Veterinária e Zootecnia ISSN 0102-5716 EXERÉSE 321 RADICAL DE CARCINOMA DE CÉLULAS TRANSICIONAIS DE BEXIGA EM CÃO: TEMPO DE SOBREVIDA SUPERIOR A DOIS ANOS Victor J.V. Rossetto I Cláudia Valéria S. Brandão 2 José Joaquim T. Ranzani 2 Priscila T. Pavan5 Maria J. Mamprim ' Rogério L. Amorim" Camila Donatti 5 RESUMO o carcinoma de células transicionais (CCT) consite na neoplasia de bexiga mais comum em cães. O tratamento cirúrgico é geralmente paliativo devido ao envolvimento do trígono vesical e uretra. Além disso, a completa exérese cirúrgica é freqüentemente impedida pelo fato do CCT ser infiltrativo em cães. O objetivo do presente trabalho é ressaltar a importância do procedimento cirúrgico quando realizado de maneira precoce e radical, bem como descrever o relato de caso de um canino, fêmea, com 14 anos de idade e CCT em região de trígono vesical, submetido à éxerese radical e com tempo de sobrevida superior a dois anos. Palavras-chave: RADICAL carcinoma; transicionais; bexiga; cães; cirurgia. EXERESIS OF BLADDER TRANSITIONAL CELL CARCINOMA SURVIV AL TIME SUPERIOR TO TWO YEARS IN DOG: ABSTRACT The transitional cell carcinoma of (TCC) is the most common bladder cancer in dogs. The surgi cal treatment is generally palliative due to the involvement ofbladder's trigone and urethra. Moreover, the complete exeresis is often hindered by the fact that the TCC generally be infiltrating in dogs. The objective of this work is to emphasize the importance of the surgi cal procedure when carried out early and radical, and describe the case report of a canine, female, with 14 years of age and TCC in trigone region of bladder, subjected to radical exeresis and with survival time over two years. Key words: carcinoma; transitional; bladder; dogs; surgery. EXÉRESIS RADICAL DEL CARCINOMA DE CÉLULAS TRANSICIONALES DE VEJIGA EN EL PERRO: TIEMPO DE SUPERVIVENCIA DE MÁS DE DOS ANOS RESUMEN EI carcinoma de células transicionales (CCT) constituye Ia neoplasia de vejiga más común en canes. EI tratamiento quirúrgico sueI e ser paliativo devido aI comprometimiento deI trígono vesical y Ia uretra. Además, Ia exéresis quirúrgica completa se ve impedida por el hecho deI CCT ser infiltrativo IM.V., Residente, Depto. de Cirurgia e Anestesiologia Veterinária, FMVZ/ UNESP, Distrito de Rubião Júnior, s/n", Botucatu - SP, Brasil; [email protected] 2 M.V., Docente, Depto. de Cirurgia e Anestesiologia Veterinária, FMVZ/ UNESP, Distrito de Rubião Júnior, s/n", Botucatu - SP, Brasil; [email protected] 3 M.V., Docente, Depto. de Reprodução Animal e Radiologia Veterinária, FMVZ/ UNESP, Distrito de Rubião Júnior, s/n", Botucatu - SP, Brasil 4 M.V., Docente, Depto. de Clínica Veterinária, FMVZ/ UNESP, Distrito de Rubião Júnior, s/no, Botucatu - SP, Brasil 5 M.V., Mestranda, Depto. de Cirurgia e Anestesiologia Veterinária, FMVZ/ UNESP, Distrito de Rubião Júnior, slo", Botucatu - SP, Brasil Rossetto, V.J.V. et aI. Exerése radical de carcinoma de células transicionais sobrevida superior a dois anos. Veto e Zootec., p.321-324, v.16, n.2,jun., 2009. de bexiga em cão: tempo de ISSN 0102-5716 Veterinária e Zootecnia 322 en canes. EI objetivo de este trabajo es destacar Ia importanciadel tratamiento quirúrgico cuando el mismo es realizado rapida y radicalmente, asi como relatar un caso en un canino, hembra de 14 anos de edad y TCC abarcando Ia region deI trígono vesical, sometido a Ia extirpación radical y tiempo de supervivencia de más de dos anos. Palabras-c1ave: carcinoma; transicionales; vejiga; canes; cirugía. INTRODUÇÃO o carcinoma de células transicionais (CCT) é a neoplasia de bexiga mais rotineiramente observada em cães (KNAPP, 2001; CHUN, 2006; MADARAME et aI., 2006; FOSSUM et aI., 2007). A região do trígono vesical é a mais acometida, o que pode resultar em obstrução parcial ou completa dos ureteres e uretra. Metástases são muitas vezes verificadas no momento do diagnóstico e envolvem geralmente os linfonodos, pulmão, esqueleto, figado e outros órgãos abdominais (KNAPP, 200 I). A cirurgia é indicada nos casos cuja massa tumoral seja delimitada e acometa pequena extensão da parede vesical ou como procedimento paliativo nos casos de tumores não ressecáveis que envolvam grande extensão da bexiga ou estruturas anatômicas importantes (KNAPP, 2001; FOSSUM et aI., 2007; HENRY, 2007). O tratamento cirúrgico, entretanto, geralmente é paliativo devido ao freqüente envolvimento do trígono vesical e uretra no momento do diagnóstico. Além disso, a exérese cirúrgica com margem de segurança normalmente é impedida, pois o CCT é bastante invasivo em cães, fato que contribui para a recidiva do tumor (KNAPP, 2001; FOSSUM et aI., 2007). RELATO DE CASO O presente trabalho relata o caso de uma cadela da raça pinscher, com 14 anos de idade, 4,6 kg de peso corporal e histórico de polaquiúria e hematúria há 45 dias. Quanto aos exames complementares, verificou-se neutrofilia de 13.776 segmentados/uL e aumento dos níveis séricos de uréia (48,1 mg/dL) e fosfatase alcalina (535,6 U/L). À urinálise, a urina possuía aspecto discretamente turvo, densidade de 1016 e pH 6,0. O exame qualitativo do sedimento urinário revelou células de descamação renais, vesicais e uretrais, além de hemácias, leucócitos, bactérias e cristais de bilirrubina. Durante o exame ultrassonográfico visibilizou-se massa de aparência vegetativa e friável no interior da bexiga, aderida à 2/3 de sua circunferência. Pôde-se observar ainda dilatação do rim e ureter esquerdos. À citologia, constatou-se carcinoma de células transicionais. O animal foi submetido à intervenção cirúrgica e após cistotomia, confirmou-se a presença de massa no interior da bexiga com comprometimento do ureter esquerdo (Fig. 1). Optou-se por realizar a éxerese do rim e ureter dilatados, bem como de toda a parede vesical envolvida. A cistorrafia da porção remanescente foi realizada com sutura de padrão cerzidura, utilizando fio de poliglactina 3-0 (Fig. 1). Posteriormente, foi realizado ovariosalpingohisterectomia eletiva, sendo os pedículos ovarianos ligados e o coto uterino transfixado com fio de mononylon 2-0. O animal retomou após dois anos do atendimento anterior e apresentava hipodipsia, hiporexia, polaquiúria e êmese há uma semana. Ao exame ultrassonográfico visibilizou-se hidronefrose do rim remanescente. A bexiga possuía áreas focais de espessamento no bordo dorsal que sugeriam recidiva tumoral ou pólipo. Em decorrência da resposta deficiente ao tratamento clínico instituído e prognóstico ruim, o proprietário optou pela eutanásia do animal. À necropsia pode-se constatar perda de área cortical com dilatação da pelve renal, assim como do ureter direito (Fig. 2). Adicionalmente, verificou-se granuloma de coto uterino com aspecto cístico aderido à bexiga e que provavelmente estava promovendo compressão do ureter e obstrução do fluxo urinário (Fig. 2). A parede e mucosa da bexiga estavam íntegras e sem quaisquer alterações ou massa tumoral. Não foram observados focos de metástase ou outras alterações nos demais órgãos. Rossetto, V.J.V. et ai. Exerése radical de carcinoma de células transicionais sobrevida superior a dois anos. Veto e Zootec., p.321-324, v.16, n.2, jun., 2009. de bexiga em cão: tempo de ISSN 0102-5716 Veterinária e Zootecnia 32: FIGURA 1. A) CCT em interior de bexiga e sondagem uretral. B) Ureter direito sondado com cateter vascularperiférico 24 e sutura da parede vesical utilizando fio de poliglactina 3-0. Botucatu, 2008. FIGURA 2. Granuloma de coto uterino (G) aderido à bexiga (B), promovendo hidroureter direito (H). Botucatu, 2008. Rossetto, V.J.V. et al. Exerése radical de carcinoma de células transicionais sobrevida superior a dois anos. Veto e Zootec., p.32l-324, v.16, n.2,jun., 2009. de bexiga em cão: tempo de Veterinária e Zootecnia ISSN 0102-5716 DISCUSSÃO 324 E CONCLUSÃO o presente trabalho relata a ocorrência do CCT em uma cadela com idade avançada. Knapp (2001) também descreve maior risco de desenvolvimento de neoplasias de bexiga em fêmeas idosas. Os demais achados clínicos e laboratorias, bem como a conduta instituída no caso também estão de acordo com a literatura. O CCT em cães geralmente não é detectado na fase inicial da tumorogênese, mas sim quando já acomete grandes extensões e até mesmo estruturas adjacentes à bexiga, como ureteres e uretra. No caso relatado houve comprometimento tumoral do ureter esquerdo que impediu a manutenção do rim ipsilateral. Knapp (200 I) já destacava o envolvimento dessa estrutura e atribuía a isso, um fator prognóstico importante. Da mesma maneira, metástases regionais e à distância podem ser observadas no momento do diagnóstico e interferem no prognóstico do paciente. A existência de tais fatores limita a eficácia das opções de tratamento, incluindo a cirurgia, e contribui para a recorrência da neoplasia (KNAPP, 2001; CHUN, 2006; HENRY, 2007). A cirurgia, entretanto, deve ser sempre indicada nos casos de CCT diagnosticados precocemente, pois como constatado no presente trabalho, o animal submetido à éxerese radical apresentou tempo de sobrevida superior a dois anos e sem a utilização de quaisquer outras terapias adjuvantes. A presença de metástase pulmonar também não foi verificada à necropsia, apesar de Chun (2006) descrevê-Ia em quase 40% dos casos. Quanto aos casos avançados de CCT que envolvam grande área da bexiga ou estruturas como ureteres e uretra, a cirurgia paliativa também deve ser indicada para a diminuição dos sinais clínicos e conseqüente melhora do estado geral do animal. Em massas que estejam causando obliteração da luz ureteral ou uretral, por exemplo, a cirurgia permite o fluxo urinário e preserva a função do trato urinário superior (KNAPP, 2001). Adicionalmente, conclui-se que a cirurgia possibilita localizar e definir com precisão a extensão da massa neoplásica, o que contribui para o fornecimento do prognóstico. Conclui-se, portanto, que a instituição precoce e radical da cirurgia, possibilita a eliminação das margens comprometidas e é uma ferramenta fundamental para o tratamento do CCT. REFERÊNCIAS CHUN, R. Canine 81adder Tumors: Beyond Piroxicam. In: Proceedings Veterinary Conference, v. 20, p. 7-11, Orlando, Florida, 2006. of the North American FOSSUM, T. W.; HEDLUND, C. S.; HULSE, D. A.; JOHNSON, A. L.; SEIM, H. 8.; WILLARD, M. D.; CARROLL, G. L. Cirurgia da Bexiga e da Uretra. In: Small Animal Surgery, capo 22, p. 534-569, 3rd ed., Mosby, 2007. HENRY, C. J. Transitional Cell Carcinoma. In: Proceedings Association, Sydney, Australia, 2007. ofthe World Small Animal Veterinary KNAPP, D. W. Tumors of the Urinary System. In: Withrow, S. J.; MacEwen, E. G. Small Animal Clínical Oncology, 3rd ed., Philadelphia: Saunders, capo 25, p. 490-499, 2001. MADARAME, H.; ITO, A.; TANAKA, R. Urinary Bladder Rhabdomyosarcoma (Botryoid Rhabdomyosarcoma) in a Labrador Retriever Dog. Journal of Toxicologic Pathology, v. 16, p. 279281,2003. Recebido em: 01104/2009 Aceito em: 06/05/2009 Rossetto, V.J.V. et aI. Exerése radical de carcinoma de células transicionais de bexiga em cão: tempo de sobrevida superior a dois anos. Vetoe Zootec., p.32l-324, v.16, n.2, jun., 2009. View publication stats