J Ilustríssimo Senhor Doutor JOÃO ANTONIO FLEURY TEIXEIRA DD. Diretor de Administração do BANCO CENTRAL DO BRASIL Brasília-DF PEDIDO ADMINISTRATIVO (Assunto: Extensão da GABC–AE aos servidores ainda não contemplados com a vantagem) O SINDICATO NACIONAL DOS SERVIDORES FEDERAIS AUTÁRQUICOS NOS ENTES DE FORMULAÇÃO, PROMOÇÃO E FISCALIZAÇÃO DA POLÍTICA DA MOEDA E DO CRÉDITO - SINAL, representado por seu presidente, David Falcão, vem à presença de Vossa Senhoria, na qualidade de legítimo representante dos servidores do Banco Central do Brasil, apresentar o presente PEDIDO ADMINISTRATIVO, conforme as razões de fato e de direito que passa a expor: I – DA LEGITIMIDADE DO REQUERENTE Trata o presente pedido administrativo de antiga reivindicação de servidores e do Sindicato requerente sobre a extensão da Gratificação de Atividade do Banco Central – Atividade Especializada, aos servidores ainda não contemplados com aquela vantagem, não obstante ocupem os mesmos cargos e exerçam as mesmas atividades dos colegas beneficiados. Por se tratar de incontestável interesse de parcela significativa da categoria representada pelo Requerente, está legitimado ao presente ato, nos termos do artigo 8º, III, da Constituição Federal e artigo 9º, III da Lei nº 9.784/99. Verbis: “Art. 9º São legitimados como interessados no processo administrativo: (...). III - as organizações e associações representativas, no tocante a direitos e interesses coletivos; (...) 18 J A Constituição Federal faculta-lhe, nesta condição, a defesa dos interesses individuais ou coletivos de seus membros, tanto na esfera administrativa quanto na judicial: “Art. 8o - É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte: (...) III - ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas; (...)” A Lei nº 8.112/90, no artigo 240, também assegura aos servidores civis federais representação através do Sindicato. Destarte, tanto a ordem constitucional vigente quanto os fins institucionais da entidade legitimam a apresentação do presente pedido. II – DOS MOTIVOS QUE AUTORIZAM A PRETENSÃO FORMULADA II.1. Da legislação aplicável e do princípio constitucional da isonomia A Gratificação de Atividade do Banco Central – Atividade Especializada destina-se a servidores que exerçam atividades especializadas e sua distribuição, e fixação do número de postos de trabalho, estão afetos à discricionariedade da Diretoria Administrativa do BACEN. A reivindicação do SINAL, é que a GABC-AE seja estendida a todos os servidores do BACEN, e se fulcra na necessidade de estabelecer padrões remuneratórios que acabem com as discrepâncias atualmente existentes, constituindo-se em política de valorização profissional e estímulo de permanência na carreira. A proposta encontra suporte na Lei nº 8.112/90 que estabelece, em seu artigo 49, a possibilidade de deferimento de gratificação aos servidores em face das atividades desenvolvidas. Verbis: “Art.49. Além do vencimento, poderão ser pagas ao servidor as seguintes vantagens: I - indenizações; II - gratificações; III - adicionais. (...)” 28 J O artigo 61 da mencionada lei autoriza, expressamente, o deferimento de retribuições em decorrência da natureza do trabalho. Vejamos: “Art. 61. Além do vencimento e das vantagens previstas nesta Lei, serão deferidos aos servidores as seguintes retribuições, gratificações e adicionais: (...) VIII - outros, relativos ao local ou à natureza do trabalho. (...)” Note-se que a ordem jurídica brasileira reconhece plenamente a possibilidade do pagamento de vantagens pecuniárias a servidores em face de variadas circunstâncias. A respeito da conceituação de tais parcelas, José dos Santos Carvalho Filho1 refere que: “Vantagens pecuniárias são as parcelas pecuniárias acrescidas ao vencimento-base em decorrência de uma situação fática previamente estabelecida na norma jurídica pertinente. Toda a vantagem pecuniária reclama a consumação de certo fato, que proporciona o direito à sua percepção. Presente a situação fática prevista na norma, fica assegurado ao servidor o direito subjetivo a receber o valor correspondente à vantagem. Esses fatos podem ser das mais diversas ordens: desempenho de funções por certo tempo; natureza especial da função; grau de escolaridade; funções exercidas em gabinetes de chefia; trabalho em condições anormais de dificuldades; etc.” Garante-se aos servidores, portanto, já como tradição de nosso ordenamento jurídico, o pagamento de certas vantagens pecuniárias cujo fundamento está, entre outros fatores, no trabalho especializado. É bem verdade que muitos servidores já estão sendo beneficiados com a GABC-AE, entretanto há, ainda, uma parcela considerável de servidores excluídos, não obstante exerçam atividades igualmente relevantes. A extensão da vantagem atende, não apenas a legislação vigente, mas, também, o princípio da isonomia, corrigindo e amenizando diferenças remuneratórias entre servidores que detêm idênticas condições funcionais e estão sujeitos à mesma legislação e mesma política remuneratória. Nesse sentido vale observar o que dispõe o artigo 5º da Constituição Federal de 1988: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos 1 Em: Manual de Direito Administrativo. 2. ed. rev. e ampl. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1999. p. 445. 38 J estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...)” Não por acaso essa disposição se encontra no Título II da Constituição Federal, que trata “Dos Direitos e Garantias Fundamentais”. Trata-se de elemento essencial para que se tenha a conformação mínima necessária ao Estado de Direito, na sua concepção plena. RUY SAMUEL ESPÍNDOLA, comentando os princípios constitucionais esclarece: “(...) Assim, por sua própria essência, evidenciam mais do que comandos generalíssimos estampados em normas, em normas da Constituição. Expressam opções políticas fundamentais, configuram eleição de valores éticos e sociais como fundantes de uma idéia de Estado e Sociedade.”2 Com isso se quer dizer que os fatores de tratamento diferenciado, quando possíveis, devem remeter a situações específicas e, na presença de dúvida, deverão ser interpretados com elasticidade. A exegese restritiva de um diploma legal, sob o aspecto da igualdade formal ou material, configura exceção e decorre, quando permitida, da própria natureza da situação fática a ser disciplinada. A envergadura do princípio em questão, constituindo óbice à proposição de distinções onde a lei não o faz, é bem lembrada por CELSO ANTONIO BANDEIRA DE MELLO, quando preleciona: “Contudo, se a distinção não procede diretamente da lei que instituiu o benefício ou exonerou de encargo não tem sentido prestigiar interpretação que favoreça a contradição de um dos mais solenes princípios constitucionais. (...) O que se encarece, neste passo, é que a isonomia se consagra como o maior dos princípios garantidores dos direitos individuais. Praeter legem, a presunção genérica e absoluta é a da igualdade, porque o texto da Constituição o impõe. (...) Bem por isso, é preciso que se trate de desequiparação querida, desejada pela lei, ou ao menos, pela conjugação harmônica das leis. Daí, o haver-se afirmado que discriminações que decorram de circunstâncias fortuitas, incidentais, conquanto correlacionadas com o tempo ou a época da norma legal, não autorizam a se pretender que a lei almejou desigualar situações e categorias de indivíduos. E se este intento não foi professado inequivocamente pela lei, 2 In Conceito de princípios constitucionais. São Paulo: RT, 1999. p. 75. 48 J embora de modo implícito, é intolerável, injurídica e inconstitucional qualquer desequiparação que se pretenda fazer.” Ainda na obra em que trata do conteúdo jurídico do princípio da igualdade, esse conceituado publicista conclui: “Há ofensa ao princípio constitucional da isonomia quando: (...) V – A interpretação da norma extrai dela distinções, discrimens, desequiparações que não foram professadamente assumidas por ela de modo claro, ainda que por via implícita.” 3 O artigo 39 da Carta também ampara a pretensão aqui aduzida: “Art. 39. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão conselho de política de administração e remuneração de pessoal, integrado por servidores designados pelos respectivos Poderes. § 1º A fixação dos padrões de vencimento e dos demais componentes do sistema remuneratório observará: I - a natureza, o grau de responsabilidade e a complexidade dos cargos componentes de cada carreira; II - os requisitos para a investidura; III - as peculiaridades dos cargos.” Assim sendo, em nome do conteúdo jurídico do princípio da igualdade, deve ser concedido, aos servidores até então excluídos, a GABC-AE corrigindo-se a injustiça verificada decorrente da ausência da retribuição. Eis aí uma situação de disparidade que urge seja sanada. II.2. Do princípio da legalidade administrativa A observância ao princípio da legalidade pela Administração Pública na efetivação de seus atos, vem preconizado no artigo 37, caput, da Constituição Federal, verbis: “Art. 37. A Administração Pública Direta e Indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e 3 MELLO, Celso Antônio Bandeira de, Conteúdo jurídico do princípio da igualdade. 3ª ed. São Paulo: Malheiros, 1993. p. 45-46. 58 J eficiência e, também, ao seguinte: (...).” O princípio da legalidade obriga a Administração Pública, na realização de todos os seus atos, à vinculação aos mandamentos legais, deles não se podendo afastar ou desviar sob pena de invalidar o ato e responsabilizar o seu autor. Como ensina o mestre HELY LOPES MEIRELLES: “Na Administração Pública não há liberdade nem vontade pessoal. Enquanto na administração particular é lícito fazer tudo que a lei não proíbe, na Administração só é permitido fazer o que a lei autoriza (...) As leis administrativas são, normalmente, de ordem pública e seus preceitos não podem ser descumpridos, nem mesmo por acordo ou vontade conjunta de seus aplicadores e destinatários, uma vez que contêm verdadeiros poderes-deveres, irrelegáveis pelos agentes públicos.”4 Se a distribuição das GABC-AE é matéria afeta à conveniência e oportunidade da Administração, pode ser deferida, a qualquer tempo, para corrigir desigualdades. II.3. Do princípio da moralidade administrativa O princípio da moralidade, por sua vez, é mais amplo do que o da legalidade, porque envolve a análise da ação administrativa, pertinente ao seu interesse público. Conforme doutrina de HELY LOPES MEIRELLES citando MAURICE HAURIOU, o agente administrativo, ao atuar, “não poderá desprezar o elemento ético de sua conduta” e “não terá que decidir somente entre o legal e o ilegal, o justo e o injusto, o conveniente e o inconveniente, o oportuno e o inoportuno, mas também entre o honesto e o desonesto”. Mais adiante afirma que “a moral administrativa é imposta ao agente público para sua conduta interna segundo as exigências da instituição a que serve a finalidade de sua ação: o bem comum”5. Sobre o princípio da moralidade, CARDOZO fornece uma definição, a saber: "Entende-se por princípio da moralidade, a nosso ver, aquele que determina que os atos da Administração Pública devam estar inteiramente conformados aos padrões éticos 4 5 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, 18ª edição, 1990, pg. 82/83. MEIRELLES, Hely Lopes. Ob. cit., pg. 84. 68 J dominantes na sociedade para a gestão dos bens e interesses públicos, sob pena de invalidade jurídica" 6 Neste diapasão, o fato de estar sendo dispensado tratamento desigual a servidores em idênticas condições funcionais afronta o princípio da moralidade administrativa. II.4. Dos princípios da efetividade, impessoalidade e razoabilidade Ao estabelecer uma política de valorização profissional e a igualdade de tratamento entre servidores exercentes de mesmos cargos e funções, estará, a Administração, atendendo, ainda, o princípio da efetividade. É que a Administração possuiu como meta os melhores resultados na prestação de serviços, organização e estrutura. Por isso, é necessário que os seus agentes sejam capazes de desempenhar as tarefas administrativas com propriedade, razão pela qual não se deve estabelecer desigualdades que acabam por desestimular servidores, criando espécies de categorias diferenciadas dentro de mesmos setores. Ao se privilegiar um grupo em detrimento de outro, também se afronta o princípio da impessoalidade. Isso porque este princípio determina que “a Administração não pode atuar com vistas a prejudicar ou beneficiar pessoas determinadas, uma vez que é sempre o interesse público que tem que nortear o seu comportamento”.7 II.5. Da extensão da GABC-AE – Exercício do poder discricionário A distribuição da Gratificação de Atividade do Banco Central – Atividade Especializada e a fixação do número de postos de trabalho decorre do poder discricionário da direção do BACEN. Tal discricionariedade deve ser analisada sob os aspectos dos princípios constitucionais supra mencionados. Nesse sentido, há que se afastar das decisões administrativas qualquer tipo de ideologia ou critérios pessoais. Conforme Di Pietro, se a decisão é manifestamente inadequada para alcançar a finalidade legal, a Administração terá exorbitado os limites da discricionariedade e terá se efetivado uma ilegalidade.8 Assim, diante dos princípios que sustentam e guiam a Administração Pública, constata-se a imperiosa necessidade de estabelecer-se tratamento igualitário entre os servidores do BACEN, estendendo-se a GABC-AE a 6 7 8 CARDOZO, José Eduardo Martins. Op. cit. p. 158. MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO. Direito Administrativo. 13. ed. São Paulo: Atlas, 2001. p. 71. Op. Cit., p. 81. 8 78 J todos os servidores na forma da fundamentação. III. DO REQUERIMENTO. Diante de todo o exposto, requer o SINAL, que Vossa Senhoria conheça deste requerimento, dando-lhe os encaminhamentos de praxe de forma a ser estendido o direito à GABC –AE a todos os servidores do BACEN. N. Termos P. Deferimento. Brasília, 14 de setembro de 2006. ___________________________ DAVID FALCÃO Presidente do SINAL 88