PSICOEDUCAÇÃO E TERAPIA DE ACEITAÇÃO E COMPROMISSO EM UMA INTERVENÇÃO EM GRUPO PARA O TRATAMENTO DO TRANSTORNO BIPOLAR: UM ESTUDO DE CASO Isabela Bendine Gastaldi; Maria Rita Zoéga Soares [email protected] Universidade Estadual de Londrina, Centro de Ciências Biológicas Área e subárea do conhecimento: Ciências Humanas, Psicologia. Palavras-chave: Transtorno Bipolar. Análise do Comportamento. Intervenção. Resumo O Transtorno Bipolar (TB) caracteriza-se como uma condição crônica grave, a qual apresenta episódios de mania, hipomania e depressão. Por se tratar de um distúrbio do humor, pode afetar diversos aspectos da vida de um indivíduo como o emocional, físico, social e profissional. A combinação de tratamento farmacológico e psicoterapêutico se faz essencial para melhorar a qualidade de vida do indivíduo com TB. A partir disso, foi realizada uma intervenção em grupo com base nos princípios da Psicoeducação e da Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT), sob a ótica da Análise do Comportamento, como uma forma de tratamento para indivíduos com o TB. O presente trabalho buscou analisar os efeitos dessa intervenção em um dos clientes que participou da psicoterapia em grupo e apresentar os efeitos da Psicoeducação e da ACT. A análise foi feita por meio de instrumentos como as escalas Hamilton, Young e WHOQOL – Bref, que avaliaram, respectivamente, sintomas de depressão, sintomas de mania e hipomania e aspectos relacionados à qualidade de vida. Introdução e Objetivos O Transtorno Bipolar (TB) é uma condição crônica grave que afeta o humor e possui causas biológicas, neuroquímicas e psicossociais. O TB é caracterizado por oscilações de humor: episódios de mania ou hipomania alternados com episódios depressivos. Assim como todas as psicopatologias, o TB necessita de tratamento, tanto farmacológico como psicoterapêutico, sendo essencial a combinação dessas duas formas de tratamento para que se apresente um melhor resultado quanto aos sintomas dessa condição. O 1 Behaviorismo Radical desenvolvido por Skinner nos apresenta o conceito de comportamento operante, por meio do qual o indivíduo age transformando o ambiente e sendo também transformado por ele. Sob essa ótica, pode-se dizer que os episódios de humor presentes na vida de um indivíduo com TB envolvem comportamentos que afetam não só a si próprio como também a sua família, emprego, relacionamentos, entre outras áreas. Por isso, ressalta-se a importância não apenas do tratamento como da informação sobre as características do TB. A Psicoeducação é uma alternativa de tratamento que oferece informações sobre o TB e tem se mostrado muito eficaz. Por meio dela, o cliente conhece melhor a condição psicológica em que se encontra e tende a aderir mais facilmente aos tratamentos indicados. A Psicoeducação sob o viés da Análise do Comportamento permite que o cliente possa também identificar certos tipos de comportamentos e relacioná-los com seus antecedentes e as consequências produzidas, o que permite um maior controle por sua parte e diminui o número de recaídas. A Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT) se coloca da mesma forma como possibilidade de tratamento do TB, uma vez que promove um aumento da flexibilidade psicológica, o que irá permitir ao cliente uma consciência maior sobre seus comportamentos, emoções e pensamentos e que a partir disso possa escolher, conforme seus próprios valores, a melhor maneira de lidar com eles. A partir da compreensão acerca do Transtorno Bipolar, suas características e as consequências na vida dos indivíduos que sofrem dessa psicopatologia, o presente trabalho buscou analisar de que forma esses recursos mencionados contribuíram no tratamento psicológico de uma das clientes que apresentavam o Transtorno Bipolar, durante uma psicoterapia realizada em grupo, e acompanhar seu caso clínico desde a primeira até a última sessão, avaliando seu progresso. Procedimentos metodológicos O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos da Universidade Estadual de Londrina e documentos como o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido do participante e o Termo de Confiabilidade e Sigilo da equipe de pesquisa foram preenchidos, assinados e arquivados. O grupo de intervenção realizado envolveu 5 participantes de faixa etária entre 18 e 65 anos, de ambos os sexos, diagnosticados com Transtorno Bipolar e livres de prejuízos cognitivos que pudessem comprometer a compreensão das atividades. A participante que foi escolhida para a análise funcional desse trabalho será tratada pelo nome fictício de Rosa. A mesma foi selecionada a partir do critério de participação assídua em todos os 10 encontros, para que se pudesse avaliar de maneira integral o seu tratamento. Para avaliar os sintomas de depressão foi utilizada a escala de HAMILTON – 2 HDRS (Gorenstein, Andrade & Zuardi, 2000), ela possui 17 itens com pontuações de 0 a 2 e de 0 a 4, que variam conforme o item. Os sintomas de mania foram avaliados pela escada YOUNG – YMRS (Gorenstein, Andrade & Zuardi, 2000), que adota uma pontuação de 0 a 4, na qual 0 é ausência de sintoma e 4 o sintoma em sua forma mais grave. A escala WHOQOL – Bref. avalia questões relacionadas à qualidade de vida e é composta por 26 itens que apresentam uma escala de 1 a 5. Pontuações inferiores a 2,9 são consideradas como “necessita melhorar”, de 3 a 3,9 considera-se regular, de 4 a 4,9 são classificadas como bom e acima de 5 como muito bom. Essa escala abrange 4 domínios: físico, psicológico, relações sociais e meio-ambiente. A pesquisa foi realizada na sala de espelho da Clínica Psicológica da Universidade Estadual de Londrina. Como recursos materiais foram utilizados: gravador de áudio digital, microcomputador, impressora, filmadora digital, projetor multimídia e caixas de som. Primeiramente, foi realizada a seleção dos participantes a partir dos critérios de inclusão e exclusão, realizada pela psicóloga responsável pela condução das sessões de psicoterapia em grupo. Posteriormente, foram realizadas 10 sessões de aproximadamente 90 minutos cada, fundamentadas de acordo com os pressupostos da Psicoeducação e da ACT. Os instrumentos foram aplicados antes do início da intervenção, ao término da mesma e no follow-up de 3 meses depois. O estudo do caso clínico da participante foi realizado por meio das observações na sala-espelho e também pela análise das gravações de áudio e vídeo das sessões de psicoterapia em grupo. Resultados e Discussão Rosa, sexo feminino, tinha 28 anos no período de tratamento, cursava graduação, porém havia se afastado do emprego em razão do TB. Morava com a mãe, o irmão, o esposo e o filho. A cliente relatou sua primeira crise de depressão há cerca de 3 anos e desde então se submeteu ao tratamento psiquiátrico, há um ano foi diagnosticada com TB. Suas queixas envolviam aumento da irritabilidade, dificuldade de concentração, falta de disposição para realizar tanto atividades de lazer, como de trabalho e dificuldade em concluir objetivos. Relatou duas tentativas de suicídio e pensamentos recorrentes de morte que, segundo ela, haviam cessado a partir do tratamento farmacológico. Nas primeiras sessões, mantinha pouco contato visual e olhava para baixo a maior parte do tempo. Em alguns momentos os terapeutas sugeriam mudanças de comportamento e Rosa aparentava resistência ao utilizar de justificativas. Como exemplo, quando terapeutas indicaram alternativas frente à falta de disposição para sair com a família e os amigos, Rosa justificou dizendo que coisas ruins poderiam acontecer, sendo esse sentimento uma intuição que 3 deveria dar atenção. Esses comportamentos de Rosa eram aparentemente mantidos por uma contingência de reforçamento negativo, na medida em que ela recusava os convites para sair e assim evitava tanto a interação social como a possibilidade de seus pensamentos negativos se concretizarem de fato. Os terapeutas, considerando os pilares da ACT, apontaram que aqueles sentimentos que ela considerava intuitivos não controlavam o seu comportamento, de modo que ela poderia se expor a essas situações independentemente desses pensamentos. Ainda conforme os pressupostos da ACT, os terapeutas discutiram no grupo o conceito de valores, de modo que a cliente pudesse estabelecer aquilo que considerava importante em sua vida. A partir da consolidação da ideia sobre valores, que para a cliente, estavam relacionados a estar junto da família e dos amigos, ser mais presente na vida do filho e do esposo, Rosa passou a aceitar convites para passear em família e com os amigos, experienciando novas vivências, que passaram a atuar então como reforços positivos, mantendo esse comportamento de sair de casa e procurar se relacionar mais. Na sessão, alguns comportamentos de melhora também foram apresentados por Rosa, mostrava-se mais sorridente a aberta ao que os outros tinham a dizer, participava com maior frequência e relatava também as suas experiências. Além disso, assim como indicado anteriormente, pode-se apontar que houve uma generalização dos comportamentos de melhora, que não ocorriam apenas na psicoterapia como também em sua casa e nos momentos em que interagia com família e amigos. De acordo com a Escala Hamilton, a cliente apresentava depressão leve antes do início do tratamento e após o grupo obteve redução do escore, indicando eutimia (humor estável). Tal dado se manteve no follow-up, indicando que as consequências no ambiente natural foram capazes de manter os comportamentos adequados. Houve uma considerável redução de sintomas. Quanto ao aumento de sintomas da mania apresentados na escala Young no pós-teste, pode-se hipotetizar que esse seria um indicativo de melhora, tendo em vista que o aumento da disposição para realizar atividades, por exemplo, é um ponto positivo no contexto do repertório comportamental de Rosa. A escala WHOQOL – Bref apontou resultados positivos de melhora em todos os domínios, com destaque para o psicológico. Rosa manteve essa melhora no período de follow-up, o que sugere uma eficácia do tratamento realizado na psicoterapia em grupo por meio da ACT e da Psicoeducação no que tange à modelagem de repertórios comportamentais e à generalização dos mesmos. Conclusões A melhora apresentada por Rosa foi observada em todos os aspectos avaliados, como foi mostrado nos gráficos das escalas HAMILTON, Young e 4 WHOQOL - Bref. A análise individual de cada um dos participantes de psicoterapias realizadas em grupo é essencial pra compreender a avaliar de que forma cada um reagiu ao tratamento e como certas variáveis. A presença assídua da participante nos encontros auxiliou na análise dos dados e provavelmente pode ter sido fundamental para os resultados observados. A categorização dos comportamentos envolvidos nesse tipo de pesquisa, tanto dos terapeutas quanto dos participantes, é importante para que se possa trabalhar com comportamentos-problema, comportamentos-alvo, entre outros, da maneira mais eficaz possível. Referências Associação Psiquiátrica Americana (2013) Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais. Trad. Nascimento, M. I. C.; et al. 5.ed. Porto Alegre: Artmed. Berk, L.; Berk, M.; Castle, D. & Lauder, S. (2010) Vivendo com Transtorno Bipolar: Um guia para entender e manejar o transtorno. Porto Alegre: Artmed. Delitti, M. (2008) Terapia Analítico-Comportamental em Grupo. In: Delitti, A. M. C. & Derdyk, P. Terapia Analítico-Comportamental em Grupo (pp. 33-58). Santo André, Esetec Editores. Delitti, M. & Derdyk, P. (2012) O trabalho da análise do comportamento com grupos: possibilidades de aplicação a casais e famílias. In: Borges, N. B. & Cassas, F. A. (Orgs.) Clínica analítico-comportamental: aspectos teóricos e práticos (pp. 259-269). Porto Alegre, Artmed. Hayes, S. C., Strosahl, K., & Wilson, K. G. (1999). Acceptance and Commitment Therapy: An experiential approach to behavior change. New York: Guilford Press. Moreno, A. R. & Moreno, D. H. (2000). Escalas de Avaliação para Depressão de Hamilton (HAM-D) e Montgomery-Åsberg (MADRS). In: Gorestein, C., Andrade, L.H.S.G. & Zuardi, A. W. (Orgs.). Escalas de Avaliação Clínica em Psicologia e Psicofarmacologia (71-87). São Paulo: Lemos - Editorial. 5