Enviado por thiago.holanda

a evolucao da prescricao clinica do exercicio a identidade da fisioterapia

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prescrição
CLÍNICA DO
EXERCÍCIO:
Ilustrações:
Márcio Batista
Projeto Gráfico e Diagramação:
du.ppg.br
Revisão de Texto:
Melissa F. Zanardo Andreata, Hellen Guareschi e Anelise de Macedo Franceschi
Esta obra está registrada na Biblioteca Nacional dos Direitos Autorais
sob o número de registro: 816/17
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Index Consultoria em Informação e Serviços Ltda.
Curitiba - PR
P986
Purvis, Thomas Clark
A evolução da prescrição clínica do exercício : a identidade da
fisioterapia / Thomas Clark Purvis, Mariane Franceschi Malucelli.—
Curitiba : Edição do Autor, 2017.
264 p. : il.
ISBN 978-85-923695-0-7
1.Fisioterapia. 2. Exercícios físicos. 3. Exercícios terapeuticos. I.
Malucelli, Mariane Franceschi. II. Título.
CDD (20.ed.) 615.82
CDU (2.ed.) 615.8
I M P R E S S O N O BRA SI L /PRI N TED I N BRA ZI L
THOMAS CLARK PURVIS
MARIANE FRANCESCHI MALUCELLI
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prescrição
CLÍNICA DO
EXERCÍCIO:
1ª E D I Ç Ã O
CURITIBA
Mariane de Macedo Franceschi Malucelli
2017
Mecânica do Exercício
O cabo de guerra interno
Força
Movimento articular
AGRADECIMENTOS
08
PREFÁCIO
12
Mecânica articular:
Movimento e força
Descrevendo posições e
movimentos articulares: Orientação do corpo
Mecânica articular:
“Controle articular” influências passivas
Mecânica articular:
Controle articular ativo
Mecânica muscular:
A força interna do cabo de guerra
Mecânica muscular:
Habilidade muscular
INTRODUÇÃO
A Fisioterapia e a prescrição do exercício
14
O perfil da potência/esforço
Perspectivas sobre a evolução da ciência
26
O profissional do exercício
34
Mecânica da resistência:
Perfil da resistência
O que é exercício?
42
Bibliografia
53
Mecânica da resistência:
Direção
Magnitude:
Explorando as propriedades da resistência
Mecânica da resistência:
Posicionamento da carga
Mecânica da resistência:
Centro de massa
Bibliografia
í
ndice
56
60
66
74
90
100
Continuum do exercício
O que é função
O Continuum Funcional
184
192
108
O mundo do exercício e
a performance externa
200
110
Performance interna
216
Exercício baseado no
cliente-paciente
224
Resposta e adaptação
228
Continuum do exercício e O.D.E.
[objetivo do exercício]
234
126
140
146
154
162
170
174
177
A orquestração
Bibliografia
252
263
Mariane
Franceschi
Malucelli
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edico este livro aos meus filhos, Chloe Grace e
Benjamin Joseph, que, mesmo tão novos, precisaram passar longos períodos sem minha
presença e suportaram minha ausência com força e
carinho, apoiando-me durante todo o percurso. Peço
a Deus que coloque a presença Dele em dobro no coraçãozinho de ambos para compensar todo o tempo
em que estivemos separados. Vocês são a minha maior
alegria, sempre. Ao meu marido, Marcos, que infalivelmente assumiu o papel de pai e mãe durante o tempo
dedicado para escrever este livro. Eu não teria conseguido sem seu total apoio e ajuda. Você sempre me incentivou a olhar mais alto e a alçar voo em terras ainda
não exploradas. Sua perseverança e força me inspiram
sempre.
Agradeço meu pai e à Raquel por nunca medirem esforços para prover o que existe de melhor para
nossa família. À minha mãe e ao Geraldo (in memorian) pela coragem de sempre se levantarem e lutarem, independentemente do tamanho da queda, com
a certeza de que a vitória está em Deus.
Ao José Luiz, meu irmão, e à Danielle, que acreditaram e me incentivaram a continuar a jornada
quando estava prestes a desistir e me apoiaram sem
limites em um momento tão crucial para este projeto.
À Anelise, minha irmã e amiga, que sempre me
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ajudou a tornar minhas visões e sonhos em realidades, muitas vezes sacrificando seu tempo e seus sonhos para ajudar a atingir os meus. Você é uma das
pessoas mais lindas e fiéis que eu conheço.
A toda a minha família no Brasil, meus avós e
minha sogra e todos os meus irmãos e cunhadas –
fui muito abençoada por nascer em uma família que
sempre, desde jovem, me apoiou e me ajudou muito
a crescer. Todos vocês representam muito para mim.
Agradeço ao próprio Tom Purvis, que viu em
mim um potencial que nem eu mesma enxergava e
confiou em mim todos estes anos para levar para o
Brasil a ciência que exigiu tanto sacrifício em sua vida
para estudá-la e desenvolvê-la. Ele nunca mediu esforços para disseminar essa semente e transformar o
mundo do exercício, jamais olhando para si mesmo,
mas sempre buscando uma maneira de ajudar profissionais a enxergarem o que é invisível na prescrição
do exercício: a força. E também à Jeniffer Purvis e
suas filhas, Jenna e Katie, por junto com o Tom terem
pago um alto preço durante esta jornada.
Agradeço ao dr. Roberto Cepeda, presidente do
COFFITO, que enxergou a necessidade de trazer um
conhecimento de vanguarda para ajudar o fisioterapeuta do Brasil a alcançar um nível profissional ainda mais
alto e trazer mais dignidade e valorização profissional.
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Agradeço também a todos aqueles que foram
meus professores neste caminho, aprendi muito com
cada um de vocês.
A todos que fazem parte e já fizeram parte do
crescimento do RTS no Brasil. À Silvia e Emílio Cornelsen e a toda equipe da Academia Swimex, por sempre estarem ao meu lado me apoiando, me escutando
e cedendo seu tempo e seu espaço maravilhoso. À
Viviane Stonoga e à Renata Petri, por tantas horas de
trabalho e empenho.
À minha família na fé, Pastor Mahesh Chavda
e Bonnie Chavda, Heather Harris, Angela e Seiy
Olurotini, Valerie e John Griffin, Todd e Lilly
Moser, Rob e Erica Robinson, Joezer e Stefanie
Cezak (o caminho reto, estreito, longo e provavelmente o mais difícil é o certo), Ana Paula
Nascimento, por serem sempre um alicerce na
força da oração.
Agradeço principalmente a Deus, porque sem
Ele nada seria possível. Por Ele ter aberto os olhos
do meu entendimento para que eu enxergasse a verdade, inclusive a verdade sobre os exercícios e me
capacitar para estar aqui hoje disseminando este conhecimento. Deus é muito bom, sempre!
“E conhecereis a verdade e a verdade vos libertará!”
(João 8:32)
Thomas
Clark
Purvis
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rimeiramente, quero agradecer ao meu pai, um
engenheiro que me apresentou ao mundo do
exercício com o objetivo de saúde e qualidade de
vida (separado dos esportes) quando eu tinha 8 anos de
idade e cultivou minha natureza já voltada à mecânica
desde aquele tempo. Ele me ensinou a aplicar a mecânica e a descobrir onde cada fator pode ser considerado
influenciador. Me ensinou a ser um pensador e alguém
que toma decisões e não um seguidor. E também me ensinou que se algo é muito popular, provavelmente está
incompleto, errado ou foi supersimplificado.
Às minhas filhas maravilhosas, ambas “gênias”,
cada uma a sua própria maneira. Elas me ensinaram
mais do que podem imaginar, e tenho certeza de que
mais do que eu sou capaz de ensiná-las. E à mãe delas,
que continua sendo família e sempre no mesmo time.
Aos inúmeros professores incríveis, habilidosos e
inspiradores que eu tive durante minha formação, os
quais eram apaixonados pelo conteúdo e por ensinar.
Aos outros não tão incríveis, hábeis ou inspiradores,
que não se interessavam pelo conteúdo nem por ensinar e que me ensinaram como não ser.
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Aos meus alunos do Master, os quais continuadamente me inspiraram a melhorar aquilo que ofereço e como eu ofereço – se minhas tentativas de mudança foram apreciadas ou não é um outro assunto.
A todos aqueles que copiaram meu trabalho,
minhas palavras e meus métodos de ensino e apresentaram como originais, sem referência ou agradecimento. Vocês sempre me desafiaram a crescer e
me elevar a níveis ainda mais altos e muito acima da
mesquinhez e mesmo assim me manter no caminho
da integridade e da maestria, caminho este do qual
vocês derivaram.
Aos meus instrutores, aos muitos indivíduos que
vieram e foram ao longo das décadas, àqueles que foram suficientemente corajosos e tolerantes o suficiente para me ajudar na partilha destas ideias em todo
o mundo. Escolhidos por sua compreensão das informações, a sua capacidade para demonstrar como
aplicá-las, sua excepcional habilidade de se comunicar de maneira simples e, sobretudo, a sua paixão
pelo ensino, cada um deles é capaz de ensinar temas
complicados de uma maneira simples e divertida.
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Eles são uma espécie rara no mundo da educação e
do exercício. Tive a honra de ter conhecido cada um
de vocês, e me sinto ainda mais honrado por vocês
terem sentido que esta informação foi digna do autossacrifício necessário para compartilhá-la com um
mundo enraizado em chavões sobre exercício e os
mitos da “ciência” de academia. E, para aqueles que
continuam a aceitar o desafio desta jornada, vocês
são tão loucos como eu. Muito obrigado!
À Mariane, sem a qual este projeto não teria
existido nem chegado a esta fase de conclusão dentro
da sua contínua evolução. Sua integridade, persistência, sensibilidade, honestidade, humildade, coragem
e fé foram inspiradoras e muitas vezes um “pontapé
na bunda” necessário.
Àquele que chamamos de Deus. Porque não fui
eu quem escolheu este caminho, nem esta aptidão
para esse conhecimento, nem o desejo de explorar,
nem a paixão, nem a coragem (ou ignorância) para
confrontar a tradição e para contar para todos aqueles que se dispuseram a ouvir. Este Deus entregou
tudo para mim.
DR. Roberto
Mattar
Cepeda
É
com satisfação que, na qualidade de diretor-presidente do Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional, apoio a edição desta obra de conhecimento técnico-científico, intitulada
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício.
A obra está organizada em capítulos, nos quais
você terá a oportunidade de ler sobre os diversos temas que envolvem a prescrição clínica do exercício.
O fisioterapeuta é o profissional da saúde especialista
no movimento humano, com habilidade e competência diferenciada para prescrição clínica de exercícios,
levando em consideração todos os fatores internos e
externos do corpo humano.
A dra. Mariane Franceschi Malucelli e o dr.
Thomas Clark Purvis, fisioterapeutas e autores do livro,
são referências internacionais na matéria. A dra. Mariane faz parte do maior centro de recuperação de traumato-ortopedia dos EUA. Dito isso, faço aqui um agrade-
prefácio
cimento público e especial a estes profissionais que, de
forma didática e científica, aceitaram este desafio.
O tema reafirma a essência da Fisioterapia no
Brasil e, de forma altamente especializada, apresenta
a prescrição clínica do exercício pautada nas condições clínicas do indivíduo, na biomecânica articular,
na cinesiologia, na cinesioterapia e na física.
A prescrição clínica do exercício é o nosso principal instrumento de trabalho. O profissional fisioterapeuta que adquirir esta distinta competência será
mais resolutivo e, consequentemente, mais valorizado no mercado de trabalho.
Cuidado! O exercício que cura é o mesmo que
machuca; a diferença está na prescrição clínica do
exercício.
Consulte o especialista do movimento humano.
Consulte o fisioterapeuta.
Boa leitura!
OFFITO
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
Q
ual o papel do fisioterapeuta dentro da prescrição do exercício na sociedade contemporânea? Quais necessidades ele deve atender?
Onde a especialidade e a maestria do saber fisioterapêutico são requeridas? E, principalmente, onde está
a maior oportunidade de mercado para o fisioterapeuta na área da prescrição clínica de exercícios?
Vivemos em um tempo em que a prescrição do
exercício parece ter perdido força dentro da fisioterapia. Como profissionais, temos nos dedicado a muitas
especialidades importantes, porém não temos buscado nos especializar na prescrição clínica do exercício,
e isso é prejudicial à nossa área. Prescrevemos exercícios como forma de intervenção fisioterápica para
a reabilitação de disfunções neuromusculoesqueléticas, prescrevemos exercícios para o pós-operatório,
prescrevemos exercícios na fisioterapia hospitalar ou
ortopédica e em muitas outras especialidades dentro
da fisioterapia. Nossa capacidade em alcançar bons
resultados com a prescrição do exercício para nossos
clientes e pacientes é dependente do quanto entendemos sobre a “ciência” do exercício, assim como nossa
habilidade em examinar e progredir cada exercício,
para cada indivíduo, de acordo com suas necessidades, limitações e objetivos individuais.
O exercício é, sem sombra de dúvidas, a ferramenta mais poderosa que o fisioterapeuta utiliza
como intervenção, pois é a única capaz de transformar uma resposta aguda em uma adaptação positiva crônica (que permanece). A prescrição clínica do
exercício faz parte da origem, do DNA da fisioterapia,
e o fisioterapeuta deve se tornar o profissional que
mais conhece todos os aspectos que envolvem o estímulo e a adaptação do exercício, tornando-se assim a
classe profissional referência para a sociedade dentro
da prescrição clínica do exercício para a reabilitação,
desenvolvimento e conservação da saúde.
Para que possamos nos especializar nesta área,
precisamos nos aprofundar no estudo da mecânica do exercício, que deriva da biomecânica, sendo a
ciência da aplicação da mecânica articular, da mecânica muscular e da mecânica da resistência específica para cada exercício e cada indivíduo. Esta ciência
nos ajuda a evoluir no aprendizado sobre o estímulo
do exercício, tornando possível prescrever exercícios
com mais eficiência e menor custo.
O conhecimento que o profissional poderá adquirir neste livro é aplicável em todos os cenários em que
o exercício é prescrito na fisioterapia. Pode ser em clínicas ortopédicas, no pós-operatório, na osteopatia, no
pilates, na musculação terapêutica etc. Isso é possível
porque é a ciência que governa o exercício, independentemente para qual especialidade o exercício é prescrito. Porém, chamamos a atenção para a prescrição
14 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
I
do exercício para a conservação da saúde e da função
neuromusculoesquelética, pois é esta uma das maiores
necessidades da população hoje e também a área com
maior possibilidade de crescimento da nossa profissão,
como indicado numa pesquisa realizada nos Estados
Unidos. Ela aponta evidências de que um grande número da população acima de 50 anos apresenta degeneração articular no joelho mesmo sem dor e sem indícios
de degeneração registrados em exame radiográfico. Os
resultados desta pesquisa demonstram que:
1. 74% das pessoas acima de 50 anos apresentam
alterações estruturais que poderiam influenciar
permanentemente a ADM;
2. 69% têm alterações estruturais que podem
influenciar a tolerância à força;
3. 88% das pessoas sem queixas de dor tiveram
pelo menos uma das patologias citadas que indicam que ausência de dor não significa ausência
de possíveis fatores que requerem considerações especiais.
Esta é uma evidência que confirma que a população acima de 50 anos necessita de profissionais
especialistas na função neuromusculoesquelética e
especialistas na aplicação de estímulos (forças), para
que obtenham resultados positivos no desenvolvimento e conservação da função sem detrimentos
adicionais às articulações.
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Prevalência de
anormalidades no
joelho detectadas por
ressonância magnética
em adultos sem
indicativo de artrose
no joelho: estudo
observacional baseado
na população
Estudo de Osteoartrose em Framingham1
Objetivo: Examinar o uso da ressonância magnética em joelhos que não indicaram evidência
1 BMJ. 2012; 345: e5339.
Published online 2012 Aug 29. doi: 10.1136/bmj.e5339
PMCID: PMC3430365
Prevalence of abnormalities in knees detected by MRI in adults without
knee osteoarthritis: population based observational study (Framingham
Osteoarthritis Study)
Ali Guermazi, professor of radiology, Jingbo Niu, research assistant
professor of medicine, Daichi Hayashi, research assistant professor of
radiology, Frank W Roemer, associate professor of radiology, Martin
Englund, associate professor, epidemiologist, Tuhina Neogi, associate
professor of medicine and epidemiology, Piran Aliabadi, professor of
radiology, Christine E McLennan, project manager, and David T Felson,
professor of medicine and epidemiology
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
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Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
radiografica de osteoartrose para determinar a prevalência de lesões estruturais associadas com a osteoartrose e suas relações com idade, sexo e obesidade.
Design: Estudo observacional baseado na população.
Localização: Comunidade em Framingham,
MA, Estados Unidos (estudo de osteoartrose em Framingham).
Participantes: 710 indivíduos > 50 anos que não
tinham evidências radiográficas de osteoartrose no
joelho (Kellgren-Lawrence grade 0) e que se submeteram à ressonância magnética do joelho.
Medidas de resultado principais: Prevalência
de descobertas através da ressonância magnética que
são insinuantes de osteoartrose de joelho (osteófitos,
danos na cartilagem, lesões da medula óssea, cistos
subcondral, lesões meniscais; sinovite; atrito; e lesões
ligamentosas) em todos os participantes e depois da
estratificação por idade, sexo, índice de massa corporal (BMI) e a presença ou a ausência de dor de joelho.
A dor foi avaliada por três perguntas diversas e também pelo questionário de WOMAC.
Resultados:
Dos 710 participantes :
• 393 (55%) eram mulheres;
• 660 (93%) eram brancos;
• 206 (29%) tiveram dor no joelho no último mês;
• A idade média era 62,3 anos;
• A prevalência de “qualquer anormalidade” foi
89% (631/710) do total;
• Osteófitos foram a anormalidade mais comum
entre todos os participantes: 74% (524/710 );
• Seguidos por dano na cartilagem: 69% (492/710);
• Lesões de medula óssea: 52% (371/710);
• Quanto maior a idade, maior a prevalência de
todos os tipos das anormalidades detectáveis por
ressonância magnética;
• A prevalência de pelo menos um tipo de patologia (“qualquer anormalidade”) foi alta em
ambos os joelhos com presença de dor (9097%, dependendo da definição de dor) e joelhos com ausência de dor (86-88%).
Conclusão
A ressonância magnética mostra lesões na articulação tíbio-femoral na maioria dos indivíduos acima de 50 anos de idade, em quem as radiografias de
joelho não apresentam nenhum traço de osteoartrose, independentemente de dor.
O conteúdo deste livro concentra-se inicialmente
no estudo da mecânica do exercício, por meio do qual
são apresentados os fatores necessários para a criação
e desenvolvimento de exercícios, seguido pelo estudo
16 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
I
do Continuum do exercício, em que apresentamos um
processo de raciocínio crítico para as tomadas de decisões durante a aplicação e execução dos exercícios.
O Continuum do exercício é um direcionamento para o profissional neutralizar a interferência dos
protocolos através do maior desafio, que é libertarnos do pensamento padrão, deixando de lado modas
e tradições sobre exercício e evoluindo para um processo de criação de exercícios específicos para cada
cliente-paciente.
Este livro foi escrito como resposta ao pedido
do dr. Roberto Cepeda, presidente do COFFITO,
que, com genuína preocupação e interesse pelo desenvolvimento profissional, vem buscando soluções
para aumentar a dignidade e o valor do fisioterapeuta
brasileiro. Movidos pela necessidade de crescimento
profissional na área da prescrição clínica do exercício, o dr. Thomas Clark Purvis (fisioterapeuta – EUA)
e eu, dra. Mariane Franceschi Malucelli (fisioterapeuta – EUA), decidimos contribuir gratuitamente com
a evolução necessária em nossa profissão no Brasil.
Escrevemos este livro contendo a fundamentação básica para o estudo e para a aplicação da mecânica do
exercício, proporcionando ao profissional o conhecimento inicial para esta evolução. Precisamos resgatar
o domínio e a autoridade sobre a prescrição do exercício para a saúde e essa jornada se inicia agora.
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A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
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Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
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ma nova ciência… O campo da fisiologia foi estudado muito antes da exploração das respostas fisiológicas ao exercício. Da mesma forma,
o campo da biomecânica já existe há anos, mas tem sido
tradicionalmente explorado no estudo do desempenho
esportivo, assim como nas áreas do movimento humano, da ortopedia, da marcha e de intervenções com o
uso de próteses.
As universidades incluem a biomecânica no currículo de todos os cursos que envolvem o estudo de
exercícios, porém, até hoje, o seu estudo tem se mostrado valioso somente em laboratórios e com pouca
aplicação na prática cotidiana para os profissionais
que prescrevem exercícios clínicos.
O universo das pesquisas sobre exercícios muitas
vezes deixa de incluir algumas considerações mecânicas importantes, como variáveis a serem controladas,
tornando grande parte dessas pesquisas imprecisas ou
inaplicáveis. Por exemplo, o fato das considerações sobre as diferenças na angulação do osso esterno, que são
únicas em cada ser humano, não terem sido consideradas como a principal influência mecânica nos exercícios para o músculo peitoral maior, é uma prova de
que, até hoje, a biomecânica não foi aplicada nos estudos
e pesquisas formais sobre exercícios no nível e clareza
exigidos. Outro exemplo é sobre o estudo do exercício
do agachamento, no qual as diferenças nas “proporções
segmentares” não são examinadas como a principal influência em determinar a maneira como ele deve ser
realizado ou modificado para cada indivíduo.
Levando esses fatos em consideração, a mecânica do exercício é uma nova ciência. A aplicação de
princípios mecânicos (engenharia) na análise, criação
e modificação do exercício para cumprir os objetivos
e as necessidades do cliente-paciente, respeitando as
idiossincrasias neuromusculares de cada indivíduo,
é uma exigência inquestionável para a evolução da
prescrição clínica do exercício.
O poder do processo do raciocínio lógico para a
tomada de decisões.
Os princípios da mecânica do exercício podem
ser memorizados, mas isso não irá alterar nada ou
ajudar ninguém.
A memorização das informações é pouco aproveitável se estes não forem empregados apropriadamente e estrategicamente. É por esta razão que a
criação e o desenvolvimento de um processo de raciocínio lógico e organizado foram absolutamente
vitais para a aplicação dos princípios da mecânica do
exercício. Em essência, esse processo de raciocínio
faz a ciência da mecânica do exercício se tornar viva.
Ele orienta a tomada de decisão clínica, tornando os
protocolos obsoletos devido às suas ineficiências em
tornar o exercício individual.
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O Continuum Funcional é um processo de reflexão
contínuo para a análise, a investigação e o exame das
capacidades funcionais, internas e externas, de qualquer
indivíduo. O Continuum do exercício nos conduz ainda mais adiante no processo de tomada de decisão, em
que o movimento, a resistência, a intenção, o esforço e
o tempo são manipulados e ensinados, adequadamente e estrategicamente, a fim de estimular uma mudança
conforme o objetivo e a tolerância de cada indivíduo.
O domínio e o processo de raciocínio desta nova
ciência requerem anos de estudo e de aplicação. A
profundidade e a abrangência das informações contidas neste livro são vastas e derivam de 30 anos de
sucessos e fracassos na aplicação desta nova ciência.
Este livro foi escrito como uma iniciação à mecânica
do exercício e ao novo processo de raciocínio lógico para tomada de decisões clínicas na prescrição do
exercício. Ele foi escrito a pedido do Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional do Brasil no
momento em que este inicia um grande movimento
de vanguarda para o avanço, o crescimento e a desafiadora evolução da prescrição clínica do exercício no
país. E, por mais que a sua missão seja local, o impacto da sua visão, da sua responsabilidade, desta ciência
e deste processo de raciocínio será inevitavelmente
global, com o Brasil definindo um novo padrão na
compreensão e na aplicação clínica do exercício.
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Thomas
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A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
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A Fisioterapia e a
Prescrição do Exercício
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isioterapia não é moda. Sendo assim, fisioterapeutas não devem estar suscetíveis aos modismos do mercado do exercício. Devemos estar
sempre nos aperfeiçoando e aprendendo sobre novos
métodos e novas técnicas. Porém, o fisioterapeuta
deve ter em mente que métodos e técnicas são sempre
novas ferramentas e estas devem ser incorporadas a
sua grande “caixa de ferramentas”, sempre julgando
quanto cada técnica ou cada método é apropriado
para cada situação. O fisioterapeuta é o profissional,
ele é o especialista que irá avaliar cada situação e a
efetividade da intervenção, sendo que tudo isso tem
que ser baseado em evidências.
A fisioterapia exige que a prescrição do exercício
seja individualizada/customizada. Esta customização
é a diferença fundamental no foco e na finalidade da
prescrição elaborada por um fisioterapeuta em comparação a outros profissionais, porque o fisioterapeuta deve customizar a aplicação do estímulo, da força,
e não somente da intensidade, número de séries e repetições, como comumente tem sido feito.
Tradicionalmente, o exercício é considerado antes da estrutura/corpo. Nesse caso, a prescrição é feita
desconsiderando idiossincrasias de quem o realiza, é
o indivíduo quem precisa se enquadrar nas regras do
exercício, independentemente da sua estrutura/corpo, e o foco da execução está no número de séries e
repetições, quer dizer, o foco está no exercício. A fisioterapia necessita evoluir desse modelo para outro,
no qual o foco está na estrutura/corpo. A prescrição
do exercício deve ser feita a partir daquilo que é observado no indivíduo específico, ou seja, a estrutura/
corpo é considerada antes do exercício. Isso significa que o exercício deve ser adaptado para atender as
peculiaridades físicas identificadas em cada situação
que se apresenta. Os protocolos de execução nesse
caso são orgânicos e ininterruptamente customizados, criados e moldados de acordo com a estrutura
do cliente-paciente e com um cenário mecânico individual. Essa simples diferença de abordagem no foco
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muda completamente a maneira como o exercício é
prescrito.
• Prescrição do Exercício Tradicional
Considera o exercício antes da estrutura/corpo.
• Prescrição Clínica do Exercício
Considera a estrutura/corpo antes do exercício.
O fisioterapeuta é o profissional mais habilitado
para a prescrição do exercício com o objetivo de melhorar a tolerância do tecido muscular. Nesse sentido,
o foco da intervenção precisa manter-se em elementos internos e priorizar a estrutura neuromusculoesquelética.
Note que, quando a atenção do exercício está no
protocolo/programa, desprezando peculiaridades estruturais de quem o executa, isso significa que a atenção está no próprio exercício, ou seja, o foco é externo.
Para que haja uma verdadeira mudança ao prescrever o exercício, saindo do foco externo e indo para o
foco interno, é imprescindível que antes aconteça uma
transformação no pensamento do profissional.
A prescrição clínica do
exercício para conservar
a capacidade física, a
função e a saúde
Restaurar, desenvolver e conservar a capacidade física do corpo humano precisam ser os objetivos
para a prescrição do exercício feita por fisioterapeutas. E é necessário que esses objetivos sejam constantemente reforçados sem nunca serem ignorados, pois
são o escopo legal de nossa profissão.
É de conhecimento popular que, para a conservação da capacidade física do corpo humano, é necessário a prática regular de exercícios físicos.
A prescrição de exercícios para a manutenção
da saúde tornou-se popular após o lançamento do
famoso livro Aerobics, do dr. Kenneth Cooper, em
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
21
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
1968. Dr. Cooper escreveu vários livros sobre esse
assunto utilizando exercícios aeróbicos, sendo considerado preconizador e pai do método de corrida
“cooper”. Desde então, médicos no mundo inteiro começaram a recomendar a prática de exercícios físicos
como algo essencial para a manutenção da saúde e,
assim, um novo mercado nasceu. As academias surgiram e com elas as marcas de roupas específicas para
a prática de exercícios. Pesquisas cada vez mais elaboradas sobre exercícios também foram desenvolvidas.
A propaganda para a conscientização da população
sobre a necessidade e os benefícios da prática de exercícios direcionados com o objetivo de manter a saúde
passou a ser cada vez mais frequente e contundente.
Com todo o esforço de marketing e investimento financeiro feito nesse ramo de mercado durante todos
esses anos, era de se esperar que uma grande parte da
população estivesse atualmente envolvida e praticando exercícios físicos direcionados. Porém, não é este
o cenário que encontramos.
A IHRSA (International Health, Raquet and
Sports Club) publicou no Global Report de 2016 que,
no Brasil, somente 3% da população (aproximadamente oito milhões) pratica atividade física direcionada em academias e clubes. Já nos Estados Unidos,
o maior mercado mundial, o número chega a 18% da
população. Essas porcentagens podem aumentar se
também considerarmos o número de praticantes de
atividade física independente e não direcionada, ou
seja, sem o acompanhamento de um profissional da
área. No entanto, esses índices são desprezíveis se levarmos em conta o esforço mundial para a conscientização da população sobre a importância da prática
de exercícios físicos. Apesar de existir uma grande
parcela da população que inicia atividades direcionadas diariamente, a maioria não dá continuidade à
prática em longo prazo. Uma das razões para isso é
que muitos dos que tentam participar não gostam da
experiência com o exercício no modelo em que hoje
é apresentado.
Aqueles que conseguem incorporar a prática de
exercício em sua rotina representam, aproximadamente, 10% da população. Isso demonstra que há uma necessidade muito grande da criação de um novo modelo de prescrição de exercício para atender estes outros
90% que estão fora do mercado, mas que precisam se
exercitar para conservar a função e a saúde.
Novamente, a IHRSA publicou em seu blog, em
novembro de 2016, que globalmente 11,7% da população tem mais de 60 anos, e a expectativa de crescimento desta população até 2050 é de 21%. Hoje, existem 75 milhões de baby boomers (nascidos entre 1945
e 1960 e que estão entrando em idade de aposentadoria), tornando esse grupo demográfico e o que mais
cresce dentro dos clubes e academias. Quando esse
grupo busca atividade física, ele busca quatro objetivos específicos:
1. Prevenção de problemas crônicos
(conservar);
2. Controle de problemas crônicos existentes
(desenvolver);
3. Inversão dos efeitos negativos da idade
(restaurar);
4. A participação plena nas atividades cotidianas e nos seus hobbies.
A estatística apresentada acima coloca esta população dentro do escopo da fisioterapia para a
prescrição do exercício para a conservação, desenvolvimento e restauração da função neuromusculoesquelética. E agora é o momento mais propício
para o nascimento deste novo modelo de prescrição
do exercício, capaz de atender esta população que há
décadas vem esperando por uma solução compatível com seu perfil psicológico e estrutural. Esse novo
modelo pode ter como efeito positivo o engajamento
e a permanência dessas pessoas na prática de atividades físicas. Em termos da saúde da população, isso
será extremamente benéfico, independentemente da
proporção em que acontecer.
22 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
I
O modelo atual, que nasceu com a popularidade
dos exercícios aeróbicos com Kenneth Cooper, em
1968, trouxe grandes benefícios para a população e
certamente vai continuar trazendo. Desde o início
da popularização da prática do exercício físico para
a saúde, muitas modas e métodos foram criados e
obtiveram sucesso. De um modo geral, eles permanecem por um tempo e desaparecem assim que um
novo modelo entra no mercado. Em paralelo a todo o
crescimento e movimentação em clubes e academias,
algo interessante também aconteceu na área médica.
Nessas quatro décadas, a Medicina Desportiva, que
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trata basicamente de problemas ortopédicos causados pela prática da própria atividade física, teve um
crescimento exponencial. Isso nos mostra que, muitas vezes, exercícios prescritos para a saúde podem
resultar em consequências ortopédicas negativas.
Lembro-me de quando participei do Congresso
Brasileiro de Medicina Desportiva, em Florianópolis
(Santa Catarina) no ano de 2003, onde, durante uma
palestra sobre lesões no joelho, um famoso médico ortopedista brasileiro disse: “o dr. Cooper esvaziou os consultórios dos cardiologistas, porém encheu os consultórios dos ortopedistas”. E essa é uma grande verdade!
Fig. 1. Prescrição clínica do exercício
realizada pelo fisioterapeuta utilizando a máquina de extensão de perna como ferramenta de intervenção.
Objetivo do exercício: desenvolver a
capacidade de tensão no comprimento
contrátil mais curto do tecido do quadríceps dentro da ADCCD (Amplitude
de Comprimento Contrátil Disponível),
restaurando e conservando o controle
contrátil no final da extensão da articulação do joelho dentro da ADPAD
(Amplitude de Posições Articulares Disponíveis).
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
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Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
Esse fato indica que o exercício em si não é automaticamente algo bom. Acompanhe um exemplo:
um indivíduo praticou atividade física com objetivo
de manter a qualidade de vida e a saúde por 20 anos,
contudo teve como resultado concomitante ao fortalecimento muscular a degeneração da cartilagem hialina e óssea em uma articulação, o que resultou na
necessidade de uma artroplastia articular. Apesar de
o objetivo inicial ter sido a prática de exercício para a
saúde e a qualidade de vida, o resultado final não foi
necessariamente esse. Quando escolhemos o estímulo
a ser prescrito no exercício, precisamos ter em mente
que a saúde articular deve ser mantida a mais íntegra possível. No modelo atual, o foco da prescrição
de exercícios para a saúde cardiovascular e o fortalecimento muscular têm sido muitas vezes atingidos à
custa da saúde ortopédica. A maior parte da população possui uma estrutura que não tolera esse modelo,
no qual a tolerância das articulações é ignorada.
Para a transformação desse cenário, em que a
saúde das articulações é ignorada, é necessária uma
mudança não somente na aparência do exercício ou
no local onde ele é realizado (clínica ou academia),
mas também na completa composição do exercício
em si. Os fisioterapeutas devem se tornar experts na
aplicação de força na estrutura do paciente-cliente,
priorizando a saúde ortopédica, na qual os fatores
mecânicos tomam precedência aos fisiológicos e na
qual a customização estratégica das variáveis mecânicas dos exercícios se tornam imprescindíveis, como
as listadas abaixo:
• Amplitude;
• Posicionamento da carga;
• Intenção;
• Perfil da resistência;
• Foco;
• Aceleração/desaceleração;
• Influências da inércia;
• Tipo de resistência;
• Apoio/restrição;
• Trajeto guiado/restrição;
• Forças articulares;
• Índices da progressão.
Todas essas variáveis são baseadas na mecânica
específica de cada exercício e são influenciadas por
fatores fisiológicos, tais como:
• Tolerância;
• Estrutura óssea;
• Estrutura articular;
• Consciência/percepção;
• Amplitude contrátil;
• Curva de aprendizagem;
• Atenção.
A ciência contida neste livro é fruto de mais de 30
anos de estudos da mecânica do exercício e sua prescrição, buscando entender quais os benefícios e custo
(desgaste articular) dos exercícios para a saúde. Em
todo este tempo também estamos ensinando profissionais do mundo inteiro sobre como aprender a mecânica de uma maneira aplicável no dia a dia para trazer o
maior benefício possível para o cliente-paciente.
A partir das constatações provenientes de todas
estas experiências, desenvolvemos uma organização
de trabalho capaz de envolver o espectro completo
de possibilidades mecânicas para a prescrição clínica do exercício dentro do Continuum do exercício.
No Continuum do exercício, o fisioterapeuta aprenderá a desenvolver um processo de raciocínio crítico
para a tomada de decisão sobre a criação do exercício
que deve ser prescrito para seu cliente-paciente, conquistando resultados seguros e eficientes. O fisioterapeuta, por sua vez, vai protagonizar uma verdadeira
evolução profissional com inúmeros desdobramentos
positivos, tais como: maior destaque no mercado,
maior valorização profissional na sociedade e maior
contribuição ao bem-estar de uma população que
hoje não encontra aquilo que precisa para a prática
sustentável de exercícios por uma vida inteira.
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Perspectivas sobre a
evolução da ciência
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A
ciência está em constante evolução. Conforme surgem nossos questionamentos sobre
um tema, surgem também novas necessidades, novas tecnologias são desenvolvidas e, assim,
novas descobertas, teorias e aprendizagem começam
a fazer parte de nosso conhecimento.
Esta é uma imagem satélite da Terra, do globo
terrestre. A Terra como todos nós a conhecemos
hoje, redonda. As imagens satélites evidenciam isso
com clareza e sem margem para contra-argumentos.
Mas todos sabem que o conhecimento desta realidade nem sempre foi assim. Estudamos nas aulas de
História que houve um tempo em que se acreditava
que a Terra era quadrada ou plana. Não somente se
acreditava que era desse modo, mas também os professores e sábios da época ensinavam isso como ciência e verdade, porque as evidências até então convergiam para isso.
Fig. 2. A teoria da Terra plana que, com o desenvolvimento do telescópio, foi rejeitada e a
evidência de que a Terra é uma esfera.
Quando olhamos para o horizonte, enxergamos
a Terra juntando-se ao céu numa linha reta que parece ser o “final da Terra”. Se tirássemos conclusões
somente sobre o que vemos a partir dessa imagem e
escrevêssemos livros sobre isso, teríamos evidências
claras de que a Terra seria plana ou quadrada. Aqueles
que lessem nossos livros e vissem “tal evidência” no
horizonte, acabariam por confirmar essa suposição.
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Assim, a teoria e sua “evidência inquestionável” se
perpetuariam até que alguém observasse algo diferente e resolvesse questioná-la, buscando mais evidências para tentar trazer respostas a sua suspeita a
fim de provar uma nova teoria.
Fig. 3. Evidências de Galileu.
E foi exatamente isso que aconteceu. Quando
alguém observou que o Sol não fazia um trajeto retilíneo no céu desde o nascente até seu poente, mas
que parecia mais curvilíneo, ele intuiu algo diferente,
que havia algo errado com o conceito de que a Terra
era quadrada ou plana. Porém, naquela época a evidência visual, a Igreja e os acadêmicos ensinavam isto
como verdade. Também ensinavam que a Terra era o
centro do universo, pois não havia meios de ver nada
diferente até aquele momento.
Então veio Galileu Galilei (1564-1642). Ele não
inventou o telescópio (Hans Lippershey, 1570-1619)
nem iniciou a teoria do heliocentrismo (Nicolau Copérnico, 1473-1543). Mas foi ele quem melhorou a
lente do telescópio e com isso tornou-o mais potente, possibilitando ver o Universo com mais detalhes.
Assim foi possível trazer as evidências necessárias
para provar que a Terra não era plana, tampouco era
o centro do universo. Galileu enxergou algo diferente
e talvez tivesse dito: “Eu vejo a Terra se movendo em
torno do Sol, junto com outros planetas, eu enxergo o
contrário do que hoje aceitamos como verdade”.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
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Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
da sua vida em Alexandria. Ficou famoso na antiguidade pelo seu método de determinar o tamanho da
Terra calculando sua circunferência, utilizando como
principal fonte de observação o movimento do Sol.
Ele estabeleceu que a circunferência da Terra era de
40.000 km. Passados mais de 2.000 anos, estudiosos
foram conferir os cálculos de Eratóstenes e tiveram
uma surpresa. A nova medição, realizada com equipamentos de precisão e com modernos sistemas de
cálculo, resultou em um número praticamente idêntico ao de Eratóstenes, ou seja, 40.075 km. É incrível
pensar que aproximadamente 2.000 anos antes de Galileu existiu alguém que calculou a circunferência da
Terra com tal precisão e, mesmo assim, muito tempo
depois, a teoria de a Terra ser redonda não era aceita.
Todavia, isso é óbvio hoje para nós.
Fig. 4. Galileu Galilei (15 de fevereiro de
1564 - 8 de janeiro de 1642): nascido na
Itália, foi matemático, astrônomo, filósofo e
físico. Galilei foi personalidade fundamental
na revolução científica.
Galileu, insistindo em suas novas evidências e
contrariando os estudiosos da época, foi colocado
em prisão domiciliar até falecer, em 1642. Entretanto,
muito antes de Galileu e Copérnico, outros estudiosos e sábios já haviam percebido que a Terra não poderia ser quadrada ou plana.
Pitágoras, em 500 a.C., foi um deles, depois veio
Aristóteles, que em 330 a.C. iniciou a teoria do geocentrismo. Mais tarde, Aristarco de Samos (310-230 a.C.)
iniciou a teoria do heliocentrismo e, em seguida, o
estudioso Eratóstenes 276-194 a.C.
A história de Eratóstenes nos chamou a atenção
e muito! Ele foi considerado o pai da Geografia, nasceu em Cirene em 276 a.C. e passou a maior parte
Fig. 5. Esquematização do Experimento de
Erastótenes. No solstício de verão, meio-dia
local, os raios de sol incidem a exatos 90º
na latitude do Trópico de Câncer. Eratóstenes de Cirene (276 a.C. - 194 a.C.): foi
matemático, astrônomo, geógrafo e bibliotecário na Grécia, e conhecido por calcular
a circunferência da Terra.
28 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
I
Talvez você esteja se perguntando “por que estamos falando sobre isso? É obvio que a Terra é redonda, porém o tema deste livro é sobre o conceito
e a prescrição clínica do exercício pela fisioterapia”.
A resposta é simples: no mundo da ciência do exercício ainda existe muita teoria de “Terra quadrada” e
vamos apresentar aqui um novo conceito, um novo
olhar para identificar e evidenciar a possibilidade de
evolução para a prescrição de exercícios na era da
“Terra redonda”.
Outro exemplo como citado acima, porém agora na área médica, vem de 1861. É a história da necessidade de os médicos lavarem as mãos antes das
cirurgias para prevenir a infecção hospitalar. O médico húngaro Ignaz Philipp Semmelweis (1818-1865)
tornou-se chefe-residente de obstetrícia no Hospital
Geral de Viena e, em menos de duas décadas de sua
breve carreira, ele se tornou o “salvador de mães” e o
inimigo da academia médica.
Naquela época, a “febre puerperal” acarretava
uma impressionante taxa de mortalidade entre 10 a
35% das mulheres que tinham seu parto dentro do
hospital, enquanto que, para mulheres que tinham
seus partos feitos fora dele, a febre não era uma
preocupação de saúde pública. Estes dados chamaram a atenção de Semmelweis que, após extensa
observação, fundamentou sua conclusão de que a
febre estava correlacionada com a infeção causada
pela falta de higiene das mãos daqueles em contato
com a paciente, incluindo médicos, enfermeiras e
estudantes. Suas observaçcões foram publicadas em
seu livro “A Etiologia, o conceito e a profilaxia da
febre puerperal” (1861).
Com a implementação, em 1847, de sua recomendação de lavar as mãos com água clorada, a
queda da taxa de mortalidade reduziu de 12,24% a
3,04% no final do primeiro ano e a 1,27% ao término
do segundo ano. Esses resultados foram magníficos e
se esperava que a prática da higiene das mãos tivesse
sido amplamente aceita pelos médicos da época, mas
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isto não aconteceu. Semmelweis foi rejeitado pela
classe médica, que não aceitou sua proposta de mudança porque ele não tinha uma evidência científica
aceitável. Os médicos ficaram ofendidos com a possibilidade de terem que lavar as mãos e Semmelweis
foi expulso de Vienna e depois colocado em um asilo,
onde morreu aos 47 anos.
Fig. 6. Ignaz Philipp Semmelweis
(1º de julho de 1818 - 13 de agosto de
1865): médico nascido na Hungria e
conhecido como o pioneiro em procedimentos antissépticos.
Alguns anos depois, Louis Pasteur conseguiu
observar os germes (micróbios) no microscópio e
confirmou a evidência necessária para afirmar a teoria de Semmelweis. Desde então, a higienização das
mãos foi aceita como verdade e introduzida como
necessária por todos aqueles em contato com pacientes dentro do ambiente hospitalar. Lembre-se que naquela época não existiam luvas sintéticas.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
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Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
Temos muito a aprender com essas duas histórias
para a aplicação na ciência do exercício. A evidência de
Galileu foi resultado de conseguir enxergar mais longe
em um aspecto mais amplo e com mais detalhes; já a
evidência de Semmelweis foi resultado de enxergar o
mais próximo possível, microscopicamente. Precisamos ter as duas visões em mente para entendermos a
prescrição de exercício. Precisamos enxergar as forças
externas de uma persperctiva macro e depois colocar
um zoom para enxergar o resultado delas dentro da articulação a cada grau de movimento.
Quando entrarmos nos detalhes da visão microscópica, precisaremos ter sempre viva a perspectiva satélite-macro, para que, quando estivermos analisando uma mitocôndria, nos perguntarmos por qual
razão isso é relevante naquela situação. Existem situações apropriadas para se analisar a mitocôndria, mas
para construir um exercício ela não é importante. A
importância dela no exercício inicia quando vamos
determinar seu tempo e frequência, isso significa o
que fazer com o exercício, mas não como construí-lo.
As decisões sobre a fisiologia devem vir depois das
decisões sobre a mecânica do exercício.
Talvez você esteja pensando: “Mas estamos no
século 21, a ciência está muito avançada e as evidências também…”. Sim, mas no próximo século o conhecimento da ciência estará em um lugar diferente porque ainda não descobrimos tudo ou sabemos
toda a verdade sobre a ciência. A Medicina e a ciência
ainda estão em evolução, por isso precisamos aprender com os livros, professores e todos os meios disponíveis. Contudo, é necessário estarmos dispostos
a aprender e entender que este é somente o começo.
É importante estarmos abertos – mente e coração –
para a evolução, porque a jornada do descobrimento
ainda não acabou.
A ciência do exercício também continua em evolução e muito do que estudamos hoje se apoia em
observações aparentes e em conclusões baseadas nas
evidências até então existentes, muito parecidas com
as observações obtidas para defender a teoria da Terra plana. Para que a evolução necessária da ciência do
exercício aconteça, será preciso avaliar como temos estudado o exercício até hoje e mudarmos a abordagem
do estudo. O estudo tradicional do exercício aborda
inicialmente a fisiologia, isto é, a adaptação que o exercício causa e posteriormente o estímulo do exercício.
O exercício físico é a chave fundamental para
alcançarmos resultados positivos sustentáveis com
nossos clientes-pacientes. No entanto, isso não é uma
tarefa simples.
Conforme indicado na introdução, as análises e
os conceitos que abordamos neste livro são baseados
na Física aplicada no exercício, que é a mecânica do
exercício – ambas são ciências exatas e podem ser
comprovadas. Os resultados obtidos através da Física
e da Mecânica são a verdade que está presente em todos os exercícios, quer saibamos ou não. Mas atenção:
existe uma diferença entre o estudo da biomecânica
tradicional e o estudo da mecânica do exercício, que
veremos a seguir.
Algumas definições
de biomecânica
• “O estudo das forças e os seus efeitos sobre os
sistemas vivos.” (Peter McGinnis, em Biomecânica do Esporte e Exercício.)
• “Ciência que estuda a ação de forças internas ou
externas no corpo vivo.” (PDR – Dicionário Médico.)
• “Biomecânica consiste na área da cinemática e
da cinética. A cinemática inclui as descrições de
movimento sem considerar as forças que o produzem. Cinética considera as forças que produzem o
movimento, resultante do movimento ou da manutenção do equilíbrio.” (Norkin e Levangie, em
Articulação, Estrutura e Função.)
• “A mecânica é uma área da física e da engenharia que estuda e aplica a avaliação de forças
30 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
I
responsáveis pela manutenção de uma estrutura
ou de um objeto em uma posição fixa, bem como
a descrição, previsão e causas de movimento de
um objeto ou estrutura. O campo da mecânica
pode ser dividido em estática, que considera as
partículas e organismos rígidos que estão em um
estado de equilíbrio estático; e dinâmica, que estuda objetos que estão em movimento acelerado.
Dinâmica pode ainda ser dividida em cinemática
e cinética. A cinemática é a geometria do movimento, que inclui a velocidade de deslocamento,
aceleração sem contar a força. Cinética considera
as forças causando o movimento.” (Garhammer,
em Cinesiologia e anatomia aplicada.)
• “Biomecânica é o estudo da estrutura e da função dos sistemas biológicos por meio dos métodos da mecânica.” (Hebert Hatze.)
Durante anos, utilizamos a seguinte definição
em nossos cursos: “Biomecânica é a ciência do movimento e a ação das forças sobre organismos vivos”.
Mas sempre parecia que algo estava faltando, porque
o que de muitas maneiras determina movimento e
recebe o efeito das forças é a estrutura (arquitetura do
corpo humano). Então, passamos a usar uma definição mais abrangente para biomecânica que incorpora
os principais componentes indicados acima: O estudo da [1] Estrutura, [2] do movimento, [3] das forças
e [4] seus efeitos sobre e dentro do corpo humano.
Então, quando falávamos de biomecânica, estávamos estudando quatro coisas:
[1] Estrutura, porque a sua tolerância e habilidade são fundamentais para o movimento, bem como a
produção da força;
[2] Movimento, porque não abrange apenas a
física do movimento, mas inclui também o extremo
dele, ou seja, o zero ou estático;
[3] Força, incluindo a interna e a externa, assim
como uma compreensão da natureza da própria força;
[4] Efeitos, que se referem aos resultados asso-
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ciados à aplicação, à produção e à tolerância das forças sobre e dentro das estruturas específicas.
No exercício,
a mecânica transcende e
engloba todos os objetivos e
todas as modas.
Com o tempo, verificamos que os fatores que estudávamos não se encontravam nos livros de biomecânica, porque estes não levavam em consideração as
diferenças de cada indivíduo e não colocavam todos
os fatores em evidência em cenários mecânicos diferentes para chegarem a conclusões. Verificamos, então, que estávamos criando uma subdivisão dentro da
biomecânica, que chamamos de mecânica do exercício (Exerciseeducation.com) e definimos como:
Mecânica do Exercício
A mecânica do exercício é a análise da mecânica
articular, da mecânica muscular e da mecânica da
resistência, assim como o estudo dos conceitos e das
aplicações avançadas sobre a mecânica das cadeias
e sobre a mecânica dos sistemas de elos integrados
(Linkage System), e também a análise de suas respostas, como as forças articulares em exercícios específicos e como todas estas realidades são alteradas pela
influência mecânica da intenção.
A mecânica do exercício é usada para analisar
exercícios tradicionais e populares e também para
criar ou modificar diferentes exercícios para indivíduos/clientes/pacientes em pontos específicos da
progressão.
Mecânica versus condições
Poderíamos dizer que mecânica do exercício é
o COMO. É como construir um exercício em uma
estrutura, com movimentos e forças específicas. Uma
vez que o exercício esteja construído, é necessário
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
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Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
definir as condições em que ele vai acontecer: quantas vezes, quão frequente e, o que é raramente definido, quão difícil ou quão intenso. Estes fatores são
considerados as condições sob as quais a mecânica do
exercício é executada, que normalmente estudamos
na fisiologia.
A essência do exercício é
a mecânica do exercício
Mecânica não pode ser definida como uma teoria ou opinião. Ela é uma área da Física convencional
e interdependente da Matemática. Não há pareceres
em Matemática. Ambas são ciências exatas. No entanto, como nesse caso a mecânica é aplicada ao corpo e ao exercício, estamos limitados pela quantidade
de informações disponibilizadas, pela capacidade de
interpretar e aplicar essas informações, pela capacidade mental humana e pessoal, pela audição e viés
seletivo e também pela nossa compreensão sobre o
corpo humano que vem, principalmente, das nossas
limitações no poder da observação.
“A mecânica do exercício
nos mostra as verdades
invisíveis sobre os exercícios”
Muitos experts encontram desafios com a aplicação da biomecânica. Eles têm dificuldade com o conceito de aplicar princípios conhecidos da física e da
engenharia para o corpo sem que primeiro alguém
tenha demonstrado por meio do método científico
“clássico”. Porém, o tipo de investigação clássico requer muitos indivíduos em estudos extensos, a fim de
detectar estatisticamente uma tendência ou verdade.
Esse é o método científico exigido na fisiologia, que é
uma ciência praticamente impossível de ser observada diretamente.
Se entendermos o corpo humano como uma máquina de engenharia, verificaremos que nem sempre
é necessário utilizar o método científico clássico para
encontarmos a verdade. Quando engenheiros estabelecem os cabos de aço em uma ponte, eles não têm
que construir trinta pontes para ver qual vai funcionar, porque a resistência dos materias já foi calculada,
assim como o efeito das forças que serão aplicadas. Se
eles possuem todos os dados necessários, constroem
uma ponte que vai durar séculos. Isso porque utilizam muitos fatores conhecidos e calculáveis. Quando
utilizamos duas ciências juntas, a física e a fisiologia,
haverá sempre áreas sujeitas a especulação e teorização. Porque a física é uma ciência exata sendo aplicada na fisiologia, que é uma ciência inexata.
Entretanto, a história da medicina ortopédica é
inteiramente baseada em evidências repetitivamente
documentadas e validadas, indicando que, quando
uma entidade física está sujeita a forças que excedem
a magnitude, a resistência, a tolerância e a capacidade dos materiais e das estruturas, o detrimento e a
degeneração (inflamação, disfunção ou falha) serão
consequência.
A mecânica do exercício nos mostra as verdades
invisíveis sobre tantas variáveis que podem aumentar
exponencialmente as forças nas articulações, como, por
exemplo, a taxa de aceleração e de desaceleração e também a distância entre o posicionamento da carga e a
articulação. E assim ela nos dá subsídios para fazermos
melhores escolhas para nossos clientes-pacientes, para
preservar a longevidade das articulações e, ao mesmo
tempo, gerar estímulo para alcançar adaptações positivas e para manter a saúde articular e muscular.
Biomecânica tradicional
versus mecânica do exercício
A maioria dos cursos de Biomecânica é voltada
aos esportes e ao movimento humano bruto (bruto
significa movimento humano total, sem dedução).
Porém, vamos estudar uma subdivisão da biomecânica e focar no estudo da mecânica das articulações e
da mecânica muscular, específicas para um exercício,
32 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
I
porque a integridade do movimento bruto é determinada pelas limitações e funções das articulações
individuais dentro de um sistema em cadeia. Inversamente, a estrutura e a função de cada articulação
individual é baseada no seu papel dentro do movimento bruto sob as forças aplicadas.
Os cursos superiores dentro da área da saúde
normalmente ensinam a mecânica do movimento
humano em termos de funções articulares individuais e movimentos globais comuns, como a marcha.
Estes estudos são normalmente baseados em estruturas esqueléticas genéricas e não específicas.
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Já na indústria do exercício, a “biomecânica do
exercício” normalmente significa estudar e determinar “as técnicas tradicionais de execução dos exercícios”. Ela raramente envolve as forças, a função articular, a função neuromuscular e a progressão que
são, na verdade, os fatores determinantes do exercício. Além disso, a maneira tradicional de analisar um
exercício gera uma visão muito restrita, sem muito
espaço para a criação e modificação individual.
A importância de diferenciarmos a mecânica do
movimento humano x biomecânica x mecânica do
exercício é que, quando colocamos um peso em nossa mão, TUDO MUDA, tudo se torna específico para
aquele cenário mecânico específico.
Por exemplo, o ritmo escápulo-umeral muda de
acordo com o aumento da resistência e com as alterações na direção da resistência, a participação muscular muda de acordo com a direção da resistência.
“Quando você coloca
um peso em sua mão,
tudo muda!”
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Fig. 7. Neste exemplo, a direção da resistência altera a participação muscular e o torque
tanto para o cotovelo quanto para o ombro.
Aqui, o torque para o cotovelo exige a participação da musculatura anterior do cotovelo, os flexores, para realizar a extensão do
cotovelo excentricamente.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
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O PROFISSIONAL DO EXERCÍCIO
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que é necessário para que o fisioterapeuta tenha sucesso com a prescrição do exercício?
Quais são as ferramentas e as matérias-primas com as quais você trabalha? O que você realmente oferece com o exercício? Você está envolvido
no processo de criação e execução do exercício que
prescreve? Você consegue transferir o conhecimento
teórico para a prática clínica?
Para que o fisioterapeuta tenha sucesso e a fisioterapia ganhe maior relevância diante da população
na área da prescrição clínica do exercício, é necessário que haja uma evolução profissional, deixando as
modas e tradições de lado e trazendo o verdadeiro
raciocínio crítico para fazer parte do cenário da prática profissional. Exercício prescrito por fisioterapeuta não é moda, é resultado!
Independentemente da ferramenta que o fisioterapeuta utilize, seja ela máquina de musculação, máquina de pilates, pesos livres, thera-bands ou cabos, a
prescrição do exercício necessita ser diferenciada no
aspecto clínico e ético profissional.
Fig. 8.
Esses três círculos representam o que devemos ser como verdadeiros profissionais dentro da
prescrição do exercício. Utilizamos o termo profissional do exercício porque, como fisioterapeutas, prescrevemos exercícios e nosso propósito aqui
é ajudá-lo a melhorar sua habilidade de entender,
prescrever e ensinar. Então, vamos pensar, vamos
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estudar e elevar nosso nível profissional, construindo um mercado novo com muito sucesso.
Fig. 9.
Conhecimento
CONHECIMENTO
O primeiro elo é sobre o que você sabe, o seu
conhecimento, aquilo que estudou sobre o assunto
“exercício” (envolvendo todas as matérias básicas,
como Anatomia, Biomecânica, Cinesiologia etc.) e
sobre como aplicar este conhecimento. O aprendizado envolve enxergar aquilo que está sendo ensinado.
Aprendizado compreende ser capaz de entender os
conceitos antigos, conseguir enxergar o novo e ainda fazer a conexão correta entre os dois.
“Diferença entre uma pessoa guiada por princípios e uma pessoa guiada por tendências: aquela guiada por princípios resistirá a seus aliados e
apoiará seus adversários se a verdade e a moral
exigirem. Uma pessoa que é levada por tendências vai para a guerra mesmo contra a verdade, a fim de defender a identidade do grupo.”
ditado popular
Existem dois problemas relacionados ao conhecimento: o primeiro são os chavões, pequenas frases
ou palavras que soam de forma inteligente e são ótimas frases de marketing porque ficam gravadas em
nossas cabeças, mas isto não é ciência. Chavões não
são completamente corretos, mas carregam um pe-
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
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Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
queno traço de verdade, normalmente aplicável em
algum cenário específico que provavelmente foi perpetuado, tornando-se um conhecimento genérico.
Não usaremos chavões porque não são considerados
“educação”. Com os chavões, vem o segundo problema: eles se tornam o chavão de um grupo inteiro de
pessoas ou de todos que participam de um método e
acabam por limitar a possibilidade do real aprendizado. Quando os participantes de um grupo escutam
uma colocação ou uma frase cujo conceito não é igual
ao que eles aprenderam, automaticamente existe uma
rejeição sem uma real avaliação. Isso faz com que esses chavões tornem-se regras genéricas do exercício e
se perpetuem por décadas.
Quando, durante o processo educacional, não se
objetiva o pensamento crítico, mas somente a aprovação, quando basta saber o mínimo necessário para
resolver um problema teórico, nos tornamos profissionais restritos, pois, ao restringir o pensamento crítico, não desenvolvemos subsídios para resolver problemas na prática. Não existe como ser profissional
da saúde com informação memorizada. Cada paciente apresenta individualidades que não se encaixam na
regra geral e, como profissionais, precisamos entender os princípios que regem o exercício para sermos
capazes de adaptar cada exercício de maneira segura
e eficaz para cada cliente-paciente.
Na prática clínica, as respostas não são tão simples e o que é aplicável em um cenário não é aplicável
em outro. Podemos usar como exemplo aqui a regra
“universal” do agachamento, que diz que o “joelho
não deve passar à frente do dedão do pé”. Esta é a
regra! Mas por que o joelho não deve ultrapassar a
frente do dedão do pé durante o agachamento? Se sua
resposta for igual a de um consumidor: “porque faz
mal para o joelho”, então temos um sério problema.
Você certamente usa um computador. Por acaso,
você precisa saber como a informação é traduzida e
criptografada na linguagem de um sistema informático? Provavelmente não, porque você é um usuário e
não um profissional de Tecnologia de Informação. O
profisisonal de TI precisa saber de programação, desenvolvimento de software e de hardware para poder
construir computadores e programas para que possamos usá-los com maior eficiência. Nós, como profissionais de fisioterapia, precisamos saber tudo o que é
neccessário para criarmos e manipularmos o exercício
para cada indivíduo, pois não somos consumidores
de exercícios e sim profissionais do exercício. Então,
aprender “exercícios” é algo para o consumidor, copiar
“exercícios” também, já o profissional aprende sobre
forças e estrutura para poder criar qualquer exercício.
Se você participa de cursos para aprender coreografia
de exercícios, é a mesma coisa que um consumidor de
computador fazer um curso para usar o Windows Office ou um novo programa. Porém, você, fisioterapeuta,
é o programador! Você é o criador de exercícios!
Quando nosso cliente-paciente nos pergunta por
que o joelho não deve passar à frente do dedão do pé,
a resposta para ele deve ser em nível de consumidor.
Porém, como profissionais e experts na prescrição do
exercício, precisamos saber a razão da regra, a ciência
e todos os detalhes envolvidos por trás desse chavão.
Precisamos saber distinguir entre o que é a verdadeira ciência do que é mito, do que é moda e do que é
tradição. Como fisioterapeuta, você precisa saber usar
toda a sua educação profissional para analisar qualquer
técnica, método ou novo exercício, todos pelo ponto de
vista da mecânica. Você, somente com seu conhecimento, deve conseguir decifrar o que está acontecendo em
cada exercício ou método que é lançado no mercado. Se
hoje você ainda não consegue fazer isso, este livro e este
processo educacional têm o objetivo de te ajudar.
Por exemplo, é essencial saber o que é cisalhamento e quando, como e por que ele precisa ser
considerado, em vez de apenas repetirmos: “cisalhamento faz mal” ou, ainda, “a cadeira extensora tem
muito cisalhamento e por isso é ruim”. Chavões como
esses carregam o potencial de serem repetidos sem
compreensão e, por isso, concluímos algo que não é
36 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
I
verdade, pois a cadeira extensora não faz mal e oferece a mesma quantidade de cisalhamento que o agachamento, porém em posições articulares diferentes
(JOSPT, 1992).
Como profissionais, também precisamos ter uma
visão de “Terra redonda” no mundo da teoria da “Terra quadrada” quando prescrevemos um exercício.
Exercício não é movimento e não devemos ser distraídos pelo movimento; exercício também não é determinado pela sensação que ele gera, porque a sensação
é enganosa e vai nos atrapalhar. A única regra que existe para o exercício são as forças e a estrutura.
Este não é um livro técnico de biomecânica ou
de anatomia. Nós utilizaremos os conhecimentos
fundamentais da fisioterapia, acrescentaremos a mecânica do exercício e apresentaremos como eles se
relacionam e são colocados em prática para a prescrição de exercícios.
Fig. 10.
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repetir a mesma coisa que se aprendeu na faculdade
por 20 anos, significa passar 20 anos questionando,
adaptando e evoluindo o que se aprendeu, aprendendo com seus erros e seus acertos e modificando sempre que possível. Isso é experiência!
A ciência da prescrição do exercício foi historicamente saturada pela influência dos esportes e do treinamento desportivo. Porém, quando transferimos este
conhecimento para a prescrição do exercício visando à
saúde, esta ciência nem sempre se aplica. É muito importante conseguirmos distinguir a origem e a fonte
onde estamos baseando nossa prática profissional.
Temos a necessidade de eliminar o exercício predeterminado, no piloto automático, os protocolos e a coreografia. Para isso, precisamos começar a customizar verdadeiramente o exercício. A customização significa muito
mais do que a inversão da ordem dos exercícios que prescrevemos. Vamos criar exercícios novos para cada cliente-paciente e mudá-los em cada sessão. Isso é uma arte, é
a arte da fisioterapia, a arte da criação do exercício. Dessa
forma, nosso trabalho nunca mais será monótono.
Fig. 11.
Prática
Delivery
PRÁTICA
O segundo elo é a prática, é sobre o que fazer e
sobre o que prescrever. Seria de esperar que quanto
maior o conhecimento, maior seria sua aplicabilidade nos exercícios, mas não é isso o que acontece.
Normalmente, os exercícios que prescrevemos e que
nós mesmos fazemos já foram predeterminados, coreografados e protocolados.
A educação representa 50% do conhecimento e a
experiência, os outros 50%. Experiência não significa
DELIVERY
O terceiro elo tem o maior peso na influência do
nosso sucesso. É como ensinar o exercício. Aqui temos maior potencial de melhorar nosso rendimento,
pois demostra o nosso envolvimento com todo o processo do cliente-paciente.
Ser tecnicamente excelente e qualificado não é
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
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Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
o suficiente para ter sucesso profissional. Saber apresentar-se e posicionar-se profissionalmente também
são qualidades imprescindíveis.
Quando o profissional atende um cliente-paciente
por 1 hora, ele tem 60 minutos para aplicar todo o seu
conhecimento e a sua prática para ajudar cada cliente-paciente individualmente a alcançar seus objetivos.
Cada sessão para cada cliente deve deter 100% da atenção do fisioterapeuta. A sessão de exercício de 1 hora
significa 3.600 segundos de atenção a todos os detalhes
que acontecem na execução de cada exercício.
Ao ensinarmos os exercícios aos nossos clientes-pacientes, precisamos estar preparados para dar dicas de
ensino que realmente ajudem-no a ter mais facilidade de
execução e de maneira correta. Para isso, a sua atenção e
o seu ensinamento serão imprescindíveis a cada segundo.
Para customizar um exercício que seja específico
para cada cliente-paciente, precisamos basear nossas
decisões nas regras da física e na estrutura individual.
Temos uma ideia de como um exercício deve ser exe-
cutado e de como ele deve parecer externamente, então ensinamos ao cliente-paciente claramente e com
uma linguagem que ele possa entender. Durante cada
repetição, precisamos comparar o que está acontecendo em cada articulação com o que esperávamos
que acontecesse.
A partir desse momento, inicia-se um processo
contínuo de perguntas na mente do profissional, um
monólogo interno, para termos as perguntas certas a
serem respondidas, as quais ajudam o profissional saber como intervir. Por meio de feedback, vamos também criar um monólogo interno no cliente-paciente
para que ele se envolva no processo do exercício que
estará fazendo. Vamos estar presentes durante cada
fração de segundo da execução do exercício com o
cliente, para entender o que está acontecendo e, principalmente, interferir na hora certa com dicas verbais ou estímulo tátil quando necessário – ambos são
progressivos e têm o objetivo de modificar o que está
acontecendo durante um exercício.
Fig. 12. Ilustração inspirada na “A Criação de Adão”, obra de Michelangelo (Capela Sistina – Vaticano).
38 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
I
As dicas verbais precisam ser eficientes para ajudar na realização do exercício e precisam ser curtas,
precisas e individuais. “Não deixe o joelho passar à
frente do dedão do pé” ou “traga a barra até o peito” são
informações genéricas e não ajudam o cliente-paciente
a se localizar de dentro para fora do corpo, para poder
modificar o que está acontecendo. Aqui, fica evidente
que aqueles profissionais que praticam o exercício frequentemente e exploram cada repetição com cautela
terão mais experiência para ensinar seus clientes como
se estivessem fazendo cada repetição com ele.
A comunicação deve ser uma tarefa agradável, mas
voltada ao objetivo, não devendo ser terapia, drama ou
entretenimento. Seu foco deve ser 100% no cliente: observe, pergunte, ouça (feedback), modifique, reforce.
Valor profissional
O que faz uma sessão de exercício custar R$ 300
ou R$ 100?
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Fig. 13. A pintura por números é uma representação da prescrição de exercícios feita por
programas e protocolos, pela qual o profissional prescreve exercícios copiados, deixando o
foco principal no exercício e não na estrutura
individual.
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Exercício é exercício e não deveria existir tanta diferença. Essa diferença de valor está na customização,
no resultado e em como o exercício é ensinado mesmo
usando as mesmas ferramentas. E não existe como memorizar informações para que a customização aconteça; não tem como memorizar informação para que a
sessão passe a valer R$ 300. É preciso realmente desenvolver um raciocínio crítico, aprender os princípios e
aplicá-los em cada segundo da sessão. Para a customização do exercício, os números não são aplicáveis. Os
números de séries e repetições, os números do tempo
na esteira, não se aplicam dentro da customização do
exercício, os parâmetros para intervenção e progressão
são somente a estrutura e função do cliente-paciente e
não é ditada por protocolos.
A diferença entre Michelangelo e um artista que
pinta seguindo números não é o número de cores disponíveis, o pincel usado ou a tela. É a habilidade com
que se usa as ferramentas e a manipulação das variáveis. Quais são as variáveis do exercício? O que compreende um exercício? E quem é o responsável pela
resistência? Se o profissional for um “Michelangelo”,
será o responsável por criar, com o exercício, uma arte
linda e diferente para cada indivíduo, mas, por outro
lado, se “pintar seguindo números”, estará somente copiando exercícios criados por outro artista.
Normalmente, a maioria dos profissionais só
prescrevem exercícios que viram alguém fazer ou que
aprenderam com alguém. Porém, quando entendemos
de forças e de estrutura, começamos a criar exercícios
novos e diferentes para cada cliente-paciente, e esta é
a melhor maneira de aumentar o valor profissional,
porque vai melhorar os resultados com menos custo
e/ou desgaste. É neste momento que tomamos nossas
próprias decisões e nos tornamos “Michelangelos”.
Como fisioterapeutas, temos o desejo de ajudar
as pessoas, ajudá-las no processo da restauração, desenvolvimento e conservação da função e a alcançarem melhores níveis de saúde. Acredito que você
deseja ser um profissional digno e bem-sucedido, e a
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
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Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
remuneração profissional tem um papel importante
em trazer dignidade. Porém, esta remuneração está
sempre vinculada ao valor percebido pelo serviço
prestado. Para sermos mais valorizados, precisamos
oferecer mais. Nossa valorização não vem do Conselho Federal, nem do diploma que conquistamos, ela
vem do nível de serviço que oferecemos e dos resultados que alcançamos.
Com a possibilidade de crescermos na profissão em
uma área ainda não muito explorada, precisamos nos
diferenciar. Qualquer consultor de marketing vai dizer
isso. Hoje vivemos um momento muito propício para
essa diferenciação que pode ser oferecida por fisioterapeutas e devemos nos posicionar no mercado oferecendo o exercício com um “sabor” muito diferente daquele
oferecido até hoje. Existe uma necessidade de profissionais que ofereçam este diferencial para a população que
necessita, para aqueles 90% da população já citados no
capítulo anterior. Podemos diferenciar preços e locais de
trabalho. Porém, o que mais vai nos destacar no mercado é a customização e o atendimento que oferecemos.
Por isso, não tenha medo de ser diferente.
Fig. 14.
do profissional. Exercícios baseados no cliente envolvem saber quanto de amplitude ele deve mover, qual
a aparência da postura, o que o cliente tem disponível
em cada articulação, o que isso significa e como este
exercício deve se parecer. Não podemos usar em um
exercício algo que o cliente-paciente não tem.
Isso pode parecer óbvio, mas, na prática, se utilizarmos as regras do exercício como fundamento,
muitas vezes ultrapassamos o limite que o cliente-paciente tem para ser usado. Se o cliente-paciente tenta
trabalhar com mais amplitude do que ele tem controle, precisamos intervir e iniciar o exercício dentro
de uma amplitude que ele possa controlar e, a partir
deste ponto, começar a progredir.
A população já tem uma opinião predeterminada de como o exercício “se parece” e o “sabor” que
ele tem. Por exemplo, “a primeira vez que você fizer
exercício sentirá dor”. Isso não precisa ser verdade
se prescrevermos exercício usando a tolerância individual como balizamento e trabalharmos dentro
do nível que o cliente-paciente está acostumado. Se
estiver acostumado com zero, iniciar com dez é muito, independentemente do seu objetivo. É necessário
construirmos a base e este processo é lento. Porém,
se o exercício tem como objetivo a saúde, não existe
pressa para se obter o resultado, porque será sustentado por uma vida inteira.
CLIENTE/PACIENTE
Exercício sustentável é aquele que o indivíduo consegue
praticar por uma vida inteira!
Cliente-Paciente
Na área de sobreposição dos anéis encontra-se a
peça mais importante, isto é, o cliente. Tudo deve ser
baseado no cliente-paciente! Os exercícios não devem
ser fundamentados nas crenças ou nas preferências
40 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
AQUILO QUE SABEMOS
• Ensino Formal + Experiência
• Pro ssional não pode seguir coreogra as e
repertório de exercícios
Chavões
As Regras Genéricas do Exercício
Ser pro ssional é conhecer a ciência e
não repetir chavões
COMO VOCÊ ENSINA
Atenção Total
3.600 segundos
EXERCÍCIOS
Conhecimento
Intenção
Qualidade das repetições
Foco
Observe, pergunte, escute,
modi que, reforce
Paciente/
Cliente
Delivery
Prática
• Exercícios customizados
In uências
Nível de conhecimento
Saber de onde vem o conhecimento
Esporte ≠ saúde
Aplicação
O que realmente importa?
Cliente/
Paciente
Fig. 15.
O que é exercício?
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amos iniciar estudando alguns fatos que são
disseminados e considerados conhecimento comum sobre o exercício. A maioria das
pessoas acha que sabem o que é exercício, até mesmo aquelas que nunca o fizeram dizem saber o que é.
Isso se dá porque possivelmente já viram uma flexão
de braço, um abdominal sendo feito, ou até mesmo
participaram de aulas de Educação Física na escola.
Agora vem a pergunta: exercício faz bem para a saúde? Quando essa pergunta é feita para consumidores
do exercício e mesmo para muitos profissionais do
exercício, a maioria vai dizer cegamente que sim, que
se exercitar faz bem para a saúde.
Todas as versões de exercícios fazem bem para
todo mundo? Você já se questionou sobre isso? Não
citamos qual tipo de exercício faz bem, o que está implícito que todos os tipos sejam bons. Mas nenhum
exercício é automaticamente bom. O pilates não é automaticamente bom, o cross fit não é automaticamente bom, o funcional não é automaticamente bom. Nenhum método de exercício é automaticamente bom
para todas as pessoas.
Como mencionado na introdução deste livro,
durante o Congresso Brasileiro de Medicina Desportiva em 2003, escutei uma palestra ministrada por
um renomado ortopedista no Brasil que disse: “O dr.
Cooper esvaziou os consultórios dos cardiologistas e
encheu os consultórios dos ortopedistas”. Isso indica
que exercícios praticados para a saúde cardiovascular
podem ter um custo articular. Então, nem todo exercício faz bem.
Exercício ocorre por dentro.
Devemos tomar decisões
baseadAs no
“lado de dentro”.
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Perspectiva
Exercício deve ser entendido como uma modalidade “invasiva”.
Tipicamente, classificamos um procedimento invasivo como aquele que provoca o rompimento das barreiras naturais ou que penetra em cavidades do organismo, abrindo uma porta ou acesso para o meio interno.
Os procedimentos que não envolvem instrumentos que
rompam a pele ou que penetram fisicamente o corpo
são considerados não invasivos. Por este motivo, profissionais da saúde e médicos se referem ao exercício como
uma modalidade não invasiva. Mas, quando colocamos
um halter na mão, as forças são transmitidas pelo corpo
até locais distantes do seu ponto de aplicação, e é esse o
conceito que nos incentiva a pensar no exercício como
uma modalidade invasiva. Devido à aplicação das forças atravessar as articulações internamente, o exercício
possui a capacidade de modificar a anatomia positiva ou
negativamente. Por isso, gostaríamos que você também
visualizasse o exercício como uma modalidade invasiva. Isso ajudará você, profissional, a ter uma perspectiva
realista do que está acontecendo durante o exercício.
Não podemos tomar decisões sobre o exercício
observando somente a superfície, isto é, observando
apenas a pele se mover. Durante o exercício, devemos
procurar visualizar a ação das forças e seus efeitos
dentro e sobre as estruturas e estar constantemente cientes de que o exercício acontece internamente.
Logo, a afirmação de que o “exercício faz bem”, deve
ser acompanhada de vários questionamentos, porque
exercício não é automaticamente bom. Para que o
exercício seja benéfico, é necessário primeiramente
questionar: para quem está sendo prescrito? Por quê?
Qual? Como? Quanto? Com que frequência?
Analogia
Vamos usar uma analogia: o filme Matrix (1999),
mas sobre o exercício.
É como entender o exercício na versão do
filme Matrix. A maioria das pessoas passa a vida
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
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Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
vendo apenas diferentes formatos e movimentos da
pele com um peso na mão. Mas há uma realidade
escondida dentro do exercício, a realidade interna.
Como profissionais, precisamos conhecer e manipular todos os fatores, internos e externos, que determinam o resultado dos exercícios e para isso precisamos
abrir nossos olhos para “enxergarmos” internamente.
“Quando você sabe
o que procurar,
tudo parece diferente.”
Fig. 16. Assim como no filme Matrix,
quando o personagem Neo toma a pílula vermelha e enxerga o que tem por trás
da Matrix, quando mudamos nosso paradigma sobre o exercício e começamos a
enxergá-lo internamente, enxergamos o
invisível, nesse momento a evolução da
prescrição do exercício acontece.
Você já se fez a pergunta: “Por que as pessoas se
exercitam?” Vamos explorar o que historicamente tem
acontecido no mercado dos 3% a 10% da população
que pratica ou já praticou atividade física. O principal
motivo pelo qual as pessoas se exercitam ainda é para
emagrecer, isto é, queimar calorias. Você pode achar engraçado, mas durante os 30 anos que trabalhamos com
a prescrição de exercícios, escutamos inúmeras vezes
clientes dizerem: “Preciso fazer mais exercícios hoje porque vou a uma festa e provavelmente vou comer muito”,
ou “Preciso ficar mais tempo na esteira para queimar as
calorias do que eu comi ontem”, como se exercício fosse
uma penitência por ter comido demais ou para ter a recompensa de poder comer mais. Outros motivos pelos
quais as pessoas buscam se exercitar são para obter fortalecimento muscular, melhoria da performance desportiva, por estética, pela saúde e pelo bem-estar.
Também devemos explorar o que hoje é considerado como indicativo de um “bom treino” ou
uma boa sessão de exercícios, tanto pelo profissional,
como pelo consumidor. Novamente, durante 30 anos,
verificamos que, para muitos, o que é indicativo de
um bom treino é o suor, a fadiga, o aumento da frequência cardíaca, a dor e a sensação. Alguns, se não
suarem ou se não sentirem dor, não consideram que
foi uma boa sessão de exercícios. Um outro fator é
a frequência cardíaca, que atualmente tornou-se um
grande indicativo de intensidade de treinamento, de
balizamento e da evolução dos clientes, não levando
em consideração o que está acontecendo nas articulações. A sensação também tem sido indicação de um
bom exercício ou de um bom treino. Muitas vezes escutamos: “Esse exercício funciona?” ou “Esse exercício é bom?” Então nos questionamos: o que querem
dizer com essa pergunta? Quais são as suas expectativas, o seu objetivo? O que eu, como profissional,
estou fazendo é necessário para ajudar meu cliente a
alcançar o seu objetivo? Esses exercícios são necessários para alcançar qualquer objetivo ou somente para
aquele objetivo com o qual estou trabalhando? Essas
perguntas nos fazem pensar profundamente e jamais
poderão ser respondidas de maneira genérica.
Acreditamos que os profissionais já tenham um
“cardápio” completo de exercícios que acreditam
44 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
I
funcionar e, para eles, qualquer exercício fora desta
seleção é uma incógnita. Devemos saber diferenciar
entre o que a indústria nos diz sobre o que são indicativos de uma boa sessão de exercícios, de uma
sessão que seja apropriada e realmente ótima para
o indivíduo.
O exercício deve ser apropriado ao nível pertinente de estímulos, como os determinados pela tolerância e pelos objetivos atuais do indivíduo. A grande
pergunta é se esse exercício está ajudando esse determinado cliente, independentemente se vai ajudar algum outro. O exercício por si só não faz nada porque
ele não funciona como mágica.
Vamos fazer uma analogia com o martelo. Não é
o martelo que coloca o prego na parede, é o profissional competente usando o martelo. Não é o exercício
que faz algo para seu cliente-paciente, é a habilidade
do profissional em aplicar o exercício adequado que
vai trazer o resultado esperado. O exercício é somente a modalidade usada para atingir o objetivo. Então,
o mais importante é ter clareza sobre qual é o objetivo, ou seja, o que realmente esperamos do exercício.
Exercícios não trabalham
músculos. São os músculos
que trabalham para executar
o exercício!
O valor de uma sessão de exercícios está na conexão
entre a sessão anterior e a próxima. Ao construir uma
casa, um único tijolo não tem valor nenhum. Ninguém
compra somente um tijolo pensando em construir uma
casa, pois é somente quando os tijolos são empilhados
estrategicamente que têm valor. Assim também o profissional precisa entender que somente uma sessão de
exercícios não tem valor se não estiver planejada com o
que já foi construído e com o que ainda falta construir
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para atingir o objetivo do cliente-paciente. A sessão de
exercícios ou o dia de treino em si não são o objetivo.
Uma sessão precisa estar colocada entre outras sessões
desenvolvidas com exercícios (estímulo/desafio) estratégicos. Não é durante a sessão que o progresso acontece, ele acontece entre as sessões. O progresso (adaptação) será então utilizado na sessão seguinte.
Exercício
Mas o que é exercício? Historicamente, exercício
tem sido:
• “Algo predeterminado”; “Com um nome”;
“Uma coreografia”;
• Alguma coisa que você “faz sem pensar muito”;
• Posições iniciais e finais definidas;
• Simplesmente mover o peso;
• Movimento;
• Governado por regras arbitrárias de exercício
(“não trave os joelhos”, “não deixe o joelho avançar à frente do dedão do pé”);
• Associado a efeitos mágicos;
• “Trabalha” algum músculo? “O que esse exercício trabalha?”
Hoje, enxergamos um exercício literalmente
como algo predeterminado e encapsulado como uma
coreografia. Sabemos o que é um agachamento, suas
regras e maneiras como ele deve ser executado. A
mesma coisa para o supino: sabemos o que é, como
deve ser executado, e todas as regras associadas a ele.
Normalmente, as regras associadas aos exercícios são
derivadas dos esportes e não são aplicáveis a exercícios prescritos para a saúde.
Inúmeras vezes escutamos a pergunta: Qual
músculo esse exercício trabalha? Precisamos mudar
nossa perspectiva. Os exercícios não trabalham músculos. São os músculos que trabalham para executar
o exercício. Isso é muito diferente e muda completamente a abordagem da sua prescrição. Para que um
exercício seja executado, é necessário que os músculos
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
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Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
estejam trabalhando dentro de você para realizar o
exercício. Os exercícios não fazem nada, eles não são
entidades independentes fora do seu corpo que chegam
perto e executam algo em você. Se os profissisonais entendessem este fato, não fariam as perguntas que fazem.
Somente repensando esses fatores poderemos realmente
evoluir na prescrição e na criação de novos exercícios
para a necessidade de nossos clientes-pacientes. Se o
exercício tem um nome, ele provavelmente não é apropriado para muitas pessoas, porque possui suas próprias
regras e sua própria coreografia, então, não se encaixa
necessariamente para todas as pessoas.
Com a nova moda do exercício funcional, o pensamento de que existe “O MELHOR EXERCÍCIO”
tem tomado espaço nas palestras sobre exercício no
mundo. A indústria tem indicado que o agachamento
é o melhor exercício para os membros inferiores, por
trabalhar o maior número de grupos musculares em
um único exercício. Mas isso não está correto. Precisamos primeiro perguntar: para quem? Pois, se meu
cliente-paciente possuir qualquer fator degenerativo
no joelho (quer saibamos ou não), o agachamento
não é o melhor exercício para estimular o quadríceps,
devido ao custo inerente deste exercício em uma articulação frágil. Sendo assim, independentemente do
que as pesquisas indicarem sobre a participação do
quadríceps neste exercício, para este cliente ele não
é a melhor opção. Se a articulação não tolerar as forças articulares que o agachamento gera, este não é um
exercício apropriado. Não podemos indicar qual o
melhor exercício sem antes considerar o indivíduo e
o objetivo do exercício.
Fig. 17. Todos os métodos
e nomes mercadológicos
do exercício são compostos dos mesmos fatores
que, em diferentes quantidades e organização,
tornam-se um método e
ganham uma “embalagem”. Cada organização
e método oferece diferentes estímulos e possíveis
adaptações, porém são
todos exercícios compostos dos mesmos fatores
incluídos na equação do
exercício.
46 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
I
E a pergunta continua: mas o que é exercício? O
mundo do exercício, as “embalagems”, o marketing e
as expectativas.
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Ioga
Pilates
Body Building
Powerlifting
Cross Fit
Corrida Esportes
Cardio
Pliometria
• Alongamento
• Funcional
• Treinamento
de Força
• Treinamento
de Potência
• Treinamento de
Esporte Específico
A palavra exercício muitas vezes vem associada
ao nome de um método ou a uma nova moda que,
normalmente, vem aliada a resultados especiais e
“mágicos”. Estes métodos crescem e permanecem no
mercado por algum tempo e depois vem uma “nova
onda” com um novo nome e outras promessas. Verificamos que profissionais são levados na “onda” e
o que um dia prescreveram como o melhor método
agora já não é mais e logo passam a prescrever um
novo método. Talvez você se pergunte e tenha lutado
para tentar entender por que tanta mudança dentro
da prescrição do exercício. O que vamos analisar agora é muito valioso porque esclarece o mundo do exercício. Todos os nomes de métodos citados anteriormente são somente nomes de marketing que trazem
consigo uma cultura e uma organização de trabalho
que encontram praticantes que se encaixam neles.
Todos esses métodos são estímulos que usamos
para alcançar uma adaptação e todos são compostos pelos mesmos ingredientes, mas em quantidades diferentes.
A ioga, o pilates, o funcional, o cross fit e a musculação
contêm os mesmos ingredientes e a arte da prescrição do
exercício está na habilidade do profissional de discernir
todas as possibilidades para escolher o que é mais apropriado para cada cliente-paciente em cada sessão e não
ficar preso somente a um método ou a uma técnica.
Podemos realmente transformar vidas com a
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prescrição de exercícios para a conservação, o desenvolvimento e a restauração da função. Então, precisamos pensar: qual desses métodos é o mais indicado
para melhorar a saúde ou a função? Funcional, pilates,
cross fit? Qual desses é predeterminado e coreografado? Qual impõe seus padrões a todos os praticantes?
Na verdade, são todos diferentes embalagens da mesma coisa, o exercício. Todos são estímulos do corpo
humano embalados com um laço diferente que agrada
um certo grupo de pessoas, com suas atitudes, seus
interesses e aparentemente um objetivo em comum.
Onde essas pessoas se encaixarem, ali será formada
uma comunidade em que se sentem confortáveis.
Essas são embalagens de exercícios que fazem os
clientes-pacientes retornarem quando gostam da experiência, quer se enquadrem no objetivo ou não. É necessário reconhecermos esses fatores e entendermos que são
compostos das mesmas variáveis que precisam ser manipuladas. Como em uma receita culinária em que muitos
ingredientes são utilizados em diferentes quantidades,
assim também é o exercício e suas diferentes embalagens.
Por isso, desenvolvemos uma equação do exercício com todas as variáveis (ingredientes) que precisam ser manipuladas.
Fig. 18.
A manipulação de todas essas variáveis com
excelência torna um profissional incomparável
no mercado. Aqueles que se tornarem experts na
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
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Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
manipulação, aplicação e prescrição do exercício
baseadas nesta equação, serão profissionais com
valor inigualável. Existe uma população que precisa de profissionais com essa capacitação. Existem
médicos esperando para enviar pacientes para profissionais que sejam experts na manipulação dessa
equação, isto é, experts na manipulação do exercício.
Profissionais que não estejam limitados a somente
métodos, mas fisioterapeutas confiantes e “mestres”
na prescrição do exercício. Fisioterapeutas que têm
a habilidade de manipular qualquer exercício para
ser apropriado e customizado para cada cliente-paciente, e não um fisioterapeuta preso a um protocolo
que deve se encaixar em todas as pessoas. Lembro
aqui que no pós-operatório é necessário que sejam
respeitados os tempos para reparação do tecido, então nestes casos os protocolos devem ser seguidos
para a segurança do paciente.
Vamos explorar a fundo a equação do exercício
no capítulo sobre o Continuum do exercício, mas antes gostaríamos de continuar trazendo mais esclarecimento sobre as embalagens em que o exercício pode
ser vendido. Talvez você tenha evidência de que todas
essas formas de exercício apresentadas tragam resultado e é verdade. Quase todas elas trazem algum tipo
de resultado se houver uma certa frequência na participação do cliente na atividade, mas será que isso
é ótimo, apropriado, eficiente, seguro ou sustentável
para este cliente?
Analise: a flexibilidade não é exclusiva da ioga
ou do pilates. Cardio não é exclusivo da esteira ou do
elíptico, nem é exclusivo de exercícios de longa duração e baixa intensidade. Novamente, ferramentas por
si só não trazem resultados. Prancha de equilíbrio
não melhora o equilíbrio, usar peso não te faz mais
forte. É o que acontece depois que utilizamos tais ferramentas que podem trazer algum resultado.
Exercício não é uma opinião. Exercício não é
algo que o profissinal acredita, gosta ou prefere e então prescreve para seu cliente-paciente. Exercício é a
manipulação de todos os fatores da equação baseados
no cliente e adequados para ele.
Finalmente: o que é exercício?
Exercício é força aplicada numa estrutura.
O exercício é um processo, não é um programa! Um
processo de estímulo e resposta (adaptação potencial)
que pode ser positiva ou negativa. Tentamos incentivar
o corpo a uma mudança e esperamos uma resposta.
De maneira ideal, o exercício é uma quantidade
de estímulos específicos a um objetivo em quantidades e frequência apropriadas. O estímulo não deve
ser aleatório, ele deve ser específico para um objetivo
e esse estímulo não deve ser determinado por nada
externo ao próprio cliente-paciente.
O estímulo
O que é o estímulo? Precisamos ter clareza e conhecimento sobre isso, porque a adaptação (resultado) é totalmente dependente do estímulo. Existe
um pensamento hoje no mundo do exercício de que
exercício é movimento e dizem: “Não treine músculos, treine movimento!” Acredito que você já deva ter
escutado essa frase.
É claro que movimento é importante e tem muito valor, como a secreção de líquido sinovial para lubrificação articular, o deslizamento dos tecidos um
sobre o outro, o deslizamento de uma superfície articular sobre a outra e a mobilidade. Vamos usar uma
analogia: pensemos num motor elétrico desligado.
Para mantermos suas partes conservadas, facilitando assim o trabalho de iniciação do motor quando
for ligado na tomada, poderemos simplesmente movê-las manualmente. Entretanto, este motor desligado enquanto movemos as suas partes manualmente
não produz HP (Horse Power) nenhum, não produz
trabalho, apesar de estar em movimento. Então é isso
que o movimento faz para o corpo se movemos uma
articulação passivamente, ele mantém a articulação
sem aderência.
48 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
I
O que está produzindo o movimento?
Porém, se o movimento for ativo, o que está
produzindo movimento são os músculos. Então
aquilo que dizem para não ser o foco do exercício,
no caso, o músculo, é justamente o responsável por
produzir o movimento. O movimento é produzido
e controlado pela contração muscular. Na verdade,
os responsáveis pelo movimento são os músculos.
Mas o que faz os músculos trabalharem? Não vamos falar do sistema nervoso neste livro de iniciação. O que faz com que um grupo de músculos trabalhe mais do que outro? Ou, ainda melhor, o que
faz com que um grupo muscular participe de um
movimento mais do que outro grupo muscular? A
resposta é a força.
O exercício é totalmente
relacionado à força.
É a força, a resistência, que faz os músculos trabalharem. Eu vou além, ao dizer que exercício é primariamente resultado da força. O principal estímulo
externo que causa mudança física é uma força específica chamada resistência, uma força em direção
oposta às fibras musculares e aplicada a uma certa
distância de um eixo.
Estudamos em Cinesiologia que a extensão de
cotovelo (movimento) é causada pelo tríceps (músculo) independentemente de qualquer indicativo da
direção da resistência. Mas quando, durante a fase
descendente de um exercício de barra fixa, o cotovelo está estendendo, não é o tríceps que está causando este movimento naquele momento, é o bíceps
em uma contração excêntrica. Assim, se você realizar uma flexão de cotovelo, em pé ou sentado, contra a gravidade e depois uma extensão do cotovelo,
não será o tríceps responsável pela extensão, será a
N
T
R
O
D
U
Ç
Ã
O
gravidade. Então, entender de força é essencial para
podermos entender de exercício.
Como poderíamos treinar o movimento sem
músculos? Os movimentos sozinhos não determinam o que acontece com a musculatura. Na verdade
quase poderíamos dizer que o movimento é o fator
menos importante do exercício. O mesmo movimento pode ser realizado por músculos completamente
diferentes baseados na direção da resistência encontrada. A resistência é a chave!
Vamos explorar um exemplo, a abdução do ombro [Fig. 19], para demonstrar que exercício não é
movimento. Se você elevar seu braço agora em abdução, utilizará um grupo de músculos necessários para
vencer a força da gravidade. Se você realizar o mesmo movimento na posição deitada (decúbito dorsal),
um grupo diferente de músculos será responsável por
realizar o movimento. Então, o mesmo movimento
foi realizado por grupos musculares diferentes. O
movimento foi o mesmo, mas a resistência mudou,
o cenário mecânico e a participação muscular também mudaram, o que nos mostra que exercício não é
movimento. Quando a resistência muda, tudo muda.
Vamos explorar mais um exemplo [Fig. 20].
Exercícios de puxar e de empurrar. Ambos são o
mesmo movimento, uma flexão e extensão de ombro
com uma flexão e extensão de cotovelo. Então, como
definimos se é um exercício de puxar ou de empurrar? Utilizando cabos ou borracha, definimos se é puxar ou empurrar pela direção da resistência, porque
o movimento é o mesmo. O mesmo movimento de
empurrar torna-se uma puxada excêntrica se invertermos a posição do cabo ou da borracha. O movimento neste exemplo é quase irrelevante, ou, melhor,
é secundário à resistência. Por isso, é essencial sabermos qual é a direção da resistência, caso contrário
nunca saberemos o que está acontecendo internamente durante um exercício. Puxadas e empurradas
são definidas por músculos se opondo a uma direção
de resistência específica.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
49
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
Fig. 19. Movimento de abdução do ombro quando realizado em diferentes posições
no espaço recruta diferentes
musculaturas para vencer a resistência e “mover o ombro”.
Em
pé:
musculatura superior ao eixo sagital.
Decúbito dorsal: musculatura anterior ao eixo sagital.
Decúbito ventral: musculatura posterior ao eixo sagital.
Fig. 20. Movimento de empurrar e puxar. O mesmo movimento é determinado como
empurrar ou puxar devido à direção da resistência. Músculos
são responsáveis por realizar os
movimentos e estes são recrutados a partir da resistência.
50 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
I
O exercício é totalmente
relacionado à força.
É a produção de
força interna em resposta à
aplicação de forças externas
para produzir o
resultado esperado.
O produtor interno de força são os músculos. A
aplicação da força externa é chamada de resistência.
Exercício é um Cabo de Guerra (CdG) entre duas forças
que acontece em cada articulação e em todas as articulações, quer ela se mova ou não durante um exercício.
Todas as formas de exercício
são exercícios resistidos!
Toda forma de exercício é exercício resistido. Muitas vezes, as pessoas não enxergam isso porque, de alguma maneira, associam cardio com aeróbico e resistência com força. Mas a verdade é que uma aula de step é
treinamento resistido. Pedalar na bicicleta ergométrica
também é exercício resistido. No espaço, sem nenhuma
resistência, sem gravidade, não se consegue fazer exercício de cardio porque ele é baseado na musculatura
esquelética. Exercício aeróbico significa que a musculatura esquelética está trabalhando aerobicamente. Nosso coração faz sempre a mesma a coisa, ele está sempre
trabalhando de forma aeróbica, a única coisa que muda
é a frequência. Exercícios aeróbicos e anaeróbicos estão
relacionados à musculatura esquelética.
“A adaptação fisiológica é fundamentalmente
uma resposta do corpo à física.”
Mitch Simon, DC, MS
É um desafio conseguirmos separar movimento de força, porém, para podermos analisar os
N
T
R
O
D
U
Ç
Ã
O
exercícios, precisamos primeiramente conseguir fazê
-lo. O mais difícil é desfazer a maneira que fomos ensinados. Aprendemos que um músculo é responsável
por um movimento específico. Porém, isso só está correto em 50% do tempo, pois cada vez que você faz uma
flexão de cotovelo você primeiro realiza a extensão do
cotovelo para depois poder voltar ao ponto inicial e, então, fazer a segunda repetição; e cada extensão realizada
não teve a participação do tríceps neste cenário mecânico. Então 50% do que aprendemos sobre movimento e
músculo está incompleto. Por isso é tão importante não
somente analisarmos as forças dentro de cada cenário
e de cada exercício, mas também não tentarmos adivinhar o que está sendo estimulado somente olhando
para o movimento.
Voltando à equação do exercício:
Fig. 21.
Todos os exercícios ou formas de exercício são
combinações específicas de:
1. [P] Posições articulares;
2. [M] Movimentos articulares;
3. [R] Resistência;
4. [S] Suporte;
5. [I] Intenção;
6. [E] Esforço;
7. [T] Tempo;
8. [F] Frequência;
9. [A] Apropriado.
Para construirmos ou analisarmos qualquer
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
51
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
exercício, é necessário sabermos manipular com
excelência as variáveis de 1 a 5. Para saber o que fazer
com o exercício, precisamos ter amplo conhecimento
sobre a manipulação das variáveis numeradas de 6 a
8. Mas saber como construir um exercício e saber o
que fazer com ele são dois processos totalmente diferentes e separados.
Essas são as nove variáveis que influenciam o
exercício, sejam elas estratégicas ou aleatórias. Independentemente de conhecermos ou não estas variáveis, elas sempre influenciaram e influenciam no
resultado obtido, quer saibamos disso ou não. Devemos manipulá-las para, estrategicamente, trazer resultados positivos para nossos clientes-pacientes. Em
primeiro lugar, é imprescindível que saibamos o que
esperar do exercício para então poder analisar como
ele deve ser construído e realizado. Esta análise deve
ser feita através do conhecimento de como todas as
variáveis do exercício o influenciam. Só então teremos condições de examinar e decidir quando continuar, regredir, ajustar, modificar, progredir ou abolir
um exercício.
O completo domínio sobre as manipulações da
equação do exercício causa uma evolução profissional do ordinário para o extraordinário e, consequentemente, agrega valor ao trabalho do fisioterapeuta.
Todas as variáveis são individualmente detalhadas no
capítulo sobre o Continuum de exercício.
Não existe execução ideal
“genérica” de um exercício.
Cada exercício deve ser
modificado com base no
objetivo, na estrutura e na
habilidade individual de
cada cliente-paciente.
52 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
bibliografia
[1] BLACK, Alexandra. Boom or bust? Get Baby Boomers Flocking to Your Gym.
Disponível em: <http://www.ihrsa.org/blog/2016/11/21/boom-or-bust-get-baby-boomersflocking-to-your-gym.html> Acesso em: 10 dez. 2016.
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[10] ROLLERS, Duane W. Eratosthenes’ Geography. Fragments collected and translated. Princeton: Princeton University Press. p.16 e 21-22, 2010.
[11] SANTOS, José Carlos de Sousa Oliveira. Eratóstenes e o tamanho da Terra. Disponível em: <http://www.fc.up.pt/mp/jcsantos/Eratostenes.html>. Acesso em: 15 dez. 2016.
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p. 15-16 e 279-293. Jun., 1992.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
53
o
começo
mec â nica
do
e x erc í cio
O cabo de guerra interno
m e c â n i c a
d o
e x e r c í c i o
A
mecânica do exercício é composta pela mecânica articular, pela mecânica muscular e
pela mecânica da resistência. Para iniciar o
estudo da mecânica do exercício, é necessária a compreensão da realidade mecânica mais básica do exercício, a de que exercício é um cabo de guerra interno
em torno de uma articulação. Este cabo de guerra
acontece entre duas forças, de um lado a resistência e
do outro a resposta muscular (potência ou esforço) e
o centro do cabo de guerra é a articulação.
Fig. 22. Exercício é um cabo de guerra.
Os exemplos a seguir são representações gráficas
desenvolvidas para ajudar no processo de aprendizagem, identificação e visualização de como o exercício
acontece internamente. Estes não são exemplos reais
de exercícios acontecendo, mas apresentam o primeiro passo para a construção do raciocínio e desenvolvimento de uma visão interna do exercício.
O cabo de guerra acontece em torno de um eixo.
Fig. 23. O cabo de guerra em torno de um eixo.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
57
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
No corpo humano, este cabo de guerra acontece
em torno de um osso.
Fig. 24. O cabo de guerra em torno de um osso.
O plano do cabo de guerra. Com uma mudança
de perspectiva, verificaremos que, se houver alteração
na direção da resistência, a musculatura que se opõe
(resiste) também mudará.
Fig. 25. Quando a resistência muda de plano, outra
musculatura passa a gerar oposição a esta nova direção da resistência.
58 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
m e c â n i c a
d o
e x e r c í c i o
Como o cabo de guerra acontece em torno de
um osso dentro do corpo humano, este é, na verdade,
um cabo de guerra em torno de uma articulação.
Fig. 26. No corpo humano, o cabo
de guerra acontece em torno da
articulação.
Quando duas forças são aplicadas em torno de
um eixo, temos uma alavanca. A alavanca é formada por duas forças aplicadas a uma distância da
articulação.
Fig. 27. Duas forças aplicadas
em torno de um fulcro formam uma alavanca.
Todo exercício é resistido e, independentemente do nome mercadológico, responde ao mesmo
processo do cabo de guerra. O exercício é o processo de vários cabos de guerra, sendo “orquestrados”
simultaneamente dentro de um sistema complexo
de resolução motora. O tempo em que o cabo de
guerra permanece acontecendo normalmente carrega uma nomenclatura; se for 20 minutos ou mais,
é chamado de exercício aeróbico e, se for 30 segundos, é chamado exercício para força. Porém, o cabo
de guerra é o mesmo.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
59
FORÇA
m e c â n i c a
O que é força?
Força (e todas as suas características e efeitos) é
sem dúvida um dos aspectos mais importantes para se
entender um exercício. Força, ou mesmo a falta dela,
é o estímulo principal de praticamente todo processo
fisiológico necessário para o desempenho humano.
Existem alguns fatores fundamentais para entender a força:
1. Força é simplesmente um empurrão e/ou puxão
exercido por um objeto em outro.
• “Força” não implica “muito”! A força pode ser
medida em gramas ou toneladas.
2. Força é linear, ou seja, ela é exercida em linha
reta, logo:
• Força tem direção e essa direção relativa é o
fator fundamental que determina a forma como
uma força específica influenciará um objeto (sua
direção relativa ao objeto);
• Uma força tem um ponto de aplicação específico;
• Força tem magnitude ou “uma quantidade”.
Discussão
Normalmente, o mundo do exercício, dentro de
sua perspectiva, se preocupa somente com a quantidade da força e quase nunca considera as influências
e efeitos da sua direção relativa.
Forças são, muitas vezes, difíceis de visualizar. O
vento é um exemplo ideal! Nós sentimos a força e vemos
os resultados do vento, mas não conseguimos enxergar a
força em si. Na verdade, porque nem sempre conseguimos enxergar a força, ela pode nos confundir. Já que não
podemos enxergar uma força normalmente usamos uma
seta, também conhecida como vetor, para representá-la.
d o
e x e r c í c i o
Fig. 28.
Um vetor representa o seguinte de uma força:
• Ponto de aplicação no objeto;
• Direção;
• Seu comprimento representa a magnitude ou a
quantidade de força sendo exercida em relação às
outras forças envolvidas.
O vetor indica a linha da força, a qual é imprescindível ser identificada para análise e criação de exercícios.
Perspectivas
1. Ver a força como um empurrão ou um puxão é
uma questão de perspectiva baseada nos objetos e
suas relações com a força, assim como a relação do
objeto com a origem aparente da força. Por exemplo, o vento é considerado um empurrão, mas a
gravidade é considerada um puxão. Em ambos, a
linha da força [Fig. 29] pode se estender por meio
do objeto e ser representada do outro lado.
2. A força é descrita como um agente de mudança. Usamos a força para causar mudanças na posição, velocidade, direção etc.
Força e seus diversos nomes
Existem forças internas e forças externas. Forças
externas são empurrões e puxões no corpo que provêm de fora dele (resistência).
Forças internas são aquelas que têm sua origem
dentro do corpo humano (músculo). Deve-se notar
que qualquer força externa aplicada ao corpo imediatamente se torna em uma força interna também.
Além disso, os efeitos combinados dessas forças internas e previamente externas resultam na produção
de forças internas adicionais que são geradas entre as
articulações – estas chamamos de forças articulares.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
61
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
F
F
F
a)
F
b)
Fig. 29. A linha da força é invisível e é a
representação da força sendo aplicada.
A linha da força é infinita e pode ser representada se estendendo pelo corpo.
a) Durante a flexão de cotovelo com
halter, a linha da força é traçada a
partir da posição do centro de massa do halter para baixo, na direção
da força da gravidade. Em ambas,
a posição da linha da força se estende acima do halter e, na posição
de total extensão do cotovelo, a linha da força se estende pelo braço.
b) No exemplo do exercício de empurrar do ombro (supino), a linha da força se estende pelo antebraço quando o cotovelo está em flexão e pelo
braço e antebraço quando o cotovelo
está em extensão.
Fig. 30. Forças internas são as geradas pelo
tecido contrátil e forças externas são as oferecidas pela resistência.
62 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
m e c â n i c a
A força muda baseado em:
1. Como é aplicada (sua relação com o objeto);
2. O que ela faz com o objeto;
3. Sua relação com outros objetos e forças. Os seguintes nomes serão introduzidos ao longo deste
processo educacional para representar “força” em
diferentes situações específicas:
• Stress;
• Tensão;
• Compressão;
• Cisalhamento;
• Fricção/Atrito;
• Potência/Esforço;
• Resistência;
• Torque.
Importante: Nenhum desses termos representa
situações inerentemente boas ou ruins. São apenas
descrições da força em um cenário mecânico específico (uma relação específica).
A parte da ciência intimidadora
Na física, a força é representada pela equação
F = ma. Esta, como todas as equações, é simplesmente uma relação entre três fatores: força, massa e aceleração. Neste caso, a força é igual a massa do objeto
multiplicada por sua taxa de aceleração (ou desaceleração).
Porém, na vida e nos exercícios, nunca existe
somente uma força sendo aplicada a um objeto (ver
terceira lei de Newton1). O cenário criado durante a
aplicação da força na vida real é o de múltiplas forças
sendo aplicadas e criadas dentro de múltiplos objetos
ao mesmo tempo. A combinação delas pode ou não
resultar em aceleração. Por exemplo: forças opostas
podem estar tentando acelerar um objeto em uma
direção oposta, porém sem causar movimento, mas
1 Terceira lei de Newton: “Quando um objeto exerce uma força sobre
outro objeto, o segundo objeto simultaneamente também exerce uma
força igual e oposta sobre o primeiro”.
d o
e x e r c í c i o
mesmo assim é vital reconhecer a tentativa da aceleração, como a isometria.
Os diferentes nomes usados
para identificar diferentes
tipos de forças são apenas
descrições de diferentes
cenários mecânicos.
Duas ou mais forças atuando em um ponto comum
de aplicação são partes de um sistema de forças concorrentes. As ilustrações, a seguir, são exemplos de quando
existe mais do que uma força atuando em um ponto. Na
verdade, existe somente uma, que é a soma vetorial de
todas as forças. O efeito líquido destas forças é chamado
de força resultante, que tem tanto a magnitude quanto
a direção aplicada no mesmo ponto no objeto.
É muito importante reconhecermos e sermos
capazes de identificar a força resultante, porque em
praticamente todo exercício a resistência é o resultado de pelo menos duas fontes de força. Por isso, para
manipularmos as forças durante um exercício, precisamos entender e reconhecer a força resultante.
Resultante = duas ou mais
forças com somente um
resultado ou influência!
Existem duas maneiras de alterar a resultante:
1. Alterar a quantidade de cada uma ou de ambas
as forças originais;
2. Alterar o ângulo entre as forças.
Quando várias forças estão agindo, é a resultante que determina a direção da resistência (e
sua magnitude).
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
63
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
a)
b)
c)
Fig. 31. a) As fibras musculares “puxam” em diferentes direções, porém a resultante é
a somatória de todos os vetores de força. b) Pegadores com forças divergentes, como corda ou tecido, podem gerar influência na resistência.
No processo de descida do cabo, o pegador gera forças adicionais que podem aumentar a resistência.
c) Em um exercício de supino com a barra no plano transverso, o tríceps está tentando estender o cotovelo. Mas a barra não permite o movimento para fora. De acordo com a Terceira Lei de Newton, a barra
puxa para dentro com a mesma intensidade que o tríceps puxa para fora. Este fato gera uma segunda
força além da gravidade, que é a fricção, e a resultante entre as duas é a nova linha da força.
Forças múltiplas: com ou sem movimento
No planeta Terra, além da gravidade, estamos
constantemente sendo influenciados por múltiplas
forças. Por essa razão, é a força resultante que vai
determinar a direção e a proporção da aceleração.
Se a resultante é zero (equilibrada, forças iguais em
direções opostas), o resultado será a ausência de movimento (sem movimento) ou será uma velocidade
constante (dependendo do que estava acontecendo
antes de a resultante se tornar zero.)
Como pode haver forças e não ter aceleração?
Cada força dentro do cabo de guerra está “tentando”
acelerar as massas envolvidas e elas vão continuar
tentando acelerar enquanto elas estiverem presentes.
Se, por exemplo, um galho de árvore quebra, a aceleração da gravidade será exposta e o galho vai cair porque não houve nenhuma força em oposição. Então,
quando a força resultante não for zero, haverá uma
mudança no movimento produzido enquanto o objeto é acelerado positiva ou negativamente.
Perspectivas sobre força e
força resultante
Lei de Newton do Movimento (relativo à força):
Primeira Lei de Newton (Lei da Inércia): Se a
força resultante (o vetor resultado da soma de todas
as forças que agem em um objeto) é nula, logo, a velocidade do objeto é constante. Consequentemente:
64 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
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d o
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um objeto que está em repouso ficará em repouso
a não ser que uma força resultante não nula aja sobre ele. Um objeto que está em movimento retilíneo
uniforme não mudará a sua velocidade a não ser que
uma força resultante não nula aja sobre ele. Esta lei
da inércia, basicamente, representa objetos em equilíbrio e seu “desejo” de permanecer inalterado. Inércia é a resistência que um corpo oferece à alteração
do seu estado de repouso ou de movimento. Quanto
maior for a massa do corpo, maior a sua inércia, ou
seja, maior a resistência que este oferece à alteração
do seu estado.
Segunda Lei de Newton (F = m.a): A soma do
vetor de força F em um objeto é igual à massa m deste objeto multiplicada pelo vetor a da aceleração do
objeto. “A força é um agente de mudança” – esta é a
lei da aceleração.
Terceira Lei de Newton: “Quando um objeto
exerce uma força sobre outro objeto, o segundo objeto simultaneamente também exerce uma força igual
e oposta sobre o primeiro”. Esta é a lei de reação,
que basicamente mostra que as forças sempre vêm
em pares quando há contato entre dois objetos. Esta
parece ser uma versão complicada da apresentação
comum desta lei, que normalmente afirma que para
cada ação há uma reação igual e oposta. Essa versão
simplificada pode ser erroneamente interpretada se
o objeto e seu ponto de contato não são considerados. As forças resultantes de dois objetos em contato
podem ser chamadas de par de interação, forças de
ação-reação, ou forças de contato. A atribuição de
qual força é classificada como ação ou reação é arbitrária. Qualquer uma das duas pode ser chamada de
ação e a outra, reação.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
65
movimento articular
m e c â n i c a
Mecânica articular:
o centro do cabo de guerra
A articulação é o centro do cabo de guerra. Ela
recebe o resultado líquido das forças aplicadas nos
dois lados do cabo de guerra e, então, fica responsável
por forças, às vezes, maiores das que são aplicadas em
um dos lados do cabo.
Não são os ossos que
movem, são as articulações!
Mesmo que um membro se mova no espaço, o
seu movimento é resultado de movimento em uma
ou mais articulações. Todo movimento humano, simples ou complexo, é resultado da orquestração de forças em torno de uma articulação. Independentemente de quantas articulações estão se movendo durante
um exercício, a função individual de cada articulação
não pode ser ignorada. “Movimento integrado é, por
definição, composto por várias articulações individuais. Sendo assim, é dependente da integridade de
cada uma das que foram integradas!”
Artrocinemática (artro = articulação; cinemática = movimento). O movimento que acontece em
uma articulação depende do formato das superfícies
de contato e dos ligamentos de estabilização passiva.
Algumas articulações fornecem mais estabilidade e
outras, mais mobilidade.
Podemos descrever a análise de um movimento
uniarticular como intra-articular (relativo à relação
entre as superfícies de contato dentro de uma articulação); e a análise de movimentos multiarticulares
como interarticulares. Ambos são extremamente importantes durante a análise e criação de exercícios.
Tipos de Movimento Articular
Sem nenhuma dúvida, o conceito da função articular mais importante de ser entendido, apreciado
d o
e x e r c í c i o
e aplicado, é o do tipo de movimento gerado pela estrutura articular. Na verdade, ignorar o movimento
articular específico (suas características e de como
é influenciado e influencia a força) é provavelmente a maior negligência que cometemos como profissionais. Não levar em consideração as propriedades
da unidade mais fundamental do movimento tem
gerado muito mal-entendido na criação, desenvolvimento, análise e realização de exercícios específicos e
exercícios resistidos.
Fig. 32. Durante o agachamento, as articulações
se movem em rotações,
porém o centro de massa
se move linearmente.
Movimento translatório ou movimento linear é
o movimento de um objeto em linha reta. Ele acontece em pequena quantidade durante o movimento articular e está presente em algumas articulações mais
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
67
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
do que outras, dependendo da forma das superfícies
de contato (joelho, facetas da coluna). Movimento
translatório é mais visível em uma articulação durante mobilizações passivas que exibem jogo articular,
e é muitas vezes usado para examinar a integridade
passiva das articulações.
Movimento linear ativo (no espaço) acontece
como resultado de rotação em múltiplas articulações.
Por exemplo, no agachamento, o centro de massa se
move linearmente, mas é o resultado do movimento rotatório de muitas articulações. Outro exemplo é
quando tentamos alcançar algo com a mão. A mão
se move linearmente, mas é resultado da rotação do
cotovelo e do ombro.
Características do eixo
1. O eixo é o centro da rotação/movimento.
2. O trajeto de um objeto girando ao redor do
eixo é um arco.
3. Esse arco está dentro de um plano de movimento criado pelo eixo. Uma linha conecta dois
pontos no espaço. Um plano conecta ou contém
quaisquer três pontos (e não está limitado pelos
“três planos cardinais”).
Não é possível entender a
resistência e os exercícios
sem compreender e aplicar
o conceito de movimento
axial e tudo o que ele
implica no exercício.
Movimento rotatório é o movimento de um
objeto ou segmento ao redor de um eixo. A maioria dos movimentos das articulações sinoviais é rotatório. Para o profissional do exercício, o eixo do
movimento é o aspecto mais importante para ser
entendido.
É vital que você seja capaz de identificar o eixo
de cada articulação durante o exercício, para que
seja possível criar e analisar um exercício, determinar a participação muscular e ainda tornar capaz
identificar a diferença entre força e resistência em
um exercício. Para enfatizar a importância do estudo sobre o eixo articular e suas influências, organizamos os fatores mais importantes e classificamos
como princípios específicos do eixo.
Fig. 33. Movimento articular é uma
rotação. O eixo é o centro da rotação
e o arco do movimento determina o
plano do movimento.
Muitas vezes, um plano é congruente com
um objeto tangível: um vidro, um pedaço de
espelho plano etc. Porém, quando relativo ao
corpo, um plano não é normalmente visível.
Para a visualização dos planos de movimento,
podemos fazer uma analogia com um limpador
de para-brisa se movendo através de um plano
representado pelo próprio vidro. A palheta tem
68 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
m e c â n i c a
um eixo de rotação que é perpendicular ao plano. Mesmo que o vidro seja removido, o plano
de movimento da palheta continua o mesmo,
porque é determinado pelo eixo da palheta. O
corpo pode se mover em um número incontável de planos.
4. Um plano de movimento é sempre perpendicular ao eixo. É essencial que sejamos capazes de
enxergar que o eixo é sempre perpendicular ao
plano de movimento.
Fig. 34. A direção do
movimento é tangencial ao arco.
d o
e x e r c í c i o
aconteceria caso os efeitos da força não fossem
iguais (empatados). Sempre imagine se uma força ou outra se tornasse maior, em que direção o
movimento aconteceria. Este então é o plano e o
eixo será perpendicular a ele. A este eixo chamamos de eixo da força (RTS®) ou eixo do potencial movimento.
Agora, um pouco mais avançado
7. Diferentemente de uma dobradiça, uma articulação humana não tem um parafuso atravessando no meio dela para fixar o centro da rotação. Na verdade, o movimento articular não é
gerado pelo eixo, mas pelo formato das superfícies de contato. Em outras palavras, é o formato
em arco das superfícies articulares que define a
posição do eixo e o movimento. O eixo articular
é mais virtual do que tangível.
Fig. 35. M o v i m e n t o
curvilíneo da articulação do joelho. O eixo
muda durante a amplitude de movimento: eixo instantâneo
da rotação.
5. A direção do movimento de um segmento é
tangencial ao arco, em qualquer ponto do arco.
Então, o segmento está constantemente mudando de direção com cada nova posição porque a
direção do movimento é sempre perpendicular
ao segmento. Da mesma maneira que uma linha
é o conjunto de infinitos pontos, um arco é o
conjunto de infinitas tangentes.
6. Então, será que existe um eixo articular quando não existe movimento articular? Sim, existe
um eixo mesmo quando não existe movimento
articular e este seria o ponto em que o movimento
m’
m
t
8. Devido às irregularidades e aos graus de curvaturas que são inconsistentes nas superfícies de
contato articulares, o ponto exato da posição do
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
69
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
eixo muda durante a amplitude de movimento.
Isto é chamado de eixo instantâneo da rotação ou centro instantâneo da rotação. Um dos
exemplos mais evidente para observarmos este
fato é a articulação do joelho. Este acontecimento gerou muitas interpretações equivocadas na
tentativa de descrever o movimento do joelho
como sendo uma sequência de rotações e translações. Porque as superfícies de contato de uma
articulação não são perfeitamente achatadas, a
translação pura nunca acontece e sempre existe
um grau de rotação. Este tipo de movimento se
chama curvilíneo.
9. As estruturas de cada articulação são muito diferentes, mas podemos entender que o
movimento articular é basicamente um osso
escorregando sobre ou rodando em torno de
outro (convexo e côncavo) sem um eixo tangível colocado através deles. O bom controle
orquestrado de todos os lados da articulação
(contrátil e não contrátil, passivo e ativo) é essencial para uma função articular apropriada
e manutenção das relativas posições do eixo e
para a estabilidade do eixo. Isto é chamado de
centrificação.
10. O eixo encontra-se sempre dentro do lado
convexo da articulação, independente de qual
lado da articulação está se movendo.
Ação reversa
Ação reversa é um termo utilizado na cinesiologia tradicional para descrever uma situação em que o
segmento que está fixo e o segmento que se move são
invertidos. Por exemplo, a flexão do cotovelo normalmente é descrita como o segmento distal se movendo
em direção ao proximal, que está fixo. Na ação reversa, o segmento proximal se move em direção ao distal, porém o movimento rotatório em torno do eixo
do cotovelo não muda.
a1)
a2)
b1)
b2)
b3)
Fig. 36. a1)
O
primeiro
exemplo é do segmento distal se movendo em direção ao proximal.
a2) O segundo exemplo indica a
ação reversa: o segmento proximal se move em direção ao distal.
b1) A articulação do quadril em neutro.
b2) O fêmur, segmento distal se
move em direção à pelve, proximal.
b3) A pelve, segmento proximal se move
em direção ao fêmur, distal.
70 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
m e c â n i c a
d o
e x e r c í c i o
Fig. 37. E x e m p l o
de ação reversa na
adução
do
quadril.
a) O fêmur se move
i n t e r n a m e n t e .
b) A ação reversa à pelve
se move em direção ao
fêmur. Perceba que a relação de movimento da
rotação na articulação
não muda.
a)
POSIÇÃO INICIAL
b)
EQUIVALÊNCIA
“Se em um mecanismo o elo que originalmente está fixo passa a se mover e outro elo se torna fixo,
diz-se que este mecanismo foi invertido. Esta inversão
não altera o movimento relativo entre os elos, mas altera seus movimentos absolutos (em relação ao solo).”1
Exemplo Fig. 36: Flexão do quadril pode aconte1 MABIE, Hamilton; REINHOLTZ, Charles. Mechanisms and Dynamics of Machinery. 4ª ed. 1986.
FIXO
cer com o fêmur se movendo dentro da pelve ou na ação
reversa da pelve se movendo em direção ao quadril.
Nesta análise, estamos somente abordando a articulação independentemente de musculatura ou exercícios.
Um outro, exemplo Fig. 37: pode ser a abdução
do quadril que pode ocorrer com o fêmur se movendo
sobre o quadril “fixo” ou a ação reversa com o quadril
(acetábulo) se movendo em torno do fêmur fixo.
Fig. 38. Lei da concavidade e
convexidade. Independentemente de qual lado se move,
o eixo permanece sempre do
lado da convexidade.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
71
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
A Lei da Concavidade e Convexidade
Originalmente, esta lei estabeleceu que, se uma
superfície côncava se mover sobre uma superfície
convexa, o deslizamento da superfície de contato
acontece na mesma direção (do mesmo lado) do movimento do segmento ósseo. Quando uma superfície
convexa se move sobre uma superfície côncava fixa, o
deslizamento da superfície convexa acontece na direção oposta do movimento do segmento ósseo.
Para aplicação desta lei, é importante a compreensão de qual é o lado em que o eixo se encontra.
Sempre que o eixo se encontra no lado do segmento
que se move, este fica contido dentro do objeto (dentro do segmento ósseo) e parte deste objeto se estende
além do eixo e, como uma gangorra, a parte que está
do outro lado do eixo se move em direção contrária.
Porém, quando a parte que se move é aquela que não
contém o eixo, todo o objeto (segmento ósseo) se
move na mesma direção.
Quando o termo “graus” é aplicado aos graus de
liberdade das articulações, é melhor entendermos
como a oportunidade de movimento permitida pela
estrutura articular relativa ao espaço tridimensional.
Em outras palavras, de quantas maneiras uma articulação pode rodar em relação ao espaço tridimensional dentro do que está predeterminado pelas superfícies de contato e o tecido conjuntivo?
Lembre que o eixo se encontra
sempre do lado convexo!
É útil relembrar que tridimensional é representado graficamente pelo sistema de coordenadas X, Y, Z.
Dessa maneira, é possível identificar posições no espaço relativas a “em cima/embaixo”, “um lado para
outro” e “frente/atrás”. Os movimentos corporais podem ser descritos da mesma maneira.
Então, uma articulação pode rodar em torno de um
eixo vertical e de um eixo horizontal. Se esta consegue fazer ambos, então pode se mover também na diagonal, assim como em movimentos cônicos. Se existir um terceiro
eixo perpendicular aos outros dois, este eixo permitirá
que o membro “rode” longitudinalmente. Quando analisamos articulações individuais, encontramos algumas
que se movem em somente um plano, outras que se movem em dois e outras que se movem em três. As articulações que se movem em três graus de movimento, na verdade, podem mover-se em um número infinito de planos
individuais e em qualquer combinação deles.
Os graus de liberdade
O termo “graus de liberdade” pode gerar confusão. Como a rotação em torno de qualquer eixo individual é medida em graus, temos a ideia de graus
angulares. Mas isto é diferente.
Graus podem ser vistos também como: uma série de passos ou níveis, como em um processo; ou um
ponto em uma escala.
Existem potencialmente seis graus de liberdade
em cada articulação para serem reconhecidos e considerados. Então, existem seis oportunidades para
uma articulação se mover.
• Oportunidade rotacional: 3 (+)
• Oportunidade linear: 3 (+)
-Y
-X
+Z
+Y
72 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
Fig. 39. Sistema tridimensional x, y, z.
m e c â n i c a
Uma articulação de dobradiça verdadeira possui um eixo e, assim, por definição, move-se somente
em um plano e possui apenas um grau de liberdade.
e x e r c í c i o
Articulações esferoides (em soquete), como a
glenoumeral e o quadril, possuem três graus de liberdade (por exemplo, movimento tridimensional).
Fig. 42. Articulação esferoide.
Três graus de liberdade. Exemplo: articulação do ombro.
Fig. 40. Articulação
em
dobradiça. Somente um
grau de liberdade. Exemplo:
a articulação do cotovelo.
O joelho é comumente descrito como uma articulação de dobradiça, com somente um grau de
liberdade, mas na verdade não é, porque a rotação
longitudinal está disponível durante a amplitude. O
movimento do joelho acontece em torno de dois eixos, então possui dois graus de liberdade.
Articulações em sela possuem dois graus de liberdade e se movem em torno de dois eixos, um vertical e outro horizontal.
Fig. 41. Articulação
em sela. Dois graus
de liberdade. Exemplo: a articulação trapézio metacarpal.
d o
“Movimento Triplanar”?
Existe muita má interpretação sobre o que é chamado de movimento triplanar e é necessário analisar
eixos e planos para podermos entender o que está
acontecendo nas articulações quando usamos o termo “movimento triplanar”.
Inicialmente, precisamos entender que um espaço tridimensional é composto por três eixos com um
número infinito de planos e não com três planos somente. Um movimento verdadeiramente multiplanar
exige que o movimento aconteça em mais do que um
eixo mecânico, então multiplanar não é um movimento que acontece em torno de um eixo somente, porém
é realizado fora de um dos planos cardinais e este cria
um plano que não tem nomenclatura definida.
Quando analisamos múltiplas articulações se movendo cada uma em um plano diferente e chamamos
de multiplanar, precisamos saber que na verdade cada
articulação individual está se movendo em torno de um
único eixo e está se movendo em somente um plano.
Também é necessário analisar que, se a articulação do joelho, por exemplo, se mover em um terceiro
plano, nós consideraremos isso uma lesão.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
73
Mecânica articular:
Movimento e força
m e c â n i c a
Explorando a relação entre
movimento e força
Movimento pode ser visto como uma mudança de
posição. A mudança de posição acontece devido a forças
desiguais (isto é, forças desequilibradas). Por exemplo, o
retângulo abaixo está estático, mantendo uma posição.
Ele está em uma posição fixa porque as forças que estão
empurrando-o são iguais, equilibradas.
ou
Fig. 43.
Se as forças se tornarem desiguais, então ele se
moverá.
ou
Fig. 44.
Esse exemplo é representativo do movimento
translatório ou linear.
Perspectiva rotacional:
forças, eixos e alavancas
Agora, imagine que um lado do retângulo ficasse preso e não mais igualmente livre para se mover
devido a uma restrição externa a ele ou uma restição
colocada através/dentro dele.
A restrição cria um eixo em torno do qual o retângulo se move livremente no espaço (características anatômicas são responsáveis por criar as restrições em articulações humanas).
d o
e x e r c í c i o
Fig. 45.
Isso cria uma alavanca. Uma alavanca é a distância do eixo até o ponto de aplicação de uma força e,
como é característico do movimento rotatório, a alavanca está constantemente mudando de direção enquanto ela gira. Mas se a força continua empurrando
na mesma direção, sua relação com a alavanca muda.
Compreender as relações entre a força, a alavanca e
o eixo é muito importante para qualquer profissional
que prescreve força (exercício) para indivíduos.
Torque
O torque é muitas vezes chamado de uma força em
rotação, porém é mais correto pensar no torque como
um empurrão ou puxão (força) que causa movimento
em torno de um eixo (rotação). A quantidade de força
em si não é o único fator que afeta seu grau de influência no movimento em torno de um eixo. A distância de
aplicação da força até o eixo tem a mesma influência na
quantidade ou torque que é gerado. Esta distância é chamada de momento do torque (ou momento da força) e
é medida como um braço do momento.
Torque = Força x Braço do Momento
T=F . BM
O torque é calculado multiplicando-se a força
pelo comprimento do braço do momento. Então,
qualquer fator que influencie a força ou o comprimento do braço do momento, influencia diretamente o torque.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
75
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
O braço do momento (BM)
Os braços do momento são específicos dos
movimentos rotatórios e representam a relação de
cada força com seu eixo. Eles representam um nível
de habilidade mecânica ou, em outras palavras, o
braço do momento representa o quanto de influência uma força tem em um movimento em torno de
um eixo. É, na verdade, a eficiência relativa da força causando movimento rotatório em cada ponto
do movimento.
O braço do momento é definido pela menor distância entre a linha da força e o eixo. A distância mais
curta de uma linha da força ao eixo é sempre perpendicular à linha de força e atravessa o eixo.
B
C
B
A
C
D
Fig. 46. Para identificar o comprimento do braço do momento.
Identifique a linha da força [A].
Depois o eixo [B] e, por último,
encontre a menor distância perpendicular à linha da força que
atravessa o eixo. Esse é o braço
do momento [C]. Se necessário,
prolongue mentalmente a linha
da força para que o braço do
momento cruze o eixo [D].
Então, para identificar o comprimento do braço
do momento em qualquer posição específica durante
o movimento de um objeto em torno do eixo, é necessário:
1. Identificar a linha da força específica em questão [A].
Nota: existem normalmente múltiplas forças
agindo em torno de um eixo no mesmo instânte.
É necessário identificar qual força será analisada.
2. Identificar o eixo específico em questão [B].
Nota: existem normalmente múltiplos eixos afetados por uma linha da força. É necessário identificar qual eixo será analisado.
3. Identificar a linha que é perpendicular à linha da força que atravessa/intercepta o eixo [C].
Nota: se a linha da força (cabo, gravidade,
músculo etc.) parece não oferecer uma relação
perpendicular ao eixo em um ponto específico
do comprimento do trajeto representado, a linha deve ser alongada/estendida (mentalmente ou graficamente) [D] para identificar o braço
do momento.
Importância no exercício
Cada movimento humano é criado por uma
ou mais articulações girando em torno dos respectivos eixos. Movimentos lineares brutos, como
de um agachamento (linear considerando que o
centro de massa deve se mover verticalmente em
uma linha reta virtual mantida sobre a base de
suporte), são produzidos por meio de múltiplas
articulações girando em proporções angulares
necessárias. Com esse entendimento, torna-se
necessário reconhecer que praticamente todas as
forças aplicadas ou criadas dentro do corpo humano estão gerando um torque, então a sua influência sobre o movimento ou sobre a estabilização é determinada tanto pelo braço do momento
da força quanto pela quantidade de força. Braço
do momento é uma das muitas razões pelas quais
o número indicado no peso não representa com
precisão a verdadeira resistência e uma das razões
76 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
m e c â n i c a
pelas quais o que está se movendo e o que está
sendo desafiado podem não estar relacionados.
Distribuição da resistência
Independentemente da quantidade de carga, o
grau de desafio efetivo em cada articulação é determinado pelo momento para cada articulação.
O agachamento é normalmente considerado um
exercício que envolve o corpo todo, mas o desafio não é
igual para todas as partes do corpo (nem deve, porque
cada articulação e suas musculaturas associadas possuem habilidades mecânicas drasticamente diferentes).
Apesar de extremamente simplificados, esses
exemplos representam a distribuição da resistência
entre o quadril e o joelho. Embora existam muitos fatores envolvidos (alguns que podem ser manipulados
e outros que não podem), vamos analisar duas experiências muito diferentes e com diferentes resultados
que podem ser esperados a partir dos agachamentos
apresentados a seguir.
No agachamento a), a carga é distribuída igualmente entre o quadril e o joelho porque os comprimentos do braço do momento são iguais. No entanto, é
provável que se experimente maior desafio nos extensores do quadril do que nos extensores de joelho porque
a)
b)
d o
e x e r c í c i o
a capacidade de produção de torque nas musculaturas
específicas de cada articulação não é igual, ou seja, normalmente força extensora de quadril é maior que força
extensora de joelho.
No agachamento b), um maior momento é gerado para os quadris (e coluna lombar). É provável que
esse indivíduo vá experimentar o agachamento como
primariamente um exercício envolvendo “glúteo e lombar” porque é exatamente isso que está sendo desafiado devido aos momentos da resistência. A exigência da
musculatura extensora do quadril e coluna é tão maior
do que a exigência para os estensores do joelho que provavelmente a fadiga/falha na lombar é capaz de impedir
qualquer perceptível desafio para o quadríceps.
Nota: Esses exemplos de distribuição da resistência por meio do comparativo entre o comprimento
do braço do momento não são uma análise completa sobre agachamentos, ainda é necessário considerar todas as forças articulares relacionadas com cada
exemplo, recrutamento muscular relacionado etc.,
assim como é necessário considerar cada indivíduo
específico, seus objetivos, fase da progressão etc. Porém, esta análise nos mostra que, mecanicamente,
um agachamento pode desafiar articulações de maneiras diferentes.
Fig. 47. Exercício
de
agachamento.
a) A linha da força recai entre a articulação do
quadril e do joelho e os comprimentos dos braços do momento são iguais, e o torque, então, é
praticamente igual para o joelho e para o quadril.
b) O braço do momento é maior para a articulação
do quadril do que para o joelho, resultando em uma
exigência maior para a musculatura extensora do
quadril e da coluna do que para o joelho. Isso devido
ao torque da resistência para a articulação do quadril
e da coluna serem maiores do que o torque da resistência para o joelho.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
77
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
Fig. 48. Esquema demostrando as mudanças do comprimento do braço do
momento da resistência durante uma flexão do cotovelo. A linha da força
está representada pela linha pontilhada e o comprimento do braço do momento está representado pela linha vermelha.
Fig. 49. Esquema demostrando as mudanças do comprimento do braço do
momento do músculo do bíceps durante a flexão do cotovelo e da resistência.
A linha da força está representada pela linha verde para resistência e azul para
potência/esforço e o comprimento do braço do momento está representado
pela linha vermelha. Neste exemplo, na posição em que o braço do momento
da resistência é maior, coincide com a posição em que o braço do momento
do músculo também é o maior. Isso mostra que, quando a resistência é mais
difícil, o músculo está mais forte.
78 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
m e c â n i c a
Características dos momentos
1. Se o sentido de uma força permanece consistente enquanto um membro gira em torno de
uma articulação, o braço do momento vai mudar
a cada grau de movimento. Isto significa simplesmente que a força terá diferentes graus de
influência em cada posição que compõe a amplitude de movimento [Fig. 48].
2. Haverá um momento, ou torque, diferente
para cada força que atua sobre um eixo comum:
força interna ou força externa, força da potência/
esforço ou força da resistência [Fig. 49].
3. Uma única força pode influenciar todas as articulações envolvidas. Haverá um momento separado para cada articulação, o comprimento deste
momento vai determinar o grau de desafio para a
musculatura em torno daquela articulação.
4. Um braço do momento nunca pode ser mais
longo do que o seu braço de alavanca associado,
isto é, o comprimento da alavanca será o com-
d o
e x e r c í c i o
primento máximo do momento. Ele pode ser
mais curto do que a alavanca, mas nunca mais
longo.
5. O momento máximo para um determinado cenário ocorrerá quando o ângulo de força
é “ótimo” (90˚). Qualquer grau menor ou maior
do que 90˚ produzirá um momento menor.
Um ângulo de força de 45˚ e um ângulo de força
de 135˚ produzirão o mesmo momento porque
estão à mesma distância de 90˚.
Quando o ângulo de força é 90˚, o braço da alavanca e o braço do momento coincidem, ou seja, têm
o mesmo comprimento e ocupam o mesmo espaço.
Quando a linha da força passa dentro do eixo,
o braço do momento é zero, então aquela força cria
zero de torque e não tem efeito sobre o movimento
rotatório porque está “equilibrado” por meio da articulação. Um braço do momento está sempre presente, mesmo quando mede zero.
Fig. 50. Flexão de cotovelo indicando
ângulo da força do músculo do bíceps
e ângulo da força da resistência.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
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Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
Força e sua relação com um eixo
Para a criação e análise de exercícios, será muito
importante compreender sobre alavanca (braços da
alavanca), torque (braço do momento) e sobre ângulo
de força. Porém, o que mais importa agora é entendermos principalmente os fatores que influenciam o
braço do momento, essencial para a compreensão do
torque. Neste nível de curso, estamos apresentando
uma introdução da mecânica do exercício, porém essencial, então vamos nos ater principalmente ao estudo do braço do momento e apresentaremos, a seguir,
a introdução sobre o ângulo da força, mas mantendo uma exploração mais profunda para níveis mais
avançados.
O ângulo da força:
força e sua relação com a alavanca
O ângulo da força é o ângulo com o qual uma
força é aplicada a um objeto.
O ângulo de aplicação de uma força (ou um ângulo da força) é o ângulo entre:
1. A linha da força;
2. A haste da alavanca;
3. Dos dois ângulos que são gerados por uma linha tocando o segmento, o da força é aquele que
está do lado do eixo da articulação.
Discussão: Não confunda ângulo da força com
ângulo da articulação (posição da articulação).
O ângulo da força representa a relação atual entre a força e a alavanca, que afetará o grau de influência da força na rotação [Fig. 50].
Grau de efetividade
Pergunte-se: quão similar é a direção da força à
real direção do movimento potencial da alavanca em
qualquer ponto? A direção de rotação da alavanca em
qualquer ponto é tangencial ou 90° à alavanca (ver
“Movimento articular”). Coincidentemente, o ângulo
de força ideal é também 90º. Quanto mais próximo o
ângulo de força está dos 90°, mais efetivo ele será em
influenciar o movimento da alavanca.
Discussão: Perceba que não podemos concluir
que uma força é mais influente somente porque o ângulo de força está 90°. É necessário avaliarmos outros
fatores que compõem o cenário mecânico, como a influência de ângulos de força, alavancas e magnitude
combinados para efetivamente tirarmos conclusões.
As ações de múltiplas forças
em torno de um eixo
O exercício pode ser descrito como um cabo de
guerra em torno de um osso ou em torno de uma
articulação. Ao examinar a interação entre múltiplas
forças sobre um osso em torno de um eixo, é importante entender o básico do sistema de alavancas.
SISTEMA DE alavancas
Por definição, uma alavanca existe quando duas
ou mais forças agem no mesmo objeto a alguma distância do eixo e com efeitos opostos. As duas forças
são identificadas pelos termos potência (ou esforço) e
resistência.
Os termos “potência/esforço” e “resistência” podem
ser uma fonte de confusão. Potência/Esforço normalmente é identificada como sendo a força que causa o movimento e logo mudaria à medida que a direção mudasse
com alterações nos torques opostos respectivos. Para
nossos propósitos, identificaremos as forças musculares
como “potência/esforço” porque, independentemente da
direção do movimento, as forças musculares requerem
nosso potência/esforço. A necessidade de identificar para
fins do exercício que potência/esforço será sempre a força
gerada pela musculatura é que quando potência/esforço
e resistência se encontrarem em equilíbrio, assim mesmo
poderemos identificá-las.
Além de conhecer que uma alavanca é composta por
um eixo, uma força de resistência e uma força de potência/esforço, o mais importante é entender quais são seus
respectivos braços do momento.
80 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
m e c â n i c a
Relações DENTRO DO sistema de alavancas
“Vantagem mecânica refere-se à eficiência da alavanca. Uma alavanca é eficiente (tem maior vantagem mecânica) quando necessita somente de uma pequena força
de esforço para superar uma grande resistência.” (JS&F, 1ª
ed.) Tenha em mente que maior vantagem mecânica não
significa automaticamente “mais torque” porque o outro
lado pode ter proporcionalmente maior força.
Em vez de nos referirmos à vantagem mecânica
somente do ponto de vista da potência/esforço, identificaremos qual lado, potência/esforço ou resistência,
tem vantagem ou desvantagem mecânica em um ponto específico na amplitude baseado no seu respectivo
momento mecânico (o momento da potência/esforço
e o momento da resistência, respectivamente).
Pense dessa maneira: quem tem a distância do
seu lado? O lado que tiver mais distância não necessita de tanta força para realizar o trabalho.
NOTA: Isso só funciona para comparar a potência/esforço e a resistência de uma única alavanca
específica, em torno de um eixo somente. Não funciona para comparar dois momentos de resistência
derivados de duas alavancas diferentes, em torno de
dois eixos diferentes etc.
Então, embora sistemas de alavancas tradicionais
de primeira, segunda e terceira classe sejam abordados
em, virtualmente, todos os livros de mecânica/física
existentes, eles só tem relevância para a análise das forças articulares e no que diz respeito às relações com o
momento da potência/esforço, o momento da resistência e a relação entre os dois. Note que não dissemos
que as forças devem ser opostas. As forças, na verdade,
podem acontecer na mesma direção. É a relação delas
em torno do eixo que cria a oposição.
Explorando o sistema de alavanca e
a relação com as forças
dentro de um “sistema 3D”
É a relação entre as forças em torno do eixo que
cria a resistência, são ações opostas dentro de um
d o
e x e r c í c i o
plano. Normalmente, exemplos tradicionais mostram somente forças que estão em um mesmo plano,
mas essa nem sempre é a realidade.
Os componentes e a
classificação tradicional
do sistema de alavancas
O braço da alavanca é a distância entre o eixo e o
ponto de aplicação de uma força. Existem dois braços
da alavanca determinados pela relação entre as forças:
1. O braço da potência (BP) (Esforço) é a distância entre o eixo até o ponto de aplicação da força do esforço ou potência.
2. O braço da resistência (BR) é a distância entre
o eixo e o ponto de aplicação da força de resistência.
Existem três classificações das alavancas baseadas em diferentes posicionamentos das duas forças
em relação ao eixo. (A classificação do sistema de
alavancas em si não é algo com relevância no estudo
para análise e criação de exercícios, ela só nos ajuda
a identificar que existem diferentes relações entre as
forças. Porém, é necessário entender como estas forças influenciam o resultado na alavanca e, para isso,
precisamos entender de braço do momento.)
Alavanca de primeira classe: O eixo está posicionado entre as duas forças [Fig. 53] (exemplo: uma
gangorra, extensão do tríceps).
1. Alavanca está equilibrada quando as duas forças são equivalentes e posicionadas na mesma
distância do eixo [Fig. 51].
2. Quando existe diferença de distância entre a
aplicação das forças em relação ao eixo, a força
que está na posição mais afastada do eixo possui
vantagem mecânica. Isto quer dizer que precisa
gerar menos força para empatar com a outra e,
consequentemente, a força posicionada mais próxima do eixo precisa gerar mais força para equilibrar ou vencer a alavanca [Fig. 54].
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
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Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
BP
BR
Fig. 51. Alavanca de primeira classe. O eixo se encontra entre a aplicação das duas forças. A distância entre
o ponto de aplicação da potência até o eixo (fulcro) representa o comprimento do braço da potência (BP). A
distância entre o ponto de aplicação da resistência até
o eixo (fulcro) representa o braço da resistência (BR).
Quanto mais distante uma força for aplicada, maior
será sua vantagem mecânica, isto é, precisa gerar menos força para equilibrar a alavanca.
Fig. 52. Exemplo de uma alavanca de primeira classe
equilibrada. Ambos estão aplicando a mesma força.
Fig. 53. Exemplo clássico de uma alavanca de primeira
classe, em que o eixo (a articulação) se encontra entre
a força da potência (tríceps) e a força da resistência
(o cabo). Ambas as forças estão puxando na mesma
direção e a oposição é criada pelo eixo.
82 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
m e c â n i c a
d o
e x e r c í c i o
Fig. 54. Se um dos personagens se aproximar do eixo,
a alavanca desequilibra e, para voltar ao equilíbrio, é
preciso gerar mais força. Neste exemplo, colocar um
personagem mais pesado. O personagem que está
mais distante do eixo possui vantagem mecânica, facilidade relativa.
BP
Fig. 55. Sistema de alavanca de segunda classe. A força da resistência está posicionada entre o eixo e a força
da potência/esforço.
BR
FULCRO
FULCRO
Fig. 56. a) Quando o antepé é considerado como
eixo, este exemplo se classifica como alavanca de segunda classe. Também considerando que a linha da
força (verde) necessariamente precisa estar posicionada entre o eixo e a força de potência. Se este fator muda, a classificação deste exemplo muda.
b) É possível analisar cada articulação independentemente e classificá-las, porém, normalmente analisamos
a articulação que está fixa como sendo o fulcro. Se for
considerado o tornozelo como sendo o eixo, este exemplo passa a ser uma alavanca de primeira classe. Isso é
uma questão de contexto.
FULCRO
a)
b)
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
83
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
Muitas vezes, encontramos dificuldade em identificar o braço da potência/esforço e o braço da resistência
em uma alavanca de segundo e terceiro grau apresentados da Fig. 55 até a Fig. 58, porque se confundem com
o fato de ambos se encontrarem do mesmo lado do eixo.
Uma maneira fácil de encontrarmos o braço da potência/
esforço e da resistência é sempre retornar à definição do
que é um braço de alavanca, localizá-lo e identificar qual
está posicionado mais próximo e mais distante do eixo.
BP
BR
Fig. 57. Em uma alavanca de terceira
classe, a força da potência se encontra
entre a força da resistência e o eixo.
Alavanca de segunda classe: posiciona a resistência entre o eixo e a potência/esforço [Fig. 55].
Porque o braço da potência/esforço, por definição, é
mais longo do que o braço da resistência, a alavanca de segunda classe é normalmente associada como
sendo uma que oferece vantagem mecância à potência/esforço, porém esta afirmação não é sempre correta. Vantagem mecânica não pode ser avaliada com
a identificação da alavanca, é necessário identificar
o comprimento do braço do momento de ambas as
forças, e vamos avaliar esta diferença no final deste
capítulo.
Atenção: No exemplo da Fig. 56, precisamos determinar qual o eixo que estamos analisando. Se for o
eixo do tornozelo (calcanhar), ele se classifica como
uma alavanca de primeira classe porque o eixo se encontra entre a aplicação das duas forças. Se for o eixo
do antepé, a alavanca se classifica como de segunda
classe. Cada articulação se encontra dentro de um sistema de alavancas.
Definição de Braço da Alavanca:
É a distância entre o ponto de
aplicação da força (do esforço
e da resistência) para o eixo.
Fig. 58. Exemplo clássico de uma
alavanca de terceira classe, em que a
força da potência (músculo bíceps) se
encontra entre a força de resistência
(halter) e o eixo. As forças estão puxando em direções contrárias.
84 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
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Alavanca de terceira classe posiciona a força da
potência/esforço entre o eixo e a resistência [Fig. 57]
(exemplo: bíceps). Estes são os sistemas de alavanca
mais comuns no corpo humano. O braço da alavanca
da potência será sempre mais curto (menor) do que o
braço da resistência. Sendo assim, este tipo de alavanca
nos coloca sempre em desvantagem mecância [Fig. 58].
da potência/esforço for, na verdade, menor do que o
momento da força de resistência [Fig. 59].
A vantagem da desvantagem mecânica
Devido à proximidade das inserções musculares ao eixo, o sistema de alavancas no corpo humano
parece nos colocar sempre em desvantagem mecânica. Porém, se analisarmos o sistema de alavanca
do corpo humano pelo ponto de vista de eficiência
em deslocamento, verificamos que este oferece uma
grande vantagem, mesmo quando em quase todos os
exemplos de alavanca o posicionamento do músculo
é muito próximo da articulação e a resistência distante da articulação, porque o músculo que está sob a
pele quando se encurta 5 cm (move 5 cm), desloca-se
muito mais do que isso na extremidade da alavanca.
Fig. 59. Exemplo de quando as forças
não são paralelas e o comprimento do
braço da potência é maior do que o
braço da resistência. Porém, com vantagem mecânica para resistência.
Existe valor no sistema de
classificação das alavancas?
É importante entender que estas três classificações
do sistema de alavancas só são relevantes para o que é
descrito como o “sistema de forças paralelas”. O livro
Articulação Estrutura e Função afirma que “um achado
comum no corpo humano são as forças que atuam no
mesmo objeto e são paralelas entre si”. Quando examinamos a grande quantidade de atividades disponíveis
aos seres humanos, parece que forças perfeitamente paralelas são raras, a não ser quando as forças são
constritas ou organizadas desta maneira, como são os
exemplos clássicos das alavancas.
Então, se as forças não são paralelas, e normalmente elas não são, é muito possível que um sistema
de alavanca com um braço de potência/esforço maior
do que o braço da resistência (segunda classe) possa
gerar desvantagem mecânica se o momento da força
P
R
Você pode dar um passo a mais e pensar em outros
exemplos de sistema de forças paralelas que não se encaixam no sistema de classificação tradicional das alavancas? Tente imaginar um braço da resistência maior
que o braço da potência, com forças paralelas, porém
com vantagem mecânica para a potência/esforço.
Na verdade, o sistema tradicional de alavancas
só funciona se as forças estiverem paralelas e os braços da alavanca estiverem retos e, na vida real (como
na construção de equipamentos), eles normalmente
não estão paralelos [Fig. 60].
Fig. 60. Sistema em que as
forças são paralelas, porém a
força da resistência, mesmo
sendo aplicada em uma posição mais distante do eixo do
que a força de potência, não
tem vantagem mecânica.
P
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
R
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Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
BM
BM
BA
Fig. 61. Exemplo clássico de uma
alavanca de primeira classe equilibrada. Nesta situação, o braço da
alavanca (BA) tem o mesmo comprimento do braço do momento (BM).
Quer dizer, eles são iguais e possuem
a mesma influência.
BA
Fig. 62. Um exercício de abdução do ombro com halteres em
uma posição em que o comprimento do braço da alavanca (BA)
e braço do momento (BM) são os
mesmos.
A definição de Braço da
Alavanca (BA) e Braço do
Momento (BM) não é a mesma!
Braço do momento (BM) e braço da alavanca
(BA) não são a mesma coisa!
Tradicionalmente, entendemos que braço do
momento e braço da alavanca são os mesmos, porém,
quando a exploração sai do livro e entra na vida real,
verificamos que esta não é a realidade.
O problema parece residir na exploração limitada para além do exemplo tradicional oferecido [Fig.
61 e Fig. 62], “o equilibrado sistema de alavanca de
primeira classe (gangorra)”. Em uma gangorra equilibrada, o braço do momento (distância perpendicular
da linha da força para o eixo) coincide com o braço
da alavanca (a distância entre o ponto de aplicação
da força para o eixo) porque o ângulo de força é de
90˚. Se a gangorra se apresentar desequilibrada [Fig.
63], torna-se evidente que ambos são muito diferentes [Fig. 64 e Fig. 65].
Os termos “braço da potência” e “braço da resistência” também podem dar margem a controvérsias.
Alguns livros os classificam como braço da alavanca e
outros como braço do momento. Porque o momento
da força é o fator mais crítico para análise e criação de
exercícios, devemos utilizar a nomenclatura momento da potência/esforço e momento da resitência.
Também devemos perceber que é necessário reavaliar as definições e uso dos termos “esforço (potência)”
e “resistência” quando analisamos exercícios. Tradicionalmente o termo esforço foi usado para indicar a força
causando movimento e resistência a força se opondo
ao movimento. Isso obviamente significa que o esforço
(potência) e a resistência vão trocar de lugar quando a
direção do movimento mudar. Porém, para analisarmos
e criarmos exercícios, esta classificação não é ideal.
86 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
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BM
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Fig. 63. Quando a gangorra não está
equilibrada, o resultado não é o mesmo.
BA
Fig. 64. Um exercício de abdução
realizado com cabos. Neste exemplo,
o braço do momento da resistência
é menor do que o comprimento do
braço da alavanca, por mais que a
aplicação da força de resistência seja
no mesmo ponto (na mão). Neste
exemplo, na mesma posição articular
do exemplo acima com halter, o torque é menor do que o torque utilizando um halter.
BA
BM
BM
BA
Fig. 65. Durante o exercício em uma
posição de 70º de abdução do ombro. Neste exemplo, o braço do momento da resistência é menor do que
na posição a 90º. O braço do momento nesta posição é menor do que
o comprimento do braço da alavanca,
mesmo utilizando um halter.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
87
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
Durante exercícios de flexão de cotovelo com
halter, os flexores do cotovelo seriam o esforço (potência), mas o halter se tornaria o esforço (potência)
quando estivesse na extensão, fase excêntrica, os músculos flexores seriam a resistência. Esta nomenclatura
não é apropriada para ser utilizada nos exercícios por
duas razões:
1. Deveríamos manter a constância de chamar
esforço (potência) o lado que estiver associado
com o músculo independentemente de direção,
porque eles estão gerando o esforço, a potência.
Um outro motivo é porque já temos nomenclatura para identificar a direção do movimento e a
chamamos de concêntrica e excêntrica.
2. A troca da nomenclatura baseada na direção do
movimento não dá espaço para identificar cenários estáticos, como na isometria. Isometria certamente exige esforço contra a resistência e, mesmo
com o sistema de nomenclatura não dando oportunidade para este cenário, ainda assim existe um
esforço muscular contra uma resistência externa.
Então é apropriado identificarmos esforço (potência) o lado da força muscular e resistência o lado
da força externa independentemente de direção.
O VERDADEIRO BRAÇO DA ALAVANCA
Normalmente, enxergamos alavancas como
algo tangível. Porém, este fato pode ser enganoso
quando precisamos identificar o verdadeiro braço
dentro da alavanca. Engenheiros enxergam os braços das alavancas como eles são: uma linha que atravessa direto do eixo até o ponto de aplicação da força. Eles ignoram o formato do objeto para encontrar
o verdadeiro braço da alavanca escondido [Fig. 66].
Este conceito é importante porque os ossos são o
que formam as alavancas e então esta situação acontece muitas vezes no corpo humano.
Fig. 66. Braço da alavanca. A definição
de braço de alavanca é: a distância entre
o eixo e o ponto de aplicação de uma força. Esta linha que une o eixo ao ponto de
aplicação da força é invisível e, às vezes,
cruza por dentro do corpo rígido (haste)
do objeto.
As máquinas são muitas vezes construídas de
uma maneira em que não existe objeto nenhum ocupando o espaço do braço da alavanca, mas este braço
invisível é o “verdadeiro braço da alavanca” [Fig. 67].
Como você pode ver, a estrutura de metal da máquina não contém fisicamente o corpo rígido que é a haste da alavanca.
Fig. 67. Braço da alavanca “invisível”.
Na construção das máquinas, muitas vezes o braço da alavanca atravessa o espaço não ocupado pela máquina.
88 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
m e c â n i c a
d o
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Estes braços de alavancas “invisíveis” também
podem ser encontrados na aplicação de forças no
corpo durante os exercícios.
A coompreensão destes conceitos da alavanca
será importante para o entendimento de conceitos
mais avançados dentro da mecânica do exercício.
Lembre-se que sempre que a nomenclatura está
entre “aspas” é porque não são termos técnicos ou mesmo aceitos no mundo acadêmico ainda. Estes termos
são palavras que facilitam o entendimento. Eles foram
elaborados durante anos de tentativa e erro, associados
com muitos anos tentando explicar conceitos da engenharia para estudantes que não são engenheiros.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
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Descrevendo posições e
movimentos articulares:
Orientação do corpo
m e c â n i c a
Posições anatômicas
As posições anatômicas não foram definidas
porque foram identificadas como as posições articulares estruturalmente ideais. Estas posições
foram definidas há muito tempo para serem simplesmente um ponto de referência para a descrição
e orientação anatômica. Estas posições são basicamante uma posição em decúbito dorsal ou em pé
com a palma da mão posicionada anteriormente
usada para que tenhamos um ponto de referência,
ela foi criada para oferecer um zero ou um começo, porém existe uma inconsistência na posição
anatômica. Todas as articulações se encontram
em neutro, ou zero, com exceção da articulação
radioulnar que na posição anatômica se encontra
em supinação. Esta inconcistência parece ter sido
necessária para manter a relação de orientação da
mão e dos dedos e manter a consistência dos movimentos destes com os planos equivalentes no tronco. A coluna também pode ser entendida como
uma exceção, pois o neutro para um indivíduo não
pode ser ditado por uma ilustração.
Termos ou referências anatômicas são relativas ao corpo que está sendo analisado e não são
relativas ao corpo e sua relação no espaço ou com
o mundo a sua volta.
O sistema planar tradicional
O sistema planar pelo qual nos comunicamos
sobre movimentos e posições do corpo humano foi construído em torno do corpo na posição
anatômica como base. Ele derivou do sistema de
coordenadas X, Y, Z para espaços tridimensionais
[Fig. 68]. Porém, o sistema planar aplicou estes três
eixos no corpo como um todo e traçou seus respectivos planos, e os chamou de planos cardinais.
Este fato fez com que nosso sistema tradicional de
comunicação se tornasse falho, deixando espaço
para má interpretação.
d o
e x e r c í c i o
Y
Z
X
Fig. 68. O sistema de coordenadas x, y, z
para espaços tridimensionais, constituído
por três eixos. Movimentos diários acontecem em inúmeros planos que não possuem
nomenclatura classificada.
Planos anatômicos
O corpo pode ser dividido em incontáveis números de planos ou secções nas quais o corpo pode
ser dividido. Somente três deles receberam um nome.
Com este sistema, basicamente indicamos Norte, Sul,
Leste e Oeste [Fig. 69].
Plano sagital (também conhecido como mediano) divide o corpo em duas metades, direita e esquerda; e medial e lateral. Por exemplo, o plano sagital
atravessa a linha média do corpo, mas também em
cada articulação existe um plano sagital, como o plano sagital do ombro.
Plano frontal (também conhecido como coronal)
divide o corpo em frente e atrás; anterior e posterior.
Plano transverso (também conhecido como horizontal) divide o corpo em superior e inferior.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
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Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
a)
b)
c)
Fig. 69. a) Plano sagital: divide o corpo em direita e esquerda ou lateral e medial.
b) Plano transverso ou horizontal: divide o corpo em superior e inferior.
c) Plano frontal: divide o corpo em frente e trás ou posterior e anterior.
O plano – Relação entre os eixos
Movimento no plano sagital ocorre em torno de
um eixo frontal (um eixo que atravessa medial-lateralmente).
Movimento no plano frontal ocorre em torno de
um eixo sagital (um eixo que atravessa antero-posterioriormente).
Movimento no plano transverso ocorre em
torno de um eixo “longitudinal” (também chamado
“eixo longo”, este é muito mais fácil de se enxergar,
e talvez ajude se enxergarmos um eixo que atravessa
proximal-distalmente ou superior-inferiormente).
A infinidade de outros planos
(diagonais etc.) e seus eixos
Mesmo que os movimentos diários normalmente ocorram em um número infinito de planos ou
até, às vezes, completamente não planares (exemplo,
circundução), três planos cardinais foram definidos
apenas como pontos de referência a partir dos quais
podemos descrever o movimento, muito semelhante
a Norte, Sul, Leste e Oeste de uma bússola. E assim
como muitas viagens acontecem em alguma posição
entre estas coordenadas, muito do nosso movimento
diário normal ocorre entre/fora destes três planos que
possuem nomes (classificados).
Quando o movimento ocorre em um plano que
está entre dois dos três planos cardinais, o movimento é muitas vezes descrito como “multiplanar”. Porém,
isto não está correto. Movimento acontece em torno
de um eixo e, consequentemente, um plano, mesmo
que não recaia exatamente sobre um destes três planos que já foram nomeados/classificados.
Percebam que movimento multiplanar não
deve ser confundido com movimento uniplanar
que acontece em um plano que não tem nome.
Também não deve ser confundido com diferentes
articulações movendo-se em planos diferentes, porém cada articulação movendo-se individualmente
em um único plano.
92 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
m e c â n i c a
Movimentos articulares
e posições
Comunicação usando articulações
como referência e não membros
Na tentativa de facilitar a comunicação e evitar erros, vamos utilizar as posições e articulações
sempre como referência porque todos os movimentos de todos os membros e de todos os ossos
acontecem por intermédio das articulações. Todos
os movimentos e posições vão descrever os movimentos e posições de uma articulação, não de
um membro. Vamos, então, usar flexão de cotovelo, extensão do joelho no lugar de flexão do braço
ou extensão da perna.
Como mencionado, os movimentos das articulações são normalmente definidos pelo plano
em que se movem e pela direção do movimento.
Novamente, o movimento acontece dentro da articulação e não é indicado por sua relação com o
mundo a nossa volta. Porém, o nosso sistema de
comunicação normalmente identifica o movimento do membro e não da articulação. Se indicássemos o movimento da articulação, a abdução jamais
seria descrita como o movimento do braço se afastando da linha média. Esta perspectiva é vital para
uma comunicação clara entre profissionais, mas
também para identificar o que realmente acontece
durante um exercício. É ainda mais crítico para comunicação quando o movimento acontece em uma
posição diferente da posição anatômica, como é o
caso de quase todos os exercícios. Por esta razão,
é melhor lembrar que movimentos articulares são
basicamente descrições das mudanças na relação
entre superfícies de contato articular. Visualize um
lado se aproximando e outro se afastando.
Descrições das posições das articulações são
baseadas na posição estática em que a articulação inicia ou encerra um movimento em relação
d o
e x e r c í c i o
ao corpo. Elas definem a relação imediata entre as
superfícies de contato articular. O nome de uma
posição articular específica não está necessariamente relacionada ao movimento realizado para
chegar àquela posição.
A descrição de uma posição articular é relativa
a dois fatores:
1. O plano em que a posição acontece, mesmo
que este plano possa se sobrepor;
2. De que lado o neutro anatômico da posição
se encontra.
Consideração do que é
Neutro nas Extremidades
Neutro anatômico é considerado como sendo a
linha divisória entre as descrições de posições (nomes de posições). É o “zero”.
Um ponto importante para
aprender movimentos
Ao aprender movimentos, evite associar músculos com um movimento articular específico. A correlação entre um movimento articular e a ação específica de um músculo ou grupo muscular leva a uma
má interpretação comum sobre quais músculos estão
trabalhando em um exercício. Os nomes de movimentos e posições indicam e descrevem movimentos
articulares e posições no que se refere ao esqueleto. A
indicação de quais músculos vão participar em qual
função depende da direção da resistência específica
que está sendo aplicada.
a análise do movimento por si só
não oferece dados suficientes
para identificação dos músculos
responsáveis por ele.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
93
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
NO plano sagital
Movimentos e posições que ocorrem em torno do
eixo frontal.
Flexão é normalmente descrita como sendo o
movimento articular que se afasta da posição anatômica; ocorre no plano sagital. Porém, esta descrição
não é sustentável quando considerada a hiperextensão. Muitos livros descrevem flexão como sendo um
aumento do ângulo articular no plano sagital, porém,
quando observamos a hiperextensão, essa descrição
não se mantém. Uma flexão partindo de uma posição
de hiperextensão vai resultar numa diminuição do ângulo articular até alcançar o neutro. A flexão também é
descrita como a aproximação das superfícies anteriores
de um membro, mas isso não é verdade na flexão do
joelho e na flexão de ombro.
Uma posição de flexão pode ser descrita como
uma posição no plano sagital e de um lado específico
do neutro. Entretanto, 90° de flexão de ombro poderia
ser também 90° de adução horizontal. Porém se a articulação para em qualquer ponto durante esse movimento, devemos chamá-lo de uma posição de flexão.
Extensão é o movimento articular retornando à
posição anatômica a partir de uma posição de flexão.
Se a articulação para de se mover em qualquer ponto
antes de atingir a posição anatômica, ela continua em
uma posição de flexão, mas em menor grau.
A posição de extensão no quadril e no ombro é
atingida quando a extensão ultrapassa o neutro.
Hiperextensão é normalmente descrita como sendo
o movimento que ultrapassa a posição anatômica (além
de 0° ou neutro) no plano sagital, que é um movimento
normal e viável para o ombro, quadril e joelhos. Entretanto, em nossa língua o prefixo hiper indica “muito” (hipermóvel, hiperatividade etc.). Por esta razão, sugerimos
que estes movimentos articulares considerados normais
sejam chamados de extensão além de neutro/zero.
Muitos profissionais consideram tudo que é
relacionado ao hiper como sendo “ruim”. Isto ocorre porque foi nomeado um movimento normal
com uma palavra que significa anormal ou excessivo. Faz mais sentido reservar a palavra hiper para
algo que excede o limite individual. Isto fará com
que o uso da palavra fique mais consistente com
seu significado.
Parar em qualquer ponto durante a extensão, além
da posição anatômica, cria uma posição de extensão.
Retornar à posição anatômica de qualquer posição
de extensão/hiperextensão é um movimento de flexão.
Dorsiflexão (flexão dorsal) é a extensão do tornozelo, porém, existem autores que sugerem que ela é
a flexão do tornozelo. Por isso, foram criadas as identificações como dorsiflexão e plantiflexão. Plantiflexão (flexão plantar) é a flexão do tornozelo.
Estes movimentos da articulação do tornozelo
são motivo de muita confusão. Kendall afirma que
em um estudo com 48 autores, 12 deram uma definição errada. Para confirmar isto considere, a partir da
posição anatômica, que a flexão de cada articulação
de um membro é consistente em direção (flexão de
punho, flexão dos dedos etc.). Então, flexão dos dedos
e flexão plantar são congruentes.
É importante distinguir entre ação muscular e
ação articular. Músculos não “flexionam”, articulações “flexionam”. Músculos contraem ou encurtam;
músculos não estendem, eles alongam.
no plano frontal
Movimentos e posições que ocorrem em torno do
eixo sagital.
Abdução é um movimento articular que se afasta
da posição anatômica no plano frontal. Normalmente
é vista como um movimento de afastamento da linha
média, mas isto cria uma comunicação falha quando
consideramos que a abdução do ombro além de 90°
94 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
m e c â n i c a
aproxima-se da linha média (então acima de 90° esta
definição não é mais verdadeira, pois se torna a aproximação da linha média).
Se a articulação para em qualquer ponto deste
movimento, é um grau específico de abdução.
Adução é o movimento de retorno à posição anatômica de uma posição de abdução. Parando em qualquer ponto antes de um retorno completo a posição
anatômica continua sendo uma posição de abdução,
mas em um grau menor. Continuando seu retorno à
posição anatômica, se a articulação continua além de
zero grau em direção à linha média ou cruza a linha
média, o movimento ainda é chamado de adução e a
posição também é chamada de posição de adução.
Protração da escápula possui um componente de
abdução. Retração da escápula possui um componente
de adução. O contorno do gradil costal exige um desvio do plano frontal na maioria destes movimentos.
Flexão lateral refere-se ao movimento da coluna
no plano frontal.
no plano transverso
Movimentos e posições que ocorrem em torno do
eixo longitudinal.
Rotação longitudinal versus movimento rotatório. Rotação longitudinal refere-se à rotação em torno
de um eixo que atravessa o comprimento de um osso.
Movimentos específicos da coluna, ombro, quadril,
articulação radioumeral e joelho são exemplos disto.
Porém, tenha em mente que “rotação” não é exclusivo
ao eixo longitudinal. Movimento rotatório acontece em
todos os movimentos discutidos (adução, abdução etc.),
todos envolvem uma rotação em torno de um eixo.
Rotação interna (ou rotação medial) indica a rotação da superfície anterior em direção à posição da
d o
e x e r c í c i o
superfície medial. Uma posição de rotação interna é
qualquer ponto para dentro do neutro.
Rotação externa (ou rotação lateral) indica a rotação da superfície anterior em direção à superfície
lateral. Uma posição de rotação externa é qualquer
ponto para fora do neutro.
Estas posições podem se tornar confusas quando as posições iniciais do ombro ou do quadril são
diferentes da posição anatômica ou se alguém erroneamente olha para o movimento do membro distal enquanto o cotovelo ou o joelho está em várias
posições de flexão. Por essa razão, os nomes rotação
medial e rotação lateral podem ser melhores.
descrições QUE precisam de
atenção especial
É crítico que você não aprenda supinação e pronação baseados na posição das mãos. Tome cuidado para não confundir mudanças na articulação do
ombro com mudanças na articulação radioulnar.
Mudanças na articulação do ombro vão causar mudanças na posição da mão no espaço mesmo que não
exista mudança na articulação radioulnar.
Pronação é a rotação medial da articulação radioulnar. O rádio está totalmente cruzado sobre a
ulna. Nunca pense na descrição “palma da mão para
trás/para baixo” porque só é verdade quando o cenário for a posição anatômica.
Supinação é a rotação lateral da articulação radioulnar. O rádio encontra-se paralelo à ulna. Novamente não pense na descrição “palma da mão para
frente/para cima”, porque só é verdadeira no cenário
da posição anatômica.
Rotação do joelho deve ser descrita pela referência
do segmento que se move em referência ao segmento
fixo. Rotação do joelho da tíbia rodando sob o fêmur
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
95
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
fixo é comumente chamado de torção tibial. Porém, isso
pode ser fonte de confusão! Parece que sempre que a tíbia gira internamente é chamada de torção tibial, porque
é associada com a pronação do pé (pé restrito), mas, se
mesmo com o pé restrito, o fêmur rodar ainda mais internamente no joelho do que a tíbia rodou em resposta
ao movimento do tálus, então a posição do joelho não é
a de “rotação interna da tíbia”. A posição seria na verdade rotação externa.
Rotação da coluna é descrita como sendo à direita ou à esquerda e deve ser designada como a rotação
do tronco sobre a pelve fixa (mais comum), ou a rotação da pelve sobre o tronco fixo. Rotação esquerda
da pelve e rotação direita do tronco são os mesmos
movimentos na coluna.
Circundução é um movimento em forma de
cone, movimento não planar de uma parte do corpo.
O ápice do cone está na articulação e a extremidade
do cone é descrita pelo segmento distal do membro.
Circundução não exige rotação sob o próprio eixo.
Perspectivas importantes
1. O plano do membro?
Uma área de conflito e controvérsia vem da aplicação inconsistente da descrição dos planos em relação
aos membros. Quando o braço é mantido na posição
anatômica, a flexão/extensão do cotovelo acontece no
plano sagital como foi descrito. Se o braço for girado
90° (rotação externa de ombro) muitos experts dirão
que o cotovelo está agora flexionando e estendendo no
plano frontal. Entretanto, os livros determinam que
flexão e extensão são movimentos descritos somente
no plano sagital e que adução a abdução são movimentos descritos somente no plano frontal.
Quando o ombro está rodado externamente,
nós não mudamos nossa descrição com relação ao
aspecto anterior, posterior, medial e lateral do braço
[Fig. 70]. O aspecto medial não se torna anterior só
porque agora está virado para frente, assim como o
aspecto anterior do tronco se torna posterior somente
porque fizemos uma volta de 180° no espaço e agora
olhamos para outra direção. O aspecto medial do braço deve continuar relativo ao braço.
Fig. 70. Como é correto utilizar o sistema
de coordenadas 3D para identificação e
comunicação de movimentos e posições
articulares, é necessário entendermos que
o eixo se refere à articulação e se move
com a articulação. Também é importante
relembrar que é o eixo que determina o
plano. Neste exemplo, a flexão do cotovelo continua sendo flexão independentemente da posição do ombro. A flexão
sempre acontece no plano sagital e nunca
no plano frontal. Flexão = eixo frontal e
movimento no plano sagital.
96 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
m e c â n i c a
Por esta razão, escolhemos visualizar o movimento do cotovelo de um braço em rotação externa
(rotação de 90° de ombro) como ainda sendo movimento no plano sagital do braço. Independentemente do plano em que o ombro estiver posicionado o
cotovelo não mudou com relação a ele mesmo.
Observe, não alteramos o sistema de coordenadas X, Y, Z para “o corpo” se este se encontra na posição em decúbito dorsal (supino), então não devemos
alterar para um membro que foi alterado no espaço.
Segure um modelo anatômico de um braço. O plano sagital é o mesmo independentemente da posição
que você o coloque no espaço quando está desconectado do tronco [Fig. 71]. O eixo frontal continua na
mesma posição atravessando a artciulação, referente
a ela, independentemente da posição no espaço.
Fig. 71. A flexão do cotovelo acontece
sempre em torno do eixo frontal e dentro
do plano sagital, independentemente da
posição do braço no espaço.
d o
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2. Relações das superfícies de contato
Falamos articulação, mas estamos pensando em
um membro.
Para aumentar a precisão, será importante
aprender a visualizar isto como movimento das superfícies articulares e começar a verdadeiramente
ver as superfícies de contato ou a relação das superfícies que fazem este movimento ocorrer. Por
exemplo, a dorsiflexão é, na verdade, a superfície
de contato do tálus se movendo nas extremidades
da tíbia e da fíbula. Somente desta maneira poderemos visualizar as limitações do movimento baseadas nas estruturas articulares.
Além disso, é necessário visualizar o plano de
movimento como o eixo do movimento articular e
não como o plano do movimento do membro. Por
exemplo, a flexão do ombro, quando realizada com
a total protração escapular, vai estar mais próxima
de uma abdução do que uma flexão e, se por algum
motivo relacionado às estruturas articulares, for
necessário evitar uma abdução, realizar uma flexão
que cria a mesma relação entre as superfícies de
contato pode ser um problema. Então, a preocupação não é somente com o plano do membro e o
eixo, mas também com os movimentos articulares
como foram determinados entre as superfícies de
contato.
3. Movimentos articulares combinados
Isto nos ajudará a ver que estas descrições de
movimento normalmente envolvem mais de uma articulação se movendo. A abdução do ombro “tradicional” é, na verdade, a combinação da abdução glenoumeral (úmero relativo à escápula e não ao tronco)
e do movimento escapulotorácico [Fig. 72]. Até que
identifiquemos o quanto cada um está envolvido na
abdução, não saberemos qual se moveu.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
97
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
a)
b)
Fig. 72. Movimentos articulares combinados. A abdução é resultado do movimento da escápula e do úmero. Precisamos desenvolver
uma “visão interna” para enxergar que a abdução é o movimento de
relação entre a cabeça do úmero e a glenoide. Porém, é o envolvimento
da escápula durante o movimento da abdução que permite ao membro
alcançar amplitudes maiores. a) Posição inicial e a relação entre as articulações. b) Posição final, identificar quanto cada articulação se moveu
para alcançar a amplitude final.
98 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
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A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
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Mecânica articular:
“Controle Articular”
influências passivas
m e c â n i c a
O
nome controle articular refere-se à manutenção das relações entre as superfícies de
contato. Isto inclui o controle sobre as posições estáticas e as mudanças nestas posições, que por
definição se chamam movimento.
Examine a relação entre posição e movimento.
Lembra-se da época que os desenhos animados eram
na verdade desenhos no papel? Eles eram formados
por vinte e quatro figuras estáticas mostradas a cada
segundo que nos davam a percepção de movimento. Podemos ver o movimento articular da mesma
maneira, sendo simplesmente uma mudança de posição. Uma série de posições estáticas precisas que,
sequencialmente, movem-se para dentro e para fora
da posição entre o início e o final. Se considerarmos
esta perspectiva, passamos a apreciar que movimento
é dependente 100% do controle sobre estas posições.
Controle articular é diferente de estabilização articular. Por definição, estabilidade e mobilidade são
opostas. Estável significa que permanece firme, sólido, não muda. Estabilidade significa solidez, segurança, permanência. Estabilizar significa evitar mudança, tornar estável. Móvel significa que se move,
que pode ser movido, caracterizado pela facilidade
em mudar.
Controle
Significa gerenciar, exercitar poder ou autoridade; restringir; limitar ou restringir alguém ou alguma coisa. Parece ser mais apropriado usar a palavra
controle para descrever o que a indústria tem chamado de “estabilidade”. Controle pode ser involuntário,
como para a manutenção da integridade articular, ou
voluntário, como o controle do trajeto do movimento
e das posições.
Estabilização
Na indústria do exercício, a palavra estabilização
é quase que exclusivamente utilizada em referência
ao controle motor “bruto”. Isto é comprovado pela
d o
e x e r c í c i o
associação feita de que a utilização de ferramentas de
equilíbrio (superfícies instáveis) vai melhorar a “estabilização”. É necessário rever a relação entre controle motor “bruto” e “segmentado”. Ter controle em
cima de uma superfície instável não é garantia que
influencia positivamente a estabilidade articular ou o
controle articular.
O controle estático influencia o alinhamento articular perfeito, porém existe uma demanda muito
maior de controle sobre as mudanças na posição articular, enquanto esta mantém os aspectos do alinhamento. Devemos perceber que o termo “estabilização
dinâmica” é incoerente tanto quanto usar o termo
“movimento estático”. O que está acontecendo nos
exercícios que dizem usar estabilização dinâmica é um
controle sobre as mudanças das relações entre as superfícies de contato, garantindo a centrificação (manutenção do eixo) e a otimização da área de contato.
As influências ativas e passivas
sobre o controle articular
Os tecidos que contribuem para o controle articular são divididos em contráteis e não contráteis.
Para representar a maneira que estes tecidos influenciam o controle articular nós vamos substituir seus
nomes por ativos e passivos, respectivamente. Ambos são vitais, mas o grau em que eles influenciam
varia devido à articulação e suas estruturas, posição,
às forças impostas e à integridade do complexo neuromuscular ativo (não confundir com ADM ativa e
passiva, estamos falando de controle articular ativo
e passivo).
Controle articular ativo (tecido contrátil – estrategicamente ajustável): aquele que está constantemente se ajustando sempre que as posições articulares mudam e as forças externas sofrem alterações em
sua direção e magnitude.
Controle articular passivo (tecido não contrátil
– não ajustável): aquele que não se ajusta. No mundo
da ortopedia, eles são responsáveis pela estabilidade
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
101
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
ou instabilidade. Oferecem limites e guias durante a
amplitude e criam uma proteção sólida no final da
amplitude, assim como influenciam os graus de liberdade disponíveis.
Podemos chamar estes controladores articulares
de “gerentes articulares e estabilizadores articulares”,
porque funcionam gerenciando como tais. Tecido contrátil agindo como gerente ou estabilizador articular
precisa cruzar a articulação entre as duas superfícies
de contato. A única forma de força que um tecido mole
pode gerar é tensão. Esta tensão pode ser ativa (tecido
mole contrátil) ou passiva (tecido mole não contrátil).
Controle passivo das relações
das superfícies de contato
Quando um profissional da área médica examina
a estabilidade articular, normalmente o faz passivamente (Teste de Lachman ou gaveta anterior). O nível de estabilidade passiva é determinado por testes
passivos, durante os quais a musculatura deve estar
relaxada. Espera-se encontrar amplitude passiva suficiente, tanto dentro da amplitude fisiológica normal,
quanto no “jogo articular”. Quando a mobilidade
passiva articular é excessiva, é indicativa de frouxidão
ligamentar. Dependendo da articulação, da posição e
direção do teste, a frouxidão não deve estar presente, quer dizer, é necessário que haja estabilidade e, se
houver frouxidão, existe um problema.
Tecido conjuntivo
As estruturas compostas por tecido conjuntivo
incluem ligamentos, tendões, bursas, cartilagem, discos, meniscos, fáscias etc., assim como os ossos. Estes
tecidos não contráteis serão chamados em nossos estudos de tecidos passivos e podem ser divididos em
dois grupos: osso e tecidos moles não contráteis.
Osso
O formato das extremidades dos ossos cria as
superfícies de contato. O formato das superfícies de
contato é a essência da estrutura articular e determina:
• Área de superfície para distribuição de força.
• Graus de liberdade.
• A estabilização passiva oferecida por uma estrutura óssea e os tecidos associados (ligamento ou
músculo).
• Tolerância das articulações às forças como cisalhamento.
Existem partes do osso fora da superfície de contato que podem oferecer barreira para o movimento
articular e para alguns planos e posições específicas
– chamam-se protuberâncias ósseas.
Tecido mole não contrátil
Das substâncias que formam o tecido conjuntivo,
a proteína e a água são as mais importantes.
Colágeno
É a mais abundante proteína encontrada no corpo humano. Ele tem uma força tensiva que se parece
com a encontrada no aço (Joint Structure & Function,
4ª ed., p. 75) e é responsável pela integridade funcional do tecido conjuntivo.
Elastina
Possui propriedades elásticas que a permite deformar sob aplicações de forças e depois retornar ao
seu estado original ao ser removida a força. A quantidade de elastina varia entre diferentes tecidos conjuntivos, baseado na função que eles possuem. De
acordo com Joint Structure and Function, o tendão de
Aquiles possui 4% de elastina e o ligamento nuchae
possui 75% elastina.
Cápsula articular
A cápsula articular é composta por duas camadas – externa e interna. A camada externa é formada de tecido com fibras densas e circunda completamente as extremidades dos ossos. Ela é fixa ao
102 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
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periósteo e é reforçada por ligamentos e estruturas
musculotendíneas que atravessam a articulação. A
camada externa possui um baixo nível de vascularização, mas é muito inervada por receptores articulares que podem detectar a proporção e a direção
do movimento, compressão e tensão, e vibração e
dor. Já a camada interna é altamente vascularizada, porém não muito inervada. Ela contém células
que sintetizam um componente do líquido sinovial.
Esta camada também produz colágeno e serve como
ponto de entrada para nutrientes e como uma saída
para a sobra de materiais.
Ligamentos
Conectam osso com osso. O mais importante é que
eles mantêm a relação das superfícies de contato ao:
1. limitar a quantidade de movimento em um
dado plano;
2. prevenir completamente o movimento em um
dado plano.
O ligamento oferece restrição passiva a, pelo
menos, um plano da articulação. Alguns ligamentos foram projetados para impedir completamente
um movimento específico, como o ligamento colateral lateral. Outros ligamentos foram projetados
para oferecer uma quantidade de movimento finita, como o ligamento cruzado anterior, o qual,
devido a sua estrutura, ajuda a manter as relações
das superfícies de contato durante o movimento de
extensão, porém exige uma parada abrupta quando
completamente estendido.
Os ligamentos possuem mais de
uma função, eles atuam como
“monitores” e como “guias”.
d o
e x e r c í c i o
Cada ligamento parece oferecer uma limitação
ao movimento dentro de um plano específico (isto
é, descrito normalmente como “monitoramento” do
movimento dentro daquele plano). Porém, cada ligamento parece trabalhar sinergisticamente com outro
da mesma articulação para oferecer um certo nível de
guia passivo sinergístico dentro de outro plano de movimento. Devido à posição de suas inserções, o LCM
(ligamento colateral medial), LCL (ligamento colateral
lateral), LCA (ligamento cruzado anterior), LCP (ligamento cruzado posterior) interagem entre si [Fig. 73].
O LCA e o LCP possuem um contato direto que atua
como guia das superfícies de contato durante a extensão do joelho com a rotação associada.
Fig. 73. Ligamentos possuem diferentes
responsabilidades: aqui, os ligamentos colaterais medial e lateral da articulação do
joelho têm a “responsabilidade” de impedir movimento no plano frontal. Os ligamentos cruzados anterior e posterior têm a
“responsabilidade” de limitar a translação
no plano sagital.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
103
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
Percentual de contribuição
Os ligamentos são indicados por muitos experts
como sendo a segunda linha de defesa da articulação, secundários aos músculos no que diz respeito
à função articular e à manutenção da relação entre
as superfícies de contato durante a amplitude de movimento. Os ligamentos são a última linha de defesa da articulação contra a amplitude de movimento
excessiva, sendo os músculos com suas capacidades
contráteis a primeira linha de defesa.
Os ligamentos também têm a função de guiar o
movimento durante toda a amplitude. Todo movimento articular é uma sinergia entre os tecidos ativos
e os passivos, sendo que a porcentagem ou a quantidade de contribuição de cada um deles é dependente
do tipo de articulação e varia em cada posição/porção
da amplitude e da direção da resistência.
Existe um pensamento de que a maioria das lesões
ligamentosas acontece porque os músculos não fizeram
seu trabalho direito como controladores da articulação e
permitiram uma amplitude articular excessiva e imprópria. Podemos usar aqui uma analogia com o guard rail,
quando dirigindo um carro numa curva e na situação
de não ser possível ter controle suficiente para manter o
carro na pista, ele encosta no guard rail para se manter
na estrada. Assim são os ligamentos quando os músculos permitiram excesso de amplitude articular.
A distribuição das fibras de colágeno e a relação
colágeno-elastina em muitos ligamentos determinam
as habilidades relativas das estruturas de prover estabilidade e mobilidade para uma articulação específica.
As fibras de colágeno nos ligamentos têm uma variedade de arranjos dependendo de sua função específica.
Devemos notar também que os ligamentos possuem órgãos sensoriais que são vitais para detectarem informações sobre o estado da articulação. Estas
informações serão usadas na orquestração da participação dos tecidos contráteis neste controle articular.
Fig. 74. O exercício chamado de “crucifixo”, ou qualquer
outro que alcance uma posição closed pack, exige uma
consideração especial sobre a ADM total resistida. Neste
exemplo, a articulação do ombro está na posição closed
pack (abdução horizontal com rotação externa) e a direção da resistência está incentivando a articulação ainda
mais profundamente.
104 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
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Tecido passivo = Tensão passiva
Já que esses tecidos não são contráteis, a tensão dentro deles precisa ser gerada por uma força externa; esse tecido não consegue gerar tensão por si mesmo. Tanto para
os ligamentos quanto para a cápsula articular esta força
é imposta pela tentativa de afastar suas inserções ósseas
durante a amplitude de movimento normal ou excessiva.
As oportunidades e
limitações apresentadas
por estruturas passivas
Tornozelo
Dorsiflexão máxima
Cotovelo
radioumeral
90° de flexão de cotovelo,
5° de supinação
Cotovelo
umeroulnar
Extensão do cotovelo
máxima
Faceta vertebral
Extensão máxima
Glenoumeral
Abdução glenoumeral
máxima e rotação
externa máxima
Quadril
Extensão máxima e rotação
interna máxima
Joelho
Extensão máxima e rotação
externa máxima
Radioulnar
distal
5° de supinação
Radioulnar
proximal
5° de supinação
Subtalar
Supinação máxima
Posições close-packed das articulações (extraídas do
livro The Rehabilitation Specialist Handbook)
d o
e x e r c í c i o
Posições close-packed
Toda articulação sinovial possui uma posição
close-packed (trancada), em que as superfícies articulares são congruentes ao máximo e a cápsula e muitos dos
ligamentos estão tensos ao máximo. Nesta posição, as
superfícies articulares são comprimidas e a articulação
possui sua maior estabilidade (menor mobilidade na
continuação daquela direção do movimento) [Fig. 74].
Posições close-packed e o exercício
Muitas vezes, chegamos à conclusão de que estas posições close-packed (travadas) são perigosas. É
absolutamente crítico que compreendamos que não
é a posição que é perigosa. É a direção e a quantidade de força externa aplicadas na articulação que vão
determinar o nível de risco. Entretanto, permitir ou
encorajar uma força externa a empurrar ou puxar a
articulação mais profundamente dentro da posição
close-packed é que se torna o problema.
Considerando estas posições como sendo altamente perigosas, muitos escolhem evitá-las ou vão
ainda além, evitando qualquer posição perto delas,
como extensão de joelho até zero no leg press. Ao não
encorajarmos nossos clientes a aprenderem a ter este
controle sobre estas amplitudes finais e críticas, por
muitas vezes criamos uma inabilidade.
A compreensão-padrão deste conceito é limitada
e pouco criteriosa. Há uma preocupação com a extensão do joelho até o zero no leg press (o qual pode ser
prejudicial dependendo da velocidade do movimento para chegar à extensão, quantidade de sobrecarga e
grau de extensão). Entretanto, não nos preocupamos
em aplicar a sobrecarga diretamente na frente do joelho para adicionar carga em um mergulho no “tríceps
no banco” (o que é muito mais diretamente aplicada
contra o LCA do que o leg press) e ainda ignoramos
completamente a posição close-packed em outras articulações, como a do ombro. De fato, tradicionalmente encorajamos e violamos esta posição close-packed e
a chamamos de amplitude de movimento completa
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
105
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
(desenvolvimento atrás do pescoço e alongamento
quando o ombro está em rotação externa nos crucifixos e no voador).
A posição close-packed (sozinha)
não é um problema! É a posição
adicionada à direção, magnitude
e ponto de aplicação da força
que determinam o grau de risco.
Posição loose-packed
A posição loose-packed de uma articulação é qualquer outra posição que não a posição close-packed,
mesmo que algumas posições estejam mais frouxas
que outras. Na posição destravada (ou loose-packed)
de uma articulação, as superfícies articulares estão relativamente livres para se moverem, os ligamentos e
cápsulas estão relativamente frouxos e os componentes ósseos podem ser movidos ativamente ou passivamente dentro da amplitude de movimento anatômica.
Tornozelo
10° de plantiflexão
Cotovelo
radioumeral
Posição anatômica
Extensão total de cotovelo,
90° de supinação
Cotovelo
umeroulnar
70° de flexão de cotovelo
10° de supinação
Faceta vertebral
Intermediário entre
flexão e extensão
Glenoumeral
55° GU abdução,
30° adução horizontal GU
Quadril
30° de flexão,
30° de abdução,
leve rotação externa
Joelho
25° de flexão
Radioulnar
distal
10° supinação
Radioulnar
proximal
70° de flexão de cotovelo,
35° de supinação
Subtalar
Posição média
Posições loose-packed das articulações (extraídas do
livro The Rehabilitation Specialist Handbook)
106 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
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A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
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Mecânica articular:
Controle articular ativo
Controle ativo sobre as relações entre as superfícies de contato
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Músculatura esquelética
Músculos fazem somente uma coisa: contraem!
Os músculos podem puxar somente com a força gerada por eles mesmos e a isso chamamos tensão. O
principal objetivo para um músculo gerar tensão é o
controle articular e a manutenção das relações entre
as superfícies de contato. Porém todos estes objetivos são indiretos, pois a única coisa que um músculo pode fazer é manipular a distância entre seus dois
pontos de inserção. É verdade que existem outras
funções no processo de geração de tensão, tal como o
gasto energético, mas isso é um subproduto de quando funcionam em seu papel principal.
O principal propósito dos
músculos esqueléticos é
o controle articular.
A função muscular através de uma perspectiva
mecânica:
1. Músculos somente geram tensão, eles puxam
[Fig. 75].
d o
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Fig. 75. O tecido muscular é
um tecido com propriedades
contráteis. Isso significa que,
quando estimulado, ele contrai (“puxa”), gerando tensão e aproximando seus pontos de fixação (inserções).
2. A tensão gerada pelo músculo “puxa” nas
duas inserções musculares igualmente e o músculo não pode determinar qual extremidade vai
se mover [Fig. 76].
O estudo do controle ativo (contrátil) foi dividido em três partes: participação muscular, habilidade
muscular e perfil da potência/resistência.
Fig. 76. A tensão gerada
no músculo exerce sua
força em ambos os pontos de inserção, independentemente de qual vai se
mover. Neste exemplo, a
tensão gerada pelo retofemural é aplicada tanto na
tíbia quanto na pelve. Se é
a tíbia ou a pelve que vai
se mover, é uma questão
mecânica.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
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Mecânica muscular:
a força interna do cabo de guerra
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Classificação planar
das funções musculares
o sistema da cinesiologia tradicional
Cinesiologia – Ciência ou estudo do movimento
e das estruturas envolvidas, ativas e passivas.
A classificação e descrição da função muscular por meio de três planos cardinais ou anatômicos
trouxe muita confusão para nossa indústria. Esta maneira de análise gerou tanto mal-entendido com relação ao que a força muscular faz ou pode fazer, que
é necessária uma completa “entrega” de tudo que já
foi estudado para que possamos realmente entender
a função dos músculos.
A maioria das aulas e livros de cinesiologia descreve a função muscular baseada na relação de um
músculo relacionado a um plano de movimento e
assumindo uma única posição inicial, direção da resistência e ação concêntrica. Para analisar este sistema e suas falhas, é necessário entender que a função
de um músculo muda se o plano de movimento mudar e que os músculos possuem mais de uma função
dependendo da necessidade/movimento.
O músculo motor primário é conhecido por ser
um músculo mecanicamente ótimo para produzir
um movimento específico dentro de um plano específico em uma articulação. Porém:
• Existe normalmente mais de um músculo motor primário para cada movimento específico;
• Um músculo pode ser o motor primário para
mais de um movimento em uma articulação
como, por exemplo, o músculo grade dorsal durante a extensão do ombro e na rotação interna;
• O músculo motor primário pode não estar
sendo sobrecarregado se a direção da resistência
não for congruente com o plano de movimento,
como, por exemplo, o exercício “voador” em pé
com halteres [Fig. 77]. Então, ativo não significa
desafiado;
Fig. 77. Este é um exemplo de um
exercício em que o músculo motor
primário da adução horizontal do
ombro (peitoral maior) não está
sendo sobrecarregado. A direção da resistência está para baixo
(gravidade) e não está congruente
com o movimento da articulação.
O peitoral está ativo, porém não
está resistido.
• Um músculo será o motor primário tanto na
fase concêntrica, quanto na excêntrica se a direção da resistência não for alterada;
• É dito erroneamente que um músculo possui
funções primárias e secundárias, o que significa
que um músculo age como motor primário em
um movimento e como assistente ou estabilizador em outro.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
111
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
Desafios com este conceito:
• Um músculo motor primário pode não ser mecanicamente capaz de produzir o movimento durante
toda a amplitude anatômica. Por esta razão, ele passa
a responsabilidade para outro músculo motor primário dentro do plano que possui uma melhor vantagem mecânica naquele ponto da amplitude;
• Em articulações como o quadril e ombro, a relação entre o músculo e o eixo pode mudar através
a)
da posição de outro eixo (por exemplo, por meio
da rotação longitudinal). Com a rotação externa
do ombro, os abdutores tradicionais e os abdutores horizontais também mudam. Com a rotação
externa do quadril os flexores são os motores primarios durante a abdução. Com a flexão do quadril, os abdutores tradicionais não abduzem mais
(inversão da ação muscular);
b)
Fig. 78. a) Exemplo de uma abdução do quadril realizada partindo-se
de uma posição neutra. A abdução é realizada pelos abdutores.
b) Exemplo de uma abdução do quadril realizada partindo-se de uma posição de rotação externa do quadril. A relação dos pontos de inserção dos
músculos em torno do quadril foi alterada e agora a abdução é realizada
com os flexores do quadril.
112 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
m e c â n i c a
• Quando fazemos uma associação direta entre
o músculo e o movimento, perdemos de vista o
conceito da necessidade (o que foi necessário para
realizar o movimento?). O cotovelo pode flexionar sem o envolvimento dos flexores de cotovelo.
É essencial mantermos o conceito da necesidade
(demanda) como o primeiro fator para identificarmos a participação muscular;
• Os planos usados para descrever movimento
não têm correlação com a função muscular.
O músculo motor secundário (musculatura acessória) é um termo usado para descrever um
músculo que foi menos eficiente em realizar um movimento específico, mas tem um pequeno grau de
habilidade mecânica para ajudar um movimento específico. O problema com este termo é que:
1. Nunca foi dito qual é o momento em que um
músculo deixa de ser primário e passa a ser secundário (acessório);
2. Isto insinua que um músculo tem menos importância para o movimento articular ou para o
controle articular.
O agonista, segundo o Collins English Dictionary, é definido como “um músculo contraindo cuja
ação é oposta por outro músculo”. Isto descreve todos
os músculos o tempo todo. Esta palavra foi originada
do grego agon, ou competidor.
No aprendizado motor e em outros campos de
estudo relacionados a ele, agonista refere-se à “fonte
ou causa do movimento”, então, durante uma flexão de
cotovelo (rosca concêntrica com haltere), os agonistas
são os flexores do cotovelo, porém no retorno o agonista é a gravidade.
O antagonista é um músculo cuja contração concêntrica tende a produzir uma ação articular exatamente oposta à do agonista. Antagonistas são sempre
os desaceleradores. Se seguirmos este pensamento,
os antagonistas funcionam sempre excentricamente.
d o
e x e r c í c i o
Entretanto, se utilizarmos essa mesma definição,
quando flexionamos o cotovelo durante uma rosca
com halteres, o antagonista é o tríceps, e quando estendemos o cotovelo o antagonista é o bíceps.
Devido a isto, consideraremos o agonista aquele
músculo lutando contra (em oposição) a resistência
independentemente da direção do movimento articular. Porém, precisamos entender os dois contextos
e sermos capazes de distinguir ambos, além de estarmos prontos para dizer qual classificação estamos
usando para evitar confusões.
O sinergista pode ter uma das duas definições:
• Sinergia assistente acontece durante a ação de
dois músculos que têm ações articulares comuns
e cada um tem uma segunda ação muscular que é
antagonista ou se opõe ao outro músculo;
• Sinergia verdadeira é simplesmente a estabilização; um músculo contrai isometricamente para
prevenir qualquer ação em uma das articulações
que um músculo multiarticular atravessa.
O estabilizador é normalmente definido como
um músculo que sustenta ou apoia uma articulação
para que outro músculo ativo tenha uma base firme sobre a qual puxar. Porém o estabilizador pode ter muitas
funções. Um músculo que pode mover uma articulação
pode também estabilizar a mesma. Isso é uma questão
da organização da tensão relativa necessária.
A classificação planar é
baseada nos planos cardinais,
mas os músculos
não sabem disso.
Repensando as palavras
As palavras abaixo estão relacionadas à cinesiologia para indicar a ação e função de um músculo.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
113
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
Ação – o mecanismo pelo qual algo é operado; fisiologia, uma mudança em órgãos, tecidos ou células,
como em uma contração muscular.
Função – capacidade, posição, responsabilidade,
dever.
Nenhuma das duas palavras acima reflete com
clareza a “função” de usarmos o músculo. As palavras ação muscular são mais eficazes quando
estamos falando da fisiologia interna do trabalho
muscular relativo à geração de tensão e não tanto
quando estamos falando do resultado na articulação
(movimento).
A função de um músculo é normalmente descrita por uma ação articular, por exemplo, flexor. O
problema é que um músculo acaba se tornando sinônimo de uma de suas funções que acontece somente
dentro de um cenário específico como se fosse sua
única função independente das circunstâncias. E esta
função muitas vezes estará errada.
Então estas palavras parecem ser mais precisas:
Participação – o ato ou efeito de participar,
de fazer parte, como em uma ação ou tentativa de
ação.
Influência – poder ou ação, capacidade que alguém ou alguma coisa exerce sobre outra ou sobre
certos fatos. Força transformadora ou produtora de
efeitos nas ações ou comportamento de outros.
Participação muscular é o termo que podemos
usar quando nos referimos ao músculo que está gerando tensão em resposta a uma demanda específica
dentro de um cenário específico e sem descrevê-lo
com um nome que não representaria bem outro cenário que o músculo poderá estar envolvido.
Influência muscular é o termo que podemos
usar quando nos referimos ao efeito mecânico em
potencial que um músculo tem em uma articulação,
o resultado articular. Isso deve representar o grau que
um músculo oferece de força rotatória ou translatória
em um segmento e seus efeitos na articulação que podem ser o movimento ou a integridade interarticular.
Os princípios mecânicos
da participação e
influência muscular
É necessário que o profissional entenda a função
isolada de um músculo para que seja possível entender seus efeitos em uma articulação. Na verdade,
é necessário entender o que cada feixe de fibra está
fazendo em diferentes direções dentro de um músculo, porque esta é a direção da força que este feixe
aplicará na articulação. Esta é a contribuição que ele
trará para o controle articular em vários cenários mecânicos. Isso não quer dizer que este músculo vai trabalhar isolado em alguma situação, porém não temos
como saber o que ele tentará oferecer quando estiver
integrado até que saibamos suas capacidades individuais. Além disso, a aplicação de sua tensão individual representa a disfunção que acontecerá caso ele
esteja faltando.
O músculo individual, sua habilidade mecânica, não será diferente quando estiver trabalhando integrado. Não tem como isso acontecer!
Entretanto, o resultado em uma articulação será
determinado pelas seguintes informações: “com
quem este músculo está trabalhando e quanta
tensão cada um é requisitado a oferecer em cada
ponto da amplitude”.
Vamos explorar!
Isolamento
Articular versus muscular
• O isolamento muscular é praticamente impossível, independentemente da atividade ou objetivo.
Então, a não ser que você esteja testando o músculo com testes manuais (e mesmo neste cenário
isolar um músculo é muito difícil), o isolamento
muscular não acontece.
• Movimento articular isolado nunca é isolamento da ação muscular.
114 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
m e c â n i c a
ȖȖ Considere que inúmeros músculos são necessários para mover e controlar uma única
articulação.
ȖȖ Considere o fato de que músculos biarticulares afetam diretamente as articulações adjacentes.
ȖȖ Considere que é a participação muscular
ativa em inúmeras articulações que permite
um movimento articular isolado em uma articulação.
ȖȖ Não existe evidência de que o movimento
articular isolado prejudica a integração futura
em atividades multiarticulares.
• “Função muscular isolada” é normalmente associada erroneamente somente a sua ação concêntrica.
ȖȖ Considere o fato de que a única diferença
na articulação entre ação muscular isométrica,
concêntrica e excêntrica é a tensão gerada relativa à resistência.
Então, não existe razão para evitar, ter medo,
condenar ou culpar o “isolamento”. Mas a primeira
coisa a ser feita quando alguém quer discutir o assunto é ter certeza de que estão falando da mesma
coisa. Parece que muitas pessoas que condenam o
isolamento estão fazendo-o em termos gerais e não
parecem distinguir entre isolamento muscular e isolamento articular.
Integração
Articulação versus músculo.
Considere cada linha de força fornecida por
cada divisão de cada músculo que é chamado à ação.
Como citado anteriormente, o resultado em uma
articulação será determinado por: “com quem este
músculo está trabalhando e quanta tensão cada um
é requisitado a oferecer em cada momento”. Então,
torna-se impossível listar os movimentos integrados
porque o número de combinações é limitado somente
d o
e x e r c í c i o
pela estrutura e função articular, pela linha da força
oferecida pelo músculo e, em seguida, por quem é
chamado para participar e quanta tensão é necessária. Estas variáveis resultam em um número infinito
de combinações baseado na alteração da quantidade
de tensão individual relativa à resistência.
Princípios mecânicos da
influência muscular e o
resultado articular
Contextos: Vamos explorar este assunto como se
fôssemos os músculos, da perspectiva do músculo, “a
visão” do músculo (corpo) e depois vamos explorar
de uma perspectiva planar (feita pelo homem).
Pelos olhos dos músculos/corpo
1. Linhas da força, não planos!
Os músculos geram tensão. Tensão é força. Músculo somente gera tensão e aproxima seus pontos de
inserção. A força é uma linha que representa um vetor.
Um músculo é “responsável por” ou “ciente de” somente duas coisas: seu comprimento e sua quantidade de
tensão. Seu comprimento é simplesmente a distância
entre as duas inserções, sem se importar em qual plano
a articulação se move. O músculo jamais teria como
saber sobre planos. Nós os criamos para descrever algo
tridimensional no espaço. O músculo pode somente
perceber ou estar envolvido em uma mudança linear
da distância entre seus dois pontos de inserção e isso
pode ocorrer em um número infinito de planos.
Explore ser um adutor do quadril:
O objetivo: controlar a distância (excentricamente, concentricamente ou isometricamente) entre um ponto na pelve e um ponto no fêmur. Se o
objetivo for uma posição estática, não faz diferença
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
115
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
em qual plano você tenta se mover. Se o resultado é
uma tentativa de afastar os pontos de inserção, este
músculo precisa responder ao que está reconhecendo por meio de uma alteração em distância/em seu
comprimento. Quando a abdução do quadril acontece o adutor magno continua tentando aproximar
seus pontos de inserção, porém está perdendo o
cabo de guerra [Fig. 79 e Fig. 80].
Fig. 79. Exercício de adução resistida.
A direção da resistência está causando uma abdução no quadril. A musculatura adutora, mesmo durante a
abdução, está puxando ambas as inserções tentando aproximá-las, mesmo quando estão se afastando.
Fig. 80. A mesma situação acontece em todos os exercícios. Neste exemplo da flexão
do cotovelo, quando o cotovelo está estendendo, os flexores do cotovelo estão contraindo, isto é, aproximando seus pontos de
inserção, mesmo quando estão perdendo o
cabo de guerra e afastando suas inserções.
116 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
m e c â n i c a
mantenha esta perspectiva em
mente quando estivermos
explorando com a visão planar
(feita pelo homem).
d o
e x e r c í c i o
nomenclatura que chamamos de extensão com
rotação externa. Um músculo não consegue escolher realizar um movimento ou outro.
Pelos olhos do homem/sistema planar:
1. Movimentos “primários” versus movimentos
“secundários” de um músculo.
Não existe movimento ou ação primária e secundária de um músculo. Movimentos são nomeados através dos planos anatômicos e é em torno destes planos que estamos tendo a pretensão de achar
que um músculo prefere um ao outro.
• O músculo não tem como preferir um ou outro
plano para trabalhar.
• Não pode escolher trabalhar somente em um
dos seus movimentos planares.
• Na realidade, um músculo não pode ter mais
do que um movimento, a não ser através do nosso
sistema de identificação de planos.
O único propósito e a única
habilidade de um músculo é a
de aproximar os dois pontos de
inserção (sem se preocupar com
o plano anatômico).
• Os movimentos planares são analisados pelo
sistema planar; já o sistema muscular é dependente da linha da força.
• Quanto mais “planar” for o movimento, maior
a necessidade de integração para criá-lo.
• O glúteo máximo puxa em uma linha reta da
origem à inserção. Ele executa o que podemos
chamar de glutation [Fig. 81].
• É somente por causa do nosso sistema de
Fig. 81. O posicionamento das fibras em
forma de leque do músculo glúteo máximo quando contraem e aproximam os
pontos de inserção puxam-no em uma
direção diagonal. O movimento final na
articulação de extensão do quadril só
acontece porque outras musculaturas estão também contraindo e impedindo a
rotação externa e abdução que as fibras
do glúteo sozinhas teriam causado.
• A direção das fibras em alguns músculos não é
congruente com a direção da inserção.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
117
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
• Seja capaz de pensar e comunicar em ambos
os contextos dos planos cardinais e da visão do
músculo.
2. Ação multiplanar.
Sendo assim, é dentro do nosso sistema de
orientação planar que existe o potencial para
ação “multiplanar” para quase todos os músculos que atravessam uma articulação com
múltiplos graus de liberdade.
a. Devido ao fato de que as inserções musculares e as resultantes da direção das fibras
raramente coincidem com nossa descrição
planar, a maioria dos músculos passa por
múltiplos eixos (adote uma habilidade analítica 3D).
b. Então, praticamente todos os músculos
possuem um componente de rotação longitudinal se a articulação o tiver também,
dependendo da posição articular em todos
os eixos disponíveis. Examine o reto abdominal, a cabeça longa do tríceps e vários
adutores e rotadores do quadril.
c. Entretanto, o que um músculo pode fazer
não é indicação do que deve ou vai acontecer, devido às possibilidades a seguir.
3. O resultado final da ação de um músculo na
articulação será baseado:
a. Na relação das fibras com o eixo.
ȖȖ A posição inicial, final e todo ponto entre elas são a chave para a determinação da
participação muscular porque elas mudam
a relação entre o músculo e o eixo. Estas
posições são determinadas pela atividade
e não pela posição anatômica. Examine os
romboides quando a escápula está elevada
ou o peitoral quando o úmero está no plano
transverso.
a)
b)
Fig. 82. a) Os adutores, quando a articulação realiza uma flexão a partir de
uma posição de extensão, participam
como flexores do quadril.
b) Durante um movimento de extensão
do quadril, partindo de uma posição de
flexão, os adutores participam como extensores do quadril.
118 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
m e c â n i c a
ȖȖ “Inversão da ação muscular” acontece
quando a função ou a participação de um
músculo é modificada pela variação da posição articular, alterando assim a relação de um
músculo com o eixo de movimento e com a
resistência. Isso acontece mais na musculatura do quadril, do ombro e do tronco, mas
pode ser encontrada em qualquer articulação dependendo da relação entre as inserções musculares e o eixo. Examine o deltoide
posterior em abdução e adução; adutores em
flexão e extensão [Fig. 82]; braquioradial em
supinação e pronação; piriforme em rotação
interna e externa; reto abdominal em rotação
para a direita e esquerda.
b. Múltiplas ações.
Novamente, o resultado final na articulação será baseado também na ação de outros
músculos, que podem vir a funcionar para
eliminar ou alterar uma ou mais ações planares do músculo em questão.
ȖȖ Esta é a verdadeira integração intermuscular.
ȖȖ Estes “outros músculos” podem agir como
antagonistas em um ou mais dos movimentos
planares associados com este músculo (examine o glúteo máximo em extensão de quadril
sem a rotação externa do quadril).
ȖȖ Ou podem ser um antagonista em torno de
um eixo e um sinergista em torno de outro eixo.
ȖȖ Ou, ainda, podem não ser antagonistas,
mas podem simplesmente oferecer direção de
força um pouco diferente gerando uma ação
resultante, por exemplo, a integração dos vários músculos da escápula.
c. Ação reversa (articular).
Qual extremidade irá se mover não é uma
escolha neurológica, mas uma questão
de ancoragem (suporte). Então, escolha a
d o
e x e r c í c i o
extremidade que você vai ancorar e a extremidade que vai se mover é a mais leve. Qual extremidade é mais pesada, você ou a que você
está tentando mover? [Fig. 83]
4. Motores primários e assistentes do movimento versus músculos importantes e músculos não importantes.
Normalmente, vemos valor no que dois fatores têm em comum e dificilmente vemos valor
nas diferenças. Sob o contexto do movimento
existem alguns músculos que são mais capazes
do que outros para produzir um movimento
específico em uma articulação, devido ao torque. Isso não significa que o músculo com menor capacidade de gerar movimento é menos
importante. Geralmente, os músculos que possuem menor capacidade de gerar movimento
são excelentes para estabilizar a articulação,
os chamamos de gerentes articulares. Ironicamente, a perda de um gerente articular pode
prejudicar o movimento articular ao ponto de
ser debilitante. Assim sendo, todos os músculos que participam de alguma maneira têm um
papel vital na função articular adequada.
5. Não existe isolamento muscular absoluto.
As relações musculares são criadas como parcerias para manutenção da integridade articular. Esta sinergia é a chave para a manutenção
da relação das superfícies de contato para o
movimento apropriado e correta distribuição
das forças. Também existem numerosas divisões neurológicas de muitos músculos que
fornecem as mudanças na distribuição da
tensão necessária para influenciar apropriadamente o controle articular/integridade.
• Um movimento articular pode ser isolado,
sendo assim um grupo muscular enfatizado, porém um músculo jamais pode ser isolado.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
119
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
a)
b)
Fig. 83. Qual extremidade irá se mover é uma questão
mecânica e não neurológica. a) Neste exemplo da contração do quadríceps, ele gera tensão em ambas as inserções,
e se a tíbia é a que se move é porque era a extremidade
mais leve ou porque não estava ancorada. b) Neste exemplo, como a extremidade distal da tíbia está
ancorada, quando a tensão é gerada no quadríceps e aplicada em ambas as inserções, é a pelve que se move, podendo
ou não causar a extensão do joelho e/ou quadril.
120 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
m e c â n i c a
Perspectiva:
redundância versus necessidade
O fato de que uma articulação possui muitos
músculos capazes de realizar o mesmo movimento
leva muitos experts a dizerem que fomos construídos
com certa redundância. Redundância, no dicionário,
significa “ausência de necessidade”. Faz mais sentido
assumir que as diferenças, assim como as similaridades, de dois músculos são chaves para suas relações
em torno de uma articulação. Cada diferença ou similaridade é essencial para a manutenção da integridade articular, e se isso não fosse verdade certamente este músculo atrofiaria até desaparecer.
Lembre-se:
ser capaz de identificar
cada eixo do movimento
será vital para determinar
a influência muscular e
os resultados articulares.
Repensando a
Função Muscular
Praticamente “todos” os músculos em torno
de uma articulação estão envolvidos de alguma
maneira, e normalmente possuem um papel vital,
porém nem sempre um papel tão apreciado dentro da atividade. Os músculos primariamente desafiados são aqueles que se opõem diretamente à
sobrecarga. Porém, outros músculos em torno da
articulação serão necessários em outras ações também vitais.
Os três fatores mecânicos fundamentais que determinam a participação muscular:
d o
e x e r c í c i o
1. Direção da resistência (a resistência gera a necessidade de contrair).
2. O eixo (e plano) criado pela resistência (é a
oposição dos torques em torno de um eixo que
gera a resistência).
O momento da resistência comparado à capacidade estrutural da articulação (graus de liberdade). Quando a articulação não possui certa
liberdade articular, ela não deve ter um torque
aplicado naquela direção. Por exemplo, o joelho
não possui capacidade para se mover no plano
frontal, porém muitos profissionais colocam
uma caneleira na tíbia e colocam o quadril do
paciente em rotação externa e pedem para o
paciente executar uma extensão de joelho, por
mais que o movimento seja no plano sagital a
resistência está gerando um torque no plano
frontal.
3. As várias relações dos músculos com o
eixo da força. É necessário identificar as inserções dos músculos que cruzam a articulação em questão (influenciado pela posição articular). Lembrando que os músculos
puxam de ambos os lados na tentativa de
aproximar suas inserções. Depois identificar
a relação com o plano da resistência. E, por
último, identificar o movimento e comparar
com a resistência, porque os músculos necessários para mover e os músculos necessários
para se oporem à resistência podem ou não
serem os mesmos (isso depende de como o
profissional construiu o exercício).
Vamos analisar a participação muscular durante
um exercício de adução horizontal, em que em um
exemplo o plano da resistência é consistente com o
plano do movimento e em outros dois exemplos eles
não são [Fig. 84]. Analise a relação da musculatura
com o eixo e analise a diferença entre o eixo da resistência e o eixo do movimento.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
121
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
a)
b)
c)
122 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
Fig. 84. Movimento articular: adução
horizontal.
a) Direção da resistência: para trás, na
direção da puxada do cabo.
• Eixo do movimento e da resistência: longitudinal (horizontal) do ombro.
• Relação dos músculos em relação ao eixo
e à direção da resistência: musculatura anterior ao eixo se opõe diretamente à resistência e também é a movedora do membro
devido à consistência de ambos os eixos.
b) Direção da resistência: para baixo, na direção da força da gravidade.
• Eixo do movimento: longitudinal (horizontal) para a adução horizontal do ombro.
• Eixo da resistência: frontal.
Eixo da resistência e eixo do movimento são
inconsistentes. • Relação dos músculos com o eixo da
resistência (frontal): musculatura superior ao eixo frontal se opõe diretamente à resistência e é mais desafiada.
• Eixo do movimento (horizontal):
musculatura anterior ao eixo horizontal é responsável por mover o braço.
c) Direção da resistência: para
cima, na direção do cabo.
• Eixo do movimento: longitudinal (horizontal) para a adução horizontal do ombro.
• Eixo da resistência: frontal.
Eixo da resistência e eixo do movimento
são inconsistentes.
• Relação dos músculos com o eixo da
resistência (frontal): musculatura inferior ao eixo frontal se opõe diretamente à resistência e é mais desafiada.
• Eixo do movimento (horizontal): musculatura anterior ao eixo horizontal é responsável por mover o braço.
m e c â n i c a
Concluindo, a participação muscular é dependente
da relação entre o músculo, a resistência e o eixo (quer
exista movimento ou não). De um ponto de vista mecânico da relação axial, podemos organizar a participação
muscular em três categorias distintas. Os opositores da resistência, os gerentes articulares e os mantedores do plano.
Os termos acima parecem ser simples e não científicos, porém não estão sendo apresentados como uma
tentativa de fornecer um novo sistema de nomenclatura, mas de fornecer termos descritivos que representem
d o
e x e r c í c i o
os verdadeiros papéis que os músculos têm, com a intenção de facilitar o processo de aprendizagem e da aplicação destes fatores mecânicos na prática.
Os “opositores” da resistência (agonista)
• São os músculos que estão se opondo diretamente à necessidade ou resistência externa dentro
do cabo de guerra [Fig. 85].
• Inclui todos os músculos posicionados do lado
do eixo em questão.
Fig. 85. Opositores da resistência.
Neste exemplo, o eixo do movimento e
o eixo da resistência são consistentes e a
musculatura anterior do ombro está se
opondo diretamente à resistência e também é a responsável pelo movimento.
Fig. 86. Gerentes articulares.
Neste exemplo, a musculatura anterior
do ombro está se opondo diretamente
à resistência e, quando gera tensão em
ambas as inserções, o resultado é o deslocamento anterior da escápula e úmero,
que é impedido pela força interna gerada
pelos gerentes articulares que se opõe à
força gerada pelos opositores da resistência. Neste exemplo, os gerentes articulares são todos os músculos posicionados
posteriormente ao eixo longitudinal da
articulação do ombro.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
123
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
Os “gerentes articulares” (antagonista)
• Estes são indiretamente afetados pela resistência.
Isso quer dizer que eles se opõem aos componentes
da força gerados pelos “opositores da resistência”
que estão tentando desequilibrar a articulação. Podemos dizer que este papel é determinado pela necessidade interna mais do que a necessidade externa. Esses serão antagonistas (de alguma maneira)
aos mencionados anteriormente [Fig. 86].
Os “mantedores do plano”
• Eles existem somente em cenários em que a resistência não é consistente com o plano de movimento
[Fig. 87].
• Reconhecemos estes somente para distinguir o
músculo que está, na verdade, se opondo (lutando
contra) à resistência daqueles que estão oferecendo
movimento sem resistência (esta é outra tentativa
de ajudá-lo a diferenciar força e movimento).
Perspectivas sobre o
gerenciamento articular:
centrificação e estabilização dinâmica
Quando a manutenção do eixo de uma articulação
durante o movimento é realizada através do controle ativo, ela é chamada de centrificação. A centrificação é a
capacidade dos músculos de guiar as superfícies de contato enquanto se movem. A centrificação é criada por
meio da orquestração de praticamente todos os músculos em torno de uma articulação, cada um deles com diferentes níveis de participação durante a amplitude. As
contrações excêntricas e concêntricas exigidas dos músculos nos dois lados do eixo, atuando como uma “dupla
de força” ou “força conjugada”, produzirão movimento
enquanto mantêm o eixo da rotação relativamente fixo.
Em essência, o movimento axial é encorajado enquanto o movimento translatório não apropriado é evitado.
Examine o manguito rotador controlando a articulação
do ombro durante a abdução.
Fig. 87. Mantedores do plano.
• Direção da resistência: para baixo, na direção da força da gravidade.
• Eixo do movimento: longitudinal (horizontal) para a adução horizontal do ombro.
• Eixo da resistência: eixo frontal.
• Eixo da resistência e eixo do movimento são inconsistentes.
• Relação dos músculos com o eixo
da resistência (frontal): musculatura
superior ao eixo frontal do ombro é
a opositora da resistência.
• Eixo do movimento (horizontal):
musculatura anterior ao eixo horizontal é responsável por manter o plano
do movimento.
124 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
m e c â n i c a
Quando o agonista e o antagonista se contraem
simultaneamente, nós chamamos de co-contração. A
cocontração dos músculos em torno de uma articulação ajuda a fornecer estabilidade para a articulação e
representa uma forma de sinergia. Eles estão mantendo
a articulação íntegra (unindo as superfícies de contato)
e garantindo um movimento normal (que a concavidade e convexidade requerem), enquanto os agonistas ou
grande movedores estão tentado afastar as superfícies
de contato (repense sobre inibição recíproca). Lembre-se que a co-contração de maneira alguma insinua
que os músculos estão agindo igualmente na geração
do torque, pois, se isso acontecesse, não resultaria em
d o
e x e r c í c i o
movimento articular. Um grupo muscular pode estar
gerando somente a tensão suficiente concentricamente
enquanto o outro pode estar gerando somente a tensão
suficiente para agir excentricamente. Um ganhando o
cabo de guerra e outro perdendo.
Exemplos:
1. Bíceps excêntrico, quando o braço estende
durante um chest press (exercício de empurrar)
no cross over (cabos) devido à direção da resistência relativa ao cotovelo [Fig. 88].
2. Bíceps na cabeça do úmero agindo como o
manguito rotador em alguns pontos da abdução
[Fig. 89].
Fig. 88. Neste exemplo de
uma adução horizontal do ombro utilizando o cabo como
resistência, a contração do
bíceps agindo na articulação
do ombro está estabilizando a
articulação e na articulação do
cotovelo é responsável através
de uma contração excêntrica,
pela extensão do cotovelo.
Fig. 89. Neste exemplo, durante o movimento de abdução do ombro, o bíceps atua
como manguito rotador guiando as superfícies de contato e
fazendo parte da centrificação.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
125
Mecânica Muscular:
Habilidade Muscular
m e c â n i c a
U
ma vez que um músculo é requisitado a participar em um papel específico, sua habilidade
varia. A quantidade de força/torque que um
músculo pode oferecer para o controle articular é resultado de sua(s):
1. Estrutura;
2. Habilidade Contrátil;
3. Características Mecânicas.
1. Estrutura Muscular
Arranjo das fibras
Músculos Penados possuem o arranjo de suas fibras obliquamente ao longo do eixo do músculo. Penado é derivado da palavra pena. As fibras que constituem
o fascículo de um músculo penado são normalmente
mais curtas e mais numerosas do que na maioria dos
músculos fusiformes. Músculos Unipenados possuem
suas fibras somente em um lado do tendão. Músculos
Bipenados, como o reto femoral, possuem suas fibras
nos dois lados de um tendão central. Nos Músculos
Multipenados ou em forma de leque, como o deltoide,
as fibras oblíquas convergem em vários tendões. A série
de fibras oblíquas nos músculos penados interfere na
relação direta entre o comprimento da fibra muscular
e a distância que o músculo pode mover um segmento
ósseo. Somente uma parte da força é direcionada a produzir movimento no segmento ósseo, entretanto, porque os músculos penados possuem um grande número
de fibras musculares, eles são capazes de transmitir uma
grande quantidade de força para os tendões.
Fáscia
Este tecido conjuntivo fibroso serve de cobertura
para todos os músculos e órgãos. É normalmente descrito como uma capa contínua que envolve todos os músculos e suas divisões, individualmente e coletivamente. A
fáscia também pode atuar como uma grande área para
inserções musculares (ex.: grande dorsal, glúteo máximo,
d o
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tensor da fáscia lata). A fáscia afeta a integridade dos músculos individuais e da estabilização dos sistemas/cadeias.
Uma perfuração minúscula na fáscia de um músculo reduzirá dramaticamente sua capacidade de gerar força.
2. Habilidade contrátil:
desenvolvimento de tensão
Como os músculos desenvolvem tensão?
Um dos maiores propósitos deste capítulo é o estudo dos processos mecânicos e implicações mecânicas pelas quais músculos geram tensão. Desenvolver
uma perspectiva da mecânica sobre estes princípios
básicos não é apenas de muita ajuda para entender
suas funções, papéis e relações entre tecidos, mas também para a tomada de decisões durante os exercícios.
A Teoria dos Filamentos Deslizantes [Fig. 90] é
o modelo atualmente aceito para o desenvolvimento de
tensão muscular (contração). As microscópicas unidades
contráteis são chamadas de miofilamentos. Existem dois
tipos de miofilamentos: grossos e finos. Os filamentos
grossos são compostos de uma proteína chamada miosina e os filamentos finos são compostos de uma proteína
chamada actina. A interação entre esses dois miofilamentos poderiam ser imaginados como um velcro móvel.
Actina
Miosina Discos Z
Sarcômero
Fig. 90. Teoria dos filamentos deslizantes.
Unidade geradora de tensão ativa.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
127
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
A actina se sobrepõe no final da miosina. A miosina se anexa temporariamente à actina via “pontes
cruzadas” que se movem similarmente a remos de
um barco a remo. A ponte cruzada puxa a actina ao
final de cada miosina, e esta desliza em direção ao
centro. Inúmeras pontes cruzadas se ligam, se puxam,
se liberam e se anexam novamente. Ao contrário da
ação de uma equipe de remo, em que todos os remos
estão dentro ou fora da água ao mesmo tempo, algumas pontes cruzadas estão se anexando e puxando,
enquanto outras estão destacadas ou se reanexando.
Esse arranjo impede que a actina deslize de volta.
Já que a actina desliza por toda a miosina, a
quantidade de sobreposições causa uma mudança no
tamanho total do sarcômero. Cada sarcômero é anexado ao próximo através dos discos Z ao final de cada
actina. Esta série de sarcômeros cria uma miofibrila.
Inúmeras miofibrilas são “envelopadas” pelo tecido conjuntivo, chamado sarcolema, para formar
uma única fibra muscular. O sarcolema é envolvido
por um tecido conjuntivo chamado endomísio.
Inúmeras fibras musculares são “envelopadas”
juntas por um tecido conjuntivo chamado perimísio,
para formar fascículos. Os fascículos são “envelopados” para formar um músculo esquelético.
O endomísio e perimísio são contínuos com o revestimento do tecido conjuntivo chamado de epimísio,
que envolve o músculo inteiro. Os tecidos conjuntivos
envolventes formam o componente elástico paralelo.
O tendão trabalha em série com os componentes
contráteis. O papel do tendão é de transmitir precisamente a força/tensão gerada pelo músculo para os
ossos que estão conectados. Essa conexão é na verdade descrita como sendo contínua com o periósteo ou
com a camada externa do osso. A fim de que a força do músculo seja precisamente transmitida para o
osso, a tensão deve primeiro ser suficiente para “compensar a folga” no tendão. A complacência do tendão
ou “alongamento” é relativamente pequena (aproximadamente 3% a 10%), assim o músculo não tem que
ir muito longe antes da sua força poder ser usada no
osso (NORKIN; LEVANGIE, 2005).
Fig. 91. Em torno do tecido contrátil,
gerador de tensão, existe o tecido não
contrátil que gera tensão passiva.
A tensão desenvolvida dentro dos elementos
contráteis de um músculo é considerada tensão ativa.
Esta tensão ativa cria a tensão passiva nos componentes do tecido conjuntivo do músculo [Fig. 91].
128 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
m e c â n i c a
a)
b)
d o
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c)
Fig. 92. a) Contração do tecido contrátil só puxa.
b) Durante a contração concêntrica, o tecido tenta aproximar os dois pontos de
inserção e está ganhando o cabo de guerra.
c) Durante a contração excêntrica, o tecido tenta aproximar os dois pontos de inserção e
está perdendo o cabo de guerra.
Assim como milhões de pontes cruzadas são formadas, a tensão é desenvolvida ao longo de um comprimento muscular, gerando o que é chamado de contração.
Perspectivas sobre a contração muscular
1. Tipos de contrações: Por tradição, se a geração de tensão leva ao encurtamento do músculo,
então é chamada de uma contração concêntrica.
Se o músculo se alonga, isso se chama de uma
contração excêntrica. E se o músculo não aparenta ter mudança de comprimento, é chamado de
contração isométrica.
2. Porque a contração significa aproximar, a ideia
de uma contração em alongamento é considerada paradoxal por alguns (NORKIN; LEVANGIE,
2005). Mas perceba que não existe nada paradoxal
na ideia de uma contração que está se alongando.
Pense que o músculo está contraindo, porém está
perdendo o cabo de guerra. [Fig. 92]
3. Devido ao tipo de contração ser na verdade
uma tensão relativa, deve-se notar que a alteração
no comprimento do músculo não é devido à escolha de alguém quanto ao tipo de contração realizar. Isso ocorre devido à escolha (ou limitação)
da quantidade de torque que é gerado através da
geração de tensão devida para comparar com o
torque da resistência que está em oposição.
4. Porque toda contração muscular é tensão,
quer dizer uma tentativa de encurtar, e o resultado é determinado pelo que está relativamente
acontecendo no cabo de guerra, estas não são
realmente tipos diferentes de contração muscular. Elas são simplesmente uma variação de tensão relativa como resultado do torque líquido em
uma direção ou outra. Essa realidade representa
a razão pela qual o processo que um produz encurtamento e outro controla o alongamento das
fibras é diferente. Porém, o entendimento da
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
129
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
relação mecânica é vital antes de explorar os processos fisiológicos. Esta realidade dá contexto para
os processos fisiológicos e nos ajuda a enxergar por
que eles não podem ser diretamente comparados.
Levantar 25 kg e abaixar 25 kg não tem a mesma
exigência mecânica.
5. Isotônica refere-se a uma tensão constante, o
que é uma impossibilidade durante as mudanças
de comprimento. A diferença dos comprimentos
dos braços do momento durante a amplitude de
movimento prova que existe mudança no torque
tanto da resistência quanto no torque da potência,
o que prova que a tensão não permanece igual durante a amplitude.
Fatores Neurais
O sarcômero é a unidade básica de desenvolvimento de tensão dentro de um músculo, mas é parte
de um complexo maior chamado de unidade motora.
A unidade motora consiste no neurônio motor e todas as fibras musculares que ele conecta.
A contração do músculo inteiro é o resultado de
muitas unidades motoras ativadas repetidamente e de
forma assíncrona. A magnitude da contração do músculo inteiro pode ser alterada conforme o número de
unidades motoras que são ativadas ou pela frequência
com que estas são ativadas. O número de unidades motoras de um músculo varia de músculo para músculo.
Unidades motoras variam conforme o tamanho
do corpo da célula neural, diâmetro do axônio, número de fibras musculares e o tipo de fibras musculares.
Cada uma dessas variações numa estrutura afeta a função da unidade motora (NORKIN; LEVANGIE, 2005).
Revisão sobre a Geração de Tensão Muscular
1. Tensão é gerada quando pontes cruzadas são
formadas;
2. Nenhuma ponte cruzada pode ser formada e
nenhuma tensão ativa pode ser gerada a não ser
que haja uma sobreposição de actina e miosina;
3. Quanto maior for o número de pontes cruzadas formadas, maior será a tensão;
4. O número máximo de pontes cruzadas será
formado quando existe o número máximo de sobreposições;
5. Durante a ação de encurtamento, as pontes cruzadas são formadas, quebradas e reformadas e as actinas são puxadas em direção ao centro da miosina;
6. Durante a ação de alongamento, as pontes cruzadas são formadas, rompidas e reformadas e as actinas são puxadas para longe do centro da miosina;
7. A relação entre a tensão muscular e a resistência determina se ocorrerá encurtamento ou alongamento. Quem está ganhando ou perdendo o
cabo de guerra;
8. A tensão pode ser aumentada pelo aumento
da frequência do disparo de uma unidade motora ou pelo aumento de unidades motoras que
são disparadas;
9. A tensão pode ser aumentada pelo recrutamento de unidades motoras com um número
maior de fibras;
10. Músculos que tenham grandes secções transversais fisiológicas são capazes de produzir mais
tensão do que os músculos que têm pequenas secções transversais.
Fatores que Afetam o
Desenvolvimento de Tensão
A quantidade de tensão ativa que um músculo
pode gerar depende tanto de fatores neurais quanto
de propriedades mecânicas do músculo.
Propriedades Mecânicas
A Relação Comprimento-Tensão
Isométrica: Um Espectro de Tensão
Parece existir uma relação direta entre o desenvolvimento de tensão em um músculo e seu comprimento
130 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
m e c â n i c a
[Fig. 93]. O comprimento de um músculo é diretamente relacionado com a quantidade de sobreposições em
um miofilamento. A quantidade de sobreposições determina a área disponível para formar o cruzamento das
pontes cruzadas. Quanto maior for o número de pontes
cruzadas formadas, maior será a tensão [Fig. 94].
d o
e x e r c í c i o
a)
força
ATIVA
TENSÃO
total
TENSÃO
b)
passiva
TENSÃO
c)
ACTINA
comprimento do sarcômero
Fig. 93. Parece haver uma relação direta entre o desenvolvimento de tensão ativa em um
músculo e seu comprimento, que é a relação
comprimento-tensão do sarcômero da musculatura esquelética. A curva ativa, passiva e
a curva total estão demonstradas. O platô da
curva ativa demonstra o comprimento ótimo
do sarcômero, em que a máxima tensão ativa é
produzida. A tensão isométrica diminui quando
o músculo é alongado devido a menor quantidade de formação de pontes cruzadas. A tensão diminui quando o músculo é encurtado devido à inabilidade de gerar mais sobreposição e
os filamentos actina e a miosina. O aumento
de tensão passiva durante o alongamento do
músculo está demonstrado pela linha pontilhada. A soma da tensão passiva e ativa resulta na
tensão total desenvolvida pela fibra muscular.
MIOSINA
Fig. 94. a) Deslizamento dos filamentos em posição mais alongada e com
menor possibilidade de gerar tensão.
b) Deslizamento dos filamentos. Quantidade de sobreposição dos filamentos com
possibilidade de geração se tensão ótima.
c) Deslizamento dos filamentos em posição
mais encurtada e com menor possibilidade
de gerar tensão.
Foi chamado de “comprimento ideal do sarcômero” aquele no qual o músculo é capaz de desenvolver
máxima tensão. Se o músculo é alongado ou encurtado além do comprimento ideal, a quantidade de tensão
ativa que ele pode gerar quando estimulado diminui.
Durante o alongamento, a tensão passiva aumenta no
componente paralelo e essa tensão passiva será adicionada à tensão ativa, afetando a tensão total.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
131
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
Perspectivas
1. A relação comprimento-tensão não deve ser definida por um comprimento ideal e tensão máxima.
Deve ser analisada como o espectro (a amplitude, o
intervalo ou o trecho) de comprimentos disponíveis e o potencial associado às alterações na tensão;
2. Isto não leva em consideração os efeitos de outros tecidos que determinarão o torque máximo
em uma articulação específica, incluindo a fadiga
e o braço do momento do(s) músculo(s);
3. Esse fato em nada se relaciona, automaticamente, com uma posição ou amplitude de treinamento ideal, embora deva influenciar nas considerações e decisões quanto ao perfil da resistência;
4. Para a aplicação deste conceito, é impossível
detectarmos qual é a amplitude ótima de trabalho
de um dado músculo, porque não está relacionado com a “amplitude média” de uma articulação.
A maior oportunidade de aplicação do conceito
sobre a relação comprimento-tensão está no entendimento sobre o que está acontecendo no extremo
das amplitudes, assim como sobre as “oportunidades” de “variação estratégica” para o posicionamento das articulações secundárias das musculaturas
biarticulares e seus efeitos na amplitude contrátil.
Dificuldades em Aplicar este Conceito
Aplicar este conceito a um músculo inteiro ou a
sistemas musculares é difícil, porque o tamanho dos
sarcômeros não são os mesmos ao longo do músculo, e muito menos entre músculos adjacentes (NORKIN; LEVANGIE, 2005). Além disso, esse conceito
foi apenas determinado para contrações isométricas.
Mesmo assim, o tamanho do sarcômero obviamente
muda durante ações excêntricas e concêntricas e isso
alterará o desenvolvimento de tensão.
O valor desta informação para a prescrição de
exercício está em conhecer os dois extremos em que
a perda relativa de tensão ativa está presente e não
tanto em saber onde a tensão máxima é desenvolvida.
“Insuficiência Ativa”: Os Extremos DA
CURVA COMPRIMENTO-TENSÃO
Insuficiência ativa, como descrita no livro Joint
Structure and Function (NORKIN; LEVANGIE,
2005), é a habilidade diminuída de um músculo de
produzir ou manter a tensão ativa devido à alteração
na relação comprimento-tensão.
“Ao nível do sarcômero, este estado pode ocorrer
quando um músculo é alongado a um ponto em que
não há sobreposição entre os miofilamentos ou quando o músculo está excessivamente encurtado e não é
mais capaz de deslizar.” (NORKIN; LEVANGIE, 2005)
Em muitos casos, os músculos estão dispostos em
torno de uma articulação de modo que o músculo não
possa ser nem excessivamente alongado nem excessivamente encurtado, em relação ao seu comprimento de
repouso. Este arranjo é mais efetivo para os músculos
que cruzam apenas uma articulação (uniarticulares).
“Músculos que cruzam mais de uma articulação
(biarticulares) podem chegar ao alongamento ou encurtamento máximo antes de alcançarem a máxima
ADM (amplitude de movimento) em todas as articulações que cruzam.” (NORKIN; LEVANGIE, 1983).
Portanto, durante o encurtamento ativo, “um músculo biarticular se tornará ativamente insuficiente
em um ponto anterior ao final da amplitude de uma
articulação, quando a ADM máxima acontece simultaneamente em todas as articulações. Insuficiência
ativa pode ocorrer em músculos uniarticulares, mas
tal ocorrência não é tão comum.” (NORKIN; LEVANGIE, 2005)
Insuficiência Ativa “Relativa”
Insuficiência ativa é frequentemente considerada
uma perda absoluta da habilidade contrátil nas extremidades do comprimento do músculo. Especialistas ainda discutem as evidências e viabilidade disto
como um todo. Indiferente aos absolutos, este conceito apresenta muitos elementos para preocupação
durante a prescrição do exercício.
132 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
m e c â n i c a
Embora uma perda total da habilidade contrátil
em músculos biarticulares pudesse limitar severamente a habilidade muscular, a “insuficiência” pode
ser gerada mesmo quando um mínimo de habilidade
contrátil é mantido. A importância está em examinar a relação entre habilidade contrátil e o perfil da
resistência. Se a relação entre eles for invertida (resistência aumentando enquanto a tensão está diminuindo), poderá haver insuficiência ativa em termos
práticos de que a tensão ativa ainda restante é reduzida a ponto de se tornar insuficiente para controlar a
resistência nos extremos da amplitude.
Para chegarmos a conclusões sobre a insuficiência
ativa, é necessário olhar para as especificidades do exercí-
d o
e x e r c í c i o
cio: posição da articulação secundária, perfil da resistência, percentual de contribuição de músculos biarticulares.
Lembrando que são os extremos, no encurtar ou alongar,
que podem gerar a insuficiência ativa [Fig. 95].
“Insuficiência Passiva” ou
Insuficiência do Antagonista
Insuficiência passiva ocorre quando uma musculatura antagonista ao movimento resistido possui comprimento insuficiente para permitir a realização completa
da ADM disponível nas articulações que cruza. Músculos
biarticulares frequentemente possuem comprimento insuficiente para permitir ADM completa simultaneamente em ambas as articulações que cruzam.
IA:C
IA:C
IP:L
IP:L
IA:L
Fig. 95. IA: L – Insuficiência ativa na porção longa da musculatura. Na porção longa, a musculatura diminui a habilidade de gerar tensão devido ao comprimento do tecido. Nesta posição existe o aumento de
tensão passiva que ajuda a musculatura não se tornar insuficiente. Então a insuficiência ativa é relativa.
IA: C – Insuficiência ativa na porção curta da musculatura. Nestas posições o tecido contrátil se encontra em uma posição curta com menor possibilidade de geração de tensão. Porém, nunca chega à total inabilidade e chamamos também de insuficiência ativa relativa.
IP: L – Insuficiência passiva na porção longa da musculatura. Quando a musculatura antagonista se
encontra em sua posição mais alongada, esta tem a possibilidade de restringir o movimento e a isso
podemos também chamar de insuficiência do antagonista.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
133
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
A grande questão é: quão “passivo” é realmente este
tecido? Quanto de seu comprimento ainda é baseado
na tensão ativa, especialmente se é um estabilizador importante responsável pela co-contração? Devido a sua
classificação, insuficiência passiva parece identificar que
o músculo está completamente inativo e que as tensões
passivas estão determinando os comprimentos disponíveis. Porém, precisamos considerar que o comprimento
dos antagonistas é determinado pela tensão ativa orquestrada como um músculo desacelerador através da
co-contração ou um gerente articular. Então, este conceito pode ser melhor identificado como “insuficiência
do antagonista” porque o tecido ainda está ativo.
Nota: Insuficiência pode não ser o melhor termo para esses conceitos porque implica entender que
algo está errado ou funcionando incorretamente. Porém, estas são situações normais que são insuficientes
apenas no contexto de limitar a habilidade de prover
maior amplitude, o que pode ser exatamente o que precisa acontecer (na verdade, na perspectiva da inteligência corporal e da diretriz principal, seria perfeito).
Levando em consideração o fato anterior, é possível que a fadiga não seja tão desproporcional quanto
pareceu, e pode, na verdade, ser consistente durante o ciclo de encurtamento-alongamento. Porém, a
perda de habilidade ativa na porção (extremo) mais
alongada é menos óbvia porque é progressivamente
contraposta pelo aumento de tensão passiva. Independentemente disso, independentemente da causa,
o resultado é o mesmo. O perfil da potência/resistência é alterado da primeira repetição para a última.
3. Características
Mecânicas do Músculo
A diferença prática entre insuficiência ativa e
passiva [Fig. 95]:
1. É necessário localizar qual a musculatura está
sendo carregada;
2. Identificar se está no extremo mais alongado
ou no mais encurtado;
3. O lado que não está carregado só se torna insuficiente quando alongado ao máximo, então parece que a insuficiência passiva só é um problema
quando a insuficiência ativa acontece no extremo
encurtado do lado oposto.
A influência da fadiga
A fadiga altera a capacidade de gerar tensão de
um músculo desproporcionalmente durante o ciclo
de encurtamento-alongamento. Normalmente, os
efeitos da fadiga são percebidos antes nas porções
mais encurtadas da contração.
Fig. 96. A linha da força de um músculo é a resultante da direção de todas as
fibras.
134 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
m e c â n i c a
O Vetor Muscular Total
A linha de força aplicada por um músculo no osso
é, na verdade, a resultante da direção das fibras que
compõem esse músculo em um ponto comum de inserção [Fig. 96].
O Momento e o Ângulo de
Força do Músculo
A quantidade de tensão gerada em um músculo,
em um determinado momento, não é a única determinante de sua habilidade de mover o osso.
Fig. 97. Neste exemplo, identificamos que
90º de ângulo de força não é o ponto mais
forte da amplitude devido à relação comprimento-tensão do isquiotibial estar diminuindo
a habilidade de geração de força.
d o
e x e r c í c i o
Cenários Mecânicos
Específicos ao Músculo
1. O ângulo de força e o momento dos músculos
mudará a cada grau de movimento;
2. Poucos músculos alcançam 90º de ângulo
de força;
3. Devido à relação comprimento-tensão, um
ângulo de força de 90º provavelmente não será
o ponto mais forte da amplitude de um músculo
[Fig. 97];
4. A maioria dos músculos não chega a 0º devido
à espessura do osso, a não ser que estejam localizados fora do plano de movimento.
Um ângulo de força ideal não indica necessariamente o ponto mais forte da amplitude de movimento do músculo/grupo de músculos. O ponto
ideal está sujeito à relação comprimento-tensão de
todos os músculos envolvidos na articulação assim
como a fadiga. Isso é ainda mais complicado em
músculos biarticulares. O bíceps braquial, braquial
e os isquiotibiais estão entre os poucos músculos
que atingem um ângulo de força de 90º. A maioria dos músculos mantêm ângulos de força relativamente pequenos ao longo da sua amplitude de
movimento.
Quando o ângulo de força de um músculo diminui ao ponto em que o músculo encosta no osso,
ainda assim resta um ângulo de força. O ângulo
de força de um músculo (ou o braço do momento)
nunca alcança zero em termos de habilidade (isso
é diferente da sua participação em um movimento
específico; veja Participação Muscular). Devido ao
osso ter uma espessura, a verdadeira alavanca está
dentro do osso ao invés de estar na sua superfície.
O fato de o osso ter uma espessura e o ângulo
de força nunca alcançar o zero absoluto nos permite sempre manter alguns graus de habilidade
mecânica.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
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Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
Polias Anatômicas
Uma polia anatômica é o osso ou proeminência
óssea que altera a direção da “puxada” do músculo.
Isto pode simplesmente alterar o plano que o músculo consegue trabalhar através do redirecionamento
da sua força. Se analisarmos o músculo grande dorsal
no contexto da extensão do ombro, a habilidade do
grande dorsal de contribuir com a extensão foi alterada [Fig. 98], assim como foi alterado o perfil da
potência.
a)
b)
136 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
Fig. 98. Polia anatômica
Exemplo do exercício de remada.
a) Posição inicial, a inserção do
músculo grande dorsal se encontra anterior ao eixo do movimento (e coincide com o eixo
da resistência), tornando-o o
músculo opositor da resistência.
b) Durante a extensão do ombro a
inserção do músculo grande dorsal se move posteriormente com
o úmero. Quando esta passa para
trás do zero, quer dizer, a inserção
do grande dorsal passa para trás do
eixo frontal, a sua puxada deixa de
ter influência neste eixo. A influência da musculadora do grande dorsal transfere-se para o eixo sagital,
mudando o plano em que tem ação
para o plano frontal. Neste caso sua
participação acontece na adução e
não mais na extensão.
m e c â n i c a
d o
e x e r c í c i o
Algumas polias anatômicas aumentam a vantagem mecânica do músculo por meio do desvio da
linha da força para mais distante do eixo da articulação, aumentando, assim, a força angular/braço do
momento. Poderíamos chamar estes cenários específicos de CAMs Anatômicos [Fig. 99].
Fig. 99. Cams Anatômicos
A patela é um CAM anatômico porque
sua presença aumenta o braço do momento da força do quadríceps, deixando-o mais forte.
Quando estiver identificando a linha da força de
um músculo que é desviado por uma polia anatômica, lembre-se que o ponto de aplicação é no osso, no
local da inserção muscular, e está na direção da puxada da contração que as fibras geram naquele ponto
de inserção [Fig. 100].
Fig. 100. A linha da força de um músculo é
a resultante das forças das fibras musculares.
É aplicada no ponto de inserção do músculo
e a direção acompanha esta relação durante
a amplitude de movimento e altera o braço
do momento do músculo. Neste exemplo, aumentando o braço do momento.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
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Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
Inserção Muscular e
Seus Efeitos na
Habilidade Muscular
Músculos Biarticulares
Vários músculos/tendões dentro do corpo cruzam mais de uma articulação. Estes músculos exercem a sua força através de todas as articulações envolvidas, embora o movimento resultante não seja
previsível. Se uma ou todas as articulações se movem,
ou não, depende da estabilização imposta e o propósito funcional da estrutura muscular.
É importante olhar o papel destes músculos individualmente dentro da cadeia ou sistema e, assim,
examinar suas relações com as articulações e outros
músculos em uma variedade de atividades.
Características de Músculos
BiArticulares: Sujeito Aos Extremos
Como já mencionado na análise da insuficiência
ativa e passiva, quando os ossos que estão conectados nas inserções do músculo se movem em direções
opostas (ex.: o joelho flexiona enquanto o quadril se
estende; como os isquiotibiais durante a corrida), o
músculo tem o potencial de se submeter a seu maior
encurtamento ou alongamento. Assim, em cada extremo ele se torna insuficientemente ativo (revisar
relação comprimento-tensão isométrica, tensão elástica passiva). Músculos biarticulares estão associados
com músculos uniarticulares, garantindo assim que a
articulação se beneficie das vantagens ou características de cada um.
Quando usar uma resistência com direção única ou uma resistência com um único eixo, um grupo
muscular biarticular será carregado mais efetivamente (assumindo que seja o objetivo) quando apenas
uma articulação for permitida a mover e a outra
estiver estabilizada. O movimento na segunda articulação alterará a aplicação da carga (ex.: flexão do
cotovelo especificamente para o bíceps). Quando parte da estabilização é realizada pelo próprio músculo
biarticular, a exigência neurológica é intensificada
(flexor de perna sentado sem apoio de coxa, extensor
de perna com a estabilização ativa de quadril, flexor
de perna deitado e rosca Scott).
Perspectiva: Os efeitos dos músculos biarticulares
em ambas as inserções não são muito conhecidos nem
muito respeitados. É necessário que se observe ambas,
inserções/ossos, recebendo o benefício da tensão gerada, mesmo que apenas em uma pareça óbvio.
Características dos músculos
em forma de leque
Existe uma grande variedade de planos/movimentos nos quais este tipo de músculo pode influenciar e é
necessário explorar todos os planos de movimento que
são perpendiculares ao arranjo das fibras (na verdade
qualquer plano fora do plano das fibras). Neste cenário, apenas uma resultante das fibras está no plano.
Quando o plano de movimento é consistente
com o plano do leque, um músculo pode passar a
responsabilidade da habilidade mecânica para outro
dentro das fibras dele mesmo, criando uma habilidade significativa ao longo de uma grande amplitude de
movimentos (se todas as fibras estiverem alinhadas
com o plano, o músculo possui sua maior habilidade).
Quando um músculo em forma de leque está
posicionado dos dois lados do eixo, as fibras de um
lado do eixo exercerão ações diferentes durante o
mesmo exercício.
138 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
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A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
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O Perfil da POTÊNCIA
m e c â n i c a
O
perfil da potência é basicamente a capacidade de exercer/demostrar “força” ao longo da
amplitude de um movimento articular (quer
dizer, durante um movimento articular específico ou
durante uma sequência de movimentos articulares).
Também é comum ser chamada de curva da potência. Este perfil ou curva é uma representação gráfica
da alteração na capacidade de tensão “bruta” desde o
início da amplitude, passando em cada posição individual, até o fim de uma amplitude de um exercício.
Existem vários fatores que influenciam as variações na “força”, que acontecem ao longo da amplitude
do movimento de um exercício específico.
Para um exercício uniarticular, estas incluem:
1. Capacidade Contrátil: A capacidade de produção de tensão da musculatura envolvida, que é
influenciada por:
• A relação comprimento-tensão. Isto é, a tensão
total = tensão ativa + tensão passiva;
• A fadiga dos músculos;
2. Mecânica Muscular: A composição dos braços do momento dos músculos envolvidos.
Exercícios multiarticulares apresentam uma variedade de situações mecânicas as quais devem ser
examinadas e incluem:
1. A influência da direção da resistência e sua
relação com as articulações em movimentos
multiarticulares.
2. Os efeitos na articulação devido à posição/
forças aplicadas nos extremos da amplitude.
Esta informação será valiosa para criarmos perfis estratégicos da resistência, permitindo-nos:
• Criar perfis complementares
ȖȖ Para complementar perfis da resistência
inadequados criados pelas limitações das ferramentas disponíveis para trabalharmos;
ȖȖ Para causar adaptações facilitadoras quando a fadiga é um fator;
d o
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• Avaliar o valor e quão apropriado é o perfil da
resistência de um exercício tradicional;
• Avaliar o valor e quão apropriado é o perfil
da resistência de um equipamento e quando
utilizá-lo em uma sessão de exercício ou para a
progressão de um cliente-paciente;
• Aprender onde e quando oferecer assistência
manual para otimizar o perfil de resistência durante as últimas repetições.
Perfil da potência uniarticular
As mudanças na força que parecem ocorrer
ao longo de um movimento uniarticular e em um
movimento da coluna são comumente avaliadas
isometricamente por meio da aplicação de carga
tangencial, isto é, a carga sempre é aplicada em
90° para o membro/tronco. Os testes isocinéticos possuem suas limitações, devido ao fato que
quando alguém se move a uma velocidade inferior um equipamento que é ajustada na máquina
(como é necessário acontecer quando a mudança
de direção acontece, isto é, parar a flexão e iniciar
a extensão), menos torque é registrado na máquina, mesmo quando o torque ainda poderia ser produzido internamente. O melhor exemplo é quando
no ponto da amplitude em que se para o movimento por completo, ainda há torque/capacidade
de produção de tensão que não são detectados por
equipamentos de testes isocinéticos ajustados para
qualquer velocidade que não seja zero grau por segundo (ou seja, estático).
Tipicamente, a curva da potência uniarticular
é uma curva Bell com maior probabilidade de ser
inclinada em direção à porção mais longa do músculo. O grau de fadiga/tensão passiva possivelmente
acentua ainda mais esta tendência. A seguir, temos
uma representação simples da potencial tendência
de uma situação de máximo esforço sem fadiga e
após fadiga. Obviamente esta representação não é
exata, apenas demonstra a tendência da relação.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
141
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
Nota A) O grau de “encurtamento” e “alongamento” em um músculo biarticular será afetado pela
posição de ambas articulações.
Nota B) O grau de “encurtamento” em um
músculo uniarticular será afetado pelo comprimento do antagonista biarticular por meio da
posição de outras articulações e da insuficiência
passiva [Fig. 101].
Fig. 102. Movimento da coluna se submete
a mudanças menos drásticas em seu perfil da
potência.
Fig. 101. Perfil da Potência em Movimentos
Uniarticulares é normalmente uma curva de
sino, bell curve. Tem uma tendência de ser
mais forte no extremo mais longo, aumentando sua força e sendo o ponto mais forte o médio e diminuindo quanto mais se aproxima do
extremo curto.
Perfil da potência em movimento da coluna
Aparentemente, a musculatura da coluna submete-se a alterações menos dramáticas no braço do momento nos extremos de amplitude, portanto parece
ser mais diretamente e consistentemente influenciada
pela curva de comprimento-tensão [Fig. 102].
Considerações
• O Perfil da Potência e o Perfil da Resistência não
são importantes quando a sobrecarga não é apropriada, isto é, quando a sobrecarga é muito baixa e
não há desafio (resistência efetiva), e quando a posição estática exigida no exercício não é mantida.
• Se somente uma pequena porção da amplitude
disponível é realizada, a amplitude deve ser comparada com aquela no final do gráfico.
• Quanto menor a amplitude, menores são as
mudanças no perfil da potência.
• Os comprimentos da musculatura biarticular
vão alterar o gráfico consideravelmente, mas o
formato será similar.
Perfil de potência de
EXERCÍCIOS multiarticulares
Movimentos multiarticulares não podem ser
examinados da mesma maneira. Eles são testados
por meio da aplicação linear de carga no movimento
142 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
m e c â n i c a
específico ou “exercício”. Isto cria um cenário muito
diferente onde o braço do momento da resistência é alterado durante a amplitude. Isso tem um papel dramático na aparência da habilidade durante a amplitude.
O perfil demonstrado a seguir representa um
exercício, ou movimento de empurrar, no qual a linha
da resistência se encontra distribuída entre o ombro
e o cotovelo (ou entre o quadril e o joelho) iniciando em baixo, ou na posição de flexão máxima, com
aproximadamente uma proporção da resistência e
do momento de 2:1 (ou maior) entre o proximal e
distal de ambas as articulações, respectivamente. Em
cima (final da fase concêntrica; porção mais curta da
d o
e x e r c í c i o
contração) a resistência está praticamente equilibrada
através dos membros e praticamente não existe momento da resistência para estas articulações. Portanto, aparentemente a sua força será maior em cima e
menor embaixo devido ao cenário mecânico de como
o sistema foi carregado (ver força estrutural e força fisiológica). Isso será alterado se a direção da resistência for alterada também.
Na verdade, se a resistência (linha da força) não
se posicionar entre as duas articulações quando estiver embaixo e não se alinhar com o membro em
cima, o perfil da potência vai se parecer mais com
um perfil uniarticular.
a.)
Fig. 103. Perfil da potência em exercícios de empurrar. A força vai parecer ser maior quanto
mais nos aproximamos do final da extensão dos membros (em cima). Isso ocorre devido à
diminuição progressiva dos braços do momento para todas as articulações ativas. Diminuição
do braço do momento diminui o torque, a resistência, deixando o perfil da resistência mais
leve em cima e mais pesado embaixo embaixo, o que faz com que no perfil da potência o
sistema perceba ser mais forte em cima e mais fraco em baixo (força estrutural).
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
143
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
Quando fadigado (ponto em que não há mais
habilidade para levantar a carga escolhida) neste
tipo de perfil de resistência citado, a curva é mais
significativamente inflexionada quando se aproxima do “topo/curto” do que “embaixo/longo”. Isso
possivelmente ocorre devido à influência da tensão
passiva embaixo e à “solitária” tensão ativa no topo.
No extremo do topo (travado) pode ser considerado “estruturalmente forte” devido a praticamente
não existir momento da resistência (o torque é mínimo), então a carga pode ser alta porque, nesta
posição, ela está sustendada pelos ossos e não pela
habilidade muscular.
Em um movimento de puxar (remada, por exemplo), em que a linha da resistência está praticamente
equilibrada dentro do braço quando ele está estendido, não existe momento da resistência nem na articulação do ombro, nem na articulação do cotovelo. No
final da fase concêntrica (porção em que o cotovelo
está em flexão) a linha da resistência está distribuída entre o ombro e o cotovelo com uma proporção
da resistência e do momento de 2:1, respectivamente,
(ou maior).
Portanto, sua força será aparentemente maior
quando o braço está estendido devido ao equilíbrio
dos momentos da resistência e à relação comprimento-tensão associada. A força vai diminuir significamente quando o braço flexiona e os momentos
da resistência aumentam quando os músculos estão
dramaticamente em suas porções mais curtas. Além
disso, a influência mecânica do músculo grande dorsal pode ser quase totalmente negada dependendo do
plano exato do movimento e do grau de extensão do
ombro alcançada [Fig. 104].
Nesta situação, ao fadigar, há uma queda mais
dramática no mesmo sentido da curva, devido à dramática perda da produção de tensão ativa (posição
mais encurtada), combinada com o aumento do momento da resistência (torque).
Fig. 104. Perfil da potência nos exercícios
de puxar. No início do movimento estamos muito “fortes”, devido ao braço do
momento ser zero. Quando o exercício
inicia, os braços de momento aumentam
progressivamente, deixando o perfil da
potência mais fraco.
Essas mudanças serão notáveis apenas quando for aplicada uma carga desafiadora. Se houver
compatibilidade com o perfil de resistência, haverá sensação de consistência entre habilidade/
carga, ao menos nas primeiras repetições (a não
ser que se consiga alterar o perfil de resistência
ao longo das repetições para atender às demandas
da fadiga).
A relação entre
Perfil de Potência-Resistência
Podemos considerar os exemplos acima como
força fisiológica versus força estrutural. A força fisiológica inclui questões que afetam as propriedades
contráteis de um músculo, como a relação comprimento-tensão, a fadiga e a mecânica muscular. A força estrutural seria o ponto potencial em uma amplitude em que o braço do momento da resistência alcança
ou se aproxima de zero, gerando assim um potencial
144 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
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d o
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maior de tolerância à carga (não necessariamente
resistência, apenas força aplicada). Nessa situação,
apenas a estrutura “resiste à força aplicada, uma vez
que, sem braço do momento, não há torque e, logo,
não há desafio para os músculos controlarem aquela
articulação.
Isto nos mostra por que não podemos considerar um perfil da potência sem também considerar um
perfil da resistência. Em essência, existe uma relação
potência-resistência que faz com que “nossa força”
(ou aparência de força) dependa de fatores internos e
também externos.
Então, para recapitular, um membro ou um sistema multiarticular é mais forte quando os membros
estão estendidos e a carga “entra” através do eixo longitudinal dos ossos (através dos ossos). Novamente,
isso não é devido à força muscular, sim aos comprimentos do braço do momento da resistência, que
nestas posições é insignificante, isto é, está equilibrado através das articulações. Este perfil será alterado
ainda mais em cada repetição devido à fadiga.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
145
Mecânica da Resistência:
Perfil da Resistência
m e c â n i c a
Por que é importante para um
fisioterapeuta estudar sobre resistência?
Por que um fisioterapeuta que utiliza o exercício
como ferramenta precisa entender as propriedades
mecânicas da resistência?
Estudar resistência tem uma abrangência muito maior do que somente analisar equipamentos.
Estudar resistência envolve a resistência manual, o
peso corporal quando usado como resistência, os
equipamentos de pilates, de musculação etc. Um
profissional que conhece as propriedades mecânicas
de cada ferramenta que utiliza, jamais recusa, condena ou descarta os equipamentos sem realmente
entendê-los. Este profissional consegue discernir e
usar a ferramenta correta no momento apropriado
para cada cliente-paciente individualmente.
Quando prescrevemos um exercício, estamos
aplicando uma força em uma estrutura e estimulamos a produção interna de força de um indivíduo,
d o
e x e r c í c i o
ou seja, a integridade neuromuscular, e para isso
é extremamente importante entender a influência
das forças externas na estrutura de nossos clientes-pacientes.
Por isso este estudo é tão importante!
Perfil da Resistência (PR)
Uma força não é resistência até que seja aplicada ao corpo e oposta por um músculo, dentro do
cabo de guerra em torno de uma articulação. Portanto, resistência é uma relação específica entre, pelo
menos, duas forças opostas.
Devido à estrutura e à função rotatória/axial das
articulações sinoviais, a resistência ao movimento
humano ou à posição é um torque criado em cada articulação no sistema de controle ativo, e ele é alterado
por qualquer mudança na sua:
1. distância perpendicular para cada articulação;
2. quantidade/magnitude de empurrar ou puxar.
Fig. 105. Perfil da resistência durante
o agachamento.
A posição de maior flexão, embaixo, é aquela
em que o braço do momento se encontra maior,
então neste ponto a resistência é máxima.
Na posição final, em extensão, em cima, os braços do momento diminuem, chegando a zero
no final, sendo o ponto de resistência mínima.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
147
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
Em praticamente todos os exercícios, a resistência varia ao longo da ADM, normalmente de maneira
não estratégica. O perfil da resistência é a representação gráfica dessas mudanças no torque à medida que
ocorrem durante a amplitude de movimento, ou seja,
PR = onde, na amplitude, é difícil e onde é mais fácil.
Por exemplo, durante um exercício de agachamento com peso livre [Fig. 105], onde é mais fácil em
cima e mais difícil embaixo.
Portanto, é vital que conheçamos todas as maneiras que a resistência é e pode ser manipulada. A
quantidade real de uma resistência em qualquer ponto da ADM não é de maneira alguma óbvia. É uma
função de todos os fatores mecânicos, as propriedades físicas da modalidade ou do equipamento, assim
como as situações envolvendo a aceleração/tempo.
É fundamental nos tornarmos mestres em manipular essas variáveis e, então, desenvolver uma
“estratégia para a resistência” com base no objetivo
deste exercício (O.D.E.) e, acima de tudo, os efeitos
combinados desses fatores nunca devem exceder a
habilidade de controle do indivíduo.
A manipulação estratégica do perfil da resistência é fundamental para alterar o resultado/adaptação
do exercício por meio do desafio muscular (padrão
de motor/recrutamento, ou seja, quais músculos são
necessários, quanta tensão terão que desenvolver) e
das forças articulares.
Importância no Exercício
O PR pode e deve ser estrategicamente criado e
modificado para se encaixar o máximo possível no perfil
da potência (PP), associado a cada exercício específico e
apropriadamente manipulado para cada cliente individualmente, levando em consideração a fadiga, patologias e os efeitos do descondicionamento físico.
O Perfil da Resistência (PR) são as mudanças da
resistência durante a amplitude do movimento no decorrer de um exercício. São os pontos onde é mais fácil
e onde é mais difícil e ele é baseado em dois fatores:
1. Mudanças na força (magnitude)
• CAM, resistência elástica, inércia (aceleração e
desaceleração), sistema de conexão (linkage system), manual (assistência, resistência) etc.;
2. Mudanças no momento
• O relacionamento entre a linha da resistência com as articulações envolvidas e como
ambas são afetadas pelas mudanças na direção da força, mudanças na posição, mudanças
no posicionamento etc.
Vamos analisar alguns exemplos do perfil da resistência utilizando o mesmo exercício e o mesmo
tipo de resistência e manipular a posição no espaço
para alterar o ponto da amplitude onde é mais fácil ou
mais difícil [Fig. 106 e Fig. 107].
A relação entre perfil da Resistência e
perfil da potência
1. O PR (perfil da resistência) pode ser criado
ou modificado para se encaixar no PP (perfil da
potência) para um exercício específico com praticamente qualquer ferramenta escolhida se o
profissional souber como manipular a física relacionada com os fatores abaixo:
a. Peso livre e cabos normalmente comprometem o PR para exercícios multiarticulares,
então o uso destas ferramentas é mais preciso
para exercícios/desafios uniarticulares;
b. Máquinas de musculação praticamente
manipulam somente a parte da magnitude do
PR. Máquinas de qualidade podem ser ótimas
para o início da série ou o final dela, mas devido às mudanças inerentes ao perfil da potência
nas primeiras repetições ainda sem fadiga e na
última repetição já com fadiga, a maioria das
máquinas exige a intervenção do profissional
para criar um cenário mecânico que acomode
para estas mudanças;
148 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
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BM
a)
b)
c)
Fig. 106. Abdução do ombro em pé.
a) Exercício de abdução do ombro na posição neutra. A linha da força está praticamente alinhada com
o eixo e o braço do momento é mínimo. Nesta posição, a resistência para o ombro também é mínima.
b) Ombro a 45º de abdução. O braço do momento aumenta progressivamente e nesta posição
a resistência aumentou consideravelmente.
c) Ombro a 90º de abdução. Esta é a posição de maior resistência dentro da amplitude deste exercício.
BM
a)
b)
c)
Fig. 107. Abdução do ombro em decúbito lateral.
a) Exercício de abdução do ombro na posição neutra. Nesta posição, o braço do momento é o maior, tornando esta posição de maior resistência dentro da amplitude deste exercício.
b) Ombro a 45º de abdução. O braço do momento aumenta progressivamente e nesta
posição a resistência aumentou consideravelmente.
c) Ombro a 90º de abdução. A linha da força está praticamente alinhada com o eixo e o braço do momento é praticamente zero. Esta é a posição de menor resistência para o ombro.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
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Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
c. Máquinas com design mecânico não tão
bem desenvolvido apresentam o maior obstáculo para encaixar a mecânica individual da
estrutura do cliente-paciente. Existem máquinas que invertem o PR em comparação ao PP,
o que torna quase impossível usar a máquina
para criar uma experiência mecânica na qual
seja possível gerar um estímulo apropriado
para o tecido contrátil. É necessário que o
profissional faça modificações no exercício,
na máquina e, às vezes, na posição do cliente
para tentar adquirir o melhor PR possível para
a melhor adaptação diante de um objetivo;
d. Qualquer movimento articular que aconteça em uma articulação que deve estar estática
vai eliminar a possibilidade de alcançar um
PR apropriado. Então, qualquer compensação
ou “roubo” vai alterar o cenário mecânico do
exercício;
e. Se o PR não for parecido com o PP vai ser
difícil manter as posições estáticas, a não ser
que o profissional pare o exercício quando for
necessário ou o cliente seja muito avançado e
consiga fazer ajustes estratégicos para terminar o exercício. Então um PR não apropriado
vai encorajar a “compensação”.
Considerações
Quanto menor for a amplitude usada durante
um exercício, menos drásticas são as alterações no
PR. Em outras palavras, porque o PR muda durante a amplitude, quanto menor a amplitude realizada,
menores são as mudanças que acontecem no PR ou
no PP.
Inversamente, quanto maior a amplitude de movimento em um exercício, maiores as mudanças nos
braços do momento da resistência para cada articulação envolvida, causando maiores variações no PR.
Além disso, amplitudes maiores estão normalmente associadas a movimentos mais rápidos.
Quanto mais abrupta for a aceleração e desaceleração da carga, maior será a magnitude da resistência,
e igualmente preocupante é a perda completa de resistência durante parte da amplitude devido à inércia.
Mesmo que uma máquina possua uma ótima engenharia ou que o PR tenha sido estrategicamente desenvolvido, nenhum perfil da resistência será ótimo
para a primeira repetição e também para a última devido à fadiga etc. Consequentemente, para solucionar
esta situação, existem pelo menos duas opções: “Ótimo + Manipulação” e “Amplitudes complementares/
com carga apropriada”.
Aplicação
Ótimo + Manipulação:
1. Criar um perfil da resistência ótimo para a primeira repetição e diminuir durante a série, ou seja,
criar um perfil quase ótimo para a primeira repetição que será modificado a cada repetição subsequente de acordo com a necessidade por meio de
assistência manual ou do uso de manipulação da
máquina dentro da amplitude média;
2. Criar um perfil da resistência ótimo para a última repetição e aumentar no início da série, ou
seja, o profissional vai criar um perfil quase ótimo
para a última repetição e este será modificado durante as primeiras repetições por meio de resistência manual.
Amplitudes complementares/com carga apropriada: completando o desafio.
Devido às limitações dos equipamentos (peso livre,
peso corporal, maioria das máquinas), múltiplos exercícios ou cargas deverão ser empregados para gerar um
desafio apropriado para toda a amplitude contrátil. Então, será necessário optar entre:
a. Realizar um exercício com amplitude
completa com a carga apropriada para os
extremos de amplitude;
b. Realizar um exercício com amplitudes
150 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
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limitadas com uma carga mais desafiadora
dentro destas amplitudes.
Exemplo: agachamento com pequena amplitude
em cima, zero a 45 graus com carga maior, complementado com agachamento mais profundo com carga mais leve.
Métodos para alterar
o perfil da resistência
1. Manipular a direção.
A direção da linha da força da resistência determina o comprimento do braço do momento da resistência e, consequentemente, o torque, alterando o perfil da resistência.
Nos exemplos das Fig. 108, Fig. 109 e Fig.
110, vamos comparar como a direção da resistência altera o perfil da resistência em movimentos iguais. Vamos analisar somente a
articulação do ombro.
2. Manipular a magnitude. É possível aumentar
ou diminuir a magnitude da resistência por meio
dos fatores abaixo e estes são os tópicos que nos
aprofundaremos nos capítulos a seguir:
Fig. 108. A direção da resistência altera a linha da força a qual determina o comprimento
do braço do momento e consequentemente o torque, alterando o perfil da resistência.
Nos exemplos a seguir (Fig. 108, Fig. 109
e Fig. 110), vamos comparar como a direção da resistência altera o perfil da resistência em movimentos iguais. Vamos
analisar somente a articulação do ombro.
O cabo nesta direção apresenta um braço
do momento menor do que no exemplo da
Fig. 109. Quer dizer, é mais “leve” do que
no exemplo da Fig. 109. No final da extensão ainda existe um certo comprimento do
braço do momento, o que indica que ainda
existe resistência nesta posição do exercício, porém, se comparado ao exemplo da
mesma posição na Fig. 109, o torque é
menor, então a resistência é menor. Porém
se comparado com a mesma posição na
Fig. 110 o torque é maior, então a resistência é maior. Podemos usar a mesma análise
para todas as outras posições.
BM
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
151
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
Fig. 109. O cabo nesta direção apresenta um braço do momento maior do que nos outros exemplos
(Fig. 108 e Fig. 110). Quer dizer, aqui o perfil da resistência é maior em todas as posições. O perfil da
resistência refere-se às alterações que a resistência sofre durante a amplitude. Verifique que as alterações do comprimento do braço do momento durante a amplitude da Fig. 108 são diferentes do que
na Fig. 109 e também diferentes do que na Fig. 110. Isso indica que a mesma posição pode ser mais
leve ou mais pesada dependendo do perfil da resistência.
BM
Fig. 110. O perfil da resistência utilizando halteres é exatamente o contrário do que nos exemplos anteriores usando os cabos. A direção da resistência neste exemplo é a gravidade.
O braço do momento diminui durante a amplitude. Neste exemplo, na posição final de extensão do
cotovelo, a linha da força está alinhada com o eixo e o braço do momento é zero, eliminando o torque
para a articulação do ombro nesta posição. Isso quer dizer que, nesta posição, diferente dos outros
exemplos, a resistência é a menor.
BM
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1. Manipulação do CAM;
2. Aumento e redução da inércia;
3. Adição de resistência com borracha/elástica ao
equipamento com massa:
ȖȖ Só funciona em exercícios de “empurrar”;
ȖȖ Pode aumentar a magnitude;
ȖȖ Pode descarregar;
ȖȖ Pode regular a inércia.
Exemplos de mudanças no perfil da resistência
durante a amplitude:
• Agachamento com peso livre possui quase zero
de resistência em cima e a resistência máxima (para
a carga escolhida) embaixo/no final da flexão.
• Qualquer exercício que utiliza “borracha”,
quando a borracha está totalmente estendida,
porém está encostada no corpo e sem distância
para os eixos de movimento, a resistência é praticamente zero.
• Balançar um kettlebell pode produzir uma quantidade enorme de resistência no ponto do arremesso inicial (início da fase concêntrica), mas tem praticamente zero de resistência durante a maior parte
da amplitude devido aos efeitos da inércia.
d o
e x e r c í c i o
10# não é 10# de resistência!
Os números no peso
não são indicação da resistência!
O peso em sua mão não é indicação
das forças em seu corpo.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
153
Mecânica da Resistência:
Direção
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Direção da Resistência e
a Criação de Oposição
Para que uma força se torne resistência, é necessário haver oposição. Então, precisamos distinguir o que
deve ser resistido ou oposto. Vamos abordar agora
várias maneiras em que a oposição pode ser gerada.
liberdade pode ser desafiada em inúmeros planos
por meio de inúmeras direções diferentes. Uma
articulação com somente um grau de liberdade
deve ser desafiada somente em uma direção de resistência, aquela disponível no plano de liberdade,
quer exista movimento ou não.
1. Gerando oposição a uma posição
• Existem 360° de desafios disponíveis no plano
perpendicular ao membro.
• O profissional pode iniciar o processo de decisão da criação do exercício com a definição de
qual dos “mantedores da posição” ele gostaria de
desafiar por meio desta posição estática e, a partir
daí, definir a direção da resistência que vai gerar
oposição [Fig. 111].
• A resistência irá afetar os recrutamentos musculares de TODAS as articulações de controle ativo.
• Existe uma relação direta entre a direção da resistência e os graus de liberdade das articulações
envolvidas. Uma articulação com três graus de
2. Gerando oposição a um plano de movimento específico
Para gerar oposição a um plano de movimento,
são necessários os seguintes fatores:
• Identificar o plano de movimento.
• Determinar quais músculos serão o foco do
exercício para agir e o quanto e em qual capacidade. Por exemplo, a flexão de ombro pode ser
realizada concentricamente pelos flexores do
ombro ou excentricamente pelos extensores do
ombro. O movimento não muda, mas a direção
da resistência sim.
• Alinhar o plano de movimento com a linha da
resistência (ou vice-versa) [Fig. 112].
Fig. 111. Gerando
oposição.
O profissional define qual musculatura quer desafiar e, a partir
daí, posiciona a direção da resistência em oposição às fibras
musculares a serem desafiadas.
Existem 360º de possibilidades.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
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Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
Linha de resistência para
o desafio excêntrico dos
“antagonistas”
Fig. 112.
PLANO DO MOVIMENTO
Linha de resistência
para o desafio
concêntrico
3. Gerando oposição por meio de diferentes
posições do corpo e a relação com a resistência
• Os exemplos a seguir indicam a mesma direção
de resistência, porém aplicada no corpo em diferentes posições no espaço [Fig. 113].
• As posições corporais são semelhantes, porém
foram alteradas no espaço para coincidir com a
direção de resistência. Esta realidade afeta o braço
do momento do centro de massa dos segmentos
do corpo, alterando o desafio associado com o
controle estático (ou seja, a estabilização).
• É importante visualizarmos que o desafio relativo ao ombro/cotovelo é o mesmo em todos
os exemplos, porém o desafio relativo ao quadril/
coluna é diferente em cada exemplo.
• Dentro de uma consideração sobre progressão, faz-se necessário entender que o primeiro
e o terceiro exemplos exigem o mínimo de estabilização ativa de tronco. Já os exemplos 2, 4
e 5 exigem mais estabilização ativa e devem ser
analisados individualmente.
Fig. 113. A direção da resistência em relação à articulação do ombro é a mesma
em todos estes exemplos. Porém, o desafio para as articulações do quadril e coluna são muito diferentes. A necessidade de
diferentes musculaturas estabilizadoras
e a quantidade de envolvimento delas é
muito diferente em cada exemplo.
156 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
m e c â n i c a
4. Gerando oposição para a “manutenção
de um plano” = Resistência fora do plano de
movimento
O desafio para a capacidade de manter um plano de movimento é muitas vezes criado inadvertidamente devido à falta de compreensão
de oposição ao movimento. Um exemplo inclui o crucifixo em pé com halteres. Também
o exercício para o manguito rotador realizado
em pé com haltere, enquanto o úmero é mantido ao lado do tronco e cotovelo flexionado
a 90°.
d o
e x e r c í c i o
participar em ambas as funções). Os exemplos a
seguir estão representando os planos de rotação do
tronco e vamos analisar como a aplicação da resistência afetaria a participação muscular.
a)
b)
Linha de
resistência
PLANO DO MOVIMENTO
PLANO DO MOVIMENTO
Fig. 114.
Os músculos desafiados para manter o plano
não estão trabalhando isometricamente, eles
estão mudando o comprimento, porém não estão sendo desafiados como aqueles se opondo à
resistência.
5. Gerando oposição para um pouco de ambos
• É necessário determinar o grau em que a resistência se desvia do plano estrategicamente. Resistência
fora do plano de movimento requer uma compreensão do grau em que a resistência está fora do plano e
quais serão seus efeitos (ou seja, quem será desafiado
como “mantedor de plano”?). Quanto mais longe do
plano de movimento a resistência for direcionada,
menos serão desafiados os músculos “movedores” e
mais desafiados serão os mantedores do plano (embora exista a probabilidade de haver certo grau de
sobreposição, como alguns músculos que podem
Linha de
resistência
Fig. 115.
• Não confunda o gráfico anterior com resultantes. Resultantes começam com duas forças.
Acima, temos exemplos de uma força que cria
dois efeitos com base no fato de que o plano de
movimento é mantido como incongruente com
a linha de resistência.
• Na aplicação prática, a linha de resistência de
um cabo ou elástico mudaria a sua contribuição
para cada componente, de acordo com a mudança em seu ângulo em relação ao plano de
movimento durante a ADM. Portanto, se uma
determinada quantidade de “resistência para
movimento” ou “resistência para a manutenção
do plano” for desejada, a utilização de duas fontes independentes pode servir melhor.
• Só porque temos todas essas opções, não significa que todas são boas. Temos que entender
as implicações de cada opção em cada situação.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
157
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
6. Direção e os eixos: o Braço do Momento da
Resistência
Quanto mais próximo à linha da força (da resistência) estiver de uma articulação, menos
torque produz, por conseguinte, menos tensão
muscular/torque é necessário para responder à
demanda. Em essência, isso determina o que é
desafiado e quanto.
Quando a linha de força cai dentro do eixo, o
braço do momento é zero. Por isso, aquela força
gera zero de torque e não tem efeito sobre o movimento de rotação, porque é “equilibrada” no
meio da articulação.
Laboratório de Braço do Momento
A realidade mecânica dos exercícios indica
que existe um Braço do Momento da resistência para TODA e CADA articulação controlada ativamente.
• Identificar como o Braço do Momento para
cada articulação do movimento muda ao longo da amplitude.
ȖȖ Examine como o mesmo exercício pode
ter mais ou menos resistência em várias articulações, simplesmente alterando a posição
do cabo e assim alterando o Braço de Momento. O posicionamento do braço diante do
cabo afeta o Braço de Momento [Fig. 116].
ȖȖ Identifique formas de estrategicamente influenciar o BM para articulações específicas de
movimento(s) em pontos específicos na amplitude, enquanto mantém praticamente o mesmo
perfil da resistência e os músculos de oposição.
Por exemplo, o exercício de supino (adução horizontal do ombro com flexão e extensão de cotovelo) com haltere quando os extremos do haltere
alteram a distância da linha da força da resistência
para “dentro” e para “fora” do cotovelo [Fig. 117].
ȖȖ Estrategicamente, influencie o BM para a
articulação em movimento(s) específico(s),
em pontos específicos na variação, alterando
os músculos que estão em oposição de uma articulação. Por exemplo: o crucifixo x o supino
com halteres.
Fig. 116. Comparando os exemplos a) e b), os braços do momento para a articulação da coluna,
ombro e cotovelo aumentaram no
exemplo b.). Isso indica que neste exemplo a resistência é maior
para todas estas articulações.
a)
b)
158 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
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Fig. 117. a) Os halteres estão exatamente sobre a articulação do cotovelo e a linha da força está equilibrada com o cotovelo e o braço do momento é zero
para o cotovelo, porém X para o ombro.
b) Os halteres estão posicionados mais medialmente à articulação do cotovelo e a linha da força está caindo entre a articulação
do cotovelo e ombro, gerando um braço do
momento para o cotovelo. Este torque está se
opondo ao torque gerado pelos extensores do
cotovelo. Para o ombro, o braço do momento diminuiu comparado ao exemplo a), então
a resistência para o ombro também diminuiu.
c) Os halteres estão posicionados mais lateralmente à articulação do cotovelo. A linha da
força está caindo para fora da articulação do
cotovelo, gerando um braço do momento para
o cotovelo, do mesmo comprimento do exemplo b.), porém em direção oposta, e agora este
torque está se opondo ao torque gerado pelos
flexores do cotovelo. Para o ombro, o braço do
momento aumentou comparado ao exemplo
a) e b), então a resistência para o ombro também aumentou.
a)
b)
c)
• Verifique que existe um braço do momento
para cada articulação de controle ativo e também para aquelas articulações que estão estabilizando. No exemplo a seguir, um exercício de
flexão de ombro [Fig. 118].
• Um cabo tem uma influência diferente de que
quando a “massa” é aplicada diretamente no
membro como resistência. A direção do cabo é
influenciada pela posição da polia e não é sempre vertical como a gravidade. Verifique que a
mudança de direção do cabo afeta as oportunidades de influência na amplitude e no perfil
da resistência diferente de quando usamos um
halter contra a gravidade. Os pontos de maior e
menor resistência durante a amplitude do movimento são diferentes quando utilizamos halter
ou cabos. Para distinguirmos onde, na amplitude, a resistência é maior ou menor, é necessário
localizarmos os braços do momento para cada
posição articular [Fig. 119].
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
159
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
a)
Fig. 118. Durante a extensão do ombro, o braço do momento aumenta
tanto para o ombro quanto para as articulações do
tornozelo, joelho, quadril,
coluna e cotovelo (articulações de controle ativo).
b)
Fig. 119. a) Na abdução do ombro com halter, a posição de maior resistência é a de 90º.
b) Na abdução do ombro com cabo (posicionado nesta direção), a posição de maior
resistência é entre os ângulos de 65º e 75º.
160 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
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Utilização de cabos e
a influência do Centro de Massa
É essencial reconhecermos quando um cabo
muito leve ou uma borracha perde o braço do momento, quando o braço do momento do centro de
massa do membro aumenta e o cabo se torna assistência ao músculo que está se opondo.
Fig. 120. Exercício de extensão de
quadril com o objetivo de desafiar o glúteo máximo (e todos os
extensores do quadril) utilizando
cabo, como no pilates. A direção
do cabo se opõe corretamente
ao tecido do glúteo máximo, porém, se a resistência da massa da
perna se tornar maior do que a
resistência oferecida pelo cabo, a
extensão de quadril se torna desafiadora para os flexores de quadril
e não mais para os extensores. E
a resistência do cabo passa a oferecer assistência para extensão do
quadril.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
161
Magnitude:
Explorando as
Propriedades da Resistência
m e c â n i c a
M
agnitude é sinônimo de quantidade. Então, a magnitude da resistência é a quantidade de força aplicada. Porém, a quantidade de força é somente metade do que cria o torque da
resistência. Também vamos aprender que, devido às
diferentes propriedades físicas de cada equipamento
que utilizamos para criar resistência, a magnitude
pode mudar durante a amplitude.
Não são somente as alterações no peso real aplicado que alteram a magnitude da resistência, as propriedades do próprio equipamento também alteram
a magnitude da resistência. Em outras palavras, aumentar de 10 para 15 kg irá aumentar a magnitude,
mas outras propriedades podem aumentar ou diminuir os 10 kg (podendo chegar até 0) apenas movendo o equipamento.
Cada equipamento, modalidade ou ferramenta
oferece diferentes oportunidades de manipulação da
resistência.
d o
e x e r c í c i o
Esse pensamento de que peso e massa são iguais pode
trazer mal-entendidos durante a análise e criação de
exercícios porque o conceito de massa será essencial
para o entendimento do conceito sobre a resistência
escondida.
Massa é a quantidade de matéria que compreende um objeto. Em essência, massa representa a inércia de um objeto.
Massa e peso não são a
mesma coisa.
Inércia é a resistência à mudança
Inércia é a tendência de um objeto de resistir a
uma mudança no seu estado atual de movimento.
Se não houver movimento ou se houver movimento
retilíneo uniforme, o objeto quer continuar fazendo
o que está fazendo atualmente.
Primeira Lei de Newton: “Um corpo vai permanecer em seu estado de repouso ou de movimento uniforme (linha reta, velocidade constante), a
menos que seja obrigado a mudar aquele estado por
forças aplicadas nele”. Anteriormente denominado
um estado de inércia por Galileu, esta lei da inércia,
basicamente, representa objetos em equilíbrio e seu
“desejo” de permanecerem inalterados.
A inércia não é uma força. A inércia é uma
propriedade da massa e está sempre presente em
uma representação da quantidade de massa em si.
A inércia não vem e vai, aumenta ou diminui, a não
ser com uma alteração na quantidade de massa em
si. A sua expressão está diretamente relacionada
com o grau de alteração/força aplicada sobre a massa. Quanto maior for a alteração na força aplicada,
maior será a expressão da inércia.
Massa
Talvez você tenha aprendido ou pense que massa
e peso são a mesma coisa, porque neste planeta a gravidade é uma constante. Porém, isso está incorreto
porque no espaço temos massa, mas não temos peso.
As implicações no exercício
O entendimento dos efeitos potenciais da massa e da inércia são enormes no exercício. O peso de
um objeto é medido estaticamente em uma balança.
Porém, os efeitos da inércia são independentes dos
efeitos da gravidade. A inércia influencia a magnitude da resistência por meio da aceleração da massa. A
Peso
Peso é a gravidade agindo sobre um objeto.
Peso = massa x gravidade (F = ma). Novamente,
a quantidade de peso por si só não é indicação da
força total de resistência.
Perspectiva: Neste planeta, não mudamos a
quantidade de gravidade para aumentar o peso, então estamos mudando a quantidade de massa.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
163
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
inércia também pode aplicar uma direção de resistência diferente daquela aplicada pela gravidade na massa do mesmo objeto, pois estas podem não coincidir
(ver a Segunda Lei de Newton).
A massa, a inércia e a aceleração podem adicionar resistência (a “resistência oculta”) no início de
uma contração concêntrica, dependendo da aceleração, ou no final da contração excêntrica, dependendo
da desaceleração.
A inércia também pode diminuir a resistência,
ou seja, tornar-se assistência, após a conclusão da
concêntrica ou durante a maior parte da amplitude
(por exemplo, um arremesso durante um levantamento do peso, quando 400 libras por um breve momento não pesam nada).
A inércia pode proporcionar resistência em
qualquer direção, incluindo horizontal, dependendo
da direção da aceleração, como durante um exercício
usando uma medicine ball quando movida horizontalmente. Devido à inércia, a direção da resistência
vai criar uma resultante quando combinada com a
direção da gravidade, que será a direção momentânea
da resistência.
A inércia influencia o exercício no início da
aceleração e no final na desaceleração da massa.
Sendo assim, potencialmente o que quer que inicie
o movimento do peso é responsável por vencer a
maior parte da resistência da inércia. Então, o controle sobre a sequência dos movimentos articulares
torna-se crítico.
Por exemplo, durante um exercício de flexão
do cotovelo (rosca bíceps) com 100#, se o movimento iniciar com qualquer outra articulação,
como o quadril e joelho, estas musculaturas foram
as responsáveis por vencer a inércia, reduzindo o
desafio para os flexores do cotovelo. Para que o
desafio seja para os flexores do cotovelo, é necessário que estes iniciem e parem o movimento.
Então, é extremamente importante que possamos
identificar qual é o objetivo deste exercício e que
o exercício seja monitorado constantemente durante sua execução.
A inércia é uma das maiores influências na resistência. Devido à forma como a maioria das pessoas
desloca o peso, a resistência e a assistência da inércia
são as principais influências nos exercícios.
Massa, força e
mudanças na velocidade
Velocidade de execução do exercício
Em última análise, não é a velocidade que importa, porque a velocidade é, por definição, uma
constante. É a aceleração e a desaceleração que
são fundamentais. Além disso, na física não existe
o termo “desaceleração”. A aceleração é simplesmente dividida em aceleração positiva e negativa.
Mas, devido ao fato da indústria do exercício automaticamente relacionar positivo e negativo com
concêntrico e excêntrico, usaremos o termo leigo
“desaceleração”.
Não é a queda que mata...
é a aterrisagem.
Segunda Lei de Newton: “A taxa de tempo de
mudança no movimento de um objeto é proporcional
à força resultante (resultado líquido das forças) agindo sobre ele e inversamente proporcional à massa do
objeto. A mudança é feita na direção da linha reta em
que a força é aplicada”. “A força é um agente de mudança.” Esta é a lei da aceleração.
164 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
m e c â n i c a
No próximo nível de estudos, exploraremos outros fatores que influenciam a magnitude da resistência, como: momento, impulso, energia cinética e
fricção. Porém, neste nível optamos por não abordar
estes fatores, pois exigem uma coompreensão já estabelecida dos fundamentos básicos da resistência.
Outras formas DE resistência
Outras formas de resistência e como suas respectivas propriedades afetam a magnitude da força externa?
Pneumática
Refere-se à utilização de ar pressurizado como
resistência. Este tipo de equipamento evita as propriedades da inércia oferecida pela gravidade e os
incrementos da progressão podem ser mínimos.
Normalmente, estes equipamentos oferecem tanto
resistência concêntrica quanto excêntrica e possuem
perfis da magnitude específicos devido às mudanças
na pressão do ar durante a amplitude e também devido à mecânica interna da própria máquina.
Hidráulica
Refere-se ao uso de fluido comprimido em um
cilindro como forma de resistência. Estes não oferecem resistência excêntrica e são considerados uma
resistência acomodativa.
Aquática
É uma resistência acomodativa – quando paramos de mover a resistência, deixa de existir. O
formato, área de superfície de contato e ângulo
do objeto movido são relevantes na determinação
da resistência. A água como propriedade de resistência oferece muitos benefícios, como flutuação,
resistência omnidirecional, e pressão hidrostática para membros inferiores, mas também oferece
muitas limitações. Ela não oferece sobracarregamento no retorno excêntrico (a não ser quando a
flutuação de um objeto é usada, a qual é dependente
d o
e x e r c í c i o
de direção e movimento). Por mais que na água o
exercício pareça usar a amplitude de movimento
completa, ele só tem resistência em uma direção e
não oferece resistência quando o movimento para
no final das amplitudes.
As propriedades de resistência elástica
Elasticidade é definida como a propriedade pela
qual um material resiste e se recupera da deformação
produzida pela força, ou seja, capacidade de retornar
ao estado original após a deformação (tensão; deformação - ceder - retorno).
O aumento da deformação leva ao aumento
da produção de tensão, mas isto é somente um
dos aspectos que influencia a resistência. É necessário adicionar o comprimento do braço do momento para analisar o que está acontecendo com
a resistência durante a amplitude do movimento.
Os exemplos de resistência elástica incluem as
borrachas (theraband) e as molas (equipamentos
de pilates).
Tensão
Como as borrachas possuem pouca massa, o
valor delas é desconsiderado e as forças relacionadas à gravidade/inércia são virtualmente insignificantes (exceto para a massa do membro/corpo propriamente dito).
Na Fig. 121 observa-se que:
1) Borracha mais leve. Conforme ela se estende,
a resistência aumenta.
2) A quantidade de aumento da tensão diminui
à medida que o diâmetro diminui.
3) Conforme chega ao seu limite de elasticidade, a resistência aumenta dramaticamente e de forma
desproporcional.
4) O próximo nível de espessura da borracha,
no mesmo comprimento, pode oferecer mais do que
duas vezes a tensão da borracha anterior.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
165
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
Fig. 121. Este é um gráfico que identifica que
o desenvolvimento da
tensão não é linear durante o percurso da deformidade da borracha.
5) Usar duas unidades de borracha menor. Se
a borracha maior era mais do que o dobro de tensão do que a média, duas unidades da menor podem proporcionar um aumento na resistência de
forma mais adequada e, subsequentemente, podem
oferecer um maior comprimento de borracha para
ser trabalhado. Duas borrachas podem também
permitir uma maior variação mecânica, a resultante
não só oferece um perfil de resistência melhor, mas
também aumenta potencialmente a possibilidade de
incrementos menores para a progressão.
Ajuste de tensão
Ajustando o comprimento da borracha para
ajustar a tensão: entendendo o “percentual de deformidade”.
Além da utilização de borrachas mais grossas ou
de duas unidades mais finas, há duas outras opções
para alcançar a tensão inicial desejada:
1. Afastar-se do ponto de ancoragem até que a
tensão desejada seja atingida;
2. Alcançar a mesma tensão sem se afastar do
ponto de ancoragem, enrolando o comprimento
indesejado na mão.
Estes dois pontos criarão dois perfis de tensão
muito diferentes na amplitude de movimento. Se a
amplitude de movimento requer 30cm de deformação linear da borracha, isto é muito menos dramático para um comprimento inicial de 16cm do que
será para um comprimento inicial de 6cm. No primeiro, a mudança na tensão será fracionada e bem
distribuída durante a amplitude; no segundo, a tensão pode dobrar.
Porque as borrachas não são um tipo de resistência baseada na massa, elas não sofrem influência da
inércia, isto é, elas são livres de inércia. Sendo assim,
são equipamentos nos quais o trabalho de aceleração
e velocidade são mais apropriados.
166 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
m e c â n i c a
a magnitude sozinha
não determina a
quantidade de resistência!
A influência da engenharia das máquinas
na magnitude da resistência
A mecânica da resistência também envolve
o estudo e análise dos equipamentos como máquinas de musculação, de pilates etc. Este é um
d o
e x e r c í c i o
estudo extenso que demanda mais tempo e aprofundamento para sua abordagem. Por este motivo, neste momento vamos explorar somente dois
fatores mecânicos relacionados às máquinas e que
influenciam a resistência e são apropriados para
este nível.
As máquinas podem mudar a magnitude da resistência ao longo da amplitude de deslocamento linear do peso, por meio da simples mudança no braço
do momento, o que afetará a distância relativa deslocada da pilha de peso [Fig. 122].
Fig. 122. Deslocamento linear do peso e o comprimento do braço do momento.
O braço do momento da resistência altera durante a amplitude. Nesse exemplo, com o cabo
se aproximando do eixo da articulação do joelho, o braço do momento da resistência diminui
durante a extensão do joelho.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
167
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
CAMs
CAMs foram criados para oferecer um grau
estratégico de manipulação do momento da força.
A maioria dos CAMs é utilizado para influenciar o
momento da resistência, na tentativa de criar um
perfil da resistência compatível com o perfil da potência. Quanto mais distante do eixo o cabo é movido, maior a resistência [Fig. 123].
Cada máquina projetada para uma finalidade
diferente deve ter um CAM diferente. O desenvolvimento de um CAM perfeito é um desafio, porque há
muitas considerações a serem feitas, como a fadiga,
velocidade, força fisiológica e força estrutural.
Um CAM da potência manipula o momento da
potência/esforço ao invés do momento da resistência, mas trabalha para atingir o mesmo efeito de um
CAM da resistência (isto é, pode deixar o movimento progressivamente mais difícil, diminuindo a vantagem mecânica da sua força de entrada ao longo da
amplitude).
Fig. 123. Este é um exemplo de CAM que
são muitas vezes encontradas nas máquinas
de musculação. Nesse exemplo, quanto mais
o braço da máquina se move, mais afasta a
linha da força do eixo, aumentando o braço
do momento durante o trajeto.
168 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
m e c â n i c a
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A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
169
Mecânica da Resistência:
Posicionamento da Carga
m e c â n i c a
Ponto de Aplicação
Posicionamento da carga, isto é, distância do
ponto de aplicação da carga em relação ao eixo. O
posicionamento da carga vai influenciar a resistência
e o resultado final nas articulações, as forças articulares, através do momento para cada um dos eixos
envolvidos e da inércia rotacional.
Momento
A alteração da posição (ponto de aplicação) de
uma carga (seja uma força externa da resistência ou a
alteração no CdM do membro via alteração na posição da articulação) em um membro irá alterar o comprimento da alavanca, que, por sua vez, irá alterar o
braço do momento (exceto para os pontos na amplitude em que o momento é igual a zero).
Porém, além do posicionamento da carga
influenciar diretamente o momento da resistência, quando utilizamos a massa como resistência,
o posicionamento tem efeitos potenciais sobre a
magnitude como resultado da inércia.
d o
e x e r c í c i o
Inércia rotacional
É necessário examinarmos o efeito combinado
do movimento rotatório com uma massa aplicada a
uma certa distância do eixo (torque) e a massa. A lei
da inércia é baseada no movimento linear, porém,
quando aplicamos uma carga e esta se move em rotação, é necessário reexaminar a influência da inércia.
A inércia rotacional é a inércia de um objeto em
movimento em torno de um eixo e é influenciada pela
distância da aplicação do objeto para o eixo. Inércia
rotacional = massa x raio ao quadrado (I = mr2). Basicamente, isto significa que o peso não afeta a inércia
tanto quanto a sua distância do eixo [Fig. 124].
Cada ponto na alavanca se move à mesma distância angular, medida em graus, e com a mesma
velocidade angular. Porém, podemos ver claramente que cada ponto da alavanca se desloca a uma
distância linear diferente a partir do seu ponto de
partida (m1 se desloca em uma distância menor do
que m2). Porque cada ponto (m1 e m2) se desloca
a uma distância diferente dentro do mesmo período de tempo – quanto mais longe um ponto está do
eixo, mais rapidamente está se movendo em relação
ao ao espaço tridimensional.
Fig. 124. Inércia rotacional
Im1=mr2, porém
Im2 = m(2r)2 = 4mr2
Então, a inércia de m2 é
4 vezes maior do que de m1.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
171
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
A inércia rotacional varia pelo quadrado do
raio. Isso quer dizer que quando um objeto é posicionado mais distante do eixo, é necessário uma
maior aceleração para movê-lo, e sua inércia impõe
uma maior resistência que corresponde a essa mudança (aceleração) que foi significativa. Portanto,
se a carga for mantida constante, mas for colocada
duas vezes mais distante do eixo, a sua inércia será
exponencialmente maior (quatro vezes maior). Assim, a força necessária para iniciar e/ou parar o peso
será exponencialmente maior.
Para fins de exercício, normalmente não conseguimos posicionar o mesmo peso ao dobro da distância da articulação, porque o aumento da resistência
seria muito significativo (o dobro do comprimento
do braço do momento). Um exemplo desta situação
é o peso usado em um exercício como o supino e o
peso usado em um exercício de crucifixo. Para suprir essa diferença, usamos cerca da metade do peso
quando dobramos a distância. Isto altera a equação
consideravelmente quando comparada com o exemplo acima, em que o mesmo peso foi utilizado em ambas as posições. Mas, mesmo com a metade do peso a
inércia ainda é maior. Assim, quando o peso é cortado ao meio, mas a distância é dobrada, a nova inércia
rotacional é o dobro da inércia original (isso não é
tão ruim quanto as quatro vezes acima, mas ainda é o
dobro da dificuldade para iniciar e parar) [Fig. 125].
Fig. 125. Im1 = mr2, porém
I1/2m= ½m(2r)2 = 2mr2
Então, a inércia de ½m é
2 vezes a inércia de m.
b)
a)
Fig. 126. Inércia rotacional
O posicionamento da carga na posição a) é o dobro da distância do posicionamento da carga na posição b).
O peso dentro do trajeto a) do crucifixo se desloca o dobro da distância que o peso dentro do
trajeto b) do supino.
172 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
m e c â n i c a
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e x e r c í c i o
Normalmente, durante um crucifixo com haltere,
acomodamos as demandas desta maior força, acelerando a carga em um ritmo mais lento do que quando usamos uma carga proporcional posicionada mais próxima
ao eixo, caso contrário, seria muito difícil mover a carga
se a mesma força de aceleração fosse aplicada. A grande questão, no entanto, é quão rápido o haltere está se
movendo quando chega a hora de parar, porque é nesta
posição que a inércia rotacional mais influencia o exercício, deixando muito difícil parar o peso [Fig. 126].
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
173
Mecânica da Resistência:
Centro de Massa
m e c â n i c a
A
gravidade atua em todas as partes de um
objeto e o seu ponto de aplicação no objeto como um todo é considerado o centro de
massa daquele objeto, tornando-se o centro de gravidade (CDG). Então, na verdade, centro de massa e
centro de gravidade são na essência os mesmos, mas
o centro de massa existe mesmo quando a gravidade
não está presente.
O centro de massa (CdM) de um objeto é o centro de distribuição da sua massa e ele não é determinado pelo centro geométrico do objeto. A massa de
um objeto é composta da massa de cada parte dele,
assim cada segmento do corpo possui o seu CdM respectivo quando analisado independentemente. Porém, quando combinados, estes determinam o CdM
do corpo todo.
Existem princípios essenciais sobre o centro de
massa de um objeto para aplicação nos exercícios.
1. O centro de massa do corpo na posição
anatômica só é relevante quando o corpo está
e x e r c í c i o
na posição anatômica! Uma vez que a posição
ou o cenário mecânico é alterado, o centro de
massa indicado na posição anatômica já não
será mais o mesmo.
2. O centro de massa pode ser alterado pelas mudanças na forma do objeto por meio da mudança
de posicionamento do corpo no espaço.
• Existem posições em que o CdM se localiza
fora do corpo [Fig. 127].
3. O CdM pode ser alterado pelo posicionamento de carga externa.
• O percentual de massa adicionada comparada
com a massa do corpo e o seu posicionamento vai
influenciar o quanto o CdM é alterado.
4. O CdM do corpo e o CdM para o exercício.
O CdM para um exercício é relativo somente à
porção do corpo agindo como resistência em
uma articulação específica (isto é, refere-se somente à massa sustentada ou suspendida por
uma articulação específica).
Fig. 127. a) O CDG do corpo
humano se encontra aproximadamente no nível de S2, e
anterior ao sacro.
b) A localização do CDG da porção superior do tronco e dos segmentos dos membros inferiores.
c) A reorganização dos segmentos produzem uma nova combinação do CDG.
sacro
CDG
a)
d o
b)
c)
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
175
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
O centro de massa para um exercício
O CdM para um exercício é baseado na porção
do corpo que está agindo como resistência. Exemplo:
o CdM da porção que está na verdade sendo “levantada” durante um agachamento será mais alto do que
quando em pé ou durante um agachamento completo
porque os pés e a perna não seriam considerado resistência. Na realidade, o CdM sendo levantado é diferente para cada articulação, baseado na massa/forma
que está acima daquela articulação. Adicionar carga
externa vai alterar ainda mais a posição do CdM.
Este fato é mais fácil de ser visualizado quando
elevamos o braço e realizamos um agachamento. Se
analisarmos a articulação do ombro quando elevamos o braço, o tronco e as pernas não fazem parte da
resistência para a articulação do ombro. Assim também é com o pé durante um agachamento [Fig. 128].
1. Para o agachamento, o CdM combinado que
está sendo levantado não inclui o pé, e quando estamos analisando a musculatura do quadril e joelho não devemos incluir a perna.
2. Na realidade, a resistência para cada articulação é determinada somente pelo CdM acima dela.
Fig. 128. Uma articulação, ou uma
musculatura, só é responsável por
levantar o que está acima dela.
Quando analisamos a articulação do tornozelo e sua musculatura durante um
agachamento, consideramos o CdM de
todo o corpo acima desta articulação.
Quando analisamos a articulação do joelho e do quadril e sua musculatura, consideramos o CdM do corpo acima dela.
Quando analisamos a articulação do quadril e sua musculatura, consideramos o
CdM acima dela.
176 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
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A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
179
o
começo
o
começo
continuum
do
e x erc í cio
O Que é Função
c o n t i n u u m
Função e a Estrutura
A popularidade do “exercício funcional” trouxe o termo função para a vanguarda da indústria do
exercício, e “função” é normalmente visto como algo
“que você tem que fazer no trabalho, na vida diária ou
no esporte”. Mas será que nossa capacidade funcional
é determinada por escolhas, desejos e objetivos? Ou
será que ela é baseada na maneira como algo funciona? O que determina a maneira como algo funciona?
A influência da estrutura
O que determina como uma dobradiça funciona é a sua forma/estrutura. Se escolhermos dobrá
-la para o lado contrário de sua estrutura original
corremos o risco de quebrá-la, no entanto, a nossa
escolha não altera a sua função original. O que determina como um carro funciona é a estrutura dele.
Um carro esportivo foi construído com materiais
específicos que toleram alta velocidade em uma
pista lisa, porém não toleram terreno íngreme. Se
decidirmos dirigi-lo fora da estrada, em uma trilha
off-road, por exemplo, isto não o torna uma camionete, ele sempre será um carro esportivo.
O livro Joint Structure and Function de Norkin e
Levangie afirma que:
“Existe uma forte interrelação entre a estrutura e a função.”
“Estrutura, quando predeterminada, determina a função.”
Como a estrutura do corpo humano é predeterminada, isto é, não temos como escolher o formato
dos nossos ossos nem das nossas articulações, é a
estrutura que determina a função. Função NÃO é
determinada aleatoriamente. No entanto, nossas
escolhas influenciarão a estrutura. Elas poderão
alterá-la tanto positiva quanto negativamente.
d o
e x e r c í c i o
Mas o que é função?
Segundo o Dicionário da Língua Portuguesa
Michaelis, a palavra “função” possui dois significados.
Função:
1. Ação de um órgão, aparelho ou máquina.
2. Atividade especial, serviço, encargo, cargo,
emprego, missão.
Esses são dois significados distintos para função,
o primeiro refere-se ao funcionamento específico das
partes, já o segundo refere-se ao funcionamento global, específico da atividade.
A palavra “performance” significa desempenho,
quer dizer, o quão bem ou mal algo funciona ou trabalha. Então, para identificar a função a qual nos referimos
quando tratamos do sistema neuromusculoesquelético,
vamos classificá-la como performance interna.
Performance interna indica a função descrita
no primeiro significado, a função básica neuromusculoesquelética, responsável pelo funcionamento da
articulação a cada grau de movimento, garantindo
sua integridade. Função é determinada pela estrutura, mas também pelos processos e suas interrelações
com ela. O propósito de todos os sistemas corporais
é de utilizar, apoiar e manter a estrutura.
Logo, performance interna (função) é determinada pela:
1. Estrutura articular (função articular);
2. Estrutura muscular (função muscular);
3. Função sensorial;
4. Capacidade de gerar tensão (output, capacidade
do músculo em gerar tensão em cada articulação).
Exercícios criados para a otimização e desenvolvimento da performance interna têm o foco nos quatro fatores mencionados acima.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
185
PERFORMANCE INTERNA
TEM?
ESTADO OPERACIONAL DOS
COMPONENTES INTERNOS
Nível de função disponível (sem ser tendencioso)
Não é especí co a uma atividade
Função Neuromusculoesquelética Básica.
Ex: ADM, estabilidade...
são PE determinadas pela PI
Visão interna da ADM. As partes essenciais
que devem estar funcionando/operacional.
In uenciam e determinam a ADM.
QUANTIDADE
NÍVEL DE FUNÇÃO
ADCCD
Função
Muscular
Pro
pr
ioc
ep
çã
PR
OP
RIE
DA
DE
S CONT
RÁTEIS
E
RIM
P
OM
POR C
adequado dos muitos
dispositivos sensoriais
que nos dizem onde
nosso corpo está e seu
estado (incluindo, mas
indo além da
propriocepção).
NT
Tensão
output por comprimento
SISTÊMICA? LOCAL? IMEDIATA? TARDIA?
n
Se
s
o
o e Dispositiv
Funcionamento
O
s
Po
içõ
eis
v
í
es
n
A r ti
culares Dispo
Deve ter o su ciente em cada
posição articular para controlar a
ADMA, depois o su cinete para
atender a qualquer demanda
[versus força].
Função
Sensorial
PERCEPÇÃO
ia i
s
ADPAD
TOLERÂNCIA = LIMIAR DO STRESS
so
r
Função
Articular
ten
são
+ percepção + intenção
NÍVEL DE COSTUME? PATOLÓGICA?
Todos possuem «campos minados» prontos para serem detonados
Fig. 129.
c o n t i n u u m
d o
e x e r c í c i o
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
187
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
Performance externa indica a função descrita no
segundo significado, aquela responsável pelo resultado
final da integração de todas as partes internas somada
a uma habilidade específica para uma tarefa ou atividade específica (como correr, levantar e sentar, trabalhar,
praticar esporte). Exercícios criados para a otimização
da performance externa otimizam e desenvolvem a habilidade de incorporar as partes dentro de uma atividade.
A performance externa é dependente do bom
funcionamento e da qualidade da performance interna. Quando algo pequeno dentro da performance interna não está funcionando bem, o resultado final na
performance externa não será tão bom.
Performance Externa [PE]
Performance externa é a habilidade de realização
de uma atividade específica. Ela é dependente do funcionamento das partes internas. A performance externa usa o que existe disponível nas partes internas para
realizar a atividade, mas não desenvolve estas partes.
usar
Incorporar todas as partes da
Performance Interna para o
objetivo final: performance
esportiva, vida diária etc.
Fig. 130.
Novamente, a palavra performance significa desempenho, quer dizer, quão bem ou mal algo funciona
ou trabalha. Ela é geralmente associada ao “desempenho atlético” ou a uma performance artística. No
desporto, medimos o sucesso da performance com
números, como a pontuação, a distância, a velocidade, a precisão do alvo etc. e normalmente ele é alcançado sem levar em consideração as limitações internas
e tolerâncias. Ele se concentra somente nos resultados
externos.
As atividades da vida diária também devem ser
consideradas performance externa, porque devemos
ser capazes de levantar e caminhar até o banheiro, por
exemplo, sem nos preocuparmos em como chegaremos lá. Não devemos nos preocupar sobre o que está
acontecendo internamente. Não devemos nos preocupar com o que está acontecendo no nosso joelho, devemos apenas nos preocupar com o objetivo externo e
alcançá-lo. Deveríamos ser capazes de chegar ao carro
sem nos preocupar com o que está acontecendo dentro de nós. Estas atividades do dia a dia e os esportes
são realizados a partir de uma habilidade específica de
incorporar muitas partes existentes com todas as qualidades que elas possuem para a realização da tarefa.
Normalmente, não prestamos atenção nas partes internas a não ser quando perdemos integridade
em alguma delas e elas então precisam de atenção. As
pessoas que perderam a capacidade de mover uma
articulação valorizam tudo que é necessário para a
recuperação desta articulação. Quanto mais se perde e mais tempo se leva para recuperar, mais foco é
colocado nas partes internas, mais evidente se torna
o potencial de otimizá-las e de como usar o “interno”
como diretriz para a prescrição do exercício.
Quando o profissional tem o objetivo de otimizar a performance externa, ele precisa entender que
otimizar primeiramente as partes específicas que serão utilizadas na tarefa é fundamental. Por isso, faz-se
necessário entender quais partes são estas, pois compõem a performance interna.
A marcha é um exemplo de performance externa,
pois é uma tarefa global específica. A boa execução da
marcha é dependente do bom funcionamento de toda
a estrutura passiva e ativa dos membros inferiores e do
tronco. Quando existe alguma disfunção na marcha,
188 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
c o n t i n u u m
nós otimizamos as partes antes de otimizar a atividade. Esse raciocínio lógico deve ser mantido para toda
intervenção utilizando exercícios não somente para a
reabilitação, mas também para o desenvolvimento e
conservação do sistema neuromusculoesquelético.
Performance INTerna [PI]
A performance interna é composta do que o cliente-paciente apresenta [TEM] disponível para ser trabalhado, é a matéria-prima que nos é apresentada. Só
podemos trabalhar com aquilo que o cliente-paciente
apresenta dentro da sua função neuromusculoesquelética e nossa intenção é otimizar aquilo que ele [TEM].
Performance interna é o estado operacional
(função) e a tolerância dos componentes internos necessários para orquestrar o movimento bruto. São as
partes. É tudo o que um indivíduo [TEM] disponível
para gerar a performance externa.
O que significa [TER]?
[TER] é como identificamos a verdadeira função. Ela envolve a função articular, a função muscular e a função sensorial. Se, hipoteticamente, a articulação do joelho sofrer uma fusão e não tiver mais
movimento, imediatamente a musculatura em torno
do joelho vai começar a atrofiar porque não existe
mais motivo para estar presente gastando energia em
uma articulação imóvel. Músculos controlam articulações. Então, para os músculos serem conservados,
são necessárias articulações que funcionem. ADM
não acontece sem articulações que se movam ou
músculos que funcionem.
Fig. 131.
d o
e x e r c í c i o
O estudo da função articular inicia-se com o
aprofundamento do conceito sobre a amplitude de
movimento. Se analisarmos internamente a ADM,
veremos que ela é indicada por graus de movimento e cada grau é uma posição estática, então ADM
é, na verdade, Amplitude de Posições Articulares
Disponíveis [ADPAD]. Quando medimos a ADM,
estamos de fato medindo duas posições articulares e
chamando-as de amplitude. Se a posição final é alterada, a amplitude total é alterada. Quando estudamos
em um livro que certa articulação possui 180 graus
de ADM, isso quer dizer que esta articulação deveria
apresentar 180 posições estáticas. Entretanto, a maioria dos indivíduos não se encaixa nos padrões indicados nos livros e precisamos identificar quais são as
posições articulares disponíveis de cada cliente-paciente individualmente.
Fig. 132.
A função muscular é, na verdade, a contração
muscular. Precisamos de contração para levar a articulação de uma posição para outra. Internamente,
a função muscular indica a Amplitude de Comprimento Contrátil Disponível [ADCCD]. Isso quer
dizer que, assim como precisamos identificar as posições articulares que um indivíduo tem disponível,
o mesmo deve ser feito com a contração muscular.
É necessária a identificação das posições dentro da
amplitude em que o tecido contrátil tem capacidade
de gerar tensão. Cada posição articular indica certo
comprimento do tecido contrátil. No entanto, quando existe alguma patologia com comprometimento
neurológico ou qualquer tipo de lesão que prejudica o sistema muscular e, devido a isso, a articulação
exibe mais posições disponíveis do que existe de
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
189
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
comprimento contrátil, ela não se enquadra nesta situação, porque a articulação alcança amplitudes que
não pode controlar ativamente.
consegue mover uma articulação, isso não significa necessariamente que não exista capacidade
de tensão naquela posição, pode ser que exista a
contração, mas não suficiente para vencer aquela
demanda, aquela resistência. Então esse processo
é, na verdade, um Continuum.
Fig. 133.
Tensão
Fig. 134.
por comprimento
Função Sensorial. É necessário que a função
sensorial esteja intacta para que exista contração
e movimento. A função sensorial vai além da propriocepção. A propriocepção é uma parte importante, mas não é a única. Por definição, propriocepção é a percepção (localização) das posições
estáticas, do movimento dos membros e do corpo, independentemente da visão. Porém, nós não
possuímos um GPS interno, não existe um sensor
único de posição. A identificação da posição vem
pela combinação das informações do comprimento muscular, da tensão muscular, da pressão articular e dos mecanorreceptores nas articulações e
na pele.
Essas são as três partes vitais para podermos
iniciar o processo de otimização da função ou da
performance interna.
É preciso ter articulações que possam se mover de modo que seja possível fazer ajustes. É preciso ter sensação e informações sensoriais do estado da articulação. É preciso ter contrações, não
somente contrações, mas contrações que tenham
capacidade de tensão suficiente para tolerar a demanda exigida em cada posição articular. A capacidade de tensão pode ser mínima e evoluir para
uma contração sólida para a manutenção daquela
posição articular, depois evoluir para ter capacidade de tensão suficiente para se mover e depois
se mover contra a resistência. Se o cliente não
capacidade de produção de tensão [HP]
Capacidade de Tensão por comprimento contrátil.
Precisamos de um pouco de contração sólida para iniciar um trabalho. Depois, precisamos otimizar a tensão
existente. O desenvolvimento da Capacidade de Tensão
é onde devemos desprender nosso maior tempo dentro
da prescrição de exercícios. Trabalhar na melhora da capacidade de tensão é como trabalhar no desempenho do
motor do carro para deixá-lo mais potente para então
melhorar o seu desempenho na corrida.
Então, resumindo...
Performance
Interna (PI)
é o estado operacional dos
componentes internos.
[TER] = são as partes que precisamos [TER]
funcionando e disponíveis para a realização de uma
tarefa ou esporte específico. É a função ou o nível de
função. Ela não é específica da atividade, é a função
neuromusculoesquelética básica. É a visão interna da
ADM, são as partes essenciais que precisam estar funcionando e que influenciam a ADM.
[TER]
190 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
Função Articular
+ Função Muscular
+ Função Sensorial
+ Capacidade de Tensão
c o n t i n u u m
d o
e x e r c í c i o
A prescrição do exercício (aplicação de força/
estímulo com objetivo de gerar uma adaptação) tem
como principal objetivo influenciar positivamente
a performance interna e a performance externa, porém, para isso, precisamos entender incicialmente
onde a performance interna do cliente-paciente se
encontra dentro do Continuum da função para que
possamos criar estímulos apropriados e gerar adaptações positivas.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
191
O Continuum Funcional
c o n t i n u u m
D
a “função/performance interna” para a
“performance externa”. O Continuum
Funcional não está relacionado com exercícios chamados de “funcionais”. Na verdade, não está
relacionado com exercício algum. Ele é uma organização
das análises da função articular, função muscular, função
sensorial e da capacidade de tensão para que o profissional tenha subsídios para criar exercícios apropriados
que otimizem a função/Performance Interna para depois
utilizar esta Performance Interna na realização de alguma
atividade específica (Performance Externa).
O Continuum Funcional representa o vasto espectro de graus ou níveis em que os componentes
neuromusculoesqueléticos mais essenciais estão operando. A função, neste cenário, é baseada e definida
pela integridade e limitações das funções articular,
muscular e sensorial. A função atual determina o
quão adequado é o exercício e a atividade atual.
PERFORMANCE INTERNA
Dentro do Continuum Funcional precisamos verificar que a Performance Interna é composta do que o
cliente-paciente apresenta [TEM] disponível para ser
trabalhado, isto é, a matéria-prima. Só podemos trabalhar com aquilo que o cliente-paciente apresenta dentro da sua função e nossa intenção, como profissionais,
é aplicar o exercício como modalidade de intervenção
para otimizar aquilo que ele [TEM]. Se o cliente-paciente não tem 180 graus de flexão de ombro disponível, por exemplo, ele só tem 160 graus, não podemos
prescrever um exercício que exija 180 graus.
Se você não tem algo,
como você pode desafiá-lo?
Quando o assunto é expandir e melhorar o que o
corpo tolera e pode fazer, precisamos primeiro perguntar e continuar perguntando durante todo o tempo do
d o
e x e r c í c i o
exercício: o que a estrutura e os processos têm a nos dizer
sobre isso? Normalmente, aparecem sinais na sensação
que o cliente-paciente deve nos informar muito antes de
existirem problemas, porém eles passam despercebidos
pela maioria dos profissionais que prescrevem exercícios.
Então, criar um exercício exige primeiramente
encontrar a “oportunidade” atualmente disponível
do indivíduo dentro do Continuum Funcional, ou
seja, o que o indivíduo [TEM] de função disponível.
Depois, encontrar onde, dentro de cada componente do Continuum Funcional, o cliente-paciente pode
ser desafiado. E a maioria desses componentes são
Continuuns entre si e a progressão de cada um deve
ser adequada, sempre através do controle.
Performance
Interna
[TEM]
função neuromusculoesquelética básica
+ capacidade de tensão
Fig. 135.
Função Articular Atual
Amplitude de Posições Articulares Disponíveis
[ADPAD]. Estas posições são influenciadas pela estrutura
articular e por suas limitações, que podem ser normais ou
anormais. Qualquer interrupção na estrutura normal vai
alterar a disponibilidade de posições articulares que poderemos trabalhar. A amplitude de posições disponíveis
é definida pela oportunidade disponível a ser trabalhada.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
193
CONTINUUM FUNCIONAL
DA FUNÇÃO DA PERFORMANCE INTERNA PARA A FUNÇÃO DA PERFORMANCE EXTERNA
O QUE ESTÁ FUNCIONANDO?
RESULTADO FINAL
PERFORMANCE INTERNA
PERFORMANCE EXTERNA
TEM?
USAR?
A ORQUESTRAÇÃO DA CONTRAÇÃO DISPONÍVEL
O CONTINUUM DA CONTRAÇÃO
FUNÇÃO ATUAL
ADPAD
ADCCD
Estrutura?
Normal?
Anormal?
C« »M« »L
Propriedades
SENSORIAL
TENSÃO
ATUAL
uniarticular
< ADMA
Tensão
< Peso membro
no PR
ADMA
Tensão
= Peso membro
no PR
> ADMA
Tensão
> Peso membro
no PR
Resultado Final
FOCO
EXTERNO
JUST
DO IT
Compensação?
Habilidade
Amplitude
Controle
ADM
in uencia
Fig. 136.
c o n t i n u u m
d o
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A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
1
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
Estudamos no capítulo sobre mecânica articular
que a ADM é composta de posições, então 90 graus
de amplitude de movimento significam 90 posições
estáticas. Por exemplo, se a articulação do ombro
apresenta 90 graus de abdução sem nenhuma restrição, significa que, do ponto de vista articular, podemos usar estas 90 posições dentro do exercício. Porém, se existe alguma restrição na posição articular e
esta se apresenta anormal, não temos a possibilidade
de desafiá-la nestas posições.
Capacidade de Tensão Contrátil
É o exame da quantidade de tensão contrátil que
um músculo é capaz de gerar dentro de um perfil da
resistência específico. É diferente de força muscular.
Nosso objetivo, quando estimulamos um tecido
dentro da performance interna, é melhorar a capacidade do músculo em gerar tensão (HP) independentemente da carga. Quanto mais otimizamos a capacidade
de tensão, mais um músculo é capaz de gerar força.
Fig. 138.
Função Muscular Atual
Amplitude de Comprimento Contrátil Disponível [ADCCD]. São as propriedades contráteis
do músculo em cada comprimento: curto, médio e
longo. Estas propriedades são influenciadas por mecanismos fisiológicos, neurológicos e mecânicos. A
contração muscular pode estar presente em algumas
posições, porém falha ou ainda inexistente em outras. O exame das propriedades contráteis do músculo deve ser feito inicialmente dentro de um cenário
mecânico em que a resistência seja a mínima possível. Uma vez que a contração se mostre presente,
podemos iniciar o processo de aumento progressivo
e adequado de mais resistência para examinar a qualidade e a quantidade desta contração.
TENSÃO/OUTPUT
Capacidade de
Tensão Contrátil
FORÇA MUSCULAR
[Capacidade de Tensão Contrátil]
+
[Habilidade] sem incluir “roubar”
medimos a força muscular
através de uma carga
específica + habilidade
de levantá-la.
FORÇA FUNCIONAL
[Capacidade de Tensão Contrátil]
+
[Habilidade] incluindo “roubar”
tempo do arremesso
Fig. 137.
Não conseguimos medir a capacidade de tensão
máxima real de um músculo, porque, para isso, seria necessário tirar o músculo do corpo e estimular
196 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
c o n t i n u u m
o tecido eletricamente para testar a sua capacidade
individual de gerar tensão independentemente de levantar uma carga. Fazer isso num organismo vivo é
quase impossível. Capacidade de tensão é diferente
de força. Para medirmos força, é necessário envolver a habilidade de levantar esta carga, então, força
é a capacidade de tensão contrátil + a habilidade de
levantar a carga sem incluir nenhum mecanismo de
eficiência mecânica em que o cérebro tenta diminuir
o desafio, o que chamamos de “roubar”.
Hoje escutamos muito outro conceito de força, a
chamada força funcional, que quer dizer o quanto de
força somos capazes de produzir dentro de um sistema integrado de múltiplas articulações, em que todas
as articulações têm um mesmo objetivo de fazer uma
atividade especial, como: empurrar um pneu ou sled,
puxar, saltar etc. “Força funcional”, do ponto de vista
mecânico, é o resultado da capacidade de tensão individual de cada articulação (e de devidos grupos musculares) somada à habilidade de diminuir a demanda
(isto quer dizer: distribuir a resistência entre o maior
número de grupos musculares ou anular a resistência
por meio da inércia para exigir o menor esforço possível e alcançar o maior resultado possível), logo, força
funcional é a habilidade da eficiência em “roubar”.
Antes de prescrevermos um exercício, precisamos examinar a capacidade de geração de tensão
atualmente disponível em um músculo dentro das
posições exigidas. Existe um Continuum da tensão
que se apresenta da seguinte maneira:
d o
e x e r c í c i o
Tensão inferior ao peso do membro dentro de
um perfil de resistência específico. Ou seja, o músculo não [TEM] tensão contrátil, output, suficiente para
superar o peso do membro contra a gravidade. Não
é capaz de produzir tensão para realizar a Amplitude
de Movimento Ativa (ADMA). Neste momento, será
necessária uma intervenção dentro da Amplitude de
Movimento Passiva (ADMP) ou da Amplitude de
Movimento Ativa Assistida (ADMAA).
Fig. 140.
Tensão equivalente ao peso do membro dentro
de um perfil de resistência específico. [TEM] capacidade de tensão suficiente para igualar o peso do
membro contra a gravidade.
Fig. 141.
Fig. 139.
Tensão superior ao peso do membro dentro de
um perfil de resistência específico. [TEM] capacidade
de tensão suficiente para superar o peso do membro
contra a gravidade.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
197
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
Performance Externa
[USAR?]: é o resultado final de todos os componentes da PI funcionando juntos para realizar uma
atividade específica.
Fig. 142.
Foco Externo: examinar como a utilização de
todas as partes [que já TEM] está funcionando para
atingir um objetivo externo. Exemplo: analisa um
arremesso ou o gesto motor de um esporte específico para determinar o que está faltando e onde está a
oportunidade de influenciar positivamente.
“Just do it”: examinar como a utilização de todas as partes [que já TEM] está participando das atividades da vida diária sem a necessidade de prestar
atenção no que está funcionando. Por exemplo: analisa a marcha para verificar como o resultado global
se apresenta para detectar o que está faltando, depois
influencia o tecido específico que está precisando de
atenção para que a marcha melhore. A partir da detecção do que está faltando, utilizar uma intervenção
local e depois repetir a atividade global para verificar
se houve melhoria.
Cada cliente-paciente encontra-se em algum
ponto dentro deste Continuum Funcional, isto é,
Continuum da função, e o nosso objetivo inicial como
fisioterapeutas dentro da prescrição do exercício para
a saúde é examinar não somente onde ele se encontra
dentro do Continuum Funcional, mas também em
que estado cada articulação se encontra dentro do
mesmo Continuum. É comum diferentes articulações se encontrarem em estágios diferentes dentro
do Continuum Funcional e, para tanto, precisam ser
consideradas quando o profissional vai escolher ou
criar um exercício. Depois, é preciso identificar o que
está faltando e o que é necessário para, no próximo
passo, poder criar o melhor exercício com o objetivo
de otimizar o que está faltando e, por último, verificar
como as partes atuam juntas.
Dentro do Continuum Funcional, não usamos
o termo avaliação, mas sim exame, porque normalmente uma avaliação é realizada uma única vez
ou dentro de períodos de tempo predeterminados
para verificar a evolução do cliente. No processo do
Continuum Funcional, o exame é constante e “orgânico”. Cada repetição necessita atenção e observação
do profissional para que este possa traduzir o que está
enxergando externamente para a realidade do que
está acontecendo internamente. Após examinar onde
o cliente-paciente se encontra no Continuum Funcional, o próximo estágio é desenvolver exercícios específicos para criar estímulos que venham a desenvolver
adaptações positivas para:
Restaurar – as posições articulares (por meio da
otimização da contração muscular através da melhora da sensibilidade e da qualidade desta contração); é
a função.
Desenvolver – a quantidade da contração muscular (para otimizar o controle articular em toda a
amplitude disponível frente a diferentes desafios); é
a função.
Conservar – a longevidade da função articular,
da função neuromusculoesquelética; é a função.
Tradicionalmente, a fisioterapia prescreve exercícios para clientes-pacientes que se encontram no
início do Continuum Funcional em que a ausência de alguma parte da função está evidente. Após
esta fase da restauração da função, muitas vezes o
198 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
c o n t i n u u m
cliente-paciente recebe alta da fisioterapia e retorna
à sua rotina de exercícios na academia ou reinicia
a prática de exercícios que normalmente é realizada dentro da performance externa. Porém, entre um
estágio e outro existe um espaço enorme dentro do
Continuum Funcional que precisa ser trabalhado e somente com exercícios criados dentro da performance
interna vamos alcançar este objetivo. É somente com
foco na performance interna que temos a oportunidade de progredir a função de cada articulação adequadamente e continuadamente ao máximo do que cada
indivíduo é capaz. Então, eliminamos este espaço que
existe entre o final do tratamento fisioterápico e as
atividades da vida diária. Neste modelo de trabalho,
o fisioterapeuta tem a oportunidade de continuar a
prescrever exercícios por muitos anos para o mesmo
cliente-paciente, pois o foco na performance interna
possibilita que ele sempre esteja trabalhando dentro
do desenvolvimento e conservação da função sempre com o foco interno.
O Continuum Funcional
A intervenção da Fisioterapia para restauração,
desenvolvimento e conservação da função exige que
o profissional se utilize de critérios específicos para
a criação de exercícios customizados. Considere as
perguntas: um exercício é funcional se excede a capacidade atual de um indivíduo? É funcional se não
for controlado ou excede a capacidade do indivíduo
de controlar o exercício? Uma bola torna algo funcional automaticamente? Nenhum aparato que adiciona
instabilidade, nenhum exercício integrado trará algum resultado positivo se for muito difícil ou avançado para o indivíduo. Também não trará resultado
se o exercício não for importante para seu objetivo ou
se o mesmo não for controlado.
Em primeiro lugar, função ideal tem como primícia dominar todas as partes do sistema neuromusculoesquelético envolvidas. Significa o indivíduo ter
controle de tudo que estiver disponível através de
d o
e x e r c í c i o
sua estrutura e de suas capacidades atuais. É também ter o controle de todas as possibilidades para as
quais esta estrutura pode ser desafiada. E funcional
deve significar que a atividade está “dentro da capacidade funcional do indivíduo. Novamente, a capacidade funcional não significa “capacidade de tensão”
em termos de quantidade de força, mas sim de qualidade da produção de força.
Então, para que qualquer exercício seja classificado como funcional, ele primeiro deve levar em
consideração a capacidade atual de alguém e, depois, deve ser apropriado para o objetivo escolhido.
Como você reabilitaria um indivíduo com evidência
da marcha em Trendeleburg? Você o faria correr?
Não! Em níveis menos visíveis, as articulações de indivíduos aparentemente saudáveis normalmente possuem pequenas disfunções. Se estas disfunções não
forem abordadas especificamente antes de ser exigido um trabalho dentro de um sistema mais avançado
de desafios, estaremos fazendo o mesmo que colocar
alguém com a marcha em Trendeleburg para correr
antes de abordar os fatores que estão influenciando a
marcha. Não ser capaz de mover um membro dentro
de um plano ou não ser capaz de mover um membro
com controle durante um exercício são situações que
estão próximas do mesmo extremo do Continuum do
controle.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
199
O mundo do exercício e
a performance externa
c o n t i n u u m
P
erformance externa é a habilidade de realização de uma atividade específica. Ela é dependente do funcionamento das partes internas. A
performance externa usa o que existe disponível nas
partes internas para realizar a atividade, mas não desenvolve estas partes.
usar
Incorporar todas as partes da
Performance Interna para o
objetivo final: performance
esportiva, vida diária etc.
Fig. 143.
Como mencionado nos capítulos anteriores, a
palavra performance significa desempenho, quer dizer o quão bem ou mal algo funciona ou trabalha,
d o
e x e r c í c i o
ela é geralmente associada ao “desempenho atlético” ou a uma performance artística. No desporto,
medimos o sucesso da performance com números,
como a pontuação, a distância, a velocidade, a precisão do alvo etc. e normalmente ele é alcançado sem
levar em consideração as limitações internas e tolerâncias. Ele se concentra somente nos resultados
externos. Porém, não é somente no desporto que
exercícios se concentram em resultados externos.
Muitas vezes, prescrevemos exercícios para a saúde
da mesma maneira.
No mundo do esporte, em uma corrida, por
exemplo, se dois atletas estão perto da linha de chegada e um deles lesionar seus isquiotibiais, mas a sua
mão cruzar a linha de chegada ao mesmo tempo em
que o outro atleta, de quem você acha que as pessoas
vão se lembrar? Daquele que lesionou. Qual se tornará herói? Quanto maior o sacrifício do corpo, mais o
atleta será lembrado. No esporte, sacrificar o corpo
para obter melhores números é normalmente glorificado e honrado.
Fig. 144. No mundo dos esportes, o atleta que mais se sacrifica
é o mais lembrado. O esporte
sacrifica o corpo pelo objetivo.
Porém, a prescrição clínica do
exercício para a saúde sacrifica a
atividade pelo corpo.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
201
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
Na verdade, os atletas têm por natureza um nível
alto de tolerância física, muito maior do que a população
em geral. Um dos fatores que transforma uma pessoa
comum em um grande atleta é a sua tolerância física.
Se a população com que você trabalha envolve
atletas, você sabe do que estamos falando. Caso contrário, se você trabalha com pessoas que procuram
saúde, o sacrifício do corpo não deve acontecer.
1. Performance externa:
como a medimos e monitoramos.
Quando os fatores e variáveis do exercício são
medidos e monitorados externamente, os chamamos
de exercícios de performance externa. Isso não é exclusivo dos esportes, independentemente do nome
do exercício e de que profissional o prescreve. Sempre
que as variáveis do exercício forem medidas externamente, devemos identificá-lo como performance externa. Então, o primeiro fator a ser considerado em
exercícios para a performance externa é a maneira
como são monitorados e medidos.
Monitoramento Externo
# séries || # repetições || # km || # minutos
Quando prescrevemos 3 séries de 10 repetições
de um exercício com certa quantidade de peso, esperando que o cliente-paciente as realize, independentemente de como cada repetição será realizada, o
exercício é considerado de performance externa, pois
o foco está no programa e não na estrutura.
A amplitude do movimento (ADM) é um exemplo de que no mundo do exercício para a saúde
também medimos fatores internos utilizando e visualizando medidas externas. Quando usamos um
goniômetro para medir a flexão do ombro que se
deslocou 60 graus, se não prestarmos atenção no movimento escapular nem no movimento da coluna e
se não percebermos quais são as partes que estão se
afastando ou se aproximando, nem sempre teremos
certeza que internamente os 60 graus vieram da articulação glenoumeral. Estamos realmente medindo
algo interno com medidas externas.
2. Performance externa e
o “tipo” de atenção/foco:
Exercícios de performance externa envolvem a
atenção do cliente-paciente durante a execução do
exercício de duas maneiras. Uma em que a atenção
está focada na habilidade da realização do gesto motor para a precisão do movimento, como, por exemplo, acertar a cesta de basquete, acertar o alvo ou rebater a bola com o taco. E outra em que a atenção está
focada na “distração”, ou melhor, sem foco algum no
exercício, os quais serão identificados aqui como “Just
do It™” (slogan da Nike).
a. Foco na distração/sem foco: por exemplo,
a participação dos pacientes na clínica ou
alunos da academia durante a execução dos
exercícios quando estão conversando durante a série e sem prestar a atenção no que está
acontecendo durante cada repetição;
b. Foco em um objeto/foco externo: por
exemplo, um jogador de tênis ou beisebol rebatendo a bola.
Pense sobre isso, por que as salas de treinamento
aeróbico, onde as esteiras e bicicletas se encontram,
possuem um cinema ou quase um home theater? Por
que antes das televisões havia suportes para revistas
e livros? Para distrair os clientes daquilo que estão
fazendo. Porém, se o cliente está distraído, ele não
consegue prestar atenção em todos os sinais enviados durante a execução dos exercícios, os quais são
muito relevantes porque carregam a única informação realmente importante de como ele está realizando o exercício. Estes sinais são necessários para indicar quando ele deve parar. Se o cliente-paciente não
202 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
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está prestando atenção no que está acontecendo em
sua estrutura durante a realização de um exercício,
o profissional perde a oportunidade de interferir nos
processos a partir das referências indicadas pelo paciente.
Fig. 145.
Na maneira de se exercitar com o foco na distração, ou sem foco, com a mentalidade “Just do It”, o
cliente está distraído, ele não está prestando atenção
no que está acontecendo em seu corpo porque não
gosta de fazer aquilo ou acha tedioso, ele estará tentando ignorar qualquer sinal do seu corpo. As pessoas
não apenas fazem exercícios aeróbicos desta forma
porque é longo, mas também levantam peso desta maneira, conversando sobre o cabelereiro, a festa, o novo
namorado etc. Essa distração, muitas vezes, é iniciada
e incentivada pelo profissional e depois da conversa a
pergunta é sempre a mesma: “Já acabou?” Essa maneira de executar o exercício indica que eles estão “apenas
fazendo” ou “Just do It!”. Como podemos esperar um
bom resultado se algo é realizado dessa maneira?
Fig. 146. Exercício com foco externo e sem
atenção. Na verdade, com foco na distração.
Sempre que realizamos exercícios vendo televisão, lendo revista ou conversando o tempo
todo, não estamos prestando atenção aos sinais internos (e importantes) do nosso corpo.
Agora, vamos explorar a outra maneira de realizar exercícios dentro da performance externa, isto é,
quando a atenção e o foco estão em um objeto externo e, normalmente, está associada à aprendizagem de
uma habilidade.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
203
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
Fig. 147.
Para que isto ocorra, é importante prestar atenção no objeto externo, por exemplo, atenção na bola e
na cesta no caso do basquete, na raquete e na bolinha
no caso do tênis, no taco e na bola no caso do beisebol. É isso que precisa acontecer quando treinamos
para um esporte, a atenção precisa estar no esporte e
na sua execução para atingir melhores resultados. Porém, para melhorar o desempenho geral no esporte
não podemos esquecer que também é essencial haver
melhoria da performance interna.
Você consegue compreender a distinção entre os
dois tipos de atenção/foco? Ambos são externos. Porém, um ignora tudo o que está acontecendo dentro
do corpo, quando a preocupação é somente cumprir
com o que foi predeterminado, como, por exemplo,
realizar uma tarefa/exercício em 20 minutos. E o outro é definitivamente consciente e focada, porém nos
fatores externos. Nenhuma das maneiras é ruim! O
problema é quando a nossa única maneira de execução de exercício é pela performance externa, independentemente do tipo de atenção envolvida.
A essência dos exercícios dentro da performance
externa é cumprir o programa. As pessoas estão tentando alcançar resultados, como mover o peso e ultrapassar as linhas de chegada, a qualquer custo, não
se importando com quais músculos estão realizando
a tarefa nem se está havendo algum sacrifício durante
o processo. Elas não se preocupam que poderia ser
Fig. 148. Exercício com foco externo, no
objeto. Quando o foco está em um objeto
externo, o exercício ou a prática é sempre
focado e utiliza muita concentração. A performance externa utiliza tudo que tem em
sua função para alcançar o objetivo, que
exige muita habilidade.
204 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
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as propriedades da inércia movendo o peso em vez
de uma musculatura específica ou que poderia ser a
panturrilha movendo o peso na mão. Elas estão preocupadas com a execução externa, naquilo que está se
movendo e o foco está no objeto. O monitoramento e
o objetivo são sempre externos.
Se o objetivo do exercício é apenas a quantidade
de peso ou o quanto ele está se movendo, realmente
não importa o que está acontecendo dentro de quem
está movendo-o, também não importa como se está
alcançando o objetivo, porém, se o objetivo for gerar
adaptação em um tecido específico, este cenário precisa mudar.
PE = OBJETIVO FINAL
para performance esportiva, vida diária etc.
Porém, toda Performance Externa é
construída e dependente do estado atual
das partes internas
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indicasse que está se deteriorando. O cliente-paciente fica cansado e muitas vezes dores aparecem, mas
ele não para até que complete o que o profissional
prescreveu. Exercício é para ser o remédio! Então o
slogan “Esporte é saúde” não está correto, porque, se
é necessária uma especialidade inteira da medicina
só para os esportistas, a Medicina Desportiva, isso é
sinal de que o esporte pode machucar, e a incoerência
persiste.
Atualmente vivemos a mesma contradição dentro do mundo comercial do exercício porque este utiliza os mesmos modelos e parâmetros do esporte, porém direcionados para um público que busca saúde.
Dentro do novo modelo de prescrição de exercício
que propomos, o exercício deve ser o remédio. Exercício tem o objetivo de restaurar, desenvolver e conservar a saúde, e não deve ser baseado nas mesmas
diretrizes dos esportes, assim como sua execução não
deve ter um foco externo.
Como mencionado anteriormente, o objetivo final de qualquer forma de exercício é a melhora da
performance externa. Devemos ser capazes de realizar as atividades da vida diária sem nos preocuparmos com o que está acontecendo dentro de nós. É
por esta razão que, durante a sessão de exercício, o
foco deve estar nas partes internas, para que possamos ignorá-las e não precisemos nos preocupar com
elas quando precisarmos usá-las no dia a dia com o
foco externo. Para alcançar isso, em algum momento,
teremos que nos concentrar apenas na parte interna.
O esporte como exercício é uma incoerência.
Talvez pudéssemos afirmar que esporte não é exercício, mas isso seria incorreto, porque certamente é uma forma de exercício. Se o exercício existe
para melhorar o corpo e para melhorar a estrutura,
um atleta jamais deveria continuar quando o corpo
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
205
PERFORMANCE EXTERNA
Monit
oram
en
to
Ex
USA?
FOCO NO RESULTADO EXTERNO
Incorporar todas as partes da PI para o objetivo
nal: performance esportiva, vida diária etc.
# repetições, # km, #
,
s
e
i
r
min
# sé
:
uto
no
s
r
te
ATENÇÃO
Foco no
Objeto
Distração
Foco no alvo
Foco na bola, taco ou raquete
Foco no tempo/repetições
O corpo pode ser o objeto
JUST DO IT
Excecução sem interesse,
apenas empurre/apenas mova,
focada na distração
PE = OBJETIVO FINAL
para performance esportiva, vida diária etc.
Porém, toda Performance Externa é construída e dependente do estado atual das partes internas
Fig. 149.
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Exercício deve ser o remédio.
É importante entender algumas destas contradições que existem no mundo dos exercícios para
você conseguir fazer a mudança de pensamento necessária para entender este novo conceito. Perceba
que o objetivo do futebol não é melhorar o corpo,
mas é a pontuação. A meta do tênis não é a de melhorar o corpo, mas é de fazer mais pontos para ganhar o jogo. O futebol e o basquete são os esportes
campeões de lesões de LCA (ligamento cruzado anterior) e reabilita-se o LCA para que os atletas voltem a jogar, mesmo sabendo que correrão o risco
de se lesionar novamente. Porém, agora existe um
recente método popular de prescrição de exercícios
que afirma que os exercícios realizados em uma cadeira extensora fazem mal para o LCA e, por consequência, não recomenda o uso desta máquina, mas,
no entanto, recomenda a prática do futebol. E a incoerência permanece.
O esporte sacrifica o corpo pela atividade e há
valor nisso, inclusive com a obtenção de troféus e
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medalhas. Mas o exercício para a saúde sacrifica a atividade em favor do corpo. É uma mudança completa
de objetivo, uma mudança de 180 graus.
Quando os exercícios para a saúde são realizados com o objetivo de mover o peso ou mover o cabo
do pilates ou mover a borracha sem prestar atenção
em como está movendo este peso/cabo/borracha e o
cliente-paciente precisa terminar o número prescrito
no programa independentemente de como o exercício é realizado, ele se aproxima do esporte e não mais
da saúde.
Exercício deve ser estratégico para ter um valor
ótimo e adequado. Existe um número surpreendente
de formas de exercícios que funcionam e que parecem trazer resultados, mas isso não significa necessariamente que sejam os mais eficientes ou os mais
eficazes possíveis.
Vamos fazer duas analogias sobre eficiência que
se aplica diretamente ao mundo do exercício.
Na primeira vamos usar o martelo. É necessário
utilizar a ferramenta correta para cada tipo de objetivo [Fig. 150]. O martelo, por exemplo, não é utilizado para apertar parafuso, mas para colocar prego.
Fig. 150. Como profissionais,
precisamos saber o que cada ferramenta que utilizamos pode nos
oferecer, para usarmos a ferramenta correta para atingir o objetivo.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
207
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
Dependendo da habilidade do profissional que
usa o martelo, o prego poderá ser colocado com, digamos, duas marteladas e sem estragar a superfície sobre
a qual será pregado. Pode também ser pregado com
muitas marteladas (umas 75, por exemplo) e, provavelmente, grande parte delas é desperdiçada por errarem
a martelada trazendo danos à superfície. E, ainda, o
prego pode ter levado uma martelada só e ter sido entortado [Fig. 151], sendo necessário arrumá-lo antes
de pregá-lo na superfície. Ambas as maneiras deram
resultado? Sim, o prego foi colocado com sucesso em
todos os casos. Quando comparamos o profissional
que colocou o prego com duas marteladas e sem machucar a superfície nem entortar o prego com o profissional que precisou de 75 marteladas, qual foi mais
eficiente [Fig. 152]? Qual foi mais habilidoso? Qual foi
realmente profissional? Qual deles você quer ser?
Fig. 151. Eficiência e eficácia na prescrição
do exercício. Profissionais que entendem da
mecânica do exercício e dominam o processo
de raciocínio crítico do Continuum do exercício
para a tomada de decisões alcançam resultados mais rapidamente, com menos desperdício
e com o menor custo possível.
O mundo do exercício vive em torno das “75”
marteladas. Emagreceu? Sim, mas demorou dois anos
e quatro “ites” (epicondilite, bursite etc.). O exercício
funcionou? Sim, mas depois de “75” repetições, porque nenhuma delas tinha um perfil de resistência
compatível com o da potência, nenhuma chegou até
o comprimento mais curto ou até o mais longo do
músculo ou nenhuma repetição foi executada com
controle em cada grau de movimento.
Fig. 152. Eficácia:
muitos métodos de
exercícios atingem resultados, porém desperdiçam muito tempo
e normalmente o custo
em termos de desgaste/saúde é muito alto.
Os exercícios que criamos hoje são muito incompletos porque os perfis da resistência são inconsistentes
com o da potência e também são necessárias muitas repetições para atingir qualquer resultado. Se criássemos
uma máquina de musculação em que o perfil da resistência fosse muito próximo do perfeito (isto é, exatamente
igual ao da potência), o resultado seria alcançado com
menos séries e com poucas repetições. Mas este cenário
mecânico não tem condições de ser copiado com um
halter ou com um cabo, porque o perfil da resistência
destes equipamentos é incompleto e gera estímulo apropriado somente em 25 a 30% da amplitude. Se durante
a execução do exercício alguma articulação que deveria
estar parada se mover, o estímulo gerado é praticamente
zero. Temos errado muitas marteladas e realmente precisamos de “75” repetições para alcançar um resultado,
mas este cenário pode ser muito mais eficiente.
A outra analogia é feita com uma criança de dois
anos [Fig. 153]. Ela decide pegar o leite da geladeira
e colocar em seu próprio prato de cereal. Quando ela
se serve, cai leite no chão, no balcão, mas certamente
208 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
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também dentro do prato. Consideramos isso sucesso?
Sim, tem leite dentro do prato. A criança alcançou o resultado, porém o prejuízo foi grande. Quando o exercício não é criado e prescrito adequadamente, é assim
que ele acontece, isto é, com o mesmo baixo nível de
acerto. Exercício é mais do que uma atividade, é mais
do que mover o corpo contra a gravidade, é mais do que
calistenia.
Como mencionado no capítulo sobre o que é exercício, por que as pessoas se exercitam? Vamos explorar
um outro aspecto desta pergunta. O que as pessoas
realmente esperam do exercício e o que é necessário
para alcançar este objetivo? A maioria destas pessoas
deseja perder peso. Algumas desejam somente reduzir
o número na balança e outras desejam diminuir a taxa
de gordura corporal. Outras querem saúde ou ficar em
forma. Segue a lista de objetivos mais comuns:
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• Emagrecer;
• Entrar em forma;
• “Ter tônus” muscular. Ou seja, melhorar aparência e sentir-se melhor;
• Aumentar a massa muscular, mas não ficar
igual ao “Schwarzenegger”;
• Melhorar a saúde: equilibrar pressão arterial,
diabetes etc.;
• Aumentar a flexibilidade;
• Melhorar a performance;
• Aumentar a potência;
• Melhorar a função.
Todos esses objetivos começam com a função da
máquina humana que é determinada pela função de seus
componentes internos e, para influenciá-la, devemos:
• Conhecer as etapas do processo;
Fig. 153. Uma outra analogia sobre eficácia e
eficiência: uma menina de dois anos colocando
leite no prato de cereal. Ela cumpre o objetivo,
porque tem leite no prato, mas o desperdício e
o custo foram altos.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
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Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
• Conhecer as partes que criam o todo;
• Compreender com quem estamos trabalhando.
Revelação: todos esses objetivos são derivados
do estímulo e da adaptação do músculo. Toda função humana começa e, muitas vezes, termina com o
músculo.
Músculo não significa
necessariamente ser
músculo grande.
Produção de tensão não
significa necessariamente
powerlifter.
Lembre-se, são os pequenos músculos do olho
que permitem focar a visão. O problema com a palavra “músculo” é que uma grande quantidade de pessoas, devido ao condicionamento que tiveram, vão
imediatamente pensar na palavra grande.
É realmente difícil para muitos ouvir a palavra
músculo e não pensar em uma pessoa musculosa
como Arnold Schwarzenegger. Pensamos imediatamente em bíceps gigantes. Isso é um problema, porque a pessoa que quer melhorar sua saúde e função
está realmente pedindo mais músculo do que tem no
momento, porém imagina que o resultado final seja o
tamanho do Schwarzenegger.
O medo e a rejeição de “músculo” são as mais
preocupantes tendências da indústria. A questão
se resume no conhecimento sobre o músculo e o
que ele faz. Para aqueles que sempre visualizaram
o tecido a partir de uma perspectiva de tensão e
força, o músculo continua sendo a fonte principal
de resultado.
Músculo
Quando falamos “músculo”, estamos nos referindo a todo o complexo neuromiofascial estrutural, a
todo o sistema neurológico aferente e eferente que os
conecta, a toda parte sensorial associada e a articulação que ele controla. Referimo-nos também à fáscia
que cria o suporte para o músculo e a sua parte operante que chamamos de componente contrátil. Nos referimos a todas essas partes! O tamanho do músculo para
esta análise não é importante. Devemos nos preocupar
com a contração e com o desenvolvimento da contração muscular. Se você gosta de treinar corrida e de
exercício da performance externa, você se preocupa em
usar contrações já existentes para realizar estes exercícios. Mas a prescrição de exercícios por fisioterapeutas
deve ser feita com a preocupação na restauração, no
desenvolvimento e na conservação da contração. A sua
preocupação deve ser em construir a contração e em
desenvolver um músculo com funcionamento ótimo
para ser usado na performance externa.
É tudo uma questão de contração! Quer dizer,
de produção de tensão. Conseguir estimular um
músculo apropriadamente em seus comprimentos
longo e curto, cuidando de todos os detalhes mecânicos envolvidos, é uma tarefa desafiadora. Não
existe nenhum exercício livre, como, por exemplo, o
agachamento [Fig. 154], que gere estímulo para os
extensores do quadril no comprimento mais curto.
Se criarmos um exercício com um cenário mecânico
em que exista resistência no comprimento mais curto
utilizando um banco de apoio e caneleira, ainda assim
precisaremos ter o maior cuidado durante a execução
porque se o movimento acelerar quando chegar perto
do comprimento mais curto, provavelmente a resistência será anulada e então não teremos estímulo.
Exercício
Exercício é a contração, a produção de tensão =
desenvolvimento da performance interna = produção
interna de força.
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Quando os parâmetros do exercício tornam-se
focados na otimização do músculo dentro do nível
de tolerância individual, a eficácia e a eficiência do
exercício podem aumentar.
• Eficácia: adequado para atingir um objetivo
ou cumprir um propósito; produz o objetivo ou
resultado esperado. Isso não significa que foi o
melhor nem que foi o mais rápido. Também não
significa que houve menos desperdício ou que fez
o melhor uso do tempo, por exemplo. Foram dadas as “75” marteladas para colocar um prego e
isso foi eficaz, porque o prego foi colocado, não
importando a maneira que isso aconteceu.
• Eficiência: executar e funcionar da melhor
maneira possível, ou atingir o objetivo da melhor
maneira possível com o mínimo de desperdício
de tempo e de esforço.
Fig. 154. Performance externa, nenhum exercício livre, como o agachamento, dá a oportunidade de desafiar o comprimento mais curto do
músculo glúteo máximo. No perfil da resistência
do agachamento, quando o glúteo se aproxima dos comprimentos contráteis mais curtos,
o torque diminui e assim diminui a resistência.
Lembrando que o comprimento mais curto do
glúteo máximo alcança posições até 30º além
do 0, e que não são alcançadas neste exercício.
CAPACIDADE contrátil
Capacidade contrátil é a necessidade de ter habilidade contrátil/integridade e produção de tensão contrátil para depois fazer uso progressivo dessa contração. Isso é diferente de mover peso. Para mover peso,
é necessário força e habilidade específica. Estamos
falando puramente de produção de tensão no tecido.
O cérebro é muito eficiente
em orquestrar o movimento
do corpo humano.
A eficiência do cérebro está em sempre economizar energia e esforço. Essa característica da organização do movimento é muito importante e necessária
para a sobrevivência. Quando realizamos atividades
da vida diária, não estamos “conscientes” de todos os
movimentos necessários para realizá-las. Nós temos
um pensamento ou desejo, como, por exemplo, “está
na hora de levantar”, e, a partir do momento em que
decidimos levantar, todos os movimentos necessários serão realizados sem que tenhamos que pensar:
“Flexione o joelho, flexione o quadril etc.”. É como se
o cérebro estivesse funcionando em piloto automático. Essa característica é imprescindível para a realização das atividades da vida diária. Para economizar
energia e esforço, o cérebro organiza mecanicamente
para que o movimento aconteça dentro do trajeto de
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
211
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
menor resistência e do que vai utilizar o maior número de grupos musculares para realizar uma tarefa.
Aqui, eficiente significa administrar o conjunto de variáveis mecânicas para alcançar melhores resultados
com a menor utilização do músculo e com o menor
esforço.
No mundo do exercício,
existem dois contextos de eficiência
No primeiro contexto, usa-se o que se tem disponível, adicionado à habilidade de usar a mecânica para a distribuição do esforço e também para a
minimização da resistência, alcançando maiores e
melhores resultados. A habilidade está em usar propriedades da inércia para diminuir o esforço e assim
perpetuar o padrão de eficiência do cérebro.
Usamos aqui o exemplo do levantamento de
peso (clean and jerk). Para atingir o objetivo, temos
que minimizar o trabalho e o esforço. Como os atletas
fazem isso? Sua primeira tarefa é arremessar o peso.
Para isso, têm que tirar o peso do solo e acelerá-lo,
porque existe um tempo específico entre o peso subir
e o atleta se posicionar embaixo da barra. O peso não
pode estar abaixando no momento em que ele se posiciona embaixo da barra porque ele não é capaz de
desacelerar o peso se não estiver exatamente embaixo
da barra no momento em que o peso iniciar o trajeto
de descida. Este timing é uma das habilidades mais
importantes durante este exercício. Os atletas necessitam de precisão no tempo e no momento em que o
peso está flutuando para se posicionar corretamente
embaixo da barra. Eles não realizam um agachamento lento com uma rosca inversa e lentamente executam um desenvolvimento de ombro. Seria impossível
realizar um levantamento de peso (clean and jerk)
utilizando somente a tensão muscular para fazê-lo.
Fig. 155. Exercícios de performance externa utilizam a musculatura já existente
e treinam a habilidade. Neste exemplo do
clean and jerk, o objetivo do exercício é levantar mais peso e, para alcançá-lo, a habilidade de usar a inércia com seu timing
perfeito, faz com que o peso seja quase
anulado em grande parte da amplitude.
A habilidade de anular a resistência é o
maior foco do exercício.
212 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
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Outro exemplo é quando um maratonista contrata um treinador com o objetivo de modificar sua
forma de corrida para melhorar seu tempo. Aqui
ele busca maior eficiência, o seu objetivo é utilizar a
menor quantidade de músculos possível para correr
uma distância determinada mantendo o músculo ativo até o fim da corrida. Se o atleta colocar alguma
quantidade extra de movimento no início da corrida,
ele acaba por lutar contra ele mesmo, desperdiçando
esforços, pois exigirá muito de seus músculos e nem
sempre alcançará o objetivo. Eficiência, neste caso, é
novamente fazer menos trabalho com o corpo para
alcançar mais e maiores números externamente.
Perceba que, nestes dois exemplos de eficiência,
a finalidade é utilizar toda a musculatura já existente,
“administrando” e “economizando” (usando somente o necessário) sua energia para atingir um objetivo
externo. Para isso, é necessário encontrar maneiras
de diminuir o estímulo externo (resistência) para facilitar o esforço e reduzir ao máximo a utilização da
musculatura. O foco aqui não é o desenvolvimento
da musculatura ou do corpo. No entanto, a musculatura já deve “estar pronta”, ou melhor, deve ter o
potencial adequado para ser utilizada dentro de uma
habilidade específica.
No segundo contexto, eficiência está em otimizar o [TER] para aumentar o seu potencial de utilização. Aqui, a finalidade é otimizar o tecido muscular,
construir um corpo melhor e mais tolerante e, para
isso, é preciso fazer exatamente o contrário do que é
feito no primeiro contexto, porque, para aumentar a
tolerância do tecido muscular, é necessária a aplicação de um estímulo adequado para cada comprimento contrátil. Se o estímulo é anulado ou diminuído,
ele deixa de ser adequado. Como eficiência significa o melhor resultado com mínimo de desperdício,
então aqui ela significa quebrar o padrão do “piloto
automático do cérebro” e não deixar a resistência ser
anulada e o esforço ser distribuído ou disperso. Se é
possível gerar o estímulo necessário para alcançar o
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objetivo de melhorar a tolerância da musculatura específica em uma sessão de exercícios de 30 minutos e
o profissional leva 2 horas para atingir esse objetivo,
isso significa que ele não foi muito eficiente.
Se o cliente trabalha somente 50% de cada movimento que realiza por estar arremessando o peso
ou porque algum outro grupo muscular está fazendo
o exercício, então existe muita perda de tempo para
alcançar este objetivo. Novamente, afirmamos que é
imprescindível saber qual objetivo que você, profissional, espera com o exercício, porque mover peso é
o oposto de desafiar o corpo. A eficiência da prescrição do exercício para a saúde está em criar exercícios
focados nas propriedades e no controle da contração
do músculo como o meio pelo qual a carga é movida e não de mover a carga com a esperança de estimular algo. A isso, chamamos de exercícios para a
performance interna.
Então, músculo é tudo! Se não tivermos músculo, não temos o que fazer com a habilidade. Nós não
conseguiríamos sair da cama para caminhar se não
existissem os músculos. Assim, o número de fatores
que podemos melhorar e influenciar positivamente
com a melhora da contração muscular quando a
quantidade suficiente de músculo está funcionando adequadamente por meio de desafios específicos
(cargas desafiadoras orientadas pelo controle e com
esforço progressivo) é muito grande.
Quando o fisioterapeuta prescreve exercícios para
gerar estímulo e restaurar, desenvolver e conservar a
contração muscular, ele precisa ser eficiente e, para
isso, é necessário que cada detalhe do exercício esteja
estimulando algo dentro do objetivo. Se o peso for arremessado, os efeitos da inércia entram em ação anulando assim o estímulo. Como demonstramos com a
experiência da balança de inércia (ver aula em EAD),
que identifica que quando o arremesso de peso é parte do exercício, a resistência chega a zero no final da
fase concêntrica e início da excêntrica. Então, se você
desejar ter estímulo nestes pontos da amplitude, é
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
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Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
necessário controlar a inércia. Se a inércia não for controlada, o profissional não terá nenhuma indicação de
que aquilo que se espera é o que está acontecendo no
tecido. Por isso a necessidade de estratégia.
Precisamos desenvolver uma visão completa do
espectro do exercício e, a partir do objetivo que o profissional espera de adaptação com o exercício, escolher a melhor intervenção.
Fig. 156. Adaptação. Homeostase. Visão do espectro do exercício.
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Quando o foco do exercício está no movimento,
na atividade, na performance externa, os exercícios
desenvolvem uma habilidade que usa a performance
interna já existente, mas não a desenvolve. Os exercícios não incluem estímulo específico para a contração
(para o tecido) e, devido ao perfil da resistência, não
permite estímulo adequado em todo o Continuum da
contração muscular. Dentro da performance externa
está o treinamento funcional tradicional, treinamento de performance esportiva, exercícios aeróbicos e as
atividades da vida diária.
Desenvolver um raciocínio crítico para tomadas
de decisões sobre a criação de exercícios deixa nossa profissão muito empolgante: quando começamos
a criar exercícios únicos, prescrever com estratégia,
monitorar cada grau em que o exercício é executado
e adaptá-lo a cada necessidade de mudança, nosso
nível de resultado aumenta e nunca mais as horas vão
demorar a passar em nosso dia de trabalho.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
215
Performance Interna
c o n t i n u u m
N
ão precisamos escolher entre dois tipos de
exercícios, podemos usar os dois para diferentes objetivos. Precisamos saber qual o
objetivo do exercício e cumprir com o propósito de
gerar estímulos específicos para otimizar todo o espectro do Continuum Funcional, isto é, da função.
Visão completa do espectro do exercício
Quando o objetivo é otimizar a função, isto é a
performance interna, o foco do exercício deve estar na
contração muscular, e devemos gerar estímulo apropriado para todo o comprimento muscular. Para isso o
profissional deve ter o foco em três fatores: na função
muscular, na função articular e na função sensorial.
Devemos avaliar as propriedades contráteis por comprimento muscular, desenvolver a integridade contrátil por comprimento muscular, em seguida desenvolver a tensão contrátil por comprimento muscular e,
por último, reforçar e conservar a integridade e a tensão
exigida dentro do Continuum da contração [Fig. 157].
Se desenvolvermos bastante HP [tensão] na
musculatura, supondo que é possível ter a percepção
deles, o cérebro terá uma boa quantidade de matéria-prima para orquestrar durante atividades de performance externa. Afetar o sistema sensorial é mais
desafiador e existe certo limite dentro do que conseguimos alcançar na articulação. Porém, no sistema
muscular, na ADCCD [Amplitude de Comprimento
Contrátil Disponível] temos muito espaço para trabalhar e é aqui que conseguiremos mais resultados, é
dentro do sistema muscular que temos mais oportunidade de gerar adaptações positivas.
Exercício é contração. Se o objetivo for melhorar a
ADM, só será possível trabalhar com a quantidade de posições articulares que foram oferecidas [ADPAD], o restante
do trabalho vem de como influenciar a contração nas Amplitudes de Comprimento Contrátil Disponível [ADCCD].
Ou seja, explorar o trabalho no comprimento curto, no
médio e no longo do músculo, explorar o valor do deslizamento das pontes cruzadas em seu total comprimento.
d o
e x e r c í c i o
O exercício com foco na contração muscular vai
desenvolver o Domínio e o Controle da contração e,
consequentemente, da articulação. Isso significa ser
capaz de ter o domínio de cada grau de movimento,
ser capaz de pará-lo a qualquer momento e também
de manter o trajeto controlando a amplitude. Quando o Domínio/Controle não estão presentes, o exercício acontece cada vez de uma forma diferente. O
Continuum de controle começa na amplitude em que
o indivíduo consegue controlar e vai se expandindo
para amplitudes maiores e, progressivamente, aumentando esta amplitude de controle.
Então, com tensão suficiente, com percepção e
com o domínio da contração, é possível controlar
uma articulação ou um movimento. Por exemplo, se
parte do objetivo for controlar as escápulas, é necessário [TER] uma capacidade de tensão suficiente nos
“controladores da escápula” e também [TER] uma
percepção da localização dela, então se adiciona uma
intenção (escolha) de controlar a escápula, e com todos estes fatores trabalhando juntos é possível dominar e controlar a posição escapular.
Esse é o processo que repetimos inúmeras vezes e
essas são as influências que precisamos levar em consideração. Quanto maior é a percepção/consciência
do corpo, melhor o progresso do cliente-paciente em
atingir seu objetivo e isso também é um Continuum.
Estamos trabalhando com um novo cliente que
apresenta pouca capacidade de gerar tensão. Ele consegue sentir e ter consciência de toda sua estrutura e quase não precisamos ensiná-lo, porque quando o cliente
consegue ter percepção e consciência de sua estrutura,
o processo de ensinar torna-se mais fácil. Por exemplo,
este cliente já foi submetido a inúmeras cirurgias e esperávamos que ele não tivesse capacidade de sentir, perceber e ter consciência corporal. Contudo, mesmo com
inúmeras cicatrizes no abdômen, ele consegue contrair
e controlar a contração da musculatura abdominal em
todo o Continuum da contração. Esse cliente tem muita
percepção, mas pouca capacidade contrátil.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
217
• Otimizar
• Desenvolver
• Conservar
TEM?
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Exercícos para
Performance
Interna
Exercícios para
Performance
Externa
TR
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N
Transformar o corpo
em um corpo melhor.
O Contínuo da contração
porção curta
longa
à
Capacidade
de produção de
tensão/Output
• Avaliar as propriedades contráteis
por comprimento.
• Desenvolver a integridade contrátil
por comprimento.
• Desenvolver a tensão contrátil
por comprimento.
• Reforçar/conservar a integridade
da contração e a tensão exigida
dentro do contínuo da contração.
A
IMENTO
MOV
O
ND
Habilidade
Treinamento de
performance
esportiva
Vida no dia a dia
Treinamento
Funcional
Tradicional
Cardio
• Não inclui o estímulo especí co
para tecidos especí cos.
• Não permite o estímulo em todo
o espectro da contração devido às
limitações do per l da resistência.
O cenário mecânico
facilita a compensação
Fig. 157.
c o n t i n u u m
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e x e r c í c i o
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
Temos outro cliente com quem passamos três
meses tentando ajudá-lo a sentir e ter controle sobre
a escápula. Ele tem muita capacidade contrátil e força,
mas o nível de consciência é muito baixo. Com ele,
achamos que o processo seria fácil, mas não foi. Esse
cliente é o oposto do primeiro – ele tem pouca percepção, mas muita capacidade contrátil.
Por isso, existe a necessidade de descobrir qual é
a peça do quebra-cabeça que está faltando para cada
cliente. Só assim poderemos inclinar nossos esforços
em escolher estímulos que tragam o suprimento para
aquilo que está faltando. Então, começamos o trabalho com aquilo que o cliente apresenta, com o que ele
[TEM] e, a partir deste ponto, começamos a mover
o estímulo progressivamente para aquilo que ele não
[TEM].
Na prescrição do exercício para a performance
interna estamos tentando desenvolver a capacidade
de tensão. Mesmo quando prescrevemos exercícios
para melhorar o equilíbrio, o cliente-paciente precisa
ter capacidade de tensão suficiente para se equilibrar
e poder corrigir onde o seu centro de massa está sob
o seu pé (base de suporte) e depois fazer os ajustes
necessários para se equilibrar. Primeiramente, é preciso ter a propriocepção (função sensorial) intacta na
planta do pé e, em segundo lugar, é necessário [TER]
capacidade de tensão suficiente para realizar as correções e os ajustes necessários. Pacientes diabéticos
normalmente possuem neuropatia e a sensibilidade
na planta dos pés é reduzida ou nula, isso impede a
percepção e a possibilidade de ajustes é reduzida, então precisamos considerar este fato antes de colocar
um cliente-paciente diabético sobre uma prancha de
equilíbrio.
Logo, se o cliente-paciente apresenta algum tipo
de contração e um pouco de capacidade de tensão
disponível, já é possível gerar uma contração muscular. Estudamos neste livro que, devido aos fatores
mecânicos, normalmente é mais fácil gerar uma contração muscular no comprimento médio do músculo.
Sendo assim, é neste ponto que devemos iniciar o trabalho da contração e, a partir daí, faremos com que
o comprimento contrátil alcance a parte mais longa
e a parte mais curta do músculo, e isso também é um
Continuum. Progredimos do médio para o curto e do
médio para o longo, entendendo que do comprimento médio para o curto o músculo é mais frágil e, por
esse motivo, devemos ser mais cautelosos para chegarmos nesta posição.
Quando o exercício é prescrito com foco na
performance interna, todas as variáveis do exercício
são monitoradas cuidadosamente e os exercícios são
executados com controle.
Qualquer atividade pode ser controlada por meio
dos sinais de advertência internos quando existe uma
mudança de foco e de atenção. Uma corrida de cinco quilômetros com o objetivo de queimar calorias,
realizada de maneira distraída e sem prestar atenção,
é considerada performance externa. Se a atenção for
alterada e o foco for mudado para os sinais internos
que o corpo emite de que é preciso parar, a corrida
acaba mesmo antes de alcançar os cinco quilômetros.
Neste caso, o foco passou a ser mais inclinado para
a performance interna. Desta maneira, as falhas que
aparecem no sistema devem ser corrigidas para que
no dia da competição ou nas atividades do dia a dia, o
corpo esteja “à prova de bala”. Quanto mais ignorados
forem os sinais durante a preparação, menos inteiro o
corpo estará no dia que mais importa. Este dia pode
ser o dia da competição para atletas ou todos os dias
para aqueles que buscam se exercitar para a saúde.
Observe o painel de controle,
não a linha de chegada.
220 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
c o n t i n u u m
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Fig. 158. A analogia da corrida de carro de Nascar: as 500 milhas. Dentro da
performance interna, é necessário que o
profissional esteja prestando atenção em
todos os sinais que o corpo emite para poder tomar decisões sobre o estímulo que
será aplicado e durante sua aplicação.
Podemos usar aqui uma excelente analogia para
demonstrar isso: a Corrida de Nascar – as 500 milhas
de Indianápolis. Os carros possuem inúmeros relógios
em todo o painel para indicar o que está acontecendo
no motor, mas existe apenas um indicador de velocidade. O painel dos carros de corrida indica tudo o que
está acontecendo com eles, e isso é importante porque,
se o motor quebrar, analogamente à performance interna, o carro nunca terminará a corrida. Durante as
500 milhas, o piloto e a equipe estão observando todos
os indicadores no painel de controle, mas não se focam na linha de chegada. Na verdade os carros passam
pelo lugar da linha de chegada 499 vezes e é somente na última volta que o juiz aparece com a bandeira.
Pense nisso! Para muitos, fazer pit stop (paradas estratégicas) não faz sentido porque se perde tempo, mas
não é sustentável completar as 500 milhas sem fazê-lo,
sem acrescentar combustível ou trocar pneus. Se as paradas não forem realizadas, não é possível terminar a
corrida com o carro sem quebrar.
Imagine que a população precisa realizar exercícios para saúde para restaurar, desenvolver e conservar a função, e será necessário realizá-los durante
a vida inteira. São muitos anos de aplicação de força
na estrutura, por isso a sua prática precisa ser sustentável. O fisioterapeuta precisa estar constantemente
verificando os sinais internos, que indicam o que está
acontecendo no “motor” (estrutura/função) para que
o cliente-paciente possa fazer todas as paradas estratégicas necessárias e para que possa terminar a corrida (a vida) com o “motor” (estrutura/função) o mais
íntegro possível.
Dentro da performance interna devemos criar
exercícios que gerem estímulos apropriados para todo
o comprimento contrátil e, para isso, será necessário
alterar a resistência de acordo com o comprimento
muscular. Exercícios tradicionalmente chamados de
funcionais [PE], quase nunca geram estímulos apropriados para cada comprimento contrátil. Normalmente, exercícios livres, como o agachamento, não
alcançam os comprimentos musculares mais curtos
do glúteo máximo. Neste exercício, quando o glúteo
máximo se aproxima do comprimento contrátil mais
curto, a resistência chega a zero devido ao braço do
momento também chegar a zero e, consequentemente, elimina o estímulo. Isto também acontece para a
musculatura do reto femural, como já mencionado
no capítulo sobre performance externa.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
221
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
Fig. 159. Exemplo do exercício de extensão do
quadril usando o cabo do pilates. Por mais que
o objetivo deste exercício seja gerar estímulo
para os extensores do quadril, ele é pouco eficiente para isso. Ele não alcança a oportunidade de estimular as porções mais curtas do
músculo e durante a extensão do quadril se a
massa da perna for superior à resistência aplicada no cabo, a resistência se torna assistência para os extensores do quadril e a massa da
perna se torna resistência para os flexores do
quadril.
Outro exemplo de exercício que estimula os extensores do quadril é a extensão do quadril em decúbito dorsal com os cabos do Pilates, e que também
não gera estímulo na porção mais curta do tecido
contrátil do glúteo máximo. Como o exercício é realizado em decúbito dorsal ele acaba quando a perna
encosta na máquina e deixa de gerar estímulos nos
20°/30° além do zero que potencialmente poderiam
ser estimulados. Além disso, precisamos ter cuidado
porque, se a resistência da massa da perna se torna
maior do que a resistência oferecida pelo cabo, a extensão de quadril se torna desafiadora para os flexores de quadril e não mais para os extensores.
Sendo assim, uma das melhores ferramentas
para gerar estímulo focado na contração muscular
são as máquinas de musculação. A máquina de extensão de perna, por exemplo, é a melhor fonte capaz
de gerar estímulo para o quadríceps com o joelho em
extensão. O mesmo acontece para o glúteo máximo.
A máquina de extensão de quadril é a melhor fonte
capaz de gerar estímulo adequado para esta musculatura em sua porção mais curta. Então ambas as máquinas precisam fazer parte do Continuum do exercício. Nenhum exercício livre faz isso. Exercícios de
extensão de joelho com caneleira ou com cabo/borracha, que geram estímulo para o quadríceps em sua
porção mais curta, possuem um perfil da resistência
contrário ao perfil da potência, o que não é ideal para
exercícios com foco na contração muscular. Então
precisamos conhecer todos estes fatores para escolher
os exercícios e as ferramentas corretas a serem utilizadas para melhor cumprir o papel de gerar estímulos
apropriados durante toda a amplitude muscular contrátil disponível.
Atenção: não é a máquina que faz com que o trabalho tenha foco na performance interna. A máquina
por si só não faz nada. Ela é somente a ferramenta. Se
o cliente-paciente sentar e empurrar a máquina sem
controle sobre a execução do exercício, é a mesma
coisa que praticar um esporte usando a performance
222 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
c o n t i n u u m
externa. Tão essencial quanto ter a ferramenta correta
para o estímulo é a maneira de execução do exercício.
Uma vez desenvolvida a performance interna,
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criamos exercícios específicos para desenvolver e otimizar a performance externa e usamos todas as partes internas para uma atividade específica.
Fig. 160. O comprimento
mais curto do músculo reto
femural é quando a articulação do quadril se encontra em flexão e a do joelho
em extensão.
Fig. 161. A máquina de
extensão de perna é uma
das poucas oportunidades
de estimularmos a musculatura do quadríceps em
sua porção mais curta com
um perfil de resistência
mais compatível com o da
potência, melhor do que
o exercício de extensão de
perna com caneleira, por
exemplo.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
223
Exercício Baseado no
Cliente-Paciente
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Fig. 162.
QUEM?
OBJETIVO?
TEM?
CONTROLA?
TUDO
COMEÇA
AQUI
U
tolera?
ma vez determinado onde cada articulação se
encontra dentro do Continuum Funcional, o
fisioterapeuta inicia um processo de raciocício para decidir como criar e onde iniciar o processo
de otimização da função/performance interna. Como
indicamos no capítulo sobre o profissional do exercício, todas as nossas decisões sobre o exercício precisam
ser baseadas no cliente. O cliente-paciente carrega em
si todas as respostas e informações necessárias para a
tomada de decisão dentro do Continuum do exercício.
Precisamos ser muito assertivos em criar perguntas [Fig. 162] para o cliente-paciente, tanto aquelas que necessitam de uma resposta verbal quanto
aquelas que serão respondidas por meio da observação. Manter um monólogo interno constante, saber
o que observar, o que manipular e o que esperar
que aconteça nos mantêm afastados da tendência de
prescrever exercícios predeterminados.
Como já indicado anteriormente, exercícios prescritos por fisioterapeutas devem considerar o indivíduo
antes do exercício. A capacidade de tensão, a amplitude
e a habilidade que ele [TEM] para você trabalhar é tudo
o que podemos usar para construir o exercício.
Existem cinco perguntas das quais derivam as
respostas necessárias para iniciar o processo de criação do exercício.
1. Quem é seu cliente-paciente?
Não qual é o nome dele, mas a sua estrutura, a
fragilidade, a habilidade, a estabilidade, a velocidade
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
225
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
e o controle do movimento, a intimidação em suas
expressões. Todos estes fatores e muitos mais podem
ser observados desde o primeiro momento em que
ele se apresenta diante de nós.
[Quem] não indica
um grupo demográfico!
[Quem?] representa um vasto espectro de características individuais de cada cliente, independentemente da
idade, pois encontramos muitos indivíduos de 70 anos que
muitas vezes possuem mais controle articular do que alguns
de 30. Pense no sedentário de 16 anos, no ex-atleta que ainda tem uma mentalidade de atleta, ou num atleta que não
possui mais tolerância articular ou sistêmica, ou ainda num
atleta que ainda não desenvolveu a tolerância. Pense nas
pessoas que nunca gostaram de se exercitar. Então, a idade
não é um indicativo de onde o cliente se encontra dentro
do Continuum Funcional. O que importa neste momento é
examinarmos qual é o controle contrátil, o estado articular, a
tolerância sistêmica e a capacidade de recuperação.
2. Objetivo?
O que você realmente precisa saber sobre os objetivos do cliente-paciente? O que realmente importa? Em geral, precisamos saber onde eles gostariam
de terminar, ou seja, qual o objetivo final… O que o
cliente-paciente gostaria de alcançar ou de realizar de
modo que, depois de determinar o seu estado atual,
sua habilidade e sua tolerância à prescrição do exercício sejam direcionadas para o objetivo final.
O objetivo parece ser um tópico simples para
ser definido, porém existem muitas questões a serem
avaliadas. Elas surgem a partir de uma “perspectiva
satélite” e evoluem para os detalhes que irão influenciar tanto a percepção do sucesso quanto o processo
em si para alcançá-lo. Existem quatro fatores que merecem consideração sobre o objetivo.
a. É necessário que o profissional traduza o
que o cliente-paciente indica como objetivo. O
que o cliente quer dizer com a expectativa dele
sobre o objetivo do exercício. Por exemplo,
quando ele diz que deseja praticar exercícios
para a saúde, isso envolve emagrecimento? Se
emagrecer for parte do objetivo, o cliente quer
diminuir o peso na balança ou ele quer diminuir dois números no tamanho da roupa? Estas são duas expectativas bem diferentes.
b. O objetivo envolve resultados externos ou
internos? Objetivos com resultados externos
envolvem: correr, andar, equilíbrio, saltar,
desenvolver alguma habilidade específica.
Objetivos com resultados internos envolvem:
melhora da saúde, diminuição da dor, melhora da função musculoesquelética, melhora da
tolerância neuromusculoesquelética.
c. Identificar quais são as exigências e os passos
no processo, quais são as partes que envolvem
o objetivo “satélite”, isto é, identificar o que está
faltando. Provavelmente, o exercício mais válido e apropriado em certo momento pode não
parecer estar em concordância com o objetivo.
d. Objetivo deste exercício (O.D.E.). Saber o
que esperar do estímulo que aplicamos é essencial para termos sucesso com o exercício.
As respostas às próximas três perguntas desfazem todas as generalizações sobre exercícios.
3. [TEM?]
Aquilo que o cliente-paciente [TEM],
performance interna, de função articular, de função
muscular, de função sensorial, de capacidade de tensão e que pode ser desafiado, ou seja, estimulado.
4. Controla?
O quanto o cliente-paciente controla e domina cada posição dentro das amplitudes de posições
226 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
c o n t i n u u m
articulares disponíveis. Para isso, é necessário ter capacidade de tensão contrátil suficiente, percepção e
habilidade de controle contrátil.
O controle é a ferramenta fundamental para
medir se o desafio é apropriado dentro da amplitude
e da capacidade de tensão. O controle é dependente da amplitude, da carga, do esforço, da velocidade
e da fadiga. Quando o controle contrátil não existe,
a contração não é sólida, ao contrário, ela é frágil e
perceptível à instabilidade do tecido em manter uma
posição. Quando o controle contrátil e o domínio da
contração muscular estão presentes, o cliente-paciente é capaz de parar a repetição em qualquer ponto da
amplitude com controle. Neste caso, ele também é capaz de parar nos dois pontos extremos da amplitude
de maneira sólida e sem arremessar o peso.
5. Tolera?
Os componentes neuromusculoesqueléticos do
cliente-paciente podem estar localizados individualmente em diversos pontos do Continuum Funcional
e cada articulação deve ser examinada individualmente e também coletivamente. Podemos “classificar” a tolerância de nossos clientes-pacientes como
excepcional ou comum [Fig. 163] (tolerância média
e baixa tolerância) e todas as variações entre estes extremos.
d o
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tolerância dentro do Continuum Funcional: ele consegue produzir alguma contração? Quando existe um
pouco de capacidade de tensão, normalmente existe
pouco controle sobre a contração e a tolerância possui um limiar muito baixo. Então, é importante lembrar que a congruência articular é influenciada pela
inabilidade da manutenção do controle articular ativo. Sendo assim, quando o limiar de tolerância local
é baixo, é necessário muitas vezes adequar o estímulo
para ser menor nos extremos da amplitude.
Pessoas que se enquadram como pessoas comuns, isto é, com tolerância média, não são tão saudáveis quanto aparentam. Estas são as pessoas que
possuem mais características de baixa tolerância do
que características excepcionais. Em indivíduos com
idade superior a 50 anos, a possibilidade de artrose,
condromalácia e osteófitos é alta. A tolerância sistêmica e a local precisam ser examinadas.
Por último, encontramos os excepcionais, que
são a minoria. Estes possuem alta tolerância, alta
habilidade, bom controle e boa percepção corporal.
Seus limiares de tolerância são altos e possuem também alta habilidade de compensação.
Precisamos identificar o nível de tolerância do
cliente-paciente antes de aplicar qualquer força em
sua estrutura. E, a partir daí, iniciar o processo de
progressão do exercício.
Fig. 163.
Considerações a serem examinadas quando nosso cliente-paciente se encontra no extremo de baixa
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
227
Resposta e Adaptação
c o n t i n u u m
Exercício é a aplicação de
um estímulo com
o objetivo de obter uma
Resposta e uma Adaptação.
O estímulo do exercício é composto por todas as
variáveis da equação:
Fig. 164.
A resposta e a adaptação são as “consequências”, isto é, são os resultados do estímulo aplicado,
podendo ser positivas ou negativas, agudas ou crônicas. Os termos “aguda” e “crônica” normalmente
são associados com lesão, ou seja, uma resposta a
uma adaptação negativa. Porém, esses termos também devem ser usados como resposta ou adaptação
positiva. Um exemplo de adaptação positiva crônica
(longo prazo) é o aumento da capacidade de tensão
contrátil; e um de resposta positiva aguda (curto
prazo) é a analgesia consequente de uma intervenção por TENS (transcutaneal electrical nerve stimulation).
Existe uma relação entre resposta e adaptação.
Uma adaptação é uma resposta, no entanto, uma
resposta nem sempre gera uma adaptação. Somente
quando uma resposta é repetida várias vezes ela é
capaz de gerar uma adaptação.
d o
e x e r c í c i o
Todo exercício tem algum grau de potencial
benefício, ou adaptação positiva, e também tem algum grau de potencial custo, ou de adaptação negativa. No passado, ensinávamos que exercícios apresentavam riscos e benefícios inerentes à sua prática,
contudo, verificamos que exercícios considerados
de baixo risco são os mais capazes de gerar adaptações negativas, como, por exemplo, a corrida; por
isso, hoje, o mais apropriado é considerar que todos
os exercícios apresentam tanto um potencial benefício quanto um potencial custo. Se o cliente sofrer
uma ruptura de um tendão durante um exercício,
este poderá ser reparado, mas, se o seu joelho sofrer um desgaste completo da cartilagem, não existe
maneira de repará-lo trazendo como consequência
a necessidade de uma nova articulação (artroplastia). Portanto, apesar da corrida ter um custo (o de
aumentar a chance de desgaste articular no joelho)
ela não é considerada de alto risco (porque a chance
de lesão aguda é pequena).
O potencial custo é determinado pelo quanto o
exercício vai exceder a capacidade funcional, isto é, a
função de um indivíduo (risco). Quanto mais o exercício se afastar da atual tolerância e das “disponibilidades” deste indivíduo, maior será o custo para ele.
Ele também é determinado pelo nível de inflamação,
que pode ser vista como “os processos associados
com a recuperação e/ou com o reparo” dos tecidos
musculares. O custo é influenciado pelo nível de atividade ao qual o cliente-paciente está acostumado e
é determinado pela quantidade de aplicação dos seguintes fatores:
• Força:
quantidade, direção e onde foi aplicada;
• Duração:
durante quanto tempo a força é aplicada;
• Frequência:
com que frequência a força é aplicada;
• Qualquer contraindicação verdadeira para um
exercício específico.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
229
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
Se estes fatores forem excedidos além da tolerância do indivíduo, o custo do exercício aumenta. Por mais que o potencial custo seja inerente a
toda prescrição de exercício, não é correto afirmar
que certo exercício é contraindicado. Essa palavra
significa que, para um pequeno conjunto de circunstâncias (lesão, anomalia etc.), um exercício
bem específico (aplicação de força, posição da articulação, movimento da articulação ou amplitude
de movimento específica) é desaconselhável neste
momento devido ao risco associado de danos a tecidos ou estruturas bem específicas. Se um exercício é “genericamente contraindicado”, quer dizer,
perigoso para todos, então ele simplesmente possui
um alto risco.
Já o potencial benefício é determinado pela
eficiência e eficácia em relação ao O.D.E. (Objetivo
Deste Exercício). Quanto menor for o custo e maior
for o benefício, mais eficiente será o exercício.
Quando prescrevemos um exercício, esperamos uma resposta e uma adaptação positiva, seja
ela aguda (imediata) ou crônica (em longo prazo).
Um exemplo de resposta aguda positiva é o aumento da Amplitude de Posições Articulares Disponíveis (ADPAD) ou a diminuição da dor após uma
manipulação articular ou após um exercício isométrico. Depois de uma resposta positiva aguda, existe a necessidade desta resposta se tornar uma adaptação crônica para que a manutenção desta nova
posição seja alcançada. Para isso, são necessários
estímulos com potencial de aumentar a capacidade
de tensão do tecido contrátil (exercícios) em torno
desta articulação com a finalidade de torná-la mais
tolerante e capaz de conservar esta nova posição.
Ao prescrevemos exercícios em que a saúde/função
do cliente-paciente é o principal objetivo, devemos
pensar sempre em longo prazo. Temos que ter em
mente que esta pessoa necessita se exercitar por 30,
40, 50 anos, e o efeito da força aplicada durante o
exercício terá consequências em longo prazo e não
podemos comprometer a sua saúde articular para
obter um resultado muscular imediato.
O objetivo da prescrição do exercício é gerar
adaptação. Desejamos que algo se adapte, desejamos uma mudança, desejamos uma resposta positiva e uma adaptação positiva. Positivo significa
que ele se encaixa em seu objetivo e reduz qualquer possibilidade do custo do exercício. É isso
que realmente estamos procurando, porém: O que
é necessário para gerar uma mudança? O que você
deseja mudar? Essas são perguntas fundamentais
que precisam ser respondidas para atingir o objetivo.
Todo estímulo aplicado e sua consequente adaptação devem acontecer com a intenção de
estar sempre alcançando a homeostase. Por definição, homeostase é o estado de equilíbrio de um
sistema. O livro Principles of Neural Science diz
que “homeostase é a constância do ambiente interno” (KANDELL; SWARTZ; JESSEL, 4a edição).
No mundo do exercício existe o pensamento que
a homeostase não é algo almejado. Existia a ideia
de que precisávamos estar sempre oferecendo estímulos diferentes para o corpo “não se acostumar”
ou não se adaptar a um estímulo, e se a homeostase
acontecesse não existiriam mais mudanças. Acreditamos que essa conclusão tenha sido tirada da
definição que diz que “homeostase é o estado de
equilíbrio”, e o equilíbrio aqui é interpretado como
ausência de mudança. No entanto, são os processos em busca deste equilíbrio que geram a esperada
adaptação.
O medidor na Fig. 165 indica a quantidade de
desafio (estímulo) aplicado ao corpo. Esta quantidade precisa ser apropriada em cada repetição, em
cada exercício e em cada sessão de exercícios. Dependendo do estímulo aplicado o ponteiro do medidor pode se deslocar para o lado esquerdo, o lado
negativo (-), ou para o lado direito, o lado positivo
(+) ou permanecer no centro, equilibrado (H).
230 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
c o n t i n u u m
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e x e r c í c i o
Fig. 165. O “medidor do desafio” para monitorar a quantidade de estímulo a ser aplicado durante cada exercício e cada sessão
de exercício. Para o objetivo da prescrição do
exercício para a saúde, para que o estímulo
gere uma adaptação positiva, basta aplicar o
mínimo de estímulo necessário, mantendo o
ponteiro do desafio dentro da zona “verde”.
Todas as variáveis da equação do exercício devem ser consideradas com critério ao criar o
desafio que será aplicado. Nada impede que
o profissional decida aplicar um desafio maior
e dentro da área amarela, desde que tenha
certeza de que é necessário para o objetivo e
apropriado para o cliente-paciente.
Consideraremos três exemplos hipotéticos utilizando a força da gravidade como um indicativo do
estímulo e consequente resposta e adaptação (homeostase) correspondentes.
1. [H]
Manutenção do estímulo atualmente acostumado. Vivemos no mundo onde existe a força da
gravidade. Nosso corpo já está adaptado ao constante estímulo desta força e a tudo ao que estamos
acostumados a fazer em nosso dia a dia dentro
deste cenário mecânico e, consequentemente, em
homeostase. Se não aplicarmos nenhum estímulo
diferente daquilo com que o corpo já está acostumado, o ponteiro do estímulo continua no centro e equilibrado. A homeostase aqui permanece
inalterada.
2. [ - ]
Aplicação de menos desafio (estímulo) do que
está acostumado. Considere a hipótese do estímulo da força da gravidade, por algum motivo, não
existir mais. Nesta situação, o ponteiro da quantidade de estímulo sai do centro movendo-se para
o lado esquerdo do medidor, indicando que agora há menos estímulo do que estava acostumado.
Com as informações “acabou o desafio oferecido
pela gravidade”, “agora não é difícil se levantar”,
para alcançar o novo equilíbrio do “mundo sem
gravidade” o cérebro diz “vamos nos livrar destes
músculos e destes ossos que não precisamos mais,
porque, agora eles só são um desperdício de energia, vamos absorvê-los e usar esses minerais e essas proteínas”. Como visto anteriormente, este trabalho do cérebro é muito eficiente. A partir destas
informações, o sistema (corpo) vai fazer todas as
adaptações necessárias para que esta nova realidade passe a ser o novo ponto de equilíbrio.
Neste caso, em que não teríamos mais o estímulo da força da gravidade, todas as respostas e adaptações aconteceriam para alcançar um novo estado
de equilíbrio, então a nova homeostase se encontraria com a musculatura mais atrofiada e com menos
densidade óssea.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
231
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
3. [ + ]
Aplicação de mais desafio (estímulo) do que
está acostumado. Utilizando o estímulo adequado,
e com o mínimo necessário de aumento no desafio,
o ponteiro se moverá para a direita promovendo um
estímulo com potencial positivo. Porém, é necessário
que o ponteiro seja movido de maneira apropriada.
Cada fator da equação do exercício tem um papel importante no momento do profissional decidir “quanto” de desafio vai aplicar em seu cliente-paciente.
Com o estímulo apropriado, o cérebro vai adicionar tudo que for necessário, proteína, músculo, mais
cálcio nos ossos etc., em quantidades suficientes para
que o novo desafio (estímulo) aplicado (que o clientepaciente não estava acostumado), torne-se o novo estado de equilíbrio, quer dizer, a nova homeostase. O
que transforma o corpo é este processo de adaptação
que todos os sistemas sofrem para que este novo estímulo [PM+RS+I/E+TF] seja percebido como nível
“já acostumado”. O resultado é obtido pela constante
procura deste equilíbrio.
O desafio é saber até que ponto pode-se “mover
o ponteiro do medidor” em um determinado dia e o
quanto de força o nosso cliente-paciente tolera. A homeostase refere-se à capacidade do organismo de se
adaptar ao ambiente que ele experimenta com mais
frequência. Este estado de equilíbrio é mantido dentro do corpo por um requintado sistema de regulação
e feedback.
O objetivo de qualquer exercício é a adaptação
positiva, é mover o “ponteiro do medidor” e estimular uma mudança, buscando alcançar a homeostase
dentro de um sistema (corpo) mais tolerante ou muitas vezes conservar aquilo que o corpo tem. Alguns
erroneamente pensam que a homeostase é um inimigo porque é um impedimento para o progresso, mas,
na verdade, este é o processo que desenvolve o corpo
em uma tentativa de recuperar a “relativa facilidade” em suportar as novas exigências (anabolismo).
Também é o processo pelo qual os nossos corpos
eliminam qualquer tecido que não seja mais necessário (catabolismo).
Esses processos pelos quais a homeostase é alcançada, ocorrem em um nível microscópico e cada tipo
de tecido tem uma diferente taxa de resposta de adaptabilidade. Então, os processos pelos quais a homeostase é mantida podem ser melhor entendidos como
acontecendo por meio de microadaptações. Este é um
fator importante para a compreensão da progressão.
A progressão do cliente-paciente pode ser identificada a cada sessão de exercícios, quando observamos
a microadaptação, por isso devemos medir o progresso
de forma diferente. Devemos observar o controle sobre
a contração e sobre o movimento. Ao observarmos os
detalhes podemos adicionar pequenas quantidades de
estímulo, constantemente, porque estamos prestando
atenção ao que muda. Quando necessário voltamos
atrás em aspectos que, muitas vezes, outros profissionais não voltariam, porque estamos observando o progresso “constante” dentro da microadaptação.
A homeostase e a microadaptação
O que produz mudança é a tentativa do corpo em
gerar a “facilidade” e a “normalidade”.
Para gerar adaptação e estimular a homeostase, é necessário aplicar um pouco mais de desafio
do que o cliente-paciente está acostumado, mas não
deve ser em excesso, então, a quantidade de estímulo necessário para gerar mudança ou para manter
aquilo que já existe vai depender de quem é o nosso
cliente-paciente. Por isso, precisamos criar exercícios
com o tipo de resistência apropriada para cada indivíduo, cada sessão, cada exercício e cada repetição.
Existem dois extremos para criarmos o estímulo para uma sessão de exercícios dentro do que é
apropriado para estimular a homeostase: o mínimo
necessário para gerar mudança ou o máximo tolerado. Entre estes extremos, existe um Continuum de
possibilidades. Quando a tolerância e a habilidade
do cliente são muito baixas, o mínimo de estímulo
232 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
c o n t i n u u m
necessário é também o máximo tolerado, porém,
quando a tolerância e habilidade do cliente-paciente
são altas, este cenário muda.
Analogia: Considere a diferença do processo de
desenvolvimento de um calo e de uma bolha. Uma
bolha é formada quando muita força é aplicada num
mesmo lugar com pouco tempo para a adaptação,
você sente quando ela aparece, exigindo sua atenção
imediata. Quando um calo é formado, ele não chama atenção imediatamente, pois sua formação só é
perceptível ao final do processo, quando a pele já se
adaptou progressivamente e apropriadamente.
Para gerar adaptação da
performance interna
[função], os números
não se aplicam!
Para gerar a adaptação/mudança esperada na
performance interna (função), a progressão através
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de parâmetros numéricos (de séries, de repetições, de
peso etc.) não se aplica. Estes números são aleatórios e
voltados para resultados externos. Para a performance
interna, observamos a homeostase e todos os aspectos da adaptação (o controle sobre a contração, sobre
o movimento, sobre o trajeto, a amplitude de movimento etc.) e usamos estes como parâmetros e como
indicativo de adaptação e progressão.
Toda adaptação gerada nos tecidos contráteis e
não contráteis, seja positiva ou negativa, acaba sendo parte do novo cenário da estrutura do indivíduo
[função/TER] e a adaptação obtida é transferida para
todas as atividades (exercícios, métodos ou esporte)
que realizará. Quando trabalhamos um joelho tornando-o melhor, temos um joelho melhor para tudo,
para correr, para praticar esportes, para sentar e levantar. Ao iniciarmos o processo de construção de
exercícios, já precisamos ter em mente que todas as
adaptações geradas na estrutura, na anatomia, transformam o corpo em uma máquina melhor e esta terá
mais e melhor disponibilidade [TER] para ser usada
e colocada à prova durante as atividades da vida cotidiana ou do esporte.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
233
Continuum do exercício e o
O.D.E. [objetivo do exercício]
c o n t i n u u m
O
Continuum do exercício é a organização do
raciocínio crítico para as decisões a serem
tomadas diante das escolhas de estímulos
que podemos aplicar. Cada estímulo possui uma
adaptação esperada, isto é, cada estímulo tem o potencial de gerar uma adaptação específica.
Os princípios da Mecânica Articular, Mecânica
Muscular e Mecânica da Resistência (A Mecânica do
Exercício) são a realidade “física” de todos os componentes a serem manipulados para criarmos os desafios apropriados para clientes-pacientes.
Já estudamos que existe uma diferença fundamental entre performance externa e performance
interna dentro da prescrição do exercício e, então,
no momento em que vamos construir ou escolher
um estímulo mecânico (exercício), o primeiro passo é determinar se queremos influenciar a contração muscular [PI] ou o movimento [PE]. Esta decisão deve ser tomada diante de cada exercício que o
profissional prescrever. O profissional precisa saber
o Objetivo “DESTE” Exercício, para ter certeza que
o estímulo escolhido vai de encontro com o que se
espera de adaptação.
Objetivo Deste Exercício – O.D.E.
Existem dois objetivos fundamentais para cada
exercício [O.D.E.]:
1. Estimular um tecido específico (por exemplo,
um exercício para a musculatura abdominal):
para isso, existe a necessidade de desafio, de estímulo focado, performance interna [PI];
2. Utilizar o tecido pronto dentro de um sistema
(por exemplo, um exercício que envolve a musculatura abdominal): desafio disperso, performance
externa [PE].
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escolha e quais aspectos estão sendo sacrificados? Se
escolhermos exercícios com foco na contração muscular, sacrificamos o treinamento da habilidade; se
escolhermos estímulos que exijam muita habilidade,
sacrificamos o estímulo para a contração muscular.
Esta escolha é específica e individual para cada exercício, não é uma escolha para a sessão inteira. Podemos criar exercícios com diferentes objetivos dentro
de uma mesma sessão de exercícios. Precisamos ter
o cuidado de não deixar que métodos e modas limitem a prescrição do exercício a estímulos que se encontrem somente em um extremo do Continuum do
exercício e, consequentemente, limitem a possibilidade de evolução do seu cliente-paciente.
Por exemplo, a nova tendência do mundo do
exercício (moda) tem disseminado a ideia que trabalhar músculos isoladamente é ruim porque não treina
os músculos da maneira com que trabalham ou funcionam normalmente e, consequentemente, esta maneira de trabalhar os músculos não seria funcional.
Para sabermos o que realmente acontece nestes tipos
de exercício, precisamos aprofundar o estudo sobre
músculos trabalhando isoladamente ou não e, para
esta análise, precisamos trazer a mecânica do exercício para o cenário.
Exercício isolado
é diferente de exercício
com desafio focado.
Uma vez que o objetivo seja determinado, iniciamos o processo de criação do estímulo (desafio,
exercício) específico. Quais aspectos ou formas
de estímulo/desafio são oferecidos com a minha
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
235
CONTINUUM DO EXERCÍCIO
MUNDO TRADICIONAL DO EXERCÍCIO
TÉCNICAS MANUAIS
AVANÇADAS
PERFORMANCE EXTERNA
PERFORMANCE INTERNA
FUNÇÃO
TEM?
» OTIMIZAR, DESENVOLVER
TRADIÇÃO
IARTICULAR
UN
< ADMA
ADMA
ADMA +
ADMAA
Menos fatores administrados
Maior o potencial de
output dependente do
nível de controle
> ADMA
MLTART
PR = PE
TRAJETO
GUIADO
ADMR
TRAJETO
GUIADO
MENOR
VÁRIAS COMBINAÇÕES
SUPORTE
HABILIDADE NECESSÁRIA
MODA
AVANÇADO
SUPORTE
SEGMENTAÇÃO
MODA ATUAL
FOCO
EXTERNO
VISANDO A
MELHORA DA
HABILIDADE
MAIOR
JUST
DO IT
PRÁTICA
PERFEITA
Mais fatores administrados
»
ADCCD
»
ADPAD
USAR?
IEP ou HÍBRIDO
TENSÃO
Menor estímulo
para tensão
Tudo além da ADMAA exige um certo nível de habilidade do cliente.
O nível de habilidade varia da manutenção da posição para administrar muitos fatores juntos.
Fig. 166. Con ra explicação detalhada na página 243.
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A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
Fig. 167. A prancha é um exercício
em que todos os músculos do corpo estão trabalhando em isometria,
sem nenhum movimento. Mesmo
assim é considerado integrado pelo
mundo “funcional”.
Quando falamos sobre exercício isolado, precisamos
diferenciar entre movimento articular isolado e isolamento
de um único músculo. Exercício que move somente uma
articulação é diferente de exercício que gera estímulo para
um único músculo. Estudamos nos capítulos da mecânica
articular e da mecânica muscular que não existe como isolar somente um músculo durante um exercício, pois todo
exercício é integrado. Na realidade, não é possível isolar
um músculo, mas é possível escolher mover somente uma
articulação, mas isso não significa que apenas um músculo
esteja recebendo o estímulo (sendo trabalhado).
Para podermos analisar o conceito de isolamento e integração que hoje tem sido disseminado, vamos
avaliar e comparar – por meio da mecânica – alguns
exercícios que se tornaram populares por serem considerados “funcionais”.
O primeiro é a prancha [Fig. 167]. Este exercício
tem como objetivo estimular a musculatura do core
(tronco) sem movimento nenhum, 100% da musculatura em isometria, em que todo o foco do exercício está em conseguir manter o corpo estático. Para
o mundo “funcional”, este exercício é considerado
integrado, mesmo sem mover nenhuma articulação.
O segundo exemplo é o exercício de lenhador
[Fig. 168], no qual todas as articulações do corpo estão
se movendo e que também é considerado integrado.
Estes são dois exemplos de exercícios classificados atualmente como funcionais por serem considerados integrados, com a diferença que no exemplo da prancha não existe movimento em nenhuma
articulação. Já no exemplo do lenhador quase todas as
articulações estão em movimento. Então, acreditam
que, para ser considerado “funcional”, o exercício tem
que “mover” todas as articulações. Porém, se o exercício mover somente uma articulação e todas as outras permanecerem estáticas, acreditam que o exercício seja isolado e, consequentemente, não funcional.
Qual é a lógica deste conceito?
Fig. 168. Durante o exercício do lenhador
todas as articulações do corpo estão em
movimento. Ele também é considerado integrado pelo mundo “funcional”.
238 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
c o n t i n u u m
O terceiro exemplo é o exercício em uma cadeira extensora [Fig. 169], no qual uma articulação se
move e todas as outras estão estáticas. Este exercício
oferece suporte com a cadeira, mas ainda assim o retofemural puxa na pelve anteriormente e os isquiotibiais posteriormente e, para que a pelve não se mova
e permaneça estável, precisamos ter a participação
de todos os músculos estabilizadores do quadril, da
coluna, do tronco etc. Analisando este exercício, podemos concluir que, mesmo movendo somente uma
articulação (e deixando todas as outras estáticas), temos muitos músculos trabalhando, logo ele não pode
ser considerado “isolado/não funcional”. Este mesmo
cenário mecânico se repete em todos os outros exercícios considerados isolados.
Fig. 169. O exercício de extensão de joelho na cadeira extensora move somente uma articulação,
porém muitas outras estão recebendo estímulo.
Elas estão trabalhando para se manterem estáticas, em isometria. No “mundo funcional”, esse
exercício é considerado isolado e consequentemente “não-funciona”, porém do ponto de vista
da mecânica esta “classificação não é coerente.
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Na realidade da mecânica do exercício, se existe um Braço do Momento para alguma articulação,
então existe resistência para todas as articulações de
controle ativo [Fig. 170]; quer escolhamos movê-la
ou não, a musculatura em torno daquela articulação
está trabalhando arduamente para mantê-la estática.
Sendo assim, não existe isolamento muscular.
Fig. 170. Exemplo da flexão do ombro
resistida. O movimento acontece na articulação do ombro. O halter posicionado a certa distância do eixo dessa articulação gera
um braço do momento e, por consequência,
torque para o ombro. Porém, não é somente
para a articulação do ombro que existe um
braço do momento. Na verdade, o halter na
mão está gerando um braço do momento
para todas as artiulações de controle ativo.
Então, todas estas estão sendo desafiadas,
quer se movam ou não.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
239
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
Todos os exercícios geram estímulos para todas as
articulações de controle ativo. Isso não quer dizer que
todas as articulações são desafiadas da mesma maneira ou com a mesma intensidade. Na verdade, o que o
mundo tem chamado de isolamento quando enxerga
um exercício é quando alguns músculos são desafiados
mais do que outros porque são eles os responsáveis por
mover a resistência enquanto outros são responsáveis
por manter a estabilização. Este é o mesmo cenário que
acontece em todos os exercícios, independentemente
do número de articulações que se movem.
Temos que saber construir exercícios apropriados para otimizar o que o cliente-paciente [TEM]
independentemente de “nomes” ou julgamentos
preestabelecido. Temos que aplicar os princípios da
mecânica articular, da mecânica muscular e da mecânica da resistência para ajudar a estrutura deste cliente-paciente, otimizando sua função e melhorando sua
posição dentro do Continuum Funcional.
Cada variável da
equação do exercício
compõe um continuum em
si mesma e
exige que o profissional
tome decisões
sobre cada uma delas em
cada exercício.
Fig. 171.
1. Posição (P): decisões sobre as opções de posição.
2. Movimento (M): decisões sobre o movimento.
[PM] são as posições e movimentos exatas das
articulações escolhidas para o exercício. Da perspectiva mecânica, as articulações são os centros fundamentais da posição e do movimento. Aqui, as “articulações” incluem o “músculo” e também qualquer
fator que o habilita a controlar uma articulação. Isto
envolve todo o sistema de produção de força interna e
seus sistemas: sensorial, muscular e articular.
Um exercício é composto por posições articulares estáticas e por movimentos articulares. As
articulações que devem estar estáticas durante o
exercício são tão importantes quanto as que estão se movendo. Se uma articulação que deve estar estática se move durante o exercício, os perfis
da resistência e da potência são alterados e normalmente isso acontece inconscientemente para
diminuir o desafio. Então, controlar as articulações que devem permanecer estáticas é essencial.
Outro fator a ser considerado sobre P/M é que os
músculos biarticulares influenciam duas articulações. O posicionamento da articulação adjacente
(do outro lado da inserção do músculo biarticular) para a realização do exercício vai alterar o
perfil da potência, então ela deve ser escolhida e
mantida com cautela.
3. Suporte/Restrição (S): Decisões sobre o
Continuum do suporte e da restrição.
Quanto mais apoio e restrição tiver o exercício,
mais focado no tecido será o desafio. Se o objetivo
do exercício for influenciar a performance interna e
a função, será necessária a presença tanto do apoio
quanto da restrição. Quanto menor for o apoio e menos restrição tiver o exercício, maior será a dispersão
do estímulo entre diferentes articulações para a execução do exercício e, consequentemente, o exercício
se inclinará mais para a performance externa.
240 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
c o n t i n u u m
Se o objetivo for melhorar
a tolerância de um tecido
específico, será necessário
que o suporte (apoio) esteja
próximo da articulação
que está se movendo.
Exercícios sem apoio ou com apoio utilizando
pranchas de equilíbrio ou bolas não geram estímulos suficientes para tecidos específicos (ANDERSON;BEHM, 2004), e ainda eliminam a possibilidade
de melhorar a capacidade de tensão ou a capacidade
de contração muscular de um tecido. É necessário ter
critério em relação a qual é o seu objetivo antes, por
exemplo, de colocar uma bola como base de suporte
para um cliente-paciente realizar um exercício.
4. 4. Resistência (R): Decisões sobre a resistência estratégica e sobre o perfil da resistência.
A resistência precisa ser apropriada em todos os
seus aspectos para que o objetivo seja mantido até a
última repetição da série. Quando a resistência não
é adequada ou se durante a série os detalhes da posição, do movimento e da intenção (as quais alteram
a resistência) deixam de ser monitorados, o exercício
pode deixar de influenciar um tecido [PI] e passar a
ter um estímulo disperso [PE] e o objetivo do exercício [O.D.E] não será atingido.
O estudo da mecânica da resistência, apresentado nos capítulos anteriores, indica os fatores mecânicos necessários para manipular o exercício para
cada indivíduo. Na verdade, precisamos entender e
manipular o perfil de resistência exato para que as
mudanças sejam estratégicas:
a. Perfil da resistência [PR] são as mudanças
na demanda. Por exemplo: “onde está difícil e
onde está fácil”;
b. Perfil da resistência é afetado pela direção,
d o
e x e r c í c i o
pela magnitude e pelo posicionamento da carga relativa à articulação/às articulações;
c. “Sobrecarga” ou, melhor, “carga ideal” para
estimular uma adaptação/mudança.
Decisões sobre [P/M] são
tomadas ao mesmo tempo
em que as decisões sobre
[R/S]. Estes quatro componentes formam o exercício.
5. Intenção (I): Decisões sobre a intenção
(aplicação avançada).
As decisões sobre a intenção também determinam se o resultado de um exercício será direcionado
à performance interna ou à performance externa. A intenção interfere diretamente no perfil da resistência.
A maneira com que ensinamos (intenção) o clientepaciente influencia como ele vai mover a carga/peso;
se ele mover a carga sem controle sobre a inércia, haverá interferência na mecânica da resistência (altera
o perfil da resistência), na mecânica muscular (altera
o perfil da potência) e na mecânica articular (altera as
forças articulares).
A intenção é o que o profissional ensina (indica)
para o cliente-paciente fazer durante o exercício. Nas
mãos certas, a intenção tem o potencial de ser a maior
influência no resultado do exercício, englobando todos os fatores acima e transformando um exercício
descuidado em estratégico ou um exercício sem sentido em significativo:
a. Intenção e posição/movimento [I e P/M]
significa o cliente-paciente ter o controle para
garantir a exatidão e precisão do exercício;
b. Intenção e resistência [I e R] significa o
esforço sendo estrategicamente direcionado contra a restrição, alterando a direção da
resistência e, consequentemente, a própria
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
241
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
resistência. Pode ser uma ferramenta para alterar as forças articulares, a ação do músculo
e a sensação;
c. Intenção e Esforço [I e E] significa o esforço focado que altera estrategicamente a
“intensidade”.
Por este ser um livro básico de mecânica do exercício, a intenção será explorada superficialmente no
capítulo sobre a orquestração, pois é necessário um
estudo mais amplo para seu completo entendimento.
6. Esforço (E): Decisões sobre o esforço.
É quão difícil ou fácil o cliente-paciente está trabalhando durante cada repetição do exercício, independentemente da carga aplicada.
O Esforço vai determinar quantas vezes será possível repetir o estímulo e também qual a frequência
que será apropriada, quer dizer, quando será apropriado que o indivíduo retorne para este exercício ou
para um estímulo semelhante.
7. 7. Tempo (T): Decisões sobre tempo.
As decisões sobre esforço e tempo são lineares e crescem de menos para mais e de menor para
maior de acordo com o objetivo e a tolerância do
cliente-paciente. Esta é uma variável muita ampla,
está relacionada com “como vamos realizar o exercício” e envolve decisões sobre:
a. Velocidade do movimento: é dependente
da progressão, do controle e da resistência.
São, na verdade, as acelerações e desacelerações de cada fase. A aceleração deve ser monitorada constantemente, pois é um fator que
interfere diretamente na resistência por meio
da inércia;
b. Duração: são as repetições, as séries, o treino, o descanso e a frequência do exercício.
Porém, para a prescrição clínica do exercício
para a otimização da performance interna,
utilizamos os números de série e repetições,
bem como o tempo, como referência na documentação. Não utilizamos esses parâmetros
como forma de progressão. Para a progressão
utilizamos, como parâmetros, o controle e a
tolerância, independente dos números.
8. Frequência: Decisões sobre frequência.
Existe a necessidade de voltar e de fazer novamente. Se não retornar e não fizer o exercício novamente o estímulo de pouco valeu. Frequência significa que “haverá outro”. Se não houver outro dia para
estimular aquele tecido não há qualquer razão para
fazer o exercício hoje.
• Orientado a
padrões de
movimento,
performance externa
• Orientado a
componentes
da função,
performance interna
• Menos
apoio externo
• Mais
apoio externo
• Trajetos de
movimentos
controlados ativamente
• Maior grau de
restrição no trajeto
(trajeto guiado)
• Base pequena
apropriada ou
plataforma instável
• Base de apoio
estável
• Diminui a
capacidade de
sobrecarregar
• Aumenta a
capacidade de
sobrecarregar
242 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
Fig. 172.
c o n t i n u u m
9. Apropriado [A]
Apropriado aqui tem o sentido de adequado.
As variáveis anteriores, de 1 a 8, precisam ser pensadas, apropriadas e adequadas para cada indivíduo:
a. É determinado pela progressão e pela habilidade atual do cliente-paciente;
b. É necessário conhecer a estrutura e os efeitos das ferramentas que temos disponíveis,
identificando o que é preciso para gerar estímulos adequados específicos a cada cliente.
Para a criação de um
exercício, é necessário Criar
o desafio estrategicamente.
Função
O Continuum do Exercício se refere à criação de
estímulos mecânicos estratégicos para influenciar o
Continuum Funcional. Então, vamos analisar dentro
de cada etapa do Continuum Funcional, quais são as
características mecânicas do estímulo, ou seja, do
exercício, que são mais apropriadas para influenciar
positivamente o tecido nesta etapa.
EXERCÍCIOS PARA INFLUENCIAR O TER?
São estímulos criados para otimizar e desenvolver a função a qual envolve a capacidade de tensão
ou output.
Desenvolvendo e Otimizando a FUNÇÃO:
Fig. 173.
d o
e x e r c í c i o
Função é composta por:
[ADPAD]
Amplitude de Posições Articulares Disponível
[ADCCD]
Amplitude de Comprimentos Contráteis Disponível
Quando existe uma disfunção ou quando a sensibilidade contrátil e a capacidade contrátil estão
ausentes em alguma posição e, consequentemente,
a capacidade de mover o membro em uma posição
específica está “faltando”, a intervenção mais adequada exige técnicas manuais avançadas. Estas técnicas
podem iniciar com a mobilização articular seguidas
por contrações isométricas de baixa intensidade para
restaurar a qualidade da contração muscular.
Capacidade de tensão
Desenvolvendo e Otimizando a Capacidade de
Produção de Tensão (output):
Fig. 174.
Os exercícios de performance interna, que têm
como objetivo otimizar a qualidade e a quantidade
da contração muscular (capacidade de tensão contrátil), devem ser sobrecarregados em somente uma
articulação para diminuir a necessidade de habilidade durante a execução do exercício. Quando o
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
243
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
exercício é uniarticular, a possibilidade de criar um
perfil da resistência compatível com o perfil da potência é maior, tornando o desafio mais focado no
tecido e isso é uma exigência quando a necessidade
da otimização da capacidade de tensão é presente.
Também obrigatoriamente necessitam de apoio e
restrição próximos da articulação, garantindo que o
desafio será focado.
Exercícios uniarticulares
1. Capacidade de tensão < ADMA
(amplitude de movimento ativa):
Neste cenário, o músculo não possui capacidade
de produzir tensão suficiente para superar o peso do
membro contra a resistência (gravidade) em uma posição específica (perfil da resistência).
Intervenção: criar exercícios para desenvolver a
sensibilidade da contração muscular por meio de técnicas manuais avançadas e de exercícios isométricos
em posições específicas para a otimização da sensibilidade da contração e, posteriormente, a quantidade
de contração. O desafio deve iniciar dentro da ADMP
(amplitude de movimento passiva), progredindo para
a ADMAA (amplitude de movimento ativa assistida)
até alcançar a ADMA.
Quando o cliente-paciente alcançar uma amplitude em que a contração muscular seja produzida,
o fisioterapeuta então inicia o trabalho de estímulo
para melhorar a qualidade dessa contração. Normalmente a contração é mais fácil de ser produzida na
porção média do comprimento contrátil, então é nesse ponto que, provavelmente, o estímulo da contração
deve iniciar. A partir daí, a progressão deve ser feita
em direção a comprimentos contráteis mais longos e
depois mais curtos.
Uma vez desenvolvida a qualidade da contração,
isto é, a contração já se mostra mais sólida em certo
comprimento. Ali é possível iniciar o trabalho de otimização da quantidade da contração com a aplicação
de desafio com resistência manual e isometrias até
que a capacidade de produção de tensão aumente o
suficiente para que a tensão seja capaz de igualar ao
peso do membro.
2. Capacidade de tensão = ADMA
Aqui, existe capacidade de produção tensão contrátil suficiente para igualar com o peso do membro
contra a resistência. Intervenção: criar exercícios
para otimizar a quantidade da contração muscular
por meio de um cenário mecânico apropriado dentro da tolerância do cliente-paciente. Esse cenário
exige o cuidado de ter o perfil da resistência compatível com o perfil da potência e isso deve acontecer
sobrecarregando somente uma articulação em cada
exercício. A necessidade de apoio/suporte e restrição deve estar presente.
3. Capacidade de tensão > ADMA
Neste momento, a capacidade de produção de
tensão já é suficiente para superar o peso do membro
contra a resistência. Intervenção: uma vez que neste
cenário já é apropriado adicionar sobrecarga (ADMR
– amplitude de movimento resistida), o exercício a ser
criado exige um cenário mecânico com mais suporte próximo à articulação que se move. O movimento deve ter seu trajeto guiado com maior restrição
para que o potencial de otimização da capacidade de
tensão seja elevado e a necessidade de habilidade de
coordenação específica seja baixa. O perfil da resistência precisa se encaixar ao máximo possível dentro
do perfil da potência para que o estímulo seja apropriado e não incentive a compensação.
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Fig. 175. Essa é uma máquina de flexão de joelho sentada. É um exercício uniarticular que possui suporte e restrição necessários para
alcançar a possibilidade de gerar estímulo focado na contração muscular.
Essa máquina estimula o músculo isquiotibial do comprimento mais longo até o
médio. O perfil da resistência inicia mais
fácil e fica mais difícil durante o trajeto
devido às manipulações do braço do
momento feitas pelo CAM. Atente-se
que cada máquina oferece um perfil da
resistência diferente. É necessário que o
profissional examine-o caso a caso.
Fig. 176. Cadeira extensora com estímulo para o quadríceps. Este é um exercício uniarticular que possui suporte.
Esta máquina estimula o comprimento
contrátil médio até o mais curto. O perfil da resistência inicia mais difícil e fica
mais fácil durante o trajeto. No exemplo
dessa máquina o perfil da resistência
se encaixa no perfil da potência. Lembre-se sempre de que é necessário um
exame individual das peculiaridades de
cada equipamento.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
245
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
Exercícios multiarticulares
MLTART
Fig. 177. Exercício de flexão de cotovelo. Esse é um exercício uniarticular,
porém sem suporte. A ausência de
suporte facilita a performance externa e requer maior controle sobre as
articulações. Esse controle deve estar
presente para que somente as articulações sobrecarregadas se movam.
Assim, mantém-se o foco do exercício
na contração muscular. Se outras articulações se moverem, a resistência é
distribuída e o potencial de influenciar
o tecido específico diminui.
Fig. 178.
Uma vez que a capacidade de tensão contrátil
tenha sido otimizada, o primeiro progresso em incluir maior habilidade específica de controle para
a realização do exercício é a inclusão de exercícios
multiarticulares.
Intervenção: a otimização da capacidade de
produção de tensão neste cenário mecânico exige
suporte próximo à articulação que se move. O movimento deve ter seu trajeto guiado para que o potencial de otimização de capacidade de tensão seja elevado e a necessidade de habilidade de coordenação
específica ainda seja pequena. A necessidade de desenvolvimento da habilidade em exercícios multiarticulares com apoio é maior do que nos exercícios
uniarticulares, porém menor do que nos exercícios
multiarticulares com menos apoio.
Estes exercícios ainda têm o foco na performance
interna, o que indica que, mesmo utilizando múltiplas articulações, o foco está na otimização da quantidade da contração muscular em diferentes comprimentos. Para isso, é imprescindível que o perfil
da resistência seja o mais compatível com o perfil
da potência para que o estímulo seja apropriado e
não estimule a compensação. Por último, é necessário ressaltar novamente que, se o cliente arremessar
o peso ou as posições que necessitam estar estáticas se moverem, o foco do exercício muda para a
performance externa.
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trajeto guiado (menos restrição) e com maior grau
de liberdade, exigindo maior controle ativo sobre
muitas articulações. O desafio é distribuído e a possibilidade da otimização da capacidade de tensão
diminui. Chamamos esses exercícios de híbridos,
porque fazem uma integração estrategicamente progredida entre a otimização da capacidade de tensão
e a utilização desta tensão com o desenvolvimento
de habilidades específicas. Nesta fase, existem várias
combinações que podem ser criadas, mas todas precisam ser estratégicas.
Fig. 179. Exercício multiarticular de empurrar, em uma máquina com trajeto
guiado. Máquinas desse tipo têm o potencial de alterar a resistência para que
o perfil seja compatível com a potência,
favorecendo o foco na contração mesmo
em um exercício multiarticular.
Tradição
EXERCÍCIO TRADICIONAIS
Fig. 180.
Tradicionalmente, os exercícios multiarticulares que utilizamos possuem um perfil da resistência
[PR[ não tão próximo ao perfil da potência [PP], favorecendo a performance externa [PE]; [PR = PE].
Normalmente, utilizamos exercícios com menor
Fig. 181. O agachamento é um exemplo de
exercício tradicional híbrido. O trajeto não é
guiado, o suporte é distal às articulações que
se movem (desconsiderando o tornozelo) e,
ainda, o perfil da resistência é oposto ao perfil da potência.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
247
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
Fig. 182. Um exercício de extensão do ombro horizontal ou um exercício de puxar é
multiarticular. Neste exemplo, o exercício
não tem apoio próximo à articulação que
está se movendo e o trajeto não é guiado.
Como está usando um cabo, o perfil da resistência é oposto ao da potência, favorecendo a performance externa.
SEGMENTAÇÃO DO EXERCÍCIO
EXERCÍCIOS QUE ESTãO NA MODA
Fig. 183.
A segmentação de um exercício deve ser usada
para a melhora de uma habilidade. Ela é necessária
quando, dentro da progressão, existe a necessidade
de segmentar um movimento ou uma habilidade
para desenvolver suas propriedades separadamente e depois utilizá-las em conjunto. Aqui temos
como exemplos a marcha ou o sentar e levantar. A
segmentação de cada movimento da atividade e o
desenvolvimento da habilidade em executar cada
parte do movimento separadamente deve acontecer depois da otimização do tecido específico dentro da performance interna.
Fig. 184.
Normalmente, os métodos que entraram na
moda, como o treinamento funcional, incluem em
seu cenário mecânico a diminuição do suporte e a
adição de graus de instabilidade, utilizando bolas ou
plataformas de equilíbrio como base de suporte. Este
cenário mecânico não favorece a produção de tensão.
Quanto maior o grau de desequilíbrio, menor a capacidade de gerar tensão em um músculo.
248 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
c o n t i n u u m
d o
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EXERCÍCIO DA Moda atual
Fig. 185.
Os exercícios, que hoje estão na moda, têm seu
foco externo. Neles, a capacidade de tensão já otimizada durante os exercícios uniarticulares e multiarticulares da performance interna é usada para realizar
uma habilidade específica, como correr, andar, saltar,
nadar, andar na esteira, jogar tênis ou futebol etc. É
necessário que todas as partes da função estejam funcionando bem para cumprirem a tarefa de maneira
perfeita. A nova moda é o crossfit ou métodos como
a Teoria Laranja ou, ainda, o HITT (High Intensity
Interval Training). Nesses exemplos, o exercício é um
esporte e o foco está no tempo, na carga e no resultado final.
Fig. 186. Exercício dentro da moda
atual, que não possui apoio, não possui restrição. Ele utiliza o timing da
inércia para redução do estímulo. Este
é um exemplo de exercício para a performance externa. O objetivo é levantar mais peso utilizando todo o corpo
e com o foco no desenvolvimento da
habilidade e não da contração muscular próxima à articulação.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
249
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
Fig. 187. Exercício dentro da moda atual, com
apoio distal às articulações que se movem, não
possui restrição. Este é um exemplo de exercício para a performance externa. O objetivo
é estimular o corpo todo sem ser muito específico do que está sendo estimulado. O foco
está no desenvolvimento da habilidade e não
na contração muscular.
Fig. 188. Exemplo de exercício híbrido, multiarticular e com adição de
superfície instável. Quando a instabilidade é acrescentada, ela compromete a possibilidade de estimular a
contração muscular.
Devemos considerar que estes são exercícios que
usam a contração, mas não a otimizam, eles treinam
uma habilidade específica. A repetição do movimento
bruto não faz com que músculos, no caso de não estarem funcionando em seu estado ótimo, passem a funcionar. Normalmente, estes exercícios são realizados
utilizando o peso corporal como resistência ou carga
externa, fazendo o uso das propriedades da inércia, e
o perfil da resistência limita a otimização de comprimentos contráteis mais curtos e mais longos.
250 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
c o n t i n u u m
Exercícios de performance externa
d o
e x e r c í c i o
2. Foco na distração: São os exercícios realizados
“sem foco algum”. O exercício é realizado lendo
revista, assistindo filme, usando o tablet ou telefone, conversando etc. O objetivo está em cumprir
certo número de séries e repetições, independentemente de como o cliente-paciente o realizará.
Fig. 190. Exercício
de performance externa com foco na
distração.
Fig. 189. Exercício de performance externa com foco no objeto exige muito
treino e prática para otimizar o esporte.
Os exercícios de performance externa podem ser
realizados de duas maneiras relacionadas com a atenção e o foco:
1. Foco no objeto: Exige alta concentração e
total controle de todas as partes internas/função
para atingir ótimos resultados. O sucesso está na
precisão com que o corpo, com todo seu potencial
sendo usado ao mesmo tempo, alcance melhor
resultado com um objeto externo, como acertar
a bola de beisebol ou do tênis, acertar o alvo no
arco e flecha ou o chute ao gol. São os esportes e os
exercícios voltados para o treinamento desportivo
específico para o esporte.
A criação de novos exercícios baseados no cliente
é uma função complexa, porém muito satisfatória, porque carrega consigo grandes possibilidades de sucesso,
tanto de melhores resultados para os clientes-pacientes
quanto de maior valorização do profissional.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
251
A Orquestração
Organização da Contração em uma Solução de Recrutamento Motor
c o n t i n u u m
N
este capítulo, apresentaremos como o cérebro interpreta e responde à aplicação de
força em seu sistema neuromusculoesquelético por meio da orquestração. Os princípios mecânicos que influenciam a resposta motora já foram
abordados neste livro e agora apresentaremos como
a organização desta resposta motora (da contração
muscular) acontece.
Durante 20 anos temos ensinado profissionais
sobre exercício e estamos sempre evoluindo, não
somente em nossos estudos, mas também em como
ensiná-los de maneira simples. Para isso, usamos
analogias associadas a imagens que facilitam o aprendizado e trazem à vida conceitos, às vezes, difíceis de
entender como colocá-los em prática apenas lendo
um livro. Usamos as analogias como ferramentas
educacionais para podermos “ver claramente” e para
termos a ciência disponível em nossas mentes, ajudando o profissional a trazer a ciência à vida em sua
prática diária.
O aprendizado motor é um estudo complexo,
porém aqui vamos abordar o processo da organização em que a contração muscular acontece dentro de
uma solução do recrutamento motor para nos ajudar
a tomar decisões frente aos desafios motores que nossos clientes-pacientes apresentam. Desafios estes que
precisamos influenciar para alcançarmos melhores
resultados com a prescrição do exercício. Para isso,
usaremos a analogia de uma orquestra e a palavra orquestração para identificar “o processo da organização da contração”.
A palavra orquestração é muito importante para
explicarmos este processo, porque, quando uma orquestra toca uma sinfonia, por exemplo, existem inúmeros fatores acontecendo ao mesmo tempo, similarmente ao que acontece com o nosso corpo.
Por exemplo, para a manutenção da posição
sentada, existem músculos que estão trabalhando
mais do que outros para sustentarem o tronco e, durante algum tempo, algumas fibras vão fadigar, dei-
d o
e x e r c í c i o
xando de participar desta orquestração. Em compensação, outras que fadigaram antes e já se recuperaram
voltarão a ajudar a manter a posição, enquanto outras fibras vão sair da orquestra. Este é um processo
constante e contínuo do recrutamento muscular em
nosso corpo.
Voltando à orquestra tocando uma sinfonia,
normalmente muitos músicos estão tocando partes
diferentes da música com diferentes instrumentos.
Assim, no mesmo momento que alguns músicos estão tocando em uma escala musical mais alta, outros
tocam numa escala mais baixa, alguns estão tocando
num volume alto e outros num volume baixo, há também aqueles que esperam o seu momento para tocar
seu instrumento, e todos tocam a parte da música
pela qual são responsáveis. Quando se passa de uma
parte a outra da sinfonia, mudando assim seu som,
é porque existiu uma mudança na participação dos
músicos, o quanto e como estão participando; muda
também quais deles entram ou saem de partes específicas da música. Durante a sinfonia, existem partes
que somente um músico toca, chamadas de solo. Podemos analisar que, em um solo, somente um músico
participa ou podemos analisar que um músico continua participando enquanto todos os outros ficam em
silêncio. É muito importante reconhecermos este fato
na orquestra, assim como no exercício, quando identificamos que um músculo está se destacando mais
em sua apresentação. Pode ser, na verdade, que ele
sempre esteve participando, mas só agora os outros
deixaram de participar a ponto de conseguirmos perceber a sua atuação.
Assim como cada instrumento é fundamental
para que a “sinfonia” seja tocada perfeitamente, também são nossos músculos em relação a qualquer movimento em nosso corpo. Independentemente do tamanho do músculo, todos eles são essenciais dentro
de seu papel individual para que o movimento seja
perfeito. O papel dos músculos pequenos é essencial
– quando eles faltam, o sistema todo falha. Assim
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
253
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
sendo, podemos comparar todas as unidades motoras
dos músculos em nosso corpo aos músicos tocando
seus instrumentos numa orquestra. Todos eles tocam
seus instrumentos obedecendo ao comando do maestro, que é aquele que conhece profundamente a sinfonia. Ele sabe qual músico chamar para participar em
cada momento e também qual a intensidade necessária de cada instrumento para que a sinfonia tenha o
som que precisa ter. O maestro conhece as qualidades de cada músico e tem o ouvido tão preparado que
percebe qualquer dissonância. Quando a música está
destoante, o maestro analisa cada músico para saber
qual está causando a dissonância e este precisa treinar individualmente sua parte novamente ou afinar
seu instrumento separado da orquestra. Os músicos
não aprendem suas partes ou praticam suas partes
somente dentro da orquestra, eles praticam sozinhos
e só depois se unem para ajustarem todas as partes e
praticarem a sinfonia completa. Isso também acontece durante os exercícios, os movimentos e todas as
atividades motoras que realizamos. Quando um músculo não está funcionando como deveria é preciso “tirá-lo” do sistema e “afiná-lo” antes de retornar para o
exercício ou movimento. O maestro em nosso sistema muscular é o cérebro e é ele que comanda toda a
nossa “orquestra muscular”.
É importante que o profissional consiga, nesse
momento, criar mentalmente uma imagem do cérebro à frente da “orquestra”, da organização das contrações, coordenando e controlando todos estes músicos
(músculos) ao mesmo tempo para tocarem uma música (realizarem corretamente o movimento).
A “orquestração” de toda esta série ou sistema de
músculos dentro do nosso corpo e ao redor das articulações é uma organização de contrações musculares tentando resolver um problema motor, ou melhor,
um “quebra-cabeça motor”. Dentro da prescrição
clínica do exercício, o próprio exercício (ou o movimento) é o “problema motor” que o cérebro precisa
decifrar e resolver. É um “quebra-cabeça motor” porque existem inúmeros fatores a serem administrados
para resolvê-lo.
Quando você quer levantar de uma cadeira, o cérebro precisa resolver este “quebra-cabeça motor” e “levantá-lo”, caso você queira sentar o “quebra-cabeça motor”
passa a ser “sentá-lo”. Existem muitos fatores acontecendo ao mesmo tempo quando temos a ideia e vontade de
“levantar” ou “sentar” e estes mudam a cada milésimo
de segundo. Nós não precisamos ficar pensando em nenhum destes fatores, simplesmente executamos a tarefa.
Vamos explorar como a orquestração, ou seja, a
organização da contração acontece:
Fig. 191.
Fig. 192.
254 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
c o n t i n u u m
Primeira etapa [Fig. 192]
Na primeira etapa da orquestração, o cérebro
identifica como está o estado dos componentes internos, isto é, o quanto de função atual existe disponível
neste momento. Ele detecta as posições articulares
disponíveis e também os comprimentos musculares
que estão disponíveis para participarem deste desafio. O cérebro também detecta o quanto o músculo
demostra ter de capacidade de gerar tensão (ou não)
e, por último, o quanto de consciência ou percepção é
necessária para realizar a tarefa. O cérebro só chama
para participar aquilo que o corpo [TEM] de função
disponível.
O objetivo do exercício é influenciar esses fatores positivamente.
Fig. 193.
Segunda etapa [Fig. 193]
Nosso cérebro está constantemente gerenciando
o “estoque interno”, regularmente fazendo um “inventário”. Ele recebe informação de cada neurônio
motor sobre o estado atual de cada fibra muscular e
só chama para participar da solução o que está disponível e tem possibilidade de participar. As partes que
não estão disponíveis, ou melhor, que estão inibidas
ou fracas não são usadas.
d o
e x e r c í c i o
Não se pode usar aquilo
que não se tem!
A partir deste ponto, começa a construção da
solução motora em torno de cada cenário mecânico
envolvido na tarefa. Por exemplo, vai ser construída
uma solução motora orientada para a marcha em torno de um edema no tornozelo; vai ser construída uma
solução motora para um agachamento onde o fêmur
direito é um milímetro mais longo do que o esquerdo; vai ser construída uma solução motora para outro
agachamento onde existe um osteófito suprapatelar;
vai ser construída uma solução motora para outro
agachamento onde existe artrose no joelho esquerdo; vai existir uma solução motora para resolver cada
quebra-cabeça motor considerando inúmeros fatores
internos que serão demonstrados através do resultado
bruto/global externo; e é este resultado que enxergamos externamente. A assimetria muitas vezes é um
resultado motor, é a melhor “música” que poderia ter
sido tocada com os músicos e os instrumentos no estado atual. Em outras palavras, é a melhor solução motora ou o melhor resultado possível com os músculos e
suas habilidades contráteis naquele momento.
O cérebro, sabendo de todos os fatores que nós
profissionais não temos acesso, apresentará a melhor
solução para o quebra-cabeça. É aqui que precisamos
saber o que fazer e determinar qual será nossa intervenção para tentar mudar o resultado.
Terceira etapa [Fig. 194]
É a adição de um desafio (força) que pode ser
a gravidade, quando estamos levantando ou sentando. Às vezes, pode ser o halter; às vezes, a máquina
de musculação; às vezes, o cabo do pilates ou até o
kettlebell. A maior influência para estimular uma
mudança no corpo humano é a força. Se a força não
existir, não temos um exercício. Nesta etapa, todos
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
255
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
os fatores que afetam a resistência, isto é, a direção,
o posicionamento da carga, o perfil da resistência, incluindo o controle das alterações da inércia e dos braços do momento, devem ser estrategicamente manipulados para obter diferentes resultados nas articulações
(como as forças articulares) e para também aumentar a
possibilidade de benefício e diminuir o custo.
A partir da adição de um desafio, o cérebro vai
orquestrar uma solução motora para realizar a intenção do que vamos fazer com o desafio, levando em
consideração todos os fatores que envolvem a resistência e as etapas anteriores a cada grau de movimento e esta orquestração muda continuadamente.
Como profissionais, possuímos somente duas
possibilidades de intervenção dentro do processo da
orquestração, a manipulação da resistência e da intenção. Todos os outros fatores são consequências/resultados das nossas decisões sobre a resistência e a intenção.
bipodal para unipodal, imediatamente o primeiro
movimento que vai acontecer é a oscilação do quadril
para a direção da perna de apoio. Isso acontece sem
que haja a intenção de alterar a posição do quadril,
porém, o cérebro obrigatoriamente precisa manter
o centro de massa sobre a base de suporte para não
cairmos. Então, imediatamente quando você teve a
intenção de mudar o apoio para unipodal, o cérebro,
que sabe onde seu centro de massa está, começará a
mover o centro de massa para o lugar onde vai ser sua
nova base de suporte.
Fig. 195.
Quinta etapa [Fig. 196]
Fig. 194.
Quarta etapa [Fig. 195]
É semelhante à segunda, porém, agora, são os
ajustes que o cérebro vai orquestrar usando o que
ele já detectou na segunda etapa para resolver o
quebra-cabeça da aplicação da força, do movimento
e da manutenção da posição. Por exemplo, se adicionarmos um halter em cada mão e passarmos de apoio
256 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
Fig. 196.
c o n t i n u u m
INTENÇÃO A
A
d o
e x e r c í c i o
Solução voltada para Performance Interna
estrategicamente controlada
 Regulação da co-contração
baseado no sentido de resistência
 O.D.E baseado na eficiência para
o objetivo = estímulo eficiente
menos desperdício de tempo e esforço
 Desafio focado na contração
 Habilidade de controlar a inércia
 Interrupção da compensação (“roubar“)
 Habilidade de deixar apropriado para
o indivíduo
A solução para o
quebra-cabeça atual
utiliza aquilo que está
disponível e evita o
que está indisponível
(vide Fig. 193)
6
SOLUÇÃO
B
INTENÇÃO B
 Dependente da intenção e da atenção
 Utiliza o padrão de eficiência do cérebro
 Dispersa o desafio: utiliza todas as articulações
possíveis para mover o peso
 Evita ou elimina o desafio:
usa a inércia ao seu favor
 Habilidade de deixar mais fácil
Juntamente com a resistência, a intenção é um fator determinante no resultado e é um dos dois fatores
que temos acesso para manipular diretamente. Aquilo
que você deseja que o seu cliente-paciente faça durante um exercício, a maneira como você o “ensina”, tem
uma grande influência na determinação do resultado.
Se o cliente-paciente tiver a intenção de apenas mover
o peso de um ponto A para um ponto B, “distraído”, o
resultado será muito diferente do que se ele controlar
o movimento, a contração e limitar a amplitude, prestando atenção no que está acontecendo internamente.
Nesta etapa, o profissional tem a possibilidade de determinar o resultado – que poderá ser a
performance interna ou a performance externa –
quando indica para o cliente-paciente como mover
a resistência.
Fig. 197.
Sexta etapa
Vamos chamar esta etapa de solução para o quebra-cabeça do exercício. Você não consegue usar o que
você não tem! O cérebro só vai usar aquilo que TEM e
está disponível. O cérebro evita o que está incapaz.
O que acontece em primeiro lugar é a orquestração do controle articular A , este é um conjunto
de co-contrações de graus variados específicos para
cada articulação individual. Quanto mais desafio estrutural a articulação tiver, melhor dizendo, quanto
mais instável estruturalmente a articulação for, maior
será a necessidade da orquestração da co-contração
para manter a integridade da articulação. Por exemplo, a diferença entre o ombro e o quadril. A articulação do quadril não tem muita dificuldade em se manter unida devido à própria estrutura (arquitetura), já
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
257
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
o ombro é quase totalmente dependente do controle
ativo para se manter íntegro.
Como já estudamos no capítulo sobre mecânica
articular, o controle articular acontece por meio de
um cabo de guerra interno em uma articulação. Uma
vez que uma resistência é aplicada, existe um cabo de
guerra em todas as articulações de controle ativo. Todas!
Quando a intenção do exercício é a otimização
da contração e da função, a solução motora deve ser
a perfomance interna. Para isso, é necessário interromper o padrão de eficiência do cérebro e utilizar
a eficiência profissional de controlar as variáveis mecânicas para que seja possível estimular o tecido contrátil em todo seu comprimento, como, por exemplo,
o controle da inércia e o desenvolvimento de desafios
em que o perfil da resistência é compatível com o da
potência.
B Se o profissional não intervir no
processo-padrão do cérebro, a solução será direcionada para a perfomance externa por meio da integração
do maior número de articulações para cumprir uma
tarefa. Portanto, se a intenção for de “apenas mover”
o peso, ou se não houver intenção nenhuma e o peso
for “apenas movido”, o processo da orquestração vai
acontecer dentro do padrão de eficiência do cérebro
que agirá das duas maneiras, a seguir [B1 e B2]:
[B1]
O cérebro escolhe sua primeira versão de eficiência, isto é, ele vai dispersar o desafio e tentar usar
menos esforço possível com o maior número de articulações possíveis. Por exemplo, para realizar uma
flexão de cotovelo (rosca bíceps) com o objetivo de
simplesmente mover o peso para cima e para baixo,
movê-lo do ponto A ao ponto B, o cérebro vai fazer
isso com a musculatura em torno do tornozelo, do
joelho, do quadril e do ombro, sem se importar com
qual deles está fazendo o trabalho. Para o cérebro, isso
é muito inteligente e eficiente porque nenhum músculo precisa trabalhar muito.
[B2]
O cérebro vai tentar reduzir ou eliminar efetivamente o desafio, a resistência, não somente repartir
ou distribuir o desafio, ele vai eliminar o desafio por
meio do arremesso do peso. Porque, se o peso é arremessado, a resistência pode chegar a zero no final da
contração concêntrica devido aos efeitos da inércia,
portanto, nesses pontos, a resistência é anulada.
Por exemplo, o resultado será uma “flexão de cotovelo que envolve o corpo todo” se estes dois fatores
[B1 e B2] forem colocados juntos. Durante o início do
trajeto da flexão, o peso será levantado com qualquer
músculo [B1] e depois, no final da amplitude, arremessando o peso, anulando a resistência e eliminando qualquer trabalho muscular [B2].
Isso é suficiente para elevar a frequência cardíaca
e cansar, é suficiente para pessoas com uma genética
favorável ganharem algum músculo, além de ser suficiente para todos os objetivos da performance externa.
Mas é incompleto internamente porque não alcançou
a porção mais curta do músculo e não teve trabalho
na mais longa, pois o peso foi arremessado. Se esse é o
objetivo do exercício e é isso que você está esperando
dele, então este cenário é perfeito. Mas, se o seu objetivo é afetar positivamente a saúde e oferecer desafios
para melhorar o corpo e a função, o cliente-paciente
deve realizar o exercício de outra maneira.
O cérebro é projetado para ser eficiente e isso é
o que chamamos de “roubar”. O roubo é, na verdade, eficiência mecânica e, se usado estrategicamente,
pode até ajudar a alcançar resultados, mas sem estratégia, a eficiência do cérebro tira toda a efetividade
e possibilidade de influenciar a performance interna,
quer dizer a função.
Então, é muito importante entendermos como
a orquestração acontece, ou melhor, como a organização da contração muscular acontece dentro de
uma Solução de Recrutamento Motor para resolver
o “quebra-cabeça motor” de um exercício, para podermos intervir no processo do exercício e obtermos
258 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
c o n t i n u u m
d o
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os resultados esperados. A prescrição clínica do exercício para a restauração, desenvolvimento e conservação da função precisa ser feita com controle. O
fisioterapeuta precisa ser eficiente em suas decisões
porque, se nunca colocarmos um estímulo intencional nos comprimentos contráteis mais curtos e nos
mais longos dos músculos específicos, perderemos
a habilidade nesses comprimentos. Com o tempo
e com a idade, estes fatores serão responsáveis por
trazer disfunções, porque aquilo que não temos não
usamos e aquilo que não usamos nós perdemos.
aquilo que não temos
não usamos e
aquilo que não usamos
nós perdemos.
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
259
ORQUESTRAÇÃO
CONSTANTE MONITORA MENTO SUBSCONCIENTE
DOS COMPONENTES INT ERNOS
Possibilidade
de intervenção
pro ssional
Organização da Contração em uma solução de
Recrutamento Motor
aConstante monitoramento/
gerenciamento do
“estoque” interno.
Existe uma multiplicidade de fatores
que não temos como saber, mas que
o cérebro precisa trabalhar com eles
e resolver o quebra-cabeça motor.
In uência das
idiossincrasias:
• Assimetrias
estruturais
• Artrose
• Osteó to
• Etc.
aO que está atualmente
disponível?
aO que não está disponível?
aSó utilizamos aquilo que
RESISTÊNCIA
O cérebro sempre saberá mais do
que nós pro ssionais sobre o que
está acontecendo dentro da
estrutura do cliente, em tempo real.
Principal estímulo para
causar mudanças físicas.
a Direção
a Suporte
a Posicionamento
a Carga/PR?
nós TEMOS.
1
Disponibilidade =
disponível + habilidade
ESTADO DOS
COMPONENTES INTERNOS
FUNÇÃO
ADPAD
ADCCD
PERCEPÇÃO
2
3
DETECÇÃO INTERNA
DA DEMANDA
TENSÃO
aForça X Movimento X Posição
aIn uência de dé cit sensorial
A
A Orquestração
acontece ao vivo.
recálculo acontece a cada
.01s » .001s para suprir as
demandas em constante
mudança, disponível-habilidades etc.
Exemplo: Neuropatia Diabética e
efeitos no trabalho de equilíbrio.
4
CAPACIDADE
DE GERAR
TENSÃO
INTENÇÃO A
Soluções são geradas
em tempo real sem
padrões predeterminados.
• Δ no BM
• Δ magnitude
• Efeitos da inércia
Solução voltada para Performance Interna
estrategicamente controlada
aRegulação da co-contração
INTENÇÃO & ATENÇÃO
In uência principal no Resultado
Intenção A - Como?
a Habilidade de deixar mais difícil
a Manutenção da posição =
movimento preciso
com controle
a Amplitude
a Controle contrátil = controle
da inércia
Intenção B - Como?
a Habilidade de deixar mais fácil
a Atenção sobre o peso, objeto,
trajeto ou alvo.
a Apenas mover o peso. Distraído.
a Focar exclusivamente em levar o
objeto de um ponto para outro.
5
baseada no sentido da resistência
O.D.E
baseado na e ciência para
a
o objetivo = estímulo e ciente
menos desperdício de tempo e esforço
aDesa o focado na contração
aHabilidade de controlar a inércia
aInterrupção da compensação (“roubar“)
de deixar apropriado para
aHabilidade
o indivíduo
A solução para o
quebra-cabeça atual
utiliza aquilo que está
disponível e evita o
que está indisponível
(vide etapa 2)
6
SOLUÇÃO
B
INTENÇÃO B
Solução voltada para Performance Externa
resultado bruto/ nal/global
aDependente da intenção e da atenção
aUtiliza o padrão de e ciência do cérebro
aDispersa o desa o: utiliza todas as articulações
possíveis para mover o peso
o: usa a inércia ao
seu favor
aHabilidade de deixar mais fácil
aEvita ou elimina o desa
Fig. 198.
c o n t i n u u m
d o
e x e r c í c i o
A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
Thomas C. Purvis & Mariane F. Malucelli
Este é o início da jornada, o ínicio de uma nova
maneira de entender o exercício e de prescrevê-lo
com excelência clínica. Depois deste estudo, você terá
suporte para ajudar ainda mais seus clientes-pacientes independentemente de quem eles sejam, jovens,
adultos ou idosos; ou melhor, tenham baixa, média
ou alta tolerância. Independentemente do “onde” seu
cliente-paciente se encontra dentro do Continuum Funcional, esta nova ciência tem o potencial de ajudar o profissional a prescrever exercícios para restaurar, desenvolver e conservar a função de cada um deles. Agora é o
momento de transformar a teoria em prática.
Fig. 199. O começo... Transformar a teoria em prática com a evolução da biomecânica, através dos princípios da mecânica do exercício e do desenvolvimento do
raciocínio crítico para tomadas de decisões através do Continuum do exercício.
Lembre-se de que a razão de nossa evolução
profissional está em nos tornarmos mais eficientes em restaurar, desenvolver e conservar a
função do cliente-paciente.
262 • A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia
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A Evolução da Prescrição Clínica do Exercício | A Identidade da Fisioterapia •
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