Avanços e desafios após a implantação do sistema municipal de monitoramento e avaliação na gestão da política de assistência social em Londrina Márcia Pastor1 Peterson Alexandre Marino2 Resumo: O presente artigo apresenta dados de uma pesquisa que busca sistematizar a experiência da Secretaria Municipal de Assistência Social de Londrina na elaboração e implantação do Sistema Municipal de Monitoramento e Avaliação, destacando a contribuição de tal Sistema no processo de gestão desta política. Faz um breve resgate histórico da Assistência Social no país e no município de Londrina após a implantação do seu Órgão Gestor até seu reordenamento para englobar as ações previstas no Sistema Único de Assistência Social. Em seguida, retrata o processo de construção do Sistema Municipal de Monitoramento e Avaliação e discute suas principais características. Por fim, tece algumas considerações acerca da importância deste Sistema para gestão da política de assistência no município de Londrina. Palavras-chave: Política de assistência social; monitoramento e avaliação; gestão. Introdução A política pública de Assistência Social é resultante das mudanças ocasionadas pela Constituição Federal de 1988 e pela Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS. Até então, a assistência consistia em práticas de benemerência, com ações residuais, de cunho tutelador e compensatório, desenvolvida primordialmente por entidades assistenciais. Em 2004 foi aprovada a Política Nacional de Assistência Social (PNAS), que estabeleceu um Sistema Único de 1 2 Docente do Departamento de Serviço Social da Universidade Estadual de Londrina e participante do Núcleo de Pesquisa sobre Gestão de Políticas Sociais da UEL.E-mail: [email protected] Mestrando em Serviço Social e Política Social da Universidade Estadual de Londrina e participante do Núcleo de Pesquisa sobre Gestão de Políticas Sociais da UEL. E-mail: [email protected] Marcia Pastor, Peterson Alexandre Marino Assistência Social (SUAS) como forma de implementar esta política em todo o território nacional, com base na descentralização da gestão. O SUAS representa um grande avanço e traduz a política de Assistência Social enquanto afiançadora de direitos, através de uma estrutura político-administrativa descentralizada. Dentre seus eixos estruturantes, destaca-se a Informação, Monitoramento e Avaliação, no qual se propõe a construção “de um sistema de informação que permita o monitoramento e avaliação de impacto de benefícios, serviços, programas e projetos de enfrentamento da pobreza” (PNAS, 2004, p. 56). O município de Londrina/PR, em consonância com essa definição, criou em 2005 um Sistema Municipal de Monitoramento e Avaliação que vem contribuindo significativamente no processo de gestão da política de assistência social. 1. Assistência social no Brasil: breves considerações A Assistência Social vista como política pública na perspectiva da Seguridade Social é algo extremamente recente em nosso país. Pois ela é, na verdade, resultado de uma série de mudanças ocasionadas pela Constituição Federal de 1988 e pela Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS. No Brasil, até 1930, não havia por parte do Estado uma compreensão da pobreza enquanto expressão da questão social decorrente do modo capitalista de produção. Quando esta emergia, era tratada como caso de polícia e/ou como uma disfunção individual (SPOSATI et al, 2003, p. 41). Coube às organizações da sociedade civil, através de ações de cunho assistencialista, conduzir os trabalhos de auxílio aos necessitados, de modo a minimizar os efeitos da pobreza. Em 1938, durante o governo de Getúlio Vargas, instalouse o Conselho Nacional de Serviço Social (CNSS) com uma primeira forma de regulamentação da relação entre o Estado e as entidades que prestavam serviços assistenciais, que veio a 44 Sociedade em Debate, Pelotas, 16(2): 43-61, jul.-dez./2010 Avanços e desafios após a implantação do sistema constituir-se numa política de incentivo ao amparo social privado e filantrópico, por meio do mecanismo de subvenção. O CNSS foi criado como um dos órgãos de cooperação do Ministério da Educação e Saúde e substituiu o governante na decisão quanto às quais organizações auxiliar. Sendo que, a partir desse momento no Brasil, homens (e senhoras) “bons” iriam avaliar o mérito do Estado em conceder auxílios e subvenções às organizações da sociedade civil (MESTRINER, 2001, p.57-58). Mestriner (2001, p.21) entende que nessa relação prevalece “o princípio da subsidiariedade entre o estatal e o privado”. Para a autora, este principio consiste basicamente: [...] em que o Estado transfere para a sociedade as responsabilidades maiores, restringindo-se à execução de ações emergenciais. Para tanto, tem utilizado da estratégia da delegação, manipulando subsídios, subvenções e isenções por meio de mecanismo de convênios e atribuição de certificados, numa pretensa relação de parceria ou de co-produção de serviços sob o financiamento estatal. Por isso, não se pode dizer que o Estado esteve de todo ausente, visto que suas ações apontaram “historicamente para a introdução de mecanismos de apoio às organizações, e não diretamente à população” (MESTRINER, 2001, p.17). Ou seja, o Estado efetuava o atendimento aos necessitados não de forma direta, porém mediado por organizações. Neste sentido, a assistência social assumia uma formatação diferente de política social. Conforme Mestriner (2001, p.16): Longe, portanto, de assumir o formato de política social, a assistência social desenrolou-se ao longo de décadas, como doação de auxílios, revestida pela forma de tutela, de benesse, de favor, sem superar o caráter de prática circunstancial, secundária e imediatista que, no fim, mais reproduz a pobreza e a desigualdade social na sociedade brasileira, já que opera de forma descontínua em Sociedade em Debate, Pelotas, 16(2): 43-61, jul.-dez./2010 45 Marcia Pastor, Peterson Alexandre Marino situações pontuais. [...] ela se volta a pequenas parcelas de indivíduos, de forma temporária ou emergencial. A partir da década de 1940 a assistência social no Brasil passou a ser assumida pelo Estado brasileiro enquanto uma modalidade de execução das políticas sociais e um grande exemplo de tal modelo de execução foi a Legião Brasileira de Assistência Social (LBA), criada no ano de 1942. Esta surgiu primeiramente com o objetivo de prestar assistência às famílias de soldados que combateram na II Guerra Mundial; porém, suas ações superaram tais objetivos, pois “com o final da guerra, a LBA se voltou à realização de trabalhos materno-infantis, distribuindo benefícios sociais assistencialistas e implementando o trabalho voluntário” (SOUZA, 2005, p.24) O principio da subsidiaridade utilizado para a provisão de atenções às demandas sociais prevaleceu no país entre as décadas de 1930 à 1990 (Mestriner, 2001). Somente a partir de 1988, com a promulgação da Constituição Federal, o Estado brasileiro assumiu a primazia na condução das políticas públicas na perspectiva da Seguridade Social [...] pode-se afirmar que no campo da Assistência Social, a Constituição Federal de 1988 trouxe uma nova abordagem, com a instituição de direitos, políticas publicas, definição de origem de financiamento, especificação da modalidade de gestão paritária e universalidade de cobertura, participação efetiva e controle social por parte da sociedade civil (SOUZA, 2005 p. 60). A política de assistência social teve sua legislação complementar aprovada em 1993 através da Lei nº 8.742, que ficou conhecida como Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS). Uma das modalidades de participação indicadas nesta lei foi a constituição dos Conselhos de Assistência Social nas esferas federal, estadual e municipal, que deveriam ser compostos pelo poder público, pelas instituições prestadoras de serviços assistenciais e pelos representantes dos usuários e da 46 Sociedade em Debate, Pelotas, 16(2): 43-61, jul.-dez./2010 Avanços e desafios após a implantação do sistema sociedade civil. A LOAS estabeleceu também que o sistema descentralizado e participativo deveria contar com as entidades e organizações de assistência social para o desenvolvimento das ações relativas às essa política, devendo as entidades observar as orientações emanadas do Conselho Nacional de Assistência Social (conforme artigos 6º e 7º da LOAS). Um novo impulso para a implementação da assistência social no país foi registrado com a IV Conferência Nacional de Assistência Social, realizada em dezembro de 2003, em Brasília/DF, que debateu a Política Nacional de Assistência Social (que viria a ser aprovada em setembro/2004) e deliberou sobre a construção do Sistema Único de Assistência Social. A PNAS/2004, ao definir um modelo de gestão da Política de Assistência no país. Inova quando se enfoca na centralidade na família e também quando trata da perspectiva socioterritorial para a execução de suas ações, focando assim as necessidades de cada município, de modo a ampliar a eficiência dos recursos financeiros e da cobertura social. Seus princípios e diretrizes apontam para a universalização do sistema; a territorialização da rede; a descentralização político-administrativa; a padronização dos serviços de assistência social; a integração de objetivos, ações, serviços, benefícios, programas e projetos; a garantia da proteção social; a substituição do paradigma assistencialista e a articulação de ações e competências com os demais sistemas de defesa de direitos humanos, políticas sociais e esferas governamentais (BRASIL, 2004). A Norma Operacional Básica do Sistema Único de Assistência Social (NOB/SUAS) foi regulamentada pelo Conselho Nacional de Assistência Social por meio da Resolução nº 27, de 24/02/2005 e aborda fundamentalmente: a divisão de competências e responsabilidades entre as três esferas de governo; os níveis de gestão de cada uma dessas esferas; as instâncias que compõem o processo de gestão e controle dessa política e como elas se relacionam; a nova relação com as entidades e organizações governamentais e não-governamentais; os principais instrumentos de gestão a serem utilizados; e a forma Sociedade em Debate, Pelotas, 16(2): 43-61, jul.-dez./2010 47 Marcia Pastor, Peterson Alexandre Marino de gestão financeira, que considera os mecanismos de transferência, os critérios de partilha e de transferência de recursos (BRASIL, 2005). Além disso, cabe ressaltar que Para a consolidação da Política de Assistência Social e implementação do SUAS faz-se urgente a formulação e implantação de um sistema de monitoramento e avaliação e um sistema de informação, que permitam a mensuração da eficiência e da eficácia das ações previstas nos planos de Assistência Social; a transparência; o acompanhamento; a avaliação do sistema e a realização de estudos, pesquisas e diagnósticos a fim de contribuir para a formulação da política pelas três esferas de governo. O monitoramento e a avaliação constituem-se ainda como parte integrante de planejamento institucional “como um componente estrutural do sistema descentralizado e participativo”, e que precisam ser tratados como setores estratégicos de gestão (LONDRINA, 2005, p.2). Porém, para a concretização deste novo modelo de gestão, os municípios assumem um papel fundamental. Considerando os contornos da administração pública no país, sabe-se que a trajetória da política de assistência social, em cada um deles, bem como a atuação dos integrantes do sistema descentralizado e participativo, darão as condições para a consolidação do SUAS. 2. A gestão da política de assistência social no município de Londrina/PR Não diferente das ações assistencialistas que permeavam o combate à pobreza no Brasil durante o período que antecedeu a LOAS, a cidade de Londrina também contava com ações não governamentais esporádicas e de cunho caritativo realizadas por algumas entidades filantrópicas do município (ALVES, 2002; LOPES, 1999). 48 Sociedade em Debate, Pelotas, 16(2): 43-61, jul.-dez./2010 Avanços e desafios após a implantação do sistema Porém, dentro da mesma perspectiva de garantia de direitos estabelecida pela Constituição Federal e pela LOAS, já no inicio da década de 1990 o município de Londrina dava indicações de seu envolvimento a respeito da Política Pública de Assistência Social. Alves (2002, p.290) relata: O mesmo processo nacional que mobilizou a promulgação da Constituição de 1988 que colocou a Assistência Social no tripé da Seguridade Social brasileira, provocou uma mobilização municipal para que fosse criada, em Londrina, uma estrutura administrativa pública, através da criação do órgão gestor da política de assistência social. A Secretaria Municipal de Ação Social regulamentada no mês de março de 1993, apenas alguns meses antes da promulgação da LOAS. Neste processo inicial já se contava com as parcerias feitas com as entidades assistenciais existentes no município. Parceria, pois a partir de então essa relação se dá numa perspectiva de complementaridade à rede municipal de serviços buscando a universalização dos atendimentos. Para se ter uma idéia, até a implantação da Secretaria de Ação Social, a relação estabelecida entre o governo municipal e as instituições não governamentais que atuam na área socioassistencial constituíam-se essencialmente em acordos verbais firmados entre prefeitos e os presidentes das instituições. Os recursos financeiros eram divididos sem nenhum critério técnico, não havendo também nenhuma ação continuada dessa prestação de serviço (SILVA, 2005, p. 64). Somente a partir de 1994 a Secretaria de Ação Social estabeleceu os primeiros 49 termos de convênio com as entidades, majoritariamente com instituições prestadoras de serviços de Creche e Educação Infantil. Basicamente, tal termo estabelecia a responsabilidade do município em efetuar o repasse mensal dos recursos, com base em valor per capta definido, ao município coube também definir o número de atendimentos que as instituições eram conveniadas a fazer e estabelecer um Sociedade em Debate, Pelotas, 16(2): 43-61, jul.-dez./2010 49 Marcia Pastor, Peterson Alexandre Marino processo de supervisão das ações desenvolvidas. Com relação às entidades, cabia a estas uma lista de responsabilidades relacionadas à qualificação dos serviços prestados e quanto às características do seu público alvo. Em 1996 conveniaram-se também os serviços especializados voltados à pessoa com deficiência, às escolas especiais e às associações de defesa de direitos. Considerando a necessidade de estabelecer parâmetros de qualidade e avaliação dos serviços prestados, bem como de formalizar o repasse financeiro às instituições mantenedoras de serviços assistenciais no município, foram criados o “Contrato de Gestão” (1999), e, posteriormente, o “Termo de Parceria” (2000). Conforme Pastor (2006) comenta, este processo de implantação da Política de Assistência em Londrina foi marcado pela vontade política da administração pública municipal, pela competência de sua gestora, pela participação da sociedade civil organizada – especialmente através dos Conselhos instituídos – e pelos efetivos esforços dos profissionais que buscaram concretizar a Assistência como política pública de direito dos cidadãos. Tudo isso num contexto de cultura política presente na sociedade em geral que associava pobreza à marginalidade e enviesava essa visão dos necessitados enquanto também cidadãos de direito. Destaca-se neste processo a realização da 1ª Conferência Municipal de Assistência Social, que foi realizada em abril de 1995 e pôde eleger na mesma oportunidade o 1º Conselho Municipal da Assistência Social de Londrina, e também o primeiro Conselho eleito no Estado do Paraná (LOPES, 1999, p.154). A implantação do órgão gestor da Assistência Social em Londrina foi um processo que demandou muito trabalho. Sendo assim, os anos subsequentes à sua implantação foram marcados pela busca de ações voltadas a consolidar a política municipal de Assistência Social enquanto uma política pública. No ano de 2001, dando prosseguimento à busca de uma forma mais adequada de relação entre as entidades e o município, surge o Termo de Cooperação Técnica e Financeira (TCTF). A 50 Sociedade em Debate, Pelotas, 16(2): 43-61, jul.-dez./2010 Avanços e desafios após a implantação do sistema principio, pode-se dizer que o TCTF não incorporou uma nova forma de relação da SMAS com as entidades não governamentais da rede socioassistencial, seguindo em linhas gerais o modelo de convênio já anteriormente firmado entre as partes por meio do Contrato de Gestão e Termo de Parceria. Entretanto, em consonância com as discussões relativas ao SUAS, a partir de 2004 o município de Londrina reordena sua estrutura de atuação na Política de Assistência Social, realizando a divisão de suas ações por níveis de proteções: Básica e Especial. O órgão gestor da assistência, agora denominado Secretaria Municipal de Assistência Social, traz em sua estrutura organizacional a linha de ação no âmbito de transferência de renda, apoio sócio-familiar e inclusão produtiva que correspondam à proposta de garantias na busca de autonomias inseridas no sistema. Sendo que na proteção especial há a lógica da divisão pautada em serviços de Média e Alta complexidade, conforme disposto na PNAS/2004 (SILVA, 2005). Cabe dizer também que as ações de Monitoramento e Avaliação ganham maior força nessa nova estruturação da assistência no município, principalmente pela criação de uma gerência específica para tal ação. O monitoramento e a avaliação de serviços e programas realizados no âmbito da Política de Assistência Social é uma ação nova, que foi instituída e introduzida na política a partir das orientações contidas na NOB/AS de 1998. Com a instituição do TCTF com as entidades, as ações de monitoramento e avaliação foram principalmente na perspectiva de subsidiar técnica e politicamente o Conselho Municipal de Assistência Social visto que apresentava a possibilidade de influência do processo, na definição política e aplicação financeira dos recursos da Assistência Social no município (SILVA, 2005, p. 71). Foram então estabelecidas estratégias e procedimentos de monitoramento e avaliação, capazes de promover a discussão acerca da necessidade em tirar o enfoque único na questão financeira e se voltar à questão da qualidade dos serviços Sociedade em Debate, Pelotas, 16(2): 43-61, jul.-dez./2010 51 Marcia Pastor, Peterson Alexandre Marino prestados aos usuários da política no município, governamentais ou não-governamentais. Para isso, Silva (2005, p. 91) nos esclarece que a Gerência de Gestão de Monitoramento e Avaliação utilizou-se de uma proposta metodológica que consta de duas dimensões: 1) Organização do processo de monitoramento e avaliação em relação ao Conselho e à Rede de Serviços; 2) Procedimentos utilizados pelos técnicos para adquirirem e sistematizarem as informações da rede monitorada. Sendo que tal proposta busca incorporar às ações de monitoramento e avaliação a padronização dos serviços, a articulação dos serviços em rede e alguns outros temas preconizados na LOAS. 3. Sistema municipal de monitoramento e avaliação: a experiência de Londrina Até 2004, o trabalho de acompanhamento às entidades não governamentais conveniadas com o município era realizado por meio de um projeto de assessoria. Como visto acima, com reordenamento do Órgão Gestor da Assistência para adequação à nova Política Nacional de Assistência Social e Norma Operacional Básica – NOB/SUAS – houve a criação da Gerência de Gestão de Monitoramento e Avaliação. Em Londrina, como forma de aprimorar a gestão da Política de Assistência Social, iniciou-se um projeto para a construção do Sistema Municipal de Monitoramento e Avaliação (SMMA), sendo a discussão para tal Sistema coordenada por técnicos da própria Gerência de Gestão de Monitoramento e Avaliação3. Tal proposta foi elaborada de forma participativa, envolvendo, além dos técnicos da própria secretaria, os conselheiros municipais de assistência social e representantes da rede de serviços governamentais e não governamentais. 3 Destacam-se neste processo as assistentes sociais Adriana Aparecida dos Santos e Marcelle Diório de Souza. 52 Sociedade em Debate, Pelotas, 16(2): 43-61, jul.-dez./2010 Avanços e desafios após a implantação do sistema Tendo como parâmetros legais a Constituição Federal de 1988, a LOAS, PNAS/2004, NOB/SUAS e Guia CRAS e Guia CREAS (MDS), este Sistema surge tendo como objetivo principal estabelecer o padrão de qualidade dos serviços socioassistenciais que compõe a política municipal de assistência social. É um instrumento estruturante do SUAS no município de Londrina/PR, por meio do qual aprimora-se a gestão da mesma, visto que constrói indicadores de avaliação de processo e resultados dos serviços socioassistenciais existentes no município. Tal documento foi exaustivamente discutido nas reuniões das comissões de serviços e aprovado pelo CMAS em outubro de 2005, através da Resolução nº. 039/2005. A partir de então, este Sistema Municipal de Monitoramento e Avaliação foi adotado como parâmetro oficial do município para análise dos serviços prestados e tem contribuído significamente para que o Conselho exerça tanto seu papel fiscalizador quanto de reconhecimento e registro dos serviços socioassistenciais, pois as entidades não constantes deste SMMA não podem ser registradas no CMAS e nem efetivar nenhum tipo de convênio com a SMAS. Destaca-se desta forma a importância que tal sistema traz para a execução da política de Assistência no município de Londrina. Conforme Santos e Souza (2005) apontam, em Londrina, a criação deste sistema teve a seguinte metodologia de construção: 1. Elaboração de proposta preliminar tendo por base referencial teórico sobre a temática e diagnóstico social do município de Londrina; 2. Definição da conceituação da vulnerabilidade e risco social no município de Londrina; 3. Discussão da proposta preliminar do sistema municipal de assistência social junto aos gestores da Política de Assistência Social e instituições socioassistencias do município de Londrina; 4. Reelaboração da proposta preliminar a partir das contribuições apresentadas; Sociedade em Debate, Pelotas, 16(2): 43-61, jul.-dez./2010 53 Marcia Pastor, Peterson Alexandre Marino 5. Apresentação da proposta preliminar no Conselho Municipal de Assistência Social para apreciação e deliberação; 6. Transformação da proposta aprovada pelo Conselho em Norma Técnica do órgão gestor da Política de Assistência Social no município de Londrina. O sistema traz uma grade de Indicadores de Avaliação que norteiam o monitoramento e a avaliação dos serviços socioassistenciais da rede de atenção básica e especializada da política municipal de Assistência Social nas áreas de: Famílias; Criança e Adolescente; Pessoa com Deficiência; Idoso. Priorizando a avaliação dos acessos destes segmentos às Políticas Públicas; aos Bens de Consumo e ao processo de Fortalecimento Pessoal, Familiar e Comunitários. Também traz Critérios de Qualidade dos serviços das Proteções Social Básica e Especial que consideram especificamente as Ações, Metodologia, Gestão, Recursos físicos, materiais e humanos e a Participação do Usuário. Ou seja, o SMMA – baseado nos parâmetros legais supracitados – descreve detalhadamente os serviços que a Política de Assistência Social em Londrina irá executar e o que exatamente se espera de cada um destes, formando assim parâmetros de qualidade para o monitoramento e avaliação a ser realizado pelo órgão gestor e o CMAS. Na Proteção Social Básica (PSB), por exemplo, as Ações primam por questões tais como: o desenvolvimento de ações que promovam a participação da família e da comunidade no funcionamento do serviço, garantindo a regularidade das ações; a profissionalização do serviço, sendo destacado além da capacitação, reclicagem e supervisão técnica contínua, a participação da equipe em eventos afetos à área de atuação, bem como a realização de reuniões periódicas com equipe técnica, coordenação, diretoria e demais funcionários (estipulando-se um mínimo mensal de uma reunião); coloca-se também enquanto critério de qualidade no campo das ações, a devida agilidade nos encaminhamentos, de modo a responder as necessidades do 54 Sociedade em Debate, Pelotas, 16(2): 43-61, jul.-dez./2010 Avanços e desafios após a implantação do sistema usuário; o atendimento individual e grupal com os usuários e suas famílias, garantindo-lhes o acesso a todas as informações necessárias e procedendo aos encaminhamentos e orientações, conforme a necessidade. No que tange à Metodologia, coloca-se como critério de qualidade para a PSB que a equipe atue na perspectiva interdisciplinar e participativa, de modo a atuar de forma articulada com a rede de serviços existentes no território, viabilizando a inclusão dos usuários (sejam eles: crianças, adolescentes, idosos, pessoas com deficiência) e seus familiares. A Gestão é posta no sentido de que a Instituição que se propõe a executar o serviço deve elaborar uma rotina de trabalho, bem como o planejamento sistemático de todas as suas ações; o SMMA aponta também a necessidade de manutenção de uma documentação atualizada (Estatuto social; Cadastro no CNPJ; Alvará de funcionamento; Regimento interno; Livros; Registro nos respectivos Conselhos Municipais, Estadual e Federal; Declarações de Utilidade Pública Municipal, Estadual e Federal; Certidões; Certificados; Atestados, Contratos internos, Relatórios anuais; Fontes de renda; Contabilidade; Convênios, documentos referentes a procedimentos administrativos; Quadro de funcionários), bem como manter o CMAS e o Órgão Gestor informado das alterações referentes à composição da diretoria, mudança de endereço, etc. Nos Recursos Físicos, Materiais e Humanos, os critérios de qualidade são listados na expectativa da existência de condições mínimas para a atuação do serviço, ou seja: existência de uma sala específica para atendimento técnico que garanta privacidade e sigilo; de um veículo para efetuar as visitas domiciliares e outras atividades que necessitem de locomoção; de local específico para armazenamento de produtos de higiene e limpeza; Manutenção diária de higiene e limpeza; de banheiros adaptados à faixa etária, com equipamentos para uso de sabonete líquido e toalha descartável; equipamentos: fax, computadores, recursos áudio-visuais; linha telefônica fixa; laudo emitido pela Vigilância Sanitária. Sociedade em Debate, Pelotas, 16(2): 43-61, jul.-dez./2010 55 Marcia Pastor, Peterson Alexandre Marino Com relação à Participação do Usuário, o SMMA preconiza que os serviços socioassistenciais devem garantir voz aos usuários e suas famílias para que tenham poder decisório e possam manifestar seus interesses. Para isso, deve desenvolver ações coletivas para potencializar a sociabilidade dos usuários e seus familiares. Na Proteção Social Especial (PSE), os critérios de qualidade indicados também consideram as Ações, Metodologia, Gestão, Recursos físicos, materiais e humanos e a Participação do Usuário. São geralmente iguais aos dispostos para a PSB, acrescentando-se algumas disposições necessárias conforme a especificidade deste nível de proteção. Os critérios referentes às Ações não diferenciam muito daqueles dispostos na PSB, inclui-se apenas o desenvolvimento de ações que promovam a participação da família nos serviços de forma a trabalhar os vínculos familiares, bem como ações que propiciem o acesso das famílias às diferentes políticas públicas. Coloca-se também a necessidade de inserção dos usuários desta proteção, e seus familiares, no atendimento dos serviços de apoio sociofamiliar4. Na Metodologia acrescenta-se a realização de visitas domiciliares visando o resgate dos vínculos familiares e o desenvolvimento de atendimento psicoterapêutico com os usuários e seus familiares. No que tange aos Recursos Humanos, Físicos e Materiais algumas diferenciações ocorrem, a saber: requere-se a existência de no mínimo um veículo para a realização de visitas domiciliares, atendimentos descentralizados, visitas para articulação com a rede de serviços e outras que necessitem de deslocamento; requere-se também a existência de rampas, portas e banheiros adaptados (acessibilidade às pessoas com deficiência). 4 O serviço de Apoio Sociofamiliar compreende o conjunto de ações desenvolvidas com famílias vulneráveis visando o desenvolvimento de suas potencialidades, bem como o atendimento das necessidades básicas e inclusão nas demais políticas públicas; 56 Sociedade em Debate, Pelotas, 16(2): 43-61, jul.-dez./2010 Avanços e desafios após a implantação do sistema A Participação do Usuário se efetiva também por meio da realização de oficinas regulares com os usuários e seus familiares, objetivando a reconstrução dos vínculos familiares. 4. Conclusão A elaboração do Sistema Municipal de Monitoramento e Avaliação propiciou um parâmetro que organiza os serviços socioassistenciais em Londrina. Foi uma construção participativa entre o órgão governamental em parceria com a rede socioassistencial não governamental. Torna-se uma importante ferramenta para a gestão da política no município, que busca normatizar o padrão de qualidade dos serviços prestados pela rede de serviços (seja esta governamental ou não governamental), rompendo assim com práticas assistencialistas arraigadas na rede socioassistencial instituídas por valores outros que não compõem o campo dos direitos sociais. Historicamente no Brasil – e no município de Londrina não foi diferente – a introdução de políticas sociais com base no modelo assistencial consagrou inúmeras formas populistas de governos, evidenciando certa “benevolência” por parte de quem as promoviam. Essa perspectiva assistencialista foi a razão pela qual muitos dos serviços prestados às classes populares necessitadas ficavam a desejar, uma vez que criou-se uma cultura de que estes serviços, sendo direcionados às pessoas de “poucas exigências” ou “ignorantes” poderiam ser reduzidos a soluções precárias quanti e qualitativamente (SPOSATI, et al. 2003, p.30-31). A implantação deste Sistema incentiva a profissionalização dos serviços socioassistenciais e otimiza o gasto público no financiamento de ações na área da assistência social (SANTOS; SOUZA, 2005, p. 12-13). É um instrumento que subsidia tecnicamente o Conselho Municipal de Assistência Social no exercício do controle social e fornece parâmetros de qualidade que são observados no momento do acompanhamento. Obviamente, esta ação supera aquela concepção de monitoramento e avaliação como mero Sociedade em Debate, Pelotas, 16(2): 43-61, jul.-dez./2010 57 Marcia Pastor, Peterson Alexandre Marino instrumento de fiscalização dos recursos aplicados e/ou quanto ao cumprimento de metas, atentando agora às concepções de qualidade postas neste Sistema. Dessa forma, concluí-se que o SMMA surge com o propósito de fornecer à política no município uma ferramenta informacional e instrumento de gestão para qualificação operacional e gestão dos serviços socioassistenciais e suas articulações. A construção de indicadores quantitativos e qualitativos se torna extremamente necessária para dimensionar os resultados e impactos obtidos. Pois podem se referir a aspectos tangíveis e intangíveis da realidade. Coloca-se enquanto desafios da gestão dessa política no município a efetivação de tudo o que é posto neste Sistema, de modo a qualificar o atendimento aos usuários da Assistência Social em Londrina, materializando o Serviço de Qualidade que deve ser oferecido aos cidadãos de direitos, usuários da política pública de Assistência Social. Entendemos que o caminho para isso ainda é longo e árduo. Entretanto, avaliando o histórico que perdurou por anos no município, não se pode negar que grandes foram os avanços na qualificação do serviço na rede socioassistencial, principalmente a não governamental que mantém relação técnica e financeira com a SMAS. O SMMA zela pela profissionalização do serviço, sendo destacado que, além de haver uma equipe mínima, são realizadas capacitações continuas, reciclagem e supervisão técnica de todos funcionários, como também da diretoria. Este Sistema possibilitou, ainda, a realização da Vigilância Social por meio da observância aos serviços de Assistência Social prestados, construindo inclusive indicadores que auxiliam na mensuração das situações de riscos sociais e violação de direitos. Propiciou ainda o cumprimento dos direitos socioassistenciais a serem assegurados na operação do SUAS a seus usuários, especialmente no que tange ao atendimento digno, 58 Sociedade em Debate, Pelotas, 16(2): 43-61, jul.-dez./2010 Avanços e desafios após a implantação do sistema atencioso e respeitoso e à oferta qualificada de serviço (BRASIL, 2004, p. 39-40). Consideramos que através desta pesquisa foi possível analisar o processo de elaboração e implantação do Sistema Municipal de Monitoramento e Avaliação na gestão da Política de Assistência Social de Londrina, compreendendo que este auxilia no processo de monitoramento e avaliação e torna-se um importante instrumento para a efetivação do SUAS no município. Referências ALVES, J. M. 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Gives a brief historical review of Social Services in the country and in Londrina after the implementation of its Managing Agency to its reorganization to include the actions contemplated in the Social Assistance Unique System. Then, portrays the process of construction of the Municipal Monitoring and Evaluation and discusses its main features. Finally, make some conclusions about the importance of this system for the assistance policy in Londrina. Keywords: Policy of social assistance; monitoring and evaluation; management. Sociedade em Debate, Pelotas, 16(2): 43-61, jul.-dez./2010 61 Marcia Pastor, Peterson Alexandre Marino 62 Sociedade em Debate, Pelotas, 16(2): 43-61, jul.-dez./2010