A E V O L U Ç Ã O D A prescrição CLÍNICA DO EXERCÍCIO: Ilustrações: Márcio Batista Projeto Gráfico e Diagramação: du.ppg.br Revisão de Texto: Melissa F. Zanardo Andreata, Hellen Guareschi e Anelise de Macedo Franceschi Esta obra está registrada na Biblioteca Nacional dos Direitos Autorais sob o número de registro: 816/17 Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Index Consultoria em Informação e Serviços Ltda. Curitiba - PR P986 Purvis, Thomas Clark A evolução da prescrição clínica do exercício : a identidade da fisioterapia / Thomas Clark Purvis, Mariane Franceschi Malucelli.— Curitiba : Edição do Autor, 2017. 264 p. : il. ISBN 978-85-923695-0-7 1.Fisioterapia. 2. Exercícios físicos. 3. Exercícios terapeuticos. I. Malucelli, Mariane Franceschi. II. Título. CDD (20.ed.) 615.82 CDU (2.ed.) 615.8 I M P R E S S O N O BRA SI L /PRI N TED I N BRA ZI L THOMAS CLARK PURVIS MARIANE FRANCESCHI MALUCELLI A E V O L U Ç Ã O D A prescrição CLÍNICA DO EXERCÍCIO: 1ª E D I Ç Ã O CURITIBA Mariane de Macedo Franceschi Malucelli 2017 Mecânica do Exercício O cabo de guerra interno Força Movimento articular AGRADECIMENTOS 08 PREFÁCIO 12 Mecânica articular: Movimento e força Descrevendo posições e movimentos articulares: Orientação do corpo Mecânica articular: “Controle articular” influências passivas Mecânica articular: Controle articular ativo Mecânica muscular: A força interna do cabo de guerra Mecânica muscular: Habilidade muscular INTRODUÇÃO A Fisioterapia e a prescrição do exercício 14 O perfil da potência/esforço Perspectivas sobre a evolução da ciência 26 O profissional do exercício 34 Mecânica da resistência: Perfil da resistência O que é exercício? 42 Bibliografia 53 Mecânica da resistência: Direção Magnitude: Explorando as propriedades da resistência Mecânica da resistência: Posicionamento da carga Mecânica da resistência: Centro de massa Bibliografia í ndice 56 60 66 74 90 100 Continuum do exercício O que é função O Continuum Funcional 184 192 108 O mundo do exercício e a performance externa 200 110 Performance interna 216 Exercício baseado no cliente-paciente 224 Resposta e adaptação 228 Continuum do exercício e O.D.E. [objetivo do exercício] 234 126 140 146 154 162 170 174 177 A orquestração Bibliografia 252 263 Mariane Franceschi Malucelli D edico este livro aos meus filhos, Chloe Grace e Benjamin Joseph, que, mesmo tão novos, precisaram passar longos períodos sem minha presença e suportaram minha ausência com força e carinho, apoiando-me durante todo o percurso. Peço a Deus que coloque a presença Dele em dobro no coraçãozinho de ambos para compensar todo o tempo em que estivemos separados. Vocês são a minha maior alegria, sempre. Ao meu marido, Marcos, que infalivelmente assumiu o papel de pai e mãe durante o tempo dedicado para escrever este livro. Eu não teria conseguido sem seu total apoio e ajuda. Você sempre me incentivou a olhar mais alto e a alçar voo em terras ainda não exploradas. Sua perseverança e força me inspiram sempre. Agradeço meu pai e à Raquel por nunca medirem esforços para prover o que existe de melhor para nossa família. À minha mãe e ao Geraldo (in memorian) pela coragem de sempre se levantarem e lutarem, independentemente do tamanho da queda, com a certeza de que a vitória está em Deus. Ao José Luiz, meu irmão, e à Danielle, que acreditaram e me incentivaram a continuar a jornada quando estava prestes a desistir e me apoiaram sem limites em um momento tão crucial para este projeto. À Anelise, minha irmã e amiga, que sempre me A G R A D ajudou a tornar minhas visões e sonhos em realidades, muitas vezes sacrificando seu tempo e seus sonhos para ajudar a atingir os meus. Você é uma das pessoas mais lindas e fiéis que eu conheço. A toda a minha família no Brasil, meus avós e minha sogra e todos os meus irmãos e cunhadas – fui muito abençoada por nascer em uma família que sempre, desde jovem, me apoiou e me ajudou muito a crescer. Todos vocês representam muito para mim. Agradeço ao próprio Tom Purvis, que viu em mim um potencial que nem eu mesma enxergava e confiou em mim todos estes anos para levar para o Brasil a ciência que exigiu tanto sacrifício em sua vida para estudá-la e desenvolvê-la. Ele nunca mediu esforços para disseminar essa semente e transformar o mundo do exercício, jamais olhando para si mesmo, mas sempre buscando uma maneira de ajudar profissionais a enxergarem o que é invisível na prescrição do exercício: a força. E também à Jeniffer Purvis e suas filhas, Jenna e Katie, por junto com o Tom terem pago um alto preço durante esta jornada. Agradeço ao dr. Roberto Cepeda, presidente do COFFITO, que enxergou a necessidade de trazer um conhecimento de vanguarda para ajudar o fisioterapeuta do Brasil a alcançar um nível profissional ainda mais alto e trazer mais dignidade e valorização profissional. E C I M E N T O S Agradeço também a todos aqueles que foram meus professores neste caminho, aprendi muito com cada um de vocês. A todos que fazem parte e já fizeram parte do crescimento do RTS no Brasil. À Silvia e Emílio Cornelsen e a toda equipe da Academia Swimex, por sempre estarem ao meu lado me apoiando, me escutando e cedendo seu tempo e seu espaço maravilhoso. À Viviane Stonoga e à Renata Petri, por tantas horas de trabalho e empenho. À minha família na fé, Pastor Mahesh Chavda e Bonnie Chavda, Heather Harris, Angela e Seiy Olurotini, Valerie e John Griffin, Todd e Lilly Moser, Rob e Erica Robinson, Joezer e Stefanie Cezak (o caminho reto, estreito, longo e provavelmente o mais difícil é o certo), Ana Paula Nascimento, por serem sempre um alicerce na força da oração. Agradeço principalmente a Deus, porque sem Ele nada seria possível. Por Ele ter aberto os olhos do meu entendimento para que eu enxergasse a verdade, inclusive a verdade sobre os exercícios e me capacitar para estar aqui hoje disseminando este conhecimento. Deus é muito bom, sempre! “E conhecereis a verdade e a verdade vos libertará!” (João 8:32) Thomas Clark Purvis P rimeiramente, quero agradecer ao meu pai, um engenheiro que me apresentou ao mundo do exercício com o objetivo de saúde e qualidade de vida (separado dos esportes) quando eu tinha 8 anos de idade e cultivou minha natureza já voltada à mecânica desde aquele tempo. Ele me ensinou a aplicar a mecânica e a descobrir onde cada fator pode ser considerado influenciador. Me ensinou a ser um pensador e alguém que toma decisões e não um seguidor. E também me ensinou que se algo é muito popular, provavelmente está incompleto, errado ou foi supersimplificado. Às minhas filhas maravilhosas, ambas “gênias”, cada uma a sua própria maneira. Elas me ensinaram mais do que podem imaginar, e tenho certeza de que mais do que eu sou capaz de ensiná-las. E à mãe delas, que continua sendo família e sempre no mesmo time. Aos inúmeros professores incríveis, habilidosos e inspiradores que eu tive durante minha formação, os quais eram apaixonados pelo conteúdo e por ensinar. Aos outros não tão incríveis, hábeis ou inspiradores, que não se interessavam pelo conteúdo nem por ensinar e que me ensinaram como não ser. A G R A D Aos meus alunos do Master, os quais continuadamente me inspiraram a melhorar aquilo que ofereço e como eu ofereço – se minhas tentativas de mudança foram apreciadas ou não é um outro assunto. A todos aqueles que copiaram meu trabalho, minhas palavras e meus métodos de ensino e apresentaram como originais, sem referência ou agradecimento. Vocês sempre me desafiaram a crescer e me elevar a níveis ainda mais altos e muito acima da mesquinhez e mesmo assim me manter no caminho da integridade e da maestria, caminho este do qual vocês derivaram. Aos meus instrutores, aos muitos indivíduos que vieram e foram ao longo das décadas, àqueles que foram suficientemente corajosos e tolerantes o suficiente para me ajudar na partilha destas ideias em todo o mundo. Escolhidos por sua compreensão das informações, a sua capacidade para demonstrar como aplicá-las, sua excepcional habilidade de se comunicar de maneira simples e, sobretudo, a sua paixão pelo ensino, cada um deles é capaz de ensinar temas complicados de uma maneira simples e divertida. E C I M E N T O S Eles são uma espécie rara no mundo da educação e do exercício. Tive a honra de ter conhecido cada um de vocês, e me sinto ainda mais honrado por vocês terem sentido que esta informação foi digna do autossacrifício necessário para compartilhá-la com um mundo enraizado em chavões sobre exercício e os mitos da “ciência” de academia. E, para aqueles que continuam a aceitar o desafio desta jornada, vocês são tão loucos como eu. Muito obrigado! À Mariane, sem a qual este projeto não teria existido nem chegado a esta fase de conclusão dentro da sua contínua evolução. Sua integridade, persistência, sensibilidade, honestidade, humildade, coragem e fé foram inspiradoras e muitas vezes um “pontapé na bunda” necessário. Àquele que chamamos de Deus. Porque não fui eu quem escolheu este caminho, nem esta aptidão para esse conhecimento, nem o desejo de explorar, nem a paixão, nem a coragem (ou ignorância) para confrontar a tradição e para contar para todos aqueles que se dispuseram a ouvir. Este Deus entregou tudo para mim. DR. Roberto Mattar Cepeda É com satisfação que, na qualidade de diretor-presidente do Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional, apoio a edição desta obra de conhecimento técnico-científico, intitulada A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício. A obra está organizada em capítulos, nos quais você terá a oportunidade de ler sobre os diversos temas que envolvem a prescrição clínica do exercício. O fisioterapeuta é o profissional da saúde especialista no movimento humano, com habilidade e competência diferenciada para prescrição clínica de exercícios, levando em consideração todos os fatores internos e externos do corpo humano. A dra. Mariane Franceschi Malucelli e o dr. Thomas Clark Purvis, fisioterapeutas e autores do livro, são referências internacionais na matéria. A dra. Mariane faz parte do maior centro de recuperação de traumato-ortopedia dos EUA. Dito isso, faço aqui um agrade- prefácio cimento público e especial a estes profissionais que, de forma didática e científica, aceitaram este desafio. O tema reafirma a essência da Fisioterapia no Brasil e, de forma altamente especializada, apresenta a prescrição clínica do exercício pautada nas condições clínicas do indivíduo, na biomecânica articular, na cinesiologia, na cinesioterapia e na física. A prescrição clínica do exercício é o nosso principal instrumento de trabalho. O profissional fisioterapeuta que adquirir esta distinta competência será mais resolutivo e, consequentemente, mais valorizado no mercado de trabalho. Cuidado! O exercício que cura é o mesmo que machuca; a diferença está na prescrição clínica do exercício. Consulte o especialista do movimento humano. Consulte o fisioterapeuta. Boa leitura! OFFITO Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli Q ual o papel do fisioterapeuta dentro da prescrição do exercício na sociedade contemporânea? Quais necessidades ele deve atender? Onde a especialidade e a maestria do saber fisioterapêutico são requeridas? E, principalmente, onde está a maior oportunidade de mercado para o fisioterapeuta na área da prescrição clínica de exercícios? Vivemos em um tempo em que a prescrição do exercício parece ter perdido força dentro da fisioterapia. Como profissionais, temos nos dedicado a muitas especialidades importantes, porém não temos buscado nos especializar na prescrição clínica do exercício, e isso é prejudicial à nossa área. Prescrevemos exercícios como forma de intervenção fisioterápica para a reabilitação de disfunções neuromusculoesqueléticas, prescrevemos exercícios para o pós-operatório, prescrevemos exercícios na fisioterapia hospitalar ou ortopédica e em muitas outras especialidades dentro da fisioterapia. Nossa capacidade em alcançar bons resultados com a prescrição do exercício para nossos clientes e pacientes é dependente do quanto entendemos sobre a “ciência” do exercício, assim como nossa habilidade em examinar e progredir cada exercício, para cada indivíduo, de acordo com suas necessidades, limitações e objetivos individuais. O exercício é, sem sombra de dúvidas, a ferramenta mais poderosa que o fisioterapeuta utiliza como intervenção, pois é a única capaz de transformar uma resposta aguda em uma adaptação positiva crônica (que permanece). A prescrição clínica do exercício faz parte da origem, do DNA da fisioterapia, e o fisioterapeuta deve se tornar o profissional que mais conhece todos os aspectos que envolvem o estímulo e a adaptação do exercício, tornando-se assim a classe profissional referência para a sociedade dentro da prescrição clínica do exercício para a reabilitação, desenvolvimento e conservação da saúde. Para que possamos nos especializar nesta área, precisamos nos aprofundar no estudo da mecânica do exercício, que deriva da biomecânica, sendo a ciência da aplicação da mecânica articular, da mecânica muscular e da mecânica da resistência específica para cada exercício e cada indivíduo. Esta ciência nos ajuda a evoluir no aprendizado sobre o estímulo do exercício, tornando possível prescrever exercícios com mais eficiência e menor custo. O conhecimento que o profissional poderá adquirir neste livro é aplicável em todos os cenários em que o exercício é prescrito na fisioterapia. Pode ser em clínicas ortopédicas, no pós-operatório, na osteopatia, no pilates, na musculação terapêutica etc. Isso é possível porque é a ciência que governa o exercício, independentemente para qual especialidade o exercício é prescrito. Porém, chamamos a atenção para a prescrição 14 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia I do exercício para a conservação da saúde e da função neuromusculoesquelética, pois é esta uma das maiores necessidades da população hoje e também a área com maior possibilidade de crescimento da nossa profissão, como indicado numa pesquisa realizada nos Estados Unidos. Ela aponta evidências de que um grande número da população acima de 50 anos apresenta degeneração articular no joelho mesmo sem dor e sem indícios de degeneração registrados em exame radiográfico. Os resultados desta pesquisa demonstram que: 1. 74% das pessoas acima de 50 anos apresentam alterações estruturais que poderiam influenciar permanentemente a ADM; 2. 69% têm alterações estruturais que podem influenciar a tolerância à força; 3. 88% das pessoas sem queixas de dor tiveram pelo menos uma das patologias citadas que indicam que ausência de dor não significa ausência de possíveis fatores que requerem considerações especiais. Esta é uma evidência que confirma que a população acima de 50 anos necessita de profissionais especialistas na função neuromusculoesquelética e especialistas na aplicação de estímulos (forças), para que obtenham resultados positivos no desenvolvimento e conservação da função sem detrimentos adicionais às articulações. N T R O D U Ç Ã O Prevalência de anormalidades no joelho detectadas por ressonância magnética em adultos sem indicativo de artrose no joelho: estudo observacional baseado na população Estudo de Osteoartrose em Framingham1 Objetivo: Examinar o uso da ressonância magnética em joelhos que não indicaram evidência 1 BMJ. 2012; 345: e5339. Published online 2012 Aug 29. doi: 10.1136/bmj.e5339 PMCID: PMC3430365 Prevalence of abnormalities in knees detected by MRI in adults without knee osteoarthritis: population based observational study (Framingham Osteoarthritis Study) Ali Guermazi, professor of radiology, Jingbo Niu, research assistant professor of medicine, Daichi Hayashi, research assistant professor of radiology, Frank W Roemer, associate professor of radiology, Martin Englund, associate professor, epidemiologist, Tuhina Neogi, associate professor of medicine and epidemiology, Piran Aliabadi, professor of radiology, Christine E McLennan, project manager, and David T Felson, professor of medicine and epidemiology A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 15 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli radiografica de osteoartrose para determinar a prevalência de lesões estruturais associadas com a osteoartrose e suas relações com idade, sexo e obesidade. Design: Estudo observacional baseado na população. Localização: Comunidade em Framingham, MA, Estados Unidos (estudo de osteoartrose em Framingham). Participantes: 710 indivíduos > 50 anos que não tinham evidências radiográficas de osteoartrose no joelho (Kellgren-Lawrence grade 0) e que se submeteram à ressonância magnética do joelho. Medidas de resultado principais: Prevalência de descobertas através da ressonância magnética que são insinuantes de osteoartrose de joelho (osteófitos, danos na cartilagem, lesões da medula óssea, cistos subcondral, lesões meniscais; sinovite; atrito; e lesões ligamentosas) em todos os participantes e depois da estratificação por idade, sexo, índice de massa corporal (BMI) e a presença ou a ausência de dor de joelho. A dor foi avaliada por três perguntas diversas e também pelo questionário de WOMAC. Resultados: Dos 710 participantes : • 393 (55%) eram mulheres; • 660 (93%) eram brancos; • 206 (29%) tiveram dor no joelho no último mês; • A idade média era 62,3 anos; • A prevalência de “qualquer anormalidade” foi 89% (631/710) do total; • Osteófitos foram a anormalidade mais comum entre todos os participantes: 74% (524/710 ); • Seguidos por dano na cartilagem: 69% (492/710); • Lesões de medula óssea: 52% (371/710); • Quanto maior a idade, maior a prevalência de todos os tipos das anormalidades detectáveis por ressonância magnética; • A prevalência de pelo menos um tipo de patologia (“qualquer anormalidade”) foi alta em ambos os joelhos com presença de dor (9097%, dependendo da definição de dor) e joelhos com ausência de dor (86-88%). Conclusão A ressonância magnética mostra lesões na articulação tíbio-femoral na maioria dos indivíduos acima de 50 anos de idade, em quem as radiografias de joelho não apresentam nenhum traço de osteoartrose, independentemente de dor. O conteúdo deste livro concentra-se inicialmente no estudo da mecânica do exercício, por meio do qual são apresentados os fatores necessários para a criação e desenvolvimento de exercícios, seguido pelo estudo 16 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia I do Continuum do exercício, em que apresentamos um processo de raciocínio crítico para as tomadas de decisões durante a aplicação e execução dos exercícios. O Continuum do exercício é um direcionamento para o profissional neutralizar a interferência dos protocolos através do maior desafio, que é libertarnos do pensamento padrão, deixando de lado modas e tradições sobre exercício e evoluindo para um processo de criação de exercícios específicos para cada cliente-paciente. Este livro foi escrito como resposta ao pedido do dr. Roberto Cepeda, presidente do COFFITO, que, com genuína preocupação e interesse pelo desenvolvimento profissional, vem buscando soluções para aumentar a dignidade e o valor do fisioterapeuta brasileiro. Movidos pela necessidade de crescimento profissional na área da prescrição clínica do exercício, o dr. Thomas Clark Purvis (fisioterapeuta – EUA) e eu, dra. Mariane Franceschi Malucelli (fisioterapeuta – EUA), decidimos contribuir gratuitamente com a evolução necessária em nossa profissão no Brasil. Escrevemos este livro contendo a fundamentação básica para o estudo e para a aplicação da mecânica do exercício, proporcionando ao profissional o conhecimento inicial para esta evolução. Precisamos resgatar o domínio e a autoridade sobre a prescrição do exercício para a saúde e essa jornada se inicia agora. N T R O D U Ç Ã O Mariane Franceschi Malucelli A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 17 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli U ma nova ciência… O campo da fisiologia foi estudado muito antes da exploração das respostas fisiológicas ao exercício. Da mesma forma, o campo da biomecânica já existe há anos, mas tem sido tradicionalmente explorado no estudo do desempenho esportivo, assim como nas áreas do movimento humano, da ortopedia, da marcha e de intervenções com o uso de próteses. As universidades incluem a biomecânica no currículo de todos os cursos que envolvem o estudo de exercícios, porém, até hoje, o seu estudo tem se mostrado valioso somente em laboratórios e com pouca aplicação na prática cotidiana para os profissionais que prescrevem exercícios clínicos. O universo das pesquisas sobre exercícios muitas vezes deixa de incluir algumas considerações mecânicas importantes, como variáveis a serem controladas, tornando grande parte dessas pesquisas imprecisas ou inaplicáveis. Por exemplo, o fato das considerações sobre as diferenças na angulação do osso esterno, que são únicas em cada ser humano, não terem sido consideradas como a principal influência mecânica nos exercícios para o músculo peitoral maior, é uma prova de que, até hoje, a biomecânica não foi aplicada nos estudos e pesquisas formais sobre exercícios no nível e clareza exigidos. Outro exemplo é sobre o estudo do exercício do agachamento, no qual as diferenças nas “proporções segmentares” não são examinadas como a principal influência em determinar a maneira como ele deve ser realizado ou modificado para cada indivíduo. Levando esses fatos em consideração, a mecânica do exercício é uma nova ciência. A aplicação de princípios mecânicos (engenharia) na análise, criação e modificação do exercício para cumprir os objetivos e as necessidades do cliente-paciente, respeitando as idiossincrasias neuromusculares de cada indivíduo, é uma exigência inquestionável para a evolução da prescrição clínica do exercício. O poder do processo do raciocínio lógico para a tomada de decisões. Os princípios da mecânica do exercício podem ser memorizados, mas isso não irá alterar nada ou ajudar ninguém. A memorização das informações é pouco aproveitável se estes não forem empregados apropriadamente e estrategicamente. É por esta razão que a criação e o desenvolvimento de um processo de raciocínio lógico e organizado foram absolutamente vitais para a aplicação dos princípios da mecânica do exercício. Em essência, esse processo de raciocínio faz a ciência da mecânica do exercício se tornar viva. Ele orienta a tomada de decisão clínica, tornando os protocolos obsoletos devido às suas ineficiências em tornar o exercício individual. 18 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia I O Continuum Funcional é um processo de reflexão contínuo para a análise, a investigação e o exame das capacidades funcionais, internas e externas, de qualquer indivíduo. O Continuum do exercício nos conduz ainda mais adiante no processo de tomada de decisão, em que o movimento, a resistência, a intenção, o esforço e o tempo são manipulados e ensinados, adequadamente e estrategicamente, a fim de estimular uma mudança conforme o objetivo e a tolerância de cada indivíduo. O domínio e o processo de raciocínio desta nova ciência requerem anos de estudo e de aplicação. A profundidade e a abrangência das informações contidas neste livro são vastas e derivam de 30 anos de sucessos e fracassos na aplicação desta nova ciência. Este livro foi escrito como uma iniciação à mecânica do exercício e ao novo processo de raciocínio lógico para tomada de decisões clínicas na prescrição do exercício. Ele foi escrito a pedido do Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional do Brasil no momento em que este inicia um grande movimento de vanguarda para o avanço, o crescimento e a desafiadora evolução da prescrição clínica do exercício no país. E, por mais que a sua missão seja local, o impacto da sua visão, da sua responsabilidade, desta ciência e deste processo de raciocínio será inevitavelmente global, com o Brasil definindo um novo padrão na compreensão e na aplicação clínica do exercício. N T R O D U Ç Ã O Thomas Clark Purvis A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 19 A Fisioterapia e a Prescrição do Exercício I F isioterapia não é moda. Sendo assim, fisioterapeutas não devem estar suscetíveis aos modismos do mercado do exercício. Devemos estar sempre nos aperfeiçoando e aprendendo sobre novos métodos e novas técnicas. Porém, o fisioterapeuta deve ter em mente que métodos e técnicas são sempre novas ferramentas e estas devem ser incorporadas a sua grande “caixa de ferramentas”, sempre julgando quanto cada técnica ou cada método é apropriado para cada situação. O fisioterapeuta é o profissional, ele é o especialista que irá avaliar cada situação e a efetividade da intervenção, sendo que tudo isso tem que ser baseado em evidências. A fisioterapia exige que a prescrição do exercício seja individualizada/customizada. Esta customização é a diferença fundamental no foco e na finalidade da prescrição elaborada por um fisioterapeuta em comparação a outros profissionais, porque o fisioterapeuta deve customizar a aplicação do estímulo, da força, e não somente da intensidade, número de séries e repetições, como comumente tem sido feito. Tradicionalmente, o exercício é considerado antes da estrutura/corpo. Nesse caso, a prescrição é feita desconsiderando idiossincrasias de quem o realiza, é o indivíduo quem precisa se enquadrar nas regras do exercício, independentemente da sua estrutura/corpo, e o foco da execução está no número de séries e repetições, quer dizer, o foco está no exercício. A fisioterapia necessita evoluir desse modelo para outro, no qual o foco está na estrutura/corpo. A prescrição do exercício deve ser feita a partir daquilo que é observado no indivíduo específico, ou seja, a estrutura/ corpo é considerada antes do exercício. Isso significa que o exercício deve ser adaptado para atender as peculiaridades físicas identificadas em cada situação que se apresenta. Os protocolos de execução nesse caso são orgânicos e ininterruptamente customizados, criados e moldados de acordo com a estrutura do cliente-paciente e com um cenário mecânico individual. Essa simples diferença de abordagem no foco N T R O D U Ç Ã O muda completamente a maneira como o exercício é prescrito. • Prescrição do Exercício Tradicional Considera o exercício antes da estrutura/corpo. • Prescrição Clínica do Exercício Considera a estrutura/corpo antes do exercício. O fisioterapeuta é o profissional mais habilitado para a prescrição do exercício com o objetivo de melhorar a tolerância do tecido muscular. Nesse sentido, o foco da intervenção precisa manter-se em elementos internos e priorizar a estrutura neuromusculoesquelética. Note que, quando a atenção do exercício está no protocolo/programa, desprezando peculiaridades estruturais de quem o executa, isso significa que a atenção está no próprio exercício, ou seja, o foco é externo. Para que haja uma verdadeira mudança ao prescrever o exercício, saindo do foco externo e indo para o foco interno, é imprescindível que antes aconteça uma transformação no pensamento do profissional. A prescrição clínica do exercício para conservar a capacidade física, a função e a saúde Restaurar, desenvolver e conservar a capacidade física do corpo humano precisam ser os objetivos para a prescrição do exercício feita por fisioterapeutas. E é necessário que esses objetivos sejam constantemente reforçados sem nunca serem ignorados, pois são o escopo legal de nossa profissão. É de conhecimento popular que, para a conservação da capacidade física do corpo humano, é necessário a prática regular de exercícios físicos. A prescrição de exercícios para a manutenção da saúde tornou-se popular após o lançamento do famoso livro Aerobics, do dr. Kenneth Cooper, em A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 21 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli 1968. Dr. Cooper escreveu vários livros sobre esse assunto utilizando exercícios aeróbicos, sendo considerado preconizador e pai do método de corrida “cooper”. Desde então, médicos no mundo inteiro começaram a recomendar a prática de exercícios físicos como algo essencial para a manutenção da saúde e, assim, um novo mercado nasceu. As academias surgiram e com elas as marcas de roupas específicas para a prática de exercícios. Pesquisas cada vez mais elaboradas sobre exercícios também foram desenvolvidas. A propaganda para a conscientização da população sobre a necessidade e os benefícios da prática de exercícios direcionados com o objetivo de manter a saúde passou a ser cada vez mais frequente e contundente. Com todo o esforço de marketing e investimento financeiro feito nesse ramo de mercado durante todos esses anos, era de se esperar que uma grande parte da população estivesse atualmente envolvida e praticando exercícios físicos direcionados. Porém, não é este o cenário que encontramos. A IHRSA (International Health, Raquet and Sports Club) publicou no Global Report de 2016 que, no Brasil, somente 3% da população (aproximadamente oito milhões) pratica atividade física direcionada em academias e clubes. Já nos Estados Unidos, o maior mercado mundial, o número chega a 18% da população. Essas porcentagens podem aumentar se também considerarmos o número de praticantes de atividade física independente e não direcionada, ou seja, sem o acompanhamento de um profissional da área. No entanto, esses índices são desprezíveis se levarmos em conta o esforço mundial para a conscientização da população sobre a importância da prática de exercícios físicos. Apesar de existir uma grande parcela da população que inicia atividades direcionadas diariamente, a maioria não dá continuidade à prática em longo prazo. Uma das razões para isso é que muitos dos que tentam participar não gostam da experiência com o exercício no modelo em que hoje é apresentado. Aqueles que conseguem incorporar a prática de exercício em sua rotina representam, aproximadamente, 10% da população. Isso demonstra que há uma necessidade muito grande da criação de um novo modelo de prescrição de exercício para atender estes outros 90% que estão fora do mercado, mas que precisam se exercitar para conservar a função e a saúde. Novamente, a IHRSA publicou em seu blog, em novembro de 2016, que globalmente 11,7% da população tem mais de 60 anos, e a expectativa de crescimento desta população até 2050 é de 21%. Hoje, existem 75 milhões de baby boomers (nascidos entre 1945 e 1960 e que estão entrando em idade de aposentadoria), tornando esse grupo demográfico e o que mais cresce dentro dos clubes e academias. Quando esse grupo busca atividade física, ele busca quatro objetivos específicos: 1. Prevenção de problemas crônicos (conservar); 2. Controle de problemas crônicos existentes (desenvolver); 3. Inversão dos efeitos negativos da idade (restaurar); 4. A participação plena nas atividades cotidianas e nos seus hobbies. A estatística apresentada acima coloca esta população dentro do escopo da fisioterapia para a prescrição do exercício para a conservação, desenvolvimento e restauração da função neuromusculoesquelética. E agora é o momento mais propício para o nascimento deste novo modelo de prescrição do exercício, capaz de atender esta população que há décadas vem esperando por uma solução compatível com seu perfil psicológico e estrutural. Esse novo modelo pode ter como efeito positivo o engajamento e a permanência dessas pessoas na prática de atividades físicas. Em termos da saúde da população, isso será extremamente benéfico, independentemente da proporção em que acontecer. 22 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia I O modelo atual, que nasceu com a popularidade dos exercícios aeróbicos com Kenneth Cooper, em 1968, trouxe grandes benefícios para a população e certamente vai continuar trazendo. Desde o início da popularização da prática do exercício físico para a saúde, muitas modas e métodos foram criados e obtiveram sucesso. De um modo geral, eles permanecem por um tempo e desaparecem assim que um novo modelo entra no mercado. Em paralelo a todo o crescimento e movimentação em clubes e academias, algo interessante também aconteceu na área médica. Nessas quatro décadas, a Medicina Desportiva, que N T R O D U Ç Ã O trata basicamente de problemas ortopédicos causados pela prática da própria atividade física, teve um crescimento exponencial. Isso nos mostra que, muitas vezes, exercícios prescritos para a saúde podem resultar em consequências ortopédicas negativas. Lembro-me de quando participei do Congresso Brasileiro de Medicina Desportiva, em Florianópolis (Santa Catarina) no ano de 2003, onde, durante uma palestra sobre lesões no joelho, um famoso médico ortopedista brasileiro disse: “o dr. Cooper esvaziou os consultórios dos cardiologistas, porém encheu os consultórios dos ortopedistas”. E essa é uma grande verdade! Fig. 1. Prescrição clínica do exercício realizada pelo fisioterapeuta utilizando a máquina de extensão de perna como ferramenta de intervenção. Objetivo do exercício: desenvolver a capacidade de tensão no comprimento contrátil mais curto do tecido do quadríceps dentro da ADCCD (Amplitude de Comprimento Contrátil Disponível), restaurando e conservando o controle contrátil no final da extensão da articulação do joelho dentro da ADPAD (Amplitude de Posições Articulares Disponíveis). A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 23 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli Esse fato indica que o exercício em si não é automaticamente algo bom. Acompanhe um exemplo: um indivíduo praticou atividade física com objetivo de manter a qualidade de vida e a saúde por 20 anos, contudo teve como resultado concomitante ao fortalecimento muscular a degeneração da cartilagem hialina e óssea em uma articulação, o que resultou na necessidade de uma artroplastia articular. Apesar de o objetivo inicial ter sido a prática de exercício para a saúde e a qualidade de vida, o resultado final não foi necessariamente esse. Quando escolhemos o estímulo a ser prescrito no exercício, precisamos ter em mente que a saúde articular deve ser mantida a mais íntegra possível. No modelo atual, o foco da prescrição de exercícios para a saúde cardiovascular e o fortalecimento muscular têm sido muitas vezes atingidos à custa da saúde ortopédica. A maior parte da população possui uma estrutura que não tolera esse modelo, no qual a tolerância das articulações é ignorada. Para a transformação desse cenário, em que a saúde das articulações é ignorada, é necessária uma mudança não somente na aparência do exercício ou no local onde ele é realizado (clínica ou academia), mas também na completa composição do exercício em si. Os fisioterapeutas devem se tornar experts na aplicação de força na estrutura do paciente-cliente, priorizando a saúde ortopédica, na qual os fatores mecânicos tomam precedência aos fisiológicos e na qual a customização estratégica das variáveis mecânicas dos exercícios se tornam imprescindíveis, como as listadas abaixo: • Amplitude; • Posicionamento da carga; • Intenção; • Perfil da resistência; • Foco; • Aceleração/desaceleração; • Influências da inércia; • Tipo de resistência; • Apoio/restrição; • Trajeto guiado/restrição; • Forças articulares; • Índices da progressão. Todas essas variáveis são baseadas na mecânica específica de cada exercício e são influenciadas por fatores fisiológicos, tais como: • Tolerância; • Estrutura óssea; • Estrutura articular; • Consciência/percepção; • Amplitude contrátil; • Curva de aprendizagem; • Atenção. A ciência contida neste livro é fruto de mais de 30 anos de estudos da mecânica do exercício e sua prescrição, buscando entender quais os benefícios e custo (desgaste articular) dos exercícios para a saúde. Em todo este tempo também estamos ensinando profissionais do mundo inteiro sobre como aprender a mecânica de uma maneira aplicável no dia a dia para trazer o maior benefício possível para o cliente-paciente. A partir das constatações provenientes de todas estas experiências, desenvolvemos uma organização de trabalho capaz de envolver o espectro completo de possibilidades mecânicas para a prescrição clínica do exercício dentro do Continuum do exercício. No Continuum do exercício, o fisioterapeuta aprenderá a desenvolver um processo de raciocínio crítico para a tomada de decisão sobre a criação do exercício que deve ser prescrito para seu cliente-paciente, conquistando resultados seguros e eficientes. O fisioterapeuta, por sua vez, vai protagonizar uma verdadeira evolução profissional com inúmeros desdobramentos positivos, tais como: maior destaque no mercado, maior valorização profissional na sociedade e maior contribuição ao bem-estar de uma população que hoje não encontra aquilo que precisa para a prática sustentável de exercícios por uma vida inteira. 24 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia I N T R O D U Ç Ã A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • O 25 Perspectivas sobre a evolução da ciência I A ciência está em constante evolução. Conforme surgem nossos questionamentos sobre um tema, surgem também novas necessidades, novas tecnologias são desenvolvidas e, assim, novas descobertas, teorias e aprendizagem começam a fazer parte de nosso conhecimento. Esta é uma imagem satélite da Terra, do globo terrestre. A Terra como todos nós a conhecemos hoje, redonda. As imagens satélites evidenciam isso com clareza e sem margem para contra-argumentos. Mas todos sabem que o conhecimento desta realidade nem sempre foi assim. Estudamos nas aulas de História que houve um tempo em que se acreditava que a Terra era quadrada ou plana. Não somente se acreditava que era desse modo, mas também os professores e sábios da época ensinavam isso como ciência e verdade, porque as evidências até então convergiam para isso. Fig. 2. A teoria da Terra plana que, com o desenvolvimento do telescópio, foi rejeitada e a evidência de que a Terra é uma esfera. Quando olhamos para o horizonte, enxergamos a Terra juntando-se ao céu numa linha reta que parece ser o “final da Terra”. Se tirássemos conclusões somente sobre o que vemos a partir dessa imagem e escrevêssemos livros sobre isso, teríamos evidências claras de que a Terra seria plana ou quadrada. Aqueles que lessem nossos livros e vissem “tal evidência” no horizonte, acabariam por confirmar essa suposição. N T R O D U Ç Ã O Assim, a teoria e sua “evidência inquestionável” se perpetuariam até que alguém observasse algo diferente e resolvesse questioná-la, buscando mais evidências para tentar trazer respostas a sua suspeita a fim de provar uma nova teoria. Fig. 3. Evidências de Galileu. E foi exatamente isso que aconteceu. Quando alguém observou que o Sol não fazia um trajeto retilíneo no céu desde o nascente até seu poente, mas que parecia mais curvilíneo, ele intuiu algo diferente, que havia algo errado com o conceito de que a Terra era quadrada ou plana. Porém, naquela época a evidência visual, a Igreja e os acadêmicos ensinavam isto como verdade. Também ensinavam que a Terra era o centro do universo, pois não havia meios de ver nada diferente até aquele momento. Então veio Galileu Galilei (1564-1642). Ele não inventou o telescópio (Hans Lippershey, 1570-1619) nem iniciou a teoria do heliocentrismo (Nicolau Copérnico, 1473-1543). Mas foi ele quem melhorou a lente do telescópio e com isso tornou-o mais potente, possibilitando ver o Universo com mais detalhes. Assim foi possível trazer as evidências necessárias para provar que a Terra não era plana, tampouco era o centro do universo. Galileu enxergou algo diferente e talvez tivesse dito: “Eu vejo a Terra se movendo em torno do Sol, junto com outros planetas, eu enxergo o contrário do que hoje aceitamos como verdade”. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 27 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli da sua vida em Alexandria. Ficou famoso na antiguidade pelo seu método de determinar o tamanho da Terra calculando sua circunferência, utilizando como principal fonte de observação o movimento do Sol. Ele estabeleceu que a circunferência da Terra era de 40.000 km. Passados mais de 2.000 anos, estudiosos foram conferir os cálculos de Eratóstenes e tiveram uma surpresa. A nova medição, realizada com equipamentos de precisão e com modernos sistemas de cálculo, resultou em um número praticamente idêntico ao de Eratóstenes, ou seja, 40.075 km. É incrível pensar que aproximadamente 2.000 anos antes de Galileu existiu alguém que calculou a circunferência da Terra com tal precisão e, mesmo assim, muito tempo depois, a teoria de a Terra ser redonda não era aceita. Todavia, isso é óbvio hoje para nós. Fig. 4. Galileu Galilei (15 de fevereiro de 1564 - 8 de janeiro de 1642): nascido na Itália, foi matemático, astrônomo, filósofo e físico. Galilei foi personalidade fundamental na revolução científica. Galileu, insistindo em suas novas evidências e contrariando os estudiosos da época, foi colocado em prisão domiciliar até falecer, em 1642. Entretanto, muito antes de Galileu e Copérnico, outros estudiosos e sábios já haviam percebido que a Terra não poderia ser quadrada ou plana. Pitágoras, em 500 a.C., foi um deles, depois veio Aristóteles, que em 330 a.C. iniciou a teoria do geocentrismo. Mais tarde, Aristarco de Samos (310-230 a.C.) iniciou a teoria do heliocentrismo e, em seguida, o estudioso Eratóstenes 276-194 a.C. A história de Eratóstenes nos chamou a atenção e muito! Ele foi considerado o pai da Geografia, nasceu em Cirene em 276 a.C. e passou a maior parte Fig. 5. Esquematização do Experimento de Erastótenes. No solstício de verão, meio-dia local, os raios de sol incidem a exatos 90º na latitude do Trópico de Câncer. Eratóstenes de Cirene (276 a.C. - 194 a.C.): foi matemático, astrônomo, geógrafo e bibliotecário na Grécia, e conhecido por calcular a circunferência da Terra. 28 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia I Talvez você esteja se perguntando “por que estamos falando sobre isso? É obvio que a Terra é redonda, porém o tema deste livro é sobre o conceito e a prescrição clínica do exercício pela fisioterapia”. A resposta é simples: no mundo da ciência do exercício ainda existe muita teoria de “Terra quadrada” e vamos apresentar aqui um novo conceito, um novo olhar para identificar e evidenciar a possibilidade de evolução para a prescrição de exercícios na era da “Terra redonda”. Outro exemplo como citado acima, porém agora na área médica, vem de 1861. É a história da necessidade de os médicos lavarem as mãos antes das cirurgias para prevenir a infecção hospitalar. O médico húngaro Ignaz Philipp Semmelweis (1818-1865) tornou-se chefe-residente de obstetrícia no Hospital Geral de Viena e, em menos de duas décadas de sua breve carreira, ele se tornou o “salvador de mães” e o inimigo da academia médica. Naquela época, a “febre puerperal” acarretava uma impressionante taxa de mortalidade entre 10 a 35% das mulheres que tinham seu parto dentro do hospital, enquanto que, para mulheres que tinham seus partos feitos fora dele, a febre não era uma preocupação de saúde pública. Estes dados chamaram a atenção de Semmelweis que, após extensa observação, fundamentou sua conclusão de que a febre estava correlacionada com a infeção causada pela falta de higiene das mãos daqueles em contato com a paciente, incluindo médicos, enfermeiras e estudantes. Suas observaçcões foram publicadas em seu livro “A Etiologia, o conceito e a profilaxia da febre puerperal” (1861). Com a implementação, em 1847, de sua recomendação de lavar as mãos com água clorada, a queda da taxa de mortalidade reduziu de 12,24% a 3,04% no final do primeiro ano e a 1,27% ao término do segundo ano. Esses resultados foram magníficos e se esperava que a prática da higiene das mãos tivesse sido amplamente aceita pelos médicos da época, mas N T R O D U Ç Ã O isto não aconteceu. Semmelweis foi rejeitado pela classe médica, que não aceitou sua proposta de mudança porque ele não tinha uma evidência científica aceitável. Os médicos ficaram ofendidos com a possibilidade de terem que lavar as mãos e Semmelweis foi expulso de Vienna e depois colocado em um asilo, onde morreu aos 47 anos. Fig. 6. Ignaz Philipp Semmelweis (1º de julho de 1818 - 13 de agosto de 1865): médico nascido na Hungria e conhecido como o pioneiro em procedimentos antissépticos. Alguns anos depois, Louis Pasteur conseguiu observar os germes (micróbios) no microscópio e confirmou a evidência necessária para afirmar a teoria de Semmelweis. Desde então, a higienização das mãos foi aceita como verdade e introduzida como necessária por todos aqueles em contato com pacientes dentro do ambiente hospitalar. Lembre-se que naquela época não existiam luvas sintéticas. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 29 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli Temos muito a aprender com essas duas histórias para a aplicação na ciência do exercício. A evidência de Galileu foi resultado de conseguir enxergar mais longe em um aspecto mais amplo e com mais detalhes; já a evidência de Semmelweis foi resultado de enxergar o mais próximo possível, microscopicamente. Precisamos ter as duas visões em mente para entendermos a prescrição de exercício. Precisamos enxergar as forças externas de uma persperctiva macro e depois colocar um zoom para enxergar o resultado delas dentro da articulação a cada grau de movimento. Quando entrarmos nos detalhes da visão microscópica, precisaremos ter sempre viva a perspectiva satélite-macro, para que, quando estivermos analisando uma mitocôndria, nos perguntarmos por qual razão isso é relevante naquela situação. Existem situações apropriadas para se analisar a mitocôndria, mas para construir um exercício ela não é importante. A importância dela no exercício inicia quando vamos determinar seu tempo e frequência, isso significa o que fazer com o exercício, mas não como construí-lo. As decisões sobre a fisiologia devem vir depois das decisões sobre a mecânica do exercício. Talvez você esteja pensando: “Mas estamos no século 21, a ciência está muito avançada e as evidências também…”. Sim, mas no próximo século o conhecimento da ciência estará em um lugar diferente porque ainda não descobrimos tudo ou sabemos toda a verdade sobre a ciência. A Medicina e a ciência ainda estão em evolução, por isso precisamos aprender com os livros, professores e todos os meios disponíveis. Contudo, é necessário estarmos dispostos a aprender e entender que este é somente o começo. É importante estarmos abertos – mente e coração – para a evolução, porque a jornada do descobrimento ainda não acabou. A ciência do exercício também continua em evolução e muito do que estudamos hoje se apoia em observações aparentes e em conclusões baseadas nas evidências até então existentes, muito parecidas com as observações obtidas para defender a teoria da Terra plana. Para que a evolução necessária da ciência do exercício aconteça, será preciso avaliar como temos estudado o exercício até hoje e mudarmos a abordagem do estudo. O estudo tradicional do exercício aborda inicialmente a fisiologia, isto é, a adaptação que o exercício causa e posteriormente o estímulo do exercício. O exercício físico é a chave fundamental para alcançarmos resultados positivos sustentáveis com nossos clientes-pacientes. No entanto, isso não é uma tarefa simples. Conforme indicado na introdução, as análises e os conceitos que abordamos neste livro são baseados na Física aplicada no exercício, que é a mecânica do exercício – ambas são ciências exatas e podem ser comprovadas. Os resultados obtidos através da Física e da Mecânica são a verdade que está presente em todos os exercícios, quer saibamos ou não. Mas atenção: existe uma diferença entre o estudo da biomecânica tradicional e o estudo da mecânica do exercício, que veremos a seguir. Algumas definições de biomecânica • “O estudo das forças e os seus efeitos sobre os sistemas vivos.” (Peter McGinnis, em Biomecânica do Esporte e Exercício.) • “Ciência que estuda a ação de forças internas ou externas no corpo vivo.” (PDR – Dicionário Médico.) • “Biomecânica consiste na área da cinemática e da cinética. A cinemática inclui as descrições de movimento sem considerar as forças que o produzem. Cinética considera as forças que produzem o movimento, resultante do movimento ou da manutenção do equilíbrio.” (Norkin e Levangie, em Articulação, Estrutura e Função.) • “A mecânica é uma área da física e da engenharia que estuda e aplica a avaliação de forças 30 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia I responsáveis pela manutenção de uma estrutura ou de um objeto em uma posição fixa, bem como a descrição, previsão e causas de movimento de um objeto ou estrutura. O campo da mecânica pode ser dividido em estática, que considera as partículas e organismos rígidos que estão em um estado de equilíbrio estático; e dinâmica, que estuda objetos que estão em movimento acelerado. Dinâmica pode ainda ser dividida em cinemática e cinética. A cinemática é a geometria do movimento, que inclui a velocidade de deslocamento, aceleração sem contar a força. Cinética considera as forças causando o movimento.” (Garhammer, em Cinesiologia e anatomia aplicada.) • “Biomecânica é o estudo da estrutura e da função dos sistemas biológicos por meio dos métodos da mecânica.” (Hebert Hatze.) Durante anos, utilizamos a seguinte definição em nossos cursos: “Biomecânica é a ciência do movimento e a ação das forças sobre organismos vivos”. Mas sempre parecia que algo estava faltando, porque o que de muitas maneiras determina movimento e recebe o efeito das forças é a estrutura (arquitetura do corpo humano). Então, passamos a usar uma definição mais abrangente para biomecânica que incorpora os principais componentes indicados acima: O estudo da [1] Estrutura, [2] do movimento, [3] das forças e [4] seus efeitos sobre e dentro do corpo humano. Então, quando falávamos de biomecânica, estávamos estudando quatro coisas: [1] Estrutura, porque a sua tolerância e habilidade são fundamentais para o movimento, bem como a produção da força; [2] Movimento, porque não abrange apenas a física do movimento, mas inclui também o extremo dele, ou seja, o zero ou estático; [3] Força, incluindo a interna e a externa, assim como uma compreensão da natureza da própria força; [4] Efeitos, que se referem aos resultados asso- N T R O D U Ç Ã O ciados à aplicação, à produção e à tolerância das forças sobre e dentro das estruturas específicas. No exercício, a mecânica transcende e engloba todos os objetivos e todas as modas. Com o tempo, verificamos que os fatores que estudávamos não se encontravam nos livros de biomecânica, porque estes não levavam em consideração as diferenças de cada indivíduo e não colocavam todos os fatores em evidência em cenários mecânicos diferentes para chegarem a conclusões. Verificamos, então, que estávamos criando uma subdivisão dentro da biomecânica, que chamamos de mecânica do exercício (Exerciseeducation.com) e definimos como: Mecânica do Exercício A mecânica do exercício é a análise da mecânica articular, da mecânica muscular e da mecânica da resistência, assim como o estudo dos conceitos e das aplicações avançadas sobre a mecânica das cadeias e sobre a mecânica dos sistemas de elos integrados (Linkage System), e também a análise de suas respostas, como as forças articulares em exercícios específicos e como todas estas realidades são alteradas pela influência mecânica da intenção. A mecânica do exercício é usada para analisar exercícios tradicionais e populares e também para criar ou modificar diferentes exercícios para indivíduos/clientes/pacientes em pontos específicos da progressão. Mecânica versus condições Poderíamos dizer que mecânica do exercício é o COMO. É como construir um exercício em uma estrutura, com movimentos e forças específicas. Uma vez que o exercício esteja construído, é necessário A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 31 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli definir as condições em que ele vai acontecer: quantas vezes, quão frequente e, o que é raramente definido, quão difícil ou quão intenso. Estes fatores são considerados as condições sob as quais a mecânica do exercício é executada, que normalmente estudamos na fisiologia. A essência do exercício é a mecânica do exercício Mecânica não pode ser definida como uma teoria ou opinião. Ela é uma área da Física convencional e interdependente da Matemática. Não há pareceres em Matemática. Ambas são ciências exatas. No entanto, como nesse caso a mecânica é aplicada ao corpo e ao exercício, estamos limitados pela quantidade de informações disponibilizadas, pela capacidade de interpretar e aplicar essas informações, pela capacidade mental humana e pessoal, pela audição e viés seletivo e também pela nossa compreensão sobre o corpo humano que vem, principalmente, das nossas limitações no poder da observação. “A mecânica do exercício nos mostra as verdades invisíveis sobre os exercícios” Muitos experts encontram desafios com a aplicação da biomecânica. Eles têm dificuldade com o conceito de aplicar princípios conhecidos da física e da engenharia para o corpo sem que primeiro alguém tenha demonstrado por meio do método científico “clássico”. Porém, o tipo de investigação clássico requer muitos indivíduos em estudos extensos, a fim de detectar estatisticamente uma tendência ou verdade. Esse é o método científico exigido na fisiologia, que é uma ciência praticamente impossível de ser observada diretamente. Se entendermos o corpo humano como uma máquina de engenharia, verificaremos que nem sempre é necessário utilizar o método científico clássico para encontarmos a verdade. Quando engenheiros estabelecem os cabos de aço em uma ponte, eles não têm que construir trinta pontes para ver qual vai funcionar, porque a resistência dos materias já foi calculada, assim como o efeito das forças que serão aplicadas. Se eles possuem todos os dados necessários, constroem uma ponte que vai durar séculos. Isso porque utilizam muitos fatores conhecidos e calculáveis. Quando utilizamos duas ciências juntas, a física e a fisiologia, haverá sempre áreas sujeitas a especulação e teorização. Porque a física é uma ciência exata sendo aplicada na fisiologia, que é uma ciência inexata. Entretanto, a história da medicina ortopédica é inteiramente baseada em evidências repetitivamente documentadas e validadas, indicando que, quando uma entidade física está sujeita a forças que excedem a magnitude, a resistência, a tolerância e a capacidade dos materiais e das estruturas, o detrimento e a degeneração (inflamação, disfunção ou falha) serão consequência. A mecânica do exercício nos mostra as verdades invisíveis sobre tantas variáveis que podem aumentar exponencialmente as forças nas articulações, como, por exemplo, a taxa de aceleração e de desaceleração e também a distância entre o posicionamento da carga e a articulação. E assim ela nos dá subsídios para fazermos melhores escolhas para nossos clientes-pacientes, para preservar a longevidade das articulações e, ao mesmo tempo, gerar estímulo para alcançar adaptações positivas e para manter a saúde articular e muscular. Biomecânica tradicional versus mecânica do exercício A maioria dos cursos de Biomecânica é voltada aos esportes e ao movimento humano bruto (bruto significa movimento humano total, sem dedução). Porém, vamos estudar uma subdivisão da biomecânica e focar no estudo da mecânica das articulações e da mecânica muscular, específicas para um exercício, 32 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia I porque a integridade do movimento bruto é determinada pelas limitações e funções das articulações individuais dentro de um sistema em cadeia. Inversamente, a estrutura e a função de cada articulação individual é baseada no seu papel dentro do movimento bruto sob as forças aplicadas. Os cursos superiores dentro da área da saúde normalmente ensinam a mecânica do movimento humano em termos de funções articulares individuais e movimentos globais comuns, como a marcha. Estes estudos são normalmente baseados em estruturas esqueléticas genéricas e não específicas. N T R O D U Ç Ã O Já na indústria do exercício, a “biomecânica do exercício” normalmente significa estudar e determinar “as técnicas tradicionais de execução dos exercícios”. Ela raramente envolve as forças, a função articular, a função neuromuscular e a progressão que são, na verdade, os fatores determinantes do exercício. Além disso, a maneira tradicional de analisar um exercício gera uma visão muito restrita, sem muito espaço para a criação e modificação individual. A importância de diferenciarmos a mecânica do movimento humano x biomecânica x mecânica do exercício é que, quando colocamos um peso em nossa mão, TUDO MUDA, tudo se torna específico para aquele cenário mecânico específico. Por exemplo, o ritmo escápulo-umeral muda de acordo com o aumento da resistência e com as alterações na direção da resistência, a participação muscular muda de acordo com a direção da resistência. “Quando você coloca um peso em sua mão, tudo muda!” BM Fig. 7. Neste exemplo, a direção da resistência altera a participação muscular e o torque tanto para o cotovelo quanto para o ombro. Aqui, o torque para o cotovelo exige a participação da musculatura anterior do cotovelo, os flexores, para realizar a extensão do cotovelo excentricamente. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 33 O PROFISSIONAL DO EXERCÍCIO I O que é necessário para que o fisioterapeuta tenha sucesso com a prescrição do exercício? Quais são as ferramentas e as matérias-primas com as quais você trabalha? O que você realmente oferece com o exercício? Você está envolvido no processo de criação e execução do exercício que prescreve? Você consegue transferir o conhecimento teórico para a prática clínica? Para que o fisioterapeuta tenha sucesso e a fisioterapia ganhe maior relevância diante da população na área da prescrição clínica do exercício, é necessário que haja uma evolução profissional, deixando as modas e tradições de lado e trazendo o verdadeiro raciocínio crítico para fazer parte do cenário da prática profissional. Exercício prescrito por fisioterapeuta não é moda, é resultado! Independentemente da ferramenta que o fisioterapeuta utilize, seja ela máquina de musculação, máquina de pilates, pesos livres, thera-bands ou cabos, a prescrição do exercício necessita ser diferenciada no aspecto clínico e ético profissional. Fig. 8. Esses três círculos representam o que devemos ser como verdadeiros profissionais dentro da prescrição do exercício. Utilizamos o termo profissional do exercício porque, como fisioterapeutas, prescrevemos exercícios e nosso propósito aqui é ajudá-lo a melhorar sua habilidade de entender, prescrever e ensinar. Então, vamos pensar, vamos N T R O D U Ç Ã O estudar e elevar nosso nível profissional, construindo um mercado novo com muito sucesso. Fig. 9. Conhecimento CONHECIMENTO O primeiro elo é sobre o que você sabe, o seu conhecimento, aquilo que estudou sobre o assunto “exercício” (envolvendo todas as matérias básicas, como Anatomia, Biomecânica, Cinesiologia etc.) e sobre como aplicar este conhecimento. O aprendizado envolve enxergar aquilo que está sendo ensinado. Aprendizado compreende ser capaz de entender os conceitos antigos, conseguir enxergar o novo e ainda fazer a conexão correta entre os dois. “Diferença entre uma pessoa guiada por princípios e uma pessoa guiada por tendências: aquela guiada por princípios resistirá a seus aliados e apoiará seus adversários se a verdade e a moral exigirem. Uma pessoa que é levada por tendências vai para a guerra mesmo contra a verdade, a fim de defender a identidade do grupo.” ditado popular Existem dois problemas relacionados ao conhecimento: o primeiro são os chavões, pequenas frases ou palavras que soam de forma inteligente e são ótimas frases de marketing porque ficam gravadas em nossas cabeças, mas isto não é ciência. Chavões não são completamente corretos, mas carregam um pe- A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 35 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli queno traço de verdade, normalmente aplicável em algum cenário específico que provavelmente foi perpetuado, tornando-se um conhecimento genérico. Não usaremos chavões porque não são considerados “educação”. Com os chavões, vem o segundo problema: eles se tornam o chavão de um grupo inteiro de pessoas ou de todos que participam de um método e acabam por limitar a possibilidade do real aprendizado. Quando os participantes de um grupo escutam uma colocação ou uma frase cujo conceito não é igual ao que eles aprenderam, automaticamente existe uma rejeição sem uma real avaliação. Isso faz com que esses chavões tornem-se regras genéricas do exercício e se perpetuem por décadas. Quando, durante o processo educacional, não se objetiva o pensamento crítico, mas somente a aprovação, quando basta saber o mínimo necessário para resolver um problema teórico, nos tornamos profissionais restritos, pois, ao restringir o pensamento crítico, não desenvolvemos subsídios para resolver problemas na prática. Não existe como ser profissional da saúde com informação memorizada. Cada paciente apresenta individualidades que não se encaixam na regra geral e, como profissionais, precisamos entender os princípios que regem o exercício para sermos capazes de adaptar cada exercício de maneira segura e eficaz para cada cliente-paciente. Na prática clínica, as respostas não são tão simples e o que é aplicável em um cenário não é aplicável em outro. Podemos usar como exemplo aqui a regra “universal” do agachamento, que diz que o “joelho não deve passar à frente do dedão do pé”. Esta é a regra! Mas por que o joelho não deve ultrapassar a frente do dedão do pé durante o agachamento? Se sua resposta for igual a de um consumidor: “porque faz mal para o joelho”, então temos um sério problema. Você certamente usa um computador. Por acaso, você precisa saber como a informação é traduzida e criptografada na linguagem de um sistema informático? Provavelmente não, porque você é um usuário e não um profissional de Tecnologia de Informação. O profisisonal de TI precisa saber de programação, desenvolvimento de software e de hardware para poder construir computadores e programas para que possamos usá-los com maior eficiência. Nós, como profissionais de fisioterapia, precisamos saber tudo o que é neccessário para criarmos e manipularmos o exercício para cada indivíduo, pois não somos consumidores de exercícios e sim profissionais do exercício. Então, aprender “exercícios” é algo para o consumidor, copiar “exercícios” também, já o profissional aprende sobre forças e estrutura para poder criar qualquer exercício. Se você participa de cursos para aprender coreografia de exercícios, é a mesma coisa que um consumidor de computador fazer um curso para usar o Windows Office ou um novo programa. Porém, você, fisioterapeuta, é o programador! Você é o criador de exercícios! Quando nosso cliente-paciente nos pergunta por que o joelho não deve passar à frente do dedão do pé, a resposta para ele deve ser em nível de consumidor. Porém, como profissionais e experts na prescrição do exercício, precisamos saber a razão da regra, a ciência e todos os detalhes envolvidos por trás desse chavão. Precisamos saber distinguir entre o que é a verdadeira ciência do que é mito, do que é moda e do que é tradição. Como fisioterapeuta, você precisa saber usar toda a sua educação profissional para analisar qualquer técnica, método ou novo exercício, todos pelo ponto de vista da mecânica. Você, somente com seu conhecimento, deve conseguir decifrar o que está acontecendo em cada exercício ou método que é lançado no mercado. Se hoje você ainda não consegue fazer isso, este livro e este processo educacional têm o objetivo de te ajudar. Por exemplo, é essencial saber o que é cisalhamento e quando, como e por que ele precisa ser considerado, em vez de apenas repetirmos: “cisalhamento faz mal” ou, ainda, “a cadeira extensora tem muito cisalhamento e por isso é ruim”. Chavões como esses carregam o potencial de serem repetidos sem compreensão e, por isso, concluímos algo que não é 36 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia I verdade, pois a cadeira extensora não faz mal e oferece a mesma quantidade de cisalhamento que o agachamento, porém em posições articulares diferentes (JOSPT, 1992). Como profissionais, também precisamos ter uma visão de “Terra redonda” no mundo da teoria da “Terra quadrada” quando prescrevemos um exercício. Exercício não é movimento e não devemos ser distraídos pelo movimento; exercício também não é determinado pela sensação que ele gera, porque a sensação é enganosa e vai nos atrapalhar. A única regra que existe para o exercício são as forças e a estrutura. Este não é um livro técnico de biomecânica ou de anatomia. Nós utilizaremos os conhecimentos fundamentais da fisioterapia, acrescentaremos a mecânica do exercício e apresentaremos como eles se relacionam e são colocados em prática para a prescrição de exercícios. Fig. 10. N T R O D U Ç Ã O repetir a mesma coisa que se aprendeu na faculdade por 20 anos, significa passar 20 anos questionando, adaptando e evoluindo o que se aprendeu, aprendendo com seus erros e seus acertos e modificando sempre que possível. Isso é experiência! A ciência da prescrição do exercício foi historicamente saturada pela influência dos esportes e do treinamento desportivo. Porém, quando transferimos este conhecimento para a prescrição do exercício visando à saúde, esta ciência nem sempre se aplica. É muito importante conseguirmos distinguir a origem e a fonte onde estamos baseando nossa prática profissional. Temos a necessidade de eliminar o exercício predeterminado, no piloto automático, os protocolos e a coreografia. Para isso, precisamos começar a customizar verdadeiramente o exercício. A customização significa muito mais do que a inversão da ordem dos exercícios que prescrevemos. Vamos criar exercícios novos para cada cliente-paciente e mudá-los em cada sessão. Isso é uma arte, é a arte da fisioterapia, a arte da criação do exercício. Dessa forma, nosso trabalho nunca mais será monótono. Fig. 11. Prática Delivery PRÁTICA O segundo elo é a prática, é sobre o que fazer e sobre o que prescrever. Seria de esperar que quanto maior o conhecimento, maior seria sua aplicabilidade nos exercícios, mas não é isso o que acontece. Normalmente, os exercícios que prescrevemos e que nós mesmos fazemos já foram predeterminados, coreografados e protocolados. A educação representa 50% do conhecimento e a experiência, os outros 50%. Experiência não significa DELIVERY O terceiro elo tem o maior peso na influência do nosso sucesso. É como ensinar o exercício. Aqui temos maior potencial de melhorar nosso rendimento, pois demostra o nosso envolvimento com todo o processo do cliente-paciente. Ser tecnicamente excelente e qualificado não é A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 37 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli o suficiente para ter sucesso profissional. Saber apresentar-se e posicionar-se profissionalmente também são qualidades imprescindíveis. Quando o profissional atende um cliente-paciente por 1 hora, ele tem 60 minutos para aplicar todo o seu conhecimento e a sua prática para ajudar cada cliente-paciente individualmente a alcançar seus objetivos. Cada sessão para cada cliente deve deter 100% da atenção do fisioterapeuta. A sessão de exercício de 1 hora significa 3.600 segundos de atenção a todos os detalhes que acontecem na execução de cada exercício. Ao ensinarmos os exercícios aos nossos clientes-pacientes, precisamos estar preparados para dar dicas de ensino que realmente ajudem-no a ter mais facilidade de execução e de maneira correta. Para isso, a sua atenção e o seu ensinamento serão imprescindíveis a cada segundo. Para customizar um exercício que seja específico para cada cliente-paciente, precisamos basear nossas decisões nas regras da física e na estrutura individual. Temos uma ideia de como um exercício deve ser exe- cutado e de como ele deve parecer externamente, então ensinamos ao cliente-paciente claramente e com uma linguagem que ele possa entender. Durante cada repetição, precisamos comparar o que está acontecendo em cada articulação com o que esperávamos que acontecesse. A partir desse momento, inicia-se um processo contínuo de perguntas na mente do profissional, um monólogo interno, para termos as perguntas certas a serem respondidas, as quais ajudam o profissional saber como intervir. Por meio de feedback, vamos também criar um monólogo interno no cliente-paciente para que ele se envolva no processo do exercício que estará fazendo. Vamos estar presentes durante cada fração de segundo da execução do exercício com o cliente, para entender o que está acontecendo e, principalmente, interferir na hora certa com dicas verbais ou estímulo tátil quando necessário – ambos são progressivos e têm o objetivo de modificar o que está acontecendo durante um exercício. Fig. 12. Ilustração inspirada na “A Criação de Adão”, obra de Michelangelo (Capela Sistina – Vaticano). 38 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia I As dicas verbais precisam ser eficientes para ajudar na realização do exercício e precisam ser curtas, precisas e individuais. “Não deixe o joelho passar à frente do dedão do pé” ou “traga a barra até o peito” são informações genéricas e não ajudam o cliente-paciente a se localizar de dentro para fora do corpo, para poder modificar o que está acontecendo. Aqui, fica evidente que aqueles profissionais que praticam o exercício frequentemente e exploram cada repetição com cautela terão mais experiência para ensinar seus clientes como se estivessem fazendo cada repetição com ele. A comunicação deve ser uma tarefa agradável, mas voltada ao objetivo, não devendo ser terapia, drama ou entretenimento. Seu foco deve ser 100% no cliente: observe, pergunte, ouça (feedback), modifique, reforce. Valor profissional O que faz uma sessão de exercício custar R$ 300 ou R$ 100? 1 2 3 4 5 Fig. 13. A pintura por números é uma representação da prescrição de exercícios feita por programas e protocolos, pela qual o profissional prescreve exercícios copiados, deixando o foco principal no exercício e não na estrutura individual. N T R O D U Ç Ã O Exercício é exercício e não deveria existir tanta diferença. Essa diferença de valor está na customização, no resultado e em como o exercício é ensinado mesmo usando as mesmas ferramentas. E não existe como memorizar informações para que a customização aconteça; não tem como memorizar informação para que a sessão passe a valer R$ 300. É preciso realmente desenvolver um raciocínio crítico, aprender os princípios e aplicá-los em cada segundo da sessão. Para a customização do exercício, os números não são aplicáveis. Os números de séries e repetições, os números do tempo na esteira, não se aplicam dentro da customização do exercício, os parâmetros para intervenção e progressão são somente a estrutura e função do cliente-paciente e não é ditada por protocolos. A diferença entre Michelangelo e um artista que pinta seguindo números não é o número de cores disponíveis, o pincel usado ou a tela. É a habilidade com que se usa as ferramentas e a manipulação das variáveis. Quais são as variáveis do exercício? O que compreende um exercício? E quem é o responsável pela resistência? Se o profissional for um “Michelangelo”, será o responsável por criar, com o exercício, uma arte linda e diferente para cada indivíduo, mas, por outro lado, se “pintar seguindo números”, estará somente copiando exercícios criados por outro artista. Normalmente, a maioria dos profissionais só prescrevem exercícios que viram alguém fazer ou que aprenderam com alguém. Porém, quando entendemos de forças e de estrutura, começamos a criar exercícios novos e diferentes para cada cliente-paciente, e esta é a melhor maneira de aumentar o valor profissional, porque vai melhorar os resultados com menos custo e/ou desgaste. É neste momento que tomamos nossas próprias decisões e nos tornamos “Michelangelos”. Como fisioterapeutas, temos o desejo de ajudar as pessoas, ajudá-las no processo da restauração, desenvolvimento e conservação da função e a alcançarem melhores níveis de saúde. Acredito que você deseja ser um profissional digno e bem-sucedido, e a A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 39 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli remuneração profissional tem um papel importante em trazer dignidade. Porém, esta remuneração está sempre vinculada ao valor percebido pelo serviço prestado. Para sermos mais valorizados, precisamos oferecer mais. Nossa valorização não vem do Conselho Federal, nem do diploma que conquistamos, ela vem do nível de serviço que oferecemos e dos resultados que alcançamos. Com a possibilidade de crescermos na profissão em uma área ainda não muito explorada, precisamos nos diferenciar. Qualquer consultor de marketing vai dizer isso. Hoje vivemos um momento muito propício para essa diferenciação que pode ser oferecida por fisioterapeutas e devemos nos posicionar no mercado oferecendo o exercício com um “sabor” muito diferente daquele oferecido até hoje. Existe uma necessidade de profissionais que ofereçam este diferencial para a população que necessita, para aqueles 90% da população já citados no capítulo anterior. Podemos diferenciar preços e locais de trabalho. Porém, o que mais vai nos destacar no mercado é a customização e o atendimento que oferecemos. Por isso, não tenha medo de ser diferente. Fig. 14. do profissional. Exercícios baseados no cliente envolvem saber quanto de amplitude ele deve mover, qual a aparência da postura, o que o cliente tem disponível em cada articulação, o que isso significa e como este exercício deve se parecer. Não podemos usar em um exercício algo que o cliente-paciente não tem. Isso pode parecer óbvio, mas, na prática, se utilizarmos as regras do exercício como fundamento, muitas vezes ultrapassamos o limite que o cliente-paciente tem para ser usado. Se o cliente-paciente tenta trabalhar com mais amplitude do que ele tem controle, precisamos intervir e iniciar o exercício dentro de uma amplitude que ele possa controlar e, a partir deste ponto, começar a progredir. A população já tem uma opinião predeterminada de como o exercício “se parece” e o “sabor” que ele tem. Por exemplo, “a primeira vez que você fizer exercício sentirá dor”. Isso não precisa ser verdade se prescrevermos exercício usando a tolerância individual como balizamento e trabalharmos dentro do nível que o cliente-paciente está acostumado. Se estiver acostumado com zero, iniciar com dez é muito, independentemente do seu objetivo. É necessário construirmos a base e este processo é lento. Porém, se o exercício tem como objetivo a saúde, não existe pressa para se obter o resultado, porque será sustentado por uma vida inteira. CLIENTE/PACIENTE Exercício sustentável é aquele que o indivíduo consegue praticar por uma vida inteira! Cliente-Paciente Na área de sobreposição dos anéis encontra-se a peça mais importante, isto é, o cliente. Tudo deve ser baseado no cliente-paciente! Os exercícios não devem ser fundamentados nas crenças ou nas preferências 40 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia AQUILO QUE SABEMOS • Ensino Formal + Experiência • Pro ssional não pode seguir coreogra as e repertório de exercícios Chavões As Regras Genéricas do Exercício Ser pro ssional é conhecer a ciência e não repetir chavões COMO VOCÊ ENSINA Atenção Total 3.600 segundos EXERCÍCIOS Conhecimento Intenção Qualidade das repetições Foco Observe, pergunte, escute, modi que, reforce Paciente/ Cliente Delivery Prática • Exercícios customizados In uências Nível de conhecimento Saber de onde vem o conhecimento Esporte ≠ saúde Aplicação O que realmente importa? Cliente/ Paciente Fig. 15. O que é exercício? I V amos iniciar estudando alguns fatos que são disseminados e considerados conhecimento comum sobre o exercício. A maioria das pessoas acha que sabem o que é exercício, até mesmo aquelas que nunca o fizeram dizem saber o que é. Isso se dá porque possivelmente já viram uma flexão de braço, um abdominal sendo feito, ou até mesmo participaram de aulas de Educação Física na escola. Agora vem a pergunta: exercício faz bem para a saúde? Quando essa pergunta é feita para consumidores do exercício e mesmo para muitos profissionais do exercício, a maioria vai dizer cegamente que sim, que se exercitar faz bem para a saúde. Todas as versões de exercícios fazem bem para todo mundo? Você já se questionou sobre isso? Não citamos qual tipo de exercício faz bem, o que está implícito que todos os tipos sejam bons. Mas nenhum exercício é automaticamente bom. O pilates não é automaticamente bom, o cross fit não é automaticamente bom, o funcional não é automaticamente bom. Nenhum método de exercício é automaticamente bom para todas as pessoas. Como mencionado na introdução deste livro, durante o Congresso Brasileiro de Medicina Desportiva em 2003, escutei uma palestra ministrada por um renomado ortopedista no Brasil que disse: “O dr. Cooper esvaziou os consultórios dos cardiologistas e encheu os consultórios dos ortopedistas”. Isso indica que exercícios praticados para a saúde cardiovascular podem ter um custo articular. Então, nem todo exercício faz bem. Exercício ocorre por dentro. Devemos tomar decisões baseadAs no “lado de dentro”. N T R O D U Ç Ã O Perspectiva Exercício deve ser entendido como uma modalidade “invasiva”. Tipicamente, classificamos um procedimento invasivo como aquele que provoca o rompimento das barreiras naturais ou que penetra em cavidades do organismo, abrindo uma porta ou acesso para o meio interno. Os procedimentos que não envolvem instrumentos que rompam a pele ou que penetram fisicamente o corpo são considerados não invasivos. Por este motivo, profissionais da saúde e médicos se referem ao exercício como uma modalidade não invasiva. Mas, quando colocamos um halter na mão, as forças são transmitidas pelo corpo até locais distantes do seu ponto de aplicação, e é esse o conceito que nos incentiva a pensar no exercício como uma modalidade invasiva. Devido à aplicação das forças atravessar as articulações internamente, o exercício possui a capacidade de modificar a anatomia positiva ou negativamente. Por isso, gostaríamos que você também visualizasse o exercício como uma modalidade invasiva. Isso ajudará você, profissional, a ter uma perspectiva realista do que está acontecendo durante o exercício. Não podemos tomar decisões sobre o exercício observando somente a superfície, isto é, observando apenas a pele se mover. Durante o exercício, devemos procurar visualizar a ação das forças e seus efeitos dentro e sobre as estruturas e estar constantemente cientes de que o exercício acontece internamente. Logo, a afirmação de que o “exercício faz bem”, deve ser acompanhada de vários questionamentos, porque exercício não é automaticamente bom. Para que o exercício seja benéfico, é necessário primeiramente questionar: para quem está sendo prescrito? Por quê? Qual? Como? Quanto? Com que frequência? Analogia Vamos usar uma analogia: o filme Matrix (1999), mas sobre o exercício. É como entender o exercício na versão do filme Matrix. A maioria das pessoas passa a vida A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 43 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli vendo apenas diferentes formatos e movimentos da pele com um peso na mão. Mas há uma realidade escondida dentro do exercício, a realidade interna. Como profissionais, precisamos conhecer e manipular todos os fatores, internos e externos, que determinam o resultado dos exercícios e para isso precisamos abrir nossos olhos para “enxergarmos” internamente. “Quando você sabe o que procurar, tudo parece diferente.” Fig. 16. Assim como no filme Matrix, quando o personagem Neo toma a pílula vermelha e enxerga o que tem por trás da Matrix, quando mudamos nosso paradigma sobre o exercício e começamos a enxergá-lo internamente, enxergamos o invisível, nesse momento a evolução da prescrição do exercício acontece. Você já se fez a pergunta: “Por que as pessoas se exercitam?” Vamos explorar o que historicamente tem acontecido no mercado dos 3% a 10% da população que pratica ou já praticou atividade física. O principal motivo pelo qual as pessoas se exercitam ainda é para emagrecer, isto é, queimar calorias. Você pode achar engraçado, mas durante os 30 anos que trabalhamos com a prescrição de exercícios, escutamos inúmeras vezes clientes dizerem: “Preciso fazer mais exercícios hoje porque vou a uma festa e provavelmente vou comer muito”, ou “Preciso ficar mais tempo na esteira para queimar as calorias do que eu comi ontem”, como se exercício fosse uma penitência por ter comido demais ou para ter a recompensa de poder comer mais. Outros motivos pelos quais as pessoas buscam se exercitar são para obter fortalecimento muscular, melhoria da performance desportiva, por estética, pela saúde e pelo bem-estar. Também devemos explorar o que hoje é considerado como indicativo de um “bom treino” ou uma boa sessão de exercícios, tanto pelo profissional, como pelo consumidor. Novamente, durante 30 anos, verificamos que, para muitos, o que é indicativo de um bom treino é o suor, a fadiga, o aumento da frequência cardíaca, a dor e a sensação. Alguns, se não suarem ou se não sentirem dor, não consideram que foi uma boa sessão de exercícios. Um outro fator é a frequência cardíaca, que atualmente tornou-se um grande indicativo de intensidade de treinamento, de balizamento e da evolução dos clientes, não levando em consideração o que está acontecendo nas articulações. A sensação também tem sido indicação de um bom exercício ou de um bom treino. Muitas vezes escutamos: “Esse exercício funciona?” ou “Esse exercício é bom?” Então nos questionamos: o que querem dizer com essa pergunta? Quais são as suas expectativas, o seu objetivo? O que eu, como profissional, estou fazendo é necessário para ajudar meu cliente a alcançar o seu objetivo? Esses exercícios são necessários para alcançar qualquer objetivo ou somente para aquele objetivo com o qual estou trabalhando? Essas perguntas nos fazem pensar profundamente e jamais poderão ser respondidas de maneira genérica. Acreditamos que os profissionais já tenham um “cardápio” completo de exercícios que acreditam 44 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia I funcionar e, para eles, qualquer exercício fora desta seleção é uma incógnita. Devemos saber diferenciar entre o que a indústria nos diz sobre o que são indicativos de uma boa sessão de exercícios, de uma sessão que seja apropriada e realmente ótima para o indivíduo. O exercício deve ser apropriado ao nível pertinente de estímulos, como os determinados pela tolerância e pelos objetivos atuais do indivíduo. A grande pergunta é se esse exercício está ajudando esse determinado cliente, independentemente se vai ajudar algum outro. O exercício por si só não faz nada porque ele não funciona como mágica. Vamos fazer uma analogia com o martelo. Não é o martelo que coloca o prego na parede, é o profissional competente usando o martelo. Não é o exercício que faz algo para seu cliente-paciente, é a habilidade do profissional em aplicar o exercício adequado que vai trazer o resultado esperado. O exercício é somente a modalidade usada para atingir o objetivo. Então, o mais importante é ter clareza sobre qual é o objetivo, ou seja, o que realmente esperamos do exercício. Exercícios não trabalham músculos. São os músculos que trabalham para executar o exercício! O valor de uma sessão de exercícios está na conexão entre a sessão anterior e a próxima. Ao construir uma casa, um único tijolo não tem valor nenhum. Ninguém compra somente um tijolo pensando em construir uma casa, pois é somente quando os tijolos são empilhados estrategicamente que têm valor. Assim também o profissional precisa entender que somente uma sessão de exercícios não tem valor se não estiver planejada com o que já foi construído e com o que ainda falta construir N T R O D U Ç Ã O para atingir o objetivo do cliente-paciente. A sessão de exercícios ou o dia de treino em si não são o objetivo. Uma sessão precisa estar colocada entre outras sessões desenvolvidas com exercícios (estímulo/desafio) estratégicos. Não é durante a sessão que o progresso acontece, ele acontece entre as sessões. O progresso (adaptação) será então utilizado na sessão seguinte. Exercício Mas o que é exercício? Historicamente, exercício tem sido: • “Algo predeterminado”; “Com um nome”; “Uma coreografia”; • Alguma coisa que você “faz sem pensar muito”; • Posições iniciais e finais definidas; • Simplesmente mover o peso; • Movimento; • Governado por regras arbitrárias de exercício (“não trave os joelhos”, “não deixe o joelho avançar à frente do dedão do pé”); • Associado a efeitos mágicos; • “Trabalha” algum músculo? “O que esse exercício trabalha?” Hoje, enxergamos um exercício literalmente como algo predeterminado e encapsulado como uma coreografia. Sabemos o que é um agachamento, suas regras e maneiras como ele deve ser executado. A mesma coisa para o supino: sabemos o que é, como deve ser executado, e todas as regras associadas a ele. Normalmente, as regras associadas aos exercícios são derivadas dos esportes e não são aplicáveis a exercícios prescritos para a saúde. Inúmeras vezes escutamos a pergunta: Qual músculo esse exercício trabalha? Precisamos mudar nossa perspectiva. Os exercícios não trabalham músculos. São os músculos que trabalham para executar o exercício. Isso é muito diferente e muda completamente a abordagem da sua prescrição. Para que um exercício seja executado, é necessário que os músculos A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 45 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli estejam trabalhando dentro de você para realizar o exercício. Os exercícios não fazem nada, eles não são entidades independentes fora do seu corpo que chegam perto e executam algo em você. Se os profissisonais entendessem este fato, não fariam as perguntas que fazem. Somente repensando esses fatores poderemos realmente evoluir na prescrição e na criação de novos exercícios para a necessidade de nossos clientes-pacientes. Se o exercício tem um nome, ele provavelmente não é apropriado para muitas pessoas, porque possui suas próprias regras e sua própria coreografia, então, não se encaixa necessariamente para todas as pessoas. Com a nova moda do exercício funcional, o pensamento de que existe “O MELHOR EXERCÍCIO” tem tomado espaço nas palestras sobre exercício no mundo. A indústria tem indicado que o agachamento é o melhor exercício para os membros inferiores, por trabalhar o maior número de grupos musculares em um único exercício. Mas isso não está correto. Precisamos primeiro perguntar: para quem? Pois, se meu cliente-paciente possuir qualquer fator degenerativo no joelho (quer saibamos ou não), o agachamento não é o melhor exercício para estimular o quadríceps, devido ao custo inerente deste exercício em uma articulação frágil. Sendo assim, independentemente do que as pesquisas indicarem sobre a participação do quadríceps neste exercício, para este cliente ele não é a melhor opção. Se a articulação não tolerar as forças articulares que o agachamento gera, este não é um exercício apropriado. Não podemos indicar qual o melhor exercício sem antes considerar o indivíduo e o objetivo do exercício. Fig. 17. Todos os métodos e nomes mercadológicos do exercício são compostos dos mesmos fatores que, em diferentes quantidades e organização, tornam-se um método e ganham uma “embalagem”. Cada organização e método oferece diferentes estímulos e possíveis adaptações, porém são todos exercícios compostos dos mesmos fatores incluídos na equação do exercício. 46 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia I E a pergunta continua: mas o que é exercício? O mundo do exercício, as “embalagems”, o marketing e as expectativas. • • • • • • • • Ioga Pilates Body Building Powerlifting Cross Fit Corrida Esportes Cardio Pliometria • Alongamento • Funcional • Treinamento de Força • Treinamento de Potência • Treinamento de Esporte Específico A palavra exercício muitas vezes vem associada ao nome de um método ou a uma nova moda que, normalmente, vem aliada a resultados especiais e “mágicos”. Estes métodos crescem e permanecem no mercado por algum tempo e depois vem uma “nova onda” com um novo nome e outras promessas. Verificamos que profissionais são levados na “onda” e o que um dia prescreveram como o melhor método agora já não é mais e logo passam a prescrever um novo método. Talvez você se pergunte e tenha lutado para tentar entender por que tanta mudança dentro da prescrição do exercício. O que vamos analisar agora é muito valioso porque esclarece o mundo do exercício. Todos os nomes de métodos citados anteriormente são somente nomes de marketing que trazem consigo uma cultura e uma organização de trabalho que encontram praticantes que se encaixam neles. Todos esses métodos são estímulos que usamos para alcançar uma adaptação e todos são compostos pelos mesmos ingredientes, mas em quantidades diferentes. A ioga, o pilates, o funcional, o cross fit e a musculação contêm os mesmos ingredientes e a arte da prescrição do exercício está na habilidade do profissional de discernir todas as possibilidades para escolher o que é mais apropriado para cada cliente-paciente em cada sessão e não ficar preso somente a um método ou a uma técnica. Podemos realmente transformar vidas com a N T R O D U Ç Ã O prescrição de exercícios para a conservação, o desenvolvimento e a restauração da função. Então, precisamos pensar: qual desses métodos é o mais indicado para melhorar a saúde ou a função? Funcional, pilates, cross fit? Qual desses é predeterminado e coreografado? Qual impõe seus padrões a todos os praticantes? Na verdade, são todos diferentes embalagens da mesma coisa, o exercício. Todos são estímulos do corpo humano embalados com um laço diferente que agrada um certo grupo de pessoas, com suas atitudes, seus interesses e aparentemente um objetivo em comum. Onde essas pessoas se encaixarem, ali será formada uma comunidade em que se sentem confortáveis. Essas são embalagens de exercícios que fazem os clientes-pacientes retornarem quando gostam da experiência, quer se enquadrem no objetivo ou não. É necessário reconhecermos esses fatores e entendermos que são compostos das mesmas variáveis que precisam ser manipuladas. Como em uma receita culinária em que muitos ingredientes são utilizados em diferentes quantidades, assim também é o exercício e suas diferentes embalagens. Por isso, desenvolvemos uma equação do exercício com todas as variáveis (ingredientes) que precisam ser manipuladas. Fig. 18. A manipulação de todas essas variáveis com excelência torna um profissional incomparável no mercado. Aqueles que se tornarem experts na A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 47 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli manipulação, aplicação e prescrição do exercício baseadas nesta equação, serão profissionais com valor inigualável. Existe uma população que precisa de profissionais com essa capacitação. Existem médicos esperando para enviar pacientes para profissionais que sejam experts na manipulação dessa equação, isto é, experts na manipulação do exercício. Profissionais que não estejam limitados a somente métodos, mas fisioterapeutas confiantes e “mestres” na prescrição do exercício. Fisioterapeutas que têm a habilidade de manipular qualquer exercício para ser apropriado e customizado para cada cliente-paciente, e não um fisioterapeuta preso a um protocolo que deve se encaixar em todas as pessoas. Lembro aqui que no pós-operatório é necessário que sejam respeitados os tempos para reparação do tecido, então nestes casos os protocolos devem ser seguidos para a segurança do paciente. Vamos explorar a fundo a equação do exercício no capítulo sobre o Continuum do exercício, mas antes gostaríamos de continuar trazendo mais esclarecimento sobre as embalagens em que o exercício pode ser vendido. Talvez você tenha evidência de que todas essas formas de exercício apresentadas tragam resultado e é verdade. Quase todas elas trazem algum tipo de resultado se houver uma certa frequência na participação do cliente na atividade, mas será que isso é ótimo, apropriado, eficiente, seguro ou sustentável para este cliente? Analise: a flexibilidade não é exclusiva da ioga ou do pilates. Cardio não é exclusivo da esteira ou do elíptico, nem é exclusivo de exercícios de longa duração e baixa intensidade. Novamente, ferramentas por si só não trazem resultados. Prancha de equilíbrio não melhora o equilíbrio, usar peso não te faz mais forte. É o que acontece depois que utilizamos tais ferramentas que podem trazer algum resultado. Exercício não é uma opinião. Exercício não é algo que o profissinal acredita, gosta ou prefere e então prescreve para seu cliente-paciente. Exercício é a manipulação de todos os fatores da equação baseados no cliente e adequados para ele. Finalmente: o que é exercício? Exercício é força aplicada numa estrutura. O exercício é um processo, não é um programa! Um processo de estímulo e resposta (adaptação potencial) que pode ser positiva ou negativa. Tentamos incentivar o corpo a uma mudança e esperamos uma resposta. De maneira ideal, o exercício é uma quantidade de estímulos específicos a um objetivo em quantidades e frequência apropriadas. O estímulo não deve ser aleatório, ele deve ser específico para um objetivo e esse estímulo não deve ser determinado por nada externo ao próprio cliente-paciente. O estímulo O que é o estímulo? Precisamos ter clareza e conhecimento sobre isso, porque a adaptação (resultado) é totalmente dependente do estímulo. Existe um pensamento hoje no mundo do exercício de que exercício é movimento e dizem: “Não treine músculos, treine movimento!” Acredito que você já deva ter escutado essa frase. É claro que movimento é importante e tem muito valor, como a secreção de líquido sinovial para lubrificação articular, o deslizamento dos tecidos um sobre o outro, o deslizamento de uma superfície articular sobre a outra e a mobilidade. Vamos usar uma analogia: pensemos num motor elétrico desligado. Para mantermos suas partes conservadas, facilitando assim o trabalho de iniciação do motor quando for ligado na tomada, poderemos simplesmente movê-las manualmente. Entretanto, este motor desligado enquanto movemos as suas partes manualmente não produz HP (Horse Power) nenhum, não produz trabalho, apesar de estar em movimento. Então é isso que o movimento faz para o corpo se movemos uma articulação passivamente, ele mantém a articulação sem aderência. 48 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia I O que está produzindo o movimento? Porém, se o movimento for ativo, o que está produzindo movimento são os músculos. Então aquilo que dizem para não ser o foco do exercício, no caso, o músculo, é justamente o responsável por produzir o movimento. O movimento é produzido e controlado pela contração muscular. Na verdade, os responsáveis pelo movimento são os músculos. Mas o que faz os músculos trabalharem? Não vamos falar do sistema nervoso neste livro de iniciação. O que faz com que um grupo de músculos trabalhe mais do que outro? Ou, ainda melhor, o que faz com que um grupo muscular participe de um movimento mais do que outro grupo muscular? A resposta é a força. O exercício é totalmente relacionado à força. É a força, a resistência, que faz os músculos trabalharem. Eu vou além, ao dizer que exercício é primariamente resultado da força. O principal estímulo externo que causa mudança física é uma força específica chamada resistência, uma força em direção oposta às fibras musculares e aplicada a uma certa distância de um eixo. Estudamos em Cinesiologia que a extensão de cotovelo (movimento) é causada pelo tríceps (músculo) independentemente de qualquer indicativo da direção da resistência. Mas quando, durante a fase descendente de um exercício de barra fixa, o cotovelo está estendendo, não é o tríceps que está causando este movimento naquele momento, é o bíceps em uma contração excêntrica. Assim, se você realizar uma flexão de cotovelo, em pé ou sentado, contra a gravidade e depois uma extensão do cotovelo, não será o tríceps responsável pela extensão, será a N T R O D U Ç Ã O gravidade. Então, entender de força é essencial para podermos entender de exercício. Como poderíamos treinar o movimento sem músculos? Os movimentos sozinhos não determinam o que acontece com a musculatura. Na verdade quase poderíamos dizer que o movimento é o fator menos importante do exercício. O mesmo movimento pode ser realizado por músculos completamente diferentes baseados na direção da resistência encontrada. A resistência é a chave! Vamos explorar um exemplo, a abdução do ombro [Fig. 19], para demonstrar que exercício não é movimento. Se você elevar seu braço agora em abdução, utilizará um grupo de músculos necessários para vencer a força da gravidade. Se você realizar o mesmo movimento na posição deitada (decúbito dorsal), um grupo diferente de músculos será responsável por realizar o movimento. Então, o mesmo movimento foi realizado por grupos musculares diferentes. O movimento foi o mesmo, mas a resistência mudou, o cenário mecânico e a participação muscular também mudaram, o que nos mostra que exercício não é movimento. Quando a resistência muda, tudo muda. Vamos explorar mais um exemplo [Fig. 20]. Exercícios de puxar e de empurrar. Ambos são o mesmo movimento, uma flexão e extensão de ombro com uma flexão e extensão de cotovelo. Então, como definimos se é um exercício de puxar ou de empurrar? Utilizando cabos ou borracha, definimos se é puxar ou empurrar pela direção da resistência, porque o movimento é o mesmo. O mesmo movimento de empurrar torna-se uma puxada excêntrica se invertermos a posição do cabo ou da borracha. O movimento neste exemplo é quase irrelevante, ou, melhor, é secundário à resistência. Por isso, é essencial sabermos qual é a direção da resistência, caso contrário nunca saberemos o que está acontecendo internamente durante um exercício. Puxadas e empurradas são definidas por músculos se opondo a uma direção de resistência específica. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 49 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli Fig. 19. Movimento de abdução do ombro quando realizado em diferentes posições no espaço recruta diferentes musculaturas para vencer a resistência e “mover o ombro”. Em pé: musculatura superior ao eixo sagital. Decúbito dorsal: musculatura anterior ao eixo sagital. Decúbito ventral: musculatura posterior ao eixo sagital. Fig. 20. Movimento de empurrar e puxar. O mesmo movimento é determinado como empurrar ou puxar devido à direção da resistência. Músculos são responsáveis por realizar os movimentos e estes são recrutados a partir da resistência. 50 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia I O exercício é totalmente relacionado à força. É a produção de força interna em resposta à aplicação de forças externas para produzir o resultado esperado. O produtor interno de força são os músculos. A aplicação da força externa é chamada de resistência. Exercício é um Cabo de Guerra (CdG) entre duas forças que acontece em cada articulação e em todas as articulações, quer ela se mova ou não durante um exercício. Todas as formas de exercício são exercícios resistidos! Toda forma de exercício é exercício resistido. Muitas vezes, as pessoas não enxergam isso porque, de alguma maneira, associam cardio com aeróbico e resistência com força. Mas a verdade é que uma aula de step é treinamento resistido. Pedalar na bicicleta ergométrica também é exercício resistido. No espaço, sem nenhuma resistência, sem gravidade, não se consegue fazer exercício de cardio porque ele é baseado na musculatura esquelética. Exercício aeróbico significa que a musculatura esquelética está trabalhando aerobicamente. Nosso coração faz sempre a mesma a coisa, ele está sempre trabalhando de forma aeróbica, a única coisa que muda é a frequência. Exercícios aeróbicos e anaeróbicos estão relacionados à musculatura esquelética. “A adaptação fisiológica é fundamentalmente uma resposta do corpo à física.” Mitch Simon, DC, MS É um desafio conseguirmos separar movimento de força, porém, para podermos analisar os N T R O D U Ç Ã O exercícios, precisamos primeiramente conseguir fazê -lo. O mais difícil é desfazer a maneira que fomos ensinados. Aprendemos que um músculo é responsável por um movimento específico. Porém, isso só está correto em 50% do tempo, pois cada vez que você faz uma flexão de cotovelo você primeiro realiza a extensão do cotovelo para depois poder voltar ao ponto inicial e, então, fazer a segunda repetição; e cada extensão realizada não teve a participação do tríceps neste cenário mecânico. Então 50% do que aprendemos sobre movimento e músculo está incompleto. Por isso é tão importante não somente analisarmos as forças dentro de cada cenário e de cada exercício, mas também não tentarmos adivinhar o que está sendo estimulado somente olhando para o movimento. Voltando à equação do exercício: Fig. 21. Todos os exercícios ou formas de exercício são combinações específicas de: 1. [P] Posições articulares; 2. [M] Movimentos articulares; 3. [R] Resistência; 4. [S] Suporte; 5. [I] Intenção; 6. [E] Esforço; 7. [T] Tempo; 8. [F] Frequência; 9. [A] Apropriado. Para construirmos ou analisarmos qualquer A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 51 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli exercício, é necessário sabermos manipular com excelência as variáveis de 1 a 5. Para saber o que fazer com o exercício, precisamos ter amplo conhecimento sobre a manipulação das variáveis numeradas de 6 a 8. Mas saber como construir um exercício e saber o que fazer com ele são dois processos totalmente diferentes e separados. Essas são as nove variáveis que influenciam o exercício, sejam elas estratégicas ou aleatórias. Independentemente de conhecermos ou não estas variáveis, elas sempre influenciaram e influenciam no resultado obtido, quer saibamos disso ou não. Devemos manipulá-las para, estrategicamente, trazer resultados positivos para nossos clientes-pacientes. Em primeiro lugar, é imprescindível que saibamos o que esperar do exercício para então poder analisar como ele deve ser construído e realizado. Esta análise deve ser feita através do conhecimento de como todas as variáveis do exercício o influenciam. Só então teremos condições de examinar e decidir quando continuar, regredir, ajustar, modificar, progredir ou abolir um exercício. O completo domínio sobre as manipulações da equação do exercício causa uma evolução profissional do ordinário para o extraordinário e, consequentemente, agrega valor ao trabalho do fisioterapeuta. Todas as variáveis são individualmente detalhadas no capítulo sobre o Continuum de exercício. Não existe execução ideal “genérica” de um exercício. Cada exercício deve ser modificado com base no objetivo, na estrutura e na habilidade individual de cada cliente-paciente. 52 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia bibliografia [1] BLACK, Alexandra. Boom or bust? Get Baby Boomers Flocking to Your Gym. Disponível em: <http://www.ihrsa.org/blog/2016/11/21/boom-or-bust-get-baby-boomersflocking-to-your-gym.html> Acesso em: 10 dez. 2016. [2] DEBRÉ, Patrice; FORSTER Elborg. Louis Pasteur. Baltimore: Johns Hopkins University Press, 1998. [3] DUCLAUX, Émile. Louis Pasteur: The History of a Mind. Philadelphia: W. B. Saunders Company, 1920. [4] GEISON, Gerald. L. The Private Science of Louis Pasteur. Princeton: Princeton Universtiy Press, 1995. [5] HATZE, Herbert. The meaning of the term biomechanics. Journal of Biomechanics 7: 189-190. 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Os exemplos a seguir são representações gráficas desenvolvidas para ajudar no processo de aprendizagem, identificação e visualização de como o exercício acontece internamente. Estes não são exemplos reais de exercícios acontecendo, mas apresentam o primeiro passo para a construção do raciocínio e desenvolvimento de uma visão interna do exercício. O cabo de guerra acontece em torno de um eixo. Fig. 23. O cabo de guerra em torno de um eixo. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 57 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli No corpo humano, este cabo de guerra acontece em torno de um osso. Fig. 24. O cabo de guerra em torno de um osso. O plano do cabo de guerra. Com uma mudança de perspectiva, verificaremos que, se houver alteração na direção da resistência, a musculatura que se opõe (resiste) também mudará. Fig. 25. Quando a resistência muda de plano, outra musculatura passa a gerar oposição a esta nova direção da resistência. 58 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a d o e x e r c í c i o Como o cabo de guerra acontece em torno de um osso dentro do corpo humano, este é, na verdade, um cabo de guerra em torno de uma articulação. Fig. 26. No corpo humano, o cabo de guerra acontece em torno da articulação. Quando duas forças são aplicadas em torno de um eixo, temos uma alavanca. A alavanca é formada por duas forças aplicadas a uma distância da articulação. Fig. 27. Duas forças aplicadas em torno de um fulcro formam uma alavanca. Todo exercício é resistido e, independentemente do nome mercadológico, responde ao mesmo processo do cabo de guerra. O exercício é o processo de vários cabos de guerra, sendo “orquestrados” simultaneamente dentro de um sistema complexo de resolução motora. O tempo em que o cabo de guerra permanece acontecendo normalmente carrega uma nomenclatura; se for 20 minutos ou mais, é chamado de exercício aeróbico e, se for 30 segundos, é chamado exercício para força. Porém, o cabo de guerra é o mesmo. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 59 FORÇA m e c â n i c a O que é força? Força (e todas as suas características e efeitos) é sem dúvida um dos aspectos mais importantes para se entender um exercício. Força, ou mesmo a falta dela, é o estímulo principal de praticamente todo processo fisiológico necessário para o desempenho humano. Existem alguns fatores fundamentais para entender a força: 1. Força é simplesmente um empurrão e/ou puxão exercido por um objeto em outro. • “Força” não implica “muito”! A força pode ser medida em gramas ou toneladas. 2. Força é linear, ou seja, ela é exercida em linha reta, logo: • Força tem direção e essa direção relativa é o fator fundamental que determina a forma como uma força específica influenciará um objeto (sua direção relativa ao objeto); • Uma força tem um ponto de aplicação específico; • Força tem magnitude ou “uma quantidade”. Discussão Normalmente, o mundo do exercício, dentro de sua perspectiva, se preocupa somente com a quantidade da força e quase nunca considera as influências e efeitos da sua direção relativa. Forças são, muitas vezes, difíceis de visualizar. O vento é um exemplo ideal! Nós sentimos a força e vemos os resultados do vento, mas não conseguimos enxergar a força em si. Na verdade, porque nem sempre conseguimos enxergar a força, ela pode nos confundir. Já que não podemos enxergar uma força normalmente usamos uma seta, também conhecida como vetor, para representá-la. d o e x e r c í c i o Fig. 28. Um vetor representa o seguinte de uma força: • Ponto de aplicação no objeto; • Direção; • Seu comprimento representa a magnitude ou a quantidade de força sendo exercida em relação às outras forças envolvidas. O vetor indica a linha da força, a qual é imprescindível ser identificada para análise e criação de exercícios. Perspectivas 1. Ver a força como um empurrão ou um puxão é uma questão de perspectiva baseada nos objetos e suas relações com a força, assim como a relação do objeto com a origem aparente da força. Por exemplo, o vento é considerado um empurrão, mas a gravidade é considerada um puxão. Em ambos, a linha da força [Fig. 29] pode se estender por meio do objeto e ser representada do outro lado. 2. A força é descrita como um agente de mudança. Usamos a força para causar mudanças na posição, velocidade, direção etc. Força e seus diversos nomes Existem forças internas e forças externas. Forças externas são empurrões e puxões no corpo que provêm de fora dele (resistência). Forças internas são aquelas que têm sua origem dentro do corpo humano (músculo). Deve-se notar que qualquer força externa aplicada ao corpo imediatamente se torna em uma força interna também. Além disso, os efeitos combinados dessas forças internas e previamente externas resultam na produção de forças internas adicionais que são geradas entre as articulações – estas chamamos de forças articulares. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 61 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli F F F a) F b) Fig. 29. A linha da força é invisível e é a representação da força sendo aplicada. A linha da força é infinita e pode ser representada se estendendo pelo corpo. a) Durante a flexão de cotovelo com halter, a linha da força é traçada a partir da posição do centro de massa do halter para baixo, na direção da força da gravidade. Em ambas, a posição da linha da força se estende acima do halter e, na posição de total extensão do cotovelo, a linha da força se estende pelo braço. b) No exemplo do exercício de empurrar do ombro (supino), a linha da força se estende pelo antebraço quando o cotovelo está em flexão e pelo braço e antebraço quando o cotovelo está em extensão. Fig. 30. Forças internas são as geradas pelo tecido contrátil e forças externas são as oferecidas pela resistência. 62 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a A força muda baseado em: 1. Como é aplicada (sua relação com o objeto); 2. O que ela faz com o objeto; 3. Sua relação com outros objetos e forças. Os seguintes nomes serão introduzidos ao longo deste processo educacional para representar “força” em diferentes situações específicas: • Stress; • Tensão; • Compressão; • Cisalhamento; • Fricção/Atrito; • Potência/Esforço; • Resistência; • Torque. Importante: Nenhum desses termos representa situações inerentemente boas ou ruins. São apenas descrições da força em um cenário mecânico específico (uma relação específica). A parte da ciência intimidadora Na física, a força é representada pela equação F = ma. Esta, como todas as equações, é simplesmente uma relação entre três fatores: força, massa e aceleração. Neste caso, a força é igual a massa do objeto multiplicada por sua taxa de aceleração (ou desaceleração). Porém, na vida e nos exercícios, nunca existe somente uma força sendo aplicada a um objeto (ver terceira lei de Newton1). O cenário criado durante a aplicação da força na vida real é o de múltiplas forças sendo aplicadas e criadas dentro de múltiplos objetos ao mesmo tempo. A combinação delas pode ou não resultar em aceleração. Por exemplo: forças opostas podem estar tentando acelerar um objeto em uma direção oposta, porém sem causar movimento, mas 1 Terceira lei de Newton: “Quando um objeto exerce uma força sobre outro objeto, o segundo objeto simultaneamente também exerce uma força igual e oposta sobre o primeiro”. d o e x e r c í c i o mesmo assim é vital reconhecer a tentativa da aceleração, como a isometria. Os diferentes nomes usados para identificar diferentes tipos de forças são apenas descrições de diferentes cenários mecânicos. Duas ou mais forças atuando em um ponto comum de aplicação são partes de um sistema de forças concorrentes. As ilustrações, a seguir, são exemplos de quando existe mais do que uma força atuando em um ponto. Na verdade, existe somente uma, que é a soma vetorial de todas as forças. O efeito líquido destas forças é chamado de força resultante, que tem tanto a magnitude quanto a direção aplicada no mesmo ponto no objeto. É muito importante reconhecermos e sermos capazes de identificar a força resultante, porque em praticamente todo exercício a resistência é o resultado de pelo menos duas fontes de força. Por isso, para manipularmos as forças durante um exercício, precisamos entender e reconhecer a força resultante. Resultante = duas ou mais forças com somente um resultado ou influência! Existem duas maneiras de alterar a resultante: 1. Alterar a quantidade de cada uma ou de ambas as forças originais; 2. Alterar o ângulo entre as forças. Quando várias forças estão agindo, é a resultante que determina a direção da resistência (e sua magnitude). A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 63 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli a) b) c) Fig. 31. a) As fibras musculares “puxam” em diferentes direções, porém a resultante é a somatória de todos os vetores de força. b) Pegadores com forças divergentes, como corda ou tecido, podem gerar influência na resistência. No processo de descida do cabo, o pegador gera forças adicionais que podem aumentar a resistência. c) Em um exercício de supino com a barra no plano transverso, o tríceps está tentando estender o cotovelo. Mas a barra não permite o movimento para fora. De acordo com a Terceira Lei de Newton, a barra puxa para dentro com a mesma intensidade que o tríceps puxa para fora. Este fato gera uma segunda força além da gravidade, que é a fricção, e a resultante entre as duas é a nova linha da força. Forças múltiplas: com ou sem movimento No planeta Terra, além da gravidade, estamos constantemente sendo influenciados por múltiplas forças. Por essa razão, é a força resultante que vai determinar a direção e a proporção da aceleração. Se a resultante é zero (equilibrada, forças iguais em direções opostas), o resultado será a ausência de movimento (sem movimento) ou será uma velocidade constante (dependendo do que estava acontecendo antes de a resultante se tornar zero.) Como pode haver forças e não ter aceleração? Cada força dentro do cabo de guerra está “tentando” acelerar as massas envolvidas e elas vão continuar tentando acelerar enquanto elas estiverem presentes. Se, por exemplo, um galho de árvore quebra, a aceleração da gravidade será exposta e o galho vai cair porque não houve nenhuma força em oposição. Então, quando a força resultante não for zero, haverá uma mudança no movimento produzido enquanto o objeto é acelerado positiva ou negativamente. Perspectivas sobre força e força resultante Lei de Newton do Movimento (relativo à força): Primeira Lei de Newton (Lei da Inércia): Se a força resultante (o vetor resultado da soma de todas as forças que agem em um objeto) é nula, logo, a velocidade do objeto é constante. Consequentemente: 64 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a d o e x e r c í c i o um objeto que está em repouso ficará em repouso a não ser que uma força resultante não nula aja sobre ele. Um objeto que está em movimento retilíneo uniforme não mudará a sua velocidade a não ser que uma força resultante não nula aja sobre ele. Esta lei da inércia, basicamente, representa objetos em equilíbrio e seu “desejo” de permanecer inalterado. Inércia é a resistência que um corpo oferece à alteração do seu estado de repouso ou de movimento. Quanto maior for a massa do corpo, maior a sua inércia, ou seja, maior a resistência que este oferece à alteração do seu estado. Segunda Lei de Newton (F = m.a): A soma do vetor de força F em um objeto é igual à massa m deste objeto multiplicada pelo vetor a da aceleração do objeto. “A força é um agente de mudança” – esta é a lei da aceleração. Terceira Lei de Newton: “Quando um objeto exerce uma força sobre outro objeto, o segundo objeto simultaneamente também exerce uma força igual e oposta sobre o primeiro”. Esta é a lei de reação, que basicamente mostra que as forças sempre vêm em pares quando há contato entre dois objetos. Esta parece ser uma versão complicada da apresentação comum desta lei, que normalmente afirma que para cada ação há uma reação igual e oposta. Essa versão simplificada pode ser erroneamente interpretada se o objeto e seu ponto de contato não são considerados. As forças resultantes de dois objetos em contato podem ser chamadas de par de interação, forças de ação-reação, ou forças de contato. A atribuição de qual força é classificada como ação ou reação é arbitrária. Qualquer uma das duas pode ser chamada de ação e a outra, reação. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 65 movimento articular m e c â n i c a Mecânica articular: o centro do cabo de guerra A articulação é o centro do cabo de guerra. Ela recebe o resultado líquido das forças aplicadas nos dois lados do cabo de guerra e, então, fica responsável por forças, às vezes, maiores das que são aplicadas em um dos lados do cabo. Não são os ossos que movem, são as articulações! Mesmo que um membro se mova no espaço, o seu movimento é resultado de movimento em uma ou mais articulações. Todo movimento humano, simples ou complexo, é resultado da orquestração de forças em torno de uma articulação. Independentemente de quantas articulações estão se movendo durante um exercício, a função individual de cada articulação não pode ser ignorada. “Movimento integrado é, por definição, composto por várias articulações individuais. Sendo assim, é dependente da integridade de cada uma das que foram integradas!” Artrocinemática (artro = articulação; cinemática = movimento). O movimento que acontece em uma articulação depende do formato das superfícies de contato e dos ligamentos de estabilização passiva. Algumas articulações fornecem mais estabilidade e outras, mais mobilidade. Podemos descrever a análise de um movimento uniarticular como intra-articular (relativo à relação entre as superfícies de contato dentro de uma articulação); e a análise de movimentos multiarticulares como interarticulares. Ambos são extremamente importantes durante a análise e criação de exercícios. Tipos de Movimento Articular Sem nenhuma dúvida, o conceito da função articular mais importante de ser entendido, apreciado d o e x e r c í c i o e aplicado, é o do tipo de movimento gerado pela estrutura articular. Na verdade, ignorar o movimento articular específico (suas características e de como é influenciado e influencia a força) é provavelmente a maior negligência que cometemos como profissionais. Não levar em consideração as propriedades da unidade mais fundamental do movimento tem gerado muito mal-entendido na criação, desenvolvimento, análise e realização de exercícios específicos e exercícios resistidos. Fig. 32. Durante o agachamento, as articulações se movem em rotações, porém o centro de massa se move linearmente. Movimento translatório ou movimento linear é o movimento de um objeto em linha reta. Ele acontece em pequena quantidade durante o movimento articular e está presente em algumas articulações mais A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 67 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli do que outras, dependendo da forma das superfícies de contato (joelho, facetas da coluna). Movimento translatório é mais visível em uma articulação durante mobilizações passivas que exibem jogo articular, e é muitas vezes usado para examinar a integridade passiva das articulações. Movimento linear ativo (no espaço) acontece como resultado de rotação em múltiplas articulações. Por exemplo, no agachamento, o centro de massa se move linearmente, mas é o resultado do movimento rotatório de muitas articulações. Outro exemplo é quando tentamos alcançar algo com a mão. A mão se move linearmente, mas é resultado da rotação do cotovelo e do ombro. Características do eixo 1. O eixo é o centro da rotação/movimento. 2. O trajeto de um objeto girando ao redor do eixo é um arco. 3. Esse arco está dentro de um plano de movimento criado pelo eixo. Uma linha conecta dois pontos no espaço. Um plano conecta ou contém quaisquer três pontos (e não está limitado pelos “três planos cardinais”). Não é possível entender a resistência e os exercícios sem compreender e aplicar o conceito de movimento axial e tudo o que ele implica no exercício. Movimento rotatório é o movimento de um objeto ou segmento ao redor de um eixo. A maioria dos movimentos das articulações sinoviais é rotatório. Para o profissional do exercício, o eixo do movimento é o aspecto mais importante para ser entendido. É vital que você seja capaz de identificar o eixo de cada articulação durante o exercício, para que seja possível criar e analisar um exercício, determinar a participação muscular e ainda tornar capaz identificar a diferença entre força e resistência em um exercício. Para enfatizar a importância do estudo sobre o eixo articular e suas influências, organizamos os fatores mais importantes e classificamos como princípios específicos do eixo. Fig. 33. Movimento articular é uma rotação. O eixo é o centro da rotação e o arco do movimento determina o plano do movimento. Muitas vezes, um plano é congruente com um objeto tangível: um vidro, um pedaço de espelho plano etc. Porém, quando relativo ao corpo, um plano não é normalmente visível. Para a visualização dos planos de movimento, podemos fazer uma analogia com um limpador de para-brisa se movendo através de um plano representado pelo próprio vidro. A palheta tem 68 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a um eixo de rotação que é perpendicular ao plano. Mesmo que o vidro seja removido, o plano de movimento da palheta continua o mesmo, porque é determinado pelo eixo da palheta. O corpo pode se mover em um número incontável de planos. 4. Um plano de movimento é sempre perpendicular ao eixo. É essencial que sejamos capazes de enxergar que o eixo é sempre perpendicular ao plano de movimento. Fig. 34. A direção do movimento é tangencial ao arco. d o e x e r c í c i o aconteceria caso os efeitos da força não fossem iguais (empatados). Sempre imagine se uma força ou outra se tornasse maior, em que direção o movimento aconteceria. Este então é o plano e o eixo será perpendicular a ele. A este eixo chamamos de eixo da força (RTS®) ou eixo do potencial movimento. Agora, um pouco mais avançado 7. Diferentemente de uma dobradiça, uma articulação humana não tem um parafuso atravessando no meio dela para fixar o centro da rotação. Na verdade, o movimento articular não é gerado pelo eixo, mas pelo formato das superfícies de contato. Em outras palavras, é o formato em arco das superfícies articulares que define a posição do eixo e o movimento. O eixo articular é mais virtual do que tangível. Fig. 35. M o v i m e n t o curvilíneo da articulação do joelho. O eixo muda durante a amplitude de movimento: eixo instantâneo da rotação. 5. A direção do movimento de um segmento é tangencial ao arco, em qualquer ponto do arco. Então, o segmento está constantemente mudando de direção com cada nova posição porque a direção do movimento é sempre perpendicular ao segmento. Da mesma maneira que uma linha é o conjunto de infinitos pontos, um arco é o conjunto de infinitas tangentes. 6. Então, será que existe um eixo articular quando não existe movimento articular? Sim, existe um eixo mesmo quando não existe movimento articular e este seria o ponto em que o movimento m’ m t 8. Devido às irregularidades e aos graus de curvaturas que são inconsistentes nas superfícies de contato articulares, o ponto exato da posição do A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 69 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli eixo muda durante a amplitude de movimento. Isto é chamado de eixo instantâneo da rotação ou centro instantâneo da rotação. Um dos exemplos mais evidente para observarmos este fato é a articulação do joelho. Este acontecimento gerou muitas interpretações equivocadas na tentativa de descrever o movimento do joelho como sendo uma sequência de rotações e translações. Porque as superfícies de contato de uma articulação não são perfeitamente achatadas, a translação pura nunca acontece e sempre existe um grau de rotação. Este tipo de movimento se chama curvilíneo. 9. As estruturas de cada articulação são muito diferentes, mas podemos entender que o movimento articular é basicamente um osso escorregando sobre ou rodando em torno de outro (convexo e côncavo) sem um eixo tangível colocado através deles. O bom controle orquestrado de todos os lados da articulação (contrátil e não contrátil, passivo e ativo) é essencial para uma função articular apropriada e manutenção das relativas posições do eixo e para a estabilidade do eixo. Isto é chamado de centrificação. 10. O eixo encontra-se sempre dentro do lado convexo da articulação, independente de qual lado da articulação está se movendo. Ação reversa Ação reversa é um termo utilizado na cinesiologia tradicional para descrever uma situação em que o segmento que está fixo e o segmento que se move são invertidos. Por exemplo, a flexão do cotovelo normalmente é descrita como o segmento distal se movendo em direção ao proximal, que está fixo. Na ação reversa, o segmento proximal se move em direção ao distal, porém o movimento rotatório em torno do eixo do cotovelo não muda. a1) a2) b1) b2) b3) Fig. 36. a1) O primeiro exemplo é do segmento distal se movendo em direção ao proximal. a2) O segundo exemplo indica a ação reversa: o segmento proximal se move em direção ao distal. b1) A articulação do quadril em neutro. b2) O fêmur, segmento distal se move em direção à pelve, proximal. b3) A pelve, segmento proximal se move em direção ao fêmur, distal. 70 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a d o e x e r c í c i o Fig. 37. E x e m p l o de ação reversa na adução do quadril. a) O fêmur se move i n t e r n a m e n t e . b) A ação reversa à pelve se move em direção ao fêmur. Perceba que a relação de movimento da rotação na articulação não muda. a) POSIÇÃO INICIAL b) EQUIVALÊNCIA “Se em um mecanismo o elo que originalmente está fixo passa a se mover e outro elo se torna fixo, diz-se que este mecanismo foi invertido. Esta inversão não altera o movimento relativo entre os elos, mas altera seus movimentos absolutos (em relação ao solo).”1 Exemplo Fig. 36: Flexão do quadril pode aconte1 MABIE, Hamilton; REINHOLTZ, Charles. Mechanisms and Dynamics of Machinery. 4ª ed. 1986. FIXO cer com o fêmur se movendo dentro da pelve ou na ação reversa da pelve se movendo em direção ao quadril. Nesta análise, estamos somente abordando a articulação independentemente de musculatura ou exercícios. Um outro, exemplo Fig. 37: pode ser a abdução do quadril que pode ocorrer com o fêmur se movendo sobre o quadril “fixo” ou a ação reversa com o quadril (acetábulo) se movendo em torno do fêmur fixo. Fig. 38. Lei da concavidade e convexidade. Independentemente de qual lado se move, o eixo permanece sempre do lado da convexidade. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 71 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli A Lei da Concavidade e Convexidade Originalmente, esta lei estabeleceu que, se uma superfície côncava se mover sobre uma superfície convexa, o deslizamento da superfície de contato acontece na mesma direção (do mesmo lado) do movimento do segmento ósseo. Quando uma superfície convexa se move sobre uma superfície côncava fixa, o deslizamento da superfície convexa acontece na direção oposta do movimento do segmento ósseo. Para aplicação desta lei, é importante a compreensão de qual é o lado em que o eixo se encontra. Sempre que o eixo se encontra no lado do segmento que se move, este fica contido dentro do objeto (dentro do segmento ósseo) e parte deste objeto se estende além do eixo e, como uma gangorra, a parte que está do outro lado do eixo se move em direção contrária. Porém, quando a parte que se move é aquela que não contém o eixo, todo o objeto (segmento ósseo) se move na mesma direção. Quando o termo “graus” é aplicado aos graus de liberdade das articulações, é melhor entendermos como a oportunidade de movimento permitida pela estrutura articular relativa ao espaço tridimensional. Em outras palavras, de quantas maneiras uma articulação pode rodar em relação ao espaço tridimensional dentro do que está predeterminado pelas superfícies de contato e o tecido conjuntivo? Lembre que o eixo se encontra sempre do lado convexo! É útil relembrar que tridimensional é representado graficamente pelo sistema de coordenadas X, Y, Z. Dessa maneira, é possível identificar posições no espaço relativas a “em cima/embaixo”, “um lado para outro” e “frente/atrás”. Os movimentos corporais podem ser descritos da mesma maneira. Então, uma articulação pode rodar em torno de um eixo vertical e de um eixo horizontal. Se esta consegue fazer ambos, então pode se mover também na diagonal, assim como em movimentos cônicos. Se existir um terceiro eixo perpendicular aos outros dois, este eixo permitirá que o membro “rode” longitudinalmente. Quando analisamos articulações individuais, encontramos algumas que se movem em somente um plano, outras que se movem em dois e outras que se movem em três. As articulações que se movem em três graus de movimento, na verdade, podem mover-se em um número infinito de planos individuais e em qualquer combinação deles. Os graus de liberdade O termo “graus de liberdade” pode gerar confusão. Como a rotação em torno de qualquer eixo individual é medida em graus, temos a ideia de graus angulares. Mas isto é diferente. Graus podem ser vistos também como: uma série de passos ou níveis, como em um processo; ou um ponto em uma escala. Existem potencialmente seis graus de liberdade em cada articulação para serem reconhecidos e considerados. Então, existem seis oportunidades para uma articulação se mover. • Oportunidade rotacional: 3 (+) • Oportunidade linear: 3 (+) -Y -X +Z +Y 72 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia Fig. 39. Sistema tridimensional x, y, z. m e c â n i c a Uma articulação de dobradiça verdadeira possui um eixo e, assim, por definição, move-se somente em um plano e possui apenas um grau de liberdade. e x e r c í c i o Articulações esferoides (em soquete), como a glenoumeral e o quadril, possuem três graus de liberdade (por exemplo, movimento tridimensional). Fig. 42. Articulação esferoide. Três graus de liberdade. Exemplo: articulação do ombro. Fig. 40. Articulação em dobradiça. Somente um grau de liberdade. Exemplo: a articulação do cotovelo. O joelho é comumente descrito como uma articulação de dobradiça, com somente um grau de liberdade, mas na verdade não é, porque a rotação longitudinal está disponível durante a amplitude. O movimento do joelho acontece em torno de dois eixos, então possui dois graus de liberdade. Articulações em sela possuem dois graus de liberdade e se movem em torno de dois eixos, um vertical e outro horizontal. Fig. 41. Articulação em sela. Dois graus de liberdade. Exemplo: a articulação trapézio metacarpal. d o “Movimento Triplanar”? Existe muita má interpretação sobre o que é chamado de movimento triplanar e é necessário analisar eixos e planos para podermos entender o que está acontecendo nas articulações quando usamos o termo “movimento triplanar”. Inicialmente, precisamos entender que um espaço tridimensional é composto por três eixos com um número infinito de planos e não com três planos somente. Um movimento verdadeiramente multiplanar exige que o movimento aconteça em mais do que um eixo mecânico, então multiplanar não é um movimento que acontece em torno de um eixo somente, porém é realizado fora de um dos planos cardinais e este cria um plano que não tem nomenclatura definida. Quando analisamos múltiplas articulações se movendo cada uma em um plano diferente e chamamos de multiplanar, precisamos saber que na verdade cada articulação individual está se movendo em torno de um único eixo e está se movendo em somente um plano. Também é necessário analisar que, se a articulação do joelho, por exemplo, se mover em um terceiro plano, nós consideraremos isso uma lesão. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 73 Mecânica articular: Movimento e força m e c â n i c a Explorando a relação entre movimento e força Movimento pode ser visto como uma mudança de posição. A mudança de posição acontece devido a forças desiguais (isto é, forças desequilibradas). Por exemplo, o retângulo abaixo está estático, mantendo uma posição. Ele está em uma posição fixa porque as forças que estão empurrando-o são iguais, equilibradas. ou Fig. 43. Se as forças se tornarem desiguais, então ele se moverá. ou Fig. 44. Esse exemplo é representativo do movimento translatório ou linear. Perspectiva rotacional: forças, eixos e alavancas Agora, imagine que um lado do retângulo ficasse preso e não mais igualmente livre para se mover devido a uma restrição externa a ele ou uma restição colocada através/dentro dele. A restrição cria um eixo em torno do qual o retângulo se move livremente no espaço (características anatômicas são responsáveis por criar as restrições em articulações humanas). d o e x e r c í c i o Fig. 45. Isso cria uma alavanca. Uma alavanca é a distância do eixo até o ponto de aplicação de uma força e, como é característico do movimento rotatório, a alavanca está constantemente mudando de direção enquanto ela gira. Mas se a força continua empurrando na mesma direção, sua relação com a alavanca muda. Compreender as relações entre a força, a alavanca e o eixo é muito importante para qualquer profissional que prescreve força (exercício) para indivíduos. Torque O torque é muitas vezes chamado de uma força em rotação, porém é mais correto pensar no torque como um empurrão ou puxão (força) que causa movimento em torno de um eixo (rotação). A quantidade de força em si não é o único fator que afeta seu grau de influência no movimento em torno de um eixo. A distância de aplicação da força até o eixo tem a mesma influência na quantidade ou torque que é gerado. Esta distância é chamada de momento do torque (ou momento da força) e é medida como um braço do momento. Torque = Força x Braço do Momento T=F . BM O torque é calculado multiplicando-se a força pelo comprimento do braço do momento. Então, qualquer fator que influencie a força ou o comprimento do braço do momento, influencia diretamente o torque. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 75 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli O braço do momento (BM) Os braços do momento são específicos dos movimentos rotatórios e representam a relação de cada força com seu eixo. Eles representam um nível de habilidade mecânica ou, em outras palavras, o braço do momento representa o quanto de influência uma força tem em um movimento em torno de um eixo. É, na verdade, a eficiência relativa da força causando movimento rotatório em cada ponto do movimento. O braço do momento é definido pela menor distância entre a linha da força e o eixo. A distância mais curta de uma linha da força ao eixo é sempre perpendicular à linha de força e atravessa o eixo. B C B A C D Fig. 46. Para identificar o comprimento do braço do momento. Identifique a linha da força [A]. Depois o eixo [B] e, por último, encontre a menor distância perpendicular à linha da força que atravessa o eixo. Esse é o braço do momento [C]. Se necessário, prolongue mentalmente a linha da força para que o braço do momento cruze o eixo [D]. Então, para identificar o comprimento do braço do momento em qualquer posição específica durante o movimento de um objeto em torno do eixo, é necessário: 1. Identificar a linha da força específica em questão [A]. Nota: existem normalmente múltiplas forças agindo em torno de um eixo no mesmo instânte. É necessário identificar qual força será analisada. 2. Identificar o eixo específico em questão [B]. Nota: existem normalmente múltiplos eixos afetados por uma linha da força. É necessário identificar qual eixo será analisado. 3. Identificar a linha que é perpendicular à linha da força que atravessa/intercepta o eixo [C]. Nota: se a linha da força (cabo, gravidade, músculo etc.) parece não oferecer uma relação perpendicular ao eixo em um ponto específico do comprimento do trajeto representado, a linha deve ser alongada/estendida (mentalmente ou graficamente) [D] para identificar o braço do momento. Importância no exercício Cada movimento humano é criado por uma ou mais articulações girando em torno dos respectivos eixos. Movimentos lineares brutos, como de um agachamento (linear considerando que o centro de massa deve se mover verticalmente em uma linha reta virtual mantida sobre a base de suporte), são produzidos por meio de múltiplas articulações girando em proporções angulares necessárias. Com esse entendimento, torna-se necessário reconhecer que praticamente todas as forças aplicadas ou criadas dentro do corpo humano estão gerando um torque, então a sua influência sobre o movimento ou sobre a estabilização é determinada tanto pelo braço do momento da força quanto pela quantidade de força. Braço do momento é uma das muitas razões pelas quais o número indicado no peso não representa com precisão a verdadeira resistência e uma das razões 76 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a pelas quais o que está se movendo e o que está sendo desafiado podem não estar relacionados. Distribuição da resistência Independentemente da quantidade de carga, o grau de desafio efetivo em cada articulação é determinado pelo momento para cada articulação. O agachamento é normalmente considerado um exercício que envolve o corpo todo, mas o desafio não é igual para todas as partes do corpo (nem deve, porque cada articulação e suas musculaturas associadas possuem habilidades mecânicas drasticamente diferentes). Apesar de extremamente simplificados, esses exemplos representam a distribuição da resistência entre o quadril e o joelho. Embora existam muitos fatores envolvidos (alguns que podem ser manipulados e outros que não podem), vamos analisar duas experiências muito diferentes e com diferentes resultados que podem ser esperados a partir dos agachamentos apresentados a seguir. No agachamento a), a carga é distribuída igualmente entre o quadril e o joelho porque os comprimentos do braço do momento são iguais. No entanto, é provável que se experimente maior desafio nos extensores do quadril do que nos extensores de joelho porque a) b) d o e x e r c í c i o a capacidade de produção de torque nas musculaturas específicas de cada articulação não é igual, ou seja, normalmente força extensora de quadril é maior que força extensora de joelho. No agachamento b), um maior momento é gerado para os quadris (e coluna lombar). É provável que esse indivíduo vá experimentar o agachamento como primariamente um exercício envolvendo “glúteo e lombar” porque é exatamente isso que está sendo desafiado devido aos momentos da resistência. A exigência da musculatura extensora do quadril e coluna é tão maior do que a exigência para os estensores do joelho que provavelmente a fadiga/falha na lombar é capaz de impedir qualquer perceptível desafio para o quadríceps. Nota: Esses exemplos de distribuição da resistência por meio do comparativo entre o comprimento do braço do momento não são uma análise completa sobre agachamentos, ainda é necessário considerar todas as forças articulares relacionadas com cada exemplo, recrutamento muscular relacionado etc., assim como é necessário considerar cada indivíduo específico, seus objetivos, fase da progressão etc. Porém, esta análise nos mostra que, mecanicamente, um agachamento pode desafiar articulações de maneiras diferentes. Fig. 47. Exercício de agachamento. a) A linha da força recai entre a articulação do quadril e do joelho e os comprimentos dos braços do momento são iguais, e o torque, então, é praticamente igual para o joelho e para o quadril. b) O braço do momento é maior para a articulação do quadril do que para o joelho, resultando em uma exigência maior para a musculatura extensora do quadril e da coluna do que para o joelho. Isso devido ao torque da resistência para a articulação do quadril e da coluna serem maiores do que o torque da resistência para o joelho. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 77 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli Fig. 48. Esquema demostrando as mudanças do comprimento do braço do momento da resistência durante uma flexão do cotovelo. A linha da força está representada pela linha pontilhada e o comprimento do braço do momento está representado pela linha vermelha. Fig. 49. Esquema demostrando as mudanças do comprimento do braço do momento do músculo do bíceps durante a flexão do cotovelo e da resistência. A linha da força está representada pela linha verde para resistência e azul para potência/esforço e o comprimento do braço do momento está representado pela linha vermelha. Neste exemplo, na posição em que o braço do momento da resistência é maior, coincide com a posição em que o braço do momento do músculo também é o maior. Isso mostra que, quando a resistência é mais difícil, o músculo está mais forte. 78 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a Características dos momentos 1. Se o sentido de uma força permanece consistente enquanto um membro gira em torno de uma articulação, o braço do momento vai mudar a cada grau de movimento. Isto significa simplesmente que a força terá diferentes graus de influência em cada posição que compõe a amplitude de movimento [Fig. 48]. 2. Haverá um momento, ou torque, diferente para cada força que atua sobre um eixo comum: força interna ou força externa, força da potência/ esforço ou força da resistência [Fig. 49]. 3. Uma única força pode influenciar todas as articulações envolvidas. Haverá um momento separado para cada articulação, o comprimento deste momento vai determinar o grau de desafio para a musculatura em torno daquela articulação. 4. Um braço do momento nunca pode ser mais longo do que o seu braço de alavanca associado, isto é, o comprimento da alavanca será o com- d o e x e r c í c i o primento máximo do momento. Ele pode ser mais curto do que a alavanca, mas nunca mais longo. 5. O momento máximo para um determinado cenário ocorrerá quando o ângulo de força é “ótimo” (90˚). Qualquer grau menor ou maior do que 90˚ produzirá um momento menor. Um ângulo de força de 45˚ e um ângulo de força de 135˚ produzirão o mesmo momento porque estão à mesma distância de 90˚. Quando o ângulo de força é 90˚, o braço da alavanca e o braço do momento coincidem, ou seja, têm o mesmo comprimento e ocupam o mesmo espaço. Quando a linha da força passa dentro do eixo, o braço do momento é zero, então aquela força cria zero de torque e não tem efeito sobre o movimento rotatório porque está “equilibrado” por meio da articulação. Um braço do momento está sempre presente, mesmo quando mede zero. Fig. 50. Flexão de cotovelo indicando ângulo da força do músculo do bíceps e ângulo da força da resistência. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 79 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli Força e sua relação com um eixo Para a criação e análise de exercícios, será muito importante compreender sobre alavanca (braços da alavanca), torque (braço do momento) e sobre ângulo de força. Porém, o que mais importa agora é entendermos principalmente os fatores que influenciam o braço do momento, essencial para a compreensão do torque. Neste nível de curso, estamos apresentando uma introdução da mecânica do exercício, porém essencial, então vamos nos ater principalmente ao estudo do braço do momento e apresentaremos, a seguir, a introdução sobre o ângulo da força, mas mantendo uma exploração mais profunda para níveis mais avançados. O ângulo da força: força e sua relação com a alavanca O ângulo da força é o ângulo com o qual uma força é aplicada a um objeto. O ângulo de aplicação de uma força (ou um ângulo da força) é o ângulo entre: 1. A linha da força; 2. A haste da alavanca; 3. Dos dois ângulos que são gerados por uma linha tocando o segmento, o da força é aquele que está do lado do eixo da articulação. Discussão: Não confunda ângulo da força com ângulo da articulação (posição da articulação). O ângulo da força representa a relação atual entre a força e a alavanca, que afetará o grau de influência da força na rotação [Fig. 50]. Grau de efetividade Pergunte-se: quão similar é a direção da força à real direção do movimento potencial da alavanca em qualquer ponto? A direção de rotação da alavanca em qualquer ponto é tangencial ou 90° à alavanca (ver “Movimento articular”). Coincidentemente, o ângulo de força ideal é também 90º. Quanto mais próximo o ângulo de força está dos 90°, mais efetivo ele será em influenciar o movimento da alavanca. Discussão: Perceba que não podemos concluir que uma força é mais influente somente porque o ângulo de força está 90°. É necessário avaliarmos outros fatores que compõem o cenário mecânico, como a influência de ângulos de força, alavancas e magnitude combinados para efetivamente tirarmos conclusões. As ações de múltiplas forças em torno de um eixo O exercício pode ser descrito como um cabo de guerra em torno de um osso ou em torno de uma articulação. Ao examinar a interação entre múltiplas forças sobre um osso em torno de um eixo, é importante entender o básico do sistema de alavancas. SISTEMA DE alavancas Por definição, uma alavanca existe quando duas ou mais forças agem no mesmo objeto a alguma distância do eixo e com efeitos opostos. As duas forças são identificadas pelos termos potência (ou esforço) e resistência. Os termos “potência/esforço” e “resistência” podem ser uma fonte de confusão. Potência/Esforço normalmente é identificada como sendo a força que causa o movimento e logo mudaria à medida que a direção mudasse com alterações nos torques opostos respectivos. Para nossos propósitos, identificaremos as forças musculares como “potência/esforço” porque, independentemente da direção do movimento, as forças musculares requerem nosso potência/esforço. A necessidade de identificar para fins do exercício que potência/esforço será sempre a força gerada pela musculatura é que quando potência/esforço e resistência se encontrarem em equilíbrio, assim mesmo poderemos identificá-las. Além de conhecer que uma alavanca é composta por um eixo, uma força de resistência e uma força de potência/esforço, o mais importante é entender quais são seus respectivos braços do momento. 80 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a Relações DENTRO DO sistema de alavancas “Vantagem mecânica refere-se à eficiência da alavanca. Uma alavanca é eficiente (tem maior vantagem mecânica) quando necessita somente de uma pequena força de esforço para superar uma grande resistência.” (JS&F, 1ª ed.) Tenha em mente que maior vantagem mecânica não significa automaticamente “mais torque” porque o outro lado pode ter proporcionalmente maior força. Em vez de nos referirmos à vantagem mecânica somente do ponto de vista da potência/esforço, identificaremos qual lado, potência/esforço ou resistência, tem vantagem ou desvantagem mecânica em um ponto específico na amplitude baseado no seu respectivo momento mecânico (o momento da potência/esforço e o momento da resistência, respectivamente). Pense dessa maneira: quem tem a distância do seu lado? O lado que tiver mais distância não necessita de tanta força para realizar o trabalho. NOTA: Isso só funciona para comparar a potência/esforço e a resistência de uma única alavanca específica, em torno de um eixo somente. Não funciona para comparar dois momentos de resistência derivados de duas alavancas diferentes, em torno de dois eixos diferentes etc. Então, embora sistemas de alavancas tradicionais de primeira, segunda e terceira classe sejam abordados em, virtualmente, todos os livros de mecânica/física existentes, eles só tem relevância para a análise das forças articulares e no que diz respeito às relações com o momento da potência/esforço, o momento da resistência e a relação entre os dois. Note que não dissemos que as forças devem ser opostas. As forças, na verdade, podem acontecer na mesma direção. É a relação delas em torno do eixo que cria a oposição. Explorando o sistema de alavanca e a relação com as forças dentro de um “sistema 3D” É a relação entre as forças em torno do eixo que cria a resistência, são ações opostas dentro de um d o e x e r c í c i o plano. Normalmente, exemplos tradicionais mostram somente forças que estão em um mesmo plano, mas essa nem sempre é a realidade. Os componentes e a classificação tradicional do sistema de alavancas O braço da alavanca é a distância entre o eixo e o ponto de aplicação de uma força. Existem dois braços da alavanca determinados pela relação entre as forças: 1. O braço da potência (BP) (Esforço) é a distância entre o eixo até o ponto de aplicação da força do esforço ou potência. 2. O braço da resistência (BR) é a distância entre o eixo e o ponto de aplicação da força de resistência. Existem três classificações das alavancas baseadas em diferentes posicionamentos das duas forças em relação ao eixo. (A classificação do sistema de alavancas em si não é algo com relevância no estudo para análise e criação de exercícios, ela só nos ajuda a identificar que existem diferentes relações entre as forças. Porém, é necessário entender como estas forças influenciam o resultado na alavanca e, para isso, precisamos entender de braço do momento.) Alavanca de primeira classe: O eixo está posicionado entre as duas forças [Fig. 53] (exemplo: uma gangorra, extensão do tríceps). 1. Alavanca está equilibrada quando as duas forças são equivalentes e posicionadas na mesma distância do eixo [Fig. 51]. 2. Quando existe diferença de distância entre a aplicação das forças em relação ao eixo, a força que está na posição mais afastada do eixo possui vantagem mecânica. Isto quer dizer que precisa gerar menos força para empatar com a outra e, consequentemente, a força posicionada mais próxima do eixo precisa gerar mais força para equilibrar ou vencer a alavanca [Fig. 54]. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 81 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli BP BR Fig. 51. Alavanca de primeira classe. O eixo se encontra entre a aplicação das duas forças. A distância entre o ponto de aplicação da potência até o eixo (fulcro) representa o comprimento do braço da potência (BP). A distância entre o ponto de aplicação da resistência até o eixo (fulcro) representa o braço da resistência (BR). Quanto mais distante uma força for aplicada, maior será sua vantagem mecânica, isto é, precisa gerar menos força para equilibrar a alavanca. Fig. 52. Exemplo de uma alavanca de primeira classe equilibrada. Ambos estão aplicando a mesma força. Fig. 53. Exemplo clássico de uma alavanca de primeira classe, em que o eixo (a articulação) se encontra entre a força da potência (tríceps) e a força da resistência (o cabo). Ambas as forças estão puxando na mesma direção e a oposição é criada pelo eixo. 82 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a d o e x e r c í c i o Fig. 54. Se um dos personagens se aproximar do eixo, a alavanca desequilibra e, para voltar ao equilíbrio, é preciso gerar mais força. Neste exemplo, colocar um personagem mais pesado. O personagem que está mais distante do eixo possui vantagem mecânica, facilidade relativa. BP Fig. 55. Sistema de alavanca de segunda classe. A força da resistência está posicionada entre o eixo e a força da potência/esforço. BR FULCRO FULCRO Fig. 56. a) Quando o antepé é considerado como eixo, este exemplo se classifica como alavanca de segunda classe. Também considerando que a linha da força (verde) necessariamente precisa estar posicionada entre o eixo e a força de potência. Se este fator muda, a classificação deste exemplo muda. b) É possível analisar cada articulação independentemente e classificá-las, porém, normalmente analisamos a articulação que está fixa como sendo o fulcro. Se for considerado o tornozelo como sendo o eixo, este exemplo passa a ser uma alavanca de primeira classe. Isso é uma questão de contexto. FULCRO a) b) A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 83 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli Muitas vezes, encontramos dificuldade em identificar o braço da potência/esforço e o braço da resistência em uma alavanca de segundo e terceiro grau apresentados da Fig. 55 até a Fig. 58, porque se confundem com o fato de ambos se encontrarem do mesmo lado do eixo. Uma maneira fácil de encontrarmos o braço da potência/ esforço e da resistência é sempre retornar à definição do que é um braço de alavanca, localizá-lo e identificar qual está posicionado mais próximo e mais distante do eixo. BP BR Fig. 57. Em uma alavanca de terceira classe, a força da potência se encontra entre a força da resistência e o eixo. Alavanca de segunda classe: posiciona a resistência entre o eixo e a potência/esforço [Fig. 55]. Porque o braço da potência/esforço, por definição, é mais longo do que o braço da resistência, a alavanca de segunda classe é normalmente associada como sendo uma que oferece vantagem mecância à potência/esforço, porém esta afirmação não é sempre correta. Vantagem mecânica não pode ser avaliada com a identificação da alavanca, é necessário identificar o comprimento do braço do momento de ambas as forças, e vamos avaliar esta diferença no final deste capítulo. Atenção: No exemplo da Fig. 56, precisamos determinar qual o eixo que estamos analisando. Se for o eixo do tornozelo (calcanhar), ele se classifica como uma alavanca de primeira classe porque o eixo se encontra entre a aplicação das duas forças. Se for o eixo do antepé, a alavanca se classifica como de segunda classe. Cada articulação se encontra dentro de um sistema de alavancas. Definição de Braço da Alavanca: É a distância entre o ponto de aplicação da força (do esforço e da resistência) para o eixo. Fig. 58. Exemplo clássico de uma alavanca de terceira classe, em que a força da potência (músculo bíceps) se encontra entre a força de resistência (halter) e o eixo. As forças estão puxando em direções contrárias. 84 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a d o e x e r c í c i o Alavanca de terceira classe posiciona a força da potência/esforço entre o eixo e a resistência [Fig. 57] (exemplo: bíceps). Estes são os sistemas de alavanca mais comuns no corpo humano. O braço da alavanca da potência será sempre mais curto (menor) do que o braço da resistência. Sendo assim, este tipo de alavanca nos coloca sempre em desvantagem mecância [Fig. 58]. da potência/esforço for, na verdade, menor do que o momento da força de resistência [Fig. 59]. A vantagem da desvantagem mecânica Devido à proximidade das inserções musculares ao eixo, o sistema de alavancas no corpo humano parece nos colocar sempre em desvantagem mecânica. Porém, se analisarmos o sistema de alavanca do corpo humano pelo ponto de vista de eficiência em deslocamento, verificamos que este oferece uma grande vantagem, mesmo quando em quase todos os exemplos de alavanca o posicionamento do músculo é muito próximo da articulação e a resistência distante da articulação, porque o músculo que está sob a pele quando se encurta 5 cm (move 5 cm), desloca-se muito mais do que isso na extremidade da alavanca. Fig. 59. Exemplo de quando as forças não são paralelas e o comprimento do braço da potência é maior do que o braço da resistência. Porém, com vantagem mecânica para resistência. Existe valor no sistema de classificação das alavancas? É importante entender que estas três classificações do sistema de alavancas só são relevantes para o que é descrito como o “sistema de forças paralelas”. O livro Articulação Estrutura e Função afirma que “um achado comum no corpo humano são as forças que atuam no mesmo objeto e são paralelas entre si”. Quando examinamos a grande quantidade de atividades disponíveis aos seres humanos, parece que forças perfeitamente paralelas são raras, a não ser quando as forças são constritas ou organizadas desta maneira, como são os exemplos clássicos das alavancas. Então, se as forças não são paralelas, e normalmente elas não são, é muito possível que um sistema de alavanca com um braço de potência/esforço maior do que o braço da resistência (segunda classe) possa gerar desvantagem mecânica se o momento da força P R Você pode dar um passo a mais e pensar em outros exemplos de sistema de forças paralelas que não se encaixam no sistema de classificação tradicional das alavancas? Tente imaginar um braço da resistência maior que o braço da potência, com forças paralelas, porém com vantagem mecânica para a potência/esforço. Na verdade, o sistema tradicional de alavancas só funciona se as forças estiverem paralelas e os braços da alavanca estiverem retos e, na vida real (como na construção de equipamentos), eles normalmente não estão paralelos [Fig. 60]. Fig. 60. Sistema em que as forças são paralelas, porém a força da resistência, mesmo sendo aplicada em uma posição mais distante do eixo do que a força de potência, não tem vantagem mecânica. P A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • R 85 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli BM BM BA Fig. 61. Exemplo clássico de uma alavanca de primeira classe equilibrada. Nesta situação, o braço da alavanca (BA) tem o mesmo comprimento do braço do momento (BM). Quer dizer, eles são iguais e possuem a mesma influência. BA Fig. 62. Um exercício de abdução do ombro com halteres em uma posição em que o comprimento do braço da alavanca (BA) e braço do momento (BM) são os mesmos. A definição de Braço da Alavanca (BA) e Braço do Momento (BM) não é a mesma! Braço do momento (BM) e braço da alavanca (BA) não são a mesma coisa! Tradicionalmente, entendemos que braço do momento e braço da alavanca são os mesmos, porém, quando a exploração sai do livro e entra na vida real, verificamos que esta não é a realidade. O problema parece residir na exploração limitada para além do exemplo tradicional oferecido [Fig. 61 e Fig. 62], “o equilibrado sistema de alavanca de primeira classe (gangorra)”. Em uma gangorra equilibrada, o braço do momento (distância perpendicular da linha da força para o eixo) coincide com o braço da alavanca (a distância entre o ponto de aplicação da força para o eixo) porque o ângulo de força é de 90˚. Se a gangorra se apresentar desequilibrada [Fig. 63], torna-se evidente que ambos são muito diferentes [Fig. 64 e Fig. 65]. Os termos “braço da potência” e “braço da resistência” também podem dar margem a controvérsias. Alguns livros os classificam como braço da alavanca e outros como braço do momento. Porque o momento da força é o fator mais crítico para análise e criação de exercícios, devemos utilizar a nomenclatura momento da potência/esforço e momento da resitência. Também devemos perceber que é necessário reavaliar as definições e uso dos termos “esforço (potência)” e “resistência” quando analisamos exercícios. Tradicionalmente o termo esforço foi usado para indicar a força causando movimento e resistência a força se opondo ao movimento. Isso obviamente significa que o esforço (potência) e a resistência vão trocar de lugar quando a direção do movimento mudar. Porém, para analisarmos e criarmos exercícios, esta classificação não é ideal. 86 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a BM d o e x e r c í c i o Fig. 63. Quando a gangorra não está equilibrada, o resultado não é o mesmo. BA Fig. 64. Um exercício de abdução realizado com cabos. Neste exemplo, o braço do momento da resistência é menor do que o comprimento do braço da alavanca, por mais que a aplicação da força de resistência seja no mesmo ponto (na mão). Neste exemplo, na mesma posição articular do exemplo acima com halter, o torque é menor do que o torque utilizando um halter. BA BM BM BA Fig. 65. Durante o exercício em uma posição de 70º de abdução do ombro. Neste exemplo, o braço do momento da resistência é menor do que na posição a 90º. O braço do momento nesta posição é menor do que o comprimento do braço da alavanca, mesmo utilizando um halter. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 87 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli Durante exercícios de flexão de cotovelo com halter, os flexores do cotovelo seriam o esforço (potência), mas o halter se tornaria o esforço (potência) quando estivesse na extensão, fase excêntrica, os músculos flexores seriam a resistência. Esta nomenclatura não é apropriada para ser utilizada nos exercícios por duas razões: 1. Deveríamos manter a constância de chamar esforço (potência) o lado que estiver associado com o músculo independentemente de direção, porque eles estão gerando o esforço, a potência. Um outro motivo é porque já temos nomenclatura para identificar a direção do movimento e a chamamos de concêntrica e excêntrica. 2. A troca da nomenclatura baseada na direção do movimento não dá espaço para identificar cenários estáticos, como na isometria. Isometria certamente exige esforço contra a resistência e, mesmo com o sistema de nomenclatura não dando oportunidade para este cenário, ainda assim existe um esforço muscular contra uma resistência externa. Então é apropriado identificarmos esforço (potência) o lado da força muscular e resistência o lado da força externa independentemente de direção. O VERDADEIRO BRAÇO DA ALAVANCA Normalmente, enxergamos alavancas como algo tangível. Porém, este fato pode ser enganoso quando precisamos identificar o verdadeiro braço dentro da alavanca. Engenheiros enxergam os braços das alavancas como eles são: uma linha que atravessa direto do eixo até o ponto de aplicação da força. Eles ignoram o formato do objeto para encontrar o verdadeiro braço da alavanca escondido [Fig. 66]. Este conceito é importante porque os ossos são o que formam as alavancas e então esta situação acontece muitas vezes no corpo humano. Fig. 66. Braço da alavanca. A definição de braço de alavanca é: a distância entre o eixo e o ponto de aplicação de uma força. Esta linha que une o eixo ao ponto de aplicação da força é invisível e, às vezes, cruza por dentro do corpo rígido (haste) do objeto. As máquinas são muitas vezes construídas de uma maneira em que não existe objeto nenhum ocupando o espaço do braço da alavanca, mas este braço invisível é o “verdadeiro braço da alavanca” [Fig. 67]. Como você pode ver, a estrutura de metal da máquina não contém fisicamente o corpo rígido que é a haste da alavanca. Fig. 67. Braço da alavanca “invisível”. Na construção das máquinas, muitas vezes o braço da alavanca atravessa o espaço não ocupado pela máquina. 88 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a d o e x e r c í c i o Estes braços de alavancas “invisíveis” também podem ser encontrados na aplicação de forças no corpo durante os exercícios. A coompreensão destes conceitos da alavanca será importante para o entendimento de conceitos mais avançados dentro da mecânica do exercício. Lembre-se que sempre que a nomenclatura está entre “aspas” é porque não são termos técnicos ou mesmo aceitos no mundo acadêmico ainda. Estes termos são palavras que facilitam o entendimento. Eles foram elaborados durante anos de tentativa e erro, associados com muitos anos tentando explicar conceitos da engenharia para estudantes que não são engenheiros. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 89 Descrevendo posições e movimentos articulares: Orientação do corpo m e c â n i c a Posições anatômicas As posições anatômicas não foram definidas porque foram identificadas como as posições articulares estruturalmente ideais. Estas posições foram definidas há muito tempo para serem simplesmente um ponto de referência para a descrição e orientação anatômica. Estas posições são basicamante uma posição em decúbito dorsal ou em pé com a palma da mão posicionada anteriormente usada para que tenhamos um ponto de referência, ela foi criada para oferecer um zero ou um começo, porém existe uma inconsistência na posição anatômica. Todas as articulações se encontram em neutro, ou zero, com exceção da articulação radioulnar que na posição anatômica se encontra em supinação. Esta inconcistência parece ter sido necessária para manter a relação de orientação da mão e dos dedos e manter a consistência dos movimentos destes com os planos equivalentes no tronco. A coluna também pode ser entendida como uma exceção, pois o neutro para um indivíduo não pode ser ditado por uma ilustração. Termos ou referências anatômicas são relativas ao corpo que está sendo analisado e não são relativas ao corpo e sua relação no espaço ou com o mundo a sua volta. O sistema planar tradicional O sistema planar pelo qual nos comunicamos sobre movimentos e posições do corpo humano foi construído em torno do corpo na posição anatômica como base. Ele derivou do sistema de coordenadas X, Y, Z para espaços tridimensionais [Fig. 68]. Porém, o sistema planar aplicou estes três eixos no corpo como um todo e traçou seus respectivos planos, e os chamou de planos cardinais. Este fato fez com que nosso sistema tradicional de comunicação se tornasse falho, deixando espaço para má interpretação. d o e x e r c í c i o Y Z X Fig. 68. O sistema de coordenadas x, y, z para espaços tridimensionais, constituído por três eixos. Movimentos diários acontecem em inúmeros planos que não possuem nomenclatura classificada. Planos anatômicos O corpo pode ser dividido em incontáveis números de planos ou secções nas quais o corpo pode ser dividido. Somente três deles receberam um nome. Com este sistema, basicamente indicamos Norte, Sul, Leste e Oeste [Fig. 69]. Plano sagital (também conhecido como mediano) divide o corpo em duas metades, direita e esquerda; e medial e lateral. Por exemplo, o plano sagital atravessa a linha média do corpo, mas também em cada articulação existe um plano sagital, como o plano sagital do ombro. Plano frontal (também conhecido como coronal) divide o corpo em frente e atrás; anterior e posterior. Plano transverso (também conhecido como horizontal) divide o corpo em superior e inferior. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 91 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli a) b) c) Fig. 69. a) Plano sagital: divide o corpo em direita e esquerda ou lateral e medial. b) Plano transverso ou horizontal: divide o corpo em superior e inferior. c) Plano frontal: divide o corpo em frente e trás ou posterior e anterior. O plano – Relação entre os eixos Movimento no plano sagital ocorre em torno de um eixo frontal (um eixo que atravessa medial-lateralmente). Movimento no plano frontal ocorre em torno de um eixo sagital (um eixo que atravessa antero-posterioriormente). Movimento no plano transverso ocorre em torno de um eixo “longitudinal” (também chamado “eixo longo”, este é muito mais fácil de se enxergar, e talvez ajude se enxergarmos um eixo que atravessa proximal-distalmente ou superior-inferiormente). A infinidade de outros planos (diagonais etc.) e seus eixos Mesmo que os movimentos diários normalmente ocorram em um número infinito de planos ou até, às vezes, completamente não planares (exemplo, circundução), três planos cardinais foram definidos apenas como pontos de referência a partir dos quais podemos descrever o movimento, muito semelhante a Norte, Sul, Leste e Oeste de uma bússola. E assim como muitas viagens acontecem em alguma posição entre estas coordenadas, muito do nosso movimento diário normal ocorre entre/fora destes três planos que possuem nomes (classificados). Quando o movimento ocorre em um plano que está entre dois dos três planos cardinais, o movimento é muitas vezes descrito como “multiplanar”. Porém, isto não está correto. Movimento acontece em torno de um eixo e, consequentemente, um plano, mesmo que não recaia exatamente sobre um destes três planos que já foram nomeados/classificados. Percebam que movimento multiplanar não deve ser confundido com movimento uniplanar que acontece em um plano que não tem nome. Também não deve ser confundido com diferentes articulações movendo-se em planos diferentes, porém cada articulação movendo-se individualmente em um único plano. 92 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a Movimentos articulares e posições Comunicação usando articulações como referência e não membros Na tentativa de facilitar a comunicação e evitar erros, vamos utilizar as posições e articulações sempre como referência porque todos os movimentos de todos os membros e de todos os ossos acontecem por intermédio das articulações. Todos os movimentos e posições vão descrever os movimentos e posições de uma articulação, não de um membro. Vamos, então, usar flexão de cotovelo, extensão do joelho no lugar de flexão do braço ou extensão da perna. Como mencionado, os movimentos das articulações são normalmente definidos pelo plano em que se movem e pela direção do movimento. Novamente, o movimento acontece dentro da articulação e não é indicado por sua relação com o mundo a nossa volta. Porém, o nosso sistema de comunicação normalmente identifica o movimento do membro e não da articulação. Se indicássemos o movimento da articulação, a abdução jamais seria descrita como o movimento do braço se afastando da linha média. Esta perspectiva é vital para uma comunicação clara entre profissionais, mas também para identificar o que realmente acontece durante um exercício. É ainda mais crítico para comunicação quando o movimento acontece em uma posição diferente da posição anatômica, como é o caso de quase todos os exercícios. Por esta razão, é melhor lembrar que movimentos articulares são basicamente descrições das mudanças na relação entre superfícies de contato articular. Visualize um lado se aproximando e outro se afastando. Descrições das posições das articulações são baseadas na posição estática em que a articulação inicia ou encerra um movimento em relação d o e x e r c í c i o ao corpo. Elas definem a relação imediata entre as superfícies de contato articular. O nome de uma posição articular específica não está necessariamente relacionada ao movimento realizado para chegar àquela posição. A descrição de uma posição articular é relativa a dois fatores: 1. O plano em que a posição acontece, mesmo que este plano possa se sobrepor; 2. De que lado o neutro anatômico da posição se encontra. Consideração do que é Neutro nas Extremidades Neutro anatômico é considerado como sendo a linha divisória entre as descrições de posições (nomes de posições). É o “zero”. Um ponto importante para aprender movimentos Ao aprender movimentos, evite associar músculos com um movimento articular específico. A correlação entre um movimento articular e a ação específica de um músculo ou grupo muscular leva a uma má interpretação comum sobre quais músculos estão trabalhando em um exercício. Os nomes de movimentos e posições indicam e descrevem movimentos articulares e posições no que se refere ao esqueleto. A indicação de quais músculos vão participar em qual função depende da direção da resistência específica que está sendo aplicada. a análise do movimento por si só não oferece dados suficientes para identificação dos músculos responsáveis por ele. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 93 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli NO plano sagital Movimentos e posições que ocorrem em torno do eixo frontal. Flexão é normalmente descrita como sendo o movimento articular que se afasta da posição anatômica; ocorre no plano sagital. Porém, esta descrição não é sustentável quando considerada a hiperextensão. Muitos livros descrevem flexão como sendo um aumento do ângulo articular no plano sagital, porém, quando observamos a hiperextensão, essa descrição não se mantém. Uma flexão partindo de uma posição de hiperextensão vai resultar numa diminuição do ângulo articular até alcançar o neutro. A flexão também é descrita como a aproximação das superfícies anteriores de um membro, mas isso não é verdade na flexão do joelho e na flexão de ombro. Uma posição de flexão pode ser descrita como uma posição no plano sagital e de um lado específico do neutro. Entretanto, 90° de flexão de ombro poderia ser também 90° de adução horizontal. Porém se a articulação para em qualquer ponto durante esse movimento, devemos chamá-lo de uma posição de flexão. Extensão é o movimento articular retornando à posição anatômica a partir de uma posição de flexão. Se a articulação para de se mover em qualquer ponto antes de atingir a posição anatômica, ela continua em uma posição de flexão, mas em menor grau. A posição de extensão no quadril e no ombro é atingida quando a extensão ultrapassa o neutro. Hiperextensão é normalmente descrita como sendo o movimento que ultrapassa a posição anatômica (além de 0° ou neutro) no plano sagital, que é um movimento normal e viável para o ombro, quadril e joelhos. Entretanto, em nossa língua o prefixo hiper indica “muito” (hipermóvel, hiperatividade etc.). Por esta razão, sugerimos que estes movimentos articulares considerados normais sejam chamados de extensão além de neutro/zero. Muitos profissionais consideram tudo que é relacionado ao hiper como sendo “ruim”. Isto ocorre porque foi nomeado um movimento normal com uma palavra que significa anormal ou excessivo. Faz mais sentido reservar a palavra hiper para algo que excede o limite individual. Isto fará com que o uso da palavra fique mais consistente com seu significado. Parar em qualquer ponto durante a extensão, além da posição anatômica, cria uma posição de extensão. Retornar à posição anatômica de qualquer posição de extensão/hiperextensão é um movimento de flexão. Dorsiflexão (flexão dorsal) é a extensão do tornozelo, porém, existem autores que sugerem que ela é a flexão do tornozelo. Por isso, foram criadas as identificações como dorsiflexão e plantiflexão. Plantiflexão (flexão plantar) é a flexão do tornozelo. Estes movimentos da articulação do tornozelo são motivo de muita confusão. Kendall afirma que em um estudo com 48 autores, 12 deram uma definição errada. Para confirmar isto considere, a partir da posição anatômica, que a flexão de cada articulação de um membro é consistente em direção (flexão de punho, flexão dos dedos etc.). Então, flexão dos dedos e flexão plantar são congruentes. É importante distinguir entre ação muscular e ação articular. Músculos não “flexionam”, articulações “flexionam”. Músculos contraem ou encurtam; músculos não estendem, eles alongam. no plano frontal Movimentos e posições que ocorrem em torno do eixo sagital. Abdução é um movimento articular que se afasta da posição anatômica no plano frontal. Normalmente é vista como um movimento de afastamento da linha média, mas isto cria uma comunicação falha quando consideramos que a abdução do ombro além de 90° 94 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a aproxima-se da linha média (então acima de 90° esta definição não é mais verdadeira, pois se torna a aproximação da linha média). Se a articulação para em qualquer ponto deste movimento, é um grau específico de abdução. Adução é o movimento de retorno à posição anatômica de uma posição de abdução. Parando em qualquer ponto antes de um retorno completo a posição anatômica continua sendo uma posição de abdução, mas em um grau menor. Continuando seu retorno à posição anatômica, se a articulação continua além de zero grau em direção à linha média ou cruza a linha média, o movimento ainda é chamado de adução e a posição também é chamada de posição de adução. Protração da escápula possui um componente de abdução. Retração da escápula possui um componente de adução. O contorno do gradil costal exige um desvio do plano frontal na maioria destes movimentos. Flexão lateral refere-se ao movimento da coluna no plano frontal. no plano transverso Movimentos e posições que ocorrem em torno do eixo longitudinal. Rotação longitudinal versus movimento rotatório. Rotação longitudinal refere-se à rotação em torno de um eixo que atravessa o comprimento de um osso. Movimentos específicos da coluna, ombro, quadril, articulação radioumeral e joelho são exemplos disto. Porém, tenha em mente que “rotação” não é exclusivo ao eixo longitudinal. Movimento rotatório acontece em todos os movimentos discutidos (adução, abdução etc.), todos envolvem uma rotação em torno de um eixo. Rotação interna (ou rotação medial) indica a rotação da superfície anterior em direção à posição da d o e x e r c í c i o superfície medial. Uma posição de rotação interna é qualquer ponto para dentro do neutro. Rotação externa (ou rotação lateral) indica a rotação da superfície anterior em direção à superfície lateral. Uma posição de rotação externa é qualquer ponto para fora do neutro. Estas posições podem se tornar confusas quando as posições iniciais do ombro ou do quadril são diferentes da posição anatômica ou se alguém erroneamente olha para o movimento do membro distal enquanto o cotovelo ou o joelho está em várias posições de flexão. Por essa razão, os nomes rotação medial e rotação lateral podem ser melhores. descrições QUE precisam de atenção especial É crítico que você não aprenda supinação e pronação baseados na posição das mãos. Tome cuidado para não confundir mudanças na articulação do ombro com mudanças na articulação radioulnar. Mudanças na articulação do ombro vão causar mudanças na posição da mão no espaço mesmo que não exista mudança na articulação radioulnar. Pronação é a rotação medial da articulação radioulnar. O rádio está totalmente cruzado sobre a ulna. Nunca pense na descrição “palma da mão para trás/para baixo” porque só é verdade quando o cenário for a posição anatômica. Supinação é a rotação lateral da articulação radioulnar. O rádio encontra-se paralelo à ulna. Novamente não pense na descrição “palma da mão para frente/para cima”, porque só é verdadeira no cenário da posição anatômica. Rotação do joelho deve ser descrita pela referência do segmento que se move em referência ao segmento fixo. Rotação do joelho da tíbia rodando sob o fêmur A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 95 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli fixo é comumente chamado de torção tibial. Porém, isso pode ser fonte de confusão! Parece que sempre que a tíbia gira internamente é chamada de torção tibial, porque é associada com a pronação do pé (pé restrito), mas, se mesmo com o pé restrito, o fêmur rodar ainda mais internamente no joelho do que a tíbia rodou em resposta ao movimento do tálus, então a posição do joelho não é a de “rotação interna da tíbia”. A posição seria na verdade rotação externa. Rotação da coluna é descrita como sendo à direita ou à esquerda e deve ser designada como a rotação do tronco sobre a pelve fixa (mais comum), ou a rotação da pelve sobre o tronco fixo. Rotação esquerda da pelve e rotação direita do tronco são os mesmos movimentos na coluna. Circundução é um movimento em forma de cone, movimento não planar de uma parte do corpo. O ápice do cone está na articulação e a extremidade do cone é descrita pelo segmento distal do membro. Circundução não exige rotação sob o próprio eixo. Perspectivas importantes 1. O plano do membro? Uma área de conflito e controvérsia vem da aplicação inconsistente da descrição dos planos em relação aos membros. Quando o braço é mantido na posição anatômica, a flexão/extensão do cotovelo acontece no plano sagital como foi descrito. Se o braço for girado 90° (rotação externa de ombro) muitos experts dirão que o cotovelo está agora flexionando e estendendo no plano frontal. Entretanto, os livros determinam que flexão e extensão são movimentos descritos somente no plano sagital e que adução a abdução são movimentos descritos somente no plano frontal. Quando o ombro está rodado externamente, nós não mudamos nossa descrição com relação ao aspecto anterior, posterior, medial e lateral do braço [Fig. 70]. O aspecto medial não se torna anterior só porque agora está virado para frente, assim como o aspecto anterior do tronco se torna posterior somente porque fizemos uma volta de 180° no espaço e agora olhamos para outra direção. O aspecto medial do braço deve continuar relativo ao braço. Fig. 70. Como é correto utilizar o sistema de coordenadas 3D para identificação e comunicação de movimentos e posições articulares, é necessário entendermos que o eixo se refere à articulação e se move com a articulação. Também é importante relembrar que é o eixo que determina o plano. Neste exemplo, a flexão do cotovelo continua sendo flexão independentemente da posição do ombro. A flexão sempre acontece no plano sagital e nunca no plano frontal. Flexão = eixo frontal e movimento no plano sagital. 96 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a Por esta razão, escolhemos visualizar o movimento do cotovelo de um braço em rotação externa (rotação de 90° de ombro) como ainda sendo movimento no plano sagital do braço. Independentemente do plano em que o ombro estiver posicionado o cotovelo não mudou com relação a ele mesmo. Observe, não alteramos o sistema de coordenadas X, Y, Z para “o corpo” se este se encontra na posição em decúbito dorsal (supino), então não devemos alterar para um membro que foi alterado no espaço. Segure um modelo anatômico de um braço. O plano sagital é o mesmo independentemente da posição que você o coloque no espaço quando está desconectado do tronco [Fig. 71]. O eixo frontal continua na mesma posição atravessando a artciulação, referente a ela, independentemente da posição no espaço. Fig. 71. A flexão do cotovelo acontece sempre em torno do eixo frontal e dentro do plano sagital, independentemente da posição do braço no espaço. d o e x e r c í c i o 2. Relações das superfícies de contato Falamos articulação, mas estamos pensando em um membro. Para aumentar a precisão, será importante aprender a visualizar isto como movimento das superfícies articulares e começar a verdadeiramente ver as superfícies de contato ou a relação das superfícies que fazem este movimento ocorrer. Por exemplo, a dorsiflexão é, na verdade, a superfície de contato do tálus se movendo nas extremidades da tíbia e da fíbula. Somente desta maneira poderemos visualizar as limitações do movimento baseadas nas estruturas articulares. Além disso, é necessário visualizar o plano de movimento como o eixo do movimento articular e não como o plano do movimento do membro. Por exemplo, a flexão do ombro, quando realizada com a total protração escapular, vai estar mais próxima de uma abdução do que uma flexão e, se por algum motivo relacionado às estruturas articulares, for necessário evitar uma abdução, realizar uma flexão que cria a mesma relação entre as superfícies de contato pode ser um problema. Então, a preocupação não é somente com o plano do membro e o eixo, mas também com os movimentos articulares como foram determinados entre as superfícies de contato. 3. Movimentos articulares combinados Isto nos ajudará a ver que estas descrições de movimento normalmente envolvem mais de uma articulação se movendo. A abdução do ombro “tradicional” é, na verdade, a combinação da abdução glenoumeral (úmero relativo à escápula e não ao tronco) e do movimento escapulotorácico [Fig. 72]. Até que identifiquemos o quanto cada um está envolvido na abdução, não saberemos qual se moveu. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 97 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli a) b) Fig. 72. Movimentos articulares combinados. A abdução é resultado do movimento da escápula e do úmero. Precisamos desenvolver uma “visão interna” para enxergar que a abdução é o movimento de relação entre a cabeça do úmero e a glenoide. Porém, é o envolvimento da escápula durante o movimento da abdução que permite ao membro alcançar amplitudes maiores. a) Posição inicial e a relação entre as articulações. b) Posição final, identificar quanto cada articulação se moveu para alcançar a amplitude final. 98 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a d o e x e r c í c i o A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 99 Mecânica articular: “Controle Articular” influências passivas m e c â n i c a O nome controle articular refere-se à manutenção das relações entre as superfícies de contato. Isto inclui o controle sobre as posições estáticas e as mudanças nestas posições, que por definição se chamam movimento. Examine a relação entre posição e movimento. Lembra-se da época que os desenhos animados eram na verdade desenhos no papel? Eles eram formados por vinte e quatro figuras estáticas mostradas a cada segundo que nos davam a percepção de movimento. Podemos ver o movimento articular da mesma maneira, sendo simplesmente uma mudança de posição. Uma série de posições estáticas precisas que, sequencialmente, movem-se para dentro e para fora da posição entre o início e o final. Se considerarmos esta perspectiva, passamos a apreciar que movimento é dependente 100% do controle sobre estas posições. Controle articular é diferente de estabilização articular. Por definição, estabilidade e mobilidade são opostas. Estável significa que permanece firme, sólido, não muda. Estabilidade significa solidez, segurança, permanência. Estabilizar significa evitar mudança, tornar estável. Móvel significa que se move, que pode ser movido, caracterizado pela facilidade em mudar. Controle Significa gerenciar, exercitar poder ou autoridade; restringir; limitar ou restringir alguém ou alguma coisa. Parece ser mais apropriado usar a palavra controle para descrever o que a indústria tem chamado de “estabilidade”. Controle pode ser involuntário, como para a manutenção da integridade articular, ou voluntário, como o controle do trajeto do movimento e das posições. Estabilização Na indústria do exercício, a palavra estabilização é quase que exclusivamente utilizada em referência ao controle motor “bruto”. Isto é comprovado pela d o e x e r c í c i o associação feita de que a utilização de ferramentas de equilíbrio (superfícies instáveis) vai melhorar a “estabilização”. É necessário rever a relação entre controle motor “bruto” e “segmentado”. Ter controle em cima de uma superfície instável não é garantia que influencia positivamente a estabilidade articular ou o controle articular. O controle estático influencia o alinhamento articular perfeito, porém existe uma demanda muito maior de controle sobre as mudanças na posição articular, enquanto esta mantém os aspectos do alinhamento. Devemos perceber que o termo “estabilização dinâmica” é incoerente tanto quanto usar o termo “movimento estático”. O que está acontecendo nos exercícios que dizem usar estabilização dinâmica é um controle sobre as mudanças das relações entre as superfícies de contato, garantindo a centrificação (manutenção do eixo) e a otimização da área de contato. As influências ativas e passivas sobre o controle articular Os tecidos que contribuem para o controle articular são divididos em contráteis e não contráteis. Para representar a maneira que estes tecidos influenciam o controle articular nós vamos substituir seus nomes por ativos e passivos, respectivamente. Ambos são vitais, mas o grau em que eles influenciam varia devido à articulação e suas estruturas, posição, às forças impostas e à integridade do complexo neuromuscular ativo (não confundir com ADM ativa e passiva, estamos falando de controle articular ativo e passivo). Controle articular ativo (tecido contrátil – estrategicamente ajustável): aquele que está constantemente se ajustando sempre que as posições articulares mudam e as forças externas sofrem alterações em sua direção e magnitude. Controle articular passivo (tecido não contrátil – não ajustável): aquele que não se ajusta. No mundo da ortopedia, eles são responsáveis pela estabilidade A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 101 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli ou instabilidade. Oferecem limites e guias durante a amplitude e criam uma proteção sólida no final da amplitude, assim como influenciam os graus de liberdade disponíveis. Podemos chamar estes controladores articulares de “gerentes articulares e estabilizadores articulares”, porque funcionam gerenciando como tais. Tecido contrátil agindo como gerente ou estabilizador articular precisa cruzar a articulação entre as duas superfícies de contato. A única forma de força que um tecido mole pode gerar é tensão. Esta tensão pode ser ativa (tecido mole contrátil) ou passiva (tecido mole não contrátil). Controle passivo das relações das superfícies de contato Quando um profissional da área médica examina a estabilidade articular, normalmente o faz passivamente (Teste de Lachman ou gaveta anterior). O nível de estabilidade passiva é determinado por testes passivos, durante os quais a musculatura deve estar relaxada. Espera-se encontrar amplitude passiva suficiente, tanto dentro da amplitude fisiológica normal, quanto no “jogo articular”. Quando a mobilidade passiva articular é excessiva, é indicativa de frouxidão ligamentar. Dependendo da articulação, da posição e direção do teste, a frouxidão não deve estar presente, quer dizer, é necessário que haja estabilidade e, se houver frouxidão, existe um problema. Tecido conjuntivo As estruturas compostas por tecido conjuntivo incluem ligamentos, tendões, bursas, cartilagem, discos, meniscos, fáscias etc., assim como os ossos. Estes tecidos não contráteis serão chamados em nossos estudos de tecidos passivos e podem ser divididos em dois grupos: osso e tecidos moles não contráteis. Osso O formato das extremidades dos ossos cria as superfícies de contato. O formato das superfícies de contato é a essência da estrutura articular e determina: • Área de superfície para distribuição de força. • Graus de liberdade. • A estabilização passiva oferecida por uma estrutura óssea e os tecidos associados (ligamento ou músculo). • Tolerância das articulações às forças como cisalhamento. Existem partes do osso fora da superfície de contato que podem oferecer barreira para o movimento articular e para alguns planos e posições específicas – chamam-se protuberâncias ósseas. Tecido mole não contrátil Das substâncias que formam o tecido conjuntivo, a proteína e a água são as mais importantes. Colágeno É a mais abundante proteína encontrada no corpo humano. Ele tem uma força tensiva que se parece com a encontrada no aço (Joint Structure & Function, 4ª ed., p. 75) e é responsável pela integridade funcional do tecido conjuntivo. Elastina Possui propriedades elásticas que a permite deformar sob aplicações de forças e depois retornar ao seu estado original ao ser removida a força. A quantidade de elastina varia entre diferentes tecidos conjuntivos, baseado na função que eles possuem. De acordo com Joint Structure and Function, o tendão de Aquiles possui 4% de elastina e o ligamento nuchae possui 75% elastina. Cápsula articular A cápsula articular é composta por duas camadas – externa e interna. A camada externa é formada de tecido com fibras densas e circunda completamente as extremidades dos ossos. Ela é fixa ao 102 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a periósteo e é reforçada por ligamentos e estruturas musculotendíneas que atravessam a articulação. A camada externa possui um baixo nível de vascularização, mas é muito inervada por receptores articulares que podem detectar a proporção e a direção do movimento, compressão e tensão, e vibração e dor. Já a camada interna é altamente vascularizada, porém não muito inervada. Ela contém células que sintetizam um componente do líquido sinovial. Esta camada também produz colágeno e serve como ponto de entrada para nutrientes e como uma saída para a sobra de materiais. Ligamentos Conectam osso com osso. O mais importante é que eles mantêm a relação das superfícies de contato ao: 1. limitar a quantidade de movimento em um dado plano; 2. prevenir completamente o movimento em um dado plano. O ligamento oferece restrição passiva a, pelo menos, um plano da articulação. Alguns ligamentos foram projetados para impedir completamente um movimento específico, como o ligamento colateral lateral. Outros ligamentos foram projetados para oferecer uma quantidade de movimento finita, como o ligamento cruzado anterior, o qual, devido a sua estrutura, ajuda a manter as relações das superfícies de contato durante o movimento de extensão, porém exige uma parada abrupta quando completamente estendido. Os ligamentos possuem mais de uma função, eles atuam como “monitores” e como “guias”. d o e x e r c í c i o Cada ligamento parece oferecer uma limitação ao movimento dentro de um plano específico (isto é, descrito normalmente como “monitoramento” do movimento dentro daquele plano). Porém, cada ligamento parece trabalhar sinergisticamente com outro da mesma articulação para oferecer um certo nível de guia passivo sinergístico dentro de outro plano de movimento. Devido à posição de suas inserções, o LCM (ligamento colateral medial), LCL (ligamento colateral lateral), LCA (ligamento cruzado anterior), LCP (ligamento cruzado posterior) interagem entre si [Fig. 73]. O LCA e o LCP possuem um contato direto que atua como guia das superfícies de contato durante a extensão do joelho com a rotação associada. Fig. 73. Ligamentos possuem diferentes responsabilidades: aqui, os ligamentos colaterais medial e lateral da articulação do joelho têm a “responsabilidade” de impedir movimento no plano frontal. Os ligamentos cruzados anterior e posterior têm a “responsabilidade” de limitar a translação no plano sagital. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 103 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli Percentual de contribuição Os ligamentos são indicados por muitos experts como sendo a segunda linha de defesa da articulação, secundários aos músculos no que diz respeito à função articular e à manutenção da relação entre as superfícies de contato durante a amplitude de movimento. Os ligamentos são a última linha de defesa da articulação contra a amplitude de movimento excessiva, sendo os músculos com suas capacidades contráteis a primeira linha de defesa. Os ligamentos também têm a função de guiar o movimento durante toda a amplitude. Todo movimento articular é uma sinergia entre os tecidos ativos e os passivos, sendo que a porcentagem ou a quantidade de contribuição de cada um deles é dependente do tipo de articulação e varia em cada posição/porção da amplitude e da direção da resistência. Existe um pensamento de que a maioria das lesões ligamentosas acontece porque os músculos não fizeram seu trabalho direito como controladores da articulação e permitiram uma amplitude articular excessiva e imprópria. Podemos usar aqui uma analogia com o guard rail, quando dirigindo um carro numa curva e na situação de não ser possível ter controle suficiente para manter o carro na pista, ele encosta no guard rail para se manter na estrada. Assim são os ligamentos quando os músculos permitiram excesso de amplitude articular. A distribuição das fibras de colágeno e a relação colágeno-elastina em muitos ligamentos determinam as habilidades relativas das estruturas de prover estabilidade e mobilidade para uma articulação específica. As fibras de colágeno nos ligamentos têm uma variedade de arranjos dependendo de sua função específica. Devemos notar também que os ligamentos possuem órgãos sensoriais que são vitais para detectarem informações sobre o estado da articulação. Estas informações serão usadas na orquestração da participação dos tecidos contráteis neste controle articular. Fig. 74. O exercício chamado de “crucifixo”, ou qualquer outro que alcance uma posição closed pack, exige uma consideração especial sobre a ADM total resistida. Neste exemplo, a articulação do ombro está na posição closed pack (abdução horizontal com rotação externa) e a direção da resistência está incentivando a articulação ainda mais profundamente. 104 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a Tecido passivo = Tensão passiva Já que esses tecidos não são contráteis, a tensão dentro deles precisa ser gerada por uma força externa; esse tecido não consegue gerar tensão por si mesmo. Tanto para os ligamentos quanto para a cápsula articular esta força é imposta pela tentativa de afastar suas inserções ósseas durante a amplitude de movimento normal ou excessiva. As oportunidades e limitações apresentadas por estruturas passivas Tornozelo Dorsiflexão máxima Cotovelo radioumeral 90° de flexão de cotovelo, 5° de supinação Cotovelo umeroulnar Extensão do cotovelo máxima Faceta vertebral Extensão máxima Glenoumeral Abdução glenoumeral máxima e rotação externa máxima Quadril Extensão máxima e rotação interna máxima Joelho Extensão máxima e rotação externa máxima Radioulnar distal 5° de supinação Radioulnar proximal 5° de supinação Subtalar Supinação máxima Posições close-packed das articulações (extraídas do livro The Rehabilitation Specialist Handbook) d o e x e r c í c i o Posições close-packed Toda articulação sinovial possui uma posição close-packed (trancada), em que as superfícies articulares são congruentes ao máximo e a cápsula e muitos dos ligamentos estão tensos ao máximo. Nesta posição, as superfícies articulares são comprimidas e a articulação possui sua maior estabilidade (menor mobilidade na continuação daquela direção do movimento) [Fig. 74]. Posições close-packed e o exercício Muitas vezes, chegamos à conclusão de que estas posições close-packed (travadas) são perigosas. É absolutamente crítico que compreendamos que não é a posição que é perigosa. É a direção e a quantidade de força externa aplicadas na articulação que vão determinar o nível de risco. Entretanto, permitir ou encorajar uma força externa a empurrar ou puxar a articulação mais profundamente dentro da posição close-packed é que se torna o problema. Considerando estas posições como sendo altamente perigosas, muitos escolhem evitá-las ou vão ainda além, evitando qualquer posição perto delas, como extensão de joelho até zero no leg press. Ao não encorajarmos nossos clientes a aprenderem a ter este controle sobre estas amplitudes finais e críticas, por muitas vezes criamos uma inabilidade. A compreensão-padrão deste conceito é limitada e pouco criteriosa. Há uma preocupação com a extensão do joelho até o zero no leg press (o qual pode ser prejudicial dependendo da velocidade do movimento para chegar à extensão, quantidade de sobrecarga e grau de extensão). Entretanto, não nos preocupamos em aplicar a sobrecarga diretamente na frente do joelho para adicionar carga em um mergulho no “tríceps no banco” (o que é muito mais diretamente aplicada contra o LCA do que o leg press) e ainda ignoramos completamente a posição close-packed em outras articulações, como a do ombro. De fato, tradicionalmente encorajamos e violamos esta posição close-packed e a chamamos de amplitude de movimento completa A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 105 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli (desenvolvimento atrás do pescoço e alongamento quando o ombro está em rotação externa nos crucifixos e no voador). A posição close-packed (sozinha) não é um problema! É a posição adicionada à direção, magnitude e ponto de aplicação da força que determinam o grau de risco. Posição loose-packed A posição loose-packed de uma articulação é qualquer outra posição que não a posição close-packed, mesmo que algumas posições estejam mais frouxas que outras. Na posição destravada (ou loose-packed) de uma articulação, as superfícies articulares estão relativamente livres para se moverem, os ligamentos e cápsulas estão relativamente frouxos e os componentes ósseos podem ser movidos ativamente ou passivamente dentro da amplitude de movimento anatômica. Tornozelo 10° de plantiflexão Cotovelo radioumeral Posição anatômica Extensão total de cotovelo, 90° de supinação Cotovelo umeroulnar 70° de flexão de cotovelo 10° de supinação Faceta vertebral Intermediário entre flexão e extensão Glenoumeral 55° GU abdução, 30° adução horizontal GU Quadril 30° de flexão, 30° de abdução, leve rotação externa Joelho 25° de flexão Radioulnar distal 10° supinação Radioulnar proximal 70° de flexão de cotovelo, 35° de supinação Subtalar Posição média Posições loose-packed das articulações (extraídas do livro The Rehabilitation Specialist Handbook) 106 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a d o e x e r c í c i o A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 107 Mecânica articular: Controle articular ativo Controle ativo sobre as relações entre as superfícies de contato m e c â n i c a Músculatura esquelética Músculos fazem somente uma coisa: contraem! Os músculos podem puxar somente com a força gerada por eles mesmos e a isso chamamos tensão. O principal objetivo para um músculo gerar tensão é o controle articular e a manutenção das relações entre as superfícies de contato. Porém todos estes objetivos são indiretos, pois a única coisa que um músculo pode fazer é manipular a distância entre seus dois pontos de inserção. É verdade que existem outras funções no processo de geração de tensão, tal como o gasto energético, mas isso é um subproduto de quando funcionam em seu papel principal. O principal propósito dos músculos esqueléticos é o controle articular. A função muscular através de uma perspectiva mecânica: 1. Músculos somente geram tensão, eles puxam [Fig. 75]. d o e x e r c í c i o Fig. 75. O tecido muscular é um tecido com propriedades contráteis. Isso significa que, quando estimulado, ele contrai (“puxa”), gerando tensão e aproximando seus pontos de fixação (inserções). 2. A tensão gerada pelo músculo “puxa” nas duas inserções musculares igualmente e o músculo não pode determinar qual extremidade vai se mover [Fig. 76]. O estudo do controle ativo (contrátil) foi dividido em três partes: participação muscular, habilidade muscular e perfil da potência/resistência. Fig. 76. A tensão gerada no músculo exerce sua força em ambos os pontos de inserção, independentemente de qual vai se mover. Neste exemplo, a tensão gerada pelo retofemural é aplicada tanto na tíbia quanto na pelve. Se é a tíbia ou a pelve que vai se mover, é uma questão mecânica. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 109 Mecânica muscular: a força interna do cabo de guerra m e c â n i c a d o e x e r c í c i o Classificação planar das funções musculares o sistema da cinesiologia tradicional Cinesiologia – Ciência ou estudo do movimento e das estruturas envolvidas, ativas e passivas. A classificação e descrição da função muscular por meio de três planos cardinais ou anatômicos trouxe muita confusão para nossa indústria. Esta maneira de análise gerou tanto mal-entendido com relação ao que a força muscular faz ou pode fazer, que é necessária uma completa “entrega” de tudo que já foi estudado para que possamos realmente entender a função dos músculos. A maioria das aulas e livros de cinesiologia descreve a função muscular baseada na relação de um músculo relacionado a um plano de movimento e assumindo uma única posição inicial, direção da resistência e ação concêntrica. Para analisar este sistema e suas falhas, é necessário entender que a função de um músculo muda se o plano de movimento mudar e que os músculos possuem mais de uma função dependendo da necessidade/movimento. O músculo motor primário é conhecido por ser um músculo mecanicamente ótimo para produzir um movimento específico dentro de um plano específico em uma articulação. Porém: • Existe normalmente mais de um músculo motor primário para cada movimento específico; • Um músculo pode ser o motor primário para mais de um movimento em uma articulação como, por exemplo, o músculo grade dorsal durante a extensão do ombro e na rotação interna; • O músculo motor primário pode não estar sendo sobrecarregado se a direção da resistência não for congruente com o plano de movimento, como, por exemplo, o exercício “voador” em pé com halteres [Fig. 77]. Então, ativo não significa desafiado; Fig. 77. Este é um exemplo de um exercício em que o músculo motor primário da adução horizontal do ombro (peitoral maior) não está sendo sobrecarregado. A direção da resistência está para baixo (gravidade) e não está congruente com o movimento da articulação. O peitoral está ativo, porém não está resistido. • Um músculo será o motor primário tanto na fase concêntrica, quanto na excêntrica se a direção da resistência não for alterada; • É dito erroneamente que um músculo possui funções primárias e secundárias, o que significa que um músculo age como motor primário em um movimento e como assistente ou estabilizador em outro. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 111 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli Desafios com este conceito: • Um músculo motor primário pode não ser mecanicamente capaz de produzir o movimento durante toda a amplitude anatômica. Por esta razão, ele passa a responsabilidade para outro músculo motor primário dentro do plano que possui uma melhor vantagem mecânica naquele ponto da amplitude; • Em articulações como o quadril e ombro, a relação entre o músculo e o eixo pode mudar através a) da posição de outro eixo (por exemplo, por meio da rotação longitudinal). Com a rotação externa do ombro, os abdutores tradicionais e os abdutores horizontais também mudam. Com a rotação externa do quadril os flexores são os motores primarios durante a abdução. Com a flexão do quadril, os abdutores tradicionais não abduzem mais (inversão da ação muscular); b) Fig. 78. a) Exemplo de uma abdução do quadril realizada partindo-se de uma posição neutra. A abdução é realizada pelos abdutores. b) Exemplo de uma abdução do quadril realizada partindo-se de uma posição de rotação externa do quadril. A relação dos pontos de inserção dos músculos em torno do quadril foi alterada e agora a abdução é realizada com os flexores do quadril. 112 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a • Quando fazemos uma associação direta entre o músculo e o movimento, perdemos de vista o conceito da necessidade (o que foi necessário para realizar o movimento?). O cotovelo pode flexionar sem o envolvimento dos flexores de cotovelo. É essencial mantermos o conceito da necesidade (demanda) como o primeiro fator para identificarmos a participação muscular; • Os planos usados para descrever movimento não têm correlação com a função muscular. O músculo motor secundário (musculatura acessória) é um termo usado para descrever um músculo que foi menos eficiente em realizar um movimento específico, mas tem um pequeno grau de habilidade mecânica para ajudar um movimento específico. O problema com este termo é que: 1. Nunca foi dito qual é o momento em que um músculo deixa de ser primário e passa a ser secundário (acessório); 2. Isto insinua que um músculo tem menos importância para o movimento articular ou para o controle articular. O agonista, segundo o Collins English Dictionary, é definido como “um músculo contraindo cuja ação é oposta por outro músculo”. Isto descreve todos os músculos o tempo todo. Esta palavra foi originada do grego agon, ou competidor. No aprendizado motor e em outros campos de estudo relacionados a ele, agonista refere-se à “fonte ou causa do movimento”, então, durante uma flexão de cotovelo (rosca concêntrica com haltere), os agonistas são os flexores do cotovelo, porém no retorno o agonista é a gravidade. O antagonista é um músculo cuja contração concêntrica tende a produzir uma ação articular exatamente oposta à do agonista. Antagonistas são sempre os desaceleradores. Se seguirmos este pensamento, os antagonistas funcionam sempre excentricamente. d o e x e r c í c i o Entretanto, se utilizarmos essa mesma definição, quando flexionamos o cotovelo durante uma rosca com halteres, o antagonista é o tríceps, e quando estendemos o cotovelo o antagonista é o bíceps. Devido a isto, consideraremos o agonista aquele músculo lutando contra (em oposição) a resistência independentemente da direção do movimento articular. Porém, precisamos entender os dois contextos e sermos capazes de distinguir ambos, além de estarmos prontos para dizer qual classificação estamos usando para evitar confusões. O sinergista pode ter uma das duas definições: • Sinergia assistente acontece durante a ação de dois músculos que têm ações articulares comuns e cada um tem uma segunda ação muscular que é antagonista ou se opõe ao outro músculo; • Sinergia verdadeira é simplesmente a estabilização; um músculo contrai isometricamente para prevenir qualquer ação em uma das articulações que um músculo multiarticular atravessa. O estabilizador é normalmente definido como um músculo que sustenta ou apoia uma articulação para que outro músculo ativo tenha uma base firme sobre a qual puxar. Porém o estabilizador pode ter muitas funções. Um músculo que pode mover uma articulação pode também estabilizar a mesma. Isso é uma questão da organização da tensão relativa necessária. A classificação planar é baseada nos planos cardinais, mas os músculos não sabem disso. Repensando as palavras As palavras abaixo estão relacionadas à cinesiologia para indicar a ação e função de um músculo. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 113 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli Ação – o mecanismo pelo qual algo é operado; fisiologia, uma mudança em órgãos, tecidos ou células, como em uma contração muscular. Função – capacidade, posição, responsabilidade, dever. Nenhuma das duas palavras acima reflete com clareza a “função” de usarmos o músculo. As palavras ação muscular são mais eficazes quando estamos falando da fisiologia interna do trabalho muscular relativo à geração de tensão e não tanto quando estamos falando do resultado na articulação (movimento). A função de um músculo é normalmente descrita por uma ação articular, por exemplo, flexor. O problema é que um músculo acaba se tornando sinônimo de uma de suas funções que acontece somente dentro de um cenário específico como se fosse sua única função independente das circunstâncias. E esta função muitas vezes estará errada. Então estas palavras parecem ser mais precisas: Participação – o ato ou efeito de participar, de fazer parte, como em uma ação ou tentativa de ação. Influência – poder ou ação, capacidade que alguém ou alguma coisa exerce sobre outra ou sobre certos fatos. Força transformadora ou produtora de efeitos nas ações ou comportamento de outros. Participação muscular é o termo que podemos usar quando nos referimos ao músculo que está gerando tensão em resposta a uma demanda específica dentro de um cenário específico e sem descrevê-lo com um nome que não representaria bem outro cenário que o músculo poderá estar envolvido. Influência muscular é o termo que podemos usar quando nos referimos ao efeito mecânico em potencial que um músculo tem em uma articulação, o resultado articular. Isso deve representar o grau que um músculo oferece de força rotatória ou translatória em um segmento e seus efeitos na articulação que podem ser o movimento ou a integridade interarticular. Os princípios mecânicos da participação e influência muscular É necessário que o profissional entenda a função isolada de um músculo para que seja possível entender seus efeitos em uma articulação. Na verdade, é necessário entender o que cada feixe de fibra está fazendo em diferentes direções dentro de um músculo, porque esta é a direção da força que este feixe aplicará na articulação. Esta é a contribuição que ele trará para o controle articular em vários cenários mecânicos. Isso não quer dizer que este músculo vai trabalhar isolado em alguma situação, porém não temos como saber o que ele tentará oferecer quando estiver integrado até que saibamos suas capacidades individuais. Além disso, a aplicação de sua tensão individual representa a disfunção que acontecerá caso ele esteja faltando. O músculo individual, sua habilidade mecânica, não será diferente quando estiver trabalhando integrado. Não tem como isso acontecer! Entretanto, o resultado em uma articulação será determinado pelas seguintes informações: “com quem este músculo está trabalhando e quanta tensão cada um é requisitado a oferecer em cada ponto da amplitude”. Vamos explorar! Isolamento Articular versus muscular • O isolamento muscular é praticamente impossível, independentemente da atividade ou objetivo. Então, a não ser que você esteja testando o músculo com testes manuais (e mesmo neste cenário isolar um músculo é muito difícil), o isolamento muscular não acontece. • Movimento articular isolado nunca é isolamento da ação muscular. 114 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a ȖȖ Considere que inúmeros músculos são necessários para mover e controlar uma única articulação. ȖȖ Considere o fato de que músculos biarticulares afetam diretamente as articulações adjacentes. ȖȖ Considere que é a participação muscular ativa em inúmeras articulações que permite um movimento articular isolado em uma articulação. ȖȖ Não existe evidência de que o movimento articular isolado prejudica a integração futura em atividades multiarticulares. • “Função muscular isolada” é normalmente associada erroneamente somente a sua ação concêntrica. ȖȖ Considere o fato de que a única diferença na articulação entre ação muscular isométrica, concêntrica e excêntrica é a tensão gerada relativa à resistência. Então, não existe razão para evitar, ter medo, condenar ou culpar o “isolamento”. Mas a primeira coisa a ser feita quando alguém quer discutir o assunto é ter certeza de que estão falando da mesma coisa. Parece que muitas pessoas que condenam o isolamento estão fazendo-o em termos gerais e não parecem distinguir entre isolamento muscular e isolamento articular. Integração Articulação versus músculo. Considere cada linha de força fornecida por cada divisão de cada músculo que é chamado à ação. Como citado anteriormente, o resultado em uma articulação será determinado por: “com quem este músculo está trabalhando e quanta tensão cada um é requisitado a oferecer em cada momento”. Então, torna-se impossível listar os movimentos integrados porque o número de combinações é limitado somente d o e x e r c í c i o pela estrutura e função articular, pela linha da força oferecida pelo músculo e, em seguida, por quem é chamado para participar e quanta tensão é necessária. Estas variáveis resultam em um número infinito de combinações baseado na alteração da quantidade de tensão individual relativa à resistência. Princípios mecânicos da influência muscular e o resultado articular Contextos: Vamos explorar este assunto como se fôssemos os músculos, da perspectiva do músculo, “a visão” do músculo (corpo) e depois vamos explorar de uma perspectiva planar (feita pelo homem). Pelos olhos dos músculos/corpo 1. Linhas da força, não planos! Os músculos geram tensão. Tensão é força. Músculo somente gera tensão e aproxima seus pontos de inserção. A força é uma linha que representa um vetor. Um músculo é “responsável por” ou “ciente de” somente duas coisas: seu comprimento e sua quantidade de tensão. Seu comprimento é simplesmente a distância entre as duas inserções, sem se importar em qual plano a articulação se move. O músculo jamais teria como saber sobre planos. Nós os criamos para descrever algo tridimensional no espaço. O músculo pode somente perceber ou estar envolvido em uma mudança linear da distância entre seus dois pontos de inserção e isso pode ocorrer em um número infinito de planos. Explore ser um adutor do quadril: O objetivo: controlar a distância (excentricamente, concentricamente ou isometricamente) entre um ponto na pelve e um ponto no fêmur. Se o objetivo for uma posição estática, não faz diferença A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 115 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli em qual plano você tenta se mover. Se o resultado é uma tentativa de afastar os pontos de inserção, este músculo precisa responder ao que está reconhecendo por meio de uma alteração em distância/em seu comprimento. Quando a abdução do quadril acontece o adutor magno continua tentando aproximar seus pontos de inserção, porém está perdendo o cabo de guerra [Fig. 79 e Fig. 80]. Fig. 79. Exercício de adução resistida. A direção da resistência está causando uma abdução no quadril. A musculatura adutora, mesmo durante a abdução, está puxando ambas as inserções tentando aproximá-las, mesmo quando estão se afastando. Fig. 80. A mesma situação acontece em todos os exercícios. Neste exemplo da flexão do cotovelo, quando o cotovelo está estendendo, os flexores do cotovelo estão contraindo, isto é, aproximando seus pontos de inserção, mesmo quando estão perdendo o cabo de guerra e afastando suas inserções. 116 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a mantenha esta perspectiva em mente quando estivermos explorando com a visão planar (feita pelo homem). d o e x e r c í c i o nomenclatura que chamamos de extensão com rotação externa. Um músculo não consegue escolher realizar um movimento ou outro. Pelos olhos do homem/sistema planar: 1. Movimentos “primários” versus movimentos “secundários” de um músculo. Não existe movimento ou ação primária e secundária de um músculo. Movimentos são nomeados através dos planos anatômicos e é em torno destes planos que estamos tendo a pretensão de achar que um músculo prefere um ao outro. • O músculo não tem como preferir um ou outro plano para trabalhar. • Não pode escolher trabalhar somente em um dos seus movimentos planares. • Na realidade, um músculo não pode ter mais do que um movimento, a não ser através do nosso sistema de identificação de planos. O único propósito e a única habilidade de um músculo é a de aproximar os dois pontos de inserção (sem se preocupar com o plano anatômico). • Os movimentos planares são analisados pelo sistema planar; já o sistema muscular é dependente da linha da força. • Quanto mais “planar” for o movimento, maior a necessidade de integração para criá-lo. • O glúteo máximo puxa em uma linha reta da origem à inserção. Ele executa o que podemos chamar de glutation [Fig. 81]. • É somente por causa do nosso sistema de Fig. 81. O posicionamento das fibras em forma de leque do músculo glúteo máximo quando contraem e aproximam os pontos de inserção puxam-no em uma direção diagonal. O movimento final na articulação de extensão do quadril só acontece porque outras musculaturas estão também contraindo e impedindo a rotação externa e abdução que as fibras do glúteo sozinhas teriam causado. • A direção das fibras em alguns músculos não é congruente com a direção da inserção. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 117 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli • Seja capaz de pensar e comunicar em ambos os contextos dos planos cardinais e da visão do músculo. 2. Ação multiplanar. Sendo assim, é dentro do nosso sistema de orientação planar que existe o potencial para ação “multiplanar” para quase todos os músculos que atravessam uma articulação com múltiplos graus de liberdade. a. Devido ao fato de que as inserções musculares e as resultantes da direção das fibras raramente coincidem com nossa descrição planar, a maioria dos músculos passa por múltiplos eixos (adote uma habilidade analítica 3D). b. Então, praticamente todos os músculos possuem um componente de rotação longitudinal se a articulação o tiver também, dependendo da posição articular em todos os eixos disponíveis. Examine o reto abdominal, a cabeça longa do tríceps e vários adutores e rotadores do quadril. c. Entretanto, o que um músculo pode fazer não é indicação do que deve ou vai acontecer, devido às possibilidades a seguir. 3. O resultado final da ação de um músculo na articulação será baseado: a. Na relação das fibras com o eixo. ȖȖ A posição inicial, final e todo ponto entre elas são a chave para a determinação da participação muscular porque elas mudam a relação entre o músculo e o eixo. Estas posições são determinadas pela atividade e não pela posição anatômica. Examine os romboides quando a escápula está elevada ou o peitoral quando o úmero está no plano transverso. a) b) Fig. 82. a) Os adutores, quando a articulação realiza uma flexão a partir de uma posição de extensão, participam como flexores do quadril. b) Durante um movimento de extensão do quadril, partindo de uma posição de flexão, os adutores participam como extensores do quadril. 118 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a ȖȖ “Inversão da ação muscular” acontece quando a função ou a participação de um músculo é modificada pela variação da posição articular, alterando assim a relação de um músculo com o eixo de movimento e com a resistência. Isso acontece mais na musculatura do quadril, do ombro e do tronco, mas pode ser encontrada em qualquer articulação dependendo da relação entre as inserções musculares e o eixo. Examine o deltoide posterior em abdução e adução; adutores em flexão e extensão [Fig. 82]; braquioradial em supinação e pronação; piriforme em rotação interna e externa; reto abdominal em rotação para a direita e esquerda. b. Múltiplas ações. Novamente, o resultado final na articulação será baseado também na ação de outros músculos, que podem vir a funcionar para eliminar ou alterar uma ou mais ações planares do músculo em questão. ȖȖ Esta é a verdadeira integração intermuscular. ȖȖ Estes “outros músculos” podem agir como antagonistas em um ou mais dos movimentos planares associados com este músculo (examine o glúteo máximo em extensão de quadril sem a rotação externa do quadril). ȖȖ Ou podem ser um antagonista em torno de um eixo e um sinergista em torno de outro eixo. ȖȖ Ou, ainda, podem não ser antagonistas, mas podem simplesmente oferecer direção de força um pouco diferente gerando uma ação resultante, por exemplo, a integração dos vários músculos da escápula. c. Ação reversa (articular). Qual extremidade irá se mover não é uma escolha neurológica, mas uma questão de ancoragem (suporte). Então, escolha a d o e x e r c í c i o extremidade que você vai ancorar e a extremidade que vai se mover é a mais leve. Qual extremidade é mais pesada, você ou a que você está tentando mover? [Fig. 83] 4. Motores primários e assistentes do movimento versus músculos importantes e músculos não importantes. Normalmente, vemos valor no que dois fatores têm em comum e dificilmente vemos valor nas diferenças. Sob o contexto do movimento existem alguns músculos que são mais capazes do que outros para produzir um movimento específico em uma articulação, devido ao torque. Isso não significa que o músculo com menor capacidade de gerar movimento é menos importante. Geralmente, os músculos que possuem menor capacidade de gerar movimento são excelentes para estabilizar a articulação, os chamamos de gerentes articulares. Ironicamente, a perda de um gerente articular pode prejudicar o movimento articular ao ponto de ser debilitante. Assim sendo, todos os músculos que participam de alguma maneira têm um papel vital na função articular adequada. 5. Não existe isolamento muscular absoluto. As relações musculares são criadas como parcerias para manutenção da integridade articular. Esta sinergia é a chave para a manutenção da relação das superfícies de contato para o movimento apropriado e correta distribuição das forças. Também existem numerosas divisões neurológicas de muitos músculos que fornecem as mudanças na distribuição da tensão necessária para influenciar apropriadamente o controle articular/integridade. • Um movimento articular pode ser isolado, sendo assim um grupo muscular enfatizado, porém um músculo jamais pode ser isolado. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 119 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli a) b) Fig. 83. Qual extremidade irá se mover é uma questão mecânica e não neurológica. a) Neste exemplo da contração do quadríceps, ele gera tensão em ambas as inserções, e se a tíbia é a que se move é porque era a extremidade mais leve ou porque não estava ancorada. b) Neste exemplo, como a extremidade distal da tíbia está ancorada, quando a tensão é gerada no quadríceps e aplicada em ambas as inserções, é a pelve que se move, podendo ou não causar a extensão do joelho e/ou quadril. 120 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a Perspectiva: redundância versus necessidade O fato de que uma articulação possui muitos músculos capazes de realizar o mesmo movimento leva muitos experts a dizerem que fomos construídos com certa redundância. Redundância, no dicionário, significa “ausência de necessidade”. Faz mais sentido assumir que as diferenças, assim como as similaridades, de dois músculos são chaves para suas relações em torno de uma articulação. Cada diferença ou similaridade é essencial para a manutenção da integridade articular, e se isso não fosse verdade certamente este músculo atrofiaria até desaparecer. Lembre-se: ser capaz de identificar cada eixo do movimento será vital para determinar a influência muscular e os resultados articulares. Repensando a Função Muscular Praticamente “todos” os músculos em torno de uma articulação estão envolvidos de alguma maneira, e normalmente possuem um papel vital, porém nem sempre um papel tão apreciado dentro da atividade. Os músculos primariamente desafiados são aqueles que se opõem diretamente à sobrecarga. Porém, outros músculos em torno da articulação serão necessários em outras ações também vitais. Os três fatores mecânicos fundamentais que determinam a participação muscular: d o e x e r c í c i o 1. Direção da resistência (a resistência gera a necessidade de contrair). 2. O eixo (e plano) criado pela resistência (é a oposição dos torques em torno de um eixo que gera a resistência). O momento da resistência comparado à capacidade estrutural da articulação (graus de liberdade). Quando a articulação não possui certa liberdade articular, ela não deve ter um torque aplicado naquela direção. Por exemplo, o joelho não possui capacidade para se mover no plano frontal, porém muitos profissionais colocam uma caneleira na tíbia e colocam o quadril do paciente em rotação externa e pedem para o paciente executar uma extensão de joelho, por mais que o movimento seja no plano sagital a resistência está gerando um torque no plano frontal. 3. As várias relações dos músculos com o eixo da força. É necessário identificar as inserções dos músculos que cruzam a articulação em questão (influenciado pela posição articular). Lembrando que os músculos puxam de ambos os lados na tentativa de aproximar suas inserções. Depois identificar a relação com o plano da resistência. E, por último, identificar o movimento e comparar com a resistência, porque os músculos necessários para mover e os músculos necessários para se oporem à resistência podem ou não serem os mesmos (isso depende de como o profissional construiu o exercício). Vamos analisar a participação muscular durante um exercício de adução horizontal, em que em um exemplo o plano da resistência é consistente com o plano do movimento e em outros dois exemplos eles não são [Fig. 84]. Analise a relação da musculatura com o eixo e analise a diferença entre o eixo da resistência e o eixo do movimento. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 121 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli a) b) c) 122 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia Fig. 84. Movimento articular: adução horizontal. a) Direção da resistência: para trás, na direção da puxada do cabo. • Eixo do movimento e da resistência: longitudinal (horizontal) do ombro. • Relação dos músculos em relação ao eixo e à direção da resistência: musculatura anterior ao eixo se opõe diretamente à resistência e também é a movedora do membro devido à consistência de ambos os eixos. b) Direção da resistência: para baixo, na direção da força da gravidade. • Eixo do movimento: longitudinal (horizontal) para a adução horizontal do ombro. • Eixo da resistência: frontal. Eixo da resistência e eixo do movimento são inconsistentes. • Relação dos músculos com o eixo da resistência (frontal): musculatura superior ao eixo frontal se opõe diretamente à resistência e é mais desafiada. • Eixo do movimento (horizontal): musculatura anterior ao eixo horizontal é responsável por mover o braço. c) Direção da resistência: para cima, na direção do cabo. • Eixo do movimento: longitudinal (horizontal) para a adução horizontal do ombro. • Eixo da resistência: frontal. Eixo da resistência e eixo do movimento são inconsistentes. • Relação dos músculos com o eixo da resistência (frontal): musculatura inferior ao eixo frontal se opõe diretamente à resistência e é mais desafiada. • Eixo do movimento (horizontal): musculatura anterior ao eixo horizontal é responsável por mover o braço. m e c â n i c a Concluindo, a participação muscular é dependente da relação entre o músculo, a resistência e o eixo (quer exista movimento ou não). De um ponto de vista mecânico da relação axial, podemos organizar a participação muscular em três categorias distintas. Os opositores da resistência, os gerentes articulares e os mantedores do plano. Os termos acima parecem ser simples e não científicos, porém não estão sendo apresentados como uma tentativa de fornecer um novo sistema de nomenclatura, mas de fornecer termos descritivos que representem d o e x e r c í c i o os verdadeiros papéis que os músculos têm, com a intenção de facilitar o processo de aprendizagem e da aplicação destes fatores mecânicos na prática. Os “opositores” da resistência (agonista) • São os músculos que estão se opondo diretamente à necessidade ou resistência externa dentro do cabo de guerra [Fig. 85]. • Inclui todos os músculos posicionados do lado do eixo em questão. Fig. 85. Opositores da resistência. Neste exemplo, o eixo do movimento e o eixo da resistência são consistentes e a musculatura anterior do ombro está se opondo diretamente à resistência e também é a responsável pelo movimento. Fig. 86. Gerentes articulares. Neste exemplo, a musculatura anterior do ombro está se opondo diretamente à resistência e, quando gera tensão em ambas as inserções, o resultado é o deslocamento anterior da escápula e úmero, que é impedido pela força interna gerada pelos gerentes articulares que se opõe à força gerada pelos opositores da resistência. Neste exemplo, os gerentes articulares são todos os músculos posicionados posteriormente ao eixo longitudinal da articulação do ombro. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 123 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli Os “gerentes articulares” (antagonista) • Estes são indiretamente afetados pela resistência. Isso quer dizer que eles se opõem aos componentes da força gerados pelos “opositores da resistência” que estão tentando desequilibrar a articulação. Podemos dizer que este papel é determinado pela necessidade interna mais do que a necessidade externa. Esses serão antagonistas (de alguma maneira) aos mencionados anteriormente [Fig. 86]. Os “mantedores do plano” • Eles existem somente em cenários em que a resistência não é consistente com o plano de movimento [Fig. 87]. • Reconhecemos estes somente para distinguir o músculo que está, na verdade, se opondo (lutando contra) à resistência daqueles que estão oferecendo movimento sem resistência (esta é outra tentativa de ajudá-lo a diferenciar força e movimento). Perspectivas sobre o gerenciamento articular: centrificação e estabilização dinâmica Quando a manutenção do eixo de uma articulação durante o movimento é realizada através do controle ativo, ela é chamada de centrificação. A centrificação é a capacidade dos músculos de guiar as superfícies de contato enquanto se movem. A centrificação é criada por meio da orquestração de praticamente todos os músculos em torno de uma articulação, cada um deles com diferentes níveis de participação durante a amplitude. As contrações excêntricas e concêntricas exigidas dos músculos nos dois lados do eixo, atuando como uma “dupla de força” ou “força conjugada”, produzirão movimento enquanto mantêm o eixo da rotação relativamente fixo. Em essência, o movimento axial é encorajado enquanto o movimento translatório não apropriado é evitado. Examine o manguito rotador controlando a articulação do ombro durante a abdução. Fig. 87. Mantedores do plano. • Direção da resistência: para baixo, na direção da força da gravidade. • Eixo do movimento: longitudinal (horizontal) para a adução horizontal do ombro. • Eixo da resistência: eixo frontal. • Eixo da resistência e eixo do movimento são inconsistentes. • Relação dos músculos com o eixo da resistência (frontal): musculatura superior ao eixo frontal do ombro é a opositora da resistência. • Eixo do movimento (horizontal): musculatura anterior ao eixo horizontal é responsável por manter o plano do movimento. 124 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a Quando o agonista e o antagonista se contraem simultaneamente, nós chamamos de co-contração. A cocontração dos músculos em torno de uma articulação ajuda a fornecer estabilidade para a articulação e representa uma forma de sinergia. Eles estão mantendo a articulação íntegra (unindo as superfícies de contato) e garantindo um movimento normal (que a concavidade e convexidade requerem), enquanto os agonistas ou grande movedores estão tentado afastar as superfícies de contato (repense sobre inibição recíproca). Lembre-se que a co-contração de maneira alguma insinua que os músculos estão agindo igualmente na geração do torque, pois, se isso acontecesse, não resultaria em d o e x e r c í c i o movimento articular. Um grupo muscular pode estar gerando somente a tensão suficiente concentricamente enquanto o outro pode estar gerando somente a tensão suficiente para agir excentricamente. Um ganhando o cabo de guerra e outro perdendo. Exemplos: 1. Bíceps excêntrico, quando o braço estende durante um chest press (exercício de empurrar) no cross over (cabos) devido à direção da resistência relativa ao cotovelo [Fig. 88]. 2. Bíceps na cabeça do úmero agindo como o manguito rotador em alguns pontos da abdução [Fig. 89]. Fig. 88. Neste exemplo de uma adução horizontal do ombro utilizando o cabo como resistência, a contração do bíceps agindo na articulação do ombro está estabilizando a articulação e na articulação do cotovelo é responsável através de uma contração excêntrica, pela extensão do cotovelo. Fig. 89. Neste exemplo, durante o movimento de abdução do ombro, o bíceps atua como manguito rotador guiando as superfícies de contato e fazendo parte da centrificação. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 125 Mecânica Muscular: Habilidade Muscular m e c â n i c a U ma vez que um músculo é requisitado a participar em um papel específico, sua habilidade varia. A quantidade de força/torque que um músculo pode oferecer para o controle articular é resultado de sua(s): 1. Estrutura; 2. Habilidade Contrátil; 3. Características Mecânicas. 1. Estrutura Muscular Arranjo das fibras Músculos Penados possuem o arranjo de suas fibras obliquamente ao longo do eixo do músculo. Penado é derivado da palavra pena. As fibras que constituem o fascículo de um músculo penado são normalmente mais curtas e mais numerosas do que na maioria dos músculos fusiformes. Músculos Unipenados possuem suas fibras somente em um lado do tendão. Músculos Bipenados, como o reto femoral, possuem suas fibras nos dois lados de um tendão central. Nos Músculos Multipenados ou em forma de leque, como o deltoide, as fibras oblíquas convergem em vários tendões. A série de fibras oblíquas nos músculos penados interfere na relação direta entre o comprimento da fibra muscular e a distância que o músculo pode mover um segmento ósseo. Somente uma parte da força é direcionada a produzir movimento no segmento ósseo, entretanto, porque os músculos penados possuem um grande número de fibras musculares, eles são capazes de transmitir uma grande quantidade de força para os tendões. Fáscia Este tecido conjuntivo fibroso serve de cobertura para todos os músculos e órgãos. É normalmente descrito como uma capa contínua que envolve todos os músculos e suas divisões, individualmente e coletivamente. A fáscia também pode atuar como uma grande área para inserções musculares (ex.: grande dorsal, glúteo máximo, d o e x e r c í c i o tensor da fáscia lata). A fáscia afeta a integridade dos músculos individuais e da estabilização dos sistemas/cadeias. Uma perfuração minúscula na fáscia de um músculo reduzirá dramaticamente sua capacidade de gerar força. 2. Habilidade contrátil: desenvolvimento de tensão Como os músculos desenvolvem tensão? Um dos maiores propósitos deste capítulo é o estudo dos processos mecânicos e implicações mecânicas pelas quais músculos geram tensão. Desenvolver uma perspectiva da mecânica sobre estes princípios básicos não é apenas de muita ajuda para entender suas funções, papéis e relações entre tecidos, mas também para a tomada de decisões durante os exercícios. A Teoria dos Filamentos Deslizantes [Fig. 90] é o modelo atualmente aceito para o desenvolvimento de tensão muscular (contração). As microscópicas unidades contráteis são chamadas de miofilamentos. Existem dois tipos de miofilamentos: grossos e finos. Os filamentos grossos são compostos de uma proteína chamada miosina e os filamentos finos são compostos de uma proteína chamada actina. A interação entre esses dois miofilamentos poderiam ser imaginados como um velcro móvel. Actina Miosina Discos Z Sarcômero Fig. 90. Teoria dos filamentos deslizantes. Unidade geradora de tensão ativa. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 127 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli A actina se sobrepõe no final da miosina. A miosina se anexa temporariamente à actina via “pontes cruzadas” que se movem similarmente a remos de um barco a remo. A ponte cruzada puxa a actina ao final de cada miosina, e esta desliza em direção ao centro. Inúmeras pontes cruzadas se ligam, se puxam, se liberam e se anexam novamente. Ao contrário da ação de uma equipe de remo, em que todos os remos estão dentro ou fora da água ao mesmo tempo, algumas pontes cruzadas estão se anexando e puxando, enquanto outras estão destacadas ou se reanexando. Esse arranjo impede que a actina deslize de volta. Já que a actina desliza por toda a miosina, a quantidade de sobreposições causa uma mudança no tamanho total do sarcômero. Cada sarcômero é anexado ao próximo através dos discos Z ao final de cada actina. Esta série de sarcômeros cria uma miofibrila. Inúmeras miofibrilas são “envelopadas” pelo tecido conjuntivo, chamado sarcolema, para formar uma única fibra muscular. O sarcolema é envolvido por um tecido conjuntivo chamado endomísio. Inúmeras fibras musculares são “envelopadas” juntas por um tecido conjuntivo chamado perimísio, para formar fascículos. Os fascículos são “envelopados” para formar um músculo esquelético. O endomísio e perimísio são contínuos com o revestimento do tecido conjuntivo chamado de epimísio, que envolve o músculo inteiro. Os tecidos conjuntivos envolventes formam o componente elástico paralelo. O tendão trabalha em série com os componentes contráteis. O papel do tendão é de transmitir precisamente a força/tensão gerada pelo músculo para os ossos que estão conectados. Essa conexão é na verdade descrita como sendo contínua com o periósteo ou com a camada externa do osso. A fim de que a força do músculo seja precisamente transmitida para o osso, a tensão deve primeiro ser suficiente para “compensar a folga” no tendão. A complacência do tendão ou “alongamento” é relativamente pequena (aproximadamente 3% a 10%), assim o músculo não tem que ir muito longe antes da sua força poder ser usada no osso (NORKIN; LEVANGIE, 2005). Fig. 91. Em torno do tecido contrátil, gerador de tensão, existe o tecido não contrátil que gera tensão passiva. A tensão desenvolvida dentro dos elementos contráteis de um músculo é considerada tensão ativa. Esta tensão ativa cria a tensão passiva nos componentes do tecido conjuntivo do músculo [Fig. 91]. 128 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a a) b) d o e x e r c í c i o c) Fig. 92. a) Contração do tecido contrátil só puxa. b) Durante a contração concêntrica, o tecido tenta aproximar os dois pontos de inserção e está ganhando o cabo de guerra. c) Durante a contração excêntrica, o tecido tenta aproximar os dois pontos de inserção e está perdendo o cabo de guerra. Assim como milhões de pontes cruzadas são formadas, a tensão é desenvolvida ao longo de um comprimento muscular, gerando o que é chamado de contração. Perspectivas sobre a contração muscular 1. Tipos de contrações: Por tradição, se a geração de tensão leva ao encurtamento do músculo, então é chamada de uma contração concêntrica. Se o músculo se alonga, isso se chama de uma contração excêntrica. E se o músculo não aparenta ter mudança de comprimento, é chamado de contração isométrica. 2. Porque a contração significa aproximar, a ideia de uma contração em alongamento é considerada paradoxal por alguns (NORKIN; LEVANGIE, 2005). Mas perceba que não existe nada paradoxal na ideia de uma contração que está se alongando. Pense que o músculo está contraindo, porém está perdendo o cabo de guerra. [Fig. 92] 3. Devido ao tipo de contração ser na verdade uma tensão relativa, deve-se notar que a alteração no comprimento do músculo não é devido à escolha de alguém quanto ao tipo de contração realizar. Isso ocorre devido à escolha (ou limitação) da quantidade de torque que é gerado através da geração de tensão devida para comparar com o torque da resistência que está em oposição. 4. Porque toda contração muscular é tensão, quer dizer uma tentativa de encurtar, e o resultado é determinado pelo que está relativamente acontecendo no cabo de guerra, estas não são realmente tipos diferentes de contração muscular. Elas são simplesmente uma variação de tensão relativa como resultado do torque líquido em uma direção ou outra. Essa realidade representa a razão pela qual o processo que um produz encurtamento e outro controla o alongamento das fibras é diferente. Porém, o entendimento da A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 129 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli relação mecânica é vital antes de explorar os processos fisiológicos. Esta realidade dá contexto para os processos fisiológicos e nos ajuda a enxergar por que eles não podem ser diretamente comparados. Levantar 25 kg e abaixar 25 kg não tem a mesma exigência mecânica. 5. Isotônica refere-se a uma tensão constante, o que é uma impossibilidade durante as mudanças de comprimento. A diferença dos comprimentos dos braços do momento durante a amplitude de movimento prova que existe mudança no torque tanto da resistência quanto no torque da potência, o que prova que a tensão não permanece igual durante a amplitude. Fatores Neurais O sarcômero é a unidade básica de desenvolvimento de tensão dentro de um músculo, mas é parte de um complexo maior chamado de unidade motora. A unidade motora consiste no neurônio motor e todas as fibras musculares que ele conecta. A contração do músculo inteiro é o resultado de muitas unidades motoras ativadas repetidamente e de forma assíncrona. A magnitude da contração do músculo inteiro pode ser alterada conforme o número de unidades motoras que são ativadas ou pela frequência com que estas são ativadas. O número de unidades motoras de um músculo varia de músculo para músculo. Unidades motoras variam conforme o tamanho do corpo da célula neural, diâmetro do axônio, número de fibras musculares e o tipo de fibras musculares. Cada uma dessas variações numa estrutura afeta a função da unidade motora (NORKIN; LEVANGIE, 2005). Revisão sobre a Geração de Tensão Muscular 1. Tensão é gerada quando pontes cruzadas são formadas; 2. Nenhuma ponte cruzada pode ser formada e nenhuma tensão ativa pode ser gerada a não ser que haja uma sobreposição de actina e miosina; 3. Quanto maior for o número de pontes cruzadas formadas, maior será a tensão; 4. O número máximo de pontes cruzadas será formado quando existe o número máximo de sobreposições; 5. Durante a ação de encurtamento, as pontes cruzadas são formadas, quebradas e reformadas e as actinas são puxadas em direção ao centro da miosina; 6. Durante a ação de alongamento, as pontes cruzadas são formadas, rompidas e reformadas e as actinas são puxadas para longe do centro da miosina; 7. A relação entre a tensão muscular e a resistência determina se ocorrerá encurtamento ou alongamento. Quem está ganhando ou perdendo o cabo de guerra; 8. A tensão pode ser aumentada pelo aumento da frequência do disparo de uma unidade motora ou pelo aumento de unidades motoras que são disparadas; 9. A tensão pode ser aumentada pelo recrutamento de unidades motoras com um número maior de fibras; 10. Músculos que tenham grandes secções transversais fisiológicas são capazes de produzir mais tensão do que os músculos que têm pequenas secções transversais. Fatores que Afetam o Desenvolvimento de Tensão A quantidade de tensão ativa que um músculo pode gerar depende tanto de fatores neurais quanto de propriedades mecânicas do músculo. Propriedades Mecânicas A Relação Comprimento-Tensão Isométrica: Um Espectro de Tensão Parece existir uma relação direta entre o desenvolvimento de tensão em um músculo e seu comprimento 130 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a [Fig. 93]. O comprimento de um músculo é diretamente relacionado com a quantidade de sobreposições em um miofilamento. A quantidade de sobreposições determina a área disponível para formar o cruzamento das pontes cruzadas. Quanto maior for o número de pontes cruzadas formadas, maior será a tensão [Fig. 94]. d o e x e r c í c i o a) força ATIVA TENSÃO total TENSÃO b) passiva TENSÃO c) ACTINA comprimento do sarcômero Fig. 93. Parece haver uma relação direta entre o desenvolvimento de tensão ativa em um músculo e seu comprimento, que é a relação comprimento-tensão do sarcômero da musculatura esquelética. A curva ativa, passiva e a curva total estão demonstradas. O platô da curva ativa demonstra o comprimento ótimo do sarcômero, em que a máxima tensão ativa é produzida. A tensão isométrica diminui quando o músculo é alongado devido a menor quantidade de formação de pontes cruzadas. A tensão diminui quando o músculo é encurtado devido à inabilidade de gerar mais sobreposição e os filamentos actina e a miosina. O aumento de tensão passiva durante o alongamento do músculo está demonstrado pela linha pontilhada. A soma da tensão passiva e ativa resulta na tensão total desenvolvida pela fibra muscular. MIOSINA Fig. 94. a) Deslizamento dos filamentos em posição mais alongada e com menor possibilidade de gerar tensão. b) Deslizamento dos filamentos. Quantidade de sobreposição dos filamentos com possibilidade de geração se tensão ótima. c) Deslizamento dos filamentos em posição mais encurtada e com menor possibilidade de gerar tensão. Foi chamado de “comprimento ideal do sarcômero” aquele no qual o músculo é capaz de desenvolver máxima tensão. Se o músculo é alongado ou encurtado além do comprimento ideal, a quantidade de tensão ativa que ele pode gerar quando estimulado diminui. Durante o alongamento, a tensão passiva aumenta no componente paralelo e essa tensão passiva será adicionada à tensão ativa, afetando a tensão total. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 131 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli Perspectivas 1. A relação comprimento-tensão não deve ser definida por um comprimento ideal e tensão máxima. Deve ser analisada como o espectro (a amplitude, o intervalo ou o trecho) de comprimentos disponíveis e o potencial associado às alterações na tensão; 2. Isto não leva em consideração os efeitos de outros tecidos que determinarão o torque máximo em uma articulação específica, incluindo a fadiga e o braço do momento do(s) músculo(s); 3. Esse fato em nada se relaciona, automaticamente, com uma posição ou amplitude de treinamento ideal, embora deva influenciar nas considerações e decisões quanto ao perfil da resistência; 4. Para a aplicação deste conceito, é impossível detectarmos qual é a amplitude ótima de trabalho de um dado músculo, porque não está relacionado com a “amplitude média” de uma articulação. A maior oportunidade de aplicação do conceito sobre a relação comprimento-tensão está no entendimento sobre o que está acontecendo no extremo das amplitudes, assim como sobre as “oportunidades” de “variação estratégica” para o posicionamento das articulações secundárias das musculaturas biarticulares e seus efeitos na amplitude contrátil. Dificuldades em Aplicar este Conceito Aplicar este conceito a um músculo inteiro ou a sistemas musculares é difícil, porque o tamanho dos sarcômeros não são os mesmos ao longo do músculo, e muito menos entre músculos adjacentes (NORKIN; LEVANGIE, 2005). Além disso, esse conceito foi apenas determinado para contrações isométricas. Mesmo assim, o tamanho do sarcômero obviamente muda durante ações excêntricas e concêntricas e isso alterará o desenvolvimento de tensão. O valor desta informação para a prescrição de exercício está em conhecer os dois extremos em que a perda relativa de tensão ativa está presente e não tanto em saber onde a tensão máxima é desenvolvida. “Insuficiência Ativa”: Os Extremos DA CURVA COMPRIMENTO-TENSÃO Insuficiência ativa, como descrita no livro Joint Structure and Function (NORKIN; LEVANGIE, 2005), é a habilidade diminuída de um músculo de produzir ou manter a tensão ativa devido à alteração na relação comprimento-tensão. “Ao nível do sarcômero, este estado pode ocorrer quando um músculo é alongado a um ponto em que não há sobreposição entre os miofilamentos ou quando o músculo está excessivamente encurtado e não é mais capaz de deslizar.” (NORKIN; LEVANGIE, 2005) Em muitos casos, os músculos estão dispostos em torno de uma articulação de modo que o músculo não possa ser nem excessivamente alongado nem excessivamente encurtado, em relação ao seu comprimento de repouso. Este arranjo é mais efetivo para os músculos que cruzam apenas uma articulação (uniarticulares). “Músculos que cruzam mais de uma articulação (biarticulares) podem chegar ao alongamento ou encurtamento máximo antes de alcançarem a máxima ADM (amplitude de movimento) em todas as articulações que cruzam.” (NORKIN; LEVANGIE, 1983). Portanto, durante o encurtamento ativo, “um músculo biarticular se tornará ativamente insuficiente em um ponto anterior ao final da amplitude de uma articulação, quando a ADM máxima acontece simultaneamente em todas as articulações. Insuficiência ativa pode ocorrer em músculos uniarticulares, mas tal ocorrência não é tão comum.” (NORKIN; LEVANGIE, 2005) Insuficiência Ativa “Relativa” Insuficiência ativa é frequentemente considerada uma perda absoluta da habilidade contrátil nas extremidades do comprimento do músculo. Especialistas ainda discutem as evidências e viabilidade disto como um todo. Indiferente aos absolutos, este conceito apresenta muitos elementos para preocupação durante a prescrição do exercício. 132 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a Embora uma perda total da habilidade contrátil em músculos biarticulares pudesse limitar severamente a habilidade muscular, a “insuficiência” pode ser gerada mesmo quando um mínimo de habilidade contrátil é mantido. A importância está em examinar a relação entre habilidade contrátil e o perfil da resistência. Se a relação entre eles for invertida (resistência aumentando enquanto a tensão está diminuindo), poderá haver insuficiência ativa em termos práticos de que a tensão ativa ainda restante é reduzida a ponto de se tornar insuficiente para controlar a resistência nos extremos da amplitude. Para chegarmos a conclusões sobre a insuficiência ativa, é necessário olhar para as especificidades do exercí- d o e x e r c í c i o cio: posição da articulação secundária, perfil da resistência, percentual de contribuição de músculos biarticulares. Lembrando que são os extremos, no encurtar ou alongar, que podem gerar a insuficiência ativa [Fig. 95]. “Insuficiência Passiva” ou Insuficiência do Antagonista Insuficiência passiva ocorre quando uma musculatura antagonista ao movimento resistido possui comprimento insuficiente para permitir a realização completa da ADM disponível nas articulações que cruza. Músculos biarticulares frequentemente possuem comprimento insuficiente para permitir ADM completa simultaneamente em ambas as articulações que cruzam. IA:C IA:C IP:L IP:L IA:L Fig. 95. IA: L – Insuficiência ativa na porção longa da musculatura. Na porção longa, a musculatura diminui a habilidade de gerar tensão devido ao comprimento do tecido. Nesta posição existe o aumento de tensão passiva que ajuda a musculatura não se tornar insuficiente. Então a insuficiência ativa é relativa. IA: C – Insuficiência ativa na porção curta da musculatura. Nestas posições o tecido contrátil se encontra em uma posição curta com menor possibilidade de geração de tensão. Porém, nunca chega à total inabilidade e chamamos também de insuficiência ativa relativa. IP: L – Insuficiência passiva na porção longa da musculatura. Quando a musculatura antagonista se encontra em sua posição mais alongada, esta tem a possibilidade de restringir o movimento e a isso podemos também chamar de insuficiência do antagonista. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 133 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli A grande questão é: quão “passivo” é realmente este tecido? Quanto de seu comprimento ainda é baseado na tensão ativa, especialmente se é um estabilizador importante responsável pela co-contração? Devido a sua classificação, insuficiência passiva parece identificar que o músculo está completamente inativo e que as tensões passivas estão determinando os comprimentos disponíveis. Porém, precisamos considerar que o comprimento dos antagonistas é determinado pela tensão ativa orquestrada como um músculo desacelerador através da co-contração ou um gerente articular. Então, este conceito pode ser melhor identificado como “insuficiência do antagonista” porque o tecido ainda está ativo. Nota: Insuficiência pode não ser o melhor termo para esses conceitos porque implica entender que algo está errado ou funcionando incorretamente. Porém, estas são situações normais que são insuficientes apenas no contexto de limitar a habilidade de prover maior amplitude, o que pode ser exatamente o que precisa acontecer (na verdade, na perspectiva da inteligência corporal e da diretriz principal, seria perfeito). Levando em consideração o fato anterior, é possível que a fadiga não seja tão desproporcional quanto pareceu, e pode, na verdade, ser consistente durante o ciclo de encurtamento-alongamento. Porém, a perda de habilidade ativa na porção (extremo) mais alongada é menos óbvia porque é progressivamente contraposta pelo aumento de tensão passiva. Independentemente disso, independentemente da causa, o resultado é o mesmo. O perfil da potência/resistência é alterado da primeira repetição para a última. 3. Características Mecânicas do Músculo A diferença prática entre insuficiência ativa e passiva [Fig. 95]: 1. É necessário localizar qual a musculatura está sendo carregada; 2. Identificar se está no extremo mais alongado ou no mais encurtado; 3. O lado que não está carregado só se torna insuficiente quando alongado ao máximo, então parece que a insuficiência passiva só é um problema quando a insuficiência ativa acontece no extremo encurtado do lado oposto. A influência da fadiga A fadiga altera a capacidade de gerar tensão de um músculo desproporcionalmente durante o ciclo de encurtamento-alongamento. Normalmente, os efeitos da fadiga são percebidos antes nas porções mais encurtadas da contração. Fig. 96. A linha da força de um músculo é a resultante da direção de todas as fibras. 134 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a O Vetor Muscular Total A linha de força aplicada por um músculo no osso é, na verdade, a resultante da direção das fibras que compõem esse músculo em um ponto comum de inserção [Fig. 96]. O Momento e o Ângulo de Força do Músculo A quantidade de tensão gerada em um músculo, em um determinado momento, não é a única determinante de sua habilidade de mover o osso. Fig. 97. Neste exemplo, identificamos que 90º de ângulo de força não é o ponto mais forte da amplitude devido à relação comprimento-tensão do isquiotibial estar diminuindo a habilidade de geração de força. d o e x e r c í c i o Cenários Mecânicos Específicos ao Músculo 1. O ângulo de força e o momento dos músculos mudará a cada grau de movimento; 2. Poucos músculos alcançam 90º de ângulo de força; 3. Devido à relação comprimento-tensão, um ângulo de força de 90º provavelmente não será o ponto mais forte da amplitude de um músculo [Fig. 97]; 4. A maioria dos músculos não chega a 0º devido à espessura do osso, a não ser que estejam localizados fora do plano de movimento. Um ângulo de força ideal não indica necessariamente o ponto mais forte da amplitude de movimento do músculo/grupo de músculos. O ponto ideal está sujeito à relação comprimento-tensão de todos os músculos envolvidos na articulação assim como a fadiga. Isso é ainda mais complicado em músculos biarticulares. O bíceps braquial, braquial e os isquiotibiais estão entre os poucos músculos que atingem um ângulo de força de 90º. A maioria dos músculos mantêm ângulos de força relativamente pequenos ao longo da sua amplitude de movimento. Quando o ângulo de força de um músculo diminui ao ponto em que o músculo encosta no osso, ainda assim resta um ângulo de força. O ângulo de força de um músculo (ou o braço do momento) nunca alcança zero em termos de habilidade (isso é diferente da sua participação em um movimento específico; veja Participação Muscular). Devido ao osso ter uma espessura, a verdadeira alavanca está dentro do osso ao invés de estar na sua superfície. O fato de o osso ter uma espessura e o ângulo de força nunca alcançar o zero absoluto nos permite sempre manter alguns graus de habilidade mecânica. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 135 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli Polias Anatômicas Uma polia anatômica é o osso ou proeminência óssea que altera a direção da “puxada” do músculo. Isto pode simplesmente alterar o plano que o músculo consegue trabalhar através do redirecionamento da sua força. Se analisarmos o músculo grande dorsal no contexto da extensão do ombro, a habilidade do grande dorsal de contribuir com a extensão foi alterada [Fig. 98], assim como foi alterado o perfil da potência. a) b) 136 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia Fig. 98. Polia anatômica Exemplo do exercício de remada. a) Posição inicial, a inserção do músculo grande dorsal se encontra anterior ao eixo do movimento (e coincide com o eixo da resistência), tornando-o o músculo opositor da resistência. b) Durante a extensão do ombro a inserção do músculo grande dorsal se move posteriormente com o úmero. Quando esta passa para trás do zero, quer dizer, a inserção do grande dorsal passa para trás do eixo frontal, a sua puxada deixa de ter influência neste eixo. A influência da musculadora do grande dorsal transfere-se para o eixo sagital, mudando o plano em que tem ação para o plano frontal. Neste caso sua participação acontece na adução e não mais na extensão. m e c â n i c a d o e x e r c í c i o Algumas polias anatômicas aumentam a vantagem mecânica do músculo por meio do desvio da linha da força para mais distante do eixo da articulação, aumentando, assim, a força angular/braço do momento. Poderíamos chamar estes cenários específicos de CAMs Anatômicos [Fig. 99]. Fig. 99. Cams Anatômicos A patela é um CAM anatômico porque sua presença aumenta o braço do momento da força do quadríceps, deixando-o mais forte. Quando estiver identificando a linha da força de um músculo que é desviado por uma polia anatômica, lembre-se que o ponto de aplicação é no osso, no local da inserção muscular, e está na direção da puxada da contração que as fibras geram naquele ponto de inserção [Fig. 100]. Fig. 100. A linha da força de um músculo é a resultante das forças das fibras musculares. É aplicada no ponto de inserção do músculo e a direção acompanha esta relação durante a amplitude de movimento e altera o braço do momento do músculo. Neste exemplo, aumentando o braço do momento. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 137 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli Inserção Muscular e Seus Efeitos na Habilidade Muscular Músculos Biarticulares Vários músculos/tendões dentro do corpo cruzam mais de uma articulação. Estes músculos exercem a sua força através de todas as articulações envolvidas, embora o movimento resultante não seja previsível. Se uma ou todas as articulações se movem, ou não, depende da estabilização imposta e o propósito funcional da estrutura muscular. É importante olhar o papel destes músculos individualmente dentro da cadeia ou sistema e, assim, examinar suas relações com as articulações e outros músculos em uma variedade de atividades. Características de Músculos BiArticulares: Sujeito Aos Extremos Como já mencionado na análise da insuficiência ativa e passiva, quando os ossos que estão conectados nas inserções do músculo se movem em direções opostas (ex.: o joelho flexiona enquanto o quadril se estende; como os isquiotibiais durante a corrida), o músculo tem o potencial de se submeter a seu maior encurtamento ou alongamento. Assim, em cada extremo ele se torna insuficientemente ativo (revisar relação comprimento-tensão isométrica, tensão elástica passiva). Músculos biarticulares estão associados com músculos uniarticulares, garantindo assim que a articulação se beneficie das vantagens ou características de cada um. Quando usar uma resistência com direção única ou uma resistência com um único eixo, um grupo muscular biarticular será carregado mais efetivamente (assumindo que seja o objetivo) quando apenas uma articulação for permitida a mover e a outra estiver estabilizada. O movimento na segunda articulação alterará a aplicação da carga (ex.: flexão do cotovelo especificamente para o bíceps). Quando parte da estabilização é realizada pelo próprio músculo biarticular, a exigência neurológica é intensificada (flexor de perna sentado sem apoio de coxa, extensor de perna com a estabilização ativa de quadril, flexor de perna deitado e rosca Scott). Perspectiva: Os efeitos dos músculos biarticulares em ambas as inserções não são muito conhecidos nem muito respeitados. É necessário que se observe ambas, inserções/ossos, recebendo o benefício da tensão gerada, mesmo que apenas em uma pareça óbvio. Características dos músculos em forma de leque Existe uma grande variedade de planos/movimentos nos quais este tipo de músculo pode influenciar e é necessário explorar todos os planos de movimento que são perpendiculares ao arranjo das fibras (na verdade qualquer plano fora do plano das fibras). Neste cenário, apenas uma resultante das fibras está no plano. Quando o plano de movimento é consistente com o plano do leque, um músculo pode passar a responsabilidade da habilidade mecânica para outro dentro das fibras dele mesmo, criando uma habilidade significativa ao longo de uma grande amplitude de movimentos (se todas as fibras estiverem alinhadas com o plano, o músculo possui sua maior habilidade). Quando um músculo em forma de leque está posicionado dos dois lados do eixo, as fibras de um lado do eixo exercerão ações diferentes durante o mesmo exercício. 138 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a d o e x e r c í c i o A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 139 O Perfil da POTÊNCIA m e c â n i c a O perfil da potência é basicamente a capacidade de exercer/demostrar “força” ao longo da amplitude de um movimento articular (quer dizer, durante um movimento articular específico ou durante uma sequência de movimentos articulares). Também é comum ser chamada de curva da potência. Este perfil ou curva é uma representação gráfica da alteração na capacidade de tensão “bruta” desde o início da amplitude, passando em cada posição individual, até o fim de uma amplitude de um exercício. Existem vários fatores que influenciam as variações na “força”, que acontecem ao longo da amplitude do movimento de um exercício específico. Para um exercício uniarticular, estas incluem: 1. Capacidade Contrátil: A capacidade de produção de tensão da musculatura envolvida, que é influenciada por: • A relação comprimento-tensão. Isto é, a tensão total = tensão ativa + tensão passiva; • A fadiga dos músculos; 2. Mecânica Muscular: A composição dos braços do momento dos músculos envolvidos. Exercícios multiarticulares apresentam uma variedade de situações mecânicas as quais devem ser examinadas e incluem: 1. A influência da direção da resistência e sua relação com as articulações em movimentos multiarticulares. 2. Os efeitos na articulação devido à posição/ forças aplicadas nos extremos da amplitude. Esta informação será valiosa para criarmos perfis estratégicos da resistência, permitindo-nos: • Criar perfis complementares ȖȖ Para complementar perfis da resistência inadequados criados pelas limitações das ferramentas disponíveis para trabalharmos; ȖȖ Para causar adaptações facilitadoras quando a fadiga é um fator; d o e x e r c í c i o • Avaliar o valor e quão apropriado é o perfil da resistência de um exercício tradicional; • Avaliar o valor e quão apropriado é o perfil da resistência de um equipamento e quando utilizá-lo em uma sessão de exercício ou para a progressão de um cliente-paciente; • Aprender onde e quando oferecer assistência manual para otimizar o perfil de resistência durante as últimas repetições. Perfil da potência uniarticular As mudanças na força que parecem ocorrer ao longo de um movimento uniarticular e em um movimento da coluna são comumente avaliadas isometricamente por meio da aplicação de carga tangencial, isto é, a carga sempre é aplicada em 90° para o membro/tronco. Os testes isocinéticos possuem suas limitações, devido ao fato que quando alguém se move a uma velocidade inferior um equipamento que é ajustada na máquina (como é necessário acontecer quando a mudança de direção acontece, isto é, parar a flexão e iniciar a extensão), menos torque é registrado na máquina, mesmo quando o torque ainda poderia ser produzido internamente. O melhor exemplo é quando no ponto da amplitude em que se para o movimento por completo, ainda há torque/capacidade de produção de tensão que não são detectados por equipamentos de testes isocinéticos ajustados para qualquer velocidade que não seja zero grau por segundo (ou seja, estático). Tipicamente, a curva da potência uniarticular é uma curva Bell com maior probabilidade de ser inclinada em direção à porção mais longa do músculo. O grau de fadiga/tensão passiva possivelmente acentua ainda mais esta tendência. A seguir, temos uma representação simples da potencial tendência de uma situação de máximo esforço sem fadiga e após fadiga. Obviamente esta representação não é exata, apenas demonstra a tendência da relação. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 141 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli Nota A) O grau de “encurtamento” e “alongamento” em um músculo biarticular será afetado pela posição de ambas articulações. Nota B) O grau de “encurtamento” em um músculo uniarticular será afetado pelo comprimento do antagonista biarticular por meio da posição de outras articulações e da insuficiência passiva [Fig. 101]. Fig. 102. Movimento da coluna se submete a mudanças menos drásticas em seu perfil da potência. Fig. 101. Perfil da Potência em Movimentos Uniarticulares é normalmente uma curva de sino, bell curve. Tem uma tendência de ser mais forte no extremo mais longo, aumentando sua força e sendo o ponto mais forte o médio e diminuindo quanto mais se aproxima do extremo curto. Perfil da potência em movimento da coluna Aparentemente, a musculatura da coluna submete-se a alterações menos dramáticas no braço do momento nos extremos de amplitude, portanto parece ser mais diretamente e consistentemente influenciada pela curva de comprimento-tensão [Fig. 102]. Considerações • O Perfil da Potência e o Perfil da Resistência não são importantes quando a sobrecarga não é apropriada, isto é, quando a sobrecarga é muito baixa e não há desafio (resistência efetiva), e quando a posição estática exigida no exercício não é mantida. • Se somente uma pequena porção da amplitude disponível é realizada, a amplitude deve ser comparada com aquela no final do gráfico. • Quanto menor a amplitude, menores são as mudanças no perfil da potência. • Os comprimentos da musculatura biarticular vão alterar o gráfico consideravelmente, mas o formato será similar. Perfil de potência de EXERCÍCIOS multiarticulares Movimentos multiarticulares não podem ser examinados da mesma maneira. Eles são testados por meio da aplicação linear de carga no movimento 142 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a específico ou “exercício”. Isto cria um cenário muito diferente onde o braço do momento da resistência é alterado durante a amplitude. Isso tem um papel dramático na aparência da habilidade durante a amplitude. O perfil demonstrado a seguir representa um exercício, ou movimento de empurrar, no qual a linha da resistência se encontra distribuída entre o ombro e o cotovelo (ou entre o quadril e o joelho) iniciando em baixo, ou na posição de flexão máxima, com aproximadamente uma proporção da resistência e do momento de 2:1 (ou maior) entre o proximal e distal de ambas as articulações, respectivamente. Em cima (final da fase concêntrica; porção mais curta da d o e x e r c í c i o contração) a resistência está praticamente equilibrada através dos membros e praticamente não existe momento da resistência para estas articulações. Portanto, aparentemente a sua força será maior em cima e menor embaixo devido ao cenário mecânico de como o sistema foi carregado (ver força estrutural e força fisiológica). Isso será alterado se a direção da resistência for alterada também. Na verdade, se a resistência (linha da força) não se posicionar entre as duas articulações quando estiver embaixo e não se alinhar com o membro em cima, o perfil da potência vai se parecer mais com um perfil uniarticular. a.) Fig. 103. Perfil da potência em exercícios de empurrar. A força vai parecer ser maior quanto mais nos aproximamos do final da extensão dos membros (em cima). Isso ocorre devido à diminuição progressiva dos braços do momento para todas as articulações ativas. Diminuição do braço do momento diminui o torque, a resistência, deixando o perfil da resistência mais leve em cima e mais pesado embaixo embaixo, o que faz com que no perfil da potência o sistema perceba ser mais forte em cima e mais fraco em baixo (força estrutural). A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 143 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli Quando fadigado (ponto em que não há mais habilidade para levantar a carga escolhida) neste tipo de perfil de resistência citado, a curva é mais significativamente inflexionada quando se aproxima do “topo/curto” do que “embaixo/longo”. Isso possivelmente ocorre devido à influência da tensão passiva embaixo e à “solitária” tensão ativa no topo. No extremo do topo (travado) pode ser considerado “estruturalmente forte” devido a praticamente não existir momento da resistência (o torque é mínimo), então a carga pode ser alta porque, nesta posição, ela está sustendada pelos ossos e não pela habilidade muscular. Em um movimento de puxar (remada, por exemplo), em que a linha da resistência está praticamente equilibrada dentro do braço quando ele está estendido, não existe momento da resistência nem na articulação do ombro, nem na articulação do cotovelo. No final da fase concêntrica (porção em que o cotovelo está em flexão) a linha da resistência está distribuída entre o ombro e o cotovelo com uma proporção da resistência e do momento de 2:1, respectivamente, (ou maior). Portanto, sua força será aparentemente maior quando o braço está estendido devido ao equilíbrio dos momentos da resistência e à relação comprimento-tensão associada. A força vai diminuir significamente quando o braço flexiona e os momentos da resistência aumentam quando os músculos estão dramaticamente em suas porções mais curtas. Além disso, a influência mecânica do músculo grande dorsal pode ser quase totalmente negada dependendo do plano exato do movimento e do grau de extensão do ombro alcançada [Fig. 104]. Nesta situação, ao fadigar, há uma queda mais dramática no mesmo sentido da curva, devido à dramática perda da produção de tensão ativa (posição mais encurtada), combinada com o aumento do momento da resistência (torque). Fig. 104. Perfil da potência nos exercícios de puxar. No início do movimento estamos muito “fortes”, devido ao braço do momento ser zero. Quando o exercício inicia, os braços de momento aumentam progressivamente, deixando o perfil da potência mais fraco. Essas mudanças serão notáveis apenas quando for aplicada uma carga desafiadora. Se houver compatibilidade com o perfil de resistência, haverá sensação de consistência entre habilidade/ carga, ao menos nas primeiras repetições (a não ser que se consiga alterar o perfil de resistência ao longo das repetições para atender às demandas da fadiga). A relação entre Perfil de Potência-Resistência Podemos considerar os exemplos acima como força fisiológica versus força estrutural. A força fisiológica inclui questões que afetam as propriedades contráteis de um músculo, como a relação comprimento-tensão, a fadiga e a mecânica muscular. A força estrutural seria o ponto potencial em uma amplitude em que o braço do momento da resistência alcança ou se aproxima de zero, gerando assim um potencial 144 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a d o e x e r c í c i o maior de tolerância à carga (não necessariamente resistência, apenas força aplicada). Nessa situação, apenas a estrutura “resiste à força aplicada, uma vez que, sem braço do momento, não há torque e, logo, não há desafio para os músculos controlarem aquela articulação. Isto nos mostra por que não podemos considerar um perfil da potência sem também considerar um perfil da resistência. Em essência, existe uma relação potência-resistência que faz com que “nossa força” (ou aparência de força) dependa de fatores internos e também externos. Então, para recapitular, um membro ou um sistema multiarticular é mais forte quando os membros estão estendidos e a carga “entra” através do eixo longitudinal dos ossos (através dos ossos). Novamente, isso não é devido à força muscular, sim aos comprimentos do braço do momento da resistência, que nestas posições é insignificante, isto é, está equilibrado através das articulações. Este perfil será alterado ainda mais em cada repetição devido à fadiga. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 145 Mecânica da Resistência: Perfil da Resistência m e c â n i c a Por que é importante para um fisioterapeuta estudar sobre resistência? Por que um fisioterapeuta que utiliza o exercício como ferramenta precisa entender as propriedades mecânicas da resistência? Estudar resistência tem uma abrangência muito maior do que somente analisar equipamentos. Estudar resistência envolve a resistência manual, o peso corporal quando usado como resistência, os equipamentos de pilates, de musculação etc. Um profissional que conhece as propriedades mecânicas de cada ferramenta que utiliza, jamais recusa, condena ou descarta os equipamentos sem realmente entendê-los. Este profissional consegue discernir e usar a ferramenta correta no momento apropriado para cada cliente-paciente individualmente. Quando prescrevemos um exercício, estamos aplicando uma força em uma estrutura e estimulamos a produção interna de força de um indivíduo, d o e x e r c í c i o ou seja, a integridade neuromuscular, e para isso é extremamente importante entender a influência das forças externas na estrutura de nossos clientes-pacientes. Por isso este estudo é tão importante! Perfil da Resistência (PR) Uma força não é resistência até que seja aplicada ao corpo e oposta por um músculo, dentro do cabo de guerra em torno de uma articulação. Portanto, resistência é uma relação específica entre, pelo menos, duas forças opostas. Devido à estrutura e à função rotatória/axial das articulações sinoviais, a resistência ao movimento humano ou à posição é um torque criado em cada articulação no sistema de controle ativo, e ele é alterado por qualquer mudança na sua: 1. distância perpendicular para cada articulação; 2. quantidade/magnitude de empurrar ou puxar. Fig. 105. Perfil da resistência durante o agachamento. A posição de maior flexão, embaixo, é aquela em que o braço do momento se encontra maior, então neste ponto a resistência é máxima. Na posição final, em extensão, em cima, os braços do momento diminuem, chegando a zero no final, sendo o ponto de resistência mínima. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 147 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli Em praticamente todos os exercícios, a resistência varia ao longo da ADM, normalmente de maneira não estratégica. O perfil da resistência é a representação gráfica dessas mudanças no torque à medida que ocorrem durante a amplitude de movimento, ou seja, PR = onde, na amplitude, é difícil e onde é mais fácil. Por exemplo, durante um exercício de agachamento com peso livre [Fig. 105], onde é mais fácil em cima e mais difícil embaixo. Portanto, é vital que conheçamos todas as maneiras que a resistência é e pode ser manipulada. A quantidade real de uma resistência em qualquer ponto da ADM não é de maneira alguma óbvia. É uma função de todos os fatores mecânicos, as propriedades físicas da modalidade ou do equipamento, assim como as situações envolvendo a aceleração/tempo. É fundamental nos tornarmos mestres em manipular essas variáveis e, então, desenvolver uma “estratégia para a resistência” com base no objetivo deste exercício (O.D.E.) e, acima de tudo, os efeitos combinados desses fatores nunca devem exceder a habilidade de controle do indivíduo. A manipulação estratégica do perfil da resistência é fundamental para alterar o resultado/adaptação do exercício por meio do desafio muscular (padrão de motor/recrutamento, ou seja, quais músculos são necessários, quanta tensão terão que desenvolver) e das forças articulares. Importância no Exercício O PR pode e deve ser estrategicamente criado e modificado para se encaixar o máximo possível no perfil da potência (PP), associado a cada exercício específico e apropriadamente manipulado para cada cliente individualmente, levando em consideração a fadiga, patologias e os efeitos do descondicionamento físico. O Perfil da Resistência (PR) são as mudanças da resistência durante a amplitude do movimento no decorrer de um exercício. São os pontos onde é mais fácil e onde é mais difícil e ele é baseado em dois fatores: 1. Mudanças na força (magnitude) • CAM, resistência elástica, inércia (aceleração e desaceleração), sistema de conexão (linkage system), manual (assistência, resistência) etc.; 2. Mudanças no momento • O relacionamento entre a linha da resistência com as articulações envolvidas e como ambas são afetadas pelas mudanças na direção da força, mudanças na posição, mudanças no posicionamento etc. Vamos analisar alguns exemplos do perfil da resistência utilizando o mesmo exercício e o mesmo tipo de resistência e manipular a posição no espaço para alterar o ponto da amplitude onde é mais fácil ou mais difícil [Fig. 106 e Fig. 107]. A relação entre perfil da Resistência e perfil da potência 1. O PR (perfil da resistência) pode ser criado ou modificado para se encaixar no PP (perfil da potência) para um exercício específico com praticamente qualquer ferramenta escolhida se o profissional souber como manipular a física relacionada com os fatores abaixo: a. Peso livre e cabos normalmente comprometem o PR para exercícios multiarticulares, então o uso destas ferramentas é mais preciso para exercícios/desafios uniarticulares; b. Máquinas de musculação praticamente manipulam somente a parte da magnitude do PR. Máquinas de qualidade podem ser ótimas para o início da série ou o final dela, mas devido às mudanças inerentes ao perfil da potência nas primeiras repetições ainda sem fadiga e na última repetição já com fadiga, a maioria das máquinas exige a intervenção do profissional para criar um cenário mecânico que acomode para estas mudanças; 148 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a d o e x e r c í c i o BM a) b) c) Fig. 106. Abdução do ombro em pé. a) Exercício de abdução do ombro na posição neutra. A linha da força está praticamente alinhada com o eixo e o braço do momento é mínimo. Nesta posição, a resistência para o ombro também é mínima. b) Ombro a 45º de abdução. O braço do momento aumenta progressivamente e nesta posição a resistência aumentou consideravelmente. c) Ombro a 90º de abdução. Esta é a posição de maior resistência dentro da amplitude deste exercício. BM a) b) c) Fig. 107. Abdução do ombro em decúbito lateral. a) Exercício de abdução do ombro na posição neutra. Nesta posição, o braço do momento é o maior, tornando esta posição de maior resistência dentro da amplitude deste exercício. b) Ombro a 45º de abdução. O braço do momento aumenta progressivamente e nesta posição a resistência aumentou consideravelmente. c) Ombro a 90º de abdução. A linha da força está praticamente alinhada com o eixo e o braço do momento é praticamente zero. Esta é a posição de menor resistência para o ombro. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 149 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli c. Máquinas com design mecânico não tão bem desenvolvido apresentam o maior obstáculo para encaixar a mecânica individual da estrutura do cliente-paciente. Existem máquinas que invertem o PR em comparação ao PP, o que torna quase impossível usar a máquina para criar uma experiência mecânica na qual seja possível gerar um estímulo apropriado para o tecido contrátil. É necessário que o profissional faça modificações no exercício, na máquina e, às vezes, na posição do cliente para tentar adquirir o melhor PR possível para a melhor adaptação diante de um objetivo; d. Qualquer movimento articular que aconteça em uma articulação que deve estar estática vai eliminar a possibilidade de alcançar um PR apropriado. Então, qualquer compensação ou “roubo” vai alterar o cenário mecânico do exercício; e. Se o PR não for parecido com o PP vai ser difícil manter as posições estáticas, a não ser que o profissional pare o exercício quando for necessário ou o cliente seja muito avançado e consiga fazer ajustes estratégicos para terminar o exercício. Então um PR não apropriado vai encorajar a “compensação”. Considerações Quanto menor for a amplitude usada durante um exercício, menos drásticas são as alterações no PR. Em outras palavras, porque o PR muda durante a amplitude, quanto menor a amplitude realizada, menores são as mudanças que acontecem no PR ou no PP. Inversamente, quanto maior a amplitude de movimento em um exercício, maiores as mudanças nos braços do momento da resistência para cada articulação envolvida, causando maiores variações no PR. Além disso, amplitudes maiores estão normalmente associadas a movimentos mais rápidos. Quanto mais abrupta for a aceleração e desaceleração da carga, maior será a magnitude da resistência, e igualmente preocupante é a perda completa de resistência durante parte da amplitude devido à inércia. Mesmo que uma máquina possua uma ótima engenharia ou que o PR tenha sido estrategicamente desenvolvido, nenhum perfil da resistência será ótimo para a primeira repetição e também para a última devido à fadiga etc. Consequentemente, para solucionar esta situação, existem pelo menos duas opções: “Ótimo + Manipulação” e “Amplitudes complementares/ com carga apropriada”. Aplicação Ótimo + Manipulação: 1. Criar um perfil da resistência ótimo para a primeira repetição e diminuir durante a série, ou seja, criar um perfil quase ótimo para a primeira repetição que será modificado a cada repetição subsequente de acordo com a necessidade por meio de assistência manual ou do uso de manipulação da máquina dentro da amplitude média; 2. Criar um perfil da resistência ótimo para a última repetição e aumentar no início da série, ou seja, o profissional vai criar um perfil quase ótimo para a última repetição e este será modificado durante as primeiras repetições por meio de resistência manual. Amplitudes complementares/com carga apropriada: completando o desafio. Devido às limitações dos equipamentos (peso livre, peso corporal, maioria das máquinas), múltiplos exercícios ou cargas deverão ser empregados para gerar um desafio apropriado para toda a amplitude contrátil. Então, será necessário optar entre: a. Realizar um exercício com amplitude completa com a carga apropriada para os extremos de amplitude; b. Realizar um exercício com amplitudes 150 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a d o e x e r c í c i o limitadas com uma carga mais desafiadora dentro destas amplitudes. Exemplo: agachamento com pequena amplitude em cima, zero a 45 graus com carga maior, complementado com agachamento mais profundo com carga mais leve. Métodos para alterar o perfil da resistência 1. Manipular a direção. A direção da linha da força da resistência determina o comprimento do braço do momento da resistência e, consequentemente, o torque, alterando o perfil da resistência. Nos exemplos das Fig. 108, Fig. 109 e Fig. 110, vamos comparar como a direção da resistência altera o perfil da resistência em movimentos iguais. Vamos analisar somente a articulação do ombro. 2. Manipular a magnitude. É possível aumentar ou diminuir a magnitude da resistência por meio dos fatores abaixo e estes são os tópicos que nos aprofundaremos nos capítulos a seguir: Fig. 108. A direção da resistência altera a linha da força a qual determina o comprimento do braço do momento e consequentemente o torque, alterando o perfil da resistência. Nos exemplos a seguir (Fig. 108, Fig. 109 e Fig. 110), vamos comparar como a direção da resistência altera o perfil da resistência em movimentos iguais. Vamos analisar somente a articulação do ombro. O cabo nesta direção apresenta um braço do momento menor do que no exemplo da Fig. 109. Quer dizer, é mais “leve” do que no exemplo da Fig. 109. No final da extensão ainda existe um certo comprimento do braço do momento, o que indica que ainda existe resistência nesta posição do exercício, porém, se comparado ao exemplo da mesma posição na Fig. 109, o torque é menor, então a resistência é menor. Porém se comparado com a mesma posição na Fig. 110 o torque é maior, então a resistência é maior. Podemos usar a mesma análise para todas as outras posições. BM A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 151 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli Fig. 109. O cabo nesta direção apresenta um braço do momento maior do que nos outros exemplos (Fig. 108 e Fig. 110). Quer dizer, aqui o perfil da resistência é maior em todas as posições. O perfil da resistência refere-se às alterações que a resistência sofre durante a amplitude. Verifique que as alterações do comprimento do braço do momento durante a amplitude da Fig. 108 são diferentes do que na Fig. 109 e também diferentes do que na Fig. 110. Isso indica que a mesma posição pode ser mais leve ou mais pesada dependendo do perfil da resistência. BM Fig. 110. O perfil da resistência utilizando halteres é exatamente o contrário do que nos exemplos anteriores usando os cabos. A direção da resistência neste exemplo é a gravidade. O braço do momento diminui durante a amplitude. Neste exemplo, na posição final de extensão do cotovelo, a linha da força está alinhada com o eixo e o braço do momento é zero, eliminando o torque para a articulação do ombro nesta posição. Isso quer dizer que, nesta posição, diferente dos outros exemplos, a resistência é a menor. BM 152 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a 1. Manipulação do CAM; 2. Aumento e redução da inércia; 3. Adição de resistência com borracha/elástica ao equipamento com massa: ȖȖ Só funciona em exercícios de “empurrar”; ȖȖ Pode aumentar a magnitude; ȖȖ Pode descarregar; ȖȖ Pode regular a inércia. Exemplos de mudanças no perfil da resistência durante a amplitude: • Agachamento com peso livre possui quase zero de resistência em cima e a resistência máxima (para a carga escolhida) embaixo/no final da flexão. • Qualquer exercício que utiliza “borracha”, quando a borracha está totalmente estendida, porém está encostada no corpo e sem distância para os eixos de movimento, a resistência é praticamente zero. • Balançar um kettlebell pode produzir uma quantidade enorme de resistência no ponto do arremesso inicial (início da fase concêntrica), mas tem praticamente zero de resistência durante a maior parte da amplitude devido aos efeitos da inércia. d o e x e r c í c i o 10# não é 10# de resistência! Os números no peso não são indicação da resistência! O peso em sua mão não é indicação das forças em seu corpo. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 153 Mecânica da Resistência: Direção m e c â n i c a d o e x e r c í c i o Direção da Resistência e a Criação de Oposição Para que uma força se torne resistência, é necessário haver oposição. Então, precisamos distinguir o que deve ser resistido ou oposto. Vamos abordar agora várias maneiras em que a oposição pode ser gerada. liberdade pode ser desafiada em inúmeros planos por meio de inúmeras direções diferentes. Uma articulação com somente um grau de liberdade deve ser desafiada somente em uma direção de resistência, aquela disponível no plano de liberdade, quer exista movimento ou não. 1. Gerando oposição a uma posição • Existem 360° de desafios disponíveis no plano perpendicular ao membro. • O profissional pode iniciar o processo de decisão da criação do exercício com a definição de qual dos “mantedores da posição” ele gostaria de desafiar por meio desta posição estática e, a partir daí, definir a direção da resistência que vai gerar oposição [Fig. 111]. • A resistência irá afetar os recrutamentos musculares de TODAS as articulações de controle ativo. • Existe uma relação direta entre a direção da resistência e os graus de liberdade das articulações envolvidas. Uma articulação com três graus de 2. Gerando oposição a um plano de movimento específico Para gerar oposição a um plano de movimento, são necessários os seguintes fatores: • Identificar o plano de movimento. • Determinar quais músculos serão o foco do exercício para agir e o quanto e em qual capacidade. Por exemplo, a flexão de ombro pode ser realizada concentricamente pelos flexores do ombro ou excentricamente pelos extensores do ombro. O movimento não muda, mas a direção da resistência sim. • Alinhar o plano de movimento com a linha da resistência (ou vice-versa) [Fig. 112]. Fig. 111. Gerando oposição. O profissional define qual musculatura quer desafiar e, a partir daí, posiciona a direção da resistência em oposição às fibras musculares a serem desafiadas. Existem 360º de possibilidades. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 155 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli Linha de resistência para o desafio excêntrico dos “antagonistas” Fig. 112. PLANO DO MOVIMENTO Linha de resistência para o desafio concêntrico 3. Gerando oposição por meio de diferentes posições do corpo e a relação com a resistência • Os exemplos a seguir indicam a mesma direção de resistência, porém aplicada no corpo em diferentes posições no espaço [Fig. 113]. • As posições corporais são semelhantes, porém foram alteradas no espaço para coincidir com a direção de resistência. Esta realidade afeta o braço do momento do centro de massa dos segmentos do corpo, alterando o desafio associado com o controle estático (ou seja, a estabilização). • É importante visualizarmos que o desafio relativo ao ombro/cotovelo é o mesmo em todos os exemplos, porém o desafio relativo ao quadril/ coluna é diferente em cada exemplo. • Dentro de uma consideração sobre progressão, faz-se necessário entender que o primeiro e o terceiro exemplos exigem o mínimo de estabilização ativa de tronco. Já os exemplos 2, 4 e 5 exigem mais estabilização ativa e devem ser analisados individualmente. Fig. 113. A direção da resistência em relação à articulação do ombro é a mesma em todos estes exemplos. Porém, o desafio para as articulações do quadril e coluna são muito diferentes. A necessidade de diferentes musculaturas estabilizadoras e a quantidade de envolvimento delas é muito diferente em cada exemplo. 156 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a 4. Gerando oposição para a “manutenção de um plano” = Resistência fora do plano de movimento O desafio para a capacidade de manter um plano de movimento é muitas vezes criado inadvertidamente devido à falta de compreensão de oposição ao movimento. Um exemplo inclui o crucifixo em pé com halteres. Também o exercício para o manguito rotador realizado em pé com haltere, enquanto o úmero é mantido ao lado do tronco e cotovelo flexionado a 90°. d o e x e r c í c i o participar em ambas as funções). Os exemplos a seguir estão representando os planos de rotação do tronco e vamos analisar como a aplicação da resistência afetaria a participação muscular. a) b) Linha de resistência PLANO DO MOVIMENTO PLANO DO MOVIMENTO Fig. 114. Os músculos desafiados para manter o plano não estão trabalhando isometricamente, eles estão mudando o comprimento, porém não estão sendo desafiados como aqueles se opondo à resistência. 5. Gerando oposição para um pouco de ambos • É necessário determinar o grau em que a resistência se desvia do plano estrategicamente. Resistência fora do plano de movimento requer uma compreensão do grau em que a resistência está fora do plano e quais serão seus efeitos (ou seja, quem será desafiado como “mantedor de plano”?). Quanto mais longe do plano de movimento a resistência for direcionada, menos serão desafiados os músculos “movedores” e mais desafiados serão os mantedores do plano (embora exista a probabilidade de haver certo grau de sobreposição, como alguns músculos que podem Linha de resistência Fig. 115. • Não confunda o gráfico anterior com resultantes. Resultantes começam com duas forças. Acima, temos exemplos de uma força que cria dois efeitos com base no fato de que o plano de movimento é mantido como incongruente com a linha de resistência. • Na aplicação prática, a linha de resistência de um cabo ou elástico mudaria a sua contribuição para cada componente, de acordo com a mudança em seu ângulo em relação ao plano de movimento durante a ADM. Portanto, se uma determinada quantidade de “resistência para movimento” ou “resistência para a manutenção do plano” for desejada, a utilização de duas fontes independentes pode servir melhor. • Só porque temos todas essas opções, não significa que todas são boas. Temos que entender as implicações de cada opção em cada situação. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 157 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli 6. Direção e os eixos: o Braço do Momento da Resistência Quanto mais próximo à linha da força (da resistência) estiver de uma articulação, menos torque produz, por conseguinte, menos tensão muscular/torque é necessário para responder à demanda. Em essência, isso determina o que é desafiado e quanto. Quando a linha de força cai dentro do eixo, o braço do momento é zero. Por isso, aquela força gera zero de torque e não tem efeito sobre o movimento de rotação, porque é “equilibrada” no meio da articulação. Laboratório de Braço do Momento A realidade mecânica dos exercícios indica que existe um Braço do Momento da resistência para TODA e CADA articulação controlada ativamente. • Identificar como o Braço do Momento para cada articulação do movimento muda ao longo da amplitude. ȖȖ Examine como o mesmo exercício pode ter mais ou menos resistência em várias articulações, simplesmente alterando a posição do cabo e assim alterando o Braço de Momento. O posicionamento do braço diante do cabo afeta o Braço de Momento [Fig. 116]. ȖȖ Identifique formas de estrategicamente influenciar o BM para articulações específicas de movimento(s) em pontos específicos na amplitude, enquanto mantém praticamente o mesmo perfil da resistência e os músculos de oposição. Por exemplo, o exercício de supino (adução horizontal do ombro com flexão e extensão de cotovelo) com haltere quando os extremos do haltere alteram a distância da linha da força da resistência para “dentro” e para “fora” do cotovelo [Fig. 117]. ȖȖ Estrategicamente, influencie o BM para a articulação em movimento(s) específico(s), em pontos específicos na variação, alterando os músculos que estão em oposição de uma articulação. Por exemplo: o crucifixo x o supino com halteres. Fig. 116. Comparando os exemplos a) e b), os braços do momento para a articulação da coluna, ombro e cotovelo aumentaram no exemplo b.). Isso indica que neste exemplo a resistência é maior para todas estas articulações. a) b) 158 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a d o e x e r c í c i o Fig. 117. a) Os halteres estão exatamente sobre a articulação do cotovelo e a linha da força está equilibrada com o cotovelo e o braço do momento é zero para o cotovelo, porém X para o ombro. b) Os halteres estão posicionados mais medialmente à articulação do cotovelo e a linha da força está caindo entre a articulação do cotovelo e ombro, gerando um braço do momento para o cotovelo. Este torque está se opondo ao torque gerado pelos extensores do cotovelo. Para o ombro, o braço do momento diminuiu comparado ao exemplo a), então a resistência para o ombro também diminuiu. c) Os halteres estão posicionados mais lateralmente à articulação do cotovelo. A linha da força está caindo para fora da articulação do cotovelo, gerando um braço do momento para o cotovelo, do mesmo comprimento do exemplo b.), porém em direção oposta, e agora este torque está se opondo ao torque gerado pelos flexores do cotovelo. Para o ombro, o braço do momento aumentou comparado ao exemplo a) e b), então a resistência para o ombro também aumentou. a) b) c) • Verifique que existe um braço do momento para cada articulação de controle ativo e também para aquelas articulações que estão estabilizando. No exemplo a seguir, um exercício de flexão de ombro [Fig. 118]. • Um cabo tem uma influência diferente de que quando a “massa” é aplicada diretamente no membro como resistência. A direção do cabo é influenciada pela posição da polia e não é sempre vertical como a gravidade. Verifique que a mudança de direção do cabo afeta as oportunidades de influência na amplitude e no perfil da resistência diferente de quando usamos um halter contra a gravidade. Os pontos de maior e menor resistência durante a amplitude do movimento são diferentes quando utilizamos halter ou cabos. Para distinguirmos onde, na amplitude, a resistência é maior ou menor, é necessário localizarmos os braços do momento para cada posição articular [Fig. 119]. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 159 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli a) Fig. 118. Durante a extensão do ombro, o braço do momento aumenta tanto para o ombro quanto para as articulações do tornozelo, joelho, quadril, coluna e cotovelo (articulações de controle ativo). b) Fig. 119. a) Na abdução do ombro com halter, a posição de maior resistência é a de 90º. b) Na abdução do ombro com cabo (posicionado nesta direção), a posição de maior resistência é entre os ângulos de 65º e 75º. 160 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a d o e x e r c í c i o Utilização de cabos e a influência do Centro de Massa É essencial reconhecermos quando um cabo muito leve ou uma borracha perde o braço do momento, quando o braço do momento do centro de massa do membro aumenta e o cabo se torna assistência ao músculo que está se opondo. Fig. 120. Exercício de extensão de quadril com o objetivo de desafiar o glúteo máximo (e todos os extensores do quadril) utilizando cabo, como no pilates. A direção do cabo se opõe corretamente ao tecido do glúteo máximo, porém, se a resistência da massa da perna se tornar maior do que a resistência oferecida pelo cabo, a extensão de quadril se torna desafiadora para os flexores de quadril e não mais para os extensores. E a resistência do cabo passa a oferecer assistência para extensão do quadril. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 161 Magnitude: Explorando as Propriedades da Resistência m e c â n i c a M agnitude é sinônimo de quantidade. Então, a magnitude da resistência é a quantidade de força aplicada. Porém, a quantidade de força é somente metade do que cria o torque da resistência. Também vamos aprender que, devido às diferentes propriedades físicas de cada equipamento que utilizamos para criar resistência, a magnitude pode mudar durante a amplitude. Não são somente as alterações no peso real aplicado que alteram a magnitude da resistência, as propriedades do próprio equipamento também alteram a magnitude da resistência. Em outras palavras, aumentar de 10 para 15 kg irá aumentar a magnitude, mas outras propriedades podem aumentar ou diminuir os 10 kg (podendo chegar até 0) apenas movendo o equipamento. Cada equipamento, modalidade ou ferramenta oferece diferentes oportunidades de manipulação da resistência. d o e x e r c í c i o Esse pensamento de que peso e massa são iguais pode trazer mal-entendidos durante a análise e criação de exercícios porque o conceito de massa será essencial para o entendimento do conceito sobre a resistência escondida. Massa é a quantidade de matéria que compreende um objeto. Em essência, massa representa a inércia de um objeto. Massa e peso não são a mesma coisa. Inércia é a resistência à mudança Inércia é a tendência de um objeto de resistir a uma mudança no seu estado atual de movimento. Se não houver movimento ou se houver movimento retilíneo uniforme, o objeto quer continuar fazendo o que está fazendo atualmente. Primeira Lei de Newton: “Um corpo vai permanecer em seu estado de repouso ou de movimento uniforme (linha reta, velocidade constante), a menos que seja obrigado a mudar aquele estado por forças aplicadas nele”. Anteriormente denominado um estado de inércia por Galileu, esta lei da inércia, basicamente, representa objetos em equilíbrio e seu “desejo” de permanecerem inalterados. A inércia não é uma força. A inércia é uma propriedade da massa e está sempre presente em uma representação da quantidade de massa em si. A inércia não vem e vai, aumenta ou diminui, a não ser com uma alteração na quantidade de massa em si. A sua expressão está diretamente relacionada com o grau de alteração/força aplicada sobre a massa. Quanto maior for a alteração na força aplicada, maior será a expressão da inércia. Massa Talvez você tenha aprendido ou pense que massa e peso são a mesma coisa, porque neste planeta a gravidade é uma constante. Porém, isso está incorreto porque no espaço temos massa, mas não temos peso. As implicações no exercício O entendimento dos efeitos potenciais da massa e da inércia são enormes no exercício. O peso de um objeto é medido estaticamente em uma balança. Porém, os efeitos da inércia são independentes dos efeitos da gravidade. A inércia influencia a magnitude da resistência por meio da aceleração da massa. A Peso Peso é a gravidade agindo sobre um objeto. Peso = massa x gravidade (F = ma). Novamente, a quantidade de peso por si só não é indicação da força total de resistência. Perspectiva: Neste planeta, não mudamos a quantidade de gravidade para aumentar o peso, então estamos mudando a quantidade de massa. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 163 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli inércia também pode aplicar uma direção de resistência diferente daquela aplicada pela gravidade na massa do mesmo objeto, pois estas podem não coincidir (ver a Segunda Lei de Newton). A massa, a inércia e a aceleração podem adicionar resistência (a “resistência oculta”) no início de uma contração concêntrica, dependendo da aceleração, ou no final da contração excêntrica, dependendo da desaceleração. A inércia também pode diminuir a resistência, ou seja, tornar-se assistência, após a conclusão da concêntrica ou durante a maior parte da amplitude (por exemplo, um arremesso durante um levantamento do peso, quando 400 libras por um breve momento não pesam nada). A inércia pode proporcionar resistência em qualquer direção, incluindo horizontal, dependendo da direção da aceleração, como durante um exercício usando uma medicine ball quando movida horizontalmente. Devido à inércia, a direção da resistência vai criar uma resultante quando combinada com a direção da gravidade, que será a direção momentânea da resistência. A inércia influencia o exercício no início da aceleração e no final na desaceleração da massa. Sendo assim, potencialmente o que quer que inicie o movimento do peso é responsável por vencer a maior parte da resistência da inércia. Então, o controle sobre a sequência dos movimentos articulares torna-se crítico. Por exemplo, durante um exercício de flexão do cotovelo (rosca bíceps) com 100#, se o movimento iniciar com qualquer outra articulação, como o quadril e joelho, estas musculaturas foram as responsáveis por vencer a inércia, reduzindo o desafio para os flexores do cotovelo. Para que o desafio seja para os flexores do cotovelo, é necessário que estes iniciem e parem o movimento. Então, é extremamente importante que possamos identificar qual é o objetivo deste exercício e que o exercício seja monitorado constantemente durante sua execução. A inércia é uma das maiores influências na resistência. Devido à forma como a maioria das pessoas desloca o peso, a resistência e a assistência da inércia são as principais influências nos exercícios. Massa, força e mudanças na velocidade Velocidade de execução do exercício Em última análise, não é a velocidade que importa, porque a velocidade é, por definição, uma constante. É a aceleração e a desaceleração que são fundamentais. Além disso, na física não existe o termo “desaceleração”. A aceleração é simplesmente dividida em aceleração positiva e negativa. Mas, devido ao fato da indústria do exercício automaticamente relacionar positivo e negativo com concêntrico e excêntrico, usaremos o termo leigo “desaceleração”. Não é a queda que mata... é a aterrisagem. Segunda Lei de Newton: “A taxa de tempo de mudança no movimento de um objeto é proporcional à força resultante (resultado líquido das forças) agindo sobre ele e inversamente proporcional à massa do objeto. A mudança é feita na direção da linha reta em que a força é aplicada”. “A força é um agente de mudança.” Esta é a lei da aceleração. 164 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a No próximo nível de estudos, exploraremos outros fatores que influenciam a magnitude da resistência, como: momento, impulso, energia cinética e fricção. Porém, neste nível optamos por não abordar estes fatores, pois exigem uma coompreensão já estabelecida dos fundamentos básicos da resistência. Outras formas DE resistência Outras formas de resistência e como suas respectivas propriedades afetam a magnitude da força externa? Pneumática Refere-se à utilização de ar pressurizado como resistência. Este tipo de equipamento evita as propriedades da inércia oferecida pela gravidade e os incrementos da progressão podem ser mínimos. Normalmente, estes equipamentos oferecem tanto resistência concêntrica quanto excêntrica e possuem perfis da magnitude específicos devido às mudanças na pressão do ar durante a amplitude e também devido à mecânica interna da própria máquina. Hidráulica Refere-se ao uso de fluido comprimido em um cilindro como forma de resistência. Estes não oferecem resistência excêntrica e são considerados uma resistência acomodativa. Aquática É uma resistência acomodativa – quando paramos de mover a resistência, deixa de existir. O formato, área de superfície de contato e ângulo do objeto movido são relevantes na determinação da resistência. A água como propriedade de resistência oferece muitos benefícios, como flutuação, resistência omnidirecional, e pressão hidrostática para membros inferiores, mas também oferece muitas limitações. Ela não oferece sobracarregamento no retorno excêntrico (a não ser quando a flutuação de um objeto é usada, a qual é dependente d o e x e r c í c i o de direção e movimento). Por mais que na água o exercício pareça usar a amplitude de movimento completa, ele só tem resistência em uma direção e não oferece resistência quando o movimento para no final das amplitudes. As propriedades de resistência elástica Elasticidade é definida como a propriedade pela qual um material resiste e se recupera da deformação produzida pela força, ou seja, capacidade de retornar ao estado original após a deformação (tensão; deformação - ceder - retorno). O aumento da deformação leva ao aumento da produção de tensão, mas isto é somente um dos aspectos que influencia a resistência. É necessário adicionar o comprimento do braço do momento para analisar o que está acontecendo com a resistência durante a amplitude do movimento. Os exemplos de resistência elástica incluem as borrachas (theraband) e as molas (equipamentos de pilates). Tensão Como as borrachas possuem pouca massa, o valor delas é desconsiderado e as forças relacionadas à gravidade/inércia são virtualmente insignificantes (exceto para a massa do membro/corpo propriamente dito). Na Fig. 121 observa-se que: 1) Borracha mais leve. Conforme ela se estende, a resistência aumenta. 2) A quantidade de aumento da tensão diminui à medida que o diâmetro diminui. 3) Conforme chega ao seu limite de elasticidade, a resistência aumenta dramaticamente e de forma desproporcional. 4) O próximo nível de espessura da borracha, no mesmo comprimento, pode oferecer mais do que duas vezes a tensão da borracha anterior. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 165 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli Fig. 121. Este é um gráfico que identifica que o desenvolvimento da tensão não é linear durante o percurso da deformidade da borracha. 5) Usar duas unidades de borracha menor. Se a borracha maior era mais do que o dobro de tensão do que a média, duas unidades da menor podem proporcionar um aumento na resistência de forma mais adequada e, subsequentemente, podem oferecer um maior comprimento de borracha para ser trabalhado. Duas borrachas podem também permitir uma maior variação mecânica, a resultante não só oferece um perfil de resistência melhor, mas também aumenta potencialmente a possibilidade de incrementos menores para a progressão. Ajuste de tensão Ajustando o comprimento da borracha para ajustar a tensão: entendendo o “percentual de deformidade”. Além da utilização de borrachas mais grossas ou de duas unidades mais finas, há duas outras opções para alcançar a tensão inicial desejada: 1. Afastar-se do ponto de ancoragem até que a tensão desejada seja atingida; 2. Alcançar a mesma tensão sem se afastar do ponto de ancoragem, enrolando o comprimento indesejado na mão. Estes dois pontos criarão dois perfis de tensão muito diferentes na amplitude de movimento. Se a amplitude de movimento requer 30cm de deformação linear da borracha, isto é muito menos dramático para um comprimento inicial de 16cm do que será para um comprimento inicial de 6cm. No primeiro, a mudança na tensão será fracionada e bem distribuída durante a amplitude; no segundo, a tensão pode dobrar. Porque as borrachas não são um tipo de resistência baseada na massa, elas não sofrem influência da inércia, isto é, elas são livres de inércia. Sendo assim, são equipamentos nos quais o trabalho de aceleração e velocidade são mais apropriados. 166 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a a magnitude sozinha não determina a quantidade de resistência! A influência da engenharia das máquinas na magnitude da resistência A mecânica da resistência também envolve o estudo e análise dos equipamentos como máquinas de musculação, de pilates etc. Este é um d o e x e r c í c i o estudo extenso que demanda mais tempo e aprofundamento para sua abordagem. Por este motivo, neste momento vamos explorar somente dois fatores mecânicos relacionados às máquinas e que influenciam a resistência e são apropriados para este nível. As máquinas podem mudar a magnitude da resistência ao longo da amplitude de deslocamento linear do peso, por meio da simples mudança no braço do momento, o que afetará a distância relativa deslocada da pilha de peso [Fig. 122]. Fig. 122. Deslocamento linear do peso e o comprimento do braço do momento. O braço do momento da resistência altera durante a amplitude. Nesse exemplo, com o cabo se aproximando do eixo da articulação do joelho, o braço do momento da resistência diminui durante a extensão do joelho. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 167 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli CAMs CAMs foram criados para oferecer um grau estratégico de manipulação do momento da força. A maioria dos CAMs é utilizado para influenciar o momento da resistência, na tentativa de criar um perfil da resistência compatível com o perfil da potência. Quanto mais distante do eixo o cabo é movido, maior a resistência [Fig. 123]. Cada máquina projetada para uma finalidade diferente deve ter um CAM diferente. O desenvolvimento de um CAM perfeito é um desafio, porque há muitas considerações a serem feitas, como a fadiga, velocidade, força fisiológica e força estrutural. Um CAM da potência manipula o momento da potência/esforço ao invés do momento da resistência, mas trabalha para atingir o mesmo efeito de um CAM da resistência (isto é, pode deixar o movimento progressivamente mais difícil, diminuindo a vantagem mecânica da sua força de entrada ao longo da amplitude). Fig. 123. Este é um exemplo de CAM que são muitas vezes encontradas nas máquinas de musculação. Nesse exemplo, quanto mais o braço da máquina se move, mais afasta a linha da força do eixo, aumentando o braço do momento durante o trajeto. 168 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a d o e x e r c í c i o A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 169 Mecânica da Resistência: Posicionamento da Carga m e c â n i c a Ponto de Aplicação Posicionamento da carga, isto é, distância do ponto de aplicação da carga em relação ao eixo. O posicionamento da carga vai influenciar a resistência e o resultado final nas articulações, as forças articulares, através do momento para cada um dos eixos envolvidos e da inércia rotacional. Momento A alteração da posição (ponto de aplicação) de uma carga (seja uma força externa da resistência ou a alteração no CdM do membro via alteração na posição da articulação) em um membro irá alterar o comprimento da alavanca, que, por sua vez, irá alterar o braço do momento (exceto para os pontos na amplitude em que o momento é igual a zero). Porém, além do posicionamento da carga influenciar diretamente o momento da resistência, quando utilizamos a massa como resistência, o posicionamento tem efeitos potenciais sobre a magnitude como resultado da inércia. d o e x e r c í c i o Inércia rotacional É necessário examinarmos o efeito combinado do movimento rotatório com uma massa aplicada a uma certa distância do eixo (torque) e a massa. A lei da inércia é baseada no movimento linear, porém, quando aplicamos uma carga e esta se move em rotação, é necessário reexaminar a influência da inércia. A inércia rotacional é a inércia de um objeto em movimento em torno de um eixo e é influenciada pela distância da aplicação do objeto para o eixo. Inércia rotacional = massa x raio ao quadrado (I = mr2). Basicamente, isto significa que o peso não afeta a inércia tanto quanto a sua distância do eixo [Fig. 124]. Cada ponto na alavanca se move à mesma distância angular, medida em graus, e com a mesma velocidade angular. Porém, podemos ver claramente que cada ponto da alavanca se desloca a uma distância linear diferente a partir do seu ponto de partida (m1 se desloca em uma distância menor do que m2). Porque cada ponto (m1 e m2) se desloca a uma distância diferente dentro do mesmo período de tempo – quanto mais longe um ponto está do eixo, mais rapidamente está se movendo em relação ao ao espaço tridimensional. Fig. 124. Inércia rotacional Im1=mr2, porém Im2 = m(2r)2 = 4mr2 Então, a inércia de m2 é 4 vezes maior do que de m1. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 171 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli A inércia rotacional varia pelo quadrado do raio. Isso quer dizer que quando um objeto é posicionado mais distante do eixo, é necessário uma maior aceleração para movê-lo, e sua inércia impõe uma maior resistência que corresponde a essa mudança (aceleração) que foi significativa. Portanto, se a carga for mantida constante, mas for colocada duas vezes mais distante do eixo, a sua inércia será exponencialmente maior (quatro vezes maior). Assim, a força necessária para iniciar e/ou parar o peso será exponencialmente maior. Para fins de exercício, normalmente não conseguimos posicionar o mesmo peso ao dobro da distância da articulação, porque o aumento da resistência seria muito significativo (o dobro do comprimento do braço do momento). Um exemplo desta situação é o peso usado em um exercício como o supino e o peso usado em um exercício de crucifixo. Para suprir essa diferença, usamos cerca da metade do peso quando dobramos a distância. Isto altera a equação consideravelmente quando comparada com o exemplo acima, em que o mesmo peso foi utilizado em ambas as posições. Mas, mesmo com a metade do peso a inércia ainda é maior. Assim, quando o peso é cortado ao meio, mas a distância é dobrada, a nova inércia rotacional é o dobro da inércia original (isso não é tão ruim quanto as quatro vezes acima, mas ainda é o dobro da dificuldade para iniciar e parar) [Fig. 125]. Fig. 125. Im1 = mr2, porém I1/2m= ½m(2r)2 = 2mr2 Então, a inércia de ½m é 2 vezes a inércia de m. b) a) Fig. 126. Inércia rotacional O posicionamento da carga na posição a) é o dobro da distância do posicionamento da carga na posição b). O peso dentro do trajeto a) do crucifixo se desloca o dobro da distância que o peso dentro do trajeto b) do supino. 172 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia m e c â n i c a d o e x e r c í c i o Normalmente, durante um crucifixo com haltere, acomodamos as demandas desta maior força, acelerando a carga em um ritmo mais lento do que quando usamos uma carga proporcional posicionada mais próxima ao eixo, caso contrário, seria muito difícil mover a carga se a mesma força de aceleração fosse aplicada. A grande questão, no entanto, é quão rápido o haltere está se movendo quando chega a hora de parar, porque é nesta posição que a inércia rotacional mais influencia o exercício, deixando muito difícil parar o peso [Fig. 126]. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 173 Mecânica da Resistência: Centro de Massa m e c â n i c a A gravidade atua em todas as partes de um objeto e o seu ponto de aplicação no objeto como um todo é considerado o centro de massa daquele objeto, tornando-se o centro de gravidade (CDG). Então, na verdade, centro de massa e centro de gravidade são na essência os mesmos, mas o centro de massa existe mesmo quando a gravidade não está presente. O centro de massa (CdM) de um objeto é o centro de distribuição da sua massa e ele não é determinado pelo centro geométrico do objeto. A massa de um objeto é composta da massa de cada parte dele, assim cada segmento do corpo possui o seu CdM respectivo quando analisado independentemente. Porém, quando combinados, estes determinam o CdM do corpo todo. Existem princípios essenciais sobre o centro de massa de um objeto para aplicação nos exercícios. 1. O centro de massa do corpo na posição anatômica só é relevante quando o corpo está e x e r c í c i o na posição anatômica! Uma vez que a posição ou o cenário mecânico é alterado, o centro de massa indicado na posição anatômica já não será mais o mesmo. 2. O centro de massa pode ser alterado pelas mudanças na forma do objeto por meio da mudança de posicionamento do corpo no espaço. • Existem posições em que o CdM se localiza fora do corpo [Fig. 127]. 3. O CdM pode ser alterado pelo posicionamento de carga externa. • O percentual de massa adicionada comparada com a massa do corpo e o seu posicionamento vai influenciar o quanto o CdM é alterado. 4. O CdM do corpo e o CdM para o exercício. O CdM para um exercício é relativo somente à porção do corpo agindo como resistência em uma articulação específica (isto é, refere-se somente à massa sustentada ou suspendida por uma articulação específica). Fig. 127. a) O CDG do corpo humano se encontra aproximadamente no nível de S2, e anterior ao sacro. b) A localização do CDG da porção superior do tronco e dos segmentos dos membros inferiores. c) A reorganização dos segmentos produzem uma nova combinação do CDG. sacro CDG a) d o b) c) A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 175 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli O centro de massa para um exercício O CdM para um exercício é baseado na porção do corpo que está agindo como resistência. Exemplo: o CdM da porção que está na verdade sendo “levantada” durante um agachamento será mais alto do que quando em pé ou durante um agachamento completo porque os pés e a perna não seriam considerado resistência. Na realidade, o CdM sendo levantado é diferente para cada articulação, baseado na massa/forma que está acima daquela articulação. Adicionar carga externa vai alterar ainda mais a posição do CdM. Este fato é mais fácil de ser visualizado quando elevamos o braço e realizamos um agachamento. Se analisarmos a articulação do ombro quando elevamos o braço, o tronco e as pernas não fazem parte da resistência para a articulação do ombro. Assim também é com o pé durante um agachamento [Fig. 128]. 1. Para o agachamento, o CdM combinado que está sendo levantado não inclui o pé, e quando estamos analisando a musculatura do quadril e joelho não devemos incluir a perna. 2. Na realidade, a resistência para cada articulação é determinada somente pelo CdM acima dela. Fig. 128. Uma articulação, ou uma musculatura, só é responsável por levantar o que está acima dela. Quando analisamos a articulação do tornozelo e sua musculatura durante um agachamento, consideramos o CdM de todo o corpo acima desta articulação. Quando analisamos a articulação do joelho e do quadril e sua musculatura, consideramos o CdM do corpo acima dela. Quando analisamos a articulação do quadril e sua musculatura, consideramos o CdM acima dela. 176 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia bibliografia [1] ACSM. Guidelines for Exercise Testing and Prescription, 2005. [2] ANDERSON, Marcia K.; PARR, Gail P.; HALL, Susan. Sports Injury Management. 2ª ed. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins, 2000. [3] BAECHLE, Thomas R.; EARLE, Roger W. (editors) NSCA. Essentials of Strength and Conditioning. 2ª ed. Champaign: Human Kinetics, 2000. [4] BARHAM, Jerry N. Mechanical Kinesiology. Saint Louis: CV Mosby, 1978. [5] BEHM, David; ANDERSON Kenneth G. The Role of Instability with Resistance Training. NSCA Journal of Strength and Conditioning Research. 20(3): 716-722, 2006. [6] CLARK, Micheal; et al. Optimal Performance Training. 2ª ed. NASM Calabasas: Harper Perennial, 2004. [7] DAVIES, George J. Rehabilitation of the Surgical Knee. Ronkonkoma: Cypress, 1984. [8] EARLE Roger W.; BAECHLE, Thomas R. 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A influência da estrutura O que determina como uma dobradiça funciona é a sua forma/estrutura. Se escolhermos dobrá -la para o lado contrário de sua estrutura original corremos o risco de quebrá-la, no entanto, a nossa escolha não altera a sua função original. O que determina como um carro funciona é a estrutura dele. Um carro esportivo foi construído com materiais específicos que toleram alta velocidade em uma pista lisa, porém não toleram terreno íngreme. Se decidirmos dirigi-lo fora da estrada, em uma trilha off-road, por exemplo, isto não o torna uma camionete, ele sempre será um carro esportivo. O livro Joint Structure and Function de Norkin e Levangie afirma que: “Existe uma forte interrelação entre a estrutura e a função.” “Estrutura, quando predeterminada, determina a função.” Como a estrutura do corpo humano é predeterminada, isto é, não temos como escolher o formato dos nossos ossos nem das nossas articulações, é a estrutura que determina a função. Função NÃO é determinada aleatoriamente. No entanto, nossas escolhas influenciarão a estrutura. Elas poderão alterá-la tanto positiva quanto negativamente. d o e x e r c í c i o Mas o que é função? Segundo o Dicionário da Língua Portuguesa Michaelis, a palavra “função” possui dois significados. Função: 1. Ação de um órgão, aparelho ou máquina. 2. Atividade especial, serviço, encargo, cargo, emprego, missão. Esses são dois significados distintos para função, o primeiro refere-se ao funcionamento específico das partes, já o segundo refere-se ao funcionamento global, específico da atividade. A palavra “performance” significa desempenho, quer dizer, o quão bem ou mal algo funciona ou trabalha. Então, para identificar a função a qual nos referimos quando tratamos do sistema neuromusculoesquelético, vamos classificá-la como performance interna. Performance interna indica a função descrita no primeiro significado, a função básica neuromusculoesquelética, responsável pelo funcionamento da articulação a cada grau de movimento, garantindo sua integridade. Função é determinada pela estrutura, mas também pelos processos e suas interrelações com ela. O propósito de todos os sistemas corporais é de utilizar, apoiar e manter a estrutura. Logo, performance interna (função) é determinada pela: 1. Estrutura articular (função articular); 2. Estrutura muscular (função muscular); 3. Função sensorial; 4. Capacidade de gerar tensão (output, capacidade do músculo em gerar tensão em cada articulação). Exercícios criados para a otimização e desenvolvimento da performance interna têm o foco nos quatro fatores mencionados acima. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 185 PERFORMANCE INTERNA TEM? ESTADO OPERACIONAL DOS COMPONENTES INTERNOS Nível de função disponível (sem ser tendencioso) Não é especí co a uma atividade Função Neuromusculoesquelética Básica. Ex: ADM, estabilidade... são PE determinadas pela PI Visão interna da ADM. As partes essenciais que devem estar funcionando/operacional. In uenciam e determinam a ADM. QUANTIDADE NÍVEL DE FUNÇÃO ADCCD Função Muscular Pro pr ioc ep çã PR OP RIE DA DE S CONT RÁTEIS E RIM P OM POR C adequado dos muitos dispositivos sensoriais que nos dizem onde nosso corpo está e seu estado (incluindo, mas indo além da propriocepção). NT Tensão output por comprimento SISTÊMICA? LOCAL? IMEDIATA? TARDIA? n Se s o o e Dispositiv Funcionamento O s Po içõ eis v í es n A r ti culares Dispo Deve ter o su ciente em cada posição articular para controlar a ADMA, depois o su cinete para atender a qualquer demanda [versus força]. Função Sensorial PERCEPÇÃO ia i s ADPAD TOLERÂNCIA = LIMIAR DO STRESS so r Função Articular ten são + percepção + intenção NÍVEL DE COSTUME? PATOLÓGICA? Todos possuem «campos minados» prontos para serem detonados Fig. 129. c o n t i n u u m d o e x e r c í c i o A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 187 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli Performance externa indica a função descrita no segundo significado, aquela responsável pelo resultado final da integração de todas as partes internas somada a uma habilidade específica para uma tarefa ou atividade específica (como correr, levantar e sentar, trabalhar, praticar esporte). Exercícios criados para a otimização da performance externa otimizam e desenvolvem a habilidade de incorporar as partes dentro de uma atividade. A performance externa é dependente do bom funcionamento e da qualidade da performance interna. Quando algo pequeno dentro da performance interna não está funcionando bem, o resultado final na performance externa não será tão bom. Performance Externa [PE] Performance externa é a habilidade de realização de uma atividade específica. Ela é dependente do funcionamento das partes internas. A performance externa usa o que existe disponível nas partes internas para realizar a atividade, mas não desenvolve estas partes. usar Incorporar todas as partes da Performance Interna para o objetivo final: performance esportiva, vida diária etc. Fig. 130. Novamente, a palavra performance significa desempenho, quer dizer, quão bem ou mal algo funciona ou trabalha. Ela é geralmente associada ao “desempenho atlético” ou a uma performance artística. No desporto, medimos o sucesso da performance com números, como a pontuação, a distância, a velocidade, a precisão do alvo etc. e normalmente ele é alcançado sem levar em consideração as limitações internas e tolerâncias. Ele se concentra somente nos resultados externos. As atividades da vida diária também devem ser consideradas performance externa, porque devemos ser capazes de levantar e caminhar até o banheiro, por exemplo, sem nos preocuparmos em como chegaremos lá. Não devemos nos preocupar sobre o que está acontecendo internamente. Não devemos nos preocupar com o que está acontecendo no nosso joelho, devemos apenas nos preocupar com o objetivo externo e alcançá-lo. Deveríamos ser capazes de chegar ao carro sem nos preocupar com o que está acontecendo dentro de nós. Estas atividades do dia a dia e os esportes são realizados a partir de uma habilidade específica de incorporar muitas partes existentes com todas as qualidades que elas possuem para a realização da tarefa. Normalmente, não prestamos atenção nas partes internas a não ser quando perdemos integridade em alguma delas e elas então precisam de atenção. As pessoas que perderam a capacidade de mover uma articulação valorizam tudo que é necessário para a recuperação desta articulação. Quanto mais se perde e mais tempo se leva para recuperar, mais foco é colocado nas partes internas, mais evidente se torna o potencial de otimizá-las e de como usar o “interno” como diretriz para a prescrição do exercício. Quando o profissional tem o objetivo de otimizar a performance externa, ele precisa entender que otimizar primeiramente as partes específicas que serão utilizadas na tarefa é fundamental. Por isso, faz-se necessário entender quais partes são estas, pois compõem a performance interna. A marcha é um exemplo de performance externa, pois é uma tarefa global específica. A boa execução da marcha é dependente do bom funcionamento de toda a estrutura passiva e ativa dos membros inferiores e do tronco. Quando existe alguma disfunção na marcha, 188 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia c o n t i n u u m nós otimizamos as partes antes de otimizar a atividade. Esse raciocínio lógico deve ser mantido para toda intervenção utilizando exercícios não somente para a reabilitação, mas também para o desenvolvimento e conservação do sistema neuromusculoesquelético. Performance INTerna [PI] A performance interna é composta do que o cliente-paciente apresenta [TEM] disponível para ser trabalhado, é a matéria-prima que nos é apresentada. Só podemos trabalhar com aquilo que o cliente-paciente apresenta dentro da sua função neuromusculoesquelética e nossa intenção é otimizar aquilo que ele [TEM]. Performance interna é o estado operacional (função) e a tolerância dos componentes internos necessários para orquestrar o movimento bruto. São as partes. É tudo o que um indivíduo [TEM] disponível para gerar a performance externa. O que significa [TER]? [TER] é como identificamos a verdadeira função. Ela envolve a função articular, a função muscular e a função sensorial. Se, hipoteticamente, a articulação do joelho sofrer uma fusão e não tiver mais movimento, imediatamente a musculatura em torno do joelho vai começar a atrofiar porque não existe mais motivo para estar presente gastando energia em uma articulação imóvel. Músculos controlam articulações. Então, para os músculos serem conservados, são necessárias articulações que funcionem. ADM não acontece sem articulações que se movam ou músculos que funcionem. Fig. 131. d o e x e r c í c i o O estudo da função articular inicia-se com o aprofundamento do conceito sobre a amplitude de movimento. Se analisarmos internamente a ADM, veremos que ela é indicada por graus de movimento e cada grau é uma posição estática, então ADM é, na verdade, Amplitude de Posições Articulares Disponíveis [ADPAD]. Quando medimos a ADM, estamos de fato medindo duas posições articulares e chamando-as de amplitude. Se a posição final é alterada, a amplitude total é alterada. Quando estudamos em um livro que certa articulação possui 180 graus de ADM, isso quer dizer que esta articulação deveria apresentar 180 posições estáticas. Entretanto, a maioria dos indivíduos não se encaixa nos padrões indicados nos livros e precisamos identificar quais são as posições articulares disponíveis de cada cliente-paciente individualmente. Fig. 132. A função muscular é, na verdade, a contração muscular. Precisamos de contração para levar a articulação de uma posição para outra. Internamente, a função muscular indica a Amplitude de Comprimento Contrátil Disponível [ADCCD]. Isso quer dizer que, assim como precisamos identificar as posições articulares que um indivíduo tem disponível, o mesmo deve ser feito com a contração muscular. É necessária a identificação das posições dentro da amplitude em que o tecido contrátil tem capacidade de gerar tensão. Cada posição articular indica certo comprimento do tecido contrátil. No entanto, quando existe alguma patologia com comprometimento neurológico ou qualquer tipo de lesão que prejudica o sistema muscular e, devido a isso, a articulação exibe mais posições disponíveis do que existe de A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 189 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli comprimento contrátil, ela não se enquadra nesta situação, porque a articulação alcança amplitudes que não pode controlar ativamente. consegue mover uma articulação, isso não significa necessariamente que não exista capacidade de tensão naquela posição, pode ser que exista a contração, mas não suficiente para vencer aquela demanda, aquela resistência. Então esse processo é, na verdade, um Continuum. Fig. 133. Tensão Fig. 134. por comprimento Função Sensorial. É necessário que a função sensorial esteja intacta para que exista contração e movimento. A função sensorial vai além da propriocepção. A propriocepção é uma parte importante, mas não é a única. Por definição, propriocepção é a percepção (localização) das posições estáticas, do movimento dos membros e do corpo, independentemente da visão. Porém, nós não possuímos um GPS interno, não existe um sensor único de posição. A identificação da posição vem pela combinação das informações do comprimento muscular, da tensão muscular, da pressão articular e dos mecanorreceptores nas articulações e na pele. Essas são as três partes vitais para podermos iniciar o processo de otimização da função ou da performance interna. É preciso ter articulações que possam se mover de modo que seja possível fazer ajustes. É preciso ter sensação e informações sensoriais do estado da articulação. É preciso ter contrações, não somente contrações, mas contrações que tenham capacidade de tensão suficiente para tolerar a demanda exigida em cada posição articular. A capacidade de tensão pode ser mínima e evoluir para uma contração sólida para a manutenção daquela posição articular, depois evoluir para ter capacidade de tensão suficiente para se mover e depois se mover contra a resistência. Se o cliente não capacidade de produção de tensão [HP] Capacidade de Tensão por comprimento contrátil. Precisamos de um pouco de contração sólida para iniciar um trabalho. Depois, precisamos otimizar a tensão existente. O desenvolvimento da Capacidade de Tensão é onde devemos desprender nosso maior tempo dentro da prescrição de exercícios. Trabalhar na melhora da capacidade de tensão é como trabalhar no desempenho do motor do carro para deixá-lo mais potente para então melhorar o seu desempenho na corrida. Então, resumindo... Performance Interna (PI) é o estado operacional dos componentes internos. [TER] = são as partes que precisamos [TER] funcionando e disponíveis para a realização de uma tarefa ou esporte específico. É a função ou o nível de função. Ela não é específica da atividade, é a função neuromusculoesquelética básica. É a visão interna da ADM, são as partes essenciais que precisam estar funcionando e que influenciam a ADM. [TER] 190 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia Função Articular + Função Muscular + Função Sensorial + Capacidade de Tensão c o n t i n u u m d o e x e r c í c i o A prescrição do exercício (aplicação de força/ estímulo com objetivo de gerar uma adaptação) tem como principal objetivo influenciar positivamente a performance interna e a performance externa, porém, para isso, precisamos entender incicialmente onde a performance interna do cliente-paciente se encontra dentro do Continuum da função para que possamos criar estímulos apropriados e gerar adaptações positivas. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 191 O Continuum Funcional c o n t i n u u m D a “função/performance interna” para a “performance externa”. O Continuum Funcional não está relacionado com exercícios chamados de “funcionais”. Na verdade, não está relacionado com exercício algum. Ele é uma organização das análises da função articular, função muscular, função sensorial e da capacidade de tensão para que o profissional tenha subsídios para criar exercícios apropriados que otimizem a função/Performance Interna para depois utilizar esta Performance Interna na realização de alguma atividade específica (Performance Externa). O Continuum Funcional representa o vasto espectro de graus ou níveis em que os componentes neuromusculoesqueléticos mais essenciais estão operando. A função, neste cenário, é baseada e definida pela integridade e limitações das funções articular, muscular e sensorial. A função atual determina o quão adequado é o exercício e a atividade atual. PERFORMANCE INTERNA Dentro do Continuum Funcional precisamos verificar que a Performance Interna é composta do que o cliente-paciente apresenta [TEM] disponível para ser trabalhado, isto é, a matéria-prima. Só podemos trabalhar com aquilo que o cliente-paciente apresenta dentro da sua função e nossa intenção, como profissionais, é aplicar o exercício como modalidade de intervenção para otimizar aquilo que ele [TEM]. Se o cliente-paciente não tem 180 graus de flexão de ombro disponível, por exemplo, ele só tem 160 graus, não podemos prescrever um exercício que exija 180 graus. Se você não tem algo, como você pode desafiá-lo? Quando o assunto é expandir e melhorar o que o corpo tolera e pode fazer, precisamos primeiro perguntar e continuar perguntando durante todo o tempo do d o e x e r c í c i o exercício: o que a estrutura e os processos têm a nos dizer sobre isso? Normalmente, aparecem sinais na sensação que o cliente-paciente deve nos informar muito antes de existirem problemas, porém eles passam despercebidos pela maioria dos profissionais que prescrevem exercícios. Então, criar um exercício exige primeiramente encontrar a “oportunidade” atualmente disponível do indivíduo dentro do Continuum Funcional, ou seja, o que o indivíduo [TEM] de função disponível. Depois, encontrar onde, dentro de cada componente do Continuum Funcional, o cliente-paciente pode ser desafiado. E a maioria desses componentes são Continuuns entre si e a progressão de cada um deve ser adequada, sempre através do controle. Performance Interna [TEM] função neuromusculoesquelética básica + capacidade de tensão Fig. 135. Função Articular Atual Amplitude de Posições Articulares Disponíveis [ADPAD]. Estas posições são influenciadas pela estrutura articular e por suas limitações, que podem ser normais ou anormais. Qualquer interrupção na estrutura normal vai alterar a disponibilidade de posições articulares que poderemos trabalhar. A amplitude de posições disponíveis é definida pela oportunidade disponível a ser trabalhada. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 193 CONTINUUM FUNCIONAL DA FUNÇÃO DA PERFORMANCE INTERNA PARA A FUNÇÃO DA PERFORMANCE EXTERNA O QUE ESTÁ FUNCIONANDO? RESULTADO FINAL PERFORMANCE INTERNA PERFORMANCE EXTERNA TEM? USAR? A ORQUESTRAÇÃO DA CONTRAÇÃO DISPONÍVEL O CONTINUUM DA CONTRAÇÃO FUNÇÃO ATUAL ADPAD ADCCD Estrutura? Normal? Anormal? C« »M« »L Propriedades SENSORIAL TENSÃO ATUAL uniarticular < ADMA Tensão < Peso membro no PR ADMA Tensão = Peso membro no PR > ADMA Tensão > Peso membro no PR Resultado Final FOCO EXTERNO JUST DO IT Compensação? Habilidade Amplitude Controle ADM in uencia Fig. 136. c o n t i n u u m d o e x e r c í c i o A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 1 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli Estudamos no capítulo sobre mecânica articular que a ADM é composta de posições, então 90 graus de amplitude de movimento significam 90 posições estáticas. Por exemplo, se a articulação do ombro apresenta 90 graus de abdução sem nenhuma restrição, significa que, do ponto de vista articular, podemos usar estas 90 posições dentro do exercício. Porém, se existe alguma restrição na posição articular e esta se apresenta anormal, não temos a possibilidade de desafiá-la nestas posições. Capacidade de Tensão Contrátil É o exame da quantidade de tensão contrátil que um músculo é capaz de gerar dentro de um perfil da resistência específico. É diferente de força muscular. Nosso objetivo, quando estimulamos um tecido dentro da performance interna, é melhorar a capacidade do músculo em gerar tensão (HP) independentemente da carga. Quanto mais otimizamos a capacidade de tensão, mais um músculo é capaz de gerar força. Fig. 138. Função Muscular Atual Amplitude de Comprimento Contrátil Disponível [ADCCD]. São as propriedades contráteis do músculo em cada comprimento: curto, médio e longo. Estas propriedades são influenciadas por mecanismos fisiológicos, neurológicos e mecânicos. A contração muscular pode estar presente em algumas posições, porém falha ou ainda inexistente em outras. O exame das propriedades contráteis do músculo deve ser feito inicialmente dentro de um cenário mecânico em que a resistência seja a mínima possível. Uma vez que a contração se mostre presente, podemos iniciar o processo de aumento progressivo e adequado de mais resistência para examinar a qualidade e a quantidade desta contração. TENSÃO/OUTPUT Capacidade de Tensão Contrátil FORÇA MUSCULAR [Capacidade de Tensão Contrátil] + [Habilidade] sem incluir “roubar” medimos a força muscular através de uma carga específica + habilidade de levantá-la. FORÇA FUNCIONAL [Capacidade de Tensão Contrátil] + [Habilidade] incluindo “roubar” tempo do arremesso Fig. 137. Não conseguimos medir a capacidade de tensão máxima real de um músculo, porque, para isso, seria necessário tirar o músculo do corpo e estimular 196 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia c o n t i n u u m o tecido eletricamente para testar a sua capacidade individual de gerar tensão independentemente de levantar uma carga. Fazer isso num organismo vivo é quase impossível. Capacidade de tensão é diferente de força. Para medirmos força, é necessário envolver a habilidade de levantar esta carga, então, força é a capacidade de tensão contrátil + a habilidade de levantar a carga sem incluir nenhum mecanismo de eficiência mecânica em que o cérebro tenta diminuir o desafio, o que chamamos de “roubar”. Hoje escutamos muito outro conceito de força, a chamada força funcional, que quer dizer o quanto de força somos capazes de produzir dentro de um sistema integrado de múltiplas articulações, em que todas as articulações têm um mesmo objetivo de fazer uma atividade especial, como: empurrar um pneu ou sled, puxar, saltar etc. “Força funcional”, do ponto de vista mecânico, é o resultado da capacidade de tensão individual de cada articulação (e de devidos grupos musculares) somada à habilidade de diminuir a demanda (isto quer dizer: distribuir a resistência entre o maior número de grupos musculares ou anular a resistência por meio da inércia para exigir o menor esforço possível e alcançar o maior resultado possível), logo, força funcional é a habilidade da eficiência em “roubar”. Antes de prescrevermos um exercício, precisamos examinar a capacidade de geração de tensão atualmente disponível em um músculo dentro das posições exigidas. Existe um Continuum da tensão que se apresenta da seguinte maneira: d o e x e r c í c i o Tensão inferior ao peso do membro dentro de um perfil de resistência específico. Ou seja, o músculo não [TEM] tensão contrátil, output, suficiente para superar o peso do membro contra a gravidade. Não é capaz de produzir tensão para realizar a Amplitude de Movimento Ativa (ADMA). Neste momento, será necessária uma intervenção dentro da Amplitude de Movimento Passiva (ADMP) ou da Amplitude de Movimento Ativa Assistida (ADMAA). Fig. 140. Tensão equivalente ao peso do membro dentro de um perfil de resistência específico. [TEM] capacidade de tensão suficiente para igualar o peso do membro contra a gravidade. Fig. 141. Fig. 139. Tensão superior ao peso do membro dentro de um perfil de resistência específico. [TEM] capacidade de tensão suficiente para superar o peso do membro contra a gravidade. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 197 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli Performance Externa [USAR?]: é o resultado final de todos os componentes da PI funcionando juntos para realizar uma atividade específica. Fig. 142. Foco Externo: examinar como a utilização de todas as partes [que já TEM] está funcionando para atingir um objetivo externo. Exemplo: analisa um arremesso ou o gesto motor de um esporte específico para determinar o que está faltando e onde está a oportunidade de influenciar positivamente. “Just do it”: examinar como a utilização de todas as partes [que já TEM] está participando das atividades da vida diária sem a necessidade de prestar atenção no que está funcionando. Por exemplo: analisa a marcha para verificar como o resultado global se apresenta para detectar o que está faltando, depois influencia o tecido específico que está precisando de atenção para que a marcha melhore. A partir da detecção do que está faltando, utilizar uma intervenção local e depois repetir a atividade global para verificar se houve melhoria. Cada cliente-paciente encontra-se em algum ponto dentro deste Continuum Funcional, isto é, Continuum da função, e o nosso objetivo inicial como fisioterapeutas dentro da prescrição do exercício para a saúde é examinar não somente onde ele se encontra dentro do Continuum Funcional, mas também em que estado cada articulação se encontra dentro do mesmo Continuum. É comum diferentes articulações se encontrarem em estágios diferentes dentro do Continuum Funcional e, para tanto, precisam ser consideradas quando o profissional vai escolher ou criar um exercício. Depois, é preciso identificar o que está faltando e o que é necessário para, no próximo passo, poder criar o melhor exercício com o objetivo de otimizar o que está faltando e, por último, verificar como as partes atuam juntas. Dentro do Continuum Funcional, não usamos o termo avaliação, mas sim exame, porque normalmente uma avaliação é realizada uma única vez ou dentro de períodos de tempo predeterminados para verificar a evolução do cliente. No processo do Continuum Funcional, o exame é constante e “orgânico”. Cada repetição necessita atenção e observação do profissional para que este possa traduzir o que está enxergando externamente para a realidade do que está acontecendo internamente. Após examinar onde o cliente-paciente se encontra no Continuum Funcional, o próximo estágio é desenvolver exercícios específicos para criar estímulos que venham a desenvolver adaptações positivas para: Restaurar – as posições articulares (por meio da otimização da contração muscular através da melhora da sensibilidade e da qualidade desta contração); é a função. Desenvolver – a quantidade da contração muscular (para otimizar o controle articular em toda a amplitude disponível frente a diferentes desafios); é a função. Conservar – a longevidade da função articular, da função neuromusculoesquelética; é a função. Tradicionalmente, a fisioterapia prescreve exercícios para clientes-pacientes que se encontram no início do Continuum Funcional em que a ausência de alguma parte da função está evidente. Após esta fase da restauração da função, muitas vezes o 198 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia c o n t i n u u m cliente-paciente recebe alta da fisioterapia e retorna à sua rotina de exercícios na academia ou reinicia a prática de exercícios que normalmente é realizada dentro da performance externa. Porém, entre um estágio e outro existe um espaço enorme dentro do Continuum Funcional que precisa ser trabalhado e somente com exercícios criados dentro da performance interna vamos alcançar este objetivo. É somente com foco na performance interna que temos a oportunidade de progredir a função de cada articulação adequadamente e continuadamente ao máximo do que cada indivíduo é capaz. Então, eliminamos este espaço que existe entre o final do tratamento fisioterápico e as atividades da vida diária. Neste modelo de trabalho, o fisioterapeuta tem a oportunidade de continuar a prescrever exercícios por muitos anos para o mesmo cliente-paciente, pois o foco na performance interna possibilita que ele sempre esteja trabalhando dentro do desenvolvimento e conservação da função sempre com o foco interno. O Continuum Funcional A intervenção da Fisioterapia para restauração, desenvolvimento e conservação da função exige que o profissional se utilize de critérios específicos para a criação de exercícios customizados. Considere as perguntas: um exercício é funcional se excede a capacidade atual de um indivíduo? É funcional se não for controlado ou excede a capacidade do indivíduo de controlar o exercício? Uma bola torna algo funcional automaticamente? Nenhum aparato que adiciona instabilidade, nenhum exercício integrado trará algum resultado positivo se for muito difícil ou avançado para o indivíduo. Também não trará resultado se o exercício não for importante para seu objetivo ou se o mesmo não for controlado. Em primeiro lugar, função ideal tem como primícia dominar todas as partes do sistema neuromusculoesquelético envolvidas. Significa o indivíduo ter controle de tudo que estiver disponível através de d o e x e r c í c i o sua estrutura e de suas capacidades atuais. É também ter o controle de todas as possibilidades para as quais esta estrutura pode ser desafiada. E funcional deve significar que a atividade está “dentro da capacidade funcional do indivíduo. Novamente, a capacidade funcional não significa “capacidade de tensão” em termos de quantidade de força, mas sim de qualidade da produção de força. Então, para que qualquer exercício seja classificado como funcional, ele primeiro deve levar em consideração a capacidade atual de alguém e, depois, deve ser apropriado para o objetivo escolhido. Como você reabilitaria um indivíduo com evidência da marcha em Trendeleburg? Você o faria correr? Não! Em níveis menos visíveis, as articulações de indivíduos aparentemente saudáveis normalmente possuem pequenas disfunções. Se estas disfunções não forem abordadas especificamente antes de ser exigido um trabalho dentro de um sistema mais avançado de desafios, estaremos fazendo o mesmo que colocar alguém com a marcha em Trendeleburg para correr antes de abordar os fatores que estão influenciando a marcha. Não ser capaz de mover um membro dentro de um plano ou não ser capaz de mover um membro com controle durante um exercício são situações que estão próximas do mesmo extremo do Continuum do controle. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 199 O mundo do exercício e a performance externa c o n t i n u u m P erformance externa é a habilidade de realização de uma atividade específica. Ela é dependente do funcionamento das partes internas. A performance externa usa o que existe disponível nas partes internas para realizar a atividade, mas não desenvolve estas partes. usar Incorporar todas as partes da Performance Interna para o objetivo final: performance esportiva, vida diária etc. Fig. 143. Como mencionado nos capítulos anteriores, a palavra performance significa desempenho, quer dizer o quão bem ou mal algo funciona ou trabalha, d o e x e r c í c i o ela é geralmente associada ao “desempenho atlético” ou a uma performance artística. No desporto, medimos o sucesso da performance com números, como a pontuação, a distância, a velocidade, a precisão do alvo etc. e normalmente ele é alcançado sem levar em consideração as limitações internas e tolerâncias. Ele se concentra somente nos resultados externos. Porém, não é somente no desporto que exercícios se concentram em resultados externos. Muitas vezes, prescrevemos exercícios para a saúde da mesma maneira. No mundo do esporte, em uma corrida, por exemplo, se dois atletas estão perto da linha de chegada e um deles lesionar seus isquiotibiais, mas a sua mão cruzar a linha de chegada ao mesmo tempo em que o outro atleta, de quem você acha que as pessoas vão se lembrar? Daquele que lesionou. Qual se tornará herói? Quanto maior o sacrifício do corpo, mais o atleta será lembrado. No esporte, sacrificar o corpo para obter melhores números é normalmente glorificado e honrado. Fig. 144. No mundo dos esportes, o atleta que mais se sacrifica é o mais lembrado. O esporte sacrifica o corpo pelo objetivo. Porém, a prescrição clínica do exercício para a saúde sacrifica a atividade pelo corpo. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 201 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli Na verdade, os atletas têm por natureza um nível alto de tolerância física, muito maior do que a população em geral. Um dos fatores que transforma uma pessoa comum em um grande atleta é a sua tolerância física. Se a população com que você trabalha envolve atletas, você sabe do que estamos falando. Caso contrário, se você trabalha com pessoas que procuram saúde, o sacrifício do corpo não deve acontecer. 1. Performance externa: como a medimos e monitoramos. Quando os fatores e variáveis do exercício são medidos e monitorados externamente, os chamamos de exercícios de performance externa. Isso não é exclusivo dos esportes, independentemente do nome do exercício e de que profissional o prescreve. Sempre que as variáveis do exercício forem medidas externamente, devemos identificá-lo como performance externa. Então, o primeiro fator a ser considerado em exercícios para a performance externa é a maneira como são monitorados e medidos. Monitoramento Externo # séries || # repetições || # km || # minutos Quando prescrevemos 3 séries de 10 repetições de um exercício com certa quantidade de peso, esperando que o cliente-paciente as realize, independentemente de como cada repetição será realizada, o exercício é considerado de performance externa, pois o foco está no programa e não na estrutura. A amplitude do movimento (ADM) é um exemplo de que no mundo do exercício para a saúde também medimos fatores internos utilizando e visualizando medidas externas. Quando usamos um goniômetro para medir a flexão do ombro que se deslocou 60 graus, se não prestarmos atenção no movimento escapular nem no movimento da coluna e se não percebermos quais são as partes que estão se afastando ou se aproximando, nem sempre teremos certeza que internamente os 60 graus vieram da articulação glenoumeral. Estamos realmente medindo algo interno com medidas externas. 2. Performance externa e o “tipo” de atenção/foco: Exercícios de performance externa envolvem a atenção do cliente-paciente durante a execução do exercício de duas maneiras. Uma em que a atenção está focada na habilidade da realização do gesto motor para a precisão do movimento, como, por exemplo, acertar a cesta de basquete, acertar o alvo ou rebater a bola com o taco. E outra em que a atenção está focada na “distração”, ou melhor, sem foco algum no exercício, os quais serão identificados aqui como “Just do It™” (slogan da Nike). a. Foco na distração/sem foco: por exemplo, a participação dos pacientes na clínica ou alunos da academia durante a execução dos exercícios quando estão conversando durante a série e sem prestar a atenção no que está acontecendo durante cada repetição; b. Foco em um objeto/foco externo: por exemplo, um jogador de tênis ou beisebol rebatendo a bola. Pense sobre isso, por que as salas de treinamento aeróbico, onde as esteiras e bicicletas se encontram, possuem um cinema ou quase um home theater? Por que antes das televisões havia suportes para revistas e livros? Para distrair os clientes daquilo que estão fazendo. Porém, se o cliente está distraído, ele não consegue prestar atenção em todos os sinais enviados durante a execução dos exercícios, os quais são muito relevantes porque carregam a única informação realmente importante de como ele está realizando o exercício. Estes sinais são necessários para indicar quando ele deve parar. Se o cliente-paciente não 202 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia c o n t i n u u m d o e x e r c í c i o está prestando atenção no que está acontecendo em sua estrutura durante a realização de um exercício, o profissional perde a oportunidade de interferir nos processos a partir das referências indicadas pelo paciente. Fig. 145. Na maneira de se exercitar com o foco na distração, ou sem foco, com a mentalidade “Just do It”, o cliente está distraído, ele não está prestando atenção no que está acontecendo em seu corpo porque não gosta de fazer aquilo ou acha tedioso, ele estará tentando ignorar qualquer sinal do seu corpo. As pessoas não apenas fazem exercícios aeróbicos desta forma porque é longo, mas também levantam peso desta maneira, conversando sobre o cabelereiro, a festa, o novo namorado etc. Essa distração, muitas vezes, é iniciada e incentivada pelo profissional e depois da conversa a pergunta é sempre a mesma: “Já acabou?” Essa maneira de executar o exercício indica que eles estão “apenas fazendo” ou “Just do It!”. Como podemos esperar um bom resultado se algo é realizado dessa maneira? Fig. 146. Exercício com foco externo e sem atenção. Na verdade, com foco na distração. Sempre que realizamos exercícios vendo televisão, lendo revista ou conversando o tempo todo, não estamos prestando atenção aos sinais internos (e importantes) do nosso corpo. Agora, vamos explorar a outra maneira de realizar exercícios dentro da performance externa, isto é, quando a atenção e o foco estão em um objeto externo e, normalmente, está associada à aprendizagem de uma habilidade. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 203 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli Fig. 147. Para que isto ocorra, é importante prestar atenção no objeto externo, por exemplo, atenção na bola e na cesta no caso do basquete, na raquete e na bolinha no caso do tênis, no taco e na bola no caso do beisebol. É isso que precisa acontecer quando treinamos para um esporte, a atenção precisa estar no esporte e na sua execução para atingir melhores resultados. Porém, para melhorar o desempenho geral no esporte não podemos esquecer que também é essencial haver melhoria da performance interna. Você consegue compreender a distinção entre os dois tipos de atenção/foco? Ambos são externos. Porém, um ignora tudo o que está acontecendo dentro do corpo, quando a preocupação é somente cumprir com o que foi predeterminado, como, por exemplo, realizar uma tarefa/exercício em 20 minutos. E o outro é definitivamente consciente e focada, porém nos fatores externos. Nenhuma das maneiras é ruim! O problema é quando a nossa única maneira de execução de exercício é pela performance externa, independentemente do tipo de atenção envolvida. A essência dos exercícios dentro da performance externa é cumprir o programa. As pessoas estão tentando alcançar resultados, como mover o peso e ultrapassar as linhas de chegada, a qualquer custo, não se importando com quais músculos estão realizando a tarefa nem se está havendo algum sacrifício durante o processo. Elas não se preocupam que poderia ser Fig. 148. Exercício com foco externo, no objeto. Quando o foco está em um objeto externo, o exercício ou a prática é sempre focado e utiliza muita concentração. A performance externa utiliza tudo que tem em sua função para alcançar o objetivo, que exige muita habilidade. 204 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia c o n t i n u u m as propriedades da inércia movendo o peso em vez de uma musculatura específica ou que poderia ser a panturrilha movendo o peso na mão. Elas estão preocupadas com a execução externa, naquilo que está se movendo e o foco está no objeto. O monitoramento e o objetivo são sempre externos. Se o objetivo do exercício é apenas a quantidade de peso ou o quanto ele está se movendo, realmente não importa o que está acontecendo dentro de quem está movendo-o, também não importa como se está alcançando o objetivo, porém, se o objetivo for gerar adaptação em um tecido específico, este cenário precisa mudar. PE = OBJETIVO FINAL para performance esportiva, vida diária etc. Porém, toda Performance Externa é construída e dependente do estado atual das partes internas d o e x e r c í c i o indicasse que está se deteriorando. O cliente-paciente fica cansado e muitas vezes dores aparecem, mas ele não para até que complete o que o profissional prescreveu. Exercício é para ser o remédio! Então o slogan “Esporte é saúde” não está correto, porque, se é necessária uma especialidade inteira da medicina só para os esportistas, a Medicina Desportiva, isso é sinal de que o esporte pode machucar, e a incoerência persiste. Atualmente vivemos a mesma contradição dentro do mundo comercial do exercício porque este utiliza os mesmos modelos e parâmetros do esporte, porém direcionados para um público que busca saúde. Dentro do novo modelo de prescrição de exercício que propomos, o exercício deve ser o remédio. Exercício tem o objetivo de restaurar, desenvolver e conservar a saúde, e não deve ser baseado nas mesmas diretrizes dos esportes, assim como sua execução não deve ter um foco externo. Como mencionado anteriormente, o objetivo final de qualquer forma de exercício é a melhora da performance externa. Devemos ser capazes de realizar as atividades da vida diária sem nos preocuparmos com o que está acontecendo dentro de nós. É por esta razão que, durante a sessão de exercício, o foco deve estar nas partes internas, para que possamos ignorá-las e não precisemos nos preocupar com elas quando precisarmos usá-las no dia a dia com o foco externo. Para alcançar isso, em algum momento, teremos que nos concentrar apenas na parte interna. O esporte como exercício é uma incoerência. Talvez pudéssemos afirmar que esporte não é exercício, mas isso seria incorreto, porque certamente é uma forma de exercício. Se o exercício existe para melhorar o corpo e para melhorar a estrutura, um atleta jamais deveria continuar quando o corpo A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 205 PERFORMANCE EXTERNA Monit oram en to Ex USA? FOCO NO RESULTADO EXTERNO Incorporar todas as partes da PI para o objetivo nal: performance esportiva, vida diária etc. # repetições, # km, # , s e i r min # sé : uto no s r te ATENÇÃO Foco no Objeto Distração Foco no alvo Foco na bola, taco ou raquete Foco no tempo/repetições O corpo pode ser o objeto JUST DO IT Excecução sem interesse, apenas empurre/apenas mova, focada na distração PE = OBJETIVO FINAL para performance esportiva, vida diária etc. Porém, toda Performance Externa é construída e dependente do estado atual das partes internas Fig. 149. c o n t i n u u m Exercício deve ser o remédio. É importante entender algumas destas contradições que existem no mundo dos exercícios para você conseguir fazer a mudança de pensamento necessária para entender este novo conceito. Perceba que o objetivo do futebol não é melhorar o corpo, mas é a pontuação. A meta do tênis não é a de melhorar o corpo, mas é de fazer mais pontos para ganhar o jogo. O futebol e o basquete são os esportes campeões de lesões de LCA (ligamento cruzado anterior) e reabilita-se o LCA para que os atletas voltem a jogar, mesmo sabendo que correrão o risco de se lesionar novamente. Porém, agora existe um recente método popular de prescrição de exercícios que afirma que os exercícios realizados em uma cadeira extensora fazem mal para o LCA e, por consequência, não recomenda o uso desta máquina, mas, no entanto, recomenda a prática do futebol. E a incoerência permanece. O esporte sacrifica o corpo pela atividade e há valor nisso, inclusive com a obtenção de troféus e d o e x e r c í c i o medalhas. Mas o exercício para a saúde sacrifica a atividade em favor do corpo. É uma mudança completa de objetivo, uma mudança de 180 graus. Quando os exercícios para a saúde são realizados com o objetivo de mover o peso ou mover o cabo do pilates ou mover a borracha sem prestar atenção em como está movendo este peso/cabo/borracha e o cliente-paciente precisa terminar o número prescrito no programa independentemente de como o exercício é realizado, ele se aproxima do esporte e não mais da saúde. Exercício deve ser estratégico para ter um valor ótimo e adequado. Existe um número surpreendente de formas de exercícios que funcionam e que parecem trazer resultados, mas isso não significa necessariamente que sejam os mais eficientes ou os mais eficazes possíveis. Vamos fazer duas analogias sobre eficiência que se aplica diretamente ao mundo do exercício. Na primeira vamos usar o martelo. É necessário utilizar a ferramenta correta para cada tipo de objetivo [Fig. 150]. O martelo, por exemplo, não é utilizado para apertar parafuso, mas para colocar prego. Fig. 150. Como profissionais, precisamos saber o que cada ferramenta que utilizamos pode nos oferecer, para usarmos a ferramenta correta para atingir o objetivo. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 207 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli Dependendo da habilidade do profissional que usa o martelo, o prego poderá ser colocado com, digamos, duas marteladas e sem estragar a superfície sobre a qual será pregado. Pode também ser pregado com muitas marteladas (umas 75, por exemplo) e, provavelmente, grande parte delas é desperdiçada por errarem a martelada trazendo danos à superfície. E, ainda, o prego pode ter levado uma martelada só e ter sido entortado [Fig. 151], sendo necessário arrumá-lo antes de pregá-lo na superfície. Ambas as maneiras deram resultado? Sim, o prego foi colocado com sucesso em todos os casos. Quando comparamos o profissional que colocou o prego com duas marteladas e sem machucar a superfície nem entortar o prego com o profissional que precisou de 75 marteladas, qual foi mais eficiente [Fig. 152]? Qual foi mais habilidoso? Qual foi realmente profissional? Qual deles você quer ser? Fig. 151. Eficiência e eficácia na prescrição do exercício. Profissionais que entendem da mecânica do exercício e dominam o processo de raciocínio crítico do Continuum do exercício para a tomada de decisões alcançam resultados mais rapidamente, com menos desperdício e com o menor custo possível. O mundo do exercício vive em torno das “75” marteladas. Emagreceu? Sim, mas demorou dois anos e quatro “ites” (epicondilite, bursite etc.). O exercício funcionou? Sim, mas depois de “75” repetições, porque nenhuma delas tinha um perfil de resistência compatível com o da potência, nenhuma chegou até o comprimento mais curto ou até o mais longo do músculo ou nenhuma repetição foi executada com controle em cada grau de movimento. Fig. 152. Eficácia: muitos métodos de exercícios atingem resultados, porém desperdiçam muito tempo e normalmente o custo em termos de desgaste/saúde é muito alto. Os exercícios que criamos hoje são muito incompletos porque os perfis da resistência são inconsistentes com o da potência e também são necessárias muitas repetições para atingir qualquer resultado. Se criássemos uma máquina de musculação em que o perfil da resistência fosse muito próximo do perfeito (isto é, exatamente igual ao da potência), o resultado seria alcançado com menos séries e com poucas repetições. Mas este cenário mecânico não tem condições de ser copiado com um halter ou com um cabo, porque o perfil da resistência destes equipamentos é incompleto e gera estímulo apropriado somente em 25 a 30% da amplitude. Se durante a execução do exercício alguma articulação que deveria estar parada se mover, o estímulo gerado é praticamente zero. Temos errado muitas marteladas e realmente precisamos de “75” repetições para alcançar um resultado, mas este cenário pode ser muito mais eficiente. A outra analogia é feita com uma criança de dois anos [Fig. 153]. Ela decide pegar o leite da geladeira e colocar em seu próprio prato de cereal. Quando ela se serve, cai leite no chão, no balcão, mas certamente 208 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia c o n t i n u u m também dentro do prato. Consideramos isso sucesso? Sim, tem leite dentro do prato. A criança alcançou o resultado, porém o prejuízo foi grande. Quando o exercício não é criado e prescrito adequadamente, é assim que ele acontece, isto é, com o mesmo baixo nível de acerto. Exercício é mais do que uma atividade, é mais do que mover o corpo contra a gravidade, é mais do que calistenia. Como mencionado no capítulo sobre o que é exercício, por que as pessoas se exercitam? Vamos explorar um outro aspecto desta pergunta. O que as pessoas realmente esperam do exercício e o que é necessário para alcançar este objetivo? A maioria destas pessoas deseja perder peso. Algumas desejam somente reduzir o número na balança e outras desejam diminuir a taxa de gordura corporal. Outras querem saúde ou ficar em forma. Segue a lista de objetivos mais comuns: d o e x e r c í c i o • Emagrecer; • Entrar em forma; • “Ter tônus” muscular. Ou seja, melhorar aparência e sentir-se melhor; • Aumentar a massa muscular, mas não ficar igual ao “Schwarzenegger”; • Melhorar a saúde: equilibrar pressão arterial, diabetes etc.; • Aumentar a flexibilidade; • Melhorar a performance; • Aumentar a potência; • Melhorar a função. Todos esses objetivos começam com a função da máquina humana que é determinada pela função de seus componentes internos e, para influenciá-la, devemos: • Conhecer as etapas do processo; Fig. 153. Uma outra analogia sobre eficácia e eficiência: uma menina de dois anos colocando leite no prato de cereal. Ela cumpre o objetivo, porque tem leite no prato, mas o desperdício e o custo foram altos. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 209 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli • Conhecer as partes que criam o todo; • Compreender com quem estamos trabalhando. Revelação: todos esses objetivos são derivados do estímulo e da adaptação do músculo. Toda função humana começa e, muitas vezes, termina com o músculo. Músculo não significa necessariamente ser músculo grande. Produção de tensão não significa necessariamente powerlifter. Lembre-se, são os pequenos músculos do olho que permitem focar a visão. O problema com a palavra “músculo” é que uma grande quantidade de pessoas, devido ao condicionamento que tiveram, vão imediatamente pensar na palavra grande. É realmente difícil para muitos ouvir a palavra músculo e não pensar em uma pessoa musculosa como Arnold Schwarzenegger. Pensamos imediatamente em bíceps gigantes. Isso é um problema, porque a pessoa que quer melhorar sua saúde e função está realmente pedindo mais músculo do que tem no momento, porém imagina que o resultado final seja o tamanho do Schwarzenegger. O medo e a rejeição de “músculo” são as mais preocupantes tendências da indústria. A questão se resume no conhecimento sobre o músculo e o que ele faz. Para aqueles que sempre visualizaram o tecido a partir de uma perspectiva de tensão e força, o músculo continua sendo a fonte principal de resultado. Músculo Quando falamos “músculo”, estamos nos referindo a todo o complexo neuromiofascial estrutural, a todo o sistema neurológico aferente e eferente que os conecta, a toda parte sensorial associada e a articulação que ele controla. Referimo-nos também à fáscia que cria o suporte para o músculo e a sua parte operante que chamamos de componente contrátil. Nos referimos a todas essas partes! O tamanho do músculo para esta análise não é importante. Devemos nos preocupar com a contração e com o desenvolvimento da contração muscular. Se você gosta de treinar corrida e de exercício da performance externa, você se preocupa em usar contrações já existentes para realizar estes exercícios. Mas a prescrição de exercícios por fisioterapeutas deve ser feita com a preocupação na restauração, no desenvolvimento e na conservação da contração. A sua preocupação deve ser em construir a contração e em desenvolver um músculo com funcionamento ótimo para ser usado na performance externa. É tudo uma questão de contração! Quer dizer, de produção de tensão. Conseguir estimular um músculo apropriadamente em seus comprimentos longo e curto, cuidando de todos os detalhes mecânicos envolvidos, é uma tarefa desafiadora. Não existe nenhum exercício livre, como, por exemplo, o agachamento [Fig. 154], que gere estímulo para os extensores do quadril no comprimento mais curto. Se criarmos um exercício com um cenário mecânico em que exista resistência no comprimento mais curto utilizando um banco de apoio e caneleira, ainda assim precisaremos ter o maior cuidado durante a execução porque se o movimento acelerar quando chegar perto do comprimento mais curto, provavelmente a resistência será anulada e então não teremos estímulo. Exercício Exercício é a contração, a produção de tensão = desenvolvimento da performance interna = produção interna de força. 210 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia c o n t i n u u m d o e x e r c í c i o Quando os parâmetros do exercício tornam-se focados na otimização do músculo dentro do nível de tolerância individual, a eficácia e a eficiência do exercício podem aumentar. • Eficácia: adequado para atingir um objetivo ou cumprir um propósito; produz o objetivo ou resultado esperado. Isso não significa que foi o melhor nem que foi o mais rápido. Também não significa que houve menos desperdício ou que fez o melhor uso do tempo, por exemplo. Foram dadas as “75” marteladas para colocar um prego e isso foi eficaz, porque o prego foi colocado, não importando a maneira que isso aconteceu. • Eficiência: executar e funcionar da melhor maneira possível, ou atingir o objetivo da melhor maneira possível com o mínimo de desperdício de tempo e de esforço. Fig. 154. Performance externa, nenhum exercício livre, como o agachamento, dá a oportunidade de desafiar o comprimento mais curto do músculo glúteo máximo. No perfil da resistência do agachamento, quando o glúteo se aproxima dos comprimentos contráteis mais curtos, o torque diminui e assim diminui a resistência. Lembrando que o comprimento mais curto do glúteo máximo alcança posições até 30º além do 0, e que não são alcançadas neste exercício. CAPACIDADE contrátil Capacidade contrátil é a necessidade de ter habilidade contrátil/integridade e produção de tensão contrátil para depois fazer uso progressivo dessa contração. Isso é diferente de mover peso. Para mover peso, é necessário força e habilidade específica. Estamos falando puramente de produção de tensão no tecido. O cérebro é muito eficiente em orquestrar o movimento do corpo humano. A eficiência do cérebro está em sempre economizar energia e esforço. Essa característica da organização do movimento é muito importante e necessária para a sobrevivência. Quando realizamos atividades da vida diária, não estamos “conscientes” de todos os movimentos necessários para realizá-las. Nós temos um pensamento ou desejo, como, por exemplo, “está na hora de levantar”, e, a partir do momento em que decidimos levantar, todos os movimentos necessários serão realizados sem que tenhamos que pensar: “Flexione o joelho, flexione o quadril etc.”. É como se o cérebro estivesse funcionando em piloto automático. Essa característica é imprescindível para a realização das atividades da vida diária. Para economizar energia e esforço, o cérebro organiza mecanicamente para que o movimento aconteça dentro do trajeto de A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 211 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli menor resistência e do que vai utilizar o maior número de grupos musculares para realizar uma tarefa. Aqui, eficiente significa administrar o conjunto de variáveis mecânicas para alcançar melhores resultados com a menor utilização do músculo e com o menor esforço. No mundo do exercício, existem dois contextos de eficiência No primeiro contexto, usa-se o que se tem disponível, adicionado à habilidade de usar a mecânica para a distribuição do esforço e também para a minimização da resistência, alcançando maiores e melhores resultados. A habilidade está em usar propriedades da inércia para diminuir o esforço e assim perpetuar o padrão de eficiência do cérebro. Usamos aqui o exemplo do levantamento de peso (clean and jerk). Para atingir o objetivo, temos que minimizar o trabalho e o esforço. Como os atletas fazem isso? Sua primeira tarefa é arremessar o peso. Para isso, têm que tirar o peso do solo e acelerá-lo, porque existe um tempo específico entre o peso subir e o atleta se posicionar embaixo da barra. O peso não pode estar abaixando no momento em que ele se posiciona embaixo da barra porque ele não é capaz de desacelerar o peso se não estiver exatamente embaixo da barra no momento em que o peso iniciar o trajeto de descida. Este timing é uma das habilidades mais importantes durante este exercício. Os atletas necessitam de precisão no tempo e no momento em que o peso está flutuando para se posicionar corretamente embaixo da barra. Eles não realizam um agachamento lento com uma rosca inversa e lentamente executam um desenvolvimento de ombro. Seria impossível realizar um levantamento de peso (clean and jerk) utilizando somente a tensão muscular para fazê-lo. Fig. 155. Exercícios de performance externa utilizam a musculatura já existente e treinam a habilidade. Neste exemplo do clean and jerk, o objetivo do exercício é levantar mais peso e, para alcançá-lo, a habilidade de usar a inércia com seu timing perfeito, faz com que o peso seja quase anulado em grande parte da amplitude. A habilidade de anular a resistência é o maior foco do exercício. 212 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia c o n t i n u u m Outro exemplo é quando um maratonista contrata um treinador com o objetivo de modificar sua forma de corrida para melhorar seu tempo. Aqui ele busca maior eficiência, o seu objetivo é utilizar a menor quantidade de músculos possível para correr uma distância determinada mantendo o músculo ativo até o fim da corrida. Se o atleta colocar alguma quantidade extra de movimento no início da corrida, ele acaba por lutar contra ele mesmo, desperdiçando esforços, pois exigirá muito de seus músculos e nem sempre alcançará o objetivo. Eficiência, neste caso, é novamente fazer menos trabalho com o corpo para alcançar mais e maiores números externamente. Perceba que, nestes dois exemplos de eficiência, a finalidade é utilizar toda a musculatura já existente, “administrando” e “economizando” (usando somente o necessário) sua energia para atingir um objetivo externo. Para isso, é necessário encontrar maneiras de diminuir o estímulo externo (resistência) para facilitar o esforço e reduzir ao máximo a utilização da musculatura. O foco aqui não é o desenvolvimento da musculatura ou do corpo. No entanto, a musculatura já deve “estar pronta”, ou melhor, deve ter o potencial adequado para ser utilizada dentro de uma habilidade específica. No segundo contexto, eficiência está em otimizar o [TER] para aumentar o seu potencial de utilização. Aqui, a finalidade é otimizar o tecido muscular, construir um corpo melhor e mais tolerante e, para isso, é preciso fazer exatamente o contrário do que é feito no primeiro contexto, porque, para aumentar a tolerância do tecido muscular, é necessária a aplicação de um estímulo adequado para cada comprimento contrátil. Se o estímulo é anulado ou diminuído, ele deixa de ser adequado. Como eficiência significa o melhor resultado com mínimo de desperdício, então aqui ela significa quebrar o padrão do “piloto automático do cérebro” e não deixar a resistência ser anulada e o esforço ser distribuído ou disperso. Se é possível gerar o estímulo necessário para alcançar o d o e x e r c í c i o objetivo de melhorar a tolerância da musculatura específica em uma sessão de exercícios de 30 minutos e o profissional leva 2 horas para atingir esse objetivo, isso significa que ele não foi muito eficiente. Se o cliente trabalha somente 50% de cada movimento que realiza por estar arremessando o peso ou porque algum outro grupo muscular está fazendo o exercício, então existe muita perda de tempo para alcançar este objetivo. Novamente, afirmamos que é imprescindível saber qual objetivo que você, profissional, espera com o exercício, porque mover peso é o oposto de desafiar o corpo. A eficiência da prescrição do exercício para a saúde está em criar exercícios focados nas propriedades e no controle da contração do músculo como o meio pelo qual a carga é movida e não de mover a carga com a esperança de estimular algo. A isso, chamamos de exercícios para a performance interna. Então, músculo é tudo! Se não tivermos músculo, não temos o que fazer com a habilidade. Nós não conseguiríamos sair da cama para caminhar se não existissem os músculos. Assim, o número de fatores que podemos melhorar e influenciar positivamente com a melhora da contração muscular quando a quantidade suficiente de músculo está funcionando adequadamente por meio de desafios específicos (cargas desafiadoras orientadas pelo controle e com esforço progressivo) é muito grande. Quando o fisioterapeuta prescreve exercícios para gerar estímulo e restaurar, desenvolver e conservar a contração muscular, ele precisa ser eficiente e, para isso, é necessário que cada detalhe do exercício esteja estimulando algo dentro do objetivo. Se o peso for arremessado, os efeitos da inércia entram em ação anulando assim o estímulo. Como demonstramos com a experiência da balança de inércia (ver aula em EAD), que identifica que quando o arremesso de peso é parte do exercício, a resistência chega a zero no final da fase concêntrica e início da excêntrica. Então, se você desejar ter estímulo nestes pontos da amplitude, é A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 213 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli necessário controlar a inércia. Se a inércia não for controlada, o profissional não terá nenhuma indicação de que aquilo que se espera é o que está acontecendo no tecido. Por isso a necessidade de estratégia. Precisamos desenvolver uma visão completa do espectro do exercício e, a partir do objetivo que o profissional espera de adaptação com o exercício, escolher a melhor intervenção. Fig. 156. Adaptação. Homeostase. Visão do espectro do exercício. 214 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia c o n t i n u u m d o e x e r c í c i o Quando o foco do exercício está no movimento, na atividade, na performance externa, os exercícios desenvolvem uma habilidade que usa a performance interna já existente, mas não a desenvolve. Os exercícios não incluem estímulo específico para a contração (para o tecido) e, devido ao perfil da resistência, não permite estímulo adequado em todo o Continuum da contração muscular. Dentro da performance externa está o treinamento funcional tradicional, treinamento de performance esportiva, exercícios aeróbicos e as atividades da vida diária. Desenvolver um raciocínio crítico para tomadas de decisões sobre a criação de exercícios deixa nossa profissão muito empolgante: quando começamos a criar exercícios únicos, prescrever com estratégia, monitorar cada grau em que o exercício é executado e adaptá-lo a cada necessidade de mudança, nosso nível de resultado aumenta e nunca mais as horas vão demorar a passar em nosso dia de trabalho. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 215 Performance Interna c o n t i n u u m N ão precisamos escolher entre dois tipos de exercícios, podemos usar os dois para diferentes objetivos. Precisamos saber qual o objetivo do exercício e cumprir com o propósito de gerar estímulos específicos para otimizar todo o espectro do Continuum Funcional, isto é, da função. Visão completa do espectro do exercício Quando o objetivo é otimizar a função, isto é a performance interna, o foco do exercício deve estar na contração muscular, e devemos gerar estímulo apropriado para todo o comprimento muscular. Para isso o profissional deve ter o foco em três fatores: na função muscular, na função articular e na função sensorial. Devemos avaliar as propriedades contráteis por comprimento muscular, desenvolver a integridade contrátil por comprimento muscular, em seguida desenvolver a tensão contrátil por comprimento muscular e, por último, reforçar e conservar a integridade e a tensão exigida dentro do Continuum da contração [Fig. 157]. Se desenvolvermos bastante HP [tensão] na musculatura, supondo que é possível ter a percepção deles, o cérebro terá uma boa quantidade de matéria-prima para orquestrar durante atividades de performance externa. Afetar o sistema sensorial é mais desafiador e existe certo limite dentro do que conseguimos alcançar na articulação. Porém, no sistema muscular, na ADCCD [Amplitude de Comprimento Contrátil Disponível] temos muito espaço para trabalhar e é aqui que conseguiremos mais resultados, é dentro do sistema muscular que temos mais oportunidade de gerar adaptações positivas. Exercício é contração. Se o objetivo for melhorar a ADM, só será possível trabalhar com a quantidade de posições articulares que foram oferecidas [ADPAD], o restante do trabalho vem de como influenciar a contração nas Amplitudes de Comprimento Contrátil Disponível [ADCCD]. Ou seja, explorar o trabalho no comprimento curto, no médio e no longo do músculo, explorar o valor do deslizamento das pontes cruzadas em seu total comprimento. d o e x e r c í c i o O exercício com foco na contração muscular vai desenvolver o Domínio e o Controle da contração e, consequentemente, da articulação. Isso significa ser capaz de ter o domínio de cada grau de movimento, ser capaz de pará-lo a qualquer momento e também de manter o trajeto controlando a amplitude. Quando o Domínio/Controle não estão presentes, o exercício acontece cada vez de uma forma diferente. O Continuum de controle começa na amplitude em que o indivíduo consegue controlar e vai se expandindo para amplitudes maiores e, progressivamente, aumentando esta amplitude de controle. Então, com tensão suficiente, com percepção e com o domínio da contração, é possível controlar uma articulação ou um movimento. Por exemplo, se parte do objetivo for controlar as escápulas, é necessário [TER] uma capacidade de tensão suficiente nos “controladores da escápula” e também [TER] uma percepção da localização dela, então se adiciona uma intenção (escolha) de controlar a escápula, e com todos estes fatores trabalhando juntos é possível dominar e controlar a posição escapular. Esse é o processo que repetimos inúmeras vezes e essas são as influências que precisamos levar em consideração. Quanto maior é a percepção/consciência do corpo, melhor o progresso do cliente-paciente em atingir seu objetivo e isso também é um Continuum. Estamos trabalhando com um novo cliente que apresenta pouca capacidade de gerar tensão. Ele consegue sentir e ter consciência de toda sua estrutura e quase não precisamos ensiná-lo, porque quando o cliente consegue ter percepção e consciência de sua estrutura, o processo de ensinar torna-se mais fácil. Por exemplo, este cliente já foi submetido a inúmeras cirurgias e esperávamos que ele não tivesse capacidade de sentir, perceber e ter consciência corporal. Contudo, mesmo com inúmeras cicatrizes no abdômen, ele consegue contrair e controlar a contração da musculatura abdominal em todo o Continuum da contração. Esse cliente tem muita percepção, mas pouca capacidade contrátil. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 217 • Otimizar • Desenvolver • Conservar TEM? E OMPLETA D C O Ã VIS TRO DO EXER O CÍC C E P IO S Exercícos para Performance Interna Exercícios para Performance Externa TR EI N Transformar o corpo em um corpo melhor. O Contínuo da contração porção curta longa à Capacidade de produção de tensão/Output • Avaliar as propriedades contráteis por comprimento. • Desenvolver a integridade contrátil por comprimento. • Desenvolver a tensão contrátil por comprimento. • Reforçar/conservar a integridade da contração e a tensão exigida dentro do contínuo da contração. A IMENTO MOV O ND Habilidade Treinamento de performance esportiva Vida no dia a dia Treinamento Funcional Tradicional Cardio • Não inclui o estímulo especí co para tecidos especí cos. • Não permite o estímulo em todo o espectro da contração devido às limitações do per l da resistência. O cenário mecânico facilita a compensação Fig. 157. c o n t i n u u m d o e x e r c í c i o A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli Temos outro cliente com quem passamos três meses tentando ajudá-lo a sentir e ter controle sobre a escápula. Ele tem muita capacidade contrátil e força, mas o nível de consciência é muito baixo. Com ele, achamos que o processo seria fácil, mas não foi. Esse cliente é o oposto do primeiro – ele tem pouca percepção, mas muita capacidade contrátil. Por isso, existe a necessidade de descobrir qual é a peça do quebra-cabeça que está faltando para cada cliente. Só assim poderemos inclinar nossos esforços em escolher estímulos que tragam o suprimento para aquilo que está faltando. Então, começamos o trabalho com aquilo que o cliente apresenta, com o que ele [TEM] e, a partir deste ponto, começamos a mover o estímulo progressivamente para aquilo que ele não [TEM]. Na prescrição do exercício para a performance interna estamos tentando desenvolver a capacidade de tensão. Mesmo quando prescrevemos exercícios para melhorar o equilíbrio, o cliente-paciente precisa ter capacidade de tensão suficiente para se equilibrar e poder corrigir onde o seu centro de massa está sob o seu pé (base de suporte) e depois fazer os ajustes necessários para se equilibrar. Primeiramente, é preciso ter a propriocepção (função sensorial) intacta na planta do pé e, em segundo lugar, é necessário [TER] capacidade de tensão suficiente para realizar as correções e os ajustes necessários. Pacientes diabéticos normalmente possuem neuropatia e a sensibilidade na planta dos pés é reduzida ou nula, isso impede a percepção e a possibilidade de ajustes é reduzida, então precisamos considerar este fato antes de colocar um cliente-paciente diabético sobre uma prancha de equilíbrio. Logo, se o cliente-paciente apresenta algum tipo de contração e um pouco de capacidade de tensão disponível, já é possível gerar uma contração muscular. Estudamos neste livro que, devido aos fatores mecânicos, normalmente é mais fácil gerar uma contração muscular no comprimento médio do músculo. Sendo assim, é neste ponto que devemos iniciar o trabalho da contração e, a partir daí, faremos com que o comprimento contrátil alcance a parte mais longa e a parte mais curta do músculo, e isso também é um Continuum. Progredimos do médio para o curto e do médio para o longo, entendendo que do comprimento médio para o curto o músculo é mais frágil e, por esse motivo, devemos ser mais cautelosos para chegarmos nesta posição. Quando o exercício é prescrito com foco na performance interna, todas as variáveis do exercício são monitoradas cuidadosamente e os exercícios são executados com controle. Qualquer atividade pode ser controlada por meio dos sinais de advertência internos quando existe uma mudança de foco e de atenção. Uma corrida de cinco quilômetros com o objetivo de queimar calorias, realizada de maneira distraída e sem prestar atenção, é considerada performance externa. Se a atenção for alterada e o foco for mudado para os sinais internos que o corpo emite de que é preciso parar, a corrida acaba mesmo antes de alcançar os cinco quilômetros. Neste caso, o foco passou a ser mais inclinado para a performance interna. Desta maneira, as falhas que aparecem no sistema devem ser corrigidas para que no dia da competição ou nas atividades do dia a dia, o corpo esteja “à prova de bala”. Quanto mais ignorados forem os sinais durante a preparação, menos inteiro o corpo estará no dia que mais importa. Este dia pode ser o dia da competição para atletas ou todos os dias para aqueles que buscam se exercitar para a saúde. Observe o painel de controle, não a linha de chegada. 220 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia c o n t i n u u m d o e x e r c í c i o Fig. 158. A analogia da corrida de carro de Nascar: as 500 milhas. Dentro da performance interna, é necessário que o profissional esteja prestando atenção em todos os sinais que o corpo emite para poder tomar decisões sobre o estímulo que será aplicado e durante sua aplicação. Podemos usar aqui uma excelente analogia para demonstrar isso: a Corrida de Nascar – as 500 milhas de Indianápolis. Os carros possuem inúmeros relógios em todo o painel para indicar o que está acontecendo no motor, mas existe apenas um indicador de velocidade. O painel dos carros de corrida indica tudo o que está acontecendo com eles, e isso é importante porque, se o motor quebrar, analogamente à performance interna, o carro nunca terminará a corrida. Durante as 500 milhas, o piloto e a equipe estão observando todos os indicadores no painel de controle, mas não se focam na linha de chegada. Na verdade os carros passam pelo lugar da linha de chegada 499 vezes e é somente na última volta que o juiz aparece com a bandeira. Pense nisso! Para muitos, fazer pit stop (paradas estratégicas) não faz sentido porque se perde tempo, mas não é sustentável completar as 500 milhas sem fazê-lo, sem acrescentar combustível ou trocar pneus. Se as paradas não forem realizadas, não é possível terminar a corrida com o carro sem quebrar. Imagine que a população precisa realizar exercícios para saúde para restaurar, desenvolver e conservar a função, e será necessário realizá-los durante a vida inteira. São muitos anos de aplicação de força na estrutura, por isso a sua prática precisa ser sustentável. O fisioterapeuta precisa estar constantemente verificando os sinais internos, que indicam o que está acontecendo no “motor” (estrutura/função) para que o cliente-paciente possa fazer todas as paradas estratégicas necessárias e para que possa terminar a corrida (a vida) com o “motor” (estrutura/função) o mais íntegro possível. Dentro da performance interna devemos criar exercícios que gerem estímulos apropriados para todo o comprimento contrátil e, para isso, será necessário alterar a resistência de acordo com o comprimento muscular. Exercícios tradicionalmente chamados de funcionais [PE], quase nunca geram estímulos apropriados para cada comprimento contrátil. Normalmente, exercícios livres, como o agachamento, não alcançam os comprimentos musculares mais curtos do glúteo máximo. Neste exercício, quando o glúteo máximo se aproxima do comprimento contrátil mais curto, a resistência chega a zero devido ao braço do momento também chegar a zero e, consequentemente, elimina o estímulo. Isto também acontece para a musculatura do reto femural, como já mencionado no capítulo sobre performance externa. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 221 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli Fig. 159. Exemplo do exercício de extensão do quadril usando o cabo do pilates. Por mais que o objetivo deste exercício seja gerar estímulo para os extensores do quadril, ele é pouco eficiente para isso. Ele não alcança a oportunidade de estimular as porções mais curtas do músculo e durante a extensão do quadril se a massa da perna for superior à resistência aplicada no cabo, a resistência se torna assistência para os extensores do quadril e a massa da perna se torna resistência para os flexores do quadril. Outro exemplo de exercício que estimula os extensores do quadril é a extensão do quadril em decúbito dorsal com os cabos do Pilates, e que também não gera estímulo na porção mais curta do tecido contrátil do glúteo máximo. Como o exercício é realizado em decúbito dorsal ele acaba quando a perna encosta na máquina e deixa de gerar estímulos nos 20°/30° além do zero que potencialmente poderiam ser estimulados. Além disso, precisamos ter cuidado porque, se a resistência da massa da perna se torna maior do que a resistência oferecida pelo cabo, a extensão de quadril se torna desafiadora para os flexores de quadril e não mais para os extensores. Sendo assim, uma das melhores ferramentas para gerar estímulo focado na contração muscular são as máquinas de musculação. A máquina de extensão de perna, por exemplo, é a melhor fonte capaz de gerar estímulo para o quadríceps com o joelho em extensão. O mesmo acontece para o glúteo máximo. A máquina de extensão de quadril é a melhor fonte capaz de gerar estímulo adequado para esta musculatura em sua porção mais curta. Então ambas as máquinas precisam fazer parte do Continuum do exercício. Nenhum exercício livre faz isso. Exercícios de extensão de joelho com caneleira ou com cabo/borracha, que geram estímulo para o quadríceps em sua porção mais curta, possuem um perfil da resistência contrário ao perfil da potência, o que não é ideal para exercícios com foco na contração muscular. Então precisamos conhecer todos estes fatores para escolher os exercícios e as ferramentas corretas a serem utilizadas para melhor cumprir o papel de gerar estímulos apropriados durante toda a amplitude muscular contrátil disponível. Atenção: não é a máquina que faz com que o trabalho tenha foco na performance interna. A máquina por si só não faz nada. Ela é somente a ferramenta. Se o cliente-paciente sentar e empurrar a máquina sem controle sobre a execução do exercício, é a mesma coisa que praticar um esporte usando a performance 222 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia c o n t i n u u m externa. Tão essencial quanto ter a ferramenta correta para o estímulo é a maneira de execução do exercício. Uma vez desenvolvida a performance interna, d o e x e r c í c i o criamos exercícios específicos para desenvolver e otimizar a performance externa e usamos todas as partes internas para uma atividade específica. Fig. 160. O comprimento mais curto do músculo reto femural é quando a articulação do quadril se encontra em flexão e a do joelho em extensão. Fig. 161. A máquina de extensão de perna é uma das poucas oportunidades de estimularmos a musculatura do quadríceps em sua porção mais curta com um perfil de resistência mais compatível com o da potência, melhor do que o exercício de extensão de perna com caneleira, por exemplo. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 223 Exercício Baseado no Cliente-Paciente c o n t i n u u m d o e x e r c í c i o Fig. 162. QUEM? OBJETIVO? TEM? CONTROLA? TUDO COMEÇA AQUI U tolera? ma vez determinado onde cada articulação se encontra dentro do Continuum Funcional, o fisioterapeuta inicia um processo de raciocício para decidir como criar e onde iniciar o processo de otimização da função/performance interna. Como indicamos no capítulo sobre o profissional do exercício, todas as nossas decisões sobre o exercício precisam ser baseadas no cliente. O cliente-paciente carrega em si todas as respostas e informações necessárias para a tomada de decisão dentro do Continuum do exercício. Precisamos ser muito assertivos em criar perguntas [Fig. 162] para o cliente-paciente, tanto aquelas que necessitam de uma resposta verbal quanto aquelas que serão respondidas por meio da observação. Manter um monólogo interno constante, saber o que observar, o que manipular e o que esperar que aconteça nos mantêm afastados da tendência de prescrever exercícios predeterminados. Como já indicado anteriormente, exercícios prescritos por fisioterapeutas devem considerar o indivíduo antes do exercício. A capacidade de tensão, a amplitude e a habilidade que ele [TEM] para você trabalhar é tudo o que podemos usar para construir o exercício. Existem cinco perguntas das quais derivam as respostas necessárias para iniciar o processo de criação do exercício. 1. Quem é seu cliente-paciente? Não qual é o nome dele, mas a sua estrutura, a fragilidade, a habilidade, a estabilidade, a velocidade A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 225 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli e o controle do movimento, a intimidação em suas expressões. Todos estes fatores e muitos mais podem ser observados desde o primeiro momento em que ele se apresenta diante de nós. [Quem] não indica um grupo demográfico! [Quem?] representa um vasto espectro de características individuais de cada cliente, independentemente da idade, pois encontramos muitos indivíduos de 70 anos que muitas vezes possuem mais controle articular do que alguns de 30. Pense no sedentário de 16 anos, no ex-atleta que ainda tem uma mentalidade de atleta, ou num atleta que não possui mais tolerância articular ou sistêmica, ou ainda num atleta que ainda não desenvolveu a tolerância. Pense nas pessoas que nunca gostaram de se exercitar. Então, a idade não é um indicativo de onde o cliente se encontra dentro do Continuum Funcional. O que importa neste momento é examinarmos qual é o controle contrátil, o estado articular, a tolerância sistêmica e a capacidade de recuperação. 2. Objetivo? O que você realmente precisa saber sobre os objetivos do cliente-paciente? O que realmente importa? Em geral, precisamos saber onde eles gostariam de terminar, ou seja, qual o objetivo final… O que o cliente-paciente gostaria de alcançar ou de realizar de modo que, depois de determinar o seu estado atual, sua habilidade e sua tolerância à prescrição do exercício sejam direcionadas para o objetivo final. O objetivo parece ser um tópico simples para ser definido, porém existem muitas questões a serem avaliadas. Elas surgem a partir de uma “perspectiva satélite” e evoluem para os detalhes que irão influenciar tanto a percepção do sucesso quanto o processo em si para alcançá-lo. Existem quatro fatores que merecem consideração sobre o objetivo. a. É necessário que o profissional traduza o que o cliente-paciente indica como objetivo. O que o cliente quer dizer com a expectativa dele sobre o objetivo do exercício. Por exemplo, quando ele diz que deseja praticar exercícios para a saúde, isso envolve emagrecimento? Se emagrecer for parte do objetivo, o cliente quer diminuir o peso na balança ou ele quer diminuir dois números no tamanho da roupa? Estas são duas expectativas bem diferentes. b. O objetivo envolve resultados externos ou internos? Objetivos com resultados externos envolvem: correr, andar, equilíbrio, saltar, desenvolver alguma habilidade específica. Objetivos com resultados internos envolvem: melhora da saúde, diminuição da dor, melhora da função musculoesquelética, melhora da tolerância neuromusculoesquelética. c. Identificar quais são as exigências e os passos no processo, quais são as partes que envolvem o objetivo “satélite”, isto é, identificar o que está faltando. Provavelmente, o exercício mais válido e apropriado em certo momento pode não parecer estar em concordância com o objetivo. d. Objetivo deste exercício (O.D.E.). Saber o que esperar do estímulo que aplicamos é essencial para termos sucesso com o exercício. As respostas às próximas três perguntas desfazem todas as generalizações sobre exercícios. 3. [TEM?] Aquilo que o cliente-paciente [TEM], performance interna, de função articular, de função muscular, de função sensorial, de capacidade de tensão e que pode ser desafiado, ou seja, estimulado. 4. Controla? O quanto o cliente-paciente controla e domina cada posição dentro das amplitudes de posições 226 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia c o n t i n u u m articulares disponíveis. Para isso, é necessário ter capacidade de tensão contrátil suficiente, percepção e habilidade de controle contrátil. O controle é a ferramenta fundamental para medir se o desafio é apropriado dentro da amplitude e da capacidade de tensão. O controle é dependente da amplitude, da carga, do esforço, da velocidade e da fadiga. Quando o controle contrátil não existe, a contração não é sólida, ao contrário, ela é frágil e perceptível à instabilidade do tecido em manter uma posição. Quando o controle contrátil e o domínio da contração muscular estão presentes, o cliente-paciente é capaz de parar a repetição em qualquer ponto da amplitude com controle. Neste caso, ele também é capaz de parar nos dois pontos extremos da amplitude de maneira sólida e sem arremessar o peso. 5. Tolera? Os componentes neuromusculoesqueléticos do cliente-paciente podem estar localizados individualmente em diversos pontos do Continuum Funcional e cada articulação deve ser examinada individualmente e também coletivamente. Podemos “classificar” a tolerância de nossos clientes-pacientes como excepcional ou comum [Fig. 163] (tolerância média e baixa tolerância) e todas as variações entre estes extremos. d o e x e r c í c i o tolerância dentro do Continuum Funcional: ele consegue produzir alguma contração? Quando existe um pouco de capacidade de tensão, normalmente existe pouco controle sobre a contração e a tolerância possui um limiar muito baixo. Então, é importante lembrar que a congruência articular é influenciada pela inabilidade da manutenção do controle articular ativo. Sendo assim, quando o limiar de tolerância local é baixo, é necessário muitas vezes adequar o estímulo para ser menor nos extremos da amplitude. Pessoas que se enquadram como pessoas comuns, isto é, com tolerância média, não são tão saudáveis quanto aparentam. Estas são as pessoas que possuem mais características de baixa tolerância do que características excepcionais. Em indivíduos com idade superior a 50 anos, a possibilidade de artrose, condromalácia e osteófitos é alta. A tolerância sistêmica e a local precisam ser examinadas. Por último, encontramos os excepcionais, que são a minoria. Estes possuem alta tolerância, alta habilidade, bom controle e boa percepção corporal. Seus limiares de tolerância são altos e possuem também alta habilidade de compensação. Precisamos identificar o nível de tolerância do cliente-paciente antes de aplicar qualquer força em sua estrutura. E, a partir daí, iniciar o processo de progressão do exercício. Fig. 163. Considerações a serem examinadas quando nosso cliente-paciente se encontra no extremo de baixa A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 227 Resposta e Adaptação c o n t i n u u m Exercício é a aplicação de um estímulo com o objetivo de obter uma Resposta e uma Adaptação. O estímulo do exercício é composto por todas as variáveis da equação: Fig. 164. A resposta e a adaptação são as “consequências”, isto é, são os resultados do estímulo aplicado, podendo ser positivas ou negativas, agudas ou crônicas. Os termos “aguda” e “crônica” normalmente são associados com lesão, ou seja, uma resposta a uma adaptação negativa. Porém, esses termos também devem ser usados como resposta ou adaptação positiva. Um exemplo de adaptação positiva crônica (longo prazo) é o aumento da capacidade de tensão contrátil; e um de resposta positiva aguda (curto prazo) é a analgesia consequente de uma intervenção por TENS (transcutaneal electrical nerve stimulation). Existe uma relação entre resposta e adaptação. Uma adaptação é uma resposta, no entanto, uma resposta nem sempre gera uma adaptação. Somente quando uma resposta é repetida várias vezes ela é capaz de gerar uma adaptação. d o e x e r c í c i o Todo exercício tem algum grau de potencial benefício, ou adaptação positiva, e também tem algum grau de potencial custo, ou de adaptação negativa. No passado, ensinávamos que exercícios apresentavam riscos e benefícios inerentes à sua prática, contudo, verificamos que exercícios considerados de baixo risco são os mais capazes de gerar adaptações negativas, como, por exemplo, a corrida; por isso, hoje, o mais apropriado é considerar que todos os exercícios apresentam tanto um potencial benefício quanto um potencial custo. Se o cliente sofrer uma ruptura de um tendão durante um exercício, este poderá ser reparado, mas, se o seu joelho sofrer um desgaste completo da cartilagem, não existe maneira de repará-lo trazendo como consequência a necessidade de uma nova articulação (artroplastia). Portanto, apesar da corrida ter um custo (o de aumentar a chance de desgaste articular no joelho) ela não é considerada de alto risco (porque a chance de lesão aguda é pequena). O potencial custo é determinado pelo quanto o exercício vai exceder a capacidade funcional, isto é, a função de um indivíduo (risco). Quanto mais o exercício se afastar da atual tolerância e das “disponibilidades” deste indivíduo, maior será o custo para ele. Ele também é determinado pelo nível de inflamação, que pode ser vista como “os processos associados com a recuperação e/ou com o reparo” dos tecidos musculares. O custo é influenciado pelo nível de atividade ao qual o cliente-paciente está acostumado e é determinado pela quantidade de aplicação dos seguintes fatores: • Força: quantidade, direção e onde foi aplicada; • Duração: durante quanto tempo a força é aplicada; • Frequência: com que frequência a força é aplicada; • Qualquer contraindicação verdadeira para um exercício específico. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 229 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli Se estes fatores forem excedidos além da tolerância do indivíduo, o custo do exercício aumenta. Por mais que o potencial custo seja inerente a toda prescrição de exercício, não é correto afirmar que certo exercício é contraindicado. Essa palavra significa que, para um pequeno conjunto de circunstâncias (lesão, anomalia etc.), um exercício bem específico (aplicação de força, posição da articulação, movimento da articulação ou amplitude de movimento específica) é desaconselhável neste momento devido ao risco associado de danos a tecidos ou estruturas bem específicas. Se um exercício é “genericamente contraindicado”, quer dizer, perigoso para todos, então ele simplesmente possui um alto risco. Já o potencial benefício é determinado pela eficiência e eficácia em relação ao O.D.E. (Objetivo Deste Exercício). Quanto menor for o custo e maior for o benefício, mais eficiente será o exercício. Quando prescrevemos um exercício, esperamos uma resposta e uma adaptação positiva, seja ela aguda (imediata) ou crônica (em longo prazo). Um exemplo de resposta aguda positiva é o aumento da Amplitude de Posições Articulares Disponíveis (ADPAD) ou a diminuição da dor após uma manipulação articular ou após um exercício isométrico. Depois de uma resposta positiva aguda, existe a necessidade desta resposta se tornar uma adaptação crônica para que a manutenção desta nova posição seja alcançada. Para isso, são necessários estímulos com potencial de aumentar a capacidade de tensão do tecido contrátil (exercícios) em torno desta articulação com a finalidade de torná-la mais tolerante e capaz de conservar esta nova posição. Ao prescrevemos exercícios em que a saúde/função do cliente-paciente é o principal objetivo, devemos pensar sempre em longo prazo. Temos que ter em mente que esta pessoa necessita se exercitar por 30, 40, 50 anos, e o efeito da força aplicada durante o exercício terá consequências em longo prazo e não podemos comprometer a sua saúde articular para obter um resultado muscular imediato. O objetivo da prescrição do exercício é gerar adaptação. Desejamos que algo se adapte, desejamos uma mudança, desejamos uma resposta positiva e uma adaptação positiva. Positivo significa que ele se encaixa em seu objetivo e reduz qualquer possibilidade do custo do exercício. É isso que realmente estamos procurando, porém: O que é necessário para gerar uma mudança? O que você deseja mudar? Essas são perguntas fundamentais que precisam ser respondidas para atingir o objetivo. Todo estímulo aplicado e sua consequente adaptação devem acontecer com a intenção de estar sempre alcançando a homeostase. Por definição, homeostase é o estado de equilíbrio de um sistema. O livro Principles of Neural Science diz que “homeostase é a constância do ambiente interno” (KANDELL; SWARTZ; JESSEL, 4a edição). No mundo do exercício existe o pensamento que a homeostase não é algo almejado. Existia a ideia de que precisávamos estar sempre oferecendo estímulos diferentes para o corpo “não se acostumar” ou não se adaptar a um estímulo, e se a homeostase acontecesse não existiriam mais mudanças. Acreditamos que essa conclusão tenha sido tirada da definição que diz que “homeostase é o estado de equilíbrio”, e o equilíbrio aqui é interpretado como ausência de mudança. No entanto, são os processos em busca deste equilíbrio que geram a esperada adaptação. O medidor na Fig. 165 indica a quantidade de desafio (estímulo) aplicado ao corpo. Esta quantidade precisa ser apropriada em cada repetição, em cada exercício e em cada sessão de exercícios. Dependendo do estímulo aplicado o ponteiro do medidor pode se deslocar para o lado esquerdo, o lado negativo (-), ou para o lado direito, o lado positivo (+) ou permanecer no centro, equilibrado (H). 230 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia c o n t i n u u m d o e x e r c í c i o Fig. 165. O “medidor do desafio” para monitorar a quantidade de estímulo a ser aplicado durante cada exercício e cada sessão de exercício. Para o objetivo da prescrição do exercício para a saúde, para que o estímulo gere uma adaptação positiva, basta aplicar o mínimo de estímulo necessário, mantendo o ponteiro do desafio dentro da zona “verde”. Todas as variáveis da equação do exercício devem ser consideradas com critério ao criar o desafio que será aplicado. Nada impede que o profissional decida aplicar um desafio maior e dentro da área amarela, desde que tenha certeza de que é necessário para o objetivo e apropriado para o cliente-paciente. Consideraremos três exemplos hipotéticos utilizando a força da gravidade como um indicativo do estímulo e consequente resposta e adaptação (homeostase) correspondentes. 1. [H] Manutenção do estímulo atualmente acostumado. Vivemos no mundo onde existe a força da gravidade. Nosso corpo já está adaptado ao constante estímulo desta força e a tudo ao que estamos acostumados a fazer em nosso dia a dia dentro deste cenário mecânico e, consequentemente, em homeostase. Se não aplicarmos nenhum estímulo diferente daquilo com que o corpo já está acostumado, o ponteiro do estímulo continua no centro e equilibrado. A homeostase aqui permanece inalterada. 2. [ - ] Aplicação de menos desafio (estímulo) do que está acostumado. Considere a hipótese do estímulo da força da gravidade, por algum motivo, não existir mais. Nesta situação, o ponteiro da quantidade de estímulo sai do centro movendo-se para o lado esquerdo do medidor, indicando que agora há menos estímulo do que estava acostumado. Com as informações “acabou o desafio oferecido pela gravidade”, “agora não é difícil se levantar”, para alcançar o novo equilíbrio do “mundo sem gravidade” o cérebro diz “vamos nos livrar destes músculos e destes ossos que não precisamos mais, porque, agora eles só são um desperdício de energia, vamos absorvê-los e usar esses minerais e essas proteínas”. Como visto anteriormente, este trabalho do cérebro é muito eficiente. A partir destas informações, o sistema (corpo) vai fazer todas as adaptações necessárias para que esta nova realidade passe a ser o novo ponto de equilíbrio. Neste caso, em que não teríamos mais o estímulo da força da gravidade, todas as respostas e adaptações aconteceriam para alcançar um novo estado de equilíbrio, então a nova homeostase se encontraria com a musculatura mais atrofiada e com menos densidade óssea. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 231 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli 3. [ + ] Aplicação de mais desafio (estímulo) do que está acostumado. Utilizando o estímulo adequado, e com o mínimo necessário de aumento no desafio, o ponteiro se moverá para a direita promovendo um estímulo com potencial positivo. Porém, é necessário que o ponteiro seja movido de maneira apropriada. Cada fator da equação do exercício tem um papel importante no momento do profissional decidir “quanto” de desafio vai aplicar em seu cliente-paciente. Com o estímulo apropriado, o cérebro vai adicionar tudo que for necessário, proteína, músculo, mais cálcio nos ossos etc., em quantidades suficientes para que o novo desafio (estímulo) aplicado (que o clientepaciente não estava acostumado), torne-se o novo estado de equilíbrio, quer dizer, a nova homeostase. O que transforma o corpo é este processo de adaptação que todos os sistemas sofrem para que este novo estímulo [PM+RS+I/E+TF] seja percebido como nível “já acostumado”. O resultado é obtido pela constante procura deste equilíbrio. O desafio é saber até que ponto pode-se “mover o ponteiro do medidor” em um determinado dia e o quanto de força o nosso cliente-paciente tolera. A homeostase refere-se à capacidade do organismo de se adaptar ao ambiente que ele experimenta com mais frequência. Este estado de equilíbrio é mantido dentro do corpo por um requintado sistema de regulação e feedback. O objetivo de qualquer exercício é a adaptação positiva, é mover o “ponteiro do medidor” e estimular uma mudança, buscando alcançar a homeostase dentro de um sistema (corpo) mais tolerante ou muitas vezes conservar aquilo que o corpo tem. Alguns erroneamente pensam que a homeostase é um inimigo porque é um impedimento para o progresso, mas, na verdade, este é o processo que desenvolve o corpo em uma tentativa de recuperar a “relativa facilidade” em suportar as novas exigências (anabolismo). Também é o processo pelo qual os nossos corpos eliminam qualquer tecido que não seja mais necessário (catabolismo). Esses processos pelos quais a homeostase é alcançada, ocorrem em um nível microscópico e cada tipo de tecido tem uma diferente taxa de resposta de adaptabilidade. Então, os processos pelos quais a homeostase é mantida podem ser melhor entendidos como acontecendo por meio de microadaptações. Este é um fator importante para a compreensão da progressão. A progressão do cliente-paciente pode ser identificada a cada sessão de exercícios, quando observamos a microadaptação, por isso devemos medir o progresso de forma diferente. Devemos observar o controle sobre a contração e sobre o movimento. Ao observarmos os detalhes podemos adicionar pequenas quantidades de estímulo, constantemente, porque estamos prestando atenção ao que muda. Quando necessário voltamos atrás em aspectos que, muitas vezes, outros profissionais não voltariam, porque estamos observando o progresso “constante” dentro da microadaptação. A homeostase e a microadaptação O que produz mudança é a tentativa do corpo em gerar a “facilidade” e a “normalidade”. Para gerar adaptação e estimular a homeostase, é necessário aplicar um pouco mais de desafio do que o cliente-paciente está acostumado, mas não deve ser em excesso, então, a quantidade de estímulo necessário para gerar mudança ou para manter aquilo que já existe vai depender de quem é o nosso cliente-paciente. Por isso, precisamos criar exercícios com o tipo de resistência apropriada para cada indivíduo, cada sessão, cada exercício e cada repetição. Existem dois extremos para criarmos o estímulo para uma sessão de exercícios dentro do que é apropriado para estimular a homeostase: o mínimo necessário para gerar mudança ou o máximo tolerado. Entre estes extremos, existe um Continuum de possibilidades. Quando a tolerância e a habilidade do cliente são muito baixas, o mínimo de estímulo 232 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia c o n t i n u u m necessário é também o máximo tolerado, porém, quando a tolerância e habilidade do cliente-paciente são altas, este cenário muda. Analogia: Considere a diferença do processo de desenvolvimento de um calo e de uma bolha. Uma bolha é formada quando muita força é aplicada num mesmo lugar com pouco tempo para a adaptação, você sente quando ela aparece, exigindo sua atenção imediata. Quando um calo é formado, ele não chama atenção imediatamente, pois sua formação só é perceptível ao final do processo, quando a pele já se adaptou progressivamente e apropriadamente. Para gerar adaptação da performance interna [função], os números não se aplicam! Para gerar a adaptação/mudança esperada na performance interna (função), a progressão através d o e x e r c í c i o de parâmetros numéricos (de séries, de repetições, de peso etc.) não se aplica. Estes números são aleatórios e voltados para resultados externos. Para a performance interna, observamos a homeostase e todos os aspectos da adaptação (o controle sobre a contração, sobre o movimento, sobre o trajeto, a amplitude de movimento etc.) e usamos estes como parâmetros e como indicativo de adaptação e progressão. Toda adaptação gerada nos tecidos contráteis e não contráteis, seja positiva ou negativa, acaba sendo parte do novo cenário da estrutura do indivíduo [função/TER] e a adaptação obtida é transferida para todas as atividades (exercícios, métodos ou esporte) que realizará. Quando trabalhamos um joelho tornando-o melhor, temos um joelho melhor para tudo, para correr, para praticar esportes, para sentar e levantar. Ao iniciarmos o processo de construção de exercícios, já precisamos ter em mente que todas as adaptações geradas na estrutura, na anatomia, transformam o corpo em uma máquina melhor e esta terá mais e melhor disponibilidade [TER] para ser usada e colocada à prova durante as atividades da vida cotidiana ou do esporte. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 233 Continuum do exercício e o O.D.E. [objetivo do exercício] c o n t i n u u m O Continuum do exercício é a organização do raciocínio crítico para as decisões a serem tomadas diante das escolhas de estímulos que podemos aplicar. Cada estímulo possui uma adaptação esperada, isto é, cada estímulo tem o potencial de gerar uma adaptação específica. Os princípios da Mecânica Articular, Mecânica Muscular e Mecânica da Resistência (A Mecânica do Exercício) são a realidade “física” de todos os componentes a serem manipulados para criarmos os desafios apropriados para clientes-pacientes. Já estudamos que existe uma diferença fundamental entre performance externa e performance interna dentro da prescrição do exercício e, então, no momento em que vamos construir ou escolher um estímulo mecânico (exercício), o primeiro passo é determinar se queremos influenciar a contração muscular [PI] ou o movimento [PE]. Esta decisão deve ser tomada diante de cada exercício que o profissional prescrever. O profissional precisa saber o Objetivo “DESTE” Exercício, para ter certeza que o estímulo escolhido vai de encontro com o que se espera de adaptação. Objetivo Deste Exercício – O.D.E. Existem dois objetivos fundamentais para cada exercício [O.D.E.]: 1. Estimular um tecido específico (por exemplo, um exercício para a musculatura abdominal): para isso, existe a necessidade de desafio, de estímulo focado, performance interna [PI]; 2. Utilizar o tecido pronto dentro de um sistema (por exemplo, um exercício que envolve a musculatura abdominal): desafio disperso, performance externa [PE]. d o e x e r c í c i o escolha e quais aspectos estão sendo sacrificados? Se escolhermos exercícios com foco na contração muscular, sacrificamos o treinamento da habilidade; se escolhermos estímulos que exijam muita habilidade, sacrificamos o estímulo para a contração muscular. Esta escolha é específica e individual para cada exercício, não é uma escolha para a sessão inteira. Podemos criar exercícios com diferentes objetivos dentro de uma mesma sessão de exercícios. Precisamos ter o cuidado de não deixar que métodos e modas limitem a prescrição do exercício a estímulos que se encontrem somente em um extremo do Continuum do exercício e, consequentemente, limitem a possibilidade de evolução do seu cliente-paciente. Por exemplo, a nova tendência do mundo do exercício (moda) tem disseminado a ideia que trabalhar músculos isoladamente é ruim porque não treina os músculos da maneira com que trabalham ou funcionam normalmente e, consequentemente, esta maneira de trabalhar os músculos não seria funcional. Para sabermos o que realmente acontece nestes tipos de exercício, precisamos aprofundar o estudo sobre músculos trabalhando isoladamente ou não e, para esta análise, precisamos trazer a mecânica do exercício para o cenário. Exercício isolado é diferente de exercício com desafio focado. Uma vez que o objetivo seja determinado, iniciamos o processo de criação do estímulo (desafio, exercício) específico. Quais aspectos ou formas de estímulo/desafio são oferecidos com a minha A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 235 CONTINUUM DO EXERCÍCIO MUNDO TRADICIONAL DO EXERCÍCIO TÉCNICAS MANUAIS AVANÇADAS PERFORMANCE EXTERNA PERFORMANCE INTERNA FUNÇÃO TEM? » OTIMIZAR, DESENVOLVER TRADIÇÃO IARTICULAR UN < ADMA ADMA ADMA + ADMAA Menos fatores administrados Maior o potencial de output dependente do nível de controle > ADMA MLTART PR = PE TRAJETO GUIADO ADMR TRAJETO GUIADO MENOR VÁRIAS COMBINAÇÕES SUPORTE HABILIDADE NECESSÁRIA MODA AVANÇADO SUPORTE SEGMENTAÇÃO MODA ATUAL FOCO EXTERNO VISANDO A MELHORA DA HABILIDADE MAIOR JUST DO IT PRÁTICA PERFEITA Mais fatores administrados » ADCCD » ADPAD USAR? IEP ou HÍBRIDO TENSÃO Menor estímulo para tensão Tudo além da ADMAA exige um certo nível de habilidade do cliente. O nível de habilidade varia da manutenção da posição para administrar muitos fatores juntos. Fig. 166. Con ra explicação detalhada na página 243. c o n t i n u u m d o e x e r c í c i o A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli Fig. 167. A prancha é um exercício em que todos os músculos do corpo estão trabalhando em isometria, sem nenhum movimento. Mesmo assim é considerado integrado pelo mundo “funcional”. Quando falamos sobre exercício isolado, precisamos diferenciar entre movimento articular isolado e isolamento de um único músculo. Exercício que move somente uma articulação é diferente de exercício que gera estímulo para um único músculo. Estudamos nos capítulos da mecânica articular e da mecânica muscular que não existe como isolar somente um músculo durante um exercício, pois todo exercício é integrado. Na realidade, não é possível isolar um músculo, mas é possível escolher mover somente uma articulação, mas isso não significa que apenas um músculo esteja recebendo o estímulo (sendo trabalhado). Para podermos analisar o conceito de isolamento e integração que hoje tem sido disseminado, vamos avaliar e comparar – por meio da mecânica – alguns exercícios que se tornaram populares por serem considerados “funcionais”. O primeiro é a prancha [Fig. 167]. Este exercício tem como objetivo estimular a musculatura do core (tronco) sem movimento nenhum, 100% da musculatura em isometria, em que todo o foco do exercício está em conseguir manter o corpo estático. Para o mundo “funcional”, este exercício é considerado integrado, mesmo sem mover nenhuma articulação. O segundo exemplo é o exercício de lenhador [Fig. 168], no qual todas as articulações do corpo estão se movendo e que também é considerado integrado. Estes são dois exemplos de exercícios classificados atualmente como funcionais por serem considerados integrados, com a diferença que no exemplo da prancha não existe movimento em nenhuma articulação. Já no exemplo do lenhador quase todas as articulações estão em movimento. Então, acreditam que, para ser considerado “funcional”, o exercício tem que “mover” todas as articulações. Porém, se o exercício mover somente uma articulação e todas as outras permanecerem estáticas, acreditam que o exercício seja isolado e, consequentemente, não funcional. Qual é a lógica deste conceito? Fig. 168. Durante o exercício do lenhador todas as articulações do corpo estão em movimento. Ele também é considerado integrado pelo mundo “funcional”. 238 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia c o n t i n u u m O terceiro exemplo é o exercício em uma cadeira extensora [Fig. 169], no qual uma articulação se move e todas as outras estão estáticas. Este exercício oferece suporte com a cadeira, mas ainda assim o retofemural puxa na pelve anteriormente e os isquiotibiais posteriormente e, para que a pelve não se mova e permaneça estável, precisamos ter a participação de todos os músculos estabilizadores do quadril, da coluna, do tronco etc. Analisando este exercício, podemos concluir que, mesmo movendo somente uma articulação (e deixando todas as outras estáticas), temos muitos músculos trabalhando, logo ele não pode ser considerado “isolado/não funcional”. Este mesmo cenário mecânico se repete em todos os outros exercícios considerados isolados. Fig. 169. O exercício de extensão de joelho na cadeira extensora move somente uma articulação, porém muitas outras estão recebendo estímulo. Elas estão trabalhando para se manterem estáticas, em isometria. No “mundo funcional”, esse exercício é considerado isolado e consequentemente “não-funciona”, porém do ponto de vista da mecânica esta “classificação não é coerente. d o e x e r c í c i o Na realidade da mecânica do exercício, se existe um Braço do Momento para alguma articulação, então existe resistência para todas as articulações de controle ativo [Fig. 170]; quer escolhamos movê-la ou não, a musculatura em torno daquela articulação está trabalhando arduamente para mantê-la estática. Sendo assim, não existe isolamento muscular. Fig. 170. Exemplo da flexão do ombro resistida. O movimento acontece na articulação do ombro. O halter posicionado a certa distância do eixo dessa articulação gera um braço do momento e, por consequência, torque para o ombro. Porém, não é somente para a articulação do ombro que existe um braço do momento. Na verdade, o halter na mão está gerando um braço do momento para todas as artiulações de controle ativo. Então, todas estas estão sendo desafiadas, quer se movam ou não. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 239 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli Todos os exercícios geram estímulos para todas as articulações de controle ativo. Isso não quer dizer que todas as articulações são desafiadas da mesma maneira ou com a mesma intensidade. Na verdade, o que o mundo tem chamado de isolamento quando enxerga um exercício é quando alguns músculos são desafiados mais do que outros porque são eles os responsáveis por mover a resistência enquanto outros são responsáveis por manter a estabilização. Este é o mesmo cenário que acontece em todos os exercícios, independentemente do número de articulações que se movem. Temos que saber construir exercícios apropriados para otimizar o que o cliente-paciente [TEM] independentemente de “nomes” ou julgamentos preestabelecido. Temos que aplicar os princípios da mecânica articular, da mecânica muscular e da mecânica da resistência para ajudar a estrutura deste cliente-paciente, otimizando sua função e melhorando sua posição dentro do Continuum Funcional. Cada variável da equação do exercício compõe um continuum em si mesma e exige que o profissional tome decisões sobre cada uma delas em cada exercício. Fig. 171. 1. Posição (P): decisões sobre as opções de posição. 2. Movimento (M): decisões sobre o movimento. [PM] são as posições e movimentos exatas das articulações escolhidas para o exercício. Da perspectiva mecânica, as articulações são os centros fundamentais da posição e do movimento. Aqui, as “articulações” incluem o “músculo” e também qualquer fator que o habilita a controlar uma articulação. Isto envolve todo o sistema de produção de força interna e seus sistemas: sensorial, muscular e articular. Um exercício é composto por posições articulares estáticas e por movimentos articulares. As articulações que devem estar estáticas durante o exercício são tão importantes quanto as que estão se movendo. Se uma articulação que deve estar estática se move durante o exercício, os perfis da resistência e da potência são alterados e normalmente isso acontece inconscientemente para diminuir o desafio. Então, controlar as articulações que devem permanecer estáticas é essencial. Outro fator a ser considerado sobre P/M é que os músculos biarticulares influenciam duas articulações. O posicionamento da articulação adjacente (do outro lado da inserção do músculo biarticular) para a realização do exercício vai alterar o perfil da potência, então ela deve ser escolhida e mantida com cautela. 3. Suporte/Restrição (S): Decisões sobre o Continuum do suporte e da restrição. Quanto mais apoio e restrição tiver o exercício, mais focado no tecido será o desafio. Se o objetivo do exercício for influenciar a performance interna e a função, será necessária a presença tanto do apoio quanto da restrição. Quanto menor for o apoio e menos restrição tiver o exercício, maior será a dispersão do estímulo entre diferentes articulações para a execução do exercício e, consequentemente, o exercício se inclinará mais para a performance externa. 240 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia c o n t i n u u m Se o objetivo for melhorar a tolerância de um tecido específico, será necessário que o suporte (apoio) esteja próximo da articulação que está se movendo. Exercícios sem apoio ou com apoio utilizando pranchas de equilíbrio ou bolas não geram estímulos suficientes para tecidos específicos (ANDERSON;BEHM, 2004), e ainda eliminam a possibilidade de melhorar a capacidade de tensão ou a capacidade de contração muscular de um tecido. É necessário ter critério em relação a qual é o seu objetivo antes, por exemplo, de colocar uma bola como base de suporte para um cliente-paciente realizar um exercício. 4. 4. Resistência (R): Decisões sobre a resistência estratégica e sobre o perfil da resistência. A resistência precisa ser apropriada em todos os seus aspectos para que o objetivo seja mantido até a última repetição da série. Quando a resistência não é adequada ou se durante a série os detalhes da posição, do movimento e da intenção (as quais alteram a resistência) deixam de ser monitorados, o exercício pode deixar de influenciar um tecido [PI] e passar a ter um estímulo disperso [PE] e o objetivo do exercício [O.D.E] não será atingido. O estudo da mecânica da resistência, apresentado nos capítulos anteriores, indica os fatores mecânicos necessários para manipular o exercício para cada indivíduo. Na verdade, precisamos entender e manipular o perfil de resistência exato para que as mudanças sejam estratégicas: a. Perfil da resistência [PR] são as mudanças na demanda. Por exemplo: “onde está difícil e onde está fácil”; b. Perfil da resistência é afetado pela direção, d o e x e r c í c i o pela magnitude e pelo posicionamento da carga relativa à articulação/às articulações; c. “Sobrecarga” ou, melhor, “carga ideal” para estimular uma adaptação/mudança. Decisões sobre [P/M] são tomadas ao mesmo tempo em que as decisões sobre [R/S]. Estes quatro componentes formam o exercício. 5. Intenção (I): Decisões sobre a intenção (aplicação avançada). As decisões sobre a intenção também determinam se o resultado de um exercício será direcionado à performance interna ou à performance externa. A intenção interfere diretamente no perfil da resistência. A maneira com que ensinamos (intenção) o clientepaciente influencia como ele vai mover a carga/peso; se ele mover a carga sem controle sobre a inércia, haverá interferência na mecânica da resistência (altera o perfil da resistência), na mecânica muscular (altera o perfil da potência) e na mecânica articular (altera as forças articulares). A intenção é o que o profissional ensina (indica) para o cliente-paciente fazer durante o exercício. Nas mãos certas, a intenção tem o potencial de ser a maior influência no resultado do exercício, englobando todos os fatores acima e transformando um exercício descuidado em estratégico ou um exercício sem sentido em significativo: a. Intenção e posição/movimento [I e P/M] significa o cliente-paciente ter o controle para garantir a exatidão e precisão do exercício; b. Intenção e resistência [I e R] significa o esforço sendo estrategicamente direcionado contra a restrição, alterando a direção da resistência e, consequentemente, a própria A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 241 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli resistência. Pode ser uma ferramenta para alterar as forças articulares, a ação do músculo e a sensação; c. Intenção e Esforço [I e E] significa o esforço focado que altera estrategicamente a “intensidade”. Por este ser um livro básico de mecânica do exercício, a intenção será explorada superficialmente no capítulo sobre a orquestração, pois é necessário um estudo mais amplo para seu completo entendimento. 6. Esforço (E): Decisões sobre o esforço. É quão difícil ou fácil o cliente-paciente está trabalhando durante cada repetição do exercício, independentemente da carga aplicada. O Esforço vai determinar quantas vezes será possível repetir o estímulo e também qual a frequência que será apropriada, quer dizer, quando será apropriado que o indivíduo retorne para este exercício ou para um estímulo semelhante. 7. 7. Tempo (T): Decisões sobre tempo. As decisões sobre esforço e tempo são lineares e crescem de menos para mais e de menor para maior de acordo com o objetivo e a tolerância do cliente-paciente. Esta é uma variável muita ampla, está relacionada com “como vamos realizar o exercício” e envolve decisões sobre: a. Velocidade do movimento: é dependente da progressão, do controle e da resistência. São, na verdade, as acelerações e desacelerações de cada fase. A aceleração deve ser monitorada constantemente, pois é um fator que interfere diretamente na resistência por meio da inércia; b. Duração: são as repetições, as séries, o treino, o descanso e a frequência do exercício. Porém, para a prescrição clínica do exercício para a otimização da performance interna, utilizamos os números de série e repetições, bem como o tempo, como referência na documentação. Não utilizamos esses parâmetros como forma de progressão. Para a progressão utilizamos, como parâmetros, o controle e a tolerância, independente dos números. 8. Frequência: Decisões sobre frequência. Existe a necessidade de voltar e de fazer novamente. Se não retornar e não fizer o exercício novamente o estímulo de pouco valeu. Frequência significa que “haverá outro”. Se não houver outro dia para estimular aquele tecido não há qualquer razão para fazer o exercício hoje. • Orientado a padrões de movimento, performance externa • Orientado a componentes da função, performance interna • Menos apoio externo • Mais apoio externo • Trajetos de movimentos controlados ativamente • Maior grau de restrição no trajeto (trajeto guiado) • Base pequena apropriada ou plataforma instável • Base de apoio estável • Diminui a capacidade de sobrecarregar • Aumenta a capacidade de sobrecarregar 242 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia Fig. 172. c o n t i n u u m 9. Apropriado [A] Apropriado aqui tem o sentido de adequado. As variáveis anteriores, de 1 a 8, precisam ser pensadas, apropriadas e adequadas para cada indivíduo: a. É determinado pela progressão e pela habilidade atual do cliente-paciente; b. É necessário conhecer a estrutura e os efeitos das ferramentas que temos disponíveis, identificando o que é preciso para gerar estímulos adequados específicos a cada cliente. Para a criação de um exercício, é necessário Criar o desafio estrategicamente. Função O Continuum do Exercício se refere à criação de estímulos mecânicos estratégicos para influenciar o Continuum Funcional. Então, vamos analisar dentro de cada etapa do Continuum Funcional, quais são as características mecânicas do estímulo, ou seja, do exercício, que são mais apropriadas para influenciar positivamente o tecido nesta etapa. EXERCÍCIOS PARA INFLUENCIAR O TER? São estímulos criados para otimizar e desenvolver a função a qual envolve a capacidade de tensão ou output. Desenvolvendo e Otimizando a FUNÇÃO: Fig. 173. d o e x e r c í c i o Função é composta por: [ADPAD] Amplitude de Posições Articulares Disponível [ADCCD] Amplitude de Comprimentos Contráteis Disponível Quando existe uma disfunção ou quando a sensibilidade contrátil e a capacidade contrátil estão ausentes em alguma posição e, consequentemente, a capacidade de mover o membro em uma posição específica está “faltando”, a intervenção mais adequada exige técnicas manuais avançadas. Estas técnicas podem iniciar com a mobilização articular seguidas por contrações isométricas de baixa intensidade para restaurar a qualidade da contração muscular. Capacidade de tensão Desenvolvendo e Otimizando a Capacidade de Produção de Tensão (output): Fig. 174. Os exercícios de performance interna, que têm como objetivo otimizar a qualidade e a quantidade da contração muscular (capacidade de tensão contrátil), devem ser sobrecarregados em somente uma articulação para diminuir a necessidade de habilidade durante a execução do exercício. Quando o A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 243 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli exercício é uniarticular, a possibilidade de criar um perfil da resistência compatível com o perfil da potência é maior, tornando o desafio mais focado no tecido e isso é uma exigência quando a necessidade da otimização da capacidade de tensão é presente. Também obrigatoriamente necessitam de apoio e restrição próximos da articulação, garantindo que o desafio será focado. Exercícios uniarticulares 1. Capacidade de tensão < ADMA (amplitude de movimento ativa): Neste cenário, o músculo não possui capacidade de produzir tensão suficiente para superar o peso do membro contra a resistência (gravidade) em uma posição específica (perfil da resistência). Intervenção: criar exercícios para desenvolver a sensibilidade da contração muscular por meio de técnicas manuais avançadas e de exercícios isométricos em posições específicas para a otimização da sensibilidade da contração e, posteriormente, a quantidade de contração. O desafio deve iniciar dentro da ADMP (amplitude de movimento passiva), progredindo para a ADMAA (amplitude de movimento ativa assistida) até alcançar a ADMA. Quando o cliente-paciente alcançar uma amplitude em que a contração muscular seja produzida, o fisioterapeuta então inicia o trabalho de estímulo para melhorar a qualidade dessa contração. Normalmente a contração é mais fácil de ser produzida na porção média do comprimento contrátil, então é nesse ponto que, provavelmente, o estímulo da contração deve iniciar. A partir daí, a progressão deve ser feita em direção a comprimentos contráteis mais longos e depois mais curtos. Uma vez desenvolvida a qualidade da contração, isto é, a contração já se mostra mais sólida em certo comprimento. Ali é possível iniciar o trabalho de otimização da quantidade da contração com a aplicação de desafio com resistência manual e isometrias até que a capacidade de produção de tensão aumente o suficiente para que a tensão seja capaz de igualar ao peso do membro. 2. Capacidade de tensão = ADMA Aqui, existe capacidade de produção tensão contrátil suficiente para igualar com o peso do membro contra a resistência. Intervenção: criar exercícios para otimizar a quantidade da contração muscular por meio de um cenário mecânico apropriado dentro da tolerância do cliente-paciente. Esse cenário exige o cuidado de ter o perfil da resistência compatível com o perfil da potência e isso deve acontecer sobrecarregando somente uma articulação em cada exercício. A necessidade de apoio/suporte e restrição deve estar presente. 3. Capacidade de tensão > ADMA Neste momento, a capacidade de produção de tensão já é suficiente para superar o peso do membro contra a resistência. Intervenção: uma vez que neste cenário já é apropriado adicionar sobrecarga (ADMR – amplitude de movimento resistida), o exercício a ser criado exige um cenário mecânico com mais suporte próximo à articulação que se move. O movimento deve ter seu trajeto guiado com maior restrição para que o potencial de otimização da capacidade de tensão seja elevado e a necessidade de habilidade de coordenação específica seja baixa. O perfil da resistência precisa se encaixar ao máximo possível dentro do perfil da potência para que o estímulo seja apropriado e não incentive a compensação. 244 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia c o n t i n u u m d o e x e r c í c i o Fig. 175. Essa é uma máquina de flexão de joelho sentada. É um exercício uniarticular que possui suporte e restrição necessários para alcançar a possibilidade de gerar estímulo focado na contração muscular. Essa máquina estimula o músculo isquiotibial do comprimento mais longo até o médio. O perfil da resistência inicia mais fácil e fica mais difícil durante o trajeto devido às manipulações do braço do momento feitas pelo CAM. Atente-se que cada máquina oferece um perfil da resistência diferente. É necessário que o profissional examine-o caso a caso. Fig. 176. Cadeira extensora com estímulo para o quadríceps. Este é um exercício uniarticular que possui suporte. Esta máquina estimula o comprimento contrátil médio até o mais curto. O perfil da resistência inicia mais difícil e fica mais fácil durante o trajeto. No exemplo dessa máquina o perfil da resistência se encaixa no perfil da potência. Lembre-se sempre de que é necessário um exame individual das peculiaridades de cada equipamento. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 245 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli Exercícios multiarticulares MLTART Fig. 177. Exercício de flexão de cotovelo. Esse é um exercício uniarticular, porém sem suporte. A ausência de suporte facilita a performance externa e requer maior controle sobre as articulações. Esse controle deve estar presente para que somente as articulações sobrecarregadas se movam. Assim, mantém-se o foco do exercício na contração muscular. Se outras articulações se moverem, a resistência é distribuída e o potencial de influenciar o tecido específico diminui. Fig. 178. Uma vez que a capacidade de tensão contrátil tenha sido otimizada, o primeiro progresso em incluir maior habilidade específica de controle para a realização do exercício é a inclusão de exercícios multiarticulares. Intervenção: a otimização da capacidade de produção de tensão neste cenário mecânico exige suporte próximo à articulação que se move. O movimento deve ter seu trajeto guiado para que o potencial de otimização de capacidade de tensão seja elevado e a necessidade de habilidade de coordenação específica ainda seja pequena. A necessidade de desenvolvimento da habilidade em exercícios multiarticulares com apoio é maior do que nos exercícios uniarticulares, porém menor do que nos exercícios multiarticulares com menos apoio. Estes exercícios ainda têm o foco na performance interna, o que indica que, mesmo utilizando múltiplas articulações, o foco está na otimização da quantidade da contração muscular em diferentes comprimentos. Para isso, é imprescindível que o perfil da resistência seja o mais compatível com o perfil da potência para que o estímulo seja apropriado e não estimule a compensação. Por último, é necessário ressaltar novamente que, se o cliente arremessar o peso ou as posições que necessitam estar estáticas se moverem, o foco do exercício muda para a performance externa. 246 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia c o n t i n u u m d o e x e r c í c i o trajeto guiado (menos restrição) e com maior grau de liberdade, exigindo maior controle ativo sobre muitas articulações. O desafio é distribuído e a possibilidade da otimização da capacidade de tensão diminui. Chamamos esses exercícios de híbridos, porque fazem uma integração estrategicamente progredida entre a otimização da capacidade de tensão e a utilização desta tensão com o desenvolvimento de habilidades específicas. Nesta fase, existem várias combinações que podem ser criadas, mas todas precisam ser estratégicas. Fig. 179. Exercício multiarticular de empurrar, em uma máquina com trajeto guiado. Máquinas desse tipo têm o potencial de alterar a resistência para que o perfil seja compatível com a potência, favorecendo o foco na contração mesmo em um exercício multiarticular. Tradição EXERCÍCIO TRADICIONAIS Fig. 180. Tradicionalmente, os exercícios multiarticulares que utilizamos possuem um perfil da resistência [PR[ não tão próximo ao perfil da potência [PP], favorecendo a performance externa [PE]; [PR = PE]. Normalmente, utilizamos exercícios com menor Fig. 181. O agachamento é um exemplo de exercício tradicional híbrido. O trajeto não é guiado, o suporte é distal às articulações que se movem (desconsiderando o tornozelo) e, ainda, o perfil da resistência é oposto ao perfil da potência. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 247 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli Fig. 182. Um exercício de extensão do ombro horizontal ou um exercício de puxar é multiarticular. Neste exemplo, o exercício não tem apoio próximo à articulação que está se movendo e o trajeto não é guiado. Como está usando um cabo, o perfil da resistência é oposto ao da potência, favorecendo a performance externa. SEGMENTAÇÃO DO EXERCÍCIO EXERCÍCIOS QUE ESTãO NA MODA Fig. 183. A segmentação de um exercício deve ser usada para a melhora de uma habilidade. Ela é necessária quando, dentro da progressão, existe a necessidade de segmentar um movimento ou uma habilidade para desenvolver suas propriedades separadamente e depois utilizá-las em conjunto. Aqui temos como exemplos a marcha ou o sentar e levantar. A segmentação de cada movimento da atividade e o desenvolvimento da habilidade em executar cada parte do movimento separadamente deve acontecer depois da otimização do tecido específico dentro da performance interna. Fig. 184. Normalmente, os métodos que entraram na moda, como o treinamento funcional, incluem em seu cenário mecânico a diminuição do suporte e a adição de graus de instabilidade, utilizando bolas ou plataformas de equilíbrio como base de suporte. Este cenário mecânico não favorece a produção de tensão. Quanto maior o grau de desequilíbrio, menor a capacidade de gerar tensão em um músculo. 248 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia c o n t i n u u m d o e x e r c í c i o EXERCÍCIO DA Moda atual Fig. 185. Os exercícios, que hoje estão na moda, têm seu foco externo. Neles, a capacidade de tensão já otimizada durante os exercícios uniarticulares e multiarticulares da performance interna é usada para realizar uma habilidade específica, como correr, andar, saltar, nadar, andar na esteira, jogar tênis ou futebol etc. É necessário que todas as partes da função estejam funcionando bem para cumprirem a tarefa de maneira perfeita. A nova moda é o crossfit ou métodos como a Teoria Laranja ou, ainda, o HITT (High Intensity Interval Training). Nesses exemplos, o exercício é um esporte e o foco está no tempo, na carga e no resultado final. Fig. 186. Exercício dentro da moda atual, que não possui apoio, não possui restrição. Ele utiliza o timing da inércia para redução do estímulo. Este é um exemplo de exercício para a performance externa. O objetivo é levantar mais peso utilizando todo o corpo e com o foco no desenvolvimento da habilidade e não da contração muscular próxima à articulação. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 249 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli Fig. 187. Exercício dentro da moda atual, com apoio distal às articulações que se movem, não possui restrição. Este é um exemplo de exercício para a performance externa. O objetivo é estimular o corpo todo sem ser muito específico do que está sendo estimulado. O foco está no desenvolvimento da habilidade e não na contração muscular. Fig. 188. Exemplo de exercício híbrido, multiarticular e com adição de superfície instável. Quando a instabilidade é acrescentada, ela compromete a possibilidade de estimular a contração muscular. Devemos considerar que estes são exercícios que usam a contração, mas não a otimizam, eles treinam uma habilidade específica. A repetição do movimento bruto não faz com que músculos, no caso de não estarem funcionando em seu estado ótimo, passem a funcionar. Normalmente, estes exercícios são realizados utilizando o peso corporal como resistência ou carga externa, fazendo o uso das propriedades da inércia, e o perfil da resistência limita a otimização de comprimentos contráteis mais curtos e mais longos. 250 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia c o n t i n u u m Exercícios de performance externa d o e x e r c í c i o 2. Foco na distração: São os exercícios realizados “sem foco algum”. O exercício é realizado lendo revista, assistindo filme, usando o tablet ou telefone, conversando etc. O objetivo está em cumprir certo número de séries e repetições, independentemente de como o cliente-paciente o realizará. Fig. 190. Exercício de performance externa com foco na distração. Fig. 189. Exercício de performance externa com foco no objeto exige muito treino e prática para otimizar o esporte. Os exercícios de performance externa podem ser realizados de duas maneiras relacionadas com a atenção e o foco: 1. Foco no objeto: Exige alta concentração e total controle de todas as partes internas/função para atingir ótimos resultados. O sucesso está na precisão com que o corpo, com todo seu potencial sendo usado ao mesmo tempo, alcance melhor resultado com um objeto externo, como acertar a bola de beisebol ou do tênis, acertar o alvo no arco e flecha ou o chute ao gol. São os esportes e os exercícios voltados para o treinamento desportivo específico para o esporte. A criação de novos exercícios baseados no cliente é uma função complexa, porém muito satisfatória, porque carrega consigo grandes possibilidades de sucesso, tanto de melhores resultados para os clientes-pacientes quanto de maior valorização do profissional. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 251 A Orquestração Organização da Contração em uma Solução de Recrutamento Motor c o n t i n u u m N este capítulo, apresentaremos como o cérebro interpreta e responde à aplicação de força em seu sistema neuromusculoesquelético por meio da orquestração. Os princípios mecânicos que influenciam a resposta motora já foram abordados neste livro e agora apresentaremos como a organização desta resposta motora (da contração muscular) acontece. Durante 20 anos temos ensinado profissionais sobre exercício e estamos sempre evoluindo, não somente em nossos estudos, mas também em como ensiná-los de maneira simples. Para isso, usamos analogias associadas a imagens que facilitam o aprendizado e trazem à vida conceitos, às vezes, difíceis de entender como colocá-los em prática apenas lendo um livro. Usamos as analogias como ferramentas educacionais para podermos “ver claramente” e para termos a ciência disponível em nossas mentes, ajudando o profissional a trazer a ciência à vida em sua prática diária. O aprendizado motor é um estudo complexo, porém aqui vamos abordar o processo da organização em que a contração muscular acontece dentro de uma solução do recrutamento motor para nos ajudar a tomar decisões frente aos desafios motores que nossos clientes-pacientes apresentam. Desafios estes que precisamos influenciar para alcançarmos melhores resultados com a prescrição do exercício. Para isso, usaremos a analogia de uma orquestra e a palavra orquestração para identificar “o processo da organização da contração”. A palavra orquestração é muito importante para explicarmos este processo, porque, quando uma orquestra toca uma sinfonia, por exemplo, existem inúmeros fatores acontecendo ao mesmo tempo, similarmente ao que acontece com o nosso corpo. Por exemplo, para a manutenção da posição sentada, existem músculos que estão trabalhando mais do que outros para sustentarem o tronco e, durante algum tempo, algumas fibras vão fadigar, dei- d o e x e r c í c i o xando de participar desta orquestração. Em compensação, outras que fadigaram antes e já se recuperaram voltarão a ajudar a manter a posição, enquanto outras fibras vão sair da orquestra. Este é um processo constante e contínuo do recrutamento muscular em nosso corpo. Voltando à orquestra tocando uma sinfonia, normalmente muitos músicos estão tocando partes diferentes da música com diferentes instrumentos. Assim, no mesmo momento que alguns músicos estão tocando em uma escala musical mais alta, outros tocam numa escala mais baixa, alguns estão tocando num volume alto e outros num volume baixo, há também aqueles que esperam o seu momento para tocar seu instrumento, e todos tocam a parte da música pela qual são responsáveis. Quando se passa de uma parte a outra da sinfonia, mudando assim seu som, é porque existiu uma mudança na participação dos músicos, o quanto e como estão participando; muda também quais deles entram ou saem de partes específicas da música. Durante a sinfonia, existem partes que somente um músico toca, chamadas de solo. Podemos analisar que, em um solo, somente um músico participa ou podemos analisar que um músico continua participando enquanto todos os outros ficam em silêncio. É muito importante reconhecermos este fato na orquestra, assim como no exercício, quando identificamos que um músculo está se destacando mais em sua apresentação. Pode ser, na verdade, que ele sempre esteve participando, mas só agora os outros deixaram de participar a ponto de conseguirmos perceber a sua atuação. Assim como cada instrumento é fundamental para que a “sinfonia” seja tocada perfeitamente, também são nossos músculos em relação a qualquer movimento em nosso corpo. Independentemente do tamanho do músculo, todos eles são essenciais dentro de seu papel individual para que o movimento seja perfeito. O papel dos músculos pequenos é essencial – quando eles faltam, o sistema todo falha. Assim A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 253 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli sendo, podemos comparar todas as unidades motoras dos músculos em nosso corpo aos músicos tocando seus instrumentos numa orquestra. Todos eles tocam seus instrumentos obedecendo ao comando do maestro, que é aquele que conhece profundamente a sinfonia. Ele sabe qual músico chamar para participar em cada momento e também qual a intensidade necessária de cada instrumento para que a sinfonia tenha o som que precisa ter. O maestro conhece as qualidades de cada músico e tem o ouvido tão preparado que percebe qualquer dissonância. Quando a música está destoante, o maestro analisa cada músico para saber qual está causando a dissonância e este precisa treinar individualmente sua parte novamente ou afinar seu instrumento separado da orquestra. Os músicos não aprendem suas partes ou praticam suas partes somente dentro da orquestra, eles praticam sozinhos e só depois se unem para ajustarem todas as partes e praticarem a sinfonia completa. Isso também acontece durante os exercícios, os movimentos e todas as atividades motoras que realizamos. Quando um músculo não está funcionando como deveria é preciso “tirá-lo” do sistema e “afiná-lo” antes de retornar para o exercício ou movimento. O maestro em nosso sistema muscular é o cérebro e é ele que comanda toda a nossa “orquestra muscular”. É importante que o profissional consiga, nesse momento, criar mentalmente uma imagem do cérebro à frente da “orquestra”, da organização das contrações, coordenando e controlando todos estes músicos (músculos) ao mesmo tempo para tocarem uma música (realizarem corretamente o movimento). A “orquestração” de toda esta série ou sistema de músculos dentro do nosso corpo e ao redor das articulações é uma organização de contrações musculares tentando resolver um problema motor, ou melhor, um “quebra-cabeça motor”. Dentro da prescrição clínica do exercício, o próprio exercício (ou o movimento) é o “problema motor” que o cérebro precisa decifrar e resolver. É um “quebra-cabeça motor” porque existem inúmeros fatores a serem administrados para resolvê-lo. Quando você quer levantar de uma cadeira, o cérebro precisa resolver este “quebra-cabeça motor” e “levantá-lo”, caso você queira sentar o “quebra-cabeça motor” passa a ser “sentá-lo”. Existem muitos fatores acontecendo ao mesmo tempo quando temos a ideia e vontade de “levantar” ou “sentar” e estes mudam a cada milésimo de segundo. Nós não precisamos ficar pensando em nenhum destes fatores, simplesmente executamos a tarefa. Vamos explorar como a orquestração, ou seja, a organização da contração acontece: Fig. 191. Fig. 192. 254 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia c o n t i n u u m Primeira etapa [Fig. 192] Na primeira etapa da orquestração, o cérebro identifica como está o estado dos componentes internos, isto é, o quanto de função atual existe disponível neste momento. Ele detecta as posições articulares disponíveis e também os comprimentos musculares que estão disponíveis para participarem deste desafio. O cérebro também detecta o quanto o músculo demostra ter de capacidade de gerar tensão (ou não) e, por último, o quanto de consciência ou percepção é necessária para realizar a tarefa. O cérebro só chama para participar aquilo que o corpo [TEM] de função disponível. O objetivo do exercício é influenciar esses fatores positivamente. Fig. 193. Segunda etapa [Fig. 193] Nosso cérebro está constantemente gerenciando o “estoque interno”, regularmente fazendo um “inventário”. Ele recebe informação de cada neurônio motor sobre o estado atual de cada fibra muscular e só chama para participar da solução o que está disponível e tem possibilidade de participar. As partes que não estão disponíveis, ou melhor, que estão inibidas ou fracas não são usadas. d o e x e r c í c i o Não se pode usar aquilo que não se tem! A partir deste ponto, começa a construção da solução motora em torno de cada cenário mecânico envolvido na tarefa. Por exemplo, vai ser construída uma solução motora orientada para a marcha em torno de um edema no tornozelo; vai ser construída uma solução motora para um agachamento onde o fêmur direito é um milímetro mais longo do que o esquerdo; vai ser construída uma solução motora para outro agachamento onde existe um osteófito suprapatelar; vai ser construída uma solução motora para outro agachamento onde existe artrose no joelho esquerdo; vai existir uma solução motora para resolver cada quebra-cabeça motor considerando inúmeros fatores internos que serão demonstrados através do resultado bruto/global externo; e é este resultado que enxergamos externamente. A assimetria muitas vezes é um resultado motor, é a melhor “música” que poderia ter sido tocada com os músicos e os instrumentos no estado atual. Em outras palavras, é a melhor solução motora ou o melhor resultado possível com os músculos e suas habilidades contráteis naquele momento. O cérebro, sabendo de todos os fatores que nós profissionais não temos acesso, apresentará a melhor solução para o quebra-cabeça. É aqui que precisamos saber o que fazer e determinar qual será nossa intervenção para tentar mudar o resultado. Terceira etapa [Fig. 194] É a adição de um desafio (força) que pode ser a gravidade, quando estamos levantando ou sentando. Às vezes, pode ser o halter; às vezes, a máquina de musculação; às vezes, o cabo do pilates ou até o kettlebell. A maior influência para estimular uma mudança no corpo humano é a força. Se a força não existir, não temos um exercício. Nesta etapa, todos A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 255 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli os fatores que afetam a resistência, isto é, a direção, o posicionamento da carga, o perfil da resistência, incluindo o controle das alterações da inércia e dos braços do momento, devem ser estrategicamente manipulados para obter diferentes resultados nas articulações (como as forças articulares) e para também aumentar a possibilidade de benefício e diminuir o custo. A partir da adição de um desafio, o cérebro vai orquestrar uma solução motora para realizar a intenção do que vamos fazer com o desafio, levando em consideração todos os fatores que envolvem a resistência e as etapas anteriores a cada grau de movimento e esta orquestração muda continuadamente. Como profissionais, possuímos somente duas possibilidades de intervenção dentro do processo da orquestração, a manipulação da resistência e da intenção. Todos os outros fatores são consequências/resultados das nossas decisões sobre a resistência e a intenção. bipodal para unipodal, imediatamente o primeiro movimento que vai acontecer é a oscilação do quadril para a direção da perna de apoio. Isso acontece sem que haja a intenção de alterar a posição do quadril, porém, o cérebro obrigatoriamente precisa manter o centro de massa sobre a base de suporte para não cairmos. Então, imediatamente quando você teve a intenção de mudar o apoio para unipodal, o cérebro, que sabe onde seu centro de massa está, começará a mover o centro de massa para o lugar onde vai ser sua nova base de suporte. Fig. 195. Quinta etapa [Fig. 196] Fig. 194. Quarta etapa [Fig. 195] É semelhante à segunda, porém, agora, são os ajustes que o cérebro vai orquestrar usando o que ele já detectou na segunda etapa para resolver o quebra-cabeça da aplicação da força, do movimento e da manutenção da posição. Por exemplo, se adicionarmos um halter em cada mão e passarmos de apoio 256 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia Fig. 196. c o n t i n u u m INTENÇÃO A A d o e x e r c í c i o Solução voltada para Performance Interna estrategicamente controlada Regulação da co-contração baseado no sentido de resistência O.D.E baseado na eficiência para o objetivo = estímulo eficiente menos desperdício de tempo e esforço Desafio focado na contração Habilidade de controlar a inércia Interrupção da compensação (“roubar“) Habilidade de deixar apropriado para o indivíduo A solução para o quebra-cabeça atual utiliza aquilo que está disponível e evita o que está indisponível (vide Fig. 193) 6 SOLUÇÃO B INTENÇÃO B Dependente da intenção e da atenção Utiliza o padrão de eficiência do cérebro Dispersa o desafio: utiliza todas as articulações possíveis para mover o peso Evita ou elimina o desafio: usa a inércia ao seu favor Habilidade de deixar mais fácil Juntamente com a resistência, a intenção é um fator determinante no resultado e é um dos dois fatores que temos acesso para manipular diretamente. Aquilo que você deseja que o seu cliente-paciente faça durante um exercício, a maneira como você o “ensina”, tem uma grande influência na determinação do resultado. Se o cliente-paciente tiver a intenção de apenas mover o peso de um ponto A para um ponto B, “distraído”, o resultado será muito diferente do que se ele controlar o movimento, a contração e limitar a amplitude, prestando atenção no que está acontecendo internamente. Nesta etapa, o profissional tem a possibilidade de determinar o resultado – que poderá ser a performance interna ou a performance externa – quando indica para o cliente-paciente como mover a resistência. Fig. 197. Sexta etapa Vamos chamar esta etapa de solução para o quebra-cabeça do exercício. Você não consegue usar o que você não tem! O cérebro só vai usar aquilo que TEM e está disponível. O cérebro evita o que está incapaz. O que acontece em primeiro lugar é a orquestração do controle articular A , este é um conjunto de co-contrações de graus variados específicos para cada articulação individual. Quanto mais desafio estrutural a articulação tiver, melhor dizendo, quanto mais instável estruturalmente a articulação for, maior será a necessidade da orquestração da co-contração para manter a integridade da articulação. Por exemplo, a diferença entre o ombro e o quadril. A articulação do quadril não tem muita dificuldade em se manter unida devido à própria estrutura (arquitetura), já A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 257 Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli o ombro é quase totalmente dependente do controle ativo para se manter íntegro. Como já estudamos no capítulo sobre mecânica articular, o controle articular acontece por meio de um cabo de guerra interno em uma articulação. Uma vez que uma resistência é aplicada, existe um cabo de guerra em todas as articulações de controle ativo. Todas! Quando a intenção do exercício é a otimização da contração e da função, a solução motora deve ser a perfomance interna. Para isso, é necessário interromper o padrão de eficiência do cérebro e utilizar a eficiência profissional de controlar as variáveis mecânicas para que seja possível estimular o tecido contrátil em todo seu comprimento, como, por exemplo, o controle da inércia e o desenvolvimento de desafios em que o perfil da resistência é compatível com o da potência. B Se o profissional não intervir no processo-padrão do cérebro, a solução será direcionada para a perfomance externa por meio da integração do maior número de articulações para cumprir uma tarefa. Portanto, se a intenção for de “apenas mover” o peso, ou se não houver intenção nenhuma e o peso for “apenas movido”, o processo da orquestração vai acontecer dentro do padrão de eficiência do cérebro que agirá das duas maneiras, a seguir [B1 e B2]: [B1] O cérebro escolhe sua primeira versão de eficiência, isto é, ele vai dispersar o desafio e tentar usar menos esforço possível com o maior número de articulações possíveis. Por exemplo, para realizar uma flexão de cotovelo (rosca bíceps) com o objetivo de simplesmente mover o peso para cima e para baixo, movê-lo do ponto A ao ponto B, o cérebro vai fazer isso com a musculatura em torno do tornozelo, do joelho, do quadril e do ombro, sem se importar com qual deles está fazendo o trabalho. Para o cérebro, isso é muito inteligente e eficiente porque nenhum músculo precisa trabalhar muito. [B2] O cérebro vai tentar reduzir ou eliminar efetivamente o desafio, a resistência, não somente repartir ou distribuir o desafio, ele vai eliminar o desafio por meio do arremesso do peso. Porque, se o peso é arremessado, a resistência pode chegar a zero no final da contração concêntrica devido aos efeitos da inércia, portanto, nesses pontos, a resistência é anulada. Por exemplo, o resultado será uma “flexão de cotovelo que envolve o corpo todo” se estes dois fatores [B1 e B2] forem colocados juntos. Durante o início do trajeto da flexão, o peso será levantado com qualquer músculo [B1] e depois, no final da amplitude, arremessando o peso, anulando a resistência e eliminando qualquer trabalho muscular [B2]. Isso é suficiente para elevar a frequência cardíaca e cansar, é suficiente para pessoas com uma genética favorável ganharem algum músculo, além de ser suficiente para todos os objetivos da performance externa. Mas é incompleto internamente porque não alcançou a porção mais curta do músculo e não teve trabalho na mais longa, pois o peso foi arremessado. Se esse é o objetivo do exercício e é isso que você está esperando dele, então este cenário é perfeito. Mas, se o seu objetivo é afetar positivamente a saúde e oferecer desafios para melhorar o corpo e a função, o cliente-paciente deve realizar o exercício de outra maneira. O cérebro é projetado para ser eficiente e isso é o que chamamos de “roubar”. O roubo é, na verdade, eficiência mecânica e, se usado estrategicamente, pode até ajudar a alcançar resultados, mas sem estratégia, a eficiência do cérebro tira toda a efetividade e possibilidade de influenciar a performance interna, quer dizer a função. Então, é muito importante entendermos como a orquestração acontece, ou melhor, como a organização da contração muscular acontece dentro de uma Solução de Recrutamento Motor para resolver o “quebra-cabeça motor” de um exercício, para podermos intervir no processo do exercício e obtermos 258 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia c o n t i n u u m d o e x e r c í c i o os resultados esperados. A prescrição clínica do exercício para a restauração, desenvolvimento e conservação da função precisa ser feita com controle. O fisioterapeuta precisa ser eficiente em suas decisões porque, se nunca colocarmos um estímulo intencional nos comprimentos contráteis mais curtos e nos mais longos dos músculos específicos, perderemos a habilidade nesses comprimentos. Com o tempo e com a idade, estes fatores serão responsáveis por trazer disfunções, porque aquilo que não temos não usamos e aquilo que não usamos nós perdemos. aquilo que não temos não usamos e aquilo que não usamos nós perdemos. A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • 259 ORQUESTRAÇÃO CONSTANTE MONITORA MENTO SUBSCONCIENTE DOS COMPONENTES INT ERNOS Possibilidade de intervenção pro ssional Organização da Contração em uma solução de Recrutamento Motor aConstante monitoramento/ gerenciamento do “estoque” interno. Existe uma multiplicidade de fatores que não temos como saber, mas que o cérebro precisa trabalhar com eles e resolver o quebra-cabeça motor. In uência das idiossincrasias: • Assimetrias estruturais • Artrose • Osteó to • Etc. aO que está atualmente disponível? aO que não está disponível? aSó utilizamos aquilo que RESISTÊNCIA O cérebro sempre saberá mais do que nós pro ssionais sobre o que está acontecendo dentro da estrutura do cliente, em tempo real. Principal estímulo para causar mudanças físicas. a Direção a Suporte a Posicionamento a Carga/PR? nós TEMOS. 1 Disponibilidade = disponível + habilidade ESTADO DOS COMPONENTES INTERNOS FUNÇÃO ADPAD ADCCD PERCEPÇÃO 2 3 DETECÇÃO INTERNA DA DEMANDA TENSÃO aForça X Movimento X Posição aIn uência de dé cit sensorial A A Orquestração acontece ao vivo. recálculo acontece a cada .01s » .001s para suprir as demandas em constante mudança, disponível-habilidades etc. Exemplo: Neuropatia Diabética e efeitos no trabalho de equilíbrio. 4 CAPACIDADE DE GERAR TENSÃO INTENÇÃO A Soluções são geradas em tempo real sem padrões predeterminados. • Δ no BM • Δ magnitude • Efeitos da inércia Solução voltada para Performance Interna estrategicamente controlada aRegulação da co-contração INTENÇÃO & ATENÇÃO In uência principal no Resultado Intenção A - Como? a Habilidade de deixar mais difícil a Manutenção da posição = movimento preciso com controle a Amplitude a Controle contrátil = controle da inércia Intenção B - Como? a Habilidade de deixar mais fácil a Atenção sobre o peso, objeto, trajeto ou alvo. a Apenas mover o peso. Distraído. a Focar exclusivamente em levar o objeto de um ponto para outro. 5 baseada no sentido da resistência O.D.E baseado na e ciência para a o objetivo = estímulo e ciente menos desperdício de tempo e esforço aDesa o focado na contração aHabilidade de controlar a inércia aInterrupção da compensação (“roubar“) de deixar apropriado para aHabilidade o indivíduo A solução para o quebra-cabeça atual utiliza aquilo que está disponível e evita o que está indisponível (vide etapa 2) 6 SOLUÇÃO B INTENÇÃO B Solução voltada para Performance Externa resultado bruto/ nal/global aDependente da intenção e da atenção aUtiliza o padrão de e ciência do cérebro aDispersa o desa o: utiliza todas as articulações possíveis para mover o peso o: usa a inércia ao seu favor aHabilidade de deixar mais fácil aEvita ou elimina o desa Fig. 198. c o n t i n u u m d o e x e r c í c i o A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia • Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli Este é o início da jornada, o ínicio de uma nova maneira de entender o exercício e de prescrevê-lo com excelência clínica. Depois deste estudo, você terá suporte para ajudar ainda mais seus clientes-pacientes independentemente de quem eles sejam, jovens, adultos ou idosos; ou melhor, tenham baixa, média ou alta tolerância. Independentemente do “onde” seu cliente-paciente se encontra dentro do Continuum Funcional, esta nova ciência tem o potencial de ajudar o profissional a prescrever exercícios para restaurar, desenvolver e conservar a função de cada um deles. Agora é o momento de transformar a teoria em prática. Fig. 199. O começo... Transformar a teoria em prática com a evolução da biomecânica, através dos princípios da mecânica do exercício e do desenvolvimento do raciocínio crítico para tomadas de decisões através do Continuum do exercício. Lembre-se de que a razão de nossa evolução profissional está em nos tornarmos mais eficientes em restaurar, desenvolver e conservar a função do cliente-paciente. 262 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia bibliografia [1] KANDEL, Eric R.; SCHWARTZ, James H.; JESSEL, Thomas M. Principles of Neural Science. 4ª ed. Boston: McGraw-Hill Medical, 2000. [2] NORKIN, Cynthia C.; LEVANGIE, Pamela K. Joint Structure and Function, A Comprehensive Analysis. 2ª ed. Philadelphia: F. A. Davis Company, 1983. [3] LI, Yongming; CAO, Chunmei; CHEN, Xiaoping. Similar Electromyographic Activities of Lower Limbs Between Squatting on a Reebok Core Board and Ground. Journal of Strength & Conditioning Research. 2013. Disponível em: <http://journals.lww.com/ nsca-jscr/Abstract/2013/05000/Similar_Electromyographic_Activities_ of_Lower.23.aspx> Acesso em: 07.dez.2016. [4] BEHM, David; ANDERSON, Kenneth G. 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