Em Busca de Felicidade: o Aumento do Uso de Antidepressivos e a Naturalização do Ser Humano no Mundo Contemporâneo Guilherme Melo de Freitas Departamento de Sociologia – FFLCH Universidade de São Paulo 1. Objetivos A presente pesquisa visa apreender o que o fenômeno do progressivo uso de medicamentos antidepressivos revela sobre a concepção de felicidade contemporânea. Para tanto, busca-se captar tendências sociais que teriam contribuído para a consolidação de traços do estilo de vida atual. 2. Material e Métodos Apesar de existirem informações estatísticas sobre o uso de antidepressivos, não foi possível obter acesso a tais bancos de dados. Portanto, partimos de constatações mais disseminadas e percentuais muito difundidos que atestam o crescente aumento do consumo desses medicamentos. Devido a esta dificuldade no que se refere aos dados quantitativos, o trabalho se direcionou para uma abordagem qualitativa da questão. Assim, a pesquisa se deu por meio de leituras da bibliografia relevante sobre o tema, voltando-se principalmente para os seguintes assuntos: processo de individualização na modernidade e seu acirramento; perda de referências; velocidade e ansiedade; histórias das emoções (mais especificamente, felicidade e da tristeza/ melancolia/ depressão); concepções de ser humano. Como referencial teórico metodológico, temos principalmente Simmel devido a seu modo de interpretar noções e conceitos (por exemplo, de “indivíduo”) a partir da compreensão do mundo social. Citamos ainda McMahon em seu sólido estudo que demonstra como se deu historicamente a construção do “dever de felicidade” do homem moderno. Além disso, recorremos à interessante expressão “Homo felix” de Lipovetsky. Finalmente, ao longo das leituras, percebeu-se a importância da noção de “sujeito cerebral”, analisada de maneira mais cuidadosa por Vidal. 3. Resultados e discussão Os estudos sobre história da felicidade demonstram que a modernidade possui traços específicos em relação a outros períodos históricos. Alguns acontecimentos importantes que tiveram efeitos nestas transformações foram os seguintes: a intensificação do individualismo; a concepção da morte como fim da existência; o maior poder do homem sobre a natureza a partir da ciência e da técnica; o reconhecimento de si como parte da própria natureza; concepção de natureza aproximada a “aquilo que não tem sentido”. Conseqüentemente, a noção de felicidade passou a corresponder a estes elementos: o homem quer ser feliz como indivíduo, na sua existência terrena; independentemente de limitações que a natureza lhe impõe, ele se utiliza dos meios possíveis para atingir a felicidade; como faz parte da natureza, no limite, felicidade pode dizer respeito a um estado de bem-estar psíquico, ou simplesmente “químico-cerebral” - por exemplo, aquele proporcionado pelos medicamentos antidepressivos. 4. Conclusões Sendo um trabalho de iniciação científica, não pudemos aprofundar a discussão das transformações sociais que poderiam estar envolvidas em todas as mudanças citadas que tiveram efeitos na concepção de felicidade. Mesmo assim, a pesquisa produzida até aqui apresenta traços relevantes no sentido de compreensão do estilo de vida contemporâneo, o que incita o desenvolvimento de um possível estudo futuro mais minucioso que possa ser realizado com mais tempo, provavelmente, num programa de mestrado. 5. Referências Bibliográficas LIPOVETSKY, Gilles. A sociedade da decepção. Barueri: Manole, 1994. MCMAHON, Darrin. Felicidade: uma história. São Paulo: Globo, 2006. SIMMEL, Georg. Questões fundamentais da sociologia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2006. VIDAL, Fernando. “Brains, bodies, selves, and science: Anthropologies of Identity and the Resurrection of the Body”. In. Critical Inquiry 28: 930–74. 2002. . “Le sujet cérébral: une esquisse historique et conceptuelle” In. Psychiatrie, sciences humaines, neurosciences 3(11): 37– 48. 2005. . “Brainhood, anthropological figure of modernity” In. History of the Human Sciences, 22; 5. 2009.