INFORME ECONÔMICO Ano 18 ● Número 35 ● 29 de agosto de 2016 Panorama e perspectivas dos acordos comerciais brasileiros Após décadas de paralisia, o Brasil começa a dar sinais de avanço na negociação de acordos de livrecomércio com países relevantes. Quais os custos para a Dívida em adiar o ajuste no Setor Público? A aprovação das medidas mais urgentes no Congresso é imprescindível para retomar o crescimento e estabilizar a Dívida do Setor Público. Mas isso é apenas a “ponta do iceberg” do ajuste necessário. FEDERAÇÃO DAS INDÚSTRIAS DO RIO GRANDE DO SUL Av. Assis Brasil, 8787 Fone: (051) 3347.8731 Fax: (051) 3347.8795 UNIDADE DE ESTUDOS ECONÔMICOS www.fiergs.org.br/economia As opiniões emitidas nesta publicação são de exclusiva e inteira responsabilidade dos autores, não exprimindo, necessariamente, o ponto de vista desta Federação. É permitida a reprodução deste texto e dos dados contidos, desde que citada a fonte. Reproduções para fins comerciais são proibidas. Panorama e perspectivas dos acordos comerciais brasileiros Após décadas de paralisia, o Brasil começa a dar sinais de avanço na negociação de acordos de livrecomércio com países relevantes. I N F O R M E E C O N Ô M I C O F I E R G S Os dados do Fundo Monetário Internacional (FMI) mostram que o Brasil integra o grupo das dez maiores economias do planeta (valor medido em dólares, sem levar em consideração a Paridade do Poder de Compra), ocupando a sétima posição em 2015. Ao mesmo tempo, as estatísticas da Organização Mundial do Comércio (OMC) apontam que o Brasil está apenas na 25ª colocação no ranking das exportações totais de bens e na 33ª considerando somente os produtos manufaturados. Dos 10 países com o maior PIB do mundo, 7 também são os principais exportadores. Um dos motivos que ajuda a explicar esse resultado diz respeito à diminuta rede de acordos de livrecomércio firmados pelo Brasil. O potencial de acesso ao mercado global a partir desse tipo de pacto é de apenas 8%, de acordo com o levantamento da Confederação Nacional da Indústria (CNI), referente ao ano de 2015. Esse número é muito inferior em comparação com outros pares da América Latina, como o México (57,4%), Peru (74,2%) e Chile (82,8%). Trata-se, portanto, de uma grave distorção para o setor produtivo nacional, sobretudo envolvendo a indústria. A agenda de abertura comercial foi relegada ao segundo plano pelo Brasil desde a criação do MERCOSUL, em 1991. Além de questões ideológicas, outro fator que dificultou o firmamento de acordos bilaterais foi a Decisão (32/00), que impede a negociação independente por parte dos seus membros. Ou seja, novos pactos precisam ter anuência e validade para todos os integrantes. Convém lembrar que, desde o início do ano 2000, o MERCOSUL negocia um acordo de livre-comércio com a União Europeia. Os dois blocos já trocaram listas de produtos com o objetivo de promover a redução tarifária de aproximadamente 87% de um total de 10 mil itens da Nomenclatura Comum do MERCOSUL (NCM). A depender do grau de sensibilidade, algumas mercadorias não serão incluídas ou terão períodos de desgravação (tempo até a completa retirada das tarifas) maiores ou menores. Outras normativas discutidas entre ambos envolvem as transações de serviços, investimentos, compras governamentais, bem como regras de origem e propriedade intelectual. Mesmo sem qualquer benefício tarifário, a União Europeia é o segundo principal mercado dos produtos brasileiros e gaúchos, somente atrás da China. Os dados do MDIC mostram que 17,8% do total exportado em termos nacionais e 14,6% em termos regionais em 2015 teve como destino o bloco europeu composto por 28 países. Considerando somente os produtos da indústria, a importância é ainda maior: Brasil (18,0%) e Rio Grande do Sul (18,9%), o maior demandante global em ambos os casos. Diante da total paralisia do MERCOSUL, e apesar da Decisão 32/00, o Brasil, sobretudo ao longo dos últimos 2 anos, iniciou, ainda que timidamente, tratativas para firmar acordos com mercados mais relevantes. A curto prazo, o acordo de livre-comércio que está prestes a ser finalizado é com o México. Além dos bens, também serão incluídos os serviços, compras governamentais, e regras para facilitação comercial e convergência regulatória. Esse pacto não inclui o setor automotivo, uma vez que o Acordo de Complementação Econômica (ACE) número 55, específico para o segmento, foi renovado no ano passado, estabelecendo quotas anuais de importação para ambos os países onde não incidem impostos. Até 2019, o tamanho dessa quota aumenta ano a ano, atingindo, por fim, o livre-comércio. Além do México, o Brasil também está negociando com o Canadá e Estados Unidos, além de países da América do Sul, como Peru, Colômbia e Chile. É importante lembrar que os acordos comerciais geram efeitos benéficos através da expansão de mercados consumidores, e, consequentemente, de agregação de valor e geração de riquezas para os produtores. Um dos exemplos é o tratado de livrecomércio entre Brasil e Colômbia para o setor de veículos, estabelecido no ano passado, cujos efeitos começaram a vigorar esse ano. O pacto estabeleceu que ambas as partes podem comercializar com alíquota zero de importação até determinados limites. Para 2016, a quota é de 12 mil unidades; já para 2017 e 2018, esses números aumentam para 25 mil e 50 mil, respectivamente. O acordo já surtiu efeitos benéficos para a indústria exportadora gaúcha. No acumulado do ano entre janeiro e julho, as vendas externas de veículos para aquele mercado alcançaram US$ 28 milhões, valor 112,5% maior em comparação com a média registrada nos últimos 5 anos nessa mesma base de comparação. O comércio exterior é um vetor de crescimento determinante para os países que almejam se desenvolver. Esse canal ganha ainda mais importância quando alguma nação enfrenta crises no mercado interno (como no caso do Brasil), pois pode ajudar a amortecer o impacto negativo da queda na geração de renda. Destarte, a agenda de acordos comerciais de livre-comércio com países relevantes é premente. Além dessa, é necessário avançar em outras questões que interferem na competitividade do setor produtivo, como os altos custos com mão de obra, logística e tributos, bem como segurança jurídica e estabilidade macroeconômica. Unidade de Estudos Econômicos – FIERGS www.fiergs.org.br/economia Quais os custos para a Dívida em adiar o ajuste no Setor Público? A aprovação das medidas mais urgentes no Congresso é imprescindível para retomar o crescimento e estabilizar a Dívida do Setor Público. Mas isso é apenas a “ponta do iceberg” do ajuste necessário. F I E R G S Resultado Primário do Setor Público Consolidado (Em % do PIB) Necessário p/ estabilizar a Dívida Líquida 8,2 Realizado 8,8 5,8 2,4 1,3 -0,8 jun/16 abr/16 fev/16 dez/15 out/15 ago/15 jun/15 abr/15 fev/15 dez/14 out/14 -2,5 -2,5 ago/14 E C O N Ô M I C O ou R$ 6,5 trilhões. Por outro lado, se além das medidas encaminhadas houverem choques positivos ou mudanças institucionais que permita expansão de 2,5% a.a. de nossa economia, a Dívida Pública se estabilizaria em 84% do PIB já em 2020, passando a cair a partir de então. Os cenários projetados mostram o quanto as políticas da Nova Matriz Econômica “penhoraram” a solidez do Setor Público brasileiro. O tênue equilíbrio fiscal obtido com o Plano Real foi desfeito, um resultado um tanto quanto irônico para os economistas entusiastas dessas políticas - já que se autoproclamam “desenvolvimentistas”. Está na hora de escolher: encaminhar as reformas, ou esperar que o futuro mande a conta. jun/14 I N F O R M E Muito embora ainda faltem quatro meses para o fim de 2016, em termos de Política Fiscal já se sabe que muito pouco – ou quase nada – será diferente da tendência já verificada nas contas públicas para o ano. Em junho, o Resultado Primário do Setor Público Consolidado acumulado em 12 meses encerrou em -R$ 104,7 bilhões (-2,5% do PIB), com o Governo Central respondendo por resultado ainda mais negativo (-R$ 111,7 bilhões, ou -2,5% do PIB). Não só a magnitude dos números impressiona, mas também as suas implicações para a Dívida. Dadas as atuais taxas de juros nos títulos que a compôem, bem como a taxa de inflação, o Setor Público apenas conseguiria estabilizar a relação entre Dívida e PIB se apresentasse um Resultado Primário de +8,8% do PIB – um corte de 11,3% do PIB, ou incríveis R$ 714,7 bilhões. Esse valor corresponde a 48,6% das Despesas Primárias do Governo Central, o que faz a idéia de um “ajuste em um ano” simplista porque inexequível: é importante lembrar que apenas 21,7% desses dispêndios podem ser comprimidos sem alteração legal. Tal cenário demonstra a importância da aprovação das modificações propostas pela nova equipe econômica ao Congresso. Além da já aprovada permissão para alocar livremente 30% das receitas (PEC 4/2015), destacam-se o limite ao crescimento das Despesas Primárias à, no máximo, a taxa de inflação (PEC 241/2016), a limitação da Dívida da União a até quatro vezes a Receita Corrente Líquida (PRS 84/2007) e a mini-Reforma da Previdência (ainda a ser enviada). Tais alterações são apenas o primeiro passo para garantir um ajuste do Setor Público que ainda precisará compreender reformas nas legislações tributária e trabalhista, assim como o encerramento da atuação do Estado como operador de empresas. Mas a anuência do Congresso com esses projetos apenas permitirá manter o atual ritmo de recuperação da confiança dos agentes e, com ele, o retorno de nossa economia a sua trajetória de crescimento potencial. Considerando as expectativas do Relatório FOCUS (Banco Central), e projeções nos relatórios do Credit Suisse, mesmo que a economia brasileira voltasse a crescer à taxa de 2,0% a.a. a partir de 2017, a Dívida Bruta do Governo Geral ainda seguiria crescendo até 2023 – quando atingiria 90% do PIB antes de se estabilizar. Contudo, esse não é o único cenário plausível. Se a retomada for mais suave, algo próximo a um crescimento de 1,5% a.a. pelos próximos 9 anos, a trajetória da Dívida seguiria em alta: não se estabilizaria nesse intervalo e atingiria preocupantes 102% do PIB – Fonte: BCB. Elaboração: UEE/FIERGS. Cenários para a Dívida* do Setor Público Consolidado (Em % do PIB) 143 142 122 102 102 90 82 78 62 45 42 2017 2018 2019 2020 2021 2022 2023 2024 2025 Média cresc. PIB 2017-2025 em 0% a.a. Em 1,5% a.a. Em 2,0% a.a. Em 2,5% a.a. Em 4,0% a.a. Fonte: BCB; Credit Suisse. Elaboração: UEE/FIERGS.*Dívida Bruta. Unidade de Estudos Econômicos – FIERGS www.fiergs.org.br/economia