Privatização e Ajuste Fiscal no Brasil Ricardo da Costa Nunes ÍNDICE 1. INTRODUÇÃO 2. RACIONALE DA DESESTATIZAÇÃO: PORQUE PRIVATIZAR ? 2.1. O crescimento do déficit público 2.2. A (in)eficiência das empresas estatais 2.3.A mudança tecnológica 2.4. O novo papel atribuído ao Estado 3. TÉCNICAS DE PRIVATIZAÇÃO: COMO PRIVATIZAR? 3.1. Modalidades e modelagem 3.2. Seqüência e preparação para a privatização 3.3. Método de avaliação do preço: CAPM 3.4. Meios de pagamento e destinação de recursos 4. EFEITOS MACROECONÔMICOS DA PRIVATIZAÇÃO 4.1. Retomada de investimentos 4.2. Aumento da eficiência da estrutura industrial 4.3. Ajuste fiscal das contas públicas 5. CONCLUSÃO 2 1. INTRODUÇÃO A rationale da intervenção direta do Estado no setor produtivo esteve por muito tempo, em particular após a depressão de 1930, relacionada à função estabilizadora do governo. Acreditava-se que o aumento do gasto governamental, por elevar o nível de demanda agregada, contribuía para a geração de renda e emprego, evitando a ocorrência de crises de superprodução ou de insuficiência de demanda. Na década de 70, teve início um movimento de retorno à concepção não intervencionista, que atribuía à crescente participação do Estado na economia o surgimento de crises. Essas crises, diferentemente da que marcou a década de 30, caracterizavam-se por níveis elevados de endividamento e inflação. Postulava-se que, em prol da maior eficiência e até da estabilização econômica, a atividade estatal deveria ser reduzida ao mínimo possível. Desde então, esse movimento, por alguns denominado de “retorno à ortodoxia”, tem se intensificado em vários países. Sua dimensão teórica e ideológica, observada na economia política, foi acompanhada pelo fortalecimento das democracias. O processo político democrático ora demandava do Estado maiores gastos sociais, ora exigia que fosse debelada a origem da crise: o surgimento de grandes déficits nos países com forte participação estatal. Paralelamente, a nova justificativa teórico-ideológica e o processo político foram se solidificando em virtude das mudanças estruturais verificadas na esfera produtiva. Assim, o avanço tecnológico permitiu que bens privados produzidos pelo setor público, antes considerados indivisíveis, se tornassem divisíveis, como no caso da telefonia. 3 O reordenamento da participação do Estado na economia esteve associado ao processo de privatização em vários países. No Brasil, a privatização teve início em 1991 e passou por vários estágios em função do momento político, das resistências que surgiram e das características das empresas em questão. O objetivo deste trabalho, dividido em três partes, é estimar a contribuição da privatização para o ajuste fiscal e analisar a técnica de privatização e a destinação dos recursos que podem propiciar maiores ganhos para o Tesouro Nacional. A primeira parte discute as razões históricas e teóricas para a redução da intervenção estatal, quais sejam: o crescimento do déficit público, a ineficiência das empresas estatais e a mudança tecnológica. Esses fatores estão basicamente associados aos efeitos macroeconômicos que se espera obter com a privatização, os quais por sua vez dependem da condução do processo. Assim, a segunda parte do trabalho discute as técnicas de privatização, com o intuito de determinar teoricamente as condições que permitem maximizar o ganho fiscal. Essas técnicas incluem a escolha da modalidade, da modelagem e da seqüência de privatização, a preparação e o método de avaliação do preço, os meios de pagamento e a destinação dos recursos obtidos. Por fim, procura-se identificar e discutir os efeitos macroeconômicos da privatização a partir de um modelo que estima os impactos da privatização. 2. RACIONALE DA DESESTATIZAÇÃO: PORQUE PRIVATIZAR ? 4 2.1 O crescimento do déficit público. O crescimento da despesa pública, responsável pelo surgimento de déficits em vários países do mundo no período pós-guerra, foi analisado pela escola da Escolha Pública. Para o conjunto de autores que integram esse arcabouço teórico - Mckenzie & Maucaulay (1980), Buchanan (1967, 1985), Borcherding (1977), Niskanen (1971), Tullock (1965), dentre outros - a ineficiência do Estado está relacionada ao fato de haver uma coalizão a favor do gasto. A motivação da intervenção estatal seria a mesma de qualquer outra ação econômica: o interesse privado de alguém que cede o voto em troca de um determinado benefício. À parte dessa motivação mais geral, desenvolveram-se no bojo da escola da Escolha Pública várias correntes que apontam causas particulares para o crescimento da despesa pública, dentre as quais: as assimetrias institucionais, a burocracia, as interações político-econômicas, a ilusão financeira e os direitos de propriedade. Nos modelos de assimetrias institucionais, de que Pommerehne (1978) é exemplo, o crescimento dos gastos estatais seria induzido pelo comportamento do eleitor mediano. Numa decisão majoritária, o valor do gasto não corresponderia ao valor modal, mas sim à mediana dos vários níveis de despesa desejados pelos eleitores, porque a agregação da demanda individual dos eleitores por bens públicos faria com que prevalecesse o valor mediano. Assim, em democracias, a alocação dos gastos públicos seria explicada pela atuação de políticos e eleitores, grupos de pressão que representam o desejo do eleitor mediano. Os grupos acabariam por fazer prevalecer suas preferências pessoais para determinar a quantidade de bens públicos a ser fornecida pelo governo e o financiamento da despesa crescente pela imposição de impostos proporcionais e/ou progressivos. Como o eleitor mediano demanda uma 5 grande quantidade de bens públicos e se beneficia pagando apenas uma parte do preço dos bens usufruídos, acaba se formando uma coalizão em favor da realização da despesa. Na corrente da burocracia, a ação do poder público é explicada, entre outros fatores, pela existência de funcionários públicos que fazem reivindicações corporativistas1 e pela presença de políticos que, para se elegerem, comprometem-se a aumentar gastos estatais e arrecadam votos dos eleitores assim beneficiados2. Assim, também aqui a participação crescente do Estado surge como decorrência dos interesses de uma parcela da sociedade representada por grupos de pressão, neste caso particular de funcionários públicos. Tem-se argumentado que o fato de os salários pagos aos funcionários públicos serem elevados relativamente à produtividade explicaria a crise fiscal. Contudo, no Brasil, ainda que o gasto com pessoal seja expressivo em relação a outros países, o número de funcionários tanto da administração direta como das estatais vem sendo reduzido desde 1989, passando de 1.442.675 em 1988 para 1.197.460 em 1994. Assim, no Brasil, o maior problema parece estar no custo crescente dos servidores inativos. Pereira (1997) observa que enquanto os proventos da aposentaria são 20% superiores ao último salário (atualmente o valor da última remuneração), na maior parte dos países o valor da aposentadoria é de 70% do último salário. Este fato acompanhado do curto tempo de contribuição exigido explica que o gasto com pessoal federal civil e militar passe de 3,46% do PIB em 1987 para 6,15% do PIB em 1995. Ao mesmo tempo, os desembolsos com investimentos das estatais em igual período foram substancialmente reduzidos enquanto a nível federal os gastos com pessoal e 1 2 Ver Marlow & Orzechowsky (1996). Ver Buchanan (1967). 6 encargos sociais consumiam recursos que poderiam ser dirigidos a investimentos em infra-estrutura, educação e saúde. Essa situação é observada por Hanke (1987,p.10):” o potencial de desenvolvimento de economias como a brasileira depende, em parte, da libertação dessas restrições, regulamentos e burocracia que o Estado impõe à sua sociedade”. Hanke aponta ainda um outro aspecto relevante, que é o fato de que o Estado Brasileiro, que se encontra sem recursos para financiar as estatais estratégicas, pode passar a responsabilidade da modernização ao setor privado. Shay (1987,p.225) apresenta um argumento convincente para tal prática: “a subutilização da infraestrutura e de ativos existentes representa um custo de oportunidade dispendioso”. Nos modelos de interações político-econômicas da escola da Escolha Pública, como em Pissarides (1980) por exemplo, o governo intervém objetivando alcançar índices de popularidade que lhe permitem perpetuar-se no poder. Assume-se que os índices de popularidade crescem com a queda do nível de desemprego, a estabilidade dos preços e o crescimento da renda disponível. Assim, a política fiscal e a publicidade das obras do governo seriam utilizadas como instrumento de ação política do governo. De acordo com a corrente denominada ilusão financeira, que teve seus trabalhos desenvolvidos inicialmente por Pluviani no século passado, a despesa pública cresceria porque a percepção que os agentes tem dos benefícios por ela gerados é maior do que do custo que lhes é repassado através da cobrança de impostos. Isto porque o recolhimento dos impostos está associado a acontecimentos favoráveis e a relação entre a despesa pública e os recursos fiscais recolhidos de cada contribuinte é imprecisa. No modelo de direitos de propriedade, não existem bens intrinsecamente 7 públicos, mas bens cujos custos sociais são inferiores aos custos privados3. O crescimento da despesa estatal seria explicado pela aplicação de um conceito amplo de bens públicos que a escola de direitos de propriedade propõe restringir para com isso reduzir o gasto público. O modelo de direitos de propriedade representa uma reação à teoria dos bens coletivos. Esta surge da necessidade de conceituar os bens públicos a partir de suas características internas: aquele cujo consumidor não pode ser discriminado, cujo consumo não pode ser excluído pelo não pagamento. Contudo, como muitos bens produzidos pelo governo são divisíveis e permitem discriminar o consumidor - seguros sociais, ensino, saúde, entre outros, que são responsáveis pela maior parcela do dispêndio estatal -, pode-se concluir que há bens privados produzidos pelo setor público que não são coletivos. De acordo com Coase (1960), a mudança do conceito de bem público cria condições para que se venha a reduzir o papel do Estado na economia. Na inexistência de bens intrinsecamente públicos, o governo pode deixar de incrementar as despesas estatais e transferir à iniciativa privada os gastos com infra-estrutura, saúde e educação - notadamente aqueles que tiveram maior participação no gasto estatal nos últimos 50 anos. As condições para que as externalidades possam ser internalizadas sem intervenção estatal, segundo Coase, são a redução dos custos privados e a assunção privada de empreendimentos que, embora tenham tradicionalmente ficado a cargo do governo, produzem bens que podem ser considerados privados. Um exemplo de bem considerado essencialmente público e que era originalmente um bem privado é o farol. A privatização do farol poderia ser realizada pela cobrança de taxas pelo seu uso. 3 Ver Coase (1960). 8 Este conceito de bem público cria argumentos convincentes para que o setor privado venha a produzir bens e serviços que outrora eram considerados de domínio público e agora se advoga no modelo de direitos de propriedade que devem ser privatizados para impedir que a despesa pública se torne crescente. A respeito da prescrição teórica de intervenção estatal, portanto, os resultados da escola da Escolha Pública sugerem que o aumento da intervenção do Estado na economia implica em perda de produtividade, com conseqüente redução da taxa de crescimento econômico e aumento do déficit público. Em conseqüência, o prognóstico da teoria prevalecente refere-se à transferência das atividades estatais para a iniciativa privada. 2.2 A (in) eficiência das empresas estatais Um argumento tradicional dos teóricos da Escolha Pública a favor da privatização aponta para a ineficiência das empresas estatais em decorrência da estabilidade dos funcionários e da busca pelo burocrata da maximização do seu salário, poder e tamanho da repartição em detrimento do lucro, como considerado por Zweifel & Zaborosky (1996). A estabilidade dos funcionários desencorajaria incrementos de produtividade. Os servidores, por terem seus empregos garantidos, não se esforçariam para melhorar o desempenho. Enquanto na concepção de Weber (1977), a burocracia era uma modalidade de organização com adequação dos meios aos objetivos desejados, a fim de alcançar a máxima eficiência, para os autores da Escolha Pública a burocracia é responsável pelo crescimento da despesa devido a: a) ineficiência causada pela superprodução e pelo afrouxamento dos controles de produção; b) sucessivos incrementos nos orçamentos, resultantes de pressão de grupos que sempre pedem mais 9 para não correrem o risco de vir a ter menos do que desejam; c) corporativismo dos funcionários, que favoreceria a eleição de candidatos comprometidos com a expansão dos gastos. Além disso, a aversão ao risco prevalecente na burocracia dá origem a muitas rotinas, com exigência de pareceres de muitos chefes de repartições, tornando morosas operações simples. As contratações, demissões e outras operações atendem a uma demorada rotina. Os administradores das empresas públicas freqüentemente se queixam do excesso de normas a eles impostas pelos diferentes órgãos, que tornam a administração pesada. Corroborando essa observação empírica, alguns autores sustentam a tese da privatização argumentando que a administração privada das empresas proporciona maiores lucros que a gestão pública. Davies (1959) realizou um estudo comparando a eficiência de empresas privadas e públicas e concluiu ser maior a eficiência das empresas privadas. Husain & Sahay (1992) argumenta que a empresa privada é mais eficiente porque responde mais rapidamente aos sinais de mercado. Landau (1985) afirma que a fonte de ineficiência da economia é a propriedade pública, com base em um estudo econométrico em que conclui haver uma relação inversa entre a participação do Estado na economia e a produtividade. A conclusão de que o grau de eficiência da economia se reduz à medida que aumenta a sua participação é partilhada por Grossman (1988) e outros autores. Tyler (1978) contrapõe os autores acima sustentando que não há diferença entre os níveis de eficiência de empresas públicas e privadas. Vickrers & Yarrow (1995) também afirmam que, mesmo no arcabouço teórico da microeconomia, é possível que o empreendimento público seja mais produtivo que o privado em muitas situações. 10 Segundo Vickrers & Yarrow (1995), em setores oligopolizados, as empresas privadas não são mais eficientes que as públicas. A eficiência depende de como é gerenciada a empresa, das especificidades da atividade e do ambiente econômico onde está inserida, o qual pode variar de país a país. Os autores citam o caso em que a simples ameaça de privatização da British Steel fez com que empresa obtivesse expressivos ganhos de produtividade. Walters (1992) também cita o exemplo da empresa Jaguar que, com a restrição orçamentária que antecedeu a privatização, obteve uma melhora de 150% no desempenho relativamente a sua performance de 1979. Em outras palavras, como o universo de estatais produtivas é formado, quase sempre, de empresas monopolistas ou oligopolistas, que atuam principalmente nos setores de insumos básicos, serviços e transportes, tende-se a associar a ineficiência da empresa pública a sua propriedade quando, na verdade, a relação entre propriedade pública/privada e eficiência não é conclusiva. A ausência de competição também seria uma causa da ineficiência das empresas públicas, além da impossibilidade de falência, da multiplicidade de objetivos e do excesso de controle sobre as supervisionadas por receio de fraudes. Segundo Beesley & Littlechild (1983), a privatização contribui para a melhoria da performance da indústria devido à ação das forças de mercado. Embora as empresas públicas não tendam a explorar o grau de monopólio, o que reduz os preços praticados, a falta de preocupação com a maximização de lucro pode originar uma desatenção com a minimização de custos e a sociedade arcará com o custo. O desmembramento dos monopólios pode gerar uma estrutura industrial mais competitiva, com as empresas remanescentes disputando mercado. Também para Abreu e Werneck(1993) a competição induz ao aumento de concorrência. 11 Para Vickrers & Yarrow (1995), o objetivo de aumentar a eficiência das empresas é atingido com a privatização em virtude do fim de monopólios que resulta numa reorganização industrial. Ainda que possam ocorrer acordos tácitos entre as empresas, a ameaça de ingresso de novas firmas e a possibilidade da expansão dos concorrentes torna possível a ocorrência periódica de disputas agressivas por mercados. A impossibilidade de falência das empresas públicas, segundo Kornai (1979), também desestimularia os administradores a buscar lucros porque, mesmo incorrendo em sucessivos déficits, as empresas contam com aporte de recursos do Tesouro Nacional. Desta forma, o Estado cria barreiras à saída de empresas ineficientes às custas do Erário Público. Para Shapiro e Willig (1990), a ineficiência das empresas estatais pode decorrer não da propriedade em si, mas do fato de os seus dirigentes, muitas vezes escolhidos por razões políticas, não necessariamente perseguirem os objetivos da empresa, mas sim, objetivos próprios ou daqueles que os indicaram para o cargo. Do ponto de vista das finanças do governo, a privatização seria justificada não só pela redução do déficit público pela via da redução da despesa governamental mas também porque o aumento de eficiência tende a induzir aumento da arrecadação. Um estudo do World Bank (1989) aponta que os benefícios econômicos da privatização são maximizados quando os governos fazem do aumento de eficiência o seu objetivo número um. Para Henning & Mansoor (1988), é justamente neste aspecto que se justifica a privatização, na medida em que o governo poderá se beneficiar do aumento da eficiência das empresas privatizadas por intermédio de um maior recolhimento de receita tributária em virtude da maior lucratividade das empresas. Além disso, o recolhimento de receita tributária poderá ser ainda maior e 12 os objetivos de política econômica do governo mais facilmente atingidos se o aumento de eficiência das empresas se refletir num aumento de eficiência da economia do país como um todo. Para Krueger (1981) e Balassa (1981), o fato dos tigres asiáticos terem apresentado taxas de crescimento do PIB superiores às de outros países em desenvolvimento é explicado por níveis diferentes de eficiência, que seria maior nos países onde houve maior submissão das empresas às forças de mercado. Segundo esses autores, os países asiáticos, ao praticarem uma política de abertura comercial, teriam submetido as suas empresas à concorrência externa, enquanto nos demais países em desenvolvimento as empresas sobreviviam graças a medidas protecionistas que lhes asseguravam o monopólio do mercado. Nos países em desenvolvimento, a falta de recursos para a realização de investimentos que permitiriam atender a demanda e a modernização dos serviços tem alimentado a pressão pela privatização. Na Argentina, a utilização do câmbio efetivo real como proxy para a competitividade da economia argentina e o aumento da participação nas exportações no mercado mundial e regional apontam uma melhoria da competitividade da economia a partir de 1994. Esse resultado estaria associado, segundo relatório do FMI (outubro/96 e março/97), à privatização, à abertura do comércio, à desregulação e outras reformas estruturais. Além disso, o patrimônio das empresas vem sendo visto como um recurso para o pagamento da dívida do governo, permitindo um saneamento das distorções geradas pelo modelo intervencionista. 2.3 A Mudança Tecnológica Por muito tempo, alguns setores, como o de telecomunicações, ferrovias e outros produtores de bens e serviços de utilidade pública foram considerados monopólios naturais porque se caracterizavam por pelo menos um dos seguintes 13 aspectos: necessidade de grande volume de capital, presença de economias de escala e externalidades. Estas peculiaridades faziam com que as empresas que atuavam em tais mercados fossem públicas ou operassem sob a supervisão de agências. Entretanto, segundo Friedman (1984), como as condições técnicas que resultam em monopólio se modificam ao longo do tempo, em virtude da criação de bens substitutos ou da redução do grau de indivisibilidade dos produtos, alguns bens deixaram de ser produzidos pelo setor público. Um exemplo representativo de tal mudança ocorreu no setor de telecomunicações, como descreve Pastoriza (1996): “A evolução tecnológica ( em especial, o surgimento das tecnologias digitais de transmissão e comutação e a incorporação de recursos computacionais às redes) reduziu sobremaneira os custos de transmissão e processamento de informações. Essa redução permitiu: o surgimento de novos ofertantes interessados em explorar serviços específicos (“nichos”, notadamente os serviços de valor adicionado); a difusão das redes corporativas intrafirmas e interfirmas, rompendo assim a fronteira que separava os produtores e os usuários de serviços de telecomunicações.” Assim, na atividade de telefonia foram criados novos produtos, que antes eram explorados por monopólios, e passaram a ser explorados por diversas firmas de atuação competitiva. Os serviços de telefonia móvel, local e interurbano passam a ser explorados por empresas diferentes e que podem, inclusive, concorrer entre si. A American Telephone and Telegraph - AT&T foi desmembrada em muitas firmas e muitas empresas públicas do mesmo ramo foram privatizadas. Em conseqüência, as tarifas norte-americanas se encontram entre as mais baixas do mundo. Pelo exposto, podemos concluir que as mudanças tecnológicas, ao induzirem alterações nas formas de produção e organização do processo produtivo, 14 fomentaram o interesse no processo de privatização porque fragmentaram atividades, reduzindo o montante de recursos necessários à realização de investimentos. 2.4 O novo papel atribuído ao Estado A teoria da Escolha Pública recupera os princípios clássicos, já presentes em Adam Smith (1937), de que o mercado é um sistema que aloca recursos e funciona independentemente da vontade de um indivíduo particular. As ações dos governantes não poderiam proporcionar equilíbrio ao mercado, mas tão somente atrapalhar o seu funcionamento. Essa crença vai de encontro ao conceito de Leviatã4 que Hobbes empregava para definir o Estado e tem sustentado programas governamentais que se atribuem um novo papel: “The private sector will be the engine of growth in Guyana ... The Government will continue its reform of the public sector to reflect the changing role of the state under a market-oriented development strategy.” (Government of Guyana, 1994, p. 4). Ou ainda, “The Government recognizes that private sector development is the mechanism through which Jamaica will move from stabilization to export-led growth. The public sector therefore must assume a new role. It must create an environment in which the private sector can operate efficiently”. (Government of Jamaica, 1994, p. 9.) Um dos melhores exemplos do novo papel atribuído ao Estado encontra-se na União Européia - EU. Embora os incentivos financeiros tradicionais, como subsídios por exemplo, ainda sejam o principal instrumento para a promoção de investimentos, a União Européia - UE vem substituindo esses incentivos pelo desenvolvimento de infra-estrutura, transferência de tecnologia e serviços de consultoria, especialmente para marketing e exportação.5. 4 5 Leviatã é um monstro marinho que encarna o mal. Ver CE (1994). 15 Friedman (1984) analisa as alternativas de solução para mercados com falhas - monopólio privado, monopólio público, ou regulação pública - e reconhece que todas apresentam inconvenientes. Contudo, segundo o autor, o monopólio privado seria menos prejudicial que os demais por ser mais sensível às mudanças das condições técnicas ao longo do tempo. No caso das estradas de ferro nos Estados Unidos, o fato de terem continuado sob supervisão de agência reguladora estatal teria reduzido a sua eficiência, impedindo que o setor se tornasse competitivo, mesmo após a redução do seu grau de monopólio pelos avanços tecnológicos. Coase (1960) reforça a posição de Friedman ao não reconhecer sentido para a regulação pública: “(...)forget about the law: look at costs and benefits to see how economic life is conducted”. A proposição de Friedman e de Coase de que a regulação não substitui a competição encontra respaldo no trabalho de Primeaux (1997) que após estudar o desempenho dos serviços de eletricidade de 49 cidades norte-americanos, concluiu que a competição era o principal fator para explicar a redução de custos, não importando ser a propriedade pública ou privada. Tal orientação está de acordo com o prognóstico de Friedman (1984), segundo o qual, a economia deveria ser gerida por regras, como a do padrão-ouro americano, e não por decisões discricionárias. Assim, não caberia ao governo intervir na economia mas reduzir o tamanho da administração pública. A proposição de Friedman é compartilhada por Lucas (1990), para quem não se deve ampliar a tributação para financiar gastos do governo. Apesar de a escola da Escolha Pública apontar diversas fontes de ineficiência no Estado, há analistas que argumentam que o Estado tem um papel a desempenhar na economia e que seus gastos não deveriam ser minimizados. Lord Keynes (1970) e, mais recentemente, autores como Przeworsky (1996) afirmam que as 16 análises econômicas mostram que os mercados não alocam os recursos eficientemente per si, cabendo ao Estado intervir para promover o crescimento econômico. A este respeito, Reis (1993) chega a recomendar a social-democracia como modelo de governo. No entanto, embora o debate sobre o papel do Estado na economia permaneça inconclusivo, assumindo muitas vezes um caráter ideológico, o diagnóstico de que o Estado interventor é responsável por déficits públicos crescentes e quedas de produtividade da economia fez com que muitos países, inclusive o Brasil, desenvolvessem programas de privatização. Nesse sentido, parece que que o objetivo dos políticos é o de dotar a administração pública de maior eficiência. A presença do Estado no processo de industrialização brasileiro teve sua importância histórica, associada ao modelo desenvolvimentista dos anos 60, de acordo com Lessa (1982) e Dain (1980). Contudo, ao longo das décadas de 70 e 80, as empresas estatais reduziram tarifas para combater a inflação e captaram recursos no exterior para que a nação se capitalizasse com divisas estrangeiras. Ao servirem como instrumento de política econômica e social, as empresas estatais sacrificaram seus objetivos comerciais pois buscavam atingir um duplo objetivo: lucro e políticas de estabilização. Hoje, o momento histórico é outro e a manutenção do controle de empresas pelo Estado tornou-se insustentável em face do esgotamento da sua capacidade de investir, em parte devido a elevado gastos com pessoal. Um exemplo ilustrativo é o caso das instituições financeiras privadas, que apesar de apresentarem maior faturamento que as públicas, desembolsam menos com pessoal: 17 Gráfico 1 Percentual das instituições financeiros sobre PIB faturamento das instituições públicas/PIB 53% faturamento das instituições públicas/PIB 47% gasto de pessoal das instituições públicas e privadas gasto pessoal/gasto total-públicas 61% gasto pessoal/gasto total-privadas 39% Fonte: IBGE, dados de 1995. Além disso, a manutenção de estatais compromete uma parcela da administração direta, exigindo a fiscalização de órgãos como a Secretaria Federal de Controle Interno, o Tesouro Nacional e o Tribunal de Contas da União - TCU, e portanto com grande dispêndio de recursos e de pessoal. No Brasil, a Lei 8.031/1990 criou e a MP 1.481 e o Decreto 1.204 regulamentaram o Programa Nacional de Desestatização - PND. O objetivo do PND seria redefinir o papel do Estado na economia, reduzindo seu tamanho, tornando-o mais dinâmico, restringindo a intervenção do setor empresarial estatal na atividade econômica e preparando as condições para a recuperação do crescimento econômico. A necessidade de reduzir a intervenção do Estado na economia já era apontada por Say (1821,p.9): “O Brasil, aquele vasto país, tão favorecido pela natureza, poderia absorver umas cem vezes mais mercadorias inglesas do que as que são inutilmente enviadas até lá sem encontrar mercados, mais o primeiro requisito teria que ser o Brasil produzir tudo que é capaz de produzir; e porque aquele miserável país não atinge aquele desejável objetivo? Porque todos os esforços dos cidadãos são paralisados pelo governo”. Reordenar a posição estratégica do Estado no Brasil é um pré-requisito para permitir que a administração pública concentre seus esforços nas atividades em que a presença do Estado seja fundamental para a consecução das prioridades 18 nacionais, entre as quais a de propiciar condições adequadas para o crescimento dos investimentos privados nos projetos de infra-estrutura. Essas condições contemplam, além da estabilidade econômica, a continuidade e segurança dos marcos legais e regulatórios, ou seja, o estabelecimento de normas e regras estáveis ao longo do tempo. Para que os ganhos fiscais da privatização não sejam neutralizados pelos déficits da previdência e dos governos subnacionais, é importante que o programa de privatização seja acompanhado pelas reformas tributária, administrativa e previdenciária. Caso contrário, segundo Simonsen (1995,p.13): “vender estatais para cobrir despesas correntes, como fizeram alguns países, é irresponsabilidade financeira, equivalente à do indivíduo que vende a casa para continuar freqüentando restaurantes de luxo. Afinal, as estatais acabam, as despesas correntes não”. A respeito da utilização de receitas de privatização para financiar gastos correntes na Inglaterra e na França, Wright (1994.p.42) afirma: “privatization may be yet another example of governments doing the right thing for the wrong reasons”. Além disso, um dos objetivos da privatização tem sido o desenvolvimento do mercado de capitais, ainda muito aquém do seu potencial. Para Simonsen(1995, p.13), a privatização atrai capitais externos: “O capital que interessa é o investimento direto, que cria raízes no país. Esse capital aflui na medida das oportunidades que lhe são oferecidas. E a privatização é a maneira eficaz de criar tais oportunidades”. Segundo Hanke (1987), esse objetivo seria mais facilmente atingido se fosse reduzida a tributação sobre dividendos e se houvesse maior abertura da economia ao comércio e aos investimentos estrangeiros. Também para a CFI (1995), a privatização aumenta o mercado de capitais e estimula a entrada de capitais estrangeiros, conforme se observa no gráfico a seguir. 19 100 90 90 80 80 70 70 60 60 50 50 40 40 30 30 20 20 10 10 0 IED acumulada 1988-1993/PIB (%) Capitalização do Mercado de Valores (%) Gráfico 2 capitalização do Mercado de capitais 1993/PIB capitalização do Mercado de capitais 1988/PIB Inversão estrangeira acumulada 0 1 2 3 Fonte: Corporation Financeira Internacional- CFI 1995 Inversão Estrangeira Direta - IED acumulada 1988-1993/PIB 3. TÉCNICAS DE PRIVATIZAÇÃO: COMO PRIVATIZAR ? No capítulo anterior, foram apresentados os fatores que justificam a redução da ingerência governamental na economia, basicamente associados aos efeitos macroeconômicos que se espera obter após a privatização. Tais efeitos, contudo, dependem em larga medida da condução do processo. Neste capítulo são analisadas as técnicas e procedimentos utilizados na privatização e discutidas as condições que permitiriam maximizar o ganho fiscal no Brasil. A primeira seção apresenta as modalidades e a modelagem da privatização. Na segunda seção, procura-se determinar a seqüência de privatização que geraria maior receita para o Tesouro e possibilitaria maior aumento de eficiência na nova estrutura industrial, bem como a validade de realizar uma preparação para a privatização. Na terceira seção, é discutido o método de avaliação do preço mínimo empregado no Programa Nacional de Privatização - PND. Na quarta seção, analisamse os meios de pagamento e a destinação dos recursos obtidos. 20 3.1. Modalidades e modelagem da privatização De acordo com a legislação vigente no Brasil, a transferência de empresas públicas para a iniciativa privada pode ser realizada por intermédio de: oferta pública de ações em leilão, venda a preço fixo de lotes de ações, negociação direta a interessado específico, venda a trabalhadores da empresa e fragmentação da empresa e venda das partes em separado. Todas essas modalidades estão previstas no Programa Nacional de Desestatização - PND, criado pela Lei 8.031/1990 e regulamentado pela MP 1.481 e Decreto 1.204, e foram utilizadas, em diferentes momentos de acordo com a situação financeira da empresa e a natureza do serviço por ela prestado, sem a necessidade de ajustes em lei. A venda de ativos à iniciativa privada pode também acontecer mediante liquidação da empresa, prevista na Lei 8.029, ou aumento de capital com perda de controle de acordo com a Lei 9.088/95. Neste último caso, o governo realiza uma chamada para aumento de capital da empresa, se abstendo de subscrever ações, o que permite que o controle acionário passe a ser de outro acionista. Num segundo momento, o governo venderia as ações restantes e a receita obtida com a privatização seria maior porque a cotação em bolsa de valores das ações tende a aumentar depois que as empresas são privatizadas, assim como a rentabilidade de seus investimentos. Mas a privatização não se esgota na transferência de patrimônio de que trata o PND, pois inclui também a transferência de direitos de exploração de atividades típicas de Estado por determinado período de tempo, prevista nas Leis 8.987 e 9.074. Esse é o caso da concessão de serviços públicos que, juntamente com a oferta pública de ações em leilão e a liquidação, constitui uma das modalidades mais importantes de privatização até agora utilizadas. 21 O leque bem variado de opções permite que a União seja beneficiada pela venda dos ativos públicos em cada situação, segundo Giambiagi e Pinheiro (1992,p.282): “o governo foi bem sucedido no desenho das regras que orientam a alienação das empresas estatais.” A modelagem de venda pode ser classificada em duas categorias: pulverizada e concentrada. Na modelagem pulverizada, as ações são vendidas ao maior número possível de compradores, em geral com grande participação de trabalhadores no processo. Na modelagem concentrada, as ações são oferecidas aos grupos que se qualificarem para o leilão. Nesse caso, o número de proponentes é pequeno, mas há uma acirrada disputa pelo controle acionário. Esse modelo é o mais adotado nos processos de privatização no mundo. A pulverização de ações strictu sensu, freqüentemente postulada pela Bolsa de Valores de São Paulo (1990) e pelo TCU (1994), significaria vender as ações das empresas em lotes pequenos para milhares de investidores no Brasil e no Exterior. Relativamente à privatização da Companhia Vale do Rio Doce, um estudo do IBOVESPA afirma: “Se for privatizada em fatias, o valor será três vezes maior do que a venda em bloco. A pulverização segundo o modelo inglês reduziria o poder dos oligopólios na determinação do preço e democratizaria o acesso às ações da empresa. A experiência internacional mostra que tem sido possível obter substanciais ganhos de capital com a aquisição de ações de empresas privatizadas nas áreas de infra-estrutura e de serviços públicos. Seria importante, portanto, que uma parcela do capital das estatais fosse pulverizada entre o grande público, para que uma maior parcela da população se beneficiasse.” Também para o TCU, a demanda pelas ações dos ativos públicos poderia ser maior caso fosse possível incorporar pequenos investidores, 22 pulverizando a compra, por exemplo, através de clubes de investimento com incentivos fiscais, o que fatalmente se refletiria num preço mais elevado. O interesse das bolsas na pulverização é óbvio: se as ações são vendidas a um bloco de controle, a corretagem da venda dos ativos públicos fica restrita apenas aos consórcios. A pulverização, por outro lado, exigiria que fossem contratadas mais corretoras, e a revenda das ações garantiria maiores ganhos para o mercado. Além disso, o argumento de democratização do capital através da pulverização freqüentemente cumpre os objetivos de acelerar o processo de privatização, através da conquista de apoio político, e de aumentar a popularidade do governo se ele estiver disposto a vender as ações por baixo preço, permitindo que os compradores de classe média tenham ganhos rápidos e substanciais. Na Inglaterra, onde este modelo foi muito divulgado, falava-se inclusive na socialização do capitalismo. Hanke (1987,p.18) é um dos defensores dessa modelagem: “devemos abrir o maior número de empresas e tentar disseminar seu capital democraticamente, submetendo a sua gestão e fiscalização aos acionistas”. Há uma correspondência entre a modelagem e modalidade de privatização. No caso de modelagem pulverizada, emprega-se a oferta pública de ações, isto é, a venda de ações a um preço fixo, normalmente baixo para tornar-se acessível a um grande número de compradores. No caso da modelagem concentrada, pode-se empregar como método de venda o leilão ou a venda direta. No Brasil, o leilão é o método de venda mais utilizado no PND. Segundo IBOVESPA (1990), a alienação de ações por meio de leilão do tipo inglês no Brasil e no exterior tenderia a aumentar a dispersão acionária do capital e a demanda, com reflexos positivos para o preço com que as empresas são negociadas. Pode-se afirmar que o leilão mais adequado para venda de ações em grandes blocos, em termos de 23 gerar a maior receita, seria o leilão de primeiro preço (unitário), pois grandes grupos estariam dispostos a pagar um "prêmio" para garantir o controle. Para Mello (1994, p.476): “os ágios de venda sobre os preços mínimos são maiores nos leilões envolvendo o controle”. Em contraposição, a oferta pública a preço fixo privilegiaria os novos compradores porque o preço seria menor. A solução encontrada no Brasil para garantir uma receita de privatização elevada e, ao mesmo tempo, fazer oferta aos empregados, foi compensar a diferença na determinação do preço mínimo. Tourinho e Viana (1993) apontam: “A CPND optou por, como regra geral, oferecer ações representativas de aproximadamente 10% do capital das empresas privatizáveis aos seus empregados, para aquisição por um preço igual a 30% do preço mínimo estabelecido para as ações da empresa, subsídio este que é recuperado elevando-se o preço mínimo das ações vendidas nos leilões”. A maior evidência de que a venda por intermédio da modelagem concentrada pode proporcionar maiores ganhos para o Tesouro Nacional está no fato das cotações das ações das empresas CVRD, PETROBRÁS e TELEBRÁS terem apresentado maior crescimento do que as cotações das ações preferenciais. A tabela a seguir mostra a evolução da cotação das ações preferenciais e ordinárias dos principais grupos controlados pela União. Mantida a quantidade de ações da União nos grupos financeiros abaixo e a proporção entre ações preferenciais e ordinárias na carteira da União, percebe-se que, no período analisado, as ações ordinárias da CVRD, PETROBRÁS e TELEBRÁS se valorizaram relativamente às preferenciais, ainda que devamos reconhecer que as ações da ELETROBRÁS pouco se alteraram. 24 Tabela 1 Avaliação da participação da União nos principais grupos estatais Parte da União Empresa tipo de ação Parte da união Parte da união Parte da União Total das ações Valor total de no valor de no valor de no valor de no valor de da União mercado das mercado em mercado em mercado em mercado em 30/12/91 30/12/92 30/12/93 06/04/94 empresas em (%) 06/04/94 holding CVRD Eletrobrás Telebrás ( US$milhões) Ordinárias 94,35% 94,77% 95,68% 95,30% 79,2 3.069 Preferenciais 5,65% 5,23% 4,32% 4,70% 6,5 1.846 Total 100% 100% 100% 100% Ordinárias 94,60% 89,38% 94,74% 94,48% 99,4 Preferenciais 5,40% 10,62% 5,26% 5,52% 29,4 Total 100% 100% 100% 100% Ordinárias 87,04% 83,89% 88,92% 89,05% 57,5 Preferenciais 12,96% 16,11% 11,08% 10,95% 3,9 100% 100% 100% 100% Ordinárias 86,23% 87,02% 88,19% 86,44% 81,4 3.000 Preferenciais 13,77% 12,98% 11,78% 13,56% 9,0 4.255 100% 100% 100% 100% 7.346 3.842 14.419 18.610 14.692 9.695 34.757 34.757 Total Petrobrás 4.915 Total Total da parte da União Valor total das empresas 10.356 2.047 12.403 3.620 6.564 10.184 7.255 34.757 Fonte: BVRJ, CVM e BNDES OBS: Fêz-se a hipótese de que a participação da União não tenha variado no período. Tanto na Inglaterra como no Brasil foi possível realizar algumas privatizações através da venda direta das ações aos administradores ou aos empregados da estatal de forma pulverizada. Contudo, há muitas dúvidas sobre como vender de forma pulverizada, num mercado tão estreito quanto o brasileiro, ativos públicos avaliados em bilhões. Para contornar essa problemática, Pinheiro (1994, p.19) propõe: “A privatização popular deve ser combinada com o abatimento das dívidas públicas com os fundos de poupança dos trabalhadores (FGTS e PIS/PASEP)(...). Neste sentido, o modelo concentrado evita, ainda, uma queda no preço das ações, que poderia ocorrer numa pulverização maciça no mercado interno, em função do movimento diário de capitais nas bolsas brasileiras ser ainda pequeno para absorver a venda de empresa do tamanho da Vale do Rio Doce, por exemplo. Mesmo que a maior parte fosse vendida no exterior, seria preciso dividir o processo em várias etapas, o que prolongaria a situação de indefinição no processo de privatização 25 brasileiro e introduziria muitas incertezas para os investidores, como riscos de takeover por exemplo, maximizadas pela defasagem temporal entre um lote e outro. Os investidores tenderiam, assim, a deixar suas propostas para a última tranche, quando a posição dos outros sócios já estivesse configurada. O modelo concentrado propicia ainda maior eficiência na administração da empresa por evitar problemas de agência em decorrência de um grande número de acionistas com interesses particulares. Esta também é a posição de Sachs (1992), para quem seria a forma de propriedade mais apropriada. 3.2. Seqüência e preparação para a privatização Tendo em vista o volume dos recursos envolvidos nas privatizações, a primeira preocupação do policy maker, deve ser com a seqüência das empresas a serem privatizadas. O cronograma das privatizações deve ser compatibilizado com o nível de poupança interna e, no caso de haver um cronograma federal e outro estadual, convém evitar que a concentração de oferta reduza os preços de venda das ações. Neste sentido, a utilização de moedas de privatização tem também cumprido o papel de atenuar a pressão monetária, viabilizando a venda. Segundo Tourinho e Viana (out. 1993,p.25): “A utilização de títulos de crédito contra o governo, como “moedas” no PND, encontra amparo em uma dificuldade de ordem prática, caso se pretendesse que a alienação fosse liquidada em moeda corrente: o volume relativamente pequeno dos agregados monetários no Brasil.” Uma segunda preocupação seria o fato de que a privatização de determinados setores ou empresas dentro de um setor proporciona ganhos fiscais distintos, cabendo ao governo estabelecer o setor (ou empresa) que deve ser primeiramente privatizado para que se tenha a maior contribuição possível para o ajuste da economia. Para aqueles que acreditam que a receita de privatização pode 26 efetivamente contribuir para o ajuste fiscal, convém buscar o êxito nas primeiras vendas para que o programa ganhe impulso e se consiga vender as empresas seguintes gerando a maior receita possível. Assim, a escolha dos setores que irão iniciar o processo pode ter implicação significativa para o sucesso das privatizações seguintes pois as primeiras empresas privatizadas servirão de referência para as seguintes em termos de produtividade e formação de expectativas de modo geral. Por outro lado, se o aumento da eficiência com a administração privada constitui a principal contribuição da privatização, tal preocupação perde importância. Este parece ser o caso da privatização no leste europeu onde se realizou uma rápida desestatização com venda de ativos por baixo preço. Enquanto as empresas que entram no PND levam em média 8 meses até serem privatizadas, na Checo-Eslováquia o ciclo de preparação e a oferta pública de 1.491 empresas levou 14 meses, isto é, em média o governo alienou mais de 3 empresas de médio e grande porte por dia. No Brasil, as críticas tem se concentrado não na seqüência mas na velocidade do processo de privatização. A demora do processo vem sendo justificada pela busca do melhor preço para os ativos públicos, seja evitando concentração, seja estudando as regras mais convenientes em cada caso. Segundo Tourinho e Viana (1993, p.3): ”A estruturação formal do PND é bastante rígida, o que lhe confere elevado grau de segurança, mas extrai um custo na forma de uma menor agilidade, quando o comparamos com a experiência de privatização de outros países”. Para Simonsen (1995), o argumento de que uma rápida privatização dilapidaria o patrimônio público é fácil de ser contraposto. Pelo contrário, a lentidão do processo de desestatização é que implica em ônus para o erário público porque, enquanto a dívida pública se valoriza a 20% a.a., os ativos das empresas apresentam rentabilidade baixa ou negativa. No Brasil, empresas como Loydbrás, COBRA e 27 SIDEBRÁS não foram vendidas e esperou-se durante anos, apenas acumulando prejuízos para o Tesouro. Para Shafik (1993), um rápido processo de privatização contribui para evitar perdas econômicas para o controlador enquanto as empresas não são privatizadas. O vice-governador de São Paulo6 também defende uma maior velocidade da privatização para que se evite a deterioração financeira das empresas e ilustra sua posição com o caso da CESP que foi saneada após demitir 30% do quadro de pessoal, mas pode ter o patrimônio reduzido se não for vendida em 7 anos pois os ativos rendem até 5% a.a., enquanto a dívida cresce a 22% a.a.. A partir da experiência de outros países, alguns autores sugerem a seqüência ótima de privatização. Para Blommesteine & Marrese (1991), a seqüência de privatização deveria seguir o critério de magnitude: primeiro as estatais menores, em seguida as medianas para, por último, as maiores empresas. Tal ordenação permitiria criar um ambiente de tranqüilidade e segurança para a venda das empresas maiores. Também para Chen (1996), o ideal seria privatizar inicialmente os setores de menor poder de mercado e os mais subsidiados, pois assim o governo continuaria recebendo os dividendos das empresas rentáveis e deixaria de assumir o prejuízo das deficitárias. Por outro lado, tendo em vista que a maior contribuição da privatização decorre do aumento de eficiência com a quebra de monopólios. Assim, seria de se esperar que a privatização ocorra primeiro nos setores que apresentem mais elevado grau de monopólio e que se caracterizem por rápidas mudanças tecnológicas. Esta é justamente a proposição de Husain & Sahay 1992) que afirmam que a privatização deveria ser iniciada nos setores que mais podem contribuir para o aumento da competitividade da economia. Beesley & Littlechild (1983) também vêem no aumento 28 da competitividade da indústria a maior contribuição de um processo de privatização, o que os leva a sugerir que o processo de privatização se inicie nos monopólios naturais nas indústrias com baixa demanda. Entretanto, os fatores que tem imperado na escolha da seqüência das empresas a serem privatizadas no Brasil e no mundo, não parecem, até o momento, ter tido base nos aspectos técnicos mencionados, predominando fatores políticos. Na Inglaterra7, e no México8, a privatização iniciou-se com empresas de menor grau de monopólio e de menor importância econômica, enquanto na Argentina9, a desestatização iniciou-se por empresas de elevado grau de monopólio e de maior importância econômica. A escolha do governo argentino pode ser explicada, em parte, pelo objetivo de mostrar a determinação de privatizar e, assim, aumentar a geração de receitas de privatização. As receitas em cash obtidas com privatização na Argentina foram de 1,2% do PIB em 1991, de 0,8% do PIB em 1992, e de 1,5% do PIB em 1993. Uma outra questão é a conveniência de preparar as empresas para a privatização, realizando ajustes prévios. Pinheiro e Schneider(1993) apontam os ajustes prévios como necessários para que a empresa se torne mais atraente e/ou para viabilizar a restruturação por parte dos compradores: Também Hanke (1987) recomenda que se realize saneamento financeiro das empresas para aumentar a sua eficácia e competitividade e Castillo (1987,p.140) é incisivo na necessidade de aportar recursos nas empresas a serem privatizadas: “A privatização normalmente requer financiamento em duas fases: a primeira para dar suporte à transferência da 6 Ver Exame (1996). Ver Vickers e Yarrow(1995). 8 Ver Sanchez & Olivera (1992). 9 Ver Gerchunoff (1992) e Gerchunoff & Cánovas (1994). 7 29 propriedade e, em seguida, para assegurar a operação ininterrupta da nova companhia”. No Brasil, o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Social) decidiu fornecer uma linha de crédito especial para financiar em até 100% os investimentos das empresas de telecomunicações que estiverem se instalando ou ampliando seus negócios no Brasil com o objetivo de fomentar a criação de um verdadeiro parque industrial de telecomunicações no país. O crédito, numa primeira etapa, será destinado à compra, instalação e montagem de equipamentos da banda B (telefonia celular privada) e também aos fabricantes de equipamentos e componentes. Os prazos vão ser de até dez anos, com carência de três anos enquanto, até então, a média era de cinco anos. Essa posição que defende a realização de ajustes prévios, contudo, não é consensual. Shafik (1993) recomenda que o governo não realize gastos com a estruturação de empresas antes da privatização porque eles tendem a não ser recuperados e seria preferível vender a quem possa estruturar as empresas. Cabe observar que embora seja desejável obter a maior renda possível da privatização para abater dívida pública, também é objetivo do PND contribuir para a modernização do parque industrial nacional. O governo da Alemanha, por exemplo, incorreu em déficit fiscal em torno de 1% do PIB no período de 1991-92 para realizar ajustes prévios mas, em compensação, impôs aos novos investidores a realização de investimentos10. 3.3. Método de avaliação do preço: CAPM As empresas podem ser avaliadas pelo valor patrimonial, pela cotação das suas ações, ou pelo fluxo esperado de recursos. No Brasil, o método empregado é do 10 Ver Schwartz e Lopes (1993). 30 fluxo esperado de recursos. Em crítica ao processo de fixação do preço mínimo adotado no PND, o Relatório do TCU (1994, p.12-13) afirma: “Embora a quase totalidade dos editais de venda inclua como critérios na determinação dos preços o valor de reposição, o patrimônio líquido e o valor original dos investimentos realizados, tem havido exclusiva prevalência dos resultados obtidos em função da aplicação do método RMA/dpl.” O valor patrimonial consta do balanço da empresa mas não é empregado porque não reflete o seu valor de mercado, como afirmado em UNB (1995): “É essencial, para os objetivos próprios da contabilidade, que a avaliação de ativos se faça pelo que efetivamente custaram. Confrontado esse valor de custo com o preço de venda, é apurado o resultado (lucro ou prejuízo) que compete ao período em que se verificou a transação. A base contábil de valor para os ativos é assim seu custo, e não seu valor de venda de mercado. Os registros apurados pela contabilidade são lançados a preços de custo históricos ou, no máximo, corrigidos monetariamente por índices oficiais(...)”. Dessa forma, o patrimônio líquido de uma empresa, ou o valor patrimonial de suas ações nada tem a ver, de fato, com o valor econômico de uma empresa. Outra crítica constante do Relatório do TCU (1994) diz respeito ao fato de o preço mínimo não cobrir o custo de reposição de uma nova planta com capacidade instalada equivalente. No caso da Escelsa, por exemplo, o preço mínimo representaria, assim, apenas 71% do custo de reposição, após depreciação. Tal distorção, todavia, pode ser explicada pelo fato de o modelo utilizado refletir os elementos que importam para o comprador: a capacidade de geração de caixa da empresa, os riscos envolvidos no negócio, o custo de oportunidade e outros aspectos que serão citados a seguir. Assim, dos métodos existentes, apenas a determinação do fluxo esperado de recursos 31 merece maiores comentários, pois as cotações das ações estão disponíveis nas bolsas de valores. O método de avaliação pelo fluxo esperado de recursos utiliza o modelo de Capital Asset Pricing Model - CAPM. Inicialmente, realiza-se a projeção das seguintes contas patrimoniais, para determinar o fluxo de caixa num determinado período: disponibilidades, provisão para créditos de liquidação duvidosa, almoxarifado, outros valores a receber, despesas pagas antecipadamente e outras contas do passivo. Deste modo, é possível prever os valores de caixa no horizonte de 10 a 20 anos, ficando o prazo a critério da empresa de consultoria.11 A seguir, são estabelecidas premissas referentes ao valor dos produtos e serviços, dos insumos, dos gastos com pessoal; dos ativos não-operacionais, das despesas futuras em decorrência de contingentes trabalhistas, além da variação da produtividade e do crescimento do mercado. Numa terceira etapa, calcula-se o valor presente do fluxo de caixa. Neste momento, é fundamental determinar o Weighted Average Cost of Capital - WACC, isto é, a taxa de desconto, a qual poderia também ser interpretada como o custo de oportunidade do capital no setor, tanto para capital próprio como para capital de terceiros de curto e longo prazos. A ponderação é realizada com base na participação relativa do capital próprio e do capital de terceiros na empresa. A taxa de desconto é determinada pela seguinte equação: r = rf + (E(rm) - rf) beta + rb onde: rf = taxa de retorno com risco zero (E(rm) - rf) = prêmio de risco, calculado em função da diferença entre a taxa de 32 retorno do mercado acionário e a taxa de retorno com risco zero beta = medida do risco sistêmico rb = risco Brasil São atribuídos valores para as variáveis componentes da taxa de desconto (r), que variam de acordo com o ambiente econômico de cada empresa - renda dos consumidores, elasticidade do produto, grau de tecnificação, estrutura de mercado, entre outros. A fixação da taxa de desconto é o aspecto fundamental da determinação do preço mínimo pois, quanto maior o WACC, menor o valor presente do fluxo de caixa. Por fim, o valor presente do fluxo de caixa é obtido adicionando o fluxo de caixa obtido pelo desconto ao WACC ao valor presente da perpetuidade. Para obter o preço da empresa, basta então efetuar alguns ajustes no valor presente encontrado, quais sejam: valor presente das aplicações e dos financiamentos de curto e longo prazos, valor de venda dos ativos não operacionais, contingências fiscais, trabalhistas e previdenciárias. Segundo Relatório do TCU (1994), o método do CAPM para a avaliação das empresas não proporciona o retorno do investimento em muitos casos. Isto porque, a adoção de parâmetros extremamente conservadores na elaboração das projeções de longo prazo atuaria no sentido de subestimar as receitas e elevar as despesas. Cabe observar, contudo, que as estimativas foram feitas com base em dados contábeis passados referentes a uma situação econômica particular que delineou o patrimônio líquido das empresas. Ou seja, se a empresa se defrontou com circunstâncias desfavoráveis, ela terá alcançado um patrimônio líquido pouco atraente, 11 Para maiores detalhes, ver Nunes & Nunes (1996). 33 o que explicaria estimadores que tendem a depreciar o valor de venda das empresas avaliadas. Assim, não seria o emprego deste método o fator responsável pela depreciação no valor do ativo. Além disso, a diferença mencionada se justifica na medida que a determinação de preço envolve um grau de subjetividade presente em qualquer avaliação desse gênero, como reconhecido por UNB (1995, p.11). Para assegurar que as empresas não sejam sub-avaliadas, o TCU propõe ainda que entidades públicas também realizem avaliação. Contudo, a proposta parece desnecessária porque a lei já determina a contratação, após licitação, de dois consórcios de consultores para calcular o preço de mercado. Se verificada uma diferença de mais de 20% entre os preços calculados pelos consórcios, o BNDES contrata uma nova empresa de consultoria. Além disso, as empresas privadas de consultoria tendem a contribuir com credibilidade ao programa pois há sempre o receio de que os órgãos envolvidos no programa de privatização obstaculizem o programa porque com o fim do processo perderiam poder. 3.4. Meios de Pagamento e destinação de recursos O objetivo desta seção é identificar as linhas gerais para aceitação de moedas e utilização dos recursos obtidos no âmbito do Programa Nacional de Desestatização - PND, com o intuito de obter o maior ganho fiscal possível. Discutemse os aspectos que devem ser considerados na definição do mix ótimo de moedas aceitas. A escolha dos meios de pagamento aceitos na privatização - cash , títulos públicos e/ou crédito - está subordinada à orientação governamental de abater dívida interna, mobiliária ou securitizada, ou financiar outras despesas, sejam de custeio, sejam de investimento. Como se verá, as duas decisões são interdependentes e devem 34 ser tomadas em conjunto. Ao aceitar uma proporção elevada de moedas de privatização, está-se restringindo o leque de destinação de recursos ao resgate de dívida securitizada em poder do mercado e favorecendo a renegociação de dívidas vencidas, ao mesmo tempo que se oferece um estímulo para acelerar o processo de privatização. Contudo, se um dos objetivos que se espera atingir com o programa de privatização é o ganho fiscal com a entrada de recursos, a prioridade do governo deve ser a redução da dívida mobiliária, cujo custo é superior ao da dívida securitizada, e conseqüentemente o governo deve preferir a aceitação de moeda corrente. A busca do ganho fiscal, no entanto, não é consensual. Se o objetivo básico do programa de privatização é aumentar a eficiência da economia, pode ser indiferente aceitar cash, títulos públicos e/ou crédito, pois o fundamental passa a ser acelerar o processo. Nesta hipótese, o governo pode, adicionalmente, aceitar cash, destinando os recursos para a realização de investimentos. Um outro aspecto a ser considerado é a situação fiscal do país. Caso a necessidade de recursos seja expressiva, o país pode aceitar apenas moeda corrente como fez a Argentina, que só aceitou títulos da dívida pública numa segunda etapa pois iniciou o processo com empresas rentáveis12. Além destes, outros aspectos fiscais e monetários, por exemplo a proveniência interna ou externa de recursos e seu impacto sobre o balanço de pagamentos, podem ser determinantes da decisão. Com o intuito de reduzir o estoque da dívida no maior montante possível, tem-se questionado se o volume de recursos obtido na venda de empresas estatais seria maior com recebimento somente em cash ou com aceitação de moedas de 35 privatização. Segundo Gerchunhoff(1992), o recebimento de títulos da dívida externa no período 1989-82 contribuiu para aliviar as contas fiscais argentinas no curto prazo, Além disso, surge também a questão de que destino dar a esses recursos: reduzir dívida interna, recomprar dívida externa ou financiar o Tesouro Nacional. Para Simonsen (1995; p.13), as receitas de privatização devem ser utilizadas para abater dívida: “(...) usar as receitas de privatização para resgatar parte da dívida pública, sobretudo dívida interna mobiliária, é medida altamente salutar”. a) Cash ou moedas de privatização ? Considerando que o sucesso do programa de privatização depende muito do nível de poupança e que o país passou por uma década de crise econômica e que boa parte dos recursos internos se encontra concentrada em títulos da dívida pública, convém estar preparado para contornar dificuldades que podem surgir na formação de mercado para os ativos estatais. Assim, a aceitação de “moedas de privatização” e a oferta de crédito aos compradores de empresas públicas representam incentivos adicionais, que reduzem custos para que a iniciativa privada adquira empresas consideradas ineficientes e com elevados passivos. Há, portanto, situações em que o governo não recebe em cash pela venda da empresa, mas o simples fato de deixar de aportar recursos já constitui uma vantagem. A aceitação de moedas de privatização, neste contexto, seria preferível à mera liquidação das empresas. Esse aspecto é relevante porque é meta do Governo Federal acelerar o programa de privatização e ampliar o programa com a inclusão dos Estados no processo, o que deverá aumentar consideravelmente a oferta de empresas privatizáveis. 12 Ver Gerchnoff e Cánovas (1994). 36 No entanto, freqüentemente, afirma-se que a aceitação de moedas de privatização no PND implica em perdas nas vendas dos ativos estatais por três razões que serão comentadas a seguir: a)devido à pequena entrada de recursos em cash, impedindo que se resgate a dívida mobiliária, cujo custo é mais elevado, e reduzindo o ganho fiscal; b) porque as dívidas vencidas são aceitas pelo seu valor ao par, sem que o governo se aproprie do deságio, e c) porque, ao resgatar títulos antecipadamente, reduz-se o perfil da dívida. O primeiro argumento aponta como problema a pequena entrada de recursos em cash nas contas do Tesouro Nacional. O governo estaria substituindo uma dívida de até 6% ao ano por outra em torno de 18% a.a.. A principal desvantagem na utilização da dívida do governo como moeda diz respeito ao fato de que os recursos em moeda de privatização que se recebe pela venda dos ativos estatais não aumentam as disponibilidades de caixa do Tesouro, determinando a captação no mercado, a juros elevados, para executar o Orçamento. Segundo Kliass (1994): "Les principales conséquences provoquées par l'adoption d'un système de financement basé sur ce type de monnaie ont été la réduction de la capacité financière de l'État (...)". Ressalte-se que, embora freqüentemente se vincule o uso “resgate de dívida mobiliária” à fonte “recursos da privatização”, tecnicamente a vinculação faz pouco sentido. O ganho fiscal é o mesmo se o governo utiliza tais recursos para financiar gastos correntes que, de outra forma, seriam financiados pela emissão de novos títulos da dívida mobiliária. A vinculação surge da necessidade de justificar a aplicação dos recursos, em virtude da publicidade e das críticas que com freqüência rondam a privatização. Tomadas apenas as considerações financeiras mais imediatas, chegar-se-ia facilmente à conclusão de que não seria interessante aceitar moedas de privatização, 37 em geral com taxas inferiores às de outros títulos da dívida interna e prazos mais longos. No entanto, a pequena entrada de recursos em cash é compensada pelo fato da aceitação de moedas de privatização aumentar a credibilidade do governo, permitindo que se possa recorrer à renegociação de dívidas com mais facilidade. As condições obtidas pelo Tesouro Nacional na negociação de tais dívidas decorrem, em grande medida, da promessa de utilização no processo de privatização dos títulos recebidos em pagamento, o que explica a existência de taxas e prazos tão diferenciados. Embora a cláusula que rege a utilização das moedas de privatização no PND refira-se apenas a uma possibilidade, a ser definida nos editais de privatização, como a promessa de que o título possa ser utilizado em algum leilão afeta positivamente o seu preço, a sua não aceitação no PND poderia ser considerada uma desqualificação do crédito do título pelo seu próprio emissor. A opção por recebimento exclusivo em cash tenderia a afetar as condições das próximas negociações, elevando os custos de financiamento das dívidas originais. Assim, a utilização da dívida do governo como instrumento monetário proporciona um abatimento na dívida securitizada, com conseqüente saneamento das finanças do setor público, e um ganho fiscal indireto e difícil de contabilizar, que corresponde à situação alternativa em que seria preciso renegociar todas as dívidas em condições de mercado. A este respeito Giambiagi e Pinheiro (1992,p276) afirmam: “Credibilidade e não títulos é o que o governo mais deseja”. Quanto ao segundo argumento, o Tesouro ao não se apropriar do deságio não está propriamente perdendo, mas apenas deixando de aumentar o seu ganho sobre o setor privado. Além disso, sabe-se que o preço mínimo dos ativos negociados no PND é também afetado pela aceitação de pagamento em cash ou em títulos. Assim, na hipótese de ser aceito apenas cash em pagamento, o preço mínimo estabelecido 38 provavelmente teria que ser menor. A combinação de pagamento em cash e títulos públicos proporciona um ganho fiscal no preço praticado no leilão. Ao considerar o terceiro argumento, deve-se lembrar que as moedas de privatização ou são dívidas vencidas e não pagas, ou títulos que foram adquiridos de maneira compulsória. Assim, não constitui problema o resgate antecipado de tais títulos porque trata-se de dívidas que já deveriam ter sido pagas. Por outro lado, dado que os credores aceitaram a renegociação das dívidas e o seu conseqüente alongamento, o resgate antecipado, de fato, reduz o perfil da dívida. Tendo em vista a importância do financiamento para a compra de ativos públicos, outra hipótese que costuma ser aventada para gerar demanda pelas empresas é a criação, pelo BNDES, de uma linha especial de financiamento para aquisição de ações no âmbito do PND. Neste sentido, vários mecanismos - fracionamento de leilões, pulverização de ações que não dão direito a controle acionário, atração de capitais estrangeiros, etc. - tem sido analisados para evitar que a insuficiência de recursos internos se repercuta em queda dos preços das ações, com prejuízo para o Erário Público. Contudo, segundo Relatório do World Bank (1989), a concessão de crédito aos compradores de ativos públicos, a juros de 12% mais correção monetária, não resulta em ganhos para o governo porque a correção monetária é sub-avaliada, e portanto o empréstimo é concedido a juros subsidiados, e a relação dívida/patrimônio torna-se elevada, o que aumenta os riscos de falência. O Relatório Reservado (1997) divulgou em 26/02/97 e 28/2/97, que o governo federal se recusou a aceitar como moeda, na privatização da CVRD, títulos da dívida externa embora isso implicasse em um aumento de até 100% no preço mínimo da empresa, e que a oferta de uma linha de crédito especial para o vencedor da licitação do arrendamento da Malha Nordeste da Rede Ferroviária Federal teria 39 despertado o interesse do grupo Garantia antes desinteressado em tal aquisição. Tais fatos corroboram a proposição de que a aceitação de títulos públicos e a oferta de crédito aumentam a demanda por ativos no processo de privatização. Um outro estímulo seria a possibilidade de utilização dos fundos de poupança dos trabalhadores (FGTS e PIS/PASEP) para aquisição de ações nos leilões de privatização. b) Dívida interna ou dívida externa ? Uma apreciação preliminar da destinação dos recursos da privatização financiar investimentos, reduzir dívida interna, recomprar dívida externa ou financiar o Tesouro Nacional - tende a induzir o observador a crer que a análise custo-benefício poderia resumir-se a uma simples equivalência financeira das dívidas mobiliárias interna e externa, bem como das moedas de privatização. Para tanto, bastaria tomar a regra de cálculo e os juros de cupom de cada título, definidos legalmente, estimar a variação de indexadores no caso de papéis pós-fixados e calcular as taxas de juros efetivas das dívidas a serem pagas, da liquidação financeira do leilão até o vencimento de cada título. O método permitiria discriminar as moedas em termos de custos, estabelecendo uma "taxa de troca" entre elas, com alguma arbitrariedade no que diz respeito a uma 13 determinação prévia da variação de indexadores como câmbio, IGPM, TR e Selic . No que se refere aos prazos, a questão é mais complexa, pois envolve uma definição do perfil ideal de maturação, tomadas em conjunto as dívidas mobiliária interna e externa, em confronto com o perfil das receitas esperadas. Em outras palavras, não bastaria apenas optar por prazos mais longos, senão também evitar concentração nos vencimentos. 13 A conveniência de uma ação desse tipo merece ser considerada com mais detalhes pois, na qualidade de sinalizador de política econômica, o Tesouro Nacional atua diretamente sobre o mecanismo de formação de expectativas dos agentes. 40 A utilização dos recursos obtidos para resgate de títulos da dívida externa tem sido questionada por tratar-se de um passivo longo, já reescalonado, cujo custo não é tão alto quanto o da dívida interna. Além disso, para calcular o custo de oportunidade vis à vis o resgate de dívida interna, seria preciso considerar o deságio que se espera obter, além do perfil ideal de vencimentos para a dívida. Contudo, se o Tesouro Nacional fizesse um amplo anúncio da recompra, para garantir a publicidade do processo, o deságio fatalmente se reduziria e, conseqüentemente, o ganho relativo estimado no cálculo que fundamentou a decisão. Por outro lado, deve-se considerar a vantagem de formação de uma base de investidores no longo prazo, com abertura de novos mercados e conseqüente redução do risco Brasil nas novas captações públicas e privadas. Não obstante as desvantagens apresentadas, o aumento da credibilidade do governo, em virtude de estar honrando seus compromissos até mesmo antecipadamente, poderia possibilitar o alongamento do perfil da dívida e a redução dos juros exigidos no longo prazo. Atendido o mérito técnico da questão, caberia ainda averiguar a legalidade da discriminação entre títulos, visto que a maior parte dos contratos da dívida externa apresentam a cláusula de Negative Pledge, a qual determina que ao pagamento dos referidos títulos seja dado tratamento pelo menos equivalente àquele dispensado a outras obrigações da Dívida Externa. Essa dificuldade, aparentemente, poderia ser contornada se as regras do leilão determinassem critérios técnicos para aceitação dos títulos, baseados na conveniência em termos de custo para o Tesouro Nacional, a exemplo do que ocorre em processos licitatórios. Além disso, como alguns contratos prevêem a aceitação dos títulos no PND sujeita a regulamentações específicas, as regras do leilão parecem conter a brecha legal necessária à implementação da proposta. 41 Com base no que se expôs até aqui, seria conveniente estabelecer, em cada caso específico e de acordo com a atratividade da empresa, o mix ideal de moedas juntamente com o montante do crédito a ser oferecido aos compradores, considerando aspectos particulares tais como modelo, volume e cronograma, de modo a obter o melhor preço na venda de ações. É claro que a definição antecipada do mix desejado confere mais transparência ao processo e evita especulação, ao permitir que os agentes conheçam antecipadamente a estratégia do Governo. Contudo, como seria impossível abarcar num modelo geral todos os aspectos particulares relevantes, convém que a definição inicial seja suficientemente flexível para adaptar-se às considerações posteriores de um tratamento caso a caso. Contudo, conforme se verá ao longo da exposição, a solução para este problema não é tão trivial. Uma análise mais acurada permite perceber que a complexidade de impactos fiscais e monetários transcende em muito a comparação dos níveis de taxas de juros relativos a cada segmento da dívida. Inicialmente, há que considerar os impactos monetários das várias opções, no interesse da sustentabilidade do Plano de Estabilização. Neste sentido, a decisão de abater dívida interna ou externa deve levar em conta a necessidade de manutenção do volume de reservas internacionais em patamar administrável. Por outro lado, supor que a análise dos efeitos monetários da entrada de recursos externos com a privatização é atribuição apenas da Autoridade Monetária seria incorrer em grave equívoco. As ações da Autoridade Monetária afetam, de resto, direta ou indiretamente, o Tesouro Nacional, todas possuem um custo e um impacto fiscal. Na hipótese de utilização dos recursos obtidos com a privatização no resgate da dívida interna do Tesouro, o impacto de ações compensatórias por parte do 42 Banco Central deve ser considerado. Supondo estável a demanda por moeda e a taxa de juros, a redução observada na DPMFI do Tesouro Nacional em poder do público deverá ser contraposta pela elevação da DPMFI do Banco Central, emitida com fins de política monetária. Cabe ressaltar que os títulos de responsabilidade do Tesouro Nacional aqui citados referem-se exclusivamente àqueles que se encontram em poder do mercado pois os títulos da carteira do Bacen estão esterilizados para efeito de política monetária. Se considerarmos que o custo do endividamento interno que cabe ao Tesouro refere-se à DPMFI Total em poder do público, composta pelos títulos de emissão do Tesouro Nacional e do Banco Central, uma contraposição como a que acaba de ser descrita poderia manter o custo do endividamento interno inalterado. Ao final do processo, a tentativa de reduzir o nível de endividamento interno é neutralizada e o custo final corresponde à taxa de juros interna, deduzida do valor auferido pela remuneração das reservas. Assim, no interesse de promover o ajustamento fiscal, há que considerar os impactos da política monetária, pois o endividamento interno depende não só do resultado fiscal, mas também das operações de política monetária que trocam ativos mais líquidos por títulos públicos federais. Diante do que acaba de ser descrito, a questão deixa de ser abater dívida interna ou externa, pois isso se resolve tornando comparáveis os preços dos vários títulos, e passa a ser se a proveniência dos recursos é interna ou externa. Se é externa, há que se buscar um mecanismo pelo qual se possa evitar o impacto monetário da expansão das reservas internacionais. Uma das hipóteses já cogitadas refere-se à abertura de conta em dólar do Tesouro Nacional no exterior, o que possibilitaria a entrada paulatina das divisas e uma 43 melhor programação monetária. Outra possibilidade diz respeito, à constituição de um Fundo vinculado à referida conta e destinado ao financiamento de exportações ou à administração da dívida externa. A dificuldade maior, nesse caso, consiste em garantir que tais recursos não seriam utilizados para elevar gastos fiscais, considerando-se as pressões que surgem quando não há vinculação explícita entre usos e fontes. Nesse sentido, tendo em vista não existirem garantias de que o Fundo só seria utilizado para administrar a dívida externa, e lembrando ainda a longa história de inadimplência relacionada a Fundos, entende-se que essa opção não seria recomendável. Se a proveniência dos recursos é interna, a troca deve ser realizada de modo a evitar o vazamento monetário da retirada dos títulos do Tesouro, posteriormente contraposta por colocação de títulos do Bacen. Este vazamento monetário, entretanto, só existe porque a troca não é simultânea e intervém expansão monetária. Se a moeda não servir para intermediar a troca de ações por títulos, a situação pode ser diferente. Uma operação, realizada em conjunto com o Banco Central poderia prever a compra pelo Banco Central, com o menor alarde possível, de títulos do Tesouro em poder do público. Simultaneamente, os recursos da venda das ações seriam entregues ao Banco Central. O problema, nesse caso, consistiria em: a)realizar as duas operações sem lapso temporal para que não haja impacto monetário. b) realizar a operação sem alarde pois, caso contrário, ou o governo perde no desconto dos títulos ou no preço das ações que tendem a reduzir-se. A reação dos agentes tende a ser, inclusive, antecipada. c) definir a unidade de medida visto tratar-se de um escambo. Uma segunda possibilidade diz respeito à troca direta de ações por títulos, o que resumiria a questão à determinação dos preços dos títulos. A venda de ações no leilão de privatização poderia ser feita numa base voluntária, aceitando-se todo o 44 pagamento em títulos, das dívidas interna, externa e moedas de privatização, nos seguintes termos: "Oferto W ações da empresa Tal e aceito como moeda os títulos X, Y e Z, de emissão do Tesouro Nacional, desde que satisfeitas as seguintes restrições: (1) Pa ≥ Pm , isto é, o preço Pa ofertado pela ação somente poderá ser aceito se for igual ou superior a um preço mínimo Pm determinado no edital de privatização. (2) Pa x Qa ≥Pt x Qt , A receita obtida com a venda de ações, determinada pela multiplicação do preço Pa da ação por sua quantidade Qa, deve ser maior ou igual à receita obtida com a venda dos títulos, correspondente à multiplicação do preço Pt do título por sua quantidade Qt. O preço Pt de cada título fica fixado pelo desconto, da data da liquidação financeira do leilão até a data de resgate prevista na sua emissão, do valor de face, monetariamente corrigido nos termos do Decreto n.º 1.139, de 11/05/94, e pelos juros de coupon, quando houver, que incidem sobre o valor de face corrigido monetariamente, e são determinados segundo o regime de capitalização composta, de acordo com a Portaria do Tesouro Nacional n.º 506, de 15/12/94, que dispõe sobre o pagamento de juros de coupon das NTN, inclusive para resgates antecipados pro rata die. As propostas serão ordenadas segundo o critério de melhor preço, ou seja, em ordem decrescente da diferença (Pa Qa - Pt Qt), até o ponto em que a soma das quantidades das ações com proposta de compra aceita seja igual à quantidade de ações ofertadas." Para melhor entendimento da proposta, exemplificaremos com a simulação de um leilão, onde serão adotadas as seguintes hipóteses: 45 • Oferta de 11 ações da empresa Tal; • Preço mínimo Pm fixado em 3; • Houve propostas de compra utilizando como moeda um dado título X cujo preço Pt foi fixado em 5. Simulação Proposta nº Pa Qa m Pt Qt 1 2 5 3 5 2 0 Rejeitada, Pa < Pm 2 3 4 3 5 3 -3 Rejeitada, Pa Qa < Pt Qt 3 3 5 3 5 2 5 Aceita 4 3 6 3 5 3 3 Aceita 5 4 3 3 5 2 2 Corte LUCRO = 8 - TOTAL Q 11 PaQa PtQt Aceitação/Rejeição Dentre as vantagens desse esquema, além de evitar impacto monetário, poder-se-ia citar o aspecto da legalidade e publicidade do leilão, evitando vazamento de informações e movimentos especulativos que quase sempre cercam as recompras. Ademais, na utilização de recursos em cash para redução da colocação líquida de dívida, há que ater-se à vinculação explícita entre usos e fontes para que os recursos em cash não tenham como destino o financiamento a outras despesas, o que face à necessidade de ajuste fiscal não seria desejável. Na troca direta de ações por títulos, esse procedimento seria dispensável. A dificuldade consiste, como já foi citado, em pré-fixar a variação dos indexadores para calcular os preços dos títulos, os quais deverão ser previamente divulgados. Há ainda que contemplar a estrutura da demanda por títulos da dívida 46 interna, pois em vários casos a motivação é o hedge em operações casadas, o que pode desestimular muitos detentores de títulos a comprar ações ou mesmo a negociar os papéis se a taxa pré-fixada não for atraente. A pauta de propostas de Nunes & Nunes (1996) pode ser assim sintetizada: 1) Definição prévia das linhas gerais para aceitação de moedas no âmbito do PND, por grupos de empresas, destinando a cada edital específico o percentual de participação moedas de privatização. Além de conferir mais transparência ao processo e evitar especulação, ao permitir que os agentes conheçam antecipadamente a estratégia do Governo, a medida facilitaria as negociações de dívidas da União junto a terceiros, assumidas por força de Lei. 2) Definição do perfil ideal de maturação, tomadas em conjunto as dívidas mobiliária interna e externa, em confronto com o perfil das receitas esperadas. A medida evitaria que se optasse apenas por prazos mais longos, impedindo também concentração nos vencimentos. 3) Troca direta de ações por títulos ( dívida interna, dívida externa, moedas de privatização, etc.) no caso dos recursos terem proveniência interna. Empresas que apresentassem resultados operacionais expressivos poderiam ir a leilão sem que fossem aceitos títulos de longo prazo, que tem juros menores. Entretanto, empresas com elevados passivos poderiam ser leiloadas com a aceitação dos títulos de longo prazo. Além de evitar impacto monetário, a publicidade do processo permitiria que se evitasse movimentos especulativos que quase sempre cercam as recompras. 4) Se a proveniência dos recursos é externa, há pelo menos duas possibilidades não excludentes, para evitar o impacto monetário da expansão das reservas internacionais. a. Entrada paulatina das divisas, o que permitiria uma melhor programação monetária. 47 b. Abertura de conta em dólar do Tesouro Nacional no exterior para administrar a dívida externa e eventualmente fazer recompras. 5) Incluir na pauta de renegociação das dívidas de Estados e Municípios junto ao Governo Federal a possibilidade de recompra de títulos da dívida externa e interna no mercado secundário por Estados e Municípios utilizando os recursos da privatização das empresas estaduais e municipais, com divisão do deságio em partes iguais. 4. EFEITOS MACROECONÔMICOS DA PRIVATIZAÇÃO Nesta seção, são discutidos os efeitos macroeconômicos do Programa, já expressos nos objetivos da Lei que o criou, quais sejam: permitir a retomada de investimentos nas empresas e atividades que vierem a ser transferidas à iniciativa privada; contribuir para a modernização do parque industrial do País, ampliando sua competitividade e reforçando a capacidade empresarial nos diversos setores da economia; contribuir para o fortalecimento do mercado de capitais, através do acréscimo da oferta de valores mobiliários e da democratização do capital das empresas que integram o programa e contribuir para a redução da dívida pública. A reordenação da posição estratégica do Estado na economia deverá permitir que a administração pública concentre seus esforços nas atividades em que a presença do Estado seja fundamental para a consecução das prioridades nacionais. Utiliza-se um modelo para estimar o ganho fiscal decorrente da privatização, um dos principais objetivos da privatização brasileira. 4.1 Retomada de investimentos Com a privatização, o governo cede à iniciativa privada um plano de investimentos que não poderia efetivar, embora fosse socialmente responsável por ele. Além disso, por permitir que sejam liberados recursos públicos para áreas prioritárias, 48 a privatização tornou-se a saída para crescer. No caso do Grupo CVRD, constatou-se que o nível de investimentos realizado havia sido bem inferior aos níveis propostos nos últimos sete anos, pois os cortes do Orçamento impediam que a empresa explorasse ao máximo o seu potencial, o que a médio prazo tenderia a reduzir a sua competitividade internacional caso a empresa não fosse privatizada. Os fatos mostram que em várias empresas privatizadas ocorreu retomada de investimentos e aumento da produção e das exportações. De acordo com Pinheiro [105], 90,54% das empresas alienadas na década de 90 aumentaram a produção em cerca de 97% no ano da privatização e em 116% no período seguinte. O nível de investimentos também aumentou após a privatização. Para o total da amostra, a mediana aumentou de um nível de 55% no ano da venda e para mais de 110% nos anos seguintes. No caso do setor siderúrgico como um todo, quando se comparam os períodos 1988-91 e 1992-96, a produção de ferro gusa, aço bruto, laminados e aço semi-acabado aumentou, respectivamente, 6,7%, 6,8%, 6,2% e 7,7%, em média anual, e as exportações tiveram um incremento de 10,7%. Permitir a retomada de investimentos nas empresas e atividades que vierem a ser transferidas à iniciativa privada é fundamental para contribuir para a modernização do parque industrial do País, ampliando sua competitividade e reforçando a capacidade empresarial nos diversos setores da economia. Neste sentido, as empresas privatizadas tem cumprido o seu papel de estimular o investimento privado em setores considerados estratégicos para a formação de um parque industrial diversificado. O investimento em tecnologia na Usiminas após a privatização foi maciço, 49 com importantes reflexos para a indústria de base nacional. No final de outubro, para aumentar a capacidade de seu parque industrial, a Usiminas assinou contrato com um consórcio internacional de cinco empresas de bens de capital, no valor de US$ 142 milhões, envolvendo a instalação de um laminador contínuo a frio para produção de chapas especiais para utilização em automóveis e construção civil. Esse tipo de laminador será fabricado pela primeira vez no nosso país e seu índice de nacionalização será de 60%. A privatização também pode ter efeitos indiretos sobre o setor público na medida em que sirva como alavanca para o crescimento. Segundo Braga (1993), a retomada do investimento com a privatização poderá permitir uma redução da relação dívida pública sobre PIB na medida que incremente a competição e contribua para financiar o investimento. 4.2. Aumento da eficiência da estrutura industrial Conforme apresentado na seção anterior, um dos efeitos macroeconômicos que se espera atingir com o PND é a retomada de investimentos das empresas privatizadas, com importantes reflexos para a eficiência da economia pois o maior promotor de desenvolvimento econômico é o nível de investimentos. Um argumento muito utilizado para não realizar a privatização de algumas estatais é o de que elas são agências de desenvolvimento econômico, social e cultural nas regiões em que atuam e deixaria de ser se privatizadas. Esse foi o caso da CVRD que atua em nove estados, seja diretamente ou através de suas 14 empresas controladas e 26 colegiadas. O estatuto da empresa determinava que 8% do seu lucro fosse aplicado em projetos sociais nos municípios onde atua, o que representava mais de R$ 20 milhões em mais de 200 projetos de infra-estrutura, como estradas e creches. 50 Além disso, havia um fundo de melhoramento do Vale do Rio Doce, que recebia 4% dos dividendos da empresa e era administrado pelo governo de Minas, tendo lhe rendido, em 1996, R$ 5 milhões. Os Estados e Municípios assim beneficiados temiam que, com a privatização, não pudessem mais contar com esses recursos. No entanto, embora este argumento seja utilizado contra a privatização, sabe-se que promover o desenvolvimento social não é função de empresa estatal e, sim, do Governo Federal e dos Estados. A multiplicidade de objetivos da empresa lucros e políticas de estabilização ou de distribuição de renda - deve ser evitada pois reduz a sua eficiência. Nesse sentido, uma das principais contribuições que o PND pode dar à política industrial brasileira é melhorar o desempenho das empresas privatizadas, permitindo um aumento da competitividade média da indústria nacional, em decorrência da: a) possibilidade de racionalizar e desburocratizar a estrutura administrativa, agilizando a gestão das empresas e reduzindo os custos indiretos; b) obtenção de ganhos de eficiência e redução de custos diretos da produção, fruto da eliminação do excesso de funcionários; c) independência estratégica, que permitirá às ex-estatais aumentarem seus lucros aproveitando oportunidades em negócios afins a sua atividade principal; d) abertura de alternativas de financiamento para seus investimentos, através de seus acionistas privados, o que permite contornar a exaustão dos recursos orçamentários públicos disponíveis para inversão nas estatais, e) delimitação dos objetivos e resolução de problemas de agência. Gandara e Kaufman (1994) identificaram uma redução de custo na produção nas siderúrgicas privatizadas e Simonsen (1995,p.13) é contundente ao reconhecer o aumento da eficiência com a privatização: “Os sucessos da privatização na siderurgia são provas contundentes de como a iniciativa particular administra muito 51 melhor do que o governo na produção de bens privados, mesmo quando considerados estratégicos. Desde então essas empresas passaram a lucrar mais e aumentar seus investimentos. Estão satisfeitos os acionistas, os empregados e os compradores de produtos siderúrgicos. O governo livrou-se do pesado ônus que era a dívida da antiga Siderbrás. Só estão frustados frustrados os políticos que miravam essas empresas como cabides de empregos”. Costa (1994) também analisa a evolução das estatais privatizadas na década de 1980 e, embora não considere os resultados estatisticamente significativos, conclui ter havido uma melhoria do desempenho no setor privado. Pinheiro (1996,p.25) chega à mesma conclusão em estudo sobre a eficiência das empresas privatizadas: “os resultados obtidos confirmam que, com a privatização ocorre uma melhoria bastante significativa, em termos estatísticos e econômicos, do desempenho das empresas(...)” De modo geral, constata-se que, após a privatização as empresas se tornaram mais eficientes e lucrativas e o aumento de lucro foi maior nas empresas em que houve mudança de propriedade, o que é consistente com a idéia de que a mudança de propriedade aumenta os incentivos para os trabalhadores e administradores. Os resultados da Usiminas corroboram os argumentos teóricos apresentados. Embora já fosse considerada uma estatal bem administrada, a empresa necessitava de aporte de capital para o crescimento e estava onerada por dívidas. Após a privatização, a sua performance melhorou. A Usiminas, que já era rentável em 1991, aumentou em 457% o seu lucro líquido e elevou em 160% o valor dos dividendos distribuídos a seus acionistas em quatro anos14. 14 Ambos calculados em dólar pela cotação da moeda americana ao final de cada exercício. 52 Além disso, o princípio de que o impacto da privatização é maior quando combinado com a abertura da economia também parece aplicar-se ao caso brasileiro. As empresas privatizadas na década de 90 foram expostas a uma maior competição externa e são mais lucrativas. No caso brasileiro, observa-se que a simples ameaça de privatização já produz efeitos em termos de aumento de eficiência das empresas. Nos últimos anos, as empresas estatais produtivas tornaram-se mais lucrativas e passaram a pagar mais dividendos ao governo. Outro problema que a privatização contribuiria para solucionar refere-se ao fato de que, nas empresas públicas mais deficitárias, as metas de redução de pessoal acabam determinando a saída dos melhores funcionários e a permanência dos menos competitivos. A desestatização coloca fim às contratações políticas e com fins eleitoreiros e à manutenção de pessoal atendendo a questões sociais, freqüente nas empresas públicas. Assim, as críticas à privatização podem também ocultar, de um lado, o medo de perder o privilégio de nomear, sem limites, parentes e amigos para cargos da empresa e, de outro, os interesses corporativistas de funcionários que não desejam perder privilégios. Embora seja notória a mudança da política de emprego da empresa privatizada, o argumento de que a privatização seria responsável por desemprego em massa também parece ser um mito. Na Espanha, o governo impôs aos compradores o compromisso de manter o nível de emprego e a realização de investimentos em tecnologia. No Brasil, a Usiminas reduziu a sua folha de pessoal (antes da privatização tinha 12.400 funcionários e hoje tem 9.200) não preenchendo as vagas dos que se aposentam. A hipótese de demissão em massa foi excluída porque era preciso ganhar o apoio dos funcionários transformados em investidores. Além disso, a participação dos 53 empregados na privatização da empresa aumentou o seu comprometimento com a lucratividade e reduziu resistências à privatização. 4.3 Ajuste fiscal das contas públicas A idéia de que se poderia abater dívida pública com a venda de propriedade estatal já era apontada por Adam Smith (1937): “In every monarchy in Europe the sale of the crown lands would produce a very large sum of money, which, if applied to the payment of the public debts” (...). No Brasil, esta posição é corroborada por um raciocínio aparentemente simples de Campos (1995), que pode ser assim resumido: “Como o capital da União investido nas empresas estatais rende 1,08% a.a., a privatização pode ter um significativo impacto fiscal se este patrimônio for vendido e usado para abater dívida pública, sobre a qual o governo paga juros anuais na faixa de 20% a 25%. A cada R$ 10 bilhões de patrimônio alienado seria possível obter uma economia líquida de R$ 1,9 bilhão a R$ 2,4 bilhões por ano.” De fato, a Petrobrás registrou uma rentabilidade de 10,19% a.a. e a CVRD de 7,12% a.a., enquanto a taxa de juros real da dívida interna oscilou em torno de 18% a.a. O impacto fiscal sugerido por Campos é bastante significativo. Em 1994, o patrimônio líquido da União nas empresas federais somava cerca de US$ 88 bilhões. Se todo esse patrimônio fosse vendido pelo seu valor contábil e usado para abater a dívida pública, seria possível ter uma economia líquida anual de 3,3% do PIB em despesas correntes. Considerando que a União teve retorno sob a forma de dividendos de apenas 0,4% do seu patrimônio aplicado nas empresas estatais no período 1988/94 e que o governo teve que captar recursos no mercado para rolar sua dívida a taxas reais de 20% a 25% ao ano, a simples troca da totalidade das ações que a União detém 54 nessas empresas por papéis da dívida pública pode produzir uma redução acumulada das suas necessidades de financiamento cujo valor presente estimado chega a U$ 36,9 bilhões. Para Tourinho e Viana (out. 1993, p.2): “Os resultados do PND, quando comparados com os dos programas de privatização de outros países da América Latina, parecem, à primeira vista, bastante modestos. Entretanto, uma comparação mais cuidadosa revela que o PND é, entre eles, o de maior relevância no que tange à intervenção no setor industrial, pois foi o programa que arrecadou maior volume de recursos com a alienação de participação estatal em empresas industriais (US$ 3,6 bilhões)”. Esta posição aparentemente consensual entre os economistas foi colocada em cheque por alguns autores. Para Hemming e Mansoor(1988), Builter(1983) e Mansoor(1987) e Walters (1992), a privatização não contribui para reduzir o déficit público, pois implica tão somente na troca de um ativo menos líquido por outro mais líquido, não proporcionando nenhum ganho fiscal direto. Para Mansoor, a política de privatização se assemelha à emissão de títulos públicos: recebe-se recursos hoje, mas em contrapartida, no futuro tem-se uma receita menor decorrente de uma redução de rendimentos. A este respeito, Werneck (1989,p.27)alerta que: “Tal como tem ocorrido em outros países, a privatização tem sido erroneamente vista no Brasil como uma maneira de reduzir o déficit do governo - e, conseqüentemente, de alterar sua postura fiscal - no montante equivalente ao resultado da venda de ativos. Já que a venda de ativos não acarreta mudanças no patrimônio líquido do governo, não há qualquer impacto fiscal, ainda que certamente o governo se veja com maior liquidez.” Para Marcel (1989), o impacto fiscal no Chile teria sido nulo. Pinheiro e Schneider (1993) apontam a explicação: na década de 70, as estatais chilenas teriam se tornados 55 rentáveis e a receita com dividendos teria alcançado 25% do total da receita governamental. Além disso, de fato, considerando que depois que as empresas forem vendidas para abater a dívida pública, novos déficits continuarão sendo gerados, privatizar com o objetivo estrito de promover ajuste fiscal poderá ser uma iniciativa estéril. Para Hanke (1987) não se deve utilizar receitas de privatização para financiar déficits. Como se pode observar nos dados constantes do Relatório do FMI (outubro de 96), a experiência argentina mostra que, apesar de ter aumentado a competitividade externa e elevado a produtividade a nível interno, e embora o programa de privatização esteja na sua fase final, novos déficits fiscais voltaram a ser gerados e o endividamento atinge nível semelhante ao que antecedeu a privatização no país. Gerchunhoff (1992) antecipou tal situação ao crer que o processo argentino ao oferecer benefícios excepcionais, como expressiva recomposição tarifária, possibilidade para fixação de reajustes futuros e manutenção de monopólios. Para Mello (1994,p.446), a privatização não contribui para o ajuste fiscal, requerendo um conjunto de medidas paralelas: “Torna-se cada vez mais claro que o ajuste do desequilíbrio fiscal brasileiro só poderá ser enfrentado com sucesso se forem abertas muitas frentes de combate. Há que existir um permanente esforço do governo no sentido da implementação de medidas como: renegociação e alongamento do perfil das dívidas interna e externa; transferência para os governos subnacionais de alguns dos atuais encargos do governo federal; renegociação das dívidas dos estados e municípios para com o governo federal; controle coordenado das empresas estatais (...) reforma da previdência social; aumento de impostos, redução de gastos, privatização, e assim por diante.” Então, como conciliar os resultados fiscais de Campos com a conclusão de 56 que a privatização não teria um impacto fiscal significativo? Há duas soluções complementares para este aparente paradoxo. A primeira diz respeito ao valor das empresas vendidas. Giambiagi e Pinheiro (1992) desenvolveram um modelo para avaliar o impacto da privatização sobre as contas públicas, concluindo que não permitiria o ajuste fiscal das contas públicas porque poucas empresas haviam sido incluídas no PND. O principal efeito fiscal viria do aumento da rentabilidade das empresas e da eficiência da economia, bem como da transferência para o setor privado da responsabilidade de investir nos setores até então ocupados pelas estatais. De fato, é interessante observar que a Lei 8.031, que criou o Programa Nacional de Desestatização, não lista o ajuste fiscal como um dos objetivos do programa, que ficaria limitado àquilo que resultasse da redução dos encargos sobre a dívida abatida. A segunda razão diz respeito à parcela dos lucros distribuída sob a forma de dividendos. A maior parte dos trabalhos considera implicitamente a distribuição integral de lucros, o que não corresponde à realidade brasileira. Para Giambiagi e Pinheiro (1996), a privatização pode contribuir eficazmente para o ajuste fiscal devido a características peculiares da nossa economia, onde o pagamento de juros é elevado e baixo o retorno de dividendos com a participação acionária das empresas públicas. Os benefícios da privatização em termos de ajuste fiscal seriam os seguintes: 1. principalmente, a utilização da receita de privatização para abater uma dívida pública de custo elevado. Só a venda da Vale do Rio Doce, pode proporcionar a utilização de recursos da ordem de R$ 5 a 6 bilhões, ou 1% do PIB, para abater a dívida pública, que apresenta um custo de rolagem elevado. 2. a redução do pagamento de juros em decorrência da redução do estoque de dívida e da queda dos juros devido ao aumento de credibilidade do governo e à menor 57 necessidade de captação de recursos no mercado. Sendo maior que a receita de dividendos, o ganho com o abate de dívida possibilita reduzir o déficit futuro do setor público e age positivamente sobre as expectativas inflacionárias. 3. a transferência de dívidas do setor público para o setor privado. 4. o fim dos aportes de capital para as empresas. 5. o aumento da rentabilidade das empresas que continuam sendo estatais em decorrência da possibilidade de aumentar os investimentos. 6. a possibilidade de que a empresa, com o aumento de sua rentabilidade, proporcione um aumento de receita ao governo oriundo do pagamento de mais impostos. Comparativamente à atual receita de dividendos, o pagamento de impostos tenderia a ser maior, contribuindo para melhorar a situação fiscal. Assim, o impacto da desestatização seria maior que o sugerido por Hemming & Mansoor, Builter (1983) e Mansoor(1988) pela conciliação de diversos fatores e menor que o esperado por Campos (1995). Para analisar a contribuição da privatização, deve-se estudar em separado as vendas de empresas controladas diretamente pela União das de subsidiárias das estatais. Em seguida, somar os efeitos da privatização de empresas controladas direta e indiretamente pela União e fazer o confronto entre os benefícios da privatização e os encargos da dívida pública. Assim, se o ganho fiscal permanente com a venda das empresas for maior do que as despesas com juros da dívida pública, a privatização contribui efetivamente para o ajuste fiscal. A estimativa do impacto fiscal da privatização sobre a Necessidade de Financiamento do Setor Público - NFSP baseia-se nos modelos de Pinheiro e Giambiagi (1993), Pinheiro e Schneider (1993) e Hachete e Lüders (1992), acrescidos de algumas modificações para uma aplicação prática. Inicialmente, procede-se o confronto entre benefícios e perdas com a privatização e, em seguida, analisa-se como 58 a dívida pública evolui com e sem os efeitos da privatização. Assim, se o ganho fiscal permanente com a venda das empresas for maior do que as despesas com juros da dívida pública, a privatização contribui efetivamente para o ajuste fiscal, na medida em que reduz o estoque de dívida. A utilização no abatimento de dívida dos recursos obtidos com a privatização poderá contribuir para o ajuste fiscal se atender aos seguintes critérios conjuntamente: redução do valor do endividamento público absoluto, reduzindo a relação dívida pública/PIB, queda da taxa de juros, sendo acompanhada de aumento do resultado primário e de crescimento do PIB. Ao longo do modelo, serão adotados os seguintes procedimentos: a) Os valores serão apresentados em dólares ou em percentual do PIB na estimativa do ganho fiscal da venda de empresas. b) Assumiremos que a privatização, no curto prazo, não repercute na credibilidade do governo, o que poderia permitir um alongamento da dívida com redução da taxa de juros, num percentual de difícil mensuração. c) Todos os recursos arrecadados em moeda corrente na venda das participações diretas do governo foram utilizados para abater a DPMFI. d)A dívida pública será dividida em duas categorias, tendo como parâmetro a taxa de juros: i)Dívida Pública Mobiliária Federal - DPMFI, cuja taxa de juros foi arbitrada em 18% a.a., considerando-se a série histórica; e ii) Dívida com Créditos Securitizados - DC, referente a debêntures Siderbrás, OFND, Certificados de Privatização, Obrigaçõs do FND - OFND, Títulos da Dívida Agrária - TDA, Letras Hipotecárias da Caixa Econômica, para a qual assumimos uma taxa de juros de 6% a.a.. Cabe observar que, embora pertençam à DPMFI, os títulos NTN-P, apresentam taxa de juros de 6% a.a. e prazo de 15 anos para resgate e tem como 59 credores as empresas controladas diretamente. Por essa razão, consideramos esses títulos recursos da União, uma vez que, quando as empresas credoras forem privatizadas, haverá um encontro de contas com a União, que assumirá os créditos e obrigações das empresas. Para avaliar o saldo líquido do ajuste, deve-se estimar o fluxo presente dos ganhos fiscais das sucessivas vendas de empresas, deflacionando por um fator de desconto δ que reflete a fragilidade do setor financeiro público. Utilizaremos como valor representativo de δ a taxa over-selic, por representar o custo do dinheiro para o governo. Assim, a contribuição permanente da privatização poderia ser representada ainda da seguinte forma: IFPt= economia com emissão de títulos da dívida mobiliária + economia de juros + redução de investimento pela transferência das empresas privatizadas - perda com a receita de dividendos + aumento de arrecadação tributária. O primeiro termo nos informa o ganho fiscal decorrente da entrada de dinheiro corrente. A receita em dinheiro complementa a necessidade de cash do governo que deixa de ir ao mercado captar a elevada taxa de juros. O segundo termo reflete a economia com juros com a aceitação de crédito securitizado, em outros termos, a redução da despesa com juros. O terceiro termo refere-se à perda de receita com privatização e, finalmente, o quarto representa a diferença de arrecadação tributária decorrente do aumento de eficiência das empresas privatizadas. O impacto permanente da privatização poderia ser medido através da igualdade: 60 (1)IFP(vp)= (1-α). Pp.λ.Kg +Σnt=1[(i.Dt-1-i*. D*t-1) /I1+δ)t] +Σnt=1[θ(Dt-1- D*tt-1-) /I1+δ)t]+ +Σnt=1[(It- I*t)/I1+δ)t]- Σnt=1[(β.Pg.λ.Kg)/I1+δ)t] +Σnt=1[[(tp.rp.-tg. β.λ.Kg)/I1+δ)t] Em relação à equação (1), podemos desmembrá-la e informar o significado de cada termo: IFP(vp)= valor presente do impacto α= parcela da privatização destinada a fiscal da privatização; outros fins que não abater dívida; Pp = preço pago pelo setor privado pela λ.Kg= parcela do capital do setor parcela do capital do setor público público privatizada; privatizada; j= taxa de juros média paga sobre a δ= taxa de desconto do setor público; DPMFI do setor público (a taxa overselic será utilizada como proxy); que nós arbitramos 18% a.a.; θ= parcela pública amortizável aceita com da dívida receita de β= taxa de retorno sobre o ativo, calculada dividindo-se os dividendos privatização; sobre o patrimônio líquido; rg= rentabilidade das empresas estatais I= nas mãos do governo produtivas estatais; Kp= capital privado decorrente de rp= aquisição em privatização; privatizadas nas mãos do setor privado; Ip= investimento privado nas empresas t= alíquota de tributação média sobre as privatizadas; empresas *= o asterisco indica o valor quando há Pg= Preço do capital público tal como privatização para cada variável no percebido pelo governo; utilizaremos o investimento rentabilidade das empresas das empresas 61 mesmo período de tempo Patrimônio líquido como proxy; D= Dívida Pública z= depreciação do capital O próximo passo é confrontar o benefício líquido da privatização com os encargos da dívida. Relacionando as despesas e receitas do setor público de um lado, e de outro, o financiamento das contas governamentais, com a suposição de câmbio constante, podemos apresentar a restrição orçamentária da União da seguinte forma: (1) Cg + Ig +i*Deg - T = δM + δDig + δDig, onde: Dig= dívida pública interna δ= diferencial T= receitas do setor privado Cg= Consumo do setor público i= taxa de juros real da dívida pública Deg= dívida pública externa interna i*= taxa de juros real da dívida pública Ig= Investimento do setor público (a externa alienação de ativos do setor público é contabilizada nesta categoria com sinal negativo Fazendo D= Dig + Deg e reescrevendo (1), temos que: δD= D’(i-g) + p’- δM/Y, onde: D’= relação da dívida pública/PIB p’= resultado fiscal primário/PIB (se positivo, superávit) g= taxa de crescimento real do PIB M= base monetária Y= Produto interno bruto (PIB) Foram adotados os seguintes procedimentos: 1. Em 1997, a estimativa de receita de privatização é de 90 bilhões, segundo MPO. 62 Considerando PIB de 815 bilhões, temos que a estimativa é de 11% com receita de privatização que assumiremos que se realize dentro dos próximos quatro anos em parcelas iguais, incluindo 1997. 2. A receita de privatização é constituída em 50% de recursos em cash e 50% em dinheiro. 3. Empregaremos o conceito de NFSP abaixo da linha, calculado pelo Banco Central e não o conceito de déficit acima da linha, divulgado pela Secretaria de Política Econômica- SPE. Embora os dois conceitos devessem apresentar o mesmo resultado, isto não vem ocorrendo. 4. Quando uma empresa é transferida à iniciativa privada, a responsabilidade dos investimentos passa a ser do setor privado. Assim, muitas vezes, se deduz o valor dos investimentos integralmente do cálculo do ganho fiscal. Contudo, algumas empresas auto-financiam seus investimentos, enquanto outras recorrem a aporte governamental. Para o orçamento de 1998, a previsão é de que 1,4% do orçamento estatal seja de aporte do Tesouro Nacional ou da empresa controladora. Assim, entendemos que o impacto fiscal na NFSP é de apenas uma fração do montante destes investimentos, que arbitramos em 5%. 5. Tem-se argumentado que as empresas privatizadas tornaram-se mais eficientes, o que faz com que algumas empresas passem a pagar impostos e as que já pagavam, passem a pagar mais. Assim, arbitramos em 5 % o ganho com elevação de receita tributária. RESULTADOS Supondo que a taxa de desconto seja de 18%, o estoque inicial da DPLSP seja de 32% do PIB - verificado em janeiro de 1997 -, que o governo apresente 63 sucessivos superávits primários de 1% e o PIB, a partir de 1997, apresente crescimento de 3%a.a., analisarmos a contribuição do ajuste fiscal da privatização. O ganho fiscal originado pelo menor pagamento de juros sobre a dívida pública, seja pelo abatimento com os recursos em cash, seja pela aceitação das moedas de privatização, pelo aumento de receita tributária utilizada no abatimento de dívida, pela transferência da responsabilidade pelos investimentos públicos, subtraído dos dividendos que o governo deixa de receber com a privatização foi de 14,35% do PIB. Este resultado é maior do que o realizado em outros trabalhos, o que tem origem no fato de se ter considerado uma privatização de R$ 90 bilhões, quando até então o impacto da privatização envolvia cifras bem menores, algo em torno de R$ 12 bilhões. O trabalho reforça a proposição de Giambiagi de que a privatização pode atuar eficazmente no ajuste fiscal devido a particularidades de nossa economia, a saber, elevados juros e grande participação das estatais na economia brasileira. 64 anos 1. Receita em Moeda 2. Economia com juros 3. Economia c/ Inv.%do PIB 4. Perda c. R. div.%do PIB 5. Ganho com elev. de Trib. anos 1. Receita em Moeda 2. Economia com juros 3. Economia c/ Inv.%do PIB 4. Perda c. R. div.%do PIB 5. Ganho com elev. de Trib. total Estimativas de Impacto Fiscal do Programa Nacional de Desestatização Percentuais do PIB a valores presentes de 1997 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 0,01% 0,00% 0,06% 0,41% 0,08% 0,56% 2,25% 1,85% 1,52% 1,25% 1,03% 0,85% 0,43% 0,57% 0,39% 0,08% 0,07% 0,08% 0,47% 0,39% 0,32% 0,26% 0,22% 0,18% 0,00% 0,04% 0,01% 0,01% 0,01% 0,01% 0,01% 0,01% 0,01% 0,01% 0,01% 0,00% 0,00% 0,01% 0,05% 0,04% 0,04% 0,03% 0,03% 0,03% 0,02% 0,02% 0,02% 0,02% 0,00% 0,00% 0,01% 0,09% 0,08% 0,07% 0,06% 0,05% 0,04% 0,04% 0,03% 0,03% 0,02% 0,00% 0,00% 0,01% 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,02% 0,02% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% PIB em US$ milhões Receita Priv US$ milhões Receita em cash- US$ milhões Receita em títulos- US$ milhões Receita em cash % do PIB Receita em títulos % do PIB Invest. das EE % PIB Economia c/ inv. das EE % do PIB dividendos das EE US$ milhões dividendos como % do PIB Imposto de Renda pago pelas EE Ganho maior rec.tributária 1991 405.770 1.564 15 1.549 0,00% 0,39% 2,33% 0,02% 96 0,02% 2008 1992 1993 409.167 507.353 2.451 2.621 1 163 2.450 2.458 0,00% 0,03% 0,60% 0,52% 2,42% 1,98% 0,04% 0,06% 224 179 0,05% 0,04% 2009 2010 1994 545.290 1.972 1348 624 0,25% 0,36% 1,58% 0,08% 405 0,07% 2011 1995 595.261 1.004 328 676 0,06% 0,17% 1996 646.744 4.405 3.304 1.101 0,51% 0,68% 1997 668.086 15.000 7.500 7.500 1,12% 2,25% 1998 688.129 15.000 7.500 7.500 1,09% 2,18% 1999 708.772 15.000 7.500 7.500 1,06% 2,12% 2000 730.036 15.000 7.500 7.500 1,03% 2,05% 2001 751.937 15.000 7.500 7.500 1,00% 1,99% 2002 774.495 15.000 7.500 7.500 0,97% 1,94% 2003 797.730 2004 821.662 2005 846.311 2006 871.701 1,04% 300 0,05% 0,12% 729 0,11% 1.729 0,15% 0,17% 0,19% 0,21% 0,21% 0,21% 0,21% 0,21% 0,21% 0,21% 86,45 86,45 86,45 86,45 86,45 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020 2017 2018 1.072.082 1.104.244 1.137.372 1.171.493 1.206.638 1.242.837 1.280.122 1.318.526 1.206.638 1.242.837 2019 1.280.122 2012 PIB em US$ milhões 924.787 952.531 981.107 1.010.540 1.040.856 Receita Priv US$ milhões Receita em cash- US$ milhões Receita em títulos- US$ milhões Receita em cash % do PIB Receita em títulos % do PIB Invest. das EE % PIB Economia c/ inv. das EE % do PIB 0,21% 0,21% 0,21% 0,21% 0,21% dividendos das EE US$ milhões dividendos como % do PIB Imposto de Renda pago pelas EE* Ganho maior rec.tributária 86,45 86,45 86,45 86,45 86,45 Fonte: STN/MF, SEST/MPO,Balanço Anual Gazeta Mercantil * Estimativa a partir de dados fornecidos pela STN. 0,21% 0,21% 0,21% 0,21% 0,21% 0,21% 0,21% 0,21% 0,21% 0,21% 0,21% 0% 0% 86,45 86,45 86,45 86,45 86,45 86,45 86,45 86,45 86,45 86,45 86,45 Evolução da DLSP com e sem privatização 90% 80% 70% 60% 50% div/PIB 40% div/PIB* 30% 20% 10% 20 18 16 14 12 10 8 6 4 2 0 0% Fonte: BNDES. 5. CONCLUSÃO A substituição da lógica que por muito tempo permeou a intervenção estatal na economia por um novo padrão de intervenção tem em comum a busca de maior eficiência, através da quebra de monopólios e da gestão privada das empresas. A desestatização atua nesse sentido porque contribui para o aumento da eficiência da economia, em parte porque a gestão pública das empresas é substituída pela gestão privada e, principalmente, porque se evita também a formação de monopólios. Neste sentido, a regulação só deve ser adotada quando a existência de mercados com falhas não deixar alternativa. Isto exigirá o desenvolvimento de legislação específica definindo os direitos e deveres do Estado, das empresas e dos consumidores, e determinando como e por quem eventuais disputas serão dirimidas. A desestatização permite ainda que o governo transfira para a iniciativa privada a responsabilidade por investimentos que não teria condições de realizar, o que tende a intensificar avanços tecnológicos e elevar a eficiência sistêmica. No que diz respeito às contas públicas, além da utilização da receita de privatização para abater uma dívida de elevado custo, o aumento de eficiência das empresas privatizadas induz aumentos de arrecadação. Dada a receita de privatização esperada, conclui-se que poderá conter provisoriamente a dívida pública. Assim, espera-se que o prosseguimento do processo, inclusive com a inclusão de outras empresas, aumente os ganhos fiscais. Além disso, os efeitos macroeconômicos que se espera obter com a privatização dependem em grande medida da condução do processo. Essa condução inclui a seqüência de privatização, o método utilização na avaliação do preço das empresas, a modalidade de desestatização, a modelagem e o método de venda, a aceitação de moedas e a destinação de recursos. A análise do processo de privatização brasileiro, com o intuito de determinar as condições que permitem maximizar o ganho fiscal para o Tesouro Nacional, indicou que: a) Apesar das críticas, em particular do TCU, a seqüência de privatização adotada no Brasil, iniciando pela venda de empresas lucrativas, cria um ambiente favorável para a venda das empresas deficitárias, o que se coaduna com a teoria estabelecida. b) O método utilizado na avaliação do preço das empresas é adequado na medida em que o valor da empresa reflete o lucro que pode propiciar a seu comprador e não o custo incorrido pelo vendedor ao adquirir a empresa ou ainda o valor atribuído ao patrimônio pela contabilidade, o qual está sujeito a distorções de correção monetária. Relativamente à crítica de que o método CAPM subavalia o preço, cabe observar que o método determina o preço mínimo e não necessariamente o preço de venda. Contudo, para evitar uma avaliação viesada na determinação do preço mínimo, duas consultorias realizam as estimativas e, caso a diferença entre elas ultrapasse 20%, outra empresa é convocada. 68 c) No Brasil, diversas modalidades de desestatização são autorizadas pela legislação vigente, podendo ser adotadas em diferentes situações, o que em tese permitiria uma melhor adequação às peculiaridades de cada situação. d) A modelagem adotada no Brasil é a concentrada, o que permite auferir maior receita. e) A utilização de moedas de privatização permite que o governo venda empresas que, de outro modo, não seriam vendidas. f) A utilização da receita de privatização para abater uma dívida de elevado custo permite que o governo maximize o ganho fiscal com a desestatização. Os resultados obtidos pelo programa até o presente momento, contudo, não nos permitem afirmar que os objetivos estejam sendo atingidos. Para Werneck (1989,p.321) não se deve esperar muito da privatização: ”Pode-se defender o programa de privatização de várias formas. O que não se pode é vê-lo como uma alternativa indolor a um efetivo ajuste fiscal.” Este também parece ser o argumento de Giambiagi e Pinheiro (1992: 282): “a privatização não é necessária ou suficiente para atingir todos os objetivos propostos pelo governo”. Assim, se a privatização não for conjugada a outras medidas de austeridade fiscal, a persistência de elevada taxa de juros e os sucessivos déficits públicos podem fazer retornar a dívida abatida ao patamar atual. BIBLIOGRAFIA ABREU, M. P. & WERNECK R. L. F. (1993) Privatization and Regulation in Brazil: The 1990-92 Policies and the Challenges Ahead. Texto para Discussão nº300. Departamento de Economia da PUC. AVERCH, H. e JOHNSON, L.L. (Dez 1962). 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