O Histórico caso de Phineas Gage

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O Histórico caso de Phineas Gage
Os estudos da personalidade foram marcados por
acidente tão famoso quanto inigmático.
Phineas Gage era um jovem supervisor de
construção de ferroviária da Rutland e Burland
Railroad, em Vermont, EUA. Em 1848 de
setembro, enquanto preparava uma carga de
pólvora para explodir uma pedra, deixou uma
barra de aço próxima do local. Com a explosão, a
barra de 2 cm de diâmetro e mais de um metro de
comprimento atravessou-lhe o crânio a alta
velocidade. A barra entrou pela bochecha
esquerda, destruiu o olho, atravessou a parte
frontal do cérebro, e saiu pelo topo do crânio, do
outro lado. Gage perdeu a consciência
imediatamente e começou a ter convulsões. No entanto, ele recuperou a consciência
momentos depois, e foi levado ao médico local, Jonh Harlow. Incrivelmente, ele começou
a falar normalmente sem qualquer alteração da consciência ou de exposição de ideias. A
hemorregia foi controlada pouco tempo depois e bastaram alguns meses para que as
diversas infecções fossem eliminadas. Phineas recuperou fisicamente e teve alta.
Porém, pouco tempo depois Phineas começou a ter mudanças
surpreendentes de personalidade e de humor. Tornou-se
extravagante e anti-social, praguejador e mentiroso, com péssimas
maneiras, e já não conseguia manter um emprego por muito tempo
ou planear o futuro coerentemente. «Gage já não era Gage1». Ele
morreu em 1861, treze anos depois do acidente, sem dinheiro,
epiléptico e sem ser autópsiado. O médico que o atendeu, John
Harlow, entrevistou alguns amigos e parentes, e escreveu dois
artigos sobre o histórial médico de Gage1,2.
Phineas Gage tornou-se um caso clássico nos livros de ensino de
neurologia. A parte do cérebro que nele tinham sido danificada, os lobos frontais, passou
a ser associada às funções mentais e emocionais que se verificou terem ficado alteradas.
Harlow acreditava que, «o equilíbrio entre as faculdades intelectuais e as propensões
animais parecem ter sido destruídas2».
O crânio dele foi recuperado e preservado no Warren Medical Museum da Universidade
de Harvard. Mais recentemente, dois neurobiologistas portugueses, Hanna e António
1
2
.Harlow JM. «Passage of an iron rod through the head.» Boston Med Surg J. 1848;39:389–393.
.Harlow JM. «Recovery from the passage of an iron bar through the head» Publ Mass Med Soc. 1868;2:327–
347
1
Damasio da Universidade de Iowa, utilizaram computação gráfica e técnicas de
tomografia cerebral para calcular a provável trajectória da barra de aço pelo cérebro de
Gage, e publicaram os resultados, em 1994. Eles descobriram que a maior parte do dano
deve ter sido feito à região ventromedial dos lobos frontais em ambos os lados3. A parte
dos lobos frontais responsável pela fala e funções motoras foi aparentemente poupada.
Assim, eles concluíram que as mudanças de comportamento social observado em
Phineas Gage provavelmente foram devidos a esta lesão, tendo a equipa observado o
mesmo tipo de mudança em outros pacientes com lesões semelhantes, causando déficits
característicos nos processos de decisão racional e de controle da emoção.
"Gage foi o início histórico dos estudos das bases biológicas
do comportamento"3, disse António Damasio.
Breve
introdução à Neurofisiologia
Para o entendimento integral deste trabalho é relevante
estudar na íntegra e com alguma profundidade alguns
assuntos relacionados com o mecanismo celular do sistema
nervoso e respectiva estrutura.
O sistema nervoso tem a capacidade de receber, transmitir,
elaborar e armazenar informações. Recebe informações
sobre mudanças que ocorrem no meio externo, isto é,
relaciona o indivíduo com seu ambiente e inicia e regula as
respostas adequadas. Não somente é afectado pelo meio
externo, mas também pelo meio interno, isto é, tudo que
ocorre nas diversas regiões do corpo.As mudanças no meio
externo são apreciadas de forma consciente, enquanto as
mudanças no meio interno não tendem a ser percebidas
conscientemente.
Quando ocorrem mudanças no meio, e estas afectam o sistema nervoso, são chamadas
3 Damasio H., Grabowski T,. Frank R., Galaburda AM., Damasio AR. (1994). "The return of Phineas Gage: clues
about the brain from the skull of a famous patient.". Science 264 (5162): 1102-5
2
de estímulos.
O sistema nervoso, conjuntamente com o endócrino, desempenha a maioria das funções
da regulação do organismo. O sistema endócrino regula principalmente as funções
metabólicas do organismo.
Com a denominação de sistema nervoso compreendemos aquele
conjunto de órgãos que transmitem a todo o organismo os impulsos
necessários aos movimentos e às diversas funções, e recebem do
próprio organismo e do mundo externo as sensações.
No sistema nervoso distingue-se uma parte nervosa central, formada
pelo eixo cérebro-espinhal, da qual partem os estímulos e à qual
chegam as sensações, e uma parte nervosa periférica, formada pelos
nervos, os quais servem para "conduzir" a corrente nervosa. Os nervos
transportam à periferia os estímulos e dela recebem as diversas
sensações que, com percurso inverso, são conduzidas ao sistema
nervoso central.
O sistema nervoso central é a parte nobre do nosso organismo: por
presunção é a sede da inteligência, o lugar onde se formam as idéias e
o lugar do qual partem as ordens para a execução dos movimentos,
para a regulação de todas as funções; é o anteparo ao qual chegam as
impressões da visão, da audição, do tacto, do olfato, do paladar. No
sistema nervoso central fica, em suma, o comando de todo o
organismo, seja entendido no sentido físico, seja no sentido psíquico.
Toda a lesão que ocorra em uma qualquer parte do sistema nervoso
central é quase sempre permanente e não pode ser reparada. As
células do sistema nervoso têm carácter "definitivo", não se regeneram
quando são destruídas, como acontece, por exemplo, com os outros
tecidos, como a pele, os músculos, etc. Estudos recentes afirmam
[porém] que talvez seja possível a regeneração de algumas células
nervosas4. (Este estudo publicado à exactamente um ano atrás
envolve uma complexa área da engenharia de tecidos na qual
conhecendo as propriedades de regeneração do tecido nervoso dos
peixes teleósteos pode ser possível a regeneração de tecido nervoso humano.)
Neurónio – a estrutura
A peça elementar do tecido nervoso é conhecida por neurónio. Esta celula tem a
seguinte estrutura: compreende um corpo celular que contém um núcleo, retículo
endoplasmático muito abundante (corpos de Nissl), mitocôndrias, aparelho de Golgi e
neurofibrilas; apresenta uma ou mais ramificações de filamentos citoplasmáticos
4 Zupanc GK, Zupanc MM. (2006 Mar) «New neurons for the injured brain: mechanisms of neuronal regeneration in
adult teleost fish.» Regen Med.;1(2):207-16.
3
finos, chamados dendrites, que conduzem os impulsos até ao corpo celular e um
prolongamento, o axónio, que pode ser muito longo e apresentar ramificações na sua
parte distal ou, ao longo da sua extensão, formando ramificações colaterais. Em alguns
casos, os axónios podem estar rodeados por uma substância esbranquiçada, de
natureza lipídica, a mielina, recoberta por uma película de citopiasma contendo
núcleos, designada por bainha de Schwann. A bainha de mielina é descontínua, dando
origem à formação de nódulos de Ranvier. A função desta bainha de mielina é a de
aumentar a impedância electrica entre o neurónio e o meio de modo a que o sinal
electrico se propague mais rapidamente através do axónio.
Dependendo do sentido em que se propaga o sinal eléctrico existem três tipos de
neurónios:
a) neurónios de conexão ou interneurónios - os que conduzem impulsos entre os
dois tipos de neurónios seguintes:
b) neurónios motores ou eferentes - os que transmitem impulsos do sistema
nervoso central para o exterior;
c) neurónios sensoriais ou aferentes - os que transmitem impulsos do exterior
para o sistema nervoso central;
Segundo o número de dendrites os neurónios podem dividir-se em:
4
-Neurónio mono ou unipolar: Um só axónio, nenhuma dendrite. Presente nos órgãos dos
sentidos. Os receptores sensoriais ocupam o lugar das dendrites.
-Neurónio bipolar: Um axónio, uma dendrite. Presente também nos órgãos dos sentidos.
-Neurónio pseudomonopolar: Dendrite e axónio se fundem-se perto do corpo neuronal.
-Neurónio multipolar: Várias dendrites, um axónio. Predomina no sistema nervoso central.
Neurónio – a transmissão sináptica
Existe sempre entre o interior
(citoplasma) e o exterior de um
neurónio, uma diferença de potencial
causada por uma distribuição desigual
de iões nos dois lados da membrana e
da permeabilidade da membrana a
esses iões. Com efeito, a concentração
de Na+ é maior fora da célula enquanto
que a concentração de K+ é maior no
interior da célula . Sendo a membrana
da célula permeável, a activação do
neurónio provoca perda de potássio e
a introdução de sódio na célula
provoca o activamento da bomba
sódio-potássio que mantém a
concentração destes iões constante
dentro e fora da célula. A diferença de
potencial de um neurónio inactivo é
então negativa — considerando o
interior da célula em relação ao
exterior ― e varia muito pouco.
Quando a membrana de uma célula
excitável é despolarizada a célula dá
origem a um processo conhecido por
potencial de acção que é relevante
estudar-se.
Um potencial de ação é uma alteração
rápida na polaridade da membrana, de
negativa para positiva e de volta para
negativa. Este ciclo completo dura
poucos milisegundos. Cada ciclo — e,
portanto, cada potencial de acção,
possui uma fase ascendente, uma fase descendente e, ainda, uma curva de voltagem
inferior à do potencial de repouso de membrana. Em fibras musculares cardíacas
especializadas, como por exemplo as do marcapasso cardíaco, existe uma fase de
5
diferença de potencial constante que pode preceder a fase descendente.
Os potenciais de ação podem ser medidos por meio de técnicas de registro de
eletrofisiologia e, mais recentemente, por meio de neurochips que contêm EOSFETs
(transístores de efeito de campo de semicondutor eletrólito-óxido).
O potencial de acção não é um fenómeno localizado percorrendo longas distâncias no
axônio, por exemplo para transmitir sinais da medula espinhal para os músculos do pé.
Em grandes animais, como as girafas e baleias, a distância percorrida pode ser de vários
metros.
Tanto a velocidade quanto a complexidade do potencial de ação variam entre diferentes
tipos de células. Entretanto, a amplitude das alterações de voltagem tende a ser
rigorosamente a mesma. Dentro da mesma célula, potenciais de acção consecutivos são
tipicamente indistinguíveis. Os neurônios transmitem informação gerando sequências de
potenciais de acção, chamadas “spike trains”. Variando a frequência ou o intervalo de
tempo dos disparos de potencial de acção gerados, os neurónios podem modular a
informação transmitida.
Esta propriedade de que os neurónios propagam sinais discretos de um só valor de
energia e por picos de potencial foi estudada por McCulloch e Pitts em 1943 e baptizada
por lei do «tudo-ou-nada»:
"A lei do tudo-ou-nada da actividade nervosa é suficiente para assegurar que a
actividade de um neurónio pode ser denotada por uma proposição. As relações
fisiológicas que existem entre actividades nervosas correspondem, então, às
relações entre proposições, isto é, uma rede de conexões entre proposições
simples pode originar proposições complexas." 5
Neste artigo é concebido um neurónio artificial -o neurónio de McCulloch e Pittsconsiderado uma abstracção de um neurónio biológico. Através de um complexo
programa de simulação é criada uma rede neuronal artificial. No entanto, a base lógica é
a mesma: para um dado neurónio de McCulloch e Pitts seja m o número de «inputs» que
chegam às suas «denditres». Estes sinais são então x1, x2, ... xm e w1, w2, ... wm o valor
desses sinais. O «output» será então:
5 McCulloch, W. and Pitts, W. (1943). «A logical calculus of the ideas immanent in nervous activity.» Bulletin of
Mathematical Biophysics, 7:115 - 133.
6
Onde φ é a função de transferência.
O resultado central do artigo de 1943 foi muito importante, tendo-se chegado à conclusão
que toda a expressão lógica pode ser processada e executada por uma rede de
neurónios, os de McCulloch e Pitts. Assim este resultado vai ser importante relativamente
à época em que se insere, a admirável conclusão foi que os elementos simples quando
conectados em rede possuíam um poder computacional muito grande.
Através dos trabalhos que estes dois cientistas instaurou-se na comunidade científica a
ideia de que o cérebro é observado como um processador que executa operações lógicas
e simbólicas, equivalente a um computador digital. Mas o impacto não se fez sentir na
neurociência mas sim na computação.
Células Neuróglicas
No tecido nervoso há, além das células neuronais, as células neuróglicas. Este tipo de
célula cumpre a função de sustentar, proteger, isolar e nutrir os neurónios. Distinguem-se,
entre elas, os astrócitos, oligodendrocitos, microglia etc. Têm formas estreladas e
prolongações que envolvem as diferentes estruturas do tecido.
Nervo – a estrutura macroscópica
Os grupos de feixes de fibras nervosas (axônios)
constituem a estrutura macroscópica chamada nervo.
Os nervos são formados por:
-Feixes de fibras nervosas com bainhas de células
neuróglicas que as recobrem.
-Tecido envolvente conectivo.
-Vasos sanguíneos finos (vasa vasorum).
Os nervos conduzem impulsos de ou para o Sistema
Nervoso Central. Dependendo do sentido de
condução podem dividir-se em:
-Nervos motores: predominantemente
eferentes.Conduzem os estímulos do sistema nervoso
central à periferia onde alcançam os músculos.
-Nervos sensitivos: predominantemente aferentes. Transmitem os estímulos da periferia
até o sistema nervoso central.
-Nervos mistos: têm uma componente motora e outra sensitiva.
De certa forma dever-se-ia considerar como mistos todos os nervos periféricos. Já que
nos motores também encontramos vias aferentes provenientes dos ossos musculares, e
nos sensitivos observam-se também fibras nervosas eferentes para as glândulas da pele
e os músculos eretores dos pelos.
7
A palavra nervo em geral é usada para falar do sistema nervoso periférico, no sistema
nervoso central as fibras formam feixes segundo a função exacta que desempenham.
Aqui ao grupo de feixes de fibras de igual função dá-se o nome de fascículo. Os
fascículos têm nomes compostos. A primeira parte do nome indica onde começa o
impulso e a segunda onde termina. Por exemplo: corticospinal-corteza-medula.
Gânglios
Conjunto de corpos neuronais que se encontram no curso dos nervos.
Em alguma parte de sua trajetória as fibras pré-ganglionares chegam a um gânglio e
realizam sinapses com as suas células.
Matéria branca e matéria cinzenta
Num corte dos órgãos que integram o sistema nervoso, tais como encéfalo ou espinalmedula, observam-se zonas mais claras e mais escuras bem definidas correspondentes à
materia branca e matéria cinzenta, respectivamente. A matéria cinzenta é formada pelos
corpos neuronais.
A matéria branca é formada, na sua maior parte, por vias de condução. Aqui se agrupam
vias aferentes, eferentes, vias de comunicação dos centros entre si. A cor branca deve-se
predominância das bainhas de mielina (essencialmente lipídicas).
Divisão funcional do sistema nervoso:
O sistema nervoso pode dividir-se funcionalmente em:
-Sistema nervoso central, da vida de relacionamento ou somático: rege as funções de
relação com o meio externo.
-Sistema nervoso autónomo ou vegetativo: ocupa-se do aspecto interior, a regulação, a
coordenação dos órgãos. É autónomo, já que estes processos não dependem da vontade
do homem.
Divisão anatómica do sistema nervoso:
De acordo com a sua localização, o sistema nervoso somático divide-se em:
-Sistema nervoso central: consta do encéfalo e da espinal-medula (cérebro espinal), estes
são os principais centros onde se relaciona e integra a informação nervosa. Encontram-se
suspensos em líquido cefalorraquidiano e estão protegidos por estruturas ósseas, o crânio
e a coluna vertebral.
-Sistema nervoso periférico: composto pelos nervos que conduzem informação para o
sistema nervoso central (aferentes) e deste (eferentes) e pelos gânglios associados. O ser
humano tem 12 pares de nervos craniais, que partem do encéfalo; 31 pares de nervos
8
raquidianos, que partem da medula.
Todo o eixo encefalo-espinal encontra-se envolto e definido por tecido conectivo fibroso
dando lugar às meninges: dura-máter, pia-máter e aracnóides. A dura-máter é grossa e
resistente e, nas aracnóides, circula o líquido cefalorraquiano e encontram-se vasos
sanguineos
Sistema nervoso autónomo:
Corresponde à porção do sistema nervoso que se ocupa da inervação das estruturas
involuntárias, tais como o músculo cardíaco, músculo liso, glândulas etc. Regula as
funções respiratórias, circulatórias, secreções etc. Compõe-se de centros ao nível do talo
encefálico, da medula e dos gânglios;
dispondo-se na sua maioria aos
costados da coluna vertebral.
Segundo a origem e a função das
fibras nervosas, divide-se em:
Sistema nervoso simpático: origina-se
na medula torácica e na lombar. Um
pouco fora dos corpos vertebrais está
situada uma cadeia de gânglios
conectados por fibras. As cadeias (são
duas, uma de cada lado da coluna) se
chamam cadeias simpáticas e seus
gânglios são conhecidos como
paravertebrais. Prepara o organismo
para uma emergência, para luta ou
para fuga. Exemplo:Uma batida de
porta repentina que ocorre no meio da
noite produz uma grande quantidade
de impulsos simpáticos eferentes. As
pupilas se dilatam, a pele fica
arrepiada, o coração bate mais
rapidamente, os vasos sangüíneos
periféricos contraem-se elevando a
pressão arterial. Distribui-se o sangue de maneira que se dirija ao coração, o cérebro e o
músculo esquelético. Aumentam as respirações, isto é, o corpo inteiro está em alerta. Ao
mesmo tempo, as funções corporais que não são de ajuda são suprimidas. A digestão se
retarda, a musculatura da parede vesical fica comparativamente relaxada e as funções
dos órgãos sexuais são inibidas.
Sistema nervoso parassimpático: os corpos do primeiro neurônio se encontram em duas
zonas bem separadas, uma é o talo encefálico e a porção sacra da medula espinal. Os
gânglios parassimpáticos se encontram afastados da coluna vertebral e perto dos órgãos
efetores. Intervém nos processos de recuperação, se encarrega de restituir a energia,
reduz freqüências cardíacas e se relaciona principalmente com as atividades funcionais
que ocorrem quando tudo está tranquilo e silencioso. O nervo mais importante se chama
9
pneumogástrico e sai da zona cefálica.
Anatomia da Cognição
Para entrar nos assuntos relacionados com interpretações imagiográficas e determinação
de áreas cognitivas resta-nos considerar alguns aspectos e terminologias referentes à
estrutura do cérebro. Note-se deste já e, pelo que foi dito anteriormente, que o encéfalo é
uma porção do sistema nervoso. Com efeito, quando nos referimos ao encéfalo estamos
a falar do tecido neuronal dentro da caixa
craneana.
O cérebro é constituído por cerca de 100
bilhões de células nervosas que ocupam
grande parte da caixa craneana e pesa cerca
de 1,3 kilogramas. Entre o cérebro e a caixa
craneana encontram-se três tipos de
estruturas chamadas meninges e que se
dividem em:
−
Dura–máter: a camada mais externa, é
espessa, dura e fibrosa, e protege o tecido
nervoso do ponto de vista mecânico.
−
A aracnoideia: a camada intermédia, é mais
fina, sendo responsável pela produção do
líquido cefalorraquidiano.
−
A pia-máter: a camada mais interna, é muito fina e é a única membrana vascularizada,
sendo responsável pela barreira sangue-cérebro.
Ao espaço entre a membrana aracnoideia e a pia-máter dá-se o nome de espaço
subacnoideu. Este é constituído por um fluído limpo, o fluído cefalorraquidiano, e por um
conjunto de pequenas artérias que fornecem sangue à superfície exterior do cérebro.
Podem-se distinguir várias zonas principais no encéfalo:
- O bolbo raquidiano é o ponto de passagem dos nervos que ligam a medula ao cérebro.
- O cerebelo é uma zona dorsal e desempenha um papel importante na manutenção do
equilíbrio e na coordenação da actividade motora. Esta região recebe ordens do cérebro
sobre os músculos e “ajusta-as” para uma melhor actuação motora.
- O encéfalo médio ou mesencéfalo;
- O tálamo é a zona onde chegam a maior parte das fibras sensitivas e aqui as
informações sensoriais são retransmitidas para as respectivas áreas do córtex cerebral.
10
- O hipotálamo desempenha um papel fundamental na regulação da temperatura do
corpo, da fome, da sede, do comportamento sexual, na circulação sanguínea e no
funcionamento do sistema endócrino (regulação hormonal).
- O sistema límbico é constituído por: hipocampo,
septo, amígdala e o bolbo olfactivo. Ele é
responsável por emoções, motivação e
comportamento agressivo.
O cérebro é o centro da maioria das
actividades conscientes e inteligentes e é
composto pelos hemisférios cerebrais direito e
esquerdo, unidos pelo corpo caloso. O
hemisfério esquerdo é responsável pela
linguagem verbal, pelo pensamento lógico e
pelo cálculo. O hemisfério direito controla a
percepção das relações espaciais (distâncias entre objectos), a formação de imagens
e o pensamento lógico, entre outros. Em geral as funções motoras e sensitivas são
“cruzadas”, ou seja, a metade direita do cérebro controla a metade esquerda do corpo
e vice-versa.
−
Existem em cada hemisfério quatro lobos:
- Lobo temporal- cuja zona superior recebe e
processa informação auditiva. As áreas
associativas deste lobo estão envolvidas no
reconhecimento, identificação e nomeação dos
objectos.
- Lobo frontal- é o córtex motor primário, associado
ao movimento de mãos e da face. As funções
associativas deste lobo estão relacionadas com o
planeamento.
- Lobo parietal- é o córtex somato-sensorial
primário, recebe informação através do tálamo
sobre o toque e a pressão. A nível associativo este
lobo é responsável pela reacção a estímulos complexos.
- Lobo occipital- recebe e processa informação visual. As suas áreas associativas estão
relacionadas com a interpretação do mundo visual e do transporte da experiência visual
11
para a fala.
O oxigénio e os nutrientes,
necessários para o
funcionamento normal das
células do cérebro, chegalhes através do sangue que
circula em vasos
sanguíneos (artérias).
O cérebro recebe sangue
por dois pares de artérias:
Artérias carótidas, que se
formam a partir das artérias
do pescoço. Estas dividemse em: artéria carótida
externa, que fornece
sangue à face e ao couro
cabeludo; artéria carótida
interna, que fornece sangue à parte da frente do cérebro e do globo ocular.
Artérias vertebrais, que se formam a partir das artérias do peito. Estas dividem-se e
fornecem sangue à parte de posterior do cérebro, ao cerebelo e ao bolbo raquidiano.
O papel da Ressonância Magnética
Nuclear funcional (fMRI) no estudo da
cognição
A técnica de Ressonância Magnética Nuclear (MRI) foi descoberta por Felix Bloch e
Edward Purcell, logo após a Segunda Guerra Mundial. Esta descoberta valeu-lhes o
prémio Nobel da Física em 1952. Porém, os desenvolvimentos que levaram à aplicação
deste fenómeno à geração de imagens tomográficas só aconteceram na década de 1970.
Recentemente, os principais responsáveis por esses desenvolvimentos, Paul Lauterbur e
Peter Mansfield, foram também laureados com o prémio
Nobel, desta vez em Medicina e Fisiologia.
O fundamento teórico é simples: quando uma dada
substância (neste caso, tecido vivo) é colocada sob a ação
de um intenso campo magnético, ela adquire uma ligeira
magnetização, resultante do alinhamento dos seus spins
12
nucleares com a direcção desse campo. No caso do hidrogénio (com um só protão) há
apenas duas possibilidades de orientação: paralela e anti-paralela. Na condição de
equilíbrio térmico, ocorre uma pequena predominância de estados paralelos ao campo
magnético externo, de forma a que essa magnetização fraca seja estabelecida.
Se um impulso de radiofrequência (RF) fôr lançado sobre a amostra verifica-se a
deslocação dos spins nucleares da direcção
em que se encontravam predominantemente
orientados, levando-os a um estado de
energia excitado. Esse impulso de RF é
composto por ondas eletromagnéticas
semelhantes àquelas emitidas por uma
emissora de radio, sendo, portanto, totalmente
inofensivo. Tendo sido excitados por esse
impulso de RF, os spins nucleares tendem a
voltar à sua condição inicial, de energia mais
baixa, mas, ao fazerem-no, emitem fotões.
Esses fotões são então detectados e
permitem a reconstrução da imagem
anatómica.
Mas com uma técnica deste tipo a dificulade
consiste em, querendo observar alterações
funcionais do cérebro com algum tipo de
estímulo externo (visual, auditivo, etc...), não o podermos fazer já que a MRI nos dá
informações anatómicas. Ou seja, a condição
fundamental para a aquisição dos dados é a nãomovimentação das estruturas.
O problema é resolvido com o conhecimento das
alterações hemodinâmicas no sangue fornecido ao
cérebro. A técnica conhecida como fMRI (functional
Magnetic Resonance Imaging) baseia-se no efeito de
BOLD (Blood Oxygenation Level Dependent effect). O
uso da técnica BOLD é tão difundido atualmente que
sempre que se fala em fMRI, considera-se,
implicitamente, que o método seja esse, a não ser que
um outro seja especificado.
Embora os mecanismos que conectam ativação
neuronal e a fisiologia cerebral sejam ainda objeto de
intensa pesquisa, é bem sabido que activação neuronal
leva a um aumento no consumo de ATP (adenosina
trifosfato), o se traduz num aumento do consumo de
glicose e oxigénio. Para eliminar a necessidade destes
substratos básicos, ocorre uma elevação do nível de
perfusão local, ou seja, um aumento localizado de
actividade neuronal leva a um aumento local do fluxo de
13
sangue. Essas alterações fisiológicas associadas à actividade cerebral acabam por ser
fundamentais para a fMRI com o conhecimento das propriedades magnéticas da
hemoglobina (Hb), componente do sangue responsável pelo transporte e difusão de
oxigênio a nível celular.
O que
ocorre é
que, ao
atravessa
r a rede
de vasos
capilares, a oxihemoglobina (hemoglobina com oxigénio) liberta O2, transformando-se em
desoxihemoglobina (dHb), cujas propriedades paramagnéticas actuam no sentido de
reforçar localmente os efeitos do campo magnético externo. Portanto, naquelas regiões
do cérebro em que se dá momentaneamente uma aCtividade neuronal mais elevada, a
passagem de hemoglobina do estado HbO2 para dHb é também mais pronunciada,
levando a um súbito aumento da concentração local de dHb. Para eliminar a falta
momentânea de O2, ocorre um aumento do volume e do fluxo sanguíneo locais, o que
leva a uma posterior diminuição da concentração da dHb em relação ao nível basal.
Essas alterações na concentração de dHb funcionam como um agente de contraste
endógeno, permitindo a geração de imagens funcionais. Embora esta teoria tenha sido
aceite e praticada por quase uma década, apenas recentemente a correlação entre o
efeito BOLD e a actividade neuronal foi demonstrada experimente usando
simultâneamente Electroencefalografia e fMRI para estudar o córtex visual do macaco
quando submetido a estímulos visuais6. Contudo, detalhes do mecanismo gerador do
efeito BOLD continuam ainda a serem alvo de intensa investigação7. A por se tratar de
uma técnica incipiente, a fMRI tem sido aplicada a uma grande variedade de estudos
funcionais, que vão desde experiências tão simples como a aposição ritmada do polegar
contra o indicador, até investigações neuropsicológicas envolvendo reacções emocionais
e julgamentos morais8, passando por estudos ligados a funções cognitivas como
linguagem9 e memória10.
Entremos agora pormenor numa experiência simples e exemplificativa de estudos deste
tipo realizada por Mark S. Cohen e Susan Y. Bookheimer11.
6 Logothetis, N.K., Pauls J, Augath M, et al. "Neurophysiological investigation of the basis of the fMRI signal".
Nature 412, 150-157 2001.
7 Attwell, D. and Iadecola, C. "The neural basis of functional brain imaging signals". Trends in Neurosciences 25,
621-625 2002.
8 Moll, J., Oliveira-Souza, R., Bramati, I.E., Grafman, J. "Functional networks in emotional moral and nonmoral
social judgments". Neuroimage 16, 696-703 2002
9 Bookheimer, S. "Functional MRI of language: new approaches to understanding the cortical organization of
semantic processing". Annual Review of Neuroscience 25, 151-188 2002
10 Haist, F., Gore, J.B., Mao, H. "Consolidation of human memory over decades revealed by functional magnetic
resonance imaging". Nature Neuroscience 4, 1139-1145 2001
11 Functional Magnetic Resonance Imaging experiments
14
O sangue está numa percentagem muito baixa na matéria cinzenta (cerca de 6%) e ainda
menos na matéria branca. Por conseguinte as mudanças hemodinâmicas ocuridas
durante a excitação em fMRI são extremamente pequenas de 2 a 5% com campos
magnéticos moderados (1,5 Tesla) até 15% com campos fortíssimos de 4 Tesla.
Gráfico 1: Variação da intensidade detectada
versus tempo e correspondentes sinais
obtidos por fMRI
No entanto, estudando o ruído do sinal em profundidade e eliminando com as devidas
atenções é possivel detectar as alterações supracitadas! A sequência de imagens de fMRI
abaixo mostra o resultado de se expôr um indivíduo de olhos abertos a olhar para um
flash à frequência de 8 Hz. as imagens correspondem a alturas em que o flash estava
ligado ou desligado. Como se observa há uma clara actividade do lobo ocipital quando a
luz está ligada. Acima apresenta-se um gráfico da intensidade dos fotões detectados
versus tempo.
A possibilidade de se realizarem estudos dessa natureza, de forma não-invasiva e livre de
riscos de material radioactivo, abre a perspectiva de serem criados novos padrões para se
Mark S. Cohen, Ph.D.
Susan Y. Bookheimer, Ph.D.
UCLA Brain mapping center
Los Angeles, CA 90095
15
avaliar pessoas com disfunções neuro-psiquiátricas e pacientes neurológicos, sobretudo
aqueles passíveis a serem submetidos a intervenções cirúrgicas12. Além disso, pode-se
estudar voluntários sãos para elucidar interessantes aspectos neurofisiológicos cerebrais,
como diferentes tipos de memória, o processo de localização espacial e navegação, por
exemplo13. De facto, um dos aspectos de fMRI mais voltados para aplicações clínicas,
tem sido a avaliação de seu potencial em planeamento cirúrgico. Nestes casos, pacientes
candidatos a neurocirurgia são submetidos a testes realizados através de fMRI, a fim de
mapear as regiões cerebrais responsáveis por funções primárias sensório-motoras ou
pela linguagem, memória ou outras funções, visando minimizar os riscos de déficits
funcionais pós-operatórios. Classicamente, a localização dessas áreas é obtida através
de referenciais anatómicos conhecidos, o que é facilitado pelo uso de técnicas de
neuroimagem de alta resolução espacial, como a ressonância magnética. Entretanto, a
presença de tumores, malformações artério-venosas (MAV) ou defeitos anatómicos póstraumáticos, pode deformar a topografia cerebral, resultando em uma consequente
dificuldade na localização dos limites anatómicos. Além disso, lesões ocorrendo
precocemente no desenvolvimento do sistema nervoso central estão ligadas à
reorganização funcional cortical por processos de plasticidade neuronal, podendo
determinar uma modificação na localização de áreas funcionais.
Para contornar esta limitação, o mapeamento de funções tem sido realizado por meio da
estimulação eléctrica cortical directa, intra ou extraoperatória. Neurologistas,
neurocirurgiões e neuropsicólogos avaliam a localização de regiões funcionais
importantes por meio da aplicação de impulsos eléctricos focados, de baixa intensidade,
na superfície do córtex. Observa-se, então, a reacção exibida pelo paciente em resposta
ao estímulo específico a uma determinada região cerebral.
Na realidade os pioneiros desta técnica foram Wilder Penfield e Herbert Jasper do
Montreal Neurological Institute que nos anos 40 tiraram partido da exposição do cérebro
durante neurocirurgias. O facto interessante é que estes prodecimentos foram realizados
em pacientes com epilepsia e que permaneciam totalmente conscientes durante o
procedimento!
Ainda que a localização funcional pela estimulação directa seja precisa, esses métodos
são altamente invasivos ou, quando realizados intraoperatoriamente, ficam limitados pelo
tempo cirúrgico e, em alguns casos, pela necessidade de se superficializar a anestesia
durante o procedimento. Outra limitação é que, algumas vezes, é necessário fazer
estimulações do lado contralateral, o que exigiria uma segunda abertura craniana,
inviabilizando o procedimento. Assim, o desenvolvimento de métodos não-invasivos é,
portanto, bastante desejável.
Essa linha de investigação tem procurado comparar os resultados obtidos através de fMRI
com métodos tradicionais de mapeamento funcional, como por exemplo
12 Wishart, H.A., Saykin, A.J. e McAllister, T.W. "Functional Magnetic Resonance Imaging: Emerging Clinical
Applications". Current Psychiatry Reports 4, 338-345 2002.
13 Araújo, D.B., Salles, A., Tedeschi, W., et al. "Spatiotemporal Patterns of Human Navigation Investigated by MEG
and fMRI" In: Proceedings of the 13th International Conference on Biomagnetism, Jena. p.863 – 865. 2002
16
eletroencefalograma (EEG), teste de injeção intra-carotídea de amital, estimulação cortical
intraoperatória e outros. Embora seja evidente que cada patologia requeira um conjunto
próprio de técnicas de diagnóstico, pode-se fazer uma idéia do impacto potencial do uso
clínico de fMRI considerando, por exemplo, o caso específico da epilepsia.
Para a maioria
dos pacientes
com epilepsia, o
EEG é ainda a
técnica mais
adequada para
se localizar o
foco gerador de
crises. Esse
método consiste,
essencialmente,
em se registrar
as linhas de
evolução
temporal de
potenciais
elétricos gerados
pela atividade
neuronal, que
chegam à superfície do escalpe. Anomalias encontradas nos traçados de EEG servem
para ajudar a identificar a natureza da patologia e a região mais provável de sua
ocorrência. Contudo, para vários pacientes que necessitam de um tratamento cirúrgico
para a epilepsia de difícil controle é necessário uma série de exames complementares a
fim de se localizar, com a maior precisão possível, a chamada zona epileptogênica.
Alguns destes exames de natureza ‘invasiva’ trazem riscos e desconforto para os
pacientes (por exemplo, implantação de eléctrodos intracranianos). Por essa razão, tornase evidente a necessidade de se buscarem técnicas alternativas e a fMRI é certamente
uma das principais.
Ilustração 1: Mapeamento cortical com cérebro exposto
Actualmente, existe um considerável repertório de estratégias em desenvolvimento que
permitem avaliar os sistemas sensorial e motor, além de funções como linguagem e
memória, em pacientes com epilepsias de difícil controlo medicamentoso e,
consequentemente, candidatos a intervenção cirúrgica14. Essa é, hoje, uma das áreas
mais promissoras da pesquisa visando aplicações clínicas de fMRI. Outras aplicações
envolvem a investigação de processos de readaptação cortical secundária a lesões
resultantes de patologias como esquizofrenia, doença de Alzheimer, esclerose múltipla,
acidentes vasculares cerebrais, além de desordens neuro-psiquiátricas causadas por
14 Binder, J.R., Achten, E., Constable, R.T., et al. "Functional MRI in epilepsy". Epilepsia 43 (Suppl. 1), 51-63 2002
17
traumatismos cerebrais12.
Do ponto de vista da pesquisa básica e do desenvolvimento tecnológico, os últimos anos
também têm sido marcados por importantes realizações nessa área. O trabalho citado
acima6 sobre as bases neurofisiológicas de fMRI é um bom exemplo de como esses dois
factores têm sido combinados para produzir resultados novos e fundamentais. E isso
aponta para uma das direcções em que os métodos de fMRI estão a ser aprimorados:
aumento de resolução espacial e temporal.
A resolução espacial da fMRI, que, tipicamente, situa-se na faixa de 4-6 mm2 em uma
imagem plana, é relativamente pobre se comparada às imagens anatómicas
convencionais obtidas através de ressonância magnética. Isso ocorre principalmente
porque, em experiências funcionais, há necessidade de se adquirir um número muito
grande de imagens num curto período de tempo. Contudo, em trabalhos recentes, já se
conseguiu que essa definição fosse reduzida para a escala submilimétrica de 0.25 mm2
em imagens geradas com seres humanos15 e para incríveis 0.015 mm2 em experiências
realizadas com animais16, permitindo, nesse caso, a observação de pequenas estruturas
intracorticais, como vasos sanguíneos minúsculos, que normalmente seriam observáveis
apenas com o uso de microfotografias e injeção de contrastes. Para isso, porém, fez-se
uso de um procedimento que está longe de poder ser considerado não-invasivo, com a
implantação de bobinas de RF, responsáveis pela localização do sinal de fMRI,
directamente no crânio dos animais estudados16.
A respeito do esforço empregado neste sentido, é bem sabido que a resolução espacial
em fMRI não pode aumentar indefinidamente, pelo menos aquela baseada em alterações
hemodinâmicas, de que aqui se trata. Evidências de que o mecanismo regulador de fluxo
sanguíneo local se dá dentro de um domínio submilimétrico17, próprio de colunas corticais,
estabelece esse nível como limite intrínseco em termos de resolução espacial para
qualquer método de neuroimagem baseado em hemodinâmica, incluindo obviamente a
fMRI.
A resolução temporal também é limitada por factores intrínsecos a essa metodologia. Isto
porque as respostas hemodinâmicas evocadas por activação neuronal apresentam um
período de latência que pode chegar a alguns segundos até que atinjam sua amplitude
máxima. Contudo, Ogawa (um dos pioneiros em fMRI) e colaboradores demonstraram
recentemente que é possível planear experiências criativas que permitam obter
informações na escala de milisegundos17.
Na esteira dos avanços científicos e tecnológicos mais recentes, o uso de técnicas
multimodais surgiu como uma abordagem inovadora, permitindo ampliar as possibilidades
de uso da fMRI, combinando-o com outros métodos dotados de capacidades
15 Duong, T.Q., Yacoub, E., Adriany, G., et al. "High-Resolution, Spin-Echo Bold, ad CBF fMRI at 4 and 7 T".
Magnetic Resonance in Medicine 48, 589-593 2002
16 Logothetis, N.K., Merkle, H., Augath, et al. "Ultra High-Resolution fMRI in Monkeys with Implanted RF Coils".
Neuron 35, 227-242 2002
17 Kim, S-G e Ogawa, S. "Insights into new techniques for high resolution functional MRI". Current Opinion in
Neurobiology 12, 607-615 2002
18
complementares. O uso combinado de EEG e fMRI é um bom exemplo nesse sentido. As
alterações de potenciais elétricos registrados pelo EEG, além de estarem diretamente
associadas à actividade neuronal, podem ser medidas com precisão de milisegundos, ao
passo que sua resolução espacial é bastante pobre. O fMRI, como vimos, é uma medida
indirecta da actividade neuronal e sem grande resolução temporal, mas permite produzir
mapas da actividade cerebral de boa resolução espacial. A aplicação simultânea dessas
duas técnicas em uma única experiência tem sido vista como uma forma de superar suas
limitações intrínsecas e de potencializar suas virtudes.
Um estudo recente, realizado com o uso combinado de EEG e fMRI, permitiu obter, pela
primeira vez, detalhes das respostas hemodinâmicas geradas através do efeito BOLD e
associadas a alterações da actividade cerebral relacionadas com a epilepsia. Observouse que tais respostas hemodinâmicas apresentam aspectos bastante diferentes do padrão
habitual, observado em situações normais. É bem possível que essas respostas
hemodinâmicas alteradas venham a constituir pistas fundamentais no esforço para se
desvendar os mecanismos de base subjacentes a essas disfunções cerebrais. Resultados
como esses, além de demais aspectos mencionados anteriormente, permitem vislumbrar
um grande potencial para o estudo in vivo da dinâmica cerebral através do uso de fMRI,
tanto em situações normais como patológicas, o que a torna desde já uma técnica
indispensável para o avanço da Neurociência.
19
A Electroencefalografia no estudo de
estímulos visuais (trabalho adaptado18)
O primeiro electroencefalograma foi obtido por Hans Berger em 1924.
A gravação da actividade cerebral é obtida mediante a colocação de eléctrodos no
escalpe munidos dum gel cuja finalidade é aproximar a impedância do eléctrodo à da
pele.
Cada eléctrodo é ligado a um input dum amplificador diferencial (um amplificador por cada
par de eléctrodos) que amplifica a diferença de potencial entre eles .O sinal resultante é
assim filtrado por um filtro passa-alto e um filtro passa-baixo tipicamente preparados para
0,5 Hz e 35-70 Hz, respectivamente .O filtro passa-alto filtra sinais electrogalvânicos
lentos e o passa-baixo filtra sinais electromiográficos.
O sinal filtrado é então disposto num monitor.
A amplitude do EEG ronda os 100mV quando medido no escalpe e oscila entre 1 e 2 mV
quando medido na superfície cerebral .
As relações eléctrodo-amplificador são tipicamente obtidas em uma de três maneiras:
 Derivação de referência comum : Um terminal de cada amplificador é ligado
ao mesmo eléctrodo e todos os outros eléctrodos são medidos relativamente
a este ponto singular. É usual utilizar um eléctrodo de referência algures ao
longo da linha mediana do escalpe.
 Derivação de referência média: Os outputs de todos os amplificadores são
somados e é feita uma média. Este sinal é assim usado como referência
comum para cada amplificador.
 Derivação bipolar: Os eléctrodos são ligados em série a um igual número de
amplificadores . Por exemplo, o Amplificador 1 mede a diferença de
potencial entre os eléctrodos A e B enquanto que o Amplificador 2 mede a
diferença entre os eléctrodos B e C e por aí adiante.
O EEG é uma mais valia no diagnóstico e análise de certas situações clínicas tais
como:
 Epilepsia e síncope
 Perturbações de sono
 Coma e morte cerebral
Existem quatro tipos principais de ondas sinusoidais rítmicas e contínuas do EEG
a referir:
18 «Electroencefalografia» realizado no IBEB com BIOPAC (no âmbido da disciplina de Biofísica Médica com o Prof.
Pedro Almeida) por Lisboa, F.B.; Bentes L.; Sousa M.; Amorim L.
20
Delta - é o alcance em frequência até 4 Hz (20 a 200 µV de amplitude típica) e
está muitas vezes associado a certas encefalopatias e lesões subjacentes .É visível numa
experiência realizada a um indivíduo durante o sono.
Teta - é o alcance em frequência que vai dos 4 aos 8 Hz (de 5 a 100 µV de
amplitude típica) e é referente à infância e adolescência. Esta frequência pode ser
produzida por hiperventilação ou detectada em estados tais como transe, hipnose, sonhos
profundos, sono leve e o momento imediatamente antes do despertar ou do adormecer.
Alfa(ou onda de Berger) - é o alcance em frequência dos 8 aos 12 Hz (de 5 a 10 µV
de amplitude típica) . E próprio de um estado de alerta relaxado de consciência .Estes
ritmos são melhor detectados quando o sujeito se encontra de olhos fechados.
O ritmo sensório-motor (SMR) é outro tipo de onda com frequência no intervalo de
12-16Hz e é característica da presença de um indivíduo de corpo estático.
Beta - é o alcance em frequência acima dos 12 Hz podendo ir até 30 Hz (2 a 20 µV
de amplitude típica). Se as ondas Beta forem de pequena amplitude com múltiplas
frequências a variar então estaremos na presença de um EEG dum indivíduo que no
momento da experiência estaria com pensamento activo, ocupado, ansioso ou muito
concentrado. Se as ondas Beta por outro lado forem rítmicas com certas frequências
dominantes, então o EEG poderá estar associado a alguma patologia ou efeitos
resultantes do consumo de drogas, normalmente benzodiazepinas.
21
Gama - As ondas gama atingem frequências do intervalo de 26-100Hz . São
próprias de grande actividade mental nomeadamente resolução de problemas, percepção
e medo .
Qualquer outro tipo de ondas tais como ondas muito finas e pontiagudas ocorrem quando
o sujeito tem epilepsia e outros tipos de transições ocorrem durante o sono.
Com anestesias halogenadas e agentes intravenosos tais como o propofol, um padrão
rápido de EEG (alfa ou lento beta) é observável acima da maior parte do escalpe.
A experiência realizada com o equipamento existente no IBEB (Biopac Student Lab) foi a
sequinte: Fez-se uma gravação de 30s estando o sujeito sentado, primeiro com os olhos
fechados (0-10s), depois com os olhos abertos (10-20s) e novamente, com os olhos
fechados (20-30s) após o ter avisado que deveria permanecer descontraído e evitar
pestanejar. Obteve-se então o seguinte EEG:
valore
s de
amplit
ude
em
µV:
22
Onda
Olhos fechados
Olhos abertos
Olhos fechados
Alfa
5.1597
1.6330
5.8522
Beta
1,9000
1.5743
2.1667
Delta
5.0132
7.8518
5.2182
Teta
2.2201
1.6514
2.2657
rítmica
É fácil de constatar que houve lugar a variações da amplitude consoante os olhos
estavam abertos ou fechados.
O máximo de amplitude foi obtido para as ondas Delta tendo sido este valor de 9,8518 µV
quando o sujeito passou do estado de olhos fechados para olhos abertos.
O mínimo de amplitude foi obtido para as ondas Alfa também no regime de olhos abertos
tendo sido esse valor de 1,2330 µV .
Durante os intervalos de tempo em que o sujeito manteve os olhos fechados a amplitude
do sinal foi sempre inferior relativamente à que foi obtida durante o período de tempo em
que permaneceu de olhos abertos para as ondas delta tendo sucedido precisamente o
contrário nos três outros tipos de ondas.
Medição das frequencias correspondentes aos três ciclos:
Onda
Média
Ciclo1(Hz)
Ciclo2(Hz)
Ciclo3(Hz)
Alfa
12.9855
11.2299
8.5333
10,9162
Beta
20,0023
23.0577
27.1010
23,3870
Delta
2.6871
2.2164
2,7778
2,5604
Teta
5,3111
6.0556
7.6825
6,3497
Rítmica
Aritmética(Hz)
Erros experimentais:
Valor
Valor
esperado(Hz)
Obtido(Hz)
Alfa
8 – 12
10,9162
9,1620
Beta
12 - 30
23,3870
11,3666
Delta
1-4
2.5604
2,4160
Teta
4-8
6,3497
5,8283
Onda
% de erro
23
As ondas alfa têm maior amplitude quando o sujeito se encontra de olhos fechados. Isto
deve-se ao facto de que quando os olhos estão fechados o cérebro simula um estado de
relaxação superior ao que existe quando os olhos estão abertos. Deste modo, como as
ondas alfa são típicas dum estado relaxado, a sua emissão é facilmente detectada com o
aumento da amplitude entre os dois estados. Essa diferença de amplitude é de 4 µV
aproximadamente , quando o valor médio ronda os 2,5 µV de diferença.
No que diz respeito às ondas beta, a variação da amplitude destas ondas é mínima. Só na
frequência é que os valores variam consideravelmente.
Os dados obtidos para as frequências do intervalo de tempo de olhos fechados e de
olhos abertos mostram que a frequência das ondas beta aumentou em cada ciclo.Na
passagem do ciclo de olhos fechados para o de olhos abertos, a frequência das ondas
Beta aumentou provavelmente devido ao facto de que quando o sujeito abre os olhos fica
mais “alerta”, mais atento e concentrado com o que se passa ao seu redor: Há um fluxo
sináptico do estímulo visual que foi captado. Era portanto de esperar que esta frequência
diminuísse de novo com o fechar de olhos, mas tal não aconteceu.
As ondas delta possuem frequências baixas mas para além disto nada mais podemos
concluir pois não testámos o que se passaria durante um sono profundo.
As ondas de maior frequência são, portanto, as Beta pois sendo resultantes de estímulos
sensoriais exigem uma maior velocidade de repetição/assimilação por parte do cérebro.
As sinapses envolvidas na transmissão de dados provenientes dos cinco sentidos são
rápidas. Por outro lado, as ondas delta estando intimamente relacionadas com a
aprendizagem e com a imaginação exigem uma velocidade de processamento menor que
permita ao cérebro uma melhor interiorização de ideias e/ou conceitos.
Alguns resultados de fMRI e EEG
(combinados) em pacientes com epilepsia
farmaco-resistente19
Relembremos que a epilepsia é uma alteração na actividade eléctrica do cérebro,
temporária e reversível, que produz manifestações motoras, sensitivas, sensoriais,
psíquicas ou neurovegetativas (disritmia cerebral paroxística).
19 «EEG-Triggered Functional MRI in Patients With
Pharmacoresistant Epilepsy»
Francois Lazeyras, Olaf Blanke, Steven Perrig, Ivan Zimine,
Xavier Golay, Jacqueline Delavelle, MD,1 Christoph M. Michel,
Nicolas de Tribolet, Jean-Guy Villemure, and Margitta Seeck
24
A Epilepsia é uma doença neurológica crónica, podendo ser progressiva em muitos
casos, principalmente no que se relaciona a alterações cognitivas, frequência e gravidade
dos eventos críticos. É caracterizada por crises convulsivas recorrentes, afectando cerca
de 1% da população mundial.
Uma crise convulsiva é uma descarga eléctrica cerebral desorganizada que se propaga
por todas as regiões do cérebro, levando a uma alteração de toda actividade cerebral.
Pode manifestar-se como uma alteração comportamental, na qual o indivíduo pode ter
problemas na expressão, movimentos exteriotipados de um membro, ou mesmo através
de episódios nos quais o paciente parece ficar alheado da realidade.
A(s) descarga(s) eléctrica(s) neuronal(ais) anómala(s) que gera(m) as convulsões
pode(m) ser resultante de neurônios com actividade funcional alterada (doentes),
resultantes de massas tumorais, cicatrizes cerebrais resultantes de processos infecciosos
(meningites, encefalites),isquêmicos ou hemorrágicos (acidente vascular cerebral), ou até
mesmo por doenças metabólicas (doenças do renais e hepáticas), anóxia cerebral
(asfixia) e doenças genéticas. Muitas vezes, a origem das convulsões pode não ser
estabelecida, neste caso a epilepsia é definida como criptogênica. Contudo o foco da
epilepsia (quando existente) é normalmente localizado e é a partir dessa adjuvante que a
EEG combinada com a fMRI é o melhor de dois mundos: por um lado a EEG permite-nos
saber com bastante precisão o foco da epilepsia e por outro a MRI dá-nos uma imagem
anatómica da zona em questão. Embora já tenha sido dito, relembramos que isto é de
extrema importância nos casos em que a epilepsia é candidata a intervenção cirurgia. A
técnica de EEG combinada com fMRI é normalmente utitilizada (e preferida face a
técnicas como PET e SPECT) expecialmente quando o foco é extra-temporal.
25
A experiência feita por François Lazeyras et all. consiste em realizar um EEG por meio de
16 eléctrodos de prata colados ao escalpe do paciente. Este dispositivo de 64-canais faz
uma amostragem à frequência de 128Hz. è um tipo de EEG diferente e mais
especializado que consiste no mapeamento da actividade cerebral e na sua reconstrução
a três dimensões. Por isso é chamado de Vídeo-EEG. Depois de ser terem recolhido os
dados durante a crise epiléptica são isseridos por meio intravenoso de 1 a 1,5 mg de
Clonazepam uma substância que funciona como «analgésico» da crise. Deste modo é
recolhida mais uma série de dados. Isto permite, por comparação, eliminar ruído e
potenciais efeitos do próprio EEG na actividade neuronal.
Ao mesmo tempo que a crise ocorre são recolhidas imagens de fMRI. No controle da
experiência estão envolvidos dois monitores: um para recolher as imagens por Video-EEG
e outro por fMRI sendo assim possível visualizar em tempo real os acontecimentos e os
dados obtidos com as duas técnicas.
26
A imagem acima refere-se a um paciente no qual foi detectada uma anomalia no lobo
ocipital esquerdo na zona da calcarina. Embora a fonte da epilepsia esteja bem definida a
cirurgia para remover o tecido morto seria bastante arriscada. Desde modo não foi
efectuada qualquer cirurgia.
Nesta paciente (acima) de 41 anos o problema consiste num quisto (zona a negro)
resultante de uma intervenção cirurgica realisada aos 11 anos para retirar um
meningioma. A imagem anotómica per si (à direita) mostra a localização o quisto mas é a
fMRI (à esquerda) que nos dá a informação da proveniência das crises: lobos occipital e
temporal direitos. Nesta paciente foi realizada a intervenção cirurgica.
27
Paciente de 14 anos com epilepsia multifocal. Neste caso foi realisada intervenção
cirurgica já que os focos são bastante superficiais.
28
O Papel da Tomografia por Emissão de
Positrões (PET) nas Neurociencias e
Neuropatologias
A PET ou Tomografia de Emissão de Positrões é um exame imagiológico da medicina
nuclear que utiliza radionuclideos que emitem um positrão aquando da sua desintegração,
o qual é detectado para formar as imagens do exame.
A PET é como outras técnicas da medicina nuclear um método de obter imagens que
informam acerca do estado funcional dos orgãos e não tanto do seu estado morfológico
como as técnicas da radiologia propriamente dita. Por este motivo ela é técnica mais
indicada no estudo da cognição. A PET como qualquer método tomográfico pode gerar
imagens em 3D ou imagens de "fatia" semelhantes à TAC.
A imagem da PET é
formada pela
localização da
emissão dos
positrões pelos
radionuclideos
fixados nos orgãos
do paciente.
Contudo como o
positrão é a partícula
de anti-matéria do
electrão, ele
rapidamente se
aniquila com um dos
inúmeros electrões
das moléculas do
paciente imediatamente adjacentes à emissão, não
chegando a percorrer nenhuma distância
significativa. É assim impossivel detectar os
positrões directamente com o equipamento.
Contudo a aniquilação positrão-electrão gera dois
raios gama (cada um de 511KeV de energia,
correspondente à massa de cada electrão
aniquilado) com direcções opostas e cuja direcção
e comprimento de onda são as variáveis
necessárias e suficientes para saber a posição de
onde foram emitidos.
No exame PET detectores de raios gama (camera
gama) são colocados em redor do paciente. Os
29
cálculos são efectuados com um computador, e com a ajuda de algoritmos semelhantes
aos da TAC, o computador reconstroi os locais de emissão de positrões a partir das
energias e direcções de cada par de raios gama, gerando imagens tridimensionais (que
normalmente são observadas pelo médico enquanto série de fotos de fatias do órgão,
cada uma separada por 5mm da seguinte). Os PETs e TACs da mesma área são
frequentemente lidos em simultâneo para correlacionar informações fisiológicas com
alterações morfológicas.
Os radionuclideos usados na PET são necessariamente diferentes dos usados nos
restantes exames da medicina nuclear, já que para esta última é importante a emissão de
fotões gama, enquanto a PET se baseia no decaimento daqueles núcleos que emitem
positrões.
- Flúor-18: marca a Fluorodeoxiglicose (FDG) radioactiva que é um análogo da Glicose.
É usado para estudar o metabolismo dos orgãos e tecidos. Semi-vida de 2 horas.
- Nitrogénio-13: é usado para marcar amónia radioactiva que é injectada no sangue
para estudar a perfusão sanguinea de um orgão (detecção de isquémia e fibrose por
exemplo).
- Carbono-11
- Oxigénio-15: usado em estudos do cérebro.
- Rubídio-82: é usado em estudos de perfusão cardiacos.
PET Oncológico: É injectado FDG com Flúor-18 no sangue do paciente. O F18-FDG, um
análogo da Glicose, é transportado para dentro das células pelo mesmo transportador na
membrana celular do açúcar, contudo dentro da célula ele não é completamente
metabolizado mas é transformado em uma forma que é conservada (fixada) no interior da
célula. Assim ele pode ser utilizado para detectar células com alto consumo de glicose e
que portanto contenham muitos transportadores membranares (hiperexpressão destes
genes), como acontece nas células dos tumores de crescimento rápido, os quais são
frequentemente malignos (cancro). É usado para distinguir (estadiar) massas benignas de
malignas no Pulmão, Colon, Mama, linfoma e outras neoplasias, e na detecção de
metásteses. Esta técnica constitui 90% dos PET feitos actualmente.
•
PET do Cérebro: é usado Oxigénio-15. Usado para avaliar perfusão sanguinea e
actividade (consumo de oxigénio) de diferentes regiões do cérebro. A F18-DOPA
está em estudo enquanto análogo do precursor de neurotransmissor DOPA.
•
PET cardiaco: FDG-F18 usado para detectar áreas isquémicas e fibrosadas, mas o
seu beneficio-custo em comparação com a técnica de SPECT cintigrafia de
Perfusão é duvidoso.
Também são usados PET em investigação em Farmacologia. O fármaco é marcado com
radionuclideo de modo a estudar a sua absorção, fixação e eliminação.
Alzheimer
Recentemente descobriu-se que a PET pode ser usada para dignosticar a doença de
Alzheimer mesmo antes dos primeiros sintomas. Um dignóstico feito deste modo mesmo
que apenas 6 meses antecipado pode reduzir em 48% a medicação que mais tarde
30
pudesse vir a ser considerada desnecessária. Obviamente um diagnóstico antecipado
pode reduzir muito significativamente a a velocidade da progressão da doença20.
A doença de Alzheimer ou mal de Alzheimer é uma doença degenerativa do cérebro
caracterizada por uma perda das faculdades cognitivas superiores, manifestando-se
inicialmente por alterações da memória episódica. Estes défices amnésicos agravam-se
com a progressão da doença, e são posteriormente acompanhados por défices visuoespaciais e de linguagem. O início da doença pode muitas vezes dar-se com simples
alterações de personalidade, com ideação paranóide.
A base histopatológica da doença foi descrita pela primeira vez pelo neuropatologista
alemão Alois Alzheimer em 1906, que verificou a existência juntamente com placas senis
(hoje identificadas como agregados de proteína beta-amilóide), de emaranhados
neurofibrilares (hoje associados a mutação da proteína tau, no interior dos neurotúbulos).
Estes dois achados patológicos, num doente com severas perturbações neurocognitivas,
e na ausência de evidência de compromisso ou lesão intra-vascular, permitiram a Alois,
Alzheimer caracterizar este quadro clínico como distinto de outras patologias orgânicas do
cérebro, vindo Emil Kraepelin a dar o nome de Alzheimer à doença por ele estudada pela
primeira vez, combinando os resultados histológicos com a descrição clínica.
Assim sendo, aquilo que é feito para diagnosticar precocemente a doença de Alzheimer é
o uso de Glicose radio-marcada com um isótopo normalmente a F18-FDG, a mesma
molécula usada para diagnosticar o cancro. Desde modo é feita uma avalição do
metabolismo cerebral, premitindo saber qual o grau de evolução da doença.
20 Dr. Michael E. Phelps, chair of the Department of Molecular Medical Pharmacology
31
Acima mostra-se o resultado da PET feita a um individuo são (esquerda) e um paciente
de Alzeimer. As zonas a vermelho, verde e azul correspondem respectivamente a:
elevado metabolismo, metabolismo médio, baixo metabolismo.
A imagem abaixo mostra vários exames PET realizados em pacientes saudáveis com 20,
40, 60 e 80 anos de idade. Pouca é a variação metabólica nos diferentes cérebros.
De seguida mostra-se o estudo feito à evolução da doença. As setas indicam zonas onde
se começam a manisfestar os sinais da doença de Alzheimer( de notar que nas imagens
da 2ª coluna a região onde se denota a primeira queda de metabolismo é precisamente a
correspondente à zona da memória):
Parkinson:
32
Esta doença é
caracterizada por
uma desordem
progressiva do
movimento devido à
disfunção dos
neurônios secretores
de dopamina nos
gânglios da base,
que controlam e
ajustam a
transmissão dos
comandos
conscientes vindos
do córtex cerebral
para os músculos do
corpo humano. Não
somente os
neurônios dopaminérgicos estão envolvidos, mas outras estruturas produtoras de
serotonina, noradrenalina e acetilcolina estão envolvidos na gênese da doença;
A Doença de Parkinson é dita idiopática, isto é, sem causa definida, mas outras formas de
parkinsonismo, como os casos genéticos ou secundários a outras doenças ou exposição
a substâncias, e mesmo os chamados parkinsonismos atípicos podem existir,
acometendo pessoas de todas as idades e sexos, mas com prevalência maior em
pessoas acima de 60 anos de idade.
O parkinsonismo caracteriza-se pela disfunção ou morte dos neurônios produtores da
dopamina no sistema nervoso central. O local mais importante, mas não primordial, já que
outras estruturas como placas intestinais e bulbos olfatórios podem ser lesados antes
mesmo da degeneração da substância negra de degeneração celular no parkinsonismo é
a substância negra, pars compacta, presente na base do mesencéfalo. Entretanto, vários
outros locais são acometidos durante o desenvolvimento da doença, mesmo fora do
sistema nervoso central, dando ao Parkinsonismo um caráter complexo e multisistêmico.
O neurotransmissor deficiente, entre outros, é a dopamina, produzido pela substância
negra, pars compacta. Entretanto, outras estruturas além da substância negra podem
estar acometidas (locus ceruleus, núcleo dorsal da rafe, núcleo pedúnculo-pontino),
levando a anormalidades de outros neurotransmissores, como a serotonina, a acetilcolina
e a noradrenalina.
As zonas afectadas no Parkinsonismo têm funções de controlo motor extra-piramidal, ou
seja, elas controlam os movimento inconscientes como por exemplo os dos músculos da
face (da comunicação emocional inconsciente) ou os das pernas quando o individuo está
de pé (não é necessário normalmente pensar conscientemente em quais músculos
contrair e relaxar quando estamos de pé mas eles contraiem-se de qualquer forma). Além
disso, esses neurónios modificam os comandos conscientes básicos vindos dos
neurónios corticais motores de forma a executar os movimentos de forma suave e sem
33
perder o equilibrio. Também é esse sistema extra-piramidal que impede que haja
contracção e relaxamento continuo e alternado dos músculos agonistas e antagonistas
aquando dos movimentos de precisão (segurar um objecto), calculando
inconscientemente o equilibrio exacto necessário desses músculos para o objecto ficar
fixado.
A forma predominante de Síndrome de Parkinson é a Doença de Parkinson, idiopática e
ligada ao envelhecimento. Contudo há outras formas de Parkinsonismo com outras
etiologias mas a mesma manifestação clínica. Neste grupo incluem-se os Parkinsonismos
secundários, com doença primária que lesa os núcleos basais, como encefalites
(infecções virais, por exemplo); doença de Wilson (disturbio do acúmulo de Cobre em
diversos órgãos incluindo o cérebro); uso de longo termo de determinados fármacos antipsicóticos.
É precisamente partindo do conhecimento de que a doença se revela pela diminuição de
dopamina que o diagnóstico em PET pode ser realizado. O radio-fármaco utilizado é
então a F18-DOPA. Esta molécula é utilizada na produção de dopamina. Em, seguida é
feita uma avaliação da concentração deste neurotransmissor na zona onde ele deveria
ser segregado, os glânglios da base.
A imagem acima mostra no doente de Parkinson uma redução em 70% da produção de
Dopamina face àquela realizada no cérebro são.
34
A Angiografia e o Prémio Nobel da Medicina
Português
A Angiografia ou Arterioangiografia é uma técnica de imagiografia médica na que se
baseia na visualização dos tecidos irrigados por sague arterial através do contraste em
raios-X. A imagem dos vasos sanguineos assim obtidos é chamada de Angiograma.
Foi em 1927 que a técnica (foto ao
lado) de Angiografia Cerebral
desenvolvida pelo Professor António
Egas Moniz teve inicio. Este brilhante
médico e neurologista português foi
galardoado em 1949 com o Prémio
Nobel da Medicina ou Fisiologia pela
descoberta da leucotomia pré-frontal
no tratamento de certas psicoses,
Egas Moniz foi proposto quatro vezes
(1928, 1933, 1937 e 1944) para o
Prémio Nobel, todas elas a propósito
da descoberta da angiografia cerebral, acumulando com a
leucotomia pré-frontal em 1937 e 1944. Os seus trabalhos
de Angiografia Cerebral permitiram então diagnosticar e
conhecer em promenor todos os tipos de patologias
venosas no cérebro: bolsas numa artéria (aneurismas),
inflamação (arterite), uma configuração anormal
(malformação arteriovenosa) ou a obstrução de um vaso
sanguíneo (icto). Estas patologias são normalmente
conhecidas por acidentes vasculares cerebrais(AVC).
O princípio
do
procediment
o é simples:
Injecta-se
uma substância radioopaca, visível nas
radiografias, numa das artérias que
irrigam o cérebro.
Numa primeira fase, a encefalografia
arterial consistia em injectar na artéria
carótida uma solução de iodeto de sódio a
25% com exposição simultânea do crânio
aos raios X, permitindo a visualização em
imagem radiográfica do sistema arterial do cérebro.
35
Parte dos trabalhos experimentais, nomeadamente os ensaios em animais vivos (cães),
foram feitos no Instituto Rocha Cabral.
Hoje em dia a técnica teve poucas alterações mas sobre-tudo consiste na inserção de um
catérter na artéria femural (existente na região pélvica). Este cartérter de pequiníssimas
dimensões viaja através das artérias até à zona do cérebro onde se supõe existir um
AVC. Ao mesmo tempo o procedimento pode ser monitorado com a obtenção de imagens
raios-X. Aquando da chegada do cartérter às artérias cerebrais ele liberta a substância
radioopaca permitindo ter uma imagem radiográfica da
irrigação sanguínea.
Ao lado apresenta-se uma fotografia de um recente
dispositivo de angiografia. Este dispositivo realiza a
chamada Angiografia Rotacional. Em tudo parecida
com a TAC (Tomografia Axial Computadorizada,
abaixo descrita). Com efeito, dispositivos deste tipo
permitem obter uma imagem de melhor resolução a
três dimensões. Ao lado mostra-se também uma
angiografia cerebral de um individuo saudável obtida
com este dispositivo.
A Tomografia Computadorizada (CT)
A Tomografia Computadorizada (TC), antigamente chamada Tomografia Axial
Computadorizada (TAC), é um método complementar de diagnóstico por imagem, que
consiste numa imagem que representa uma secção ou "fatia" do corpo. É obtida através
do processamento por computador de informação recolhida após expor o corpo a uma
sucessão de raios X.
A construção da primeira máquina de tomografia
ocorreu em 1972 no "THORN EMI Central
Research Laboratories", em Inglaterra, por Godfrey
Newbold Hounsfield.
A TC baseia-se nos mesmos princípios físicos da
radiografia convencional, segundo os quais tecidos
com diferente composição absorvem a radiação X
de forma diferente. Ao serem atravessados por
raios X, tecidos mais densos (como o fígado) ou
com elementos mais pesados (como o cálcio),
absorvem mais radiação que tecidos menos
densos (como o pulmão, que está cheio de ar).
36
Assim, uma TC indica a quantidade de radiação absorvida por cada parte do corpo
analisada (radiodensidade), e traduz essas variações numa escala de cinzentos,
produzindo uma imagem. Cada pixel da imagem corresponde à média da absorção dos
tecidos nessa zona, expresso em Unidades de Hounsfield (em homenagem ao criador da
primeira máquina de
TC).
Para obter uma TC, o
paciente é colocado
numa mesa que se
desloca para o interior
de um orifício de cerca
de 70cm de diâmetro.
À volta deste encontrase uma ampola de
raios X, num suporte
circular designado
gantry. Do lado oposto
à ampola encontra-se o detector responsável por captar a radiação e transmitir essa
informação ao computador ao qual está conectado.
Nas máquinas convencionais, durante o exame a “gantry” descreve uma volta completa
(360º) em torno do paciente, com a ampola a emitir raios X que após atravessar o corpo
do paciente são captados na outra extremidade pelo detector. Esses dados são então
processados pelo computador, que analisa as variações de absorção ao longo da secção
observada, e reconstrói esses dados sob a forma de uma imagem. A “mesa” avança
então mais um pouco, repetindo-se o processo para obter uma nova imagem, alguns
milímetros ou centímetros mais abaixo.
Máquinas mais recentes, designadas “helicoidais”, descrevem uma hélice em torno do
corpo do paciente, em vez de uma sucessão de círculos completo. Desta forma é obtida
informação de uma forma contínua, permitindo, dentro de certos limites, reconstruir
imagens de qualquer secção analisada, não se limitando portanto aos "círculos" obtidos
com as máquinas convencionais. Permitem também a utilização de doses menores de
radiação, além de serem muito mais rápidas.
A principal vantagem da TC é que permite o estudo de "fatias" ou secções transversais do
corpo humano vivo, ao contrário do que é dado pela radiologia convencional, que consiste
na representação de todas as estruturas do corpo sobrepostas. É assim obtida uma
imagem em que a percepção espacial é mais nítida. Outra vantagem consiste na maior
distinção entre dois tecidos. A TC permite distinguir diferenças de densidade da ordem
0,5% entre tecidos, ao passo que na radiologia convencional este limiar situa-se nos 5%.
Desta forma, é possível a detecção ou o estudo de anomalias que não seria possível
senão através de métodos invasivos, sendo assim um exame complementar de
diagnóstico de grande valor. Uma das principais desvantagens da TC está relacionada
com o facto de utilizar radiação ionizante. Esta tem um efeito negativo sobre o corpo
37
humano, sobretudo pela capacidade de induzir mutações genéticas, visível sobretudo em
células que se estejam a multiplicar rapidamente. Embora o risco de se desenvolverem
anomalias seja baixo, é desaconselhada a realização de TCs em grávidas e em crianças,
devendo ser ponderado com cuidado os riscos e os benefícios. Uma outra da
desvantagem da TC é o seu elevado preço, especialmente quando comparada com
outros métodos como a radiografia convencional ou mesmo a ecografia.
Estimulação Magnética Transcraneana
(TMS)
A estimulação magnética transcraniana é uma técnica que se baseia numa lei física bem
conhecida: a lei de Faraday:
a corrente elétrica induzida em um circuito fechado por um campo magnético, é
proporcional ao número de linhas do fluxo que atravessa a área envolvida do circuito, na
unidade de tempo. Sendo E o campo eléctrico induzido, ds é um elemento infinitesimal do
circuito e dΦB/dt é a variação do fluxo magnético. Uma maneira alternativa de se
representar é na forma da diferença na função do campo magnético B:
Esta expressão mostra claramente que é possível induzir uma corrente num fio condutor
por meio de um campo magnético variável. O que acontecerá se em vez de um fio
condutor estivermos na presença de um neurónio? O principio é precisamente o mesmo:
pretende-se activar zonas do cérebro usando um campo magnético variável. Esta é então
uma técnica não-invasiva cuja evolução é o presente e o futuro da Engenharia Biomédica
aplicada às Neuroociências! A TMS pode ser usada em diversas patologias como a
depressão e outros tipos de doenças psiquiátricas!
38
A utilização da TMS iniciou-se em 198521 e tem sido um instrumento extremamente
valioso para a elucidação de diversos aspectos da fisiologia do sistema motor humano.
Os primeiros estimuladores magnéticos tinham, porém, a uma frequência de estimulação
limitada pelo tempo de recarga dos condensadores e, dependendo da intensidade
utilizada, não era possível alcançar frequências superiores a 0,5 Hz.
Entretanto, os neurofisiologistas já sabiam há muito tempo que certos efeitos da
estimulação cerebral só apareciam se a área em questão fosse estimulada
repetitivamente, presumivelmente devido a fatores cumulativos, inibitórios ou excitatórios.
Por este motivo, era imperativo o desenvolvimento dos aparelhos de estimulação
magnética no sentido de que estímulos repetidos pudessem passar a ser aplicados.
Várias questões de ordem técnica tiveram que ser solucionadas pelos engenheiros, como
o superaquecimento das bobinas com a passagem frequente de grandes cargas
eléctricas. Esse problema foi solucionado com sistemas de refrigeração a água ou a óleo.
Dispomos, actualmente, de equipamentos capazes de realizar a estimulação magnética
transcraniana repetitiva (rTMS).
Sabemos, hoje, que os efeitos da rTMS sobre as respostas motoras dependem da
frequência e da intensidade da estimulação22. Impulsos a 1 Hz não levam a mudanças
progressivas nas amplitudes dos potenciais de acção musculares compostos (PAMC) dos
músculos intrínsecos da mão a intensidades de uma a duas vezes o limiar motor, embora,
a intensidades mais baixas, em alguns indivíduos, ocorra uma tendência à flutuação
cíclica da amplitude. Impulsos de 3 a 5 Hz levam a um aumento progressivo no tamanho
dos PAMC e a uma diminuição da latência. Impulsos de 10 a 25 Hz, a intensidades até
1,3 vezes o limiar, também levam, em alguns sujeitos, a um aumento progressivo da
amplitude, mas em outros, à medida que a intensidade é aumentada, um padrão
alternante de amplitude aparece, de modo que um PAMC muito grande é seguido por
uma resposta pequena ou até ausente. Esses efeitos cíclicos resultam de alterações na
excitabilidade corticomotoneuronal produzidas por impulsos únicos, como se pode
demonstrar com estudos dos efeitos de estímulos pareados23.
Estes estímulos resultam em alterações da excitabilidade corticomotoneuronal com
duração de até vários minutos. Foi demonstrado, por exemplo, que um estímulo de 20 Hz
e a 1,5 vezes o limiar motor leva a respostas mais frequentes que impulsos únicos,
aplicados a cada dez segundos por quatro minutos24. Não se sabe se este desvio do
limiar é devido a alterações em nível cortical ou medular, mas ele tem evidentes
implicações para a segurança do método. O efeito já foi previamente notado em
experiências com primatas e foi sugerido que possa representar eficiência aumentada das
sinapses corticais excitatórias, que se acredita estarem implicadas na aprendizagem
motora.
21
22
23
24
Barker et al.
Pascual-Leone et al., 1992, 1993, 1994; Valls-Solé et al., 1992
Valls-Solé et al., 1992
Pascual-Leone et al., 1994
39
Se a rTMS é aplicada ao
ponto de estimulação
óptima para um músculo da
mão, por exemplo, as
respostas também podem
ser evocadas em outros
grupos musculares, à
medida que os estímulos
são feitos. Assim, respostas
como a flexão do braço e
até mesmo do deltóide
podem ser obtidas23. A
ordem de recrutamento de
músculos adicionais ao
padrão de resposta é
somatotópica, sugerindo
uma difusão cortical dos
estímulos.
Os efeitos da rTMS também
podem ser influenciados pela existência de fadiga motora central25. Os efeitos da rTMS a
frequencias variáveis de 0,1 a 6 Hz foram estudados em músculos durante o repouso e
com diferentes tempos de exercício prévio; foi demonstrado um padrão de queda
progressiva das amplitudes dos PAMC, durante a aplicação de estímulos, nos músculos
que haviam sido activados voluntariamente antes da aplicação da rTMS. Esse padrão de
queda reflete a fadiga das vias motoras centrais e foi demonstrado de maneira mais
inequívoca com estímulos de rTMS aplicados a 0,3 Hz.
Contudo para além destes estudos somatosensoriais o que de mais relevante tem sido
feito com a TMS é asua aplicação nas doenças psiquiátricas. Com efeito, foi demonstrado
que a rTMS do córtex frontal afeta o humor26. Em dez indivíduos normais, a rTMS da área
pré-frontal esquerda levou a um estado de depressão, enquanto que a estimulação préfrontal direita ou central pode provocar alguma euforia.
Aparentemente, existe um paradoxo no qual a rTMS do córtex pré-frontal dorsolateral
esquerdo induz, em voluntários sadios, redução da felicidade e aumento da tristeza, o que
é uma depressão do humor; entretanto, a estimulação da mesma área em pacientes com
depressão melhora o humor. Claramente, uma explicação simplista em termos de
excitação ou inibição cortical seria difícil de ser sustentada. Provavelmente desempenham
um papel os efeitos neuromodulatórios de substâncias liberadas pela rTMS, já que os
efeitos relatados perduram de minutos a semanas, segundo os trabalhos já publicados.
Mas de que modo pode a TMS resolver problemas como a depressão?
Teoricamente, a estimulação do córtex préfrontal poderia levar, transinapticamente, a uma
activação de neurônios dopaminérgicos no mesencéfalo e de neurónios noradrenérgicos
e serotonérgicos no tronco cerebral. Estudos em animais demonstraram efeitos da rTMS
25 Brasil-Neto et al., 1994
26 George et al., 1996; Pascual-Leone et al., 1996a
40
sobre a neurotransmissão dopaminérgica.
No próximo mês (Junho de 2007) a FDA (Food and Drug Administration, entidade
reguladora da medicação nos Estados Unidos) vai dar o seu parecer quanto ao uso da
TMS para o tratamento da depressão.
A possibilidade de estimulação cortical leva-nos a fazer algumas especulações que,
passando a contradição, podem ter algum tipo de veracidade. Com efeito, note-se que em
pacientes sujeitos a amputações. A região do cortex pertencente ao membro amputado
não ficou «muda». Com efeito, está provado que as zonas motora e sensorial
pertencentes ao membro amputado dão lugar a uma nova matriz de ligações neuronais27.
Este é conhecido como o efeito de «plasticidade do cortéx cerebral».
O mesmo acontece em alguns casos de deficiências do tecido nervoso causados por
AVC's ou mesmo tramatismos craneanos. No caso do vídeo mostrado na aula como
resultado do acidente, o paciente ganhou funções motoras novas e o rearanjo das
funções cognitivas deu lugar a que o talento pianístico se fosse revelado da melhor forma.
São também muitos os casos em que este tipo de patologias dão origem a expressões
artísticas formidáveis especialmente em artes plásticas. A questão fica em aberto: como
será possível conhecer mecanismo? E com essa resposta será que a TMS poderá
restabelecer funções motoras?
A Música e o Cérebro
Provavelmente o desenvolvimento mais importante na investigação científica sobre a
música foi a descoberta de que a música é percebida através da parte do cérebro que
recebe os estímulos das emoções, sensações e sentimentos, sem antes ser submetida
aos centros cerebrais envolvidos com a razão e a inteligência. Schullian e Schoen
explicam este fenômeno: "Música, que não depende das funções superiores do cérebro
para franquear entrada ao organismo, ainda pode excitar por meio do tálamo – o posto de
intercomunicação de todas as emoções, sensações e sentimentos. Uma vez que um
estímulo foi capaz de alcançar o tálamo, o cérebro superior é automaticamente invadido,
e, se o estímulo é mantido por algum tempo, um contato íntimo entre o cérebro superior e
o mundo da realidade pode ser desta forma estabelecido."
Tempo e espaço não permitem uma abordagem completa da percepção musical. É
suficiente dizer que estudos nos últimos cinquenta anos têem trazido à luz algumas
descobertas bastante significativas, que podem ser resumidas como se segue:
- A música é percebida e desfrutada sem necessariamente ser interpretada pelos centros
superiores do cérebro que envolvem a razão e o julgamento.
- A resposta à música é mensurável, mesmo quando o ouvinte não lhe dá uma atenção
27 Cohen et al., 1993
41
consciente.
- Há evidências de que a música pode levar a mudanças de estados de espírito pela
alteração da química corporal e do equilíbrio dos electrólitos.
- Rebaixando o nível de percepção sensorial, a música amplifica as respostas à côr, toque
e outras percepções sensoriais.
- tem sido demonstrado que os efeitos da música alteram a energia muscular e promovem
ou inibem o movimento corporal.
- Música rítmica altamente repetitiva tem um efeito hipnótico.
- O sentido da audição tem um efeito maior sobre o sistema nervoso autônomo do que
qualquer outro sentido.
Uma das razões para o uso da música como terapia é que há influências no corpo através
de estímulos sonoros enviados ao cérebro. Algumas abordagens de musicoterapia são
usadas para recuperar habilidades motoras perdidas por doenças. Há várias formas de se
trabalhar com populações diversas e até com pacientes em coma, porque existem vários
níveis de coma desde o mais profundo, quando não se responde a nenhum estímulo, até
um coma mais leve, quando há resposta motora. Isto acontece pelo que foi dito
anteriormente: a música pode ser processada sem passar pelo chamado «cortex
superior», ficando no sistema límbico. Deste modo, mesmo em coma, a pessoa preserva
a sua memória sonora.
A explicação para aplicação em situações como essa ou com pessoas que sofreram
acidentes, tendo dificuldades de unir palavras como sequela, é que a música processa-se
no cérebro de modo diferente da linguagem falada ou escrita. Pode haver restituição do
funcionamento de determinadas regiões do cérebro que não se consegue através da fala
normal. Tanto pode ser feito com uma música tocada pelo musicoterapeuta como com
uma gravação. O cérebro vai receber e processar a música de modo diferente da fala. Por
essa razão um gago pode cantar sem gaguejar.
Uma sessão de musicoterapia dura em média uma hora e utiliza desde som, ruídos a
música propriamente dita. A musicoterapia abrange quatro áreas: a improvisação musical
através dos instrumentos, corpo e voz; a recriação musical, criando algo novo a partir da
música que existe; a audição musical, que é um método de passividade com a pessoa
ouvindo determinadas músicas; e a composição.
O paciente não precisa ser nenhum «expert» em música ou ter qualquer habilidade em
tocar instrumentos para se beneficiar do tratamento. Também não existe um estilo ideal
de música. Os sons são usados de acordo com cada situação e história de vida.
42
Bibliografia
Bibliografia:
Para além das referências indicadas em situações particulares ao longo do texto (vejamse nos rodapés) aqui se apresenta uma lista da bibliografia consultada:
1. Damasio H., Grabowski T,. Frank R., Galaburda AM., Damasio AR. The return of
Phineas Gage: clues about the brain from the skull of a famous patient. Science.
264(5162):1102-5, 1994.
2. Dr. Antonio Damasio's "Descarte's Error: Emotion, Reason and the Human Brain", Avon
Hearst, New York, 1995, with exposes fascinating material on the relationships between
brain, mind and emotion (see the on-line reviews on Serendip server, also in the Times
Literary Supplement)
3. Macmillan, M. Phineas Gage's Contribution to Brain Surgery .Australia Journal of the
History of Neurosciences 5(2), 1995.
4. What Happened to Phineas? Discover Magazine, January 1995.
For an interesting modern case, similar to Gage's, but caused by a bullet injury, see: A
Bullet to the Mind, by Franck Vertosick Jr. Discover Magazine, October 1996
5. Fisiologia Humana. Philippe Meyer. - Anatomia. Basmajian.
6. 7ª Edição. - Tratados de Fisiologia Médica. Guyton - Hall. 9ª
Edição. - Lippert Anatomia Texto e Atlas. 4ª Edição.
Espanha.
7. 5ª Edição 2000. Espanha. - Lippert Anatomia Texto e Atlas.
8. 4ª Edição. Espanha.
9. Neuroanatomy:
Alvin M. Burt, Ph. D
10. Principles of Neuroscience and Behavior:
Eric R. Kandel, James H. Schwartz, Thomas M. Jessell
11. Neuroanatomy:
A.R. Crossman, D. Neary
12. Bases da Neuroanatomia Clínica:
Paul A. Young, Paul H. Young
13. Neuroanatomia Texto e Atlas 2ª edição:
43
John H. Martin
14. Neuroanatomia Funcional:
Ângelo Machado
15. RESSONÂNCIA MAGNÉTICA FUNCIONAL: AS FUNÇÕES DO CERÉBRO
REVELADAS POR SPINS NUCLEARES
Roberto Covolan, Dráulio B. de Araújo, Antonio Carlos dos Santos e Fernando Cendes
16. Logothetis, N.K., Pauls J, Augath M, et al. "Neurophysiological investigation of the
basis of the fMRI signal". Nature 412, 150-157 2001.
Artigos não referenciados explicitamente:
17. Attwell, D. and Iadecola, C. "The neural basis of functional brain imaging signals".
Trends in Neurosciences 25, 621-625 2002.
[ Medline ]
18. Moll, J., Oliveira-Souza, R., Bramati, I.E., Grafman, J. "Functional networks in
emotional moral and nonmoral social judgments". Neuroimage 16, 696-703 2002.
[ Medline ]
19. Bookheimer, S. "Functional MRI of language: new approaches to understanding the
cortical organization of semantic processing". Annual Review of Neuroscience 25, 151-188
2002.
[ Medline ]
20. Haist, F., Gore, J.B., Mao, H. "Consolidation of human memory over decades revealed
by functional magnetic resonance imaging". Nature Neuroscience 4, 1139-1145 2001.
[ Medline ]
21. Wishart, H.A., Saykin, A.J. e McAllister, T.W. "Functional Magnetic Resonance
Imaging: Emerging Clinical Applications". Current Psychiatry Reports 4, 338-345 2002.
22. Araújo, D.B., Salles, A., Tedeschi, W., et al. "Spatiotemporal Patterns of Human
Navigation Investigated by MEG and fMRI" In: Proceedings of the 13th International
Conference on Biomagnetism, Jena. p.863 – 865. 2002.
23. Binder, J.R., Achten, E., Constable, R.T., et al. "Functional MRI in epilepsy". Epilepsia
43 (Suppl. 1), 51-63 2002.
24. Duong, T.Q., Yacoub, E., Adriany, G., et al. "High-Resolution, Spin-Echo Bold, ad CBF
fMRI at 4 and 7 T". Magnetic Resonance in Medicine 48, 589-593 2002.
Logothetis, N.K., Merkle, H., Augath, et al. "Ultra High-Resolution fMRI in Monkeys with
44
Implanted RF Coils". Neuron 35, 227-242 2002.
26. Kim, S-G e Ogawa, S. "Insights into new techniques for high resolution functional
MRI". Current Opinion in Neurobiology 12, 607-615 2002.
[ Medline ]
27. Bénar, C-G, Gross, D.W, Wang Y, et al. "The Bold response to interictal epileptiform
discharges". Neuroimage 17, 1182-1192 2002.
Curiosidades:
1 Neuroanatomia - Um Estudo Fotográfico - Fábio Bombarda >>
Um estudo fotográfico do Sistema Nervoso Central.Mais de 200 imagens de dissecções
realizadas no Instituto de Anatomia fotografadas por Fábio Bombarda.
http://neuroanatomy.cjb.net
2 Cuidado com a matéria branca
O cérebro dos mentirosos é diferente do das pessoas honestas, revela um estudo de uma
equipa da University of Southern California. Os cientistas concluíram que os mentirosos
compulsivos têm até 26% mais matéria branca no cérebro do que outros indivíduos. A
matéria branca do cérebro transmite informação enquanto a matéria cinzenta processa-a.
45
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