XVII Encontro da Associação Nacional de Pós-Graduação em Ciências Sociais “Depois das reformas: o lugar do empresariado nacional na nova ordem econômica latino-americana Breve comparação entre os casos argentino, brasileiro e mexicano” Wagner Iglecias Departamento de Sociologia da USP Caxambu, outubro de 2003 1 DEPOIS DAS REFORMAS: O LUGAR DO EMPRESARIADO NACIONAL NA NOVA ORDEM ECONÔMICA LATINO-AMERICANA - BREVE COMPARAÇÃO ENTRE OS CASOS ARGENTINO, BRASILEIRO E MEXICANO WAGNER IGLECIAS1 Resumo O presente trabalho tem por objetivo mapear e analisar os novos padrões de organização e ação coletiva do empresariado industrial latino-americano que têm sido desenvolvidos nos últimos anos, especialmente após a implementação das reformas econômicas orientadas para o mercado. Para tanto é utilizada uma perspectiva comparativa entre Argentina, Brasil e México, as três mais importantes economias da América Latina, nas quais desenvolveu-se, com maior êxito, o modelo nacional-desenvolvimentista, agora suplantado pelas referidas reformas. A discussão, no presente contexto, acerca dos novos padrões de organização do empresariado nacional enquanto ator coletivo e de seu relacionamento com o Estado pauta-se pelos novos condicionantes e limitações trazidos à baila pelo próprio ambiente econômico e institucional oriundo das reformas. Palavras-chave: empresariado, Estado, período pós-reformas, novos padrões de ação coletiva 2 Introdução As reformas econômicas orientadas para o mercado, adotadas em vários países da América Latina a partir dos anos 80 e caracterizadas por um receituário mais ou menos comum, sustentado nas políticas de abertura econômica, desregulamentação e privatização, têm produzido, como era de se esperar, diferentes efeitos nos diversos contextos nacionais do continente. Da mesma forma, os novos arranjos institucionais criados a partir das reformas, com a redefinição dos papéis do Estado e de suas diversas instâncias, do capital estrangeiro e do empresariado nacional na dinâmica política e econômica, apontam para tendências de mudanças, em maior ou menor grau, dependendo do país analisado, nos tradicionais padrões de ação coletiva do empresariado e de suas formas de relacionamento com o Estado típicos do período nacional-desenvolvimentista. O caso argentino, por conta recente crise institucional sugere, até o momento, menor variação em relação ao antigo cenário, enquanto os casos brasileiro e mexicano, cada qual em seu contexto, apontam para a ocorrência de mudanças significativas nas formas de organização e atuação política do empresariado. 1 Doutorando em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP). Correio eletrônico: [email protected] 2 Agradeço a colaboração de Alicia Ortiz Rivera, Carlos Alba Vega e Cláudio Gonçalves Couto pela cessão de textos e informações aqui utilizados. 2 Argentina, Brasil e México são exemplos de países de industrialização tardia, cujo desenvolvimento econômico, durante a maior parte do século XX, teve como motor o intervencionismo estatal no domínio da economia. Pela ação do Estado, tanto como indutor do desenvolvimento quanto como agente econômico, construiu-se nesses países um sistema capitalista moderno, industrial e corporativo, de base nacional. Também pela ação do Estado foram constituídas as elites industriais, não apenas como agentes econômicos, mas também como atores políticos. O esgotamento do nacional-desenvolvimentismo, que vigorou nos três países entre o início dos anos 30 e meados da década de 70, desagou na crise econômica dos anos 80 e na implementação de reformas orientadas para o mercado, na década de 90, reformulando não apenas a estrutura do Estado e seu papel nos domínios da política e da economia, mas também as suas formas de articulação com a sociedade. 3 De fato, uma das principais conseqüências das reformas orientadas para o mercado é a diminuição da capacidade de intervenção do Estado no domínio da economia, observável nos três países abordados e tomada como eixo fundamental para a reflexão esboçada no presente texto. Os impactos das reformas sobre a institucionalidade política apontam, no entanto, para a manutenção, no caso brasileiro, do papel do Estado como potencial indutor de um novo modelo de desenvolvimento. O mesmo não pode ser dito da Argentina, onde as instituições foram quase totalmente desmanteladas por conta da crise econômica, política e social dos últimos anos, encontrando-se nos dias atuais em processo de reconstrução. E tampouco do México, onde o Estado se vê envolvido por uma contenda entre os poderes Executivo e Legislativo e enfraquecido pelo aumento da dependência externa do país após a adesão ao Tratado de Livre Comércio da América do Norte. As três primeiras sessões do trabalho tratam de cada um dos países analisados. As sessões sobre a Argentina e o México apresentam ao leitor de forma um pouco mais pormenorizada a estrutura e a trajetória da ação coletiva do empresariado industrial nos dois países e seu relacionamento com o aparato estatal ao longo das últimas décadas, para depois abordar as principais características das reformas adotadas nos dois contextos e suas conseqüências sobre o tecido produtivo, as instituições e as formas de organização e ação coletiva do empresariado. Finalmente, abordam as características da atuação política do empresariado no período pós-reformas. A sessão sobre o Brasil, por sua vez, trata de forma 3 Há distinções cronológicas entre os três países no que tange às reformas pró-mercado. Em termos gerais pode-se dizer que a Argentina foi a primeira a adota-las, na segunda metade dos anos 70, sob o regime militar. Os malogros econômicos colhidos à época fizeram com que a alternativa neoliberal fosse interrompida durante o governo de Alfonsin para ser finalmente retomada e aprofundada por Carlos Menem, a partir de 1989. No México a efetiva mudança do modelo de desenvolvimento se deu após a crise financeira de 1982, quando Miguel De la Madrid chegou à Presidência e iniciou a implementação das reformas, as quais seriam radicalizadas a partir de 1988, com o início do governo de Carlos Salinas de Gortari. No Brasil o reformismo neoliberal é iniciado efetivamente a partir do governo Collor de Mello, em 1990, amaina durante o governo Itamar Franco e volta a ser retomado de forma mais decidida pelo governo de Fernando Henrique Cardoso, a partir de 1995. A despeito de tais distinções, é durante a década de 90 que se dá o conjunto mais importante de reformas nos três países, alicerçado na abertura comercial, na desregulação da economia e na privatização do patrimônio estatal, constituindo um novo modelo de desenvolvimento no qual se atribuiu papel fundamental às forças de mercado. 3 mais sintética a história da representação dos interesses empresariais, logo partindo para a discussão das conseqüências das reformas sobre o tecido produtivo, as instituições e os tradicionais padrões de ação coletiva do empresariado, para finalmente discutir a temática no momento contemporâneo. A quarta e última sessão, de caráter conclusivo, compõe-se da análise comparativa entre os três casos propriamente dita. ARGENTINA O empresariado e seus padrões históricos de ação coletiva e relacionamento com o Estado A representação dos interesses empresariais na Argentina foi historicamente caracterizada por uma estrutura multifacetada, dividida e concorrencial, incapaz de unir-se em entidades de cúpula e de formular um projeto político comum. A tradicional divisão da economia argentina entre os setores exportadores e aqueles vinculados ao mercado doméstico ensejou a competição entre as entidades de representação de interesses e inviabilizou a construção de uma plataforma de pleitos coletivos. Os padrões de relacionamento do empresariado com o Estado, dada a recorrente instabilidade política do país desde o início do século XX, foram marcados pelo desenvolvimento de estratégias defensivas, de curto prazo e voltadas ao atendimento imediato de demandas particulares. Diante da debilidade das instituições, o grande empresariado buscou no acesso direto às instâncias decisórias do Poder Executivo exercer influência sobre as políticas públicas, obter benefícios e minimizar riscos, sobrevivendo às crises mais pela sua capacidade de pressão sobre o Estado que pelo ajuste às cambiantes condições de funcionamento da economia e da política. Segundo a argumentação de Schneider, o caso argentino representaria um círculo vicioso nas relações entre empresariado e Estado, no qual não há a participação das entidades empresariais nos principais processos decisórios relativos às esferas da economia e da política, mas eventualmente de empresários tomados individualmente. (Schneider, 2002; 2000a; 2000b). Os primórdios da ação coletiva do empresariado argentino encontram-se nos anos de 1860, quando as elites rurais iniciaram articulações para a criação de uma entidade para a representação ampla de seus interesses. Data do ano de 1866 a fundação da primeira grande organização política empresarial do país, a Sociedade Rural Argentina (SRA). Uma década mais tarde, em 1875, surgiu o Clube Industrial Argentino, primeira iniciativa do nascente empresariado industrial de organizar-se em uma entidade de representação coletiva. A principal reivindicação da nova organização era a adoção, por parte do Estado, de políticas protecionistas ao setor fabril, a fim de que as atividades industriais no país pudessem ser efetivamente estruturadas. Baseando-se nas vantagens comparativas na produção de grãos e carne, o país era à época um grande exportador de bens primários e um importador de manufaturas, ao passo que as primeiras atividades fabris eram basicamente concentradas no beneficiamento de itens agropecuários.4 Poucos meses após a criação do Clube Industrial Argentino uma dissidência de empresários de orientação econômica liberal rompeu com a entidade e fundou o Centro Industrial Argentino. Mesmo tendo em conta que 4 Nesse período são fundados, ainda como incipientes empresas industriais, alguns dos maiores grupos econômicos da história do país, como Bunge y Born (1884), Alpargatas (1885), Quilmes (1895), Pescarmona (1907) e B. Roggio (1908). 4 em 1887 as duas facções empresariais tenham se fundido para a criação da União Industrial Argentina (UIA), aquela divergência ideológica e política seria a primeira de inúmeras disputas travadas no interior do empresariado industrial argentino ao longo de décadas. O grande impulso à industrialização do país ocorreu por meio da adoção da política de substituição de importações, após a crise de 1929 e o fim do modelo agro-exportador. A economia deixava de ser consideravelmente aberta para tornar-se relativamente fechada. O Estado assumia um papel duplo, como produtor de insumos básicos para a atividade econômica e como regulador do novo modelo. Entre o início dos anos 30 e meados dos anos 40 surgiram alguns dos mais tradicionais segmentos da indústria do país, como têxteis, alimentos, metalurgia, maquinaria, produtos elétricos e petróleo. 5 Até a década de 30 o empresariado, tanto agro-exportador quanto industrial, havia tido importante participação na política nacional, articulando-se sempre pela lógica da defesa de seus interesses mais imediatos e paroquiais, como no apoio ao golpe contra o presidente Hipólito Yrigoien. O período entre 1946 e 1958 corresponde à segunda etapa do modelo substitutivo. O intervalo compreende a vitória nas urnas do Partido Justicialista e à eleição de Perón, sua reeleição em 1951, sua deposição em 1955 por um golpe militar e o restabelecimento da ordem democrática, com a eleição de Arturo Frondizi, da União Cívica Radical (UCR), em 1958. Nesse curto espaço de pouco mais de uma década se deu a implementação, pelo Estado, de um amplo arco de políticas industriais, do desenvolvimento de novos segmentos infra-estruturais, como comunicações, construção pesada, aço e energia e da consolidação do mercado doméstico.6 Enquanto a indústria se desenvolvia e se diversificava, crescia também o associativismo empresarial no país. Entre 1946 e 1951 multiplicou-se a quantidade de entidades empresariais, sempre dentro do perfil neocorporativista inaugurado por Perón. Nenhuma delas, porém, jamais se capacitaria como instituição representativa dos interesses mais amplos do empresariado. Perón, se tinha domínio sobre os sindicatos de trabalhadores, nunca conseguiu unir o empresariado em uma estrutura corporativa controlada pelo Estado. Em seu governo teve início o ciclo de intervenções diretas do Estado sobre as organizações empresariais, com a dissolução da UIA, que agrupava empresários contrários a seu projeto político, e a criação da Confederação Geral Econômica (CGE), que abrigava os setores empresariais surgidos com o modelo nacional-desenvolvimentista. O êxito da representação empresarial no âmbito da CGE se daria, exatamente, sob um regime nacional-desenvolvimentista, com a forte presença do Estado na economia, a aliança com as classes trabalhadoras e a preservação de setores estratégicos da atividade econômica para o capital nacional. Derrubado Perón, a UIA era reativada pelos militares, enquanto a CGE era posta na ilegalidade. 5 Nesse período são fundadas empresas como Peñaflor (bebidas, 1928), YPF (petróleo, 1929), Masterllone (laticínios, 1929) e Sancor (laticínios, 1936). 6 Nesse período que são criadas empresas como Pérez Companc (energia e comunicações, 1946), Arcor (alimentos, 1951), Techint (aço, construção pesada e comunicações, 1952) e Socma (construção pesada e motores, 1956). 5 No fim dos anos 50 teve início a terceira e última fase da política substitutiva, com a criação dos complexos petroquímico e de motores. Entre as décadas de 60 e 70 a indústria atingiu sua maior participação no PIB argentino, tornando-se o eixo ordenador da economia do país. A construção, no entanto, de um complexo industrial quase que exclusivamente voltado ao mercado doméstico, em crescente descompasso com as inovações tecnológicas surgidas nos países desenvolvidos, conjugada à instabilidade política recorrente durante as décadas de 60 a 80, teve efeitos profundamente deletérios à indústria argentina. Do golpe militar de 1966, contra o presidente Arturo Illia, da UCR, à eleição de Raul Alfonsin, também da UCR, em 1983, passando pelo regresso de Perón em 1973 e pelo novo período militar iniciado em 1976, a Argentina conheceu diversos modelos de política industrial, quase todos fracassados. . O período mais prejudicial ao setor industrial do país se deu sob a ditadura inaugurada em meados da década de 70. Além de reiterar o recorrente ciclo de instabilidade política na história do país, a junta militar que assumiu o poder em 1976 decretou o fim do modelo nacional-desenvolvimentista, quebrando.as bases e relações sociais, institucionais e produtivas que haviam sustentado e em grande medida definido a economia argentina durante quase todo o seu processo de industrialização (Nochteff, 1998). A abrupta e radical abertura da economia pelos militares expôs a indústria à concorrência internacional dentro de condições operacionais bastante desfavoráveis, com uma combinação explosiva entre queda de barreiras de importação, aumento de taxas de juros e sobrevalorização do peso. O mercado interno foi invadido por produtos estrangeiros, ao mesmo tempo em que a política cambial inviabilizou as exportações. Os déficits comerciais sucederam-se, caíram os níveis da produção industrial, do consumo doméstico, da renda e do emprego e o setor industrial privado conheceu um nível de endividamento jamais visto. A indústria argentina enveredava a partir daquele momento por um caminho de insolvência econômica e atraso tecnológico do qual aparentemente jamais se livraria. O longo intervalo compreendido entre a queda de Perón e a chegada ao poder de Alfonsin foi marcado pelo acirramento da disputa ideológica no seio do empresariado. Os segmentos que se opunham à CGE chamavam para si uma plataforma ideológica conservadora. Pediam a diminuição do papel do Estado na economia e na sociedade e defendiam a idéia de que as forças de mercado deveriam estar no centro do desenvolvimento econômico, considerando o capital estrangeiro a peça fundamental do processo. Desta forma, entre 1955 e 1983 entidades como a Ação Coordenadora das Instituições Empresariais Livres (ACIEL) e a Assembléia Permanente de Entidades Gremiais Empresárias (APEGE), representantes do grande capital nacional e estrangeiro, lutaram contra o projeto peronista e defenderam governos autoritários, aos quais apoiaram com suporte político e ideológico e o fornecimento de quadros para postos-chave na estrutura burocrática estatal. Eram entidades multisetoriais, que englobavam não apenas a UIA mas também as conservadoras Sociedade Rural Argentina e Câmara Argentina de Comércio. Contrariamente à ACIEL e à APEGE, a CGE, por sua vez, defendia a necessidade da criação de uma entidade de cúpula única voltada à elaboração de um projeto nacional de desenvolvimento. A CGE tinha por objetivo institucionalizar, dentro dos marcos neocorporativos do peronismo, a participação de capital e trabalho no processo de tomadas de decisão do 6 Estado, ao passo que os membros da ACIEL e APEGE acreditavam na natureza transitória de suas próprias entidades. De acordo com o discurso daqueles segmentos empresariais, somente as forças de mercado poderiam ser responsáveis pela alocação ótima dos recursos, sendo que as entidades representativas apenas distorciam aquele propósito. No entanto, achando-se um mal necessário, viam como sua missão destruir entidades que defendiam a politização do processo, como a CGE e os sindicatos de trabalhadores, a fim de que as forças de mercado pudessem atuar livremente. (Acuña, 1998). Não por acaso a CGE seria uma vez mais extinta por um governo militar, em 1976. Os históricos conflitos no interior da comunidade empresarial, dos sindicatos setoriais às entidades de cúpula, afetaram toda a representação dos empresários e geraram um padrão de permanente tensão, tendo a dinâmica de resolução dos conflitos entre o empresariado tornada dependente da solução mesma dos conflitos políticos nacionais. Numa lógica de jogo de soma zero, tanto se podia conquistar o Ministério da Economia como ser dissolvido pelo próximo governo de turno. (Acuña, 1995). Mas o último período militar, entre 1976 e 1983, mudou a visão do empresariado sobre a democracia. Excluídas das decisões tecnocráticas da política econômica, as elites econômicas do país passaram a pesar mais detalhadamente os benefícios de seu apoio a regimes autoritários. Ainda que o governo tenha promovido a socialização das dívidas dos maiores grupos econômicos do país, a crescente concentração de poder nas mãos dos militares passou a ser vista como de grande risco para os interesses do grande empresariado. Os elevados custos da instabilidade política, conjugados com os resultados adversos da política econômica implementada pela ditadura, fizeram com que amplos setores do empresariado passassem a apoiar, ainda no final dos anos 70, o restabelecimento do regime democrático. Reformas econômicas, reestruturação industrial e colapso institucional Raul Alfonsin consumiu grande parte de seu mandato na consolidação das instituições democráticas e no combate ao desequilíbrio macroeconômico herdado do período militar, particularmente grave nas questões da inflação e da dívida externa. Após as frustradas tentativas de planos de estabilização de natureza heterodoxa, acabou golpeado pela hiperinflação, antecipando sua saída do poder e sendo sucedido, em 1989, por Carlos Menem, então candidato eleito. Aglutinando um arco variado de apoios políticos, das antigas fileiras do peronismo ao capital transnacional, dos grandes grupos econômicos nacionais à classe média frustrada com a UCR, Menem promoveu um choque de ortodoxia sobre a economia argentina, retomando e aprofundando a estratégia de inserção internacional elaborada pelo último ciclo de governos militares. Lançou mão da queda de barreiras à importação, de políticas monetárias restritivas e de políticas fiscais regressivas. Desregulou inúmeros setores da atividade econômica, abriu o país aos fluxos internacionais de bens e capital e deslocou definitivamente o eixo dinâmico da economia para o mercado, através das privatizações de empresas estatais. Implantou ainda, por decreto, a Lei de Convertibilidade, pela qual buscava derrotar definitivamente o processo hiperinflacionário, atrelando a inflação argentina à norte-americana. Contou para tanto com o apoio de um empresariado politicamente débil e ideologicamente afinado com suas medidas. Um rápido balanço de seu governo mostra que durante os anos 90 ocorreu um processo de concentração e centralização do capital, aumento da vulnerabilidade e da dependência ao capital externo, hipertrofia do Poder Executivo, piora da distribuição de renda e 7 crescimento de forma assombrosa do desemprego e da exclusão social, resultando numa crise institucional sem precedentes na história do país. O protagonismo do Estado durante a implementação das reformas alijou do processo decisório a maior parte da sociedade e apenas exacerbou a tendência de aumento da competição, entre os atores sociais, pelo acesso direto às suas instâncias mais relevantes. As privatizações, mecanismo fundamental, na ótica do governo, no combate aos desequilíbrios macroeconômicos e na formulação de um novo modelo de crescimento, supuseram uma crescente concentração de poder da tomada de decisões por parte do Poder Executivo em detrimento do poder parlamentar.7 Isto se manifestou através de reiteradas decisões tomadas por aquele, sob a forma de decretos e resoluções presidenciais, com a conseguinte deterioração do quadro institucional. Elas implicaram também, em varias áreas da economia, a substituição do monopólio estatal pelo privado, estabelecido, paradoxalmente, como determinação estatal. Estes monopólios ou oligopólios, por seu caráter, e pelas condições de controle às que foram submetidos, passaram a obter lucros extraordinários, com baixo ou nulo risco empresarial. (Ferrer, 2003). Na maior parte dos processos de privatização os grupos econômicos locais participaram como sócios minoritários dos consórcios estrangeiros que arrematavam as empresas estatais. A maioria deles, alguns anos depois, retirou-se paulatinamente dessas sociedades, mediante a venda de suas participações a preços que lhes possibilitaram multiplicar várias vezes aquilo que haviam investido na compra das estatais.. Pareciam mais interessados em negócios de curto prazo do que em tomar parte de atividades que não podiam controlar Aproveitaram-se de seus conhecimentos sobre o mercado local e atuaram como simples intermediários de transações milionárias. (Schvarzer, 1997) Daí a intensificação da estratégia de focalização no estabelecimento de relações diretas com as instâncias decisórias do Estado. Os grandes grupos econômicos nacionais e suas entidades de representação não aderiram com entusiasmo ao projeto menemista apenas por afinidades ideológicas, ou para assumir os riscos da competição internacional os quais, ao cabo de dez anos de reformas, não puderam suportar, mas para, por meio do estabelecimento de laços exclusivos de relacionamento com a burocracia estatal, auferir benefícios em escala individual ou setorial. De favorecimentos na realização de obras públicas a privilégios nos processos de privatização de estatais, configurando a chamada “plata fácil” dos anos 90, os padrões de relacionamento entre Estado e grande empresariado na década passada estiveram muito distantes de qualquer concepção de um projeto coletivo para o país. Como uma das mais drásticas conseqüências da política econômica adotada nos anos 90 aparece a diminuição relativa do setor industrial na economia argentina. Alguns dos elementos que caracterizaram o desempenho da indústria nos anos 90 são: diminuição da participação relativa da indústria no nível de emprego, diminuição do número de estabelecimentos, aumento do grau de abertura comercial (com ênfase nas importações), aumento dos investimentos em equipamentos importados, aumento da concentração e desnacionalização industrial, queda abrupta do coeficiente de valor agregado, declínio da margem bruta real, abandono das políticas de desenvolvimento local de tecnologia para produtos e processos, desverticalização da produção por conta das importações de insumos 7 Os principais setores privatizados durante o governo Menem foram telecomunicações, eletricidade, gás, petróleo, aviação civil, bancos, estradas e ferrovias 8 e as dramáticas conseqüências do desemprego. (Kosacoff, 2001; 1999). Grande parte das cadeias produtivas foi desarticulada, a participação do Estado na produção de bens foi extremamente reduzida e a pequena e média indústria nacional passou por um severo processo de ajuste às novas condições econômicas, sem jamais ter conseguido voltar a se posicionar de maneira competitiva no novo cenário O processo de desindustrialização da economia argentina deve-se, em grande medida, à consolidação da estrutura industrial em torno de um reduzido conjunto de atividades que se sustentam na exploração de vantagens comparativas naturais. Setores inteiros, como eletroeletrônicos, desapareceram, ou foram reduzidas à mínima expressão, como bens de capital, enquanto só houve avanço nas atividades ligadas ao processamento de bens primários como a indústria de alimentos (Schor, 2002; Schvarzer, 1995). Durante o governo Menem, e após ele, a indústria voltou a ter tanto peso na economia argentina como antes da implantação da política de substituição de importações, nas primeiras décadas do século XX. Quadro I - Participação do setor industrial no PIB Argentino Período % 1900-1909 15,35 1910-1919 16,54 1920-1929 18,05 1930-1939 21,06 1940-1949 24,22 1950-1959 24,80 1960-1969 28,18 1970-1979 27,23 1980-1990 23,60 1993-2000 17,19 2001 15,38 Fonte: Banco Central da República Argentina / Cepal A análise da evolução do PIB e da produção industrial do país nas duas últimas décadas mostra que o período mais longo de crescimento ocorreu entre 1991 e 1994, no auge da convertibilidade. A ele seguiu-se a queda em 1995, como reflexo da crise mexicana e a breve retomada, mais moderada, entre 1996 e 1998. A partir de então observa-se a evolução negativa do PIB e via de regra um encolhimento ainda maior da atividade industrial, reproduzindo um padrão observável desde pelo menos o início dos anos 80, cuja razão se deve à participação decrescente do setor industrial na geração de riqueza no país. Após três anos de queda do PIB, com o aumento do desemprego e da exclusão social, veio a tona a crise de dezembro de 2001, colocando à prova a combalida institucionalidade argentina. A instabilidade política do período, associada à débâcle do modelo adotado nos anos 90, teve reflexos na economia, que diminuiu 10% em 2002. Gráfico I – Argentina – Evolução do PIB e da Produção Industrial – 1981-2002 (em %) 9 Argentina - Evolução do PIB e da Produção Industrial - 1981-2002 (em %) 15,00 10,00 5,00 0,00 -5,00 -10,00 -15,00 81 82 83 84 85 86 87 88 89 90 91 92 93 94 95 96 97 98 99 00 01 02 PIB Prod. Ind. Fonte: Cepal Após a fase mais aguda da crise, já no governo Duhalde e em meio à disputa surda entre diversos segmentos do empresariado, deu-se, com o fim do regime de convertibilidade, o alento para uma provável recuperação do setor industrial. Seus defensores argumentavam que a desvalorização do peso estimularia tanto as exportações como um novo processo de substituição de importações. O desmantelamento do sistema industrial argentino, no entanto, não parece apontar para aumento de exportações de produtos de baixo valor agregado, e sequer para uma reconstrução rápida das cadeias produtivas a fim de substituir a entrada de insumos e produtos estrangeiros no país. Os dias atuais: novas entidades, velhos vícios? Dado o novo contexto econômico, as antigas divergências entre os industriais perfilados na UIA e na CGE desapareceram, assim como também amainou-se o conflito das associações com os sindicatos de trabalhadores, profundamente enfraquecidos durante os anos 90. Mas as transformações pelas quais o país passou nas duas últimas décadas, tanto em relação à redemocratização da vida política quanto no tocante às reformas econômicas orientadas para o mercado, parecem não ter modificado, em essência, as formas de organização e ação coletivas do empresariado..O capital nacional argentino se mantém sendo pródigo em criar novas entidades de representação de interesses e em manter-se dividido entre elas, e parece continuar a buscar no acesso direto e privilegiado às instâncias decisórias do aparato estatal vantagens individuais ou setoriais, mantendo-se incapaz de estruturar-se como ator coletivo, de estabelecer alianças com outros segmentos da sociedade e de propor qualquer projeto mais amplo para o futuro do país. A dinâmica da atuação política do empresariado e de seu relacionamento com o Estado, porém, pode vir a ser alterada por ocasião da reconstrução das instituições e da tentativa de reconquista da estabilidade econômica nestes primeiros meses do governo de Nestor Kirchner. Em maio de 2002, a partir da fusão de duas pequenas e influentes organizações conservadoras, o Conselho Empresarial Argentino e a Fundação Invertir, foi criada a Associação Empresária Argentina (AEA), composta por corporações estrangeiras e 10 nacionais com o objetivo de “promover o desenvolvimento econômico e social da Argentina desde a perspectiva do empresariado privado, com especial ênfase no fortalecimento das instituições necessárias para aquela finalidade”. Contando como membros, à semelhança do Conselho Mexicano de Homens de Negócios, com algumas dezenas dos mais importantes empresários do país, o objetivo mais amplo da AEA é influir sobre as grandes questões nacionais, desde a implementação de novos planos econômicos até a sucessão presidencial, além de eventualmente ocupar o vazio de poder originado das crises institucionais como a que o país viveu após a renúncia de Fernando De la Rúa. Como objetivo mais imediato, a AEA parece constituir-se como um inédito e poderoso lobby, formado pelos mais diversos segmentos empresariais (majoritariamente do setor industrial, mas também dos setores comerciais, financeiros e de serviços), destinado a resolver a questão da dívida de seus membros junto a credores internacionais, agravada após o fim do regime de convertibilidade. Como primeiro presidente da instituição foi proclamado um alto executivo do grupo Perez Companc, defensor confesso da criação de mecanismos de compensação estatal aos prejuízos auferidos pelo empresariado argentino por conta da desvalorização do peso, como a redolarização dos depósitos bancários feitos por suas empresas no país e a elevação das tarifas dos serviços públicos como mecanismo de compensação dos custos da mudança do regime cambial. No primeiro semestre de 2003, em pleno período eleitoral, quando a Argentina preparava-se para ir às urnas em primeiro turno escolher os dois principais postulantes à Presidência da República, a União Industrial Argentina vivia o seu próprio processo sucessório. A entidade foi às urnas pela primeira vez depois de uma década. Acabara o pacto entre o Movimento Industrial Argentino (MIA) e o Movimento Industrial Nacional (MIN), os dois grupos políticos que tradicionalmente se alternaram na condução da associação a partir de um acordo para o rodízio de poder selado nos anos 80, quando impôs-se, entre o grande empresariado do país, o consenso da necessidade de combate à hiperinflação e da adoção das reformas neoliberais. Alberto Alvarez Gaiani, representante da indústria alimentícia, ex-presidente da entidade durante grande parte da década de 90 e líder empresarial intimamente ligado ao governo Menem, apresentou a lista de candidatos à UIA por ele encabeçada sem levar em conta nomes apoiados pela Techint, o maior conglomerado industrial do país, ligado ao setor siderúrgico. Paulo Rocca, nome maior da Techint, formou a chapa opositora entre os afiliados do MIN e escolheu Guillermo Gotelli, ex-executivo da Alpargatas e empresário de porte médio do segmento metalúrgico, como candidato a presidente da entidade. Eduardo Duhalde e Carlos Menem apoiaram, respectivamente, Gotelli e Gaiani. O velho confronto entre “aceros” e “caramelos” voltava à tona na principal associação empresarial argentina. Enquanto a chapa de Gaiani defendia a formação de uma diretoria de pesos pesados da indústria, conectados aos circuitos internacionais do capital, a fim de exercer maior pressão sobre as decisões governamentais, Gotelli tinha como plataforma fortalecer a representatividade, na associação, dos pequenos e médios empresários, muitos dos quais vitimados pela política econômica adotada durante os anos 90. Por trás das plataformas eleitorais e das divergências estavam as questões mais prementes não apenas do passado próximo do país, mas de seu futuro no curto e médio prazos, como o fim do regime de convertibilidade cambial, as alternativas para a retomada do crescimento, a revitalização do mercado interno e a escolha entre a participação da Argentina num bloco econômico sul-americano ou a adesão do país à Área de Livre Comércio das Américas (ALCA). Em outros termos, uma disputa entre neoliberais e 11 desenvolvimentistas. O resultado final do pleito, realizado em 22 de abril, foi uma tranqüila vitória da chapa de Gaiani, próxima ao MIA. Na proporção de dois votos para um, a entidade, desgastada por sua excessiva proximidade com o Estado durante os anos Menem, seria uma vez mais comandada pelo grupo que mais contribuiu para seu desprestígio. A vitória de Nestor Kirchner nas eleições presidenciais esvaziou ainda mais a UIA, visto que suas principais lideranças, quando não apoiaram Menem no pleito, estiveram com Ricardo Lopez Murphy, ex-ministro da Economia de postura ideológica ultraliberal. A chegada de Kirchner ao poder soaria, nos meios empresariais, como uma espécie de vingança dos desenvolvimentistas, da Techint e de sua chapa derrotada nas eleições da UIA. A incômoda situação em que fica a UIA após a derrota de seus candidatos preferidos é mesma da de outras entidades empresariais fortemente ligadas ao menemismo, como a Câmara Argentina de Comércio e a Associação de Bancos Argentinos. Tampouco teve êxito a tentativa de criação da Mesa do Empresariado Nacional, entidade que seria formada por oito grandes associações empresariais com o objetivo de reeditar o Grupo dos Oito dos anos 90 e aumentar o poder de pressão sobre o novo governo.8 Ao mesmo tempo em que os grandes grupos econômicos se dividem entre a viuvez do menemismo e as novas modalidades de pressão coletiva sobre o governo, o pequeno e médio empresariado tenta ressurgir não apenas como ente econômico, mas também como ator político, e parece desejar apoiar Kirchner em seu projeto de reconstrução da economia argentina. Entre essas organizações encontram-se a Coordenadoria Interempresarial Argentina (Coinar), que reúne pequenos e médios empresários dos setores de calçados, vestuário, brinquedos, gráficos e agricultura, e a Intercâmaras de Argentina, fundada em 2002 também por pequenos e médios empresários dentro do espírito do “que se vayan todos”, estendido, nesse caso específico, às lideranças das grandes associações empresariais do país. Enquanto Kirchner tenta se equilibrar entre demandas tão distintas que surgem entre os empresários e acena para eles, dentro dos estreitos limites do combalido Estado argentino, com licitações para obras públicas, política cambial favorável às exportações e medidas protecionistas no âmbito do Mercosul, ainda não há evidências de que a criação de novas entidades de representação dos interesses empresariais não tenham como única motivação o atendimento às necessidades mais imediatas e particulares de seus membros. BRASIL O empresariado e seus padrões históricos de ação coletiva e relacionamento com o Estado A representação dos interesses empresariais no Brasil foi caracterizada, ao longo do século XX, pela progressiva coexistência da estrutura oficial de sindicatos divididos regional e setorialmente e agrupados em uma estrutura piramidal, e associações setoriais 8 Refundariam o antigo agrupamento empresarial a União Industrial Argentina, Associação de Bancos Argentinos, Bolsa de Comércio de Buenos Aires, Câmara Argentina da Construção, Câmara Argentina de Comércio, Sociedade Rural, Confederações Rurais Argentinas e Bolsa de Cereais, entidades reunidas durante os anos 90 no apoio à política econômica do governo Menem. 12 autônomas, com grande capacidade de adaptação às mudanças institucionais ocorridas ao longo de diversas conjunturas políticas e econômicas. O elevado grau de especialização das entidades empresariais e de fragmentação da estrutura de representação de interesses inviabilizaram, historicamente, a formação de uma organização de cúpula suficientemente abrangente e articulada para sobrepor-se às clivagens setoriais e formular uma plataforma consensual entre os diversos segmentos do empresariado. O associativismo empresarial brasileiro, surgido no início do século XX, desenvolveu-se, efetivamente, sob o modelo nacional-desenvolvimentista, a partir da centralidade do Estado como indutor do crescimento econômico e da organização política das classes sociais. A crise e a superação do modelo colocaram em xeque, no entanto, as formas de organização coletiva do empresariado e de sua articulação com o Estado. Reformas econômicas e reestruturação da propriedade do capital Durante os anos 80 não se formou, no Brasil, um consenso sobre como enfrentar o esgotamento da política econômica inaugurada na década de 30 e estabelecer uma nova estratégia de desenvolvimento. Em meio a democratização, coabitaram o Estado distintas visões sobre o grau de participação do setor público na esfera econômica, o papel do capital estrangeiro, o lugar do capital nacional, a abertura comercial e a desregulação da economia. Nem mesmo em relação aos programas de estabilização monetária houve consenso, dada a oscilação da burocracia estatal entre as saídas ortodoxas e heterodoxas para a crise econômica que o país atravessava à época. (Sallum, 2000; Diniz, 1994). O auge e o declínio da política econômica adotada durante os anos 80 prepararam, porém, as condições para a implementação das reformas pró-mercado e a conseqüente redefinição do papel do Estado e das relações entre ele e a sociedade. De fato, após o impeachment de Collor e o breve governo de Itamar, formou-se finalmente a coalizão hegemônica para a implementação no Brasil das reformas, de resultados já conhecidos. Implementadas tardiamente no Brasil, quando comparadas a outros países latino-americanos, as reformas ocorreram num período de tempo relativamente curto, no intervalo de menos de uma década. A crença exacerbada nas virtudes do mercado, aliadas às escolhas de política econômica feitas pela corrente dominante dentro do aparelho estatal provocaram uma profunda reorganização do capitalismo brasileiro. Cadeias produtivas foram desestruturadas parcial ou integralmente a partir da maior exposição à competição internacional. Amplos setores da atividade econômica foram desnacionalizados. Empresas nacionais de longa trajetória e ícones da industrialização brasileira encerraram suas atividades ou foram absorvidos por grupos mais poderosos, tanto do país quanto e principalmente do exterior. A desarticulação da estrutura econômica preexistente provocou sérios impactos sobre a ação coletiva do empresariado brasileiro, com a divisão das suas entidades de representação entre o apoio ao governo e a paralisia diante das conseqüências das medidas adotadas. Lideranças empresariais do passado recente se retiraram tanto da atividade empresarial quanto da vida associativa. Antigos barões da indústria brasileira saíram de cena, como José Mindlin, Abraham Kasinski, Celso Varga, Felipe Arno, Hugo Etchenique, Cláudio Bardella, Sérgio Prosdócimo, Paulo Villares etc. (Diniz, 2000). A reorganização da economia brasileira atingiu inclusive o setor financeiro, onde transferiram suas instituições para controladores estrangeiros banqueiros como Jorge Paulo Lehman (Banco Garantia), Léo Wallace 13 Cochrane (Banco Noroeste), Ezequiel Nasser (Banco Excel) e Aloísio Faria (Banco Real), entre outros. Ao fim e ao cabo das reformas levadas a efeito no decorrer dos anos 90, em que pese o sucesso relativo do estancamento do processo inflacionário e do fracasso relativo no alcance da meta de equilíbrio das contas públicas, o que se percebe é um reordenamento do arranjo de forças entre Estado, capital nacional e capital estrangeiro, com o aumento da participação relativa deste na estrutura econômica brasileira. O capital estrangeiro respondia por 36% do faturamento dos 350 maiores grupos empresariais do país em 1991. No final de 1999 essa participação chegava a 53,5%, representando 146% de crescimento A participação das empresas estrangeiras nas exportações dos 500 maiores grupos do país caiu de 53,2% em 1997 para 47,6% em 2000, enquanto no caso das importações o salto foi de 63,1% para 64,9%. Em 1992 esse índice era de apenas 53,8%. A manutenção da ortodoxia cambial entre 1995 e 1999 proporcionou às empresas de capital estrangeiro em atividade no país a verticalização, desde seu país de origem, de toda a cadeia de suprimentos, provocando não apenas impactos negativos na Balança Comercial como comprometendo a indústria nacional. 9 Conseqüências negativas também se deram na Balança de Serviços por conta do crescente volume de remessas de lucros e royalties ao exterior. Some-se a esses fatos a concentração progressiva da propriedade dos maiores grupos empresariais em atividade no país durante a última década. Se entre 1991 e 1996 o país recebeu IED atraído pela privatização de empresas estatais, após 1996 os investimentos estrangeiros foram para fusões e aquisições de empresas privadas. Empresas nacionais públicas e privadas, de todos os setores da atividade econômica, trocaram de mãos durante os anos 90. Entre 1994 e 2001 realizaram-se no Brasil 2440 transações, entre privatizações, fusões e aquisições, movimentando, apenas nos leilões de privatização, R$ 103 bilhões, de acordo com levantamento da consultoria KPMG.10 A progressiva concentração da propriedade do capital tem se dado inequivocamente em direção à primazia do capital externo. Em 2002 as empresas de capital estrangeiro, somadas às estatais privatizadas durante os anos 90 e atualmente em sua maioria sob o controle de investidores externos, foram responsáveis pela maior parte do faturamento dos grandes grupos econômicos em atividade no país. Grático 2 – As 50 Maiores Empresas em Atividade no Brasil, por origem do capital e receita de vendas (em US$ milhões) - 2002 9 Cito trecho da entrevista de Ivoncy Ioschpe sobre como avalia a passagem de Gustavo Franco à frente do Banco Central e sua insistência na manutenção da sobrevalorização cambial: “Ele foi um enorme irresponsável. O Brasil está pagando a conta que ele deixou. Na lógica da estabilização, essa abertura até fazia sentido, por um ano talvez. Mas com a estabilidade consolidada, ele deveria ter se preocupado em como pagar esse processo. Não fez nada disso. Nós importávamos qualquer quinquilharia.” – ISTOÉ DINHEIRO – Entrevista com Ivoncy Ioschpe – 13/03/02 10 Folha de São Paulo, 10/02/02, em reportagem publicada a partir de estudos do Grupo Indústria e Competitividade, do Instituto de Economia da UFRJ e do Núcleo de Economia da Indústria e da Tecnologia da Unicamp. 14 70000 60000 50000 40000 30000 20000 10000 0 Estatais Capital Nacional Capital Estrangeiro Estatais Privatizadas Fonte: América Economia A ação coletiva do empresariado sob a nova institucionalidade Os anos 80 e 90 foram caracterizados pela aparição de novas modalidades de ação coletiva do empresariado brasileiro. Após quase duas décadas de números modestos em relação ao ritmo de surgimento de associações autônomas, ocorreu um novo boom de criação destas entidades, tornando-se mais ampla e complexa a estrutura de representação de interesses das classes empresariais. Como desdobramento e evolução desse processo de fortalecimento das associações autônomas de representação surgiram entidades multisetoriais, destinadas a coordenar o pensamento e a ação coletiva do empresariado nacional. Nas principais cidades do país foram fundados, a partir de 1983, os institutos liberais, cuja principal função era difundir, através de grupos de discussão e publicações, os valores da iniciativa privada e a primazia do livre-mercado sobre a ação estatal. Em 1987 foi fundado o Pensamento Nacional das Bases Empresariais (PNBE), iniciativa de lideranças empresariais de diversos setores da economia para aumentar o grau de influência da classe sobre o governo sem prender-se ao corporativismo das estruturas oficiais de representação nem tampouco aos particularismos das associações setoriais. Em 1989 alguns dos maiores empresários do país fundaram o Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI), espécie de think thank alheio à órbita da CNI e da Fiesp e voltado à discussão e à formulação de propostas de política industrial. São todas entidades que irrompem no cenário da ação coletiva empresarial num momento de indefinição quanto aos rumos do modelo de desenvolvimento brasileiro. Com o governo FHC finalmente formou-se o consenso, entre o grupo político no poder, o grande empresariado nacional e o capital estrangeiro em atividade no país, sobre a necessidade de adoção das reformas. Mas no governo havia pelo menos duas visões distintas sobre a natureza e o grau de profundidade delas. Uma, mais doutrinária e fundamentalista, o neoliberalismo, e outra, que absorveu parte do modelo anterior, o liberal-desenvolvimentismo (Sallum 2000). Ainda que distintas, foram, no entanto, duas correntes que travaram, ao longo dos dois mandatos de FHC, uma disputa política e ideológica dentro dos marcos do liberalismo. A preponderância, no núcleo duro do Estado, da primeira corrente sobre a segunda, entretanto, teve conseqüências extremamente relevantes para o tecido produtivo brasileiro, e, por extensão, para o capital privado 15 nacional e suas formas de organização coletiva.11 Tendo como norte mobilizador de sua ação política e gerencial a estabilização monetária, a corrente neoliberal implementou, especialmente durante o primeiro mandato de FHC, uma combinação de instrumentos de política econômica profundamente deletérios à indústria brasileira, como a sobrevalorização cambial, a manutenção de altas taxas de juros, a recuperação e o aumento da carga tributária e o desestímulo às políticas industriais setoriais ou a qualquer projeto mais amplo de política industrial. 12 Na concepção dessa corrente cabia ao Estado buscar a todo custo o equilíbrio das contas públicas externas e internas e atuar como promotor, regulador e fiscalizador da concorrência inter-empresas, dentro dos moldes e dos limites da economia de mercado.13 Ainda de acordo com essa lógica, mesmo iniciativas neocorporativistas de concertação entre governo, empresários e trabalhadores, como as câmaras setoriais, eram vistas como uma perturbação de ordem política nos mecanismos de mercado.14 11 Segundo Tápia e Sarti (2002) pode-se entender por núcleo duro do Estado durante o governo FHC alguns postos chave ocupados por representantes da corrente mais afeita à ortodoxia liberal, como o Ministério da Fazenda, a Presidência do Banco Central e a Secretaria da Receita Federal, os quais, na luta interna travada com a corrente adversária submeteram às prioridades da economia todas as demais formas de políticas públicas e concentraram nesses órgãos o processo decisório. 12 Cito a seguir trechos de entrevista concedida por Alcides Tápias, ex-ministro do Desenvolvimento do governo FHC, à revista Istoé Dinheiro. Sobre a rejeição da corrente neoliberal do governo às iniciativas de política industrial, declara: “Dava uma celeuma muito grande. Diziam que nós estávamos escolhendo vencedores, oferecendo vantagens e benefícios indevidos. Mas por que vencedores? Não estávamos defendendo uma ou outra empresa, mas um setor inteiro. As regras valeriam para empresas nacionais ou estrangeiras. Para aquelas que já estivessem aqui ou quisessem se instalar no Brasil. Era tudo horizontal e transparente.” Em relação ao papel de FHC como árbitro do conflito entre neoliberais e liberaldesenvolvimentistas, declara: “Ele acompanhava a maioria. Como eu vi que minhas posições foram ficando isoladas, por maior que se tenha espírito público, é muito difícil não perder o ânimo e o combustível. Por isso, achei melhor ceder o lugar a uma outra pessoa com novas idéias. Mas eu sempre achei que é possível conciliar a estabilidade da moeda e o equilíbrio fiscal com o desenvolvimento. Até porque o Brasil precisa de mais crescimento não só para atacar seus problemas sociais, mas também gerar recursos para honrar suas dívidas interna e externa.” – ISTOÉ DINHEIRO – Entrevista com Alcides Tápias – 20/12/01 13 Cito a seguir trechos de entrevista concedida por Ivoncy Ioschpe, atual presidente do Iedi, à revista Istoé Dinheiro. Questionado sobre se os anos 90 teriam sido uma nova década perdida para o Brasil, declara: ´Pelo aspecto de desenvolvimento industrial, sim. O governo Fernando Henrique teve coisas boas, como a estabilização e a postura diplomática internacional, mas não se pode esquecer que a média de crescimento foi muito baixa, perto de 1,5%. Tirando o crescimento populacional, não houve expansão da renda nem do mercado de consumo. Não dá para dizer que foi bom. E o que é mais grave: o Brasil perdeu oportunidades no período em que o mundo mais cresceu.” Perguntado se nutria alguma expectativa de convencer o Ministro da Fazenda, Pedro Malan, da necessidade de adoção de algumas medidas de política industrial preconizadas pela entidade, declara: “Não, jamais. O Malan tem outra religião, e fé é uma coisa que a gente não discute.” ISTOÉ DINHEIRO – Entrevista com Ivoncy Ioschpe – 13/03/02 14 Por absoluta falta de espaço não tratarei, neste texto, de pormenorizar a experiência das câmaras setoriais ocorrida na primeira metade dos anos 90 no Brasil. Ressalto apenas que os acordos automotivos acertados a partir da negociação tripartite entre governo, empresários e trabalhadores, envolvendo a indústria automobilística e o setor de autopeças, são considerados experiências extremamente bem sucedidas. Seus principais êxitos se deram tanto em relação ao estabelecimento de um tipo inovador de relação política das partes envolvidas quanto em termos propriamente econômicos, expressos na manutenção das taxas de lucratividade das empresas, na manutenção dos níveis de emprego e salários dos trabalhadores, na queda dos preços praticados ao consumidor final e no aumento da demanda por automóveis. Para maiores informações consultar Diniz (1993) e Arbix (1996). 16 É relativamente recente a enxurrada de críticas do empresariado nacional ao modelo econômico adotado no país nos anos 90. Mesmo sofrendo os impactos das quedas de barreiras comerciais, ainda sob a gestão de Itamar Franco, da sobrevalorização do real e da elevação contínua das taxas de juros, já sob FHC, grande parte dos empresários não faltaram com o apoio ao governo. Em meados da década, quando FHC atuava de maneira entusiástica para aprovar no Congresso Nacional a emenda da reeleição, a posição da grande maioria das lideranças empresariais era de apoio a seu governo e a suas realizações no campo da economia. 15 A postura mais combativa do Iedi a partir do lançamento, em 1998, do documento “Agenda para um Projeto de Desenvolvimento Industrial” e a eleição, no mesmo ano, de Horácio Lafer Piva para a presidência da Fiesp, vão representar momentos de inflexão no apoio quase unânime que FHC deteve junto às elites empresariais brasileiras. Mesmo assim, pôde contar, especialmente na primeira metade de seu segundo mandato, com as fissuras internas do empresariado e o acirramento de suas divergências, à medida que a nova face da economia brasileira se tornava mais nítida. 16 A questão do largo apoio do empresariado nacional ao receituário de reformas implementado no país é relativamente recente e talvez não totalmente explorada pela literatura. É provável que o empresariado brasileiro, visto sob a perspectiva tanto do ator político quanto do empresário tomado individualmente, não tenha ficado imune à onda neoliberal que varria o mundo desde fins dos anos 70 e que chegou entre nós sobretudo no final dos 80. A crença nas virtudes do mercado (e em contrapartida, nas deficiências do Estado) levou diversos setores da elite econômica brasileira a apostar na adoção de medidas que lhes eram, no fim das contas, desfavoráveis, tanto enquanto classe como enquanto empreendedores. Possivelmente os segmentos a serem prejudicados pudessem até ter clareza do preço a ser pago, mas talvez não se imaginassem assim tão prejudicados, dada a 15 Pesquisa realizada pela Fiesp em setembro de 1996 com 191 de um total de 287 diretores da Federação e do Ciesp mostrava que 80% desejavam que FHC tivesse direito à reeleição. Aqueles que opinaram a favor da possibilidade de reeleição ao Presidente da República tinham como principal justificativa o fato de que “apenas FHC poderia comprometer-se com a estabilidade alcançada com o Plano Real e realizar as reformas necessárias ao país”. Líderes empresariais de outras entidades à época, como Eduardo Eugênio Gouvêia Vieira, presidente da Firjan, e Guilherme Afif Domingos, na ocasião presidente da Confederação das Associações Comerciais do Brasil, também manifestaram-se apoiando a idéia - O Estado de São Paulo – “Reeleição de FHC tem 80% de apoio na Fiesp” – 23/09/96 16 A esse respeito é interessante observar as discussões travadas por lideranças empresariais mais ou menos afeitas às medidas de política econômica adotadas pelo governo FHC. Sobre os reclamos feitos pelo Iedi e pela Fiesp de adoção pelo governo de instrumentos de política industrial, declara Eduardo Eugênio Gouvêia Vieira: “Vamos tomar cuidado com essa história. O que muitos deles querem é o fechamento da economia. Esse é um filme que já vimos muito e que já sabemos o final. O resultado é que as ineficiências acabam sendo repassadas para a sociedade e ela que pague a conta. O Iedi é historicamente nacionalista, que uma volta ao passado. Gosto do Paulo Cunha e do Eugênio Staub, mas o que eles querem é isso. Não podemos voltar a ser uma ilha, como querem essas entidades.” – ISTOÉ DINHEIRO – Entrevista com Eduardo Eugênio Gouvêia Vieira – 10/08/01. Em resposta às declarações de seu oponente, segue Eugênio Staub: “Esse tipo de crítica é por ignorância, preguiça (não leu as propostas e não gostou), má-fé ou puxa-saquismo. Nessa última categoria tem um número grande nas entidades e no empresariado. Eles concordam com quem está no poder. Quem está na oposição eles criticam. O Eduardo Eugênio (Vieira Gouvêa, presidente da Fierj), um quase xará meu, falou sobre isso. Bem, há críticos que se encaixam em mais de uma categoria... (...) O presidente Fernando Henrique Cardoso também nos criticou dizendo que somos a aliança do arcaico. Ele disse que o PT, o Iedi e a Fiesp têm uma proposta comum, de levantar barreiras contra a importação e proteger certos setores. Disse que somos a aliança do arcaico. Tenha paciência... Isso não é verdade. Essa história de que o Iedi quer o fechamento é tolice.” – Istoé Dinheiro – Entrevista com Eugênio Staub – 31/08/01 17 crença mesma nas virtudes e nos frutos vindouros do modelo que se inaugurava. (Kingstone, 1999). Sustento a hipótese de que três grandes motivações levaram o empresariado nacional, ou sua fração mais destacada, a apoiar as reformas. Em primeiro lugar, a já comentada convicção ideológica, traduzida na percepção de que as mudanças eram necessárias..17 18 Em segundo, a certeza de que o novo modelo enterraria as aspirações políticas e econômicas das classes trabalhadoras, numa espécie de “revanche” em relação à derrota sofrida pelas elites empresariais na Constituinte de 1986-1988.19 E em terceiro, a fragilidade política e econômica crônica do empresariado diante do Estado, representada pela ausência de uma articulação ampla dos interesses empresariais envolvidos e traduzida, muitas vezes, em pragmatismo e adesismo. 20 Uma quarta hipótese, aventada por Peter Kingstone, diz respeito ao fato de que as reformas, e em especial a abertura da economia, não produziram grande efeito redistributivo entre os capitalistas brasileiros, não tendo se configurado, no país, um cenário de vencedores e perdedores. (Kingstone, 2001). De fato, conforme vimos acima, o dado mais relevante do período em relação ao assunto foi o aumento da participação relativa do capital estrangeiro sobre a riqueza nacional. Se as reformas orientadas para o mercado produziram perdedores entre a classe empresarial, estes provavelmente não tenham sido os grandes grupos econômicos, mas o empresariado de médio e pequeno porte. (Botelho; Mendonça, 2002). Ainda durante o ciclo das reformas pró-mercado implementadas por FHC as associações empresariais foram colhidas por uma crise “existencial”, caracterizada pelo esvaziamento de suas funções políticas diante da magnitude das mudanças na estrutura produtiva do país, da qual apenas recentemente parecem estar se recuperando. Diferentemente do que ocorreu no México, tanto a tradicional estrutura de representação de interesses do empresariado quanto suas novas modalidades de ação coletiva não encontraram no Estado brasileiro a mesma contrapartida obtida pelas organizações 17 Convicção que se esvai à medida que a perseguição da meta da estabilidade parece tornar-se um fim em si mesmo. No decorrer do governo FHC o entusiasmo inicial do empresariado com as reformas vai sendo substituído, ao longo do tempo, pela elevação do tom das críticas. Horácio Lafer Piva, em discurso de posse na presidência da Fiesp, em 1998, fazia um duro discurso contra a priorização, pelo governo, das questões financeiras. Repetiria três anos mais tarde, por ocasião da assunção de seu segundo mandato na entidade, que “queremos recalibrar a relação setor público / setor privado, governo e mercado. Queremos menos mitos, menos ilusionismo, mais sensatez.” 18 Cabe ressaltar a lembrança de Velasco Cruz, para quem a concepção de um projeto liberalizante por parte do empresariado brasileiro tem raízes antigas, situando-se antes mesmo da crise política entre governo militar e empresariado por conta da campanha anti-estatização, nos anos 70. (Cruz, 1995). É provável que o apoio entusiasmado das classes empresariais à chegada do receituário neoliberal no Brasil se deva ao fato de que os empresários imaginassem que a partir de então superariam a condição histórica de subalternidade em relação ao Estado e se constituiriam, em parceria com o capital estrangeiro, nos protagonistas do novo modelo de desenvolvimento. 19 Temos discutido até aqui as perdas impostas pela reconversão do modelo de desenvolvimento ao empresariado nacional. Não é o foco deste texto, mas há de se supor que os prejuízos auferidos pelas classes trabalhadoras e seus sindicatos tenham sido muito maiores, expressos sobretudo no aumento significativo dos níveis de desemprego e subemprego, na crescente informalização da mão-de-obra e na diminuição da participação dos salários na renda nacional no decorrer dos anos 90. 20 Talvez não se possa conceituar como adesismo, mas o próprio PNBE esvaziou-se enquanto projeto político quando FHC e o PSDB foram ao poder em âmbito federal e em alguns estados em 1994, na medida em que várias de suas lideranças passaram a ocupar cargos nos novos governos, liquidando a independência da entidade em relação ao Estado. 18 empresariais no caso daquele país durante os governos De la Madrid e Salinas. Com Collor, e principalmente sob o governo FHC, foram desmantelados diversos canais de interlocução entre Estado e empresariado, reduzindo-se a participação empresarial a conselhos estatais de pequena importância, externos às instâncias nas quais se tomavam as decisões estratégicas responsáveis pela definição das linhas mestras da política governamental. (Diniz, 2000). O novo desenho do Estado, originário das reformas proporcionou nos últimos anos, contudo, um maior acesso do empresariado industrial às instâncias regulatórias criadas para coordenar e fiscalizar o funcionamento dos mais diversos setores da atividade econômica. Diante de um novo arcabouço institucional que redefiniu as relações entre os poderes e redesenhou a estrutura do Estado, têm sido criadas novas formas de articulação dos pleitos empresariais, como nos casos das entidades multisetoriais que reúnem empresas de uma mesma cadeia produtiva ou as iniciativas de coordenação dos diversos interesses empresariais em relação a temas específicos da agenda legislativa, como as reformas tributária e trabalhista.21 Ao mesmo tempo, os sindicatos oficiais e as associações independentes passam a conjugar a prática de lobbying no Congresso Nacional à profissionalização de suas estruturas internas, ao aumento da gama de serviços oferecidos aos associados e à intensificação de suas relações com instituições representativas de outros segmentos da sociedade para a discussão de assuntos comuns. A expectativa a partir do início do governo Lula é que, uma vez superada a fase de aplicação de instrumentos ortodoxos de política econômica, seja intensificado o diálogo entre Estado, empresariado e trabalhadores, no intuito da implementação de políticas ativas de desenvolvimento econômico. MÉXICO O empresariado e seus padrões históricos de ação coletiva e relacionamento com o Estado A representação dos interesses empresariais no México foi caracterizada, ao longo do século XX, pela criação e o fortalecimento de uma estrutura piramidal, multifacetada em termos regionais e setoriais mas coordenada hierarquicamente por associações de abrangência crescente unidas por organizações de cúpula. A existência de um Estado forte, de tipo centralizador e com efetivo controle sobre os atores sociais impôs ao empresariado a necessidade de institucionalizar progressivamente sua atuação política, estimulando tanto sua ação coletiva quanto a elaboração de plataformas comuns de interesses (Vide Anexo I). De acordo com a argumentação de Schneider, o caso mexicano apresenta um círculo virtuoso nas relações entre empresariado e Estado, no qual organizações empresariais fortes, abrangentes, de filiação voluntária, não competitivas entre si e ordenadas por órgãos de cúpula participariam de processos oficiais de negociação com o governo para a implementação de reformas econômicas e políticas. (Schneider, 2002; 2000a; 2000b) 21 Refiro-me aqui a iniciativas como a criação da Agenda Legislativa da Indústria, no âmbito da CNI, da Ação Empresarial e da Organização Nacional da Indústria do Petróleo (ONIP). Somam-se a esse grupo entidades de outras naturezas que têm surgido no país, como a Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia (ABRACE), reunindo empresas de diversos setores da economia através do vínculo de consumidores de serviços e produtos fornecidos por empresas privatizadas que atuam sob a órbita das agências regulatórias. 19 O associativismo empresarial no México tem seus primeiros traços ainda no século XIX, durante o porfiriato, com a mobilização política de um pequeno e poderoso conjunto de empresas familiares do estado Nuevo Leon (norte do país), conhecido como “Grupo Monterrey”. A ação coletiva mais significativa do empresariado mexicano, porém, foi impulsionada pelo governo revolucionário, com a criação da estrutura oficial de representação de sindicatos e federações setoriais e regionais, lideradas pela Confederação de Câmaras Industriais dos Estados Unidos Mexicanos (Concamin) e pela Confederação de Câmaras Nacionais de Comércio (Concanaco). A aliança de poder que deu sustentação ao novo regime não contemplava, oficialmente, a participação do empresariado. A separação formal entre poder político e poder econômico impediu a participação empresarial no partido hegemônico, mas não impediu que os empresários fossem interlocutores freqüentes do Estado nos assuntos mais importantes da nação. No final dos anos 20 inaugurou-se uma era de convivência entre a estrutura oficial e a estrutura autônoma de representação de interesses do capital mexicano. Lideranças empresariais ideologicamente conservadoras criaram, em 1929, a primeira entidade autônoma de representação empresarial. A Confederação Patronal da República Mexicana (Coparmex), fundada em Monterrey, surgiu com o claro propósito de defender os interesses empresariais em oposição a implementação pelo Estado de políticas sociais voltadas às massas rurais e urbanas. Outras entidades de caráter autônomo e de filiação voluntária foram criadas nas décadas posteriores, a partir de recortes regionais, setoriais e de tamanho da empresa. À semelhança da institucionalização, pelo Estado, de toda a sociedade mexicana, a dinâmica de verticalização da representação dos interesses empresariais, contudo, era presidida pela lógica da centralização política nas grandes câmaras, contemplando a heterogeneidade do empresariado numa estrutura coordenada por uma ação efetivamente coletiva, na qual puderam coexistir ao longo dos anos demandas e projetos variados.22 Entre 1940, com a ascensão de Lázaro Cárdenas ao poder, e o início dos anos 70 o México viveu o Desarrollo Estabilizador, período de apogeu do modelo nacionaldesenvolvimentista, registrando altas taxas de crescimento econômico, desenvolvimento industrial e estabilidade política. O crescimento da economia e a formação de grandes grupos empresariais motivaram a criação, em 1962, do Conselho Mexicano de Homens de Negócios (CMHN), entidade sem estrutura formal congregando cerca de 40 dos maiores empresários do país, presentes nos mais importantes setores da economia e cujo objetivo principal era estabelecer um canal direto de acesso ao núcleo do poder estatal (Ortiz, 1998). Com o esgotamento do modelo de substituição de importações, nos anos 70, surgiram as primeiras grandes divergências entre empresários e Estado, motivando a criação do Conselho Coordenador Empresarial (CCE), entidade de cúpula do empresariado mexicano que tinha por objetivo contrapor-se à retomada do intervencionismo estatal na esfera econômica, como tentou à época o então presidente Luís Echverría. A crise econômica de 1982 só viria a agravar a tensão entre ambos os lados. Com a declaração, pelo governo mexicano, da moratória de sua dívida externa e a estatização do sistema financeiro, 22 A respeito do grau de proximidade política das entidades com o projeto nacional-desenvolvimentista mexicano ver anexo 1. 20 rompeu-se definitivamente o antigo pacto político que havia presidido as relações entre empresariado e Estado desde os anos 20. O fim do modelo nacional-desenvolvimentista fez com que a estratégia de contenção da sociedade civil entrasse em crise – se não no caso dos trabalhadores, fortemente controlados pelo PRI e progressivamente enfraquecidos com a crise econômica e as reformas subseqüentes a ela, ao menos no caso do empresariado, que passava a enxergar-se, ele mesmo, como um ator político independente. Ainda nos primeiros meses do governo De la Madrid iniciava-se um processo de reaproximação entre setores das elites econômicas e políticas. Amplos setores do empresariado, notadamente os mais ligados ao PRI e mais voltados ao mercado doméstico, optavam por reatar as ligações com o Estado, redefinindo, porém, a estratégia para a recomposição do pacto, através da aliança com a tecnocracia neoliberal que chegava ao poder com o novo presidente. Outros segmentos, entretanto, historicamente mais críticos do modelo nacional-desenvolvimentista e mais voltados ao mercado externo, passavam a pesar os custos da manutenção de um regime político autoritário e centralizado. Embora Estado e empresariado voltassem aos poucos a compartilhar visões semelhantes sobre o futuro do país, havia sido detonada uma nova forma de ação coletiva entre setores do empresariado, que passavam a apostar na via político-partidária uma possibilidade de constituir-se como alternativa de poder.23 No governo De la Madrid implementaram-se, sob a chancela do Fundo Monetário Internacional, as primeiras reformas econômicas, voltadas não apenas a solucionar os constrangimentos macroeconômicos mais imediatos, como a questão da dívida externa, mas também a edificar um novo modelo de desenvolvimento. O novo presidente substituiu progressivamente a velha burocracia do PRI, há décadas incrustada no aparelho do Estado, por uma tecnocracia jovem e sintonizada com os ventos neoliberais que sopravam desde o Reino Unido sob Thatcher e os EUA sob Reagan. Com ela o México deixava para trás as práticas protecionistas e preparava-se para o modelo exportador. O grande empresariado apoiou, em sua maioria, a reconversão da economia mexicana, e com De la Madrid iniciouse um período de convergência entre as demandas históricas dos homens de negócios e as novas diretrizes do Estado. (Luna, Tirado e Valdés, 1987). A reaproximação, entretanto, não foi suficiente para impedir o lançamento da candidatura presidencial, pelo PAN, de um líder empresarial em 1988, e muito menos para afastar a possibilidade concreta de que Cuauhtémoc Cárdenas, do PRD, quase vencesse as eleições.24 A apertada (e contestada) vitória do candidato oficial Carlos Salinas obrigou empresários e Estado a articularem uma providencial recomposição ainda antes da posse do novo presidente. Para tanto Salinas 23 Os estratos empresariais que optam pela via eleitoral são em geral os do norte do país, historicamente menos submetidos à tutela estatal e mais integrados ao mercado norte-americano. Constituíamse também de grupos de jovens empresários que não haviam presenciado a fase aúrea do protecionismo econômico. 24 Entre 1982 e 1988 ocorre o auge da participação político-partidária do empresariado, com o aumento da militância no PAN e mesmo no PRI. Inúmeros empresários filiaram-se e concorreram a prefeituras, governos estaduais e cargos no legislativo federal, movimento que culminou na candidatura presidencial de Clouthier em 1988 pelo PAN, a qual simbolizava o desejo de diversos segmentos do empresariado mexicano de apresentarem-se à sociedade como uma alternativa liberal-democrática ao PRI. A massa de empresários de porte médio adere, em grande medida, ao projeto panista, conjugando liberalismo econômico e conservadorismo moral numa mesma agremiação partidária. 21 aprofundou, a partir de 1989, as reformas de caráter liberalizante, com destaque para as privatizações, a desregulação da economia e a aceleração das negociações para a adesão do México ao Nafta. Reformas econômicas e reorganização do capital O governo de Salinas de Gortari foi caracterizado pela consolidação do modelo exportador. Aceitando a premissa de que o mundo vivia um inexorável processo de globalização, o novo presidente submeteu a economia mexicana a um choque de competitividade, colocando o Estado ao lado dos mais aptos a sobreviver nos novos tempos. As privatizações de empresas estatais, iniciadas no mandato de seu antecessor, foram aprofundadas. Empresas dos setores financeiro, de telefonia, siderurgia, transporte aéreo, mineração, comunicação etc. foram vendidas a investidores privados nacionais e estrangeiros. Uma nova geração de empresários foi formada a partir dos processos de transferência das empresas públicas para mãos privadas. A legislação sobre investimento externo foi abrandada, expondo o país a novos fluxos de investimento externo e novas oportunidades de negócios. A abertura comercial foi radicalizada, com quedas abruptas de tarifas e barreiras. A legislação fundiária também foi modificada de modo a permitir uma utilização mais empresarial da terra, ao mesmo tempo em que foram encorajados a flexibilização das relações trabalhistas e o enfraquecimento das negociações coletivas. O Banco de México ganhou maior autonomia para definir os rumos da política econômica sem interferências do Executivo e negociou-se os termos e condições da entrada do México no Nafta. (Tirado, 1998). A adoção das reformas neoliberais no México não pressupôs, como em outros países, o desmonte da antiga estrutura de representação de interesses e a redefinição das formas de articulação entre Estado e sociedade, especialmente quando se pensa no caso do empresariado. Ainda que o núcleo do poder estatal preferisse manter e encorajar um padrão de relacionamento com as lideranças empresariais que transpunha qualquer oficialidade nas ligações entre Estado e elites econômicas, as principais associações empresariais envolviam-se em uma renhida disputa para definir quem lideraria o grande empresariado nas negociações com o governo. Se no processo de privatizações foram favorecidos alguns grupos econômicos que mantinham excessiva proximidade com o referido núcleo de poder, relações menos nebulosas entre empresariado e Estado se deram nas tratativas para a integração do país ao Nafta. Por iniciativa do CCE foi criada, no início dos anos 90, a bem sucedida Coordenadoria de Organismos Empresariais de Comercio Exterior (COECE), com o objetivo de representar os interesses dos diversos segmentos empresariais do país nas negociações para a adesão ao tratado. A passagem do regime de substituição de importações para o regime exportador deslocou o eixo da economia do setor interno para o setor externo. Após a integração ao Nafta a economia mexicana teve grande parte de suas cadeias produtivas desmanteladas, ao mesmo tempo em que algumas grandes empresas nacionais passaram a aventurar-se no mercado externo, a fim de se manterem competitivas dentro do próprio mercado doméstico, crescentemente internacionalizado. A adoção das políticas pró-mercado ensejou o fortalecimento de alguns grandes grupos empresariais, com atuação em diversos setores da 22 economia, progressivamente internacionalizados por conta de alianças estratégicas com empresas de capital estrangeiro. (Teichman, 1995). Com a integração ao espaço econômico norte-americano o México tornou-se, em larga medida, uma plataforma de exportação de produtos industrializados para os EUA. Poucos anos após a entrada no Nafta a pauta de exportações do país deixou de estar concentrada em produtos agrícolas e petróleo, como ocorria nos anos 70 e 80, e passou a ter nas manufaturas a sua quase totalidade. Em uma década e meia o país quase dobrou sua participação no comércio mundial, passando de 1,26% em 1980 para 2,09% em 1995. As exportações, que cresceram, em dólares, 39,6% entre 1980 e 1985, e 23,8% entre 1985 e 1990, quase triplicaram entre 1990 e 1995, ano seguinte a entrada em vigor do acordo, e experimentaram um aumento de 47,7% ate 1998. (Alba, 2001). O México é na atualidade responsável por 2/3 de todo o volume exportado pelos maiores grupos empresariais em atividade na América Latina. Quadro 2 – As 100 maiores empresas exportadoras da América Latina 2002 País Número de empresas México 63 Venezuela 2 Brasil 17 Chile 5 Colômbia 5 Argentina 4 Peru 3 Equador 1 Total 100 Fonte: América Economia Volume exportado (em US$ milhões) 137790,10 43281,00 15862,30 4675,70 3797,60 2546,60 1810,10 1202,30 210965,70 % do total 65,31% 20,52% 7,52% 2,22% 1,80% 1,21% 0,86% 0,57% 100,00% A entrada do país no bloco comercial norte-americano, a um só tempo representou um enorme incremento no volume de seu comércio exterior e estreitou, por este mesmo motivo, os laços comerciais com os EUA. A estratégia provavelmente condicionou o destino do México nas próximas décadas ao desempenho da economia norte-americana, tendo em vista que as exportações mexicanas têm progressivamente sido direcionadas na sua quase totalidade para o vizinho do Norte. Quadro 3 – Destino geográfico das exportações do México – 1980-1998 1980 1985 1990 EUA 62,50 60,90 68,80 Canadá 1,10 1,80 1,70 Europa 14,00 19,20 14,30 América Latina 5,50 4,60 4,90 Ásia 4,20 11,20 6,90 Outros 12,70 2,30 3,50 23 1995 83,30 2,50 5,00 4,90 2,60 1,70 1998 87,80 1,30 3,70 4,00 1,90 1,30 Total 100,00 100,00 100,10 100,00 100,00 Volume (US $ milhões) 15512 21664 26838 79542 117500 Fonte: Sumario Estadistico de Comercio Exterior / Instituto Nacional de Estadistica, Geografia y Informatica – SHCP – Banco de México Enquanto nos anos 70 as maiores empresas do país estavam sob controle do Estado ou pertenciam ao grande capital nacional, na atualidade entre os maiores grupos econômicos em atividade no país estão o conglomerado estatal do petróleo (Pemex), a empresa de telefonia privatizada durante o governo Salinas (Telmex), a multinacional mexicana do cimento (Cemex) e um punhado de corporações norte-americanas e asiáticas dos setores automotivo, de autopeças, eletroeletrônico e informática, que vem instalando plantas em território mexicano desde o início dos anos 80 e têm parcela majoritária de seu faturamento obtida com as exportações.25 Quadro 4 – 20 Maiores Grupos Exportadores do México - 2002 Empresa Setor de Atividade Petróleos Mexicanos Petróleo / Gás Pemex Explotación y Producción Petróleo / Gás General Motors Mexico Automotivo Daimler Chrysler México Automotivo Delphi Corporation Autopeças Volkswagen México Automotivo Cemex Cimento Samsung México Eletroeletrônicos US Commercial Varejo Delphi Paccard Electric Systems Autopeças Sony de México Eletroeletrônicos IBM México Informática Hewllet Packard México Informática Lear Holding Autopeças Nissan México Automotivo Ford México Automotivo Grupo Alfa Holding General Electric Eletroeletrônicos Visteon Autopeças America Movil Telecomunicaçõe 25 Propriedade Exportações % no total do capital (US$ milhões) de vendas Estatal 14408,30 28,70 Estatal 13109,00 46,00 Estrangeira 9095,30 79,50 Estrangeira 6744,70 78,10 Estrangeira 6006,00 80,00 Estrangeira 4274,00 62,80 Nacional 4060,00 62,10 Estrangeira 3950,00 87,80 Estrangeira 3859,30 100,00 Estrangeira 3414,40 80,00 Estrangeira 3033,00 65,20 Estrangeira 2998,00 75,10 Estrangeira 2456,00 59,80 Estrangeira 2444,90 63,20 Estrangeira 2061,50 41,30 Estrangeira 1995,30 44,90 Nacional 1841,00 35,60 Estrangeira 1838,60 48,00 Estrangeira 1804,00 80,00 Nacional 1711,30 30,70 Exceção feita ao setor automotivo, em sua maioria essas plantas estrangeiras instaladas em território mexicano atuam sob o modelo das maquilas, reduzindo-se às etapas finais do processo produtivo, como a montagem de componentes desenvolvidos e produzidos em outras regiões do mundo. Restrita, originalmente, às regiões fronteiriças do norte do país, as maquiladoras difundiram-se, nos últimos anos, por todo o México, instalando-se inclusive no sul desindustrializado. Atualmente, porém, o país vive um processo de progressivo esvaziamento dessa indústria, por ocasião da transferência de suas plantas para a Ásia, onde os custos de produção são ainda menores que no México. 24 s Fonte: América Economia A implementação das reformas econômicas e a conversão para o modelo exportador tiveram impactos também sobre a estrutura da propriedade do capital no México. Na primeira metade dos anos 90, por ocasião dos processos de privatização, o país tornou-se o maior receptor de Investimento Externo Direto da América Latina. Entre 1990 e 1993 o IED alcançou 3% do PIB, enquanto havia se mantido em apenas 1% durante os anos 80. Num segundo momento o dinheiro estrangeiro aportou no país devido à onda de fusões e aquisições de empresas dos mais diversos setores da economia, dando ensejo à reorganização do tecido produtivo mexicano. A iniciativa do governo Salinas de alterar substancialmente a legislação de investimentos estrangeiros permitiu o aporte de capital externo em segmentos antes restritos ao Estado e ao capital nacional, como industria química, telecomunicações, ferrovias, bancos e siderurgia. Com a maior desregulamentação da legislação sobre investimento estrangeiro algumas das mais tradicionais empresas privadas mexicanas passaram ao controle, total ou parcial, do capital externo. De fato, a estrutura da propriedade do capital no México é hoje predominantemente estatal ou estrangeira. Entre os 50 maiores grupos econômicos em atividade no país em 2002, sete eram de controle majoritário do governo federal, vinte e quatro eram empresas estrangeiras e dezenove eram empresas de capital majoritariamente nacional. Naquele ano as empresas estatais foram responsáveis por um volume de vendas de US$ 147.373,80 milhões em 2002, enquanto as corporações estrangeiras tiveram um volume de US$ 109.157,00 milhões e as companhias de capital majoritariamente nacional responderam por um volume de US$ 89.875,10 milhões, correspondendo, respectivamente, a 42,54%, 31,51’% e 25,85% do faturamento total. Considerando que as empresas de capital majoritariamente nacional adotaram, como estratégia de sobrevivência após a abertura da economia mexicana, a política de alianças estratégicas com sócios estrangeiros em variados graus de participação na propriedade de seu capital, e lembrando que a forte participação do setor público no faturamento total dos 50 maiores grupos econômicos do país se deve ao monopólio estatal do petróleo, conclui-se que hoje os setores mais dinâmicos da economia mexicana encontram-se sobre controle de capitais externos.26 Constituem-se nos segmentos mais competitivos da indústrias do país e não pautam sua produção para o mercado doméstico (Valdés Ugalde, 2002). A partir de um cenário de progressiva internacionalização da economia, democratização da vida política e diminuição da capacidade de atuação do Estado que a ação coletiva empresarial começa a ganhar novos contornos. Vicente Fox: os empresários no poder? 26 Como exemplo pode-se citar a Teléfonos de México, a maior empresa privatizada na história do país. O mitológico empresário Carlos Slim, líder do consórcio que arrematou a companhia, controla apenas 24% de seu capital. A empresa, que teve um volume total de vendas em 2002 de US $ 10,9 bilhões, possui diversos controladores, como fundos de investimento norte-americanos e concorrentes europeus como a France Telecom. 25 A vitória de Vicente Fox, do PAN, nas últimas eleições presidenciais constitui-se não apenas como um fato inédito na história política mexicana, mas como uma saída à direita para o esgotamento do modelo político de partido dominante que vigorou no país por mais de setenta anos. Apoiado por alguns dos mais importantes grupos empresariais nacionais, e beneficiado pela crescente rejeição social ao PRI, Fox chegou ao poder simbolizando as esperanças de mudança de milhões de indivíduos (Chand, 2001). Alinhado com o governo norte-americano pelo conservadorismo de seu partido e por suas relações próximas com George W. Bush, Fox prometia obter concessões econômicas e políticas junto ao vizinho do Norte. Seu pragmatismo de homem de negócios parecia a primeira vista uma útil ferramenta, aos olhos de muitos segmentos da sociedade mexicana, para a formação de consensos visando o combate às grandes mazelas nacionais. Fox quebrou inclusive um dos mais antigos tabus da política mexicana, através da participação direta de executivos de empresas privadas e lideranças empresariais em postos-chave no governo.27 Apesar de todas as novidades que sua figura pudessem representar na vida política do país, três anos após sua posse, no entanto, o atual presidente conta com a frustração de amplos setores do país, tendo seu governo associado à imagem de imobilismo e inexperiência política. Somado a isso, está a frente de um governo incapaz de fazer frente à recessão econômica, dado o elevado grau de dependência do país às oscilações da economia norteamericana. As reformas fiscal, trabalhista e energética relativas, respectivamente, às questões da tributação, dos salários e do funcionamento e da propriedade dos setores elétrico e petroquímico, ainda majoritariamente em mãos estatais e de fundamental interesse do empresariado, não avançam no Congresso Nacional. Sem maioria no parlamento, Fox também não conseguiu implementar a reforma do Estado, voltada a reorganizar a burocracia estatal, ainda dominada nacionalmente pelo PRI, e a criar novas estruturas institucionais garantidoras da governabilidade e da consolidação da democracia. Prejudicado pelas derrotas que a oposição lhe impõe no Congresso, pelas divergências com seu próprio partido, pelas denúncias de contribuições ilegais a sua candidatura e pela queda da atividade econômica, do nível de renda e de emprego, Fox foi derrotado nas recentes eleições legislativas, onde seu partido obteve apenas 12% dos votos, e provavelmente enfrentará dificuldades ainda maiores para aprovar suas metas quando a nova legislatura assumir suas cadeiras na Câmara de Deputados. Quadro 5 - México – Composição da Câmara dos Deputados Partido Atual legislatura Próxima legislatura 27 Há muitos empresários no primeiro escalão do governo Fox, como o Ministro da Fazenda, executivo de carreira do Grupo Imsa, do setor siderúrgico e ex-vice presidente da Concanaco; o Secretário de Finanças, oriundo dos grupos Femsa (bebidas) e Somex (maquinaria); o Ministro da Energia, executivo de carreira da Union Carbide e do Grupo Vitro (vidro); o Ministro do Trabalho e Previdência Social, ex-presidente da Coparmex; o Ministro da Agricultura, empresário do setor de agribusiness; o Secretário de Governo, executivo de carreira dos principais escritórios de advocacia do país; o Coordenador Geral de Opinião Pública e Imagem, ex-diretor de marketing da Procter & Gamble e do Grupo Televisa; o Diretor Geral da Nacional Financeira, ex-Diretor Corporativo do Grupo Visa; o Diretor Geral da Pemex, ex-presidente da DuPont México. A estatal Pemex conta com um Conselho de Administração composto por doze membros, seis nomeados pelo governo e seis pela iniciativa privada. Entre os nomeados pelo atual governo estão os presidentes dos grupos Pulsar (alimentos), Cemex (cimento) e Telmex (telecomunicações). 26 PRI 221 PAN 207 PRD 50 Outros 22 Fonte: Instituto Federal Eleitoral 223 154 96 27 Desde a segunda metade dos anos 90 a tradicional estrutura de representação dos interesses empresariais vem sendo impelida a adaptar-se a um novo cenário político e econômico, marcado pelo avanço da democracia, pela diminuição do raio de ação do Estado e pela reorganização do tecido produtivo. A transformação do ambiente em que atuam as empresas tem ensejado o surgimento concomitante de novas tendências clientelistas e pluralistas. De um lado, estão segmentos que tentam aumentar seu nível de influência sobre as políticas públicas assumindo o comando de instâncias diversas do aparato estatal. De certo modo, a contraparte do processo de intensa internacionalização da economia mexicana em relação à ação coletiva do empresariado nacional tem se revelado no recente esvaziamento da legitimidade de suas entidades representativas. 28 As próprias entidades patronais reconhecem a perda de poder político e toleram aqueles que, embora tenham interesse no resultado coletivo de sua ação, resistem em cooperar, preferindo adotar outros mecanismos de interlocução com o Estado, num fenômeno típico dos obstáculos à ação coletiva.(Olson, 1999). De outro lado,.há setores do empresariado que passam a valorizar o Legislativo como uma instância fundamental para o pleito de seus interesses.29 Os novos mecanismos de ação coletiva são confrontados com o impasse institucional na relação entre os poderes Executivo e Legislativo, e tem ainda de enfrentar a perda de legitimidade junto ao pequeno e médio empresariado e aos setores voltados ao mercado doméstico, fortemente atingidos não apenas pela abertura da economia como pelo aumento da pobreza, do desemprego e pela retração do consumo interno.30 Perante tantos desafios e a frustração em relação ao desempenho de Fox a frente do governo, as organizações têm buscado intensificar suas ações de lobbying no Congresso Nacional, a partir da constatação de que se está diante de um Executivo menos forte que o habitual, cuja sucessão passa a ser absolutamente imprevisível num ambiente democrático. As novas formas de atuação coletiva do empresariado no México, no entanto, são ainda muito recentes, e a adaptação de 28 A crise de legitimidade das principais entidades empresariais de representação de interesses se deve, em grande medida, à super-representação dos grandes grupos empresariais, presentes nos cargos de direção da quase totalidade das associações. 29 Cito trecho de entrevista de Gabriel Aguirre, diretor da Coordenação para Assuntos Legislativos da Coparmex: “Em julho de 2003 se criou a área de assuntos legislativos na Coparmex, já que há algum tempo percebemos que as principais decisões do país têm passado pelo Congresso Nacional. Em verdade as organizações empresariais não tinham claro, até há pouco, qual a função do lobby legislativo e qual o seu nível de influência sobre as grandes decisões. Para o empresariado era difícil ter uma relação com o Congresso porque estávamos acostumados a uma forma de relação muito direta com o Governo Federal. Se tínhamos um problema fazendário, íamos conversar diretamente com o Ministro da Fazenda. Atualmente estamos desenvolvendo grupos temáticos de trabalho, que tratam de fazer lobby, de influir, a partir de propostas tecnicamente sustentadas e politicamente viáveis.” – El Independiente, 30/07/2003.. 30 Muito recentemente as grandes associações empresariais mexicanas passaram a oferecer um conjunto de serviços a seus associados, a fim de garantir a manutenção e o aumento de seus quadros e melhorar a percepção deles sobre a qualidade da função representativa por elas desempenhada. Passam, além disso, por um processo de profissionalização, com a contratação de pessoal especializado e a adoção de parâmetros modernos de gestão. 27 suas entidades de representação aos novos arranjos institucionais que aos poucos vão sendo construídos provavelmente será lenta.31 32 Em meio à crise do governo Fox, à recessão econômica, ao desgaste das organizações empresariais e ao desalento generalizado da sociedade mexicana com as reformas políticas e econômicas levadas a cabo nas últimas décadas, Carlos Slim, o maior empresário latino-americano, parece desencantado com o atual presidente, a quem apoiou na última eleição, e também descrente na eficiência do lobby legislativo. A um só tempo aproxima-se de outros mega-empresários latino-americanos e estabelece uma relação política direta com Andrés Lopez Obrador, governador do Distrito Federal filiado ao PRD. Cotado para ser ele próprio o próximo presidente da república, Slim prefere o papel de grande eleitor, e faz de Obrador um forte candidato para as eleições de 2006, apostando talvez no PRD como última alternativa institucional para a superação das recorrentes crises mexicanas através da fundação de um novo modelo de desenvolvimento, de caráter social e orientado para o mercado doméstico. Conclusões No presente texto buscamos identificar e analisar as novas formas de organização e atuação do grande empresariado industrial latino-americano nos últimos anos, já sob os impactos das reformas econômicas orientadas ao mercado e da consolidação das instituições democráticas, tomando como objeto de reflexão os casos da Argentina, Brasil e México. Sustentamos a hipótese de que as mudanças na economia, com a abertura comercial, a reorganização da propriedade do capital e o deslocamento do eixo dinâmico da geração de valor para as forças de mercado diminuíram, de maneira significativa, a margem 31 Cito a seguir trechos da entrevista de Juan Manuel Baltrán, diretor de análise política da Coparmex: “O empresariado têm diversificado suas estratégias para influir na tomada de decisões do governo. As grandes empresas continuam a financiar candidatos aos poderes legislativo e executivo, nos mais diversos níveis, e os empresários em geral estão convencidos da necessidade de aumentar a prática dos lobbies, desde as prefeituras até o Congresso Nacional. Mas não existem regras definidas para a atuação nesse processo de transição e alternância política que estamos vivendo. Antes era fácil almoçar com um funcionário do Estado e resolver um problema, agora é mais difícil, mais complexo (...) Um processo de maior democracia exige maior participação social, estávamos acostumados a que viessem a nós, nos chamassem. Tem sido trabalhoso adotar novas posturas, desenvolver novas regras, criar novos instrumentos, ocupar novos espaços. As organizações empresariais estão em processo de redefinição, talvez em alguns anos surjam novas entidades, e as que existem provavelmente terão mudado sua forma de ser, é algo que está se dando. Estamos trabalhando com um pacote de regras antigas, que já não funcionam, e logo nos deparamos com uma zona de vazios aonde não temos como trabalhar e como resolver os desafios que se apresentam. E isso tem provocado dificuldade no relacionamento com o governo Fox, porque do lado do governo lhes tem custado muito trabalho clarificar as regras para estabelecer novas relações com a sociedade civil.“– El Independiente, 06/08/2003. 32 Cito trecho do discurso de Yeidckol Polevnsky, presidente da Canacintra, despedindo-se dos deputados da legislatura que se encerra em 2003: “Estamos indubitavelmente ante um divisor de águas na vida democrática, política e social do México, e sentimos que vale a pena perguntarmos qual segue sendo nosso objetivo central e prioritário. Com uma visão autocrítica, asseguraria que nosso objetivo prioritário é unir nossos pontos de vista e nossas forças para construir, junto com os Poderes Legislativo e Executivo, os acordos que necessitamos os industriais, os empresários, os trabalhadores e em geral, todos os mexicanos, para fazer valer todos o potencial que temos como país. Os novos tempos não requerem dos grupos que busquem unicamente gerar benefícios a setores privilegiados, mas que tenham uma visão de desenvolvimento integral para o México ” – Cidade do México, agosto de 2003. 28 de atuação do Estado na formulação de políticas públicas em geral e da política econômica em particular. Ao mesmo tempo, o avanço da democracia nos contextos brasileiro e mexicano, provocou um rearranjo institucional no qual há uma nova relação de poder entre Executivo e Legislativo, a qual ainda não pode ser avaliada no caso argentino por conta da gravidade da crise institucional derivada da falência do modelo econômico adotado nos anos 90. As transformações na atuação empresarial também aproximam os casos brasileiro e mexicano, na medida em que nos dois países, embora em ritmos e intensidades diversos, observa-se um processo crescente de profissionalização da gestão das associações empresariais e a criação de novas modalidades de atuação, direcionadas a diferentes instâncias do aparato estatal. Apesar da diminuição, em maior ou menor grau, da margem de manobra do Estado em relação ao desenvolvimento econômico, ele continua a exercer, por sua iniciativa ou mesmo por sua ausência, o papel de indutor das formas de organização e ação coletiva do empresariado enquanto ator coletivo. O caso brasileiro nos mostra que é pela iniciativa do Estado, através da transformação institucional operada desde as reformas, que se enseja a criação de novas modalidades de organização e ação coletiva por parte dos segmentos empresariais, os quais se adaptam com relativa rapidez e criatividade ao novo cenário. Diante de uma institucionalidade mais complexa e de um ambiente econômico mais competitivo, a criação de novas entidades pauta-se por demandas em relação a temas específicos e pelo estabelecimento de canais de articulação direcionados a instâncias determinadas do aparato estatal, contribuindo para a maior fragmentação da representação coletiva do empresariado e para as a reiteração das dificuldades no estabelecimento de projetos coletivos. No caso mexicano, as evidências até agora captadas pressupõem que, devido ao avanço da democracia e devido à inação do Estado, e especialmente do Poder Executivo, têm se conformado os novos padrões de ação política das classes empresariais. Não se pode imaginar em relação ao grande empresariado daquele país, transformações rápidas nas modalidades de organização da representação coletiva, ainda que o associativismo empresarial viva uma crise de legitimidade interna. Por sua complexidade e abrangência, a estrutura associativa mexicana não tem passado por modificações significativas. O que está mudando são os padrões de ação empresarial enquanto ator coletivo, que apontam para duas tendências opostas e contraditórias, representadas pela priorização da atuação junto ao Poder Legislativo e pela intensificação da pressão sobre as instâncias decisórias do Executivo, através da participação direta nas mesmas. Embora muito mais sólida que a estrutura corporativa brasileira, a organização dos interesses empresariais no México apenas muito recentemente tem adquirido alguma flexibilidade para lidar com os novos arranjos institucionais que têm se configurado no país. A crise relativa enfrentada pelas principais associações empresariais do país provavelmente será superada pela sua capacidade de adaptação ao novo ambiente institucional, levando em conta os interesses das classes empresariais em termos globais. A análise do caso argentino, por sua vez, dada a especificidade de seu momento histórico, enseja mais a formulação de novas indagações que de hipóteses explicativas. Por um lado mantêm-se a tendência de surgimento de novas organizações de representação de interesses do empresariado. Por outro, diante de instituições enfraquecidas pela crise 29 econômica e política, observa-se a reiteração da atitude das classes empresariais de buscar, através de sua capacidade de pressão sobre o Estado, a superação de suas dificuldades particulares. Dado, porém, o enfraquecimento dos próprios empresários não apenas como atores políticos, mas principalmente como entes econômicos, há uma oportunidade de que a ação coletiva do empresariado se torne, efetivamente, coletiva, sintonizada com a necessidade da reconstrução das instituições e com os anseios dos demais segmentos da sociedade. Tendo em vista o drama argentino, talvez a indagação mais instigante sobre o país refira-se à opção histórica que se apresenta aos grandes empresários argentinos entre apoiar um governo progressista na tentativa de reconstrução do país ou optar, uma vez mais, pela maximização de benefícios particulares às expensas do restante da nação. A comparação entre os três casos, em que pese a complexidade e a particularidade de cada um deles, permite concluir que as novas modalidades de organização e atuação do empresariado nacional são, em grande medida, respostas à ação do Estado. Numa época em que o eixo dinâmico da economia é deslocado para o mercado, e em grande medida as prioridades em relação às políticas são pautadas pela lógica do capital internacional, o empresariado doméstico aparece como um ator de importância relativa no ambiente econômico e no cenário político, tendo nas iniciativas do Estado as referências para sua atuação. Assim como nos anos 90, quando pela iniciativa do Estado o empresariado nacional, especialmente o de grande porte, pôde participar dos processos de tomadas de decisões, reagir a eles ou simplesmente tentar tirar proveito deles, nos dias atuais permanece o Estado jogando papel fundamental na sua relação com os atores sociais em geral e com os empresários nacionais em particular. A qualidade da resposta que estes darão à iniciativa dos governos dependerá de sua capacidade de adaptação às novas condições políticas e econômicas de cada contexto. 30 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ACUÑA, Carlos – “Political Struggle and Business Peak Associations: Theoretical reflexions on the Argentine case” – in Durand, Francisco and Silva, Eduardo (editors) – Organized Business, Economic Change, Democracy in Latin America – Miami: North-South Center Press, 1998 ACUÑA, Carlos – “Business Interests, Dictatorship, and Democracy in Argentina” – in Bartell, Ernest and Payne, Leigh (editors) – Business and Democracy in Latin America – Pittsburgh and London: University of Pittsburgh Press, 1995 ALBA VEGA, Carlos. 2000 – “México y sus perspectivas para el siglo XXI” – Klauke, Barbara (Coord.) - Regionalwissenschaft Lateinamerikas – Westaliche-WilhelmsUniversitat Munster. Munster, Lit. BOTELHO, Marisa; MENDONÇA, Maurício – “As políticas de apoio à geração e difusão de tecnologias para as pequenas e médias empresas no Brasil” – CEPAL: Série Desarrollo Productivo, Julio de 2002. BOSCHI, Renato – “O Estado e o Setor Privado no Cenário Pós-Reformas: Novas Modalidades de Regulação” – Paper apresentado no Seminário “Brasil, Mudanças Recentes e Perspectivas” – Pent Fundation, Buenos Aires, dezembro de 2002 CHAND, Vikram – Mexico´s Political Awakening – Notre Dame: University of Notre Dame Press, 2001 DINIZ, Eli e BOSCHI, Renato – “Reformas econômicas e perspectivas do capitalismo no Brasil dos anos 90: Empresário Democracia e Equidade” – Paper apresentado no 3º Encontro da Associação Brasileira de Ciência Política (ABCP) – Niterói, julho de 2002 DINIZ, Eli e BOSCHI, Renato – “Associativismo e trajetória política do empresariado brasileiro na expansão e declínio do Estado desenvolvimentista” - Teoria & Sociedade, nº 5, Belo Horizonte, 2000, pp. 48-81 DINIZ, Eli e BOSCHI, Renato – “Empresários e Poder Legislativo no Brasil Contemporâneo” - Paper apresentado no XIV Encontro da Associação Nacional de Pós-Graduação em Ciências Sociais (ANPOCS) – Petrópolis, outubro de 2000 FERRER, Florencia e Crenzel, Emílio – “A Crise Argentina e o Futuro da Democracia” – Paper apresentado em reunião do Grupo de Estudos Brasil – Argentina, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo em abril de 2003. IGLECIAS, Wagner – “Contribuições recentes do empresariado latino-americano à consolidação democrática: Brasil e México em perspectiva comparada” - Paper apresentado no III Workshop Empresa, Empresário e Sociedade – Curitiba, setembro de 2002 KINGSTONE, Peter – “Why Free-Trade ‘Losers´ Support Free-Trade Industrialists and the Surprising Politics of Trade Reform in Brazil” – March, 2001 KINGSTONE, Peter – Crafting Coalitions:for Reform. Business Preferences, Political Institutions and Neoliberal Reform in Brazil - University Park: Pennsylvania State University Press, 1999 Kosacoff, KOSACOFF, Bernardo “Repensando la Industralización Argentina” – Enoikos, Revista de la Facultad de Ciéncias Económicas de la Universidad de Buenos Aires, novembro de 2001 31 KOSACOFF, Bernardo (editor) – Corporate Strategies under Structural Adjustment in Argentina: responses by industrial firms to a New Set of Uncertainties – New York: St. Martin´s Press, Inc., 2000. LEOPOLDI, Maria Antonieta - Política e Interesses: As Associações Industriais, a Política Econômica e o Estado. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 2000 LINDENBOIM, Javier – “El Empresariado Industrial Argentino y sus Organizaciones Gremiales entre 1930 y 1946” – Desarrollo Económico, vol. XVI, nº 62, 1976. LUNA, Matilde; TIRADO, Ricardo; VALDÉS, Francisco – “Businessmen and Politics in México – 1982-1986” in Maxfield, Sylvia and Montoya, Ricardo – Government and Private Sector in Contemporary Mexico – San Diego: Center for U.S.-Mexican Studies, 1987 NOCHTEFF, Hugo – “La Política Económica de la Argentina en los Noventa: una mirada de conjunto” – Paper apresentado no Seminário “Economia, Tecnologia y Gestión”. Universidade de Buenos Aires, 1998 OLSON, Mancur – A Lógica da Ação Coletiva: Os Benefícios Públicos e uma Teoria dos Grupos Sociais – São Paulo: Edusp, 1999 Ortiz, Alicia – “El Consejo Mexicano de Hombres de Negócios: órgano de acción política de la elite empresarial” – Revista Mexicana de Sociologia – Ano LXV, nº 1, 2002, pp. 101-139 SALLUM, Brasílio - “Globalização e Desenvolvimento: A Estratégia Brasileira dos Anos 90” – Novos Estudos Cebrap, n º 58, novembro de 2000 SCHNEIDER, Ben Ross – “Why is Mexican Business so Organized?” – Latin American Reserach Review, 37, 2002 SCHNEIDER, Ben Ross – “Business Politics and Regional Integration: The Advantadge of Organization in Nafta and Mercosur” – October 2000 SCHNEIDER, Ben Ross – The State and Collective Action: The Politics of Organizing Business in Latin America” – February 2000 SCHORR, Martin – “Mitos y Realidades del Pensamiento Neoliberal: la evolución de la indústria manufacturera argentina durante la década de los noventa” – Flacso, Argentina, 2002. SCHVARZER, Jorge – “Los Grandes Grupos Económicos Argentinos. Una larga y poco convencional retirada estratégica” – Nueva Sociedad, 151: 88-101, 1997 TAPIA, Jorge & SARTI, Fernando – “A Agenda dos Empresários e a Questão do Desenvolvimento – A Visão do IEDI” – Paper apresentado no XVI Encontro da Associação Nacional de Pós-Graduação em Ciências Sociais (ANPOCS) – Caxambu, outubro de 2002 TEICHMAN, Judith - Privatization and Political Change in México – Pittsburgh: Univeristy of Pittsburgh Press, 1995 VALDÉS UGALDE, Jose Luis. – “Nafta and México: A Sectoral Analysis” in Chambers, Edward & Smith, Peter (ed.). 2002 – Nafta in the New Millenium – La Jolla; Edmonton: Center for U.S.-Mexican Studies; The University of Alberta Press 32 Periódicos CLARÍN – Kirchner pedió en la Bolsa más inversión y menos especulación – 11/07/2003 CLARÍN – La UIA pedió que el dólar no baje de três pesos – 05/06/2003 CLARÍN – En medio a la crisis, crean una poderosa agrupación empresária – 29/05/2002 CLARÍN – Según la UIA, se necesita de una burguesia nacional – 26/05/2003 CLARÍN – Se unen 8 cámaras de la produción, el comércio y la banca – 07/05/2003 CLARÍN – Alvarez gañó en la UIA – 23/04/2003 CLARÍN – Los industriales van hoy a las urnas – 22/04/2003 CLARÍN – Disputa por el manejo de la UIA – 18/03/2003 EL INDEPENDIENTE – Entrevista com Gabriel Aguirre – 30/07/2003 EL INDEPENDIENTE – Entrevista com Juan Beltran – 06/08/2003 FOLHA DE SÃO PAULO – Gerdau teme aumento de impostos – 25/06/2003 FOLHA DE SÃO PAULO Gerdau elogia reforma, mas afirma que faltam pontos importantes – 21/04/2003 FOLHA DE SÃO PAULO - Empresário já não teme PT, mas apóia FHC - 22/10/2001 FORBES – “Slim Fest: Latin America´s Billionaires Talk Things Over” – 06/09/2003 FORBES – “Secret Meeting of Latin American Billionaires” – 23/05/2003 ISTOÉ DINHEIRO – Entrevista com Ivoncy Ioschpe – 13/03/2002 ISTOÉ DINHEIRO – Entrevista com Alcides Tápias – 20/12/2001 ISTOÉ DINHEIRO – Entrevista com Horácio Lafer Piva – 26/10/2001 ISTOÉ DINHEIRO – Entrevista com Eugênio Staub – 31/08/2001 ISTOÉ DINHEIRO – Entrevista com Eduardo Eugênio Gouvêia Vieira – 10/08/2001 LA JORNADA “Respalda el Consejo Mexicano de Hombres de Negócios las críticas de Garza Medina al gobierno foxista” – 05/06/2003 LA JORNADA – “La participación de empresários en la política agudizará la corrupción” 22/04/2003 LA NACIÓN – La UIA se queda de no tener diálogo – 13/07/2003 LA NACIÓN – Se apresta a resurgir el Grupo de los Ocho – 03/05/2003 LA NACIÓN – Que quiere AEA del país – 12/04/2003 PAGINA 12 – Golpe al mentón al titular de la UIA – 06/06/2003 PAGINA 12 – Alvarez Gaiani, en otra sintonia – 05/06/2003 PAGINA 12 – Precaución y buenas ondas: primeras reacciones del establishment al gobierno – 26/05/2003 PAGINA 12 – Ahora, barajar y dar de nuevo: se vienen reacomodamientos en el mundo empresarial – 29/04/2003 PAGINA 12 – Precaución y buenas ondas: primeras reaciones del establishment al gobierno – 26/04/2003 PAGINA 12 – No se fueron, pero vuelven – 23/04/2003 PAGINA 12 – “Ellos tienen una visión anticuada, no les preocupa generar riquezas” – 16/04/2003 PAGINA 12 – Libreto conocido y gastado: las grandes empresas proponen la agenda económica – 03/04/2003 PAGINA 12 – La UIA, sin unidad, a las urnas – 22/03/2003 PAGINA 12 – Rebelión en la granja – 21/03/2003 PAGINA 12 – Un lobby empresário para los tiempos que corren – 28/05/2002 33 QUEHACER POLÍTICO – “Más influyente que los presidentes de la República: Slim, de Telmex a Los Pinos” – 03/06/2003 Sites Associação Empresária Argentina – http://www.aeanet.net Confederação Nacional da Indústria – http://www.cni.org.br Confederação Patronal da República Mexicana – http://www.coparmex.org.br Conselho Coordenador Empresarial – http://www.cce.org.mx Federação das Indústrias do Estado de São Paulo – http://www.fiesp.com.br Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial – http://www.iedi.org.br União Industrial Argentina – http://www.uia.org.ar 34 ANEXO I Apoio incondicional CNPP CNPC Apoio moderado Canacintra Posição intermediária Canaco Mex CNG AMIS CMHN Oposição moderada Concamin CCE Camco Oposição aberta Coparmex Concanaco Fonte: Luna, Tirado e Valdés, 1987 CNPP – Confederação Nacional da Pequena Propriedade CNPC – Confederação Nacional de Câmaras de Pequeno Comércio Canacintra – Câmara Nacional da Indústria de Transformação Canaco Mex – Câmara Nacional de Comércio da Cidade do México CNG – Confederação Nacional Pecuária AMIS – Associação Mexicana de Instituições de Seguro CMHN – Conselho Mexicano de Homens de Negócios Concamin – Confederação de Câmaras Industriais dos Estados Unidos Mexicanos CCE – Conselho Coordenador Empresarial Camco – Câmara Americana de Comércio Coparmex – Confederação Patronal da República Mexicana Concanaco – Confederação Nacional de Câmaras de Comércio 35 ANEXO II Estado Estrutura de representação Formas de ação coletiva Argentina Enfraquecido pela crise institucional e econômica dos últimos anos Permanência da tendência de criação de novas entidades, a partir de demandas conjunturais e pontuais; disputa de hegemonia entre UIA e AEA Permanência do padrão anterior de acesso direto ao núcleo do Executivo Brasil México Redesenhado, ainda Momento de inação, com raio de ação estrutura burocrática significativo, embora encabeçada por um menor que no modelo partido político mas anterior controlada por outro; diminuição da capacidade de intervenção por conta da dependência ao Nafta Tornada mais Permanência da complexa e estrutura atual, que fragmentada, com enfrenta crise de novas modalidades legitimidade e busca de organização; adaptar suas formas ausência de entidade de atuação à nova de cúpula conjuntura política do país Valorização do lobby Duas tendências no Legislativo e opostas: valorização canalização das do lobby no demandas para Legislativo e instâncias específicas participação direta do Executivo em postos-chave no Executivo 36