UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE FACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO MARIANA FERES DOS SANTOS CONSTRUÇÕES COM CERTIFICAÇÕES LEED NO BRASIL: O CASO DO ELDORADO BUSINESS TOWER São Paulo 2012 UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE FACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO MARIANA FERES DOS SANTOS CONSTRUÇÕES COM CERTIFICAÇÕES LEED NO BRASIL: O CASO DO ELDORADO BUSINESS TOWER DISSERTAÇÃO DE MESTRADO Dissertação de Mestrado apresentada à Universidade Presbiteriana Mackenzie, Curso de Pós Graduação. Área de concentração: Arquitetura Sustentável Aprovada em 14/03/2012 BANCA EXAMINADORA Profª. Drª. Eunice Helena S. Abascal – Orientadora Universidade Presbiteriana Mackenzie Profª. Drª. Perola Felipette Brocaneli Universidade Presbiteriana Mackenzie Prof. Dr. Marcelo de Andrade Romero Universidade de São Paulo S237c Santos, Mariana Feres dos Construçőes com certificaçőes leed no brasil: o caso do eldorado business tower. / Mariana Feres dos Santos – 2012. 159 f. : il. ; 30cm. Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2012. Bibliografia: f. 117-125. AGRADECIMENTOS A minha mãe Maria Cecília e ao meu pai Josenildo, pelo apoio, incentivo, paciência e compreensão, colocando sempre minhas necessidades acima das deles. Nunca serei capaz de retribuir tamanha dedicação. A toda minha família e amigos que compreenderam minha ausência em diversos momentos e continuaram a me incentivar a desenvolver esse trabalho. A minha orientadora, Professora Eunice Helena S. Abascal, pelo acompanhamento e conhecimento que me ajudaram na conclusão desse trabalho. A professora Perola Felipette Brocaneli, pela atenção e pela disponibilidade em sempre ajudar. Ao arquiteto Eduardo Martins, pela ajuda na obtenção de materiais e de informações sobre o Eldorado Business Tower. A todos os professores do curso de mestrado do Mackenzie que, de forma indireta, contribuíram no desenvolvimento desse trabalho. i RESUMO O trabalho consiste na análise da certificação LEED, uma das mais utilizadas e reconhecidas no Brasil, através de um estudo de caso do primeiro edifício a receber o mais alto nível da certificação LEED CS na América Latina. A certificação tem sido utilizada como meio de comprovação que um edifício é sustentável e esse trabalho analisa o edifício do ponto de vista arquitetônico, verificando se a certificação garante a este uma arquitetura sustentável. O desenvolvimento do trabalho começa com um breve histórico sobre como o desenvolvimento sustentável entrou para o discurso mundial, explicando alguns dos principais conceitos relacionados ao tema. Em seguida, são mostrados exemplos de arquitetura classificada como sustentável e a definição desta. Para a análise do LEED, é desenvolvido um breve cenário comparativo entre duas outras certificações: o BREEAM, a primeira certificação a ser utilizada e que serviu como base para muitas outras, e o AQUA, outra certificação que vem sendo utilizada no Brasil. Para o estudo de caso do Eldorado Business Tower, é feito um breve histórico do projeto e uma análise do edifício a partir do projeto, do processo de certificação e de observações realizadas em visita feita ao local. Palavras-chave: Green Building – LEED – Sustentabilidade. ii ABSTRACT The job is to analyze the certification system LEED, one of the most used and recognized in Brazil, through a case study of the first building to receive the highest level of the LEED CS certification in Latin American. The certification has been used to prove that a building is sustainable and this job analyzes the building using an architectural point of view, verifying if the certification ensures that the building has a sustainable architecture. The job will begin with a brief history about how sustainable development joined the world speech, explaining some of the key concepts related do the topic. After that, some examples of sustainable architecture and its definition will be shown. For the analysis of LEED, two other certifications were chosen for a brief comparative scenario: BREEAM, the first certification to be used and which served as the basis for many others, and AQUA, another certification that has been used in Brazil. For the case study of Eldorado Business Tower, it will be done a brief history of the project and an analysis of the building through the project, the certification process and observations made in the visit to the site. Key words: Green Building – LEED – Sustainability iii SUMÁRIO INTRODUÇÃO............................................................................................. 1 CAPÍTULO 1 Sociedade e Meio Ambiente............................................... 12 1.1 A Pegada Ecológica da Humanidade................................................ 13 1.2 O Impacto da Construção Civil no Meio Ambiente............................ 15 1.3 Sustentabilidade - Conceitos e Definições........................................ 16 1.4 Agenda 21......................................................................................... 20 1.5 Agenda Verde x Agenda Marrom...................................................... 22 1.6 Uma síntese das principais questões abordadas.............................. 23 CAPÍTULO 2 Arquitetura Sustentável...................................................... 25 2.1 Arquitetura internacional e sustentabilidade: alguns exemplos......... 29 2.1.1 Norman Foster........................................................................... 29 2.1.2 Ken Yeang.................................................................................. 31 2.2 Arquitetura brasileira......................................................................... 34 2.2.1 Rino Levi.................................................................................... 35 2.2.2 Marcos Acayaba........................................................................ 38 2.3 Considerações sobre o capítulo 2..................................................... 40 CAPÍTULO 3 Sistemas de Certificação Green Building......................... 42 3.1 BREEAM........................................................................................... 44 3.2 AQUA................................................................................................ 47 3.3 Certificação LEED............................................................................. 54 3.3.1 LEED no Mundo......................................................................... 55 3.3.2 Processo de Certificação........................................................... 57 3.3.3 Categorias.................................................................................. 60 3.3.3.1 LEED NC – LEED para Novas Construções....................... 63 3.3.3.2 LEED ND – LEED para Desenvolvimento de Bairros......... 64 3.3.3.3 LEED CS – LEED para Fachadas e Áreas Comuns de Prédios Comerciais............................................................ 64 3.3.3.4 LEED retail NC e CI – LEED para Lojas de Varejo............. 65 iv 3.3.3.5 LEED Healthcare – LEED para Unidades de Saúde.......... 65 3.3.3.6 LEED EB OM – LEED para Operação e Manutenção de Edifícios Existentes............................................................ 65 3.3.3.7 LEED Schools – LEED para Escolas.................................. 65 3.3.3.8 LEED CI – LEED para Interiores Comerciais...................... 66 3.3.4 LEED no Brasil........................................................................... 66 3.3.5 Construções Certificadas no Brasil............................................ 66 3.3.5.1 Banco Real Agência Bancária Granja Viana...................... 68 3.3.5.2 Delboni Auriemo – Dumont Villares.................................... 68 3.3.5.3 Banco de Investimentos Morgan Stanley – Edifício Faria Lima Square....................................................................... 69 3.3.5.4 Edifício Cidade Nova – Bracor............................................ 71 3.4 Considerações e síntese................................................................... 72 CAPÍTULO 4 Eldorado Business Tower: uma perspectiva crítica........ 74 4.1 Histórico do Projeto........................................................................... 74 4.2 Características do Empreendimento................................................. 79 4.3 LEED 2.0 x LEED 3.0........................................................................ 94 4.4 Processo de Certificação do Eldorado Business Tower.................... 100 4.5 Considerações sobre o capítulo 4..................................................... 105 CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................ 111 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................................................... 117 ANEXOS...................................................................................................... 126 ANEXO 1 – Entrevista com Eduardo Martins em 18/11/10..................... 126 ANEXO 2 – Manual do Locatário do Eldorado Business Tower............. 133 v LISTA DE FIGURAS Figura 1 Tripé da sustentabilidade 17 Figura 2 Commerzbank em Frankfurt 29 Figura 3 Commerzbank em Frankfurt 29 Figura 4 Sistema de ventilação natural do Commerzbank 30 Figura 5 Corte demonstrando jardins laterais 30 Figura 6 Corte demonstrando ventilação natural do Commerzbank 30 Figura 7 Tokyo Nara Tower – Ken Yeang 32 Figura 8 Menara Mesiniaga 33 Figura 9 Menara Mesiniaga 33 Figura 10 Edifício Concórdia – Rino Levi 37 Figura 11 Edifício Concórdia – Rino Levi 37 Figura 12 Banco sul-americano – Rino Levi 37 Figura 13 Banco sul-americano – Rino Levi 37 Figura 14 Residência Baeta – Marcos Acayaba 39 Figura 15 Residência Baeta – Marcos Acayaba 39 Figura 16 Corte Residência Baeta – Marcos Acayaba 39 Figura 17 Perfil mínimo de desempenho do Processo Aqua 49 Figura 18 Leroy Merlin de Niterói 52 Figura 19 Processo de Certificação LEED 57 Figura 20 Formulário de registro para Certificação LEED 58 Figura 21 Metodologia de aplicação do LEED 60 Figura 22 Banco Real – Agência Bancária Granja Viana 68 Figura 23 Delboni Auriemo Dumont Villares 69 Figura 24 Faria Lima Square 70 Figura 25 Morgan Stanley 70 Figura 26 Edifício Cidade Nova 71 Figura 27 1ª proposta para a construção do Eldorado Business 74 Tower Figura 28 2ª proposta para a construção do Eldorado Business 75 vi Tower Figura 29 3ª proposta para a construção do Eldorado Business 76 Tower Figura 30 4ª proposta para a construção do Eldorado Business 76 Tower Figura 31 5ª proposta para a construção do Eldorado Business 77 Tower Figura 32 6ª proposta para a construção do Eldorado Business 77 Tower Figura 33 7ª e 8ª proposta para a construção do Eldorado Business 78 Tower Figura 34 Eldorado Business Tower 79 Figura 35 Heliponto do Eldorado Business Tower 80 Figura 36 Ilustração artística da implantação do Eldorado Business 81 Tower e do Shopping Eldorado Figura 37 Passarela de acesso ao Shopping Eldorado 82 Figura 38 Escada rolante para acesso do térreo elevado a rua 82 Figura 39 Fachada do Eldorado Business Tower 83 Figura 40 Volumetria vista em diagonal e à distância, ressaltando a 83 exploração de curvatura das fachadas voltadas para a Marginal do Rio Pinheiro e para o Shoppping Eldorado; recurso de amenização da massa frente à altura da torre Figura 41 Centro de usinagem montado no segundo subsolo do 84 Eldorado Business Tower Figura 42 Montagem dos painéis do Eldorado Business Tower 85 Figura 43 Sistema para tratamento e reaproveitamento de água da 86 chuva, da condensação do ar-condicionado e da drenagem dos subsolos Figura 44 Tela do programa de computador que mostra o consumo 87 de água e de energia de acordo com cada setor do edifício Figura 45 Condensadoras na cobertura do Eldorado Business Tower 88 vii Figura 46 Tela do programa de computador que exibe os aparelhos 89 de ar-condicionado ligados em cada sala e permite monitorar o funcionamento de qualquer um deles. Figura 47 Roda entálpica na cobertura do Eldorado Business Tower Figura 48 Tela do programa de computador que mostra 90 o 90 funcionamento das rodas entálpicas Figura 49 Hall do Eldorado Business Tower 91 Figura 50 Eldorado Business Tower 91 Figura 51 Tela do programa de computador que exibe se persianas 92 estão fechadas ou abertas Figura 52 90 vagas preferenciais para carros 100% álcool ou 100% 93 GNV Figura 53 Bicicletário localizado no térreo do Eldorado Business 93 Tower Figura 54 Depósito de material reciclado 94 Figura 55 Entrada do depósito de material reciclado 94 Figura 56 LEED – CS para Fachadas e Áreas comuns do edifício 96 versão 3.0: Categoria Espaço Sustentável Figura 57 LEED – CS para Fachadas e Áreas comuns do edifício 97 versão 3.0: Categoria Uso Racional da Água Figura 58 LEED – CS para Fachadas e Áreas comuns do edifício 98 versão 3.0: Categoria Energia e Atmosfera Figura 59 LEED – CS para Fachadas e Áreas comuns do edifício 99 versão 3.0: Categoria Materiais e Recursos Figura 60 LEED – CS para Fachadas e Áreas comuns do edifício 100 versão 3.0: Categoria Qualidade Ambiental Interna Figura 61 LEED – CS para Fachadas e Áreas comuns do edifício 100 versão 3.0: Categoria Inovação e Processo do Projeto Figura 62 LEED – CS para Fachadas e Áreas comuns do edifício 101 versão 2.2 com pontuação fornecida ao Eldorado Business Tower: Categoria Espaço Sustentável viii Figura 63 LEED – CS para Fachadas e Áreas comuns do edifício 102 versão 2.2 com pontuação fornecida ao Eldorado Business Tower: Categoria Uso Racional da Àgua Figura 64 LEED – CS para Fachadas e Áreas comuns do edifício 102 versão 2.2 com pontuação fornecida ao Eldorado Business Tower: Categoria Energia e Atmosfera Figura 65 LEED – CS para Fachadas e Áreas comuns do edifício 103 versão 2.2 com pontuação fornecida ao Eldorado Business Tower: Categoria Materiais e Recursos Figura 66 LEED – CS para Fachadas e Áreas comuns do edifício 104 versão 2.2 com pontuação fornecida ao Eldorado Business Tower: Categoria Qualidade Ambiental Interna Figura 67 LEED – CS para Fachadas e Áreas comuns do edifício 105 versão 2.2 com pontuação fornecida ao Eldorado Business Tower: Categoria Inovação e Processo do Projeto Figura 68 Simulação de pontuação do Eldorado Business Tower no 108 LEED 3.0 Figura 69 Eduardo Martins 124 ix LISTA DE TABELAS Tabela 1 Estágio de desenvolvimento da Agenda 21 nos 21 municípios brasileiros Tabela 2 Categorias de Pontuação do BREEAM 46 Tabela 3 Exemplo de cálculo de pontuação do BREEAM 46 Tabela 4 Categorias de pontuação do BREEAM 47 Tabela 5 Tabela comparativa sobre a pontuação necessária no 95 LEED 2.0 e no LEED 3.0 x LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1 Pegada ecológica da humanidade 14 Gráfico 2 Construções LEED no Mundo 56 Gráfico 3 Profissionais LEED AP no Brasil 59 Gráfico 4 Registros por categoria LEED 61 Gráfico 5 Registros do LEED por Estado 62 Gráfico 6 Registros do LEED por tipologia 62 Gráfico 7 Registros e certificações LEED no Brasil 63 xi LISTA DE QUADROS Quadro 1 Aspectos compreendidos no desenvolvimento 3 sustentável Quadro 2 Diferenças entre agenda marrom e agenda verde 23 Quadro 3 Sistemas de certificação 44 Quadro 4 Categorias do Processo Aqua 49 Quadro 5 Certificação Aqua de edifícios comerciais 51 Quadro 6 Certificação Aqua de hotéis, eventos e spas 51 Quadro 7 Certificação Aqua de escolas e escritórios 51 Quadro 8 Certificação Aqua de edifícios habitacionais 52 Quadro 9 Certificação Aqua de edifícios em operação - uso 52 Quadro 10 Empreendimentos certificados LEED no Brasil 66 xii LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ACIESP Academia de Ciências do Estado de São Paulo AQUA Alta Qualidade Ambiental ASHRAE American Society of Heating, Refrigerating and Air- conditionning Engineers ASTM American Society for Testing and Materials BRE Building Research Establishment BREEAM Building Research Establishment Environmental Assessment Method CDS-ONU Comissão de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas CIB International Council for Research and Innovation in Building and Construction CONAMA Conselho Nacional do Meio Ambiente CNUMAD Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento CPDS Comissão de Políticas de Desenvolvimento Sustentável DOE U.S. Department of Energy EPA U.S. Environmental Protection Agency GBCI Green Buiilding Certification Institute IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IETC International Environmental Technology Centre LCA Life Cycle Analisys LEED Leadership in Energy and Environmental Design, Estados Unido ONU Organização das Nações Unidas UNEP United Nations Environment Programme USGBC U. S. Green Building Council WGBC World Green Building Council 1 INTRODUÇÃO No mundo contemporâneo, assuntos que envolvem a questão da sustentabilidade entraram em voga. Após longa história de sofrimento de toda sorte de impactos ambientais, o planeta começa a dar sinais de que seus recursos naturais, se usados indiscriminadamente, não são ilimitados. Por essa razão, a sociedade passou a estar alerta para o fato de que, junto com o progresso e os avanços tecnológicos, há também uma grande carga de agressão ao meio ambiente. Advém então a dúvida de como não impedir o desenvolvimento e, ao mesmo tempo, preservar o meio ambiente. Quando a crise do petróleo assustou o mundo, na década de 1970 do século XX, o meio ambiente emergiu como objeto de preocupação. Observou-se que “O crescimento da população mundial, as largas escalas entre poder econômico e político contribuem para a deterioração ambiental, que, por sua vez, altera tanto a vida das pessoas quanto a estabilidade política e econômica mundiais” (FRANCO, 2001, p.43). Ficava evidente também a dupla condição da humanidade, capaz de destruir essas formas de vida ou então aprender a viver em harmonia com elas, considerando sua interdependência (LOVELOCK, 2006). Tais preocupações motivaram a discussão dessa temática entre líderes do mundo todo. A Conferência de Estocolmo, de 1972, e vinte anos depois a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, no Rio de Janeiro, foram eventos seminais para esse debate, e o desenvolvimento sustentável se afirmou então como uma prioridade no discurso mundial, no que tange ao desenvolvimento das cidades. A criação de uma Agenda 21 Global que propunha ações de longo prazo para que esse desenvolvimento fosse possível consistiu em realização de expressiva importância nesse contexto. Após a criação da Agenda 21 Global, diversos países passaram a criar suas agendas locais, adaptando os planos mundiais às características e especificidades de cada país, e, mais tarde, municípios foram desenvolvendo suas agendas com planos para o desenvolvimento sustentável. 2 Apesar de todas essas ações, a dúvida permanecia: “Como o desenvolvimento sustentável pode ser definido e operacionalizado para que seja utilizado como ferramenta para ajustar os rumos que a sociedade vem tomando em relação à sua interação com o meio ambiente natural?” (BELLEN, 2006, p.13). A resposta do próprio Bellen a essa pergunta fora que a solução nasceria com “[...] o desenvolvimento e a aplicação de sistemas de indicadores ou ferramentas de avaliação que procuram mensurar a sustentabilidade” (2006, p.13). A despeito dessa preocupação com as questões ambientais relativas ao desenvolvimento e à vida urbana, é também fato que “[...] a indústria da construção e suas atividades são responsáveis por uma substancial quantidade de uso de recursos globais e emissão de resíduos. Ela também desempenha importante papel no desenvolvimento sócio-econômico e na qualidade de vida”1 (CIB/UNEP-IETC, 2002, p.iii). O que sugere que se faz também urgente refletir não somente sobre uma cidade sustentável, mas sobre a arquitetura produzida no meio urbano. A indústria da construção é uma das atividades que causa expressivo impacto ao meio ambiente, o que suscita interesse em discutir o que é uma arquitetura sustentável, suas características e limites, bem como refletir sobre o papel que a arquitetura representa na cidade, que se pretende sustentável. Segundo o U.S. Green Building Council (2008), a construção civil é responsável por 40% do uso de energia primária, 72% do consumo de eletricidade, 39% da emissão de gás carbônico e 13,6% do consumo de água potável nos Estados Unidos. Nesse contexto, e visando a produção de edificações dotadas de recursos minimizadores de danos ambientais, surgiram as certificações verdes, instrumentos de avaliação que determinam parâmetros para classificação da arquitetura quanto à sustentabilidade. Conforme procedimentos e definição da certificação verde, a emissão de pareceres aos edifícios atestaria sua adequação aos critérios 1 “The construction industry and its activities are responsible for a substantial amount of global resource use and waste emissions. It also has an important role to play in socio-economic development and quality of life.” 3 enunciados por esses instrumentos identificando tal arquitetura àquela capaz de causar o menor impacto possível ao meio ambiente. Com o objetivo de avaliar desde o projeto, a obra e manutenção dos edifícios, foram criados diversos sistemas de certificação para uso em diferentes países, porém “(...) todos estes sistemas concentram-se exclusivamente na dimensão ambiental da sustentabilidade” (SILVA & AGOPYAN, 2004, p.1), o que sugere que a certificação que resulta de sua aplicação não avalia o desempenho total e real das construções, e sequer contempla o conceito de “arquitetura sustentável” de maneira mais ampla e completa. Para avaliar a sustentabilidade de um edifício, é necessário contemplar também aspectos tais como o uso e a dimensão social dos espaços, em busca de uma arquitetura que contemple as necessidades de seus usuários de maneira justa e que ofereça oportunidades e boa qualidade de vida (SILVA & AGOPYAN, 2004). Uma arquitetura que contemple também aspectos de eficiência e economia de meios e recursos. A busca de equilíbrio entre ambiente físico, processos econômicos e organizações sociais, o chamado tripé da sustentabilidade (SILVA apud CSILLAG, 2007, P.30), é o que tornaria um empreendimento realmente sustentável, levando-se em consideração que uma construção dessa natureza pode ser instrumento de melhoria da qualidade de vida de um indivíduo ou comunidade. Quadro 1: Aspectos compreendidos no desenvolvimento sustentável Fonte: BARROS, 2005, p. 16 4 A maioria das certificações se fundamenta na análise de ciclo de vida (LCA2) de um edifício: LCA é o procedimento de analisar formalmente a complexa interação de um sistema – que pode ser um material, um componente ou um conjunto de componentes – com o ambiente ao longo de todo o seu ciclo de vida, caracterizando o que tornou-se conhecido como enfoque do “berço ao túmulo” (cradle-to-grave). (SILVA, 2003, p.17). Apesar de a definição de LCA se fundamentar no conceito de “berço ao túmulo”, ou seja, considerar o objeto de estudo em um ciclo do início ao fim da existência, as certificações consideram apenas o ciclo “berço ao sítio” (cradle-to-site) (BARROS, 2005), isto é, analisam apenas o ciclo que abrange do projeto à operação e manutenção do edifício, não considerando futura demolição ou reuso, visto que é praticamente impossível prever o que vai acontecer com tal edifício em dez, vinte ou cinqüenta anos. Apesar de esse tipo de prospecção não ser realizada, a certificação leva em consideração aspectos como reaproveitamento de materiais, ou quantidade de materiais desviada de aterros sanitários e enviada para reciclagem. Uma vez certificado, o edifício não é mais analisado para verificação se tudo o que garantiu a certificação ainda se aplica. Existe possibilidade de buscar a certificação LEED EB OM3, destinada à operação e manutenção de edifícios existentes, mas essa certificação não afeta a certificação obtida anteriormente, como o LEED CS4 ou LEED NC5. A CIB/UNEP-IETC (2002) defende que países em desenvolvimento precisariam ter um plano de Agenda 21 diferente dos países desenvolvidos, pois os problemas, prioridades e capacidades das indústrias, dos governos, das culturas e formas de ver o mundo são diferentes. Esta ponderação talvez também se aplique às certificações, pois além de todos os motivos mencionados, os métodos construtivos, materiais e acesso às tecnologias também diferem. 2 Life Cycle Analisys. 3 Para Operação e Manutenção de Edifícios Existentes 4 Para Fachadas e Áreas Comuns de Prédios Comerciais 5 Para Novas Construções e Grandes Reformas 5 Diante da problemática que o processo de certificação sugere, indicando caminhos para que uma abordagem crítica seja elaborada, este trabalho aborda o sistema de certificação LEED6, que vem sendo utilizado no Brasil e que é ainda bastante recente, ao se levar em consideração que a primeira edificação certificada no país foi a agência do Banco Real, na Granja Viana, em 2007. A certificação LEED vem se revelando cada vez mais uma meta e diversos edifícios que a utilizam, como as duas torres do Rochaverá, a agência do Banco Real na Granja Viana e o próprio Eldorado Business Tower, são hoje valorizados, do ponto de vista da divulgação de sua arquitetura e como símbolos de atendimento eficiente aos critérios de certificação, e também em termos de valorização imobiliária. Ganhando cada vez mais notoriedade e exercendo influência crescente nos meios empresariais e de incorporação imobiliária, os sistemas de certificação estão sendo também cada vez mais utilizados. Cabe então indagar das causas dessa crescente procura e valorização, perguntando também se um edifício certificado atende à premência de consistir de fato em uma arquitetura sustentável, e o que contribui para que seja assim identificado. Estas perguntas caracterizam os problemas que a pesquisa enuncia, e que a conduzem, sugerindo uma hipótese ou linha, a saber, de que a certificação não é condição suficiente para caracterizar a arquitetura sustentável na acepção plena desse termo: uma arquitetura capaz de atender às questões de economia de recursos e meios energéticos e materiais, mas que seja também apta a acolher usos e atividades, de forma a valorizar e qualificar a permanência e fluxos em seus espaços. O método de aplicação da certificação LEED é, em certa medida, direcionado para suprir interesses de mercado imobiliário, contribuindo para qualificar os empreendimentos conforme os parâmetros relacionados. A avaliação é feita por meio da aplicação de instrumento que resulta em um checklist, o qual identifica um conjunto de parâmetros e categorias que atribuem pontuação ao empreendimento, a qual depende dos créditos que a edificação atender. 6 Leadership in Energy and Environmental Design 6 Com uma estrutura simples a ponto de ser, por isso, criticada, o LEEDTM é baseado em especificação de desempenho em vez de critérios prescritivos, e toma por referência princípios ambientais e de uso de energia consolidados em normas e recomendações de organismos de terceira parte com credibilidade reconhecida, como a ASHRAE7; a ASTM8; a EPA9; e o DOE10 (SILVA, 2003, p. 54). O edifício Eldorado Business Tower, localizado à Avenida das Nações Unidas, junto ao Shopping-Center Eldorado, em São Paulo, projetado pelo escritório de arquitetura Aflalo & Gasperini e executado pela Construtora Gafisa, foi o primeiro edifício na América Latina a receber o certificado na categoria LEED CS Platinum, o mais alto nível de classificação. Este edifício será abordado como objeto de estudo para compreensão de como a Certificação LEED funciona e, o mais importante, quais itens leva em consideração para avaliar edifícios e se esses itens avaliados suprem todas as condições para que um edifício seja realmente sustentável e apresente qualidade arquitetônica. Os objetos de estudo que fundamentam este trabalho são, portanto, a certificação LEED e o mencionado edifício-alvo desta. Essa qualidade arquitetônica se define como um conjunto de determinações atendidas pela arquitetura, em que se destacam não apenas aspectos ambientais e energéticos, mas questões relativas ao espaço criado, circulações, distinção entre espaços de fluxo, transição e permanência, inserção do objeto arquitetônico no meio urbano, acessibilidade, materiais utilizados e efeitos no ambiente construído. Sugere-se que a sustentabilidade de uma edificação implique no atendimento dessa multiplicidade de aspectos. O objetivo deste trabalho, portanto, é analisar qualitativamente a certificação LEED como meio e instrumento suficiente de avaliação de sustentabilidade de edifícios, mediante o estudo de um caso que recebeu o mais alto nível de certificação, questionando o processo do LEED enquanto definidor da sustentabilidade da 7 8 9 10 American Society of Heating, Refrigerating and Air -conditionning Engineers American Society for Testing and Materials U.S. Environmental Protection Agency U.S. Department of Energy 7 arquitetura, e buscando compreender a relação entre esse procedimento e a sustentabilidade. O estudo de caso será objeto de análise mediante a compreensão do projeto arquitetônico que deu lugar à obra, verificando-se relações das características arquitetônicas com a produção de um edifício certificado, e como esta certificação representa ou não a produção de uma arquitetura sustentável. Trata-se de uma primeira abordagem, de natureza qualitativa quanto à relação entre certificação e sustentabilidade na arquitetura. O objetivo específico consiste em questionar de maneira crítica se a obra atende aos quesitos de classificação, bem como o alcance e a adequação do instrumento de medida, ou seja, verificar se o edifício Eldorado Business Tower é sustentável e se a categoria alcançada no LEED garante a ele essa sustentabilidade. Estes objetivos somente podem ser alcançados estudando não só o processo de certificação, mas o próprio projeto arquitetônico. Esse estudo envolve conhecer desde a concepção e partido, até os desdobramentos projetuais quanto ao espaço produzido, circulações, dimensionamento, soluções construtivas e técnicas, recursos arquitetônicos utilizados para a geração de conforto ambiental; enfim, é da arquitetura que provém a inclusão de princípios que a tornam certificável, e não apenas a existência de um instrumento definido “a priori”. Estes objetivos e meios de análise consistem na metodologia adotada. A metodologia envolve ainda um breve estudo do LEED frente a outras modalidades de certificações, mencionando outros sistemas existentes, tais como primeira certificação utilizada no mercado, o BREEAM11, e outro sistema utilizado no Brasil, o AQUA12. Cabe frisar que esta abordagem panorâmica não é o foco da metodologia, mas tão somente suporte para articular uma discussão crítica do processo de certificação. O LEED foi criado inicialmente nos Estados Unidos para certificar edifícios pretensamente sustentáveis e começou a ser utilizado e reconhecido no Brasil, tendo o primeiro edifício certificado em 2007, e outros países, concretizando a aspiração de funcionar como um instrumento universal. 11 Building Research Establishment Environmental Assessment Method 12 Alta Qualidade Ambiental 8 A certificação BREEAM foi desenvolvida em 1988 no Reino Unido, sendo a primeira apresentada ao mercado, e muitas outras que vieram depois a utilizaram como base, inclusive o LEED. O BREEAM já teve versão adaptada para outros locais, como Canadá e Hong Kong. Assim como o LEED, o BREEAM certifica edifícios determinando categorias que resultam em um checklist tornando esse método de avaliação mais simples e acessível, devido a essa sistematização. O Processo AQUA foi o primeiro sistema de certificação criado no Brasil. Lançado em abril de 2008, o sistema adaptou a certificação francesa HQE para a realidade brasileira. O método de avaliação também é realizado a partir de um checklist que enuncia catorze (14) categorias, tendo o mesmo objetivo do LEED e do BREEAM, a saber, facilitar o acesso e a compreensão pelo mercado imobiliário às formas de avaliação, tornando-as menos complexas e mais sintéticas. O Processo Aqua (Alta Qualidade Ambiental) é uma certificação adaptada à realidade brasileira pela Fundação Vanzolini e por professores do Departamento de Engenharia de Construção Civil da Poli/USP. O processo é fundamentado no sistema francês Haute Qualité Environnementale (HQE), mas adota critérios próprios e incorpora normas da ABNT. (CORBIOLI, 2009). O sistema de certificação, se observado de uma perspectiva crítica, admite enunciar a dúvida de até onde se produz, a partir dele como parâmetro, uma arquitetura de fato sustentável. E até que ponto uma arquitetura na qual se ausentam soluções que a tornem sustentáveis é compensada pelo atestado de “sustentável”, atribuído pelo fato de o edifício atender a categorias que enfatizam algumas tecnologias e recursos, e que nem sempre esgotam todos os determinantes e conteúdos necessários a uma arquitetura mais complexa em suas soluções e problemas definidos. Esse atendimento às categorias mais valorizadas permitiria a obtenção de certificação; e as indagações que a certificação suscita consistem nos problemas identificados para conduzir a dissertação de mestrado. Segundo John B. Herz, “(...) uma das principais funções de uma construção é a de atenuar as condições negativas e aproveitar os aspectos positivos oferecidos pela localização e pelo clima” (1998, p. 9). Isto implica em dizer que esse processo deve 9 ser adequado às circunstâncias específicas de cada projeto e lugar, levando a que o mesmo autor também mencione o paradoxo entre a necessidade de utilizar da tecnologia quando não se revela possível aproveitar ao máximo a luz e a ventilação naturais: Muitos edifícios modernos de vidro precisam de sistemas igualmente modernos de aquecimento e resfriamento bastante avançados e caros, com o objetivo de adaptar a construção ao clima. Neste caso, não se pretende que o projeto responda ao clima, mas que o equipamento adapte os edifícios a ele (HERTZ, 1998, p.19). A busca pelas certificações que comprovem a sustentabilidade de empreendimentos tem crescido cada vez mais, o que leva a enunciar perguntas relativas às causas desse crescimento: talvez em função de potencializar o valor imobiliário, ou por existir real preocupação com o meio ambiente? Ou então, em obter reais vantagens de economia de meios e recursos, centrados em eficiência energética e reuso de água, o que sugere que na prática, a certificação seja um índice de edifícios com essas qualidades: Internacionalmente, um número crescente de empresas do setor imobiliário e de construção vislumbra oportunidades de negócios relacionadas ao ambiente, seja para minimizar riscos, antecipar-se a mudanças na legislação, ou para sustentar uma imagem corporativa positiva. Os maiores desafios e oportunidades referem-se ao valor adicionado referente a valores ambientais, pois, apesar da importância atribuída aos valores verdes ter aumentado, argumentos ambientais não são suficientes para “vender” um empreendimento (SILVA, 2003, p. 5). A preocupação com uma arquitetura que aproveite ao máximo os recursos que o meio ambiente oferece utilizando o mínimo possível os recursos da natureza e causando, dessa maneira, um menor impacto, existe há muito tempo. Aliás, a importância de tal arquitetura vem sendo difundida há um bom tempo, antes de as certificações serem desenvolvidas. Não há dúvidas de que edifícios certificados apresentam menores índices de consumo de água e energia, mas a questão é até que ponto a certificação valoriza e se posiciona de maneira a assumir o protagonismo frente a outros fatores intrínsecos à arquitetura, e que em muito contribuem para que esta seja sustentável e incentiva a prática de arquitetura em 10 moldes mais complexos, expressando-se essa complexidade no partido e nas decisões projetuais. O LEED e o AQUA são compreendidos como instrumentos qualitativos para nortear a produção e possibilitar a avaliação de arquitetura sustentável; no entanto, sua aplicação prática bem como a visibilidade e o valor financeiro alcançados pelos empreendimentos que o utilizam sugere um questionamento da certificação, indagando se esta não se pauta apenas em suprir instrumentos de marketing e de agregação de valor imobiliário. O desenvolvimento do trabalho implica em um breve cenário comparativo dos sistemas de certificação utilizados no Brasil, para a apresentação de suas categorias, cujo objetivo é identificar, com essa comparação, diferenças fundamentais, bem como o alcance e possibilidades distintas desses instrumentos. Será também realizada uma introdução ao BREEAM, o primeiro instrumento de avaliação de edifícios sustentáveis, base para todos os outros, inclusive para o LEED. Passar-se-á em seguida a conhecer o instrumento de certificação AQUA, um dos mais usados e reconhecidos no Brasil, fundamentos esses que conduzirão a um estudo mais aprofundado (incluindo um estudo de caso), da certificação LEED. A comparação visa caracterizar esses instrumentos e identificar o que e como medem. Esse percurso comparativo será realizado com a apresentação e discussão dos instrumentos de certificação, fundamentando-se em fontes secundárias (trabalhos acadêmicos e bibliografias sobre sustentabilidade e certificação LEED no Brasil e informações fornecidas pelo U.S Green Building Council), visando compreender intenções, procedimentos e lógicas do processo de certificação. Apresenta-se também um mapeamento sucinto dos edifícios certificados no Brasil e na cidade de São Paulo, a fim de identificá-los e sintetizar algumas características de interesse. Proceder-se-á ao estudo de caso do Eldorado Business Tower a partir do projeto e de suas peças gráficas, incluindo observações realizadas no local. O estudo contará ainda com a análise do processo de certificação desse edifício, cujo material de pesquisa, de fontes secundárias e primárias, foi devidamente coletado 11 durante visita técnica realizada. O trabalho conta ainda com entrevista realizada com agentes diretamente envolvidos no projeto do edifício. O cruzamento de informações obtidas a partir de todos esses instrumentos e meios consiste no procedimento metodológico adotado, que procura articular uma análise crítica a partir da reflexão sobre as condições que levaram à certificação e sua relação com a arquitetura realizada e o espaço vivenciado. A dissertação está estruturada da seguinte maneira: numa primeira parte, considerações gerais sobre as relações entre sociedade e meio ambiente, apresentando um histórico do termo desenvolvimento sustentável e explicando alguns dos principais conceitos a ele relacionados. O segundo capítulo abordará exemplos de arquitetura classificada como sustentável em determinados momentos históricos, definindo-a e citando exemplos para, no terceiro capítulo, abordar as certificações verdes, iniciando com o BREEAM e o AQUA para em seguida aprofundar o LEED, objeto teórico de estudo do trabalho. Por último, será apresentado o estudo de caso com base no primeiro edifício que recebeu o certificado LEED platina na América Latina: o Eldorado Business Tower. Nesse capítulo, será apresentado o percurso histórico do projeto do edifício, as características arquitetônicas, de inserção urbana, materiais e construtivas que são a base do processo de certificação. Em seguida, uma análise crítica que indaga se essas características são suficientes para denominar sua arquitetura como sustentável será então apresentada. 12 CAPÍTULO 1. Sociedade e Meio Ambiente A questão da sustentabilidade em Arquitetura vem progressivamente se afirmando como matéria de relevância indiscutível, pois é quase intuitiva a idéia de que vivemos um momento em que o desenvolvimento depende de cuidados para com o meio ambiente e economia dos escassos recursos naturais e materiais disponibilizados. Segundo Ignacy Sachs (1993), duas posições antagônicas polemizam sobre a relação entre oferta e consumo de bens e recursos do planeta. Os “malthusianos” alertam que o mundo tem população excessiva, e que se consome hoje muito mais do que se produz. Esse desequilíbrio seria responsável por a natureza não conseguir acompanhar o ritmo do homem que, além do consumo, também é responsável pela contínua poluição do meio ambiente. Em oposição a essa corrente, os “cornucopianos” afirmam que a superpopulação mundial não é impedimento para que os impactos danosos ao meio ambiente não possam ser minimizados, pois tecnologia e conhecimento estão à disposição para ajudar a diminuir impactos e permitir que gerações futuras vivam sem a preocupação de esgotamento dos recursos naturais. O Relatório de Founex identificou os principais tópicos dessa problemática, presentes até hoje na agenda internacional. Rejeitando as abordagens reducionistas do ecologismo intransigente e do economicismo estreito e rigoroso, o relatório traçou um caminho intermediário e eqüidistante entre as posições extremas de “malthusianos” e “cornucopianos”. (SACHS, 1993, p.11). O Relatório de Founex foi preparado após o Encontro de Founex, em junho de 1971, quando diversos países já se preparavam para a Conferência de Estocolmo. Nessa época, preocupações com o meio ambiente se acentuavam. As décadas de 1970 e 1980 foram marcadas por diversos desastres ambientais que começaram a chamar a atenção, como o encolhimento do Mar de Aral e a destruição ambiental na Europa do Leste, e diante de acidentes causados pelo homem de grande repercussão, como o ocorrido na usina nuclear de Chernobyl, na antiga União Soviética, onde um reator apresentou problemas técnicos, liberando radiação, e o acidente de Bhopal, na Índia, quando aconteceu um vazamento de toneladas de gases tóxicos em uma 13 fábrica de pesticidas. Foi então realizada a conferência das Nações Unidas, em Estocolmo, em 1972, com o tema o Homem e o Meio Ambiente, sendo esta a primeira reunião global, que reuniu cento e treze países com o principal objetivo de discutir o desenvolvimento humano e sua intensa relação com o meio ambiente. Continuando os esforços de enfrentamento de problemas ambientais e desenvolvimento, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente realizou, em 1979 e 1980, vários seminários debatendo diversos estilos de desenvolvimento. O conjunto destas ações se refletiu no Relatório Brundtland, de 1987, um documento que identificou problemas ambientais, como o efeito estufa e a destruição da camada de ozônio, apresentou soluções para seu enfrentamento e definiu desenvolvimento sustentável (SACHS, 1993). Vinte anos depois da reunião de Estocolmo, nova conferência da Organização das Nações Unidas sobre meio ambiente e desenvolvimento foi então realizada, desta vez no Rio de Janeiro. A denominada ECO 92 se tornou mundialmente conhecida e, segundo Hans Michael van Bellen (2006, p.22), “(...) finalmente a interligação entre desenvolvimento socioeconômico e as transformações do ambiente entrou no discurso oficial da maioria dos países do mundo”. As diversas conferências, realizadas ao longo dos anos, que tiveram como tópicos assuntos sobre o meio ambiente e o desenvolvimento sustentável atestam uma preocupação progressiva sobre esses dois temas, colocando em evidência o problema do impacto causado pelo ser humano no meio ambiente e como esse impacto pode ser mensurado para que possa ser diminuído de maneira fundamentada, atingindo, assim, o desenvolvimento sustentável. 1.1 A Pegada Ecológica da Humanidade Pegada ecológica é um conceito que define a mensuração do impacto que o ser humano acarreta ao planeta, ou seja, “(...) a pegada ecológica contrasta o consumo dos recursos pelas atividades humanas com a capacidade de suporte da natureza e 14 mostra se seus impactos no ambiente global são sustentáveis a longo prazo” (CIDIN, SILVA, 2004, p. 46). Segundo o Global Footprint Network, atualmente, o planeta leva um ano e cinco meses para se regenerar frente ao que a humanidade consome em um ano, ou seja, a sociedade ultrapassa o que se encontra disponível para ser consumido, definindo um conceito denominado overshoot13. O overshoot acontece quando a demanda é maior do que aquilo que a natureza pode fornecer ou maior do que a capacidade da natureza de se regenerar (GLOBAL FOOTPRINT NETWORK, 2010). Gráfico 1: Pegada ecológica da humanidade FONTE: World Wide Fund for Nature (WWF). Living planet report 2008, p.2. Disponível em http://wwf.panda.org/about_our_earth/all_publications/living_planet_report/footprint/. Acesso em 19/09/2010. De acordo com o Global Footprint Network (2010), calcular a pegada ecológica de uma pessoa, cidade, negócio ou nação é importante, porque assim é possível identificar e mensurar a pressão que a sociedade exerce sobre o planeta e, assim, cuidar melhor do meio ambiente, providenciando ações necessárias. O gráfico 1 mostra que o planeta está em overshoot desde o final da década de 1980 e o impacto que o ser humano causa ao meio ambiente está crescendo continuamente. 13 Acima do limite 15 Para cessar esse significativo aumento de impacto, uma mudança de comportamento e dos processos que afetam o meio ambiente se torna imperiosa. Desfazer o mal já realizado requer um programa cuja escala supera grandemente, em custo e tamanho, os programas espaciais e militares. (...) Somos como os passageiros de uma grande aeronave em travessia do Atlântico, que, de repente, percebem quanto dióxido de carbono o avião está acrescentando a um ar já poluído (LOVELOCK, 2006, p.25). 1.2 O Impacto da Construção Civil no Meio Ambiente A construção civil é uma das atividades humanas que mais causa impacto ao meio ambiente (CIB/UNEP-IETC, 2002), sendo, portanto, bastante responsável pelo estado de overshoot que o planeta se encontra atualmente. O rápido crescimento populacional, principalmente em países em desenvolvimento, aumenta a demanda por espaços construídos e, conseqüentemente, o impacto destes no meio ambiente (HERNANDES, 2007). Assim, a legislação define impacto ambiental e o que estes acarretam ao ser humano e biosfera: (...) considera-se impacto ambiental qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das atividades humanas que, direta ou indiretamente, afetam: I - a saúde, a segurança e o bem-estar da população; II - as atividades sociais e econômicas; III - a biota; IV - as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente; V - a qualidade dos recursos ambientais. (CONAMA, resolução 001 de 23/01/1986, artigo 1º) De acordo com a Aciesp/1987 (apud FRANCO, 2001, p. 30), impacto ambiental é “(...) toda e qualquer atividade, natural ou antrópica, que produz alterações bruscas em todo o meio ambiente ou apenas em alguns de seus componentes. De acordo com o tipo de alteração, pode ser ecológico, social ou econômico.” Segundo o USGBC (2010), os prédios são os principais responsáveis pela emissão de gás carbônico na atmosfera. Em segundo lugar ficam os transportes e em terceiro, as indústrias. A construção civil é responsável pela utilização de 40% da 16 energia primária, 72% do consumo de eletricidade, 39% da emissão de gás carbônico e 13,6% do consumo de água potável. Segundo o CIB/UNEP-IETC (2002), os principais vilões da construção civil, quando se fala de mudança de clima, são o aço e o concreto. A produção de cimento é, depois da queima de combustíveis fósseis, o maior agente antropogênico na contribuição para a emissão de gases do efeito estufa. A produção do aço e do ferro é responsável pela utilização de 4,1% da energia do mundo. A construção civil também é responsável por diversos outros problemas, como poluição sonora, poeira e contaminações através de resíduos tóxicos. Além dos impactos ambientais, há que apontar também impactos sócio-econômicos. A construção civil é uma das atividades que mais oferece empregos no mundo, apesar de ter, também, a reputação de envolver ganância, corrupção, trabalho ilegal e destruição ambiental (CIB/UNEP-IETC, 2002). Como pilar da economia nacional, sabe-se que apesar das sucessivas quedas nos últimos anos o setor da construção civil no Brasil foi responsável por 6,5% de todo o PIB do país. (...) Quanto à carga tributária, a construção civil é o segundo maior contribuinte do país, ficando atrás somente do comércio (HERNANDES, 2007, p. 25). 1.3 Sustentabilidade - Conceitos e Definições Partindo do impacto ambiental que a sociedade causa ao planeta, e considerando que boa parte desse impacto é causado pela construção civil, a definição de sustentabilidade se tornou imperiosa e decisiva. A CIB/UNEP-IETC define que sustentar é manter a espécie homo sapiens viva. Sustentabilidade é a condição que permitirá que a espécie homo sapiens continue viva, ou seja, convivendo em harmonia com a natureza. Desenvolvimento sustentável é o tipo de desenvolvimento necessário para alcançar a sustentabilidade. Construção sustentável significa que todos os princípios do desenvolvimento sustentável foram aplicados a todo o processo da construção, desde a escolha do material, passando pela fase de projeto, construção até a manutenção do edifício. (CIB/UNEP-IETC, 2002, p. 6) 17 A CIB/UNEP-IETC (2002), ao tratar do tema deixa claro que o objetivo não é simplesmente sobreviver, mas garantir qualidade de vida e, para isso, é necessário encontrar o meio termo que permita o desenvolvimento social e econômico, sem prejudicar a natureza. (...) esta busca de equilíbrio entre o que é socialmente desejável, economicamente viável e ecologicamente sustentável é usualmente descrita em função da chamada “triple bottom line”, que congrega as dimensões ambiental, social, e econômica do desenvolvimento sustentável. (SILVA, 2003, p.1). Figura 1: Tripé da sustentabilidade FONTE: ARAUJO, 2006: p. 83. A dimensão econômica do desenvolvimento sustentável requer um sistema econômico que proporcione acesso a recursos e oportunidades para todos. O objetivo é que todos possam ter prosperidade dentro dos limites do que é ecologicamente possível e sem infringir os direitos humanos básicos. Em se tratando da construção civil, estes objetivos fazem pensar em arquiteturas capazes de atender a essas necessidades, beneficiando a todos os seus usuários e preservando o ambiente em que se insere. A dimensão social do desenvolvimento sustentável requer sociedades justas que possibilitem o desenvolvimento humano com 18 qualidade de vida aceitável para todos. A dimensão ambiental requer o equilíbrio entre proteger o ambiente físico e seus recursos e usar esses recursos de maneira que o planeta possa continuar proporcionando qualidade de vida aceitável para os seres humanos. (CIB/UNEP-IETC, 2002, p. 6). A arquitetura reúne em sua especificidade condições e anseios voltados a todas essas dimensões de sustentabilidade, definindo-se por essa razão em uma resposta social de expressiva amplitude e complexidade. Apesar de reconhecer que, desde Estocolmo, a preocupação com a “(...) harmonização de objetivos sociais, ambientais e econômicos” (SACHS, 2009, p.54) se tornou evidente, este autor definiu sustentabilidade de acordo com oito conceitos: social, cultural, ecológico, ambiental, territorial, econômico, política nacional e política internacional, ampliando assim seu espectro de relações definidoras. Segundo Sachs (2009): • Sustentabilidade Social é dar a mesma qualidade de vida para todos os seres humanos, todos devem ter direito a educação e a um bom emprego, ou seja, é necessário existir igualdade social. • Sustentabilidade Cultural é respeitar as tradições, mas estar aberto a inovações. • Sustentabilidade Ecológica significa usar os recursos da natureza com sabedoria, aproveitando os recursos renováveis e limitando o uso de recursos não renováveis. • Sustentabilidade Ambiental é respeitar o meio ambiente e saber utilizar seus recursos sem esgotá-los. • Sustentabilidade Territorial significa não ter desigualdades entre territórios e dar o mesmo tipo de importância às áreas urbanas e rurais. 19 • Sustentabilidade Política Nacional é respeitar a democracia e a habilidade do Estado em fazer projetos nacionais com diversos empreendedores como parceiros. • Sustentabilidade Política Internacional é a manutenção da paz, sem guerras, a manutenção de um sistema internacional financeiro, o mínimo possível de disparidades sociais e econômicas e o máximo de cooperação entre países. Desde a conferência sobre o meio ambiente no Rio de Janeiro em 1992, diversos autores definiram o que seria desenvolvimento sustentável, mas o conceito mais aceito atualmente é o da World Comission on Environment and Development (WCED): Desenvolvimento econômico e social que atenda as necessidades da geração atual sem comprometer a habilidade das gerações futuras atenderem as suas próprias necessidades. (BRUNDTLAND apud HERNANDES, 2006, p. 27). Esta definição é de grande interesse ao campo da Arquitetura e Urbanismo, pois implica em dizer que um edifício sustentável não é aquele que atende aqui e agora a algumas condições definidas como sustentáveis, mas aquele que é capaz de resistir no tempo a essa conceituação. A arquitetura e as cidades são também artefatos realizados para as gerações futuras, e objeto para um desenvolvimento sustentável. Esta questão é de grande relevância para a elaboração de um argumento que seja capaz de auxiliar a definir arquitetura sustentável, e assim, cotejá-la com as condições de sustentabilidade de edifícios submetidos às diversas certificações verdes, objeto deste estudo. Apesar de haver intensa discussão sobre o tema da sustentabilidade, ainda persiste a dúvida sobre “(...) como o desenvolvimento sustentável pode ser definido e operacionalizado para que seja utilizado como ferramenta para ajustar os rumos que a sociedade vem tomando em relação à sua interação com o meio ambiente natural?” (BELLEN, 2006, p.13). 20 A resposta de Bellen (2006, p.13) a essa pergunta é atingir esse estado de equilíbrio com “(...) o desenvolvimento e a aplicação de sistemas de indicadores ou ferramentas de avaliação que procuram mensurar a sustentabilidade”, o que lança luz à importância da certificação como esse possível sistema de indicadores que poderia estar a serviço de uma arquitetura sustentável. No entanto, resta a inquietação de saber se apesar desses indicadores, a arquitetura pode ser definida como apta ao meio ambiente exclusivamente pela aplicação desses instrumentos de certificação. 1.4 Agenda 21 Durante a ECO´92 (Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento), foi desenvolvida a Agenda 21 Global com o objetivo de estabelecer “(...) um plano ambicioso de ação global para o século seguinte, que estabelecia uma visão de longo prazo para equilibrar necessidades econômicas e sociais com os recursos naturais do planeta” (SILVA, 2003, p.2). Na CNUMAD14, 178 governos adotaram a Agenda 21 e envidaram esforços para criar as Agendas 21 locais, adaptando a Agenda 21 Global às características de cada país e, posteriormente, a cada estado e município. Uma estratégia nacional de desenvolvimento sustentável é “(...) um processo ou sistema que torna possível a implementação de estrutura e atividades estratégicas para responder aos princípios e desafios do desenvolvimento sustentável” (DALALCLAYTON E BASS apud COUTINHO; JUNIOR; MALHEIROS, 2008, p.10). No Brasil, esse processo foi implementado e teve natureza participativa, conforme revela a passagem: A construção da Agenda 21 brasileira partiu do desencadeamento de um processo de planejamento participativo com a finalidade de analisar a situação atual do país para identificar potencialidades e fragilidades e, dessa forma, visualizar o desenvolvimento futuro de forma sustentável. Para isso, procurou abordar a realidade brasileira de forma multissetorial, a partir de diagnósticos setoriais elaborados 14 Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento 21 por especialistas, apoiados por ampla participação de representantes de diferentes setores da sociedade de todas as regiões do país, inclusive com participação da área acadêmica. (CPDS apud COUTINHO; JUNIOR; MALHEIROS, 2008, p. 9). M unicípio s Grandes Regiõ es e classes de tamanho da po pulação do s município s B ra s il A té 5 000 De 5 001a 10 000 De 10 001a 20 000 De 20 001a 50 000 De 50 001a 100 000 De 100 001a 500 000 M ais de 500 000 N o rt e Co m pro cesso de elabo ração da A genda 21iniciada Estágio da A genda To tal 5 565 1257 1294 1370 1055 316 233 40 449 To tal Sensibilização / mo bilização Definição de diagnó stico e meto do lo gia Elabo ração Implementação do P lano de de açõ es da Desenvo lvimento A genda 21em po líticas públicas Sustentável Não inicio u o pro cesso Desco nhece de o que seja elabo ração A genda 21 da A genda 21 1 10 5 115 201 240 293 117 115 24 5 10 58 98 105 136 59 46 8 12 8 10 14 35 39 10 15 5 2 17 28 46 52 58 15 15 3 250 19 43 48 60 33 39 8 4 009 990 945 1034 716 192 116 16 451 152 148 96 46 7 2 0 12 3 62 9 22 30 296 30 N o rde s t e 1 794 462 2 12 51 10 4 95 1 200 13 2 S ude s t e 1 668 309 13 2 40 60 77 1 229 13 0 S ul 1 18 8 14 7 72 21 18 36 945 96 466 64 32 7 13 12 339 63 C e nt ro - O e s t e Tabela 1: Estágio de desenvolvimento da Agenda 21 nos municípios brasileiros Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Informações Básicas Municipais População e Indicadores 2009. Sociais, Pesquisa de Disponível em: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/economia/perfilmunic/2009/defaulttabzip.shtm - Acesso em 09/09/10. O Brasil aprovou sua Agenda 21 em 2002 e, desde então, diversos municípios têm se empenhado em construir Agendas 21 locais. Dos 5.565 municípios brasileiros, praticamente 20% já estão com o processo de elaboração da Agenda 21 iniciado, conforme mostra a tabela acima. Para atender aos itens relacionados na Agenda 21 Global, identifica-se como desafio desenvolver indicadores que atestem um desenvolvimento sustentável garantindo, assim, que os objetivos sejam atendidos. Na década de 1980, as questões envolvidas nos encontros mundiais que resultaram na Agenda 21 se estenderam ao debate do impacto da construção civil, enunciando o problema de como realizar edificações sustentáveis e como avaliar a sustentabilidade dessas edificações (STUERMER; BEDENDO; BROCANELI, 2010). Nesse contexto, 23 integrando em sua forma de avaliação questões sociais e econômicas específicas de cada país, sendo que estas também integram o conceito de sustentabilidade. “ (...) o LEED se mostra inadequado para abordar situações típicas de países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento bem como a questão social e cultural que não é absorvida pela certificação (...)” (STUERMER; BEDENDO; BROCANELI, 2010, p.04). A Agenda Marrom trata das questões sócio-culturais de cada país, sendo mais específica, enquanto que o LEED foca questões ambientais, mas de universal, tanto que os critérios de certificação usados hoje, no Brasil, são os mesmos usados nos Estados Unidos. 1.6 Uma síntese das principais questões abordadas Não há dúvidas de que preocupações com o meio ambiente afetam decisões e agendas mundiais desde a década de 1970. O impacto das ações humanas ao meio ambiente passou a ser então avaliado e mensurado, a partir do reconhecimento de sua importância crítica, e cidades, estados e países se esforçam desde então para agir em suas respectivas realidades, o que permitiu uma redução desse impacto. Nesse contexto, surgiram as Agendas 21 globais e locais e as definições de Agenda Verde e Marrom, sendo que a primeira prioriza a natureza e a segunda, o ser humano. A principal questão crítica a frisar é que talvez nenhuma das duas agendas deva ter prioridade, ou seja, ambos os fatores por elas identificados como relevantes para alcançar a sustentabilidade devam ser levados em consideração. Desde então, diversos conceitos surgiram, sendo o principal o de sustentabilidade, e tal conceito não leva em consideração apenas o meio ambiente ou o ser humano nele impactante, mas aspectos relacionados tanto ao meio ambiente como à qualidade de vida. Ou seja, o conceito aborda mais do que o impacto causado ao meio ambiente, enunciando implicitamente o problema de como reduzir esse impacto sem comprometer a qualidade de vida da sociedade. A construção civil pode ser um dos maiores inimigos do meio ambiente, mas ela é também um dos maiores geradores de empregos, e sua produção convida a 24 encontrar soluções que permitam que essa frutífera atividade prossiga, mas que também se possa reduzir o expressivo impacto que a torna tão prejudicial ao meio ambiente. Sustentabilidade não significa degradar a natureza em prol do ser humano ou vice-versa, mas a idéia principal é fazer com que ambos convivam harmoniosamente. 25 CAPÍTULO 2. Arquitetura Sustentável A arquitetura sustentável pode ser definida como um meio para se alcançar soluções espaciais, relativas às relações das edificações com o meio urbano sustentável, ou ainda, “(...) soluções que geram desenvolvimento sem comprometer a disponibilidade de recursos das futuras gerações” (HERNANDES, 2006, p.32). A fim de precisar esse conceito, tem-se que arquitetura sustentável pode se definir da maneira seguinte: (...) uma forma de promover uma busca de maior igualdade social, valorização dos aspectos culturais, maior eficiência econômica e um menor impacto ambiental nas soluções adotadas nas fases de projeto, construção, utilização, reutilização e reciclagem da edificação, visando a distribuição equitativa da matéria-prima, garantindo a competitividade do homem e das cidades. (MÜLFARTH apud HERNANDES, 2006, p. 31). Soluções sustentáveis nasceriam no projeto de arquitetura e projeto urbano, ao considerar os materiais utilizados, a construção em si e a maneira de realizar a manutenção da casa, ou do edifício. A arquitetura sustentável também deve contemplar todos os itens do tripé da sustentabilidade, tornando o projeto, além de ecologicamente correto, economicamente viável e socialmente responsável. É importante ressaltar que a sustentabilidade na arquitetura deve não só poupar energia e evitar técnicas ou materiais agressivos ao meio ambiente, mas também ser viável no plano econômico (inclusive para sustentar suas práticas e desmentir aqueles que afirmam que a construção ecologicamente sustentável é mais cara) e socialmente consciente (promovendo inclusão social, acessibilidade universal e revitalização de edifícios, praças, parques ou bairros existentes, mas deteriorados). Portanto, a sustentabilidade na arquitetura também inclui políticas e projetos de planejamento (em escala urbana e territorial), paisagismo e preservação de ecossistemas urbanos e rurais (FUJIOKA, 2008, p.34). 26 Para Fujioka (2008), a arquitetura ecologicamente correta deve buscar a redução do consumo de água e de energia, prever reutilização de águas pluviais, manter o máximo possível de área permeável, prever o tratamento da água que será lançada na rede pública, seguir as normas de acessibilidade, respeitar os padrões ergonômicos, evitar desperdícios e superdimensionamento, prever espaço para reciclagem de lixo, utilizar materiais de baixa emissão de componentes voláteis orgânicos e controlar a ventilação nos ambientes internos. Para Corbella e Yannas (2003), a arquitetura bioclimática, conceituada como aquela que atua no sentido de dominar as condições climáticas, utilizando os recursos disponíveis na natureza (sol, vegetação, chuva, vento) para minimizar os impactos ambientais e reduzir o consumo energético, deve buscar o conforto ambiental considerando: • O conforto térmico do usuário, analisando todas as variáveis relativas a esse item e propondo soluções que amenizem qualquer desconforto gerado pelo ambiente; • O conforto visual, proporcionando um bom nível de iluminação de acordo com a tarefa a ser realizada no ambiente e promovendo uma boa distribuição de luz para não causar ofuscamento ou grandes contrastes. As cores das superfícies também são importantes e também se deve procurar obter o máximo possível de iluminação natural, controlando-se a intensidade de entrada de luz e procurando integrar os projetos de iluminação natural e artificial, com o objetivo de economizar energia; • O conforto acústico, procurando que a arquitetura proposta obtenha as melhores condições de reprodução e acolhimento de som nos ambientes. O nível do som precisa estar correto, sem ser alterado tanto por elementos que o absorvam demais quanto por superfícies capazes de refletir o som e causar reverberações ou interferências. O ruído externo também não deve interferir nas condições de percepção sonora no ambiente interno. 27 O projeto de um edifício deve sempre incluir estudo sobre orientação solar e eólica; bem como de dimensionamento e disposição de panos envidraçados, considerando sempre a posição do edifício em relação ao sol. É preciso ainda estudar quais áreas envidraçadas precisam ser protegidas, incluindo o detalhamento de como essas proteções serão realizadas; sendo também relevantes a definição de fachada e cobertura de acordo com a necessidade de proteção solar; materiais de vedação; materiais de estrutura; desempenho térmico dos materiais; condicionantes ambientais, como poluição sonora e vegetação; e divisão interna do espaço (GONÇALVES; DUARTE, 2006). Mas cabe lembrar que o projeto de arquitetura deve ser avaliado a partir do relacionamento e interdependência desses fatores, e que estes não devem ser atendidos de forma isolada. Portanto, a arquitetura sustentável não deve levar em conta apenas fatores relativos ao meio ambiente. Conforme mencionado, alcançar a sustentabilidade depende de cuidados em relação aos demais aspectos que a constituem, e da abordagem de fatores sócio-econômicos no projeto. Como exemplo do exposto, deve-se lembrar que o material não deve ser escolhido apenas por ser ecologicamente correto, devendo atender a outras necessidades projetuais, como proporcionar conforto, contribuir para a qualidade de vida do usuário e atender à legislação e normas urbanísticas. E, com base nesse conjunto de preocupações e soluções articuladas, a concepção arquitetônica poderia atender à sustentabilidade. Outro exemplo de natureza crítica poderia imaginar o projeto de um edifício corporativo implantado em uma das regiões mais movimentadas de São Paulo. Aproveitar o máximo de insolação e de ventilação natural talvez inviabilizasse a condição ecologicamente correta desse edifício, pois seria também necessário pensar em uma barreira contra ruídos. Neste último caso, há diversas tecnologias disponíveis que ajudam a diminuir o consumo e melhorar a eficiência energética de um edifício, mas o projeto exemplificado requer enfrentar especificamente a questão do ruído urbano, para atingir qualidade e sustentabilidade. Algumas considerações fundamentadas em interpretações históricas fazem crer que muitos exemplares de arquitetura modernista brasileira já teriam em sua época de 28 concepção atingido o máximo da condição sustentável, com a utilização de cobogós (elementos vazados cerâmicos) e outros tipos de brises-soleil, que propiciavam o aproveitamento de iluminação e ventilação naturais (FUJIOKA, 2008). Também é possível considerar que a aplicação dos métodos utilizados mais recentemente pelo arquiteto malaio Ken Yeang, fazendo o edifício interagir o máximo possível com a natureza, também resultam em arquitetura sustentável, mas o fato é que a arquitetura que almeje essa definição deveria integrar um conjunto de fatores arquitetônicos. Entre esses múltiplos fatores agregadores de qualidade, pode-se mencionar um extenso rol: as relações entre o edifício e seu entorno; acessibilidade, espaços previstos para permanência e circulações; conforto do usuário em relação ao dimensionamento dos espaços, e soluções e propostas de meios adequados e eficientes para racionalizar o consumo energético. Como, por exemplo, aproveitar ao máximo a iluminação e ventilação naturais, ou ainda, prever sistemas de reuso de água e geração energéticas, capazes de contribuir para uma gestão mais eficaz desses recursos escassos. No entanto, é importante considerar ainda na construção materiais que acarretem baixo impacto ao meio ambiente, obedecer às normas de acessibilidade universal, gerar economia em manutenções futuras e ser avaliado por essa economia também, gerando o máximo possível de economia durante a construção e, mediante avaliação, obter um ótimo desempenho ambiental. Essa extensa relação de qualidades arquitetônicas relativas à sustentabilidade sugere que para um conceito amplo como “arquitetura sustentável”, as categorias envolvidas com seu sucesso prático constituem um sistema projetual mais vasto do que meramente o atendimento a alguns tópicos referentes à economia de recursos energéticos e soluções inteligentes. 31 Com cinqüenta e três andares, o Commerzbank tem uma planta triangular com um grande átrio no centro. Toda a parte de elevadores, escadas e serviços são localizados nos três cantos do edifício. Os jardins laterais de quatro pavimentos de altura, que alternam com oito pavimentos de escritórios, associados à utilização de fachadas duplas, criam um sistema de ventilação natural. A camada externa da fachada é feita de vidros fixos e permanece sempre fechada, enquanto que a camada interna tem janelas que podem ser abertas para permitir a ventilação. (PAWLEY, 1999) 2.1.2 Ken Yeang No meio internacional, diversos outros edifícios foram projetados buscando atingir o qualificativo de arquitetura ecologicamente correta, mas o arquiteto malaio Ken Yeang foi um dos que mais se destacou, desde fins do século vinte, projetando sob a motivação do tema “edifícios altos verdes”. A seguir, são relacionados os principais conceitos desenvolvidos por Ken Yeang para o projeto de um “edifício ecológico”, consideráveis na etapa de concepção: – Orientação das fachadas e janelas; – Posição do núcleo de elevadores e sua influência na configuração do edifício e na distribuição do espaço interno; – Projeto das proteções solares; – Cor da envoltória; – Efeito da vegetação e seu cultivo ao longo do edifício; – Modo de climatização (ar-condicionado, ventilação natural ou modo misto); – Seleção de materiais e das fontes de energia. (UMAKOSHI; GONÇALVES, 2009, p.138). 32 Os projetos de Ken Yeang são caracterizados pela grande preocupação com o conforto ambiental e uso intenso da vegetação. “A arquitetura de suas torres exibe uma forte presença orgânica através dos freqüentes jardins verticais que escalam por entre as estruturas e fachadas, além das soluções bioclimáticas típicas de uma imagem natural” (ZAMBRANO, 2008, p.93). Yeang também explora novas tecnologias tendo em vista futuras aplicações em suas obras, testando suas teorias mediante simulações digitais e por meio de protótipos. Apesar de adotar a experimentação como base do trabalho, nem todas as idéias testadas como protótipos são aplicadas à construção de edifícios projetados por esse arquiteto. Yeang justifica que a dificuldade de aplicar tudo o que testa em protótipos nas construções reside no fato de que, cronologicamente, é impossível executar um projeto e uma velocidade com construção que suas com a mesma pesquisas são realizadas. O Tokio Nara Tower, de 1995, é um Figura 7: Tokyo Nara Tower – Ken Yeang dos edifícios de Ken Yeang que, ao utilizar Fonte: vegetação que percorre toda a fachada, pode GOOGLE. www.google.com.br. 22/04/2011 Disponível em Acesso em então conferir a todo o edifício, do solo ao topo, uma mesma linguagem e solução bioclimática (UMAKOSHI;GONÇALVES, 2009). No Menara Mesiniaga (1989-1992), na Malásia, Ken Yeang utilizou alguns dos conceitos que considera importantes para o projeto de arquitetura bioclimática. Todos os banheiros têm ventilação natural e tanto essa área funcional como serviços e elevadores estão direcionados para o leste, o lado mais quente. Escadas e halls de elevadores também são naturalmente ventilados. A área de trabalho é quase toda envidraçada, com vista para a área externa, com algumas salas fechadas bem no centro, mas todas com divisórias de vidro possibilitando também que os usuários vejam o exterior (YEANG, 1996). 33 Figura 8: Menara Mesiniaga Fonte: GOOGLE, 2011. Disponível em www.google.com.br. Acesso em 14/08/2011 Figura 9: Menara Mesiniaga Fonte: YEANG, p.80, 1996 34 Ken Yeang defende que edifícios altos deveriam funcionar como cidades verticais, ou seja, concentrar serviços, lazer, trabalho e habitação em um único edifício (UMAKOSHI; GONÇALVES, 2009). Defende ainda que todos os escritórios do futuro devam contar com: - Relação com o ambiente externo - Espaços de transição entre os ambientes internos e externos - Áreas abertas que sirvam como oportunidade para encontros, como pátios e halls de elevadores - Copa e áreas para alimentação - Iluminação natural - Ventilação natural - Maior acessibilidade - Áreas para vestiários - Condições de iluminação mais parecidas possível com a área externa - Utilização de vidro (YEANG, 1996, p. 244) 2.2 Arquitetura brasileira Apesar de tantos exemplos de arquitetura ecologicamente correta terem surgido no exterior na década de 1990, Gonçalves e Duarte (2006) defendem que a arquitetura moderna brasileira demonstrara características bioclimáticas já no período entre 1930 e 1960, com o uso de quebra-sóis e cobogós, presentes com intensidade nas obras de arquitetos como Lúcio Costa, Oscar Niemeyer e Rino Levi. O conforto ambiental e o consumo de energia teriam sido preocupação recorrente em projetos de boa qualidade e, por esse motivo, a arquitetura bioclimática se tornou importante para legitimar uma arquitetura sustentável. A Arquitetura sustentável é a continuidade mais natural da Bioclimática, considerando também a integração do edifício à totalidade do meio ambiente, de forma a torná-lo parte de um conjunto maior. É a arquitetura que quer criar prédios objetivando o aumento da qualidade de vida do ser humano no ambiente 35 construído e no seu entorno, integrando as características da vida e do clima locais, consumindo a menor quantidade de energia compatível com o conforto ambiental, para legar um mundo menos poluído para as próximas gerações. (CORBELLA E YANNAS apud GONÇALVES E DUARTE, 2006, p.52). Na arquitetura moderna brasileira “(...) vale mencionar os notáveis aspectos da casa bandeirista de pau-a-pique, bem como a notável solução do muxarabi, a grelha quebra-sol de madeira de origem árabe e mediterrânea, tão tradicional também na Península Ibérica.” (FUJIOKA, 2008, p.43), elementos esses que teriam sido adequados à manifestação da arquitetura moderna no Brasil. Nas décadas de 1950 e 1960, quando a tecnologia nem era tão avançada a ponto de suprir necessidades de conforto ambiental ausentes no projeto, diversos arquitetos já se preocupavam com a concepção e execução de uma arquitetura que, por si só, fosse capaz de promover conforto ambiental para os usuários das futuras casas ou edifícios e permitisse o máximo de aproveitamento das características que os ambientes ofereciam. A seguir, são apresentados alguns arquitetos e obras arquitetônicas brasileiras exemplares, quanto à motivação inerente à sustentabilidade. 2.2.1 Rino Levi Rino Levi ficou conhecido por ser bastante rigoroso com o detalhamento técnico da arquitetura, além de se preocupar com a estética do projeto. Rompeu com o arcaico e tradicional método de construir através de um simples ‘desenho artístico’, desenhando exaustivamente todas as etapas da obra: fundação, estrutura, alvenaria, acabamento, esquadrias, chegando até a detalhar luminárias e mobiliário. (UEDA, p. 46, 2001). 36 Uma das principais características de seus projetos era a preocupação em suprir e controlar a insolação e iluminação naturais, aspectos que geralmente enfrentava com a utilização de persianas de madeira ou venezianas nos edifícios residenciais e brises-soleil, nos edifícios comerciais. Nos anos de 1950, materiais refratários conhecidos por aproveitar a luz natural passaram a ser fabricados por empresas de vidros, mas Rino Levi se recusou a utilizá-los, pois além do custo muito alto, exigiam a instalação de máquinas de ar-condicionado, aumentando o consumo de eletricidade. Além disso, pela sua experiência, os panos de vidro nunca forneceram iluminação suficiente para dispensar o uso de iluminação artificial durante o dia (UEDA, 2001). Os tratamentos de fachada prescritos por Rino Levi que indicam sua grande preocupação com a insolação puderam ser observados nitidamente pela primeira vez no Edifício Concórdia, construído entre 1955 e 1957, em São Paulo. O projeto do brise segue as necessidades da orientação das fachadas. Enquanto a fachada da Rua Plínio Ramos recebe brise horizontal feito com placas curvas de fibrocimento rente ao caixilho para barrar o sol de noroeste (tarde e poente), a fachada interna, aberta para um jardim construído no teto da garagem, recebe brise horizontal disposto em balanço, filtrando um pouco da insolação matutina e acentuando a extensão do espaço interno para o exterior. (ANELLI; GUERRA; KON apud RAHAL, 2006, p.65). 37 Figura 11: Edifício Concórdia – Rino Levi Figura 10: Edifício Concórida – Rino Levi Fonte: RAHAL, p.65, 2006 Fonte: RAHAL, p.65, 2006 Apesar de não ser a favor do uso de pano de vidro, Rino Levi o adotou, em conjunto com brises de alumínio fixos, no edifício do Banco Sul-Americano, atual Banco Itáu, localizado em São Paulo, na Avenida Paulista, e construído entre 1961 e 1965 (UEDA, 2001). Figura 13: Banco Sul-Americano – Rino Levi Figura 12: Banco Sul-Americano – Rino Levi Fonte: RAHAL, p.66, 2006 Fonte: RAHAL, p.66, 2006 Para o arquiteto Affonso Eduardo Reidy, a arquitetura moderna brasileira é caracterizada pela constante preocupação de adaptação ao clima. Ele descreve a arquitetura moderna brasileira como: 38 ...uma particular sensibilidade dos arquitetos à condições regionais, tendo constante preocupação de obter soluções adequadas ao clima, desenvolvendo os mais variados sistemas de proteção contra o calor , os quais, muitas vezes, da estrutura como elemento marcante da composição, oferecendo, freqüentemente, motivação ao seu aspecto formal; quase sempre o encontro de soluções claras e simples, mesmo para problemas mais complicados, que são solucionados com generosidade e largueza. A riqueza da flora, a dramaticidade da paisagem e a força do sol talvez sejam responsáveis pela tendência, bastante freqüente, para uma certa exuberância formal (...) (REIDY apud ZAMBRANO, 2008, p.62). A arquitetura moderna brasileira no período abordado neste item demonstrou uma preocupação em aproveitar o máximo possível do que a natureza tem a oferecer. Apesar de não dispor de tecnologia relativa à operação inteligente de sistemas e processos de economia energética ou reciclagem e reuso de materiais que hoje se aprimoram nos prédios certificados que buscam reduzir o impacto ambiental, a preocupação com sustentabilidade, compreendendo-a como a produção de um ambiente voltado ao conforto dos usuários partia do projeto. O projeto recebia a atenção merecida no sentido de ser compreendido como uma intermediação capaz e suficiente para prover as edificações das qualidades necessárias à expressão da sustentabilidade. 2.2.2 Marcos Acayaba As obras de Marcos Acayaba demonstram essa estreita relação entre arquitetura e meio ambiente. Como exemplo, a residência Baeta (1993-94) no Guarujá aproveitou a declividade do terreno fazendo pilares árvores, preservando a mata nativa e permitindo que a água da chuva escoasse normalmente (FUJIOKA, 2008). Como o local não permitia a instalação de um canteiro de obras, as peças foram idealizadas de maneira que fossem executadas em outro lugar e apenas montadas no local. Dessa maneira, Acayaba trabalhou com estruturas de madeira pré-fabricadas. 39 Figura 14: Residência Baeta – Marcos Figura 15: Residência Baeta – Marcos Acayaba Acayaba Fonte: NAKANISHI, p. 105, 2007 Fonte: NAKANISHI, p. 105, 2007 Figura 16: Corte Residência Baeta – Marcos Acayaba Fonte: NAKANISHI, p. 110, 2007 40 Diversos outros exemplos de construções que, de alguma maneira, utilizaram técnicas para amenizar o impacto do edifício no meio ambiente podem ser apontadas no Brasil, incitando a descobrir quais princípios e características assinalam uma arquitetura que por suas características de concepção e materialidade a definem como sustentável e se as certificações levam em consideração esses princípios, polemizando a questão. 2.3 Considerações sobre o capítulo 2 A busca por uma arquitetura sustentável fez com que diversas definições desta surgissem ao longo dos anos. Aproveitamento de luz e ventilação naturais se tornou imprescindível para quem tenta respeitar ao máximo o que a natureza tem a oferecer. A integração da arquitetura com a natureza também se tornou passível de definir a sustentabilidade, e ainda aproveitar ao máximo o terreno, evitando cortes e aterros, como exemplifica a obra de Marcos Acayaba, ou utilizar o máximo a presença de vegetação natural nos projetos, como revela a prática de Ken Yeang, demonstram uma preocupação com o meio ambiente. Porém, a definição de arquitetura sustentável se torna mais complexa mediante a quantidade e disponibilidade de tecnologia aplicada hoje aos edifícios para compensar a ausência de ventilação natural, por exemplo. O fato é que a arquitetura realizada pensando em qualidade e responsabilidade frente à natureza e ao usuário deve partir da premissa de ser sustentável, procurando alcançar esse nível de excelência de forma sistêmica e integrando seus diversos condicionantes e possibilidades, técnicas, tecnológicas e estéticas. Os primeiros passos e condicionantes de um projeto partem de analisar o terreno, verificar o que tem a oferecer e o que pode ser aproveitado, posicionar a futura edificação de maneira a obter uma boa insolação, iluminação natural e resguardo, fazendo com que o conforto térmico não venha a ser prejudicado por uma implantação e orientação indevidas, de maneira que se possa, ainda, tirar máximo partido da ventilação natural. 41 O conceito de sustentabilidade envolve também questões sociais e econômicas, a arquitetura sustentável também deve se preocupar com a qualidade de vida do usuário, refletida em acessibilidade universal, conforto térmico, visual e acústico e racionalização de meios tanto de construção quanto de manutenção. Um dos atuais problemas que podem ser identificados reside em que muitas vezes a ausência desse cuidado e preocupação com o projeto de forma a contemplar seus aspectos sistêmicos pode ser compensada pela agregação de tecnologias que, embora elevem a qualidade da edificação em alguns itens específicos, não garantem um resultado arquitetônico sustentável. Tais recursos ajudam em muito nos aspectos relativos à máxima economia de meios tais como energia e água, consistindo essas soluções no cerne da arquitetura sustentável, quando se fala em construções “verdes”. Mas a questão crítica permanece de até onde a aplicação dessa tecnologia é suficiente para caracterizar a arquitetura sustentável. 42 CAPÍTULO 3. Sistemas de Certificação Green Building O impacto causado pela construção civil é uma das atividades humanas que mais afeta o meio ambiente, e as Certificações Green Building foram desenvolvidas com a finalidade de prover um instrumento de avaliação desse impacto e, também, como forma de mensurá-lo com base na análise do ciclo de vida dos edifícios. A primeira certificação, denominada BREEAM, surgiu em 1990 no Reino Unido e, a partir dela, surgiram diversas outras que usaram sua estrutura como base de referência. De certa maneira, esse instrumento passou a ser um guia de referência para quem desenvolvia projetos e trabalhava com construção civil, direcionando as soluções projetuais e as ações na obra para garantir um edifício sustentável. O objetivo foi incentivar o mercado a buscar alto nível de desempenho ambiental dos edifícios por meio de uma avaliação que identificasse necessidades de intervenções em obras ou alterações expressivas na forma de projetar, construir e manter um edifício. A expressão Green Building foi então cunhada para englobar todas as iniciativas dedicadas à criação de construções que utilizem recursos de maneira eficiente, com claro foco em uso de energia; que sejam confortáveis; e que tenham maior longevidade, adaptando-se às mudanças nas necessidades dos usuários e permitindo desmontagem ao final do ciclo de vida do edifício, para aumentar a vida útil dos componentes através de sua reutilização ou reciclagem. (SILVA, 2003, p.33) Os sistemas de certificação criados assumiam por desafio descobrir o que e como avaliar, e qual o objetivo a atingir. Atualmente, diversos países adotaram um desses instrumentos e respectivo método de avaliação ambiental de edifícios. Entre esses instrumentos, pode-se destacar: 43 BREEAM Building Research Establishment Environmental Assessment Method. Reino Unido. Sistema criado pelo BRE em 1990. Considerado o sistema mais antigo e que influenciou grande parte dos sistemas posteriores, inclusive o LEED. BEPAC Building Environmental Performance Assessment Criteria. Canadá. Sistema baseado no BREEAM que praticamente não foi usado, mas deu origem ao GBC. GBC Green Building Challenge. Consórcio de iniciativas que criou, em 1998, a ferramenta GBTool para avaliar edifícios. Tem como meta abordar as características locais de cada local onde é aplicado. LEED Leadership in Energy and Environmental Design. Sistema criado pelo USGBC em 2000, fortemente difundido nos EUA e com influência na criação de outros sistemas pelo mundo. CASBEE Comprehensive Assessment System for Building Environmental Efficiency. Japão. Introduzido em 2002. HKBEAM Hong Kong Building Environmental Assessment Method. Iniciado em 1996 inspirado no BREEAM. É uma iniciativa privada da The Real Estate Developers Association of Hong Kong. Ecoprofile Sistema oficial de avaliação da Noruega. Coordenado pela Byggforsk (Instituto Norueguês de Pesquisa de Edifícios). Miljöstatus Environmental Status. Sistema sueco de avaliação. Iniciado em 1995, começou a atividade em 1997, sendo que, em 2002, já estava na versão 4 e contava com aproximadamente 2000 edifícios avaliados. NABERS National Australian Building Environmental Rating System. Sistema de avaliação australiano, iniciado em 2001, e com versão piloto a ser lançada em 2003. Avaliação de edifícios de escritórios e residências. HQE Haute Qualité Environnementale. Sistema oficial francês de avaliação de diversos tipos de edifícios. Em 2002, entrou em teste. SPeAR Sustainable Project Appraisal Routine, criado pela emrpesa de 44 engenharia Arup Group. Sistema privado de acesso e uso restrito à empresa, usado para a avaliação da sustentabilidade de edifícios. BEES® Building for Environmental and Economic Sustainability. Software produzido por Barbara Lippiatt no National Institute os Standards and Technology nos EUA. Permite avaliar o desempenho econômico e ambiental na escolha de materiais deconstrução. Green Canadá. Sistema on-line de avaliação que faz parte do Globes BREEAM/Green Leaf. Uma versão para o Reino Unido foi lançada em 2002. Processo Brasil. Sistema baseado no HQE, lançado em 2008. Aqua Quadro 3: Sistemas de Certificação Fonte: A partir de HERNANDES, 2007, p.34 3.1 BREEAM O Building Research Establishment Environmental Assessment Method (BREEAM) foi o primeiro e é um dos mais conhecidos métodos de avaliação ambiental de edifícios. Lançado no Reino Unido em 1990 por pesquisadores do BRE15 e do setor privado, o BREEAM dispõe hoje de mais de 200.000 edifícios certificados (BRE, 2010). O BREEAM fornece um processo formal de avaliação embasado em uma auditoria externa. O edifício é avaliado independentemente por avaliadores treinados e indicados pelo BRE, que, por sua vez, é responsável por especificar os critérios e métodos de avaliação e pela garantia da qualidade do processo de avaliação utilizado (SILVA, 2003, p. 38). Dentre as vantagens que o BREEAM oferece estão o reconhecimento de mercado pelo desenvolvimento de prédios com baixo impacto ambiental, a inspiração para encontrar novas soluções que minimizem o impacto ambiental e a possibilidade de 15 Building Research Establishment 50 Ao contrário de outros instrumentos como o LEED, cuja certificação se completa em apenas uma fase, o Processo Aqua admite três fases, sendo que cada uma delas passa por auditoria e recebe um certificado específico. Na primeira, chamada de Programa, é definido o programa de necessidades, documento que deverá orientar o projetista na concepção arquitetônica, bem como nas definições técnicas do empreendimento. A segunda fase é a Concepção, em que o projetista, de posse do documento do Programa, deverá definir a concepção arquitetônica e as diretrizes técnicas do empreendimento, visando o projeto executivo. A terceira fase é a Realização, ou seja, a obra, desenvolvida de acordo com o sistema de gestão e seguindo o projeto. Em cada uma das fases o empreendedor recebe um certificado que o habilita a prosseguir e realizar a fase seguinte (CORBIOLI, 2009). O AQUA ainda não dispõe de uma certificação que avalie a fase seguinte à obra, que caracteriza a operação e manutenção. Para a construção ser certificada através de Processo AQUA é necessário durante a fase Programa definir o desempenho pretendido pelo empreendedor nas 14 categorias e através do SGE deve-se garantir controle do projeto; durante a Concepção os projetistas elaboram a arquitetura e técnicas do projeto. Por último, a fase Realização, na qual o empreendimento é construído. É preciso avaliar o desempenho do edifício nas três etapas mediante visita técnica agendada da Fundação Vanzolini e o certificado é emitido em 30 dias. Em todas as fases de avaliação permite-se corrigir eventuais desvios (PUGLIERO, PIMENTEL, 2010, p. 4). Destinado a escritórios, edifícios escolares, hotéis e edifícios habitacionais, o AQUA já dispõe de vinte e três (23) processos iniciados, quinze (15) certificados emitidos e nove (9) empreendimentos certificados (Fundação Vanzolini, 2010). O número de certificados emitidos é maior do que o número de empreendimentos certificados porque alguns empreendimentos receberam mais do que um certificado. O prédio da Leroy Niteroi, por exemplo, tem já dois certificados: um relativo à fase Programa e um da fase Concepção. 53 - Pedras retiradas do antigo prédio e que caracterizariam entulho foram utilizadas nas calçadas e acessos da loja; - Os resíduos sólidos foram separados e os sacos de papelão do cimento empregado, encaminhados para reciclagem; - Utilização de tinta a base de água, menos agressiva ao ambiente que as convencionais; - No interior da loja foi utilizado piso de concreto polido, cuja limpeza é feita apenas com água, dispensando o uso de produtos químicos; - Foram plantadas árvores nativas como paisagismo; - O projeto prevê vagas preferenciais para idosos, deficientes e carros flex. - Economia de 50% de água através do uso de descargas com fluxo duplo, torneiras com acionamento manual que fecham automaticamente e reutilização da água de chuva na manutenção dos jardins, limpeza externa e descarga dos banheiros; - Economia de 17% de energia com a utilização de brises nas fachadas envidraçadas que diminuem o consumo de ar-condicionado; uso de painéis solares para aquecimento de água e a iluminação dos postes e fachadas com tecnologia LED, que propicia gastar menos energia e cuja emissão luminosa dura mais tempo. Segundo a Fundação Vanzolini (2011), a loja obedece, ainda, a normas de acessibilidade, possui dois pontos de coleta seletiva de resíduos, inclusive para pilhas e baterias e possui econômetros para informar quanto o edifício está economizando de energia elétrica e água. 54 O AQUA, assim como o LEED, busca atribuir sustentabilidade aos edifícios por meio de análise do seu desempenho ambiental. Apesar de a avaliação observar fatores diversos, envolvendo aspectos arquitetônicos e de gestão, muitas das alternativas buscadas para atingir os requisitos em ambas as certificações são semelhantes, mesmo porque ambas têm objetivos prioritários semelhantes, como a redução do consumo de água e energia, por exemplo. Além disso, o AQUA aborda de forma bastante sumária os aspectos arquitetônicos e de projeto e desenho dos edifícios, não possibilitando uma análise complexa e em profundidade da arquitetura e sua relação com a sustentabilidade. De que se conclui que apesar das flagrantes diferenças entre os sistemas de certificação, todos se apóiam em hierarquias de categorias e estas consistem em uma seleção de aspectos, relegando muitas vezes outros que certamente contribuem também para a sustentabilidade das edificações: a espacialidade, os usos atribuídos ao espaço arquitetônico, as relações entre público e privado, os fluxos, transições e espaços de permanência, entre outras categorias de interesse. 3.3 Certificação LEED Desenvolvida pelo U.S. Green Building Council, a certificação LEED visa ajudar e mensurar a implementação de recursos e tecnologias que permitam que uma construção exerça menor impacto no meio ambiente, tornando-se, mediante esse conceito, uma construção sustentável. Reconhecida em vários países, a certificação se baseia em categorias que permitem a avaliação de diversos tipos de edifícios, tais como comerciais, residenciais, escolares e hospitalares, levando em consideração todas as fases de um edifício, desde a sua construção, ou reforma, até a sua manutenção. Da mesma maneira que o BREEAM, o LEED gera uma pontuação de acordo com o atendimento de requisitos pré-estabelecidos, mas com uma diferença: o BREEAM admite um fator de ponderação, o qual em cada item é multiplicado para se obter a pontuação final de determinado edifício e, conseqüentemente, determinar em qual classificação este se enquadra. No LEED cada item atendido gera uma determinada 55 pontuação que é somada no final para que seja determinada qual classificação o edifício receberá. 3.3.1 LEED no Mundo O U.S. Green Building Council foi criado em 1993 e, segundo o próprio USGBC (2010), logo em seguida seus membros sentiram necessidade de criar um sistema que avaliasse o impacto da construção no meio ambiente e que pudesse, de alguma maneira, medir o quão sustentável essa edificação seria. Realizaram-se estudos sobre os sistemas de avaliação de prédios verdes existentes e, menos de um ano após a formação do U.S. Green Building Council, formou-se um comitê que cuidaria apenas da criação desse sistema de avaliação. O comitê seria formado por profissionais diversos, como arquitetos, engenheiros, agentes imobiliários, proprietários de edifícios, ambientalistas, advogados e representantes de indústrias (GBCI, 2010). Em 1998, o Green Building Council já atuava em oito países e seus representantes se reuniam para rever todas as atividades globais. Com isso, foi fundado o World Green Building Council em novembro de 1999 com o papel de formalizar as comunicações internacionais e dar apoio a todas as iniciativas para difundir a construção sustentável ao redor do mundo. A princípio, seu trabalho incluía os oitos países mencionados anteriormente: Austrália, Canadá, Japão, Espanha, Rússia, Emirados árabes, Reino Unido e Estados Unidos. (GBCI, 2010) A primeira versão do LEED, uma versão teste denominada LEED 1.0, foi lançada em 1998. Após muitas modificações e aprimoramentos, o LEED 2.0 foi lançado em março de 2000. As atualizações continuaram sendo feitas e a versão 2.1 chegou ao mercado em 2002, seguida da versão 2.2, lançada em 2005 (USGBC, 2010). Com a evolução do LEED, surgiram categorias para avaliar diferentes tipologias de edifícios: LEED for Core & Shell, LEED for New Construction LEED for Schools (Escolas), LEED for Neighborhood Development, LEED for Retail, LEED for Healthcare, LEED for Homes e LEED for Commercial Interiors (USGBC, 2010). 56 O registro dos projetos que buscam a certificação é realizado no site do Green Building Council Institute, criado em 2008 como entidade autônoma do U.S. Green Building Council (USGBC, 2010). O GBCI se tornou responsável pelas certificações e por desenvolver programas que ajudassem a monitorar e medir o impacto ambiental de cada edificação, definindo sua sustentabilidade. Para acompanhar as constantes mudanças e atender ao universo de informações e novas tecnologias, a certificação LEED vai ganhando novas versões, o que a atualiza e possibilita que atenda a novas necessidades. Gráfico 2: Construções LEED no Mundo Fonte: Green Building Council Brasil – disponível em http://www.gbcbrasil.org.br/?p=certificacao - acesso em 12/09/11 57 3.3.2 Processo de Certificação O processo de certificação do LEED tem cinco etapas, indicadas na figura abaixo: Figura 19: Processo de Certificação LEED Fonte: Green Building Council Institute – disponível em http://www.gbci.org/main-nav/buildingcertification/certification-guide.aspx - acesso em 14/08/10 Segundo o GBCI - Green Building Council Institute - o primeiro passo para obter a certificação LEED é verificar em qual categoria o empreendimento se encaixa, e se a edificação cumpre todos os pré-requisitos, podendo então atingir o mínimo de pontos necessário para receber, pelo menos, o nível de certificado. Após verificar os pré-requisitos, é necessário registrar o projeto junto ao Green Building Council Institute. Esse registro é realizado por meio de uma plataforma online e, nele são fornecidos todos os dados do empreendimento. Em seguida, são preenchidos os dados do projeto, o que gera uma pré-analise da certificação. No final da obra, são preenchidos todos os dados referentes à construção e, caso exista alguma alteração em relação ao projeto, este poderá ser informado ao sistema também. 58 Figura 20: Formulário de Registro para Certificação LEED Fonte: Green Building Council Institute – disponível em https://www.leedonline.com/irj/portal/anonymous?NavigationTarget=ROLES://portal_content/leed/pages/org.leed. UserRegistrationPage – acesso em 15/08/10 59 Após esse procedimento, todas as documentações e informações serão analisadas pelo Green Building Council Institute para a definição da certificação. Se a pontuação estiver entre 40 e 49 pontos, o edifício será considerado Certificado (Certified), se entre 50 e 59, receberá o selo Prata (Silver), se estiver entre 60 e 79, será Ouro (Gold) e, se entre 80 e 110, Platina (Platinum) (GBCI, 2010). Gráfico 3: Profissionais LEED AP no Brasil Fonte: Green Building Council Brasil – disponível em http://www.gbcbrasil.org.br/pt/index.php?pag=certificacao.php&certificado=cert_metodologia.php – acesso em 12/08/10 No auxílio e consultoria durante o processo de certificação atuam LEED APs, profissionais que conhecem o processo e a plataforma. Segundo o Green Building Council Brasil, em junho de 2011 havia cento e um (101) profissionais LEED no Brasil, sendo 89 LEED APs e 16 LEED GAs (GBC Brasil, 2011). Esse profissional atua junto à certificação, mas sua participação no processo não é obrigatória, apesar de elevar o crédito do procedimento. 60 3.3.3 Categorias Os pré-requisitos para a obtenção da certificação LEED são divididos em cinco categorias: Materiais e Recursos (MR), Energia e Atmosfera (EA), Qualidade Ambiental Interna (EQ), Uso Racional de Água (WE) e Espaço Sustentável (SS) (Green Building Council Brasil). A fim de dotar o procedimento de expertise suficiente, o Comitê do Green Building Council Brasil se subdivide em cinco subcomitês, sendo um subcomitê para cada categoria (GBC BRASIL, 2010). Figura 21: Metodologia de aplicação do LEED Fonte: Green Building Council Brasil – disponível em http://www.gbcbrasil.org.br/pt/index.php?pag=certificacao.php&certificado=cert_metodologia. php – acesso em 12/08/10 No Brasil hoje são utilizadas oito categorias de certificado LEED, o LEED NC, para construções novas e grandes reformas, o LEED ND para desenvolvimento de bairros, o LEED CS para fachadas e áreas comuns de prédios comerciais, o LEED Retail NC e CI para lojas de varejo, o LEED Healthcare para unidades de saúde, o LEED EB OM, para operação e manutenção de edifícios existentes, o LEED Schools para escolas e o LEED CI, para interiores comerciais (GBC BRASIL, 2011). 61 Até o ano de 2010, apenas quatro categorias eram utilizadas no Brasil: LEED CS, LEED NC, LEED CI e LEED EB OM. Portanto, atualmente, todos os edifícios certificados estão dentro de algumas dessas categorias, mas já foram feitos registros nas demais, com exceção do LEED ND, que não tem nenhum registro efetuado. Gráfico 4: Registros por categoria LEED Fonte: Green Building Council Brasil – disponível em http://www.gbcbrasil.org.br/?p=certificacao - acesso em 12/09/11 Como é possível observar na figura anterior, o maior índice de certificações foi expedido para LEED CS, para fachadas e áreas comuns de prédios comerciais (45%), seguido de LEED NC, com 38%; em seguida, com a mesma porcentagem (8%), ficam o LEED EB OM e o LEED CI, e por fim, 1% do LEED Retail NC e 0% do LEED School. Esse resultado atesta que a incidência prioritária de certificações ocorre com base na avaliação parcial da arquitetura e não na edificação como um todo, indicando a prática relativa da certificação no Brasil. 62 Os gráficos abaixo indicam que o maior número de registros acontece em São Paulo e a tipologia que tem mais registros são os edifícios comerciais. Segundo Fernando Sinicatto, gerente de administração da CB Richard Ellis, responsável pelo Eldorado Business Tower, os prédios comerciais buscam, cada vez mais, a certificação LEED, pois empresas multinacionais, ao implantarem seus escritórios no Brasil, querem sempre que os edifícios onde vão se instalar sejam certificados.16 Gráfico 5: Registros do LEED por Estado Fonte: Green Building Council Brasil – disponível em http://www.gbcbrasil.org.br/?p=certificacao - acesso em 12/09/11 Gráfico 6: Registros do LEED por tipologia Fonte: Green Building Council Brasil – disponível em http://www.gbcbrasil.org.br/?p=certificacao - acesso em 12/09/11 16 Conforme foi comentado durante a visita técnica realizada em 16 de março de 2011, monitorada pelo Engenheiro Eletricista Fernando Sinicatto, gerente de administração (Administradora CB Richard Ellis) 63 Gráfico 7: Registros e certificações LEED no Brasil Fonte: Green Building Council Brasil – disponível em http://www.gbcbrasil.org.br/?p=certificacao - acesso em 12/09/11 O primeiro registro para uma certificação LEED no Brasil ocorreu em 2004 e, desde então, esse número cresce a cada ano, sendo que a primeira certificação foi dada em 2007, quando já existiam 48 registros. 3.3.3.1 LEED NC – LEED para Novas Construções O LEED NC foi inicialmente desenvolvido para prédios comerciais novos, mas é utilizado para construções novas em geral e grandes reformas de prédios existentes (LEED 2009 FOR NEW CONSTRUCTIONS AND MAJOR RENOVATIONS RATING SYSTEM). Nos Estados Unidos, essa categoria é aplicada também para certificação de prédios residenciais novos, pois o padrão de acabamento para entrega dos apartamentos naquele país inclui piso, armários, luminárias e diversos outros itens que fazem com que o novo morador tenha apenas que prover mobiliário. No Brasil, muitos apartamentos novos são entregues apenas com fiação passada e revestimento de áreas molhadas, sendo que sala e quartos são, por vezes, entregues no contrapiso, não dispondo de mais nenhum acabamento ou equipamento. Conforme o padrão brasileiro, os interiores ficam a cargo do 64 comprador, sendo que os prédios residenciais podem ser certificados apenas na categoria LEED CS. Atualmente existem catorze (14) edificações com certificação LEED NC no Brasil (GBC BRASIL, 2010). As pontuações são verificadas mediante uma planilha onde cada item é registrado e pontuado. 3.3.3.2 LEED ND – LEED para Desenvolvimento de Bairros Baseado no fato de que o mundo está em constante crescimento e que a maneira que esse crescimento ocorre influencia todo o planeta, foi criado o LEED ND. Diferentemente das outras categorias do LEED, que focam principalmente em construções sustentáveis, o LEED ND prioriza a seleção do terreno, a infra-estrutura e a construção de elementos que conformam um bairro, levando em consideração toda a paisagem e o contexto. O objetivo desta categoria é promover um crescimento sustentável de áreas e bairros urbanos. Apesar de já estar sendo divulgado no Brasil, nenhum projeto foi registrado buscando essa certificação ainda, o que sugere que entre nós há ainda enfoque maior na realização imobiliária como forma de fazer cidade. 3.3.3.3 LEED CS – LEED para Fachadas e Áreas Comuns de Prédios Comerciais O LEED CS pode ser utilizado para prédios onde a incorporadora tem total controle sobre as fachadas e áreas comuns, incluindo parte elétrica, encanamentos e sistemas de proteção de incêndios, mas não tem nenhum controle sobre o que é realizado em cada unidade, em termos de reforma interna, escolha de materiais e forma de controle do uso de água e energia, que ficam por conta do futuro proprietário, que tem total liberdade em optar, ou não, por um projeto sustentável. Atualmente, existem no Brasil onze edificações que receberam certificação nessa modalidade (GBC BRASIL, 2011). 65 3.3.3.4 LEED retail NC e CI– LEED para Lojas de Varejo O LEED retail NC e CI leva em consideração o fato de que estabelecimentos varejistas funcionam em horários e forma diferente do que edifícios comerciais. As necessidades de estacionamento e de escoamento de transporte são diferentes, assim como o consumo de energia e de água. (USGBC, 2011) Ainda não existe nenhum prédio no Brasil certificado nessa categoria, porém já foram feitos três registros para a certificação. 3.3.3.5 LEED Healthcare – LEED para Unidades de Saúde O LEED Healthcare pode ser utilizado para novas construções e reformas de consultórios e instalações licenciadas para cuidar da saúde. Essa categoria começou a ser utilizada no Brasil em 2011 e ainda não tem nenhuma certificação emitida e nenhum registro feito nela. 3.3.3.6 LEED EB OM – LEED para Operação e Manutenção de Edifícios Existentes O LEED EB OM permite que proprietários e responsáveis pela manutenção de prédios existentes obtenham a certificação LEED desses edifícios com base em gestão predial, atualizações de sistemas e alterações diversas que ajudem na obtenção da qualificação de edificação sustentável. Atualmente existe apenas um edifício certificado nessa categoria no Brasil, (GBC BRASIL, 2011). 3.3.3.7 LEED Schools– LEED para Escolas O LEED Schools é utilizado tanto para a construção de escolas novas quanto para grandes reformas em escolas existentes. Como essa categoria da certificação passou a ser utilizada no Brasil apenas em 2011, o LEED para Escolas ainda não tem nenhuma escola certificada, mas já está com um registro em andamento. 67 Eldorado Business Tower São Paulo SP LEED CS 2.2 Platinum Ventura Corporate Towers - Torre Leste Rio De Janeiro RJ LEED CS 2.2 Gold WTorre Nações Unidas 1 e 2 São Paulo SP LEED CS 2.0 Silver McDonalds - Riviera São Lourenço Bertioga SP LEED NC 2.0 Certified CD BOMI Matec Itapevi SP LEED NC 2.0 Silver Pão de Açúcar Indaiatuba SP LEED NC 2.0 Certified Torre Vargas 914 Rio De Janeiro RJ LEED CS 2.2 Gold Brasken São Paulo SP LEED CI 2.2 Certified Centro de Cultura Max Feffer Pardinho SP LEED NC 2.2 Gold RJ LEED CI 2.0 Gold Fleury Medicina Diagnostica Rochavera São Paulo Building the Future ( Boehringer Ingelheim ) São Paulo SP LEED CI 3.0 Gold Unilever TI – Rochaverá São Paulo SP LEED CI 2.0 Gold Sede GBC Brasil Barueri SP LEED CI 2.0 Gold Pavilhão Vicky e Joseph Safra São Paulo SP LEED NC 2.2 Gold Centro de Desenvolvimento Esportivo Osasco SP LEED NC 2.2 Gold Rochaverá Torre A São Paulo SP LEED CS 2.0 Gold WTorre JK - Torre São Paulo São Paulo SP LEED CS 2.0 Gold Ecopatio Bracor Imigrantes São Bernardo SP LEED NC 2.2 Gold do Campo CD Procter and Gamble - Itatiaia Itatiaia SP LEED NC 2.2 Gold Centro Distribuição AVON Cabreúva SP LEED NC 2.2 Gold Edifício Jatobá São Paulo SP LEED CS 2.0 Gold Pão de Açúcar Vila Clementino São Paulo SP LEED NC 2.2 Certified Agência Bradesco Perdizes São Paulo SP LEED NC 2.2 Gold CYK São Paulo SP LEED EB Certified O&M Curitiba Office Park Torre Central Curitiba PR LEED CS 2.0 Ventura Corporate Towers - Torre Prata LEED CS Oeste Rio De Janeiro RJ Novo Auditório do Edifício Sede Salvador 2.0 BA LEED NC 2.2 Gold Silver Odebrecht Quadro 10: Empreendimentos Certificados LEED no Brasil Fonte: Green Building Council Brasil – disponível em http://www.gbcbrasil.org.br/pt/index.php?pag=certificacao.php&certificado=cert_leedRegistrados.php – acesso em 12/08/10 68 3.3.5.1 Banco Real Agência Bancária Granja Viana Figura 22: Banco Real – agência bancária Granja Viana Fonte: www.ces.fgvsp.br/arquivos/CS_ap02.ppt – acesso em 12/08/10 Utilizando diversas tecnologias, a agência da Granja Viana do Banco Real foi, em 2007, a primeira edificação da América Latina a receber uma certificação LEED. Com um projeto que incluiu reuso de águas pluviais, área externa permeável, área de copa e sanitários com ventilação natural, mobiliário construído com madeira certificada, torneiras com fluxo de água reduzido e sensor de presença, vaso sanitário com consumo máximo de 6L por descarga, luminárias com alto rendimento e baixo consumo e separação dos circuitos de iluminação, a agência recebeu a certificação LEED NC Silver. (FGV, 2010) 3.3.5.2 Delboni Auriemo – Dumont Villares Em julho de 2008 a unidade Dumont Villares do Centro de Diagnósticos Delboni Auriemo foi o segundo empreendimento no Brasil a receber um certificado LEED. Com um investimento de 7 milhões de reais, o laboratório recebeu o Certificado LEED NC Silver. A edificação possui fácil acesso a ônibus e metrô, incentivando o transporte público, bicicletário, vagas preferenciais para carros flex, válvulas e metais que controlam o fluxo de água, evitando desperdício, ar-condicionado com gás ecologicamente correto, sensores que controlam a iluminação e diminuem o gasto de energia, utilização de madeira certificada e, durante a construção, 99% dos resíduos foram desviados de aterros, sendo destinados à reciclagem (BERTACHINI, 2008). 69 Figura 23: Delboni Auriemo Dumont Villares Fonte: Delboni Auriemo – disponível em http://www.delboniauriemo.com.br/unidade_sustentavel_1.php#x – acesso em 14/08/10 3.3.5.3 Banco de Investimentos Morgan Stanley - Edifício Faria Lima Square O edifício que abriga a sede do Banco de Investimentos Morgan Stanley foi o primeiro na América Latina a receber a Certificação LEED CI. A sede, localizada no Edifício Faria Lima Square, situado em São Paulo, na Avenida Brigadeiro Faria Lima, nº 3624, recebeu o certificado Silver em outubro de 2008. Com projeto de interiores da Athie Wohnrath, a sede do banco dispõe de torneiras com sensor, descargas com duplo fluxo, luminárias com alta eficiência energética, mobiliários em madeira certificada, ar-condicionado que utiliza gás causando menos impacto à camada de ozônio e computadores, monitores e impressoras que consomem menos energia. O projeto também investiu no aproveitamento máximo de materiais e estruturas que existiam no edifício, como forro, piso e luminárias, com o objetivo de que tudo o que fosse entregue no prédio fosse mantido, gerando menos demolição (REVISTA INFRA, 2008). 70 Figura 24: Faria Lima Square Fonte: http://www.arcoweb.com.br/arquitetura/collaco-e-monteiro-arquitetos-faria-lima-09-08-2007.html. Acesso em 10/12/2011 Figura 25: Morgan Stanley Fonte: http://www.athiewohnrath.com.br/morgan-stanley. Acesso em 10/12/2011. 71 3.3.5.4 Edifício Cidade Nova - Bracor O Edifício Cidade Nova recebeu o LEED CS Certified em 20/10/2008. Sua principal característica é a fachada dupla, construída com o objetivo de deixar entrar luz natural mas barrar o calor, produzindo um efeito chaminé. Uma segunda pele de vidro, distando 60cm da fachada foi construída, fazendo com que o ar quente que atravessa a primeira fachada suba e se dissipe na atmosfera. Esse sistema permitiu a economia de aproximadamente 50% dos gastos com o ar-condicionado (PAIVA; SILVA, 2008). O edifício é formado por três blocos com lajes interligadas e dois desses blocos são interligados por um átrio que é protegido por uma clarabóia. O objetivo desta é deixar entrar o máximo de luz natural possível e, quando um sombreamento é necessário, persianas automatizadas fecham a clarabóia (PAIVA; SILVA, 2008). Figura 26: Edifício Cidade Nova Fonte: PAIVA, Cida; SILVA, Jaime. Fachadas duplas ventiladas. Revista Finestra, 54ª edição, Setembro de2008 – disponível em http://www.arcoweb.com.br/arquitetura/ruy-rezende-edificio-cidade-11-12-2008.html - acesso em 15/08/2010. 72 3.4 Considerações e síntese Os sistemas de certificação Green Building surgiram para direcionar arquitetos e construtoras à prática da arquitetura sustentável e de construções verdes. A primeira certificação surgiu no Reino Unido e, desde então, diversas outras foram criadas e disseminadas. No Brasil, a certificação mais reconhecida e utilizada é o LEED, fato comprovado quando se verifica que o número de registros cresce exponencialmente a cada ano e que, em 2011, quatro novas categorias da certificação passaram a ser utilizadas. Muitos edifícios que buscam a certificação LEED são exemplares de tipo comercial ou corporativo, situação que se alia hoje ao fato de muitas empresas multinacionais fazerem questão de que os edifícios aonde vão instalar filiais no Brasil sejam certificados. Edifícios certificados dispõem de vantagens atrativas às empresas locatárias, no que se refere aos sistemas de gestão condominial, e oferta de sistemas e meios de eficiência energética os quais incidem diretamente nas condições ambientais e também no rateio dos custos condominiais mensais. Ao analisar os primeiros edifícios certificados no Brasil, é possível perceber que o foco da certificação é a economia de energia e de água, bem como sistemas gestores de coleta de seletiva de resíduos sólidos, e que alguns dispositivos básicos, como torneiras com sensor, descargas com fluxo duplo e luminárias com alta eficiência energética, já garantem alguma pontuação. A arquitetura, compreendida como um sistema complexo e integrado de soluções setoriais que merecem relacionamento, a fim de que o resultado ambiental seja um todo sinérgico, envolve preocupações que articulam desde aspectos estéticos, passando pelas condições específicas do espaço gerado, sua materialidade e localização. A sustentabilidade depende, por definição de atendimento dessa demanda complexa, devendo ser garantida no projeto. Embora muitos edifícios recebam certificações ao atender um conjunto de atributos exigidos pelos selos que os organizam, tais como o LEED, a sustentabilidade deve ser especificada em cada 73 situação projetual, a fim de compreender seu real significado, e afastar definições amplas, que certamente dão oportunidade à mistificações a partir desse conceito. 74 CAPÍTULO 4. Eldorado Business Tower: uma perspectiva crítica 4.1 Histórico do projeto Desde a inauguração do Shopping Eldorado, em 1981, já se falava na construção de uma torre de escritórios no terreno vizinho que fosse interligada ao shopping por uma passarela. O grupo J. Alves Veríssimo, proprietário do shopping, contratou então o estúdio norte americano Lewis Iglehart & Lydia Yoslow Design para fazer o projeto da torre e a Construtora Birmann, conhecida pela execução de edifícios com tecnologias inovadoras, como responsável pelo empreendimento (SERAPIÃO, 2008). Essa primeira proposta para o edifício comercial, desenvolvida em 1992, previa duas torres que ocupariam a mesma área em que hoje se situa o Eldorado Business Tower. Desde o início, propusera-se a construção de um edifício inteligente e, nesse caso, foram projetados dois edifícios inteligentes com mil vagas de garagem e uma passarela climatizada que os ligaria ao shopping, conforme figura ao lado. A conclusão das obras estava prevista para 1994, mas o custo final ultrapassaria em muito aquele Figura 27: 1ª proposta para a construção do previsto inicialmente. O orçamento das Eldorado Business Tower edificações finalizadas atingiu a cifra de Fonte: SERAPIÃO, 2008 175 milhões de dólares, sendo que o investimento previsto era de 50 milhões de dólares. Essa proposta foi, então, descartada e o escritório Aflalo & Gasperini contratado para realizar um novo projeto (SERAPIÃO, 2008). 75 A segunda proposta foi apresentada em 1999, com projeto de Gian Carlo Gasperini e construção a cargo da Construtora Sandria. Propôs-se uma torre de quarenta andares que apresentava um chanfro no coroamento, localizada na esquina da Marginal Pinheiros com a Rua Ofélia. A proposta contava também com uma construção mais baixa, separada da torre principal, para um centro de convenções (SERAPIÃO, 2008). Figura 28: 2ª proposta para a construção do Eldorado Business Tower Fonte: SERAPIÃO, 2008 O escritório Aflalo & Gasperini apresentou, ainda, entre 1999 e 2000, mais cinco versões de projeto. A segunda proposta, também desenvolvida por Gian Carlo Gasperini, dispunha dois blocos retangulares e a torre. Um dos blocos retangulares continuaria destinado a um centro de convenções, enquanto o outro a um estacionamento com praça na cobertura. A torre foi dividida em três partes bastante distintas, sendo a base mais estreita e o topo mais largo. Segundo Roberto Aflalo, nascia, nessa ocasião, a idéia que levou à futura concepção do Edifício Rochaverá, 76 ou seja, de um edifício que apresenta as lajes superiores de maior dimensão que as inferiores (SERAPIÃO, 2008). Figura 29: 3ª proposta para a construção do Eldorado Business Tower Fonte: SERAPIÃO, 2008 Roberto Aflalo foi o responsável pelas demais propostas apresentadas logo em seguida. A quarta versão mantinha um bloco baixo, destinado ao estacionamento, com uma praça na cobertura, ganhando um bloco intermediário, para o centro de convenções. Nessa fase, o volume da torre foi o foco de atenção, e diversas versões volumétricas se apresentaram, antes de se chegar àquela que foi de fato aprovada e construída. (SERAPIÃO, 2008). Figura 30: 4ª proposta para a construção do Eldorado Business Tower Fonte: SERAPIÃO, 2008 77 Na quinta versão do projeto, o programa foi alterado por solicitação do cliente, e a torre deveria conter, além de escritórios, um hotel. Assim, a torre ganhou uma base mais alargada, onde ficariam os escritórios, com topo mais esbelto, onde se localizariam as instalações do hotel, dispondo de prumadas de elevador independentes. Conforme é possível observar na figura 5, o edifício também passava a contar com uma das fachadas arredondada (SERAPIÃO, 2008). Figura 31: 5ª proposta para a construção do Eldorado Business Tower Fonte: SERAPIÃO, 2008 Na sexta proposta, a última que previa a participação da Construtora Sandria, o programa de escritórios e hotel permaneceu, mas volumetricamente se procedeu a uma distinção funcional perceptível, mediante uma subtração à meia altura do edifício, enfatizando a distinção de usos. Nessa etapa, o complexo passou a ter sua principal elevação faceada com a Marginal Pinheiros, ao invés da Rua Ofélia, como nos projetos anteriores (SERAPIÃO, 2008). Figura 32: 6ª proposta para a construção do Eldorado Business Tower Fonte: SERAPIÃO, 2008 Quando esse projeto foi finalizado, a Construtora Sandria não conseguiu viabilizá-lo economicamente. Após o ataque terrorista aos Estados Unidos de 11 de setembro 78 de 2001, a procura por edifícios comerciais caiu drasticamente e todos os empreendimentos novos ficaram temporariamente suspensos (SERAPIÃO, 2008). Superada a crise, a Gafisa assumiu a execução do complexo, e o projeto foi então alterado novamente. Nas sétima e oitava versões, começou a ganhar características finais. O programa foi novamente modificado, com o hotel descartado e a torre passou a abrigar apenas escritórios. A demanda por vagas fez com que o bloco do centro de convenções desse lugar a um edifício-garagem. A torre de escritórios ganhou duas faces levemente arredondadas, com a fachada maior paralela à Marginal Pinheiros. Após essas definições, iniciou-se o projeto final do edifício com especificação da tecnologia que viria a ser usada na construção. (SERAPIÃO, 2008) Figura 33: 7ª e 8ª propostas para a construção do Eldorado Business Tower Fonte: SERAPIÃO, 2008 79 Segundo Eduardo Martins17, que trabalhou junto com Roberto Aflalo no desenvolvimento do projeto do Eldorado Business Tower, a idéia, desde o princípio, foi construir uma torre como referência no ambiente construído. Esta deveria levar em consideração idéias e concepções que permitissem que o complexo ganhasse uma imagem forte, capaz de mesmo depois de anos, continuar a ser uma referência e mantivesse uma linguagem arquitetônica atualizada. Para isso, procurou-se obter tais efeitos a partir da materialidade, buscando-se o emprego de recursos de engenharia de ponta desde o início da construção. 4.2 Características do empreendimento O Eldorado Business Tower é um edifício de uso corporativo interligado por Shopping Eldorado, (escritórios), uma passarela ao localizado na Avenida das Nações, Unidas, confluência com a Avenida Rebouças, em São Paulo. O Eldorado Business Tower foi inaugurado em 2007 e ocupa um terreno de 10.379 m², dispondo de área construída de 128.645 m², 142 metros de altura, 29 elevadores, 1.806 vagas de garagem, e é considerado um escritório comercial triple A18. Em 2008, o edifício Figura 34: Eldorado Business Tower Fonte: Mariana Feres dos Santos. Acervo pessoal, obtido em visita técnica realizada em 16.03.2011 recebeu a certificação LEED CS Platina. Executado pela Construtora e Incorporadora Gafisa, com projeto do Aflalo 17 Em entrevista realizada no dia 18/11/2010 18 Padrão de edifícios definidos como modernos e eficientes & Gasperini e paisagismo de 80 Benedito Abbud, foi o primeiro edifício a ter essa certificação na América Latina e o quarto no mundo. Inaugurada em novembro de 2007, a torre destinada a escritórios tem 32 pavimentos- tipo, com lajes em concreto protendido de espessura de 27 cm, que possibilitam plantas flexíveis, com áreas úteis que variam de 1.950 a 2.004 m2. Todos os escritórios contam com piso elevado e forro, com pé-direito de 3,00m, do piso ao forro (PAIVA;SILVA, 2008). O edifício dispõe de quatro (4) subsolos, mais edifício-garagem com sete (7) pavimentos, totalizando 1.806 vagas, centro de convenções e heliponto com capacidade para dez (10) toneladas. Figura 35: Heliponto do Eldorado Business Tower Fonte: Mariana Feres dos Santos. Acervo pessoal, obtido em visita técnica realizada em 16.03.2011 A construção do complexo foi iniciada em 2005, sendo que a obra se estendeu por trinta meses. Oito meses foram gastos exclusivamente para escavação do subsolo, 81 devido à natureza rochosa. A área do último subsolo é menor que a prevista em projeto devido à impossibilidade de se retirar completamente a rocha. A obra foi executada tendo em vista a certificação na categoria Platina, e para isso, apostou em recursos construtivos e arquitetônicos singulares, que visavam obter a mais alta certificação do LEED (PAIVA, 2008). O terreno tem como limites de um lado, a via expressa da Avenida Nações Unidas, do outro, o estacionamento do Shopping Eldorado e, como vizinho, a estação de trem denominada Hebraica. A situação do complexo, e o fato de a via que serve como alça de acesso ao shopping apresentar dimensões insuficientes para escoamento do fluxo de automóveis que recebe (de quem vem pela Rua Ofélia), fez com que os arquitetos responsáveis pelo projeto elevassem o térreo, e projetassem acessos mais eficientes aos estacionamentos. Essa elevação, no entanto, justificase também por possibilitar o afastamento do complexo e do térreo, principalmente, do ruído representado pela proximidade à Av. Nações Unidas e à Avenida Rebouças. Figura 36: Ilustração artística da implantação Eldorado Business Tower e Shopping Eldorado Fonte: Gafisa, 2011 82 O térreo elevado forma uma praça, interligada à rua mediante elevadores e escadas rolantes protegidos por uma caixa de vidro, onde se encontram o acesso principal ao edifício e o início da passarela que o conecta ao tradicional centro de compras. ”Estes se tornam complementares: enquanto os usuários do prédio passam a contar com uma gama de serviços à distância de poucos passos, o shopping-center ganha milhares de clientes” (AFLALO, apud SERAPIÃO, 2008, p.63). Figura 37: Passarela de acesso ao Shopping Eldorado Fonte: Mariana Feres dos Santos. Acervo pessoal, obtido em visita técnica realizada em 16.03.2011 Figura 38: Escada rolante para acesso do térreo elevado a rua Fonte: Mariana Feres dos Santos. Acervo pessoal, obtido em visita técnica realizada em 16.03.2011 83 A linguagem arquitetônica e a materialidade da torre procuraram transparecer o máximo de leveza e contemporaneidade possível, minimizando o impacto da massa construída no ambiente urbano (PAIVA; SILVA, 2008), o que transparece de forma precisa na análise estética da obra que os próprios arquitetos realizaram: Um edifício alto, com lajes muito grandes, naturalmente fica com uma massa pesada. Se fosse como o WTC de NY, por exemplo, a fachada estaria resolvida com um tratamento puro, elegante. Mas no caso do Eldorado, com 32 andares, essa solução o deixaria atarracado, principalmente quando visto na diagonal. (AFLALO apud SERAPIÃO, 2008: 66). Volumes em balanço, vedados com vidros verdes e cuja massa se projeta na elevação principal são explorados em duas das fachadas; as demais exploraram visualmente uma curvatura, como recursos de forma e proporção para que a torre fosse percebida como m.assa esbelta. As faces curvas, voltadas para a Marginal do Rio Pinheiro e para o Shoppping Eldorado, têm 1,27m de balanço e curvatura de 179 graus. As faces retangulares têm balanço de 2,73 e 3,25m. (PAIVA, SILVA, 2008): “Assim, procuramos criar duas massas que marcam as fachadas principais, fazendo uma espécie de sanduiche, para que o resultado fosse mais esbelto”. (AFLALO apud SERAPIÃO, 2008, p.66). Figura 39(à esquerda): Fachada do Eldorado Business Tower Fonte: Paiva, 2008 Figura 40 (à direita): Volumetria vista em diagonal e à distância, ressaltando a exploração de curvatura das fachadas voltadas para a Marginal do Rio Pinheiro e para o Shoppping Eldorado; recurso de amenização da massa frente à altura da torre. Fonte: www.googleimages.com 84 As fachadas foram cuidadosamente trabalhadas para que houvesse o máximo de transparência e leveza visual, e causando o mínimo impacto ambiental no que diz respeito à percepção, sobretudo da torre. As cores verde e branca foram definidas pelo cliente e, a princípio, foi cogitado utilizar granito branco, mas o material tinha por característica alta absorção de água e exigiria muita manutenção. A solução foi utilizar vidros extraclear transparentes com pintura cerâmica serigrafada na parte interna. Essa pintura tem a singularidade de penetrar capilarmente no vidro, de modo a não agregar poluentes, tornando a manutenção dos vidros mais fácil. Em todos os vidros também foi aplicado um produto hidrofóbico, que torna a superfície mais lisa e, conseqüentemente, também facilita a manutenção. Para as áreas que deveriam permitir a vista da área externa foram utilizados laminado pirolítico Low-e Sunergy de 12 milímetros, na cor verde, com características de alta reflexão luminosa, ou seja, deixa a luminosidade passar e tem baixa refletividade externa e interna, ou seja, não espelha e apresenta baixa transmissão térmica, deixando penetrar apenas 35% do calor que incide na face no interior do edifício (PAIVA, SILVA, 2008). Para a confecção de toda a esquadria em prazo que atendesse ao cronograma da obra, ao volume de trabalho e ao nível de qualidade esperados, uma área de produção de caixilharia da Andalume foi montada no segundo subsolo do Eldorado Business Tower (PAIVA, 2008). Figura 41: Centro de usinagem montado no segundo subsolo do Eldorado Business Tower Fonte: PAIVA, 2008, p.79. 85 Com essa estratégia foi possível gerenciar toda a linha de produção, desde a logística de recebimento dos materiais e estoque até a programação do centro de usinagem e industrialização (corte dos perfis, usinagem, montagem e colagem dos vidros nos painéis) e a instalação dos painéis na fachada. Para garantir o funcionamento do processo, a Andalume importou um centro de usinagem de última geração da Fom Industrie e enviou um engenheiro à Itália, para treinamento em programação e manutenção. (PAIVA, 2008: 78). Para a instalação, todos os painéis de vidro foram identificados com etiquetas com nomes e códigos de cores. Os painéis de vidro, já finalizados, foram içados por uma monovia desenvolvida especialmente para esse fim, levados até a extremidade do pavimento, basculados a noventa graus e encaixados na posição certa com a ajuda de uma grua. Cada painel pesava até 400 quilos e tal monovia dispunha de capacidade para até 500 quilos, sendo esse processo repetido 3.206 vezes (PAIVA, 2008). Figura 42: Montagem dos painéis do Eldorado Business Tower Fonte: PAIVA, p.79, 2008 Diversas tecnologias foram aplicadas à obra, em busca da certificação Platina. Além de medidores de consumo de água e energia individuais, toda a água da chuva, do consumo do ar-condicionado e da drenagem do subsolo é captada, tratada e 86 reutilizada para a limpeza do prédio, vasos sanitários do térreo e do subsolo e para a manutenção do paisagismo. Para a certificação LEED, são levadas em consideração a quantidade de água consumida, e como essa água é lançada na rede pública. A certificação exige que a água lançada na rede pública deva ter o mínimo de concentração de partículas possível, ou seja, o mínimo de sólidos suspensos (REVISTA FINESTRA, 2008). Figura 43: Sistema para tratamento e reaproveitamento de água da chuva, da condensação do ar- condicionado e da drenagem dos subsolos Fonte: REVISTA FINESTRA, nº53, abr/maio/jun/ 2008, p.83 Além do reaproveitamento da água, também são utilizados métodos para a economia de água como bacias sanitárias com caixa acoplada dual flush, de 3 e 6 litros, mictórios com sensor de presença, torneiras automáticas para lavatório e chuveiros com restritor de vazão (CB RICHARD ELLIS, MANUAL DO LOCATÁRIO, 2011). A medição do consumo de água é totalmente setorizada e pode ser verificada por meio de um programa de computador ao qual a administração tem acesso. 87 Figura 44: Tela do programa de computador que mostra o consumo de água e de energia de acordo com cada setor do edifício Fonte: Mariana Feres dos Santos. Acervo pessoal, obtido em visita técnica realizada em 16.03.2011 Outra tecnologia utilizada no complexo foi o sistema de ar-condicionado. Como mencionado anteriormente, a água gerada por condensação é reaproveitada. O sistema de ar-condicionado é o VRV III (volume de refrigerante variável), que possibilita tanto o resfriamento quanto o aquecimento do ambiente e possibilita baixo consumo de energia, permitindo que cada proprietário pague apenas pelo que consumir. O gás refrigerante utilizado é o R-410ª, menos agressivo para a camada de ozônio (REVISTA FINESTRA, 2008). À primeira vista, o sistema de ar-condicionado parece multi split19, dispondo de metade das condensadoras na cobertura do edifício e a outra metade na cobertura 19 Aparelho de ar-condicionado que pode ter duas ou mais evaporadoras para uma única condensadora. 88 ou laje de garagem. Ao contrário da maioria dos prédios, onde evaporadoras e condensadoras ficam no mesmo local dos respectivos escritórios, e são mantidos pelos locatários, ou proprietários, ocupando uma sala que tem por finalidade funcionar como casa de máquinas ou terraço técnico, as condensadoras do Eldorado Business Tower são mantidas pelo condomínio. O fato de não ser necessário um espaço próprio e exclusivo para essas condensadoras em cada unidade economiza cerca de 15m² em cada meia laje e permite apenas uma distância de 65cm entre forro e laje20. Figura 45: Condensadoras na cobertura do Eldorado Business Tower Fonte: Mariana Feres dos Santos. Acervo pessoal, obtido em visita técnica realizada em 16.03.2011 Por ser um sistema de operação modulado, permite ligar de forma independente o ar-condicionado de cada compartimento ou escritório. O controle é feito pelo 20 Informação obtida durante a visita técnica realizada em 16 de março de 2011, monitorada pelo Engenheiro Eletricista Fernando Sinicatto, gerente de administração (Administradora CB Richard Ellis). 91 O prédio preocupação energética também demonstra com a quando se eficiência trata do transporte e deslocamento vertical. Dispõe de um total de 29 elevadores, sendo que 18 deles têm Sistema de Antecipação e Destino de Chamadas. Figura 49: Hall do Eldorado Business Tower Ou seja, no lugar do usual painel de Fonte: PAIVA, 2008 chamada, o passageiro aperta o número do andar onde pretende ir e, na tela aparecerá qual elevador está disponível. De acordo com a Gafisa, dos onze (11) elevadores restantes, seis (6) são os mais rápidos do país. Os últimos cinco (5) atendem o edifício garagem (REVISTA FINESTRA, 2008). Os elevadores também possuem um sistema de frenagem regenerativa, ou seja, o elevador que estiver descendo fornece energia para o próximo que for subir. Também foi instalado o sistema Animeo, da empresa Somfy, que controla as aberturas mediante telas solares21 automatizadas de modo a não permitir a entrada de uma grande quantidade de luz ou calor. Na medida em que o sol vai mudando de posição e atingindo mais uma fachada do que a outra, as telas solares são fechadas e as da outra fachada que ficou sem incidência solar são abertas automaticamente, diminuindo, assim, o consumo do ar-condicionado e aproveitando melhor a iluminação natural. (REVISTA FINESTRA, 2008). Locatários e usuários de cada andar não têm nenhum controle sobre as persianas. Figura 50: Eldorado Business Tower Fonte: PAIVA, 2008 21 Tipo de persiana que melhora o conforto térmico e visual através do controle da radiação solar e da luz capazes de atravessar a tela 92 A posição das telas também pode ser controlada por software monitorado pela administração, que pode verificar quais persianas estão abertas e quais estão fechadas. Figura 51: Tela do programa de computador que exibe se persianas estão fechadas ou abertas. Fonte: Mariana Feres dos Santos. Acervo pessoal, obtido em visita técnica realizada em 16.03.2011 O estacionamento é automatizado por um tipo de sistema sem parar que faz com que a cancela se abra para usuários previamente autorizados. Apresenta também um contador localizado em determinados pontos no chão que permite que o usuário saiba quantas vagas estão livres em cada subsolo (REVISTA FINESTRA, 2008). O estacionamento dispõe de noventa (90) vagas de garagem melhor localizadas, e preferenciais para carros 100% a álcool ou 100% a GNV. No Brasil, grande parte dos carros são flex; então, apesar de as vagas existirem, não é possível controlar qual combustível o carro que acede ao estacionamento está realmente utilizando. 94 O Eldorado Business Tower também possui bicicletário com vestiário, no térreo, e coleta seletiva de lixo, possuindo depósito de material reciclado e de materiais contaminantes, no 1º subsolo. Todos os andares são obrigados a realizar coleta seletiva de lixo e aqueles que, por algum motivo não a fizerem, não terão seu lixo recolhido. Seguindo normas do LEED, verifica-se que no Eldorado Business Tower é também proibido fumar a uma distância menor de 8 metros de qualquer uma das portas do edifício. Figura 55: Entrada do depósito de material Figura 54: Depósito de material reciclado reciclado Fonte: Mariana Feres dos Santos. Acervo Fonte: Mariana Feres dos Santos. Acervo pessoal, obtido em visita técnica realizada em pessoal, obtido em visita técnica realizada em 16.03.2011 16.03.2011 4.4 LEED 2.0 x LEED 3.0 O Eldorado Business Tower foi certificado com a chancela Platinum na versão 2.0 do LEED. A versão atualmente utilizada é a 3.0, aonde alguns itens de pontuação sofreram alterações. Uma das mudanças mais significativas entre as versões 2.0 e 3.0 do LEED foi a pontuação máxima passível de ser atingida em cada versão e número de pontos necessários para atingir cada nível da certificação. Na versão 2.0, 95 é possível obter um máximo de 61 pontos, enquanto que, na versão 3.0, é possível atingir 110 pontos. A pontuação mínima necessária para cada um dos níveis da certificação, em cada uma das versões, está descrita na tabela abaixo: Nível de certificação Pontuação necessária no Pontuação necessária LEED 2.0 no LEED 3.0 Certificado 23 a 27 pontos 40 a 49 pontos Prata 28 a 33 pontos 50 a 59 pontos Ouro 34 a 44 pontos 60 a 79 pontos Platina 45 a 61 pontos 80 pontos ou mais Tabela 5: Tabela comparativa sobre a pontuação necessária no LEED 2.0 e no LEED 3.0 A primeira categoria listada na certificação LEED é Espaço Sustentável22. Essa categoria pressupõe que os edifícios afetem o ecossistema de maneiras diferentes, e que seus projetos devam atentar para a presença de áreas verdes, e também devam, conforme sua localização, não prejudicar, com seu impacto, eventuais terras agricultadas, não afetar ou dispersar animais selvagens que vivam na região, não aumentar qualquer tipo de erosão local ou regional, nem contribuir para aumentar o percentual de áreas impermeáveis. O tipo de iluminação externa pode ainda poluir o céu, interferindo na ecologia noturna (USGBC, 2006). Tanto a versão 2.0 quanto a versão 3.0 da certificação relacionam os mesmos itens; o que se modificou é que na versão 3.0, alguns itens ganharam peso diferenciado. Na versão 2.0, pode-se atingir um máximo de 15 pontos nessa categoria, enquanto que, na versão 3.0, ela vale 28 pontos. Os itens que ganharam peso e pontuação na versão mais nova da certificação foram o Crédito 2, relativo a Desenvolver Densidade Urbana e Conexão com a Comunidade (visa o desenvolvimento de áreas com infra estrutura existente), que valia 1 ponto e passou a valer 5 pontos e os créditos relativos ao transporte alternativo que são 4.1, 4.2, 4.3 e 4.4 (transporte público, bicicletário e vestiário para 22 Sustainable Sites 96 ciclistas, veículos de baixa emissão e capacidade de estacionamento), que, juntos, valiam 4 e passaram a valer 13 pontos, conforme mostra a figura abaixo: Figura 56: LEED – CS para Fachadas e Áreas comuns do edifício versão 3.0: Categoria Espaço Sustentável Fonte: GBC Brasil, 2009 A localização do edifício também é de extrema importância para a certificação, porque pode afetar o ecossistema influenciando na decisão dos usuários de por qual meio de transporte chegar ao empreendimento. Os edifícios, devem de preferência conter características que garantam alta performance, ou seja, o máximo de eficiência energética e economia de recursos, e se localizar de maneira a valorizar a vizinhança, a infra- estrutura urbana e os meios de transporte existentes (USGBC, 2006). O pré-requisito dessa categoria é a prevenção da poluição ativa da construção. Para atingir esse objetivo, a obra deve obedecer a um plano para controle de erosão e sedimentação (USGBC, 2006). Por esse item consistir em um pré-requisito, não é fonte de nenhuma pontuação para a certificação, mas a ausência da documentação exigida referente a esses pré-requisitos acarreta em que o empreendimento não possa sequer tentar a certificação. A segunda categoria diz respeito ao Uso Racional da Água23, ou seja, analisa basicamente o quanto de água está sendo poupado e o quanto está sendo 23 Water Efficiency 97 reaproveitado. O máximo de pontos possível de se obter nesse item, na versão LEED 2.0 é 5 pontos, enquanto que, no LEED 3.0, é possível obter 10 pontos. A diferença é que, na versão mais recente, além de existir um pré-requisito que antes não existia, também há um crédito a mais, propiciando uma maior pontuação quanto maior a economia de água. Todos os créditos envolvidos também receberam pesos diferenciados, como mostra a figura abaixo: Figura 57: LEED – CS para Fachadas e Áreas comuns do edifício versão 3.0: Categoria Uso Racional da Água Fonte: GBC Brasil, 2009. Na versão 3.0, é necessário comprovar um mínimo de 20% de redução no uso da água para estar apto a obter a certificação e, a partir daí, quanto maior for a redução, maior a pontuação. Enquanto que, na versão 2.0, uma redução de 20% é suficiente para gerar um ponto. A terceira categoria é Energia e Atmosfera, que analisa, basicamente, a eficiência energética do edifício, alternativas para economia de energia e quantidade e qualidade dos gases que o edifício é responsável por liberar na atmosfera. Nesse item, a versão antiga poderia atingir 14 pontos, enquanto que a versão nova pode dotar 37 pontos. Os pré-requisitos e os créditos são os mesmos e a mudança consiste apenas no peso e importância que cada crédito recebeu, como pode ser verificado na figura abaixo. 98 Figura 58: LEED – CS para Fachadas e Áreas comuns do edifício versão 3.0: Categoria Energia e Atmosfera Fonte: GBC Brasil, 2009. A quarta categoria é Materiais e Recursos e analisa os tipos de materiais utilizados, a gestão de resíduos e o que é reaproveitado de uma antiga construção que eventualmente exista desde antes, no terreno. Na versão 3.0 do LEED é possível obter 13 pontos nesse item, enquanto que a versão antiga só permitia 11 pontos. Os itens são os mesmos e a diferença está no fato de que o crédito 1, que analisa o reuso de construções existentes ganhou dois sub-itens. Na versão antiga, ganhavase um ponto se 25% da construção antiga fossem reaproveitados, mais um ponto se 50% fossem reaproveitados e mais um ponto para 75%. Na versão 3.0, esse item gera um ponto para 25%, mais um para 33%, 42%, 50% e 75%. O crédito 3 também foi alterado. Relacionado à quantidade de materiais reutilizados, esse item gerava um ponto quando 1% dos materiais fosse reutilizado. Na versão 3.0, o ponto é gerado quando 5% dos materiais são reutilizados. O cálculo é feito dividindo o custo dos materiais reutilizados pelo custo total dos materiais da obra. 99 Figura 59: LEED – CS para Fachadas e Áreas comuns do edifício versão 3.0: Categoria Materiais e Recursos Fonte: GBC Brasil, 2009 A quinta categoria é a Qualidade Ambiental Interna. Essa categoria analisa a qualidade do ar dentro do edifício, assim como o conforto ambiental geral, já que o conforto dos usuários é uma das condições diretamente ligadas à produtividade. A versão 2.0 permitia atingir 11 pontos nessa categoria, enquanto que a versão 3.0 permite atingir 12 pontos. A diferença está no peso que os itens do crédito 4 receberam. Na versão anterior era possível obter 3 pontos nesses itens, e na versão nova é possível atingir 4 pontos. Para obter pontos no crédito 4, é necessário comprovar a utilização de materiais de baixa emissão de compostos voláteis. O LEED exige o conhecimento da toxidade de cada produto e a comprovação de que eles não excedam o limite de VOC24 indicado. 24 Volatile organic compounds / Compostos orgânicos voláteis 100 Figura 60: LEED – CS para Fachadas e Áreas comuns do edifício versão 3.0: Categoria Qualidade Ambiental Interna Fonte: GBC Brasil, 2009 A última categoria trata da Inovação no Projeto e gera pontos se este admitir o LEED AP25, um profissional capacitado que conhece tanto o processo quanto a plataforma da certificação, e se utilizar tecnologias e inovações que poupem recursos. No LEED 2.0, era possível obter 5 pontos nesse item, enquanto que, no LEED 3.0, é possível obter 6 pontos. Figura 61: LEED – CS para Fachadas e Áreas comuns do edifício versão 3.0: Categoria Inovação e Processo do Projeto Fonte: GBC Brasil, 2009 4.4 Processo de Certificação do Eldorado Business Tower O Eldorado Business Tower cumpriu à risca todos os pré-requisitos exigidos pela certificação LEED 2.0 e, por esse motivo, acedeu à possibilidade de receber a certificação. O próximo passo foi definir seu nível de certificação. Na primeira categoria, Espaço Sustentável, o único item que não gerou pontos foi o crédito 3, que diz respeito à remediação de áreas contaminadas. Esse item gera um 25 Accredited Professional 101 ponto se o terreno escolhido para o empreendimento estiver contaminado e a incorporadora se disponibilizar a fazer a descontaminação. No caso, como o terreno não era contaminado, não foi necessária a descontaminação e esse ponto não foi gerado. Figura 62: LEED – CS para Fachadas e Áreas comuns do edifício versão 2.2 com pontuação fornecida ao Eldorado Business Tower: Categoria Espaço Sustentável Fonte: CTE; GAFISA, 2009 Na segunda categoria, Uso Racional de Água, o Eldorado Business Tower não obteve pontuação no crédito 2, relacionado a tecnologias inovadoras para águas servidas. Para obter esse ponto, o edifício deve conseguir uma redução de 50% no uso de água potável mediante o reuso de água da chuva e uso de dispositivos que economizem água nos banheiros, por exemplo. Uma segunda opção para obter essa pontuação é tratar 50% da água utilizada no local do próprio empreendimento e reutilizar essa água (USGBC, 2006). O edifício em estudo não comprovou nenhuma das duas situações, não obtendo esse ponto. 103 Figura 65: LEED – CS para Fachadas e Áreas comuns do edifício versão 2.2 com pontuação fornecida ao Eldorado Business Tower: Categoria Materiais e Recursos Fonte: CTE; GAFISA, 2009 Na categoria Qualidade Ambiental Interna, o Eldorado Business Tower perdeu 2 pontos. Um ponto por não atender ao crédito 5 e um ponto por não atender ao crédito 6. O crédito 5 diz respeito ao controle interno de poluentes e produtos químicos, ou seja, tentar diminuir a exposição dos usuários de áreas que possam estar submetidas a emissões. Um exemplo é de que as máquinas de xerox dos escritórios devem sempre se localizar em área própria, pois seu funcionamento produze ozônio. A exaustão de áreas para depósito e armazenamento de produtos de limpeza também deve ser realizada de maneira isolada dos demais espaços. O crédito 6 fala sobre controle de sistemas e determina que um mínimo de 50% dos usuários do edifício possa ter acesso a formas de controle a fim de adaptar o conforto ambiental às suas necessidades. Por exemplo, os usuários devem ter o controle da iluminação, umidade e temperatura de seus respectivos espaços. 104 Figura 66: LEED – CS para Fachadas e Áreas comuns do edifício versão 2.2 com pontuação fornecida ao Eldorado Business Tower: Categoria Qualidade Ambiental Interna Fonte: CTE; GAFISA, 2009 Na última categoria, Inovação e Processo de Projeto, o Eldorado Business Tower recebeu a pontuação máxima: 5 pontos. O primeiro ponto foi concedido ao empreendimento por ele ter reduzido o consumo de água em 40%. O segundo ponto foi concedido pelo fato de 30% do custo de materiais se relacionarem a materiais reciclados. O terceiro ponto foi creditado devido ao fato de 40% do material serem produzidos e manufaturados na região. O quarto ponto foi devido ao fato de toda a madeira utilizada ter a certificação FSC e o quinto ponto foi concedido devido à contratação de um profissional LEED Accredited Professional para acompanhar o processo. 105 Figura 67: LEED – CS para Fachadas e Áreas comuns do edifício versão 2.2 com pontuação fornecida ao Eldorado Business Tower: Categoria Inovação e Processo do Projeto FONTE: CTE; GAFISA, 2009 4.5 Considerações sobre o capítulo 4 Após dez anos de desenvolvimento de diferentes projetos para o empreendimento, o Eldorado Business Tower foi concebido de maneira que pudesse se tornar uma referência de construção sustentável. A tecnologia e materiais utilizados na construção garantiram que muitos itens exigidos pela certificação LEED fossem atendidos. Com localização privilegiada, próxima a um grande centro comercial, a situação do edifício foi um quesito favorável à certificação. No que se refere ao terreno, não estando localizado em área contaminada, a que se procedeu descontaminação, esse fato contribuiu para que não se obtivesse pontuação maior. A certificação LEED concede um ponto para quem esteja disposto a escolher um terreno contaminado e fazer a descontaminação, incentivando o tratamento de áreas contaminadas. Portanto, um primeiro passo já havia sido dado em busca da certificação, relativo à escolha do terreno. A partir daí, a certificação foi perseguida atendendo-se a determinadas especificações de projeto e fazendo boa utilização da tecnologia existente. O que afirma a importância da tecnologia construtiva incorporada e da materialidade escolhida para a certificação. Como foi discutido, o edifício recebeu a certificação em versão LEED 2.0 e a versão utilizada atualmente é a 3.0. A questão sobre se ele receberia o mesmo nível de certificação com a nova versão permanece viva, visto que os critérios da pontuação foram substancialmente alterados. 106 Apesar de não ser possível fazer uma análise detalhada da certificação, pois envolve documentações sigilosas enviadas ao USGBC, uma simulação de transferência e comparação dos pontos obtidos pelo Eldorado Business Tower conforme a planilha de certificação LEED 3.0 permite verificar o nível de certificação que o edifício receberia conforme a nova versão, como ilustra a imagem seguinte (Versão LEED 3.0): 107 108 Figura 68 – Simulação de pontuação do Eldorado Business Tower no LEED 3.0 Conforme as figuras demonstram, se a pontuação do Eldorado Business Tower fosse calculada com base na versão 3.0 do LEED, o edifício receberia a certificação Ouro, ao invés da Platina. O Eldorado Business Tower parece, a primeira vista, apenas mais um edifício de escritórios como muitos outros que foram construídos em São Paulo, mas uma análise detida revela a utilização intensiva de significativa estrutura tecnológica que proporciona a economia de recursos energéticos e meios no edifício, o que demonstra o foco da certificação sobre a preocupação com economia de água e de energia. Na época em que foi certificado, recebeu o mais alto nível de certificação e, muito provavelmente, isso não aconteceria na nova versão do LEED. Também é impossível não questionar a certificação em função de alguns itens que fornecem pontos. O bicicletário e o vestiário, por exemplo, praticamente nem são utilizados pelos usuários do prédio hoje, e esse item gera um ponto na versão 2.0 e 2 pontos na versão 3.0. Outro exemplo são as vagas diferenciadas para carros movidos a álcool ou GNV. No Brasil não existe carro 100% álcool ou 100% GNV, então é impossível comprovar se o automóvel que está ocupando a vaga realmente não está abastecido com gasolina. A grande questão envolvendo a certificação é até onde esse documento que valoriza tanto um edifício também comprova a utilização de um projeto sustentável. Qual a diferença entre o Eldorado Business Tower, do ponto de vista de uma arquitetura sustentável, de qualquer outro edifício de escritórios de São Paulo? A princípio, a 109 idéia inicial é a mesma: uma grande caixa de vidro completamente lacrada que isola totalmente o interior do edifício da cidade. Não é possível ouvir ruídos provenientes da rua, uma enorme vantagem para um edifício que fica na Marginal Pinheiros, a temperatura interna é controlada e a iluminação também. Não há dúvida de que os materiais foram cuidadosamente escolhidos, de maneira a não agredir muito o meio ambiente, a iluminação foi trabalhada de maneira a reduzir o consumo de energia e os banheiros todos tem um controle rigoroso que permite verificar quanto de água é consumido em cada um deles, mas existem outros itens que também podem ser trabalhados de maneira a contribuir com o meio ambiente. Ken Yeang, por exemplo, direcionou toda a área de serviços e os blocos de banheiros para o lado mais quente do Menara Mesiniaga, deixando estes com ventilação natural. As escadas e elevadores também tiveram a mesma solução. No Eldorado Business Tower, toda a área de serviços, os blocos de elevadores, escadas e banheiros, são centralizados no edifício, obrigando que seja feita uma climatização artificial nessas áreas também. Áreas que não precisariam, a princípio, de tamanho isolamento da área externa. Ken Yeang também faz um grande uso de vegetação nos seus projetos. Os edifícios não precisam ter apenas uma área verde no térreo, caracterizada como impermeável, para receber pontuação. A vegetação pode ser trabalhada na fachada, como no Tokyo Nara Tower, ou em pequenos pátios deixados em cada pavimento, como no Menara Mesiniaga. O Eldorado Business Tower tem uma grande praça no térreo, uma grande área impermeável, porém essa raramente é utilizada, pois como é possível perceber em visita ao edifício, todos os usuários que descem no horário de almoço, ou mesmo no final do dia, vão direto em direção ao shopping. Tendo uma visão do aspecto econômico e social que a sustentabilidade envolve, também, um edifício com tamanha tecnologia inviabilizaria sua construção, devido aos custos, dependendo da construtora. O fato é que o retorno econômico acontece a longo prazo, mas e no momento da construção, quando não se dispõe de tanto recurso para investimento e quando não for possível esperar o retorno a longo prazo 110 que esse tipo de investimento traz? O resultado é que esse tipo de tecnologia acaba sendo apenas para ser usada por construtoras grandes, capazes de absorver tamanhos gastos. O Eldorado Business Tower não deixa de ser um grande marco dentro de tudo que conseguiu alcançar. Talvez hoje ele recebesse uma certificação de nível mais baixo e talvez ele pudesse ter soluções arquitetônicas que aproveitassem mais o que o meio ambiente tem a oferecer, mas para a época em que foi construído, considerando o histórico de edifícios certificados até aquele momento, ele mostrou um grande avanço e se tornou uma referência. O que precisa ficar claro, atualmente, é que é possível usar uma referência como exemplo e aproveitar tudo de bom que ela traz, mas as melhorias precisam continuar acontecendo para que, no futuro, a excelência em construção sustentável possa ser atingida unindo um projeto integrado ao meio ambiente com uma tecnologia de ponta que vai melhorar ao máximo o desempenho desse futuro edifício. 111 CONSIDERAÇÕES FINAIS Não há duvidas de que todo e qualquer assunto relacionado à sustentabilidade é prioridade no mundo atual. É um fato também que o ser humano vem afetando a natureza de tal maneira e intensidade que esta não consegue se regenerar suficientemente para que esses impactos não tenham efeitos a longo prazo. As certificações verdes surgiram, nesse contexto, a fim de minimizar e enfrentar impactos da construção civil, e como forma de avaliar e estabelecer um padrão para a sustentabilidade de edifícios. Visam incentivar a sociedade a incluir o impacto sobre o meio ambiente em suas pautas, considerando-se a construção civil uma atividade geradora de efeitos significativos sobre este. Esse trabalho analisou as certificações verdes no geral e focou naquela que tem grande repercussão hoje no Brasil, e que é cada vez mais utilizada e reconhecida: a certificação LEED. No capítulo 1 foi relatado um breve histórico sobre como o assunto sustentabilidade entrou em pauta no mundo, mostrando definições de sustentabilidade, e foram explicados alguns dos principais conceitos sobre o assunto, como pegada ecológica, Agenda 21, agenda verde e agenda marrom. O capítulo 2 mostrou a definição de arquitetura sustentável, dando exemplos desta no Brasil e no mundo, citando alguns arquitetos que utilizavam recursos de uma arquitetura sustentável, como Norman Foster, Ken Yeang, Rino Levi e Marcos Acayaba. O capítulo 3 tratou sobre os sistemas de certificação Green Building mostrando, primeiramente, um panorama geral, relatando duas certificações que serviram como base para a análise crítica do LEED que são o BREEAM, primeira certificação a ser utilizada e que serviu como base para muitas outras, e o AQUA, certificação também utilizada no Brasil. Em seguida é feita uma análise do LEED, como ele é utilizado no Brasil e no mundo, seu processo de certificação e suas categorias. 112 No capítulo 4 foi feita uma análise do estudo de caso escolhido, o primeiro edifício a receber uma certificação LEED CS platinum na América Latina: o Eldorado Business Tower. Resta, porém, incerteza de até onde o LEED cumpre o papel para o qual foi criado, cabendo indagações: a certificação ajuda os edifícios a diminuir o impacto que causam no meio ambiente? A resposta afirmativa foi sugerida pelas análises realizadas na dissertação: sim, sem dúvida, o LEED é um instrumento cuja aplicação incrementa o desempenho ambiental dos edifícios, antes, durante e depois de finalizada a construção. Intervém diretamente nos processos de gestão condominial, relativos ao gerenciamento da distribuição e controle de meios e recursos energéticos, no gerenciamento de resíduos gerados tanto pela atividade da construção quanto os proporcionados pelo uso intensivo da arquitetura, e controla as condições de conforto ambiental. Mas, a questão que instiga à pesquisa é se o instrumento também incentiva a prática de uma arquitetura de melhor qualidade, considerando-se todos os aspectos que definem essa atividade e que são mediadas pelo projeto arquitetônico. O problema que conduziu e estimulou a pesquisa realizada é se as soluções consagradas pela certificação e que geram pontuação (inclusive o Platinum, experimentada no estudo de caso realizado) atendem o usuário, o incorporador, a construtora e, ao mesmo tempo, a natureza? Em parte sim, mas foi possível considerar, durante a realização deste trabalho, que muitas das soluções que poderiam ser objeto de atenção e incorporadas desde o início de um projeto arquitetônico conscientemente orientado aos temas ambientais são compensadas com a utilização de tecnologia de ponta durante o processo de construção. A iluminação natural do Eldorado Business Tower, por exemplo, foi controlada com persianas automatizadas enquanto que a ventilação natural foi substituída por um sistema de ar-condicionado mais eficiente no que diz respeito a gasto de energia. O conceito de sustentabilidade implica em um significado de ampla extensão: um edifício sustentável deve ser economicamente viável, socialmente desejável e ecologicamente correto, e a aplicação do LEED é certamente um recorte e seleção 113 de aspectos considerados certificáveis, acrescidos de uma escala de valor que confere pontuação, cuja escolha e hierarquia no rol de atributos certificáveis é variável, inclusive definindo, por meio dessa variação, a categoria da certificação. A certificação se tornou um privilégio, tanto de investidores de maior possibilidade financeira e de usuários de arquitetura que partilham espaços projetados nesses empreendimentos, devido ao seu alto custo. Esse custo retorna para o proprietário em economia de recursos e meios, dentro de alguns anos, e em benefícios ao meio ambiente, mas os aspectos que relacionam a vivência cotidiana do espaço e as edificações refletem propriedades definidas desde a concepção no projeto arquitetônico. A arquitetura afeta usuários em seu dia-a-dia, nos eventos que possibilita, e seus usuários são os beneficiários imediatos de sua proposta, e não podem se dar ao luxo de esperar alguns anos para fruir desse investimento. Considerando-se, ainda, que nem todos os empreendimentos podem buscar a certificação e que edifícios certificados correspondem à minoria no país, o LEED acaba por ter impacto nem tão expressivo em relação à totalidade do que é construído hoje no Brasil. Diretrizes básicas de projeto, como ventilação cruzada e iluminação natural ficam por vezes esquecidas e são compensadas com a utilização de ar-condicionado e iluminação artificial com a justificativa de que estes não gastam tanta energia como antes, ou não afetam o meio ambiente como antes, pois, no caso do ar-condicionado, o gás refrigerante é ecologicamente correto e, no caso da iluminação, são usados dispositivos como sensor de presença e lâmpadas LED que diminuem muito o consumo de energia. O LEED também sugere ainda a necessidade de discussão diante da abstração de seus princípios e categorias. Por exemplo, atribuindo pontuação a um edifício por comportar vagas exclusivas para carros a álcool ou GNV. Ter um carro flex nem sempre implica que a pessoa o abasteça com álcool. Mesmo que a consciência ecológica incomode a maioria das pessoas, o combustível escolhido pode ser aquele mais barato, ou o que compensar mais frente à relação custo e benefício. 114 Outro item a ser evidenciado no LEED é o fato de os edifícios, uma vez certificados, nunca mais passarem por nenhum tipo de avaliação para garantir se tudo o que rendeu a certificação realmente é utilizado da maneira prometida. Seria necessário, por exemplo, avaliar periodicamente, se a coleta de lixo seletiva é realizada, se a água continua sendo tratada conforme o projeto ou se, realmente, ninguém está fumando próximo às portas de entrada. O Eldorado Business Tower foi escolhido como estudo de caso por ser o primeiro edifício da América Latina a receber o mais alto nível do LEED, o Platina, na categoria LEED CS e, mesmo esse edifício, quando se comparam as planilhas de pontuação LEED 2.0 e LEED 3.0, receberia hoje, mediante a versão atualizada, a certificação na categoria Ouro, ou seja, seria rebaixado. A certificação também inspira uma certa falta de confiança quando se leva em consideração a dificuldade para obter qualquer dado relativo ao objeto de estudo. Toda a documentação é tratada como sigilosa, tornando impossível uma real análise de até onde esse edifício realmente é sustentável. Os dados deveriam ser divulgados de maneira a dar valor e credibilidade ao selo. Assim, como, por exemplo, o fabricante de determinada comida expõe todo o seu conteúdo calórico e de vitaminas em um selo na sua embalagem para comprovar a veracidade de suas informações, o selo verde deveria vir com todos os índices que teoricamente garantiram sustentabilidade a determinado edifício explicitados. Afinal de contas, tais índices deveriam ser objeto de orgulho, tornando-se visíveis. Por exemplo, poderia ser utilizado um indicador comparando o consumo energético de um outro edifício de mesma área construída com o edifício certificado, demonstrando que o consumo dos prédios que não tem selo é maior, e o edifício em questão ganhou pontuação porque seu consumo corresponde a um valor menor. Ao contrário disso, as informações são lacradas a sete chaves, gerando ainda mais dúvidas sobre o processo. O estudo de caso também permitiu demonstrar que alguns dos itens pelos quais o edifício recebeu pontuação talvez não pudessem ser aplicados a determinados casos. As vagas para carros movidos a álcool ou a GNV, já mencionadas anteriormente, renderam pontos na certificação, sendo que não existe um automóvel 115 100% movido a álcool ou 100% a GNV, no Brasil. O bicicletário e o vestiário existentes no edifício também renderam pontos, mas são controversos devido à localização em uma avenida intensamente movimentada e também em face de consistir em edifício corporativo, com vários sub-solos destinados a garagens, demonstrando que a grande parte de seus usuários e visitantes se desloca em veículo motorizado particular. Localizado em plena Marginal Pinheiros, o acesso de bicicleta já se inviabiliza, e esse fato foi comprovado em visita quando havia apenas cinco bicicletas estacionadas no local. O LEED, por exemplo, não avaliou o impacto que um edifício daquele porte, com expressivo número de subsolos e grande área construída teria no meio ambiente. A certificação só avalia aspectos positivos dos edifícios, ou seja, é sempre possível ganhar um ponto, mas nunca é possível perder um por algum erro muito grave que cause impacto no meio ambiente. A grande questão a ser indagada é o que mudaria no projeto arquitetônico se o Eldorado Business Tower não fosse certificado nem considerado sustentável. Muito provavelmente, a resposta para essa pergunta seria praticamente nada. Talvez os materiais não fossem escolhidos com tanto cuidado, mas o edifício, muito provavelmente, teria exatamente a mesma aparência. Apesar de apresentar, definitivamente, vários pontos controversos, o LEED se tornou um eficiente agente disseminador de práticas que estimulam a melhorar o desempenho energético de um edifício, uma das maiores preocupações e setores de atuação das certificações. De origem estrangeira, o instrumento tem grande influência no mercado imobiliário brasileiro e a valorização que sua aplicação atrai aos imóveis faz com que empreendedores e investidores sejam os grandes divulgadores da certificação. As certificações influenciaram muito no sentido de mostrar ao arquiteto, ao construtor, ao incorporador e, inclusive, ao cliente final sobre a importância das construções sustentáveis e o checklist utilizado por elas acaba servindo como guia para todos os envolvidos no processo sobre qual caminho seguir, quais itens devem ser considerados e priorizados e o que não deve ser objeto de atenção, e num projeto arquitetônico, o que deve ser solucionado de outra maneira. 116 O fato é que, se não existisse o LEED, ou qualquer outra certificação, por mais que a sociedade e os profissionais de arquitetura sejam conscientes das necessidades que relacionam a construção civil, a arquitetura e o meio ambiente, os edifícios seriam construídos exatamente da mesma maneira que são hoje – com meios e técnicas atuais -, mas sem incorporar as preocupações que o LEED incentiva. O LEED é um sinal, um indício que pode funcionar como estímulo ao atendimento de questões relacionadas ao ambiente. Embora centrado em eficiência energética, a certificação é dotada e obedece a critérios e técnicas específicas, que certamente atribuem maior qualidade ao produto, consistindo em um instrumento contemporâneo de qualidade da mais alta importância. No entanto, as preocupações específicas da arquitetura com a integração de seus aspectos, desde a estética, passando pela técnica aos espaços projetados, estão na base dessa qualidade total, e esta dissertação é uma peça que procurou evidenciar esse fundamento. O LEED sozinho não atesta a prática da boa arquitetura, mas a utilização da certificação não deixa de trazer um bem à sociedade, visto que dissemina idéias e conceitos de sustentabilidade, mesmo que essa abstração somente poderá ser superada pela concretude da arquitetura que desde o Renascimento, procurou mediar no projeto arquitetônico, as qualidades intrínsecas do espaço e de sua materialidade. 117 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARAUJO, Geraldino Carneiro de. 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Disponível em: http://www.purarquitetura.com.br/socios.php . Acesso em 20/11/2010. é que esse projeto vem desde 1981, quando o Shopping Eldorado foi inaugurado. Eduardo: Não, na verdade esse projeto se iniciou em 2001. Mariana: Mas tinha outras construtoras antes, certo? Eduardo: Tinha, mas o projeto com esse formato vem desde 1999, 2000, por aí. Mariana: Foi quando ele começou a tomar a cara que tem hoje? Eduardo: 127 Exato. Existiram vários projetos, mas desde 1991 que o Aflalo & Gasperini está em contato com o Shopping Eldorado para tentar viabilizar um negócio ali. Foram feitos projetos com a Racional, se não me engano, e outras construtoras, mas a Gafisa foi a única que conseguiu fazer a intermediação comercial com o Eldorado. Ali tinha muitos problemas familiares, então era muito difícil e a Gafisa conseguiu fazer dar certo. Quando a Gafisa iniciou o trabalho, ela já iniciou com o pensamento de que seria construída uma torre referencial na cidade. Ela é uma torre de 60 mil metros quadrados computáveis, 120 mil metros quadrados de área construída e já nasceu com lajes nesse formato, uma laje de 2 mil metros quadrados por andar, então tem a performance de edifícios norte americanos. Nem os europeus tem tanto assim: 140 mil metros de altura. Então já se sabia que era um prédio para o novo Brasil. Eles estavam já apostando nesse Brasil que agora a gente está vendo mais real e, para isso, eles tinham como princípio construir um prédio que dali a vinte anos ainda fosse atual. Essa era a meta. A Gafisa tem bons engenheiros. O Luiz Fernando, o diretor do projeto, começou já fazendo uma seleção de engenheiros de altíssimo nível buscando o caminho de engenharia de ponta. A engenharia de ponta no final do século passado já era uma busca de economia de eletricidade. Toda a engenharia já estava voltada para essa economia. Mundialmente, todo mundo está fazendo esforços para serem mais econômicos em termos de consumo de eletricidade. Aqui no Brasil que ainda não existe essa cultura. Ainda ontem, eu estava ouvindo o José Goldemberg, que foi presidente da Fesp, criticando a necessidade da usina de Belo Monte. Ele fala que o Brasil é o único país que cresce em energia elétrica a mesma coisa que ele cresce em economia, em todos os outros essa curva não acompanha porque, ao mesmo tempo em que eles crescem na produção, eles exigem que tudo o que se vá produzir consuma menos energia, então não crescem na mesma proporção. 128 A Gafisa já entrou nesse projeto com esse pensamento mundial, essa preocupação com o desperdício de energia. Por outro lado, a taxa de aluguel desses prédios é muito alta e quanto mais caro é o aluguel, mais rentável é para quem está investindo. Portanto, a conta de quem vai ocupar o lugar é feita com o aluguel mais o condomínio e o condomínio nesses prédios é muito alto. Então o objetivo era fazer um projeto em que a economia de energia não fosse, necessariamente, no investimento e sim no uso. Para isso, eles fizeram todas as contas de consumo de energia possível na época, em 2001, onde estudaram muito a possibilidade da cogeração que acabou sendo efetivada. No início era a co-geração com óleo e depois acabou sendo possível ser feito com gás. A co-geração não foi pensada por causa do LEED que na época nem existia. Mariana: Não se pensava em certificação na época? Eduardo: Sim, pensava-se em certificação, mas não no LEED. Pensava-se na idéia de ter um baixo consumo energético e, portanto, uma conta de luz menor e, com isso, o aluguel todo menor. A eficiência do condomínio passava por ar-condicionado, consumo de água, consumo de eletricidade, percursos de tubulação e sistemas. Houve um projeto que nós detalhamos, mas como foi o mesmo engenheiro que acompanhou projeto e obra, ele teve a capacidade de, durante a construção, continuar o projeto. Foram surgindo novas teorias, novas técnicas, novos aparelhos e ele foi pesquisando mundialmente e conseguindo manter tudo o mais atualizado possível, modificando o projeto durante o processo. Em determinado momento, 2002 se não me engano, ou 2003, o selo LEED estava surgindo no mercado e não tinha nem tomado, ainda, a dimensão que tem hoje, e ele (engenheiro responsável pela obra) foi ao Mackenzie para contatar o departamento de tecnologia e sustentabilidade do Mackenzie para o próprio Mackenzie dar uma assessoria para ele e depois emitir um selo do Mackenzie para 129 a certificação. Então eles não estavam ainda preocupados com a certificação internacional porque ela ainda não tinha esse valor comercial, mas eles já estavam fazendo certo e estavam preocupados que alguém de fora reconhecesse para não dizer que eles não tinham como contar vantagem de si mesmos. Então eles estariam contratando e sustentando a formação interna do Mackenzie para um selo Mackenzie. Eles fizeram o contrato, aliás, eu fiz várias participações com os meus colegas, inclusive com o Professor Ladislao, que infelizmente morreu, e que era o líder desse trabalho. Ele começou a formular tudo, mas conforme eles foram formulando, a obra começou a andar numa velocidade que a universidade não tem. A universidade não conseguiu se organizar em uma velocidade que garantisse a existência do selo. Dentro de pouco tempo, o selo começou a vir para o Brasil e algumas empresas americanas, como a Tishman, por exemplo, resolveram aplicar o selo. A eficiência do prédio sempre foi pensada em projeto e ele sempre foi feito de maneira que atendesse os requisitos do LEED mesmo quando não se buscava a certificação. O prédio tem características e todas as concepções dele foram sempre pensadas com o mesmo objetivo do LEED só que eles nunca tinham pensado nisso de obter o LEED. O LEED passou a ser um selo que eles estavam buscando ter super útil comercialmente, mas eles seriam platinum de qualquer maneira mesmo sem o selo. Foram feitas pouquíssimas adaptações. O Rochaverá, por exemplo, teve mais adaptações. As fachadas dele, por exemplo, são escuras e não dava para mudar isso porque marketing já estava muito evoluído. Os projetos já tinham algumas características que eram mais daquela época em que foram concebidos, pois eles foram concebidos com uma diferença de um ano aproximadamente. O Rochaverá é de um pouco antes. Daí, quando surgiu o Eldorado, nós fomos buscar soluções de extrema performance, tanto nos vidros, quanto na fachada, quanto nas instalações. Na verdade, vendo desse ponto de vista, a certificação é puramente comercial, pois os requisitos seriam atendidos de qualquer maneira e a certificação serviu apenas para mostrar a todos o que realmente foi feito. Tanto que nos dois edifícios, no 130 Rochaverá e no Eldorado, as unidades foram comercializadas muito rápido e muitas das empresas que se instalaram lá também buscaram a certificação de interiores. Após participar desses projetos, eu cheguei à conclusão de que o selo LEED não é um selo de arquitetura, nem de engenharia. Se você estiver fazendo uma boa arquitetura, se você estiver fazendo um projeto de última geração, você tem compromisso com isso e não é pelo o que o selo está te exigindo. O que o selo vai mostrar é o seguinte: qual é o nível que esse cara que está me vendendo o prédio tem? E o selo diz: dentro dos meus critérios, ele tem isso. Pode ser inclusive outro selo, como o AQUA. Eu só tive experiência com o LEED até hoje, então conheço menos o AQUA. Hoje eu estou fazendo trabalhos para o Senac e dentro do Senac tem cursos de sustentabilidade e eles não querem certificar os prédios que temos feitos, com nenhum selo. Eles tem essa relação de para que que interessa para eles ter o selo LEED, sendo que existem outros selos e eles ensinam sustentabilidade. Os selos que deveriam pagar para o Senac e não o contrário, pois o Senac é uma instituição que não visa o comercial. Então eu vejo que essa questão do selo é bastante relativa. Se você pensar que o CDHU vai fazer uma construção, você acha que ele vai gastar com selo? Se ele gastar, eu mesmo chamo o cara para falar que ele é doido, pois não precisa. Mariana: Mesmo porque isso gera um custo alto na construção, certo? Eduardo: Não, não gera um custo alto. Isso não é verdade, não é assim. Você pensa em um prédio que você está fazendo com uma engenharia de ponta, piso elevado, arcondicionado central e tudo isso que nós estamos fazendo nesses prédios que são verdadeiros fórmulas um da construção civil, você tem tal grau de tecnologia, que você vai agregar aí 5, no máximo 10% no custo. O que tem é muito mais dificuldade, muito mais trabalho, pois você não pode por a pedra de tal lugar porque ela consome mais energia e gasolina no percurso do que a pedra a menos de 800km, 131 ou o cheiro não pode ofender a pessoa, mas em termo de custo, para uma construção sustentável de habitação popular, não é nenhum absurdo. O problema é que eles compram o terreno mais barato possível no pior lugar e tudo o que for feito para tornar a torre sustentável não foi feito na atitude de incorporação. Essa relação é que precisa ser superada e isso é o que o LEED tem capacidade de fazer com os grandes empreendedores, ou seja, ele diz para não comprar terreno em qualquer lugar porque depois vai gerar mais problema. O LEED, para mim, funciona muito como as pessoas. Um europeu, de pele bem clara, quando vem para o Brasil, é considerado lindo pelo povo, pois é diferente, mas ele vai sofrer com o tempo, pois o tipo de pele dele não é feito para ficar no calor. O mesmo acontece com alguém da raça negra quando vai para a Europa, por exemplo. Mariana: E o que você acha da questão da pontuação do LEED? Você cumpre alguns itens e ganha pontos, mesmo tendo deixado outros itens de fora. O máximo que acontece é a certificação ser gold ao invés de platinum, por exemplo. Eduardo: O LEED estabelece os pré-requisitos, que são itens que não podem deixar de serem feitos em hipótese alguma. Cumprindo o pré-requisito, realmente tem algum ou outro item que pode ficar de fora, mas se não tiver todos os pré-requisitos, nem certified o prédio será. Mariana: Apenas para finalizar, eu já ouvi dizerem que o bom arquiteto projeta sempre um edifício eficiente e que a única diferença para obter o LEED é que o arquiteto precisa acrescentar alguns pequenos itens a mais para conseguir uma pontuação. Você concorda? Eduardo: 132 Sim. O LEED cria diretrizes que você deve seguir. O bom arquiteto já as segue, buscando ou não a certificação e se o objetivo, mas tarde, for a certificação, basta acrescentar pequenas coisas. No caso acrescentamos o bicicletário e o vestiário. do Eldorado, por exemplo, nós 133 ANEXO 2- Manual do Locatário do Eldorado Business Tower 134 135 136 137 138 139 140 141 142 143 144 145 146 147 148 149 150 151 152 153 154 155 156 157 158 159