UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO SÓCIO-ECONÔMICO DEPARTAMENTO DE SERVIÇO SOCIAL EIXOS DE INSERÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL NO INSTITUTO DE CARDIOLOGIA DE SANTA CATARINA TANIA MARA TORTELLI DEFINIDO EM I 4tinp)Wa- ty4s Costa Chete Dee c de Serv ■ ço Sociof CSE/UFS.0 Florianópolis 2002 TÂNIA MARA TORTELLI EIXOS DE INSERÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL NO INSTITUTO DE CARDIOLOGIA DE SANTA CATARINA Trabalho de Conclusão de Curso de apresentado ao Departamento Social na Universidade Serviço Federal de Santa Catarina para obtenção do titulo de Bacharel em Serviço Social, orientado pela Ribeiro Maria Vera professora Nogueira Florianopolis 2002 BANCA EXAMINADORA Professora Vera Maria Ribeiro Nogueira Presidente Assistente Social Moisés Antônio Geraldo 10 Examinador Assistente Social Luci Cristina S. da Silveira 2 0 Examinador Data da Defesa: 25/04/2002 Conceito Obtido: O ontem é apenas um sonho O amanita é apenas urna visão Mas, O hofe hem vivido fará do Ontem um sonho de felicidade E do amanhã urna visão de esperança! (Autor desconhecido) AGRADECIMENTOS Deus, por ter-me iluminado e me protegido e tem me acompanhado sempre, me dando luz, força e coragem para enfrentar todos os obstáculos que foram colocados durante a vida académica. À meu Pai (in memorial?) que, com certeza deve estar orgulhoso, por eu estar realizando um desejo que ele sempre almejou para mim. Pai, cada dia que passa a saudade aumenta mais. À minha Mae, que durante toda vida, mesmo com problemas, sempre esteve ao meu lado, me incentivando, me dando força e apoio para que eu atingisse meus objetivos. Mãe, eu te amo. À minha orientadora, Professora Vera Maria Ribeiro Nogueira , pela dedicação, confiança e apoio. Obrigada por ter me incentivado e transmitido seus conhecimentos. À todos os professores do Serviço Social, os quais contribuíram para minha formação profissional. Às amigas e colegas de Curso Tatyana e Vanessa, pelo companheirismo, pela convivência. Ter conhecido vocês foi maravilhoso, que nossa amizade ultrapasse o espaço universitário. ik colega Graziela, pela troca de experiência, e pelo companheirismo durante nosso estágio no INCA. À todos os colegas do curso, pelo bom convívio e pelos laços de amizade foram sumindo entre todos nós. À todos do Serviço Social do INCA, em especial ao meu Supervisor de Estágio. Moisés Antônio Geraldo, pelas contribuições e sugestões construtivas, sempre respeitando e compreendendo minhas limitações. À todos que direta e indiretamente contribuiram e torceram pela Vitória. 5 SUMÁRIO INTRODUÇÃO 1 ATENÇÃO HOSPITALAR 6 10 1.1 Origens do atendimento hospitalar 10 1.2 As conseqiiéncias do internamento 19 2 AS CONSEQÜÊNCIAS PSICOSSOCIAIS DAS CARDIOPATIAS 26 3 INSTITUTO DE CARDIOLOGIA 32 3.1 0 INCA no SUS em Santa Catarina 32 3.2 Contexto e dinâmica institucional 36 3.3 Caracterização dos usuários 39 4 EIXOS DE INSERÇÃO DO TRABALHO DO SERVIÇO SOCIAL NO INSTITUTO DE CARDIOLOGIA DE SANTA CATARINA 42 4.1 Práticas Educação e Saúde e o Serviço Social 42 4.2 0 Assistente Social e o Hospital 45 4.3 0 Serviço Social no INCA 53 CONSIDERAÇÕES FINAIS 57 FONTES BIBLIOGRÁFICAS 60 IN T RO D U Ç ÃO 0 contexto da saúde, no Brasil, hoje, é muito amplo e complexo; podemos destacar que a população brasileira tem seu direito A saúde adquirido, mas, muitas vezes, esse direito não é colocado na prática como deveria. Em 1988, a Assembléia Nacional Constituinte aprovou a Nova Constituição Brasileira, incluindo, pela primeira vez, uma seção sobre a saúde. Essa seção incorporou, em grande parte, os conceitos e propostas da Conferência Nacional de Saúde, podendo-se dizer que, na essência, a Constituição adotou a proposta de Reforma Sanitária, ou seja, a de um sistema único de saúde. A Saúde foi incluída no capitulo denominado de Seguridade Social. A Seguridade Social é o conjunto das ações de Saúde, Previdência Social (pensões, aposentadorias financeiros) e Assistência e outros benefícios Social. A idéia presente na Constituição Brasileira é que a Seguridade Social seja um conjunto de politicas e ações dirigidas A proteção social da população, com um financiamento comum. Por isso, a Area da saúde é financiada basicamente através do orçamento da Seguridade Social. Compõem ainda o orçamento indicado, recursos de outras fontes como Estados, Municípios e da União. A Constituição também previa a elaboração e aprovação das Leis Orgânicas correspondentes a cada urna dessas Areas, num prazo de seis meses, com a finalidade de organizar o funcionamento das mesmas. No caso da Saúde, a organização e funcionamento do Sistema Único de Saúde. Entretanto. mesmo aprovada a lei Orgânica da Saúde, em 1990, o Governo declarava que adotava o SUS, mas suas atitudes eram de resistência descentralização: não fazia a reestruturação do Ministério da Saúde, nem o repasse de recursos para os Estados e Municípios. Somente com a 7 publicação do NOB n ° 01 (norma operacional básica) de maio de 1993, é se que foram efetivando os processos de descentralização das ações e serviços de saúde, e o Sistema Único de Saúde começou a ser colocado em prática. E, com isso, dando direito a todos os cidadãos de saúde gratuita e sem distinção social. A nova Constituição inovou ao assinalar que: a Saúde é direito de todos e um dever do Estado Podemos entender que o acesso aos serviços de saúde é um direito do homem, e que esse indivíduo tem substancial parcela de responsabilidade quanto à preservação de sua saúde e dos que dependem dele, e que cabe ao Estado dar total assistência, independente da condição sócio-econômica do indivíduo e de vinculação ou não a um sistema de previdência social, embora o custeio do SUS se faça com recursos da Seguridade Social, além dos recursos da Unido, dos Estados, dos municípios e do Distrito Federal. Cabe ao Estado dar assistência integral no sentindo de preservação da saúde, quando a ausência de sua atuação puser por em risco a coletividade ou quando se concluir a necessidade de esforços e recursos fora do alcance da capacidade individual. preservação da saúde requer todo um aparato, que se baseia, não somente em estar bem fisicamente, mas, sim, envolve a proteção do meio ambiente, a higiene das moradias e locais de trabalho, das escolas e lugares públicos, o saneamento rural e urbano, a vigilância sanitária e todos os fatores que venham a influenciar para que o cidadão tenha uma saúde boa. No Instituto de Cardiologia (INCA), constatamos que a preservação da saúde realmente vai muito além do estar bem fisicamente. Pois o problema que ocasiona o internamento das pessoas id internadas, que é o cardiaco. deixa-as numa situação de muita debilidade, tanto fisica como emocionalmente, necessitando, assim, de orientação e apoio em relação às mudanças que ocorrerão em suas vidas. Diante da realidade vivida pelos cardiopatas, principalmente no que diz respeito à orientação dentro do hospital, em relação a sua saúde e aos possíveis encaminhamentos, considero importante a intervenção do profissional do Serviço Social, a fim de favorecer-lhes urna visão melhor 8 do que estão enfrentando e levá-los a sentirem-se amparados dentro do ambiente hospitalar. Diante desse contexto, interessou-me conhecer mais a fundo a intervenção do Serviço Social no INCA, sendo que, para isso, estabelecemos os seguintes objetivos para o trabalho: (23, Sistematizar a intervenção do Serviço Social no Instituto de Cardiologia; Identificar os recursos e as demandas que são colocadas ao Assistente Social no INCA, relacionadas ao paciente, à família e própria Instituição. Para se colher as informações que permitiram atingir os objetivos propostos, foram usados como procedimentos de estudo a consulta a monografias e relatórios que abordam o tema e a observação, durante o estágio, das ações desenvolvidas pelo Assistente Social da Instituição 0 trabalho foi dividido em quatro capítulos; o primeiro capitulo trata das origens do atendimento hospitalar e as conseqüências do internamento hospitalar. Nesse capitulo, apresenta-se a trajetória política e social do hospital, desde sua origem até os hospitais contemporâneos, tentando resgatar a sua forma de atendimento e, também, nesse capitulo, fala-se das conseqüências do internamento nas pessoas que precisam dos serviços hospitalares, conseqüências essas que podem ser desveladas através da angústia, do medo. Falamos, ainda, das limitações impostas a eles e que acabam gerando muita tensão. Nesse mesmo capitulo, falamos um pouco da solidão que afeta o individuo hospitalizado e da necessidade que ele tem de ter o familiar por perto. No segundo capitulo, intitulado As conseqüências psicossociais dos cardiopalas, concentramo-nos em falar da angústia que é para o cardiopata lidar com uma doença crônico-degenerativa, ou seja, uma doença que tern tratamento, mas não tem cura. Isso provoca, nos pacientes, muitas incertezas e preocupações, dentre elas, a ameaça da morte. 0 paciente internado se faz muitas perguntas em relação a si mesmo, aos seus familiares, de como tudo ficará; isso tudo abala seu estado emocional, precisando, assim, sempre ter alguém por perto que o incentive, acompanhe 9 e oriente sobre esse momento pelo qual está passando. 0 Assistente Social vem sendo um grande aliado nessa batalha. No terceiro capitulo, falamos como o INCA está inserido no SUS em Santa Catarina, seu contexto e dinâmica institucional e caracterização dos usuários. Dentro desse capitulo, abordamos exclusivamente a atuação do INCA, atuação essa de grande relevância para a população usuária, que necessita de um atendimento especializado especifico de cardiopatia. Sendo o e criterioso em cada caso INCA, hospital referência em atendimento cardíaco pelo SUS, hi uma demanda muito grande, sendo a grande maioria dos pacientes originários de outras cidades do Estado. 0 quarto e último capitulo concentra-se na inserção do Serviço Social no INCA. Nesse capitulo, procuramos expor os dados obtidos relativos As práticas educativas realizadas pelo assistente social e o papel importante que o Serviço Social tem no aspecto saúde/doença em relação orientação, agindo, assim na dimensão sócio-educativa. Falamos, também, do Assistente Social e o hospital, como ele está inserido no contexto hospitalar e quais suas atribuições e, finalizando o capitulo, também falamos de suas ações e suas ferramentas de trabalho, fazendo, assim, sua intervenção profissional. O indivíduo, quando hospitalizado, necessita de muita orientação em relação A saúde e aos seus direitos, enquanto cidadão que está usufruindo dos serviços daquela instituição. Para que esse indivíduo tenha conhecimento de seus direitos enquanto cidadão, ele precisa de orientação e esclarecimentos e é nessa hora que o profissional do Serviço Social vem atuar junto aos hospitais, comunidades, para que o usuário saiba o que lhe é devido por direito e como fazer para a legitimação desses direitos. 1 ATENÇÃO HOSPITALAR 1.1 Origens do atendimento hospitalar Para que possamos compreender o atendimento hospitalar, precisamos entender que a saúde e cidadania caminham juntas e que o Estado tem papel fundamental nesse processo. As lógicas das politicas e práticas do Estado brasileiro, na saúde, so poderão ser compreendidas admitindo aquelas contradições e reciprocidade de ações entre seus agentes econômicos e politicos. Em nosso contexto social, contradições e ações não se restringem a um único setor e, menos ainda, à assistência medico-hospitalar, forma mais explicita e perceptível das políticas e práticas de saúde. Mais importante que a Constatação desagradável, ou mesmo dolorosa de um atendimento médicohospitalar frequentemente desqualificado, indutor de justificativa revolta e análise impressionista de suas vitimas, é identificar suas determinantes, reconstituir sua trajetória e capacitar-nos, como sujeitos, a encontrar alternativas socialmente mais justas. (RIBEIRO, 1993, p. 73) Mas, para se ter um entendimento mais preciso, e necessário realmente resgatar o que é o hospital e a importância que o mesmo tem na nossa sociedade e na vida de cada indivíduo que por qualquer que seja o motivo, já usou necessitou de serviços que um hospital e todo seu corpo funcional oferece. A área pública, no Brasil, opera diretamente 20% dos hospitais, realiza 2 a 3 milhões de internações por ano e, ainda, compra outras 7,5 milhões dos serviços privados contratados pelo SUS. Teoricamente, essa imensa rede de unidades próprias e contratadas deveria garantir assistência hospitalar e de urgência a 80% da população brasileira. (CAMPOS, 1992, p. 91) As leis que criaram o Sistema Único de Saúde - SUS (1998 e 1991) surgeriam a implantação de um novo modelo assistencial, ou melhor, 11 previam a construção de um novo desenho institucional para brasileiro. Uma das novidades é o sistema a diretriz que recomenda a descentralização de um conjunto de responsabilidades, de recursos financeiros e de poder para o município. Esse modelo estaria centrado nas origens da doença, onde os cuidados e os recursos seriam com a saúde e não com a doença. 7.4 a efetividade de um sistema único depende de sua dimensão, distribuição e tecnologia disponível, para que sua acessibilidade seja universal e igual para toldos [...]" (RIBEIRO, 1993, p. 130) Nos dias atuais, percebe-se que nosso Sistema Único de Saúde implantado chega a engatinhar perante o que gostaríamos que fosse, mas ainda é um sistema igualitário, em que o direito a saúde está sendo oferecido a todos. Os hospitais seguem o modelo de um sistema único e oferecendo todo atendimento do corpo médico e do quadro de funcionários. No sentido das habilitações hospitalares, existe o decreto que normatiza as uniformidades hospitalares. Segundo o decreto 52.464 de 12 de setembro de 1963 (SORRENTINO, 1997), da legislação hospitalar encontrarmos o artigo 3' que diz o seguinte: Art. 3 ° : Serão adotados, nas instituições de assistência médico-social, para fins de uniformidade, os seguintes conceitos: Assistência hospitalar é toda assistência médico-social, que tem por base o hospital, qualquer que seja sua especialização ou denominação. Hospital é a instituição destinada a internar pacientes para diagnóstico e tratamento médico, incumbrindo-lhe, ainda, atender aqueles não necessitados de internação. Hospital Geral é aquele destinado a atender pacientes necessitados de recursos clínicos gerais ou especializados. Hospital Especializado é aquele destinado a atender pacientes de uma ou mais especialidades correlatas. Hospital - Unidade Sanitária (unidade médico-sanitária, unidade mista , unidade integrada de saúde) é aquela que compreende em seu programa as atividades de assistência médica, inclusive hospitalização para clinica e cirurgia de urgência, obstetrícia e as de saúde pública. 17 Hospital Local ou de Comunidade é aquele que, em seu programa de atividade de assistência médica, clinica, cirúrgica, obstétrica e pediátrica integra as de saúde pública, de acordo com as possibilidades de pessoal e equipamento. Hospital Distrital ou Regional é aquele que, mantendo articulação com os Hospitais. Unidade Sanitárias e Hospitais Locais, tem atividades de saúde pública e presta asssitência médica de maior amplitude. Hospital de Base é aquele que se destina a executar atividades médico-sanitária e constitui o centro de coordenação e integração de serviço médico-hospitalar de uma zona, devendo estar capacitado a prestar também, assistência especializada mais diferenciada, bem como a formar e aperfeiçoar pessoal hospitalar. Ambulatório é um serviço destinado a diagnostico ou tratamento de pacientes sem internação. Quarto hospitalar é um comportamento do hospital destinado a alojar um ou dois pacientes. Enfermaria é um compartimento do hospital destinado ao alojamento de três ou mais pessoas. Leito é a cama destinada ao paciente hospitalizado adulto ou criança. Berço é a cama para recém-nascido sadio do parto ocorrido no hospital. Internação é a entrada no hospital do paciente que nele permaneça ao menos 24 horas. Matricula é o registro do paciente no hospital para consulta ou in Lotação é o número de leitos efetivamente existentes no hospital, respeitadas as instruções baixadas pelo órgão técnico especializado (SORRENTINO, 1997). Percebemos, então, que, seja qual for o tipo de hospital, ele estará sempre dentro de urna lei que o regulamenta e também corn um objetivo em comum, dar ao cidadão que o procura todo o atendimento necessário, dentro do que estará precisando naquele momento. Corn a rapidez que as coisas acontecem no nosso mundo, junto com a tecnologia e a globalização, percebe-se que os hospitais são uma amostra 1,3 desses avanços, através da capacitação de seus médicos, das aparelhagens especificas para cada tipo de exame. E, com isso tudo, os recursos necessários para se ter um diagnóstico preciso fica mais ao alcance dos profissionais capacitados, tornando, assim, as doenças e os tratamentos catalogados universalmente. [...] mais do que qualquer outra instituição clue compõe o sistema de saúde, os hospitais, em todo o mundo, cada vez mais se parecem resultado, principalmente, da similaridade progressiva dos perfis epidemiológicos e da aproximação das culturas dos países que se industrializam e desenvolvem dentro do mesmo modo de produção, da universalização e uniformidade das tecnologias médicas, administrativas e, sobretudo, das políticas econômicas e sociais que se internacionalizam. (RIBEIRO, 1993, p. 11) 0 hospital, como outras instituições que surgiram ao mesmo tempo em vários continentes e lugares do mundo antigo, não podemos dizer que teve uma origem única. [...] ele já existia na Grécia de Esculápio e na Roma Antiga, onde vários templos criaods para homenagear esse sábio Deus serviam de abrigo aos pobres, velhos e enfermos. Na China, no Ceilão, no Egito, antes e depois de Cristo, há registros de hospedarias, hospitais e hospicios, palavras que têm a mesma raiz latina, onde almas pias patrocinavam e cuidavam de peregrinos, crianças, velhos, vagabundos e doentes. (OMS, 1957, FOUCAULT, 1979 apud RIBEIRO, 1993, p.23) Como podemos ver, já existiam lugares para cuidar de pessoas enfermas, ou pessoas sem alguém para atender suas necessidades, bem antes do que podemos imaginar. Isso se segue até os dias atuais, é claro, sempre se aperfeiçoando, tanto na sua estrutura como tecnologicamente. Na Idade Media, o hospital adquire novos contornos e missões. 0 hospital ligado ao mosteiro de Pantocrator, em Constantinopla (1136), o do Cairo (1283) e o de Bagdá são parecidos. Este último já possuía uma equipe médica permanente e servia de escola. Na época do Império Islâmico, tinha 34 hospitais com caracteristicas semelhantes entre si e bastante distintas dos hospitais europeus. Esses ainda permaneciam com sua missão essencialmente espiritual, dando atendimento religioso e socorrendo, gratuitamente, os doentes e moribundos. (ROSEN, 1980, apud RIBEIRO, 1993, p. 24) A partir do mercantilismo, ocorreram mudanças econômicas e sociais e com isso foi atribuida uma importincia maior As municipalidades para o 14 equacionamento dos problemas comunitários e houve um maior interesse de subordinar o clero as autoridades civis e, com isso, uma mudança gradativa nos hospitais do Ocidente. Com a criação dos Estados Monárquicos, os hospitais vieram para a administração pública. É a partir de então que o médico começa a se tornar sua figura central, o que não acontecia no hospital antigo. A partir do século XVII, começando na Holanda, o hospital torna-se além de campo das práticas médicas, instrumento de formação e aperfeiçoamento. A mudança de qualidade da instituição hospitalar traduzia anseios gerados pelas novas politicas econômicas e sociais das nações européias, que se destacavam com o mercantilismo e a industrialização. A grande massa de pessoas, vindo para os centros urbanos e o grande movimento portuário, tudo decorrente do sistema de trocas entre a Europa e demais continentes, e acabaram aproximando povos e doenças, o que suscitou a doação de medidas sanitárias abrangentes. Como começaram a aparecer doenças devido à grande circulação de pessoas nesses centros, foram estabelecidas algumas normas, entre elas, os hospitais gerais destinados a deterem as doenças epidémicas. Os principais interessados, nesse caso, eram negociantes, mercadores e senhores ricos, que se sentiam ameaçados em seus negócios e em suas vidas. Segundo RIBEIRO: Essa trajetória política e social do hospital europeu teve continuidade nas colônias. A presença e intervenção do Estado no hospital colonial e, porém, bastante modesta. No continente americano, por exemplo, a iniciativa de construir, dirigir e sustentá-lo é da própria comunidade. 0 Estado se serve do hospital para o seu pessoal militar ou no curso de epidemias. Certamente esse hospital absorve modos de ser do seu predecessor europeu, mas ganha outras características por força de situações absolutamente novas. (RIBEIRO, 1993, p. 25) Os Hospitais começaram a trabalhar entre a clinica e a cirurgia, o que se tornou uma das principais características do hospital moderno e que o tornou lugar para o ensino e a pesquisa médica. Mesmo sendo um lugar para cirurgiões e médicos, ele começa a ter outras missões que vão além de cuidar do doente. Ele começa a ser urn campo de experiências e passa a ter 15 uma nova missão, de incorporar tecnologias, no inicio, artesanais e, no século seguinte, produzidas industrialmente. Com o inicio das cirurgias nos hospitais, houve um novo avanço para esses estabelecimentos, mas uma preocupação se tinha naquele tempo e que ainda percorre os dias atuais que é a infecção hospitalar. 0 mal não seriam os agentes microbianos, mas, sim, o hospital, pois, no hospital, morriam muitas pessoas e o contato que se tinha com as mesmas e com outros doentes geravam a infecção. A prevenção daquele tempo seria a mesma de hoje: a lavagem das mãos. Se a cirurgia, graças à analgesia, à anti-sepsia e à incorporação de virias das disciplinas básicas da medicina deu novas características ao hospital do século XIX, é necessário, no entanto, compreender a precariedade dela e dele. Ela evoluíra, passando da superfície do corpo a profundezas maiores, procurando extrair projéteis e estancar hemorragias. Mas, raramente, se arriscavam ás cavidades internas [....] No amanhecer do século XX, raros hospitais no mundo tinham laboratório clinico ou aparelho de raios X. (RIBEIRO, 1993, p. 26). 0 hospital do século XX ainda é um lugar de internação de pobres, claro que todos reconhecidamente doentes e precisando de cuidados médicos. As pessoas ricas passaram a fazer uso do hospital somente depois de uma sensível queda da mortalidade por infecção hospitalar e, também, depois que alojamentos diferenciados vieram a ser instalados. 0 seu uso por todas as classes sociais se deu devido ao aumento das doenças causadas por fatores externos e ao crescimento urbano, conseqüência do processo de industrialização. Os procedimentos terapêuticos, clínicos ou cirúrgicos continuaram bastante limitados nas quatro primeiras décadas do século XX. Somente na metade deste mesmo século, corn a produção industrial dos quimioterdpicos e de equipamentos, o hospital adquire características e missões novas, próprias do hospital contemporaneo (RIBEIRO, 1993) Vários são os aspectos preponderantes dentro do hospital; afinal, lidar com a vida e a morte nos traz expectativas desconhecidas, além do mais, a medicina adquiriu uma eficácia sem comparações. Ela consegue coibir a dor_ o sofrimento e até a morte através do saber e da experiência de suas equipes. Pois trás de todo o trabalho oferecido pelo hospital existe um corpo funcional. não só de médicos, mas de enfermeiros, técnicos e 16 profissionais de diversas Areas que atuam conjuntamente para o bom desenvolvimento da instituição. 0 Hospital é uma das instituições sociais que tem um grande reconhecimento público. Geralmente, quando é feita uma critica por não satisfazer nossas expectativas pessoais, essa critica é feita ao hospital e não A instituição hospitalar. 0 hospital, na verdade, está empenhado em fazer viverem os ameaçados pela morte, mas, também, tem outras missões, entre elas a de adiá-la, torná-la indolor e ocultá-la. Entre essas missões, o hospital continua sendo um aparelho formador de profissionais que estão sempre em processo de qualificação. Além de ser uma escola, ao qualificar esses profissionais, automaticamente, ele qualifica e avaliza tecnologias, que são produtos industriais, mercadorias. Entre essas mercadorias, está o trabalho. 0 hospital contemporâneo tem por missão recuperar a força de trabalho e devolvê-la ao mercado; de certa forma, ele reproduz o capital. Ele também é uma empresa em que o capital se multiplica; mesmo não sendo um hospital lucrativo, como no caso dos hospitais públicos, nem por isso deixa de reproduzir o capital, porque fora a missão de recuperar a mão-de-obra adoecida, também é um lugar de venda e consumo de mercadorias, nesse caso, uma mercadoria especial: as tecnologias médicas. Essa missão tende a ganhar cada vez mais destaque, devido ao fato de a clientela hospitalar tornar-se idosa e excluida do mercado de trabalho, o tratamento de suas doenças acaba sendo, em si mesmo, meios de reprodução do capital (RIBEIRO, 1993). Um fato marcante na história do hospital contemporâneo é a produção industrial da penicilina em 1941. Os medicamentos começam a se tornar mais eficazes e mais baratos. Em seguida, vieram os equipamentos médicos e os materiais descartáveis e a assistência médico-hospitalar se torna universal. Torna-se socialmente obrigatória e muito mais cara. A clientela dos hospitais continua sendo a grande maioria das pessoas pobres, mas muitos são os trabalhadores adoecidos e acidentados. A aceitação da assistência médica como direito e beneficio passou a ser compartilhada por empregadores, empregados e Estado, obedecendo As 17 mais diversas causas, entre elas, está o reconhecimento do trabalho industrial como um fator preponderante para acidentes, doenças e mortes, uma necessidade muito grande de recuperar a força de trabalho, para que a mesma retornasse à produção. Sio muitas, pois, as missões do hospital. Algumas, explicitas, tem caráter meritório e socialmente relevante. Outras permanecem ocultas, como tantas instituições que reproduzem as formas e os modos de produzir de cada sociedade. (RIBEIRO, 1993, p. 30) Segundo RIBEIRO: 0 hospital acaba sendo uma oficina, e o medico, seu principal mecânico. Cumpre a ele fazer com que a máquina-homem retorne o mais depressa á circulação como mercadoria ambulante. Interessa consertá-la, mas interessa menos evitar que se quebre. Ela tem que ter, como qualquer máquina, um tempo fail, durante o qual produza mais e melhor; todavia, hi outros homens-máquinas sendo produzidos, que precisam ser consumidos e bom, por isso, que ela se vi, aos poucos [...] (RIBEIRO, 1993, p.30) 0 hospital, seja ele de caráter público ou privado, representa a necessidade de interesses vindos da produção industrial na saúde. O que aparece é o que mais se destaca e é socialmente aceito: é o cuidado com o enfermo. bom que a recuperação aconteça, é triste que outras pessoas doentes dos mesmos males e de outros socialmente provocados venham a ocupar esses mesmos leitos do hospital, repetindo sempre o trabalho do hospital que é de curar e salvar. Durante toda a sua trajetória, o hospital contemporâneo, evoluiu muito. Mas o elemento constante dessa trajetória tem sido o homem que sofre e morre. Quando se fala-se do caráter empresarial, não se pode voltar somente à complexidade reconhecida, pois se requer uma administração profissional na qual problemas e.erenciais e financeiros têm prioridade para elevar sua eficiência e qualidade assistencial. empresa, o hospital corno do que tipificar Mais relevante independentemente de sua condição de propriedade pública ou privada, perceber sua lógica de reproduzir o capital e as estruturas sociais. Mesmo quando sua finalidade não é lucrativa, o fato de dar curso à venda e consumo de produtos e destinar-se á recuperação da força de trabalho 18 adoecia por determinantes sociais coloca-o dentro da cadeia de reprodução do capital. (DONNANGELO, 1975; GONÇALVES, 1979; POLLACK, 1971 apud RIBEIRO, 1993, p.32) Em relação aos trabalhadores do hospital contemporâneo, existe uma linha demarcando dois tipos de trabalhadores, de um lado, estão os que cuidam diretamente dos enfermos, que são os médicos, o corpo de enfermagem, o pessoal os serviços auxiliares de diagnóstico e terapia. E, de outro lado, estão os que dão sustentação ao que os primeiros fazem, que é o pessoal de apoio administrativo e dos serviços de infra-estrutura. 0 primeiro grupo significa dois terços do corpo funcional do hospital. 0 segundo grupo não tem contato permanente com o paciente; tem a possibilidade de exercer suas funções fora do setor da saúde. Não existe uma categoria única de trabalhadores hospitalares, mas diversas, em função das diferentes atividades, quer seja no primeiro ou no segundo grupo. Essa divisão segundo categorias e com diferente qualificação, pode não parecer, nem corresponder as inovações tecnológicas médicas. Na medicina, as práticas mais simples e menos qualificadas são feitas pelos recém-chegados, entre eles os estagiários, residentes, estabelecendo uma divisão por antigüidade, experiência e conhecimento. Isso pode acontecer dentro de outras categorias, uma vez que o trabalho do hospital não é apenas de profissionais de saúde categorizados. Na realidade, o hospital é o ambiente fisico reservado para acolher doentes e tratar as doenças. Local onde circulam profissionais de saúde, tentando realizar suas funções, apesar de todas as limitações que existem no próprio meio. 0 hospital só existe em função do doente e da doença. Sem isso, o seu sentido se torna inexistente, tudo que se possa por IA é determinado pela dor e sofrimento. O profissional da saúde é o profissional de 'vir-a-ser', porque, de verdade, ele é o profissional da doença. Só convive com seus maiores adversários: o sofrimento, o medo e a morte. Não usufrui do convivio com sua conquista, a saúde. Já que o hospital visa a cura e esta, por sua vez , só existe para a doenga, essa dualidade passa a ser a (mica razão do hospital: doença x cura. (LEITÃO, 1993, p. 93) 19 1.2 As conseqüências do internamento Quando a pessoa tem que fazer um internamento, seja para um processo cirúrgico ou não, gera em torno de si própria uma certa angústia e incertezas do que está por vir. Isso porque o período no hospital é aquele vivido num ambiente que lhe é desconhecido e nada familiar. Ele chega ao hospital, faz seu tratamento e recebe alta hospitalar, mas, mesmo sabendo que está ali para sanar algum problema, o simples fato de já estar com algumas limitações o incomoda muito, pois o hospital é um local que lhe vai impor mudanças de hábitos como os horários para alimentação, horário de visitas. Segundo Foucalt, o horário é uma velha herança. As comunidades monásticas haviam sem dúvida sugerido seu modelo estrito. Ele se difundiria rapidamente. Seus três grandes processos, estabelecer as censuras, obrigar as ocupações determinadas, regulamentar os ciclos de repetição, muito cedo foram encontrados nos colégios, nas oficinas, nos hospitais. Então, para a pessoa internada, gera muita ansiedade, pois o tempo no hospital é delimitado por horários, marcado por monotonia. silêncio e falta de atividade longe dos familiares. 0 internato hospitalar envolve o paciente como um todo, afeta seu físico e seus sentimentos. Envolve sua familia, amigos e profissionais de saúde. 0 paciente se sente preso dentro do hospital, sob a vigildncia constante de médicos, enfermeiros e profissionais da saúde, tendo que seguir normas e ter uma disciplina conforme regras impostas. - e um dispositivo que obrigue, pelo jogo do O exercicio da disciplina sup 6 olhar, um aparelho onde as técnicas que permitem ver induzam os efeitos de poder, e onde, em troca, os meios de coerção tornem claramente visíveis aqueles sobre quem se aplicam. (FOUCAULT, 1986, p. 153). Junto com essa disciplina vem o fato de sentirem-se 'presos' em um ambiente onde precisam estar, pois disso depende sua recuperação e junto a eles estão pessoas no seu mesmo estado clinico ou pior. 20 Segundo FOUCAULT, o velho esquema simples do encarceramento e do fechamento, do muro espesso, da porta solida, que impedem de entrar ou de sair, começa a ser substituído pelo cálculo das aberturas, dos cheios e dos vazios, das passagens e das transparências. Assim é que o hospitaledifício se organiza, pouco a pouco, como instrumento de ação médica: deve permitir que se possa observar bem os doentes, portanto, coordenar melhor os cuidados; a forma dos edifícios, pela cuidadosa separação dos doentes, deve impedir os contágios, a ventilação, que se faz circular em torno de cada leito; deve, enfim, evitar que os vapores deletérios se estagnem em volta do paciente, decompondo seus humores e multiplicando a doença por seus efeitos imediatos (RIBEIRO, 1993). Todo esse estado de disciplina e regras acaba gerando muita tensão no paciente, pois o simples fato de já estar internado e o motivo da internação abala muito o seu psicológico, através do estresse do dia-a-dia e da expectativa de melhora. A noção de que a hospitalização é uma experiência geradora de estresse pode ser abstraída da própria conceptualização do estresse como sendo produzido por eventos internos ou externos que evocam algum tipo de adaptação e pode ser apoiada por diversos estudos que identificaram fisiológicas mensuráveis, associadas com a hospitalização. (FARIAS, 1981, p. 3) As pessoas hospitalizadas enfrentam vários fatores de estresse eé difícil investigar o estresse, somente pelos relatos dos mesmos, pois, nem sempre, eles conseguem verbalizar o que estão sentindo. Apesar da hospitalização ser vivenciada individualmente, acredita-se que a maioria das pessoas que se hospitalizam, independente da idade ou do quadro clinico, são afetadas pelo estresse. Além do estresse produzido pela própria doença, a hospitalização inclui mudanças no seu dia-a-dia, seja no ambiente físico e social e nas atividades diárias, fazendo com que afete todo seus sistema de vida. 0 sentimento de perda do sistema de apoio surge em conseqüência da dramática mudança do ambiente físico e da separação de pessoas significativos, junto ás quais o individuo se sente seguro. (MURRAY, 1975, apud FARIAS, 1981, p. 3) 11 O paciente sente muito a falta do familiar durante a internação; por mais que ele receba a visita de seus familiares todos os dias, existe nele um sentimento muito forte, que é a necessidade do outro, a necessidade de uma segurança, ele sabe que pode contar com todos os profissionais do hospital, mas é no familiar que vê o seu porto seguro. A solidão 6, assim, a configuração extremada da ausência do Outro. 0 outro que se torna presente pela própria ausência configura em meu ser sua necessidade. O desespero do homem contemporâneo apresenta virias facetas de sofrimento, mas, seguramente a ausência do outro é um dos maiores espectros dessa realidade. (AGERAMI-CAMON, 1992, p. 6) Todo esse momento de internação gera uma angústia misturada com esperança, expectativa, sem saber o que está por vir. Isso tudo gera muitas mudanças no seu organismo. Hi pacientes que, após a internação, começam a ter insônia, outros sentem mais dores, tem crises depressivas, isso tudo originado pela própria internação. O paciente cirúrgico é o que mais sofre com todo o internamento, pois além dele estar ali para um tratamento, este muitas vezes demora um tempo, até que os profissionais cheguem à conclusão quanto ao procedimento adequado. é algo A busca por uma saida ou solução para os problemas caracteristicamente vivido pelo paciente cirúrgico. E uma vivência que acompanha todo o processo espaço -temporal e que recebeu o nome de 'buscando solução'. Apesar de todos os pacientes tentarem solucionar os problemas encontrados, a maneira de fazê-lo pode variar. Foram identificadas pelo menos duas: 'tentando resolver' e 'tentando tirar da mente'. (HENSE, 1987, p.162) Segundo a autora, o "tentando resolver" acontece quando o paciente tenta acabar com o problema encontrado, mesmo que não consiga sanar o problema. mas diminui-lo. Ela faz isso com maior ou menor atenção e seguindo alguns passos que tomam a forma de um processo que 6: buscando esclarecimento, avaliando , decidindo e fazendo. E o "tentando tirar da mente" é que nem todos os pacientes, quando se deparam com o problema, tentam resolvê-lo. Alguns preferem evitá-lo e não pensar nele, isso quer dizer que tentarn tirar - o problema de sua mente. 22 Eles podem fazer isso através de diversas atitudes, como, por exemplo, tendo vontade de fugir, escondendo, desligando e enganando. O indivíduo, quando se vê diante de uma situação, pode ter diversas reações, uma vez que não sabe realmente o que pode acontecer com ele. Quem de nós nunca se viu assim ou um familiar nosso que tenha passado por uma situação de internamento? Se nós, familiares do paciente, estamos sempre esperando algo que na verdade não sabemos o que 6, a nossa mente fica sempre na expectativa de boas noticias, mas sabemos que também podem ser más noticias, e isso é uma verdadeira angústia. Imaginemos, então, a situação do paciente, pois é seu corpo, é sua vida que está em jogo. No transcorrer de todo o processo espaço -temporal, desde o momento em que ocorrem as alterações de saúde até a alta hospitalar, o paciente cirúrgico se vê diante de eventos, problemas ou dificuldades que, para ele, assumem a forma de prazos marcados, pelos quais ele tem que passar e que gradativamente vão s realizando [....] Isto desperta nele alguns sentimentos, desejos, ações ou reações, que transparecem mesmo quando ele ainda está em casa, antes de ir ao médico. (HENSE, 1987, p. 181) Todos esses sentimentos estão relacionados com o cumprimento de um prazo ou a ocorrência de algum fato, evento ou problema, que se resumem na espera. Para o paciente, essa espera esta relacionada corn: há definições a aguardar, há acontecimentos a aguardar e há o retorno a sua vida de antes. Depois de aguardar as definições, o paciente aguarda pelo acontecimento em si. Ele não aguarda mais a definição de algo, mas do próprio fato. Ele aguarda, por exemplo, o dia marcado para a internação, a cirurgia, o preparo para a cirurgia e a alta. Após ter aguardado todos esses acontecimentos, ele aguarda a volta gradativa a sua rotina de vida. Segundo HENSE, há vários eventos e problemas que, quando ocorrem e são superados, levam o paciente a ter a sensação de alivio. Foram identificados três: a cirurgia, o desconforto fisico e a alta hospitalar. A autora diz que: 0 alivio em relação à cirurgia tende a se manifestar nos primeiro dias que se seguem a sua realização, pelo fato de já ter passado pelo risco cirúrgico eji ter resolvido seu problema de saúde. Sensação de alivio de já ter passado pela experiência de hospitalização e estar voltado para casa. (HENSE, 1 0 87. p. 101) 23 Para o paciente, o alivio que ele sente depois de ter passado por todos os procedimentos necessários, pelo que era desagradável. Esse alivio envolve a sensação de estar livre, de terem-lhe tirado um peso, de estar se sentido melhor e mais aliviado. Mesmo que, para alguns pacientes, o_fato de estar hospitalizado seja pior que o de ser operado, eles reconhecem a necessidade de ficar no hospital devido A maior segurança para a sua saúde. Cabe ressaltar que a família tem um papel fundamental na recuperação do paciente durante a internação e mesmo depois da alta, pois o paciente fica muito vulnerável emocionalmente; por isso, as visitas hospitalares devem levar Animo e nunca levar mais problemas para a pessoa internada. Ha uma fundamental importincia da visão fenomenológica no acompanhamento hospitalar, da necessidade do profissional de saúde se atualizar numa reflexão em relação ao que envolve o ser que adoece, vendo-o dentro de um processo histórico-existencial. (LEITÃO, 1993, p. 97) Todo paciente internado deve ser visto, não como algo que está em busca de uma solução, mas, sim, considerando sempre seu lado humano. percebendo sempre que junto àquela pessoa adoecida está toda urna história de vida, corn suas alegrias, suas tristezas, angústias e desejos e que, naquele momento, o seu físico está precisando de ajuda, mas o seu emocional também precisa de cuidados. Pois, nesse momento, muitas coisas se passam em sua cabeça, várias possibilidades são pensadas por eles, até mesmo a morte vem em suas mentes. Parece que, mesmo não querendo pensar, o paciente pensa, avalia e pesa a sua situação, sua historia de saúde, seu estilo de vida, sua relação com Deus e com as pessoas. seus hábitos e vícios, suas expectativas e emoções. Para alguns pacientes , a possibilidade da morte e urn grande fantasma: assim, pensam e sonham com ela. Outros dizem saber que não irão morrer [...] (HENSE, 1987, p. 106) Diante disso tudo, a família é o grupo social mais importante, mesmo havendo pacientes que prefiram ficar sozinhos no Hospital. a maioria tern propensão a aumentar seu nivel de dependência e de apego aos familiares. ") .4 Esta também precisa de apoio e sua tendência é bused-10 no pessoal da equipe hospitalar, em parentes, amigos e em Deus, pois a doença é uma ameaça à integridade da família e aos sentimentos de invulnerabilidade e de segurança. A internação gera as maiores inquietudes. 0 doente é conduzido para o quarto ou enfermaria. 0 importante é que ele seja realmente paciente, isto 6, deixe-se conduzir para a cama que lhe foi destinada, -deixe-se despir e colocar a roupa do hospital, permita que o examinem, que não reaja, não pergunte e obedeça ao pessoal hospitalar. Dentro de todo esse processo, os aspectos humanos foram sufocados pelos aspectos técnicos e pelas rotinas hospitalares. Ninguém perguntou ou teve interesse em saber se ele tem filhos, onde trabalha, o que está sentindo emocionalmente. São poucos os profissionais que levam compreensão e atenção. A doença, na verdade, vai mais além do que a dor física, uma mudança no funcionamento do corpo, pois, junto com a doença, vem uma série de conseqüências afetivas e sociais. Para muitos pacientes a doença pode significar: inutilidade, ignorância, pobreza, estupidez e pecado. Assim como a saúde pode significar: utilidade, sabedoria, bom senso, riqueza e bem estar. As preocupações sobre o motivo de sua doença fazem o paciente ficar mais doente, as dúvidas sobre a complexidade da doença, o diagnóstico que esta por vir, os exames a que deverá submeter - se, para ele, tudo isso não passa de uma incognita e novidade perigosa. Na verdade, o paciente se faz várias perguntas sem respostas para si mesmo. A separação provisória de sua família pode traumatizá-lo profundamente, a diferença entre o ambiente familiar e o Hospital podem preocupá-lo mais do que a própria hospitalização, pois, afinal de contas, ele esta ali para que algo de positivo seja feito em seu beneficio. Conforme pesquisas feitas, parece que o trauma da ausência familiar é bem mais sentido pelas mães, cujos filhos ainda estão nos primeiros anos de vida ou pelos pais de cujo trabalho depende praticamente a manutenção da família. Perguntam-se respectivamente: Quem olhará para os filhos? A empregada? A vizinha? 0 marido? Mas será que eles tern maneiras? Sera que eles 'sabem ter tempo com meus filhos? Quem pagará os aluguéis? Quem custeará os estudos? Onde irão comprar o necessário para comer? [...] Para se vestir? [._.]Quando receber alta hospitalar terei condigiies de 15 voltar ao trabalho? Estas e outras perguntas os invadem, traumatizando os para o resto da vida, se não encontrarem um gesto de bondade e compreensão no hospital. (FAVRETTO, 1977, p. 62) Para o paciente qualquer sinal dos profissionais que o estão atendendo pode significar preocupação. Muitas vezes, ao entrar no hospital, o paciente se sente totalmente desinformado. Quando é internado, ele não conhece ninguém, quem vai cuidá-lo, sente-se totalmente isolado. A despersonalização do doente é um problema sério, pois ele se sente um objeto na mão de muitos, enquanto precisa de uma só resposta. [...] Aquele homem, hi poucas horas atrás, era o ser [...] o comerciante [...] o advogado [...] o industrial [...] agora, bruscamente perde o nome [...] perde sua atividade e passa a ser o n° 34 da cirurgia do tórax está passando bem, aquele do n° 233 está no fim. 0 mais curioso é que os profissionais da saúde (medicos, enfermeiros, assistentes sociais, etc.), exigem que sejam chamados pelo nome, e com a devida especialização. Seri que o enfermo, pelo fato de sua enfermidade, deixou de ser gente? (FAVRETTO, 1997, p. 62) A instituição hospitalar deve ser o lugar do médico. Mas isso tem que ser fato e não só direito. Humanizar e atender o paciente, não como se ele fosse uma coisa, e não sendo ele objeto do médico, como se este fosse seu dono. Sua identidade tem que ser respeitada e sempre sendo ouvido, o paciente tem uma maior independência, é dono de si mesmo, consciente de seus direitos e podendo reivindicá-los. (LEITÃO, 1993, p. 100) 2 AS CONSEQÜÊNCIAS PSICOSSOCIAIS DAS CARDIOPATIAS As doenças cardiovasculares atingem cada vez mais a população e, nos últimos anos, tem-se mostrado como a principal causa de morte no Brasil. São vários os fatores que mostram a aceleração cada vez maior de pessoas com problemas cardiocirculatórios. As causas mais freqüentes são a hipertensão arterial e a doença de Chagas. Estes dados revelam urn perfil de morbi - mortalidade no Brasil, relacionado a situações preveniveis, se acompanhadas de uma política social mais efetiva. A Doença de Chagas não existiria, se as campanhas de informação e orientação da população fossem mais eficazes, assim como o combate ao agente transmissor. Do mesmo modo, os programas de acompanhamento aos hipertensos parecem não ser satisfatórios, já que estes indivíduos acabam evoluindo para um quadro de miocardiopatia, situação extrema da falta de controle da causa básica. (G.ASTALDI, 2000, p. 20) Outras causas também contribuem para o aumento das complicações cardiocirculatórias, como, por exemplo, a mudança no perfil das pessoas que moram nos grandes centros. As situações tipicas de cidade grande levam ao aumento das preocupações diárias e, como conseqüência, vem o estresse gerado pelo estilo de vida. A mulher também ganhou um grande espaço entre as pessoas portadoras de problemas cardiocirculatórios. As cardiopatias em mulheres estão também relacionadas ao uso do anticoncepcional associado ao tabagismo e também ao aumento das preocupações e do estresse. Os jovens também começam a fazer parte dessa população, como consequencia dos hábitos de vida sedentária, alimentação e cigarro. As doenças do coração atingem também crianças, por isso não se pode dizer que os problemas cardiocirculatórios, é problema de pessoas 27 com idade mais avançada. É comum vermos crianças com esses problemas e também os jovens. As pessoas com cardiopatia são consideradas portadoras de doença crônico-degenerativa. E é cada vez maior o número de pessoas a compor a clientela dos serviços de saúde. Embora a doença seja passível de controle, os cuidados com o tratamento podem levar a uma drástica alteração no estilo de vida das pessoas. A doença gera uma ansiedade e medo. É uma situação para a qual a pessoa não esta preparada, significa uma quebra no seu dia-a-dia, pois vai além da pessoa do doente, representa uma ameaça ao equilíbrio social e, por isso, o homem luta contra ela. A pessoa que tem um problema crônico de saúde, como é o caso dos cardiopatas, passa por um processo de redefinição de identidade. Vai ter alterações no estilo de vida, o que, na maioria das vezes, não é tão aceito com facilidade. Mesmo conhecedores de seu problema e da associação de fatores de risco presentes no seu estilo de vida, muitos ainda acreditam não precisar mudar o estilo de vida para o controle da doença. Na verdade, eles não aceitam ter que viver com limitações, pois sua vida muda por inteiro, desde a alimentação, até qualquer esforço fisico e emocional. E tudo isso traz uma modificação da qualidade de vida do paciente onde entra: bemestar material, bem-estar físico, emocional, recreação, lazer, relacionamento familiar e social, entre outros. [...) o indivíduo e a familia, muitas vezes, não são devidamente acompanhados pelos profissionais de saúde. A falta de informações quanto a como cuidar-se restringe o tratamento à terapia medicamentosa e a pessoa passa crer que está 'condenada' a uma situação de 'estar doente' para o resto da vida. 0 conviver saudável corn a doença não é explorado, mas sim as restrições e as limitações que a nova situação requer. 0 estresse decorrente dessa fase de adaptação acaba por agravar ainda mais o quadro geral. (GASTALDI, 2000, p. 22) necessário que as atenções se voltem para o individuo que possui necessidades especificas que vão além do aspecto biológico. Dando essa atenção a pessoa corn doença crônica, atende-se sua real relevância, baseando-se em terapias alternativas e eficazes. 28 O individuo cardiopata, devido à sua doença, experimenta grandes mudanças no seu estilo de vida, tendo a necessidade de adaptação As condições externas para o desempenho de todas as suas funções. Devido a isso, ele necessita de orientações e troca de informações com profissionais de saúde e outros individuos que compartilham a mesma situação, para uma melhor compreensão sobre o seu processo saúde-doença e, assim, desenvolver mecanismos de controle do mesmo, visando a promoção da saúde. Entende-se por processo saúde-doença a situação de ser cardiopata com todas as implicações decorrentes desta condição, dentre elas, a mudança no seu modo de vida com as freqüentes agudizações e descompensações e a conseqüente alteração no desempenho do seu papel social. (GASTALDI, 2000, p. 23) Para definir o processo saúde-doença, para a cardiopatia, é muito mais que ficar somente na sua condição biológica. Esse processo está inserido nas questões referentes A educação, A alimentação, ao desamor, A e no contexto do solidão, As condições ambientais, ao estilo de vida trabalho e da família. 0 nosso coração é a máquina do nosso corpo, se ele parar, paramos também, eis o medo que todos os cardiopatas sentem ao saber que estão com um problema cardiocirculatório: o medo da morte, todos, de uma maneira geral, ficam apreensivos diante da internação e da noticia de uma cirurgia, sem saber de quanto tempo será a internação, pois quase todos que se internam, estão descompensados e terão que melhorar seu estado para depois irem para uma cirurgia. Descompensado, segundo os médicos, é quando o paciente está muito debilitado, de um modo geral, e tem que melhorar o quadro, para depois fazer a cirurgia. Esse casos podem demorar meses e pacientes, isso tudo ocasiona ansiedade, angústia e que ficam imaginando coisas que muito medo, nos poderão acontecer, relembrando quando estavam bem , e não se acostumam com o ambiente hospitalar. [.. ] Ao entrar no hospital, ao saber-se doente, seu coração é trazido corno aquilo que ele pós-psiquismo do paciente também e. influenciado por outras variáveis importantes, peculiares a cada situação . Uma delas 6 a 29 área física pela qual o doente circula no hospital durante o processo de adoecer. (LAMOSA, 1990, p. 37) Muitas vezes, o paciente cardiopata se acha um ser inútil, que não vai mais conseguir fazer nada, acha que todos vão estar sempre em seu auxilio. claro que esse tipo de doença crônica sempre terá uma atenção especial, tanto no hospital, quanto em sua casa, mas o que ele precisa estar ciente é que tendo um tratamento medicamentoso correto, poderá continuar sua vida sem medo e sem resignação. preciso que se faça um esclarecimento: apesar do doente ser, em alguns casos, afetado por uma cardiopatia tida como crônica, ele pode requerer um minima de cuidados e de atenção médica, vivendo como um indivíduo de boa saúde. Mesmo que sua afecção 'medicamente crônica' limite-o em algumas atividades, ele buscar readapatar se a uma vida 'normal', criando seu próprio grau de autonomia. 0 'cronificado' do ponto de vista psíquico, nem sempre tem deficiencies tão grandes nem seqüela que precisem de cuidados tão freqüentes. Na realidade, esse estado depende existencial. psicológica elaboração uma de fundamentalmente (SCHNEIDER, 2 apud LAMOSA, 1990, p. 39) - 0 interessante, as vezes, é a leitura que o paciente faz de si mesmo; é "sou doente" e não "estou doente", o que seria o mais correto. 0 que muitos querem buscar, na verdade, com essa segunda condição, são os ganhos secundários, como, por exemplo: maior atenção em casa, benefícios, mesmo que inconscientemente. Muitas vezes procuram esconder a doença, porque pensam serem excluídos. Esconder-se, porque se pensa doente, denota a condição de exclusão em que se posicionam muitos deles na tentativa de não se assumirem improdutivos perante a sociedade. Por outro lado, muitos fazem questão de mostrar-se doentes, pois quando este papel é oficializado por um diagnóstico, é permitido que o doente fuja das normas sociais sem sofrer pressão. (GASTALDI, 2000, p. 74) Ao ser internado, o paciente perde o controle sobre si mesmo. Outras pessoas decidem e manipulam seu corpo. Para o paciente, isso pode ser uma catástrofe e, muitas vezes, uma humilhação. Expor-se pode significar a quebra de tabus, uma invasão da intimidade e falta de controle de seu espaço. Como conseqüência disso, dependendo da ação, pode haver interferência na imagem do corpo. uma 30 Relacionando, ainda, ao aspecto físico, deve-se considerar a restrição de atividades físicas, que levam à perda parcial ou total da independência por tempo limitado ou não. Dentro desse aspecto, pode-se observar o significado que tem e o uso que o doente e sua família fazem desse momento. Os períodos de limitações físicas podem ser vistos como invalidez e os sentimentos ficam aflorados. Na verdade, o medo é de "terminar os dias como um inválido"; mesmo que essas limitações não tenham uma grande dimensão, podem ser vivenciadas como tal. Outro incomodo para o cardiopata é provocado por essa parada na vida rotineira, é a oportunidade de um encontro consigo mesmo e dos sentimentos que até então estavam escondidos em função do dia-a-dia e de outras atividades. Ficar doente é uma tarefa para a qual não se está preparado: o encontro com um corpo vulnerável e com a sensibilidade da vida. Uma cardiopatia resulta em expressões emocionais, em comportamentos neuróticos, em descompensações depressivas e, mais raramente, em manifestações psicoides, dependendo da fragilidade e predisposições anteriores. Outras vezes, a vida psíquica do paciente é fator contribuinte (em algumas circunstância, diria, decisivo) para a instalação de cardiopatia. (LAMOSA, 1990, p. 42) Os cardiopatas, de um modo geral, ficam muito debilitados diante da internação e do tratamento que terão que fazer. É normal entrarmos no quarto do paciente e ele estar chorando, os motivos sempre estão voltados a sua situação atual, preocupações com a família e muita apreensão quanto ao que está por vir. Mas todos sempre esperançosos e pensando positivo em sua recuperação. Sendo o coração um dos órgãos vitais do nosso corpo, e primordial para nos mantermos vivos, são normais as angústias e os anseios das pessoas portadoras de doenças cardiocirculatórias. Deve-se compreender que os processos emocionais e sociais não devem ser excluidos na compreensão, no diagnóstico, no desenvolvimento doengas. e na terapêutica das 31 0 paciente, quando internado, fica a mercê de qualquer decisão médica, seja tratamento com medicamentos, ou intervenção cirúrgica. Neste último caso, o paciente tem autonomia para decidir se quer ou não fazer a cirurgia, e é nesse momento que a tensão aumenta e começa a se sentir vulnerável a tudo o que lhe é colocado. [...] a decisão pela operação é freqüentemente resultado de numerosas consultas especializadas; a operação tem por finalidade a 'restauração' de um órgão mitificado; o cirúrgico é encarado frequentemente como um 'Ultimo recurso'; o paciente é preparado numa atmosfera de alta tecnologia, sempre sublinhada de 'agressividade', o enfermo vive um 'longo' período, cheio de incertezas, de limitações, de ruptura com o meio familiar, social e de trabalho_ Este clima emocional certamente conduz o paciente a viver intensamente a ambivalência, a negação, o medo, a angústia e todos os "sintomas e sinais' de uma doença crônica. (LAMOSA, 1990, p.22) O cardiopata, de uma certa forma, torna-se uma pessoa triste e apreensiva, sempre na expectativa de que algo possa acontecer com o seu coração, e nesse misturar de angústias, tristezas e alegrias, ele vai vivendo seus dias. 3 INSTITUTO DE CARDIOLOGIA 3.1 0 INCA no SUS em Santa Catarina' A saúde da população brasileira necessita de cuidados e para que essa oferta de cuidados seja eficaz, ela precisa ser organizada dentro de um sistema que funcione para o bem da população. Existem necessidades de saúde que, para serem supridas, exigem recursos simples e acessiveis. Fazem parte desse grupo: vacinação básica, tratamento de verminoses, aplicação de medicamentos, controle de pressão alta e diabetes, acompanhamento pré-natal, entre outros. A esse conjunto de cuidados denominamos atenção básica. Sao cuidados que podem estar à disposição da população em postos de saúde, com profissionais treinados para prestarem este tipo de atendimento, sem que para isso necessite de recursos sofisticados e caros. Se houver serviços desse tipo em número suficiente, eles poderão resolver boa parte dos problemas de saúde. Pois o posto de saúde é um local de fácil acesso para os moradores do bairro. Por oferecerem urna atenção primária, são chamados de rede básica ou primários. Já. as pessoas que sofrem de doenças mais complicadas e que também já tenham passado pelo posto de saúde, onde se avalia a necessidade de especialista, de recursos mais complexos, de urna pequena cirurgia, exigirão um local mais sofisticado para o atendimento, que pode ser um pequeno hospital ou ambulatório de especialidades, Sao os serviços chamados de nivel médio. 33 Esses serviços não precisam existir em quantidade tão grande quanto aos postos de saúde. Um pequeno número desses hospitais e ambulatórios já será suficiente para todo um bairro ou até uma cidade. Vários postos de saúde encaminharão para esses locais os doentes que deles necessitem. Não se pode esquecer o paciente que precisa de uma intervenção cirúrgica difícil, de internação prolongada, que já fez um tratamento e não obteve bons resultados, também pessoas vitimas de acidentes. São situações que merecem cuidados mais complexos, num hospital de grande porte, que conte com salas cirúrgicas, laboratórios, médicos especializados. Essas situações exigem serviços chamados de alta complexidade. Podemos incluir nesse tipo de atendimento, cirurgias cardíacas, transplantes, pois são atendimentos que necessitam de pro fi ssionais especializados. Os serviços de saúde precisam ter diferentes complexidades para atender os diferentes problemas da população [...]. Organizar e planejar a oferta de serviços de saúde com esses níveis de complexidade e distribuição é organizar na realidade, um sistema de saúde. (SORRENTINO, 1997, p. 25) No Brasil, a história dos serviços de saúde tern inicio nas primeiras décadas do século XX, mais precisamente em 1923, com as antigas "caixasbeneficientes", reconhecidas pela lei Eloy Chaves e corn organização e contribuição mensal dos empregados das empresas. Os primeiros a organizar essas caixas foram os trabalhadores da rede ferroviária. Até perto dos anos 50, os serviços públicos de saúde eram praticamente inexistentes, ofereciam algumas ações básicas e atendiam somente as populações carentes. Tinham corno objetivo afastar os doentes pobres, portadores de doenças contagiosas, do restante da população sadia, e não exatamente promover a saúde. As pessoas que tinham urn melhor poder aquisitivo recorriam a médicos particulares, pois para eles os hospitais pouco ou nenhuma recurso tinham a oferecer (SORRENTINO. 1997) L.] os avanços da medicina e outras grandes transformações vividas por nossa sociedade, a ideia de os trabalhadores contribuirem mensalmente A parte referente ao histórico c aspectos fisicos do INCA foram obtidos junto ao Trabalho dc Concluso de Curso de Karen Dorningues. 34 com um pequena parte de seus salários [...] deixou de ser facilidade ou opção de alguns para tornar-se uma necessidade, sendo até hoje o principio básico de qualquer sistema de previdência e mesmo dos planos de saúde. (SORRRENTINO, 1997, p. 28) Com o aumento dos trabalhadores urbanos, a partir de 1960, houve uma demanda por cuidados de saúde; com o avanço tecnológico da medicina, o preço desses cuidados também foi-se tornando caro. Na tentativa de colocar os serviços de saúde e de aposentadoria de acordo com a nova realidade, foi criado o Instituto Nacional de Previdência Social (INPS), em 1967, com o objetivo de organizar os vários fundos de pensão existentes na época, e estruturar um sistema de previdência para todos os trabalhadores. A saúde continuava a ser assunto do Ministério da Saúde. Até ai, o problema das aposentadorias estava resolvido. E orno então ficaria a saúde? O governo na tentativa de dar respostas a população, em 1974, surgiu o Instituto Nacional de Assistência e Previdência Social, o INAMPS, onde saúde e previdência passam a ser um assunto único. Mas o estado não tinha hospitais e atendimento básico para todos. Era necessária a contratação de serviços particulares, que também eram insuficientes. Houve, então, financiamentos para grupos privados construirem hospitais, e o Estado e Municípios atenderiam serviços básicos e serviços particulares e alguns hospitais do INAMPS fariam o atendimento hospitalar. Quanto maior o número de consultas, mais verbas eram repassados pelo INAMPS; esse dinheiro foi mal usado e foi acabando, As folhas do sistema, o desperdício, entre outras coisas, levaram ao quadro visto no inicio da década de 90: os escândalos da previdência, as crises intermináveis do serviço público de saúde e a total derrocada do sistema corno um todo. Entre as várias medidas para resolver essa crise, a saúde voltou para o Ministério da Saúde, separada das pensões e aposentadorias, que ficaram com o Ministério da previdência (SORRENTINO 1997). 35 Com a Constituição brasileira, promulgada em 1988, a saúde foi assegurada a todos os cidadãos brasileiros como dever do Estado, com a criação do Sistema Único de Saúde - SUS, que procura organizar a prestação de serviços em todo o pais. Segundo a lei 8.080, de 19 de setembro de 1990, Capitulo I, artigo 5 ° , são objetivos e atribuições do SUS: I - Identificação e divulgação dos fatores condicionantes e determinantes da saúde; II - A formulação de política de saúde destinada a promover, nos campos econômico e social; III - A assistência de pessoas por intermédio de ações de promoção, proteção e recuperação de saúde, com a realização integrada das ações assistenciais e das atividades preventivas. São três os princípios norteadores do SUS. Em primeiro lugar, ele é universal. Isso quer dizer que é garantido a toda a população o direito aos serviços de saúde que integram esse sistema, colocando um fim na exigência de apresentar carteira de trabalho ou qualquer outro comprovante para se ter direito ao atendimento em um serviço público ou privado que tenha convênio com o SUS. Em segundo lugar, ele é descentralizado. Isso define os municípios como os principais responsáveis pela administração do sistema de saúde local. Aos municípios conveniados com o SUS devem ser destinados verbas correspondentes ao tamanho e complexidade, do mais simples ao mais sofisticado, ou seja, do básico ao de alta complexidade O Instituto de Cardiologia 6 um hospital público de referência no Estado de Santa Catarina, atendendo pacientes cardiopatas. Foi inaugurado em 17 de abril de 1963, pelo então governador Celso Ramos. A Instituição é mantida por dotações orçamentárias atribuídas pela Secretaria do Estado da Saúde, auxilio e subvenções que são conferidas pelo Estado, União ou entidades de direito público e privado. Os usuarios, em sua grande maioria, são atendidos pelo SUS, sendo que o hospital atende ao que denomina pacientes com convénios e pacientes que arcam com as suas próprias despesas corn saúde. A missão do INCA é atender individuos com doenças cardiovasculares e orientar a população em geral, tendo como instrumento 36 de trabalho recursos humanos e tecnológicos, através de ações curativas, preventivas e de reabilitação, que integrem atividades de pesquisa e ensino. 0 INCA é uma instituição de caráter preventivo e curativo, prestando serviços tanto diretamente como através de assessoria e orientação. Dentre os graus de complexidade do sistema de saúde, o INCA enquadra-se no nível de alta complexidade, pois os tratamentos cardíacos quanto as intervenções cirúrgicas são tratamentos extremamente complicados e que necessitam de profissionais especializados e hospitais com infra estrutura e especialidade nesses tratamentos. 3.2 Contexto e dinâmica institucional O Instituto de Cardiologia existe hi 37 anos e, no momento de sua fundação, contava apenas com o serviço de ambulatório. O secretário da saúde, A época, era Dr. Fernando Osvaldo de Oliveira e o diretor geral do instituto era Dr. Isaac Lobato Filho. 0 INCA funcionava A Rua Felipe Schmidt, no centro de Florianópolis, Capital. 0 Instituto surgiu devido A falta no Estado de um hospital para pacientes cardíacos, que suportasse a grande demanda, que cada vez crescia mais. Logo foi transferido para o Hospital Celso Ramos, onde passou a contar com leitos para internação, ficando o ambulatório instalado no prédio do Hemosc. Foi a partir do dia 30 de novembro de 1987, que o INCA passou a funcionar junto ao Hospital Regional de São José, Dr. Homero de Miranda Gomes, tendo como diretor Dr. Jauro Collaço. De 1991 a 1993, a direção geral ficou a cargo do Dr. Théo Fernando Bub. de 1993 a 1995. teve como diretor o Dr. Antônio Silveira Sbissa e, de 1995 a 1999, o diretor geral foi Dr. Jamil Cherem Schneider. Atualmente, o Dr. .Antônio Silveira Sbissa novamente é o diretor. 0 INCA contou com sua primeira Assistente Social em 1987. que Márcia Ferreira Sell, a qual trabalha até hoje no Instituto, que conta corn mais dois assistentes sociais. 37 Conforme o artigo primeiro do regimento interno do INCA, o mesmo direciona suas ações para os seguintes objetivos. I - Organizar e operar o serviço de cardiologia, objetivando colaboração com a Secretaria do Estado de Saúde de Santa Catarina, na prestação de assistência à população catarinense; 2 - Colaborar com os órgãos técnicos da SES (Secretaria do Estado da Saúde de Santa Catarina) na solução dos problemas médico-hospitalares, relacionados com a atividade de cardiologia; 3 - Realizar pesquisas, inquéritos e estudos necessários ao desenvolvimento de sua especialidade; 4 - Colaborar com os órgão técnicos da SES na especialização, treinamento e aperfeiçoamento de pessoal técnico (.......). Esses objetivos são constatados nos tratamentos clínicos, cirúrgicos, ambulatorial, hemodindmico, com realização de exames. Mesmo a demanda sendo muito alta, o serviço prestado pela maioria dos profissionais é de qualidade, sempre buscando um aperfeiçoamento profissional. De acordo com o artigo terceiro do regime interno do INCA, para execução de suas finalidades o INCA segue uma estrutura organizacional que é a seguinte: Diretor Geral; Gerente Técnico; Gerente do Corpo Clinico; Gerente Administrativo e Financeiro; Gerente do Corpo de Enfermagem; Assessor de Direção; Assessor da Gerência Administrativa Financeira 0 Serviço Social está articulado ao trabalho da gerência técnica. 0 INCA está pleiteando a criação de uma nova sede, exclusiva instituição, tendo como prioridade o bom atendimento. Os pacientes são encaminhados ao INCA pelas mais diversas instituições, seja pela SES, municipios, hospital, visto que o INCA é o único hospital especializado no tratamento cirúrgico cardíaco do Estado e que atende pelo Sistema Único de Saúde. 38 Devido A grande demanda, As vezes, a programação não se cumpre, as cirurgias cardíacas não são realizadas, desencadeando, assim, problemas como cirurgias que são prorrogadas. Dentro do INCA existe a associação de funcionários, sindicato dos médicos, associação de servidores, federação dos trabalhadores na saúde. A instituição tem como planos e programas fazer transplante cardíaco, possuir sede própria, fazer atendimento domiciliar aos pacientes com miocardiopatia dilatada. 0 INCA tem uma equipe que é o grupo de pesquisa, cuja principal função é decidir a ética da pesquisa na instituição. Fazem parte dessa equipe: padre, assistente social, médico cirurgião, escriturário, técnico de enfermagem e enfermeiro. A compra de medicamentos, equipamento e contratação de pessoal é totalmente dependente da Secretaria de Estado da Saúde. Após o instituto ter sua sede própria, ele terá melhores condições de atendimento e um número maior de leitos para internação, além de uma melhor estrutura para a realização das cirurgias cardíacas. Podemos dizer que no INCA existem fatores que estão deficitários. como é o caso do abastecimento em relação a vestuário que é muito precário, tendo na grande parte das vezes, o paciente que trazer roupas de cama da própria casa. Mas em relação à alimentação e medicamentos tudo é sempre muita bem fornecido. Muitas vezes, os profissionais que trabalham no INCA têm uma remuneração baixa, devido ao rebaixamento salarial e aos não reajustes mas mesmo assim, o atendimento com os pacientes é satisfatório e notório perante todos. 0 trabalho em saúde é um trabalho essencial à vida humana e é parte do setor de serviços. t. um trabalho da esfera da produção não-material, que se completa no ato de sua realização. Não tem corno resultado urn produto material independente do processo de produção e comercializivel no mercado. 0 produto 6 indissociável do processo que o produz é a própria realização da atividade. (PIRES, 1998, p. 159) 39 3.3 Caracterização dos usuários Os usuários do Instituto de Cardiologia são pessoas com os mais diversos problemas cardíacos, desde o paciente que esta ali somente para tratamento medicamentoso, até aquele que está à espera de uma intervenção cirúrgica. Sao pessoas que se encontram muito tempo internadas no hospital devido ao quadro clinico em que se encontram no momento da internação. 0 paciente cardiopata é uma pessoa que vive um grande grau de tensão emocional, pois ele sabe que seu problema não é um mero "propleminha" e se torna, na maioria das vezes, emotivo e angustiado, exigindo uma maior atenção de todos que estão ao seu redor, entre esses, familiares e profissionais. As atitudes e os processos mentais acabam desempenhando papel relevante no desenvolvimento da doença e no processo de cura, como conseqüência de sua influencia psicológica. Nesse momento, compete aos profissionais e familiares encorajar o paciente a desenvolver sua auta-confiança, apontar aos pacientes exemplos de cirurgias que obtiveram sucesso, garantir os seus direitos propiciando maior confiabilidade em si e nos profissionais e familiares que o cercam. (DOMINGUES, 2000, p. 38) No Instituto de Cardiologia, os pacientes provem de várias classes sociais e que, devido a sua saúde, se tornam vulneráveis a situações emotivas e psicossociais. Desse modo, os múltiplos aspectos relacionados ao tratamento desses pacientes têm exigido a participação de vários profissionais da area da saúde, além da simples presença do médico. Entre esses profissionais está o Assistente Social. Esses profissionais devem ver esse paciente como um todo, pois não é somente a doença que o preocupa, mas o processo como um todo. Para que a equipe de saúde entenda o paciente corno portador de direitos e de forma humanizada, deve o profissional da saúde procurar atende-lo como pessoa e não como número ou membro do sistema. Seus sentimentos, sua angústia e sua indefinição diante do caso devem ser considerados. Isso porque, ao chegar, o paciente traz consigo uma carga emocional muito grande, pois está preocupado corn a doença, e começa a se preocupar, também, corn o ambiente em que está sendo inserido. (DOMINGUES, 2000, p. 40) 40 Entre os pacientes cardiopatas internados no INCA, pode-se verificar que existem aqueles que compreendem realmente o que estão passando e aqueles que deixam transparecer a não aceitação da doença, não que seja fácil aceitar ter uma doença crônica, mas pensam que seu estado de saúde não terá melhora; essa diferença é muito visível de um paciente para outro, isso também transparece mais nos pacientes que terão uma intervenção cirúrgica. Buscar entender os motivos que conduzem as pessoas a adotarem ou não comportamentos e práticas de cuidados favoráveis à promoção ou preservação da própria saúde é tarefa por demais desafiadora e, ao mesmo tempo, muito estimulante, pois exige do investigador a habilidade de lançar um olhar abrangente sobre o universo das mesmas, visando captar a compreensão que possuem a respeito de saúde e doença, seus significados e a maneira como interpretam seus problemas de saúde e, consequentemente, respondem aos memos (WALDMAN, 1999, p. 93). Para um indivíduo, muitas vezes, ter saúde é simplesmente não estar sentindo nada fisicamente, pois para muitos somente a dor física representa doença; carecendo de muita informação, pois saúde é um conjunto de fatores, entre eles: moradia, alimentação, higiene, tudo isso contribuindo para um bom estado corporal, emocional e social. Segundo WALDMAN (1999, p. 95) [...] os significados de saúde e doença variam entre indivíduos, grupos culturais e classes sociais, conforme cada época e cultura, pois as pessoas tem saúde ou doença segundo a classificação de sua sociedade, vista que esses conceitos estão intimamente relacionados à transformação cultural e estrutura social, responsáveis por sua compreensão de mundo. Outra caracteristica dos usuários do INCA é que são pessoas que somente passando por esse momento de dificuldade começam realmente a dar importância aos momentos em que estavam bons. É claro que há pacientes com problemas cardiacos mesmo se cuidando, como é o caso dos paciente onde a doença é urn fator de hereditariedade, e mesmo as crianças que já vem com o problema desde a vida intra-uterina, mas a grande maioria foram relapsos em relação aos cuidados que deveriam ter tido, como, por exemplo: o fumo. o cigarro. o sedentarismo e os controles normais para se ter uma boa saúde. 41 Um dos grandes erros do homem e só dar valor ao que quer conquistar ao que já perdeu. O que o homem possui, tranqüilamente, passa-lhe desapercebido. Dessa forma, so considera a saúde quando está lutando para readquiri-la ou quando a perdeu em definitivo. 0 que significa que a saúde passa a ser conseqüência da doença ausente, e que todas as atenções ficam para a doença, não para a saúde. (LEITÃO, 1993, p. 93) Uma característica muito forte nos pacientes cardiopatas necessidade de a família estar por perto, para auxilia-los é a e lhes dar conforto na hora mais difícil de suas vidas. A família, por si só, é uma peça fundamental em todo o processo hospitalar que o paciente terá que enfrentar. [...] a grande importância do envolvimento dos familiares nesse processo; assim torna-se cada vez mais imprescindível a participação destes durante todo o periodo de tratamento de um paciente internado, pois a presença de alguém querido faz com que o paciente tenha mais confiança em sua recuperação, pois tem a certeza de que existe alguém esperando por essa melhora e/ou cura (ADÃO, 2000, p. 30). 4 EIXOS DE INSERÇÃO DO TRABALHO DO SERVIÇO SOCIAL NO INSTITUTO DE CARDIOLOGIA DE SANTA CATARINA 4.1 Práticas Educação e Saúde e Serviço Social A saúde pública talvez seja uma das poucas areas de ação em que existe a possibilidade de qualquer profissional olhar e atuar, concretamente, em um cenário onde se sobressaem as diferenças de classes, caracterizada principalmente pelos focos de epidemias, pela desnutrição, pelo desemprego, pela falta de moradia e de serviços de saúde compatíveis com as necessidades da demanda. Os resultados são os altos indices de mortalidade e de pessoas sempre à procura dos hospitais. Devido a essa demanda sempre ser muito grande, é necessário que se faça um trabalho no sentido de prevenir essas doenças, como forma de proteção, o que pode ser feito através de uma prática sócio-educativa. A pratica sócio-educativa se dá nesse espaço como ação de promoção e proteção à saúde. Para isso, são necessárias propostas de participação social para essa area, propostas estas que deverão estar voltadas, não só para o fato criterioso das intenções e ações que desencadeiam dessa politica o controle social, mas, também, para elaboração e organização dos serviços. Para isso, é importante que essa prática seja desenvolvida no sentido de desenvolver consciências. As mudanças so se tornam concretas com as ações dos homens sobre o meio. Concomitantemente, porem, deve haver mudanças ao nivel das consciências desses mesmos homens, que, ao visualizarem as contradiOes no processo saúde-doença, poderiam contribuir para a construção de uma realidade mais justa (WENDHAUSEN, 1992. p. 22). 43 importante uma identificação, não s6 da política desenvolvida, como também das demandas colocadas para o serviço, fazendo um questionamento e redefinindo o papel destas na sociedade, fazendo uma discussão dos direitos, obrigações, necessidades, construindo mecanismos de viabilização da participação de segmentos sociais no que se refere as questões. A educação é de suma importância, mas é preciso resgatar seu verdadeiro valor para a população. Nesse sentido, cabe ao pro fissional da saúde e também cidadão desvendar a realidade, uma visão mais concreta dos determinantes saúde/doença e de sua própria vida. Deve também o profissional, junto com a comunidade, participar da luta na melhoria de suas condições de vida. A prática educativa, antes de qualquer coisa, deverá ser uma prática educada, norteada por conhecimentos, percepções e motivações, que reflita criticamente a realidade social, cultural e política da população. Nesse sentido, ela tenta romper ações e posturas alienadas, fetichadas ou mesmo basistas, e busca apreender as questões sociais na sua historicidade. Com isso, depreende-se o fato de que o educador, dado o seu objeto de trabalho, jamais terá que acomodar-se no seu divã institucional, mas munir-se permanentemente de uma consciência critica, consciência teórica, habilidade diagnóstico e competência técnica, para elucidar sua prática cotidiana. (LAFEVRE, 1989, p. ? apud OLIVEIRA, 1991, p. 78) Segundo Oliveira (1991, p. 78) Educação em saúde é uma prática social que se relaciona intimamente com as ciências sociais e com a ciência da saúde. Tem como objeto de ação a construção de um projeto politico pedagógico, que possibilite população o desenvolvimento de estratégias de ação que leve à superação da dominação e à construção de um processo de cidadania. .A dimensão social dessa pratica permite caracterizá-la como sócioeducativa, pois sua ação baseia-se na participação dos cidadãos na efetivação e controle dos serviços de saúde e no que diz respeito as ações e relações que ocorrem dentro da própria instituição de saúde, em qualquer nível de atendimento hospitalar, seja em postos de saUde, ambulatória ou até mesmo hospital especializado. Desse modo, população e profissionais da saúde são sujeitos envolvidos diretamente na pratica educativa. 44 0 processo educativo, seja ele especifico ou não, quando exercido de modo intencional, pode gerar organização e ampliar as condições de cidadania da população, consequentemente mobilizando-a para seus enfretamentos e ações no sentido de contribuir para melhoria de sua qualidade de vida. Esse é um processo que exige co-responsabilidade, auto determinação e participação, elementos que existem na medida em que os indivíduos possuem conhecimento da realidade que os cerca, no caso especifico, da realidade de saúde. (WENDHAUSE, 1992, p. 35) A educação, em saúde, mesmo sendo constituída em um campo especializado de saber, uma vez caracterizada como prática sócioeducativa, deve ser conhecida como atuação de todos os profissionais da área. Todo profissional deve ter em sua formação, uma base pedagógica, que o habilite a desempenhar uma prática reflexiva/critica. [...] é necessário um comprometimento do técnico entre fazer profissional e a 'coisa social' sobre a qual imprime sua ação. A relação de cumplicidade de que ai se estabelece é fator essencial no processo de mudança de comportamento, devendo esta ser consolidada, principalmente, a partir de um processo pedagógico socializante que terá por base o tripe informação, educação e comunicação, vistos numa perspectiva de democratização e decodificação de conhecimentos, ações e relações. (OLIVEIRA, 1991, p. 79) 0 conhecimento dos principais problemas de saúde da população está relacionado com as bases sociais de produção da doença que são: alimentação, habilitação, subemprego, desemprego, ausência de saneamento básico, enfim, com as condições de vida da população. Diante disto, saúde, indivíduos e profissionais devem se colocar de forma participativa no contexto da sociedade, pois são partes de uma totalidade histórica e, como tal, devem se posicionar dentro de urna perspectiva globalizante, nunca perdendo de vista seu objeto de ação, sempre se instrumentalizando para assumirem um compromisso com o projeto de construção de cidadania. Saúde coletiva depende, em grande parte, do exercício de estratégias desalienantes, na decodificação analisada de informações básicas necessárias ao exercício da cidadania, na desmistificação do saber médico, social, educacional, histórico, econômico. (OLIVEIRA, 1991, p. 82) 0 processo de educação deve ser compreendido, não apenas como um direito do cidadão. mas como um compromisso na formação da cidadania, 45 fazendo com que as pessoas se tornem capazes de compreender a realidade social e atuando sobre essa realidade. Os profissionais de saúde têm uma prática educativa, a partir do momento em que essa prática estiver comprometida com uma proposta democrática, isto 6, voltada para a construção da cidadania. Com isso, a prática educativa ganhará força e reconhecimento perante a sociedade civil e política. [...] propostas educativas devem estar sempre presentes em todas as ações nos serviços de saúde, realizando-se em bases coletivas, oportunizando a reflexão do conjunto dos profissionais comprometidos com a transformação social. A prática educativa necessita de um tratamento sistemático, metodológico e critico, além de acompanhamento continuo do desenvolvimento das ações de saúde, o que exige uma reflexão permanente do processo. (WALDMAN, 1999, p. 60) O profissional do Serviço Social é um desses profissionais que têm como prática na área de saúde, a prática sócio-educativa. A preocupação das tarefas de estudo pelo assistente social é a de chegar nos aspectos que desestruturam o paciente, para depois estabelecer um tratamento. 4.2 0 .Assistente Social e o Hospital 2 0 assistente social trabalha nos hospitais, na inter-relação corn os pacientes e sua familia. Quando a população procura o hospital, já sabe o que ela quer da instituição, o direito de tem á saúde, supõe que a população não é pedinte em termos de saúde. 0 assistente social tem obrigações profissionais dentro do hospital; como parte do corpo de funcionários do hospital, ele deve colaborar para que se tenha bons resultados nos serviços prestados e a população seja bem atendida. Pois o atendimento do hospital. prestado à população. é mais valorizado quanto maior for o seu nível de qualidade. 2 Esse item foi baseado. fundamentalmente. nas indicaOes de COSTA (2000) c BERTANI (1993). 46 A intervenção profissional direta remete a reflexões e tomadas de posição sobre saúde, acesso a tratamento e condições de vida dos doentes, numa esfera maior e mais ampla do que a situação concreta possa transparecer. A função do assistente social do hospital, então, possibilita condições para o paciente participar do que é seu direito, o tratamento de saúde, e localiza o Serviço Social nas organizações hospitalares modernas. (BERTANI, 1993, p. 43) A prática dos assistentes sociais, foi, muitas _vezes, revista através dos anos. Não era a prática em si que era questionada, mas, sim, o desempenho das práticas repetitivas e sem um referencial teórico. Não se percebia que prática e teoria interagem, são inseparáveis no exercicio de qualquer profissão. Os assistentes sociais sabem que muitas vezes, o usuário, por uma estratégia de sobrevivência, acaba desenvolvendo repertório de ações, que muitas vezes permite-lhes lidar em com os profissionais da instituição. Mas não é o conhecimento das normas e regras da instituição que faz do pro fissional o controlador do usuário. "Na tentativa de realizar sua ação profissional, o assistente social elementos essenciais na sua prática, como princípios valorativos, um corpo de conhecimentos e um repertório interventivo." (BARTLETT, 1970, apud BERTANI, 1993, p. ?) Muitas vezes, os doentes têm muitas dificuldades em se movimentar dentro dos hospitais devido aos esquemas formais da instituição, e são os assistentes sociais os primeiros a auxiliarem os mesmos, flexibilizando essas normas em favor do paciente. Pois orientação e informação podem ser consideradas auxilios e não só fatores disciplinadores. A ação profissional, na sua inter-relação com o usuário, como com a instituição, está sempre se modificando, interagindo e provocando mudanças em função de uma aliança de compromisso com os interesses do usuário. O usuário não e apenas um consumidor dos efeitos úteis do trabalho, ele participa do processo de trabalho. na medida em que dele depende o fornecimento de informações sobre seu estado de saúde. Nos serviços de saúde. a inserção dos assistentes sociais no conjunto dos processos de trabalho destinados a produzir serviços para a população e por um conjunto de necessidades que se definem e redefinem a partir das 47 condições históricas sob as quais a saúde pública se desenvolveu no Brasil. (COSTA, 2000, p. 41) 0 Serviço Social, ao atender as necessidades imediatas da população na saúde, interfere e cria mecanismos que incidem sobre as principais contradições do sistema de saúde no Brasil. Podemos citar como os principais pontos referências: um grande crescimento da população por meios que venham assegurar a sua saúde, o déficit na oferta de serviços, a efetivação dos mecanismos de controle e acompanhamento ao processo de reorganização do SUS e a administração de uma reprimida demanda. COSTA (2000, p. 42) diz que as tensões do sistema fizeram com que tivesse urna ampliação e um maior dimensionamento das atividades e qualificações técnicas e políticas dos assistentes sociais. Segundo COSTA (2000, p. 42), as atividades do Serviço Social estão prioritariamente concentradas nos seguintes campos de atividades ou eixos de inserção do trabalho profissional, que se relacionam intimamente corn requisições. São elas: k77 Ações de caráter emergencial: São ações consideradas excepcionais, nas quais os mecanismos instituicionais existentes não as absorvem cotidianamente, ações essas que se expressam em atividades voltadas para agilização de internamentos, exames, consultas, tratamentos, medicamentos, sangue, próteses, etc... Essas ações exigem uma certa mobilização e a articulação de recursos humanos e materiais dentro e fora do sistema público e privado de saúde. Educação e informação em saúde: Sao atividades que consistem em informações individuais ou grupais ao usuário , família e a comunidade. Informações essas que têm como objetivo esclarecer, informar e buscar soluções em relação a problemáticas que envolvem a colaboração na solução de problemas de saúde, tanto individual como coletiva, principalmente quando se trata de epidemias e endemias. 48 Planejamento e Assessoria: Essas ações são mediadoras da cooperação e constituição dos diversos processos de trabalho que envolvem gestores, funcionários, profissionais e usuários dos serviços de saúde. Essas atividades estão relacionadas com a realização de ações voltadas para o processo de reorganização do trabalho no SUS, no que diz respeito à assessoria e planejamento das unidades de saúde, especialmente em práticas de educação em saúde, que compreendem as ações e atividades de vigilância alimentar e sanitária, instrumentalização dos processos, controle das ações. Treinamento, preparação e formação de recursos humanos, atividades essas voltadas para a capacitação de funcionários, etc... Li Mobilização da Comunidade: Essas atividades consistem basicamente em ações educativas, voltadas para sensibilização e mobilização da comunidade em função da instalação e funcionamento dos conselhos de unidades de saúde e do engajamento na organização de trabalhos educativos voltados para a prevenção e o controle de endemias e epidemias. São atividades voltadas ao contexto politicooraanizativo e instrumental. COSTA (2000, p. 43) diz, também, que o conjunto dessas atividades é operacionalizado por meio dos seguintes núcleos de objetivação do trabalho do assistente social, que são: e LTh Levantamento de dados que consiste na caracterização identificação das condições socio-económicas e sanitárias dos usuários.. LY Interpretação de normas e rotinas que são os procedimentos de natureza educativa, como orientações individuais e coletivos: e encaminhamentos 49 ti Agenciamento de medidas e iniciativas de caráter emergencial; Desenvolvimento de atividades de apoio pedagógico e técnicopolitico junto aos funcionários, aos representantes dos usuários no sistema e à comunidade de usuários. 0 levantamento de dados baseia-se na realização do levantamento dos dados socio-econômicos e culturais dos usuários ou da comunidade. No atendimento hospitalar, essa obtenção de dados é realizada por meio de preenchimento de questionários, entrevistas, sendo essa a primeira etapa de atendimento e acompanhamento realizado pelo assistente social. Com isso, forma-se um conjunto de procedimentos e normas relacionadas ao internamento dos pacientes. Nos hospitais, essa atividade relaciona-se com a necessidade de dar agilização ás iniciativas e providências na realização de exames, aviso de alta ou óbito, relaciona-se também com a necessidade de garantir a rotatividade dos leitos. Nos hospitais, a interpretação de normas e rotinas, seus principais pontos de atuação, estão relacionados com o cumprimento de horários e tempo de duração das visitas, o número de visitantes que é permitido para cada paciente internado, os comportamentos que podem ser adotados durante a visita e, também, com as atitudes e comportamentos do pacientes e de sua familia após a alta hospitalar, que ainda é o periodo em que o paciente está se recuperando. Segundo COSTA (2000, p. 51) Esse conjunto de atividade origina-se, de um lado, da rigidez das normas e da própria natureza do sistema de saúde, ao requisitar comportamentos, cuidados e precauções especiais para a circulação do paciente e dos seus familiares e visitantes no interior das unidades, derivando-se, por outro lado, de um conjunto de situações que se relacionam COM o grave quadro de exclusão social, cultural e educacional a que está submetido população usuária do SUS a ponto de comprometer a própria capacidade da população para decodificar normas e rotinas que poderiam ser repassadas por outros meios. Nos procedimentos de natureza sócio-educativa que acontecem nas diversas fases do acompanhamentos e atendimento ao usuário em todas as 50 unidades de saúde, a prática do assistente social esta voltada para "educação em saúde", através de orientações e encaminhamentos individuais ou não, que, de uma maneira quase que geral, atividade acontece junto ao processo de interpretação de normas e rotinas. 0 assistente social é o profissional responsável pela mobilização do usuário em relação à captação de sangue, tratamento fora do domicilio, necrápsias, realização de exames mais complexos, etc... 0 assistente social tem também a responsabilidade dos avisos em geral; nos hospitais, o profissional é responsável pelo aviso de altas, óbitos e estados de saúde do paciente. 0 procedimento usado para esses procedimentos é basicamente a linguagem e o conhecimento. Nos hospitais, é função também do assistentes social trabalhar na orientação quanto aos cuidados que os familiares devem tomar durante as visitas ao paciente, orientações essas que previnem quanto aos comportamentos que venham comprometer o estado de saúde do paciente, assim também como os procedimentos que dever ser tomados no momento após a alta, como, por exemplo, recomendações terapêuticas, como a medicação, higiene e cuidados necessários para evitar o contagio da doença. 0 assistente social presta informações sobre a importância do retorno para avaliação e informa sobre as unidades de referência que devem ser procuradas para continuação do tratamento. Para se ter um resultado concreto e se atingir o objetivo esperado, faz-se necessário que o profissional do Serviço Social trabalhe, conjuntamente, em praticas multidisciplinares e interdisciplinares com, os demais profissionais, como, por exemplo, enfermeiros, nutricionistas, psicólogos ... na organização de atividades educativas, como formação de grupos de orientação e oficinas terapêuticas para o acompanhamento no tratamento dos pacientes. Podemos afirmar que há necessidade de o assistente social, em complementaridade corn a equipe multidisciplinar, participar de e organizações, direcionar entendimentos corn outros profissionais movimentos em beneficio do doente, garantindo a sobrevivência da própria instituição. Se a organização se destina ao atendimento da população, o compromisso corn o usuário legitima sua existência e continuidade. (BERTANI, 1993, p. 449) 51 Como forma de prevenção e controle das doenças, os assistentes sociais organizam, coordenam e fazem palestras, também coordenam eventos e discussões relacionadas a preconceitos e atitudes prejudiciais à saúde. Para dar encaminhamento a esses trabalhos, o assistente social se utiliza de normas e portarias, pois necessita tomar conhecimento da legislação social existente, como, por exemplo, a LOAS, LOS, ECA, Código de defesa do Consumidor, atenção nas mudanças que podem ocorrer na unidade de saúde em que trabalha, como também para onde ele faz encaminhamentos, com o objetivo sempre de fazer melhor atendimento ao usuário. 0 agenciamento de medidas e iniciativas de caráter emergencial diz respeito a tomar providências no que se refere no atendimento às urgências sociais, as quais envolvem o processo de prestação de serviços, como, por exemplo, transporte, marcação de exames e consultas extras, providências quanto a recursos assistenciais. Nos hospitais, o serviço social tem como uma das principais solicitações, a providência de transporte para os paciente, no que se refere a transferência de hospital ou realização de exames fora do hospital. Também ocorrem transportes para saidas extras, como por exemplos recebimento de benefícios da previdência, fazer documentos em cartórios. 0 assistente social também é acionado na marcação de exames, consultas e internamentos extras, frente a grande procura reprimida por consultas, leitos e exames. Nesses casos, a solicitação é feita através das direções das unidades, e se referem à intervenção do Serviço Social junto As várias instáncias do sistema, seja A família, ás instituições sociais ou os politicos. Em se tratando de exames, um fator é determinante nesse caso: trata-se da realização de exames pagos pelo SUS, quando sua quota se esgota, ou referem-se a exames que o próprio SUS não autoriza. Esses problemas se agravam da relação do SUS com o sistema privado de apoio ao diagnóstico, o qual é responsável por 90% dos exames complexos com os quais é conveniada, e que programa o atendimento aos usuários do SUS, colocando-os em longas filas de espera, ocorrendo muitas 51 suspensões do tratamento. Isso ocasiona a procura pelo Serviço Social para intermediar o atendimento. [...] a legitimidade do Serviço Social no interior do processo coletivo de trabalho na saúde se constrói 'pelo avesso', ou seja, a sua utlidade se afirma nas contradições fundamentais da política de saúde e, particularmente, no SUS. Trata-se, portanto, de uma atividade ocupacional que particulariza sua inserção no conjunto dos processos de trabalho na saúde, prioritariamenre em função dos segmentos excluídos social e culturalmente. Isso significa que as principais situações-objeto da intervenção do Serviço Social são aquelas que envolvem os excluídos, os 'inaptos' e os incapazes de receber, total ou parcialmente, atendimento das unidades. (COSTA,2000, p. 66) 0 desenvolvimento de atividades de apoio pedagógico e técnicopolitico refere-se à realização de atividades que o assistente social organiza, assessora e realiza, na organização de seminários, cursos, debates, treinamentos, palestras e reuniões. 0 assistente social, inserido no interior do processo de trabalho em saúde, age de um modo interativo, como uma ligação entre os diversos níveis do SUS, e entre o SUS e as demais políticas sociais existentes, o que pode-se concluir-se que o seu principal produto de trabalho é assegurar, por mais tortuosos que sejam os caminhos, a integralidade das ações. 0 que é relevante para realizar urn atendimento, por mais que possa parecer a atividade e os meios utilizados, o assistente social necessita conhecer, não apenas o funcionamento do sistema de saúde (rede) , a dinâmica e a capacidade de atendimento de outras instituições públicas e privadas que envolvam ou se apresentem como um meio de viabilizar o atendimento das necessidades da população e que extrapolam a capacidade de atendimento exclusivo das Instituições de saúde. (COSTA, 2000. p.62) Segundo Pires (1998, p. 196), o assistente social não é especificamente um profissional de saúde, mas pode atuar em serviços de saúde, prestando assistência direta aos pacientes com problemas sócio-econômicas e familiares que interfiram na sua doença ou que o paciente está, momentaneamente, impossibilitado de resolver. No hospital publico, os assistentes sociais atuam nas unidades avaliam a situação social de cada paciente. A partir dai, levantam necessidades e problemas, depois adotam medidas para resolvê-los. Acompanham as altas hospitalares, providenciando transporte ou resolvendo outros problemas[...] 53 4.3 0 Serviço Social no INCA 0 Serviço Social, no Instituto de Cardiologia de Santa Catarina, local onde fiz meu estagio, atua como sócio-educativa e sócio-terapêutico, ou seja, ele é orientado em todas as dúvidas que o paciente e sua família possam vir a ter em relação ao hospital, aos seus direitos enquanto estiver internado, fornece orientação no sentido de doação de sangue, cuidados pré-operatórios, acompanhantes no hospital e qual o procedimento no momento da alta, atuando, também, nos momentos em que o paciente precisa de um encaminhamento ou esclarecimento de dúvidas, como, por exemplo, a sua situação em relação à perícia, a atestados médicos, qual deverá ser seu procedimento junto ao INSS (Instituto Nacional de Seguridade Social). Em alguns casos, o próprio profissional entra em contato com o órgão solicitado. Uma situação que é muito vivenciada são os contatos feitos com o Serviço Social das prefeituras de outros municípios, sempre se tratando de providenciar transporte para algum paciente daquele município ou até mesmo algo que o paciente esteja precisando naquele momento, como é o caso dos doadores de sangue, para cirurgia. 0 Serviço Social faz também um trabalho com os pacientes que precisam fazer um transplante, pacientes estes que são portadores de miocardiopatia dilatada cuja situação somente é amenizada através de medicamentos. Muitos deles já estão A espera de um transplante cardiaco há muito tempo, mas, como para se fazer um transplante, precisa-se de um doador e que também a pessoa esteja apta ao transplante, muitos deles ficam muito angustiados. Nesses casos, o serviço social faz um estudo sócio-econômico da situação dos pacientes portadores da doenças, para que o hospital forneça-lhes remédios por dez dias durante todos os meses. Faz urn estudo tam'bem das condições da familia; caso ela faça o transplante, isso inclui o ambiente onde vivem, pessoas que possam dedicar-se ao paciente no momento da recuperação. 0 Assistente Social fornece o parecer sobre a viabilidade do transplante. 54 0 assistente social está preparado para acrescentar na relação com o paciente elementos que possibilitem o enfrentamento de sua condição de pessoa doente, sua relação com a família, no emprego, junto Previdência, à continuidade do tratamento e outras condições chamadas 'sociais' vitais à sobrevivência e que são de seu domínio profissional. (BERTANI, 1993, p. 42) No INCA, a intervenção do assistente social que eu acompanhei no estágio vai desde o momento de internação até o momento do óbito. Para fazer essas intervenções, o profissional do Serviço Social usa suas ferramentas de trabalho. No momento da internação, são feitas entrevistas com o paciente, e antes de se chegar ao mesmo, é verificado o seu prontuário, para quando se chegar ao quarto, se possa saber um pouco sobre sua pessoa. Nas abordagens individuais, são observados os aspectos em relação A procedência, família, emprego, como se sente em relação à internação, motivo da internação; na maioria das vezes, as entrevistas se tornam um espaço de troca bastante produtivo, pois o paciente relata tudo de uma maneira como se quisesse expor todo seu anseio e suas expectativas. Durante as entrevistas, colocam suas dúvidas sobre o tempo de internação, os que trabalham perguntam sobre o momento da perícia, documentos que precisam levar do hospital. .As entrevistas têm como objetivo um conhecimento próximo da realidade do paciente, o que é obtido através de um levantamento sócio-econômico. Também é analisada a relação familiar. além de outros fatores que desencadeiam a doença do coração, preocupações e angústias, para que se possa fazer a intervenção. simultaneamente, procurando recursos que poderão beneficiar o paciente. A entrevista é o momento do encontro na situação de diálogo entre seres humanos e suas histórias de vida. 0 que os difere é o papel assumido dentro da instituição, no momento em que um procura o outro e expõe sua dificuldade/necessidade. 0 solicitado, muitas vezes, contradizendo sua proposta de 'ser profissional', assume o 'saber instituicionalizado'. o saber legitimado como oficial e orienta o paciente como um portador do nãosaber, uma 'tabula rasa', unia folha em branco que precisa e deve ser preenchida com informação sofisticada. 0 cliente expõe publicamente sua necessidade para receber ajuda, orientação, encaminhamento. Abre um pouco a janela de sua privacidade para poder ter o que é seu direito, tem 'esperança-dúvida' de ser bem atendido e deseja resolutividade para usa solicitação. (BERTAN1, 1993, p. 44) 55 Num primeiro momento as entrevistas são feitas no tipo fechada, que é quando se vai ter a primeira conversa com o paciente. No segundo contato com o paciente, essas entrevistas sempre são feitas do tipo entrevista aberta, a qual é norteada pelos objetivos pelos quais a entrevista está sendo realizada. Esse tipo de entrevista propicia para ambos, tanto entrevistador como entrevistado, uma liberdade de expressão, pois o entrevistado pode falar livremente, de acordo com sua necessidade, e fornecerá 'as pistas' a serem seguidas pelo entrevistador, havendo por parte deste uma colaboração não diretiva. A entrevista sempre é feita de uma maneira que não venha intervir no que o paciente não quisesse falar, respeitando seus direitos e suas vontades, buscando sempre detectar o que poderia ser feito para ajuda-lo e orientá-lo no que for preciso. Outra ferramenta usada para intervenção de seu trabalho no INCA são as reuniões realizadas com os familiares dos pacientes. É explicado para o familiar que ele tem papel fundamental na recuperação do paciente, eles relatam todos os seus anseios e também os anseios do paciente sobre a demora da cirurgia; é explicado que o procedimento é demorado devido a várias pessoas estarem internadas e por o INCA ser hospital referência no Estado, a demanda é muito grande. São detalhados os cuidados que devem ser tomados após a cirurgia, tempo de internação e todo o procedimento hospitalar. Nas reuniões, o serviço social divulga e faz divulgar o conhecimento adquirido. Em todas as reuniões, é explicado que todos têm direito a um atendimento digno de cidadão, que contribui para o funcionamento do hospital e que saúde é urn direito de todos. Segundo art. 196 da Constituição Federal . A saúde é um direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem a redução do risco da doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário as ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. 0 assistente social procura orientar os familiares nos cuidados do pós-operatório com o paciente, nas mudanças de hábitos que a família terá que fazer para que o paciente tenha uma melhor condição de vida. Nessas reuniões, constata-se que a família se mobiliza em torno do problema e a 56 para que no preocupac -do é tanta que muitas vezes tem que alertá-los passem essa angústia para o paciente. A intervenção profissional direta remete à reflexão e tomada de posição de vida dos doentes, numa sobre saúde, acesso a tratamento e condições mais ampla do que a situação concreta possa transparecer. esfera maior e A função do assistente social do hospital, então, possibilita condições para saúde e localiza o paciente participar do que é seu direito, o tratamento de o Serviço Social nas organizações hospitalares modernas. (BERTANI, 1993, p.43) CONSIDERAÇÕES FINAIS Assim como ocorre em relação às outras doenças, mais importante que tratar as patologias do coração é evitá-las, desenvolvendo melhores hábitos, como adotar uma alimentação com mais fibras, frutas, legumes e carnes magras e menos açúcar e alimentos gordurosos, reduzir ou eliminar o hábito de fumar e o uso de outras substancias tóxicas, praticar esportes e exercícios físicos, ampliar os momentos vividos junto à natureza, procurar reduzir a presença ou ação de fontes de estresse no dia-a-dia, melhorar as relações com pessoas da família, amigos e colegas, buscando, assim, diminuir a ansiedade e promover o bem-estar. O que acontece com os cardiopatas é que eles somente vão se dar conta dos hábitos sadios em relação à saúde somente quando já estão com seu coração comprometido e necessitando de intervenções, sejam elas medicamentosas ou cirúrgicas. As doenças cardiovasculares aumentaram muito nos últimos anos, e o, INCA, cada vez mais recebe pacientes cardiopatas. Com essa demanda, e devido à falta de sede própria do INCA, seu espaço é dividido com outro hospital, sendo o número de leitos insuficiente para a demanda apresentada e o número de cirurgias limitado em apenas. no máximo, três por dia, fazendo com que os pacientes fiquem um período prolongado na instituição, gerando , com isso, muita inquietude e reclamações por parte de pacientes e familiares. Os pacientes mencionados no trabalho têm como objetivo, nesse período de internação, realização da cirurgia corn sucesso e boa recuperação-. Para isso, existem familiares e profissionais capacitados, 58 voltados para o mesmo objetivo, ou seja, procurando auxiliar o paciente para que alcance êxito. 0 profissional do Serviço Social tem um papel fundamental nessa recuperação do paciente, pois ele intervem de maneira a deixar o paciente confiante no seu objetivo e expectativa de melhora. Como é uma situação que envolve não só o paciente, mas também os familiares que estão certamente muito abalados com a situação, mas tem que se mostrar forte perante o paciente, o Assistente Social vem ao encontro desses familiares no papel de orientador em relação aos procedimentos que serão enfrentados pelo paciente e até por eles mesmos. Uma das ferramentas de trabalho usadas pelo profissional para ajudar o familiar nesse esclarecimento são as reuniões do pré-operatório, em que todas as dúvidas podem ser sanadas, pois o familiar chega ao hospital para sanar o problema que tanto aflige o ente querido e, na maioria das vezes, se depara com um problemas maior que o esperado, como é o caso de uma intervenção cirúrgica. 0 familiar se torna carente de informações, pois o paciente se trona muito frágil. cabendo ao familiar ser o suporte ou melhor o grande apoio nessa hora. So que para o familiar poder ser o apoio, ele precisa ser orientado. Na maioria das vezes, eles têm informações distorcidas a respeito da internação e da cirurgia e até de seu papel como acompanhante, o qual é fundamental para a recuperação do paciente. A reunido faz corn que toda essa enxurrada de informações seja colocada ás claras e eles possam exercer com clareza o seu papel. Para o paciente, a hospitalização significa admitir que esta doente, a partir do momento em que assume isso, ele acaba expondo toda sua dor, seu sofrimento, revelando também sua fragilidade; diante disso, ele é um ser humano que deve ser respeitado por assumir a fragilidade diante da doença. Toda essa fragilidade serve de alerta para os profissionais que trabalham na instituição, mas também para os familiares do paciente e pessoas próximas dele, que acabam fazendo parte do processo de recuperação, que poderá ser longo, mas que com à união de profissionais e familiares, não será dificil atingir o objetivo da recuperação. Pretendemos, com o presente estudo enfocar a inserção de urn profissional que tem como papel na sua ação profissional ações 59 interventivas, sócio-educativas, sócio-terapéuticas,ações essas que vem ao encontro das necessidades dos pacientes internados. Isso significa, também, transcender o aspecto técnico de suas ações, o que, consequentemente, contribuirá para uma "assistência" mais humana na Area da saúde. O Serviço Social tornou-se de fundamental importância na área da saúde, ele tem toda uma capacitação que o torna capaz de exercer sua profissão e ir ao encontro das necessidades dos pacientes internados e seus familiares. Necessidades essas que vão desde uma orientação até um encaminhamento mais preciso do que estão precisando. Diante do trabalho realizado, constatamos que os atividade do Serviço Social na saúde compreendem ações de caráter emergencial, educação e informação em saúde e planejamento e assessoria. O assistente social é o profissional que está preparado para acrescentar na relação com o paciente, elementos que possibilitem a conscientização no enfrentamento de sua condição de doente; nesse momento, sua relação com a familia, no emprego e em todas as circunstâncias chamadas sociais e são de seu domínio profissional. A função do Assistente social, no hospital, possibilita condições para o paciente participar do que é seu direito, o tratamento de saúde, e localiza o Serviço Social nas organizações hospitalares modernas. O assistente social é o profissional que atende o doente, que comparece conforme sua necessidade , em busca de orientação e auxilio, sendo esse o profissional para compreendê-lo e ajudá-lo. Dentro de todos as normas e rotinas hospitalares, da dificil linguagem dos médicos, é o assistente social o profissional que vai dar uma explicação ao doente, que se sente perdido diante disso e da situação que esta vivendo. FONTES BIBLIOGRÁFICAS ADÃO, Ana Paula B. A importância da rede de relações para recuperação do paciente. In: Uma experiência na clinica cirúrgica do hospital Regional de São José. Doutor Homero de Miranda Gomes - HRS/HMG, 2000. (Trabalho de Conclusão de Curso) ANGERAMI-CAMON, Valdemar Augusto. Solidão: a ausência do outro. 2. ed., São Paulo : Pioneira, 1992. BERTANI, Iris Femer. 0 processo de trabalho do Serviço Social no ambulatório do INCOR. In: Revista Serviço Social e Sociedade. São Paulo : Cortez, n. 42, 1993. CAMPOS, Gastâo Wagner de S. Reforma da Reforma: repensando a saúde. São Paulo : Hucitec, 1992. COLETÂNEA DE LEIS. Conselho Regional de Serviço Social 12. Região. Santa Catarina. Gestão, 1996/1999. e a inserção COSTA, Maria DaIva H. 0 trabalho nos serviços de saúde dos(as) assistentes sociais. In: Revista Serviço Social e Sociedade. Sao Paulo : Cortez, n. 56, 2000. DOM1NGUES, Karen. Influência familiar no processo de tratamento ao paciente pré-operatório de troca valvular no Instituto de Cardiologia. Florianópolis, 2000. (Trabalho de Conclusão de Curso de Serviço Social) FARIAS, Juraci N. de. Florianópolis, 1981 Eventos estressantes da hospitalização. FAVRETTO, Arcidio. 0 doente: razão de ser do hospital. 3. ed., São Paulo, 1977. 61 FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir. Nascimento da pressão. Petrópolis : Vozes, 1986. GASTALDI, Andréia Bendine. Grupos de Convivência: do mito realidade no cuidado do Cardiopata. 2000. Dissertação (Pós-Graduação) Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis. HENSE, Denise Suzanna S. Tendo que operar-se: a experiência_ do paciente cirúrgico e sua espiritualidade. 1987. Dissertação (Mestrado) Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis. INSTITUTO DE CARDIOLOGIA. Regimento Interno. Sao José. LAMOSA, Bellkiss W. Romano. Psicologia Aplicada à Cardiologia. Sao Paulo : BYK, 1990. LEITÃO, Marisa S. 0 Psicólogo e o Hospital. Porto Alegre : Sagra - De Luzzatto, 1993. MANNRICH, Nelson. Constituição Federal. Consolidação das Leis do Trabalho, Legislação Providenciaria. São Paulo : Revistas dos Tribunais, 2001. MEZAMO, João C. Legislação Federal. São Paulo, 1978. Hospitalar: Coletânea da Legislação OLIVEIRA, Raimunda N. da C. 0 espaço público sócio-politico da educação em Saúde Pública. In: Revista Serviço Social e Sociedade. São Paulo : Cortez, n. 36, 1991. PIRES, Denise. Reestruturação Produtiva e Trabalho em Saúde no Brasil. São Paulo : Anna Blume, 1998. RIBEIRO, Herval P. 0 Hospital: História 1993. e Crise. São Paulo : Cortez, SORRENTINO, Sara Romera. A Saúde pede Socorro. In: KUPSTAS. Mircia (Org.). Saúde em Debate. São Paulo : Moderna, 1997. WALDMAN, Beatriz F. 0 enfoque cultural no processo educação em saúde. 1999. Dissertação (Mestrado ern Enfermagem), Porto .Alegre. 62 WENDHAUSEN, Aaueda. Educação em saúde: possibilidades de uma proposta. 1992. Dissertação (Mestrado em Enfermagem), Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis.