Navegando à deriva na ética do esporte Marcelo Claro, nov/2012 Recentemente o Palmeiras perdeu de virada do Internacional de Porto Alegre em jogo válido pelo Campeonato Brasileiro de futebol. Mais do que o resultado final de 2 a 1 para o Inter, este jogo se destaca por trazer à tona aspectos importantes da ética no esporte. O que causou polêmica foi um lance em que o atacante palmeirense Hernán Barcos desviou com a mão uma cobrança de escanteio, sem que o juiz notasse essa infração. A bola entrou no gol do Inter e o árbitro validou o gol em um primeiro momento, mas depois, ao ser alertado pelo quarto árbitro, anulou o lance. Jogadores e dirigentes do Palmeiras contestaram a marcação por entenderem que o quarto árbitro havia sido avisado da infração por alguém externo à arbitragem, utilizando recurso de consulta de imagem de televisão – o que é proibido pela FIFA. O caso foi levado para julgamento no STJD – Superior Tribunal de Justiça Desportiva, que indeferiu o pedido do Palmeiras de anulação do jogo. Independentemente do resultado deste julgamento, algumas questões podem ser colocadas: os resultados esportivos estão acima da ética? Qual o valor de um resultado esportivo positivo obtido por meio de infrações não detectadas? Se for valorizada a obtenção de resultados esportivos por meio de infrações não detectadas no momento em que ocorreram, passamos a ter dois caminhos para as conquistas esportivas: um primeiro em que se busca o resultado de forma limpa, exclusivamente por mérito esportivo; e um segundo em que se busca o resultado de forma "esperta", no qual o mérito é obtido por se conseguir enganar o árbitro, de modo que ele não perceba a infração no momento em que ela tenha ocorrido. O segundo caminho é inadmissível do ponto de vista ético, pois nos leva a competições por quem consegue enganar mais e melhor, por quem é bem sucedido em fazer com que os árbitros não percebam suas trapaças. Na partida em questão o atacante Barcos admitiu em entrevista coletiva que fez o gol com a mão, apesar de alegar que foi empurrado antes de encostar a mão na bola. Do ponto de vista ético, se Barcos considera que foi empurrado antes de fazer o gol com a mão, deveria ter reclamado do juiz a marcação de um pênalti a seu favor, ao invés de ter comemorado o gol, como o fez – atitude esta que deixa clara sua intenção de enganar o juiz. Mais ainda, depois de perceber que o gol havia sido anulado pelo árbitro, não deveria ter contestado esta marcação. Mas, ao contrário, Barcos reclamou veementemente ao juiz a validação do gol, novamente deixando clara sua intenção de enganar o árbitro. Os dirigentes do Palmeiras, por sua vez, também admitiram que o gol havia sido feito de maneira irregular, mas mesmo assim decidiram entrar com recurso no STJD para buscar a anulação do resultado e o agendamento de um novo jogo. Ou seja, entenderam que o resultado esportivo está acima da ética. É ingenuidade se buscar um comportamento ético no esporte? Utopia? A meu ver, um dos pilares para o desenvolvimento de grandes países e de grandes sociedades é estar a postura ética presente em todos os níveis, bem como em todos os segmentos de atuação – aí incluído o segmento esportivo. O esporte e seus ídolos são seguidos por bilhões de pessoas no mundo. Dirigentes esportivos e atletas têm em suas mãos a incrível possibilidade de influenciar o comportamento da sociedade, de acordo com a ética e os valores que aplicam em suas atuações. Neste episódio, perderam a oportunidade de utilizar o esporte como modelo de comportamento – perderam a oportunidade de dar um exemplo grandioso de postura ética e realmente vitoriosa. O tema da ética no esporte é muito amplo e merece reflexões aprofundadas.