UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS E VETERINÁRIAS CÂMPUS DE JABOTICABAL ADAPTAÇÕES DO MÚSCULO GLÚTEO MÉDIO EM EQÜINOS SUBMETIDOS A TREINAMENTO DE RESISTÊNCIA E SUPLEMENTADOS COM DIFERENTES CONCENTRAÇÕES DE ÓLEO DE SOJA Carla Braga Martins Orientador: Prof. Dr. José Corrêa de Lacerda Neto Tese apresentada à Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias UNESP, Câmpus de Jaboticabal - como parte das exigências para obtenção do título de Doutor em Medicina Veterinária - área de concentração em Medicina Veterinária (Clínica Médica Veterinária). JABOTICABAL - SÃO PAULO - BRASIL Janeiro de 2007 SUMÁRIO Página LISTA DE ABREVIATURAS ..................................................................................iii LISTA DE FIGURAS ............................................................................................. IV LISTA DE TABELAS.............................................................................................. V RESUMO .............................................................................................................. VII SUMMARY ......................................................................................................... VIII I. INTRODUÇÃO......................................................................................................1 II. REVISÃO DE LITERATURA ...............................................................................3 2.1. CARACTERÍSTICAS DOS CAVALOS PURO SANGUE ÁRABE (PSA).........................3 2.2. ESTRUTURA DO MÚSCULO ESTRIADO ESQUELÉTICO ............................................4 2.3. GENERALIDADES DAS FIBRAS MUSCULARES.......................................................5 2.4. CARACTERÍSTICAS DAS PROTEÍNAS CONTRÁTEIS ................................................6 2.5. CONTRAÇÃO MUSCULAR...................................................................................8 2.6. CLASSIFICAÇÃO DOS TIPOS DE FIBRAS MUSCULARES ..........................................9 2.7. ADAPTAÇÕES DA MUSCULATURA ESQUELÉTICA ................................................14 2.8. CARACTERÍSTICAS DO MÚSCULO GLÚTEO MÉDIO ..............................................22 2.9. FONTES DE ENERGIA PARA A CONTRAÇÃO MUSCULAR ......................................22 2.10. PRODUÇÃO DE LACTATO ..............................................................................24 2.11. CAUSAS DE LIMITAÇÃO NO DESEMPENHO .......................................................26 2.12. IMPORTÂNCIA DA TÉCNICA DE BIÓPSIA PERCUTÂNEA.......................................26 III. MATERIAL E MÉTODOS .................................................................................29 3.1. ANIMAIS ........................................................................................................29 3.2. TESTE PARA DETERMINAÇÃO DA CURVA VELOCIDADE-LACTATO.........................31 3.3. PROGRAMA DE TREINAMENTO .........................................................................32 3.4. DETERMINAÇÃO DO PESO E ESCORE CORPORAL ...............................................33 3.5. COLHEITA DE AMOSTRAS MUSCULARES ...........................................................33 ii 3.6. PROCESSAMENTO DAS AMOSTRAS MUSCULARES .............................................38 3.7. ANÁLISES HISTOQUÍMICAS..............................................................................39 3.8. ANÁLISES MORFOMÉTRICAS............................................................................41 3.9. DETERMINAÇÃO DO GLICOGÊNIO TOTAL ...........................................................42 3.10. ANÁLISE ESTATÍSTICA...........................................................................43 IV. RESULTADOS.................................................................................................44 4.1. PESO E ESCORE CORPORAL ............................................................................44 4.2. TÉCNICA DE BIÓPSIA MUSCULAR .....................................................................45 4.3. IDENTIFICAÇÃO DOS TIPOS DE FIBRAS MUSCULARES .........................................46 4.4. MORFOMETRIA DAS FIBRAS MUSCULARES ........................................................50 4.5. QUANTIFICAÇÃO DO GLICOGÊNIO TOTAL ..........................................................53 4.6. RELAÇÃO TREINAMENTO X TIPO DE FIBRA X METABOLISMO ENERGÉTICO ............54 V. DISCUSSÃO .....................................................................................................56 VI. CONCLUSÕES ................................................................................................67 VII. REFERÊNCIAS...............................................................................................68 VIII. APÊNDICE.........................................................................................................I iii LISTA DE ABREVIATURAS ADP - adenosina difosfato ATP - adenosina trifosfato CPM - cadeia pesada de miosina EE - extrato etéreo EPM - erro padrão da média mATPase - adenosina trifosfatase miofibrilar ou miosina adenosina trifofatase MS - matéria seca NADH - nicotinamida adenina dinucleotídeo reduzida PSA - Puro Sangue Árabe Pi - ortofosfato inorgânico iv LISTA DE FIGURAS Figura 1. Agulha de biópsia muscular tipo Bergström 6,0mm (Kruise). (a) agulha guia contendo uma abertura; (b) cilindro cortante; (c) mandril...............34 Figura 2. Procedimentos para colheita da amostra muscular. (a) Local da tricotomia (área de 25 cm2 aproximadamente), (b) infiltração do anestésico local, (c) botão anestésico, (d) incisão de pele, (e) local incisado, (f) inserção da agulha de biópsia muscular na incisão de pele. A agulha possui marcações externas para auxiliar na colheita da amostra na profundidade adequada....................................................36 Figura 3. Ilustração da ferida cirúrgica. (a) lesão imediatamente após a colheita das amostras; (b) curativo realizado subseqüentemente.......................37 Figura 4. Amostra muscular no interior da abertura da agulha..............................38 Figura 5. Ilustração da evolução da cicatrização da ferida cirúrgica. (a) 0, (b) 1, (c) 2 e (d) 7 dias após a colheita da amostra...............................................46 Figura 6. Fotomicrografia de cortes transversais do músculo glúteo médio corados mediante técnicas histoquímicas. a. mATPase após pré incubação ácida (pH 4,5) e incubação alcalina (pH 10,5). b. NADH-TR. Observar o padrão de organização em mosaico dos diferentes tipos de fibras. Obj. 20x..........................................................................................................48 Figura 7. Cortes histológicos transversais seriados do músculo glúteo médio corados com as técnicas: a. mATPase, b. NADH-TR. Observam-se fibras tipo I, IIA e IIAX (células grandes com reação na periferia) e IIX ................................................................................................................49 Figura 8. Curva velocidade-lactato de eqüinos cruza Árabe e PSA, submetidos a treinamento de resistência durante sete semanas..................................55 v LISTA DE TABELAS Tabela 1. Distribuição dos animais em grupos experimentais com base na dieta alimentar fornecida (0, 6, 12, 18 e 24% de adição de óleo....................30 Tabela 2. Protocolo de treinamento dos eqüinos na esteira rolante......................32 Tabela 3. Médias ± erro padrão da média (EPM) do peso e escore corporal de eqüinos cruza Árabe e Puro Sangue Árabe (PSA) submetidos à suplementação com diferentes concentrações com óleo de soja..........44 Tabela 4. Médias ± EPM do peso e escore corporal de eqüinos cruza Árabe e PSA, submetidos a treinamento de resistência durante sete semanas...............................................................................................44 Tabela 5. Colorações histoquímicas observadas nas fibras musculares avaliadas.................................................................................................47 Tabela 6. Efeito da suplementação com óleo de soja sobre a freqüência (%) ± EPM dos tipos de fibras do músculo glúteo médio de eqüinos cruza Árabe e PSA .......................................................................................50 Tabela 7. Freqüência (%) ± EPM dos tipos de fibras do músculo glúteo médio de eqüinos cruza Árabe e PSA, submetidos a treinamento de resistência durante sete semanas............................................................................51 Tabela 8. Efeito da suplementação com óleo de soja ± EPM sobre a área média de secção transversal dos tipos de fibras do músculo glúteo médio de eqüinos cruza Árabe e PSA ...................................................................51 Tabela 9. Área média de secção transversal (µm2) ± EPM dos tipos de fibras do músculo glúteo médio de eqüinos PSA, submetidos a treinamento de resistência durante sete semanas..........................................................52 vi Tabela 10. Efeito da suplementação com óleo de soja ± EPM sobre a área relativa dos tipos de fibras do músculo glúteo médio de eqüinos cruza Árabe e PSA .....................................................................................................52 Tabela 11. Área relativa (%) ± EPM dos tipos de fibras do músculo glúteo médio de eqüinos cruza Árabe e PSA, submetidos a treinamento de resistência durante sete semanas.......................................................53 Tabela 12. Médias ± EPM do glicogênio total presente nas fibras do músculo glúteo médio de eqüinos cruza Árabe e PSA, submetidos a diferentes concentrações de óleo de soja............................................................53 Tabela 13. Médias ± EPM do glicogênio total presente nas fibras do músculo glúteo médio de eqüinos cruza Árabe e PSA, submetidos a treinamento de resistência durante sete semanas...................................................54 Tabela 14. Freqüência e área relativa das fibras oxidativas e glicolíticas antes e após o período de treinamento............................................................55 Tabela 15. Composição percentual e química dos concentrados experimentais....II Tabela 16. Escala de avaliação do escore corporal...............................................III vii ADAPTAÇÕES DO MÚSCULO GLÚTEO MÉDIO EM EQÜINOS SUBMETIDOS A TREINAMENTO DE RESISTÊNCIA E SUPLEMENTADOS COM ÓLEO DE SOJA RESUMO - Objetivou-se avaliar o efeito da suplementação com diferentes concentrações de óleo de soja e do treinamento de resistência nas adaptações do músculo glúteo médio de 20 eqüinos da raça Puro Sangue Árabe. Os animais foram distribuídos em cinco grupos, cada grupo foi composto por quatro cavalos. O grupo controle não recebeu óleo e os demais foram suplementados com 6, 12, 18 e 24% de óleo. Os animais foram submetidos a sete semanas consecutivas de exercício em esteira rolante e trilha. Analisou-se a influência do treinamento e da suplementação com óleo sobre o peso e escore corporal, concentração de glicogênio muscular e características das fibras do músculo glúteo médio. Os resultados demonstraram que as diferentes concentrações de óleo na dieta não influenciaram as variáveis estudadas. Houve redução significativa do peso corpóreo após o treinamento, no entanto o escore corporal permaneceu constante. O músculo glúteo médio expressou três tipos de fibras puras: I, IIA, IIX. O treinamento não induziu hipertrofia das fibras do músculo glúteo médio. O treinamento ocasionou aumento na proporção e na área relativa das fibras tipo IIA em detrimento das fibras IIX, melhorando a capacidade oxidativa muscular. Tanto as dietas com óleo como o treinamento não aumentaram as concentrações de glicogênio muscular. Palavras-chave: Eqüinos, músculo glúteo médio, biópsia muscular, glicogênio muscular. viii GLUTEUS MEDIUS MUSCLE ADAPTATIONS OF ARABIAN HORSES SUBMITTED TO ENDURANCE TRAINING AND SUPPLEMENTED WITH TO SOY OIL SUMMARY – The aim of this study was evaluate the effects of supplementation with different concentrations of soy oil and endurance training on gluteus medius muscle adaptations in twenty Arabian horses. The horses were randomized in five groups (four horses each group). The control group did not receive the oil and the other groups were supplemented with 6%, 12%, 18% and 24% of soy oil. The animals were submitted to seven weeks of exercise on treadmill and track. The influence of training and oil supplementation on body weight, corporal score, muscular glycogen stores and characteristics of the gluteus medius muscular fibers were analyzed. The results showed that the supplementation of soy oil in diet was not significantly effective on the studied parameters. There was a significant reduction of the body weight after the end of training; however the corporal score showed no changes. The gluteus medius muscle expressed three types of pure fibers: I, IIA and IIX. The training induced a increase in the proportion and relative area of the type IIA fibers in detriment of type IIX fibers, improving the oxidative capacity muscular. No hypertrophy of the muscular fibers was observed. There were no significant changes in the values of the total glycogen after the training period. Keywords: Equine, gluteus medius muscle, muscular biopsy, muscular glycogen. I. INTRODUÇÃO A utilização do cavalo para a prática de esportes vem aumentando no Brasil e no mundo. Nos últimos anos muitas pesquisas sobre fisiologia do exercício têm sido realizadas em eqüinos, estudando a resposta desta espécie a diferentes estímulos, como o treinamento e a dieta alimentar. Cada vez mais os cavalos são vistos como atletas e submetidos a protocolos de treinamento que visam a melhoria de seu desempenho. Dentre os esportes eqüestres mais praticados se destaca o enduro, caracterizado por ser uma prova de resistência. Esta modalidade de esporte hípico surgiu nos Estados Unidos em 1955, se expandiu pela Europa e chegou ao Brasil em 1989, onde desde então, apresenta crescimento relevante. Os animais que participam desta atividade estão sujeitos a inúmeros tipos de estresse, quer pelo treinamento excessivo quer pela natureza exaustiva da modalidade. Para isso, a adequada preparação física é fundamental e diminui os riscos de exaustão. É do interesse de cavaleiros e técnicos que os cavalos possam desempenhar da melhor forma possível o seu papel durante a competição, sem comprometimento de sua saúde. Com isso, torna-se imprescindível condicionar os animais, destacando as qualidades de resistência, sem causar-lhes transtornos físicos. O sistema muscular possui participação primordial no exercício, pois todo movimento é o resultado da contração de músculos esqueléticos por meio de uma articulação móvel. As fibras musculares exibem alta capacidade de adaptar-se estruturalmente frente ao trabalho muscular aos quais os animais são submetidos. Tais adaptações envolvem trocas estruturais e metabólicas, que determinam a capacidade de locomoção e trabalho de um cavalo e, portanto, seu desempenho em programas de treinamento. Algumas dessas respostas adaptativas envolvem, entre outras coisas, características relacionadas à demanda energética em função do trabalho muscular desempenhado. 2 Com a evolução dos estudos foram desenvolvidas técnicas para se pesquisar o efeito do exercício sobre as fibras musculares. O uso combinado dessas diferentes técnicas de análise muscular fornece informação suficiente para identificar corretamente o fenótipo miofibrilar; determinar o tipo de metabolismo que o músculo utiliza para obter a energia química e transformá-la em mecânica e proporciona informação à cerca do tamanho dos diferentes tipos de fibras dos músculos. Desta forma, este estudo teve como objetivo avaliar os efeitos do treinamento orientado pela curva velocidade-lactato e da suplementação alimentar com diferentes concentrações de óleo de soja sobre as características morfológicas e bioquímicas do músculo glúteo médio de eqüinos cruza Árabe e PSA submetidos a treinamento de resistência em esteira rolante e trilha. 3 II. REVISÃO DE LITERATURA 2.1. Características dos cavalos Puro Sangue Árabe (PSA) A mais antiga raça de cavalos no mundo foi registrada nos hieróglifos egípcios 1800 anos antes de Cristo. O cavalo Árabe foi apreciado durante 3500 anos devido a sua extraordinária capacidade como animal de montaria, pela velocidade, resistência, agilidade e inteligência. Foram necessários mais de três milênios de seleção para se obter o cavalo de guerra do deserto, capaz de resistir a prolongados períodos de trabalho intenso com o mínimo de cuidado e alimentação. Essas qualidades persistem em seu fenótipo e são reconhecidas até hoje, por meio de competições de longo percurso nos Estados Unidos da América e na Europa. No Brasil, onde essas provas também são realizadas, o PSA se destaca sempre nas primeiras colocações. No trabalho da fazenda, os criadores se surpreendem com a produtividade diária, capaz de pronta recuperação após um dia inteiro de atividade (PERROY, 2006). Os três mil anos de seleção e aprimoramento do cavalo Árabe proporcionaram-lhe qualidades genéticas incomparáveis. A partir da Idade Média, garanhões árabes foram exportados para quase todas as partes do mundo, dando origem a outras raças e regenerando plantéis inteiros de cavalos. Dentre suas aptidões, o PSA participa de esportes hípicos como salto, adestramento em categorias intermediárias, hipismo rural, enduro e trabalho agropecuário, se destacando em provas de longa distância devido a sua resistência (PERROY, 2006). 4 2.2. Estrutura do músculo estriado esquelético O músculo esquelético, assim denominado porque se insere no esqueleto, é o tecido mais abundante do corpo, compreendendo cerca de 40% do peso corporal dos mamíferos. No cavalo da raça Puro Sangue Inglês, a musculatura esquelética constitui 52% do peso corpóreo, comparada com 42% em outras raças (GOLL, 1996). O músculo esquelético eqüino é um tecido heterogêneo, composto por diferentes tipos de fibras musculares, capaz de realizar ampla variedade de atividades físicas devido a grande diversidade celular, molecular, especialização funcional e capacidade plástica. Essa característica proporciona ao tecido muscular a capacidade de gerar um amplo tipo de atividades de contração, a qual se traduz em maior eficiência mecânica e termodinâmica do organismo (GOLDSPINK,1998). As variedades de funções desempenhadas pelos músculos requerem diferentes proporções de tipo de fibra, acarretando assim diferenças na composição de fibras entre os músculos, as quais exibem propriedades mecânicas e metabólicas distintas (LUTZ et al., 1998). Os músculos esqueléticos dos mamíferos são compostos por fascículos de fibras musculares unidos por meio de tecido conectivo. A camada mais externa que envolve o músculo é denominada epimísio. O perimísio é o tecido conectivo que envolve feixes individuais de fibras musculares denominados fascículos. Cada fibra muscular é revestida por tecido conectivo denominado endomísio. A unidade morfofuncional do músculo esquelético é a fibra muscular. Essas fibras representam o resultado coordenado da expressão de distintas proteínas estruturais e enzimas metabólicas (POWERS & HOWLEY, 2000). O padrão de inervação estabelecido determina as propriedades fisiológicas das fibras musculares, culminando com a formação das unidades motoras, elemento funcional constituído pelo neurônio motor e fibras musculares associadas (GONZALES & SARTORI, 2002). 5 Um dos aspectos microscópicos mais distintos nos músculos esqueléticos é sua aparência estriada. Tais estriações são produzidas pela alternância entre bandas claras e escuras que aparecem ao longo do comprimento da fibra devido a distribuição ordenada dos filamentos longitudinais de diferentes espessuras, os quais correspondem às proteínas contrateis, actina e miosina (POWERS & HOWLEY, 2000; BLANCO & PÉREZ, 2004). 2.3. Generalidades das fibras musculares As fibras musculares são células altamente especializadas, apresentam inúmeras organelas, são multinucleadas, cujos núcleos estão localizados ao redor da periferia da célula e abaixo do sarcolema (POWERS & HOWLEY, 2000). De acordo com SNOW & VALBERG (1994), as fibras do músculo esquelético dos eqüinos contêm de 100 a 200 núcleos. Entre o sarcolema e a membrana basal encontram-se as células satélites, importantes na reparação de injúrias musculares. Uma quantidade variável de retículo endoplasmático liso e rugoso, aparelho de Golgi e lisossomos estão normalmente localizados próximo dos núcleos das células musculares. Numerosas proteínas, incluindo a mioglobina e enzimas envolvidas na glicólise estão distribuídas no sarcoplasma. Grânulos de glicogênio e variável quantidade de gotículas de lipídeos também estão distribuídos pelo sarcoplasma entre os miofilamentos e sob o sarcolema. Enzimas envolvidas no metabolismo oxidativo estão localizadas dentro das membranas mitocondriais. As mitocôndrias dos músculos dos eqüinos estão concentradas abaixo do sarcolema, particularmente associadas aos capilares, embora também sejam encontradas entre as miofibrilas. No sarcoplasma do músculo, existe uma extensa rede de canais membranosos que envolvem cada miofibrila e correm paralelamente a elas. Esses canais são denominados de retículo sarcoplasmático e armazenam cálcio, o qual 6 possui grande importância para a contração muscular (POWERS & HOWLEY, 2000). As fibras musculares estão organizadas em numerosas estruturas fusiformes presentes no sarcoplasma, denominadas miofibrilas, caracterizadas por apresentar composição molecular diversa e constituir as estruturas intracelulares que durante a contração muscular convertem a energia química em mecânica. As miofibrilas são compostas por dois filamentos protéicos, os filamentos espessos de miosina e finos de actina (POWERS & HOWLEY, 2000; BLANCO & PÉREZ, 2004). Cada espécie possui uma distribuição fibrilar característica na musculatura esquelética. Nos eqüinos, assim como na maioria dos mamíferos, as fibras musculares seguem o padrão de distribuição denominado mosaico, devido as fibras tipo I, IIA e IIX pertencentes a diferentes unidades motoras se entremearem umas com as outras (RIVERO & PIERCY, 2004). 2.4. Características das proteínas contráteis 2.4.1 Miosina A miosina é uma proteína constituída por seis cadeias polipeptídicas, sendo quatro cadeias leves e duas cadeias pesadas (POWERS & HOWLEY, 2000). É considerada a proteína contrátil mais abundante do músculo esquelético e representa um terço do total das proteínas musculares (PICARD et al., 2002), constitui a molécula motora da contração muscular. É o componente principal dos filamentos grossos das miofibrilas (SELLERS, 2000). As isoformas de cadeia pesada de miosina (CPM) constituem proteínas com pequenas diferenças entre si. A molécula da miosina apresenta dois extremos terminais, um corresponde à porção amino e o outro a porção carboxil. A porção amino forma a cabeça da miosina, componente essencial que atua como 7 motor durante o sistema de geração de forças do músculo, devido aos sítios ativos que possui para a união com a actina e com a enzima mATPase, responsável pela hidrólise do ATP em difosfato de adenosina e fosfato inorgânico (GALLER et al., 1997; KARLSSON et al., 1999). O terminal carboxil das cadeias pesadas de miosina se enrola sobre si mesmo, para formar a cauda da miosina (LENNINGER, 1981). As proteínas que caracterizam a célula muscular esquelética são codificadas por uma família multigênica, denominada isoformas (SCHIAFFINO & REGGIANI, 1996; EDDINGER, 1998, BOTTINELLI & REGGIANI, 2000). Essas apresentam características bioquímicas, estruturais e fisiológicas comuns, mas demonstram distinções na seqüência de aminoácidos, manifestando ligeiras diferenças nas atividades biológicas, como a atividade da mATPase e a afinidade ao cálcio. E, ademais, constituem parte essencial do sistema contrátil do músculo (PERRY, 1985). As isoformas de miosina de cadeia pesada e leve dos músculos esqueléticos possuem como função a regulação das propriedades contráteis das fibras musculares, determinando a velocidade máxima de contração muscular. A velocidade e a força de contração muscular dependem da quantidade de fibras musculares ativas, de suas propriedades contráteis e metabólicas. A velocidade máxima de encurtamento de uma única fibra muscular está correlacionada com as isoformas de CPM que predominam nas fibras musculares (SCHIAFFINO & REGGIANI, 1996; McKOY et al., 1998; RIVERO & PIERCY, 2004). A expressão e o desenvolvimento das diferentes isoformas de miosina no músculo esquelético são regulados pela interação de múltiplos mecanismos de controles, dentro dos quais se destacam os fatores neuronais, hormonais e mecânicos (SCHIAFFINO & REGGIANI, 1996; TALMADGE, 2000; LEFAUCHEUR, 2001). Nos mamíferos, incluindo o homem, se conhecem nove isoformas de cadeia pesada de miosina, e cada uma delas é codificada por um gene diferente, 8 apresentando atividade mATPase particular (BOTTINELLI & REGGIANI, 2000; ALLEN & LEINWAND, 2001; DA COSTA et al., 2002). 2.4.2 Actina Os filamentos delgados são formados principalmente pela actina, a nebulina e proteínas reguladoras (tropomiosina e troponina) que possuem importante papel na regulação do processo contrátil. A actina constitui a principal proteína desse grupo (EDDINGER, 1998). As fibras musculares dos mamíferos expressam duas isoformas de actina, a esquelética e a cardíaca. A parte terminal amino (NH2) da actina interage com a cabeça da miosina (SCHIAFFINO & REGGIANI, 1996) e conjuntamente formam a unidade contrátil do músculo (BOTTINELLI & REGGIANI, 2000). 2.5. Contração muscular A energia para a contração muscular é oriunda da degradação do ATP pela enzima mATPase presente na cabeça da miosina, originando difosfato de adenosina e fosfato inorgânico e liberando energia que irá energizar as pontes cruzadas de miosina, ocorrendo a união da cabeça da miosina ao filamento de actina. Como resultado, ocorre alteração conformacional da molécula da miosina e parte da energia liberada é utilizada para produção de movimento entre os filamentos, onde os filamentos de actina deslizam sobre os filamentos de miosina. Ao final dessa seqüência, os produtos da hidrólise do ATP são liberados e se unem novamente reconstituindo a molécula de ATP (POWERS & HOWLEY, 2000). O fator desencadeante da contração muscular é a chegada de um impulso nervoso à junção neuromuscular. A geração de um potencial de ação num 9 motoneurônio provoca a liberação de acetilcolina na junção neuromuscular, essa se liga aos receptores da placa motora, causando despolarização na membrana celular, a qual é conduzida através dos túbulos transversos profundamente na fibra muscular, resultando na liberação do cálcio do retículo sarcoplasmático. O cálcio se liga à troponina, alterando a posição da tropomiosina e descobrindo os sítios ativos da actina. A ponte cruzada da miosina energizada forma uma ligação forte no sítio ativo da actina. Esse ciclo da contração é repetido enquanto houver cálcio e ATP presentes e se rompe quando cessam os potenciais de ação e o retículo sarcoplasmático remove ativamente o cálcio do sarcoplasma (POWERS & HOWLEY, 2000). 2.6. Classificação dos tipos de fibras musculares Ao longo do tempo, para o estudo das características fibrilares, tanto em músculos de animais como em humanos, vem se aplicando diversas classificações, fundamentadas em técnicas que avaliam parâmetros bioquímicos, estruturais, funcionais e histoquímicos da fibra muscular. A diferenciação clássica dos tipos de fibras se baseava na coloração que conferiam ao músculo, vermelho ou branco, segundo o seu conteúdo de mioglobina. Dessa forma, os músculos com mais de 40% de fibras vermelhas foram denominados vermelhos. Ao contrário, os que possuíam mais de 40% de fibras pálidas, recebiam o nome de músculos brancos (BEECHER et al., 1965). Atualmente, o sistema de classificação das fibras musculares mais comumente empregado é o histoquímico, que consiste no tratamento do tecido muscular com técnicas histoquímicas ou histoenzimáticas que permitem identificar de forma simples e rápida os diferentes tipos de fibras. A análise histoquímica mais utilizada se baseia nas propriedades contráteis das fibras, a partir da determinação do grau de reatividade da atividade da enzima adenosina trifosfatase miofibrilar (mATPase) presente na fibra muscular em meio ácido ou 10 alcalino, proposto por PADYKULA & HERMAN (1955) citado por BOTTINELLI & REGGIANI (2000). ENGEL (1962) aplicou as análises mencionadas em músculo humano definindo as fibras tipos I e II. BROOKE & KAISER (1970), melhorando a técnica da atividade mATPase mediante pré-incubação ácida, demonstraram na musculatura humana a subdivisão do tipo II em subtipos IIA, IIB e IIC. Outra técnica histoquímica amplamente utilizada para a identificação fibrilar se fundamenta na determinação das propriedades metabólicas e proporciona informações sobre o substrato utilizado pela fibra muscular para obter energia. Por meio desta técnica é possível diferenciar as fibras com baixa capacidade oxidativa, as quais contêm elevadas concentrações de enzimas sarcoplasmáticas das fibras com alta capacidade oxidativa, que contêm por sua vez, elevadas concentrações de enzimas mitocondriais dentre as quais a succinato desidrogenase (RIVERO et al., 1993b). GAUTHEIR (1969) citado por KLONT et al. (1998), determinou a capacidade oxidativa da fibra muscular utilizando como marcador do padrão oxidativo a enzima succinato desidrogenase (SDH), e identificou três tipos de fibras, as quais denominou segundo a tonalidade predominante como fibras vermelhas, intermediárias e brancas. ASHMORE & DOERR (1971), associaram técnicas histoquímicas de atividade da mATPase e da enzima succinato desidrogenase (SDH) e descreveram três tipos de fibras: mATPase resistente e metabolismo oxidativo, mATPase ácido lábil e metabolismo oxidativo-glicolítico e mATPase ácido lábil e metabolismo glicolítico. A caracterização morfológica, bioquímica e fisiológica das fibras musculares esqueléticas de mamíferos foram aperfeiçoadas com a utilização de técnicas histoquímicas e imunohistoquímicas por PETER et al. (1972); SNOW et al. (1982); RIVERO (1993b). PETER et al. (1972), estudaram as propriedades motoras e metabólicas das fibras musculares, objetivando identificar as características fibrilares segundo as propriedades contráteis e o grau de resistência à fadiga. Para tanto, tais 11 pesquisadores utilizaram como marcador do padrão oxidativo da fibra muscular a enzima nicotinamida adenina dinucleotideo desidrogenase (NADH). Esta enzima se encontra na face interna da membrana mitocondrial e sua função é catalizar a transferência de elétrons do NADH2 a compostos citocromos, e por último ao oxigênio, na cadeia de transporte de elétrons (DUBOTWITZ & BROOKE, 1973). Essas técnicas possibilitaram a identificação de unidades motoras com proteínas contráteis e metabólicas peculiares, dentre as quais destacaram-se as fibras oxidativas de contração lenta, que possuem unidades motoras resistentes à fadiga e metabolismo oxidativo; fibras rápidas glicolíticas-oxidativas, com atividade metabólica tanto glicolítica como oxidativa, média resistência à fadiga; e as fibras rápidas glicolíticas, as quais se caracterizam por apresentarem unidades motoras facilmente fatigáveis e metabolismo glicolítico. Apesar do uso extensivo e simplicidade de execução, as técnicas histoquímicas apresentam certas limitações para a identificação correta do fenótipo fibrilar, devido a grande variabilidade da atividade mATPase entre os diversos tipos de fibras presentes no músculo esquelético (GORZA, 1990). Dessa forma, para reduzir a porcentagem de erro na identificação deve-se associar técnicas mais sensíveis que permitam determinar a heterogeneidade das fibras musculares. Entre essas técnicas se destacam a eletroforese, imunohistoquímica, hibridação in situ e reação da cadeia de polimerase (PCR). O princípio básico dessas provas consiste em definir as isoformas específicas das cadeias pesadas e leves de miosina, já que cada tipo de fibra muscular expressa uma isoforma diferente que demonstra divergências em atividades contráteis, atividade mATPase, velocidade de contração e produção de força. A atividade da mATPase está intimamente relacionada ao predomínio do tipo de isoformas, que determinará as propriedades contráteis das fibras musculares (CHIKUNI et al., 2001). RIVERO et al. (1996, 1999), através da técnica de ELISA e eletroforese identificaram três tipos de isoformas MHC presentes em diferentes músculos de cavalos, uma lenta (MHC-I) e duas rápidas (MHC-IIA e MHC-IIX). Através da 12 imunohistoquímica definiram três tipos de fibras puras I, IIA e IIX e duas híbridas IIC e IIAX. Estes métodos integrados demonstraram que o músculo esquelético eqüino não expressa isoforma tipo IIB e fibras assim denominadas deveriam receber a denominação de fibras IIX (RIVERO et al., 1999; SERRANO & RIVERO, 2000; ETO et al., 2003). As fibras híbridas também são denominadas intermediárias, pois são consideradas resultados do estado de transição fenotípica entre dois tipos de fibras puras que pode ser estimulado pelo treinamento ou destreinamento, ou pelo envelhecimento (PEUKER & PETTE, 1997; LEFAUCHEUR et al., 1998; PICARD et al., 2002). Essas fibras possuem alto potencial de adaptação, já que são capazes de alterar o fenótipo das isoformas de cadeia pesada de miosina quando a demanda funcional do músculo necessita (BALDWIN & HADDAD, 2001). As fibras híbridas podem ser identificadas com a utilização de anticorpos específicos, os quais reagem com as isoformas de cadeia pesada de miosina das fibras musculares esqueléticas (PICARD et al., 2003). Essas fibras são caracterizadas por expressar mais de uma isoforma de cadeia pesada de miosina (STARON et al., 1999; PICARD et al., 2002; STRBENC et al., 2004). As fibras tipo IIC são encontradas em quantidades relativamente grandes em animais muito jovens, porém são raras no eqüino adulto, no qual geralmente são citadas como fibras de transição (SANTOS, 2002). 2.6.1 Fibras tipo I A isoforma de cadeia pesada de miosina expressada por essas fibras é a tipo I. Foram primeiramente denominadas células vermelhas devido a coloração avermelhada que conferiam ao músculo dada a grande concentração de mioglobina presente no seu citoplasma. Posteriormente, considerando suas características funcionais e metabólicas foram classificadas como fibras de contração lenta e metabolismo oxidativo. Apresentam baixas concentrações da 13 enzima mATPase (BOTTINELLI et al., 1994), a qual lhes confere baixa capacidade para hidrolisar o ATP (ROSE, 1986). Possuem metabolismo oxidativo, consumindo glicose e ácidos graxos através do metabolismo aeróbio. Utilizam a oxidação dos ácidos graxos que estão distribuídos amplamente nos espaços miofibrilares do interior da fibra muscular como fonte preferencial de energia. Para que ocorra o processo de oxidação é necessário amplo fornecimento sangüíneo para o transporte de oxigênio e ácidos graxos. Por isso, essas células são altamente vascularizadas e possuem elevado conteúdo mitocondrial. Nas mitocôndrias ocorrem as reações do ciclo de Krebs com a utilização do oxigênio para a produção de energia, indispensável para a contração muscular. Apresentam número expressivo de núcleos, os quais lhes conferem grande atividade metabólica, capacitando-as para a síntese e o desdobramento rápido de suas próprias proteínas (POWERS & HOWLEY, 2000). Possuem pequeno tamanho, o que facilita a difusão rápida do oxigênio e de substratos à mitocôndria. Apresentam elevada resistência à fadiga muscular, pois são dotadas estrutural e bioquimicamente para gerar força muscular durante um período prolongado de tempo, realizar movimentos repetitivos lentos e manter uma força isométrica a custa da produção de elevada taxa de energia a partir das rotas aeróbias (SIECK et al., 1995; PICARD et al., 2002). 2.6.2 Fibras tipo IIA Essas fibras expressam a isoforma de cadeia pesada de miosina tipo IIA e apresentam características entre as fibras do tipo I e IIX. São designadas como células de contração rápida, possuem muitas mitocôndrias e são irrigadas por grande número de vasos sangüíneos, apresentam elevado conteúdo de mioglobina, o que lhes confere tonalidade avermelhada. Armazenam mais oxigênio e lipídeos, e menos glicogênio do que as fibras IIX, podendo, portanto, apresentar metabolismo glicolítico e oxidativo. Estão adaptadas ao metabolismo 14 aeróbio devido ao conteúdo intermediário de mitocôndrias, que lhes proporciona resistência à fadiga e capacidade glicolítica moderada a baixa. Sua contração é rápida e sustentável por razoável período de tempo (PICARD et al., 1995; QUIROZ-ROTHE & RIVERO, 2001). 2.6.3 Fibras tipo IIX As fibras IIX possuem metabolismo energético glicolítico e expressam a isoforma de cadeia pesada de miosina tipo IIX. Consomem glicose por meio do metabolismo anaeróbio com desenvolvimento de força maior do que aquela descrita para as fibras tipo I. A velocidade de contração das fibras tipo IIX é rápida, similar às fibras tipo IIA, porém não conseguem sustentar esta contração por muito tempo (BOTTINELLI et al., 1991). Segundo SWASH & SCHWARTZ (1981) e HILDEBRAND (1995), as fibras glicolíticas tipo IIX são pouco vascularizadas, apresentam baixa concentração de mioglobina e poucas mitocôndrias, pois o metabolismo aeróbio é menos importante. Com relação ao tamanho, são geralmente maiores que as fibras tipo I e IIA (PICARD et al., 1995). Apresentam extenso retículo sarcoplasmático que lhes permite rápida liberação de íons cálcio. Estão bem adaptadas para saltos, corridas e outros movimentos vigorosos e breves (PICARD et al., 1995; QUIROZ-ROTHE & RIVERO, 2001). 2.7. Adaptações da musculatura esquelética O músculo pode ser considerado, dentre todos os tecidos, como um dos sistemas de maior capacidade adaptativa. Devido a sua plasticidade o tecido muscular é capaz de modificar suas características morfológicas e funcionais como resposta a diversos estímulos. Dentre os fatores que exercem influência 15 sobre as características do tecido muscular destacam-se a idade, sexo, alimentação, função do músculo, hormônios, inervação, exercício, raça e genética (KARLSSON et al., 1999; BROCKS et al., 2000; LEFAUCHEUR et al., 2003). A capacidade máxima de interconversão entre os diferentes tipos de fibras é limitada, e depende de um estímulo adequado. Desta forma, o estímulo pode fazer uma fibra muscular, inicialmente adaptada para a contração rápida passar a expressar isoformas de contração lenta, tornando-se de contração lenta, e viceversa (GONDIM, 2005). 2.7.1 Alimentação Segundo HAMBLETON et al. (1980) a adição de óleo como fonte de energia e a adaptação dos animais ao metabolismo lipídico produz efeito poupador de glicogênio, importante para o animal persistir no exercício. JONES et al. (1992) relataram que a suplementação com óleo promove aumento do armazenamento e redução da mobilização do glicogênio. Segundo estes pesquisadores, isto pode ser conseqüência da maior utilização dos ácidos graxos como substrato para a produção de energia, favorecendo a melhora da performance aeróbia e anaeróbia. 2.7.2 Genética e Raça Durante o desenvolvimento embrionário dos mamíferos, as células musculares iniciais começam a expressar proteínas contráteis específicas antes do músculo ser inervado. Dessa forma, o fenótipo da fibra muscular aparenta ser uma propriedade geneticamente ARMBRUSTMACHER, 1999). determinada da célula (HAYS & 16 Nos eqüinos, as diferenças individuais existentes em uma mesma raça, referentes à composição das fibras musculares, estão relacionadas com as características genéticas e fenotípicas (HODGSON et al., 1986; RIVERO et al., 1993a; SNOW & VALBERG, 1994; ESSÉN-GUSTAVSSON et al., 1980). As variedades na composição fibrilar de músculos podem ser observadas entre as raças. Essas diferenças estão relacionadas às características de desempenho, para as quais a raça foi selecionada. No cavalo, a distinção é mais evidente no músculo glúteo médio, um dos maiores e mais importantes músculos para a produção de força propulsora. Existem também variações na área das fibras e na capacidade oxidativa entre as raças e dentro delas (PETTE & STARON, 1997). Cada cavalo possui propensão genética para determinado tipo de atividade, que pode ser mais bem aproveitada se houver treinamento apropriado (LEWIS, 1995). As proporções das fibras do tipo I e do tipo II são estáveis dentro de uma raça (RIVERO et al., 1989). Segundo esses mesmos autores, a proporção média das fibras do tipo II é menor nos cavalos das raças American Trotter, Árabe e Andaluz em relação a animais da raça Puro Sangue Inglês. 2.7.2 Inervação As propriedades de uma fibra em particular, são determinadas pela sua inervação, sendo que todas as fibras relacionadas com o mesmo neurônio motor possuem propriedades similares, mas não idênticas (SNOW & VALBERG, 1994). A inervação do músculo pode alterar os tipos de miofibrilas, como exemplo, após lesão de desnervação, a reinervação de fibras de contração lenta por neurônio motor de fibras de contração rápida faz com que as fibras lentas recéminervadas assumam as características de contração rápida. Acredita-se que o padrão ou o índice de descarga do neurônio motor inferior desempenhe papel importante nesse processo (HAYS & ARMBRUSTMACHER, 1999). 17 2.7.3 Função do músculo Os músculos esqueléticos de eqüinos são compostos por diferentes tipos de fibras. As fibras musculares que realizam atividades em condições aeróbias se mesclam com as fibras de caráter metabólico anaeróbio ou intermediário. Em conseqüência, a distribuição e a proporção dessas fibras determinam o grau de especialização do músculo. Devido a este fato, as diferenças entre os músculos esqueléticos e função são determinadas pela presença e distribuição dos diferentes tipos de isoformas de proteínas contráteis e regulatórias das miofibrilas (PERRY, 1985). As fibras tipo I, de contração lenta, são ativadas em atividades que requerem a manutenção de atividade durante períodos prolongados, como as funções posturais ou exercício de resistência. Em contrapartida, as fibras tipo IIA estão associadas com atividades que requerem o desenvolvimento de forças rápidas e prolongadas. Enquanto que as fibras tipo IIX são ativadas quando se requer o desenvolvimento de forças rápidas e breves, portanto são recrutadas em exercícios de alta intensidade e curta duração (ALECKOVIC et al., 1989). Os músculos propulsores estão situados proximalmente à coxa e atuam em curtos períodos de tempo, possuem poucas fibras tipo I e maior porcentagem de fibras tipo II com grande velocidade de contração (ESSÉN-GUSTAVSSON et al., 1994; MAYORAL et al., 1999). 2.7.4 Exercício ou treinamento As adaptações da musculatura esquelética durante o exercício e após um período de treinamento físico podem ser observadas de forma macroscópica, microscópica e bioquímica (ERIKSON, 1996). O exercício físico, espontâneo ou induzido, dependendo da duração, freqüência e intensidade, e pode gerar modificações na estrutura do tecido 18 muscular (ESSÉN-GUSTAVSSON & LINDHOLM, 1985; RIVERO et al., 1993a, SUCRE et al., 1999). O exercício espontâneo é aquele que o animal realiza no desenvolvimento normal de suas atividades sem estar submetido a nenhum treinamento. Esse tipo de atividade física parece exercer efeito positivo sobre todos os músculos implicados no exercício, já que tende a incrementar ligeiramente o metabolismo oxidativo, aumentando a proporção das fibras oxidativas e conferindo maior tolerância ao estresse físico (ESSÉN-GUSTAVSSON & JENSEN WAERN, 1993). Outros pesquisadores afirmam que o exercício espontâneo não é suficiente para modificar as proporções dos diferentes tipos de fibras musculares (GENTRY et al., 2002). O efeito do exercício induzido, aquele produzido pela aplicação de treinamentos durante um período de tempo determinado, sobre a composição fibrilar é variável. Alguns pesquisadores relatam que o exercício de resistência, moderado e aeróbio produz aumento da capacidade aeróbia do músculo para gerar ATP (ESSÉN-GUSTAVSSON et al., 1983; DEMIREL et al., 1999). Esta modificação ocorre mediante adaptações metabólicas fibrilares associadas ao aumento da atividade de enzimas implicadas no metabolismo oxidativo como, citrato sintetase (CS) e 3-OH-Acil-Coa desidrogenase (HAD), além do incremento na proporção de fibras oxidativas (ESSÉN-GUSTAVSSON et al., 1983; RIVERO et al., 1999). Quando o exercício é anaeróbio ou de força, ocorre hipertrofia fibrilar (SALTIN & GOLLNICK, 1983), embora alguns autores não tenham encontrado evidencias de tal efeito (UHRIN & LIPTAJ, 1992). Os efeitos do exercício sobre a composição fibrilar são complexos e variáveis, dependem de vários fatores, incluindo o tipo de exercício (força e resistência), a intensidade e duração, o condicionamento físico prévio do indivíduo, o músculo estudado e a constituição genética. As alterações bioquímicas e fisiológicas produzidas resultam da adaptação dos componentes miofibrilares aos novos requerimentos de energia como resposta ao estresse metabólico que se origina nos músculos que participam 19 ativamente no exercício. Entre essas adaptações se destaca o incremento da capacidade oxidativa das fibras musculares, através do aumento da atividade das enzimas que intervêem na β oxidação dos ácidos graxos, aumento da densidade mitocondrial e da capilarização (ESSÉN-GUSTAVSSON, 1996; SUCRE et al., 1999). GUYTON (2002) ressalta ainda, a hipertrofia e hiperplasia; aumento das enzimas mitocôndriais; aumento nos componentes do sistema metabólico do fosfanogênio (ATP e fosfocreatina); aumento das reservas de glicogênio e triglicerídeos. Como conseqüência ocorre melhoria na capacidade dos sistemas metabólicos, tanto anaeróbio como aeróbio, aprimorando especialmente a velocidade máxima de oxidação e a eficiência do sistema metabólico oxidativo. Segundo LINDNER et al. (2003), dentre os principais efeitos fisiológicos que o treinamento induz no músculo esquelético eqüino, se destacam a hipertrofia das fibras musculares, aumento da proporção de determinado tipo de fibras, conversão dos tipos de fibras, aumento da atividade das enzimas oxidativas, aumento da densidade mitocondrial, aumento da densidade capilar, aumento da atividade da enzima AMP desaminase, nulo ou pequeno efeito na atividade das enzimas anaeróbias, aumento moderado do conteúdo de glicogênio intramuscular, aumento do número de transportadores de glicose na membrana, aumento do número de transportadores de ácidos graxos livres na membrana, melhoria no transporte iônico através de membrana, aumento da capacidade de tamponamento do músculo. HENCKEL (1983) relata que o treinamento pode aumentar significativamente a área e o número médio de fibras. Admite-se que um número pequeno de fibras musculares que apresentam aumento da sua área possa fender-se ao meio, por todo comprimento, formando fibras inteiramente novas, aumentando assim, também o número de fibras (GUYTON, 2002). A realização de exercícios de alta velocidade, assim como o salto, requer potência, a qual está associada a presença de grandes massas musculares. Exercícios prolongados necessitam de oxigênio para o metabolismo energético, uma característica de músculos contendo elevada proporção de fibras pequenas 20 (tipo I). O aumento da musculatura para obter maior potência é conseqüência do aumento no número e tamanho de fibras, estas alterações são controladas por fatores genéticos e pela intensidade de treinamento (LEWIS, 1995). LINDNER et al. (2003) observaram que as adaptações celulares corresponderam às alterações ultra-estruturais. Tais alterações têm sido interpretadas no cavalo como indicativos de aumento na capacidade aeróbia e de melhoria da resistência. Numerosos estudos têm demonstrado aumento da densidade mitocondrial no cavalo associado com diferentes tipos de treinamento e uma correlação positiva entre o número de fibras musculares com elevada capacidade oxidativa e o êxito competitivo em atividades de resistência (RIVERO, 1997). As mensurações sangüíneas de lactato imediatamente após o exercício durante o treinamento mostraram que as concentrações deste metabólito são reduzidas com o desenvolver do treinamento. LINDNER et al. (2001), demonstraram que além do deslocamento para a direita da curva de lactato, à medida que ocorre melhoria do condicionamento físico em animais treinados em esteira rolante, também ocorrem modificações nas fibras musculares. A capacidade para realizar exercícios de baixa intensidade e longa duração está correlacionada com elevadas percentagens de fibras musculares de tipo I e IIA (RIVERO et al., 1993a), enquanto que exercícios de curta duração e alta velocidade estão relacionados a elevadas porcentagens de fibras tipo II (BARREY et al., 1999). Cavalos de resistência de elite apresentaram porcentagens mais altas de fibras do tipo I e IIA e porcentagens mais baixas de fibras do tipo IIX no músculo glúteo médio quando comparado a competidores comuns. Em eventos de resistência humana, diversos relatos equacionam uma alta proporção de fibras de contração lenta em músculos ativos em atletas competidores com desempenho superior. Ao contrário, os atletas corredores de curtas distâncias geralmente apresentam porcentagem maior de fibras musculares tipo IIB em seus músculos locomotores (BLANCO & PÉREZ, 2004). 21 Animais submetidos a treinamento de resistência utilizam em maior proporção o metabolismo aeróbio para produção de energia (RONÉUS et al., 1994), o que mostra o papel preponderante das fibras oxidativas musculares na performance desses animais. Entretanto, as fibras glicolíticas também participam desta atividade, uma vez que, a medida que o trabalho se torna mais intenso, cada vez mais energia é fornecida por meio anaeróbio (WHITE & SNOW, 1987; SCHUBACK & ESSÉN-GUSTAVSSON, 1998). SERRANO et al. (2000) estudaram os efeitos de um programa de treinamento sobre os tipos de fibras musculares do músculo glúteo médio por meio de técnicas de eletroforese, histoquímica, imunohistoquímica e bioquímica. Após três meses de treinamento observaram diminuição significativa de fibras tipo IIX e aumento das fibras tipo IIA, enquanto a freqüência de fibras tipo I não foi alterada. A diminuição das fibras tipo IIX foi ainda maior após oito meses de treinamento. Exercícios de resistência em cavalos evocam significante transição dos tipos de fibras de contração rápidas para lenta (SERRANO et al., 2000). Segundo GONDIM (2005), quanto maior a porcentagem de isoformas dos tipos I e IIA, melhor poderá ser o desempenho em longas distâncias. Segundo ROSE (1986), uma das maiores e mais importantes adaptações ao treinamento de resistência é o aumento, no músculo esquelético, das concentrações de enzimas das vias associadas a β oxidação. Como resultado ocorre o aumento da capacidade de trabalho devido à grande oxidação das gorduras e a pequena utilização de glicogênio. Entretanto a duração do período de treinamento e a intensidade do exercício podem influenciar no perfil de atividade destas enzimas. 22 2.8. Características do músculo glúteo médio O músculo glúteo médio, objeto de estudo no presente trabalho, está localizado na região da garupa do cavalo. Sua função é estender a articulação coxofemoral e abduzir a coxa (SISSON, 1986). No cavalo, o músculo glúteo médio possui grande importância na locomoção e tem sido utilizado em estudos da performance atlética para avaliar o grau de adaptação muscular ao treinamento, por ser o mais ativo em todos os andamentos. Sua localização facilita o acesso e o volume de sua massa é representativo (LINDHOLM & PIEHL, 1974; LINDHOLM & SALTIN, 1974; ESSÉNGUSTAVSSON et al., 1989; BAYLY & HODGSON, 1991; RIVERO et al., 1993b). Apresenta grande atividade propulsora nos andamentos durante o exercício e ausência de grandes artérias, veias e nervos (HENCKEL, 1983; RIVERO et al., 1989). 2.9. Fontes de energia para a contração muscular A energia para a contração muscular é oriunda da degradação do ATP pela mAPTase localizada na cabeça da miosina. A degradação do ATP em ADP + Pi e a liberação de energia servem para energizar as pontes cruzadas de miosina, que por sua vez deslocam as moléculas de actina sobre a miosina, encurtando o músculo (POWERS & HOWLEY, 2000). A manutenção da contração muscular requer o fornecimento de uma quantidade de energia química cerca de quatro vezes maior durante o exercício do que no repouso. Esta demanda energética é suprida pela síntese de ATP realizada principalmente a partir da fosfocreatina, glicólise anaeróbia, β oxidação e fosforilação oxidativa (BALDISSERA, 1997; POWERS & HOWLEY, 2000). Todos os exercícios utilizam em primeiro momento a energia armazenada nos estoques intramusculares de ATP e creatina fosfato, fase esta chamada de 23 alática da produção anaeróbia de energia. Inicialmente estes estoques de ATP são restabelecidos pela via glicolítica e posteriormente pela via aeróbia, sendo que esta última utiliza primeiramente o glicogênio e em seguida os lipídeos como substratos (SPURWAY, 1992). A via predominante em determinado momento depende em parte da intensidade do exercício e em parte da duração do mesmo. MUÑOZ et al. (1999) ressaltam que a via glicolítica é um mecanismo importante para geração de energia muscular durante o exercício em eqüinos, principalmente em esforços de alta intensidade e curta duração. Nos exercícios de longa duração e baixa intensidade o fornecimento de energia é realizado preferencialmente pelas vias do ácido tricarboxílico e β oxidação pelas vias metabólicas aeróbias e, alternativamente, pela via glicolítica, anaeróbia (HODGSON et al., 1985, ESSÉN-GUSTAVSSON et al., 1989). Animais submetidos a treinamento de resistência utilizam em maior extensão o metabolismo aeróbio para produção de energia (RONÉUS et al., 1994), o que mostra serem as fibras oxidativas musculares de papel preponderante na performance desses animais. Entretanto, as fibras glicolíticas também o são, já que em trabalhos mais intensos também utilizam o metabolismo anaeróbio como fonte de energia (WHITE & SNOW, 1987; SCHUBACK & ESSÉNGUSTAVSSON, 1998). As fibras tipo I tendem a depender amplamente do metabolismo aeróbio da glicose e de ácidos graxos para obtenção de energia. As fibras do tipo II derivam energia principalmente da glicose anaeróbia tendo o glicogênio como substrato principal. Tais fibras se tornam fatigadas mais rapidamente, porém são capazes de realizar contrações rápidas e, portanto, são encontradas em elevadas proporções nos grupos musculares que movem rapidamente os membros (SANTOS, 2002). SNOW et al. (1981) estudando o glicogênio em um grupo de cavalos participantes de uma competição de enduro, relacionaram o desempenho dos animais e a composição das fibras musculares do músculo glúteo médio. 24 Observaram que, os animais com alta proporção de fibras tipo I e adequado estoque de glicogênio muscular apresentaram melhor desempenho na competição de enduro de 80km. 2.10. Produção de Lactato Com o aumento da intensidade do exercício há primeiramente elevação discreta das concentrações sangüíneas ou plasmáticas de lactato, mas ao se atingir determinada intensidade de esforço ocorre repentina elevação do lactato, formando um ponto de inflexão na curva lactato-velocidade. Este ponto é referido como limiar anaeróbio ou início do acúmulo de lactato no sangue, e geralmente ocorre quando a concentração de lactato alcança entre 2 e 4mmol/L (NIMMO & SNOW, 1982). O lactato produzido pela via glicolítica e não aproveitado pela fosforilação oxidativa mitocondrial possui dois destinos no organismo, acumula-se no próprio músculo ou se difunde para o sangue. Difundido para o sangue, o lactato é carreado para o fígado, coração e outras fibras musculares, onde é metabolizado aerobiamente ou ressintetizado a novas unidades de carboidratos (SPURWAY, 1992). O lactato que não é dissipado das fibras acumula-se continuamente, excedendo a capacidade de tamponamento físico-químico e de transporte de íons H+ das células. Sendo assim, o pH intracelular diminui, afetando tanto o processo de contração como mecanismos que regulam a remoção de ADP nos sítios das pontes cruzadas, localizadas entre a actina e a miosina. A falência da homeostase ATP/ADP é o maior desafio para a continuidade da excitação, e a conseqüente contração muscular. O mesmo autor ressalta que, não se sabe ao certo se a queda de pH dentro da fibra muscular é o único mecanismo da fadiga muscular, entretanto, sabe-se que esta queda contribui decisivamente para a parada do exercício. 25 O limiar anaeróbio vem sendo utilizado para a determinação da intensidade do exercício em programas de treinamento de cavalos atletas (EVANS et al., 1993; TRILK et al., 2002). O limiar anaeróbio individual se baseia na cinética do lactato plasmático durante exercício com cargas progressivas (STEGMANN et al., 1981). O Ponto de Lactato Mínimo (Lacmin) consiste do momento em que a concentração de lactato plasmática é mínima antes de um exercício com cargas progressivas e após indução de acidose lática. Inicialmente, estimula-se acidose láctica colocando o animal para percorrer 4km em velocidade intensa. Quando a concentração de lactato estiver alta, a intensidade do exercício é diminuída. O lactato vai sendo metabolizado e sua concentração começa a diminuir. O animal é submetido a teste de velocidades progressivas, a velocidade na qual a concentração de lactato (que está caindo após a acidose provocada) apresentar uma inflexão e voltar a subir é considerado o limiar anaeróbio (TEGTBUR et al., 1993). A metabolização acentuada de glicose, durante a glicólise; assim como a mobilização acentuada de fibras do tipo IIX acaba produzindo quantidade excessiva de lactato superando a capacidade de remoção. Cavalos de enduro apresentam elevações de apenas duas a três vezes no lactato após uma competição de intensidade submáxima (ESSÉN-GUSTAVSSON et al., 1984); enquanto aumentos de até 40 vezes foram registrados após exercício de máxima intensidade (LINDHOLM & SALTIN, 1974). Há alguns anos pensava-se que o aumento da intensidade do exercício levaria ao ponto no qual uma quantidade insuficiente de oxigênio estaria disponível para a fosforilação oxidativa e moléculas de NADH2 seriam reoxidadas através da transformação do piruvato em lactato, gerando acúmulo deste último no músculo e posteriormente no sangue. Este modelo apontava o déficit de oxigênio como principal fator para o acúmulo de lactato muscular e sanguíneo (MYERS & ASHLEY, 1997). Apesar de alguns pesquisadores sustentarem tal modelo (WASSERMAN et al., 1999), trabalhos recentes apontam não somente a falta de 26 oxigênio, mas o aumento do fluxo da glicose e o recrutamento de fibras musculares que produzem energia pela via anaeróbia como mecanismos responsáveis pelo acúmulo de lactato (ANTONUTTO & DI PRANPERO, 1995; BILLAT, 1996). 2.11. Causas de limitação no desempenho São inúmeras as causas de exaustão que se desenvolvem em cavalos que realizam provas de resistência. As diminuições nas reservas de energia constituem fatores importantes de exaustão que se manifestam no transcorrer dos eventos eqüestres. A fadiga pode ocorrer devido à diminuição das reservas de glicogênio das fibras musculares e não ao declínio de glicose circulante (ESSÉNGUSTAVSSON et al., 1984, VALBERG, 1986). A acidose muscular decorrente do acúmulo de lactato pode impedir a glicólise e a capacidade respiratória da mitocrôndria e, ambas podem estar associadas ao declínio do ATP muscular (NIMMO & SNOW, 1982). A fadiga muscular está diretamente relacionada ao desajuste entre a produção e a metabolização do ATP (POWERS & HOWLEY, 2000). Os problemas musculares são causas comuns de déficit no rendimento atlético do cavalo. Os músculos mais freqüentemente afetados em cavalos de esporte são os glúteos e a musculatura lombar (RIVERO et al., 1999). 2.12. Importância da técnica de biópsia percutânea A técnica de biópsia por agulha percutânea foi introduzida por Bergström em 1962 e desde 1974 tem sido aplicada para o músculo esquelético de cavalos (LINDHOLM & PIEHL, 1974). As informações adquiridas em análises do músculo esquelético têm auxiliado no diagnóstico e prognóstico de afecções musculares, 27 na avaliação do treinamento atlético e na compreensão das adaptações que ocorrem em decorrência do treinamento (WHITE & SNOW, 1987; SNOW & VALBERG, 1994). A técnica de biópsia muscular utilizando a agulha percutânea é simples e pode ser realizada durante o período de treinamento sem causar complicação ou efeito negativo no rendimento do cavalo, sendo bem aceita pelo proprietário do animal (LINDHOLM & PIEHL, 1974; SNOW & GUY, 1976; SNOW & VALBERG, 1994; RIVERO et al., 1999). Essa técnica constitui excelente ferramenta na avaliação do potencial atlético do cavalo, sendo bastante utilizada na medicina esportiva eqüina (ESSÉN-GUSTAVSSON et al., 1984; HODGSON & ROSE, 1987; RIVERO et al.,1995a,b). Investigações realizadas em diferentes raças têm demonstrado que regiões mais profundas do músculo glúteo médio possuem maior porcentagem de fibras tipo I, enquanto as regiões mais superficiais têm maior porcentagem de fibras do tipo II (KLINE et al., 1987; RIVERO et al., 1993b, ISLAS et al., 1996). Segundo SERRANO & RIVERO (2000) regiões profundas (proximais) do músculo possuem grande porcentagem de fibras tipo I que são recrutadas para postura e manutenção e, altas proporções são encontradas em atividades de longa duração. Em contrapartida, maiores proporções de fibras tipo IIX, de partes superficiais (distais) do músculo, indicam que esta região é mais envolvida com exercícios de curta duração e alta intensidade. LEXELL et al. (1983) relataram que para se ter representação adequada do músculo e minimizar os erros, é necessário realizar biópsia em diferentes profundidades e analisar no mínimo 150 fibras por amostra. RIVERO et al. (1993b) não encontraram diferenças quanto às características musculares contra laterais em cavalos. Para superar o problema da grande variação na percentagem dos tipos de miofibrilas, o ideal é que a coleta do músculo glúteo médio seja feita sempre na mesma profundidade (SNOW & GUY, 1980; RIVERO et al., 1993a,b; RIVERO et al., 1995b). De acordo com SERRANO & RIVERO (2000), as variações que 28 existentes nesta profundidade podem ser provocadas pelo efeito do treinamento de baixa intensidade e longa duração. Para examinar o efeito de coletas repetidas no mesmo local do músculo, LINDNER et al. (2002) coletaram fragmentos do músculo glúteo médio direito e esquerdo nas profundidades de 20 e 60 mm, utilizando a técnica descrita por LINDHOLM & PIEHL (1974). Cada lado do músculo foi biopsado três vezes em um intervalo de sete semanas. Esses autores comprovaram que, quando se coleta várias amostras nesse intervalo permite-se à constituição completa do músculo. Dessa forma, não há prejuízo para avaliação das variáveis musculares. Após a ocorrência de injúria, observa-se que o tecido muscular apresenta excelente capacidade de reparação. Esta habilidade de regeneração está relacionada à extensão da necrose, a preservação da inervação e do suprimento sanguíneo na área e o grau de integridade do sarcolema da fibra muscular. Quando o trauma não danifica a lâmina basal e o plasmalema das miofibrilas, é possível a reparação completa (RIVERO et al., 1999; LINDNER et al., 2002). 29 III. MATERIAL E MÉTODOS 3.1. Animais Foram utilizados 20 eqüinos PSA e cruza Árabe, 13 éguas e sete machos castrados, com peso entre 314 e 418kg e idades variando entre quatro e 11 anos, pertencentes a propriedades particulares e ao Departamento de Clínica e Cirurgia Veterinária da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias (FCAV) - UNESP, campus de Jaboticabal. Os animais permaneceram confinados em baias individuais no Setor de Eqüideocultura desta faculdade, dispondo de sal mineral e água à vontade, e feno de Cynodon dactylon de acordo com a proporção 60:40 (volumoso:concentrado) para um consumo de matéria seca de 2% do peso vivo. Adicionalmente, receberam concentrados em cochos individuais duas vezes ao dia, formulados com 0, 6, 12, 18 e 24% de óleo de soja refinado, fubá de milho, farelo de soja, fosfato bicálcico, calcário e premix mineral e vitamínico (Apêndice -Tabela 15). O consumo de energia e nutrientes foi proporcional ao peso metabólico (P0,75kg) de cada animal, seguindo a exigência para cavalo de 370kg submetidos a exercício moderado de acordo com o NRC (1989). Os animais foram soltos em piquetes de Cynodon dactylon uma vez por semana. Antes do período experimental os animais foram submetidos a exame físico para avaliação da higidez, dando-se destaque à integridade do sistema locomotor (TAYLOR & HILLYER, 1997). Utilizou-se eqüinos sadios, em boas condições nutricionais e após passarem por programas de desverminação, combate a ectoparasitas e vacinação. Os animais foram submetidos a treinamento de equitação e adaptação ao manejo e a esteira, durante período de 15 dias consecutivos. Neste período foi fornecido o concentrado experimental com 0% de óleo. Posteriormente, os 20 eqüinos foram distribuídos em cinco grupos de acordo com a dieta alimentar, 30 sendo cada grupo composto de quatro cavalos. O critério de distribuição foi feito em função do sexo e idade, na tentativa de formar grupos homogêneos. O grupo controle não recebeu óleo e os demais grupos foram suplementados com 6, 12, 18 e 24% de óleo de soja (Tabela 1). O óleo foi adicionado aos concentrados no momento do fornecimento, evitando-se assim a possível rancificação na armazenagem devido ao alto teor de extrato etéreo (EE). A composição dos concentrados experimentais utilizados está relacionada na Tabela 15 (Apêndice). Tabela 1. Distribuição dos animais em grupos experimentais com base na dieta alimentar fornecida (0, 6 12, 18 e 24 % de adição de óleo). Grupos Animal 1 2 3 4 Óleo (%) 0 0 0 0 Sexo F F M F Idade (anos) 6 7 11 4 6 5 6 7 8 6 6 6 6 F F M M 6 7 9 8 12 9 10 11 12 12 12 12 12 F F M M 6 6 7 11 18 13 14 15 16 18 18 18 18 F F M F 6 6 12 8 24 17 18 19 20 24 24 24 24 F F M F 5 5 7 11 0 F; fêmea, M: macho. 31 3.2. Teste para determinação da curva velocidade-lactato Com o propósito de avaliar o condicionamento físico dos animais e determinar a intensidade do treinamento em esteira1 foram realizados dois tipos de exercícios testes, denominados velocidade-lactato e Lacmim. O teste velocidade-lactato consistiu em um período de aquecimento de dois minutos a 1,7 m/s e cinco minutos a 4,0 m/s com 0% inclinação. Em seguida a esteira foi inclinada a 10%, com velocidade inicial de 4,0 m/s e, a cada 2 minutos a velocidade foi acrescida em 1,0 m/s. A velocidade final foi determinada pelo momento no qual o animal demonstrava sinais de fadiga, como desconcentração, sudorese intensa, abaixamento da cabeça e cansaço tendendo a não acompanhar a esteira rolante, se deslocando para trás. Após este período, o animal foi submetido ao desaquecimento durante 15 minutos a 1,7 m/s, objetivando sua recuperação. Foi realizado também o teste para a determinação do limiar anaeróbio pelo Ponto de lactato mínimo - Lacmim (TEGTBUR et al., 1993). Este teste consistia de 5 minutos de aquecimento a 4m/s com a esteira sem inclinação, depois, galope a 9m/s com inclinação de 10% até que a concentração sangüínea de lactato atingisse 8mmol/L. Para esta determinação foi realizada a coleta de sangue a cada minuto. Após esta etapa, foi realizado o desaquecimento a velocidade de 3,5m/s até que concentração sangüínea de lactato reduzisse em 50% do pico máximo. Na fase seguinte, inclinava-se a esteira a 5% na velocidade de 4m/s. A cada dois minutos a velocidade foi aumentada em 1m/s e mensurado o lactato sangüíneo até ocorrer dois aumentos consecutivos na lactacidemia. Teste finalizado, realizou-se novo desaquecimento de 3 minutos a 3,5m/s, seguido de 5min a 1,7m/s. O limiar anaeróbio foi calculado no ponto mínimo da curva da concentração sangüínea de lactato. O valor obtido no teste de Lcmim determinou a velocidade no estágio 5 do protocolo de treinamento em esteira (Tabela 2). ________________________________ 1 Esteira Galloper 5500 - Sahinco LTDA, Palmital, SP, Brasil. 32 3.3. Programa de treinamento Os cavalos trabalharam seis dias por semana, intercalando exercício na esteira rolante e na trilha em dias alternados. Metade dos animais foi treinado pela manhã na esteira rolante e a outra metade, montados no período da tarde, em trilha. O protocolo de treinamento na esteira rolante está descrito na tabela 2. No estágio 5 do trabalho na esteira utilizou-se 80% da velocidade correspondente ao limiar anaeróbio, observado para cada cavalo no teste de Lacmim. O exercício em trilha foi realizado a velocidade média de 9km/h durante duas horas consecutivas, em que os animais realizavam sempre o mesmo percurso. O programa de treinamento foi o mesmo para todos os animais. No dia de descanso permaneciam soltos em piquete. Tabela 2. Protocolo de treinamento dos eqüinos na esteira rolante. Estágio Tempo (min) V (m/s) 1 2 3* 4 5* 6 7 8 Total 2 4 10 2 10 2 7 3 35 1,7 5 4 4 (6-7) # 3 5 1,7 * inclinação de 5% # 80% da velocidade encontrada para o limiar anaeróbio no Teste de Lacmim Espaço (m) 204 1200 2400 480 3600-4200 360 2100 306 10650-11250 33 3.4. Determinação do peso e escore corporal O peso corporal foi mensurado em balança específica para grandes animais1. A avaliação do escore corporal foi realizada segundo HENNEKE et al. (1983), a partir da visualização e palpação das regiões zootécnicas tais como: pescoço, costela, cernelha, paleta, escápula, processos espinhosos lombares, glúteos e base da cauda; atribuindo valores através de uma escala pontuada de 1 a 9, onde 1 é considerado extremamente magro e 9, extremamente gordo (Tabela 15), independente do tamanho e conformação do animal. Ambos os parâmetros foram determinados antes e após o término do treinamento de sete semanas. 3.5. Colheita de amostras musculares Para a análise muscular foi selecionado o músculo esquelético glúteo médio, por participar ativamente da locomoção e ser um dos mais importantes músculos para a produção de força propulsora. Amostras do músculo glúteo médio foram colhidas dos animais em tronco de contenção específico para eqüinos, em posição quadrupedal. As colheitas foram efetuadas de acordo com a metodologia preconizada por LINDHOLM & PIEHL (1974) e VALETTE et al. (1999), utilizando a agulha de biópsia percutânea do tipo Bergström nº 6.0 (Figura 1). As amostragens foram realizadas no lado esquerdo da garupa dois dias antes do início do treinamento e ao término deste (sete semanas após). _____________________ 1 Perfecta, São Paulo. 34 a b c Figura 1. Agulha de biópsia muscular tipo Bergström 6,0mm ( Kruise). (a) agulha guia contendo uma abertura; (b) cilindro cortante; (c) mandril. O local de inserção da agulha adotado foi o sugerido por LINDHOLM & PIEHL (1974), o qual se localiza no terço médio cranial de uma linha imaginária que se estende da tuberosidade coxal à base da cauda. Para tanto, realizou-se tricotomia de uma área de aproximadamente 5cm2, correspondente à região do músculo glúteo médio. Foi realizada a limpeza da região, utilizando gaze estéril embebida em solução de iodopovidine1 e posteriormente embebida em solução de álcool iodado. Em seguida, foi realizado o bloqueio anestésico local, mediante a infiltração de 1mL de Cloridrato de lidocaína 2% sem vasoconstrictor2 por via subcutânea. Dois minutos após a realização da anestesia local, realizou-se a antisepsia com solução de álcool-iodado e procedeu-se uma incisão na pele, tecido subcutâneo e fáscia glútea, utilizando lâmina de bisturi descartável nº 22, em seguida promoveu-se hemostasia compressiva utilizando gaze estéril. _____________ 1 2 Asteriodine, ASTER, São Paulo, SP. Lidostesim® SV, DENSPLY, Catanduva, SP. 35 Introduziu-se a agulha acoplada ao cilindro cortante com a janela fechada, b ambos previamente esterilizados, em um ângulo de 90º, na incisão promovida pela lâmina de bisturi, até aproximadamente 6,0 cm de profundidade, para atingir o músculo glúteo médio. Em seguida, o cilindro cortante foi suspenso, permitindo a abertura da janela de corte e procedeu-se o deslocamento lateral na agulha, pressionando lateralmente contra a massa muscular descrevendo um ângulo de 45º, então, introduziu-se o cilindro cortante para a realização do corte do fragmento muscular (Figura 2). 36 a b c d a e f Figura 2. Procedimentos para colheita da amostra muscular. (a) Local da tricotomia (área de 25cm2 aproximadamente), (b) infiltração do anestésico local, (c) botão anestésico, (d) incisão de pele, (e) local incisado, (f)* inserção da agulha de biópsia muscular na incisão de pele. A agulha possui marcações externas para auxiliar na colheita da amostra na profundidade adequada. __________ *Foto cedida por D’ANGELIS, 2004. 37 Foram coletadas duas amostras consecutivas do músculo glúteo médio através da mesma incisão no lado esquerdo da garupa de cada animal. As amostras destinadas às análises histoquímicas foram colhidas com a abertura da agulha direcionada medialmente e amostras destinadas à análise bioquímica foram colhidas com a abertura direcionada lateralmente. Após a colheita da amostra, a agulha foi retirada cuidadosamente e realizou-se a hemostasia comprimindo-se manualmente a ferida cirúrgica com gaze estéril. A lesão foi tratada com pomada cicatrizante e repelente1 uma vez ao dia, até a cicatrização (Figura 3). a b Figura 3. Ilustração da ferida cirúrgica. a. lesão imediatamente após a colheita das amostras; b. curativo realizado subseqüentemente. _________________ 1 Ungüento Person®, Saúde Animal Ltda, Rio de Janeiro, RJ. 38 3.6. Processamento das amostras musculares As amostras musculares obtidas do músculo glúteo médio (Figura 4) destinadas à análise histoquímica foram resfriadas dois minutos após a colheita, mediante a imersão em hexano2 por 30 segundos, em seguida imersas em nitrogênio líquido a -196ºC. As amostras destinadas à quantificação de glicogênio na fibra muscular, foram imediatamente imersas em nitrogênio líquido. Ambas foram armazenadas em freezer a -70°C até o momento da análise laboratorial. Figura 4. Amostra muscular no interior da abertura da agulha. _____________ 2 Hexano P.A. Synth, Diadema, SP. 39 3.7. Análises Histoquímicas Foram realizadas quatro secções transversais seriadas com 12µm de espessura das amostras musculares, em criostato1 à -20°C. Os cortes foram dispostos em lâminas histológicas, as quais permaneceram armazenadas em freezer a temperatura de -20°C até o momento da realização das análises musculares no laboratório de Farmacologia do Departamento de Morfologia e Fisiologia Animal da FCAV - UNESP, campus de Jaboticabal, São Paulo. 3.7.1. Adenosina Trifosfatase Miofibrilar (mATPase) A atividade enzimática da mATPase foi utilizada para identificar e distinguir os tipos de fibras musculares puras por meio da velocidade de contração destas. A técnica utilizada para essa análise foi uma adaptação do método de coloração metacromática da atividade ATPase em miofibras, descrito por OLGIVIE & FEEBACK (1990), utilizando alguns passos recomendados por GUTH & SAMAHA (1970) e ENNION et al. (1995) e, empregada com sucesso por D’ANGELIS et al. (2005). As lâminas contendo os cortes musculares foram mantidas à temperatura ambiente durante 35 minutos, para secagem e aderência dos mesmos à lâmina histológica. Os cortes foram fixados por 6 minutos à temperatura de 22 a 24°C em solução de formalina tamponada a 5% e pH 7,3 contendo 0,17M de cloreto de sódio, 336 mm de sacarose e 0,13M de cacodilato de sódio. Posteriormente, foram lavados três vezes em solução tampão Tris base 21 mM pH 7,8 contendo 3,4 mM de cloreto de cálcio (GUTH & SAMAHA, 1970). Em seguida, foram préincubados em meio ácido (pH 4,50 a 4,55) contendo 52 mM de acetato de potássio e 17,7 mM de cloreto de cálcio durante 5 minutos à temperatura de 22 a 24°C (OLGIVIE & FEEBACK, 1990). Os cortes foram lavados, utilizando o mesmo ____________ 1 Mícron GmbH – H1599 OM, 69190, Walldorf, Alemanha. 40 tampão conforme descrito anteriormente, e incubados segundo o procedimento descrito por ENNION et al. (1995), em meio alcalino (pH 10,50 a 10,55) contendo 40 mM de glicina, 20 mM de cloreto de cálcio e 2,5 mM de ATP1 em estufa a 37°C durante 25 minutos. Após esses procedimentos, foram lavados rapidamente em água destilada e incubados em solução aquosa de cloreto de cálcio 1% por três minutos. Em seguida, foram novamente lavados em água destilada, corados com azul de toluidina 1% durante 10 segundos, desidratados em séries crescentes de etanol (70, 80, 90, 100 e 100%), diafanizados em três séries de xilol 100% e montados em lamínulas com entelan (OLGIVIE & FEEBACK, 1990). 3.7.2 Nicotinamida adenina dinucleotídeo tetrazólio redutase A NADH-TR foi realizada para determinar o metabolismo oxidativoglicolítico dos diferentes tipos de fibras musculares de eqüinos. Utilizou-se como marcador do padrão oxidativo, a enzima nicotinamida adenina dinucleotideo desidrigenase (NADH). A técnica consiste em incubar a amostra muscular em solução que contêm a enzima NADH e NBT (Nitro blue tetrazolium) para formar o complexo NADH-TR (RYAN, 1992). As lâminas contendo os cortes musculares foram mantidas à temperatura ambiente durante 20 minutos, para secagem e aderência dos mesmos a lâmina histológica. Os cortes foram incubados durante 40 minutos em estufa a 37°C em solução contendo 8 mg de NADH-TR, 10 mg NBT e 10 mL de tampão Tris 0,2M pH 7,4 (1,2114g Tris em 50 mL de água destilada). Em seguida, foram lavados em água destilada três vezes. Posteriormente, foram fixados em formol 5% tamponado pH 7,0, durante cinco minutos. Seguido de lavagem em água destilada, desidratação em etanol, diafanização em xilol e montagem com entelam, conforme descrito anteriormente para mATPase. ____________ 1 Sigma Aldrich, Química do Brasil Ltda, São Paulo, SP. 41 3.8. Análises morfométricas As análises morfométricas foram realizadas no laboratório de análises de imagens do Departamento de Anatomia da Faculdade de Veterinária, Universidade de Córdoba, Córdoba, Espanha. Dois cortes histológicos corados mediante as técnicas histoquímicas, foram digitalizados em campos idênticos a partir da realização de fotomicrografias de cada secção utilizando o sistema de processamento de imagens computadorizado equipado com microscópio Leica DMLS1 acoplado a câmara Leica ICC A de alta resolução1. A freqüência e área média de secção transversal de cada tipo de fibra foram obtidas utilizando o programa de análises de imagens2. A freqüência média foi considerada como a porcentagem do número total de fibras. A área média de secção transversal das fibras foi medida em µm2, a partir da mensuração de cada tipo de fibra muscular. Foram mensuradas entre 100 e 200 fibras por amostra (total de dois campos analisados). A área relativa (%) que cada tipo de fibra ocupa em uma amostra de músculo foi calculada multiplicando por 100, o resultado da divisão entre a porcentagem do tipo de fibra multiplicada pela área média de secção transversal deste tipo de fibra e a somatória resultante ao aplicar a fórmula para todos os tipos de fibras (SULLIVAN & ARMSTRONG, 1978; RIVERO et al., 1993a). ____________ 1 2 Leica Microsistemas, Barcelona, Espanha Visiolog 5, Noemi, Microptic, Barcelona, Espanha. 42 3.9. Determinação do glicogênio total A quantificação do glicogênio total presente nas fibras musculares foi realizada segundo a metodologia preconizada por MOON et al. (1989) com algumas adaptações. Adicionou-se 1ml de solução de ácido perclórico 6% à 50-100mg da amostra muscular. Homogeneizou-se imediatamente utilizando-se o sonicador, assegurando-se que todo tecido estivesse macerado. Em seguida, foi realizada a neutralização pela adição de X µL* de K2CO3 3M. As amostras neutralizadas foram centrifugadas a 3000g por 15 minutos a 10-12oC em centrífuga refrigerada1. O sobrenadante foi desprezado, agitou-se e retirou-se 100µL do homogeneizado neutralizado. Realizou-se o mesmo procedimento com o branco (tampão citrato) e com os padrões (P50, P150, P300 e P600). Acrescentou-se 200µL de amiloglicosidase e incubou-se à temperatura ambiente por 1 hora. Em seguida, adicionou 300µL de ácido perclórico 6%. Agitou e neutralizou pela adição de YµL* de K2CO3 2,25M, agitando-se novamente. Centrifugou em centrífuga refrigerada a 2250xg por 10 minutos a 10-12oC. Adicionou-se 1ml do meio de análise de glicose (Kit Labtest) à 20µL do sobrenadante neutralizado (amostras e padrões) e incubou-se por 18 minutos. A leitura foi realizada em espectofotômetro a 505 nm. O cálculo do glicogênio presente nas amostras musculares foi efetuado a partir da fórrmula abaixo: %= ∑ [ P] ∑ Leit. Amostra x Leitura , XXXx0x ,001 ∑ [ padrões] Leiturax1amostra 1, XXX x 0,001 amostra Peso xmúsculo Leit . P PesoFígado ∑ Leitura padrões Peso músculo O valor de XXX = volume de K2CO3 3M utilizado para neutralização. 1 Centrífuga ALC, PK121K , Itália. O volume de K2CO3 3M ou 2,25M a ser adicionado depende do momento do preparo do reagente. Ao se preparar uma nova solução de ácido peclórico e/ou K2CO3, o volume para a neutralização deve ser checado e o cálculo refeito, se necessário. 43 Para as formulações dos reagentes utilizou-se: tampão citrato (21,0g de ácido cítrico em 1000mL de água deionizada; 5,5 a 6,0g de NaOH em pastilhas pH para 4,0-4,4); ácido perclórico 6% (10mL de ácido perclórico a 70%, diluído em 107mL de água deionizada); carbonato de potássio (K2CO3) 3M (41,4g de K2CO3 em 100mL de água destilada) e K2CO32,25M (31,1g K2CO3 em 100mL de água destilada). 3.10. ANÁLISE ESTATÍSTICA As variáveis estudadas foram analisadas mediante o programa estatístico SAS – Statistical Analysis System (SAS, 2002). Realizou-se a Análise de Variância (ANOVA) para avaliar o efeito da dieta e do treinamento sobre as variáveis estudadas. Utilizou-se o teste de Tukey para a comparação das médias entre os diferentes grupos de dieta alimentar. Aplicou-se o t de “student” quando as comparações foram realizadas entre os grupos de treinamento, e o teste de Wilcoxon para comparações referentes ao escore corporal. Para todas as análises realizadas estabeleceu-se o nível de significância igual a p≤0,05 (SAMPAIO, 1998). Os resultados foram apresentados como valores médios ± erro padrão da média (EPM), na forma de tabelas e figuras. 44 IV. RESULTADOS 4.1. Peso e escore corporal Mediante análise dos dados é possível observar que não houve efeito significativo da suplementação com óleo de soja sobre o peso e escore corporal dos animais (Tabela 3). Desta forma, os animais foram comparados em função do treinamento realizado (Tabela 4). Tabela 3. Médias ± erro padrão da média (EPM) do peso e escore corporal de eqüinos cruza Árabe e Puro Sangue Árabe (PSA) submetidos à suplementação com diferentes concentrações com óleo de soja. Grupos I (n=4) Variáveis Fisiológicas Peso corpóreo (kg) Escore corporal 388,5 ± 20,6 5 II (n=4) 389,5 ± 15,2 5 III (n=4) 399,7 ± 11,3 6 IV (n=4) 380,2 ± 15,1 5 V (n=4) 392,6 ± 19,0 6 Médias na mesma coluna não diferiram significativamente pelos testes de Tukey e Wilcoxon (p≤0,05). Tabela 4. Médias ± EPM do peso e escore corporal de eqüinos cruza Árabe e PSA, submetidos a treinamento de resistência durante sete semanas. Grupos Pré (n=20) Pós (n=20) Variáveis Fisiológicas Peso corpóreo (kg) Escore corporal 5 398,4ª ± 8,91 381,9b ± 5,74 6 Pré: antes do treinamento, Pós: após o treinamento. Médias na mesma coluna seguidas de letras iguais não diferem significativamente pelo teste t de student e Wilcoxon (p≤0,05). O valor médio do peso corpóreo diminuiu significativamente (p≤0,05) após o período de sete semanas de treinamento. O treinamento não exerceu efeito significativo (p>0,05) sobre o escore corporal. 45 4.2. Técnica de biópsia muscular A técnica de biópsia preconizada por Bergström permitiu a colheita de amostras musculares de tamanho adequado e em condições apropriadas para as análises histoquímicas. Neste caso a profundidade escolhida, 6,0 cm, permitiu a colheita de amostras homogêneas. O local determinado para a colheita apresentou fácil acesso. A administração de 1,0 ml de cloridrato de lidocaína suprimiu a sensibilidade cutânea e permitiu a realização da incisão sem qualquer reação por parte dos animais. A introdução da agulha de biópsia no músculo glúteo médio se deu de forma tranqüila, sem necessidade adicional de anestésico. Os animais não apresentaram sensibilidade muscular e não mostraram reflexo nociceptivos durante a retirada de espécimes do músculo. As feridas cirúrgicas cicatrizaram por segunda intenção. Observou-se que as bordas das feridas cirúrgicas dos animais apresentaram-se coaptadas no dia seguinte da realização da biópsia muscular e a cicatrização evoluiu naturalmente, estando a ferida cicatrizada e apresentando crescimento de pêlos após sete dias (Figura 5). 46 a b c d Figura 5. Ilustração da evolução da cicatrização da ferida cirúrgica. d a colheita da amostra. (a) 0, (b) 1, (c) 2 e (d) 7 dias após a 4.3. Identificação dos tipos de fibras musculares 4.3.1 mATPase O músculo glúteo médio dos eqüinos estudados apresentou três tipos de fibras puras: I, IIA e IIX, segundo o grau de reatividade da enzima mATPase após a pré-incubação ácida (pH 4,5) e incubação alcalina (pH 10,5). Os diferentes tipos de fibras demonstraram o padrão de organização em mosaico. As fibras tipo I foram ácido estáveis e alcalino lábeis, demonstrando coloração azul claro. As fibras tipo IIA foram ácido lábeis a pré-incubação ácida e 47 alcalino resistentes à incubação alcalina, assumindo coloração intermediária entre as fibras tipo I e IIX (azul intermediário). As fibras tipo IIX mostraram-se ácido lábeis e alcalino resistentes, corando-se fortemente quando submetidas à incubação alcalina, assumindo coloração azul escuro (Tabela 5 e Figura 6a). 4.3.2. Atividade metabólica das fibras musculares As fibras musculares foram classificadas em oxidativas e/ou glicolíticas segundo a intensidade da reação utilizando a técnica NADH-TR que determina seu metabolismo energético. As fibras tipo I demonstraram reação fortemente positiva, assumindo coloração roxo intenso, indicando metabolismo energético oxidativo. As fibras tipo IIA reagiram moderadamente, mostrando coloração moderada a intensa, intermediária entre as fibras tipo I e IIX, com intensa reação na periferia da célula. As fibras tipo IIX reagiram fracamente à técnica NADH-TR, assumindo coloração clara, mostrando-se glicolíticas (Tabela 5 e Figura 6b). Mediante a comparação das técnicas mATPase e NADH-TR foi possível distinguir ainda, as fibras híbridas tipo IIAX (intermediária entre IIA e IIX), as quais demonstraram coloração intermediária entre as fibras IIA e IIX, e reação na periferia da célula após a coloração com a técnica de NADH-TR (Figura 7). A tabela 5 caracteriza o resultado da reação dos diferentes tipos de fibras às técnicas histoquímicas mATPase e NADH-TR para o músculo glúteo médio de eqüinos. Tabela 5. Colorações histoquímicas observadas nas fibras musculares avaliadas. Tipos de fibra I IIA IIAX IIX Reação + ++ +++ +++ mATPase alcalina Coloração azul claro azul intermediário azul escuro azul escuro +++: reação positiva forte; ++: reação moderada; +: reação fraca. Reação +++ ++ ++ + NADH- TR Coloração roxo escuro roxo intermediário lilás lilás 48 IIX IIA IIA IIX IIX I IIX IIA I IIX I a IIX IIA IIA IIX IIX IIX I IIA I IIX I b Figura 6. Fotomicrografia de cortes transversais do músculo glúteo médio corados mediante técnicas histoquímicas. a. mATPase após pré incubação ácida (pH 4,5) e incubação alcalina (pH 10,5). b. NADH-TR. Observar o padrão de organização em mosaico dos diferentes tipos de fibras. Obj. 20x. 49 As fibras foram identificadas a partir da análise comparativa dos campos corados mediante as técnicas de mATPase e NADH-TR impressos em preto e branco (Figura 7). I IIX I IIA IIX IIX IIAX IIA I IIX I IIX IIA a I IIX IIX IIA IIX IIAX I IIA I IIX I IIX IIA b Figura 7. Cortes histológicos transversais seriados do músculo glúteo médio corados com as técnicas: a. mATPAse, b. NADH-TR. Observam-se fibras tipo I, IIA, IIAX (células grandes com reação na periferia) e IIX. 50 4.4. Morfometria das fibras musculares Para os estudos quantitativos não foram incluídas as fibras híbridas (IIAX), uma vez que sua proporção foi muito pequena (3,4 e 0,6% pré e pós-treinamento, respectivamente). Portanto, estas fibras foram consideradas como IIX. 4.4.1. Freqüência dos tipos de fibras (%) Determinou-se a freqüência ou percentual de cada tipo de fibra muscular em relação à dieta alimentar baseada nas diferentes concentrações de óleo de soja (Tabela 6). Tabela 6. Efeito da suplementação com de óleo de soja sobre a freqüência (%) ± EPM dos tipos de fibras no músculo glúteo médio de eqüinos cruza Árabe e PSA. Grupos de dietas Freqüência dos tipos de fibras (%) IIA I IIX Pré Pós Pré Pós Pré Pós I (n=4) 21,5 ± 0,71 22,7 ± 1,31 49,7 ± 1,38 58,5 ± 4,87 28,8 ± 1,56 18,8 ± 3,62 II (n=4) 21,7 ± 1,60 21,7 ± 1,93 48,7 ± 1,65 50,2 ± 5,19 29,6 ± 4,21 28,1 ± 3,42 III (n=4) 19,7 ± 2,32 21,2 ± 1,18 41,0 ± 2,20 53,5 ± 0,87 39,3 ± 0,85 25,3 ± 2,17 IV (n=4) 25,5 ± 2,72 26,5 ± 1,31 40,5 ± 4,05 55,5 ± 2,96 34,0 ± 6,01 18,0 ± 3,88 V (n=4) 18,5 ± 3,93 19,7 ± 1,38 45,7 ± 1,54 58,2 ± 1,80 35,8 ± 5,78 22,1 ± 1,85 Médias na mesma coluna não diferiram significativamente pelo teste de Tukey (p≤0,05). Como não houve diferenças em decorrência dos tratamentos com óleo, podemos desconsiderar a hipótese desta variável influenciar na freqüência dos diferentes tipos de fibras no músculo glúteo médio dos eqüinos. Assim sendo, os animais foram distribuídos em dois grupos em função do treinamento (Tabela 7). 51 Tabela 7. Freqüência (%) ± EPM dos tipos de fibras do músculo glúteo médio de eqüinos cruza Árabe e PSA, submetidos a treinamento de resistência durante sete semanas. Grupos de treinamentos I Pré (n=20) 20,7Ac ± 1,19 Pós (n=20) 22,4Ab ± 0,76 Freqüência dos tipos de fibras (%) IIA IIX 35,1Ab ± 2,09 44,2Ba ± 1,47 55,2Aa ± 1,58 22,4Bb ± 1,56 Pré: antes do treinamento, Pós: após o treinamento. Letras maiúsculas representam comparações na mesma coluna (entre treinamentos) e letras minúsculas representam comparações na mesma linha (entre tipos de fibras). Letras diferentes diferem significativamente pelo teste t de student (p≤0,05). Observou-se aumento significativo nas fibras tipo IIA (p≤0,05) e diminuição significativa (p≤0,05) nas fibras tipo IIAX e IIX após o período de treinamento de sete semanas. Houve predomínio das fibras IIA pré e pós treinamento em relação às demais. 4.4.2. Área total de secção transversal (µm2) A dieta (Tabela 8) e o treinamento (Tabela 9) não ocasionaram alteração significativa (p>0,05) na área de secção transversal em nenhum dos tipos de fibras musculares. Tabela 8. Efeito da suplementação com de óleo de soja ± EPM sobre a área média de secção transversal (µm2) dos tipos de fibras no músculo glúteo médio de eqüinos cruza Árabe e PSA. Grupos de dietas Área de secção transversal (µm2) IIA I IIX Pré Pós Pré Pós Pré Pós I (n=4) 3851 ± 139 3921 ± 356 4863 ± 199 5154 ± 678 7861 ± 348 8894 ± 1762 II (n=4) 3601 ± 129 4139 ± 442 4392 ± 412 4965 ± 534 7020 ± 466 8711 ± 865 III (n=4) 2608 ± 312 4491 ± 227 3437 ± 364 5276 ± 207 6308 ± 646 8869 ± 426 IV (n=4) 4634 ± 351 3751 ± 563 6724 ± 693 4754 ± 652 10524 ± 957 7688 ± 1029 V (n=4) 3914 ± 453 3380 ± 407 4806 ± 555 4362 ± 463 7267 ± 989 7200 ± 983 Médias na mesma coluna não diferiram significativamente pelo teste de Tukey (p≤0,05). Letras minúsculas representam comparações na mesma linha (entre tipos de fibras). Letras diferentes diferem significativamente pelo teste de Tukey (p≤0,05). 52 Tabela 9. Área média de secção transversal (µm2) ± EPM dos tipos de fibras do músculo glúteo médio de eqüinos cruza Árabe e PSA, submetidos a treinamento de resistência durante sete semanas. Grupos de treinamentos I Pré (n=20) Pós (n=20) 3766 Ac ± 212,3 3936 Ac ± 185,4 Área de secção transversal (µm2) IIA IIX Aa Ab ± 512,7 7451 4824 ± 335,8 4902Ab ± 225,0 8273Aa ± 465,9 Pré: antes do treinamento, Pós: após o treinamento. Letras maiúsculas representam comparações na mesma coluna (entre treinamentos) e letras minúsculas representam comparações na mesma linha (entre tipos de fibras). Letras diferentes diferem significativamente pelo teste t de student (p≤0,05). Em relação ao tamanho dos diferentes tipos de fibras, conforme observado na Tabela 9, a área de secção transversal das fibras tipo IIX foi significativamente maior (P≤0,05) que a área correspondente às fibras tipo I e IIA, obedecendo a seguinte ordem da maior para a menor: IIX >IIA > I. 4.4.3. Área Relativa (%) Como não houve efeito dos tratamentos com óleo sobre a área relativa dos tipos de fibras musculares (Tabela 10), os animais foram distribuídos em dois grupos em função do treinamento (Tabela 11). Tabela 10. Efeito da suplementação com de óleo de soja sobre a área relativa (%) ± EPM dos tipos de fibras no músculo glúteo médio de eqüinos cruza Árabe e PSA. Grupos de dietas Área relativa (%) IIA I IIX Pré Pós Pré Pós Pré Pós I (n=4) 15,4 ± 1,15 16,5 ± 0,5 44,7 ± 1,55 54,7 ± 5,74 39,9 ± 1,83 28,8 ± 5,69 II (n=4) 15,7 ± 0,85 15,5 ± 0,5 43,2 ± 3,97 43,2 ± 4,33 41,1 ± 5,36 41,3 ± 3,88 III (n=4) 11,8 ± 1,70 16,0 ± 0,81 32,5 ± 2,25 47,1 ± 1,41 55,7 ± 2,39 36,9 ± 1,89 IV (n=4) 16,7 ± 3,45 20,0 ± 1,22 36,2 ± 4,27 53,0 ± 3,67 47,1 ± 7,84 27,0 ± 4,49 V (n=4) 13,5 ± 2,33 14,2 ± 1,31 41,2 ± 1,93 53,5 ± 2,63 45,3 ± 5,43 32,3 ± 3,29 Médias na mesma coluna não diferiram significativamente pelo teste de Tukey (p≤0,05). 53 Tabela 11. Área relativa (%) ± EPM dos tipos de fibras do músculo glúteo médio de eqüinos cruza Árabe e PSA, submetidos a treinamento de resistência durante sete semanas. Grupos de treinamentos I 14,4Ac ± 0,94 Pré (n=20) Pós (n=20) 16,4 Ac ± 0,58 Área relativa (%) IIA 39,1 Bb ± 1,78 IIX 46,5Aa ± 2,57 51,1 Aa ± 1,84 32,5Bb ± 2,09 Pré: antes do treinamento, Pós: após o treinamento. Letras maiúsculas representam comparações na mesma coluna (entre treinamentos) e letras minúsculas representam comparações na mesma linha (entre tipos de fibras). Letras diferentes diferem significativamente pelo teste t de student (p≤0,05). Conforme observado na Tabela 11, houve aumento significativo (p<0,05) na área relativa das fibras tipo IIA decorrente do treinamento. Em contrapartida, ocorreu diminuição significativa (p<0,05) na área ocupada pelas fibras IIX. A área ocupada pelas fibras IIA foi significativamente maior (p<0,05) que a área ocupada pelas fibras tipos I e IIX, tanto nos animais treinados como nos inativos. 4.5. Quantificação do glicogênio total A dieta alimentar não influenciou na concentração de glicogênio total nas fibras musculares (Tabela 12). Tabela 12. Médias ± EPM do glicogênio total presente nas fibras do músculo glúteo médio de eqüinos cruza Árabe e PSA, submetidos a diferentes concentrações de óleo de soja. Grupos de dietas Glicogênio total (g/100g) I (n=4) 1,46 ± 0,17 II (n=4) 1,51 ± 0,16 III (n=4) 1,54 ± 0,25 IV (n=4) 1,15 ± 0,14 V (n=4) 1,27 ± 0,32 Médias na mesma coluna não diferiram significativamente pelo teste de Tukey (p≤0,05). 54 Não houve alteração significativa (p>0,05) no glicogênio total presente no músculo glúteo médio dos animais estudados após o período de treinamento de sete semanas (Tabela 13). Tabela 13. Médias ± EPM do glicogênio total presente nas fibras do músculo glúteo médio de eqüinos cruza Árabe e PSA, submetidos a treinamento de resistência durante sete semanas. Grupos de treinamentos Pré (n=20) Glicogênio total (g/100g) 1,41 ± 0,11 Pós (n=20) 1,37 ± 0,07 Pré: antes do treinamento, Pós: após o treinamento. Médias na mesma coluna não diferiram significativamente pelo teste t de student (p<0,05). 4.6. Relação treinamento x tipo de fibra x metabolismo energético As curvas velocidade-lactato médias dos animais, assim como, as proporções das fibras oxidativas e glicolíticas do músculo glúteo médio antes e após o período de treinamento estão apresentadas na Figura 8 e Tabela 14, respectivamente. Observa-se que houve deslocamento da curva velocidadelactato para a direita, aumentando a velocidade necessária para atingir o limiar anaeróbio considerado como 4mmol de lactato sanguíneo (VLac4). Os animais apresentaram aumento significativo no percentual de fibras oxidativas (I+IIA) e diminuição das fibras glicolíticas (IIX) após o treinamento. 55 10 9 Concentração de lactato (mmol/L) Pré-treinamento Pós-treinamento VLac4 PRÉ: 7,71b VLac4 PÓS: 8,80a 8 7 a 6 5 IIX IIX 4 IIX IIA 3 2 1 0 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 Velocidade (m/s) Figura 8. Curva velocidade-lactato de eqüinos cruza Árabe e PSA, submetidos a treinamento de resistência durante sete semanas. Tabela 14. Freqüência e área relativa das fibras oxidativas e glicolíticas antes e após o período de treinamento. Variáveis Fibras oxidativas glicolíticas PRÉ 64,9Ab 35,1Ba PÓS 77,6Aa 22,4Bb oxidativas 53,5Ab 67,5Aa glicolíticas Oxidativas (I + IIA), glicolíticas (IIX). 46,5Ba 32,5Bb Freqüência (%) Area relativa (%) Letras maiúsculas representam comparações na mesma coluna (entre fibras) e letras minúsculas representam comparações na mesma linha (entre treinamentos). Letras diferentes diferem significativamente pelo teste t de student (p≤0,05). 56 V. DISCUSSÃO A alimentação, assim como, o tipo de exercício desenvolvido são fatores que influenciam a adaptação das fibras musculares (RIVERO & PIERCY, 2004). Neste estudo a suplementação alimentar com base nas diferentes concentrações de óleo de soja durante sete semanas não influiu significativamente sobre nenhuma das variáveis estudadas, sendo o treinamento responsável pelas adaptações ocorridas no músculo glúteo médio dos animais em questão. Esses resultados deferiram dos encontrados por Dunnett et al. (2002), que observaram aumento da capacidade oxidativa muscular em animais submetidos a exercício de baixa e moderada intensidade, suplementados com óleo durante 10 semanas. Embora o peso dos animais tenha diminuído significativamente ao final do treinamento; o escore corporal aumentou, entretanto esse aumento não foi considerado significativo. Esse fato pode ser explicado porque o grupo de animais utilizado não apresentava homogeneidade quanto ao estado corporal no início do treinamento. Dessa forma, os animais magros adquiriram peso enquanto os obesos perderam, formando um grupo aparentemente mais homogêneo que demonstrou uma condição corporal adequada no decorrer do treinamento. Notouse ainda, que ambos adquiriram massa muscular e melhoria na capacidade física para realização dos exercícios, adquirindo maior resistência à fadiga. De acordo com SERRANO et al. (2000) a resistência à fadiga está relacionada ao aumento do número de mitocôndrias e capilares, da atividade oxidativa das enzimas musculares, e a menor mobilização de glicogênio endógeno devido a utilização da oxidação dos lipídeos como fonte de energia. Conforme relatado por inúmeros pesquisadores (ESSÉN-GUSTAVSSON et al., 1984; RIVERO et al., 1995a; 1995b; LINDNER et al., 2002; D’ANGELIS, 2004), o método de biópsia muscular por agulha percutânea tipo Bergström adotado nesta pesquisa demonstrou ser uma técnica de fácil aplicação, causando lesões de pequena proporção, cuja cicatrização evoluiu de forma rápida sem a ocorrência 57 de complicações, podendo ser aplicada em animais que estejam participando de programas de treinamento. A profundidade de 6,0 cm adotada para a colheita propiciou amostras homogêneas. Considera-se que amostras coletadas em eqüinos nesta profundidade apresentam maior homogeneidade dos tipos de fibras. Enquanto, na profundidade de 8,0 cm, observa-se maior proporção de fibras do tipo I e em regiões superficiais do músculo (4,0 cm) encontra-se maior predomínio de fibras tipo IIX (RIVERO et al., 1995a; SERRANO & RIVERO, 2000). Conforme descrito em estudos prévios na espécie eqüina, os resultados obtidos a partir da técnica de mATPase permitiu confirmar a existência de três tipos de fibras puras no músculo glúteo médio de eqüinos, as fibras tipo I, IIA e IIX. Mediante a utilização da técnica metabólica do NADH-TR observou-se que as fibras tipo I e IIA reagiram intensamente, demonstrando, portanto, serem oxidativas, enquanto as fibras IIX reagiram fracamente por apresentarem metabolismo glicolítico. A associação das técnicas mATPase e NADH-TR, possibilitou ainda, identificar as fibras híbridas IIAX (IIA + IIX) que representaram 3,4% e 0,6% antes e após o treinamento respectivamente. Para a identificação adequada das fibras híbridas é indicada a utilização de técnicas mais precisas como a eletroforese e a imunohistoquímica (RIVERO & PIERCY, 2004), entretanto tais técnicas não foram realizadas neste estudo e dessa forma pode-se inferir que a freqüência de fibras tipo IIAX foram subestimadas. Não foram identificadas fibras híbridas tipo C, tal fato pode ser justificado porque estas são geralmente encontradas em animais jovens, sendo raras em adultos. GONDIM et al. (2005) identificaram fibras puras I, IIA e IIX, e fibras híbridas IIAX em amostras do músculo glúteo médio de cavalos árabes com idades entre sete e 11 anos submetidos a treinamento para enduro. Observaram ainda que as fibras híbridas IIAX representavam uma porcentagem inferior a 10% do total de fibras quantificadas, e apresentavam área de secção transversal muito variada. Estes autores também não identificaram fibras tipo C nas suas amostras. 58 As fibras musculares apresentaram o padrão de distribuição em mosaico no músculo glúteo médio, corroborando com estudos precedentes realizados em eqüinos (RIVERO & PIERCY, 2004). As fibras tipo IIX apresentaram área de secção transversal significativamente maior que as fibras tipo IIA. Por sua vez, nestas últimas a área de secção transversal foi maior que a das fibras tipo I nos períodos pré e pós treinamento, esses achados corroboram os encontrados por GONDIM et al. (2005). Segundo RIVERO et al. (1999) e SERRANO & RIVERO (2000) as fibras IIX são maiores em tamanho que as fibras tipo I e IIA, especialmente em eqüinos sem treinamento prévio. O treinamento de resistência realizado no período de sete semanas resultou em modificações nas propriedades contráteis e metabólicas do músculo glúteo médio, aumentando a capacidade oxidativa das fibras musculares a partir do aumento na proporção das fibras tipo IIA em detrimento das fibras tipo IIX; do aumento da área relativa ocupada pelas fibras oxidativas (I + IIA) e da diminuição da área ocupada pelas fibras glicolíticas (IIX). Os diferentes tipos de fibras apresentaram diferenças quanto a porcentagem da área ocupada por cada uma dela, obedecendo a seguinte proporção da maior para a menor: IIX>IIA>I e IIA>IIX>I antes e após o treinamento, respectivamente. O somatório da área ocupada pelas fibras I e IIA atingiu 64,9 e 77,6% nos períodos pré e pós treinamento, respectivamente, confirmando a melhoria na capacidade oxidativa do músculo. Entretanto, não se observou hipertrofia das fibras musculares, possivelmente devido ao tempo de duração e intensidade do treinamento utilizado. Inúmeros estudos utilizando treinamento de resistência em eqüinos têm demonstrado aumento na freqüência das fibras IIA e concomitante diminuição das fibras IIX (ESSÉN-GUSTAVSSON & LINDHOLM, 1985; ESSÉN-GUSTAVSSON et al., 1989; RIVERO et al., 1989; 1991; 1995b; RIVERO, 1996). As pesquisas têm reportado ainda, o aumento de fibras híbridas IIAX e fibras tipo I (RIVERO et al., 1995b; RONÉUS et al., 1987; SERRANO et al., 2000). Em contrapartida, os treinamentos de alta intensidade e curta duração têm ocasionado diminuição das 59 fibras tipo I e aumento das fibras tipo IIX (LOVELL & ROSE, 1991; RIVERO et al., 2002). SERRANO et al. (2000) relataram que dependendo da natureza do estímulo induzido, a resposta adaptativa pode ocasionar hipertrofia nas fibras musculares e/ou alteração das propriedades metabólicas e estruturais. A correlação entre a duração do programa de treinamento e a magnitude das alterações induzidas no âmbito molecular tem demonstrado a ocorrência da transição de fibras IIX para IIA durante a fase precoce do treinamento e conversão de fibras IIA em I mais tardiamente (SERRANO & RIVERO, 2000; SERRANO et al., 2000). Dessa forma a fibra é capaz de alterar completamente suas propriedades contráteis e metabólicas como resposta ao estímulo recebido (RIVERO & PIERCY, 2004). O efeito do treinamento sobre a área das fibras musculares de eqüinos é controverso (RIVERO & PIERCY, 2004). As pesquisas vêm apresentando resultados diversificados, tal fato pode ser explicado pelos diferentes tipos de exercício que os cavalos são submetidos, pela diferença na proporção de fibras em cada raça e pelas diferentes respostas que esta diferença pode apresentar após um período de treinamento. Cavalos adultos sob um programa de treinamento aeróbio apresentam normalmente pequeno aumento da área das fibras musculares. Esta resposta está relacionada à conversão de fibras de baixa capacidade oxidativa em fibras de alta capacidade oxidativa, que possuem área menor. A redução na área da fibra quando esta está se tornando mais adaptada ao metabolismo aeróbio é uma alteração favorável, pois permite rápida difusão de oxigênio para o interior da fibra e remoção de produtos do metabolismo, como o CO2. Estudos realizados em cavalos de corrida de idades similares verificaram maior área de fibra para os animais inativos do que nos cavalos em atividade, apesar de uma aparentemente maior massa muscular nos cavalos de alta performance (SNOW & VALBERG,1994). Segundo RIVERO (1996) as respostas musculares adaptivas ao treinamento são mais pronunciadas em cavalos jovens e inativos que em cavalos maduros e treinados regularmente. Tais respostas 60 geralmente são mantidas por um período de cinco a seis semanas de inatividade (FOREMAN et al., 1990; TYLER et al., 1998). RIVERO et al. (1995b) encontraram hipertrofia das fibras tipo I e IIA em amostras colhidas na profundidade de 6,0 cm do glúteo médio em PSA submetidos a programa de treinamento de resistência por três meses. Notaram ainda, que os animais que possuíam maiores porcentagens e áreas das fibras tipo I e IIA apresentaram melhor resposta ao teste ergométrico. RIVERO et al. (1993c) observaram que cavalos competidores em enduro que apresentavam performance atlética excelente possuíam alta porcentagem de fibras de contração lenta e metabolismo oxidativo, com maior área que cavalos considerados de performance moderada. Enquanto TYLER et al. (1998) observaram hipertrofia dos três tipos de fibras em resposta ao treinamento de alta intensidade. SERRANO & RIVERO (2000) verificaram hipertrofia de fibras tipo I após três meses de treinamento aeróbio de éguas da raça Andaluz, utilizando 50% da vlac2 (velocidade correspondente a 2mmol/L de lactato sangüíneo). Argumentaram que esse período de treinamento não foi suficiente para converter fibras IIX em IIA e estas em I. SERRANO et al. (2000) aplicando metodologia semelhante a SERRANO & RIVERO (2000) em garanhões Andaluzes observaram hipertrofia das fibras IIA após três meses de treinamento. Segundo os mesmos autores, esse tipo específico de hipertrofia é explicado pela conversão de fibras IIX em IIA, já que as fibras IIX possuem área maior que as fibras tipo IIA. D’ANGELIS et al. (2005) observaram que o treinamento aeróbio em PSA realizado por 90 dias utilizando 80% do Vlac4 (velocidade em que a concentração de lactato sangüínea atingiu 4mmol/L) não alterou significativamente a freqüência das fibras tipo I e IIA, entretanto reduziu significativamente a porcentagem das fibras tipo IIX. Verificaram ainda hipertrofia das fibras tipo I, IIA e IIX, e aumento da área relativa das fibras tipo I. Existe possível relação entre o tamanho dos diferentes tipos de fibras musculares com os padrões que regem a ativação das mesmas durante o exercício muscular, já que são recrutadas de acordo com a intensidade e duração 61 do trabalho muscular. Dessa forma, as respostas musculares ao treinamento dependerão das características do estímulo (tipo, intensidade e duração) e do estado do músculo antes do início do treinamento (RIVERO, 1996). Para a manutenção da postura e exercícios de baixa intensidade, geralmente, são ativadas as fibras tipo I. Quando a atividade requer o desenvolvimento de forças rápidas e prolongadas são recrutadas as fibras IIA (ARMSTRONG & PHELPS, 1984; ALECKOVIC et al., 1989) e quando o trabalho muscular gera movimentos rápidos e breves, são ativadas as fibras IIX (RIVERO & CLAYTON, 1996). De acordo com SERRANO et al. (2000), exercícios de resistência ocasionam transição de fibras de contração rápida para contração lenta. O organismo, no seu mecanismo de adaptação ao estresse metabólico, modifica a expressão das isoformas de cadeia pesada de miosina (SERRANO & RIVERO, 2000; BALDWIN & HADDAD, 2001). Isso pode explicar o incremento das fibras musculares com tendência ao metabolismo aeróbio, devido a transformação das fibras tipo IIX em IIA e destas em I (ESSÉN-GUSTAVSSON e LINDHOLM, 1985; RIVERO et al., 1993a; BALDWIN & HADDAD, 2001; LEFAUCHER, 2001). Como ressalta MUÑOZ et al. (1999), o desempenho atlético do eqüino está intimamente ligado à relação entre a capacidade oxidativa e glicolítica do indivíduo. D’ANGELIS et al. (2005) observaram que os animais apresentando maiores freqüências e área ocupada pelas fibras tipo I e IIA, após três meses de treinamento aeróbio, também, foram os melhores em desempenho atlético nos testes ergométricos. Contrariamente, os cavalos que mostraram menores freqüências e área ocupada pelas fibras tipo I e IIA apresentaram baixo desempenho no exercício teste. Esses dados confirmam que cavalos com excelente desempenho atlético em programas de treinamento aeróbio apresentam maiores freqüências de fibras oxidativas. No entanto, no presente estudo tal fato não foi observado, pois não houve diferença significativa na freqüência e área ocupada pelas fibras oxidativas entre os animais que obtiveram melhor e pior desempenho nos testes ergométricos. 62 As adaptações celulares e ultra-estruturais musculares observadas têm sido interpretadas no homem (HOPPELER et al., 1973; ANDERSEN & HENRIKSSON, 1977; INGJER, 1979) e no cavalo (RIVERO, 1997) como indicativos de incremento da capacidade aeróbia e melhoria da capacidade de resistência. Numerosos estudos têm demonstrado no cavalo um incremento da densidade mitocondrial associado com diferentes tipos de treinamento e uma correlação positiva entre o número de fibras musculares com elevada capacidade oxidativa e o êxito competitivo em atividades de resistência (RIVERO, 1997). Segundo LINDNER et al. (1997), o treinamento realizado em dias alternados durante seis semanas em intensidades equivalentes a vlac1,5 ou vlac2,5 durante 45 minutos possuíram maior efeito sobre os parâmetros celulares e ultraestruturais do músculo glúteo médio que o treinamento em maior intensidade (vlac4) durante apenas 25 minutos. Dessa forma, concluíram que o treinamento delineado com sessões de intensidade relativamente baixa e duração prolongada é mais efetivo para melhorar a capacidade de resistência individual que o treinamento com exercícios de intensidade mais alta e de menor duração. Esses resultados corroboram com nossos achados e confirmam as observações que vêm sendo realizadas na fisiologia do exercício eqüino por D’ANGELIS et al. (2005) e MARTINS et al. (2006). SERRANO et al. (2000) concluíram que a magnitude das alterações ocorridas em função do treinamento, como a conversão de fibras de contração rápida em lenta, depende da duração do mesmo. A maioria das adaptações induzidas com o treinamento é reversível quando o estímulo cessa e que as alterações em resposta ao treinamento não ocorrem de forma homogênea no tecido muscular, sendo mais marcantes em determinadas regiões do músculo. A produção e a utilização apropriada de energia são essenciais para o eqüino atleta, representando o ponto crítico para o desempenho máximo (EATON, 1994; LINDNER et al., 1997; HARRIS & HARRIS, 1998). Em cavalos de enduro, a principal via energética utilizada é a aeróbia (SLOET et al., 1991; HOFFMAN et al., 2002), sendo os lipídeos a principal fonte energética (BERGERO et al., 2005). 63 PRINCE et al. (2002) demonstraram que eqüinos da raça PSA possuem predisposição racial para a utilização de ácidos graxos livres durante exercícios de baixa intensidade. Em exercícios de baixa intensidade e longa duração ocorre ativação do metabolismo oxidativo que utiliza principalmente da oxidação de lipídeos como fonte de energia. O condicionamento aeróbio ocasiona aumento das concentrações de enzimas das vias associadas a β-oxidação no músculo esquelético resultando no aumento da capacidade de trabalho devido à grande oxidação das gorduras e a pequena utilização de glicogênio (ROSE, 1986) e aumento da capacidade oxidativa, aumento da vascularização, redução da glicogenólise muscular e do metabolismo anaeróbio (GEOR et al., 1999; TYLER et al., 1998). Como conseqüência ocorre melhoria do mecanismo de produção e metabolização do lactato, retardando o seu acúmulo (BAYLY, 1985; VALBERG, 1986). De acordo com RIVERO & PIERCY (2004) essas adaptações são acompanhadas pela melhoria da capacidade de tamponamento muscular e maior eficiência do complexo excitação contração. Alguns pesquisadores consideram que o organismo como mecanismo de compensação ao aumento dos ácidos graxos no sangue, modifica as vias metabólicas responsáveis pela produção de ATP no músculo esquelético em direção as vias oxidativas, especialmente, as implicadas na degradação dos ácidos graxos. Essa adaptação metabólica direcionada ao metabolismo aeróbio parece gerar alterações na estrutura do fenótipo fibrilar, como diminuição do tamanho da fibra muscular e possui a vantagem de facilitar a difusão do oxigênio e substratos necessários para o metabolismo oxidativo (SIECK et al., 1995; PICARD et al., 2002). Embora os lipídeos sejam os substratos energéticos predominantes para a realização de exercícios submáximos, a fadiga nesses casos tem sido associada ao esgotamento de glicogênio intramuscular (VALBERG, 1986). BERGSTRÖM et al. (1967) relataram que atletas com maior concentração de glicogênio muscular apresentaram maior desempenho físico e dessa forma, o aumento das reservas 64 de glicogênio muscular adquiridas com o treinamento tem sido interpretado como benéfico. De acordo com DUNNETTT et al. (2002) a vantagem de utilizar dietas hiperlipídicas concomitante ao treinamento físico é favorecer a utilização de ácidos graxos como substrato para o metabolismo energético. Como conseqüência desta alteração metabólica ocorre a economia de outros substratos como a glicose plasmática, aminoácidos e o glicogênio muscular. Entretanto, nesse trabalho, as reservas de glicogênio muscular dos animais se mantiveram constantes após o período de treinamento. Tal fato pode ser justificado pela duração do período experimental ter sido insuficiente para ocasionar tais adaptações. A grande divergência dos resultados dos estudos nos quais é avaliado o efeito de gordura animal ou óleos vegetais sobre a resposta metabólica e o desempenho de cavalos atletas parece depender da disparidade dos protocolos experimentais utilizados, podendo ser atribuída a vários fatores, como, idade, condição corporal, raça, intensidade e duração do condicionamento físico, composição e período de administração da dieta e a técnica de determinação do glicogênio. D’ANGELIS (2004) também não observou alterações nas reservas de glicogênio muscular após o período de treinamento de 90 dias. Em contrapartida, SERRANO et al. (2000) encontraram aumento significativo no conteúdo de glicogênio muscular após três e oito meses de treinamento para enduro. Esses mesmos autores constataram também que o treinamento aeróbio induziu menor mobilização de glicogênio endógeno, utilizando a oxidação de lipídeos como fonte de energia. GANSEN et al. (1999) avaliaram o efeito de três programas de treinamentos diferentes sobre as reservas de glicogênio muscular e verificaram que durante todo período de condicionamento as concentrações de glicogênio permaneceram constantes para as amostras colhidas na profundidade de 2,0 e 6,0 cm. Nove dias após o término do treinamento observaram aumento de 47 e 48% respectivamente nas concentrações de glicogênio dos animais submetidos aos treinamentos delineados na vlac1,5 ou vlac2,5 durante 45 minutos e essas concentrações 65 permaneceram elevadas até cinco semanas após o fim do condicionamento. Já o treinamento de maior intensidade e menor duração utilizando a vlac4 por 25 minutos não exerceu efeito significativo sobre a variável estudada. Os mesmos autores relataram ainda que as amostras colhidas na profundidade de 6,0 cm apresentaram maiores concentrações de glicogênio quando comparada às colheitas efetuadas na profundidade de 2,0 cm. SERRANO et al. (2000) detectaram aumento do conteúdo de glicogênio intramuscular após três meses de treinamento aeróbio e observaram que esse substrato diminuiu significativamente após três meses de destreinamento. No entanto, ainda foi considerado significativamente mais elevado que antes do início do treinamento. Considerando que as fibras tipo I e IIA possuem metabolismo oxidativo, os resultados obtidos indicaram que o programa de treinamento utilizado promoveu o aumento do potencial aeróbio no músculo glúteo médio em detrimento do potencial glicolítico do mesmo. De acordo com RIVERO (1996) a análise de biópsias musculares extraídas antes e após o programa de treinamento pode comprovar a efetividade do mesmo. Embora sejam numerosos os estudos que investigam a resposta muscular ao exercício e como o treinamento modifica esta resposta (SNOW & VALBERG 1994; RIVERO & PIERCY, 2004), são poucos os pesquisadores que empregam esses conhecimentos básicos em aplicações práticas para avaliar a capacidade competitiva e controlar o treinamento aplicado ao cavalo. A importância da musculatura esquelética no sistema locomotor, sua grande capacidade adaptativa e sua íntima relação com a performance nas diversas atividades eqüestres, devem servir de estímulo para busca de conhecimentos estruturais e metabólicos deste tecido para que possamos manipular o desenvolvimento muscular de forma adequada, obtendo o máximo desempenho e evitando afecções musculares, entre outras. É importante enfatizar que embora a literatura disponha de inúmeras pesquisas relacionadas ao estudo das características musculares em eqüinos, novos estudos se fazem necessários 66 para determinar as características metabólicas, bioquímicas e estruturais das fibras nas diversas raças submetidas a diferentes programas de treinamento, especialmente os realizados à campo. Faz-se também necessário a difusão e a aplicação prática dos conhecimentos adquiridos com as pesquisas visando auxiliar os programas de treinamentos realizados nas diversas modalidades de esportes eqüestres. 67 VI. CONCLUSÕES Os resultados obtidos no presente trabalho permitiram concluir que: As diferentes concentrações de óleo na dieta não influenciaram as variáveis estudadas. O treinamento não induziu hipertrofia das fibras do músculo glúteo médio. O treinamento ocasionou aumento na proporção e na área relativa das fibras tipo IIA em detrimento das fibras IIX, melhorando a capacidade oxidativa muscular. Tanto as dietas com óleo como o treinamento não aumentaram as concentrações de glicogênio muscular. O treinamento melhorou a capacidade aeróbia dos animais. 68 VII. REFERÊNCIAS ALECKOVIC, Z.; ZOBUNDZIJA, M.; BRICK, A.; MIHOLJCIC, B. Histochemical and morphological characteristics of muscles in relation to their functional activity. Acta Veterinaria, Brno, v. 39, n. 5-6, p. 287-298, 1989. ALLEN, D. L.; LEINWAND, L. A. Postnatal myosin heavy chain isoform expression in normal mice and mice null for IIB or IID myosin heavy chains. Developmental Biology, San Diego, v. 229, p. 383-395, 2001. ANDERSEN P.; HENRIKSSON, J. Capillary supply of the quadriceps muscle of man: adaptive response to exercise. The Journal of Physiology, Cambridge, v. 270, p. 677-690, 1977. ANTONUTTO, G.; DI PRANPERO, P. E. The concept of lactate threshold: A short review. Journal of Sports Medicine and Physical Fitness, Torino, v. 35, n. 1, p. 6-12, 1995. ARMSTRONG R. B.; PHELPS, R. O. 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Ingredientes (%) 0% 6% 12% 18% 24% Fubá de milho 84,45 73,50 59,85 47,70 38,25 Farelo de soja 13,20 17,75 25,00 30,75 34,00 0,00 6,00 12,00 18,00 24,00 Calcário 0,95 1,00 1,05 1,00 1,00 Fosfato 0,20 0,30 0,40 0,65 0,65 Sal comum 0,80 1,00 1,20 1,30 1,40 0,40 0,50 0,60 0,70 0,80 100,00 100,05 100,10 100,10 100,10 3,141 3,380 4,022 4,390 4,500 PB* (%) 12,00 12,90 15,35 16,76 17,20 EE* (%) 2,89 8,57 14,18 19,83 25,55 FB* (%) 2,35 2,46 2,68 2,84 2,89 MM* (%) 4,52 4,84 5,26 5,68 5,70 Ca (%) 0,46 0,52 0,59 0,65 0,66 P (%) 0,34 0,35 0,37 0,42 0,45 Óleo de soja 1 2 Premix Total Valores Calculados ED* Mcal/kg 1 Óleo de soja refinado ; 2Premix: P-72g, Ca-191g, Na-68,25, Cl-105,00, Mg-27,5, S-14,963g, Zn-1500,00mg, Cu-250,00mg, Mn-1000,00mg, Fe-1000,00, Co-12,24mg, I-20,00mg, Se-2,25mg, Fl(max)-0,72, Vit A 1600000UI,Vit D3 200000UI, Vit E 3000UI, Vit K3 636mg, Vit B1 1200mg, Vit B2 1600mg, Vit B12 3300mg, Ác. Pantotênico 3300mg, Biotina 20mg, Ác. Nicotínico-6000mg, Ác. Fólico-200mg, Colina 40g, L-lisina 25g, Antioxidante 200mg. *Energia digestível (ED), proteína bruta (PB) e extrato etéreo (EE), fibra bruta (FB), matéria mineral (MM). Como não foi possível a formulação de concentrados isoenergéticos e isoproteicos, devido a grande adição de óleo nos grupos 18 e 24%, o ajuste foi realizado através da quantidade de concentrado fornecido para que o consumo de nutrientes e energia fosse o mesmo. III Tabela 16. Escala de avaliação do escore corporal. Condição Pontuação Descrição Pobre 1 Animal extremamente emaciado; saliências ósseas aparecendo, especialmente vértebras cervicais e lombares. Muito magro 2 Animal emaciado; saliências ósseas ainda visíveis na paleta e pelve; vértebras cervicais discretamente visíveis. Magro 3 Pescoço magro; junção acentuada do pescoço, cernelha e paleta; estrutura pélvica ainda acentuada. Moderadamente magro 4 A espinha ainda aparece, mas as vértebras não são individualizadas; linha da costela ainda visível. Moderado 5 Lombo relativamente achatado; costelas visíveis, porém facilmente palpáveis. 6 Pescoço, paleta e cernelha com formas arredondadas; área do lombo pode ter leve depressão ao longo da espinha; base da cauda e costelas com consistência macia. Moderadamente gordo 7 Gordura depositada ao longo da cernelha e pescoço; base da cauda macia; costelas cobertas por gordura; dobras sobre a espinha podem ser visíveis. Gordo 8 Pescoço engrossado; acúmulo de gordura nas nádegas; dobras evidentes ao longo da espinha; difícil palpação das costelas. Extremamente gordo 9 Pescoço, cernelha e paleta inchadas de gordura; dobras proeminentes nas costas; bolsas de gordura sobre as costelas. Levemente gordo Fonte: HENNEKE et al. (1983). não