GASTOS MINIMOS COM SAUDE. INSTRUCAO

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Conselho de Secretarias Municipais de Saúde do Estado de Goiás
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PARECER Nº 001/2015 COSEMS GO
EMENTA:
TRATAMENTO
FORA
DE
DOMICÍLIO (TFD). Instrução Normativa nº
03/2014 TCM/GO e a Lei Complementar nº 141,
de 2012. As despesas realizadas nas ações e
serviços de saúde para o TFD são consideradas
na apuração dos recursos mínimos aplicados em
saúde pelos Municípios e Estado.
Trata-se o expediente de consulta formulada pelas Secretarias Municipais de Saúde do
Estado de Goiás, encaminhada à Assessoria Jurídica do COSEMS/GO, com o objetivo de
esclarecer o conteúdo previsto no o Art. 3º da Instrução Normativa nº03/2014 do Tribunal de
Contas dos Municípios do Estado de Goiás e o possível conflito com instrumentos normativos
primários e secundários que regulam o Sistema Único de Saúde (SUS).
É o relatório.
I – CONSIDERAÇÕES INICIAIS
A Constituição da República Federativa do Brasil garante aos cidadãos brasileiros o
acesso universal e integral aos cuidados de saúde. O direito à saúde é previsto no Art. 196 da
Constituição da República, sendo de relevância pública as ações e serviços de saúde. Vejamos:
Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido
mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco
de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às
ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. (Grifo
nosso).
O mandamento constitucional assegura a todos o direito à saúde, bem como, o acesso
universal, igualitário e integral das ações e serviços públicos de saúde para a promoção,
prevenção e recuperação da saúde.
Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede
regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado
de acordo com as seguintes diretrizes:
I - descentralização, com direção única em cada esfera de governo;
II - atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas,
sem prejuízo dos serviços assistenciais;
A Lei Orgânica do Sistema Único de Saúde (Lei Federal nº8.080 de 1990) na esteira do
conceito alargado de saúde prevê que:
Art. 2º A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o
Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício.
§ 1º O dever do Estado de garantir a saúde consiste na formulação e
execução de políticas econômicas e sociais que visem à redução de riscos
de doenças e de outros agravos e no estabelecimento de condições que
assegurem acesso universal e igualitário às ações e aos serviços para a
sua promoção, proteção e recuperação.
§ 2º O dever do Estado não exclui o das pessoas, da família, das empresas
e da sociedade.
Art. 3o Os níveis de saúde expressam a organização social e econômica
do País, tendo a saúde como determinantes e condicionantes, entre outros,
a alimentação, a moradia, o saneamento básico, o meio ambiente, o
trabalho, a renda, a educação, a atividade física, o transporte, o lazer e o
acesso aos bens e serviços essenciais. (Redação dada pela Lei nº 12.864,
de 2013)
Parágrafo único. Dizem respeito também à saúde as ações que, por força
do disposto no artigo anterior, se destinam a garantir às pessoas e à
coletividade condições de bem-estar físico, mental e social.
Assim, com foco na integralidade do atendimento, na proteção e recuperação da saúde,
a Portaria SAS/Ministério de Saúde nº 055 de 24/02/1999 (D.O.U. de 26/02/1999, em vigor
desde 01/03/1999) trata dos benefícios de Tratamento Fora do Domicilio (TFD) no âmbito do
Sistema Único de Saúde (SUS).
II – DO TRATAMENTO FORA DO DOMICÍLIO – Portaria SAS/MS n 055 de
1999.
A Portaria do Ministério da Saúde estabeleceu uma nova sistemática para a inclusão
destes procedimentos específicos na tabela do Sistema de Informações Ambulatoriais (SIASUS).
O benefício de TFD consiste no fornecimento de passagens para atendimento médico
especializado de diagnose, terapia ou cirúrgico em alta complexidade, a ser prestado à pacientes
2
atendidos exclusivamente pelo SUS, em outros Estados, além de ajuda de custo para alimentação
e pernoite de paciente e acompanhante, se necessário.
Tal benesse é concedida ao paciente do SUS apenas quando todos os meios de
tratamento existentes no Município de origem estiverem esgotados ou inexistir capacidade
instalada para o tratamento em seu Município ou no Estado.
É preciso enfatizar que todo Município deverá disponibilizar meios, continuados e
ininterruptos, de acesso do paciente ao tratamento fora dos limites do seu Município de
residência.
A compreensão acima vai ao encontro do que dispõe a Constituição Federal no que
concerne o direito à saúde, bem como nos dizeres da Lei nº 8.080 de 1990 e do Decreto nº 7.508
de 2011, o qual regulamenta a Lei Orgânica do SUS para dispor sobre o Sistema Único de
Saúde, planejamento da saúde, assistência à saúde e a articulação interfederativa.
Nos termos do artigo 8º do Decreto nº 7.508 de 2011, o acesso universal, igualitário e
ordenado às ações e serviços de saúde se inicia pelas portas de entrada do SUS e se completa na
rede regionalizada e hierarquizada, de acordo com a complexidade do serviço. Tem-se aí a
integralidade na assistência em todos os níveis de complexidade.
III – DA INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº03/2014 DO TRIBUNAL DE CONTAS
DOS MUNICÍPIOS
Preliminarmente, tem-se que os regulamentos e as instruções normativas editadas por
outras autoridades administrativas, servem apenas para a fiel execução de um ato normativo e
não podem impor e nem restringir direitos, não podem gerar direitos ou obrigações novas.
Com este enfoque, passemos para a análise da Instrução Normativa nº03/2014 publicada
pelo Tribunal de Contas dos Municípios do Estado de Goiás e que orienta os jurisdicionados
acerca das despesas que asseguram os recursos mínimos dos Municípios para o financiamento
das ações e serviços públicos na área da saúde:
Preceitua o Art. 3º da IN nº 03/2014 do TCM GO:
Art. 3º. Demais despesas, não descritas no artigo 1º desta Instrução,
ou em desconformidade à Lei Complementar nº. 141/2012, serão
desconsideradas para fins de aplicação do percentual mínimo das
receitas destinadas à saúde municipal, em especial quanto às
despesas alocadas ao transporte intermunicipal de pacientes, bem
como à prestação de manutenção de estrutura ou pagamento de serviços
3
de naturezas contábil e/ou jurídica, mesmo que vinculados
exclusivamente à área da gestão da saúde municipal. (Grifo nosso).
A interpretação desta prescrição do Art. 3º da Instrução Normativa nº 003/2014 do
TCM no Estado de Goiás, desconsidera as ações e serviços com o Tratamento Fora de Domicílio
(TFD) como gastos mínimos saúde, segundo os percentuais mínimos previstos na Lei
Complementar nº 141, de 2012.
O Fundo Municipal de Saúde ou Estadual de Saúde continuará com a responsabilidade
de assistir integralmente o usuário do Sistema Único de Saúde, todavia, segundo a Instrução
Normativa em análise, tal despesa não será contabilizada para efeito de apuração da aplicação
dos recursos mínimos com ações e serviços públicos de saúde, confrontando, nitidamente, com a
proteção conferida pela Lei Complementar nº 141/2012.
IV – DAS AÇÕES E SERVIÇOS DE SAÚDE
Segundo a doutora em saúde pública e especialista em direito sanitário Lenir Santos, em
sua obra: SUS e a Lei Complementar 141 Comentada, a Constituição da República impõe no Art.
196 uma obrigação do Estado manter na forma dos Art. 198 e 200 e na Lei Orgânica do SUS
8.080/90, ações e serviços públicos de saúde que possam promover a saúde e prevenir, de modo
mais direto, mediante uma rede de serviços regionalizados e hierarquizados, os riscos de
adoecer (assistência preventiva) e recuperar o indivíduo das doenças que o acometem
(assistência curativa).1
Para tratar das ações e serviços de saúde, é apropriado compreender o conceito atual de
saúde, elevado à categoria de direito subjetivo público, e que traz à luz deste novo conceito de
saúde os determinantes e condicionantes (alimentação, moradia, saneamento, meio ambiente,
renda, trabalho, educação, transporte etc.), impondo aos órgãos que compõem o Sistema Único
de Saúde o dever de identificar esses fatos sociais e ambientais, para que o Governo, como um
todo, formule políticas públicas condizentes com a melhoria nas condições de vida da
população.2
A Lei nº 8.080 de 1990, que dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e
recuperação da saúde, bem como a organização e funcionamento dos serviços correspondentes,
regulamenta as ações e serviços de saúde, executados isolada ou conjuntamente, em caráter
1
2
SANTOS, LENIR. SUS e a Lei Complementar 141 comentada. Saberes Editora, Campinas-SP, p. 61.
SANTOS, LENIR. SUS e a Lei Complementar 141 comentada. Saberes Editora, Campinas-SP, p. 59.
4
permanente ou eventual, por pessoas naturais ou jurídicas de direito Público ou privado e impõe
ao Estado o dever de prover as condições indispensáveis ao pleno exercício do direito
fundamental à saúde. É o que diz o Art. 2º desta Lei, vejamos:
Art. 2º A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o
Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício.
§ 1º O dever do Estado de garantir a saúde consiste na formulação e
execução de políticas econômicas e sociais que visem à redução de riscos
de doenças e de outros agravos e no estabelecimento de condições que
assegurem acesso universal e igualitário às ações e aos serviços para a
sua promoção, proteção e recuperação.
Nessa perspectiva, a Lei Orgânica do SUS estabelece que as ações e serviços públicos
de saúde e os serviços privados contratados ou conveniados que integram o SUS, atenderão,
dentre outros princípios, a universalidade de acesso em todos os níveis de assistência e a
integralidade da assistência.
Art. 7º As ações e serviços públicos de saúde e os serviços privados
contratados ou conveniados que integram o Sistema Único de Saúde
(SUS), são desenvolvidos de acordo com as diretrizes previstas no art.
198 da Constituição Federal, obedecendo ainda aos seguintes princípios:
I - universalidade de acesso aos serviços de saúde em todos os níveis
de assistência;
II - integralidade de assistência, entendida como conjunto articulado
e contínuo das ações e serviços preventivos e curativos, individuais e
coletivos, exigidos para cada caso em todos os níveis de complexidade
do sistema;
Em janeiro de 2012, a Lei Complementar nº 141 foi publicada com a finalidade de
cumprir a prescrição constitucional do Art. 198, §3º, com redação dada pela Emenda
Constitucional nº 29 de 2000 (EC 29), para dispor sobre os valores mínimos a serem aplicados
anualmente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios em ações e serviços públicos de
saúde; estabelece os critérios de rateio dos recursos de transferências para a saúde e as normas de
fiscalização, avaliação e controle das despesas com saúde nas três esferas de governo.
E dentro do escopo traçado pela Lei Complementar nº 141, caberá ao Poder Público
definir as ações e serviços de saúde capazes de garantir a integralidade da assistência à saúde,
compatibilizando essas ações e serviços com as necessidades de saúde da população e seu
financiamento obrigatório previsto na própria Lei Complementar 141.
5
É nesse pensar que se incluem no rol de ações e serviços públicos de saúde, os recursos
despendidos com o Tratamento Fora de Domicílio, conforme previsão dos incisos II e XI do Art.
3º da Lei Complementar nº 141:
Art. 3o Observadas as disposições do art. 200 da Constituição
Federal, do art. 6º da Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, e do art.
2o desta Lei Complementar, para efeito da apuração da aplicação dos
recursos mínimos aqui estabelecidos, serão consideradas despesas com
ações e serviços públicos de saúde as referentes a:
II - atenção integral e universal à saúde em todos os níveis de
complexidade, incluindo assistência terapêutica e recuperação de
deficiências nutricionais;
XI - ações de apoio administrativo realizadas pelas instituições
públicas do SUS e imprescindíveis à execução das ações e serviços
públicos de saúde;
É inerente à eficácia do tratamento e a recuperação da saúde, o transporte do paciente
para assegurar a continuidade nas ações e serviços, com foco na atenção integral à saúde e na
assistência terapêutica em todos os níveis de complexidade, ainda que fora do Município porta
de entrada.
A Lei Complementar nº 141, torna óbvio que é considerado a atividade de saúde a
integralidade da assistência à saúde, ou seja, a atenção integral e universal, o que denota total
compatibilidade com o conceito traçado no Art. 7º, II da Lei nº 8.080/903.
Assim, com intuito de assegurar a integralidade da assistência à saúde, o transporte para
o tratamento fora de domicílio configura ação de apoio administrativo realizado pelas
instituições públicas que constituem o SUS, sendo imprescindível para a execução das ações e
serviços públicos que garantam o direito à saúde do paciente.
Assegura Lenir Santos4 que:
As ações de apoio administrativo são consideradas como ações e serviços
de saúde pondo fim a intensa polêmica a respeito de atividades-meio e
atividades-fim. Sempre entendemos absurdo separar as atividades de
suporte às atividades-fim, uma vez que a última não sobrevive sem a
primeira. Quem tem os fins a cumprir deve ter os meios.
3
4
SANTOS, LENIR. SUS e a Lei Complementar 141 comentada. Saberes Editora, Campinas-SP, p. 67.
SANTOS, LENIR. SUS e a Lei Complementar 141 comentada. Saberes Editora, Campinas-SP, p. 66-67.
6
V – DO MANUAL DE PROCEDIMENTOS E NORMAS DO TRATAMENTO
FORA DE DOMICÍLIO DA SECRETARIA DE ESTADO DA SAÚDE DE GOIÁS
Em ciência aos princípios nucleares do direito fundamental e social à saúde, o
Ministério da Saúde, da Secretaria de Assistência à Saúde editou a Portaria MS/SAS nº 055 de
24 de fevereiro de 1999, que dispõe sobre a rotina do Tratamento Fora de Domicílio no Sistema
Único de Saúde – SUS.
Esta Portaria estabelece em seu Art. 5º, abaixo transcrito, que caberá as Secretarias de
Estado da Saúde propor para as respectivas Comissões Intergestores Bipartite – CIB, a estratégia
de gestão para definir as responsabilidades da Secretaria de Estado da Saúde e Secretarias
Municipais de Saúde para a autorização do TFD, bem como estratégias de utilização com o
estabelecimento de critérios, rotinas, fluxos em consonância com as características territoriais,
condições socioeconômicas e capacidade técnico-financeira de cada ente além de claro, definir
os recursos financeiros destinados ao TFD.
Art. 5º - Caberá as Secretarias de Estado da Saúde/SES propor às
respectivas Comissões Intergestores Bipartite – CIB a estratégia de gestão
entendida como: definição de responsabilidades da SES e das SMS para a
autorização do TFD; estratégia de utilização com o estabelecimento de
critérios, rotinas e fluxos, de acordo com a realidade de cada região e
definição dos recursos financeiros destinados ao TFD.
Cabe prever, aqui, que a Comissão Intergestores Bipartite é reconhecida pela Lei
Federal nº 8.080/90 como sendo a instância colegiada de articulação, negociação e pactuação
entre gestores de saúde dos entes federativos, para a operacionalização das políticas públicas de
saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde – SUS.
Art. 14-A. As Comissões Intergestores Bipartite e Tripartite são
reconhecidas como foros de negociação e pactuação entre gestores,
quanto aos aspectos operacionais do Sistema Único de Saúde
(SUS).(Incluído pela Lei nº 12.466, de 2011).
Parágrafo único. A atuação das Comissões Intergestores Bipartite e
Tripartite terá por objetivo: (Incluído pela Lei nº 12.466, de 2011).
I - decidir sobre os aspectos operacionais, financeiros e administrativos
da gestão compartilhada do SUS, em conformidade com a definição da
política consubstanciada em planos de saúde, aprovados pelos conselhos
de saúde; (Incluído pela Lei nº 12.466, de 2011).
II - definir diretrizes, de âmbito nacional, regional e intermunicipal, a
respeito da organização das redes de ações e serviços de saúde,
principalmente no tocante à sua governança institucional e à integração
das ações e serviços dos entes federados; (Incluído pela Lei nº 12.466, de
2011).
III - fixar diretrizes sobre as regiões de saúde, distrito sanitário,
integração de territórios, referência e contrarreferência e demais aspectos
7
vinculados à integração das ações e serviços de saúde entre os entes
federados. (Incluído pela Lei nº 12.466, de 2011).
Assim, para implementar o serviço do Tratamento Fora Domicílio, no Estado de Goiás,
foi instituído uma Comissão Estadual através da Portaria GAB/SES n.º 041/2007 a qual
desenvolveu o Manual de Normas e Procedimento para o Tratamento Fora de Domicilio.
VI - CONCLUSÃO
Pelo exposto, verifica-se que a matéria acerca do Tratamento Fora de Domicílio
apresenta respaldo no ordenamento jurídico pátrio que trata do Sistema Único de Saúde, estando
tipificada no Art. 3º da Lei Complementar nº 141 de 2012 no rol de ações e serviços públicos de
saúde, para efeito da apuração da aplicação dos recursos mínimos em saúde.
É o parecer, salvo melhor juízo.
Goiânia, 10 de abril de 2015.
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Marília Cláudia Carvalhais
Assessora Jurídica do COSEMS/GO
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