REVISTA CIÊNCIAS DA SAÚDE UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA Reitor: Álvaro Toubes Prata Vice-Reitor: Carlos Alberto Justo da Silva CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE Diretora: Kenya Schmidt Reibnitz Site www.ccs.ufsc.br/revistaccs/ojs/index.php/REVCCS REVISTA CIÊNCIAS DA SAÚDE ISSN 0101 – 9546 Revista Ciências da Saúde Florianópolis V. 31, N. 2 P. 1 - 74 2012 Revista Ciências da Saúde é uma revista semestral editada pelo Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal de Santa Catarina. Comissão Editorial: Elisabeth Wazlawik (Nutrição-UFSC), Inês Beatriz Rath (Estomatologia-UFSC), Liliane Janete Grando (Patologia-UFSC), Maria Itayra Coelho de Souza Padilha (Enfermagem-UFSC), Patrícia Haas (Análises ClínicasUFSC), Roberto Henrique Heinish (Clínica Médica-UFSC), Tânia Silvia Fröde (Editora-chefe UFSC). Comissão Consultiva: Alcides Miranda Silva (UFRGS), Ana Luísa Petersen Cogo (UFRGS), Cristianne Fammer Rocha (UFRGS), Eduardo Dalmarco (UFSC), Elisabeth Gomes da Rocha Thomé (UFRGS), Emilia Addison Machado Moreira (UFSC), Eva Neri Rubim Pedro (UFRGS), Liliana Muller Larocca (UFPR), Luciane Peter Grillo (UNIVALI),Márcia Assunção Ferreira (UFRJ), Margarita Ana Rubin Unicovsky (UFRGS), Paulo Roberto Kechele (UFSC), Regina Rigato Witt (UFRGS), Simone Beatriz Pedrozo Viana(UNIVALI). (Catalogação na fonte pela Biblioteca Universitária da Universidade Federal de Santa Catarina) Revista Ciências da Saúde/Universidade Federal de Santa Catarina. Centro de Ciências da Saúde. -- V.1, n.1 (1982)- , - Florianópolis: Imprensa Universitária, 1982. V.: 27cm Semestral ISSN 0101-9546 1.Ciências Médicas. 2. Saúde-pesquisas. I. Universidade Federal de Santa Catarina. II Centro de Ciências da Saúde. Endereço: Revista Ciências da Saúde - Secretaria do Centro de Ciências da Saúde da UFSC Campus Universitário - Trindade Caixa Postal 476 88040 970 - Florianópolis - SC Telefone (0xx) 48 3721-9525 / 3721-9783 / (0xx) 48 3721-9712 ramal 211 Site: www.ccs.ufsc.br/revistaccs/ojs/index.php/REVCCS SUMÁRIO Editorial.................................................6 ASPECTOS EPIDEMIOLÓGICOS DAS DOENÇAS PALPEBRAIS NO AMBULATÓRIO DO SERVIÇO DE OFTALMOLOGIA NO HOSPITAL UNIVERSITÁRIO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA [Epidemiological aspects of the eyelid diseases in the ophthalmologic service at the university hospital of Santa Catarina Federal University] Cleyton Takaiti Shimono; Augusto Adam Netto; Kleber Eidi Shimono; Rodrigo Dall’Oglio da Cunha; Ana Flávia Salai; Lívia Souza de Oliveira..................................................7 POSTURAS EPISTEMOLÓGICAS DAS PRODUÇÕES DE FISIOTERAPIA RESPIRATÓRIA SEGUNDO FLECK [Epistemological productions respiratory physiotherapy according Fleck] Fabíola Hermes Chesani...............................................16 NÍVEL DE ATIVIDADE FÍSICA DE IDOSOS LONGEVOS RESIDENTES NA GRANDE FLORIANÓPOLIS/SC [Level of physical activity oldest old residents in “Grande Florianópolis”] Giovana Zapellon Mazo, Tânia Rosane Bertoldo Benedetti, Janeisa Franck Virtuoso, Rodrigo de Rosso Krug, Márcia Zanon Benetti........................25 O PROGRAMA DE AGENTES COMUNITÁRIOS DE SAÚDE SOB A ÓTICA DE NORBERT ELIAS [The program of community health workers in the light of Norbert Elias] Liliana Muller Larocca, José Rabone Junior, Daiane Siqueira Luccas.................................................34 EFICÁCIA DE UM PROGRAMA DE CAPACITAÇÃO PRESENCIAL EM SAÚDE AUDITIVA PARA AGENTES COMUNITÁRIOS DE SAÚDE [Efficacy of a training program in hearing health for Community Health Workers] Daniele Laí Urnau; Débora Frizzo Pagnossin; Indiara de Mesquita Fialho..................................................42 MEDICALIZAÇÃO EM SAÚDE MENTAL NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE: UMA REVISÃO DE LITERATURA [Medicalization in mental health in primary health care: a review of literature] Leandro Moreira; Gabriela Marcellino de Melo Lanzoni; Caroline Cechinel...............50 INTERVENÇÕES PARA MELHORAR A ADESÃO AO TRATAMENTO DE DOENÇAS CRÔNICAS [Interventions to improve adherence to treatment of chronic diseases] Annelita Almeida Oliveira Reiners; Priscilla Uiara de Oliveira do Carmo; Cecília Victorazzo Louzada; Joana D’arc Chaves Cardoso; Rosemeiry Capriata de Souza Azevedo...................................61 Normas editoriais...............................71 Revista Ciências da Saúde Editorial Prezado Leitor, Cotidianamente ouve-se falar da importância acerca dos cuidados com a saúde, em termos de boa alimentação, prática de exercícios físicos, regulamentação dos excessos, entre outros. Ao fim e ao cabo, preza-se pelo cuidado com o corpo, por manter a boa forma e, talvez, um padrão de beleza imposto pela influência midiática. Os cuidados com o corpo são essenciais, obviamente. Contudo, está no esquecimento outra essencialidade quando se trata de saúde: a saúde da mente. Esta também necessita de cuidados pelos mesmos hábitos saudáveis que se deve ter ao cuidar do corpo, porém com atenção especial ao exercício do conhecimento, tal qual deve ser buscado principalmente pela leitura. O exercício da leitura não tem restrições. A leitura pode ser praticada sem restrição de idade, cultura ou gênero. Com a leitura adquire-se conhecimento, fortalece-se a memória, enriquece-se o espírito, este também essencial nos cuidados para com a saúde. Paulatinamente, a despeito de todo o cuidado, o corpo envelhece. E a mente? Ah! Esta bem cuidada somente se fortalece. A Revista Ciências da Saúde traz para o leitor artigos de distintas áreas do conhecimento da saúde. Artigos que visam promover o fomento da pesquisa em saúde e o incentivo aos cuidados com o corpo pelo fortalecimento da mente. Deste modo, é sobre o pilar da harmonia entre as esferas dos cuidados com o corpo e, principalmente, com a mente, que a Revista Ciências da Saúde deseja uma boa leitura! Amanda Caroline Nunes de Avelar Secretária da Revista Ciências da Saúde 6 Shimono, C. T. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 7-15, jul./dez. 2012 ASPECTOS EPIDEMIOLÓGICOS DAS DOENÇAS PALPEBRAIS NO AMBULATÓRIO DO SERVIÇO DE OFTALMOLOGIA NO HOSPITAL UNIVERSITÁRIO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA [Epidemiological aspects of the eyelid diseases in the ophthalmologic service at the university hospital of Santa Catarina Federal University] Cleyton Takaiti Shimono1; Augusto Adam Netto2; Kleber Eidi Shimono3; Rodrigo Dall’Oglio da Cunha4; Ana Flávia Salai5; Lívia Souza de Oliveira6. Resumo: As doenças palpebrais são ocorrências frequentes entre as doenças oculares externas e são escassos os estudos sobre este tema. Entre janeiro de 2005 a dezembro de 2010, 520 pacientes foram avaliados através do mês, ano, estação do ano, procedência, sexo, faixa etária e diagnóstico. Outubro, 2006 e 2007 e primavera foram, respectivamente, mês, anos e estação do ano com maior número de atendimentos devido a moléstias palpebrais. A maioria dos pacientes era procedente de Florianópolis, do sexo feminino, com idade entre 15 e 29 anos. A enfermidade palpebral mais frequente foi hordéolo cuja incidência diminui com o aumento da idade. Palavras-chave: pálpebras, doenças palpebrais, epidemiologia. Abstract: The eyelid diseases are frequent occurrences of external ocular diseases and there are few studies on this topic. From January of 2005 to December of 2010, 520 patients were evaluated by month, year, season, origin, gender, age and diagnosis. October, 2006 and 2007 and spring were, month, year and season with the highest number of attendances due to eyelid diseases respectively. Most patients were from Florianópolis, female, aged between 15 and 29 years. The eyelid disease more frequent was hordeolum whose incidence decreases with increasing age. Keywords: eyelids, eyelid diseases, epidemiology. 1. Médico graduado na Universidade Federal de Santa Catarina. E-mail: [email protected] 2. Professor titular da disciplina de oftalmologia do departamento de cirurgia do CCS/UFSC. Professor coordenador da disciplina de oftalmologia do módulo de sistemas sensoriais da UNISUL. Chefe do serviço de oftalmologia do HU/UFSC. Email: [email protected] 3. Médico graduado na Universidade Federal de Santa Catarina. E-mail: [email protected] 4. Médico graduado na Universidade Federal de Santa Catarina. E-mail: [email protected] 5. Médica graduada na Universidade Federal de Santa Catarina. E-mail: [email protected] 6. Médica graduada na Universidade Federal de Santa Catarina. E-mail: [email protected] 7 Shimono, C. T. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 7-15, jul./dez. 2012 Introdução As pálpebras são pregas delgadas da pele, músculo e tecidos fibrosos(1) que têm como funções proteger os olhos do contato com corpo estranhos e evitar o ressecamento da córnea e da conjuntiva(2). São recobertas externamente pela pele e internamente pela conjuntiva. Entre a pele e a conjuntiva existem vasos sanguíneos, nervos, músculos, glândulas e placas rígidas e fibrosas, o tarso, que sustentam as margens palpebrais.(1, 3) No tarso se encontram as glândulas de Meibomius que se abrem em ductos na margem da pálpebra.(2) Os cílios, pelos fortes, curvos e curtos, dispostos em duas ou mais fileiras e implantados na borda livre das pálpebras(4) possuem em seus folículos as glândulas de Zeiss. Entre os folículos situamse as glândulas de Moll.(3) As doenças palpebrais estão entre os problemas oculares mais comuns (1 5). O hordéolo é um processo infeccioso agudo, normalmente causado por estafilococos. (1, 2) Classificado como interno quando as glândulas de Meibomius estão acometidas ou em externo quando há o comprometimento das glândulas de Zeiss ou de Moll. Dor, rubor e edema são os sintomas mais comuns. Quando múltiplos e recorrentes podem estar associados a deficiências vitamínicas e imunológicas. (1, 2, 6) A blefarite é um processo inflamatório crônico bilateral das margens palpebrais (7). Classificada como seborreica, ulcerativa ou mista.(3) A seborreica está frequentemente associada a seborreia do couro cabeludo, supercílios e orelhas.(1, 8) A ulcerativa é um processo infeccioso,(3) geralmente estafilocócico.(1) Os principais sintomas são irritação, ardência e prurido nas margens palpebrais. Crostas e granulações podem ser vistas aderidas aos cílios. O calázio é uma inflamação crônica granulomatosa e estéril da glândula meibomiana.(3) De etiologia desconhecida, diferencia-se do hordéolo pela ausência de sinais inflamatórios agudos(1) e pode ser o resultado crônico de um hordéolo não resolvido.(2) A triquíase, desvio dos cílios da sua posição normal com consequente atrito destes contra a córnea,(2) pode ser causado pelo entrópio, blefarite, cicatrizes resultantes de traumatismos e pela blefaropigmentação.(1, 9) Os sintomas são sensação de corpo estranho, dor, irritação, congestão conjuntival, lacrimejamento e blefaroespasmo reflexo.(3) Outras enfermidades palpebrais encontradas neste estudo foram corpo estranho subtarsal, ectrópio, edema palpebral, entrópio, ptose palpebral, queimaduras palpebrais e tumores palpebrais. A existência, em nosso meio, de poucas pesquisas sobre a incidência de doenças palpebrais, levou-nos a elaborar o presente trabalho. Almejamos que com ele, possamos contribuir para que a equipe que compõe o serviço de oftalmologia do HU/UFSC esteja melhor preparada para diagnosticar as moléstias palpebrais mais frequentes e consequentemente tratá-las da forma mais adequada. Estes fatos motivaram a realização deste estudo para avaliar os aspectos epidemiológicos das doenças palpebrais nos pacientes atendidos emergencialmente no ambulatório do serviço de oftalmologia do HU/UFSC, entre janeiro de 2005 e dezembro de 2010, associando-as com o ano, mês, procedência, sexo, faixa etária, diagnóstico e estação do ano. Métodos As doenças palpebrais diagnosticadas nas consultas de emergência oftalmológica no ambulatório do serviço de oftalmologia do HU/UFSC foram abordadas em um estudo descritivo, observacional, transversal e retrospectivo. Entre o período de janeiro de 2005 a dezembro de 2010 foram analisados dados de 520 pacientes atendidos no ambulatório do serviço de oftalmologia do HU/UFSC. Variáveis pesquisadas que não foram anotadas nos respectivos prontuários e pacientes que não foram diagnosticados com 8 Shimono, C. T. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 7-15, jul./dez. 2012 doenças palpebrais foram excluídos do estudo. A coleta dos dados procedeu-se mensalmente, no período de julho a agosto de 2011 através da revisão dos prontuários com informações sobre os atendimentos diários em emergência oftalmológica arquivados no Serviço de Prontuários do Paciente (SPP) do HU/UFSC. A partir dos dados coletados, desenvolveu-se um protocolo com as seguintes variáveis: diagnóstico da doença palpebral, mês e ano de atendimento, procedência (cidade em que o paciente residia no momento da consulta e bairro se paciente procedente de Florianópolis), idade (dividida nas seguintes faixas etárias: 0 a 14; 15 a 29; 30 a 39; 40 a 49; 50 a 59 e 60 anos ou mais), sexo e estação do ano. O projeto foi aprovado no Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da UFSC sob processo número 2064 de 28 de novembro de 2011. Análise estatística O banco de dados foi criado em uma planilha de dados do Microsoft Excel® (Microsoft, WA, EUA) e depois importado para o pacote estatístico Stata® 11.2 (StatCorp., TX, EUA). Primeiramente foram categorizadas as variáveis conforme objetivo do estudo. Após foi realizada uma análise descritiva com as prevalências e respectivo intervalo de confiança de 95%. Para a análise, a variável diagnóstico de doenças palpebrais foi dividida em quatro variáveis dicotômicas (sim/não). Não foram analisados os diagnósticos de triquíase e daqueles classificados como outros devido ao baixo número destes diagnósticos na amostra. Para a medida de efeito, foi realizada regressão logística univariada com o objetivo de obter a razão de odds. Foram consideradas significativas aquelas associações com valor p<0,05 através do teste de Wald. Resultados e discussão Entre janeiro de 2005 a dezembro de 2010, as doenças palpebrais foram responsáveis por 22,7% dos atendimentos emergenciais realizados no ambulatório do serviço de oftalmologia do HU/UFSC. Esse número é superior ao encontrado no trabalho de Pereira et al(10) realizado no Serviço de Urgência Oftalmológica do Hospital São Geraldo no período de setembro de 2005 a janeiro de 2006 com 8346 pacientes atendidos e que obteve como resultado 11,77% dos atendimentos decorrentes de doenças palpebrais. No estudo de Schellini et al(11) realizado no Serviço de Emergência e Triagem Oftalmológica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Botucatu – UNESP entre janeiro de 1988 a dezembro de 1989 com 5613 consultas oftalmológicas realizadas. Destas 12% foram devido a doenças palpebrais. Em Leonor et al(12) foram atendidos 810 pacientes no Hospital Dia da Santa Casa de Misericórdia de Limeira entre fevereiro a julho de 2007 devido a urgência ou emergência oftalmológica, destes 12% foram diagnosticados com alguma enfermidade palpebral. A pesquisa de Sanchez et al(13) realizado no Serviço de Urgências Oftalmológicas no Hospital Rio Ortega em um intervalo de 9 meses foram prestados 2914 atendimentos com 8,1% motivados por doenças palpebrais. Já Shields e Sloane(14) analisou as principais queixas e diagnósticos de problemas oculares na atenção primária nos EUA no ano de 1985 e obteve como resultado 3,9% dos pacientes atendidos apresentaram doenças palpebrais. O mês com o maior número total de registros de atendimentos de pacientes com doenças palpebrais foi outubro (n=55, 10,6%; IC95% 7,9 – 13,2). Em 2005, foi registrado o menor número de atendimentos (n=70, 13,5%; IC95% 10,5 – 16,4) quando comparado aos anos 2006 e 2007, estes 9 Shimono, C. T. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 7-15, jul./dez. 2012 correspondendo aos anos com maior número de atendimentos (n=102, 19,6%; IC95% 16,2 – 23,0, em cada ano). Em relação às estações do ano, houve uma diferença quando comparados aos resultados encontrados por Edwards(15) e Schellini et al.(11) A maior incidência de doenças palpebrais no serviço de oftalmologia do HU/UFSC entre janeiro de 2005 e dezembro de 2010 foi na primavera (n=141, 27,1%; IC95% 23,3 – 30,9). No trabalho de Edwards(15) realizado no Serviço de Oftalmologia do Hospital Kent e Canterbury entre maio de 1993 a abril de 1984 a maior incidência de moléstias palpebrais ocorreu no verão e em Schellini et al,(11) no outono. Essa diferença nos resultados encontrados em Edwards(15) e Schellini et al,(11) provavelmente, se deve as diferenças climáticas nos diferentes locais estudados. Na primavera, o pólen liberado pelas flores pode causar processos alérgicos dentre eles dermatites, blefarites e edemas palpebrais. Dessa forma, a primavera apresenta uma maior relação na incidência de alergias.(16) Pode-se observar que a maioria dos pacientes com diagnóstico de doenças palpebrais foram procedentes de Florianópolis (n=411, 79%; IC95% 75,5 – 82,5), seguidos de municípios da grande Florianópolis (n=91, 17,5%; IC95% 14,2 – 20,8) e de outros municípios (n=18, 3,5%; IC95% 1,9 – 5,0) com grande parte destes indivíduos procedentes do bairro Trindade (n=66, 16%) seguidos dos bairros Pantanal (n=35, 8,5%), Centro (n=33, 8,1%), Carvoeira (n=20, 4,9%) e Córrego Grande (n=20, 4,9%). O pequeno número de pacientes não oriundos de Florianópolis procuraram o serviço de oftalmologia do HU/UFSC, provavelmente, devido ao longo tempo de espera para atendimento no hospital de referência em oftalmologia para os outros municípios da região metropolitana de Florianópolis, uma vez que o HU/UFSC não é o hospital de referência em oftalmologia para tais municípios. Outras causas de procura do serviço de oftalmologia no HU/UFSC de pacientes não procedentes de Florianópolis seriam indivíduos com atividades profissionais próximas ao HU/UFSC ou a presença de pessoas conhecidas internadas no HU/UFSC aproveitando a situação para consultar-se no serviço de oftalmologia. Neste trabalho constatou-se que a maioria dos pacientes atendidos pelo serviço de oftalmologia com diagnóstico de doença palpebral no HU/UFSC era do sexo feminino (n= 291, 56%; IC95% 51,7 – 60,2) em relação ao masculino (n=229, 44%; IC95% 39,8 – 48,3). No estudo de Leonor et al(12) foram atendidos 810 pacientes com queixas de doenças oculares 66,6% dos pacientes atendidos no ambulatório de urgências oftalmológicas eram do sexo masculino e 33,4% do sexo feminino. Porém, neste mesmo trabalho, as afecções palpebrais no sexo feminino corresponderam a 23% e no masculino a 11%. Nos trabalhos de Kessler(17) e (18) Silva, verificou-se uma maior tendência a procura dos serviços de saúde pelo sexo feminino. A menor procura de atendimento no serviço de oftalmologia do sexo masculino seria pelo fato de que os homens buscam atendimento nos serviços de saúde quando doenças em estados mais avançados ou enfermidades consideradas mais graves começam a afetar o seu rendimento no trabalho, segundo Kessler.(17) No presente estudo, a faixa etária com o maior número de diagnóstico de doenças palpebrais foi entre 15 a 29 anos (39,8%), seguidas das faixas etárias entre 40 a 49 anos (16,7%) e 30 a 39 anos (15,2%), o que representou um percentual total de 71,7% dos casos. Este resultado foi diferente do encontrado no trabalho de Sanchez et al(13) em que a maioria dos pacientes encontrava-se em uma faixa etária acima de 51 anos (49,6%). Em Miller(3) e em Leonor 10 Shimono, C. T. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 7-15, jul./dez. 2012 et al,(12) porém, a maioria dos pacientes eram adultos jovens e em idade produtiva. Tais resultados assemelham-se com os números encontrados neste estudo. O diagnóstico de doenças palpebrais mais frequente neste trabalho foi hordéolo (36,7%), seguido por blefarite (32,1%) e corpo estranho subtarsal (14,2%), o que totalizou 83% dos diagnósticos de doenças palpebrais (Tabela 1). Esse resultado difere dos resultados encontrados por Sanchez et al,(13) cujo diagnóstico mais frequente foi o de blefarite com incidência de 52,4%. Na pesquisa de Sheldrick et al(19) realizada a oeste de Nottingham, Inglaterra entre março de 1989 a fevereiro de 1990 através de consultas ambulatoriais e visitas domiciliares de 1630 pacientes, encontrou-se como diagnósticos mais frequentes a blefarite e o calázio, representando 5,7% e 3,3%, respectivamente. Tabela 1 - Distribuição dos ambulatório do diagnóstico Diagnóstico Hordéolo Blefarite Corpo estranho subtarsal Calázio Triquíase Outros Total Entretanto, em Schellini et al,(11) o maior número de diagnósticos foi o de hordéolo com 43,8%, a blefarite figurou em segundo lugar com 20,1%. No trabalho de Pierre Filho et al(20) realizado no Serviço de Emergências Oftalmológicas do Departamento de Oftalmologia da Santa Casa de Sobral entre maio a outubro de 2008 foram atendidos 1024 pacientes, destes o somatório de pacientes com diagnósticos de hordéolo ou de calázio foram 23,6%, já em Pereira et al(10) essa soma correspondeu a 6,02%. A partir de dados coletados do Hospital Nacional de Pesquisa e Assistência Médica Ambulatorial nos EUA em 1993, das 2,32 milhões de consultas decorrentes de problemas oculares e anexos oculares, Nash e Margo(21) verificaram que o hordéolo representou 3% dos diagnósticos, enquanto a blefarite e o calázio corresponderam a 2,7% e 1,5%, respectivamente, das doenças palpebrais. pacientes com diagnóstico de doenças palpebrais atendidos no serviço de oftalmologia do HU/UFSC de acordo com o n 191 167 74 51 18 19 520 % 36,7 32,1 14,2 9,8 3,5 3,7 100 IC95% 32,6 - 40,9 28,1 - 36,1 11,2 - 17,2 7,2 - 12,4 1,9 - 5,0 2,0 - 5,2 FONTE: SPP HU/UFSC, no período entre janeiro de 2005 a dezembro de 2010. Neste estudo, observou-se uma maior frequência no diagnóstico de blefarite com o aumento da idade, com o grupo com 60 anos ou mais apresentando uma probabilidade de ocorrência de blefarite 2,79 vezes maior que o grupo com 14 anos ou menos. Já a probabilidade de ocorrência do hordéolo diminui com o aumento da idade e houve uma tendência na diminuição na probabilidade do diagnóstico de calázio com o aumento da faixa etária (Tabela 2). 11 Shimono, C. T. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 7-15, jul./dez. 2012 Tabela 2 – Diagnóstico de doenças palpebrais associadas às faixas etárias dos pacientes atendidos no ambulatório do serviço de oftalmologia do HU/UFSC Hordéolo Blefarite Calázio * * OR (IC95%) p OR (IC95%) p OR (IC95%) p* <0,001 0,008 0,005 Idade ≤ 14 1,00 1,00 1,00 15 - 29 1,00 (0,43; 2,34) 1,51 (0,54; 4,25) 0,38 (0,14; 1,04) 30 - 39 0,80 (0,32; 2,02) 1,47 (0,49; 4,42) 0,34 (0,10; 1,10) 40 - 49 0,53 (0,21; 1,34) 2,21 (0,75; 6,50) 0,39 (0,13; 1,21) 50 - 59 0,46 (0,18; 1,22) 2,28 (0,75; 6,91) 0,10 (0,02; 0,52) ≥ 60 0,19 (0,06; 0,56) 2,79 (0,92; 8,51) 0,11 (0,02; 0,57) FONTE: SPP HU/UFSC, no período entre janeiro de 2005 a dezembro de 2010. * Análise realizada através do teste de Wald. A blefarite está frequentemente associada à dermatite seborréica,(1, 8, 22) uma doença inflamatória crônica que acomete regiões ricas em glândulas sebáceas como sobrancelhas, sulcos nasolabiais, glabela e pálpebras.(23) A idade de início da dermatite seborréica ocorre na maioria das vezes na faixa etária entre 20 a 50 anos ou mais.(24) Além disso, existem relatos de uma associação entre a dermatite seborréica e pacientes com doenças de Parkinson,(23) esta uma doença neurodegenerativa caracterizada por bradicinesia, tremor em repouso, rigidez, marcha arrastada e postura em flexão.(23) A doença de Parkinson tem sua idade de início mais frequente na sétima década de vida, porém pode acometer uma faixa etária entre 35 a 85 anos.(23) Tais fatos explicariam o porquê do aumento da frequência do diagnóstico de blefarite com o aumento da faixa etária. Já a probabilidade de ocorrência do hordéolo diminui com o aumento da idade. Provavelmente, por uma maior conscientização de bons hábitos de higiene, como lavar as mãos, com o aumento da idade, evitando o contato frequente das mãos e de objetos contaminados com os olhos. O calázio pode ser o resultado crônico de um hordéolo não resolvido,(2) dessa forma com a diminuição da frequência no diagnóstico de hordéolo com o aumento da idade, o diagnóstico de calázio também estaria diminuído com o aumento da idade. A probabilidade de ocorrência da blefarite foi 1,77 vezes maior no sexo feminino do que no sexo masculino. Esse dado seria consequência de uma maior procura dos serviços de saúde por parte das mulheres(17, 18) quando comparadas aos homens. Já os homens apresentam uma chance 78% maior do diagnóstico de corpo estranho subtarsal quando comparados as mulheres (Tabela 3). Os corpos estranhos subtarsais, normalmente, estão associados aos acidentes de trabalho nas profissões exercidas principalmente pelo sexo masculino. Estes acidentes ocorrem na maioria das vezes pela falta de experiência, falta de instrução adequada no uso de equipamentos de segurança e, até mesmo, condições inadequadas de trabalho oferecidas aos pacientes atendidos no serviço de oftalmologia.(12, 25) Nossos achados seriam explicados dessa forma. 12 Shimono, C. T. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 7-15, jul./dez. 2012 Tabela 3 – Diagnóstico de doenças palpebrais associadas ao sexo dos pacientes atendidos no ambulatório do serviço de oftalmologia do HU/UFSC Blefarite Corpo Estranho Subtarsal * OR (IC95%) p OR (IC95%) p* Sexo 0,003 <0,001 1,00 1,00 Masculino 1,77 (1,21; 2,59) 0,22 (0,13; 0,39) Feminino FONTE: SPP HU/UFSC, no período entre janeiro de 2005 a dezembro de 2010. * Análise realizada através do teste de Wald. Além disso, foi observada uma menor chance do diagnóstico de blefarite nos anos 2008 e 2009 quando comparados ao ano de 2005 (Tabela 4). Provavelmente, devido ao aumento no número de atendimentos em outros serviços de oftalmologia diferentes do serviço de oftalmologia do HU/UFSC, a um menor número de encaminhamentos das unidades de saúde e ao desconhecimento da existência da enfermidade pelo paciente. Tabela 4 - Diagnóstico de blefarite associada aos anos analisados dos pacientes atendidos no ambulatório do serviço de oftalmologia do HU/UFSC Blefarite OR (IC95%) p* 0,021 Ano 1,00 2005 0,72 (0,38; 1,33) 2006 0,60 (0,32; 1,13) 2007 0,42 (0,21; 0,84) 2008 0,39 (0,19; 0,79) 2009 0,57 (0,30; 1,09) 2010 FONTE: SPP HU/UFSC, no período entre janeiro de 2005 a dezembro de 2010. * Análise realizada através do teste de Wald. Constatou-se, assim, que as doenças palpebrais foram responsáveis por um elevado número de consultas no ambulatório do serviço de oftalmologia do HU/UFSC. Esperamos que os resultados obtidos neste trabalho auxiliem o serviço a melhorar o diagnóstico e a tratar da forma mais adequada possível estes agravos tão frequentes no atendimento oftalmológico emergencial. Conclusão A partir das avaliações clínicoepidemiológicas das doenças palpebrais nos pacientes atendidos no ambulatório do serviço de oftalmologia do HU/UFSC, podemos destacar como pontos conclusivos do presente estudo que as doenças palpebrais foram responsáveis por 22,7% dos atendimentos emergenciais no período compreendido entre janeiro de 2005 a dezembro de 2010. O mês com o maior número de registros de atendimentos foi outubro (10,6%). Os anos com o maior número de registros de pacientes atendidos foram os de 2006 e 2007, cada um com 102 atendimentos. A estação do ano com o maior registro total de pacientes atendidos foi a primavera (27,1%) seguida do inverno (26,2%). A maioria dos pacientes era procedente de Florianópolis (79%) e do 13 Shimono, C. T. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 7-15, jul./dez. 2012 bairro Trindade (16,0%). O maior número de pacientes atendidos com diagnóstico de doenças palpebrais era do sexo feminino (56,0%). Os pacientes situados na faixa etária de 15 a 29 anos (39,8%) foram os mais acometidos por doenças palpebrais. Entre as doenças palpebrais, o diagnóstico mais frequente foi o de hordéolo (36,7%), seguido de blefarite (32,1%) e de corpo estranho subtarsal (14,2%). A probabilidade de ocorrência de blefarite foi maior no sexo feminino e com o aumento da faixa etária. A freqüência dos diagnósticos de hordéolo e calázio diminui com o aumento da idade. A probabilidade do diagnóstico de corpo estranho subtarsal foi 78% maior no sexo masculino do que no feminino. Referências bibliográficas 1. Sullivan JH, Crawford JB, Whitchen JP. Pálpebras, aparelho lacrimal e lágrimas. In: Vaughan DG, Asbury T, RiordanEva P. Oftalmologia geral. 15ª ed. São Paulo: Atheneu; 2003. p. 74-81. 2. 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Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 16-24, jul./dez. 2012 POSTURAS EPISTEMOLÓGICAS DAS PRODUÇÕES DE FISIOTERAPIA RESPIRATÓRIA SEGUNDO FLECK [Epistemological productions respiratory physiotherapy according Fleck] Fabíola Hermes Chesani1 Resumo: Este estudo investigou o perfil epistemológico que emerge das produções científicas de fisioterapia respiratória sobre a perspectiva de Fleck. A coleta de dados foi através de artigos publicados em periódicos na área de saúde na base de dados Scientific Electronic Library Online – SciELO, entre o ano de 2002 a 2010. A análise dos artigos foi realizada a partir do título, do resumo e das palavras- chave. Encontraram-se 18 periódicos e 88 artigos referentes à fisioterapia respiratória. O perfil epistemológico que emerge das produções científicas de fisioterapia respiratória sobre a perspectiva de Fleck é o da avaliação e tratamento fisioterapêutico. Palavras-chave: fisioterapia respiratória, Fleck, produções científicas. Abstract: This study investigated the epistemological profile that emerges from the scientific production of respiratory physiotherapy from the perspective of Fleck. Data collection was through articles published in journals in the area of health in the database Scientific Electronic Library Online - SciELO, the period between of 2002 to 2010. The analysis was performed of articles from the title, abstract and keywords. We found 18 journals and 88 articles related to respiratory physiotherapy. The epistemological profile that emerges from the scientific production of respiratory physiotherapy from the perspective of Fleck is the assessment and treatment. Keywords: respiratory physiotherapy, Fleck, scientific productions. Introdução o primeiro serviço de fisioterapia da América do Sul dando início a história da fisioterapia no Brasil 1. No intuito de suprimir a demanda por técnicos, em 1951, foi criado o primeiro Curso Técnico de Fisioterapia do Brasil, com duração de um ano em período integral. Nos anos que seguiram esta data houve todo um movimento no Brasil pela melhora da qualidade dos profissionais formados nos então cursos técnicos. Todo esse movimento teve como marco inicial à fundação da Associação Brasileira de Fisioterapeutas – ABF, que ocorreu em 19 de agosto de 1959. Esta associação foi ímpar para o Quando se remete o pensamento para a história da fisioterapia e da fisioterapia respiratória, observam-se três momentos distintos que caracterizam a doença na sociedade humana: o biologicista e tecnicista, o preventivo e o da visão integrada do paciente e de seu universo. No Brasil, a Fisioterapia inicia-se no final do século XIX, com a criação do serviço de Eletricidade Médica e Hidroterapia na cidade do Rio de Janeiro: a casa das duchas como era conhecida. Em 1884, o médico Arthur Silva cria, no Hospital de Misericórdia do Rio de Janeiro, ______________________ 1 Docente da Universidade do Vale do Itajaí e Doutorando no Programa de Pós-graduação em Educação Científica e Tecnológica da UFSC. Email:[email protected] 16 Chesani, F. H. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 16-24, jul./dez. 2012 desenvolvimento da Fisioterapia no Brasil e para criação de seu primeiro curso superior de fisioterapia 2. No Brasil, nos anos 60, encontramos poucos fisioterapeutas trabalhando na área da Fisioterapia Respiratória, sobretudo em pacientes portadores de sequelas da poliomielite com comprometimento da musculatura respiratória e em pacientes portadores de doenças pulmonares crônicas ao nível ambulatorial ou domiciliar. Nos anos 70 foram formados os primeiros grupos de fisioterapeutas respiratórios para atuarem com pacientes no pré e pós-operatório de grandes cirurgias como as cardíacas, pulmonares e abdominais altas. Os anos 80 caracterizam-se pelo desenvolvimento de centros de terapia intensiva, geral ou especializada, nos quais o fisioterapeuta se inseriu como membro integrante do grupo multiprofissional, responsabilizando-se pela assistência ventilatória e motora dos pacientes criticamente doentes. Em 1983, por meio da Resolução Número 4 do Conselho Federal de Educação, o currículo mínimo do curso de fisioterapia foi dividido em quatro ciclos. O primeiro ciclo era referente às matérias biológicas, o segundo ciclo matérias de formação geral, o terceiro ciclo matérias préprofissionalizantes e o quarto ciclo matérias profissionalizantes 3. Na década de 90 a Fisioterapia passa por um processo de transformação. Com a Lei de Diretrizes e Bases (9394/96) que estabelece autonomia para as Universidades elaborarem seus currículos, os cursos de fisioterapia incorporam a prevenção em seu currículo 3 . Em 19 de fevereiro de 2002, resolve o Ministro da Educação, instituir as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Fisioterapia as quais foram aprovadas, por meio do Parecer do Conselho Nacional de Educação nº 1.210/2001. A formação geral e específica dos egressos/profissionais tem ênfase na promoção, prevenção, recuperação e reabilitação da saúde 4. A Fisioterapia Respiratória brasileira, nos últimos anos, está se firmando como uma especialidade e existem no país vários cursos de especialização, de aperfeiçoamento e produções científicas na área 5 . Com a mudança das políticas públicas em saúde no país em 2002 preconiza-se um terceiro estilo de pensamento na fisioterapia respiratória, uma atitude humanizada e visão integrada do paciente e de seu universo. Epistemologicamente este terceiro estilo de pensamento concebe a construção do saber a partir de uma relação dialética entre sujeito (indivíduo) e objeto (realidade objetiva), mediada pelo estado de conhecimento, entrelaçadas em relações históricas e estilizadas, psicossocialmente construídas 6 . Para Fleck 7 o conhecer representa a atividade mais condicionada socialmente da pessoa e o conhecimento é a criação social por excelência. Ao analisar as descobertas científicas, Fleck dimensiona a construção do novo conhecimento além das fronteiras do indivíduo-pesquisador. A tradição, a formação e o costume dariam origem a uma disposição para perceber e atuar conforme um estilo de pensamento, em um coletivo de pensamento, ou seja, de forma dirigida e restrita. Fleck 7 cunhou os conceitos de estilo de pensamento e coletivo de pensamento na década de 1930. Um estilo de pensamento constitui-se em uma instância ao mesmo tempo cognitiva, psicológica e sociológica a orientar e restringir o pensamento e as percepções, as práticas e as teorias, as indagações e as respostas dos membros de um coletivo que o compartilham. Segundo Lowi 8 os estilos de pensamento estruturam-se em círculos concêntricos quanto à especialização: os especialistas esotéricos são os centros de produção, inovação e desenvolvimento de 17 Chesani, F. H. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 16-24, jul./dez. 2012 saber (os cientistas “de ponta” para a biomedicina). Eles são referência para a periferia dos círculos esotéricos (círculos intermediários, médicos clínicos), que servem de referência e prestam serviços para os círculos exotéricos, que são os leigos, pacientes dos serviços de saúde, usuários dessa medicina 9. A construção do saber científico passa pela definição do estilo de pensamento e do coletivo de pensamento num momento histórico dado, investigando-se suas características de tendência à persistência, circulação intercoletiva de ideias e transformação do estilo. Seguindo esta linha, o objetivo deste estudo é investigar o perfil epistemológico que emerge das produções científicas de fisioterapia respiratória sobre a perspectiva de Fleck. A partir deste contexto, surgiu a seguinte questão de pesquisa: atualmente qual o perfil epistemológico que emerge das produções científicas de fisioterapia respiratória sobre a perspectiva de Fleck? Metodologia Para o entendimento do estilo de pensamento da fisioterapia respiratória dentre outras possíveis fontes para pesquisa como teses, entrevistas, anais congressuais, optou- se por uma coleta de dados através de artigos publicados em periódico. Para a localização das produções científicas de fisioterapia respiratória utilizamos a base de dados Scientific Electronic Library Online – SciELO- Brasil, que é uma biblioteca eletrônica que abrange uma coleção selecionada de periódicos científicos brasileiros. Mais especificamente, a busca foi na área das ciências da saúde e a palavra- chave foi fisioterapia respiratória. A análise dos artigos publicados na área de fisioterapia respiratória foi realizada a partir do título, resumo e palavra-chave, entre o período fevereiro do ano de 2002 a setembro 2010. Este período foi eleito devido à mudança da matriz curricular do curso de fisioterapia que preconizava a implementação na sua prática de um estilo de pensamento humanista e integral. Para a percepção do estilo de pensamento, que acontece juntamente com o aprofundamento do estudo teórico e da vista ao objeto utilizou-se a técnica para a coleta de dados a análise documental. A análise documental é ótima técnica de abordagem exploratória de dados qualitativos, sejam complementando as informações obtidas por outras técnicas, seja utilizada sozinha para revelar aspectos novos de um tema ou problema. São considerados documentos quaisquer materiais escritos que possam ser usados como fonte de informação sobre o comportamento humana. Estes incluem desde leis e regulamentos, normas, pareceres, cartas, memorandos, diários pessoais, autobiografias, jornais, revistas, discursos, roteiros de programa de rádio e televisão, estatísticas e arquivos escolares 10. A técnica de análise dos dados coletados nas revistas será o Método da Análise do Conteúdo 11. Existem maneiras diferentes do conteúdo ser abordado. Pode ser na procura de palavras, expressões, sentenças, parágrafo ou texto como um todo. Alguns preferem a análise da contagem das palavras ou expressões, ou realizar a análise temática, como foi realizado neste estudo 10. Resultado e Discussão Na base de dados SciELO- Brasil encontramos 20 periódicos que publicaram artigos em fisioterapia respiratória, os quais são: Revista Brasileira de Fisioterapia, Fisioterapia em Movimento, Jornal Brasileiro de Pneumologia, Revista Brasileira de Terapia Intensiva, Revista Brasileira de Cirurgia Cardiovascular, Revista Brasileira de Hematologia e Hemoterapia, Jornal Brasileiro de Nefrologia, Revista Brasileira de Nefrologia, Revista da Associação Médica Brasileira, Revista Paulista de Pediatria, Revista Brasileira de Saúde Materno Infantil, Texto e 18 Chesani, F. H. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 16-24, jul./dez. 2012 Contexto Enfermagem, Arquivos de Neuro- Psiquiatria, São Paulo Medical Journal, Revista do Colégio Brasileiro de cirurgiões,Revista Brasileira de Educação Especial, Revista Latino Americana de Enfermagem, Jornal de Pediatria, Acta Paulista de Enfermagem e Arquivos de cardiologia. Descrição na figura 1. Figura 1- Periódicos de publicaram artigos de Fisioterapia Respiratória. Nos 20 periódicos apresentados na figura 1 encontramos 88 artigos publicados referentes a fisioterapia respiratória. A Revista Brasileira de Fisioterapia é o periódico que tem maior número de publicações sobre a fisioterapia respiratória. A missão deste periódico é publicar artigos científicos relativos ao objeto básico de estudo e campo de atuação profissional da Fisioterapia, veiculando estudos básicos e aplicados sobre a prevenção e tratamento das disfunções de movimento. Esta missão deixa claro que os estudos que retratam a promoção e educação em saúde não são publicados, excluindo desta forma as relações históricas, sociais, culturais, familiares e econômicas do sujeito. O estudo identificou 4 estilos de pensamento nos artigos de fisioterapia respiratória: processos de avaliação e técnicas de tratamento em fisioterapia, profissão e trabalho em fisioterapia, 19 Chesani, F. H. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 16-24, jul./dez. 2012 epidemiologia, estudos promoção, educação e processo saúde-doença. experimentais, prevenção no A figura 2 apresenta a sistematização da relação entre o número de artigos com a temática. Figura 2- Porcentagem de artigos por temática Na figura 2 constatou-se que o estilo de pensamento predominante nos artigos de fisioterapia respiratória ainda é o tecnicista e reabilitador, com 76 publicações com esta temática. As políticas públicas em saúde preconizam desde o ano de 2002 a atenção integral ao indivíduo, neste estudo observaram-se somente 8 publicações nesta temática. Quanto à epidemiologia, estudos experimentais e profissão em trabalho de fisioterapia identificaram 4 artigos. Gomes e Da Ros 12 investigaram a etiologia da cárie no estilo de pensamento da ciência odontológica e identificaram cinco tendências a transformação do estilo de pensamento: a biologicista, a clínicoepidemiológica, a clínico - biologicista, o biopssicosocial e a social. Este estudo corroborou com os dados desta pesquisa. Os currículos das profissões da área da saúde foram construídos tendo como base o Relatório Flexner, publicado em 1910 nos Estados Unidos da América (EUA). Este relatório tinha como objetivo fixar diretrizes para o ensino médico daquele país e do Canadá seguindo o modelo cartesianonewtoniano que apresentava um currículo rígido mínimo de quatro anos de estudo com formação em ciências básicas e profissionalizantes. No Brasil este modelo chegou por volta da década de 50 através de incentivo da Fundação Rockfeller, e proporcionou um avanço tecnológico e científico, uma visão fragmentada da ciência, focada na especialização e incapaz de resolver algumas questões básicas que envolvem o processo saúde-doença 13. Este modelo pedagógico hegemônico de ensino é centrado em conteúdos, organizados de maneira compartilhada e isolada, fragmentando os indivíduos em especialidades, dissociando conhecimentos 20 Chesani, F. H. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 16-24, jul./dez. 2012 das áreas básicas e conhecimentos das clínicas, incentivando a precoce especialização e perpetuando modelos tradicionais de práticas em saúde. Este modelo tradicional de ensino em saúde é tecnicista e preocupado com a sofisticação dos procedimentos, conhecimento dos equipamentos de diagnósticos, tratamento e cuidado 14. Tesser 15 relata que este modelo é interventor, controlador e dominador, coerente com as características da racionalidade científica moderna em geral: racionalismo, mecanicismo, dualismo, fragmentarismo, metodologismo, quantitativismo e materialismo. Com isso, busca controlar o corpo, eliminar ou controlar doenças, fazer a gestão dos riscos e regulamentar os modos de vida. Koifman 16 relata que o movimento de ruptura das antigas maneiras de conceber o organismo humano se deu com a anatomia e instaurou uma nova racionalidade médica, moderna, que tinha como traço fundamental o mecanismo fisiologista do período clássico. Nessa concepção, a vida deixou de ser objeto central da prática médica, e a forma humana passou a ser vista como máquina. Ocorreu, então, a transformação da prática clínica. Os hospitais passaram a ser organizados como espaço clínico de uma ciência das entidades patológicas. O corpo humano tornou-se, então, a sede das doenças; e as doenças, entidades patológicas. Assim, a saúde passou a ser vista como ausência de doença e a cura passou a significar a eliminação dos sintomas. Tratava-se de enfrentar a doença como manifestação de causas, subjetivas e externas, e se procurava alcançar uma causa universal da doença. Essa medicina baseavase em uma patologia especulativa e em nosologias fenomenológico O modelo mecanicista, fragmentado e compartilhado, não consegue dar respostas aos problemas e as angústias da humanidade. As escolas sofrem os impactos das mudanças políticas, sociais, econômicas e tecnológicas, e, mesmo assim resistem a mudanças, pois carregam consigo o fardo do 17 conservadorismo . Estas constatações conduzem a uma reflexão sobre o processo de conhecimento. Possivelmente, um dos entraves no processo é a visão positivista de ciência, ainda muito presente, que impõe uma racionalidade técnica, que é responsável pela detenção de verdades descobertas, que transmite a verdade como prontas, acabadas, 18 inquestionáveis . Fleck trabalha o modelo interativo do processo de conhecimento, subtraindo, portanto, a neutralidade do sujeito, do objeto e do conhecimento, afinando-se claramente com a concepção construtivista da verdade. O conhecimento a que se refere está intimamente ligado a pressupostos e condicionamentos sociais, históricos, antropológicos e culturais e, à medida que se processa, transforma a realidade. Opõe-se ao modelo impirista-mecanicista, atribuindo ao sujeito um papel ativo que introduz ao conhecimento,uma visão de realidade socialmente transmitida. A realidade não pode ser vista enquanto abstração do sujeito ou reflexo do objeto independentemente. A relação cognoscitiva entre cognoscente e objeto a conhecer é formado por um terceiro fator, o estado de conhecimento, que são as relações históricas, sociais e culturais 19. Da Ros (20) crê que os pressupostos mais importantes de Fleck são: abordagens integradoras dos fenômenos patológicos, as doenças resultam de interações multifatoriais e multidimensionais, as doenças podem ser vistas por diferentes áreas (clínico, bacteriológico..), cada área tende a achar que sua atuação suficiente e definitiva, as doenças são construções coletivas dos médicos, todo conhecimento científico é socialmente construído, ciência aplicada não é menor que ciência básica, todas as observações dependem do observador, em consequência disto resulta numa incongruência, a doença não existe fora de um determinado corpo individual. 21 Chesani, F. H. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 16-24, jul./dez. 2012 A dinâmica da produção de conhecimento passa por três fases: instauração, extensão e transformação do estilo de pensamento. Na fase de instauração ocorre inicialmente um ver confuso, pouco desenvolvido e pouco articulado de um estilo de pensamento novo. A instauração de um estilo de pensamento novo geralmente implica numa perda da capacidade de observar certos aspectos do estilo anterior. Após o período de instauração segue-se o período de extensão do novo estilo de pensamento, a harmonia das ilusões, onde as ideias eficazes proporcionam uma intrínseca harmonia do estilo de pensamento; para que esta harmonia ocorra adequadamente é necessária uma coerção do pensamento. Por último, o ver formativo já estilizado permite a construção do fato científico de forma mais elaborada, “sólida”, estruturando um novo coletivo de pensamento 7. As novas diretrizes curriculares dos cursos de fisioterapia preconizam que a formação do profissional de saúde deve contemplar o sistema de saúde vigente no país, o trabalho em equipe e a atenção integral à saúde. Incentivam uma sólida formação geral, necessária para que o futuro graduado possa superar os desafios permanentemente renovados na prática profissional e na produção do conhecimento, permitindo variados tipos de formação e habilitações diferenciadas em um mesmo programa 21. A busca de artigos investigado neste estudo evidenciou que a fisioterapia respiratória ainda esta na fase de instauração de um novo estilo de pensamento, pois a fisioterapia respiratória observa muitos aspectos de um estilo de pensamento referente à avaliação e tratamento fisioterapêutico, portanto, um tecnicista, reabilitadora e biologicista. Este estilo de pensamento percebe os doentes apenas pela sua nosologia, permanece fortemente articulado com a atividade histórica de formação dos cursos da área de saúde. O estado de conhecimento das produções de fisioterapia respiratória, isto é, o contexto histórico, social, familiar, cultural e econômico do ser humano está neutro. A relação cognoscitiva entre cognoscente e objeto a conhecer é neutra, não existe interação entre sujeito, objeto e conhecimento, trata-se de estudos empíricos. Fleck defende que todo o conhecimento é socialmente construído, mas isto não significa negar o empírico. Conclusão A Fisioterapia respiratória, nos diferentes períodos de sua história, passou por transformações que foram importantes para sua inserção e atuação na área da saúde. Em relação à sua regulamentação, a profissão passou de uma escolaridade média para de nível superior. Porém, manteve o vínculo com o modelo biomédico, atendendo prioritariamente ao indivíduo nas suas limitações físicas. O perfil epistemológico que emerge das produções científicas de fisioterapia respiratória sobre a perspectiva de Fleck é da avaliação e tratamento fisioterapêutico, portanto, predomina a assistência tecnicista, curativa, recuperadora e reabilitadora. A fisioterapia respiratória esta na primeira fase do processo do conhecimento, a instauração. Para que o fisioterapeuta respiratório contemple o sistema de saúde vigente no país, o trabalho em equipe e a atenção integral à saúde e transforme o estilo de pensamento vigente é necessária uma certa cumplicidade dos membros que compartilham esta ideia, cumplicidade conquistada com as circulações de idéias intercoletivas e intracoletivas e uma suave coerção para um estilo de pensamento mais humanista e integral, proporcionando uma interação entre sujeito, objeto e conhecimento. 22 Chesani, F. H. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 16-24, jul./dez. 2012 Referências 1. Rebelatto J, Botomé S. Fisioterapia no Brasil: fundamentos para uma ação preventiva e perspectivas profissionais. 2nd ed. São Paulo: Manole; 1999. 2. Batalha FMB. A formação do Fisioterapeuta na UFRJ e a profissionalização da Fisioterapia [dissertação]. 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Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 25-33, jul./dez. 2012 NÍVEL DE ATIVIDADE FÍSICA DE IDOSOS LONGEVOS RESIDENTES NA GRANDE FLORIANÓPOLIS/SC [Level of physical activity oldest old residents in “Grande Florianópolis”] Giovana Zapellon Mazo1; Tânia Rosane Bertoldo Benedetti2; Janeisa Franck Virtuoso3; Rodrigo de Rosso Krug4; Márcia Zanon Benetti5. Resumo: Objetivou-se neste estudo analisar o nível de atividade física de 183 longevos da Grande Florianópolis/SC. Identificou-se e associou-se os dados sociodemográficos e nível de atividade física. No nível de atividade física geral, a maioria (57,9%) realizava mais de 150 minutos/semana (ativos fisicamente). No trabalho (96,7%), atividades domésticas (56,3%) e lazer (61,7%) eram inativos fisicamente. No transporte (39,3%) insuficientemente ativos. Não houve associação entre os dados sociodemográficos e o nível de atividade física. Os longevos são ativos fisicamente no nível de atividade física geral. Na avaliação por domínios são considerados insuficientemente ativos ou inativos. Palavras-Chave: Idoso de 80 Anos ou mais. Atividade motora. Dados Demográficos. Abstract: Aimed this study to analyze the level of physical activity of 183 oldest old residents in Big Florianópolis/SC. Sociodemographic data and the level of activity were identified and associed. At the general level of physical activity, the majority (57.9%) took more than 150 minutes/week (physically active). In work (96,7%), housework (56,3%) and leisure (61,7%), were physically inactive. In transportation (39,3%) insufficiently active. The sociodemographic data not associated with the domains of physical activity. The oldest old are are physically active in general physical activity level. In evaluation domains are considered insufficiently active or inactive. Keywords: Aged, 80 and over. Motor Activity. Demographic Data. Introdução No Brasil os idosos longevos representavam cerca de 600 mil pessoas em 1980. Em 2010, esse número passou para 1,6 milhão, com projeções de aumento para 9 milhões em 2020 e 14 milhões em 20401. O crescimento da população de idosos é um acontecimento mundial e ocorre em nível acelerado também no Brasil1. Este aumento se destaca especialmente na faixa etária com 80 anos ou mais de idade, denominados “idosos longevos”2,3,4,5,6. ____________________ 1 Licenciada em Educação Física e Professora Doutora do Programa de Pós-Graduação em Ciências do Movimento Humano (UDESC); [email protected] 2 Professora Doutora do Programa de Pós-Graduação em Educação Física (UFSC); [email protected] 3 Fisioterapeuta Mestre em Ciências do Movimento Humano (UDESC); [email protected] 4 Licenciado em Educação Física e Mestre em Ciências do Movimento Humano (UDESC); [email protected] 5 Licenciada em Educação Física e Mestre em Ciências do Movimento Humano (UDESC). [email protected] 25 Mazo, G. Z. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 25-33, jul./dez. 2012 O aumento no número de idosos longevos desencadeia uma série de inquietações na sociedade, principalmente do ponto de vista epidemiológico, já que nessa faixa etária, concentra-se a prevalência de morbidades e de incapacidades7,8. Portanto, o acompanhamento de indicadores de saúde em idosos mais velhos é prioridade e merece atenção redobrada8. Nesse contexto, a prática de atividade física regular vem sendo amplamente recomendada por profissionais da saúde como uma forma de prolongar a saúde9. Atualmente, há um alto nível de evidência e recomendação (nível A) para o aumento da expectativa de vida, através da preservação da capacidade funcional, devido sua influência no desenvolvimento de doenças crônicas, especialmente nas atividades de resistência aeróbia e muscular10. No entanto, as pesquisas brasileiras têm estudado em pequena escala este grupo etário com relação à prática de atividades físicas, pois o conceito arraigado em nossa cultura é que os idosos longevos praticam pouco ou não praticam atividades físicas5,11. Sendo assim, surge à necessidade de conhecer o nível de atividade física de idosos longevos, a fim de identificar quais estratégias podem ser adotadas para melhorar a qualidade de vida dessa população. Portanto, o presente estudo tem como objetivo analisar o nível de atividade física de idosos longevos residentes na Grande Florianópolis/SC. Métodos Tipo de Estudo e Casuística Este estudo transversal e descritivo12 foi conduzido nos municípios de Florianópolis/SC e São José/SC cuja população formada por idosos, de ambos os sexos, com 80 anos de idade e mais (idosos longevos), entre os anos de 2003 e 2005. Para a formação da amostra foram compilados os dados de três bancos de pesquisas anteriores,13,14,15 adotando-se como critérios de inclusão homens e mulheres com idade igual ou superior a 80 anos. Características como seleção da amostra, estratificação e unidades de análise adotadas em cada estudo, estão apresentadas no Quadro 1. Quadro 1: Seleção da amostra, estratificação e unidades de análise de cada pesquisa. Pesquisador Seleção da amostra Estratificação Unidades de análise Distritos municipais e grupos de convivência Mazo13 (2003)* Probabilística Apenas idade existentes em Florianópolis, SC (2002) 14 Benedetti Setores censitários definidos Probabilística Sexo e idade (2004)* pelo IBGE (2004) Proporcional: Cardoso15 Probabilística 20% dos idosos Grupos de convivência (2005) (60 anos ou mais) * Foram realizados cálculos amostrais para composição da amostra. IBGE: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística 26 Mazo, G. Z. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 25-33, jul./dez. 2012 Após a formação do banco dos dados, a amostra do presente estudo totalizou em 183 idosos longevos com média de idade de 84,32 ± 3,85 anos, sendo 116 mulheres e 67 homens. Instrumentos e Coleta de Dados Nos três estudos, foram aplicados uma ficha diagnóstica semelhante, com identificação de dados sociodemográficos (sexo, escolaridade e estado civil) e autorrelato do estado de saúde, e o Questionário Internacional de Atividade Física (IPAQ), versão 8, forma longa e semana normal, adaptado para idosos,16 para verificar o nível de atividade física. O IPAQ permite estimar o dispêndio energético semanal em atividades físicas relacionados ao trabalho, transportes, tarefas domésticas e lazer por 10 minutos contínuos, com intensidade moderada ou vigorosa, durante uma semana típica17. Ambos os instrumentos foram aplicados em forma de entrevista. Para a interpretação do nível de atividade física por meio do IPAQ, utilizouse como critério os limiares recomendados para que a atividade física resulte em benefícios para a saúde. Os idosos tiveram seus níveis de atividade física, total e nos diferentes domínios do IPAQ (trabalho, transporte, lazer e atividades domésticas, sendo que o domínio tempo sentado não foi utilizado) classificados em: inativos – zero minuto por semana de atividade física; insuficientemente ativos – realizavam de 1 a 149 minutos por semana; e ativos – valor igual ou superior a 150 minutos por semana17. Os idosos participantes de grupos, seja de exercícios físicos ou de convivência, foram abordados no local onde ocorrem essas atividades, enquanto os demais foram entrevistados em suas residências. Em ambos os casos, foram agendados a melhor data e horário para aplicação dos instrumentos, primeiramente a ficha diagnóstica e depois o IPAQ. Tratamento dos Dados Os dados coletados foram armazenados em um banco de dados no programa Microsoft Excel® e cada participante foi cadastrado segundo um número codificador. A análise estatística foi realizada no pacote estatístico SPSS – Statistical Package for Social Sciences (versão 17.0). Todas as variáveis foram analisadas descritivamente por meio de frequência simples, porcentagens (variáveis categóricas) e medidas de posição e dispersão (variáveis numéricas). Para associação entre variáveis categóricas, utilizou-se o teste de QuiQuadrado (χ2) ou Exato de Fisher, quando necessário. A comparação entre dois grupos, com variáveis numéricas, foi realizada utilizando o teste de Mann-Whitney. Adotou-se um nível de significância de 5%. Aspectos Éticos Para realização dessa pesquisa, foram cumpridos os princípios éticos de acordo com a resolução 196 do Conselho Nacional de Saúde. A privacidade dos dados dos indivíduos foi garantida tanto nos estudos prévios como neste. O Comitê de Ética em Pesquisas em Seres Humanos da Universidade Federal de Santa Catarina aprovou a pesquisa de Benedetti14 (protocolo 051/2001), enquanto que a pesquisa de Mazo13 e Cardoso 15 obtiveram a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisas em Seres Humanos da Universidade do Estado de Santa Catarina (protocolo 95/2007 e 164/2005 respectivamente). Resultados Foram avaliados 183 idosos longevos, sendo 116 (63,4%) mulheres e 67 (36,6%) homens. A média de idade da amostra foi 84,32 ± 3,85 anos, não havendo diferença significante entre homens e mulheres (84,21 ± 3,50 e 84,38 ± 4,05 anos, respectivamente). 27 Mazo, G. Z. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 25-33, jul./dez. 2012 Os dados sociodemográficos demonstram que os idosos eram, em sua maioria, viúvos (61,2%) ou casados (36,6%). Quanto ao nível de escolaridade, 53,8% tinham apenas o ensino fundamental incompleto e 15,2% eram analfabetos. A Tabela 1 apresenta as associações entre o sexo e as variáveis sociodemográficas. Conforme o ajuste residual (¥), existe uma tendência dos homens terem cursado o ensino superior (18,2%) quando comparados às mulheres (1,9%). Com relação ao estado civil, ocorre uma tendência das mulheres serem viúvas (82,8%). Também se observa na Tabela 1 que a maioria dos idosos longevos entrevistados considera seu estado de saúde “bom” (60,1%) ou “ruim” (26,2%). Apenas 10,4%, auto avaliaram seu estado de saúde como “ótimo”. Há uma tendência dos homens apresentarem uma melhor auto percepção de saúde (19,4%) quando comparados com as mulheres (5,2%). Tabela 1: Associação entre o sexo e dados sociodemográficos e autorrelato do estado de saúde de idosos longevos (n= 183). Mulheres (n= 116) f (%) Homens (n= 67) f (%) Total (n= 183) f (%) X2 Estado civil Casado 16 (13,8) 51 (76,1) 67 (36,6) 71,427 Viúvo 96 (82,8) ¥ 16 (23,9) 112 (61,2) Nunca casou 4 (3,4) 0 (0,0) 4 (2,2) Escolaridade Analfabeto 19 (18,4) 5 (9,1) 24 (15,2) Fund. incompleto 59 (57,3) 26 (47,3) 85 (53,8) 16,008 Fund. completo 13 (12,6) 6 (10,9) 19 (12,0) Ensino médio 10 (9,7) 8 (14,5) 18 (11,4) Superior 2 (1,9) 10 (18,2) ¥ 12 (7,6) Autorrelato do estado de saúde Ótima 6 (5,2) 13 (19,4) ¥ 19 (10,4) Boa 72 (62,1) 38 (56,7) 110 (60,1) 9,660 Ruim 34 (29,3) 14 (20,9) 48 (26,2) Péssima 4 (3,4) 2 (3,0) 6 (3,3) 2 Fund. = fundamental; χ = teste Qui-Quadrado; p= nível de significância. ¥ Ajuste Residual ≥ 2,0; * p ≤ 0,05 Os homens e as mulheres longevas do presente estudo têm semelhante nível de atividade física, de acordo com os dados apresentados na Tabela 2, não havendo associação entre nível de atividade física e sexo. O somatório dos domínios do IPAQ demonstrou que os idosos longevos em sua maioria foram considerados ativos (57,9%). p <0,001* 0,003* 0,022* Acredita-se que esse padrão tenha ocorrido devido o ponto de corte utilizado (150 minutos por semana). No domínio do trabalho, que se refere às atividades físicas realizadas durante o trabalho, remunerado ou voluntário, observa-se que a maioria dos idosos longevos não trabalha (96,7%) e apenas 5 28 Mazo, G. Z. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 25-33, jul./dez. 2012 foram considerados mais ativos neste domínio. Com relação às atividades físicas realizadas como meio de transporte, para deslocarem-se de um local a outro, 39,3% dos idosos são insuficientemente ativos enquanto 23,5% são considerados ativos. No domínio das atividades domésticas, 56,3% dos idosos longevos são considerados inativos enquanto apenas 19,7% são ativos. Apesar de consistir um campo feminino, a prevalência de inatividade física foi maior entre as mulheres (59,5%), mas sem diferença significativa. Quanto ao domínio do lazer, que se refere às atividades físicas de recreação, esporte, exercício físico e lazer, nota-se que a maioria dos participantes do estudo foram classificados como inativos (61,7%). Essa característica também ocorreu entre homens (65,7%) e mulheres (59,5%). Salienta-se que as mulheres apresentaram maior prevalência na classificação ativa (25,0%). Tabela 2: Associação entre sexo e nível de atividade física de idosos longevos (n= 183). Mulheres Homens Total (n= 116) (n= 67) (n= 183) Nível de Atividade Física X2 p f (%) f (%) f (%) No trabalho Inativo 112 (96,6) 65 (97,0) 177 (96,7) 0,603 0,740 Insuf. Ativo 1 (0,9) 0 (0,0) 1 (0,5) Ativo 3 (2,6) 2 (3,0) 5 (2,7) No transporte Inativo 43 (37,1) 25 (37,3) 68 (37,2) 0,015 0,992 Insuf. Ativo 46 (39,7) 26 (38,8) 72 (39,3) Ativo 27 (23,3) 16 (23,9) 43 (23,5) Nas atividades domésticas Inativo 69 (59,5) 34 (50,7) 103 (56,3) Insuf. Ativo 27 (23,3) 17 (25,4) 44 (24,0) 0,853 0,653 Ativo 20 (17,2) 16 (23,9) 36 (19,7) No lazer Inativo 69 (59,5) 44 (65,7) 113 (61,7) 0,853 0,653 Insuf. Ativo 18 (15,5) 10 (14,9) 18 (15,3) Ativo 29 (25,0) 13 (19,4) 42 (23,0) Total Inativo 20 (17,2) 12 (17,9) 32 (17,5) 0,793 0,673 Insuf. Ativo 31 (26,7) 14 (20,9) 45 (24,6) Ativo 65 (56,0) 41 (61,2) 106 (57,9) 2 Insuf.= Insuficientemente; χ = teste Qui-Quadrado; p= nível de significância. Acrescenta-se também que não houve associação significante entre os níveis de atividade física e as características sociodemográficas, sugerindo que na faixa etária estudada, essas características não influenciam o padrão de atividade física. Além disso, observou-se uma tendência dos idosos longevos inativos nas atividades físicas desenvolvidas como meio de transporte apresentarem autorrelato negativo (péssimo) do seu estado de saúde (p= 0,022; Ajuste Residual ≥ 2,0). 29 Mazo, G. Z. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 25-33, jul./dez. 2012 Discussão Na associação entre o sexo e dados sociodemográficos, observou-se que existe uma tendência dos homens terem cursado o ensino superior e das mulheres serem viúvas. Na avaliação do nível de atividade física total, observou-se que grande parte dos idosos foram classificados como ativos fisicamente (57,9%). Um estudo2 constatou que 80% dos idosos longevos pesquisados tinham hábitos saudáveis de vida. Entretanto, 24,6% eram insuficientemente ativos e 17,5% inativos. O aumento da inatividade física é influenciada por muitos fatores, sendo a idade um deles18. As perdas biopsicossociais que o processo de envelhecimento ocasiona nos idosos longevos contribuem para o aumento da inatividade física10. Sendo assim a medida que a idade aumenta, o indivíduo tende a tornar-se menos ativo9,19. Quanto ao nível de atividade física realizado no domínio trabalho, os participantes deste estudo classificaram-se em sua grande maioria como inativos (96,7%). O mercado de trabalho, realmente, é o primeiro a excluir o velho por considerá-lo defasado e com menor capacidade produtiva20. Neste estudo, foi evidenciado que essa realidade é mais exacerbada nos idosos longevos estudados. Entretanto, observa-se no estudo de Patrício e Moreira21 que pessoas com histórico de muito trabalho, seja em casa ou na lavoura, resultaram em idosos mais ativos no trabalho e com tendência a ser mais longevos. Os idosos longevos, no domínio transporte, foram considerados insuficientemente ativos (39,3%) e inativos (37,2%). Isto também foi encontrado no estudo de Cardoso, Mazo e Japiasú22, em que identificaram alto índice de inatividade (71,2%) no transporte entre idosos acima de 60 anos. Acrescenta-se ainda que, entre idosos longevos, as dificuldades de transporte tornam-se maiores, uma vez que nessa faixa etária co-existem um série de morbidades e incapacidades. O presente estudo também evidenciou que mais da metade dos idosos longevos são inativos fisicamente (56,3%) no domínio atividades domésticas. Cardoso, Mazo e Japiasú22 encontram resultados conflitantes, pois, ao avaliarem 198 idosos, a atividade doméstica correspondeu a 40% do total de atividades físicas praticadas. Os resultados do presente estudo podem ser justificados pela faixa etária analisada, uma vez que o estudo mencionado anteriormente foi conduzido com idosos acima de 60 anos. Tanto homens quanto mulheres foram considerados, na maioria dos casos, inativos fisicamente (61,7%) no domínio lazer. Esse resultado concorda com o estudo de Aartsen et al.23 em que acompanharam, durante 6 anos, 2.076 indivíduos residentes em Amsterdam, na Holanda, com idade entre 5585 anos e avaliaram a participação destes indivíduos em atividades como serviços religiosos, associações de bairros, organizações de ajuda, cursos educacionais, esportes e atividades de lazer. Os autores constataram que há uma significativa diminuição da participação dos idosos nessas atividades com o passar dos anos. Essa observação pode justificar a alta frequência de inatividade física entre idosos longevos. Dados provenientes da Pesquisa Nacional de Saúde dos Estados Unidos de 1992, com idosos acima de 65 anos, indicaram que apenas 37% dos homens e 24% das mulheres entrevistadas praticavam atividades físicas no tempo livre por três ou mais vezes por semana e por mais de 30 minutos nas últimas duas semanas24. Além disso, a sociedade brasileira tem muitas barreiras que dificultam a prática de atividades físicas pelos idosos, bem como as condições de transporte que também podem ser um obstáculo importante25. A diferença do nível de atividade física segundo o sexo dos idosos longevos também foi analisada. Mesmo na ausência de diferença significante, constatou-se que os 30 Mazo, G. Z. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 25-33, jul./dez. 2012 homens (23,9%) foram mais ativos fisicamente do que as mulheres (17,2%) nas atividades domésticas. As mulheres realizam mais afazeres domésticos e cuidados com a família durante toda a vida, enquanto os homens idosos, mesmo aposentados, permanecem descompromissados com esses afazeres26. Dessa forma, os resultados encontrados no presente estudo vão de encontro com a literatura específica. Nota-se também diferença, na atividade física de lazer em que as mulheres (25%) foram mais ativas fisicamente que os homens (19,4%), sem diferença significativa. Andreotti e Okuma27 já observaram maior proporção de mulheres idosas em programas de exercícios físicos. Além disso, a presença de incapacidades pode estimular a mulher longeva a exercitar-se. As características sociodemográficas (idade, estado civil e escolaridade) parecem não influenciar no nível de atividade física em qualquer domínio entre a amostra do presente estudo. Com relação ao nível de atividade física no lazer, estudos apontam outros fatores que influenciam a prática, tais como, condições ambientais, condições financeiras25, sexo10,19, condições de saúde19, obesidade, tabagismo, estado civil10,28, escolaridade10 e a idade18. Essas variáveis podem influenciar também outros domínios da atividade física. A autopercepção de saúde é um fator que também reflete baixo nível de atividade física, uma vez que, ao relatar sua saúde como ruim, o idoso também praticará menos atividades físicas25. Conforme observado no presente estudo, apenas o grupo de idosos inativos no domínio do transporte associouse com o autorrelato negativo do estado de saúde. Considerações finais O domínio mulheres diferenças nível de atividade física por mostrou-se semelhante entre e homens, indicando que as comportamentais de sexo não resultam em diferença no nível de atividade física nessa faixa etária. Além disso, houve maior prevalência de idosos longevos inativos em todos os domínios, independente do sexo. O estudo também observou que as características sociodemográficas não associam-se ao padrão de atividade física de idosos longevos. Portanto, sugere-se que novas características, como condições ambientais e financeiras, sejam analisadas a fim de identificar quais influenciam na ocorrência de inatividade física entre essa população. Diante dessas conclusões, nota-se a necessidade de programas diferenciados para ampliar o nível de atividade física de idosos longevos. Independentemente do domínio, a manutenção da atividade física é muito importante para essa faixa etária, pois resulta em uma série de benefícios físicos e sociais. Portanto, novas estratégias como atendimentos personalizados ou domiciliares podem ser adotados por profissionais da saúde no intuito de aprimorar o nível de atividade física de idosos longevos. Referências 1. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Base de dados, censo 2010. Rio de Janeiro: IBGE, 2010a. 2. Moreira LMA, Souza FR, Cordeiro APB, Conceiçâo LS, Conceiçâo LS. Estudo sobre a longevidade em Santa Inês, Bahia: aspectos demográficos, genéticos e sociais. 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M. et al Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 34-41, jul./dez. 2012 O PROGRAMA DE AGENTES COMUNITÁRIOS DE SAÚDE SOB A ÓTICA DE NORBERT ELIAS [The program of community health workers in the light of Norbert Elias] Liliana Muller Larocca¹; José Rabone Junior²; Daiane Siqueira Luccas³. Resumo: Trata-se de estudo exploratório com abordagem qualitativa, e objetivo de analisar, sob a ótica dos profissionais de saúde, as relações estabelecidas entre os Agentes Comunitários de Saúde e usuários de uma Unidade Básica de Saúde, problematizando-as em consonância com os conceitos da teoria do sociólogo Norbert Elias. Para tal foram realizadas entrevistas semi-estruturadas, com posterior análise dos discursos. A pesquisa permitiu reconhecer a necessidade de estudar os espaços do cuidar em Saúde Coletiva, com ênfase à compreensão das redes de relações formadas entre os atores sociais e referendar o elo sociológico do Agente Comunitário de Saúde, usuário e assistência prestada. Palavras Chave: Programa Saúde da Família. Poder Social. Agentes Comunitários de Saúde. Abstract: It is treated of exploratory study with quantitative approach. This study objectified to analyze, in health professionals’ point of view, the relations established between Community Health Workers and users in a covered area, problematizing them according to Norbert Elias’s theory. Thus, interviews were carried out with further discourse analysis complying with proper ethical principles. It was possible to evidence the sociological bond among Community Health Agent, users and the delivered care. The research enabled to recognize the need to study care settings in Public Health, emphasizing the understanding of the social maze that human relations entail, approaching sociological, health backgrounds. Keywords: Family Health Program. Power. Community Health Workers. Introdução integralidade da assistência aos seus usuários, além da participação ativa da sociedade no sistema. Nesse sentido, objetivando modificar essencialmente a atenção básica em saúde e a relação do SUS com seus usuários, o governo instituiu em 1994 o Programa de Saúde da Família (PSF – posteriormente designado estratégia - ESF) com o objetivo de, por meio de ações voltadas à promoção da saúde do indivíduo e Com a constituição de 1988, por meio do artigo 196, foi legalmente instituída no Brasil a universalização do acesso aos serviços de saúde. Dois anos depois, a Lei 8080 consolidou em nosso país a criação do Sistema Único de Saúde (SUS) estabelecendo entre suas diretrizes a universalização, a descentralização e a ________________ ¹ Enfermeira. Doutora em Enfermagem. Docente e Líder do Grupo de Pesquisas em Políticas, Gestão e Práticas em Saúde da Universidade Federal do Paraná - GPPGPS / UFPR. E-mail: [email protected] ² Discente do curso de graduação em Enfermagem da Universidade federal do Paraná UFPR. Bolsista de Iniciação Científica PIBIC/CNPq. Membro do Grupo de Pesquisas em Políticas, Gestão e Práticas em Saúde da Universidade Federal do Paraná - GPPGPS. Email: [email protected] ³ Enfermeira. Mestranda do PPGENF - UFPR. Membro do Grupo de Pesquisas em Políticas, Gestão e Práticas em Saúde da Universidade Federal do Paraná - GPPGPS. E-mail: [email protected] 34 Larocca, L. M. et al Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 34-41, jul./dez. 2012 da família, estreitar relações entre sociedade e serviço.(1) Implementada pela Lei 10.507/2002(2), a profissão de Agente Comunitário (ACS) foi encampada pelo Ministério da Saúde em 1991, quando se iniciou nacionalmente o Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS) embasado no modelo idealizado em 1987 no Ceará(3,4). O mesmo seria responsável pela realização de atividades de prevenção de doenças e promoção da saúde, utilizando-se de ações individuais e coletivas, podendo atuar nos domicílios e na comunidade. O ACS deveria, portanto, transpor os limites físicos da Unidade Básica de Saúde (UBS) e ir ao encontro do usuário, visitando-o periodicamente e tornando-se elo entre serviço e população. Visando mudanças paradigmáticas foram instituídos requisitos mínimos para atuação do ACS: ter concluído o ensino fundamental; residir na região em que trabalha desde o lançamento do edital de contratação e passar por um curso preparatório(5). A obrigatoriedade de residir na área de atuação profissional pode ser considerada um pioneirismo no processo de trabalho em saúde, pois o papel a ser desenvolvido no território deixa de ser apenas de morador, tornando-se concomitantemente profissional e elo de uma rede de setores. Esta multiplicidade de papéis aproxima o ACS dos usuários: “[...] relações de agente de saúde e de vizinho, relações de quem orienta quanto aos cuidados com a saúde, e de quem frequenta os mesmos espaços sociais que os usuários [...]”(6:124). Assim sendo, compreende-se que a convivência dos atores sociais num dado território sanitário pressupõe relações passíveis de estudos sociológicos. Para concretização deste estudo foram consideradas as relações de figuração, interdependência e equilíbrio de tensões estabelecidas entre os atores sociais do SUS. Tais conceitos estão descritos na obra Os estabelecidos e os outsiders(7) de Norbert Elias, inspiração teórica deste estudo. O objetivo do estudo foi analisar, sob a ótica dos profissionais de saúde, as relações estabelecidas entre os Agentes Comunitários de Saúde e usuários de um dado território, problematizando-as em consonância com os conceitos da teoria do sociólogo Norbert Elias. O estudo localizado em um pequeno território pretende focar questões que merecem ser investigadas e problematizadas numa maior dimensão. A aproximação teórica a esta obra em particular se deve ao processo de produção da mesma. Elias analisou, por meio de uma pesquisa-ação, as relações que se estabeleceram entre moradores de uma dada localidade inglesa, com poucas distinções de classe social. Compreende-se neste estudo que as conclusões de Elias são aplicáveis às relações que se dão entre os atores sociais da Estratégia de Saúde da Família (ESF), pois os sujeitos pesquisados desempenham concomitantemente, relações de cuidadores, receptores de cuidado, vizinhos e cidadãos(8). Além disto, a obra de Elias problematiza as relações de poder visualizando-as sob a forma de elementos como a fofoca, que pode aparecer ligada à especificidade da fusão entre o âmbito profissional e o pessoal da relação entre ACS e usuários. Elias compreende que as relações que pressupõem a interatividade complexa entre pessoas são essencialmente relações de poder, expressando-se na compreensão de si, dos outros, no conhecimento e nos costumes, permitindo ver indivíduo e grupos como sujeitos da construção do ambiente no qual suas vidas transcorrem(9). A dinâmica entre as sociedades e os indivíduos, reconhecida como figuração, é relacional, repleta de contradições e tensões que implicam lugar e posição social como: propriedade, trabalho, classe, etnia, gênero e geração(7,10,11). As formas de dependência recíproca, interdependência, são formações 35 Larocca, L. M. et al Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 34-41, jul./dez. 2012 sociais de dimensões variáveis (território, escola, unidade de saúde, cidade, nação, etc.) às quais os seres humanos estão ligados(7,10,11). Neste estudo compreendeu-se o serviço local de saúde como locus de formação social, onde são percebidas redes de interdependência, geradoras da produção histórica das sociedades(7). O último conceito refere-se às tensões existentes no cotidiano dos indivíduos que acabam por provocar mudanças no equilíbrio de forças (equilíbrio de tensões), com consequente alteração estrutural das sociedades(7,10,11). Metodologia Inspirado no pensamento sociológico é um estudo de caráter exploratório com abordagem qualitativa, realizado numa Unidade Básica de Saúde, moldada na Estratégia de Saúde da Família, localizada num município da região metropolitana de Curitiba-Paraná. Os atores sociais da pesquisa foram compostos por todos os membros da equipe multiprofissional da UBS de nível superior e médio, totalizando sete participantes (a visão dos ACS encontra-se publicada em outro estudo)(3). Os sujeitos envolvidos (02 enfermeiros, 01 técnico de enfermagem, 02 médicos e 02 cirurgiões dentistas) representam o pressuposto de que estes profissionais vivenciariam a dinâmica das relações entre os ACS e os usuários, em outra perspectiva de análise: visão ampliada das relações territoriais. Foram realizadas entrevistas semi-estruturadas com as seguintes temáticas: Conhecimento acerca dos principais objetivos do Programa de Saúde da Família (PSF); Dificuldades para implantação de um modelo de cuidado voltado à vida e promoção da saúde; Conquistas e desafios do PSF; Requisitos para formação e contratação do ACS; Atribuições e funções do ACS; Visita domiciliária realizada pelo ACS; Contradições entre formação e atuação dos ACS; Peculiaridades sobre o fato do ACS residir e trabalhar no mesmo território. Os discursos obtidos foram organizados, problematizados e analisados, sendo os conceitos de Elias utilizados como categorias de análise. As categorias de análise: figuração, interdependência e equilíbrio de tensões dão voz às relações de poder entre os atores sociais do território investigado. Deste modo, esses discursos permitiram uma aproximação ao objeto de nosso estudo: as relações de poder entre o ACS e os usuários de uma UBS; observadas pela lente da visão dos demais profissionais de saúde. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) do Setor de Ciências da Saúde da UFPR por meio do parecer n. 416.096.07.09. Foram respeitadas as exigências do CEP e da resolução 196/96 do CNS. Todos os entrevistados optaram por participar da pesquisa livre e esclarecidamente e suas identidades foram preservadas substituindo-se randomicamente seus nomes por letras e números (E1...E7). Resultados e discussão Os resultados serão apresentados em quadros, nos quais o referencial teórico foi categorizado; ressalta-se que alguns discursos contemplavam mais de uma categoria, mas os pesquisadores optaram, para efeitos analíticos, considerar apenas uma categoria teórica por discurso analisado. Em se tratando de figuração, o primeiro ponto a emergir nas entrevistas foi a fofoca, trata-se de um importante ponto de consonância com a obra de Elias(7), que a classificou como importante agente de figuração, já que esta submete o indivíduo ao julgamento coletivo. A fofoca foi encontrada em cinco discursos durante as entrevistas, sendo aqui ilustrada pelo E7: Comentar com os vizinhos, às vezes a pessoa [...] se abre com outro, aí a gente vai cobrar – olha, da sua 36 Larocca, L. M. et al Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 34-41, jul./dez. 2012 área e você não está sabendo – e ele diz – mas é que a pessoa não quis conversar comigo(E7). Percebe-se que o profissional reconhece o fenômeno da fofoca como reflexo das relações entre o ACS e o usuário, percebe-se, também, certa familiaridade com o fato, tratado com naturalidade e bom humor, o que pode significar que o entrevistado convive com ele no processo de trabalho em saúde. No mesmo sentido, E6 contextualiza e correlaciona com a proximidade geográfica: DISCURSO Entrevistado parafraseando usuário: “ – eu tenho receio porque aquela senhora [ACS] mora no bairro e eu estou com uma doença e tenho receio de abrir a porta pra ela, porque ela vai saber deste problema e logo o bairro todo vai saber – já tive algumas situações em que o usuário pediu pra que determinado ACS não o visitasse (E3)” “digamos que você é um ACS, como fulano te conhece ele fala – arranja uma vaga pra mim – você arranja, outro fica sabendo, isso acaba gerando um conflito, as pessoas dizem – fulano conseguiu por que eu não posso? (E4)” “não tem como atender todos os pacientes do mundo não é? (E2)” “quando começou o PSF algumas regiões tinham fofoca, aquela comadre2 gerava uma situação, algumas pessoas da área não queriam se abrir com a gente porque tinham receio (E3)” “tem muita gente que se aproveita da amizade com o ACS pra conseguir outras coisas (E2)” QUADRO 1 – FIGURAÇÃO NA ESF 2 “como ele [o agente] mora na região ele tem um acesso mais fácil à população, mas o que pode acontecer é que a pessoa, por já conhecer [o agente] tenha vergonha de falar sobre certas coisas(E6). É possível reconhecer a aplicabilidade, nas relações sociais da ESF, dos conceitos de relação de poder entre indivíduos da mesma classe social analisados por Elias. Vê-se, ainda, que o profissional entrevistado reconhece que a imposição legal de o ACS residir no local onde trabalha impacta no exercício da profissão. ANÁLISE Receio do usuário em relação ao julgamento da sociedade. Para sentir-se confortável em comentar sua vida privada com o ACS, o usuário necessita confiar neste Fenômeno da reação negativa da sociedade, que ocorre quando um usuário se beneficia do seu nível de intimidade com o ACS. Resignação frente ao fato da ESF não atingir todos os espaços de seu Município. Fenômeno da fofoca como determinador da efetividade do atendimento em saúde. Uso da interface público-privado do ACS para obtenção de vantagens. Regionalismo, pessoa que faz fofoca. 37 Larocca, L. M. et al Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 34-41, jul./dez. 2012 O conceito de interdependência, foi percebido no cotidiano do cenário pesquisado, como explica E3: ele [ACS] é um elo entre a gente e a população, [...] vai às em casas, observa e traz pra que a gente faça o diagnóstico da situação (E3). Nota-se também, uma valorização da interdependência, vista como positiva e estimulada pelo entrevistado: eu até costumo instruir para que eles se ofereçam pra entrar mesmo, essa é a oportunidade que você tem de captar mais coisas, [...] tanto que algumas delas [as agentes] falam assim – eu cheguei ao portão e ela [a usuária] não falou. Aí eu entrei na casa e ela começou a chorar (E3). Outro ponto que emergiu nos discursos foi a correlação entre a interdependência e a proximidade geográfica entre ACS e usuários. Esta proximidade possibilita ao ACS conhecer mais profundamente o território no qual atua (afinal também vivencia suas contradições, problemas e alegrias), conhecendo a estrutura, as carências e as características específicas deste território, como explica E5: DISCURSO eles têm maior noção [dos problemas da área], eles sabem quais são os agravos que afetam a comunidade (E5). Observou-se, ainda, a dificuldade do ACS em ter seu horário de trabalho bem definido, E7 aponta que: [...]o pessoal não respeita o horário de trabalho, o agente comunitário acaba sendo agente comunitário de segunda a segunda, vinte e quatro horas por dia, os agentes vão ao mercado e eles [os usuários] reclamam, querem marcar consultas, os agentes quase não têm sossego (E7). Esta situação, relacionada ao fenômeno da interdependência existente, destaca que usuários têm no ACS a representação de um membro da UBS, extrapolando muros e limites físicos, acabando por abordá-lo em tempo integral. Tal representação pode, em alguns casos, ser vista negativamente, como explica E1: Os ACS reclamam bastante disso, no final de semana estão no mercado e as pessoas vêm pedir exame pra eles (E1). ANÁLISE “era bem mais difícil no começo todo Dificuldades encontradas na implementação da mundo [profissionais de saúde] ESF são enfrentadas, em parte, devido ao aceitar, hoje já tem outra visão, o estabelecimento da interdependência. pessoal sabe que o PSF dá certo (E1)” “a pessoa fala – tenho muita dificuldade porque neste bairro não tem nada, não tem um centro de referência [...] e o ACS mora na região, ele sabe que lá tem aquele local [centro de referência], que a pessoa poderia ir, se não está não é porque não tem (E3) Ilustra-se neste discurso um dos pontos positivos da imposição legal de residir onde se trabalha. O ACS, ao conhecer o território em que atua, pode ter facilidade em indicar aos usuários locais ou atividades como centros de convivência ou grupos de atividades físicas, por exemplo. Esta proximidade geográfica, aliada à interdependência, ajuda o ACS a compreender a determinação social do processo saúde-doença. QUADRO 2 – INTERDEPENDÊNCIA NA ESF 38 Larocca, L. M. et al Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 34-41, jul./dez. 2012 Na última categoria analisada, equilíbrio de tensões, observou-se discursos nos quais foram explicitadas situações geradoras de tensão (Quadro 3). Nota-se aqui uma presença marcante nas falas dos entrevistados da questão da confiança e credibilidade da ESF como estratégia resolutiva: [...] a população não é educada pra ser tratada só no primário, eles já vêm pra cá [UBS] achando que têm que ir para o terciário, aí você diz – não, o médico da família vai te atender – e eles dizem – não, tem que ser o especialista (E1). E5 corrobora: as pessoas acreditam que você só consegue fazer um diagnóstico com um exame de alta complexidade, que as coisas simples não são boas (E5) e E7 complementa: eles vêm aqui atrás de um especialista, eles querem um pediatra, um cardiologista,não querem um médico que olhe eles no geral, a família toda, eles não querem um clínico geral, [...] está na cabeça das pessoas, eles vêm atrás de cura, não vêm pra prevenir uma doença ou pra ter uma educação em saúde (E7). Neste ponto, percebe-se que, segundo os sujeitos da pesquisa, os usuários não estão confortáveis, e em alguns casos não confiando no modelo de atendimento da ESF. Este fenômeno gera tensão entre profissionais da UBS, pois, segundo estes, o que é oferecido pela unidade é subaproveitado e a população procura na unidade soluções intersetoriais e que compreendem outras dimensões relacionais. Esta situação pode estar ligada à visão dos usuários, voltada ao modelo assistencialista, com ênfase na doença, mas também pode refletir uma necessidade de reestruturação político-gerencial da ESF. Alguns estudos corroboram a insatisfação dos membros da comunidade com relação ao trabalho dos ACS sinalizando uma necessária reorganização das relações de poder(12). Em se tratando dos próprios profissionais, a tensão é abordada por E3, que conta um episódio ocorrido num contato com um profissional de outro setor de atendimento: [...] ele me puxou, sentamos e ele começou a falar mal do PSF: que o PSF é um dinheiro jogado fora, que os médicos da família não fazem nada, estão sempre referenciando, mas o papel daquele profissional [o médico da família] é referenciar, só que para o especialista ele não tem resolubilidade (E3). Neste discurso foi possível notar que alguns profissionais de saúde acreditam que a ESF – moldada num enfoque preventivista e de promoção à saúde - é pouco efetiva no controle dos agravos. E1 ilustra, ainda, que na própria UBS por vezes: profissionais [de saúde] orientam o paciente a procurar outro lugar ou ir ao especialista (E1), Estes discursos explicitam episódios geradores de tensão entre a equipe de saúde e usuários do sistema: são considerados neste estudo como agentes de mutação da sociedade(6). É importante destacar que as tensões não são, portanto, necessariamente ruins; frequentemente são os gatilhos necessários para mudanças paradigmáticas. 39 Larocca, L. M. et al Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 34-41, jul./dez. 2012 DISCURSO “por exemplo: é amigo do ACS, às vezes o agente diz que não precisa vir fazer consulta, que é só pedir o exame, acaba tirando um pouco do enfoque, a gente acaba solicitando mais exames do que necessário [...] acho que a proximidade das pessoas atrapalha um pouco (E5)” “eles [ACS] sabem muito bem sua função e às vezes eles têm que fazer outros trabalhos (E3)” ANÁLISE O ACS - elo entre a UBS e os usuários pode assumir funções que não são dele a fim de atender às demandas dos usuários, causando desconforto à equipe. A necessidade em desempenhar funções administrativas na UBS desagrada o ACS, os demais profissionais e, possivelmente, a população. “você tem que ter jogo de cintura aqui com A tensão aqui explicitada vai de encontro a o povo, porque você não pode acostumar um importante princípio do SUS. Os mal, às vezes você dá a mão e a pessoa já profissionais, não estão acostumados com a quer o braço (E4)” participação popular na UBS e sentem-se desconfortáveis. QUADRO 3 – EQUILÍBRIO DE TENSÕES NA ESF Considerações finais Ao produzir estudos sobre sociedades, indivíduos e relações de poder, Norbert Elias permitiu dar voz ao ser humano das pequenas comunidades. Para nós, este autor propiciou um olhar diferenciado à ESF: suas contradições, tensões e possibilidades. As relações pessoais são especialmente importantes no processo de trabalho em saúde, no qual a proximidade entre profissional e usuário é intimamente ligada a vários fatores com influência na qualidade e efetividade do atendimento. Nesse sentido, referenda-se a continuidade de estudos, nos espaços do cuidar em Saúde Coletiva, voltados à compreensão da complexa trama tecida pelas relações humanas, aproximando referenciais sociológicos ao mundo da saúde. Durante a realização da pesquisa, foi possível presenciar fenômenos que indicam a necessidade de ações no sentido de estabelecer diálogos entre profissionais e usuários envolvidos no processo de cuidar de um dado território. Um dos pontos relevantes do estudo corrobora a necessidade de formação para compreender, estimular e concretizar a participação popular como um dos princípios do SUS. Destarte, é imprescindível à equipe multidisciplinar de saúde conhecer a estrutura social em que está inserida e considera-se, afinal, que os elementos expostos indicam a necessidade de políticas públicas voltadas à valorização da vida. Referências 1. Brasil. Ministério da Saúde. Programa saúde da família - PSF. Brasília, DF; 2001. 2. Brasil. Lei n° 10.507, de 10 de julho de 2002. Cria a Profissão de Agente Comunitário de Saúde e dá outras providências. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, 11 Jul 2002. 3. Larocca LM, Luccas DS. 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Observou-se que antes da capacitação os ACS já apresentavam conhecimento suficiente na maioria das categorias de conhecimento investigadas, o que foi ampliado após a capacitação. Concluiu-se que este programa de capacitação foi eficaz, com acréscimo nos conhecimentos sobre saúde auditiva. Descritores: capacitação, saúde da família, audição. Abstract: This study aimed to evaluate the efficacy of a training program in hearing health for Community Health Workers (CHW). 50 CHW were enrolled after signing the Free and Clarified Consent Term. Their knowledge improvement after the classroom training program was evaluated by comparing the answers for questionnaires applied before and after the training program. It was observed that before the training program the HCW already showed adequate knowledge in most categories of knowledge investigated, which was expanded after the training program. It was concluded that this training program was efficient on developing CHW knowledge on hearing health. Key words: training, Community Health Workers (CHW), hearing helth. Introdução enfermeiro, um auxiliar de enfermagem e seis agentes comunitários de saúde (ACS) e, quando ampliada, conta com um dentista, um auxiliar de consultório dentário e um técnico em higiene dental. Os ACS conseguem uma comunicação e aproximação junto à população, de forma a promover ações que visam a promoção da saúde, e a integração da comunidade com a equipe de saúde da família3 A Saúde da Família é uma estratégia para reorientar o modelo assistencial, de forma a implantar equipes multiprofissionais em unidades básicas de saúde. Estas equipes acompanham um número determinado de famílias correspondentes às regiões que atendem, tendo por função ações que visam à promoção da saúde, prevenção e recuperação de doenças e reabilitação de doentes2. As equipes de saúde da família são compostas por um médico generalista, um ______________________ 1 Discente do 10º período do Curso de Fonoaudiologia da Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI/SC); Bolsista de Iniciação Científica, Artigo 170 do Governo de Santa Catarina, UNIVALI/SC. 2 Fonoaudióloga. Mestre em Distúrbios da Comunicação Humana, docente do Curso de Graduação em Fonoaudiologia da UNIVALI/SC. e-mail para correspondência: [email protected]. 3 Fonoaudióloga, Mestre em Saúde Pública, docente do Curso de Graduação em Fonoaudiologia da UNIVALI/SC. 42 Urnau, D. L. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 42-49, jul./dez. 2012 A Política Nacional de Saúde da Pessoa Portadora de Deficiência4 define que o portador de deficiência apresenta, em caráter permanente, perdas ou anormalidades psicológicas, fisiológicas ou anatômicas, que o tornam incapaz de desempenhar as atividades dentro de um padrão considerado normal para o ser humano. Dentre os diversos tipos de deficiências, a deficiência auditiva (DA) tem sido tema de vários estudos, e, por atingir um considerável número de pessoas, o Ministério da Saúde, em 2004, publicou a Portaria nº 2.073, que destaca como ações da atenção básica, o desenvolvimento de programas que promovam a saúde auditiva, trabalhando com informações, educação e orientação familiar5. Já, nacionalmente são realizadas várias campanhas que destacam a saúde auditiva e visam a promoção da mesma6. Uma vez que os ACS são considerados o elo entre o sistema de saúde e seus usuários, é necessário que os mesmos conheçam o serviço de saúde auditiva, bem como o que é a saúde auditiva, a fim de realizar uma aproximação junto à comunidade. Os programas de capacitação de ACS em saúde auditiva têm sido promissores, sendo uma ótima opção, uma vez que os ACS atuam em equipes de saúde da família em todo território brasileiro e podem auxiliar em atividades de prevenção e promoção de saúde, contribuindo para que o diagnóstico e a intervenção da deficiência auditiva ocorram de forma adequada para todos os usuários do SUS1. Anteriormente a esta pesquisa, foi realizado um estudo no mesmo município em que o presente estudo foi realizado, o qual objetivou determinar qual o conhecimento dos ACS sobre saúde auditiva7. No estudo7, a autora sugeriu a realização de um programa de capacitação sobre saúde auditiva, devido ao limitado conhecimento dos ACs sobre a saúde auditiva. A Organização Mundial de Saúde (OMS)8, desde 1998 recomendou, em nível de atenção primária, a capacitação de ACS na área de audição e afecções do ouvido. Acredita-se que esta capacitação auxiliaria no processo de detecção precoce da deficiência auditiva, com o devido encaminhamento dos ACS daquelas pessoas com queixa auditiva para atendimento nos diferentes níveis de atenção à saúde, conforme a necessidade de cada caso. Em contrapartida, após o atendimento em níveis de atenção à saúde auditiva de maior complexidade, se confirmada a deficiência auditiva e indicado o uso de uso de aparelho de amplificação sonora individual (AASI), o usuário retorna à sua unidade de saúde de referência e precisa do apoio e auxílio da equipe de saúde para dar continuidade ao seu processo de reabilitação auditiva, de forma que o ACS pode ser um agente facilitador para a adaptação do AASI pelo deficiente auditivo. A capacitação dos ACS, além de promover a prevenção da perda auditiva, contribui como suporte às famílias para adesão ao processo de diagnóstico audiológico e de (re) habilitação. Para isto, é fundamental que a capacitação dos ACS seja ampla, abordando temas como os aspectos gerais da audição e da deficiência auditiva; tipos, causas e prevenção da perda auditiva, além de formas de identificação e diagnóstico da mesma1. Assim, o objetivo geral desde estudo foi avaliar a eficácia de um programa de capacitação presencial para ACS, na área de saúde auditiva. Métodos Este estudo foi do tipo observacional, aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI), sob parecer nº 0048.0.223.00011 de 23 de março de 2011. Participaram do estudo 50 ACS de um município do estado de Santa Catarina, indicados pela Secretaria Municipal de Saúde, sendo divididos em dois grupos de 25 agentes. Antes de iniciar as atividades da capacitação, os ACS receberam explicação 43 Urnau, D. L. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 42-49, jul./dez. 2012 detalhada da pesquisa e assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido. Neste termo estavam descritos os aspectos do sigilo e anonimato dos sujeitos participantes, sendo os resultados apresentados para o grupo estudado, sem identificação de nenhum membro do mesmo. A capacitação foi realizada empregando-se como metodologia de ensino aula expositiva e dialogada e atividades práticas, com o conteúdo teórico baseando na apostila elaborada a partir do material da OMS adaptado e validado para o português1. A capacitação teve duração de 12 horas, divididas em três encontros de quatro horas/aula, em três dias consecutivos para cada grupo de 25 agentes. Destaca-se que os ACS foram divididos em dois grupos, pois a capacitação contava com uma parte prática, realizada no Serviço de Atenção à Saúde Auditiva (SASA), na qual o grupo de ACS precisava ser pequeno, para não interferir nas atividades deste Serviço. Os temas abordados na aula expositiva foram: (a) audição e deficiência auditiva; (b) tipos, prevenção e causas da deficiência auditiva; (c) técnicas de identificação e diagnóstico da deficiência auditiva; (d) aspectos gerais da deficiência auditiva; (e) aparelhos de amplificação sonora individual (AASI): cuidados, manuseio e orientações para o uso. As atividades práticas foram realizadas nas dependências do Serviço de Atenção à Saúde Auditiva no qual os pesquisadores realizam suas atividades profissionais, constando de visita ao Serviço e participação em um grupo de acompanhamento de usuários de Aparelhos de Amplificação Sonora Individual (AASI). Para avaliar o conhecimento sobre saúde auditiva, apresentado pelos ACS antes e após a capacitação, foi aplicado um questionário com 20 perguntas sobre os assuntos abordados no decorrer do curso. A aplicação do questionário pré-capacitação ocorreu no início do primeiro dia de atividades e a aplicação do questionário póscapacitação ocorreu ao final do terceiro dia de atividades. A metodologia aplicada na capacitação foi avaliada com base em um questionário com perguntas fechadas, no qual os sujeitos registravam se os objetivos foram ou não atingidos em relação à: esclarecimento de dúvidas, tempo de capacitação, atividades teóricas, práticas e recursos audiovisuais. Este questionário foi aplicado após a capacitação. Além disso, foram considerados os relatos dos ACS durante os encontros presenciais da capacitação. Estes relatos foram retirados do diário de pesquisa das autoras, que, após cada encontro com os ACS, registravam comentários dos mesmos e impressões das atividades do dia. Para análise dos dados, foi aplicada uma escala arbitrária de valores arbitrários a fim de qualificar a adequação das respostas apresentadas pelos ACS nos questionários pré e pós-capacitação. As questões foram ordenadas por categorias de conhecimento investigado e foi usado como escala arbitrária os seguintes valores: conhecimento excelente, quando 45 ou mais ACS apresentavam conhecimento correto sobre o item investigado; conhecimento suficiente quando entre 25 e 44 ACS apresentavam conhecimento correto sobre o item investigado e, conhecimento insuficiente quando menos de 25 ACS apresentaram conhecimento correto sobre o item investigado, conforme quadro abaixo: 44 Urnau, D. L. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 42-49, jul./dez. 2012 Quadro 1 – Escala arbitrária de valores para qualificação dos conhecimentos dos ACS sobre saúde auditiva Nº de ACS que deveriam responder Escala de conhecimento corretamente a questão Conhecimento excelente 45 ou mais ACS Conhecimento suficiente Entre 25 e 44 ACS Conhecimento insuficiente Menos de 25 ACS A análise estatística dos dados relativos à avaliação da metodologia empregada foi do tipo descritiva, com distribuição de frequência absoluta. Resultados Os ACS que participaram da presente pesquisa têm, na sua maioria, mais de cinco anos de atuação como ACS, realizaram curso de preparação para ACS e têm escolaridade caracterizada pela conclusão do ensino médio. Os ACS distribuem-se tanto em unidades básicas de saúde da zona urbana quanto da zona rural de um município do estado de Santa Catarina, nas quais já houve atuação fonoaudiológica por meio de estágios supervisionados. O conhecimento dos ACS sobre saúde auditiva pré e pós-capacitação presencial é apresentado no quadro 1. Quadro 2 – Conhecimento dos ACS sobre saúde auditiva nas condições pré e póscapacitação. Conhecimento investigado Anatomia e fisiologia da audição Tipos de deficiência auditiva Órgão da audição Acústica Prevenção Vacinação Triagem auditiva Uso de questionários Orientações Desenvolvimento normal da audição Padrões de linguagem no primeiro ano de vida Deficiência auditiva e suas consequências Desenvolvimento da linguagem alterado Conceito de deficiência auditiva Dificuldade de audição Aprendizagem Tratamento AASI concedido pelo SUS Molde auricular Implante coclear Função do AASI Pré capacitação Pós capacitação Insuficiente Insuficiente Suficiente Suficiente Suficiente Suficiente Insuficiente Suficiente Suficiente Excelente Suficiente Insuficiente Suficiente Suficiente Suficiente Suficiente Suficiente Suficiente Suficiente Excelente Suficiente Suficiente Insuficiente Excelente Suficiente Insuficiente Insuficiente Suficiente Suficiente Suficiente Suficiente Suficiente 45 Urnau, D. L. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 42-49, jul./dez. 2012 Causa da Deficiência Auditiva Otites Exposição a ruídos Drogas ototóxicas Hereditariedade Suficiente Excelente Insuficiente Suficiente Suficiente Suficiente Suficiente Suficiente A avaliação dos ACS sobre a metodologia aplicada na capacitação é apresentado no quadro 2. Quadro 2 - Avaliação dos ACS sobre a metodologia aplicada na capacitação presencial sobre saúde auditiva, em valores absolutos. Item avaliado Informações de fácil compreensão Esclarecimento de dúvidas Tempo de capacitação adequado Informações fornecidas de aplicabilidade na prática diária dos ACS Atividades teóricas satisfatórias para a aprendizagem Atividades práticas satisfatórias para a aprendizagem Recursos audiovisuais adequados Em relação à avaliação da metodologia utilizada, também foram considerados recortes das falas dos ACS durante os encontros presenciais do programa de capacitação. Estes recortes mostram indicadores da avaliação dos ACS quanto ao programa, sendo representadas por expressões como: “isto sim é uma capacitação”; “assim a gente realmente aprende”; “a Secretaria (Municipal de Saúde) deveria ofertar mais cursos assim”; “nos outros cursos que a gente vai, ouve a pessoa falando, falando e não grava nada, neste não”; “as atividades práticas nos ajudam a entender melhor o que vocês estão falando”. Discussão Considerando que a atuação dos ACS em equipes de saúde da família em todo território brasileiro pode auxiliar em atividades de prevenção e promoção da saúde, incluindo as questões ligadas à audição, espera-se que os ACS tenham um Conceito atribuído Atingiu Não atingiu 41 9 34 16 38 12 44 6 42 8 44 6 42 8 conhecimento sobre saúde auditiva que os torne aptos para orientar e auxiliar o deficiente auditivo nas mais diversas questões ligadas à saúde. Assim, observa-se, no quadro 1, que, mesmo antes da capacitação (précapacitação), os ACS que participaram do programa aqui proposto apresentavam conhecimento suficiente na maioria das categorias de conhecimento investigadas. Um fator que pode ter contribuído para este conhecimento é que os ACS participantes do programa de capacitação exercem suas atividades em unidades básicas de saúde nas quais já houve a atuação da fonoaudiologia, de forma que todos os ACS já haviam tido contato com questões ligadas à Fonoaudiologia previamente à capacitação. As categorias com conhecimento insuficiente por parte dos ACS antes da capacitação foram anatomia e fisiologia da audição e tratamento da deficiência auditiva. Após a capacitação, observa-se que em todas as categorias analisadas predominou o conhecimento considerado 46 Urnau, D. L. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 42-49, jul./dez. 2012 suficiente por parte dos ACS. Apenas dois itens chamam a atenção com conhecimento considerado insuficiente pelos ACS: triagem auditiva e dificuldade de audição. No caso destes dois itens (triagem auditiva e dificuldade de audição), acreditase que o conhecimento insuficiente após a capacitação se dê em função da forma como estes foram abordados durante a capacitação. A triagem auditiva foi muito explorada como primeira forma de detecção de uma possível perda auditiva, o que pode ter gerado confusões aos ACS sobre as diferenças entre triagem e avaliação da audição. Já, o item dificuldade de audição está relacionado aos diferentes graus de deficiência auditiva. Aqui, as pesquisadoras se questionam se o material utilizado na capacitação1 é adequado para os ACS, pois os conceitos apresentados são muito detalhados e específicos da formação médica e fonoaudiológica. Ainda, é necessário considerar que o questionário pré-capacitação foi aplicado no início do primeiro encontro do programa, momento em que se esperava que os ACS estivessem motivados e interessados sobre o que iria acontecer, respondendo atentamente ao questionário. Já, o questionário póscapacitação foi respondido no final do terceiro dia do programa, sendo que conforme os ACS respondiam, poderiam sair. Assim, a atenção despendida pelos ACS ao responder o questionário pós-capacitação pode ter sido comprometida em função do cansaço (final do terceiro dia de capacitação) e do desejo de finalizar as atividades o mais breve possível. No que se refere à avaliação da metodologia aplicada na capacitação presencial de ACS em saúde auditiva, a maioria dos ACS considerou todos os aspectos como adequados para a capacitação. Já, analisando os recortes das falas dos ACS ao longo do programa de capacitação, observa-se uma avaliação positiva quanto à metodologia utilizada e a importância atribuída pelos ACS quanto às atividades práticas. Estudos realizados sobre a capacitação de ACS em saúde9 citam que o treinamento deve munir os ACS de conhecimentos diversos em torno da questão do processo de saúde-doença, incorporando, além da perspectiva biomédica, outros saberes que o habilitem nesse processo de interação cotidiana com as famílias e no reconhecimento de suas necessidades. Acredita-se que a capacitação em saúde auditiva para ACS realizada neste estudo atingiu este objetivo, pois a maioria dos ACS demonstrou acréscimos no conhecimento sobre saúde auditiva após a capacitação, bem como uma avaliação positiva da metodologia utilizada. A capacitação realizada neste estudo propôs aos ACS formas de atuação em saúde auditiva em relação a aspectos técnicos e atividades educativas, conforme proposto na literatura que define o papel da formação técnica dos ACS9. Estudo realizado no estado de São Paulo, para a capacitação de ACS em saúde auditiva1 abordou temas relativos à audição e deficiência auditiva; tipos de deficiência auditiva; prevenção e causas da deficiência auditiva; técnicas de identificação e diagnóstico da deficiência auditiva e aspectos gerais da deficiência auditiva. Nesta capacitação foi utilizado o material desenvolvido pela WHO e adaptado e validado para o português1, sendo avaliado o conhecimento dos ACS antes e após a capacitação. Após a capacitação, os autores1, verificaram que o material proposto pela WHO para a capacitação dos ACS foi adequada para o objetivo proposto e propiciou a formação do ACS em diversos aspectos da área de saúde auditiva. A capacitação dos ACS em saúde auditiva é relevante na atuação dos ACS como promotores da saúde auditiva por meio da orientação das famílias sobre a importância da audição e a prevenção da deficiência auditiva1. Um programa de capacitação em saúde auditiva10 realizado com ACS de um município paulista que não possuíam experiência prévia em saúde auditiva utilizou o material da WHO adaptado e validado para o português1, foi desenvolvido na forma 47 Urnau, D. L. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 42-49, jul./dez. 2012 presencial (grupo 1) e por meio de videoconferência (grupo 2). Embora na condição pré-capacitação o grupo 2 tenha demonstrado maior conhecimento sobre saúde auditiva quando comparado ao grupo 1, na condição pós-capacitação esta diferença não foi estatisticamente significante, demonstrando que ambos apresentaram semelhante nível de assimilação do conteúdo ministrado. Contudo, os autores10 destacaram que a melhora no conhecimento sobre saúde auditiva após a capacitação foi mais expressiva para o grupo presencial, que manteve o melhor aproveitamento, assim como se observou na capacitação presencial desenvolvida no presente estudo, em que os ACS participantes citam que “as atividades práticas nos ajudam a entender melhor o que vocês estão falando”. Acredita-se que o contexto de atividades práticas e a participação dos ACS em atividades dos Serviços de Saúde Auditiva, são fundamentais para a assimilação dos conhecimentos desejados para os ACS na área da saúde auditiva. O programa de capacitação presencial em saúde auditiva se mostra eficaz para ampliar o conhecimento dos ACS na maioria dos domínios abordados durante os encontros presencias, exceto o domínio relativo aos aspectos gerais da deficiência auditiva(10), equivalente a categoria deficiência auditiva e suas consequências deste estudo. Neste estudo, esta categoria foi a que apresentou pior desempenho dos ACS após a capacitação, concordando com o exposto na literatura10. Em relação à metodologia, o discurso dos ACS ao relatarem que “isto sim é uma capacitação” e, “assim a gente realmente aprende”, vai ao encontro da literatura especializada que descreve que na capacitação presencial é possível controlar a interação entre os participantes, sua motivação, atenção e interesse, que representam condições importantes para o aprendizado10. Conclusão O programa de capacitação em saúde auditiva no formato presencial, aqui pesquisado, mostrou-se eficaz na capacitação dos ACS, pois a maioria dos ACS que participaram da pesquisa apresentou acréscimo nos conhecimentos sobre saúde auditiva após a capacitação. Os resultados comprovaram a eficácia da capacitação presencial, sendo estas atividades relevantes para a comunicação entre os diferentes níveis de atenção à saúde auditiva: atenção básica; média e alta complexidade. Quanto à metodologia empregada, esta se mostrou adequada, uma vez que os ACS consideraram que todos os itens avaliados na metodologia foram alcançados e relataram que o programa gerou interesse e participação dos mesmos nas atividades. A capacitação dos ACS em saúde auditiva permite que estes atuem como agentes facilitadores do processo de adaptação de AASI por usuários com deficiência auditiva e que, muitas vezes abandonam o uso do AASI por falta de um profissional mais próximo a ele que entenda sobre o uso e manuseio do AASI. Sugerem-se novas pesquisas, tanto para avaliar o conhecimento sobre saúde auditiva que ficou retido pelos ACS que participaram do programa de capacitação após seis meses de finalização deste, como para ampliar o número de ACS com capacitação em saúde auditiva, utilizando-se diferentes metodologias: presencial e à distância. Para novos estudos, sugere-se a utilização de indicadores pré e póscapacitação, de forma que seja possível avaliar a efetividade do programa de capacitação auditiva por meio da observação de mudanças na atuação prática dos ACS após o programa de capacitação. Outro cuidado relevante para novos estudos é a aplicação do questionário póscapacitação, pois este pode ter sido influenciado pelos fatores cansaço e rapidez (desejo de finalizar a atividade o mais breve possível). 48 Urnau, D. L. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 42-49, jul./dez. 2012 as competências das três esferas de gestão [online]. [acesso 2008 set 15]; Disponível em: URL: http://www.saude.mg.gov.br/atos_norma tivos/legislacaosanitaria/estabelecimento s-de-saude/saudeauditiva/PORTARIA_2073.pdf. Referências 1. Alvarenga K F, Bevilacqua MC, Martinez MANS, Melo TM, Blasca WQ, Taga MFL. Proposta para capacitação de agentes comunitários de saúde em saúde auditiva. Pró-Fono R. Atual. Cient. [online]. 2008; 20(3):171-6. [acesso 2012 fev 27]. Disponível em: URL: http://www.scielo.br/pdf/pfono/v20n3/06 .pdf. 2. Brasil. Secretaria de Assistência à Saúde. Ministério da Saúde. Programa de saúde da família. 2008 [online]. [acesso 2008 set 16]; Disponível em: URL: http://portal.saude.gov.br/portal/saude/ci dadao/area.cfm?id_area=149. 3. Brasil. Ministério da Saúde. Gabinete do Ministro. Portaria nº 2.488, de 21 de outubro de 2011. Aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes e normas para a organização da Atenção Básica, para a Estratégia Saúde da Família (ESF) e o Programa Agentes Comunitários de Saúde (PACS) [online]. [acesso 2012 fev 27]; Disponível em: URL: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis /gm/2011/prt2488_21_10_2011.html. 4. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Política Nacional de Saúde da Pessoa Portadora de Deficiência, 2008. Série E. Legislação em Saúde. 72p [online]. [acesso 2012 fev 27]; Disponível em: URL: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicaco es/politica_nacional_saude_pessoa_defic iencia.pdf. 5. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Assistência à Saúde. Portaria GM/MS 2.073 de 28 de setembro de 2004. Institui a Política Nacional de Atenção à Saúde Auditiva a ser implantada em todas as unidades federadas, respeitadas 6. Sociedade Brasileira de Otologia. Campanha nacional de saúde auditiva. 2008 [online]. [acesso 2008 set 01]; Disponível em: URL: http://www.saudeauditiva.org.br/. 7. Bassi D. A saúde na perspectiva dos agentes comunitários de saúde [monografia] Itajaí(SC): Universidade do Vale do Itajaí(UNIVALI) – Curso de Fonoaudiologia; 2010. 8. World Health Organization (WHO). The report of the International Workshop on Primary Ear and Hearing Care. Cape Town, South Africa,1998 [online]. [acesso 2012 fev 27]; Disponível em: URL: http://www.who.int/pbd/deafness/activiti es/en/capetown_final_report.pdf. 9. Nunes, MO, Trad LB, Almeida BA, Homem CR, Melo MCI. O agente comunitário de saúde: construção da identidade desse personagem híbrido e polifônico. Cad. Saúde Pública [online]. 2002; 18(6):1639-46. [acesso 2012 jan 06]. Disponível em: URL: http://www.scielosp.org/pdf/csp/v18n6/1 3260.pdf 10. Melo TM, Alvarenga KF, Blasca WQ, Taga MFL. Capacitação de agentes comunitários de saúde em saúde auditiva: efetividade da videoconferência. Pró-Fono R. Atual. Cient. [online] 2010; 22(2):139-45. [acesso 2012 fev 27]. Disponível em: URL: http://www.scielo.br/pdf/pfono/v22n2/en _v22n2a12.pdf. . 49 Moreira, L. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 50-60, jul./dez. 2012 MEDICALIZAÇÃO EM SAÚDE MENTAL NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE: UMA REVISÃO DE LITERATURA [Medicalization in mental health in primary health care: a review of literature] Leandro Moreira1; Gabriela Marcellino de Melo Lanzoni2; Caroline Cechinel3. Resumo: Este estudo trata de uma revisão integrativa de literatura, que busca discutir o consumo de psicotrópicos na Atenção Primária à Saúde segundo a literatura científica. As buscas foram realizadas nas bases de dados PUBMED, SCIELO e LILACS, com os descritores “Mental Health” AND “Primary Health Care”, resultando em 29 estudos. Os resultados apontaram que estudos sobre a medicalização indiscriminada e promoção a saúde mental ainda encontram-se incipientes. Conclui-se a importância de investimento em capacitação profissional na busca de mudar a visão cultural sobre a suposta resolubilidade da medicalização. Palavras-chave: Saúde Mental; Atenção Primária à Saúde; Promoção da saúde; Psicotrópicos. Abstract: This study is an integrative review of literature, which seeks to discuss the consumption of psychotropic drugs in Primary Health Care according to scientific literature. The searches were conducted in the databases Pubmed, Scielo and LILACS with the key words "Mental Health" AND "Primary Health Care", resulting in 29 studies. The results indicate that studies of the medicalization indiscriminate and promoting mental health are still incipient. The conclusion is the importance of investment in professional training in the pursuit of changing the cultural view of the presumed solvability of medicalization. Key-words: Mental Health; Primary Health Care; Health Promotion; Psychotropic Drugs. Introdução A partir da definição de saúde, entendida como uma situação de completo bem estar físico, psicológico e social, o termo “Qualidade de vida” vem se posicionando dentre o foco principal da atuação, no que tange a promoção da saúde1. Concepções monocausais do processo saúdedoença têm sido ampliadas a outras dimensões além da biológica, como estilo de vida, meio ambiente e sistema de saúde. A medicalização representa uma importante ferramenta para o alcance do estado de saúde, entretanto, não suficiente para a abordagem integral de muitas patologias2. Estima-se que em 2005, distúrbios mentais atingiam 450 milhões de pessoas no mundo. Aproximadamente 10% dos adultos passam por problemas relacionados a doenças mentais e 25% das pessoas irá desenvolvê-las em algum momento de suas vidas. Associada a mais de 90% dos casos de suicídios que ocorrem anualmente no mundo, a depressão é comumente não diagnosticada a tempo. ____________________________ 1 Médico. Especialista em Saúde da Família. Universidade Federal de Santa Catarina. [email protected] 2 Enfermeira. Doutoranda em Enfermagem. Universidade Federal de Santa Catarina. [email protected] 3 Enfermeira. Mestranda em Saúde Coletiva. Universidade Federal de Santa Catarina. [email protected] 50 Moreira, L. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 50-60, jul./dez. 2012 Além disso, pessoas com distúrbios mentais têm maiores riscos de adoecimento por diminuição das funções imunes, condições precárias de saúde, pouca aderência ao esquema de tratamento além das dificuldades de muitos pacientes de obterem acesso adequado aos medicamentos3. Quando a assistência à saúde mental está integrada à Atenção Primária em Saúde (APS), o acesso é aprimorado possibilitando melhores condições de diagnóstico e tratamento. Porém, para ser totalmente efetiva e eficiente, a abordagem da saúde mental na APS deve ser complementada por outros níveis de cuidado e com sistema de referência/contra-referência exitoso para oferecer suporte e supervisão3. Entende-se que para uma boa prática de atenção à saúde mental, é necessário o funcionamento pleno de todas essas engrenagens. Em 2001, a qualidade da APS voltada à saúde mental foi questionada, quando se identificou que 69 países não apresentavam sistemas de atenção à comunidade e em outras 73 nações essa atenção não estava disponível em nível primário. Ainda, em 78 países não existia nenhuma espécie de atenção à saúde mental e 37 nações não possuíam legislação específica sobre o assunto4. Fundamentada na visão de desinstitucionalização italiana, iniciou-se no Brasil o efetivo do movimento social pelos direitos dos pacientes psiquiátricos em 19 . O Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental (MTSM) denunciou as precárias condições dos manicômios do país, da violência praticada contra os pacientes internados e da visão mercantilizada de seus gestores. Passou-se, então, a construir coletivamente uma cr tica ao chamado saber psiquiátrico e ao modelo hospitalocêntrico na assistência s pessoas com transtornos mentais5. A partir do ano de 1992, os movimentos sociais conseguem aprovar as primeiras leis que determinam a substituição progressiva dos leitos psiquiátricos por uma rede integrada de atenção saúde mental. A década de 90 foi marcada pelo compromisso firmado pelo Brasil na assinatura da Declaração de Caracas e pela realização da II Conferência Nacional de Saúde Mental. Ainda, nesta década entrou em vigor no país as primeiras normas federais regulamentando a implantação de serviços de atenção diária, fundadas nas experiências dos primeiros Centros de Atenção Psico-social (CAPS), Núcleos de Atenção Psico-social (NAPS) e Hospitais-dia, e as primeiras normas para fiscalização e classificação dos hospitais psiquiátricos5. Em 2001, no contexto da promulgação da lei 10.216 e da realização da III Conferência Nacional de Saúde Mental, a Política de Saúde Mental do governo federal, alinhada com as diretrizes da Reforma Psiquiátrica, passa a consolidar-se, ganhando maior sustentação e visibilidade5. Entretanto, o processo de desinstitucionalização pode ser analisado sob três aspectos, a saber: a desinstitucionalização como desospitalização; a desinstitucionalização como desassistência; e, a desinstitucionalização como desconstrução. Construir uma política de saúde que acolhe os doentes psiquiátricos do processo de desinstitucionalização garante a esses pacientes um tratamento adequado e pleno6. Porém, o que se observa na prática é uma atenção restrita de medidas preventivas e de promoção à saúde mental, onde predominam práticas abusivas do uso de psicotrópicos e auto-medicação. Busca-se no medicamento a esperança de escapar das pressões sociais, familiares ou do trabalho. Realidade essa que se estende a diversos países, mantendo os medicamentos benzodiazepínicos entre os mais prescritos do mundo7. A introdução, na década de 50, de fármacos relativamente eficazes e seletivos para o tratamento de pacientes esquizofrênicos e maníaco-depressivos incentivou a formulação de conceitos biológicos sobre a patogenia dessas doenças mentais importantes. Novos estudos 51 Moreira, L. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 50-60, jul./dez. 2012 possibilitaram desenvolvimento de medicamentos cada vez mais seletivos. A introdução do clordiazepóxido iniciou a era dos benzodiazepínicos na década de 60 que substituiu diversas drogas até então usadas (barbitúricos, meprobamato, hidrato de cloral, entre outros) que provocavam sérios efeitos colaterais, depressão fatal do sistema nervoso central quando em doses não controlados8. O uso crônico de altas doses de benzodiazepínicos tem sido associado ao aumento da agitação de base, depressão, pânico, paranoia, mialgia, tremores musculares, diminuição da concentração e memória. É um medicamento que facilmente está associado a risco de dependência e uso abusivo. Os sintomas de abstinência podem se tornar significativos quando utilizado indiscriminadamente por longos períodos, uma vez que manifesta intensificação temporária dos problemas que originalmente levaram ao seu uso9. Diante da disposição de estimativas alarmantes quanto à potencialidade de comorbidades manifestadas por distúrbios mentais, entende-se a preocupação de transformar o amplo debate realizado pela sociedade em ações preventivas. Entretanto, o que se observa na prática diária, intensamente documentada, é o aumento crescente de pessoas fazendo uso de psicotrópicos9. Em meio a este contexto, questiona-se: As equipes de saúde da Estratégia Saúde da Família têm atuado no combate ao elevado consumo de psicotrópicos? Qual abordagem teórica tem sido dada ao debate? Assim, este estudo objetiva verificar como é abordada na literatura científica o consumo de psicotrópicos na APS. Metodologia Adotou-se a Revisão Integrativa, visto que ela contribui para sintetizar os estudos publicados e tirar conclusões sobre o assunto escolhido. Seguiram-se as etapas, com base no estabelecimento de critérios bem definidos sobre a coleta de dados, análise e apresentação dos resultados desde o início do estudo, a partir de um protocolo de pesquisa previamente elaborado pelos autores e validado10. Na primeira etapa, realizou-se a seleção da pergunta de pesquisa: “As equipes de saúde da Estratégia Saúde da Família têm atuado no combate ao elevado consumo de psicotrópicos?” e “Qual abordagem teórica tem sido dada ao debate?”. Na segunda etapa, critérios de inclusão de estudos e seleção da amostra foram definidos, ou seja, artigos nas línguas inglesa, espanhola e portuguesa disponibilizados de forma completa e gratuita, sem limite de tempo. Em seguida, os estudos foram selecionados nas bases eletrônicas de dados PUBMED, LILACS e SCIELO, utilizando os descritores “Mental Health” AND “Primary Health Care”, extraídos dos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS). A terceira etapa visou a representação dos estudos selecionados em formato de tabelas. A quarta etapa contempla a análise considerando todas as características em comum, análise crítica dos achados, identificando diferenças e conflitos; interpretação dos resultados. A sexta etapa, busca reportar de forma clara a evidência encontrada. Tais etapas constituíram um protocolo a ser seguido. No primeiro levantamento com os descritores indicados, foram encontrados 2.723 artigos na base PUBMED, 159 artigos na base SCIELO e 371 artigos na base LILACS. Todos os resumos foram submetidos a uma leitura flutuante, a partir da qual foram selecionados 13 artigos da base PUBMED, 11 artigos da base SCIELO e 5 artigos da base LILACS, considerando a pertinência dos estudos em relação ao objetivo deste estudo. Não foram computados a esses números os artigos encontrados repetidamente em mais de uma base, somando, então, um total de 29 estudos considerados para análise crítica. Os artigos foram sistematizados em tabelas, sendo posteriormente submetidos a uma leitura rigorosa, levando-se em conta o critério de exaustão e pertinência da coleta dos dados. 52 Moreira, L. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 50-60, jul./dez. 2012 A partir dessa amostra, as informações de identificação dos artigos e que respondiam a pergunta de pesquisa foram extraídas e inseridas em um instrumento com os seguintes itens: base de dados, autores, ano, título, considerações sobre o estudo. Os achados foram agrupados de acordo com as semelhanças e diferenças, sintetizados na forma de narrativas a partir da análise, bem como, discutidos conforme a literatura pertinente. Resultados e Discussão Os estudos analisados demonstram um crescente uso de psicotrópicos não só no Brasil como em diversos outros países da América Latina, Europa e Estados Unidos, como ilustra a Figura 1. Figura 1: Caracterização dos estudos selecionados para análise, 2011. Ano Autor Título País 2011 Chan, WaiSun; et al. A multidisciplinary primary care team consultation in a socio-economically deprived community: An exploratory reandomised controlled trial Irlanda 2010 Buszewicz, Marta; et al Evaluation of a system of structured, pro-ative care for chronic depression in primary care: a randomized controlled trial Inglaterra 2010 Mykletun, Arnstein; et al. General practitioner`s opinions on how to improve treatment of mental disorders in primary health care. Interviews with one hundred Norwegian general practitioners Noruega 2010 Mwape, Lonia; et al. Integrating mental health into primary health care in Zambia: a care provider`s perspective Zambia 2010 Prins, M.A.; et al Patient factors associated with guideline-concordant treatment of anxiety and depression in primary care Holanda 2010 Jenkins, R.; et al. Integration of mental health into primary care in Kenya Quenia 2010 Neves, H.G.; et al. Saúde mental na atenção primária: necessária constituição de competências Brasil 2009 Tanaka, O.Y.; et al. Ações de saúde mental na atenção básica: caminho para ampliação da integralidade da atenção Brasil 2009 Forsyth, A.; et al. Dietitians and Exercise Physiologists in primary care: Lifestyle interventions for patients with depression and/or anxiety Australia 2008 Clatney, Lisa.; et al. Mental health care in the primary care setting: Family physicians’perspectives Canada 2006 Aikens, J.E. Explaining patients beliefs about the necessity and harmfulness of antidepressants Estados Unidos 2003 Van Voorhees, B.W.; et al. Primary care patients with depression are less accepting of treatment than those seen by mental health specialists Estados Unidos 53 2003 Gilbody, S.; et al. Educational and organizational interventions to improve the management of depression in primary care Inglaterra 2010 Braga, L.C.; et al. Condições de trabalho e transtornos mentais comuns em trabalhadores da rede básica de saúde de Botucatu (SP) Brasil 2010 Ribeiro, L.M; et al. Saúde mental e enfermagem na estratégia saúde da família: como estão atuando os enfermeiros? Brasil 2009 Dimenstein, M.;et al. O apoio matricial em unidades de saúde da família: experimentando inovações em saúde mental Brasil 2009 Ribeiro, M.S.; et al. Comparação da assistência em saúde mental em unidades básicas de saúde com ou sem equipe do Programa de Saúde da Família Brasil 2009 Silveira, D.P.; Vieira, A.L.S. Saúde mental e atenção básica em saúde: análise de uma experiência no nível local Brasil 2008 Silva, A.T.C.; Menezes, P.R. Esgotamento profissional e transtornos mentais comuns em agentes comunitários de saúde Brasil 2008 Fortes, S.; et al. Nosological profile and prevalence of commun mental disorders of patients seen at the family health program (FHP) units in Petrópolis, Rio de Janeiro Brasil 2007 Magruder, K.M.; Yeager, D.E. Mental health problems in primary care: progress in North America Estados Unidos Gask, L. Improving the quality of mental health care in primary care settings: a view from the United Kingdom Reino Unido 2007 Fritsch, R.; et al Un ensayo clínico aleatorizado de farmacoterapia con monitorización telefónica para mejorar el tratamiento de la depresión en la atención primaria en Santiago, Chile Chile 2007 Nunes, M.; et al Ações de saúde mental no Programa Saúde da Família: confluências e dissonâncias das práticas com os princípios das reformas psiquiátricas e sanitária Brasil 2009 Oliveira, M.V. Dependencia a benzodiazepinas en un centro de atención primaria de salud: Magnitud del problema y orientaciones para el manejo integral Chile 2008 Lima, M.C.P.; et al Transtornos mentais comuns e uso de psicofármacos: impacto das condições socioeconômicas Brasil 2008 Fonseca, M.L.G.; et al. Sofrimento difuso e transtornos mentais comuns: uma revisão bibliográfica Brasil 2007 54 2007 Ribeiro, C.S.; et al Chronic use of diazepan in primary healthcare centers: user profile and usage pattern Brasil 2003 Galleguillos, T.U.; et al. Tendencia del uso de benzodiazepinas en una muestra de consultantes en atención primaria Chile No Chile, a automedicação, o abuso e a dependência de benzodiazepínicos são constatados desde a década de 1980. Em 1988, nesse país, estima-se que 58% do uso de benzodiazepínicos era feito sem prescrição médica e o uso crônico, definido no estudo como o uso diário do medicamento por pelo menos 1 (um) ano, alcançava 5,9%11. Entretanto, identificou-se no Chile que a maior causa de dependência a benzodiazepínicos são prescrições médicas infundadas12. Estudos transcorridos no Brasil apontam as mulheres acima de 40 anos como sendo o grupo que mais consomem benzodiazepínicos. Dentre os sintomas mais relacionados como motivadores ao uso destes medicamentos estão o nervosismo e a insônia. No que tange aos motivos do uso crônico, o estudo apontou causas como insônia, efeito calmante do medicamento e a dependência entre as mais citadas pelos pacientes13. O debate lançado pela OMS em 2001 denunciando o despreparo de vários países em relação à promoção de saúde mental foi mencionado em alguns trabalhos, em especial alguns países mais pobres da África, como Zâmbia e Quênia, culminando em esforços com os objetivos voltados à maior integração entre o serviço de saúde mental no atendimento primário com o atendimento de nível secundário14,15,16. Apesar disso, dos países em desenvolvimento que conseguiram organizar investimentos específicos a área de saúde mental, cerca de 37% gastam menos de 1% do orçamento do setor saúde com programas direcionados à reabilitação psicossocial17. A Reforma Psiquiátrica propõe diretrizes de ação em território nacional visando a descentralização do atendimento e eliminando a visão hospitalocêntrica e do modelo biomédico convencional. Apesar do destaque que recebe a APS como o elementochave no processo de atenção ao coletivo e não mais ao indivíduo, a reforma encontrou na estrutura extra-hospitalar uma contradição à sua proposta. Ainda, configura-se como uma estrutura despreparada para abrigar um entendimento de cuidados na área de saúde mental adequado18. O medicamento e a condição patológica que antes eram estigmatizados por grande parte da população tornaram-se mais presente no cotidiano atual. Os transtornos mentais comuns estão cada vez mais prevalentes e, apesar de sempre mais associados a baixas condições socioeconômicas, essa classe social não correspondia ao grupo que mais fazia uso dos medicamentos19. Após reformulações da Saúde Pública ocorridas nas últimas décadas no Brasil, aumentou-se a oferta de equipamentos de saúde em diversos municípios e observou-se o nivelamento do uso de psicotrópicos entre as diferentes classes sociais. Esse fator está embasado na manutenção do caráter prescritivo e autoritário adotado em muitas unidades de Estratégia de Saúde da Família (ESF); despreparo dos profissionais em lidar com temas relacionados a problemas psíquicos; dificuldade no estabelecimento sistemas de referência e contra-referência; entendimento da cultura populacional sobre a necessidade de medicalização como fator primordial para a cura de enfermidades e à medicalização dos sintomas. Neste sentido, considerações de vínculo e acolhimento, além de estratégias de minimização da medicalização tornam-se, portanto, extremamente valiosas, porém são relativamente escassas e ainda incipientes17. A adoção do modelo biopsicossocial de determinação do processo saúde-doença propõe que além dos fatores biopsíquicos, os fatores políticos e sócio-culturais. Estes se tornam parte do fundamento e análise do indivíduo. Dessa forma, o tratamento não seria apenas a medicalização exclusiva, e o 55 Moreira, L. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 50-60, jul./dez. 2012 sujeito receberia uma atenção integral, juntamente com a sua família e o meio em que está inserido. Outro aspecto estudado foi a controvérsia sobre o modelo multiprofissional de atuação que constitui uma estruturação vertical e hierárquica. Apesar de ampliar a avaliação sobre o indivíduo, essa análise muitas vezes torna-se fragmentada, existindo pouca interação entre os agentes cuidadores. Um estudo realizado na Irlanda aborda exatamente a atuação multiprofissional sobre uma população com problemas psicossociais. Nesse estudo, conclui-se que não houve diferença estatisticamente significativa entre o grupo estudado quando comparado ao seu controle, constituído por pessoas que receberam cuidados usuais de consulta com médicos generalistas20. Assim, sugere-se uma atuação de natureza interdisciplinar, que diferente do modelo multiprofissional, visa uma estruturação horizontal primado por princípio de descentralização e propostas por participação popular, dando ênfase não só aos aspectos técnicos como também aos aspectos éticos. É uma atuação que amplia a escuta a um entendimento mais vasto, englobando, além da visão dos profissionais mais especializados, a percepção da população na qual estão inseridos. As equipes de saúde da família trabalhariam com os conceitos de vigilância à saúde com o enfoque sobre os riscos, desenvolvendo atividades preventivas e de promoção à saúde mental, instigando práticas de cidadania sobre a população adstrita18. Alguns estudos avaliaram diversas estratégias de atuação na tentativa de prevenir e promover a saúde mental. Um número considerável de estratégias de intervenção educacional tem sido associado ao tratamento da depressão no sistema primário de saúde. Entretanto, observou que estratégias educacionais simples e passivas como palestras e panfletos que orientem sobre sintomas e tratamento de depressão tem efeito mínimo sobre os cuidados na depressão. Em um estudo desenvolvido a curto prazo mostrou que o serviço de atenção integrado a saúde mental que envolvam médicos, enfermeiros, psiquiatras e psicólogos poderia mostrar uma efetividade maior agindo diretamente em contato com a comunidade mas esse efeito desaparece quando analisados em estudos a longo prazo21,22,23. Essas pesquisas sugerem que a abordagem multiprofissional convencional poderia despertar curiosidade da população com relação ao tema, induzindo em principio a uma avaliação das condições da qualidade de vida, porém são ineficientes em mudar os hábitos e costumes já enraizados. O fornecimento de informações importantes acerca do tratamento com psicoterápicos aos pacientes, como vantagens do medicamento, os efeitos colaterais e a programação sobre o uso do medicamento como um fator importante para prevenção de uso abusivo destes medicamentos24,25. Evidenciou-se, em um ensaio clínico, que a farmacoterapia adjunta a monitorização telefônica, realizadas em nível primário de assistência, possibilitava uma maior aderência ao tratamento e diminuição do erro do uso de medicamentos, inclusive abuso26,27. Mudanças dos hábitos de vida têm demonstrado benefícios importantes no combate a alguns transtornos mentais. Dietas mais ricas em frutas e verduras, além do hábito de praticar exercícios físicos regulares estão associados à melhora nos padrões sintomáticos da depressão e ansiedade28. Alguns estudos listaram os fatores associados à prevalência de transtornos mentais comuns e identificaram atributos do indivíduo, do meio familiar e social e em especial o ambiente de trabalho como um dos principais colaboradores para o aumento desse índice. Cabe citar a baixa renda, a informalidade e a insegurança do desemprego alem das altas demandas psicológicas no trabalho29,30. Evidencia-se que esse transtorno está presente dentro da ESF, órgão que deveria estar preparado e que deveria estar justamente promovendo a saúde mental Esse estudo apontou que 43% das agentes comunitária de saúde enquadravam 56 Moreira, L. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 50-60, jul./dez. 2012 no diagnóstico de transtorno mental comum e 84,4% demonstravam sinais de esgotamento profissional. Uma intervenção no ambiente de trabalho também se faz necessário, começando a partir da própria Unidade Básica de Saúde31. Dentre os principais obstáculos apontados nos estudos devemos citar o despreparo dos profissionais da rede de atenção primária, não só na questão técnica de diagnóstico e acompanhamento adequado do indivíduo, mas também quanto ao despreparo à abordagem biopsicossocial e coletiva do assunto. Diversos estudos transversais inquiriram médicos e outros profissionais da saúde sobre a dificuldade de conduzir um paciente com transtorno mental. A maioria respondeu falta de capacitação pessoal e profissional e queixou da lacuna existente entre a atenção primária e as instituições de referência. O que se percebe, portanto, é que a incorporação de ações em saúde mental na atenção básica não é algo que se efetiva sem o desenvolvimento de estratégias institucionais como capacitação, supervisão e financiamento14,15,29,32,33,34,35. O Ministério da Saúde propôs nesse sentido, através da Coordenação Geral da Saúde Mental, o desenvolvimento de diversos documentos referentes à integração da saúde mental com a APS: o Apoio Matricial. Percebeu-se que a Reforma Psiquiátrica não poderia avançar sem a incorporação da APS ao processo. O matriciamento tem por objetivo assegurar à APS, uma base especializada tanto em nível assistencial quanto técnico-pedagógico e cada vez mais os municípios têm aderido a essa proposta34. Diversos CAPS estão sendo instaurados em nível nacional com mecanismos de indução financeira pelo Ministério da Saúde. O objetivo é que o CAPS seja o articulador das demandas de saúde mental, servindo de retaguarda para as residências terapêuticas. Entretanto, é necessário melhorar a integração desse serviço à ESF, fazendo com que o CAPS se torne uma entidade cada vez mais participativa em conjunto com as equipes de saúde da família através de consultas, trabalhos em grupo, visitas domiciliares, e reuniões com a equipe. A importância do Apoio Matricial está também relacionada à oferta de capacitações, treinamentos e palestras aos profissionais de saúde da rede primária, promovendo encontro de saberes que estimulem uma atuação mais integral e menos fragmentada36. Entretanto, apesar dos princípios acima apontarem para um cuidado que ultrapasse o modelo biomédico, ainda faltam textos oficiais sobre as ações voltadas para o enfrentamento de problemas relacionados à saúde mental na APS. Ao mesmo tempo em que se preconiza que uma equipe de saúde deva suprir ao menos 85% das necessidades da população cadastrada, as questões psicossociais ainda não estão incluídas nas estratégias de prioridades2. Considerações Finais Optou-se por uma análise qualitativa dos artigos. Muitas práticas ainda se baseiam na teoria ou na análise de uma subamostragem levantada na maioria dos estudos, porém o que se percebe é a congruência ao fato da necessidade de modificação do entendimento sobre o cuidado à saúde. A visão biomédica ainda demonstra força na cultura de formação dos profissionais de saúde e também na população em geral. Valoriza-se a integralidade e o caráter do olhar profissional baseado no modelo biopsicossocial da atuação como a ferramenta realmente efetiva na promoção a saúde. Embora este estudo tenha limitações no que tange o número de idiomas utilizados e o recorte histórico definido, pode-se identificar que o desafio atual vai além das conquistas já alcançadas, como a redução considerável do número de leitos psiquiátricos e a reversão dos gastos públicos destinados ao pagamento de internações psiquiátricas para a ampliação da rede de serviços extra-hospitalares. Uma das etapas cruciais para melhorar a condição da saúde 57 Moreira, L. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 50-60, jul./dez. 2012 mental no panorama mundial terá como eixo a atuação dos profissionais da área em desmitificar a idéia de que só a medicalização traz a resolutividade. A Reforma Psiquiátrica não só contribuiu para os tais fatores supra-citados, mas aproximou a comunidade ao tema e adjunto a esse fato, encontrou uma estrutura extra-hospitalar despreparada para receber e trabalhar de forma ampla esse aspecto na comunidade. Desta forma, é indicada para pesquisas futuras a investigação de técnicas promotoras desse novo pensamento terapêutico, a começar entre os próprios profissionais e gestores de saúde para que estes possam atuar de forma coerente com o conceito de promoção a saúde e difundi-lo entre a população. Referências 1. World Health Organization(WHO). Promoting mental health: concepts, emerging evidence, practice. WHO Press, Genebra, 2005. 2. Tanaka OU, Ribeiro EL. Ações de saúde mental na atenção básica: caminho para ampliação da integralidade da atenção. Ciênc Saúde Coletiva. 2009;14(2):47786. 3. World Health Organization(WHO). Improving health system and services for mental health. WHO Press, Genebra, 2009. 4. World Health Organization(WHO). As burden of mental disorder looms large, countries report lack of mental health programmes. WHO Press, Genebra, 2001. 5. Ministério da Saúde. Reforma Psiquiátrica e pol tica de saúde mental no Brasil, Brasília, 2005. 6. Hirdes A. A reforma psiquiátrica no rasil: uma (re) visão. Ciênc Saúde Coletiva. 2009;14(1):297-305. de atenção à saúde e o uso de ansiolítico entre mulheres. Estudos de Psicologia. 2004;9(1):121-9. 8. Brunton L, Lazo J, Parker K. Goodman & Gilman - As bases farmacológicas da terapêutica. 10a edição. Rio de Janeiro: McGraw-Hill; 2003. p.303-321. 9. Galduróz JC, Noto AR, Nappo S, Carlini E. 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International Journal of Mental Health Systems.[ acesso em 2010 jul] 2010;4(21)4, disponível em: URL: http://www.ijmhs.com/content/4/July/20 10. 15. Jenkins R, Kiima D, Njenga F, Okonju M, Kingora J, Kathuru D, Lock S. 7. Carvalho LF, Dimenstein M. O modelo 58 Moreira, L. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 50-60, jul./dez. 2012 Integration of mental health into primary care in Kenya. World Psychiatry. 2010;9(2):118-20. 16. Fortes S, Villano LAB, Lopes C. Nosological profile and prevalence of commun mental disorders of patients seen at the family health program (FHP) units in Petrópolis, Rio de Janeiro. Rev Bras Psiquiatr. 2008;30(1):32-7. randomized controlled Trial. BMC Psychiatry 2010;10(61),[ acesso em 2010 jul]. Disponível em: URL: http://www.biomedcentral.com/bmcpsyc hiatry/content/10/August/2010 17. Silveira DP, Vieira ALS. Saúde mental e atenção básica em saúde: análise de uma experiência no nível local. Ciênc Saúde coletiva. 2009;11(1):139-48. 22. 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Fritsch R, Araya R, Solís J, Montt E, Pilowsky D, Rojas G. Un ensayo clínico aleatorizado de farmacoterapia con monitorización telefónica para mejorar el tratamiento de la depresión en la atención primaria en Santiago. Rev Med Chile. 2007;135:587-95. 20. Chan WS, Whitford D, Conroy R, Gibney D, Hollywood B. A multidisciplinary primary care team consultation in a socio-economically deprived community: An exploratory reandomised controlled Trial. BMC Health Services Research 2011;11(14),[ acesso em 2010 jul]. Disponível em: URL: http://www.biomedcentral.com/bmchealt hservres/content/11/January/2011, Gilbody S, Whitty P, Grimshaw J, Thomas R. Educational and Organizational Interventions to Improve the Management of Depression in Primary Care. 2003;286(23):3145-51. 21. Buszewicz M, Griffin M, McMahon E, Beecham J, King M. Evaluation of a system of structured, pro-ative care for chronic depression in primary care: a 25. Magruder K, Yeager D. Mental health problems in primary care: progress in North America. Eur J Psychiat. 2007;21(1):55-61. 26. Forsyth A, Deane F, Williams P. Dietitians and Exercise Physiologists in primary care: Lifestyle interventions for patients with depression and/or anxiety. Journal of Allied Health. 2009;38(2):6368. 27. Braga LC, Carvalho LR, Binder MCP. Condições de trabalho e transtornos mentais comuns em trabalhadores da rede básica de saúde de Botucatu (SP). Ciênc Saúde Coletiva. 2010;15 suppl.1:1585-96. 28. Fonseca MLG, Guimarães MBL, 59 Moreira, L. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 50-60, jul./dez. 2012 Vasconcelos EM. Sofrimento difuso e transtornos mentais comuns: uma revisão bibliográfica. Rev APS. 2008;11(3):285-94. 29. Silva ATC, Menezes PR. Esgotamento profissional e transtornos mentais comuns em agentes comunitários de saúde. Rev Saúde Pública. 2008;42(5):921-9. 30. Mykletun A, Knudsen AK, Tangen T, Overland S. General practitioner`s opinions on how to improve treatment of mental disorders in primary health care. Interviews with one hundred Norwegian general practitioners. BMC Health Services Research.[ acesso em 2010 jul] 2010;10(35) disponível em: URL: http://www.biomedcentral.com/bmchealt hservres/content/10/February/2010. 31. Ribeiro LM, Medeiros SM, Albuquerque JS, Fernandes SMBA. Saúde mental e enfermagem na estratégia saúde da família: como estão atuando os enfermeiros?. Rev Esc Enferm USP. 2010;44(2):376-82. 32. Dimenstein M, Severo AK, Brito M, Pimenta AL, Medeiros V, Bezerra E, et al. O apoio matricial em unidades de saúde da família: experimentando inovações em saúde mental. Saúde Soc. 2009;18(1):63-74. 33. Clatney L, Macdonald H, Shah S. Mental health care in the primary care setting: Family physicians’ perspectives. Canadian Family Physician. 2008;54:884-9. 34. Neves HG, Lucchese R, Munari DB. Saúde mental na atenção primária: necessária constituição de competências. REBEn. 2010:63(4):666-70. 60 Reiners,A. A. O. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 61-70, jul./dez. 2012 INTERVENÇÕES PARA MELHORAR A ADESÃO AO TRATAMENTO DE DOENÇAS CRÔNICAS [Interventions to improve adherence to treatment of chronic diseases] Annelita Almeida Oliveira Reiners1; Priscilla Uiara de Oliveira do Carmo2; Cecília Victorazzo Louzada3; Joana D’arc Chaves Cardoso4; Rosemeiry Capriata de Souza Azevedo5. Resumo: Pesquisa bibliográfica cujo objetivo foi descrever a produção latino-americana sobre intervenções para melhorar a adesão aos tratamentos da Hipertensão Arterial e Diabetes Mellitus. Os dados foram coletados na base de dados LILACS com diversos descritores relacionados a temática. Foram analisados 10 artigos. Os resultados mostraram que as intervenções propostas pelos autores são principalmente educativas e multiprofissionais. Os principais métodos empregados para avaliar as intervenções foram questionários, exames e medida da pressão arterial. Os autores consideraram que as intervenções melhoraram a adesão dos pacientes. Palavras chave: Estudos de intervenção. Adesão à medicação. Doença Crônica. Abstract: Bibliographical research which objective was to describe the Latin American production about interventions to improve adherence to treatment of Hypertension and Diabetes Mellitus. Data were collected in the LILACS database with several descriptors related to the theme. We analyzed 10 articles. The results showed that the interventions proposed by the authors are primarily educational and multidisciplinary. The major methods used to evaluate the interventions were questionnaires, tests and blood pressure measurement. The authors considered that interventions improved patient adherence. Keywords: Intervention studies. Medication adherence. Chronic Disease. Introdução desenvolvimento do país, tanto em termos de Atualmente, dentre as doenças prevalência, incapacitações, mortalidade crônicas (DC) mais prevalentes no mundo, prematura e custos envolvidos no controle do encontram-se a Hipertensão Arterial (HA) e tratamento de suas complicações. Sua o Diabetes Mellitus (DM). Estas são incidência tem aumentado, entre outros problemas de saúde pública que representam motivos, devido ao aumento da expectativa importante causa de morbimortalidade, de vida das pessoas e às mudanças nos estilos independentemente do grau de de vida da população1,2. _____________________ 1 Docente, Universidade Federal de Mato Grosso – Faculdade de Enfermagem. E-mail: [email protected] 2 Enfermeira, Universidade Federal de Mato Grosso – Faculdade de Enfermagem Email: [email protected] 3 Mestranda, Universidade Federal de Mato Grosso – Faculdade de Enfermagem. Rua República nº 130 – casa 27 – Bairro Coophema – Cuiabá – MT. CEP: 78085-200. E-mail: [email protected] 4 Docente, Universidade Federal de Mato Grosso – Faculdade de Enfermagem. E-mail: [email protected] 5 Mestranda, Universidade Federal de Mato Grosso – Faculdade de Enfermagem. E-mail: [email protected] 61 Reiners,A. A. O. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 61-70, jul./dez. 2012 O tratamento dessas doenças geralmente envolve medicamentos e medidas não farmacológicas, como dieta específica, controle do peso, atividade física, entre outros, que demandam monitoramento e gerenciamento de longo prazo. A adesão a esses tratamentos exige mudança de hábitos que devem ser integrados à rotina diária dos portadores dessas enfermidades. Ainda que o conhecimento sobre as doenças e seus tratamentos tenha crescido nas últimas décadas e muitas terapêuticas e cuidados, em alguma medida, seja hoje acessível à parte considerável da população mundial, a baixa ou não adesão aos tratamentos permanece sendo um problema que traz prejuízos diversos tanto para os doentes, quanto para suas famílias, os serviços de saúde e para o país. Além disso, prejudica os resultados terapêuticos e traz consideráveis perdas sociais, psicoemocionais e econômicas na medida em que contribui para que as pessoas continuem doentes e/ou morram precocemente. Muitos profissionais de saúde enfrentam esse problema no cotidiano da assistência aos pacientes e inúmeras investigações sobre adesão ao tratamento têm sido desenvolvidas com propósitos diversos. Há estudos que se propõem a analisar os conceitos e terminologias de adesão/não adesão, bem como suas formas de medida, mas, geralmente as pesquisas buscam identificar a presença desse fenômeno em determinado grupo de pacientes com levantamento dos fatores que contribuem para que isso aconteça. Em relação a intervenções, os profissionais de saúde apontam diferentes formas de lidar com a não adesão aos tratamentos da HA e DM3. Intervenções para melhorar o problema da não adesão aos tratamentos forneceriam um retorno significativo aos investimentos em prevenção de problemas de saúde4. Esses tipos de intervenção têm sido objeto de investigações e, em pesquisas de revisão, pesquisadores as têm relatado e avaliado5,6,7. Entretanto, estudos de revisão que buscaram e sistematizaram as pesquisas latino-americanas com o propósito de mostrar um panorama abrangente e atual dessas intervenções não foram encontrados Neste sentido, questiona-se: Quais são as intervenções que efetivamente têm sido realizadas em países latino-americanos para melhorar a adesão ao tratamento de DC? O objetivo deste estudo foi descrever a produção bibliográfica latino-americana existente sobre as intervenções que os profissionais de saúde realizaram para melhorar a adesão aos tratamentos da HA e do DM. Metodologia Trata-se de revisão de literatura na qual foram buscados artigos publicados em periódicos latino-americanos entre os anos de 2001 a 2011 que tinham como objetivo descrever as intervenções para melhorar a adesão ao tratamento da HA e do DM. Foram excluídas teses e dissertações, além de estudos de revisão e estudos nos quais os resumos não estavam claramente descritos. A coleta dos dados foi realizada no período de agosto a dezembro de 2011. As publicações foram obtidas por meio de buscas na base de dados LILACS, utilizando os seguintes descritores: intervenção, estratégia, cooperação do paciente, estudos de intervenção, recusa do paciente ao tratamento, conduta do tratamento medicamentoso, conduta no tratamento medicamentoso, desistência ao tratamento, desistência do paciente ao tratamento, interrupção do tratamento, recusa ao tratamento, aderência, adesão ao tratamento medicamentoso, adesão ao tratamento farmacológico, educação, paciente, participação do paciente , autocuidado, educação em saúde, promoção da saúde. A partir das estratégias de busca obteve-se 19 artigos, com a leitura dos títulos e resumos, bem como da aplicação dos critérios de inclusão e exclusão, obteve-se 10 textos (Figura I) que foram lidos na íntegra e seus dados extraídos, registrados e organizados em um formulário criado especificamente para a pesquisa. Depois as informações 62 Reiners,A. A. O. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 61-70, jul./dez. 2012 foram agrupadas em um formulário com os seguintes itens: tipos de intervenção, objetivos e focos da intervenção, população alvo da intervenção, conteúdos, abordagens, estratégias e recursos utilizados, responsáveis pela intervenção, forma de avaliação, resultados alcançados, dificuldades e facilidades encontradas. TEXTO REFERÊNCIA SILVA, T.R. et al. Controle de Diabetes Mellitus e Hipertensão Arterial com Grupos de Intervenção Educacional e Terapêutica em Seguimento Ambulatorial de 1 uma Unidade Básica de Saúde. Saúde & Sociedade, v.15, n.3, p180-189. set-dez 2006. MOREIRA, T. M. M.; ARAÚJO, T. L. Verificação de eficácia de uma proposta de 2 cuidado para aumento da adesão ao tratamento da hipertensão arterial. Acta Paul. Enf., São Paulo, v. 17.n.3, p. 268-77, 2004. HOLGUÍN, L.; CORREA, D.; ARRIVILLAGA, M.; CÁCERES, D.; VARELA, M.T. 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Os 10 estudos localizados foram publicados em periódicos na área multidisciplinar. A não adesão aos tratamentos, por ser um problema tão frequente e que prejudica tanto o paciente quanto sua família, o serviço de saúde e a sociedade, carecem de 63 Reiners,A. A. O. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 61-70, jul./dez. 2012 maior investimento em pesquisas de intervenção, cujos resultados possam contribuir para modificar o panorama das DC na América Latina e no mundo. As intervenções foram publicadas como pesquisa original ou como relato de experiência. Nas primeiras, os autores compararam a intervenção proposta com outro tipo de intervenção (caso-controle) ou realizaram apenas uma intervenção confrontando os resultados pós-intervenção aos da pré-intervenção. Relatos de experiência são importantes formas de divulgar intervenções, entretanto, pesquisas que avaliam intervenções são fundamentais para munir os profissionais de evidências cientificamente comprovadas de sua efetividade ou não. Tipos de intervenção Os estudos relatam diferentes tipos de intervenção, com a finalidade de melhorar a adesão dos pacientes ao tratamento, a maioria delas de cunho educativo (Textos 1, 2, 4, 6, 8, 9). Isso é um aspecto importante, pois atividades de educação em saúde objetivam desenvolver nas pessoas um sentido de responsabilidades sobre as decisões relacionadas à saúde, tanto individual como coletivamente, além de reconhecidamente ter potencial para a redução de custos junto a diversos contextos da assistência8. Nas intervenções de cunho educativo os profissionais de saúde têm a oportunidade de centrar suas ações nas pessoas e não somente em procedimentos, aliando orientação, informação, adequação dos esquemas terapêuticos ao estilo de vida do paciente, esclarecimentos, suporte social e emocional. Eles podem trabalhar junto aos pacientes questões ligadas ao reconhecimento e à aceitação de suas condições de saúde, adaptação a essas condições e cultivo de hábitos que promovam a qualidade de vida e proporcionam o desenvolvimento do autocuidado9. Assim, é necessário que os profissionais de saúde reconheçam a educação em saúde como uma tarefa inerente ao seu trabalho e que, por isso, devem fazer capacitações e treinamentos regularmente. O processo de educação em saúde exige que os profissionais de saúde tenham conhecimentos abrangentes que vão além dos aspectos clínicos e fisiopatológicos da doença10. Um dado relevante encontrado nas intervenções é que, em parte delas, os autores vincularam ações terapêuticas às educativas [Textos 1,2,3,4,5,9,10]. Foram atividades como visitas domiciliares, consultas médicas e não médicas regularmente agendadas e mais frequentes; busca de faltosos, atendimento de fisioterapeuta e terapeuta ocupacional, atendimento médico preferencial a intercorrências, intervenção psicológica e fornecimento de vale transporte e cesta básica. Atividades educativas aliadas às atividades clínicas favorecem a adesão, pois o paciente tem mais condições de expressar suas dificuldades e angústias em relação ao tratamento, além de ser possível o profissional de saúde entender quais são os obstáculos para que ocorra a adesão efetiva. A visitação domiciliar é uma intervenção importante, pois aproxima o profissional da saúde/ serviço de saúde do paciente, proporcionando um maior grau de confiança, além de ser uma categoria de atenção domiciliar à saúde que possibilita uma análise da realidade do indivíduo e de sua família. Funciona como um instrumento de intervenção essencial na saúde da família e na continuidade de qualquer forma de assistência, sendo utilizada com o intuito de auxiliar nas intervenções ou no planejamento de ações11. A consulta de enfermagem não fez parte das intervenções relatadas. Porém, seria importante, uma vez que tal atividade é favorável para exposição de queixas do paciente, para a identificação das necessidades de autocuidado e também para se realizar atividades educativas. Nessas atividades, o enfermeiro pode preparar tanto o indivíduo como a família para o autocuidado, contribuindo para a promoção, proteção, recuperação e reabilitação da 64 Reiners,A. A. O. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 61-70, jul./dez. 2012 saúde8, e consequentemente, para a adesão do tratamento. Responsáveis pelas intervenções Devido à complexidade das condições crônicas e ao fato de que as pessoas geralmente têm comorbidades, especialmente os idosos, e também pelo motivo de a adesão ser um fenômeno multifatorial, intervenções para melhorá-la requerem a atuação de diferentes profissionais12. A presença de uma equipe multidisciplinar completa na unidade de saúde pode contribuir para a compreensão do paciente sobre sua enfermidade e a importância da adesão ao tratamento para obter a cura13. Quando vários profissionais atuam de forma interligada, despendendo a mesma energia e com objetivos mútuos, considerando a pessoa do usuário, sua subjetividade e diversas necessidades, cada um dando profundidade à sua área de domínio profissional, as estratégias são mais efetivas14. Diante da ação da equipe multiprofissional, o paciente será submetido a uma gama muito maior de informações com enfoques diferentes e teremos, então, com um indivíduo bem orientado, a possibilidade da incorporação de hábitos adequados de vida e, quando necessário, do uso correto dos medicamentos prescritos, configurando assim, a adesão ao tratamento15. Nesta pesquisa, de modo geral, as intervenções foram desenvolvidas por diversos profissionais, incluindo psicólogos, médicos, nutricionistas, fisioterapeuta, fonoaudiólogo, auxiliar administrativo, assistente social, terapeuta ocupacional e dentista. Embora tenha sido relatada a presença da enfermagem na maioria das intervenções, os autores não descreveram claramente o papel desempenhado por ela. O enfermeiro como interventor claramente foi mencionado em quatro dos estudos [Textos 2,4,6,8]. Mesmo tendo a possibilidade de estar mais próximo do paciente, ainda se observa a ausência do profissional enfermeiro no que se refere a realizações de intervenções para melhorar a adesão ao tratamento. E o papel do enfermeiro é fundamental, pois, sempre que se inclui um profissional não médico na cadeia de atendimento ao paciente, observa-se aumento nos índices de adesão ao tratamento (comparecimento às consultas, tomada das medicações, controle da pressão arterial etc.). A justificativa para isso é que aparentemente os pacientes preferem relatar efeitos colaterais, sintomas, encontro de barreiras situacionais para a adesão ao tratamento e qualquer outro fator que esteja interferindo na observância das recomendações médicas a um profissional não-médico16. O enfermeiro pode exercer papel importante na atenção à saúde de pessoas com problemas crônicos de saúde, participando da coordenação e integração das intervenções, incentivando os membros da equipe para o oferecimento de assistência integrada e com qualidade17. Foco das intervenções Apesar dos avanços nas concepções de Educação em Saúde, o modelo biomédico permanece, em sua base filosófica, orientando o enfoque dominante das intervenções. Por isso, o que se pode constatar nos estudos revisados, é que as intervenções tinham como foco principal a doença e o tratamento. No que diz respeito à doença, os autores preocuparam-se em fornecer conhecimento aos pacientes sobre a enfermidade, os fatores de risco e as complicações. Já em relação ao tratamento, a ênfase foi na mudança do estilo de vida e na importância de seguir o tratamento medicamentoso como prescrito. Chama à atenção a ênfase que alguns autores deram ao controle do paciente sobre a enfermidade, sobre ele mesmo (autocontrole) e sobre as situações de estresse [Textos 2,3,5,9], denotando uma preocupação de alguns profissionais em capacitar os pacientes para lidar com a doença e o tratamento de maneira a garantir a adesão. Isso é importante, pois o foco do 65 Reiners,A. A. O. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 61-70, jul./dez. 2012 tratamento das DC deve ser reorientado para o paciente e sua família, estimulando-os a promover sua própria saúde, uma vez que o gerenciamento dessas condições requer mudanças no estilo de vida e no comportamento diário18. Estratégias e recursos utilizados A fim de melhor lidar com as condições crônicas e melhorar a adesão aos tratamentos, os órgãos governamentais e organizações de saúde afirmam que as intervenções que utilizam mais de uma estratégia têm sido mais eficazes4. E recomendam que os profissionais de saúde tenham habilidades avançadas de comunicação e de aconselhamento, bem como técnicas de auxílio a mudança de comportamento. A principal estratégia empregada pelos autores nas intervenções foi a de reuniões em grupo [Textos 1,2,3,5,6,8,9], nas quais haviam discussões sobre a doença, o tratamento, nutrição e temas relacionados com a atenção médica. Essa estratégia tem caráter informativo, reflexivo e de suporte com a finalidade de identificar dificuldades, discutir possíveis soluções para os problemas que não permitem uma adesão eficaz. As reuniões em grupo possibilitam que os pacientes percebam problemas comuns aos seus, apreendam novos meios de superá-los, expressem suas ansiedades e também tirem suas dúvidas. É um ambiente de interação com o outro, com outros conceitos e valores, onde é possível construir vínculos, se sentir acolhido, compartilhar dificuldade, buscar alternativas para superá-las e encontrar recursos para lidar com questões do adoecer, da doença e seus efeitos9. Além de permitir que os profissionais estimulem os pacientes, contribuindo na motivação que eles precisam ter para alcançar suas metas de cuidado e tratamento, as atividades educativas em grupo criam oportunidade para que as pessoas formem uma consciência crítica da sua realidade e suas necessidades, desenvolvam suas potencialidades e busquem soluções para seus problemas de saúde de forma efetiva10. Um dado relevante que encontramos foi o fato de que alguns autores incluíram a família em suas estratégias [Textos 1,2,5,8]. Isso é especialmente importante porque famílias são essenciais no processo de adesão do portador de DC ao tratamento e se constituem em forte pilar para continuar na luta de enfrentamento de doenças limitantes. Os cuidados implementados pela família têm a finalidade de preservar a vida de seus membros, com a vantagem de serem realizados de maneira adequada às suas próprias possibilidades, aos seus padrões culturais, às necessidades particulares de cada indivíduo e às condições do meio onde vive19. Contando com o apoio da família, é sempre possível viver de forma mais saudável e ter qualidade de vida20. Além das reuniões em grupo, os autores lançaram mão de a visita domiciliar como estratégia para melhorar a não adesão ao tratamento dos pacientes hipertensos [Textos 2,4,]. Nela, os serviços de saúde são oferecidos ao indivíduo e sua família em suas residências com o objetivo de promover, manter ou restaurar a saúde, maximizando o nível de independência, minimizando os efeitos das incapacidades ou doenças, incluindo aquelas sem perspectiva de cura. A visita domiciliar é uma categoria da atenção à saúde que prioriza o diagnóstico da realidade do indivíduo e as ações educativas. É um instrumento de intervenção fundamental na saúde da família e na continuidade de qualquer forma de assistência e/ ou atenção domiciliar à saúde, sendo programada e utilizada com o intuito de subsidiar intervenções ou o planejamento de ações11. Também foram utilizadas como estratégias atividades clínicas de rotina e mais frequentes, supervisão semanal com conferência das medicações, busca ativa dos pacientes faltosos e aerogramas. Nas entrevistas individuais informativas os autores buscaram, além de informar, também compreender os motivos da irregularidade ou do abandono do tratamento. 66 Reiners,A. A. O. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 61-70, jul./dez. 2012 As consultas regulares com médicos e/ou outros profissionais, assim como a visitação domiciliar, são estratégias importantes por possibilitar a aproximação dos profissionais de saúde ao paciente e sua família, permitindo maior interação e consequentemente maior entendimento das dificuldades de adesão ao tratamento. Além disso, essa estratégia reduz o tempo entre as consultas médicas, proporciona um atendimento diferenciado, possibilitando a orientação do tratamento e cuidados gerais com a saúde do paciente e ajuda na prevenção de um dos fatores de riscos associados ao abandono do tratamento que é a rejeição ao serviço de saúde21. Estratégias criativas foram utilizadas em duas das intervenções. Uma delas foi a realização de visitas a lojas de produtos dietéticos e a supermercados juntamente com os pacientes [Texto 8]. Essa estratégia é de grande valia, uma vez que muitos pacientes portadores de diabetes não têm contato com a realidade nutricional, seja pela falta de conhecimento ou por crenças associadas à patologia. A outra estratégia usada foi o repasse de mensagens via celular aos pacientes com estímulo à adesão ao tratamento, bem como de informações sobre doença e tratamento [Texto 7]. Isso demonstra a preocupação dos interventores em aliar à sua prática os recursos tecnológicos disponíveis à população, trazendo um diferencial às suas ações em saúde. Em uma das intervenções os autores lançaram mão de uma estratégia utilizada pela Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro, onde se realizou a dispensação de medicamentos diretamente no domicílio do paciente diabético previamente selecionado, juntamente com informações de promoção à saúde [Texto 10]. Esse tipo de estratégia mostra a preocupação dos profissionais acerca do acesso dos pacientes ao tratamento medicamentoso, combatendo um dos fatores que predispõe a não adesão. Muitos pacientes encontram dificuldades diversas para estar no estabelecimento de saúde onde é fornecido o medicamento, situação que usualmente leva ao abandono do tratamento. Em relação aos recursos utilizados nas intervenções, nem todos os autores mencionaram nos estudos os recursos empregados nas atividades educativas. Foi referido o uso de materiais audiovisuais (vídeos, folhetos), flipchart e cartões para transmitir as informações pretendidas [Textos 4,6,7,8]. A importância do uso desses recursos, dentre outros, em atividades educativas reside na possibilidade de facilitar a compreensão dos pacientes sobre a patologia e o tratamento, permitir o esclarecimento de informações necessárias, bem como de reafirmar a necessidade de aderirem ao tratamento. Local das intervenções Algumas intervenções foram realizadas nos domicílios dos pacientes quando foram feitas visitas domiciliares e outras em ambulatórios hospitalares [Textos 5,9], mas a maioria delas aconteceu em unidades básicas de saúde. Esses espaços possibilitam um contato mais próximo e duradouro com os pacientes e também com suas famílias, favorecendo o trabalho para melhorar a adesão ao tratamento. Quanto maior é a proximidade dos pacientes com os serviços de saúde, melhor é a interação com os profissionais e as chances de se ter uma adesão eficaz aumentam. Período de realização das intervenções Nem todos os autores deixaram claro o período em que as intervenções foram realizadas, mas podemos dizer que, em média, elas variaram de 2 meses a 2 anos. A obtenção de bons resultados em uma intervenção que visa melhorar a adesão ao tratamento implica necessariamente em levar em conta que ela é um comportamento que necessita de tempo considerável para ser adotado e que as pessoas terão ritmos diferentes no processo de vivência da doença e do tratamento. Desta forma, ações para melhorar a adesão requerem períodos prolongados e 67 Reiners,A. A. O. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 61-70, jul./dez. 2012 contínuos para serem realizadas. Esse requisito tem um papel fundamental na adesão ao tratamento, na medida em que permite vários encontros entre profissionais de saúde e pacientes nos quais os primeiros deverão trabalhar para estabelecer um vínculo com os últimos22, o que não é possível de se realizar em curtos períodos de tempo. População alvo Participaram dos estudos homens e mulheres entre 18 e 82 anos de idade principalmente na faixa da meia-idade e idosos. Isso é compreensível, pois embora casos de HA e DM em jovens sejam relatados, essas doenças acometem principalmente pessoas na faixa etária acima dos 40 anos23. Formas e avaliação da adesão e dos resultados encontrados A Organização Mundial da Saúde diz que não há consenso sobre um método de aferição da adesão ao tratamento que possa ser tomado como padrão-ouro, recomendando, assim, o uso combinado de métodos para melhorar sua acurácia4. No caso das intervenções para melhorar a adesão ao tratamento da HA, a principal forma de avaliação que utilizaram foi a medida da pressão arterial. Na maioria das intervenções para melhorar a adesão ao tratamento do DM foi utilizado o controle de taxas pré e pós- intervenção para concluir se a adesão foi alcançada. Os autores utilizaram as taxas como a da glicemia capilar, glicemia de jejum, hemoglobina glicada, colesterol total, HDL, LDL, triglicérides, além de medida da PA, da circunferência da cintura, peso e altura. Em cinco estudos os autores avaliaram a adesão por meio de questionários aplicados antes e depois das intervenções e acrescentaram outros parâmetros a essas medidas, o que na certa aumenta a confiabilidade dos resultados obtidos com a intervenção [Textos 2,3,5,6,9]. Os questionários estruturados são largamente utilizados para medir a adesão por sua facilidade operacional e baixo custo, apesar de, em sua maioria, possuírem baixa sensibilidade e baixo valor preditivo positivo24. Resultados Em todos os artigos foram relatados resultados positivos na melhora da adesão. As reuniões em grupo e as entrevistas individuais também obtiveram êxito em seu propósito de melhorar a adesão ao tratamento após terem proporcionado aos pacientes momentos de expressão das dificuldades e posteriormente evidenciado possibilidades de superação. Mas, a despeito dos resultados, há que se considerar que ainda é necessário que medidas de acompanhamento constante dos pacientes sejam adotadas, pois a adesão ao tratamento é um comportamento complexo sujeito à influência de fatores intrínsecos e extrínsecos que o modifica ao longo do tempo. Dificuldades/facilidades encontradas na sua realização Dos 10 estudos revisados, apenas três relataram as dificuldades/facilidades encontradas na realização das intervenções [Textos 1,2,10]. A menção desses seria interessante para que outros profissionais pudessem não somente conhecer aspectos que contribuem para facilitar a realização de intervenções para melhorar a adesão aos tratamentos, como também ter informações sobre os possíveis obstáculos a serem encontrados. A disponibilização de infraestrutura de apoio pelos serviços (fornecimento regular de medicação, padronização dos medicamentos e dos exames, atendimento às intercorrências, sala para os encontros) e o envolvimento da equipe multiprofissional, quando existiam, foram mencionados como facilitadores da intervenção. Da mesma forma, a ausência deles ou sua existência de maneira parcial, foram consideradas dificultadores da intervenção. 68 Reiners,A. A. O. et al. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 61-70, jul./dez. 2012 Igualmente, a participação inadequada dos familiares no grupo, a falta de referência para atendimento de casos especiais e mais complexos, as dificuldades de acesso aos domicílios dos pacientes devido à questões geográficas, os atrasos na entrega dos medicamentos, ausência de controle sobre a ingestão do medicamentos pelo paciente, e a incipiente parceria com as unidades de atenção básica e os órgãos da sociedade civil, foram considerados como dificultadores da intervenção. Conclusão Este estudo de revisão é o primeiro a apresentar um panorama das publicações latino americanas sobre intervenções para melhorar a adesão ao tratamento dos pacientes portadores de HA e DM dos últimos 10 anos. O número de artigos publicados na América Latina sobre a temática é pequeno. Nos estudos encontrados, pode-se constatar que as intervenções propostas pelos autores são principalmente educativas, utilizando-se de estratégias diversas e realizadas por profissionais de várias áreas, inclusive da enfermagem, em período e locais apropriados ao trabalho educativo. Os principais métodos empregados para avaliar os resultados da intervenção foram os questionários em conjunto com exames e medida da pressão arterial. Os resultados alcançados foram positivos em relação à melhora da adesão. Cabe ressaltar que este artigo limitou-se a produção latino-americana disponibilizada na base de dado LILACS. No entanto, essa pesquisa possibilitou conhecer as intervenções e apreender em que medida elas podem contribuir para a melhora da adesão dos pacientes ao tratamento. Da mesma forma, colabora para fornecer evidências aos profissionais de saúde do que tem e o que não tem sido efetivo nas formas de lidar com a não adesão aos tratamentos. Referências 1. Brasil. Ministério da Saúde. 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Trabalhos apresentados em eventos (congressos, simpósios, seminários...) serão aceitos desde que não tenham sido publicados integralmente em anais e autorizados, por escrito, pela entidade organizadora do evento, quando as normas do mesmo assim o exigirem. 5. Excepcionalmente, serão aceitos trabalhos já publicados em periódicos estrangeiros, desde que autorizados pela Comissão Editorial do periódico onde o artigo tenha sido originalmente publicado. 6. A Consultoria Científica se reserva o direito de sugerir eventuais modificações de estrutura ou conteúdo do trabalho, que serão acordadas com os autores. Não serão admitidos acréscimos ou alterações após o envio para composição editorial. 7. As opiniões emitidas nos trabalhos, bem como a exatidão, adequação e procedência das citações bibliográficas, são de exclusiva responsabilidade dos autores. 8. A revista classificará os textos encaminhados de acordo com as seguintes seções: 8.1 EDITORIAL – matéria de responsabilidade da Comissão Editorial da Revista. 8.2 ARTIGOS ORIGINAIS: a) PESQUISA – constará de relatos de investigações científicas concluídas. b) REVISÃO – abrangerá revisões de literatura sobre temas específicos. c) RELATO DE EXPERIÊNCIA/CASOS CLÍNICO – incluirá descrições de atividades acadêmicas assistenciais e de extensão. d) REFLEXÃO – apresentará materiais de caráter opinativo e/ou análise de questões que possam contribuir para o aprofundamento de temas relacionados à área a que se destina a revista. 8.3 OUTRAS SEÇÕES: a) ENTREVISTA – espaço destinado a entrevistas de autoridades / especialistas / pesquisadores. b) TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO / DISSERTAÇÕES DE MESTRADO E TESES DE DOUTORADO – RESUMOS E ABSTRACT c) PÁGINA DO LEITOR. 9. NORMAS DE APRESENTAÇÃO DE TRABALHOS 9.1 – FORMATO – O trabalho deverá ser encaminhado em 02 (duas) vias. Na digitação deverá ser utilizado espaço 1,5; com margem esquerda 3 cm; margem direita (superior e inferior) 2 cm; letra Times New Roman, tamanho 12, observando a ortografia oficial, editor Word For Windows. O título deverá ser em caixa alta, negrito, espaço 1,5 simples e justificado. Os autores deverão estar abaixo do título do artigo, em negrito, espaço simples e em caixa baixa. O texto deverá conter seus respectivos títulos, de acordo com as características do trabalho (ex. Artigo de pesquisa: Introdução, Métodos, Resultados e Discussão, etc.), formatados em caixa baixa, negrito. É obrigatório o envio de disquete ou CD-ROM na primeira etapa do trabalho. 9.2 – PADRÃO DE APRESENTAÇÃO – a) ARTIGOS ORIGINAIS – redigidos de acordo com as normas da Revista do CCS devendo conter no máximo 15 laudas de texto para artigos originais e 25 para revisões 71 Normas de Publicação Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 71-74, jul./dez. 2012 e observar o que segue: Título do artigo em português (caixa alta) e inglês (caixa baixa) e entre colchetes. Nome(s) completo(s) do(s) autor(es). Em nota de roda pé a(s) credencial(is) e local de atividade do(s) autor(es) (espaço 1,5 cm), email para correspondência. Resumo indicativo em português, de acordo com as normas da Revista do CCS, com até 100 palavras, em espaço 1,5. Palavras-chave - palavras ou expressões que identifiquem o artigo. Para determinação das palavras-chave consultar a lista de “Descritores em Ciências da Saúde – DECS-LILACS”, elaborada pela IREME e/ou “Medical Subject Heading – Comprehensive Medline”. Texto – incluindo ilustrações (quadros, fotos, modelos, mapas, desenhos, gravuras, esquemas, gráficos e tabelas), com seus respectivos títulos e fontes (quando houver). Exceto gráficos e tabelas, todas as ilustrações deverão ser designadas como figuras. As despesas com os fotolitos de figuras somente coloridas serão de responsabilidade dos autores Abstract – tradução do resumo em inglês, em espaço 1,5 cm. Keywords – tradução das palavraschave para o inglês. As referências (Normas de Vancouver) no texto deverão ser numeradas consecutivamente de forma crescente e na ordem que aparecem no texto pela primeira vez, identificando assim os autores SOMENTE POR NÚMEROS. A numeração, no texto, portanto deve ser em ORDEM CRESCENTE e SOBRESCRITO. NÃO LISTAR OS NOMES DOS AUTORES NO TEXTO. No setor de referências: (Normas de Vancouver) A listagem de referências deverá seguir a mesma ORDEM NUMÉRICACRESCENTE do texto. NÃO COLOCAR OS AUTORES EM ORDEM ALFABÉTICA. EXEMPLOS DE REFERÊNCIAS A) Artigos de revistas 1. Artigo padrão de revista: Listar os primeiros seis autores seguido por et al. Vega KJ, Pina I, Krevsky B. Heart transplantation is associated with an increased risk for pancreatobiliary disease. Ann Intern Med 1996;124:980-3. Mais do que seis autores: Parkin DM, Clayton D, Black RJ, Masuyer E, Friedl HP, Ivanov E, et al. Childhood-leukaemia in Europe after Chernobyl: 5 year follow-up. Br J Cancer 1996;73:1006-12. 2. Organização como autor: The Cardiac Society of Australia and New Zealand. Clinical exercise stress testing. Safety and performance guidelines. Med J Aust 1996;164:282-4. 3. Sem menção de autor: Cancer in South Africa [editorial]. S Afr Med J 1994;84:15. 4. Volume com suplemento: Shen HM, Zhang QF. Risk assessment of nickel carcinogenicity and occupational lung cancer. Environ Health Perspect 1994;102 Suppl 1:275-82. 5. Número com suplemento: Payne DK, Sullivan MD, Massie MJ. Women's psychological reactions to breast cancer. Semin Oncol 1996;23(1 Suppl 2):8997. 6. Volume com parte: Ozben T, Nacitarhan S, Tuncer N. Plasma and urine sialic acid in non-insulin dependent diabetes mellitus. Ann Clin Biochem 1995;32(Pt 3):303-6. 7. Número com parte: Poole GH, Mills SM. One hundred consecutive cases of flap lacerations of the leg in ageing patients. N Z Med J 1994;107(986 Pt 1):377-8. 8. Número sem menção de volume: Turan I, Wredmark T, Fellander-Tsai L. Arthroscopic ankle arthrodesis in rheumatoid arthritis. Clin Orthop 1995;(320):110-4. 9. Sem menção de número nem de volume: 72 Normas de Publicação Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 71-74, jul./dez. 2012 Browell DA, Lennard TW. Immunologic status of the cancer patient and the effects of blood transfusion on antitumor responses. Curr Opin Gen Surg 1993:325-33. 10. Paginação em numeração romana: Fisher GA, Sikic BI. Drug resistance in clinical oncology and hematology. Introduction. Hematol Oncol Clin North Am 1995 Apr;9(2):xi-xii. 11. Indicação do tipo de artigo, se necessário: Enzensberger W, Fischer PA. Metronome in Parkinson's disease [carta]. Lancet 1996;347:1337. Clement J, De Bock R. Hematological complications of hantavirus nephropathy (HVN) [resumo]. Kidney Int 1992;42:1285. 12. Artigo contendo retratação: Garey CE, Schwarzman AL, Rise ML, Seyfried TN. Ceruloplasmin gene defect associated with epilepsy in EL mice [retractação de Garey CE, Schwarzman AL, Rise ML, Seyfried TN. In: Nat Genet 1994;6:426-31]. Nat Genet 1995;11:104. 13. Artigo retratado: Liou GI, Wang M, Matragoon S. Precocious IRBP gene expression during mouse development [retractado em Invest Ophthalmol Vis Sci 1994;35:3127]. Invest Ophthalmol Vis Sci 1994;35:1083-8. 14. Artigo com erratum publicado: Hamlin JA, Kahn AM. Herniography in symptomatic patients following inguinal hernia repair [erratum publicado encontra-se em West J Med 1995;162:278]. West J Med 1995;162:28-31. B- Livros e outras monografias 1. Autor(es) individual: Ringsven MK, Bond D. Gerontology and leadership skills for nurses. 2nd ed. Albany (NY): Delmar Publishers; 1996. 2. Editor(es), compilador, como autor: Norman IJ, Redfern SJ, editors. Mental health care for elderly people. New York: Churchill Livingstone; 1996. 3. Organização como autor e editor: Institute of Medicine (US). Looking at the future of the Medicaid program. Washington: The Institute; 1992. 4. Capítulo de um livro: Phillips SJ, Whisnant JP. Hypertension and stroke. In: Laragh JH, Brenner BM, editors. Hypertension: pathophysiology, diagnosis, and management. 2nd ed. New York: Raven Press; 1995. p. 465-78. 5. Livro de atos de conferência, congresso, encontro: Kimura J, Shibasaki H, editors. Recent advances in clinical neurophysiology. Proceedings of the 10th International Congress of EMG and Clinical Neurophysiology; 1995 Oct 15-19; Kyoto, Japan. Amsterdam: Elsevier; 1996. 6. Comunicação em conferência: Bengtsson S, Solheim BG. Enforcement of data protection, privacy and security in medical informatics. In: Lun KC, Degoulet P, Piemme TE, Rienhoff O, editors. MEDINFO 92. Proceedings of the 7th World Congress on Medical Informatics; 1992 Sep 6-10; Geneva, Switzerland. Amsterdam: North-Holland; 1992. p. 1561-5. 7. Relatório técnico ou científico: Publicado pela entidade financiadora ou patrocinadora: Smith P, Golladay K. Payment for durable medical equipment billed during skilled nursing facility stays. Final report. Dallas (TX): Dept. of Health and Human Services (US), Office of Evaluation and Inspections; 1994 Oct. Report No.: HHSIGOEI69200860. Publicado pela entidade executora: Field MJ, Tranquada RE, Feasley JC, editors. Health services research: work force and educational issues. Washington: National Academy Press; 1995. Contract No.: AHCPR282942008. Sponsored by the Agency for Health Care Policy and Research. 8. Dissertação: Kaplan SJ. Post-hospital home health care: the elderly's access and utilization [dissertação]. St. Louis (MO): Washington Univ.; 1995. 73 Normas de Publicação Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 71-74, jul./dez. 2012 9. Patente: Larsen CE, Trip R, Johnson CR, inventors; Novoste Corporation, assignee. Methods for procedures related to the electrophysiology of the heart. US patent 5,529,067. 1995 Jun 25. C).Outras publicações 1. Artigo de jornal: Lee G. Hospitalizations tied to ozone pollution: study estimates 50,000 admissions annually. The Washington Post 1996 Jun 21;Sect. A:3 (col. 5). 2. Material audiovisual: HIV+/AIDS: the facts and the future [cassette video]. St. Louis (MO): MosbyYear Book; 1995 3. Texto legal: Legislação publicada Preventive Health Amendments of 1993, Pub. L. No. 103-183, 107 Stat. 2226 (Dec. 14, 1993). Legislação não promulgada: Medical Records Confidentiality Act of 1995, S. 1360, 104th Cong., 1st Sess. (1995). Code of Federal Regulations: Informed Consent, 42 C.F.R. Sect. 441.257 (1995). Audição: Increased Drug Abuse: the Impact on the Nation's Emergency Rooms: Hearings Before the Subcomm. on Human Resources and Intergovernmental Relations of the House Comm. on Government Operations, 103rd Cong., 1st Sess. (May 26, 1993). 4. Mapa: North Carolina. Tuberculosis rates per 100,000 population, 1990 [demographic map]. Raleigh: North Carolina Dept. of Environment, Health, and Natural Resources, Div. of Epidemiology; 1991. 5. Livro da Bíblia: The Holy Bible. King James version. Grand Rapids (MI): Zondervan Publishing House; 1995. Ruth 3:1-18. 6. Dicionário e referências semelhantes: Stedman's medical dictionary. 26th ed. Baltimore: Williams & Wilkins; 1995. Apraxia; p. 119-20. 7. Texto clássico: The Winter's Tale: act 5, scene 1, lines 1316. The complete works of William Shakespeare. London: Rex; 1973. B) Material não publicado 8. Aguardando publicação: Leshner AI. Molecular mechanisms of cocaine addiction. N Engl J Med. Em publicação 1996. Material electrónico C) Material eletrônico 9. Revista em formato eletrônico: Morse SS. Factors in the emergence of infectious diseases. Emerg Infect Dis [serial online] 1995 Jan-Mar [cited 1996 Jun 5]; 1(1):[24 ecrans]. Disponível em: URL: http://www.cdc.gov/ncidod/EID/eid.htm 10. Monografia em formato eletrônico: CDI, clinical dermatology illustrated [monografia em CD-ROM]. Reeves JRT, Maibach H. CMEA Multimedia Group, producers. 2nd ed . Version 2.0. San Diego: CMEA; 1995. 11. Ficheiro de computador: Hemodynamics III: the ups and downs of hemodynamics [programa de computador]. Version 2.2. Orlando (FL): Computerized Educational Systems; 1993. 10.O(s) autores deverão encaminhar o artigo para análise acompanhado de uma carta com os seguintes dizeres: (Cidade, data) À Comissão Editorial Revista de Ciências da Saúde Os autores abaixo assinados transferem come exclusividade, os direitos de publicação, na Revista de Ciências da Saúde do artigo intitulado: (escrever título do artigo) e garantem que o artigo é inédito e não está sendo avaliado ou foi publicado por outro periódico. (incluir nome completo de todos os autores, endereço postal, telefone, email, fax, e assinaturas respectivas). 74 75