2 UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE – BIGUAÇU CURSO DE PSICOLOGIA MICHELE DE OLIVEIRA SANTOS APLICABILIDADE DA PSICOEDUCAÇÃO NO TRATAMENTO DO TRANSTORNO AFETIVO BIPOLAR Biguaçu 2012 3 MICHELE DE OLIVEIRA SANTOS APLICABILIDADE DA PSICOEDUCAÇÃO NO TRATAMENTO DO TRANSTORNO AFETIVO BIPOLAR Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de graduação em Psicologia da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI – Centro de Ciências da Saúde, como requisito parcial á obtenção do título de Bacharel em Psicologia. Orientador (a): Prof.ª Ivânia Jann Luna, Msc. Biguaçu 2012 4 MICHELE DE OLIVEIRA SANTOS ÁREA DE PESQUISA: Psicologia Clínica TEMA: “Psicoeducação para Tratamento do Transtorno Afetivo Bipolar” TÍTULO DO PROJETO: “Aplicabilidade da psicoeducação no tratamento do Transtorno Afetivo Bipolar” BANCA EXAMINADORA Profª: Ivânia Jann Luna (Orientadora) Categoria Profissional: Psicologia / Professora da UNIVALI Titulação: Mestre em Psicologia Clínica Profª: Vera Baumgarten Ulysséa Baião Categoria Profissional: Psicologia / Professora da UNIVALI Titulação: Doutora em Psicologia Experimental Psicóloga: Enis Mazzuco Categoria Profissional: Psicologia / Professora da UNIVALI Titulação: Mestre em Sociologia Política 5 AGRADECIMENTOS • Agradeço a Deus, que me deu a vida e inteligência, e que me dá força para continuar a caminhada em busca dos meus objetivos. • À Professora orientadora Ivânia Jann Luna pela dedicação na realização deste trabalho, que sem sua importante ajuda não teria sido concretizado. • À professora Vera, pelas sugestões dadas para a realização da monografia. • À professora Enis, por aceitar o convite e fazer parte da banca examinadora. • Aos meus pais, Iriovaldo e Maria Elena que me ensinaram a não temer desafios e a superar os obstáculos com humildade. • Ao meu namorado Henrique Willemann pela paciência e mão estendida nos momentos difíceis em que eu passei para a realização deste trabalho. • Aos demais amigos (as) e colegas pelo companheirismo sempre presente. • E a todos aqueles, que de alguma forma contribuíram na elaboração desta monografia. 6 RESUMO SANTOS, M. O. “Aplicabilidade da Psicoeducação no Tratamento do Transtorno Afetivo Bipolar”. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Psicologia – Bacharelado em Psicologia) – Universidade do Vale do Itajaí, Biguaçu, 2012. Esta pesquisa tem como objetivo geral compreender os aspectos relevantes da Psicoeducação aplicada ao tratamento do transtorno afetivo bipolar na visão de psicólogos que já utilizaram desta prática em instituições psiquiátricas. Tal trabalho desenvolvido foi embasado em uma pesquisa qualitativa, do tipo exploratória, onde os sujeitos foram 03 psicólogos regularmente matriculados no Conselho Regional de Psicologia, que tiverem experiência profissional em Instituição Psiquiátrica e que utilizem uma abordagem psicoterápica em Psicologia para fundamentar a sua prática profissional. Quanto ao tipo de amostragem, foi utilizado a por conveniência onde os sujeitos foram indicados por professores do curso de Psicologia da Univali, campus – Biguaçu, sendo selecionados 03 sujeitos. Como instrumento de coleta de dados foi utilizado à entrevista semi-estruturada sendo esta composta por um roteiro básico de 05 questões. O procedimento de análise dos dados foi realizado através dos mapas de associação de ideias. Foram formadas cinco categorias analíticas para que as respostas da pesquisa fossem mais bem analisadas.E dentre alguns resultados obtidos, pode-se elucidar que o principal objetivo da psicoeducação é munir o paciente de informações sobre seu transtorno e que os métodos e técnicas utilizados pelos psicólogos nas atividades de psicoeducação, que são bem particulares, vão ao encontro de sua abordagem e da forma de trabalho da instituição onde o desenvolviam. O trabalho foi concluído destacando que, a forma particular e flexível de se aplicar a psicoeducação está ligado diretamente ao referencial teórico de cada terapeuta e da instituição na qual estão inseridos. Palavras – chave: psicoeducação; transtorno afetivo bipolar. 7 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO..................................................................................................11 2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA....................................................................16 2.1 DOENÇA MENTAL..........................................................................................16 2.2 TRANSTORNO AFETIVO BIPOLAR.............................................................19 2.3 PSICOEDUCAÇÃO...........................................................................................26 2.4 TERAPIA FAMILIAR PSICOEDUCACIONAL..............................................31 3 MÉTODO.............................................................................................................33 3.1 DELINEAMENTO DA PESQUISA...................................................................33 3.2 SUJEITOS...........................................................................................................34 3.3 PROCEDIMENTOS DE COLETA DOS DADOS.............................................35 3.4 PROCEDIMENTOS DE ANÁLISE DOS DADOS...........................................36 3.5 CUIDADOS ÉTICOS..........................................................................................37 4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS.............................................39 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS...............................................................................49 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..................................................................51 8 LISTA DE QUADROS Quadro 1 – Classificação dos Transtornos/Episódios com suas características e sintomas...........................................................................................................................23 Quadro 2 – Perfil dos Sujeitos Entrevistados......................................................35 Quadro 3 – Concepção e Objetivo da Psicoeducação..........................................39 Quadro 4 – Metodologias Utilizadas na Prática da Psicologia............................41 Quadro 5 – Características da Psicoeducação......................................................42 Quadro 6 – Suporte Teórico no Trabalho com Psicoeducação............................44 Quadro 7 – Resultados do Trabalho....................................................................46 9 LISTA DE SIGLAS CAPS – Centro de Atenção Psicossocial CID -10 – Critérios Diagnósticos para Pesquisa CNSM – Conferência Nacional de Saúde Mental CRP – Conselho Regional de Psicologia DSM – Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais MTSM – Movimento de Trabalhadores em Saúde Mental NAPS – Núcleo de Atenção Psicossocial OMS – Organização Mundial de Saúde OPAS – Organização Pan-America de Saúde TAB – Transtorno Afetivo Bipolar TCC – Terapia Cognitiva-Comportamental TFF – Terapia Focada na Família TIP/RS – Terapia Interpessoal e de Ritmo Social 10 LISTA DE APÊNDICE APÊNDICE A – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO..59 APÊNDICE B – ROTEIRO TEMÁTICO...................................................................61 11 1 INTRODUÇÃO A Organização Pan-America de Saúde – OPAS e a Organização Mundial de Saúde – OMS (2001) têm apontado o contínuo aumento da prevalência de transtornos mentais na população, sobretudo nas últimas décadas. Conforme essas organizações, estima-se que atualmente cerca de 450 milhões de pessoas sofrem de transtornos mentais ou neurobiológicos. Nesse contexto, o Transtorno Afetivo Bipolar (TAB) afeta cerca de 1,6% da população e representa uma das principais causas de incapacitação no mundo (BLAZER, 2000 apud PEDRÍLIO, 2010). Porém, nas últimas décadas, diversos estudos referentes à ocorrência de doenças em populações humanas nos têm permitido um maior entendimento do curso dos transtornos mentais, permitindo que se tenha conhecimento das conseqüências diretas e indiretas da doença, facilitando desta forma, a direção de um tratamento (MACIEL, 2010). Atualmente, de acordo com Colom e Vieta (2004) o tratamento farmacológico é considerado indispensável no transtorno bipolar, no entanto, intervenções psicológicas vêm, de forma crescente, sendo reconhecidas como um componente integral do tratamento para o transtorno bipolar. Desta forma, dentre as abordagens não farmacológicas está a psicoeducação, que é considerada uma das principais estratégias para transformar aspectos negativos vivenciados pelos portadores de TAB, e abrange prover informações aos pacientes e familiares sobre a natureza e o tratamento da doença (MENEZES; SOUZA, 2011). Diante do exposto acima, venho justificar a presente pesquisa que parte de meu profundo interesse pelos transtornos mentais juntamente com as práticas psicoeducativas voltadas às pessoas acometidas pelo mesmo. Tendo em vista também, o fato de a literatura ser tão escassa no que diz respeito às práticas psicoeducativas, que de acordo com alguns autores que serão citados no decorrer deste trabalho, são extremamente importantes para adesão ao tratamento medicamentoso e ao entendimento dessas pessoas acometidas pelo transtorno juntamente com sua família e amigos. Este trabalho, portanto, tem o intuito de investigar especificamente as práticas psicoeducativas no Transtorno Afetivo Bipolar. 12 O conceito de “Transtorno Afetivo Bipolar” (TAB) situa-se nas alterações do humor, sendo um pólo da doença o humor depressivo, e outro pólo o humor eufórico. Porém, não é só o humor que fica alterado no transtorno bipolar. Muitas outras funções cerebrais e extracerebrais também se alteram, como as relacionadas aos ritmos biológicos (sono, apetite), ao controle dos movimentos do corpo (agitação ou lentidão), das funções de memória e de concentração mental, da impulsividade e dos desejos e vontades, inclusive do prazer, tanto das pequenas coisas da vida, como do prazer sexual (TUNG, 2007). Para Souza (2005) o TAB é considerado um quadro grave crônico e recorrente que representa um grande problema de saúde, incluindo tanto um grande peso econômico como altas taxas de mortalidade. O TAB é caracterizado por episódios de mania ou hipomania, alternados com períodos de depressão e/ou eutimia. Há indicativos de que o TAB está associado a alterações de substâncias intracelulares envolvidas na regulação de neurotransmissores, plasticidade sináptica, expressão gênica, sobrevivência e morte neural. Além disso, seu aparecimento está ligado à presença de genes vulneráveis e à interação destes com a influência ambiental. Sabe-se, porém, que não se trata apenas de um problema bioquímico, mas também, de um problema de natureza psicológica e social (MICHELON; VALLADA, 2005). Estima-se que a bipolaridade pode comprometer cerca de 1% da população geral, porém, estudos que analisam o espectro bipolar, indicam uma prevalência de 5%. Em geral, o aparecimento dos primeiros sintomas ocorre na adolescência, entre os 18 e 22 anos, podendo dessa forma, romper com o processo de maturação, ocasionando prejuízos significativos no campo biopsicossocial, dado que nesta fase se iniciam diversos preparativos para a vida adulta, entre estes, a escolha da profissão, a conquista da autonomia e os relacionamentos amorosos (SOUZA, 2005). Associado a isso, existe o fato de que os portadores de TAB apresentam altos índices de recaídas, as quais podem ser incapacitantes e causadoras de alterações estruturais e funcionais em certas regiões do cérebro. Tais alterações afetam de forma muitas vezes irreversível, o processo cognitivo, o curso e prognóstico da doença, sendo influenciadas pela não-aderência ao tratamento farmacológico e a conseqüente agudização do Transtorno Afetivo Bipolar (FREY et al., 2004). Moreno; Moreno e Ratzke (2002) citam que as reinternações por TAB são freqüentes, sendo que estas podem estar ligadas a não adesão ao tratamento 13 medicamentoso, o qual deve prosseguir mesmo nos períodos de remissão, estrutura familiar inadequada, falta de conhecimento sobre a doença, efeitos colaterais dos medicamentos e a negação da doença. No entanto, há evidências de que o curso do TAB pode ser modificado por meio de abordagens psicoterápicas, com diferentes vertentes teóricas, dentre as quais, a Teoria Cognitivo-Comportamental, a Terapia Focada na Família, a Psicoeducação bem como a Terapia Interpessoal e de Ritmo Social. Estas têm como objetivo comum, o aumento da adesão ao tratamento, a redução dos sintomas residuais, a identificação dos indícios sindrômicos com a conseqüente prevenção das recaídas, a diminuição das taxas e períodos de hospitalizações e a melhora na qualidade de vida dos pacientes e seus familiares (KNAPP; ISOLAN, 2005). Portanto, estas abordam a psicoeducação como ferramenta primordial, que de acordo com Rotelli (1990 apud MENEZES, 2009) vem incidir com os objetivos da reforma psiquiátrica, ou seja, a não internação gradual nos manicômios por meio da criação de serviços na comunidade que desenvolvam métodos de prevenção e reabilitação psicossocial. Todavia, intervenções psicoeducacionais são esclarecimentos oferecidos ao paciente, à família e aos amigos sobre o TAB e seu tratamento, tendo como objetivo, munir o paciente com todas as informações necessárias, para que ele possa compreender e lidar com a doença e suas implicações. Assim, permitindo também que coopere com o médico em prol do seu tratamento (Colom; Vieta, 2004). Yu Yin e Oliveira (2004) através do Programa de Atendimento a Doenças Afetivas e Ansiedade da Universidade Federal de São Paulo (PRODAF), realizaram um estudo com familiares de pessoas com TAB. Este projeto realizou-se com a abordagem psicoeducativa, que teve como objetivo contribuir para a melhoria do relacionamento entre familiares e pacientes. Através de um questionário, os participantes responderam questões com os seguintes temas: idéias iniciais sobre a doença; possibilidade de diálogo com o paciente acerca da doença; impacto da doença e efeitos da intervenção. Outro estudo referente às práticas psicoeducativas foi o de Menezes (2009) realizado no Grupo de Psicoeducação para familiares e portadores do TAB, através do programa de extensão á comunidade oferecido pela Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (FAMERP). Este estudo teve como objetivo, identificar na perspectiva de portadores de TAB, as implicações de um grupo de psicoeducação no seu cotidiano. A 14 pesquisa se realizou através de entrevistas, e as questões norteadoras da mesma foram: conte-me sobre como é o seu dia a dia e como tem sido para você participar do grupo de psicoeducação. Andrade (1999) psicóloga e colaboradora do Grupo de Estudos de Doenças Afetivas do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, relata que não há uma homogeneidade na definição de objetivos e descrição de técnicas e modalidades utilizadas na abordagem psicoeducacional. A mesma cita que o que há em comum entre as diversas práticas psicoeducativas é a utilização de parte do acompanhamento clínico do paciente para o repasse de informações acerca da doença e de seu tratamento – seja para o paciente, e seja para seus familiares. De acordo com a mesma autora, as configurações psicológicas parecem ser o que mais distingue as diversas práticas clínicas dessa abordagem. Dependendo do tipo de intervenção terapêutica e do referencial teórico, os desdobramentos dos aspectos educativos serão compostos de diferentes métodos e técnicas. Para ela, a abordagem psicoeducacional é mais que gerar conhecimento ao paciente e sua família acerca do que é a doença e seu tratamento; é ajudá-los a compreenderem e dar significado à experiência vivida e engajá-los no uso dessa compreensão em seus cotidianos, valorizando a vida e preocupando-se com ela. Deste modo, para a realização deste projeto, foram revisados na literatura nacional alguns artigos de pesquisa neste âmbito, porém, verificou-se que incipientes no Brasil, não contextualizando a prática da psicologia junto ao TAB. Portanto, a relevância científica deste projeto é compreender a prática e a visão dos profissionais que utilizam a psicoeducação como forma de tratamento. Contudo, a principal relevância social da presente pesquisa é a partir da análise e exploração do discurso dos psicólogos, reforçar a manipulação das informações sob o enfoque psicoeducativo, com fins de propiciar um melhor entendimento sobre o mesmo. E é por tudo isso que tal pesquisa propõe compreender os aspectos relevantes da Psicoeducação aplicada ao tratamento do transtorno afetivo bipolar na visão de psicólogos que já utilizaram desta prática em instituições psiquiátricas. Como também, busca identificar os pressupostos da psicoeducação aplicado ao tratamento do transtorno afetivo bipolar; verificar os aspectos educativos relevantes no tratamento do transtorno e 15 analisar as técnicas da Psicoeducação e sua aplicabilidade tendo em vista o curso da doença. 16 2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA Neste capítulo, serão apresentadas revisões acerca dos temas: Doença Mental, Transtorno Afetivo Bipolar, Psicoeducação e Terapia Familiar Psicoeducacional. 2.1 DOENÇA MENTAL A loucura nem sempre foi vista sob o olhar médico, antes, era entendida como forma de manifestação do humano. Este assunto, que hoje é tão contestado, foi objeto das mais variadas explicações, desde as mitológicas, religiosas até as científicas. A história da doença mental, ou loucura, é descrita desde a origem da civilização, onde a pessoa tida como anormal era “abandonada para morrer de fome ou por ataque de animais” (RODRIGUES, 2001 apud SPADINI; SOUZA, 2006, p. 124). Para Gonçalvez (2004) a doença mental foi compreendida de diversas formas ao longo da história, sendo que, por muitas vezes, foi atribuída à punição dos deuses e a possessões demoníacas. Os remédios e soluções para os males do espírito, baseados em conhecimentos e técnicas ancestrais, iam suavizando o sofrimento e atendendo as suas mais urgentes necessidades de saúde. De acordo com o autor supracitado, ainda hoje, em sociedades ditas civilizadas e globalizadas, continuam a existir tais interpretações em torno da doença mental – “almas penadas, espíritos, possessão demoníaca, mau olhado, pragas, coisas ruins, feitiçarias, etc” (GONÇALVEZ, 2004, p. 160). Entretanto, no século XVII se reconheceu a influência psicológica das emoções sobre o corpo, onde a doença começou a ser explicada mais pela razão, perdendo-se a força dos aspectos sobrenaturais na explicação da doença. Mas, apesar de tudo, os doentes continuaram sendo excluídos da sociedade, e como forma de tratamento, eram aplicados purgativos e sangrias, eram chicoteados e morriam por falta de cuidados. No entanto, no século XVIII, houve um novo entendimento sobre o adoecimento mental, passando a ser reconhecido como um distúrbio do sistema nervoso, recebendo a designação de doença que necessitava ser estudada. Porém, manteve-se a tática de 17 excluir e isolar o doente, acreditando-se que era um tratamento que o doente mental necessitava, entendendo-se que família e sociedade eram estímulos negativos, não se considerando os fatores psicológicos e sociais (PEREIRA; LABATE; FARIAS, 1998). Contudo, historicamente, de acordo com Osinaga (1999 apud SPADINI; SOUZA, 2006) é no século XIX que a loucura nomeia-se como doença mental. Atualmente, não há uma tentativa de se chegar a um consenso sobre a descrição da doença mental. Porém, é no DSM que encontramos a descrição científica das diferentes categorias diagnósticas encontradas na atualidade. Contudo, no DSM IV-TR, ao invés de usar o termo doença mental ou loucura, usa-se o termo de transtornos mentais, que conceitua-se como: Síndromes ou padrões comportamentais ou psicológicos clinicamente importantes, que ocorrem num indivíduo e estão associados com sofrimento (p. ex., sintoma doloroso) ou incapacitação (p. ex., prejuízo em uma ou mais áreas importantes do funcionamento) ou com um risco significativamente aumentado de sofrimento, morte, dor, deficiência ou perda importante da liberdade (DSM-IV-TR (2002, p. 27). Foucault (1979) cita que foi com a chegada da família real no Brasil, que o doente mental teve uma atenção específica. Em decorrência das mudanças sociais e econômicas sucedidas, e para colocar em ordem o desenvolvimento das cidades e das populações, fez-se necessário o uso de medidas de controle, entre essas, a criação de um espaço, que retirasse das ruas aqueles que ameaçavam a paz e a ordem social. Posteriormente, em 1841, foi criado, no Rio de Janeiro, o primeiro hospital psiquiátrico brasileiro, Hospital Dom Pedro II (MACHADO; LOUREIRO; LUZ, 1978). Nessa perspectiva, de acordo com Machado (1978 apud FRANCISCHETTO; OLIVEIRA, 2008) o louco passou a ser considerado doentio e passível de tratamento. Baseado no princípio do isolamento, o hospício Pedro II foi o lugar de exercício da ação terapêutica da recém criada ciência psiquiátrica, constituindo-se, assim, o Modelo Asilar apoiado na proposta de tratamento moral estabelecida por Pinel e Esquirol. Entretanto, na década de 70 são registradas várias denúncias quanto à política brasileira de saúde mental em relação às condições (públicas e privadas) de atendimento psiquiátrico à população. É nesse contexto, que no fim da década citada, nasce à demanda pela reforma psiquiátrica no Brasil. Pequenos núcleos estaduais, principalmente nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais constituem o Movimento de Trabalhadores em Saúde Mental (MTSM) que colocam em xeque a 18 política psiquiátrica praticada no país (MESQUITA; NOVELLINO; CAVALCANTI, 2010). Além disso, de acordo com os autores supracitados, na década de 80 acontecem vários encontros preparatórios para a I Conferência Nacional de Saúde Mental (I CNSM), que ocorreu em 1987 os quais aconselham a priorização de investimentos nos serviços extra-hospitalares e multiprofissionais como oposição à tendência Hospitalocêntrico. No final de 1987 realiza-se o II Congresso Nacional do MTSM em Bauru, SP, aonde se consolida o Movimento de Luta Antimanicomial e é instalado o lema “por uma sociedade sem manicômios”. No entanto, Terra et al. (2006) cita que em 06 de abril de 2001 foi aprovada a Lei nº 10.216, que dispõe sobre a proteção e os direitos dos portadores de transtorno mental, redirecionando o padrão assistencial em saúde mental, não sendo mais centrado no hospital psiquiátrico e também não permitindo a construção de novos hospitais. Essa lei indicava a extinção dos manicômios e sua substituição por instituições abertas, tais como: Unidades de Saúde Mental em Hospital Geral, Emergência Psiquiátrica em Pronto-Socorro Geral, Unidade de Atenção Intensiva em Saúde Mental em regime de Hospital-Dia, Centro de Atenção Psicossocial (CAPS), Núcleos de Atenção Psicossociais (NAPS) que funcionariam por vinte e quatro horas, pensões protegidas, etc. Para dar início a esse desafio, surgiram os serviços de saúde mental ambulatoriais, tendo como propósito, reverter antigas práticas, utilizando novas referências de atendimento ao paciente por meio de intervenções de diversos profissionais, com formação e prática norteadas para a assistência comunitária (SILVEIRA; ALVES, 2003). Os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) foram criados com a proposta de prestar uma assistência mais adequada e humanizada. Tais centros caracterizam-se por serem serviços de atendimento comunitário ambulatorial que assumem a responsabilidade de cuidar de pessoas que sofrem com transtornos mentais na sua região de abrangência (BRASIL, 2002). Spadini e Souza (2006) relatam que hoje, já se sabe que a doença mental, explicada por causas biológicas, psicológicas e sociais, precisa de assistência adequada com fins de ressocializar o doente e de oferecer apoio apropriado para este e para a sua família. No entanto, a ressocialização ainda é difícil, pois a doença mental em certos 19 casos, ainda é vista como uma violação das regras sociais, entendida como uma desordem, não é tolerada e, portanto, isolada. Porém, nos primórdios da psiquiatria, a família do doente não o acompanhava, permanecia totalmente ausente e sem tomar parte ou interessar-se pelo “tratamento” que era oferecido ao seu familiar. Assim, a família abduzia-se dos cuidados ao doente, pois essa relação era subsidiada pelo modelo da exclusão do mesmo, sendo ela, considerada uma das causas para a doença de seu familiar. Contudo, se antes a família era afastada do doente pelo entendimento de que atrapalhava o tratamento do mesmo, hoje ela é incluída, pois entende-se que o portador de doença mental necessita de um tratamento digno, e que a participação da família é fundamental para sua recuperação (SPADINI; SOUZA, 2006). Assim, portanto, na próxima sessão, serão abordadas as questões que englobam o Transtorno Afetivo Bipolar. 2.2 TRANSTORNO AFETIVO BIPOLAR O TAB é uma doença grave, que tem como característica a recorrência de episódios de mania e depressão, impactando drasticamente na qualidade de vida daqueles acometidos (GOMES; LAFER, 2007). De acordo com o DSM-IV-TR (2002) conhecido anteriormente como psicose maníaco-depressiva, o TAB deixou de ter essa denominação pelos sintomas psicóticos que não são tão freqüentes, mas prosseguindo os episódios maníacos, sendo a mania sua marca registrada. Para Moreno et al. (1999 apud MIASSO, 2006) o TAB é a forma mais grave de transtorno de humor. Tendo em vista seu caráter recorrente, estima-se em média, que o número de episódios no decorrer da vida é de nove, sendo que 48 % dos pacientes apresentam mais de cinco episódios. Todavia, comparado com outros transtornos psiquiátricos, os pacientes bipolares não tratados estão dentre aqueles que apresentam elevado risco de suicídio, pois até 60% dos bipolares que apresentam episódios de hipomania com depressão tentam suicídio durante a evolução do transtorno (JURUENA, 2001). 20 Porém, para Kaplan; Grebb e Sadock (1997) os indivíduos com idade inferior a 50 anos são mais propensos de um primeiro surto, em contra partida, os que já o possuem, enfrentam um grande risco de ter um episódio maníaco ou depressivo recorrente, na medida em que envelhecem. Para Santin; Ceresér e Rosa (2005) durante a vida, o TAB do tipo I acomete cerca de 0,8% da população adulta, onde, homens e mulheres são igualmente afetados. Já o TAB do tipo II afeta cerca de 0,5% da população, sendo mais comum em mulheres. Entretanto, Sanches e Jorge (2004) citam que, se levar em consideração o conteúdo fisiopatológico do TAB, este estaria ligado à falta de coordenação orgânica das áreas do cérebro responsáveis pelas emoções. Desta forma, estudos realizados por Frey et al. (2004) por meio de neuroimagem, evidenciam várias alterações na estrutura e no funcionamento de determinadas regiões do cérebro de indivíduos bipolares, como córtex pré-frontal e temporal, cerebelo, gânglios da base e sistema límbico. Para Nunes; Bueno e Nardi (2001) um dos principais fatores biológicos que favorecem o TAB é a tendência genética ou hereditária, aumentando o risco de ocorrência de transtorno de humor na descendência em oito a vinte vezes mais que a expectativa na população normal. Porém, crises existenciais chegaram a ser diretamente implicadas na etiopatogenia ou na eclosão dos transtornos de humor, não restando dúvidas de que a presença de agentes estressores permanentes precipita e influencia o curso do transtorno de humor. Miklowitz et al. (1988 apud JUSTO; CALIL 2004) vai de acordo com o que o autor acima citado diz e fala que existem estudos indicando que, acontecimentos estressantes ou traumáticos da vida, podem antecipar episódios ou interferir na capacidade de recuperação do paciente. Esses episódios podem estar ligados a problemas familiares, conjugais, a ruptura de ritmos cronobiológicos ou estarem relacionados ao suporte social e a qualidade de relacionamentos afetivos. No entanto, Cordioli (2008) cita que vários estudos têm demonstrado que pacientes bipolares possuem características específicas de personalidade, em termos de comportamento e cognição. Tais fatores cognitivos, possivelmente formam sua própria vulnerabilidade para o desenvolvimento de sintomas no transtorno bipolar, não sendo apenas sinais periféricos. Apesar de a questão genética ser muito importante, existe vários casos de transtorno bipolar em que não existe nada na história familiar da pessoa que justifique 21 esse transtorno. Vários casos de transtorno bipolar na verdade são sintomas iniciais de outras doenças, sendo muito freqüente, o desencadeamento e a manutenção de um episódio afetivo por efeito de medicamentos e drogas (TUNG, 2007). Souza (2005) divide o tratamento do TAB em três fases: aguda, continuação e manutenção, sendo que na fase aguda, o objetivo é tratar a mania sem causar depressão e /ou aliviar efetivamente à depressão sem ocasionar mania. A meta na fase de continuação é consolidar os benefícios, diminuir os efeitos colaterais, tratar até reduzir a possibilidade de recaída e aumentar o funcionamento global. Já no tratamento de manutenção, as metas são prevenir mania e/ou depressão e elevar ao máximo a recuperação funcional, ou seja, que o paciente permaneça em remissão, conseguindo alcançar assim a eutimia e, por conseguinte a reinserção social. Entretanto, de acordo com Frey et al. (2004) o tratamento do TAB consiste em estratégias farmacológicas e não-farmacológicas. As farmacológicas envolvem os medicamentos estabilizadores do humor, tais como o Lítio, Anticonvulsivantes e Antipsicóticos. Estes têm como finalidade controlar a fase aguda e prevenir novos episódios e têm um papel fundamental na reparação da plástica sináptica, compensando uma série de alterações funcionais e estruturais em determinadas regiões do cérebro geradas pelas recaídas. E o tratamento não-farmacológico consiste nas Psicoterapias, que objetivam, principalmente, o aumento da adesão ao tratamento, a redução dos sintomas residuais, a prevenção das recaídas, a diminuição das taxas e períodos de hospitalizações e a melhora na qualidade de vida dos pacientes e de seus familiares (KNAPP; ISOLAN, 2005). Todavia, sabe-se que 66% dos pacientes com TAB tratados com lítio respondem ao tratamento, mas apenas a metade apresenta benefícios clínicos, existindo desta forma, uma lacuna entre a eficácia e a efetividade dos estabilizadores de humor. Porém, apenas 1% a 2% de todas as publicações abordam quais são os fatores relacionados com a baixa eficácia na profilaxia dos transtornos bipolares, apesar de aproximadamente 50% dos pacientes bipolares interromper o tratamento pelo menos uma vez, enquanto 30% deles o fazem ao menos duas vezes. (SCOTT; POPE, 2002 apud SANTIN; CERESÉR; ROSA, 2003). Santin; Ceresér e Rosa (2003) citam em seu artigo que as taxas de não-adesão no TAB são altas, representando 47% em determinada fase do tratamento ou 52% durante um período de dois anos, podendo assim, aumentar a recorrência de mania, pois 60% 22 dos pacientes internados com mania aguda apresentavam falhas no uso da medicação no mês que antecedeu a sua hospitalização. Cordioli (1998) traz em seu livro alguns fatores para a não aderência, que incluem: história prévia de não aderência; início recente da doença; idade baixa; sexo masculino; história de humor elevado, grandioso ou eufórico; queixas de “saudade” dos períodos em “alta”; aspetos da relação médico-paciente, inclusive o grau de confiança do médico na validade do tratamento. Já para Leite e Vasconcellos (2003), os motivos para não adesão ao tratamento medicamentoso são: o acesso econômico aos medicamentos, o número muito elevado de medicações prescritas e o esquema terapêutico, mesmo quando o medicamento é fornecido gratuitamente, os efeitos colaterais e a ausência de sintomas em certas fases da doença. Alguns pacientes não aderem ao tratamento porque se recusam a aceitar que possuem a doença (SANTIN; CERESER & ROSA, 2005). Assim, a capacidade de reconhecer os sintomas da aproximação da doença e a habilidade de desenvolver estratégias para lidar com eles é provavelmente um aspecto fundamental para um bom prognóstico no TAB (GOMES; LAFER, 2007). Contudo, Zaretsky (2003, apud MIASSO, 2006) menciona que, intervenções psicossociais e psicológicas adjuntas ao tratamento medicamentoso podem ser eficazes, aumentando o tempo entre as crises, diminuindo a intensidade dos episódios e o ajudando na aceitação do tratamento, ao ressaltar a importância do uso correto do mesmo. 23 Quadro 1 – Classificação dos Transtornos/Episódios suas características e sintomas (continua) TRANSTORNO/EPISÓDIO CARACSTERÍSTICAS Um SINTOMAS ou mais Episódios Ver sintomas do Episódio Maníacos ou geralmente acompanhados Depressivos Maiores. Mistos, Maníaco, Misto e por Episódios Depressivos TRANSTORNO BIPOLAR I Maiores. Um ou mais Episódios Ver sintomas do Episódio Depressivos Maiores, Depressivo acompanhado menos TRANSTORNO BIPOLAR II por um Maior e pelo Hipomaníaco. Episódio Hipomaníaco. Um ou mais Episódios Humor deprimido, perda Depressivos Maiores, com do interesse ou prazer, pelo menos duas semanas de insônia ou hipersônia humor deprimido ou perda quase todos os dias, fadiga EPISÓDIO DEPRESSIVO MAIOR de interesse, acompanhados ou por pelo sintomas depressão. menos perda quatro pensamentos adicionais de de energia, morte de recorrentes, sentimento de inutilidade, diminuída capacidade de pensar, marcante perda da libido, marcante perda de apetite, etc. 24 Quadro 1 – Classificação dos Transtornos/Episódios suas características e sintomas (continuação) No mínimo uma semana de Necessidade de sono pressão por humor anormal, diminuída, persistentemente elevado, falar, auto-estima inflada expansivo irritável, ou grandiosidade (delirante ou devendo ser acompanhado ou não), fuga de idéias, EPISÓDIO MANÍACO por pelo menos sintomas eufóricos. três agitação psicomotora, perda de inibições sociais normais, comportamento imprudente, energia sexual marcante, etc. No mínimo uma semana, Tristeza, irritabilidade, durante o qual atendam os euforia, angústia, vontade critérios tanto para Episódio de morrer, insônia, raiva, Depressivo Maior quanto agitação psicomotora, fuga para EPISÓDIO MISTO Episódio Maníaco. de idéias, fadiga ou perda Praticamente todos os dias o de energia, pressão por sujeito apresenta uma breve falar, perda mudança de humor. do perda da libido, interesse ou prazer, etc. No mínimo quatro dias de Atividade aumentada ou humor EPISÓDIO HIPOMANÍACO anormal e inquietação física, persistentemente elevado, distrabilidade, diminuição expansivo irritável, da necessidade de sono, sendo ou acompanhada por aumento da energia sexual, pelo menos três sintomas leve excesso de gastos, eufóricos. sociabilidade etc. aumentada, 25 Quadro 1 – Classificação dos Transtornos/Episódios suas características e sintomas (continuação) Um ou Episódios Humor deprimido, perda mais Depressivos Maiores, pelo do interesse ou prazer, menos duas semanas de insônia ou hipersônia humor deprimido ou perda quase todos os dias, fadiga TRANSTORNO DEPRESSIVO de interesse, acompanhados ou MAIOR por pelo perda de quatro pensamentos menos de energia, morte sintomas de depressão, sem recorrentes, sentimento de história Episódios inutilidade, etc. de Maníacos, Mistos ou Hipomaníacos. Dois anos deprimido, de humor Insônia, diminuição de acompanhado energia ou atividade, perda por sintomas depressivos de autoconfiança, choro que não critérios satisfazem para Depressivo Maior. TRANSTORNO DISTÍMICO os freqüente, sentimentos de Episódio desesperança, incapacidade de perceptível lidar com responsabilidades rotineiras cotidiana, etc. da vida 26 Quadro 1 – Classificação dos Transtornos/Episódios suas características e sintomas (conclusão) Dois anos com numerosos Diminuição de energia ou sintomas hipomaníacos, não atividade, satisfazendo os critérios pessimismo a respeito do TRANSTORNO para Episódio Maníaco e futuro, CICLOTÍMICO numerosos dificuldade de sintomas concentração, aumento da depressivos, satisfazendo insônia, não energia os ou atividade, critérios diminuição da necessidade para Episódio Depressivo de Maior. sono, sociabilidade aumentada, otimismo excessivo, etc. Fonte: Adaptado do DSM-IV-TR (2002) e CID – 10 (1998) Com tudo isso, após serem elucidadas as questões referentes ao TAB, no próximo capítulo será abordado temas da psicoeducação e suas intervenções. 2.3 PSICOEDUCAÇÃO Apesar de o TAB ser caracterizado por fortes indicadores biológicos e o tratamento farmacológico ser impreterível, é necessário que exista uma atenção psicossocial, considerando que no tratamento estritamente biológico são altos os índices de não aderência e recaídas. Portanto, é essencial integrar abordagens terapêuticas que busquem a aplicação clínica do modelo biopsicossocial e a inclusão e valorização da participação dos pacientes e de sua família (ANDRADE, 1999). De acordo com o autor supracitado, entre as abordagens não farmacológicas há a Psicoeducação, desenvolvida a partir da década de 70 como um tratamento suplementar ao fármaco, com a intenção de manter o paciente inserido na comunidade. Por isso, esta abordagem é vista como sendo um dos modelos de reabilitação psicossocial, considerando que a mesma compreende o desenvolvimento de um conjunto de 27 programas e serviços que visam facilitar a vida de pessoas com problemas severos e persistentes em saúde mental (GUERRA, 2004). Caminha et al. (2003 apud FREITAS, 2010, p. 16) cita que: Psicoeducação é uma disciplina científica de conhecimento e atuação bidimensional entre a Saúde e a Educação, que interage com o processo de aprendizagem humano, especificamente orientada para os seus padrões normais e patológicos, considerando a influência do meio, da família, da sociedade e do percurso profissional do indivíduo na sua trajetória de vida. A definição de psicoeducação para Andrade (1999) varia de acordo com os pressupostos e objetivos que os profissionais pretendem alcançar, sendo a abordagem dos aspectos psicológicos o que mais diferencia uma prática clínica de outra. Dessa forma, existem diferentes métodos e técnicas, dependendo do tipo de intervenção e do referencial teórico adotados. Tal forma de tratamento caracteriza-se por ser limitada no tempo, diretiva, com foco no presente e na busca de resolução de problemas. Ademais, é uma abordagem fundamentada em técnicas experimentais e científicas, onde parte-se da hipótese de que as cognições norteiam as emoções e os comportamentos. Para o processo de educação, são utilizados folders elucidativos, livros acessíveis a leigos, filmes, esclarecimentos, entre outros. Estes tornam-se essenciais, pois é através destas informações que o paciente aprende sobre o funcionamento de sua patologia, conseguindo assim, identificar comportamentos e pensamentos distorcidos/disfuncionais e que acabam provocando angústia e sofrimento (BASCO; RUSH, 2005 apud FIGUEIREDO et al., 2009). Para Knapp e Isolan (2005) um dos principais objetivos da psicoeducação é a adesão à medicação. Embasada no modelo médico biopsicossocial, a psicoeducação visa fornecer informações aos pacientes sobre a natureza e o tratamento do transtorno bipolar, provendo ensinamentos teóricos e práticos para que o paciente possa compreender e lidar melhor com a sua doença. Outros temas abordados em intervenções psicoeducacionais abrangem a identificação precoce de sintomas prodrômicos, a reprimir o uso de drogas de abuso e o manejo de situações provocadoras do estresse e da ansiedade, entre outros. 28 No entanto, para Justo e Calil (2004) o objetivo inicial da psicoeducação é fazer do paciente um cooperador ativo, aliado dos profissionais de saúde envolvidos e, logo, usar-se do procedimento terapêutico mais efetivo. Porém, nas fases agudas do transtorno, as intervenções devem focar na melhora do vínculo terapêutico entre terapeuta e paciente e na adesão ao tratamento. Durante as fases de eutimia, enfatiza-se o uso de terapias de psicoeducação e de terapia cognitivocomportamental voltadas para o melhor entendimento da doença e de aspectos gerais do tratamento, como o uso de medicação (CORDIOLI, 1998). Contudo, Callaham e Bauer (1999 apud Justo e Calil, 2004) definem psicoeducação como a tentativa de implementar, no paciente, familiares e profissionais, meios para lidar com a doença, através do compartilhamento bidirecional de informações relevantes. De fato, a psicoeducação tem se mostrado uma estratégia que apresenta resultados promissores, permitindo o rápido reconhecimento de recaídas. Ultimamente, é uma medida profilática crucial no tratamento e manutenção do TAB, de modo que os clínicos envolvidos devam estar abertos ao manejo de tal prática (COLOM; VIETA, 2004). Cordioli (1998) cita que existem quatro tipos de intervenções psicossociais testadas por estudos: psicoeducação, terapia cognitivo-comportamental, terapia familiar e terapia interpessoal e de ritmo social, e que, apesar de terem pressupostos teóricos diferentes, as quatro abordam tópicos semelhantes, baseando-se no modelo de psicoeducação com algumas modificações ou especificidades. A Terapia Focada na Família (TFF) é uma abordagem voltada aos familiares do portador de TAB, empregada no curso do tratamento, como forma de amenizar o nível de estresse na família através do desenvolvimento de estratégias que permitam aos familiares lidar com a doença e com o manejo dos sintomas (MACHADO-VIEIRA; SANTIN; SOARES, 2004). A Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) é constituída por diferentes etapas e utiliza o elemento educacional, visando à colaboração, através do modelo cognitivo e do ensino, quanto à identificação e análise de alterações cognitivas que incidem tanto na mania quanto na depressão. Os sintomas atrelados a esses episódios, assim como os subsindrômicos são monitorados na TCC, a partir de técnicas como o mapeamento de vida, identificação de sintomas, gráfico do humor e afetivograma. Assim, a TCC traba- 29 lha com o paciente os diversos significados que o transtorno tem para ele (NETO, 2004). De acordo com Knapp e Isolan (2005) a TCC é na maioria das vezes utilizada no formato individual, apesar de que as técnicas de grupo tenham sido desenvolvidas e testadas. Os objetivos da TCC no transtorno bipolar são: educar pacientes e familiares sobre o transtorno bipolar, seu tratamento e suas dificuldades adjuntas à doença, ensinar técnicas para monitorar o episódio, a gravidade e o fluxo dos sintomas, promover a aceitação e a cooperação no tratamento, apresentar técnicas não-farmacológicas para lidar com sintomas e problemas, auxiliar o paciente a enfrentar fatores estressantes que estejam interferindo no tratamento, estimular a aceitação da doença, aumentar o efeito protetor da família e atenuar o trauma e o estigma associado à doença. A observação de que vários pacientes com transtorno bipolar apresentam menos oscilações de humor quando conservam um estilo regular nas suas atividades diárias (sono, alimentação, atividade física) induziu ao desenvolvimento da psicoterapia chamada de Terapia Interpessoal e de Ritmo Social (TIP/RS) (KNAPP; ISOLAN, 2005). A TIP/RS de acordo com Frank et al. (1994; 2000 apud JUSTO; CALIL, 2004) é desenvolvida individualmente e foi criada especificamente para o tratamento do TAB, a partir da pressuposição do envolvimento de alterações de ordem cronobiológica na origem do transtorno. Há a hipótese de um distúrbio genético que induziria as irregularidades do ritmo circadiano e do ciclo sono-vigília que, por sua vez, estariam ligados aos sintomas bipolares. Os fatos da vida, tanto negativos quanto positivos, poderiam ser responsáveis por rupturas da harmonia cronobiológica e a terapia, ajustando princípios de psicoterapia interpessoal e técnicas comportamentais, busca manter essa regularidade. Assim, há boas proeminências para indicar que as intervenções de psicoeducação, individuais ou em grupo, adjuntas à farmacoterapia, podem ser promissoras para o tratamento de pacientes bipolares. Mesmo intervenções breves que ressaltam a adesão à medicação e a identificação precoce dos sintomas podem ser favoráveis na prevenção de novos episódios de humor e em períodos mais prolongados de eutimia. No entanto, pacientes que aderem às medicações e que são conhecedores de seus sintomas prodrômicos possivelmente se favorecerão de outras intervenções com abordagens mais amplas (KNAPP; ISOLAN, 2005). 30 Colom e Vieta (2004) destacam doze tópicos essenciais a serem abordados em um programa psicoeducacional para pacientes bipolares, nos quais: 1) Informação sobre os altos índices de recorrência associados à doença e à sua condição crônica; 2) Informação sobre os fatores de desencadeamento e um treinamento pessoal para auxiliar os pacientes a identificarem os seus próprios; 3) Informação sobre os agentes psicofarmacológicos, suas vantagens e seus potenciais efeitos colaterais; 4) Treinamento na detecção precoce dos sintomas prodrômicos; 5) Composição de um "plano de emergência"; 6) Treinamento sobre o manejo dos sintomas; 7) Informação sobre os riscos associados ao uso de drogas ilícitas, café e álcool; 8) Ênfase sobre a importância de rotinas de manutenção – especialmente hábitos de sono; 9) Promoção de hábitos saudáveis; 10) Treinamento em gerenciamento de estresse; 11) Informação concreta sobre alguns assuntos como gravidez e transtornos bipolares e risco de suicídio; 12) Lidar com o estigma e outros problemas sociais relacionados à doença que os pacientes bipolares não podem discutir facilmente com seus amigos "saudáveis". A psicoeducação precisa abranger, também, os fatores que interferem na evolução do transtorno bipolar e outros aspectos particulares a cada portador, fatores de vulnerabilidade e o contexto em que vive. Para tanto, deve-se favorecer a participação do paciente no sentido de explicitar seu modo de entender sua situação, o que poderá promover discussões muito produtivas no grupo (JUSTO; CALIL, 2004). Cabe destacar que, a psicoeducação necessita ser feita em períodos de eutimia, pois, os pacientes em fase depressiva, podem ter uma tendência em se apropriar apenas dos aspectos negativos da psicoeducação, ocasionando dificuldades cognitivas que podem prejudicar o aprendizado desta. Já os indivíduos em estado maníaco, devido a 31 sua distratibilidade e a outros distúrbios cognitivos, podem não armazenar nenhuma informação (COLOM; VIETA, 2004). Assim, Rouget e Aubry (2007 apud Menezes, 2009) citam que a psicoeducação deveria ser parte integrante do tratamento do transtorno afetivo bipolar, sendo reconhecida como uma intervenção psicológica de primeira linha, aplicável a maioria dos pacientes e seus familiares, podendo ser realizada por uma ampla gama de profissionais treinados nesta abordagem. Contudo, promover a educação sobre a doença, a identificação e manejo de comorbidades, bem como o estímulo para mudanças positivas no estilo de vida do paciente e sua família são importantes papéis que devem ser exercidos pela equipe multidisciplinar no tratamento de pacientes com transtorno de humor. Inclusive, deve ser encarada como um dever do profissional frente ao portador, visto que faz parte dos direitos do paciente ser informado sobre sua doença (MACHADO-VIEIRA; SANTIN; SOARES, 2004). 2.4 TERAPIA FAMILIAR PSICOEDUCACIONAL A terapia familiar teve seu início nos Estados Unidos, na década de 50, devido a duas causas principais: o trabalho com esquizofrênicos e com crianças, ambos dependentes de suas famílias (CORDIOLI, 1998). Inspirados pela busca de soluções terapêuticas para populações clínicas não favorecidas por tratamentos convencionais, que surgiram os primeiros modelos de Terapia Familiar. Pacientes psicóticos e adolescentes delinqüentes levaram os terapeutas da década de 1950, a não seguir com os protocolos da prática clínica convencional, incluindo as famílias nos tratamentos, desenvolvendo-se assim várias abordagens para a compreensão dos problemas (GRANDESSO, 2008). De acordo com o autor supracitado, as diversas abordagens de Terapia Familiar surgiram, portanto, da falta de um padrão unificador, resultando em distintos avanços conceituais, na busca de descrever e esclarecer os problemas particulares de cada grupo perante os desafios da prática clínica. 32 Entretanto, a terapia familiar de acordo com a tradição foi designada para a cura dos sintomas e a solução dos problemas, porém, na última década, surgiu uma nova compreensão de terapia familiar. Esta, em vez de curar as síndromes médicas ou psiquiátricas, tem como finalidade elevar ao máximo as habilidades de funcionamento e enfrentamento dos pacientes e de suas famílias (NICHOLS; SCHWARTZ, 1998). Assim, as famílias estão adquirindo um novo espaço em relação aos transtornos psiquiátricos, suas necessidades estão sendo analisadas e sua participação no tratamento está mais ativa, estando juntamente integrada à equipe de cuidados com o doente mental (YACUBIAN; NETO, 2001). De acordo com Mendes e Rodrigues (2010) a família desempenha um papel fundamental no tratamento do paciente com Transtorno Afetivo Bipolar, de modo a propiciar um suporte mais sólido para que o paciente possa realizar o tratamento e não recair. Mas, sem informações básicas sobre os sintomas e tratamento da doença, as famílias não conseguem serem efetivas junto à equipe de cuidados com o doente mental, estando sempre dependente dos serviços profissionais, gerando desta forma, um aumento no custo do tratamento e na sobrecarga para os familiares (YACUBIAN; NETO, 2001). Com base nisso, é feita a intervenção direcionada à família, oferecendo suporte emocional por meio de um diálogo no qual os familiares possam expor suas angústias, sofrimentos e dúvidas (CORDIOLI, 2008). Para Knapp e Isolan (2005) as intervenções com familiares de pacientes com transtorno bipolar têm como principais objetivos: 1) Modificar as interações familiares que interferem no tratamento; 2) Psicoeducação para o pacientes e para os seus familiares sobre o transtorno bipolar; 3) Desenvolvimento de habilidades de comunicação e 4) Desenvolvimento de habilidades de resolução de problemas. Contudo, a Terapia Familiar como processo psicoeducacional, mesmo que realizada somente com os familiares de pacientes com transtorno bipolar, pode ser considerada uma importante estratégia de atenção à saúde destes cuidadores, bem como um meio qualificador dos cuidados prestados ao indivíduo diagnosticado com o mesmo (FIGUEIREDO et al., 2009). 33 3 MÉTODO 3.1 DELINEAMENTO DA PESQUISA O presente capítulo tem por objetivo expor o caráter metodológico adotado na realização desta pesquisa, como forma de garantir a confiabilidade e o rigor científico do trabalho. Para realizar este projeto de pesquisa, foi realizado um levantamento bibliográfico exploratório, utilizando-se o banco de dados da biblioteca virtual do SciELO, o banco de dados do Google acadêmico, o banco de dados da PEPSIC, livros, teses de doutorado, dissertações de mestrado e monografias sobre o tema da Psicoeducação e Transtorno Afetivo Bipolar. Este levantamento auxiliou na construção da fundamentação teórica. Porém, o foco da pesquisa será em compreender os aspectos relevantes da Psicoeducação aplicada ao tratamento do transtorno afetivo bipolar na visão de psicólogos que desenvolveram esta prática. Portanto foi realizada uma pesquisa qualitativa e exploratória. A escolha pela pesquisa qualitativa foi por esta investigar uma realidade que não pode ser quantificada. Esse tipo de análise trabalha com o universo de significados, valores, crenças, atitudes e fenômenos aos quais não podem ser reduzidos à operacionalização variáveis (MINAYO, 2001). De acordo com Gil (1999) as pesquisas exploratórias têm como objetivo proporcionar maior familiaridade com o problema, com vistas a torná-lo mais explícito ou a constituir hipóteses. Este tipo de pesquisa tem como desígnio o “aprimoramento de idéias ou a descoberta de intuições. Seu planejamento é bastante flexível, de modo que possibilite a consideração dos mais variados aspectos ao fato estudado” (Gil, 2002, p. 41). 34 3.2 SUJEITOS Para a seleção dos sujeitos para presente pesquisa, os critérios de inclusão e exclusão utilizados foram: Critérios de Inclusão: • Graduação em Psicologia, regularmente matriculado no Conselho Regional de Psicologia; • Deverá ter experiência de trabalho em Instituição Psiquiátrica; • Utilizar de abordagem psicoterápica em Psicologia para fundamentar a sua prática profissional. Critério de Exclusão: • Possuir vínculo empregatício com alguma instituição psiquiátrica no momento da seleção da amostra. Este critério de exclusão foi estipulado, por este vínculo empregatício implicar que o projeto seja submetido à aprovação da comissão de ética do hospital onde este desempenha a função de psicólogo (a). A amostra é composta por 3 (três) sujeitos, oriundos de instituição de assistência psiquiátrica, sendo que, a escolha da amostra foi por conveniência, onde, de acordo com Gil (1999) se constitui como a menos rigorosa. “O pesquisador seleciona os elementos a que tem acesso, admitindo que estes possam, de alguma forma, representar o universo” (Gil, 1999, p. 104). Portanto, os sujeitos foram indicados por professores do curso de Psicologia da Univali, campus - Biguaçu, que mantém contato profissional com sujeitos que trabalharam no contexto institucional psiquiátrico. Se, mais que três sujeitos se enquadrarem nos critérios de seleção, será feito um sorteio para escolher os três que participarão da pesquisa, porém, se houver apenas dois que se encaixem nos critérios, a pesquisa poderá ser feita com apenas estes, não sendo menos que dois participantes o 35 total da amostra selecionada. Contudo, no quadro a seguir será apresentado o perfil de cada sujeito entrevistado. Quadro 2 – Perfil dos Sujeitos Entrevistados ENTREVISTADOS NOME IDADE SEXO ESTADO CIVIL Sujeito 01 L 41 F Casada Sujeito 02 L 26 F Casada Sujeito 03 M 31 F Casada 3.3 PROCEDIMENTOS DE COLETA DOS DADOS Para a coleta de dados, foi agendado um horário com cada psicólogo selecionado, onde nos encontramos no local e horário estipulado de acordo com as necessidades do entrevistado e entrevistador. Sendo que o local escolhido ofereceu condições adequadas para que o sigilo e a ética na pesquisa com seres humanos fossem resguardados. Porém, antes de começar a entrevista, foram explicados aos sujeitos os procedimentos utilizados para a coleta dos dados. Foi esclarecido que a entrevista iria ser gravada em um gravador, para que depois a mesma pudesse ser transcrita, porém, antes de começar a entrevista, foi entregue a cada sujeito o termo de consentimento livre e esclarecido (APÊNDICE A), para que se sinta à vontade em participar ou não da mesma. A coleta de dados foi realizada mediante a realização de entrevistas semi estruturadas, baseadas no roteiro temático (APÊNDICE B) na qual, segundo Gil (1999) o entrevistador permite que o entrevistado fale livremente sobre o assunto, porém, 36 quando este se desvia do tema original, esforça-se para sua retomada. Este instrumento foi utilizado nesta pesquisa, pois atende as necessidades dos objetivos deste estudo. Isto porque, esse instrumento permite aos entrevistados, a partir de perguntas abertas, construírem sentidos com suas respostas, a partir das suas práticas discursivas cotidianas (RICHARDSON, 1999). A entrevista é uma prática discursiva, pois é uma interação que se dá em um determinado contexto, com objetivos claros e por meio da qual se “produzem sentidos e se constroem versões da realidade” (SPINK, 2004, p.186). 3.4 PROCEDIMENTOS DE ANÁLISE DOS DADOS A análise dos dados foi realizada de acordo com as técnicas desenvolvidas por Spink (2004) nos procedimentos metodológicos com as práticas discursivas e produção de sentidos no cotidiano. A técnica que utilizamos nesta pesquisa para elucidar as entrevistas realizadas foram os mapas de associação de ideias, que tem o objetivo de “sistematizar o processo de análise das práticas discursivas em busca dos aspectos formais da construção lingüística dos repertórios utilizados nessa construção e da ideologia implícita na produção de sentidos” (SPINK, 2004, p.107). Segundo a autora, os mapas auxiliam na interpretação das práticas discursivas dos entrevistados e facilitam a comunicação dos passos posteriores ao processo interpretativo. De acordo com a autora supracitada a elaboração dos mapas tem início com a definição das categorias atendendo aos propósitos dos objetivos, constituindo assim formas de visualizar as dimensões teóricas da pesquisa. Organizam-se então os conteúdos conforme as categorias, mantendo intacto o diálogo e a seqüência das falas de cada participante. “Os mapas não são técnicas fechadas” (p.107), mesmo que no início da técnica as categorias são definidas em função dos objetivos da pesquisa, estas categorias no decorrer da análise podem sofrer modificações, tende a ocorrer sempre à interação da análise de conteúdo e elaboração das categorias (SPINK, 2004, p.107). A construção dos mapas “rompe com as formas usuais de análise categorial” (p.107), pois nesta construção o pesquisador tem de digitar a entrevista na íntegra, elaborar uma 37 tabela onde irá conter colunas com relação ao número de categorias utilizadas e posteriormente realizar a transcrição de alguns conteúdos da entrevista para as determinadas categorias. 3.5 CUIDADOS ÉTICOS Todos os sujeitos envolvidos nessa pesquisa serão informados quanto aos aspectos éticos, de acordo com a resolução do CFP n° 016/2000, e apontado no código de ética profissional do Psicólogo, nos artigos 9° e 16°, ressaltando: O dever do psicólogo em respeitar sigilo profissional, tem por finalidade proteger a intimidade das pessoas, grupos ou organizações, que tenha acesso em seu exercício profissional, art. n° 9; Os participantes não receberão ou pagarão quaisquer valores para a participação na pesquisa; Todos os objetivos da pesquisa serão esclarecidos aos participantes, como também, o uso das informações; Avaliar os riscos envolvidos na pesquisa, tanto pelos procedimentos quanto a divulgação dos resultados, com objetivo de proteção dos envolvidos, art. n° 16 alínea “a”; É garantida a participação voluntária na pesquisa, de acordo com o termo de consentimento (APÊNDICE A), salvo nas situações previstas em específica legislação e respeitando os princípios deste Código, art. 16 alínea “b”; Garantido o anonimato das pessoas envolvidas na pesquisa, grupos ou organizações, salvo interesse manifesto destes, art. 16 alínea “c”; Garantido também o acesso às pessoas, grupos ou organizações aos resultados das pesquisas ou estudos, sempre que assim o desejarem art. 16 alínea “d”. Os esclarecimentos prestados acima visam o respeito aos sujeitos de pesquisa, observando de igual maneira sua integridade física, psíquica e social, observando o cumprimento das normas do Código da profissão da Psicologia em vigor, seguindo também as normas previstas na resolução 196/1996 do Conselho Nacional de Saúde. 38 Com isso, o trabalho de pesquisa se realizará permitindo o conhecimento e esclarecimento sobre os termos de consentimento aos sujeitos, visando de acordo com os termos, o respeito e o comprometimento do pesquisador frente aos entrevistados. Por conseguinte esclarecemos que ao final da investigação será feita uma devolutiva dos resultados aos participantes. Para a devolutiva, será agendado um horário com cada participante da pesquisa, onde nos encontraremos no local e horário que melhor convier ao entrevistado e entrevistador. Por conseguinte, será entregue o material da pesquisa por escrito aos mesmos e comentado oralmente os seus resultados. 39 4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS De acordo com os objetivos propostos nesta pesquisa e a partir das falas dos sujeitos entrevistados, foi possível construir cinco categorias de respostas, das quais: 1) concepção e objetivo da psicoeducação; 2) metodologias utilizadas na prática do psicólogo; 3) características da psicoeducação; 4) suporte teórico no trabalho com psicoeducação e 5) resultados do trabalho com psicoeducação. Estas serão apresentadas nos quadros abaixo, bem como, discutidas à luz do referencial teórico. Descrição das Respostas relativas à Categoria 1 Quadro 3 – Concepção e objetivos da psicoeducação Sujeito -1 Sujeito -2 Sujeito -3 (continua) “O principal objetivo é auxiliar o paciente a entender um pouco do processo que ele esta passando, do adoecimento, das crises e poder lidar melhor com essa situação, inclusive tentando prevenir novas crises”. (sic) “A psicoeducação de uma forma geral, traz a informação necessária para o paciente que sofre com qualquer transtorno. Todas estas informações passam segurança e entendimento sobre o que aqueles pacientes estão passando” [...] (sic) [...] “O profissional que fosse trabalhar com as palestras, que era o principal instrumento, poderia escolher qual era a forma de abordar a questão do transtorno. Então, o profissional tinha a liberdade de pontuar as questões que achava mais importantes dentro deste transtorno. Eu, como tinha uma prática gestáltica, pontuava as questões que no meu ver no meu olhar para aquele grupo era mais importante no momento. Se a questão era a adesão à medicação, eu trabalhava com eles a questão do porque que a medicação era importante naquele momento e porque que a questão da medicação era importante ser discutida com seu médico” [...] (sic) 40 Quadro 3 – Concepção e Objetivos da Psicoeducação Sujeito -3 (conclusão) “Se o grupo de pacientes naquele momento tinha uma dificuldade maior no entendimento dos sintomas e no entendimento do porque que determinadas coisas aconteciam com seu corpo no momento de uma crise eufórica ou depressiva, eu trabalhava na ajuda deles identificar o que acontecia com o corpo deles, para que eles pudessem compreender um pouco mais os sinais que o sintoma estava querendo sinalizar. A proposta da psicoeducação dependia muito da forma como o profissional se colocava diante do tema do transtorno. Então, tem profissionais que se colocam diante de um transtorno mental no foco medicamentoso, que é o caso dos médicos, então psicoeducação era voltada para a questão medicamentosa. Agora, o profissional psicólogo que tem uma abordagem um pouco mais ampliada mais para o comportamento, para os núcleos familiares, para o contexto familiar, vai trabalhar o foco da psicoeducação neste contexto, família, sintoma, priorizando a demanda que agente vê. Agente vê que ele está demandando que não está aceitando a medicação, ai agente vai trabalhar o que está acontecendo que a medicação não está sendo bem aceita” [...] (sic) De acordo com as falas de todos os sujeitos, pode-se verificar que o objetivo da psicoeducação é munir os pacientes com TB de informações e também auxiliá-los a compreender a situação em que estão acometidos. Assim, indo de encontro com a fala dos sujeitos, Santin; Ceresér e Rosa (2005) citam em seu artigo, referindo a psicoeducação como uma abordagem que possibilita ao paciente informação sobre o TB. Em meio a essas informações, abordam-se também aspectos referentes à natureza do transtorno, às opções de tratamento, aos efeitos colaterais das medicações, à identificação de estressores e outros estímulos que podem originar crises. Knapp e Isolan (2005) também corroboram as respostas dos sujeitos, relatando que a psicoeducação objetiva dar aos pacientes informações sobre a natureza e o tratamento do transtorno bipolar, provendo ensinamentos teóricos e práticos para que o paciente possa compreender e lidar melhor com a sua doença. Outros autores que ressaltam o objetivo da psicoeducação como Colom e Vieta, (2004) referem em seu artigo que o principal objetivo da intervenção psicoeducativa é habilitar os portadores de TB a se apropriarem de sua doença, possibilitando que lidem de forma promissora com as consequências desta. Fornecendo assim, uma margem de compreensão sobre a complexa relação entre a doença, os sintomas e os efeitos colaterais, por exemplo. 41 Figueiredo et al. (2009, p. 17) é sucinto e objetivo, mas também legitima a fala dos entrevistados, quando cita em seu artigo que o “objetivo da psicoeducação é prover os pacientes bipolares com uma abordagem teórico-prática que lhes possibilite o entendimento do seu transtorno”. Portanto, os dados dos 3 (três) sujeitos entrevistados correspondem ao que a literatura traz a respeito do tema. Assim, o próximo quadro abordará quais métodos são utilizados para obter tais objetivos. Descrição das Respostas relativas à Categoria 2 Quadro 4 – Metodologias Utilizadas na Prática do Psicólogo Sujeito -1 Sujeito -2 Sujeito -3 [...] “O desenvolvimento dessa prática vai depender se é um processo mais grupal, eu gostava muito de trabalhar com grupos, então agente desenvolvia esses temas de maneiras diferentes. A gente trabalhava muito esta questão de esclarecer um pouco o que é o transtorno para os familiares, então isso agente fazia através de palestras, de pequenas peças de teatro que suscitavam uma discussão a respeito do tema. Com os pacientes agente também trabalhava com um grupo que era muito interessante que agente chamava grupo de cartões” [...] (sic) [...] “Esses temas são abordados através de palestras ou grupos terapêuticos”. (sic) [...] “E a forma eram as palestras, grupos, e eu usava muito o atendimento individual, e a palestra acaba entrando em uma coisa mais direcionada um pouco mais na concretude” [...] (sic) De acordo com as falas dos sujeitos, os métodos mais utilizados por eles nas instituições eram os grupos e as palestras, referidos pelos três sujeitos, porém, o atendimento individual era realizado muito pelo sujeito 3(três), como o mesmo cita. Indo ao encontro com as falas acima citadas, estudos revisados por Gomes e Lafer (2007) indicam que a abordagem em grupo constitui-se em uma ótima maneira para se trabalhar as habilidades em reconhecer sinais que precedem um episódio agudo e para 42 adquirir estratégias para lidar com eles. Portanto, pode-se observar na citação a seguir os benefícios da psicoeducação em grupo. “Observa-se também, que a intervenção em grupo auxilia, de forma significativa, na redução dos índices de hospitalização e na melhora do desempenho ocupacional dos portadores do transtorno” (GRINBERG; YIN; CAMPANINI, 2010 apud PEREIRA et al., 2009, p. 158). Todavia, referente ao atendimento individual, estudos que avaliaram a psicoterapia psicodinâmica individual sugerem que essa abordagem, integrada à medicação, pode ser eficaz no tratamento do transtorno bipolar (KNAPP; ISOLAN, 2005). Porém, a partir de um estudo realizado por Menezes (2009) com um grupo de psicoeducação de TAB, foi possível identificar a partir dos relatos dos participantes, que foi por meio das palestras e discussões no grupo de psicoeducação que os mesmos passaram a se conhecer mais, a ter condições de lidar melhor com as manifestações do TAB e, inclusive, evitar internações desnecessárias. Desta forma, observa-se que os métodos utilizados pelos sujeitos entrevistados vão ao encontro com o que a literatura traz a respeito do tema. A seguir será apresentado como estes sujeitos desenvolveram a psicoeducação a partir das características da sua prática. Descrição das Respostas relativas à Categoria 3 Quadro 5–Características da Psicoeducação Sujeito -1 (continua) [...] “Eu acho que o terapeuta que está trabalhando com este método, ele tem que fazer uma leitura do grupo do paciente, de ver qual é o nível em que ele está na doença o comprometimento da doença e tentar ver que forma melhor aplicar. Acho que tem várias maneiras, inclusive na época em que eu trabalhava agente tentou até desenvolver um método de montar quebra cabeças com palavras chaves referentes à doença e vai depender muito de cada grupo. Você vai ter que ver se vai ter que ser um grupo em que vai ter que trabalhar de uma forma um pouco mais lúdica ou um pouco mais intelectualizada digamos assim ou racionalizada, então vai depender do grupo”. (sic) 43 Quadro 5 – Características da Psicoeducação (conclusão) Sujeito -2 [...] “Com os pacientes mais comprometidos, existe um grupo terapêutico especial, onde os coordenadores tomam o cuidado para não exigirem (demandarem) daquele paciente com maior comprometimento”. (sic) Sujeito -3 “Na instituição os pacientes eram divididos em grupos, quando eu cheguei lá, eram divididos em grupo I e grupo II. Os pacientes que estavam mais organizados cognitivamente, a questão da higiene pessoal, questão do cuidado da limpeza diária estavam mais preservados eles iam para o grupo II, os pacientes que estavam mais desorganizados, com um pouco mais de dificuldade, até de locomoção, de convívio com outros pacientes eram colocados no grupo I. Então as atividades eram direcionadas para o grupo I e grupo II, só o que acontecia em alguns momentos, o grupo I era infantilizado pela questão da desorganização e o grupo II era exigido demais e ai a gente via que alguns regrediam por causa da exigência, da demanda. Com o tempo eu fui modificando um pouco isso, tanto na minha prática quanto nas propostas com a equipe de psicologia e os outros profissionais. Então os pacientes passaram a ter uma avaliação individual, bom, essa pessoa pode participar da palestra, porque talvez nesse momento seja bom para ela, então toda semana os pacientes quase que diariamente eram reavaliados e ai eles participavam de tais atividades que o grupo poderia acolhe-lhos. Se o grupo de palestras essa semana tinha o maior grupo de pacientes que estavam precisando entender um pouco mais sobre transtorno afetivo bipolar, a palestra seria sobre transtorno afetivo bipolar, mas não necessariamente todos gostariam, ou poderiam participar dessa palestra, porque talvez isso poderia regredir ou não tinham o interesse sobre aquilo” [...] (sic) De acordo com as falas dos sujeitos, existem várias formas de se aplicar a psicoeducação, levando em consideração o grau de comprometimento de cada paciente. Contudo, sugere-se que seja feito uma leitura individualizada ou do grupo para visualizar qual a melhor forma de se trabalhar a demanda que for identificada. Indo ao encontro dos relatos dos entrevistados, há autores que recomendam que sejam apropriados diferentes tipos de intervenções psicoeducativas, dependendo do estágio da doença, no caso do TB (ROTHBAUM e ASTIN, 2000 apud JUSTO e CALIL, 2004). 44 Assim, pode-se observar a partir dos relatos dos sujeitos, que a forma como eles desenvolviam seu trabalho, tem muito haver com a instituição onde os mesmos trabalhavam. Onde os profissionais psicólogos, podem, a partir da demanda que eles visualizarem, nortear os trabalhos psicoeducativos. Então, eles têm esta flexibilidade de estar escolhendo a melhor forma de abordar as questões pertinentes, ou em grupo, ou atendimento individual ou com palestras, dependendo do nível de comprometimento do paciente. A necessidade de ser flexível também pode ser ligado ao fato de que é escassa a literatura no que diz respeito às características do trabalho na psicoeducação do TB. Desta forma, no próximo quadro será apresentada a linha de abordagem utilizada pelos sujeitos para embasar sua prática. Descrição das Respostas relativas à Categoria 4 Quadro 6 – Suporte Teórico no Trabalho com Psicoeducação Sujeito -1 Sujeito -2 Sujeito -3 [...] “Então agente estudava um pouco de psiquiatria mesmo, um pouco da abordagem da psicoeducação, muito do que essa minha supervisora trouxe da própria Espanha para cá. Em linha de abordagem eu tinha feito logo que me formei na linha psicanalítica e alguns anos atrás eu fiz formação em sistêmica. É claro que a psicanálise me deu todo um embasamento de conhecimento teórico, mas na prática com o paciente não era utilizado eu não usava a psicanálise. Não usava uma linha de abordagem específica porque eu trabalhava muito com grupos, então eu estudei também bastante a respeito de o próprio Osório que é um autor que está morando aqui em Florianópolis, do Zimmermann que também tem um viés bem psicanalítico, mas a abordagem em específica não” [...] (sic) “Sou psicóloga da Gestalt-terapia, e minha teoria me ajuda a olhar de forma específica para cada um dos pacientes, entender de que forma eles estão se ajustando e ao mesmo tempo entender o todo em que estão inseridos”. (sic) “A minha teoria é a teoria gestáltica, essa formulada pelo casal Marcos e Rosane Müller-Granzotto e ela me ajudou muito me embasou na prática em especial, no olhar individual para o que acontece com a pessoa naquele momento. Então sem uma fixação no sintoma, sem uma fixação no diagnostico, e sim um olhar mais cuidadoso, um olhar mais acolhedor para aquele ajustamento que esta acontecendo naquele momento” [...] (sic) 45 Observando as falas dos sujeitos, o trabalho com grupos e a abordagem gestáltica se sobressaíram em suas práticas nas instituições psiquiátricas a que estiveram vinculados profissionalmente. A respeito da abordagem grupal, observa-se que o sujeito 1, cita a proposta de Pichon Rivière (1998), que entende por grupo, um conjunto de pessoas movidas por necessidades semelhantes e se reúnem em torno de uma tarefa específica, um objetivo mútuo, onde cada participante é diferente e exercita sua fala, sua opinião, seu silêncio, defendendo seu ponto de vista. Este autor desenvolveu a metodologia e os grupos operativos, que se caracterizam pela relação que seus integrantes mantêm com a tarefa, que pode ser de cura ou aquisição de conhecimentos por exemplo. As finalidades e propósitos dos grupos operativos são as atividades centradas na solução de situações estereotipadas, dificuldades de aprendizagem e comunicação, devido à acumulação de ansiedade que desperta toda mudança. A ansiedade diante da mudança pode ser depressiva (abandono do vínculo anterior) ou paranóide (criada pelo novo vínculo e as inseguranças) (OSÓRIO, 2003). Desta forma, para Pichon Rivière (1998) todo grupo operativo é terapêutico, mas nem todo grupo terapêutico é operativo. O grupo operativo é um instrumento de trabalho, um método de investigação e cumpre, além disso, uma função terapêutica. Para elucidar a abordagem Gestáltica utilizada pelos sujeitos 2 e 3, onde relatam utilizar em sua prática um olhar específico, um olhar acolhedor, sem uma fixação no sintoma e no diagnóstico, mas sim um olhar acolhedor para o ajustamento que está acontecendo, faço uma ponte com o que a abordagem da Gestált-terapia chama de ética.“Entendendo-se por ética, a postura de abertura e acolhimento àquilo que se manifesta como motivação mundana, como algo “outro” (MÜLLER-GRANZOTTO, 2007, p. 17). De acordo com os mesmos autores, o TB na abordagem da Gestált-terapia é visto como um sofrimento ético-político e o clínico da Gestált-terapia não é somente mais um a mediar os conflitos sociais ou as mutações naturais que possam estar o provocando. O clínico é, sim, aquele que pode escutar, nesse sofrimento, o apelo por suporte, o apelo por inclusão. 46 Desta forma, intervir nos casos em que haja sofrimento ético-político significa estar disponível a acompanhar os sofredores em seus pedidos de socorro, de modo a auxiliá-los a descobrir os meios pelos quais eles possam ser ouvidos e atendidos em seus apelos (MÜLLER-GRANZOTTO, 2009). Assim, pode-se verificar que é a partir do olhar fenomenológico que estes sujeitos constituem a construção da metodologia de trabalho, que envolve contextualizar as demandas com as necessidades do consulente. Assim sendo, no próximo quadro, serão levantados os resultados do trabalho de todo este processo. Descrição das Respostas relativas à Categoria 5 Quadro 7 – Resultados do Trabalho com Psicoeducação Sujeito -1 Sujeito -2 Sujeito -3 [...] “Eu acredito muito que tem melhoras, agente observava muito assim, os pacientes com transtornos afetivos ele acaba tendo uma reincidência de internação muito grande e eu acho que quanto mais o paciente conseguia lidar, entender o processo dele, quais são os sintomas os sinais da doença, ele poderia buscar recurso de tratamento muito antes, tanto recurso medicamentoso quanto outras formas de tratamento que eu acho que também são bem importantes. Então eu acho que o paciente melhora no sentido de que ele consegue prevenir uma crise, entendendo o que está acontecendo com ele. Então se ele entende que, aquela irritabilidade dele, aquela insônia, aquela energia um pouquinho a mais do normal faz parte do processo de adoecimento dele e se ele tem uma conscientização ele pode buscar o tratamento antes para prevenir, por exemplo, uma internação” [...] (sic) [...] “Os pacientes que participam da psicoeducação saem mais informados, ás vezes até pedem um material para ler. A partir da informação eles adquirem conhecimento sobre o que estão passando, sentindo, o que muitas vezes ajuda no tratamento”. (sic) “Se levar em consideração a necessidade dele tem uma melhora sim, agora tinha gente lá que não se beneficiava em nada em participar da palestra que era uma palestra, por exemplo, psicoeducativa, porque não era a necessidade dele, não era o que ele estava precisando naquele momento, então se você olha para necessidade individual mesmo e prioriza a necessidade individual básica dessa pessoa naquele momento que está em crise ou surto se a necessidade for psicoeducação ele vai se beneficiar sim eu tenho experiências ótimas assim de orientação” [...] (sic) 47 De acordo com os relatos dos sujeitos, pode-se obsevar que há diversos benefícios diante da complexidade e do grau de comprometimento do quadro clínico, aos pacientes que participam do trabalho com psicoeducação. Alguns estudos confirmam os discursos dos sujeitos entrevistados, no que se refere ao conhecimento proporcionado no grupo de psicoeducação. Nesse sentido, Rouget e Aubry (2007 apud MENEZES, 2009) em uma pesquisa de revisão da literatura sobre a eficácia da psicoeducação no TAB, referem que esse modo de intervenção propicia a melhora do curso da doença por, entre outras coisas, favorecer a ampliação do conhecimento dos participantes sobre a doença. Todavia, indo ao encontro do que o sujeito 3 (três) relata, referente a pessoa não se beneficiar com a psicoeducação, Colom e Vieta (2004) citam em seu artigo que há pacientes que não se favorecem tanto da psicoeducação em grupo, tendo relatos de pacientes sobre aumento de ansiedade , medo e checagem obsessiva do estado de humor, após se submeterem a essa abordagem de tratamento, revelando, assim, que podem acontecer consequências adversas também. No entanto, os benefícios da psicoeducação ainda se sobressaem. De acordo com estudos feitos por Dogan (2003 apud SANTIN; CERESÉR e ROSA, 2005) a psicoeducação aumentou o conhecimento do paciente em relação à doença e ao medicamento, melhorou a qualidade de vida dos pacientes nos domínios geral, físico e social, diminuindo os sintomas psiquiátricos, reduzindo as recaídas e aumentando a adesão ao tratamento medicamentoso. Desta forma, um estudo realizado por Michalak et al. (2005 apud PELLEGRINELLI, 2010) que avaliou o impacto da psicoeducação na qualidade de vida dos pacientes bipolares, mostrou que o grupo psicoeducacional apresentou melhora significativa na qualidade de vida em comparação com o grupo que não recebeu a psicoeducação. Aliás, Colom & Vieta (2004) fazem referência ao Programa de Transtornos Bipolares de Barcelona, realizado por Colom, et al. (2003), o qual, mediante a prática da psicoeducação em grupo, demonstrou dados satisfatórios na prevenção de todos os tipos de episódios bipolares (maníacos ou hipomaníacos, mistos ou depressivos), além de aumento de tempo para nova recaída. Contudo, Gonzáles-Pinto et al. (2004 apud MENEZES 2009) também ratificam estas informações ao mencionarem que a psicoeducação, de forma teórica e prática, 48 capacita o portador de TB a compreender melhor seu transtorno e lidar de maneira mais adequada com suas consequências na vida. Assim, pode-se verificar que as respostas dos sujeitos entrevistados coadunamse ao que a literatura traz a respeito do tema. 49 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Diante da proposta inquirida nesta pesquisa, penso ter atingido o objetivo a que me propus ao realizá-la, que seria compreender os aspectos relevantes da Psicoeducação no TB na visão de psicólogos que já utilizaram desta prática em instituições psiquiátricas. Desta forma, pode-se concluir a partir das falas dos sujeitos que há muitos aspectos relevantes nas práticas psicoeducativas, principalmente no que diz respeito à informação ao paciente com TB sobre seu transtorno, para que o mesmo possa entender um pouco mais este processo pelo qual está passando e poder ser um colaborador ativo durante o tratamento, inclusive tentando prevenir novas crises e possíveis internações. Conclui-se também que não há uma forma específica de se aplicar a psicoeducação e que isso vai depender muita da postura teórica e metodológica utilizada pelo psicólogo. Como pode-se observar, um sujeito da pesquisa relata não utilizar uma abordagem específica, onde o mesmo vinculou conhecimentos distintos para embasar sua prática. Porém, os outros dois sujeitos utilizaram um olhar advindo de sua abordagem que os fez olhar o paciente de outra forma. No que diz respeito aos aspectos educativos, pode-se evidenciar, a partir das falas dos sujeitos, que os resultados observados nos pacientes que participavam dos trabalhos psicoeducativos eram muito visíveis, chegando o mesmo, a partir do entendimento que ele tem sobre o seu processo de adoecimento, conseguir prevenir uma crise, que é de extrema importância para um paciente com reincidentes internações. Elucidou-se também que existem várias técnicas para se aplicar no processo psicoeducativo e que vai depender muito do que o psicólogo vislumbrar no grupo de pacientes. Desta forma, ele pode fazer psicoeducação na forma de palestras, em grupos, com peças de teatro e com o atendimento individual. Contudo, o terapeuta deve levar em conta o grau de comprometimento de cada paciente e avaliar em qual grupo o mesmo irá melhor se beneficiar e de que forma ele irá se beneficiar. Se vai se beneficiar na palestra, ou no atendimento individual, se ele irá se beneficiar com o tema medicação, ou com o tema, como prevenir recaídas por exemplo. Tudo deve ser avaliado pelo terapeuta para que o paciente se beneficie da melhor forma. 50 Concluiu-se também, que esta flexibilidade na forma de se aplicar a psicoeducação, de o terapeuta poder avaliar quem vai participar, como aplicar a psicoeducação e qual tema esta pessoa irá se beneficiar é próprio da instituição onde os sujeitos da pesquisa estão inseridos. Contudo esta prática é particular desta instituição, podendo em outra ser diferente, ter uma técnica fechada, não flexível. Contudo isso, fica evidente que as falas dos profissionais se coadunam quanto as ideias que envolvem os aspectos relevantes da psicoeducação aplicado ao TB e que estas práticas são necessárias e importantes no contexto da instituição psiquiátrica, tanto quanto com o transtorno afetivo bipolar. Entretanto, deixo como sugestões de continuidade para pesquisas relacionadas ao referido tema, abordar e aprofundar questões no que se refere o quanto a psicoeducação favorece a adesão à medicação, e também, o quanto beneficia a percepção quanto ao início de um episódio maníaco ou depressivo no TB depois de aplicadas as sessões psicoeducativas, pois estes, de acordo com a literatura, são uns dos maiores problemas envolvidos neste transtorno. 51 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANDRADE, A. C. F. A abordagem psicoeducacional no tratamento do trasntorno afetivo bipolar. Revista de psiquiatria clínica, São Paulo, v.26, n.6, 1999. Disponível em: <http://urutu.hcnet.usp.br/ipq/revista/vol26/n6/art303.html>. Acesso em: 22 jun. 2011. BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria 336/GM de 19 de fevereiro de 2002. Brasília, 2002. Disponível em: <http://dtr2004.saude.gov.br/susdeaz/legislacao/arquivo/39_Portaria_336_de_19_02_20 02.pdf>. Acesso em: 25 ago. 2011. BRASIL. Ministério da Saúde. 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Idade:.......................;sexo:......................................; Naturalidade:............................... Endereço: ...................................................................................................................... Profissão: ..................................................................; Identidade:................................. Assunto: Pesquisa Acadêmica. Título: APLICABILIDADE DA PSICOEDUCAÇÃO NO TRATAMENTO DO TRANSTORNO AFETIVO BIPOLAR O (a) senhor (a) foi plenamente esclarecido de que será submetido a algumas perguntas, que buscam compreender os aspectos relevantes da Psicoeducação aplicada ao tratamento do transtorno afetivo bipolar. Esta entrevista será feita em data e hora previamente estabelecida entre o senhor (a) e a pesquisadora. A entrevista será gravada para posteriormente ser transcrito os dados obtidos e será solicitado que o senhor (a) assine e rubrique todas as folhas deste termo de consentimento. A mesma faz parte integrante de pesquisa para a idealização de um trabalho para obtenção parcial de nota para a conclusão do curso. O objetivo desta entrevista é suscitar dados que validem a definição do tema abordado, ou seja, dados que orientem esta pesquisa no que se refere à psicoeducação aplicada do tratamento do transtorno afetivo bipolar. Não estão previstos riscos ao participar desta pesquisa, e os benefícios referem-se a permitir uma melhor compreensão científica sobre o tema a partir dos resultados gerados, agregando assim, novas informações a sua prática. É uma pesquisa de caráter exclusivamente acadêmico/científico. Mesmo aceitando participar espontaneamente, o senhor (a) poderá desistir a qualquer momento, inclusive sem justificativa, bastando para isso apenas livremente informar a sua desistência. Por ser voluntária e sem interesse financeiro, o senhor (a) não terá direito a qualquer tipo de remuneração ou indenização. Os dados referentes à sua entrevista serão privados, e a análise dos mesmos será de cunho eminentemente exploratório, servindo tão-somente para desenvolver o trabalho de 60 pesquisa proposta por esta aluna, visando à obtenção da nota parcial. A devolutiva também se dera de forma privada e oral, em local e data que melhor vier ao entrevistado e entrevistador. Biguaçu,..........de...........................................de 2012. Assinatura (de acordo):.................................................................................................. 61 APÊNDICE B – ROTEIRO TEMÁTICO 1. Qual é o objetivo principal da Psicoeducação no tratamento do transtorno afetivo bipolar? 2. Quais são os temas chaves abordados nesta prática, e de que forma eles são desenvolvidos? 3. Existem métodos diferentes de se aplicar a psicoeducação, levando em consideração o grau de comprometimento de cada paciente? 4. Observam-se relativas melhoras nos pacientes depois de aplicadas as sessões psicoeducativas? Se sim, em quais aspectos? 5. Qual a teoria utilizada por você, e de que forma ela se aplicou para embasar sua prática?