que beleza hoje é uma imposição externa, são modelos que vem de
fora e você tenta se enquadrar. Ao longo da vida você eventualmente, se
você tiver muito auto estima, estiver bem e tal, você pode até tentar mudar
esses conceitos e usar conceitos próprios seus, mas na verdade acho que
você passa a vida toda indo atrás de modelos de beleza que são fabricados
lá de fora e não obrigatoriamente estão certos. São aqueles que são “gente
do momento”. Acho que a gente está refém desses conceitos que a mídia
faz, são conceitos que vem já fabricados nas revistas, o que a Globo está
botando no ar, como são as pessoas. São coisas que vão mudando com o
tempo, muda muito com o tempo.” (LUCIA)
“A mídia é absurdamente forte. Estas revista são voltadas para o público
feminino e para o público masculino também, mas principalmente para o
feminino... para a estética e beira a irresponsabilidade, né?! [...] na maioria
das vezes sem qualquer tipo de comprovação científica vendem uma idéia
que basta você passar o creme anti-celulite que acabou a celulite, ou basta
passar o creme antirrugas que acabaram as rugas. E é uma indústria que
cresce absurdamente e as pessoas acreditam e compram mesmo. Às
vezes deixam de comprar um remédio, mas compram o cosmético.”
(PAULO)
Na propaganda do creme Lancôme Génifique, é possível perceber que certas
marcas de cosmético chegam a atribuir a responsabilidade de manter o corpo jovem
para as consumidoras: “A juventude está em seus genes. Reative-a”. Desse modo,
para algumas mulheres, o corpo torna-se um objeto gerenciável que é submetido a
cirurgias plásticas, tratamentos anti-idade e prática de exercício, na tentativa de
evitar o envelhecimento (LIPOVETSKY, 2007).
Essa obrigação que o indivíduo tem sobre aparência do corpo pode explicar o relato
dos entrevistados quando afirmam que as pacientes gastam muito dinheiro com
cosméticos, preferindo comprar produtos e serviços relacionados à beleza do que à
manutenção da saúde (BAUDRILLARD, 2008). Já, Bianca acredita que as pessoas
70
tendem a priorizar o consumo hedônico (DHAR e WERTENBROCH, 2000) e por isso
não se importam com valores financeiros ao adquirir produtos cosméticos. Em seu
depoimento abaixo ela coloca o prazer dos cuidados com a beleza junto com outros
consumos hedônicos como viajar e Elaine associa diretamente os gastos hedônicos
da estética com a felicidade:
“As pessoas são mais preocupadas, hoje em dia, com essa coisa cosmética
do que doenças, impressionante! A pessoa é capaz de gastar um dinheirão
para resolver cosmética e não quer gastar para fazer uma cirurgia e tirar um
sinal com cara de câncer. Acho que tem que chegar num equilíbrio.”
(CARLA)
“Nesse nicho (beleza) as pessoas pagam qualquer preço, mas não querem
pagar médico para doença [...] Vale qualquer dinheiro. É interessante isso.
Acho bem fácil de explicar. Acho que ninguém quer gastar dinheiro com
coisas que são perdas... você ficar doente é uma perda e precisa pagar
médico para ficar bom. Para você ficar bonito, viajar, ter prazer, vale tudo,
as pessoas são capazes de passar muitos apertos; para ter o prazer de
comprar uma bolsa, fazer uma viagem, fazer um procedimento, uma
plástica, qualquer coisa...” (BIANCA)
“Não sei se é o Brasil que lida muito com essa estética muito mais do que
outros países, mas enfim... não sei te dizer o porque mas infelizmente hoje
as pessoas estão ligadas muito na estética. E aí ela gasta nisso porque ela
acha que vai ficar mais feliz.” (ELAINE)
A avaliação de terceiros sobre o corpo e a beleza parece ser uma questão
especialmente importante para as mulheres na sociedade carioca, já que “o corpo é
um componente central do self nessa cultura”, como observa Goldenberg (2007,
2009). Desse modo, o julgamento de um indivíduo sobre outro é, possivelmente,
baseado na aparência física no Rio de Janeiro, onde o corpo é percebido como um
capital. Essa constatação está de acordo com o modelo proposto por Mittal (2006),
onde o corpo é parte do self central. A dimensão social do corpo é evidenciada pela
importância dos outros na avaliação estética como sugerem os relatos abaixo:
“O problema é que quando o outro fala da sua imagem, do seu cartão de
visita, eu acho que isso te machuca mais. [...] o outro falando de você, eu
acho que pesa mais. A estética é pior ainda, porque você está falando de
uma coisa que a pessoa... já percebeu que não estava tão bom assim.”
(HELENA)
“Quando o outro fala que ela está melhor. ‘O que você tem feito? Você
melhorou, você está mais bonita, sua pele está mais lisa, seu cabelo, seu
corpo’. Elas ficam mais felizes quando tem o reconhecimento de outras
pessoas.” (NADIA)
Outros fatores, encontrados no discurso dos entrevistados, que levam à obsessão
pela aparência e pela juventude estão ligados ao mercado de trabalho ou às
71
questões sentimentais e emocionais. Segundo Dion, Berscheid e Walster (1972),
pessoas bonitas tendem a ser mais bem sucedidas na vida pessoal e profissional.
“A pessoa quer ficar mais bonita, inclusive profissionalmente. É
emocionalmente e profissionalmente. Pessoas mais jovens e com uma
aparência melhor têm uma possibilidade de se manter no emprego melhor.
Acho que isso também é comprovado.” (RAFAEL)
“ajuda na sua autoestima, para arrumar um namoro, sair se sentir bem.
Sentir-se bem profissionalmente, principalmente no meu caso que mexo
com a pele. Eu tenho que está com a pele boa, isso faz diferença. [...]
Infelizmente hoje em dia você vê empregos onde só contratam pessoas que
são mais bonitas.” (ISIS)
“Hoje em dia, não sei se é pelo visual... não sei se porque, infelizmente, até
para você conseguir um emprego você tem que estar bonita, entendeu?!
Para você conseguir um namorado, né?!” (ELAINE)
As pacientes com problemas emocionais e amorosos. Que terminaram, se
separaram e eu não sei, eu acho que eu acabo, com o meu jeito de falar,
como eu falo muito, eu sempre acabou ouvindo os segredos: ‘Terminei com
meu namorado e quero ficar com a aparência melhor, quero ficar mais
bonita, tem muito disso’. (GABRIELA)
4.2.1 Beleza X Saúde Mental
Os entrevistados notam que suas pacientes tendem a deslocar o significado de
beleza propositadamente a um artista/celebridade distante de sua vida cotidiana ou
para o passado, através de recordações e fotografias, já que memória serve como
uma segura fonte de imagens. Nesse contexto, os tratamentos cosméticos parecem
utilizados como uma ligação entre o consumidor e seus ideais, ou seja, o indivíduo
procura resgatar significados que foram deslocados (MCCRACKEN, 2003) em
algum momento através do consumo de estética. Como relata Elaine abaixo:
“É esse o problema que a mídia traz para a gente. Ela chega com uma
coisa utópica: "quero ficar com essa cara, com esse peito, com esse nariz,
com essa sobrancelha, com essa testa" e que é impossível. [...] Elas
sempre vêm baseadas numa imagem ou a auto imagem dela mais nova ou
a imagem da amiga. Isso é muito difícil de você combater.”
Porém, ao alimentar a fantasia de parecer-se com uma celebridade ou o desejo de
voltar a ter o rosto de 20 anos, algumas pacientes podem fugir da realidade
(MCCRACKEN, 2003). De acordo com Lipovetsky (2007), os transtornos
relacionados à aparência são resultantes da insegurança que as mulheres têm da
própria imagem. A mídia contribui com essa insegurança ao expor fotos
supermodelos, cujos defeitos foram muitas vezes corrigidos por programas de
computação gráfica. Sendo assim, as mulheres utilizam os artifícios possíveis para
72
possuir uma beleza praticamente inatingível; consequentemente nunca estão
satisfeitas com a própria aparência. Esse cenário é observado no discurso dos
dermatologistas pesquisados quando relatam que algumas pacientes buscam
incessantemente a beleza e a juventude, e atribuem esse comportamento a
problemas psicológicos:
“[...] um cirurgião plástico me falou que tinha uma paciente - só para você
ver como é uma maluquice - ela fez, ficou legal e falou: "poxa, mas não
fiquei parecida com a Vera Fisher". As pessoas tem uma expectativa de
uma transformação. Por isso que falo que são almas vazias, querem fazer
várias coisas... (BIANCA)
“Têm pessoas...e ai varia inclusive com o patológico [...] É a dedicação a
beleza. Vira uma neurose, né?! Então faz botox de três em três meses,
aplica tudo... Começa haver distorções.” (PAULO)
“ [...] já tive algumas assim: ‘eu quero’, eu falo: ‘eu não faço porque vai ficar
pior’. A face não suporta mais fazer nada. [...] Ela queria porque queria que
fizesse preenchimento. Nós dissemos que não, que não dava para fazer
porque era uma área muito perto dos olhos. Essa paciente acabou indo
fazer com outro (dermatologista), injetaram um preenchedor e ela ficou cega
de 1 olho. [...] Por mais que você faça, que você melhora, elas nunca estão
satisfeitas, não digo todo mundo... É o que a gente chama de dismorfofobia,
uma fobia da sua aparência, por mais que você faça [...] É uma insatisfação
interior que acaba levando a essa insatisfação do visual, eu acho.” (CARLA)
4.2.2 Beleza e ciclo de vida
De acordo com o relato de alguns entrevistados, as principais queixas em relação ao
rosto são referentes à aparência envelhecida. Sendo assim, as rugas, o melasma e
a flacidez incomodam quando alteram o semblante da paciente, deixando-a com um
aspecto mais envelhecido. A exceção são as marcas deixadas pelas acnes que
incomodam em qualquer idade:
“No rosto a queixa mais comum é acne, isso em qualquer consultório de
dermatologia [...] mas como eu atendo, realmente, um público focado para
embelezamento de pele, o fotoenvelhecimento, a ruga, a mancha e a
flacidez são as maiores queixas.” (NADIA)
No rosto, eu acho que são [...] são as rugas assim, [...] porque ruga
realmente é uma coisa que as mulheres... elas querem ser mais jovens.
Então dar um ar mais jovial ao rosto, eu acho que é a maior preocupação.
Mancha essas coisas, se isso estiver trazendo uma idéia de
envelhecimento, mas se ela tiver uma manchinha que ela acha que não
incomode tanto, ela não vai ligar muito, ela vai preferir tratar a ruga, do que
a mancha. (GABRIELA)
Para Goffman (apud JENKINS, 2008) o rosto representa a interação do self com o
mundo; o que o torna um importante componente para a composição da identidade.
Desse modo, as doenças dermatológicas e o envelhecimento que levam a uma
73
mudança na aparência, por causa das sequelas aparentes na pele, podem até
causar a perda de parte da identidade do indivíduo (MCCRAKEN, 2003):
“Eu acho que a (psoríase) mostrou isso para mim, de uma forma muito
gritante, a pele é a forma de apresentação do indivíduo. Então todo mundo
quer ter uma pele bonita, todo mundo quer ter uma pele jovem. [...] Então a
pele é de extrema importância para o ser humano.” (KÁTIA)
“O que elas mais valorizam é a pele. Se está manchada, se está
envelhecida, se está flácida, se não está. [...] e principalmente a pele do
rosto, porque está mais amostra. Então, é a pele do rosto que é onde a
gente vê o envelhecimento de forma mais evidente.” (HELENA)
“Sempre o rosto, né?! Porque é nossa...apresentação digamos assim. É
manchas no rosto, acho que são as queixas maiores. [...] Pensando
esteticamente: acne, melasma, que agente vê muito, que são aquelas
manchas escuras que ajuda mulher tem na gravidez e tem também
relacionado a tomar sol.” (ISIS)
No entanto, a entrevistada Carla comenta que cada faixa etária apresenta uma
reclamação diferente. Ela relata que entre os adolescente e jovens adultos as
queixas são mais ligadas ao corpo, e conforme as pacientes vão envelhecendo o
foco dos problemas muda para o rosto. Do mesmo modo, Casotti, Suarez e Campos
(2008) já haviam observado que o modo como a mulher consome os produtos de
beleza varia conforme as fases da vida. As autoras analisam que mudanças de
rotina e a percepção do envelhecimento do corpo influenciam no modo como as
mulheres se relacionam com os cosméticos.
“Tenho muita paciente, especialmente meninas novas, na faixa entre 18 e
25, nessa faixa é mais estria e celulite. Na faixa de 40, 50 é o rosto, rugas,
manchas. Muda conforme a faixa etária. Quer dizer, a menina nova está
tirando a roupa para ir a praia, botando biquíni, não quer ter um furinho no
bumbum e nem na lateral, nenhuma estria. A mulher mais velha já não está
mais dando muita bola, não está indo tanto a praia ou se vai não está dando
bola, o problema é mais o rosto, até porque a menina nova não tem
problema nenhum no rosto, a não ser acne.” (Carla)
Os entrevistados entendem que “a carioca quer ser bronzeada” (ELAINE) e, por
isso, não aceita deixar de tomar sol para fazer um tratamento de pele. No entanto,
Elaine acredita que essa é uma particularidade do Rio de Janeiro ao conversar com
colegas de outros estados. Assim, mesmo conhecendo a importância do filtro solar,
as mulheres jovens querem resultados imediatos, pois o momento presente é o
importante (CASOTTI, SUAREZ e CAMPOS, 2006)
“Isso é muito difícil de você mudar, é o que eu falei as pessoas são
imediatistas, elas veem o bronzeado agora e se sentem bonitas agora, ela
não está pensando nas consequências, é difícil. [...] Quando eu vou passar
74
o tratamento para alguém, eu tento passar o mais prático possível, se tiver
alguma coisa que possa usar que já seja sabonete e alguma outra coisa
junto, ou um filtro solar que já tem base, o que eu puder trazer de prático
para a pessoa eu faço, porque eu sei, eu também passo (GABRIELA).
Por último, Casotti, Suarez e Campos (2008) contam que depois de uma certa idade,
com os filhos independentes e menos trabalho, as mulheres voltam a ter tempo
disponível. Logo, essas consumidoras voltam a ter o hábito de experimentar
diversos produtos, porém são mais exigentes e sofisticadas que na juventude
(CASOTTI, SUAREZ E CAMPOS, 2006). O que é verificado nos relatos quando Ana
sugere que as mulheres maduras têm consciência do seu envelhecimento e se
preocupam em cuidar de seu corpo e seu bem-estar.
“ ‘agora que meus filhos cresceram vou cuidar de mim’, é uma fala que tem
muito. Vêm mulheres de todas as idades com essa fala de ‘agora vou cuidar
de mim’, até os 70 e poucos, acha que já passou da hora mas elas vêm.”
(ANA)
“Eu tenho uma paciente no consultório que ela é muito engraçada. Ela tem
uma artrose coxofemural, com todos os seus comemorativos, ela tem
dificuldade para andar, mas a coisa que mais a preocupa é a mancha da
pele e ela agora está tão feliz que a pele ficou sem mancha, está luminosa,
está brilhosa” (KÁTIA)
Quadro 4 – Valores da cultura carioca
Rosto
• Rugas;
• Linhas de expressão: “sulco nasogeniano” (próximo ao nariz), “bigode chinês”
(próximo à boca e com a glabela, entre as sobrancelhas);
• Melasma (manchas na pele);
• Flacidez: diminuição da estrutura do rosto.
Corpo
Partes do corpo
Queixas encontradas
• Glúteos e quadril;
• Gordura localizada: relação com o desejo
• Abdômen;
de ser magra;
• Seios.
• Celulite;
• Estrias.
4.3 RELAÇÃO MÉDICO- PACIENTE
Alguns entrevistados consideram que a reputação de um dermatologista é
importante para a formação de sua clientela em um sistema onde, muitas vezes, as
pacientes
mais
antigas
indicam
outras
pacientes.
Ainda,
certos
médicos
75
pesquisados acreditam que a rápida resposta aos tratamentos cosméticos é outro
fator que contribui para “ganhar o paciente” (HELENA).
Todavia, não há um consenso entre os entrevistados sobre a fidelidade das
pacientes que os procuram por questões estéticas. No entanto, a pesquisa de Amui
(2006) que entrevistou as consumidoras sugere que “ter um dermatologista” é quase
como ter uma “marca”.
“Acham que é lindo falar: ‘meu dermatologista mandou usar isso’. É chique,
faz parte falar que você tem um dermatologista e ele receitou tal coisa.”
(LUCIA)
Alguns acreditam que a confiança no médico é um fator que influencia a escolha das
pacientes ao decidirem realizar um tratamento estético: “se você conseguir reunir
uma boa relação médico paciente e resultado, o paciente é seu” (HELENA). Outros
observam que elas trocam de dermatologista de acordo com sua conveniência,
buscando um médico que realize exatamente o procedimento que desejam.
“O paciente de estética, a gente o chama de promíscuo. Todos os
dermatologistas falam “ah o paciente de estética é promíscuo”, todo
mundo sabe disso. Então, ele chega aqui, ele já foi na fulana, fulana e
fulana, ele sai rodando.” (ELAINE)
Ao questionar os dermatologistas do grupo sobre a porcentagem de pacientes que
eles costumam atender por problemas de saúde e por questões estética pôde-se
notar que: primeiramente, alguns médicos pesquisados responderam pensando
apenas naqueles pacientes que chegam ao seu consultório exclusivamente pela
estética; depois, esses dermatologistas comentaram que, apesar de a maioria de
seus pacientes apresentarem a doença como questão inicial, quase sempre tinham
questionamentos sobre a estética, também. Como é possível observar no relato
abaixo:
“No consultório é 40% estética e 60% doenças, até pela minha formação na
universidade, acho que isso acaba pesando mais, acaba vendo muito
paciente ainda com doença. 40, 45% estética. Na verdade, hoje as
consultas são muito misturadas.” (BIANCA)
Alguns médicos pesquisados consideram a relação com as pacientes de estética é
mais fácil do que com as pacientes clínicas. As pacientes que estão doentes
chegam na consulta “chateadas, machucadas por outros médicos e desenganadas”
(HELENA); enquanto no tratamento estético não há uma preocupação com a saúde,
76
o objetivo é melhorar a aparência. Nota-se que esses dermatologistas preferem lidar
com aspectos positivos da vida. Porém, eles relatam que as pacientes de cosmética
têm uma exigência maior do resultado.
Alguns dermatologistas do grupo do estudo percebem uma diferença na relação com
a estética das pacientes mulheres e dos pacientes homens. Segundo eles, as
mulheres dizem abertamente que precisam de um tratamento estético, como uma
ruga. Já os homens, em geral, primeiro mencionam que estão envelhecendo e, só
após se sentirem seguros, revelam que querem algo para melhorar a pele. Porém,
Nadia nota um comportamento interessante entre os homens que são metrossexuais
e frequentam seu consultório:
“Eu tenho pacientes assim também, que são até mais vaidosos do que as
próprias mulheres [...] São os metrossexuais. Homens completamente
vaidosos, e eles estimulam as mulheres a virem, a se tratarem porque eles
querem estar aqui sempre e querem ficar fazendo os tratamentos que são
de última tecnologia, são os tops de linha. O que tem de mais novo, que ele
leu na revista, que ele viu na novela.”
Os entrevistados também parecem concordar que é mais difícil que as mulheres
mais jovens sigam o tratamento estético corretamente do que aquelas que já
apresentam algum sinal de envelhecimento. Como lembrou com Beauvoir (1990), ao
não enxergar os sinais da idade, as pessoas sentem que a velhice está muito
distante, um fato irreal em suas vidas:
“muito do envelhecimento vem do sol. Você tem que criar, naquela paciente
mais nova, o hábito de se prevenir, porque, normalmente, as pessoas são
imediatistas. Quando são jovens não vêem as rugas, não vêem as
manchas... então para ela tomar uma atitude preventiva, é muito difícil. [...]
Isso para mim é um grande desafio. Para a paciente que já tem ruga é
muito mais fácil, porque ela já está vendo o defeito. Então, ela quer corrigir
aquilo que ela vê, já é uma abordagem muito mais simples, até se o
tratamento é mais complicado a paciente tende a fazer. (GABRIELA)
“Acho que as mulheres mais velhas meio que se convencem mais a usar
protetor direto, abre mão do jeito que pega sol, não é abrir mão do sol, não
ir para a praia meio dia, diminuir as horas de exposição.” (ANA)
“Geralmente as manchas vêm nas mulheres mais velhas, as rugas vêm
mais cedo. Aí é um desvio que a carioca tem. A carioca quer ser bronzeada.
Ou então elas viram para mim: "porque vou mexer na mancha, você vai
mandar eu parar de tomar sol e eu não estou a fim". (ELAINE)
Muitas vezes, a barreira lingüística também parece atrapalhar a relação entre
médicos e pacientes. Talvez seja por isso que alguns dermatologistas achem mais
simples cuidar de pacientes que são “iguais aos dermatologistas” (MARIO), isto é,
77
do mesmo grau intelectual (BOLTANSKI,1989; SILVA, 2002). Contudo, a exigência
das mulheres que possuem um grau de instrução superior é maior do que as
pessoas que tem menor instrução, como observado nos discursos abaixo:
“Ninguém aceita de primeira, você tem que explicar. Diria que a mulher mais
velha consegue compreender e a mulher mais jovem não consegue
compreender tanto isso ou pelo menos não quer aceitar, não aceita. [...]
essa queixa não muda muito com o poder financeiro não, mas a
compreensão é diferente. Por exemplo, a mulher que tem um grau de
instrução superior, ela compreende. Ao contrário da pessoa que tem um
grau de instrução inferior, mas que tem dinheiro. Por exemplo, a mulher do
comerciante, do dono do bar, ela não consegue compreender porque que a
mulher da novela é linda e ela não pode ser. Ela acha que é uma questão
financeira e ponto.” (ELAINE)
“A gente acaba comparando uma coisa com a outra, teria um nível
universitário (em Copacabana) contra, talvez, nem a escolaridade completa
lá em São Cristovão. [...] Até nas consultas eu acho que o atendimento é
diferente. Lá na clínica, tem vezes, que você tem que desenhar. Você fala:
‘Repete pra mim, por favor’. Aí repete tudo errado. [...] Nessa parte mais
baixa que eu te falei, a expectativa da estética é muito menor. [...] Com
relação à cobrança de respostas eu acho que vem mais do nível superior
sem dúvida nenhuma. É normal que o paciente no nível superior tenha um
grau de tratamento acima.” (MARIO)
4.3.1 Gerenciando expectativas
Como ficar mais jovem ou prevenir o envelhecimento? Para os entrevistados, a idéia
de “ficar mais jovem” parece ser muito abstrata, o que dificulta a avaliação da
expectativa pelo médico do paciente em relação ao tratamento. Dessa forma, podem
ocorrer ruídos na comunicação quanto aos objetivos do tratamento, propostos
inicialmente pelos dermatologistas.
Nesse sentido, nota-se que a narrativa é especialmente importante no campo da
cosmiatria, já que suas questões parecem ter forte relação com o emocional ao
interferir na auto-estima. Sendo assim, a narrativa é um instrumento que o
dermatologista tem para ajustar suas expectativas às das pacientes (GROSSMAN e
CARDOSO, 2006; STONE, 1991). Alguns dermatologistas da pesquisa parecem
compreender que uma queixa pode ter uma importância diferente para o médico e
para a paciente. O relato de Kátia sugere a importância da sensibilidade do médico
para ouvir a paciente:
“[...] por exemplo, você chega com uma mancha no rosto, mas você está
preocupada com a mancha que tem no seu nariz, se ela não faz mal para a
saúde eu não vou ficar chamando a sua atenção para aquela mancha e
dizendo que você tem que tratar, eu vou partir para resolver o problema que
78
está te incomodando. A visão do paciente tem que ser respeitada pelo
médico [...]”
Contudo, nota-se, por outros relatos, que a preocupação em informar o tratamento e
seus possíveis resultados é maior do que em escutar os sentimentos das pacientes.
A intenção de alguns dermatologistas em adequar as expectativas das mulheres à
realidade e em orientá-las, esclarecendo as limitações dos procedimentos, parece
ter uma relação com o medo de sofrer futuras reclamações ou processos.
“Eu explico muito o que o creme vai fazer para que a cliente não fique com
falsas expectativas do produto. [...] A minha consulta demora um pouquinho
mais, então tenho essa preocupação de explicar até o que vai acontecer.
Na conversa eu explico, [...] que não é aquilo que ela está achando, que vai
ficar com a pele igual quando tinha 20 anos. Você na conversa tem que
introduzir isso pra explicar qual a expectativa real do creme.” (CARLA)
“Porque o que a melhora para mim não é a mesma coisa que para você.
[...] Eu explico isso para o paciente, mas sei que as vezes ele não
consegue compreender. Isso gera a insatisfação, quando você faz e a
pessoa fica chateada: ‘não era isso o que eu queria’, isso é problema e
isso dá processo.” (ELAINE)
“O método promete...tem capacidade de uma melhora X. Ela espera uma
melhora 10 X. [...] Existem aborrecimentos, processos, coisa que eu
nunca tive. Até porque eu mostro muitas vezes o que vou fazer. E mostro
a expectativa inadequada, às vezes desestimulo a fazer justamente
tentando evitar isso.” (PAULO)
Através dos discursos, também pôde-se observar uma preocupação dos
dermatologistas em não deixar transparecer o procedimento que foi feito na
paciente,
a
intenção
é
que
o
resultado
seja
“naturalmente
construído”
(GOLDENBERG, 2009). Uma entrevistada comenta que insiste com sua equipe que
“as pessoas da rua não devem ver que seus pacientes se submeteram a um
procedimento” (CARLA), ela deseja que os conhecidos de suas pacientes percebam
como a mulher está bem, mas não descubram exatamente o que ela fez. Desse
modo, nota-se a importância do médico definir o objetivo do tratamento, e não deixar
que o paciente o faça.
4.3.2 Conflitos da bioética na cosmiatria
Os conflitos da bioética, entre médico e paciente, parecem ser recorrentes no
consultório do dermatologista que realiza tratamentos estéticos (SCHRAMM, 2002).
Enquanto alguns entrevistados parecem ter uma dificuldade maior em estipular os
limites de procedimentos cosmético, outros afirmam que é necessário manter a
79
conduta que consideram correta, independentemente da vontade da paciente. Uma
hipótese é que alguns dermatologistas formados recentemente tenham receio em
perder seus paciente como Olga que diz que “se o paciente não alcançar o
resultado, vai querer outro”. Já os dermatologistas mais antigos do grupo são mais
seguros ao afirmar para a paciente que não concorda em prosseguir com certos
procedimentos estéticos. Alguns entrevistados chegam a comentar que usam seu
bom senso e critério pessoal de beleza para tomar decisões.
“Se a pessoa pedir para eu fazer um pouco mais... se eu achar que não vai
ser uma coisa, que na minha opinião, vai destoar totalmente eu até faço,
mas sempre preservando o meu sentido de estética. [...] Já aconteceu de eu
fazer o retoque e a paciente voltar e eu achar que dá para preencher um
pouco mais. Nesse caso, eu uso meu bom senso e meu critério de beleza,
mas isso é muito subjetivo, é difícil. Eu acho que na hora também você tem
que sentir, se aquele paciente vai te dar problema. [...] É o cliente que você
sabe que sempre vai querer fazer alguma coisa, teve paciente que eu me
recusei a fazer, porque eu sabia que estaria sempre achando ruim.”
(GABRIELA)
“Muitas ficam aborrecidas, mas eu coloco muito seriamente para elas
dizendo: ‘não tenho nada para te oferecer, não tenho nenhuma tecnologia
miraculosa, milagrosa, nenhum equipamento, não tenho nada para te
oferecer; acho que não é isso o que você está precisando’ [...] Às vezes o
paciente entra numa viagem e a culpa talvez não seja dele, acho que cabe
ao médico colocar para ele: ‘você está querendo chegar no 10º andar mas
pode no máximo chegar no 5º’.” (LUCIA)
Dessa forma, pode ser difícil definir quando um procedimento estético é moralmente
indicado na cosmiatria por sua subjetividade, como observado nos relatos acima.
Logo, como se deve julgar se o principio da “Não Maleficência” (SGRECCIA, 1996)
está sendo respeitado nessa área da medicina?
Alguns dermatologistas da pesquisa mencionaram que o campo estético não é como
a doença que possui um exame concreto para guiar o tratamento que deve ser
seguido. Sendo assim, até onde o procedimento cosmético, que pode apresentar um
risco real, deve ser indicado?
Ainda, nos relatos, foi observado que apesar de alguns entrevistados reforçarem sua
posição contrária ao procedimento estético em mulheres que possuem algum
distúrbio psicológico, dificilmente encaminham essas pacientes para o tratamento
psiquiátrico. Desse modo, alguns profissionais pesquisados parecem violar outro
princípio da bioética, o princípio da “Beneficência” (SGRECCIA, 1996), onde o
dermatologista também deve contribuir para o bem-estar dos pacientes. Dificuldades
80
podem ter origem na excessiva especialização da medicina ou na complexidade da
saúde mental.
Lucia observa o fenômeno da “compartimentalização do conhecimento”, um exemplo
são os dermatologistas que sabem trabalhar apenas com cosméticos, como se a
doença não fizesse parte da especialidade. Alguns autores já mencionam a
necessidade da introdução das “humanidades médicas” na formação universitária,
incorporando elementos das ciências humanas (filosofia, psicologia, antropologia,
literatura) na formação e na prática dos profissionais de saúde. Bianca lembra que a
postura antiética de alguns médicos recém-formados pode ser conseqüência da falta
de disciplinas que discutam a ética médica, resultando na formação de profissionais
menos comprometidos. (DAWNIE et al., 2000; GRUPPO CPR, 1996).
4.3.3 A questão do comércio no meio médico
Questões éticas pouco discutidas podem dar origem à conflitos internos referentes
ao tratamento comercial dado à estética. Alguns entrevistados admitem que se
sentem incomodados com o consumo do corpo como um objeto (ASKEGAARD et
al., 2002), sendo colocados em uma posição de instrumento do paciente, que deseja
atingir uma aparência ideal. Assim, eles parecem perceber um distanciamento dos
ensinamentos da Universidade sobre a relação médico-paciente. Para eles, a
relação entre o médico e o paciente torna-se fútil e sem confiança. De acordo com
Baudrillard
(2008),
apesar
de
ser
superficial
considerar
que
o
médico
“dessacralizou”, a figura do “médico-sacerdote” da medicina tradicional não mais
existe. Na sociedade contemporânea, o médico e o medicamento possuem uma
virtude cultural mais do que uma função terapêutica. No campo da cosmiatria eles
servem à ética moderna, em que o individuo é responsável por seu próprio corpo
(LIPOVETSKY, 2007; WOLF, 1992; DION, BERSCHEID e WALSTER, 1972;
NOVAES, 2008). O médico desempenha um papel prático sobre o corpo privatizado,
é ele o dispensador de bens e signos materiais.
“Às vezes na estética, parece que ele está comprando aquilo de você e a
relação comercial é um pouco [...] a pessoa compra o nariz, compra a boca
e eu não gosto muito disso [...] e você não tem como garantir que vai ficar
uma boca perfeita, porque você é humana, você não é uma máquina que
tem uma forma que vai lá botar a boca. Vai sair um pouquinho diferente,
isso é natural, mas o paciente não está preocupado com isso, ele quer que
seja perfeito, porque ele está comprando. Então esse lado comercial me
incomoda um pouco.” (GABRIELA)
81
“A verdade é que eu considero um comércio... então você tem lá um pacote
de sessões de laser para celulite [...] você vai vender esse pacote, se está
indicado ou não, se vai beneficiar ou não, isso é outra história. É um tipo de
comércio, você apresenta e a pessoa quer ou não comprar, pode ou não
comprar sem, na grande maioria das vezes, se preocupar.” (PAULO)
Desse modo, alguns entrevistados parecem tentar manter uma relação médica e
não comercial com suas pacientes, preferindo trabalhar com o tratamento estético
de modo devagar, construindo “aos poucos a relação médico-paciente”. Talvez essa
conduta seja uma tentativa de resgate do papel do médico tradicional. Também
parece haver uma preocupação de alguns dermatologistas pesquisados em deixar
que a paciente mencione o interesse em tratamentos estéticos, pois não consideram
adequado oferecer o tratamento à paciente.
Paulo conta que apresenta os tratamentos que realiza para as pacientes, sem os
oferecer diretamente. Ele possui, em seu consultório, um quadro com todos os
procedimentos e tratamentos na sala de espera das pacientes. Ele conta que foi um
colega mais jovem com quem divide o consultório, que teve essa ideia. Desse modo,
são as pacientes que o abordam sobre os tratamentos. Gabriela, ainda, percebe que
cada dermatologista atrai um certo padrão de pacientes, de acordo com seu
comportamento:
“se você é muito invasiva, muito agressiva nos tratamentos, você atrai
pacientes mais agressivos. Quando você é mais calma, você atrai
pacientes mais calmos e o que eu já vi é que eu prefiro ser menos
agressiva”.
Rafael fez um relato interessante sobre sua experiência com pacientes cosméticos.
Ele percebeu que ao atender os pacientes particulares e do convênio no mesmo
consultório, passou a dar descontos com muita freqüência. Assim, ele decidiu
atender em dois consultórios diferentes, pois o entrevistado acredita que a
sofisticação do ambiente em que realiza tratamentos de cosmética é importante para
atrair mais clientes. Também foi percebido, pela observação em campo, que alguns
consultórios, onde o foco é estética, eram bem sofisticados e localizados em prédios
exclusivamente médicos.
4.4 ENVELHECIMENTO
Os dermatologistas pesquisados demonstraram desconforto em definir tanto beleza
quanto envelhecimento. Alguns entrevistados preferiram iniciar o relato recorrendo
82
às características mais gerais do envelhecimento. Falaram de tipologias,
classificações e origens do envelhecimento sem que chegassem mais próximos da
realidade do dia-a-dia trazido em seus consultórios por suas clientes:
“[...] na dermatologia a gente tem dois tipos de envelhecimento: o
fotoenvelhecimento. Na realidade o envelhecimento intrínseco, de etnia, não
depende de você, é genético. Então, assim, a pessoa asiática ela envelhece
menos. A pessoa negra ela envelhece menos. E tem o envelhecimento
extrínseco tem a ver com a dieta, tabaco e principalmente pelo sol. Você
tem que saber aproveitar ao máximo esses dois, a gente tem como vilão
sempre o sol e o cigarro.” (FLÁVIA)
“Tem dois tipos de envelhecimento na pele: o envelhecimento cronológico e
o envelhecimento por exposição ao sol, que a gente chama de
fotoenvelhecimento. O envelhecimento cronológico acontece na pele toda e
o fotoenvelhecimento são mas as áreas expostas ao sol e que é bem mais
rápido. Envelhecer é um negócio que não tem jeito.” (CARLA)
“Envelhecimento a gente tem o envelhecimento intrínseco que é o
envelhecimento das células, é aquela pele que vai ficando mais delicada, os
músculos levam á rugas de expressão, é natural do ser humano. E tem o
envelhecimento extrínseco que é tudo o que sol causa, poluição, cigarro.
Então junta os dois e a gente tem os resultados de todos os anos.” (JOANA)
Quando os relatos se aproximam da realidade do envelhecimento, os entrevistados
trazem observações com contradições em relação aos aspectos positivos dos
tratamentos estéticos existentes, principalmente, informações e tipos de prevenção e
o inevitável caminho para o envelhecimento como sugerem alguns depoimentos
abaixo sintetizados no quadro 5.
“O quanto antes a gente pensar que isso vai acontecer com a gente, isso
vai ser tratado da melhor maneira possível. Tratar a pele com uma proteção
do sol eu acho que é fundamental. Hoje a gente tem a medicina cada dia
mais como uma medicina preventiva de tratamento então eu acho que no
que tange assim o envelhecimento de modo geral é a prevenção. O “X” da
questão é a prevenção.” (MARIO)
“Envelhece tudo. Envelhece o coração, músculo, o cabelo, a pele e para
mim é irreversível, que você apenas tem coisas paliativas e que a medicina
para mim, o melhor da medicina é investir nessa coisa da prevenção, de
dentro para fora.” (ELAINE)
“eu acho que hoje com toda essa modernidade, com todos esses
tratamentos novos têm como a gente retardar o envelhecimento. [...] Hoje
também, a sociedade brasileira de dermatologia enfatiza bastante o uso do
protetor para prevenir câncer de pele. [...] É muito difícil hoje na praia ver
alguém que não leva protetor solar, eu acho que melhorou muito.” (OLGA)
Flavia lembra que nas gerações anteriores as pessoas viviam sem incomodar-se
com a prevenção contra envelhecimento. Exauriam o corpo quando jovens, não se
preocupando com o futuro.
83
Para os dermatologistas do grupo pesquisado, o envelhecimento é ruim, porém é
inevitável. Eles utilizam termos como “a idade é um limite implacável”, “o
envelhecimento é inexorável”, “as pessoas não aceitam bem (o envelhecimento)” e
“envelhecer é muito dolorido” em seus discursos para demonstrar o sentimento de
suas pacientes em relação esse processo. De acordo com Debert (2004) as pessoas
tendem a associar diretamente velhice e doença, assim, o envelhecimento é visto
como algo negativo, como pode ser observado nos discursos abaixo:
“Eu acho que faz parte, é inexorável, não tem como fugir dele, mas as
pessoas não aceitam isso muito bem. Às vezes você tem que ensinar para
as pessoas que envelhecer faz parte, que não tem jeito. As pessoas querem
banir isso do cronograma mas não pode, tem que ter.” (LUCIA)
“O envelhecimento, como que a gente fala, é uma coisa que não é boa, não
é bom envelhecer, em nenhum sentido é bom envelhecer, mas é uma coisa
que acontece e eu acho que todos nós temos que nos preparar
emocionalmente, psicologicamente para isso. Porque você envelhece e
tudo em você envelhece, a emoção, o pensamento, a memória, a pele, o
cabelo, todos os órgãos internos. Não envelhece uma coisa só, e como diz
o meu marido, seria muita injustiça se você envelhecesse o físico e não
envelhecesse a emoção, se você envelhecesse a pele e não envelhecesse
o coração, entendeu? Tudo envelhece ao mesmo tempo, mas envelhecer
não é uma coisa boa, a gente chega a uma fase da vida que dá menos valor
a algumas coisas e mais em outra, mas em geral não é bom envelhecer.”
(KÁTIA)
“Tem algumas (pacientes) que não gostam não. Não tem solução... como
diz Irene Ravache ‘só não envelhece quem morre cedo’. Mário Quintana diz
que ‘envelhecer é ótimo porque a outra opção é péssima, é horrível’.”
(CARLA)
“40 é uma marca muito dolorosa pra a mulher porque ela começa a ser
ameaçada pela menopausa, realmente cai mesmo, acho que muitas coisas
caem, a cor da pele, a unha, o cabelo, tudo modifica, é uma coisa que você
vê na textura da pele, a pele fica mais ressecada. Lógico que vai depender,
mas dos 20 para os 30 tem uma quedinha, dos 30 para os 40 é maior, dos
40 para os 50 é um negócio arrasador, agora 60 já foi e você teve que se
acomodar, isso não quer dizer que você não vai ficar bonita.” (BIANCA)
Quadro 5 - As duas faces do envelhecimento
O lado positivo
O amadurecimento emocional acompanha o
envelhecimento
As pessoas passam a dar valor às coisas que
realmente importam
As pessoas passam a cuidar mais de si
mesmas, ficam mais vaidosas
O avanço tecnológico ajuda as pessoas à
envelhecer de forma prazerosa
O lado negativo
O envelhecimento é irreversível
É notável o envelhecimento físico
Há
diversas
envelhecimento
doenças
associadas
ao
Há maior possibilidade de câncer
Não reconhecimento da própria aparência pelas
mudanças provocadas pelo envelhecimento
84
4.4.1 A idade
Alguns dermatologistas consideram que o fato de alguém
parecer velho, assim
como parecer belo é consequência de um estado emocional, é um processo que
começa “de dentro para fora” (MARIO). Logo, as pessoas que se sentem velhas,
terão uma aparência mais envelhecida e isso ocorre em qualquer idade.
Culturalmente o entendimento da idade é também uma construção social e um
entendimento de cada um sobre sua identidade (LOGAN, WARD, SPITZE, 1992).
Para alguns entrevistados, cuidar de si próprio é um maneira de não se deixar
envelhecer. O comportamento é quem define os marcadores de tempo (DEBERT,
2004).
“Envelhecimento também começa de dentro para fora. A pessoa que se
sente velha, fatalmente vai se portar como mais velha, agir como uma
velha, se vestir como uma velha e se cuidar como uma velha. [...] Ela vai
fazer tudo como se fosse uma velha. A primeira coisa é ela se achar velha,
o envelhecimento é você se achar velha.” (HELENA)
“[...] até essa coisa mesmo da questão da sexualidade, as mulheres tem
essa situação. Antigamente a mulher depois dos 40, 50 era avó, acabou.
[...] Ninguém olhava para a avó, hoje em dia as avós namoram, estão
bonitas, elegantes, se pintam. A mulher saindo de casa, isso mudou muito
para a mulher e acabam mudando, ela quer retardar o máximo possível isso
e acho que é bem legal isso. Acho que é uma coisa saudável.” (BIANCA)
“Eu acho que primeiro lugar da história tem que se aposentar pegar o
pijama e ficar na cadeira de balanço em casa. Vai envelhecer. E vai mais
rápido, sem dúvida.” (RAFAEL)
Essas mudanças de comportamento na sociedade contemporânea e o avanço
tecnológico na medicina estética, resultaram em alterações no ciclo e na qualidade
de vida da mulher (EPHRON, N. apud ROSÁRIO E CASOTTI, 2008). Nesse cenário,
os tratamentos estéticos passaram a ser utilizados para que a mulher aparente ter a
idade que sente e não sua idade real. As mulheres não querem que as pessoas
saibam sua real idade. No estudo de Barak et al. (2008), os autores observam que
mesmo em países orientais a idade cognitiva e a desejável são inferiores à idade
cronológica das mulheres.
“Hoje a velhice mudou de faixa etária, você está ficando mais velha com 60,
70 anos, por causa dos recursos todos que se tem e as mulheres não
querem envelhecer.” (BIANCA)
“Você não quer chegar aos cinqüenta anos com cara de cinqüenta. Se fosse
assim, ninguém recorreria a tratamento estético. O tratamento estético é
isso, a pessoa quer tentar retardar um pouco o envelhecimento. Ninguém
vai falar, ‘ahh vou ficar em casa esperando o tempo passar sem fazer nada’,
85
isso não vai acontecer, porque ninguém está preparado psicologicamente
pra isso. Você sabe que você vai envelhecer, mas você não quer que sua
pele acompanhe a cronologia da idade.” (OLGA)
Na cultura brasileira, o envelhecimento é associado a perda de “um importante
capital, o corpo” (GOLDENBERG, 2007, 2009). Assim, os indivíduos sofrem
conseqüências da sociedade pela perda da aparência jovem. Como Bouzón
comenta “não basta ser bonito e saudável é preciso aparentar ser jovem” (p.234).
Logo,
as
mulheres
cariocas
sentem-se
psicologicamente
afetadas
pelo
envelhecimento, e por isso, sentem desvalorizadas perante a percepção de seu
envelhecimento pelo outro, segundo o discurso de alguns entrevistados. Do mesmo
modo, em seu livro Coroas, Goldenberg (2009) comenta que a visão de si mesma
sofreu alteração por causa do comentário de uma dermatologista.
“Eu acho que o envelhecimento é uma coisa que faz parte da vida e todo
mundo tem que envelhecer, né?! Só que a marca do envelhecimento, a
estética, você vai perdendo a atração física que você pode proporcionar.
Isso tanto para os outros como para você mesma. A satisfação de se ver.
Eu acho que quando você perde isso, você perde uma coisa importante
né?! Você baixa a sua auto-estima, que não é só da sua pessoa, como você
é, do indivíduo, mas obviamente com a parte física.” (NADIA)
“você tem uma expectativa de viver mais. E você quer é não parecer mais
velha até o final da sua vida isso [...] É até mesmo por que é a atividade
laborativa também ela está mais estendida [...] Então ela se mantiver mais
bonita mais tempo, ela vai ter um companheiro/companheira por mais
tempo com atração por ela e vice-versa por mais tempo e vai se manter no
seu trabalho/emprego.” (RAFAEL)
Uma das dermatologistas pesquisada, Ana, relata que a beleza na juventude é um
instrumento de poder de certas mulheres, e por isso, elas têm uma grande
dificuldade em aceitar o envelhecimento, fazendo tudo o que podem para se
manterem jovens. Já as mulheres que trabalham, não sentem tanto a perda da
juventude, pois não se apoiaram na beleza quando mais novas.
Segundo alguns dermatologistas pesquisados, a vaidade é importante para que a
mulher viva melhor, é o incentivo das pessoas para continuar vivendo. Outros
entrevistados relacionam o fato de envelhecer bem, através de tratamentos
estéticos, à uma sensação de prazer.
“A vaidade é uma coisa que te mantém vivo. Eu tenho essa opinião. Então
vejo velhinhas...aquelas velhinhas mais bonitinhas... que chegam no
consultório [...] Pessoas mais vaidosas gostam mais da vida. Querem se
parecer melhor para o mundo. [...] Quer que essas pessoas vivam mais e
adoeçam menos. Tenho essa...é uma interpretação do valor da minha
profissão...” (RAFAEL)
86
“eu sou completamente clara em relação a achar que todo mundo pode
envelhecer bem, que você pode usar da tecnologia, de tudo que a medicina
e a tecnologia te oferece hoje em dia para ficar melhor. [...] Representa o
aumento da auto-estima, a satisfação pessoal, prazer em ser quem ela é.
Prazer em estar com outras pessoas e demonstrar quem ela é, não ter
vergonha de ser como ela é, não ter vergonha de envelhecer, prazer
mesmo.” (NADIA)
Quando perguntados sobre o que pensam das mulheres que se encontram na faixa
dos 30 anos e das mulheres na faixa dos 50 anos, os entrevistados trazem
informações organizadas a partir de sua experiência:
Quadro 6 – Caminhos dos tratamentos anti-idade
Mulher de 30 anos
Queixas
O corpo começa a
modificar;
Rugas leves: sulco
nasogeniano,
linhas de
expressão;
Manchas na pele:
pelo sol (cultura
carioca) ou por
causa de
hormônios;
Falta de viço na
pele;
Cabelo não está
bonito e está
caindo.
Possíveis Tratamentos
Tratamentos
relacionados à
prevenção: profilaxia
do processo de
envelhecimento;
Botox: Não há um
consenso sobre sua
indicação. Alguns
entrevistados
consideram que é a
melhor idade para
iniciar esse
tratamento, outros
pensam ser muito
cedo;
Cremes anti-idade,
incluindo o filtro solar.
Características do comportamento
Deseja parar no tempo;
Quer adiar o envelhecimento;
Os sinais de envelhecimento não são tão evidentes;
É bem resolvida, independente, esclarecida e bem
sucedida profissionalmente;
Quer tempo para cuidar de si mesma, equilibrando a
vida profissional e pessoal;
Preocupa-se com a alimentação e com a saúde;
Sofre forte influencia da sociedade: mídia e amigas;
É bem informada e consciente das novidades;
Para alguns entrevistados ela é tranquila, outros a
consideram exagerada e ansiosa;
Quer estar linda sem ter trabalho ou gastar dinheiro;
Não está disposta a cuidar das manchas, adora sol.
Mulher de 50 anos
Queixas
Possíveis Tratamentos
Alterações
hormonais
causadas pela
menopausa;
Os cremes,
isoladamente, não
solucionam os
problemas;
Rugas acentuadas:
na fronte, nos
olhos, entre
sobrancelhas e no
sulco nasogeniano;
Preenchimento;
Flacidez
acentuada: “bigode
chinês” e “bolsas
de buldogue”;
Lifting;
Características do comportamento
Deseja voltar no tempo e buscar o que já perdeu;
Incomoda-se com o descompasso entre a cabeça e
o corpo: a cabeça continua jovem, enquanto o corpo
envelhece;
Quer melhorar a aparência e se sentir mais jovem;
Cirurgia;
Gostaria de ter tido informações sobre saúde e
envelhecimento quando tinha 30 anos;
Peeling com ácido ou
de cristal;
É bem resolvida profissionalmente e em sua vida
afetiva familiar;
Botox.
Aceita melhor o envelhecimento;
Sabe que um bom resultado requer esforço;
87
Envelhecimento
das mãos;
Alguns entrevistados pensam que as questões dessa
mulher são visíveis e têm fundamento; outros notam
que é uma mulher complicada, com queixas e
demandas mais exacerbadas;
Cabelos brancos;
Manchas: pele
alterada pelo sol;
Pode haver uma preocupação maior com as
manchas por causa do câncer de pele.
Não consegue
emagrecer.
4.5 PRODUTOS ANTI-IDADE
De acordo com os relatos da pesquisa, nota-se que os entrevistados avaliam os
produtos anti-idade por sua função real, sua utilidade. Assim, esses dermatologistas
procuram realizar tratamentos estéticos que melhoram fisiologicamente a pele da
paciente. Consequentemente, essas mulheres tendem a retornar a um estado de
equilíbrio, com uma aparência rejuvenescida (MCCRAKEN, 2003).
Com a intenção de confirmar a comprovação da funcionalidade de um produto, os
entrevistados referem que as marcas devem apresentar pesquisas com exame
histológico; informar aos dermatologistas as substâncias que a fórmula contém; além
de manterem um bom controle de qualidade. De acordo com os dermatologistas
pesquisados, as marcas Eucerin, La Roche-Posay, Vichy, Avene, Galderma,
Theraskin, Neutrogena, Roc, Stiefel e Melora possuem produtos confiáveis.
“Porque, na verdade, o que eu acredito que aconteça é que na indústria a
fiscalização é mais forte. Então a qualidade do produto é mais garantida,
eles têm que te garantir isso.” (NADIA)
“Para mim os cremes anti-idade são assim, existe no mercado uns 2 ou 3
ativos que realmente melhoram. Que tem estudo cientifico comprovado,
inclusive com biópsia de pele dizendo que melhorou e melhoram mesmo... e
são ótimos! Melhoram horrores. A grande maioria é baseada neles ou são
subprodutos deles.” (ELAINE)
“Uma marca que tenha um embasamento científico, isso com certeza, que
se preocupe em mostrar para o médico porque ele pode confiar na marca,
ou no produto. Eles chegam e dizem: ‘Olha esse produto aqui a gente
lançou e ele foi bom porque ele tem esse e esse componente’ Ou então:
‘Ele é bom, porque a gente fez um estudo e mostrou a eficiência dele’, e
tudo bem.” (GABRIELA)
“[...] consagrado é o ácido retinóico que é realmente o grande creme antiidade; a vitamina C que acho que também ajuda; e agora recente, não teve
tempo para se sedimentar, são os cremes com ácido hialurônico. Os outros,
não sei... Acho que tem muita novidade, a gente tem até dificuldade de dar
conta de tanto detalhe, de tanta molécula e ter experiência para resolver. O
cara vem aqui e me apresenta trabalho com meia dúzia de paciente. Eu me
lembro de uma apresentação para produtos masculinos, o trabalho era com
oito pacientes!” (BIANCA)
88
Contudo, fatores como o cheiro agradável e a cosmética3 adequada para a paciente,
que proporcionam uma experiência sensorial prazerosa na pele (MCCRAKEN,
2003), também são considerados fatores importantes de um produto para alguns
dermatologistas da pesquisa. Assim, pode-se pensar que o consumo hedônico não
está presente apenas nos relatos das consumidoras, como explorado na pesquisa
de Amui (2006), mas também no discurso de alguns dermatologistas:
“Não é muito assim não, nossa, um produto que irrita o paciente, que tem
uma cosmética... por exemplo, você passa um remédio de estética fedido,
com cheiro ruim, que tem uma cor que mancha, isso depõe muito contra o
produto de estética. Você tem que conhecer o sensorial do produto, a
pessoa que tem pele oleosa não pode usar creme, tem que usar loção, gel”
(LUCIA)
“Uma boa cosmética, ou um creme que tenha um cheiro ruim, uma
coloração ruim, isso não vai ser agradável para paciente, na sua rotina.”
(ISIS)
Além da experiência sensorial, também foi lembrada a experiência emocional. De
acordo com a entrevistada Lucia, as experiências prazerosas podem ser vivenciadas
pelo ritual de arrumação, através do qual o indivíduo transfere o significado do bem
para sua vida, resultando no aumento de sua autoestima
e de seu bem-estar
(MCCRAKEN, 2003):
“Melhora a autoestima da pessoa [...] Tem muita gente que só de começar a
passar um creminho, começar a passar um filtro solar já se sente super
bem. [...] Assim, além do conteúdo do pote em si, a coisa do ritual, de você
estar doando um pouquinho do seu tempo pra você, [...] Quando você está
passando um creme anti-idade... isso na cabeça da mulher entra como se
ela estivesse se cuidando. Tudo o que diz respeito a ela estar se cuidando
eu acho bacana, pode ser com creme anti-idade, pode ser tomar banho com
sabonete diferenciado uma vez por semana [...] Tem momentos da vida da
pessoa em que isso não é uma prioridade, a pessoa está com uma doença
grave ou outra coisa. Aí a pessoa começa a se recuperar e isso é uma coisa
que ajuda no processo de recuperação, isso é muito legal. [...] Quando você
vê uma pessoa que está vivendo algum tipo de doença e começa a ter
cabeça, saco e paciência de se cuidar, isso é um bom sinal de
recuperação.” (LUCIA)
Percebe-se que os entrevistados crêem na eficiência dos produtos anti-idade que
são dermocosméticos ou remédios - aqueles que necessitam de receita médica - no
tratamento do fotoenvelhecimento, rugas finas, textura da pele e algumas manchas.
Já a pele mais envelhecida com rugas profundas, por exemplo, pode ser recuperada
apenas com tratamentos mais invasivos.
3
Os entrevistados mencionaram que o termo cosmética significa o modo como o produto é veiculado:
creme, loção, e gel, entre outras possibilidades. Também se refere ao odor e textura do produto.
89
“A pele, a textura, para atenuar manchas, porque muitos (cremes) associam
despigmentantes também, algumas rugas finas, alguma cicatrizes bem
superficiais, uma renovação que também ajuda, mas é basicamente isso.”
(JOANA)
“Ruga, fotoenvelhecimento da pele, ruga fina, textura da pele, melhora um
pouco a textura. Melhora muita coisa o creme anti-idade.” (OLGA)
“Ruga leve, mancha, ressecamento e... textura da pele que... e aí traz uma
pele com mais brilho, uma pele mais macia, uma pele mais clara, mais
uniforme. E depois de muito tempo de determinados remédios, uma pele
mais firme. [...] Os cosméticos não, eles prometem muito e cumprem muito
pouco. Mas os remédios, sim. Eu consigo isso tudo que eu te falei com
remédio. Ele (dermocosmético) mantém o que eu consegui. Então ele
mantém a pele hidratada, ele mantém a pele clara porque ele ajuda a não
escurecer mais. Ele mantém a pele hidratada, macia, depois que eu já
consegui isso com os remédios.” (NADIA)
Contudo, alguns entrevistados apresentam um discurso confuso ao diferenciar as
marcas que prescrevem e as marcas que não são indicadas por desvalorizar a
profissão. Primeiramente, eles comentam que receitar produtos que são vendidos
livremente, sem a necessidade de prescrição médica, afeta a imagem do
dermatologista negativamente. Porém, posteriormente, eles deixam claro que
prescrevem as marcas La Roche-Posay e Vichy que são marcas vendidas em
farmácias sem o controle da receita médica. Pode ser que a principal questão dos
dermatologistas pesquisados seja para quem a propaganda da marca está sendo
direcionada, médicos ou público leigo, e a comprovação científica da substância.
Esse conflito fica claro nos discursos abaixo:
“É cosmecêutico, cosmético com terapêutico. O que é considerado
tratamento é uma terra meio esquisita. O que eu preciso de receita médica
para comprar é só o ácido retinóico [...] Quando a pessoa vai lá querendo
tratar as rugas estou considerando que ela está indo no médico então vou
prescrever remédio. [...] Existe um trabalho que mostra que a vitamina C
corrige rugas? Sim, existe um trabalho, que a pessoa fez biópsias na pele
de quem usou e de quem não usou, comparou um lado e outro da pele, isso
é um trabalho científico. Isso aqui não me dá, a Lancôme; o da La Roche
me dá. Posso até usar o Lancôme em algum momento, mas não estou
usando meus conhecimentos médicos quando estou usando Lancôme, isso
me incomoda porque não tenho comprovação.” (ANA)
“É diferente de eu chegar ali no balcão - talvez a moça do balcão pudesse
falar: ‘compra esse que é uma linha muito boa’, [...] pronto, não preciso ir no
dermatologista, eu compro com o balconista, vou no free shopping e
compro.” (LUCIA)
Possivelmente, as dimensões encontradas no estudo de Amui (2006) referentes aos
produtos de luxo - qualidade, exclusividade e preço alto - são o motivo pelo qual
alguns dermatologistas pesquisados se mostraram favoráveis ao consumo do
90
cosmético anti-idade da marca Lacôme, embora não o prescrevam. Já que, através
dos relatos, nota-se que a marca não se dirige ao dermatologista e não apresenta
estudos com validade científica. Pode-se pensar que no momento em que fazem
uma boa avaliação da marca Lancôme esses entrevistados podem estar se
colocando na posição de consumidores e não de médicos (AMUI, 2006).
“Lancôme, é muito bom, mas é muito caro. Então, é aquela paciente que
busca... isso para mim já está ligado aos cosméticos de luxo, que são
cosméticos que funcionam, são muito bons, mas que estão atrás das
marcas super caras e famosas.” (GABRIELA)
“É uma marca muito boa, mas a gente não receita. A gente sabe que é boa,
que as mulheres todas usam e a gente também quando vai comprar a gente
também compra Lancôme, quando eu ganho um creme da Lancôme, todo
mundo fica contente porque é bom, é uma boa marca. A gente não usa por
que? Porque como ele tem propaganda para o leigo, você não sabe as
concentrações das substâncias.” (KÁTIA)
“eu não tenho números de pacientes significativos para te falar o resultado.
Mas assim, minha mãe usa Lancôme, eu tenho tias que usam e eu sei que
o resultado é muito bom, mas eu não posso te falar números significativos
de Lancôme. É uma irmã, minha mãe, uma minha tia que eu acompanho,
mas não tenho paciente pra te falar número significativo de resultado.”
(OLGA)
Alguns dermatologistas pesquisados demonstraram preferir prescrever os produtos
industrializados aos manipulados. Para eles, são poucas as farmácias de
manipulação confiáveis e não se pode impor que a paciente manipule a fórmula em
uma determinada farmácia. Ademais, o prazo de validade dos produtos manipulados
é menor que do industrializado, alguns precisam ser mantidos refrigerados e a
cosmética pode não ser agradável. Desse modo, os dermatologistas relatam que
prescrevem os cosméticos manipulados quando não há a fórmula desejada no
mercado e quando a paciente não tem condições de pagar pelos produtos
industrializados, como mencionado nos discursos:
“Depende da farmácia. Eu só peço às vezes para manipular em algumas
condições. Por exemplo, às vezes manipulado o produto sai um pouco mais
barato pra quem não tem um poder aquisitivo... que não consegue comprar.
Por exemplo, um Tri-Luma custa cento e quatro reais, você manipula a
mesma fórmula por trinta. Eu até acredito em farmácia de manipulação, mas
farmácia grande e confiável assim que você já teve resultado, você já sabe
como que é o laboratório.” (OLGA)
“Eu trato com grade produto já pronto sempre que possível. Por que são
laboratórios mais confiáveis. É a produção, ela é mais controlada. O tempo
de validade do produto é mais longa. [...] Farmácia de manipulação tem
trezentas. Então você não consegue confiar em todas. Algumas eu confio
outras não. É...estabilidade do produto acaba sendo melhor em média. O
91
produto de um laboratório grande vai sofrer um controle maior. Acaba tendo
mais confiança no produto do que sendo manipulado.” (RAFAEL)
“O problema da manipulação é onde você vai manipular, têm farmácias
muito boas e farmácias não tão boas, a única diferença. Se for manipular
em uma farmácia de credibilidade é a mesma coisa. O paciente particular
não quer passar duas vezes na farmácia, o paciente mais humilde que não
tem tanto dinheiro. Não quer esperar sete dias.” (FLÁVIA)
As entrevistadas Lucia e Gabriela, diferentemente de outros dermatologistas
pesquisados, acreditam que o creme manipulado valoriza o médico, por ser um
processo artesanal, em que se personaliza uma fórmula para cada paciente. Ao
contrário, os produtos industrializados são limitados a um número determinado de
constantes (BAUDRILLARD, 2008).
“Acho que a manipulação valoriza o médico, porque você tem que saber
lidar com os elementos do creme, os elementos do shampoo, os elementos
da loção e você botar do seu conhecimento em relação a isso, uma fórmula
que é pessoal, isso é demais, eu acho que realmente valoriza o que o
médico realmente entende.” (GABRIELA)
“Tem o paciente que acha o máximo você mandar fazer um produto
manipulado porque ele entende que aquilo ali está personalizada para ele.
Eu não uso computador, faço tudo na mão, minha receita é na mão, eu uso
ficha. Não tenho aqui uma receita pronta daquele creme, eu faço, manipulo
na hora, faço as concentrações na hora e acho que a pessoa acha aquilo
legal, que estou fazendo uma coisa artesanal e absolutamente direcionada
para ela.” (LUCIA)
Pode-se observar que alguns entrevistados relataram que suas pacientes,
frequentemente, desejam novidades cosméticas. Talvez, enquanto para algumas
pacientes o anseio por essas novidades esteja relacionado com o consumo
hedônico, onde os novos tratamentos são importantes para que o ser humano possa
reagir, repetidamente, aos estímulos gerados pela experiência prazerosa de utilizar
os produto anti-idade; para outras mulheres as novidades podem significar outras
possibilidades de controlar o corpo e moldá-lo conforme o padrão social
(MCCRAKEN, 2003; LIPOVETSKY, 2007)
Um comportamento interessante entre os dermatologistas pesquisados é o habito de
testarem o produto, primeiramente, em si mesmos ou em familiares para, então,
receitá-lo para suas pacientes. Como observado nos discursos abaixo:
“Hoje em dia eu acho que melhorou muito, mas você tem os clássicos,
coisas assim que vão sempre te trazer aspectos positivos, o paciente
sempre vai ficar feliz. E tem as novidades, sempre quando eu vou a um
congresso, eu sempre pego para minha família, entrego para minhas
cunhadas, minhas tias, minha mãe, cada um fica com um e usa por 02 ou
92
03 meses e no final a gente fala: - Esse funcionou, esse não funcionou.”
(GABRIELA)
“Se chegar um protetor novo, você não vai me ver passar um creme para o
paciente sem antes testar. Eu sempre testo a textura do creme. Sempre”.
(OLGA)
4.5.1 As marcas pesquisadas
As marcas, através discurso publicitário, são capazes de despertar o desejo por um
produto que foi carregado de significados. Desse modo, ao serem questionados
sobre os produtos anti-idade de cada marca, alguns dermatologistas não
responderam pensando não apenas em um produto, mas em toda a linha de
produtos da marca. Assim, parece ser a marca que resume os significado que serão
atribuídos aos cosméticos e, posteriormente, transferidos para aos pacientes
(BAUDRILLARD, 2008; MCCRAKEN, 2007).
Buscou-se reunir os comentários dos entrevistados após a apresentação das figuras
correspondentes aos produtos anti-idade das diversas marcas. Cabe observar que
as tabelas abaixo não seguem um único padrão de apresentação, já que foram
encontradas, inclusive, algumas divergências de opiniões.
Avon (Renew)
Aspectos Positivos
Aspectos Negativos
Outros Aspectos
Possui substâncias como ácido Não há estudos científicos
retinóico, que os dermatologistas dessa marca;
consideram eficaz.
A concentração é muito baixa;
Muito difundido na população
com poder aquisitivo mais
baixo;
Não tem acesso à informações
da fórmula;
Os médicos não se opõe ao
seu uso, desde que não
prejudique a pele;
Não é um produto médico, não
necessita de receituário;
Produzem apenas um produto
para todos os tipos de pele;
Não prescrevem o Renew;
A marca faz anúncios na
televisão, em revistas e possui
um modo de venda “porta-aporta”.
A marca é focada em um
público leigo;
Seu preço é similar ao de
alguns produtos prescritos
pelos dermatologistas.
93
Dermage
Aspectos Positivos
A marca é confiável;
A formula dos produtos industrializados é acessível;
A marca possui uma boa linha de produtos industrializados;
A marca é próxima dos dermatologistas: fazem visitas aos médicos, mantêm uma farmacêutica
disponível para auxilio e realizam estudos constantemente;
Está sempre presente em congressos;
Preocupam-se com as embalagens e com as novidades do mercado;
Investem em pesquisa;
Têm um excelente custo-benefício;
Produzem os produtos pensando na pele das brasileiras;
O médico e o paciente se sentem exclusivos.
Innéov
Aspectos Positivos
É um bom produto;
Aspectos Negativos
Pode não ser eficaz;
Pode ser positivo para as O produto é caro;
pessoas que não têm tempo de
Os resultados das pesquisas
se alimentarem bem;
não são confiáveis;
Tem um bom preço;
Não atingiram muitos os
É feito por duas marcas muito dermatologistas;
conhecidas e confiáveis;
A propaganda é exagerada.
Realizam pesquisas sobre seu
efeito.
Aspectos Neutros
O produto é considerado
complemento
nutricional,
cosmecêutico e nutracêuticos;
É uma tendência no mercado
de cosméticos;
Existe uma discussão grande
entre os dermatologistas sobre
os resultados.
94
La Roche-Posay
Aspectos Positivos
Aspectos Negativos
Outros Aspectos
A marca é séria, confiável e O preço dos produtos é alto;
possui bons produtos;
A propaganda tem sido feita
A estratégia de marketing é diretamente para o consumidor
direcionado ao dermatologista;
final.
O público que consome a
marca é de classe média alta.
A marca cumpre o que propõe;
As informações dos produtos
são acessíveis;
Investem em novas pesquisa,
apresentam
artigos
aos
dermatologistas e estão presente
em congressos;
Os dermatologistas são visitados
por representantes e têm uma
boa comunicação com seus
farmacêuticos;
O laboratório avalia o efeito dos
produtos e a satisfação dos
pacientes;
A marca está pensando no tipo
de pele dos brasileiros;
Os dermatologistas prescrevem
produtos da marca;
A marca é tradicional, com nome
internacional.
Lancôme
Aspectos Positivos
Os
produtos
considerados
“cosmético puro”, como a
maquiagem, são bons;
Aspectos Negativos
Outros Aspectos
As marcas Lancôme e a Avon
parecem oferecer o mesmo
efeito, porém são consumidos
por níveis sociais diferentes;
Há
uma
percepção
no
mercado que é “chique” passar
o creme da Lancôme;
É um laboratório grande, de
tradição;
As
concentrações
das
substâncias
presentes
na
A marca é confiável;
fórmula não são divulgadas;
O anti-idade é eficiente;
Não há comprovação científica
A consistência dos produtos dos resultados do creme antiproporciona
uma
sensação idade;
agradável;
Os produtos da Lancôme são
Há bastante inovação dos considerados muito caros;
produtos da Lancôme;
O laboratório não se aproxima
dos dermatologistas;
Os cremes anti-idade não são
prescritos
pelos
dermatologistas;
Não
há
divulgação
produtos no Brasil.
dos
95
Natura (Chronos)
Aspectos Positivos
Tem um preço acessível;
Sempre apresenta novidades;
Sua apresentação é bonita;
A Natura é preferida à Avon;
Há boas substâncias na fórmula.
Aspectos Negativos
Aspectos Neutros
O produto anti-idade funciona A marca atinge mulheres de
apenas
como um creme baixa renda e de classe média
hidratante;
baixa;
Indicar
Natura
pode A Natura e
desmerecer a profissão do consideradas
dermatologista;
equivalentes;
a
Avon são
marcas
A
concentração
das Seu modo de venda facilita a
substâncias não é suficiente compra sem receita;
para fazer efeito anti-idade;
Parece haver um forte trabalho
A empresa não têm contato de marketing.
com os médicos;
Não são
científicos;
feitos
A fórmula do
desconhecida;
trabalhos
produto
Dermatologistas
prescrevem Natura;
é
não
Existe apenas um creme para
todos os tipo de pele.
Vichy
Aspectos Positivos
Aspectos Negativos
A marca está se voltando para o A propaganda é direcionada
meio médico;
para o consumidor final, o que
pode denegrir a imagem do
A marca é confiável e tradicional
médico;
no mercado;
Há um exagero na propaganda
Os produtos são acessíveis;
de alguns produtos;
A linha de produtos é bem
Não
tem
uma
presença
avaliada;
expressiva no Brasil;
Sempre lançam novos produtos
Os produtos são caros;
e tendências no mercado;
Algumas pesquisas não são
Estão presentes nos congressos;
representativas.
A Vichy tem um laboratório
respeitável, com departamento
de pesquisa;
Preocupam-se
pesquisas.
em
Aspectos Neutros
A marca foi muito comparada a
La Roche-Posay;
Alguns entrevistados acham a
marca é eficiente em visitar os
dermatologistas,
enquanto
outros afirmaram o contrário.
mostrar
4.6 O NÃO CONSUMO DE PRODUTOS ANTI-IDADE
Os dermatologistas pesquisados parecem concordar que são poucas pacientes
adeptas do “envelhecimento natural” (NADIA). Contudo, eles fazem diferentes
96
observações quanto à motivação pela qual algumas mulheres escolhem não utilizar
produtos anti-idade:
O primeiro aspecto considerado é a maior aceitação da aparência envelhecida
quando a idade da mulher já é avançada. Alguns médicos da pesquisa parecem
perceber que suas pacientes que escolhem não utilizar produtos antienvelhecimento
são mulheres “de 70 anos para cima” (ISIS), que têm uma boa aceitação da vida que
tiveram.
“homem mais velho, mulher com setenta anos aí já não liga muito para essa
parte de estética não. [...] Eu acho que é bem resolvida. [...] Depois que
passa dos sessenta eu acho que a pessoa já aceitou assim. Eu acho que é
muito por aceitação.” (OLGA)
Outro aspecto refere-se à crença de que não se deve intervir no envelhecimento do
corpo, pois as rugas fazem parte da história pessoal. Essas pacientes concordam
com Wolf (1992) ao considerar uma violência contra a mulher a tentativa de “apagar”
as rugas do rosto. Além disso, os entrevistados consideram que essas mulheres
felizes com sua autoimagem e que pertencem à uma geração que considera que
“tomar remédio é agressão” (BIANCA). Eles, ainda, observam que a felicidade das
pacientes e a sensação de bem-estar são conceitos que se misturam.
“As vezes o que eu estou vendo não está incomodando o paciente. Existe o
que eu falei que o paciente vem com uma queixa de unha e para ele o rosto
dele está bonito. [...] Eu nem proponho tratamento porque, as vezes, você
até ofende a pessoa. Às vezes, a pessoa está se sentindo linda com o
rosto, mas na verdade não está.” (Olga)
“São perfil completamente... envelhecimento natural, que nada você faça
para intervir a forma como o seu corpo deve envelhecer. [...] dizem que
fazem isso por uma opção e querem que as rugas marcam alguma coisa
que elas passaram e tal, elas tem toda uma filosofia do envelhecimento
natural.” (Nadia)
“Então a pessoa que... não se importa com a mancha, está bem com isso
mesmo. Vou dar um exemplo: outro dia... eu vi Evandro Mesquita, é um
cara que é feliz com a vida dele, que é todo largadão. É surfista, continua
surfando. Está feliz da vida.” (Rafael)
O medo que algumas pacientes têm em se submeter a procedimentos muito
agressivos é outra motivação presente nos relatos, porém utilizam os cremes que é
um tratamento menos invasivo, parece fazer parte do que consideram um
“envelhecimento natural” (CLARKE, GRIFFIN, 2007). Do mesmo modo, na pesquisa
de Rosário (2006), as mulheres entrevistadas também parecem ter uma aversão ao
risco de alterar a aparência ou de ter sua saúde afetada ao tingir os cabelos.
97
Alguns entrevistados notam que as mulheres que não têm interesse em utilizar
produtos anti-idade trabalharam a vida inteira, mantendo-se ocupadas, por isso não
teriam tempo para se preocupar com a aparência. Contudo, essa afirmação é
contraditória com ao de que as mulheres bonitas e jovens tendem a ser mais bem
sucedidas (DION, BERSCHEID e WALSTER, 1972).
“São mulheres que trabalharam a vida inteira, sempre se ocuparam e tem
outras cosias para fazer do que ficar passando creme. [...] Tem umas que
não tem paciência ou: ‘não me passa essa coisa de passar um de manhã,
um de tarde e um de noite. Me dá só um produto. Melhor um sabonete’.”
(CARLA)
Já Elaine e Gabriela lembram que as mulheres que não consomem produtos de
beleza não têm cuidado com sua aparência, nem vaidade (ROSÁRIO e CASOTTI,
2008). Elas atribuem esse comportamento à preguiça.
“É descuidada com tudo, ela não está penteada, não tem nada no rosto,
nem uma maquiagem, tem unha mal feita no sentido de que... não é que ela
foi a manicure, ser uma pessoa bem cuidada não é uma questão de
dinheiro, é uma questão de detalhes. A unha dela pode estar cheia de
cutícula ou quebrada ou roída, mas basta você cortar e lixar, é uma coisa
barata. Pentear o cabelo é uma coisa barata. Escovar o dente é uma coisa
barata. [...] Por exemplo, três dedos de raiz branca... pelo amor de Deus,
ninguém merece isso!” (ELAINE)
Bianca ainda reflete que o não consumo dos produtos anti-idade pode ser uma
reação contra os custos dos tratamentos, ou pode ser que as mulheres esperam o
milagre de manter a pele jovem sem precisar cuidar-se.
Também parece ser um pensamento comum entre os dermatologistas que pacientes
com doenças mais graves preferem, primeiro, solucionar a questão da saúde e
posteriormente pensar na estética. Mario relata que mesmo sem mencionar algo
relacionado à estética, as pacientes falam espontaneamente que irão “deixar para
depois o creme”:
“Agora eu vou ser muito sincero eu não sei se não optam ou se eu não
coloco dessa forma. Então é a abordagem do paciente com a sua
abordagem. Já aconteceu de eu falar para o paciente deixar a parte estética
mais para frente, vamos ver primeiro essa parte da doença e tal.”
Novamente o olhar do outro é importante quando o assunto é estética (MITTAL,
2006). Alguns dermatologistas pesquisados notam que certas pacientes passam a
aceitar o tratamento estético quando “alguma amiga elogia” e percebe a melhora na
aparência. Talvez os entrevistados comentem esse comportamento por não
98
aceitarem que possam existir pessoas que, realmente, prefiram não tentar se
enquadrar em algum padrão de beleza.
“Geralmente, aos pouquinhos, aí tem alguma melhora, quando alguma
amiga elogia, aí que ela se empolgam mais ainda. Geralmente a paciente
gosta, acaba tendo o retorno. Eu acho que quando o outro percebe é muito
importante, eu acho que é bem legal, ela se sente bem segura.” (JOANA)
“Não, tem pessoas que não tem realmente paciência para isso, é o jeito,
todas as pessoas acabam se disciplinando a usar e acabam ficando mais
satisfeitas” (KÁTIA)
99
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A idéia de inicialmente de entrevistar consumidores foi modificada quando em um
dos trabalhos anteriores (AMUI, 2006) dessa linha de pesquisa da Cátedra L’Oréal
de Comportamento do Consumidor, e que entrevistou mulheres de classe mais alta,
sugeriu
a
importância
dos
dermatologistas
consultados
por
elas
como
influenciadores na compra e uso de produtos e serviços de beleza. Assim, decidiuse falar com um grupo de dermatologistas não só para compreender o que pensam
sobre beleza e envelhecimento e os produtos, serviços e marcas associados, mas
também entender como esse grupo de referência e com poder de influenciar os seus
pacientes e suas demandas em relação às possibilidades cosméticas.
Sempre tive interesse em temas relacionados à moda e à beleza. Logo, parte dos
programas que costumo assistir na televisão e alguns sites que visito na internet são
relacionados aos assuntos: são blogs e canais do Youtube que se tornaram
referências; reality shows como o “Esquadrão da moda”, “Project Runway” e
“Superbonita”; além das revistas Vogue e Marie Claire, que possuem colunas
específicas sobre cosméticos que sempre prometem beleza e rejuvenescimento.
Assim, mesmo antes de ter acesso aos artigos acadêmicos nos cursos de marketing
e comportamento do consumidor e na elaboração desse estudo, fui “bombardeada”
por muitas informações sobre o tema através dos diferentes meios de comunicação
de massa.
Contudo, apenas ao iniciar essa dissertação, tornei-me mais sensível as mídias que
exageram quanto aos padrões de beleza, propondo artifícios que podem ser
associados a uma verdadeira “guerra” contra o envelhecimento. “Envelhecer bem”?
Boa parte das mensagens sugere serviços, procedimentos e produtos para
rejuvenescer sem mencionar, adequadamente, os possíveis riscos à saúde física e
mental.
Mesmo que a beleza seja considerada por muitos uma indústria supérflua, a venda
dos produtos de beleza não parece se alterar significantemente em períodos de
crises mundiais e de retração no poder de compra4. Esse fato também pode ser
percebido nos consultórios dos dermatologistas entrevistados onde a demanda por
4
Fonte: Relatório L’Oreal 2008 100
procedimentos cosméticos faz com que a cosmiatria esteja muito presente na rotina
desses médicos.
A força midiática e de construção de marcas parece ter me contaminado quanto ao
tema, mas parece ter contaminado também esses profissionais entrevistados que
em alguns momentos confessam o quanto valorizam a atenção das empresas e
suas marcas nos congressos ou na construção de relacionamentos personalizados
quando declaram não gostar das marcas que falam direto com os pacientes e não
falam com eles.
O estudo exploratório pode destacar o fato de que esse grupo de dermatologistas
entende que a realização de procedimentos estéticos pode afetar positivamente e/ou
negativamente,
psicologicamente
e/ou
fisicamente
o
paciente.
Assim,
os
profissionais da área da cosmiatria entrevistados procuram orientar seus paciente
sobre a indicação de tratamento estético. A crítica sobre a “promiscuidade” de
alguns profissionais que trabalham com a estética e realizam esses procedimentos
sem julgar, adequadamente, sua necessidade, visando principalmente o ganho
financeiro e não na bioética médica apareceu nas entrevistas feitas com
profissionais mais velhos.
Os entrevistados mais jovens parecem ser críticos em relação aos seus pacientes
ou talvez mais fáceis de serem seduzidos pelas mídias ou marcas? Alguns relataram
que as pacientes pedem para que eles indiquem certos produtos e/ou realizem
procedimentos estéticos descritos em propagandas e matérias que aparecem na
mídia sem uma previa avaliação médica. Assim, alguns dermatologistas da pesquisa
comentaram que se sentem obrigados à buscar essas informações para manteremse atualizados, embora não “obedeçam” às vontades dessas pacientes.
Temas como a beleza e o envelhecimento não foram simples de serem definidos
pelos médicos entrevistados. Assim, os dermatologistas da pesquisa utilizavam
palavras como “bem-estar” e “harmonia” em seu discurso para caracterizar a beleza,
evitando descrevê-la com termos mais tangíveis; ou buscavam termos técnicos da
medicina para falar sobre o assunto, talvez, por ser um tema que não fornece
localizações sólidas no ambiente efêmero da moda e da mídia de massa
101
(LIPOVETSKY, 2007) ou mesmo por ter uma associação com futilidade o que se
opõe à tradição de um médico.
Já, ao comentar sobre o envelhecimento, os entrevistados procuravam relatar as
mudanças físicas que ocorrem no corpo. Embora utilizassem termos como “a idade
é um limite implacável” e “o envelhecimento é inexorável”, eles também buscavam
apontar aspectos positivos do envelhecimento, apresentando um discurso confuso
que hora parecia ser voltado para as suas convicções pessoais e hora parecia se
lembrar de seus lugares como grupo de referência influenciador da beleza e que
parece produzir e conversar com o coletivo ou social.
A união dos temas beleza e envelhecimento pareceu complicada, mesmo para esse
grupo de profissionais diretamente ligados aos dois temas. Foi possível notar que
apesar de os hábitos de consumo relacionados aos cosméticos serem associados
muitas vezes a um consumo superficial e não fundamental à vida dos consumidores,
em um primeiro momento; alguns dermatologistas mencionaram que consideram a
vaidade essencial no processo de envelhecimento das mulheres, agindo como um
motivador para uma vida saudável e melhorando a auto-estima do paciente. Esse
novo posicionamento da dermatologia ou até o que poderia ser chamado a
“assinatura’” de um dermatologista, como se fala de um estilista da moda parece ter
sido culturalmente bem construído ao longo dos anos.
Enquanto em outros tempos a cosmiatria podia ser alvo de certo preconceito entre
os
dermatologistas,
mais
recentemente,
as
questões
da
beleza
e
do
rejuvenescimento passaram a fazer parte da caracterização dessa especialidade da
medicina. No entanto, alguns entrevistados se mostram ao mesmo tempo críticos e
confusos. Falam que a cosmiatria vem sendo tratada como um negócio em nossa
sociedade junto com a banalização do uso de procedimentos cosméticos. Essa
relação comercial parece desagradar os entrevistados, que não concordam com o
consumo do corpo como um objeto (ASKEGAARD et al., 2002).
Segundo os entrevistados, o resultado de um tratamento de rejuvenescimento é algo
abstrato, podendo surgir divergências na comunicação entre médicos e pacientes
sobre quais melhoras na aparência são possíveis de atingir. Além disso, a
percepção do que é importante tratar esteticamente para o médico e para o paciente
102
pode diferir. Assim, a narrativa é essencial para que os resultados correspondam as
expectativas tanto das pacientes quanto dos dermatologistas (GROSSMAN e
CARDOSO, 2006).
Quanto a como percebem seus clientes, foi possível encontrar algumas diferenças
em seus relatos originadas de suas experiências:
- Como agem com os que buscam diretamente tratamento estético versus e os que
chegam ao consultório por questões de doenças;
- A timidez masculina versus o desembaraço feminino;
- As questões estéticas das mulheres jovens versus o desafio das mulheres mais
velhas frente às rugas;
- Pacientes com o elevado grau de instrução, como dos entrevistados versus os
pacientes de baixo nível de instrução e/ou intelectual.
Em alguns momentos das entrevistas foi mencionada a importância da percepção do
outro ou dos outros sobre a aparência ou mais especificamente sobre o
envelhecimento do corpo no Rio de Janeiro, uma sociedade que dá extrema
importância ao corpo que é tratado como “um capital” (GOLDENBERG, 2007, 2009).
Logo, torna-se mais difícil atingir a aparência ideal definida pela sociedade. Nesse
contexto, o uso dos tratamentos e produtos cosméticos passam a ser uma
esperança de chegar ao padrão de beleza que foi deslocado (MCCRACKEN, 2003).
Seria o rosto a interação do self com o mundo como falou Goffman (1987)? Alguns
dermatologistas contam que o rosto assume uma importância maior para as
mulheres mais velhas, ou seja, esse grupo é o que parece se preocupar mais com a
face/self como interagindo com o mundo. Os dermatologistas da pesquisa contam
que as principais questões trazidas pelas pacientes em seus consultórios estão
relacionadas ao envelhecimento e ao rosto: rugas e linhas de expressão. Já, as
pacientes mais jovens, por ainda exibirem mais o corpo, tendem a dividir suas
atenções entre o rosto e o corpo. Casotti, Suarez e Campos (2006) também haviam
observado que o envelhecimento ou a passagem do tempo faz com que as mulheres
tenham
preocupações
diferentes
em
relação
às
questões
estéticas
consequentemente consumos de serviços e produtos de beleza também diferentes.
e
103
Além disso, os entrevistados notam que há um grande dilema de algumas pacientes
cariocas entre ficar com o corpo bronzeado e cuidar da pele para evitar o
aparecimento de manchas que são comuns em lugares onde há sol quase o ano
inteiro e a praia.
Quanto às marcas de produtos anti-idade que foram usadas para o exercício
projetivo, o grupo de dermatologistas entrevistados falou de aspectos que julgam
importantes nesses produtos desde fatores ligados à testes com os produtos,
comunicação do produto ou aspectos mais associados à funcionalidade do produto a
outros relacionados a características mais hedônicas associadas às marcas:
- constante produção de estudos científicos, principalmente aqueles que apresentam
estudos histológicos;
- divulgação da fórmula do produto;
- presença em congressos da área;
- proximidade da marca com os dermatologistas;
A questão do controle de qualidade foi lembrada em relação a farmácias de
manipulação onde parece haver certa desconfiança dos médicos que em alguns
casos preferem utilizar os produtos industrializados. Cabe observar, no entanto, que
alguns demonstraram preferência por produtos manipulados em seus relatos o que
se liga ao estudo de Amui (2006) onde mulheres entrevistadas disseram gostar das
fórmulas manipuladas, pois acham que é algo customizado para elas.
Os aspectos relacionados ao consumo hedônico tais como o aroma diferenciado, a
cosmética, a embalagem e a comunicação prazerosa em termos de imagens do
produto foram também considerados importantes pelos entrevistados, mas podem
ser deixados de lado se a paciente não tem condições financeiras para pagar por
essas características hedônicas. Uma observação interessante feita por mais de um
entrevistado foi em relação a marcas de luxo como a Lancôme que não possuem ou
divulgam pesquisas científicas, nem divulgam também os componentes de sua
fórmula, por isso não prescrevem esse tipo de marca.
104
Outras questões que levam os dermatologistas do grupo à rejeitarem uma marca
anti-idade parece ser um certo preconceito em relação ao fácil acesso aos produtos
através do canal de venda porta a porta de marcas como Natura e Avon. Um dos
entrevistados verbaliza com clareza que a acessibilidade ao produto “desvaloriza a
profissão do médico” o que por outro lado pode levar justamente a uma valorização
das fórmulas manipuladas prescritas. Foram também mencionadas as estratégias
promocionais da marca feitas diretamente para os consumidores como algo que
também não gostam, pois consideram que são apelos feitos a um público leigo.
Por último, ao serem questionados sobre o não consumo de tratamentos anti-idade,
alguns dermatologistas do grupo comentaram sobre diferentes fatores que podem
levar as mulheres a terem esse comportamento. Apenas a preguiça foi lembrada
como um comportamento negativo para o não consumo. Os outros aspectos
lembrados parecem sinalizar algo positivo não só pelo que falaram, mas por suas
expressões de aprovação em relação às mulheres que aceitam melhor sua
aparência envelhecida principalmente quando já tem uma idade avançada. Falam
então de mulheres “que têm uma boa aceitação de suas vidas”, que “acreditam que
não se deve intervir no envelhecimento do corpo” ou mulheres que trabalharam a
vida inteira e que preferem se ocupar de outras coisas e não têm tempo para se
preocupar com a aparência. Essas considerações feitas parecem indicar um certo
alívio dos entrevistados em relação às mulheres com esse perfil já que em outros
momentos da entrevista trouxeram relatos em que parecem sentir certa pressão ou
cobrança de suas pacientes que quando entram em seus consultórios estão em
busca de padrões inalcançáveis de beleza e rejuvenescimento construído pela mídia
e prometidos pelas marcas.
5.1 SUGESTÕES PARA ESTUDOS FUTUROS
Com o andamento dessa pesquisa, surgiram algumas questões que podem ser
interessantes para alguns estudos:
•
Investigar a relação de mulheres que dependem de hospitais públicos com os
dermatologistas e seu desejo de cuidarem da aparência.
•
Verificar como as consumidoras de tratamentos estéticos percebem sua
relação com os dermatologistas.
105
•
Compreender quais são os fatores influenciadores do consumo de cremes
anti-idade e avaliar qual a importância de cada um deles na tomada de
decisão na escolha do produto.
•
Compreender
o
comportamento
das
mulheres
que
não
consomem
cosméticos anti-idade.
•
Compreender o comportamento de mulheres de classes econômicas mais
baixas.
106
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111
ANEXO
ANEXO 1- Roteiro semi-estruturado para entrevista com empresa
Podemos gravar a entrevista?
Quando formos usar as informações, você não será identificada, bem como sua marca.
Trabalho:
• Há quanto tempo trabalha com produtos de beleza?
• Antes de trabalhar com cosméticos, o que fazia?
• Que mudanças aconteceram na sua vida a partir desse trabalho? Alguma
aparência? Me fale mais sobre essas mudanças?
mudança na sua
Beleza:
• Fale um pouco sobre beleza. O que é ser bela pra você?
• Poderia descrever o padrão de beleza de atual ? E o padrão das brasileiras?
• Se houver discrepância. O que pensa sobre essa diferença?
• Imagine uma pessoa descuidada. Poderia descrevê-la? E uma pessoa bem cuidada?
Consumo:
• Quais cosméticos são os mais procurados pelas mulheres brasileiras?
• Quais são os cosméticos que considera da rotina?
• Quais são os que considera de luxo?
• Fale-me sobre o creme anti-idade da empresa (falar sobre as diferentes marcas, se houver).
• Quem é a mulher que consome a marca?
• Você sabe o que mais vende dessa marca?
• Como são dadas as orientações/sugestões para venda ou uso desses cremes?
• Existe uma idade a partir da qual as marcas passam a recomendar esses cremes?
• O que você acha dos dermatologistas em geral? Explique-me como vocês lidam com os
dermatologistas.
• É possível diferenciar esses profissionais, os dermatologistas? (Se a empresa tiver relação direta
com os profissionais)
• O que é mais difícil na relação com os dermatologistas? (Se a empresa tiver relação direta com os
profissionais)
• Vocês costumam fazer algum tipo de pesquisa com eles? Se sim me explique de que tipo, com
que periodicidade? (Se a empresa tiver relação direta com os profissionais)
• Você vê diferenças entre os dermatologistas do Rio em relação a outras regiões brasileiras?
• E os dermatologistas de outros países?
• Você se lembra de algum acontecimento curioso que relacione algum dermatologistas com os
cremes anti-idade? (Se a empresa tiver relação direta com os profissionais)
Nosso estudo tem como público alvo os dermatologistas. A sua entrevista, como uma especialista
está nos auxiliando a construir o roteiro principal.
Muito obrigada por esta entrevista e pela generosidade de nos conceder seu tempo.
112
ANEXO 2 - Roteiro semi-estruturado da entrevista com dermatologistas
Podemos gravar a entrevista?
Quando formos usar as informações, você não será identificada.
• Nome:
• Idade:
• Estado Civil:
• Formação:
• Há quanto tempo trabalha com dermatologia e com dermatologia estética (cosmiatria)?
• Poderia me contar por que escolheu trabalhar com essa área?
• Se você dividir suas clientes entre as pacientes que o(a) procuram por consultas por motivos
estéticos e por consultas por doenças dermatológicas, quantos por cento estariam em cada
grupo?
• O que é beleza para você?
• Como descreveria uma mulher bonita?
• Pensando na sua experiência profissional, que aspectos acredita são mais valorizados pela
mulher em seu corpo?
• E no seu rosto?
• É possível diferenciar os tipos de pacientes que você tem?
• O que você me diria sobre envelhecimento.
• Agora vamos imaginar a mulher de mais de 30 anos entrando no seu consultório pela primeira
vez. O que você diria sobre ela.
•
Agora vamos imaginar a mulher de 50 anos entrando no seu consultório pela primeira vez. O que
você diria sobre ela.
• O que você diria sobre cremes anti-idade?
• Quais fatores estéticos podem ser resolvidos com cosméticos anti-idade? Cumprem as
expectativas das pacientes?
• Você possui alguma preferência na sua indicação dos cremes anti-idade existentes? Por que?
• O que faz você confiar em uma marca de cremes anti-idade?
• O que você acha dos produtos anti-idade feitos em farmácia de manipulação?
• E das grandes marcas? (Mostrar as imagens)
• Você tem pacientes que preferem não utilizar os cosméticos anti-idade? Fale-me um pouco delas.
Muito obrigada por esta entrevista e pela generosidade de nos conceder seu tempo.
113
ANEXO 3 – Entrevistas com dermatologistas
Bianca
Bianca tem 51 anos, é casada e graduou-se pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, onde
também cursou residência médica em pediatria, curso de especialização e de mestrado em
dermatologia. Trabalha com dermatologia infantil no Instituto de Puericultura e Pediatria Martagão
Gesteira e em consultório em Ipanema.
a. A decisão de trabalhar com dermatologia (cosmiatria) e o público com quem trabalha.
A entrevistada fez residência em pediatria, área onde atuou por alguns anos, antes de especializar-se
em dermatologia há “mais ou menos 12 anos”. Ela explica que sua formação em dermatologia seguiu
uma “linha antiga” em que não havia a preocupação em “cuidar da pele, esteticamente”; ela conta
que essa visão começou, lentamente, a mudar nos anos 90. Nessa época, ocorreram os primeiros
congressos “onde se falava muito em estética”. Contudo, ela esclarece que, na universidade, a
importância que começava a ser dada ao campo não era vista como algo positivo. Ela reflete que há
“um lado justo”, pois, primeiro, o médico deve conhecer a pele, fisiologicamente, depois, conhecer as
doenças para, então, cuidar da parte estética. Bianca explica que, ao início, a cicatriz deixada pela
acne era praticamente a única relação do dermatologista com a estética: “o trabalho que se fazia era
com um peeling, e, mesmo assim, fazia-se escondido, porque, se o chefe do serviço soubesse, era a
maior confusão”.
A dermatologista relata que, em seu consultório, 60% dos pacientes a procuram por doenças e 40%
por estética, talvez por sua formação sólida na universidade. No entanto, a maioria das consultas são
por queixas associadas, “o paciente vem com uma doença, mas, no final da consulta, ele pergunta
assim: ‘o que posso fazer para melhorar?’, isso, em qualquer faixa etária”. Ela explica que os 40%
dos pacientes a procuram por procedimentos estéticos mais pesados, como preenchimento, botox e
laser.
Em relação às categorias de pacientes que chegam ao consultório em Ipanema, há aquelas que “são
dondocas da classe AAA” e querem fazer todos os tratamentos. No entanto, este grupo não é a
maioria, por sua postura mais conservadora; há pessoas mais velhas que teriam indicação de cirurgia
plástica, mas, por medo da intervenção, solicitam informações sobre o preenchimento; há alguns
artistas “globais” que têm muita preocupação com sua imagem, pois a aparência é uma exigência de
seu trabalho e tem impacto direto em sua profissão; e há os adolescentes que vão à consulta ou
porque suas mães não se conformam com suas espinhas, ou porque estão desesperados com sua
única espinha e querem tratá-la. No primeiro caso, Bianca acha interessante tratar o conflito,
satisfazer a mãe e o filho, além de mostrar para a mãe que seu filho deve ter espaço para decidir se
cuidar, no momento em que sentir vontade. Ela comenta que o adolescente sempre acha que tem um
defeito e que dizem: “a gente não é perfeito mesmo, não tem saída”.
b. Conceito de beleza: como define a beleza e como descreve uma mulher bonita.
114
Bianca considera difícil expor sua opinião sobre beleza. Ela afirma que é um conceito estético que
envolve questões culturais. Por exemplo, há algumas características da beleza negra que nem todos
gostam. Já, na sociedade brasileira, ao contrário de outras partes do mundo, a mulher bela é pouco
mais roliça que o padrão magérrimo das modelos, como a Luiza Brunet - mulher que ela acha muito
mais interessante do que a Gisele Bündchen.
Além das diferenças culturais, a dermatologista relata que “existem belezas que fazem parte do
consciente coletivo, como as mulheres gregas e os olhos azuis” e que, tecnicamente, uma mulher
bonita tem estatura alta e distribuição dos traços do rosto. quase perfeita. Todavia, em sua opinião, a
beleza não é composta apenas pelo lado estético: “se eu começar a travar um diálogo com uma
pessoa que acho linda, talvez a beleza dela se esmoreça se faltar conteúdo na conversa”.
A entrevistada, ainda, declara ser “filha da época da Leila Diniz”, esclarecendo que era uma geração
que via a beleza de um modo “completamente diferente”. Ela lembra que as mulheres eram mais
“cheinhas” e tinham contornos, sem muito exagero. Ela se considera da “velha guarda” e afirma que
assiste pouca televisão, e, talvez por isso, suas principais referências do belo sejam mulheres de
antigamente, que “tinham um rosto mais quadrado, diferente”. Ela declara que a beleza de
antigamente é mais interessante e acredita que a homogeneidade do que é considerado bonito “é o
caos”. Ela cita a Sophia Loren e a Grace Kelly como mulheres “lindas”, e a Angelina Jolie, a Michelle
Pfeiffer e a Carla Bruni, as mulheres belas da geração atual
c. Como percebe o comportamento em relação à beleza, na sociedade carioca.
Bianca acredita que a mídia desempenhe um papel fundamental na percepção de beleza da
população. Ela comenta que as manequins têm um tipo de “beleza gay”, “são todas esquálidas”,
assim como “os estilistas” que ditam a moda das passarelas: “não têm bunda, não têm quadril, não
têm coxa”. Desse modo, algumas mulheres tentam seguir esse padrão e “ficam enlouquecidas
porque têm cintura demais, porque têm quadril demais”. A dermatologista também comenta que as
propagandas que aparecem nos meios de comunicação são mais um fator que contribui para o
aumento da demanda pelos tratamentos estéticos. Ela lembra adolescentes que vão a seu
consultório para manter pele bonita, “tudo bem, odiar espinha e cravo, mas a demanda de cremes
hidratantes é uma coisa da mídia”. Ela relata o caso de uma paciente que foi à consulta com sua filha
de 11 anos; nessa família, a pressão para cuidar da pele vinha da criança, enquanto a mãe dizia que
“não ia abandonar o sol”, quando deveria ser o contrário. Bianca comenta que, em geral, o nível de
cuidado das mulheres consigo mesmas tem relação com sua fase de vida. Ela afirma que, nessa
sociedade, o dia-a-dia é muito corrido e não há tempo para se cuidar. No entanto, quando os filhos
“vão embora” essa mulher muda seu referencial e, só assim, consegue voltar seu olhar para si. Desse
modo, ela fica contente quando os outros notam essa mudança e alguém comenta como está mais
jovial; a paciente conta para a entrevistada que "todo mundo está reparando" e ela fica muito feliz por
isso.
115
A dermatologista afirma que as maiores reclamações, em seu consultório, estão relacionadas a
celulite, a estria e ao envelhecimento facial. Segundo Bianca, as mulheres não querem ter celulite, ela
conta que acha “divertido” elas se queixarem disso, mas não fazerem nenhum exercício físico para
mudar a situação, “o que é uma contradição”. Ela acredita que todas procuram por “um milagre”,
“uma vida fácil”, o que ela considera uma característica da natureza humana. Já o envelhecimento
facial é percebido por ela quando suas pacientes se incomodam com o “sulco nasogeniano”, próximo
ao nariz, com o “bigode chinês”, próximo à boca e com a glabela, entre as sobrancelhas. No entanto,
a entrevistada esclarece que as rugas mais acentuadas são queixas de pessoas com 60 anos, “algo
que incomoda muito”.
Bianca explica outro fato recorrente do processo de envelhecimento: o desaparecimento labial. Logo,
muitas pacientes querem fazer o preenchimento para resgatar sua boca, pois existe uma “expectativa
de transformação”. Do mesmo modo, um ídolo serve como inspiração para mudanças no corpo.
Assim, a entrevistada relata a história de uma mulher que foi ao consultório de um cirurgião plástico
e, apesar de essa paciente ter gostado do resultado da cirurgia, ela fez o seguinte comentário: "poxa,
mas não fiquei parecida com a Vera Fisher". Por isso, ela afirma que cuidar da saúde mental é
essencial, “senão ficam aquelas almas vazias em busca da felicidade através de uma beleza que não
chega nunca.”
A dermatologista acredita que o avanço das pesquisas e das tecnologias que possibilitam o
rejuvenescimento somado à dificuldade em aceitar o envelhecimento faz com que as pessoas
“paguem qualquer preço pelos tratamentos estéticos”. Logo, ela reflete sobre a diferença entre o que
significa gastar dinheiro com medicamentos e consultas médicas por problemas de saúde e o que
significa despender valores financeiros por questões estéticas. “Ninguém quer gastar dinheiro com o
que é perda: ficar doente já é ruim e ainda precisa perder dinheiro, precisa pagar um médico para
ficar bom. Já, para ficar bonito, para viajar e ter prazer vale tudo. Assim, as pessoas são capazes de
passar muitos apertos para comprar uma bolsa que desejam, fazer uma viagem, fazer um
procedimento ou uma plástica”. Além disso, ela afirma que certas crenças oriundas de um histórico
social contribuem para que, no inconsciente coletivo, os indivíduos não concordem com a prática da
cobrança financeira por cuidados com a saúde: “tem toda a coisa da religiosidade”.
d. A relação entre médico e paciente.
Segundo Bianca, os dermatologistas devem estar atentos ao que está “circulando” no mercado, pois
“podem sair coisas mirabolantes dali”. Ela escuta, frequentemente, as mulheres falarem que leram
matérias sobre tratamentos estéticos em revistas de salão de beleza, com na “Boa Forma e na Corpo
& Saúde”. Algumas dessas pacientes apresentam um problema que a dermatologista percebe que
está aumentando na sociedade, que é a busca por uma aparência que não existe. Ela acredita que,
“no fundo”, seja uma questão psiquiátrica de deformidade do seu self
e preocupa-se, pois ela
acredita que os dermatologistas não estão preparados para cuidar desse tipo de paciente. Ela relata
que, além dessa falta de educação médica, há a questão do ganho financeiro com os tratamentos
116
estéticos e da ética profissional, envolvidas no assunto. Ela, ainda, esclarece que essa questão é
tema cada vez mais recorrente nos congressos de dermatologia.
A dermatologista afirma que sua postura em relação à essa paciente “doente” é conversar com ela,
esclarecendo que há um problema psiquiátrico envolvido. Ela conta que o médico deve tomar cuidado
para não entrar “nessa maluquice” e, para isso, ela aborda quais são as expectativas do tratamento,
mostrando a realidade e as dificuldades da solução. Durante a consulta, ela também questiona quais
outras questões (psicológicas) que levaram o paciente àquele tratamento, “senão ele vai ficar
frustrado com o resultado”. Ainda assim, ela afirma que alguns pacientes acabam procurando outro
profissional para fazer o que desejam: “Têm alguns que atingem o meu limite e eu não atinjo o limite
deles, então irão procurar outro médico”. Bianca comenta que não se frustra com essa atitude, ela
considera que isso faça parte da relação médico-paciente.
A entrevistada atribui à sua idade e à sua experiência a tranquilidade para lidar com suas pacientes,
inclusive com aquelas que retornam ao seu consultório para “consertar” algum procedimento que ela
havia se recusado a fazer, por não concordar que o resultado ficaria satisfatório. Todavia, ela acha
que essa paciente não deve reclamar do médico que realizou o procedimento, pois “buscou um
profissional que concordou com seu ponto de vista” e o tratamento não atendeu as expectativas
esperadas. Bianca também comenta a dificuldade em conseguir que seus pacientes mais novos
“deixem de ir à praia ao meio-dia e usem o filtro solar adequadamente, para prevenir o
envelhecimento”.
e. O processo de envelhecimento.
Bianca entende que o ser humano tem dificuldade em lidar com limites e a idade é um “limite
implacável”. Assim, ela afirma que envelhecer é algo muito dolorido, principalmente em uma
sociedade que cultua a juventude. Segundo ela, isso acaba gerando uma competitividade entre as
mulheres mais velhas e mais novas.
A dermatologista reflete que o fato da mulher “sair de casa” fez com que ela quisesse retardar seu
envelhecimento e uma conseqüência foi a “mudança da faixa etária da velhice”. Ela reconhece uma
modificação de comportamento no modo de vestir-se das mulheres de meia-idade, por exemplo. No
entanto, ela considera que identificar qual idade representa a meia-idade é algo complexo. Para ela,
seria após os 50 anos, mas pela exigência social, algumas mulheres acham que estão na meia-idade
com 40 anos. A entrevistada atribui isso ao descompasso entre a mente, que ainda está muito ativa,
e o corpo, que já apresenta, por exemplo, dor ciática, tendinite e dificuldade em realizar certos
movimentos. Ela, ainda, explica que, antigamente, a mulher de 40, 50 anos era avó e, mesmo que ela
tivesse sexualidade ativa, isso não era reconhecido. Já, na sociedade contemporânea, as mulheres
dessa idade são bonitas, namoram, passeiam e também podem ser avós.
Em sua escala de “quedas”, Bianca declara que a mulher dos 20 para os 30 anos “tem uma
quedinha”, dos 30 para os 40 anos a queda “é maior”, dos 40 para os 50 é um “negócio arrasador” e
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“gera muita crise”, “com 60 anos, você tem que se acomodar, mas isso não quer dizer que você não
vá ficar bonita”. Já, a maioria dos homens estão bem com 40 anos e, se, “antigamente, o cara tinha
uma amante, agora ele sai de casa ou nem se casa”. Ela relata que essa diferença mexe muito com a
mulher.
f. Mulher de 30, mulher de 50: como são suas pacientes em cada estágio da vida.
Mulher de 30 anos: A entrevistada relata que o discurso dessas pacientes é: "cheguei aos 30 e
preciso começar a me cuidar". Ela se lembra que muitas mulheres perguntam o que deveriam fazer
em relação ao cabelo, aos lábios. Segundo a dermatologista, aos 30 anos já aparece alguma
“ruguinha no sulco nasogeniano” e o corpo começa a modificar. Ela também menciona que,
dependendo da constituição física da mulher, já há queixa em relação aos lábios. Ela esclarece que,
com essa idade, algumas mulheres querem aplicar o botox para congelar totalmente a testa ou para
mexê-la discretamente, para prevenir algumas rugas, “assim, esse sulco vai se formar muito
lentamente”. Ela se lembra que, quando tinha “30 e poucos anos”, reparou na primeira “preguinha do
pescoço”, entrou em desespero e sua minha mãe lhe disse: "minha filha, não tem saída".
Mulher de 50 anos: Ela relata que essas pacientes reclamam das rugas da fronte, dos olhos, entre as
sobrancelhas e do sulco nasogeniano. Ela afirma que as mulheres se queixam que suas rugas estão
mais proeminentes. A entrevistada conta que, nessa idade, as rugas e a flacidez se acentuam,
fazendo o “bigode chinês” e “as bolsas de buldogue” que começam aos 40 anos, muito suavemente.
Ela declara que o sol ajuda a aumentar a flacidez da pele - “ele quebra as fibras elásticas” – e, em
uma cidade como o Rio de Janeiro, as mulheres são muito afetadas por seu efeito.
g. Os cremes anti-idade: o que pensa sobre sua funcionalidade.
A entrevistada afirma que o rosto responde muito bem às tecnologias anti-idade, mas o corpo não,
logo é necessário malhar e se alimentar bem para ter algum resultado. Ela assume que, com alguns
cremes anti-idade é possível melhorar a textura da pele, clarear e tornar a pele menos irregular.
Segundo ela, uma pessoa que usa ácido retinóico e se protege do sol ficará com a pele bonita e com
o viço, mesmo envelhecendo. Ela afirma que esse ácido é a substância consagrada como “o grande
creme anti-idade”. “A vitamina C também ajuda” e, recentemente, apareceu o ácido hialurônico.
Contudo, é necessário mais tempo para confirmar a eficácia desse último. Ela diz que não pode
opinar sobre outras substâncias e afirma que, com tanta novidade no mercado, tem dificuldade em
“dar conta de tanto detalhe, de tanta molécula”. Ela também comenta que muitas pesquisas sobre
novas substâncias não são representativas.
h. Industrializado x Manipulado
Bianca considera que há pouca concorrência na indústria de cremes prontos, já que quase todas as
marcas pertencem a L´Oréal. Por isso, ela acredita que, quando um creme novo é lançado, muitas
vezes, a fórmula muda pouco e como é composto por “350 mil itens” é complexo analisar e difícil
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conhecer todas as moléculas do cosmético. Já os produtos manipulados, ela gosta de utilizá-los
quando quer uma fórmula mais restrita, com substâncias mais antigas e conhecidas.
A dermatologista comenta que os alemães pesquisam muito e trabalham com coisas muito
“esquisitas”. Ela sempre recebe informações da indústria de cosméticos desse país. Ela gosta muito
da marca Eucerin, pois apresenta estudos científicos. Ela pensa que é importante o médico buscar
embasamento em pesquisas e cobrar isso da indústria: “Já que eu tenho que prescrever um creme
que tem um custo muito alto, eu quero uma resposta boa dos produtos”. A entrevistada também
prescreve alguns produtos da marca La Roche-Posay e da Vichy.
i. As Marcas: o que pensa das marcas apresentadas – Avon (Renew), Vichy, La Roche-Posay,
Natura (Chronos) e Lancôme e Innèov
La Roche-Posay: Bianca acha que o produto desta marca contribue para melhorar a pele, mas não se
trata do ácido retinóico.
Avon (Renew): Ela não conhece seus estudos científicos, logo, não prescreve os produtos desta
marca. Todavia, quando uma paciente lhe diz que adora algum de seus cosméticos, ela não se opõe
ao uso, pois não faz mal.
Dermage: A entrevistada afirma que gosta dos produtos desta marca. Ela conta que a fórmula é mais
restrita, então, é mais fácil de analisar.
Innéov: Ela acha o produto desta marca muito interessante, mas precisa de mais tempo no mercado.
Ela declara que já leu sobre os estudos, mas não sabe “até que ponto funciona, até que ponto é uma
substância que está sendo ingerida e até que ponto pode ocorrer uma reação”.
Vichy: Ela afirma que são cosmecêuticos, “pode ter palmitato de retinol ou vitamina C”.
Natura (Chronos): Sua opinião sobre a Natura e a Avon são a mesma.
Lancôme: A dermatologista lembra como ficou feliz quando a revista Veja fez uma reportagem sobre
os cosmecêuticos, afirmando que nenhum deles têm a dose necessária para provocar uma mudança.
Ela considera todos umectantes, mas acha que a Lancôme é quase como a Avon.
j. O não consumo de produtos anti-idade.
A dermatologista conta que há mulheres que acham os procedimentos anti-idade muito agressivos e
preferem continuar com as rugas mais acentuadas. Ela afirma que não costuma perguntar
diretamente sobre um problema de pele que está visível, prefere uma abordagem mais sutil,
questionando se ainda há outra queixa: “Se o paciente fala: ‘não, só queria resolver isso’, para mim
acabou a consulta”.
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Bianca comenta que as mulheres que preferem não utilizar nada são pessoas que trabalham
bastante, são da geração "podes crer" e acham que tudo é agressão, “tomar remédio é agressão”.
Ela reflete se isso pode ser uma defesa pelos custos dos tratamentos ou a crença que irá ocorrer um
milagre e a paciente ficará com a pele jovem sem precisar se cuidar.
Lucia
Lucia tem 52 anos, graduou-se em medicina pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) em
1981. Fez pós-graduação, mestrado e doutorado em dermatologia pela UFRJ e trabalha na área
desde sua formação. A entrevista foi realizada no Hospital Universitário
a. A decisão de trabalhar com dermatologia (cosmiatria) e o público com quem trabalha.
Lucia conta que é uma dermatologista referenciada em dermatologia clínica, doenças. No entanto, ela
argumenta que faz parte do trabalho do dermatologista tratar, tanto, de problemas clínicos quanto
estéticos, “não existe você não fazer alguma coisa de estética quando você está no mercado de
trabalho”.
No consultório de Lucia, muitos pacientes a procuram por questões estéticas, a maioria, mas a
dermatologista diz que “aos 30 anos de profissão reservo-me o direito de selecionar o que eu não
quero fazer em estética”. Por isso, apesar do número elevado de pacientes que buscam estética,
trabalha mais com pacientes clínicos: “eu faço efetivamente talvez 70% de dermatologia clínica e
30% de dermatologia estética”. A entrevistada explica que não gosta de trabalhar com “a parte
supérflua” da estética. Ela se interessa pela estética que envolve o envelhecimento, a possibilidade
de “melhorar a qualidade de vida” do paciente, mas “não aquela busca alucinada pelos anos de vida
perdida, a pessoa tem 60 anos e quer aparentar 20”.
Como ela trabalha tanto em uma instituição pública quanto em consultório particular, percebe uma
nítida diferença entre seus pacientes. No serviço público, o poder aquisitivo das pessoas é bem
menor e não há muita demanda “de estética por estética”. Já, no consultório particular, recebe muitas
pessoas “alucinadas”, em busca da beleza.
b. Conceito de beleza: como define a beleza e descreve uma mulher bonita.
Lucia considera que a beleza é um movimento “que vem de dentro” e acredita que o bem-estar e a
harmonia são fundamentais em sua definição. A dermatologista afirma que, “mesmo com rugas” e
“com cabelo branco”, é possível “ter a beleza”. Então, pondera que a “combinação das coisas” é o
importante, o que não significa “tudo estar lisinho, esticadinho”.
A entrevistada utiliza o termo harmonia para descrever uma mulher bonita. Ela explica que a boca
deve harmonizar com os olhos, com o nariz e com o cabelo. Segundo Lucia, “o conjunto deve
funcionar bem”, pois “não adianta ter uma boca linda e um olho feio”.
120
c. Como percebe o comportamento em relação à beleza, na sociedade carioca.
Lucia reflete que a sociedade exerce um grande peso no que é considerado belo. Comenta que
existe uma “imposição externa” de padrões em que as pessoas tentam se enquadrar. A
dermatologista relata que é necessário ter uma elevada autoestima e sentir-se bem para, “ao longo
da vida”, deixar os modelos sociais e passar a “usar seus próprios conceitos”. Ela acredita que a
maioria das pessoas “passa a vida toda indo atrás de modelos de beleza que são fabricados lá de
fora e que, não obrigatoriamente, estão certos”.
A entrevistada considera que a mídia “fabrica” o que é belo, com fotos em revistas ou pelo que a
“rede Globo expõe na televisão”. Afirma que esses padrões sempre mudam com os anos, “beleza é
uma coisa absolutamente etérea”. Ela cita o exemplo do pêlo no corpo do homem, que sempre foi um
“marcador de masculinidade” e, atualmente, “homem não pode ter pelo no tronco”. Essa influência da
mídia também afeta o cotidiano dos consultórios dos dermatologistas, já que muitas pacientes
telefonam para o consultório pedindo determinado tratamento, mesmo antes da consulta. Segundo
Lucia, as pessoas recebem tanta informação que ficam perdidas e, na maioria das vezes, o que
pedem não é o tratamento que precisam. Ela conta que as paciente lêem sobre determinado assunto
“na revista do salão de beleza”.
Lucia explica que, no consultório de dermatologia, o rosto aparece como a parte mais valorizada do
corpo. No entanto, sabe que, no Rio de Janeiro, as mamas, o peito, a barriga e a bunda têm muito
apelo. Em relação ao rosto, ela diz que as mulheres reclamam bastante das rugas e das manchas e
imagina que essa queixa se deva à associação da ruga com o envelhecimento.
d. A relação entre médico e paciente.
Lucia pensa que é muito interessante poder ser uma “agente de cosmética” em um contexto que visa
o bem-estar e sente-se satisfeita quando suas pacientes comentam “agora, não fico sem namorar
nem um mês”. Ela acredita que melhorar a qualidade de vida dos pacientes, sem colocar suas vidas
em risco, pode fazer o papel de outras terapias.
Todavia, a dermatologista percebe um exagero da sociedade na busca pela beleza e pelo
rejuvenescimento. Para ela, cabe ao médico explicar para o paciente quais são suas possibilidades e
diminuir suas expectativas que, muitas vezes, são irreais. Segundo Lucia, essa é uma situação
bastante complicada, já que não há como mensurar a melhora conseqüente a um procedimento, ao
contrário da avaliação da melhora clínica, em que existe um “documento, que é o exame,” mais
concreto.
Entre aqueles que trabalham com estética, a entrevistada percebe que “seus colegas” estão muito
preocupados com o retorno financeiro e acabam “prostituíndo-se profissionalmente”, sem impor os
limites necessários ao tratamento do paciente. Ela conta que, ao fazer entrevistas com candidatos
para a residência em dermatologia, se depara-se com médicos recém-formados que escolheram a
121
especialidade, por acharem que a remuneração é alta e fácil e que é um meio glamouroso, onde “o
consultório fica cheio de artistas”.
Ao falar sobre a postura antiética de alguns médicos recém-formados, a dermatologista questiona a
grade curricular do curso de medicina. Para ela, faltam disciplinas que discutam a ética médica e uma
conseqüência disso é a formação de profissionais menos comprometidos. Lucia também comenta
que alguns médicos estão “compartimentalizando o conhecimento”. Como exemplo, quando um outro
colega dermatologista lhe encaminha pacientes com doenças, pois só sabem trabalhar com
cosméticos, como se não tivessem tido sua formação em medicina. Então, a dermatologista reflete
que “os médicos têm muita informação, mas não têm formação” e lembra que muitos dermatologistas
jovens prescrevem substâncias recém lançadas, fazendo testes nos próprios pacientes. A
entrevistada condena essa postura e explica ser “uma pessoa muito quadradinha na formação”. Ela
afirma que “lugar de pesquisa clínica é dentro da universidade”, sem comprometer a saúde do
paciente.
Para a dermatologista, parte dos pacientes com questões de estética sofrem de “dismorfofobia, tem
um distúrbio da percepção”, e deveriam ser tratados por psicólogos e psiquiatras. Ela comenta que,
após “muito tempo de profissão”, consegue reconhecer aqueles pacientes que sofrem dessa
patologia. Lucia sabe que essa pessoa irá trazer problemas posteriormente, pois “achou que ia sair
tudo, mas ainda ficaram algumas ruguinhas”. Essa paciente já usou todos os cremes e ainda traz um
“punhado de potes”, que trouxe do free shopping, para sua médica avaliar. A entrevistada acredita
que a mulher mais jovem é a mais alucinada, e que, sua questão é psicológica. Nesses casos, ela
conta que a paciente fica “aborrecida” e que diz, seriamente, que não pode prometer uma “tecnologia
miraculosa”, mas que “está livre para procurar alguém que prometa”.
e. O processo de envelhecimento.
Lucia explica que o envelhecimento é “inexorável”, mas “as pessoas não o aceitam bem”. Ela conta
que tem que “ensinar” a algumas pacientes que é um processo que faz parte da vida, “as pessoas
querem banir isso do cronograma, mas não pode”. A dermatologista percebe, entre suas pacientes,
que há uma facilidade maior em aceitar o envelhecimento de outra pessoa do que o próprio.
f. Mulher de 30, mulher de 50: como são suas pacientes em cada estágio da vida.
Mulher de 30: A paciente dessa idade vai à consulta, normalmente, por uma questão de saúde e
aproveita para pedir informação e um “creminho”, pois acha que está na hora de começar a usar algo.
Para Lucia, a mulher de 30 anos é muito influenciada pela sociedade, logo, mostra interesse pelo que
“as amigas” estão fazendo: preenchimento e botox, entre outros. Ela acredita que, nem sempre, elas
irão usar o creme recomendado, mas "acham lindo falar que o dermatologista mandou usar isso",
afinal, “faz parte do glamour”.
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Mulher de 50: A mulher de 50 “já se informou e vem com a demanda concreta”, que pode ser uma
queixa que o rosto está envelhecido, quer manter o viço da pele, está com muitas manchas e quer
melhorar. Sua questão é saber qual o melhor tratamento a seguir. Lucia explica que, se concordar
que a solicitação é algo relevante, aceita tratar a paciente, esteticamente. No entanto, há mulheres
que perguntam por telefone, antes de marcar a consulta, se já podem deixar marcado um peeling.
Então, a dermatologista orienta sua secretária informar essa paciente que, "se precisar, a médica faz,
mas quem resolve se vai fazer ou não é ela"
g. Os cremes anti-idade: o que pensa sobre sua funcionalidade.
Lucia explica que os cosméticos não possuem apenas a função que está descrita na embalagem, de
efetivamente melhorar a pele. Ela acredita que os cremes fazem parte de um ritual de cuidado
consigo mesma que pode melhorar a autoestima e fazer com que a pessoa se sinta melhor. Ela
explica que é um processo importante para a “melhora global” de pacientes que estão saindo de
quadros como depressão ou se recuperando de alguma doença infecciosa. A dermatologista
esclarece que quando alguém, “que está vivendo algum tipo de doença” e começa a pensar em se
cuidar, já é um “bom sinal de recuperação”. Ela conta que alguns pacientes têm vergonha de sair na
rua, por causa da pele manchada ou pelo cabelo que caiu muito, e se animam quando vêem alguma
melhora em sua aparência, “é importante no processo de recuperação”.
A entrevistada também estimula mulheres idosas a se cuidarem. Ela lembra que, aos poucos, com
elogios e melhora efetiva da pele, essas pacientes adotam os cremes anti-idade em sua rotina e
começam a gostar de usá-los. Ela explica que não precisa ser um creme, mas algo estimule um
cuidado consigo mesma, como um banho com essências, é “bacana”.
h. Industrializado x Manipulado
Lucia prescreve tanto os cosméticos manipulados quanto os industrializados, dependendo da
paciente que está tratando. Ela acredita que algumas pacientes entendem que o creme manipulado é
“especialmente direcionado” para sua pele e valorizam o processo artesanal. Outras, não têm
paciência de ir à farmácia duas vezes, já que o produto manipulado não fica pronto no mesmo dia em
que a pessoa o encomenda. Essas pessoas acham mais prático comprar algo industrializado. Em
outras situações, a entrevistada “mistura” os produtos. Por exemplo, um sabonete manipulado e o
produto da noite, industrializado.
Para Lucia, muitas vezes, a prescrição de cosméticos industrializados é um fator de desvalorização a
profissão do dermatologista, pois há alguém no “balcão” que indica toda uma linha de determinada
marca. A paciente diz: “eu compro com o balconista, vou no freeshopping”. Outra questão que ela
nota, é a facilidade do acesso aos farmacêuticos das farmácias de manipulação. Já nos laboratórios
que industrializam os cremes, a paciente passa por várias pessoas, ao telefone, até conseguir
resolver seu problema.
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A dermatologista afirma que há “farmácias muito boas e farmácias que não prestam”. Ela explica que
uma farmácia boa tem que saber trabalhar com cosméticos, pois são insumos mais caros,
diferenciados e devem ter uma boa apresentação. Ela comenta que o médico deve conhecer o
“sensorial do produto”, um creme não funciona em pele oleosa, deve-se usar loção ou gel, por
exemplo. Também, deve-se ter atenção se o remédio tem um cheiro ruim ou se mancha a roupa,
porque “isso depõe muito contra o produto de estética”.
i. As Marcas: o que pensa das marcas apresentadas – Avon (Renew), Vichy, La Roche-Posay,
Natura (Chronos), Lancôme e Innèov.
La Roche-Posay: Ela considera uma “marca séria” e “boa”. Além disso, “investe em pesquisa”, o que
Lucia acha importante. Ela comenta que é “bacana” ter “patentes”, “moléculas novas”.
Lancôme: A dermatologista acha que os produtos são muito bons, “de ponta”. Ela acha a
“apresentação bonita” e gosta do “sensorial”, mas relata que os cremes são caros e não têm “acesso”
os representantes da marca.
Dermage: Para Lucia, a Dermage é uma das “farmácias mais sérias”. Ela gosta tanto de seus
produtos industrializados quanto de manipulação. Ela conta que “eles se preocupam com suas
embalagens” e com as novidades do mercado, investem em pesquisa e são muito solícitos com os
dermatologistas. Também menciona que a farmácia está investindo em uma “estrutura de marketing
e de venda”.
Innéov: Lucia gosta do produto e considera seu preço competitivo. Ela conta que, antes do Innéov, já
existia um cosmético em cápsulas chamado Imedeen, mas era muito caro. Para ela, esse tipo de
cosmético é uma tendência no mercado.
Avon (Renew): A dermatologista acredita que a marca melhorou bastante e possui produtos
interessantes com bons preços. No entanto, ela afirma que não se pode prescrever um produto que
“está na vitrine”. Lucia conta que a Avon tentou se aproximar da dermatologia, mas não durou mais
do que dois congressos. Atualmente, não tem nenhum contato e o que conhece é através de
pacientes que usam os produtos por conta própria.
Vichy: A entrevistada gosta muito da marca e a considera “muito respeitável”. Ela já usava algumas
linhas antes de chegarem no Brasil e comenta que, ainda hoje, existe, apenas, uma pequena parcela
de seus produtos no país. Para ela, é uma marca reconhecida e tradicional no mercado, por isso,
mesmo que o negócio seja ruim no Brasil, “já estoura a boca do balão, em outros lugares”.
Natura (Chronos): Lucia admira a empresa por, investir em sustentabilidade. Ela analisa que ter uma
indústria nacional preocupada com o meioambiente é “bárbaro”. Em sua opinião, a Natura “não tem a
pretensão de substituir a Avon e nem de concorrer com a La Roche-Posay”, tem um posicionamento
particular, algo mais “clean”. Ela chegou a pensar em votar, nas eleições para Presidência da
República, na Marina Silva, por causa de seu vice, que é o dono da Natura.
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A entrevistada costuma dar os produtos da Natura de presente para estrangeiros, como os
sabonetes, mas nunca prescreve cremes anti-idade, pelo mesmo motivo por que não prescreve
cosméticos da Avon. Ela explica que a empresa tem ativos patenteados anti-idade, que são ótimos.
No entanto, cremes com concentrações eficazes inviabilizariam seu modelo de negócio, já que seria
necessário ter uma receita médica para comprá-los. Assim, vendem os ativos em concentrações
maiores para outros laboratórios.
j. O não consumo de produtos anti-idade.
Lucia acredita que não é absolutamente necessário usar cosméticos anti-idade, afinal “tem tanta
vovozinha que passou a vida sem usar creme”. De qualquer forma, a dermatologista “explica para a
paciente o que o mundo moderno tem para oferecer” e mostra que é interessante usar hidratante, um
sabonete que hidrata ou um óleo, quando a pele está seca. Se o paciente não gosta do creme porque
“mela”, existem outros recursos que podem agradá-lo. O dermatologista deve saber utilizar esses
veículos e indicar o que melhor se adéqua àquela pessoa. Ela afirma que se deve fazer uso do que a
“modernidade” trouxe de positivo e respeitar o paciente, sempre.
Helena
Helena tem 28 anos, é solteira e graduou-se em medicina há três anos. Ela faz residência em
dermatologia no hospital universitário Antônio Pedro há um ano, mesmo tempo em que trabalha com
dermatologia.
a. A decisão de trabalhar com dermatologia (cosmiatria) e o público com quem trabalha.
A entrevistada escolheu dermatologia no período de internato da faculdade. Ela narra que, nessa
área, o aluno é direcionado para aprender sobre doenças, como “manifestações na pele”. Ela, então,
passou a gostar muito de trabalhar com clínica médica e acredita que a dermatologia “mexe com
todas as clínicas juntas”.
Em sua pós-graduação, Helena está aprendendo a cosmiatria, o que a fez ter vontade de trabalhar
com os dois campos: clínica e estética. Ela considera estética uma “medicina mais limpa e mais
tranquila”, onde o médico consegue um resultado quase instantâneo. A entrevistada explica que essa
“medicina limpa” significa ter pouquíssimo sangue nos procedimentos e poucos aborrecimentos no
dia-a-dia, pois “seguindo a técnica você não vai errar muito”. Ela, ainda, pensa que sua qualidade de
vida pode ser melhor, trabalhando nessa área da dermatologia.
A dermatologista trabalha em um hospital público onde a maioria dos pacientes chega no ambulatório
por doenças. Dessas pessoas cerca de 30% têm alguma queixa relacionada à estética. Ela explica
que há “uma parte do ambulatório” que atende apenas os servidores. Desse público, 90% marca a
consulta por questões estéticas e a grande maioria é do sexo feminino. Ela, ainda, afirma que o
tratamento com remédios manipulados são mais caros. Por isso, quem procura o ambulatório, tem
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um poder aquisitivo um pouquinho melhor, mas não alto, “porque não tem uma população com poder
aquisitivo alto”, no hospital.
b. Conceito de beleza: como define a beleza e descreve uma mulher bonita.
Helena tem dificuldade em conceituar beleza. Ela sugere que a mulher bonita deve se cuidar e estar
bem consigo mesma. Contudo, diferencia o que é ter bondade e ter beleza. Ela acredita que a
maioria das pessoas diz que o importante é estar bem com o próximo, mas ela enfatiza que “uma
pessoa pode ser maravilhosa do ponto de vista humano e também ser muito bonita”, “uma coisa não
anula a outra”.
No entanto, a dermatologista reflete que, para a mulher transparecer beleza, deve primeiro “se sentir
bem e bela”. Assim, ela pensa que, primeiro, vem o bem-estar, que “começa de dentro para fora”. Já,
a beleza externa, ela considera que é um gosto individual, pois o que é belo para um pode não ser
para o outro. Ela exemplifica com as pintas do rosto, enquanto alguém reclama que “a sardinha
incomoda, uma outra pessoa acha a sardinha muito bonitinha”. Logo, ela nota vários tipos de beleza
na sociedade, mas “não existe um padrão”. Ela comenta que, por isso, “não funciona querer ter a
beleza do outro”.
Ao pedir para descrever uma mulher bonita, a entrevistada inicia falando que acha bonito um cabelo
claro ou loiro escuro, mais para o cacheado, do que para o liso. O rosto seria fino, assim como os
traços e a cor dos olhos seria mel. Helena afirma que a mulher deve ser alta e ter “uma proporção
boa: mama, quadril, glúteos e nada exagerado”. Logo, essa mulher seria “magra, alta e com a
tonalidade da pele morena”.
c. Como percebe o comportamento em relação à beleza, na sociedade carioca.
A dermatologista percebe que as mulheres que se preocupam com estética, não têm uma
preocupação maior, como uma doença. Ela também conta que muitas pacientes querem um
“tratamento instantâneo” e não conseguem aguardar alguns meses (quatro ou seis) para ter uma
melhora significativa na pele. A entrevistada lembra que, depois de uma certa idade, o tratamento
deve ser continuado por toda a vida.
Helena conta que muitas mulheres da classe social mais baixa que atende no hospital sabem que o
sol envelhece, mas só percebem as conseqüências, depois de muitos anos. Ela lembra que, em
geral, as pacientes chegam arrependidas, “sabendo que não precisavam ter pego tanto sol, e que é
algo que não dá para voltar atrás”. Por isso, é comum essas mulheres tentarem passar as
orientações que aprendem com os médicos para os filhos e os netos, mas não há como mensurar o
resultado desse discurso, em suas casas.
A entrevistada narra que as mulheres que buscam estética no hospital valorizam muito sua pele,
principalmente a pele do rosto com “manchas e rugas”. Ela comenta que, mesmo quando a pele de
outras partes do corpo está muito manchada, elas dão importância maior ao rosto. Assim, a
126
dermatologista reflete que o rosto é a primeira parte do corpo que as pessoas olham, “depois podem
até olhar o resto”. Ela afirma que é no rosto que o envelhecimento fica mais evidente. Logo, ela nota
que “machuca” quando outra pessoa “fala do seu cartão de visita”. Além disso, ela acredita que o
envelhecimento da face incomoda as mulheres, pois, cada vez que se olham no espelho “para
pentear o cabelo, escovar os dentes ou se maquiar” se deparam com sua imagem. No entanto, ela
percebe que o “outro falando, pesa muito” para as mulheres, pois “a visão do outro é muito cruel”,
principalmente, “se percebeu o defeito que elas já perceberam antes, o que significa que está
chamando muita atenção”. Entretanto, ela imagina que, em um salão de beleza, o cabelo será o mais
comentado; se for a uma clínica, diversas mulheres irão querer “colocar peito”.
d. A relação entre médico e paciente.
A dermatologista considera a relação com os pacientes de estética mais fácil do que com os
pacientes com doenças clínicas. Ela relata as pacientes que estão doentes chegam à consulta
“chateados, machucados por outros médicos e desenganados”. Já, quando buscam tratamento
estético, elas querem melhorar sua aparência e não há preocupação com a saúde, mas elas têm uma
exigência maior quanto ao resultado.
Como seu trabalho é em um serviço público, não são todos os procedimentos que estão disponíveis
para os pacientes de cosmiatria. A pessoa que chega ao ambulatório pode pagar um creme
manipulado que a médica prescreve, mas não “consegue fazer um botox”. Helena narra a dificuldade
de fazer esse tipo de procedimento no hospital e afirma que o paciente “sabe disso, então é melhor
se conformar em fazer só o creme” e o peeling, tratamento que “as mulheres gostam muito”. Desse
modo, ela esclarece que é difícil recuperar uma pele muito fotoenvelhecida, mas “recupera um
pouquinho e vai sempre orientando a usar filtro solar, beber bastante água e a ter paciência”. A
entrevistada costuma explicar para a paciente qual a expectativa que ela pode ter quanto à aparência
de sua pele e nota que o grau de satisfação, em geral, é muito bom. Ela menciona que há algumas
pacientes que chegam deprimidas por não gostarem de sua imagem estando com o lado psicológico
afetado.
Helena declara que essas mulheres se “agarram” ao resultado proporcionado pelo
tratamento e, com isso, acreditam que podem melhorar .
Helena afirma que as pessoas ficam surpresas quando descobrem que “existe
laboratório de
cosmiatria” no serviço público. Talvez, por isso, as pacientes usuárias destes serviços sejam “muito
agradecidas”. Ela acredita que orientar a paciente e esclarecer as limitações dos procedimentos é
essencial para uma boa relação médico-paciente. A médica também considera que, mesmo
esclarecendo que a melhora não será tão boa, “não se pode tirar todas as esperanças que a paciente
tem”. Ela observa que, a cada consulta, as mulheres se conscientizam das limitações dos métodos
dermatológicos e ajustam suas expectativas. Para a usuária, qualquer “resultadozinho” é muito bom.
Ela também conta que, seguindo a técnica, o padrão do procedimento, dificilmente o dermatologista
vai errar, “então você vai ter resultados bons”.
127
Helena ressalta que é preciso ter paciência, pois sabe que o resultado final não será “tão
maravilhoso” e seu papel é investir em algo que, sabe, é difícil de atingir e muitas vezes não é
possível. Por exemplo, a “manchinha do sol” é “tranqüila de clarear”, ao contrário da “mancha de
acne, de machucado, de inflamação” que são muito difíceis. A entrevistada expõe para o paciente
que “a deposição do pigmento é difícil de tirar, mas, com o tempo, vai clarear muito, o filtro solar vai
clarear muito. Mesmo assim, a gente não deixa de passar as medicações despigmentantes”. Após
três meses, “ela volta e fala que clareou um pouquinho, mas...” e, então, Helena repete a mesma
explicação.
A entrevistada declara que os médicos vivem de resultados, logo, não adianta ter uma boa relação,
“rir para todo mundo” e “ser uma pessoa apresentável”, se não consegue resolver os problemas do
paciente. Além disso, a rapidez com que se atinge o objetivo também é importante, “você ganhou o
paciente”. Para ela, o médico que é capaz de reunir “uma boa relação médico-paciente e resultados”
consegue a fidelidade do paciente.
e. O processo de envelhecimento.
Helena define o envelhecimento como um processo que começa “de dentro para fora”, assim como a
beleza. “A pessoa que se sente velha, vai se portar como mais velha, agir como uma velha, se vestir
como uma velha e se cuidar como uma velha”. Ela pensa que uma “velhinha” não se cuida tão bem
como “uma mulher de 30, de 40, de 50 anos”. Desse modo, ela considera que o primeiro passo para
o envelhecimento é se sentir velho.
Todavia, ela esclarece que existe o envelhecimento biológico que pode ser retardado com o uso do
filtro solar, evitando o sol e utilizando bons produtos na pele. Além disso, ela aponta outros fatores
que contribuem para o avanço ou retardo do envelhecimento, como a alimentação adequada, o
tempo de descanso e o exercício físico.
f. Mulher de 30, mulher de 50: como são suas pacientes em cada estágio da vida.
Mulher de 30: A dermatologista reflete que a mulher de 30 anos é “mais preventiva”, pois não tem
sinais de envelhecimento tão evidentes. Ela afirma que muitas começam a colocar botox com essa
idade, “porque sabem que é a melhor idade para iniciar esse tratamento”. Essas mulheres querem
“melhorar alguma coisa, para não deixar a pele ficar tão ruim”, por exemplo, para a pele não ficar
muito manchada. Helena comenta que essas pacientes são mais tranquilas, pois têm consciência de
que não há muita coisa para resolver, apenas para prevenir.
Mulher de 50: A entrevistada afirma que as de mulheres 50 são mais complicadas, “primeiro porque
algumas começam a se tratar só aos 50 anos”. Assim já têm muitos sinais de envelhecimento. Essas
mulheres “pegaram muito sol, algumas fumam, outras não se alimentam bem ou não dormem bem”.
Ela explica que precisa orientar a paciente, esclarecendo que sua pele vai melhorar, mas que, “por
causa de um passado prejudicial”, não vai ter um resultado expressivo. Ela percebe que algumas
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mulheres chegam à consulta conscientes do estrago que fizeram na pele e que o tratamento não irá
recuperar totalmente sua pele. “Outras acreditam que terão uma pele muito boa novamente”. A
dermatologista afirma que essas mulheres são as mais complicadas.
g. Os cremes anti-idade: o que pensa sobre sua funcionalidade.
Helena acredita que os cremes anti-idade têm um resultado positivo, se a paciente for disciplinada e
usar o produto por um tempo prolongado. Segundo a dermatologista, esses cremes começam a
hidratar a pele com três meses de uso, mas, para diminuir a flacidez, as rugas e dar mais resistência
à pele é necessário o tratamento mais longo. Ela explica que as substâncias utilizadas na fórmula dos
cosméticos renovam as células e combatem os radicais livres.
Ela cita alguns requisitos importantes para que se confie em uma marca de cosmético: “primeiro o
creme tem que atingir o objetivo esperado”; “segundo, é importante saber quais são seus efeitos
colaterais, alguns cremes irritam a pele”; e “terceiro, sua cosmética deve ser aceitável”. A
entrevistada conta que “uma cosmética boa” são produtos que possuem o cheiro bom, a textura
agradável e adequada para o clima. Alguns produtos para o dia são oleosos, quando deveriam ter o
“toque seco”, para não aumentar a oleosidade. Ela também sugere que a marca deve ter diferentes
opções de apresentação, como gel e creme, para que o dermatologista possa ter escolhas em seu
trabalho.
h. Industrializado x Manipulado
Helena gosta de trabalhar com o produto manipulado, pois consegue fazer a fórmula
com a
concentração e as substâncias que preferir. Além disso, ela consegue pedir que a apresentação do
produto seja em “base creme, base gel, loção ou espuma”, adequando o produto ao paciente. No
entanto, ela ressalta que a farmácia de manipulação deve ser de confiança e ter experiência em
cosméticos. Nesse caso, a “marca” importa muito.
i. As Marcas: o que pensa das marcas apresentadas – Avon (Renew), Vichy, La Roche-Posay,
Dermage, Natura (Chronos), Lancôme e Innéov.
Avon (Renew): Helena não conhece bem o creme anti-idade. Ela lembra que esse creme é muito
difundido na população com poder aquisitivo mais baixo e já ouviu que “o produto é testado
dermatologicamente, alguns têm vitamina C e ácido retinóico”. Ela afirma que se isso for verdadeiro,
seu uso é bom para esse público. Assim, é possível “atingir, pelo menos parte do objetivo, de hidratar
a pele e de combater radicais livres”.
Vichy: Ela já recebeu “amostras” do produto e gostou do resultado. Ela percebeu que, logo na
primeira vez que usou, ela própria, sentiu que hidratou sua pele.
129
La Roche-Posay: Helena exclama que essa marca é “hors-concours para tudo”. Ela declara que o
creme não tem concorrentes em preço, por ser muito caro, nem em resultado, “é o melhor”. Se ela
tivesse “dinheiro”, compraria apenas produtos La Roche-Posay.
Innèov: A dermatologista não conhece esse produto.
Natura (Chronos): A dermatologista pensa que “essas marcas ganham muito no preço”. Os
consumidores compram por ser mais acessível e pela facilidade da compra, “não precisa de ninguém
e só ver o catálogo e escolher”. O produto é como um “creme hidratante” e, nessa função, melhora
muito, é “um produto bom”.
Dermage: Helena confia nesta farmácia e a utiliza na prescrição de seus cremes “não estou querendo
fazer propaganda, mas é algo de experiência própria”. Quanto aos produtos prontos, ela afirma que o
resultado é bom: “tem essa coisa do toque seco e ela controla a oleosidade da pele”. Ela declara que,
se fosse indicar um produto, seria algo da Dermage, pois a farmácia apresenta um excelente custobenefício.
Lancôme: A entrevistada não conhece o creme anti-idade da marca, apenas as maquiagens e o filtro
solar. Ela relata que, com esses produtos, há uma grande preocupação quanto a sua textura. Apesar
de não conhecer o cosmético anti-idade, gosto da marca.
j. O não consumo de produtos anti-idade.
Helena pensa que as mulheres que preferem não usar cosméticos anti-idade estão satisfeitas com a
pele. Ela comenta que é uma escolha pessoal e, se essa paciente se sente bem dessa forma, “está
tudo certo”.
Elaine
Elaine tem 40 anos de idade e é casada. Fez sua pós-graduação e mestrado na Universidade
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e trabalha com dermatologia desde sua formação na faculdade.
Seu consultório fica no bairro de Botafogo, zona sul do Rio de Janeiro.
a. A decisão de trabalhar com dermatologia (cosmiatria) e o público com quem trabalha.
Elaine decidiu fazer dermatologia, primeiro, pois considera que a especialidade permite “meter a mão
5
na massa”, ou seja, fazer procedimentos , ao invés de passar o dia “apenas” com consultas. Além
disso, a entrevistada explica que gosta de perceber a satisfação imediata do paciente “Quando você
faz um botox a pessoa vem sorrindo e fica muito feliz”. Por último, considera que sua especialidade
proporciona um bom retorno financeiro. Elaine conta que é muito difícil separar a dermatologia
estética da dermatologia clínica, e que, portanto, iniciou a estética ao mesmo tempo que a clínica.
5
Aplicação de substâncias e/ou pequenas cirurgias
130
Afirma que a pele é um órgão visível a todos, logo, torna-se complicado fazer a distinção entre o que
é tratamento clínico e o que é tratamento estético.
A entrevistada trabalha em dois consultórios. O primeiro, é privado, onde outra dermatologista
encaminha seus pacientes para que Elaine faça os procedimentos estéticos. Nesse consultório,
atende nove entre 10 pacientes, por questões estéticas. Ela comenta que o perfil dos pacientes “é de
um particular mais caro”. No segundo consultório, trabalha “basicamente com convênios”, que foram
“encolhendo”, e ela passou a atuar com Unimed e Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDES),
apenas. O número de pacientes do convênio, que a procuram por estética é menor, cerca de 70%.
Ela explica que a maioria “não vem por um problema só. Ele vem pela micose de unha, mas “vira
para mim e fala assim: ‘essa manchinha tem jeito?’, entra na estética também”. A médica define suas
pacientes, em geral, como mulheres de mais de 30 anos que estão tentando recuperar o que
perderam, em relação à aparência.
b. Conceito de beleza: como define a beleza e descreve uma mulher bonita.
Para Elaine, beleza é “harmonia do conjunto”, “desde o falar, conversar, os traços, e de como ela se
arruma”. Argumenta que, “às vezes, você vê uma pessoa linda e você vai olhar o olho dela, é torto, é
vesga, o nariz é grande”. Sugere, ainda, que uma mulher bonita sabe utilizar o que tem de positivo e
esconder o que não a valoriza “ ‘ahh essa mulher é linda’, eu olho e sei que a mulher é horrorosa...”
Para descrever uma mulher bonita, ela utiliza exemplos de pessoas famosas, diferenciando-as por
padrões: uma brasileira, seria a Juliana Paes “acho uma típica beleza brasileira, é morena, bunduda,
ela é simpática”. Aponta a Gisele Bündchen como um padrão de beleza europeu e considera a
Mônica Bellucci uma beleza clássica “pra mim ela é uma pessoa estonteante! (...) ela, velha, é muito
melhor que muita mulher de 20”. Já, um padrão de beleza negra típica, para ela é a Thais de Araújo.
c. Como percebe o comportamento em relação à beleza, na sociedade carioca.
Para Elaine, as brasileiras têm uma forte ligação com a estética, mais do que em outros países. Em
seu consultório, percebe uma supervalorização da beleza. “Infelizmente, o visual, a estética, hoje em
dia se gasta mais do que você gasta com saúde, a verdade é essa, hoje em dia, minha percepção é
essa”. Acredita nessa cultura, “até para você conseguir um emprego, você tem que estar bonita,
entendeu?! Para você conseguir um namorado, né?!”
Outra questão que relata em sua entrevista é a importância da marca e do custo dos cremes no
mercado de cosméticos. Para isso, ela lembra de um diálogo que teve com uma paciente:
Paciente - "O médico passou esse creme que custou uns 20 reais. Com certeza, não deve
funcionar tanto como esse aqui, que é francês e custou uns 120. Aí, eu sai daquela médica,
doutora, e vim aqui porque, pra minha amiga, você passou um creme de 100 reais”,
Elaine - “Você acha que eu vou discutir! Quando eu comecei a trabalhar eu discutia... Hoje,
não, ‘eu acho que ele é perfeito pra você’ e o prescrevo. Eu sei que as substâncias que ele tem
são iguais aos desse aqui, eu sei que não estou fazendo mal a ela”.
131
Elaine também destaca a necessidade de inovação de suas pacientes “Ela quer uma coisa nova.
Mesmo eu sabendo que o velho é ótimo.”. Com vontade de consumir novidades, suas pacientes
compram diversos cremes no exterior “Todas as mulheres que viajam, todas compram cremes, de
monte. Não sabem nem pra que funciona, mas acham lindo e compram.”
Ao falar sobre o que as cariocas mais valorizam no corpo, apontou que “99,9% das mulheres querem
ser magras” e nota essa insatisfação através da queixa sobre a celulite “elas querem ser magras e
isso vem misturado com a celulite” ou “Elas vêm: ‘tive filho, estou com uma gordurinha aqui (...) mas
eu acho que tudo foca a magreza”. Já, no rosto, “a dermatologista, de um modo geral, se incomoda
pelas manchas mas tem paciente que vem aqui, toda pintada: ‘gosto das minhas manchas, eu quero
ver é essa ruga aqui’”. Ela entende que “a carioca quer ser bronzeada” e não quer parar de tomar sol.
No entanto, afirma que essa é uma particularidade do Rio de Janeiro, pois, ao conversar com colegas
de outros estados, em congressos, percebe que as paulistas e as sulistas não se importam diante da
sugestão de que evitem o sol.
d. A relação entre médico e paciente.
Elaine narra que o resultado do tratamento estético é “abstrato”, o que torna difícil adequá-lo a
expectativa da paciente “Porque o que é melhor para mim não é a mesma coisa do que para você”.
Quando o paciente “não consegue compreender, isso gera a insatisfação”, e o pior, é que “isso é
problema e isso dá processo” e pode fazer “com que ela mude de médico”. Comenta que tenta
explicar bem quais resultados irão alcançar “para eu não me aborrecer com processo,
honestamente...”. Mas assume que a maioria dos dermatologistas não tem essa postura.
A entrevistada procura adequar o tratamento à realidade da paciente. Por exemplo, se há alguma
questão financeira ou de saúde, quando o mais indicado é uma plástica para flacidez, indica outro
tratamento, explicando que o resultado não será o melhor possível. Porém, esse relacionamento é
complicado quando a paciente chega ao consultório “avisando” qual tratamento quer fazer, por
exemplo: “quero fazer botox”, “você vai ficar horrível com botox” "ahh! mas quero fazer", ignorando o
julgamento do médico. Relata que, muitas vezes, as pacientes “vêm baseadas numa imagem ou a
auto imagem dela mesma mais jovem ou a imagem da amiga” ou levam uma revista dizendo: "quero
ficar com essa cara, com esse peito, com esse nariz, com essa sobrancelha, com essa testa" e a
médica sabe que isso é inalcançável “É uma coisa infernal”. Ainda, afirma que há um consenso no
meio médico quanto à infidelidade do paciente de estética. Em geral, essa mulher “roda” vários
dermatologistas, pois nunca está satisfeita. Já, a paciente com problemas clínicos pode permanecer
com o mesmo médico por muito tempo.
Elaine fala de dois fatores que influenciam a relação médico-paciente: a idade e o grau de instrução
do paciente. Conta que a mulher jovem, com menos de 20 anos não costuma acreditar na
dermatologista, “se essa mulher é jovem ela não vai me entender porque não está a fim de me
entender” e troca de médico. Já a mulher “dos 35 para cima, ela consegue me compreender (...) e a
gente chega num denominador comum: ‘você vai ter que fazer isso para melhorar, mas...’”. A mulher
que possui “grau de instrução superior, ela compreende”, mas sua exigência com o tratamento é
maior. “A pessoa que tem um grau de instrução inferior, mas que tem dinheiro (...) não consegue
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compreender porque que a mulher da novela é linda e ela não pode ser”, mas sua satisfação com o
tratamento é maior, mostra-se mais grata e feliz.
e. O processo de envelhecimento.
Elaine define o envelhecimento como “um processo natural e irreversível”. Comenta que a pessoa
envelhece “global! Envelhece o coração, os músculos, o cabelo, a pele (...) o melhor da medicina é
investir nessa coisa da prevenção”, pois entende que “é a única forma da gente enganar o tempo.
Trabalhar a favor de manter aquelas células do corpo inteiro mais tempo estáveis, prolonga o seu
relógio”.
f. Mulher de 30, mulher de 50: como são suas pacientes em cada estágio da vida.
Mulher de 30: A entrevistada assinala que uma “típica” mulher de 30 anos chega em seu consultório
com queixas de ruga, manchas, “geralmente por sol ou por hormônio” e a falta de “viço na pele “. No
entanto, não está disposta a cuidar das manchas, pois “adora sol, geralmente é esse o problema”.
Para Elaine, o ideal seria que suas pacientes fossem ainda mais cedo, com mais ou menos 26 anos
procurar tratamento para manchas. Assim, conseguiria prevenir seu aparecimento. Essas mulheres
reclamam que o cabelo não está bonito ou está caindo, o que piora “na era das progressivas”
segundo a dermatologista. Algumas se queixam da flacidez da pele, mas a entrevistada afirma que,
salvo aquelas que têm maior flacidez por sua genética, as pacientes parecem sempre exageradas em
suas reclamações.
Normalmente, a mulher de 30 anos é muito ansiosa e quer que, “em um mês, ela esteja linda”, que
“não custe caro” e que “não precise fazer nada em casa... Uma coisa utópica”. Segundo a
dermatologista, o mais difícil é aceitar o envelhecimento, “até porque envelhecer é difícil”, e que o
tratamento tem limites, tanto para a saúde quanto para a prevenção do envelhecimento.
Mulher de 50: A mulher de 50 anos enfrenta as questões da menopausa, que pioram a saúde da pele
e afetam o organismo de modo geral. Assim, Elaine relata que essa paciente reclama que “a pele
está horrível”, que “não consegue emagrecer” e que “o cabelo já caiu a metade”. Todavia, ela “tem
uma queixa muito real, com mais fundamento”. Além disso, “a mulher de 50 sabe que um tratamento,
com um bom resultado, requer esforço. Ela já vem a fim de fazer esse esforço para ter esse
resultado”, pois já utilizou diversos artifícios e “tomou tanto na cabeça que já percebeu que a vida é
outra”. Elaine comenta que fica satisfeita com essa atitude da paciente porque sabe que “vai ter uma
boa resposta”.
g. Os cremes anti-idade: o que pensa sobre sua funcionalidade.
Elaine divide os cremes anti-idade em dois grupos: aqueles cujos ativos possuem estudo científico
comprovando sua eficácia “inclusive com biópsia de pele dizendo que melhorou... e são ótimos!” O
segundo grupo, “até melhoram, mas não o que eles prometem (...), a propaganda é muito maior.”
Acredita esses cosméticos são úteis para “A qualidade da pele, as manchas da pele, é... o viço da
pele”, “Tem paciente que você fala, ‘vamos passar um creme e talvez a gente faça um peeling para
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tirar o resto da mancha’. Ela volta com a cara limpa, feliz da vida, acabou o problema dela, tchau, dou
alta.”
Elaine diz que “99% das dermatologistas usam o creme cosmético para conhecê-lo saber, se auto
aplicam, ou nelas mesmas ou no marido, no filho, no papagaio e periquito” e que uma boa marca tem
“preocupação com a qualidade da embalagem em não estragar o produto, a conservação, quer dizer,
todo um estudo dela que você confia, que foi apresentado a você”, além de “você vê que ele tem um
tempo no mercado. Você vê que tem pouco efeito colateral”, no entanto “às vezes, se ele vier
preencher uma lacuna que eu não tenho, infelizmente eu não espero trabalho, tenho que lançar mão
dele porque ele é tão assim... que vale a pena você começar a testar”.
Além disso, a dermatologista explica que “o envelhecimento se separa em dois grupos, o intrínseco,
que é determinado geneticamente e não há como modificar isso (...) e o envelhecimento extrínseco,
que pode ser modificado, melhorado e muito melhorado pelos cremes. O envelhecimento externo,
que é esse extrínseco, ele basicamente, principalmente no Brasil, 99% dele é dado pelo sol.” A
entrevistada afirma que “Se você foto proteger a menina e a adolescente, você tem um adulto que vai
envelhecer mais velho. O filtro protetor solar e a proteção solar também não deixam de ser uma
arma, diria que a arma mais poderosa contra o envelhecer.”
h. Industrializado x Manipulado
Elaine conta que, “no Brasil, um creme que realmente tira mancha composto com ácido
despigmentante prestam uns três. Já nos Estados Unidos devem ter, facilmente uns 300, é uma
coisa absurda”. Contudo, de acordo com a entrevistada, houve uma mudança nos últimos 15 anos no
Brasil. Antes
“manipulava-se muito porque você não tinha o produto pronto na prateleira, que
atendesse às necessidades do médico. Hoje, há no mercado, produtos que atendem as suas
necessidades. Quando isso ocorre, eu não formulo.”.
Para ela, “a fiscalização no Brasil não é uma “Brastemp” (...) Tenho pacientes que fizeram o creme
numa farmácia e ficou ótimo, pegou a mesma fórmula, a mesma receita, foi em outra farmácia e
queimou a cara dela. Existe uma variação grande entre elas. Eu não posso mandar o paciente: ‘vai
nessa’, o paciente fala: ‘por que? Você está lucrando?’”. Desse modo, a entrevistada explica que
prescreve creme manipulado em duas situações: “Primeiro, quando não tem o que me atende.
Segundo, quando o paciente vira para mim e pede, dizendo que o manipulado sai mais barato”.
i. As Marcas: o que pensa das marcas apresentadas – Avon (Renew), Vichy, La Roche-Posay,
Natura (Chronos), Lancôme e Innèov
Innèov: A entrevistada sabe que, fora do Brasil, a variedade de produtos da marca é maior. Quanto a
sua qualidade: “É um bom produto mas a propaganda que ele faz é muito além do resultado e a
paciente vem com uma expectativa muito além do resultado.” A médica já escutou as mesmas
expectativas das pacientes, em relação a “gelatina, cartilagem de tubarão, não agüento mais ouvir
isso... É uma ilusão...”
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Avon (Renew): “Eu odeio o Renew da Avon. Odeio com todas as minhas forças” diz a medica. A
entrevistada afirma que “talvez o produto não seja ruim, mas a forma como ele é veiculado, vendido e
apresentado é um absurdo”, “Primeiro, ele não esclarece direito a paciente (...). Essa paciente não
tem dinheiro e compra o da noite somente, aí não passa o do dia. O da noite, geralmente, tem um
princípio ativo de um ácido. Se você usar aquilo e for pra praia no dia seguinte, sua cara vai
manchar”. Também faz uma crítica às pacientes que reclamam do preço dos produtos que prescreve
e, no entanto, compram o Renew, que tem o preço igual ou mais caro.
Vichy: “Gosto dos produtos da Vichy e gosto deles, mas não prescrevo muito Vichy porque a forma
como ele é veiculado me irrita. Ele é feito para ser vendido sem a interferência do médico (...) Não
posso prescrever uma coisa que está tão popularizada. Fica feio pra o médico prescrever isso,
denigre. ‘Paguei a consulta para ela me vender uma coisa que eu chego lá e compro?’, não posso”
La Roche-Posay: “Amo, eu amo a La Roche-Posay”. A médica afirma que a qualidade dos produtos é
boa, mas o preço é alto e ainda que “cumpre o que se propõe”.
Natura: Para Elaine, é similar ao Renew, “especificamente o Chronos, eu odeio, tanto quanto odeio
Avon, pelos mesmos motivos”. Contudo, acredita que “existe uma preocupação um pouquinho maior
da vendedora em passar as coisas direito”.
Dermage: A entrevistada acha que a manipulação tem uma boa qualidade. Em sua opinião, a linha de
produtos prontos “Atende à necessidade da lacuna porque é um produto pronto, que não tenho na
prateleira e, ao mesmo tempo, ele foca no Brasil. Então, os produtos dela são muito gel... tem um
veículo, uma qualidade apropriada para o problema que eu tenho aqui, que não é lá de fora”.
Lancôme: “Gosto deles. Aqui, é muito difícil você passar pelo problema que eu falei, ele atende a pele
européia, de creme europeu. Diria que a Lancôme atende, geralmente, a mulher de meia idade com
bom poder aquisitivo, ponto”.
j. O não consumo de produtos anti-idade.
Para Elaine, as mulheres que não consomem cremes anti-idade, são mulheres que não se cuidam
em nada “É descuidada com tudo, ela não está penteada, não tem nada no rosto, nem uma
maquiagem, tem unha mal feita (...). Ser uma pessoa bem cuidada não é uma questão de dinheiro, é
uma questão de detalhes.”. Propõe, às vezes “‘você quer mexer em alguma outra coisa?’, sempre
vou tomar cuidado para não ofender, porque tem gente que fica ofendida: ‘alguma mancha que você
queira, cabelo, unha’, às vezes vejo aquela unha toda nojenta, com micose e a mulher não está nem
aí com a hora do Brasil. "Não tem jeito, vai demorar muito para melhorar, deixa para lá", ou então "eu
não ligo pra isso". Não falo mais nada, acabou.”
Mario
Mario tem 29 anos, é casado e fez sua pós-graduação em dermatologia na Universidade Federal do
Estado do Rio de Janeiro. Há sete anos é formado em medicina e há quatro anos é especialista em
dermatologia. Ele tem consultório no bairro de Copacabana, na zona sul do Rio de Janeiro, onde foi
realizada a entrevista, e em São Cristovão, zona norte da cidade.
a. A decisão de trabalhar com dermatologia (cosmiatria) e o público com quem trabalha.
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Mario conta que foi uma criança com muitos problemas de pele, “sou quase um atlas de
dermatologia”, e precisava ir frequentemente em consultas médicas. Assim, antes de entrar na
universidade de medicina, ele já sabia que iria escolher essa especialidade.
O dermatologista trabalha com a parte clínica, cirúrgica e estética da dermatologia. Ele iniciou seu
trabalho com cosmiatria por uma questão financeira. No entanto, tem uma forte relação com o
tratamento da acne, “são os resultados que me satisfazem como profissional”. Mario relata que
durante sua pós-graduação não “olhava com tanto calor para a parte de estética”, mas quando, “entra
no mercado, não há como escapar desses pacientes. Ele afirma que não faz “propaganda” de seu
trabalho com estética e considera o tratamento da acne se “carro-chefe”. Talvez por isso, apenas 5%
dos seus pacientes o procuraram exclusivamente para tratamentos que buscam a beleza. Porém,
quase 50% das pessoas que atende, têm alguma questão de estética envolvida.
O entrevistado esclarece que quer parar de trabalhar em São Cristovão, onde sua “clientela” é de
uma classe social mais baixa e possui um nível mais baixo de escolaridade. Nesse bairro, sua
consulta é, praticamente, apenas por doença. Já, em Copacabana, a maioria da clientela tem nível
universitário e pertence à classe média. Muitas clientes acabam tendo alguma questão relacionada à
estética. Ele pretende formar uma clientela que o procure por problemas clínicos, e, nesta clientela
entrar, naturalmente, no campo de estética.
b. Conceito de beleza: como define a beleza e descreve uma mulher bonita.
O dermatologista acredita que beleza é um bem-estar pessoal. Ele declara que, em dermatologia
estética, “olhar-se no espelho e estar satisfeito com sua aparência é fundamental”. Em seu trabalho,
ele procura orientar o paciente “a chegar nesse ponto” de satisfação. Para ele, submeter-se a
procedimentos, incessantemente, faz com que o “paciente sempre almeje algo que nunca conseguirá
alcançar”.
Segundo Mario, uma mulher bonita deve ser simétrica e natural, “eu acho que é o mais importante na
beleza”. Ele pensa que a harmonia facial é muito importante e acredita que a “simetria, dentro da
normalidade, traz um equilíbrio no corpo”. No entanto, ele considera o conceito de beleza algo muito
pessoal.
c. Como percebe o comportamento em relação à beleza, na sociedade carioca.
Mario reconhece problemas psicológicos em algumas mulheres que buscam tratamento de beleza.
Essas pacientes pensam que seria necessário mudar tudo em sua aparência. Contudo, a maioria das
mulheres possui uma elevada auto-estima. O dermatologista nota que todas elas têm uma
preocupação com o rejuvenescimento, em diferentes graus. Algumas citam que querem rejuvenescer,
outras “melhorar a aparência” ou querem ter “um rostinho de criança, de 15 anos, de 20 anos...”.
136
Mario comenta que não consegue perceber qual parte do corpo as mulheres valorizam mais. Ele
acredita que isso é mais claro em um consultório de cirurgia plástica. Todavia, as paciente que vão ao
consultório médico se incomodam muito com a textura da pele e com as estrias do corpo, que
aparecem nos seios e no culote, normalmente. No rosto, as queixas por causa das manchas estão
presentes no seu dia a dia. De modo geral, ele escuta bastante as pacientes reclamarem do
envelhecimento, das manchas e das rugas. O entrevistado percebe que suas pacientes ficam felizes
com o tratamento estético quando são abordadas por um amigo ou colega que comenta a melhora
em sua aparência sem saber, ao certo, o que melhorou.
d. A relação entre médico e paciente.
Muitas vezes, os pacientes pedem a Mario um determinado remédio, como o Roacutan para acne,
que ele considera “excelente droga, quando bem indicada”. Entretanto, o dermatologista não aceita
essa imposição do paciente, ele fala que prescreve a terapêutica de acordo com o que considera
necessário. Ele explica que sua abordagem é um tratamento mais devagar, construindo “aos poucos,
a relação médico-paciente”. Ele conta que já perdeu muitos pacientes por causa disso, mas “não abre
mão” de agir de acordo com o que acredita. Ele analisa que essa postura gera “tanto a satisfação
médica, não financeira, quanto a satisfação do seu paciente”. Assim, ele diz que pode chegar a fazer
um botox ou um preenchimento, mas primeiro tentará algo menos radical.
O entrevistado entende que a ideia de “ficar mais jovem” é muito subjetiva. Assim, é difícil avaliar qual
a expectativa real do paciente. Se o desejo da mulher é ficar com “rostinho de 15 anos”, ele pensa
que não é o médico adequado para ela. Por isso, ele afirma que, ou ela vai mudar seu conceito de
rejuvenescimento, durante a consulta, ou ela vai procurar outro profissional. Ele aponta que existem
tratamentos mais agressivos, com tecnologia avançada, mas “não há como abraçar o mundo”.
Contudo, ele concorda que seria interessante ter máquinas a laser, como alguns outros
dermatologistas, pois facilitaria alcançar resultados em curto prazo. De qualquer modo, ele declara
que não mudaria sua conduta de “ir devagar” e de utilizar esses procedimentos, apenas, quando o
tratamento é indicado.
Mario percebe diferenças no relacionamento com pessoas de classes sociais distintas. Ele se lembra
que o público com menos condições financeiras, que atende em São Cristóvão, tem uma
compreensão mais limitada de como o sol acelera o processo de envelhecimento: “você fala: ‘Repete
pra mim, por favor’. Aí, repete tudo errado.” Essa população, provavelmente, “tem um nível de
escolaridade mais baixo” e espera um resultado mais imediatista, sem entender que o processo para
atingir uma melhora é demorado. Ao contrário, a população com melhor poder aquisitivo compreende
melhor o que o médico explica. Ele também avalia que o relacionamento com esse público é mais
próximo, talvez por “ser igual a você”. No entanto, a cobrança às respostas do tratamento são mais
altas, já que consegue comprar produtos melhores, “é normal que o paciente no nível superior tenha
um grau de tratamento acima”.
e. O processo de envelhecimento.
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Mario afirma que não há como interromper o processo de envelhecimento, ele acontece diariamente.
Ele explica que, para cuidar da pele, é fundamental a proteção do sol e, o quanto antes se
conscientizar disso, melhor será o tratamento. O dermatologista esclarece que o fotoenvelhecimento
é decorrente dos primeiros anos de vida, até os 20, 25 anos. Ele, ainda, elucida que a medicina está
cada vez mais preventiva, tanto para estética, quanto para doenças. Assim, é importante “se cuidar e
fazer exames periódicos”.
f. Mulher de 30, mulher de 50: como são suas pacientes em cada estágio da vida.
Mulher de 30: As pacientes que o dermatologista atende, dessa faixa etária, possuem nível superior e
trabalham. Ele narra que, de uma maneira geral, elas querem se cuidar, “pode ser que não tenham
vindo por isso, mas vão sair daqui com alguma coisa pincelada”. Ele define uma frase que seria o
símbolo dessas mulheres: “Não quero ficar”.
Mulher de 50: Mario relata que as mulheres de 50 anos têm queixas mais “exacerbadas” e “exigem
um tratamento contra o fotoenvelhecimento. Ele acredita que elas buscam melhorar e “enxergar no
espelho uma imagem de dez ou quinze anos atrás”, o que, “sem dúvida, é possível em termos de
texturas de pele, de manchas...”.
g. Os cremes anti-idade: o que pensa sobre sua funcionalidade.
O
dermatologista
acredita
na
eficácia
de
substâncias
que
são
reconhecidamente
fotorrejuvenescedoras e que “fazem parte do receituário todos os dias”, como o ácido retinóico. Ele
afirma que alguns produtos que possuem essa substância na fórmula atingem sua expectativa, mas
comenta que “não é um milagre” e não há como alcançar a pele de cinqüenta anos atrás.
Mario considera essencial receber informações científicas, seja pelos representantes ou pelos
congressos ou pelas reuniões da Sociedade de Dermatologia. Ele lembra que, normalmente, as
empresas de cosmético enviam a literatura científica junto com um novo produto. No entanto, a Avon
e a Natura utilizam “comercial” para vender o creme: “use 10 dias e fique com a cara de cinco”, o que
não é informação suficiente para o dermatologista.
h. Industrializado x Manipulado
Em sua opinião, é preciso que o dermatologista seja “maleável”. Mario utiliza a farmácia de
manipulação quando o paciente não possui recursos financeiros e precisa “baratear” o produto ou
quando “precisa de algo um pouco diferente, que não tem pronto no mercado”. Ele considera uma
ferramenta positiva, mas acredita que consegue um resultado melhor no tratamento anti-idade com
produtos prontos de laboratórios reconhecidos.
O entrevistado afirma que não indica uma farmácia de manipulação aos pacientes, mas percebe
diferenças entre os resultados de cosméticos manipulados em farmácias distintas. Entre os
laboratórios que produzem cremes industrializados, há aqueles em que ele confia “de olhos
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fechados”, pois sempre lançam produtos bons, com poucos efeitos colaterais e com boa cosmética.
Nesses casos, “preço do creme funciona como um viés ou uma confirmação” da qualidade do
produto. E há outros laboratórios que nem sempre lançam bons produtos. Logo, é necessário
aguardar uma resposta do mercado quanto ao resultado.
i. As Marcas: o que pensa das marcas apresentadas – Avon (Renew), Vichy, La Roche-Posay,
Natura (Chronos) Lancôme e Inneòv
Natura (Chronos): O dermatologista conta que não conhece a fórmula, logo, é difícil avaliar o produto.
Ele declara que o produto não faz parte de seu receituário e, mesmo que a paciente ache, o creme
bom, ele não pode garantir que os benefícios sejam provenientes desse cosmético.
La Roche-Posay: Mario afirma que são produtos, constantemente, prescritos por ele. Ele confia nos
cosméticos que a marca lança e tem acesso a todas as informações que precisa. Seu primeiro
contato com o produto é através do representante que lhe explica o que esperar do produto, qual a
cosmética e a fragrância. “Se o cara da Natura chega aqui e fala: ‘Esse Chronos é o acido retinóico,
ele faz isso’, pelo menos eu sei onde eu posso usar e o que eu espero dele”.
Avon (Renew): O entrevistado tem a mesma opinião dos cremes anti-idade da Avon e da Natura, não
pode afirmar se é bom ou ruim. Ele comenta que, se prescrevesse esse creme, iria se sentir como um
“vendedor de cosmético, como escolher um perfume ou um xampu”.
Demarge: O dermatologista afirma que é uma marca “super conhecida e bem conceituada”.
Innéov: Mario relata que já recebeu “alguma coisa”, talvez um prospecto do produto, mas não faz
parte do seu receituário “por falta de conhecimento do produto”. Ele diz não se lembrar se não o
achou “tão interessante” ou se esqueceu da existência dessa pílula.
Vichy: Ele declara que é uma “ótima marca, na parte da estética”, “na verdade, acho que é uma das
melhores”. Acho que é do mesmo grupo da La Roche. Sem dúvida, excelentes produtos, com
excelentes resultados.
Lancôme: O dermatologista não percebe uma divulgação “intensa” dos produtos no Brasil. Ele
assume que indicaria algum produto para um conhecido e acredita que, se a marca fosse mais bem
disseminada no Brasil, teria uma parcela maior no mercado de cosméticos.
Ele conclui afirmando que a Vichy, a La Roche-Posay, a Dermage e alguns produtos da Lancôme
fazem parte de seu receituário. A Natura e a Avon “com certeza não fazem”.
j. O não consumo de produtos anti-idade.
Mario não sabe se algumas pacientes, realmente, não tem interesse em utilizar cremes anti-idade ou
se não os usam porque ele não aborda o assunto. Contudo, ele conta que as pacientes com doença
querem, primeiro, cuidar de seu problema, para, posteriormente, pensar em estética. Ele relata que
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elas falam, para “deixar para depois o creme”, mesmo sem ele questionar isso. Ele acredita que elas
já têm uma grande preocupação com a doença e, por isso, não querem pensar em outra coisa. Outro
ponto é o custo com o tratamento da doença, que pode ser alto. Assim, não sobraria dinheiro para
comprar o creme.
O dermatologista também menciona que, para algumas pacientes, as marcas do envelhecimento
podem não incomodar e, quando perguntam sobre os possíveis tratamentos, provavelmente, é por
curiosidade. De qualquer modo, ele sempre indica o uso do filtro solar.
Gabriela
Gabriela tem 27 anos, é solteira, graduou-se em medicina pela Faculdade Souza Marques e está
cursando a pós-graduação em dermatologia na Policlínica Geral do Rio de Janeiro. Seu consultório
fica na Urca, bairro da zona sul do Rio de Janeiro, onde atua há dois anos com cosmiatria.
a. A decisão de trabalhar com dermatologia (cosmiatria) e o público com quem trabalha.
Gabriela escolheu ser médica como seu irmão mais velho, a quem admira. Ela escolheu essa
especialidade por ter sido uma criança que tinha dermatite atópica, uma doença crônica que a fez ir
regularmente ao dermatologista. Além disso, ela explica que a dermatologia permite que o
profissional consiga ter um horário flexível, uma boa qualidade de vida, ser “um pouco dona de casa”
e ainda ter um bom retorno financeiro, por causa dos procedimentos estéticos e pequenas cirurgias,
conseguindo não se prender ao plano de saúde.
A dermatologista afirma que há uma diferença entre trabalhar no consultório e no hospital. No
primeiro, seu nome está diretamente em risco e precisa fazer seu melhor. No segundo, há
professores que a auxiliam e uma instituição por trás de si. Apesar de ela preferir trabalhar tratando
doenças, ela esclarece que não há como o dermatologista fugir da estética, situação diferente da de
antigamente. Ela declara que 60% dos pacientes vão a seu consultório porque têm uma mancha,
porque querem tirar rugas, porque querem fazer um botox e ela não pode negar. Ela conta que a
maioria das mulheres chegam por algum problema de saúde, mas acabam perguntando sobre uma
questão estética. Já, os homens, vão à consulta por doença, acne ou calvície.
b. Conceito de beleza: como define a beleza e descreve uma mulher bonita.
Para Gabriela, o conceito de beleza é cultural e ela discorda quando a sociedade tentar uniformizar
seu conceito. Apesar de ela adorar os concursos de miss Brasil e miss Universo, ela acha incoerente
escolher uma mulher como “a mais linda do mundo” dentre pessoas tão distintas e com valores tão
diferentes. Além disso, ainda há a percepção pessoal: “o que eu acho bonito, não necessariamente é
o que você acha”.
A entrevistada declara que uma mulher bonita é confiante e valoriza seus pontos fortes. Ela acredita
que não adianta ser simétrica, ter pernas grossas, lábios grossos e olhos claro se não souber usar
140
isso a seu favor. Isso é o que torna uma mulher charmosa, “às vezes uma pessoa é linda, mas não se
dá conta disso e passa despercebida”. Ela, ainda, percebe como todo mundo tem algo bonito que
merece ser valorizado e “tudo tem relação com a atitude da pessoa”.
c. Como percebe o comportamento em relação à beleza, na sociedade carioca.
A dermatologista declara que as mulheres mais novas são imediatistas e não enxergam a ruga, nem
a mancha. Assim, é difícil conseguir que elas criem o hábito de se prevenir (passar o filtro solar). Ela
relata que essas mulheres veem o bronzeado naquele momento, sentem-se bonitas e não pensam
nas conseqüências futuras, por exemplo. Ao contrário, ela revela que as pacientes que já têm ruga
estão vendo o defeito, logo, a abordagem é muito mais simples, mesmo se o tratamento for mais
complicado. De qualquer modo, ela considera mais difícil manter um tratamento estético da pele no
Rio de Janeiro do que em outras cidades, por causa da cultura que envolve as cidades de praia,
como o “bronzeado”. No entanto, ela acha que isso está mudando, pois já não é tão legal ficar
“esturricado” com marca de biquíni como era antigamente. Ela reflete que ter um “bronzeado mais
saudável”, “a pessoa ficar corada” é importante, mas nada que seja exagerado.
Gabriela lembra que suas pacientes reclamam das estrias no bumbum e nos seios, e das celulites.
Ela comenta que, no rosto, as reclamações estão diretamente ligadas aos sinais do envelhecimento.
Por isso, ela pensa que as rugas são as grandes vilãs e ela afirma que as mulheres querem fazer
botox e preenchimento para evitá-las ou para diminuí-las. Algumas vezes, ela tenta “frear” esses
tratamentos invasivos, direcionando para o peeling. Já, as mancha são uma preocupação para as
mulheres apenas quando remetem ao envelhecimento, do contrário elas não se incomodam. Ela
conta que uma mancha considerada pequena pelo médico pode ser um grande trauma para a
mulher. Assim ela não acha que deve julgá-la. Porém, ela pondera que há um limite, e se for alguém
com um distúrbio de imagem, é mais complexo lidar com a situação.
A entrevistada conta que algumas mulheres são do tipo “alucinado obsessivo”. Segundo ela, essa é
aquela que já fez “milhões de tratamentos” e quer ter certeza que está fazendo o correto e não há
nenhuma novidade no mercado que a torne mais bonitas. Ela pensa que essas mulheres passam por
diversos dermatologistas para “ver se algum fala algo diferente”. Outras vão ao consultório, porque
suas amigas já estão fazendo algum tipo de tratamento e elas não querem “ficar para trás”. A
dermatologista também conta que algumas mulheres dessa sociedade decidem ir ao dermatologista
quando têm algum problema emocional e amoroso. Ela explica que essas mulheres terminaram um
relacionamento e querem preencher um vazio. Elas acham que irão se auto afirmar: “terminei com
meu namorado e quero ficar mais bonita”. Ela não gosta de fazer algo “muito drástico” com essas
pacientes, pois irão perceber que o tratamento não preencheu seu vazio e podem se arrepender.
d. A relação entre médico e paciente.
Gabriela percebe que cada dermatologista atrai um certo padrão de pacientes, de acordo com seu
comportamento: “se você é muito invasiva, muito agressiva nos tratamentos, você atrai pacientes
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mais agressivos. Quando você é mais calma, você atrai pacientes mais calmos e, o que eu já percebi
é que eu prefiro ser menos agressiva”. Ela acredita que o caminho para o resultado de um tratamento
é o que importa. A dermatologista explica que, em sua consulta, quando uma paciente pergunta o
que poderia melhorar, ela “volta a pergunta querendo saber o que a incomoda”. Ela não se sente no
direito de falar para uma paciente que ela deveria mudar o lábio, por exemplo. Quando ela acha que
a paciente exagerou em um tratamento com outro dermatologista e essa paciente chega a seu
consultório pedindo ainda mais daquele tratamento, sua conduta é pedir que espere atenuar o efeito
do que foi feito para, então, avaliar seu pedido. Ela afirma que prefere ser conhecida por fazer
“menos do que mais”, por ser mais cuidadosa. Gabriela diz que, em relação ao paciente estético, a
culpa de um problema sempre vai ser do dermatologista. Ela explica que relação médico-paciente,
muitas vezes, é comercial e ela não gosta disso, “as partes do corpo viram produtos e não há como
garantir que a boca vai ficar perfeita, pois o médico é humano”. Assim, ela entende que a relação
torna-se fútil e sem confiança.
A entrevistada relata que não pode escolher recusar um paciente, pois ainda está no começo de sua
carreira. Contudo, ela declara que seu limite de tratamento é quando sente que chegou em um ponto
que considera bom e bonito. Ela conta que usa seu bom senso e critério de beleza para tomar
decisões, o que considera difícil, já que acredita que esse campo é muito subjetivo. Ela também
avalia se o paciente tem um comportamento que lhe pode gerar futuros problemas, há alguns “que
sempre irão querer fazer alguma coisa nova” E se lembra de ter influenciado pacientes a desistirem
do tratamento por achar que nunca ficariam felizes. Ela reflete que, em geral, são pessoas que já
fizeram muitas coisas e mudaram de dermatologista, talvez, porque o anterior tenha se recusado a
continuar os tratamentos.
A dermatologista procura passar os tratamentos da forma mais prática possível para seus pacientes,
principalmente, quando esses são jovens. Isso, porque há uma certa dificuldade em aderir aos
cuidados diários que a dermatologista recomenda. Ela relata que também passa creme à noite e sabe
como “é chato” e como “dá preguiça”. Desse modo, tenta adaptar os tratamentos à vida de cada um,
facilitando o trabalho de seus pacientes. Ela se incomoda com o fato de ter que ser “antenada” para
ser uma boa médica de estética. Ela conta que isso faz parte do seu marketing pessoal. A médica
afirma que, se sair uma matéria no Fantástico ou na revista Veja, o paciente vem imediatamente ao
consultório do dermatologista e este precisa ter conhecimento do assunto.
e. O processo de envelhecimento.
A dermatologista relata que o mais importantes no processo de envelhecimento é a saúde. Ela
acredita que é essencial ter saúde, ter uma boa qualidade de vida e manter-se ativo para envelhecer
bem. Ela lembra que muitos pacientes de idade que chegam a seu consultório com doenças
provenientes do sol, como câncer de pele, são pessoas que tomaram muito sol quando eram jovens.
Para ela, o rejuvenescimento, a estética, ficam “em segundo plano”. Ela considera válido mulheres
jovens e de meia-idade prevenirem o aparecimento de rugas e manchas, mas ela acha muito artificial
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mulheres mais velhas fazendo tratamento agressivos com a intenção de ter uma aparência mais
jovem.
f. Mulher de 30, mulher de 50: como são suas pacientes em cada estágio da vida.
Mulher de 30 anos: Ela a descreve como uma pessoa que começou a se preocupar nesse momento
com o envelhecimento, pois se deu conta que existem as rugas e as manchas. Ela relata que, em
geral, essa paciente nunca utilizou creme, salvo aquela que já teve acne ou faz uso do filtro solar na
praia, no verão.
A dermatologista refere que, quando essa mulher chega ao consultório, já passou em alguma
farmácia para comprar o creme da L´Oréal ou comprar Avon e Natura. Como médica, ela afirma que
não pode avaliar essas marcas por não ter conhecimento sobre suas fórmulas, mas ela explica que
se a paciente sente-se bem com o creme, não pede para ela parar de usá-lo. De qualquer modo,
normalmente, a entrevistada indica cremes para dar mais viço, brilho e hidratar a pele, e, também,
para prevenir as rugas e, ainda, o filtro solar. Ela conta que é isso que essa paciente procura, pois “é
muito difícil você ter uma pessoa que já tenha um fotoenvelhecimento” com essa idade. Ela esclarece
que a vontade dessa mulher é parar no tempo, “não é melhorar, nem voltar, o que ela quer é parar
ali” e, realmente, é possível retardar o processo do envelhecimento, mas não congelar no tempo.
Assim, a medica utiliza o botox, que paralisa os músculos, apenas em pacientes que já apresentam
uma ruga mais acentuada, que não é o comum.
Mulher de 50 anos: Gabriela conta que essa mulher quer voltar no tempo e rejuvenescer: “ela mostra
até fotos antigas e pede a boca como era antigamente”. Ela reflete que há muita nostalgia nessa
idade. A médica comenta que é uma paciente que quer reverter o envelhecimento com
preenchimento, pois “o canto de sua boca, suas bochechas, tudo caiu”. A dermatologista explica que
se preocupa em passar expectativas realistas do que é possível fazer com tratamentos
dermatológicos. Ela afirma que, mesmo com muita tecnologia, nada substitui a cirurgia plástica.
Sendo assim, às vezes, ela conversa com a paciente, que o indicado seria uma plástica ou ela
considera que é crível retardar a cirurgia mais 10 anos, usando laser, peeling mais profundo ou
preenchimento. Ela lembra que alguma mulheres têm medo de cirurgia e, por isso, procuram um
dermatologista que pode melhorar o aspecto de sua pele, mas, dependendo da aparência, não
resolverá o problema. Contudo, ela se preocupa com a banalização que o procedimento cirúrgico tem
sofrido na sociedade.
g. Os cremes anti-idade: o que pensa sobre sua funcionalidade.
Gabriela relata que os cremes anti-idade já melhoraram muito e continuam em desenvolvimento. Ela
comenta que existem os cremes clássicos, “que vão sempre trazer aspectos positivos”, e as
novidades que podem funcionar ou não. Ela ganha esses lançamentos quando vai a um congresso e
os testa nela mesma e nas mulheres de sua família, por dois ou três meses, antes de prescrevê-los.
Porém, ela explica que quando o produto é de um laboratório confiável, ela o testa em pacientes com
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quem têm uma relação próxima, assumindo para eles que se trata de um produto novo. Ela, ainda,
explana que não gosta de pedir amostra no estande da marca em congressos, ela prefere que o
representante vá ao seu consultório, pois ela acredita que, se eles querem que os dermatologistas
usem seus produtos, então, eles que os busquem.
A entrevistada gosta dos cremes anti-idade para prevenção de rugas e manchas, para melhorar o
viço e o brilho da pele e para os usar, associados aos tratamentos mais agressivos. Contudo, ela
avalia que a área dos olhos (olheiras) e as áreas onde há as celulites são difíceis de tratar. Ela afirma
que alguns dermatologistas acreditam no tratamento desses problemas com os cremes e outros não
percebem resultado, o que é o seu caso. Ela também acredita que são necessários tratamentos mais
“fortes” quando o paciente tem muitas rugas, flacidez de face, perda de volume ou sulcos muito
fundos e melasma. Nestes casos que é comum associar um ácido para peeling ou um laser.
Segundo a dermatologista, as empresas têm cada vez mais cuidado ao lançar seus produtos, pois os
pacientes e os médicos têm acesso a qualquer informação pela internet. Ela refere que isso faz com
que as marcas se preocupem em embasar as fórmulas que produzem e seus componentes, além de
incentivar as pesquisas. Ela afirma que confia em marcas que têm embasamento científico e que se
preocupam em mostrar para o médico o porquê ele pode confiar na marca ou no produto. Ela
prescreve muito La Roche-Posay, Avène, Neutrogena, que são as marcas mais conceituadas.
h. Industrializado x Manipulado
Gabriela considera que utilizar a farmácia de manipulação valoriza o trabalho do dermatologista,
porque ele mostra que sabe lidar com os elementos do creme, do shampoo e da loção para
desenvolver fórmulas personalizadas para seus pacientes. Ela acredita que ainda não possui
conhecimento suficiente para fazer suas fórmulas, por isso ela copia algumas que já existem e que
são conceituadas. Desse modo, ela afirma que o paciente se beneficia do custo mais baixo do
produto e fica mais satisfeito, incentivando-o a manter o tratamento. No entanto, ela pondera que é
essencial que o produto seja feito em uma farmácia de confiança, onde o médico sabe que o
cosmético será bem feito. Além disso, ela reflete que alguns itens dermatológicos possuem uma
composição muito instável, como o filtro solar. Nestes casos, ela prefere utilizar alguns produtos
industrializados.
i. As Marcas: o que pensa das marcas apresentadas – Avon (Renew), Vichy, La Roche-Posay,
Dermage, Natura (Chronos), Lancôme e Innéov
Avon (Renew): A entrevistada declara que a marca é bastante popular e não busca a classe médica.
Ela nunca recebeu um representante para explicar “porque o produto funciona”, nem bulas
informando os princípios ativos. Por isso, ela conta que não pode prescrever cremes desta marca
para o paciente.
144
Vichy: A dermatologista gosta bastante da marca, acha-a confiável e com preço mais acessível, mas
ela acredita é pouco conhecida no mercado brasileiro. Logo, deveria “correr atrás do paciente” que
fica “muito preso à marca La Roche-Posay”. Também não tem muito contato com representantes.
La Roche-Posay: Ela acha a marca “ótima, muito boa” e a prescreve bastante. A médica percebe
bons resultados e uma cosmética muito boa. Lembra que lançaram uma linha para a pele brasileira,
facilitando o uso dos produtos, “têm problemas que só têm aqui”. Ela considera o preço alto, acha que
é uma estratégia para tornar a marca mais chique.
Innéov: Ela relata que foram feitos estudos científicos e que foram apresentados para os médicos. No
entanto, há uma pequena desconfiança, pelo trabalho ter sido encomendado pelo próprio laboratório.
Ela conta que confia mais na pílula para proteção solar do que a pílula contra o envelhecimento e
afirma que o custo do produto é alto.
Dermage: A entrevistada assume que é sempre muito bem tratada pela empresa. Ela comenta que
seus funcionários são atenciosos e esse investimento faz com que os médicos confiem em sua
marca. Ela lembra que são feitas muitas pesquisas e que tem uma linha pronta bem moderna, além
de serem manipuladas bem as fórmulas que os dermatologistas prescrevem.
Natura (Chronos): Ela não prescreve Natura e considera a mesma “história da Avon”.
Lancôme: Para ela, os cosméticos de luxo funcionam e são muito bons, mas estão atrás de marcas
“super caras e famosas”. Ela conta que adquiriu conhecimento sobre esses produtos através de
congressos internacionais, aulas sobre cosméticos de luxo e cremes que comprou “lá fora” e
experimentou em si própria e em sua mãe. Em seu consultório, poucos pacientes têm recursos
financeiros para usá-los e, por isso, não os prescreve em seu dia a dia. Contudo, ela sugere a sua
compra, quando viajam para o exterior.
j. O não consumo de produtos anti-idade.
Gabriela relata que são mulheres mais preguiçosas e sabem que não vão usar os cremes e, por isso,
optam pelo mais simples,Ω que é o filtro solar. Ela lembra que há algumas pacientes que só irão
utilizar algo quando as rugas aparecerem e outras que não estão “muito preocupadas com estética,
estão bem consigo e acham que estão envelhecendo bem”.
Flávia
Flávia tem 26 anos, é solteira e graduada em medicina há dois anos. Ela faz pós-graduação em
dermatologia no Hospital Universitário Antonio Pedro, onde trabalha com cosmiatria há um ano. Seu
consultório fica na Urca, zona sul do Rio de Janeiro.
A decisão de trabalhar com dermatologia (cosmiatria) e o público com quem trabalha.
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A entrevistada considera a parte clínica da dermatologia mais interessante do que a estética, porém,
seu trabalho seria limitado à consulta, que é mal remunerada. Ela afirma que é pelos procedimentos
estéticos que os dermatologistas têm lucro.
Em seu consultório, Flávia conta que 60% de seus pacientes que procuram é para tratar de
cosmiatria. Contudo, ela argumenta que, se for considerar que a acne envolve uma questão estética,
então, esse percentual se eleva para 80% dos pacientes. Já, no hospital, os pacientes clínicos
procuram o serviço de dermatologia “por doenças maiores, como psoríase e câncer de pele” e “o
resto procura porque tem uma pintinha que incomoda, então é clínico e, também, estético”. Ela
lembra que tem muita gente que vai ao hospital para melhorar a pele. Ela relata que isso independe
do nível social e a diferença é o creme que será prescrito.
b. Conceito de beleza: como define a beleza e descreve uma mulher bonita.
Para Flávia, beleza é a pessoa se sentir bem. Ela reforça a ideia de que, para transparecer a beleza,
é importante não estar preocupada com o porquê outras pessoas estão olhando para você: “tem
gente que tem acne, então, qualquer pessoa que olha: ‘Ah não! Está olhando para a minha acne’”.
A dermatologista descreve uma mulher bonita como alguém que é segura, “que anda com o peito
aberto”. Ela comenta que, quem se acha bonita acaba vendendo beleza. Além disso, ela reflete que a
beleza é subjetiva porque tem “muita mulher bonita loira, muita mulher bonita morena, muita mulher
bonita baixa, não existe um protótipo”. Ela avalia que houve uma mudança no que é considerado
belo, o que acabou sendo uniformizado no mundo, talvez, por causa da globalização. Ela se lembra
que, do Rio de Janeiro, pode assistir desfiles de moda que acontecem em Nova Iorque ou o desfile
da Victoria Secrets, no Japão.
c. Como percebe o comportamento, em relação à beleza, na sociedade carioca.
A entrevistada considera que os dermatologistas e os amigos são os maiores influenciadores do uso
do creme anti-idade. Ela refere que algumas mulheres perguntam para as amigas o que estão
usando e elas acabam usando também. Além disso, as viagens e os farmacêuticos são os canais por
onde circulam informações sobre as novidades do mercado de cosméticos.
Flávia analisa que a visão dos outros é fundamental para que a mulher passe a ir ao dermatologista:
“toda mulher que vai ao consultório em busca da estética está incomodada com o que os outros
pensam dela”. Ela afirma que a crítica de terceiros também é importante após o tratamento. Suas
pacientes lhe contam, felizes, quando outras pessoas comentam que estão mais descansadas e
quando perguntam se fizeram cirurgia plástica. Se ninguém faz um comentário, ela relata que a
paciente volta, frustrada, para a consulta, “mesmo que ela tenha achado o resultado bom”, o que para
Flávia é o ideal, pois “é muito feio alguém perceber que a testa está paralisada por causa de um
botox”.
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A dermatologista nota que suas pacientes preferem começar o tratamento com um creme do que com
algo via oral, pois têm medo que ocorra alguma alteração no fígado, “sempre é o fígado”. Ela avalia
que a percepção é de que um creme é algo mais leve e é, de fato, menos invasivo. Assim, a primeira
opção do médico nunca é o remédio pela boca.
Em sua percepção, a mulher brasileira tem bastante celulite e se incomoda com isso, mas não é algo
específico. Ela afirma que, no rosto, a mulher reclama de qualquer manchinha, cicatriz de acne,
melasma e olheiras, “tem gente que tem muita”. No entanto, ela é muito procurada por causa da
acne. Ela declara que muitas pessoas confundem dermatologia com cirurgia plástica. Então, ela
atende pacientes que se queixam tanto de deformidade no nariz quanto de preenchimento de lábios.
Ela conta que, se fosse dividir, cronologicamente, suas pacientes por doenças, a acne seria “mais na
adolescência”; o fotoenvelhecimento e as rugas seriam nas pacientes de 35 a 40 anos.
d. A relação entre médico e paciente.
A entrevistada ressalta que suas pacientes chegam à consulta reclamando que querem dar uma
melhorada na pele, porque está muito manchada e muito caída. A dermatologista então, analisa e
traça a conduta, à sua maneira. No entanto, o botox está muito disseminado e “na moda”. Logo,
muitas mulheres chegam ao consultório pedindo esse procedimento, independente da indicação. Ela
comenta que chega a ser um pouco frustrante para as pacientes, quando o correto é um peeling ou
um preenchimento.
Ela se lembra que já teve que lidar com mulheres que “estavam sonhando muito” com o resultado,
queriam ter uma aparência que seria inviável. Nesses casos, ela, primeiro, deixa bem claro que não
há como mudar totalmente a aparência e, quando percebe que terá problemas, ela aumenta muito o
preço do procedimento ou conduz o tratamento à sua maneira e não como a paciente lhe “manda”.
Assim, essa mulher desiste da dermatologista. Todavia, ela explica que algumas pacientes que
acabaram mudando de médico, retornaram para reparar algum problema causado por procedimentos
mal-feitos: “pacientes com vasinhos muito pequenos não têm indicação, por isso tem que aumentar
muito a potência do aparelho e acaba queimando. Aí, ela volta dizendo que não devia ter feito e o que
pode fazer com aquela parte que queimou”. Flávia esclarece que o eticamente correto é tentar fazer
com que a paciente retorne ao médico que fez o procedimento, mas isso é “quase impossível”, pois
sua credibilidade já foi perdida.
Segundo Flávia, os pacientes pobres são mais limitados em entender que o fotoenvelhecimento é um
processo evolutivo. Ela conta que eles ficam tostando no sol e, apenas com 40 anos de idade,
passam a se preocupar. Ela acredita que, às vezes, eles não fazem perguntas sobre o assunto
porque não têm capacidade e fingem que entendem o que foi explicado. “Já, o paciente rico tem
mais instrução e começa com fotoproteção, desde cedo”. Ela afirma que a noção de que a pele é o
produto de uma soma de coisas, só uma pessoa mais orientada é que tem. Ela também nota que as
pacientes, depois de orientadas, ficam mais calmas e passam a usar protetor solar e boné.
147
e. O processo de envelhecimento.
Flávia explica que existem dois tipos de envelhecimento: o envelhecimento intrínseco, que é
relacionado à etnia e à genética e o envelhecimento extrínseco, que é ligado à dieta, ao tabaco e,
principalmente, ao sol. Ela esclarece que a melhor forma de envelhecer bem é manter o hábito
saudável de vida, evitar o sol e o cigarro. Assim, a dermatologista considera que viver bem é cuidar
de tudo o que pode fazer falta no futuro. Logo, deve-se cuidar da coluna, cuidar do joelho, cuidar da
pele e da alimentação.
A entrevistada percebe que ocorreu uma mudança de pensamento, com o passar dos anos, em
relação ao processo de envelhecimento. Ela acredita que houve uma conscientização de que se
envelhece, pois, antigamente, as pessoas achavam que deveriam viver intensamente porque a
juventude não acabava. Ela observa que mesmo os mais humildes têm acesso à ginástica na praia e
fazem uma dieta mais balanceada, “está todo mundo preocupado com a pele e isso torna a velhice
mais saudável e o envelhecimento menos sofrível”. Ela nota que as mulheres não querem correr
contra o tempo, “elas querem ficar bem no tempo”.
f. Mulher de 30, mulher de 50: como são suas pacientes em cada estágio da vida.
Mulher de 30 anos: A dermatologista afirma que essa mulher é linda e mesmo que fume e tome sol,
ainda não sentiu o efeito destes fatores. Ela nota que, geralmente, essa paciente está se cuidando e,
por isso, não está muito gorda, ou teve um filho e está começando uma família com a qual se
preocupa. Ela considera que esse é o tempo ideal para começar a se tratar porque ainda está
começando a criar rugas, melasma e manchas de sol. Ela conta que essa mulher está preocupada
com a prevenção.
Mulher de 50 anos: Flávia comenta que a mulher de 50 anos quer voltar no tempo, “ela quer botar
botox porque está com rugas, ela quer botar preenchimento porque o sulco está pronunciado, ela
quer fazer o peeling porque ela está com manchas”. Ela percebe que seu sentimento é de querer
melhorar. A dermatologista acredita que essas questões incomodam muito, pois mostram a idade da
mulher e, por mais que elas aceitem envelhecer, elas não querem que outras pessoas saibam
quantos anos elas têm. Ela reflete, ainda, que, mesmo quando alguém descobre sua idade, essa
mulher quer escutar: “ você está tão bem”.
g. Os cremes anti-idade: o que pensa sobre sua funcionalidade.
A dermatologista acredita que há cremes bons e que funcionam, pois existe muito trabalho, muito
dinheiro e muito estudo nesse mercado. Ela considera que o médico deve saber aplicar o produto e
saber seu mecanismo de ação para que o creme atenda suas expectativas e as dos pacientes.
Contudo, ela afirma que também existe muita venda de ilusão, “principalmente dessas marcas mais
baratas que não têm nenhum estudo por trás”. Ela avalia que não há como um cosmético anti-idade
ser barato, já que é muito caro fazer todo o processo, desde a formulação até a fabricação. Ela conta
148
que muitos estudos sobre os cremes são feitos em hospitais universitários ou em grandes centros.
Quando não há conflito de interesse relacionado ao trabalho, ela refere que é possível confiar nos
resultados e muitos são publicados em revistas de dermatologia.
Flávia considera que o uso dos cremes para olheiras, inchaço dos olhos, sulco aprofundado e
manchas uniformiza bastante a pele. Porém, ela explica que, quando está “tudo muito caído”, tem
que intervir com algum procedimento mais agressivo. Ela esclarece que prescreve o cosmético
antienvelhecimento, de acordo com a necessidade do paciente: “têm uns, que o colágeno é mais
importante, então, é um creme; outros, que o preenchimento da ruga é mais importante e, aí, é outro
creme; têm outros, que o clareamento é mais importante, então, é outro creme”.
A dermatologista afirma que, para confiar em um produto, o mais importante é saber a marca a qual
ele pertence: “têm marcas que você sabe que têm estudos e a gente está em contato com isso,
direto”. Para ela, as marcas que têm estudos são as mais confiáveis.
h. Industrializado x Manipulado
Para a entrevistada, o problema da farmácia de manipulação é que não há um padrão de qualidade.
Assim, existem farmácias muito boas e farmácias não tão boas. Por isso, quando um paciente precisa
enviar uma fórmula para manipulação, ela indica qual a farmácia, garantindo que o produto será bem
feito.
A dermatologista comenta que o paciente particular não gosta de passar duas vezes na farmácia,
nem esperar setes dias para sua fórmula ficar pronta. Logo, ela costuma indicar produtos
industrializados, para esses pacientes. Ela declara que há um imediatismo em relação a tudo. Assim,
mesmo os cremes que atuam a longo prazo têm algum efeito imediato, senão o paciente pára o
tratamento. Ela afirma que é um efeito motivador para o paciente. Já, o paciente mais “humilde, que
não tem tanto dinheiro”, assim, são prescritas fórmulas para manipulação.
i. As Marcas: o que pensa das marcas apresentadas – Avon (Renew), Vichy, La Roche-Posay,
Natura (Chronos), Lancôme e Innèov
Lancôme: Flávia considera uma marca confiável e cara, utilizada só com pacientes selecionados. Ela
comenta que há muitos estudos, mostrando que seus produtos realmente melhoram os quadros. Ela
também argumenta que é uma marca que tem muita renovação e não faz muita propaganda e nem
fala que irão acontecer milagres. Ela relata que “ela não corre atrás de você”, mas sempre está atrás
do melhor produto do mercado.
La Roche-Posay: Essa marca é uma das preferidas da dermatologista. Ela relata que existe uma
troca muito boa entre os dermatologistas e seus farmacêuticos e “a La Roche responde exatamente
àquilo que a gente quer”. Ela afirma que, mesmo não sendo uma marca nacional, é muito próxima do
dermatologista e dos professores universitários. Ela comenta que os dermatologistas sempre
recebem seus trabalhos.
149
Vichy: Ela acredita ser o mesmo conceito da “La Roche”. Ela também afirma que são marcas mais
baratas e seus produtos têm uma resposta muito positiva. Ela avalia que essas duas marcas têm
destaque no Brasil.
Dermage: Ela declara que é a farmácia de manipulação em que confia. Ela conta que é uma empresa
nacional, que tem muitos produtos bons, tanto os já prontos quanto os que manipula. Ela considera
que é uma farmácia de confiança, se tiver algum problema com a fórmula “ela liga e corre atrás do
dermatologista”. Ela comenta que isso traz um conforto, ao fazer uma prescrição para o paciente.
Avon (Renew): Ela relata que não tem muito conhecimento sobre a Avon, pois nunca recebeu um
estudo e não prescreve essa marca.
Innèov: A entrevistada conta que esse produto é um cosmecêutico,
algo muito novo e que o
prescreve a seus pacientes, porque já saíram alguns resultados positivos sobre o mesmo. Porém, ela
ainda não sabe qual a resposta a longo prazo. A dermatologista esclarece que utiliza esse produto,
pois não há produtos que resolvam algumas manifestações que incomodam os pacientes. Assim, ela
explica que, somando um pouco de cada produto, o resultado pode ser bom. A médica acredita que
as pílulas para celulite e para que gordura localizada têm um efeito razoável. Porém, ela ainda tem
dúvidas se o tratamento faz efeito, ou porque o paciente está disposto a mudar de vida e muda seu
comportamento ou se é efeito do Innéov.
Natura (Chronos): A dermatologista comenta que os usuários do hospital, às vezes, fazem um
“esforcinho” e compram o Renew. Contudo, ela afirma que não é possível fazer um
acompanhamento. Já, no consultório particular, seus pacientes são resistentes a comprar os cremes
da Natura e da Avon. Ela relata que a Natura e a Avon não têm contato com os médicos: “parece que
elas preferem ensinar para as consultoras como vender, a falar pra gente como o creme age”. Flávia
considera que estas marcas fazem parte de uma área “bem obscura” e ela declara que nunca viu um
trabalho comparativo realizado pelas mesmas.
j. O não consumo de produtos anti-idade.
Flávia conta que alguns pacientes vão à consulta apenas por questões de saúde. Ela afirma que,
mesmo que a paciente tenha uma ruga, ela não questiona a pessoa, se isso não a incomodar. Ela
nota que são mulheres que se sentem bem e bonitas.
Carla
Carla tem 56 anos, é solteira e graduou-se em medicina há 32 anos pela Universidade Federal do Rio
de Janeiro. Ela tem mestrado e doutorado em dermatologia e trabalha com cosmiatria há 20 anos.
Seu consultório fica na zona sul da cidade do Rio de Janeiro, no bairro de Botafogo.
a. A decisão de trabalhar com dermatologia (cosmiatria) e o público com quem trabalha.
150
Carla demorou a ingressar no trabalho com a cosmiatria. Sua principal motivação foi precisar
“consertar os problemas” que ocorriam quando suas pacientes procuravam outro médico, para cuidar
da parte estética. Ela conta que se tornou “expert” em complicações em suas próprias pacientes.
Assim, a médica resolveu contratar dermatologistas altamente qualificados em procedimentos
específicos, para trabalhar em seu consultório, com sua supervisão. Ela afirma que, desse modo,
resolveu seu problema, pois utiliza o produto correto, com a técnica correta, nas mulheres que a
procuram.
A entrevistada sugere que, todos que são atendidos em seu consultório, cerca de 50% dos pacientes
sejam direcionados para a área médica e 50% para a área estética. Contudo, se forem considerados
seus pacientes, ela afirma que 70% a procuram por problemas de saúde e 30%, por estética. Carla
relata que muitas pessoas a procuram por seu nome, que é bastante conceituado no mercado. Ela
conta que sua consulta é “relativamente mais cara” do que a de outros dermatologistas. A médica
também aponta que seus pacientes estão dispostos a pagar um valor alto pela consulta e pelos
tratamentos, tendo a confiança de que será feito um trabalho de qualidade. Além disso, ela não
possui convênio, atende apenas “doente particular”. A médica lembra que os “doentes novos”, em
geral, são complicados, pois já passaram por diversos dermatologistas que não conseguiram fazer
um diagnóstico ou chegam a ela porque estão com alguma complicação de procedimentos estéticos
realizados por outros médicos.
b. Conceito de beleza: como define a beleza e descreve uma mulher bonita.
Para Carla, o conceito de beleza é um estado de bem estar. Ela acredita que o belo é uma sensação
de “conforto com sua aparência”. A dermatologista considera que a beleza está relacionada à
percepção e não à visão, “é algo interior, de felicidade, o brilhar do olho”. Ela não concorda com a
busca incessante das pessoas de quererem parecer mais novas.
A entrevistada se lembra que organizou um congresso mundial de dermatologia cosmética com a
seguinte frase: "looking good, feeling good". Ela conta que quis dizer que “se você está se sentindo
aparentemente bem, você está se sentindo bem” e a médica acredita que o oposto também deva ser
verdadeiro, “se você está feeling good você acaba looking good”.
c. Como percebe o comportamento, em relação à beleza, na sociedade carioca.
Carla percebe que muitas pessoas estão mais preocupadas com a cosmética do que com as
doenças. Ela observa que algumas mulheres são capazes de gastar “um dinheirão para resolver
estética”, mas não querem despender de dinheiro para fazer uma cirurgia para retirada de um sinal
com suspeita de câncer. A médica comenta que essas pacientes nunca estão satisfeitas e,
provavelmente, apresentam definir dismorfofobia. Ela acredita que seja uma insatisfação interior que
acaba levando a essa insatisfação com o visual. A entrevistada refere que atende algumas mulheres
que buscam incessantemente a juventude, mas não há solução.
151
A dermatologista credita parte da supervalorização da estética à propaganda e ao número quantidade
de pessoas da mesma faixa etária que são submetidos a procedimentos cosméticos. Ela comenta
que há muitas pacientes que chegam ao consultório com um “saco cheio de cosméticos” que
compraram na Europa e nos Estados Unidos e que não sabem para que servem. A entrevistada
lembra que algumas pacientes fazem o tratamento estético escondido de seus maridos, por isso
precisa ser algo discreto. Ela explica que, apesar dos maridos as acharem belas, elas não se sentem
bem. Logo, elas guardam dinheiro para que eles não percebam que foram ao dermatologista.
Carla comenta que as reclamações diferem, de acordo com a faixa etária da paciente. Ela lembra que
muitas são jovens, entre 18 e 25 anos, e, nessa idade, a maior queixa são as estrias e as celulites.
Ela observa que a menina nova vai “muito à praia” e não quer ter um “furinho no bumbum e nem
estria”, seu rosto ainda está “lisinho”. Já, as mulheres na “faixa de 40, 50 anos” reclamam do rosto,
por causa das rugas e das manchas. Ela percebe que as primeiras críticas são em relação ao canto
dos olhos, depois, em volta da boca, e a flacidez, “despenca tudo”. Ela esclarece que a flacidez está
muito ligada aos fatores genéticos. A médica, ainda, elucida que a mulher mais velha já não vai “tanto
à praia ou não liga para a celulite”, seu problema é no rosto, onde “chama mais a atenção”.
d. A relação entre médico e paciente.
Quando a dermatologista começou a fazer cosmiatria, poucos pacientes souberam. Ela conta que
não é uma médica que costuma oferecer o tratamento, ela prefere esperar que o paciente pergunte
se é possível fazer algo para melhorar sua aparência. Carla afirma que não se preocupa em atender
“milhões de clientes no mesmo dia” e prefere demorar mais tempo em cada consulta, para explicar à
paciente qual a expectativa real que ela deve ter, em relação a um procedimento ou a um creme. Ela
comenta que, algumas vezes, elas chegam ao consultório com expectativas maiores do que o real e
ela conversa que a pele irá melhorar, mas não será a mesma de 20 anos de idade.
Carla acredita que o médico deve explicar, exatamente, como funcionam os tratamentos
dermatológicos e conhecer os hábitos de vida de seus pacientes. Ela percebe que não adianta fazer
o laser em uma mulher que “ama o sol” e é muito queimada de praia, pois ela não vai parar de “pegar
sol”. Ela lembra que, no Rio de Janeiro, as pessoas estão se expondo ao sol todos os dias e, talvez,
se fizer o laser, irá piorar a pele. A genética também influência nas questões da pele. Uma mulher,
cuja mãe e avó tiveram flacidez de pele cedo, provavelmente, também terá.
A entrevistada considera que é importante esclarecer para a pessoa que a pele não ficará melhor “de
uma hora para a outra”. Ela explica para a paciente que as amigas irão começar a elogiar sua
fisionomia, “isso é importante”. A médica conta que insiste com sua equipe que seu objetivo não é
que “as pessoas da rua vejam que seus pacientes se submeteram a um procedimento”, ela quer que
os conhecidos percebam como a mulher está bem, mas não descubram exatamente o que ela fez.
Carla comenta que algumas pacientes querem fazer diversos procedimentos, buscando o
rejuvenescimento. Nesses casos, ela conversa com essas mulheres, argumentando que não pode
152
fazer mais nenhum tratamento, porque sua face “não suporta mais nada”. A dermatologista relata
que, às vezes, elas procuram outros médicos e retornam com complicações, como “a paciente que
teve queimaduras por laser e o tratamento durou um ano, até ela ficar com uma face apresentável
para sair à rua”. Ela conta que, em geral, essas pessoas param de buscar tratamentos quando
ocorrem essas complicações.
e. O processo de envelhecimento.
Carla explica que existem dois tipos de envelhecimento na pele: o envelhecimento cronológico e o
envelhecimento por exposição ao sol (fotoenvelhecimento). Ela esclarece que o envelhecimento
cronológico acontece na pele toda e o fotoenvelhecimento nas áreas mais expostas ao sol. A médica
avalia que não tem solução para o envelhecimento. Ela cita Irene Ravache, “só não envelhece quem
morre cedo”; e Mário Quintana, “envelhecer é ótimo, porque a outra opção é horrível”. A
dermatologista acredita que o mais importante é envelhecer bem, tanto em relação à pele, quanto em
relação aos outros órgãos.
A médica relata uma aula que deu em Manaus sobre fotoproteção, falando da “questão do sol”. Ela
explica que posiciona duas pacientes, lado a lado, uma com 64 anos e a outra com 74 anos. Carla
conta que a mais nova “pegou sol a vida inteira” e a de 74 anos sempre se protegeu e, apesar de
terem cores semelhantes, tipo de pele semelhante, a qualidade do cabelo e da pele são
completamente diferentes. Logo, ela declara que não adianta, apenas, fazer procedimentos, é
necessário cuidar da exposição solar, usar hidratante, “são várias coisas”.
f. Mulher de 30, mulher de 50: como são suas pacientes em cada estágio da vida.
Mulher de 30 anos: A dermatologista conta que, nessa faixa etária, o tratamento é preventivo, pois
“não se está precisando de nada para a face”. Ela orienta em como adiar o envelhecimento, como
fazer com que a pessoa chegue com uma pele boa aos 40, 50 e 60 anos de idade. Ela refere que há
pacientes que, antes dessa idade, chegam ao consultório tendo feito botox, preenchimento labial,
mas Carla não acredita que seja indicado. Ela afirma que, se a mulher começar a fazer esse
procedimento muito cedo, “mais para frente, será complicado continuar fazendo”.
Mulher de 50 anos: A entrevistada percebe que a indicação do tratamento para essa mulher depende
de sua situação: pode ser que ela tenha rugas na testa, sulcos próximos ao nariz ou a pele alterada
pelo sol. Para melhorar essa situação, a dermatologista pode fazer um peeling com ácido ou com
cristal, que é mais suave, por exemplo.
g. Os cremes anti-idade: o que pensa sobre sua funcionalidade.
Carla considera que há produtos “bastante bons” no mercado, mas ela afirma que a maior parte “não
serve para nada”. Ela explica que o médico deve saber a diferença entre as substâncias usadas nos
cremes e qual a concentração necessária para melhorar cada pele. A dermatologista acredita que os
153
cremes servem para tirar manchas, melhorar rugas finas, melhorar a textura da pele e as asperezas
da pele e, às vezes, até a elasticidade.
A dermatologista afirma que, para começar a utilizar um produto, o laboratório precisa provar que é
bom, precisa publicar trabalhos sobre esse produto e utilizar bons ingredientes na fórmula. A médica
avalia que é importante ter acesso às amostras para testá-las em alguém da família ou nela mesma.
Ela gosta de perceber a textura dos cremes, pois ela precisa saber se é adequado para uma pele
seca ou oleosa. A entrevistada está usando um creme anti-idade da Avène que está tirando todas as
suas “manchinhas”. Ela considera essa marca muito boa.
h. Industrializado x Manipulado
Carla, normalmente, prefere os cremes prontos aos manipulados, pois ela acredita que o controle de
qualidade da indústria é melhor. Ela conta que gosta bastante de alguns laboratórios e afirma que
existe “uma gama” enorme de produtos no mercado. A médica comenta que há poucas farmácias
dermatológicas confiáveis e que precisa indicar a farmácia, para garantir que o produto será bem
feito. Ela avalia que já teve graves problemas com produtos de farmácias de manipulação. A
dermatologista conta o caso de uma paciente que pediu um remédio a uma farmácia de manipulação
que, provavelmente, incluiu um perfume na fórmula, sem avisá-la. Como a paciente era
“extremamente” alérgica, esse produto estragou o tratamento.
i. As Marcas: o que pensa das marcas apresentadas – Avon (Renew), Vichy, La Roche-Posay,
Natura (Chronos), Lancôme e Innèov
Lancôme: A dermatologista não prescreve essa marca, pois ela afirma que eles não apresentam as
fórmulas dos cosméticos e ela gosta de saber, ao menos, os ingredientes utilizados. Ela conta que,
quando lançam um produto, “vem um ou dois doentes que usaram, dizendo que funciona” e ela não
pode acreditar nisso. A entrevistada não acredita no que diz a embalagem do produto “reconstituinte
profundo”. No entanto, considera as consistências maravilhosas.
Dermage: Carla comenta que os produtos da Dermage são muito bons e as substâncias de cada item
estão descritas na embalagem.
La Roche Posay: A médica “gosta muito” da marca, ela a considera “número um em termos de
hidratante”.
Natura (Chronos): Ela não prescreve Natura, mas percebe que o Chronos tem uma substância
chamada elastinol 4, que é muito boa.
Avon (Renew): Assim como a Natura, ela não prescreve a Avon. No entanto, a médica gosta do
ingrediente ácido retinóico, um dos primeiros do mercado contra o envelhecimento, porém não
conhece as concentrações.
154
Innéov: Carla afirma que esse produto é uma pílula que surgiu como se fosse algo inovador. A
médica chegou a testar em si mesma, por seis meses, e não percebeu nenhuma diferença. Como é
muito caro e teria que comprar o produto, ela achou que “não valeria a pena continuar usando”.
Contudo, ela afirma que, se houver trabalhos com um numero grande de pacientes, comprovando a
eficácia do produto, ela pode passar a prescrevê-lo.
Vichy: A entrevistada considera a Vichy uma excelente marca e faz parte de uma banca de
pesquisadores do laboratório. Contudo, ela comenta que há “algumas coisas que eles não liberam”. A
entrevistada analisa que a marca é “fantástica” e gosto muito dos produtos, mas, produtos como o
anticelulite, não adiantam muito.
j. O não consumo de produtos anti-idade.
Carla considera que são mulheres que estão ótimas, se sentindo bem e não querem usar nenhum
produto. Ela pensa que são pessoas que trabalharam a vida inteira, sempre se ocuparam e têm
outras preocupações. A médica comenta que sempre orienta a usar, ao menos, alguma coisa: “se
está com a pele seca, um hidratante; se tem a pele oleosa ,alguma coisa para retirar o excesso de
óleo”. No entanto, ela relata que algumas mulheres não têm paciência e pedem para prescrever
apenas um sabonete, o que é mais prático.
Joana
Joana tem 28 anos, graduou-se em medicina em 2006 pela Universidade Federal Fluminense e
especializou-se em dermatologia na Santa Casa da Misericórdia, no Rio de Janeiro. Seu consultório
fica na zona oeste do Rio de Janeiro, na Barra da Tijuca.
a. A decisão de trabalhar com dermatologia (cosmiatria) e o público com quem trabalha.
Joana conta que trabalhou no consultório de sua tia, dermatologista, digitando as prescrições
médicas, durante sua adolescência. Ela também lembra que “sofreu” bastante com acne na
puberdade, fatos que fizeram com que se aproximasse da dermatologia. A médica afirma que é
“muito difícil” não trabalhar com estética. Nessa especialidade, a demanda é muito grande. Ela
considera “uma delícia” discutir os casos de clínica, mas também é “muito gostoso trabalhar com
estética”.
A dermatologista relata que, no segundo ano da residência, passou a atender pacientes de
cosmiatria, por um “preço mais acessível” na Santa Casa, tratando acne, fazendo laser e outros
procedimentos. No seu consultório, ela comenta que “apenas não faz o laser”. Ela faz procedimentos
como botox e preenchedores. A entrevistada observa que, de cada 10 consultas que atende, por dia,
na Barra da Tijuca, cerca seis a sete são direcionadas para estética.
b. Conceito de beleza: como define a beleza e descreve uma mulher bonita.
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A dermatologista avalia que beleza é harmonia, equilíbrio e “estar feliz”. Ela acredita que a beleza
está em manter os traços e o conjunto de suas pacientes e não desfigurá-las. Para a médica, cada
paciente tem o seu estilo, mas, uma mulher que ela considera bonita, é a modelo Gisele Bündchen,
que tem um cabelo “maravilhoso” e uma pele “maravilhosa”. Ela conta que os dermatologistas
buscam o “perfeito e maravilhoso para o paciente”, de acordo com sua realidade.
c. Como percebe o comportamento, em relação à beleza, na sociedade carioca.
Joana assume que a rotina de passar creme e filtro solar diariamente é cansativa, por isso a mulher
precisa estar disposta a se cuidar. A médica comenta que a paciente se cuida mais quando está feliz
e “de bem com a vida”, dedicando mais tempo a ela mesma, assim como quando recebe elogios do
marido e das amigas. A entrevistada também comenta que as revistas e o rádio influenciam a decisão
de iniciar um tratamento cosmético.
A médica afirma que, no corpo, as mulheres reclamam da gordura localizada, estrias e hidratação da
pele, e sempre pedem depilação com laser. Na face, ela conta que suas pacientes se queixam das
rugas de expressão, manchas provocadas pela exposição solar, cicatrizes pós-inflamatórias ou após
uma acne, e sulcos. A entrevistada refere que essas reclamações variam de acordo com idade da
paciente e o quanto se expôs ao sol durante sua vida.
d. A relação entre médico e paciente.
Joana relata que procura adequar os tratamentos estéticos ao estilo de vida de suas pacientes,
mesmo sendo difícil. Ela conta que pode fazer uma “receita linda e maravilhosa”, mas a pessoa só irá
segui-la se for ajustada à sua rotina e se estiver “sentindo-se segura”. Por exemplo, se a mulher está
acostumada com alguma marca e em sua linha há um creme que atinge as expectativas da
dermatologista, ela irá sugerir esse produto para o tratamento. A entrevistada também procura
verificar o quanto a paciente se dispõe a gastar, ao indicar um produto, porém, ela comenta que essa
é uma questão difícil de abordar.
A dermatologista refere que a paciente lhe conta o que a está incomodando naquele momento. Pode
ser que “aquela ruga nem seja tão expressiva” e que ela tenha outras prioridades. Assim, a médica
sugere um tratamento para “melhorar de uma forma geral”, somando o que ela considera importante
e o que a paciente deseja. Ela afirma que conversa com a pessoa sobre suas possibilidades de
melhora a cada consulta. A entrevistada relata que, em alguns procedimentos, é possível perceber o
resultado, instantaneamente. Em outros, é preciso aguardar alguns dias para observar o efeito, como
o botox, que “leva mais ou menos 15 dias para agir”.
Joana costuma utilizar máquinas fotográficas para comparar como a mulher estava antes de iniciar os
procedimentos, durante e após sua conclusão. Ela mostra os limites do tratamento e suas
expectativas, pois há “coisas que não irão melhorar”. A entrevistada comenta que, muitas vezes, a
pessoa nota que melhorou e fica satisfeita, mas “não tem noção do quanto melhorou”. Logo, a foto é
156
um registro importante para mostrar essa realidade e motivar essa mulher a continuar se cuidando,
“ela vai se empolgando”.
e. O processo de envelhecimento.
A entrevistada explica que cada indivíduo sofre o envelhecimento intrínseco, que é o envelhecimento
das células - “natural do ser humano” - e o envelhecimento extrínseco, que é causado pelo sol,
poluição e cigarro, entre outros. Ela esclarece que a soma desses dois processos resulta na
aparência de cada pessoa, ao longo dos anos. A médica reflete que o fotoenvelhecimento deixou de
ser apenas um problema estético, pois uma pele “cheia de lesões” causadas por anos de exposição
ao sol é uma questão de saúde. Ela também percebe que está ocorrendo uma mudança de
comportamento, pois as paciente mais antigas reclamam de terem que passar filtro solar,
diariamente. Ela conta que o conhecimento de que o filtro solar é um item importante para a saúde e
que deve ser usado, mesmo em dias nublados, ainda está sendo assimilado pela sociedade.
Joana acredita que o processo de envelhecimento gera muita ansiedade. Ela percebe que algumas
pessoas o aceitam e buscam “envelhecer com dignidade”. Outras não aceitam bem as
conseqüências e não deixam de se cuidar. A dermatologista considera entre 25 e 30 anos uma boa
faixa etária para começar a se cuidar
e conseguir que se torne algo “tão cumulativo”, “porque,
depois, pode ficar difícil de tratar”. Ela afirma que, antes de estudar dermatologia, não se preocupava
muito. Conforme ela foi conhecendo os detalhes desse envelhecimento, passou a pensar: “estou
envelhecendo e não vou deixar isso acelerar, vou me cuidar!”.
f. Mulher de 30, mulher de 50: como são suas pacientes em cada estágio da vida.
Mulher de 30 anos: A entrevistada conta que essa paciente possui algumas rugas de expressão ou
algumas manchas de sol na pele e quer começar a se tratar. Ela refere que é uma mulher que vai à
consulta “direcionada” por alguma matéria que leu em revistas ou por alguma amiga que indicou o
tratamento, pois gostou do resultado. Assim, ela afirma que é uma paciente mais informada e
consciente das novidades do mercado.
Mulher de 50 anos:
A entrevistada relata que essa mulher já tem rugas mais acentuadas e o
tratamento seria o preenchimento. Ela lembra que, nessa idade, ela busca “tentar atenuar aquilo que
está a incomodando”. A dermatologista considera que a paciente brasileira, certamente, tem um “alto
grau de fotoenvelhecimento”, pela incidência solar que há no país. Além disso, ela afirma que essa
mulher sofre com alterações hormonais causadas pela menopausa: manchas, uma pele mais seca e
queda de cabelo. Ela acredita que algumas mulheres têm conhecimento dos danos causados à pele,
pela menopausa, “mas surgem algumas dúvidas” como: “eu passo creme, passo creme e não
hidrata!”. Joana comenta que é importante ela entender que não é tarde para começar a se cuidar,
“vamos correr atrás e vamos buscar, juntas alguma melhora”.
g. Os cremes anti-idade: o que pensa sobre sua funcionalidade.
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A dermatologista afirma que os cremes anti-idade são “fundamentais”, são “ótimos”, mas há um limite
no resultado proporcionado por eles. Assim, dependendo da pele da paciente é necessário associar
outros procedimentos, até chegar a “um ponto ótimo”.
A médica afirma que os melhores ativos antienvelhecimento são os retinóides - ácido retinóico - que
ajudam na renovação celular e na remoção de manchas. Ela utiliza os cremes anti-idade,
principalmente, para melhorar a textura da pele, para atenuar manchas, para suavizar rugas finas e
cicatrizes “bem superficiais” e para ajudar na renovação celular.
Joana refere que os dermatologista recebem informações sobre novos produtos por diversos canais.
Alguns estudos científicos chegam pelos congressos, outros, por encontros internacionais ou por
colegas que já trabalharam com o cosmético. Ela acredita que os grupos de discussões são “super
importantes”, onde um profissional mostra sua experiência com um determinado produto. Os colegas
criticam e decidem se deve ser adotado na prática ou não.
h. Industrializado x Manipulado
A entrevistada conta que, em sua formação como dermatologista, teve bastante experiência com
produtos de manipulação. Ela pode visitar algumas farmácias de manipulação e ver como funciona
sua linha de produção. A dermatologista afirma que pede para a paciente procurar farmácias que
confia e está acostumada, “que saiba, teoricamente, como é seu processo”. Ela comenta que se
sente mais segura quando a farmácia tem uma pessoa disponível para tirar suas dúvidas, pois, às
vezes, os princípios ativos não são compatíveis.
A médica considera que o mais importante para formulação de um produto, é conhecer o princípio
ativo da medicação, sua qualidade e saber o que pretende alcançar com aquele princípio ativo, o que
“quer oferecer a sua paciente”. Ao analisar as marcas industrializadas, ela relata que expor a
formulação na embalagem do creme, ter uma boa cosmética, ter tolerabilidade, penetrar bem na pele
e ter “um tempo de ação legal” são fatores que mostram que o laboratório é confiável. A entrevistada
explica que, quando o creme tem o cheiro ou a coloração ruim, não é agradável para paciente e,
consequentemente, mais difícil de entrar na sua rotina.
i. As Marcas: o que pensa das marcas apresentadas – Avon (Renew), Vichy, La Roche-Posay,
Natura (Chronos), Lancôme e Innèov
Lancôme: Joana considera uma marca “muito boa”, “excelente”, com uma base cosmética que,
geralmente, as pessoas gostam. A médica comenta que procura saber quais os princípios ativos e ela
afirma que seus produtos podem trazer benefícios, mas ela conta que não são milagrosos e é preciso
associá-los a alguns procedimentos, por vezes. A dermatologista observa que existe uma tradição
dos cosméticos da marca, geralmente, “o paciente fantasia e acha chiquérrimo passar creme da
Lancome”. Assim, algumas pacientes utilizam o creme pela marca, sem saber se aquela cosmética e
aquele ativo é indicado para sua pele. Por isso, a entrevistada relata que, em casos em que a
indicação está incorreta, precisa esclarecer para essa mulher que o produto é “ótimo”, mas não deve
158
ser usado naquele momento, e sugere que ela dê o creme para a mãe ou alguém que irá fazer um
melhor uso do cosmético.
Avon (Renew): A dermatologista não tem experiência com o Renew, não sabe qual o princípio ativo e
não é uma marca que esteve presente em sua formação, mas ela afirma muitas pacientes o usam.
Ela declara que algumas pacientes percebem um benefício inicial, mas, após um determinado tempo
de uso, elas observam que há um limite na melhora e procuraram um médico. Joana comenta que,
“de certa forma”, esse creme é uma “automedicação”.
La Roche-Posay: A entrevistada gosta muito da marca e ela refere que o laboratório está presente no
dia a dia do dermatologista: “nos eventos, eles estão presentes, sempre trazem novidades, temos
uma boa comunicação”.
Vichy: Joana a considera uma boa marca. Ela relata que a comunicação com os dermatologistas é
boa e afirma que eles estão presentes nos eventos. A entrevistada conta que não é um laboratório
tão comentado nas reuniões semanais que participa com seus professores de dermatologia na Santa
Casa da Misericórdia, mas ela observa que eles estão sempre presentes nos congressos. A médica
comenta que costuma indicar a maquiagem corretiva da Vichy, pois é um item muito importante para
pacientes que possuem alguma cicatriz ou doenças como o vitiligo.
Innéov: A entrevistada afirma que não possui experiência com esse produto. Ela explica que é uma
novidade, que está presente em congressos, mas que o laboratório ainda não apresentou
experiências que ela possa julgar ou criticar, para iniciar o uso da Innéov em suas pacientes.
Natura (Chrono): A médica não tem contato com a Natura. No entanto, ela conta que muitas
pacientes de baixa renda e classe média baixa usam seus cremes. Ela analisa que as mulheres que
estão “desesperadas” por beleza “sempre encontram uma amiga que vende os produtos da Natura”,
facilitando o acesso ao cosmético. No entanto, a dermatologista declara que não tem contato
profissional com a marca, para saber que benefícios estão buscando para suas clientes.
Dermage: Joana refere que a farmácia é “super presente”. Ela conta que tem contato semanal com a
fornecedora, por telefone. A dermatologista lembra que, na pós-graduação, foi visitar o laboratório e
achou “super legal” a iniciativa da marca levar “o universo deles” para perto do médico. Ela declara
que gosta muito de seus produtos.
j. O não consumo de produtos anti-idade.
Joana comenta que não é comum pacientes que preferirem não utilizar cosméticos. Ela acredita que
são mulheres que não têm paciência para se cuidar. A dermatologista relata que, às vezes, as
mulheres a procuram por outra causa, uma lesão, uma unha encravada ou uma verruga e a médica
percebe que a pele está fotoenvelhecida e, então, aborda o assunto de modo sutil. Ela conta que
procura colocar essa questão perguntando como está a pele, questionando a oleosidade, se há
159
algum tratamento que pode ser feito, adequado à realidade dela, pela pele que ela tem, a sua
profissão.
A médica observa que, geralmente, quando essa mulher aceita começar a se cuidar e tem alguma
melhora, “alguma amiga elogia”, a paciente “se empolga mais ainda” e acaba retornando ao
consultório para continuar o tratamento. Ela percebe que é muito importante para as mulheres,
quando o outro comenta que elas estão mais bonitas, elas se sentem “seguras”.
Para a
dermatologista, é “gratificante saber que, naquele momento, elas estão conseguindo ficar melhor”.
Paulo
Paulo é médico, graduado pela Universidade Gama Filho há 22 anos e professor de dermatologia.
Ele cursou sua pós-graduação e mestrado na Universidade Federal do Rio de Janeiro e trabalha com
consultório particular há 16 anos.
a. A decisão de trabalhar com dermatologia (cosmiatria) e o público com quem trabalha.
Ao final da faculdade de medicina, o entrevistado pensou em seguir a especialidade de cirurgia geral.
Contudo, ele foi convocado para servir o Exército onde trabalhou por 2 anos. Durante esse período, o
dermatologista presenciou a vida de seu irmão como cirurgião, o que o fez repensar sua decisão
inicial. Logo, Paulo conta que procurou um professor, que o convidou para conhecer o serviço de
dermatologia. Assim, ele decidiu seguir essa especialidade e teve a oportunidade de trabalhar no
consultório desse professor por alguns anos, “que era radicalmente contra a estética”. Ele comenta
que, talvez por isso, teve dificuldade em começar a trabalhar com a estética. Todavia, o médico
afirma que o mercado demanda que os dermatologistas trabalhem com tratamentos cosméticos,
diferentemente de quando era estudante. Desse modo, ele relata que tem investindo em cosmiatria
nos últimos oito anos. Em seu consultório, ele acredita que 90% de seus pacientes o procuram por
consulta clínica e 10% por estética.
Paulo observa que os alunos com interesse em dermatologia, na universidade onde leciona,
acreditam que estética é uma área da especialidade muito bem paga. Ele considera que houve uma
invasão na atividade estética por outras especialidades, logo a alta remuneração desses profissionais
está cada vez mais difícil. Ele, ainda, critica a entrada de médicos de outras especialidades em
cursos de pós-graduação em medicina estética. Ele comenta que, quando o médico tem uma
formação cirúrgica, é mais fácil fazer um procedimento estético. Porém algumas especialidades
clínicas não englobam experiência cirúrgica e os profissionais dessas áreas cometem erros graves,
ao realizar os procedimento estéticos. Quando as “aberrações chegam a seu consultório” ele procura
corrigi-las, mas ele conta que são incorrigíveis, na maioria das vezes. Ele também refere que alguns
médicos ganham bem. Contudo o risco de trabalhar com tratamento estético é grande.
b. Conceito de beleza: como define a beleza e descreve uma mulher bonita.
160
Para Paulo, beleza significa, primeiramente, a saúde mental do indivíduo, que compreende o bemestar físico, social e mental. Segundo o dermatologista, uma pessoa que está bem socialmente, com
seu marido e com seus amigos reflete esse estado em sua aparência. Portanto, ele acredita que a
mulher deve cuidar da saúde mental e, posteriormente, buscar beleza física, como um complemento.
O entrevistado considera que uma bela mulher “madura” é aquela que soube se preservar e
conseguiu prevenir o envelhecimento, evitando a exposição ao sol e mantendo a pele hidratada, por
exemplo. Contudo, ele afirma que a beleza não é manter o corpo e o rosto bonitos, apenas. O
dermatologista reforça seu pensamento de que se deve estar bem socialmente e afetivamente para
atingir a beleza: “uma mulher pode ser bonita, independente de ela ter olhos azuis e um rosto
perfeito”.
c. Como percebe o comportamento em relação à beleza, na sociedade carioca.
O entrevistado considera que a mídia é “absurdamente forte” no conteúdo e no volume de matérias
sobre estética voltadas para os públicos feminino e masculino, principalmente, para o feminino. Ele
afirma que algumas dessas matérias “beiram” a irresponsabilidade, pois, na maioria das vezes,
apresentam tratamentos sem comprovação científica e relatam resultados “milagrosos”. Desse modo,
o médico acredita que algumas reportagens são pagas para exibir uma imagem positiva do produto, o
que ele chama de imprensa direcionada. Por exemplo, ele comenta que os aparelhos importados,
que são novidades no mercado, têm um custo altíssimo e por isso não podem ficar parados. Logo,
ele observa notícias em que uma repórter faz o tratamento e emite um bom comentário sobre o
aparelho. Para o entrevistado, essa conduta teria um valor positivo se a repórter escrevesse sobre
sua verdadeira opinião.
O dermatologista afirma que a indústria da beleza cresceu muito e, às vezes, as pessoas deixam de
comprar um remédio para consumir um cosmético, o que é preocupante. Em outras situações, os
tratamentos de beleza e rejuvenescimento são oferecidos sem que haja indicação. Ele conta a
história de uma paciente que foi a uma clínica de estética para fazer um tratamento na barriga, que
havia lido em uma revista. A clínica de estética se propôs a fazer esse tratamento e ainda ofereceu
outro tratamento, para o rosto, sem que fosse feita uma avaliação da necessidade de se realizar
esses procedimentos. Nesse caso, a paciente tinha quase 70 anos de idade e o tratamento era um
laser para reduzir gordura na barriga, o que Paulo classificou como uma “piada de mau gosto”.
O entrevistado relata que possui pouca experiência em tratamentos corporais, mas ele analisa que o
rosto incomoda mais as mulheres que seus corpos, apesar de estar situado em uma cidade onde “o
corpo tem um grande peso”. O dermatologista conta que as manchas que aparecem no rosto
incomodam muito suas pacientes, seguido das reclamações da flacidez da pele. Ele relata que essas
são as duas principais queixas, sendo que, na queixa de flacidez, entra também a questão das rugas.
d. A relação entre médico e paciente.
161
Na sala de espera do consultório do dermatologista há uma placa com uma relação de tratamentos
estéticos, fixada à parede. O entrevistado, após refletir por um momento, explica que a ideia de
colocá-la naquele local foi de um colega mais jovem, que ele convidou para trabalhar em seu
consultório e que possui uma visão diferente da sua, em relação à estética. O médico conta que o
outro dermatologista realiza a maioria dos procedimentos estéticos, assim como as consultas clínicas
dos pacientes com convênio. Ele ainda refere que prefere despertar o interesse do público que
atende, com consulta clínica, pela placa na sala de espera, pois tem dificuldade em “vender o
tratamento estético”. Ele se sente mais confortável quando os pacientes o questionam sobre esse
assunto.
O entrevistado acredita que sua clientela foi construída pelo “boca-a-boca” e avalia que os pacientes
procuram os médicos de sua especialidade pela confiança, quando a questão é estética. Paulo
considera que ser honesto sobre as reais possibilidades de melhora de cada tratamento de estética é
a maneira correta de se trabalhar com cosmiatria. Além disso, ele comenta que é complicado para um
médico prometer o quanto a paciente irá responder ao tratamento. Assim, ele pondera que a margem
entre o ético e o antiético na estética é muito estreita. O dermatologista conta que explica às
pacientes quais os tratamentos ele acredita que são eficazes e as avisa quais são os procedimentos
possíveis de serem realizados em seu consultório, já que existem máquinas de laser com “custos
elevadíssimos” que ele não possui em sua clínica. Para as pacientes que não aceitam seu
envelhecimento e as que resistem a mudar os hábitos diários, o entrevistado relata que procura criar
inconvenientes que as façam desistir do tratamento. Ele observa que algumas mulheres desejam
uma “pílula do milagre” e comenta que essas pacientes esperam que o resultado seja muito superior
ao que é realmente possível. Outras pessoas apresentam resistência em mudar seus hábitos,
principalmente, em uma cidade de sol como o Rio de Janeiro. Ele afirma que é inútil fazer um
tratamento com o laser para manchas, queixa recorrente, durante meses e “torrar no sol no verão
seguinte, isso seria rasgar dinheiro”.
Desse modo, o médico reforça a importância da prevenção no processo de envelhecimento,
especialmente em um cidade onde o sol é forte durante todo o ano. Assim, ele afirma que insiste com
sua família e com seus pacientes a utilizar o protetor solar corretamente e não se expor ao sol entre
os horários de 10 horas e 16 horas. O dermatologista afirma que o benefício dessas pequenas ações
é “incalculável” e melhor do que o uso dos cremes anti-idade, do laser, do preenchimento e do botox.
Ele acredita que a prevenção deveria ser divulgada como benefício para o câncer de pele e como
cuidado para o envelhecimento cutâneo, que é percebido, primeiramente, pela quantidade de
manchas e, posteriormente, pela diminuição da elasticidade da pele.
O dermatologista analisa que a cosmiatria é, muitas vezes, tratada como um comércio: “a pessoa
chega ao consultório ou clínica e o profissional vai vender um pacote de sessões de laser para
celulite, independentemente de ser indicado para aquela paciente”. Para ele, as pessoas que
trabalham muito com estética perdem o pudor de “vender” os procedimentos, distanciando-se da
relação médico-paciente ensinada nas universidades. Além disso, algumas pacientes chegam ao
162
consultório com a intenção que o dermatologista ofereça o produto que está na moda. Ele conta que
elas já conhecem os métodos existentes e os respectivos preços, por reportagens sobre estética.
e. O processo de envelhecimento.
O dermatologista afirma que, aproximadamente, em 2030, o país terá uma população envelhecida.
Portanto, ele acredita que as pessoas devam pensar, investir e trabalhar na prevenção do processo
de envelhecimento que ocorre em todas as partes do corpo. Segundo o médico, as pessoas
envelhecem por inteiro: tonos muscular, articulações etc.
Paulo percebe que a questão da prevenção do envelhecimento está sendo trabalhada em relação ao
câncer. Ademais, ele conta que foi, recentemente, a um congresso onde havia uma forte campanha
de prevenção de envelhecimento cutâneo. Ele comenta que os encontros são boas oportunidade
para se conversar sobre o assunto. Ele afirma que há avanços nos métodos que buscam reverter o
envelhecimento. Porém, o melhor é prevenir, em qualquer área da medicina.
O dermatologista refere que as mulheres percebem o envelhecimento pelas diferenças em seus
corpos, dos 30 anos para os 40 anos, para os 50 anos etc. Ele relata que existem as alterações
hormonais que auxiliam esse processo, mudando seu humor e suas características, por exemplo.
Desse modo, a mulher necessita cuidar de sua saúde, globalmente, sendo a beleza da pele apenas
uma pequena parte. Ele explica que a abordagem deve ser “multifatorial”.
f. Mulher de 30, mulher de 50: como são suas pacientes em cada estágio da vida.
Mulher de 30 anos: O dermatologista relata que as maiores reclamações dessas mulheres são as
manchas, “porque, se uma mulher pega sol desde menina, com trinta anos, ela já está com
manchas”. Contudo, ele conta que as pacientes desejam continuar praticando esses mesmos hábitos,
resolvendo suas questões com um creme “milagroso”.
Paulo conta que, muitas vezes, desestimula a paciente de 30 anos a se submeter a procedimentos
estéticos. Ele considera que a prevenção e a mudança de hábito em relação ao lazer de exposição
ao sol, são mais benéficos. O entrevistado também indica o uso de cremes com princípios ativos que
possuam comprovação científica.
Mulher de 50 anos: O médico refere que existe um grupo de mulheres dessa idade que estão bem
resolvidas, profissionalmente, e em sua vida afetiva familiar. Ele relata que essas pacientes têm uma
aceitação muito melhor do envelhecimento. Por isso, o médico comenta que elas possuem uma
expectativa adequada dos resultados dos tratamentos e seu desejo é apenas de melhorar a pele, o
que afeta positivamente o tratamento. Ao contrário, a pessoa que está mal resolvida
profissionalmente e emocionalmente espera que os problemas de sua vida sejam resolvidos pelo
tratamento, o que é inviável.
163
O entrevistado comenta que as expectativas exageradas acontecem em qualquer idade, porém, são
mais evidente na mulher madura, pois nessa faixa etária o dano solar já é muito grande e aparente,
logo, mais difícil de tratar. Ele afirma que as tecnologias auxiliam muito nos resultados. Assim, é
possível tentar reverter as manchas utilizando métodos como ácido retinóico, ácido glicólico e,
principalmente, laser.
g. Os cremes anti-idade: o que pensa sobre sua funcionalidade.
O dermatologista considera que é possível resolver algumas questões de estética, como manchas e
rugas menores, com o uso do creme anti-idade e do peeling químico, a um custo “baixíssimo”. Já
para ter um bom resultado contra a flacidez, ele avalia que é necessário utilizar o laser,
especialmente os lasers fracionados. O médico também comenta que alguns cremes antiflacidez têm
um efeito chamado de “efeito cinderela”. Ele explica que o cosmético cria uma película que segura a
pele, porém ao tomar banho, essa película acaba.
Paulo relata que o mercado apresenta, constantemente, diversos cremes anti-idade com valores
econômicos altíssimos e sem comprovação científica. Ele considera que o preço do creme é uma
estratégia de marketing das empresas, pois, há uma crença coletiva de que o valor alto qualifica o
produto no mercado de beleza. O entrevistado também relata que algumas mulheres sempre buscam
essas novidades, os “modismos”, que aparecem a cada verão. Ele, ainda, refere que há influencia de
terceiros, ao escolher que produto consumir, como “o último creme da Lancôme que a amiga
comprou em Paris”. O médico concorda que é importante ter inovação dos cremes de
rejuvenescimento, contudo, deve haver comprovação científica.
O dermatologista afirma que prescreve apenas as substâncias que estão consagradas na literatura.
Ele relata que essas substâncias, que possuem comprovação científica, restringem-se ao ácido
retinol e ao ácido glicólico, praticamente. O médico alerta que existem muitos trabalhos sem controle,
em estética. Por exemplo, 1.000 mulheres com características de pele semelhantes são divididas em
dois grupos iguais, a primeira metade usa o creme pesquisado e a outra metade, o placebo. Após um
determinado período, o resultado é aferido segundo a percepção de melhora dessas mulheres, não
há um exame histológico mostrando se houve regeneração da pele. Portanto, ele considera que os
estudos são “totalmente subjetivos” e acredita que as resposta podem ser enviesadas por causa do
custo financeiro que as mulheres despenderam.
O entrevistado refere que, para confiar em um creme anti-idade e passar a prescrevê-lo, esse produto
tem que ser cientificamente eficaz. Além disso, ele comenta que gostaria de conhecer um cosmético
que não irritasse a pele dos pacientes, pois, a maioria dos produtos confiáveis são fortes
sensibilizantes e deixam a pele sensível ao sol. O médico também explica que não prescreveria um
produto anunciado em revistas e com vendas de porta em porta. Ele acredita que seria uma “burrice
enorme” prescrever um remédio com propaganda, pois ele considera que estaria “desqualificando”
seu trabalho. No entanto, o dermatologista percebe que prescreve mais cremes de algumas marcas
164
especificas, que têm, tradicionalmente, estudos científicos, por causa do trabalho de marketing dos
laboratórios.
h. Industrializado x Manipulado
Paulo afirma que prefere a indústria farmacêutica às farmácias de manipulação, pois ele não acredita
no controle de qualidade de um pequeno laboratório de manipulação. Ele afirma que é importante
saber como o produto foi estocado e como foi preparado. Ele avalia que o controle de todo o
processo é importante. Além disso, o médico considera complicado confiar na fiscalização brasileira a
qual essas farmácias são obrigadas a se submeter. Desse modo, o entrevistado relata que utiliza a
farmácia de manipulação apenas quando necessita de drogas que não consegue na indústria
comum.
O dermatologista ainda relata que existe uma relação “promíscua” entre alguns médicos e alguns
laboratórios de manipulação. Ele explica que as farmácias costumam oferecem dinheiro ou
vantagens, como a locação de uma diária de um aparelho de laser, aos médicos, proporcionalmente,
à quantidade de receitas de seus produtos que são prescritas. Ele conta que já recebeu diversas
propostas, mas nunca aceitou, por considerar antiético. Segundo o entrevistado, os dois laboratórios
que ele confia e que ele considera que são éticos são Dermage e Dermatos.
i. As Marcas: o que pensa das marcas apresentadas – Avon (Renew), Vichy, La Roche-Posay,
Natura (Chronos), Lancôme e Innèov
Vichy: O dermatologista considera uma ótima marca. Ele relata que é um laboratório multinacional
com departamento de pesquisa e com uma estrutura industrial enorme, o que considera importante.
O entrevistado analisa que o laboratório faz muitas pesquisas que não se enquadram no perfil ideal,
porém, eles se preocupam em apresentar resultados. Ele, ainda, comenta que é a única marca que
apresenta tendências.
Natura (Chronos): O médico refere que a Natura sempre têm novidades. Contudo, ele nunca leu um
trabalho científico da marca. Ele considera que os produtos das marcas que popularizam seus
produtos possuem algumas substancias que têm efeito comprovado. No entanto, são vendidos em
uma concentração muito baixa, pois, na concentração maior, correm o risco de irritação da pele e
seria necessário um acompanhamento médico.
Lancôme: Paulo não prescreve os cremes dessa marca. Ele observa que é um laboratório que
sempre lança produtos de última geração, prometendo um milagre, sem comprovação científica. Ele
afirma que a marca não apresenta estudos.
La Roche Posay: O entrevistado refere que é um laboratório sério e bem avaliado no mercado. Ele
afirma que a marca busca um contato muito forte com os dermatologistas, sempre mostrando seus
estudos científicos. Ele considera essa estratégia importantíssima, pois o médico se lembra da
marca, sem o perceber.
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Innéov: O entrevistado lembra que o produto é uma pílula e afirma que não há “a menor possibilidade
de ele acreditar nisso”. Ele reflete que a marca promete uma juventude eterna, de forma milagrosa,
com esse produto. O dermatologista afirma que nunca lhe mostraram qualquer trabalho científico, o
que ele considera praticamente impossível de ser feito. Ele comenta que a carga genética de cada
um é que é diferente e seria preciso um grupo homogêneo para realizar um trabalho científico.
Dermage: O dermatologista conta que não indica farmácias de manipulação, mas quando o paciente
insiste muito ele cita a Dermage e a Dermatos. Ele relata que essa farmácia (Dermage) faz um bom
trabalho e tem bastante contato com os médicos.
Avon (Renew): Ele assume que tem preconceito com a marca por causa dos anúncios que veiculam
na televisão e em revistas, e pelo seu modo de venda “porta-a-porta”. Logo, ele não prescreveria
esse produto, mesmo se acreditasse em seus resultados. Ele afirma que esse produto não é eficaz,
apesar de ter em sua fórmula substâncias como o ácido glicólico, pois a concentração é muito baixa.
j. O não consumo de produtos anti-idade.
Paulo afirma que existem pacientes que preferem não consumir tratamentos cosméticos. Ele
considera que são mulheres “totalmente” bem resolvidas, que irradiam felicidade, na maioria das
vezes, e não estão preocupadas com a estética. Porém, o dermatologista reflete que é positivo para a
mulher se cuidar, estar apresentável. Ele analisa que o equilíbrio é saudável.
Isis
Isis é uma profissional de 26 anos, que se graduou há três anos em medicina. Ela está se
especializando em dermatologia pela residência do hospital Universitário Antônio Pedro, em Niterói.
a. A decisão de trabalhar com dermatologia (cosmiatria) e o público com quem trabalha.
A entrevistada trabalha com dermatologia apenas no ambiente do hospital, onde a maior parte dos
pacientes apresenta problemas clínicos. Isis relata que há dois grupos de pacientes, os próprios
servidores e aqueles que chegam encaminhados. Ela conta que o primeiro grupo não necessita de
uma avaliação prévia para marcar a consulta. Já o segundo grupo, para ser atendido na
dermatologia, deve ser encaminhado por um medico do posto de saúde ou por outro médico do
hospital. A dermatologista faz uma breve reflexão sobre as classes sociais que atende no hospital.
Ela conta que a maioria das pessoas é de “classe mais baixa”, porém, dentre o grupo dos servidores,
alguns pertencem à classe média. Além desses, há alguns poucos pacientes que pertencem à classe
média alta e chegam ao hospital universitário, pois é um lugar capaz de tratar de doenças graves. Isis
pondera que, para a formação de um dermatologista, não seria positivo ter um contato mais estreito
com cosmiatria durante a residência, pois, quando estiver atuando no mercado, a demanda principal
é pela estética.
166
A dermatologista percebe que muitas pacientes têm interesse em tratamento estético, pois, após a
fase aguda da doença algumas pacientes solicitam algo para suavizar as marcas causadas pela
doença: “fiquei com esta marquinha (...) eu não gosto, como é que eu faço para corrigir esta
mancha?”. Contudo, ela afirma que a maioria das mulheres sabe que, no hospital público, os
tratamentos são limitados e esclarece que a prioridade em um hospital universitário são as doenças
de maior gravidade. Porém, a entrevistada observa que muitas mulheres do grupo dos servidores
“chegam queixando-se somente de estética”, ela acredita que isso aconteça, pois essas pacientes
podem marcar uma consulta com os dermatologistas sem encaminhamento.
b. Conceito de beleza: como define a beleza e descreve uma mulher bonita.
Para Isis, beleza não é um padrão, mas uma sensação de bem-estar consigo que “ajuda em todos os
aspectos da vida”: na saúde, na prática de exercício físico, ao olhar-se ao espelho e sentir-se bem.
Ela também ressalta a importância da mulher saber lidar com o que ela não tem, já que “ninguém vai
atingir a perfeição”.
A dermatologista reflete que a beleza ocorre quando o lado “interno” (emocional) e externo
(aparência) andam em harmonia. Ela explica que, se a mulher não se sente bem externamente,
emocionalmente ficará abalada. Logo, a médica se lembra de uma prima que é “super gordinha” e os
familiares a criticam pelo excesso de peso. No entanto, essa prima fala abertamente que se olha no
espelho e se percebe linda. A entrevistada esclarece que esse exemplo reflete o que é a beleza,
independentemente se ela, Isis, considera essa mulher bela, fisicamente.
c. Como percebe o comportamento em relação à beleza, na sociedade carioca.
Isis é crítica quanto à valorização excessiva da sociedade, em relação à beleza. Ela comenta que
muitos empregadores contratam apenas pessoas “mais bonitas”, o que afeta “o emocional”. Assim,
ela afirma que há mulheres deprimidas e que não aceitam a própria beleza porque não se enquadram
no padrão que a sociedade impôs. Ela afirma que essa supervalorização também influencia na vida
pessoal. Por exemplo, quando há uma competição entre as mulheres, mesmo entre amigas, a pessoa
que é menos bonita se sente inferiorizada e isso atrapalha diversos aspectos da convivência.
A dermatologista acredita que há uma diferença entre o padrão de beleza brasileiro e o internacional.
Ela enfatiza que, no Brasil, há preferência por mulheres com “corpão”, “coxa grossa”, “quadril largo”,
“bunda grande” e “peitão”. Além disso, a pele deve ser bronzeada e os cabelos loiros são mais
valorizados. Ao contrário, o padrão de beleza internacional considerada bela a mulher que é “mais
esguia”, “mais clara” e “mais alta”, segundo a entrevistada. Porém, ela acredita que as mulheres “bem
peitudas” e loiras são as favoritas, como no Brasil. A entrevistada considera que existe uma cultura
nacional que privilegia o corpo esculpido. Ela argumenta que o Brasil é um país tropical, o que remete
à praia, sol e carnaval. A entrevistada observa que, nesse contexto, a “marquinha de biquíni” vira um
fetiche, “uma mulher que posa numa revista sempre tem uma marquinha de biquíni”.
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Dentre os atributos mais valorizados pelas mulheres, Isis percebe que há uma preocupação com os
cabelos e, principalmente, com o rosto. Ela considera que o rosto é importante para suas pacientes,
pois é sua apresentação. A entrevistada afirma que as manchas no rosto representam as maiores
queixas. Contudo, suas causas são diversas: há uma forte relação com a acne, com o período da
gravidez e com a exposição ao sol. Ela pondera que pode haver um viés nessas reclamações, já que
os dermatologistas não podem auxiliar em outras patologias e no hospital em que trabalha, as
pacientes têm consciência desse fato. A médica alerta que para o tratamento contra manchas
(melasma) ser eficaz é preciso que seja contínuo e o uso do filtro solar é essencial, contudo, não há
uma cura. Além dessas questões, a dermatologista escuta as pacientes reclamarem das estrias nas
mamas, nos glúteos e no abdômen. Muitas mulheres passam a ter estrias pela gravidez ou pelo uso
de alguns medicamentos, como o corticóide.
d. A relação entre médico e paciente.
Para Isis, os cuidados com a estética fazem parte da saúde, aumentam a auto estima, por exemplo.
Segundo a dermatologista, não é uma prioridade, mas todos querem ficar mais bonitos. Ela também
acredita que, sentindo-se melhor, a mulher trabalhará mais bem disposta e, ainda, a ajudará a
“arrumar um namoro”. A entrevistada afirma que é essencial manter sua pele “boa”, já que escolheu
trabalhar com dermatologia.
A dermatologista considera que os bons medicamentos usados para fins estéticos são caros e, por
isso, as mulheres das classes mais altas conseguem atingir melhores resultados nos tratamentos.
Ela comenta que não consegue prescrever determinados remédios para as pacientes do Sistema
Único de Saúde (SUS), maioria no hospital, pela condição financeira. Desse modo, a entrevistada
observa que essas mulheres de “classes menos favorecidas” aceitam “um resultado não tão bom
quanto as pacientes que têm um poder aquisitivo melhor”. A médica relata que há uma maior
expectativa pelas mulheres que conseguem comprar produtos mais caros e eficazes, mas considera
que todos esperam “algum grau de melhora”. Ela, ainda, avalia que há uma diferença entre a
persistência no tratamento, e entre os dois grupos de mulheres. Enquanto a paciente do SUS se
acomoda, “ahh...eu tentei e não consegui”, a mulher com uma melhor condição financeira insiste até
chegar a uma melhora.
e. O processo de envelhecimento.
Ao ser questionada sobre o envelhecimento, Isis, primeiro, comenta sobre as conseqüências físicas
e, posteriormente, sobre as questões emocionais envolvidas nesse processo.
Ela relata que as
pacientes leigas têm dificuldade em entender que os sinais do envelhecimento são consequência do
seu modo vida. A dermatologista conta que muitas mulheres não aceitam que as marcas do sol são
resultado da exposição ao longo dos anos ao sol, e não da semana anterior, e que é normal
aparecerem hematomas, freqüentemente. Ela percebe que as pacientes demoram a aceitar lesões da
pele que foram causadas pelo descuido em uma época que não tinham consciência. Ela se lembra de
168
algumas mulheres que deixam de usar blusas de manga curta, por causa das manchas no braço, por
exemplo. A entrevistada acredita que algumas marcas podem gerar complexos: “as pessoas estão
olhando para as minhas manchas, para as minhas unhas...”.
Isis considera fundamental envelhecer bem, mentalmente, pois as transformações no corpo são parte
de um processo natural. Ela conta que algumas limitações são características do organismo e outras
ocorrem por falta de acesso à informação. Para a entrevistada, é importante aceitar as limitações que
chegam com a idade e aprender a conviver com elas: problemas cardíacos e pulmonares, entre
outros. A médica relata a mulher pode “otimizar” o que tem de positivo com algumas “atividades” e
deve compreender que as manchas são sinais daquilo que foi vivido, “aceitando-as como uma
característica”. Ela argumenta que ninguém pode fugir do processo de envelhecimento, não adianta
usar botox, nem fazer cirurgia plástica. Para a médica, quem abusa desses tratamentos estéticos
acaba com uma aparência artificial.
f. Mulher de 30, mulher de 50: como são suas pacientes em cada estágio da vida.
Mulher de 30 anos: Segundo Isis, as mulheres de 30 anos apresentam queixas ligadas à estética,
frequentemente. Ela reflete que o melasma é uma questão recorrente nas reclamações, talvez,
porque com 30 anos, a mulher esteja mais propensa à fertilidade. A dermatologista percebe que os
cabelos e as unhas também são partes do corpo com que as pacientes dessa idade se preocupam.
Mulher de 50 anos: Após pensar um pouco, Isis conclui que o melasma é a principal reclamação em
todas as idades. No entanto, ela relata que a preocupação com a estética é secundária para as
pacientes dessa idade, pois existe o medo que a mancha seja um câncer de pele. A médica acredita
a que grande divulgação dessa doença tenha conscientizado muitas pessoas a procurarem um
dermatologista. Assim, em qualquer classe social, há um sentimento de medo quando aparece uma
nova mancha na pele.
g. Os cremes anti-idade: o que pensa sobre sua funcionalidade.
A entrevistada considera difícil avaliar os cremes anti-idade por ter pouca experiência com eles, já
que iniciou, há apenas seis meses, seu trabalho com cosmética. Ela comenta que, ainda, não
acompanha muitas pacientes na área de cosmiatria e, normalmente, tem a orientação de um
professor ao utilizar esses produtos. Porém, a médica observa os resultados em pessoas que lhe são
próximas ou familiares, comparando-as com mulheres que nunca utilizaram os cremes anti-idade. Ela
observa a redução da flacidez da pele e um aspecto mais jovem, proveniente do uso desses
cosméticos.
A dermatologista acredita na funcionalidade dos cosméticos que possuem uma comprovação
científica, pois apresentam fundamentos estatísticos. Contudo, ela relata que os bons resultados
dependem do uso adequado desses produtos. Ademais, a médica considera dois fatores que também
influenciam na decisão de escolha da prescrição de um produto: o poder aquisitivo da paciente, pois,
169
“não adianta indicar um remédio caro, se a paciente não pode comprar”, e a experiência de um
colega. Isis não confia nas marcas que costumam fazer propagandas, como Avon e Natura, ela
argumenta que faltam trabalhos científicos que comprovem a eficácia desses cosméticos
antienvelhecimento. A entrevistada refere que o respaldo científico é uma segurança para os
dermatologistas, pois há muitos processos contra as pessoas que trabalham com estética. Além
disso, a entrevistada conta que os cremes não devem ser utilizados sem indicação médica, pois
existem especificidades para cada tipo de pele e de idade. Ela afirma que o resultado do uso dos
cosméticos é melhor nas mulheres que os usam desde jovens, acompanhando o processo de
envelhecimento.
Para Isis, o uso diário de o filtro solar, que não é propriamente um cosmético, é mais importante que
o uso dos cremes anti-idade. Ela afirma que o protetor solar previne melhor o envelhecimento do que
qualquer cosmético anti-idade. Porém, a médica conta que são poucas as pacientes que chegam ao
hospital com o hábito de usá-lo todos os dias. Ela analisa que as pacientes com 40, 50 anos de
idade, que sempre usaram protetor ou que não tomaram muito sol quando jovens têm a pele melhor
que algumas mulheres mais novas. A entrevistada relata que o acesso à informação relativa ao uso
apropriado do protetor solar é recente: “usar protetor para todas as finalidades, como ir à padaria, ir à
farmácia, caminhar e ir à praia”.
h. Industrializado x Manipulado
A entrevistada afirma que prescreve muitas fórmulas manipuladas, no hospital, pois são mais baratas
do que os cosméticos industrializados. Isis refere que prefere o resultado do creme “pronto”, mas não
tem opção ao prescrever um produto, pois os pacientes do SUS não possuem uma boa condição
financeira. Ela se lembra de uma paciente que utilizava o remédio manipulado, para melasma, e ao
alterar por um produto industrializado, a resposta foi melhor. A dermatologista considera que existem
remédios que, por orientação de professores, não oferecem problemas em serem manipulados.
Outros, há uma indicação de prescrever o creme industrializado.
i. As Marcas: o que pensa das marcas apresentadas – Avon (Renew), Vichy, La Roche-Posay ,
Natura (Chronos), Lancôme e Innèov.
Avon (Renew): Isis conta que não gosta da marca, pois não há um respaldo... Não tem nada
científico. Ela afirma que já apareceram pacientes que sofreram de pequenas “espinhazinhas”, acne,
por causa dos produtos desta marca, já que esta não oferece um creme para cada tipo de pele.
Vichy: A dermatologista considera uma linha de cremes muitos boa e afirma que é bastante
conhecida. Ela refere que os produtos desta apresentam bons resultados, contudo, é uma marca
mais cara.
170
La Roche-Posay: Segundo a médica, essa marca “é a mãe da cosmiatria”. Ela comenta que os
produtos dessa empresa são os mais usados. Além disso, essa marca é cara, mas seus resultados
são bons.
Innéov: Ela afirma que ouviu comentários sobre essa pílula, mas não a conhece. A dermatologista
relata que nenhum paciente que atende já utilizou esse produto, mas, alguns professores
comentaram que seu resultado é positivo. Ela analisa que é um produto muito recente e, como
médica, não trabalha com esses produtos tão novos. Seus professores a incentivam a prescrever
esse tipo de “cosmético”: “a experiência é boa, vamos tentar com este paciente”.
Dermage: A entrevistada conta que é uma marca muito boa, “existem ótimos resultados com seus
produtos.
Natura: Isis considera Natura e Avon, marcas com características similares. No entanto, ela prefere
Natura, pois já percebeu que os produtos da outra marca apresentam mais problemas.
Lancôme: A médica não conhece essa marca.
j. O não consumo de produtos anti-idade.
A entrevistada observa que as mulheres que preferem não utilizar os cremes anti-idade são mais
velhas, “de 70 anos para cima” e têm uma boa aceitação daquilo que viveram. Ela conta que essas
pacientes não se importam com as conseqüências, estéticas, do que viveram, desde que isto não
seja prejudicial a sua saúde, como um câncer.
Rafael
Rafael graduou-se em medicina no ano de 1992. Ele estudou da Universidade Federal do Rio de
Janeiro (UFRJ), onde também fez sua residência, que concluiu em 1996. Após essa especialização, o
médico cursou o mestrado, defendendo a dissertação em 1999 e, desde então, é professor de uma
universidade particular no Rio de Janeiro.
a. A decisão de trabalhar com dermatologia (cosmiatria) e o público com quem trabalha.
O entrevistado ingressou na residência de dermatologia logo que terminou o curso de medicina. Ele
relata que atendeu pacientes da dermatologia no Hospital Federal em seu segundo e terceiro anos de
residência. Assim que encerrou sua especialização, o médico conta que abriu um consultório e,
paralelamente, dedicou-se à dissertação de mestrado. Ele explica que sua especialidade é a parte
cirúrgica da dermatologia e é conhecido no mercado por fazer procedimentos cirúrgicos mais
complexos, trabalhando bastante com tumores. Na universidade em que leciona, o dermatologista
dedica grande parte de seu tempo à dermatologia cirúrgica, enquanto outro colega dedica-se à parte
clínica.
171
Contudo, o dermatologista também trabalha com pacientes interessados em estética, desde quando
abriu seu consultório. Ele explica que a demanda para esses procedimentos é grande e há um
retorno financeiro interessante. Desse modo, ele acredita que é prejudicial para a área clínica, optar
trabalhar exclusivamente com uma especificação de tratamento, dentro da dermatologia, pois o
médico perde pacientes que irão procurar alguém que fará os dois tipos de tratamento, o clínico e o
estético. Assim, o entrevistado refere que trabalha com cosmética paralelamente, fazendo aplicações
de toxina botulínica e preenchedores de braço, de rugas e de sulcos, por exemplo. Além disso, ele
conta que faz aplicação de laser, que é um procedimento cosmético.
Rafael comenta que a maior parte do seu atendimento primário envolve clínica e cirurgia. Porém, os
mesmos pacientes solicitam tratamento cosmético, ao final da consulta. Ele acredita que sua rede de
relacionamentos com outros médicos propicia que as pessoas que o procuram no consultório sejam
pacientes clínicos.
b. Conceito de beleza: como define a beleza e descreve uma mulher bonita.
O entrevistado considera complicado falar sobre beleza e difícil defini-la. Primeiro, ele afirma que é
uma opinião pessoal, mas, posteriormente, relata que há um padrão de beleza definido pela
sociedade.
O médico analisa que existe uma diferença em definir a beleza harmônica e a beleza percebida, ao,
sentir uma atração sexual. Ele pondera que a primeira tem relação com o bem-estar e nesse caso, as
pessoas idosas também transmitem beleza. Além disso, o dermatologista acredita que formas
harmônicas são um conjunto de pequenas informações aprendidas na formação do caráter de uma
pessoa, sendo que os meios de comunicação participam na constituição do padrão de beleza. Ele
acredita que, por causa da sociedade, tende-se a considerar a raça negra menos bonita e as pessoas
de origem européia mais bonitas. Assim, cabelos lisos, olhos claros, pele alva são características de
uma mulher bonita. Rafael refere que a Luiza Brunet e a Xuxa são dois exemplos de mulheres
bonitas que se encaixam no padrão de beleza ditado da sociedade.
Apesar de o dermatologista considerar impossível separar beleza de atração sexual, essa beleza não
precisa ser tradicional. Para ele, uma mulher bela possui o rosto afinado, cabelo bonito e bem
cuidado, olhos bonitos, corpo sem excessos, nádegas um pouco eminente e os seios fartos. O
entrevistado refere que uma atriz que não tem o rosto perfeito, mas desperta uma grande atração
sexual é a Scarlett Johansson. Ele esclarece que existem mulheres muito mais belas, mas ela
transmite desejo.
c. Como percebe o comportamento em relação à beleza, na sociedade carioca.
O dermatologista afirma que em todas as classes sociais há pessoas que não se importam com
estética, que há mulheres que gostam de se cuidar e há aquelas que são neuróticas. Ele observa que
há mulheres que começam a distorcer sua imagem, logo, se torna uma questão patológica. Ele relata
que são pessoas que se aplicam tudo o que aparece no mercado e fazem botox de três em três
172
meses, por exemplo. Em relação às classes menos favorecidas, o entrevistado comenta que é
possível formular medicamentos mais baratos. Contudo os tratamentos como o pelling requerem um
maior esforço pelo aspecto econômico ou pela busca a lugares que oferecem o tratamento gratuito.
Rafael observa que há uma necessidade de ficar bonita por mais tempo por questões profissionais e
emocionais, na sociedade brasileira. Ele esclarece que pessoas mais jovens e mais belas têm a
possibilidade de se manterem em cargos melhores por mais tempo. Ele acredita que é um fato
comprovado: “pessoas mais bonitas conseguem cargos melhores do que pessoas mais feias;
pessoas mais altas conseguem cargos melhores do que pessoas mais baixas...”. Segundo o médico,
as pessoas mais desprendidas dos padrões estéticos são artistas, como Ancelmo Góis, que
considera “as mulatas muito bonitas, e sempre as mostra em sua coluna diária, nuas e com bundas
grandes”. Ele também comenta que os europeus se encantam com padrões de beleza que são muito
diferentes daquilo que sempre vêem. Assim eles se interessam pela beleza de outros continentes.
O entrevistado afirma que as mulheres não se queixam muito de seus corpos para os
dermatologistas. Ele explica que elas procuram os cirurgiões plásticos para esse propósito. Todavia,
o médico esclarece que estão começando a surgir aparelhos para tratamento corporal em sua
especialidade, que são basicamente aparelhos de diminuição de medidas. Assim, o entrevistado
comenta que, algumas vezes, as pacientes reclamam do volume abdominal, da gordura localizada na
barriga. Porém, ele enfatiza que a pele do rosto, do colo e do dorso das mãos é o foco principal do
dermatologista. Ele comenta que o corpo é importante quando há a presença de manchas na pele.
Rafael observa que as mulheres que vão a seu consultório valorizam, principalmente, a firmeza do
rosto. Ele relata que suas pacientes se queixam muito quando começam a perceber a diminuição da
estrutura do rosto, pela flacidez: “minha bochecha era mais alta, agora, está mais baixa”. O médico
acredita que uma pele firme, com manchas incomoda menos do que a pele flácida. Ele, ainda, conta
que elas reclamam da qualidade da pele e do envelhecimento que traz as manchas e as rugas.
d. A relação entre médico e paciente.
Rafael relata que muitas pacientes solicitam tratamentos cosméticos, enquanto estão cuidando de
problemas de saúde, “como faço para melhorar essa ruga depois que o câncer estiver resolvido”,
quando descobrem que ele trabalha com cosmiatria. Além disso, ele acredita que a forte abordagem
à cosmética e ao rejuvenescimento pelo meio jornalístico influencia a conduta de certas pacientes,
que algumas vezes chegam à consulta indagando por algum tratamento específico e, outras vezes,
questionam se o procedimento/creme exposto na mídia tem valor.
O entrevistado analisa que os dermatologistas devem ter bom-senso ao realizar procedimentos. Para
ele, outras pessoas não devem perceber qual método de tratamento foi utilizado na paciente, pois
seria um motivo de “chacota”. Desse modo, o médico refere que conversa com suas pacientes sobre
todos os tratamentos e expectativas de melhora, evitando “ultrapassar limites”. Ele comenta que tenta
convencer essas mulheres que este ou aquele tratamento é contra-indicado. O dermatologista ainda
relata que as pacientes neuróticas acabam procurando outro médico. Ele explica que essa percepção
distorcida é uma doença, como a anorexia, que é percebida na anamnese.
173
O médico relata que atende em quatro lugares diferentes. O primeiro grupo são pacientes atendidos
na universidade, onde ele comenta que são mais idosos, geralmente, e as queixas são relacionadas
à idade, à pele ressecada e ao câncer de pele. O segundo grupo, são seus pacientes do hospital
Copa D’Or e, normalmente, são enfermos em situação mais grave. Ele conta que continua o
acompanhando no consultório, após a alta do hospital. Por último, o entrevistado afirma que atende
os pacientes de convênio e particular, em dois consultórios diferentes. Ele esclarece que o
atendimento no consultório de convênio é um pouco mais ágil do que no particular e atinge um
volume grande de pessoas. Nesse local, ele recebe desde casos simples a até queixas de câncer de
pele. O dermatologista refere que o outro consultório é mais sofisticado, onde ele possui um
equipamento de laser. Ele explica que o convênio não cobre os tratamentos cosméticos, e, assim, ele
encaminha, para o consultório particular, aqueles que desejam realizar esse tipo de procedimento.
O dermatologista esclarece que abriu dois consultórios, em lugares diferentes, por ser confuso
misturar os pacientes do convênio e os particulares. Ele percebe que, ao atender os dois grupos de
pacientes no mesmo consultório, o médico passa a dar descontos com muita freqüência ou acaba
cobrando o valor do convênio para o paciente particular. Além disso, o entrevistado acredita que a
sofisticação do ambiente em que trabalha com cosmética e com pacientes particulares é importante
para atrair mais clientes. O médico afirma que comprovou, por experiência própria, o efeito de um
consultório mais bonito e confortável, já que teve um consultório em Copacabana mais simples, antes
de mudar seu consultório particular para um prédio mais elegante, com mármore e garagem.
Rafael conta que as pacientes do convênio preferem usar seu plano de saúde em casos de doenças.
Contudo, elas não se incomodam em pagar a consulta particular quando o tratamento é estético. Ele
acredita que as pessoas estão pré-dispostas a pagar pelas despesas cosméticas, já que o contrato
com o plano não inclui esses procedimentos.
e. O processo de envelhecimento.
O dermatologista tem um pouco de dificuldade de começar a falar sobre o assunto, logo ele inicia
discursando sobre o envelhecimento clínico. Ele comenta que, pela visão da dermatologia, o
envelhecimento trata, basicamente, de alterações da pele relacionadas ao ganho da idade. A perda
de estrutura da pele, que ele se referiu anteriormente, é um exemplo. O dermatologista observa que
algumas pessoas envelhecem mais cedo por pré-disposição e outros porque pegaram mais sol
durante a vida ou tiveram influencia de outros fatores externos.
Rafael reflete que o valor de sua profissão, ao tratar uma paciente por cosmética, está em ajudar as
pessoas a se sentirem melhor e adoecerem menos. Ele acredita que, desse modo, é possível ajudar
a melhorar o mundo, pois pessoas mais vaidosas querem aparecer melhor para ele. O entrevistado
afirma que a manutenção da beleza faz parte da saúde também.
O entrevistado percebe que as pessoas que perdem a vaidade costumam envelhecer mais
rapidamente. Ele conta que há “velhinhas arrumadinhas, distintas” que chegam ao consultório e são
“super vaidosas”. O dermatologista entende que a vaidade é “o motor da vida dessas mulheres”. Ele
avalia que as pessoas sem vaidade têm tendência a tornarem-se mais deprimidas. Há algumas
174
que...que enfrentam melhor o problema de envelhecer e outras o enfrentam de uma forma pior. O
médico comenta que a perspectiva de vida vem aumentando e as pessoas desejam ter uma pele
mais jovem, por mais tempo. Ele considera que é a essência do ser humano. Se a pessoa tem uma
expectativa de viver mais, ela quer parecer mais velha, apenas no final da vida.
f. Mulher de 30, mulher de 50: como são suas pacientes em cada estágio da vida.
Mulher de 30 anos: Rafael refere que essa mulher deixou de ser jovem e ela começa a se aproximar
dos 40. Ele afirma que sua pele ainda é estruturalmente bonita, porém é uma paciente que já tem um
temor do futuro e que “evitar ficar feia”. Logo, ele explica que o tratamento é uma profilaxia do
processo de envelhecimento.
O dermatologista afirma que sua pele ainda está clara, boa e estruturada. Contudo, ele observa que a
pessoa que pega sol desde muito jovem começa a ter pequenas alterações de pele perto dos 30
anos. O médico conta que, às vezes, atende uma paciente com câncer de pele da forma mais
precoce, o que assusta a pessoa. Ele relata que muitas pacientes não compreendem que essa
mancha é proveniente do acumulo dos anos de sol, independentemente dos cuidados que ela tem,
naquele momento.
Mulher de 50 anos: O médico refere que essa mulher quer se apresentar melhor para o mundo, ela
quer se sentir mais jovem. Ele explica que, nessa idade já aparecem alterações mais significativas e,
consequentemente, mais indicações de tratamentos que ajudam a cumprir o objetivo dessas
pacientes. O entrevistado também relata que a paciente já chega à consulta sabendo um pouco o que
quer fazer e algumas questões são resolvidas apenas com a plástica. Ele comenta que algumas
pacientes compreendem as limitações dos procedimentos pela dermatologia, outras têm medo e
preferem uma forma menos agressiva de tratamento. Contudo, o médico esclarece que já existem
procedimentos dermatológicos com laser, menos agressivos, para flacidez com “algum resultado”. O
entrevistado, ainda, lembra que já é preciso retirar certas manchas que representam um pequeno
câncer de pele, em algumas pessoas de 50 anos.
g. Os cremes anti-idade: o que pensa sobre sua funcionalidade.
Rafael acredita que existem poucas substâncias que têm fundamento cientifico e funcionam no
tratamento anti-idade. Ele relata que confia apenas no ácido retinóico para o tratamento de
rejuvenescimento, pois há embasamento científico. O médico ainda comenta que é uma substância
barata, que já está no mercado há mais de vinte anos. Ele também refere que a vitamina C apresenta
algum efeito antienvelhecimento. Para o entrevistado, os bons produtos conseguem melhorar um
pouco a cor e a espessura da pele, além de aumentar em um pouco o depósito de colágeno. Porém,
ele explica que a paciente só consegue um bom resultado se mantiver o uso, regularmente. Ele
também comenta que ao começa a fazer um tratamento com substâncias ácidas, que produzem
irritação na pele, as pacientes mudam o seu comportamento, afastando-se um pouco do sol e
protegendo-se melhor.
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O dermatologista avalia que há muitos cremes e produtos que são lançados, por objetivo comercial,
sem apresentar qualquer comprovação científica de seu efeito. Ele se lembra de certa substância que
provou promover “o tal efeito cinderela”, que melhora momentaneamente e superficialmente a
flacidez, porém, não é um resultado sustentado. Em contrapartida, o ácido retinóico continua no
receituário médico. O entrevistado afirma que confiaria em um novo produto que mostrasse
resultados sérios: “se houver um trabalho científico em revista de alto impacto e com dados
estatísticos fortes”. Ele argumenta que muitos trabalhos são feitos apenas considerando a diferença
por fotografia, o que para ele não é válido cientificamente.
O entrevistado relata que costuma prescrever produtos que ele acredita que tenham resultado. Ele
comenta que, diferentemente, muitos profissionais fazem receitas com 30 itens, cuja soma dos
valores chega a 2.000,00 reais, em produtos.
h. Industrializado x Manipulado
O entrevistado comenta que procura adequar as prescrições médicas às possibilidades financeiras de
cada paciente. Ele relata que formula um creme ou utiliza um produto de farmácia de valor mais baixo
para as pessoas que têm menor poder aquisitivo. Contudo, ele conta que prefere trabalhar com uma
grade de produto prontos, pois ele considera os laboratórios industrializados, mais confiáveis. O
médico explica que a produção é mais controlada e o tempo de validade é mais longo para os
produtos industrializados. Ele também refere que o relacionamento dos laboratórios com as
sociedades médicas, mostrando os estudos científicos, é muito importante.
Rafael comenta que há muitas farmácias de manipulação e, por isso, é difícil conhecer e confiar em
todas. Ele conta que algumas farmácias oferecem dinheiro aos médicos para que as indiquem em
sua prescrição, o que é ilícito. O dermatologista considera essa prática desonesta, porém, ele afirma
que alguns profissionais aceitam essa “comissão”. Ele relata que duas farmácias de manipulação no
Rio de Janeiro são confiáveis, tanto pela sua honestidade, quanto pela qualidade dos produtos: a
Dermage e a Dermatos.
i. As Marcas: o que pensa das marcas apresentadas – Avon (Renew), Vichy, La Roche-Posay,
Natura (Chronos), Lancôme e Innèov
Avon (Renew): Rafael refere que a empresa tem vontade de estreitar as relações com os
dermatologistas. Ele relata que seu modo de venda “porta-a-porta” dificulta a utilização de qualquer
produto, por causa da necessidade do controle do receituário e afirma que não trabalhar com
produtos médicos, pois pode-se comprar o produto sem receita médica.
O entrevistado conta que a marca precisa englobar produtos que não causem reações no organismo,
por serem vendidos para uma mulher que não tem, necessariamente, um acompanhamento médico.
Por isso, a concentração de princípios ativos é menor e não produz um efeito de rejuvenescimento.
Ele acredita que os médicos não irão prescrever a marca, por não ser vendida em uma rede de
farmácias.
Natura: O dermatologista afirma que ele não prescreve Natura pelos mesmos motivos da Avon. Ele
considera que, ao indicar esses produtos, está desmerecendo sua profissão, pois o médico estuda na
176
faculdade de medicina para prescrever uma medicação, que é vendida por um farmacêutico
responsável. Todavia, ele comenta que é uma boa marca e seus produtos são confiáveis.
Dermage: Rafael afirma que prescreve os produtos dessa marca e gosta dessa farmácia para
formulação. Ele relata que a qualidade dos produtos é bastante alta, e o médico e o paciente se
sentem exclusivos.
O entrevistado comenta que é uma farmácia de manipulação que está se tornando uma empresa de
cosméticos. Ele refere que o desejo da propretária da Dermage é ser a marca brasileira de
dermocosméticos. Assim, ela aprimora cada vez mais, a apresentação de seus produtos.
Innéov: O médico explica que é uma pílula, porém, ele não acredita no resultado de nutracêuticos em
forma de pílulas. Ele refere que, embora tenham sido feitos alguns estudos científicos, ele não confia
nos resultados.
La Roche-Posay: O dermatologista conta que os produtos anti-idade, desta marca, têm um pouco de
ácido retinóico. Ele relata que é um creme mais caro, com efeito um pouco menor, mas que funciona.
O médico comenta que já teve graves problemas com o laboratório, em congressos, porém ele afirma
que é extremamente confiável. Ele refere que utiliza bastante seu protetor solar e os produtos para
tratamento anti-acne.
Lancôme: O médico considera a marca “quase como a Avon”. Ele relata que são produtos cosméticos
que não precisam de receita, e não os prescreve. O entrevistado conta que a sensação de utilizar
esse creme é agradável e seu uso não é prejudicial. Assim, ele pede para suas pacientes, que já o
compraram, para usarem como hidratante.
Vichy: Rafael compara essa marca à La Roche Posay. Ele afirma que são os mesmos proprietários: a
L’Oreal. Porém, o dermatologista prefere La Roche Posay, pois está há mais tempo no mercado e
seus produtos são mais fáceis de utilizar. Além disso, ele explica que a Vichy produz cosméticos
“mais finos”, logo, a marca está entre a Lancôme e a La Roche Posay. O médico ainda esclarece que
não é necessário receita para comprar seus produtos.
j. O não consumo de produtos anti-idade.
Rafael relata que há pessoas que não ligam para estética e não acham “tão importante” gastar tempo
e dinheiro com a manutenção da beleza. Ele acredita que a aparência não incomoda essa mulher e
não traz modificação para a vida dela. O médico refere que há algumas pessoas com esse perfil que
são mais deprimidas e outras que continuam contentes e vivem bem com uma mancha e com a
flacidez. Ele se lembra de um artista, o Evandro Mesquita, que não se importa com as manchas e é
um cara que é feliz com seu estilo de vida, todo “largadão”.
Ana
Ana tem 43 anos e é casada. Quando se graduou em medicina, optou por especializar-se em
pediatria. Apenas dez anos depois, em 2001, fez sua pós-graduação em dermatologia. Ela atende
suas pacientes em seu consultório no bairro de Copacabana, na zona sul do Rio de Janeiro.
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a. A decisão de trabalhar com dermatologia (cosmiatria) e o público com quem trabalha.
A entrevistada escolheu trabalhar com dermatologia, pois gosta de entender como as doenças se
desenvolvem, porém, não lhe agrada cuidar de pacientes graves. Sendo assim, ela encontrou, nessa
especialidade, uma forma de fazer a “medicina boa”. Ela também assume que gosta de estética e
beleza, mas a médica afirma que não é seu foco principal.
Ana relata que atende duas vezes por semana no consultório, mas pretende aumentar seu horário de
trabalho pela demanda que está ocorrendo. Ela percebe que metade de suas pacientes a procuram
apenas por questões estéticas e, às vezes, há busca para o tratamento de doenças.
b. Conceito de beleza: como define a beleza e descreve uma mulher bonita.
Para a entrevistada, beleza é um estado de “bem estar”, é a “felicidade com sua aparência”, é sentirse bem, sem mudar seu jeito. Ela comenta que já viu mulheres bonitas de diversas maneiras, “mulher
gorda bonita”, “mulher magra bonita” e ela considera que “a mulher deve estar combinando com ela
mesma, deve estar harmônica”. Ana acredita que uma mulher bonita é agradável de olhar,
independente a cor do olhos e da forma do nariz. Ela a descreve como uma pessoa que, mesmo
tendo rugas, gosta e tem vontade de se arrumar.
A dermatologista observa que a mulher brasileira se aceita bem com o biótipo que possui, “mais cheia
de curvas, e até acha bom”. Ela relata que sua pele é morena e os cabelos louros não são naturais.
Ana conta que é raro ver uma brasileira com olhos claros.
c. Como percebe o comportamento em relação à beleza, na sociedade carioca.
A dermatologista observa que a relação das mulheres com a questão da estética varia de acordo com
a faixa-etária. Ela relata que a pessoa que a procurar por estética aos 20 anos, em geral, irá se
cuidar a vida inteira. A médica conta que há pacientes de sua idade que também são bem cuidadosas
e querem prevenir o envelhecimento, mas é “mais inconstante” porque elas não criaram o hábito
desde cedo. E há as mulheres de meia-idade que “passam a se tratar, dependendo da sua
personalidade”. Ana acredita que algumas mulheres dessa faixa-etária chegam à consulta por
questões que não têm relação com a estética, nem com doenças. Ela observa que a motivação pode
ser uma separação, por exemplo, e elas querem “dar outro rumo na vida”; outras comentam que seus
filhos cresceram e querem cuidar de si.
Ana relata que algumas pacientes estão sempre insatisfeitas com o resultado, “estão sempre
infelizes”. No entanto, ela acredita que o motivo dessa infelicidade é outro. Ela avalia que essas
mulheres estão insatisfeitas com a pele e com a cabeça, sendo difícil de agradá-las, “sempre dizem:
‘vou fazer uma cirurgia plástica’, estão sempre procurando alguma coisa a mais”. Ela também
observa que algumas pessoas fazem procedimentos “invasivérrimos” para o corpo, mas querem uma
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prescrição de um creme que dê resultado para o rosto. Ela reflete que a mídia pode fazer com que as
mulheres acreditem que existe “uma fórmula mágica” para a face.
A entrevistada percebe que as mulheres valorizam o cabelo liso. Ela conta que existem algumas
pacientes que têm o “cabelo étnico”, um termo que conheceu no consultório. Elas valorizam seus
cachos bonitos, bem tratados, mas ela admite que é uma minoria. Em relação ao corpo, a
dermatologista comenta que suas pacientes reclamam do peso, das estrias e da celulite. Todavia, ela
afirma que as adolescentes, suas mães e as puérperas, todas se queixam por causa das estrias.
Ana, ainda, comenta que, mesmo não sendo sua área de atuação, as mulheres falam bastante do
peso e do desejo de fazer “lipo” e “aumento de mama”. Ela lembra que suas pacientes costumam
pedir indicação de cirurgiões.
No rosto, Ana observa que suas pacientes valorizam a textura da pele, sem rugas e sem manchas.
Ela lembra que, no Brasil, há muitas pessoas com a pele manchada por causa do sol e essa mancha
ajuda a transparecer o envelhecimento, além de ser esteticamente feio. A médica considera que esse
problema perturba as mulheres de todas as faixas etárias. Contudo, as mais novas ficam apavoradas
e até “meio deprimidas”, pois, para tratar as manchas é necessário “mudar o hábito de pegar sol”,
“elas ficam sem saber o que irão escolher”. Ela acredita que essa dificuldade em optar pelo sol ou
pelas manchas tem relação com a cultura do país, pois o lazer é “na praia, ao ar livre”. Variavelmente,
ela percebe que as mulheres mais velhas se convencem mais facilmente a usar o protetor solar todos
os dias e elas também abrem mão de ir à praia ao meio-dia.
d. A relação entre médico e paciente.
A dermatologista brinca que a revista Veja é feita para a dermatologia, pois “a cada três ou quatro
edições sai uma matéria” que suas pacientes lêem e procuram a médica querendo fazer o tratamento
indicado pela revista. Ela comenta que, normalmente, são procedimentos ou cosméticos “super caros
e não acessíveis a todos”, sendo que, nem sempre, seu efeito foi comprovado. Então, a entrevistada
afirma que conversa com sua paciente para diminuir sua expectativa e tentar algo mais viável. Ela
acredita que muitas mulheres não têm ideia do custo de bons produtos de estética e, às vezes,
chegam com “muito desejo de tratar, mas não realizar isso”. Assim, a entrevistada relata que costuma
“sondar pela profissão, pelo tipo de vida, pelas histórias que elas contam o quanto elas poderão
disponibilizar”, para passar um creme adequado.
Ana conta que, além das revistas, há muito acesso às informações de estética pela internet. Ela
chama um site de buscas de Dr. Google, pois, através de pesquisas feitas neste site, algumas
pacientes se autoexaminam e chegam ao consultório pedindo apenas a receita para o medicamento
pesquisado na internet. A médica lembra-se de uma pessoa que lhe pediu uma prescrição para um
creme feito com uma planta da África que servia para enrijecer a pele da mama, “ela chegou com
toda a pesquisa pronta, mas era tudo não cientifico, e não prescrevi”.
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Ana relata que uma pergunta de rotina é: “o que incomoda?”. Ela conta que, geralmente, as pacientes
chegam com uma lista de questões puramente estéticas. A entrevistada avalia que, às vezes, as
mulheres têm tanta expectativa no resultado que não percebem “uma melhora menor”. Ela conta que
sempre precisa falar para a paciente que o tratamento é lento e depende de vários fatores, “se expor
ao sol, se ela vai usar um protetor”. Contudo, se uma amiga nota a mudança na pele, se outras
pessoas comentam, a paciente fica satisfeita, independente de ela ter percebido alguma diferença.
e. O processo de envelhecimento.
A dermatologista acredita que a aceitação das mulheres quanto ao processo de envelhecimento está
muito ligada a história de vida daquela pessoa e não com seu sentimento daquele momento. Ela
conta que mulheres que foram muito bonitas e que foram reconhecidas por sua beleza reclamam de
tudo e estão dispostas a tudo. As mulheres que sempre trabalharam e tiveram outros assuntos para
pensar, não ficam tão arrasadas com o envelhecimento. A médica avalia que são pessoas que
cuidam do básico, mas não se desesperam. A dermatologista, ainda, se lembra que, quando foi ao
consultório de uma amiga, uma senhora de 90 anos estava fazendo um laser e comentou: “não tenho
herdeiro, não tenho para quem deixar meu dinheiro, vou me cuidar".
f. Mulher de 30, mulher de 50: como são suas pacientes em cada estágio da vida.
Mulher de 30 anos: Ana afirma que as pessoas mais novas se incomodam “demais com defeitos”. Ela
conta que chegam “meninas de 20, 30 anos” que querem perfeição e são super exigentes, “elas
chegam a ficar em depressão”. A dermatologista acredita que são mulheres super ligadas em beleza,
que conhecem os cremes e os princípios ativos. Ela comenta que as pacientes mais vaidosas a
procuram aos 20 anos com essa questão: "está na hora de eu me cuidar".
Mulher de 50 anos: A entrevistada conta que é uma paciente tranquila que quer começar a se cuidar.
Ela avalia que, quando a mulher chega na meia-idade com essa questão (pela primeira vez) é porque
não deu muita importância a isso durante sua vida, “são pessoas que não estão muito neuróticas com
esse assunto”. A dermatologista afirma a queixa principal é a falta de tônus, a “bochecha que está
caindo” e o “famoso bigode chinês”. Além disso, ela refere que essa mulher se queixa de manchas e
rugas ao redor dos olhos também. Todavia, Ana relata que, nesse momento, os cremes não resolvem
o problema, é necessário algo mais invasivo, como um preenchimento e um lifting, talvez, cirúrgico.
A dermatologista observa que o maior problema dessa fase da vida é que “as cabeças estão
envelhecendo muito pouco e o corpo não acompanha”. Ela explica que uma mulher que trabalha é
independente e tem uma cabeça muito jovem .
g. Os cremes anti-idade: o que pensa sobre sua funcionalidade.
A entrevistada considera que os cremes podem melhorar a hidratação da pele, sua textura, as
manchas, as rugas finas, a luminosidade e podem corrigir oleosidade ou ressecamento da pele. Ela
comenta que, a longo prazo, os cremes antienvelhecimento também podem diminuir rugas ao redor
180
dos olhos. Ana relata que, ao analisar uma pesquisa, observa como o princípio ativo faz com que o
colágeno se prolifere ou como ele combate os radicais livres. Ela questiona se o ingrediente
realmente funciona e em que evidências o resultado foi baseado. A dermatologista confia nos
laboratórios que apresentam controle de qualidade, certificado ISO e que estão se atualizando e
desenvolvendo pesquisas constantemente, às vezes, até na universidade.
A dermatologista esclarece que a diferença entre remédio e cosmético é a concentração do ácido
retinóico no produto que, sendo alta, só pode ser vendido com receita médica. Ela afirma que não
prescreve um creme como Nívea ou L’Oreal Age Perfect, pois “qualquer um pode chegar em uma
farmácia e pegar”. A entrevistada explica que poderia indicar esse tipo de cosmético em seu
receituário associado a outros remédios, mas, ela considera que são marcas “tão popularizadas” que
sua prescrição como médica. Ela, ainda, comenta que os produtos antienvelhecimento são
considerados cosmecêuticos, cosméticos com terapêuticos.
h. Industrializado x Manipulado
Ana relata que há duas farmácias de manipulação nas quais acredita muito, a Dermatos e a
Dermage. Ela conta que elas fazem controle de qualidade, fazem pesquisas, promovem cursos sobre
assuntos de dermatologia e fazem lançamentos para explicar os resultados de suas pesquisas. A
médica afirma que existem farmácias de segunda linha que são “mais simples” e não investem no
relacionamento com os médicos. Todavia, ela sabe que existe controle de qualidade, utilizam um bom
principio ativo e seu valor é mais acessível, apesar da fragrância e da embalagem serem inferiores.
Ela, ainda, cita um terceiro grupo de farmácias de manipulação “que não dá nem para passar, é muito
ruim”. Ela comenta que, quando a paciente tem condições, ela pede para fazer a fórmula nas
farmácias do primeiro grupo que são as melhores farmácias, “disparado”.
A dermatologista comenta que o ácido retinóico é um ativo que apresenta um bom resultado em
qualquer produto, mas há uma diferença no preço do creme manipulado e no industrializado. Ela
explica que, quando o creme é manipulado em uma farmácia boa, como a Dermatos, seu resultado
será melhor, pois o creme virá com um veículo hidratante e um anti-inflamatório que ajudará no
tratamento.
i. As Marcas: o que pensa das marcas apresentadas – Avon (Renew), Vichy, La Roche-Posay,
Natura (Chronos), Lancôme e Innèov.
Innéov: Ana afirma que é um produto feito por duas marcas muito conhecidas e confiáveis. Ela leu
sua fórmula e analisou que tem sentido em termos biológicos. Assim, a médica relata que tomou essa
pílula por seis meses e notou alguma mudança. Contudo, alterou outros hábitos, no mesmo período.
Por isso ela não tem certeza se o mérito de sua melhora é do Innéov.
La Roche-Posay: Ana refere que o representante da marca vai ao consultório explicar o ativo, a
concentração dos produtos e tirar as dúvidas. Além disso, ela conta que há um retorno para avaliar
181
como foi o efeito e a satisfação dos pacientes em relação a um determinado produto. A médica afirma
que é uma marca que costuma publicar trabalhos e está presente nos congressos de dermatologia e
nas reuniões da Sociedade Brasileira de Dermatologia. Ela, ainda, refere que o marketing desse
laboratório faz a propaganda direta para os dermatologistas.
A entrevistada explica que essa marca não utiliza o ácido retinóico, pois é um ativo que não poderia
ser vendido em concentrações altas, sem prescrição médica. Assim, o laboratório trabalha com
outros princípios ativos e expõe as fórmulas para os dermatologistas saberem o que estão indicando.
Natura (Chronos): A entrevistada declara que não utiliza essa marca. Ela afirma que esse produto
contém retinóico, mas em uma concentração que vai fazer o efeito de hidratação, apenas. Ela
comenta que a paciente poderia estar investindo em um creme que contém esse princípio ativo em
uma concentração que faz efeito e “custa metade do preço”, mas precisa de receita médica. Ana
considera que existe muito marketing em cima do produto, “as embalagens são lindas, parece que vai
fazer muito efeito. Acho que é propaganda enganosa”.
Lancôme: A médica conta que a marca não faz propaganda para o médico, mas a essência dos
cremes e a embalagem são de “primeirésima”. Ela afirma que não usa como tratamento, porque não
sabe o que tem na fórmula. No entanto, ela indica bastante o removedor de maquiagem, a linha de
maquiagem. A dermatologista comenta que procura saber o conteúdo, até do hidratante e do
sabonete e que, apesar de não serem remédios, são produtos “coadjuvantes” no tratamento da pele.
Vichy: A dermatologista relata que essa marca tem o mesmo nível da La Roche. Contudo, ela não
tem tanto contato com o laboratório, que tem uma presença menor no Brasil. Ana conta que a marca
se preocupa com pesquisa, em dizer ao médico porque usar o ingrediente, quais os benefícios e em
“dar retorno”.
j. O não consumo de produtos anti-idade.
Ana reflete que o não consumo dos cosméticos pode estar relacionado à atitude do dermatologista,
se ele não tem iniciativa de questionar se o paciente está tendo cuidados mínimos como tirar a
maquiagem, usar o filtro, usar um hidratante e limpar o rosto adequadamente. Ela observa que,
algumas vezes, elas começam a usar e se sentem bem, outras não têm “esse estímulo” e, então,
começam a usar e, depois, param. “É uma coisa que vem de dentro mesmo”.
Kátia
Kátia é médica, casada e formou-se em 1975. Ela é especialista em dermatologia e reumatologia,
além de ter feito mestrado, doutorado e pós-doutorado. Atualmente, ela leciona na Universidade
Federal do Rio de Janeiro.
a. A decisão de trabalhar com dermatologia (cosmiatria) e o público com quem trabalha.
182
A médica fez sua primeira pós-graduação em reumatologia, pois teve a oportunidade de trabalhar
com um professor durante a faculdade que a “seduziu” para seguir a especialidade. Ela conta que
esse mesmo “mentor intelectual”, posteriormente, a direcionou para estudar uma doença chamada
psoríase. Contudo, para ter um melhor conhecimento da enfermidade, ela escolheu fazer uma
segunda pós-graduação em dermatologia, em 1985, obtendo seu título de especialista em 1994.
Desde então, a médica faz atendimento em dermatologia também.
Kátia relata que apenas 10% de suas pacientes a procuram, puramente por estética. No entanto, as
pacientes com problemas clínicos também solicitam, constantemente, algo cosmético. Ela comenta
que pessoas com lúpus ou psoríase também se preocupam com sua pele, com seus cabelos, com
suas unhas. A dermatologista refere que trabalha com estética e com clínica no consultório, mas não
com os procedimentos cirúrgicos da cosmiatria.
b. Conceito de beleza: como define a beleza e descreve uma mulher bonita.
Kátia considera beleza algo “muito complexo”. Para ela, “a saúde física e mental, o estado emocional
e o equilíbrio” são parte do significado do belo. A médica, ainda, afirma que uma alimentação
saudável é importante para alcançar a beleza. Além disso, ela avalia que uma mulher alegre, feliz e
agradável é mais bela.
A entrevistada analisa que a pessoa precisa ter um aspecto físico bom, para parecer bela. Ela
também percebe que alguém que é agradável de conversar, ver e ouvir transparece beleza. A médica
acredita que esse tipo de pessoa faz com que outros tenham vontade de estar por perto. No entanto,
ela admite que, pelos padrões de beleza, uma mulher bela deve ser alta e magra, deve possuir uma
pele bonita, olhos brilhantes e cabelos com brilho, “isso é verdade”.
c. Como percebe o comportamento em relação à beleza, na sociedade carioca.
A dermatologista observa que o ser humano gosta de ficar bonito, de se olhar ao espelho e dedicar
alguns momentos à beleza, ela entende que “isso é saudável”. Contudo, ela analisa que, quando a
paciente tem alguma doença séria e seu foco continua voltado para a estética, seu comportamento se
torna um problema. A médica acredita que algumas pessoas “vivem em uma realidade diferente”,
pois ela não compreende como alguém pode pensar incessantemente em tratamentos de beleza. A
entrevistada, então, reflete que essas mulheres tem “uma distorção da realidade da vida e do que
significam as coisas” e, talvez por isso, sejam pessoas “estereotipadas” na sociedade. Ela conta que
são mulheres que querem saber quais são os últimos lançamentos a “toda a hora”.
A dermatologista afirma que o cabelo enfeita o rosto, porém, ela considera que as pessoas têm uma
preocupação maior do que deveriam com essa área do corpo. Ela observa que as pessoas “gastam
horas” no salão de beleza, para arrumar o cabelo e comenta que as mulheres fazem “vários
alisamentos” e “mudam sua cor toda hora”. Kátia analisa que as mulheres querem ter o cabelo
esticado, independentemente se esse formato liso e comprido combina com seus rostos. Ela relata
183
que é o padrão considerado bonito, pela sociedade. Todavia, ela percebe que existem outros tipos de
cabelo interessantes, o que o deixa feio é a falta de hidratação e o descuido.
A entrevistada conta que percebeu a importância da pele para o ser humano ao estudar a psoríase.
Ela analisa que esse órgão é o primeiro contato do indivíduo com o meio ambiente, “com o seu
semelhante”, “é a forma de apresentação da pessoa”. Assim, todos querem ter uma pele bonita e
jovem. Logo, a médica observa que a referência ideal é a pele do bebê: “bonita, brilhosa, coradinha,
macia e hidratada”. Ela comenta que todos, independente da cor da pele, nascem com uma pele
sem mancha e sem espinha e as pessoas gostariam de ter essa uniformidade novamente. Ela conta
que a maquiagem é um modo de tentar “camuflar” as marcas, mas é trabalhoso fazer isso
diariamente.
Kátia, então, se lembra de uma paciente que tem uma doença chamada artrose de coxofemoral “com
todos os seus comemorativos”. A médica conta que essa mulher tem dificuldade para andar, mas, a
coisa que mais a preocupa é a mancha da pele, possivelmente por ser a primeira parte do seu corpo
que outras pessoas notam. “Agora, essa paciente está feliz porque sua pele ficou sem mancha, está
luminosa, está brilhosa”.
d. A relação entre médico e paciente.
Kátia acredita que pessoas que exageram na questão estética não costumam frequentar seu
consultório, pois ela não possui aparelhos de laser e não faz peeling nesse local de trabalho. Sendo
assim, essas mulheres buscam médicos que têm um foco maior em estética, com mais opções de
tratamentos. Ela comenta que sua relação com cosmética é limitada aos cremes de beleza para
melhorar a pele e o cabelo. Todavia, a médica acredita que as pacientes que a procuram por doenças
dermatológicas ou sistêmicas também têm direito de tratar algo que as incomodam, esteticamente.
A entrevistada refere que a visão da paciente tem que ser respeitada pelo médico. Por isso, ela
afirma que aborda apenas as questões estéticas que incomodam a pessoa. Por exemplo, se uma
mulher chegar ao consultório com uma mancha e um problema na ponta do nariz, e, somente a
incomoda o segundo problema, apenas aquele deverá ser tratado.
Contudo, ela relata que a
abordagem para doenças graves é diferente. Se uma paciente chega ao consultório com uma lesão
grave e não a valoriza, o dermatologista deve “chamar a atenção” da pessoa para se preocupar com
aquele problema.
A dermatologista relata que há vários pacientes com 60, 70, 80 anos que se preocupam com uma
mancha na pele. Ela explica que as melanoses vão aparecendo com o tempo e o efeito do sol, “as
agressões na pele”. A médica avalia que essas mulheres também ficam preocupadas com as
manchas, “a gente pensa que a pessoa já tem 80 anos e não vai se importar com isso, mas se
importa”.
e. O processo de envelhecimento.
184
Kátia afirma que o envelhecimento não é algo bom, mas acontece e todos precisam se preparar
“emocionalmente” e “psicologicamente”, pois tudo no indivíduo envelhece: “a emoção, o pensamento,
a memória, a pele, o cabelo, todos os órgãos internos”. Ela lembra que seu marido reflete que seria
muita injustiça envelhecer o físico e não envelhecer a emoção, “se você envelhecer a pele e não
envelhecer o coração”. A médica lembra que, nesse processo, a visão piora, o olho perde o brilho, o
paladar vai se alterando, as rugas aparecem na pele e o cabelo fica branco. Ela considera que o
cabelo branco é uma das piores conseqüências, “no ponto de vista de beleza”, pois não adianta pintálo que, logo, aparece, novamente. Além disso, a pessoa mais velha fica mais suscetível às doenças e
sua imagem está mais ligada às mais enfermidades do que a juventude.
A entrevistada também argumenta que envelhecer também é difícil no campo profissional. Ela pensa
que a aposentadoria irá deixá-la fora de acontecimentos da ciência, pois sua época como médica terá
passado, “mesmo que não esteja morta”. Ela se lembra que desde que se formou em medicina, essa
ciência já “evoluiu muito, em todos os sentidos”.
Kátia relata que todos falam sobre a prevenção do envelhecimento, mas não valorizam as ações
concretas que podem ser uma alimentação saudável, não fumar, evitar o excesso de bebida, o
excesso de sol, excesso de vento e excesso de frio, porque agridem a pele. Atividade física, porque a
atividade física ajuda melhorar também a vitalidade de todos os tecidos e aí podem usar cremes que
podem prevenir o envelhecimento da pele. Há pessoas que querem colocar botox muito cedo,
pessoas com 30 anos querem fazer botox. Eu acho que isso não é uma coisa boa, vai diminuir a
atividade muscular localizada, o tempo todo, e, não sei se isso vai fazer com que esse músculo fique
mais flácido. No futuro quando elas estiverem com 70 anos, acho que vão ficar com as rugas muito
mais intensas.
f. Mulher de 30, mulher de 50: como são suas pacientes em cada estágio da vida.
Mulher de 30 anos: Kátia acredita que a mulher, aos 30 anos, já começa a se preocupar com “alguma
ruguinha”, “pezinhos de galinha” e “alguma mancha na pele””. Ela afirma que essa paciente já quer se
prevenir, pois ela é “bombardeada o tempo todo” com a ideia da beleza eterna,
e não quer
envelhecer.
Mulher de 50 anos: A dermatologista comenta que essa paciente “quer tirar as rugas mesmo” e está
preocupada com a aparência de suas mãos, pois ela afirma que essa parte do corpo envelhece mais
rápido. Além disso, a entrevistada relata que os cabelos brancos já são outra fonte de preocupação.
Por fim, Kátia sugere que as questões da mulher de 50 anos são mais palpáveis e visíveis, “são mais
reais”.
g. Os cremes anti-idade: o que pensa sobre sua funcionalidade.
A dermatologista acredita que os cremes anti-idades cumprem a expectativa das pacientes que
querem melhorar a pele, tornando-a mais hidratada. No entanto, não cumprem as expectativas das
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mulheres que fazem os tratamentos pensando em ter a mesma pele de 20 ou 30 anos atrás. Assim,
ela ressalta que se a pessoa usa bons cremes, religiosamente, e de maneira adequada, e um protetor
solar, sua pele poderá melhorar, apesar dos anos.
Kátia conta que a cosmética evoluiu muito ao trabalhar com substâncias que possuem um potencial
maior de hidratação, como a vitamina A e a vitamina C. Ela afirma que, hoje, há um entendimento
maior sobre as alterações da pele e do envelhecimento. Segundo a médica, as melhores marcas no
mercado são da L´Oreal, como a La Roche-Posay, além das marcas Roc, Galderma, Stiefel e
Eucerin.
Para a entrevistada, fatores como o tempo de mercado e seu conhecimento sobre o creme são
essenciais para ela indicá-lo a uma paciente. Ela conta que pessoas com dermatite atópica
necessitam de produtos que sejam hipoalergênicos, assim o médico precisa saber, exatamente, seus
efeitos colaterais. Kátia, ainda, afirma que já existem diversos cremes para esse grupo especial de
pessoas: antienvelhecimento, protetor solar, entre outros.
A dermatologista reflete que as tecnologias novas são uma realidade. Ela comenta que passa a
utilizar novos produtos quando “são melhores do que os que existem e quando podem atingir um
novo mercado”. A médica também explica que é importante conhecer as substâncias e saber se são
melhores do que aquelas que ela já conhece.
h. Industrializado x Manipulado
A dermatologista afirma que existem boas farmácias de manipulação. Ela comenta que não tem
nenhum reparo a fazer às farmácia de manipulação que são mais próximas, que ela mantém mais
contato.
Kátia esclarece que as boas farmácias têm controle de qualidade e enfatiza a importância de esse
controle de qualidade “ser mantido”, ou seja, a empresa deve verificar constantemente o padrão de
qualidade de seus produtos. A entrevistada lembra de empresas que tinham controle de qualidade no
começo, mas falharam após um período: “você vê manchas em roupa e pensa que sempre comprou
ali, aquela roupa era tão boa (...)”.
i. As Marcas: o que pensa das marcas apresentadas – Avon (Renew), Vichy, La Roche-Posay,
Natura (Chronos), Lancôme e Innèov
Lancôme: Kátia acredita que é uma boa marca e sabe que muitas mulheres usam, seus produtos.
Contudo, não os receita, ela afirma que tem um viés para leigos. Além disso, a dermatologista
comenta que não conhece as concentrações das substâncias presentes nas fórmulas.
Natura: Para a entrevistada é a mesma situação da Lancôme, ela pode fazer uso pessoal, mas não
receita, por não conhecer a fórmula do creme.
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Vichy: A médica conta que essa marca entrou no receituário dos médicos, pois participa de
congressos internacionais e passou a fazer uma abordagem direta com os dermatologistas. Ela refere
que os últimos cremes lançados possuem dados suficientes para serem receitados.
Innéov: A entrevistada afirma que conhece essa marca desde seu lançamento, pois frequenta,
anualmente, congressos internacionais. Ela explica que há produtos antienvelhecimento, para queda
de cabelo e para queda de unha, mas ela não sabe se funcionam, já que não tem experiência com
eles. A médica afirma que a propaganda é boa e são substancias muito concentradas nas pílulas,
“como se fossem de nanotecnologia”.
Dermage: Kátia observa que a Dermage é muito próxima do dermatologista, desde seu início. Ela
relata que viu “a primeira vez que botaram um creminho na praça e foram crescendo”. Ela considera
que as duas profissionais que criaram a farmácia são muito íntegras como profissionais e muito
interessadas também. “Elas vão a congressos, elas aprendem, elas estudam, todas as duas. Depois,
separaram-se, mas as duas têm o mesmo perfil, o mesmo profissionalismo”.
Avon (Renew): A dermatologista refere que as substâncias presentes no Renew são as mesmas
utilizadas pelos médicos. No entanto, não há informações sobre as concentrações da fórmula. Logo,
a entrevistada afirma que tem não nada a dizer sobre o produto. Ela ainda comenta que as pessoas
leigas o consideram um excelente creme.
La Roche-Posay: Kátia conta que é uma das marcas que mais usa com suas pacientes. Ela gosta
dos cremes, indica xampus para pacientes com psoríase e creme hidratante para aquelas que têm
dermatite atópica, “O pessoal gosta muito do Revenine que melhora, realmente, a textura da pele”. A
dermatologista considera que essa marca e a Vichy são laboratórios que respondem à expectativa,
eles têm tradição e nome internacional. Ela pondera que é importante conhecer a história.
j. O não consumo de produtos anti-idade.
Kátia afirma que existem pacientes que não gostam de usar creme, não querem se cuidar e não têm
paciência. Ela explica que, mesmo avisando à suas pacientes com pele seca que a hidratação na
pele ajuda a ter uma aparência mais jovem, essas mulheres continuam sem se tratar.
Contudo, a entrevistada comenta que todas as pessoas que “acabam se disciplinando” ficam mais
satisfeitas. Ela relata o caso de uma senhora de mais de 60 anos, que era muito simples e não tinha
condições de comprar um creme. A dermatologista conta que observava a pele dessa mulher, que
era mais jovem que a média de sua idade; foi quando ela descobriu que a senhora passava óleo de
cozinha, todo dia, na pele. Ela explica que o óleo não é bom, mas é melhor do que nada.
Olga
Olga tem 32 anos, é casada e estudou medicina na Centro Universitário Serra dos Órgãos (faculdade
de medicina de Teresópolis). Fez a pós-graduação
em dermatologia no hospital Mario Kroeff e
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dermatologia infantil no hospital Municipal Menino Jesus, posteriormente estudou medicina estética.
Trabalha em dois centros de estética nos bairros Barra da Tijuca e Recreio dos Bandeirantes, ambos
na zona oeste da cidade do Rio de Janeiro.
a. A decisão de trabalhar com dermatologia (cosmiatria) e o público com quem trabalha.
Olga iniciou seu trabalho com dermatologia há quatro anos e cosmiatria há dois anos. Escolheu essa
especialidade ao trabalhar em um posto de saúde durante a faculdade: “fiquei apaixonada por
dermatologia clínica”. Tudo em tratamento de doenças a atrai, enquanto considera estética um campo
mais “complicado”, já que o “culto” excessivo à beleza é empecilho para atingir o objetivo esperado
pela paciente. Ela relata que resolveu fazer estética ao longo da pós-graduação. Além disso, a
entrevistada afirma que hoje não há como ser dermatologista e não atender estética. Ela afirma que,
se atuasse apenas na área clínica (doenças) estaria “ferrada”, pois não conseguiria retorno financeiro
significativo.
A entrevistada trabalha tanto em lugares onde a principal demanda é o tratamento de doenças
quanto em clínicas de estética. Olga conta que, no primeiro
local, “90% do atendimento é de
dermatologia clínica”, dirigido a uma clientela da classe média baixa. Ela também lembra que essa
classe social tem interesse em se cuidar esteticamente, mas possui “menos oportunidade” financeira,
sendo que, “o máximo que podem pagar é um clareamento ou um rejuvenescimento leve”. No
segundo local, , seu público é formado por uma camada social mais elevada. Na clínica da Barra da
Tijuca realiza tratamentos para emagrecimento e para gordura localizada e na clínica do Recreio dos
Bandeirantes trabalha com procedimentos para rejuvenescimento. Olga reconhece a mesma atitude
nos pacientes desses dois locais: estão sempre em busca do rejuvenescimento e da beleza. Para ela,
a vantagem em trabalhar em clínicas de estética, é o acesso a aparelhos de última geração que são
muito caros para ter-se em um consultório.
Olga comenta que “todo mundo quer fazer dermatologia por causa da estética” e que a maioria dos
dermatologistas recém-formados não atende pacientes com o objetivo de tratar por enfermidade.
Além disso, médicos de especialidades que não são ligadas a estética procuram aprender medicina
estética. Conta, ainda, que apenas 4% dos alunos de sua turma do curso de medicina estética eram
dermatologistas ou cirurgiões plásticos. De acordo com a entrevistada este é um mercado que cresce
continuamente, tanto pela demanda dos pacientes quanto pela oferta de médicos e “fica esse ciclo
vicioso”.
b. Conceito de beleza: como define a beleza e descreve uma mulher bonita.
Em princípio, a dermatologista teve grande dificuldade em definir beleza e diversas vezes comentou
“agora você me pegou, eu não sei te falar”. A seguir, Olga falou sobre beleza a partir de sua visão
como dermatologista: “beleza física..... a primeira coisa que eu olho é a pele, não tem jeito isso, já é
automático”. De acordo com a entrevistada, um médico de outra especialidade terá, provavelmente,
outro olhar sobre a beleza. Para ela, dermatologista, “beleza é uma pele tratada”, “ um cabelo bem
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tratado” e “estar sempre de bem com a vida”. Considera, ainda, que uma pessoa “alto astral, fica com
um ar mais jovial”, o que é importante em uma sociedade onde o “bonito é ser novo”.
c. Como os dermatologistas percebem o valor da beleza na sociedade carioca.
Olga percebe excesso de zelo com a beleza quando suas pacientes deixam de “comprar uma roupa”
ou “sair para jantar” para fazer o tratamento estético. A dermatologista pontua diversos motivos para
esse comportamento: “as vezes, é por causa do marido, por causa das amiga ou porque não está
bem consigo mesma”. No entanto, imagina que o motivo mais forte seja enxergar, em uma foto
antiga, o quanto mudou, envelheceu, a comparação consigo mesmo. Lembra, então, que nunca
escutou uma mulher assumir que sua pele envelhecida é algo natural.
A entrevistada relata que suas paciente preferem tratar uma ruga a tratar de uma doença simples de
pele, como “um pano branco”. Entretanto, se há uma doença mais grave a pessoa “fica mais focada
no problema”. A beleza também prevalece em relação ao valor que a paciente está disposta a pagar
por um produto. Por exemplo, ao prescrever “um esmalte para tratar uma micose, que custa oitenta
reais, a paciente vai reclamar, mas se você passar um creme de oitenta reais para o rosto, ela vai
comprar feliz da vida”.
A dermatologista também comenta que a mídia é grande influenciadora do comportamento dos
pacientes. Se sair uma determinada matéria sobre um tratamento estético no “Fantástico” será motivo
de conversas para a semana inteira. Isso ocorre tanto com novos tratamentos quanto com algum
escândalo que envolva um elemento da indústria de beleza, como um laboratório.
Segundo Olga, as três áreas que as mulheres mais reclamam no corpo são os glúteos, o abdômen e
os seios. A médica comenta que cerca de 80% do tratamento com aplicação de gás carbônico, a
denominada carboxiterapia, são realizados no abdômen e nos glúteos, considerado uma “preferência
nacional”. Já, quanto à a valorização dos seios grandes, ela acredita que é um sinal de mudança na
cultura da sociedade: “antigamente, pelo contrário, as pessoas faziam redução de mama”. No rosto, o
“sonho” de suas paciente é não ter espinhas, manchas, ou rugas. Olga explica que “a acne na
mulher adulta pode ser tratada com rapidez"; a ruga, depende do “grau” em que se encontra e o
melasma, “é o tratamento mais demorado”, já que depende da paciente se proteger do sol, “o que é
mais difícil”.
d. A relação entre médico e paciente.
Olga relata a importância de informar o tratamento e seus possíveis resultados, claramente, para não
“criar uma expectativa muito grande” na paciente. Ela conta que “a maioria de suas pacientes são
tranqüilas e entendem”, cerca de 80% fica satisfeita com o resultado. Contudo, “às vezes, o paciente
é bem envelhecido e acha que vai sair daqui com o rosto lindo e maravilhoso”. A dermatologista
comenta, ainda, que sempre precisa “arrumar uma solução para a cliente, tem que melhorar alguma
coisa” ou ela ficará insatisfeita, “aí é briga, é confusão” e “ela sai reclamando”.
A entrevistada relata que suas pacientes costumam trazer fotos antigas para comparar com sua
aparência atual. Algumas das fotos são para mostrar como o volume dos cabelos diminuiu “Olha
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aqui, quando eu tinha 40 anos. Olha agora, com 60, quase não tenho cabelo.” Então, Olga explica
para elas que não há como voltar à aparência de 10 anos atrás, e que, em mais 10 anos, sua
aparência estará diferente de como é hoje, “a pele muda”, “o cabelo é diferente”. Em outra situação
do cotidiano, ela conta que suas pacientes acreditam que o “Dr. Google vai fazer mais do que você”,
e essas mulheres chegam exigindo um determinado tratamento, no início da consulta. A entrevistada
afirma que, na maioria das vezes, após a explicação, essas pacientes aceitam e seguem o
tratamento recomendado. No entanto, se houver insistência, ou a médica faz o tratamento, deixando
claro que não é o ideal, ou a paciente procura outro dermatologista.
Para se manter atualizada com as novidades, a dermatologista costuma ir a congressos
internacionais. Ela relata que “todo mundo só quer coisa nova” e a médica deve estar informada.
Comenta que, se uma paciente chegar na clínica e não tiver o aparelho mais recente, ela irá procurar
outra clínica de estética.
e. O processo de envelhecimento.
Olga define o envelhecimento como uma conseqüência da vida. Segundo a dermatologista, “quanto
mais a gente envelhece menos colágeno a gente tem” e “as pessoas têm que se acostumar com
isso”. Ela afirma, por sua experiência profissional, que as mulheres têm uma grande dificuldade em
aceitar esse processo, “você não quer chegar aos 50 anos com cara de 50” e conta que, apesar de
existirem maneiras de “retardar esse envelhecimento” com recursos da
dermatologia,
o
envelhecimento é inevitável. Em sua percepção “tudo é voltado para estética”, ao contrário de
“antigamente”, quando “não havia culto à beleza do corpo, como existe em nossa geração”.
Contudo, lembra que, há alguns anos atrás, “todo mundo passava na pele óleo, urucum, coca-cola e
folha de figo, para ficar bronzeado”. Nesse sentido, de prevenção, a entrevistada afirma que essa
nova geração possui mais informação que as anteriores. Por isso, já começa a utilizar o filtro solar
desde jovem, evitando “o efeito acumulativo do sol”. Além disso, Olga ressalta como “trabalho da
Sociedade Brasileira de Dermatologia a ênfase no uso do protetor solar para prevenir câncer de
pele”, o que tem ajudado a conscientizar as pessoas.
f. Mulher de 30, mulher de 50: como são suas pacientes em cada estágio da vida.
Mulher de 30 anos: Olga relata que 30 anos é um “marco na vida de uma mulher”. É a idade que ela
começa a se “assustar” com o processo do envelhecimento. Ela explica que essas pacientes “não
buscam rejuvenescimento de pele”, mas melhorar algo no rosto que as deixem mais bonitas. A
dermatologista acha que são mulheres bem resolvidas com “uma pele muito boa para a idade”.
Mulher de 50 anos: Para a entrevistada, essa paciente “é mais complicada”, pois apresenta “um
monte de queixas” e quer utilizar todos os tratamentos possíveis para rejuvenescer, tais como “botox,
preenchimento, além de outros”. Suas reclamações estão relacionadas, principalmente, à pele e ao
cabelo. A paciente diz que “não tem tanto pelo ”, “o cabelo não está bom”, a “sobrancelha era mais
grossa”, “apareceram novas rugas”, “os olhos não estão bons” e “a papada está caindo”.
g. Os cremes anti-idade: o que os dermatologistas pensam sobre sua funcionalidade.
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Olga considera que os cremes anti-idade são bons, e estão cada vez “mais eficazes, por causa do
avanço tecnológico”. A dermatologista acredita que funcionam bem para o tratamento do
“fotoenvelhecimento da pele”, de “rugas finas” e para “melhorar a textura da pele”. Na maioria das
vezes, Olga assume que esses cosméticos cumprem aquilo que prometem na propaganda. Todavia,
conversa com a paciente que uma “ruga muito profunda só vai melhorar com a intervenção da
cirurgia plástica”. Nesse caso, ela afirma que “nem o próprio laboratório vai prometer que sua pele
ficará sem rugas”.
A dermatologista conta que os “laboratórios grandes” fazem “estudos científicos” com uma boa
“revisão bibliográfica” e apresentam “artigos que realmente mostram a eficácia do tratamento”. Ela
pontua que são “muito corretos e não fazem propaganda enganosa”. A entrevistada fala do exemplo
da Galderma que “garante a redução de 79% das manchas em dois meses com o creme Tri-Luma”, e
diz que, “possivelmente, esse laboratório devolve o dinheiro se a paciente não atingir o resultado”.
Além de ler artigos científicos, a entrevistada costuma “testar a textura do creme” nela mesma. Isso,
porque ela prefere sentir e saber melhor sobre determinado creme, antes de indicá-lo para suas
pacientes.
Segundo a entrevistada, os laboratórios têm mais interesse em investir no avanço dos cosméticos
que na área da “clínica médica”. Ela reflete que “o laboratório, não pensa na integridade física do
paciente, ele está pensando na parte financeira”. Enquanto há sempre novidades envolvendo cremes
anti-idade, não há muitas pesquisas em tratamentos para a “psoríase, que é uma doença autoimune”, por exemplo. No entanto, admite que é muito importante lançar novos produtos, “é sempre
bom”. Ainda declara que, nesse mercado, a novidade é uma necessidade, “o melhor aparelho de
estética é um hoje, e amanhã, vai ser um outro”.
Sendo assim, Olga prefere indicar os laboratórios que investem muito na dermatologia e apresentam,
constantemente, trabalhos científicos. Considera que a Vichy, a La Roche-Posay, a Theraskin e a
Galderma merecem sua confiança.
h. Industrializado X Manipulado: qual preferem e quais são seus prós e contras.
Para Olga, existem dois tipos de farmácias de manipulação: as “farmácias grandes” e as “farmácias
de manipulação de fundo de quintal”. Ela confia no primeiro grupo, pois o resultado é bom, sempre
apresentam “revisão bibliográfica” sobre novos produtos e, “uma vez por mês enviam pela internet ou
por panfleto impresso, artigos científicos e a opinião de outras pessoas sobre uma fórmula”. Além
disso, sempre há um farmacêutico de plantão para tirar dúvidas. Já, o segundo grupo, não passa
credibilidade, “não tem farmacêutico de plantão todos os dias da semana” e os pacientes conseguem
solicitar, “quatro vezes seguidas, um mesmo ácido” com a mesma receita, que deveria ficar presa na
farmácia à primeira solicitação de compra.
A dermatologista relata que um produto manipulado “não é muito estável”, o tempo de “duração é
mais curto ”, e, “as vezes, precisa ser mantido em geladeira” para não perder suas propriedades.
Assim, a médica prefere indicar o cosmético industrializado, que é “mais prático e mais seguro”, por
causa da estabilidade. Contudo, solicita a sua paciente para manipular a fórmula em algumas
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situações específicas: 1. quando o paciente não tem dinheiro para comprar o creme industrializado,
que é mais caro. “Por exemplo, um Tri-Luma custa cento e quatro reais,
e a mesma fórmula
manipulada custa trinta reais”. 2. quando reconhece que “a paciente vai seguir a orientação de deixar
na geladeira”. 3. quando o “produto não tem como ser industrializado, pela concentração das
substâncias de uma composição”, como a “uréia com óleo de amêndoa”. Olga comenta que, ao
decidir entre um creme industrializado ou de manipulação, também considera a opinião do paciente,
pois alguns têm preconceito com o laboratório e outros com a farmácia de manipulação, por achar
que o médico “ganha um dinheiro por fora”, segundo refere.
i. As Marcas: o que pensam das marcas apresentadas – Avon (Renew), Dermage, Innéov, La
Roche-Posay, Lancôme, Natura (Chronos) e Vichy.
Avon (Renew): Olga diz que não prescreve o produto, por falta de informações da fórmula, “se o
paciente tiver reação àquele uso você não sabe nem qual produto foi”. Não acredita, também, que o
creme tenha bons resultados, mesmo porque é um
cosmético para vários tipos de pele e a
entrevistada prefere “fazer um tratamento mais individualizado”: “vou avaliar o tipo de pele, a idade
que ela tem, o grau da mancha, o grau do foto-envelhecimento”, relata a médica
Dermage: A entrevistada gosta de todos os produtos da marca. Conta que recebe visitas e artigos
científicos pela internet sobre os novos produtos. Ela tem acesso às formulas da linha industrializada
e também tem contato com a farmacêutica que, muitas vezes a ajuda ao formular um produto
manipulado.
Innéov: Considera que ainda é uma marca muito questionada, pois “ninguém tem certeza se funciona
bem”. Segundo Olga, é como fazer uso de colágeno, “nem todo mundo acha que isso funciona” e por
isso há uma discussão grande entre os dermatologistas. A médica relata que os fabricantes não
apresentaram trabalhos científicos sobre o produto.
La Roche-Posay: A dermatologista afirma que “só tem produto bom”, mas seu custo é alto. Valoriza
sua presença em congressos, onde mostram novos artigos científicos e podem tirar dúvidas. Olga
define o público que utiliza a marca como “classe média alta”.
Lancôme: Olga conta que os produtos dessa marca são muito caros e por isso o público com quem
trabalha não tem condições de utilizá-los. No entanto, acredita que os produtos funcionam bem, pois
sua mãe e tia os usam e a dermatologista percebe resultado positivo. Assume que o laboratório “não
é próximo” aos dermatologistas, mas que um laboratório grande, com um nome forte, com este, faz
com que se confie no produto.
Natura (Chronos): Para Olga, o Chronos da Natura é “a mesma coisa que o Renew da Avon”. Ela não
tem acesso à
fórmula e a marca trabalha com um só tipo de
creme para todas as mulheres.
Ressalta que, se prescrever essa marca, as pacientes da Barra e do Recreio irão falar “nunca mais
volto naquela dermatologista!”. Ao contrário, na zona leste ninguém saberá quem é Vichy ou La
Roche-Posay, “não têm muito essa cultura”.
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Vichy: A entrevistada afirma que as melhores marcas de cremes anti-idade são Vichy e La RochePosay. Gosta da marca por lançar produtos novos e por estar presente nos congressos.
j. O não consumo de cosmético anti-idade.
Olga não se lembra de um paciente que tenha preferido não utilizar cosméticos anti-idade. Descreve
seus pacientes que não têm queixas relacionadas a estética como “homem mais velho” ou “mulher
com setenta anos” que são bem resolvidos com a própria idade.
Nádia
Nádia tem 32 anos, é casada, graduou-se pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro
(UNIRIO) em 2002. Pós-graduação em Dermatologia no Instituto Prof. Dr. Rubem David Azulay,
Santa Casa da Misericórdia do Rio de Janeiro, obtendo o título de especialista em 2005. Trabalha em
Dermatologia desde 2003, quando entrou na pós-graduação, e em Cosmiatria a partir de 2004 em
consultório localizado no bairro de Botafogo, Rio de Janeiro. Atua como docente no Instituto Azulay.
a. A decisão de trabalhar em Dermatologia (Cosmiatria) e o público com quem trabalha.
No princípio, Nádia pensou em trabalhar em Terapia Intensiva ou Cirurgia Geral, com especialização
em Cirurgia Plástica, pois gostava de realizar “procedimentos”, “pequenas cirurgias”. Segundo a
entrevistada, essas especialidades exigem que o médico trabalhe em regime de plantão, o que é
mais “pesado”. Logo, na época em que estava escolhendo sua especialização seu marido, que
cursava Residência Médica em Cirurgia Geral sugeriu que Nádia trabalhasse numa especialidade
que a permitisse ficar mais tempo em casa, pois teriam “dificuldades com as (futuras) crianças” se os
dois dessem plantão, idéia que ela não aceitava muito bem no início. No entanto, inscreveu-se à
seleção para a Pós-Graduação em Dermatologia, que era uma opção dentre as especialidades que
não precisaria “dar tanto plantão”, e foi aceita. Assim, resolveu cursar essa especialidade “só para ver
como era” e “apaixonou-se” por Dermatologia, “tanto a parte de doença quanto a parte de beleza”.
Ela comenta que, mesmo não trabalhando em regime de plantão, sua rotina é longa, de 8 às 21h.
Apesar do horário de trabalho ser mais intenso do que esperava, ela consegue estar com seus filhos
todas as noites.
A entrevistada afirma que prefere trabalhar em Cosmiatria, sub-área da Dermatologia em que se
especializou, do que com a área da clínica. Ela avalia que é cansativo conversar sobre problemas
referentes a doenças durante todo o dia, pois isso desgasta muito. O mesmo não ocorre quando as
pacientes a procuram por questões de estética, pois não há uma grande preocupação de saúde,
como há com os pacientes com doenças. Ela considera sua especialização “a parte boa da medicina”
e comenta que algumas pacientes tornaram-se “grandes amigas”. A dermatologista também
menciona que gosta de perceber que fez um bom trabalho e, algumas vezes, fica mais feliz do que o
próprio paciente, com o resultado final. Ela gosta de constatar que a paciente está mais “feliz, mais
bonita”.
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Em seu consultório particular, em Botafogo, 80% dos pacientes a procuram por questões de estética
e 20% vão ao consultório apresentando alguma doença. Ela acredita que esta proporção se deva à
especialização em Cosmiatria. A médica percebe um comportamento diferente entre homens e
mulheres quando o assunto é estética. As mulheres, a grande maioria, dizem abertamente que
precisam tratar de algo estético, como uma ruga. Já os homens, em geral, primeiro mencionam que
estão envelhecendo e, só após se sentirem seguros revelam que querem um tratamento estético.
Entretanto, ela lembra que os homens metrossexuais são diretos no assunto e mais vaidosos do que
as mulheres.
b. Conceito de beleza: como define a beleza e descreve uma mulher bonita.
Nádia reflete que existem diferentes padrões de beleza ditados “pelo mercado, com a moda e com o
comércio” em “qualquer lugar do mundo”. Contudo, ela afirma que não adianta estar dentro dos
padrões estipulados e não gostar de sua imagem. A dermatologista explica que, para transparecer a
beleza, é importante gostar de sua imagem no espelho, “uma mulher bonita é feliz com o que ela vê”.
Ao descrever a mulher bonita, a entrevistada utiliza conceito que vem de sua experiência com as
mulheres que atende em seu consultório. Ela conta que há pacientes fora do padrão considerado
para a época, mas que se sentem bem e bonitas, enquanto outras não conseguem se olhar no
espelho, o que considera muito ruim. Ela comenta que, proporcionar beleza às pacientes que têm
pele saudável, ajuda a aumentar sua auto-estima. Em seu trabalho ela “tenta, harmonizar o corpo e o
rosto da pessoa e busca a proporcionalidade do corpo”
c. Como os dermatologistas percebem o valor da beleza na sociedade carioca.
Nádia lembra que são poucas as pacientes “que percebem sua imagem destorcida”. Ela conta que
essas mulheres “tem uma auto-estima muito baixa” e independente do que se faça, sempre irão
querer mais. A dermatologista comenta que, em geral, suas pacientes ficam satisfeitas quando
percebem alguma melhora, “são coisas discretas, é bem saudável no meu ponto de vista". No
decorrer do tratamento, “elas percebem que estão mais rejuvenescidas, menos cansadas, com a pele
mais clara, mais bonita. Elas conseguem reconhecer isso, e, então, ficam mais felizes”. A
entrevistada ainda relata como é importante que as mulheres “tenham um tempo para elas mesmas”,
ir ao consultório do dermatologia, à ginástica, à nutricionista ou ao cabeleireiro. Segundo Nádia, “elas
sentem que estão se cuidando” e sentem-se bem por isso. Dentre as mulheres, Nádia percebe que
há maior satisfação com o tratamento quando uma amiga ou conhecida observa que estão diferentes,
mais bonitas.
A dermatologista nota um comportamento interessante entre os homens metrossexuais que
frequentam seu consultório. Ela conta que alguns deles são extremamente vaidosos. Ela revela que
eles querem “os tratamentos mais novos e de última tecnologia que leram na revista ou viram na
novela”. A entrevistada afirma que as mulheres também chegam às consultas com informações sobre
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algo que leram na mídia e descrevem o tratamento “de forma leiga”. Ela desabafa que os meios de
comunicação são “maçantes” quando o assunto é dermatologia estética.
Em seu consultório, suas pacientes costumam “reclamar do bumbum e da barriga”. A entrevistada
afirma que essas queixas têm relação com a gordura localizada, ou seja, celulite e flacidez que
tendem a aparecer mais no abdome e no quadril. Em relação ao rosto, a reclamação mais comum,
nos consultórios de dermatologia, é a acne. Contudo, o público-alvo, que trabalha, vai à
dermatologista para “embelezar a pele”. Assim, as reclamações recorrentes, em seu consultório são
as rugas e a flacidez causadas pelo “foto envelhecimento”. As pacientes relatam “que estão com a
pele ressecada, manchada e com rugas” e, de acordo com Nádia, “existem rugas de várias formas,
flacidez de papada, manchas pelo corpo e manchas, também na face, que pioram com o ciclo
hormonal”.
d. A relação entre médico e paciente.
Nádia relata que, às vezes, fica mais feliz do que suas pacientes, com os resultados, “eu fico
eufórica”, segundo suas palavras. Ela declara que faz uma “crítica (técnica) muito forte” ao seu
trabalho e assume que é prazeroso atingir o objetivo que propôs para a paciente. Posteriormente, o
reconhecimento mais importante é o da própria paciente. A dermatologista não consegue finalizar um
tratamento “enquanto o paciente não está satisfeito”, isso, quando é se trata de um paciente que não
tem a visão de si mesmo distorcida.
A entrevistada alega que, além da “satisfação pessoal”, um trabalho bem feito favorece “a parte
comercial”. Segundo Nádia “um paciente satisfeito traz vários outros
pacientes, um paciente
insatisfeito não traz ninguém”. Assim, afirma que a procura por sua consulta deve-se, primeiro lugar,
à busca espontânea pelo “boca-a-boca” e, em segundo lugar, por alguma divulgação da mídia sobre
novos tratamentos. Ela comenta que, após explicar como é realizado aquele procedimento, conversa
com o paciente se há indicação para ele ou não.
e. O processo de envelhecimento.
Nádia pondera que o envelhecimento é parte da vida e todos envelhecem. Ela reflete que “a marca
do envelhecimento”, em termos de estética é a perda da atração
que
o indivíduo “pode
proporcionar”, “tanto para os outros, como para si mesmo”. Ela acredita que perder a “satisfação de
se ver” implica em baixar a auto-estima, o que pode ser contornado quando a pessoa “cuida de si
mesma com gestos simples no dia-a-dia até ser submetido a uma cirurgia”. “Se a tecnologia existe
para deixar alguém bem, em qualquer momento esteticamente bonita, tanto para os outros, como
para você mesma, não tem porque não utilizá-la!”. Nádia considera que seus pacientes não devem
ter vergonha de envelhecer e devem ter, sim, prazer. No entanto, ela deixa claro que o não
envelhecimento não pode tornar-se uma “obsessão”, isso ela considera ruim.
f. Mulher de 30, mulher de 50: como são suas pacientes em cada estágio da vida.
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Mulheres de 30 anos: A maioria das pacientes de Nádia fazem parte desse grupo. Ela comenta que
“são mulheres esclarecidas e a grande maioria, independente”. Essas mulheres “possuem sucesso
profissional e procuram se sentir melhor, cuidar um pouco mais delas mesmas”. A entrevistada
lembra que estas pacientes despendem muito tempo para serem “mulheres bem sucedidas e querem
um pouquinho do tempo para cuidar delas também”. “Então, quando elas percebes isso ela querem
equilibrar os dois lados”. Nádia conta que, em geral, são pessoas que se preocupam com sua
alimentação e com sua saúde.
Mulheres de 50 anos: Nádia afirma que essas pacientes gostariam de ter tido “as oportunidades que
as mulheres de 30 anos têm hoje”, como: informações sobre como “cuidar da pele, o que evitar, como
se alimentar”. Ela esclarece que essas mulheres também “tinham menos independência financeira e
menos autonomia”. Assim, elas buscam o que já perderam, “educação e instrução, tanto sobre a
doença como quanto sobre a beleza, como o uso do filtro solar para retardar o envelhecimento”.
g. Os cremes anti-idade: o que pensam sobre sua funcionalidade.
Segundo Nádia, existem os remédios, os cosmético e os dermocosméticos anti-idade que são uma
mistura dos remédios com os cosméticos. Entretanto, a dermatologista revela que, quando se fala na
“grande revolução” da estética, os remédios são os protagonistas. Apenas os remédios conseguem
regenerar a pele, enquanto os dermocosméticos “funcionam como mantenedores daquilo foi
transformado pelo remédio”. Assim, ela lembra que a prescrição é a combinação dos dois. A médica
explica que, quando atinge seu objetivo quanto ao tratamento, e uma pele bem saudável, passa a
mantê-la hidratada e sem manchas com os dermocosméticos e cosméticos. Para ela, os
dermocosméticos anti-idade são capazes de resolver apenas rugas leves, ressecamento e a
uniformidade da pele. Já os remédios conseguem, “depois de muito tempo”, uma pele fique mais
firme.
Desse modo, a dermatologista considera que os cremes anti-idade “prometem muito e
cumprem muito pouco” do que propõe.
A entrevistada declara que sua experiência no consultório com seus pacientes é fundamental para
conhecer e confiar em uma marca de tratamento anti-idade. Além disso, é necessária a apresentação
de trabalhos científicos que Nádia possa ler e criticar, o que é importante para passar a prescrever
um creme novo. Assim, ela comenta que uma marca séria, cujos representantes que lhe apresentem
estudos sobre o cosmético, é “um bom começo”. Existem algumas marcas que ela prefere utilizar,
como a Melora e a Avène.
h. Industrializado X Manipulado: qual preferem e quais são seus prós e contras.
Há duas razões principais para a dermatologista manipular um produto. Primeiro, se não há um
determinado creme pronto no mercado e, segundo, se o paciente não tem condições financeiras para
pagar pelo industrializado, o que é comum no hospital público que trabalha. Para ela, a cosmética do
creme, o cheiro, o prazo de validade e a apresentação da embalagem são “algumas coisas fazem
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pensar em comprar o produto pronto”. A facilidade da compra e a manutenção fora da geladeira
também são fatores que favorecem o consumo do cosmético industrializado.
Os motivos expostos pelas pacientes para justificar a preferência pelos produtos industrializados são:
“ter que esperar o remédio ficar pronto” e a “dúvida em relação a qualidade do produto manipulado”.
Nádia acredita que, na indústria, a fiscalização seja mais forte, enquanto, dentre as farmácias de
manipulação existem as que “apresentam para você essa fiscalização, essa garantia do produto” e
outras que não. Assim, pacientes que já utilizaram os serviços das farmácias de manipulação e
tiveram algum problema, não confiam na qualidade do que é manipulado.
i. As Marcas: o que pensam das marcas apresentadas – Avon (Renew), Dermage, Innéov, La
Roche-Posay, Lancôme, Natura (Chronos) e Vichy.
Avon (Renew): Nádia afirma que é cosmético e, portanto, não cumpre o que anuncia. Por isso, nunca
prescreve este pruto e não incentiva seus pacientes a comprarem-no. Ela fala refere que a marca é
focada em um público leigo, “que não tem respaldo médico”. Desse modo, ela pede para que as
pacientes não usem este creme, mesmo que já o tenham comprado. Contudo, se a pele da mulher
está ótima ela permite usá-lo, pois “mal não vai fazer”. A médica relata que suas pacientes reagem
com “um pouco de surpresa”, porque achavam que o produto era bom.
Dermage: Ela confia muito na Dermage e enfatiza que “trabalha diretamente com o médico”. De
acordo com a entrevistada, se há “algum problema na prescrição, eles dão respaldo”. Eles também
visitam os dermatologistas, apresentando estudos realizados sobre seus produtos, e, estão sempre
atualizados.
Innéov: Nádia explica que o Innéov é um complemento nutricional, um “antioxidante”. “Então, se você
já tem uma boa alimentação, regrada e equilibrada você não precisa fazer uso deste complexo, é
como se fosse um reforço nutricional”. Entretanto, ela prescreve o produto, quando sua paciente “tem
um dia-a-dia complicado” e precisa complementar a alimentação. Mesmo assim, considera “o impacto
muito baixo”.
La Roche-Posay: A dermatologista lembra que “nos últimos tempos” essa marca têm feito “muita
divulgação direta para o público” e reclama que isso atrapalha a prescrição médica. Ela afirma que
80% das causas da acne na mulher adulta é pelo uso errado do creme desta marca. A médica
declara que, para proporcionar algumas mudanças, prescreve os dermocosméticos, e, para isso é
importante que o paciente seja “avaliado por um médico que conheça sua pele”. Assim, ela comenta
que, apesar das vendas serem boas, as indicações por pessoas leigas são erradas, o que é ruim
para a marca, porque, ao final, haverá um cliente insatisfeito. Desse modo, Nádia declara que não
percebe muita credibilidade na marca, por sua estratégia de marketing.
Lancôme: A dermatologista diz que a marca é “fantástica”, quando o produto é usado como
cosmético puro: para maquiagem, filtro solar e hidratante. Já o creme “anti-idade é fraco”, “não tem
como um hidratante ter um efeito anti-idade, retardar o envelhecimento”. Ela revela que as pacientes
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que compram produtos Lancôme e as que compram produtos Avon têm a mesma falta de instrução,
com níveis sociais são diferentes. Segundo Nádia, é trata-se de uma compra espontânea, em que “a
cliente entra na loja de cosméticos e escolhe o que vai comprar, orientada por uma vendedora”.
Natura: A entrevistada reforça que a Natura é como a Avon, mas com focos diferentes. Ela afirma que
as duas marcas são concorrentes, “então tem o mesmo preço e atingem a mesma camada social”.
Vichy: A dermatologista narra que a Vichy percorreu o caminho inverso da marca La Roche-Posay.
Primeiramente, a marca trabalhava com “venda direta para o público em geral” e, agora, “está
fazendo visitação médica”. Ela conta que passou a prescrever produtos Vichy após ter sido visitada
por um representante. Nádia costuma prescrever produtos Vichy, assim como os cosméticos da La
Roche-Posay, pois acredita na qualidade dos dermocosméticos da L’Oréal. No entanto, ela não
acredita na funcionalidade do creme anti-idade e afirma que os estudos científicos “demonstram uma
melhora subjetiva e, quando é objetiva não é invasiva”. Além disso “não há muitos estudos
histopatológicos”. Assim, são cremes que “melhoram alguma coisa”, mas sua proposta não é
cumprida e há “exagero no marketing”.
j. O não consumo de cosmético anti-idade.
Nádia comenta que atende poucas pacientes que preferem não utilizar produtos anti-idade. De todo
modo, ela percebe que essas mulheres, em sua maioria, são adeptas do “envelhecimento natural” e
acreditam que não se deve “intervir na forma como o seu corpo deve envelhecer”.
A dermatologista narra que elas “fazem isso por uma opção e consideram que suas rugas são
marcas de alguma coisa que passaram na vida” e estão “satisfeitas com sua imagem”.
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