FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA Fundação Oncocentro de São Paulo Comitê de Fonoaudiologia em Cancerologia 2000 Governo do Estado de São Paulo Mário Covas Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo José da Silva Guedes Fundação Oncocentro de São Paulo – FOSP Presidência Maria Cecília M. M. Azevedo Corrêa Diretoria Técnico-Científica Jorge Sabbaga Diretoria Administrativa e Financeira Antonio de Oliveira Netto FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA Organizadoras Ana Paula Brandão Barros Lica Arakawa Monique Donata Tonini Viviane Alves de Carvalho Fundação Oncocentro de São Paulo Comitê de Fonoaudiologia em Cancerologia 2000 COMITÊ DE FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO Coordenadora Geral: Viviane Alves de Carvalho – Fundação Oncocentro de São Paulo Coordenadora da Comissão Científica: Ana Paula Brandão Barros – Hospital do Câncer – A. C. Camargo Coordenadora da Comissão de Divulgação: Lica Arakawa – Instituto Brasileiro do Controle do Câncer São Camilo Secretária: Fernanda Camargo Membros Participantes: Monique Donata Tonini – Hospital das Clínicas Jane Cinira Morais Alexandre Nivia Maria da Silva Martins – Hospital do Câncer – A. C. Camargo Teresa Cristina Diniz Amaral – D’ Alfa ORGANIZADORAS Ana Paula Brandão Barros Fonoaudióloga do Centro de Tratamento e Pesquisa do Hospital do Câncer – A.C. Camargo (SP); Fonoaudióloga do Instituto de Otorrinolaringologia da UNIFESPEPM; Fonoaudióloga da Clínica Neuro Center (Santos); Coordenadora da Comissão Científica do Comitê de Fonoaudiologia em Cancerologia da Fundação Oncocentro de São Paulo – FOSP; Mestranda em Fisiopatologia Experimental pela Faculdade de Medicina da USP. Lica Arakawa Fonoaudióloga do Instituto Brasileiro de Controle do Câncer – São Camilo – IBCCSC; Coordenadora da Comissão de Divulgação do Comitê de Fonoaudiologia em Cancerologia – FOSP; Mestranda em Fisiopatologia Experimental pela Faculdade de Medicina da USP. Monique Donata Tonini Fonoaudióloga da Disciplina da Cirurgia de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital das Clínicas – FMUSP; Membro do Comitê de Fonoaudiologia da Fundação Oncocentro de São Paulo; Mestranda em Fisiopatologia Experimental pela Faculdade de Medicina da USP. Viviane Alves de Carvalho Fonoaudióloga da Fundação Oncocentro de São Paulo; Fonoaudióloga do Instituto de Otorrinolaringologia da UNIFESP-EPM; Coordenadora Geral do Comitê de Fonoaudiologia em Cancerologia; Mestranda em Fisiopatologia Experimental pela Faculdade de Medicina da USP. FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO COLABORADORES Adriana C. Alves Batista Assistente Social da Universidade de Franca. Agrício Crespo Chefe do Serviço de Cabeça e Pescoço e Coordenador da Disciplina de Otorrinolaringologia da Faculdade de Ciências Médicas – UNICAMP. Almir A. Feitosa Odontologista do Instituto do Câncer Arnaldo Vieira de Carvalho. Ana Lúcia Spina Fonoaudióloga Responsável pelo Setor de Fonoaudiologia do Serviço da Disciplina de Otorrinolaringologia, Cabeça e Pescoço da UNICAMP; Especialista em Voz pelo CECEV; Mestranda em Ciências Médicas FCM – UNICAMP. Ana Paola Forte Fonoaudióloga do Hospital Albert Einsten; Curso de Aperfeiçoamento em Voz com Área de Concentração na Reabilitação à Pacientes Oncológicos pela Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. Andréa Dishtchekenian Fonoaudióloga Mestre em Distúrbios da Comunicação Humana: Campo Fonoaudiológico pela Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina. Andrea Sguizzardi Especialista em Voz com Área de Concentração na Reabilitação à Pacientes Oncológicos pela Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. Antonio André M. Perdicaris Professor Titular de Oncologia – Faculdade Ciências da Saúde / UNIMES; Membro Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia de Cabeça e Pescoço; Titular do Colégio Brasileiro de Cirurgiões (TCBC); Fellow do American College of Surgeons (FACS) e Membro Titular da Academia de Medicina do Estado São Paulo. Antonio José Gonçalves Professor Adjunto de Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo. 6 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA Antonio Sérgio Petrilli Professor, Doutor e Chefe do Setor de Oncologia Pediátrica do Departamento de Pediatria da Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina. Belmiro José Matos Mestre pelo Departamento de Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo; Supervisor do Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital Santa Marcelina – São Paulo. Carlos Jorge Lotfi Infectologista responsável pelo Serviço de Infectologia e Controle de Infecção do Centro de Tratamento e Pesquisa do Hospital do Câncer - A. C. Camargo (SP); Mestre em Infectologia pela UNIFESP-EPM e doutorando pelo Centro de Tratamento e Pesquisa do Hospital do Câncer - A. C. Camargo (SP). Cássia A. Campos Fonoaudióloga clínica. Concentina D’Amico Psicóloga do Hospital Ipiranga. Cristiane Marangom Fonoaudióloga clínica; Especialista em Voz com Área de Concentração na Reabilitação à Pacientes Oncológicos pela Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. Cristina Lemos Barbosa Furia Fonoaudióloga do Centro de Tratamento e Pesquisa do Hospital do Câncer - A. C. Camargo (SP); Mestranda em Fisiopatologia Experimental pela Universidade de São Paulo – USP; Docente do Curso de Fonoaudiologia da Universidade São Francisco. Daniela Tsyeme Mekaru Fonoaudióloga clínica; Especialista em Voz com Área de Concentração na Reabilitação à Pacientes Oncológicos pela Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. Denise Emitia Andrade Facuri Psicóloga da Universidade de Franca. Elaine S. Figueiredo Fonoaudióloga clínica; Especialista em Voz com Área de Concentração na Reabilitação à Pacientes Oncológicos pela Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo 7 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO Elisabete Carrara-de Angelis Coordenadora do Departamento de Fonoaudiologia do Centro de Tratamento e Pesquisa do Hospital do Câncer - A.C. Camargo (SP); Mestre em Distúrbios da Comunicação Humana e Doutora em Neurociências pela UNIFESP-EPM; Docente do Centro Universitário São Camilo e do CEFAC. Erica E. Fukuyama Médica do Instituto do Câncer Arnaldo Vieira de Carvalho. Flávio A.P. Settani Médico do Instituto do Câncer Arnaldo Vieira de Carvalho. Gláucia B. Rocha Fonoaudióloga clínica. Hugo V.L. Ramos Médico do Instituto do Câncer Arnaldo Vieira de Carvalho. Irene Shimura Médica do Serviço de Medicina Nuclear do Hospital Samaritano e do Instituto do Câncer Arnaldo Vieira de Carvalho. Irma Helena E B. Bomfim Psicóloga da Universidade de Franca. José E Góis Filho Médico do Instituto do Câncer Arnaldo Vieira de Carvalho. Kariane Peixoto Fernandes Psicóloga da Disciplina de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do ICHC – FMUSP. Karin Schultz Fisioterapeuta Titular do Hospital do Câncer-A.C.Camargo; Coordenadora do Curso de Aprimoramento em Fisioterapia Oncológica do Hospital do Câncer; Mestranda em Oncologia pelo Centro de Tratamento e Pesquisa do Hospital do Câncer. Laélia C. Vicente Especialista em motricidade Oral 975/00; Mestre em Distúrbios da Comunicação pela PUC–SP; Docente do Curso de Fonoaudiologia do Centro Superior de Vila Velha – UVV. 8 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA Laércio Martins Professor Instrutor do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo; Mestre em Cirurgia Ge ral Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo. Lara Scupino Borges Nutricionista do Ambulatório do Instituto Halsted de Curitiba. Leda Vasconcellos Especialista em Voz com Área de Concentração na Reabilitação à Pacientes Oncológicos pela Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo; Mestre em Ciências pela UNICAMP. Letícia Lessa Mansur Professora Assistente – Doutora do Departamento de Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional da FMUSP. Liane Wannmacher Fonoaudióloga clínica; Especialista em Voz com Área de Concentração na Reabilitação à Pacientes Oncológicos pela Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. Lilian Huberman Krakauer Mestre em Distúrbios da Comunicação pela PUC-SP; Especialista em Motricidade Oral; Membro do Corpo Clínico do CEFAC; Docente do CEFAC. Lucia Figueiredo Mourão Fonoaudióloga clínica; Mestre e Doutoranda em Neurociências pela UNIFESP-EPM. Luciana Passuelo do Vale Fonoaudióloga do Instituto do Câncer Arnaldo Vieira de Carvalho; Especialista em Voz com Área de Concentração na Reabilitação à Pacientes Oncológicos pela Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo; Fonoaudióloga do Instituto de Otorrinolaringologia da UNIFESP-EPM; Mestranda em Fisiopatologia Experimental pela Faculdade de Medicina da USP. Luciano R. Neves Médico do Instituto do Câncer Arnaldo Vieira de Carvalho Luiz Roberto Medina dos Santos Médico Assistente-Doutor da Disciplina de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. 9 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO Luiz H.F. Barbosa Médico do Instituto do Câncer Arnaldo Vieira de Carvalho. Magda Rodrigues Simões Fonoaudióloga da Universidade de Franca. Manoel J.R. Valle Neto Médico do Instituto do Câncer Arnaldo Vieira de Carvalho. Mara Rodrigues Luiz Fonoaudióloga e mestranda pela Faculdade de Psicologia da USP. Marcelo Doria Durazzo Médico e Doutor em Medicina pela Faculdade de Medicina da USP; Médico da Disciplina de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (DCCP HC-FMUSP). Maria Elisabete Bovino Pedalini Fonoaudióloga do Setor de Audiologia do Centro de Tratamento e Pesquisa do Hospital do Câncer - A.C.Camargo (SP). Maria Lúcia Nascimento Vidigal Mestranda em Fisiopatologia Experimental pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo; Graduada e Especializada pela Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina UNIFESP – EPM; Docente do CEFAC; Coordenadora da D ALFA. Maria Lúcia da Silva Cleto Fonoaudióloga Responsável pelo Setor de Fonoaudiologia em Oncologia da Clínica de ORL HC-FMUSP. Maria Regina de Oliveira Affonso Walter Autora do livro “Que Susto”. Maria Cecília Martinelli Iorio Professora Adjunto, Doutora e Chefe da Disciplina de Distúrbios da Audição do Departamento de Otorrinolaringologia e Distúrbios da Comunicação Humana da Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina. 10 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA Maria Valéria Schimidt Goffi Gomes Fonoaudióloga do Setor de Audiologia do Centro de Tratamento e Pesquisa do Hospital do Câncer - A.C.Camargo (SP); Fonoaudióloga da Divisão de Clínica Otorrinolaringologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP; Doutora em Ciências dos Distúrbios da Comunicação Humana pela UNIFESP-EPM. Marília S. Marone Diretora do Serviço de Medicina Nuclear do Hospital Samaritano e do Instituto do Câncer Arnaldo Vieira de Carvalho. Marina Lang Fouquet Mestranda em Fisiopatologia Experimental pela Universidade São Fonoaudióloga da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. Paulo; Marineide Prudencio de Carvalho Ex-residente do Hospital A C Camargo; Oncologista Clínico; Mestre em Oncologia pela Universidade de São Paulo; Assistente do Serviço de Hematologia e Hemoterapia da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. Marisa Frasson de Azevedo Professora Adjunto, Doutora do Departamento de Otorrinolaringologia e Distúrbios da Comunicação Humana da Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina. Mônica Mendes de Oliveira Fonoaudióloga clínica; Especializanda em Voz com Área de Concentração na Reabilitação à Pacientes Oncológicos pela Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. Nívia Maria da Silva Martins Fonoaudióloga do Centro de Tratamento e Pesquisa do Hospital do Câncer - A. C. Camargo (SP); Fonoaudióloga do Hospital Ribeirão Pires (SP); Mestranda em Ciências – Área de Oncologia da Fundação Antônio Prudente Hospital do Câncer – São Paulo; Membro da Comissão Científica do Comitê de Fonoaudiologia em Cancerologia da Fundação Oncocentro de São Paulo – FOSP. Onivaldo Cervantes Professor Adjunto Doutor da Disciplina de Otorrinolaringologia e Chefe do Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço da Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina. (UNIFESP- EPM). Patrícia Pécora Liberman Fonoaudióloga do Setor de Audiologia do Centro de Tratamento e Pesquisa do Hospital do Câncer - A.C.Camargo (SP). 11 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO Paulo J. Valentim Médico do Instituto do Câncer Arnaldo Vieira de Carvalho. Renata Furia Sanchez Fonoaudióloga do Departamento de Fonoaudiologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital Amaral Carvalho – Jaú / SP. Renata M. Soneghet Fonoaudióloga do Hospital Albert Einsten; Curso de Aperfeiçoamento em Voz com Área de Concentração na Reabilitação à Pacientes Oncológicos pela Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. Renata Valim de Souza Fisioterapeuta Titular do Hospital do Câncer - A.C.Camargo; Supervisora de Estágio das Faculdades Claretianas de Batatais -S.P. Roberta Busch Especialista em Voz com Área de Concentração na Reabilitação à Pacientes Oncológicos pela Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo; Mestranda em Neurociências pela UNIFESP-EPM; Professora Supervisora Cliníca da UNIBAN; Fonoaudióloga do Instituto de Otorrinolaringologia da UNIFESP-EPM; Curso de Especialização em Distúrbios da Comunicação Humana pela UNIFESP-EPM. Sofia Toniosso Estagiária do Setor de Audiologia do Centro de Tratamento e Pesquisa do Hospital do Câncer - A. C. Camargo (SP). Soraya Abbes Clapés Margall Fonoaudióloga, Doutora em Distúrbios da Comunicação Humana pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP - EPM); Docente do Curso de Fonoaudiologia do Centro Universitário São Camilo. Sueli Rosa Vieira Fonoaudióloga clínica; Especializanda em Voz com Área de Concentração na Reabilitação à Pacientes Oncológicos pela Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo; Teresa C.R.D.M. Amaral Especialista em Voz com Área de Concentração na Reabilitação à Pacientes Oncológicos pela Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo; Fonoaudióloga do D’Alfa. 12 APRESENTAÇÃO Dentre os vários critérios usados para a aferição do sucesso de um evento científico, constância e periodicidade de realização ocupam papel de destaque. A razão para esse fato é óbvia. A progressiva expansão de especialidades nas áreas da saúde, acabou gerando um aumento exponencialmente proporcional no número de encontros e congressos. Todos os dias, novos cartazes e folhetos aparecem anunciando a realização de mais um evento científico na área da saúde. Poucos porém, são os congressos que de fato divulgam progressos científicos ou assistenciais reais. Por carência de um conteúdo inovador, ou ainda por não encontrarem público que responda às suas expectativas, muitos eventos, que inicialmente ambicionavam uma determinada periodicidade, acabam tendo frustrada essa expectativa. Trajetória diametralmente contrária trilhou o evento “Encontro de Fonoaudiologia em Cancerologia”. Inaugurado despretensiosamente em dezembro de 1993, como iniciativa isolada do Serviço de Fonoaudiologia da FOSP, o evento tinha, naquela ocasião, o único objetivo de promover o congraçamento de profissionais que se iniciavam nessa nova especialidade. Desde então, esses encontros vem se realizando anualmente, organizados pelo Comitê de Fonoaudiologia em Cancerologia da Fundação Oncocentro de São Paulo. Como demonstram os diversos dados epidemiológicos disponíveis no país, o contigente de pacientes acometidos por neoplasias da região da cabeça e pescoço, ou que são terapeuticamente mutilados nessa topografia, é bastante grande. A necessidade de reabilitálos para as funções respiratórias, fonatórias e de deglutição é clara e acaba gerando uma demanda crescente para fonoaudiólogos capacitados a exercer essa tarefa. Poucos, no entanto, são os cursos de fonoaudiologia que durante a g raduação preparam o aluno para essa função específica. Nesse contexto, e sem dúvida nenhuma, também em função da seriedade e do profissionalismo dos membros do Comitê, os Encontros acabaram se tornando um dos mais respeitáveis eventos fonoaudiológicos do país. A publicação que ora apresentamos demonstra essa afirmação. Contendo artigos extraídos de apresentações realizadas em vários dos Encontros, Fonoaudiologia em Cancerologia é publicação que há muito vem sendo aguardada pela comunidade fonoaudiológica. São 39 capítulos que versam sobre os mais diversos aspectos da reabilitação. A multiplicidade de assuntos coaduna-se com a constante ênfase na abordagem multidisciplinar dada pela maioria dos autores. O livro reúne algumas das aulas e trabalhos 13 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO científicos originais apresentados do II(1994), até o último Encontro, realizado em outubro do ano passado. O critério de inclusão baseou-se na abrangência e importância do assunto e, evidentemente, na disponibilidade do texto. Alguns dos palestrantes convidados não nos entregaram a aula manuscrita em tempo hábil de publicação. Através de capítulos contendo informações essencialmente técnicas, mesclados com outros de conteúdo conceituai geral, o texto consegue abordar aspectos referentes a todas as áreas profissionais envolvidas na reabilitação do paciente oncológico, especialmente na região de cabeça e pescoço. Na organização dos capítulos optamos por agrupá-los de acordo com a especialidade correspondente. Embora pautados pela mensagem multidisciplinar que permeia a totalidade dos textos, entendemos que dessa maneira a leitura não linear do texto fica facilitada. Separamos também, apenas com intuito didático, os capítulos que descrevem estudos experimentais pela primeira vez divulgados nesse formato. O volume traz ainda dez relatos sobre a atividade de serviços de fonoaudiologia que se dedicam a reabilitação oncológica e, portanto, serve também como um guia para profissionais e estudantes que procuram estágios ou qualquer forma de aperfeiçoamento. Vale ressaltar que as instituições que oferecem este atendimento não se limitam às apresentadas, pois algumas não puderam encaminhar seus relatos. Enfim, Fonoaudiologia em Cancerologia é texto de excelente qualidade que certamente vai ocupar importante papel na literatura não só fonoaudiológica, mas de todas as áreas da saúde. A Fundação Oncocentro de São Paulo sente-se honrada e orgulhosa por estar contribuindo com mais essa obra à comunidade. Jorge Sabbaga Diretor Técnico Científico Novembro/2000 14 SUMÁRIO Parte I –Temas abordados nos Encontros de Fonoaudiologia em Cancerologia Capítulo 1 Atualidades em Cabeça e Pescoço Câncer da Cavidade Oral .......................................... Marineide Prudencio de Carvalho 25 Capítulo 2 Desafios Bio-Psico-Sociais no Controle do Câncer da Cavidade Oral ........................... A. André M. Perdicaris 28 Capítulo 3 Detecção Precoce e Prognóstico do Câncer da Boca ........................................................ Marcelo Doria Durazzo 32 Capítulo 4 Laringectomias Parciais ....................................................................................................... Belmiro José Matos 38 Capítulo 5 Laringectomia Quase-Total (Near-Total Laryngectomy).................................................. Luiz Roberto Medina dos Santos 48 Capítulo 6 Laringectomias Endoscópicas com Laser de Co2: Considerações Terapêuticas e de Reabilitação ............................................................................................ Ana Lúcia Spina Agrício Crespo 53 Capítulo 7 Liga de Prevenção e Controle do Câncer da Cavidade Oral – abordagem multidisciplinar do câncer oral em hospital – escola .......................................................................................... 59 Marcelo Doria Durazzo 15 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO Capítulo 8 O Câncer de Cabeça e Pescoço e a Equipe Multidisciplinar............................................. Onivaldo Cervantes 62 Capítulo 9 O Convívio Interdisciplinar e a Formação Profissional..................................................... Belmiro José Matos 68 Capítulo 10 O Convívio Interdisciplinar e o Papel da Fonoaudiologia................................................. Laélia Cristina C. Vicente 72 Capítulo 11 Reabilitação Fonoaudiológica após as Laringectomias Parciais ....................................... Renata Fúria Sanchez 78 Capítulo 12 Reabilitação na Laringectomia Total................................................................................... Maria Lúcia da Silva Cleto 83 Capítulo 13 Considerações Sobre os Tipos de Reconstrução de Cavidade Oral na Fonoarticulação..................................................................................................................... Lica Arakawa 87 Capítulo 14 Influência das Próteses Obturadoras e Rebaixadoras de Palato na Terapia Fonoaudiológica...................................................................................................... Viviane Alves de Carvalho 93 Capítulo 15 Atuação Fonoaudiológica nas Paralisias Faciais ................................................................ Marina Lang Fouquet 99 Capítulo 16 O Papel do Audiologista no Tratamento do Paciente com Câncer................................... Maria Elisabete Bovino Pedalini Sofia Toniosso M. Valéria Schmidt Goffi 16 105 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA Capítulo 17 Emissões Otoacústicas em Crianças com Retinoblastoma ................................................ Patricia Helena Pecora Liberman 110 Capítulo 18 Atuação Fonoaudioló gica em Unidade de Terapia Intensiva............................................ 115 Ana Paula Brandão Barros Nívia Maria da Silva Martins Elisabete Carrara-de Angelis Cristina Lemos Barbosa Furia Carlos Jorge Lotfi Capítulo 19 Atuação Fonoaudiológica em Tumores do SNC ................................................................ Mara Rodrigues Luiz Letícia Lessa Mansur 121 Capítulo 20 Atuação Fonoaudiológica nas Paralisias Laríngeas............................................................ Monique Donata Tonini 145 Capítulo 21 Desafios e Perspectivas no Tratamento do Câncer da Boca e Orofaringe: Reabilitação Fonoaudiológica das Disfagias ...................................................................... Laélia Cristina C. Vicente 152 Capítulo 22 Nutrição em Pacientes com Câncer de Cavidade Oral....................................................... Lara Scupino Borges 159 Capítulo 23 Atuação Fisioterapêutica na Cirurgia de Cabeça e Pescoço.............................................. Karin Schultz Renata Valim de Souza 164 Capítulo 24 Relato de uma Experiência na Associação Brasileira dos Laringectomizados................ Concentina D’Amico 17 169 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO Capítulo 25 Cartilha Informativa em Cirurgia de Cabeça e Pescoço .................................................... Kariane Peixoto Fernandes 171 Capítulo 26 Trabalho Integrado de Fonoaudiologia, Psicologia e Serviço Social para Atendimento ao Paciente Laringectomizado ...................................................................... Adriana C. Alves Batista Denise Emília Andrade Facuri Irma Helena F. B. Bomfim Magda Rodrigues Simões 173 Capítulo 27 Associações de Laringectomizados ..................................................................................... Maria Regina de Oliveira Affonso Walter 178 Parte II – Trabalhos Científicos apresentados nos Encontros de Fonoaudiologia em Cancerologia Capítulo 28 Neoplasias Cerebrais em Crianças e suas Repercussões para Deglutição........................ Maria Lúcia Nascimento Vidigal 183 Capítulo 29 Inteligibilidade de Fala nas Ressecções de Cavidade Oral................................................ Cristina Lemos B. Furia Elisabete Carrara-de Angelis Lúcia Figueiredo Mourão 186 Capítulo 30 Inteligibilidade de Fala em Pacientes com Ressecção de Tumor de Cavidade de Boca e/ou Orofaringe....................................................................................................... Marina Lang Fouquet Teresa C.R.D.M. Amaral Laélia C.C. Vicente 18 195 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA Capítulo 31 Relato de Um Caso: O Trabalho Fonoaudiológico em Um Paciente submetido a Glossectomia Total.......................................................................................... Lilian Huberman Krakauer 205 Capítulo 32 Aspectos Fonoaudiológicos no Pós-Operatório da Laringectomia Near-Total............... 207 Elaine S. Figueiredo Liane Wannmacher Ana Paola Forte Renata M. Soneghet Cláudia A. Campos Gláucia B. Rocha Laélia C. Vicente Capítulo 33 Avaliação Cintilográfica de Aspiração Orotraqueal Em Pacientes Laringectomizados Near-Total............................................................................................. Liane Wannmacher Elaine S. Figueiredo Laélia C. Vicente Ana Paola Forte Antonio J. Gonçalves Laércio Martins Irene Shimura Marília S. Marone 214 Capítulo 34 Inteligibilidade de Fala Eletrolaríngea de Laringectomizados Totais .............................. Elaine S. Figueiredo Liane Wannmacher Laélia C. Vicente 219 Capítulo 35 Laringectomizados Totais: Aspectos da Reabilitação Fonoaudiológica.......................... Daniela Tsyeme Mekaru Sueli Rosa Vieira Cristiane Marangom Mônica Mendes Carvalho Viviane Alves de Carvalho* Marina Lang Fouquet 19 226 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO Capítulo 36 Análise da Relação Entre os Fluxos de Ar Pulmonar e Esofágico na Emissão de Vogais da Língua Portuguesa em Indivíduos Laringectomizados............................... Soraya Abbes Clapés Margall 237 Capítulo 37 Laringectomia Parcial Supracricoídea: Avaliação Perceptiva Auditiva e Acústica da Voz..................................................................................................................... 246 Luciana P. Vale Teresa C. R.D. M. Amaral José F. Góis Filho Erica E. Fukuyama Paulo J. Valentim Manoel J.R. Valle Neto Luiz H. F. Barbosa Hugo V. L. Ramos Luciano R. Neves Flávio A. P. Settani Almir A. Feitosa Capítulo 38 Eficácia do Tratamento Fonoaudiológico nas Paralisias e nas Paresias Faciais Periféricas................................................................................................... Roberta Busch Andrea Sguizzardi Leda Vasconcellos Viviane Alves de Carvalho Marina Lang Fouquet 253 Capítulo 39 Monitorização Auditiva na Ototoxidade ............................................................................. Andréa Dishtchekenian Maria Cecília Martinelli Iorio Antonio Sérgio Petrilli Marina Frasson de Azevedo 20 260 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA Parte III – Relatos de Serviços de Atendimento Fonoaudiológico à Pacientes Oncológicos Relato 1 Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer / A. C. Camargo.......................... 273 Relato 2 Centro de Tratamento e Pesquisa Hospital do Câncer / A.C. Camargo Audiologia .......................................................................................................................... 275 Relato 3 Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo................................................... 276 Relato 4 Hospital das Clínicas / FMUSP - Disciplina de Cirurgia de Cabeça e Pescoço .............. 277 Relato 5 Hospital das Clínicas / FMUSP – Clínica de Otorrinolaringologia .................................. 279 Relato 6 Hospital Amaral Carvalho Jaú / SP ..................................................................................... 280 Relato 7 Fundação Oncocentro de São Paulo .................................................................................... 282 Relato 8 Hospital Ribeirão Pires ......................................................................................................... 283 Relato 9 Instituto do Câncer Arnaldo Vieira de Carvalho – ICAVC ............................................... 284 Relato 10 Instituto Brasileiro de Controle do Câncer.......................................................................... 21 286 Parte I TEMAS ABORDADOS NOS ENCONTROS DE FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA ATUALIDADES EM CABEÇA E PESCOÇO CÂNCER DA CAVIDADE ORAL Marineide Prudencio de Carvalho INTRODUÇÃO No Brasil, o número estimado de casos novos de câncer de cavidade oral, para o ano de 1999 é de 5.850 para cada 100.000 homens e de 2.100 para cada 100.000 mulheres, representando 3,03% da incidência geral dos cânceres. Em geral esses pacientes são alcoólatras, tabagistas e negligenciam a higiene oral. O risco de desenvolver uma neoplasia de origem epitelial na cavidade oral é diretamente proporcional à intensidade e à duração da exposição ao tabaco. Em relação ao álcool, dados de pesquisa sugerem que ele atua na mucosa por contato direto, como promotor da carcinogênese. As áreas da mucosa expostas ao álcool apresentam maior risco de desenvolver carcinoma espinocelular, enquanto que as glândulas salivares, que não estão diretamente expostas ao álcool apresentam outros tipos de carcinoma, como o carcinoma adenocístico e o carcinoma muco-epidermóide. A interação entre os fatores de risco ambientais e as alterações do genoma das células que sofrem a transformação neoplásica tem sido objeto de intensa pesquisa com fins de diagnóstico, prognóstico, tratamento e prevenção. ESTUDOS GENÉTICOS Nas células somáticas existe um conjunto de proteínas responsável pela constante manutenção da estabilidade dos ácidos nucléicos, DNA e RNA. Esse sistema funciona continuamente para que essas moléculas mantenham corretas suas estruturas e composições químicas. Idealmente, qualquer alteração nesses parâmetros deve ser imediatamente corrigida. Em situações normais, quando uma célula está em processo de divisão, e o DNA não apresenta lesões estruturais importantes, a célula atravessa a fase G1 e entra 25 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO na fase S do ciclo celular. No entanto, se lesões forem detectadas, uma proteína, denominada p53, será produzida e desencadeará uma cascata de eventos capaz de paralisar o ciclo celular antes que se inicie o processo de síntese das novas fitas do DNA. Nesse momento, a específica lesão é então avaliada em relação à possibilidade de correção. Se for possível corrigir o defeito do gene, a célula assim procederá, e o processo de divisão será reiniciado, com a célula entrando na fase S. Caso o defeito detectado seja complexo demais para que seja corrigido pelas moléculas responsáveis, a célula sofrerá um processo de auto destruição conhecido por apoptose. Nas células tumorais os sistemas de reconhecimento e de reparação das lesões do genoma encontram-se muitas vezes alterados, o que favorece o acúmulo de lesões genéticas no clone tumoral. Em 40% dos tumores da cavidade oral o gene p53 encontra-se alterado por mutação. Carcinógenos químicos inalados da combustão do fumo são capazes de induzir esse tipo de mutação. Vírus também são capazes de alterar o genoma das células da cavidade oral. O tipo 16 do vírus do papiloma humano (HPV) é considerado carcinogênico por expressar duas proteínas capazes de interferir com proteínas reguladoras do ciclo celular da célula hospedeira. A proteína viral E6 favorece a degradação da proteína p53. Já a proteína E7 interfere com o ciclo celular através de sua ligação com o produto do gene supressor RB. Na célula normal a proteína RB está ligada a um fator de transcrição. Quando essa ligação se desfaz a célula progride no ciclo. A proteína E7 ao se ligar à proteína RB favorece à divisão celular. Dessa maneira, a célula infectada pelo HPV 16 além de desregulada em relação aos seus mecanismos de controle da divisão, também perde a capacidade de fazer com que haja pausa necessária no ciclo, para correção das eventuais lesões no material genético. O herpes vírus tipo 6, anteriormente isolado apenas de pacientes com doenças linfoproliferativas e síndrome da imunodeficiência adquirida, tem sido também agora, freqüentemente identificado, por técnicas de PCR, em tumores de pacientes com carcinoma espinocelular da cavidade oral. Outras alterações do genoma freqüentemente encontradas nas células que compõem os casos de câncer de boca, são as deleções ou perdas de segmentos cromossômicos. Os cromossomos mais comumente atingidos são o cromossomo 9, 11, 17 e 18. Genes supressores de tumor estão usualmente localizados nesses cromossomos. O p53, por exemplo, situa-se no braço curto do cromossomo 17. O BRCA1 no braço longo do mesmo cromossomo. O gene p16, no braço curto do cromossomo 9. O gene WT1, no braço curto do cromossomo 11 e o DCC no braço longo do cromossomo 18. Assim, as deleções cromossômicas contribuem de maneira bastante freqüente para os distúrbios do controle da divisão celular e do crescimento epitelial neoplásico da cavidade oral. CONSIDERAÇÕES FINAIS Como em todas as neoplasias, a transformação maligna das células da cavidade oral, ocorre em várias etapas. Mutações do genoma induzidas por vírus e/ou por agentes químicos inalados e ingeridos pela utilização do cigarro e das bebidas alcoólicas são bastante comuns. Deleções de segmentos cromossômicos são também freqüentemente identificadas. Com uma acurada inspeção da cavidade oral auxiliada por exames laboratoriais, é possível identificar os vários passos desse processo carcinogenético, que inclui tanto as fases iniciais quando existe apenas uma leve alteração na coloração da mucosa, até as fases mais tardias quando o quadro clínico é de lesão infiltrativa ou ulcerada. O conhecimento das alterações cromossômicas nos tumores da cavidade oral 26 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA amplia as nossas possibilidades de tratamento. Enquanto os quimioterápicos antineoplásicos destroem as células indiscriminadamente, a administração de drogas como o ácido cis retinóico favorece a diferenciação celular, bloqueando a transformação tumoral. A ainda incipiente geneterapia um dia corrigirá as lesões do genoma. Essas formas de tratamento poderão por certo contribuir para a destruição dos tumores já instalados mas poderão também ser usadas preventivamente em pessoas que compõem os chamados grupos de risco para desenvolver o câncer de boca. *Aula ministrada no IV Encontro de Fonoaudiologia em Cancerologia / 1996 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CLARK, J. R.; SOUJANEN, J. N. Cancer of the Head and Neck Region. IN: SKARIN, A.; CANELLOS, G.P. (eds.). Atlas of Diagnostic Oncology. 2a ed. Barcelona, Mosby – Wolfe, 1996, p.27- 29. EARON, R. E. Genetic Lesions in Human Cancer. IN: BISHOP, L. M.; WEINBERG, R. A. (eds.). Molecular Oncology, la ed., New York, Scientfic American., 1996, p. 143177. GLASSER, C.; KORNER, G. V.; LEITHA, T. et al. Pretreatment hemoglobin (Hgb) is associated with responses to neoadjuvante chemoradiation therapy (CRT) in patients with oral cavity and oropharynx cancers. 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Refletir tão somente sobre a carcinogênese e a história clínica natural desses tumores tão expostos a propedêutica, implicaria em rever os principais fatores de risco independentes como o TABAGISMO e o ETILISMO, esses associados a outros tais como mal higiene local, micro traumatismos físicos, infecções virais e carências alimentares, cujas ações contínuas e por etapas, ao longo do tempo, determinariam as transformações teciduais com diferenciações pré-cancerosas e o desenvolvimento final da neoplasia, aceleradas inclusive nos indivíduos imuno-deprimidos e também nos casos de maior susceptibilidade genética predisponente. A variedade de respostas individuais ao universo das possibilidades mutacionais às exposições a situações ou agravos de risco, inclusive ao acaso (reparações gênicas mais rápidas e/ou códigos genéticos mais estáveis ou mesmo maior ação de genes supressores de tumor face a mutações em oncogenes) poderia, a princípio, ser um fator a mais para dificultar a padronização das ações de saúde pública no controle do Câncer de Boca. Assim, já está razoavelmente estabelecido tanto em modelos experimentais como pela clínica, que a carcinogênese oral é multifactorial, e basicamente resultante da ruptura da homeostase pela interação de estímulos externos e expressões genômicas alteradas, com gerações fenotípicas aberrantes. Entretanto, de forma não reducionista, é necessário uma reflexão mais volta- 28 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA da para o campo BIO-ÉTICO-EDUCACIONAL, inclusive da própria construção do conhecimento, a nível comunitário, para começar a compreender as razões ou mesmo as raízes do paradoxo inicialmente citado. Já nesse nível, caberiam as perguntas: A que homem educamos? E para que? Em resposta, poderíamos afirmar que a Educação deverá, por princípio, proporcionar as possibilidades para que o homem opte, atue e transforme a sua própria realidade e a dos seus semelhantes, a educação, também deve proporcionar formas de aprendizagem, autoexpressão, participação, que o processo de ensino-aprendizagem é autêntico quando implica numa mudança. Pensar em SAÚDE enquanto processo de sobrevivência e quando a perdemos, já faz parte de uma longa história, na qual a preservação da mesma, em termos de PREVENÇÃO sempre em bases populacionais, ficou relegada a plano secundário. Ao longo da história das mazelas nosológicas da sociedade, o modelo intervencionista assistencial, inclusive paternalista, sempre sobressaiu-se ao modelo preventivo de interação social, inclusive por determinações político-sócio-econômicas. A Organização Mundial de Saúde - OMS conceitua SAÚDE (Salute = Salvação) como sendo "um estado de completo bem estar físico, mental e social e não a simples ausência de enfermidade", a isso, podería-se acrescer equilíbrio ecológico, espiritualidade, esperança de vida etc., o que implicaria num bem sucedido equilíbrio entre o indivíduo e o meio que o cerca, numa percepção integrada e abrangente com a natureza. Por outro lado, a DOENÇA, na concepção popular, implica somente em sinais e sintomas, um vasto caminho em que levados tão somente por dor, tumor ou sangramentos, marcos avançados da neoplasia, indivíduos bloqueados, sofridos buscam e clamam por soluções já tardias. Infelizmente em termos da realidade oncológica, a fase molecular, préclínica ou mesmo pré-cancerosa é assintomática e, portanto, para um grande contingente leigo, ou mesmo para profissionais de saúde desavisados há uma importante perda de oportunidade de intervenção, senão a principal, na negação ou negligência do óbvio. Assim, ao consideramos CULTURA como uma totalidade dos sistemas de significação, que espaço educacional e que ênfase deve-se dar a COMUNICAÇÃO, enquanto prioridade, na busca de sedimentar princípios básicos de SAÚDE? E qual o seu desafio? O modelo ideal para buscar assimilação comportamental deve enfatizar uma MENSAGEM relacionada a um ESTILO DE VIDA aceito e incorporado a comunidade; esta, a priori, deverá ser saturada e envolvida com a idéia de MUDANÇA e receber REFORÇOS POSITIVOS e EXEMPLOS PARADIGMÁTICOS de todos os envolvidos com CREDITIBILIDADE, principalmente das autoridades, dos seus líderes ou dos seus ídolos. Afora os excluídos do sistema, se considerarmos o número de indivíduos que mesmo alfabetizados são funcionalmente despreparados, desinteressados, desvinculados das decisões, em instituições educacionais descompromissadas com o TODO, sobra um percentual muito pequeno de pessoas neste país, que percebem no contexto psicossocial o seu papel e a sua responsabilidade, num universo mais amplo, inclusive da sua SAÚDE e a dos outros. A ESCOLA BÁSICA poderia ser melhor aproveitada para a ESTAMPAGEM de um ideário na promoção da saúde global, de forma bem enfática. Reforçando essas colocações, a UICC (União Internacional Contra o Câncer) afirma que "quanto a mudar os estilos de vida, deve-se começar a orientar o indivíduo na infância e nos primeiros 29 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO anos de escolaridade. Os estudantes devem se conscientizar sobre as consequências de comportamentos prejudiciais à saúde e serem motivados a assumir a responsabilidade pessoal pelos cuidados a ela. Se esperarmos até a vida adulta para iniciar essa educação, será tarde demais”. Profetizar ou vivenciar avanços tecnológicos, no pleno desenvolvimento atual da engenharia genética, visando a cura ou o controle do Câncer implica também no desafio das suas aplicabilidades fora dos laboratórios experimentais ou dos ensaios clínicos, inclusive de caráter ético. Ademais, a ampliação dos campos terapêuticos fazem a prática da INTERDISCIPLINARIDADE determinar cada vez mais interfaces profissionais complexas, na busca da excelência e da qualidade de resultados, gerando por vezes opiniões ou intervenções díspares ou mesmo conflitantes. Realinhando o problema do Câncer de Boca, talvez o maior dos desafios, a nível primário e secundário, buscando detecções ou mesmo diagnósticos precoces, nesse instante, seja ainda o de resgatar o grande número de indivíduos adultos, cotidianamente expostos aos riscos, e resistentes a mu danças. Seres que não vislumbram o perigo a longo prazo, pouco motivados por fatos ou informações superficiais que não trazem, de forma palpável, benefícios imediatos, populações com falta de juízo crítico ou reflexão a respeito de saúde, mais preocupados com a sobrevivência do dia-a-dia, da manutenção dos seus empregos, com o amargo da sua fome, do que com a qualidade da suas vidas ou do meio ambiente. Por outro lado, a carência de atividades comunitárias mais consistentes por parte da maioria dos profissionais da saúde, principalmente os DENTISTAS, abre espaço para desinformação e insegurança. A falta do exercício do paradigma da PREVENÇÃO, em todos os seus níveis, e a adoção, em pleno alvorecer do próximo milênio, ainda do modelo ASSISTENCIAL – PATERNALISTA, por parte da maioria das Escolas Formadoras de Profissionais de Saúde, é responsável por um sistema que insiste em permanecer intra-muros em hospitais, ambulatórios, clínicas, consultórios, etc., a espera de estados de doença, não intervindo, na sua grande maioria na manutenção da saúde em nível comunitário e em projetos preventivos. Esta discussão, ao nível universitário, deve transcender da esfera dessas escolas e ser estendida a outras áreas do conhecimento acadêmico, ampliando discussões, buscando rever e compreender o homem, ajudando-o a construir um mundo melhor para todos. Infelizmente, o Brasil ainda exibe contrastes sanitários excludentes na violação de princípios básicos de qualidade de vida, por expressões de violência, pobreza, miséria e ignorância. Nessa premissas, atenções básicas à saúde traduzem-se numa anomia despropositada, comprometendo a segurança da sociedade organizada, fazendo da luta contra o Câncer um alvo não prioritário, sujeito a campanhas esporádicas, curtas e pouco financiadas. Assim, sob o manto da bio-ética, o compartilhar com o próximo informações vitais, faz do profissional de saúde mais do um simples formador de opiniões, vai muito além, pois resgata a sua própria cidadania, evitando ser cúmplice e testemunha de atestados de óbitos “sociais” cada vez mais numerosos e cuja causa mortis primária pode ser expressa: “FALTA DE EDUCAÇÃO”. *Aula ministrada no V Encontro de Fonoaudiologia em Cancerologia / 1997 30 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA BIBLIOGRAFIA CONSULTADA FREIRE, P. Educação e Mudança. 15 ed., São Paulo, Paz e Terra, 1989. BRASIL. Ministério da Saúde. Instituto Nacional do Câncer (INCA), Coordenadoria de Programas de Controle do Câncer (Pro-Onco). Câncer de boca – Manual de detecção de lesões suspeitas. 2 a ed., Rio de Janeiro, 1996. PARISI Jr., O. Carcinogênese da Cavidade Oral. Revista Sociedade Brasileira de Cancerologia, Ano I, 1:17-23, 1998. PERDICARIS, A. A. M. Comunicação médica e competência interativa: uma visão semiótica. Tese de Doutoramento. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 1995. UICC. Manual of clinical Oncologv. 5 a ed., Berlin: Springer - Verlag, 1990. 31 DETECÇÃO PRECOCE E PROGNÓSTICO DO CÂNCER DA BOCA Marcelo Doria Durazzo INTRODUÇÃO O câncer da região da cabeça e do pescoço tem recebido destaque crescente na literatura médica. A atenção que se dá ao câncer dessa região, acompanha o crescimento da especialidade médica que é a Cirurgia de Cabeça e Pescoço. Esse crescimento se deu no Brasil principalmente nas últimas quatro décadas. Sob a denominação câncer de cabeça e pescoço agrupa-se um conjunto de afecções malignas, com características muitas vezes bastante distintas umas das outras, mas que se desenvolvem na face e no pescoço. Ficam excluídos, portanto, os tumores malignos das estruturas endocranianas, normalmente abordadas por especialistas em neurologia e neurocirurgia. Entre os cânceres da cabeça e do pescoço, pode-se citar todo o grupo dos tumores malignos das chamadas vias respiratórias e digestivas superiores. Entre estes está incluído o câncer da mucosa de revestimento da cavidade oral, ou, mais simplesmente, câncer de boca (ou câncer bucal ou câncer oral). Ainda se incluem os cânceres da laringe, da faringe, da cavidade nasal e dos seios paranasais. Outros tumores malignos da região cervical bastante incidentes acometem a tireóide. Esta glândula é sede de uma gama de tumores malignos bastante distintos no que diz respeito ao comportamento biológico. Destacam-se ainda na região cérvico-facial os tumores malignos da pele e o câncer das glândulas salivares. Os linfomas muitas vezes, manifestam-se no pescoço. Existem também outras afecções malignas se desenvolvem no território da cabeça e do pescoço, porém com menos freqüência que as acima mencionadas. O câncer é a terceira causa mais comum de morte no Brasil (antecedido pelas doenças cardiocirculatórias e pelos agentes externos). Responde por próximo de 11,5% de todas as mortes (BRASIL, 1999). O câncer da boca é o mais incidente entre os tumores malignos encontrados em no território da cabeça e do pescoço. Estimativa do Ministério da Saúde aponta o câncer de boca como ocupante do sexto lugar entre os mais 32 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA incidentes entre os homens (com 5.850 casos novos em 1999) e do oitavo lugar entre os que mais acometem as mulheres (2.100 casos novos em 1999), representando 3% de todos os tumores malignos da população brasileira (BRASIL, 1999). O câncer da boca tem incidência alta em outros países como a Índia e a França, onde supera os 20 casos por 100.000 habitantes, e pode chegar a 50 por 100.000 habitantes (TAVARES, 1997; DIB et al., 1990). Nos Estados Unidos, de 1990 a 1996, o câncer de boca ocupou a sexta posição em freqüência entre os homens, com incidência de 15 casos por 100.000 habitantes. Entre as mulheres norte-americanas, o câncer de boca figurou como o 13° mais freqüente. Esses números mostram categoricamente a relevância do câncer de boca dentro da oncologia clínica e cirúrgica e apontam para a necessidade da prevenção dessa doença que, além de ter alta incidência, está associada a altas taxas de morbidade e mortalidade. DETECÇÃO PRECOCE - PREVENÇÃO E DIAGNÓSTICO DE TUMORES EM FASES INICIAIS A prevenção e o diagnóstico precoce do câncer da boca representam um desafio. Ao contrário do desejável, em centros de tratamento de câncer oral é regra se observar o predomínio dos tumores em fase avançada de desenvolvimento. É baixa a incidência de tumores precoces, ou seja, em fase inicial de desenvolvimento (TAVARES, 1997; DIB et al., 1990; FRANCO, et al., 1989). É certo que a morbidade e a mortalidade associadas ao câncer da boca seriam bastante diminuídas se a distribuição dos tumores favorecesse, em termos de incidência relativa, as formas mais precoces. Com esse intuito, i.e., visando aumentar a relação casos iniciais/casos avançados, urge que grande parte dos esforços dos profissionais promotores da saúde sejam direcionados para a prevenção e para o diagnóstico precoce do câncer da bucal. Como ponto inicial no que diz respeito à prevenção e ao diagnóstico precoce do câncer oral, impõe-se aos que se propõem diagnosticar o câncer da boca o conhecimento dos chamados fatores de risco para seu desenvolvimento. Os fatores de risco para o desenvolvimento de uma doença são aqueles caracteristicamente observados na população comprometida em relação a população geral. Por esse motivo, o fato de um indivíduo apresentar umas ou algumas dessas características significa que o mesmo tem uma maior probabilidade para desenvolver a doença em questão. Assim, conhecer os fatores de risco do câncer de boca é, mais ou menos, como que traçar o perfil dos portadores da doença. Entre os fatores de risco para o desenvolvimento do câncer oral, é marcante o papel do tabagismo e do etilismo (TAVARES, 1997; DIB et al., 1990), isoladamente ou em associação. Outros aspectos importantes para o perfil dos portadores de câncer de oral são os seguintes: a maioria dos acometidos é composta por pessoas caucasóides do sexo masculino com idade entre a quinta e oitava décadas de vida (DIB et al., 1990). A desnutrição e as hipovitaminoses que dela decorrem e a higiene oral precária gerando freqüentes infecções são observadas em muitos deles, parecendo também concorrer para o desenvolvimento do câncer oral (TAVARES, 1997; FRANCO et al., 1989). Nos tumores malignos dos lábios, é marcante o papel da exposição à radicação solar. Os principais fatores de risco para o desenvolvimento de câncer bucal estão listados na tabela 1 33 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO Tabela 1: Fatores de risco para o desenvolvimento de câncer oral (TAVARES, 1997; FRANCO et al., 1989). sexo masculino caucasóide idade entre 40 e 70 anos tabagismo etilismo desnutrição hipovitaminoses infecções virais imunossupressão higiene precária da boca exposição à radiação solar (lábio) A identificação de indivíduos expostos aos fatores de risco e a atenção devida a eles dispensada no exame físico são as poucas armas de que os profissionais da área da saúde dispõem para diagnosticar os tumores da cavidade oral em fases iniciais. Nos portadores de lesões iniciais, o prognóstico é bastante melhor. Daí a importância do diagnóstico tão precoce quanto possível. Na grande maioria dos casos, os tumores da boca (em fase inicial ou avançada) podem ser diagnosticados sem muita dificuldade. De fato, para a realização do exame da cavidade oral bastam, sob boa iluminação, a abertura da boca e a inspeção e palpação da mucosa de revestimento da cavidade oral. Assim, a oroscopia e a palpação da boca devem ser partes integrantes do exame físico de todo indivíduo examinado por médicos, cirurgiões-dentistas e fonoaudiólogos. O próprio indivíduo pode proceder ao chamado “auto-exame”. O exame da boca (realizado pelo profissional ou pelo paciente) parece ser a forma mais eficaz de se diagnosticar lesões suspeitas (BRASIL, 1996). Entre as lesões suspeitas estão as lesões brancas (leucoplasias ou leucoplacas) e as lesões vermelhas (eritroplasias) que não apresentam regressão após 15 ou 20 dias do seu aparecimento. Lesões suspeitas devem ser sempre biopsiadas para que se proceda ao diagnóstico através da histopatologia. Muitas delas revelam-se benignas e correspondem a processos hiperplásicos e/ou hipertróficos do epitélio, com maior ou menor grau de displasia. Outras lesões são verdadeiros tumores malignos. O tipo histológico mais freqüentemente encontrado (em mais de 90% dos casos) é o carcinoma epidermóide ou espinocelular, também chamado de carcinoma de células escamosas (TAVARES, 1997; DIB et al., 1990; FRANCO et al., 1989; BRASIL, 1996; CERNEA, 1993; DURAZZO, 1997; SHAH, 1999). Cumpre ainda ao especialista (em especial ao cirurgião de cabeça e pescoço) o exame do pescoço visto que a disseminação linfática e o comprometimento por câncer dos linfonodos regionais do pescoço é comum, mesmo em portadores de pequenos tumores malignos da boca (DURAZZO, 1997; SHAH, 1999). Exames laboratoriais complementares também são importantes no que concerne à avaliação do tumor primário na boca, ao comprometimento de estruturas adjacentes, à disseminação para os linfonodos do pescoço e à disseminação para órgãos distantes (DURAZZO, 1997). Tais exames permitem que se conheça a extensão da doença antes de se estabelecer a terapêutica a ser empregada. O tratamento do câncer da boca é essencialmente multidisciplinar, envolvendo grande variedade de especialistas como médicos (cirurgiões, especialistas em 34 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA radioterapia e oncologistas clínicos), cirurgiões-dentistas, fonoaudiólogos, fisioterapeutas, psicólogos e nutricionistas. Evidentemente, o tratamento é tanto mais complexo quanto mais avançado se apresentar o determinado tumor. Os doentes portadores de tumores em fase inicial serão submetidos a tratamentos mais eficazes, associados a menos seqüelas estéticas e funcionais e menos onerosos (CERNEA, 1993; DURAZZO, 1997; SHAH, 1999; MEDINA, 1999). Tal consideração reforça, mais uma vez, a urgência do diagnóstico precoce. PROGNÓSTICO DO CÂNCER DA BOCA O câncer de boca é, na maioria das vezes, doença bastante grave. Sua evolução é variável em doentes tratados de acordo com experiências publicadas de serviços de referência. Ainda assim, alguns fatores têm importância no prognóstico e na evolução dos doentes. Tais fatores são os chamados fatores prognósticos, ou seja, fatores que têm impacto (ou influência) no curso da doença e na evolução do doente. Para o câncer de boca, muitos são os fatores que parecem ter impacto negativo na evolução do doente, seja por estarem associados a recidivas em nível local (no sítio primário, i.e., na boca e adjacências), regional (nos linfonodos cervicais) ou distante (metástases em órgãos distantes como pulmões, ossos, fígado, e outros), ou por estarem associados a uma menor sobrevida (global e/ou livre de câncer). Alguns fatores prognósticos estão associados ao doente e outros à doença. A Tabela 2 lista os principais fatores associados ao prognóstico no câncer oral. O conhecimento de tais fatores é importante por permitir, frente a um determinado caso, que o médico que assiste o doente tenha idéia do curso natural daquela doença e proponha uma terapêutica mais ou menos agressiva. A título de exemplo, pode-se citar que os tumores localizados na língua têm comportamento marcadamente menos favorável do que aqueles que acometem qualquer outra sub-região da boca (DIB et al., 1990). De maneira semelhante, os tumores acompanhados de disseminação metastática (regional ou distante) estão associados a menor sobrevida quando comparados com os casos nos quais a doença está restrita à boca (DIB et al., 1990). O exame histopatológico do espécime resultante da biópsia diagnóstica e o exame da peça resultante do tratamento cirúrgico também trazem informações úteis e que têm impacto no prognóstico do câncer da boca (SHAH, 1999; MEDINA, 1989; BEENKEN et al., 1999; MADDOX, 1990; JONES et al., 1992). Estes fatores (grau de diferenciação celular, espessura do tumor, profundidade da lesão, presença de invasão perineural por células do tumor, presença de invasão vascular pelas células neoplásicas e comprometimento de margens cirúrgicas por carcinoma) só podem no entanto, ser conhecidos após a biópsia diagnóstica e/ou após o tratamento cirúrgico. Com relação ao estudo do DNA, a ausência de diploidia celular também parece influenciar negativamente o prognóstico de portadores de câncer da boca (TYTOR, 1992). Os fatores acima mencionados também figuram na Tabela 2. 35 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO Tabela 2: Fatores com impacto negativo no prognóstico do câncer oral (DIB et al., 1990; BEENKEN et al., 1999; MADDOX, 1990; JONES et al., 1992; Tytor, 1992) associados ao doente ⋅ idade < 65 anos ⋅ sexo masculino associados ao tumor ⋅ localização na língua ⋅ estadio clínico > 1 ⋅ presença de lesão cervical palpável ⋅ presença de metástases a distância observáveis à histopatologia e ao exame do DNA ⋅ pouca diferenciação histológica ⋅ margens de ressecção comprometidas ⋅ presença de invasão perineural ⋅ presença de invasão vascular ⋅ profundidade do tumor > 5mm ⋅ ausência de diploidia nuclear * Aula ministrada no VI Encontro de Fonoaudiologia em Cancerologia / 1998 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRASIL. Ministério da Saúde. Instituto Nacional do Câncer (INCA), Coordenadoria de Programas de Controle do Câncer (Pro-Onco). 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Em 1854, Manuel Garcia realizou o exame de sua própria laringe, utilizando-se de um espelho de dentista, estudando os movimentos das cordas vocais e a fisiologia da respiração e da fonação, sendo o mentor da laringoscopia indireta. A primeira laringectomia por câncer foi realizada por BILROTH em 1873. Em 1990, ocorreram 505.000 mortes por câncer nos EUA, resultando em uma taxa de mortalidade de 174/100.000 habitantes. Quatro mil dessas mortes foram por câncer de laringe (?1%), sendo que anualmente são diagnosticados aproximadamente 12.500 casos dessa neoplasia. Essa incidência vem gradativamente aumentando nos EUA, estando atualmente em torno de 10 casos/100.000 habitantes. É predominante no sexo masculino e na sexta e sétima décadas. Menos de 1% dos casos ocorrem abaixo dos 30 anos. Segundo estudo de AUSTEN (1982), a glote é a região mais freqüentemente acometida. A freqüência de incidência, entre os 3 compartimentos da laringe é: Supraglote 40%, Glote 59% e Subglote 1%. Estas taxas poderão variar sendo que em cidades como Belgrado, Paris e Milão, as cifras para o câncer de localização supraglótica são maiores. A sobrevida de 5 anos, levando-se em consideração todos os estádios, é de aproximadamente 68%. O fumo e o álcool são fatores importantes na gênese do câncer da laringe. Também exercem influências alguns produtos químicos, deficiências alimentares múlti- 38 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA plas, determinadas doenças ocupacionais e o Virus do Papiloma Humano (HPV) principalmente os do tipo 16, 18 e 33. Acredita-se que o que ocorre é uma complexa interação destes vários fatores, que só agora nós começamos a entender. A presença de metástases linfáticas exerce grande influência na curabilidade da doença. Neoplasias da região supraglótica apresentam alta incidência de metástases palpáveis e ocultas, sendo mais freqüentes nos níveis II, III e IV. Já o câncer da região glótica tem menor risco de apresentar metástases cervicais. Estudos com microscopia eletrônica demonstraram que os linfáticos subepiteliais, apresentam-se com alta densidade nas aritenóides. Essa densidade decresce na comissura anterior, e se torna bastante pequena na corda vocal anteriormente. Menos de 5% dos tumores T1 apresentam metástases cervicais. Essas taxas sobem para 5% a 10% nos T2, 10% a 20% nos T3 e 25% a 40% nos T4. Os locais de metastatização mais freqüentes, são para gânglios da cadeia jugular interna, sendo que os mais acometidos são os do nível II. Em seguida, aparecem os linfonodos do nível III e finalmente os do nível IV. Os gânglios da cadeia do espinal e das outras regiões cervicais são sede de metástases menos freqüentemente. O padrão de disseminação do câncer da laringe foi bem estudado em secções laríngeas por KIRCHNER E PRESSEMAN, e conhece-lo é muito importante quando tratamos do câncer precoce. ANATOMIA CIRÚRGICA A laringe é uma parte do aparelho respiratório, altamente diferenciada. Desempenha funções de cunho respiratório, fonatório e esfincteriano. Situada na região infra-hioídea, abaixo da faringe e acima da traquéia, é formada por um arcabouço musculocartilaginoso. As cartilagens da laringe são em número de nove, três ímpares e medianas que são a cartilagem tireóide, a cricóide e a epiglote; e seis pares e laterais, a saber: as cartilagens aritenóides, as cartilagens corniculadas de Santorini e as cartilagens cuneiformes ou de Wrisberg. Essas últimas não são constantes. As diferentes peças cartilaginosas que acabamos de descrever estão unidas entre si, ora por simples ligamentos, ora por verdadeiras articulações, que um certo número de músculos põe em movimento. A laringe é dividida em três regiões. A região glótica, compõe o espaço virtual entre as duas cordas vocais. A região supraglótica estende-se das cordas vocais até a abertura superior da laringe, que compreende a borda livre da epiglote, as pregas aritenoepiglóticas e os vértices das cartilagens aritenóides. A superfície interna da região supraglótica, apresenta em suas paredes laterais, as falsas cordas vocais ou bandas ventriculares, que normalmente não apresentam função fonatória e delimitam com as cordas vocais verdadeiras um espaço denominado de ventrículo de Morgagni. A região infraglótica, vai das cordas vocais até o plano que passa pela borda inferior da cartilagem cricóide. Os músculos da laringe são os tireoaritenóideos, que constituem as próprias cordas vocais e se inserem, na frente, no ângulo agudo da cartilagem tireóide e, posteriormente, nas apófises vocais das cartilagens aritenóides, limitando o espaço glótico entre elas. O músculo ariaritenóideo, que vai de uma aritenóide à outra e que ao se contrair, aproxima as aritenóides e, portanto as cordas vocais. Os cricoaritenóideos posteriores se na face posterior da placa da cricóide e na apófise muscular da aritenóide e quando se contraem provocam um movimento dilatador da glote. Os cricoaritenóideos laterais inserem-se na porção lateral da borda superior do anel da cricóide e na apófise muscular da aritenóide, e quando se contraem provocam o fechamento da glote. Os 39 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO cricotiróideos, que se inserem na face anterior das cartilagens cricóide e tireóide, ao lado da linha média, na região infra-hioídea, quando se contraem distendem as cordas vocais. De acordo com sua ação, os músculos da laringe são classificados em adutores, abdutores e tensores. Os adutores aproximam as cordas vocais e são constritores da glote. São adutores os cricoaritenóideos laterais e ariaritenóideos. Os abdutores afastam as cordas vocais e portanto funcionam como dilatadores da glote. São abdutores os cricoaritenóideos posteriores. Os tensores que distendem as cordas vocais incluem os tireoaritenóideos e os cricotireóideos. A inervação motora desses músculos é feita pelo laríngeo inferior ou recorrente, com exceção da do cricotireóideo, cuja motilidade é garantida pelo laríngeo superior, nervo que é também responsável pela sensibilidade da mucosa laríngea. Os músculos adutores e tensores, aproximando as cordas vocais, desempenham função fonatória. Os abdutores, afastando as cordas vocais, têm função respiratória. Quando ocorrem alterações motoras desses grupos musculares, acarretam distúrbios respiratórios ou fonatórios, que podem chegar até mesmo à asfixia ou à afonia. O epitélio da laringe é do tipo cilíndrico ciliado vibrátil, exceto ao nível das cordas vocais, onde transforma-se no tipo pavimentoso estratificado, devido à metaplasia de adaptação para a função fonatória. O cório submucoso é rico em glândulas mucíparas e formações linfóides. Estas estruturas linfóides são também bastante abundantes no vestíbulo laríngeo (amígdala laríngea). A vascularização arterial é dada pelas artérias laríngeas, superior, média e inferior, que são ramos da tiroídea. Os linfáticos, são escassos ao nível das cordas vocais e vão aumentando à medida que nos afastamos destas, para cima e para baixo. Essa distribuição “em ampulheta”, tem de fato, grande importância na disseminação dos tumores malignos. ESTADIAMENTO: CLASSIFICAÇÃO DO TUMOR PRIMÁRIO (T) PARA A LARINGE (UICC E AJCC) Tx T0 Tis Sem os requisitos mínimos para avaliação do tumor primário Sem evidência de tumor primário Carcinoma in situ SUPRAGLOTE Tl T2 T3 T4 Tumor limitado a um sítio da região com mobilidade preservada Tumor invade mais de um sítio da supraglote, com mobilidade normal das cordas vocais Tumor limitado à laringe com fixação de corda vocal e ou invasão da área retrocricóide, parede medial do seio piriforme ou espaço pré-epiglótico. Tumor invade a cartilagem tireóide e ou se estende aos tecidos vizinhos. GLOTE Tl T2 Tumor limitado a coda(s) vocal com mobilidade normal Tla tumor limitado a uma corda vocal Tlb tumor acomete ambas as cordas vocais Tumor com extensão para supraglote e ou subglote e ou com mobilidade 40 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA T3 T4 Tumor limitado à laringe com fixação de corda vocal Tumor invade a cartilagem tireóide e ou se estende aos tecidos vizinhos SUBGLOTE T1 T2 T3 T4 Tumor limitado à subglote Tumor se estende à corda vocal com mobilidade normal ou diminuída Tumor limitado à laringe com fixação de corda vocal Tumor invade a cartilagem tireóide e ou se estende aos tecidos vizinhos CLASSIFICAÇÃO DOS LINFONODOS REGIONAIS (N) (UICC e AJCC) Nx N0 NI N2 linfonodos regionais não podem ser avaliados ausência de metástase em linfonodo regional metástase única, linfonodo ipsilateral, menor ou igual a 3 cm metástase em linfonodo ipsilateral, maior que 3 cm, menor ou igual a 6 cm, ou múltiplos linfonodos ipsilaterais, nenhum maior que 6cm de diâmetro, ou lifonodos bilaterais ou contralaterais, nenhum maior que 6 cm. N2a metástase num linfonodo ipsilateral, maior que 3 cm, menor ou igual a 6 cm. N2b metástase em múltiplos linfonodos ipsilaterais, nenhum maior que 6 cm. N2c metástases bilaterais ou contralaterais, nenhum maior que 6 cm. N3 metástase em linfonodo maior que 6 cm de diâmetro. CLASSIFICAÇÃO DAS METÁSTASES À DISTÂNCIA (M) Mx M0 M1 presença de metástases à distância não podem ser avaliadas não apresenta metástases à distância. metástases à distância DIAGNÓSTICO Toda pessoa acima de 40 anos que apresente rouquidão progressiva há mais de 1 mês, necessita uma investigação com exame detalhado da laringe para esclarecimento diagnóstico. Isso se torna ainda mais mandatório se o paciente for fumante de longa data. Deve-se estar sempre alerto para queixas de odinofagia e disfagia associadas, sendo nesses casos obrigatório o exame da faringe e esôfago. O exame físico deve atentar para eventuais alterações da voz, da deglutição e da respiração, e incluir: − Palpação da base da língua. − Exame indireto de hipofaringe, base da língua e laringe. − Inspeção cuidadosa da nasofaringe, no sentido de se detectar infecções e neoplasias associadas. − Inspeção e palpação do pescoço, cartilagens da laringe, tireóide, gânglios das cadeias ganglionares, principalmente cadeia jugular interna. O exame endoscópico deve ser minucioso e relatar todas as regiões da laringe, base de língua, hipofaringe e esôfago cervical. A utilização de instrumentos de documentação fotográfica e vídeo é vantajosa. A adição do exame clínico com o endoscópico confere precisão diagnóstica em 90 a 95% dos casos. 41 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO A propedêutica radiológica pode ser util. Tomografia computadorizada e Ressonância Nuclear Magnética tem os mesmos objetivos e servem para se detectar invasão e destruição da cartilagem tireóide e das partes moles, nos casos avançados. Nos tumores glóticos, serve para avaliar a extensão do tumor, a existência ou não de infiltração da musculatura profunda, o eventual acometimento dos espaços paraglóticos e da área retrocricóide, a presença de gânglios cervicais com aspecto sugestivo de processo metastático. PROGNÓSTICO Aumentos tanto do T quanto do N, diminuem a taxa de sobrevida, embora o N seja mais preditivo que o T. A presença de extravasamento capsular dos gânglios cervicais também confere um pior prognóstico. Tumores com conteúdo aneuplóide de DNA evoluem pior. Os casos associados com mutações no gene ras tem, em geral, alto grau de malignidade e grande tendência a metastatizar. (ANWAR, 1993). PATOLOGIA A maioria absoluta dos tumores da laringe é carcinoma espinocelular. Somente 1% são de outros tipos, como o carcinoma adenóide cístico, os mucoepidermó ides, os tumores neuroendócrinos como os carcinóides, os sarcomas e outros. Uma diferenciação muito importante deve ser feita entre o carcinoma in situ e o microinvasivo. O primeiro não ultrapassa a membrana basal e o segundo já invade a membrana basal num pequeno foco. Tanto o carcinoma in situ quanto a displasia grave, indicam risco de transformação para carcinoma invasivo. CONDUTAS Câncer da região supraglótica Estádio inicial (TI e T2) – Estádio I e II Tratamento com cirurgia ou radioterapia. A taxa de cura com cirurgia é de 90 a 95% no Tl e de 80 a 90% no T2. Radioterapia sem cirurgia de resgate produz uma taxa de controle para T1 de 80 a 90% e de T2 de 70% a 80%. Nossa conduta é a laringectomia supraglótica para T1 e T2, em doentes que estejam aptos para o procedimento. Realizamos também o esvaziamento cervical modificado nos níveis II a IV, para pescoço clinicamente N0. Utilizamos a radioterapia nos casos com margens cirúrgicas comprometidas ou em doentes sem condição cirúrgica, como aqueles que não apresentam uma capacidade pulmonar satisfatória. Estádio avançado (T3 e T4) – Estádio III e IV As taxas de cura variam de 30 a 40%, associando-se cirurgia e radioterapia (HANSEN, 1975; SIRALA E PAVOLAINEN, 1975). Segundo WAGENFELD et al. (1981), após 5 anos, um terço dos doentes estão livres de doença, um terço morrem do câncer e um terço morrem de outras causas, que incluem inclusive um segundo tumor primário. A terapia combinada com cirurgia e radioterapia, oferece os melhores resultados conforme LEE et al. (1980). O acometimento linfonodal do pescoço tem grande 42 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA efeito na taxa de sobrevivência. Existe hoje grande discussão sobre a indicação do esvaziamento cervical no pescoço clinicamente N0. Além disso debate-se também se, devemos ou não esvaziar o lado contralateral em pescoços que são clinicamente positivos. Nós temos realizado o esvaziamento de princípio, mesmo no pescoço N0 e sempre esvaziamos ambos os lados. Câncer da região glótica Estádio inicial – Estádio I e II Pode ser tratado por cirurgia ou radioterapia. As taxas de controle local com radioterapia variam de 85 a 95%, para T1 e de 65 a 75% para T2. Os resultados da cirurgia variam de acordo com as diferentes técnicas cirúrgicas produzindo índices de controle local para T1, que oscilam entre 93 e 98%, e para T2 em torno de 80%. Com Radioterapia para T1 e T2, a qualidade de voz mantém-se melhor, porém observa-se um índice maior de segundos tumores primários, com esta modalidade terapêutica. Contra-indicações para radioterapia são: tamanho do tumor, tumor de comissura anterior, extensão subglótica e diminuição de mobilidade das cordas vocais. O procedimento endoscópico foi realizado pela primeira vez por LYNCH em 1916. STRONG E JAKO utilizaram o laser de CO2 para ressecção endoscópica em 1972. Existem séries na literatura, nas quais essa modalidade foi aplicada para casos T1, com sucesso equivalente ao da radioterapia ou ao método cirúrgico aberto, e com menor custo. Estádio avançado – Estádio III e IV Assunto é controverso. Deve-se usar radioterapia com dose total ou cirurgia primária? Com os novos “estudos de preservação de órgão” esta controvérsia tem sido revivida, já que com este método, as taxas de sobrevivência têm sido comparadas e um alto número de laringes tem podido ser preservado. No nosso meio porém, isto ainda não é uma realidade. Em relação ao tratamento do pescoço, JOHNSON et al. em (1993), que encontraram 10% de metástases ocultas em 125 doentes com estágio clínico T3N0M0 e em 29% dos doentes T4N0M0. RAZACK et al. (1989) tiveram 20% de recidiva no pescoço em 59 doentes (T3N0) e 54% em 128 doentes (T4N0M0), que haviam sido submetidos a laringectomia total. Por estes achados e por nossa experiência pessoal, recomendamos que o esvaziamento cervical eletivo seja realizado para todos os tumores glóticos T3 e T4. TRATAMENTO CIRÚRGICO O principal objetivo das laringectomias parciais é o de preservar ao máximo a função vocal e respiratória sem comprometer os índices de cura. Laringectomias parciais verticais: . CORDECTOMIA POR LARINGOFISSURA: Indicada para T1 e T2 inicial da glote, quando sua extensão posterior não vai até o processo vocal. Apesar de ter sido realizada por muitos anos, com a instituição do laser endoscópico, as indicações para este procedimento têm diminuído. Entretanto permanece uma técnica de valor no armamento da cirurgia conservadora da laringe, podendo ser feita também uma decorticação quando uma corda vocal está acometida por uma leucoplasia. . LARINGECTOMIA PARCIAL FRONTOLATERAL (LEROUX E ROBERT) – Esta técnica está indicada para lesões T1 de corda vocal, com infiltração da comissura ante- 43 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO rior e com pequena extensão à corda vocal contralateral. São realizadas incisões verticais na cartilagem tireóide. A distância da linha média, irá depender da localização e extensão do tumor. Quando ocorre infiltração da comissura anterior, é ressecada a quilha anterior. A abordagem da laringe é sempre realizada pelo lado menos acometido. São ressecados a cartilagem tireóide, o pericôndrio interno, a corda vocal verdadeira, a falsa corda vocal e o ventrículo. A linha de ressecção posterior pode chegar até a apófise vocal. A traqueostomia é realizada previamente, iniciando-se o ato cirúrgico. . LARINGECTOMIA PARCIAL FRONTOLATERAL AMPLIADA (NORRIS) – É semelhante à laringectomia frontolateral, diferindo apenas pelas áreas que são ressecadas. Sua indicação é para os tumores glóticos T1, que acometem a comissura anterior, podendo alcançar a apófise vocal, porém sem acometer a aritenóide. Poder também ser utilçizada mesmo que haja pequena extensão do tumor para o ventrículo, para a falsa corda ou para a subglote. Remove-se uma maior quantidade de cartilagem tireóide, incluindo praticamente todo o lado acometido e 1/3 do lado contralateral. É ressecada a corda vocal do lado afetado, o ventrículo, a falsa corda, a comissura anterior e aproximadamente o terço anterior da corda vocal do lado menos afetado. Também poderão ser ressecadas a aritenóide e a apófise vocal do lado da lesão. Em geral nestes casos há necessidade de se proceder a reconstrução com retalhos locais. Para este fim temos utilizado o retalho miocutâneo de platisma ou retalhos musculares. . LARINGECTOMIA PARCIAL FRONTO-ANTERIOR (SOM, SILVER) – Indicada para tumores glóticos T1 e T2, que acometem ambas as cordas anteriormente. São praticadas incisões verticais em cada lado da cartilagem tireóide, incluindo-se na ressecção o terço anterior de ambas as cordas vocais verdadeiras, os ventrículos e as falsas cordas. . HEMILARINGECTOMIA (OGURA, BILLER, SOM) – Classicamente remove-se a porção da laringe que inclui uma corda vocal, a comissura anterior ao processo vocal da aritenóide, a falsa corda ipsilateral, o ventrículo, o espaço paraglótico e a cartilagem tireóide. Esta técnica é usada para lesões T2 e T3, limitadas, com mínima extensão subglótica e acometimento supraglótico restrito à superfície inferior da falsa corda. A fixação da corda vocal não é uma contraindicação absoluta, a menos que apresente fixação da articulação cricoaritenóide. Muitas modificações para este procedimento básico têm sido desenvolvidas para incluir a aritenóide ipsilateral, a comissura anterior, 1/3 da corda vocal contralateral e porções da parte superior da cartilagem cricóide. As complicações nesse procedimentos incluem: aspiração nos primeiros dias pós operatórios, dificuldade de descanulização, estenose glótica por excesso de espessura do retalho empregado na reconstrução e formação de granuloma ou de sinéquia. Laringectomia horizontal, supraglótica Descrita por ALONZO (1947), sofreu modificações técnicas a princípio por LEROUX (1956), e posteriormente por OGURA E SOM (1971). Cada autor buscou através do tempo, introduzir algumas modificações de cunho pessoal, com o intuito de obter um melhor resultado do ponto de vista oncológico e funcional. As indicações são: lesões de epiglote (face laríngea ou lingual), da prega ariepiglótica, da porção superior das falsas cordas vocais, e tumores na superfície laríngea ou com extensão para a base da língua de 1 cm a 1,5 cm. Outros autores têm estendido o procedimento, em situações selecionadas, como quando há acometimento de porções justapostas do seio piriforme, da parede de hipofaringe, ou quando se compro- 44 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA mete uma aritenóide ou mesmo o ventrículo ou a porção superior de uma corda vocal. As últimas modificações não são aceitas por todos os autores. As contra-indicações são: fixação ou diminuição acentuada da mobilidade de uma corda vocal. No caso de existir extensão do tumor para a base da epiglote, extensão do tumor para o ventrículo, grande extensão do tumor para a base da língua, ou para o lado da laringe com 0,5 cm a 1,0 cm para a comissura anterior, e acometimento da cartilagem aritenóide pode ser necessária a laringectomia total. Em situações limítrofes o exame anátomo patológico de congelação durante o ato cirúrgico é muito útil. A laringectomia horizontal supraglótica é contra-indicada em doentes idosos portadores de doença pulmonar crônica ou em mau estado geral. Deve-se tomar redobrado cuidado em doentes submetidos à radioterapia prévia pois a cicatrização estará provavelmente alterada, A técnica básica remove as estruturas laríngeas acima da glote, incluindo a epliglote, o ligamento ariepiglótico, as falsas cordas, o espaço pré-epiglótico e porção da cartilagem tireóide. O osso hióide pode ser preservado em tumores pequenos, porém em tumores extensos que invadem o espaço pré-epiglótico sua ressecção se torna obrigatória. O procedimento básico pode ser estendido a estruturas adjacentes, incluindo a base da língua, o seio piriforme e uma aritenóide. Cada uma destas extensões remove também mecanismos importantes de proteção das vias aéreas e uma cuidadosa avaliação pré-operatória do doente e da extensão do seu tumor, é essencial para o sucesso final. Laringectomias subtotais . LARINGECTOMIAS SUBTOTAIS COM PRESERVAÇÃO DA VIA AÉREA ORIGINAL 1.Laringectomia subtotal com reconstrução com epiglote (TUCKER, 1979) - Permite ressecção de grande parte da glote, deixando a via aérea competente. Deixa -se apenas o corpo de uma aritenóide e a parte posterior da cartilagem tireóide, bilateralmente. A cirurgia é contra-indicada em doentes com risco cirúrgico elevado e sempre que a epiglote estiver afetada pelo tumor. Pode ser realizada em doentes submetidos a radioterapia prévia.. 2.Laringectomia supracricóide - Técnica introduzida por MAJER E RIEDER (1959) e posteriormente desenvolvida por PIQUET E CHEVALIER (1991), que relataram uma série de 104 casos com T2 de glote acometendo a comissura anterior, o ventrículo da laringe e ambas as cordas vocais. Esta cirurgia remove toda a cartilagem laríngea, ambas as cordas vocais verdadeiras e falsas, uma aritenóide e o espaço paraglótico, preservando a epiglote. A reconstrução é feita com crico-hióideo-epigloto-pexia. As contra-indicações principais são a fixação de uma aritenóide ou extensão subglótica maior que 7 mm. As principais complicações incluem: aspiração e estenose, não havendo possibilidade de descanulização. Em 1990, LACCOURREYE et al., relataram a experiência com 68 casos de câncer de região supraglótica, que apresentavam contra-indicação para laringectomia supraglótica, por acometimento da glote, da comissura anterior, do ventrículo, do espaço paraglótico e da cartilagem tireóide. O procedimento inclui a remoção da epiglote, o espaço pré-epiglótico, preservação de uma ou ambas as aritenóides e reconstrução com a crico-hióideopexia (CHP). As indicações para esse procedimento incluem: lesões supraglóticas T1 e T2, que se estendam ao ventrículo, à epiglote e para o terço posterior das falsas cordas; lesões supraglóticas T1 e T2 que se estendam à glote e comissura anterior, com ou sem diminuição da mobilidade de corda vocal; lesões T3, transglóticas; lesões T4 supraglóticas ou transglóticas selecionadas, invadindo a cartilagem 45 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO tireóide. Contra-indicações são: extensão infraglótica maior que 10 mm anteriormente e 5 mm posteriormente, fixação de aritenóide, invasão maciça do espaço pré-epiglótico, extensão de lesões supraglóticas e transglóticas para a parede da faringe, para a base da língua, para a região pós-cricóide, para a região interaritenoídea e por último invasão da cartilagem cricóide. - LARINGECTOMIAS SUBTOTAIS COM TRAQUEOSTOMIA Laringectomia near-total (quase total) – PEARSON et al. (1980) – Esta técnica permite o tratamento de lesões T3 da glote, mantendo-se a fala através de um pequeno shunt com saída de ar para a faringe, evitando-se assim a aspiração. A traqueostomia é definitiva. A ressecção inclui praticamente toda a cartilagem tireóide, deixando-se apenas uma pequena porção e preservando-se uma aritenóide. Está indicada em lesões T3, que acometem uma hemilaringe. Está contraindicada quando há acometimento de ambas as aritenóides, ou do espaço interaritenóideo, ou lesões da área retrocricóide. Está também está contra-indicada pós-radioterapia em situações nas quais os limites não estejam bem definidos. RADIOTERAPIA PÓS-OPERATÓRIA A radioterapia aumenta o controle locorregional do câncer de laringe. Indicamos sempre que houver traqueostomia prévia à cirurgia, gânglios com extravasamento capsular, extensão subglótica maior que 1 cm, acometimento da hipofaringe ou base de língua, disseminação extralaríngea do tumor e invasão perineural. REABILITAÇÃO A reabilitação do doente submetido a laringectomia parcial, necessita obrigatoriamente de uma abordagem multidisciplinar que inclua o auxílio do serviço de psicologia, de nutrição, de uma enfermagem especializada na área. É também absolutamente fundamental a participação do serviço de fonoaudiologia. Em um primeiro momento esse serviço é bastante importante para a instituição dos exercícios que visem evitar a aspiração. Posteriormente o trabalho de reabilitação vocal é objetivado. Sempre que possível esse trabalho deverá ser feito em conjunto com a equipe médica que disponibilizará os detalhes e as peculiaridades de cada uma das cirurgia realizadas. * Aula ministrada no Seminário de Fonoaudiologia em Cancerologia / 1998 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CHANG, P.; ARONSON, D.L. Plasma derived von Willebrand factor preparations: collagen binding and ristocetin cofactor activities. Thromb Haemost, 78: 930-3, 1997. FAVALORO, E.J.; DEAN, M.; GRISPO, L.; EXNER, T.; KOUTTS, J. Von Willebrand's disease: use of coilagen binding assay provides potencial improvement to laboratory monitoring of desmopressin (DDAVP) therapy. Am J Hematol, 45: 05-11, 1994. FAVALORO, E.J.; FACEY, D.; GRISPO, L. Laboratory assessment of von Willebrand 46 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA factor. Use of different assays can influente the diagnosis of von Willebrand's disease, dependent on differing sensitivity to sample preparation and differential recognition of high molecular weight VWF forms. Coagulation and Transfusion Medicine, 103: 264-71, 1995. FAVALORO, E.J.; GRISPO, L.; DINALE, A.; BERNDT, M.; KOUTTS, J. Von Willebrand's disease: laboratory investigation using an improved functional assay for von Willebrand factor. Pathology, 25: 152-8, 1993. FAVALORO, E.J.; GRISPO, L.; EXNER, T.; KOUTTS, J. Development of a simple collagen based ELISA assay aids in the diagnosis of, and permits sensitive discrimination between Type 1 and Type II, von Willebrand's disease. 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Thrombosis and Haemostasis, 70: 99-104, 1993. MICHELSON, A.D. Flow cytometry: a clinicai test of platelet function. Blood, 87: 4925-36, 1996. 47 LARINGECTOMIA QUASE-TOTAL (NEAR-TOTAL LARYNGECTOMY) Luiz Roberto Medina dos Santos INTRODUÇÃO A voz é uma característica peculiar à espécie humana. Para os especialistas envolvidos com o tratamento de pacientes portadores de câncer da laringe, fica evidente o desejo desses pacientes em aceitar recuperações com riscos, por vezes aumentados, para preservar ou restabelecer a voz. A laringectomia quase-total, descrita por PEARSON et al., em 1980b, é um procedimento cirúrgico para tratamento do câncer avançado da laringe, cuja principal vantagem é a preservação da fala, com ar pulmonar, através de uma passagem mucosa e muscular enervada, porém sem possibilidade de respiração nasal. Em outras palavras possibilita a criação de um shunt fonatório miomucoso dinâmico. Assim, lesões muito grandes para serem tratadas por laringectomias parciais , porém com mucosa e nervo laringeo inferior preservados em um mesmo lado, podem ser tratadas dessa forma, com um shunt que dirige o ar para a faringe, para a produção de uma fala utilizando ar pulmonar. PRINCÍPIOS TÉCNICOS As laringectomias parciais, onde voz e respiração nasal são preservadas, requerem um remanescente laríngeo com cartilagem cricóide livre e pelo menos uma aritenóide funcionante. Nos casos onde exista extensão vertical do tumor com envolvimento cricóideo, mas com preservação de uma aritenóide, a laringectomia quase-total pode ser realizada. Neste procedimento a ressecção é radical no lado do câncer e, portanto oncologicamente segura. No lado oposto, são preservados os nervos laríngeo inferior e superior (ramo externo), a aritenóide, um curto segmento da junção cricoaritenóidea e uma fita de parede traqueal posterior, partindo do traqueostoma, que será 48 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA permanente. Tal remanescente laríngeo inervado é moldado como um tubo esfinctérico que, embora inadequado como via aérea de respiração, é suficientemente grande para agir como um shunt dinâmico para produção de voz, desviando o ar da traquéia para a faringe. Assim, o paciente tem um traqueostoma lateral que deve ser ocluído com o dedo, para que o ar seja desviado através do shunt para a fala (figura 1). Figura 1: O conceito da laringectomia quase-total. (Segundo PRADHAN) Esta operação é conhecida na literatura como laringectomia vertical estendida, cirurgia de Pearson ou laringectomia near-total. Quando envolve o tratamento do câncer de seio piriforme é conhecida como faringolaringectomia near-total (PRADHAN, 1995). INDICAÇÕES As indicações clássicas da laringectomia quase-total (PEARSON et al., 1980b) são: a. Lesões avançadas e lateralizadas da laringe, com extensão subglótica para a cartilagem cricóide (T3 e alguns T4 de laringe). b. Câncer avançado do seio piriforme com envolvimento de seu ápice (T4). c. As regiões interaritenóidea, retroaritenóidea e pós-cricóidea devem estar normais para permitir uma ressecção segura, preservando a aritenóide contralateral. d. Fixação da prega vocal, invasão extralaríngea no lado do câncer e envolvimento faríngeo extenso, mesmo requerendo reconstrução com retalhos, não contraindicam a cirurgia. e. Pode ser ocasionalmente recomendada, com bases fisiológicas, em pacientes com reserva pulmonar pobre como alternativa para uma laringectomia supraglótica, com grande risco de pneumonia aspirativa no período pós-operatório. CONTRA-INDICAÇÕES A laringectomia “near-total” está contra-indicada quando: a. Há envolvimento tumoral interaritenóideo ou pós-cricóideo, o que torna oncologicamente insegura a preservação da aritenóide contralateral. 49 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO b. Envolvimento de mais da metade anterior do comprimento da prega vocal contralateral, pois isto não permite a preservação suficiente da laringe para a formação do shunt. c. Radioterapia prévia é contra-indicação relativa pelo edema variável dos tecidos. Sempre que um paciente tenha recebido radioterapia prévia à cirurgia ou esteja em franca desnutrição, com distúrbios metabólicos, ou ainda, sofra de doença aterosclerótica severa haverá maior risco de complicações e fístulas pós-operatórias. A alternativa terapêutica será a realização de laringectomia total e colocação de prótese tráqueo-esofágica. CASUÍSTICAS Segundo DE SANTO et al. (1989), a sobrevida global em 3 anos para os pacientes submetidos a laringectomia “near-total” foi 61%. Foi obtida voz satisfatória em 82% dos pacientes. As complicações mais freqüentes foram a aspiração em 12% dos casos e a estenose do shunt em 9%. A recidiva local do tumor aconteceu em 3% dos pacientes e a recidiva cervical em 14%, com índice de metástases a distância de 17%. Em publicação mais recente, o mesmo grupo de autores (PEARSON et al.,1998a) analisou 225 pacientes submetidos a esse procedimento, relatando a obtenção de voz em 85% deles, com sobrevida comparável aos procedimentos tradicionais. SUITS et al. (1996) publicaram uma experiência com 39 pacientes, tratados num período de 10 anos, obtendo boa voz em 30 (76%) pacientes. As complicações relatadas foram aspiração severa em 21% e estenose em 29%. Houve recidiva local em 11% dos pacientes e cervical em 8%, com índice de metástases a distância de 21%. GAVILÁN et al. (1996) publicaram, em 1996, uma casuística com 49 pacientes submetidos laringectomia “near-total”, num período de três anos. Relataram boa reabilitação da fala em 79,6% dos pacientes, num prazo de 40 dias de pós-operatório e em 89,7% num prazo acima de 6 meses. Usando válvula fonatória obtiveram 51,4% dos pacientes falando sem usar a mão. Entre as complicações referiram aspiração sintomática em 11,4% e fístula faringo-cutânea em 50% dos pacientes. Houve recidiva local em 10,4% e regional em 4,2%, com índice de metástases à distância de 2,1%. No período de 3 anos, 75% dos pacientes estavam sem evidência de doença. Um grupo indiano, com grande experiência em laringectomias, chefiado por SHENOY et al. (1997) publicou uma casuística de 30 pacientes submetidos à operação, em razão de tumores avançados (estádios III e IV) de laringe (11 pacientes) e faringe (19 pacientes). Com um seguimento médio de 22 meses (de 18 a 44) obtiveram controle locoregional em 74% com voz em 29 pacientes, classificada como excelente em 15 e satisfatória em 8, no período de 7 a 20 dias de pós-operatório. A média de hospitalização foi 22 dias e apenas 1 paciente apresentou aspiração temporária. Completando com uma avaliação da dinâmica fonatória, esses autores realizaram eletromiografia transcutânea por agulha nos pacientes, classificados com faladores e não-faladores. Demonstraram músculo viável com inervação mantida em 64% dos pacientes, provando a natureza dinâmica do shunt. ANDRADE et al. (2000) publicaram casuística de 42 pacientes submetidos a laringectomia quase-total, com voz considerada de boa qualidade em 83,3% dos casos, com sobrevida global a 5 anos de 81,7% para os carcinomas da laringe e 66,6% para os do seio piriforme, além de complicações em 28,9%. 50 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA LIMA et al. (1997) estudaram 28 pacientes com carcinoma epidermó ide da laringe, T3/T4, tratados com laringectomia quase-total. Relataram boa voz em 92,8%, sem recidivas locais e com sobrevida livre de doença em 3 anos de 85%. Na Disciplina de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, no período de janeiro de 1995 a agosto de 1997, tratamos 18 pacientes com a laringectomia quase-total. Dezesseis homens e duas mulheres, com idade variando de 33 a 76 anos (média=54). Todos portadores de carcinoma epidermóide de laringe (12 pacientes) ou faringe (6), em estádios III (15 pacientes) e IV (3 pacientes). A lesão neoplásica era supraglótica em 7 pacientes, glótica em 5 pacientes e em seio piriforme em 6 pacientes. As complicações ocorreram em 8 pacientes (44%), sendo infecção operatória em 4 e fístula faringo-cutânea em outros 4 pacientes. Nenhum paciente apresentou fístula linfática ou aspiração pelo shunt. O tempo de hospitalização foi menor que 10 dias para 8 pacientes, entre 10 e 20 dias para 7 pacientes e maior que 20 dias para 3 pacientes. Assim, 55% dos pacientes permaneceram hospitalizados por mais que 10 dias. Na avaliação do shunt fonatório 12 pacientes (66%) apresentaram boa voz, 4 pacientes (22%) evoluíram com estenose do shunt e 2 pacientes ainda estavam em processo de fonoterapia, à época do levantamento. O seguimento mostrou 10 pacientes (55%) vivos sem evidência de doença, após 30 meses. Houve recidiva local em 3 pacientes (17%) e regional em outros 3 (17%). Dois pacientes puderam ser resgatados pela laringectomia total, enquanto que apenas 4 pacientes (22%)morreram da doença. CONCLUSÕES Podemos depreender do acima exposto que a laringectomia quase-total permite ressecções oncológicas adequadas dos tumores da laringe, culminando com a reconstrução imediata da comunicação pulmonar e faríngea, sem utilização de próteses. A voz adquirida é fisiológica, vindo o ar dos pulmões, e de boa qualidade na maioria das vezes. No entanto, há de se ressaltar a necessidade de se realizar uma seleção adequada dos pacientes candidatos a receberam tal tratamento. Em países onde o alto índice de câncer de laringe se associa a dificuldades econômicas para reabilitação com próteses, a laringectomia quase-total se torna uma ótima opção curativa e de reintegração dos pacientes ao convívio social. * Aula ministrada no V Encontro de Fonoaudiologia em Cancerologia / 1997 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANDRADE, R.P.; KOWALSKI, L.P.; VIEIRA, L.J.; SANTOS, C.R. Survival and functional results of Pearson's near-total laryngectomy for larynx and pyriform sinus carcinoma. Head Neck, 22(1):12-6, 2000. De SANTO, L.W.; PEARSON, B.W.; OLSEN, K.D. Utility of near-total laryngectomy for supraglottic, pharyngeal, base of tongue and others cancers. Ann Otol Rhinol Laryngol, 98(l Pt 1):2-7, 1989. GAVILÁN, J.; HERRANZ, J.; PRIM, J. Speech results and complications of near-total laryngectomy. Ann Otol Rhinol Laryngol, 105(9):729-33, 1996. 51 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO LIMA, R.A.; FREITAS, E.Q.; KLIGERMAN, J.; PAIVA, F.P. et al. Near-total laryngectomy for treatment of advanced laryngeal cancer. Am J Surg, 174(5):490-1, 1997. PEARSON, B.W.; De SANTO, L.W.; OLSEN, K.D. et al. Results of near-total laryngectomy. Ann Otol Rhinol Laryngol , 107(10 Pt 1):820-25, 1998a. PEARSON, B.W.; WOODS, R.D. 2nd; HARTMAN, D.E. Extended hemilaryngectomy for T3 glottic carcinoma with preservation of speech and swallowing. Laryngoscope, 90 (12):1950-61, 1980b. PRADHAN, S. Voice conservation surgery in laryngeal cancer. Mumbai - India, Lloyds Publishing House, 1995. SHENOY, A.M.; PLINKERT, P.K.; NANJUNDAPPA, N. et al. Functional utility and oncologic safety of near-total laryngectomy with tracheopharyngeal speech shunt in a Third World oncologic center. Eur Arch Otorhinolaryngol, 254(3):128-32, 1997. SUITS, G.W.; COHEN, J.I.; EVERTS, E.C. Near-total laryngectomy. Patient selection and technical considerations. Arch Otolaryngol Head Neck Surg, 122(5):473-75, 1996. 52 LARINGECTOMIAS ENDOSCÓPICAS COM LASER DE CO2: CONSIDERAÇÕES TERAPÊUTICAS E DE REABILITAÇÃO Ana Lúcia Spina Agrício Crespo As cirurgias parciais têm sido utilizadas de modo crescente como procedimento para tratamento de tumores iniciais de laringe há muitos anos, objetivando a preservação das funções fonatória, esfincteriana e respiratória da laringe. A preservação máxima de tecidos possibilita ao paciente desenvolver suas habilidades vocais e funcionais após cirurgia. A ressecção endoscópica com laser de CO2 para tumores iniciais de laringe, tem recebido particular atenção, desde que introduzida por STRONG E JAKO em 1972. Considerada como uma excelente alternativa quando é possível respeitar os critérios oncológicos e a exigência primária de exposição adequada e acesso a lesão. Desde a primeira ressecção cirúrgica com laser de CO2, esta técnica vem sendo difundida com ampla aceitação. Os limites da indicação da cirurgia estão ainda em investigação e são controversos entre os diferentes autores. Até o presente momento sua aplicação só é confiável para tumores iniciais da laringe: Glóticos - T1: - T1a - T1b - T2: - T2a limitado ás pregas vocais; pode incluir comissura anterior e/ou posterior; mobilidade normal. acomete uma prega vocal acomete as duas pregas vocais estende-se para a subglote e/ou supraglote mobilidade da prega vocal está diminuída 53 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO Supraglóticos -T1: limitado a uma sub-região anatômica e com a prega vocal móvel (UICC, 1997) A exposição do tumor é um fator determinante para a cirurgia endoscópica a laser, não podendo ser indicada para qualquer lesão, pois se tornaria um procedimento de risco, interferindo na precisão dos resultados. Pacientes com rigidez da coluna cervical, retrognatia, dentição proeminente ou com base de língua volumosa, são difíceis candidatos à seleção. Entre as vantagens desse procedimento destacam-se a maior precisão de corte, a coagulação de pequenos vasos e conseqüente diminuição da perda sangüínea. A utilização de um micromanipulador ao modo de um "joy stick", permite a utilização de ambas as mãos com a mesma precisão. As lesões que atingem a região da comissura anterior são operadas com maior facilidade. O maior obstáculo à cirurgia endoscópica com laser de CO2, respeitados os critérios de seleção anteriormente mencionados, é seu alto custo. Devido às divergências existentes para as definições dos diferentes tipos de cordectomia, o comitê de nomenclatura da Sociedade Laringológica Européia (8) propôs: 1-Cordectomia subepitelial ou decorticação (tipo 1) 2-Cordectomia subligamentar (tipo II) 3-Cordectomia transmuscular (tipo III) 4-Cordectomia total ou completa (tipo IV) 5-Cordectomia extensiva (tipo V) - envolvendo a prega vocal contralateral (tipo V-a) - envolvendo a aritenóide (tipo V-b) - envolvendo a prega vestibular (tipo V-c) - envolvendo a subglote em l cm (tipo V-d) A proposta tem dois objetivos: entender melhor cada técnica cirúrgica em função da extensão tumoral e comparar mais rigorosamente os resultados pós-cirúrgicos. UM BREVE ESTUDO COMPARATIVO DE RESULTADOS APÓS DIFERENTES MODALIDADES DE TRATAMENTO PARA CÂNCER INICIAL DA LARINGE A radioterapia e a cirurgia convencional, também são indicadas para tumores iniciais de laringe, assim como que a cirurgia endoscópica a laser de CO2. Todas estas modalidades são consideradas efetivas na erradicação do tumor, sendo enfatizado por alguns autores que a expectativa do resultado vocal, deverá atuar como critério de eleição do tratamento. A seguir, alguns estudos comparam os resultados vocais e funcionais da cirurgia a laser com os resultados da cirurgia convencional e da radioterapia. Por meio de análise acústica objetiva, CRAGLE E BRANDENBURG (1993) avaliaram a voz de um grupo de pacientes tratados com radioterapia e de um grupo após cirurgia endoscópica a laser de CO2, todos com o mesmo estadio do tumor. Em análise comparativa dos resultados vocais, observaram características semelhantes com as duas modalidades de tratamento. STAINER et al. (1991) observaram que os resultados funcionais da laringe são similares após radiação ou cirurgia a laser, para tumores comparativamente iguais. 54 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA Uma das grandes desvantagens relatadas em relação a radioterapia é que não pode aplicada novamente no caso de recidiva do tumor. O tempo de tratamento com radioterapia é mais prolongado e os efeitos colaterais e seqüelas tendem a ser permanentes. Quando persiste edema e mucosite, são maiores as dificuldades em se diagnosticar precocemente as possíveis recidivas. O padrão de fonação glótica após cirurgia a laser e após cirurgia convencional foi avaliado e comp arado por KEILMAN et al. (1996) por meio de imagem vídeolaringoscópica. Os autores observaram que a fonte sonora prevalece em maior número de laringes em nível glótico após cirurgia laser, enquanto que na cirurgia convencional a tendência é estabelecer-se em nível supraglótico, ou ainda em glote e supraglote, configurando fonte sonora mista. Foi também observada presença de sinéquias com maior freqüência nas cirurgias convencionais do que nas cirurgias endoscópicas a laser. A cirurgia conservadora convencional resseca um volume maior de tecidos quando comparada à cirurgia endoscópica com laser de CO2. Esta perda de substância leva a um desequilíbrio das estruturas remanescentes, agravada pela esperada alteração da sinestesia. As teorias fonatórias que explicam os mecanismos vocais adaptados, não se acoplam adequadamente em tal situação. Nas cirurgias a laser a perda de substancia é mínima podendo assim ser comparada com resultados vocais após radioterapia que é a modalidade mais conservadora de tratamento. É importante salientar que a formação de granulomas é freqüente após cirurgia a laser. Este fato pode causar surpresas durante o período pós-operatório e de reabilitação, pois granulomas podem gerar vozes boas por compensar o volume ressecado, ocasionando falsas expectativas ao paciente e ao terapeuta. Outro fator é o tempo de cicatrização que é mais demorado após cirurgia com laser de CO2, durando em média 30 dias, com resultados instáveis neste período. Existe ainda freqüente dúvida nos primeiros meses de "follow up" sobre quando está presente a possibilidade de recorrência do tumor, por serem, essas cirurgias, ressecções muito conservadoras. O acompanhamento deve ser mensal no primeiro ano. Embora existam controvérsias em relação a indicação das modalidades de tratamento para tumores iniciais de laringe, todo paciente pode se beneficiar com orientações ou terapias vocais após o tratamento desses tumores seja qual for a opção terapêutica. O caráter apreciável nestas modalidades é que todas permitem a preservação das funções e o desenvolvimento de suas habilidades. POSSÍVEIS RESULTADOS VOCAIS APÓS LARINGECTOMIAS À LASER Os resultados vocais após laringectomia a laser estão relacionados com o tamanho da lesão e conseqüente extensão cirúrgica. Observam-se, vozes muito próximas a um padrão adaptado após excisão cirúrgica pouco extensa e também, disfonia moderada a severa em ressecções amplas da prega vocal. Além da extensão cirúrgica outros fatores podem influenciar na qualidade vocal do paciente; são eles: os tratamentos prévios com radioterapia classicamente associados a pior desempenho funcional e as sinéquias, formadas após remoção da comissura anterior. Aumento da freqüência fundamental comumente é observado após laringectomia a laser e o fator determinante pode ser explicado, como sendo resultado da redução da massa vibratória. Rouquidão e soprosidade são alterações vocais freqüentemente encontradas 55 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO devido à alteração da fonte vibratória. Tensão fonatória também pode estar presente durante a fonação, provavelmente agindo como mecanismo compensatório, a fim de reduzir o espaço glótico. Tal fator somado às dificuldades respiratórias, pode gerar astenia como característica fonatória comprometendo ainda mais a comunicação. O Tempo Máximo de Fonação poderá estar encurtado e o motivo mais freqüente é a dificuldade da coaptação glótica. Este desajuste desequilibra a coordenação entre fala, produção vocal e respiração, podendo ainda produzir ruídos respiratórios. Estes fatores quando associados comprometem a inteligibilidade da fala. A fonte sonora poderá ser do tipo friccional ou vibrante. A fonte friccional está relacionada às dificuldades de sonorização durante a fala. A configuração da fonte poderá estabelecer-se com participação somente de estruturas glótica, somente de estruturas supraglóticas ou com a participação de ambas. Quando há participação de fonte supraglótica a freqüência fundamental tende a abaixar, possibilitando uma voz com características mais graves, propiciando muitas vezes maior conforto durante a fonação, principalmente ao paciente homem. A redução de massa faz com que a resistência das pregas vocais esteja modificada, assim como o padrão e as características vibratórias. Assim estabelecem-se limitações importantes na possibilidade de variação de freqüência e intensidade. CASPER E COLTON (1990) relataram alterações na aerodinâmica e no comportamento vibratório das pregas vocais como sinais fisiológicos de distúrbios vocais. As alterações referidas podem ou não estar presentes após laringectomias a laser. Quando presentes podem ocorrer com diferentes graus de participação. Em alguns casos tais alterações se somam caracterizando padrão vocal desfavorável, com disfonias consideradas severas. Da mesma forma, alterações menos acentuadas de estruturas evidenciarão vozes próximas do padrão adaptado. O fonoaudiológico deverá estar atento durante a avaliação, para a presença ou ausência dessas características, a fim de buscar mais efetividade no ajuste fonatório. Com exceção da cordectomia incluindo a cartilagem aritenóide, geralmente não aparecem sinais ou dificuldades relacionados à deglutição após as cirurgias a laser. AVALIAÇÃO E REABILITAÇÃO VOCAL APÓS CIRURGIA À LASER A avaliação das necessidades e possibilidades fonatórias deve ser feita em todo indivíduo após cirurgia de laringe. A reabilitação quando necessária, deve iniciar recentemente após a cirurgia, para evitar adaptações inadequadas. A avaliação vocal e exploração das possibilidades de comunicação do paciente devem ser sempre realizadas por um fonoaudiólogo. O objetivo maior da reabilitação é promover a melhor condição vocal diante da atual possibilidade de fonação do paciente, reintegrando e reequilibrando os aspectos funcionais. O fonoaudiólogo deve ter conhecimento prévio do procedimento cirúrgico, como quais estruturas estão intactas e quais alterações anatômicas foram ocasionadas pela cirurgia. Só assim pode traçar plano terapêutico objetivo. Em avaliação diagnóstica observa-se a habilidade de um indivíduo em sustentar ou não a fonação. Informações sobre o controle da função respiratória, combinada com eficiência glótica determinam a capacidade do controle laríngeo. A avaliação pode ser realizada observando a capacidade de sustentação de vogais ou mesmo dos sons fricativos surdos e sonoros. 56 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA A avaliação vocal deve enfatizar também o tipo e grau da disfonia e determinar o impacto na qualidade vocal do indivíduo. Nesta modalidade é importante que o paciente forneça dados sobre sua condição vocal anterior à cirurgia. A determinação da altura e intensidade são importantes para explorar as possibilidades de cada paciente. Assim observa-se a relevância da avaliação acústica objetiva além da avaliação perceptiva. Extração de dados como freqüência fundamental média, razão harmônico ruído, perturbações da freqüência fundamental e distribuição de energia no espectro de longo termo são dados objetivos que podem ser aplicados como rotina de controle vocal, monitorando a evolução terapêutica. O registro visual feito por laringoscopia assessora a fonoterapia com dados essenciais quanto ao tipo de fonte sonora (friccional ou vibrante), predominância de fonte sonora (glótica, supra-glótica ou mista), quais estruturas participam da fonação, presença de fenda glótica, retrações cicatriciais e sua interferência na fonação. Outro dado importante que só se observa por exame laringoscópico é a formação de sinéquia, que pode gerar barreiras na evolução vocal, pois reduz a quantidade de estrutura vibrante. Neste caso, cabe ao otorrinolaringologista avaliar a conveniência de remoção da sinéquia após discussão com o fonoaudiólogo sobre suas possíveis implicações na evolução terapêutica. A partir da avaliação vocal se estabelece o processo de reabilitação. Este deve abordar todas as observações feitas em avaliação, além da ampla variedade de fatores inerentes a comunicação. A intenção é promover o maior equilíbrio possível entre as funções respiratórias, fonatórias e adaptativas de fala, respeitando as características individuais e limitações pós-cirúrgicas. Estimular a máxima adução das pregas vocais pode proporcionar fonte sonora, principalmente naqueles casos de extrema soprosidade onde a fonte friccional é a única possibilidade de fonação. A intenção da adução é converter fonte friccional em fonte vibrante. Tal estimulação é realizada com exercícios de esforços suaves à moderados durante a fonação podendo utilizar, para tal processo, sons de apoio e vogais sustentadas. Em alguns casos a fonte sonora é supraglótica ou mista (glote e supraglote). Esta fonte sonora poderá ser a melhor possibilidade de produção vocal do indivíduo, ou seja, a única fonte vibrante e deve ser mantida. A hidratação é importante na reabilitação destes pacientes. A laringe bem hidratada é uma proteção adicional contra o atrito da fonação, reduzindo a possibilidade de irritação dos tecidos. (BEHLAU E PONTES, 1995). Estimular a sobrearticulação e demais expressões faciais pode ser um amparo comunicativo para estes pacientes minimizando o déficit vocal. A estimulação da vibração da laringe, feita por técnica de sons vibratórios, pode promover maior contato entre as estruturas remanescentes, favorecendo muitas vezes o aumento na produção de harmônicos e melhorando a intensidade. Deve-se estimular ainda, a vibração por meio de sons vibratórios com variação de freqüência e intensidade pois pode incrementar a qualidade vocal, melhorando o controle e a eficiência glótica. A interação de fatores aerodinâmicos de pressão e fluxo de ar associados à possibilidade de tensão muscular adequada, devem determinar o padrão fonatório do indivíduo. A realização dos exercícios deve promover a interação destes fatores. A expectativa da reabilitação é a busca do reequilíbrio e da adaptação fonatória diante das diferentes necessidades e da atual configuração laríngea do paciente. Orientações das possíveis dificuldades de fala em ambiente ruidoso são 57 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO importantes para que o indivíduo possa resguardar-se quando esta necessidade é um fato, como por exemplo, quando tem que ministrar aula, palestra, presidir reuniões entre outras situações de exposição da voz. Nestes casos a utilização do microfone deve ser orientada como um aparato importante, pois reduz os esforços e viabiliza a situação. Enfim, a voz é uma grande característica individual que nos permite identificar sexo, idade, transmitir informações e expressar emoções. As alterações vocais influenciam na identidade do indivíduo. Após as laringectomias que implicam em alterações vocais definitivas é comum notar queixas do paciente homem de ser confundido com mulher ao telefone, ou de sempre parecer doente, ou de sentir-se sem possibilidades para suas atividades de fala e desconfortável ao falar com estranhos. Explorar, orientar e investir nas possibilidades fonatórias do paciente é uma ampla função do fonoaudiólogo, que pode influenciar na qualidade de vida após cirurgias laríngeas. *Apresentado no V e VII Encontro de Fonoaudiologia em Cancerologia / 1997 e 1999 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANGELIS, E. C.; FURIA, C. B.; MOURÃO, L. F.; KOWALSKI; L. P. A atuação da fonoaudiologia no câncer de cabeça e pescoço. São Paulo, Lovise, 2000. BEHLAU, M.; PONTES, P. Avaliação e tratamento das disfonias. São Paulo, Lovise, 1995, p.210. COLTON, R. H.; CASPER, J. K. Compreendendo os problemas de voz. Porto Alegre, Artes Médicas, 1996, p. 179-82. 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RYDELL, R.; SCHALÉN, L.; FEX, S.; ELNER, A. Voice evaluation before and after laser excision vs. Radiotherapy of TIA glottic carcinoma. Acta Otolaryngol (Stockh), 115(4): 560-5, 1995. 58 LIGA DE PREVENÇÃO E CONTROLE DO CÂNCER DA CAVIDADE ORAL ABORDAGEM MULTIDISCIPLINAR DO CÂNCER ORAL EM HOSPITAL-ESCOLA Marcelo Doria Durazzo Aproximadamente 4% de todos os tumores malignos notificados no Brasil acometem a boca (VANDERLEI et al, 1998). Além de pela alta incidência, esses cânceres se caracterizam pelo fato de poderem ser diagnosticados precocemente, por estarem associados a hábitos evitáveis (tabagismo e etilismo) e por serem tratáveis e, muitas vezes, curáveis, principalmente quando diagnosticados em fases iniciais (TAVARES E NOMA, 1997; FRANCO et al, 1989; DIB et al, 1990; DURAZZO E SILVA -FILHO, 1997; CARVALHO E FAVA, 1989). A propósito da cura do câncer de boca, pode-se dizer que ela será tanto mais alcançada quanto mais precocemente forem diagnosticados os tumores, ou seja, quanto mais atentos estiverem os profissionais atuantes na área de saúde para cavidade oral. Assim, médicos, dentistas e fonoaudiólogos, principalmente, são os responsáveis pelo exame sistemático da boca e, para tanto, devem ter a devida formação técnica. Diante das características do câncer oral supra mencionadas e da imposição do diagnóstico precoce da afecção, deu-se dentro da Faculdade de Medicina da USP, uma união de esforços no sentido de se otimizar a prevenção, a realização do diagnóstico precoce e o pronto tratamento dos portadores de câncer de boca (VANDERLEI et al, 1998; CARVALHO E FAVA, 1989). Na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e no Hospital das Clínicas esse esforço culminou com a formação da Liga de prevenção e Controle do Câncer da Cavidade Oral (LPCCCO). A LPCCCO, fundada em 1995 na FMUSP, é uma instituição que resultou da iniciativa conjunta do corpo discente (alunos da FMUSP cursando do 3o. ao 6o. anos) e do corpo docente (professores e médicos da Disciplina de Cirurgia de Cabeça e Pescoço). A LPCCCO foi constituída vinculada ao Departamento Científico do Centro Acadêmico "Oswaldo Cruz" da FMUSP e à Disciplina de Cirurgia de Cabeça e Pescoço da FMUSP, chefiada pelo Professor Titular 59 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO Alberto Rosseti Ferraz. A Diretoria Executiva é exercida por alunos membros da Liga e o Conselho Científico é formado por professores e médicos da Disciplina. ATIVIDADES DA LPCCCO A história das "Ligas" da FMUSP é antiga. Tais ligas se ocupam de doenças e condições clínicas que sejam relevantes em termos de saúde pública. Assim, as doenças sexualmente transmissíveis, a febre reumática, a dor – associada a tantas doenças – e várias outras condições, são objeto de atuação, por parte de alunos, médicos e professores da FMUSP e Hospital das Clínicas. Uma vez caracterizada a relevância do câncer de boca, como exposto na introdução do presente texto, justificou-se a formação de uma liga que abordasse especificamente a afecção. A LPCCCO é entidade reconhecida pelo Hospital das Clínicas da FMUSP como pessoa jurídica vinculada ao Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço. Assim, as atividades desenvolvidas guardam características que são próprias das disciplinas em hospitais -escola, como as descritas abaixo. Atividades didáticas: curso introdutório sobre câncer da cavidade oral; introdução dos alunos na especialidade através de um programa de aulas vinculado a vários temas da propedêutica e da cirurgia de cabeça e pescoço com especial atenção para as afecções da cavidade oral e discussões de casos atendidos em ambulatório. Atividades assistenciais: atendimentos aos portadores de afecções cérvico-faciais e participação em cirurgias; campanhas de diagnóstico precoce em não queixosos; exame da cavidade oral de portadores de afecções de outros sistemas. Atividades científicas: iniciação científica com participação na elaboração de manuscritos (VANDERLEI et al, 1998; TAVARES E NOMA, 1997; DURAZZO E SILVA FILHO, 1997); elaboração de protocolos para atendimento de indivíduos não queixosos (prospecção); análise retrospectiva dos casos de portadores de câncer da cavidade oral atendidos e tratados. No que diz respeito à formação de médicos, além da atuação mencionada (atividades didáticas, assistenciais e científicas), o corpo docente se ocupa de transmitir conhecimentos específicos relacionados não apenas ao câncer de boca, mas também às outras doenças da região cérvico-facial. Tome-se, por exemplo, a distribuição das afecções observadas nos ambulatórios da LPCCCO no período de 1996 a março de 1999. Nesse período, 195 doentes (99 do sexo masculino) foram atendidos em 769 consultas. Quase metade dos doentes (40%) era portadores de lesões da cavidade oral (principalmente de câncer). Outros 9% e 5% eram portadores de câncer de faringe e laringe, respectivamente. Perto de 20% dos pacientes tinham afecções da tireóide, com predomínio das doenças benignas. Entre outras leões cervicais benignas observadas, figuravam as doenças congênitas do pescoço (cistos e fístulas branquiais, cistos do ducto tireoglosso, hemangiomas e linfangiomas, entre outras). Os tumores benignos (como, por exemplo, os lipomas), as sialodenites e outras afecções, mais raras, foram também observadas. Em suma, toda a especialidade médica da cirurgia de cabeça e pescoço é objeto de ensino e aprendizado na LPCCCO. Outros aspectos médicos rotineiramente abordados na formação dos alunos membros da LPCCCO são concernentes à terapêutica complementar – sobretudo à radioterapia – a ao tratamento da dor. Também a reconstrução dos defeitos resultantes da abordagem cirúrgica do câncer oral é tema de interesse dentro da LPCCCO. 60 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA A LPCCCO tem buscado divulgar o problema do câncer da boca junto as outras categorias de profissionais da saúde. Mencione-se, por exemplo, que a LPCCCO inspirou a fundação da Liga de Prevenção, Diagnóstico Precoce e Controle das Lesões da Cavidade Oral da Faculdade de Odontologia da USP (FOUSP). O suporte médico à referida liga é dado pela LPCCCO. Da mesma forma, os doentes tratados nos ambulatórios da LPCCCO são seguidos na FOUSP. Lá esses pacientes têm a sua reabilitação protética levada a cabo. Firmou-se, assim, uma estreita relação entre as duas ligas. Tal relação ilustra a importância da abordagem multidisciplinar do câncer de boca. Assim como entre os cirurgiões dentistas, também entre outros profissionais da área de saúde o problema do câncer da cavidade oral tem que ser divulgado, seja pela necessidade de se realizar o diagnóstico o mais precocemente possível, seja pelas várias modalidades de terapêutica complementar que se impõe no tratamento e reabilitação dos doentes. Entre esses outros atores figuram fonoaudiólogos e psicólogos, por exemplo. A atuação desses profissionais é hoje imprescindível na terapêutica e no seguimento dos doentes, sob pena da inabilitação e da exclusão dos doentes tratados de seus círculos familiares, sociais e profissionais. * Aula ministrada no seminário de Fonoaudiologia em Cancerologia / 1999 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CARVALHO, M.B.; FAVA, A.S. Tumores malígnos da cavidade oral. IN: BRANDÃO, L.G.; FERRAZ, A.R. (ed.). Cirurgia de Cabeça e Pescoço. V. I, São Paulo, Roca, 1989, pp.299-305. DIB, L.L.; PINTO, B.S.; SANVITTO, L.C.; CONTEZINI, H.; LOMBARDO, V.; FRANCO, E. Determinantes de sobrevida em câncer de boca: fatores sóciodemográficos e anatômicos. Rev Bras Cir Cab Pesc, 14:1-9, 1990. DURAZZO, M.D.; SILVA FILHO, G.B. Tratamento do câncer da cavidade oral. Rev Med (São Paulo), 76:260-5, 1997. FRANCO, E.L.; KOWALSKI, L.P.; OLIVEIRA, B.V.; CURADO, M.P.; PEREIRA, R.N.; SILVA, M.E.; FAVA, A.S.; TORLONE, H. Risk factors for oral cancer in Brazil: a case-control study. Int J Cancer, 43: 992-1000, 1989. TAVARES, M.R.; NOMA, R.K. Epidemiologia e fatores de risco do câncer da cavidade oral. Rev Med (São Paulo), 76: 256-9, 1997. VANDERLEI, F.A.B.; PEREIRA, F.C.;; BARRETO, R.L.; MATSUNAGA, P.; DURAZZO, M.D.; TAVARES, M.R.; SILVA FILHO, G.B.; FERRAZ, A.R. Três anos de atividade da Liga de Prevenção e Controle do Câncer da Cavidade Oral.Rev Med (São Paulo), 77:179-82, 1998. 61 O CÂNCER DE CABEÇA E PESCOÇO E A EQUIPE MULTIDISCIPLINAR Onivaldo Cervantes O câncer é a 3a causa de morte na população mundial, perdendo apenas para as doenças infecciosas e parasitárias e para as doenças cardiovasculares. Em alguns países é a na realidade a segunda causa de morte. Morrem cerca de 6.000.0000/ano de pessoas vítimas de câncer. No sexo masculino é bastante alta a incidência do câncer de pulmão, do aparelho digestivo (estômago, cólon, fígado e esôfago estão entre os mais freqüentes), da próstata, da boca e da laringe e, no sexo feminino as maiores incidências são dos cânceres de mama, colo de útero e do sistema digestivo. Estatísticas indicam 29.000 casos novos/ano nos Estados Unidos, com cerca de 9.500 mortes/ano decorrentes de câncer de cavidade oral e 11.000 casos novos/ano de câncer de laringe. Ainda dentro da área da Cabeça e Pescoço encontramos uma maior incidência de canceres de lábio, boca, laringe, tireóide, faringe e glândulas salivares, entre outros, sem considerarmos a alta incidência do câncer de pele, pois moramos num país tropical, com grande exposição à luz solar. Podemos considerar que o câncer da Cabeça e Pescoço representa 10% de todas as neoplasias diagnosticadas. O hábito de fumar e a ingestão de bebidas alcoólicas aumentam em até 19 vezes a probabilidade de um indivíduo vir a desenvolver câncer na via aerodigestiva superior. Além disso, inúmeros fatores genéticos também estão envolvidos. Fica fácil perceber então, a importância de uma equipe multidisciplinar na abordagem do paciente com câncer de Cabeça e Pescoço. Uma das melhores formas de combatermos o câncer é fazendo um trabalho preventivo, afastando o indivíduo dos fatores predisponentes e, caso o tumor já esteja presente, o diagnóstico deve ser o mais precoce possível. No diagnóstico e tratamento do câncer de Cabeça e Pescoço é de fundamental importância podermos contar com uma equipe multidisciplinar. Essa equipe deve incluir além dos diversos profissionais abaixo listados, também os familiares e o próprio paciente, que deve participar ativamente das decisões sobre o seu tratamento. 62 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA Alguns profissionais, atuando em suas áreas específicas podem contribuir no tratamento do paciente com câncer de Cabeça e Pescoço. Entre eles podemos citar: Cirurgião de Cabeça e Pescoço, Otorrinolaringologista, Radioterapeuta, Oncologista clínico, Fonoaudiólogo, Equipe de Enfermagem, Fisioterapeuta, Nutricionista, Clínico Geral e/ou especialista, Cirurgião Dentista, Cirurgião Bucomaxilofacial, Patologista, Cirurgião Plástico, Radiologista, Anestesiologista e Assistente Social. Idealmente, um profissional coordenará todo o grupo de especialistas envolvidos, que nesses casos deverá ser o cirurgião que fez o diagnóstico, operou, e fará o seguimento pós-operatório. A equipe deve traçar linhas de condutas genéricas, particularizadas evidentemente para cada caso. Para o correto tratamento, devemos trabalhar com recursos adequados, que deverão ser fornecidos pela instituição onde o paciente estiver sendo tratado. Falaremos da atuação de cada profissional frente ao tratamento do paciente. CIRURGIÃO DE CABEÇA E PESCOÇO O cirurgião habitualmente é o que faz o diagnóstico e propõe o tratamento específico ao paciente, seja ele cirúrgico, radioterápico, quimioterápico ou combinado. É de fundamental importância que o cirurgião tenha boa formação clínico-cirúrgica e disponha de meios adequados para realizar o tratamento proposto. Em outras palavras, o cirurgião além de conhecer as melhores técnicas que podem ser utilizadas durante o ato cirúrgico no tratamento de um tumor específico, deve também saber decidir qual a melhor forma de se tratar o paciente de uma maneira global. Uma pergunta deve ser sempre respondida: “Será a opção cirúrgica a mais adequada para este paciente?”. Nem sempre o cirurgião terá como primeira opção a cirurgia, podendo muitas vezes optar pela quimioterapia e/ou radioterapia. Este profissional deve estar habituado a tratar pacientes graves e conhecer bem a infra-estrutura da instituição na qual trabalha, estando acostumado à rotina do centrocirúrgico, da terapia intensiva, da enfermaria e etc. O cirurgião de cabeça e pescoço é também o responsável pela avaliação clínica laboratorial e radiológica pré-operatória do paciente, no intuito de se estadiar adequadamente a determinada neoplasia. Está também sob sua responsabilidade a solicitação para a avaliação específica dos demais membros da equipe, principalmente do fonoaudiólogo. É importante salientar que a adequada reabilitação se inicia já no pré-operatório. Solicitação para avaliação nutricional, odontológica e psicológica devem ser requeridas sempre que se fizer necessário. O cirurgião deve ser agressivo contra a doença e não contra o paciente, pois muitas vezes nos deparamos com as “vítimas do câncer sem ter câncer”. Alguns pacientes recebem um tratamento tão agressivo que acabam ficando com graves seqüelas que não permitem nenhum tipo de reabilitação. Por isso sempre que pensamos no melhor tratamento para o doente que está a nossa frente, devemos invariavelmente considerar como será feita a reconstrução durante a cirurgia, e em como e de que forma iremo s reabilitá-lo. Quando se tratar de uma glossectomia deve-se estar preocupado também com o resultado funcional da cirurgia. É importante lembrar que o paciente, pelo menos diante dos familiares, deverá voltar a comer pela boca sem se sentir constrangido. Quando se estiver diante de uma laringectomia, quer seja parcial ou total, deve-se preocupar com a reabilitação vocal, realizando reconstruções que permitam ao paciente 63 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO falar, evite a aspiração e, se for o caso, faz-se a adaptação da prótese fonatória. A relação com o fonoaudiólogo é absolutamente fundamental, pois cada serviço apresenta peculiaridades na maneira de conduzir a reabilitação, sendo que alguns preferem tentar o desenvolvimento de voz esofágica e outros já colocam prótese fonatória no intra-operatório. O cirurgião também seguirá periodicamente o paciente em consultas, tratando possíveis complicações, avaliando seu estado nutricional, psíquico e detectando eventuais recidivas. Em alguns casos não será o cirurgião que fará estes diagnósticos, pois como o seguimento é usualmente mensal apenas no primeiro ano, passando para bimensal no segundo, trimestral no terceiro e quadrimestral a partir do quarto ano, freqüentemente é o fonoaudiólogo, durante uma sessão de terapia que o fará. Nesse sentido, ressalta-se a importância do bom treinamento deste profissional e de sua relação com o restante da equipe, no sentido de capacita-lo a pedir uma reavaliação mais precoce do cirurgião, caso haja alguma suspeita de recidiva ou se detecte alguma complicação. RADIOTERAPEUTA Responsável pelo planejamento e tratamento radioterápico, utilizando dos recursos disponíveis para melhor resultado. Deve estar atento às complicações que possam surgir durante esta modalidade de tratamento, como radiodermite, monilíase e xerostomia, entre outras. Deve examinar periodicamente o paciente e discutir os achados com o cirurgião. ONCOLOGISTA CLÍNICO O oncologista clínico também deve ser o responsável pela periódica avaliação clinica do paciente, principalmente controlando suas funções renal, hepática e hematopoiéticas. Deve estar atento aos quadros comuns de leucopenia, nos quais poderão surgir infecções graves. Este profissional deve estar em contato direto permanente com o cirurgião e com o radioterapeuta. FONOAUDIÓLOGO A atuação do fonoaudiólogo no tratamento do câncer de Cabeça e Pescoço se inicia no período pré-operatório e se acentua no pós-operatório. É fundamental que o fonoaudiólogo mantenha uma boa relação com os demais membros da equipe. O fonoaudiólogo atuará de forma intensa na reabilitação pós-operatória das microcirurgias da laringe, quando se tratar de lesões benignas deste órgão, na reabilitação pós glossectomias parciais ou totais, nas faringectomias, nas laringectomias e faringolaringectomias, onde atuará tanto nos quadros de disfagia como nos quadros de disfonias. Os canceres de língua e laringe são os mais freqüentemente operados, e portanto é grande a demanda para reabilitação. É bastante importante que o fonoaudiólogo esteja preparado para tanto. Este profissional deverá avaliar os fatores médicos e psicossociais para iniciar a reabilitação. A despeito de sua eficiência e rapidez, não se pode indicar prótese laríngea para todos os pacientes, pois não são todos que terão condições financeiras para aquisição. O mesmo acontece com a voz esofágica. Muitas vezes a técnica cirúrgica empregada e/ou a realização de radioterapia pós-operatória, tornam impossível a sua indicação. Muitos pacientes se contentarão com o vibrador laríngeo, 64 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA não querendo outro método. O fonoaudiólogo deve portanto, estar atento a uma série de variáveis para indicar a melhor forma de reabilitar cada paciente. Deve expor ao paciente as particularidades de cada técnica e após definir a metodologia a utilizar, discutir com o restante da equipe. Deve estar preparado também para manipular o traqueostoma e as próteses, detectar precocemente problemas relativos à doença e ser o elo de ligação do paciente com os demais membros da equipe. ENFERMAGEM Nesse tópico estão incluídos os enfermeiros e os auxiliares de enfermagem. Suas atribuições específicas no pré e principalmente pós-operatório, manipulando traqueostomias, sondas, drenos, curativos e ministrando medicações são fundamentais para o êxito do tratamento. FISIOTERAPEUTA Importante membro da equipe multidisciplinar, principalmente na reabilitação respiratória pós-operatória e nas seqüelas de lesões nervosas. NUTRICIONISTA A avaliação nutricional pré-operatória e a orientação para uma dieta adequada no pós-operatório ficam a cargo da equipe de nutrição, que exerce um papel importante na reabilitação nutricional do paciente com câncer. O conhecimento das necessidades nutricionais e sua suplementação adequada produzirão uma recuperação mais rápida e eficiente do paciente. A orientação quanto à alimentação através de sondas e ao preparo da dieta levarão o paciente a um retorno mais precoce ao seu lar. CIRURGIÃO DENTISTA A orientação e o tratamento dentário pré operatório ou pós radioterápico, possibilitando ao paciente uma higiene bucal apropriada, diminui focos de infecção e permite uma alimentação adequada por via oral. Nas grandes reconstruções pode orientar o cirurgião quanto à oclusão dentária. PSICÓLOGO Ajudar na obtenção de uma apropriada abordagem do paciente em relação à sua doença, é papel do psicólogo. Esse auxílio se faz necessário em todas as etapas da relação paciente-doença. Logo após o diagnóstico pela biopsia, nos cuidados pré-operatórios, e durante o período de hospitalização que não raramente inclui uma estadia, as vezes prolongada, na Unidade de Terapia Intensiva. É função do psicólogo também auxiliar o paciente em relação aos traumas decorrentes dos déficits e das alterações estéticas ocasionadas pelas grandes ressecções. Por fim, cabe ao psicólogo o acompanhamento intensivo nos quadros terminais tão importantes para o bem estar psíquico do paciente. Este profissional deve fazer parte de toda equipe multidisciplinar que se propõe a tratar pacientes com câncer. 65 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO ANESTESIOLOGISTA A experiência no tratamento de pacientes com câncer pode diferenciar um bom anestesiologista. O preparo para uma grande cirurgia de cabeça e pescoço requer cuidados específicos. A necessidade de se passar uma sonda enteral durante o ato cirúrgico, a troca da sonda de intubação durante o procedimento, o fato de o paciente ter todo seu rosto coberto, o risco de perda da via aérea, a dificuldade de intubação nos pacientes com tumores obstrutivos, a proximidade geográfica que a doença guarda com os grandes vasos, e a difícil recuperação pós-anestésica são particularidades que, entre outras, fazem com que o anestesiologista indicado para uma grande cirurgia de cabeça e pescoço esteja treinado especificamente para isso. PATOLOGISTA Este profissional assume grande importância a partir do momento em que suspeitamos que um determinado paciente tenha câncer. As biópsias das lesões de cabeça e pescoço acabam usualmente produzindo fragmentos pequenos e a experiência do patologista em firmar um correto diagnóstico a partir desse material é fundamental. Ao analisar peças de grandes ressecções, o patologista deve estar atento às margens cirúrgicas e à distribuição dos linfonodos nas cadeias ressecadas. Informações incorretas podem levar a tratamentos inadequados, como por exemplo a uma radioterapia desnecessária. Além disso, podem resultar em retardo no diagnóstico e no tratamento de uma neoplasia. A padronização de laudos é importante para todos e garante uniformidade na documentação científica. ASSISTENTE SOCIAL É importante se ter na equipe de trabalho um assistente social. Grande parte dos pacientes e familiares é composta de pessoas com poucos recursos econômicos e para quem o auxílio deste profissional é extremamente muito importante. Possivelmente este texto esteja omitindo, outros profissionais tão importantes quanto os aqui citados. Na nossa prática porém, devemos ter sempre a humildade de solicitar o parecer ou mesmo o auxílio de qualquer outro profissional, toda a vez que isso se fizer necessário. A equipe multidisciplinar no tratamento do paciente oncológico deve trabalhar como uma orquestra musical, onde o objetivo final é o melhor resultado terapêutico para o paciente com câncer de cabeça e pescoço expresso por uma qualidade de vida melhor, e por um retorno ao convívio de seus familiares e às suas atividades sociais e trabalho, o mais precocemente possível. * Aula ministrada no VII Encontro de Fonoaudiologia em Cancerologia / 1999. 66 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA LEITURA RECOMENDADA CARRARA -DE ANGELIS, E.; FURIA, C.L.B.; MOURÃO, L.F.; KOWALSKI, L.P. A Atuação da Fonoaudiologia no câncer de cabeça e pescoço. São Paulo, Lovise, 2000, 341p. CASPER, J.K.; COLTON, R.H. Clinical manual for laryngectomy and head and neck cancer rehabilitation. San Diego,Singular, 1993, 197p. DOYLE, P.C. Foundations of voice and speech rehabilitation following laryngeal cancer.San Diego,Singular, 1994, 292p. THAWLEY, S.E.; PANJE, W.R.; BATSAKIS, J.G.; LINDBERG, R.D. Comprehensive management of head and neck tumors. Philadelphia, W.B. Saunders, 1987, 1917p. 67 O CONVÍVIO INTERDISCIPLINAR E A FORMAÇÃO PROFISSIONAL Belmiro José Matos “A procura da verdade é, por um lado difícil e, por outro, fácil, já que nenhum de nós poderá desvendá-la por completo ou ignorá-la inteiramente. Contudo, cada um de nós poderá acrescentar um pouco do nosso conhecimento sobre a natureza, e disto uma certa grandeza emergirá.” Aristóteles, 350 a. C. Cada vez se torna mais necessária uma perfeita coesão entre as diversas equipes de saúde, que prestam assistência aos doentes, isto em qualquer área médica, tornando-se ainda mais importante esta interação, quando falamos na assistência aos doentes de Cirurgia de Cabeça e Pescoço. Este convívio deve abranger as várias áreas afins como os Serviços de Nutrição, Psicologia, Radioterapia, Quimioterapia, Assistentes Sociais, Enfermagem e hoje, o indispensável Serviço de Fonoaudiologia. O objetivo deste relato é ressaltar alguns pontos que acredito serem fundamentais, para o bom andamento deste convívio entre as disciplinas. A Cirurgia de Cabeça e Pescoço veio preencher uma lacuna existente, entre a cirurgia plástica, oftalmologia, otorrinolaringologia, bucomaxilofacial e alguns casos de Cirurgia Geral, avançando nos limites das ressecções oncológicas, como as craniofaciais, com a Neurocirurgia e as reconstruções cada vez mais sofisticadas e fisiológicas, com a microcirurgia e inervação dos retalhos. A formação do cirurgião de Cabeça e Pescoço, preconizada pela Sociedade Brasileira de Cirurgia de Cabeça e Pescoço, deve essencialmente constar de 2 (dois) anos de pré-requisito em Cirurgia Geral e após isso, mais 2 (dois) anos na Residência de Cirurgia de Cabeça e Pescoço, como formação básica, e neste tocante, tal a sua complexidade, provavelmente venhamos a ter no futuro especialização, nas diversas áreas de 68 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA atuação, para que haja um melhor domínio e evolução da mesma. Tivemos nossa formação profissional inicial na Cirurgia de Cabeça e Pescoço da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, cujo Professor Titular na época era o Dr. Anísio C. Toledo. O bom cirurgião deverá buscar dentro de si as 4 (quatro) qualidades fundamentais enaltecidas por Halsted: olhos de águia, mãos de fada, coração de leão e humildade. Sem dúvida nesta área o cirurgião precisará aprender a olhar com minúcias, a alta complexidade anatômica que é pertinente a região cervical. Em nenhuma área tão pequena do corpo humano temos um contingente de estruturas tão importantes. Este fato já acarreta uma dificuldade inicial na formação deste especialista, pois, em geral, ele vem acostumado a trabalhar em campos maiores, como é o caso da Cirurgia Geral. Há também uma variedade de órgãos com as doenças as mais diversas possíveis, trazendo dificuldade para o diagnóstico preciso e depois para a terapêutica cirúrgica. Temos representação do sistema endócrino, vascular, linfático, respiratório, digestivo e do nervoso. Deverá obrigatoriamente o cirurgião ter uma visão global das principais doenças para facilitar a prática clínica. As “mãos de fada” aqui se referem a artesania cirúrgica, com todo cuidado exigido, desde o preparo inicial pré-operatório do doente. O ato cirúrgico, deverá ser executado com o toque leve dos tecidos, já durante a ressecção oncológica, evitando, com manobras táticas precisas, sangramentos desnecessários, que tanto prejuízo trarão no pósoperatório. Os retalhos devem ser bem planejados, via de regra com uma ou duas opções, utilizando sempre aquele que for mais seguro e traga menor morbidade. O “coração de leão”, refere-se ao preparo físico e a firmeza com que a equipe cirúrgica terá que conduzir o ato operatório. As ressecções por vezes se prolongam por oito ou dez horas, não podendo haver desperdício de tempo com manobras consideradas acessórias ou inúteis, que acabam prolongando a cirurgia desnecessariamente. Terá que haver sempre objetividade e simplicidade. A humildade é outro tópico muito importante. Já que pela sua própria natureza, o cirurgião tende a ser um pouco vaidoso, ele deverá combater dentro de si esta tendência e saber escutar outras opiniões para o caso em questão, mesmo que de cirurgiões mais jovens, pois estes poderão ter uma boa solução para o caso, mesmo durante o ato cirúrgico, com alguma alternativa válida. A humildade não significa submissão e muito menos omissão, mas de fato, um respeito ao ser humano que confiou na equipe. Nós temos a obrigação moral de, dentro dos nossos recursos, oferecer o melhor a este indivíduo, respeitando-o como um todo desde a sua psique até a parte física afetada, bem como suas contingências sociais. A humildade também se refere ao próprio cirurgião, a necessidade de estar aprendendo continuamente, principalmente no início enquanto jovem residente, para que possa assimilar os passos básicos da cirurgia, os nós cirúrgicos, os detalhes de utilização do bisturi de lâmina, do bisturi elétrico, a iluminação do campo cirúrgico, a colocação do doente na mesa cirúrgica, os princípios de antissepsia, a antibióticoterapia e etc. A nossa formação teve 2 (duas) fases distintas: a cirurgia endócrina (tireóide e paratireóides) e a oncológica, atuando nos vários setores da Cirurgia de Cabeça e Pescoço. Atualmente sou responsável pelo Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço no Hospital Santa Marcelina, na zona leste de São Paulo, serviço de referência do SUS, a residência é credenciada pelo MEC e filiada à Sociedade Brasileira de Cirurgia de 69 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO Cabeça e Pescoço. Atendemos cerca de 5.500 doentes/ano, devido a região ser altamente populosa e ter um grande número de doentes migrantes. Inicialmente a reabilitação dos doentes oncológicos deixava bastante a desejar. Em relação às áreas de apoio, o cirurgião tentava resolver tudo sozinho e os resultados para o doente nem sempre eram bons, levando a internações bastante prolongadas. De alguns anos para cá, com o surgimento dos serviços hospitalares de nutrição e fonoaudiologia, houve então um grande e rápido salto na assistência a estes enfermos. Com o convívio com os serviços de fonoaudiologia pudemos entender melhor a fisiologia da deglutição e procuramos então na medida do possível realizar retalhos cada vez mais fisiológicos, obtendo com isso e com o auxílio inestimável da terapia fonoaudiológica um melhor resultado e qualidade de vida. Foi muito importante o surgimento da fonoaudiólogia ativa dentro do hospital, participando com as demais áreas envolvidas na reabilitação. Nós somos testemunhas do quanto esta especialidade têm ajudado os doentes com laringectomias parciais, principalmente as supra-glóticas, pós-correção das estenoses laringotraqueais, nas cirurgias da cavidade oral, da orofaringe, da hipofaringe e da glândula parótida. Se há acometimento de pares cranianos esta atuação se torna ainda mais preciosa. Esta importância se percebe num fato que vemos cada vez mais freqüentemente acontecer: cada vez mais, trabalhos são publicados nacional e internacionalmente, associando os médicos da Cirurgia de Cabeça e Pescoço e os profissionais da Fonoaudiologia. Outra área de destaque é o Serviço de Nutrição. Atualmente dispomos da dieta enteral cada vez mais aprimorada. Já no pré-operatório, os cuidados de nutrição prévia são importantes, pois a maioria dos doentes oncológicos encontram-se desnutridos, pela própria dificuldade para se alimentar e pela ingestão alcoólica, que em alguns casos é bastante pesada. No pós-operatório isto se torna ainda mais fundamental. Nós já vimos muitos doentes desmaiarem de fome no passado, quando as dietas eram bastante precárias. Hoje, com o Serviço de Nutrição ativo e cada vez mais atuante nos hospitais, oferece-se dietas mais adequadas a cada doente, com a quantidade de calorias suficientes. Muitas vezes esse apoio é estendido a nível ambulatorial permitindo uma recuperação ainda mais satisfatória e auxiliando muito o doente na sua adaptação para a alimentação por via oral. O Serviço de Enfermagem especializada é o braço direito de todos estes profissionais, pois são seus componentes que irão ajudar o cirurgião nos curativos, nos cuidados com as traqueostomias, na administração de medicações e dietas por via oral ou sondas. São os enfermeiros que acompanham os doentes por 24 horas e nos dão uma constante posição quanto a sua evolução, informando aceitação ou não das dietas, quantidades ingeridas, complicações que por ventura tenham surgido sem que fossem detectadas pelos outros profissionais. O Serviço de Psicologia, é também imprescindível hoje em dia. Os doentes com câncer têm alterações muito sérias da psique, por vezes manifestadas por quadros depressivos, quando se deparam com a doença, com o tratamento que deverá ser realizado e com a perspectiva de mudanças nas condições de vida. Além disso, é importante ressaltar, a carga de todas as alterações familiares que o diagnóstico acarreta. Nesse sentido, esse paciente deverá receber todo o apoio psicológico necessário até o seu pleno restabelecimento. Os Serviços Sociais estão cada vez mais atuantes em nosso meio. Na área de Cirurgia de Cabeça e Pescoço, a sua atuação é vital, no intuito de melhorar as condições de assistência aos doentes, que na sua grande maioria são extremamente carentes. Os 70 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA profissionais do Serviço Social tem um importante papel na integração destes ao seu meio ambiente. É desnecessário frisar a importância dos Serviços de Radioterapia e Quimioterapia, para o tratamento do doente com câncer. Felizmente hoje contamos com colegas da mais alta capacidade nestes setores. Podemos assim oferecer uma melhor perspectiva de cura ou de sobrevivência aos nossos pacientes ou mesmo, em muitas vezes, melhorar a qualidade de suas vidas. Por tudo que foi dito até agora, o convívio do Cirurgião de Cabeça e Pescoço com a equipe multiprofissional, deve ser o mais harmônico possível e baseado sempre nos preceitos de respeito e cooperação de todas as partes. Na verdade um trabalho deve complementar o outro e a preocupação com o doente deverá estar sempre acima das vaidades pessoais. * Aula ministrada no III Encontro de Fonoaudiologia em Cancerologia / 1995. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS DANIEL, R. K.; TERZIS, J. K. Reconstructive microsurgery. Boston, Little Brown, 1977. DRUMMOND, J. P. O médico como paciente na U.T.I. Revista Brasileira de Terapia Intensiva, 10(4): 155, 1998. LEMOS, P.; CORBIOLI, N. (org.) Doutor Zerbini: um coração pela vida. São Paulo, Lemos Editorial, 1999. MATOS, B. J. Técnicas de reconstrução laringotraqueal na estenose pós-intubação- análise do tratamento cirúrgico de 21 casos. Dissertação de Mestrado. Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, 1996. SABISTON Jr., D. C. Tratado de cirurgia de Davis-Christopher. Rio de Janeiro, Interamericana, 1979. 71 O CONVÍVIO INTERDISCIPLINAR E O PAPEL DA FONOAUDIOLOGIA Laélia Cristina C. Vicente INTRODUÇÃO Por muitos anos a fonoaudiologia no Brasil esteve presente na área da cancerologia realizando a reabilitação vocal do laringectomizado total. Na década de 90, esse quadro se modificou, o fonoaudiólogo ampliou sua atuação nos casos oncológicos de cabeça e pescoço, intervindo nas demais áreas do conhecimento, tais como nas intercorrências alimentares, nos comprometimentos de fala, de mímica facial e de motricidade oral, além das seqüelas vocais na qual foi seu principal campo de ação. A fonoaudiologia inserida na área da cancerologia, no entanto, ainda é subexplorada. Não é raro o paciente ter que se deslocar da cidade onde reside para grandes centros em busca de um tratamento mais especializado e completo. Esse fato se deve em razão do descaso do governo em promover tratamentos multidisciplinares, que visem uma melhor qualidade de vida ao paciente e sua reintegração biopsico-físico-social. Somado a isso, infelizmente, ainda são poucos os fonoaudiólogos com interesse e capacitação para atuar na oncologia. Com a introdução do fonoaudiólogo na área de cancerologia da cabeça e pescoço, gerou-se nele a necessidade de adquirir informações que excedesse os da fonoaudiologia tradicional, buscando nas áreas correlatas a compreensão sobre a evolução do câncer, as suas manifestações, as modalidades de tratamento, as seqüelas estéticas e funcionais, para desta forma, poder definir, ampliar e delimitar o seu campo de ação, que então passou a não mais se restringir apenas à reabilitação das seqüelas procedentes do tratamento cirúrgico. O paciente oncológico de cabeça e pescoço, na maioria das vezes, é assistido por diversos profissionais da área da saúde que procuram minimizar as manifestações da doença e otimizar o tratamento. Para uma terapêutica multidisciplinar eficaz, é necessária, além da competência individual dos profissionais envolvidos, uma ação em conjunto e interligada, em que todos compreendam as atuações e as limitações de cada área, tendo 72 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA como meta única da equipe, a reintegração social do paciente com adequada qualidade de sobrevida. Para BERNINI (1997) é de vital importância oferecer ao paciente sistemas terapêuticos unívocos, para que ele possa reencontrar a sua integridade afetada pela avalanche de intervenções. O objetivo desse texto não é descrever como avaliar e tratar as seqüelas funcionais de fala, voz, mastigação, deglutição e mímica facial decorrentes das diversas modalidades de tratamento do câncer de cabeça e pescoço, mas sim, conduzir o leitor para uma reflexão sobre o papel do fonoaudiólogo na oncologia e o convívio interdisciplinar. O PAPEL DA FONOAUDIOLOGIA NA ONCOLOGIA Por vezes restringimos a atuação fonoaudiológica à tarefa de reabilitar o enfermo. No entanto, o campo de ação desta especialidade deve ultrapassar a prática de tratar as seqüelas funcionais provenientes da terapêutica do câncer de cabeça e pescoço. A ampla compreensão da anatomia e fisiologia das estruturas envolvidas nas funções de voz, fala, mastigação, deglutição e mímica facial, bem como o conhecimento das diferentes modalidades de tratamento, permite ao fonoaudiólogo determinar os comprometimentos esperados para uma determinada abordagem terapêutica, possibilitando estabelecer uma conduta individualizada. Como comentam LOGEMANN et al. (1993) é fundamental que se conheça os efeitos específicos de uma intervenção cirúrgica em particular. O primeiro contato com o paciente deve ser anterior à cirurgia. O fonoaudiólogo deve informar quais serão as seqüelas funcionais decorrentes do(s) tratamento(s), assim como, quais serão as possibilidades de tratamento e como este se procederá. Além de tais informações, é nesse momento que o fonoaudiólogo inicia sua avaliação observando aspectos pertinentes ao paciente, tais como articulação, regionalismo, maneirismo, ritmo e velocidade de fala, traços de personalidade, entre outros, que serão considerados no momento da reabilitação. A orientação fonoaudiológica, tanto pré como pós-operatória, visa estabelecer o vínculo entre terapeuta, paciente e família, e conscientizando a todos sobre as seqüelas fonoaudiológicas e sobre as possibilidades de reabilitação (CASPER E COLTON, 1993; DOYLE, 1994; VICENTE et al., 1997; MARTINS et al., 1999). Durante o processo de reabilitação, o foco terapêutico deve ser centrado na minimização dos comprometimentos funcionais e maximização das adaptações e compensações adequadas para a função. GONÇALVES E BEHLAU(1997) apontam três aspectos fundamentais a serem considerados na fonoterapia: 1. enfatizar o positivo estimular os aspectos que o paciente conseguir realizar de modo adequado; 2. aceitar o negativo - as limitações que apresente em decorrência da cirurgia e, também, as nossas próprias limitações enquanto terapeutas; 3. desenvolver adaptações compensatórias para tentar suprir da melhor maneira possível as deficiências existentes. Vale destacar, a importante função do reabilitador em identificar os limites terapêuticos, que por vezes são sombrios, para que não se exija do paciente o que ele não possa realizar por limitações cirúrgicas ou mesmo cognitivas. A frustração do paciente só contribui para o insucesso terapêutico. Outro aspecto que vale menção, é o que diz respeito à motivação e ao empenho do terapeuta. O paciente percebe e sente confiança naquele profissional que transmite seriedade, que compreende as suas dificuldades e que se empenha para lhe proporcionar a melhor qualidade de vida possível. O paciente com câncer geralmente se sente fragilizado necessitando que os profissionais a sua volta lhe mostrem o sentido de viver. 73 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO A atuação do fonoaudiólogo não deve se limitar ao paciente. Muitas vezes a intervenção junto aos familiares se faz necessária. A relação familiar, com freqüência se desestabiliza fazendo com que os familiares se sintam despreparados para agir com seu parente doente. O desconhecimento do que e de como fazer para ajudar na recuperação, acabam por isolar o paciente da família. Outras vezes, a família se isenta do processo de recuperação e assume um comportamento excessivamente zeloso para com o paciente. Cabe ao fonoaudiólogo orientar a família e fazer com que esta participe ativamente da reabilitação do doente. Indicar e ajudar o paciente na escolha do meio para a sua reabilitação, também é função do fonoaudiólogo. Nas laringectomias totais por exemplo, o fonoaudiólogo deve expor ao paciente os recursos terapêuticos disponíveis e auxiliá-lo na escolha do meio de reabilitação vocal que melhor se adapte a ele especificamente. A não apresentação de todos os recurso de produção vocal alaríngea é, no mínimo, uma atitude antitética e centralizadora. A opção final deve ser sempre do paciente. Alguns profissionais não gostam de utilizar a laringe eletrônica. Entretanto, existem pacientes que optam por esse meio de produção de voz, ou como método de reabilitação da fala ou alternativa para atuar paralelamente a outros (WANNMACHER et al., 1999). Em outros casos, como nas laringectomias com disfagia, cabe ao fonoaudiólogo determinar a terapêutica adequada sendo de extrema importância que o paciente esteja conscientizado das razões para que se estabeleça um perfeito elo de colaboração. Mas, será que o papel do fonoaudiólogo na equipe multi-profissional se resume apenas a reabilitação do paciente? O fonoaudiólogo tem capacitação teórico-prática para auxiliar e contribuir com os demais membros da equipe, como os cirurgiões de cabeça e pescoço, otorrinolaringologistas, cirurgiões buco-maxilo-faciais, e nutricionistas entre outros, no que se refere ao diagnóstico, prognóstico e terapêutica. Para tanto, é necessário mais uma vez enfatizar a importância do amplo conhecimento por parte do fonoaudiólogo sobre as deficiências funcionais acarretadas por cada uma das modalidade de tratamento (cirurgia, radioterapia e/ou quimioterapia). O fonoaudiólogo deve reconhecer as estruturas remanescentes que podem participar das funções de comunicação e alimentação e os recursos de reabilitação a serem empregados. Desta forma, o fonoaudiólogo, nas reuniões clínicas, deve ter habilidade para discernir sobre as possibilidades fonoterápicas existentes no contexto de um planejamento terapêutico global, e juntamente com os demais membros da equipe, ajudar na indicação médica, considerando a futura qualidade de vida do paciente as reais possibilidades do mesmo em se reintegrar socialmente. Porém, o reconhecimento da importância do fonoaudiólogo como um dos membros da equipe multidisciplinar que cuida do paciente com câncer, será sempre decorrente de um trabalho responsável e respaldado cientificamente É a partir da pesquisa científica que o fonoaudiólogo amplia seu conhecimento, e desta forma, viabiliza ações cada vez mais certeiras e eficazes. Em nosso meio, infelizmente ainda são poucas as pesquisas nessa área, quando as comparamos com as existentes em outros campos de atuação do fonoaudiólogo. De acordo com FURIA et al. (1999) as seqüelas na alimentação, mastigação, deglutição e fala precisam sempre ser avaliadas do ponto de vista qualitativo e quantitativo. Assim, permite-se aos profissionais da saúde, e inclusive ao fonoaudiólogo, a mensuração objetiva e rigorosa da melhora das funções no decorrer da evolução terapêutica que muitas vezes é precocemente percebida pelo paciente, pela família e amigos. Do exposto fica claro que o papel do fonoaudiólogo deve ir além do ato de reabilitar as seqüelas funcionais inerentes ao tratamento oncológico. O fonoaudiólogo 74 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA deve ter também uma ação participativa junto à equipe multiprofissional e uma ação de orientação e esclarecimento junto ao paciente e seus familiares. Além disso, cabe ao fonoaudiólogo uma atuação voltada a pesquisa científica para que a fonoaudiologia cresça com respeito e dignidade também na cancerologia. O CONVÍVIO INTERDISCIPLINAR Para o tratamento do câncer de cabeça e pescoço, muitos são os profissionais envolvidos, tais como, o médico, o cirurgião, o oncologista, o radioterapeuta, o patologista, o enfermeiro, o fisioterapeuta, o fonoaudiólogo, o psicólogo, o nutricionista, o cirurgião bucomaxilo-facial, o odontólogo, o assistente social, entre outros. Todas ou parte dessas especialidades intervêem no tratamento do paciente. De acordo com CASPER E COLTON (1993), o tratamento oncológico requer o mais alto nível técnico dos muitos profissionais, que devem trabalhar como uma equipe coordenada durante todo o processo. Para tanto, é importante que a equipe compartilhe respeito, comportamento ético e que tenha metas bem estabelecidas. Quando a equipe está integrada, trabalhando em conjunto, com todos conscientes de suas atribuições e responsabilidades, o trabalho interdisciplinar é eficaz. A equipe deve estar presente em todas as etapas do tratamento do paciente, antes, durante e após o diagnóstico e a cirurgia, fornecendo assistência ao doente e à sua família. Desta forma, acredita BERNINI (1997), é possível evitar ao máximo danos físicos e psíquicos e sustentar minimamente a integração familiar e social, preparando as condições para a etapa da recuperação e reabilitação. O principal objetivo da equipe no processo terapêutico do paciente com câncer de cabeça e pescoço, além de tratar o câncer, é possibilitar o retorno ao convívio familiar, social e profissional, com meios de comunicação e alimentação satisfatórios. Na Santa Casa de São Paulo, onde trabalhei como fonoaudióloga por 5 anos no Serviço de Face e Pescoço da Faculdade de Ciências Médicas, há uma equipe multiprofissional quase completa sendo a interdisciplinaridade a marca do serviço. Quando o paciente chega ao hospital, passa pela clínica médica geral que o encaminha para a especialidade de face e pescoço. Esses profissionais por sua vez, fazem toda a investigação necessária e apontam a terapêutica. Nesse momento o paciente é apresentado para os demais membros da equipe que atuarão no caso. Os casos cirúrgicos são precedidos de orientações exercidas pelas diversas especialidades, tais como assistencia social, serviço de cirurgia buco-maxilo-facial, nutricão, fonoaudiologia e psicologia. A orientação fonoaudiológica sempre é realizada junto com a psicológica e quando necessário, com os demais membros da equipe. Nessa ocasião o paciente e seus familiares tem a oportunidade de esclarecer todas as dúvidas sobre o tratamento a ser realizado e de conhecer os profissionais que o ajudarão na reabilitação, iniciando um vínculo bastante importante para sua recuperação. Durante a internação, a equipe composta por cirurgiões, enfermeiros, nutricionistas, fisioterapeutas, fonoaudiólogos, psicólogos e especialistas em cirurgias buçomaxilo-faciais realizam uma visita no leito discutindo, de forma breve, as condutas que serão realizadas. Nesse momento, o paciente tem a oportunidade de vivenciar a atuação em conjunto da equipe, o que possibilita que ele obtenha uma melhor noção sobre as responsabilidades inerentes a cada especialidade, que trabalham unidas pela sua recuperação global. A discussão mais pormenorizada sobre os casos, é realizada na reunião clínica, pelos mesmos profissionais acrescidos agora do radiologista, do radioterapeuta, do 75 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO patologista e de outros que se fizerem necessários para a elucidação de um problema particular. Vale ressaltar, que nessas reuniões a interdisciplinaridade é praticada no seu conceito. Cada profissional é reconhecido pelo trabalho que a equipe demanda. A visão do objeto fica mais integrada, não se forma só com a disponibilidade interna de cada um, mas com a necessidade de um trabalho da equipe em relação à sua própria dinâmica (MUSOLINO E RODRIGUES, 1994). Durante o período de pós-operatório, todos os recursos reabilitadores disponíveis no hospital são utilizados. Cada especialidade que atua com o paciente tem evidentemente a sua especificidade. No entanto, o trabalho é integrado e as ações se completam. Para os pacientes em que a cirurgia não é o tratamento de eleição, o fonoaudiólogo tem a possibilidade de intervir de forma paliativa e tentar minimizar os efeitos funcionais da alimentação e comunicação. A inserção da fonoaudiologia nos casos tratados exclusivamente com a radioterapia, ainda é limitada sendo pouco conhecidos os reais benefícios de tal intervenção. É esta uma lacuna na atuação interdisciplinar que deve ser amplamente investigada e brevemente preenchida. Concluindo, em qualquer etapa do tratamento do paciente com câncer de cabeça e pescoço é fundamental a integração dos profissionais envolvidos. Como refere MUSOLINO E RODRIGUES (1994), todos organizam a produção do conhecimento e todos são produto e produtor deste processo. COMENTÁRIOS FINAIS É incontestável a importância da presença do fonoaudiólogo na equipe multiprofissional responsável pelo tratamento do câncer de cabeça e pescoço. No entanto, é importante que essa presença se dê em todas as etapas terapêuticas, avaliando, orientando, reabilitando e pesquisando os transtornos funcionais, auxiliando a equipe interdisciplinar, o paciente e a família na obtenção de um resultado satisfatório. Em toda e qualquer equipe é preciso existir a interdisciplinaridade. Numa partida de futebol, um único jogador não ganha o jogo. É necessário que a equipe toda esteja sintonizada, caso contrário, a derrota será inevitável. Na atuação com a saúde isso não é diferente. Todos tem as suas atribuições e igual importância no processo de tratamento. A equipe deve ter como meta única a reintegração bio-psico-físico-social do paciente e todos os recursos de avaliação e tratamento devem ser disponibilizados em prol de uma melhor qualidade de vida. A simples existência de reuniões clínicas com as diversas especialidades não é suficiente para garantir a interdisciplinaridade. Muitas vezes os integrantes atuam de forma individualizada, com objetivos próprios e sem discorrerem através de uma linguagem comum ao grupo. A verdadeira interdisciplinaridade é formada pelas atitudes diárias de cada profissional, pela construção do conhecimento em grupo, numa relação de troca e respeito entre todos os envolvidos. A ciência só tem a lucrar quando as forças se somam, gerando ações mais eficientes e otimizando o tratamento do câncer de cabeça e pescoço. Agradecimento Ao Serviço de Face e Pescoço da Santa Casa de São Paulo, em nome do Prof. Dr. Antonio José Gonçalves, com quem aprendi muito durante o nosso período de convivência e que me permitiu mencionar o trabalho que lá é desenvolvido. * Aula ministrada no II Encontro de Fonoaudiologia em Cancerologia / 1994 76 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BERNINI, V.G. Reabilitação Psicossocial do Paciente de Câncer de Laringe. In: NORONHA, M.J.R.; DIAS,F.L. Câncer da Laringe – Uma Abordagem Multiprofissional. Revinter, 1997, p.314-8. CASPER, J.K.; COLTON, R.H. Clinical Manual for Laryngectomy and Head and Neck Cancer Rehabilitation. Singular Publishing Group, 1993. DOYLE, P.C. Foundation of voice and speech rehabilitation following laryngeal cancer. Singular Publishing Group, p.97-114, 1994. FURIA, C.L.B.; ANGELIS, E.C. A inteligibilidade de fala nas glossectomias: resultados após a reabilitação fonoaudiológica. IN: KOWALSKI, L.P.; DIB, L.L.; IKEDA, M.K; ADDE, C. Prevenção, diagnóstico e tratamento do câncer bucal. Frontis Editorial, 1999, p. 499-509. GONÇALVES, M.I.; BEHLAU, M. Reabilitação Fonoaudiológica nas Laringectomias Alargadas: Glossofaringolaringectomias. 1N: NORONHA, M.J.R.; DIAS,F.L. Câncer da Laringe - Uma Abordagem Multiprofissional. Revinter, 1997, p.293-8. LOGEMANN,J.A.; PAULOSKI, B.R.; RADEMAKER,A.W.; McCONNEL, B.Q.; JONHSON, J.; BAKER,T. Speech and swallow function after tonsil/base of tongue resection with primary closure. J. Speech and Hearing Reseach, 1993, 36: p. 918-26 MARTINS, N.M.S.; ANGELIS,E.C.; FURIA, C.L.B.F; BRANDÃO,A.P. Orientação fonoaudiológica pré e pós-operatória nos tumores de cavidade oral. IN: KOWALSKI, L.P.; DIB, L.L.; IKEDA, M.K; ADDE, C. Prevenção, diagnóstico e tratamento do câncer bucal. Frontis Editorial, 1999, p. 455-60. MUSOLINO, C.V.; RODRIGUES, A.P. Equipe Clínica: Uma reflexão sobre Multidisciplinaridade e Interdisciplinaridade. IN: MARCHESAN, I.Q.; BOLAFFI,C; GOMES,I.C.D.; ZORZI,J.L. Tópicos em Fonoaudiologia 1994, Editora Lovise, 1994, p.207-10. VICENTE, L.C.C.; GONÇALVES, M.I.; GONÇALVES, A.J. Laringectomias Quase-totais Reabilitação Fonoaudiológica. IN: LOPES FILHO, O. Tratado de Fonoaudiologia. Roca, 1997, p. 1051-61. VICENTE, L.C.C. Avaliação videofluoroscópica da articulação de pacientes submetidos às ressecções da boca. IN: KOWALSKI, L.P.; DIB, L.L.; IKEDA, M.K; ADDE, C. Prevenção, diagnóstico e tratamento do câncer bucal. Frontis Editorial, 1999, p. 467-74. WANNMACHER, L.; FIGUEIREDO, E.S.; VICENTE, L.C.C. Estudo da inteligibilidade da fala eletrolaríngea de laringectomizados totais. Pró-fono, R. Atual. Ci., 11(2):22-6, 1999. 77 REABILITAÇÃO FONOAUDIOLÓGICA APÓS AS LARINGECTOMIAS PARCIAIS Renata Furia Sanchez INTRODUÇÃO Os tumores malignos que acometem a laringe correspondem, em quase sua totalidade, ao carcinoma espinocelular (cerca de 90% dos casos) e engloba de 2 a 5% de todas as doenças malignas (COLTON, 1996). A proporção é de 5 homens para cada mulher. As causas do câncer são variadas, podendo ser externas ou internas ao organismo, estando ambas interrelacionadas. As externas relacionam-se ao meio ambiente e aos hábitos ou costume próprios de um ambiente social e cultural. As internas são na maioria das vezes geneticamente pré-determinadas, estando ligadas a capacidade do organismo de se defender das agressões externas (INCA, 1996). Há uma nítida associação entre a ingestão excessiva de álcool e o vício de fumar com o desenvolvimento de câncer nas vias aerodigestivas superiores. O tabagismo é o maior fator de risco para o câncer de laringe. Quando a ingestão excessiva de álcool é adicionada ao fumo, o risco aumenta para o câncer supraglótico. Pacientes com câncer de laringe que continuam a fumar e beber têm probabilidade de cura diminuída e aumento do risco de aparecimento de um segundo tumor primário na área de cabeça e pescoço (INCA, 1998). O principal sintoma do câncer de laringe é a disfonia, já que a região glótica é normalmente mais acometida, seguida pela região supraglótica e subglótica. O câncer supraglótico geralmente é acompanhado de outros sintomas além de alterações na qualidade vocal, como disfagia leve e sensação de corpo estranho na garganta. Em casos mais avançados de lesões das pregas vocais, além da disfonia, é comum acontecer disfagia e dispnéia. E imprescindível o diagnóstico preciso da extensão tumoral para o tratamento radical do tumor, e controle oncológico, com a máxima preservação funcional. A realização de cirurgia conservadora da laringe (laringectomias parciais) propicia ao paciente uma melhor reintegração psico-social, sem que haja comprometi- 78 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA mento da expectativa de cura do paciente. Isto é viabilizado por dois fatores principais: •campanhas educacionais informando a população, principalmente os grupos de riscos (tabagistas e etilistas), sobre os efeitos dos agressores ambientais e sintomas iniciais da doença; •desenvolvimento de novos métodos de investigação laríngea, como vídeolaringoscopia com estroboscopia ou pseudoestroboscopia, tornando possível diagnósticos cada vez mais precoces e precisos dos tumores da laringe. Quando da realização de uma laringectomia parcial, deve se levar em conta a complexidade das funções da laringe (respiração, mecanismo esfincteriano, deglutição e fonação). Com qualquer técnica utilizada, a cirurgia não terá sucesso se não for possível manter a função de proteção das vias aéreas inferiores à deglutição, e necessitará de uma complementação para interromper a comunicação orotraqueal. Assim, a utilização de técnicas reconstrutoras deve propiciar urna situação de manutenção das funções laríngeas de maneira adequada, evitando complicações que possam inviabilizar a terapêutica, e aprimorar a função fonatória (BRASIL E BEHLAU, 1998). TRATAMENTO O câncer de laringe pode ser tratado com cirurgia, radioterapia e/ou quimioterapia, dependendo de muitos fatores. Tumores primários pequenos e superficiais de uma ou ambas pregas vocais, tumores que envolvem a margem livre da epiglote, tumores menores de l cm de diâmetro e tumores em pacientes com riscos cirúrgicos, normalmente, podem ser submetidos à radioterapia. Muito provavelmente, os doentes apresentarão alterações vocais durante o tratamento (COLTON, SAGERMAN, CHUNG, YOUNG E REED, 1978). Há uma variedade de abordagens cirúrgicas para o tratamento do câncer laríngeo, que podem envolver a excisão da lesão, de até metade da laringe, apenas das estruturas supraglóticas ou da laringe inteira (COLTON, 1996). Segundo DOYLE (1994), informações sobre a extensão do tumor são essenciais para a decisão em relação a escolha do tipo de cirurgia a ser realizada. As laringectomias parciais são indicadas para tumores glóticos – T1, T2 ou T3, e o limite máximo de ressecção dependerá principalmente da possibilidade de se reconstruir a laringe residual, mantendo as funções respiratória e esfincteriana. As laringectomias verticais envolvem uma série de cirurgias que vão desde a remoção de uma prega vocal, as cordectomias, até ressecções maiores, como as hemilaringectomias ou laringectomias fronto-laterais. As laringectomias parciais verticais, em todas as suas variações, provocam uma deficiência na coaptação glótica, que geralmente é corrigida anatomicamente por meio da reconstrução da área ressecada. Usualmente as reconstruções são realizadas com a simples aproximação de tecidos remanescentes, músculo ou retalho miocutâneo. As alterações vocais nas laringectomias verticais incluem alteração da qualidade vocal com rouquidão, aspereza e soprosidade, redução de intensidade vocal, alteração do pitch e incoordenação pnemo -fonoarticulatória. Com relação as laringectomias horizontais, ALONSO (1947), descreve a técnica de laringectomia parcial supraglótica, indicada para tumores T 1 a e T 1 b e alguns T2. Neste tipo de cirurgia, há a remoção da epiglote e pregas ariepiglóticas e vestibulares, que funcionam como esfíncter de proteção da via aérea inferior, restando as pregas vocais como único mecanismo protetor laríngeo à deglutição. A maioria dos pacientes submetidos a laringectomias supraglóticas demonstra dificuldades para a deglutição, 79 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO apresentando freqüentes aspirações, principalmente com líquidos, devido à ineficiência laríngea em proteger a via aérea inferior. Embora a laringectomia parcial ofereça uma qualidade vocal inferior à radioterapia, proporciona a preservação da voz laríngea com maior segurança. O efeito sobre a capacidade de produção da voz e da capacidade de deglutição depende da extensão e da natureza da cirurgia realizada. REABILITAÇÃO FONOAUDIOLÓGICA As laringectomias parciais alteram a geometria e a arquitetura histológica da glote, gerando uma deficiência da coaptação glótica, que poderá ser corrigida ou não pela reconstrução. O maior dilema, é que existe a necessidade de um tubo aberto para a respiração, em contra-ponto com a necessidade de um esfíncter rápido tanto para a fonação como para a deglutição. Os distúrbios vocais e da deglutição que acontecem em decorrência das excisões laríngeas parciais, requerem a atuação de um fonoaudiólgo, que terá o papel de auxiliar o paciente na produção de sua melhor voz e de uma deglutição mais facilitada. Para isso, é importante que o fonoaudiólogo esteja completamente informado sobre os detalhes da cirurgia, tais como, estruturas remanescentes e tipos de reconstrução. Os procedimentos realizados pela fonoaudiologia iniciam-se com a orientação pré-operatória, orientação e avaliação pós-operatória, onde se analisa o sistema sensóriomotor oral, a mastigação, a deglutição, a voz e a articulação. Nos distúrbios da deglutição o exame da videofluoroscopia, fornece informações valiosas a respeito das disfagias orofaríngeas, possibilitando uma melhor compreensão dos mecanismos compensatórios para a deglutição. Os objetivos da terapia são: •desenvolver a fonação, estimulando a participação das estruturas remanescentes como órgãos vibrantes; •trabalhar com a qualidade da comunicação oral, pois sendo limitada a função glótica, devemos buscar técnicas que produzam um efeito global na emissão; •adequar a deglutição através de movimentos compensatórios e/ou manobras para a facilitação da mesma. Os principais impactos funcionais causados pelas laringectomias parciais verticais são: •voz soprosa •fraca intensidade •dificuldade de sonorização •diminuição do tempo máximo fonatório •aspiração na deglutição (temporária) Já nas laringectomias horizontais ocorre: •impacto menor quanto à fonação •alteração importante da deglutição (perigo de aspiração) 80 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA Terapia Fonoaudiológica Na reabilitação indica-se fonoterapia agressiva. Os exercícios ministrados utilizam forças de oclusão do trato vocal, hipertonicidade da musculatura paralaríngea e auxílio da movimentação dos membros superiores na tentativa de reduzir o espaço laríngeo criado (BEHLAU E PONTES, 1995). Nas laringectomias verticais utiliza-se principalmente: •técnicas de favorecimento de coaptação das pregas vocais (empuxe) •escalas musicais •sobrearticulação •técnicas de ressonância com sons de apoio nasais •método mastigatório •sons vibrantes Os exercícios realizados para pacientes submetidos a laringectomias horizontais são: •mobilidade vertical da laringe (alteração de frequência grave/agudo) •técnicas de favorecimento de coaptação de pregas vocais (empuxe) •mudanças posturais de cabeça •manobras de proteção de via aérea inferior (supraglótica, esforço, deglutições múltiplas) •deglutição seletiva de alimentos (miolo de pão/ purê/ gelatina/ iogurte/ líquidos) É importante ressaltar que a laringe tem um grau grande de compensação, independente da cirurgia realizada. E que as reconstruções auxiliam a reabilitação fonoaudiológica. CONCLUSÃO A reabilitação fonoaudiológica se baseia em adequar as funções dentro dos limites anátomo -funcionais impostos pelo tratamento realizado, visando a melhor adaptação do paciente para uma melhor qualidade de vida. * Aula ministrada no VII Encontro de Fonoaudiologia em Cancerologia/1999 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALONSO, J. M. Conservative surgery of the larynx. Trans Am Acad Ophthalmol Otolaryngol, 51:633 - 42, 1947. BEHLAU, M.; PONTES, P. Avaliação e Tratamento das Disfonias. São Paulo, Lovise, 1995. BRASIL, O. O.C.; BEHLAU, M. Laringectomias Parciais Verticais: Avaliação Funcional. Revista Brasileira de Otorrinolaringologia, 65(1), 1999. COLTON, R. H.; CASPER, J.K. Compreendendo os Problemas de Voz: urna perspectiva fisiológica ao diagnóstico e ao tratamento. Porto Alegre, Artes Médicas, 1996. 81 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO COLTON, R.H.; SAGERMAN, R.; CHUNG, C.; YOUNG, Y.; REED, G. Voice Change after Riotherapy. Radiology, 127:821-4, 1978. DOYLE, P. C. 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Sendo a laringe órgão de produção da voz e de respiração, pela laringectomia há a mutilação devido à ablação desse órgão e desmembramento, porque a respiração então feita pelo nariz passa a ser feita unicamente pelo traqueostoma, perdendo o mesmo, a função olfatória. No entanto, os órgãos articulatórios permanecem na via respiratória alta e quando o paciente faz movimentos bucais para falar, não há som algum e consequentemente não mais poderá comunicar-se oralmente. Devido a esse aspecto, evitando consequências emocionais desastrosas para os mesmos, quando são informados da necessidade de um treinamento para a aquisição de uma voz suplente que demandará tempo, motivação por parte dele e grande apoio familiar, para que possa haver a sua reintegração ao mu ndo dos falantes. COMO VOLTAR A FALAR Voz Esofageana Histórico A constatação de que o esôfago poderia ser utilizado como fonte sonora data de muito tempo, quando em 1928, RAPRAND observou fonação esofágica em paciente com obstrução laríngea traumática. Mais tarde, surgiram outros relatos, ainda sem uma descrição exata da fisiologia desse mecanismo (BOURGET, 1856; CEZERMAK, 1859). Somente algumas décadas depois, GUTZMANN (1908) elaborou o método de aprendizado, denominado por SEEMAN em 1926, de voz esofageana. 83 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO Métodos de Obtenção da Nova Voz I - Método da inalação (ou aspiração de ar) Apresenta certa dificuldade de execução devido à necessidade de grande controle muscular: o ar penetrará através de uma aspiração do ar corrente para o esôfago, fazendo com que o mesmo produza uma abertura devido à diferença de pressão: a do meio ambiente e a dele própria (pressão negativa) a qual absorve o ar do ambiente. É um método que exige grande disciplina, atenção e calma. Este método foi criado por SEEMAN em 1926. II - Método da deglutição Constitui-se no método clássico de produção de voz esofágica, sendo mais fácil de ser compreendido e executado que o anterior. Consiste da deglutição do ar imediatamente seguida da expulsão na forma de qualquer vogal. Se houver demora, a bolha de ar descerá para porções mais inferiores do esôfago ou mesmo penetrará no estômago, invalidando a manobra. É um método que provoca uma fala interrompida devido à necessidade de inúmeras deglutições às diferentes sílabas, o aparecimento do “Klunging” representado pelo ruído da bolha sendo deglutida e escape de ar pelo estoma. Este método foi criado por GUTZMANN em 1908. III - Método da injeção (holandês) Engloba duas técnicas: a injeção do ar por pressão glossofaríngea ou por injeção consonantal. Na primeira, a língua comporta-se como uma bomba mecânica que comprime e injeta o ar no esôfago. Na Segunda, repete-se o movimento mas, tentando a emissão de /k/,/p/,/t/ o que faz com que a parte do fluxo de ar atinja o esôfago. A bola de ar retorna à cavidade oral em ambas as técnicas e é então articulada. A fala é fluente por permitira reposição do ar durante a própria emissão e dos 3 métodos, é o que apresenta melhor qualidade vocal. Este método foi criado por MOOLE-NAAR-BIJL em 1953 e aperfeiçoado por DAMTSE em 1958. Em qualquer dos três métodos, há necessidade da formação de uma nova glote, o que se dá na altura da 6a vértebra cervical, através de contrações fônicas crico-faríngeas, muito embora possa haver outros pontos nada desejáveis: entre dorso da língua e véu palatino, entre base da língua e parede posterior da faringe entre pregas mucosas e bordas cicatriciais, entre pilares anteriores e palato mole (voz de pato Donald), entre músculos ariepiglóticos e estilofaríngeos (voz coaxada). Após a aquisição do mecanismo de produção da eructação para a nova voz, devese observar certos aspectos didáticos: − controle das emissões (perceber que a fluência virá aos poucos, não pretendendo falar de repente) − monossílabos, dissílabos, trissílabos − numerais − grupos consonantais − arquifonemas − frases 84 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA AVALIAÇÃO DOS NÍVEIS DE AQUISIÇÃO DA VOZ ESOFAGEANA (WEPMAN et al, 1953) Nível Produção do som Habilidade da fala 1 2 3 4 5 6 7 Automática Voluntária Contínua Voluntária Voluntária a maior parte Voluntário às vezes Involuntário Impossível Normal Frases Palavras Monossílabos Sem palavras Sem palavras Sem som algum A laringe artificial ou eletro-laringe em 1940 e durante muito tempo foi a única forma de comunicação oral. Constitui-se de um cilindro de metal com um vibrador com uma membrana vibrátil e botão liga – desliga. Colocado na região cervical e com o paciente articulando, o ruído produzido pelo aparelho é levado aos tecidos do pescoço, ampliado e transformado em voz. Porém, é uma voz mecânica, monótona, robotizada. VOZ COM PRÓTESE Aperfeiçoadas na década de 1970, são implantadas cirurgicamente e consistem de uma válvula unidirecional colocada em uma fístula traqueo-esofágica criada. A oclusão do traqueostoma pelo próprio paciente, leva o ar para a fístula que o direciona para o esôfago e dali para a cavidade oral onde é articulado. O ar utilizado é o pulmonar e não o ambiental. A voz é muito boa. Os pioneiros destas próteses foram BLOM E SINGER, em 1979, seguidos por PANJE, em 1981. CONCLUSÃO Deve-se sempre considerar as diferenças individuais tendo em mente os fatores muitas vezes inevitáveis com que muitas vezes nos defrontamos e que poderão bloquear a nova voz , como as alterações psicológicas (perda da imagem corporal, não poder falar, presença definitiva do traqueostoma, não poder fumar), fatores orgânicos, seqüelas cirúrgicas, seqüelas radioterápicas e alterações funcionais. Entretanto, a re-aquisição da comunicação oral é uma realidade: laringectomizados voltam na maioria, às suas atividades, superam o problema, enfrentam e vencem a mutilação voltando a falar de novo, conseguindo provar para si mesmos que estão novamente integrados no mundo ao seu redor tanto social, profissional mas, principalmente com eles mesmos, por terem adquirido uma nova voz. * Aula ministrada no II Encontro de Fonoaudiologia em Cancerologia / 1994. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BOURGUET (1856) apud DAMTSÉ, P.H. Oesophageal speech after larvngectomy. Groningen, Hoitsema, 1958. 85 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO CZERMAK (1859) apud LANDEAU, M. La voix esophagienne. J Franç Oto Rhino Laryng. 10:1-9, 1961. DAMTSÉ, P.H. Oesophageal speech after laryngectomy. Groningen, Hoitsema, 1958. MOOLENAAR-BIJL, A.L. Connection between consonant articulation and the intake of air in oesophageal speech. Folia Phoniatric (Basel). 5:212-20, 1953. RAPRAND (1928) apud LUCHSINGER, R. Der mechanismus der sprech – und stimmbildung bei laryngectomierten und die ubungbehandlung. Pract Oto Rhino Laryng (Basel). 14:304-11, 1952. WEPMAN, J.M., MAC GAHAN, J.A, SHELTON, N.W., RICHARD, J.C. The objective measurement of progressive esophageal speech development. J Speech Hearing Dis. 18: 247-251, 1953. 86 CONSIDERAÇÕES SOBRE OS TIPOS DE RECONSTRUÇÃO DE CAVIDADE ORAL NA FONOARTICULAÇÃO Lica Arakawa INTRODUÇÃO Nas últimas décadas, o desenvolvimento de técnicas reconstrutivas mais elaboradas e eficazes salienta-se como um dos aspectos mais importantes na evolução da Cirurgia de Cabeça e Pescoço. Nessa reconstrução, que tem como objetivo maior, reparar ou minimizar os defeitos decorrentes da ressecção da neoplasia, são empregadas técnicas básicas de Cirurgia Plástica reparadora, enxertos, retalhos e transplantes microcirúrgicos. A indicação e escolha do tipo de reconstrução depende de vários critérios, e um dos principais é a qualidade funcional resultante. A fala é uma das mais importantes funções orais e apresenta-se frequentemente comprometida em doentes com lesões da cavidade oral. No presente trabalho, o objetivo é apresentar considerações referentes a fonoarticulação após os diferentes tipos de reconstrução cirúrgica de cavidade oral. RECONSTRUÇÃO Os principais objetivos do tratamento oncológico são a melhora na qualidade de vida e o aumento do tempo de sobrevida dos doentes. A cirurgia reparadora visa primeiramente proteger as estruturas vitais como grandes vasos ou meninges. Deve ser “preferencialmente realizada no mesmo ato operatório da ressecção, propiciar cicatrização por primeira intenção e maximizar a reabilitação estética e funcional” (KOWALSKI et al., 2000). 87 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO Na escolha do método de reconstrução, seguem-se os princípios de cirurgia plástica, caminhando do mais simples para o mais complexo. Frente a um defeito a ser reconstruído, a escolha do método respeita a sequência: fechamento primário, transplante livre ou enxe rto, retalhos locais, retalhos regionais, retalhos distantes e retalhos livres ou microcirúrgicos (AZEVEDO, 1989). Quanto à vascularização, os retalhos são classificados em axiais e aleatórios. De maneira bastante simplificada, os retalhos axiais apresentam um sistema de vascularização definido que se estende ao longo de seu eixo longitudinal, e os aleatórios não apresentam um pedículo dominante e sua vascularização depende de um pedículo amplo para assegurar o suprimento sanguíneo. TÉCNICAS DE RECONSTRUÇÃO EM CAVIDADE ORAL Fechamento primário Realizado pela sutura borda a borda da ferida operatória. É a reconstrução mais simples e deve ser usada em defeitos menores. Transplantes livres de pele ou mucosa Os transplantes livres ou enxertos não vascularizados são indicados em defeitos menores em que não houve irradiação prévia ou exposição óssea. Consiste numa técnica simples, a colocação de um fragmento de pele ou mucosa sobre o defeito. Porém, tem seu uso limitado, pois pode ocorrer necrose parcial ou total se o suprimento sanguíneo do leito cirúrgico não for suficiente para manter o transplante livre. Retalho local de língua A técnica baseia-se no descolamento do retalho para o fechamento do defeito, mantendo a vascularização pela parte não descolada. É utilizado em defeitos menores como perdas médias de soalho de boca lateral e anterior e realizada em dois tempos cirúrgicos. São pediculados anterior ou posteriormente pela artéria lingual. Retalhos à distância ou regionais (KLIGERMAN, 1989; KOWALSKI et al., 1999) •Nasogeniano: indicado para perdas com mucosa, músculo e osso ou exposição óssea. Podem ser pediculados superior ou inferiormente. É realizado em dois tempos cirúrgicos. Não é indicada para indivíduos com a barba cerrada. •Frontal ou de MacGregor: é colocado na cavidade oral por trás da arcada zigomática ou através de incisão em nível de região massetérica, sem riscos de lesão de ramos do nervo facial. Uso limitado devido ao defeito na área doadora e é realizado em dois tempos cirúrgicos. •Platisma: retalho volumoso. Pouco utilizado em cavidade oral. Não é indicado quando realiza-se o esvaziamento cervical radical e em doentes com programação radioterápica. •Delto Peitoral ou de Bakmjian: indicada para grandes defeitos, é realizado em dois tempos cirúrgicos e pode ou não ser utilizado na forma tubulizada. •Peitoral maior ou de Aryan: retalho músculo-cutâneo ou osteomiocutâneo-7° costela confiável e versátil. Éconfeccionado num só tempo cirúrgico. Apresenta como desvantagem a perda de volume na área doadora (mama). Seu uso é frequente na perda associada do soalho bucal, língua e osso. •Trapézio ou de Demergasso: retalho de músculo cutâneo ou osteomiocutâneoespinha da omoplata confiável. Excelente opção nas grandes perdas da cavidade 88 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA oral, sua vascularização é fornecida pela artéria cervical transversa. Ocorre num só tempo cirúrgico. Transplantes microcirúrgicos Indicado para defeitos maiores, principalmente se a perda é de vários tecidos diferentes, ou exige cirurgia complexa, em várias etapas. Os transplantes microcirúrgicos realizam-se com a retirada do retalho da área doadora com seu feixe vascular e posterior reanastomose realizadas pelo uso do microscópio (BESTEIRO E FERREIRA, 1989). • Retalho cutâneo -antebraquial ou retalho chinês: retalho confiável, volumoso e versátil. • Retalho mucoso -de jejuno • Retalho músculo-cutâneo -reto-abdominal • Retalho osteomio-cutâneo -crista escapular -crista ilíaca: para defeitos compostos de osso e mucosa. -paraescapular-costa-grande-dorsal: para defeitos ósseos maiores com grande perda de substância mucosa e de pele. ASPECTOS FONOARTICULATÓRIOS McCONNEL et al. (1987) realizaram em estudo comparativo entre três tipos de reconstrução: enxerto de pele, retalhos parciais de língua e retalhos miocutâneos em 212 doentes com lesões neoplásicas com estadio T2 e T3 de língua e soalho de boca com radioterapia pós-operatória. Foram avaliadas a inteligibilidade e articulação seis meses após a cirurgia. Os resultados apresentados foram melhores escores de inteligibilidade e articulação para os enxertos de pele, seguidos pelos retalhos miocutâneos. Os retalhos locais de hemilíngua apresentaram os piores escores nos dois aspectos. Em 1990, MICHIWAKI et al. realizaram um trabalho com o objetivo de verificar os prejuízos articulatórios em pacientes glossectomizados e pelveglossectomizados parciais, cujo retalho usado na cirurgia reparadora foi o microcirúrgico de antebraço. Concluíram em seu trabalho que o uso deste retalho é satisfatório quanto ao aspecto da fala em pacientes com ressecções de língua e soalho, pois glossectomizados parciais apresentaram excelentes escores e os demais resultados de inteligibilidade foram inversamente proporcionais à área ressecada. LOGEMANN et al. (1993) examinaram 11 pacientes submetidos a ressecção cirúrgica de mais de um centímetro de base de língua, tonsila e pilares das fauces associada com ressecção de mandíbula do lado do tumor e reconstrução com fechamento primário. Destes, seis realizaram radioterapia pós-operatória e nove, fonoterapia. Nos casos de ressecção anterior de língua, a dificuldade maior ocorreu nos fonemas africados, seguidos das fricativas posteriores e das linguo-dentais; e nos casos de ressecções de base de língua, os erros ocorreram mais em fricativas posteriores, seguidos de fonemas africados. Em 1996, McCONNEL et al. concluíram um estudo realizado em 10 anos em 6 centros renomados em Cirurgia de Cabeça e Pescoço. Quatro grupos funcionais foram emparelhados, sendo: (1) de pacientes com ressecção de região anterior de língua com soalho de boca; (2) com ressecção de região anterior de língua com soalho e 89 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO mandibulectomia segmentar lateral; (3) com mais de 1 cm de base de língua, tonsilas e palato mole e o (4) com mais de 1 cm de base de língua, tonsilas, palato mole e mandibulectomia segmentar lateral. Os pesquisadores concluíram neste estudo que o fechamento primário mostrou escores iguais ou melhores em relação aos retalhos à distância e microcirúrgicos, sendo estes últimos equivalentes nos escores apresentados na avaliação da inteligibilidade e articulação. Um estudo retrospectivo foi realizado por KAMATA (1996) no qual foram apresentados os resultados da cirurgia reconstrutiva num período de 22 anos (1973-1994). Foram comparados os retalhos miocutâneos peitoral maior, delto-peitoral e os retalhos microcirúrgicos. Quanto a avaliação de fala, concluiu-se que em glossectomizados parciais com preservação de língua maior ou igual à metade, os escores correspondiam à fala compreensível a maior parte do tempo, necessitando ocasionalmente de repetição, independente do tipo de reconstrução. Em pacientes com ressecção de língua móvel maior que 2/3, os escores foram bastante variáveis , com média de fala compreensível a maior parte do tempo para retalhos microcirúrgicos e retalho miocutâneo peitoral maior. Em reconstrução com retalho delto-peitoral, os escores indicaram fala compreensível com apoio visual (face a face). Com intuito de estabelecer um método objetivo de avaliação, PANCHAL et al. (1996) realizaram um estudo prospectivo de avaliação da fala e da deglutição com 8 pacientes submetidos a cirurgia de ressecção de câncer de cavidade oral (T2-T3), reconstrução com retalho de tecido livre microvascular de antebraço e radioterapia pósoperatória. Todos foram glossectomizados parcialmente e quatro com mandibulectomia segmentar. Cinco pacientes tiveram excelentes escores na avaliação da fala, dois moderados e um resultado considerado insatisfatório. Os retalhos microcirúrgicos de antebraço e miocutâneo peitoral e nasogeniano foram comparados quanto ao aspecto funcional por POMPEI et al. (1998) em grupos de 15 pacientes de cada tipo de retalho realizado em cavidade oral. O retalho miocutâneo de peitoral maior apresentou melhor performance nas glossectomias totais ou subtotais. O nasogeniano confirmou ser a primeira escolha reconstrutiva para ressecções Antero-laterais de língua e soalho. Especialmente em glossectomias parciais, os retalhos de antebraço mostraram-se confiáveis e seguros, com sua espessura reduzida e maior flexibilidade. DISCUSSÃO O procedimento das diversas técnicas tem sido descrito com minúcias na literatura, porém, poucos relatos são dedicados à avaliação dos aspectos funcionais observados após a cirurgia reconstrutiva. Segundo McCONNEL et al. (1996) “quando um cirurgião precisa decidir como vai reconstruir a região da cavidade oral e/ou da orofaringe, a primeira consideração é a preservação da fala e da deglutição. Porém, há uma falta de dados quanto a estes aspectos para a decisão.” Considerando apenas estes estudos e seguindo os princípios básicos da Cirurgia Reparadora, o fechamento primário, além de simples e rápido, mostrou ser um tipo de reconstrução eficiente quanto ao aspecto fonoarticulatório em ressecções de T2-T3 de língua em avaliação isolada, e iguais ou melhores se comparadas aos retalhos à distância e microcirúrgicos em pelveglossectomias e ressecções de orofaringe. Os enxertos de pele mostraram ser melhores do que os retalhos distais miocutâneos de peitoral maior, que por sua vez, apresentaram resultados melhores do que os retalhos locais de 90 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA língua em ressecções T2-T3 de língua. Os escores obtidos na avaliação funcional do retalho nasogeniano foram mais altos em ressecções antero-laterais de língua. Também foram altos os escores do miocutâneo peitoral maior em glossectomias maiores que 2/3 de área de ressecção. O delto-peitoral apresentou resultados piores em ressecções dessa mesma região e extensão em relação ao peitoral maior e aos microcirúrgicos de antebraço. Os retalhos microcirúrgicos de antebraço mostraram resultados satisfatórios em todos os estudos, sendo equivalente aos retalhos à distância em pelveglossectomias e ressecções de orofaringe. CONCLUSÃO Sabemos, obviamente que os diferentes resultados funcionais pós-operatórios não dependem exclusivamente do tipo de reconstrução e sim de um conjunto de fatores envolvendo o local, a extensão e a abordagem cirúrgica de ressecção; os tratamentos oncológicos complementares; o acompanhamento fonoaudiológico; assim como os aspectos individuais. Porém, também é clara a importância de uma atenção cada vez maior aos tipos de reconstrução utilizados, visto que nas últimas três décadas as técnicas de cirurgia reparadora vêm apresentando avanço com objetivo de melhorar os aspectos funcionais e estéticos, para consequentemente melhorar a qualidade de vida do paciente. Os estudos citados apenas ilustram resultados pouco conclusivos devido ao número reduzido de sujeitos em relação às inúmeras variáveis. Seria necessário padronizar o método de avaliação e aplicá-lo em grupos semelhantes quanto às variáveis para obter resultados comparativos representativos. Assim mesmo, é possível desenvolver alguns critérios que auxiliem na escolha de um tipo de reconstrução. Por exemplo, o uso de retalhos microcirúrgicos, tão complexos, nem sempre substituem os retalhos à distância ou podem apresentar resultados piores do que um simples fechamento primário em seus aspectos funcionais nas pelveglossectomias. Ao mesmo tempo, podem representar a melhor alternativa em defeitos compostos entre os demais retalhos. Para tanto, espera-se que mais estudos forneçam dados do efeito funcional das várias reconstruções, não somente descrevendo seus procedimentos cirúrgicos, possibilitando uma seleção cada vez mais aprimorada e reduzindo os riscos de insucessos na reabilitação. * Aula ministrada no VII Encontro de Fonoaudiologia em Cancerologia / 1999 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AZEVEDO,J.F. Princípios gerais e Técnicas de Reconstrução em Cirurgia de Cabeça e Pescoço. IN: BRANDÃO, L. G.; FERRAZ, A. R. Cirurgia de Cabeça e Pescoço Princípios Básicos. v. 1, São Paulo, Roca, 1989. KAMATA, S. Reconstuction Alternatives using free flaps or pedicled flaps. IN: SHAH, J.P.; JOHNSON, J. T. Head and Neck Proceedings, v. 4, 1996. KLIGERMAN, J.; NASSIF, T. Reconstrução do Soalho da Boca e Aplicação dos retalhos Livres na Cavidade Oral. IN: BRANDAO, L. G.; FERRAZ, A. R. Cirurgia de Cabeça e Pescoço - Princípios técnicos e terapêuticos. v.II, São Paulo, Roca,1989. 91 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO KOWALSKI, L. P.; CARVALHO, A. L.; MAGRIN, J. Cirurgia Reparadora em Câncer de Cabeça e Pescoço. IN: CARRARA-DE ANGELIS, E.; FURIA, C. L. B.; MOURÃO, L. F.; KOWALSKI, L. P. A Atuação da Fonoaudiologia no Câncer de cabeça e pescoço. São Paulo, Lovise, 2000. LOGEMANN, J.A.; PAULOSKI, B.R.; RADEMAKER, A.W.; McCONNEL, F.M.S.; HEISER, M.A.; CARDINALE, S.; SHEDD, D.; STEIN, D.; BEERY, Q.; JOHNSON, J.; BAKER, T. Speech and swallow function after tonsil/ base of the tongue resection with primary closure. Journal of speech and hearing research, 36: 918-26, 1993. McCONNEL, F.M.S.; TEICHGRAEBER, J.F.; ADLER, R.K., A Comparison of three methods of oral reconstruction. Arch. Otolaringol. Head and neck surg, 113: 496500, 1987. MICHIWAKI, Y.; OHNO, K.; IMAI, S.; YAMASHITA, Y.; SUZUKI, N.; YOSHIDA, H.; MICHI, K. Functional effects of intraoral reconstruction with a free radial forearm flap. J. Cranio. Max. Fac.. Surg., 18: 164-8, 1990. PANCHAL, J.; POTTERTON, A. J.; SCANLON, E.; McLEAN, N.R.An objective assessment of speech and swallowing following free flap reconstruction for oral cavity cancers. British journal of plastic surgery, 49: 363-9, 1996 POMPEI, S.; CARAVELLI, G.; VIGILI, M. G.; DUCCI, M.; MARZETTI, F. Free Radial Forearm Flap and Myocutaneous Flap in Oncological reconstrutive surgery of the oral cavity. Comparison of functional results. Minerva Chir, 53(3): 183-92, 1998. 92 INFLUÊNCIA DAS PRÓTESES OBTURADORAS E REBAIXADORAS DE PALATO NA TERAPIA FONOAUDIOLÓGICA Viviane Alves de Carvalho INTRODUÇÃO O câncer de boca é um dos tumores mais freqüentes na cirurgia de cabeça e pescoço. Segundo dados da União Internacional Contra o Câncer (BOSCH E COLEMAN, 1999), as lesões malignas da cavidade bucal ocupam o sexto lugar mundial em incidência. No Brasil, estima-se, para 1999, a ocorrência de 261.900 casos de câncer, dos quais 3% serão de boca (FOSP,1999). Deste número, 10% correspondem aos tumores de maxila, palato duro e palato mole. Estes tumores são mais freqüentes no sexo masculino, numa proporção de 4 homens para uma mulher. Os principais fatores de risco para o aparecimento destas lesões são: tabagismo, etilismo, uso de próteses dentárias mal adaptadas, higiene oral precária e dentes em mau estado de conservação (TEIXEIRA et al.,1994). O tratamento do câncer de palato pode ser feito por irradiação em casos de lesões iniciais, bem localizadas e sem comprometimento ósseo. Porém, na maioria das vezes, as lesões apresentam-se em estágios avançados, necessitando do tratamento cirúrgico, complementado com radioterapia quando indicada. Nas ressecções de maxila, palato duro e palato mole ocorre uma comunicação entre as cavidades oral e nasal, que promovem limitações de ordem física, estética, alimentar além de comprometerem a comunicação oral (BRANDÃO et al., 1999). Alguns autores afirmam que com relação à voz, o paciente pode apresentar ressonância predominantemente hipernasal, loudness reduzida, tempos máximos fonatórios reduzidos e incoordenação pneumofonoarticutória. Na fala, aparecem as trocas articulatórias dos sons sonoros orais pelos sons nasais e uma imprecisão articulatória de todos os sons, mas principalmente dos sons plosivos e fricativos surdos, porque 93 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO necessitam de uma maior pressão intra-oral. Com relação à deglutição, nas ressecções de maxila e de palato duro, pode haver alteração nas fases oral preparatória e oral da deglutição caracterizada por dificuldade de mastigação e por refluxo nasal. As ressecções de palato mole podem alterar a fase orofaríngea da deglutição manifestada por refluxo nasal e estase alimentar em valécula e seios piriformes. (DaBREO et al.,1990; ALTMANN, 1994; BEHLAU E GONÇALVES, 1994; BRANDÃO et al., 1999). REABILITAÇÃO PALATOTOMIAS PROTÉTICA NAS MAXILECTOMIAS E Para a reabilitação das ressecções de palato, é necessário o trabalho integrado entre o fonoaudiólogo e o cirurgião dentista responsável pela confecção de próteses que possam estar preenchendo as cavidades criadas pela cirurgia. Historicamente, as primeiras tentativas de reabilitação protética da fissura palatina remontam a 2.600 a.C. com os egípcios. No século XVI, Pierre Fauchard e Claude Martin contribuíram para a evolução do tratamento protético. Mc Grath, Suersen e Kingsley continuaram o avanço nesta área ao considerarem na confecção dos obturadores palatinos os aspectos anatômicos e funcionais do palato mole e faringe (MATTOS et a1.,1994). Segundo PIZZI et al. (1991) a prótese é um dos melhores meios de reabilitação nas ressecções de palato, devido à sua rápida execução, à redução de custos e às possibilidades futuras de modificação. CARRARA-de ANGELIS et al. (1998) afirmam que nas ressecções de palato ou ressecções de maxila, a prótese obturadora é imperiosa para impedir a comunicação oral/nasal e o refluxo alimentar. O objetivo das próteses obturadoras de palato são o de preencher a cavidade criada cirurgicamente e o de separar a cavidade oral da nasal, restabelecendo as funções de fala e deglutição. Os principais tipos de prótese são: próteses obturadoras palatinas e obturadores faríngeos. As próteses obturadoras palatinas são indicadas nas ressecções de palato duro e maxila. Essas próteses são confeccionadas em resina acrílica termo polimerizável, composta por uma parte superior que se acomode na região intracavitária, e outra inferior que restabelece o contorno da abóboda palatina. Os obturadores faríngeos são indicados para as ressecções de palato mole ou em cirurgia que alteram o esfíncter velofaríngeo. Este aparelho é confeccionado a partir de uma placa palatina com retenções de grampos dentais com uma extensão em resina acrílica para a região velofaríngea. Essas próteses podem ser confeccionadas nas fases pré e/ou pós-operatória tardia. A confecção da prótese na fase pré-operatória ocorre quando existe a interação do cirurgião dentista com o cirurgião de cabeça e pescoço. Os objetivos desta prótese que recebe o nome de prótese imediata, segundo MAXYMIW, WOOD E ANDERSON (1989), são: prevenir fibrose tecidual, restaurar contorno do palato, proteger a área cirúrgica e separar a cavidade oral da nasal. MARKER et al. (1997) acrescentam que a prótese imediata garante o aporte nutricional, pois auxilia a mastigação e a deglutição do paciente, e reduz o período de desconforto até que seja feita a prótese permanente. Já a confecção da prótese definitiva deve ocorrer aproximadamente entre os 3 e os 6 meses do pós-operatório. Esse período corresponde ao tempo de cica- 94 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA trização dos tecidos e é reservado também para a realização de radioterapia quando indicada. O principal requisito para o sucesso da adaptação da prótese obturadora palatina é a perfeita integração do trabalho multidisciplinar com várias especialidades como o cirurgião dentista, o cirurgião de cabeça e pescoço e o fonoaudiólogo. INTERAÇÃO CIRURGIÃO DENTISTA E FONOAUDIÓLOGO Existem casos nos quais o atendimento fonoaudiológico deverá ser anterior à confecção das próteses. Isto ocorre por exemplo, quando os pacientes apresentam trismo acompanhado de rigidez muscular. Desta forma, o paciente deve passar um período preliminar em atendimento fonoaudiológico e só quando houver abertura da boca próxima de 40 mm, este deve ser reencaminhado ao cirurgião dentista. Durante a confecção da prótese, o fonoaudiólogo atua auxiliando o cirurgião dentista na adaptação funcional do obturador faringeano. No momento da moldagem do obturador faringeano, é realizada avaliação perceptivo-auditiva com amostras de fala que promovam um maior fechamento do esfíncter velofaríngeo como as vogais /i/ e /u/, contagem de números, frases com sons fricativos e plosivos surdos, entre outros. A partir deste procedimento, verificam-se as mudanças na ressonância de voz e no padrão articulatório. Também é realizada a avaliação da deglutição da saliva e água, observando-se a presença ou ausência do refluxo nasal. Na adaptação imediata do obturador faringeano, nem sempre observa-se uma melhora completa da voz e da deglutição, pois ainda não houve tempo suficiente para que as estruturas remanescentes do esfíncter velofaringeo pudessem se adaptar e se moldar a prótese e realizar um fechamento próximo do normal. A adaptação funcional normalmente ocorre de 3 a 6 meses após a colocação do obturador faringeano. Neste período o paciente deve ser reavaliado e se necessário, ajustes na prótese serão realizados. Após a adaptação da prótese, a fonoterapia deve prosseguir se ainda se observar a presença de hipernasalidade e a diminuição na inteligibilidade de fala. Os exercícios para estas situações podem ser, entre outros, sobrearticulação, aumento do fluxo aéreo oral, redução na velocidade de fala. YOSHIDA, MICHI E OHSAWA (1990) avaliaram 8 pacientes pós-maxilectomia com e sem prótese obturadora. A função velofaríngea foi analisada por meio da expirometria e da nasofibroscopia. Em 50 % dos pacientes houve uma melhora drástica na inteligibilidade de fala. A falta de melhora na inteligibilidade dos outros 50 % dos pacientes foi atribuída à incompetência velofaríngea ou à adaptação inadequada das próteses. Ainda na década de noventa, PEGORARO-KROOK (1995) observou melhora na inteligibilidade de fala e redução da hipernasalidade e da emissão de ar nasal após o tratamento protético do palato. UMINO et al. (1998) avaliaram em 54 pacientes com e sem prótese a inteligibilidade de fala. A média da inteligibilidade de fala sem a prótese foi de 35,7% e com a prótese de 84,9%. A análise revelou que a comunicação entre a cavidade oral e nasal foi um dos fatores que influenciaram na inteligibilidade de fala sem a prótese. LEVI et al. (1999) observaram a redução da nasalidade, adequação da clareza articulatória e melhora da inteligibilidade de fala, após a adaptação de próteses obturadoras em 7 pacientes. 95 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO PRÓTESES ORAIS NAS RESSECÇÕES DE LÍNGUA E ASSOALHO DE BOCA. Nas ressecções parciais ou totais de língua e /ou de assoalho pode ser indicada a adaptação de próteses do tipo rebaixadora de palato ou prótese de língua.. Segundo FURIA (1999) a modificação da ressonância está intimamente relacionada ao tamanho e ao formato da boca. Desta forma, pacientes que apresentam ressecções em cavidade oral podem beneficiar-se do uso de prótese intra -orais. Os objetivos desta prótese são reduzir o espaço da cavidade oral, melhorar as características de ressonância, auxiliar no direcionamento do alimento e propiciar contato com a língua remanescente favorecendo a deglutição e a articulação. O fonoaudiólogo auxilia o cirurgião dentista na adaptação desta prótese, através da avaliação fonoarticulatória e de deglutição. A prótese rebaixadora de palato é realizada a partir de uma prótese dentária superior convencional. Coloca-se sobre a prótese, na região do palato duro, uma placa de cera. Em seguida solicita-se ao paciente a emissão de sílabas ou de palavras com os sons linguodentais ou línguo velares. Nos casos em que existe uma porção de língua remanescente e móvel, a partir da compressão realizada pela língua durante a emissão destes sons, é possível realizar a moldagem da prótese rebaixadora e definir a altura desta placa. Após isto, pode-se solicitar ao paciente que permaneça de uma a duas semanas com este primeiro molde ainda em cera. Ao término deste período, o paciente é reavaliado, e ajustes ou desgastes podem ser realizados. A última etapa é então finalizada, com a prótese sendo acrilisada. Este mesmo procedimento ocorre nas glossectomias totais. Porém nestes casos, existe a tendência, na maior parte das vezes, de se confeccionar uma placa rebaixadora em toda a extensão do palato e numa mesma altura. Ajuste nestas próteses são realizados até que o fonoaudiólogo defina que houve uma melhora na emissão de fala e na deglutição. ROSSI et al. (1999) observaram melhora na inteligibilidade de fala em 5 pacientes glossectomizados após o uso da prótese rebaixadora de palato. Um outro tipo de prótese é a chamada prótese de língua, cujo objetivo é reconstruir o órgão perdido. Neste caso, é realizada uma prótese mandibular que se estende por todo o assoalho da boca, buttons são posicionados e uma língua de silicone é inserida nesta região. Neste tipo de prótese existe a necessidade de se confeccionar duas peças. Uma delas irá apresentar uma elevação na região anterior, facilitando a emissão dos sons linguodentais. A outra peça, terá uma depressão na região posterior com a finalidade de facilitar o direcionamento do bolo alimentar para a orofaringe durante a deglutição. Segundo DIB e SENEDA (1999), este tipo de prótese mostra-se interessante do ponto de vista funcional, porém inconveniente do ponto de vista prático, já que o paciente deve realizar a troca da peça dependendo da função que irá exercer. * Aula ministrada no VII Encontro de Fonoaudiologia em Cancerologia / 1999 REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS ALTMANN, E.B.C. Fissuras Labiopalatinas. São Paulo, Pró-fono, 1994. BEHLAU, M. S.; GONÇALVES, M. 1. Desordens vocais no paciente com inadequação velofaríngica. IN: ALTMANN, E. B. C. Fissuras Palatinas, São Paulo, Pró-fono, 96 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA BOSCH, F. X.; COLEMAN, M. P. Epidemiologia descritiva e câncer humano. IN: Internacional Union Against Cancer. Manual de Oncologia Clínica, São Paulo, Springer-Verlag, 1999. BRANDÃO, APB; CARRARA-DE ANGELIS, E; FURIA, CLB; MARTINS, NMS; MARIANI, PB; SÊNEDA, LM. Reabilitação protética e fonoaudiológica nas palatotomias. In: KOWALSKI, LP, DIB, LL; IKEDA, MK; ADDE, C. - Prevenção, diagnóstico e tratamento do Câncer Bucal, ed. Frontis Editorial, p.511-21, 1999. CARRARA-ANGELIS, E; BRANDÃO, A.P.B FÚRIA, C; MARTINS N.M. Rumos atuais da fonoaudiologia em oncologia. Rev. Conselho Federal de Fonoaudiologia-Brasil, 1(1):46-53,1998. Da BREO, E.L.; CHALIAN, V.A.; LINGEMAN,R.; REISBICK, M.H. Prosthetic and surgical of osteogenic sarcoma of the maxilla. J. Prosthet.Dent, 63(3):316-20,1990. DIB, L.; SENEDA, L.M. Reabilitação com prótese bucomaxilofacial. IN: CARRARA– ANGELIS, E; FÚRIA, C; MOURÃO, L.; KOWALSKI, L Atuação da fónoaudiologia no câncer de cabeça e pescoço. São Paulo, Lovise, 1999. FURIA, C Reabilitação fonoaudiológica nas ressecções de boca e orofaringe. 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ROSSI, D.F.; FURIA, C.L.B.; CARRARA DE ANGELIS, E; GOMES, D.BARROS, A.P.B., MARTINS, N.M.S. Avaliação Perceptiva da comunicação de pacientes glossectomizados totais e parciais com o uso da prótese rebaixadora de palato. IN: IV CONGRESSO BRASILEIRO DE CÂNCER BUCAL, São Paulo,1999, Anais. 97 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO TEIXEIRA, A.C.B.; ALVES, C.A.F.; SILVA, C.T.; GENOVESE, W.J. Câncer de boca Noções básicas para prevenção e diagnóstico. São Paulo, Fundação Petrópolis, 1997. TURNER, G.E.; WILLIANS,W.N. Fluoroscopy and nasoendoscopy in designing palatal ligt protheses. J. Prosthet.Dent, 66(1):63-71,1991. UMINO, S.; MASUDA, G.; ONO, S.; FUJITA, A.K. Speech intelligibility following maxillectomy with and without prosteses: an analysis of 54 cases. J.OraI Rehabl, 25(2):153-8,1998. YOSHIDA, H.; MICHI, K.; OHSAWA, T Prosthetic treatment for speech disorder due to surgically acquired maxillary defects. J.Oral Rehabl, 17(b):565-71,1990. 98 ATUAÇÃO FONOAUDIOLÓGICA NAS PARALISIAS FACIAIS Marina Lang Fouquet INTRODUÇÃO A mímica facial é um instrumento importante na comunicação e na expressão de nossos sentimentos: sabemos dizer se alguém está alegre, irritado, pensativo, somente observando sua expressão facial. Quando vamos conversar com alguém, olhamos primeiramente para o rosto da pessoa. Portanto, a paralisia ou paresia facial gera um impacto estético, emocional e social para o portador, que percebe-se tolhido na sua auto-imagem e na sua expressão. Segundo DEVRIESE (1998), há três problemas principais que afetam o paciente com paralisia facial: somático (dificuldade de fechar os olhos, assimetria, diminuição da função, sialorréia e lacrimejamento), social (impedimento na comunicação, isolamento social e inabilidade para trabalhar) e psicológico (alteração da identidade, medo e vergonha). Ainda existem controvérsias quanto à etiologia da paralisia facial, sendo propostas as seguintes causas: alteração vascular, alergia, vírus, doença auto-imune, hanseníase, polirradiculoneurite, diabetes, afecções da orelha média, herpes zoster, meningites basais e tumores de base, neurinoma do acústico e tumores da glândula parótida. (DORETTO, 1989). Para uma melhor compreensão da paralisia facial é necessário o conhecimento do trajeto do nervo facial, que é o sétimo par craniano, com função mista, mas predominantemente motora. O curso do nervo facial pode ser dividido em supranuclear e nuclear. Na parte supranuclear há a representação motora do nervo facial na região mais baixa do giro précentral. Deste ponto, as fibras se encaminham para o tronco cerebral e a maioria delas cruza, dirigindo-se para o núcleo do lado oposto. Porém, parte das fibras permanece 99 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO homolateral e enervará o quadrante superior da face do mesmo lado. A parte nuclear do trajeto do nervo facial inicia-se no núcleo, com localização no soalho do quarto ventrículo. As fibras partem do núcleo e emergem do tronco encefálico no sulco bulbo-pontino, divididas em duas raízes: uma raiz motora (o nervo facial propriamente dito) e uma raiz sensitiva e visceral (nervo intermédio). Neste ponto, na emergência do VII par craniano no sulco bulbo-pontino, inicia-se o trajeto “periférico”.O nervo intermédio e o nervo facial penetram no meato acústico interno junto com o nervo vestíbulo-coclear, o VIII par craniano. No meato acústico interno, o nervo intermédio forma um tronco nervoso único com o nervo facial, penetrando então no canal facial. Após um curto trajeto o nervo curva-se para trás. Esta curvatura é denominada joelho externo e nesta região há o gânglio geniculado, gânglio sensitivo do nervo facial. O nervo segue então para baixo e emerge do crânio pelo forame estilomastoídeo. Do trajeto que vai do gânglio geniculado até o forame estilomastoídeo há vários ramos: o nervo pretoso maior emerge do gânglio geniculado e é constituído por fibras eferentes viscerais gerais que enervam a glândula lacrimal. O VII par craniano segue em direção ao forame estilomastoídeo, passa então na parede medial da cavidade timpânica, acima da janela oval e abaixo do canal semicircular horizontal, e no final deste segmento, emite fibras para o nervo estapediano (TESTA, 1997), que supre o músculo estapédio. Logo acima do forame estilomastoídeo, o nervo facial emite o nervo corda do tímpano, constituído por fibras aferentes viscerais especiais, que recebem os influxos gustativos dos 2/3 anteriores da língua, e por fibras eferentes viscerais gerais, que enervam as glândulas salivares submandibular e sublingual. Finalmente, o nervo facial emerge do crânio pelo forame estilomastoídeo, emite os ramos auricular posterior (sensibilidade cutânea do pavilhão auricular e meato acústico externo, juntamente com fibras do glossofaríngeo e do vago), ramo digástrico (enervação do ventre posterior do músculo digástrico) e o ramo estilo-hioídeo (enervação do músculo estilo-hioídeo). A seguir, atravessa a glândula parótida, divide-se em tronco temporofacial e tronco cervicofacial, que por sua vez, ou dentro da glândula parótida ou após deixá -la, darão origem aos ramos temporal, zigomático, bucal, marginal da mandibula e cervical. Estes suprem os músculos da mímica facial. Os ramos terminais são muito variáveis na sua disposição, apresentando inúmeras anastomoses entre si. A paralisia facial pode ser dividida em central e periférica. Na central ocorre uma lesão do tracto córtico-nuclear, a paralisia é contralateral e afeta somente o quadrante inferior da face (isto porque, como vimos acima, as fibras homolaterais que enervam o quadrante superior da face permaneceram intactas). Já na paralisia facial periférica ocorre uma lesão do nervo a partir de sua emergência no sulco bulbo-pontino, a paralisia é homolateral à lesão e afeta toda a hemiface (MACHADO, 1991). É interessante conhecermos o trajeto do VII par craniano para entendermos os sintomas e termos noção do topografia da lesão. Como exemplo, no trajeto periférico do nervo facial, se a lesão ocorrer antes do ramo para o estapédio haverá alteração do reflexo estapediano, alteração na gustação dos 2/3 anteriores da língua e paralisia facial do lado homolateral. Há a fase flácida e a fase sequela na paralisia facial (GOFFI-GOMEZ, 1999). A flácida é a fase inicial da paralisia facial, com flacidez da musculatura no repouso e ausência ou diminuição de sua movimentação. É possível haver regeneração e a mobilidade voltar ao normal. Entretanto, pode haver uma reinervação aberrante do nervo facial, caracterizada por sincinesias, contraturas e graus variados de paralisia motora (ROSS et al. 1991), denominada fase das sequelas. Segundo MORAN E NEELY (1996), 100 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA define-se a sincinesia como qualquer movimento involuntário observado na região facial, diferente daquele solicitado voluntariamente. Este movimento anormal é de amplitude maior do que do lado normal da face ou paradoxal em direção ou contração. Estes autores defenderam que há padrões previsíveis e não aleatórios de sincinesias, sendo a mais comum a movimentação involuntária da boca (músculo zigomático maior) com fechamento de olho voluntário. Já a contratura ocorre quando há reinervação da musculatura que passou por um processo de perda de massa e tamanho de fibra, sofrendo algum grau de atrofia. AVALIAÇÃO DA MÍMICA FACIAL A intervenção fonoaudiológica inicia-se com a anamnese, obtendo-se dados sobre o momento da ocorrência da paralisia facial, causa, grau de lesão do nervo e tratamentos propostos até o momento. Nesta primeira sessão, são dadas orientações gerais, como cuidados com o olho (se houver paralisia do músculo orbicular do olho o paciente não consegue fechá-lo) e alimentação (pode haver estase de alimento em vestíbulo, por flacidez do músculo bucinador; perda de alimento e sialorréia por incompetência labial no lado paralisado). Na avaliação da mobilidade dos músculos da mímica, utilizamos a proposta de CHEVALIER et al. (1987): Em primeiro lugar, com a face em repouso, observamos se há os seguintes sinais: abolição das rugas frontais (testa); rebaixamento da ponta da sobrancelha; nariz desviado em vírgula para o lado saudável; abolição do sulco nasomentoniano; abolição do sulco nasolabial; desvio e depressão da comissura labial; lábio superior "caído"; lábio inferior "caído" e bochecha flácida pendendo em saco, determinando o grau de alteração, que é classificado em total, parcial e normal. A seguir, observamos o grau de mobilidade de toda a musculatura da mímica. Adaptamos a avaliação de CHEVALIER et al. (1987), classificando a alteração em cinco graus: Cotação: (0) - a contração não é visível a olho nú, nem a luz rasante. (1) - pequena mobilidade de pele. (2) - a pele move-se mais. Percebe-se levemente as rugas, mas há fadiga da musculatura até após cinco repetições do movimento. (3) - a pele move-se mais claramente. O número de rugas aumenta, assim como sua profundidade. Entretanto, ao efetuar dez vezes a repetição do movimento, nota-se uma diferença de sincronia entre o lado são e o lado lesado. (4) - o movimento é efetuado de maneira ampla, sincrônica e simétrica em relação ao lado são. Músculos da mímica facial 1. Parte frontal do músculo occipitofrontal - solicita-se que o paciente faça "cara de assustado", elevando as sobrancelhas, formando rugas horizontais na testa. Observa-se o grau de mobilidade deste músculo do lado lesado da face. 2. Músculo corrugador do supercílio - pede-se que o paciente faça "cara de bravo", formando rugas verticais entre as sobrancelhas. 3. Músculo piramidal do nariz e músculo transverso do nariz - solicita-se que o paciente faça "cara de cheiro ruim", elevando a pele do nariz, franzindo-a. 101 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO 4. Parte palpebral do mú sculo orbicular dos olhos - solicita-se que o paciente feche suavemente os olhos. Observa-se se há um “gap” no fechamento do olho no lado lesado e mede-se este gap com um paquímetro. 5. Parte orbital do músculo orbicular dos olhos - pede-se que o paciente feche os olhos com força. Mede-se o “gap” com paquímetro. 6. Músculo bucinador - solicita-se que o paciente faça um movimento de sucção. Observa-se se há com tração do lado lesado. Para uma melhor avaliação do tônus deste músculo, é possível introduzir uma espátula na cavidade oral e comparar a contração do músculo bucinador dos dois lados. 7. Músculo risório - orienta-se o paciente a fazer um “sorriso fechado”ou “sorriso irônico” levando as comissuras labiais para trás e para fora. 8. Músculos zigomáticos maior e menor e músculo elevador do lábio superior e da asa do nariz - pede-se que o paciente realize um “sorriso aberto”, que deve ser bem amplo. Ao realizar o “sorriso aberto”, observa-se também a função do músculo depressor do lábio inferior. Quando há lesão da enervação deste músculo, observa-se que o lábio inferior está torto, cobrindo os dentes inferiores no lado lesado. 9. Músculo orbicular dos lábios - orienta-se o paciente a realizar um “bico”, protruindo os lábios. 10. Músculo mirtiforme - solicita-se que o paciente alongue o lábio superior, cobrindo os dentes superiores, como se fosse raspar o bigode com gilete. 11. Músculo depressor do lábio inferior - orienta-se o paciente a mostrar os dentes inferiores, abaixando o lábio inferior. 12. Músculo mentalis - solicita-se que o paciente faça um “bico de criança manhosa”, elevando e protruindo o lábio inferior, contraindo o músculo mentalis. 13. Músculo triangular dos lábios - pede-se que o paciente faça “cara de palhaço triste", levando a comissura labial para baixo, formando um “U” invertido. 14. Músculo platisma - orienta-se o paciente a contrair a musculatura do pescoço. É mais fácil a realização deste movimento em conjunto com a contração do músculo triangular dos lábios. Na avaliação da mobilidade da musculatura da mímica facial, é importante que o avaliador iniba a função da musculatura do lado saudável da face, com pressão digital no sentido contrário ao movimento de contração do músculo que está sendo avaliado. Isto porque a movimentação do lado são pode gerar movimentação passiva do lado lesado da face, dando a falsa impressão que há movimento voluntário do músculo avaliado. Isto é particularmente comum na avaliação dos músculos frontal, corrugador do supercilio, piramidal do nariz, orbicular dos lábios, mirtiforme, mentalis e depressor do lábio inferior. A reavaliação da mobilidade da musculatura da mímica facial deve ser realizada em toda sessão, anotando-se os progressos. O tônus da musculatura também é avaliado e classificado em hipotônico, normotônico ou hipertônico (GOFFI-GOMEZ, BOGAR, BENTO E MINITI, 1996). Durante a avaliação, observa-se se há sincinesia de movimento de algum outro músculo. Por exemplo, motilidade do orbicular dos olhos com atração da comissura labial para cima e para fora (ao fechar os olhos o paciente sorri.). Classifica-se a sincinesia em quatro graus: 0 - ausência de sincinesia +1 - na frente do espelho, o paciente consegue inibir a sincinesia voluntariamente. 102 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA +2 - inibição da sincinesia por pressão digital (pressão digital no sentido contrário ao movimento patológico) +3 - sincinesia incontrolável. TERAPIA MIOFUNCIONAL Segundo GOFFI-GOMEZ (1999), os exercícios miofuncionais objetivam acelerar o retorno dos movimentos e da função da musculatura da mímica facial, evitando que haja a atrofia destes músculos, o que dificultaria a sua recuperação. GOFFI-GOMEZ, BOGAR, BENTO E MINITI (1996), comparando dois grupos com paralisia facial, um que realizou exercícios miofuncionais e outro que não, constataram que os exercícios miofuncionais efetivamente contribuem na aceleração do processo de recuperação dos movimentos faciais. ROSS et al. (1991) demonstraram que o treino neuro-muscular pode melhorar a função facial, mesmo em casos de paralisia crônica há mais de 20 anos. Na fase flácida da paralisia facial, com nenhum movimento ou somente esboço de movimento da musculatura acometida, GUEDES (1994) sugere compressas frias e batidas rápidas com as pontas dos dedos sobre a região muscular tida como flácida. Nesta fase, são realizados exercícios isométricos, repetindo-se os movimentos solicitados durante a avaliação, acrescentados de massagem indutora sobre o músculo paralisado, no sentido do movimento. (GUEDES, 1994; GOFF1-GOMEZ, 1999). Por exemplo, para trabalhar o músculo frontal, solicita-se que o paciente contraia este músculo, realizando a “cara de assustado” e faça massagem digital na direção do movimento do músculo, da sobrancelha em direção ao cabelo. As massagens devem ser exclusivamente manuais e lentas, com pressão profunda (GOFFI-GOMEZ, 1999). Ao notar-se movimentação na musculatura acometida, cessam-se as massagens indutoras e são realizados exercícios isotônicos. Nas sincinesias, os músculos envolvidos devem ser identificados e então trabalha-se a dissociação dos movimentos, com exercícios que visam a utilização independente dos grupos musculares envolvidos. Também são utilizados exe rcícios de alongamento da musculatura contraída em repouso (GOFFI-GOMEZ, VASCONCELOS E MORAES, 1999). Por exemplo, quando o paciente fecha os olhos voluntariamente, há retração involuntária da comissura labial. Para trabalharmos a dissociação, solicitamos que o paciente feche os olhos e mantenha-os fechados, enquanto protrui e retrai os lábios.Todos os exercícios deverão ser realizados na frente do espelho. ROSS et al. (1991) demonstraram o benefício da realização dos exercícios com feedback do espelho. É necessário que o paciente realize os exercícios de forma consciente. * Aula ministrada no VII Encontro de Fonoaudiologia em Cancerologia / 1999 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CHEVALIER, A.M. et al. Avaliação da função motora da face nas lesões periféricas e centrais. IN: LACÔTE, M.; CHEVALIER, A.M.; MIRANDA, A.; BLETON, J.P.; STEVENIN, P. Avaliação clínica da função muscular. Manole, 13-24,1987. DEVRIESE, P.P. Treatment of sequelae after facial paralysis: a global approach. J. Laryngol. otol, 112 (5), 429-31, 1998. 103 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO DORETTO, D. - Fisiopatologia clínica do sistema nervoso – “Fundamentos em semiologia”. São Paulo: Atheneu, 262-72, 1989. 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A radioterapia (Rxt) no tratamento de tais tumores, pode provocar perda auditiva condutiva de diferentes graus (SMOUHA E KARMODY, 1995; VARGHESE et al., 1997). Alguns estudos citam que além dos comprometimentos relacionados à orelha média, os pacientes podem ser portadores também de perda auditiva neurossensorial, sugerindo que a Rxt também altera estruturas da orelha interna (MORETTI, 1976; SINGH et al., 1991; SCHOT et al., 1992; SILVEIRA, 1998). O acompanhamento audiológico desses indivíduos é importante para o tratamento médico otorrinolaringológico, além de possibilitar uma pronta intervenção para a reabilitação, quando necessário. Além da radioterapia, a quimioterapia é uma intervenção clínica comum. Os agentes quimioterápicos podem gerar efeitos colaterais como nefrotoxicidade, mielossupressão, disfunção gastrointestinal e ototoxicidade (BENSADON, 1998). As ototoxicoses são afecções iatrogênicas provocadas por diferentes drogas medicamentosas que alteram o ouvido interno (labirinto). Estas drogas podem afetar o sistema coclear ou o sistema vestibular ou ambos, alterando duas funções importantes do organismo: a audição e o equilíbrio (BAGGER-SJOBACK et al., 1980; OLIVEIRA, 1994). A cisplatina, medicação mais freqüentemente usada na quimioterapia, é uma droga ototóxica, sendo sua principal manifestação a perda auditiva. A incidência e a se- 105 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO veridade da perda auditiva vem sendo reportada por vários autores. RYBAK (1981) observou variação na incidência de perda auditiva de 9% a 91%, dependendo do critério audiológico empregado, da dose de cisplatina utilizada e da velocidade da infusão. Os efeitos bioquímicos da cisplatina são ainda desconhecidos. KOMUNE et al. (1981) sugerem que a cisplatina possa ser responsável pela atrofia da estria vascular e pelo colapso da membrana de Reissner. Segundo eles, as células ciliadas externas localizadas na porção basal da cóclea são as primeiras a serem atingidas podendo haver posteriormente um envolvimento progressivo das células ciliadas externas localizadas mais internamente na cóclea (porção apical). BOHEIM E EKKEHARD (1985) concordam com esta teoria e afirmam que as freqüências agudas são as primeiras atingidas (6000 e 8000 Hz). Com a continuidade do tratamento, a perda auditiva avança para as freqüências mais graves. Segundo LAURELL E BAGGER-SJOBACK (1991) a lesão das células ciliadas ocorre alguns dias ou semanas após a administração da droga e depende da dose. O padrão de alteração auditiva com o uso da cisplatina pode variar de acordo com cada paciente. Essa susceptibilidade individual está presente nos relatos de AGUILARMARKULIS et al. (1981) e de LAURELL E JUNGNELIUS (1990). Esses autores descrevem indivíduos que manifestam acometimento auditivo extenso com baixas doses de cisplatina em oposição a outros que, mesmo após diversos ciclos com altas doses mantém a função auditiva inalterada. Alguns estudos revelam que a ocorrência da perda auditiva não está relacionada com a eficácia oncológica do tratamento com a cisplatina. Isto significa que existem diferentes mecanismos para os efeitos oncológicos e ototóxicos da cisplatina. Nos pacientes avaliados por BLAKLEY E MYERS (1993) os efeitos oncológicos não se correlacionaram com o desenvolvimento da perda auditiva significando, que é possível minimizarr os efeitos ototóxicos sem que a eficácia oncológica seja comprometida. Segundo esses autores as perdas auditivas resultantes da utilização da cisplatina têm efeito cumulativo. Já outros trabalhos (MYERS et. al., 1991) relatam a existência de um platô, a partir do qual os não mais são elevados os limiares auditivos em função da administração da cisplatina. A continuidade da administração da droga não traria então, outros efeitos para a audição. O objetivo maior dos estudos da audição em pacientes que utilizam ou utilizaram a cisplatina é o do aconselhamento. Para alguns pacientes, decisões no que se refere à continuidade ou não do tratamento são baseadas no prognóstico para perda auditiva e subsequente qualidade de vida. As pesquisas neste campo têm contribuído para eliminação de várias drogas ototóxicas do arsenal terapêutico, evitando-se assim a surdez iatrogênica. Além disso contribuem para uma maior eficácia no monitoramento auditivo e vestibular, e possibilitam a administração de tratamentos controlados e mais seguros com doses adequadas e com menos risco de desencadear surdez. E importante monitorar a ototoxicidade durante a administração das drogas ototóxicas principalmente em crianças com idade pré-linguística, para que seja possível diagnostica-la no momento em que ela se inicia. Os pacientes de risco sempre devem ser monitorados (OLIVEIRA, 1994). O acompanhamento auditivo de pacientes tratados com drogas ototóxicas deve ser feito através de um protocolo que inclua a audiometria convencional, a audiometria de alta freqüência (VAN DER HULST et al., 1988; CAMPBELL e DURRANT, 1993) e a pesquisa das emissões otoacústicas. Desta forma, a perda auditiva é diagnosticada o mais 106 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA precocemente possível evitando o isolamento que a deficiência auditiva causa ao portador de câncer (BENSADON, 1998). O trabalho de monitorização dos pacientes tratados com cisplatina no Hospital do Câncer consiste na realização dos seguintes testes: • Audiometria tonal limiar convencional; • Audiometria tonal de alta freqüência; • Audiometria vocal; • Medidas da imitância acústica; • Emissões otoacústicas transientes; • Emissões otoacústicas produto de distorção; • Avaliação otoneurológica (quando necessária). Como critérios de ototoxicidade, adotamos: 1. Audiometria tonal (convencional e de altas freqüências): variação de 25 dB em uma freqüência isolada ou 15 dB em três ou mais freqüências adjacentes; 2. Emissões otoacústicas transientes: desaparecimento de resposta em determinada freqüência, estando esta presente na avaliação inicial, ou variação maior do que 3 dB (mantendo-se os mesmos parâmetros entre as avaliações); 3. Emissões otoacústicas produto de distorção: redução na intensidade de resposta em 6 dB ou ausência de resposta nos exames subsequentes (mantendo-se os mesmos parâmetros de intensidade e ruído). Estudo realizado no Hospital do Câncer (BENSADON, 1998), no período de outubro de 1996 a abril de 1998, com 30 pacientes relacionando alterações auditivas e cisplatina revelou comprometimento auditivo em 73,33% dos pacientes que fizeram uso da droga. Deve ser ressaltado que ao avaliar o acometimento auditivo da cisplatina nas altas freqüências (10 a 16 kHz), obteve-se uma melhor detecção dos efeitos da ototoxicidade. Segundo VAN DER HULST et al. (1998) e DRESCHLER et al. (1989), o estudo das altas freqüências pode aumentar o predomínio das alterações auditivas. Este fato pôde ser comprovado no estudo de BENSADON (1998) no qual, nas freqüências convencionais, observou-se 43,33% de orelhas comprometidas. Com a combinação da pesquisa das altas freqüências, 44% das orelhas inicialmente classificadas como inalteradas, passaram a ser classificadas como alteradas, elevando-se, assim, para 68,33% o percentual de orelhas avaliadas que apresentaram alterações auditivas. As perdas auditivas encontradas neste estudo foram predominantemente bilaterais e simétricas (86,36% dos casos). Somente 13,64% das alterações foram unilaterais. Observou-se também um predomínio do comprometimento das freqüência agudas, sendo detectada uma progressão do comprometimento, com posterior envolvimento das freqüências da fala em poucos pacientes. Neste estudo, as freqüências agudas foram responsáveis por uma maior incidência de orelhas com alterações nos limiares auditivos, após o uso da cisplatina. Ainda com relação à intensidade máxima de perda auditiva para as freqüências agudas, este trabalho demonstrou resultados bastante semelhantes aos encontrados por LAURELL et al. (1987) e ADAMS et al. (1989) que mencionam acometimento de até 40 dB NA. Porém estes números ainda estão distantes das faixas máximas obtidas neste estudo, que foi de 80 dB NA. As perdas auditivas ocorreram de maneira gradual e progressiva. Junto à evolução audiométrica de alguns pacientes foi possível observar uma tendência à estabilização dos limiares auditivos nas altas freqüências, mesmo com o aumento das doses totais. A maior parte das orelhas avaliadas neste estudo (75,6%) teve como momento inicial para instalação das alterações auditivas o primeiro ciclo de quimioterapia. 107 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO Outro dado importante deste estudo diz respeito às emissões otoacústicas. Os resultados obtidos através dos registros das emissões otoacústicas transientes e produto de distorção foram diretamente proporcionais aos encontrados com a audiometria tonal. A monitorização auditiva deve fornecer parâmetros confiáveis e fidedignos para que se possam definir as estratégias terapêuticas para cada paciente. Alterações funcionais das células ciliadas externas que se apresentem de maneira reversível, e não correspondam a um déficit na função auditiva, dificilmente podem ser utilizados como critérios para modificação ou suspensão de uma medicação como a cisplatina. Entretanto, dados fornecidos por exames que demonstram diminuição ou ausência de resposta auditiva, em uma freqüência previamente presente, devem ser valorizados, pois equivalem a um real acometimento funcional nesse nível. Consequentemente, surge a necessidade de uma avaliação auditiva completa e de eventual reavaliação do protocolo de tratamento. Como vimos, o acompanhamento audiológico pode fornecer muitas das informações necessárias para proceder eventuais mudanças no esquema terapêutico, visando a minimização dos efeitos colaterais da cisplatina, e assim, melhorar a qualidade de vida dos pacientes. Além disso, permite a que pais e educadores e familiares de pessoas que venham a desenvolver perda auditiva, recebam precocemente as orientações necessárias inclusive sobre a eventual adaptação de próteses auditivas a adultos e crianças. O diagnóstico da perda auditiva é importante pois pode preservar a capacidade de comunicação dos pacientes e evitar que, uma vez recuperados do câncer, fiquem sem capacidade de retornar à vida normal, em função de seqüelas do tratamento. A vida social dos mesmos já está muitas vezes comprometida, apenas pela ciência do diagnóstico. * Aula ministrada no VII Encontro de Fonoaudiologia em Cancerologia / 1999 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ADAMS, M.; KERBY, I.J.; ROCKER, 1.; EVANS, A.; JOHANSEN, K.; FRANKS, C.R. Acomparison of the toxicity and efficacy of cisplatin and carboplatin in advanced ovarian cancer. Acta Oncol, 28:57-60, 1989. AGUILAR-MARKULIS, N.V.; BECKLEY, S; PRIORE, R; METTLIN, C. Auditory toxicity effects of long-term cis -dichlorodiammineplatinum II therapy in genitorinary cancer patients. J Surg Oncol, 16:111-23, 1981. BAGGER-SJOBACK, D.; FILIPEK, C.S.; SCHACHT, J. Characteristics and drug responses of cochlear and vestibular adenylate cyclase. 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É sabido que tanto as drogas usadas na quimioterapia quanto a irradiação de órbita que atingem o ouvido interno (SMOUHA E KARMODY, 1995; SILVEIRA, 1998) têm potencial ototóxico. O uso de irradiação local ou próximo a estruturas do órgão da audição é também considerado como tóxico para o ouvido. Pode provocar lesão nas porções externa e média e, mais raramente, na orelha interna. A quimioterapia em pacientes portadores de retinoblastoma intra-ocular ainda não está bem definida, embora tenha se mostrado eficaz na preservação da visão em um grande número de pacientes, por evitar a enucleação e radioterapia externa (SHIELDS et al, 1997; FRIEDMAN et al, 2000). A Carboplatina (RYBAK, 1999) e a Cisplatina (ILVESKOSKI et al, 1996; RYBAK, 1999), que fazem parte do arsenal terapêutico no tratamento do retinoblastoma são drogas reconhecidas com as reais capacidades à indução da lesão coclear. A ototoxicidade é definida como a capacidade de gerar lesão em estruturas da orelha interna. Tal lesão pode afetar a cóclea, o aparelho vestibular ou ambos (OLIVEIRA, 1993). A potencialidade do efeito ototóxico não está restrita apenas aos anti-neoplásicos, pois alguns antibióticos, diuréticos e anti-inflamatórios também podem lesar essas estruturas. 110 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA Assim, ototoxicidade é predominantemente iatrogênica, mas com dosagem adequada das drogas e monitorização auditiva seus efeitos podem ser minimizados (BENZADON, 1998). O principal sintoma da ototoxicidade é a perda auditiva (RYBAK, 1999). As altas frequências (acima de 8000 Hz) são as inicialmente acometidas (BENZADON, 1998), seguidas das frequências médias, responsáveis em grande parte pela recepção da fala, já que seu acometimento traz sérios prejuízos para a comunicação. A detecção precoce da perda auditiva é fundamental para evitar-se a progressão da surdez. Considerando-se que o tratamento no retinoblastoma com conservação do globo ocular é eficiente em aproximadamente 50 a 60% dos casos, esta doença potencialmente leva à cegueira. A perda de audição nesses pacientes é portanto, altamente prejudicial por determinar duas deficiências em fase de aquisição de linguagem e desenvolvimento neuropsicomotor. A proposta do nosso trabalho é monitorar a audição de crianças portadoras de retinoblastoma submetidas a quimio e radioterapia através de exames periódicos com o objetivo de detectar a perda auditiva o mais precocemente possível. PROCEDIMENTO São atendidas crianças portadoras de retinoblastoma em qualquer estadio de evolução. Estas crianças são avaliadas usando-se testes objetivos como emissões otoacústicas e imitanciometria (CAMPELL E DURRANT, 1993; WYDEN, 1997). Estes resultados são obtidos antes do início do tratamento, após o 1º ciclo de quimioterapia (Qt), após o 3º ciclo, ao final do tratamento e 6 meses após a última avaliação. Imitanciometria Dois testes avaliam o funcionamento do sistema tímpano-ossicular (STO) na orelha média, a timpanometria e a pesquisa do reflexo estapediano. • impanometria: mede a mobilidade do sistema a variações de pressão. Os timpanogramas são classificados em três tipos A, B e C (HALL III E CHANDLER, 1994). ° Tipo A. É definido como timpanograma normal. Tem um pico (ou ponto de máxima admitância) próximo a ou na pressão atmosférica, entre 0 e -100 daPa. ° Tipo B. Não tem ponto de máxima admitância. À medida que varia a pressão no conduto auditivo externo, existe uma variação relativamente pequena da admitância. ° Tipo C. O ponto de máxima admitância ocorre quando a pressão no conduto auditivo externo excede – 100 daPa. • eflexo estapediano: o músculo estapediano na cavidade da orelha média contrai bilateralmente na presença de sons fortes. O reflexo estapediano medido por meio da imitanciometria, aparece como uma diminuição da complacência (ou aumento da impedância) do STO quando o músculo contrai. O limiar do reflexo é definido como a menor intensidade do estímulo acústico capaz de provocar uma mudança mínima mensurável na complacência do STO. Em indivíduos com audição normal a intensidade mínima necessária para eliciar o reflexo está entre 70 e 100 dB (NA) (NORTHERN E GABBARD, 1994). 111 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO Emissões Otoacústicas Transientes Evocadas (Teoae) São eliciadas por cliques e estão presentes em praticamente todas as orelhas saudáveis. Perdas de audição maiores que 30 dB (NA) impedem a obtenção das emissões. A resposta é dada pela amplitude das ondas A e B, entre 2,5 e 12,5 ms, após a apresentação do estímulo. Para reduzir o artefato do estímulo, a amostra consiste em 2 conjuntos de 4 cliques (3 positivos e um negativo, 3 vezes mais intenso). São apresentadas 260 amostras de dados, que consistem em 2080 cliques (260 x 4 cliques), resultando em 2 submediações (A e B), cada uma contendo respostas de 1040 cliques. A correlação entre as duas ondas A e B é a representação da reprodutibilidade. Quanto menor a reprodutibilidade, menor a probabilidade da emissão estar presente. Quando a reprodutibilidade é alta, as ondas estão virtualmePte indistinguíveis. PARÂMETROS DE INTERPRETAÇÃO DA TEOAE Correlação global entre as duas ondas (reprodutibilidade) Amplitude global da resposta em relação ao ruído Composição de frequência da resposta no espectro FFT e reprodutibilidade em cada banda de frequência CRITÉRIOS DE INTERPRETAÇÃO. PRESENÇA DE EMISSÕES Pelo menos 3 dB S/R em todas as bandas de frequência testadas (VOHR et al., 1993), e reprodutibilidade (WR) >50%. Emissões Otoacústicas Produto De Distorção (Dpoae) Surgem como resultado da interação não-linear de dois estímulos aplicados simultaneamente na cóclea. Perdas de audição maiores que 40dB (NA) impedem a obtenção das emissões. DP. PARÂMETROS DE INTERPRETAÇÃO Amplitude absoluta dentro da faixa normal Amplitude acima do ruído DP. CRITÉRIOS DE INTERPRETAÇÃO (PRESENÇA X AUSÊNCIA) KIMBERLY et al (1997): estabeleceu que 6 dB acima do noise-floor permite 5% de probabilidade de detectar uma emissão falsa. 112 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA DP. CRITÉRIOS DE MONITORAÇÃO DA AUDIÇÃO: Variação maior do que 6 a 9 dB a depender do nível do estímulo (70 e 55 dB SPL, respectivamente), indica uma mudança no estado geral da cóclea se as condições de registro e de OM forem mantidas estáveis Pelo fato de que a variabilidade das DP não é dependente da amplitude inicial da DP permite que mesmo indivíduos com resposta de pequena amplitude podem ser monitorizados (ROEDE et al, 1993). * Aula ministrada do VII Encontro de Fonoaudiologia em Cancerologia/1999 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BENZADON, R.L. Estudo Clínico e Audiológico da Ototoxicidade da Cisplatina. 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New York, Thieme, 1997. 114 ATUAÇÃO FONOAUDIOLÓGICA EM UNIDADE DE TERAPIA INTENSIVA Ana Paula Brandão Barros Nívia Maria da Silva Martins Elisabete Carrara-de Angelis Cristina Lemos Barbosa Furia Carlos Jorge Lotfi O campo de atuação da Fonoaudiologia amplia-se a cada dia, efetivando o compromisso com a saúde. A atuação do fonoaudiólogo em hospitais é relativamente recente, principalmente no que diz respeito ao acompanhamento de pacientes em leito de enfermarias, unidades de terapia semi-intensivas e intensiva (SEMI-UTI e UTI). A atuação ambulatorial em diferentes áreas nos hospitais também amplia-se nas últimas décadas. No hospital, o fonoaudiólogo ingressa na equipe atuando de forma multi e interdisciplinar. Esta atuação é caracterizada com objetivos de prevenção, diagnóstico e reabilitação propriamente dita. Objetiva assim, a redução e prevenção de complicações e restabelecimento da alimentação via oral e da comunicação, importantes para o bem estar do paciente. Idealmente, o fonoaudiólogo que atua em hospital deve ter conhecimentos básicos das especialidades médicas e de reabilitação: neurologia, geriatria, medicina intensiva, pediatria, neonatologia, cardiologia, pneumologia, otorrinolaringologia, oncologia clínica e cirúrgica, radiologia, gastroenterologia, infectologia, odontologia, fisioterapia, enfermagem, farmacologia, nutrição, terapia ocupacional e psicologia, o que obviamente nem sempre é possível em sua formação acadêmica. A UT1 é o local onde o paciente tem suas funções vitais monitorizadas durante todo o tempo, possibilitando corrigir possíveis alterações, em tempo hábil. Trata-se de um atendimento emergencial, que deve ser rápido e intensivo, deixando de ser hospitalar quando ocorre a alta, tornado-se, então, clínico (PELEGRINI, 1999). É de extrema importância que o fonoaudiólogo, ao se inserir na UTI possua conhecimentos específicos sobre alguns procedimentos realizados, bem como valores de 115 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO normalidade e/ou alterações que são mencionados através dos aparelhos de monitorização. Temos o objetivo de descrever as noções básicas e peculiares sobre o controle de infecção para a abordagem destes pacientes, bem como noções sobre os principais aparelhos de monitorização. NOÇÕES DE CONTROLE DE INFECÇÃO HOSPITALAR Na UTI a exposição aos microorganismos se dá basicamente pelo contato direto com o ambiente contaminado ou com os pacientes. O ambiente inanimado, compreendendo ar, água, alimentos, piso, paredes e teto, também contribui como reservatórios de bactérias e fungos, com menor importância na transmissão de microorganismos para o paciente, podendo ser responsável p or surtos de infecção hospitalar (SCARPITTA, 1997). BERGOGNE - BEREZIN (1995) relata que a incidência de infecções adquiridas em UTI tem sido estimada em 5 a 10 %, levando à morte uma em cada 5000 pessoas hospitalizadas. O Controle de Infecção Hospitalar é o esforço organizado em manipular e controlar o ambiente e a equipe, para eliminar ou minimizar a exposição a microorganismos patogênicos que possam tornar doentes profissionais de saúde ou seus pacientes. Há dois tipos de microorganismos: patogênicos (produzem doenças) e nãopatogênicos (oportunistas, por serem inofensivos, até que uma determinada situação os torne ofensivos novamente). Basicamente, para que ocorra uma infecção são necessários uma fonte de infecção e um agente (microorganismo patogênico), um meio de transmissão e o hospedeiro. Os quatro meios principais de transmissão de microorganismos são: contato (direto, indireto, perdigotos), veículo comum, via aérea e vetorial (FRAZZA et al., 1999). Convém ressaltar que a exposição a microorganismos patogênicos pode ocorrer por contato parenteral, por exemplo: perfuração da pele por agulhas e instrumentos cortantes, por contato com mucosas e/ou por contato com feridas e abrasões da pele. O objetivo das medidas de controle de infecção é eliminar ou reduzir a transferência de microorganismos, seja por imunizações, pelo uso adequado de equipamentos de proteção individual ou por desinfecção e esterilização de superfícies e equipamentos. Para que obtenhamos melhor qualidade na prestação do nosso atendimento, devemos seguir algumas regras básicas de higiene e de controle de infecção, que serão descritas a seguir. PREVENÇÃO DE INFECÇÃO PARA O PACIENTE Lavar as mãos antes e depois da abordagem e usar luvas é obrigatório tanto para a saúde do paciente como do profissional, principalmente quando houver contato com mucosas, secreções ou substâncias potencialmente infectadas. Nomeia-se esta rotina como “Precaução Universal” (GARNER, 1996). Deve-se ter em mente os conceitos básicos: limpeza, desinfecção e esterilização: • Todo o material que for utilizado e a superfície de trabalho próxima ao paciente será submetido à limpeza. Esta removerá a sujeira mais grosseira do objeto e do ambiente. 116 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA • A desinfecção eliminará os principais microorganismos através de desinfectantes hospitalares específicos. • A esterilização, por sua vez, significa a eliminação de 100% dos microorganismos, através de métodos eficazes por meio de calor e pressão (autoclave). PREVENÇÃO DE INFECÇÃO PARA O PROFISSIONAL As principais medidas de barreira para diminuir o risco ocupacional com doenças infecciosas são as seguintes: • Utilização de máscara cirúrgica para evitar a transmissão de infecção em pacientes portadores de moléstias infeciosas respiratórias, como por exemplo, meningites bacterianas, doenças virais como o citomegalovírus e a mononucleose. • Uso de luvas, de tamanho adequado, sempre que for entrar em contato com mucosa, saliva, secreções e sangue. Se alguma luva perfurar ou rasgar, deverá ser trocada. • Uso de máscara tipo respirador na abordagem de pacientes com diagnóstico de tuberculose pulmonar ou laríngea, varicela e sarampo. Observar que a utilização de máscara para tuberculose se justifica nos pacientes com início de terapêutica recente (até 15 dias) ou suspeita clínica. CUIDADOS NO TRANSPORTE Muitas vezes, em nossa rotina de investigação clínica, são solicitados exames para um melhor diagnóstico, como avaliações videofluoroscópica da deglutição orofaríngea e avaliações nasofibrolaringoscópicas. Quando em comum acordo com a equipe, ele será removido para tais avaliações, com alguns cuidados que devem ser seguidos. NASCIMENTO E SHIMATAI (1997) relatam que o transporte e a remoção de pacientes devem ser valorizados e padronizados, porque qualquer falha no método pode acarretar danos ao paciente ou mesmo aos profissionais da equipe. Todo procedimento. de remoção e transporte deve ser realizado em condições de máxima segurança, desde o início até o fim, aplicando-se três regras básicas: • manter a vida; • regularidade do deslocamento sobre a rapidez, escolhendo adequadamente o meio de transporte (maca, cadeira de rodas); • cuidado permanente com a assepsia. E importante ressaltar que pacientes com doenças infecto-contagiosas deverão seguir as normas de isolamento adotadas no leito. NOÇÕES DE ISOLAMENTO DE MOLÉSTIAS INFECTOCONTAGIOSAS Pacientes portadores de moléstias infecto-contagiosas, ao serem internados, deverão se submeter às normas de isolamento da Instituição, para evitar a disseminação da doença entre pacientes, profissionais de saúde e outros funcionários. Todo paciente, ao internar, deverá ser considerado de risco para doenças transmitidas pelo sangue (Hepatite, HIV) e, portanto serão submetidos à “Precaução Universal”. Pacientes com doenças transmitidas por contato deverão ser submetidos a “Precaução de Contato” - quarto privativo, luvas e avental. Nas doenças transmitidas por aerossóis (tuberculose pulmonar ou laríngea, sarampo, varicela e herpes Zoster disseminado), o paciente deverá ser submetido à 117 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO “Precaução Respiratória” – aerossóis, quarto privativo e máscara tipo respirador (colocar antes de entrar no quarto e retirar somente após a saída do mesmo). Em pacientes com doenças transmitidas por gotículas (difteria, coqueluche, caxumba, rubéola e meningite por Haemophilis Influenzae e Neisséria Meningitidis), é importante quarto privativo e máscara tipo cirúrgica (GARNER, 1996). APARELHOS DE MONITORIZAÇÃO Em nossa experiência de atendimento na UTI do Hospital do Câncer (SP), por muitas vezes nos deparamos com pacientes com sequelas comprometedoras como o rebaixamento do nível de consciência e/ou aspirações broncopulmonares silentes. Esta última pode ocorrer em consequência de tumores no Sistema Nervoso Central e nos pósoperatórios quando há lesão ou manipulação do ramo laríngeo superior do nervo vago. Durante a avaliação e a terapia fonoaudiológica, é de suma importância o conhecimento de determinados parâmetros, pois somente através do conhecimento das taxas de normalidade pode-se verificar o momento mais adequado para a atuação, ou a necessidade da solicitação de outro profissional da equipe para correta intervenção. Desta forma, nossa avaliação clínica terá que ser fundamentada, no mínimo, em dados como ausculta cervical e pulmonar, oximetria e monitorização da frequência cardíaca, para que possamos contribuir de forma efetiva para a evolução do caso, sem colocar em risco a vida do paciente. Com relação aos aparelhos de monitorização, convém saber: • O padrão de normalidade de freqüência cardíaca é de 70 a 75 batimentos por minuto. Pode apresentar-se diminuída - bradicardia, definida usualmente como sendo menor que 60 bat./min.; ou aumentada - taquicardia, que significa uma freqüência rápida, definida usualmente como acima de 100 bat./min. (GUYTON E HALL 1997). É visualizada no Monitor de Freqüência Cardíaca. • A porcentagem de saturação do oxigênio arterial da hemoglobina funcional Oximetria (%SpO2) – é medida continuamente por um monitor não invasivo (Oxímetro). Observa-se em indivíduos normais, valores que oscilam entre 90 e 100% 02/ min (GUYTON E HALL 1997). Os valores apresentados no monitor devem ser considerados a partir de uma adequada perfusão do aparelho. Deve-se sempre desconfiar do valor em presença do excesso de movimentos do paciente. Todas estas medidas obviamente têm seus parâmetros de normalidade, com variações individuais, considerando o estado geral e metabólico, a patologia de base e as respostas observadas após manipulação do paciente, para termos certeza do momento ideal da atuação fonoaudiológica. A atuação do fonoaudiólogo em UTI tem como principais objetivos: a avaliação, a orientação e a reabilitação. A avaliação tem início com uma anamnese completa: • queixa; • história médica; • estado de alerta; • nível cognitivo (compreensão e expressão); • capacidade de responder a ordens simples (ex: tossir); • respiração (presença de traqueostoma, cânulas com ou sem cuff, ventilação mecânica, história de broncopneumonia de repetição, secreção mucopurulenta, declínio rápido da função respiratória); • postura de repouso (se patológica); 118 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA • via de alimentação e suporte nutricional. A avaliação propriamente dita será direcionada para a alteração fonoaudiológica específica, ou seja, linguagem, deglutição voz e/ou fala. A disfagia é uma das alterações fonoaudiológicas que mais solicitará a presença do fonoaudiólogo na UTI em caráter emergencial, devido às sérias complicações que podem gerar no estado de saúde do paciente. O diagnóstico da disfagia por muitas vezes é complicado. A avaliação da deglutição começa com a anotação de todos os parâmetros de monitorização – saturação do oxigênio, frequência cardíaca e presença de alterações respiratórias. Segue-se com a ausculta cervical e pulmonar, que é de grande valia. E importante saber previamente se o paciente acabou de ser submetido à fisioterapia respiratória e quando foi aspirado pela última vez. Algumas vezes, o padrão respiratório normal e a ausência de secreção é decorrente da intervenção fisioterápica e não de uma situação real. Investiga-se a presença dos reflexos patológicos presentes e dos fisiológicos ausentes, sensibilidade peri e intra-oral, aspecto da musculatura dos órgãos fonoarticulatórios em repouso e movimento, dentição, presença de disartrofonia e triagem vocal. Somente depois de todos estes dados colhidos e considerados tem-se noção se este paciente tem potencial para auto-alimentação. Se possível, inicia-se avaliação da deglutição oral, sempre monitorando o paciente. Após avaliação da via oral observa-se a ocorrência de mudanças no estado geral (orgânicas e comportamentais), alterações da qualidade vocal e presença de ruído em região de orofaringe, indicando parada de alimentos em vias aéreas superiores. Sempre após a atuação, deve-se deixar o paciente como foi encontrado, sem desconforto respiratório ou presença de secreções e/ou alimentos em região de orofaringe, evitando alterações após o término da avaliação. Para que isto ocorra, todas as provas terapêuticas necessárias (manipulação cervical, respirações rápidas e curtas, solicitação de aspiração orotraqueal e nebulização contínua para normalização da troca gasosa) devem ser realizadas. Concluída a avaliação, discute-se com a equipe os reais riscos e/ou benefícios que o início da deglutição via oral poderá trazer. Quando a avaliação clínica não dá a real situação do paciente, é prudente a solicitação de exames objetivos que possam auxiliar no diagnóstico preciso e na consecutiva conduta. Tem-se como métodos objetivos a nasofibroscopia adaptada à deglutição e a videofluoroscopia da deglutição orofaríngea, que são as mais frequentemente utilizadas no Brasil. Quanto à orientação na UTI, poderá ser pré e/ou pós-operatória nos casos em que há sequelas fonoaudiológicas. Pode ser feita ao paciente, à equipe e/ou aos familiares quanto à estimulação indireta ou melhor consistência e quantidade da via oral assistida. Os exercícios fonoterápicos indiretos e diretos (treino de via oral) só serão iniciados nos casos em que houver participação efetiva do paciente e comum acordo com toda equipe. Visam adequação das funções para retirada de sonda com segurança e controle de risco de broncoaspiração, favorecendo e acelerando o processo de alta da UTI. A atuação da fonoaudiologia na UTI é um trabalho tanto no sentido de manutenção de vida, porque previne as complicações, quanto de qualidade de vida. Permite que o paciente volte a se alimentar pela boca, mantendo um suporte nutricional adequado. Proporciona ajustes necessários para as alterações da comunicação. 119 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO Tendo em vista a perspectiva de um quadro com uma evolução geralmente difícil, a equipe multidisciplinar tem o objetivo de proporcionar atendimento especializado, para uma melhor qualidade de vida. Controvérsias entre fonoaudiólogos sobre conceitos, objetivos, métodos e prioridades na atuação em hospital constatam um campo ainda a ser definido. Reconhecemos e parabenizamos os colegas que, com muito empenho, provam a capacidade e respeito já conquistado pelos fonoaudiólogos nesta área de atuação. * Aula ministrada no VII Encontro de Fonoaudiologia em Cancerologia/1999 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BERGOGNE-BEREZIN, E. Nosocomial infections: new agents, incidence, prevention. Presse Med , 24 (2): 89-97, 1995. FRAZZA, M.M.; ALVAREZ, A.M.M.A.; CAOVILLA, H.H.; GANANÇA, M.M.; MUNHOZ, M.S.L.; SILVA, M.L.G. Normatização de condutas para controle de infecção em Fonoaudiologia. Jornal do Conselho Regional de Fonoaudiologia – 2ª Região, nº28: 09-12, 1999. GARNER, J.S. The Hospital lnfection Central Practices Advisory Ammittee – Guideline for Isolation Precautions in Hospital – Infect Control Hosp. Epidemiol., 17:53-80, 1996. GUYTON, A.C.; HALL, J.E. Tratado de Fisiologia Médica. Rio de Janeiro, Guanabara Koogan, , 1997. NASCIMENTO, M.L.; SHIMATAI, Y. Áreas de Apoio no Ambiente Hospitalar. IN: RODRIGUES, E.A.C.; MENDONÇA, J.S.; AMARANTE, J.M.B.; FILHO, M.B.A.; GRINBAUM, R.S.; RICHTMANN, R. Prevenção e controle das Principais Infecções Hospitalares. Sarvier, 1997, p. 477-80. PELEGRINI, A.P.N. Fonoaudiologia Hospitalar – Reflexões Além das Fronteiras. Fonoaudiologia Brasil, Ano 2, 2: 40-5, 1999. SCARPITTA, C.R.M. Limpeza e Desinfecção nas Áreas Hospitalares. In: RODRIGUES, E.A.C.; MENDONÇA, J.S.; AMARANTE, J.M.B.; FILHO, M.B.A.; GRINBAUM, R.S.; RICHTMANN, R. Prevenção e controle das Principais Infecções Hospitalares. Sarvier, 1997, p. 421-25. 120 ATUAÇÃO FONOAUDIOLÓGICA EM TUMORES DO SNC Mara Rodrigues Luiz Letícia Lessa Mansur Nos tumores do Sistema Nervoso, a ocorrência, a combinatória e a gravidade dos sintomas fonoaudiológicos relacionados à comunicação, linguagem, fala e deglutição e de outros agravantes cognitivos e motores estão na dependência direta de variáveis como: a natureza, a extensão, a velocidade de crescimento do processo tumoral e o local da lesão. Os efeitos secundários decorrentes da terapia por radiação e/ou farmacológica e dos procedimentos cirúrgicos surgem como agentes determinantes no tipo de abordagem ao paciente. O investimento no tratamento dos tumores tem aumentado a sobrevida e modificado o curso de evolução da doença, permitindo a reflexão sobre vários aspectos relacionados à reabilitação. O fonoaudiólogo exerce uma função importante nas fases da manifestação e tratamento dos sintomas, entre os quais: • a perda da capacidade de se comunicar e de informar sobre as necessidades e os desejos; • a súbita necessidade de traqueostomia e de ventilação mecânica prejudicando a adaptação do indivíduo à condição de hospitalização. A vivência de situações inesperadas e desconhecidas, tais como a internação em UTI e outras unidades hospitalares e a impossibilidade do gerenciamento da própria vida podem surgir como condições desfavoráveis à obtenção dos resultados esperados na fase de reabilitação. Neste contexto, cabe ao fonoaudiólogo a responsabilidade sobre a identificação e o estabelecimento do programa de intervenção para a melhoria da comuni- 121 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO cação do paciente durante os diversos momentos de manifestação, evolução e tratamento da doença. Para isso, torna-se imprescindível o conhecimento teórico-prático das alterações fonoaudiológicas, de outras alterações cognitivas, do efeito das intervenções cirúrgicas, farmacológicas e radiológicas, bem como o domínio de informações sobre o efeito da interação desses diversos fatores sobre a comunicação. Isso inclui a familiaridade com a terminologia e com os princípios gerais relativos aos cuidados nas diferentes fases do tratamento da doença. Este capítulo faz uma revisão sobre a atuação fonoaudiológica em portadores de tumores do SNC enfatizando a fase de hospitalização, tendo por base o atendimento a 24 pacientes, realizado entre março de 1997 e janeiro de 1998, na Divisão de Clínica Neurológica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. A atuação fonoaudiológica será descrita em dois momentos: na fase aguda e na fase de reabilitação. Alguns dados expostos propiciaram questionamentos e reflexões sobre a atuação fonoaudiológica em tais pacientes, principalmente naqueles com prognóstico limitado. Como a Neurooncologia é um campo ainda novo para o fonoaudiólogo, pesquisas devem ser elaboradas para que as correlações teórico-práticas no tratamento dos tumores sejam divulgadas. ALTERAÇÕES FONOAUDIOLÓGICAS EM TUMORES DO SNC O perfil dos pacientes quanto ao sexo, idade e evolução do processo tumoral está representado nos gráficos abaixo. 122 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA A disfagia foi a alteração mais freqüentemente encontrada entre os 24 pacientes atendidos, correspondendo a 41% dos casos. Deve-se ressaltar que tanto afasia como sintomas cognitivos temporários ou permanentes foram encontrados. Tais fatores intensificam a gravidade da disfagia. A avaliação contínua dos pacientes favoreceu a caracterização diferencial dessas alterações, e o estabelecimento de um adequado programa terapêutico direcionado à melhoria da comunicação e da deglutição pôde ser efetivado. 123 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO AFASIA A afasia pode ser definida como uma alteração no conteúdo, forma e uso da linguagem e processos cognitivos subjacentes, tais como, percepção, compreensão e memória. Essa alteração é caracterizada por redução e disfunção, que se manifestam tanto no aspecto expressivo quanto receptivo da linguagem oral e escrita, embora em diferentes graus em cada uma dessas modalidades. (CHAPEY, 1996). A afasia é causada por lesão orgânica no cérebro decorrente de uma série de fatores. A etiologia mais freqüentemente citada na literatura específica é o acidente vascular cerebral, que provoca lesões circunscritas e permanentes. Tumores, traumatismos, doenças degenerativas e outras doenças metabólicas, tóxicas ou infecciosas também podem resultar num quadro afásico. A classificação da afasia nos grandes quadros clássicos é proveniente do agrupamento dos sintomas relativos à compreensão (decodificação da linguagem pelo canal auditivo) e a expressão da linguagem oral. Dessa forma, em relação à expressão da linguagem, encontramos as descrições dos quadros afásicos fluentes e não fluentes. Entre as fluentes encontram-se as afasias de Wernicke, de condução e transcortical sensorial. Entre as não fluentes estão a afasia de Broca e a afasia global. Considera-se, ainda, aqueles que mantém ou não a capacidade de repetição da linguagem: os afásicos transcorticais motores e sensoriais mantém essa habilidade, enquanto que os afásicos de condução, Wernicke e Broca são incapazes de replicar o estímulo oral. Em relação à compreensão, a afasia de Broca, anômica, transcortical motora e de condução compõem o grupo no qual a compreensão oral está preservada. Por outro lado, o maior prejuízo na compreensão encontra-se nas afasias transcortical sensorial e na de Wernicke. A afasia global traduz a dificuldade geral do paciente em relação à comunicação: pequena capacidade ou quase nula de compreensão e ausência de expressão oral significativa ou ainda extrema redução da linguagem expressiva (LECOURS, 1983). O que diferencia a afasia nos casos de causa tumoral é o curso temporal dos sintomas. A conseqüência é a variabilidade da classificação dos quadros afásicos durante o tratamento do tumor. Pode-se por exemplo, incluir o paciente em um quadro de afasia global no período pré-cirúgico e o mesmo paciente ser incluído no quadro da afasia de condução no pós-operatório Diferente da estabilidade dos efeitos lesionais no AVC, a presença de um tumor pode ocasionar sintomas diversos em um curto tempo. Um rápido agravamento do quadro pode ser documentado e mesmo a ocorrência de longos períodos de estabilidade dos sintomas relativos à comunicação, ainda que na vigência de progressão tumoral. O caráter temporário dos sintomas depende do tipo de tumor, da velocidade de crescimento, da extensão e localização no SNC, dos efeitos secundários e do prognóstico (NEWTON,1994; HELM-ESTABROOKS E ALBERT,1994). Os efeitos secundários do tumor muitas vezes impedem a classificação da afasia dentro de um quadro puramente lingüístico. Neste contexto, a abordagem fonoaudiológica deve acompanhar a evolução do tumor, pois a modificação dos sintomas, tanto em direção à piora quanto à minimização ou até ao desaparecimento da disfunção cerebral é freqüente. Embora muitas vezes o processo tumoral determine a condição degenerativa da doença, é possível reconhecer precocemente o período em que o paciente irá permanecer temporariamente estável, sendo importante uma abordagem terapêutica dirigida as suas dificuldades (DIKEMAN E KAZANDJIAN,1995). 124 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA Obter um consistente desempenho em termos de comunicação, promovendo a maior funcionalidade cognitiva em cada fase da evolução da doença é o principal objetivo da atuação fonoaudiológica com estes pacientes. A preservação da compreensão, em níveis funcionais, que permita o entendimento das orientações e condutas terapêuticas recebe especial enfoque pois denuncia a execução de um plano terapêutico bem sucedido (OZER et al,1994; DIKEMAN E KAZANDJIAN,1995). AVALIAÇÃO DA AFASIA NOS CASOS DE TUMORES DO SNC O diagnóstico diferencial das afasias baseia-se na análise quantitativa e qualitativa da compreensão e da produção oral, além das habilidades de repetição e nomeação. A avaliação da leitura e da escrita contribui para a definição mais precisa do quadro de linguagem (CHAPEY,1996; HELM-ESTABROOKS E ALBERT,1994). Alguns aspectos da emissão oral podem ser observados numa situação de conversa semi-dirigida. A emissão fluente ou não fluente, e distúrbios sintáticos, semânticos e fonológicos (parafasias) são analisados. Dados sobre a articulação e prosódia também são verificados. Através da conversa informal obtém-se conhecimento sobre as habilidades cognitivas e lingüísticas preservadas que propiciam a comunicação funcional apesar das falhas. O nível de consciência do paciente sobre sua dificuldade de comunicação também pode ser verificado. Quadros graves de anosognosia, por exemplo, comuns na afasia de Wernicke, chegam a impedir a interação. O exame da linguagem oral deve conter amostras de narrativas, descrições e argumentações. Testes como o da escolha de uma figura representando ações específicas com pessoas e objetos t ambém devem fazer parte da avaliação da linguagem oral. Nesta tarefa, é possível a verificação do acesso lexical, além da capacidade de organizar as informações relevantes e com um significado aceitável. A compreensão oral é outra habilidade verificada durante a conversa informal. Como o paciente é avaliado através das repostas que fornece, alguns dados devem ser observados previamente. A existência da grave apraxia de fala impede até mesmo as respostas do tipo sim/não. Os distúrbios auditivos periféricos também interferem na investigação. Outros problemas de natureza visual ou visuoespacial, como a hemianopsia e a heminegligência acabam prejudicando a integração das informações contextuais, ocasionando a ausência de respostas ou o aumento do tempo de reação. Assim, a capacidade de compreensão oral deve ser investigada através de várias situações de conversa, buscando identificar as habilidades residuais de compreensão, até mesmo no caso de alterações muito graves. A seleção de temas relevantes e relacionados com o conhecimento de mundo do paciente é um aspecto essencial para a avaliação. A aplicação de testes específicos, quando possível, é indicada. A exposição do paciente aos estímulos balanceados quanto a complexidade sintática e lexical colabora com a definição do nível da compreensão oral. O desempenho nas tarefas contendo palavras isoladas, frases com estrutura sintática simples e complexa, parágrafos, estórias curtas e ordens deve ser registrado. O uso de uma pontuação criteriosa permite a comparação entre grupos de pacientes e até do mesmo paciente em períodos diferentes da evolução. A capacidade de repetição é outro aspecto a ser considerado. Os estímulos correspondem a palavras e frases, sendo selecionados de acordo com a freqüência, cate- 125 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO goria semântica, complexidade fonêmica, extensão e familiaridade. As respostas gravadas e transcritas permitem que seja estabelecida a classificação dos erros. A ocorrência maior de um tipo de erro é esperada para um ou outro tipo de afasia. Por exemplo, na afasia de condução as maiores dificuldades são observadas com as tarefas de repetição, havendo grande número de parafasias fonêmicas e por vezes impossibilidade de repetição de frases. Na afasia de Wernicke a freqüência de emissão de pseudo-palavras é grande. Na afasia anômica espera-se que a capacidade de repetição esteja muito próxima do normal (HELMESTABROOKS E ALBERT,1994; LECOURS,1983; CHAPEY,1996). Os dados sobre a nomeação também fazem parte da avaliação da linguagem. Embora as dificuldades de denominação existam em todos os quadros de afasia, os tipos de erros são variáveis. É importante considerar que fatores como a falha atencional, a fadiga, os distúrbios visuoespaciais, os estados confusionais e as dificuldade de compreensão podem interferir na análise dos resultados. O teste de nomeação por confrontação visual inclui figuras que representam diferentes categorias semânticas: objetos, ações, números, letras, cores e partes do corpo. Ainda é possível selecionar as subcategorias como por exemplo, frutas, meios de transportes, peças do vestuário, e outras possibilitando a investigação dos distúrbios de modalidade específica e/ou de categoria específica. Provas adicionais devem complementar os dados e definir a natureza da alteração, que pode estar relacionada à falha no acesso lexical ou na capacidade de recuperação da informação. Tipos mais comuns de erros direcionam para um determinado tipo de afasia. Assim, as parafasias fonêmicas são comuns na afasia de condução, as parafasias semânticas e os comportamentos de extração sêmica são comuns na afasia anômica, as pseudo-palavras na afasia de Wernicke e a ausência de respostas na afasia de Broca. A prova de fluência verbal também traz importantes dados sobre a capacidade de nomeação em uma categoria específica, desta vez sem qualquer facilitador. O número de respostas diferentes em 1 minuto indica a capacidade de acesso lexical e a estratégia de organização para a busca de respostas. Um dos protocolos mais utilizados para a avaliação estruturada da linguagem dos afásicos é o Boston Diagnostic Aphasia Examination, de HAROLD GOODGLASS E EDITH KAPLAN, de 1983. Outros protocolos investigam a funcionalidade da comunicação como o CADL (Communicative Abilities of Daily Living), de Holland,1980. As provas de leitura e escrita trazem dados adicionais sobre o distúrbio de linguagem instalado. Algumas tarefas automáticas como a escrita do próprio nome, das letras do alfabeto e dos números podem ser prontamente obtidas. Já a leitura e escrita de palavras com ortografia regular e irregular, nem sempre podem ser lidas com facilidade, estando na dependência de variáveis como : freqüência, familiaridade, concretude, extensão, categoria semântica e classe. A avaliação deve considerar a habilidade de leitura e escrita de palavras isoladas, tanto quanto frases, parágrafos e estórias curtas. A escrita sob ditado e a produção de uma narrativa escrita fazem parte dos testes específicos (HELM-ESTABROOKS E ALBERT,1994). A análise dos resultados é quantitativa e qualitativa, baseada na pontuação pelos tipos de erros. 126 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA Os quadros de dislexia e de disgrafia adquiridas aparecem descritos na literatura e são muito estudados. São eles: dislexia de superfície, dislexia fonológica e dislexia profunda. Para esta classificação os modelos cognitivos são utilizados em larga escala e descrevem o processamento da leitura em seus componentes. Como a fundamentação teórica e esta metodologia de avaliação são complexas, não nos estenderemos sobre esse assunto neste capítulo. Informações específicas estão contidas na literatura, no campo da Neuropsicologia Cognitiva (ELLIS,1995). A figura abaixo ilustra os critérios para o diagnóstico da afasia segundo a literatura (HELM-ESTABROOKS E ALBERT,1994). A avaliação da leitura e escrita tem especial valor quando o paciente está na dependência de cânulas de traqueostomia e ventilação mecânica. A comunicação alternativa é um dos recursos viáveis na UTI e geralmente envolve o uso de pranchas elaboradas com estímulos visuais gráficos ou figuras (DIKEMAN E KAZANDJIAN,1995). APRAXIA DE FALA A apraxia de fala consiste na impossibilidade ou dificuldade para executar voluntariamente movimentos bucofaciais envolvidos na produção fonêmica durante a emissão oral, embora a mobilidade dos órgãos fonoarticulatórios esteja preservada ou muito próxima do normal. É importante ressaltar que a apraxia de fala não pode ser atribuída à existência de perda de sensibilidade, força ou coordenação dos movimentos, tampouco à falha 127 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO atencional (WERTZ et a1, 1991; HELM-ESTABROOKS E ALBERT,1994; ROSENBEK E LA POINTE,1985; DARLEY et al,1978). A fala automática ocorre em um nível de desempenho muito melhor e diferenciase nitidamente da fala voluntária, na qual observa-se a incapacidade de programar, seqüencializar e executar movimentos articulatórios intencionais, tanto sob ordens verbais como sob apresentação do modelo (HELM-ESTABROOKS E ALBERT,1994). Os sintomas freqüentemente encontrados na apraxia de fala são as substituições fonêmicas e o comportamento constante de ensaio-e-erro, ocasionando a perda qualitativa da emissão. No curso temporal do tumor, observa-se o gradual aumento da dificuldade de emissão, chegando à extrema incapacidade de realização de movimentos articulatórios isolados e impossibilidade da expressão oral. Muitas vezes, a apraxia de fala coexiste com os quadros de afasia e o diagnóstico diferencial é uma tarefa complexa, principalmente nos casos de afasia de condução. Para os pacientes com alterações mais graves, a proposta de uma investigação ao longo da evolução da doença torna-se um recurso viável trazendo maiores possibilidades para o reconhecimento da interação entre os sintomas da afasia e da apraxia (WERTZ et al,1991; HELMESTABROOKS E ALBERT,1994; ROSENBEK E LA POINTE,1985; DARLEY et al,1978). A falha na capacidade de discriminar e lidar com os conceitos espaciais, além da percepção alterada do próprio corpo, interfere também na realização dos movimentos voluntários bucofaciais e de membros, durante a alimentação. DISARTRIA A disartria é o distúrbio motor da fala, consequente à lesão cerebral. É identificada quando os mecanismos motores da produção oral ficam prejudicados devido à lesão tanto em áreas do SNC como do SNP, ou ainda em conseqüência de lesão associada (DARLEY et al,1978). Os seguintes aspectos da emissão oral ficam prejudicados: articulação, fonação, ressonância, respiração e prosódia. Verifica-se a perda ou falha do controle muscular sobre a força, velocidade e coordenação dos movimentos articulatórios, ocasionando erros dos tipos: distorção, trocas e omissões fonêmicas. A articulação é imprecisa e a coordenação pneumofônica mostra-se alterada. Sinais de lesão neurogênica são observados pela existência de mudanças no tônus muscular, paralisias e paresias, fraqueza, incoordenação e movimentação involuntária. DARLEY classifica as disartrias em grupos, de acordo com os sistemas motores envolvidos. Encontram-se descritas em cinco tipos: flácida, espástica, hipercinética, hipocinética e atáxica. Algumas características acústicas são predominantes de acordo com o tipo da disartria, observando-se alterações nos aspectos segmentais ou ainda nos supra-segmentais, os quais tornam-se mais evidentes durante a fala contextualizada. Muitas vezes, encontramos casos de disartria mista, em decorrência da extensão do tumor e dos efeitos secundários que atingem outras regiões do SNC. 128 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA DISFAGIA A alteração da deglutição em decorrência a lesão cerebral corresponde a disfagia neurogênica. A disfagia neurogênica é estudada, por muitos autores, como manifestação de tumores infiltrativos ou compressivos do SNC ocasionando o prejuízo bilateral das áreas cortical, corticobulbar ou do tronco cerebral. No entanto, sabe-se que lesões unilaterais decorrentes da existência de tumor no SNC também levam à disfagia (NEWTON,1994; LOGEMANN,1990; HUCKABEE,1992; BUCHHOLZ,1994). As dificuldades comumente encontradas decorrem da fraqueza na musculatura dos lábios, da língua, do véu palatino, da faringe e do esôfago provenientes de lesão neurológica. Somam-se a incoordenação dos movimentos e a falha na sensibilidade das regiões oral e faríngea, que interferem com as fases voluntária e reflexa da deglutição (BUCHHOLZ,1994; HUCKABEE,1992; GROHER,1992; LOGEMANN,1983). Dessa forma, o trajeto do alimento desde a cavidade oral até o esôfago fica prejudicado, ocasionando, por vezes, complicações como a desnutrição, a desidratação e a pneumonia aspirativa. Na abordagem ao paciente disfágico por etiologia tumoral, importa a verificação da natureza e grau do prejuízo à função de deglutição nas diferentes fases de tratamento do tumor. Um interesse específico permanece sobre a freqüência, características clínicas, gravidade e tratamento da disfagia nesta população (NEWTON et al,1994). Para isso, uma escala funcional foi proposta com o intuito tanto de estabelecer a condição do paciente em termos da sua independência, como de medir os resultados do plano de intervenção (NEWTON et al,1994; OZER et al,1994). Os níveis da escala variam desde a independência total, na qual a deglutição é segura e eficiente, até a dependência completa, onde há impossibilidade de alimentação via oral. AVALIAÇÃO DA DISFAGIA NOS CASOS DE TUMORES DO SNC O exame clínico fonoaudiológico é essencial para se detectar os riscos de aspiração de alimentos e secreções e consequentemente de pneumonia aspirativa. Os exames objetivos como o videodeglutograma devem ser adicionados dependendo das condições clínicas e cognitivas dos pacientes (GUPTA et al,1996). O exame da deglutição envolve a coleta precisa de informações sobre a história pregressa da doença. Dados sobre o estado nutricional devem ser correlacionados com os sintomas da disfagia, indicando a necessidade imediata ou não de fontes alternativas de alimentação. A pesquisa voltada para a queixa do paciente traz importantes dados para a elaboração do programa terapêutico a curto ou a longo prazo. Como o aparecimento e o desenvolvimento da disfagia podem ser lentos, muitos pacientes permanecem com pequena percepção sobre o estado real da disfunção ou a gravidade dos sintomas. Dessa forma, nem sempre a queixa correlaciona-se com os dados do videodeglutograma. Muitos pacientes apresentam queixas leves, mas revelam um nível moderado ou até grave de disfagia, com presença de aspiração e necessidade de supervisão, assistência ou tubo de alimentação (NEWTON et al,1994). As avaliações específicas da linguagem, do estado cognitivo e comportamen- 129 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO tal são somadas às observações sobre o desempenho do paciente nas fases oral, faríngea e esofágica, verificando-se a possibilidade de se melhorar a eficência da deglutição com o uso de manobras compensatórias e de auto-ajuste. A preservação das capacidades cognitivas e comunicativas do paciente constitui um dos indicadores para a classificação do paciente na escala de independência relativa à deglutição funcional. A flutuação do estado de consciência ou das funções cognitivas pode impossibilitar a aquisição de estratégias compensatórias e o uso de manobras específicas que favoreçam a deglutição. Muitas vezes é o estado cognitivo alterado que imp ede a complementação dos dados através dos exames objetivos (DIKEMAN E KAZANDJIAN,1995; OZER et al,1994; LOGEMANN,1990; HUCKABEE,1992). Nestes casos, a avaliação sobre segurança em se manter a via oral torna-se tarefa complexa. Quando porém, aparecem os sintomas específicos como tosse e engasgo durante a alimentação, o reconhecimento da dificuldade de deglutição se torna mais fácil. No entanto, tanto a penetração laríngea como a aspiração de alimento ou de secreção orofaríngea podem ocorrer de forma silenciosa, principalmente nos pacientes que apresentem o reflexo de tosse inibido ou falho. Várias são as causas para a diminuição do reflexo de tosse. Todas estão relacionadas à perda da sensibilidade laríngea. Entre elas as mais frequentes são: a lesão neurológica, a entubação endotraqueal prolongada, a presença da cânula de traqueostomia e o procedimento constante de aspiração da secreção orotraqueal. Ressalta-se que também o nível de alerta interfere com a prontidão das respostas reflexas (NEWTON et al,1994; SHAKER et al,1995; EINBLING E GROSS,1996). Na evolução do processo tumoral, algumas situações merecem especial atenção por parte do fonoaudiólogo. Uma delas é a complicação respiratória, cujas conseqüências favorecem a presença da disfagia ou agravam a dis função. Alguns estudos mostram que a intubação endotraqueal, por período maior que 24 horas, ocasiona ao paciente um prejuízo grave, porém transitório, relacionado ao período de latência para o disparo do reflexo de deglutição. A oferta de alimentação via oral, logo após a extubação não é portanto indicada pois constitui risco de aspiração. Melhoras certamente ocorrerão, se o problema estiver apenas relacionado à intubação e são gradualmente verificadas no decorrer da evolução clínica (LARMINAT et al,1995; TOLEP et al,1996). Outra condição desfavorável à deglutição é a presença da cânula de traqueostomia. As conseqüências de tal procedimento geralmente afetam a mobilidade laríngea e causam a perda dos mecanismos reflexos protetores das vias aéreas. Uma resposta incoordenada do fechamento laríngeo pode ser verificada nestes casos. Além disso, a traqueostomia acarreta uma incoordenação dos movimentos de adução e abdução das pregas vocais,. Observa-se nesses casos o encurtamento do tempo normal de adução. Cerca de 65% dos pacientes com traqueostomia apresentam alterações da deglutição, resultando em aspiração (SHAKER et al,1995). O nível de alerta também traz conseqüências sobre a disfagia, Pacientes com rebaixamento do nível de consciência são menos hábeis para integrar as informações sensoriais relativas à presença do alimento na cavidade oral, durante a fase voluntária da deglutição. A falha no uso dessas informações, provenientes da sensibilidade gustativa, térmica e de pressão, prejudica o mecanismo de auto-ajuste requerido para a deglutição segura do alimento (NEWTON et al,1994; OZER et al,1994). A avaliação no período pós operatório, deve considerar as conseqüências da cirurgia como fatores que também interferem na deglutição. Devido ao edema, as fibras corticobulbares e o próprio tronco cerebral podem ser afetados. Se esta é a causa, o 130 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA prognóstico é geralmente bom e o retorno à alimentação VO é previsto, sem complicações (NEWTON et al, 1994). ALTERAÇÕES FONOAUDIOLÓGICAS E TUMORES DO SNC: CORRELAÇÕES ANÁTOMO-CLÍNICAS Entre os 24 pacientes atendidos na Divisão de Clínica Neurológica do Hospital das Clínicas da FMUSP, as maiores ocorrências foram os tumores de fossa posterior (45%) e os tumores de IV ventrículo (15%). Os sintomas motores relativos à disartria e disfagia foram os mais evidentes, seguidos dos distúrbios cognitivos temporários (falha atencional e incapacidade de auto-monitorização das tarefas). Tumores corticais ocorreram em 35% dos casos. Quando localizados no hemisfério esquerdo ocasionaram as alterações da linguagem (afasias) que persistiram após o término do período de avaliação. TUMORES DO LOBO FRONTAL Alterações nas áreas motoras do lobo frontal (4 e 6 de Broadmann) afetam diretamente a capacidade de comunicação do paciente. A disartria é o distúrbio motor mais freqüentemente encontrado, resultando em modificação qualitativa da emissão oral. A inteligibilidade da fala pode ficar totalmente prejudicada em estágios avançados do processo tumoral. As alterações da linguagem do tipo afasias, também são frequentes, quando a localização do tumor é reconhecida no lobo frontal do hemisfério esquerdo de indivíduos destros (JOSEPH, 1996; HELM-ESTABROOKS E ALBERT, 1994). A perda quantitativa da emissão oral e escrita e a relativa preservação da com- 131 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO preensão oral são os sintomas que inserem os pacientes nos dois quadros mais clássicos: Afasia de Broca e Afasia Transcortical Motora. No entanto, um tumor pode atingir as áreas frontais e pré-frontais de forma progressiva e rápida, sendo que nesses casos o prejuízo de linguagem se dá associado a outros distúrbios cognitivos. Podem surgir importantes falhas na capacidade de atenção, de julgamento, de memória e de resolução de problemas. Quadros clínicos semelhantes aos processos demenciais frontais podem ser identificados nesses pacientes (JOSEPH, 1996; PORTO, 1996; OZER et al., 1994). A síndrome frontal, mais complexa, também pode ser diagnosticada, com os respectivos sinais de modificação do comportamento, falhas de planejamento e de monitorização das respostas. Uma importante conseqüência desses casos é a necessidade de assistência para as tarefas de alimentação, uma vez que a falha de iniciativa impede a realização desta de forma independente. TUMORES DO LOBO TEMPORAL Quando localizados no lobo temporal do hemisfério esquerdo, os tumores podem prejudicar a linguagem, causando afasias (JOSEPH, 1996). Estas se apresentam fluentes podendo ser variável a capacidade de compreensão da linguagem. Em casos extremos de dificuldade, como nas afasias de Wernicke e na Transcortical Sensorial, muitas vezes o paciente é incapaz de exercer sua autonomia nas atividades da vida diária (HELMESTABROOKS, 1994; OZER et al., 1994). A afasia global pode ser encontrada quando o tumor é extenso e ocupa uma área profunda no lobo temporal esquerdo. Tumores localizados no lobo temporal direito ocasionam também distúrbios da comunicação oral, diferentes das afasias. Os aspectos pragmáticos da comunicação ficam alterados havendo prejuízo principalmente das habilidades discursivas. Há discreta ou proeminente desorganização do discurso narrativo. A interferência do hemisfério direito lesado é notada na relação com os interlocutores em situações mais complexas, onde a integração dos conteúdos contextuais, verbais e não verbais, é necessária para a manutenção da comunicação. Alterações classificadas como não lingüísticas incluem a negligência, a falha atencional e os distúrbios visuoespaciais. Essas alterações acabam prejudicando a relação interpessoal, uma vez que o paciente despreza ou utiliza pouco o contexto extralingüístico pertinente à comunicação (JOANETTE, 1996). Alterações emocionais, distúrbios da memória e mudanças comportamentais também podem ser observadas nesses pacientes. TUMORES DO LOBO PARIETAL A percepção e integração das informações somestésicas geralmente encontram-se prejudicadas quando o tumor atinge o lobo parietal. Os distúrbios sensoriais são os mais comuns incluindo as parestesias e outras anormalidades envolvendo os aspectos discriminativo e espacial das sensações. A percepção do próprio corpo e da posição que ocupa no espaço (propriocepção) aparece falha e prejudica a integração da sensibilidade consciente. Quadros de apraxia, com importantes alterações sobre os aspectos motores da fala podem ser encontrados (JOSEPH, 1996; HELM-ESTABROOKS E ALBERT, 1994, WERTZ et al., 1991).O avanço dos sintomas em direção à ausência da emissão oral é 132 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA decorrente da progressiva dificuldade de realizar movimentos articulatórios simples. Disfagia grave também pode acontecer quando a incapacidade atinge o controle motor sobre a abertura e fechamento mandibular e a movimentação voluntária da língua. TUMORES DO TRONCO CEREBRAL Uma das primeiras manifestações de tumores localizados no tronco cerebral é a paralisia ou distúrbios da sensibilidade facial por lesão de nervos cranianos, especialmente o V, VI e o VII. A disfagia e a disartria serão encontradas se houver envolvimento de algum nervo craniano que participe da função orofaríngea ou laringo-faríngea. Estes nervos são o trigêmeo (V), o facial (VII), o glossofaríngeo (IX), o vago (X), o acessório (XI) e o hipoglosso (XII). As alterações da fala e deglutição surgem porque os impulsos aferentes que passam pelo VII, IX e X pares e as eferências do IX, X e XII não chegam ou chegam com falhas no tronco cerebral (JOSEPH, 1996; GROHER, 1992; LOGEMANN, 1983; NEWTON et al, 1994) Schwanomas e neurinomas são tumores freqüentemente encontrados afetando o VIII, IX e V pares. Estes tumores geralmente se iniciam na infância, porém há alta incidência de sintomas na idade adulta (JOSEPH, 1996). Uma especial consideração deve ser feita ao neurinoma do acústico. O tratamento do tumor é cirúrgico e, a depender de sua dimensão, a intervenção ocasiona lesões permanentes ou transitórias em nervos cranianos vizinhos. Verifica-se nos pacientes com localização unilateral, prejuízo motor ipsilateral e funções cognitivas íntegras. Com relação aos sintomas auditivos, o treino acústico com audiômetro e em campo é indicado, para que se otimizem as habilidades do ouvido não lesado, no sentido de compensar as perdas. Quanto aos sintomas motores (decorrentes da lesão temporária ou permanente dos nervos cranianos VII, IX, X e XII), a prevenção dos padrões errôneos de deglutição e fala é indicada já no pré-operatório. A dis artria flácida ocasiona a fala pastosa nestes casos, esteticamente comprometida e por vezes ininteligível. A disfunção cerebelar pode adicionar sintomas a esses quadros. Evidentemente o tratamento em equipe permitirá a recuperação das funções, para padrões próximos ao ideal. No caso do neurinoma do acústico, as correções cirúrgicas para amenizar as dificuldades de movimentação facial (VII par) são importantes, assim como as correções de ordem estética que irão garantir a possibilidade do uso de comunicação não verbal, relacionada à mímica facial. Tendências futuras no tratamento do neurinoma do acústico diricionam-se ao trabalho com as representações corticais da face e da cavidade oral desde o período précirúrgico, sendo este o momento mais indicado para o paciente ampliar o conhecimento sobre a mobilidade e sensibilidade de sua face e cavidade oral. Essa orientação fundamentase na teoria sobre plasticidade neural (KANDEL, SCWARTZ E JESSEL, 1995) e deve ser melhor desenvolvida e analisada. Em outras palavras, é possível a aprendizagem sobre o controle motor voluntário relacionado à fala e à deglutição, se o paciente for submetido a um treino específico na fase pré-cirúrgica. Dessa forma espera-se que o paciente chegue ao pósoperatório utilizando voluntariamente os recursos motores aprendidos e consiga, mais eficientemente, realizar as compensações necessárias à fala e deglutição. 133 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO TUMORES DO CEREBELO Mutismo O aparecimento dos quadros de mutismo após a ressecção dos tumores de fossa posterior é mais comum em crianças, porém também há relatos em adultos. Os estudos apontam a presença de mutismo em 8 a 15% das crianças, sendo considerado um sinal pertencente a uma síndrome mais complexa (POLLACK, 1997; DONGEN, 1994; AGUIAR, 1995; POLLACK et al, 1995). Uma das características desta síndrome é a reversibilidade dos sintomas, embora o curso temporal da melhora clínica seja variável. Um estudo longitudinal com crianças em período pré e pós cirúrgico mostrou que a recuperação da habilidade de comunicação ocorre em média durante os 4 meses subsequentes à cirurgia. O início é marcado pelo uso de palavras isoladas, com gradativa recuperação da fluência normal. Foi observada a presença de disartria e características de linguagem semelhantes à Afasia de Broca, durante a fase de recuperação (POLLACK, 1997). Uma segunda característica é que os sintomas geralmente aparecem após um intervalo de relativa normalidade das funções no período pós-operatório. A terceira é que os sintomas desaparecem freqüentemente entre as primeiras semanas e os primeiros meses após a cirurgia. A descrição do mutismo cerebelar no contexto de uma síndrome é fundamentada pela confirmação de outras alterações motoras, cognitivas e comportamentais no período pós-operatório. Entre elas, destacam-se os distúrbios da memória, a falha na iniciativa dos atos motores voluntários, a disfagia e a labilidade emocional. O movimento voluntário de abertura ocular também encontra-se ausente, estando inserido na existência da falha global de iniciativa aos atos voluntários. A apraxia bucofacial grave pode existir, chegando a impedir a alimentação via oral. Alguns autores consideram os sintomas motores em conjunto com as mudanças de comportamento e a labilidade emocional evidente, definindo “uma síndrome de mutismo - pseudobulbar pós ressecção de tumor de fossa posterior”, enquanto resultado da disfunção temporária do tronco cerebral (POLLACK, 1997; AGUIAR, 1995; POLLACK et al, 1995). Durante a evolução observa-se primeiramente a melhora da movimentação global voluntária. A função de deglutição atinge padrões satisfatórios antes mesmo do retorno da fala. Enquanto a fala começa a melhorar observa-se a existência das falhas para a iniciativa de tarefas mais complexas. A disartria torna-se evidente, mas logo regride e os aspectos da fala chegam à normalidade. A frequência desta síndrome tem sido difícil de ser determinada porque a descrição dos casos enfatiza por vezes apenas um ou outro sintoma clínico. Tanto as causas das alterações quanto a natureza da reversibilidade dos sintomas estão sendo estudadas através das técnicas de neuroimagem somadas aos testes neuropsicológicos e comportamentais. O substrato anatômico envolvido com estes sintomas permanece em discussão. Entretanto, resultados da imagem funcional e o reconhecimento das complexas conexões entre cerebelo e áreas corticais cerebrais fundamentam as conclusões sobre a etiologia desta síndrome. Quanto às estruturas envolvidas, verifica-se que na maioria dos casos o mutismo apareceu após a ressecção de tumores cerebelares de linha média ou de IV ventrículo, envolvendo a incisão inferior do vermis. Como existem vários casos de extensos tumores hemisféricos cerebelares em que não há mutismo, há fortes indícios de que o 134 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA prejuízo bilateral da região inferior do vermis seja crucial para indicar o substrato anatômico desta patologia (POLLACK, 1997; DONGEN, 1994; AGUIAR, 1995; POLLACK et al, 1995). Entretanto, vários fatores indicam que o mutismo e as mudanças comportamentais não estão correlacionadas apenas ao vermis inferior mas também às estruturas adjacentes. Se apenas o vermis tivesse participação direta sobre o controle da fala, o mutismo ou a disartria seriam sinais imediatos do pós-operatório. No entanto, como já mencionada, esses sintomas aparecem posteriormente, no intervalo de 1 a 3 dias. As imagens pós-operatórias também reforçam tal conclusão. Foram observados nos pacientes com mutismo, uma incidência significantemente diferente de edema bilateral dos pedúnculos cerebelares e/ou do tronco cerebral, quando comparada com os pacientes que não apresentavam sinais da síndrome. As conexões aferentes e eferentes destas regiões incluem as projeções para o córtex motor pré-frontal e área motora suplementar. Já que a síndrome não é vista após lesões cerebelares unilaterais, pode ser inferido que é necessário o prejuízo bilateral desta via para produzir as alterações (POLLACK, 1997; POLLACK et al, 1995). DISARTRIA E DISFAGIA São decorrentes da compressão dos nervos cranianos, principalmente do V ao XII par (ver tumores de tronco). TUMORES DE VENTRÍCULO Este tipo de tumor geralmente se desenvolve em indivíduos jovens e atingem o IV ventrículo em 70% da vezes. A ocorrência em crianças é de 40% no primeiro ano de vida e de 75% na primeira década. Pode haver obstrução do ventrículo, resultando em hidrocefalia e aumento da pressão intracraniana. A compressão do tronco cerebral e do cerebelo também pode ocorrer, sendo observados os sintomas motores correspondentes. A impossibilidade da passagem e drenagem do líquido céfalo raquiano, ocasiona um mal funcionamento cognitivo geral, tendo por consequência os distúrbios de comportamento, o mutismo, falhas atencionais, de iniciativa e de controle motor voluntário (JOSEPH, 1996). AÇÕES FONOAUDIOLÓGICAS NOS CASOS DE TUMORES DO SNC O diagnóstico do tumor é o ponto de partida para sua abordagem. Os sintomas iniciais podem incluir desde dor de cabeça até crises epilépticas, dificuldades visuais, auditivas até alterações cognitivas de linguagem e comunicação. Alterações motoras do tipo paresias ou paralis ias podem atingir os membros, a fala e a deglutição. A sintomatologia pode surgir de forma abrupta ou progressiva, no decorrer de meses ou anos. As disfunções motoras e/ou cognitivas que passam a fazer parte da vida do paciente nem sempre têm caráter temporário e podem traduzir a presença de seqüelas irreversíveis. O diagnóstico neurológico é então, instrumento imprescindível para a elaboração precisa do planejamento fonoaudiológico. Através do diagnóstico médico são coletadas informações fidedignas sobre os efeitos secundários do tumor no SNC (edema, efeito de compressão e deslocamento de estruturas), sobre as áreas especificamente 135 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO envolvidas e sobre a existência de uma única ou de múltiplas lesões (JOSEPH, 1996; NEWTON et al, 1994; HELM-ESTABROOKS E ALBERT, 1994). Mas o tratamento dos tumores não se limita ao diagnóstico e ao ato cirúrgico de extirpação. O tumor altera muitas vezes de modo significativo a independência e a capacidade de se manter ativo do ponto de vista social e econômico. A possibilidade de desfrutar de simples prazeres da vida como se alimentar por via oral pode ficar restrita. Sendo assim, o atendimento ao paciente com tumor deve ter início assim que o diagnóstico for comprovado e deve ser realizado por uma equipe multidisciplinar. O paciente, bem como sua família, devem ser preparados para as ações a serem realizadas, no sentido de curar ou minimizar os efeitos do tumor. Vários são profissionais não médicos envolvidos: psicólogos, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, assistentes sociais, enfermeiros, nutricionistas e fonoaudiólogos. Médicos das diversas especialidades, além do neurologista participam do atendimento, conforme o caso: oftalmologistas, otorrinolaringologistas, clínicos gerais, radiologistas, entre outros. O fonoaudiólogo realiza avaliações específicas e trata os casos de acordo com suas particularidades. Sua atuação objetiva fornecer orientações, minimizar os prejuízos e tratar as seqüelas. A FASE AGUDA A fase aguda inicia-se com o súbito aparecimento dos sintomas das disfunções neurológicas motoras e/ou sensoriais, bem como cognitivas e comportamentais. O objetivo desta fase é o retorno da estabilidade neurológica e clínica com a minimização do prejuízo cerebral e da subsequente disfunção (OZER et al, 1994). Para a equipe médica, as questões relativas à adequação de uma conduta cirúrgica imediata em contrapartida ao tratamento medicamentoso, quimioterápico e radioterápico dos processos tumorais constituem o enfoque da abordagem. Para o fonoaudiólogo, a implementação de um programa de reabilitação é a questão central, o que envolve a prevenção dos riscos e das complicações, assim como o início da abordagem educativa ao paciente, familiares e cuidadores, o mais precocemente possível. A prevenção dos fatores de risco é contínua e segue por toda a fase de reabilitação, tendo por objetivo a manutenção do máximo grau de independência do paciente. A gravidade, o tipo, a localização e a extensão do tumor são os fatores determinantes do prazo para a execução do plano de reabilitação. As alternativas para o tratamento são estabelecidas em conjunto, porém a decisão da equipe médica tem peso maior nesta fase. O paciente deverá receber o tratamento adequado, tanto ambulatorialmente como na internação hospitalar. O objetivo da intervenção fonoaudiológica é o de garantir a funcionalidade da comunicação e da deglutição e o de prevenir futuras disfunções por adaptações errôneas. Muitas vezes as compensações voluntárias e involuntárias podem surgir para minimizar as disfunções, ocasionando um comportamento de auto-aprendizagem ineficiente (BUCHHOLZ, 1994; OZER et al, 1994). Este conjunto de dados determina os objetivos do plano terapêutico em relação à natureza da intervenção e aos prazos para a execução. 136 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA OS SINTOMAS TEMPORÁRIOS Geralmente a condição pós-operatória do paciente é marcada pela necessidade de monitorização constante dos sinais vitais, já que nesta fase o risco de mortalidade é permanente. Por esta razão, uma abordagem multiprofissional deve ser estabelecida precocemente, já na UTI, com a expectativa de que o paciente chegue à fase de reabilitação com a menor ocorrência possível de complicações clínicas. Uma vez que as complicações sistêmicas influenciam os resultados da recuperação do paciente, a conduta fonoaudiológica para a detecção da disfagia, da afasia e dos estados confusionais são essenciais. No período pós operatório, a atuação em equipe exerce grande impacto sobre o planejamento terapêutico e contribui diretamente para garantir a sobrevivência do paciente (OZER et al,1994). A importância da avaliação fonoaudiológica nesta fase consiste na obtenção de dados à beira do leito que contribuem para a identificação dos sintomas permanentes e para a verificação da modificação do grau das disfunções no sentido da perda total, ou inversamente, do desaparecimento das alterações relativas às funções cognitiva, comunicativa e motora. Os sintomas temporários observados com maior freqüência são: diminuição do nível de consciência, sonolência, confusão mental, falha atencional, aumento do tempo de reação, incapacidade de auto-monitorização das tarefas, distúrbios comportamentais e alterações sistêmicas (JOSEPH, 1996; LOGEMANN, 1990; DIKEMAN E KAZANDJIAN, 1995). Em decorrência da gravidade de um ou mais sintomas temporários, e principalmente das alterações sistêmicas, muitas vezes o paciente recebe a indicação de traqueostomia, de ventilação mecânica e de.tubos de alimentação. Neste contexto, a orientação fonoaudiológica e a realização de treinamento específico voltado para o uso dos movimentos articulatórios na ausência temporária da fonação, é essencial para otimizar as oportunidades de comunicação do paciente dentro da UTI. Lembramos que a situação de internação em UTI é temporária, porém a sintomatologia decorrente da lesão neurológica e/ou da abordagem cirúrgica pode não ser. Freqüentemente as disfunções cognitivas são observada no pós-operatório imediato e interferem com o desempenho do paciente na realização de treinos específicos. Entre tais disfunções cognitivas estão: * O prejuízo no controle das funções executivas * A falha na percepção contextual * A falha no desempenho dos papéis sociais * A impossibilidade de auto-regulação comportamental * Os distúrbios atencionais * A lentificação dos processos cognitivos AS SEQUELAS A diferenciação entre sintomas temporários e os decorrentes de seqüelas neurológicas, nem sempre é fácil de ser feita no momento inicial da avaliação, principalmente quando as funções cognitivas do paciente estiverem alteradas. Como a execução do plano terapêutico e a obtenção dos resultados dependem muito de uma satisfatória capacidade de aprendizagem, a reavaliação periódica do paciente e a revisão contínua do planejamento fonoaudiológico são essenciais (DIKEMAN E KAZANDJIAN, 1995). Muitas 137 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO vezes as seqüelas que atingem a comunicação e deglutição são identificadas de forma mais clara através de testes específicos, no momento da estabilidade dos sintomas, em fases posteriores. A persistência de disfagia, por exemplo, pode exigir exames complementares radiológicos e clínicos para que a etiologia da alteração seja melhor definida. A FASE DA REABILITAÇÃO Estabilidade dos sintomas Quando o paciente atinge padrões clínicos satisfatórios em relação às suas funções vitais recebe alta da UTI, finalizando a fase aguda e entrando na fase de reabilitação. O paciente é então encaminhado às enfermarias, onde continua recebendo cuidados médicos com o intuito de se manter a estabilidade clínica e evitar o risco de complicações. Neste momento, o grau de estabilidade neurológica pode ser melhor determinado. As conseqüências da lesão cerebral tornam-se mais definidas, permitindo a inclusão do paciente no grupo de dependentes totais, moderados ou independentes para a realização de atividades de vida diária. Na fase de reabilitação se prepara o paciente para o retorno ao lar ou a outra instituição, já devidamente engajado num programa terapêutico multidisciplinar, cujo objetivo principal deve ser o da reinserção do paciente a seu meio social, mesmo em condições de dependência (OZER et al, 1994). O restabelecimento das funções motoras e comunicativas enquanto sequelas neurológicas é novamente abordado no planejamento fonoaudiológico, a partir das avaliações à beira do leito. Nessa fase, o paciente continua sendo favorecido pela terapia fonoaudiológica para a disfagia e os distúrbios da comunicação, priorizando as novas aprendizagens para compensar e otimizar as funções falhas. A orientação familiar e o treinamento dos cuidadores, realizados pela equipe multidisciplinar são muito importantes para a garantia de um ambiente externo favorável à recuperação do paciente. A preocupação incide ainda sobre a minimização de futuros prejuízos à função comunicativa e de deglutição, evitando-se a adoção de comportamentos prejudiciais à rotina de vida. A Alta Hospitalar A alta é o momento em que o paciente fica apto para receber cuidados contínuos longe da situação hospitalar. A decisão sobre a extensão da fase de reabilitação e sobre a freqüência às sessões terapêuticas em nível ambulatorial dependerá do acordo entre a equipe e a família, que envolve a análise das condições econômicas e dos recursos humanos disponíveis para cada caso. Para a formulação do plano terapêutico, particularmente nessa etapa da reabilitação, é necessário considerar a relação entre a gravidade das seqüelas do paciente, e os recursos disponíveis em seu ambiente (OZER et al, 1994; DIKEMAN E KAZANDJIAN, 1995). Os dados psicossocia is devem ser resgatados posteriormente, como instrumentos de verificação da real reinserção do paciente às situações sociais após o tratamento. É importante considerar se houve efetiva modificação nos hábitos de vida, se as estratégias aprendidas estão sendo de fato utilizadas e se houve algum tipo de aprendizagem nova, autogerada, desencadeando o sucesso na atividade social. 138 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA Para os pacientes com doença degenerativa, a intervenção deve estar em consonância com o declínio até a perda total da função comunicativa. Nestes casos, a inteligibilidade da fala gradativamente atinge níveis dramáticos de prejuízo chegando muitas vezes, à impossibilidade completa. A comunicação oral então deve ser reforçada através dos recursos de comunicação suplementar e/ou alternativa, que podem ser elaborados com simples materiais ou sofisticados sistemas informatizados. O objetivo é permitir que a comunicação continue existindo, mesmo nas últimas fases de evolução do tumor. ELEIÇÃO DOS PACIENTES AO TRATAMENTO FONOAUDIOLÓGICO Os pacientes com distúrbios motores são aqueles com melhor prognóstico do ponto de vista fonoaudiológico já que, devido à preservação das funções cognitivas, a melhoria da comunicação e da deglutição são atingidas de forma mais rápida (LOGEMANN, 1990; CHAPEY, 1993; NEWTON et al, 1994). O alcance rápido da melhora é esperado porque freqüentemente tais pacientes apresentam alguns pré-requisitos mais importantes, tais como: * compreendem suas dificuldades e necessidades; * preservam as habilidades comunicativas e metacognitivas; * dispõem de recursos atencionais; * mantêm auto-motivação; * aprendem estratégias compensatórias ou modificadoras de funções * adaptam-se ao ambiente hospitalar e ao programa de reabilitação. Por outro lado, os pacientes com distúrbios cognitivos permanentes não são os melhores candidatos para o estabelecimento de um programa terapêutico a curto prazo. Destacam neste grupo os pacientes com dificuldades de compreensão, aqueles com incapacidade de perceber suas alterações (anosognosia), os incapazes de exercer crítica e julgamento e ainda aqueles que apresentam problemas comportamentais. A melhora das funções de comunicação, fala e deglutição dependerá da melhora de outras áreas do funcionamento cognitivo, relacionadas à capacidade de aprendizagem (OZER et al, 1994; DIKEMAN E KAZANDJIAN, 1995; NEWTON et al, 1994). Como tais pacientes não conseguem manter uma participação ativa sobre o processo de reabilitação, o plano terapêutico multidisciplinar deve ser voltado inicialmente para a melhora comportamental. Os procedimentos de intervenção devem então direcionar primeiramente a modificação do estado cognitivo. Nestes casos, as atividades de vida diária, envolvidas na rotina hospitalar devem ser enfatizadas enquanto contexto favorável à apresentação contínua e selecionada de estímulos auditivos, visuais, táteis e cinestésicos. Como já mencionado, na alta hospitalar a informação do programa terapêutico aos familiares e cuidadores é essencial. Embora ocorram dificuldades na abordagem direta ao paciente com distúrbios cognitivos, um programa terapêutico é possível, contanto que os objetivos sejam claramente definidos, a médio e longo prazo. QUESTÕES SOBRE A APRENDIZAGEM COGNITIVAS NA REABILITAÇÃO E AS FUNÇÕES Uma vez que o programa de reabilitação fonoaudiológica é estruturado segundo o grau de preservação das funções cognitivas e motoras do paciente, a questão da 139 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO capacidade de aprendizagem é primordial para o alcance dos objetivos. A medida do desempenho do paciente em situação de treino repetitivo, tomada em períodos de tempo devidamente marcados, permite verificar a eficácia da proposta terapêutica. Ou seja, a mudança progressiva no desempenho, devidamente registrada, mostra se a aprendizagem ocorreu como conseqüência da intervenção fonoaudiológica. Muitas situações terapêuticas conduzidas pelo fonoaudiólogo trazem ao paciente a experiência com a aprendizagem. Por exemplo, os exercícios miofuncionais orais na terapia para a disfagia e disartria, ou as tarefas selecionadas para o trabalho com a linguagem oral e escrita no caso das afasias, envolvem primeiramente o treino repetitivo. Se a condição esperada é a de que as tarefas deixem gradativamente de ser controladas conscientemente e atinjam a automaticidade, então, espera-se que um ciclo de aprendizagem seja bem estabelecido. O conhecimento sobre o conceito de aprendizagem e sobre as relações entre este processo e a ativação das áreas cerebrais é necessário para compreender como as disfunções cognitivas decorrentes do crescimento tumoral prejudicam a obtenção de resultados a curto prazo. Aprendizagem é definido como a capacidade de adquirir habilidades motoras e não motoras. Esta aquisição é considerada implícita quando não requer o reconhecimento consciente de um evento e explícita quando é conscientemente controlada pelo indivíduo (DOYON, 1997; KANDEL, 1995). Três estágios são definidos no processo de aprendizagem e devem ser considerados durante a avaliação e a reabilitação: 1- o paciente adquire implícita ou explicitamente o conhecimento necessário para desempenhar uma tarefa específica. Atenção e esforço conscientes são requeridos neste estágio. 2- as produções serialmente executadas são combinadas em uma única produção. Nesta fase há um aumento da velocidade no tempo necessário para executar a tarefa e redução no número de erros. A atenção ainda é necessária, embora em menor extensão. 3- através da prática, a execução da tarefa é automática, com redução do esforço e da atenção a ser dirigida à tarefa. É importante lembrar que a capacidade de aprendizagem aparece como um dos pré-requisitos para a melhoria da disfagia, principalmente durante a fase aguda do tratamento do tumor. A prática é necessária para se progredir de um estágio para outro e para se adquirir a automaticidade. No entanto, essa evolução pode variar entre os sujeitos e entre as tarefas de aprendizagem. Há também variação na participação de áreas cerebrais, dependendo do estágio da aquisição da habilidade, como mostram os estudos com imagem funcional. Ou seja, a diversidade existe quando a tarefa é diferente mas também depende do estágio específico da aquisição. Portanto, a natureza do processo de aprendizagem elicita uma maior ou menor participação das diferentes áreas cerebrais. Alguns padrões de ativação surgem no ato da aquisição e outros padrões distintos aparecem após algum nível de automatização da tarefa. Diferenças são vistas em sujeitos que adquiriram o conhecimento explícito da tarefa antes da prática começar. 140 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA A conclusão de estudos com neuroimagem é a de que o córtex pré-frontal está engajado com a aprendizagem de nova sequência de movimentos, especialmente quando os sujeitos precisam usar estratégias de solução de problemas para adquirir a habilidade motora, mas que esta região não é ativada quando a tarefa é automática. Em contraste, o cerebelo é requisitado tanto para codificar, como para recuperar uma seqüência de movimentos. Estudos mostram que o cerebelo tem papel crítico, não somente na fase inicial da aprendizagem de uma seqüência motora, mas no estágio de automatização. As áreas pré-frontais dorsal e córtex do giro cingulado anterior são reativadas quando se solicita a atenção aos movimentos, mesmo na condição de seqüência previamente aprendida. Isto sugere que tais áreas corticais têm um papel crítico na manutenção da atenção à ação. Também são os mediadores de alguns componentes cognitivos durante a aprendizagem motora, na situação de tentativa e erro: decisão, nível atencional e recuperação mental da sequência motora. Apesar de vários estudos mostrarem a participação cortical, subcortical e cerebelar na aprendizagem, muitas questões permanecem ainda sem respostas. Não se sabe se o mesmo padrão de ativação está presente numa variedade de tarefas de aprendizagem ou se esses padrões são dependentes da natureza da tarefa (DOYON,1997). Mais pesquisas são necessárias para se conhecer as variações no nível da atividade neuronal durante um ciclo completo de aprendizagem, desde a apresentação do novo estímulo até a completa automatização. Dessa forma, espera-se que as condições de aprendizagem possam ser melhor selecionadas por cada um dos profissionais da equipe multidisciplinar. Enquanto condutores do processo de reabilitação, o nosso objetivo deve ser o da constatação da aprendizagem cada vez mais eficiente dos pacientes, após um determinado período de treino. Agradecimentos Agradecemos à equipe multidisciplinar da Clínica Neurológica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, cujo convívio possibilitou o desenvolvimento das reflexões apresentadas neste capítulo. * Aula ministrada no VI Encontro de Fonoaudiologia em Cancerologia / 1998 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AGUIAR,P.H.; PLESE,J.P.P.; CIQUINI,O.; MARINO,R. Transient mutism following a posterior fossa approach to cerebellar tumors in children: a critical review of the literature. Child's Nerv Sys, 11:306-10, 1995. BUCHHOLZ, D.W. Neurogenic dysphagia: what is the cause when the cause is not obvious? Dysphagia, 9: 245-55, 1994. CAMERON,J.L.; ZUIDEMA,G.D. Aspiration pneumonia: magnitude and frequency of the problem. JAMA, 219 (9): 1194 -6, 1972. CHAPEY, R. 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Na deglutição, segundo LEONARD E KENDALL (1996), ocorre o fechamento laríngeo em três níveis, protegendo as vias aéreas contra a aspiração do bolo alimentar. Em atividades de esforço como defecação ou carregamento de peso, há um aumento da pressão subglótica pela adução máxima das três válvulas para impedir o escape de ar sob alta pressão dentro dos pulmões. A fonação é uma função adaptada e aprendida da laringe. Ocorre uma modificação nos ajustes respiratórios, produzindo um fluxo aéreo que inicia a vibração das pregas vocais (teoria mioelástica-aerodinâmica). Estas se aproximam da linha média, iniciando um ciclo vibratório graças ao Efeito de Bernouilli. A laringe é inervada por dois ramos do nervo vago, os nervos laringeos inferior e superior. O nervo laringeo inferior é mais conhecido como nervo laringeo recorrente devido ao seu trajeto descendente, passando inferiormente e a esquerda do arco da aorta e a direita da artéria subclávia e recorrendo para a laringe. O nervo laringeo recorrente é um ramo essencialmente motor inervando os músculos intrínsecos da laringe, com exceção do músculo cricotireoídeo, único músculo inervado pela porção motora do nervo laringeo superior (ramo interno). Segundo HENDERSON et al (1974), o nervo laringeo recorrente também envia fibras para o mús- 145 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO culo cricofaríngeo, além de possuir pequena porção sensitiva. O nervo laringeo superior (ramo externo) é responsável por toda sensibilidade laríngea, incluindo o reflexo de tosse. A lesão dos nervos laríngeos causará tipos específicos de paralisia laríngea de acordo com o ramo lesado. CARRARA-DE ANGELIS et al (1998) dividem a etiologia das paralisias laríngeas em traumática, neoplásica, idiopática, infecciosa, neurológica e pós-radioterápica. Os nervos laríngeos apresentam íntimas relações anatômicas com importantes estruturas do pescoço e do tórax. Assim, processos patológicos (neoplásicos ou infecciosos) da mama, aorta, esôfago, e tireóide bem como os seus tratamentos cirúrgicos podem comprometer o nervo. Entre as causas traumáticas, também encontram-se os ferimentos cervicais por instrumentos pérfuro-cortantes, projéteis de fogo e as contusões violentas. As paralisias pós-radioterapia ocorrem devido à fibrose da musculatura e /ou por fibrose nas estruturas por onde passa o nervo. COHEN et al. (1982) citam também a existência de paralisia laríngea em crianças, como conseqüência de defeitos congênitos (doenças do sistema nervoso central), de traumas durante o nascimento e de tumores. As paralisias laríngeas também podem ocorrer por fixação das articulações. Esse fenômeno é comumente observado em casos de uso prolongado de sondas de alimentação ou de intubação orotraqueal, que causam anquilose das aritenóides. COMPROMETIMENTO DO NERVO LARINGEO SUPERIOR Deglutição Os pacientes com lesão do nervo laringeo superior referem uma sensação de “bolo na garganta”, que caracteriza a anestesia laríngea causada pela lesão do ramo sensitivo. O reflexo de tosse fica diminuído ou ausente. PRATER E SWIFT (1986) referem que a disfagia está relacionada a essa perda de sensibilidade laríngea, podendo ocorrer aspiração silenciosa. PERIE (1998) acredita que possa haver atraso no trânsito faríngeo, pois o nervo laringeo superior envia fibras motoras para os constritores médio e superior da faringe. O tratamento da disfagia desses pacientes tem caráter preventivo, orientando a realização de manobras de proteção, como a deglutição supraglótica, para se evitar a aspiração silenciosa. Evita-se alimentos viscosos, que possam permanecer estasiados nas paredes faríngeas, provocando aspiração tardia. A sensibilidade laríngea pode ser trabalhada com a introdução de bolos de diferentes temperaturas e quantidades . Voz A lesão do nervo laringeo superior ocasiona a paralisia do músculo cricotireoídeo ipsilateral, com perda da tensão da prega vocal. A prega vocal fica portanto encurtada. Como consequência, a glote assume posição oblíqua durante a fonação, com rotação da glote posterior para o lado lesado durante a fonação (HIRANO et aI, 1994). As principais queixas dos pacientes referem-se à voz agravada e à perda da 146 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA capacidade de variação da altura, causada pela dificuldade ou impossibilidade de emissão de sons agudos. Durante a fala encadeada, a voz torna-se monótona sem variação melódica. Pode ser observado também rouquidão e asperez a leve, devido à flacidez da prega e à assimetria de onda mucosa durante a fonação. A intensidade vocal está normal ou ligeiramente reduzida (PRATER E SWIFT, 1986). O tratamento vocal enfoca as técnicas que favoreçam a vibração da mucosa (sons vibrantes, fricativos), a melhora da extensão vocal (escala musical) e a projeção vocal (apoio respiratório, humming, sobrearticulação). O uso da vibração da língua contra lábio superior (como se fosse falar rapidamente "blá-blá-blá...", jogando a língua para fora da boca) oferece bons resultados. Esse exercício associa duas técnicas: o som vibrante, que favorece a vibração normotensa da mucosa e a emissão com anteriorização e posteriorização de língua que auxilia na variação de altura. COMPROMETIMENTO DO NERVO LARINGEO RECORRENTE A lesão do nervo laringeo recorrente provoca paralisia da musculatura intrínseca da laringe, ocasionando a paralisia da prega vocal, geralmente em posição paramediana (BOONE E McFARLANE, 1994). A paralisia em posição de abdução é rara. É importante ressaltar que quanto mais distante a prega vocal estiver da linha média pior será o prognóstico vocal. Quando há lesão bilateral do nervo, a paralisia abdutora (pregas vocais aduzidas) é mais comumente observada. Nesses casos, não são relatadas alterações vocais. Respiração A presença da fenda glótica leva a uma falta de controle do fluxo respiratório. Como mecanismo compensatório, o paciente desenvolve padrão respiratório superior, com ciclos respiratórios curtos. Pelo escape de ar, o paciente apresenta fadiga constante que piora nas situações de esforço físico, incluindo o uso da comunicação oral. BENNINGER et al (1994) propõem a realização de exercícios que propiciem uma ótima respiração, com condicionamento aeróbico e exercícios que promovam um aumento da força e do controle da musculatura torácica e abdominal. Sugerem a realização de caminhadas e corridas. Nos casos de paralisia abdutora, ocorre dispnéia e observa-se estridor laringeo durante a respiração. Nesses casos, o tratamento é iminentemente cirúrgico, inicialmente com confecção de traqueostomia, que permite o restabelecimento de uma respiração confortável. Mais tarde, cirurgias corretivas podem ser indicadas, como a aritenoidecto-mia, a aritenoidopexia (PRATER E SWIFT, 1986) ou a tenotomia (TSUJI et al, 1997). Voz Na laringoscopia observa-se assimetria de vibração de mucosa, desnível entre as pregas vocais e fenda glótica durante a fonação. Consequentemente, a qualidade vocal pode apresentar: • soprosidade, pela fenda glótica; • bitonalidade, pelo desnível e assimetria de vibração; • rouquidão, pela flacidez da mucosa e da musculatura; 147 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO • aspereza, que pode aparecer tardiamente pelo enrijecimento do tecido e pela instalação de tratopatias. Pode ocorrer também o falsete paralítico como mecanismo de adaptação. A intensidade vocal fica bastante reduzida, com maior decréscimo ao final da emissão. Os tempos fonatórios ficam significativamente reduzidos. Estes sinais ocorrem pela falta de controle da saída do ar. Observa-se instabilidade e quebras de sonoridade durante a emissão. A terapia vocal inicia-se com o treino respiratório, favorecendo o padrão costodiafragmático. Acredita-se que a melhora do padrão respiratório seja fundamental para a melhora da qualidade vocal, pois o controle do escape aéreo auxilia nos aumentos dos tempos fonatórios e da intensidade. Orienta-se a realização de exercícios que favoreçam a propriocepção da movimentação da musculatura abdominal (percepção da movimentação diafragmática) e intercostal. Os exercícios respiratórios utilizados em aulas de canto (EMMONS, 1995) também mostram bons resultados. Em relação à fonação, a fonoterapia tem como objetivos a melhora da coap-tação glótica, a obtenção de uma vibração equilibrada e simétrica das pregas vocais, a adequação dos parâmetros vocais (altura, intensidade e duração), a desativação de tratopatias de adaptação e por fim a aquisição de uma boa projeção vocal. Dentre os exercícios que favorecem a coaptação glótica BEHLAU E PONTES, (1995a), destacam: − Deglutição incompleta sonorizada – aproveita a constrição laríngea ocorrida durante a deglutição, associando uma emissão vocal durante o início da fase faríngea. − Ataque vocal brusco – provoca hiperfuncionamento glótico, geralmente associado a emissão de sons plosivos. Não deve ser utilizado com freqüência, para evitar traumatismos. − Fonação inspiratória – favorece a coaptação glótica por mecanismo de sucção das pregas vocais para a linha média. Devem ser realizados sob supervisão do fonoaudiólogo, pois alguns pacientes tendem a desenvolver padrão respiratório superior durante o exercício. − Técnicas de empuxo – consistem na utilização da adução máxima das pregas vocais em situações de esforço como exercício fonatório, associando socos ou mãos em gancho com sons plosivos ou vogais prolongadas. Segundo YAMAGUCHI et al (1993) esses exercícios promovem aumento da intensidade vocal. BENNINGER et al (1994) ressalvam que a realização de exercícios de adução forçada devem ser evitados ou monitorados com extrema atenção, pois podem levar a uma compensação hiperfuncional que poderá ser prejudicial a longo prazo. Assim, esses autores aconselham a realização de terapia vocal tradicional com técnicas menos agressivas: − vibração de língua ou lábio; − sons fricativos; − técnica sueca do /b/ prolongado; − som basal; − sons hiperagudos; − escalas musicais. A técnica de empuxo pode ser introduzida com uma variação também eficiente e menos agressiva. Solicita-se ao paciente que exerça leve pressão sobre qualquer superfície ou cerre os punhos em todas as situações de fala. Também traz como van- 148 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA tagem o fato de o paciente estimular a coaptação glótica durante diversos momentos do seu dia-a-dia e não somente duas ou três vezes ao dia, como é geralmente orientada a prática dos exercícios fora da terapia. As técnicas de mudança de postura, segundo BEHLAU E PONTES (1995a) são indicadas nos casos em que há assimetria de tamanho, massa, forma, vibração e tensão. Nos casos de paralisia vocal indica-se a realização de rotação ou inclinação lateral de cabeça (quando há desnível entre as pregas). O lado no qual o exercício será realizado dependerá do objetivo a ser alcançado. Assim, a inclinação de cabeça para o lado sadio aumenta a fenda glótica, desnivelando ainda mais as pregas. É indicado quando espera-se o retorno da função da prega vocal paralisada, estimulando sua movimentação. Já se o objetivo é a compensação com a prega vocal sadia, esse exercício deve ser realizado de forma contrária. A rotação de cabeça para o lado paralisado medializa a prega paralisada, diminuindo a fenda glótica pela compensação da prega vocal sadia. A manipulação digital da laringe, com os dedos em "U" sobre a cartilagem tireoídea, aproxima as pregas vocais e pode reduzir a soprosidade. O objetivo é que o paciente consiga perceber as mudanças vocais ocorridas e posteriormente manter a mesma qualidade vocal sem a estimulação. Para a melhora da projeção vocal podem ser realizados humming, sobrearticulação, voz salmodiada e a emissão com protrusão de língua. LANDIS (1994) refere ainda a eficácia da realização de exercícios miofuncionais para melhora da ressonância e intensidade vocal em pacientes disfônicos. Esses exercícios aumentam a amplitude de movimentos durante a articulação, facilitando a projeção vocal. Mesmo quando o paciente adquire uma boa qualidade vocal, observa-se, em alguns casos, a permanência de dessonorização de consoantes sonoras, que podem ser trabalhadas com exercícios específicos de oposição de pares mínimos. Se não houver retorno da função no período de seis a doze meses, é proposta uma abordagem cirúrgica que propicie a aproximação da prega vocal paralisada à linha média. São descritas técnicas de injeção de material sob a mucosa da prega vocal e técnicas de remodelação da estrutura laríngea (HOFFMAN E McULLOCH, 1996). Deglutição É observada disfagia com alimentos líquidos, pela falha no fechamento do ádito laríngeo durante a deglutição, havendo penetração laríngea ou aspiração. É comum os pacientes referirem pigarros e tosses constantes, que provavelmente são devidos a aspiração de saliva. Esse sintoma muitas vezes é agravado durante o sono, devido a perda de controle e à posição assumida pelas estruturas do trato aero-digestivo, que favorece ainda mais a aspiração. EKBERG et al. (1986) observaram que a penetração e aspiração durante a deglutição ocorreram por atraso na movimentação da epiglote em 59% dos pacientes, a falha no fechamento vestibular em 64% e falha na coaptação glótica em 45% dos casos. Essa disfagia é descrita na literatura como um evento raro e transitório (WOO et al., 1991; PERIE et al., 1998). Entretanto, em estudo realizado por TONINI et al (1999), queixas de deglutição foram referidas por cerca de 50% da população de pacientes com lesão do nervo laringeo recorrente. Não se encontram citações para tratamento específico na literatura. Na prática clínica, observa-se redução significativa dos sintomas com a realização de manobras que propiciem o fechamento laríngeo (LOGEMANN, 1998), como o posicionam do queixo para baixo e a manobra supraglótica. Orienta-se a ingestão de líquidos em 149 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO pequenos goles, facilitando o controle laríngeo. O uso do canudo também pode ser útil, pois mantém o queixo mais baixo e aumenta a força da mu sculatura oral, levando a uma propulsão mais forte do bolo. Para se prevenir a aspiração durante o sono, o paciente deve ser orientado para a elevação do seu decúbito. CONCLUSÃO As principais alterações funcionais decorrentes da paralisia laríngea são disfagia e disfonia. A disfagia, tanto nas lesões de laríngeo superior como de recorrente são leves e respondem bem ao tratamento fonoaudiológico, sem necessidade de outras condutas. Segundo BEHLAU et al (1995) não há tradição de atendimento fonoaudiológico no campo das disfonias orgânicas. Porém, cada vez mais se aceita que esse atendimento resulta em benefício. CASPER et al. (1986) apontam excelentes resultados com a terapia vocal, observando o funcionamento normal da prega vocal em cerca de 50% dos pacientes com lesão periférica do nervo laringeo recorrente. Mesmo assim, os objetivos da fonoterapia devem ser mais realistas, não buscando uma voz normal, mas sim uma voz produzida sem esforço e com compensações fonatórias saudáveis, permitindo ao paciente uma comunicação eficiente. É fundamental também se trabalhar com a psicodinâmica vocal, com o intuito de auxiliar o paciente a aceitar a sua nova voz. * Aula ministrada no VII Encontro de Fonoaudiologia em Cancerologia / 1999 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BEHLAU, M.; GONÇALVES, I.; PONTES, P. Encaminhamento fonoaudiológico das disfonias. IN: MARCHESAN, I. Q.; ZORZI, J.; GOMES, I Tópicos em Fonoaudiologia, São Paulo, Lovise, 1995, p. 97-111. BEHLAU, M.; PONTES, P. Avaliação e tratamento das disfonias. São Paulo, Lovise, 1995a. 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Segundo o INCA (Instituto Nacional do Câncer) a cirurgia radical do câncer de boca evoluiu sobremaneira, com incorporação de técnicas de reconstrução imediata, permitindo largas ressecções e uma melhor recuperação do paciente. As deformidades, porém, ainda são grandes e o prognóstico dos casos, intermediário. Muitas das seqüelas alimentares isolam o paciente do convívio familiar e social durante as refeições. O ato prazeroso passa a ser realizado com privação. A desnutrição e a desidratação são manifestações que toda equipe multiprofissional procura evitar que ocorram. O paciente submetido ao tratamento oncológico de boca e orofaringe pode vivenciar dificuldades em uma ou mais fases da deglutição (preparatória, oral e faríngea). A localização do tumor e o tipo de tratamento é que vão determinar quais serão os comprometimentos funcionais. No caso da cirurgia, além da região, a extensão exata e o tipo de reconstrução vão influenciar na habilidade da mastigação e deglutição. O processo de reabilitação deve ser executado por uma equipe multiprofissional, atuando de forma interdisciplinar. Todos os esforços e conhecimentos devem ser aplicados em favor da reintegração social do paciente com qualidade de vida apropriada. 152 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA DISFAGIA APÓS TRATAMENTO CIRÚRGICO Com finalidade didática as seqüelas de alimentação decorrentes do tratamento cirúrgico são apresentadas a partir da localização do tumor. Entretanto, vale lembrar que o câncer pode acometer mais de uma estrutura sendo necessária a exérese de outras regiões e, consequentemente, a disfagia orofaríngea será de acordo com a intervenção realizada. Lábios De acordo com o INCA, o Brasil apresenta uma alta incidência de câncer de lábio, uma vez que se trata de um país tropical que sustenta também em sua economia atividades rurais nas quais os trabalhadores ficam expostos de forma continuada à luz solar. É essa a razão para o câncer de lábio inferior ser mais ocorrente que o superior. Ressecções parciais dos lábios não comprometem o ato de alimentação. O mesmo não é verdade para ressecções completas dos lábios superior e inferior. A ausência de mobilidade da região ressecada e reconstruída impossibilita a continência salivar e alimentar. A falta de pressão dos lábios dificulta a retirada do alimento do talher. O comprometimento do selamento labial inviabiliza a manutenção do bolo alimentar na cavidade bucal durante a mastigação. Além disso, o paciente apresenta dificuldade para a protrusão e diminuição na tonicidade importantes para a sucção. Os alimentos de consistência líquida são os de pior contenção para esses pacientes. Mandíbula O comprometimento alimentar no tratamento do câncer da mandíbula vai depender da localização do tumor, da extensão cirúrgica e o tipo de reconstrução. Para uma melhor compreensão da disfagia nas mandibulectomias, tal estrutura precisa ser dividida em região mentoniana e do corpo e ângulo da mandíbula. O mento é uma área difícil de ser reconstruída por causa da sua configuração. Quando a reconstrução é realizada com êxito, o único impedimento é o corte dos alimentos com os dentes incisivos, uma vez que estes são ressecados junto com a mandíbula. No entanto, o paciente tem a possibilidade de realizar a incisão com os dentes remanescentes. Já nos casos em que a reconstrução não é possível, além da impossibilidade de se cortar os alimentos, os pacientes apresentam incontinência salivar e alimentar pela falta do arcabouço ósseo. O prognóstico funcional para estes doentes é ruim, limitando em muito as possibilidades de reabilitação fonoaudiológica. Desta forma, se faz necessária a utilização de meios compensatórios para a reintrodução da dieta oral, como por exemplo, posicionar o alimento na região posterior da boca e manter a cabeça para trás. Nas mandibulectomias do corpo e ângulo da mandíbula, a mastigação do lado ressecado fica inviabilizada, sendo porém facilmente realizada pelo lado contralateral. Quando a ressecção é segmentar e não há a reconstrução da região, o paciente apresenta ainda aumento no tempo de propulsão alimentar, já que não ocorre a estabilidade da oclusão por falta de fixação dos cotos da mandíbula. Dentre as mandibulectomias, as da região do mento são as que apresentam mais prejuízos funcionais e sendo também as de mais difícil tratamento. Palato As ressecções do palato comprometem as fases preparatória e oral da deglutição ocorrendo refluxo alimentar para cavidade nasal. A protetização é o principal meio 153 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO de reabilitação. O ideal é que uma prótese provisória seja inserida no intra-operatório, para que os pacientes consigam já no pós-operatório mastigar e deglutir sem apresentarem refluxo nasal. Durante a confecção da prótese, o fonoaudiólogo pode realizar avaliações de fala e deglutição, a fim de garantir uma melhor adaptação (VICENTE et al., 1997). Língua A ressecção da língua pode ser parcial ou total, combinada ou não com outras estruturas da cavidade bucal e/ou orofaringe. Sendo assim, pode ocorrer disfagia em uma ou mais fases da deglutição. Glossectomia Parcial No tratamento cirúrgico do terço anterior da língua, a fase da deglutição prejudicada é a preparatório, comprometendo a lateralização do bolo alimentar. A higiene oral também é atingida. Vale destacar, que tais seqüelas são diretamente proporcionais a extensão cirúrgica e a mobilidade da língua remanescente. Na ressecção de hemilíngua, as dificuldades também se dão na mastigação e na higiene oral. Entretanto, o grau de comprometimento é menor em relação a exérese anterior pela facilidade de compensação do lado contrário à cirurgia. Já as glossectomias do terço posterior tende a apresentar alterações nas fases oral e faríngea da deglutição. O tempo de trânsito do bolo alimentar da boca para a faringe pode durar mais que o normal devido a dificuldade de realização dos movimentos de propulsão. A mobilidade restrita da região posterior, pode ainda, prejudicar o contato do dorso da língua contra o pilar palatoglosso, o que causa, um atraso no disparo do reflexo da deglutição. Tais alterações são, na maioria das vezes, as causas para a aspiração antes da deglutição nessa modalidade de tratamento. Para LOGEMANN (1983), o paciente precisa ser ensinado a proteger conscientemente a via aérea inferior durante a alimentação, uma vez que a falta de controle do bolo alimentar favorece o seu escape para esta região antes que a deglutição voluntária se inicie. A ressecção de base de língua apresenta comprometimento alimentar mais severo que as demais, ocorrendo disfagia na fase faríngea. O paciente apresenta limitações no toque do pilar palatoglosso com a língua, dificultando ou atrasando o reflexo da deglutição e conseqüentemente a proteção da via aérea inferior é prejudicada. A perda de tecido da região também pode viabilizar a retenção de alimento na valécula, possibilitando aspiração tardia. De acordo com LOGEMANN (1983), o paciente com ressecção de base de língua tem dificuldade de abertura do esfíncter cricofaríngeo durante a deglutição, uma vez que a base da língua é importante no relaxamento desse esfíncter. Neste caso, a realização da miotomia pode ser indicada. Vale ressaltar que as glossectomias menores que 50% podem apresentar alterações mínimas de deglutição, normalmente no pós-operatório imediato, sendo de fácil adaptação. Ao passo que, nas ressecções maiores de 50% os comprometimentos funcionais são mais importantes. Nesse caso, a reabilitação vai depender de diversos fatores, tais como, a extensão da cirurgia, o tipo e o aspecto da reconstrução, o grau de mobilidade da língua remanescente e da presença ou ausência dos dentes (VICENTE et al., 1997). 154 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA Glossectomia Total Dentre os tratamentos cirúrgicos do câncer da boca, a exérese total da língua é a mutilação mais grave, resultando em prejuízos funcionais irreversíveis ao paciente e limitando de maneira importante sua qualidade de vida. Por essa razão muitos serviços de cirurgia de cabeça e pescoço não realizam tal procedimento terapêutico. E do conhecimento de todos que a língua tem uma importante função durante a alimentação: recebe o alimento cortado pelos incisivos ou depositado no interior da cavidade bucal pelos talheres ou copo; auxilia na trituração do alimento; recolhe no seu centro o bolo formado; propulsiona a dieta para a orofaringe; ajuda no disparo do reflexo de deglutição que aciona os mecanismos de proteção nasal e laríngea e de abertura do esôfago. A língua tem ainda como funções, a de identificar e reconhecer o tipo e a temperatura do alimento a ser ingerido, e por fim a de auxiliar na higiene bucal. Sendo assim, como seqüela alimentar após glossectomia total temos: impossibilidade de mastigar; ausência do controle e propulsão do bolo alimentar; dificuldade de deglutição da saliva, podendo causar sialorréia e/ou aspiração; dificuldade no disparo do reflexo da deglutição; tempo de trânsito oral e faríngeo maior que o normal; possibilidade de ocorrer aspiração antes, durante ou após a deglutição; ageusia (ausência de paladar); estado nutricional debilitado; anorexia (perda de apetite); higienização bucal precária durante a alimentação. Além das alterações fisiológicas, é importante mencionar as mudanças nos hábitos alimentares que o glossectomizado total vivência. Com freqüência ele realiza refeições solitárias, não se alimentando em lugares públicos como restaurantes e festas familiares e sociais. Além disso, ele deixa de ter prazer em comer. Sua dieta passa a ser restrita àquelas de consistência líquida e pastosa. A fonoterapia para esses casos contribui para minimizar tais alterações e para ajudar o paciente a aceitar as limitações funcionais inerentes ao tratamento oncológico. Assoalho da boca As ressecções restritas ao assoalho de boca da região anterior, geralmente não ocasionam comprometimentos funcionais durante a alimentação. Todavia, naquelas de extensão maior, ou em casos em que outras estruturas adjacentes também são ressecadas, ou ainda, quando a língua é utilizada para reconstruir o defeito cirúrgico do assoalho da boca, as alterações se fazem presentes. O paciente pode apresentar dificuldade na lateralização, no controle e na propulsão do bolo alimentar; aumento no tempo de trânsito oral e atraso no disparo do reflexo de deglutição. Desta forma, como nas demais localizações do câncer de boca, a disfagia orofaríngea nas pelvectomias vai depender da extensão da ressecção e do tipo de reconstrução. Área Retromolar A área retromolar faz parte da região da orofaringe. Está localizada entre as duas arcadas dentárias, por trás da implantação dos últimos molares (BARBOSA, 1962). O reflexo da deglutição é o principal acometido pela ressecção desta área, com probabilidade de apresentar-se atrasado ou ausente do lado da cirurgia, uma vez que a exérese do pilar palatoglosso faz parte do tratamento do câncer. Nos casos em que o palato mole também é ressecado, é comum se observar o refluxo alimentar para a cavidade nasal. 155 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO Em ambos os casos, a disfagia pode ser compensada com a mudança postural da cabeça inclinada para o lado livre do tratamento cirúrgico. Alguns pacientes podem apresentar uma diminuição da abertura da boca nas cirurgias retromolares, causada por retração cicatricial, o que ocasiona dificuldade na incisão de alimentos de maior volume. A fonoterapia é importante para evitar que essa intercorrência ocorra ou para minimizar seu efeito. DISFAGIA APÓS RADIOTERAPIA O emprego da radioterapia no câncer de boca e orofaringe habitualmente causa transtornos para o paciente se alimentar durante e após o período das aplicações. Os efeitos precoces da irradiação são edema, mucosite, anorexia e alteração do paladar que dificultam a mastigação, a formação do bolo alimentar, e causam odinofagia. Além disso o estado nutricional do paciente fica freqüentemente debilitado nesse período. O uso de sonda nasoenteral em alguns casos é necessário para se evitar a desnutrição. Vale destacar que o edema intra-bucal e a mucosite podem impossibilitar o uso de próteses dentárias durante a realização da radioterapia e logo após o seu término, devendo o paciente nutrir-se com alimentos de consistência líquida e pastosa. No período pós-radioterapia tardio, os efeitos são praticamente irreversíveis, podendo interferir nas fases preparatória, oral e faríngea da deglutição. A xerostomia é comum pós radioterapia para o câncer de boca, prejudicando a formação e a propulsão do bolo alimentar. Dessa forma, o paciente é obrigado a ingerir alimentos umedecidos. A cárie de radiação, a osteoradionecrose da mandíbula, a fibrose e o trismo também podem ocorrer como seqüela a longo prazo, comprometendo a mastigação, a propulsão, o tempo de trânsito oral e o reflexo de deglutição. A fonoterapia durante e após a radioterapia visa minimizar essas conseqüências e otimizar as funções de mastigação e deglutição e a higiene oral. O trabalho conjunto com a equipe da nutrição é fundamental para se garantir um adequado estado nutricional ao paciente. INTERVENÇÃO FONOAUDIOLÓGICA O fonoaudiólogo deve atuar já na fase pré-operatória, orientando, esclarecendo e conscientizando o paciente e seus familiares sobre a terapêutica a ser empregada e sobre as conseqüentes alterações de comunicação oral e alimentação. As cirurgias de cavidade da boca e orofaringe podem ocasionar prejuízos mínimos a bastante importantes, devendo os esclarecimentos serem fornecidos de acordo com a extensão exata da cirurgia e do tipo de reconstrução. No pós-operatório recente, o paciente deve ser submetido a avaliação das suas funções orais. Atenção deve ser dada à extensão cirúrgica e ao aspecto da reconstrução, investigando a motricidade e sensibilidade das , estruturas da boca e a habilidade do paciente em deglutir espontaneamente a saliva. E importante lembrar que nesse período é comum ocorrer edema da região manipulada dificultando a sua mobilidade. Tais informações são fundamentais para se definir as estratégias fonoterápicas e para se confirmar ou adequar os esclarecimentos fornecidos no pré-operatório ao paciente. A reabilitação da disfagia deve iniciar imediatamente após a liberação médica para alimentação por via oral, geralmente por volta do 15° dia de pós-operatório. 156 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA Para os tumores de boca e orofaringe tratados cirurgicamente é necessária a realização de exercícios oromotor preparatórios (LOGEMANN, 1983) para que se possa melhorar o controle muscular durante a mastigação e a deglutição. São indicados os exercícios isotônicos com as estruturas do sistema estomatognático e de sensibilidade intrabucal, como a estimulação térmica no pilar palatoglosso para o reflexo de deglutição. Durante a terapia com alimentos, estratégias terapêuticas devem ser aplicadas de acordo os dados obtidos da avaliação pós-operatória. São elas: Modificações nas características da dieta (consistência, textura e volume) Nas ressecções completas de lábios e da região do mento, o paciente apresenta maior facilidade na contenção alimentar quando este está na consistência pastosa ou sólida. Para a retirada de alimento do talher, um volume maior facilita a sua introdução para a cavidade da boca. Para os casos em que a mobilidade de língua está ausente ou bastante limitada, as consistências líquida engrossada e pastosa fina são as mais indicadas, precavendo-se que a dieta líquida não cause aspiração antes da deglutição. Alimentos muito viscosos devem ser evitados, uma vez que a higiene oral com a língua é precária ou inexistente, podendo ocasionar aspiração após a deglutição. A alternância da consistência alimentar durante a refeição favorece a propulsão do bolo alimentar e a retirada dos resíduos na cavidade da boca, valécula e seios piriforme. Um maior volume de alimento, por vezes, pode ajudar no reflexo de deglutição e na passagem do bolo da boca para o esôfago. No entanto essa é uma particularidade que deve ser bem investigada para cada caso. Posicionamento da dieta na cavidade bucal Introduzir o alimento sobre a língua é uma excelente opção para as ressecções completas de lábios. Nas mandibulectomias, nas cirurgias retromolares e nas glossectomias menores que 50%, a dieta deve ser posicionada no lado contralateral à ressecção. Já os pacientes submetidos a cirurgias que ocasionem uma movimentação lingual muito alterada, se beneficiam da introdução do alimento na porção posterior da cavidade da boca. Manobras posturais de cabeça Os paciente que não apresentam um bom controle do bolo alimentar e/ou apresentam dificuldades para a propulsão do bolo alimentar, podem posicionar a cabeça levemente para trás. Entretanto, se ocorrer aspiração antes da deglutição tal posição deve ser evitada. Inclinar a cabeça para o lado em que as estruturas da boca e da orofaringe estão íntegras, promove uma mastigação e deglutição mais satisfatória. Múltiplas deglutições É indicado para o paciente que apresenta higiene oral ruim durante a refeição, visando a não manutenção do bolo na cavidade bucal e prevenindo aspirações tardias. Deglutição dura Para os pacientes com ressecção da base da língua, essa manobra maximiza o movimento da estrutura remanescente e contribui para a limpeza alimentar da valécula. 157 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO Manobra de Masako Os pacientes com ressecções oncológicas da orofaringe se favorecem de tal estratégia, desenvolvendo compensações com a faringe, uma vez que a manobra aumenta a movimentação da parede posterior da faringe durante a deglutição. A combinação de duas ou mais estratégias acima mencionadas, permite ao paciente adaptações ou compensações satisfatórias, viabilizando a reabilitação funcional. Vale relembrar que os exercícios isotônicos são igualmente importantes no processo terapêutico do paciente com câncer de boca e orofaringe. Para os pacientes que apresentam aspiração antes, durante ou após a deglutição são indicadas estratégias de proteção da via aérea inferior, tais como a deglutição supraglótica, a super-supraglótica e manobra de Mendelsohn. Concluindo, a fonoterapia é um processo ativo. O paciente tem um papel atuante e responsável na sua reabilitação. Por sua vez, o fonoaudiólogo deve ter a capacidade de compreender a relação clínica da disfagia com a natureza e extensão da ressecção cirúrgica, deve reconhecer adaptações e compensações desenvolvidas pelo paciente (AGUILAR et al., 1979) e por fim, identificar as limitações funcionais inerentes a cada caso. * Aula ministrada no V Encontro de Fonoaudiologia em Cancerologia / 1997 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AGUILAR, N.V.; OLSON, M.L.; SHEDD, D.P. 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FONTE CONSULTADA http:/www.inca.org.br/cancer/tipos/boca.html 158 NUTRIÇÃO EM PACIENTES COM CÂNCER DE CAVIDADE ORAL Lara Scupino Borges Pacientes com câncer de cavidade oral geralmente apresentam-se desnutridos por diversos fatores, entre os quais destacam-se: o próprio processo neoplásico; dor e mal-estar durante a mastigação e deglutição; efeitos colaterais provocados pelos tratamentos administrados (cirurgia, quimioterapia e/ou radioterapia); antecedentes de consumo crônico de álcool; obstrução física das vias superiores do aparelho digestivo ocasionada pelo tumor, além de problemas psicológicos, sociais, econômicos e culturais (CARRILLO, 1995). Os efeitos da desnutrição sobre o paciente são: aumento da morbidade e redução da sobrevida, da tolerância aos tratamentos, da imunocompetência e da qualidade de vida (GRIS et al 1995). O tratamento para pacientes com câncer de cavidade oral inclui a cirurgia, a radioterapia, a quimioterapia e a imunoterapia, utilizados isolados ou em combinação (LOPEZ et al, 1994). É bastante importante também a instituição de um suporte nutricional adequado, se possível, antes da terapêutica oncológica específica, para reduzir complicações e melhorar a tolerância do paciente ao tratamento, prevenindo-o de um comprometimento adicional no seu estado nutricional e consequentemente atingindo um melhor índice de resposta (GOODWIN E BYERS, 1993). Pode-se definir suporte nutricional como sendo a administração de nutrientes por via oral, enteral e/ou parenteral, com o objetivo de manter e/ou recuperar o estado nutricional dos pacientes. Para estabelecer o suporte nutricional individualizado, o nutricionista deverá inicialmente determinar o estado nutricional de cada paciente. Esta determinação começa com uma avaliação feito pelo profissional, que baseia-se em parâmetros clínicos, dietéticos, antropométricos, bioquímicos e imunológicos e também no exame físico geral do paciente (AUGUSTO, 1993). 159 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO A determinação do estado nutricional possibilita o cálculo dos requerimentos nutricionais, feito a partir do gasto energético basal (GEB), através da fórmula de Harris Benedict (AUGUSTO, 1993; MOORE, 1994). Mulheres : GEB = 655 + (9,6 X P) + (1,7 X A) - (4,7 X I) Homens : GEB = 66 + (13,7 X P) + (5 X A) - (6,8 X I) Sendo : P = Peso em kg A = Altura em cm I = Idade em anos Para o cálculo do valor calórico total (VCT), leva-se em consideração o GEB, o fator atividade (FA), o fator injúria (FI) e o fator temperatura (FT) (WAITZBERG, 1995). VCT = GEB X FA X FI X FT Sendo: FA Acamado = 1,2 Acamado + Móvel = 1,25 Ambulante = 1,3 FI Paciente não complicado = 1,0 Pós-op. De câncer = 1,1 Fratura = 1,2 Sepsis = 1,3 Peritonite = 1,4 Multitrauma, Reabilitação = 1,5 Multitrauma + Sepsis = 1,6 Queimadura 30 – 50 % = 1,7 Queimadura 50 – 70 % = 1,8 Queimadura 70 – 90 % = 2,0 FT 388 C = 1,1 398 C = 1,2 408 C = 1,3 418 C = 1,4 KINNEY, 1966, 1970; 1976 WILMORE, 1977 LONG, 1979; ELWIN, 1980 Após a determinação do estado nutricional e cálculo dos requerimentos nutricionais, define-se a via de administração para o suporte nutricional. Esta poderá ser oral, enteral e/ou parenteral. • Via oral: a dieta via oral deve ser preservada sempre que possível por ser a mais fisiológica. O suporte nutricional oral é indicado quando a quantidade de alimento ingerido pelo paciente não é suficiente para atender suas demandas nutricionais. Os suplementos orais podem ser formulados a partir de alimentos “in natura” ou administrados através de fórmulas industrializadas (MAHAN E ARLIN, 1994). 160 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA • Via enteral: o suporte nutricional enteral é indicado quando o paciente está impossibilitado de se alimentar por via oral (disfagia, anorexia, obstrução esofágica, etc.), mas apresenta as funções digestivas e absortivas do trato gastrointestinal íntegras (MAHAN E ARLIN, 1994). O suporte é feito através da administração de nutrientes “in natura” ou fórmulas industrializadas nutricionalmente completas, utilizando-se sondas de alimentação. A colocação e o tipo de sonda vai depender das condições do trato gastrointestinal do paciente e da cirurgia à qual foi submetido. A administração dos nutrientes pode ser feita por sondas nasoenterais ou através de ostomias, sendo que estas são indicadas quando o paciente for permanecer com a sonda por um período prolongado ou quando houver dificuldade na passagem da mesma. As sondas podem estar localizadas no estômago, duodeno ou jejuno. • Via parenteral: o suporte nutricional parenteral é indicado quando o trato gastrointestinal não está normal anatômica ou funcionalmente. E feito através da administração de nutrientes diretamente na corrente circulatória, por meio de um cateter colocado no sistema venoso. De acordo com este planejamento nutricional, define-se a conduta dietoterápica, levando-se em consideração as necessidades e condições fisiológicas de cada paciente. Pacientes com câncer da cavidade oral, submetidos à cirurgia, geralmente permanecem com nutrição enteral no pós-operatório. O reinício da dieta via oral, será determinado por fatores que dependem do tipo da cirurgia realizada, da cicatrização e da evolução clínica do paciente. Neste mo mento, o paciente deve realizar fonoterapia para treinar a deglutição e a comunicação, sendo que o intercâmbio entre o fonoaudiólogo e o nutricionista é de grande valia para a reabilitação do paciente. O nutricionista verifica a aceitação da dieta, avaliando e acompanhando o estado nutricional do paciente. A medida que evolui o treinamento fonoterápico e de acordo com a condição clínica, modificam-se as quantidades e a consistência da dieta oral, diminuindo-se paralelamente o volume e a frequência da alimentação oferecida por sonda nasoenteral. No momento da reintrodução da dieta via oral, é necessário que o paciente permaneça um certo tempo com alimentação mista, ou seja, por via oral e por sonda. na Nesta fase inicial do tratamento, é necessário que uma oferta maior seja fornecida via sonda nasoenteral, uma vez que a quantidade de alimento ingerida por boca dificilmente será suficiente para suprir suas necessidades nutricionais. A dieta oferecida deverá ser, na maioria das vezes, de consistência líquidopastosa, como por exemplo, vitaminas, mingaus, iogurtes, sucos de frutas, sopas batidas. etc. A dieta deverá ser fracionada em no mínimo cinco refeições ao dia e, se necessária deverão ser utilizados suplementos orais. Apesar de algumas dificuldades encontradas, tais como engasgo, incontinência de líquidos pelos cantos da boca, tosse, ansiedade e nervosismo, os pacientes são encorajados por toda a equipe a prosseguir o tratamento e se adaptar às mudanças alimentares. Os casos de pacientes que apresentam disfagia severa deverão ser discutidos em reuniões clínicas pela equipe multidisciplinar, analisando-se a realização de gastrostomia provisória ou permanente, ou ainda optando-se pela manutenção da sonda nasoenteral. 161 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO Antes da alta hospitalar, o nutricionista deve orientar a dieta, seja por via oral, sonda ou mista, através de impressos próprios de orientação nutricional, com intuito de facilitar a compreensão dos pacientes e acompanhantes. A maioria dos pacientes que são submetidos à cirurgia de cabeça e pescoço são encaminhados posteriormente à Radioterapia para avaliação quanto a tratamento complementar. Se houver indicação, os pacientes deverão receber orientação quanto aos possíveis efeitos colaterais do tratamento e sobre as condutas necessárias para que não haja prejuízo do estado nutricional. Estes pacientes receberão orientação nutricional, enfatizada para alguns aspectos importantes como fracionamento da dieta, ingestão de líquidos durante o dia, ingestão adequada de proteínas e calorias, proibição do uso de bebidas alcoólicas e fumo e cuidado com higiene pessoal. Os pacientes em radioterapia que se alimentam por sonda nasoenteral são orientados a permanecer com a sonda, mesmo quando apresentam aceitação adequada da dieta via oral, pois poderão apresentar efeitos colaterais que irão posteriormente comprometer a ingestão. Os pacientes sem sonda, com efeitos colaterais acentuados e consequente diminuição da aceitação da dieta, requerem introdução imediata do suporte nutricional enteral. Os portadores de câncer da cavidade oral geralmente apresentam um estado nutricional bastante comprometido. É muito importante a definição precisa da conduta dietoterápica que, como visto, deve objetivar a minimização das consequências advindas da própria neoplasia e dos efeitos colaterais do tratamento. * Aula ministrada no V Encontro de Fonoaudiologia em Cancerologia / 1997 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AUGUSTO, A.L.P. - Peso teórico e necessidades energéticas dos indivíduos. IN: AUGUSTO, A.L.P.; ALVES, D.C.; MANNARINO, J.C.; GERUDE, M. - Terapia Nutricional. São Paulo, Atheneu, 1993. p. 21-27. AUGUSTO, A.L.P. - Avaliação Nutricional. IN: AUGUSTO, A.L.P.; ALVES, D.C.; MANNARINO, J.C. ; GERUDE, M. - Terapia Nutricional. São Paulo, Atheneu, 1993. p. 28-37. CARRILLO, F.J.O. - Apoyo nutricio en el paciente com cáncer de cabeza y cuello. IN: GRIS, J.R. ; CARRILLO, F.J.O. - Apoyo nutricio en cáncer, Mexico, lnteramericana, 1995. p. 211-25. GOODWIN, W.J.; BYERS, P. M. - Nutritional management of the head and neck cancer patient - Medical clinics of North America, 77 : 597-609, 1993. GRIS, J.R.; CARRILLO, F.J.O. - Desnutrición en el paciente con cáncer. IN: GRIS, J.R.; CARRILLO, F.J.O. Apoyo nutricio en cáncer. Mexico, lnteramericana, 1995. p. 12-25. LOPEZ, N.J.; MADDEN, ; HIGHBARGER,T. - Nutritional support and prognosis in patients with head and neck cancer - Journal of surgical oncology, 55: 33-6, 1994. 162 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA MAHAN, L.K.; ARLIN, M.T. - Métodos de suporte nutricional. IN:________. Alimentos, nutrição e dietoterapia. 8.ed. São Paulo, Roca, 1994. p. 537--57. MOORE, M.C. Evaluación nutricional. IN: _________. Guía clínica de enfermería – Nutrición y dietética. 2.ed. España, Mosby, 1994.p. 3-23. WAITZBERG, D.L.; RODRIGUES, J.J.G. Gasto energético e cálculo de necessidades calórico-protéicas. IN: WAITZBERG,D.L. Nutrição enteral e parenteral na prática clínica. 2.ed. Rio de Janeiro, Atheneu, 1995. p. 166-173. 163 ATUAÇÃO FISIOTERAPÊUTICA NA CIRURGIA DE CABEÇA E PESCOÇO Karin Schultz Renata Valim de Souza INTRODUÇÃO As cirurgias de cabeça e pescoço, trazem ao paciente diversas alterações tanto estéticas quanto funcionais, que variam conforme a localização e a extensão do tumor a ser ressecado. O papel da fisioterapia é fundamental durante o período de internação, bem como após a alta hospitalar do paciente, e tem o objetivo de auxiliar, orientar, reeducar e agilizar o retorno às suas atividades diárias, com mais conforto, visando melhorar sua qualidade de vida. Alguns fatores não devem ser excluídos da avaliação, como por exemplo: o estado nutricional, uso de álcool e o tabagismo, pois podem interferir na recuperação destes pacientes. A extensão da cirurgia e o tipo de anestesia também devem direcionar a intensificação dos cuidados pós-operatórios. Cabe ao fisioterapeuta avaliar, orientar e tratar da melhor forma as sequelas, que comprometem o pulmão, a face, a articulação têmporo-mandibular e o ombro do paciente, e motivá-lo a buscar a recuperação dentro de suas limitações. PULMÃO Considerando-se ser o pulmão um orgão vital, é extremamente importante o cuidado e manutenção da função respiratória. Uma vez que grande parte dos pacientes portadores de tumor de cabeça e pescoço são fumantes, e alguns apresentam Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC), sempre que possível os pacientes deverão 164 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA realizar fisioterapia pré-operatória, visando a higienização do pulmão e o treino da musculatura respiratória como preparo para a cirurgia. As complicações pulmonares em pacientes de cabeça e pescoço tratados cirurgicamente resultam em aumento do tempo de internação e em acentuado aumento na morbidade (STEELMAN et al., 1986; TVETERAS et al., 1986). A traqueostomia é conduta de rotina nas grandes cirurgias de cabeça e pescoço, podendo ser temporária ou definitiva de acordo com o tipo de cirurgia realizada. A atuação da fisioterapia se faz necessária no sentido de remover a secreção das vias aéreas e prevenir o seu acúmulo, através do procedimento de aspiração. No pós-operatório imediato, costumase encontrar maior quantidade de secreção sanguinolenta. Este é portanto o período que requer o maior cuidado de higienização tanto das vias aéreas quanto da traqueostomia no sentido de se prevenir a formação de rolhas que, se não adequadamente higienizadas, poderão obstruir a cânula de traqueostomia e levar o paciente a um desconforto respiratório importante. Pelo mesmo motivo, a nebulização deverá ser mantida continuamente, explicando-se ao paciente a sua importância na fluidificação da secreção e umidificação das vias aéreas, e seu papel na facilitação da expectoração espontânea ou mesmo da aspiração. A aspiração deverá ser realizada sempre que necessária, podendo variar de frequência de acordo com as condições pulmonares de cada paciente. O fisioterapeuta deve avaliar o paciente diariamente, através da ausculta pulmonar e verificar os exames radiológicos. As manobras de higiene brônquica devem ser realizadas com cuidado nos pacientes com cicatrizes na região torácica, principalmente quando existirem áreas de rotação de retalho. Sempre de acordo com as condições do paciente, diversos tipos de exercícios respiratórios devem ser utilizados com a finalidade de manter a força dos músculos inpiratórios e expiratórios, de melhorar a ventilação pulmonar, além de prevenir o acúmulo de secreções. Nos casos em que o paciente apresente complicações pulmonares como atelectasias ou infecções, pode-se optar por exercícios com pressão positiva intermitente, como recurso adicional para mobilizar secreção e melhorar a função pulmonar. Éimportante lembrar que embora o quadro do paciente indique a necessidade de realização da reexpansão pulmonar, o profissional deverá despender atenção redobrada aos pacientes portadores de DPOC. FACE A face do paciente em pós-operatório de cabeça e pescoço sofre prejuízos estéticos importantes, que podem acarretar alterações psicológicas graves, devido à exposição do rosto e à perda da expressão. O tamanho do tumor, a técnica microcirurgica e a monitorização são os fatores mais importantes no que concerne ao risco de paralisia facial pós-operatória (BEEKHUIS et al., 1965) temporária ou permanente. As sequelas de instalação imediata são o edema e as alterações da sensibilidade e da mímica facial, que quando não tratadas devidamente podem evoluir para situações de edema organizado com fibrose, aderência, assimetria facial, retração muscular, que acabam por interferir com a fala, com a deglutição e principalmente com a expressão facial. O edema no pós-operatório de cabeça e pescoço é consequência da obstrução linfática e venosa proveniente da ligadura de vasos no transcurso da cirurgia, ou da com- 165 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO pressão mecânica produzida por hematomas. O edema torna-se localizado e organizado, proporcionando então o aparecimento de tecido fibroso, que tende a encolher, e que resultará em comprometimento da elasticidade muscular e da eficácia da contração, podendo levar também a formação de aderências cicatriciais. Não se pode esquecer ainda, que todo esse processo é agravado quando o paciente é submetido à radioterapia (ISCHIMURA et al., 1993). Os cuidados fisioterápicos visam a normalização da sensibilidade, a melhora do aporte sangüíneo e da drenagem linfática e a reeducação muscular no sentido de minimizar o déficit motor, e prevenir a retração do lado são e o encurtamento do lado paralisado. A reabilitação deve ser iniciada precocemente, existindo uma ampla variedade de técnicas a serem usadas, dependendo da necessidade do paciente. A reeducação muscular é fundamental para o reequilibro da função motora da face, e como tentativa de se melhorar a qualidade expressiva. É realizada através de exercícios de mímica facial, estimulação tátil, massagem e mobilização do pescoço. A crioterapia também pode ser utilizada desde que não existam contra-indicações como por exemplo enxertos recentes. A massagem de drenagem linfática é recomendada para acelerar e intensificar o processo de absorção do edema, devendo obviamente ser direcionada às cadeias ganglionares preservadas na cirurgia. ATM - ARTICULAÇÃO TÊMPOROMANDIBULAR Algumas cirurgias de cabeça e pescoço, impõem ao paciente alterações nos mecanismos de abertura da boca, acarretando o que denomina-se trismo. O termo trismo, originou-se para definir um espasmo tetânico prolongado dos músculos maxilares através do qual existe uma restrição da abertura da boca. Com o tempo porém, essa nomenclatura passou a ser utilizada para qualquer situação que interfira na movimentação livre da mandíbula, independente de sua etiologia. ( McCULLOCH et al., 1997). A abertura normal da boca varia segundo autores e métodos utilizados para mensuração (RANDAL et al., 1993; KING et al., 1989). O trismo pode ser confirmado, no entanto sempre que a abertura da boca for menor que 35mm (O LEARY et al., 1990; KING et al., 1989). A ocorrência desta situação encontra-se facilitada pelo fato de os músculos responsáveis pela oclusão da boca, temporal, masseter, pterigoideomédio, terem cerca de dez vezes mais força do que aqueles que fazem sua abertura, pterigoideo lateral, digástrico, miohioideo, genohioideo e hioideo inferior, (KAPANDJI, 1987). Normalmente, os fatores predisponentes ao trismo em pacientes portadores de tumor de cabeça e pescoço são a extensão tumoral, devido ao crescimento infiltrativo deste; a radioterapia responsável pela diminuição da vascularização da área e a fibrose pósoperatória por alterar as estruturas ligamentares e produzir encurtamentos (KARTUSCH et al., 1992). O tratamento varia de acordo com a extensão e a sintomatologia do quadro, podendo ser utilizado analgésicos simples e relaxantes musculares, técnicas fisioterápicas como massagem, exercícios, alongamento, aplicação de TENS (estimulação elétrica transcutânea) e até a utilização de oxigênio hiperbárico, um método ainda pouco adotado devido a suas dificuldades e ao seu alto custo (DERKSEN et al., 1970). Exercícios baseados no princípio de facilitação neuromuscular proprioceptiva tem mostrado grande valor no tratamento de trismo. Este princípio é baseado no fenô- 166 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA meno fisiológico que leva a ativação de um grupo muscular (agonista) causar o relaxamento reflexo dos músculos antagonistas da mesma articulação. O exercício muscular é realizado repetindo a tentativa de abrir a boca contra uma resistência aplicada (KAPANDJI, 1987). Independente do tratamento escolhido o objetivo gira sempre em torno da melhora da revascularização e da restauração dos movimentos, visto que o trismo acarreta além de uma sequela estética, algo mais grave que é a sequela funcional. Esta interfere na alimentação e na mastigação, chegando muitas vezes inclusive, a alterar o estado nutricional, e provocar a importantes dificuldades para a higiene e para o tratamento dentário. OMBRO O ombro é uma articulação bastante complexa, composta por um conjunto de sete articulações. Possui três graus de liberdade, permitindo orientar o membro superior em seu eixo transversal com mo vimentos de flexão e extensão, eixo ântero-posterior, com movimentos de abdução e adução e eixo longitudinal com movimentos de rotação interna e externa (SCHULTZ et al., 2000). Vale lembrar que o ombro é responsável por movimentos rotineiros, que fazem parte das atividades diárias da vida de um indivíduo, e que sua inabilidade pode levar a quadros de insatisfação e, em situações extremas, até à depressão. Nos esvaziamentos cervicais, a ressecção ou o trauma cirúrgico produzido no nervo acessório, resulta em diminuição na amplitude dos movimentos do ombro devido principalmente à paralisia do músculo trapézio. O grau de limitação é dado tanto pela perda da estabilidade escapular secundária a paralisia do músculo trapézio, agravada pela dor; quanto pelo estiramento dos músculos rombóide e elevador da escápula (WEISBERGER E KINDAID, 1998). Todos os pacientes submetidos a esvaziamento cervical devem receber fisioterapia, na tentativa de minimizar este problema através da compensação com a mobilização de outros grupos musculares. O trabalho de alongamento da região cervical e da cintura escapular deve ser iniciado assim que possível, devendo fazer também parte do tratamento a longo prazo, pois a tendência de encurtamento muscular é grande, principalmente pela falta do movimento ativo em sua amplitude máxima. Consequentemente, é comum a instalação do “ombro doloroso”. Recursos como o TENS, podem ser utilizados para o alívio da dor. CONSIDERAÇÕES FINAIS A reabilitação completa das funções motoras deve ser sempre o objetivo do fisioterapeuta. Quando porém, esse objetivo não é possível de ser atingido, a preocupação deve ser a de oferecer a máxima manutenção da capacidade funcional. Por vezes, isso pode significar muito pouco ao paciente, que torna-se insatisfeito e apático afastando-se do tratamento. Neste momento, o fisioterapeuta deve redobrar seu esforço no sentido de adaptar o paciente à nova situação e incentivá-lo a recuperar, da melhor maneira possível, as suas funções diárias, mesmo dentro de suas limitações. Emocionalmente, o câncer já traz aos pacientes uma idéia de mutilação e morte. O fisioterapeuta deve ser portanto, mais um na equipe a apoiar e ajudar o paciente 167 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO a superar o sentimento de desesperança e desamparo que invariavelmente o acompanha e lutar para que o que seja alcançado se traduza basicamente em uma melhor condição de sobrevida. * Aula ministrada no seminário de Fonoaudiologia em Cancerologia / 1999 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BEEKHUIS, G.J.; HARRINGTON, E.B. Trismus. Etiology and management of inability to open the mouth. Laryngoscope, 75:1234-58, 1965. DERKSEN, A. A. D. The trismus- pseudocompylodactyly syndrome. J. Medical Genetics, 11: 41-9, 1970. ISCHIMURA, K.; TANAKA T. 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IN: CARRARA DE ANGELIS, E.; FURIA C. L.B.; MOURÃO L.F.; KOWALSKI L.P. A atuação da fonoaudiologia no câncer de cabeça e pescoço. São Paulo, Lovise, p.309-14, 2000. STEELMAN, R.; SOKOL, J. Quantification of trismus following irradiation of the temporomandibular joint. Missori Dental J., 66:21-2, 1986. TVETERAS, K.; KRISTENSEN, S. Review. The aetiology and pathogenesis of trismus. Clin. Otolaryngol. 11, 383-7, 1986. WEISBERGER, E.; KINDAID, J.I. Cable grafting of the spinal acessory nerve after radical neck dissection. Arch. Otolaryngol Head Neck Surg. 124: p.377-80,1998. 168 RELATO DE UMA EXPERIÊNCIA NA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DOS LARINGECTOMIZADOS Concentina D’Amico A Associação reúne-se mensalmente, no Hospital Ipiranga. Participam pacientes laringectomizados de várias instituições hospitalares. Funciona nos moldes de um centro de convivência, organizando palestras, através da equipe interdisciplinar, para orientação e esclarecimentos diversos. Mantém também oficinas de pintura, trabalhos de sensibilização corporal, danças circulares, organiza caminhadas e festas como a Festa Junina e a de Natal. Trata-se de um grupo aberto, de apoio e de referência, onde a família do paciente também é convidada a participar. Acreditamos que só o fato de estarmos em grupo, trocando idéias e compartilhando experiências, já nos coloca em direção ao crescimento. O paciente laringectomizado enfrentou uma verdadeira batalha pela vida. A sua auto-imagem está definitivamente modificada pela dor causada pelo diagnóstico e pelo tratamento. São freqüentes os sintomas de depressão e ansiedade, assim como os sentimentos de rejeição e inadequação, que acabam por leva-lo a um isolamento social. São muitas as perdas, mas hoje sabemos que se apropriadamente enfrentadas, causarão um saudável amadurecimento emocional e uma melhor qualidade de relacionamento do paciente consigo mesmo e com o outro. Faz-se necessário então ajudar a pessoa laringectomizada a desenvolver novamente seu potencial, estimulando suas diversas formas de manifestação e elevando, desta maneira a sua auto-estima. O comprometimento da expressão por meio da fala, ocasiona tensão física e emocional. Porém, nós entendemos que o ato de se expressar é um todo, que inclui não só a linguagem oral mas engloba o movimento, o gesto e o olhar. O corpo fala. Foi em função desse conceito que nasceu a proposta de se estimular a dança circular, de roda, no início de 1996. Essa é uma maneira do paciente entrar em contato com o seu corpo de maneira prazerosa e lúdica, e não de maneira sofrida e repleto de dúvidas. Utilizamos danças de várias culturas, como a ciranda do nordeste brasileiro, a grega, a 169 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO romena, entre outras. São músicas antigas, que nos remetem ao tempo em que o homem esteve mais próximo da natureza e de si mesmo . Dançamos de mãos dadas, com o corpo e o coração, buscando sentimentos de alegria, de bem estar e de maior integração. Os pacientes relatam alívio da tensão e da ansiedade, melhora do humor e consequentemente da depressão. Observamos, que a dança harmoniza o corpo e grupo, favorecendo a integração da nova imagem corporal e criando um espírito de solidariedade, que dá suporte para que cada um compreenda o seu processo de forma segura e positiva. VAMOS DANÇAR! * Aula ministrada no V Encontro de Fonoaudiologia / 1997 170 CARTILHA INFORMATIVA EM CIRURGIA DE CABEÇA E PESCOÇO Kariane Peixoto Fernandes Esta cartilha foi elaborada aos pacientes da Disciplina de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP. A especialidade “Cirurgia de Cabeça e Pescoço” envolve as seguintes afecções: neoplasias, doenças tireodianas, patologias não neoplásicas em glândulas salivares, anomalias congênitas e doenças sistêmicas de localização cervical. O resultado da ressecção cirúrgica dos tumores desta região acarreta, alterações estéticas e funcionais, necessitando de uma equipe multidisciplinar para sua reabilitação. A internação é um período de grande ansiedade, tanto para o paciente quanto para a família, pois além do receio de uma cirurgia há sempre uma total alteração em suas rotinas. Geralmente, na ocasião em que um paciente é internado lhe são fornecidas múltiplas informações, que diante da ansiedade do momento, nem sempre são totalmente aproveitadas. Para facilitar a compreensão do tratamento proposto, foi elaborada a Cartilha Informativa ou Pré-Operatória, que tem como objetivos: • fornecer informações básicas sobre a internação para o paciente e sua família • orientar (esclarecimento das dúvidas mais freqüentes) • diminuir a angústia – a internação deixar de ser algo tão desconhecido • promover a apresentação dos profissionais que poderão atender na enfermaria. As informações sobre a permanência na enfermaria referem-se : • ao que fazer no dia da internação, • a como chegar até a enfermaria e quem procurar • a rotina da enfermaria • aos procedimentos gerais sobre a cirurgia (não especificando nenhum tipo de operação) 171 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO • ao pós-operatório • aos procedimento de alta hospitalar • ao retorno ambulatorial e a continuidade do tratamento. Além disso, na cartilha existem informações sobre a função de cada um dos profissionais que poderão atuar no tratamento. A cada especialidade foi solicitado um pequeno texto explicativo versando sobre seu trabalho e a relação deste com os pacientes: • Fonoaudiólogo – orientações de voz, fala, deglutição e respiração. • Nutricionista – orientações de dieta. • Psicólogo – avaliação, orientação e psicoterapia direcionada a problemas referentes a própria doença, a internação, a cirurgia, ao pós-operatório e à reabilitação. • Médico – explicações sobre exames, anestesia, cirurgia, cortes, drenos, recuperação pós-operatória, pós-operatório e alta. • Enfermeiro – explicações sobre as rotinas para a coleta e feitura de exames, sobre curativos e sobre a execução da prescrição médica. • Assistente Social – orientação sobre os direitos do paciente e de como requere-los (auxílio doença, laudos, etc.). A Cartilha deve ser entregue no momento em que o paciente ingressa no agendamento cirúrgico e é orientado a aguardar em sua casa o chamado para internação. Dessa forma haverá tempo suficiente para que o paciente e sua família leiam e identifiquem suas dúvidas pessoais podendo assim, por ocasião da internação trazer perguntas mais elaboradas e dirigidas a cada profissional. Para sabermos sobre a eficiência da Cartilha elaborou-se um questionário de avaliação que deve ser entregue no momento da alta do paciente, contendo as seguintes questões: • As informações oferecidas pela Cartilha foram claras? • Esclareceu suas dúvidas? Restaram algumas? • A leitura foi fácil? • Sua família também leu a Cartilha? • Gostaria de acrescentar ou tirar algo da Cartilha? Em última análise, a Cartilha visa garantir um atendimento qualitativamente melhor e mais humano aos pacientes. * Aula ministrada no VI Encontro de Fonoaudiologia em Cancerologia / 1998 172 TRABALHO INTEGRADO DE FONOAUDIOLOGIA, PSICOLOGIA E SERVIÇO SOCIAL PARA ATENDIMENTO AO PACIENTE LARINGECTOMIZADO Adriana C. Alves Batista Denise Emília Andrade Facuri Irma Helena F B. Bomfim Magda Rodrigues Simões INTRODUÇÃO Este trabalho nasceu graças à iniciativa da Fonoaudiologia em convidar um psicólogo da Universidade de Franca para participar das discussões sobre os atendimentos realizados com pacientes laringectomizados. No segundo semestre de 1995, iniciaram-se as discussões de como poderia ser o trabalho psicológico junto a esses pacientes. Em 1996 foi introduzido, para alunas de Fonoaudiologia e de Psicologia, um estágio de atendimento a pacientes laringectomizados. Participavam do estágio duas fonoaudiólogas, uma psicóloga, monitoras de Psicologia, e estagiárias de Fonoaudiologia e de Psicologia. Foi um ano extremamente rico, de (re) conhecimento mútuo. Cada área precisava saber e compreender o que a outra fazia. Ao longo do ano, várias avaliações foram sendo realizadas que possibilitaram reformulações que enriqueceram ainda mais o estágio. Em 1997, ocorreu a entrada do Serviço Social na atividade. Este encontro acarretou uma reorganização nas atividades e a formação de grupos de orientação às famílias dos pacientes. 173 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO O QUE ESTAMOS FAZENDO • Reuniões interdisciplinares com a presença de todos os participantes do estágio: ocorrem discussões de textos, supervisões das sessões da Psicologia e apresentação de sínteses dos atendimentos da Fonoaudiologia (as estagiárias tem supervisão de suas sessões em outro horário) e discussão do grupo de família. • A Psicologia tem 1 hora de estudo de textos psicanalíticos. • Fonoaudiologia: 2 sessões semanais de 40 minutos de duração. • Psicologia: 2 sessões semanais de 50 minutos de duração em abordagem psicanalítica. • Serviço Social: coordenação das reuniões com famílias, com participação de uma fonoaudióloga e uma psicóloga, com duração de 1 hora, além de visitas domiciliares. • Reuniões entre pacientes a partir de agosto de 1998. • Atendimentos domiciliares aos pacientes da parte da Psicologia. • Relatórios integrados de Fonoaudiologia e Psicologia do estágio. • Reuniões com outros profissionais • Divulgação em Hospitais e para profissionais afins NOSSOS DADOS Profissionais envolvidos Estagiárias do Grupo Atendimento individuais oferecidos Atendimento em grupo oferecidos Supervisão de casos Atendimentos complementares Reuniões complementares esporádicas Média de pacientes atendidos anualmente 2 supervisores (psicologia e Fonoaudiologia) 1 assistente social 1 monitoras de Psicologia 5 estagiárias de Psicologia 5 estagiárias de Fonoaudiologia 2 sessões semanais de Fonoaudiologia e de Psicologia Atendimentos à família quinzenalmente 1 reunião interdisciplinar por semana 2 reuniões pré e pós operatórias de Fonoaudiologia, Psicologia e orientação família Reuniões multidisciplinares com otorrinolaringologista 12 pacientes FONOAUDIOLOGIA Os laringectomizados totais são indivíduos com necessidades especiais, que têm que reestruturar sua auto-imagem, reintegrar-se na sociedade e encontrar meios adaptativos para retomar a autonomia e participação na vida em comunidade. 174 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA A complexidade do trabalho requerido na reabilitação do indivíduo laringectomizado exige uma abordagem de interdisciplinaridade, que atende o indivíduo em todos os seus aspectos bio -psico-sociais e relativos à comunicação. A atuação fonoaudiológica não elege um tipo de comunicação mais importante, preconizando assim as outras formas de comunicação oral eficazes, de escolha do paciente e que lhe traga ganhos em sua vida social, familiar, afetiva e profissional. O trabalho fonoaudiológico objetiva também a intervenção pré e pós cirúrgica e orientações à família dos pacientes laringectomizados. PSICOLOGIA A Psicologia, orienta-se por uma abordagem psicanalítica. “Trabalho como uma artista. Olho para os meus pacientes como lugares misteriosos onde a beleza se esconde em meio a entulhos. Meu objetivo é ajudá-los a se receberem como fragmentos de uma obra de arte frustrada, a ver restaurado, para que pintem a felicidade suprema de verem belos” (ALVES, 1995). O estágio propõe dar ao paciente possibilidades de resgatar alguns pontos fragmentados, como: • sua identidade por perda ou modificação da voz; • a família, que não mais o reconhece; • a sexualidade, que sofre modificações em função de aspectos físicos e psíquicos; • o trabalho que muitas vezes não pode ser o mesmo em função de riscos a saúde; • a entrada da palavra morte em seu vocabulário. Estes aspectos dentre tantos outros existentes encontram na atuação da psicologia espaço para serem trazidos e vividos. Nas sessões, é possível pensar-se diferente, ir a busca do como se é, e das transformações ocorridas para assim estar-se. É a retomada da vida, de aspectos saudáveis para se enfrentar as mutações. A possibilidade de sessões psicoterapêuticas pré e pós cirúrgicas com o paciente, abre também perspectivas, antes não vislumbradas, como a de um trabalho com a ansiedade relacionada especificamente com a intervenção cirúrgica. Esta é, muitas vezes, sentida corno “a morte de hora marcada”, que tem associada fantasias de mutilação e, também, de aniquilamento. Sendo assim, tal espaço permite trabalhar a definição que o paciente tem de morte, que está diretamente ligada a ansiedades anteriores, relacionadas a perdas e quebras de vínculos já vivenciadas pelo mesmo. SERVIÇO SOCIAL A família dos pacientes recebe uma atenção especial, pois é unânime entre a equipe e os estagiários o reconhecimento de sua importância no processo de restabelecimento do paciente. O Serviço Social vem atuando diretamente com as famílias, através de reuniões grupais, visitas domiciliares e atendimentos individuais. Desempenha também o papel de facilitador na relação clínica – paciente – família. O espaço aberto para a participação dos familiares é aproveitado para que possam falar, ouvir, trocar experiências, sanar dúvidas, enfim, refletir sobre suas condições e potencialidades. Tenta-se prevenir os eventuais problemas que poderiam surgir por falta de escElarecimentos. As reuniões com as famílias assumem um caráter transdiscipli- 175 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO nar, pois há a participação dos profissionais das outras áreas discutindo um mesmo assunto, com três visões diferentes e complementares. Quando uma família é acometida por uma doença que deixa seqüelas tão profundas, seqüelas estas não só físicas, mas psicológicas e sociais, muitas mudanças ocorrem e o apoio de uma equipe interdisciplinar torna-se imprescindível. O Serviço Social colabora com a equipe, principalmente no momento em que traz para o estágio a visão sobre a família, fazendo com que haja uma melhor compreensão sobre o paciente. CONSIDERAÇÕES FINAIS Acreditamos que fizemos um bom trabalho ao longo destes anos mas que muito ainda deva ser realizado. O trabalho tem propiciado bons resultados à equipe, no âmbito profissional e pessoal, e ao paciente. Trabalhar interdisciplinarmente requer atenção e disponibilidade, mas traz inúmeros benefícios para as partes envolvidas. Talvez, o principal destes seja a percepção do muito que temos para a oferecer, lembrando constantemente que o que temos a aprender é imensurável. * Apresentado no V Encontro de Fonoaudiologia em Cancerologia / 1997 REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA ALVES, R. O quarto do mistério. 2 ed. Campinas, Papirus Spectrum, 1995, 224p. BIBLIOGRAFIA CONSULTADA BELHAU, M. PONTES, P. A.; ZIEMER, R. Reabilitação vocal do paciente laringectomizado. IN: PICCOLOTTO, L. (Org.) Trabalhando a voz: vários enfoques em Fonoaudiologia. São Paulo, Summus, 1988. BERTELLI, A.P. Câncer de laringe. São Paulo, Manole, 1980. ETCHEGOYEN, R. H. Fundamentos da técnica psicanalítica. 2 ed., Porto Alegre, Artes Médicas, 1987, p.528. GÜNTERT, A.E.V. Pacientes laringectomizados: avaliação psicológica através das provas. H.T.P; PFISTER e RORSCHACH., Tese de Mestrado – Escola Paulista de Medicina São Paulo, 1990. NEMR, N.K. A outra voz, estudo dos fatores determinantes da reabilitação do laringectomizado. Tese de Mestrado. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 1992. NORONHA, M.J.R.; DIAS, L.F. (col.) Câncer da Laringe: uma abordagem multidisciplinar. Rio de Janeiro, Revinter, 1997. SÁ, J. L. M. (org). Serviço Social e interdisciplinaridade: dos fundamento filosóficos à prática interdisciplinar no ensino, pesquisa e extensão. 2 ed., São Paulo, Cortez, 1995. 176 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA SERVILHA. E. A.M. Uma atuação Fonoaudiológica com pacientes laringectomizados totais: O grupo da composição. IN. LACERDA E PANHOCA (org.) Tempo de Fonoaudiologia. São Paulo, Universitária, 1997. SILVA, I. M. P. A fonoterapia nas laringectomas totais: IN. NORONHA. M. J. R.: DIAS, L. F. (col) Câncer da laringe: uma abordagem multidisciplinar. Rio de Janeiro. Revinter, 1997. 177 ASSOCIAÇÕES DE LARINGECTOMIZADOS Maria Regina de Oliveira Affonso Walter INTRODUÇÃO Entre as coisas mais gostosas que a vida nos oferece estão conversar, falar, discutir, “bater papo”, trocar idéias, contar casos, jogar conversa fora, enfim, nos comunicar. O ser humano é um animal sociável que se diferencia dos outros animais por pensar e falar. É tão natural, simples e maravilhoso. Quando pessoas se encontram, há uma troca de olhares, um aperto de mão e logo a seguir, o que fazem? Começam a se comunicar através da fala. É automático, a palavra vem e a comunicação está feita. As pessoas que descobrem que estão com câncer nas cordas vocais ou laringe e que precisam submeter-se a uma cirurgia, não imaginam o que será perder, totalmente, a capacidade de comunicação. Por mais que nos seja explicado, a nossa imaginação não consegue avaliar o tamanho do dano. Não é possível calcular o que é abrir a boca, tentar falar e não sair absolutamente nenhum som. Apenas silêncio. Há pessoas, que como eu, tiveram a sorte de encontrar profissionais maravilhosos que, antes mesmo da operação, nos informam das alternativas existentes para se poder falar posteriormente, por meio da voz esofágica ou por aparelho. Sorte minha! Há muitos médicos, ainda hoje, que só se preocupam em extirpar o tumor e só isso. Eu sei que esse ato é absolutamente importante, mas entendo que o trabalho deles não deveria terminar aí. Eles parecem não entenderem que embora a vida continue igual para muitos paciente o mesmo não pode ser dito para o laringectomizado. Junto com o tumor, também se tira a capacidade de comunicação com o mundo exterior. Somos pessoas, na maioria, adultas, temos família, filhos, emprego, vida feita e que, de repente, não mais que de repente, nos transformamos em mudos e silenciosos. No meu entender, a obrigação do cirurgião de cabeça e pescoço é a de fazer um trabalho conjunto com a fonoaudióloga. Assim que o paciente apresente melhoras, deve se começar o tratamento. Isso para que ele não tenha tempo de entrar em depressão, agilizando a comunicação com a família, enfim, que tenha esperanças de melhorar sua qualidade de vida. É difícil imaginar o que é ter que bater palmas, bater os pés ou tocar um sini- 178 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA nho para que os outros saibam onde estamos. A gente se sente muito só. Nessas horas poder se reunir com outros laringectomizados pode ajudar muito. ASSOCIAÇÃO DE LARINGECTOMIZADOS – POR QUE? Para se criar uma associação temos que primeiro tentar achar os laringectomizados da região e reuni-los. Podem crer que não é fácil. A maioria dos médicos sonega o endereço de seus pacientes. Até hoje, eu não entendo o porquê. Além disso, a tendência de grande parte dos laringectomizados é a de se esconder no seu pequeno mundo familiar. Quando se consegue os endereços e se marca uma reunião, somente alguns comparecem. Nossas primeiras reuniões, feitas na Clínica Expressão, em Sorocaba-SP, sob orientação da fonoaudióloga Vânia Lopes, foram pouco freqüentadas. Éramos apenas dois ou três. Não desistimos e continuamos enviando os convites para todos os encontros mensais. Aos poucos, a freqüência foi aumentando, o que nos animou muito. A primeira coisa que percebemos numa reunião de laringectomizados é a alegria que sentimos ao nos depararmos com outros iguais a nós. Notamos que não estamos sós, que nossos problemas e dúvidas são comuns a outras pessoas também. São reuniões alegres, em que rimos muito dos casos engraçados, das situações constrangedoras, das idéias geniais que um transmite ao outro. Há todo tipo de gente. Os que falam com voz esofágica, com aparelho, os que sussurram e os que não abrem a boca. Nessa heterogênea forma de comunicação, há uma harmonia muito grande, uma enorme troca de energias. O que fala bem quer convencer o outro a tentar a voz esofágica. O que fala com aparelho quer mostrar que a sua maneira é a melhor, mas percebe-se que na realidade, o que se quer é ajudar o outro. Quando aparece um novo membro, o grupo todo se une para contar o que vem pela frente e tentar minimizar as dores e surpresas. Os encontros são memoráveis. Além dos familiares que sempre comparecem, temos também convidado alguns médicos e outros profissionais da área da saúde para comparecerem e responderem às nossas dúvidas. Tudo isso é muito interessante e estimulante. Porém, só as reuniões não são suficientes para resolver um grande problema. A maioria dos laringectomizados não pode pagar o tratamento fonoaudiológico, quando este não é oferecido pelo serviço público. E assim que acontece em Sorocaba e na maior parte das cidades brasileiras. Embora se possa fazer pequenos grupos aqui e ali, que pagam quantias simbólicas, é importante que pensemos maior. Infelizmente há hoje ainda muita gente que nem sabe que pode voltar a falar e que está resignada em seu silêncio. Para podermos fazer algo maior, temos que criar uma associação. Várias vozes têm mais peso que uma só. Com uma associação formada, poderemos pedir, exigir, reivindicar, e brigar por mais coisas. Poderemos lutar por um serviço público que não atenda somente a crianças e sim a todos que precisem. Poderemos solicitar a doação de aparelhos, orientar pessoas através de meios de comunicação, trabalhar pela prevenção do câncer de laringe com campanhas educativas sobre os malefícios do cigarro. Temos que fazer com que o governo se sinta responsável por nós. Pode ser uma utopia, mas acho que através de uma associação, os laringectomizados serão mais “ouvidos” em suas necessidades. Nós precisamos contar ao mundo que existimos e que, infelizmente, estamos aumentando em número. Eu confesso, sou uma otimista incorrigível! Gosto da vida, gosto das pessoas, gosto de falar e tenho certeza que se tivermos um próximo encontro, poderei falar da nossa associação como realidade, e não como está hoje, somente no projeto. * Apresentado no VII Encontro de Fonoaudiologia em Cancerologia / 1999 179 Parte II TRABALHOS CIENTÍFICOS APRESENTADOS NOS ENCONTROS DE FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA NEOPLASIAS CEREBRAIS EM CRIANÇAS E SUAS REPERCUSSÕES PARA DEGLUTIÇÃO Maria Lúcia Nascimento Vidigal INTRODUÇÃO O aprimoramento das técnicas neurocirúrgicas associado ao avanço tecnológico permitiu uma sobrevida maior às crianças portadoras de neoplasias cerebrais. O papel do fonoaudiólogo no período pós operatório tornou-se fundamental no que se refere aos cuidados com a deglutição e a comunicação, que seguramente dignificam e melhoram a qualidade de vida do paciente em questão. O objetivo do presente estudo é o de relatar a experiência obtida com pacientes submetidos a neurocirurgia da fossa posterior, que apresentaram seqüelas no pós operatório relacionadas à deglutição, e que acabaram por afetar o aporte nutricional e a respiração. REVISÃO DA LITERATURA Segundo AICARD (1992) os tumores do Sistema Nervoso Central são a segunda causa de malignidade da infância, só estando atras das leucemias. A incidência de neoplasias intracranianas é de 1:20.000. Os tumores são mais comuns na infância do que na adolescência. Em bebês, há predomínio dos tumores supratentoriais do tipo astrocitomas, e infratentoriais, do tipo meduloblastomas e ependimomas. Na faixa etária entre 2 e 4 anos, predominam os tumores infratentoriais do tipo astrocitomas, medu-loblastomas e ependimomas. Entre os 4 e os 8 anos de idade o predomínio é de infratentoriais do tipo astrocitomas cerebelares. SHIMINSKI-MAHER (1995, 1996) relata a ocorrência de 1500 novas neoplasias cerebrais pediátricas anualmente nos Estados Unidos. Deste total, 10% são de tronco cerebral com o pior prognóstico de sobrevida a longo prazo. A autora também 183 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO apresenta uma classificação para a malignidade das neoplasias de tronco cerebral. Assim as neoplasias podem ser classificadas como histologicamente malígnas, que são aquelas cuja lesão é difusa e originada na ponte; e as agressivas pela localização, que podem ser focais, cistícas ou exofíticas. DOHRMAN et al (1976) observam que os ependimomas de fossa posterior que estão localizados na região do IV ventrículo correspondem de 8 a 10% dos tumores da infância. PIERRE-KAHN et al (1983) relatam uma taxa de sobrevida livre de doença em 5 anos de 39%, um índice de recorrência local de 41% e de metástase em 20% . O tumor é difícil de ser visualizado através da tomografia computadorizada sem contraste, pois tem a mesma atenuação que o parênquima, AICARD (1992). O tratamento é neurocirúrgico, sendo que a ressecção pode ser incompleta, pois o tumor é, na maioria das vezes, infiltrativo. A radioterapia não tem bons resultados. O tumor libera células que colonizam a medula espinhal e portanto, demanda radioterapia profilática. MATERIAL E MÉTODOS Foram estudados retrospectivamente 9 pacientes (3 do sexo feminino e 6 do sexo masculino), na faixa etária entre 1 e 15 anos, atendidos pelo Serviço de Fonoaudiologia do Hospital Albert Einstein – São Paulo, no período de 1993 a 1998. Os prontuários foram revisados. As tomografias computadorizadas e/ou ressonâncias magnéticas demonstraram a lesão de fossa posterior. Todos os pacientes foram submetidos à ressecção da neoplasia. Os exames anátomo -patológicos das lâminas biopsiadas confirmaram o diagnóstico (1 Astrocitoma,1 Glioma pontino e 7 Ependimomas). Todas as neoplasias foram malignas pela localização com exceção de 1, que foi considerada como histologicamente maligna. Cinco pacientes foram submetidos à videofluoroscopia da deglutição. Todos os pacientes foram submetidos a terapia fonoaudiológica. RESULTADOS A figura 1 mostra a evolução dos pacientes. 184 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA DISCUSSÃO As manifestações clínicas pré-cirúrgicas foram: cefaléia, tonturas, náuseas e vômitos, rigidez de nuca, papiledema, paralisia ou paresia de pares cranianos e alterações da marcha. Nenhum dos pacientes apresentou disfagia antes da neurocirurgia. Os sinais e sintomas específicos da deglutição mais encontrados após a neurocirurgia foram os desvios de rima bucal, de língua e de palato mole. Observou-se alteração da sensibilidade de lábios, língua, palato mole, faringe e laringe (inclusive observando-se ausência do reflexo de tosse). Houve também, diminuição da mobilidade de lábios, língua, palato mole, faringe e laringe (musculatura intrínseca e extrínseca). Os exames complementares confirmaram os achados clínicos. A videofluoroscopia revelou aspiração do bolo alimentar e de secreções antes, durante ou após o disparo do reflexo faríngeo; estase em valéculas e seios piriformes e incoordenação do esfíncter esofágico superior. Estes achados provavelmente estão relacionados com o acometimento dos pares cranianos envolvidos na deglutição, como também dos centros pareados de controle da deglutição localizados no tronco cerebral. CONCLUSÃO Apesar das sequelas pós-cirúrgicas das neoplasias cerebrais na infância serem graves, este levantamento demonstra que a equipe multiprofissional é capaz de melhorar a qualidade de vida do paciente, principalmente no que se refere ao restabelecimento da alimentação por via oral e da comunicação, mesmo considerando o reservado prognóstico de vida a médio e longo prazo. * Apresentado no VII Encontro de Fonoaudiologia em Cancerologia / 1999 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AICARD J Diseases of the nervous system in childhood Mac Keith Press 14: 780 – 849, 1992. DOHMAN GJ, FARWELL JR, FLANNERY JT Ependimomas and ependimoblastomas in children Journal of Neurosurgery 45: 273 – 283, 1976. PIERRE-KHAN A, HIRSCH JF, ROUX FX, RENIER D, SAINTE-ROSE C Intracranial ependymomas in childhood: survival and functional results in 47 cases Child’s Brain 10, 145 – 156, 1983. SHIMINSKI-MAHER T, WISOLL F Pediatric brain tumors; in Goul KA (ed): Neurooncology Crit Care Clin North Am 7: 159 –169, 1995. SHIMINSKI-MAHER T Brainstem tumors in childhood: preparing patients and families for long and short term care Pediatric Neurosurgery 24:267 – 271, 1996. 185 INTELIGIBILIDADE DE FALA NAS RESSECÇÕES DE CAVIDADE ORAL Cristina Lemos B. Fúria Elisabete Carrara-de Angelis Lúcia Figueiredo Mourão INTRODUÇÃO O câncer de cavidade oral compreende de 2 a 8 % de todos os cânceres, sendo que o carcinoma de língua é o segundo mais freqüente, acometendo os indivíduos principalmente entre a quinta e sexta década de vida, numa ocorrência de cinco homens para uma mulher. O câncer de língua envolve lesões do soalho de boca e da língua propriamente dita, e está associado a fatores desencadeantes como fumo, consumo substancial de álcool, higiene oral precária e fatores genéticos. O tratamento primário do câncer de língua compreende o tratamento cirúrgico e/ou radioterápico, sendo em alguns casos necessário o tratamento combinado com a quimioterapia. As ressecções da língua - glossectomias - têm relação com o tamanho, a extensão e a infiltração da lesão. Ressecções de menos 50% da língua são denominadas glossectomias parciais. As ressecções correspondentes a três quartos do volume do órgão são denominadas subtotais, e as maiores glossectomias totais (WEBER et al., 1991). A glossectomia parcial inclui desde o fechamento primário, ou seja, a sutura do local de retirada da lesão, até reconstruções em que se utilizam rotações de retalhos de tecidos adjacentes como pele e/ou músculo. Nesses casos, o músculo peitoral maior é o mais freqüentemente utilizado, devido a sua proximidade e à possibilidade de reinervação. Já em casos de glossectomia subtotal, total e de soalho de boca (pelvectomias), as reconstruções com tecidos adjacentes são imprescindíveis (WEBER et al, 1991). Com relação à fala, a língua é um dos mais importantes articuladores para a produção das vogais e de muitas consoantes. As vogais de uma língua são identificadas de acordo com sua posição no trato vocal, sendo que variações na dimensão ântero-pos- 186 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA terior e vertical produzem modificações ressonantais. Em função disto, a voz pode estar alterada, com a característica de qualidade pastosa, monótona e hipernasal. Alterações importantes na produção de diversos sons da fala, como nas consoantes t, d, k, g, n, nh, s, z, ch, j, 1, lh, r, rr e nas vogais é, ê, i, ó, ô, u, podem ocasionar imprecisão articulatória que, acrescida ao trismo acentuado, prejudicam a inteligibilidade de fala. Entende-se por inteligibilidade de fala o sucesso da comunicação falada pelo sujeito e compreendida pelo ouvinte. As alterações de deglutição e fala são compatíveis com o grau, extensão e local da ressecção, determinando diferentes tipos de comprometimento (CASPER E COLTON, 1993). Nos casos em que há a possibilidade de conservação de uma porção da língua, da preservação da mobilidade do tecido remanescente e da reconstrução com retalhos mais volumosos anteriormente, as chances de reabilitação evidentemente serão melhores. Vários métodos subjetivos e objetivos têm sido descritos para avaliar as seqüelas de deglutição e fala em glossectomizados. Entre eles, destacam-se a análise perceptiva da inteligibilidade de fala ou da qualidade vocal por ouvintes treinados e não treinados e as avaliações objetivas como a palatometria, a eletropalatometria, a videofluoroscopia, e a análise acústica e espectrográfica. Os autores SKELLY et al. (1971) avaliaram a inteligibilidade de fala através de palavras foneticamente balanceadas em 25 sujeitos, 14 glossectomizados totais e 11 parciais, antes e depois de um programa de intervenção fonoaudiológica e concluiram que a inteligibilidade pré-terapia variou entre 6 e 24% e após a terapia entre 24 e 46% nos glossectomizados parciais, e nas totais entre 0 e 8% na pré-terapia e 18 e 42% no pósterapia. Após o programa terapêutico de 12 meses, 5 glossectomizados totais e 2 glossectomizados parciais foram filmados através da cinefluoroscopia, com intuito de se verificar os movimentos adaptativos e compensatórios da articulação. Compensações específicas com lábios, véu, úvula, bochechas, parede faríngea, epiglote, e quando presentes com língua residual e mandíbula, foram observadas. Segundo GEORGIAN et al. (1982), 20% dos glossectomizados parciais produzem os fonemas /t/ e /d/ através do contato de língua e palato associado ao fechamento dos lábios, e descrevem um caso que apresenta também a protrusão e retração da mandíbula. Compensações similares foram observadas em dois pacientes que não conseguiam produzir fonemas velares pelo tecido lingual remanescente (MORRISH, 1984). O trabalho do feedback auditivo para as compensações da massa residual da língua ou adaptação de outros articuladores são enfatizadas por IMAI E MICHI (1992). As próteses orais são um recurso valioso para tratamento dos pacientes glossectomizados ( MOORE, 1972; ARAMANY et al., 1982; LEONARD E GILLIS, 1982; CHRISTENSEN et al., 1983; GILLIS E LEONARD, 1983; KNOWLES et al., 1984; MCKINSTRY et al., 1985; DAVIS et al., 1987; ROBBINS et al., 1987). Em 1990, LEONARD E GILLIS descreveram a análise acústica e da inteligibilidade de fala em cinco glossectomizados totais que utilizaram próteses reparadoras palatais e/ou mandibulares. A utilização da prótese, produziu melhora de 22% da inteligibilidade de fala. No trabalho, os autores também discutem que as próteses atuam diferencialmente em cada paciente. Um paralelo entre avaliação objetiva e subjetiva de fala é descrito por LEONARD et al. (1992) em estudo que conclui que os níveis de prejuízo da fala relacionamse com o grau de extensão da lesão. Observam que as ressecções posteriores possibilitamum prejuízo na produção das vogais e as ressecções anteriores afetam o efeito de constrição e oclusão prejudicando a produção das consoantes. Relatam que os falantes glossectomizados subtotais, apresentaram um prejuízo de fala maior que os 187 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO glossectomizados totais, pois outras estruturas adjacentes são ressecadas, diminuindo a possibilidade da utilização de algumas compensações potenciais. WEBER et al (1991), também consideram a fala dos glossectomizados totais melhor do que a dos subtotais. Com relação à avaliação perceptiva auditiva e acústica da fala em pacientes glossectomizados, a literatura internacional é escassa e a nacional inexistente. A proposta deste trabalho é portanto a de avaliar a inteligibilidade de fala dos glossectomizados parciais e totais ao início e ao término da terapia fonoaudiológica. MATERIAL E MÉTODO Participaram deste estudo dez pacientes, seis glossectomizados parciais incluindo um glossectomizado subtotal e quatro glossectomizados totais, sendo oito do sexo masculino e dois do sexo feminino. A faixa etária variou entre 39 a 64 anos, com a inclusão também de uma criança de 10 anos. De todos os glossectomizados parciais, somente dois necessitaram de reconstrução, utilizando-se o retalho de língua e o miocutâneo do peitoral. Os seis pacientes realizaram radioterapia pós-operatória e um deles teve associado a quimioterapia. Os glossectomizados totais realizaram reconstrução com peitoral maior (2), grande dorsal (1) e crista ilíaca (1). Dois pacientes fizeram radioterapia pós-operatória, um paciente radioterapia pré-operatória e quimioterapia pós-operatória, e um quimioterapia préoperatória. O intervalo médio entre a cirurgia e o início da fonoterapia foi de 27 dias, sendo que somente um paciente chegou após cinco meses. (Tabela 1) O material constou do registro de emissões através do gravador Sanyo, modelo MW 12K empregando-se fita cassete Sony de 60 min e velocidade de gravação de 19 cm/s em ambiente silencioso. Todos os pacientes foram submetidos a uma gravação de um protocolo constando de 14 emissões vogal/consoante/vogal descritas a seguir: ata, aka, ada, aga, assa, axa, aza, aja, ala, alha, ana, anha, ara, arra. Os pacientes foram orientados a repetir o modelo dado. A maioria dos pacientes apresentava nível sócio-econômico e grau de escolaridade baixos que não os capacitavam para leitura de frases e textos. As emissões foram editadas aleatoriamente e analisadas por 61 ouvintes - alunos do 2o ano de Fonoaudiologia, que foram orientados a registrar o que ouviram. Por ser um estudo inicial, apenas quatro pacientes finalizaram o acompanhamento terapêutico proposto, dois glossectomizados parciais e dois totais. O programa terapêutico constou de exercícios de mobilidade da porção residual da língua, desenvolvimento de articulações compensatórias e desativação de possíveis compensações negativas. Os atendimentos foram semanais e individuais com tempo de sessão de 30 minutos, durante dois meses. Ao término, os quatro pacientes foram submetidos a uma gravação, utilizando-se o mesmo protocolo de análise. RESULTADOS Os resultados da análise da inteligibilidade dos dez pacientes pós-cirurgia encontram-se na tabela 2. Os seis primeiros são pacientes submetidos as glossectomias parciais e os quatro últimos a glossectomias totais. A porcentagem de inteligibilidade de fala após o programa terapêutico, que contou com a participação de quatro pacientes, dois glossectomizados parciais e dois glossectomizados totais encontra-se na tabela 3. 188 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA TABELA 1 - Caracterização dos pacientes glossectomizados quanto ao sexo, idade, estadiamento, cirurgia realizada, tipo de reconstrução, tratamentos complementares e tempo de intervalo entre cirurgia e início da fonoterapia. Na tabela 4, encontra-se a porcentagem de melhora da inteligibilidade de fala após dois meses do programa de reabilitação dos dois glossectomizados parciais e dois glossectomizados totais respectivamente. 189 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO Legenda: Pgl - pelveglossectomia gl – glossectomia D – direito R - ressecção glan. – glândula submd – submandibular md – mandibulectomia sec – seccional nr - não realizado E – esquerdo ESOHA – esvaziamento supra omohioídeo ampliado SH – esvaziamento suprahioídeo rot. – rotação ret. - retalho EC – esvaziamento cervical ECRA – esvaziamento cervical radical ampliado ECRM — esvaziamento cervical radical modificado ECOHA – esvaziamento cervical omohioídeo ampliado B - Bilateral TABELA 2 - Porcentagem de inteligibilidade de fala pós -cirurgia. Caso 01 02 03. 04. 05. 06. 07. 08. 09. 10. Cirurgia / Reconstrução Pgl.parcial + R glan. submd e sublingual à D Pgl.parcial E + rotação retalho D língua Pgl. Md. Marginal Pgl. Parcial Bucofaringectomia + gl. Parcial Pgl. Quase total + retalho miocutanêo grande peitoral Pgl. Total + epiglotectomia. + md séc + osteotomia retalho microcirúgico crita ilíaca Pgl. Total + rotação retalho peitoral Pgl. total + rotação retalho peitoral gl. Total + soalho boca retalho grande dorsal E Legenda: Pgl – pelveglossectomia gl – glossectomia R – ressecção glan. – glândula % Inteligibilidade 66,33 37,00 43,91 40,52 36,53 15,71 33,17 25,64 35,83 31,65 submd – submandibular md – mandibulectomia sec – seccional D – direita / E - esquerda Tabela 3 – Porcentagem de Inteligibilidade de Fala Após o Programa Terapêutico Caso 01 02. 09. 10. Cirurgia/ Reconstrução Pgl. parcial + R glândula submandibular e sublingual Pgl. parcial E + rotação retalho D língua Pgl. total + rotação retalho peitoral gl. total + soalho boca + retalho grande dorsal E 190 % Inteligilidade 74,53 38,99 39,58 38,17 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA Legenda: Pgl - pelveglossectomia D - direita / E - esquerda gl - glossectomia R - ressecção TABELA 4 - Porcentagem de melhora da inteligibilidade de fala após 2 meses de programa de reabilitação. Glossectomia % melhora Parcial 12,17% 6,01% Total 10,78% 22,08% COMENTÁRIOS As glossectomias apresentam seqüelas importantes na alimentação, mastigação, deglutição, e fala. Estas seqüelas precisam ser avaliadas do ponto de vista qualitativo e quantitativo, permitindo aos profissionais da saúde, inclusive ao fonoaudiólogo, a mensuração objetiva da melhora na comunicação oral e da evolução terapêutica que muitas vezes são percebidas antes pelo paciente, pela família e amigos. As glossectomias parciais e totais apresentam como seqüela o comprometimento na inteligibilidade de fala, que está relacionada à extensão da remoção da língua e à habilidade de movimentação da porção remanescente (CASPER E COLTON, 1993). Nesse estudo, pôde-se observar, na fase pós-cirurgia, uma variação da inteligibilidade de fala de 15,71% a 66,33% nas glossectomias parciais e de 25,64 a 35,83% nas totais. Esses resultados são concord es com os estudos de LEONARD E GILLIS (1990) que relacionam a extensão da ressecção cirúrgica das estruturas da cavidade oral com o grau de comprometimento da inteligibilidade de fala, e que demonstram que o prejuízo de fala parece diferir de forma significativa entre cada um dos glossectomizados. O pior resultado de nosso estudo foi observado num paciente glossectomizado subtotal com resultados ainda inferiores aos glossectomizados totais. Tal fato pode estar relacionado à ausência da movimentação de língua neste paciente e ao aspecto e tamanho do retalho que não permitia contatos compensatórios. Outros autores também discutem dados similares (WEBER et al., 1991 ; LEONARD et al., 1992). Analisando os resultados após a terapia, observa-se uma melhora nos quatro casos, com a porcentagem de 38,99 e 74,53% nas parciais e 38,17 e 39,58% nas totais. Com relação ao resultado terapêutico nas glossectomias observou-se o melhor resultado da inteligibilidade de fala pós-terapia (22,08%) em uma criança de 10 anos, portadora de um sarcoma de língua, sugerindo que a plasticidade e as possibilidades adaptativas da criança possam ser mais efetivas do que as de adultos. Nas glosssectomias parciais observou-se menor porcentagem de inteligibilidade nos fonemas /g / , /t /, / 3 /, / V / e maior porcentagem no / R /, /l/ e /n/. SKELLY et al. (1971) discutem que os fonemas /z/, /n/, /g/ são produzidos de forma semelhante ao normal, os fonemas /r/, /l/ apresentam maiores desvios de produção, e que a presença da flexibilidade na porção da língua pode permitir a produção do /t/ e /d/ dentro dos limites aceitáveis. 191 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO As glossectomias totais, por sua vez, apresentaram menor porcentagem de inteligibilidade nos fonemas / h /, / l /, / V / , / 3 /, / g/ e maior porcentagem nos fonemas /t /, / l /, / n /. Estes dados vêm de encontro aos achados de SKELLY et al. (1971) que ao descreverem as compensações articulatórias de cinco glossectomizados totais, observaram melhores resultados também nos fonemas anteriores / t /, / l /, / n / . O presente trabalho demonstra a importância da intervenção terapêutica auxiliando o desenvolvimento de articulações compensatórias e adaptativas, que se refletirá na efetividade da comunicação oral e consequentemente numa melhor possibilidade de integração social dos pacientes. Embora muitas vezes os limites anatômicos ou funcionais da reabilitação sejam grandes, os resultados encontrados comprovam a importância da atuação fonoaudiológica nestes casos, uma vez que as estruturas remanescentes de cavidade oral permitem, uma grande possibilidade de compensações. CONCLUSÃO A localização, o grau da ressecção, a mobilidade do tecido remanescente e a localização e aspecto do retalho são fatores determinantes na efetividade da comunicação em pacientes glossectomizados. Este estudo constata a melhor inteligibilidade de fala nas glossectomias parciais quando comparadas às totais, como também demonstra a existência de um aumento importante na inteligibilidade após um programa de reabilitação fonoaudiológica. A reabilitação dos pacientes submetidos a cirurgias ablativas de cabeça e pescoço, especialmente da cavidade oral é uma das contribuições mais valiosas que a fonoaudiologia pode oferecer. Esta área de atuação é recente em nosso país e tem sido pouco explorada. As pesquisas nessa área em nosso meio ainda são escassas. Um maior número de pesquisas que auxiliem na avaliação e planejamento terapêutico da deglutição, voz e fala se faz necessário, para que desta forma os pacientes possam ser cada vez mais beneficiados pela reabilitação da comunicação e da deglutição. O tempo deve ser encarado um aliado positivo e, neste sentido, a reabilitação deve ser direta, eficaz e rápida. O nosso papel é o de oferecer ao paciente não apenas a chance para uma eficiente qualidade de comunicação, mas para uma melhor qualidade de vida. * Apresentado no V Encontro de Fonoaudiologia em Cancerologia / 1997 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARAMANY, M.A; DOWNS, J. A; BEERY, Q.C.; ASLAN, Y. Prosthodontic rehabilitation for Glossectomy Patients. J Prosthetic Dent. , 48: 78 - 81, 1982. DAVIS, J.W.; LAZARUS, C. ; LOGEMANN, J.; HURST, P.S. Effect of a maxillary glossectomy prosthesis articulation and swallowing. J Prosthetic Dent., 57715-9, 1987. CARRARA-ANGELIS, E.; MOURÃO, L.F.; FURIA, C.B.L. Disfagias associadas ao tratamento de câncer de cabeça e pescoço. Acta Oncológica Brasileira, 17 (2): 77-82, 1997. 192 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA CARRARA-ANGELIS, E ; FURIA, CLB ; MOURÃO, L ; MIGUEL, RE; BARROS, AP; AUGUSTO, MC. Videofluoroscopic Evalluation of Glossectomised Patients. 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Arch Otolayngol Head Neck Surg. , 117: 512 - 5, 1991. 194 INTELIGIBILIDADE DE FALA EM PACIENTES COM RESSECÇÃO DE TUMOR DE CAVIDADE DE BOCA E/OU OROFARINGE Marina Lang Fouquet Teresa C.R.D.M. Amaral Laélia C.C. Vicente INTRODUÇÃO No âmbito mundial, a incidência do câncer de boca é de menos de 5% de todos os cânceres (Instituto Nacional do Câncer-1999). No Brasil, porém, o câncer oral produz números diferentes. A boca ocupa a terceira localização anatômica de maior ocorrência entre os cânceres no sexo masculino e a sétima nas mulheres (Associação Paulista de Cirurgiões Dentistas-1999). Em 1996, 597 óbitos no Estado de São Paulo foram decorrentes do câncer de boca aí incluindo as lesões de lábios, língua e glândulas salivares (Fundação Oncocentro de São Paulo-1999). O câncer de boca ocorre mais freqüentemente em pessoas do sexo masculino (86,07%), brancos (84,84%) e em idades que variam entre 45 e 55 anos. A grande maioria dos portadores é tabagista (95,08%). Outros fatores que também predispõem ao desenvolvimento deste tipo de câncer são: etilismo, condições precárias de higiene bucal e próteses dentárias mal ajustadas ou em más condições(Associação Paulista de Cirurgiões Dentistas-1999). Os pacientes submetidos à cirurgia de ressecção destes tumores enfrentam problemas funcionais múltiplos e muitas vezes graves na fala, mastigação, deglutição e nutrição. Além disso, passam por alterações nas suas atividades, profissionais e sociais além de sofrerem alterações estéticas (OLSON E SHEDD, 1978; TEICHGRAEBER, BOWMAN E GOEPFERT, 1986; HARIBHAKTI, KAVARANA E TIBREWALA, 1993). Segundo FLETCHER et al.(1991), as principais desordens de fala encon- 195 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO tradas em pacientes com câncer de cabeça e pescoço são: articulação prejudicada; inteligibilidade reduzida; qualidade vocal e ressonância alteradas; mudança na prosódia e ritmo de fala e redução da proficiência de fala. As estruturas da cavidade oral que quando ressecadas causam impacto na produção da fala são a língua, o soalho da boca, o trígono retromolar, a mandíbula, e os palatos duro e mole. A língua tem sua função alterada, não só pela perda do tecido, mas também pela restrição de seu movimento e pela sua eventual denervação (nervo hipoglosso). CHENG et al.(1994) comentam que a fala é altamente dependente da função da língua, pois esta modela a cavidade oral na produção de diversos fonemas, tocando o palato e os dentes para a produção de vogais e consoantes. O local e o tamanho da ressecção determinam o déficit de fala. A técnica de reconstrução utilizada (fechamento primário, enxerto de pele, retalho regional ou local e transferência livre de diferentes locais), por sua vez, também pode contribuir para a diminuição da mobilidade da língua. Atualmente, têm surgido técnicas reconstrutivas mais eficientes, porém muitas dificuldades ainda persistem. O tratamento fonoaudiológico, através do desenvolvimento de movimentos compensatórios, contribui para melhorar as funções fisiológicas básicas do paciente e a sua comunicação social (FREEDLANDER et al. 1989; FLETCHER et al 1991; CHENG et al.1994). As mudanças funcionais que ocorrem no pós-operatório são facilmente observadas, porém, devido à dificuldade em se estabelecer critérios de avaliação confiáveis, poucas são as pesquisas que investigam objetivamente as alterações nas funções de fala e deglutição (TEICHGRAEBER, BOWMAN E GOEPFERT,1986; LOGEMANN et al. 1992). A fala é uma ferramenta social e a mais significativa medida de sua qualidade é o grau de compreensão da mensagem, denominado de inteligibilidade de fala. Este trabalho teve o objetivo de verificar os fatores que interferem na inteligibilidade de fala. Para tanto foram analisados pacientes com ressecções de neoplasias provenientes do assoalho de boca, da língua e da região retromolar. MATERIAL E MÉTODO Foi analisada a inteligibilidade de fala de 9 pessoas, sendo 7 do sexo masculino e 2 do sexo feminino. A idade variou entre 49 e 79 anos. Dos nove pacientes avaliados, cinco sofreram pelveglossectomias parciais e dois pelvectomias totais com glossectomias parciais. Um paciente submeteu-se a glossectomia parcial e um paciente necessitou de ressecção de área retromolar com reconstrução de língua. Sete pacientes foram operados pela Disciplina de Face e Pescoço do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo; um paciente foi operado no Instituto Brasileiro de Controle do Câncer (IBCC) e um paciente foi operado no Instituto Arnaldo Vieira de Carvalho. No período da avaliação, todos estavam entre o 4° mês e 4° ano de pósoperatório. Oito tinham realizado, ou ainda estavam em terapia fonoaudiológica para articulação no Setor de Reabilitação Fonoaudiológica a Pacientes Oncológicos de Cabeça e Pescoço da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. O outro paciente tinha realizado fonoterapia somente para deglutição, tendo abandonado o serviço antes do início do treino articulatório. Os pacientes realizaram fonoterapia de 1 mês a 3 anos. Dados específicos sobre cada um dos pacientes encontram-se no QUADRO 1. Com um gravador marca Panasonic - Stereo Radio Cassette Recorder, RX FT570 e fita TDK A 60 - IECI/ Type 1, em ambiente acusticamente tratado, foi gravado 196 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA um minuto de fala espontânea dos pacientes, contando a evolução de suas doenças e, em uma outra fita, foi registrada a fala dos pacientes nomeando figuras foneticamente balanceadas. A fita com a fala espontânea dos pacientes foi ouvida por 4 mulheres e 6 homens não fonoaudiólogos, com 2o grau completo e idades variando de 17 a 64 anos, que julgaram a inteligibilidade de fala de cada um e preencheram um protocolo, adaptado pelas fonoaudiólogas (ANEXO), que classifica a inteligibilidade da fala segundo McCONNEL et al.(1987). Optou-se pelo emprego de juízes leigos para o julgamento da inteligibilidade da fala, pois desse modo os resultados obtidos retratariam mais apropriadamente as situações de comunicação diária dos pacientes. A gravação dos pacientes nomeando figuras foi ouvida por três fonoaudiólogos que, a partir do quadro fonêmico de cada paciente, classificaram o sistema fonêmico em quatro graus: 1- sem distorção ou imprecisão 2- imprecisão 3- distorção discreta: quando apenas alguns fonemas foram distorcidos 4- distorção evidente: quando vários fonemas foram distorcidos Definiu-se como imprecisão quando ocorria alteração na produção do fonema, mas de maneira na qual ele ainda pudesse ser reconhecido (ex.: fonema /s/ com sigmatismo). Definiu-se como distorção quando o modo pelo o qual o fonema era produzido não possibilitava o seu reconhecimento. Os pacientes foram ainda submetidos a uma avaliação fonoaudiológica do sistema sensório motor-oral, verificando-se o aspecto, a mobilidade e o tônus da língua, lábios e bochechas; o aspecto do palato duro; o aspecto e a mobilidade do palato mole; a dentição e o uso de próteses dentárias. Especial atenção foi dada à mobilidade de língua, avaliando protrusão, retração, lateralização da língua na comissura labial e bochecha, e a elevação e abaixamento de sua ponta e dorso. Os graus de alteração de mobilidade de língua foram então classificados como segue: 1- alteração leve: paciente consegue realizar todos os movimentos de língua com discreta alteração. Ex: paciente protrui, com desvio 2- alteração moderada: paciente consegue realizar todos os movimentos, porém com limitações. Ex: consegue protruir, mas somente até o lábio inferior. 3- alteração moderadamente-severa: paciente não consegue realizar alguns movimentos. Ex: consegue protruir, retrair e lateralizar para um dos lados. 4- alteração severa: paciente consegue poucos movimentos ou apenas esboços de movimentos. Ex: paciente somente protrui 5- mobilidade ausente: não apresenta movimentação de língua. O grau de inteligibilidade de fala, classificado pelos juízes leigos, foi relacionado com o tipo de cirurgia realizada, com o grau de alteração da mobilidade de língua e com o grau de distorção do sistema fonêmico. Nosso intuito foi o de verificar quais aspectos interferiram positiva ou negativamente na habilidade do paciente em comunicar-se, em situações de fala normal, com interlocutores da população em geral. 197 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO QUADRO 1: Descrição dos pacientes segundo idade, sexo, tipo de cirurgia e reconstrução, estadiamento (TNM), tempo de pós-operatório e tempo de fonoterapia nº idade sexo cirurgia reconstrução TNM tempo tempo de de P.O. fonoterapia 1 79 F pelveglossectomia parcial à D. + região jugal e rebordo gengival fechamento primário de assoalho de boca e de língua T2N0 M0 4 anos 4 meses 2 53 M pelveglossectomia parcial à D. + ressecção de loja amigdaliana Retalho de língua T3N0 4 meses 1mês 3 53 M pelveglossectomia parcial + mandibulectomia marginal retalho miocutâneo infrahioideo T3N0 2anos 3 meses 4 66 M T3N0 4anos 2 anos 5 63 M pelveglossectomia parcial à D retalho microcirúrgico de Yang T3N0 8 meses 3 meses 6 55 M pelvectomia total + glossectomia parcial àD Retalho de língua T3N1 1 ano e 8 meses 1 mês e meio 7 63 M pelvectomia total + glossectomia parcial àE+ mandibulectomia marginal retalho miocutâneo infrahioídeo + fechamento primário de língua T3N0 2 anos 6 meses 8 49 F glossectomia parcial fechamento primário T3N2 1 ano e 4 meses 2 meses 9 52 M ressecção retromolar à D. + ressecção de palato mole + mandibulectomia marginal Retalho de língua T2N0 3 anos e5 meses 3 anos Retalho de pelveglossectomia língua + retalho parcial à E + ressecção retromolar mio-cutâneo de platisma (para ressecção retromolar) 198 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA RESULTADOS No QUADRO 2, é mostrada a porcentagem de juízes que classificaram a inteligibilidade de fala de cada paciente em um determinado grau, e relacionado o grau de inteligibilidade de fala com o tipo de cirurgia realizada em cada paciente. Cada coluna vertical corresponde a um paciente. Em negrito, apresentamos os valores em porcentagem mais significantes. No QUADRO 3 estão relacionados os graus de inteligibilidade de fala com os graus de alteração de mobilidade de língua de cada paciente, estabelecidos pelos fonoaudiólogos. No QUADRO 4 estão relacionados os graus de inteligibilidade de fala com os graus de distorção do sistema fonêmico, observados pelos fonoaudiólogos. QUADRO 2: Porcentagem de juízes que classificaram a fala dos pacientes em diversos graus de inteligibilidade, segundo tipo de cirurgia. pelveglossectomia parcial Tipo de cirurgia pac.1 pac.2 pac.3 inteligível, sem erros 30% 10% 30% inteligível, com erros 60% 40% 50% inteligível, com 10% 50% atenção difícil de entender 20% ininteligível Legenda: pac. – paciente pac.4 Pac.5 pelvectomia total + glossectomia parcial glossectomia parcial pac.6 pac.7 pac.8 80% 20% 10% 40% 40% 10% 100% 10% 70% 80% 20% retromolar com rec. língua pac.9 50% 40% 10% 10% 10% QUADRO 3: Pacientes classificados segundo grau de inteligibilidade de fala, concedido pelos juízes, e grau de alteração de mobilidade de língua , verificado pelas fonoaudiólogos . Alteração leve de mob. inteligível, sem erros inteligível, com erros inteligível, com atençaõ difícil de entender ininteligível Alteração moderada de mobilidade Alteração moderadamentesevera de mobilidade paciente 4* paciente 2 Alteração severa de mobilidade Mobilidade ausente de língua paciente 8 paciente 9 paciente 1 paciente 3 paciente 7 paciente 6 paciente 5 Legenda: * - corresponde ao sujeito que foi classificado por 40% dos juízes como tendo fala inteligível com atenção e, por 40% dos juízes, como difícil de entender. 199 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO QUADRO 4: Número de sujeitos classificados segundo grau de inteligibilidade de fala, concedido pelos juízes, e grau de distorção do sistema fonêmico, verificado pelas fonoaudiólogos. Sem distorção ou imprecisão Imprecisão inteligível, sem erros paciente8 paciente 9 inteligível, com erros paciente 3 paciente 1 inteligível, com atenção paciente 2 difícil de entender distorção discreta distorção evidente pac. 4* e 7 paciente 6 ininteligível paciente 5 Legenda: * - corresponde ao sujeito que foi classificado por 40% dos juízes como tendo fala inteligível com atenção e, por 40% dos juízes, como difícil de entender. DISCUSSÃO Na literatura encontram-se referências relacionando o tipo e extensão da cirurgia com o grau de inteligibilidade de fala. SKELLY, SPECTOR E DONALDSON (1971) concluíram que ressecções de metade da língua requerem menos adaptações da fala do que ressecções que incluem toda a ponta. A flexibilidade da língua residual também foi considerada um fator crítico. MASSENGILL, MAGWELL E PICKRELL (1970) demonstraram que os níveis de inteligibilidade de fala no pós-operatório diminuem na proporção em que se aumenta a porção da língua retirada na cirurgia. No nosso trabalho, encontramos, como observado no QUADRO 2, uma tendência a piores resultados de inteligibilidade de fala nos dois pacientes submetidos a pelvectomia total com glossectomia parcial ( paciente 7, julgado por 70% dos juízes como tendo fala inteligível com atenção e paciente 6, julgado por 80% dos juízes, como tendo fala difícil de entender). Como os dois pacientes tiveram ressecção total do assoalho de boca, perdeu-se a musculatura extrínseca da língua, o que justifica o grau importante de alteração de mobilidade de língua em um paciente, e a ausência no outro. Esses achados são concordes com os da literatura, que cita menor inteligibilidade de fala em pacientes submetidos a ressecção de assoalho de boca. TEICHGRAEBER, BOWMAN E GOEPFERT (1985) encontraram os melhores resultados de fala em pacientes com ressecções anteriores de língua, da base de língua, da região retromolar e do pilar anterior. Pacientes com cirurgias para lesões em assoalho de boca, mucosa bucal e rebordo alveolar obtiveram os piores resultados de fala. WÄCHTER E DIOS (1993) encontraram melhor inteligibilidade de fala em pacientes submetidos a ressecção lateral de língua do que em pacientes com ressecção de assoalho de boca. LOGEMANN et al. (1993) demonstraram que o grupo de pacientes que se submeteram a ressecção de tonsilas / base de língua exibiram melhor inteligibilidade de fala do que pacientes que tiveram ressecados a parte anterior da língua / assoalho de boca, apesar dos mesmos fonemas terem sido afetados. 200 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA No QUADRO 2, também pode-se observar uma tendência a melhor inteligibilidade de fala nos pacientes submetidos a pelveglossectomia parcial do que em pacientes submetidos a pelvectomia total com glossectomia parcial (pacientes 1 e 3 , julgados por 60% e 50% dos juízes como tendo fala inteligível, com erros; e paciente 2, julgado por 50% dos juízes como tendo fala inteligível, com atenção). Porém, dois pacientes submetidos a mesma ressecção (pelveglossectomia parcial) tiveram um desempenho aquém do esperado: o paciente 4 foi julgado como tendo fala inteligível, com atenção por 40% dos juízes e como difícil de entender por outros 40%, e o paciente 5 foi julgado por 100% dos juízes como tendo fala ininteligível. O paciente 4 apresentava velocidade de fala aumentada que persistiu, apesar de ter sido enfaticamente trabalhada em terapia, contribuindo para uma inteligibilidade de fala reduzida. O paciente 5 abandonou a terapia fonoaudiológica antes do início do treino articulatório, o que pode justificar a ininteligibilidade de sua fala. Enfatizando a importância da fonoterapia, SKELLY, SPECTOR E DONALDSON (1971) citam que no decorrer da terapia fonoaudiológica é possível desenvolver compensações adequadas para uma melhor inteligibilidade de fala e PAULOSKI et al.(1993) referem que dentre as razões para a não melhora da fala, em sua amostra, estava o pequeno número de pacientes submetidos à fonoterapia. Dois pacientes obtiveram as melhores porcentagens de inteligibilidade de fala: o paciente 8, glossectomizado parcial com fechamento primário, e o paciente 9, submetido a ressecção retromolar e reconstrução de língua. Esses pacientes foram julgados como tendo fala inteligível, sem erros, por 80% e 50% dos juízes, respectivamente. Ambos foram os únicos da amostra que não sofreram algum grau de ressecção de assoalho de boca. Estes dados coincidem com os achados de literatura que indicam que o grau de inteligibilidade de fala é menor nas ressecções de assoalho de boca (TEICHGRAEBER, BOWMAN E GOEPFERT, 1985; WÄCHTER E DIOS, 1993; LOGEMANN et al., 1993). Além disso, o paciente 8 sofreu ressecção de uma pequena parte lateral da língua, que aparentemente não é tão essencial para a produção dos fonemas da fala. WÄCHTER E DIOS (1993), em uma escala de grau de inteligibilidade de fala de O a 3, sendo 3 fala muito inteligível, encontraram grau 2 em pacientes com ressecção lateral da língua, e LOGEMANN et al.. (1993) citam que a parte anterior da língua, por ser a mais móvel, é a mais crítica durante a produção de fala. Já o paciente 9, teve ressecado a sua região retromolar. TEICHGRAEBER, BOWMAN E GOEPFERT (1985) referem que, são estes pacientes que obtiveram os melhores resultados de fala. No QUADRO 3 objetivou-se relacionar o grau de alteração de mobilidade de língua com o grau de inteligibilidade de fala, concedido pelos juízes. É possível observar que há uma tendência dos pacientes com melhor mobilidade de língua a apresentarem um melhor grau de inteligibilidade de fala. O quadro, porém, mostra duas exceções: o paciente 5, já citado anteriormente como tendo abandonado a terapia (julgado por 100% dos juízes como tendo fala ininteligível, apesar de apresentar alteração moderadamente-severa de mobilidade de língua) e o paciente 7 que apresentou mobilidade ausente de língua mas mesmo assim, foi julgado pelos juízes como tendo fala inteligível, com atenção. Acreditamos que a razão para isso se deva ao fato desse paciente apresentar um palato duro plano com diminuição do espaço vertical intra-oral e, que graças a este facilitador anatômico, tenha conseguido desenvolver boas compensações articulatórias. A questão das compensações articulatórias adquiridas é bastante comentada na literatura. ALLISON et al. (1987) citam que é possível melhorar a inteligibilidade da fala através do contato do tecido mole remanescente contra o palato. SKELLY, SPECTOR E 201 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO DONALDSON (1971) enfatizaram que os glossectomizados parciais fazem uso da língua residual em movimentos adaptativos, com o intuito de aproximar-se da normalidade. HAMLET et al. (1990), seguindo a mesma linha de pensamento de SKELLY et al. (1971) mostram que pacientes glossectomizados parciais procuram desenvolver padrões de articulação compensatórios que, apesar de serem modificações dos padrões articulatórios normais, são acústica e perceptualmente aceitáveis. WÄCHTER E DIOS (1993) concluem que os mecanismos compensatórios desenvolvidos nas ressecções de parte de língua e assoalho de boca demonstram a grande capacidade de adaptação da língua remanescente. No QUADRO 4 foi possível observar que quanto maior a distorção do sistema fonêmico, pior a inteligibilidade de fala. O tipo de reconstrução empregada parece ter uma relação importante com a mobilidade da língua remanescente e, consequentemente, com o grau de distorção do sistema fonêmico e com a inteligibilidade da fala. ALLISON et al. (1987) referem que na sua amostra de pacientes com ressecção de língua e mandíbula, quando não houve reconstrução, a inteligibilidade da fala foi determina pela extensão da ressecção. Porém, quando houve reconstrução, o tipo de reconstrução empregado foi mais significativo para o prejuízo da fala do que o grau da ressecção. Neste trabalho, dois pacientes pelveglossectomizados parciais tiveram seus assoalhos reconstruídos: o paciente 3, com retalho miocutâneo infrahioideo, e o paciente 5, com enxerto microcirúrgico de Yang (enxerto distal). O primeiro apresentou alteração leve de mobilidade de língua e o segundo, alteração moderadamente severa. PAULOSKI et al. (1993) citam que o uso de retalho distal, introduz um tecido sem controle motor ou sensitivo em uma área onde a sensibilidade e a coordenação são críticas para a função normal de fala. Portanto, pode-se esperar um desempenho pior nos pacientes com enxerto distal. O paciente 1, pelveglossectomizado parcial, foi submetido a fechamento primário de assoalho de boca e de língua e o paciente 8, glossectomizado parcial, também foi submetido a fechamento primário de língua. Estes dois pacientes apresentaram alteração de mobilidade de língua leve, distorção leve do sistema fonêmico e foram julgados como tendo fala inteligível com erros (paciente 1) e inteligível sem erros (paciente 8). Este tipo de reconstrução permite uma boa flexibilidade da língua remanescente que, segundo SKELLY, SPECTOR E DONALDSON (1971) é um dos fatores determinantes para a boa inteligibilidade da fala. Entretanto, o uso da língua como retalho, diminui consideravelmente a sua mobilidade. Pode-se observar, nesta amostra, que os pacientes submetidos a este tipo de reconstrução (pacientes 2 e 4) apresentaram alterações da mobilidade da língua de graus moderadamente severo e moderado, respectivamente. O paciente 9, com ressecção retromolar, também foi submetido a reconstrução com retalho de língua. Porém, neste caso, a parte da língua utilizada para reconstrução foi a parte posterior, que influencia menos na produção da fala, já que a parte anterior da língua é a mais móvel e crítica para a produção dos fonemas (LOGEMANN et al., 1993). CONCLUSÕES Ainda são poucos na literatura os dados objetivos sobre os resultados funcionais após cirurgia de câncer de boca e orofaringe. O primeiro objetivo deste tipo de tratamento é, sem dúvida, a erradicação do tumor. Porém, a preocupação em proporcionar uma melhor qualidade de vida possível para o paciente deve ser a segunda pre- 202 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA tensão. Se existirem dados objetivos sobre resultados funcionais, a escolha de um determinado tratamento ou de uma técnica de reconstrução se fará de maneira mais criteriosa. Apesar do número reduzido da nossa amostra, foi possível observar que a inteligibilidade de fala, em pacientes submetidos a ressecção parcial de língua, parcial ou total de assoalho de boca e ressecção retromolar com reconstrução de língua depende: – do grau de mobilidade da língua remanescente e não somente do tipo de cirurgia e reconstrução; – do grau de distorção do sistema fonêmico; – da adaptação à nova configuração intraoral. Desta forma, em uma intervenção articulatória cabe ao fonoaudiólogo procurar maximizar a mobilidade da língua remanescente e melhorar a produção fonêmica, objetivando a melhor inteligibilidade de fala. Vale destacar que as limitações inerentes ao tipo de cirurgia e reconstrução são fatores devem também ser considerados no prognóstico funcional. ANEXO Protocolo de avaliação da inteligibilidade de fala dos pacientes com ressecção de boca e/ou orofaringe classificada por juízes leigos Juiz nº: Inteligível, sem erros articulatórios Inteligível, percebe-se alguns erros Inteligível, só com muita atenção difícil de entender Ininteligível Pc1 Pc2 Pc3 Pc4 Pc5 Pc6 Pc7 Pc8 Pc9 * Apresentado no VI Encontro de Fonoaudiologia em Cancerologia / 1998 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALLISON, G.R.; RAPPAPORT, I.; SALIBIAN, A.H.; McMICKEN, B.; SHOUP, J.E.; ETCHEPARE, T.L.; KRUGMAN, M.E. Adaptive mechanisms of speech and swallowing after combined jaw and tongue reconstruction in long-term survivors. The american journal of surgery, 154:419-22, 1987. CHENG, N.; SHOU, B.; ZHENG, M.; HUANG, A. Microneurovascular transfer of the tensor fascia lata musculocutaneous flap for reconstruction of the tongue. Ann. plast. sur., 33(2): 136-41, 1994. FLETCHER, S.G.; JACOB, R.F.; KELLY, D.H.; KRIEGER, B.N.; MARTIN, D.E.; MYERS, E.N.; ROLNICK, M.I. 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Os tumores que afetam a cavidade oral em geral criam alterações estéticas e funcionais importantes, dependendo do local e tamanho do tumor e do modo de tratamento utilizado. Bastante se discute na literatura, a qualidade de vida que o paciente passa a ter após a retirada de um tumor dessa região. Sabe-se que alguns fatores etiológicos são muito importantes para o câncer de boca. O tabaco e/ou álcool, por exemplo são consumidos por 80% dos pacientes que apresentam estas lesões. A ressecção total de língua acaba por alterar as funções orais, como fala, mastigação e deglutição. Para se obter o máximo de reabilitação de um paciente glossectomizado, e oferecer a ele a melhor qualidade de vida possível, uma equipe de profissionais deve atuar em conjunto. Es sa equipe deve conter especialistas em cirurgia de cabeça e pescoço, odontologia, fonoaudiologia e nutrição. Muitas vezes a equipe deve contar também com os préstimos de um psicólogo. A fonoterapia, em geral inicia-se já no pré-operatório com exercícios preparatórios dos órgãos fonoarticulatórios, principalmente para lábios e mandíbula, incluindo também a orientação para a alimentação. Relata-se a seguir, o trabalho fonoaudiológico em um paciente submetido à glossectomia total. HISTÓRIA Paciente de 57 anos, masculino, branco, apresentava ronco e disfagia. Referia dor quando falava e deglutia. Apresentava distorção dos sons da fala, comprometendo 205 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO a inteligibilidade da mesma. O paciente foi submetido a biópsia de lesão oral, sendo detectado carcinoma epidermóide em base de língua e pilar anterior direito. Foi realizada glossectomia total e retirada do pilar anterior direito. A reconstrução foi realizada com retalho de peitoral maior. Após a cirurgia, o paciente passou a apresentar grau importante de dificuldade de deglutição e fala. FONOTERAPIA O paciente iniciou terapia fonoaudiológica um mês após a cirurgia. Encontrava-se ainda bastante edemaciado, com xerostomia devido à radioterapia a que havia sido submetido anteriormente à cirurgia. Na apresentação, o paciente apresentava dificuldade de deglutir inclusive saliva e estava sendo alimentado através de sonda nasogástrica. Inicialmente, ênfase foi dada à alimentação. O paciente foi orientado a usar colher de cabo longo e a colocar a cabeça para trás ao deglutir, para que a ação da gravidade facilitasse a sua deglutição. O paciente respondeu bem ao início do processo terapêutico, evoluindo bem e tendo controle voluntário contra a aspiração. Em seguida, iniciou-se o trabalho com pastosos e massas, que também obteve bons resultados. A fala encontrava-se bastante prejudicada. LEONARD E GONÇALVES (1998) também observaram este fato em seu estudo, principalmente em relação as consoantes. Foi então realizado um trabalho com fonemas bilabiais no paciente. O retalho auxilia o fechamento da cavidade, permitindo uma tentativa de fala mais inteligível e uma deglutição funcional. O paciente obteve um desenvolvimento satisfatório, levando-se em consideração o tipo de cirurgia realizado. É muito importante lembrar que a extensão da ressecção e a natureza da reconstrução determinam as habilidades funcionais do paciente. CONCLUSÃO O trabalho fonoaudiológico foi importante para o restabelecimento das funções orais do paciente. Temos que aprender a lidar com os limites que cada paciente apresenta e maximizar o uso das estruturas remanescentes. Temos sempre que estimular o paciente a tentar restabelecer suas funções orais e a lidar com suas dificuldades. * Apresentado no II Encontro de Fonoaudiologia em Cancerologia / 1994 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS LEONARD, R.; GONÇALVES, M.I. Speech Rehabilitation Postglossectomy. IN: Robbins, K.T.; Murry, T. Head and Neck Cancer – Organ Preservation, Function, and Rehabilitation. Singular Publishing, 1998, p. 109-18. SHAW, H.J.; HARDINGHAM, M. Cancer of the floor of the mouth: surgical Management. J. Lar. Otol. 91: 467-487 , 1977. 206 ASPECTOS FONOAUDIOLÓGICOS NO PÓS-OPERATÓRIO DA LARINGECTOMIA NEAR-TOTAL Elaine S. Figueiredo Liane Wannmacher Ana Paola Forte Renata M. Soneghet Cláudia A. Campos Gláucia B. Rocha Laélia C. Vicente INTRODUÇÃO A voz é imprescindível à comunicação oral. Muitas são as doenças que podem interferir na sua produção, dentre elas, o câncer de laringe. Este, em estadio avançado, na maioria das vezes requer a exérese de todo o órgão laríngeo com consequente perda da voz. Na tentativa de preservar a voz sem comprometer as margens oncológicas, muitos cirurgiões têm optado pela laringectomia near-total (PEARSON, 1981). Tal cirurgia é apropriada a lesões glóticas ou subglóticas com fixação de apenas uma prega vocal, lesões supraglóticas muito extensas e lesões de seio piriforme onde o nível cricofaríngeo não esteja comprometido. É necessário que se preserve pelo menos uma porção pequena de uma prega vocal inervada e sua aritenóide. Com o tecido remanescente, é realizado um shunt que comunica a traquéia à faringe, permitindo as funções fonatória e protetora das vias aéreas inferiores, mas não a função respiratória, havendo a necessidade de traqueostomia. Segundo alguns autores, este procedimento está sujeito a algumas complicações inerentes como estenose do shunt e aspiração orotraqueal (CHANDRACHUD et al., 1989; DeSANTO et al., 1989; BRASIL, 1994; LEVINE et al., 1994). O tipo de voz que a cirurgia near-total possibilita é a traqueofaríngica, obtida por meio de oclusão digital do traqueostoma e conseqüente direcionamento do ar pulmonar ao shunt, o qual é capaz de vibrar e produzir voz. As características de emissão, 207 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO no entanto, podem variar para cada indivíduo (BRASNU et al., 1989; HOASJOE et al., 1992). A fonação pode ser obtida logo após a cirurgia (SINGH E HARDCASTLE, 1985; SU E HWANG, 1993), sendo possível aprimorar a efetividade da comunicação oral, bem como da deglutição, por meio de reabilitação fonoaudiológica. O objetivo deste trabalho foi verificar a evolução fonoaudiológica de oito sujeitos submetidos a laringectomia near-total, quanto aos aspectos de deglutição e fala, bem como analisar a voz traqueofaríngica apresentada. MATERIAL E MÉTODOS Participaram do presente estudo 8 sujeitos submetidos a laringectomia near-total, sendo 1 do sexo feminino e 7 do sexo masculino, com idades variáveis entre 39 a 75 anos (média = 59). Todos foram operados pela Disciplina de Face e Pescoço do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da Irmandade Santa Casa de São Paulo, no período de novembro de 1995 a junho de 1996, com exceção de um sujeito, operado no ano de 1994. Atualmente, todos os sujeitos se encontram saudáveis, com exceção de 1, que veio a óbito por motivo não oncológico. Para caracterizar a amostra foram coletados no prontuário médico, os seguintes dados: local e estadio do tumor; realização de esvaziamento cervical; radioterapia e presença de complicações no pós-operatório imediato (Quadro 1). Quadro 1 - Caracterização da amostra segundo sexo, idade, local e estadio do tumor (TU), esvaziamento cervical (EC), radioterapia (RT) e complicações pós-operatórias (PO). Nº 1 SEXO F IDADE 39 LOCAL TU glote e supraglote ESTADIO T3N0 2 3 4 M M M 43 70 56 transglótico glote e infraglote hipofaringe 5 6 7 M M M 62 65 75 8 M 59 EC bilateral RT sim COMPLICAÇÃO PO estenose T3N0 T3N0 T3N2B não não não sim unilateral sim não fístula faringocutânea não glote e supraglote supraglote e hipofaringe glote e supraglote T3N0 T3N0 T3N0 unilateral sim unilateral sim não não fístula faringocutânea não não supraglote e faringe T3N0 bilateral sim não Os sujeitos foram avaliados pelo Setor de Reabilitação Fonoaudiológica da referida Instituição, sendo submetidos à terapia subsequente aqueles que tiveram indicação. O intervalo de tempo entre a cirurgia e a primeira avaliação fonoaudiológica variou de 8 a 84 dias, de acordo com o encaminhamento médico. Para a realização deste trabalho, foram analisados os dados relativos à evolução de cada sujeito quanto à deglutição e fala, num intervalo de tempo desde a data da primeira avaliação fonoaudiológica até o mês de julho de 1996. Além disso, foi realizada uma avaliação do comportamento vocal dos sujeitos. Dos dados da primeira avaliação, foram extraídos dois tópicos para análise: a presença de emissão vocal, a partir de uma vogal sustentada, e a ocorrência de sinais de 208 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA disfagia (tosse, engasgos frequentes e/ou saída de alimento pelo traqueostoma) durante a deglutição de alimentos em quaisquer consistências (Tabela 1). Em relação à evolução dos sujeitos, foram verificados os seguintes aspectos quanto à deglutição e fala: 1) Deglutição – ocorrência de disfagia, realização de terapia, duração da mesma e resultado obtido (Tabela 2). Foram considerados reabilitados os pacientes que deixaram de apresentar os sinais como tosse, engasgos e/ou saída de alimento pelo traqueostoma durante a deglutição de alimentos em quaisquer consistências. 2) Fala – tempo levado para iniciar emissões de vogais, monossílabos, dissílabos, tris sílabos, frases simples e conversa espontânea, daqueles sujeitos que apresentavam fonação traqueofaríngica (Tabela 3). Quanto à avaliação da voz traqueofaríngica, foram analisados perceptualmente os seguintes parâmetros: qualidade vocal; loudness; pitch e modulação tonal (Tabela 4). Para esta avaliação, levou-se em consideração as características da voz laríngea como parâmetro de comparação. Também observou-se a ocorrência de escape de ar pelo traqueostoma e o grau de severidade correspondente. Foram medidos os tempos máximos de fonação, a partir de vogal sustentada, utilizando-se um cronômetro (Tabela 5). A medição dos tempos máximos de fonação foi realizada em apenas 5 sujeitos da amostra, não participando o sujeito que evoluiu com estenose do shunt, o que veio a óbito e um sujeito que transferiu a residência para outro Estado antes da realização desta tarefa. HOASJOE et al. (1992) constataram que os falantes traqueofaríngicos apre- RESULTADOS: Tabela 1 - Ocorrência de voz traqueofaríngica e de disfagia durante a primeira avaliação fonoaudiológica, em oito sujeitos submetidos a laringectomia near-total. AVALIAÇÃO VOZ DISFAGIA SIM N (%) 7 (87,5) 3 (37,5) NÃO N (%) 1 (12,5)* 5 (62,5) TOTAL N (%) 8 (100) 8 (100) * Sujeito que evoluiu com estenose do shunt. Tabela 2 - Evolução de oito sujeitos laringectomizados near-total quanto à deglutição, no que diz respeito à ocorrência de disfagia, realização de terapia, duração e resultado da mesma. Nº 1* 2 3 4 5 6 7 8 DISFAGIA não sim não não não sim sim não TERAPIA sim sim sim - * Sujeito que evoluiu com estenose do shunt. 209 DURAÇÃO 2 semanas 35 semanas 3 semanas - RESULTADO reabilitado não reabilitado reabilitado - FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO Tabela 3 - Evolução de oito sujeitos laringectomizados near-total quanto à fala, no que diz respeito à ocorrência de voz traqueofaríngica e tempo levado para iniciar emissões de vogais, monossílabos (MONO), dissílabos (Dl), trissílabos (TRI), frases simples (FS) e conversa espontânea (CE). SUJEITO VOZ 1* não VOGAIS - MONO - DI - TRI - FS - CE - 2 3 4 sim sim sim 1 1 1 1 1 1 1 1 1 2 1 1 2 1 1 2 1 1 5 6 7 sim sim sim 1 1 1 1 10 1 1 12 1 1 14 1 1 14 2 2 não emitida 2 8 sim 1 1 1 1 1 2 TEMPO (em semanas) *Sujeito que evoluiu com estenose do shunt. Tabela 4 – Avaliação perceptual da voz traqueofaríngica de oito sujeitos laringectomizados near-total, quanto à qualidade vocal, loudness, pitch e modulação tonal. SUJEITO 1* QUALIDADE VOCAL - LOUDNESS - PITCH - MODULAÇÃOTONAL - 2 3 4 rouca rouca rouca-tensa-molhada adequada adequada adequada grave grave agudizado restrita restrita restrita 5 6 rouca-comprimida rouca-tensa-estrangulada adequada adequada agudizado agudizado restrita monotônica 7 8 Rouca-crepitante rouca aumentada adequada grave grave restrita restrita *Sujeito que evoluiu com estenose do shunt. Tabela 5 – Avaliação de oito sujeitos laringectomizados near-total, quanto à ocorrência de escape de ar pelo traqueostoma, grau de severidade do mesmo e tempos máximos de fonação (TMF). SUJEITO 1* ESCAPE DE AR - GRAU DE SEVERIDADE - TMF (em segundos) - 2 3 4 sim sim não leve severo - 7 não avaliado não avaliado 5 6 7 sim sim sim moderado severo leve 10 3 7 8 não - 8 *Sujeito que evoluiu com estenose do shunt. 210 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA COMENTÁRIOS E CONCLUSÕES A partir da análise da Tabela 1, verificou-se que a grande maioria dos sujeitos da amostra foi capaz de emitir voz traqueofaríngica desde a avaliação fonoaudiológica. Apenas 1 sujeito (12,5%) não apresentou fonação devido à estenose do shunt. Segundo CHANDRACHUD et al. (1989) e DeSANTO et al. (1989), cerca de 10% dos sujeitos submetidos a laringectomia near-total apresentaram estenose do shunt no pós-operatório. Quanto à deglutição, 3 sujeitos (37,5%) apresentaram disfagia, resultado semelhante ao encontrado por LEVINE et al. (1994), no entanto, superior aos índices referidos por CHANDRACHUD et al. (1989) e DeSANTO et al. (1989), de 10% e 15% respectivamente. Já SINGH E HARDCASTLE (1985) e SU E HWANG (1993) referiram ausência de disfagia em 100% dos sujeitos estudados. Segundo DeSANTO et al. (1989), a aspiração orotraqueal seria atribuída à criação de um shunt demasiado largo para a função esfincteriana. Em estudo realizado por meio de exame endoscópico, CHANDRACHUD et al. (1989) observaram a dinâmica do shunt, nos casos bem sucedidos, verificando a sua abertura durante a fala e fechamento na deglutição. Em relação aos resultados referidos na Tabela 2, dos 3 sujeitos que apresentaram disfagia, 2 foram reabilitados em um período de duas a três semanas e 1 sujeito, após trinta e cinco semanas de terapia, ainda apresentava sinais de aspiração orotraqueal. LEVINE et al. (1994) relataram que 27% da amostra estudada manteve aspiração durante a sua evolução. Quanto a evolução da fala (Tabela 3), dos 7 sujeitos que apresentaram voz traqueofaríngica, 6 foram capazes de emitir vogais, palavras, frases e conversa espontânea entre a primeira e segunda semanas de terapia. Apenas 1 sujeito não obteve fala satisfatória até a trigésima-quinta semana de reabilitação, conseguindo emitir no máximo frases simples isoladas. Na literatura, o tempo levado à reabilitação da fala é variável, de 2 semanas (SINGH E HARDCASTLE, 1985) até 20 semanas (LEVINE et al., 1994). Segundo estudos realizados, a maioria dos sujeitos submetidos à laringectomia near-total obtêm uma fala bem sucedida e inteligível (PEARSON, 1981; SINGH E HARDCASTLE, 1985; CHANDRACHUD et al., 1989; DeSANTO et al., 1989; SU E HWANG, 1993; LEVINE et al., 1994). Dos resultados da avaliação perceptiva-auditiva da voz (Tabela 4), os 7 sujeitos com fonação traqueofaríngica apresentaram qualidade vocal predominantemente rouca. Esta característica era esperada, uma vez que as poucas estruturas remanescentes que atuam na fonação vibram de forma irregular. Além da rouquidão, 4 sujeitos apresentaram variações vocais, tais como molhada, crepitante, comprimida e tensa-estrangulada. Acredita-se que esta variabilidade pode ocorrer de acordo com o tamanho do shunt confeccionado, o aspecto das mucosas envolvidas na vibração, bem como a capacidade de movimentação das estruturas remanescentes. Quanto a loudness, 6 dos sujeitos apresentaram-na adequada e 1, aumentada. Segundo HOASJOE et al. (1992), geralmente os falantes traqueofaríngicos apresentam loudness adequada para a conversação, apesar da modulação de intensidade ser restrita. Com relação ao pitch, 4 vozes foram consideradas graves e 3 agudizadas. Acredita-se que este pitch agudizado possa estar relacionado à rigidez de estruturas fonatórias e conseqüente redução da onda vibratória, uma vez que os mesmos sujeitos apresentaram qualidade vocal com tensão associada. Em relação à modulação tonal, todos os 7 sujeitos manifestaram modulação restrita, sendo que 1 deles apresentou fonação monotônica. Da mesma forma, 211 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO sentavam uma voz com modulação restrita, podendo parecer monótona ou artificial ao ouvinte. Quanto a ocorrência de escape de ar pelo traqueostoma, dos 7 sujeitos avaliados, 5 apresentaram escape de ar de grau leve a severo. O tempo máximo de fonação (TMF), foi medido em 5 sujeitos e a média obtida foi de 7 segundos. BRASNU et al. (1989) verificaram uma média de TMF de 17 segundos, enquanto HOASJOE et al. (1992) obtiveram uma média de 14,7 segundos, variando de 6 a 24,6 segundos. Segundo os últimos autores, um dos possíveis motivos relacionados às medidas de TMF reduzidas, encontradas nos falantes traqueofaríngicos, seria a oclusão digital ineficiente do traqueostoma. No presente estudo, o sujeito que obteve a menor medida de TMF (3 segundos) apresentava escape de ar severo. No entanto, a mesma relação não foi verificada nos demais sujeitos da amostra (Tabela 5). Com base nos resultados obtidos, pôde-se concluir que a maioria dos sujeitos da amostra apresentou voz traqueofaríngica e ausência de sinais de disfagia no pós-operatório da laringectomia near-total. A maior parte dos sujeitos que apresentaram disfagia, pôde ser reabilitada em um curto período de fonoterapia e a maioria dos sujeitos que apresentaram voz traqueofaríngica no pós-operatório, foram capazes de produzir rapidamente uma fala efetiva. A voz traqueofaríngica produzida pela amostra em geral apresentou qualidade vocal rouca, loudness adequada, modulação tonal restrita e pitch grave, com tendência a agudizar-se na presença de tensão vocal. Os tempos máximos de fonação foram reduzidos, sem que necessariamente estivessem relacionados à ocorrência de escape de ar pelo traqueostoma. Por fim, acredita-se que a cirurgia near-total possibilita ao paciente oncológico uma reabilitação rápida e satisfatória quanto à comunicação e à deglutição, favorecendo, consequentemente, a reintegração do indivíduo no âmbito social. * Apresentado no IV Encontro de Fonoaudiologia em Cancerologia /1996 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRASIL, O.O. Tratamento do câncer da laringe. IN: LOPES, O.; CAMPOS, C.A. Tratado de otorrinolaringologia. São Paulo, Roca, 1994, p. 1066-79. BRASNU, D.; STROME, M.; BUCHMAN, L.C.; PFAUWADEL, M.C.; MENARD, M.; MARTINEZ, P.; LACCOURREYE, H. 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O shunt, por ser dinâmico, permite as funções fonatória e protetora das vias aéreas inferiores, porém não é suficientemente amplo para possibilitar a função respiratória, havendo a necessidade de traqueostomia. Ao exame nasofibroscópico em casos bem sucedidos de laringectomia near-total, é possível visibilizar a abertura do shunt durante a fonação e o seu fechamento durante a deglutição, evitando a passagem de alimentos às vias aéreas inferiores (CHANDRACHUD et al., 1989). Contudo, na literatura, encontram-se alguns estudos onde a disfagia, caracterizada por aspiração orotraqueal, é referida como uma das possíveis complicações pós-cirúrgicas da laringectomia near-total (DeSANTO et al., 1989; LEVINE et al., 1994; FORTE et al.,1996; VICENTE et al., 1997). 214 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA Aspirações freqüentes podem ser letais ao paciente, levando-o a desenvolver broncopneumonia, no entanto, não se sabe precisar a quantidade de material aspirado necessária para desencadear um problema pulmonar (SILVER et al., 1991). Com o objetivo de detectar a disfagia e quantificar a porcentagem aspirativa apresentada por pacientes oncológicos de cabeça e pescoço, MUZ et al. (1987) utilizaram a técnica cintilográfica, considerando-a o método mais sensível para verificar pequenas quantidades de material aspirado. A cintilografia é um exame radiológico utilizado pela Medicina Nuclear, que possibilita a análise de imagens dinâmicas ou estáticas, geradas a partir de um equipamento computadorizado conectado a uma gama-câmara. Esta câmara é capaz de captar os raiosgama emitidos por um radiofármaco (administrado por via oral ou intravenosa) presente nos tecidos do órgão alvo (WALKER E MARGOULEFF, 1984). Na avaliação cintilográfica de aspiração orotraqueal em sujeitos submetidos a cirurgia de cabeça e pescoço, o indivíduo avaliado deglute uma solução onde esteja diluído um radionuclídeo chamado tecnécio (TC-99m). O trajeto do bolo irá contrastar as regiões da cavidade oral, faringe, esôfago e estômago, sendo que nos sujeitos com aspiração orotraqueal, serão captadas, também, imagens das vias aéreas inferiores (MUZ et al., 1994). O presente estudo teve por objetivo detectar e quantificar o grau de aspiração orotraqueal de sujeitos laringectomizados near-total, através de avaliação cintilográfica. MATERIAL E MÉTODO A amostra constou de 6 sujeitos do sexo masculino, com idades entre 43 e 75 anos (média = 60). Todos haviam sido portadores de tumores laríngeos T3 e foram submetidos a laringectomia near-total pela Disciplina de Face e Pescoço da Faculdade de Ciências Médicas da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, sendo que 4 sujeitos realizaram radioterapia pós-cirúrgica. O tempo de pós-operatório, no momento da coleta de dados, variava de 6 a 18 meses. Após a cirurgia, 5 sujeitos evoluíram com disfagia, sendo 4 no pós-operatório imediato e 1 após a realização de radioterapia. Estes sujeitos foram reabilitados pelo Setor de Fonoaudiologia da referida Instituição, voltando a alimentar-se exclusivamente por via oral. Para a realização do presente estudo, primeiramente, todos os sujeitos foram submetidos a um questionário, onde foram verificados os seguintes aspectos: queixa quanto à deglutição (ocorrência de sensação de alimento parado em recessos orofaríngeos, tosse, engasgos e/ou saída de alimento pelo traqueostoma); utilização de manobra compensatória para deglutir e perda de peso corporal (comparação entre a medida atual e a apresentada no período pós-operatório recente). Foi também verificada, a partir de prontuário médico, referência de broncopneumonia nos sujeitos da amostra. A avaliação cintilográfica da deglutição foi realizada no Serviço de Medicina Nuclear da referida Instituição, com gama-câmara de modelo DSX Retangular e marca Sophy. O material utilizado para a deglutição foi uma solução composta de 3,0 mCi de Tc-99 e 25 ml de leite. Cada sujeito foi orientado a deglutir a solução líquida em dose única, em posição vertical anterior ao campo de captação da gama-câmara. A imagem dinâmica foi registrada durante a deglutição e as imagens estáticas foram estabelecidas após o término do trajeto do bolo, nas posições anterior e posterior. 215 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO A porcentagem de aspiração orotraqueal (PA) foi calculada a partir das imagens estáticas, utilizando-se a fórmula PA = RA x 100/TC, onde RA refere-se à contagem de radioatividade na região de aspiração e TC representa a contagem total de todas as regiões. Este protocolo de avaliação foi baseado no referido por MUZ et al. (1987). RESULTADOS Os dados obtidos a partir do questionário aplicado aos sujeitos e dos prontuários médicos estão descritos na Tabela 1. No Gráfico 1, encontram-se referidos os resultados da avaliação cintilográfica de aspiração orotraqueal. Tabela 1 - Ocorrência de queixa quanto à alimentação, uso de manobra facilitadora à deglutição, perda de peso corporal, e ocorrência de broncopneumonia (BCP) em 6 sujeitos laringectomizados near-total. Nº 1 QUEIXA DE ALIMENTAÇÃO + USO DE MANOBRA FACILITADORA - PERDA DE PESO CORPORAL - 2 3 4 + + + + + - - 5 6 + + + - - - Legenda: (+) Sim BCP - (-) Não Gráfico 1 - Detecção e quantificação de aspiração orotraqueal por meio de avaliação cintilográfica, em 6 sujeitos laringectomizados near-total. COMENTÁRIOS E CONCLUSÕES Quanto aos dados referidos na tabela de número 1, em relação às condições alimentares, pôde-se verificar que 5 sujeitos apresentaram alguma queixa quanto à deglutição de alimentos, dos quais 3 referiram utilizar manobras facilitadoras durante a ali- 216 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA mentação. Contudo, nenhum destes 5 sujeitos referiu perda de peso, o que sugere que apesar de haver queixas eventuais quanto à deglutição, estas não interferiram no suporte nutricional do paciente. O único sujeito que referiu diminuição do peso corporal, foi o mesmo que não apresentou queixa quanto à alimentação e tampouco utilizava qualquer manobra compensatória. Segundo informações de prontuário médico, este sujeito apresentava um segundo tumor primário, o que vinha acarretando perda progressiva de peso. Em relação à ocorrência de broncopneumonia, esta não foi observada nos 6 sujeitos da amostra. Os resultados da avaliação cintilográfica apontaram 3 dos sujeitos com porcentagem de aspiração inferiores a I%: 0,13%; 0,16%; e 0,24%. Os outros 3 sujeitos apresentaram porcentagem de aspiração entre 1 e 5%: 1,27%; 2,04%; e 4,61%. MUZ et al. (1994) consideraram aspirações inferiores a 1% como “pequenas”, de 5% a 10% como “evidentes” e superiores a 20% como “grandes”. De acordo com esta classificação, no presente estudo, 3 sujeitos apresentaram aspirações pequenas, 2 manifestaram aspirações um pouco mais perceptíveis, quando comparadas às anteriores, e 1 sujeito apresentou aspiração evidente. Segundo SILVER et al. (1991), o volume de material aspirado necessário para ocasionar broncopneumonia não foi determinado, embora soubesse que quanto maior a aspiração e maior o tempo de retenção do material aspirado, maior o risco de desenvolver uma infecção pulmonar. Além disso, o autor referiu outros fatores que deveriam ser considerados, como a flora patogênica, o grau de acidez do material aspirado e a capacidade imunológica do organismo. A partir da análise dos resultados obtidos, pode-se concluir que, apesar de 100% da amostra ter apresentado algum grau de aspiração orotraqueal, a quantidade detectada não se mostrou relevante para acarretar problemas pulmonares. * Apresentado no V Encontro de Fonoaudiologia em Cancerologia / 1997 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CHANDRACHUD, H.R.; CHAURASIA, M.K.; SINHA, K.P. Subtotal laryngectomy with myomucosal shunt. J Laryngol Otol, 103: 504-7, 1989. DeSANTO, L.W.; PEARSON, B.W.; OLSEN, K.D. 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SILVER, K.H.; VAN NOSTRAND, D.; KUHLEMEIER, K.V.; SIEBENS, A.A. Scintigraphy for the detection and quantification of subglottic aspiration: preliminary observations. Arch Phys med Rehabil, 72: 902-10, 1991. VICENTE, L.C.; GONÇALVES, M.I.; GONÇALVES, A.J. Laringectomias quase-totais – reabilitação fonoaudiológica. IN: LOPES, O. Tratado de fonoaudiologia. São Paulo, Roca, 1997, p.1051-61. WALKER, J.M; MARGOULEFF, D. A clinical manual of nuclear medicine. Connecticut, Appleton-Century-Crofts, 1984. 218 INTELIGIBILIDADE DE FALA ELETROLARÍNGEA DE LARINGECTOMIZADOS TOTAIS Elaine S. Figueiredo Liane Wannimacher Laélia C. Vicente INTRODUÇÃO Indivíduos submetidos a laringectomia total dispõem de alguns meios de produção de voz alaríngea para a reabilitação da comunicação oral. Alguns pacientes optam pela fala eletrolaríngea, a qual é obtida por meio de um aparelho chamado laringe eletrônica, também conhecido como laringe artificial, vibrador elétrico ou prótese eletrônica. Este meio de produção de voz alaríngea pode constituir o principal método de reabilitação da fala ou atuar paralelamente a outros. Pode ser indicado como facilitador da comunicação no pós-operatório imediato ou ainda aos pacientes que, mesmo durante o processo de aquisição da voz esofágica, tenham urgência em voltar a falar. A laringe eletrônica cervical é um vibrador movido à bateria ou pilha, o qual emite um estímulo sonoro contínuo, controlado pelo manejo de um dispositivo. A partir do contato direto do aparelho com o pescoço ou a bochecha, o som é transmitido ao trato vocal e transformado em fala por meio da articulação. O som produzido pela laringe eletrônica é caracterizado por uma qualidade mecânica e artificial, sendo acompanhado por um componente de ruído durante a fala. O aparelho possui, em geral, pouca ou nenhuma capacidade de variação de freqüência e, quanto à intensidade, a maioria dos modelos apresenta um dispositivo para o controle de volume. Mesmo que o som gerado pela laringe eletrônica possa parecer estranho e desagradável a muitos, este meio de produção de voz alaríngea é capaz de prover uma boa inteligibilidade de fala (LUEDERS, 1956; MARTIN, 1963; CASPER E COLTON, 1993; DOYLE, 1994). 219 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO No entanto, são muitos os fatores que podem favorecer ou prejudicar a inteligibilidade da fala eletrolaríngea, desde características acústicas da laringe eletrônica utilizada, até aspectos anátomo -funcionais inerentes à laringectomia total (WEISS et al., 1979). Também devem ser levadas em conta, as habilidades individuais de fala e do manejo do aparelho (CARPENTER E KALB, 1981; CLARK E STEMPLE, 1982; HOLLEY et al., 1983). Assim, este estudo teve por objetivo verificar o nível de inteligibilidade da fala eletrolaríngea de dez laringectomizados totais, bem como identificar os fatores estruturais e funcionais que possam interferir no seu desempenho. MATERIAL E MÉTODO A amostra constou de dez sujeitos do sexo masculino, com idades entre 46 e 82 anos, média de 63 anos. Todos haviam sido portadores de neoplasia em região laríngea, sendo que 2 deles também haviam apresentado tumor em seio piriforme. Portanto, 8 sujeitos foram submetidos a laringectomia total e 2, a laringectomia total e faringectomia parcial. Em 5 sujeitos foi realizado esvaziamento cervical. Quanto ao tratamento complementar, 8 sujeitos fizeram radioterapia, sendo 3 no período pré-operatório e 5, no pós-operatório, e 1 sujeito realizou quimioterapia antes da cirurgia. Todos os sujeitos, com exceção de um, foram operados pela Disciplina de Face e Pescoço do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da Irmandade Santa Casa de São Paulo. O tempo de pósoperatório dos sujeitos, no momento da coleta de dados, variou de 6 meses a 5 anos e 6 meses. Os sujeitos haviam optado pela utilização da laringe eletrônica como meio de comunicação definitivo ou temporário. Aqueles que a utilizavam temporariamente, encontravam-se em período de aprendizagem da voz esofágica. Como critério de inclusão na pesquisa, foram selecionados aqueles indivíduos que faziam uso da laringe eletrônica há pelo menos 1 mês. Cinco sujeitos utilizavam a laringe eletrônica de modelo nacional Gerador Vocal AV-500 e os demais, o modelo importado Servox Inton Speech Aid. Seis sujeitos faziam contato do aparelho na região cervical do lado esquerdo, dois do lado direito e dois na região anterior. Quanto à freqüência do seu uso, 6 sujeitos usavam-no “sempre” (uso diário e a todo o momento), 3, “quase sempre” (uso diário, mas não em todas as situações) e 1, “raramente” (uso não diário). Oito sujeitos realizaram fonoterapia para o aprendizado da fala eletrolaríngea, sendo estes atendidos no Setor de Reabilitação Fonoaudiológica da referida Instituição. O tempo de terapia variou de 1 a 12 meses. Todos os sujeitos foram submetidos a uma avaliação fonoaudiológica durante o mês de julho de 1997. Esta foi realizada por meio de um protocolo, do qual se obtiveram dados a respeito do manejo da laringe eletrônica, aspecto de região cervical, dentição, tipo articulatório, pronúncia e ritmo de fala, além da presença de alterações articulatórias e de ruídos adjacentes (boca, traqueostoma e/ou aparelho). Estes aspectos foram analisados por 3 fonoaudiólogas do referido serviço. Cada sujeito participou também de uma gravação de fala espontânea, com assunto de sua escolha, utilizando a própria laringe eletrônica na realização da tarefa. As baterias ou pilhas correspondentes aos aparelhos utilizados foram fornecidas pelos avaliadores, garantindo assim seu funcionamento adequado. Para o registro das amostras de fala, foi utilizado gravador Sony de modelo WMGX90, microfone unidirecional Sony de modelo ECM-909 A e fita cassete Sony de 220 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA modelo ZX-Type 1, sendo as gravações realizadas em cabina acústica. Os dez trechos de fala espontânea foram editados de maneira que houvesse 1 minuto em cada amostra. A fita editada foi exposta a 24 juizes leigos, 12 homens e 12 mulheres, variando de 19 a 60 anos de idade, todos com segundo grau completo de escolaridade. A exposição da gravação foi realizada em campo aberto, com nível de intensidade confortável aos ouvintes. Anteriormente à análise da gravação, os juizes foram familiarizados com o som produzido pela laringe eletrônica, a partir da demonstração do uso do aparelho por um dos avaliadores e por exposição de um trecho de fala eletrolaríngea desprezado na edição da fita. A partir de uma única escuta das amostras gravadas, os juizes foram orientados a classificar a inteligibilidade de fala de cada sujeito, de acordo com quatro níveis, os quais foram preestabelecidos pelos autores deste trabalho. Os níveis de inteligibilidade de fala propostos foram: 1) Inteligível: referente à compreensão integral da mensagem. 2) Inteligível com atenção: referente à compreensão do conteúdo global da mensagem, embora houvesse perda de alguns elementos, exigindo do ouvinte uma maior atenção dispensada. 3) Pouco inteligível: referente à compreensão parcial do conteúdo, comprometendo o entendimento da mensagem, devido à assimilação de alguns segmentos da fala e perda de outros. 4) Ininteligível: referente à incompreensão da mensagem. Este critério de classificação dos níveis de inteligibilidade de fala foi adaptado do proposto por McCONNEL et al. (1987). A análise utilizada para a classificação final do nível de inteligibilidade de fala de cada sujeito da amostra levou em consideração a maior concordância obtida nos 24 julgamentos realizados (= 60%). Nos casos em que houve divisão de opiniões entre os juizes, muito semelhantes ou até idênticas, foram consideradas ambas as classificações, ficando, assim, a fala do sujeito caracterizada por dois níveis de inteligibilidade. Os aspectos estruturais e funcionais obtidos a partir do protocolo de avaliação fonoaudiológica foram organizados de acordo com os níveis de inteligibilidade de fala determinados para cada sujeito. Os dados obtidos nesta pesquisa foram descritos com base em normas estatísticas. RESULTADOS Da análise dos juizes, foram obtidos os seguintes resultados quanto à classificação da inteligibilidade de fala eletrolaríngea: 1) De acordo com aproximadamente 60% dos juizes: 3 sujeitos “inteligíveis” (média = 94,5%); 1 “inteligível com atenção” (70,8%); 2 “pouco inteligíveis” (média = 60,4%); e 1 “ininteligível” (91,7%). 2) De acordo com divisão dos juizes: 2 sujeitos “inteligíveis" (média = 52%) e “inteligíveis com atenção” (média = 48%); 1 “pouco inteligível” (45,8%) e “ininteligível” (41,7%). Os resultados da classificação do nível de inteligibilidade e os dados da avaliação fonoaudiológica estão apresentados nas seguintes tabelas: 221 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO Tabela 1 - Nível de inteligibilidade de fala eletrolaríngea em relação à presença de alteração em pescoço, ao manejo da laringe eletrônica (L.E.) e à presença de ruído na fala de dez laringectomizados totais. Nº 1 NÍVEL I ALT. PESCOÇO ∅ MANEJO L.E. entrecorta frases 2 I ∅ entrecorta frases ∅ L.E./estoma 3 I ∅ entrecorta frases ∅ 4 I e II ∅ - ∅ 5 I e II ∅ - ∅ 6 II ∅ Fibrose / edema desliga antes mau contato ∅ L.E. ∅ fibrose fibrose mau contato L.E. / estoma mau contato / desliga antes mau contato / não faz pausas L.E. / estoma L.E. 7 III 8 III 9 10 III e IV IV RUÍDO Tabela 2 - Nível de inteligibilidade de fala eletrolaríngea em relação ao tipo articulatório, pronúncia e ritmo de fala de dez laringectomizados totais. Nº NÍVEL TIPOARTICULATÓRIO PRONÚNCIA RITMO 1 I - - - 2 I - - - 3 I exagerado - - 4 I e II travado regionalismo - 5 I e II - regionalismo - 6 II - regionalismo - 7 III - - - 8 III - regionalismo aumentado 9 III e IV - regionalismo - 10 IV - - reduzido Legenda: I - inteligível II - inteligível com atenção III - pouco inteligível IV - ininteligível ( - ) - normal 222 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA Tabela 3 - Nível de inteligibilidade de fala eletrolaríngea em relação aos aspectos de dentição e articulação de dez laringectomizados totais. Nº NÍVEL DENTIÇÃO PRÓTESE DENTÁRIA ALT. ARTICULAÇÃO 1 I inferior superior ∅ 2 I total ∅ 3 I ∅ completa I e II ∅ ∅ superior ∅ 4 5 I e II 6 7 II III ∅ inferior incompleta inferior incompleta ∅ superior superior ∅ sigmatismo 8 III ∅ III e IV ∅ ∅ total ∅ 9 10 IV ∅ superior ∅ ∅ ∅ ∅ Legenda: I – inteligívelII - inteligível com atenção III - pouco inteligível IV - ininteligível (∅ ) - ausente COMENTÁRIOS E CONCLUSÕES Em relação aos resultados obtidos a partir da avaliação perceptual dos juizes leigos quanto à inteligibilidade de fala, observou-se que 60% dos falantes foram considerados inteligíveis, com compreensão total do conteúdo da mensagem, necessitando ou não de maior atenção dispensada pelos ouvintes. Já 40% dos sujeitos laringectomizados produziram emissões menos inteligíveis, sendo as suas mensagens pouco compreendidas ou incompreendidas. Na literatura, não foi encontrada qualquer referência sobre a quantidade ou porcentagem, em geral, de falantes bem sucedidos com o uso da laringe eletrônica cervical. No entanto, alguns autores constataram que a laringe eletrônica, enquanto meio de produção de voz alaríngea, era capaz de prover uma boa inteligibilidade de fala (LUEDERS, 1956; MARTIN, 1963; CASPER E COLTON, 1993; DOYLE, 1994). Além disso, muitos estudos que compararam a inteligibilidade de fala eletrolaríngea com a esofágica e/ou traqueoesofágica, concluíram que havia sujeitos inteligíveis usando qualquer uma das emissões alaríngeas, sugerindo que a efetividade da comunicação dependia mais das habilidades individuais do que do método utilizado (CARPENTER E KALB, 1981; CLARK E STEMPLE, 1982; HOLLEY et al., 1983). Em relação aos resultados descritos na Tabela 1, quanto aos dados referentes à presença de fibrose ou edema na região cervical, verificou-se que o grupo de sujeitos com fala inteligível não apresentou qualquer alteração. Já no grupo menos inteligível, a fibrose no pescoço foi frequentemente observada. Quanto ao aspecto de manejo da laringe eletrônica, o mau contato do aparelho no pescoço foi uma inabilidade observada somente nos sujeitos menos inteligíveis. Observando-se que estes dois aspectos relacionados à região cervical aparecem com freqüência nos mesmos sujeitos, sugere-se que o enrijecimento do tecido do pescoço dificulte o contato adequado do aparelho, prejudicando a propagação da energia sonora produzida e o aproveitamento desta para a fala. Também o ruído eletrônico adjacente do aparelho esteve presente na fala de todos os sujeitos menos inteligíveis. Este ruído consiste no som produzido pela laringe 223 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO eletrônica que deixa de ser transmitido às cavidades de ressonância. WEISS et al. (1979) referiram que o nível do ruído eletrônico era potencializado pelo mau posicionamento do aparelho na região cervical, bem como pelas alterações do tecido do pescoço ocasionadas pela radioterapia. Assim, quanto maior a rigidez, menor a capacidade de transmissão do sinal eletrônico ao trato vocal e maior a irradiação do ruído. O ruído irradiado seria um fator interferente na inteligibilidade de fala, quanto maior fosse o seu nível de intensidade em relação ao da fala eletrolaríngea. Apesar do ruído eletrônico adjacente ter sido observado no grupo menos inteligível, associado ao mau contato do aparelho e, na maioria das vezes, à fibrose do pescoço, também esteve presente em um sujeito com fala inteligível, porém sem a manifestação dos outros dois aspectos mencionados. Acredita-se que a presença des te ruído deva-se aos aspectos eletroacústicos específicos do aparelho utilizado pelo sujeito. Como sugeriram WEISS et al. (1979), o ruído adjacente da laringe eletrônica também poderia ser proveniente das características sonoras de um determinado aparelho. A presença do ruído de traqueostoma encontrado em alguns sujeitos da amostra, não permite maiores discussões, uma vez que foi pouco incidente e observado tanto em sujeitos considerados inteligíveis, quanto ininteligíveis. Na literatura, não foram encontrados estudos que avaliassem o grau de interferência do ruído de traqueostoma na inteligibilidade da fala eletrolaríngea, no entanto, alguns autores admitem que este ruído pode mascarar o som da fala e prejudicar a sua efetividade (HOLLEY et al., 1983; CASPER E COLTON, 1993). Um resultado surpreendente, com relação ao manejo da laringe eletrônica, revelou que o ato de entrecortar frases foi uma característica observada apenas nos sujeitos com fala inteligível. Supunha-se que este tipo de manejo pudesse ser um fator interferente na inteligibilidade da fala eletrolaríngea, uma vez que compromete a sua fluência. O entrecortar de frases consiste na realização de pausas inadequadas entre as palavras de uma mesma sentença e é um aspecto comumente abordado em terapia fonoaudiológica (CASPER E COLTON, 1993). Em relação aos resultados descritos na Tabela 2, os tipos articulatórios alterados, tanto exagerados quanto travados, não prejudicaram a inteligibilidade da fala eletrolaríngea, uma vez que foram observados somente em bons falantes. Quanto à pronúncia, foi verificada a presença de regionalismos em emissões inteligíveis, bem como ininteligíveis, o que, aparentemente, não comprometeu a inteligibilidade de fala. No entanto, nota-se que este aspecto esteve presente em t odos os sujeitos cuja fala foi classificada em dois níveis de inteligibilidade. Isto sugere que o regionalismo possa ter influenciado na diversidade de opiniões dos juizes, no que diz respeito a confusões semânticas ou distrações por parte do ouvinte. Com respeito à avaliação do ritmo de fala, verificou-se que o ritmo, tanto aumentado como reduzido, foi um fator prejudicial à inteligibilidade da fala eletro-laríngea. Da análise dos dados da Tabela 3, os aspectos dentários e articulatórios não se mostraram fatores determinantes no comprometimento da inteligibilidade da fala eletrolaríngea dos sujeitos avaliados. Com base nos resultados obtidos, pôde-se concluir que, na amostra estudada, houve maior incidência de sujeitos com um bom nível de inteligibilidade de fala, onde foram compreendidos, se não o conteúdo integral das emissões de fala encadeada, o contexto global das mensagens transmitidas. 224 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA Os aspectos que mais comprometeram a inteligibilidade de fala eletrolaríngea foram a fibrose na região cervical, o mau contato da laringe eletrônica no pescoço, o ruído eletrônico adjacente do aparelho e o ritmo de fala inadequado. Por fim, acredita-se que a fala eletrolaríngea é uma boa forma de comunicação, sendo que alguns aspectos que prejudicam a sua inteligibilidade podem ser abordados em fonoterapia. Orientações quanto ao manejo do aparelho e aproveitamento dos elementos supra-segmentares da fala podem aprimorar a comunicação oral e ajudar a compensar os prejuízos decorrentes das alterações estruturais pós-cirúrgicas e radioterápicas. * Apresentado no VI Encontro de Fonoaudiologia em Cancerologia / 1998 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CARPENTER, M.A.; KALB, M.B. Individual speaker influence on relative intelligibility of. esophageal speech and artificial larynx speech. Journal of Speech and Hearing Disorders, 46:77-80, 1981. CASPER, J.K.; COLTON, R.H. Clinical manual for laryngectomy and head/neck cancer rehabilitation. San Diego, Singular Publishing Group, 1993, Inc. CLARK, J.G.; STEMPLE, J.C. 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A ressecção do câncer de laringe pode acarretar sequelas na deglutição e na voz, fatores essenciais na manutenção do convívio social. A Laringectomia Total tem como consequência a perda do mecanismo fonatório básico, podendo ser caracterizada como uma mutilação, pois o indivíduo é privado de expressar emoções e idéias através de sua voz. Neste caso, o fonoaudiólogo que atua com pacientes oncológicos de cabeça e pescoço, tem como objetivo oferecer uma forma alternativa de comunicação através dos seguintes métodos: voz esofágica, laringe eletrônica e prótese vocal. Cabe ao fonoaudiólogo, além do trabalho de reabilitação propriamente dito, estar atento às necessidades emocionais do paciente e do familiar que o acompanha, 226 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA favorecendo a aceitação de sua nova condição e sua reintegração social e profissional (BARROS, 1995). Dessa forma, a atuação fonoaudiológica abrange o acompanhamento desde a descoberta do câncer, quando o paciente e a família encontram-se fragilizados emocionalmente. Na orientação pré-operatória são fornecidas informações sobre a cirurgia, a anatomia e a fisiologia antes e após a cirurgia, enfatizando a perda da voz. Porém, a compreensão dessas informações pode ser dificultada pelo estado emocional do paciente, pois este está muito ansioso e com medo da cirurgia, causando um impacto muito grande no pós-operatório, quando o paciente se defronta com a realidade e a impossibilidade de se comunicar através da voz, abalando-se ainda mais emocionalmente. O Serviço de Reabilitação Fonoaudiológica do Departamento de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital Santa Casa Misericórdia de São Paulo atende aos pacientes submetidos a cirurgia, radioterapia e ou quimioterapia, com sequelas na comunicação oral e nas funções neurovegetativas, encaminhados por este setor e outros hospitais. Dos pacientes atendidos no período de janeiro a outubro de 1999, 55,7% eram laringectomizados totais. O objetivo deste estudo foi determinar a eficácia das formas de reabilitação fonoaudiológica para laringectomizados totais com relação a melhora da qualidade de vida desses indivíduos. METODOLOGIA Participaram desta pesquisa, 20 indivíduos laringectomizados totais, sendo 2 do sexo feminino, na faixa etária de 50 a 80 anos. Os entrevistados foram selecionados de maneira aleatória, cujo único critério era estar em processo de reabilitação fonoaudiológica no momento da pesquisa, no Setor de Reabilitação Fonoaudiológica a Pacientes Oncológicos de Cabeça e Pescoço, já tendo recebido os atendimentos iniciais e optado por uma das formas de comunicação (voz esofágica, laringe eletrônica e prótese vocal), sendo esta forma efetiva ou não. Realizou-se uma entrevista individual, através de um questionário, composto por 17 questões de múltipla-escolha, e aplicados pelas fonoaudiólogas do setor. O questionário foi elaborado procurando-se obter dados sobre as orientações pré e pós-operatória (questionário em anexo): • início e o processo da reabilitação; • maiores dificuldades encontradas na opinião destes pacientes; • nível de colaboração e nível de satisfação do paciente; • método mais efetivo; • uso funcional do método para a manutenção da comunicação Algumas perguntas foram elaboradas em forma de alternativas e foi permitido que os pacientes assinalassem mais de uma alternativa. RESULTADOS E DISCUSSÃO A partir da análise dos resultados, pôde-se constatar que 55% dos pacientes não receberam a orientação pré-operatória, considerando que 8 (40%) deles não realizaram o procedimento cirúrgico na Santa Casa Misericórdia na Disciplina de Cabeça e Pescoço, realizada pela Fonoaudiologia e Psicologia da equipe da Cirurgia de 227 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO Cabeça e Pescoço. Porém, os pacientes que afirmaram ter sido orientados, mostraram-se satisfeitos com as informações dadas, apenas um deles referiu que gostaria de ter sido melhor esclarecido quanto às mudanças anatômicas. Tem-se como objetivos no pré-operatório: • explicar a anatomia e fisiologia normal; • métodos de reabilitação existentes; • necessidade inicial de uma comunicação alternativa no pós operatório imediato através de gestos e/ou escrita; • uso da sonda nasoenteral e traqueostomia Considera-se, também, a maneira como o paciente assimila as informações, e dessa forma, o psicólogo desempenha um papel essencial ao mediar a relação paciente/fonoaudiólogo e dar suporte emocional, num momento tão emergencial e distinto para cada paciente, como é o pré-operatório. DOYLE (1994) citou que o momento de orientação pré-operatória pode oferecer a base inicial para um relacionamento de cooperação mútua entre paciente e terapeuta. LOFIEGO (1994), ANGELIS, FÚRIA E MOURÃO (1997) afirmaram que a orientação pré-operatória deva promover apoio ao paciente, criar um vínculo e fornecer as informações quanto ao antes/depois da cirurgia e as possibilidades de reabilitação. LOFIEGO (1994) referiu que no momento do pré-operatório há possibilidade do paciente conhecer outro laringectomizado total que possa esclarecer os desconfortos, as dificuldades e as vantagens da reabilitação quanto ao convívio social. ANGELIS, FÚRIA E MOURÃO (1997) afirmaram realizar uma anamnese e uma avaliação quanto a comunicação e a deglutição. Ainda nesse sentido, ao analisar os resultados quanto a orientação pós operatória, verificou-se que 75% afirmaram ter compreendido os aspectos da reabilitação da comunicação. LOFIEGO (1994) ressaltou como objetivos gerais da orientação pós-operatória a coordenação da respiração, voz e articulação. ANGELIS, FÚRIA E MOURÃO (1997) fizeram referência a realização do pós-operatório imediato, para “re-orientação” e manutenção de um bom contato com o paciente e seus familiares, retomando dados que podem necessitar de um maior esclarecimento. Fig. 1 Porcentagem da realização do pré Fig. 2 Relação das formas de comunicação e pós operatório após a cirurgia utilizadas (antes da reabilitação) 228 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA Antes de iniciar o tratamento fonoaudiológico, 65% dos laringectomizados totais afirmaram que comunicavam-se imediatamente após a cirurgia. Destes, 8% através da fala articulada, 23% através de gestos, 23% através da escrita e 46% através de gestos mais escrita (figura 2). Estes dados são condizentes com as orientações dadas no pré-operatório quanto ao estabelecimento de uma forma alternativa de comunicação em função da ausência de voz. Para a reabilitação da comunicação, 75% optaram pela aquisição da voz esofágica, 10% pela laringe eletrônica, 10% pela prótese vocal e 5% pela escrita (figura 3), sendo que a média de sessões realizadas até o momento da entrevista foi de 17 sessões. Fig. 3 Índice do método de escolha ao Fig. 4 Índice dos aspectos que os iniciar o processo de reabilitação pacientes gostariam que fossem diferentes Na data da entrevista, 75% dos pacientes referiram satisfação com o processo e o método de escolha para a reabilitação da comunicação. Entretanto, 70% demonstraram que gostariam que este fosse diferente em algum aspecto: destes, 71% referiram-se à mudanças na qualidade vocal, 21% velocidade de fala, 21% gostariam que fosse mais fácil o aprendizado e 14% gostariam que a fala fosse mais fluente (figura 4). Constatou-se também, que 90% mantiveram a opção inicial até a data da realização da entrevista; dentre os 10% que optaram por uma outra forma de comunicação, preferiram a prótese vocal pela comunicação mais imediata, e um dos pacientes optou pela prótese por insatisfação com a laringe eletrônica. Na literatura há comparação entre os métodos de reabilitação, grau de inteligibilidade e eficiência na comunicação: WILLIAMS E WATSON (1985) demonstraram que o grau de inteligibilidade foi melhor na prótese e laringe eletrônica, quando comparado com a voz esofágica. A loudness foi melhor na prótese do que na laringe eletrônica. O pitch e a qualidade vocal demonstraram-se melhores na prótese, seguida da voz esofágica e a laringe eletrônica. WANNMACHER E FIGUEIREDO (1998) observaram que os aspectos mais influentes na inteligibilidade de fala, com a laringe eletrônica, foram o manejo inadequado e a fibrose da região cervical. CLEMENTS et al (1997) concluíram que o melhor método eleito pelos pacientes foi o uso da prótese vocal, quanto à qualidade de vida, qualidade da voz e melhor inteligibilidade. 229 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO HELSINGER E SEIF (1985) num estudo sobre aquisição da voz esofágica, obtiveram como resultados que a medida que a idade cronológica avança, alguns fatores de ordem psicológica, orgânica e social dificultam a aquisição de novos conhecimentos. Os autores observaram também que o intervalo entre o aparecimento dos sintomas da doença e a busca pelo tratamento médico adequado tem relação com a motivação e, consequentemente, com o aprendizado da voz esofágica. Estes estudos tem demonstrado especificidades de cada método de reabilitação, o que torna as vantagens e desvantagens indicadores de grande valor na escolha do método adequado para cada paciente. Nesta pesquisa verificou-se uma média de 5 meses para uma comunicação funcional com a voz esofágica, e comunicação imediata nos casos de uso da prótese vocal ou laringe eletrônica. Os pacientes apontaram como maiores dificuldades: 1. aspectos da aquisição da voz esofágica (65%); 2. incômodo com o “chiado” (5%); 3. sensação de queimação (10%); 4. não tiveram dificuldades (10%); 5. não souberam especificar a dificuldade (5%). Observou-se que 80% dos pacientes relataram realizar exercícios em casa. Dos 20% que disseram não realizá-los: 75% atribuíram ao fato de não conseguirem sem o apoio da terapeuta, 25% não sentiam necessidade, 25% não acreditavam que ajudaria, 25% afirmaram que o ambiente em casa não era propício e 25% não sentiam motivação. Com relação ao uso funcional, apenas 60% afirmaram comunicar-se efetivamente através do método de escolha, embora 75% dos pacientes dissessem que estavam satisfeitos com o processo e o método de reabilitação. Além disso, constatou-se que dos pacientes que afirmaram comunicar-se através do método, apenas 65% relataram que os familiares compreendiam o que expressavam, e somente 30% relataram ser compreendidos por não familiares (figura 5). 230 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA Fig 5 Relação de ouvintes com os quais os sujeitos referiram manter a comunicarão Fig.6 Porcentagem com relação ao uso funcional do método em reabilitação Esses achados sugerem que mesmo que o paciente tenha condições de participar de situações comunicativas, ele não o faz de maneira efetiva, tendendo sempre ao isolamento do convívio social e/ou restringindo-se a família. SALMON E MOUNT (1991) realizaram um estudo cujos resultados mostraram que a experiência do atendimento em grupo viabiliza maior convivência com outras pessoas que também foram submetidas a laringectomias totais e que talvez fosse uma opção para reabilitar o paciente, fornecendo não só a forma de comunicação, mas condições para que seja funcional em seu dia-a-dia. Pôde-se verificar também a eficácia de cada método enquanto uso funcional para a situação de comunicação: laringe eletrônica 100%, prótese vocal 66,6% e voz esofágica 56,25% (Figura 6). Ainda com relação ao contexto comunicativo, 35% referiram ter alguma atividade de lazer e 15% afirmaram estar trabalhando, outros 15% referiram trabalhar e realizar atividades recreativas e 35% dos pacientes demonstraram não manter atividades sociais (figura 7). Figura 7. Índice de ocorrência de pacientes em função da realização de atividades sociais Para finalizar, 90% dos pacientes afirmaram ter adquirido melhor qualidade de vida após o início do tratamento fonoaudiológico. 231 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO CONCLUSÃO A partir deste estudo, pudemos concluir que as orientações pré-operatória e pósoperatória contribuíram para a reabilitação dos laringectomizados totais, já que 45% dos pacientes (no pré-operatório) e 75% dos pacientes (no pós-operatório) referiram satisfação e compreensão das informações dadas. A orientação pré-operatória propiciou a comunicação de 65% dos pacientes no pós-operatório imediato por meio da fala articulada, gestos e escrita. Também observamos que a maior parte dos pacientes optou pela voz esofágica como forma de comunicação oral, apesar de referirem dificuldades durante a aquisição desta. Quanto ao método de reabilitação escolhido, 60% dos pacientes referiram comunicação efetiva, sendo que a laringe eletrônica apresentou-se como o método mais eficaz em relação a prótese vocal e a voz esofágica, respectivamente. Dos pacientes entrevistados, 90% afirmaram melhora na qualidade de vida com o atendimento fonoaudiológico, mostrando a importância desse tratamento na reabilitação do laringectomizado total. Cabe ao fonoaudiólogo estar atento as possibilidades e limitações da comunicação oral de cada paciente, sendo ainda necessárias pesquisas nesta área para que observemos a eficácia da reabilitação oral dentro do contexto comunicativo, propiciando desta forma a reintegração social do paciente. Apresentado no VII Encontro de Fonoaudiologia em Cancerologia / 1999 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANGELIS,E.C., FURIA, C.L.B., MOURÃO, L.F. A Fonoaudiologia no Hospital A.C. Camargo . IN: Fonoaudiologia e Instituições, São Paulo: Lovise, 1997, p. 169-74. BARROS, M.C.P.P. Considerações sobre a atuação do profissional fonoaudiólogo na área de Cirurgia de Cabeça e Pescoço. IN: Um pouco de nós sobre voz. São Paulo: Pró-fono, 1995, p.144. COELHO, F.R.G. Epidemiologia do Câncer IN: CURSO BÁSICO EM ONCOLOGIA DO HOSPITAL A.C. CAMARGO. São Paulo, Fundação Antonio Prudente, 1996, p. 110. CLEMENTS, K.S. et al. Communication after laryngectomy. Na assessment of patient satisfaction Arch Otolaryngol Head Neck Surgery, 123 (5): 493-6, May, 1997. DOYLE, P.C. Foundations Of Voice And Speech Rehabilitation Following Laryngeal Cancer. San Diego, Singular, 1994,p. 97-114. LOFIEGO, J.L. Laringectomia: avaliação e terapia fonoaudiológica. Rio de Janeiro: Revinter, 1994, p.130-135. HELSINGER, F.M.H., SEIF, C.S. Aspectos Qualitativos da reabilitação de pacientes Laringectomizados. Rio de Janeiro, Instituto Nacional de Câncer, 1985. 232 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA SALMON, S.J. , MOUNT, K.H. Alaryngeal Speech Rehabilitation. Texas, Pró-Ed., 1991. WANNMACHER, L. FIGUEIREDO,E.S., VICENTE, L.C.C. Estudo da inteligibilidade de fala eletrolaríngea de dez sujeitos Laringectomizados Totais. IN: Laringologia e Voz Hoje/1995-1997. Rio de Janeiro: Revinter, 1998. WATSON, J.B., WILLIAMS, S.E. Differences in Speaking Proficiencies in three Laryngectomee groups. Ach Otolaryngol, 111: 216-9, 1985. 233 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO ANEXO I. Dados de Identificação: Nome:_____________________________________ Idade: _____D.N. __ /___ / __ Profissão:_________________ Escolaridade: ________________________________ II. Dados cirúrgicos: Data da laringectomia total:___ / ____/ ___ Fez Esvaziamento cervical? ( ) Sim/ tipo:______________________( ) Não Complicações ? ( ) fístula cutânea ( ) fístula traqueoesofágica ( ) cicatrização ( ) outras: _________________________________________________________ III. QUESTIONÁRIO: 1. Antes da cirurgia, o Sr(a) teve alguma reunião com a fonoaudióloga/psicóloga sobre como seria a cirurgia e o que ia mudar após a realização da mesma? ( ) sim ( ) não 2. Ficou claro que tipo de alterações haveria após a cirurgia ? ( ) sim ( ) não 3. Após a cirurgia, o Sr(a) entendeu os métodos de reabilitação de voz? ( ) sim ( ) não 4. Quando iniciou o tratamento fonoaudiológico, conseguia se comunicar ? ( ) sim ( ) não Se "sim", de que forma ? ( ) fala ( ) gestos ( ) escrita 5. Ao iniciar o processo de reabilitação, optou pelo método: ( ) voz esofágica ( ) laringe eletrônica ( ) prótese traqueoesofágica ( ) escrita 6. Após quanto tempo de terapia, você acha que já estava se comunicando bem? ( ) desde a primeira semana ( ) antes do primeiro mês ( ) após o primeiro mês ( ) após 2 meses ( ) após 3 meses ( ) após 4 meses ( ) após 6 meses ( ) mais de 1 ano 7. Qual foi sua maior dificuldade para o aprendizado do método de reabilitação escolhido? 234 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA 8. Mantêm a opção inicial até hoje ? ( ) sim ( ) não ( ( ( ( ( ( ( ( ( ) ) ) ) ) ) ) ) ) Se “não”, porque: não conseguiu aprender não teve condições orgânicas adequadas não teve tempo para treinar em casa não teve condições financeiras para manter não gostou da voz as pessoas não o compreendem condições para adquirir o material necessário para mudar acredita que a mudança possibilite melhora na comunicação outros: E optou pela mudança para: ( ) voz esofágica ( ) laringe eletrônica ( ) prótese traqueoesofágica ( ) escrita 9. Está satisfeito com o método utilizado ? ( ) sim ( ) não 10. Gostaria que fosse diferente ? () sim ( ) não Se “sim”, o que gostaria de mudar: ( ) a qualidade da voz ( ) pitch: ( ) loudness:_________________ ( ) outros: ( ) a velocidade, o ritmo e a entonação ( ) a fluência ( ) a estética ( ) a necessidade de uma coordenação de movimentos ( ) os cuidados de preservação e manutenção do equipamento ( ) a dependência dos cuidados médicos ( ) outros: 11. Realiza os exercícios sugeridos em casa? ( ) sim ( ) não Se “sim”, quantas vezes ao dia ? Se “não”, por quê ? ( ) falta de tempo disponível ( ) não consegue realizá-los sozinho ( ) não acredita que ajude ( ) o ambiente não é propício ( ) não se sente motivado ( ) outros: ________________________________________ 12. Faz uso do método para se comunicar? () sim ( ) não 13. Os familiares estão compreendendo o que é dito? () sim ( ) não 14. Todas as pessoas compreendem ? () sim ( ) não 235 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO 15. Tem atividades de lazer? ( ) sim ( ) não 16. Está trabalhando? () sim ( ) não Se “não”, por quê? ( ) não sente necessidade ( ) não se sente capaz para tal atividade ( ) não tem emprego ( ) não tem tempo ( ) sente dificuldade p/ estabelecer a comunicação suficiente ( ) outros: 17. Acredita que a reabilitação fonoaudiológica tenha acrescentado informações e colaborado para melhorar sua qualidade de vida? () sim ( ) não 236 ANÁLISE DA RELAÇÃO ENTRE OS FLUXOS DE AR PULMONAR E ESOFÁGICO NA EMISSÃO DE VOGAIS DA LÍNGUA PORTUGUESA EM INDIVÍDUOS LARINGECTOMIZADOS Soraya Abbes Clapés Margall INTRODUÇÃO Nos indivíduos acometidos por câncer de laringe, a perda do órgão como resultado de uma laringectomia total, determina o desenvolvimento de uma fonação alternativa que utiliza o esôfago, denominada voz esofágica. O fluxo de ar utilizado para a produção da voz esofágica não é o pulmonar, mas sim o ar introduzido voluntariamente do meio ambiente para o esôfago. Por sua vez, o ar pulmonar nestes indivíduos destina-se apenas à função respiratória, sendo inspirado e expirado através do traqueostoma. Um ponto de grande controvérsia na reabilitação através do desenvolvimento da voz esofágica é a relação entre os fluxos de ar pulmonar e esofágico durante a fonação, ou seja, entre a emissão esofágica e a respiração pulmonar (ROBE, MOORE, ANDREWS, HOLINGER, 1956). De um lado existem especialistas que advogam a necessidade da dissociação entre a expiração pulmonar e a emissão esofágica, para que esta alcance uma melhor qualidade, enquanto no extremo oposto, estão os que defendem a necessidade da sincronia, isto é, a simultaneidade dos dois atos. STERN (1920) foi o primeiro a sustentar a necessidade da dissociação entre o processo de emissão esofágica e a expiração pulmonar. Em seu estudo, condena a sincronia entre os dois processos, porque além da voz esofágica ficar obscurecida pelos sons de atrito do ar no traqueostoma durante a passagem do ar pulmonar, pode haver indução à tosse. 237 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO Vários outros estudos concordam com esta corrente, entre eles o de LEVIN (1940). O autor recomenda, como primeiro passo para o desenvolvimento da voz esofágica, a dissociação dos dois processos. Propõe dois procedimentos para a dissociação: – no primeiro, o indivíduo deve inspirar inflando os pulmões de ar e falar em voz esofágica sustentando esta posição; – no segundo, o indivíduo deve falar em voz esofágica somente após expirar todo o ar pulmonar pelo traqueostoma. GATEWOOD (1944) menciona claramente a dissociação dos dois processos, em que o paciente é ensinado a introduzir ar no esôfago obstruindo voluntariamente o traqueostoma com o dedo, e com a ajuda da expansão natural do tórax provocada no momento da inspiração pulmonar. HOWIE (1947) discute e recomenda a dissociação, afirmando que a turbulência de ar no orifício do traqueostoma obscurece grande parte da fala. LE HUCHE (1980) insiste que, para a aquisição da voz esofágica, o mais importante é o paciente adquirir a “independência dos sopros pulmonar e esofágico”, evidenciando a dissociação entre ambos. Apesar das veementes recomendações a favor da assincronia dos sopros, o autor aconselha o uso de proteção para o traqueostoma, a fim de que “o laringectomizado não lance no rosto do interlocutor uma corrente de ar pulmonar, quando falar”. Defendendo a corrente contrária, a que favorece a sincronia entre a respiração e a emissão esofágica, encontra-se o estudo de BURGER E KAISER (1925), que descreve um caso de sincronia entre os processos. FROESCHELS (1928) também expõe o caso de um paciente cuja expansão e contração pulmonares, através do movimento respiratório natural do tórax e do diafragma, ajudaram sensivelmente na entrada e saída do ar esofágico. MASON (1950) observa que a ação do tórax e os movimentos respiratórios para a emissão esofágica são os mesmos usados para a fala normal, pois a coordenação original produz pulsação no esôfago através da parede que possui em comum com a traquéia. MOOLENAAR-BIJL (1951) E DI CARLO, AMSTER E HERER (1955) concordam com a sincronia e descrevem que a análise de curvas expirométricas dão evidências deste fato. ROBE et al (1956) estudam 23 indivíduos laringectomizados e concluem que a sincronia entre a expiração pulmonar e a emissão esofágica estava presente em todos eles. SNIDECOR E CURRY (1960), utilizando equipamento eletropneumográfico sensitivo e fonofotográfico, descrevem a performance de seis falantes esofágicos e concluem que houve sincronia. EDELS (1983) afirma que ao invés de dissociar o modelo de sincronia da respiração pulmonar, basta suprimir a força da expiração pulmonar até que seja difícil ouvila. Há trabalhos que não apresentam dados conclusivos sobre a fidelidade total dos autores a uma das duas correntes. O ponto de acordo entre eles diz respeito ao ruído do traqueostoma durante a expiração pulmonar. Assim, MARTIN (1963) e DIEDRICH E YOUNGSTROM (1966) não estabelecem relação direta entre a respiração e a emissão esofágica, porém relatam que a fala é obscurecida pelo ruído do ar expiratório pulmonar que passa através do traqueostoma. Nosso objetivo neste trabalho foi estudar os fluxos de ar esofágico e pulmonar, em indivíduos laringectomizados, durante a emissão das vogais da língua portuguesa, através de análise fluxométrica por pneumotacógrafo. 238 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA MATERIAL E MÉTODO Foram avaliados dez indivíduos submetidos a laringectomia total, do sexo masculino, com idades variando entre 53 e 63 anos. Todos fizeram fonoterapia para desenvolvimento da voz esofágica, por um período que variou entre 4 meses a 1 ano e 6 meses, e a utilizavam como principal meio de comunicação oral. No momento do teste todos os indivíduos gozavam de bom estado de saúde, sem alterações pulmonares. Dos indivíduos foi obtido um material fonético e um material de registro de fluxos de ar pulmonar e esofágico. O material fonético constou da gravação da voz esofágica de cada um dos dez indivíduos, ao emitir uma frase foneticamente balanceada. Concomitantemente, cinco indivíduos treinados em análise de voz ouviram a fita editada e classificaram a voz esofágica de cada indivíduo de acordo com a sua qualidade relativa, em “ótima”, “boa” ou “regular”. O material de registro de fluxos de ar pulmonar e esofágico foi obtido durante o processo de emissão de voz esofágica de cada indivíduo produzindo as sete vogais orais (/a/, /e/, /i/, /o/, /u/) e as cinco vogais nasais (/ /, /e/, /i/, /õ/, /u/) do português brasileiro (MASCHERPE, 1970). Os fluxos foram registrados por dois pneumotacógrafos, cada um deles conectado a um transdutor, que por sua vez achava-se conectado a um amplificador. Os fluxos aéreos foram registrados em papel milimetrado. O primeiro pneumotacógrafo registrava o fluxo de ar esofágico exalado pela boca e pelo nariz, e captado por uma máscara adaptada à face do indivíduo, recobrindo as cavidades oral e nasal. O outro pneumotacógrafo registrava o fluxo de ar pulmonar captado por outra máscara, adaptada ao pescoço do indivíduo, recobrindo o traqueostoma. Inicialmente cada indivíduo foi solicitado a respirar normalmente, enquanto registrávamos no canal 2 (C2) seu fluxo de ar pulmonar sem qualquer emissão esofágica associada. Denominamos este primeiro procedimento de Registro Preliminar (RP). A seguir, o indivíduo emitia as 12 vogais separadamente, de acordo com a apresentação aleatória de carteias com a forma gráfica de cada vogal. A emissão de cada vogal foi sustentada durante o tempo considerado confortável pelo emissor. Durante a emissão das vogais, um pneumotacógrafo captava o fluxo esofágico e registrava-o no canal 1 (C 1) mediante traçado, enquanto o outro pneumotacógrafo captava, simultaneamente, o fluxo pulmonar e registrava-o no canal 2 (C2), também mediante traçado. Este procedimento foi denominado Registro 1 (RI). Dos traçados dos dois registros (RP - RI) extraímos características qualitativas relacionadas aos fluxos de ar pulmonar e esofágico. Os traçados dos fluxos pulmonares na presença de emissão esofágica nos permitiram observar se a curva manteve a mesma forma apresentada sem emissão, isto é, com um único pico de amplitude, ou se a mesma variou. Quando a curva revelou dois picos de amplitude, foi denominada bifásica (Gráfico 2), em contraposição à anterior, designada monofásica (Gráfico 1). A curva bifásica caracterizou-se por um primeiro pico, de amplitude menor, e um segundo pico sempre maior que o primeiro - o pico de amplitude máxima. A partir dos traçados RI C 1 e RI C2 consideramos a presença da simultaneidade ou não dos fluxos esofágico e pulmonar durante as emissões sonoras. Na presença de simultaneidade, ou seja, sincronia, avaliamos o comportamento do início da emissão 239 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO esofágica com relação aos picos de amplitude do fluxo expiratório pulmonar. Assim, dividimos a sincronia em três tipos: − Tipo 1: quando o início do fluxo esofágico coincide com o início da formação do pico de amplitude da curva monofásica (Gráfico 3); − Tipo 2: quando o início do fluxo esofágico coincide com o início da formação do pico de amplitude máxima da curva bifásica (Gráfico 4); − Tipo 3: quando o início do fluxo esofágico ocorre após o pico de amplitude da curva monofásica (Gráfico 5). Os tipos de sincronia foram analisados considerando-se as qualidades vocais. RESULTADOS E COMENTÁRIOS Dos traçados obtidos quanto às curvas do ar pulmonar expirado através do traqueostoma durante a respiração sem emissão esofágica associada (Registro Preliminar), pudemos observar que para 100% dos indivíduos as curvas foram monofásicas, com um único pico de amplitude que decai rapidamente no início, seguindo-se logo depois uma queda mais lenta (Gráfico 1). Tal curva exemplifica o padrão de expiração normal, encontrado em indivíduos sem alterações pulmonares (BOUHUYS, 1977), o que indica a manutenção do padrão respiratório normal nos indivíduos laringectomizados. Dos traçados obtidos da expiração pulmonar através do traqueostoma (Registro I - Canal 2), pudemos observar dois tipos de curva expiratória pulmonar na associação com a emissão esofágica: a curva monofásica e a curva bifásica. Em sete dos dez indivíduos laringectomizados, não houve alteração do padrão da curva expiratória pulmonar apresentada no silêncio (RP); os indivíduos mantiveram a curva monofásica na associação com a emissão esofágica (RI C2). Para os outros três indivíduos houve alteração: de curva monofásica apresentada no silêncio, para curva bifásica de expiração pulmonar (Gráfico 2), quando passou a emitir em voz esofágica. Não encontramos na literatura consultada nenhuma referência a esse tipo de curva em qualquer patologia. Sua descrição aparece, portanto, pela primeira vez neste trabalho. A curva bifásica de expiração pulmonar é caracterizada por um pequeno pico de fluxo expiratório (pico menor), logo seguido por outro pico expiratório, sempre de maior amplitude que o primeiro (pico de amplitude máxima), dentro da mesma fase expiratória. Os três indivíduos que alteraram sua curva expiratória pulmonar, obtiveram qualidade de voz esofágica ótima. Provavelmente, tais indivíduos utilizaram-se de um mecanismo que altera sua curva, de monofásica para bifásica, quando lhes é solicitada a emissão esofágica. Este evento pode ter ocorrido para facilitar o mecanismo de produção da voz esofágica, o que justificaria a qualidade vocal ótima. Da análise concomitante dos traçados RI C1 e RI C2, isto é, o fluxo esofágico exalado através das cavidades oral e nasal, e o fluxo pulmonar expirado através do traqueostoma, respectivamente, pudemos observar que todos os indivíduos apresentaram associação entre ambos, o que comprova a sincronia entre a respiração e a emissão esofágica em 100% dos indivíduos (gráficos 3, 4 e 5), defendida por vários autores (BURGER E KAISER, 1925; FROESCHELS, 1928; STETSON, 1937; MASON, 1950; MOOLENAARBIJL, 1951; BATEMAN, 1953; Dl CARLO et al, 1955; ROBE et al., 1956; SNIDECOR E CURRY, 1960; EDELS, 1983). Se considerarmos que o indivíduo passou várias décadas usando o ar expiratório pulmonar para a fala, será compreensível a dificuldade da tentativa de dissociar 240 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA esse mecanismo, impedindo que o ar saia através do traqueostoma enquanto se fala usando a voz esofágica. É provável que o mecanismo da fala com o ar expiratório esteja fixado neurologicamente através de engrama. Desta sincronia entre emissão esofágica e expiração pulmonar podemos observar a presença de três tipos de resposta básica, conforme a relação temporal entre os dois eventos estudados, isto é, entre a exalação esofágica e a expiração pulmonar. Cada indivíduo manteve o seu tipo de resposta durante todas as emissões do teste, comprovando a constância intrafalante. Na resposta de tipo 1 (Gráfico 3), observamos que o início da exalação esofágica foi concomitante com o início da expiração pulmonar, sendo a curva expiratória pulmonar monofásica. Apresentou este tipo de resposta, um grupo de três indivíduos, todos com qualidade vocal ótima. Na resposta de tipo 2 (Gráfico 4), observamos uma curva expiratória pulmonar bifásica, e o início da exalação esofágica ocorrendo sempre concomitantemente com o início do segundo pico da curva bifásica, pico de amplitude máxima. Outro grupo de três indivíduos apresentou essa resposta; novamente os três eram categorizados com qualidade vocal ótima. Na resposta de tipo 3 (Gráfico 5), o início da exalação esofágica deu-se sempre após o pico de amplitude do fluxo expiratório pulmonar, com curva expiratória pulmonar monofásica. Os quatro indivíduos restantes apresentaram esta resposta, dos quais dois com qualidade vocal boa e dois com regular. A partir dos dados descritos, levantamos a hipótese da possibilidade de dois ajustes motores diferentes na emissão esofágica: a sincronia total e a sincronia parcial. A sincronia total seria representada pelas respostas de tipo 1 e 2, uma vez que, em ambas, o início da exalação esofágica coincide com o início do pico de maior amplitude do fluxo expiratório pulmonar. Convém ressaltar que todos os indivíduos deste grupo apresentaram qualidade vocal ótima. A sincronia parcial seria representada pela resposta de tipo 3, uma vez que o início da exalação esofágica ocorre somente após o pico de amplitude do fluxo expiratório pulmonar, ou seja, em atraso. Dos indivíduos que apresentaram este tipo de sincronia parcial, nenhum pertencia ao grupo de qualidade vocal ótima, e sim aos grupos de boa e regular. Estas relações de sincronia total e parcial sugerem que melhor será a qualidade vocal esofágica, quanto mais efetiva for a sincronia entre respiração e emissão. É importante lembrar que todos os indivíduos apresentaram curva monofásica quando da expiração sem emissão. Portanto, o aparecimento de curva bifásica em três indivíduos indica a necessidade de um novo ajuste motor como facilitador da emissão esofágica. É viável supor que a curva bifásica reflete uma tentativa de refrear a expiração pulmonar com o objetivo de torná-la simultânea à exalação esofágica, a fim de melhorar o resultado acústico obtido, isto é, a qualidade vocal. Em nenhuma ocasião a emissão esofágica iniciou-se antes do pico de amplitude máxima do fluxo expiratório pulmonar, o que acrescenta mais um dado a favor da sincronia entre respiração e emissão esofágica, indicando que a emissão esofágica na ausência da expiração pulmonar não é um procedimento natural. SAMUEL & ADAMS (1976) relatam que o diafragma e presumivelmente a parede torácica são responsáveis pelo carregamento de ar do esôfago, mantendo a coluna de ar sob pressão e em contato com o esfíncter faringo-esofágico; a dilatação esofágica ocorre muito rapidamente para ser devida à ação peristáltica, sendo provavelmente o resultado da queda na pressão intratorácica quando o diagrama desce. Em conclusão, 241 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO bons falantes esofágicos apresentam movimentos de esôfago e diafragma coordenados, enquanto que falantes pobres apresentam movimentos diafragmáticos reduzidos ou descoordenados aos do esôfago. SALMON (1979) também ressalta a importância da movimentação diafragmática num estudo que aponta um acentuado incremento na pressão interna do esôfago quando de uma inspiração pulmonar, passando do valor de repouso em torno de -4 a -7 mmHg para -20 mmHg. Nossos achados induzem a supor que esta coordenação entre movimentação diafragmática e esofágica tenha ocorrido de forma mais efetiva em nossos melhores falantes, o que reforça a sincronia dos fluxos. CONCLUSÕES 1- Foi de 100% a sincronia entre expiração pulmonar e exalação esofágica na emissão das vogais pelos indivíduos laringectomizados. 2- Durante a emissão esofágica, 30% dos indivíduos laringectomizados alteraram a curva expiratória pulmonar, de monofásica para bifásica, todos portadores de qualidade vocal esofágica ótima. 3- Houve constância intrafalante quanto ao tipo de sincronia entre a expiração pulmonar e a exalação esofágica. 4- O início da exalação esofágica coincidiu com o pico da expiração pulmonar, em falantes com qualidade vocal esofágica ótima. 5- Falantes com qualidade vocal esofágica boa e regular apresentaram atraso no início da exalação esofágica, em relação ao pico da expiração pulmonar. * Apresentado no II Encontro de Fonoaudiologia em Cancerologia/1994 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BOUHUYS, A. The physiology of breathing. New York, Grune & Stratton, 1997, p.173-232 BURGER, H.; KAISER, L. Speech without a larynx. Acta Otolaryngol., 8:90-7, 1925. 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Gráfico 5 : Resposta de sincronia Tipo 3: início da exalação esofágica após o pico da amplitude do fluxo expiratório pulmonar (curva expiratória pulmonar monofásica). FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA 245 LARINGECTOMIA PARCIAL SUPRACRICOÍDEA: AVALIAÇÃO PERCEPTIVA AUDITIVA E ACÚSTICA DA VOZ Luciana P. Vale Teresa C.R.D.M. Amaral José F. Góis Filho Erica E. Fukuyama Paulo J. Valentim Manoel J.R. Valle Neto Luiz H.F. Barbosa Hugo V.L. Ramos Luciano R. Neves Flávio A.P. Settani Almir A. Feitosa INTRODUÇÃO Em 1959, MAYER E RIEDER descreveram a laringectomia parcial supracricoídea pela primeira vez. Em seguida LABAYLE E BISMUTH (1972), PIQUET et al. (1974 e 1986), GUERRIER et al. (1987) e LACCOURREYE et al. (1990) também estudaram esta técnica. As indicações cirúrgicas incluem carcinomas supraglótico e glótico (T1 e T2), casos selecionados de T3 e T4 e alguns casos de seio piriforme (LACCOURREYE et al., 1995), podendo ser a laringectomia parcial supracricoídea considerada um tratamento alternativo para carcinomas laríngeos selecionados, além da radioterapia, laringectomia total, laringectomia “near-total” e laringectomia supraglótica (NAUDO et al., 1998). 246 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA Na laringectomia parcial supracricoídea mantém-se a cartilagem cricoídea, o osso hióide e ao menos uma cartilagem aritenóide a fim de preservar as funções laríngeas (respiração, deglutição e fonação). As pregas vocais e a cartilagem tireóide são totalmente removidas e o espaço pré-epiglótico é quase todo ressecado. A manutenção da cartilagem cricoídea permite a retirada da traqueostomia, e a preservação de pelo menos uma aritenóide possibilita melhores condições para a produção da voz e da função esfincteriana da laringe durante a deglutição (PIQUET et al., 1986; GUERRIER et al., 1987; LACCOURREYE et al., 1990a; LACCOURREYE et al., 1990b; BUCHMAN et al., 1995; LACCOURREYE et al., 1995d; LACCOURREYE et al., 1995e) Há duas formas de fechamento da laringe após a laringectomia parcial supracricoídea: cricohioidopexia e cricohioidoepiglotopexia. Na primeira, o fechamento é realizado entre a cartilagem cricoídea e o osso hióideo . Na segunda, utiliza-se, além dessas estruturas, a cartilagem epiglote. No período pós-operatório, a traqueostomia deve ser retirada o quanto antes pois esta reduz a elevação laríngea durante a deglutição e perturba a sensibilidade dos receptores mecânicos laríngeos. A retirada permite uma rápida mobilização das cartilagens aritenoídeas, preservando o reflexo de tosse e prevenindo infecção pulmonar (NAUDO et al., 1998). A sonda nasoenteral deve ser mantida até o paciente ser capaz de deglutir sem apresentar engasgos, tosse ou outros sinais de penetração ou aspiração laríngea, verificados através de avaliações específicas. Os pacientes submetidos a esta cirurgia comunicam-se através de voz laríngea, não necessitam de traqueostoma definitivo e, por vezes, apresentam dificuldades de deglutição no período pós-operatório imediato, sendo reabilitados frequentemente com sucesso. A voz após este tipo de cirurgia têm sido estudadas por LACCOURREYE et al. (1995d, e), GÖIS et al. (1998) e NASCIMENTO (1999). Apesar dos pacientes apresentarem qualidade vocal, pitch, loudness e vários parâmetros acústicos alterados em relação aos indivíduos normais, são capazes de manter uma comunicação satisfatória e inteligível. O objetivo deste estudo foi realizar a avaliação perceptiva auditiva e acústica da voz de 8 pacientes submetidos à laringectomia parcial supracricoídea. MATERIAL E MÉTODO De junho de 1997 a abril de 1999, dezesseis pacientes foram submetidos a laringectomia parcial supracricoídea, no Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Instituto do Câncer “Arnaldo Vieira de Carvalho”. Destes pacientes, foram estudados 8 homens com idade entre 47 e 73 anos (média de 62,5 anos) portadores de carcinoma espinocelular da laringe. De acordo com a classificação clínica da UICC e da AJCC, 1 paciente era TiaN0M0, 1 era T1bN0M0, 4 eram T2N0M0 e 2 eram T4N0M0. O paciente com a classificação T1aN0M0 foi sub 247 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO metido inicialmente à radioterapia e posteriormente à laringectomia parcial supracricoídea como cirurgia de resgate. Os 2 pacientes estadiados como T4N0M0 foram classificados como T4 devido à invasão da cartilagem tireoídea, sendo submetidos a esvaziamento cervical seletivo bilateral. A reconstrução laríngea realizada foi cricohioidopexia em três pacientes e cricohioidoepiglotopexia em cinco (TABELA 1). TABELA 1: Pacientes submetidos à laringectomia parcial supracricóidea, segundo idade, sítio primário, estadiamento e tipo de cirurgia: Nome Idade JR AEF FPN LAM PER DV OVG AGP 62 73 65 47 56 65 60 72 Sítio Primário PVD PVD, CA, PVE PVD, CA, PVE PVD PVD, CA, PVE PVD, CA, PVE PVD PVE, CA TNM Cirurgia T2N0M0 T4N0M0 T4N0M0 T2N0M0 T1bN0M0 T2N0M0 T2N0M0 T1aN0M0 RDP PRÉ CHEP CHP CHEP CHEP CHEP CHP CHP CHEP (Cururgia de resgate) Legenda: PVD – prega vocal direita T – tumor CHP – cricohioidopexia PVE – prega vocal esquerda N – nódulos CHEP – cricohioideopiglotopexia CA – comissura anterior M – metástase Duas fonoaudiólogas realizaram a análise perceptiva auditiva quanto ao tipo de qualidade vocal (rouca, soprosa, áspera, tensa, diplofônica), ressonância vocal (normal, laringo-faríngica ou laríngea), pitch (agudo, grave ou normal) e a loudness (forte, fraca e normal). Para análise acústica da voz utilizou-se o programa “Multi Dimensional Voice Program (MDVP)” da Kay Elemetrics. Os pacientes foram colocados em pé, com os braços estendidos ao longo do corpo, microfone à 15 cm da boca e foram instruídos a emitirem as vogais sustentadas /a, i, u/. Destas, foram selecionados trechos de aproximadamente 3 segundos para a extração dos parâmetros de frequência fundamental (f0), jitter (quociente de perturbação do pitch ou PPQ ), shimmer (quociente de perturbação da amplitude ou APQ) e proporção ruído-harmônico (NHR). Para a análise, foram obtidas médias de cada um destes parâmetros para cada vogal analisada. RESULTADOS Na avaliação perceptiva auditiva, as qualidades vocais mais encontradas foram a rouca e a tensa, porém encontrou-se, para alguns pacientes, componentes de diplofonia, aspereza e soprosidade. A ressonância foi laringo-faríngica em todos os casos, o pitch foi agudo e a loudness foi fraca em 6 dos 8 pacientes (TABELA 2). 248 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA TABELA 2: Resultados da avaliação perceptiva auditiva da voz, segundo os parâmetros de qualidade vocal (Q.V.), ressonância, pitch e loudness. Nome JR AEF FPN OVG LAM PER DV AGP Legenda: Q. V Ressonân. Pitch R-T-D Lar-faríng. Nomal R-T Lar-faríng. Agudo T-R-Á Lar-faríng. Agudo R-S Lar-faríng. Grave R-T Lar-faríng. Agudo R-S Lar-faríng. Agudo T Lar-faríng. Agudo T-R Lar-faríng. Agudo R – rouca T – tensa D – diplofônica A – áspera S – soprosa Lar-faring – laringo-faríngica Loudness Forte Normal Fraco Fraco Fraco Fraco Fraco Fraco Na avaliação acústica, a frequência fundamental média encontrada para as vogais /a, i, u/ foi 203,2 Hz; 209,5 Hz e 258,0 Hz, respectivamente, valores estes acima do limite superior esperado para o sexo masculino (80 a 150Hz). Os valores de jitter (PPQ), shimmer (APQ) e proporção ruído-harmônico (NHR) mostraram-se acima dos valores de normalidade estipulados pelo programa MDVP. O APQ foi o parâmetro mais alterado para todas as vogais (TABELA 3). TABELA 3: Resultados da avaliação acústica da voz de pacientes submetidos à laringectomia parcial supracricóidea, segundo os parâmetros de frequência fundamental (Fo), jitter (PPQ) , shimmer (APQ) e proporção ruído-harmônico (NHR): Fo(Hz) PPQ (%) APQ(%) NHR Vogal /a/ 203,25 4,10% 10,72% 0,52 Vogal /i/ 209,5 4,19% 8,76% 0,36 Vogal /u/ 258 3,36% 9,56% 0,38 NORMAL 80-150Hz 0,84% 3,07% 0,19 DISCUSSÃO A laringectomia parcial supracricoídea possibilita a realização de uma cirurgia conservadora para o carcinoma avançado laringeo que necessita de uma laringectomia total ou “near-total”, e também um procedimento que permite maior controle local que não se consegue com a laringectomia parcial vertical ou radioterapia para carcinoma de laringe estádio II (PIQUET et al., 1986; GUERRIER et al., 1987; LACCOURREYE et al., 1990; LACCOURREYE et al., 1990a,b) 249 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO A qualidade vocal rouca era esperada pois, as estruturas mais importantes para a produção harmônica da voz - pregas vocais – são retiradas na laringectomia parcial supracricoídea. Já a qualidade vocal tensa foi encontrada pois a maior parte dos pacientes apresentavam dificuldades de vibração dos tecidos laríngeos remanescentes. Isto gerou esforço fonatório excessivo de trato vocal (veias túrgidas à fonação, aumento de massa cervical) para que a voz pudesse ser produzida, o que também justifica a ressonância laringofaríngica e o pitch agudo. Em seus trabalhos, BUCHMAN et al. (1995); LACCOURREYE et al. (1995d,e) encontraram frequência fundamental (f0) em torno de 137Hz (LACCOURREYE et ai.,1995e) e 150Hz (LACCOURREYE et al.,1995d), valores estes dentro dos limites esperados para pessoas normais. No entanto, estes autores comentam que a variabilidade da f0 foi muito grande (de 71 a 362Hz (LACCOURREYE et al.,1995e) e 83 a 353Hz (LACCOURREYE et al., 1995d). Ainda LACCOURREYE et al., constataram que seus pacientes reconstruídos com cricohioidoepiglotopexia apresentavam valores de f0 aumentados em relação aos reconstruídos com cricohioidopexia. Em nossos estudos, os dados de f0 obtidos foram maiores do que aqueles apresentados por LACCOURREYE et al.(1995e,d). Acreditamos que isso tenha ocorrido pois todos os nossos pacientes apresentavam rigidez dos tecidos remanescentes da laringe com consequente dificuldade de vibração destes, o que gerou grande tensão fonatória. Além disso, nenhum dos nossos pacientes haviam sido submetidos à terapia fonoaudiológica pósoperatória para reabilitação da voz, onde o objetivo seria aumentar a vibração dos tecidos laríngeos e diminuir o esforço fonatório.Os valores de jitter e shimmer são indicadores da estabilidade vibratória das pregas vocais durante a fonação, no que se refere à sustentação da frequência fundamental e da intensidade (HORII, 1980). Os valores aumentados de jitter (PPQ) e shimmer (APQ) encontrados neste trabalho sugerem grande aperiodicidade na produção vocal em decorrência da mudança na fisiologia fonatória. Já a proporção ruídoharmônico (NHR) alterada sugere maior quantidade de componentes de ruído do que de harmônicos na voz. Como afirmou LACCOURREYE et al.(1995d), na laringectomia parcial supracricoídea há a ressecção do espaço paraglótico e da musculatura intrínseca da laringe. A mucosa sobre a aritenóide remanescente não está mais estendida sobre uma musculatura adaptada como na glote normal, o que poderia causar a instabilidade do padrão vibratório e um incompleto fechamento da neoglote. CONCLUSÃO Após a análise dos resultados da avaliação perceptiva auditiva e acústica da voz de 8 pacientes submetidos à laringectomia parcial supracricoídea, concluímos: − rouquidão e tensão foram os tipos de qualidade vocal mais encontradas; − todos os pacientes apresentaram ressonância laringo-faríngica; − o pitch e a loudness encontrados para a maior parte dos pacientes foram agudo e fraca, respectivamente; − a frequência fundamental mostrou valores aumentados; − os parâmetros de jitter (PPQ), shimmer (APQ) e proporção ruído-har mô nico (NHR) mostraram valores alterados para todos os pacientes. * Apresentado no VII Encontro de Fonoaudiologia em Cancerologia 250 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BUCHMAN, L.C., LACCOURREYE, O., WEINSTEIN, G., GARCIA, D., JOUFFRE, V., BRASNU, D. Evolution of speech and voice following supracricoid partial laryngectomy. J Laryngol Otol, 109: 410-3, 1995. 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As paralisias faciais podem ter origem central ou periférica. Nas de origem periférica, ocorre lesão do neurônio motor inferior (em alguma parte do trajeto do nervo, a partir da saída do nervo do sulco bulbo pontino) homolateral à paralisia, acometendo toda uma hemiface, ou apenas os músculos inervados pelo ramo acometido. Nas paralisias de origem central ocorre lesão do neurônio motor superior (supranuclear) contralateral ao lado paralisado, atingindo os músculos do quadrante inferior da face. Pode aparecer contração involuntária da musculatura mímica como manifestação emocional (MACHADO, 1993). As causas das paralisias faciais podem ser: traumática, congênita (síndrome de Moëbius), infecciosa (otite média aguda, otite média crônica, AIDS, sífilis), metabólica (diabetes), gestacional (edema generalizado na mulher, que pode acometer o nervo 253 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO facial), neoplásica (tumores encefálicos ou tumores localizados em qualquer local do trajeto do nervo), idiopática (paralisia de Bell – incidência de 20 a 40% dos casos) e hemorrágica (hemorragia cerebral). Dentre as causas neoplásicas, o local de acometimento mais comum do nervo facial é a glândula parótida. Dependendo da extensão do tumor nesta glândula, haverá compressão ou invasão do nervo, causando paralisia ou paresia facial antes mesmo da cirurgia de exérese do tumor. Na maioria dos casos, esta consequência também ocorre no pós-operatório, devido à manipulação ou ressecção do nervo durante a cirurgia. Nos casos de abcessos cervicais e nas cirurgias buco-maxilo-faciais, geralmente ocorre lesão de um dos ramos do nervo facial, mais comumente, do ramo bucal ou do marginal da mandíbula. Vários procedimentos terapêuticos têm sido propostos como coadjuvantes ao tratamento médico, tais como estimulação elétrica, estimulação galvânica, ultra-som, biofeedback, massagem e terapia miofuncional (GUEDES, 1994; GOFFI-GOMEZ, 1999). O atendimento fonoaudiológico nas paralisias faciais tem como objetivo avaliar o prejuízo causado na musculatura facial e nas funções relacionadas à ela e intervir com processos terapêuticos para minimizar ou sanar estes prejuízos (GUEDES, 1994). A intervenção fonoaudiológica dependerá da fase de evolução da doença. A fase flácida é caracterizada pela flacidez da musculatura facial em repouso e pela ausência ou diminuição da movimentação da hemiface paralisada. Por isso, ocorre uma assimetria, havendo um desvio da musculatura para o lado sadio. Esta é a fase inicial da paralisia, quando são realizados exercícios isométricos, acompanhados por massagens indutoras no sentido do movimento (GOFFI-GOMEZ,1999). A estimulação térmica é indicada para auxiliar na recuperação da função. É importante verificar se há algum prejuízo nas fases preparatória e oral da deglutição, devido a uma possível incompetência labial ou a uma hipofunção do músculo bucinador. Neste caso, devem ser fornecidas orientações para sanar este déficit. A fase sequela ocorre após a regeneração das fibras do nervo e caracteriza-se por uma alteração que permanece após o 3o mês de instalação da paralisia/paresia facial podendose observar a ocorrência de sincinesias, contraturas e diminuição da amplitude do movimento. Nesta fase, são realizados exercícios isotônicos para melhorar a mobilidade dos músculos e, caso presentes, as sincinesias podem ser trabalhadas através de exercícios de dissociação de movimentos. O prognóstico da terapia depende do tipo da lesão, tempo entre a lesão do nervo e o início do tratamento, presença ou não de atrofia e empenho do paciente na realização dos exercícios (CHEVALIER, 1987; GOFFI-GOMEZ, 1999). Assim, o objetivo desta pesquisa foi verificar a eficácia da terapia fonoaudiológica no tratamento das paralisias ou paresias faciais periféricas, no que diz respeito à simetria, ao tônus e à mobilidade dos músculos da mímica facial. CASUÍSTICA E MÉTODO Participaram deste estudo 18 pacientes, 9 do sexo feminino e 9 do masculino, na faixa etária de 21 a 65 anos. Destes pacientes, 6 foram submetidos a parotidectomia total, 8 a parotidectomia superficial, 1 a parotidectomia radical, 1 teve abcesso e 2 apresentaram paralisia de Bell. Como consequência da cirurgia, exceto os que apresentaram paralisia de Bell, 11 sofreram manipulação do nervo facial e 5 ressecção do nervo. Foi realizado um estudo retrospectivo, por meio da análise de prontuários de pacientes da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo atendidos no período de 1995 a 1999. Realizamos uma análise comparativa da musculatura e simetria facial 254 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA em repouso e da mobilidade dos músculos da mímica na 1a avaliação e no último atendimento. Para executar a avaliação, foi adaptada a escala proposta por CHEVALIER (1987), que é dividida em 4 graus, onde “0” equivale a contração não visível; “1”, a pequena movimentação de pele; “2”, a percepção leve das rugas; “3”, a aumento das rugas e de sua profundidade e “4”, a movimentação sincrônica e simétrica. Dos pacientes que sofreram a ressecção do nervo, 2 permanecem em tratamento e 3 abandonaram após uma média de 5 sessões. Dos pacientes que tiveram apenas a manipulação do nervo, 1 permanece em atendimento, 3 abandonaram após uma média de 3 sessões e 7 receberam alta fonoaudiológica após uma média de 7 sessões. Os dois pacientes que apresentavam paralisia de Bell continuam em terapia fonoaudiológica. Os procedimentos terapêuticos utilizados na fase flácida foram: estimulação térmica e exercícios isométricos acompanhados por massagens indutoras. Na fase sequela foram realizados exercícios isotônicos e exercícios para controlar as sincinesias, quando presentes. Os pacientes foram atendidos em sessões de fonoterapia semanais. RESULTADOS Serão apresentados abaixo os resultados obtidos após a fonoterapia realizada com os pacientes portadores de paresia ou paralisia facial periférica. LEGENDA F– CS – OO – EAN – B– Z– R– DLI – OL – TB – P– mm. occiptofrontal mm. corrugador do supercílio mm. orbicular dos olhos mm. elevador da asa do nariz mm. bucinador mm. zigomático mm. risório mm. depressor do lábio inferior mm. orbicular dos lábios mm. triangular da boca mm. Platisma O GRÁFICO 1 mostra os dados de melhora e de manutenção da mobilidade da musculatura referentes aos pacientes que sofreram a ressecção do nervo facial. GRÁFICO 1 – Resultados de melhora e manutenção da mobilidade da musculatura de pacientes com ressecção do nervo facial 255 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO O GRÁFICO 2 representa os resultados obtidos com os pacientes que tiveram paralisia de Bell. GRÁFICO 2 – Resultado de melhora e manutenção da muscuclatura de pacientes com Paralisia de Bell O GRÁFICO 3 apresenta os resultados da fonoterapia em pacientes que sofreram apenas a manipulação do nervo facial. GRÁFICO 3 – Resultados de melhora e manutenção da musculatura de pacientes com manipulação do nervo facial O GRÁFICO 4 representa os dados de normalização de alguns músculos da face em pacientes que tiveram a manipulação do nervo facial. GRÁFICO 4 – Resultados de melhora e de normalização da musculatura em pacientes com manipulação no nervo facial 256 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA COMENTÁRIOS O GRÁFICO l refere-se aos pacientes que tiveram ressecção do VII par craniano (N=5). Pudemos observar que, de 5 pacientes, 2 tiveram melhora do tônus dos músculos frontal e orbicular dos lábios. Houve melhora do tônus dos músculos corrugador do supercílio, elevador da asa do nariz, risório, triangular da boca, platisma e depressor do lábio inferior em 3 pacientes e a permanência da alteração em 2 pacientes. Com relação à mobilidade dos músculos orbicular dos olhos e zigomáticos, 4 pacientes apresentaram melhora e 1 manteve o quadro inalterado. De 5 pacientes, 2 apresentaram melhora do tônus do músculo bucinador, 2 não apresentaram melhora do quadro e 1 apresentou dados incompletos no prontuário. De acordo com SEGAL et al. (1995) a reabilitação neuromuscular promove melhoras na musculatura facial dos pacientes, não importando se a paralisia é ou não crônica. Em nosso estudo observamos que os músculos orbicular dos olhos e zigomáticos foram os que apresentaram melhor resposta à terapia miofuncional, mesmo nos casos em que a sequela parecia irreversível, como nas paralisias faciais periféricas com ressecção do nervo. SHIAU et al (1995) descreveram um estudo que demonstra o efeito a longo prazo da reabilitação neuromuscular na paralisia facial. Os autores observaram uma melhora evidente durante o tratamento, entretanto a função facial tende a piorar com o passar do tempo, após o término da terapia. Portanto, preconizam sessões de manutenção periódica. Na presente pesquisa, houve o registro de um paciente que sofreu ressecção do nervo e que após ter se submetido a um período de terapia, abandonou-a. Após 2 anos retornou ao Setor de Fonoaudiologia, pois percebeu uma piora do quadro e ao serem retomados os exercícios, houve melhora da simetria e tônus facial. Esse dado reforça a importância de um acompanhamento periódico de 3 a 6 meses (SHIAU et al, 1995) Nos dois casos de paralisia de Bell (GRÁFICO 2) houve melhora da mobilidade dos músculos frontal, orbicular dos olhos, zigomáticos, triangular da boca, platisma e depressor do lábio inferior, somente em 1 paciente. Com relação aos músculos corrugador do supercílio, elevador da asa do nariz, bucinador, orbicular dos lábios e risório, houve melhora da mobilidade nos dois pacientes. Nestes casos, foi possível observar uma melhora geral da musculatura, entretanto, não houve uma normalização da sua função. PEITERSON (1994) relata um estudo com 1701 pacientes com paralisia de Bell, cujo resultado mostra um alto índice de melhora com normalização da mobilidade da musculatura - 85% dos pacientes recuperaram a função normal em 3 semanas e 15%, entre 3 e 5 meses. Apenas 12% de sua amostra apresentou sequelas insignificantes e 18% a permanência da paralisia. Devido ao pequeno número de casos de paralisia de Bell avaliados em nosso estudo, não foi possível considerar as conclusões como definitivas. No GRÁFICO 3 estão descritos os resultados obtidos com os pacientes que tiveram manipulação do nervo (N=11). Com fonoterapia foi observada melhora da mobilidade do músculo elevador da asa do nariz em 81,8% (N=9) dos pacientes; dos músculos frontal, orbicular dos olhos, orbicular dos lábios e zigomáticos em 72,7% (N=8) dos pacientes; dos músculos corrugador do supercílio e risório em 63,6% (N=7) dos pacientes e do músculo bucinador em 45,5% (N=5) dos pacientes. Foram encontrados dados incompletos sobre a melhora dos músculos triangular da boca e platisma em 72,7% dos prontuários e do músculo depressor do lábio inferior em 63,6% dos prontuários. Este estudo retrospectivo foi baseado na análise dos prontuários dos pacientes com paralisia facial atendidos a partir de 1995 e, no início do atendimento, ainda não 257 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO havia um protocolo de avaliação e evolução terapêutica, o que pode justificar a ausência de dados relacionados a estes músculos. Muitos pacientes que sofreram a manipulação do nervo, chegaram a ter a movimentação normalizada de alguns músculos: orbicular do olho, risório, zigomáticos em 45,5% (N=5) dos pacientes; orbicular dos lábios em 36,4% (n=4) dos pacientes; elevador da asa do nariz e bucinador em 27,3% (N=3) dos pacientes e frontal e corrugador do supercílio em 9,1% (N=l) dos pacientes, como mostra o GRÁFICO 4. PARK E WATKINS (1949) obtiveram dados de melhora na mobilidade dos músculos faciais dos seus pacientes nos 3 a 4 primeiros meses de reabilitação. Esses dados são semelhantes aos encontrados neste trabalho, uma vez que a média de terapia foi de 2 meses para a alta fonoaudiológica dos pacientes com manipulação do nervo. Vale ressaltar que encontramos um índice significativo de abandono da terapia. Dos 18 pacientes, 6 abandonaram o tratamento: 3 pacientes com manipulação e 3 com ressecção do nervo, com uma média de permanência em terapia de 3 e 5 semanas, respectivamente. Pode-se inferir que esses achados estão relacionados à falta de perseverança dos pacientes durante o tratamento, à recuperação espontânea da função muscular e dificuldade de locomoção devido a questão econômica. GUEDES (1994) também referiu o abandono dos pacientes durante o tratamento fonoaudiológico, devido à dificuldade de locomoção ou dependência de terceiros, procedência de outros estados, presença de outras doenças associadas, não credibilidade na reabilitação e outros. Durante a realização desta pesquisa, um paciente com ressecção do nervo facial realizou fonoterapia por 3 meses obtendo melhora da simetria facial em repouso e do tônus muscular. Apesar destes resultados, houve o encaminhamento médico para eletroestimulação, observando-se uma piora da simetria facial, hiperemia e edema da hemiface alterada. Na literatura foram encontrados alguns autores que obtiveram resultados satisfatórios com o uso da eletroestimulação (FOMBEURS, BERGERAS E CHEVALEIR, 1978; JONGKEES, 1984). Em contrapartida, BARAT (1984) e GUEDES (1994) encontraram musculatura com tônus aumentado, diminuição da mobilidade e presença de sincinesias em alguns casos. CONCLUSÕES 1. Todos os pacientes foram beneficiados da terapia fonoaudiológica; 2. Foi observado melhora da simetria facial e da manutenção do tônus muscular nos casos de ressecção do nervo facial; 3. Houve uma melhora geral da mobilidade da musculatura facial nos casos de paralisia de Bell; 4. Houve melhora com normalização da mobilidade dos músculos risório, zigomáticos e orbicular do olho (45,5%), orbicular dos lábios (36,4%), elevador da asa do nariz e bucinador (27,3%), frontal e corrugador do supercílio (9,1%) nos casos de manipulação do nervo; 5. Os músculos orbicular dos olhos e o zigomáticos maior e menor foram os que mais obtiveram resultados com a fonoterapia em todos os pacientes estudados. * Apresentado no VII Encontro de Fonoaudiologia em Cancerologia / 1999 258 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BARAT, M. Principles of rehabilitation in facial paralysis. IN: Facial Nerve – Proceedings of the fifth Internacional Symposium on the Facial Nerve.. v.1, Bordeaux. S.L. M. Portmann, Masson, 1984, p. 66-7. CHEVALIER, A.M. Avaliação da função motora da Face nas lesões periféricas e centrais IN:. LACOTE, M.; CHEVALIER, A.M.; MIRANDA, A.; BLETON, J.P. STEVENIN,P. São Paulo, Monole, 1987, p.13-85. FOMBEURS, J.P.; BERGERAS, D. E CHEVALEIR, A.M. Notre experiénce de la kinesitherapie et de la rééducation des paralysies faciales périphériques. Ann Chir Plast, 4: 237-40, 1978. GOFFI-GOMEZ, M.V.S. A contribuição do trabalho fonoaudiológico na paralisia facial no câncer de cabeça e pescoço. In: KOWALSKI, L.P.; DIBI, L.L.; IKEDA, M.K. E DDLE, C. Prevenção, diagnóstico e tratamento do câncer bucal. São Paulo, Frôntis, 1999, p. 523-8. GUEDES, Z. C. A atuação do fonoaudiólogo na equipe multidisciplinar de atendimento ao portador de paralisia facial periférica. Tese de Doutorado. Curso de Pós-Graduação em Distúrbios da Comunicação Humana: Campo Fonoaudiológico da Escola Paulista de Medicina, São Paulo, 1994. JONGKEES, L.B.W. Medical and physical treatment of facial paralysis. IN: Facial Nerve – Proceedings of the fifth Internacional Symposium on the Facial Nerve.. 1, Bordeaux. S.L. M. Portmann, Masson, 1984, p. 66-7. LUCENA, A.C.T. Fisioterapia na paralisia facial periférica. São Paulo, Lovise, 1993, 96p. MACHADO, A. Neuroanatomia Funcional. São Paulo, Atheneu, 1993. PARK. H.P. E WATKINS, A.L. Facial paralysis analysis of 500 cases. Arch Phys Med, 30: 749-62, 1949. PEITERSEN, E. Natural history of Bell’s palsy. IN: STENNERT, E.R. The Facial Nerve. European Archives of otorhinolaryngology, SUPPL, p.547. SEGAL, B.; ZOMPA, I.; DANYS, I.; BLACK, M.; SHAPIRO, M.; MELMED, C.; ARTHURS, B. Symmetry and synkinesis during rehabilitation of unilateral facial paralysis. J Otolaryngol, 24 (3): 143-8, 1995. SEGAL, B.; HUNTER, T.; DANYS, I.; FREEDMAN, C.; BLACK, M. Minimizing synkinesis during rehabilitation of the paralyzed face: Preliminary assessment of a new small – movement therapy. J Otolaryngol, 24 (3): 149-53, 1995. SHIAU, J.; SEGAL, B.; DANYS, I.; FREEDMAN, C.; SCOTT, S. Long-term effects of neuromuscular rehabilitation of chronic facial paralysis. J Otolaryngol, 24 (4): 21720, 1985. 259 MONITORIZAÇÃO AUDITIVA NA OTOTOXICIDADE Andréa Dishtchekenian Maria Cecília Martinelli lorio Antonio Sérgio Petrilli Marisa Frasson de Azevedo INTRODUÇÃO A deficiência auditiva tem sido considerada uma doença severamente incapacitante, em virtude do papel da audição na comunicação humana. Esta pode ser congênita ou adquirida, e apresentar graus e tipos variáveis. Uma das causas da deficiência auditiva adquirida é o uso de drogas ototóxicas. Essas drogas lesam as estruturas sensoriais da orelha interna, podendo afetar tanto o sistema auditivo como o vestibular. Vários fatores podem influenciar no potencial da toxicidade, como, o agente, a dose, a duração, a função renal, o uso prévio de outras drogas e a susceptibilidade individual. A causa mais comum de perda auditiva permanente por drogas ototóxicas tem sido especialmente verificada com o uso de aminoglicosídeos e derivados da platina, como a cisplatina (FAUSTI et al., 1984). Apesar de demonstrar atividade antitumoral eficaz em seres humanos, a cisplatina possui alto grau de toxicidade auditiva. (AGUILAR-MARKULIS et al., 1981; SKINNER et al., 1990). Sabe-se que inicialmente, o dano ocorre na base da cóclea, acometendo primeiramente a audição para altas frequências, podendo progressivamente evoluir para o ápice, comprometendo as médias e as baixas frequências (STUART et al., 1990). Tendo em vista as alterações auditivas causadas pela utilização da cisplatina, é importante a monitorização da audição em pacientes usuários desta droga para se determinar a progressão da ototoxicidade, quando ela se inicia. Convém ressaltar que um programa efetivo de monitorização dos efeitos tóxicos na audição, resultaria em detecção precoce da perda auditiva, e possibilitaria a escolha de tratamentos alternativos (ASHA, 1994; FAUSTI et al., 1993b). 260 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA No momento em que mudanças dos limiares de audibilidade são notadas, algumas medidas podem ser tomadas pelo médico especialista como: suspender a medicação utilizada; utilizar tratamentos alternativos; reduzir ou mudar a dose; ou ainda dar continuidade ao regime de tratamento, preparando o paciente e a família para uma eventual perda de audição (PASIC E DOBIE, 1991; FAUSTI et al., 1993b; MENCHER et al., 1995). É importante ressaltar que a audiometria de altas frequências tem sido considerada o método de escolha na detecção mais precoce de perda auditiva induzida por drogas ototóxicas. Esse exame possibilita a detecção de alterações auditivas antes mesmo que as frequências mais importantes para a compreensão da fala fiquem comprometidas (FAUSTI et al., 1984; KOPELMAN et al., 1988; FRANK E DREISBACH, 1991; FAUSTI et al., 1993a; FAUSTI et al., 1994; FAUSTI et al., 1998; DISHTCHEKENIAN et al., 1998). Esse procedimento tem-se revelado mais sensível do que as emissões otoacústicas (BENSADON, 1999; BERG, 1999), uma vez que os equipamentos atualmente disponíveis permitem o registro dos dados até 10000Hz. Em contraste, sabemo s que existem audiômetros que permitem avaliar os limiares de audibilidade até 20000 Hz. Por outro lado, alguns autores mencionam a importância da realização das emissões otoacústicas no diagnóstico precoce de alterações auditivas, quando comparada a audiometria tonal na faixa de frequências convencional. Apontam, ainda, uma redução da amplitude das emissões otoacústicas anterior às alterações dos limiares tonais (PROBST, HARRIS E HAUSER, 1993; ZOROWKA, SCHMITT E GUTJAHR, 1993; OZTURAN et al., 1996; LITTMAN, MAGRUDER E STROTHER, 1998; KASHIWAMURA, 1998). Trabalhos experimentais vêm sendo realizados na Northwestern University Chicago - IL, sob a orientação do Prof. Dr. Lazio Stein (Comunicação Pessoal, 2000), utilizando altas frequências para evocar as emissões otoacústicas com a finalidade de monitorar a audição de pacientes submetidos à quimioterapia. Concordando com a utilização da audiometria de altas frequências como um procedimento efetivo na avaliação dos efeitos ototóxicos, a American Speech-LanguageHearing Association (ASHA) em 1994, padronizou um protocolo que recomenda alguns procedimentos para monitorar a audição de pacientes que realizam tratamento com drogas ototóxicas. Segundo a ASHA, primeiramente é realizada a anamnese, seguida pela otoscopia e posteriormente pela avaliação audiológica constituída por: audiometria tonal liminar (faixa de frequências convencional); audiometria de altas frequências (acima de 8000Hz); logoaudiometria e medidas de imitância acústica. Geralmente, a logoaudiometria e as medidas da imitância acústica são obtidas na primeira avaliação, mas não necessariamente retestadas nas avaliações subsequentes, a menos que mudanças dos limiares de audibilidade sejam notadas. Caso o paciente esteja impossibilitado de responder aos testes audiológicos subjetivos, medidas objetivas podem ser realizadas, como a audiometria de tronco cerebral e as emissões otoacústicas. A partir destes pressupostos, realizamos um estudo cujo objetivo foi monitorar os limiares de audibilidade de pacientes com diagnóstico de osteossarcoma submetidos à quimioterapia, sem tratamento prévio. 261 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO MATERIAL E MÉTODO O material deste estudo foi constituído pelos limiares de audibilidade obtidos em 27 pacientes (54 orelhas) com diagnóstico de osteossarcoma, sem tratamento prévio, submetidos à quimioterapia com cisplatina, carboplatina e outras drogas associadas. Os pacientes foram encaminhados pelo Setor de Oncologia Pediátrica do Departamento de Pediatria da Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulis ta de Medicina, ao Ambulatório da Disciplina de Distúrbios da Audição da Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina. Dos 27 pacientes avaliados, 19 eram do sexo masculino e oito do feminino, na faixa etária de 11 a 20 anos. Todos os pacientes foram submetidos a anamnese, otoscopia e avaliação audiológica constituída por: • Audiometria tonal liminar na faixa de frequências convencional (250 a 8000Hz); • Audiometria de altas frequências (9000 a 18000Hz); • Logoaudiometria, (pesquisa do limiar de reconhecimento de fala e o índice percentual de reconhecimento de fala); • Medidas da imitância acústica: • Timpanometria e pesquisa dos reflexos acústicos, no modo contra e ipsilateral, como uma forma de avaliação clínica utilizada para descartar qualquer alteração de orelha média. Para a realização da audiometria tonal liminar convencional e logoaudiometria foi utilizado o audiômetro da marca MAICO, modelo MA-41, com fones TDH-39 e coxim MX41 (ANSI, 1969). Para a audiometria de altas frequências foi utilizado o audiômetro da marca INTERACOUSTICS, modelo AS 10 HF e fones KOSS HV-1 A, com limiares de audibilidade expressos em dBNPS (decibel Nível de Pressão Sonora). Para a realização das medidas da imitância acústica foi utilizado o analisador de orelha média da marca INTERACOUSTICS, modelo AZ-7. Todos os pacientes realizaram o mesmo protocolo de quimioterapia, que consistiu de nove ciclos, com intervalos de 21 dias entre um ciclo e outro. Conforme pode ser observado no esquema abaixo, a cisplatina foi administrada na dose de 100mg/m2 em cinco dos nove ciclos de tratamento. Esquema do tratamento quimioterápico: S = semana de tratamento. A dose total das drogas utilizadas no tratamento quimioterápico foi: Cisplatina Carboplatina Doxorrubicina Ifosfamida Mesna 100mg/m2 X 5 500mg/m2 X 5 70mg/m2 X 6 9 g/m2 X 5 9 g/m2 X 5 262 = = = = = 500mg/m2 2500mg/m2 420mg/m2 45 g/m2 45 g/m2 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA De acordo com o protocolo de tratamento utilizado, foram realizadas quatro avaliações audiológicas, uma no período pré, duas durante o tratamento (após semanas seis e 17) e uma após a quimioterapia. Para o estudo dos limiares de audibilidade foi utilizada a mesma referência em todas as frequências estudadas, sendo que os valores obtidos em dBNA (decibel Nível de Audição), limiares das frequências de 250 a 8000Hz, foram transformados em dBNPS (decibel Nível de Pressão Sonora), segundo os valores determinados pelo padrão ANSI, 1969. Para a análise estatística dos resultados, foram utilizados testes não paramétricos, levando-se em consideração a natureza das variáveis estudadas. Para a avaliação de possíveis diferenças entre os limiares obtidos por frequência testada nos períodos estudados para cada frequência dentro de cada grupo, utilizou-se o teste não paramétrico para "K" amostras não independentes de Friedman (SIEGEL, 1975), complementado pelo teste de comparações múltiplas (HOLANDER E WOLFE, 1973). Em todos os testes fixou-se em 0,05 ou 5% o nível para a rejeição da hipótese de nulidade, assinalando-se com asterisco os valores significantes. RESULTADOS Foi realizado inicialmente o levantamento dos limiares de audibilidade obtidos nos 27 pacientes – 54 orelhas, na faixa de frequências de 250 a 18000Hz, nos períodos pré, semana seis, semana 17 e após a quimioterapia. Verificou-se que nove pacientes – 18 orelhas (33,3%), apresentaram limiares de audibilidade normais na faixa de frequências convencional até o término do tratamento e 18 pacientes – 36 orelhas (66,6%), apresentaram alteração dos limiares de audibilidade na faixa de frequências convencional, durante a quimioterapia. Desta forma, a amostra foi dividida em dois grupos: Grupo 1, pacientes que apresentaram limiares de audibilidade normais na faixa de frequências de 250 a 8000Hz após o término da quimioterapia, e Grupo 2, pacientes que apresentaram limiares de audibilidade alterados na faixa de frequências convencional após a quimioterapia. As Tabelas 1 e 2 mostram as médias dos limiares de audibilidade (dBNPS), obtidos em cada frequência testada (Hz), nos períodos pré, semana seis, semana 17 e pósquimioterapia, nos Grupos 1 e 2, respectivamente. Pode-se observar que houve maior incidência de perda auditiva neurossensorial, bilateral e simétrica, com predomínio nas altas frequências, tanto no Grupo 1, como no 2, conforme mostram as Figuras l e 2. A audiometria de altas frequências (9000 a 18000kHz) identificou mudanças nos limiares de audibilidade em 100% dos casos já na primeira avaliação audiológica realizada durante quimioterapia, na dose de 300mg/m2 de cisplatina. No Grupo 1, observou-se que as alterações auditivas ocorreram a partir da frequência de 11000Hz, não havendo mudanças significantes dos limiares de audibilidade nas avaliações subsequentes. No Grupo 2, as alterações ocorreram a partir da frequência de 2000Hz, com variação de até 70dB entre os limiares de audibilidade, sendo estas, mais observadas entre 3000 e 18000Hz. O início das alterações auditivas predominou na semana seis, isto é, após a administração de 300mg/m2 de cisplatina, não tendo sido verificadas diferenças estatis - 263 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO ticamente significantes entre os limiares obtidos após a primeira avaliação, durante o tratamento e as demais. Houve uma tendência à estabilização dos limiares de audibilidade, mesmo com o aumento da dose da cisplatina. Não foi realizada, no entanto, a avaliação audiológica dos pacientes entre os três primeiros ciclos de quimioterapia (SO, S3 e S6), onde verificou-se que há a maior concentração da cisplatina, pois o protocolo não previa tais avaliações. Tal fato, não permitiu verificar em qual ciclo ocorreu a instalação inicial das alterações auditivas. CONCLUSÕES A quimioterapia proposta por este protocolo leva a perda auditiva neurossensorial, bilateral e simétrica predominantemente nas altas frequências. Em 33,3% dos casos induz perda auditiva somente nas altas frequências. Em 66,6% dos casos provoca perda auditiva que se inicia na faixa de frequências convencional. Na dose de 300mg/m2 de cisplatina ocorrem mudanças significantes dos limiares de audibilidade, que se mantém até o término da quimioterapia, não havendo mudanças significantes nas avaliações subsequentes. Estes dados sugerem que a avaliação audiológica seja realizada entre os três primeiros ciclos de 100mg/m2 de cisplatina (SO, S3 e S6). Com o intuito de melhor verificarmos o início da instalação das alterações auditivas, recomendamos que a avaliação audiológica em pacientes submetidos à quimioterapia com o uso de cisplatina seja realizada a cada ciclo da droga administrada. Tabela 1 – Valores médios dos limiares de audibilidade (dBNPS), obtidos na faixa de frequências de 250 a 18000 (Hz), por orelha testada, no Grupo 1, nos períodos pré, S6, S17 e pós-tratamento quimioterápico. Pré S6 S17 Pós 250 500 1000 2000 3000 4000 6000 8000 9000100001100012000130001400015000160001700018000Hz 38,83 24,83 16,67 16,17 16,94 18,11 26,94 23,00 32,78 30,83 29,72 35,56 36,39 43,33 49,44 63,06 73,61 82,22 34,94 21,22 14,17 14,78 15,56 15,33 26,67 21,61 39,17 40,00 44,44 52,22 58,89 68,33 80,83 94,44 99,72 104,72 35,14 21,86 15,36 14,14 15,36 16,29 26,43 23,36 39,64 37,50 40,00 48,57 51,79 60,36 69,29 85,36 93,57 102,14 33,56 20,11 14,17 14,78 15,83 17,28 26,67 23,28 39,72 38,33 43,33 51,11 56,94 67,50 78,89 92,50 98,61 101,94 X2calc=x2calculado Teste de Friedman (pré x S6 x S17 x Pós) X2citríco =7,82 250 X2calc=3,408 900 X2calc=4,773 500 X2calc=7,515 1000 X2calc=4,881 10000 11000 X2calc=4,669 X2calc=14,180* 2000 X2calc=2,908 12000 X2calc=7,738 13000 X2calc=13,234* 3000 X2calc=2,056 14000 X2calc=19,071* 264 4000 X2calc=11,567 15000 X2calc=26,656* 6000 X2calc=0,275 16000 X2calc=31,156* 17000 X2calc=25,000* 8000 X2calc=2,009 18000 X2calc=27,991* FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA Teste de comparações múltiplas pré < S6 Teste de comparações múltiplas pré < pós pré < pós Teste de comparações múltiplas pré < S6 pré < S17 pré < pós Teste de comparações múltiplas pré < S6 pré < S17 pré < pós Teste de comparações múltiplas pré < S6 pré < S17 pré < pós Teste de comparações múltiplas pré < S6 pré < S17 pré < pós Teste de comparações múltiplas pré < S6 pré < S17 pré < pós Tabela 2 – Valores médios dos limiares de audibilidade (dBNPS), obtidos na faixa de frequências de 250 a 18000 (Hz), por orelha testada, no Grupo 2, nos períodos pré, S6, S17 e pós-tratamento quimioterápico. Pré S6 S17 Pós 250 500 1000 2000 3000 4000 6000 8000 9000100001100012000 130001400015000 1600017000 36,6122,61 16,11 15,33 16,39 17,28 24,72 20,08 33,61 30,56 31,25 31,53 35,83 43,89 52,36 67,08 73,13 38,0023,72 16,81 24,50 41,53 52,42 70,14 67,44 82,94 80,29 81,32 85,29 88,38 94,09 97,27 103,79105,87 36,6524,96 20,96 23,15 43,27 53,35 69,23 68,58 82,29 80,21 80,21 82,29 85,42 89,09 96,14 103,25105,77 36,3323,72 20,00 28,94 49,44 58,94 75,00 71,89 82,42 81,45 82,10 84,68 89,00 93,52 98,46 102,83104,44 18000 78,61 105,75 106,82 105,63 X2calc= X2calculado Teste de Friedman (pré x S6 x S17 x pós) X2crítico = 7,82 250 X2calc=4,754 500 X2calc=3,705 1000 X2calc=2,176 Teste de comparações múltiplas pré < S6 pré < S17 pré < pós 900 X2calc=45,227* Teste de comparações múltiplas pré<S6 pré<S17 pré<pós 10000 11000 X2calc=44,718* X2calc=46,188* Teste de comparações múltiplas pré<S6 pré<S17 pré<pós Teste de comparações múltiplas pré<S6 pré<S17 pré<pós 2000 X2calc=21,389* Teste de comparações múltiplas pré < S6 pré < S17 pré < pós 3000 X2calc=50,229* Teste de comparações múltiplas pré < S6 pré < pós 12000 13000 X2calc=47,151* X2calc=46,077* Teste de comparações múltiplas pré<S6 pré<S17 pré<pós Teste de comparações múltiplas pré<S6 pré<S17 pré<pós 4000 X2calc=46,5792* 6000 X2calc=50,900* Teste de comparações múltiplas pré < S6 pré < S17 pré < pós 14000 X2calc=46,631* 15000 X2calc=43,524* 16000 X2calc=31,204* Teste de comparações múltiplas pré<S6 pré<S17 pré <pós Teste de comparações múltiplas pré<S6 pré<S17 pré<pós Testede comparações múltiplas pré<S6 pré<S17 pré<pós 265 8000 X2calc=51,012* Teste de comparações múltiplas pré < S6 pré < S17 pré < pós 17000 X2calc=13,831* 18000 X2calc=10,619* Teste de comparações múltiplas Testede comparação múltiplas pré<S17 pré<pós pré<S17 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO Figura 1 – Valores médios dos limiares de audibilidade (dBNPS), obtidos na faixa de frequências de 0.25 a 18.0 (KHz), por orelha testada, no Grupo 1, nos períodos pré, S6, S17 e pós-tratamento quimioterápico 266 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA Figura 2 – Valores médios dos limiares de audibilidade (dBNPS), obtidos na faixa de frequências de 0.25 a 18.0 (KHz), por orelha testada, no Grupo 2, nos períodos pré, S6, S17 e pós-tratamento quimioterápico. * Apresentado no VII Encontro de Fonoaudiologia em Cancerologia / 1999 267 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AGUILAR-MARKULIS, N.V.; BECKLEY, S.; PRIORE, R.; METTLIN, C. Auditory toxicity effects of long-term cis -dichlorodiammineplatinum II therapy in genitourinary cancer patients. J. Surg. Oncol., 16:111-23, 1981. AMERICAN NATIONAL STANDARD INSTITUTE. American National Standards Specification for audiometers. American Standard S3.6-1969. New York, 1969. AMERICAN SPEECH-LANGUAGE-HEARING ASSOCIATION Guidelines for the audiologic management of individuals receiving cochleotoxic drug therapy. ASHA, 36:11-19, 1994. BENSADON, R.L. Estudo clínico da ototoxicidade da cisplatina: comparação entre os exames de audiometria tonal convencional, audiometria de altas frequências e emissões otoacústicas. Tese de Doutorado. Universidade de São Paulo, 1999.100p. BERG, A.L.; SPITZER, J.B.; GARVIN Jr, J.H. Ototoxic impact of cisplatin in pediatric oncology patients. Laryngoscope, 109:1806-14, 1999. DISHTCHEKENIAN, A.; KECHICHIAN, R.; PETRILLI, A.S.; AZEVEDO, M.F.; IORIO, M.C.M. A study of the hearing of osteosarcoma patients treated with car-boplatin and cisplatin chemotherapy. IN: CONGRESSO DA ACADEMIA AMERICANA DE AUDIOLOGIA X., Los Angeles, 1998, Anais. FAUSTI, S.A.; SCHECHTER, M.A.; RAPPAPORT, B.Z.; FREY, R.H.; MASS, R.E. Early detection of cisplatin ototoxicity. Cancer, 53:224-31, 1984. FAUSTI, S.A.; FREY, R.H.; HENRY, J.A.; OLSON, D.J.; SCHAFFER, H.I. Highfrequency testing techniques and instrumentation for early detection of ototoxicity. J. Rehab. Res. Dev., 30(3):333-41, 1993a. FAUSTI, S.A.; HENRY, J.A.; SCHAFFER, H.I.; OLSON, D.J.; FREY, R.H.; BAGBY Jr., G.C. High frequency monitoring for early detection of cisplatin ototoxicity. Arch. Otolaryngol. Head Neck Surg., 119:661-6, 1993b. FAUSTI, S.A.; LARSON, V.D., NOFFSINGER, D., WILSON, R.H., PHILLIPS, D.S.; FOWLER, C.G. High-frequency audiometric monitoring strategies for early detection monitoring of ototoxicity. Ear Hear., 15:232-9, 1994. FAUSTI, S.A.; HENRY, J.A.; HAYDEN, D.; PHILLIPS, D.S.; FREY, R.H. Intrasubject reliability of high-frequency (9-14kHz) thresholds: tested separately vs. following conventional frequency testing. J. Am. Acad. Audiol., 9:147-52, 1998. FRANK, R. ; DREISBACH, L.E. Repeatability of high-frequency thresholds. Ear Hear., 12:294-5, 1991. HOLANDER, M.; WOLFE, D.A. Nonparametric statistical methods. New York, John Wiley & Sons, 1973, 503p. KASHIWAMURA, M. Studies of the evaluation of cochlea function with distortion product otacoustic emission. Hokkaido Igaku Zasshi, 73:641-62, 1998. 268 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA KOPELMAN, J.; BUDNICK, A.S.; SESSIONS, R.B.; KRAMER, M.B.; WONG, G.Y. Ototoxicity of high-dose cisplatin by bolus administration in patients with advanced cancers and normal hearing. Laryngoscope, 98:858-64, 1988. LITTMAN, T.A.; MAGRUDER, A.; STROTHER, D.R. Monitoring and predicting ototoxic damage using distortion-product otoacoustic emissions: pediatric case study. J. Am. Acad. 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O Departamento de Fonoaudiologia iniciou o atendimento ao paciente oncológico em agosto de 1996, para pacientes vinculados ao SUS, convênios e particulares, internos ou externos. Atende a todos os pacientes com sequelas na comunicação oral e deglutição, essencialmente decorrentes do tratamento do câncer de cabeça e pescoço, mas também com encaminhamentos provenientes de outros departamentos, como Pediatria, Neurologia, Mama, Abdômen, Tórax, entre outros. O hospital prima pelo modelo de atendimento multidisciplinar de todos os casos. A Fonoaudiologia integra o corpo clínico do Hospital, com reuniões semanais de discussão de casos, com participação de outros profissionais. Além disso, participa sistematicamente das reuniões de outros departamentos, como Cirurgia de Cabeça e Pescoço, Neurologia e Pediatria. Realiza diariamente a videofluoroscopia da deglutição, conjuntamente com o Departamento de Imagem, para casos internos e externos. Participa, juntamente com o Departamento de Cirurgia de Cabeça e Pescoço, da avaliação funcional da deglutição e fonação através da nasofibroscopia e telelaringoscopia. Atua intensamente, também, como formador de profissionais especializados. O Departamento de Fonoaudiologia oferece estágios para graduandos de último ano, através de convênio com o Centro Universitário São Camilo, curso de aprimoramento anual, com provas de seleção realizadas ao final do ano e a partir de 2001, curso de especialização. Além disso, desde 1998, oferece pós-graduação no nível de mestrado e doutorado, para profissionais da saúde, incluindo fonoaudiólogos. 273 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO Coordenação: Dra. Elisabete Carrara de Angelis Equipe: Ana Paula Brandão Barros Cristina Lemos Barbosa Furia Nívia Maria da Silva Martins DEPARTAMENTO DE FONOAUDIOLOGIA – A. C. CAMARGO Rua Antonio Prudente, 211 CEP: 01509-900 Liberdade Tel: (0xx11) 3272-5123 / 5124 São Paulo- S.P. www.hcanc.org.br 274 CENTRO DE TRATAMENTO E PESQUISA HOSPITAL DO CÂNCER - A.C. CAMARGO O Departamento de Audiologia é responsável pela avaliação da audição tanto no adulto como na criança, encaminhados de outros departamentos do Hospital. Este funciona desde 1996 e sua implementação veio da necessidade primordial de atendermos a população portadora de câncer que necessite de quimioterapia e radioterapia, modalidades terapêuticas que podem induzir a uma perda auditiva e a alterações do sistema vestibular (labirinto). As categorias atendidas em nosso serviço são: SUS, convênio e particular para pacientes deste hospital encaminhados por outros serviços, e particular e convênio para pacientes externos ao hospital. Os exames oferecidos são audiometia tonal vocal, imitanciometria, testes vestibulares, potenciais evocados auditivos, emissões otoacústicas e avaliação do processamento auditivo central. Oferecemos estágio semestral com aulas práticas e teóricas na área de audiologia. Fonoaudiólogas: Patricia Helena Pécora Liberman Maria Elisabete Bovino Pedalini Maria Valéria Schmidt Goffi DEPARTAMENTO DE AUDIOLOGIA - A.C. CAMARGO Rua Antonio Prudente, 211 CEP: 01509-900 Liberdade Tel: (0xx11) 3272-5123 / 5124 São Paulo-S.P. www.hcanc.org.br 275 IRMANDADE DA SANTA CASA DE MISERICÓRDIA DE SÃO PAULO O Serviço de Cabeça e Pescoço do Departamento de Cirurgia da Santa Casa de São Paulo iniciou suas atividades há dez anos. Em 1994, o trabalho de reabilitação fonoaudiológica foi iniciado com os pacientes oncológicos de cabeça e pescoço, vinculado ao Departamento de Cirurgia, oferecendo estágio para fonoaudiólogas já formadas a partir de 1995. Em 1998 foi aprovado o Curso de Especialização em Voz da Santa Casa de São Paulo. No Setor, são atendidos pacientes da Santa Casa ou de outros hospitais sub-metidos a laringectomias totais, laringectomias parciais, cirurgia de cavidade oral e orofaringe, mandibulectomias, maxilectomias, cirurgia de glândula parótida e tireoidectomias. Na Irmandade da Santa Casa de São Paulo são atendidos somente pacientes do SUS. O Serviço de Cabeça e Pescoço conta com uma equipe multidisciplinar constituída por cirurgiões de cabeça e pescoço, cirurgiões buco-maxilo-faciais, odontólogo que confecciona as próteses intrabucais, patologista, radiologista, radioterapeuta, fisioterapeutas respiratórios, nutricionistas, psicóloga, fonoaudióloga e assistentes sociais. Na Instituição são realizados exames complementares como videofluoroscopia, laringofibroscopia, nasolaringofibroscopia e teste de insuflação. Desde 1998, há o Curso de Especialização em Voz, com duração de dois anos e média de 1100 horas, que oferece oito vagas na área de concentração em voz e quatro vagas na área de concentração em reabilitação fonoaudiológica a pacientes oncológicos de cabeça e pescoço. Todas as especializandas têm prática e aulas teóricas em ambas as áreas. Fonoaudióloga: Marina Lang Fouquet IRMANDADE DA SANTA CASA DE MISERICÓRDIA DE SÃO PAULO Ambulatório Conde de Lara, Cirurgia - 1o andar. Rua Dr. Cesário Motta Júnior, 112 CEP: 01277-900 Santa Cecilia Tel: (0xx11) 224.0122 Ramal 5882 São Paulo – S.P. 276 HOSPITAL DAS CLÍNICAS / FMUSP DISCIPLINA DE CIRURGIA DE CABEÇA E PESCOÇO A Disciplina de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital das Clínicas – Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (DCCP-HC-FMUSP) foi instalada em 1957, oriunda da Cirurgia Geral, como o primeiro serviço universitário da Especialidade no país. Em 1988, teve inicio o atendimento fonoaudiológico, regular, porém feito como trabalho voluntário. Desde 1992, foi oficializada a presença da Fonoaudiologia dentro da Disciplina, pela contratação de um fonoaudiólogo através da Fundação Faculdade de Medicina. O atendimento é voltado principalmente aos doentes da própria Disciplina, matriculados no Hospital das Clínicas, sendo custeado pela Secretaria de Saúde do Estado. Ocasionalmente, são atendidos pacientes vindos de outras Clínicas do HCFMUSP. Mensalmente, são realizados em média, 100 atendimentos ambulatoriais e 50 em enfermaria. A demanda maior é representada pela população submetida a laringectomias parciais, ressecções em cavidade oral e as paralisias laríngeas. Como exames auxiliares, a Fonoaudiologia conta principalmente com a laringoscopia realizada pelo médico endoscopista da equipe e com a videofluoroscopia, realizada no Instituto de Radiologia – HCFMUSP. Todos os exames são feitos com a presença da fonoaudióloga da Disciplina. Embora não sendo de rotina, também podem ser solicitados diversos exames, como a eletromiografia ou a manometria, sempre que necessário. Essas avaliações são realizadas nos Serviços especializados do Hospital das Clínicas. Desde 1995, anualmente, oito fonoaudiólogos realizam estágio na DCCP, atendendo em enfermaria e ambulatório e participando de projetos de pesquisa. Além disso, ministram aulas sobre a atuação fonoaudiológica em Cirurgia de Cabeça e Pescoço para os médicos residentes e para o 3o. ano do Curso de Fonoaudiologia – FMUSP. Esse estágio faz parte de um curso de pós-graduação lato sensu, denominado Programa de Aprimoramento Profissional “Voz, Comunicação e Sociedade num Contexto Multiprofissional”. 277 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO Fonoaudióloga: Monique Donata Tonini SERVIÇO DE FONOAUDIOLOGIA DA DISCIPLINA DE CIRURGIA DE CABEÇA E PESCOÇO - HOSPITAL DAS CLÍNICAS – FMUSP Av.Dr. Éneas de Carvalho Aguiar, 255 8o andar – sala 8174 CEP: 05403-000 Cerqueira César Tel: (0xx 11) 3069-6425 (Secretaria) 3069-7219 (Ambulatório) São Paulo- S.P. 278 HOSPITAL DAS CLÍNICAS / FMUSP CLÍNICA DE OTORRINOLARINGOLOGIA O atendimento fonoaudiológico ao paciente oncológico do Serviço de Fonoaudiologia (em especial ao laringectomizado total e parcial) destina-se tanto aos pacientes da Clínica de Otorrinolaringologia - FMUSP, bem como a pacientes oriundos de outras instituições ou de outros Estados. O apoio fonoaudiológico inicia-se sempre que possível no pré-operatório, quando o paciente e familiares são informados sobre a sequela çirúrgica da perda da voz e também da possibilidade do aprendizado da voz esofageana. Sempre que possível, eles são apresentados a um paciente adequadamente reabilitado. Também é oferecido ao paciente um Manual de Orientação para o dia-a-dia com esclarecimento de dúvidas. O atendimento ocorre duas vezes por semana. Os pacientes são dividido em dois grupos: Grupo II, dos iniciantes e Grupo I dos que já estão em nível intermediário ou adiantado. Possuímos um jornal “A NOVA VOZ”, pequena publicação mensal da Clínica Otorrinolaringológica. Este contém assuntos variados e de interesse do grupo de laringectomizados, bem como tópicos para discussão. Fonoaudióloga: Maria Lúcia Cleto SERVIÇO DE FONOAUDIOLOGIA EM ONCOLOGIA DA CLÍNICA DE OTORRINOLARINGOLÓGICA DO HOSPITAL DAS CLÍNICAS FMUSP Av.Dr. Éneas de Carvalho Aguiar, 255 6o andar sala 6 CEP: 05403-000 Cerqueira César Tel: (0xx 11) 3069 6385 São Paulo- S.P. 279 HOSPITAL AMARAL CARVALHO JAÚ - SP O Hospital Amaral Carvalho passou a dedicar-se à área oncológica no final da década de 60. Tornou-se referência em Oncologia em 1972, atraindo para seu quadro, profissionais especializados ao longo de 25 anos. Atende hoje 311 municípios do estado de São Paulo e 103 municípios de outros estados. Segundo dados do Registro Hospitalar do Câncer (RHC) do Hospital Amaral Carvalho, a instituição realizou atendimentos pelas seguintes categorias e sua respectiva percentual em 1999: SUS (78%), Convênios (15%) e Particular (7%). Foram atendidos um total de 21.028 pacientes neste ano, no qual o número de casos novos foram 3.534, apresentando uma taxa de crescimento de atendimentos de 17%. O Departamento de Cabeça e Pescoço foi responsável pelo atendimento de 320 (7.75%) desses casos novos no mesmo período. O Departamento de Fonoaudiologia está em atividade neste hospital desde 1994, junto ao Departamento de Cabeça e Pescoço, realizando um programa de prevenção e detecção precoce do câncer de boca. Este visa aumentar o conhecimento da população sobre as características deste tipo de câncer, esclarecer sobre os fatores de risco e principalmente ensinar as formas de detecção precoce através do auto-exame da boca e da consulta odontológica anual de controle. A equipe multidisciplinar da Instituição conta com os Departamentos de: Fonoaudiologia, Odontologia, Psicologia, Fisioterapia, Terapia Ocupacional, Nutrição,além do corpo clínico. O Departamento de Cirurgia de Cabeça e Pescoço conta com equipamento de nasovideolaringoscopia para exame complementar. 280 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA Fonoaudióloga: Renata Furia Sanchez DEPARTAMENTO DE FONOAUDIOLOGIA - HOSPITAL AMARAL CARVALHO Rua Dona Silvéria, 150 CEP 17210-080 - Cx. Postal 38 Tel: (0xx14) 620-1200 Jaú – SP 281 FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO - FOSP A FOSP é uma instituição geradora de condições para o aprimoramento de ações médico-assistenciais em oncologia, constituindo-se em órgão de apoio da Secretaria de Saúde para assessorar a política de saúde em câncer no Estado. Na instituição, o atendimento fonoaudiológico a pacientes oncológicos de Cabeça e Pescoço iniciou-se no final da década de 70. Este serviço está inserido na Divisão de Reabilitação da FOSP que conta com uma equipe multidisciplinar formada por cirurgiões buco-maxilo-faciais, fonoaudiólogo, psicólogo, assistente social e protéticos especializados. Essa equipe tem como objetivo a reabilitação funcional e estética dos pacientes oncológicos de cabeça e pescoço, por meio da adaptação de próteses buco-maxilo-faciais. Os principais tipos de próteses realizadas são: oculares, óculo-palpebrais, auriculares, nasais, maxilares, mandibulares, implantes bucais e cranianos. Essa fundação recebe pacientes provenientes dos hospitais de São Paulo, interior e outros estados, sendo todos atendidos pelo Sistema Único de Sáude (SUS). A FOSP atende principalmente pacientes submetidos à cirurgia da cavidade oral, e um menor contigente de pacientes laringectomizados. Exames complementares como nasolaringoscopia e videoendoscopia são solicitados aos hospitais de origem do paciente. Atualmente podem ser realizadas visitas ou observação do atendimento fonoaudiológico, através do agendamento com a fonoaudióloga responsável. Fonoaudióloga: Viviane Alves de Carvalho SETOR DE FONOAUDIOLOGIA - FUNDAÇÃO ONCOCENTRO DE SÃO PAULO Rua Galeno de Almeida, 148 CEP: 054010-030 Cerqueira César Tel: (0xx11) 280 58 52 www.fosp.saude.sp.gov.br São Paulo – S.P. 282 HOSPITAL RIBEIRÃO PIRES O Hospital Ribeirão Pires foi fundado em 1958, sendo constituído por diversas especialidades. Todavia nos últimos anos buscando oferecer um tratamento mais especializado aos seus pacientes e tendo sempre como meta proporcionar uma melhor qualidade de vida aos mesmos, vem oferecendo uma atenção especial a área de reabilitação. O atendimento fonoaudiológico teve início em junho de 1998, ampliando-se a cada dia. A priori, a demanda era provinda apenas de otorrinolaringologistas, atualmente os encaminhamentos também são realizados por cirurgiões de cabeça e pescoço, neurologistas, pediatras, entre outras especialidades. O Hospital Ribeirão Pires oferece atendimento fonoaudiológico aos seus pacientes, obedecendo as duas categorias: pacientes provindos de convênios e particulares. Esse âmbito hospitalar possibilita a atuação em equipe multidisciplinar, a qual favorece para obtenção de melhores resultados terapêuticos. Dentro dessa instituição estão disponíveis além dos exames convencionais, a avaliação nasofibrolaringológica. Todavia quando necessário e oportuno realizamos encaminhamentos para outras instituições, a fim de se obter resultados mais objetivos, tais com a solicitação de avaliação videofluoroscópica da fala e da deglutição. Até o presente momento não oferecemos estágio para outros fonoaudiólogos, bem como cursos de aprimoramento. Fonoaudióloga: Nívia Maria da Silva Martins HOSPITAL RIBEIRÃO PIRES Rua Major Cardim, nº 415 CEP: 09424-070 Núcleo Colonial Tel: (0xx11) 4827 7000 Ramal: 3241 Ribeirão Pires – SP 283 INSTITUTO DO CÂNCER ARNALDO VIEIRA DE CARVALHO - ICAVC O Instituto do Câncer Arnaldo Vieira de Carvalho é um hospital destinado ao tratamento de pacientes com câncer e possui diversas especialidades médicas e paramédicas. O Serviço de Fonoaudiologia do ICAVC está vinculado ao Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço. O Serviço de Fonoaudiologia foi iniciado em agosto de 1999, sob a forma de prestação de serviço. Este tem por objetivo, atender os pacientes oncológicos de cabeça e pescoço. A maior demanda do atendimento do serviço refere-se às laringectomias totais e parciais supracricoídeas e glossectomias total. Além disso, o serviço também realiza avaliações computadorizadas da voz e da fala, acompanhamento dos exames laringológicos e realização de exames videofluoroscópicos da deglutição e fala, em conjunto com Serviço de Radiologia. O Serviço de Fonoaudiologia realiza em média, 50 (cinquenta) atendimentos mensais. Quanto ao fluxo dos pacientes, 80% pertencem ao SUS, 15% são conveniados e 5% particulares. Em agosto de 1999 foi criado o grupo de Atuação Multiprofissional, com o objetivo de atender os pacientes oncológicos de Cabeça de Pescoço, no período pré e pósoperatório. A equipe é formada pelos seguintes profissionais: médicos cirurgiões de cabeça e pescoço, enfermeiros, nutricionistas, assistentes social, fisioterapeutas, psicólogos e fonoaudiólogos. Semanalmente, são realizadas reuniões teórico-práticas envolvendo os profissionais vinculados ao grupo multiprofissional, a equipe de residência e os estagiários do hospital. 284 FONOAUDIOLOGIA EM CANCEROLOGIA Fonoaudióloga: Luciana Passuello do Vale SERVIÇO DE FONOAUDIOLOGIA - INSTITUTO DO CÂNCER ARNALDO VIEIRA DE CARVALHO – ICAVC Rua Dr. Cesário Motta Junior, 112 1° andar CEP: 01221-020 Vila Buarque Tel: (0xx11) 222 7088 - Ramal 221 São Paulo - SP 285 INSTITUTO BRASILEIRO DE CONTROLE DO CÂNCER SÃO CAMILO O atendimento fonoaudiológico aos pacientes do Instituto Brasileiro de Controle do Câncer (IBCC) foi iniciado voluntariamente em 1995. São realizados atendimentos em ambulatório e enfermaria (leito) aos pacientes do SUS e de Convênios nos quais a Instituição esteja credenciada. Quinzenalmente ocorrem reuniões da equipe de Cirurgia de Cirurgia de Cabeça e Pescoço, no qual está integrada a fonoaudióloga, com os seguintes profissionais: radiologista, radioterapeuta, enfermeira e nutricionista. De acordo com os casos a serem discutidos, eventualmente são convidados outros profissionais. No momento, o IBCC não oferece um programa de educação continuada no que refere-se ao atendimento fonoaudiológico, porém, há proposta de criar um estágio assim que a rotina de atendimento tenha estrutura e demanda em condições de oferecer um programa de boa qualidade. Fonoaudióloga: Lica Arakawa Adriana Gandolpho SERVIÇO DE FONOAUDIOLOGIA - INSTITUTO BRASILEIRO DE CONTROLE DO CÂNCER- SÃO CAMILO – IBCC-SC Av. Alcântara Machado, 2576 CEP 03102-002 Moóca Tel: (0xx11) 291 6988 São Paulo - S.P. 286 EDITORAÇÃO, FOTOLITO E IMPRESSÃO IMPRENSA OFICIAL SERVIÇO P ÚBLICO DE Q UALIDADE Rua da Mooca, 1921 São Paulo SP Tel.: (11) 6099-9457 / 6099-9529 CNPJ 48.066.047 / 0001-84 http://www.imprensaoficial.com.br