A Antropologia em questão Há pouco mais de 30 anos, a Antropologia sofreu uma guinada inesperada em sua trajetória de ciência do Homem. Assentada desde o século xix em teorias e visões de cunho científico, orientadas ora pela Lógica Dialética – como o evolucionismo sociocultural, a ecologia cultural e o marxismo –, ora pela Lógica da Identidade – como o culturalismo e o funcionalismo –, ora pela Lógica da Diferença – com os durkheimianos da Escola Sociológica Francesa –, e, por fim, pela lógica clássica ou sistêmica – como o estruturalismo –, a Antropologia foi açoitada por um tal vendaval de extravagâncias e exigências que a chacoalhou em suas modestas certezas científicas e em seus sinceros propósitos humanistas a ponto de, em certos momentos, pressentir que, talvez, nem mais sentido faria. Hoje ela aí está a cambalear zonza e atônita com o que lhe vem acometendo. Alguns ainda buscam firmar de volta seu passo altaneiro, outros acham que cambalear é o seu destino. É chegada a hora de um acerto de contas com esse estado de coisas, de enfrentar as incertezas e os dilemas, de rediscutir os princípios e as teorias que dão sustentação ao pensar antropológico e formular as bases constitutivas de uma nova teoria da Antropologia, dentro da qual se abriguem e se concertem com justeza as lógicas e as teorias que contribuem para entender o fenômeno humano. Esta nova Antropologia é qualificada como hiperdialética por derivar do sistema lógico hiperdialético ou quinquitário criado pelo filósofo e lógico brasileiro Luiz Sérgio Coelho de Sampaio (1933-2003).1 Assim, a Antropologia Hiperdialética pretende ser um constructo teórico e metodológico que, ao invés de renegar sua formação e seu legado teórico e etnográfico, incorpora-os e subsume-os 12 A n t r o p o l o g i a H i p e r d i a l é t i c a como contribuições formativas, burilando-as e rearrumando-as em uma nova ordem de compreensibilidade. A Antropologia Hiperdialética tem como autoimposta tarefa enfrentar e superar as aporias atuais da reflexão antropológica, seu abismo de incompreensibilidade, a nulificação do Homem e sua desnaturalização; porém, seu objetivo precípuo é o de lançar uma nova luz sobre o fenômeno humano – a cultura, os aspectos sociais e culturais lato sensu e a relação do Homem com a natureza – como uma totalidade coerente, compreensível e significativa, tanto em si mesmo como em relação com a natureza/universo do qual faz parte. Ela se projeta alicerçada em fundamentos científicos, mas também realçada por considerações lógico-filosóficas. Intentando não somente abarcar e avaliar, mas também propor uma nova visão sobre o fenômeno humano, a Antropologia Hiperdialética, além de se constituir em pensar científico-filosófico, porta consigo consciente e necessariamente um engajamento ético. Na sua concepção intelectual e prática, a Antropologia Hiperdialética é o resultado das reflexões conjuntas de um antropólogo e de um filósofo que têm trabalhado com os temas da cultura e da sociedade igualitária e hierárquica, tais como política, economia, psicanálise, lógica e filosofia.