Volume 28 - Número 2 - Junho, 2009

Propaganda
•Ensaios clínicos aleatórios
em neurocirurgia
•Qualidade dos ensaios clínicos
aleatórios em neurocirurgia
publicados no Brasil
•Comentários: Ensaios clínicos
aleatórios em neurocirurgia
•Anomalias dos nervos lombossacrais em
natimortos a termo. Estudo anatômico
•Cavernomas pontinos extraventriculares.
Parte I. Acesso transtentorial a cavernoma
pontino dorsolateral
•Cavernomas pontinos extraventriculares.
Parte II. Acesso pré-sigmoideo
transpetroso a cavernoma
pontino ventrolateral
•Meios contínuos em neurocirurgia
vascular e neurorradiologia
intervencionista. Parte I
•Meningiomas do forâmen magno
•Metástase de adenocarcinoma de mama
no ângulo pontocerebelar
Volume 28 • Número 2 • Junho • 2009
Órgão Oficial da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia
Órgão Oficial das Sociedades de Neurocirurgia de Língua Portuguesa
(ISSN 0103-5355)
Editores
Gilberto Machado de Almeida
Milton K. Shibata
Mário Gilberto Siqueira
Editores Associados
Atos Alves de Sousa (Belo Horizonte, MG)
Benedicto Oscar Colli (Ribeirão Preto, SP)
Carlos Umberto Pereira (Aracaju, SE)
Eduardo Vellutini (São Paulo, SP)
Ernesto Carvalho (Porto, Portugal)
Fernando Menezes Braga (São Paulo, SP)
Francisco Carlos de Andrade (Sorocaba, SP)
Hélio Rubens Machado (Ribeirão Preto, SP)
João Cândido Araújo (Curitiba, PR)
Jorge Luiz Kraemer (Porto Alegre, RS)
José Alberto Gonçalves (João Pessoa, PB)
José Alberto Landeiro (Rio de Janeiro, RJ)
José Carlos Esteves Veiga (São Paulo, SP)
José Carlos Lynch Araújo (Rio de Janeiro, RJ)
José Perez Rial (São Paulo, SP)
Manoel Jacobsen Teixeira (São Paulo, SP)
Marcos Barbosa (Coimbra, Portugal)
Marcos Masini (Brasília, DF)
Nelson Pires Ferreira (Porto Alegre, RS)
Pedro Garcia Lopes (Londrina, PR)
Sebastião Gusmão (Belo Horizonte, MG)
Sérgio Cavalheiro (São Paulo, SP)
Waldemar Marques (Lisboa, Portugal)
Sociedade Brasileira
de Neurocirurgia
Diretoria
(2008-2010)
Presidente
Conselho Deliberativo
Presidente
Luiz Carlos de Alencastro
Cid Célio Jayme Carvalhaes
Vice-Presidente
Jorge Luiz Kraemer
Secretário
Secretário-Geral
Kunio Suzuki
Arlindo Alfredo Silveira D’ Ávila
Conselheiros
Tesoureiro
Albert Vicent B. Brasil
Marcelo Paglioli Ferreira
Atos Alves de Sousa
Secretário Permanente
Carlos Roberto Telles Ribeiro
Samuel Tau Zymberg
Djacir Gurgel de Figueiredo
Primeiro Secretário
Evandro Pinto da Luz de Oliveira
Alexandre Mac Donald Reis
José Alberto Landeiro
Presidente Anterior
José Antonio Damian Guasti
José Carlos Saleme
José Carlos Saleme
Presidente Eleito da SBN 2010
Léo Fernando da Silva Ditzel
José Marcus Rotta
Luis Alencar Biurrum Borba
Presidente do Congresso 2010
Mário Gilberto Siqueira
Silvio Porto de Oliveira
Nelson Pires Ferreira
Presidente Eleito do Congresso 2012
Paulo Andrade de Mello
Marco Aurélio Marzullo de Almeida
Sebastião Nataniel Silva Gusmão
Secretaria Permanente
Rua Abílio Soares, 233 – cj. 143 – Paraíso
04005-001 – São Paulo – SP
Telefax: (11) 3051-6075/3051-7157/3887-6983
Home page: www.sbn.com.br
E-mail: [email protected];
[email protected]
Instruções para os autores
Arquivos Brasileiros de Neurocirurgia, publicação científica
oficial da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia e das Sociedades
de Neurocirurgia de Língua Portuguesa, destina-se a publicar
trabalhos científicos sobre neurocirurgia e ciências afins, inéditos
e exclusivos. Em princípio, são publicados trabalhos redigidos em
português, com resumo em inglês. Excepcionalmente, poderão ser
redigidos em inglês, com resumo em português.
Os artigos submetidos para publicação deverão ser classificados
em uma das categorias abaixo:
• A ordem preferencial de publicação será a cronológica,
respeitando-se a proporcionalidade referida anteriormente
• Os direitos autorais de artigos publicados nesta revista pertencerão exclusivamente a Arquivos Brasileiros de Neurocirurgia.
É interditada a reprodução de artigos ou ilustrações publicadas
nesta revista, sem o consentimento prévio do Editor

• Artigos originais: informações resultantes de pesquisa clínica,
epidemiológica ou experimental. Resumos de teses e dissertações. Pretende-se que pelo menos a metade das páginas da
revista seja destinada a esta categoria
1.Um original e uma cópia do texto impresso e editado em
espaço duplo, utilizando fonte 12, em face única de papel
branco de tamanho “A4” ou “carta”, respeitando margem
mínima de 2,5 centímetros ao redor do texto
• Artigos de revisão: sínteses de revisão e atualização sobre
temas específicos, com análise crítica e conclusões. As bases
de dados e o período abrangido na revisão deverão ser especificados
2.Cópia em disquete ou em CD-ROM, digitado e formatado de
maneira idêntica ao original impresso, com identificação do
artigo e do processador de texto utilizado
3.Duas coleções completas das ilustrações
• Relatos de caso: apresentação, análise e discussão de casos
que apresentam interesse relevante
4.Declaração, assinada pelo autor principal, de que o trabalho
é inédito e submetido exclusivamente para publicação em
Arquivos Brasileiros de Neurocirurgia. Se for o caso,
expressar o desejo de arcar com as despesas relativas à reprodução de ilustrações coloridas
• Notas técnicas: notas sobre técnica operatória e instrumental
cirúrgico
• Artigos diversos: são incluídos nesta categoria assuntos
relacionados à história da neurocirurgia, ao exercício profissional, à ética médica e outros julgados como pertinentes aos
objetivos da revista
• Cartas ao editor: críticas e comentários, apresentados de forma
resumida, ética e educativa, sobre matérias publicadas nesta
revista. O direito à réplica é assegurado aos autores da matéria
em questão. As cartas, quando consideradas como aceitáveis
e pertinentes, serão publicadas com a réplica dos autores
 Normas gerais para publicação
• Os artigos para publicação deverão ser enviados ao Editor, no
endereço apresentado abaixo
• Todos os artigos serão submetidos à avaliação de, pelo menos,
dois membros do Corpo Editorial
• Serão aceitos apenas os artigos originais, cuja parte essencial
não tenha sido publicada previamente. Os artigos, ou parte
deles, submetidos para publicação em Arquivos Brasileiros
de Neurocirurgia não deverão ser submetidos, concomitantemente, a outra publicação científica. Destas restrições, estão
excluídas as Sinopses e outras publicações de Congressos e
Reuniões Científicas
• Não serão aceitos artigos que não corresponderem totalmente
às normas aqui descritas
• Compete ao Corpo Editorial recusar artigos submetidos para
publicação e de sugerir ou adotar modificações para melhorar
a clareza e a estrutura do texto e manter a uniformidade no
estilo da revista
• Os originais dos artigos recusados não serão devolvidos. Os
autores serão comunicados por meio de carta
Normas para submeter os artigos para publicação
Os autores devem enviar, ao Editor, o seguinte material:

Normas para a estrutura dos artigos
Sempre que possível, os artigos devem ser estruturados contendo todos os itens relacionados a seguir e paginados na sequência
apresentada:
1. Página-título: título do artigo; nome completo de todos os
autores; títulos universitários ou profissionais dos autores
principais (máximo de dois títulos por autor); nomes das
Instituições onde o trabalho foi realizado; título abreviado
do artigo, para ser utilizado no rodapé das páginas; nome,
endereço completo, e-mail e telefone do autor responsável
pelas correspondências com o Editor
2. Resumo: de forma estruturada, utilizando cerca de 250 palavras, descrevendo objetivo, métodos, principais resultados
e conclusões; abaixo do resumo, indicar até seis palavraschave, com base no DeCS (Descritores em Ciências da
Saúde), publicado pela Bireme e disponível em http://decs.
bvs.br
3. Abstract: título do trabalho em inglês; tradução correta do
resumo para o inglês; indicar key words compatíveis com as
palavras-chave, também disponíveis no endereço eletrônico
acima mencionado
4. Texto principal: introdução; casuística ou material e métodos; resultados; discussão; conclusão; agradecimentos
5. Referências: relacionar em ordem alfabética, pelo sobrenome do primeiro autor e, quando necessário, pelo sobrenome
dos autores subsequentes; se existir mais de um artigo do
mesmo autor, ou do mesmo grupo de autores, utilizar ordem
cronológica crescente; nas referências utilizar o padrão de
Vancouver; listar todos os nomes até seis autores, utilizando
“et al.” após o sexto; as referências relacionadas devem,
obrigatoriamente, ter os respectivos números de chamada
indicados de forma sobrescrita, em local apropriado do texto
principal; no texto, quando houver citação de nomes de
autores, utilizar “e cols.” para mais de dois autores; dados
não publicados ou comunicações pessoais devem ser citados,
como tal, entre parênteses, no texto e não devem ser relacionados nas referências; utilizar abreviatura adotada pelo
Index Medicus para os nomes das revistas; siga os exemplos
de formatação das referências (observar, em cada exemplo,
a pontuação, a sequência dos dados, o uso de maiúsculas e
o espaçamento):
Artigo de revista
Agner C, Misra M, Dujovny M, Kherli P, Alp MS, Ausman JI.
Experiência clínica com oximetria cerebral transcraniana. Arq
Bras Neurocir. 1997;16:77-85.
Capítulo de livro
Peerless SJ, Hernesniemi JA, Drake CG. Surgical management
of terminal basilar and posterior cerebral artery aneurysms.
In: Schmideck HH, Sweet WH, editors. Operative neurosurgical techniques. 3rd ed. Philadelphia: WB Saunders; 1995.
p. 1071-86.
Livro considerado como todo (quando não há colaboradores
de capítulos)
Melzack R. The puzzle of pain. New York: Basic Books Inc
Publishers; 1973.
Tese e dissertação
Pimenta CAM. Aspectos culturais, afetivos e terapêuticos relacionados à dor no câncer. [tese]. São Paulo: Escola de Enfermagem
da Universidade de São Paulo; 1995.
Anais e outras publicações de congressos
Corrêa CF. Tratamento da dor oncológica. In: Corrêa CF, Pimenta
CAM, Shibata MK, editores. Arquivos do 7º Congresso Brasileiro
e Encontro Internacional sobre Dor; 2005 outubro 19-22; São
Paulo, Brasil. São Paulo: Segmento Farma. p. 110-20.
Artigo disponível em formato eletrônico
International Committee of Medial Journal Editors. Uniform
requirements for manuscripts submitted to biomedical journals. Writing and editing for biomedical publication. Updated
October 2007. Disponível em http://www.icmje.org. Acessado
em 2008 (Jun 12)
6. Endereço para correspondência: colocar, após a última
referência, nome e endereço completos do autor que deverá
receber as correspondências enviadas pelos leitores
7. Tabelas e quadros: devem estar numerados em algarismos
arábicos na sequência de aparecimento no texto; devem estar
editados em espaço duplo, utilizando folhas separadas para
cada tabela ou quadro; o título deve ser colocado centrado
e acima; notas explicativas e legendas das abreviaturas
utilizadas devem ser colocadas abaixo; apresente apenas
tabelas e quadros essenciais; tabelas e quadros editados em
programas de computador deverão ser incluídos no disquete,
em arquivo independente do texto, indicando o nome e a
versão do programa utilizado; caso contrário, deverão ser
apresentados impressos em papel branco, utilizando tinta
preta e com qualidade gráfica adequada
8. Figuras: enviar duas coleções completas das figuras, soltas
em dois envelopes separados; as fotografias devem ter boa
qualidade, impressas em papel brilhante, sem margens; letras
e setas autoadesivas podem ser aplicadas diretamente sobre as
fotografias, quando necessárias, e devem ter tamanho suficiente
para que permaneçam legíveis após redução; utilizar filme
branco e preto para reproduzir imagens de filmes radiográficos;
o nome do autor, o número e a orientação vertical das figuras
devem ser indicados no verso delas; os desenhos devem ser
apresentados em papel branco, elaborados profissionalmente,
em dimensões compatíveis com as páginas da revista (7,5 cm é
a largura de uma coluna, 15 cm é a largura da página); figuras
elaboradas em computador devem ser incluídas no disquete,
no formato JPG ou TIF; a resolução mínima aceitável é de 300
dpi (largura de 7,5 ou 15 cm); os autores deverão arcar com
os custos de ilustrações coloridas
9. Legendas das figuras: numerar as figuras, em algarismos
arábicos, na sequência de aparecimento no texto; editar as
respectivas legendas, em espaço duplo, utilizando folha
separada; identificar, na legenda, a figura e os eventuais
símbolos (setas, letras etc.) assinalados; legendas de
fotomicrografias devem, obrigatoriamente, conter dados
de magnificação e coloração; reprodução de ilustração já
publicada deve ser acompanhada da autorização, por escrito,
dos autores e dos editores da publicação original e esse fato
deve ser assinalado na legenda
10. Outras informações: provas da edição serão enviadas aos
autores, em casos especiais ou quando solicitadas, e, nessas
circunstâncias, devem ser devolvidas, no máximo, em cinco
dias; exceto para unidades de medida, abreviaturas devem
ser evitadas; abreviatura utilizada pela primeira vez no
texto principal deve ser expressa entre parênteses e precedida pela forma extensa que vai representar; evite utilizar
nomes comerciais de medicamentos; os artigos não poderão
apresentar dados ou ilustrações que possam identificar um
doente; estudo realizado em seres humanos deve obedecer
aos padrões éticos, ter o consentimento dos pacientes e a
aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Instituição
onde foi realizado; os autores serão os únicos responsáveis
pelas opiniões e conceitos contidos nos artigos publicados,
bem como pela exatidão das referências bibliográficas apresentadas; quando apropriado, ao final do artigo publicado,
serão acrescentados comentários sobre a matéria. Esses
comentários serão redigidos por alguém indicado pela Junta
Editorial
11. Endereço do Editor:
Milton K. Shibata
Rua Peixoto Gomide, 515 – cj. 144
01409-001 – São Paulo, SP
Telefax: (11) 3287-7241
E-mail: [email protected]; [email protected]
Arquivos Brasileiros de Neurocirurgia
Rua Abílio Soares, 233 – cj. 143 – 04005-006 – São Paulo – SP
Tels.: (11) 3051-6075/3051-7157/3887-6983 Fax: (11) 3887-8203
Este periódico está catalogado no ISDS sob o no- ISSN – 0103-5355 e indexado na Base de Dados Lilacs.
É publicado, trimestralmente, nos meses de março, junho, setembro e dezembro.
São interditadas a republicação de trabalhos e a reprodução de ilustrações publicadas em
Arquivos Brasileiros de Neurocirurgia, a não ser quando autorizadas pelo Editor, devendo,
nesses casos, ser acompanhadas da indicação de origem.
Pedidos de assinaturas ou de anúncios devem ser dirigidos à
Secretaria Geral da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia.
Assinatura para o exterior: US$ 35,00.
Índice
Volume 28 – Número 2 – Junho de 2009
41
Editorial: Ensaios clínicos aleatórios em neurocirurgia
Milton K. Shibata e Mário G. Siqueira
43
Qualidade dos ensaios clínicos aleatórios em neurocirurgia publicados no Brasil
Duarte Nuno Crispim Cândido, Fabiano Timbó Barbosa
48
Comentários: Ensaios clínicos aleatórios em neurocirurgia
Benedicto Oscar Colli
50
Anomalias dos nervos lombossacrais em natimortos a termo. Estudo anatômico
Max Franco de Carvalho, Roberta Teixeira Rocha, João Tiago Silva Monteiro, Carlos Umberto Pereira,
Alex Franco de Carvalho, Francisco do Prado Reis
54
Cavernomas pontinos extraventriculares. Parte I. Acesso
transtentorial a cavernoma pontino dorsolateral
Marcos Augusto Stávale Joaquim, Gustavo Cartaxo Patriota, André de Macedo Bianco
58
Cavernomas pontinos extraventriculares. Parte II. Acesso
pré-sigmoideo transpetroso a cavernoma pontino ventrolateral
Marcos Augusto Stávale Joaquim, Gustavo Cartaxo Patriota, André de Macedo Bianco
62
Meios contínuos em neurocirurgia vascular e neurorradiologia intervencionista. Parte I
Rogelio Iván Ortiz-Velázquez, Jose Guilherme Mendes Pereira Caldas, Jorge Arturo Santos Franco,
Rodrigo Mercado Pimentel, Rogelio Revuelta
74
Meningiomas do forâmen magno
Revisão da literatura
Danilo Otávio de Araújo Silva, Leonardo Ferraz Costa, Matheus Augusto Pinto Kitamura,
Joacil Carlos da Silva, Hildo Rocha Cirne de Azevedo Filho
81
Metástase de adenocarcinoma de mama no ângulo pontocerebelar
Relato de caso
José Nazareno Pearce de Oliveira Brito, Gerson Luis Medina Prado, Ricardo Marques Lopes de Araújo,
Wildson de Castro Gonçalves Neto
Contents
Volume 28 – Number 2 – June, 2009
41
Editorial: Randomized controlled trials on neurosurgery, in Brazil
Milton K. Shibata e Mário G. Siqueira
43
The quality of a randomized controlled trials on neurosurgery published in Brazil
Duarte Nuno Crispim Cândido, Fabiano Timbó Barbosa
48
Randomized controlled trials on neurosurgery. Comments
Benedicto Oscar Colli
50
Anomalies of the lumbosacral nerve roots in stillborns. An anatomical study
Max Franco de Carvalho, Roberta Teixeira Rocha, João Tiago Silva Monteiro, Carlos Umberto Pereira,
Alex Franco de Carvalho, Francisco do Prado Reis
54
Extraventricular pontine cavernomas. Part I. Transtentorial
route to remove a postero-lateral pontine cavernoma
Marcos Augusto Stávale Joaquim, Gustavo Cartaxo Patriota, André de Macedo Bianco
58
Extraventricular pontine cavernomas. Part II. Pre-sigmoid,
transpetrosal approach to ventrolateral pontine cavernomas
Marcos Augusto Stávale Joaquim, Gustavo Cartaxo Patriota, André de Macedo Bianco
62
Mechanics of continuous media in vascular neurosurgery
and endovascular neuroradiological procedures
Rogelio Iván Ortiz-Velázquez, Jose Guilherme Mendes Pereira Caldas, Jorge Arturo Santos Franco,
Rodrigo Mercado Pimentel, Rogelio Revuelta
74
Foramen magnum meningiomas
Literature review
Danilo Otávio de Araújo Silva, Leonardo Ferraz Costa, Matheus Augusto Pinto Kitamura,
Joacil Carlos da Silva, Hildo Rocha Cirne de Azevedo Filho
81
Breast andenocarcinoma metastasis in the cerebello pontire angle. Case report
Case report
José Nazareno Pearce de Oliveira Brito, Gerson Luis Medina Prado, Ricardo Marques Lopes de Araújo,
Wildson de Castro Gonçalves Neto
Arq Bras Neurocir 28(2): 41-42, junho de 2009
Editorial: Ensaios clínicos
aleatórios em neurocirurgia
Os ensaios clínicos aleatórios são fundamentais para a demonstração da efetividade de um
novo procedimento em medicina. Para que uma nova droga seja introduzida na prática clínica,
ensaios aleatórios deverão demonstrar que ela é mais efetiva, ou pelo menos tão efetiva quanto
os tratamentos disponíveis. O mesmo deveria ocorrer em relação aos procedimentos cirúrgicos,
mas infelizmente essa não é a realidade.3 Com frequência, os cirurgiões baseiam-se em séries
cirúrgicas sem controle rigoroso para julgar os méritos de um determinado procedimento,5 o que
é arriscado, pois os estudos não controlados e sem alocação aleatória apresentam diversos vieses
que podem levar a valorização inadequada da efetividade de uma nova forma de tratamento.4
É evidente que os procedimentos neurocirúrgicos também necessitam de avaliação por
ensaios clínicos aleatórios, mas deve ser lembrado que, mesmo com todas as possibilidades de
controle que esse tipo de estudo oferece, sua realização deve ser cuidadosa, pois tais ensaios
são passíveis de defeitos na elaboração, condução, análise e relato.6,7
Existem dois estudos que analisaram os ensaios clínicos aleatórios em neurocirurgia. Em
1983, Haines2 relatou um levantamento realizado na literatura de língua inglesa (Acta Neurochirurgica; Annals of Neurology; Archives of Neurology; Brain; British Journal of Surgery; Child’s
Brain; Journal of Neurosurgery; Journal of Neurology, Neurosurgery and Psychiatry; Neurology;
Neurosurgery e Surgical Neurology) durante um período de 36 anos (1945-1977). Além do número restrito de ensaios encontrados, no total de 51, o autor verificou que, embora todos tenham
adotado o procedimento de alocação aleatória, somente 17 (33%) relataram procedimentos de
mascaramento e somente em seis dos relatos foi realizada uma análise estatística adequada dos
resultados. Em 2004, Vranos e cols.,10 utilizando o MedLine, o Embase e o Cochrane Library
Controlled Trials Registry, selecionaram dentre as publicações em inglês, francês, alemão e
italiano realizadas nos 30 anos que precederam essa pesquisa, 108 estudos clínicos aleatórios.
Embora alguns aspectos deste último estudo sejam diferentes do anterior, as conclusões gerais
são bastante semelhantes: na maioria dos relatos existe um limitado número de amostras, e
diversos parâmetros de qualidade (ex.: alocação aleatória e mascaramento duplo-cego) foram
relativamente negligenciados na maioria dos ensaios. Conclusões semelhantes foram descritas
em ensaios aleatórios em cirurgia pediátrica1 e em cirurgia laparoscópica,8 sugerindo que tais
problemas talvez sejam inerentes às áreas cirúrgicas.
Neste número de Arquivos Brasileiros de Neurocirurgia está publicado um estudo de
Cândido e Barbosa intitulado “Qualidade dos ensaios clínicos aleatórios em neurocirurgia publicados no Brasil”. O propósito básico do trabalho não pôde ser alcançado, pois após a análise de
183 artigos publicados nesta revista, no período de março de 1999 a março de 2008, os autores
constataram que nenhum ensaio clínico aleatório havia sido publicado.
Além da escassez comprovada de ensaios clínicos aleatórios em neurocirurgia, conforme
atestada pelas duas publicações mencionadas anteriormente, a ausência desse tipo de estudo
na nossa revista tem uma explicação adicional. Quando um autor brasileiro produz um artigo
mais elaborado, sua tendência natural é tentar publicá-lo em uma revista indexada onde o fator
de impacto é maior. Infelizmente, apesar dos esforços dos editores e de membros da Diretoria da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia, nos últimos 15 anos, Arquivos Brasileiros de
Neurocirurgia persiste fora dos indexadores de maior prestígio. Em consequência, apesar da
qualidade dos artigos publicados na revista, muitos dos trabalhos de maior impacto são destinados às publicações de maior pontuação.
Cada vez mais os neurocirurgiões reconhecem a necessidade de ensaios clínicos aleatórios
para a avaliação de novos procedimentos. No entanto, deve ser lembrado que muito do que
aprendemos sobre o tratamento dos pacientes neurocirúrgicos foi oriundo de séries não controladas de pacientes, muitas vezes analisadas de forma retrospectiva. Muitos procedimentos
neurocirúrgicos são complicados e caros e alguns desses são realizados em condições incomuns,
Arq Bras Neurocir 28(2): 41-42, junho de 2009
o que inviabiliza ensaios muito grandes. Por outro lado, a irreversibilidade habitual dos resultados cirúrgicos pode impedir a alocação aleatória de pacientes em estudos comparando cirurgia
versus terapia medicamentosa ou cirurgias de diferentes complexidades e riscos.9
A despeito de todas essas explicações e justificativas, não há dúvida de que é “por meio de
estudos de ensaio clínico aleatório que se consegue um melhor nível de evidências científicas,
por esses relacionarem-se com um menor índice de vieses na seleção das investigações”, conforme ressaltado no excelente artigo de Cândido e Barbosa.
Referências
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
8.
9.
10.
Curry JI, Reeves B, Stringer MD. Randomized controlled trials in pediatric surgery: could we do better? J
Pediatr Surg. 2003;38:556-9.
Haines SJ. Randomized clinical trials in neurosurgery. Neurosurgery. 1983;12:259-64.
Horton R. Surgical research or comic opera: questions, but few answers. Lancet. 1996;347:984-5.
Ioannidis JP, Haidich AB, Pappa M, Pantazis N, Kokori SI, Tektonidou MG, et al. Comparison of evidence
of treatment effects in randomized and nonrandomized studies. JAMA. 2001;286:821-30.
Johnson AG, Dixon JM. Removing bias in surgical trials. BMJ. 1997;314:916-7.
Moher D, Dulberg CS, Wells GA. Statistical power, sample size, and their reporting in randomized controlled
trials. JAMA. 1994;272:122-4.
Schulz KF, Chalmers I, Hayes RJ, Altman DG. Empirical evidence of bias: Dimensions of methodological
quality associated with estimates of treatment effects in controlled trials. JAMA. 1995;273:408-12.
Slim K, Bousquet J, Kwiatkowski F, Pezet D, Chipponi J. Analysis of randomized controlled trials in laparoscopic surgery. Br J Surg. 1997;84:610-4.
Solomon MJ, Laxamana A, Devore L, McLeod RS. Randomized controlled trials in surgery. Surgery. 1994;115:
707-12.
Vranos G, Tatsioni A, Polyzoidis K, Ioannidis JPA. Randomized trials of neurosurgical interventions: a systematic appraisal. Neurosurgery. 2004;55:18-26.
Milton K. Shibata e
Mário G. Siqueira
Editores
42
Editorial
Shibata MK e Siqueira MG
Arq Bras Neurocir 28(2): 43-47, junho de 2009
Qualidade dos ensaios clínicos aleatórios
em neurocirurgia publicados no Brasil
Duarte Nuno Crispim Cândido1, Fabiano Timbó Barbosa2
Universidade de Ciências da Saúde de Alagoas
Escola de Ciências Médicas de Alagoas
Liga de Anestesiologia, Dor e Terapia Intensiva de Alagoas
RESUMO
Contexto: O ensaio clínico aleatório é definido como um estudo prospectivo, o qual compara o efeito e
o valor de intervenções em seres humanos, envolvendo um ou mais grupos, a pelo menos um grupocontrole, com alocação aleatória dos participantes e utilização de medidas de controle. A qualidade de um
ensaio clínico aleatório pode ser definida como a probabilidade de um estudo planejado gerar resultados
sem tendenciosidades e que se aproximem da realidade terapêutica. Objetivo: Avaliar a qualidade dos
ensaios clínicos aleatórios em neurocirurgia publicados no Brasil. Métodos: Este estudo é transversal
e descritivo; critérios de inclusão: artigo original de ensaio clínico aleatório em neurocirurgia publicado
no Brasil; critérios de exclusão: estudo experimental, estudos laboratoriais e estudos observacionais.
Utilizou-se estatística descritiva para descrever as variáveis secundárias. Resultados: Entre 183 artigos
publicados, 15% (27/183) foram classificados como artigos originais. Não foram identificados ensaios
clínicos aleatórios. Entre os artigos originais, 63% (17/27) foram caracterizados como estudos do tipo
transversal de incidência/prevalência, 30% (8/27) como coorte, 4% (1/27) como acurácia e 4% (1/27)
como de revisão sistemática da literatura. Conclusão: Após busca manual e criteriosa, não foram
encontradas publicações de ensaios clínicos aleatórios em neurocirurgia no Brasil.
PALAVRAS-CHAVE
Ensaio clínico aleatório. Avaliação em saúde. Neurocirurgia.
ABSTRACT
The quality of a randomized controlled trials on neurosurgery published in Brazil
Background: The randomized clinical trial is defined as a prospective study witch compares effects
and the value of interventions on human beings, involving one or more groups over at least one control
group, with randomized allocation of participants and using measures to prevent bias. The quality of a
randomized controlled trial is defined as probability to ensure results without biases in a trial and that
to come near to reality. Objective: To evaluate the quality of randomized controlled trials published
on neurosurgery in Brazil. Methods: This is a transversal and descriptive study; inclusions criteria:
original article of randomized clinical trial; exclusions criteria: experimental studies, laboratory studies,
observational studies. Results: In 183 published articles, 15% (27/183) were classified as original
articles. There were no randomized clinical trials identified. Among the original articles 63% (17/27)
were classified as transversal (incidence/prevalence) studies, 30% (8/27) as coort studies, 4% (1/27)
as accuracy studies and 4% (1/27) as meta-analysis. Conclusion: After criteriously and manual search
there were not found randomized clinical trials on neurosurgery published in Brazil.
KEY WORDS
Clinical trial. Randomized. Health evaluation. Neurosurgery.
1 Estudante do 6º ano de Medicina na Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas (Uncisal) – Escola de Ciências Médicas de Alagoas
(ECMAL). Membro da Liga de Anestesiologia, Dor e Terapia Intensiva (LADTI) de Alagoas.
2 Mestre em Ciências da Saúde pela Universidade Federal de Alagoas (UFAL). Tutor da LADTI de Alagoas.
Arq Bras Neurocir 28(2): 43-47, junho de 2009
Introdução
Vive-se atualmente uma fase em que existe exacerbação de pesquisas e publicações, tanto na esfera nacional
quanto internacional. É impossível que um profissional
da área de saúde consiga manter-se atualizado com todas as publicações que se fazem dia a dia na literatura
especializada. Para tal, devem-se identificar os estudos
relevantes, com base na qualidade metodológica, e assim
selecionar aqueles que possam complementar ou até
mesmo modificar a prática profissional.1
O tipo de estudo empregado na pesquisa, quando
adequadamente realizada, determinará sua confiabilidade. É por meio de estudos de ensaio clínico aleatório que
se consegue um melhor nível de evidências científicas,
por esses relacionarem-se com um menor índice de
vieses na seleção das investigações.29
O ensaio clínico aleatório é definido como um
estudo prospectivo, o qual compara o efeito e o valor
de intervenções em seres humanos, envolvendo um ou
mais grupos, a pelo menos um grupo-controle, com
alocação aleatória dos participantes e utilização de medidas de controle. Deve objetivar testar o efeito de uma
intervenção terapêutica, profilática ou diagnóstica para
elucidação de perguntas quanto às condutas terapêuticas
ou prevenção de doenças.6
A qualidade de um ensaio clínico aleatório pode
ser definida como a probabilidade de um estudo planejado gerar resultados sem tendenciosidades e que se
aproximem da realidade terapêutica.14 Sendo assim,
esta variável (qualidade) pode ser avaliada por meio de
três tipos de instrumentos: itens individuais, listas de
verificação e escalas.20 O uso de escalas revela vantagem ao transformar as informações em números, cuja
simplicidade permite uma rápida e fácil compreensão
da qualidade desse tipo de estudo.14
A hipótese testada nesta pesquisa é que apenas
5% dos artigos originais de ensaios clínicos aleatórios
publicados em neurocirurgia sejam de boa qualidade.
Objetiva-se, então, avaliar a qualidade dos ensaios
clínicos aleatórios publicados.
Métodos
Esta pesquisa não foi submetida ao Comitê de Ética
em Pesquisa, por não se relacionar com pesquisa em
seres humanos e não dispor de carências éticas, não se
aplicando essa avaliação. O termo de consentimento
esclarecido não se aplica a esse tipo de pesquisa. Os
gastos inerentes à pesquisa foram de responsabilidade
dos autores.
44
Trata-se de um estudo transversal e descritivo. A
revista Arquivos Brasileiros de Neurocirurgia foi escolhida por ser a revista oficial da Sociedade Brasileira de
Neurocirurgia, ter grande impacto em sua área, além de
ser indexada à base de dados Lilacs. O critério de inclusão
para a avaliação da qualidade metodológica foi: artigo
original de ensaio clínico aleatório em neurocirurgia publicado no Brasil. Os critérios de exclusão para avaliação
da qualidade metodológica foram: estudo experimental,
estudos laboratoriais e estudos observacionais.
A variável primária foi a qualidade dos ensaios
clínicos aleatórios, sendo essa definida como a
probabilidade de um ensaio clínico planejado gerar
resultados sem tendenciosidades.14 As variáveis secundárias foram: número de autores, local de origem da
publicação, classificação do tipo de estudo, realização
do cálculo do tamanho da amostra, descrição das variáveis analisadas, encaminhamento da pesquisa para
o comitê de ética em pesquisa, utilização do termo de
consentimento livre e esclarecido, descrição de critérios de inclusão e exclusão, descrição da fonte de fomento, teste estatístico utilizado e nível de significância
adotado na pesquisa. As variáveis secundárias foram
colhidas em todos os artigos originais pesquisados,
caracterizando-se como artigos originais aqueles em
que o estudo fosse do tipo revisão sistemática, casocontrole, coorte, prevalência/incidência (transversal),
acurácia e ensaio clínico aleatório.
Foram analisados todos os artigos publicados na
revista Arquivos Brasileiros de Neurocirurgia, entre
março de 1999 e março de 2008, por intermédio da busca manual e observando-se as palavras: “randômico”,
“randomizado”, “aleatório”, “duplo-cego”, “placebo”
ou qualquer outra palavra que sugerisse que o artigo se
tratava de um ensaio clínico aleatório. Para que não houvesse perdas ou erros na classificação dos estudos, todos
os estudos em que surgiram dúvidas foram revisados e
discutidos em um segundo momento entre os autores, e
as discordâncias resolvidas após consenso entre eles.
A escala de qualidade utilizada nesta pesquisa para
analisar os ensaios clínicos aleatórios pode ser vista
no quadro I.
Os critérios descritos para avaliação pela escala de
qualidade foram:14
1) Para a randomização: o método de geração da
sequência aleatória foi considerado apropriado
quando permitiu a cada participante do estudo
ter a mesma chance de receber cada intervenção,
e quando o investigador não pudesse prever qual
seria o próximo tratamento.
2) Para o mascaramento duplo-cego: um estudo foi
considerado duplo-cego quando o termo duplocego foi usado. O método foi considerado apropriado quando nem o paciente, nem o responsável
Qualidade dos artigos de ensaios clínicos aleatórios
Cândido DNC & Barbosa FT
Arq Bras Neurocir 28(2): 43-47, junho de 2009
Quadro 1
Itens da Escala de Qualidade. Adaptado de Jadad AR e cols.14
* Itens da Escala de Qualidade
1a – O estudo foi descrito como aleatório (uso de palavras
como “randômico”, “aleatório”, “randomização”)?
1b – O método foi adequado?
2a – O estudo foi descrito como duplo-cego?
2b – O método foi adequado?
como coorte,8,9,11,15,18,22,31,33 4% (1/27) como acurácia3
e 4% (1/27) como revisão sistemática da literatura (Gráfico 1).13 Nenhum ensaio clínico aleatório foi
identificado pela busca manual.
Quanto à origem dos artigos, 47% (14/30) tiveram
como sede o estado de São Paulo, 20% (6/30), Sergipe,
10% (3/30), Rio Grande do Sul, 7% (2/30), Rio de Ja-
3 – Houve descrição das perdas e exclusões?
4%
* Pontuação: cada item (1, 2 e 3) recebe um ponto para a resposta sim ou zero ponto
para a resposta não. Um ponto adicional é atribuído se, no item 1, o método de
geração da sequência aleatória foi descrito e foi adequado e se, no item 2, o método
de mascaramento duplo-cego foi descrito e foi adequado. Um ponto é deduzido se, na
questão 1, o método de geração da sequência aleatória foi descrito, mas de maneira
inadequada e se, na questão 2, foi descrito como duplo-cego, mas de maneira inadequada.
pela coleta de dados tiveram como identificar o
tipo de tratamento dispensado a cada um, ou, na
ausência dessa declaração, se o uso de placebos
idênticos ou imitações foi mencionado.
3) Para as perdas e exclusões: os participantes
que entraram no estudo mas não completaram
o período de observação, ou que não foram
incluídos na análise mas foram descritos pelos
autores dos artigos originais. O número e as
razões para as perdas em cada grupo precisavam
ser declarados. Quando não houvesse perdas,
isso também deveria ser declarado no artigo.
Quando não houve descrição de perdas foi
atribuída nota zero a esse item.
Um máximo de cinco pontos poderia ser obtido
por meio dessa escala, sendo: três pontos para cada
sim, um ponto adicional para um método adequado de
randomização e um ponto adicional para um método
adequado de mascaramento. Um estudo é considerado
de má qualidade quando recebe dois pontos ou menos
na escala de qualidade.14
Foi planejada a avaliação do método de randomização e do sigilo da alocação nos artigos originais de
ensaios clínicos aleatórios.
As variáveis secundárias foram descritas com uso de
estatística descritiva. O número de autores foi descrito
como mediana e amplitude interquartílica.
4%
30%
63%
Transversal
Coorte
Acurácia
Revisão sistemática
Gráfico 1 – Distribuição dos artigos originais.
neiro e 17% (5/30) divididos entre os estados da Bahia,
Pernambuco, Minas Gerais, Goiás e Santa Catarina.
A mediana do número de autores por artigo foi de
3 (2 a 6).
Em nenhum artigo foi descrito o cálculo do tamanho
da amostra. Houve descrição das variáveis analisadas
no método estatístico em 81% (22/27), aprovação por
Comitê de Ética em Pesquisa em 15% (4/27), apresentação de Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
em 7% (2/27), descrição dos critérios de inclusão em
81% (22/27), descrição dos critérios de exclusão em
26% (7/27) e fonte de fomento em 26% (7/27).
Os testes estatísticos mais utilizados estão demonstrados no gráfico 2: 30% (8/27) dos artigos revelam
nível de significância < 0,05.5,8,11,18,28,30,34,35
30%
25%
20%
Qualidade dos artigos de ensaios clínicos aleatórios
Cândido DNC & Barbosa FT
10%
5%
r
lgo
m
Sm oro
irn vof
Sp
ea
rm
an
AN
OV
A
t
en
Fis
ch
e
Ko
T
de
S
tud
do
0%
ad
ra
Foram investigados 183 artigos publicados na
revista Arquivos Brasileiros de Neurocirurgia no
período entre março de 1999 e março de 2008, visto
que 15% (27/183) dos artigos foram classificados como
artigos originais.
Entre os artigos originais 63% (17/27) foram caracterizados como estudos do tipo transversal de incidência/prevalência,2,5,10,12,16,17,19,23-28,30,32,34,35 30% (8/27)
15%
Qu
i-Q
u
Resultados
Gráfico 2 – Gráfico em pirâmides demonstrando a frequência
dos testes estatísticos utilizados nos artigos originais.
45
Arq Bras Neurocir 28(2): 43-47, junho de 2009
Discussão
O passo inicial na investigação científica é a formulação de projetos que sigam o rigor metodológico.
Níveis de evidência só serão alcançados se boas publicações forem realizadas nas revistas específicas de cada
especialidade da área de saúde. A descrição inadequada
de um estudo pode torná-lo difícil ou impossível de ser
interpretado21 e redundar impraticável a aplicação dos
seus resultados na clínica diária.
Em 2002, Camargo,4 verificou o crescente número de
publicações e corrobora o achado de uma minoria de artigos originais. São publicados principalmente trabalhos
retrospectivos ou transversais, realizados a posteriori,
quando o autor tenta mostrar um tratamento clínico ou
técnica cirúrgica realizada. O tipo de estudo em que se
pode encontrar melhor nível de evidência científica,
menores tendenciosidades e vieses, que seria o estudo
de ensaio clínico aleatório, não foi encontrado, talvez por
carecer de melhor rigor técnico ou um bom entendimento
de estatística, ou até mesmo por falta de grupos de estudo interessados, ou ainda por haver pesquisadores com
pouca experiência nesse tipo de estudo.
Quanto ao local de origem, a maioria das publicações teve como local de sede o estado de São Paulo,
sendo 14 entre 30 artigos originais (47%). A diferença
encontrada em relação aos outros locais de origem não
pareceu ser qualitativa, mas quantitativa, uma vez que
é no estado de São Paulo onde existe o maior número
de centros formadores, maior número de cursos de
pós-graduação e, consequentemente, maior número
de pesquisadores.
O número de autores teve a mediana de três autores
por artigo, um número considerado aceitável. Não há
consensualmente uma regra normativa quanto à quantidade de autores por artigo, apenas criticam-se aqueles
com vários autores, já que existe uma prática de se
acrescentar nomes de pessoas ao trabalho quando essas
não contribuíram efetivamente para a execução da pesquisa. Indivíduos que contribuem de maneira indireta
poderiam ser mencionados no item de agradecimentos
do artigo original.
Estudo com amostra por conveniência foi um
achado universal neste trabalho. Tal modalidade facilita o agrupamento e a estruturação da amostra, já que
muitos pesquisadores carecem de grande número de
pacientes para a efetivação da pesquisa. No entanto,
esse tipo de amostra pode influenciar na relevância
estatística do estudo. O tamanho da amostra influencia
inversamente no valor de “p”, por isso amostras muito
grandes tendem a apresentar baixos valores de “p” e
a induzir a erros na tomada de decisões em relação às
diferenças encontradas na pesquisa.7 Não apresentar
o cálculo do tamanho da amostra põe em dúvida a
46
validade dos resultados obtidos, visto que o valor de
“p” pode estar super ou subestimado. Também existem
implicações éticas envolvidas no cálculo do tamanho
da amostra, pois utilizar o número adequado para cada
amostra evita que um número maior de participantes
se exponha a uma determinada intervenção. Saber o
número de participantes também permite prever os
gastos envolvidos em uma pesquisa.
Quanto ao item Comitê de Ética em Pesquisa, verifica-se que poucas são as publicações que se submeteram
à aprovação prévia, apenas quatro das 27 (15%).3,8,19,31
Isso fica ainda pior no que tange ao consentimento livre
e esclarecido, pois apenas foi encontrada menção em
dois trabalhos.8,31 Esses itens são parte fundamental nas
escalas de avaliação de qualidade, para que ao término
da pesquisa não haja dilemas ou transgressões éticas.
Outra crítica vincula-se à omissão dos critérios de exclusão, presentes apenas em sete dos 27 trabalhos (26%),
e tão importantes para que se tenham amostras homogêneas, adequadas às variáveis primárias e secundárias, a
fim de evitar desvios da pesquisa. Apoio financeiro por
meio de fonte de fomento só foi apresentado em sete
das 27 publicações, dessas a maioria em programas de
incentivo à pesquisa na graduação.2,5,18,24,27,28,31
As limitações desta pesquisa foram a falta de artigos
de ensaios clínicos aleatórios para que os autores pudessem confrontar sua hipótese, esboçada como variável
primária, e a busca em apenas uma revista. Outras
revistas relevantes da área de neurocirurgia poderiam
ter sido tomadas como amostra para tentar minimizar
as limitações. Entretanto, por ser uma das duas revistas
nacionais encontradas indexadas à base de dados Lilacs,
o que favorece divulgação pública nacional e internacional, e sendo aquela que contava com maior número
de publicações e histórico mais antigo de publicações
(25 anos), foi tida pelos autores como revista de boa
relevância na área a que se detém.
Avaliar a qualidade de artigos de ensaios clínicos
aleatórios é essencial, uma vez que além de observar
o número de artigos publicados (novas evidências geradas), orientar-se-ão autores a minimizar falhas nas
etapas de planejamento, execução e divulgação de futuras pesquisas e se determinará o grau de confiabilidade
dos resultados de estudos já publicados. Orientações
para as publicações de ensaios clínicos aleatórios são
encontradas no instrumento intitulado CONSORT (Consolidated Standards of Reporting Trials) statement, desenvolvido por um grupo internacional de estatísticos,
pesquisadores, epidemiologistas e editores de revistas
biomédicas.21 Esse consta de 22 itens a serem checados
e um fluxograma que apresenta informações sobre as
quatro fases de um estudo (cadastro, randomização,
seguimento e a análise) e está disponível em URL:
http://www.consort-statement.org/.
Qualidade dos artigos de ensaios clínicos aleatórios
Cândido DNC & Barbosa FT
Arq Bras Neurocir 28(2): 43-47, junho de 2009
Conclusão
19.
Após busca manual e criteriosa, não foram encontradas publicações de ensaios clínicos aleatórios em
neurocirurgia no Brasil.
20.
21.
Referências
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
8.
9.
10.
11.
12.
13.
14.
15.
16.
17.
18.
Amatuzzi MLL. Análise da evolução qualitativa de publicações em Ortopedia e Traumatologia. Comparação entre a
“Revista Brasileira de Ortopedia” e “The Journal of Bone
and Joint Surgery”. Rev Bras Ortop. 2004;39:527-35.
Botelho RV, Abgussen CMB, Machado GCFP, Elias AJR,
Silva AMB, Bittencourt LRA, et al. Epidemiologia do trauma
raquimedular cervical na zona norte da cidade de São Paulo.
Arq Bras Neurocir. 2001;20(3-4):64-76.
Brainer-Lima PT, Brainer-Lima AM, Azevedo Filho HRC.
Deslocamento do cérebro na craniotomia estereotáxica
para lesão superficial. Arq Bras Neurocir. 2004;23:148-50.
Camargo OP. Novos rumos da publicação científica médica
em nosso país. Rev Diagn Trat. 2002;7:42.
Carvalho MF, Rocha RT, Monteiro JTS, Pereira CU, Carvalho
AF, Defino HLA. Anatomia quantitativa do atlas. Arq Bras
Neurocir. 2007;26:48-52.
Castelo AF, Sesso RC, Atallah NA. Epidemiologia clínica: uma
ciência básica para o clínico. J Pneumol. 1989;15:89-98.
Cavalcanti AB, Akamine N, Sousa JMA. Avaliação crítica da
literatura. In: Knobel E, editor. Condutas no paciente grave.
3rd ed. São Paulo: Atheneu; 2006. p. 2635-47.
Collange LA, Martins RS, Zanon-Colange N, Santos MTS,
Moraes OJS, Franco RC. Avaliação de fatores prognósticos
da deambulação em crianças com mielomeningocele. Arq
Bras Neurocir. 2006;25:161-5.
Ferraz A, Macedo GL, Faviere W. Routine intracranial pressure monitoring in a countryside university hospital. Arq Bras
Neurocir. 2002;21(3-4):91-8.
Francisco PCS, Schoepfer JL. Drenagem estereotáxica dos
hematomas intracerebrais com rt-PA. Arq Bras Neurocir.
2002;21(3-4):99-102.
Gallo P, Bonatelli AP. Avaliação prognóstica dos aneurismas intracranianos por estudo do grau clínico, tomografia
computadorizada e angiografia cerebral. Arq Bras Neurocir.
2000;19:71-82.
Garcias GL, Martino-Roth MG, Fontana T. Holoprosencefalia. Incidência na cidade de Pelotas. Arq Bras Neurocir.
2005;24:52-7.
Gonçalves MB, Landeiro JA, Alvarenga RMP. Parede
medial do seio cavernoso: dura-máter ou tecido fibroso?
Revisão sistemática da literatura. Arq Bras Neurocir.
2005;24:151-6.
Jadad AR, Moore A, Carroll D, Jenkinson C, Reynolds DJ,
Cavaghan DJ, et al. Assessing the quality of reports of
randomized clinical trials: is blinding necessary? Control
Clin Trials. 1996;17:1-12.
Leal FSCB, Junior OIT, Bonatelli APF. Interpretação da
velocidade de hemossedimentação nas cirurgias assépticas
da coluna vertebral. Arq Bras Neurocir. 2000;19:165-9.
Leal SCB, Guimarães ACA, Franco RR, Veiga JCE. Lesões
me­dulares traumáticas agudas sem alterações radiológicas
relacionadas com o trauma. Arq Bras Neurocir. 1999;18:
188-93.
Martins RS, Siqueira MG. Neurorrafia hemiipoglosso-facial
após dissecção intratemporal do nervo facial: análise retros­
pectiva de 13 pacientes. Arq Bras Neurocir. 2008;27:1-6.
Mello LR, Espíndola G, Silva FM, Bernardes CI. Lesado
medular. Estudo prospectivo de 92 casos. Arq Bras Neurocir.
2004;23:151-6.
Qualidade dos artigos de ensaios clínicos aleatórios
Cândido DNC & Barbosa FT
22.
23.
24.
25.
26.
27.
28.
29.
30.
31.
32.
33.
34.
35.
Melo JRT, Lemos-Junior LP, Matos LT. Principais causas
de trauma craniencefálico na cidade de Salvador, Bahia,
Brasil. Arq Bras Neurocir. 2005;24(3):93-7.
Moher D, Jadad AR, Nichol G, Penman M, Tugwell P, Walsh
S. Assessing the quality of randomized controlled trials: an
annotated bibliography of scales and checklists. Control Clin
Trials. 1995;6:62-73.
Moher D, Schulz KF, Altman D. The CONSORT statement:
revised recomendations for improving the quality of reports
of parallel-group randomized trials. JAMA. 2001;285:198791. Disponível em http://www.consort-statement.org/
Montanaro AC, Rosi Jr J, Alves Jr JDC. Curativo com
capacete para prevenção de edema e coleção subgaleal
pós-operatórios. Arq Bras Neurocir. 2002;21(1-2):12-5.
Oliveira FEAL, Sato CRA, Shibata MK. Risco de contágio
ocupacional pelo sangue do doente durante os procedimentos neurocirúrgicos. Arq Bras Neurocir. 1999;18:77-83.
Pereira CU, Abud LN, Abud FN, Leite RT. Traumatismo
craniencefálico por acidente com bicicleta. Resultados
preliminares. Arq Bras Neurocir. 2000;19:83-7.
Pereira CU, Barreto AS, Moreira LCM. Traumatismos
craniencefálicos leves. Estudo comparativo entre observação clínica e realização de exames complementares. Arq
Bras Neurocir. 2005;24:58-66.
Pereira CU, Duarte GC, Santos EAS. Avaliação epidemiológica do traumatismo craniencefálico no interior do estado
de Sergipe. Arq Bras Neurocir. 2006;25:8-16.
Pereira CU, Santos EAS, Monteiro JTS. Fatores prognósticos da hemorragia talâmica: considerações iniciais sobre
35 casos. Arq Bras Neurocir. 2006;25:148-55.
Pereira CU, Sousa ACS, Lima MA, Santos PCF, Santos EAS.
Alterações eletrocardiográficas em pacientes com traumatismo da coluna cervical. Arq Bras Neurocir. 2006;25:60-5.
Schulz KF. Unbiased research and the human spirit:
the challenges of randomized controlled trials. CMAJ.
1995;153:783-6.
Siqueira MG, Plese JP. Dificuldades na microdissecção da
fissura e da cisterna silvianas. Estudo anatomocirúrgico
em 152 cirurgias neurológicas eletivas. Arq Bras Neurocir.
2001;20(1-2):16-29.
Souza HL, Teixeira MJ, Tella Jr OI. Compressão do gânglio
de Gasser e da raiz trigeminal com balão no tratamento
da neuralgia do nervo trigêmeo: Estudo prospectivo de 40
doentes. Arq Bras Neurocir. 2002; 21(3-4):68-90.
Teixeira MJ, Shu EBS, Nóbrega JCM, Corrêa CF. Dor facial
atípica: caracterização de uma amostra. Arq Bras Neurocir.
2000;19:64-70.
Teixeira MJ, Yeng LT, Souza EC, Pereira VC. A lesão do trato
de Lissauer e do corno posterior da medula espinal e a estimulação do sistema nervoso central para o tratamento da
neuralgia pós-herpética. Arq Bras Neurocir. 1999;18:17-3.
Val JAC, Lima ALO, Martins AO. O impacto da rizotomia
dorsal seletiva na qualidade de vida de crianças espásticas portadoras de paralisia cerebral. Arq Bras Neurocir.
2008;27:7-11.
Vasconcellos LP, Veiga JCE, Flores JAC, Mattar Neto B.
A influência da hiperglicemia como fator prognóstico em
pacientes com hematoma intraparenquimatoso encefálico
espontâneo relacionado à hipertensão arterial. Arq Bras
Neurocir. 2006;25:54-9
Original recebido em setembro de 2008
Aceito para publicação em março de 2009
Conflito de interesses não declarado
Endereço para correspondência
Duarte Nuno Crispim Cândido
Alameda São Benedito, 308
57055-600 – Maceió, AL, Brasil
E-mail: [email protected]; [email protected]
47
Arq Bras Neurocir 28(2): 48-49, junho de 2009
Comentários: Ensaios clínicos
aleatórios em neurocirurgia
Benedicto Oscar Colli 1
O artigo “Qualidade dos ensaios clínicos aleatórios
em neurocirurgia publicados no Brasil”, escrito por
Cândido e Barbosa, publicado nas páginas precedentes, teve por objetivo avaliar a qualidade dos ensaios
clínicos publicados no país.
Para a avaliação dos trabalhos, utilizaram a definição de ensaio clínico aleatório como “um estudo
prospectivo, o qual compara o efeito e o valor de intervenções em seres humanos, envolvendo um ou mais
grupos, a pelo menos um grupo-controle, com alocação
aleatória dos participantes e utilização de medidas de
controle”.
Os autores selecionaram a revista Arquivos Brasileiros de Neurocirurgia como representativa das
publicações neurocirúrgicas, por ser essa indexada
à base de dados Lilacs, e analisaram os artigos nela
publicados nos últimos dez anos (março de 1999 a
março de 2008).
Para a avaliação da qualidade dos ensaios clínicos
aleatórios seriam utilizados os critérios recomendados
pela literatura.1
A conclusão principal da pesquisa, não surpreendente para quem trabalha no ramo, foi que não foram
encontrados ensaios clínicos aleatórios publicados
no país nesse período. Como conclusão secundária
observou-se que apenas 15% dos artigos publicados
foram classificados como originais.
Alguns fatos devem ser ressaltados na análise dessa
publicação:
1. Os critérios utilizados para a seleção da revista a ser adotada para a pesquisa dos estudos
aleatórios foram os fatos de ela ser indexada
no Lilacs e ser publicada há 25 anos. Porém,
isso não significa necessariamente que nela são
publicados os melhores trabalhos, pois outra
revista brasileira, indexada no MedLine e com
fator de impacto, também publica trabalhos
neurocirúrgicos. Outro fato que reforça essa
hipótese é que apenas 15% dos trabalhos publicados no período estudado eram originais.
2. O segundo fato a ser comentado são as dificuldades na realização de ensaios clínicos aleató­
rios com pacientes neurocirúrgicos no Brasil.
Essas dificuldades podem ser divididas em três
grupos: a) número de pacientes necessários para
esses estudos; b) dificuldades de financiamento
da pesquisa; c) falta de recursos humanos.
a) Concentração de pacientes – o primeiro
grande problema é a falta de centralização
no atendimento neurocirúrgico por capacitação, competência e resolutividade.
A centralização de pacientes neurocirúrgicos nos hospitais ocorre por falta de opção
e concentra-se nos hospitais públicos que,
na maioria das vezes, não são os mais bem
equipados e não têm alta resolutividade
no atendimento dos pacientes. Portanto, a
constituição aleatória de grupos de estudos
em um período razoável para comparação
torna-se muito difícil em nosso meio.
b) Financiamento das pesquisas – as variações
sazonais financeiras e de recursos humanos
das instituições públicas dificultam a manutenção de esquemas padronizados de tratamento (exames complementares, medicações,
instrumental, órteses e próteses etc.) e também
constituem obstáculos para estudos clínicos
aleatórios. Embora seja possível recorrer a
financiamento de instituições de fomento à
pesquisa, a dificuldade de planejamento de
ensaios clínicos aleatórios, especialmente no
estabelecimento de cronogramas de execução,
torna esses estudos menos competitivos na
captação de recursos.
c) Falta de recursos humanos – o número de
neurocirurgiões com formação adequada em
pesquisa e que dedicam algum tempo do seu
trabalho para essa atividade é pequeno. Além
disso, a falta de profissionais especializados
1 Editor associado. Professor Titular da Divisão de Neurocirurgia do Departamento de Cirurgia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina
de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (HCFMRP-USP).
Arq Bras Neurocir 28(2): 48-49, junho de 2009
envolvidos na execução de vários processos
da pesquisa, desde o planejamento adequado,
a coleta de dados, a análise dos dados e a
sua publicação, contribui para aumentar as
dificuldades.
3. Como a produção científica do Brasil está muito
relacionada aos cursos de pós-graduação, outro
fator que contribui para que ensaios clínicos
aleatórios não sejam publicados no país são
os critérios de classificação dos cursos de pósgraduação preconizados pela Coordenadoria de
Aperfeiçoamento de Ensino Superior (Capes).
Entre esses critérios, um dos mais importantes
é a publicação em periódico com fator de
impacto. Portanto, para atender aos critérios
preconizados pela Capes, dificilmente autores
participantes de cursos de pós-graduação que
conseguem realizar um ensaio clínico aleatório
irão publicar seus resultados em revistas nacionais sem fator de impacto.
Vários desses problemas afetam também países
desenvolvidos, como a dificuldade de concentração de
pacientes para se obter números adequados. Por essa
razão, os grandes ensaios clínicos aleatórios resultam
da cooperação entre vários centros. Esse tipo de co-
Comentários: Ensaios clínicos aleatórios em neurocirurgia
Colli BO
operação não é frequente no Brasil, exceto quando
envolve interesses da indústria farmacêutica ou de
instrumentais cirúrgicos que fornecem a infraestrutura
financeira e logística para a sua realização. De grande
auxílio nos países desenvolvidos é a existência de boa
infraestrutura voltada para publicações, constituída
por pessoal auxiliar para todas as fases da pesquisa. A
questão do financiamento da pesquisa é facilitada pela
possibilidade de bom planejamento e pela participação
da iniciativa privada (indústria farmacêutica ou de
instrumental).
A iniciativa dos autores é muito louvável por
levantar, em nosso meio, a questão da qualidade das
publicações científicas.
Referência
1.
Jadad AR, Moore A, Carrol D, Jenkinson C, Reynolds DJ,
Gavaghan DJ, et al. Assessing the quality of reports of
randomized clinical trials: is blinding necessary? Control
Clin Trials. 1996:17(1):1-12.
Endereço para correspondência
Prof. Dr. Benedicto Oscar Colli
Divisão de Neurocirurgia do Departamento de Cirurgia - HCFMRP
Campus Universitário – USP
14048-900 – Ribeirão Preto, SP, Brasil
E-mail: [email protected]
49
Arq Bras Neurocir 28(2): 50-53, junho de 2009
Anomalias dos nervos lombossacrais em
natimortos a termo. Estudo anatômico
Max Franco de Carvalho1, Roberta Teixeira Rocha2, João Tiago Silva Monteiro3,
Carlos Umberto Pereira4, Alex Franco de Carvalho4, Francisco do Prado Reis5
Laboratório de Anatomia do Departamento de Morfologia do Centro de Ciências
Biológicas e da Saúde da Universidade Federal de Sergipe (UFS).
RESUMO
Contexto: Existe controvérsia entre autores quanto à incidência de variações anatômicas dos nervos
espinhais lombossacros. A incidência dessas anomalias nervosas varia de 0% a 30% como verificado
em estudos anatômicos em cadáveres adultos de diferentes nacionalidades, de 2,0% a 4,0% em estudos
de imagem diagnóstica e de 0,34% a 10% em séries cirúrgicas. Objetivo: Determinar a incidência de
anomalias anatômicas nos nervos espinhais lombossacros em 40 natimortos a termo de nacionalidade
brasileira. Métodos: O segmento lombossacro da coluna vertebral de 40 natimortos, provenientes do
laboratório de patologia clínica do Hospital Universitário da Universidade Federal de Sergipe (UFS), foi
estudado no Laboratório de Neuroanatomia do Departamento de Morfologia da UFS. Foram excluídos
aqueles casos que possuíam síndromes ou qualquer defeito orgânico associado. Os espécimes
anatômicos foram fixados com solução de formaldeído a 10%, infundida por meio da veia umbilical. As
peças foram preparadas com a ressecção em bloco das partes moles dorsais, processos espinhosos
e lâminas da décima vértebra torácica até o sacro. Resultado: Neste estudo, foram encontradas seis
variações anatômicas dos nervos espinhais lombossacros, em seis diferentes espécimes, de quatro
tipos, totalizando 15% das peças. As variações anatômicas dos nervos espinhais lombossacros foram
classificadas em oito tipos, sendo a anastomose intradural a mais presente. O quinto nervo lombar foi
o mais frequentemente comprometido Não foi observada diferença significativa quanto ao sexo e lado
envolvido. Conclusão: O presente estudo enfatiza a importância do conhecimento dessas anomalias
anatômicas durante os procedimentos cirúrgicos na região lombossacral, pois não se trata de evento
muito raro.
PALAVRAS-CHAVE
Nervo lombossacral. Anomalias.
ABSTRACT
Anomalies of the lumbosacral nerve roots in stillborns. An anatomical study
Context: There is such controversy among authors about the real incidence of lumbosacral nerve roots
anomalies. The incidence ranges from 0% to 30% in anatomic studies in different populations, from
2% to 4% in diagnostic image studies and 0.34% to 10% in surgical series. Objective: To determine
the incidence of anatomical abnormalities of the lumbossacral spinal nerves in 40 Brazilian stillborns.
Methods: The segment of the lumbosacral spine of 40 stillborns, from the clinical pathology laboratory
at the University Hospital of Federal University of Sergipe (UFS) was studied in the Laboratory of
Neuroanatomy, Department of Morphology of the UFS. We excluded those cases that had any defects
or syndromes associated. The anatomical specimens were fixed with formaldehyde solution 10%,
infused through the umbilical vein. The specimens were prepared with en bloc resection of the soft dorsal
spinous processes and laminae from the tenth thoracic vertebra to the sacrum. Results: In this study,
were found four types of anatomical variations of lumbosacral spinal nerves in six different specimens,
accounting for 15% of the specimens. The fifth lumbar nerve was the most frequently involved (66%).
The anatomical variations of lumbosacral spinal nerves were classified into eight types, and the intradural
anastomosis was the most frequent. There was no significant difference regarding gender and side
involved. Conclusion: Our study emphasizes the importance of knowledge of these anatomical anomalies
during surgical procedures in the lumbosacral region because they are not too rare.
KEY WORDS
Lumbosacral nerve roots. Anomaly.
1 Professor MSc substituto do Departamento de Medicina da Universidade Federal de Sergipe (UFS). Aluno do Programa de Pós-graduação
(doutorado) da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP).
2 Médica Radiologista da UFS.
3 Acadêmico de Medicina e bolsista PIBIC (01220587) UFS.
4 Professor Doutor Adjunto do Departamento de Medicina da UFS.
5 Professor Titular do Departamento de Morfologia da UFS.
Arq Bras Neurocir 28(2): 50-53, junho de 2009
Introdução
As descrições clássicas da coluna vertebral nos
livros de anatomia não fazem referência sobre a existência de variações anatômicas na origem ou trajeto
dos nervos espinhais lombossacros.6,8,21 A maioria dos
estudos aborda essas anomalias por meio de relatos de
casos, pequenas séries de achados incidentais transoperatórios e de exames imagéticos.3,5,9,10,16,17,20
Existe controvérsia entre autores quanto à incidência
de variações anatômicas dos nervos espinhais lombossacros. A incidência dessas anomalias nervosas varia de
0% a 30% como verificado em estudos anatômicos em
cadáveres adultos de diferentes nacionalidades,2,7,9,13 de
2,0% a 4,0% em estudos de imagem9,14,16 e de 0,34% a
10% em séries cirúrgicas.4,15
Os relatos cirúrgicos de que os nervos espinhais
anômalos ocupam mais espaço no canal vertebral ou
forâmen intervertebral e a dificuldade de mobilização
transoperatória desses nervos sugerem que haveria
sintomas clínicos compressivos lombares, durante os
movimentos normais de flexão e extensão da coluna
vertebral, sem haver a necessidade de compressão
extrínseca.10,22
Por muito tempo, a importância clínica dessas
anomalias estava relacionada aos maus resultados
pós-discectomia e lombalgias de causas obscuras.
Postacchini et al.16, com base em estudo de 46 casos
com anormalidades anatômicas dos nervos espinhais
lombossacros, diagnosticadas por meio de mielografia,
concluíram que essas anomalias são achados incidentais
sem qualquer importância clínica.
Em razão do grande número de procedimentos
cirúrgicos na região lombossacra, o conhecimento
dessas anomalias anatômicas é de grande importância,
para evitar lesões iatrogênicas e danos neurológicos
irreparáveis. O objetivo deste estudo é determinar a
incidência de anomalias anatômicas nos nervos espinhais lombossacros em 40 natimortos a termo de
nacionalidade brasileira.
Casuística e métodos
O segmento lombossacro da coluna vertebral de
40 natimortos (21 masculinos e 19 femininos), provenientes do laboratório de patologia clínica do Hospital
Universitário da Universidade Federal de Sergipe
(UFS), foi estudado no Laboratório de Neuroanatomia do Departamento de Morfologia da UFS. Foram
excluídos aqueles casos que possuíam síndromes ou
qualquer defeito orgânico associado. Os espécimes
Anomalias dos nervos lombossacrais em natimortos a termo. Estudo anatômico
Carvalho MF e col
anatômicos foram fixados com solução de formaldeído
a 10%, infundida por meio da veia umbilical. As peças
foram preparadas com a ressecção em bloco das partes
moles dorsais, processos espinhosos e lâminas da décima vértebra torácica até o sacro. O estudo extradural
consistiu na observação macroscópica da simetria, da
origem, do trajeto, da emergência dural dos nervos
espinhais até o forâmen de conjugação e relação dos
nervos espinhais com os pedículos. Após o estudo
extradural, a dura-máter foi aberta longitudinalmente,
permitindo a visualização direta da medula espinhal,
origem dos filamentos radiculares na medula espinhal,
cone medular, cauda equina e junção intradural dos
filamentos radiculares que formam as raízes nervosas
ventrais e dorsais.
Os fragmentos intradurais e extradurais obtidos durante o estudo macroscópico foram retirados e fixados
em formol a 10% por 48 horas e, após esse período,
inclusos em parafina e realizados cortes transversais
de 5 micrômetros e estudados histologicamente pela
técnica de hematoxilina e eosina.
A incidência de anomalias nervosas na população
estudada foi comparada com outras investigações anatômicas pelo teste de qui-quadrado.
Resultados
O estudo anatômico revelou seis (15%) anormalidades anatômicas dos nervos lombossacros em seis
diferentes espécimes. Dessas, três foram intradurais
e três extradurais. Das intradurais, duas anastomoses
intradurais estavam entre as raízes do nervo dorsal
(Figura 1) e uma entre as raízes do nervo ventral.
Nesses três casos, foi observada uma camada espessa
da aracnoide aderida aos filamentos radiculares que
dificultava a mobilização e individualização dessas
raízes. Nas anomalias extradurais, foram visualizadas
uma emergência dural comum de duas raízes nervosas
(Figura 2), uma divisão extradural e uma raiz nervosa
com origem dural cranial que emergia pelo forâmen
intervertebral cranial ao esperado (Tabela 1).
A raiz de L5 esteve envolvida em quatro casos (66%
dos casos) e S1 em três (50%). Três espécimes foram do
sexo masculino e três do feminino, os lados direito e o
esquerdo foram acometidos em três casos cada.
Durante o estudo das três anomalias intradurais, o
conteúdo intradural estava friável, o que impediu um
estudo detalhado da organização intradural. O estudo
histológico revelou tecido nervoso em todas as raízes
nervosas anômalas.
51
Arq Bras Neurocir 28(2): 50-53, junho de 2009
Discussão
FALTA
FIGURA 1
Figura 1 – Anastomose intradural entre L5-S1 em raiz nervosa
dorsal direita. 1a. Fotografia do espaço intradural dorsal; a
seta demonstra anomalia do tipo I, com anastomose entre a raiz
dorsal do quinto nervo espinhal lombar direito e a raiz dorsal
do primeiro nervo sacro. 1b. Ilustração esquemática do espaço
intradural dorsal; a seta demonstra anomalia do tipo I, com
anastomose entre a raiz dorsal do quinto nervo espinhal lombar
direito e a raiz dorsal do primeiro nervo sacro.
De acordo com os estudos de Kadish e Simmons9
e de Chotigavanich e Sahatapes,2 existem oito tipos
de anomalias:1,11,12,17,22 tipo I – anastomose intradural;
tipo II – anastomose extradural; tipo III – emergência
assimétrica (a) cranial, (b) caudal; tipo IV – emergência
dural comum; tipo V – divisão extradural (raízes dorsais
e ventrais originam dois nervos distintos); tipo VI – saco
dural termina no nível das vértebras lombares com os
nervos sacrais, originando-se de um tronco nervoso
único; tipo VII – o nervo deixa o canal vertebral por
meio do forâmen vertebral caudal ou cefálico; tipo VIII)
complexa (Figura 3).
Tipo I
Tipo IV
Figura 2 – Emergência dural comum S1-S2 em raiz nervosa
esquerda. 2a. Fotografia do canal vertebral dorsal; a seta
demonstra anomalia do tipo IV entre o primeiro e segundo
nervos espinhais sacros esquerdos. 2b. Ilustração esquemática do
canal vertebral dorsal, onde a seta demonstra anomalia do tipo
IV entre o primeiro e segundo nervos espinhais sacros esquerdos.
Tabela 1
Anomalias das raízes encontradas
Feto nº
Tipo I
07
Tipo IV
Tipo V
S1 e S2
esquerda
17
L5 e S1
esquerda
23
L5 e S1
direita
24
L4
esquerda
32
38
52
Tipo VII
L5
direita
L4 e L5
direita
Tipo II
Tipo V
Tipo III A
Tipo VI
Tipo IIIB
Tipo VII
Tipo VIII
Figura 3 – Ilustração esquemática da classificação, com setas
demonstrando as anomalias dos nervos espinhais lombossacros.
Tipo I: anastomose intradural. Tipo II: anastomose extradural.
Tipo IIIa: emergência assimétrica cranial. Tipo IIIb: emergência
assimétrica caudal. Tipo IV: emergência dural comum. Tipo V:
divisão extradural (raízes dorsais e ventrais originam dois nervos
distintos). Tipo VI: saco dural termina no nível das vértebras
lombares com os nervos sacrais, originando-se de um tronco
nervoso único. Tipo VII: o nervo deixa o canal vertebral por meio
do forâmen vertebral caudal ou cefálico. Tipo VIII: complexa.
A incidência de variações anatômicas dos nervos
espinhais lombossacros encontrada neste estudo foi de
15%. Os achados não apresentaram discrepância significativa (p = 0,87) em relação ao estudo anatômico de
Kadish e Simmons,9 que observaram 14% em população
norte-americana. Entretanto, houve diferença significante (p = 0,04) quando comparado com a incidência
de 30% encontrada no estudo anatômico realizado por
Chotigavanich e Sahatapes2 em cadáveres adultos de
origem tailandesa, e com a de Oliveira e cols.,13 que
não observaram nenhuma anormalidade anatômica nos
nervos espinhais após dissecar o conteúdo extradural e
intradural de 35 colunas de cadáveres adultos brasileiros. Hasue e cols.7 relataram uma incidência de 8,5% de
variações anatômicas extradurais dos nervos espinhais
lombossacros, porém não realizaram o estudo intradural das raízes ventrais e dorsais dos nervos espinhais
durante a avaliação anatômica.
Anomalias dos nervos lombossacrais em natimortos a termo. Estudo anatômico
Carvalho MF e col
Arq Bras Neurocir 28(2): 50-53, junho de 2009
Os achados do presente estudo estão de acordo com
a literatura quanto à inexistência de predominância
quanto ao sexo e ao lado acometido.2,7,9 A presença de
deformidades congênitas da coluna vertebral associada
com anomalias dos nervos espinhais tem sido relatada
na literatura.1,2,9,11,12,18,19,22 Entretanto, essa associação
não foi por nós estudada.
A anomalia tipo I foi responsável por 50% dos casos
em questão, as anomalias tipos IV, V e VII foram observadas em apenas um caso cada. Nos estudos cirúrgicos
de White 3rd e cols.,22 Neidre e Macnab12 e Stambough e
cols.20, a emergência dural comum dos nervos espinhais
(tipo IV) foi a mais frequentemente encontrada.
Nas variações anatômicas descritas por Kadish e
Simmons,9 as anomalias mais presentes foram as dos
tipos I e IV. Já no estudo de Chotigavanich e Sahatapes,2
a anomalia anatômica do tipo VIII (complexa) foi a mais
frequente. Apesar de essa anomalia não ter sido observada no presente estudo, vale ressaltar que em todos
os casos classificados como tipo VIII havia anastomose
intradural entre os nervos espinhais envolvidos.
O quinto nervo lombar foi o mais envolvido. Por
causa do grande número de procedimentos cirúrgicos na coluna lombar baixa, o conhecimento dessas
anormalidades pode evitar lesões iatrogênicas durante
procedimentos e descompressão insuficiente do canal
vertebral. Essas anomalias devem ser lembradas sempre que houver uma discordância entre o exame físico
e os achados de diagnóstico por imagem. Durante o
ato cirúrgico, a dificuldade de mobilização dos nervos
espinhais ou a presença local de compressão radicular
ou medular mínima para um quadro clínico exuberante,
também, podem constituir fortes indícios da presença
de anormalidades anatômicas.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
8.
9.
10.
11.
12.
13.
14.
15.
16.
17.
18.
19.
Conclusão
Variações anatômicas dos nervos espinhais lombossacros foram achados frequentes no presente estudo.
É importante relacionar a presença de anomalia dos
nervos espinhais sempre que houver discrepância entre
o exame físico e os achados de imagem e quando houver dificuldade de mobilização das raízes nervosas em
procedimentos cirúrgicos no canal vertebral.
Referências
1.
Cannon BW, Hunter SE, Picasa JA. Nerve roots anomalies
in lumbar disc surgery. J Neurosurg. 1962;9:208-14.
Anomalias dos nervos lombossacrais em natimortos a termo. Estudo anatômico
Carvalho MF e col
20.
21.
22.
Chotigavanichc C, Sahatapes S. Anomalies of the lumbosacral nerve roots: an anatomic investigation. Clin Orthop
Rel Res. 1992;278:46-50.
Epstein JA, Canas R, Ferrar J, Hyman RA, Khan A. Conjoined
lumbosacral nerve roots. J Neurosurg. 1981;55:585-9.
Ethelberg S, Riishede J. Malformation of lumbar spinal roots
and sheaths in the causation of low backache and sciatica.
J Bone Joint Surg Br. 1952;34-B:442-6.
Goffin J. Plets C. Association of conjoined and anastomoses
nerve roots in the lumbar region. Clin Neurol Neurosurg.
1987;89:117-20.
Goss GH. Anatomia de Gray. 29th ed. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan; 1988. p. 806-19.
Hasue M, Kikuchi S, Sakuyama Y, Yto T. Anatomic study of
the interralation between lumbosacral nerve roots and their
surroundings tissues. Spine. 1983;8:50-8.
Hollinshead W. Anatomy for surgeons. 3rd ed. New York:
Harper & Row; 1982. v. 3., p.19-23.
Kadish LJ, Simmons EH. Anomalies of the lumbosacral
nerve roots. An anatomical investigation and myelographic
study. J Bone Joint Surg Br. 1984;66:411-6.
Keon-Cohen B. Abnormal arrangement of the lower lumbar
and first sacral nerves within the spinal canal. J Bone Joint
Surg Br. 1968;50:261-5.
Maiuri F, Gambardella A. Anomalies of the lumbosacral nerve
roots. Neurol Res. 1989;11:130-5.
Neidre A, Macnab I. Anomalies of the lumbosacral nerve
roots: review of 16 cases and classification. Spine.
1983;8:294-9.
Oliveira RP, Rodrigues NR, Galvão PEC, Barros Filho
TEP. Anomalias das raízes nervosas lombares: estudo
anatômico. Acta Ortop Bras. 1996;4:1-3.
Peyester RG, Treplic JG, Hashin ME. Computed tomography
of lumbosacral conjoined nerve roots anomalies. Potencial
cause of false positive reading for herniated nucleus pulposus. Spine. 1985;10:331-7.
Phillips LH 2nd, Park TS. The frequency of intradural conjoined lumbosacral dorsal nerve roots found during seletive
dorsal rhizotomy. Neurosurgery.1993;33:88-91.
Postacchini F, Urso S, Ferro L. Lumbosacral nerve root
anomalies. J Bone Joint Surg. Am. 1982;64:721-9.
Prestar FJ. Anomalies and malformations of lumbar spinal
nerve roots. Min Invasive Neurosurg. 1996;39:133-7.
Rask MR. Anomalous lumbosacral nerve roots in association
with spondilolisthesis. Surg Neurol. 1977;8:139-40.
Savas R, Calli C, Yünten N, Alper H. Hypoplasic lumbar
pedicle in association with conjoneid nerve root MRI
demonstration. Comput Med Imag Graph. 1998;22:77-9.
Stambough J, Balderston RA, Booth RE, Rothman RH. Surgical management of sciatica involving anomalous lumbar
nerve roots. J Spinal Disord. 1988;1:111-4.
Testut L. D’Anatomie humaine. 7th ed. Paris: Gaston Doin;
1921. v. 3., p. 133-3.
White 3rd JG, Strait TA, Binkley JR, Hunter SE. Surgical
treatment of 63 cases of conjoined nerve roots. J Neurosurg.
1982;56:114-7.
Original recebido em julho de 2008
Aceito para publicação em março de 2009
Conflito de interesses não declarado
Endereço para correspondência
Max Franco de Carvalho
Rua José Seabra Batista, 22, Condomínio Tyrol, Edifício Innsbruck
49025-000 – Aracaju, SE, Brasil
E-mail:[email protected]
53
Arq Bras Neurocir 28(2): 54-57, junho de 2009
Cavernomas pontinos extraventriculares.
Parte I. Acesso transtentorial a
cavernoma pontino dorsolateral
Marcos Augusto Stávale Joaquim1, Gustavo Cartaxo Patriota2, André de Macedo Bianco3
Instituto de Neurociências, São Paulo.
Serviço de Neurocirurgia do Hospital 9 de Julho, São Paulo.
RESUMO
Objetivo: Descrever a via transtentorial, por meio de craniotomia têmporo-occipital, para remoção
de cavernoma pontino de localização dorsolateral, exemplificado pela apresentação de um caso.
Conclusão: O acesso transtentorial demonstra-se útil e seguro para remoção de lesões localizadas
nessa região da ponte.
PALAVRAS-CHAVE
Cavernoma. Angioma cavernoso. Cirurgia do tronco cerebral.
ABSTRACT
Extraventricular pontine cavernomas. Part I. Transtentorial route to remove a postero-lateral
pontine cavernoma
Objective: To present the transtentorial route through a temporal-occipital craniotomy for surgical removal
of a posterior-lateral pontine cavernomas, exemplified by the presentation of a case. Regional anatomy
is discussed. Conclusion: The transtentorial approach may be used safely to remove lesions of highly
located in the posterior-lateral region of the pons.
KEY WORDS
Cavernoma. Cavernous angioma. Brain stem surgery.
Introdução
Os cavernomas provocam hemorragias de diferentes
intensidades ao longo de sua existência. Hemorragias em
áreas eloquentes ou áreas de grande densidade e concentração de fibras e núcleos, como o tronco corticoencefálico, podem produzir sequelas irreparáveis2-4,6,8,10,14,20-24.
Os cavernomas devem ser removidos profilaticamente
quando o risco da cirurgia for menor do que o risco da
história natural da doença. A grande maioria dos cavernomas deve ser removida.
As lesões do tronco encefálico foram consideradas
inoperáveis no passado. A evolução da microcirurgia, dos métodos auxiliares de ressecção, da cirurgia
guiada por imagens e das técnicas de monitorização
neurofisiológica permite atualmente que essas lesões
sejam submetidas ao tratamento cirúrgico. Os acessos
ao tronco encefálico citados em publicações anteriores não incluem a citação do acesso transtentorial
póstero-lateral, exceto as publicações de Ono e cols.,18
Kashimura e cols.19 e Kumabe e cols.11
Cirurgia dos cavernomas
do tronco encefálico
Para o planejamento da cirurgia no tronco encefálico,
deve-se ter conhecimento segmentar das relações neurovasculares (anatomia topográfica externa), assim como
1 Neurocirurgião do Instituto de Neurociências, São Paulo, SP, Brasil. Doutor em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São
Paulo (FMUSP).
2 Neurocirurgião do Instituto de Neurociências, São Paulo, SP, Brasil.
3 Neurocirurgião do Serviço de Neurocirurgia do Hospital 9 de Julho, São Paulo.
Arq Bras Neurocir 28(2): 54-57, junho de 2009
da disposição dos feixes de fibras e núcleos que ali se localizam (anatomia topográfica interna). Tais disposições
devem estar memorizadas pelo cirurgião e determinam o
tipo de monitorização a ser utilizado.4,12,13,16,18
Na região dessa lesão pontina, em relação à topografia
externa, nota-se superiormente o colículo inferior e seu
braço, a veia basal de Rosenthal e as artérias cerebrais
posteriores e cerebelar superior e seus ramos.7 Podem ser
vistas veias tectais. Anteriormente, há o sulco das veias
mesencefálicas laterais e, inferiormente, visualiza-se o
lobo quadrangular do cerebelo que, quando retraído inferiormente, expõe a fissura cerebelo-mesencefálica (fissura
pré-centro cerebelar) e o sulco pontomesencefálico.18 Em
relação à anatomia vascular e dos troncos nervosos, além
do nervo troclear, inferiormente localiza-se o nervo trigêmeo, emergindo da transição entre a ponte e o pedúnculo
cerebelar médio. Tais estruturas citadas neste parágrafo
situam-se nos espaços incisurais posterior e médio,18
encontrados estudando-se a borda tentorial. A cisterna
quadrigeminal continua-se com a cisterna cerebelomesencefálica. A cisterna ao redor do mesencéfalo (cisterna perimesencefálica) corresponde às asas da cisterna
ambiens. Esta possui um compartimento supratentorial e
um infratentorial que contém o nervo troclear.15,25
Em relação à topografia interna, na ponte deve ser
conhecida a disposição das fibras longitudinais, transversas
e dos núcleos pontinos. Nessa região são importantes o
lemnisco lateral e seu núcleo, o lemnisco espinhal e lemnisco medial, e, mais anteriormente, o trato corticoespinal,
corticopontino e corticonuclear, além das fibras transversas
e núcleos pontinos. Os núcleos trigeminais e as fibras do
pedúnculo cerebelar superior estão relacionados.
Cavernomas do tronco encefálico frequentemente
revelam uma coloração amarelada na superfície, consequente a hemorragias prévias. Nem sempre o centro dessa
área é o melhor acesso à lesão e a anatomia funcional
local deve ser considerada em conjunto com a navegação.
Após a intrusão no tronco encefálico, o cavernoma é
visualizado, dissecado e removido. A coagulação bipolar
fraca pode diminuir a lesão e facilitar a remoção. O tecido
neural normal não deve ser empurrado ou manipulado.
A área gliótica circunjacente, com depósito de hemossiderina, não deve ser removida, pois lesões serão
provocadas e, nesse local, não há risco de epilepsia pelo
depósito de ferro. Os angiomas venosos locais devem ser
preservados. Movimentos leves são realizados e o cirurgião deve interrogar continuamente o neurofisiologista
durante a manipulação leve e antes das remoções, para
que o neurofisiologista possa ajudar a impedir que a lesão
ocorra, e não avisar que ela já ocorreu. Para tanto, o cirurgião deve interrogar o monitoramento a cada compressão
ou deslocamento tecidual leve. Tal conduta aumenta o
tempo da operação, requer paciência, mas é fundamental
na cirurgia do tronco encefálico.3,5,6,9,14,17,21-24
Cavernomas pontinos. Tratamento cirúrgico. Parte I.
Stávale Joaquim MA e col
Particularidades do acesso em questão
Uma craniotomia têmporo-occipital de base
larga é planejada com guia estereotáxico ou com
neuronavegação. A informatização do acesso é indispensável. A craniotomia de base larga permite manipulação angular dos instrumentos ao longo da borda
do forâmen de Pacchioni (espaço incisural) e a observação e o isolamento da veia de Labbé a ser preservada.
A membrana aracnoide do espaço incisural deve ser aberta
e seu conteúdo visualizado. Em seguida, os seios venosos
tentoriais são coagulados e a tenda do cerebelo é aberta até
a sua borda.1 Esse procedimento é guiado pelo planejamento informatizado, em direção às asas da cisterna.
Caso-exemplo
BG, 41 anos, sexo feminino. Admitida no prontoatendimento com queixa de síndrome vestibular aguda
e cefaleia. Ao exame neurológico, havia um quadro
vestibular central, sem diplopia ou alterações de outros
nervos cranianos. A tomografia computadorizada demonstrou uma hemorragia localizada e recente, situada
na porção dorsal, lateral e superior da ponte, logo abaixo
do sulco pontomesencefálico. A ressonância magnética confirmou o achado (Figuras 1 a 4). A cirurgia foi
realizada com a remoção completa da lesão e o exame
neurológico da paciente no pós-operatório foi normal
(Figuras 5 a 7). A monitorização neurofisiológica intraoperatória revelou descargas por estimulação mecânica
piramidal no membro inferior contralateral durante a
dissecção da lesão lateralmente ao trato piramidal.
Figura 1 – Ressonância magnética, sequência T2,
mostrando a lesão pontina.
55
Arq Bras Neurocir 28(2): 54-57, junho de 2009
Figura 2 – Ressonância magnética, cortes axiais, e relação topográfica com a fissura cerebelo-pontina.
Figura 3 – Tratografia corticoespinal e das fibras do pedúnculo cerebelar médio. Relações nucleares podem ser inferidas.
Figura 5 – Mapeamento estereotáxico.
Figura 4 – Relações com o trato corticoespinal.
Figura 7 – Ressonância magnética. Controle pós-operatório.
Figura 6 – Ressonância magnética. Controle pós-operatório.
56
Cavernomas pontinos. Tratamento cirúrgico. Parte I.
Stávale Joaquim MA e col
Arq Bras Neurocir 28(2): 54-57, junho de 2009
Discussão
A cirurgia do tronco encefálico tornou-se, com
boa frequência, um procedimento de baixo risco, mas
exige tecnologia elaborada. As lesões com riscos de
hemorragias devem ser removidas para que se evitem
danos futuros. Os cavernomas do tronco encefálico são
retirados atualmente com frequência comparável à dos
cavernomas supratentoriais.
10.
11.
12.
13.
14.
Conclusão
As lesões em localizações incomuns do tronco encefálico merecem publicações para a contribuição na
tomada de decisões nos casos semelhantes. O acesso a
essa região pontina merece essa atenção. Os cavernomas pontinos craniais e laterais, situados logo abaixo
do sulco pontomesencefálico podem ser removidos com
segurança por esse acesso.
15.
16.
17.
18.
19.
Referências
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
8.
9.
Browder J, Kaplan HA, Krieger AJ. Anatomical features of
the straight sinus and its tributaries. J Neurosurg. 1976;44:
55-61.
Conway JE, Rigamonti D. Cavernous malformations: a review
and current controversies. Neurosurg Q. 2001;16:15-23.
Endo S, Matsumura N, Kurimoto M, Takaku A. Surgically
ressected brain stem cavernous angioma in an infant. Childs
Nerv Syst. 1997;13:613-5.
Fox JR. Tentorial section for decompression of the brain
stem and large basilar aneurysm. Case Report. J Neurosurg.
1968;28:74-7.
Fritschi JA, Reulen HJ, Spetzler RF, Zabramski JM. Cavernous malformations of the brain stem. A review of 139 cases.
Acta Neurochir (Wien). 1994;130:35-46.
Haque R, Kellner CP, Solomon RA. Cavernous malformations of the brain stem. Clin Neurosurg. 2008;55:88-96.
Hardy DG, Rhoton AL. Microcirurgical relationships of the
superior cerebelar artery and trigeminal nerve. J Neurosurg.
1983;59:63-105.
Hauch EF, Barnett SL, White JA, Samson D. Symptomatic
brainstem cavernomas. Neurosurgery. 2009;64:61-71.
Kashimura H, Inoue T, Ogasawara K, Ogawa A. Pontine
cavernous angioma resected using the subtemporal,
anterior transpetrosal approach determined using threedimensional anisotropy contrast imaging: technical case
report. Neurosurgery. 2006;58(1 Suppl):ONS-E175.
Cavernomas pontinos. Tratamento cirúrgico. Parte I.
Stávale Joaquim MA e col
20.
21.
22.
23.
24.
25.
Kondziolka D, Lundsford LD, Kestle JR. The natural history of cerebral cavernous malformations. J Neurosurg.
1995;83:820-4.
Kumabe T, Suzuki M, Yoshimoto T, Suzuki J. A case of
cavernous angioma extend from the ventral part of the pons
to the midbrain: subtemporal and trans-tentorial approach.
No Shinkei Geka. 1988;16:1193-7.
Martin RG, Grant JL, Peace D, Theiss C, Rhoton AL. Microsurgical relationships of the anterior inferior cerebelar
artery and the facial vestíbulo cochlear nerve complex.
Neurosurgery. 1980;6:483-507.
Martinez AG, Oliveira E, Tedeschi H, Wen HT, Rhoton AL.
Microsurgical anatomy of the brain stem. Oper Tech Neurosurg. 2000;3:80-6.
Mathiesen T, Edner G, Kihlstrom L. Deep and brainstem
cavernomas: a consecutive 8-year series. J Neurosurg.
2003;99:31-7.
Matsuno M, Rhoton AL, Peace DP. Microcirurgical anatomy of
the posterior fossa cisterns. Neurosurgery. 1988;23:58-80.
Matsushima T, Rhoton AL, Oliveira E, Peace D. Microsurgical
anatomy of the veins of the posterior fossa. J Neurosurg.
1983;59:63-105.
Okuno S, Nishi N, Hirabayashi H, Sakaki T. A surgical case
of growing cavernous angioma at the pontomedullary junction. No Shinkei Geka. 2000;28:891-7.
Ono M, Rhoton AL, Barry M. Microcirurgical anatomy of
the region of the tentorial incisura. J Neurosurg. 1984;60:
365-99.
Porter RW, Detwiler PW, Spetzler RF, Lawton MT, Baskin
J, Derksen PT, et al. Cavernous malformations of the
brainstem: experience with 100 patients. J Neurosurg.
1999;90:50-8.
Rodinson JR, Awad IA, Little JR. Natural history of the
cavernous angioma. J Neurosurg. 1991;75:709-14.
Saito N, Sasaki T, Chikui E, Yuyama R, Kirino T. Anterior
transpetrosal approach for pontine cavernous angioma:
case report. Neurol Med Chir (Tokyo). 2002;42:272-4.
Sami M, Eghbal R, Carvalho GA, Matthies C. Surgical
management of brainstem cavernomas. J Neurosurg.
2001;95:825-32.
Sandalcioglu IE, Wiedemayer H, Secer S, Asgari S, Stolke
D. Surgical removal of brain stem cavernous malformations:
surgical indications, technical considerations, and results. J
Neurol Neurosurg Psychiatry. 2002;72:351-5.
Symon K, Jackowski A, Bills D. Surgical treatment of pontomedullary cavernomas. Br J Neurosurg. 1991;5:339-47.
Yasargil MG, Kasdaglis K, Jain KK, Weber HP. Anatomical
observations of the subarachnoid cisterns of the brain during
surgery. J Neurosurg. 1976;44:298-302.
Original recebido em junho de 2008
Aceito para publicação em março de 2009
Endereço para correspondência
Marcos Augusto Stávale Joaquim
Alameda Campinas, 1.360, 16° andar
01404-002 – São Paulo, SP, Brasil
E-mail: [email protected]
57
Arq Bras Neurocir 28(2): 58-61, junho de 2009
Cavernomas pontinos extraventriculares.
Parte II. Acesso pré-sigmoideo transpetroso
a cavernoma pontino ventrolateral
Marcos Augusto Stávale Joaquim1, Gustavo Cartaxo Patriota2, André de Macedo Bianco3
Instituto de Neurociências. São Paulo.
Serviço de Neurocirurgia Hospital 9 de Julho, São Paulo.
RESUMO
Objetivo: Descrever a via pré-sigmoidea ampliada para acesso a lesões localizadas na região
ventrolateral da ponte, exemplificado com a apresentação de um caso de cavernoma pontino nessa
localização. Conclusão: Esse acesso, amplamente revisto pela literatura, é útil para remoção cirúrgica
de cavernomas pontinos ventrolaterais.
PALAVRAS-CHAVE
Cavernoma. Angioma cavernoso. Cirurgia do tronco cerebral.
ABSTRACT
Extraventricular pontine cavernomas. Part II. Pre-sigmoid, transpetrosal approach to ventrolateral
pontine cavernomas
Objective: To describe the pre-sigmoid transpetrosal approach to the ventrolateral pontine region,
exemplified by the presentation of a case of cavernoma in this localization. Conclusion: This approach
is useful to remove pontine ventrolateral cavernomas.
KEY WORDS
Cavernoma. Cavernous angioma. Brain stem surgery.
Introdução
Técnica cirúrgica
Os cavernomas do tronco encefálico podem provocar graves repercussões tanto pela hemorragia como
pelo crescimento. O avanço da microcirurgia, da neuronavegação, da estereotaxia e da monitorização neurofisiológica intraoperatória possibilita a remoção dessas
lesões com baixo risco cirúrgico, o que mudou a conduta
atual. Lesões acessíveis devem ser removidas profilaticamente, desde que o planejamento prévio assim o
permita.3,5,7,11 A via pré-sigmoidea, acesso amplamente
revisto pela literatura, é útil para remoção cirúrgica de
cavernomas pontinos de localização ventrolateral.
Nesses casos, o paciente é operado em decúbito
lateral, com planejamento estereotáxico ou por neuronavegação. Uma craniectomia retromastoidea é ampliada
por meio de mastoidectomia e petrosectomia parcial,
expondo-se o nervo facial. A cóclea e os canais semicirculares são removidos. O seio sigmoide é preservado.
O orifício da veia de Santorini nos seios sigmodes é
coagulado. O nervo facial é isolado. A abertura dural
retromastoidea associa-se à abertura pré-sigmoidea.
Assim, áreas de introdução do instrumental no compartimento cisternal tornam-se amplas.
1 Neurocirurgião do Instituto de Neurociências, São Paulo. Doutor em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
(FMUSP).
2 Neurocirurgião do Instituto de Neurociências, São Paulo.
3 Neurocirurgião do Serviço de Neurocirurgia do Hospital 9 de Julho, São Paulo.
Arq Bras Neurocir 28(2): 58-61, junho de 2009
As cisternas do ângulo pontocerebelar, pré-pontina e
ambiens são adentradas. O trajeto do complexo nervoso
vestibulococlear é seguido até o sulco bulbopontino.
A artéria cerebelar ântero-inferior e uma alça descendente da artéria cerebelar superior são visualizadas.
O nervo trigêmeo é isolado e o nervo abducente pode
ser visualizado.5,12-14 A superfície lateral do tronco encefálico é visualizada no setor pontino, desde o sulco
bulbopontino até o sulco pontomesencefálico. As veias
locais são identificadas, mas muitas variações são
possíveis. O trabalho é realizado no espaço petroclival
médio.1,2,4,8-10,15-19
Seguindo-se o mapeamento, o ponto de intrusão
na ponte é escolhido, poupando-se a topografia das
fibras de maior competência funcional. Nessa região
da ponte encontram-se fibras piramidais, núcleos pontinos e fibras transversas da ponte. Adjacente à lesão
encontram-se fibras do nervo facial e abducente, o
corpo trapezoide e o lemnisco medial. Também podem
estar próximos o núcleo olivar superior e o núcleo do
nervo trigêmeo. As fibras do pedúnculo cerebelar médio
situam-se póstero-lateralmente.
Parte do cavernoma pode ser visível na superfície
do tronco encefálico, ou um hematoma recente ou antigo (amarelado) pode eventualmente ser visto. Após
intrusão no tronco encefálico, hematomas são delicadamente lavados e o cavernoma é, em geral, visualizado na sua parede. O ângulo de visão do microscópio
deve permitir inspeção de toda cavidade. Apenas o
cavernoma será removido e a gliose nos seus limites
não é retirada ou lesionada. Preferencialmente, não se
operam lesões na fase aguda das hemorragias, pois o
tecido nervoso ao redor do coágulo é amolecido e sua
lesão ou aspiração causará deficiências adicionais. Os
angiomas venosos são preservados. Durante o procedimento é possível ocorrer a lesão da veia de Dandy.
O fechamento minucioso impede fístulas liquóricas. A
cavidade cirúrgica no tronco encefálico deve estar bem
limpa antes do fechamento para não haver dúvida na
ressonância pós-operatória. Nos casos de neoplasias,
a ressonância deve ser realizada no primeiro dia após
a cirurgia e áreas de captação refletem neoplasia macroscópica residual. Leva-se em conta que, após 48 a
72 horas, áreas de manipulação cirúrgicas e isquêmicas
podem captar contraste e confundir a interpretação
do exame. Nos casos de estudos pós-operatórios de
cavernomas, a ressonância nuclear magnética poderá
ser de difícil interpretação se houver sangue “recente”,
proveniente da cirurgia, no leito cirúrgico, dentro do
tronco encefálico. Nesses casos, o controle a longo
prazo revelará o resultado.
Caso-exemplo
PC, 21 anos, sexo feminino. Apresentou cefaleia
hemicraniana e discreta síndrome de Millard-Gubler,
com paresia facial homolateral à lesão e hemiparesia
incompleta poupando a face contralateral. O quadro foi
transitório e reverteu-se em semanas.
A ressonância nuclear magnética revelou um cavernoma hemorrágico pontino anterior à emergência do
nervo trigêmeo e posterior ao trato piramidal e fibras
transversas da ponte (Figuras 1 e 2). A cirurgia envolveu
um acesso pré-sigmoideo ampliado anteriormente por
petrosectomia, com exposição do nervo facial e, posteriormente, foi associada a técnica retrossigmoidea. O seio
sigmoide foi preservado. A estereotaxia mostrou o acesso
e o local de intrusão no tronco encefálico (Figura 3).
Figura 1 – Ressonância magnética mostrando a topografia da lesão.
Figura 2 – Ressonância magnética, sequência T2.
Cavernomas pontinos. Tratamento cirúrgico. Parte II
Stávale Joaquim MA e col
59
Arq Bras Neurocir 28(2): 58-61, junho de 2009
Figura 3 – Tomografia realizada para estereotaxia e tomografia mostrando osteotomia.
A monitorização neurofisiológica intraoperatória
acusou frequentes disfunções e instabilidades elétricas
do nervo facial. As funções piramidais apresentaram
leve instabilidade por estímulo mecânico. A lesão foi
removida preservando-se sua área gliótica adjacente
(Figura 4). No período pós-operatório houve paralisia
facial parcial que melhorou espontaneamente, mas
não totalmente. Procedimento de cirurgia plástica foi
necessário (cross-facing), tornando a disfunção imperceptível. Ocorreu anacusia definitiva homolateral,
causada pela petrosectomia.
Referências
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
8.
Figura 4 – Ressonância magnética. Controle pós-operatório.
Conclusão
A face anterior da cisterna pré-pontina e do ângulo
pontocerebelar, formada pelo clivo e porção medial
da face posterior da pirâmide, é acessível por essa
via. Do mesmo modo, suas faces posterior e medial,
constituídas pela superfície ventral e ventrolateral do
tronco encefálico, também são abordáveis. A remoção
óssea adicional (osteotomias ampliadas) permite a
visualização do conteúdo cisternal por vários ângulos
e a escolha do melhor ponto de intrusão no tronco
encefálico. O trabalho é realizado entre as estruturas
neurovasculares locais, poupando-se a função. Portanto,
lesões ventrolaterais da ponte podem ser abordadas
por via pré-sigmoidea, que se associam ao conjunto de
abordagens ao tronco encefálico.
60
9.
10.
11.
12.
13.
14.
15.
Al-Mefty O, Fox JL, Smith RR. Petrosal approach for petroclival meningiomas. Neurosurgery. 1988;22:510-7.
Bricolo Ap, Turazzi S, Talacchi A, Cristofori L. Microsurgical
removal of petroclival meningiomas: a report of 33 patients.
Neurosurgery. 1992;31:813-82.
Drake CG. Surgical removal of arteriovenous malformation,
from the brain stem and cerebellopontine angle. Neurosurgery. 1975;43:661-70.
Hakuba A, Nishimura S, Jang BJ. A combined retroauricular
and preauricular transpetrosal-transtentorial approach to
clivus meningiomas. Surg Neurol. 1988;30:108-16.
Haque R, Kellner CP, Solomon RA. Cavernous malformations of the brain stem. Clin Neurosurg. 2008;55:88-96.
Hardy DG, Rhoton AL. Microcirurgical relationships of the
superior cerebelar artery and trigeminal nerve. J Neurosurg.
1983;59:63-105.
Hauch EF, Barnett SL, White JA, Samson D. Symptomatic
brain stem cavernomas. Neurosurgery. 2009;64:61-71.
Kashimura H, Inoue T, Ogasawara K, Ogawa A. Pontine
cavernous angioma resected using the subtemporal,
anterior transpetrosal approach determined using threedimensional anisotropy contrast imaging: technical case
report. Neurosurgery. 2006;58(1 Suppl):ONS-E175.
Kawase T, Toya S, Shiobara R, Mine T. Transpetrosal approach for aneurysms of the lower basilar artery. J Neurosurg. 1985;63:857-61.
Kumabe T, Suzuki M, Yoshimoto T, Suzuki J. A case of
cavernous angioma extend from the ventral part of the pons
to the midbrain: subtemporal and trans-tentorial approach.
No Shinkei Geka. 1988;16:1193-7.
Kupersmith MJ, Kalish H, Epstein F, Yu G, Berenstein A, Woo
H, et al. Natural history of brain stem cavernous malformations. Neurosurgery. 2001;48:47-53.
Martin RG, Grant JL, Peace D, Theiss C, Rhoton AL. Microsurgical relationships of the anterior inferior cerebelar
artery and the facial-vestibulocochlear nerve complex.
Neurosurgery. 1980;6:483-507.
Martinez AG, Oliveira E, Tedeschi H, Wen HT, Rhoton AL.
Microsurgical anatomy of the brain stem. Oper Tech Neurosurg. 2000;3:80-6.
Matsuno M, Rhoton AL, Peace DP. Microcirurgical anatomy
of the posterior fossa cisterns. Neurosurgery. 1988;23:
58-80.
Mayberg M, Symon L. Meningiomas of the clivus and apical petrous bone. Report of 35 cases. J Neurosurg. 1986;65:160-7.
Cavernomas pontinos. Tratamento cirúrgico. Parte II
Stávale Joaquim MA e col
Arq Bras Neurocir 28(2): 58-61, junho de 2009
16.
17.
18.
19.
Sekhar LN, Estonillo R. Transtemporal approach to the skull
base: an anatomical study. Neurosurgery.1986;19:799-808.
Sekhar LN, Schramm VL Jr, Jones NF. Subtemporal-preauricular infratemporal fossa approach to large lateral and posterior
cranial base neoplasms. J Neurosurgery. 1987;67:488-99.
Sen CN, Sekhar LN. The subtemporal and preauricular
infratemporal approach to intradural structures ventral to
the brain stem. J Neurosurg. 1990; 73:345-54.
Tedeschi M, Rhoton AL. Lateral approaches to the petroclival
region. Surg Neurol. 1994;41:180-216.
Cavernomas pontinos. Tratamento cirúrgico. Parte II
Stávale Joaquim MA e col
Original recebido em junho de 2008
Aceito para publicação em janeiro de 2009
Endereço para correspondência
Marcos Augusto Stávale Joaquim
Alameda Campinas, 1.360, 16° andar
01404-002 – São Paulo, SP, Brasil
E-mail: [email protected]
61
Arq Bras Neurocir 28(2): 62-73, junho de 2009
Meios contínuos em neurocirurgia vascular
e neurorradiologia intervencionista. Parte I
Rogelio Iván Ortiz-Velázquez1, Jose Guilherme Mendes Pereira Caldas2, Jorge
Arturo Santos Franco1, Rodrigo Mercado Pimentel1, Rogelio Revuelta1
Escola Politécnica da Universidade de São Paulo.
Este trabalho foi realizado graças ao apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do
Estado de São Paulo (Fapesp) – Processo nº 2006/03977-1.
RESUMO
Os aneurismas e as placas de ateroma compartem não somente um elevado índice de morbimortalidade,
como também sua localização. Isso sugere que fatores hemodinâmicos contribuam no seu
desenvolvimento. A quantificação de forças hemodinâmicas é complicada, especialmente em vasos
intracranianos; porém, avanços recentes em mecânica computacional têm permitido calcular
sua magnitude e distribuição em modelos arteriais com ajuda de técnicas de dinâmica de fluidos
computacionais. No entanto, a compreensão desses modelos e a verificação de sua validade e limitações
dependem do conhecimento de seu desenho e dos parâmetros hemodinâmicos utilizados. Por outro
lado, a determinação das propriedades mecânicas das paredes arteriais é crucial, não somente para a
compreensão das alterações do sistema cardiovascular no tempo e das causas responsáveis que dão
origem às lesões vasculares, bem como para a realização da angioplastia, o planejamento de pontes
arteriais e a seleção de próteses endovasculares. Dessa forma, a mais importante contribuição que
podemos obter do conhecimento da biomecânica, em geral, e da mecânica dos meios contínuos, em
particular, se encontra no melhor entendimento da fisiologia. Nesta revisão, passamos pelos conceitos
fundamentais utilizados na formulação dos problemas da mecânica dos meios contínuos, com ênfase na
pesquisa biomecânica das lesões vasculares, no intuito de oferecer algumas definições que promovam
a análise crítica dos resultados nesse campo.
PALAVRAS-CHAVE
Mecânica dos meios contínuos. Neurocirurgia. Neurorradiologia. Lesões vasculares.
ABSTRACT
Mechanics of continuous media in vascular neurosurgery and endovascular neuroradiological
procedures
Cerebral aneurysms and atherosclerosis share not only a high rate of morbidity and mortality, but also
its location. It suggests that hemodynamic factors contribute to their development. Quantification of
hemodynamic forces is complicated, especially in intracranial arteries. However, recent advances in
computational mechanics have allowed calculating the magnitude and distribution of these forces in
arterial models with the help of techniques of computational fluid dynamics. However, the understanding
of these models and verification of their validity and limitations depend on the knowledge of its design
and hemodynamic parameters. Furthermore, the determination of mechanical properties of the arterial
walls is crucial, not only for the understanding of the changes of the cardiovascular system in time and
the causes of the injuries that they develop, as well as to the realization of angioplasty, planning of
arterial bypass or the selection of endovascular prosthesis, for example. Thus, concepts on mechanics
of continuous media are needed in the body of knowledge of all interested in cerebrovascular disease. In
this review, we look the fundamental concepts used in the formulation of the problems of the mechanics
of continuous media, focusing on biomechanics research of vascular lesions, in order to provide some
definitions that promote the critical analysis of the results in this field. The most important contribution
that we can get from the knowledge of biomechanics, in general, and from the mechanics of continuous
media, in particular, is a better understanding of physiology.
KEY WORDS
Mechanics of continuous media. Neurosurgery. Neuroradiology. Vascular lesions.
1 Neurocirurgião.
2 Professor livre-docente do Departamento de Radiologia da Universidade de São Paulo (USP) e chefe do Serviço de Neurorradiologia
Intervencionista do Hospital das Clínicas da USP.
Arq Bras Neurocir 28(2): 62-73, junho de 2009
Introdução
A biologia está incluída na ciência e a mecânica
não está limitada à física.
Y. C. Fung
A first course in continuum mechanics
No hemisfério ocidental, a aterosclerose representa
a patologia emblemática do sistema cardiovascular.
No Brasil, 80% dos acidentes vasculares cerebrais são
de tipo isquêmico e, conforme dados do Ministério
da Saúde, representam a principal causa de morte.26,27
Aneurismas cerebrais e hemorragia subaracnoidea
compartem com a doença aterosclerótica não somente
o elevado índice de morbimortalidade, mas também
sua localização preferencial (curvas e bifurcações arteriais). Isso sugere que forças hemodinâmicas, tal como
o shear stress, ou sua distribuição espaço-temporal,
contribuam no desenvolvimento dessas lesões18,46 e,
em última instância, determinem sua localização, taxa
de crescimento e ruptura.19,38
Ainda que a história natural dos aneurismas intracranianos seja desconhecida,4,5,8,16,17,38 sabe-se que fatores
mecânicos participam de sua origem, crescimento e
ruptura.5,16,17 Forças hemodinâmicas contribuem para o
enfraquecimento local da parede, ao passo que forças
intramurais participam da estabilidade ou do crescimento do saco aneurismático e, finalmente, a ruptura ocorre
quando as forças hemodinâmicas excedem a resistência
da parede.16,17 Por outro lado, no desenvolvimento das
lesões ateroscleróticas, a disfunção endotelial é um
evento precoce24,31,34,42 e sabemos que o endotélio é sensível às forças hemodinâmicas.6,7,24,34,37,42 Ele expressa
diferentes genes e produz distintas moléculas, dependendo da magnitude e direção das forças induzidas
pelo fluxo.6,18,24,42 Consequentemente, para entender e,
por último, controlar a função endotelial, em primeiro
lugar há de se conhecer como o fluxo induz as forças que
deformam as células, como as células reconhecem essas
forças e como a transdução desses estímulos controlam
a expressão gênica.
É possível comprovar que, sob tensão, os tecidos
mudam sua morfologia, composição e taxa de crescimento. Assim, através do tempo existem variações da
composição material e propriedades mecânicas em todo
o sistema orgânico e essa é uma característica distintiva
da vida.12 Particularmente, os vasos sanguíneos estão
expostos a uma complexa distribuição de tensões que
constituem estímulos que regulam proliferação, migração e apoptose, participando, portanto, do controle do
crescimento e remodelamento vascular.24,33 Esse último
é um fenômeno-chave no estudo do sistema vascular,
pois transforma microestrutura, dimensões, funções,
propriedades mecânicas e condiciona o desenvolvimenMeios contínuos em neurocirurgia
Ortiz-Velázquez RI e col
to de lesões aneurismáticas e ateroscleróticas.11,17,18,42,46
Desse modo, podemos considerar aneurismas e placas de ateroma como exemplos clínicos nos quais o
entendimento da mecânica arterial, particularmente
do shear stress, é essencial para a neurocirurgia e ao
procedimento endovascular.
Desde o ponto de vista físico, quando um fluido,
como o sangue, é conduzido por intermédio de um tubo
deformável, como uma artéria, interações entre as forças
que regem a mecânica do fluido e as forças elásticas da
parede geram ampla variedade de fenômenos, incluindo
as relações não lineares pressão-fluxo, a propagação
de ondas e a ressonância.11,13,17,20,31,41,43 O entendimento
da origem e da natureza desses fenômenos é ainda um
desafio experimental, analítico e computacional formidável que envolve o estudo de fluxos instáveis a baixos
números de Reynolds, interações fluxo-estrutura e análise do movimento tridimensional.2,13,15,33,37 Não obstante,
nossos conhecimentos vêm se modificando de tal modo
que hoje temos a capacidade de visualizar tridimensionalmente a geometria do fluxo sanguíneo e a distribuição dos perfis de velocidade.1,2,8 Quer dizer, a aquisição
de imagens detalhadas das bifurcações vasculares
permitiu definir características locais do fluxo1,2,8,18,42,46
e ferramentas computacionais possibilitaram análises
detalhadas das forças hemodinâmicas associadas ao
desenvolvimento de lesões vasculares.23 Assim, não
obstante a quantificação de forças hemodinâmicas ser
complicada, especialmente em vasos intracranianos,
avanços recentes em mecânica computacional têm
permitido calcular a magnitude e distribuição dessas
forças em modelos arteriais, com ajuda de técnicas de
dinâmica de fluidos computacionais (CFD).9,22,38 Portanto, o aperfeiçoamento da angiografia rotacional 3D
e a introdução do tratamento endovascular justificam,
em parte, o crescimento do interesse pelos estudos de
CFD, pois, teoricamente, é possível obter dados para
a construção de ferramentas clínicas que auxiliem no
planejamento do tratamento ou na determinação do
risco de ruptura.4,5,21
No mesmo sentido, a determinação das propriedades mecânicas das paredes arteriais é crucial, não
somente para a compreensão dos câmbios do sistema
cardiovascular no tempo e das causas responsáveis
que dão origem às lesões que nelas se desenvolvem,
5,11,12,16-18,46
bem como para a realização da angioplastia, o
planejamento de pontes arteriais e a seleção de próteses
endovasculares.4,9,15,21,22 Por exemplo, pode-se comprovar que a proliferação da íntima, após implantação de
um stent ou a realização de angioplastia por balão, é
inibida por altos níveis de shear stress.41
Finalmente, novos métodos de mensuração, fundamentados na navegação endovascular, permitem hoje
a mensuração de variáveis hemodinâmicas in situ e
63
Arq Bras Neurocir 28(2): 62-73, junho de 2009
trouxeram consigo a necessidade de uma melhor análise
dos dados, obrigando-nos a entender os fenômenos que
somos capazes de mensurar. Por tudo isso, conceitos próprios da biomecânica ou, especificamente, da mecânica
dos meios contínuos são cada vez mais necessários no
conjunto de conhecimentos de todo interessado na patologia vascular cerebral. Nesta série de revisões, passamos
pelos conceitos fundamentais utilizados na formulação
dos problemas da mecânica dos meios contínuos, com
ênfase na pesquisa biomecânica das lesões vasculares,
no intuito de oferecer algumas definições que promovam
a análise crítica dos resultados nesse campo.
Por alguma estranha razão que não compreendemos completamente, a natureza obedece à matemática.
Eli Passow
Understanding calculus concepts
Como forma de exemplificar nossa motivação, permitimo-nos introduzir alguns questionamentos básicos a respeito de asseverações aparentemente evidentes para todo
neurocirurgião e neurorradiologista intervencionista.
“O sistema circulatório é um sistema de distribuição
e intercâmbio que exemplifica a eficiência do desenho
biomecânico.35,39 Descrita de maneira simples, a circulação consiste em uma bomba que força o sangue,
periódica e ritmicamente, dentro de um sistema de tubos
elásticos que se bifurcam. Os pulsos de pressão e fluxo
viajam centrifugamente e são parcialmente refletidos
nos pontos de mudança da impedância, dando origem
a pulsos retrógrados, enquanto pulsos anterógrados
são amortecidos ao alcançar os vasos de resistência. O
sangue, então, retorna num fluxo quase contínuo com
pulsações secundárias impostas às veias pela contração muscular e pelo próprio coração. Por sua vez, uma
árvore vascular típica está constituída por milhares de
segmentos conectados em série e em paralelo, de diferentes diâmetros e comprimentos, e submetidos a diversas
pressões e taxas de fluxo.” Apesar dessa heterogeneidade
morfológica e hemodinâmica, prevalece a hipótese de
que seu desenho obedece a princípios físicos simples
que otimizam a operação do sistema como um todo.25,2830,32,35,36,39,44,45
Porém, como se definem esses princípios e
as bases da otimização? E uma onda de pressão e fluxo?
Por que aneurismas e placas de ateroma são lesões exclusivas do segmento convectivo da circulação?
O sistema cardiovascular é, desde logo, muito mais
complexo que essa descrição sucinta, já que, por exemplo, apresenta geometria variável e viscoelasticidade não
uniforme.11,12,14,17,23 Isso faz que soluções para problemas
cardiovasculares e circulatórios dependam de descrições
detalhadas e do uso de ferramentas analíticas que são, às
vezes, estranhas e de difícil compreensão em função do tipo
de formação que regularmente se espera de um médico.
64
Novamente, analisemos: “os vasos periféricos têm
sido comumente vistos, desde o ponto de vista clínico,
como responsáveis da pós-carga”.31 Reconhecemos,
então, o conceito que fundamenta o raciocínio clínico
do tratamento da hipertensão arterial. Contudo, essa
hipótese está fundamentada em condições de fluxo
contínuo11,16,17,31 e, portanto, em paredes rígidas. Ademais,
tanto artérias de distribuição (mediano calibre) como
leitos vasculares periféricos contribuem à resistência.11,23
Assim, intuitivamente, parece que a natureza da descrição é inadequada, dado o caráter evidentemente pulsátil
e, portanto, oscilatório da circulação, que se mantém
inclusive pela microcirculação.23 Do mesmo modo, se
considerarmos que “a impedância, diferentemente da
resistência que se mantém constante, é uma variável
complexa, cuja magnitude varia com a frequência de
pulso”,23 poderíamos nos questionar acerca do significado
de uma variável complexa. A título de esclarecimento, o
termo variável complexa refere-se a uma entidade matemática, baseada na manipulação de números complexos,
sem relação com qualquer nível de dificuldade.
“O modelo Windkessel é o sistema acoplado de
compliança-resistência mais utilizado para a descrição
da natureza pulsátil da circulação”.3 Porém, meditemos acerca da seguinte afirmativa: “modelos baseados
em segmentos arteriais viscoelásticos, de movimento
livre, e fluxo governado por equações de Navier-Stokes
constituem as melhores aproximações dos eventos
circulatórios”.45 Diante de ambos os modelos, podemos identificar suas diferenças? Existem diferenças?
Podemos definir viscoelasticidade? E as equações de
Navier-Stokes? Esses modelos têm clarificado o comportamento da parede arterial quando sujeita a variações
de pressão e auxiliado no entendimento do estresse
cíclico que atua sobre a parede e na forma como essa
se adapta. Porém, o que é o estresse?
Assim, para cada modelo de descrição do sistema
vascular é necessário verificar sua validade e limitações.1 Tais verificações dependem do conhecimento do
desenho específico e dos parâmetros hemodinâmicos
utilizados. Portanto, o entendimento da moderna teoria
da circulação requer noções de mecânica dos meios
contínuos que permitam uma adequada interpretação
dos estudos que nela se desenvolvem. Finalmente, a
mais importante contribuição que podemos obter do
conhecimento da biomecânica, em geral, e da mecânica dos meios contínuos, em particular, encontra-se no
melhor entendimento da fisiologia.
Devemos estar aptos, graças ao trabalho dos próprios
matemáticos, a chegar a uma certeza no que diz respeito
à maior parte das questões nas quais devemos nos preocupar; e, dentre essas, devemos ser capazes de encontrar
Meios contínuos em neurocirurgia
Ortiz-Velázquez RI e col
Arq Bras Neurocir 28(2): 62-73, junho de 2009
a exata solução para problemas que, no passado, foram
cobertos, por completo, pela tradicional incerteza…
Bertrand Russell
The principles of mathematics
No estudo de lesões vasculares, sejam aneurismas
intracranianos ou placas de aterosclerose carotídeas,
em algum momento teremos de definir conceitos como
força, movimento, fluxo, deformação, propriedades
materiais, interação entre corpos e mudanças de estado
temporais ou permanentes etc. Afortunadamente, esses
aspectos são suscetíveis de expressão matemática, na
forma de equações diferenciais e condições de contorno, cuja solução oferece informação quantitativa
do problema em estudo.10-12,16,17,23,43 Não propomos a
discussão dos métodos de solução dessas equações.
Nosso objetivo é oferecer definições que auxiliem na
compreensão do processo que permite a expressão de
um problema circulatório na sua forma matemática,
pois desse modo se facilita a compreensão de sua
natureza e a identificação das variáveis envolvidas,
gerando, consequentemente, novos modelos e direções
de pesquisa a partir de umas poucas suposições iniciais.
Porém, dada a disparidade aparente entre as abordagens
físico-matemática e médica, revisamos brevemente a
história do desenvolvimento de alguns dos conceitos
hemodinâmicos que hoje são de uso comum, para demonstrar que essa diferença é fictícia e que, por outro
lado, procedimentos físico-matemáticos são muito mais
que algoritmos para a resolução de problemas particulares. Geralmente, conceitos físicos e matemáticos são
ideias profundas que têm um conjunto de aplicações tão
amplo quanto seu tempo de evolução.
Galileu, estudante de medicina antes de se converter em físico, mostrou que a matemática é a chave da
ciência, sem a qual, essa não pode ser adequadamente
compreendida. Ele descreveu a constância do período
do pêndulo, o que lhe permitiu mensurar pela primeira
vez a frequência do pulso,31 e ainda contribuiu para
a parte essencial da demonstração da existência da
circulação que se baseou no seu princípio de medida.
Harvey, discípulo de Galileu, foi o primeiro a notar
que as válvulas do sistema cardiovascular permitem
o fluxo unidirecional do sangue. Essa observação, em
associação com o princípio da conservação da massa,
levou-o a postular que o sangue retorna das artérias às
veias. Ele mediu a capacidade ventricular e, sabendo a
frequência de pulso, calculou o gasto cardíaco, obtendo
um resultado de 234 kg/h. Obviamente, tal resultado,
em função do princípio da conservação da massa, exigia
a existência do fenômeno circulatório. O conceito da
circulação de Harvey requeria, ademais, a existência
teórica de capilares. A descoberta dos capilares, por
Malpighi, 45 anos depois,11,23 somente corroborou uma
Meios contínuos em neurocirurgia
Ortiz-Velázquez RI e col
necessidade lógica. Isso demonstra, como frequentemente ocorre, que a teoria (princípio de conservação
da massa) motiva e guia os estudos experimentais.
Por outro lado, Newton não fez estudos de biologia,
porém seu cálculo, as leis do movimento e a equação
constitutiva dos fluidos viscosos são os fundamentos
para qualquer estudo do fluxo arterial.43
No século XVIII, foi notável o desenvolvimento
do tratamento teórico da dinâmica dos fluidos, especificamente no campo dos fluidos ideais, nos quais o
efeito da viscosidade é ignorado. O líder nesse campo
foi médico e o mais prolífico matemático da história:
Euler. Euler generalizou as leis do movimento de
Newton em equações diferenciais parciais que deram
origem à mecânica do contínuo e ao estabelecimento
das equações de Navier-Stokes.10 Apesar de descrever as
equações da propagação da onda de pulso, reconheceu a
dificuldade de analisar tais fenômenos, não sendo capaz
de encontrar sua solução.31
A dinâmica dos fluidos do século XIX se dividiu
na luta entre os engenheiros que observaram o que não
podia ser explicado e os matemáticos que explicaram o
que não podia ser observado.16,17,31 Porém, aconteceram
importantes avanços na teoria e aplicações. Um dos
mais proeminentes se deve, uma vez mais, a um médico:
Poiseuille. Ele logrou estabelecer, experimentalmente,
a relação entre fluxo, gradiente de pressão e dimensões
de um tubo capilar, mostrando que a taxa de fluxo se
relaciona com a quarta potência do diâmetro interno
do tubo. Seus resultados, por outro lado, permitiram o
estabelecimento da mais famosa condição de contorno
entre um fluido viscoso e a parede de um sólido: a condição de não deslizamento.43 Uma formação similar em
medicina e física teve Thomas Young,19 cujas pesquisas
biofísicas incluíram a visão humana e a percepção da
cor. Porém, é conhecido por seu trabalho acerca da natureza da elasticidade, particularmente, das propriedades
elásticas das artérias e da velocidade de propagação do
pulso arterial. Seu trabalho levou ao conceito de módulo
elástico (módulo de Young).11,12,16,17,23,31 Por seu turno, os
irmãos Weber (um físico e o outro médico) estabeleceram
muitas das propriedades das ondas de pulso propagadas
e refletidas.31 Seus resultados e o trabalho de Young
permitiram que Moens e Korteweg descrevessem matematicamente a relação entre a velocidade de pulso arterial
e o módulo de elasticidade da parede arterial), até hoje a
mais útil relação entre a propagação da onda de pulso e
as propriedades da parede arterial.16,17,23,45
Co =
Eh
2rp
Nela, é possível reconhecer que a velocidade depende
do módulo de elasticidade (E) da artéria e da espessura da
65
Arq Bras Neurocir 28(2): 62-73, junho de 2009
parede (h) e varia de maneira inversamente proporcional
ao raio interno da artéria (r) e à densidade do sangue (ρ).
Assim, tal formulação é um exemplo de como a correlação
de propriedades mecânicas e geométricas é útil na descrição
do comportamento do mais básico dos sinais clínicos.
Por outro lado, o desenvolvimento do que hoje é a teoria biomecânica moderna teve de esperar até a conclusão
da Segunda Guerra Mundial e o desenvolvimento da teoria
dos fenômenos não lineares,10-12,16,17,23,31,43 sendo somente
possível graças aos avanços em física e matemática aplicada, à introdução do computador digital e ao desenvolvimento de métodos numéricos (elementos finitos) que
permitem explorar as capacidades computacionais.
Todavia, talvez o mais importante e fundamental
avanço no estudo dos problemas circulatórios foi a demonstração por Womersley, McDonald e Taylor, após a
introdução de uma aplicação da integral conhecida como
transformada rápida de Fourier, da validez e aplicabilidade da análise de Fourier nos fenômenos circulatórios.31
Quer dizer, a representação do sistema arterial como um
oscilador contínuo capaz de ser analisado no domínio da
frequência. Considere-se, assim, que a regularidade do
batimento cardíaco é uma das principais características
do sistema cardiovascular. Sabemos também que normalmente essa regularidade é mantida durante longos
períodos de tempo. Desse modo, tal qualidade do sistema
cardiovascular caracteriza um estado de oscilação contínua. Nessa condição, qualquer onda, de pressão ou fluxo,
que se repita regularmente pode ser representada por uma
série de Fourier, isto é, a onda pode ser descrita como
a soma de um conjunto de ondas cujas frequências são
múltiplos inteiros da frequên­cia de repetição da onda em
estudo.15,41 A vantagem dessa abordagem é que seu tratamento matemático se facilita. Sem embargo, ao aplicar
a análise de Fourier à circulação, certas simplificações
têm de ser aceitas. A de maior importância depende da
circulação não ser um sistema linear, de tal forma que,
apesar de as séries de Fourier representarem o pulso de
fluxo ou pressão, estritamente falando, não se pode dizer
que um termo harmônico de pressão está relacionado
diretamente com seu correspondente termo harmônico
de fluxo. Porém, o efeito da não linearidade (calculado
por Womersley) é suficientemente pequeno para se
negligenciá-lo em uma primeira aproximação.31
Definições
A biomecânica provê as ferramentas físicas e
analíticas que permitem descrever os problemas
fisiológicos com acurácia matemática.
Y. C. Fung
Biomechanics: mechanical properties of living tissues
66
A abordagem matemática dos problemas circulatórios inicia-se com a ideia de aproximação. Imaginemos
que não contamos com as ferramentas para resolver um
problema. Assim, em lugar de tentar resolvê-lo de maneira exata, temporariamente nos mantemos satisfeitos
com uma solução aproximada. Essa solução, então, é
refinada de modo a oferecer melhor estimativa do problema. Logo, continuamos a melhorar a aproximação
até alcançar a resposta esperada (limite). A ideia de
aproximação é muito comum na vida diária, usamo-la
quando tentamos encontrar uma palavra no dicionário
ou determinar nosso peso. Em ambos os casos, nossa
primeira aproximação é refinada diversas vezes, cada
vez mais perto de nosso objetivo, até alcançarmos uma
conclusão satisfatória (a palavra ou o peso correto). De
maneira análoga, muitos dos problemas em matemática
podem ser abordados mediante esses passos: aproximação, refinamento e limite. No mesmo sentido, as
teorias científicas também constituem aproximações
que descrevem situações físicas com certo grau de
acurácia e são continuamente refinadas para uma maior
exatitude.
A análise fundamentada em modelos matemáticos
para descrever a evidência experimental e sua teoria é
uma característica de inúmeras disciplinas científicas.
Contudo, nas ciências médicas, a complexidade física
e a inacessibilidade experimental dos sistemas biológicos têm limitado essa abordagem.23,31 Sem embargo,
progressos em matemática analítica e computacional, o
melhor entendimento dos sistemas biológicos e novas
técnicas de imagem têm permitido o desenvolvimento
de modelos que predizem o comportamento biológico
em resposta a mudanças internas ou externas.40 No contexto particular do sistema vascular, o objetivo desses
modelos é a predição acurada do ambiente mecânico
das células que formam a parede arterial (mecânica dos
sólidos) e do fluxo sanguíneo (mecânica dos fluidos),
considerados determinantes maiores da homeostase
do sistema.20
Já que a biomecânica e a mecânica dos meios
contínuos proveem o marco teórico-matemático
que permite a análise dos problemas do sistema
vascular,10-13,15-17,20,23,31,33,40,43 começamos por defini-las.
Biomecânica
A biomecânica pode ser entendida, de maneira ampla, como o estudo da correlação entre a função de um
sistema fisiológico e sua estrutura, a partir dos princípios que regem os eventos do universo físico.11,12,16,17 Seu
objetivo é o estudo da geometria, propriedades materiais
e condições de contorno que permitam caracterizar a
Meios contínuos em neurocirurgia
Ortiz-Velázquez RI e col
Arq Bras Neurocir 28(2): 62-73, junho de 2009
resposta dos sistemas biológicos, diante das mais diversas forças, facilitando o reconhecimento da influência
que o mundo físico exerce na estrutura, propriedades e
funções dos seres vivos. Assim, o campo de estudo da
biomecânica abrange: a distribuição do estresse; o estabelecimento de equações constitutivas que descrevem
as propriedades mecânicas dos materiais; a resistência
e propriedades viscoelásticas (creep, histerese, fratura,
fadiga, corrosão); os materiais compósitos; o fluxo; a
transferência de calor e de massa (difusão e transporte
por meio de membranas); o movimento de partículas
(correntes iônicas etc.); a estabilidade e o controle dos
sistemas mecânicos; a propagação de ondas; a vibração;
as ondas de choque e a ressonância; entre outros.
Segundo Fung,11,12 existem quatro pré-requisitos para
a solução de qualquer problema em biomecânica:
1. identificação da geometria ou estrutura do
sistema;
2. identificação dos materiais e suas propriedades
mecânicas;
3. identificação das leis básicas que governam o
comportamento do sistema;
4. identificação das condições iniciais e de
contorno.
Assim, o primeiro dos requisitos requer estudos
anatômicos, histológicos e microestruturais dos corpos
em análise (artérias, aneurismas, placas etc.), com a
finalidade de conhecer sua configuração geométrica.
O segundo envolve ensaios mecânicos, no intuito de
formular equações constitutivas. Essas relacionam o
estresse ao estiramento e à taxa de deformação, quer
dizer, definem o comportamento mecânico do material
do qual está constituído o corpo e são, normalmente,
determinadas por uma combinação de experimentação e estudos teóricos (limites termodinâmicos). Esse
passo é frequentemente difícil, pois, em geral, não é
possível isolar o tecido para testá-lo. Ainda, o tamanho
da amostra pode ser muito pequeno ou podem existir
dificuldades para manter o tecido em condições fisiológicas. Por outro lado, com frequência, as relações
estresse-deformação em amostras biológicas são não
lineares e a não linearidade faz a determinação das
equações constitutivas um reto. Apesar disso, é possível
estabelecer sua forma matemática, fazendo uso de parâmetros (incógnitas), cujo valor pode ser determinado
posteriormente, mediante experimentação. O terceiro
depende do número de hipóteses assumidas e do grau
de simplificação do problema. No entanto, deverão ser
satisfeitos os axiomas da mecânica do contínuo: leis
do movimento (Newton), leis de conservação (massa,
momento e energia) e as equações constitutivas dos
materiais. Qualquer outra hipótese ad hoc deverá ser
Meios contínuos em neurocirurgia
Ortiz-Velázquez RI e col
especificada e tratada com precaução no tocante a sua
validade. Com a informação básica (equações constitutivas) e os princípios adequadamente ordenados (leis
de movimento etc.), é possível construir as equações
governantes que regem o problema. Por último, a identificação das condições iniciais e de contorno depende
do tipo de problema. Logo, o conhecimento do ambiente no qual o sistema trabalha é indispensável para
sua caracterização, pois as condições de contorno não
são mais que os fatos conhecidos que caracterizam o
problema. Por ser esse um dos conceitos fundamentais,
passamos a esclarecer seu significado, exemplificando
a condição de contorno mais importante no estudo da
circulação arterial.
Considere que, como consequência da viscosidade
de um fluido, não possam existir câmbios abruptos da
velocidade em qualquer ponto de um campo de fluxo.
Então, na interface de um fluido (fluxo de sangue) e sua
fronteira sólida (parede arterial), a velocidade do fluido
(velocidade do sangue em contato com a parede) deverá ser a mesma que a velocidade da fronteira (parede
arterial), pois de outra maneira existiria uma mudança
súbita de velocidade nesse ponto. Essa condição é denominada condição de contorno de não deslizamento
(no-slip boundary condition) e deverá ser satisfeita em
toda análise de fluxos viscosos.43 Isso significa que nas
artérias, por exemplo, o sangue não pode simplesmente
escorregar. Em vez disso, o sangue em contato com a
parede arterial não se move, pois deve ter a mesma
velocidade da parede, que se mantém estática. Entretanto, as camadas de fluxo que se separam da parede
movem-se com velocidades que crescem ao aumentar
a distância à mesma. Portanto, ao conectar a velocidade
máxima do centro da luz arterial à velocidade zero na
parede, forma-se um perfil parabólico sem câmbios
abruptos de velocidade em todos os pontos do campo
(perfil parabólico do fluxo laminar). Essa condição é a
razão pela qual se requer a ação de bomba do coração
para manter o fluxo. Na sua ausência, o fluido seria
capaz de escorregar e manter-se em um estado de fluxo
contínuo, sem gasto de energia. Na sua presença, o
trabalho cardíaco é requerido para manter o gradiente
de velocidade com respeito à parede arterial.
Por outro lado, os corpos, que regularmente se
estudam nas teorias clássicas de hidrodinâmica e elasticidade, têm geometria simples ou ao menos conhecida.
As equações constitutivas têm sido provadas e suas
condições de contorno identificadas. Em contraste, os
problemas em biomecânica não somente fogem das
teorias clássicas da elasticidade e hidrodinâmica, bem
como sua principal dificuldade encontra-se na ausência
de dados que permitam o estabelecimento das equações
constitutivas.11,12,23 Contudo, uma vez formulado o
problema, resta encontrar soluções para as equações
67
Arq Bras Neurocir 28(2): 62-73, junho de 2009
governantes, com condições iniciais e de contorno
apropriadas. A solução pode ser analítica, numérica
(elementos finitos) ou experimental. Porém, a realização
de experimentos que confirmem as soluções encontradas sempre é necessária, pois comparar os resultados
experimentais com os resultados teóricos e numéricos
é a única forma de justificar a validade das hipóteses.1
Se estudos analíticos e numéricos são representativos
dos achados experimentais, quer dizer, se for possível
corroborar a concordância, então estaremos em capacidade de calcular os valores numéricos dos coeficientes
indeterminados (parâmetros) presentes nas equações
constitutivas. Se as novas equações obtidas predisserem
com acurácia o comportamento de outros problemas,
então a validade está provada e, somente depois disso, o
método poderá ser utilizado para explorar sua utilidade
prática e experimental.
Mecânica do contínuo
Na escala de observação natural (macroscópica)
podemos pensar, por exemplo, em qualquer líquido
como um meio contínuo (sem descontinuidades, buracos ou fissuras).43 Na realidade, porém, os líquidos são
coleções de moléculas discretas que apresentam espaços
entre elas. Para o estudo de seu comportamento, a mecânica clássica oferece basicamente duas abordagens:
a mecânica do contínuo e a mecânica estatística. A mecânica estatística descreve o comportamento médio de
cada molécula individual para entender o desempenho
global do meio em escala macroscópica. Na mecânica
do contínuo, por outra parte, considera-se um volume de
comportamento médio, independentemente de qualquer
atenção às moléculas individuais.10
Matematicamente, os objetos físicos (corpos materiais) podem ser tratados como meios contínuos limitados por uma superfície fechada. A superfície pode ser
real, como a pele que limita o corpo humano. Porém,
pode ser imaginária, como no caso de uma superfície
encerrando um lugar do espaço tridimensional. Sabe-se
que os objetos físicos estão sujeitos a forças externas
atuando em seus corpos, como ocorre com a gravidade
(forças de volume ou de campo), e em suas superfícies,
como a pressão atmosférica (forças de superfície ou de
contato). Se considerarmos esses corpos como meios
contínuos, então será possível conhecer a forma como
eles reagem a essas forças. Assim, a determinação das
condições internas do corpo, em resposta às forças externas, é o campo de estudo da mecânica do contínuo.10
Quer dizer, essa abrange o comportamento dos sólidos
e fluidos em uma escala na qual as suas propriedades
físicas (massa, momento, energia, velocidade, acelera68
ção, tensão, estiramento, deformação etc.) podem ser
definidas para cada ponto do corpo.12,16,43
Porém, o que é um ponto do corpo material? Imaginemos, por exemplo, um líquido como a água. Acreditemos que essa está constituída de pequenas partes,
todas elas contínuas umas com as outras, sem espaços
vazios entre elas, e as denominemos elementos do
fluido (tal como gotas que quando unidas formam um
corpo de água). Convenhamos agora que cada elemento
do fluido (cada gota) é excessivamente grande para a
escala microscópica e infinitamente pequeno para a
escala macroscópica. A primeira condição é necessária
para assegurar que cada elemento (cada gota) contenha
uma quantidade grande de moléculas do líquido, que
garantam seu comportamento como tal, e a segunda é
indispensável para tratar cada elemento do fluido como
um ponto da escala macroscópica. Eis um exemplo,
considere um milímetro cúbico de ar. Ele contém 1016
moléculas. Se definirmos um elemento de ar como
o volume de uma milionésima parte do milímetro
cúbico, esse elemento ainda estará constituído de 1010
moléculas; isso ainda é excessivamente grande para a
escala microscópica, assegurando que o elemento se
comporte como o ar, porém suficientemente pequeno
para que uma milionésima parte do milímetro cúbico
possa ser tratada como um ponto na escala macroscópica (Figura 1).
1/106
Escala macroscópica
1 cm3
Escala microscópica
1010
Figura 1 – Definição de ponto em um meio contínuo.
Generalizemos a ideia anterior. O tratamento de um
corpo material como um meio contínuo é razoavelmente
aplicado quando a relação δ/λ << 1,43 onde δ é a escala
da microestrutura e λ é a escala do problema físico de
interesse. Se se estiver interessado nas forças às quais
células endoteliais estão submetidas secundariamente
ao fluxo, a escala é de μm para as células endoteliais
(microestrutura) e mm para o problema físico (parede
arterial). Portanto, a relação δ/λ é μm / mm ≈ 0,001, o
que torna a hipótese do contínuo uma proposta razoável.
De maneira similar, se o interesse recair na velocidade
Meios contínuos em neurocirurgia
Ortiz-Velázquez RI e col
Arq Bras Neurocir 28(2): 62-73, junho de 2009
da parte central do fluxo em uma artéria, a escala, uma
vez mais, é de μm para a microestrutura (diâmetro das
células vermelhas) e de mm para o problema físico (diâ­
metro arterial), assim δ/λ << 1. Contudo, essa situação
difere no capilar, onde δ/λ ≈ 1, já que os diâmetros do
eritrócito e capilar são aproximadamente iguais (5-8
μm). Portanto, nesse caso a hipótese do contínuo não
resulta aplicável. Assim, a pertinência de uma abordagem fundamentada na hipótese do contínuo dependerá
do desenho experimental.
Como mencionado, sob a hipótese do contínuo é
possível definir propriedades locais para cada ponto do
corpo e encontrar as quantidades físicas de interesse (estresse, deformação etc.) também para cada ponto. Isso
indica, por outra parte, que as equações governantes do
problema são equações de ponto, tendo, portanto, de
ser resolvidas para cada ponto do corpo. Para exemplificar a importância do anterior, pensemos no problema
do fluxo sanguíneo. A condição de não deslizamento
parece contrariar a evidência experimental de que, na
circulação, estase sanguínea é sinônimo de trombose.
Contudo, o conflito se resolve ao reconhecer que a condição de contorno é uma condição de ponto e, portanto,
um eritrócito ou uma plaqueta, por exemplo, estão em
repouso no ponto em que eles interagem com a parede,
satisfazendo a condição. Todavia, somente naquele
ponto o repouso é uma condição. O resto da superfície,
constituída de inúmeros pontos em movimento, provoca
seu deslocamento (o rolling observado na microscopia
intravital) e, consequentemente, não existe contradição
entre a condição de não deslizamento e os princípios de
Virchow. Por outro lado, resulta evidente a necessidade
de técnicas de cômputo para a resolução desse tipo de
problema, pois é possível contar os pontos do corpo por
milhares ou milhões.
Passemos agora a alguns aspectos formais. O
conceito de contínuo deriva da matemática.10 Nessa,
o sistema dos números reais é um contínuo, pois entre
quaisquer dois números reais (diferentes) que escolhamos existe uma infinidade de outros números reais que
preenchem o intervalo da reta numérica, limitado pelos
números inicialmente considerados, sem que existam
descontinuidades ou buracos. Intuitivamente, o tempo
é um contínuo e, por isso, pode ser representado por um
sistema de números reais, pois é possível encontrar para
cada instante do tempo um instante precedente e outro
subsequente que preencham a linha do tempo, como os
números reais preenchem a reta numérica. Da mesma
maneira, o espaço tridimensional pode ser representado
por um contínuo constituído de trios ordenados de números reais (x, y, z). Assim, definir um problema, que
varia no espaço e no tempo, é definir um problema do
contínuo tetradimensional.
Meios contínuos em neurocirurgia
Ortiz-Velázquez RI e col
Estendendo o conceito do contínuo à matéria, podemos definir a distribuição contínua da matéria no espaço
mediante o conceito de densidade. Considerando que a
quantidade de matéria é medida pela massa e assumindo
que certa quantidade de matéria ocupa certo espaço Vo,
escolhemos um ponto P qualquer do espaço Vo e definimos uma sequência de subespaços progressivamente
menores de Vo que se acercam ou convergem em P e que
denominamos V1, V2, V3, . . . Vn – 1, Vn (Figura 2).
V0
V1
V2
V3
M2
M3
P
M1
M0
No espaço ocupado por Vo, a sequência de subespaços V1, V2, V3, . . .Vn – 1, Vn que
convergem no ponto (P) permite definir a série de razões Mo/ Vo, M1/ V1, M2/ V2,....
Mn – 1/ Vn – 1, Mn/ Vn entre a massa (M) e o volume (V) de cada subespaço. No limite,
quando o número de subespaços cresce indefinidamente (Vn→∞), a razão Mn/ Vn
define a densidade de massa no ponto (P).
Figura 2 – Conceito de densidade em um meio contínuo.
Se chamarmos o volume de Vn como Vn , e a massa
da matéria contida em Vn como Mn , podemos formar
a razão Mn/ Vn à qual denominamos densidade. Continuemos a fazer que Vn se aproxime de P progressivamente, fazendo Vn infinitas vezes menor até que seu
valor seja próximo de zero. Esse processo, denominado
passo ao limite, gera um valor (limite) da densidade
que chamamos densidade da distribuição de massa no
ponto P e que, abreviadamente, pode-se escrever como
ρ (P). Se a densidade pode ser definida dessa maneira,
em qualquer ponto de Vo a massa estará distribuída de
maneira contínua. Uma abordagem similar é usada para
definir a densidade de momento e de energia. Assim,
um material, um corpo, um meio é um contínuo se a
densidade de massa, de momento e de energia existirem
nesse sentido matemático. Sem embargo, essa definição
matemática do contínuo não pode ser satisfeita por
sistemas do mundo real.10 Por exemplo, um gás não
satisfaz a condição matemática de um meio contínuo
se Vn se tornar menor que a distância média entre as
moléculas. Da mesma forma, nenhum organismo, tecido ou célula pode satisfazer o critério matemático do
contínuo. Por isso, Fung10-12 propõe uma definição do
meio contínuo similar ao conceito matemático, exceto
pelo tamanho permitido de Vn, o qual nunca pode ser
69
Arq Bras Neurocir 28(2): 62-73, junho de 2009
menor que o tamanho das partículas das quais está
constituído o material.
Uma vez que se decidiu que um corpo material
(sólido ou fluido) pode ser descrito como um contínuo,
é possível realizar uma cópia geométrica abstrata, no
sentido matemático da definição do contínuo, quer
dizer, uma cópia isomórfica em relação ao sistema dos
números reais. Isso significa que cada ponto do corpo
corresponde a um ponto do espaço euclidiano, que é
identificado mediante um e somente um trio (x, y, z) de
números reais, formando-se uma cópia ideal do corpo
no espaço tridimensional (Figura 3). Essa idealização
da matéria tem as seguintes características:
• A densidade de massa do sistema idealizado é
a mesma que a do sistema real.
• O conjunto de forças aplicadas em ambos os
sistemas (ideal e real) gera o mesmo estresse e
deformação.
• As equações constitutivas do sistema real
são utilizadas para descrever as propriedades
mecânicas do sistema ideal.
• O sistema real satisfaz as equações de movimento, continuidade e balanço da energia do
sistema ideal com erros cujos limites podem
ser calculados.
P0
Z
Z0
P
X0
X
Y0
Em uma cópia isomórfica em relação aos números reais, cada ponto do
corpo (p) corresponde a um ponto (Po) do espaço tridimensional que, por
sua vez, é identificado pelas suas coordenadas (Xo, Yo, Zo).
Figura 3 – Cópia ideal de um meio contínuo.
A vantagem de idealizar o corpo se encontra na
facilidade de cálculo, pois a determinação de estresse
e deformações pode realizar-se de maneira rigorosa na
cópia isomórfica. Entretanto, no corpo real há limitações
experimentais de tamanho e variabilidade estatística
que, por outra parte, sempre deverão ser avaliadas.31
Por outro lado, tratando de equações constitutivas,
se essas forem as mesmas para valores consecutivos de
tamanho do corpo, então, a cópia abstrata tem somente
uma equação constitutiva em todas as escalas de tamanho. De maneira recíproca, se as equações constitutivas
do corpo são diferentes para diferentes intervalos de
valores de tamanho, então a cópia abstrata também tem
70
diferentes equações constitutivas para esses mesmos
valores de tamanho. Essa é uma característica útil,
pois permite estudar diferentes estruturas do corpo e
seu comportamento em diferentes dimensões de observação, o que facilita o entendimento das partes e do
todo. Essa hierarquia nas equações constitutivas está
relacionada ao grau de similaridade da estrutura do
corpo em todos os seus níveis. Por exemplo, a estrutura
geométrica do material pode ser fractal, quer dizer,
autossimilar em sucessivos limites de valores do tamanho ou, pelo contrário, ser completamente aleatória.
Se considerarmos o padrão geométrico das vias aéreas
dos grandes brônquios até os pequenos bronquíolos, a
estrutura é fractal e pode-se esperar que os bronquíolos
obedeçam às mesmas equações constitutivas. Porém, o
padrão alveolar não é fractal e as propriedades mecânicas dessa escala necessitam de descrições completamente diferentes. Assim, a escala de observação muda
não somente a aparência do objeto, como também seu
comportamento e, dependendo da propriedade que se
deseja pesquisar, é possível considerar o corpo de estudo
com diferentes hierarquias constitutivas.
Finalmente, mencionaremos que a mecânica do
contínuo tem como axiomas os mesmos da física
(leis do movimento de Newton, leis de conservação
etc.).10-12,16,17,23,31,45 Porém, existem três axiomas adicionais, próprios da mecânica do contínuo:
• Em um corpo ou meio contínuo, duas partículas que são vizinhas em um período de tempo
se mantêm vizinhas em todos os tempos. É
importante notar que isso não significa que o
corpo não possa fraturar-se ou dividir-se. Porém
as superfícies de fratura ou de divisão se convertem em novas superfícies externas. Assim,
nos organismos o crescimento ou a reabsorção
tissular que incrementam ou diminuem a massa
criam novas superfícies no corpo.
• O estresse e a deformação podem ser definidos
em qualquer ponto do corpo.
• O estresse em um ponto está relacionado à
deformação e à velocidade de deformação no
mesmo ponto. Entretanto, a relação de estressedeformação é influenciada por outros parâme­
tros como temperatura, carga elétrica etc. Não
obstante, esses podem ser estudados de maneira
independente.
Estresse
Voltemos ao conceito de densidade material e reconsideremos o ponto P no espaço Vo e a mesma sequência
de subespaços V1, V2, V3, . . . .Vn – 1, Vn em Vo com seus
Meios contínuos em neurocirurgia
Ortiz-Velázquez RI e col
Arq Bras Neurocir 28(2): 62-73, junho de 2009
volumes correspondentes V1, V2, V3, . . . .Vn – 1, Vn , cada
um envolvendo P (Figura 2). Assim, segundo Fung,10
quando o número de subespaços cresce e tende ao infinito (n→∞), o valor de Vn se aproxima de um valor ω
e a sequência das sucessivas razões Mn/ Vn tem como
valor limite o valor ρ (com uma variabilidade aceitável
ε), se e somente se:
portanto, a força atuando em um ponto da superfície e
pode ser escrita como:
T=
dF
dS
+
p–
Mn
Vn
<ε
ΔS
(n→∞)
ΔS
ΔF
ΔF
Então, ρ é a densidade do material no ponto P, com
uma aceitável variabilidade ε, em um limite definido
de volume ω. Assim, e da mesma forma, é possível
definir o momento dos pontos por unidade de volume
(densidade de momento) ou pela energia (densidade
de energia). Porém, se a variável de interesse é a força
atuando na superfície do corpo, e o valor limite da força
por unidade de área existe para cada ponto da superfície,
esse limite é denominado tensão, tração ou estresse, e o
conjunto das trações ou tensões, em todas as direções
da superfície, é conhecido como tensor das tensões ou
tensor de Cauchy.
Dada a importância do conceito de tensão, passamos
a desenvolvê-lo com maior detalhe. Consideremos um
corpo qualquer, por exemplo, uma artéria ocupando
uma região do espaço. Imaginemos agora que no
interior da artéria possamos limitar uma superfície
por uma fronteira, em matemática denominada superfície fechada (Figura 4). Obviamente, algum tipo
de interação deverá existir entre o material em ambos
os lados dessa superfície. Passemos a analisar um aspecto fundamental dessa interação. Pensemos em uma
pequena parte da superfície em questão e a nomeemos
de “ΔS”. Desenhemos, desde um ponto qualquer de
“ΔS”, um vetor perpendicular de magnitude igual a 1
e apontando para fora (vetor normal unitário) que nos
permita saber qual é a orientação da superfície. Assim,
o vetor nos ajuda a distinguir os dois lados da superfície
“ΔS”. Por conveniência, deixemos que o lado para o
qual o vetor está dirigido seja chamado lado positivo.
Consideremos agora a matéria situada no lado positivo
de “ΔS”. Essa exerce uma força na matéria situada no
lado negativo de “ΔS” que denominamos ΔF. Então,
podemos esperar que a magnitude, direção e sentido
da força ΔF dependa do tamanho e localização da área
e da orientação da superfície “ΔS”. A continuação,
permitamos que “ΔS” diminua de tamanho até que
a razão entre ΔF/“ΔS” tenda para o valor limite dF/
dS. O valor desse limite é uma quantidade vetorial ou
vetor, quer dizer, tem magnitude, direção e orientação
e a chamaremos de vetor de tração ou vetor de tensão.
O vetor de tensão ou simplesmente tensão representa,
Meios contínuos em neurocirurgia
Ortiz-Velázquez RI e col
ΔS
ΔF
T = dF/dS
ΔS
ΔS
ΔF
ΔS
ΔF
ΔF
O valor limite (dF/dS) da razão entre ΔF/ΔS é um vetor que representa a
relação força/área, atuando em um ponto da parede arterial, denominado
vetor de tensão ou simplesmente tensão.
Figura 4 – Vetor de tensão, tração ou estresse.
A descoberta de que para qualquer superfície fechada “S” de um meio contínuo existe um campo de
tensões, cuja ação sobre a matéria que ocupa o espaço
situado no lado interno de S é equipolente à ação da
matéria exterior à mesma superfície, é conhecida como
o princípio das tensões de Euler e Cauchy.10-12,16,17,43
Em outras palavras, na superfície de um corpo, ou na
interface de dois corpos, a tensão atuando na superfície
deverá ser a mesma em ambos os lados. Isso constitui
mais um axioma na mecânica dos meios contínuos
porquanto permite definir a interação entre as partes
dos corpos.
Desse modo, podemos comprovar que os termos
estresse e tensão são usados de maneira intercambiável
e, dado que expressam a razão entre a força aplicada
e a área de aplicação (relação força/área), sua unidade
é a mesma da pressão: o pascal (1 N/m2). Assim, a
tensão pode-se entender como a intensidade das forças que atuam dentro do corpo como reação às forças
externas aplicadas (forças de superfície ou contato e de
volume ou campo). Para seu estudo, dividem-se suas
componentes ortogonais em: shear stress ou tensão
de cisalhamento, que corresponde à força tangencial
à superfície, e tensão normal ou força perpendicular
à superfície (Figura 5). Um tipo de estresse uniforme
com o qual nós, médicos, estamos acostumados é a
pressão. Um estresse uniforme é uma tensão na qual
a força atua igualmente em todas as direções. Porém,
71
Arq Bras Neurocir 28(2): 62-73, junho de 2009
pode ocorrer a tensão não ser igual em todas as direções
(estresse diferencial). O estresse, em termos gerais, não
é fácil de mensurar de maneira direta. Entretanto, como
estabelecido pelos axiomas do contínuo, ele pode ser
inferido se forem conhecidas as propriedades mecânicas
do material (equações constitutivas) e a magnitude do
estiramento que condiciona a força aplicada.10
Tensão normal
Tensão de cisalhamento
(shear stress)
material). Assim, os corpos podem ser divididos em
duas classes, dependendo de seu comportamento sob
tensão: materiais quebradiços (que apresentam uma
região de comportamento elástico variável, porém
somente uma região pequena de comportamento dúctil
antes da fratura) e materiais dúcteis (que apresentam
somente uma pequena região de comportamento
elástico e uma região grande de comportamento dúctil
antes da fratura).
Com base no comportamento do material sob tensão resulta evidente que existem diferentes classes de
aneurismas e placas de ateroma. Porém, quais são as
bases da diferença entre aneurismas pequenos e placas
instáveis, de comportamento quebradiço e aneurismas
grandes e placas estáveis, de comportamento dúctil, é
uma pergunta que ainda espera por resposta, e estudos
de mecânica de meios contínuos são indispensáveis
para atingi-la.
Referências
Estiramento
Compressão
Na tensão normal, a força atua perpendicularmente à superfície. Na
tensão de cisalhamento (shear stress) a força é tangente à superfície.
Observe-se que a tensão condiciona estiramento e
compressão, além do cisalhamento.
1.
2.
Figura 5 – Tensões.
3.
Brevemente, pois será tema do seguinte artigo desta
série, podemos definir o estiramento como a expressão
geométrica da deformação causada pela tensão.10-13,15-17,
20,23,31,33,40,43
Portanto, expressa a mudança do tamanho
ou da forma. A deformação origina-se quando as partículas ou elementos materiais (moléculas, átomos etc.)
que formam o corpo são forçadas a deslocar-se de sua
posição original em resposta à tensão. Assim, a tensão
ou o estresse está para a força como o estiramento está
para a deformação. O estiramento também pode ser
dividido em seus componentes ortogonais: estiramento
normal e tangencial com base nas forças que causam
a deformação. O estiramento normal é secundário às
forças perpendiculares, ao plano ou à área de secção
transversa do material e o estiramento tangencial (shear
strain) é causado pelas forças tangenciais à superfície
do corpo.
Quando um corpo é submetido ao estresse passa
por três sucessivos níveis de deformação: deformação
elástica (quando o estiramento é reversível), deformação dúctil (quando o estiramento é irreversível)
e fratura (estiramento irreversível com ruptura do
72
4.
5.
6.
7.
8.
9.
10.
Acevedo-Bolton G, Jou LD, Dispens BP, Lawton MT, Higashida RT, Martin AJ, et al. Estimating the hemodynamic
impact of interventional treatments of aneurysms: numerical simulation with experimental validation: technical case
report. Neurosurgery. 2006;59:E429-30.
Baoshun M, Harbaugh RE, Raghavan ML. Three-dimensional geometrical characterization of cerebral aneurysms.
Ann Biomed Eng. 2005;32:264-73.
Burattini R, Di Salvia PO. Development of systemic arterial mechanical properties from infancy to adulthood interpreted by four-element windkessel models. J Appl Physiol.
2007;103:66-79.
Castro MA, Putman CM, Cebral JR. Patient-specific computational modeling of cerebral aneurysms with multiple
avenues of flow from 3D rotational angiography images.
Acad Radiol. 2006;13:811-21.
Cebral JR, Castro MA, Burgess JE, Pergolizzi RS, Sheridan
MJ, Putman CM. Characterization of cerebral aneurysms for
assessing risk of rupture by using patient-specific computational hemodynamics models. AJNR. 2005;26:2550-9.
Davies PF, Mundel T, Barbee KA. A mechanism for heterogeneous endothelial responses to flow in vivo and in vitro.
J Biomech. 1995;28:1553-60.
Davies PF, Zilberberg J, Helmke BP. Spatial microstimuli in
endothelial mechanosignaling. Circ Res. 2003;92:359-70.
Ford MD, Lee SW, Lownie SP, Holdsworth DW, Steinman
DA. On the effect of parent-aneurysm angle on flow patterns
in basilar tip aneurysms: Towards a surrogate geometric
marker of intra-aneurismal hemodynamics. J Biomech.
2008;41:241-8.
Frauenfelder T, Boutsianis E, Schertler T, Husmann L,
Leschka S, Poulikakos D, et al. Flow and wall shear
stress in end-to-side and side-to-side anastomosis of venous coronary artery bypass grafts. Biomed Eng Online.
2007;26:35-9.
Fung YC. A first course in continuum mechanics. New
Jersey: Prentice Hall; 1994.
Meios contínuos em neurocirurgia
Ortiz-Velázquez RI e col
Arq Bras Neurocir 28(2): 62-73, junho de 2009
11.
12.
13.
14.
15.
16.
17.
18.
19.
20.
21.
22.
23.
24.
25.
26.
27.
28.
Fung YC. Biomechanics: circulation. New York: Springer;
1997.
Fung YC. Biomechanics: mechanical properties of living
tissues. New York: Springer; 2004.
Grotberg JB, Jensen OE. Biofluid mechanics in flexible
tubes. Annu Rev Fluid Mech. 2004;36:121-47.
Han HC, Marita S, Ku DN. Changes of opening angle in hypertensive and hypotensive arteries in 3-day organ culture.
J Biomech. 2006;39:2410-18.
Holzapfel GA, Weizsacker HW. Biomechanical behavior of
the arterial wall and its numerical characterization. Comput
Biol Med. 1998;28:377-92.
Humphrey JD. Cardiovascular solid mechanics: cells, tissues, and organs. New York: Springer; 2002.
Humphrey JD, Delange SL. An introduction to biomechanics:
solids and fluids, analysis and design. New York: Springer;
2004.
Jankowski P, Bilo G, Kawecka-Jaszcz K. The pulsatile
component of blood pressure: its role in the pathogenesis
of atherosclerosis. Blood Press. 2007;16:238-45.
Jou LD, Wong G, Dispensa B, Lawton MT, Higashida RT,
Young WL, et al. Correlation between lumenal geometry
changes and hemodynamics in fusiform intracranial aneurysms. AJNR. 2005;26:2357-63.
Kassab GS. Biomechanics of the cardiovascular system:
the aorta as an illustratory example. J R Soc Interface.
2006;3:719-40.
LaDisa JF Jr, Olson LE, Douglas HA, Warltier DC, Kersten
JR, Pagel PS. Alterations in regional vascular geometry
produced by theoretical stent implantation influence distributions of wall shear stress: analysis of a curved coronary
artery using 3D computational fluid dynamics modeling.
Biomed Eng Online. 2006;5:40-58.
LaDisa JF Jr, Olson LE, Guler I, Hettrick DA, Kersten JR,
Warltier DC, et al. Circumferential vascular deformation after
stent implantation alters wall shear stress evaluated with
time-dependent 3D computational fluid dynamics models.
J Appl Physiol. 2005;98:947-57.
Li JK-J. Dynamics of the vascular system. Singapore: World
Scientific Publishing; 2004.
Li YS, Haga JH, Chien S. Molecular basis of the effects
of shear stress on vascular endothelial cells. J Biomech.
2005;38:1949-71.
Liu YS, Kassab GS. Vascular metabolic dissipation in Murray’s
law. Am J Physiol Heart Circ Physiol. 2007;292:H1336-9.
Martinez TLR, Santos RD, Armaganijan D, Torres KP,
Loures-Vale A, Magalhães ME, et al. National alert campaign about increased cholesterol: determination of cholesterol levels in 81,262 Brazilians. Arq Bras Cardiol [serial
on the Internet]. 2003;80:635-8. Disponível em : http://www.
scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0066-782X2003000600006&lng=en&nrm=iso. doi: 10.1590/S0066782X2003000600006.
Brasil. Ministério da Saúde. Uma análise da desigualdade
em saúde. Série G. Estatística e informação em Saúde.
Brasília, DF: Brasil; 2006.
Murray C. The physiological principle of minimum work: I.
The vascular system and the cost of blood volume. Proc
Natl Acad Sci. 1926;12:207-14.
Meios contínuos em neurocirurgia
Ortiz-Velázquez RI e col
29.
30.
31.
32.
33.
34.
35.
36.
37.
38.
39.
40.
41.
42.
43.
44.
45.
46.
Murray C. The physiological principle of minimum work:
II. Oxygen exchange in capillaries. Proc Natl Acad Sci.
1926;12:299-304.
Murray C. The physiological principle of minimum work applied to the angle of branching of arteries. J Gen Physiol.
1926;9:835-41.
Nichols WW, O’Rourke MF. McDonald’s blood flow in arteries: theoretical, experimental and clinical principles. London:
Oxford University Press; 2005.
Painter PR, Edén P, Bengtsson HU. Pulsatile blood flow,
shear force, energy dissipation and Murray’s Law. Theor
Biol Med Model. 2006;21:3-31.
Pena E, Martinez MA, Calvo B, Doblaré M. On the numerical treatment of initial strains in biological soft tissues. Int J
Numer Meth Eng. 2006;68:836-60.
Qin K, Jiang Z, Sun H, Gong K, Liu Z. A multiscale model for
analyzing the synergy of CS and WSS on the endothelium
in straight arteries. Acta Mech Sinica. 2006;2:76-83.
Rosen R. Optimality principles in biology. Great Britain:
Butterworth & Co. Publishers Ltd.; 1967.
Rossitti S. Energetic and spatial constraints of arterial networks. Arq Neuropsiquiatr. 1995;53:333-41.
Satcher RLJ, Bussolari SR, Gimbrone MAJ, Dewey CFJ.
The distribution of fluid forces on model arterial endothelium using computational fluid dynamics. J Biomech Eng.
1992;14:309-16.
Shojima M, Oshima M, Takagi K, Torii R, Hayakawa M,
Katada K, et al. Magnitude and role of wall shear stress
on cerebral aneurysm: computational fluid dynamic study
of 20 middle cerebral artery aneurysms. Stroke. 2004;
35:2500-5.
Thompson DAW. On growth and form. United Kingdom:
Cambridge University Press; 1961.
van de Vosse FN. Mathematical modelling of the cardiovascular system. J Eng Math. 2003;47:175-83.
Westerhof N, Stergiopulos N, Noble MIM. Snapshots of
hemodynamics. New York: Springer; 2005.
Zalba G, Fortuño A, San José G, Moreno MU, Beloqui O,
Díez J. Oxidative stress, endothelial dysfunction and cerebrovascular disease. Cerebrovasc Dis. 2007;241:24-9.
Zamir M. The physics of pulsatile flow. New York: SpringerVerlag; 2000. p.220.
Zamir M. The role of shear forces in arterial branching. J
Gen Physiol. 1976;67:213-22.
Zamir M. Optimality principles in arterial branching. J Theor
Biol. 1976;62:227-51.
Zarins CK, Giddens DP, Bharadvaj BK, Sottiurai VS, Mabon
RF, Glagov S. Quantitative correlation of plaque localization
with flow velocity profiles and wall shear stress. Circ Res.
1983;53:502-14.
Original recebido em março de 2008
Aceito para publicação em setembro de 2008
Endereço para correspondência
Rogelio Iván Ortiz-Velázquez
Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 255 – 3º andar
05403-001 – São Paulo, SP, Brasil
E-mail: [email protected]
73
Arq Bras Neurocir 28(2): 74-80, junho de 2009
Meningiomas do forâmen magno
Revisão da literatura
Danilo Otávio de Araújo Silva¹, Leonardo Ferraz Costa¹, Matheus Augusto Pinto
Kitamura¹, Joacil Carlos da Silva2, Hildo Rocha Cirne de Azevedo Filho3
Serviço de Neurocirurgia do Hospital da Restauração, Recife
RESUMO
Contexto: Os meningiomas do forâmen magno são patologias raras e representam um dos mais desafiantes
tumores do sistema nervoso central em relação ao seu tratamento cirúrgico. Sua frequência varia na literatura
em torno de 3% dos meningiomas. Podem ser classificados como ventrais, ventrolaterais e dorsais. Tal
classificação é importante, pois define a abordagem cirúrgica a ser utilizada. Objetivo: Revisão dos aspectos
clínicos e terapêuticos desse raro e intrigante tumor. Método: Pesquisa eletrônica no PubMed (www.
pubmed.com) utilizando as seguintes palavras-chave: meningioma do forâmen magno e acesso extremo
lateral. Foram revisados dados de trabalhos do período de 1987 a 2008. Também foi realizada pesquisa
das publicações mais citadas em relação ao tema. Artigos com dados clínicos incompletos não foram
analisados. Resultados: Como todos os meningiomas, são mais frequentes no sexo feminino. Possuem
uma apresentação clínica variável. O diagnóstico precoce é mandatório a fim de se atingir os melhores
resultados terapêuticos. O tratamento de eleição, definido pela maioria dos autores, é o cirúrgico, embora
a radiocirurgia estereotáxica esteja despontando como uma das possibilidades terapêuticas. A maioria das
séries publicadas relata uma taxa de ressecção total em torno de 70% dos casos. Conclusões: A melhor
opção terapêutica, até o presente momento, é a remoção cirúrgica do tumor. A abordagem ideal ainda não
está estabelecida como um consenso, embora esteja se direcionando para o acesso extremo lateral e suas
variantes segundo a maioria dos autores. A embolização pré-operatória tem o seu papel definido e deve
ser utilizada sempre que possível. A radiocirurgia estereotáxica pode ser uma opção terapêutica para um
grupo seleto de pacientes. O diagnóstico precoce continua sendo a melhor arma de todo esse arsenal para
que os pacientes desfrutem de um bom resultado terapêutico e evoluam com um prognóstico favorável. Em
virtude da complexidade de sua localização anatômica, é necessário o amplo conhecimento da anatomia
dos acessos de base de crânio, em especial o acesso extremo lateral e suas variantes.
PALAVRAS-CHAVE
Meningioma. Forâmen magno. Acesso extremo lateral.
ABSTRACT
Foramen magnum meningiomas. Literature review
Context: Foramen magnum meningiomas are rare diseases and represent one of the most challenging tumors of
the central nervous system for its surgical treatment. Its frequency varies in the literature corresponding to about
3% of all meningiomas. They are classified as ventral, ventrolateral and dorsal. This classification is important
because it defines the surgical approach to be used. Objective: Literature review of clinical and therapeutic
aspects of this rare and puzzling tumor. Method: An electronic search in PubMed (www.pubmed.com) using
the following keywords: meningioma of the foramen magnum and extreme lateral access. We reviewed data
from studies published during the period of 1987 to 2008. We also carried out research into the publications
cited in the articles. Articles with incomplete clinical data were not analyzed. Results: Like all meningiomas
they are more common in women. They have a variable clinical presentation. Early diagnosis is mandatory in
order to achieve the best therapeutic results. The treatment of choice, as defined by most authors, is surgery,
while stereotactic radiosurgery is emerging as one of the therapeutic possibilities. Most published series report a
total resection rate of around 70%. Conclusions: The best therapeutic option, so far, is the surgical removal of
the tumor. The ideal approach is not yet established as a consensus, although it is moving toward the extreme
lateral access and its variants according to most authors. The preoperative embolization has its defined role
and should be used whenever possible. The stereotactic radiosurgery may be a therapeutic option for a select
group of patients. Early diagnosis remains the best factor to achieve a good outcome and a favorable prognosis.
Due to the complexity of its anatomical location, one must have extensive knowledge of the anatomy of the
skull base, especially that concerning with the extreme lateral access and its variants.
KEY WORDS
Meningioma. Foramen magnum. Extreme lateral approach.
1 Residentes do Serviço de Neurocirurgia do Hospital da Restauração, Recife.
2 Neurocirurgião do Hospital da Restauração, Recife.
3 Chefe do Serviço de Neurocirurgia do Hospital da Restauração, Recife.
Arq Bras Neurocir 28(2): 74-80, junho de 2009
Introdução
Meningiomas são uns dos tumores mais frequentes
que acometem o sistema nervoso central (SNC). Séries
clínicas indicam que 20% dos tumores cerebrais são
meningiomas, enquanto séries de autópsia mostram
uma incidência de até 30%.39 São tumores que derivam
das células meningoteliais aracnoideas, geralmente são
benignos (grau I OMS); contudo podem ter comportamento mais agressivo, sendo classificados como grau II
(atípico), cerca de 7% dos casos, ou grau III (anaplásico
ou maligno), 3% dos casos.14 Sabe-se que sua incidência
no sexo feminino em relação ao masculino é de 2:1
para os meningiomas cerebrais e de até 10:1 para os
espinhais.14 São mais frequentes em adultos e idosos,
sendo rara sua apresentação na infância.39
Os meningiomas localizados no forâmen magno
(MFM) são raros e representam uns dos mais desafiantes tumores do SNC em relação ao seu tratamento
cirúrgico. Sua frequência é estimada em torno de 3%
dos meningiomas.3 São classificados como ventrais,
ventrolaterais e dorsais.3 Tal classificação é importante, pois define a abordagem cirúrgica a ser utilizada.
Possuem apresentação clínica variável. O diagnóstico
precoce é mandatório a fim de se atingir os melhores
resultados terapêuticos. O tratamento de eleição, definido pela maioria dos autores, é o cirúrgico, embora a
radiocirurgia estereotáxica esteja despontando como
uma das possibilidades terapêuticas. A maioria das
séries publicadas relata uma taxa de ressecção total em
torno de 70% dos casos. Por causa da complexidade
de sua localização anatômica, é necessário o amplo
conhecimento da anatomia dos acessos à base de crânio,
em especial o acesso extremo lateral e suas variantes.
A presente revisão da literatura tem como objetivo
expor os aspectos clínicos e terapêuticos dessa rara e
intrigante patologia.
Método
Esta revisão de literatura foi realizada por meio de
pesquisa eletrônica no PubMed (www.pubmed.com)
utilizando as seguintes palavras-chave: meningioma
do forâmen magno e acesso extremo lateral. Foram
revisados dados de trabalhos do período de 1987 a
2008. Também foi realizada pesquisa das publicações
mais citadas em relação ao tema. Os artigos com dados
clínicos incompletos não foram analisados.
Os dados considerados mais importantes são apresentados nesta revisão.
Meningiomas do forâmen magno
Silva DOA e col
Apresentação clínica
Os meningiomas são tumores de crescimento lento,
assim produzem sintomatologia insidiosa na grande
maioria dos casos.39 Quando localizados no forâmen
magno, essa regra se repete. Os tumores de localização
anterior ou ventral, que são aqueles situados anteriormente ao primeiro ligamento denteado e aos nervos cranianos baixos (IX, X, XI, XII), bilateralmente no plano
coronal, têm apresentação clínica diferente daqueles
classificados como de localização dorsal.2,3,8,19,40 É importante frisar que a maioria dos MFM é do tipo ventral,
correspondendo a 68% a 98% dos casos.3,18,19,40
O quadro clínico mais frequente na maioria das
publicações é a associação de sinais de longas vias,
principalmente motores, como tetraplegia, tetraparesia ou hemiparesia espástica, disestesia e diminuição da sensibilidade global em graus variados,
com déficits dos nervos cranianos IX, X, XI, XII
uni ou bilateral­­men­te.2,3,7,8,10,16,18,19,23,27,31,40,45,48 Outras
manifestações clínicas importantes são distúrbios
da marcha e cefaleia que, no caso dos tumores dorsais, têm a característica de ser occiptocervical.7,23,48
Os pacientes também podem apresentar-se apenas com
queixa de torcicolo, cervicalgia e dispneia; esta última
já podendo representar insuficiência respiratória.23,48
Os distúrbios esfincterianos podem estar presentes
em até 20% dos casos.41 Um dado interessante no
exame clínico desses pacientes é observar a atrofia
da musculatura interóssea das mãos.10
Alguns autores, no entanto, publicaram manifestações clínicas peculiares e de grande importância para
a literatura. Ahmed e cols.1 relataram o caso de um
paciente que apresentou rouquidão como sintoma único
de um MFM. Tal sintomatologia desapareceu após a
remoção cirúrgica da lesão. Sawaya42 apresentou um
paciente com quadro clínico mimetizando esclerose
lateral amiotrófica. Esse paciente evoluiu com melhora
clínica e recuperação dos déficits neurológicos após o
tratamento cirúrgico do tumor. Barnadas e cols.6 mostraram um caso no qual o primeiro sinal foi o aparecimento
de ulcerações orais traumáticas causadas por mordidas
da língua. O exame clínico desse paciente evidenciou
desvio, fasciculações e hemiatrofia do lado direito da
língua, caracterizando uma paralisia isolada do XII
nervo; a ressonância magnética (RM) evidenciou um
tumor de forâmen magno, confirmado posteriormente
como meningioma. Wörner e cols.57 reportaram um caso
de uma paciente de 54 anos com história de hipertensão
arterial com sete meses de evolução, associada a tinido,
tontura e déficit auditivo à esquerda; a RM revelou um
tumor compatível com MFM, confirmado após cirurgia
e análise histopatológica; o tratamento cirúrgico do
tumor foi realizado e a paciente apresentou melhora da
75
Arq Bras Neurocir 28(2): 74-80, junho de 2009
sintomatologia, inclusive da hipertensão arterial, após
oito meses de evolução pós-operatória. Tsao e cols.53
relataram um caso que reflete a importância do exame
neurológico em pacientes com disfagia: a paciente
com 58 anos de idade apresentava história de disfagia
progressiva havia 18 meses; os exames endoscópicos do
aparelho gastrintestinal não revelaram anormalidades;
a semiologia neurológica flagrou diminuição da sensibilidade distal bilateral nas extremidades, hiper-reflexia
e alteração da marcha; a laringoscopia e a videofluoroscopia revelaram marcante disfunção hipofaríngea;
após ser diagnosticado um MFM por RM, o tratamento
cirúrgico foi realizado com resolução quase completa
dos sintomas.
Diagnóstico por imagem
A tecnologia de imagem revolucionou o tratamento
das patologias neurocirúrgicas. Em especial, a RM teve
um papel inigualável em virtude do estudo anatômico
proporcionado por ela. No entanto, as estruturas ósseas
são mais bem avaliadas pela tomografia computadorizada (TC), sendo esta também de grande importância
não só no diagnóstico, mas também no planejamento
cirúrgico, principalmente nas patologias de base de
crânio.
A RM é a modalidade de escolha para a avaliação
de tumores da região do forâmen magno. Wagle e
cols.,54 já em 1987, demonstravam o potencial da RM
no diagnóstico dos MFM. Nas imagens ponderadas
em T1, geralmente, os meningiomas apresentam-se
iso ou hipointensos em relação ao tecido neural, podendo, em algumas ocasiões, ser até discretamente
hiperintensos. 10,39 Embora as imagens ponderadas
em T1 sejam ótimas para visualização das estruturas
anatômicas, a interface tumor/tecido neural não é bem
visualizada.10,39 Quando administrado o contraste de
gadolíneo, os meningiomas geralmente apresentam
uma captação homogênea ajudando a identificar o
tumor e sua base dural, onde se pode flagrar o dural
tail em alguns casos.10,39 Como a maioria dos MFM
é do tipo ventral, a base dural localiza-se na borda
occipital anterior do forâmen magno. Nas imagens
ponderadas em T2, os meningiomas apresentam-se iso
ou hiperintensos em relação ao tecido neural ao seu
redor.10,39 Deve-se avaliar detalhadamente as imagens
em T2 para visualização do plano aracnoideo entre o
tumor e o tronco cerebral.10,39 A ausência desse plano e
a presença de edema no tronco cerebral sugerem que a
superfície pial foi invadida, o que dificultará a remoção
completa do tumor.10,39
O estudo com angiografia digital ou angiorressonância é importante para avaliação das estruturas vasculares
da região do forâmen magno, em especial a relação
76
do tumor com as artérias vertebrais.10,39 A fase venosa
da angiografia é de igual importância, pois oferece
informações cruciais para o planejamento cirúrgico,
como a disposição e patência dos seios venosos durais
transverso e sigmoide.10,39
A TC de crânio é indispensável para avaliação
das estruturas ósseas. As técnicas de reconstrução da
junção crânio-cervical em 3D oferecem informações
adicionais sobre as estruturas ósseas que podem ser
ressecadas.10,39
Carvalho e cols.13 demonstraram o impacto das
informações oferecidas pela TC e RM nos resultados cirúrgicos de uma série de 70 pacientes com meningiomas
de base de crânio petroclivais. Embora esse trabalho
não avalie os MFM, ele nos oferece dados importantes
em relação à avaliação radiológica de lesões de base de
crânio. Por exemplo, sinais de infiltração tumoral ou
edema perilesional no tronco cerebral influenciaram a
extensão da remoção cirúrgica.
Tratamento
O tratamento preconizado para os MFM pela maioria dos autores é a remoção cirúrgica do tumor, podendo
esta ser total, subtotal ou parcial. Em virtude da peculiar
localização anatômica desses tumores, é mandatório o
total domínio da anatomia dos acessos de base de crânio,
em especial o acesso extremo lateral e suas variantes.
A radiocirurgia estereotáxica é uma opção terapêutica
que vem despontando há alguns anos, mas ainda sem
eficácia comprovada a longo prazo, segundo a maioria
dos autores. A embolização pré-operatória dos MFM,
quando possível de ser realizada, deve ser utilizada
como medida adjuvante para facilitar a remoção cirúrgica do tumor. As complicações pós-operatórias são
aquelas inerentes a qualquer procedimento cirúrgico, no
entanto é necessária uma especial atenção ao desenvolvimento de instabilidade da junção craniocervical após
o tratamento cirúrgico. Esses aspectos são analisados
a seguir.
Os MFM de localização ventral, de acordo com
a maioria dos autores, são mais bem abordados pelo
acesso extremo lateral. George e cols.18 publicaram uma
série de 14 tumores abordados com uma extensão lateral
do acesso suboccipital mediano clássico. Os autores
advogam que se obtém bom acesso à porção anterior
do forâmen magno com menor risco de lesão e retração
da porção inferior do tronco cerebral. Adicionalmente,
preconizam a transposição medial da artéria vertebral
para uma melhor exposição cirúrgica. Sen e col.,47 em
uma série de seis pacientes publicada em 1990, ratificaram a utilidade do acesso suboccipital extremo lateral
para ressecção de tumores ventrais do forâmen magno.
Nesse trabalho, os autores mostram que os acessos
Meningiomas do forâmen magno
Silva DOA e col
Arq Bras Neurocir 28(2): 74-80, junho de 2009
transoral e cervical posterior muitas vezes são incapazes
de proporcionar a ressecção total desses tumores sem
adicionar déficits neurológicos.
Sekhar e Javed,43 em outra série publicada em 1993,
relataram 17 casos de meningiomas do forâmen magno
e petroclivais com acometimento do sistema arterial
vértebro-basilar. Dos seis pacientes com acometimento
da artéria vertebral, a ressecção completa foi obtida
em todos; em um, a artéria vertebral foi ocluída, em
outro o vaso foi reparado e, ainda em outro, foi realizada revascularização com enxerto venoso. Nenhum
paciente evoluiu com déficit neurológico permanente.
Um paciente apresentava invasão das artérias basilar e
vertebral, onde a artéria vertebral era hipoplásica. Nesse
caso, a artéria vertebral foi ocluída e o tumor ressecado
por completo. O paciente evoluiu com piora transitória
da hemiparesia. Dos dez pacientes com acometimento
da artéria basilar, a ressecção completa só foi possível
em três casos, em cinco pacientes foi realizada remoção
subtotal (mais de 90% do volume tumoral) e, em dois,
foi retirado em torno de 70% do volume tumoral. Os
autores concluem que meningiomas com envolvimento
das artérias basilar e vertebral podem ser removidos
com sucesso com técnicas modernas de cirurgia de
base de crânio, mas o cirurgião deve exercer um bom
julgamento a respeito de quanto tumor deve ser removido em cada caso particular.
Kratimenos e Crockard.27 utilizaram o acesso extremo lateral transcondilar para tratamento cirúrgico de 15
pacientes com tumores ventrais da junção craniocervical. Em 12 casos a ressecção completa foi atingida e, em
três, foi feita remoção subtotal. Os autores acreditam
que esse acesso oferece melhor exposição da junção
bulbomedular e das estruturas vasculares, preservação
da estabilidade cervical com remoção do terço posterior
do côndilo occipital e elimina a necessidade de retração
do tecido neural.
Bertalanffy e cols.8 relataram uma série de 19 pacientes com MFM ventrais ou ventrolaterais operados
pelo acesso extremo lateral transcondilar. Nos cinco
anos de acompanhamento, a mortalidade foi nula e não
ocorreram complicações neurológicas. A ressecção total
foi obtida em 100% dos casos. Os autores reforçam
que, com a análise detalhada dos aspectos anatômicos
de cada caso, a remoção cirúrgica desses tumores pode
ser feita com sucesso.
Samii e cols.40 publicaram uma extensa série de
40 meningiomas da junção craniocervical. Os acessos
suboccipitais mediano e lateral, com abertura do forâmen magno e laminectomia dos segmentos cervicais
envolvidos, foram suficientes na grande maioria dos
casos. A remoção do terço posterior do côndilo occipital
com o uso de drill foi necessária em apenas sete casos.
As taxas de ressecção total e subtotal foram 63% e
Meningiomas do forâmen magno
Silva DOA e col
30%, respectivamente. Complicações pós-operatórias
ocorreram em 30% dos pacientes.
George e cols.,19 em outra grande série de 40 casos
de MFM, analisaram o tratamento cirúrgico desses
tumores em relação a sua localização. Os acessos
utilizados foram o suboccipital lateral em 31 casos,
suboccipital mediano em quatro casos e ântero-lateral
em cinco casos. A escolha da abordagem cirúrgica foi
feita de acordo com a localização tumoral em relação a
três aspectos: plano horizontal (anterior n = 18, lateral
n = 21, posterior n = 1); artéria vertebral (acima n = 4,
abaixo n = 20, ambos n = 16); dura-máter (intradural
n = 24, extradural n = 2, ambos n = 4). Os tumores intradurais anteriores e laterais foram operados pelo acesso
suboccipital lateral. A remoção do côndilo occipital
com drill foi feita quando os tumores localizavam-se
acima da artéria vertebral, e da massa lateral do atlas
quando o tumor localizava-se abaixo desta. Os tumores
intradurais posteriores foram abordados pelo acesso suboccipital mediano. Os meningiomas com componente
extradural foram ressecados pelo acesso ântero-lateral
isolado ou em combinação com o suboccipital mediano. A taxa de ressecção completa foi de 94% para os
tumores intradurais e de 50% para os extradurais. As
condições clínicas melhoraram em 90% dos pacientes.
Houve apenas três óbitos no pós-operatório.
Pirotte e cols.36 relataram uma série de seis casos de
MFM, na qual foram analisadas as diferentes extensões
laterais do acesso suboccipital mediano. Essas variações
incluíram condilectomia occipital parcial, transposição
da artéria vertebral e até mesmo exposição e secção
do seio sigmoide. Nessa série de pacientes, os autores
concluíram que a única maneira de se obter uma boa
exposição cirúrgica, sem retração das estruturas vitais
localizadas no nível do forâmen magno, é com a aplicação individualizada, caso a caso, do acesso extremo
lateral e suas variantes.
Na série de Banerji e cols.5 de sete tumores de base
de crânio, dos quais dois eram MFM, situados ânterolateralmente, o acesso extremo lateral transcondilar
associado à laminectomia de C1 a C3 foi utilizado com
sucesso e remoção total desses tumores. Os autores não
acreditaram ser necessária a transposição da artéria vertebral nos casos de tumores essencialmente intradurais.
Tal técnica cirúrgica foi realizada nos casos de tumores
(dois condrossarcomas) com extensão e acometimento
extradural da artéria vertebral.
Touho52 relatou um caso de MFM com acometimento da artéria cerebelar póstero-inferior em que
foi necessária a anastomose término-terminal desta
para remoção do tumor. Nesse artigo, o autor chama
a atenção para o fato de que os exames de imagem
pré-operatórios não foram capazes de diagnosticar o
envolvimento dessa artéria.
77
Arq Bras Neurocir 28(2): 74-80, junho de 2009
Arnautovic e cols.,3 em clássico artigo sobre MFM
do tipo ventral, mostraram os resultados de uma série
de 18 pacientes. A abordagem cirúrgica preferida pelos
autores foi o acesso extremo lateral transcondilar, com
remoção de, no máximo, metade do côndilo occipital,
a depender do tamanho do tumor. Em geral, realiza-se
a laminectomia de C1 e C2. Os autores advogaram a
abertura do forâmen transverso de C1 e a transposição
inferior medial da artéria vertebral. No entanto, quando
o tumor engloba essa artéria, é preferível dissecar e
remover o máximo de tecido tumoral quando existe
um plano aracnoideo entre o tumor e a artéria. Porém,
tal manobra nem sempre é possível, pois o tumor
apresenta-se, algumas vezes, aderido ao vaso. Nesses
casos, é opinião do autor que não se tente remover as
porções tumorais mais aderidas à artéria, por causa do
risco de ruptura desta. A taxa de ressecção total foi de
75%, e as de ressecção quase total e subtotal, de 12,5%
cada. As principais complicações pós-operatórias foram
déficits dos nervos cranianos IX e X. O principal fator
relacionado a bom prognóstico no pós-operatório foi
um alto escore pré-operatório na Escala de Performance
de Karnofsky (EPK). Logo, os autores enfatizaram a
necessidade do diagnóstico precoce dessas lesões. Já
na série de Gupta e cols.,23 que compreende 12 casos de
lesões anteriores e ântero-laterais do forâmen magno,
das quais os meningiomas eram maioria, não foi necessária ressecção do côndilo occipital, nem transposição
da artéria vertebral para remoção cirúrgica das lesões.
Nanda e cols.34 publicaram um importante trabalho
com análise da necessidade da remoção do côndilo
occipital, durante o acesso extremo lateral, para tratamento cirúrgico de dez pacientes com lesões anteriores
do forâmen magno, das quais seis eram meningiomas.
Realizaram também estudo comparativo com oito cadáveres. Os autores concluíram que não é necessária a
remoção, mesmo que parcial, do côndilo occipital para
a ressecção completa e segura das lesões intradurais
anteriores do forâmen magno.
Pamir e cols.35 publicaram a experiência no tratamento de 22 pacientes com MFM. Em relação aos
tumores localizados posteriormente ao ligamento denteado, a abordagem suboccipital mediana mostrou-se
satisfatória para a adequada remoção desses tumores.
Contudo, para as lesões anteriores do forâmen magno,
a aquisição das técnicas do acesso extremo lateral foi
de grande importância para o tratamento cirúrgico
desses tumores.
O trabalho de Suhardja e cols.50 faz um estudo
anatômico e comparativo entre o acesso extremo lateral
transcondilar e o retrossigmoideo. Foram utilizados 13
cadáveres nos quais de cada lado foi realizado um dos
acessos. A área de exposição cirúrgica de cada acesso foi
calculada separadamente. Como conclusão, mostrou78
se, com significância estatística, que o acesso extremo
lateral proporcionou maior área de exposição operatória
e permitiu melhor acesso à região do forâmen magno.
Margalit e cols. 29 publicaram uma série de 42
pacientes com tumores anteriores e ântero-laterais
da região do forâmen magno. Desses, 18 eram meningiomas. O acesso suboccipital extremo lateral foi
utilizado em todos os casos. No entanto, nesse artigo
os autores chamam a atenção para a necessidade de
individualizar as variantes desse acesso em cada caso
particular e de acordo com a patologia de base. Eles
defendem que a mobilização da artéria vertebral e a
ressecção do côndilo occipital dependem da extensão
e localização do tumor, bem como das características
patológicas de cada lesão. Por exemplo, em todos os
casos de meningiomas foi necessária a mobilização da
artéria vertebral, mas a condilectomia occipital parcial
foi realizada em apenas oito casos. Contudo, dos 12
pacientes que apresentavam cordomas dessa região, a
ressecção condilar completa foi necessária em nove,
com posterior fixação occipitocervical.
Como demonstrado, a discussão na literatura a respeito das variações do acesso suboccipital lateral para o
tratamento cirúrgico dos MFM de localização anterior
ou ântero-lateral é ampla. Várias outras referências
literárias advogam o acesso extremo lateral com, pelo
menos, condilectomia parcial individualizada para cada
caso na remoção desses tumores.31,16,28,32,37 Também
existem defensores de uma abordagem suboccipital lateral retrocondilar.7 Alguns autores ainda preconizam o
acesso suboccipital lateral clássico para a retirada dessas
lesões.2,20,26,41,48 Outros preferem o acesso suboccipital
mediano clássico.22 As lesões situadas posteriormente
são abordadas pela via suboccipital posterior mediana
clássica, como consenso entre os autores. Embora ainda
seja relatado o acesso transoral para o tratamento desses
tumores,11,41 sua utilidade é limitada e ele está sendo
cada vez mais abandonado.
Em relação ao desenvolvimento de instabilidade
occipitocervical após o tratamento cirúrgico de tumores
da região do forâmen magno, a literatura converge para
uma linha de condutas similares. Os pacientes que são
submetidos a ressecção de até 30% ou do terço posterior do côndilo occipital geralmente não necessitam
de fusão.9,49 Nos casos em que a condilectomia chega
a 50% ou mais, é muito provável que seja necessária a
fusão occipitocervical.9,49
A utilização de embolização pré-operatória está
bem estabelecida no tratamento dos meningiomas de
base de crânio, pois ela facilita o ato operatório e diminui o sangramento.17,38 É um procedimento seguro,
entretanto deve-se ter em mente que alguns pacientes
podem evoluir com piora do quadro neurológico após
o mesmo.38
Meningiomas do forâmen magno
Silva DOA e col
Arq Bras Neurocir 28(2): 74-80, junho de 2009
Uma análise detalhada a respeito da radiocirurgia
estereotáxica vai além do propósito desta revisão.
Porém, ressaltamos que Muthukumar e cols.33 publicaram um artigo, no qual essa modalidade terapêutica
poderia ser oferecida para pacientes com MFM que
não fossem bons candidatos a cirurgia, por exemplo,
pacientes muito idosos. Em uma série de cinco pacientes, os autores observaram redução do volume tumoral
em um caso e ausência de crescimento da lesão nos
quatro restantes.
6.
7.
8.
9.
10.
Conclusões
Os meningiomas de forâmen magno são tumores
raros. Possuem apresentação clínica variável, desde
pacientes com graves sintomas motores bilaterais e
insuficiência respiratória até pacientes com sintomatologia completamente inespecífica, nos quais um detalhado exame neurológico é imprescindível. Associados
à semiologia neurológica, os estudos de imagem com
RM, TC e angiografia cerebral são definitivos para o
diagnóstico e a programação cirúrgica.
A melhor opção terapêutica, até o presente momento, é a remoção cirúrgica do tumor. A abordagem ideal
ainda não está estabelecida como um consenso, embora
esteja se direcionando para o acesso extremo lateral e
suas variantes segundo a maioria dos autores.
A embolização pré-operatória tem o seu papel definido e deve ser utilizada sempre que possível.
A radiocirurgia estereotáxica pode ser uma opção
terapêutica para um grupo seleto de pacientes.
O diagnóstico precoce continua sendo a melhor
arma de todo esse arsenal para que os pacientes desfrutem de um bom resultado terapêutico e evoluam com
um prognóstico favorável.
11.
12.
13.
14.
15.
16.
17.
18.
19.
20.
Referências
21.
1.
22.
2.
3.
4.
5.
Ahmed YS, Hanson DR, Halaka AN. Hoarseness as the
sole presenting symptom of foramen magnum meningioma.
J Laryngol Otol. 1990;104:715-7.
Akalan N, Seckin H, Kilic C, Ozgen T. Benign extramedullary tumors in the foramen magnum region. Clin Neurol
Neurosurg. 1994;96:284-9.
Arnautovic KI, Al-Mefty O, Husain M. Ventral foramen magnum meningiomas. J Neurosurg. 2000;92:71-80.
Avninder S, Gupta V, Sharma KC. Lymphoplasmacyte rich
meningioma at the foramen magnum. Br J Neurosurg.
2008;24:1-3.
Banerji D, Behari S, Jain VK, Pandey T, Chhabra DK.
Extreme lateral transcondylar approach to the skull base.
Neurol India. 1999;47:22-30.
Meningiomas do forâmen magno
Silva DOA e col
23.
24.
25.
Barnadas MA, Escartín A, Alomar A. Oral ulcerations as the
first sign of a foramen magnum meningioma. Oral Surg Oral
Med Oral Pathol Oral Radiol Endod. 2000;90:609-11.
Bassiouni H, Ntoukas V, Asgari S, Sandalcioglu EI, Stolke D,
Seifert V. Foramen magnum meningiomas: clinical outcome
after microsurgical resection via a posterolateral suboccipital
retrocondylar approach. Neurosurgery. 2006;59:1177-85.
Bertalanffy H, Gilsbach JM, Mayfrank L, Klein HM, Kawase
T, Seeger W. Microsurgical management of ventral and ventrolateral foramen magnum meningiomas. Acta Neurochir
(Wien). 1996;Suppl 65:82-5.
Bijjani GK, Sekhar LN, Riedel CJ. Occipitocervical fusion
following the extreme lateral transcondylar approach. Surg
Neurol. 2000;54:109-15.
Boulton MR, Cusimano MD. Foramen magnum meningiomas: concepts, classifications and nuances. Neurosurg
Focus. 2003;14:10.
Bounkowski JA, Gibson RD, Snape L. Foramen magnum
meningioma: transoral resection with a bone baffle to prevent
CSF leakage. Case report. J Neurosurg. 1990;72:493-6.
Bruneau M, George B. Foramen magnum meningiomas:
detailed surgical approaches and technical aspects at
Lariboisière Hospital and review of the literature. Neurosurg
Rev. 2008;31:19-32.
Carvalho GA, Matthies C, Tatagiba M, Eghbal R, Samii M.
Impact of computed tomographic and magnetic resonance
imaging findings on surgical outcome in petroclival meningiomas. Neurosurgery. 2000;47:1287-94.
Commins DL, Atkinson RD, Burnett ME. Review of meningioma histopathology. Neurosurg Focus. 2003;3:14.
David CA, Spetzler RF. Foramen magnum meningiomas.
Clin Neurosurg. 1997;44:467-89.
De Tella Jr OI, De Paiva Neto MA, Aguiar PH, Herculano
MA. Anterior and lateral foramen magnum meningiomas.
Arq Neuropsiquiatr (Sao Paulo). 2006;64:437-40.
Dowd CF, Halbach VV, Higashida RT. Meningiomas: the role
of preoperative angiography and embolization. Neurosurg
Focus. 2003;15:10.
George B, Dematons C, Cophignon J. Lateral approach to
the anterior portion of the foramen magnum. Application to
surgical removal of 14 benign tumors: technical note. Surg
Neurol. 1988;29:484-90.
George B, Lot G, Boissonnet H. Meningioma of the foramen magnum: a series of 40 cases. Surg Neurol. 1997;
47:371-9.
Goel A, Desai K, Muzumdar D. Surgery on anterior foramen magnum meningiomas using a conventional posterior
suboccipital approach: a report on an experience with 17
cases. Neurosurgery. 2001;49:102-6.
Guidetti B, Spallone A. Benign extramedullary tumors of the
foramen magnum. Adv Tech Stand Neurosurg. 1988;16:
83-120.
Gupta SK, Khosla VK, Chhabra R, Mukherjee KK. Posterior
midline approach for large anterior/anterolateral foramen
magnum tumors. Br J Neurosurg. 2004;18:164-7.
Gupta SK, Sharma BS, Khosla VK, Mathuriya SN, Pathak
A, Tewari MK. Far lateral approach for foramen magnum
lesions. Neurol Med Chir (Tokyo). 2000;40:48-52.
Kenning TJ, Kanwar VS, Qian J, Deshaies EM. A de novo
desmoid tumor of the surgical site following foramen magnum meningioma resection in a patient with Gardner´s
Syndrome: a case report and review of the literature. J
Neurooncol. 2008;26:30-9.
Khaoroptham S, Jittapiromsak P, Siwanuwatn R, Chantra K.
The outcome of surgical treatment for tumors of the craniocervical junction. J Med Assoc Thai. 2007;90:1450-7.
79
Arq Bras Neurocir 28(2): 74-80, junho de 2009
26.
27.
28.
29.
30.
31.
32.
33.
34.
35.
36.
37.
38.
39.
40.
41.
42.
43.
80
Kondoh T, Tamaki N, Taomoto K, Yasuda M, Matsumoto S. Surgical approaches to foramen magnum meningioma: report of three cases. Neurol Med Chir (Tokyo).
1990;30:163-8.
Kratimenos GP, Crockard HA. The far lateral approach for
ventrally placed foramen magnum and upper cervical spine
tumors. Br J Neurosurg. 1993;7:129-40.
Kumar CV, Satyanarayana S, Rao BR, Palur RS. Extreme
lateral approach to ventral and ventrolaterally situated lesions of the lower brainstem and upper cervical cord. Skull
Base. 2001;11:265-75.
Margalit NS, Lesser JB, Singer M, Sen C. Lateral approach to
anterolateral tumors at the foramen magnum: factors determining surgical procedure. Neurosurgery. 2005;56:324-36.
Marhx-Bracho A, Rueda-Franco F, Ibarra-de La Torre
A, García-González O, Bornstein-Quevedo L, de LeónBogorge B. Chordoid meningioma of the foramen magnum
in a child: a case report and review of the literature. Childs
Nerv Syst. 2008;24:623-7.
Marin Sanabria EA, Ehara K, Tamaki N. Surgical experience with skull base approaches for foramen magnum
meningioma. Neurol Med Chir (Tokyo). 2002;42:472-8.
Menezes AH. Surgical approaches, postoperative care and
complications of posterolateral – far lateral transcondylar
approach to the ventral foramen magnum and upper cervical
spinal canal. Childs Nerv Syst. 2008;24:1203-7.
Muthukumar N, Kondziolka D, Lunsford LD, Flickinger JC.
Stereotactic radiosurgery for anterior foramen magnum
meningiomas. Surg Neurol. 1999;51:268-73.
Nanda A, Vincent DA, Vannemreddy PS, Baskaya MK,
Chanda A. Far lateral approach to intradural lesions of the
foramen magnum without resection of the occipital condyle.
J Neurosurg. 2002;96:302-9.
Pamir MN, Kiliç T, Ozduman K, Türe U. Experience of a
single institution treating foramen magnum meningiomas.
J Clin Neurosci. 2004;11:863-7.
Pirotte B, David P, Noterman J, Brotchi J. Lower clivus
and foramen magnum anterolateral meningiomas: surgical
strategy. Neurol Res. 1998;20:577-84.
Rhoton AL Jr. Meningiomas of the cerebellopontine angle and
foramen magnum. Neurosurg Clin N Am. 1994;5:349-77.
Rocen CL, Ammerman JM, Sekhar LN, Bank WO. Outcome
analysis of preoperative embolization in cranial base surgery. Acta Neurochir (Wien). 2002;144:1157-64.
Rockhill J, Mrugala M, Chamberlain MC. Intracranial meningiomas: an overview of diagnosis and treatment. Neurosurg
Focus. 2007;23:1.
Samii M, Klekamp J, Carvalho G. Surgical results for
meningiomas of the craniocervical junction. Neurosurgery.
1996;39:1086-94.
Sarat Chandra P, Jaiswal AK, Mehta VS. Foramen magnum
tumors: a series of 30 cases. Neurol India. 2003;51:193-6.
Sawaya RA. Foramen magnum meningioma presenting
as amyotrophic lateral sclerosis. Neurosurg Rev. 1998;21:
277-80.
Sekhar LN, Javed T. Meningiomas with vertebrobasilar
artery encasement: review of 17 cases. Skull Base Surg.
1993;3:91-106.
44.
45.
46.
47.
48.
49.
50.
51.
52.
53.
54.
55.
56.
57.
Sekhar LN, Wright DC, Babu RP. Surgical resection of
cranial base meningiomas. Neurosurg Clin N Am. 1994;5:
299-330.
Sekhar LN, Wright DC, Richardson R, Monacci W. Petroclival
and foramen magnum meningiomas: surgical approaches
and pitfalls. J Neurooncol. 1996;29:249-59.
Seki K, Shimizu K, Matsushita M, Li ZL, Niibayashi K, Yamamuro T. Postlaminectomy kyphosis of the cervical spine
complicating spinal cord tumor in the foramen magnum. No
Shinkei Geka. 1994;22:481-4.
Sen CN, Sekhar LN. An extreme lateral approach to intradural lesions of the cervical spine and foramen magnum.
Neurosurgery. 1990;27:197-204.
Sharma BS, Gupta SK, Khosla VK, Mathuriya SN, Khandelwal N, Pathak A et al. Midline and far lateral approaches to
foramen magnum lesions. Neurol India. 1999;47:268-71.
Shin H, Barrenechea IJ, Lesser J, Sen C, Perin NI. Occipitocervical fusion after resection of craniovertebral junction
tumors. J Neurosurg Spine. 2006;4:137-44.
Suhardja A, Agur AM, Cusimano MD. Anatomical basis of approaches to foramen magnum and lower clival meningiomas:
comparison of retrosigmoid and transcondylar approaches.
Neurosurg Focus. 2003;14:9.
Tange Y, Uto A, Wachi A, Koike J. Transcondylar fossa approach to treat ventral foramen magnum meningioma: case
report. Neurol Med Chir (Tokyo). 2001;41:458-62.
Touho H. End-to-end anastomosis of the posterior inferior
cerebellar artery before excision of a meningioma involving
the lower clivus and the foramen magnum. Case report. Surg
Neurol. 1999;52:185-8.
Tsao GJ, Tsang MW, Mobley BC, Cheng WW. Foramen
magnum meningioma: dysphagia of atypical etiology. J Gen
Intern Med. 2008;23:206-9.
Wagle VG, Villemure JG, Melanson D, Ethier R, Bertrand
G, Feindel W. Diagnostic potential of magnetic resonance
in cases of foramen magnum meningiomas. Neurosurgery.
1987;21:622-6.
Wang ZY, Xie JC, Ma CC, Liu B, Chen XD, Li ZD, et al.
Microsurgery on foramen magnum meningioma with suboccipital approach. Beijing Da Xue Xue Bao. 2004;36:634-6.
Wong CW, Poon WS. Far lateral approach with intraoperative ultrasound Doppler identification of the vertebral artery.
Clin Neurol Neurosurg. 1999;101:264-7.
Wörner BA, Rahim T, Lange M, Fink U, Oeckler R. Long
lasting improvement arterial hypertension after surgical
treatment of a foramen magnum meningioma: case report.
Surg Neurol. 2002;58:189-92.
Original recebido em setembro de 2008
Aceito para publicação em abril de 2009
Conflito de interesses não declarado
Endereço para correspondência
Danilo Otávio de Araújo Silva
Rua Paissandu, 200, ap. 401 – Boa Vista
50070-200 – Recife, PE, Brasil
E-mail: [email protected]
Meningiomas do forâmen magno
Silva DOA e col
Arq Bras Neurocir 28(2): 81-84, junho de 2009
Metástase de adenocarcinoma de
mama no ângulo pontocerebelar
Relato de caso
José Nazareno Pearce de Oliveira Brito1, Gerson Luis Medina Prado2,
Ricardo Marques Lopes de Araújo3, Wildson de Castro Gonçalves Neto3
Disciplina de Neurologia e Neurocirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual do Piauí (Facime-Uespi) e da
Faculdade de Saúde, Ciências Humanas e Tecnológicas do Piauí (Novafapi) e Disciplina de Radiologia da Facime-Uespi, Teresina.
RESUMO
Câncer de mama é a principal neoplasia maligna em mulheres. Apesar de todos os avanços médicos
tanto no diagnóstico como na terapêutica, um terço das pacientes com esse tipo de câncer irá morrer
em decorrência das metástases. Apesar de tumores no ângulo pontocerebelar (APC) terem uma
apresentação clínica com características uniformes, eles representam variedades histopatológicas
distintas. Além das metástases, o neurinoma do acústico, meningiomas, cistos epidermoides e
neurinomas dos nervos cranianos V, VII, IX, X e XI correspondem, aproximadamente, a 98% dos tumores
no APC. Este relato descreve um caso de metástase de adenocarcinoma de mama no APC.
PALAVRAS-CHAVE
Adenocarcinoma de mama. Metástase. Ângulo pontocerebelar.
ABSTRACT
Breast andenocarcinoma metastasis in the cerebello pontire angle. Case report
Breast cancer is the main malignant neoplasm in women. Despite all diagnostic and therapeutic
advances, one third of the patients with this cancer will die as a result of metastasis. Although tumors
in the cerebellopontine angle present with clinical uniform characteristics, they represent distinct
histopathological varieties. Besides metastasis, acoustic schwannomas, meningiomas, epidermoidal
cysts, and neurinomas of V, VII, IX, X and XI cranialnerves occur in about 98% of the tumors of
cerebellopontine angle. This report describes a rare case of breast adenocarcinoma metastasis in the
cerebellopontine angle.
KEY WORDS
Breast adenocarcinoma. Metastasis. Cerebellopontine angle.
Introdução
A principal neoplasia maligna feminina ainda permanece sendo o câncer de mama. Apesar do aumento
da sobrevida decorrente do diagnóstico precoce e dos
novos métodos terapêuticos, um terço dessas pacientes
morre em virtude das metástases.2
O ângulo pontocerebelar (APC) é um espaço latente
de forma irregular localizado na fossa posterior cerebral;
é formado pela face cerebelar da parte petrosa do osso
temporal, ponte e pedúnculo cerebelar médio. Tumores
que têm origem no APC são raros, correspondendo a
apenas 5% a 10% de todos os tumores intracranianos.
Causam, por compressão do tronco cerebral e dos
nervos cranianos que trafegam por esse sítio, sintomas
neurológicos por interferência nos núcleos e tratos
longos do tronco cerebral. Apesar de as apresentações
clínicas serem semelhantes, 98% dos tumores encontra-
1 Professor Adjunto Doutor de Neurologia e Neurocirurgia. Coordenador da Disciplina de Neurologia e Neurocirurgia da Faculdade de Ciências
Médicas da Universidade Estadual do Piauí (Facime-Uespi) e da Faculdade de Saúde, Ciências Humanas e Tecnológicas do Piauí (Novafapi).
2 Professor Adjunto Doutor da Disciplina de Radiologia da Facime-Uespi.
3 Acadêmicos de Medicina da Novafapi.
Arq Bras Neurocir 28(2): 81-84, junho de 2009
dos nesse sítio são representados pelo schwannoma do
acústico (70%-80%), meningiomas (5%-10%), cistos
epidermoides (6%-7%) e schwannomas dos nervos
cranianos V, VII, IX, X e XI.3,4,6,7,9,15 O adenocarcinoma metastático da mama é uma lesão mais rara nessa
região. Atualmente, não existem diretrizes terapêuticas
para metástases isoladas do adenocarcinoma de mama
neste sítio.3,8
O presente trabalho relata um caso de metástase de
adenocarcinoma de mama no APC direito. A apresentação clínica, características histopatológicas, achados
radiológicos e diagnóstico diferencial dos tumores
metastáticos do APC serão discutidos.
Figura 1 – Tomografia computadorizada de crânio evidenciando
a lesão no ângulo pontocerebelar direito.
Relato do caso
Paciente MDML, sexo feminino, 38 anos, branca,
procedente da cidade de Codó, MA, foi admitida no
Serviço de Neurocirurgia do Hospital São Marcos
(Teresina, PI), em 4/2/2003, com queixas de cefaleia
progressiva há um mês, associada a náuseas, vômitos,
zumbidos e tonturas, assim como dificuldade para deambular e um episódio de crise convulsiva. Ao exame,
apresentava estado geral comprometido, desidratada,
torporosa, disfásica, com pupilas isocóricas e fotorreagentes. Como antecedente pessoal havia relato de
mastectomia radical em 2001, em razão do nódulo
na mama direita, cujo estudo histopatológico revelou
tratar-se de um carcinoma ductal infiltrante grau II.
Nessa ocasião, recebeu tratamento adjuvante com
quimio e radioterapia.
A tomografia computadorizada (TC) e a ressonância
magnética (RM) do crânio (Figuras 1 e 2) evidenciaram
a presença de lesão expansiva de contornos lobulados
no APC direito, isodensa ao parênquima cerebelar nas
imagens de TC e isointensa nas imagens da RM ponderadas em T1 e T2, com halo de edema circundante e
efeito de massa sobre o parênquima cerebelar adjacente.
A lesão apresentava intenso realce após a infusão do
meio de contraste, tanto nas imagens tomográficas
quanto de ressonância.
Realizou-se planejamento cirúrgico com exérese do
tumor, em 7/2/2003, com boa evolução clínica e melhora da sintomatologia no pós-operatório. O resultado
do exame histopatológico foi de carcinoma metastático
pouco diferenciado. A paciente foi então encaminhada
para radioterapia. Está atualmente em acompanhamento
ambulatorial no hospital.
82
Figura 2 – Ressonância magnética da mesma lesão.
Discussão
Os neurinomas do acústico, meningiomas e outras
lesões são clinicamente distintos dos tumores metastáticos do APC que, de modo geral, causam sintomas
auditivo-vestibulares de forma aguda. A ligação com
neuropatias dos nervos cranianos é comum, visto que os
pacientes acometidos podem apresentar dores na região
da mastoide, hipoacusia, migrânia e sintomas vestibulares. A ataxia pode representar invasão cerebelar
avançada. A paralisia do nervo facial é comum, podendo
ser confundida com paralisia de Bell. O acometimento
do nervo hipoglosso e dos nervos do forâmen jugular
sugere fortemente um processo maligno.6,11,12,14 O aparecimento rápido desses sinais e sintomas e a história de
processo maligno devem sugerir o diagnóstico de lesão
metastática do APC.6,11-14 Na suspeita de lesão metastática, no pré-operatório, deve-se investigar tumores do
pulmão, mama, fígado, rim e próstata.6,12-14
A evolução clínica da paciente em questão demonstrou ser compatível com a história natural de uma lesão
metastática de APC.
Metástase de adenocarcinoma de mama no ângulo pontocerebelar
Brito JNPO e col
Arq Bras Neurocir 28(2): 81-84, junho de 2009
A incidência precisa das lesões metastáticas no osso
temporal é desconhecida. Apresentam uma longa fase
latente antes de surgir algum sintoma. Mais de 200 casos
de metástase no osso temporal são descritos na literatura
e o tumor primário mais comum é o adenocarcinoma
de mama.5,10
As metástases no canal auditivo interno são muito
raras, representam apenas cerca de 0,3% das lesões do
APC,3 e, diferentemente das metástases no osso temporal,
são estas, assim como as lesões do APC, marcadas por sintomas agudos e rapidamente progressivos sobre os nervos
cranianos VII e/ou VIII. Desordens faciais estão presentes
em 74% dos casos com lesão do canal auditivo interno.10
Yuh e cols.,17 em investigação sobre metástases no APC,
identificaram, em relação aos nervos cranianos VII e VIII,
que pelo menos um desses é afetado em 92,2% e que a
RM revela lesões maiores que aquelas sugeridas pela
apresentação clínica, envolvendo frequentemente outros
nervos cranianos, podendo também ser bilaterais.
Araújo e cols.,2 após análise de 42 prontuários de
mulheres com câncer de mama, concluíram que as
metástases cerebrais com frequência ocorrem após
metástase em outra localização (óssea, pulmonar e hepática). Em mais da metade dos casos foi diagnosticada
hipertensão intracraniana e a TC foi o método de eleição
para a confirmação diagnóstica. No caso em estudo,
o principal sintoma da paciente estava relacionado à
hipertensão intracraniana e o primeiro método para
diagnóstico foi a TC (seguido de RM), mostrando a
localização primária da lesão no APC. A apresentação
das lesões metastáticas do APC na TC é variável. Se
a parte petrosa do osso temporal estiver envolvida,
pode apresentar formas osteolíticas ou osteoblásticas.
Existem lesões hipervascularizadas que frequentemente
se realçam após administração intravenosa do meio
de contraste. As angiografias podem mostrar captação
vascular, o que auxilia no diagnóstico.1,4,11 A aparência
na RM também varia, sendo hipointensa em T1 e hipo
ou hiperintensa em T2, aspecto similar ao neurinoma do
acústico; pode ainda se realçar pelo gadolínio. O edema
em torno das lesões, visto como um acréscimo de sinal
em T2 ou perda na interface entre tumor e parênquima
preservado, representa tipicamente o efeito de massa.
Quando se suspeita de doença metastática no APC, uma
craniotomia suboccipital ou translabiríntica pode ser
realizada – dependendo da extensão da perda auditiva
– para uma intervenção diagnóstica e/ou terapêutica. A
ausência de alargamento do canal auditivo interno é importante, mas não definitiva, no diagnóstico diferencial
de outros tumores, como os neurinomas do acústico.16
A história clínica é sempre crucial e pode confirmar
o diagnóstico. Se levantada a hipótese de malignidade,
deve ser executado um tratamento multidisciplinar com
cirurgia para ressecção da lesão, seguido de quimioteraMetástase de adenocarcinoma de mama no ângulo pontocerebelar
Brito JNPO e col
pia e radioterapia, depois da confirmação diagnóstica.8
O tratamento de pacientes com pequenas lesões no
canal auditivo interno é, algumas vezes, expectante;
principalmente quando a suspeita é de schwannoma.
Entretanto, em pequenas lesões, a definição do tipo de
lesão é muito importante para o seguimento do paciente, pois metástases devem ser tratadas agressivamente
por apresentarem pior prognóstico.3,6,13,14 A paciente
em questão mostrou uma lesão metastática de caráter
agressivo com quadro convulsivo e de hipertensão intracraniana, tratada por cirurgia seguida de radioterapia
adjuvante conformacional, com resultado satisfatório.
Referências
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
8.
9.
10.
11.
12.
13.
14.
Ajal M, Roche J, Turner J, Fagan P. Unusual lesions of the
internal auditory canal. J Laryngol Otol. 1998;112:650-3.
Araújo MAS, Derchain SFM, Bianchessi ST, Koseki NM,
Teixeira LC, Brenelli HB. Metástase cerebral em pacientes
com carcinoma da mama: avaliação clínica de 42 casos.
Acta Oncol Bras. 2000;20:91-5.
Beutler AS, Hsiang JK, Moorhouse DF, Hansen LA, Alksne
JF. Pilocytic astrocytoma presenting as an extra-axial tumor
in the cerebellopontine angle: case report. Neurosurgery.
1995;37:125-8.
Brackmann DE, Bartels LJ. Rare tumors of the cerebellopontine angle. Otolaryngol Head Neck Surg. 1980;88:555-65.
Cumberworth VL, Friedmann I, Glover GW. Late metastasis
of breast carcinoma to the external auditory canal. J Laryngol
Otol. 1994;108:808-10.
Delerue O, Destee A. Bilateral metastases in the cerebellopontine angle. J Neurol Neurosurg Psychiatry.
1990;54:562-3.
Ferri GG, Modugno GC, Fioravanti A, Calbucci F, Ceroni AR.
Metastasi nel condotto uditivo interno. Acta Otorhinolaryngol
Ital. 1998;18:269-75.
Guilemany JM, Alobid I, Gastón F, Morrelló A, BernalSprekelsen M. Cerebellopontine angle and internal auditory
canal metastasis from ductal carcinoma of the breast. Acta
Otolaryngol. 2005;125:1004-7.
Gupta A, Ahmad FU, Sharma MC, Garg A, Mehta VS. Cerebellopontine angle meningeal melanocytoma: a rare tumor
in an uncommon location. J Neurosurg. 2007;106:1094-7.
Kendall B, Symon L. Investigation of patients presenting
with cerebellopontine angle syndromes. Neuroradiology.
1977;13:65-84.
Kingdom TT, Lalwani AK, Pitts LH. Isolated metastatic
melanoma of the cerebellopontine angle: case report.
Neurosurgery. 1993;33:142-4.
Marques E, Brandis A, Samii M, Tatagiba M. Late metastasis
of breast adenocarcinoma into internal auditory canal and
cerebellopontine angle: case report. Arq Neuropsiquiatr.
2002;60:639-42.
Pech A, Cannoni M, Pellet W, Triglia JM, Zanaret M,
Thomassin JM. Les tumeurs de l’angle ponto-cérébelleux à
l’exception des neurinomes de l’acoustique. Ann Otolaryngol
Chir Cervicofac. 1986;103:293-301.
Polini JC, Campodónico CC, Benavides TE. Diagnóstico
y tratamiento de 40 pacientes con patología tumoral del
ángulo ponto-cerebeloso. Neuroeje. 2000;14:7-12.
83
Arq Bras Neurocir 28(2): 81-84, junho de 2009
15.
16.
17.
84
Streitmann MJ, Sismanis A. Metastatic carcinoma of the
temporal bone. Am J Otol. 1996;17:780-3.
Vellutini EAS, Siqueira MG, Velasco OP. Neurinoma do
acústico. In: Siqueira MG, Novaes V, editors. Tumores
intracranianos. São Paulo: Revinter; 1999. p. 306-17.
Yuh WT, Mayr-Yuh NA, Koci TM, Simon JH, Nelson KL,
Zyroff J, et al. Metastatic lesions involving the cerebellopontine angle. Am J Neuroradiol. 1993;14:99-106.
Original recebido em maio de 2008
Aceito para publicação em novembro de 2008
Endereço para correspondência
José Nazareno Pearce de Oliveira Brito
Rua Des. César do Rêgo Monteiro, 1.220
64049-580 – Teresina, PI, Brasil
E-mail: [email protected]
Metástase de adenocarcinoma de mama no ângulo pontocerebelar
Brito JNPO e col
Rua Anseriz, 27, Campo Belo – 04618-050 – São Paulo, SP. Fone: 11 3093-3300 • www.segmentofarma.com.br • [email protected]
Diretor geral: Idelcio D. Patricio Diretor executivo: Jorge Rangel Gerente financeira: Andréa Rangel Gerente comercial: Rodrigo Mourão Editora-chefe: Daniela Barros MTb 39.311 Diretor de criação:
Eduardo Magno Gerentes de negócios: Claudia Serrano, Eli Proença, Marcela Crespi, Rosana Moreira Coordenador editorial: Alexandre Costa Diretora de arte: Renata Variso Designer: Eduardo Vargas
Sales Revisoras: Cristina Moratto e Isabel Gonzaga de Menezes Produtor gráfico: Fabio Rangel Periodicidade: Bimestral Tiragem: 2.000 exemplares Cód. da publicação: 8667.10.09
Download