TEMAS EM DISCUSSÃO – ABRIL PROF. JUTORIDES 1. China: Líder Global? / Marcos Troyjo Como se dará o desdobramento da ascensão da China no cenário global? Será que além de motor do crescimento mundial a China também deseja exercer maior liderança? Ser vista como única potência de dimensão semelhante aos Estados Unidos? Muitos analistas rapidamente decretam que o impressionante crescimento econômico chinês delineia uma nova ordem global em que a China será a potência preponderante. Existem, no entanto, graves falhas nessa maneira de ver o desenrolar das relações internacionais nos próximos 50 anos. Historicamente, como bem exemplifica Henry Kissinger em seu On China, líderes chineses sempre enxergaram sua cultura como intrinsicamente superior. O modelo chinês de império se caracterizou ao longo tempo não pela expansão de sua cultura, mas pela absorção de outras culturas, localizadas em seu entorno geopolítico, à visão de mundo chinesa. O fechamento a outras culturas incutiu na alma e na arquitetura chinesas marcas perceptíveis. Vêm à mente o hermetismo da Cidade Proibida ou mesmo a Grande Muralha, monumentos ao isolacionismo chinês. É curioso constatar que a recente ascensão da China se dá como notável exceção a seu paradigma histórico de insularidade. Por conta de uma “externalidade geopolítica” dos anos 1970 – a necessidade dos EUA de rachar a viga-mestra do comunismo mediante a promoção do cisma sino-soviético – os benefícios econômicos estendidos à China a reconfiguraram como potência exportadora. O êxito da China resulta portanto de uma “mudança de DNA”; de ter seu crescimento voltado para fora. A idéia de “liderança global” é um experimento a que as autoridades chinesas ainda não decidiram se lançar. A extroversão da China em outros campos que não o da economia é obra difícil. Na arena política global, a visão chinesa tem sido de “crítica parcial”, não necessariamente de oposição a de um sistema protagonizado pelos EUA. A razão é simples. A geopolítica dos últimos 30 anos, em que a China é menos um ator e mais um espectador, criou ambiente propício à continuada prosperidade chinesa. A China talvez seja o país que menos contribuiu para as operações de paz da ONU dentre os países-membros do Conselho de Segurança. É também o que mais oferece resistência a movimentos de reforma do Conselho, particularmente ao aumento do número de membrospermanentes. Liderança global, hipótese em que a China teria de assumir mais responsabilidades no campo da paz e segurança, é um luxo bastante caro. Ao passo que em 2011 cada cidadão dos EUA dispendeu US$ 1.700 com defesa, cada chinês gastou apenas US$ 65. É improvável que a China deseje financiar sua condição de líder global. Tal status é incompatível com o modelo de crescimento adotado até o presente por Pequim. Ademais, embora muitas nações flertem com a experiência chinesa de crescimento econômico, é impossível reproduzi-la como modelo “adaptável” a diferentes realidades socioeconômicas. E há também limitações em termos de “soft power”. Se liderança tem que ver com o plano dos valores, que projeto a China tem a oferecer ao mundo? Dificilmente pode-se pensar a China como “role model”, um exemplo a ser seguido, ou mesmo imaginar um “Sonho Chinês” a inspirar indivíduos ou países das mais variadas culturas. Marcos Troyjo é diretor do BricLab da Columbia University e professor do Ibmec Fonte: Brasil Econômico - 28/02/2012 2. Harvard: O Brasil como potência emergente - Entrevista com o Prof. Marcos Troyjo por Fábio Pereira 10/10/2011 Em recente evento no Centro David Rockefeller de Estudos LatinoAmericanos na Universidade de Harvard em Boston, o diplomata Marcos Troyjo apresentou ao meio acadêmico e empresarial dos Estados Unidos as potencialidades e novos movimentos estratégicos do Brasil no mundo. Entrevista exclusiva com o diplomata que apresentou suas principais questões e visões estratégicas do Brasil como potência. Marcos Troyjo é diretor presidente do Centro de Diplomacia Empresarial e co-Diretor do BRICLab da Columbia University, pesquisar do Universidade Paris-Descartes (Sorbonne) e é autor de Nação Comerciante, Poder e Prosperidade no Século XXI. 1) Como os grandes países emergentes estão se preparando para a nova economia política global? A ideia de "BRICs" (conjunto de nações emergentes que congrega Brasil, Rússia Índia e China) como categoria válida para a análise do presente e futuro das relações internacionais é um "conceito-em-construção". O sucesso de cada um desses países na economia política do século XXI resultará essencialmente de 4 perguntas que países candidatos a potência internacional têm de responder: (i) Qual é seu projeto nacional? (ii) Como perseguirá seus objetivos num mundo interdependente e conflituoso? (iii) Como está se preparando para a economia digital do conhecimento? e (iv) Que sacrifícios está disposto a fazer? Os BRICs, se quiserem ademais atuar como grupo, em coesão que permita somar forças e assim influenciar em maior medida as relações internacionais, terão de tornar-se mais do que apenas nações que compartilham dimensões geográficas e estatísticas econômicas e sociais semelhantes – grande território, grande população, grande economia, grande potencial para desempenhar papéis construtivos ou fragmentários em suas regiões geopolíticas e na economia global, Será fundamental construir visões e ações articuladas na busca de seus interesses e acerca do entendimento de como o mundo deve funcionar. É também fundamental estabelecer instâncias regulares e formais que congreguem líderes empresariais, porta-vozes da sociedade civil e autoridades governamentais na formulação de agendas comuns. 2) Não se está colocando muita ênfase na coesão dos BRIC? Vale enfatizar que (ao menos até agora) os BRICs não são uma organização internacional. Não são, tampouco, um bloco econômico com modalidades de livre-comércio. Não são, muito menos, plataforma para construção de consensos quanto a itens da agenda internacional como direitos humanos, meio ambiente paz e segurança internacionais regras para o comércio internacional, atuação conjunto na ONU ou OMC, etc. 3) Quais parâmetros guiarão as escolhas dos BRICs? Os BRICs têm de saber o que querem para seus países, para suas elites, o que querem do mundo e para o mundo. Portanto, é preciso questionar se os BRICs têm um projeto de poder, um projeto de prosperidade e um projeto de prestígio. 4) Qual deve ser o comparativo entre as motivações e capacidades de cada BRIC para o cenário internacional? A China deseja ser rica e daí poderosa. Ela seguramente tem um projeto de prosperidade em vigor já há mais de 30 anos. Isso contribui para o incremento de seu prestígio e poder. Sua performance no campo dos chamados "novos" itens da agenda internacional (diretos humanos, meio ambiente, etc.) é das mais sofríveis. A China continuará a ser a planta de manufatura industrial do mundo ainda por muitos anos. O investimento na China será motivado essencialmente pela criação de infraestrutura local voltada ao comércio em terceiros países. Já a Índia deseja ser poderosa e daí ter prestígio. O diferencial competitivo tem vindo da baixa remuneração do fator trabalho (salários) em determinados setores (têxteis, outsourcing, tecnologias da Informação). Não possui nenhum projeto articulado de prosperidade. O investimento continuará a vir de empresas que desejam reduzir seus custos salariais e de produção mediante a "offshorização" de suas operações. O investimento será vigoroso em áreas de valor agregado como a indústria química, software e outros segmentos relacionados às TIs, mas em escala insuficiente para fazer um "boom" que perpasse toda sua estrutura socioeconômica de castas. Ademais, os mercados de capitais ainda são pouco significativos. A Rússia,quer poder, prosperidade e prestígio, mas não sabe como chegar lá. Às vezes, ainda fala como se fosse uma superpotência. A população de cientistas é imensa. A Europeização da Rússia irá representar uma tensão entre conflito e cooperação com países de seu entorno que acabará por produzir efeitos positivos para a Moscou. No instante em que a economia européia estiver reequilibrada, o investimento da União Européia fluirá fortemente a Rússia, pois é a última fronteira da Europa. A credibilidade do mercado de capitais e das instituições é ainda bastante frágil e vai demorar anos para tornar-se sólida. O investimento doméstico e internacional estará focado principalmente em infraestrutura e indústrias de capital intensivo. 5) E o Brasil? O Brasil se insere numa atmosfera de incerteza quanto à economia global. Tal cenário pode implicar significativa estiagem internacional de capitais. A dependência que hoje nosso perfil econômico externo mantém com a China é por demais arriscada. É com este ambiente externo que devemos dar sentido prático à continuada expansão da economia brasileira e o resgate da dívida social. Será preciso aliar esforços de governo e sociedade na construção de um projeto para os próximos 25 anos. Este projeto tem de conjugar aquilo que as empresas brasileiras vêm fazendo de melhor em termos de mercado global e uma visão estratégica de como devemos nos inserir na geoeconomia do século XXI. 6) Por que afirma que o Brasil precisa de um "business grade"? Há modelos de negócios brasileiros a seguir? Hoje, apesar da "neocrise" de 2011, ainda há uma espécie de "espiral de otimismo" que envolve o Brasil. Muitos mostram-se impressionados com a resiliência e criatividade de algumas empresas brasileiras. O estudo da evolução dessas empresas (Alpargatas, Marcopolo, Embraer, Petrobras, Vale, Fogo de Chão, BOVESPA, Natura) ao longo dos últimos 15 anos nos faz concluir que, em graus e aplicações diferentes, podem ser identificadas 3 características que ajudam a mapear o DNA do sucesso dessas corporações. A primeira dessas características é o que poderíamos chamar de "auto-destruição criativa". São empresas que entenderam a dinâmica radical de aparecimento e transformação de tecnologias e de como isso afeta seu negócio. A Alpargatas deixou de ser uma empresa de calçados para tornar-se uma empresa de design & branding. Há 20 anos, as Havaianas eram produto para as classes D e E. Seu principal atrativo era "não deformar, não ter cheiro e não soltar as tiras". Hoje, com design apurado e marketing de primeira linha, as Havaianas ostentam loja-conceito no bairro de Saint-Germain-des-Près, em Paris, e adornam os pés de Nicole Kidman ou Carla Bruni.A Petrobras está deixando de ser uma empresa de petróleo para tornar-se uma corporação de múltiplas fontes de energia, com presença importante em biocombustíveis e geradores eólicos e fotovoltaicos. A Vale não é mais apenas uma gigante da mineração, mas da logística, e assim por diante. São empresas que também se tornaram verdadeiros "Hubs de Conhecimento". Corporações que promovem maciços investimentos em educação empresarial e até mesmo universidades corporativas. Apostaram no pagamento de MBAs a seus executivos e em Mestrados e Doutorados para a ponta técnica e especializada. É comum também o envio de seus principais executivos e pessoal temático a mecas acadêmicas como INSEAD, IE, London Business School, Harvard, MIT. Outro traço distintivo dessas campeãs brasileiras é o seu conservadorismo financeiro. Em meio à sedução de derivativos e IPOs intempestivos, trabalharam duro para tornar a operação em-si, e não milagrosas fontes externas, sua principal base de financiamento. A última característica dessas empresas é que, sem abandonar o presente, já se encontram com olhos voltados para o futuro. E o amanhã para elas é movido por 3 condutores: internacionalização, capital humano e planejamento de longo prazo. Elas escolheram o caminho da internacionalização seja através do modelo de "empresa-comerciante" (turbinando exportações e importações) ou do modelo de "empresa-rede" (espraiando a rede de produção e distribuição por todo o mundo, sempre visando ao menor custo e máximo retorno). Utilizam seu valioso capital humano para moldar o futuro. A Petrobras hoje tem planos diretores que chegam até mesmo ao ano de 2030. Ou seja, já conquistamos o investment grade. Agora é partir para o business grade. 7) Para o Brasil, quais devem ser os pilares de uma nova competitividade externa? O papel a ser desempenhado pelo Estado é central. É dizer, o Governo é parte da solução e parte do problema. A opção pelo mercado interno por parte do Brasil tem sido cantada em prosa e verso como a grande responsável pela maneira quase incólume com que o País passou pela crise deflagrada em setembro de 2008. Isso leva alguns a concluírem que é um erro a internacionalização da economia brasileira. Que não importa a pequena ênfase que o Brasil confere à conquista de mercados externos. Ora, nada mais errado. A China também atravessou a crise de cabeça erguida, e ostenta 60% de seu PIB relacionado ao comércio exterior. Muitos acreditam que a baixa participação do Brasil no comércio mundial (menos de 1% de tudo que se compra e vende no mundo) e do comércio exterior no Brasil (apenas cerca de 17% do PIB) é fruto do protecionismo dos países mais ricos. No entanto, há questões prévias, ainda mais importantes que o resultado dessas negociações. Por exemplo: o Brasil quer fazer do comércio exterior sua principal via de inserção na economia global? Será que desejamos que o comércio exterior se torne nossa ferramenta privilegiada para a construção de poupança nacional e de recursos para investir? Temos portanto que substituir noções simplistas, como a idéia de que "o mercado mundial pode ser interessante para o Brasil se barreiras protecionistas forem eliminadas", por questões como "qual nossa estratégia de promoção comercial mesmo num mundo protecionista?" As lições da história econômica das últimas décadas ensinam claramente que aqueles países que buscaram a internacionalização tiveram mais êxito do que os atrelados dogmaticamente a seu mercado interno. Cabe ao Brasil aprender essa lição. Para esse objetivo, além das reformas trabalhista, previdenciária e tributária, há um "quarteto" de prioridades: (i) a facilitação da legislação interna para abertura de empresas de vocação exportadora; (ii) ênfase nos aspectos logísticos de projetos a serem contemplados pelas PPPs (parcerias público-privadas); (iii) formação de recursos humanos especializados, no âmbito do setor privado, para a promoção comercial no exterior e a atração de IEDs (investimentos estrangeiros diretos), e (iv) fortalecimento da presença das micro e pequenas empresa mediante consórcios exportadores. Eis os primeiros, e elementares, passos rumo a uma nova inserção externa. 8) Qual então sua visão prospectiva para o Brasil? O Brasil ainda está em busca de um projeto articulado de poder ou prosperidade. Sua visão estratégica é mais geopolítica que geoeconômica. Sua idéia de prestígio está entrelaçada principalmente com o fortalecimento da ONU e a construção de uma Comunidade SulAmericana de Nações, bem como a cooperação Sul-Sul, mas com pouca margem para além das "boas intenções" e relações "equilibradas". Tentativas levadas a cabo pelo Brasil de construir relações estratégicas, como a China ou a França, são unilaterais na maioria das vezes. A nova posição do Brasil nas relações internacionais virá de êxitos em setores específicos (agroenergia, mineração, perfuração e extração de petróleo offshore, aviões, conglomerados bancários gigantes e os efeitos multiplicadores para a indústria de serviços do investimento em infraestrutura). E, em grande medida, pelo novo status de potência petrolífera viabilizado pelas descobertas do pré-sal. Eis a grande janela de oportunidade, associada à economia da criatividade, para fazer as reformas internas, subir o investimento em P&D para 2% do PIB e internacionalizarmos a marca 'Brasil'. Assim, o País estaria inserido de forma definitiva no quadro das nações mais dinâmicas, prósperas e influentes do século XXI. *Palestra co-patrocinada pelo David Rockefeller Center for Latin America Studies, HarvardMIT Workshop on the Political Economy of Development in Brazil, e Sustainability Science Program, Harvard Kennedy School-HKS **Fábio Pereira Ribeiro é especialista em finanças, inteligência estratégica e política internacional. É diretor de Marketing e Novos Negócios da Strong Educacional Esags. [email protected] 3. Facebook e Twitter: o papel da mídia no Despertar Árabe 15/8/2011 O Despertar Árabe foi inusitado por varias razões. Dentre elas está certamente o papel da internet e das redes sócias. Outros episódios da era internauta já foram assistidos online, incluindo o ataque de 11/9 e a invasão ao Iraque. Os criadores do Facebook e do Twitter nunca pensaram que seus inventos teriam um impacto tão grande, inclusive o poder de ser um instrumento para a queda de regimes anacrônicos. Prova de que os Estados sabem da importância da mídia como quarto poder é o fato que muitos países prestam relevante atenção e monitoramento ao uso de meios de comunicação que possam mobilizar os insurgentes, como no caso da China e Coréia do Norte. Quando do levante popular na praça Tahir, a primeira medida da ditadura egípcia contra os insurgentes foi cortar serviços de comunicação fundamentais para a revolta popular: a internet e os celulares. Facebook, Twitter e SMS detonaram o que pode ser a primeira grande revolução do século 21. Ou não. Seja o que venha a ser, ela será twittada! Google e Twitter se uniram contra o apagão de Mubarak e viabilizaram um sistema que prescinde de conexão com a internet para publicar mensagens de voz no Twitter. Qualquer bombardeio hoje esta sob as lentes das centenas de milhares de portadores de celulares e redes de TV internacionais transmitindo ao vivo para o mundo via You tube. E o melhor: tudo de graça. Mais interessante do que aumento do acesso às redes sociais internacionais no Oriente Médio é o crescimento do uso da língua árabe. Estudos mostram que a língua árabe está se transformando no idioma mais usado no Facebook. Hoje, representa 10 milhões de usuários adeptos a interface neste idioma, ou seja, 1/3 de todos os usuários. Com o crescimento vertiginoso de 175% ao ano do Facebook em árabe, espera-se que o idioma árabe lidere ao ultrapassar o número de adeptos da língua inglesa ainda em 2011. É importante recordar que o acesso à Internet e seus custos ainda não são universais e que há uma alta taxa de analfabetismo nestas regiões e exclusão digital. Com jornais historicamente dominados pelas elites políticas, é inegável que a internet, algumas redes sociais e celulares/SMS em muito contribuíram para organizar e motivar as massas em protesto. A tecnologia literalmente revolucionária transformou-se na maior arma da sociedade civil mundial. As novas tecnologias permitiram que uma nova geração de árabes mobilizasse as massas para derrubar uma tirania. Podem agora ajudar a construir uma democracia, como por exemplo, ao exigir transparência dos futuros governantes. Será um feito ainda maior. Outro fator a ser mencionado é sobre o efeito gota d’ água. A revolta na Tunísia foi motivada por um abuso de autoridade cometido por policiais contra um vendedor de frutas. Um evento muito específico, ainda que não único na medida em que ocorria com demasiada freqüência, foi o suficiente para se dizer: Chega! Basta! Este feito, chamado por alguns de "fenômeno emergente" tem por característica ser um processo auto organizado que unifica como se fosse um único organismo o que parecem ser entidades individuais separadas. Incluindo, inclusive, a deserção de soldados militares e a adesão destes aos protestantes civis. Este caldeirão de animosidades quebra as descontinuidades passivas e divididas para um estado de união e confiança na mudança rumo a uma nova ordem. Trata-se da união das diferenças por um "grito de dignidade". O sucesso do levante popular é que, além do apoio massivo dos meios de comunicação, a Primavera Árabe permitiu a quebra de uma cultura de passividade, vitimização e resignação de regimes autoritários, ainda que muitas vezes expressos mediante atos de auto-imolação ou políticas de violência. Ainda que a internet e outros meios de comunicação tenham tido um papel preponderante, eles não determinam o curso da história. O Facebook e o Twitter foram importantes, mas não suficientes. Izabela Pereira, Mestre em resolução de conflitos. Email: [email protected] 4. Uma mulher mais forte / Luiz P. Bellini Jr. 8/3/2012 Hoje, dia internacional da mulher, resolvi relembrar um artigo publicado há exatos 6 anos. Atualizei alguns dados (qualquer erro numérico é apenas um grão de areia perto da beleza de uma mulher). Assim, aqui vai minha homenagem a um dos dias mais bonitos do ano: Hoje, 8 de março, milhares de mulheres comemoram o episódio ocorrido em 1857 nos Estados Unidos, em que funcionárias de uma fábrica de tecidos de Nova Iorque se rebelaram contra as condições precárias de trabalho. Foi a primeira vez na história que mulheres se uniram para reivindicar melhorias. Infelizmente, a rebelião foi contida de forma violenta, terminando com a morte de 129 tecelãs. Outras datas são marcantes na história das mulheres. Em 1865, na Alemanha, foi criada a Associação Geral das Mulheres Alemãs. Na França, em 1870, as mulheres passam a ter acesso aos cursos de Medicina. Quatro anos mais tarde, em 1874, surge no Japão a primeira escola normal para moças. Em 1878, na Rússia, foi fundada a primeira Universidade Feminina Russa. No Brasil, em 1932, foi instituído o voto feminino. Como resultado, a Assembléia Geral da Organização das Nações Unidos, em 8 de março de 1975, estabeleceu que este deveria ser o dia da emancipação feminina. Desde então, todo ano, centenas de milhares de flores são enviadas pelo mundo todo. Especiais em televisão, jornais e revistas são lançados. Novos perfumes, propagandas direcionadas para as mulheres e muitas outras formas de homenagens são desenvolvidas. No Google, se você procurar por “dia da mulher”, encontrará 5.500.000 resultados. Por curiosidade, digite “dia do homem”. Serão apenas 1.300.000 resultados. E ainda há aqueles que afirmam que o homem não precisa de dia especial, pois todos os outros dias do ano são dele. Na última década, o tema que mais esteve e ainda está em pauta no universo feminino é a questão das mulheres no mercado de trabalho. No Brasil, segundo o IBGE, elas ocupam 47% da população economicamente ativa. Em 1976 eram 29%. Na China, de acordo com dados do governo, essa porcentagem é de 38%. Embora, neste país, elas tenham adquirido o direito a nove anos de escolaridade obrigatória somente em 2001. De acordo com a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), as mulheres são os principais artífices da educação brasileira. Do total de professores, elas ocupam 84% das vagas disponíveis, desde o nível básico até o superior. Dos 34 países analisados pela organização, este é o maior índice. Em nações desenvolvidas como Estados Unidos, Alemanha e Japão, o percentual feminino não ultrapassa os 65%. No comando de 19% das empresas no Brasil, as mulheres mostram que são iguais aos homens. Não há diferença na questão da capacidade. Elas até estudam mais e conseguem controlar mais o próprio tempo, pois muitas ainda têm filhos, ou filhas, para cuidar em casa - 89% são mães solteiras. Que homem consegue isso? Na esfera política elas estão ganhando espaço. Dos 191 países membros da ONU, elas ocupam os principais postos em 15 países. Este total parece pequeno, mas praticamente dobrou nos últimos anos. Elas comandam desde grandes nações, como Angela Merkel, na Alemanha, e Dilma Rousseff, no Brasil, até pequenas ilhas, como Maria do Carmo Silveira, em São Tomé e Príncipe. Chega a um total de US$ 3,5 trilhões de Produto Interno Bruto (PIB). Elas estão aí para o que der e vier. A primeira forma de sociedade foi matriarcal, quem sabe voltará a ser? Será melhor? Mais justa? Talvez. Minha avó já dizia: quando as mulheres passarem a comandar o mundo provavelmente teremos menos guerra e mais justiça social. Luiz P. Bellini Jr. é bacharel em relações internacionais e sócio do Grupo ALT 5. O clima na Rússia / Marcos Troyjo 15/2/2012 Estive há pouco em Moscou para o Russia Forum, principal evento político-empresarial do país. Temperaturas de -30°C. Todo o calor vinha das manifestações pró e contra o homem-forte Vladimir Putin, que mais uma vez deve ser eleito presidente do gigante país no pleito de março. Na Rússia, como no Brasil, debate-se apaixonadamente se o modelo econômico vigente é sustentável a longo prazo. Se a ênfase no mercado interno pode se alicerçar na competitividade internacional dos recursos energéticos que tanto Rússia quanto Brasil possuem em abundância. A visão russa sobre o futuro da Rússia é bem mais sombria que a dos brasileiros sobre o Brasil. Ao passo que no Brasil há uma espiral de otimismo, os russos acreditam que seu país esteja em declínio no cenário internacional. Mantém uma dolorida nostalgia do malogrado império soviético. Entendem que são uma sociedade "sem valores". Lamentam não mais viajar a preços subsidiados pelo que hoje é a CEI (Comunidade dos Estados Independentes), área ocupada pelas antigas repúblicas soviéticas. Ressentem-se da ausência da (suposta) solidariedade intrassoviética e internacional que graçava durante a Guerra Fria. Acham que os jovens superficializaram-se; não têm ideais, salvo a compra de calças jeans de grife e dietas que os mantêm esquálidos o bastante para disputar o mercado internacional de modelos. Os russos também temem por sua demografia. A trajetória populacional descendente coloca-os em risco de exclusão das áreas mais dinâmicas do crescimento mundial, como salienta Jim O'Neill, criador da sigla Bric, em The Growth Map, seu mais recente livro. Também presente em Moscou, Nouriel Roubini, que ganhou fama mundial por ter supostamente previsto o cataclismo financeiro de 2008, vocalizou sua convicção de que a Rússia não deve mais ser considerada parte do Bric. Aqui, mais uma vez, o estimado declínio populacional também tem influência, pois a Rússia deixaria progressivamente de oferecer mão de obra em ampla escala e seu mercado interno perderia peso relativo. A meu ver, embora o conceito de Brics tenha surgido a partir de projeções sobre o futuro da economia global, a evolução contemporânea do conceito deve também abarcar critérios de "hard power", como poderio militar, papel na ONU, além das dimensões territoriais, abundância de recursos naturais, influência regional e global, e grande contingente de cientistas. Assim, Brics são as principais potências mundiais dos próximos 40 anos, excetuando-se EUA e Europa. É impossível excluir a Rússia desse quadro. Os amargos ânimos russos são também influenciados pelo papel que o complexo de petróleo & gás representa no presente e futuro do país. Ainda não decidiram se o fato da Rússia ser a maior produtora mundial de petróleo é uma benção ou uma maldição. Os recursos energéticos são substanciais para a economia política do país. No entanto, a ausência de projetos estruturados de desenvolvimento convida a que a economia russa não se diversifique ou modernize - e mantenha elevados níveis de burocracia e corrupção. Marcos Troyjo é diretor do BricLab da Columbia University e professor do Ibmec Fonte: Brasil Econômico - 14/02/2012