entrevista Impactos das tecnologias digitais sobre a audição dos jovens Os avanços tecnológicos são inegáveis e importantes. Mas, fora da medida, alguns equipamentos podem causar impacto na audição. O alerta é da médica otorrinolaringologista Érica Ortiz, que chama a atenção especial dos pais, especialmente porque os maiores adeptos dessas inovações, portanto os mais vulneráveis, são os jovens. Acompanhe a entrevista: Dr. Jornal - Qual é o impacto da tecnologia digital em musicas na audição do ser humano? Drª Érica - Atualmente, sabe-se que podemos perder a audição por exposição nociva a ruídos intensos e contínuos, ainda pior se estiverem associados à vibração ou agentes químicos ototóxicos. A perda auditiva induzida por ruído (PAIR) é definida como uma perda auditiva neurossensorial irreversível bilateral e simétrica, que se desenvolve gradualmente ao longo de uma exposição média de 6 a 10 anos a um nível de intensidade sonora de 85dB/8horas/dia. drª Érica Ortiz CRM 91200 médica otorrinolaringologista Dr. Jornal - Como evolui esse tipo de perda auditiva? Drª Érica - A perda de audição progride rapidamente nos primeiros 10 anos, e depois, torna-se mais lenta até estabilizar em um certo nível de intensidade sonora. Já o trauma acústico é uma perda auditiva súbita por um aumento súbito do nível de pressão sonora, como exemplo uma bomba ou rojão explodindo ao lado de uma pessoa (ouvido). 4 entrevista Dr. Jornal- O que as novas tecnologias trouxeram em termos de impactos auditivos? Dr. Jornal - As pessoas não tem noção dos estragos que podem fazer alguns aparelhos. Drª Érica - A nova tecnologia de tocadores de musica digital trouxe novos hábitos a população, principalmente para adolescentes e adultos jovens. Os iPods, celulares, MP3, MP4 têm grande capacidade de armazenamento, baterias duradouras e qualidade e volume de sons elevados; além disso, estão acoplados geralmente a fones individualizados de ouvido, cuja emissão de som chega diretamente à membrana timpânica e conseqüentemente às células ciliadas externas. Os custos mais baratos destes aparelhos possibilitaram a vasta utilização pelos adultos jovens, adolescentes e crianças. Comumente, observamos pessoas nas ruas, nos parques, nos carros e ônibus ouvindo musicas em seus fones de ouvidos acoplados aos tocadores digitais. O abarrotamento de pessoas e carros nas médias e grandes cidades provoca o uso mais prolongado destes aparelhos durante o dia, à medida que as pessoas aguardam no trânsito, em filas ou caminham. A possível conseqüência desta sonorização solitária é o aparecimento de um maior número de indivíduos com perda auditiva no futuro. Drª Érica - Alguns aparelhos chegam a emitir sons em intensidade de 130 dB, que é considerada muito perigosa aos ouvidos do ser humano, comparado ao som de uma turbina de avião a jato. As tabelas presentes nesta página mostram as diferentes fontes e suas respectivas intensidades sonoras, e os níveis seguros de exposição sonora, assim como o tempo tolerável de exposição ao ruído. Dr. Jornal - Já existem estudos que comprovem os impactos do uso desses aparelhos sobre a audição? Drª Érica - Apesar de parecer que as perdas auditivas tendem a aumentar com o uso inadvertido destes aparelhos de sons, estudos demonstram resultados controversos. Os achados intuitivos que podem ser extraídos deste primeiro estudo a longo prazo sobre perda auditiva dão conta que, a cada 5 anos, para homens e mulheres nascidos no final do século 20, as chances de apresentar problemas de audição caem 13% e 6%, respectivamente. Isso se deve ao conhecimento de como podemos perder a audição Tabela 01 - Níveis de ruídos Fonte Sonora Turbina de avião a jato Arma de fogo Serra elétrica Cortador de grama Show de rock Furadeira pneumatica Walkman no volume 5 Pátio do aeroporto internacional do RJ Avenida movimentada Trafego pedágio Automóvel a 20 metros Conversação a 1 metro Sala silenciosa Área residencial à noite Falar sussurrando 5 Intensidade Sonora (dB) 140 130-140 110 107 105-128 100-105 95 80-85 85 80 70 80 50 40 20 entrevista Tabela 02 - Tempo máximo de exposição sonora por dia Tempo máximo por dia 6 horas 6 horas 4 horas 3 horas 2 horas 1 1/2 hora 1 hora 1/2 hora <15 minutos Nível Sonoro (dB) 86 92 95 97 100 102 103 110 115 por exposição ao ruído e às medidas de segurança no trabalho para conservação da audição. O estudo sugere que as mudanças positivas nos últimos 50 anos, níveis de ruídos reduzidos no trabalho e melhor saúde, no geral são mais importantes do que o crescimento do uso de fones de ouvido e outros produtos “barulhentos”. Por muitos acreditarem que o mundo está cada vez mais cheio de ruídos, pensa-se que as perdas auditivas podem aumentar, diz Weihai Zhan, cientista da saúde da população da Universidade de Wisconsin, Madison (EUA), mas a predominância dos problemas auditivos pode estar diminuindo entre as gerações. Porém, este cientista não avaliou indivíduos moradores de médias e grandes cidades. Num estudo feito em 1999, em São Paulo, 20 voluntários foram expostos a 60 minutos de música em alto volume (87 a 113 decibéis) por meio dos fones de um “walkman”. Dos 40 ouvidos estudados, 25% tiveram perda auditiva e 72,5% apresentaram zumbidos. Em 90% dos casos, esses sintomas desapareceram em menos de 24 horas. Em 48 horas, todos tinham voltado à normalidade. Dr. Jornal - Que outros fatores favorecem a utilização dos tocadores digitais em níveis sonoros perigosos? Drª Érica – O alerta seria respeitar os níveis sonoros seguros (que podem ser observados nas tabelas), deixando em volume baixo e fragmentando o uso destes aparelhos ao longo do dia ou semana. Todos os usuários deveriam ter noção da intensidade sonora emitida por seu aparelho digital e não ultrapassar o nível de intensidade sonora de 70dB. Dr. Jornal - Existem alguns sinais de alerta que deveriam levar a pessoa a procurar o médico? Drª Érica - O principal sinal de alerta é o zumbido. Quando o zumbido fica constante ou aumenta de intensidade, pode sugerir que já houve lesão nas células da orelha interna. E, obviamente, a perda de audição que pode ocorrer de maneira progressiva e a pessoa ter dificuldade na conversa em locais ruidosos ou não ouvir quando a chamam a uma média distância, ou ainda ter dificuldade em entender as palavras. Dr. Jornal - O que está sendo feito para prevenir as perdas auditivas em jovens? Drª Érica - Na tentativa de prevenir perdas auditivas na população jovem, projetos de lei estão sendo analisados no Brasil. Na França, já existe uma lei em vigor e na Bélgica, um projeto em análise. A Sociedade Brasileira de Otologia (SOB) apóia o Projeto de Lei para controle de MP3, que tem como base a Campanha Nacional da Saúde Auditiva. O Projeto de Lei nº 4524/08, de autoria do deputado federal Jefferson Campos (PTB-SP), proíbe a comercialização de tocadores pessoais de música em formato digital, os famosos MP3 players, cujo 6 entrevista volume máximo ultrapasse o limite de 90 decibéis. A proposta inclui não só ipods e similares, mas também aparelhos de múltiplas funções, como celulares. Além disso, o projeto obriga a inscrição de alerta para os riscos do uso prolongado em alto volume (superior a 85 decibéis) em todos esses aparelhos. O projeto chega três meses depois de a Sociedade Brasileira de Otologia alertar o Brasil durante o mês de novembro do ano passado sobre os perigos do som alto dos MP3 players por meio da Campanha Nacional da Saúde Auditiva. O slogan da Campanha, ‘Abaixe o volume ou diminua para sempre a sua audição‘, foi muito bem recebido por escolas, hospitais e universidade. No quadro abaixo, pode-se observar as medidas da intensidade sonora dos diversos aparelhos de sons da atualidade e seus níveis de volume seguros e nocivos ao ouvido humano: aparelho / fabricante iPod Nano, da Apple MuVo TX FM, da Creative Walkman NW E-507, da Sony Go Gear SA178, da Philips 7 nível seguro nível nocivo 64% do volume: volume máximo: 63% do volume: volume máximo: 68% do volume: volume máximo: 82% do volume: volume máximo: 85 dB 85 dB 85 dB 85 dB 114 dB 109 dB 101 dB 94 dB