O Mercado de Bens e Serviços em Economia Aberta

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CAPÍTULO 14 - O MERCADO DE BENS E SERVIÇOS EM ECONOMIA
ABERTA
INTRODUÇÃO
Até agora, examinamos o mercado de câmbios e a balança de pagamentos, isoladamente
de outras variáveis macro-económicas. Nos próximos capítulos vamos integrar a taxa
de câmbios e a balança de pagamentos num modelo macro-económico simples. O
nosso objectivo é o de compreender melhor as interacções entre as variáveis
internacionais e domésticas, na determinação do desempenho macro-económico e da
eficácia da política macro-económica.
Esta área é muito debatida nos media. Críticos de uma abertura internacional afirmam
que os défices da balança de mercadorias reduzem o crescimento económico e
”desindustrializam” a economia americana. Os especialistas estão em desacordo sobre
se o défice comercial dos USA reflecte práticas comerciais injustas, um ambiente
atractivo para o investimento nos USA ou, simplesmente, a interacção entre as políticas
económicas domésticas e internacionais. Os opositores à NAFTA alegam que a abertura
do comércio com o México foi a causa da crise do peso em 1994. Críticos da União
Europeia preocupam-se com o facto do levantamento de barreiras entre os países da
União diminuir o controlo dos responsáveis pela condução de políticas macroeconómicas.
Estes assuntos complexos podem envolver a interacção de muitas variáveis económicas,
incluindo o produto, o nível de preços, o emprego, as taxas de câmbio e as taxas de juro.
Portanto, a perspectiva deste e dos próximos capítulos alternará entre uma análise de
equilíbrio parcial e geral. A primeira centra-se num menor número de interacções e a
segunda numa perspectiva mais geral. Veremos como muitos dos diferendos e
afirmações contraditórias sobre a macroeconomia internacional, resultam do facto de se
ignorar, ou compreender mal, as relações entre as análises de equilíbrio geral e parcial.
As afirmações que são verdadeiras para um mercado considerado isoladamente,
podem ser falsas para um mercado num contexto mais geral.
A nossa investigação da macroeconomia internacional assenta em dois mercados chave:
o mercado de bens e serviços domésticos (o objecto do presente capítulo) e o
mercado monetário e cambial (capitulo 15).
14.2 – AS MEDIDAS DO PRODUTO DE UM PAÍS
O mercado de bens e serviços produzidos num país é o primeiro bloco do nosso modelo
macro-económico aberto. As medidas do produto (conjunto de bens e serviços
produzidos) de uma economia são, o Produto Nacional Bruto (PNB) e, o Produto
Interno Bruto (PIB). Ambos medem a soma do valor de mercado de todos os bens e
serviços finais produzidos numa economia em determinado período. Vamos ver
alguns conceitos implícitos nestas definições.
Em primeiro lugar, o PNB e o PIB excluem muitos bens e serviços que não são
transaccionados no mercado. Assim, nenhuma destas medidas toma em consideração,
por exemplo, a comida produzida na quinta de um proprietário e por ele consumida, os
serviços domésticos prestados pelas donas de casa, apesar destes bens e serviços
contribuírem para o bem estar da sociedade. Ambas as medidas também ignoram a
produção de bens que provocam diminuição de bem-estar (insatisfação), tais como, o
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lixo, a poluição e o congestionamento, porque esses bens (aliás, males) não são
transaccionados no mercado. Portanto, tanto o PNB como o PIB não reflectem de
modo rigoroso o bem estar dos residentes de um país.
Em segundo lugar, o cálculo do PNB e do PIB implica a adição de valores de todos os
bens e serviços finais produzidos numa economia, avaliados a preços de mercado.
Isto é necessário para facilitar a agregação de bens e serviços de natureza muito diversa.
Em terceiro lugar, tanto o PNB como o PIB incluem apenas a produção final de bens
e serviços, não a dos bens e serviços intermediários; isto permite evitar a dupla
contagem. Se incluíssemos todos os valores da produção de silicone, de placas semicondutoras e da produção de computadores no PNB, estaríamos a contar a produção
de silicone três vezes. Isto porque tanto os valores das placas semi-condutoras, como
de computadores já incluem o valor do silicone, que é usado como um factor
produtivo.
Finalmente, tanto o PNB, como o PIB, medem a produção em determinado período.
Por exemplo, consideremos uma economia com um PNB de $8.083 biliões de dólares.
Se não especificarmos o período de tempo, este número dá pouca informação. Se
dissesse respeito a um dia, a produção seria enorme; se dissesse respeito a uma década
a economia seria diminuta.
A diferença entre o PNB e o PIB assenta nas suas definições. O PNB bruto refere-se ao
produto produzido pelos factores de produção de um país (dos nacionais de um
país) – independentemente da parte do mundo em que a produção é realizada. O
PIB bruto refere-se ao produto produzido dentro das fronteiras de um país –
independentemente da nacionalidade dos recursos produtivos. O produto de um
residente nos USA, trabalhando temporariamente na Alemanha, faz parte dos PNB
americano, mas não do PIB americano. Podemos chegar ao PNB a partir do PIB se
adicionarmos a este último os rendimentos recebidos dos factores detidos pelo país
no resto do mundo e, subtrairmos os rendimentos pagos pelo país aos factores do
resto do mundo. O quadro 14.1 apresenta esse cálculo para os USA durante vários
anos.
Até um período recente, a maioria dos países acentuava a importância do PIB nas suas
estatísticas, enquanto que os USA davam maior importância ao PNB. A partir de 1991
os USA começaram a dar mais importância ao PIB. Em países como a China que são
sobretudo fornecedores líquidos de factores para o resto do mundo, o PNB é maior do
que o PIB; para países, como o Brasil, que são importadores líquidos de serviços de
factores, o PNB é menor do que o PIB. Os pagamentos internacionais aos factores
produtivos não só incluem ordenados e salários, mas também juros, dividendos e lucros
das firmas.
14.3 - DETERMINAÇÃO DO PRODUTO EM ECONOMIA ABERTA
A melhor maneira de analisarmos o mercado de bens e serviços a um nível macroeconómico é considerarmos a economia como sendo uma firma gigante, a
Companhia Nacional, SA. A firma aufere rendimentos através do produto oferecido
aos preços de mercado. As receitas da firma são iguais ao valor do seu produto (o PNB
da economia); e estas receitas, servem para pagar os factores produtivos. Portanto, o
PNB da economia (representado pelas receitas da firma, Companhia Nacional, SA),
também é igual ao rendimento total das famílias residentes na economia (representado
pelos pagamentos aos factores pela Companhia Nacional, SA.). Esta igualdade entre o
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valor do produto ou PIB e, o valor do rendimento nacional, é importante para
compreender a determinação do nível de PIB de equilíbrio.
O próximo passo implica a análise das fontes de procura pelo produto da firma. A
Companhia Nacional, SA. pode vender o seu produto para quatro grupos básicos
de destinatários: as famílias residentes, ela própria, o governo e os estrangeiros.
Quando as famílias residentes compram bens e serviços elas estão a fazer gastos, ou
despesas de consumo, C. Quando a Companhia Nacional, SA. retém parte do seu
produto para produzir bens e serviços no futuro (máquinas, ferramentas), ela está a
fazer gastos de investimento, I. As autoridades regionais e locais compram uma
quantidade de bens e serviços, efectuando gastos do Governo, G. Finalmente, os
gastos dos estrangeiros em bens e serviços produzidos por uma economia
correspondem às exportações. Se subtrairmos as compras de bens produzidos no
estrangeiro a todas as rubricas mencionadas, ou seja, se subtrairmos os gastos com as
importações, imp., obtemos uma medida dos gastos totais com o produto doméstico.
Assim, podemos escrever os gastos totais com o produto da Companhia Nacional,
SA., E, como:
E= C + I + G + X-imp
(14.1)
O equilíbrio no mercado de bens e serviços exige que a sua quantidade procurada
(medida pelos gastos, E) seja igual à sua quantidade produzida (medida pelo produto
oferecido, PIB). O nível de produto para o qual o produto procurado é igual ao produto
oferecido é representado por Y. Ou seja:
Y (= PIB = E) = C + I + G + X – imp
(14.2)
Por outras palavras, em equilíbrio, o valor do produto oferecido por uma economia
(Y, no lado esquerdo da equação 14.2), deve igualar os gastos totais com esse produto
(C+I+G+X-imp, no lado direito da equação 14.2). Em termos da firma Companhia
Nacional, SA., o seu produto deve ser igual ás receitas obtidas com a sua venda. O
quadro 14.2 regista o PIB, o consumo das famílias (consumo privado), o investimento
das firmas (privado), os gastos do governo, as exportações e as importações, dos USA
para um conjunto de anos, ilustrando as relações das equações 14.1 e 14.2.
A equação 14.2 fornece o modelo básico para a nossa análise do mercado de bens e
serviços.
A variável Y representa tanto o valor do produto de uma economia, o PIB, como,
também, o rendimento total dos factores produtivos usados na produção desse
produto, ou seja, o rendimento nacional, RN.
O montante de despesas de consumo privado, C, depende do rendimento. Ou seja,
rendimentos mais elevados estão associados a despesas de consumo mais elevadas e
rendimentos menos elevados estão associados a despesas de consumo também menos
elevadas. Esta relação pode ser representada por C(Y+), onde o sinal + significa que
existe uma relação positiva entre o consumo e o rendimento. Quando o rendimento se
eleva o consumo eleva-se, mas numa quantidade menor do que o rendimento, pois o
restante montante da elevação no rendimento vai para poupanças. Os economistas
chamam à parte do aumento no rendimento que vai para consumo, a propensão
marginal a consumir, pmc. Trata-se de uma fracção, situada entre 0 e 1. Por exemplo,
se o rendimento nacional (Y) aumentar de $1000 e o consumo elevar-se em $800, a
propensão marginal a consumir, pmc=∆Y/∆C=$800/$1000=0.8.
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O investimento inclui quer as compras de novos equipamentos pelas firmas
(máquinas, fábricas, etc.), para produção futura, quer as mudanças nos stocks. O nível
de gastos (ou, despesas) de investimento depende, sobretudo, da taxa de juro i, que
mede o custo de oportunidade do uso dos fundos disponíveis, num projecto específico.
Isso é óbvio quando uma firma pede fundos emprestados para financiar um projecto de
investimento. Mas, mesmo quando uma firma usa fundos próprios, a taxa de juro
continua a medir o custo de oportunidade dos fundos investidos num determinado
projecto. É que esses fundos próprios poderiam ter sido aplicados,
alternativamente, num depósito bancário a render juros. Portanto, a taxa de juro
mede o custo de oportunidade dos fundos usados no investimento – independentemente
dos fundos serem, ou não, emprestados. Quando a taxa de juro está a um nível baixo,
também o custo de oportunidade é baixo e a firma inicia um número considerável de
projectos. Quando as taxas de juro são relativamente elevadas o custo de oportunidade
de investir também se torna elevado, e um menor número de projectos permanece
viável. Podemos representar esta relação negativa entre a taxa de juro e o
investimento por I(i-).
As determinantes dos gastos do governo são explicadas pelas teorias das finanças
públicas e da escolha pública. No nosso modelo vamos admitir que os gastos do
governo são determinados exogenamente, e representados por G.
As exportações, ou compras por estrangeiros de bens e serviços produzidos na
economia doméstica, dependem sobretudo, do rendimento dos países estrangeiros, e
dos preços relativos domésticos e estrangeiros. Para manter uma certa simplicidade
examinamos um país de cada vez, admitindo que o rendimento no país estrangeiro,
Y*, é uma constante. Níveis mais altos de Y*, indicam níveis mais altos de gastos
estrangeiros na compra de bens e serviços domésticos, ou seja, níveis mais altos de
exportações pelo país doméstico. Portanto, existe uma relação positiva ente o
rendimento estrangeiro e as exportações da economia doméstica.
A procura de exportações também depende nos seus preços em relação aos preços
de bens e serviços semelhantes produzidos no estrangeiro, ou seja, nos preços
relativos. O preço de um bem produzido na economia doméstica é P, ou seja, o
preço doméstico, expresso em moeda doméstica. O preço em moeda doméstica de
um bem produzido no estrangeiro é igual ao seu preço em moeda estrangeira,
multiplicado pela taxa de câmbio, a qual é o preço em moeda doméstica de uma
unidade de moeda estrangeira (taxa de câmbio ao incerto). Portanto, podemos definir
R, o preço relativo dos bens e serviços domésticos, como:
R≡ P/ e P*
Quanto mais elevado for preço relativo, R, tanto mais caros são os bens produzidos
na economia doméstica em relação aos bens estrangeiros, e menor será o volume
de exportações da economia doméstica. Quanto mais baixo for o preço relativo, tanto
mais baratos serão os bens domésticos em relação aos bens estrangeiros, e tanto maior
será o volume de exportações domésticas.
Em resumo, as exportações, X, variam positivamente com o rendimento
estrangeiro (Y*), e negativamente com o preço relativo dos bens domésticos (P/eP*),
ou seja: X(Y*+, R -).
O preço relativo dos bens domésticos e estrangeiros, R, é chamado de taxa de
câmbio real. A moeda doméstica exibe uma apreciação real quando R sobe e, uma
depreciação real quando R desce. Uma apreciação real diminui as exportações do
país doméstico e uma depreciação real tem um efeito contrário. Notemos que uma
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apreciação nominal da moeda doméstica (i.e., uma queda em e) traduz-se numa
apreciação real se não existirem movimentos compensatórios nos níveis de preços
doméstico e estrangeiro – ou seja, como R = (1/e) x (P/P*), se (P/P*) não mudar, então R
sobe se a moeda doméstica aprecia, isto é, se a taxa de câmbio, e, baixa. Do mesmo
modo, uma depreciação nominal (uma elevação em e), se não for acompanhada por
nenhuma mudança em nenhum dos preços, doméstico e estrangeiro, implica uma
depreciação real.
As determinantes das importações são o espelho das determinantes das exportações. As
importações dependem do rendimento doméstico e dos preços relativos dos bens
domésticos e estrangeiros, ou seja, da taxa de cambio real. As importações crescem
com o rendimento doméstico e com o preço relativo dos bens domésticos, imp ( Y+,
R+). A parte de qualquer elevação no rendimento que vai para importações é
chamada de propensão marginal a importar (pmi), a qual, é uma fracção entre 0 e 1.
Se um aumento no rendimento de $1000 provocar um aumento das importações de
$100, então a propensão marginal importante é ∆imp/∆Y=$100/$1000=0.1.
Agora já podemos desenhar graficamente a relação entre o rendimento nacional e os
gastos totais nos bens e serviços produzidos numa economia. Os painéis da fig. 14.1
combinam o consumo, o investimento, os gastos do governo, as exportações e as
importações, de modo a construir os gastos totais. O painel (a) ilustra a relação positiva
entre o consumo e o rendimento; a inclinação da recta do consumo é a propensão
marginal a consumir, ou ∆C/∆Y. A recta do consumo não parte da origem mas tem
um intercepto vertical positivo. Este intercepto ilustra o facto de mesmo quando o
rendimento se reduz a zero, o consumo continua a ser positivo, sendo sustentado
por poupanças acumuladas.
O painel (b) apresenta uma recta horizontal pois admitimos que o investimento é
independente do rendimento. A altura da recta do investimento depende da taxa de juro.
As rectas representando os gastos do governo e as exportações (painéis c) e d)) também
são horizontais, pois admitimos que ambos são independentes do rendimento. O painel
(e) apresenta a recta das importações com inclinação positiva, para ilustrar o facto das
importações dependerem positivamente do rendimento. A inclinação dessa recta traduza
propensão marginal a importar.
Os gastos totais (painel f) são simplesmente a soma dos vários gastos (note-se que
as importações entram na soma com um sinal negativo). A inclinação da recta dos
gastos totais dá o efeito de uma mudança no rendimento nos gastos totais (∆E/∆Y).
Uma elevação no rendimento eleva duas das componentes dos gastos: o consumo,
num montante dado pela propensão marginal a consumir, e as importações, num
montante dado pela propensão marginal a importar. A inclinação da recta dos
gastos é igual à soma destes efeitos, onde a mudança nas importações entra, de
novo, com o sinal negativo. Portanto, a inclinação da recta de gastos totais é igual a
(pmc-pmi).
O painel f) da fig. 14.1 ilustra a relação entre o rendimento nacional, ou PIB (medido
no eixo horizontal) e os gastos totais nos bens e serviços domésticos (medidos no eixo
vertical). O mercado de bens e serviços estará em equilíbrio quando o rendimento
nacional ou PIB for igual aos gastos totais (equação 14.2). Podemos facilmente
encontrar o ponto que satisfaz esta condição – desenhando, na fig. 14.2, uma linha de
45%.
Relembremo-nos que ao longo de uma recta de 45% as quantidades medidas nos eixos
horizontal e vertical são iguais; isto significa que o rendimento nacional, medido no
eixo horizontal, é igual à despesa nacional (gastos totais), medida no eixo vertical. O
nível de rendimento, ou PIB, de equilíbrio é dado por Y0.
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A níveis de rendimento inferiores Y0 (tais como Y1) os gastos excedem o valor do
produto. Quando as firmas vendem mais bens e serviços do que produzem, os seus
stocks começam a decrescer e elas começam a produzir mais. O resultado é uma
elevação no valor do produto Y, que se move em direcção a Y0. Por outro lado, a
níveis de rendimento superiores a Y0, (tais como Y2), o rendimento excede os gastos
feitos para os comprar. Os stocks começam a acumular-se e as firmas respondem
diminuindo a produção. O rendimento cai em direcção a Y0. O equilíbrio em Y0, na
fig.14.1, baseia-se na hipótese de que i,Y*, G e R se mantêm fixos. Uma mudança em
qualquer destas variáveis deslocará a recta da despesa, dando origem a um rendimento
de equilíbrio diferente.
Agora, que determinamos o nível de rendimento de equilíbrio, vamos analisar os feitos
do comércio internacional sobre o rendimento de equilíbrio.
COMÉRCIO INTERNACIONAL E MERCADO DE BENS E SERVIÇOS
A balança de transacções correntes é uma das componentes do mercado de bens e
serviços doméstico. A relação entre o rendimento nacional e a balança de transacções
correntes é uma relação interactiva; ou seja, o rendimento afecta a balança de
transacções correntes e vice-versa. Podemos ilustrar essa interacção na fig. 14.3, onde se
combina os painéis das exportações e importações da fig. 14.1. Relembremo-nos que as
exportações são independentes do nível de rendimento doméstico, enquanto que as
importações crescem com esse rendimento.
Mantendo constante o rendimento estrangeiro, (Y*) e os preços relativos dos bens
domésticos e estrangeiros, a taxa de câmbio real R, a balança de transacções correntes
estará saldada (sem excedentes , nem défices) a um único nível de rendimento, (Yca), na
fig. 14.3. Quando o rendimento se reduz para um nível abaixo de Yca, a diminuição
resultante nas importações produz um excedente na balança de transacções correntes
(imp. < X). Quando o rendimento se eleva acima de Yca, o aumento resultante nas
importações produz um défice na balança de transacções correntes (imp > X). Não
existe necessariamente uma correspondência entre o nível de rendimento a que o
mercado de bens e serviços está em equilíbrio e o nível de rendimento que restabelece o
equilíbrio da balança de transacções correntes (Yca, na fig. 14.3). Apenas uma
coincidência é que os tornaria iguais.
Até aqui, centramos a nossa atenção nos efeitos do rendimento na balança de
transacções correntes. Mantendo-se todas as outras variáveis constantes, rendimentos
mais elevados estão associados a défices das contas de transacções correntes, e
rendimentos mais baixos a excedentes da mesma balança. Mas, as outras variáveis nem
sempre se mantém iguais. Também temos de considerar o efeitos de mudanças da
balança de transacções correntes no rendimento. Suponhamos, por exemplo, que um
aumento no rendimento estrangeiro de Y*0 para Y*1, provoca um aumento nas
exportações, deslocando a recta dos gastos totais para cima, como é indicado no painel
(a) da fig. 14.4. Os maiores gastos no produto doméstico, esgotam os stocks, o que leva
as firmas a aumentarem a sua produção. O nível de equilíbrio do rendimento doméstico
eleva-se, de Y0 para Y1. A balança de transacções correntes muda para um excedente,
mas num menor volume do que o aumento inicial nas exportações. O aumento nas
exportações faz aumentar o rendimento doméstico, o que, por sua vez, eleva as
importações e anula parcialmente o efeito inicial positivo na balança de transacções
correntes. Quando o ajustamento estiver completado, o rendimento é mais elevado do
que no ponto de equilíbrio inicial e a balança de transacções correntes ter-se-á movido
para um excedente. Do mesmo modo, uma diminuição nas exportações causará um
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movimento da balança de transacções correntes para um défice e, provocará um a
diminuição no rendimento, que anulará parcialmente o referido défice.
Estes resultados são simples mas, importantes, pois denunciam um erro vulgar.
Anteriormente, defendemos que, mantendo todas as outras variáveis constantes, um
aumento no rendimentos conduzem a um défice na balança corrente (através de um
aumento nas importações) e, uma diminuição no rendimento a um excedente (através de
uma diminuição nas importações). Mas, a fig 14.4 ilustra uma elevação no rendimento
que é acompanhada por um movimento em direcção a um excedente na balança
corrente. Não existe contradição entre as duas linhas de raciocínio. Assim, na Fig. 14.4
podemos ilustrar essas contradições, distinguindo entre movimentos ao longo das curvas
de gastos e deslocações nessas curvas.
Uma mudança no rendimento doméstico (representada por um movimento ao longo da
curva de gastos na fig. 14.4), muda as importações na mesma direcção. O resultado é
que qualquer aumento no rendimento provoca um défice na balança corrente, enquanto
que uma diminuição do rendimento conduz a um excedente na balança corrente. Mas,
qualquer
mudança nas exportações, ou nas importações, causada por algo que não seja uma
mudança no rendimento doméstico (como, por exemplo, uma mudança no
rendimento
estrangeiro), desloca a curva de gastos no painel a) da fig. 14.4 e provoca mudanças no
nível de
rendimento de equilíbrio. O novo nível de rendimento aparece no painel b) através de
um
novo valor para a balança corrente, correspondente à intersecção da recta das
importações e da nova recta das exportações,
ao nível do novo rendimento de equilíbrio. O aumento nas importações provoca um
menor
excedente da balança corrente; mas, apesar de tudo, a elevação no rendimento
acompanha um
movimento em direcção a um excedente na balança corrente.
A interacção mútua, entre o rendimento e a balança corrente, implica um certo cuidado
nas
conclusões. Em algumas situações o rendimento pode elevar-se, enquanto
a balança corrente se move em direcção a um défice; em outras, o rendimento pode
elevar-se, enquanto a balança corrente se move em direcção a um excedente. A relação
depende das causas da mudança inicial.
UMA NOTA SOBRE A TERMINOLOGIA
Um movimento em direcção a um excedente na balança corrente é referido como uma
melhoria da balança corrente e um movimento em direcção a um défice, uma
deterioração, ou pioria, da balança corrente. Embora esta terminologia seja
conveniente no sentido em que é mais fácil dizer “o défice da balança
corrente melhorou” do que dizer “a balança corrente moveu-se em
direcção a um excedente”, ou “ o défice da balança corrente baixou”, no
entanto, também pode ser enganadora. Falar de um movimento em
direcção a uma melhoria implica que esse movimento seja considerado
desejável – o que nem sempre é o caso.
Os excedentes não são necessariamente bons, tal como, os défices não são
necessariamente maus. De facto, as economias que crescem
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rapidamente em relação ao resto do mundo e que fornecem muitas
oportunidades ao investimento, tendem a exibir défices da balança
corrente. Esses défices são contrabalançados por entradas de capitais
(excedentes da balança de capitais) à medida em que os investidores
estrangeiros se aproveitam das oportunidades de negócio dadas pela
economia em crescimento. Do mesmo modo, um excedente pode (mas
nem sempre é esse o caso), reflectir uma economia em estagnação, em
que as importações caem com a diminuição no rendimento e os
investidores estrangeiros não vislumbram boas oportunidades de
investimento. Apenas podemos nos pronunciar sobre os aspectos
positivos de um excedente ou de um défice à luz da situação económica
global de um país.
Existe uma outra razão para evitar palavras com conotações positivas, ou negativas, pois
os défices e os excedentes afectam os indivíduos, ou grupos, de modo
distinto.
Portanto é necessário habituarmo-nos a evitar a utilização de terminologia errada, ou
seja, a que emprega conotações positivas, ou negativas.
MUDANÇAS NO MERCADO DE BENS E SERVIÇOS
Até agora, as variáveis mantidas constantes incluíam as compras do governo (G), os
preços relativos dos bens domésticos e estrangeiros, ou seja, a taxa de
câmbio real, R e a taxa de juro (i). Podemos determinar os efeitos de cada
uma destas variáveis sobre o rendimento e a balança corrente, usando a
análise gráfica. Quando nos referimos aos “níveis de equilíbrio do
rendimento, queremos dizer o nível particular de rendimento que
representa o equilíbrio no mercado do produto, dados os valores da s
restantes variáveis, incluindo G, i, Y, P, P*, a taxa de câmbio, e, bem
como as propensões marginais a consumir e a importar. Uma mudança
em qualquer dessas variáveis muda o nível de rendimento para o qual o
valor dos produtos oferecidos, Y, é igual ao valor dos gastos, E.
A POLÍTICA FISCAL E O MULTIPLICADOR DOS GASTOS
Uma mudança nas compras de produtos pelo governo, é um exemplo de uma política
fiscal, ou seja, uma política que usa os gastos do governo e os impostos
para afectarem o desempenho de uma economia. Como os gastos do
governo são uma das componentes dos gastos totais em bens domésticos
(equação 14.4), o efeito inicial de uma mudanças nos gastos do governo é
uma idêntica mudança nos gastos totais. Na fig. 14.5, representamos um
aumento nos gastos, de G0 para G1. O rendimento de equilíbrio eleva-se e
a balança corrente move-se em direcção a um défice.
A dimensão dos efeitos de uma política fiscal sobre o rendimento, depende do
multiplicador dos gastos. Um aumento de $1 nos gastos do governo, gera
um aumento do rendimento de $1 vezes o multiplicador das despesas. O
valor do multiplicador é dado por 1/(1-pmc+pmi), em que pmc é a
propensão marginal a consumir e pmi é a propensão marginal a importar.
Uma pmc alta eleva o valor do multiplicador, pois faz com que um
aumento no rendimento se transforme num aumento idêntico nos gastos
de consumo. Uma elevada propensão marginal a importar, diminui o
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valor do multiplicador, pois o rendimento gasto nas importações “foge”
da economia doméstica (sai para o exterior).
Suponhamos, por exemplo, um aumento incial de $1000 nos gastos do governo (G1-G0).
O rendimento eleva-se, de imediato, em $1000. A elevação em $1000 do
rendimento eleva os gastos no produto doméstico em $1000 (pmc-pmi).
Esta segunda etapa de aumento nos gastos resulta num aumento adicional
do rendimento, a partir do qual os beneficiários gastam $1000 (pmcpmi)(pmc-pmi) no produto doméstico. Este processo – chamado de efeito
multiplicador etapa a etapa, pois os gastos adicionais passam para a
próxima etapa através de uma elevação no rendimento – continua, até
que os gastos do governo iniciais de $1000 tenham aumentado o
rendimento também de $1000 (1-pmc+pmi). Portanto, a mudança total no
nível de rendimento de equilíbrio, causada por uma mudança inicial nos
gasto do governo é:
Y1-Y0 = [1/1-pmc+pmi)] (G1-G0)
Como uma elevação nos gastos do governo aumenta o rendimento, as importações
elevam-se e a balança corrente move-se em direcção a um défice,
como se pode ver no painel b) da fig. 14.5.
OS PREÇOS RELATIVOS DOS BENS DOMÉSTICOS E ESTRANGEIROS: A
TAXA DE CÂMBIO REAL
As mudanças nos preços relativos dos produtos domésticos e estrangeiros, ou taxa de
câmbio real , R, também alteram o rendimento de equilíbrio e a balança corrente. Uma
apreciação real da moeda doméstica, ou uma elevação em R, reflecte que os produtos
domésticos se tornam mais caros relativamente aos estrangeiros; ou, uma elevação em
R, reflecte que os produtos domésticos estão a ficar mais caros relativamente aos
produtos estrangeiros. As exportações caem (o que é demonstrado por uma deslocação
na recta das exportações, para baixo e para a esquerda, na fig. 14.6) e as importações
elevam-se (equivalente a uma deslocação da curva das importações, para cima e para a
direita). Estas respostas resultam do facto das pessoas desviarem os seus gastos dos
bens domésticos, agora mais caros, para os bens estrangeiros, agora mais baratos.
Os gastos totais nos produtos domésticos caem, e a recta dos gastos totais desloca-se
para baixo. À medida em que diminuem os gastos nos produtos domésticos, acumulamse os stocks e as firmas domésticas diminuem a produção. O rendimento cai num
montante idêntico ao à dimensão da descida nos gastos totais multiplicada pelo
multiplicador dos gastos, (1/[1-pmc+pmi]). Com a diminuição no rendimento as pessoas
cortam nos seus gastos, incluindo os gastos nos produtos importados. A balança
corrente move-se em direcção a um défice, mas em menor dimensão do que o impacte
inicial da mudança em R, devido ao efeito parcialmente anulador, que resulta da
diminuição no rendimento e nas importações.
Os preços relativos, ou taxa de câmbio real, são, muitas vezes, o resultado de políticas
económicas direccionadas. Estas políticas destinadas a alterarem a repartição dos gastos
entre produtos domésticos e estrangeiros, são chamadas de políticas de deslocações nos
gastos (expenditure-switching policies).
Como a taxa de câmbio nominal entra na determinação dos preços relativos dos
produtos domésticos e estrangeiros, a chamada taxa de câmbio real, R=P/eP*,
mudanças na taxa de câmbio nominal, quer sob um regime de câmbios fixos, como
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flexíveis, pode alterar os preços relativos, pelo menos no curto prazo. Num regime de
câmbios fixos, uma desvalorização nominal (uma elevação na taxa de câmbio nominal,
e) baixará o preço relativo dos produtos domésticos (ou, gerará uma desvalorização
real), desde que os preços , P e P*, não respondam, anulando o efeito da elevação em e.
O mesmo se passa em relação no caso de uma depreciação num regime de câmbios
flexíveis. No entanto, veremos em capítulos posteriores que existem razões para duvidar
que uma desvalorização ou depreciação, deixem os preços P e P* inalterados no longo
prazo.
Este efeito da taxa de câmbio nos preços relativos tem desempenhado um importante
papel nas políticas económicas internacionais. Durante a Grande Depressão dos anos
30, os países procuravam desesperadamente aumentar as suas exportações, como um
meio de combater o desemprego. País sobre país, desvalorizaram a suas moedas num
esforço para atingirem uma desvalorização real e uma vantagem competitiva à custa
dos seus parceiros nas trocas. Essas desvalorizações, tal como, qualquer outra política
destinada a beneficiar um país à custa de outros, eram designadas de políticas de
extorsão aos vizinhos (beggar-thy-neighbours policies). As desvalorizações nominais
falharam, muitas vezes, o objectivo pretendido, pois quando um país começava a
desvalorizar a sua moeda era, logo, seguido pelo seu parceiro, que desvalorizava a sua
moeda em retaliação, o que deixava a taxa de câmbio e os preços relativos intactos. Ao
mesmo tempo, as políticas proteccionistas tais como, por exemplo, a tarifa SmootHawley nos EUA, estavam na moda, eliminando a possibilidade do comércio
internacional empurrar a economia mundial para uma recessão.
Os efeitos competitivos de mudanças na taxa de câmbio real continuam a fazer-se sentir
no mundo. A apreciação real do dólar em relação a outras moedas, que ocorreu no início
da década de 80, despertou pedidos de adopção de políticas de depreciação do dólar,
para reduzir o défice da balança corrente e elevar o rendimento nos EUA. As industrias
americanas de exportação tradicionais, tais como os produtores agrícolas, culparam a
apreciação do dólar, para desculparem a sua incapacidade de exportarem. As indústrias
que concorriam com as indústrias importadoras, como, por exemplo, a indústria
automóvel e de calçado, viam as importações das concorrentes crescerem, culpando a
apreciação do dólar. Tal como em 1930, as pressões políticas proteccionistas cresceram.
Mais recentemente, o yuan chinês depreciou-se, em termos reais, em relação ás outras
moedas asiáticas, tais como o won da Coreia do Sul, que foram mais atingidas pela crise
asiática. As indústrias chinesas perderam os seus mercados para as indústrias Coreanas
e pedem ao governo chinês que as protejam.
Os movimentos nas taxas de câmbio nominais, a menos que sejam acompanhados por
movimentos contraditórios nos preços, tem sempre efeitos redestributivos na economia
doméstica. As indústrias orientadas para a exportação e as indústrias que
concorrem com as importações (de substituição das importações) perdem, e as
indústrias orientadas para o mercado domésticos (de produtos não
transaccionáveis) ganham com as
apreciações da moeda doméstica. Os
consumidores domésticos também ganham à medida em que preço em moeda
doméstica dos bens importados cai, fazendo baixar o custos de vida. As depreciações da
moeda tem efeitos opostos, ajudando as indústrias viradas para o comércio internacional
à custa das indústrias de produtos não transaccionáveis e dos consumidores domésticos.
Estes efeitos redestributivos ajudam a explicar a razão pela qual as taxas de câmbio
nunca são entendidas como estando ao nível correcto por todas as pessoas. Durante a
década de 70, o dólar depreciou-se bastante em relação a outras principais moedas e os
políticos perderam apoios. No inicio da década de 80 passou-se o contrário: o dólar
apreciou-se em relação às outras moedas e surgiram os apoios a medidas de depreciação
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do dólar e proteccionistas, destinadas a diminuírem o défice americano da balança de
transacções correntes.
Nos finais da década de 80 e inícios da década de 90, o dólar depreciou-se em relação ás
principais moedas, em especial em relação ao yen e ao marco alemão, uma tendência
que os políticos desejavam alterar através de intervenções no mercado cambial. Nos
finais da década de 90, a apreciação do dólar tornou a explicar as notícias contra as
depreciações das moeda asiáticas.
A CURVA J
Acabamos de defender que uma depreciação real (ou uma desvalorização real) da
moeda doméstica diminui o preço relativo dos bens domésticos, aumenta as
exportações, reduz as importações e move assim, a balança corrente para um excedente.
Este processo de ajustamento, contudo, não ocorre instantaneamente. Na realidade, no
curto prazo, uma depreciação, ou desvalorização, da moeda doméstica pode até
empurrar a balança corrente para um défice maior. Para vermos a razão, vamos escrever
a expressão da balança corrente, na equação 14.5:
O saldo da balança corrente = (preço das exportações x quantidade das exportações) –
(preço das importações x quantidade das importações) = (P x QX) – ([e x P*] x Qimp)
(14.5)
Onde:
QX e Qimp, representam, respectivamente, as quantidades de exportações e importações
de produtos.
Quando se eleva a taxa de cambio nominal, o preço das importações eleva-se de
imediato, mas, a quantidade das importações pode levar algum tempo a diminuir, pois
as importações e exportações baseiam-se em encomendas feitas meses antes – antes da
desvalorização, ou depreciação. Se assim for, o valor das importações elevar-se-á no
curto prazo. Do mesmo modo, uma depreciação da moeda doméstica torna as
exportações mais atraentes aos olhos dos compradores estrangeiros, mas eles podem
levar algum tempo a ajustarem-se à mudanças nos preços. Assim, um ajustamento lento
das quantidades a mudanças nos preços relativos, causadas pela depreciação ou
desvalorização da moeda doméstica, podem implicar um maior défice na balança
corrente.
À medida em que o tempo passa (i.e., no longo prazo), as quantidades importadas e
exportadas ajustam-se. A quantidade das importações cai e a das exportações eleva-se.
Esta distinção entre os efeitos de curto e longo prazos, de uma depreciação, ou
desvalorização, real da moeda doméstica é chamada de curva J. A fig. 14.7 ilustra
este fenómeno. No eixo horizontal medimos o tempo; no eixo vertical o saldo da
balança corrente. No inicio, a balança corrente regista um défice. A desvalorização, ou
depreciação, da moeda doméstica ocorre no momento t0. Inicialmente, o défice da
balança corrente eleva-se, pois eleva-se o preço em moeda doméstica dos produtos
importados. À medida em que o tempo passa, as quantidades exportadas e importadas,
começam a ajustar-se. As receitas da exportações começam a elevar-se e as despesas
nos produtos importados caem. O défice pára de crescer e a balança corrente move-se
em direcção a um excedente. O caminho percorrido pela balança corrente ao longo
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do tempo, provocado pela elevação em e, tem um traçado semelhante à letra J. Será
que a curva J é uma mera curiosidade teórica, ou existem provas de que ela realmente
descreve os efeitos de mudanças nas taxas de câmbio? A resposta não é simples. A
presença, ou ausência, dos efeitos descritos pela curva J depende das elasticidades das
procuras por importações e exportações. Como essas elasticidades diferem de país
para pais e de período para período, a curva J é observada em alguns casos e, noutros
não. A experiência recente sugere que os países industriais passam pelos efeitos da
curva J durante seis meses a um ano, após a depreciação, ou desvalorização. Mas
mesmo nos casos de uma curva J pronunciada causada por baixas elasticidades de curto
prazo, a evidência mostra elasticidades de longo prazo suficientemente altas para fazer
com que as depreciações, ou desvalorizações, coloquem a balança corrente num
excedente.
TAXAS DE JURO
Mudanças nas taxas de juro alteram o rendimento de equilíbrio, pois mudam o
investimento. Uma elevação na taxa de juro desencoraja o investimento. Como as
despesas de investimento são uma das componentes dos gastos totais, uma queda no
investimento reduz os gastos totais e causa uma diminuição no rendimento. Isto aparece
ilustrado na fig. 14.8, na qual a taxa de juro se elevou de i0 para i1. A diminuição no
rendimento é igual à diminuição nas despesas de investimento multiplicada pelo
multiplicador dos gastos (1/[1-pmc+pmi)]). A diminuição no rendimento reduz as
importações e, conduz a balança corrente para um excedente. Ainda não temos a teoria
que explica a razão pela qual as taxas de juro mudam, mas estudá-la-emos no
capitulo 15, quando adicionarmos o mercado monetário.
RESUMO DOS EFEITOS SOBRE O RENDIMENTO E SOBRE A BALANÇA
CORRENTE
As mudanças nas variáveis que aumentam os gastos totais sobre os produtos
domésticos, também aumentam o rendimento de equilíbrio no mercado do produto.
Essas mudanças incluem aumentos nos gastos do governo, ou no rendimento
estrangeiro e diminuições nos preços relativos dos produtos domésticos, ou na taxa de
juro doméstica. O Quadro 14.3 resume esses efeitos.
Aumentos nos gastos do governo e diminuições nas taxas de juro conduzem a balança
corrente para um défice. Aumentos no rendimento estrangeiro, ou diminuições nos
preços relativos dos produtos domésticos (quer sejam causados por uma queda em P,
uma elevação em P*, ou em e), conduzem a balança corrente para um excedente.
INTERDEPENDÊNCIA: PROTECCIONISMO, RENDIMENTO E A BALANÇA
CORRENTE
Apesar da popularidade do proteccionismo para dar resposta a um défice da balança
corrente, a análise económica sugere que se trata de uma resposta inadequada e, por
vezes, prejudicial para a economia mundial. Os problemas com o proteccionismo
incluem repercussões dos seus efeitos adversos sobre as economias dos parceiros
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comerciais, a possibilidade de retaliação, e as ineficiências económicas, devido ás
barreiras ao comércio livre.
Tal como as exportações são uma fonte de procura para a produção doméstica, as
importações são uma fonte de procura para as economias dos parceiros comerciais. O
proteccionismo por parte de um país, se conseguir reduzir a sua procura por produtos
estrangeiros, reduz também os rendimentos estrangeiros. Esta redução torna-se a
repercutir na economia doméstica, através da redução na procura de exportações. Com
essas interligações entre as economias, as reduções, feitas através de proteccionismos
artificiais nas importações, resultam em reduções nas exportações.
A história da legislação proteccionista torna evidente que medidas proteccionistas
implementadas por um país, também levam à adopção das mesmas medidas por outros
países. Qualquer tipo de políticas de extorsão-do-vizinho espalha-se rapidamente entre
os outros países. Como as exportações de cada país são as importações dos seus
parceiros comerciais, qualquer esforço bem sucedido de melhorar a sua balança corrente
produz efeitos sobre a balança corrente desses parceiros. A retaliação é uma razão
adicional pela qual não devemos acreditar que as medidas proteccionistas podem
reduzir as importações, sem reduzir as exportações. Na realidade, se o proteccionismo
muda os gastos em bens estrangeiros para bens domésticos em todos os países, os saldos
das balanças correntes permanecem inalterados, se todas as outras variáveis se
mantiverem inalteradas, pois as exportações diminuem no mesmo montante do que as
importações.
Finalmente, a razão mais importantes para evitar medidas proteccionistas foram
expostas nos capítulos 2 a 11. O comércio livre permite produzir a quantidade máxima
de produtos a partir de recursos escassos.
OS DÉFICES GÉMEOS
Os défices gémeos foram um dos temas mais populares nos media americanos, durante
as décadas de 80 e 90. Este termo refere-se à combinação de um défice orçamental e
de um défice da balança corrente. Em que sentido é que os dois défices são gémeos?
Os défices orçamentais são iguais ao excesso das compras do governo sobre os
impostos líquidos (G-T), enquanto que os défices da balança corrente são iguais ao
excedente das importações sobre as exportações. Dadas essas definições, não se vê a
ligação directa entre os dois.
Repetindo a equação 14.2, sabemos que o rendimento nominal é igual á soma dos
gastos de consumo, de investimento, do governo, e do saldo da balança corrente, ou
exportações líquidas (CA = X-imp):
Y=C+I+G+X-imp = C+ I + G + CA
Reagrupando a equação 14.6 podemos ver que Y-(C+I+G) = CA, ou seja, que a balança
corrente de um país traduz a diferença entre o rendimento nacional (Y) e os gastos dos
residentes em produtos (C+I+G). Se os residentes compram mais do que o país
produz, ele incorre num défice da balança corrente (as importações são superiores às
exportações) e o país tem de pedir emprestado, para pagar o excesso de gastos. Na
perspectiva da balança de pagamentos, isto equivale a dizer que um défice da balança
corrente tem de ser coberto por um excedente da balança de capitais, ou uma
diminuição na riqueza liquida do país. Um país que produz mais do que compra aos
seus residentes, exibe um excedente da balança corrente e, empresta-o aos
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estrangeiros. O excedente da balança corrente é contrabalançado por um défice da
balança de capitais, ou seja, por um aumento na riqueza externa do país.
Do ponto de vista das famílias que recebem o rendimento nacional, existem três
aplicações para esse rendimento: a) ele pode ser gasto em consumo b) pode ser pago
ao governo sob a forma de impostos e c) pode ser poupado (S):
Y= C + T + S
Combinando e reagrupando as equações 14.6 e 14.7 obtemos a expressão que realça a
relação enter o défice orçamental e o défice da balança corrente:
S – I = (G-T) + (X-imp) = (G-T) + CA
A diferença entre poupança e investimento na economia (S-I) deve igualar a soma do
excedente orçamental (G-T<0), ou o défice orçamental (G-T>0) e o excedente da
balança corrente (CA >0), ou o défice da balança corrente (CA<0). Os dois termos no
lado direito da equação 14.8 são “gémeos”, no sentido em que para dados valores da
poupança e do investimento, uma mudança num é acompanhada por mudanças
contrárias no outro; quanto maior for o défice orçamental (ou seja, quanto maior for
G-T), tanto maior o défice da balança corrente. Dados os níveis de poupança privada
e investimento na economia, quando o governo gasta mais do que recebe de receitas,
o país tem de pedir emprestado no estrangeiro para financiar os seus gastos
(lembrem-nos de que um défice da balança corrente implica um excedente da balança
de capitais ou um empréstimo liquido no estrangeiro)
Podemos reagrupar os termos da equação 14.8 obtendo:
I = S – (G-T) – CA
14.9
Uma economia aberta tem três fontes de financiamento do investimento: a poupança
doméstica, um excedente orçamental, ou empréstimos no estrangeiro. A poupança
representa um adiamento do consumo presente que liberta fundos para financiar
projectos de investimento, os quais aumentam o produto futuro. Um excedente
orçamental resulta do governo não gastar todas as receitas de impostos (G-T<0);
podemos considerar isto como uma poupança do governo que pode financiar projectos
de investimento. A soma da poupança privada (S) e da poupança publica (-(G-T)) é
chamada de poupança nacional. Finalmente, o país pode importar mais produtos do que
exporta (CA<0), usar as importações liquidas para financiar projectos de investimento e,
pedir emprestado aos estrangeiros.
Numa outra perspectiva podemos reagrupar a equação 14.8 para concentrar a nossa
atenção sobre a poupança privada na economia :
S= I + (G – T ) + CA
14.10
Quando os indivíduos poupam, essa poupança é canalizada para um dos seguintes fins:
projectos de investimento domésticos; compras de títulos emitidos pelo governo
doméstico, para cobrir as suas despesas em excesso das suas receitas de impostos (G-T),
ou compras de títulos estrangeiros e empréstimos a estrangeiros (CA).
A equação 14.10 também sugere a razão pela qual muitos analistas propõem
aumentos nas poupanças domésticas para reduzir os défices gémeos. Um maior
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nível de poupanças eleva o lado esquerdo da equação 14.10, permitindo qualquer défice
orçamental em simultâneo com um menor défice da balança corrente (ou, o que é
equivalente, permitindo que qualquer défice da balança corrente esteja associados a um
menor défice orçamental). Mas, a avaliação das políticas apropriadas para lidar com o
problema dos défices, exige mais do que a informação fornecida pela equação 14.10.
Mais precisamente, necessitamos de perceber como é que as variáveis da equação estão
inter-relacionadas, tanto umas com as outras, como com outras variáveis macroeconómicas importantes. Antes de o fazermos podemos resumir os resultados deste
capítulo.
A CURVA IS
O nosso objectivo é combinarmos os ensinamentos deste capítulo sobre o mercado do
produto, com o exame dos mercados monetário e cambial. Para atingirmos esse
objectivo utilizaremos uma técnica gráfica chamada curva IS. Uma Curva IS, resume a
relação existente entre o rendimento e a taxa de juro que equilibram o mercado do
produto. Quando usamos a curva IS, admitimos que o nível de preços P é fixo de tal
modo que as mudanças no Produto Interno Bruto, Y, se traduzam directamente em
mudanças no PIB real, que representaremos por Q, onde Y = Q x P.
Na secção 14.5.3 admitimos que uma elevação na taxa de juro, ao desencorajar o
investimento, diminuiria o nível de rendimento de equilíbrio no mercado do produto. A
fig. 14.9 repete o painel (a) da fig. 14.8, mostrando o feito de um aumento na taxa de
juro sobre o rendimento de equilíbrio no mercado do produto (agora, o rendimento real).
Quando a taxa de juro se eleva, de i0 para i1, as firmas enfrentam um custo de
oportunidade dos fundos necessários para investimento mais elevado, o que reduz as
despesas de investimento, de I(i0) para I(i1). Como as despesas de investimento
integram as despesas totais no produto doméstico, a despesa total diminui. As firmas
vêem os seus stocks baixarem e respondem, diminuindo a sua produção, pelo que o
produto diminui, de Q0 para Q1. Do mesmo modo, uma queda na taxa de juro exigiria
um aumento no rendimento de equilíbrio no mercado do produto.
Podemos resumir a relação negativa entre o rendimento e as taxas de juro,
necessária para manter o equilíbrio no mercado do produto, numa recta com
inclinação negativa, no painel (b) da fig. 14.9. Chamamos a esta curva a Curva IS,
pois numa economia fechada o mercado do produto está em equilíbrio quando o
investimento é igual à poupança. Numa economia aberta a relação é mais
complexa, tornando o nome de curva IS, menos apropriado. Contudo, vamos usar esse
termo, lembrando-nos sempre que a curva IS mostra as combinações do
rendimento e da taxa de juro que mantém o mercado do produto em equilíbrio.
Quando desenhamos uma curva IS, admitimos que os gastos do governo (G), as
exportações (X) e a propensão marginal a importar se mantém constantes.
Mudanças em qualquer dessas variáveis desloca a curva IS. De facto, uma mudança em
qualquer variável, à excepção da taxa de juro, que desloque a recta dos gastos totais,
também desloca a curava IS. Qualquer mudanças que desloque a recta dos gastos totais
para cima, desloca a curva IS para a direita e qualquer mudança que baixe a despesa
total, desloca a curva IS para a esquerda. Por exemplo, uma elevação nos gastos do
governo, ou nas exportações, eleva os gastos totais e, logo, desloca a curva IS para a
direita (equação 14.1). Um aumento nos gastos do governo (G), ou em X, desloca a
curva IS para a direita. Um aumento exógeno nas importações, reduz os gastos totais e,
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para dadas taxas de juro, reduz o rendimento, deslocando a curva IS para a esquerda. A
fig. 14.10 resume estas deslocações.
A curva IS resume as condições para o equilíbrio no mercado do produto.
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