1 Inserção Comercial e Competitividade Setorial na Argentina: Uma

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Inserção Comercial e Competitividade Setorial na Argentina: Uma Análise Acerca
da Possibilidade de Desindustrialização da Economia.
Michael Gonçalves da Silva1
Clésio Lourenço Xavier **
Vanessa Siqueira Peres da Silva ***
Resumo: Devido à elevada demanda mundial por bens intensivos em recursos naturais,
nos últimos anos, principalmente pela rápida expansão da economia chinesa, o presente
artigo teve o propósito de mensurar, através da análise do saldo comercial, como a
economia argentina se inseriu no comércio internacional, entre os anos de 2000-2011.
Utilizando-se da agregação setorial proposta pela Organisation for Economic CoOperation and Development (OECD), classificação de intensidade tecnológica: não
industriais, baixa, média – baixa, média - alta e alta intensidade tecnológica, e com os
dados de comércio obtidos junto a COMTRADE/ONU, desagregados a três dígitos, foi
possível constatar que a economia argentina obteve saldos comerciais crescentes para os
setores produtores de bens não industriais, e déficits comerciais crescentes nos demais
setores da economia. Tais resultados podem apontar para um possível processo de
desindustrialização da economia.
Palavras Chave: Desindustrialização, Saldos Comercias e Intensidade Tecnológica.
Abstract: Due to high global demand for goods intensive in natural resources, in recent
years, mainly by the rapid expansion of the Chinese economy, this article aimed to
measure, through the analysis of the trade balance, as Argentina's economy is entered in
trade international, between the years 2000-2011. Using the sectoral aggregation
proposed by the Organisation for Economic Co-Operation and Development (OECD),
classification of technological intensity: non-industrial, low, medium - low - middle and
high tech and trade data obtained from COMTRADE / UN disaggregated to three digits,
it was established that the Argentine economy growing trade balances obtained for the
sectors producing non-industrial goods, and growing trade deficits with the other sectors
of the economy. These results may point to a possible de-industrialization of the
economy.
Keywords: Deindustrialization, and Technological Intensity Balances commercial
Eje 3. Argentina, ¿ Nueva Etapa?
1
Economista da Universidade Federal de Santa Maria. Doutorando do Programa de Pós-Graduação em
Economia da Universidade Federal de Uberlândia. Tel: 55- (55) 8105-7098. E-mail:
[email protected].
** Professor Doutor Associado da Universidade Federal de Uberlândia e Pesquisador de
Produtividade do CNPq. 55. Tel: (34) 9979-1963. E-mail: [email protected]
*** Professora Assistente I da Universidade Federal de Santa Maria. Doutoranda do Programa de
Pós-Graduação em Estatística e Experimentação Agropecuária da Universidade Federal de Lavras.
Tel: 55- (55) 81530028. E-mail: [email protected]
1
INTRODUÇÃO
A crescente demanda por bens não industriais nos anos 2000, devido ao crescimento das
economias do oriente, tem levantado uma série de questões sobre a forma de inserção
comercial dos demais emergentes. Neste contexto, a questão da desindustrialização
dessas economias tem ganhado cada vez mais espaço, uma vez que os setores de maior
intensidade tecnológica têm perdido espaço na pauta exportadora para os setores não
industriais.
Assim, ao considerar a análise de inserção comercial, é possível verificar quais setores,
classificados de acordo com a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (OCDE), apresentaram crescimento, ou não, entre os anos em questão. Os
resultados podem evidenciar a participação da indústria no comercial internacional,
contribuindo para verificar se há evidências de desindustrialização da economia.
O objetivo deste artigo é fazer uma discussão acerca das evidências do processo de
desindustrialização da economia argentina vis-à-vis a sua inserção no comercio
internacional.
A pesquisa será bibliográfica e empírica, com análise de dados oriundos do comércio
internacional. A realização da pesquisa será técnica qualitativa, de cunho explanatório.
A base de dados utilizada é a da SITC da ONU/UNCTAD para gerar dados
desagregados a três dígitos, no período recente.
O artigo está estruturado da seguinte maneira: além desta seção introdutória, serão
contempladas outras quatro seções. Uma revisão inicial das teorias de comércio e
inserção internacional; a seguir será apresentada uma breve discussão acerca da
desindustrialização da economia; em seguida, serão discutidos alguns indicadores do
país e, por fim, os dados de comércio internacional serão desagregados da SITC e
reagregados utilizando-se a proposta da OCDE de agregação setorial, obtendo-se, assim,
informação do desempenho comercial. As considerações finais expõem uma síntese dos
resultados e as conclusões.
2
INSERÇÃO
COMERCIAL:
BREVE
REFLEXÃO
DAS
TEORIAS
DE
COMERCIO INTERNACIONAL
Em relação ao comércio Internacional David Ricardo, em sua teoria das vantagens
comparativas, afirma que os países deveriam produzir aquilo que apresentasse maior
produtividade relativa. No modelo ricardiano de comércio, as diferenças existentes entre
países, no tocante a preços relativos, devem-se às diferenças entre as exigências de mão
de obra. Como essas exigências são constantes no modelo ricardiano, os custos de mão
de obra também o são. Por isso, as condições de demanda não determinam o padrão de
troca no caso de dois países e dois bens.
Davis (1996) argumenta que o teorema de Stolper e Samuelson 2 para se tornar
observável em trabalhos empíricos deve ter como referencial não somente as dotações
de fatores de um país com relação ao resto do mundo, mas deve-se ainda relativizar as
dotações de um país somente em comparação com as de outros países que apresentem
dotações semelhantes. Para identificar estes grupos o autor usa o conceito de cones de
diversificação. Ele explica que as dotações de fatores entre países coíbem a igualdade
dos preços dos fatores.
Cimoli (1988) mostra que o padrão de comércio mensurado com base nos fluxos
comerciais pode ser avaliado de acordo com o processo de divergência e convergência
tecnológica. Ou seja, o processo de inovação é responsável pela divergência tecnológica
verificada entre países, e a imitação e difusão são responsáveis pela convergência entre
eles. À medida que as inovações surgem, o país pode obter ganhos por meio das rendas
ricardianas, devido ao processo de divergência tecnológica, que lhe proporciona o
cenário propício ao crescimento econômico, dependendo do grau e permanência de sua
divergência. Já nos países que convergem tecnologicamente, as rendas ricardianas
tendem a desaparecer.
Canuto (1998) expõe um modelo teórico sobre a interação entre comércio exterior e
crescimento com restrição de divisas, no qual os padrões de especialização, associados
às estruturas produtivas de setores de dois países distintos, têm papel fundamental, dado
que as dinâmicas setoriais diferenciadas com relação à inovação e à imitação
2
O Teorema de Stolper-Samuelson afirma que se o insumo trabalho é abundante, por exemplo, um
aumento no preço relativo do bem leva a um aumento mais que proporcional do preço do fator utilizado
intensivamente na produção e à diminuição da remuneração real do outro fator.
3
tecnológicas (aliadas às elasticidades específicas de renda e preços da demanda de cada
setor) condicionam o crescimento econômico. O modelo proposto por esse autor
considera que a intensificação do comércio entre o Norte-Sul dá-se pelos hiatos
tecnológicos e pelo ciclo do produto de Vernon.3 É a variabilidade nos padrões de
especialização dos países que diferencia o seu modelo.
Logo, para o autor, o modelo é constituído tendo por base as seguintes considerações:
variações de produtividade tornam-se específicas aos setores, e não mais aos países;
salários nominais são indexados aos aumentos médios de produtividade; demanda de
importação e exportação, semelhante aos modelos keynesianos de crescimento, com
restrições de divisas;4 permitem-se saldos comerciais negativos, mediante ingresso
líquido na conta de capitais. Deste modo, a intensificação da inovação tecnológica é
responsável pela divergência entre Norte e Sul. Quanto maior for o grau de inovação
verificado nos países do Norte maior será a divergência nos padrões de especialização
dos países; quanto mais rápido ocorrer o processo de imitação e difusão das inovações
mais rápido o processo de divergência dará lugar ao processo de convergência entre os
países.
Fernández e Curato (2011) analisam o padrão de especialização comercial argentino
entre 1990 e 2010. Seus resultados foram comparados com o Brasil enquanto no
segundo há um processo de (re)primarização e de redução da intensidade tecnológica
das exportações, no primeiro há um acréscimo nas exportações industriais com elevação
da participação dos setores de média-alta tecnologia e queda das exportações de baixa
tecnologia.
Xavier (2001) afirma que a literatura keynesiana aponta que as diferenças de
elasticidade-renda e elasticidade-preço das exportações e importações são específicas
aos países e condicionam o crescimento econômico relativo dos países, conforme pode
ser verificado em Thirlwall (l979) e McCombie & Thirlwall (1994).
3
Vernon parte desse conceito e o articula a uma teoria do comércio que aponta para uma noção de
vantagens comparativas de caráter dinâmico e a uma teoria do investimento (produtivo) que pressupõe
racionalidade limitada e estrutura de mercado em concorrência imperfeita (CANUTO, 1998).
4
O modelo supõe uniformidades nacionais, de preferência em relação a: consumo, rendas e taxas de
salários. Na ausência de crédito internacional, o equilíbrio do balanço de pagamentos ocorre devido à
igualdade dos gastos entre Norte e Sul.
4
Thirlwall, (1979) afirma que numa situação de estabilidade na taxa real de câmbio e de
funcionamento da economia abaixo da plena ocupação de capacidade, a razão da taxa de
crescimento da renda doméstica em relação à renda do resto do mundo é condicionada
pela razão da elasticidade-renda da demanda por exportações sobre a elasticidade-renda
da demanda de importações. Esta relação é conhecida como “lei de Thirlwall”: a taxa de
crescimento de longo prazo de uma economia é dada pela taxa de crescimento de longo
prazo de suas exportações dividida pela elasticidade de longo prazo da demanda de
importações.
Para McCombie & Thirlwall (1994) é que há também razões a priori para se esperar no
mínimo um certo grau de exogeneidade das elasticidades-renda, em lugar de sua
completa incorporação pelo próprio processo de crescimento econômico: a dotação de
recursos naturais, a presença de path dependence e o grau de aprendizado tecnológico,
entre outras. Sendo assim, os aumentos de produtividade seriam determinados pelas
taxas de crescimento e não o inverso, resultando em restrições de balanço de
pagamentos limitantes do crescimento da demanda e renda domésticas.
Krugmam (1987) argumenta que o comércio internacional favorece o surgimento da
indústria nascente, pois, com o aumento nas receitas de exportações de bens intensivos
em recursos naturais, a acumulação de capital aumenta, favorecendo o surgimento da
industrialização e, consequentemente, a substituição de importações. Segundo o autor,
as economias em desenvolvimento têm vantagem comparativa potencial nas
manufaturas, mas ainda não possuem força suficiente para concorrer com o comércio
internacional. Essas indústrias nascentes devem receber, temporariamente, ajuda do
governo, até que tenham condições de competir com a concorrência internacional. Deste
modo, a comercialização de bens da economia com os demais países está associada às
vantagens comparativas que o país possui; o seu padrão de comércio é mensurado com
base em seus fluxos comerciais.
A análise dos autores que tratam de comércio internacional possibilita tornar mais
evidentes os fatores responsáveis pela discussão da existência do processo de
desindustrialização da economia, no qual será tratada adiante.
5
CONCEITOS ACERCA DA DESINDUSTRIALIZAÇÃO DA ECONOMIA
O termo desindustrialização é recorrentemente utilizado para referir se a perda relativa
da indústria no emprego e na renda. As evidências do processo de desindustrialização se
manifestam numa reversão da pauta exportadora de determinado país, no qual é o
resultado mais imediato deste processo. Dessa forma, é interessante fazer uma breve
reflexão de alguns autores que discutem as características da desindustrialização na
economia.
Clark (1957) afirma que esse processo de desindustrialização da economia ocorria, em
países desenvolvidos, devido à elevação da demanda por serviços em detrimento da
demanda por manufaturados, à medida que a renda per capita tendia a se elevar.
Para Nassif (2008) a discussão acerca da desindustrialização é oriunda de duas políticas:
a de substituição de importações e a de abertura comercial, combinada com altas taxas
nos preços internacionais de commodities.
Oreiro e Feijó (2010), após apresentadas às definições de desindustrialização, afirmam
que, não necessariamente, terá um impacto negativo, pois se a redução da participação
da indústria, no produto e na geração de emprego, vier acompanhada de um aumento na
pauta de exportação de produtos com maior intensidade tecnológica, a dinâmica
industrial não será afetada.
A reprimarização da economia, de acordo com Gonçalves (2001), é a perda da atividade
internacional dos produtos manufaturados, e o ganho dos produtos agrícolas exportados,
ou ainda, é a mudança da estrutura de exportação com a maior participação relativa dos
produtos agrícolas, e a menor participação dos manufaturados.
Rowthorn e Ramaswamy (1999) a desindustrialização é explicada principalmente por
fatores que são internos ao das economias avançadas, isto é, como resultado das
interações entre os padrões de preferência mudando entre industriais e de serviços, o
mais rápido crescimento da produtividade na fabricação, em comparação aos serviços e
o declínio associado relativo no preço de fábrica.
Para Tregenna (2008), a desindustrialização é normalmente conceituada como um
declínio na indústria transformadora como uma percentagem do emprego total. A partir
de uma perspectiva de desindustrialização kaldoriana, poderia ter implicações negativas
para o crescimento em longo prazo, dado um especial crescimento das propriedades de
fabricação.
6
Da mesma forma, De Negri (2005), em economias em processo de desindustrialização,
os produtos classificados como commodities ou intensivos em trabalho são os únicos
que contribuem para a geração de saldos comerciais positivos. Por outro lado, os
produtos de média e alta intensidade tecnológica, além de não contribuírem para o
superávit comercial, também apresentam déficits muito elevados.
Rowthorn e Ramaswamy (1999), ao analisar a evolução do emprego industrial em 18
economias desenvolvidas, constataram que desde 1970 esses países sofreram uma
redução da participação do emprego industrial em relação ao emprego total de 10
pontos percentuais, chegando ao patamar de 18% em 1994. Embora o período e a
velocidade com que esse processo se iniciou tenham ocorrido de forma diferenciada
entre os países, os autores buscaram apontar suas causas e implicações. As explicações
para o deslocamento do emprego da indústria para o setor de serviços não diferem muito
das explicações nos estágios iniciais de desenvolvimento quando há uma redução do
emprego na agricultura, seja pela ótica da demanda quanto pela ótica da oferta.
A explicação pelo lado da demanda é dada pela mudança na elasticidade renda,
enquanto no caso da oferta as justificativas convergem para o crescimento da
produtividade. Com relação à produtividade, Rowthorn e Ramaswamy (1997) ressaltam
que apesar da dificuldade de se medir a produtividade no setor de serviços, é
indiscutível o crescimento mais rápido da produtividade na indústria, fazendo com que
o setor de serviços siga absorvendo essa mão de obra liberada, até mesmo para
acompanhar o crescimento do produto industrial.
Tregenna (20095 apud OREIRO; FEIJÓ, 2010) define a desindustrialização como uma
situação na qual tanto o emprego industrial quanto o valor adicionado da indústria
reduz-se à proporção do emprego total e do Produto Interno Bruto (PIB),
respectivamente. Além do mais, a desindustrialização é uma discussão pertencente ao
bojo da literatura heterodoxa, que considera a perspectiva de composição setorial
determinante para o crescimento.
Clark (1957) se refere que a desindustrialização pode ser vista como uma diminuição da
participação do emprego na indústria, que incorre por incorporação de novas
tecnologias que aumentam a produtividade. Ela é também caracterizada pela diminuição
5
Tregenna, F. Characterizing deindustrialization: an analysis of changes in manufacturing employment
and output internationally. Cambridge Journal of Economics, Cambridge, v. 33, n. 3, p. 433-466, 2009.
7
dos bens manufaturados no produto e no emprego em relação a outros setores,
principalmente o de serviços.
Quatro explicações são encontradas em Palma (2005) sobre a desindustrialização:
terceirização das atividades produtivas, deslocando a mão de obra industrial para os
serviços; redução da elasticidade-renda da demanda por bens manufaturados; aumento
na produtividade na indústria de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC); nova
divisão internacional do trabalho.
Assim, após essa breve reflexão teórica acerca das definições do processo de
desindustrialização da economia será tratado, na próxima seção, uma sucinta discussão
da economia argentina nos últimos anos.
ECONOMIA ARGENTINA NO PERÍODO RECENTE
O inicio dos anos 2000 na argentina foi marcado por um cenário de forte crise
econômica nunca antes visto pelo país 6. Desta forma, em cenário de crise econômica
são notadas quedas significativas no desempenho industrial de determinado país, ou
seja, a demanda agregada do país diminui.
Considerando o Produto Interno Bruto (PIB) como indicador de desempenho da
economia, seu declínio está relacionado com a redução da produção industrial, deste
modo, o gráfico 1 ilustra o desempenho do PIB da Argentina entre os anos de 2000 e
2011.
Face ao gráfico fica evidente a queda abrupta do PIB argentino em 2002 reflexos da
crise econômica, pelo qual o país atravessou. A partir de 2002, pode-se observar que o
PIB apresenta uma trajetória de elevação até o ano de 2011, com um pequeno declínio
em 2009, decorrente da crise mundial de 2008, mas rapidamente retomado sua trajetória
crescente para os anos posteriores.
6
Para melhor entendimento acerca do desempenho da economia argentina nos anos 90 e 2000 consultar
Vadell (2006).
8
Gráfico 1 – Produto Interno Bruto da Argentina a Preços Correntes (em Bilhões)
entre 2000 – 2011.
450.000
400.000
350.000
300.000
250.000
200.000
150.000
100.000
50.000
0
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011
Fonte: International Monetary Fund, World Economic Outlook Database, April 2012
Outra variável de grande importância para compreensão do desempenho industrial de
determinado país está na taxa de investimento. Em linhas gerais podemos definir taxa
de investimento como uma relação entre o investimento e o produto interno bruto de
cada país, ou seja:
*
I
Investimento
PIB
(1)
O gráfico 2 ilustra o comportamento da taxa de investimento na economia Argentina
entre os anos de 2000-2011. Assim como o comportamento do PIB, sua trajetória
apresenta uma redução para os anos de 2002 e 2009, também relacionados, de certa
forma, as consequências das crises da economia argentina e mundial respectivamente.
Assim, fica evidente que a taxa de investimento no país apresentou uma trajetória
crescente a partir de 2002, superando os 25% em relação ao PIB, este dados
demonstram uma forte relação com o Produto Interno Bruto.
9
Gráfico 2 – Taxa de Investimento da Economia Argentina entre 2000 – 2011 em
Termos (%).
30.000
25.000
20.000
15.000
10.000
5.000
0
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011
Fonte: International Monetary Fund, World Economic Outlook Database, April 2012
Dadas as informações acerca do comportamento do PIB e da taxa de investimento na
economia Argentina, ambas apresentaram uma trajetória crescente no período em
questão. Desta forma, considerando que o aumento dos níveis de investimento são
responsáveis por gerar emprego e renda e consequentemente elevar o produto de
determinada economia, o gráfico 3 visa apresentar o comportamento da taxa de
desemprego no país nos últimos anos.
Definindo taxa de desemprego (A) como sendo a relação entre a quantidade de
desempregados na economia (D) e a força de trabalho (L) disponível na economia no
período vigente, assim temos:
A
D
L
(2)
Deste modo, o gráfico 3 ilustra a taxa de emprego na economia argentina entre os anos
de 2000 e 2011, considerando os reflexos da crise econômica de 2001 no país,
responsável pelas reduções do PIB e da taxa de investimento em 2002, para este ano, a
10
taxa de desempregados também se elevou. No ano seguinte, é notada uma tendência de
queda na mesma, ou seja, passado o período pós crise neste país, a taxa de investimento
e PIB cresceram gerando emprego e renda, reduzindo assim, a taxa de desempregados
na economia.
Gráfico 3 – Taxa de Desemprego da Economia Argentina entre 2000 – 2011.
25.000
20.000
15.000
10.000
5.000
0
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011
Fonte: International Monetary Fund, World Economic Outlook Database, April 2012
Logo, ao analisar os indicadores de PIB, taxa de investimento e taxa de desemprego da
economia Argentina entre os anos de 2000-2011, pode-se concluir que após o período
de crise econômica, o país apresentou uma trajetória favorável para a sua economia.
Entretanto, tais dados analisados até aqui são apresentados de maneira agregada, ou
seja, não informam quais foram os setores que mais contribuíram para os resultados
ilustrados até aqui.
Assim, a seguir, a discussão irá se concentrar na análise dos saldos comerciais setoriais,
para tanto será utilizada a metodologia de agregação setorial proposta pela Organisation
for Economic Co-Operation and Development (OECD), os dados de comércio serão
obtidos junto a UNCTAD/COMTRADE desagregados a três dígitos.
11
SALDOS COMERCIAIS E COMPETITIVIDADE SETORIAL
A metodologia de agregação de dados da Organisation for Economic Co-Operation and
Development (OECD) mede a intensidade tecnológica de produtos industrializados. A
sua classificação é bem simples e permite avaliar o grau de tecnologia da pauta
exportadora de um país. Os setores que a classificação da OECD agrega são os
seguintes: produtos não industriais; produtos industriais de baixa intensidade
tecnológica; produtos industriais de baixa-média intensidade tecnológica; produtos
industriais de média-alta intensidade tecnológica; produtos industriais de alta
intensidade tecnológica; e demais produtos. Esta classificação será útil na avaliação da
composição da intensidade das exportações e dos saldos comerciais da economia
Argentina, com o objetivo de analisar a estrutura de comércio do país. Esta metodologia
de agregação será utilizada nesta seção.
O setor de produtos “não industriais” é que compreende a maior parte dos produtos
oriundos da agricultura, além de contemplar outras commodities intensivas em recursos
naturais. De modo sucinto, os principais setores de “produtos não industriais” são:
alimentos (frutas, frutos do mar, grãos, laticínios, ovos etc.), petróleo bruto e seus
derivados também no estado bruto, couro e peles, pedras preciosas, matéria de origem
animal e vegetal, óleos e sementes de frutos oleaginosos, fertilizantes e adubos de
origem mineral, cortiça e madeira, borracha em seu estado bruto, minérios metálicos,
cimento, cal, amianto e materiais de construção em geral, refratários e carvão e coque.
O próximo setor é o de manufaturas, composto de indústrias de baixa intensidade
tecnológica, as quais podem ser listadas do seguinte modo: indústria de papel e celulose,
bebidas e tabacos, papéis e embalagens, fios têxteis, obras e artefatos em metal,
manufaturas de couro e pele, manufaturas de borracha, óleos processados utilizados na
alimentação de origem animal e vegetal, gorduras e ceras, artigos para viagens, móveis
e colchões, vestuário e acessórios, calçados, vidros, cerâmicas, gás natural e fabricado,
corrente elétrica, aço e ferro e metais não ferrosos.
O setor formado por produtos industriais de baixa-média intensidade tecnológica
compreende os setores de bens de capital, ou seja, setor de máquinas e equipamentos,
12
além de veículos de transporte (automóveis, motocicletas, bicicletas e similares) e
transporte férreo, plásticos e tintas.
Segmentos de média-alta tecnologia incluem os setores produtores de aparelhos e
instrumentos científicos e indústria química bruta.
O segmento de alta intensidade tecnológica inclui a indústria farmacêutica, eletrônicas
de precisão, materiais radioativos, indústria aeronáutica e seus similares e afins.
Com base nas informações do Quadro 1, o próximo passo será (re)agregar os dados
seguindo a classificação da OECD – o lado direito informa os setores de atividade
econômica e o lado esquerdo, a classificação proposta pela OECD.
QUADRO 1
CLASSIFICAÇÃO OECD
Nomenclatura
Produtos não industriais
Setores de Atividade
Animais vivos, minérios, petróleo, gás
mineral, grãos e produtos in natura etc.
Produtos industriais de baixa intensidade tecnológica
Indústrias tradicionais: papel e celulose,
bebidas, alimentícia, vestuário, mobiliário,
couro e calçados.
Produtos industriais de baixa-média intensidade
Fazem parte desta classificação: bens de
tecnológica
consumo duráveis, tais como: eletrônicos,
automóveis.
Bens de Capital: máquinas e equipamentos,
petroquímica, metalurgia, combustíveis etc.
Produtos industriais de média-alta intensidade
Química fina, telecomunicações, instrumentos
tecnológica
de precisão etc.
Produtos industriais de alta intensidade tecnológica
Farmacêutica, bioquímica, aviões e
equipamentos eletrônica etc.
Fonte: Organisation for Economic Co-Operation and Development (2010).
Ao agregar os dados das exportações argentinas obtemos os resultados encontrados no
gráfico 4, onde é possível verificar que em todos os setores as exportações apresentaram
13
elevações, com destaque para os setores de não industriais, baixa e baixa – média
intensidade tecnológica. Os setores de média – altas e alta intensidades tecnológicas
apresentaram crescimento bem inferior aos demais setores da economia. Isto fica
evidente no gráfico abaixo.
Gráfico 4- Exportações da Argentina entre 2000 e 2011 (em Bilhões US$)
35
30
25
Não industriais
20
15
10
Baixa
Baixa - média
Média - Alta
Alta
5
0
Fonte: Comtrade / ONU
Ao incluir as importações, os resultados obtidos com o agrupamento dos dados dos
saldos comerciais estão ilustrados no gráfico 5. De acordo com o mesmo, fica evidente
que o setor não industrial foi o setor que apresentou saldos comerciais crescentes para o
período em questão. Tal resultado obtido, principalmente, pela elevação dos preços
internacionais de commodities decorrente do aumento na demanda de países como a
China nos últimos anos.
Os setores de baixa, baixa – média, média alta intensidade tecnológica foram os setores
que apresentaram maior declínio para o período em questão, principalmente a partir de
2002. O setor de alta intensidade tecnológica apresentou menor variância em seu
desempenho, embora, assim como os demais, com exceção dos não industriais,
obtiveram déficits comerciais crescentes.
14
Gráfico 5- Saldos Comerciais da Argentina entre 2000 e 2011 (em Bilhões US$)
15
10
5
Não industriais
Baixa
0
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011
-5
Baixa - média
Média - Alta
Alta
-10
-15
-20
Fonte: Comtrade / ONU
Desta forma, fica evidente que mesmo com os indicadores favoráveis a economia da
Argentina (PIB e taxa de investimento crescente e taxa de desemprego decrescente),
quando analisada a sua inserção comercial demonstra a crescente importação de bens de
maior intensidade tecnológica, ou seja, a participação de bens industriais importados na
economia tem aumentado, podendo levar a indústria doméstica a perda de sua
competitividade.
Gonçalves (2001), ao afirmar que a reprimarização da economia é a perda da atividade
internacional dos produtos manufaturados, e o ganho dos produtos agrícolas exportados
e, De Negri (2005) ao afirmar que a desindustrialização está associada aos saldos
comerciais crescentes dos produtos não industriais, considerando a análise destes
autores a economia Argentina poderia estar passando por um processo de
desindustrialização.
Logo, a desindustrialização da economia pode ser atribuída não somente a países
desenvolvidos assim como proposto por Clark (1957) e Rowthorn e Ramaswamy
(1999), mas sim aos países que possuem dotação de recursos naturais e, certo grau de
industrialização de sua economia, no qual quando a ocorrência de choques de demanda
por bens não industriais, ocorrer mudanças nos saldos comerciais setoriais da economia.
15
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O crescimento na demanda mundial por commodities agrícolas e minerais
impulsionando seus preços internacionais se apresentou como uma oportunidade aos
países intensivos em recursos naturais. Tal fato pode levar a canalização de recursos
destinados aos investimentos para os setores intensivos em recursos naturais em
detrimento da indústria.
Quando se analisa as exportações da economia Argentina pode-se constatar que os
setores de não industriais, baixa e baixa-média intensidade tecnológica apresentaram
resultados crescentes, os demais setores (média-alta e alta intensidade tecnológica)
também cresceram suas exportações, mas numa proporção bem menor.
Ao avaliar a inserção comercial do país, ou seja, ao incluir as importações, ficou
evidenciado que o país apresentou saldos comerciais crescentes nos setores de não
industriais e déficits comerciais crescentes nos setores industriais. Tais resultados
diferem da análise de Fernández e Curato (2011), pois os autores consideraram apenas
os resultados das exportações e não os saldos comerciais.
Desta forma, quando se avalia o saldo de comércio é possível compreender como que
determinado país se insere no comércio mundial e, se os déficits comerciais dos setores
industriais continuarem decrescentes e os setores não industriais permanecerem com
superávits crescentes, no longo prazo, poderá a economia da Argentina enfrentar um
processo de desindustrialização.
REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CANUTO, O. Padrões de especialização, hiatos tecnológicos e crescimento com
restrição de divisas. Revista de Economia Política, São Paulo, v. 18, n.º 3 (71), p. 5-15,
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