CINEL – CENTRO DE FORMAÇÃO PROFISSIONAL DA INDÚSTRIA ELECTRÓNICA 5. TRANSISTOR DE JUNÇÃO BIPOLAR 5.1 Noção e constituição O transístor de junção bipolar é um dispositivo constituído por um cristal de silício ou germânio no qual existem três zonas semicondutoras, duas tipo N separadas por uma tipo P, ou, duas tipo P separadas por uma tipo N. Assim temos transístores tipo NPN ou tipo PNP. As três zonas têm terminais de acesso e designam-se por emissor, base e colector. Na figura 5.1 estão representados os dois tipos de transístores e os respectivos símbolos. Emissor Emissor E E N P B Base N B Base P N P C Colector C Colector (A) (B) Figura 5.1 – (A) – Transístor NPN; (B) – Transístor PNP. A seta que aparece no símbolo é orientada segundo a polarização directa do díodo emissor. O transístor é semelhante a dois díodos (duas junções P-N) de costas um para o outro: - Díodo emissor – base ou díodo emissor (ou junção de emissor) Díodo colector – base ou díodo colector (ou junção de colector) No entanto, o seu comportamento não pode ser visto como o resultado do comportamento dos dois díodos em separado. Tem de ser visto em conjunto, funcionando tudo simultaneamente. O emissor é a parte do transístor mais fortemente dopada. A sua função é a de injectar na base os seus portadores maioritários (electrões se for tipo N ou lacunas se for tipo P). A base é muito estreita e fracamente dopada e por isso permite que a maior parte dos portadores que nela são injectados pelo emissor sejam recolhidos (ou colectados) pelo colector. Este é a parte mais extensa do transístor e tem uma dopagem intermédia entre a do emissor e a da base. EB 41 Vamos começar o estudo pelo transístor NPN, tendo em vista que no tipo PNP o funcionamento é idêntico só que neste são as lacunas os portadores maioritários e as tensões e correntes têm os sentidos opostos. 5.2 Polarização do transístor O transístor pode funcionar em três zonas: Zona de corte A junção de colector e a junção de emissor estão inversamente polarizadas, figura 5.2. Praticamente não há corrente. A pequena corrente que existe é devida apenas aos portadores minoritários e na maior parte dos casos despreza-se. O transístor nesta zona é comparado a um interruptor aberto. Como não há corrente a potência dissipada é nula. E C P N N B Figura 5.2 – Junção de emissor e junção de colector com polarização inversa Zona de saturação Tanto o díodo colector como o díodo emissor estão directamente polarizados, figura 5.3. A corrente de colector é imposta pelo circuito de carga. O transístor nesta zona é comparado a um interruptor fechado. A tensão colector emissor (UCE) vale cerca de 0,3V Há alguma potência dissipada dada por: P = UCE sat .IC 0,3 . IC E C N P N B Figura 5.3 – Junção de emissor e junção de colector directamente polarizadas EB 42 CINEL – CENTRO DE FORMAÇÃO PROFISSIONAL DA INDÚSTRIA ELECTRÓNICA Zona activa O transístor é usado na maior parte das aplicações como amplificador. Há, no entanto, um grande número de aplicações, principalmente no domínio da Electrónica Industrial ou Electrónica de Potência, em que é usado em comutação isto é ou funciona na zona de corte ou na zona de saturação. Para ser usado como amplificador, o transístor tem de funcionar na zona activa. A junção de emissor é polarizada directamente e a junção de colector é polarizada inversamente, figura 5.4. Desta forma consegue-se uma corrente de colector praticamente igual à corrente de emissor. A corrente de base é muito menor que qualquer destas duas. E IE C P N IB IC N B Figura 5.4 – Transístor polarizado na zona activa A explicação é a seguinte: como a junção de emissor está directamente polarizada há uma corrente directa de electrões (portadores maioritários neste tipo de transístor) do emissor para a base. A base mais estreita e fracamente dopada não fornece lacunas suficientes para se fazer a recombinação. Há portanto muitos electrões vindos do emissor que não se recombinam com as lacunas da base e penetram no colector onde são atraídos pelo terminal positivo da fonte. Na figura 5.5 ilustra-se este movimento dos electrões - E B C N P N Junção de emissor + Electrão Lacuna Junção de colector Figura 5.5 – Movimento dos electrões num transístor NPN polarizado na zona activa As três correntes existentes nos terminais do transístor estão relacionadas por: IE = IC + IB IE – corrente de emissor IC – corrente de colector IB – corrente de base EB 43 O número de electrões injectados na base é controlado pela polarização directa do díodo emissor. O valor da tensão inversa do díodo colector tem pouca influência. Na figura 5.6 mostra-se a polarização correcta de um transístor NPN e de um transístor PNP. IE E C UEE IB B IC IE UCC E C IC UCC UEE IB B Figura 5.6 – Polarização na zona activa de um transístor NPN e de um transístor PNP Esta ligação designa-se por ligação em base comum porque o terminal de base é comum à entrada e à saída. 5.3 Alfa cc O alfa cc dá-nos a relação entre a corrente de colector e a corrente de emissor: cc = IC / IE Como IC e IE são quase iguais, o valor de cc é muito próximo da unidade. O seu valor situa-se entre 0,95 e 0,99. A CC dá-se o nome de ganho de corrente em regime contínuo ou em repouso da montagem BC, ou ganho de corrente em regime de sinais fortes ou relação directa de transferência de corrente em regime de sinais fortes. 5.3 Curvas características As curvas características são gráficos que relacionam as correntes e as tensões num transístor. Como o transístor tem três terminais, um deles tem de ser comum à entrada e à saída. Assim, além da configuração em base comum já referida, o transístor pode ser ligado em emissor comum e colector comum. As relações entre tensões e correntes dependem da montagem do transístor e por isso as características devem ser consideradas conforme o caso. Num transístor temos a considerar três correntes e três tensões: IC, IE, IB e UBE, UCE, UCB 5.3.1 Base comum EB 44 CINEL – CENTRO DE FORMAÇÃO PROFISSIONAL DA INDÚSTRIA ELECTRÓNICA A figura 5.7 mostra um transístor NPN em configuração base comum, também chamada base aterrada IE E IC C UEE IB UCC B Figura 5.7 – Transístor NPN em configuração base comum Na figura 5.8 mostram-se as características de saída Região de saturação Região activa IC (mA) 40 IE=30mA 30 IE=20mA 20 IE=10mA 10 Região activa IE=0 0 0 2 4 6 8 (V) UCB Região de corte ICO Figura 5.8 – Características de saída típicas de um transístor NPN montado em base comum Como se pode observar, a corrente de emissor IE controla a corrente de colector IC. Porém, para cada valor fixo da corrente IE, a corrente IC depende do valor de UCB. Para IE=0 só há uma pequena corrente de fugas na junção do colector e geralmente é desprezada. Para anular completamente a corrente IC só com uma pequena polarização directa. Para IE=1mA, há um rápido aumento da corrente IC enquanto UCB está em polarização directa baixa e torna-se praticamente constante a partir da altura em que UCB passa a polarização inversa. Para outros valores de IE o andamento das curvas é semelhante. EB 45 A parte inicial das curvas em que há um rápido crescimento de IC é a zona de saturação. Geralmente, o transístor é usado para trabalhar na zona em que IC é praticamente constante – zona activa. Na figura 5.9 estão representadas as curvas características de entrada. São semelhantes às curvas características de um díodo só que agora a tensão UCB tem sobre elas algum efeito. IE (mA) 8 UCB=10 V 6 Colector aberto UCB=1V UCB=0 4 2 0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 (V) 1 UBE Figura 5.9 – Curvas características de entrada de um transístor que relacionam IE com UBE para vários valores de UCB. 5.3.2 Emissor comum As curvas características de um transístor ligado em emissor comum podem ser traçadas usando uma montagem como a representada na figura 5.10. IC mA R2 UBB R1 m A V IB UCC UCE R3 Figura 5.10– Circuito para determinar as curvas características de um transístor ligado em emissor comum Fixa-se IB e varia-se R3. Com os valores de UCE e de IC medidos desenha-se uma curva, idêntica às que estão representadas na figura 5.11. A cada valor de IB corresponde uma curva. Nesta montagem a corrente de colector IC é controlada pela corrente de base IB, embora para cada valor fixo de IB a corrente de colector varie consoante a tensão inversa aplicada. Como se pode ver, o andamento das curvas é idêntico ao da montagem em base comum. EB 46 CINEL – CENTRO DE FORMAÇÃO PROFISSIONAL DA INDÚSTRIA ELECTRÓNICA IC (mA) 40 IB=300A 30 IB=200A 20 IB=100A 10 IB=0 0 0 10 20 30 40 UCE (V) Figura 5.11 – Curvas características de saída para um transístor ligado em emissor comum Na figura 5.12-A mostra-se mais em pormenor a curva correspondente a IB=0 e outra das curvas. IC Ruptura Saturação ICEO IB=0 BUCEO UCE Figura 5.12 – Curva de colector para IB=0 e outra curva Para IB=0 há apenas uma pequena corrente de fugas, muito próxima de zero, que aumenta ligeiramente com o aumento de UCE. Esta corrente como é devida aos portadores minoritários, aumenta com a temperatura. É especificada pelo fabricante e representa-se por ICEO (corrente de fugas colector emissor com o terminal de base aberto - open). Devem-se escolher transístores com ICEO baixo para evitar que, em funcionamento normal, correntes de fugas excessivas possam ter influencia na sua operação. EB 47 A partir de um certo valor de UCE o díodo colector entra em ruptura. Esta tensão de ruptura é indicada nas folhas de dados como BUCEO (máx.). O seu valor depende do transístor. Para o BC546 por exemplo tem o valor 65V, para o BC547, 45V. Para o não danificar o transístor deve-se evitar que a tensão chegue a este valor. Geralmente dáse uma margem de segurança, que pode ser, por exemplo, evitar que UCE seja superior a metade de BUCEO (máx.). Para as outras curvas há uma parte inicial muito abrupta em que o crescimento é muito rápido e depois um certo nivelamento. A zona inicial em que há o rápido aumento da corrente designa-se por zona de saturação. Nesta zona o díodo colector está directamente polarizado e o transístor comporta-se como uma resistência de baixo valor. A zona de saturação corresponde a um UCE de alguns décimos de volt. A zona nivelada corresponde à zona activa, onde geralmente o transístor é usado. A corrente IC é praticamente constante nesta zona, mesmo com grande aumento de UCE. Continuando a aumentar UCE chega-se à tensão de ruptura (as tensões de ruptura não estão representadas na figura 5.11). Deve-se evitar que o transístor chegue a esta tensão. Com estas curvas é muito fácil determinar o ponto de funcionamento do transístor. Por exemplo, se UCE=20V e IB=100A, então IC=10mA. 5.4 Beta cc O beta cc de um transístor - ganho em corrente contínua - relaciona a corrente de colector com a corrente de base: cc = IC / IB Por exemplo, um transístor com IC = 6mA e IB = 75A tem um cc = 6/0,075 = 80. O cc é indicado nas folhas de dados por hFE. O seu valor não é constante, depende do ponto de funcionamento do transístor e por isso é indicado para um determinado valor de Ic e UCE. A figura 5.13 dá uma ideia dessa variação CC T=150ºC T= -50ºC IC Figura 5.13 – Variação de CC com IC e com a temperatura Entre cc e cc existe a relação: EB 48 CINEL – CENTRO DE FORMAÇÃO PROFISSIONAL DA INDÚSTRIA ELECTRÓNICA cc = cc / ( cc +1) cc = cc / (1- cc) ou 5.5 Curvas da base São muito idênticas à curva de um díodo, o que era de prever, só que agora a tensão UCE tem alguma influência. IB UCE=1V UCE=30V UBE Figura 5.14 – Curvas da base A figura 5.14 mostra essa influência. A diferença entra as duas curvas é pouco perceptível e na prática consideram-se as curvas como sobrepostas. A figura 5.15 representa a característica da corrente de saída IC em função da tensão de entrada UBE para um transístor de silício montado em emissor comum. IC ICEO ICO -0,2 -0,1 0 Corte 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 U BE(V) Tensão de limiar Região activa Saturação Figura 5.15 – Curvas da corrente IC em função da tensão UBE Na região de corte a corrente IE=0 e IC=ICO (ICO é a corrente de saturação inversa do díodo colector inversamente polarizado tendo o emissor em circuito aberto). A tensão de corte é UBE corte =0V. EB 49 A junção do emissor com polarização directa tem um comportamento idêntico ao de um díodo directamente polarizado, isto é, só aparece uma corrente de base significativa a partir de um determinado valor de tensão, chamada tensão de limiar U . A corrente IC, proporcional a IB também surge só a partir deste valor de tensão. A região activa do transístor que se considera logo a partir dos 0V em que começa a polarização directa do emissor, só começa de facto a partir da tensão de limiar U. Na tabela seguinte estão indicadas tensões típicas para um transístor NPN a 25ºC. UCE saturação UBE saturação UBE activo UBE limiar UBE corte Silício 0,2 0,8 0,7 0,5 0,0 Germânio 0,1 0,3 0,2 0,1 – 0,1 Exemplo: O transístor do circuito representado na figura é de silício e tem um CC = 100. a) Determine o valor das correntes. b) Suponha que se mudou a resistência de base de 180K para 50K. Verifique se o transístor continua a funcionar na zona activa ou se está na de saturação. IC IB 2K UCB UCE 5V 10V 180K UBE Resolução: a) Como a junção de emissor está directamente polarizada, o transístor não está em corte, ou está a funcionar na zona activa ou na de saturação. Vamos supor que está na zona activa. Aplicando a Lei das Malhas à malha da base, temos: 5 = 180.IB + UBE Considerando UBE=0,7V, vem para IB e para IC: IB = (5 – 0,7) / 180 IB = 0,0239mA IC = CC.IB = 100.0,0239 = 2,39mA Vamos agora verificar se efectivamente o transístor está ou não a funcionar na zona activa. Para estar a funcionar na zona activa, a junção do colector tem de estar inversamente polarizada, o que num transístor NPN equivale à tensão UCB ser positiva. EB 50 CINEL – CENTRO DE FORMAÇÃO PROFISSIONAL DA INDÚSTRIA ELECTRÓNICA A Lei das Malhas aplicada à malha do colector dá: 10 = 2 IC + UCB + UBE 10 = 2.2,39 + UCB + 0,7 UCB = 4,52V Está portanto confirmado o funcionamento na zona activa. b) Vamos supor que o transístor está na saturação. A Lei das Malhas aplicada à malha do colector, atendendo a que na saturação UCE = 0,2V ( muitas vezes considera-se UCE = 0), dá: 10 = 2.IC + UCE IC sat = (10 – 0,2) / 2 = 4,9mA No circuito da base temos: 5 = 50.IB + UBE IB = (5-0,8) / 50 = 0,084mA A corrente mínima de base que faz o transístor entrar na saturação é dada por IB min = IC sat / CC IB min = 4,9 / 100 = 0,049mA Como a corrente IB é superior a IB min o transístor está na saturação. 5.6 Valores limite de utilização Entre outros valores indicados nas folhas de dados tem especial interesse: Os valores máximos de tensão inversa que levam o dispositivo à ruptura: - BUCBO – Tensão colector-base com o emissor aberto BUCEO – Tensão colector-emissor com a base aberta BUEBO – Tensão emissor-base com colector aberto - Corrente máxima de colector (DC) - IC Max - Temperatura máxima da junção – Tj Máx - Potência máxima – PC Máx - Indicada para uma dada temperatura A potência dissipada por um transístor pode ser calculada através de: PD = UCE . IC O construtor indica a potência máxima a uma dada temperatura, em geral 25ºC. EB 51 Quando a temperatura aumenta, a potência máxima que o transístor pode dissipar diminui. No gráfico representado na figura seguinte há uma diminuição de 2mW/ºC de elevação de temperatura. PC máx (mW) 300 0 25 50 75 100 125 150 175 (ºC) T Figura 5.16 – Variação da máxima potência dissipável com a temperatura Esta variação depende da resistência térmica entre junção e ambiente. Um valor frequente para esta resistência é 2mW/ºC. É também frequente a indicação pelo fabricante da resistência térmica junção-embalagem que tem valores mais baixos que a anterior. O valor desta resistência pode ainda ser mais baixo, se o transístor for montado sobre um dispositivo dissipador de calor. A utilização de dissipadores permite que a potência dissipada seja maior. Na figura 5.17 está representada a curva de máxima dissipação de potência no gráfico das características de saída de um transístor e também a recta de carga. IC (mA) IB=300A IC máx Hipérbole de dissipação máxima IB=200 A UCC /RC IC IB=100A PF Recta de carga IB=0 UCC UCE máx UCE UCE (V) Figura 5.17 – Hipérbole de dissipação máxima e recta de carga No quadro seguinte está reproduzida uma parte da folha de dados dos transístores NPN BC546 e BC547: EB 52 CINEL – CENTRO DE FORMAÇÃO PROFISSIONAL DA INDÚSTRIA ELECTRÓNICA LIMITING VALUES In accordance with the Absolute Maximum Rating System (IEC 134). SYMBOL VCBO VCEO VEBO PARAMETER CONDITIONS collector-base voltage MIN. MAX. UNIT open emiter BC546 - 80 V BC547 - 50 V BC546 - 65 V BC547 - 45 V BC546 6 V BC547 6 V collector-emiter voltage open base emiter-base voltage open collector - IC collector current (DC) - 100 mA ICM peak collector current - 200 mA IBM peak base current - 200 mA Ptot total power dissipation - 500 mW Tstg storage temperature -65 +150 ºC TJ junction temperature - 150 ºC Tamb operating ambient temperature -65 +150 ºC Tamb 25ºC; note 1 Note 1. Transístor mounted on a FR4 printed-circuit board. 5.7 Recta de carga cc Considere-se o circuito representado na figura 5.18 IC RC IB UCE UBB RB UBE Figura 5.18 Se aplicarmos a Lei das malhas à malha de saída obtemos: UCC = RC IC + UCE ou IC = (UCC – UCE) / RC Esta equação define a recta de carga cc Para a traçar calculam-se os pontos extremos: EB 53 UCC Para UCE = 0 IC = UCC / RC Para IC = 0 UCE = UCC Na figura 5.19 está a sua representação gráfica sobreposta às curvas de colector IC (mA) IB=300A UCC / RC IB=200 A Saturação PF IB=100A Corte IB=0 UCC UCE (V) Figura 5.19 – Representação da recta de carga cc A recta de carga representa o lugar geométrico dos pontos em que o transístor pode trabalhar. O ponto de intersecção da recta de carga cc com a curva correspondente à corrente de base calculada é o ponto de funcionamento do transístor em repouso, também chamado ponto de operação ou ponto quiescente. Qualquer ponto de funcionamento do transístor terá de se situar sobre a recta de carga. O ponto em que a recta de carga intercepta a curva correspondente a I B = 0, designa-se por corte. Neste ponto a corrente de base é zero e a corrente de colector também é praticamente zero (IC=ICEO - corrente de fuga). Pode-se considerar UCE (Corte) UCC A intersecção da recta de carga com a curva IB = IB (saturação) designa-se por saturação. Na saturação a corrente de colector é máxima e aproximadamente igual a IC (Saturação) UCC / RC Qualquer valor de IB superior a IB (saturação) fará com que IC tenha o seu valor máximo possível, aproximadamente igual a UCC / RC. Para valores de IB inferiores a IB (saturação) o transístor estará a operar na zona activa. 5.8 Circuitos de polarização A aplicação mais corrente do transístor é em amplificação. Um sinal é aplicado à entrada do transístor e à saída temos um sinal de maior amplitude e com a mesma frequência. EB 54 CINEL – CENTRO DE FORMAÇÃO PROFISSIONAL DA INDÚSTRIA ELECTRÓNICA Para funcionar como amplificador o transístor tem de operar na zona activa, isto é, o díodo emissor deve ter polarização directa e o díodo colector polarização inversa. Antes de se aplicar ao transístor o sinal que se pretende amplificar, deve-se escolher um ponto de funcionamento em repouso (PFR) ou ponto quiescente. Quando o sinal lhe for aplicado, o ponto de funcionamento vai oscilar ao longo da recta de carga para cima e para baixo do PFR escolhido. Este PFR deve ser escolhido de forma a que o sinal que se pretende amplificar não faça o transístor entrar no corte nem na saturação. Escolhe-se em geral, um PFR situado aproximadamente a meio da recta de carga. 5.9 Polarização da montagem emissor comum 5.9.1 Polarização por resistência RB ou polarização da base A figura 5.20-A mostra este processo de polarização. Na prática usa-se a mesma tensão de alimentação para todo o circuito e não uma bateria para cada tensão. Assim este circuito fica simplificado como se representa em 5.20-B. +UCC RC RB RC IB UBB UCC RB Figura 5.20 – Polarização por resistência RB ou polarização da base Este processo tem o grave inconveniente de ser muito sensível às variações de CC. Recorde-se que CC tem uma grande variação com a corrente e com a temperatura. Quando um transístor é percorrido por corrente aquece. O seu aquecimento, faz com que CC aumente e por conseguinte IC aumente também. Este aumento de IC faz com que o transístor aqueça ainda mais e portanto CC aumente mais. Entra-se assim num ciclo que pode ter como consequência a destruição do transístor. Além do aumento de CC ainda há outros factores que contribuem para o aumento da corrente do colector à medida que o transístor aquece: - EB A corrente ICBO aumenta devido à formação de mais pares electrão/lacuna e vai-se juntar à corrente maioritária IC (a corrente de fugas do colector duplica por cada 10ºC de aumento de temperatura) 55 A resistência da junção base–emissor tem coeficiente de temperatura negativo. A subida da temperatura faz diminuir a resistência e portanto aumentar IB. Se IB aumenta IC também aumenta (a tensão directa UBE diminui à taxa de 2,5mV/ºC). - Estes inconvenientes tornam o seu uso bastante limitado. 5.9.2 Polarização por resistência de base e resistência de emissor ou polarização com realimentação do emissor Com a colocação de uma resistência RE no emissor do transístor, pretende-se tornar o ponto de funcionamento mais estável em relação às variações de CC. +UCC RC RB RC IB RB UCC UBB RE RE (A) (B) Figura 5.21 – Polarização por resistência de base e resistência de emissor ou polarização da realimentação do emissor. A – circuito completo. B – circuito simplificado. Aplicando a lei das malhas à malha da base, obtém-se: UCC = RB IB + UBE + RE IE Atendendo a que IE IC, fica UCC = RB IB + UBE + RE IC Daqui, podemos concluir que, se CC aumentar então IC também aumenta, assim como a tensão RE IC. Este aumento de RE IC obriga RB IB a diminuir, ou seja, obriga IB a diminuir. Esta diminuição de IB implica a diminuição de IC, o que compensa o aumento de CC. Este processo de polarização ainda continua sensível às variações de CC como se pode ver pelo exemplo seguinte. Exemplo : Calcule o valor da corrente do colector no circuito representado na figura 5.22-A, para os valores CC=100 e CC=200. Faça a representação gráfica da recta de carga e destes dois pontos. EB 56 CINEL – CENTRO DE FORMAÇÃO PROFISSIONAL DA INDÚSTRIA ELECTRÓNICA +20V 400K 1K IC (mA) 16,66 ( CC=200) 8,77 200 ( CC=100) 4,59 0 UCE(V) 10 (A) 20 (B) Figura 5.22 – A – circuito do problema; B – recta de carga Resolução: Considerando a malha da base e atendendo a que IB = IC/ CC, UBE 0,7V e que IE IC, temos: Para =100: 20 = 400 IC /100 + UBE + 0,2 IC Para =200: IC = 4,59mA 20 = 400 IC /200 + UBE + 0,2 IC IC = 8,77mA Para se representar a recta de carga, figura 5.19-B, usam-se os seus pontos extremos UCE=0V IC=20/(1+0,2) =16,66mA e IC=0 UCE=20V Pode-se verificar que a duplicação de CC fez praticamente duplicar a corrente do colector. Para se ter uma melhor estabilização do ponto de repouso o valor de RE deveria ter um valor bastante superior, só que, quanto maior for, maior a perda de energia pois RE é percorrida pela corrente mais elevada do transístor. Em geral, RE é da ordem de dezenas ou centenas de ohms. Outro inconveniente desta polarização é que o transístor fica saturado se RB for inferior a CC RC. 5.9.3 Polarização com realimentação do colector ou auto-polarização Neste processo de polarização a resistência RB está ligada ao colector e não à fonte de alimentação como se mostra na figura 5.23. EB 57 +UCC RC RB Figura 5.23 – Polarização com realimentação do colector ou auto-polarização Se CC aumenta então IC também aumenta, assim como a tensão em RC. Este aumento da tensão em RC obriga à diminuição da tensão RB IB e portanto à diminuição de IB. A redução da corrente da base compensa o aumento da corrente do colector. Com esta polarização o ponto quiescente continua dependente de CC mas, em relação à polarização com resistência de emissor, tem mais estabilidade. Além disso tem a vantagem de ser mais simples pois só tem duas resistências. Exemplo: Calcule o valor da corrente do colector no circuito representado na figura 5.24-A, para os valores CC=100 e CC=200. Faça a representação gráfica da recta de carga e destes dois pontos. +20V IC (mA) 1,5K 13,33 200K ( CC=200) 7,69 ( CC=100) 5,49 0 UCE(V) A 10 20 B Figura 5.24 - A – circuito do problema; B – recta de carga Resolução: A lei das malhas aplicada à malha da base dá: 20 = 1,5 (IC + IB) + 200 IB + UBE Para CC = 100 vem: EB 58 CINEL – CENTRO DE FORMAÇÃO PROFISSIONAL DA INDÚSTRIA ELECTRÓNICA 20 = 1,5 ( IC + IC/100) + 200 IC/100 + 0,7 IC = 5,49mA Para CC = 200 vem: 20 = 1,5 ( IC + IC/200) + 200 IC/200 + 0,7 IC = 7,7mA Para traçar a recta de carga (fig. 5.22-B): IC sat = 20 / 1,5 = 13,33mA Pode-se observar neste exemplo, que o aumento de CC para o dobro apenas fez aumentar a corrente do colector 1,4 vezes, o que mostra a maior estabilidade desta polarização. Além desta vantagem ainda há outra em relação à polarização anterior, é que se pode baixar o valor de RB sem nunca saturar o transístor: Suponhamos que RB está em curto-circuito, como se representa na figura 5.25, então a corrente do colector tem o valor: IC = (UCC-0,7) / RC Este valor ainda é ligeiramente inferior ao da corrente de saturação IC sat = UCC/RC. +UCC +UCC RC RC 0,7V A B Figura 5.25 – A - polarização com realimentação do colector com RB em curto; B – circuito equivalente O transístor com a base em curto com o colector comporta-se como um díodo. Mas, este circuito além de não conseguir uma estabilidade térmica eficaz, tem ainda outro inconveniente. É que a ligação de RB entre o colector e a base, útil em corrente contínua como estabilizadora em relação às variações de temperatura, provoca em corrente alternada a chamada realimentação negativa, degeneração ou contra-reacção, isto é, faz com que um sinal aplicado à entrada do transístor seja contrariado pelo sinal de saída. Suponhamos que se aplica uma tensão alternada na base do transístor da figura 5.23. EB 59 Vamos supor que o sinal está a aumentar. Então, a tensão entre base e emissor também aumenta, comandando a corrente IC, só que o potencial na base aumentando faz com que esta se torne mais positiva e faça a corrente IC e IB diminuir, contrariando assim a subida do sinal. Para a parte negativa do sinal o raciocínio é análogo. Assim, o sinal de entrada é parcialmente perdido. Na figura 5.26 representa-se este efeito. A B Figura 5.26 – Efeito da realimentação negativa no sinal de entrada: A – sinal aplicado ao amplificador; B – sinal que efectivamente é tratado 5.9.4 Polarização por divisor de tensão ou polarização universal É uma polarização bastante melhorada em relação às anteriores. É independente de CC e por isso é a mais usada. O divisor de tensão é constituído pelas resistências R1 e R2. A figura 5.27 - A representa este processo de polarização. +UCC +UCC RC R1 RC +U2 R2 RE RE A B Figura 5.27 - Polarização por divisor de tensão. A – Circuito completo; B – Circuito equivalente Se a corrente IB for bastante inferior à corrente no divisor de tensão (R1+R2), pode-se considerar que o divisor de tensão funciona como uma fonte de tensão aplicada à base É o que está representado na figura 5.24 – B. Neste caso, o valor da corrente de emissor é dada por IE = (U2 – UBE) / RE EB 60 CINEL – CENTRO DE FORMAÇÃO PROFISSIONAL DA INDÚSTRIA ELECTRÓNICA A função da resistência RE continua a ser a de evitar que a temperatura altere o ponto de funcionamento em repouso do transístor. Se a temperatura aumenta, a corrente IC também aumenta, assim como IE, (IE IC), então, a tensão em RE também aumenta o que faz diminuir a tensão UBE pois que a tensão entre a base e a massa (U2) é praticamente constante. A diminuição de UBE provoca a diminuição de IB e portanto de IC, compensando o aumento inicial. Exemplo: Considere o circuito representado no lado esquerdo da figura seguinte. Supondo o transístor de silício, determine o valor da tensão UCE. +18V 49,6K +18V 4K 4K +2,5V 8K 900 900 Resolução: O valor de CC não é conhecido. Vamos considerar que a corrente IB se pode desprezar em face da corrente no divisor de tensão e passar para o circuito equivalente representado no lado direito da figura. A tensão na base do transístor é dada por: U2 = U . R2 /(R1+R2) U2 = 18 . 8/(8+49,6) = 2,5V Aplicando a Lei das Malhas à malha da base obtém-se: 2,5 = 0,7 + 0,9 IE IE = (2,5 – 0,7) / 0,9 = 2mA Fazendo IC = IE e aplicando a Lei das Malhas à malha de saída, vem: 18 = 4 IC + UCE + 0,9 IC UCE = 18 – 8 – 1,8 = 8,2V Estabilização do divisor de tensão Na figura 5.28 está representado um circuito equivalente ao representado em 5.27 - A, que se obteve deste por aplicação do teorema de Thevenin entre os pontos correspondentes ao terminal da base e a massa. +UCC EB 61 RTh RC Figura 5.28 - Circuito equivalente a 5.24 - A Os valores RTh e UTh são calculados por: RTh = (R1 . R2) / (R1 + R2) UTh = UCC . R2 / (R1 + R2) Este circuito equivalente é mais simples do que o original e por isso mais fácil de analisar. Se aplicarmos a lei das malhas à malha da base deste circuito, obtemos: UTh = RTh IB + RE IE + UBE Como IB IE / CC, podemos escrever: IE (UTh - UBE) / (RE + RTh / CC) Para o circuito ser estável deverá ser RE bastante superior a RTh/ CC e se isto se verificar esta última parcela pode ser desprezada e obtém-se: IE (UTh - UBE) / RE Num projecto de um divisor de tensão para polarizar um transístor deve-se atender a que RE deve ser superior pelo menos a 10 RTH. CC para se ter estabilização. Isto equivale a RTh 0,1 RE . CC Se substituirmos RTH por R2 continuamos a satisfazer esta exigência (RTh é sempre menor que R2 porque é o resultado do paralelo de R2 com R1) e torna-se muito mais útil. R2 0,1 RE . CC Cálculo das resistências de polarização: A tensão em RE deve ser cerca de 10% da tensão UCC (poderá ir até 20%): UE = 0,1 UCC O valor de RE necessário para se ter uma determinada corrente de colector é: RE = UE / IE EB 62 CINEL – CENTRO DE FORMAÇÃO PROFISSIONAL DA INDÚSTRIA ELECTRÓNICA Para o transístor ficar polarizado a meio da recta de carga: UCE = UCC / 2 Assim, a tensão em RC é 0,4 UCC e então: RC = 0,4 UCC / IC O valor de R2 deve satisfazer R2 0,1 RE . CC em que se deve considerar o menor valor de CC. Por exemplo se CC variar entre 100 e 300 deve-se tomar o valor 100. O valor de R1 pode ser calculado pela proporção: R1 / R2 = U1 / U2 Exemplo: No circuito da figura o transístor é de silício e tem um valor de CC=100 para uma corrente quiescente de colector IC=1mA. Estimar os valores que se poderão usar para R1, R2, RE e RC. +12V R1 RC R2 RE Resolução: Considerando a tensão em RE = 10% de UCC, temos: UE = 0,1 . 12 = 1,2V. Como IE IC, vem: RE = 1,2 / 1 = 1,2K Para o ponto de funcionamento se situar a meio da recta de carga, UCE = 12/2 = 6V. Então: RC = (12 – 6 – 1,2) / 1 = 4,8K Como o transístor é de silício UBE=0,7V e então a tensão em R2 vai ser EB 63 U2 = UE + UBE U2 = 1,2 + 0,7 = 1,9V Se atendermos a que R2 0,1 RE CC, temos: R2 0,1 . 1,2 . 100 R2 12K Fazendo R2 = 12K e U1 = 12 – 1,9 = 10,1, vem para R1: U1 / U2 = R1 / R2 R1 = R2 . U1 / U2 R1 = 12 . 10,1 / 1,9 = 63,8K Na figura 5.26 está representado o mesmo circuito mas com os condensadores de acoplamento e derivação representados. Os condensadores C1 e C2 são condensadores de acoplamento. O condensador CE é um condensador de derivação à massa. Tem a função de evitar que a resistência RE, útil em c.c. para estabilizar termicamente o transístor, constitua para as componentes alternadas perda de sinal. O seu valor deve ser tal que XCE RE /10 ou 1 / 2.f.CE 0,1RE +UCC R1 RC C2 C1 uo ui R2 RE CE Figura 5.29 Polarização por divisor de tensão com condensadores de acoplamento e de derivação 5.10 Transístores PNP Podem-se usar transístores PNP em vez de NPN em todos os circuitos apresentados. Como o transístor PNP tem as tensões e as correntes com sentido oposto ao transístor NPN, é necessário inverter todas as correntes e tensões no circuito. 5.11 Verifique se sabe EB 64 CINEL – CENTRO DE FORMAÇÃO PROFISSIONAL DA INDÚSTRIA ELECTRÓNICA 1. Desenhe os símbolos dos transístores NPN e PNP e indique o nome dos terminais e o sentido das correntes. 2. a) b) c) Diga como se polariza um transístor: Na zona activa; Na zona de corte; Na zona de saturação 3. Qual o efeito do aumento de temperatura no funcionamento de um transístor? 4. Defina CC. 5. Defina CC e relacione com CC. 6. A potência máxima admitida por um transístor é 1W. Se estiver polarizado com UCE=10V, qual a máxima corrente de colector que admite? 7. A potência máxima dissipável de um transístor para a temperatura de 25ºC é de 500mW com um coeficiente de 2mW/ºC. Se a temperatura aumentar para 50ºC, qual a potência que o transístor pode dissipar? 8. A curva da figura representa a característica de saída corresponde à corrente de base constante de 50A de um transístor ligado em emissor comum. Descreva a curva identificando as três partes distintas que nela se observam. IC 50A UCE 9. O transístor representado no esquema é de silício e tem um CC=150. Pretende-se polarizá-lo de forma a que o ponto de funcionamento fique a meio da recta de carga. O valor da tensão de alimentação é de 15V e a carga é de 2K. UCC=15V RB EB RC=2K 65 10. Considere o esquema representado em que o transístor é de silício com um CC=100. a) Calcule o valor das tensões da base, do emissor e do colector em relação à massa; b) Desenhe a recta de carga; c) Qual o valor aproximado de CC que faz o transístor entrar em saturação? +20V 150K 750 200 11. Qual a função da resistência de 200 no circuito do exercício anterior? Explique como ela actua. 12. Calcule o valor da corrente de repouso do amplificador: +UCC RC RB 13. Determine o ponto de funcionamento do transístor da figura, se CC=100. +12V EB 170K 4K 30K 1K 66 CINEL – CENTRO DE FORMAÇÃO PROFISSIONAL DA INDÚSTRIA ELECTRÓNICA 14. Das montagens polarizadoras referidas qual é a que apresenta maior estabilidade? 15. Utilizando o método indicado, faça uma previsão dos valores que se poderão atribuir às resistências da figura seguinte para se polarizar o transístor a meio da recta de carga. O transístor é de silício, tem um CC=100 e a corrente de colector deve ser de 2mA. +20V R1 RC R2 RE Soluções: 6. IC=0,1A. 7. P=450mW. 9. RB=572K. 10. a) UC=11,5V; UE=2,3V; UB=3V. c) CC=200. 12. IC=1,58mA. 13. IC=1,6mA; IB=16A; UCE=10V. 15. RE=1K, RC=4K, R1=64K, R2=10K. EB 67