Revista Ciências da Saúde

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REVISTA
CIÊNCIAS
DA SAÚDE
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA
Reitor: Álvaro Toubes Prata
Vice-Reitor: Carlos Alberto Justo da Silva
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
Diretora: Kenya Schmidt Reibnitz
Site
www.ccs.ufsc.br/revistaccs/ojs/index.php/REVCCS
REVISTA
CIÊNCIAS
DA SAÚDE
ISSN 0101 – 9546
Revista Ciências da Saúde
Florianópolis
V. 31, N. 2
P. 1 - 74
2012
Revista Ciências da Saúde é uma revista semestral editada pelo Centro de
Ciências da Saúde da Universidade Federal de Santa Catarina.
Comissão Editorial: Elisabeth Wazlawik (Nutrição-UFSC), Inês Beatriz Rath
(Estomatologia-UFSC), Liliane Janete Grando (Patologia-UFSC), Maria Itayra
Coelho de Souza Padilha (Enfermagem-UFSC), Patrícia Haas (Análises ClínicasUFSC), Roberto Henrique Heinish (Clínica Médica-UFSC), Tânia Silvia Fröde
(Editora-chefe UFSC).
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(UFRGS), Cristianne Fammer Rocha (UFRGS), Eduardo Dalmarco (UFSC),
Elisabeth Gomes da Rocha Thomé (UFRGS), Emilia Addison Machado Moreira
(UFSC), Eva Neri Rubim Pedro (UFRGS), Liliana Muller Larocca (UFPR), Luciane
Peter Grillo (UNIVALI),Márcia Assunção Ferreira (UFRJ), Margarita Ana Rubin
Unicovsky (UFRGS), Paulo Roberto Kechele (UFSC), Regina Rigato Witt (UFRGS),
Simone Beatriz Pedrozo Viana(UNIVALI).
(Catalogação na fonte pela Biblioteca Universitária da
Universidade Federal de Santa Catarina)
Revista Ciências da Saúde/Universidade Federal de Santa Catarina. Centro de
Ciências da Saúde.
-- V.1, n.1 (1982)- , - Florianópolis: Imprensa Universitária, 1982.
V.: 27cm
Semestral
ISSN 0101-9546
1.Ciências Médicas. 2. Saúde-pesquisas. I. Universidade Federal de Santa Catarina. II
Centro de Ciências da Saúde.
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Revista Ciências da Saúde - Secretaria do Centro de Ciências da Saúde da UFSC
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SUMÁRIO
Editorial.................................................6
ASPECTOS EPIDEMIOLÓGICOS DAS
DOENÇAS
PALPEBRAIS
NO
AMBULATÓRIO DO SERVIÇO DE
OFTALMOLOGIA
NO
HOSPITAL
UNIVERSITÁRIO DA UNIVERSIDADE
FEDERAL DE SANTA CATARINA
[Epidemiological aspects of the eyelid
diseases in the ophthalmologic
service at the university hospital of
Santa Catarina Federal University]
Cleyton Takaiti Shimono; Augusto
Adam Netto; Kleber Eidi Shimono;
Rodrigo Dall’Oglio da Cunha; Ana
Flávia
Salai;
Lívia
Souza
de
Oliveira..................................................7
POSTURAS EPISTEMOLÓGICAS DAS
PRODUÇÕES
DE
FISIOTERAPIA
RESPIRATÓRIA SEGUNDO FLECK
[Epistemological
productions
respiratory physiotherapy according
Fleck]
Fabíola
Hermes
Chesani...............................................16
NÍVEL DE ATIVIDADE FÍSICA DE
IDOSOS LONGEVOS RESIDENTES
NA GRANDE FLORIANÓPOLIS/SC
[Level of physical activity oldest old
residents in “Grande Florianópolis”]
Giovana Zapellon Mazo, Tânia Rosane
Bertoldo Benedetti, Janeisa Franck
Virtuoso, Rodrigo de Rosso Krug,
Márcia Zanon Benetti........................25
O
PROGRAMA
DE
AGENTES
COMUNITÁRIOS DE SAÚDE SOB A
ÓTICA DE NORBERT ELIAS [The
program
of
community
health
workers in the light of Norbert Elias]
Liliana Muller Larocca, José Rabone
Junior,
Daiane
Siqueira
Luccas.................................................34
EFICÁCIA DE UM PROGRAMA DE
CAPACITAÇÃO PRESENCIAL EM
SAÚDE AUDITIVA PARA AGENTES
COMUNITÁRIOS DE SAÚDE [Efficacy
of a training program in hearing
health
for
Community
Health
Workers] Daniele Laí Urnau; Débora
Frizzo Pagnossin; Indiara de Mesquita
Fialho..................................................42
MEDICALIZAÇÃO
EM
SAÚDE
MENTAL NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À
SAÚDE:
UMA
REVISÃO
DE
LITERATURA
[Medicalization
in
mental health in primary health care:
a review of literature] Leandro
Moreira; Gabriela Marcellino de Melo
Lanzoni; Caroline Cechinel...............50
INTERVENÇÕES PARA MELHORAR A
ADESÃO AO TRATAMENTO DE
DOENÇAS CRÔNICAS [Interventions
to improve adherence to treatment of
chronic diseases] Annelita Almeida
Oliveira Reiners; Priscilla Uiara de
Oliveira do Carmo; Cecília Victorazzo
Louzada;
Joana
D’arc
Chaves
Cardoso; Rosemeiry Capriata de
Souza Azevedo...................................61
Normas editoriais...............................71
Revista Ciências da Saúde
Editorial
Prezado Leitor,
Cotidianamente ouve-se falar da importância acerca dos
cuidados com a saúde, em termos de boa alimentação, prática
de exercícios físicos, regulamentação dos excessos, entre
outros. Ao fim e ao cabo, preza-se pelo cuidado com o corpo,
por manter a boa forma e, talvez, um padrão de beleza imposto
pela influência midiática.
Os cuidados com o corpo são essenciais, obviamente.
Contudo, está no esquecimento outra essencialidade quando
se trata de saúde: a saúde da mente. Esta também necessita
de cuidados pelos mesmos hábitos saudáveis que se deve ter
ao cuidar do corpo, porém com atenção especial ao exercício
do conhecimento, tal qual deve ser buscado principalmente
pela leitura.
O exercício da leitura não tem restrições. A leitura pode
ser praticada sem restrição de idade, cultura ou gênero. Com a
leitura adquire-se conhecimento, fortalece-se a memória,
enriquece-se o espírito, este também essencial nos cuidados
para com a saúde.
Paulatinamente, a despeito de todo o cuidado, o corpo
envelhece. E a mente? Ah! Esta bem cuidada somente se
fortalece.
A Revista Ciências da Saúde traz para o leitor artigos de
distintas áreas do conhecimento da saúde. Artigos que visam
promover o fomento da pesquisa em saúde e o incentivo aos
cuidados com o corpo pelo fortalecimento da mente.
Deste modo, é sobre o pilar da harmonia entre as
esferas dos cuidados com o corpo e, principalmente, com a
mente, que a Revista Ciências da Saúde deseja uma boa
leitura!
Amanda Caroline Nunes de Avelar
Secretária da Revista Ciências da Saúde
6
Shimono, C. T. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 7-15, jul./dez. 2012
ASPECTOS
EPIDEMIOLÓGICOS
DAS
DOENÇAS
PALPEBRAIS
NO
AMBULATÓRIO DO SERVIÇO DE OFTALMOLOGIA NO HOSPITAL
UNIVERSITÁRIO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA
[Epidemiological aspects of the eyelid diseases in the ophthalmologic service at the
university hospital of Santa Catarina Federal University]
Cleyton Takaiti Shimono1; Augusto Adam Netto2; Kleber Eidi Shimono3; Rodrigo
Dall’Oglio da Cunha4; Ana Flávia Salai5; Lívia Souza de Oliveira6.
Resumo: As doenças palpebrais são ocorrências frequentes entre as doenças oculares
externas e são escassos os estudos sobre este tema. Entre janeiro de 2005 a dezembro de
2010, 520 pacientes foram avaliados através do mês, ano, estação do ano, procedência, sexo,
faixa etária e diagnóstico. Outubro, 2006 e 2007 e primavera foram, respectivamente, mês,
anos e estação do ano com maior número de atendimentos devido a moléstias palpebrais. A
maioria dos pacientes era procedente de Florianópolis, do sexo feminino, com idade entre 15
e 29 anos. A enfermidade palpebral mais frequente foi hordéolo cuja incidência diminui com
o aumento da idade.
Palavras-chave: pálpebras, doenças palpebrais, epidemiologia.
Abstract: The eyelid diseases are frequent occurrences of external ocular diseases and there
are few studies on this topic. From January of 2005 to December of 2010, 520 patients were
evaluated by month, year, season, origin, gender, age and diagnosis. October, 2006 and 2007
and spring were, month, year and season with the highest number of attendances due to
eyelid diseases respectively. Most patients were from Florianópolis, female, aged between 15
and 29 years. The eyelid disease more frequent was hordeolum whose incidence decreases
with increasing age.
Keywords: eyelids, eyelid diseases, epidemiology.
1. Médico graduado na Universidade Federal de Santa Catarina. E-mail:
[email protected]
2. Professor titular da disciplina de oftalmologia do departamento de cirurgia do
CCS/UFSC. Professor coordenador da disciplina de oftalmologia do módulo de
sistemas sensoriais da UNISUL. Chefe do serviço de oftalmologia do HU/UFSC. Email: [email protected]
3. Médico graduado na Universidade Federal de Santa Catarina. E-mail:
[email protected]
4. Médico graduado na Universidade Federal de Santa Catarina. E-mail:
[email protected]
5. Médica graduada na Universidade Federal de Santa Catarina. E-mail:
[email protected]
6. Médica graduada na Universidade Federal de Santa Catarina. E-mail:
[email protected]
7
Shimono, C. T. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 7-15, jul./dez. 2012
Introdução
As pálpebras são pregas delgadas da
pele, músculo e tecidos fibrosos(1) que têm
como funções proteger os olhos do contato
com corpo estranhos e evitar o ressecamento
da córnea e da conjuntiva(2). São recobertas
externamente pela pele e internamente pela
conjuntiva. Entre a pele e a conjuntiva
existem vasos sanguíneos, nervos, músculos,
glândulas e placas rígidas e fibrosas, o tarso,
que sustentam as margens palpebrais.(1, 3) No
tarso se encontram as glândulas de
Meibomius que se abrem em ductos na
margem da pálpebra.(2) Os cílios, pelos
fortes, curvos e curtos, dispostos em duas ou
mais fileiras e implantados na borda livre das
pálpebras(4) possuem em seus folículos as
glândulas de Zeiss. Entre os folículos situamse as glândulas de Moll.(3)
As doenças palpebrais estão entre os
problemas oculares mais comuns (1 5). O
hordéolo é um processo infeccioso agudo,
normalmente causado por estafilococos. (1, 2)
Classificado como interno quando as
glândulas de Meibomius estão acometidas ou
em externo quando há o comprometimento
das glândulas de Zeiss ou de Moll. Dor,
rubor e edema são os sintomas mais comuns.
Quando múltiplos e recorrentes podem estar
associados a deficiências vitamínicas e
imunológicas. (1, 2, 6)
A blefarite é um
processo
inflamatório crônico bilateral das margens
palpebrais (7). Classificada como seborreica,
ulcerativa ou mista.(3) A seborreica está
frequentemente associada a seborreia do
couro cabeludo, supercílios e orelhas.(1, 8) A
ulcerativa é um processo infeccioso,(3)
geralmente estafilocócico.(1) Os principais
sintomas são irritação, ardência e prurido nas
margens palpebrais. Crostas e granulações
podem ser vistas aderidas aos cílios.
O calázio é uma inflamação crônica
granulomatosa e estéril da glândula
meibomiana.(3) De etiologia desconhecida,
diferencia-se do hordéolo pela ausência de
sinais inflamatórios agudos(1) e pode ser o
resultado crônico de um hordéolo não
resolvido.(2)
A triquíase, desvio dos cílios da sua
posição normal com consequente atrito destes
contra a córnea,(2) pode ser causado pelo
entrópio, blefarite, cicatrizes resultantes de
traumatismos e pela blefaropigmentação.(1, 9)
Os sintomas são sensação de corpo estranho,
dor, irritação, congestão conjuntival,
lacrimejamento e blefaroespasmo reflexo.(3)
Outras
enfermidades
palpebrais
encontradas neste estudo foram corpo
estranho subtarsal, ectrópio, edema palpebral,
entrópio, ptose palpebral, queimaduras
palpebrais e tumores palpebrais.
A existência, em nosso meio, de
poucas pesquisas sobre a incidência de
doenças palpebrais, levou-nos a elaborar o
presente trabalho. Almejamos que com ele,
possamos contribuir para que a equipe que
compõe o serviço de oftalmologia do
HU/UFSC esteja melhor preparada para
diagnosticar as moléstias palpebrais mais
frequentes e consequentemente tratá-las da
forma mais adequada. Estes fatos motivaram
a realização deste estudo para avaliar os
aspectos epidemiológicos das doenças
palpebrais
nos
pacientes
atendidos
emergencialmente no ambulatório do serviço
de oftalmologia do HU/UFSC, entre janeiro
de 2005 e dezembro de 2010, associando-as
com o ano, mês, procedência, sexo, faixa
etária, diagnóstico e estação do ano.
Métodos
As doenças palpebrais diagnosticadas
nas consultas de emergência oftalmológica
no ambulatório do serviço de oftalmologia
do HU/UFSC foram abordadas em um
estudo descritivo, observacional, transversal
e retrospectivo.
Entre o período de janeiro de 2005 a
dezembro de 2010 foram analisados dados
de 520 pacientes atendidos no ambulatório
do serviço de oftalmologia do HU/UFSC.
Variáveis pesquisadas que não foram
anotadas nos respectivos prontuários e
pacientes que não foram diagnosticados com
8
Shimono, C. T. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 7-15, jul./dez. 2012
doenças palpebrais foram excluídos do
estudo.
A coleta dos dados procedeu-se
mensalmente, no período de julho a agosto
de 2011 através da revisão dos prontuários
com informações sobre os atendimentos
diários em emergência oftalmológica
arquivados no Serviço de Prontuários do
Paciente (SPP) do HU/UFSC. A partir dos
dados coletados, desenvolveu-se um
protocolo com as seguintes variáveis:
diagnóstico da doença palpebral, mês e ano
de atendimento, procedência (cidade em que
o paciente residia no momento da consulta e
bairro
se
paciente
procedente
de
Florianópolis), idade (dividida nas seguintes
faixas etárias: 0 a 14; 15 a 29; 30 a 39; 40 a
49; 50 a 59 e 60 anos ou mais), sexo e
estação do ano.
O projeto foi aprovado no Comitê de
Ética em Pesquisa com Seres Humanos da
UFSC sob processo número 2064 de 28 de
novembro de 2011.
Análise estatística
O banco de dados foi criado em uma
planilha de dados do Microsoft Excel®
(Microsoft, WA, EUA) e depois importado
para o pacote estatístico Stata® 11.2
(StatCorp., TX, EUA). Primeiramente foram
categorizadas as variáveis conforme objetivo
do estudo. Após foi realizada uma análise
descritiva com as prevalências e respectivo
intervalo de confiança de 95%.
Para a análise, a variável diagnóstico
de doenças palpebrais foi dividida em quatro
variáveis dicotômicas (sim/não). Não foram
analisados os diagnósticos de triquíase e
daqueles classificados como outros devido
ao baixo número destes diagnósticos na
amostra. Para a medida de efeito, foi
realizada regressão logística univariada com
o objetivo de obter a razão de odds. Foram
consideradas
significativas
aquelas
associações com valor p<0,05 através do
teste de Wald.
Resultados e discussão
Entre janeiro de 2005 a dezembro de
2010, as doenças palpebrais foram
responsáveis por 22,7% dos atendimentos
emergenciais realizados no ambulatório do
serviço de oftalmologia do HU/UFSC. Esse
número é superior ao encontrado no trabalho
de Pereira et al(10) realizado no Serviço de
Urgência Oftalmológica do Hospital São
Geraldo no período de setembro de 2005 a
janeiro de 2006 com 8346 pacientes
atendidos e que obteve como resultado
11,77% dos atendimentos decorrentes de
doenças palpebrais.
No estudo de Schellini et al(11)
realizado no Serviço de Emergência e
Triagem Oftalmológica do Hospital das
Clínicas da Faculdade de Medicina de
Botucatu – UNESP entre janeiro de 1988 a
dezembro de 1989 com 5613 consultas
oftalmológicas realizadas. Destas 12% foram
devido a doenças palpebrais. Em Leonor et
al(12) foram atendidos 810 pacientes no
Hospital Dia da Santa Casa de Misericórdia
de Limeira entre fevereiro a julho de 2007
devido
a urgência
ou emergência
oftalmológica,
destes
12%
foram
diagnosticados com alguma enfermidade
palpebral.
A pesquisa de Sanchez et al(13)
realizado no Serviço de Urgências
Oftalmológicas no Hospital Rio Ortega em
um intervalo de 9 meses foram prestados
2914 atendimentos com 8,1% motivados por
doenças palpebrais. Já Shields e Sloane(14)
analisou as principais queixas e diagnósticos
de problemas oculares na atenção primária
nos EUA no ano de 1985 e obteve como
resultado 3,9% dos pacientes atendidos
apresentaram doenças palpebrais.
O mês com o maior número total de
registros de atendimentos de pacientes com
doenças palpebrais foi outubro (n=55,
10,6%; IC95% 7,9 – 13,2). Em 2005, foi
registrado o menor número de atendimentos
(n=70, 13,5%; IC95% 10,5 – 16,4) quando
comparado aos anos 2006 e 2007, estes
9
Shimono, C. T. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 7-15, jul./dez. 2012
correspondendo aos anos com maior número
de atendimentos (n=102, 19,6%; IC95% 16,2
– 23,0, em cada ano).
Em relação às estações do ano, houve
uma diferença quando comparados aos
resultados encontrados por Edwards(15) e
Schellini et al.(11) A maior incidência de
doenças
palpebrais
no
serviço
de
oftalmologia do HU/UFSC entre janeiro de
2005 e dezembro de 2010 foi na primavera
(n=141, 27,1%; IC95% 23,3 – 30,9). No
trabalho de Edwards(15) realizado no Serviço
de Oftalmologia do Hospital Kent e
Canterbury entre maio de 1993 a abril de
1984 a maior incidência de moléstias
palpebrais ocorreu no verão e em Schellini et
al,(11) no outono. Essa diferença nos
resultados encontrados em Edwards(15) e
Schellini et al,(11) provavelmente, se deve as
diferenças climáticas nos diferentes locais
estudados. Na primavera, o pólen liberado
pelas flores pode causar processos alérgicos
dentre eles dermatites, blefarites e edemas
palpebrais. Dessa forma, a primavera
apresenta uma maior relação na incidência
de alergias.(16)
Pode-se observar que a maioria dos
pacientes com diagnóstico de doenças
palpebrais
foram
procedentes
de
Florianópolis (n=411, 79%; IC95% 75,5 –
82,5), seguidos de municípios da grande
Florianópolis (n=91, 17,5%; IC95% 14,2 –
20,8) e de outros municípios (n=18, 3,5%;
IC95% 1,9 – 5,0) com grande parte destes
indivíduos procedentes do bairro Trindade
(n=66, 16%) seguidos dos bairros Pantanal
(n=35, 8,5%), Centro (n=33, 8,1%),
Carvoeira (n=20, 4,9%) e Córrego Grande
(n=20, 4,9%).
O pequeno número de pacientes não
oriundos de Florianópolis procuraram o
serviço de oftalmologia do HU/UFSC,
provavelmente, devido ao longo tempo de
espera para atendimento no hospital de
referência em oftalmologia para os outros
municípios da região metropolitana de
Florianópolis, uma vez que o HU/UFSC não
é o hospital de referência em oftalmologia
para tais municípios. Outras causas de
procura do serviço de oftalmologia no
HU/UFSC de pacientes não procedentes de
Florianópolis seriam indivíduos com
atividades profissionais próximas ao
HU/UFSC ou a presença de pessoas
conhecidas internadas no HU/UFSC
aproveitando a situação para consultar-se no
serviço de oftalmologia.
Neste trabalho constatou-se que a
maioria dos pacientes atendidos pelo serviço
de oftalmologia com diagnóstico de doença
palpebral no HU/UFSC era do sexo feminino
(n= 291, 56%; IC95% 51,7 – 60,2) em
relação ao masculino (n=229, 44%; IC95%
39,8 – 48,3). No estudo de Leonor et al(12)
foram atendidos 810 pacientes com queixas
de doenças oculares 66,6% dos pacientes
atendidos no ambulatório de urgências
oftalmológicas eram do sexo masculino e
33,4% do sexo feminino. Porém, neste
mesmo trabalho, as afecções palpebrais no
sexo feminino corresponderam a 23% e no
masculino a 11%.
Nos trabalhos de Kessler(17) e
(18)
Silva, verificou-se uma maior tendência a
procura dos serviços de saúde pelo sexo
feminino. A menor procura de atendimento
no serviço de oftalmologia do sexo
masculino seria pelo fato de que os homens
buscam atendimento nos serviços de saúde
quando doenças em estados mais avançados
ou enfermidades consideradas mais graves
começam a afetar o seu rendimento no
trabalho, segundo Kessler.(17)
No presente estudo, a faixa etária
com o maior número de diagnóstico de
doenças palpebrais foi entre 15 a 29 anos
(39,8%), seguidas das faixas etárias entre 40
a 49 anos (16,7%) e 30 a 39 anos (15,2%), o
que representou um percentual total de
71,7% dos casos. Este resultado foi diferente
do encontrado no trabalho de Sanchez et
al(13) em que a maioria dos pacientes
encontrava-se em uma faixa etária acima de
51 anos (49,6%). Em Miller(3) e em Leonor
10
Shimono, C. T. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 7-15, jul./dez. 2012
et al,(12) porém, a maioria dos pacientes eram
adultos jovens e em idade produtiva. Tais
resultados assemelham-se com os números
encontrados neste estudo.
O diagnóstico de doenças palpebrais
mais frequente neste trabalho foi hordéolo
(36,7%), seguido por blefarite (32,1%) e
corpo estranho subtarsal (14,2%), o que
totalizou 83% dos diagnósticos de doenças
palpebrais (Tabela 1). Esse resultado difere
dos resultados encontrados por Sanchez et
al,(13) cujo diagnóstico mais frequente foi o
de blefarite com incidência de 52,4%. Na
pesquisa de Sheldrick et al(19) realizada a
oeste de Nottingham, Inglaterra entre março
de 1989 a fevereiro de 1990 através de
consultas ambulatoriais e visitas domiciliares
de 1630 pacientes, encontrou-se como
diagnósticos mais frequentes a blefarite e o
calázio, representando 5,7% e 3,3%,
respectivamente.
Tabela 1 - Distribuição dos
ambulatório do
diagnóstico
Diagnóstico
Hordéolo
Blefarite
Corpo estranho subtarsal
Calázio
Triquíase
Outros
Total
Entretanto, em Schellini et al,(11) o
maior número de diagnósticos foi o de
hordéolo com 43,8%, a blefarite figurou em
segundo lugar com 20,1%. No trabalho de
Pierre Filho et al(20) realizado no Serviço de
Emergências
Oftalmológicas
do
Departamento de Oftalmologia da Santa
Casa de Sobral entre maio a outubro de 2008
foram atendidos 1024 pacientes, destes o
somatório de pacientes com diagnósticos de
hordéolo ou de calázio foram 23,6%, já em
Pereira et al(10) essa soma correspondeu a
6,02%. A partir de dados coletados do
Hospital Nacional de Pesquisa e Assistência
Médica Ambulatorial nos EUA em 1993, das
2,32 milhões de consultas decorrentes de
problemas oculares e anexos oculares, Nash
e Margo(21) verificaram que o hordéolo
representou 3% dos diagnósticos, enquanto a
blefarite e o calázio corresponderam a 2,7%
e 1,5%, respectivamente, das doenças
palpebrais.
pacientes com diagnóstico de doenças palpebrais atendidos no
serviço de oftalmologia do HU/UFSC de acordo com o
n
191
167
74
51
18
19
520
%
36,7
32,1
14,2
9,8
3,5
3,7
100
IC95%
32,6 - 40,9
28,1 - 36,1
11,2 - 17,2
7,2 - 12,4
1,9 - 5,0
2,0 - 5,2
FONTE: SPP HU/UFSC, no período entre janeiro de 2005 a dezembro de 2010.
Neste estudo, observou-se uma maior
frequência no diagnóstico de blefarite com o
aumento da idade, com o grupo com 60 anos
ou mais apresentando uma probabilidade de
ocorrência de blefarite 2,79 vezes maior que
o grupo com 14 anos ou menos.
Já a probabilidade de ocorrência do hordéolo
diminui com o aumento da idade e houve
uma
tendência
na
diminuição
na
probabilidade do diagnóstico de calázio com
o aumento da faixa etária (Tabela 2).
11
Shimono, C. T. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 7-15, jul./dez. 2012
Tabela 2 – Diagnóstico de doenças palpebrais associadas às faixas etárias dos pacientes
atendidos no ambulatório do serviço de oftalmologia do HU/UFSC
Hordéolo
Blefarite
Calázio
*
*
OR (IC95%)
p
OR (IC95%)
p
OR (IC95%)
p*
<0,001
0,008
0,005
Idade
≤ 14
1,00
1,00
1,00
15 - 29
1,00 (0,43; 2,34)
1,51 (0,54; 4,25)
0,38 (0,14; 1,04)
30 - 39
0,80 (0,32; 2,02)
1,47 (0,49; 4,42)
0,34 (0,10; 1,10)
40 - 49
0,53 (0,21; 1,34)
2,21 (0,75; 6,50)
0,39 (0,13; 1,21)
50 - 59
0,46 (0,18; 1,22)
2,28 (0,75; 6,91)
0,10 (0,02; 0,52)
≥ 60
0,19 (0,06; 0,56)
2,79 (0,92; 8,51)
0,11 (0,02; 0,57)
FONTE: SPP HU/UFSC, no período entre janeiro de 2005 a dezembro de 2010.
*
Análise realizada através do teste de Wald.
A blefarite está frequentemente
associada à dermatite seborréica,(1, 8, 22) uma
doença inflamatória crônica que acomete
regiões ricas em glândulas sebáceas como
sobrancelhas, sulcos nasolabiais, glabela e
pálpebras.(23) A idade de início da dermatite
seborréica ocorre na maioria das vezes na
faixa etária entre 20 a 50 anos ou mais.(24)
Além disso, existem relatos de uma
associação entre a dermatite seborréica e
pacientes com doenças de Parkinson,(23) esta
uma doença neurodegenerativa caracterizada
por bradicinesia, tremor em repouso, rigidez,
marcha arrastada e postura em flexão.(23) A
doença de Parkinson tem sua idade de início
mais frequente na sétima década de vida,
porém pode acometer uma faixa etária entre
35 a 85 anos.(23) Tais fatos explicariam o
porquê do aumento da frequência do
diagnóstico de blefarite com o aumento da
faixa etária.
Já a probabilidade de ocorrência do
hordéolo diminui com o aumento da idade.
Provavelmente,
por
uma
maior
conscientização de bons hábitos de higiene,
como lavar as mãos, com o aumento da
idade, evitando o contato frequente das mãos
e de objetos contaminados com os olhos.
O calázio pode ser o resultado crônico de um
hordéolo não resolvido,(2) dessa forma com a
diminuição da frequência no diagnóstico de
hordéolo com o aumento da idade, o
diagnóstico de calázio também estaria
diminuído com o aumento da idade.
A probabilidade de ocorrência da blefarite
foi 1,77 vezes maior no sexo feminino do
que no sexo masculino. Esse dado seria
consequência de uma maior procura dos
serviços de saúde por parte das mulheres(17,
18)
quando comparadas aos homens. Já os
homens apresentam uma chance 78% maior
do diagnóstico de corpo estranho subtarsal
quando comparados as mulheres (Tabela 3).
Os
corpos
estranhos
subtarsais,
normalmente, estão associados aos acidentes
de trabalho nas profissões exercidas
principalmente pelo sexo masculino. Estes
acidentes ocorrem na maioria das vezes pela
falta de experiência, falta de instrução
adequada no uso de equipamentos de
segurança e, até mesmo, condições
inadequadas de trabalho oferecidas aos
pacientes atendidos no serviço de
oftalmologia.(12, 25) Nossos achados seriam
explicados dessa forma.
12
Shimono, C. T. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 7-15, jul./dez. 2012
Tabela 3 – Diagnóstico de doenças palpebrais associadas ao sexo dos pacientes atendidos no
ambulatório do serviço de oftalmologia do HU/UFSC
Blefarite
Corpo Estranho Subtarsal
*
OR (IC95%)
p
OR (IC95%)
p*
Sexo
0,003
<0,001
1,00
1,00
Masculino
1,77 (1,21; 2,59)
0,22 (0,13; 0,39)
Feminino
FONTE: SPP HU/UFSC, no período entre janeiro de 2005 a dezembro de 2010.
*
Análise realizada através do teste de Wald.
Além disso, foi observada uma menor
chance do diagnóstico de blefarite nos anos
2008 e 2009 quando comparados ao ano de
2005 (Tabela 4). Provavelmente, devido ao
aumento no número de atendimentos em
outros serviços de oftalmologia diferentes do
serviço de oftalmologia do HU/UFSC, a um
menor número de encaminhamentos das
unidades de saúde e ao desconhecimento da
existência da enfermidade pelo paciente.
Tabela 4 - Diagnóstico de blefarite associada aos anos analisados dos pacientes atendidos no
ambulatório do serviço de oftalmologia do HU/UFSC
Blefarite
OR (IC95%)
p*
0,021
Ano
1,00
2005
0,72 (0,38; 1,33)
2006
0,60 (0,32; 1,13)
2007
0,42 (0,21; 0,84)
2008
0,39 (0,19; 0,79)
2009
0,57 (0,30; 1,09)
2010
FONTE: SPP HU/UFSC, no período entre janeiro de 2005 a dezembro de 2010.
*
Análise realizada através do teste de Wald.
Constatou-se, assim, que as doenças
palpebrais foram responsáveis por um
elevado número de consultas no ambulatório
do serviço de oftalmologia do HU/UFSC.
Esperamos que os resultados obtidos neste
trabalho auxiliem o serviço a melhorar o
diagnóstico e a tratar da forma mais
adequada possível estes agravos tão
frequentes no atendimento oftalmológico
emergencial.
Conclusão
A partir das avaliações clínicoepidemiológicas das doenças palpebrais nos
pacientes atendidos no ambulatório do
serviço de oftalmologia do HU/UFSC,
podemos destacar como pontos conclusivos
do presente estudo que as doenças palpebrais
foram responsáveis por 22,7% dos
atendimentos emergenciais no período
compreendido entre janeiro de 2005 a
dezembro de 2010. O mês com o maior
número de registros de atendimentos foi
outubro (10,6%). Os anos com o maior
número de registros de pacientes atendidos
foram os de 2006 e 2007, cada um com 102
atendimentos. A estação do ano com o maior
registro total de pacientes atendidos foi a
primavera (27,1%) seguida do inverno
(26,2%). A maioria dos pacientes era
procedente de Florianópolis (79%) e do
13
Shimono, C. T. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 7-15, jul./dez. 2012
bairro Trindade (16,0%). O maior número de
pacientes atendidos com diagnóstico de
doenças palpebrais era do sexo feminino
(56,0%). Os pacientes situados na faixa
etária de 15 a 29 anos (39,8%) foram os mais
acometidos por doenças palpebrais. Entre as
doenças palpebrais, o diagnóstico mais
frequente foi o de hordéolo (36,7%), seguido
de blefarite (32,1%) e de corpo estranho
subtarsal (14,2%). A probabilidade de
ocorrência de blefarite foi maior no sexo
feminino e com o aumento da faixa etária. A
freqüência dos diagnósticos de hordéolo e
calázio diminui com o aumento da idade. A
probabilidade do diagnóstico de corpo
estranho subtarsal foi 78% maior no sexo
masculino do que no feminino.
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15
Chesani, F. H.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 16-24, jul./dez. 2012
POSTURAS EPISTEMOLÓGICAS DAS PRODUÇÕES DE FISIOTERAPIA
RESPIRATÓRIA SEGUNDO FLECK [Epistemological productions respiratory
physiotherapy according Fleck]
Fabíola Hermes Chesani1
Resumo: Este estudo investigou o perfil epistemológico que emerge das produções
científicas de fisioterapia respiratória sobre a perspectiva de Fleck. A coleta de dados foi
através de artigos publicados em periódicos na área de saúde na base de dados Scientific
Electronic Library Online – SciELO, entre o ano de 2002 a 2010. A análise dos artigos foi
realizada a partir do título, do resumo e das palavras- chave. Encontraram-se 18 periódicos e
88 artigos referentes à fisioterapia respiratória. O perfil epistemológico que emerge das
produções científicas de fisioterapia respiratória sobre a perspectiva de Fleck é o da avaliação
e tratamento fisioterapêutico.
Palavras-chave: fisioterapia respiratória, Fleck, produções científicas.
Abstract: This study investigated the epistemological profile that emerges from the scientific
production of respiratory physiotherapy from the perspective of Fleck. Data collection was
through articles published in journals in the area of health in the database Scientific
Electronic Library Online - SciELO, the period between of 2002 to 2010. The analysis was
performed of articles from the title, abstract and keywords. We found 18 journals and 88
articles related to respiratory physiotherapy. The epistemological profile that emerges from
the scientific production of respiratory physiotherapy from the perspective of Fleck is the
assessment and treatment.
Keywords: respiratory physiotherapy, Fleck, scientific productions.
Introdução
o primeiro serviço de fisioterapia da
América do Sul dando início a história da
fisioterapia no Brasil 1.
No intuito de suprimir a demanda por
técnicos, em 1951, foi criado o primeiro
Curso Técnico de Fisioterapia do Brasil, com
duração de um ano em período integral. Nos
anos que seguiram esta data houve todo um
movimento no Brasil pela melhora da
qualidade dos profissionais formados nos
então cursos técnicos. Todo esse movimento
teve como marco inicial à fundação da
Associação Brasileira de Fisioterapeutas –
ABF, que ocorreu em 19 de agosto de 1959.
Esta associação foi ímpar para o
Quando se remete o pensamento para
a história da fisioterapia e da fisioterapia
respiratória, observam-se três momentos
distintos que caracterizam a doença na
sociedade humana: o biologicista e
tecnicista, o preventivo e o da visão
integrada do paciente e de seu universo.
No Brasil, a Fisioterapia inicia-se no
final do século XIX, com a criação do
serviço
de
Eletricidade
Médica
e
Hidroterapia na cidade do Rio de Janeiro: a
casa das duchas como era conhecida. Em
1884, o médico Arthur Silva cria, no
Hospital de Misericórdia do Rio de Janeiro,
______________________
1
Docente da Universidade do Vale do Itajaí e Doutorando no Programa de Pós-graduação
em Educação Científica e Tecnológica da UFSC. Email:[email protected]
16
Chesani, F. H.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 16-24, jul./dez. 2012
desenvolvimento da Fisioterapia no Brasil e
para criação de seu primeiro curso superior
de fisioterapia 2.
No Brasil, nos anos 60, encontramos
poucos fisioterapeutas trabalhando na área da
Fisioterapia Respiratória, sobretudo em
pacientes portadores de sequelas da
poliomielite com comprometimento da
musculatura respiratória e em pacientes
portadores de doenças pulmonares crônicas
ao nível ambulatorial ou domiciliar.
Nos anos 70 foram formados os
primeiros
grupos
de
fisioterapeutas
respiratórios para atuarem com pacientes no
pré e pós-operatório de grandes cirurgias
como as cardíacas, pulmonares e abdominais
altas.
Os anos 80 caracterizam-se pelo
desenvolvimento de centros de terapia
intensiva, geral ou especializada, nos quais o
fisioterapeuta se inseriu como membro
integrante do grupo multiprofissional,
responsabilizando-se
pela
assistência
ventilatória e motora dos pacientes
criticamente doentes.
Em 1983, por meio da Resolução
Número 4 do Conselho Federal de Educação,
o currículo mínimo do curso de fisioterapia
foi dividido em quatro ciclos. O primeiro
ciclo era referente às matérias biológicas, o
segundo ciclo matérias de formação geral, o
terceiro
ciclo
matérias
préprofissionalizantes e o quarto ciclo matérias
profissionalizantes 3.
Na década de 90 a Fisioterapia passa
por um processo de transformação. Com a
Lei de Diretrizes e Bases (9394/96) que
estabelece autonomia para as Universidades
elaborarem seus currículos, os cursos de
fisioterapia incorporam a prevenção em seu
currículo 3 .
Em 19 de fevereiro de 2002, resolve
o Ministro da Educação, instituir as
Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso
de Graduação em Fisioterapia as quais foram
aprovadas, por meio do Parecer do Conselho
Nacional de Educação nº 1.210/2001. A
formação
geral
e
específica
dos
egressos/profissionais tem ênfase na
promoção, prevenção, recuperação e
reabilitação da saúde 4.
A Fisioterapia Respiratória brasileira,
nos últimos anos, está se firmando como
uma especialidade e existem no país vários
cursos de especialização, de aperfeiçoamento
e produções científicas na área 5 .
Com a mudança das políticas
públicas em saúde no país em 2002
preconiza-se um terceiro estilo de
pensamento na fisioterapia respiratória, uma
atitude humanizada e visão integrada do
paciente e de seu universo.
Epistemologicamente este terceiro
estilo de pensamento concebe a construção
do saber a partir de uma relação dialética
entre sujeito (indivíduo) e objeto (realidade
objetiva), mediada pelo estado de
conhecimento, entrelaçadas em relações
históricas e estilizadas, psicossocialmente
construídas 6 .
Para Fleck 7 o conhecer representa a
atividade mais condicionada socialmente da
pessoa e o conhecimento é a criação social
por excelência. Ao analisar as descobertas
científicas, Fleck dimensiona a construção
do novo conhecimento além das fronteiras
do indivíduo-pesquisador. A tradição, a
formação e o costume dariam origem a uma
disposição para perceber e atuar conforme
um estilo de pensamento, em um coletivo de
pensamento, ou seja, de forma dirigida e
restrita.
Fleck 7 cunhou os conceitos de estilo
de pensamento e coletivo de pensamento na
década de 1930. Um estilo de pensamento
constitui-se em uma instância ao mesmo
tempo cognitiva, psicológica e sociológica a
orientar e restringir o pensamento e as
percepções, as práticas e as teorias, as
indagações e as respostas dos membros de
um coletivo que o compartilham.
Segundo Lowi 8 os estilos de
pensamento estruturam-se em círculos
concêntricos quanto à especialização: os
especialistas esotéricos são os centros de
produção, inovação e desenvolvimento de
17
Chesani, F. H.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 16-24, jul./dez. 2012
saber (os cientistas “de ponta” para a
biomedicina). Eles são referência para a
periferia dos círculos esotéricos (círculos
intermediários, médicos clínicos), que
servem de referência e prestam serviços para
os círculos exotéricos, que são os leigos,
pacientes dos serviços de saúde, usuários
dessa medicina 9.
A construção do saber científico
passa pela definição do estilo de pensamento
e do coletivo de pensamento num momento
histórico
dado,
investigando-se
suas
características de tendência à persistência,
circulação intercoletiva de ideias e
transformação do estilo. Seguindo esta linha,
o objetivo deste estudo é investigar o perfil
epistemológico que emerge das produções
científicas de fisioterapia respiratória sobre a
perspectiva de Fleck.
A partir deste contexto, surgiu a
seguinte questão de pesquisa: atualmente
qual o perfil epistemológico que emerge das
produções
científicas
de
fisioterapia
respiratória sobre a perspectiva de Fleck?
Metodologia
Para o entendimento do estilo de
pensamento da fisioterapia respiratória
dentre outras possíveis fontes para pesquisa
como teses, entrevistas, anais congressuais,
optou- se por uma coleta de dados através de
artigos publicados em periódico.
Para a localização das produções
científicas de fisioterapia respiratória
utilizamos a base de dados Scientific
Electronic Library Online – SciELO- Brasil,
que é uma biblioteca eletrônica que abrange
uma coleção selecionada de periódicos
científicos brasileiros. Mais especificamente,
a busca foi na área das ciências da saúde e a
palavra- chave foi fisioterapia respiratória.
A análise dos artigos publicados na
área de fisioterapia respiratória foi realizada
a partir do título, resumo e palavra-chave,
entre o período fevereiro do ano de 2002 a
setembro 2010. Este período foi eleito
devido à mudança da matriz curricular do
curso de fisioterapia que preconizava a
implementação na sua prática de um estilo de
pensamento humanista e integral.
Para a percepção do estilo de
pensamento, que acontece juntamente com o
aprofundamento do estudo teórico e da vista
ao objeto utilizou-se a técnica para a coleta
de dados a análise documental. A análise
documental é ótima técnica de abordagem
exploratória de dados qualitativos, sejam
complementando as informações obtidas por
outras técnicas, seja utilizada sozinha para
revelar aspectos novos de um tema ou
problema. São considerados documentos
quaisquer materiais escritos que possam ser
usados como fonte de informação sobre o
comportamento humana. Estes incluem
desde leis e regulamentos, normas,
pareceres, cartas, memorandos, diários
pessoais, autobiografias, jornais, revistas,
discursos, roteiros de programa de rádio e
televisão, estatísticas e arquivos escolares 10.
A técnica de análise dos dados
coletados nas revistas será o Método da
Análise do Conteúdo 11. Existem maneiras
diferentes do conteúdo ser abordado. Pode
ser na procura de palavras, expressões,
sentenças, parágrafo ou texto como um todo.
Alguns preferem a análise da contagem das
palavras ou expressões, ou realizar a análise
temática, como foi realizado neste estudo 10.
Resultado e Discussão
Na base de dados SciELO- Brasil
encontramos 20 periódicos que publicaram
artigos em fisioterapia respiratória, os quais
são: Revista Brasileira de Fisioterapia,
Fisioterapia
em
Movimento,
Jornal
Brasileiro
de
Pneumologia,
Revista
Brasileira de Terapia Intensiva, Revista
Brasileira de Cirurgia Cardiovascular,
Revista Brasileira de Hematologia e
Hemoterapia,
Jornal
Brasileiro
de
Nefrologia, Revista Brasileira de Nefrologia,
Revista da Associação Médica Brasileira,
Revista Paulista de Pediatria, Revista
Brasileira de Saúde Materno Infantil, Texto e
18
Chesani, F. H.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 16-24, jul./dez. 2012
Contexto Enfermagem, Arquivos de
Neuro- Psiquiatria, São Paulo Medical
Journal, Revista do Colégio Brasileiro de
cirurgiões,Revista Brasileira de Educação
Especial, Revista Latino Americana de
Enfermagem, Jornal de Pediatria, Acta
Paulista de Enfermagem e Arquivos de
cardiologia. Descrição na figura 1.
Figura 1- Periódicos de publicaram artigos de Fisioterapia Respiratória.
Nos 20 periódicos apresentados na
figura 1 encontramos 88 artigos publicados
referentes a fisioterapia respiratória. A
Revista Brasileira de Fisioterapia é o
periódico que tem maior número de
publicações sobre a fisioterapia respiratória.
A missão deste periódico é publicar artigos
científicos relativos ao objeto básico de
estudo e campo de atuação profissional da
Fisioterapia, veiculando estudos básicos e
aplicados sobre a prevenção e tratamento das
disfunções de movimento. Esta missão deixa
claro que os estudos que retratam a
promoção e educação em saúde não são
publicados, excluindo desta forma as
relações históricas, sociais, culturais,
familiares e econômicas do sujeito.
O estudo identificou 4 estilos de
pensamento nos artigos de fisioterapia
respiratória: processos de avaliação e
técnicas de tratamento em fisioterapia,
profissão e trabalho em fisioterapia,
19
Chesani, F. H.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 16-24, jul./dez. 2012
epidemiologia,
estudos
promoção, educação e
processo saúde-doença.
experimentais,
prevenção no
A figura 2 apresenta a sistematização da
relação entre o número de artigos com a
temática.
Figura 2- Porcentagem de artigos por temática
Na figura 2 constatou-se que o estilo
de pensamento predominante nos artigos de
fisioterapia respiratória ainda é o tecnicista e
reabilitador, com 76 publicações com esta
temática. As políticas públicas em saúde
preconizam desde o ano de 2002 a atenção
integral ao indivíduo, neste estudo
observaram-se somente 8 publicações nesta
temática. Quanto à epidemiologia, estudos
experimentais e profissão em trabalho de
fisioterapia identificaram 4 artigos.
Gomes e Da Ros 12 investigaram a
etiologia da cárie no estilo de pensamento da
ciência odontológica e identificaram cinco
tendências a transformação do estilo de
pensamento: a biologicista, a clínicoepidemiológica, a clínico - biologicista, o
biopssicosocial e a social. Este estudo
corroborou com os dados desta pesquisa.
Os currículos das profissões da área
da saúde foram construídos tendo como base
o Relatório Flexner, publicado em 1910 nos
Estados Unidos da América (EUA). Este
relatório tinha como objetivo fixar diretrizes
para o ensino médico daquele país e do
Canadá seguindo o modelo cartesianonewtoniano que apresentava um currículo
rígido mínimo de quatro anos de estudo com
formação
em
ciências
básicas
e
profissionalizantes. No Brasil este modelo
chegou por volta da década de 50 através de
incentivo da Fundação Rockfeller, e
proporcionou um avanço tecnológico e
científico, uma visão fragmentada da ciência,
focada na especialização e incapaz de
resolver algumas questões básicas que
envolvem o processo saúde-doença 13.
Este modelo pedagógico hegemônico
de ensino é centrado em conteúdos,
organizados de maneira compartilhada e
isolada, fragmentando os indivíduos em
especialidades, dissociando conhecimentos
20
Chesani, F. H.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 16-24, jul./dez. 2012
das áreas básicas e conhecimentos das
clínicas,
incentivando
a
precoce
especialização e perpetuando modelos
tradicionais de práticas em saúde. Este
modelo tradicional de ensino em saúde é
tecnicista e preocupado com a sofisticação
dos procedimentos, conhecimento dos
equipamentos de diagnósticos, tratamento e
cuidado 14.
Tesser 15 relata que este modelo é
interventor, controlador e dominador,
coerente com as características da
racionalidade científica moderna em geral:
racionalismo,
mecanicismo,
dualismo,
fragmentarismo,
metodologismo,
quantitativismo e materialismo. Com isso,
busca controlar o corpo, eliminar ou
controlar doenças, fazer a gestão dos riscos e
regulamentar os modos de vida.
Koifman 16 relata que o movimento
de ruptura das antigas maneiras de conceber
o organismo humano se deu com a anatomia
e instaurou uma nova racionalidade médica,
moderna, que tinha como traço fundamental
o mecanismo fisiologista do período
clássico. Nessa concepção, a vida deixou de
ser objeto central da prática médica, e a
forma humana passou a ser vista como
máquina. Ocorreu, então, a transformação da
prática clínica. Os hospitais passaram a ser
organizados como espaço clínico de uma
ciência das entidades patológicas. O corpo
humano tornou-se, então, a sede das
doenças; e as doenças, entidades patológicas.
Assim, a saúde passou a ser vista como
ausência de doença e a cura passou a
significar a eliminação dos sintomas.
Tratava-se de enfrentar a doença como
manifestação de causas, subjetivas e
externas, e se procurava alcançar uma causa
universal da doença. Essa medicina baseavase em uma patologia especulativa e em
nosologias fenomenológico
O modelo mecanicista, fragmentado e
compartilhado, não consegue dar respostas
aos problemas e as angústias da humanidade.
As escolas sofrem os impactos das mudanças
políticas, sociais, econômicas e tecnológicas,
e, mesmo assim resistem a mudanças, pois
carregam
consigo
o
fardo
do
17
conservadorismo .
Estas constatações conduzem a uma
reflexão sobre o processo de conhecimento.
Possivelmente, um dos entraves no processo
é a visão positivista de ciência, ainda muito
presente, que impõe uma racionalidade
técnica, que é responsável pela detenção de
verdades descobertas, que transmite a
verdade
como
prontas,
acabadas,
18
inquestionáveis .
Fleck trabalha o modelo interativo do
processo de conhecimento, subtraindo,
portanto, a neutralidade do sujeito, do objeto
e do conhecimento, afinando-se claramente
com a concepção construtivista da verdade.
O conhecimento a que se refere está
intimamente ligado a pressupostos e
condicionamentos
sociais,
históricos,
antropológicos e culturais e, à medida que se
processa, transforma a realidade. Opõe-se ao
modelo impirista-mecanicista, atribuindo ao
sujeito um papel ativo que introduz ao
conhecimento,uma visão de realidade
socialmente transmitida. A realidade não
pode ser vista enquanto abstração do sujeito
ou reflexo do objeto independentemente. A
relação cognoscitiva entre cognoscente e
objeto a conhecer é formado por um terceiro
fator, o estado de conhecimento, que são as
relações históricas, sociais e culturais 19.
Da Ros (20) crê que os pressupostos
mais importantes de Fleck são: abordagens
integradoras dos fenômenos patológicos, as
doenças resultam de interações multifatoriais
e multidimensionais, as doenças podem ser
vistas por diferentes áreas (clínico,
bacteriológico..), cada área tende a achar que
sua atuação suficiente e definitiva, as
doenças são construções coletivas dos
médicos, todo conhecimento científico é
socialmente construído, ciência aplicada não
é menor que ciência básica, todas as
observações dependem do observador, em
consequência
disto
resulta
numa
incongruência, a doença não existe fora de
um
determinado
corpo
individual.
21
Chesani, F. H.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 16-24, jul./dez. 2012
A dinâmica da produção de
conhecimento passa por três fases:
instauração, extensão e transformação do
estilo de pensamento. Na fase de instauração
ocorre inicialmente um ver confuso, pouco
desenvolvido e pouco articulado de um estilo
de pensamento novo. A instauração de um
estilo de pensamento novo geralmente
implica numa perda da capacidade de
observar certos aspectos do estilo anterior.
Após o período de instauração segue-se o
período de extensão do novo estilo de
pensamento, a harmonia das ilusões, onde as
ideias eficazes proporcionam uma intrínseca
harmonia do estilo de pensamento; para que
esta harmonia ocorra adequadamente é
necessária uma coerção do pensamento. Por
último, o ver formativo já estilizado permite
a construção do fato científico de forma mais
elaborada, “sólida”, estruturando um novo
coletivo de pensamento 7.
As novas diretrizes curriculares dos
cursos de fisioterapia preconizam que a
formação do profissional de saúde deve
contemplar o sistema de saúde vigente no
país, o trabalho em equipe e a atenção
integral à saúde. Incentivam uma sólida
formação geral, necessária para que o futuro
graduado possa superar os desafios
permanentemente renovados na prática
profissional e na produção do conhecimento,
permitindo variados tipos de formação e
habilitações diferenciadas em um mesmo
programa 21.
A busca de artigos investigado neste
estudo evidenciou que a fisioterapia
respiratória ainda esta na fase de instauração
de um novo estilo de pensamento, pois a
fisioterapia respiratória observa muitos
aspectos de um estilo de pensamento
referente à avaliação e tratamento
fisioterapêutico, portanto, um tecnicista,
reabilitadora e biologicista. Este estilo de
pensamento percebe os doentes apenas pela
sua nosologia, permanece fortemente
articulado com a atividade histórica de
formação dos cursos da área de saúde.
O estado de conhecimento das produções de
fisioterapia respiratória, isto é, o contexto
histórico, social, familiar, cultural e
econômico do ser humano está neutro. A
relação cognoscitiva entre cognoscente e
objeto a conhecer é neutra, não existe
interação
entre
sujeito,
objeto
e
conhecimento, trata-se de estudos empíricos.
Fleck
defende
que
todo
o
conhecimento é socialmente construído, mas
isto não significa negar o empírico.
Conclusão
A Fisioterapia respiratória, nos
diferentes períodos de sua história, passou
por transformações que foram importantes
para sua inserção e atuação na área da saúde.
Em relação à sua regulamentação, a
profissão passou de uma escolaridade média
para de nível superior. Porém, manteve o
vínculo com o modelo biomédico, atendendo
prioritariamente ao indivíduo nas suas
limitações físicas.
O perfil epistemológico que emerge
das produções científicas de fisioterapia
respiratória sobre a perspectiva de Fleck é da
avaliação e tratamento fisioterapêutico,
portanto, predomina a assistência tecnicista,
curativa, recuperadora e reabilitadora.
A fisioterapia respiratória esta na
primeira fase do processo do conhecimento,
a instauração. Para que o fisioterapeuta
respiratório contemple o sistema de saúde
vigente no país, o trabalho em equipe e a
atenção integral à saúde e transforme o estilo
de pensamento vigente é necessária uma
certa cumplicidade dos membros que
compartilham esta ideia, cumplicidade
conquistada com as circulações de idéias
intercoletivas e intracoletivas e uma suave
coerção para um estilo de pensamento mais
humanista e integral, proporcionando uma
interação
entre
sujeito,
objeto
e
conhecimento.
22
Chesani, F. H.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 16-24, jul./dez. 2012
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24
Mazo, G. Z. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 25-33, jul./dez. 2012
NÍVEL DE ATIVIDADE FÍSICA DE IDOSOS LONGEVOS RESIDENTES NA
GRANDE FLORIANÓPOLIS/SC
[Level of physical activity oldest old residents in “Grande Florianópolis”]
Giovana Zapellon Mazo1; Tânia Rosane Bertoldo Benedetti2; Janeisa Franck Virtuoso3;
Rodrigo de Rosso Krug4; Márcia Zanon Benetti5.
Resumo: Objetivou-se neste estudo analisar o nível de atividade física de 183 longevos da
Grande Florianópolis/SC. Identificou-se e associou-se os dados sociodemográficos e nível de
atividade física. No nível de atividade física geral, a maioria (57,9%) realizava mais de 150
minutos/semana (ativos fisicamente). No trabalho (96,7%), atividades domésticas (56,3%) e
lazer (61,7%) eram inativos fisicamente. No transporte (39,3%) insuficientemente ativos. Não
houve associação entre os dados sociodemográficos e o nível de atividade física. Os longevos
são ativos fisicamente no nível de atividade física geral. Na avaliação por domínios são
considerados insuficientemente ativos ou inativos.
Palavras-Chave: Idoso de 80 Anos ou mais. Atividade motora. Dados Demográficos.
Abstract: Aimed this study to analyze the level of physical activity of 183 oldest old
residents in Big Florianópolis/SC. Sociodemographic data and the level of activity were
identified and associed. At the general level of physical activity, the majority (57.9%) took
more than 150 minutes/week (physically active). In work (96,7%), housework (56,3%) and
leisure (61,7%), were physically inactive. In transportation (39,3%) insufficiently active. The
sociodemographic data not associated with the domains of physical activity. The oldest old
are are physically active in general physical activity level. In evaluation domains are
considered insufficiently active or inactive.
Keywords: Aged, 80 and over. Motor Activity. Demographic Data.
Introdução
No Brasil os idosos longevos representavam
cerca de 600 mil pessoas em 1980. Em 2010,
esse número passou para 1,6 milhão, com
projeções de aumento para 9 milhões em
2020 e 14 milhões em 20401.
O crescimento da população de
idosos é um acontecimento mundial e ocorre
em nível acelerado também no Brasil1. Este
aumento se destaca especialmente na faixa
etária com 80 anos ou mais de idade,
denominados
“idosos
longevos”2,3,4,5,6.
____________________
1
Licenciada em Educação Física e Professora Doutora do Programa de Pós-Graduação em
Ciências do Movimento Humano (UDESC); [email protected]
2
Professora Doutora do Programa de Pós-Graduação em Educação Física (UFSC);
[email protected]
3
Fisioterapeuta
Mestre
em
Ciências
do
Movimento
Humano
(UDESC);
[email protected]
4
Licenciado em Educação Física e Mestre em Ciências do Movimento Humano (UDESC);
[email protected]
5
Licenciada em Educação Física e Mestre em Ciências do Movimento Humano (UDESC).
[email protected]
25
Mazo, G. Z. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 25-33, jul./dez. 2012
O aumento no número de idosos
longevos desencadeia uma série de
inquietações na sociedade, principalmente do
ponto de vista epidemiológico, já que nessa
faixa etária, concentra-se a prevalência de
morbidades e de incapacidades7,8. Portanto, o
acompanhamento de indicadores de saúde
em idosos mais velhos é prioridade e merece
atenção redobrada8.
Nesse contexto, a prática de
atividade física regular vem sendo
amplamente recomendada por profissionais
da saúde como uma forma de prolongar a
saúde9. Atualmente, há um alto nível de
evidência e recomendação (nível A) para o
aumento da expectativa de vida, através da
preservação da capacidade funcional, devido
sua influência no desenvolvimento de
doenças crônicas, especialmente nas
atividades de resistência aeróbia e
muscular10. No entanto, as pesquisas
brasileiras têm estudado em pequena escala
este grupo etário com relação à prática de
atividades físicas, pois o conceito arraigado
em nossa cultura é que os idosos longevos
praticam pouco ou não praticam atividades
físicas5,11.
Sendo assim, surge à necessidade de
conhecer o nível de atividade física de idosos
longevos, a fim de identificar quais
estratégias podem ser adotadas para melhorar
a qualidade de vida dessa população.
Portanto, o presente estudo tem como
objetivo analisar o nível de atividade física
de idosos longevos residentes na Grande
Florianópolis/SC.
Métodos
Tipo de Estudo e Casuística
Este estudo transversal e descritivo12
foi
conduzido
nos
municípios
de
Florianópolis/SC e São José/SC cuja
população formada por idosos, de ambos os
sexos, com 80 anos de idade e mais (idosos
longevos), entre os anos de 2003 e 2005.
Para a formação da amostra foram
compilados os dados de três bancos de
pesquisas anteriores,13,14,15 adotando-se como
critérios de inclusão homens e mulheres com
idade igual ou superior a 80 anos.
Características como seleção da amostra,
estratificação e unidades de análise adotadas
em cada estudo, estão apresentadas no
Quadro 1.
Quadro 1: Seleção da amostra, estratificação e unidades de análise de cada pesquisa.
Pesquisador
Seleção da amostra
Estratificação
Unidades de análise
Distritos municipais e
grupos
de convivência
Mazo13 (2003)*
Probabilística
Apenas idade
existentes em Florianópolis,
SC (2002)
14
Benedetti
Setores censitários definidos
Probabilística
Sexo e idade
(2004)*
pelo IBGE (2004)
Proporcional:
Cardoso15
Probabilística
20% dos idosos
Grupos de convivência
(2005)
(60 anos ou mais)
* Foram realizados cálculos amostrais para composição da amostra.
IBGE: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
26
Mazo, G. Z. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 25-33, jul./dez. 2012
Após a formação do banco dos dados,
a amostra do presente estudo totalizou em
183 idosos longevos com média de idade de
84,32 ± 3,85 anos, sendo 116 mulheres e 67
homens.
Instrumentos e Coleta de Dados
Nos três estudos, foram aplicados
uma ficha diagnóstica semelhante, com
identificação de dados sociodemográficos
(sexo, escolaridade e estado civil) e
autorrelato do estado de saúde, e o
Questionário Internacional de Atividade
Física (IPAQ), versão 8, forma longa e
semana normal, adaptado para idosos,16 para
verificar o nível de atividade física. O IPAQ
permite estimar o dispêndio energético
semanal em atividades físicas relacionados
ao trabalho, transportes, tarefas domésticas e
lazer por 10 minutos contínuos, com
intensidade moderada ou vigorosa, durante
uma semana típica17. Ambos os instrumentos
foram aplicados em forma de entrevista.
Para a interpretação do nível de
atividade física por meio do IPAQ, utilizouse como critério os limiares recomendados
para que a atividade física resulte em
benefícios para a saúde. Os idosos tiveram
seus níveis de atividade física, total e nos
diferentes domínios do IPAQ (trabalho,
transporte, lazer e atividades domésticas,
sendo que o domínio tempo sentado não foi
utilizado) classificados em: inativos – zero
minuto por semana de atividade física;
insuficientemente ativos – realizavam de 1 a
149 minutos por semana; e ativos – valor
igual ou superior a 150 minutos por
semana17.
Os idosos participantes de grupos,
seja de exercícios físicos ou de convivência,
foram abordados no local onde ocorrem
essas atividades, enquanto os demais foram
entrevistados em suas residências. Em ambos
os casos, foram agendados a melhor data e
horário para aplicação dos instrumentos,
primeiramente a ficha diagnóstica e depois o
IPAQ.
Tratamento dos Dados
Os
dados
coletados
foram
armazenados em um banco de dados no
programa Microsoft Excel® e cada
participante foi cadastrado segundo um
número codificador. A análise estatística foi
realizada no pacote estatístico SPSS –
Statistical Package for Social Sciences
(versão 17.0).
Todas as variáveis foram analisadas
descritivamente por meio de frequência
simples, porcentagens (variáveis categóricas)
e medidas de posição e dispersão (variáveis
numéricas).
Para associação entre variáveis
categóricas, utilizou-se o teste de QuiQuadrado (χ2) ou Exato de Fisher, quando
necessário. A comparação entre dois grupos,
com variáveis numéricas, foi realizada
utilizando o teste de Mann-Whitney.
Adotou-se um nível de significância de 5%.
Aspectos Éticos
Para realização dessa pesquisa, foram
cumpridos os princípios éticos de acordo
com a resolução 196 do Conselho Nacional
de Saúde. A privacidade dos dados dos
indivíduos foi garantida tanto nos estudos
prévios como neste. O Comitê de Ética em
Pesquisas
em
Seres
Humanos
da
Universidade Federal de Santa Catarina
aprovou a pesquisa de Benedetti14 (protocolo
051/2001), enquanto que a pesquisa de
Mazo13 e Cardoso 15 obtiveram a aprovação
do Comitê de Ética em Pesquisas em Seres
Humanos da Universidade do Estado de
Santa Catarina (protocolo 95/2007 e
164/2005 respectivamente).
Resultados
Foram
avaliados
183
idosos
longevos, sendo 116 (63,4%) mulheres e 67
(36,6%) homens. A média de idade da
amostra foi 84,32 ± 3,85 anos, não havendo
diferença significante entre homens e
mulheres (84,21 ± 3,50 e 84,38 ± 4,05 anos,
respectivamente).
27
Mazo, G. Z. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 25-33, jul./dez. 2012
Os
dados
sociodemográficos
demonstram que os idosos eram, em sua
maioria, viúvos (61,2%) ou casados (36,6%).
Quanto ao nível de escolaridade, 53,8%
tinham apenas o ensino fundamental
incompleto e 15,2% eram analfabetos. A
Tabela 1 apresenta as associações entre o
sexo e as variáveis sociodemográficas.
Conforme o ajuste residual (¥), existe uma
tendência dos homens terem cursado o
ensino superior (18,2%) quando comparados
às mulheres (1,9%). Com relação ao estado
civil, ocorre uma tendência das mulheres
serem viúvas (82,8%).
Também se observa na Tabela 1 que
a maioria dos idosos longevos entrevistados
considera seu estado de saúde “bom”
(60,1%) ou “ruim” (26,2%). Apenas 10,4%,
auto avaliaram seu estado de saúde como
“ótimo”. Há uma tendência dos homens
apresentarem uma melhor auto percepção de
saúde (19,4%) quando comparados com as
mulheres (5,2%).
Tabela 1: Associação entre o sexo e dados sociodemográficos e autorrelato do estado de
saúde de idosos longevos (n= 183).
Mulheres
(n= 116)
f (%)
Homens
(n= 67)
f (%)
Total
(n= 183)
f (%)
X2
Estado civil
Casado
16 (13,8)
51 (76,1)
67 (36,6)
71,427
Viúvo
96 (82,8) ¥ 16 (23,9) 112 (61,2)
Nunca casou
4 (3,4)
0 (0,0)
4 (2,2)
Escolaridade
Analfabeto
19 (18,4)
5 (9,1)
24 (15,2)
Fund. incompleto
59 (57,3)
26 (47,3)
85 (53,8)
16,008
Fund. completo
13 (12,6)
6 (10,9)
19 (12,0)
Ensino médio
10 (9,7)
8 (14,5)
18 (11,4)
Superior
2 (1,9)
10 (18,2) ¥
12 (7,6)
Autorrelato do estado de
saúde
Ótima
6 (5,2)
13 (19,4) ¥ 19 (10,4)
Boa
72 (62,1)
38 (56,7) 110 (60,1)
9,660
Ruim
34 (29,3)
14 (20,9)
48 (26,2)
Péssima
4 (3,4)
2 (3,0)
6 (3,3)
2
Fund. = fundamental; χ = teste Qui-Quadrado; p= nível de significância.
¥
Ajuste Residual ≥ 2,0; * p ≤ 0,05
Os homens e as mulheres longevas do
presente estudo têm semelhante nível de
atividade física, de acordo com os dados
apresentados na Tabela 2, não havendo
associação entre nível de atividade física e
sexo.
O somatório dos domínios do IPAQ
demonstrou que os idosos longevos em sua
maioria foram considerados ativos (57,9%).
p
<0,001*
0,003*
0,022*
Acredita-se que esse padrão tenha ocorrido
devido o ponto de corte utilizado (150
minutos por semana).
No domínio do trabalho, que se
refere às atividades físicas realizadas durante
o trabalho, remunerado ou voluntário,
observa-se que a maioria dos idosos
longevos não trabalha (96,7%) e apenas 5
28
Mazo, G. Z. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 25-33, jul./dez. 2012
foram considerados mais ativos neste
domínio.
Com relação às atividades físicas
realizadas como meio de transporte, para
deslocarem-se de um local a outro, 39,3%
dos idosos são insuficientemente ativos
enquanto 23,5% são considerados ativos.
No
domínio
das
atividades
domésticas, 56,3% dos idosos longevos são
considerados inativos enquanto apenas
19,7% são ativos. Apesar de consistir um
campo feminino, a prevalência de
inatividade física foi maior entre as mulheres
(59,5%), mas sem diferença significativa.
Quanto ao domínio do lazer, que se
refere às atividades físicas de recreação,
esporte, exercício físico e lazer, nota-se que a
maioria dos participantes do estudo foram
classificados como inativos (61,7%). Essa
característica também ocorreu entre homens
(65,7%) e mulheres (59,5%). Salienta-se que
as mulheres apresentaram maior prevalência
na classificação ativa (25,0%).
Tabela 2: Associação entre sexo e nível de atividade física de idosos longevos (n= 183).
Mulheres
Homens
Total
(n= 116)
(n= 67)
(n= 183)
Nível de Atividade Física
X2
p
f (%)
f (%)
f (%)
No trabalho
Inativo
112 (96,6)
65 (97,0)
177 (96,7)
0,603
0,740
Insuf. Ativo
1 (0,9)
0 (0,0)
1 (0,5)
Ativo
3 (2,6)
2 (3,0)
5 (2,7)
No transporte
Inativo
43 (37,1)
25 (37,3)
68 (37,2)
0,015
0,992
Insuf. Ativo
46 (39,7)
26 (38,8)
72 (39,3)
Ativo
27 (23,3)
16 (23,9)
43 (23,5)
Nas atividades domésticas
Inativo
69 (59,5)
34 (50,7)
103 (56,3)
Insuf. Ativo
27 (23,3)
17 (25,4)
44 (24,0)
0,853
0,653
Ativo
20 (17,2)
16 (23,9)
36 (19,7)
No lazer
Inativo
69 (59,5)
44 (65,7)
113 (61,7)
0,853
0,653
Insuf. Ativo
18 (15,5)
10 (14,9)
18 (15,3)
Ativo
29 (25,0)
13 (19,4)
42 (23,0)
Total
Inativo
20 (17,2)
12 (17,9)
32 (17,5)
0,793
0,673
Insuf. Ativo
31 (26,7)
14 (20,9)
45 (24,6)
Ativo
65 (56,0)
41 (61,2)
106 (57,9)
2
Insuf.= Insuficientemente; χ = teste Qui-Quadrado; p= nível de significância.
Acrescenta-se também que não
houve associação significante entre os níveis
de atividade física e as características
sociodemográficas, sugerindo que na faixa
etária estudada, essas características não
influenciam o padrão de atividade física.
Além disso, observou-se uma tendência dos
idosos longevos inativos nas atividades
físicas desenvolvidas como meio de
transporte apresentarem autorrelato negativo
(péssimo) do seu estado de saúde (p= 0,022;
Ajuste Residual ≥ 2,0).
29
Mazo, G. Z. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 25-33, jul./dez. 2012
Discussão
Na associação entre o sexo e dados
sociodemográficos, observou-se que existe
uma tendência dos homens terem cursado o
ensino superior e das mulheres serem viúvas.
Na avaliação do nível de atividade
física total, observou-se que grande parte dos
idosos foram classificados como ativos
fisicamente (57,9%). Um estudo2 constatou
que 80% dos idosos longevos pesquisados
tinham hábitos saudáveis de vida. Entretanto,
24,6% eram insuficientemente ativos e
17,5% inativos. O aumento da inatividade
física é influenciada por muitos fatores,
sendo a idade um deles18. As perdas
biopsicossociais que o processo de
envelhecimento
ocasiona
nos
idosos
longevos contribuem para o aumento da
inatividade física10. Sendo assim a medida
que a idade aumenta, o indivíduo tende a
tornar-se menos ativo9,19.
Quanto ao nível de atividade física
realizado no domínio trabalho, os
participantes deste estudo classificaram-se
em sua grande maioria como inativos
(96,7%). O mercado de trabalho, realmente, é
o primeiro a excluir o velho por considerá-lo
defasado e com menor capacidade
produtiva20. Neste estudo, foi evidenciado
que essa realidade é mais exacerbada nos
idosos longevos estudados. Entretanto,
observa-se no estudo de Patrício e Moreira21
que pessoas com histórico de muito trabalho,
seja em casa ou na lavoura, resultaram em
idosos mais ativos no trabalho e com
tendência a ser mais longevos.
Os idosos longevos, no domínio
transporte,
foram
considerados
insuficientemente ativos (39,3%) e inativos
(37,2%). Isto também foi encontrado no
estudo de Cardoso, Mazo e Japiasú22, em que
identificaram alto índice de inatividade
(71,2%) no transporte entre idosos acima de
60 anos. Acrescenta-se ainda que, entre
idosos longevos, as dificuldades de
transporte tornam-se maiores, uma vez que
nessa faixa etária co-existem um série de
morbidades e incapacidades.
O presente estudo também evidenciou
que mais da metade dos idosos longevos são
inativos fisicamente (56,3%) no domínio
atividades domésticas. Cardoso, Mazo e
Japiasú22 encontram resultados conflitantes,
pois, ao avaliarem 198 idosos, a atividade
doméstica correspondeu a 40% do total de
atividades físicas praticadas. Os resultados
do presente estudo podem ser justificados
pela faixa etária analisada, uma vez que o
estudo mencionado anteriormente foi
conduzido com idosos acima de 60 anos.
Tanto homens quanto mulheres foram
considerados, na maioria dos casos, inativos
fisicamente (61,7%) no domínio lazer. Esse
resultado concorda com o estudo de Aartsen
et al.23 em que acompanharam, durante 6
anos, 2.076 indivíduos residentes em
Amsterdam, na Holanda, com idade entre 5585 anos e avaliaram a participação destes
indivíduos em atividades como serviços
religiosos,
associações
de
bairros,
organizações de ajuda, cursos educacionais,
esportes e atividades de lazer. Os autores
constataram que há uma significativa
diminuição da participação dos idosos nessas
atividades com o passar dos anos. Essa
observação pode justificar a alta frequência
de inatividade física entre idosos longevos.
Dados provenientes da Pesquisa Nacional de
Saúde dos Estados Unidos de 1992, com
idosos acima de 65 anos, indicaram que
apenas 37% dos homens e 24% das mulheres
entrevistadas praticavam atividades físicas no
tempo livre por três ou mais vezes por
semana e por mais de 30 minutos nas últimas
duas semanas24. Além disso, a sociedade
brasileira tem muitas barreiras que dificultam
a prática de atividades físicas pelos idosos,
bem como as condições de transporte que
também
podem
ser
um
obstáculo
importante25.
A diferença do nível de atividade
física segundo o sexo dos idosos longevos
também foi analisada. Mesmo na ausência de
diferença significante, constatou-se que os
30
Mazo, G. Z. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 25-33, jul./dez. 2012
homens (23,9%) foram mais ativos
fisicamente do que as mulheres (17,2%) nas
atividades domésticas. As mulheres realizam
mais afazeres domésticos e cuidados com a
família durante toda a vida, enquanto os
homens idosos, mesmo aposentados,
permanecem descompromissados com esses
afazeres26. Dessa forma, os resultados
encontrados no presente estudo vão de
encontro com a literatura específica. Nota-se
também diferença, na atividade física de
lazer em que as mulheres (25%) foram mais
ativas fisicamente que os homens (19,4%),
sem diferença significativa. Andreotti e
Okuma27 já observaram maior proporção de
mulheres idosas em programas de exercícios
físicos. Além disso, a presença de
incapacidades pode estimular a mulher
longeva a exercitar-se.
As características sociodemográficas
(idade, estado civil e escolaridade) parecem
não influenciar no nível de atividade física
em qualquer domínio entre a amostra do
presente estudo. Com relação ao nível de
atividade física no lazer, estudos apontam
outros fatores que influenciam a prática, tais
como, condições ambientais, condições
financeiras25, sexo10,19, condições de saúde19,
obesidade, tabagismo, estado civil10,28,
escolaridade10 e a idade18. Essas variáveis
podem influenciar também outros domínios
da atividade física.
A autopercepção de saúde é um fator
que também reflete baixo nível de atividade
física, uma vez que, ao relatar sua saúde
como ruim, o idoso também praticará menos
atividades físicas25. Conforme observado no
presente estudo, apenas o grupo de idosos
inativos no domínio do transporte associouse com o autorrelato negativo do estado de
saúde.
Considerações finais
O
domínio
mulheres
diferenças
nível de atividade física por
mostrou-se semelhante entre
e homens, indicando que as
comportamentais de sexo não
resultam em diferença no nível de atividade
física nessa faixa etária. Além disso, houve
maior prevalência de idosos longevos
inativos em todos os domínios, independente
do sexo.
O estudo também observou que as
características
sociodemográficas
não
associam-se ao padrão de atividade física de
idosos longevos. Portanto, sugere-se que
novas características, como condições
ambientais e financeiras, sejam analisadas a
fim de identificar quais influenciam na
ocorrência de inatividade física entre essa
população.
Diante dessas conclusões, nota-se a
necessidade de programas diferenciados para
ampliar o nível de atividade física de idosos
longevos. Independentemente do domínio, a
manutenção da atividade física é muito
importante para essa faixa etária, pois resulta
em uma série de benefícios físicos e sociais.
Portanto,
novas
estratégias
como
atendimentos personalizados ou domiciliares
podem ser adotados por profissionais da
saúde no intuito de aprimorar o nível de
atividade física de idosos longevos.
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O PROGRAMA DE AGENTES COMUNITÁRIOS DE SAÚDE SOB A ÓTICA DE
NORBERT ELIAS [The program of community health workers in the light of Norbert
Elias]
Liliana Muller Larocca¹; José Rabone Junior²; Daiane Siqueira Luccas³.
Resumo: Trata-se de estudo exploratório com abordagem qualitativa, e objetivo de analisar,
sob a ótica dos profissionais de saúde, as relações estabelecidas entre os Agentes
Comunitários de Saúde e usuários de uma Unidade Básica de Saúde, problematizando-as em
consonância com os conceitos da teoria do sociólogo Norbert Elias. Para tal foram realizadas
entrevistas semi-estruturadas, com posterior análise dos discursos. A pesquisa permitiu
reconhecer a necessidade de estudar os espaços do cuidar em Saúde Coletiva, com ênfase à
compreensão das redes de relações formadas entre os atores sociais e referendar o elo
sociológico do Agente Comunitário de Saúde, usuário e assistência prestada.
Palavras Chave: Programa Saúde da Família. Poder Social. Agentes Comunitários de Saúde.
Abstract: It is treated of exploratory study with quantitative approach. This study objectified
to analyze, in health professionals’ point of view, the relations established between
Community Health Workers and users in a covered area, problematizing them according to
Norbert Elias’s theory. Thus, interviews were carried out with further discourse analysis
complying with proper ethical principles. It was possible to evidence the sociological bond
among Community Health Agent, users and the delivered care. The research enabled to
recognize the need to study care settings in Public Health, emphasizing the understanding of
the social maze that human relations entail, approaching sociological, health backgrounds.
Keywords: Family Health Program. Power. Community Health Workers.
Introdução
integralidade da assistência aos seus
usuários, além da participação ativa da
sociedade no sistema. Nesse sentido,
objetivando modificar essencialmente a
atenção básica em saúde e a relação do SUS
com seus usuários, o governo instituiu em
1994 o Programa de Saúde da Família (PSF –
posteriormente designado estratégia - ESF)
com o objetivo de, por meio de ações
voltadas à promoção da saúde do indivíduo e
Com a constituição de 1988, por
meio do artigo 196, foi legalmente instituída
no Brasil a universalização do acesso aos
serviços de saúde. Dois anos depois, a Lei
8080 consolidou em nosso país a criação do
Sistema
Único
de
Saúde
(SUS)
estabelecendo entre suas diretrizes a
universalização, a descentralização e a
________________
¹ Enfermeira. Doutora em Enfermagem. Docente e Líder do Grupo de Pesquisas em Políticas,
Gestão e Práticas em Saúde da Universidade Federal do Paraná - GPPGPS / UFPR. E-mail:
[email protected]
² Discente do curso de graduação em Enfermagem da Universidade federal do Paraná UFPR. Bolsista de Iniciação Científica PIBIC/CNPq. Membro do Grupo de Pesquisas em
Políticas, Gestão e Práticas em Saúde da Universidade Federal do Paraná - GPPGPS. Email: [email protected]
³ Enfermeira. Mestranda do PPGENF - UFPR. Membro do Grupo de Pesquisas em Políticas,
Gestão e Práticas em Saúde da Universidade Federal do Paraná - GPPGPS. E-mail:
[email protected]
34
Larocca, L. M. et al
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 34-41, jul./dez. 2012
da família, estreitar relações entre sociedade
e serviço.(1)
Implementada
pela
Lei
10.507/2002(2), a profissão de Agente
Comunitário (ACS) foi encampada pelo
Ministério da Saúde em 1991, quando se
iniciou nacionalmente o Programa de
Agentes Comunitários de Saúde (PACS)
embasado no modelo idealizado em 1987 no
Ceará(3,4). O mesmo seria responsável pela
realização de atividades de prevenção de
doenças e promoção da saúde, utilizando-se
de ações individuais e coletivas, podendo
atuar nos domicílios e na comunidade. O
ACS deveria, portanto, transpor os limites
físicos da Unidade Básica de Saúde (UBS) e
ir ao encontro do usuário, visitando-o
periodicamente e tornando-se elo entre
serviço e população. Visando mudanças
paradigmáticas foram instituídos requisitos
mínimos para atuação do ACS: ter concluído
o ensino fundamental; residir na região em
que trabalha desde o lançamento do edital de
contratação e passar por um curso
preparatório(5).
A obrigatoriedade de residir na área
de atuação profissional pode ser considerada
um pioneirismo no processo de trabalho em
saúde, pois o papel a ser desenvolvido no
território deixa de ser apenas de morador,
tornando-se concomitantemente profissional
e elo de uma rede de setores. Esta
multiplicidade de papéis aproxima o ACS
dos usuários: “[...] relações de agente de
saúde e de vizinho, relações de quem orienta
quanto aos cuidados com a saúde, e de quem
frequenta os mesmos espaços sociais que os
usuários [...]”(6:124).
Assim sendo, compreende-se que a
convivência dos atores sociais num dado
território sanitário pressupõe relações
passíveis de estudos sociológicos. Para
concretização
deste
estudo
foram
consideradas as relações de figuração,
interdependência e equilíbrio de tensões
estabelecidas entre os atores sociais do SUS.
Tais conceitos estão descritos na obra Os
estabelecidos e os outsiders(7) de Norbert
Elias, inspiração teórica deste estudo.
O objetivo do estudo foi analisar,
sob a ótica dos profissionais de saúde, as
relações estabelecidas entre os Agentes
Comunitários de Saúde e usuários de um
dado território, problematizando-as em
consonância com os conceitos da teoria do
sociólogo Norbert Elias.
O estudo localizado em um pequeno
território pretende focar questões que
merecem ser investigadas e problematizadas
numa maior dimensão.
A aproximação teórica a esta obra
em particular se deve ao processo de
produção da mesma. Elias analisou, por meio
de uma pesquisa-ação, as relações que se
estabeleceram entre moradores de uma dada
localidade inglesa, com poucas distinções de
classe social. Compreende-se neste estudo
que as conclusões de Elias são aplicáveis às
relações que se dão entre os atores sociais da
Estratégia de Saúde da Família (ESF), pois
os sujeitos pesquisados desempenham
concomitantemente, relações de cuidadores,
receptores de cuidado, vizinhos e cidadãos(8).
Além disto, a obra de Elias
problematiza as relações de poder
visualizando-as sob a forma de elementos
como a fofoca, que pode aparecer ligada à
especificidade da fusão entre o âmbito
profissional e o pessoal da relação entre ACS
e usuários. Elias compreende que as relações
que pressupõem a interatividade complexa
entre pessoas são essencialmente relações de
poder, expressando-se na compreensão de si,
dos outros, no conhecimento e nos costumes,
permitindo ver indivíduo e grupos como
sujeitos da construção do ambiente no qual
suas vidas transcorrem(9).
A dinâmica entre as sociedades e os
indivíduos, reconhecida como figuração, é
relacional, repleta de contradições e tensões
que implicam lugar e posição social como:
propriedade, trabalho, classe, etnia, gênero e
geração(7,10,11).
As
formas
de
dependência
recíproca, interdependência, são formações
35
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sociais de dimensões variáveis (território,
escola, unidade de saúde, cidade, nação, etc.)
às quais os seres humanos estão
ligados(7,10,11). Neste estudo compreendeu-se
o serviço local de saúde como locus de
formação social, onde são percebidas redes
de interdependência, geradoras da produção
histórica das sociedades(7).
O último conceito refere-se às
tensões existentes no cotidiano dos
indivíduos que acabam por provocar
mudanças no equilíbrio de forças (equilíbrio
de tensões), com consequente alteração
estrutural das sociedades(7,10,11).
Metodologia
Inspirado
no
pensamento
sociológico é um estudo de caráter
exploratório com abordagem qualitativa,
realizado numa Unidade Básica de Saúde,
moldada na Estratégia de Saúde da Família,
localizada num município da região
metropolitana de Curitiba-Paraná. Os atores
sociais da pesquisa foram compostos por
todos
os
membros
da
equipe
multiprofissional da UBS de nível superior e
médio, totalizando sete participantes (a visão
dos ACS encontra-se publicada em outro
estudo)(3).
Os
sujeitos
envolvidos
(02
enfermeiros, 01 técnico de enfermagem, 02
médicos e 02 cirurgiões dentistas)
representam o pressuposto de que estes
profissionais vivenciariam a dinâmica das
relações entre os ACS e os usuários, em
outra perspectiva de análise: visão ampliada
das relações territoriais. Foram realizadas
entrevistas semi-estruturadas com as
seguintes temáticas: Conhecimento acerca
dos principais objetivos do Programa de
Saúde da Família (PSF); Dificuldades para
implantação de um modelo de cuidado
voltado à vida e promoção da saúde;
Conquistas e desafios do PSF; Requisitos
para formação e contratação do ACS;
Atribuições e funções do ACS; Visita
domiciliária
realizada
pelo
ACS;
Contradições entre formação e atuação dos
ACS; Peculiaridades sobre o fato do ACS
residir e trabalhar no mesmo território.
Os discursos
obtidos
foram
organizados, problematizados e analisados,
sendo os conceitos de Elias utilizados como
categorias de análise. As categorias de
análise: figuração, interdependência e
equilíbrio de tensões dão voz às relações de
poder entre os atores sociais do território
investigado. Deste modo, esses discursos
permitiram uma aproximação ao objeto de
nosso estudo: as relações de poder entre o
ACS e os usuários de uma UBS; observadas
pela lente da visão dos demais profissionais
de saúde.
O estudo foi aprovado pelo Comitê
de Ética em Pesquisa (CEP) do Setor de
Ciências da Saúde da UFPR por meio do
parecer n. 416.096.07.09. Foram respeitadas
as exigências do CEP e da resolução 196/96
do CNS. Todos os entrevistados optaram por
participar
da
pesquisa
livre
e
esclarecidamente e suas identidades foram
preservadas substituindo-se randomicamente
seus nomes por letras e números (E1...E7).
Resultados e discussão
Os resultados serão apresentados em
quadros, nos quais o referencial teórico foi
categorizado;
ressalta-se
que
alguns
discursos contemplavam mais de uma
categoria, mas os pesquisadores optaram,
para efeitos analíticos, considerar apenas
uma categoria teórica por discurso analisado.
Em se tratando de figuração, o primeiro
ponto a emergir nas entrevistas foi a fofoca,
trata-se de um importante ponto de
consonância com a obra de Elias(7), que a
classificou como importante agente de
figuração, já que esta submete o indivíduo ao
julgamento coletivo. A fofoca foi encontrada
em cinco discursos durante as entrevistas,
sendo aqui ilustrada pelo E7:
Comentar com os vizinhos, às vezes
a pessoa [...] se abre com outro, aí
a gente vai cobrar – olha, da sua
36
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área e você não está sabendo – e
ele diz – mas é que a pessoa não
quis conversar comigo(E7).
Percebe-se que o profissional
reconhece o fenômeno da fofoca como
reflexo das relações entre o ACS e o usuário,
percebe-se, também, certa familiaridade com
o fato, tratado com naturalidade e bom
humor, o que pode significar que o
entrevistado convive com ele no processo de
trabalho em saúde.
No mesmo sentido, E6 contextualiza
e correlaciona com a proximidade
geográfica:
DISCURSO
Entrevistado parafraseando usuário: “ – eu
tenho receio porque aquela senhora [ACS]
mora no bairro e eu estou com uma doença e
tenho receio de abrir a porta pra ela, porque
ela vai saber deste problema e logo o bairro
todo vai saber – já tive algumas situações em
que o usuário pediu pra que determinado
ACS não o visitasse (E3)”
“digamos que você é um ACS, como fulano
te conhece ele fala – arranja uma vaga pra
mim – você arranja, outro fica sabendo, isso
acaba gerando um conflito, as pessoas dizem
– fulano conseguiu por que eu não posso?
(E4)”
“não tem como atender todos os pacientes
do mundo não é? (E2)”
“quando começou o PSF algumas regiões
tinham fofoca, aquela comadre2 gerava uma
situação, algumas pessoas da área não
queriam se abrir com a gente porque tinham
receio (E3)”
“tem muita gente que se aproveita da
amizade com o ACS pra conseguir outras
coisas (E2)”
QUADRO 1 – FIGURAÇÃO NA ESF
2
“como ele [o agente] mora na
região ele tem um acesso mais fácil
à população, mas o que pode
acontecer é que a pessoa, por já
conhecer [o agente] tenha vergonha
de falar sobre certas coisas(E6).
É
possível
reconhecer
a
aplicabilidade, nas relações sociais da ESF,
dos conceitos de relação de poder entre
indivíduos da mesma classe social analisados
por Elias. Vê-se, ainda, que o profissional
entrevistado reconhece que a imposição legal
de o ACS residir no local onde trabalha
impacta no exercício da profissão.
ANÁLISE
Receio do usuário em relação ao julgamento
da sociedade. Para sentir-se confortável em
comentar sua vida privada com o ACS, o
usuário necessita confiar neste
Fenômeno da reação negativa da sociedade,
que ocorre quando um usuário se beneficia
do seu nível de intimidade com o ACS.
Resignação frente ao fato da ESF não atingir
todos os espaços de seu Município.
Fenômeno da fofoca como determinador da
efetividade do atendimento em saúde.
Uso da interface público-privado do ACS
para obtenção de vantagens.
Regionalismo, pessoa que faz fofoca.
37
Larocca, L. M. et al
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O conceito de interdependência, foi
percebido no cotidiano do cenário
pesquisado, como explica E3:
ele [ACS] é um elo entre a gente e a
população, [...] vai às em casas,
observa e traz pra que a gente faça
o diagnóstico da situação (E3).
Nota-se também, uma valorização da
interdependência, vista como positiva e
estimulada pelo entrevistado:
eu até costumo instruir para que
eles se ofereçam pra entrar mesmo,
essa é a oportunidade que você tem
de captar mais coisas, [...] tanto que
algumas delas [as agentes] falam
assim – eu cheguei ao portão e ela
[a usuária] não falou. Aí eu entrei
na casa e ela começou a chorar
(E3).
Outro ponto que emergiu nos
discursos foi a correlação entre a
interdependência e a proximidade geográfica
entre ACS e usuários. Esta proximidade
possibilita ao ACS conhecer mais
profundamente o território no qual atua
(afinal também vivencia suas contradições,
problemas e alegrias), conhecendo a
estrutura, as carências e as características
específicas deste território, como explica E5:
DISCURSO
eles têm maior noção [dos
problemas da área], eles sabem
quais são os agravos que afetam a
comunidade (E5).
Observou-se, ainda, a dificuldade do
ACS em ter seu horário de trabalho bem
definido, E7 aponta que:
[...]o pessoal não respeita o horário
de trabalho, o agente comunitário
acaba sendo agente comunitário de
segunda a segunda, vinte e quatro
horas por dia, os agentes vão ao
mercado e eles [os usuários]
reclamam,
querem
marcar
consultas, os agentes quase não têm
sossego (E7).
Esta situação, relacionada ao
fenômeno da interdependência existente,
destaca que usuários têm no ACS a
representação de um membro da UBS,
extrapolando muros e limites físicos,
acabando por abordá-lo em tempo integral.
Tal representação pode, em alguns casos, ser
vista negativamente, como explica E1:
Os ACS reclamam bastante disso,
no final de semana estão no
mercado e as pessoas vêm pedir
exame pra eles (E1).
ANÁLISE
“era bem mais difícil no começo todo Dificuldades encontradas na implementação da
mundo [profissionais de saúde] ESF são enfrentadas, em parte, devido ao
aceitar, hoje já tem outra visão, o estabelecimento da interdependência.
pessoal sabe que o PSF dá certo
(E1)”
“a pessoa fala – tenho muita
dificuldade porque neste bairro não
tem nada, não tem um centro de
referência [...] e o ACS mora na
região, ele sabe que lá tem aquele
local [centro de referência], que a
pessoa poderia ir, se não está não é
porque não tem (E3)
Ilustra-se neste discurso um dos pontos positivos
da imposição legal de residir onde se trabalha. O
ACS, ao conhecer o território em que atua, pode
ter facilidade em indicar aos usuários locais ou
atividades como centros de convivência ou grupos
de atividades físicas, por exemplo. Esta
proximidade geográfica, aliada à interdependência,
ajuda o ACS a compreender a determinação social
do processo saúde-doença.
QUADRO 2 – INTERDEPENDÊNCIA NA ESF
38
Larocca, L. M. et al
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 34-41, jul./dez. 2012
Na última categoria analisada,
equilíbrio de tensões, observou-se discursos
nos quais foram explicitadas situações
geradoras de tensão (Quadro 3). Nota-se aqui
uma presença marcante nas falas dos
entrevistados da questão da confiança e
credibilidade da ESF como estratégia
resolutiva:
[...] a população não é educada pra
ser tratada só no primário, eles já
vêm pra cá [UBS] achando que têm
que ir para o terciário, aí você diz –
não, o médico da família vai te
atender – e eles dizem – não, tem
que ser o especialista (E1).
E5 corrobora:
as pessoas acreditam que você só
consegue fazer um diagnóstico com
um exame de alta complexidade,
que as coisas simples não são boas
(E5)
e E7 complementa:
eles vêm aqui atrás de um
especialista, eles querem um
pediatra, um cardiologista,não
querem um médico que olhe eles no
geral, a família toda, eles não
querem um clínico geral, [...] está
na cabeça das pessoas, eles vêm
atrás de cura, não vêm pra prevenir
uma doença ou pra ter uma
educação em saúde (E7).
Neste ponto, percebe-se que,
segundo os sujeitos da pesquisa, os usuários
não estão confortáveis, e em alguns casos
não confiando no modelo de atendimento da
ESF. Este fenômeno gera tensão entre
profissionais da UBS, pois, segundo estes, o
que é oferecido pela unidade é
subaproveitado e a população procura na
unidade soluções intersetoriais e que
compreendem outras dimensões relacionais.
Esta situação pode estar ligada à visão dos
usuários, voltada ao modelo assistencialista,
com ênfase na doença, mas também pode
refletir uma necessidade de reestruturação
político-gerencial da ESF.
Alguns estudos corroboram a
insatisfação dos membros da comunidade
com relação ao trabalho dos ACS sinalizando
uma necessária reorganização das relações de
poder(12).
Em se tratando dos próprios
profissionais, a tensão é abordada
por E3, que conta um episódio
ocorrido num contato com um
profissional de outro setor de
atendimento: [...] ele me puxou,
sentamos e ele começou a falar mal
do PSF: que o PSF é um dinheiro
jogado fora, que os médicos da
família não fazem nada, estão
sempre referenciando, mas o papel
daquele profissional [o médico da
família] é referenciar, só que para o
especialista
ele
não
tem
resolubilidade (E3).
Neste discurso foi possível notar que
alguns profissionais de saúde acreditam que a
ESF – moldada num enfoque preventivista e
de promoção à saúde - é pouco efetiva no
controle dos agravos. E1 ilustra, ainda, que
na própria UBS por vezes:
profissionais [de saúde] orientam o
paciente a procurar outro lugar ou
ir ao especialista (E1),
Estes discursos explicitam episódios
geradores de tensão entre a equipe de saúde e
usuários do sistema: são considerados neste
estudo como agentes de mutação da
sociedade(6). É importante destacar que as
tensões não são, portanto, necessariamente
ruins; frequentemente são os gatilhos
necessários para mudanças paradigmáticas.
39
Larocca, L. M. et al
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 34-41, jul./dez. 2012
DISCURSO
“por exemplo: é amigo do ACS, às vezes o
agente diz que não precisa vir fazer
consulta, que é só pedir o exame, acaba
tirando um pouco do enfoque, a gente
acaba solicitando mais exames do que
necessário [...] acho que a proximidade das
pessoas atrapalha um pouco (E5)”
“eles [ACS] sabem muito bem sua função e
às vezes eles têm que fazer outros trabalhos
(E3)”
ANÁLISE
O ACS - elo entre a UBS e os usuários pode assumir funções que não são dele a fim
de atender às demandas dos usuários,
causando desconforto à equipe.
A necessidade em desempenhar funções
administrativas na UBS desagrada o ACS, os
demais profissionais e, possivelmente, a
população.
“você tem que ter jogo de cintura aqui com A tensão aqui explicitada vai de encontro a
o povo, porque você não pode acostumar um importante princípio do SUS. Os
mal, às vezes você dá a mão e a pessoa já profissionais, não estão acostumados com a
quer o braço (E4)”
participação popular na UBS e sentem-se
desconfortáveis.
QUADRO 3 – EQUILÍBRIO DE TENSÕES NA ESF
Considerações finais
Ao
produzir
estudos
sobre
sociedades, indivíduos e relações de poder,
Norbert Elias permitiu dar voz ao ser
humano das pequenas comunidades. Para
nós, este autor propiciou um olhar
diferenciado à ESF: suas contradições,
tensões e possibilidades.
As
relações
pessoais
são
especialmente importantes no processo de
trabalho em saúde, no qual a proximidade
entre profissional e usuário é intimamente
ligada a vários fatores com influência na
qualidade e efetividade do atendimento.
Nesse sentido, referenda-se a continuidade
de estudos, nos espaços do cuidar em Saúde
Coletiva, voltados à compreensão da
complexa trama tecida pelas relações
humanas,
aproximando
referenciais
sociológicos ao mundo da saúde.
Durante a realização da pesquisa,
foi possível presenciar fenômenos que
indicam a necessidade de ações no sentido de
estabelecer diálogos entre profissionais e
usuários envolvidos no processo de cuidar de
um dado território. Um dos pontos relevantes
do estudo corrobora a necessidade de
formação para compreender, estimular e
concretizar a participação popular como um
dos princípios do SUS.
Destarte, é imprescindível à equipe
multidisciplinar de saúde conhecer a
estrutura social em que está inserida e
considera-se, afinal, que os elementos
expostos indicam a necessidade de políticas
públicas voltadas à valorização da vida.
Referências
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saúde da família - PSF. Brasília, DF;
2001.
2.
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4. Tomaz JBC. O agente comunitário de
saúde não deve ser um "super-herói".
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40
Larocca, L. M. et al
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 34-41, jul./dez. 2012
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1999 [acesso em 01 jul 2008]. Disponível
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em:URL:
http://periodicos.uem.br/ojs/index.php/Ci
encCuidSaude/article/view/11234/6071.
41
Urnau, D. L. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 42-49, jul./dez. 2012
EFICÁCIA DE UM PROGRAMA DE CAPACITAÇÃO PRESENCIAL EM SAÚDE
AUDITIVA PARA AGENTES COMUNITÁRIOS DE SAÚDE [Efficacy of a training
program in hearing health for Community Health Workers]
Daniele Laí Urnau1; Débora Frizzo Pagnossin2; Indiara de Mesquita Fialho3.
Resumo: O objetivo do estudo foi avaliar a eficácia de um programa de capacitação em saúde
auditiva para agentes comunitários de saúde (ACS). Participaram do estudo 50 ACS, sendo a
capacitação foi do tipo presencial, sendo o aproveitamento avaliado comparando-se o
desempenho dos ACS em um questionário pré e pós-capacitação. Observou-se que antes da
capacitação os ACS já apresentavam conhecimento suficiente na maioria das categorias de
conhecimento investigadas, o que foi ampliado após a capacitação. Concluiu-se que este
programa de capacitação foi eficaz, com acréscimo nos conhecimentos sobre saúde auditiva.
Descritores: capacitação, saúde da família, audição.
Abstract: This study aimed to evaluate the efficacy of a training program in hearing health
for Community Health Workers (CHW). 50 CHW were enrolled after signing the Free and
Clarified Consent Term. Their knowledge improvement after the classroom training program
was evaluated by comparing the answers for questionnaires applied before and after the
training program. It was observed that before the training program the HCW already showed
adequate knowledge in most categories of knowledge investigated, which was expanded after
the training program. It was concluded that this training program was efficient on developing
CHW knowledge on hearing health.
Key words: training, Community Health Workers (CHW), hearing helth.
Introdução
enfermeiro, um auxiliar de enfermagem e
seis agentes comunitários de saúde (ACS) e,
quando ampliada, conta com um dentista, um
auxiliar de consultório dentário e um técnico
em higiene dental.
Os
ACS
conseguem
uma
comunicação e aproximação junto à
população, de forma a promover ações que
visam a promoção da saúde, e a integração da
comunidade com a equipe de saúde da
família3
A Saúde da Família é uma estratégia
para reorientar o modelo assistencial, de
forma a implantar equipes multiprofissionais
em unidades básicas de saúde. Estas equipes
acompanham um número determinado de
famílias correspondentes às regiões que
atendem, tendo por função ações que visam à
promoção da saúde, prevenção e recuperação
de doenças e reabilitação de doentes2.
As equipes de saúde da família são
compostas por um médico generalista, um
______________________
1
Discente do 10º período do Curso de Fonoaudiologia da Universidade do Vale do Itajaí
(UNIVALI/SC); Bolsista de Iniciação Científica, Artigo 170 do Governo de Santa Catarina,
UNIVALI/SC.
2
Fonoaudióloga. Mestre em Distúrbios da Comunicação Humana, docente do Curso de
Graduação em Fonoaudiologia da UNIVALI/SC. e-mail para correspondência:
[email protected].
3
Fonoaudióloga, Mestre em Saúde Pública, docente do Curso de Graduação em
Fonoaudiologia da UNIVALI/SC.
42
Urnau, D. L. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 42-49, jul./dez. 2012
A Política Nacional de Saúde da
Pessoa Portadora de Deficiência4 define que
o portador de deficiência apresenta, em
caráter permanente, perdas ou anormalidades
psicológicas, fisiológicas ou anatômicas, que
o tornam incapaz de desempenhar as
atividades dentro de um padrão considerado
normal para o ser humano.
Dentre os diversos tipos de
deficiências, a deficiência auditiva (DA) tem
sido tema de vários estudos, e, por atingir um
considerável número de pessoas, o Ministério
da Saúde, em 2004, publicou a Portaria nº
2.073, que destaca como ações da atenção
básica, o desenvolvimento de programas que
promovam a saúde auditiva, trabalhando com
informações, educação e orientação familiar5.
Já, nacionalmente são realizadas várias
campanhas que destacam a saúde auditiva e
visam a promoção da mesma6.
Uma vez que os ACS são
considerados o elo entre o sistema de saúde e
seus usuários, é necessário que os mesmos
conheçam o serviço de saúde auditiva, bem
como o que é a saúde auditiva, a fim de
realizar uma aproximação junto à
comunidade.
Os programas de capacitação de ACS
em saúde auditiva têm sido promissores,
sendo uma ótima opção, uma vez que os
ACS atuam em equipes de saúde da família
em todo território brasileiro e podem auxiliar
em atividades de prevenção e promoção de
saúde, contribuindo para que o diagnóstico e
a intervenção da deficiência auditiva ocorram
de forma adequada para todos os usuários do
SUS1.
Anteriormente a esta pesquisa, foi
realizado um estudo no mesmo município em
que o presente estudo foi realizado, o qual
objetivou determinar qual o conhecimento
dos ACS sobre saúde auditiva7. No estudo7, a
autora sugeriu a realização de um programa
de capacitação sobre saúde auditiva, devido
ao limitado conhecimento dos ACs sobre a
saúde auditiva.
A Organização Mundial de Saúde
(OMS)8, desde 1998 recomendou, em nível
de atenção primária, a capacitação de ACS
na área de audição e afecções do ouvido.
Acredita-se que esta capacitação auxiliaria no
processo de detecção precoce da deficiência
auditiva, com o devido encaminhamento dos
ACS daquelas pessoas com queixa auditiva
para atendimento nos diferentes níveis de
atenção à saúde, conforme a necessidade de
cada caso. Em contrapartida, após o
atendimento em níveis de atenção à saúde
auditiva de maior complexidade, se
confirmada a deficiência auditiva e indicado
o uso de uso de aparelho de amplificação
sonora individual (AASI), o usuário retorna à
sua unidade de saúde de referência e precisa
do apoio e auxílio da equipe de saúde para
dar continuidade ao seu processo de
reabilitação auditiva, de forma que o ACS
pode ser um agente facilitador para a
adaptação do AASI pelo deficiente auditivo.
A capacitação dos ACS, além de
promover a prevenção da perda auditiva,
contribui como suporte às famílias para
adesão ao processo de diagnóstico
audiológico e de (re) habilitação. Para isto, é
fundamental que a capacitação dos ACS seja
ampla, abordando temas como os aspectos
gerais da audição e da deficiência auditiva;
tipos, causas e prevenção da perda auditiva,
além de formas de identificação e
diagnóstico da mesma1.
Assim, o objetivo geral desde estudo
foi avaliar a eficácia de um programa de
capacitação presencial para ACS, na área de
saúde auditiva.
Métodos
Este estudo foi do tipo observacional,
aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa
da Universidade do Vale do Itajaí
(UNIVALI), sob parecer nº 0048.0.223.00011 de 23 de março de 2011.
Participaram do estudo 50 ACS de
um município do estado de Santa Catarina,
indicados pela Secretaria Municipal de
Saúde, sendo divididos em dois grupos de 25
agentes. Antes de iniciar as atividades da
capacitação, os ACS receberam explicação
43
Urnau, D. L. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 42-49, jul./dez. 2012
detalhada da pesquisa e assinaram o termo de
consentimento livre e esclarecido. Neste
termo estavam descritos os aspectos do sigilo
e anonimato dos sujeitos participantes, sendo
os resultados apresentados para o grupo
estudado, sem identificação de nenhum
membro do mesmo.
A
capacitação
foi
realizada
empregando-se como metodologia de ensino
aula expositiva e dialogada e atividades
práticas, com o conteúdo teórico baseando na
apostila elaborada a partir do material da
OMS adaptado e validado para o português1.
A capacitação teve duração de 12
horas, divididas em três encontros de quatro
horas/aula, em três dias consecutivos para
cada grupo de 25 agentes. Destaca-se que os
ACS foram divididos em dois grupos, pois a
capacitação contava com uma parte prática,
realizada no Serviço de Atenção à Saúde
Auditiva (SASA), na qual o grupo de ACS
precisava ser pequeno, para não interferir nas
atividades deste Serviço.
Os temas abordados na aula
expositiva foram: (a) audição e deficiência
auditiva; (b) tipos, prevenção e causas da
deficiência auditiva; (c) técnicas de
identificação e diagnóstico da deficiência
auditiva; (d) aspectos gerais da deficiência
auditiva; (e) aparelhos de amplificação
sonora individual (AASI): cuidados,
manuseio e orientações para o uso.
As
atividades
práticas
foram
realizadas nas dependências do Serviço de
Atenção à Saúde Auditiva no qual os
pesquisadores realizam suas atividades
profissionais, constando de visita ao Serviço
e participação em um grupo de
acompanhamento de usuários de Aparelhos
de Amplificação Sonora Individual (AASI).
Para avaliar o conhecimento sobre
saúde auditiva, apresentado pelos ACS antes
e após a capacitação, foi aplicado um
questionário com 20 perguntas sobre os
assuntos abordados no decorrer do curso. A
aplicação do questionário pré-capacitação
ocorreu no início do primeiro dia de
atividades e a aplicação do questionário póscapacitação ocorreu ao final do terceiro dia
de atividades.
A
metodologia
aplicada
na
capacitação foi avaliada com base em um
questionário com perguntas fechadas, no qual
os sujeitos registravam se os objetivos foram
ou não atingidos em relação à:
esclarecimento de dúvidas, tempo de
capacitação, atividades teóricas, práticas e
recursos audiovisuais. Este questionário foi
aplicado após a capacitação. Além disso,
foram considerados os relatos dos ACS
durante os encontros presenciais da
capacitação. Estes relatos foram retirados do
diário de pesquisa das autoras, que, após cada
encontro com os ACS, registravam
comentários dos mesmos e impressões das
atividades do dia.
Para análise dos dados, foi aplicada
uma escala arbitrária de valores arbitrários a
fim de qualificar a adequação das respostas
apresentadas pelos ACS nos questionários
pré e pós-capacitação. As questões foram
ordenadas por categorias de conhecimento
investigado e foi usado como escala
arbitrária os seguintes valores: conhecimento
excelente, quando 45 ou mais ACS
apresentavam conhecimento correto sobre o
item investigado; conhecimento suficiente
quando entre 25 e 44 ACS apresentavam
conhecimento correto sobre o item
investigado e, conhecimento insuficiente
quando menos de 25 ACS apresentaram
conhecimento correto sobre o item
investigado, conforme quadro abaixo:
44
Urnau, D. L. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 42-49, jul./dez. 2012
Quadro 1 – Escala arbitrária de valores para qualificação dos conhecimentos dos ACS sobre
saúde auditiva
Nº de ACS que deveriam responder
Escala de conhecimento
corretamente a questão
Conhecimento excelente
45 ou mais ACS
Conhecimento suficiente
Entre 25 e 44 ACS
Conhecimento insuficiente
Menos de 25 ACS
A análise estatística dos dados
relativos à avaliação da metodologia
empregada foi do tipo descritiva, com
distribuição de frequência absoluta.
Resultados
Os ACS que participaram da presente
pesquisa têm, na sua maioria, mais de cinco
anos de atuação como ACS, realizaram curso
de preparação para ACS e têm escolaridade
caracterizada pela conclusão do ensino
médio. Os ACS distribuem-se tanto em
unidades básicas de saúde da zona urbana
quanto da zona rural de um município do
estado de Santa Catarina, nas quais já houve
atuação fonoaudiológica por meio de estágios
supervisionados.
O conhecimento dos ACS sobre
saúde auditiva pré e pós-capacitação
presencial é apresentado no quadro 1.
Quadro 2 – Conhecimento dos ACS sobre saúde auditiva nas condições pré e póscapacitação.
Conhecimento investigado
Anatomia e fisiologia da audição
Tipos de deficiência auditiva
Órgão da audição
Acústica
Prevenção
Vacinação
Triagem auditiva
Uso de questionários
Orientações
Desenvolvimento normal da audição
Padrões de linguagem no primeiro ano de vida
Deficiência auditiva e suas consequências
Desenvolvimento da linguagem alterado
Conceito de deficiência auditiva
Dificuldade de audição
Aprendizagem
Tratamento
AASI concedido pelo SUS
Molde auricular
Implante coclear
Função do AASI
Pré capacitação
Pós capacitação
Insuficiente
Insuficiente
Suficiente
Suficiente
Suficiente
Suficiente
Insuficiente
Suficiente
Suficiente
Excelente
Suficiente
Insuficiente
Suficiente
Suficiente
Suficiente
Suficiente
Suficiente
Suficiente
Suficiente
Excelente
Suficiente
Suficiente
Insuficiente
Excelente
Suficiente
Insuficiente
Insuficiente
Suficiente
Suficiente
Suficiente
Suficiente
Suficiente
45
Urnau, D. L. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 42-49, jul./dez. 2012
Causa da Deficiência Auditiva
Otites
Exposição a ruídos
Drogas ototóxicas
Hereditariedade
Suficiente
Excelente
Insuficiente
Suficiente
Suficiente
Suficiente
Suficiente
Suficiente
A avaliação dos ACS sobre a metodologia aplicada na capacitação é apresentado no quadro 2.
Quadro 2 - Avaliação dos ACS sobre a metodologia aplicada na capacitação presencial sobre
saúde auditiva, em valores absolutos.
Item avaliado
Informações de fácil compreensão
Esclarecimento de dúvidas
Tempo de capacitação adequado
Informações fornecidas de aplicabilidade na prática diária dos ACS
Atividades teóricas satisfatórias para a aprendizagem
Atividades práticas satisfatórias para a aprendizagem
Recursos audiovisuais adequados
Em relação à avaliação da
metodologia utilizada, também foram
considerados recortes das falas dos ACS
durante os encontros presenciais do programa
de capacitação. Estes recortes mostram
indicadores da avaliação dos ACS quanto ao
programa,
sendo
representadas
por
expressões como: “isto sim é uma
capacitação”; “assim a gente realmente
aprende”; “a Secretaria (Municipal de
Saúde) deveria ofertar mais cursos assim”;
“nos outros cursos que a gente vai, ouve a
pessoa falando, falando e não grava nada,
neste não”; “as atividades práticas nos
ajudam a entender melhor o que vocês estão
falando”.
Discussão
Considerando que a atuação dos ACS
em equipes de saúde da família em todo
território brasileiro pode auxiliar em
atividades de prevenção e promoção da
saúde, incluindo as questões ligadas à
audição, espera-se que os ACS tenham um
Conceito atribuído
Atingiu Não atingiu
41
9
34
16
38
12
44
6
42
8
44
6
42
8
conhecimento sobre saúde auditiva que os
torne aptos para orientar e auxiliar o
deficiente auditivo nas mais diversas
questões ligadas à saúde.
Assim, observa-se, no quadro 1, que,
mesmo antes da capacitação (précapacitação), os ACS que participaram do
programa aqui proposto apresentavam
conhecimento suficiente na maioria das
categorias de conhecimento investigadas. Um
fator que pode ter contribuído para este
conhecimento é que os ACS participantes do
programa de capacitação exercem suas
atividades em unidades básicas de saúde nas
quais já houve a atuação da fonoaudiologia,
de forma que todos os ACS já haviam tido
contato
com
questões
ligadas
à
Fonoaudiologia previamente à capacitação.
As categorias com conhecimento
insuficiente por parte dos ACS antes da
capacitação foram anatomia e fisiologia da
audição e tratamento da deficiência auditiva.
Após a capacitação, observa-se que
em todas as categorias analisadas
predominou o conhecimento considerado
46
Urnau, D. L. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 42-49, jul./dez. 2012
suficiente por parte dos ACS. Apenas dois
itens chamam a atenção com conhecimento
considerado insuficiente pelos ACS: triagem
auditiva e dificuldade de audição.
No caso destes dois itens (triagem
auditiva e dificuldade de audição), acreditase que o conhecimento insuficiente após a
capacitação se dê em função da forma como
estes foram abordados durante a capacitação.
A triagem auditiva foi muito explorada como
primeira forma de detecção de uma possível
perda auditiva, o que pode ter gerado
confusões aos ACS sobre as diferenças entre
triagem e avaliação da audição. Já, o item
dificuldade de audição está relacionado aos
diferentes graus de deficiência auditiva.
Aqui, as pesquisadoras se questionam se o
material utilizado na capacitação1 é adequado
para os ACS, pois os conceitos apresentados
são muito detalhados e específicos da
formação médica e fonoaudiológica.
Ainda, é necessário considerar que o
questionário pré-capacitação foi aplicado no
início do primeiro encontro do programa,
momento em que se esperava que os ACS
estivessem motivados e interessados sobre o
que iria acontecer, respondendo atentamente
ao questionário. Já, o questionário póscapacitação foi respondido no final do
terceiro dia do programa, sendo que
conforme os ACS respondiam, poderiam
sair. Assim, a atenção despendida pelos ACS
ao responder o questionário pós-capacitação
pode ter sido comprometida em função do
cansaço (final do terceiro dia de capacitação)
e do desejo de finalizar as atividades o mais
breve possível.
No que se refere à avaliação da
metodologia aplicada na capacitação
presencial de ACS em saúde auditiva, a
maioria dos ACS considerou todos os
aspectos como adequados para a capacitação.
Já, analisando os recortes das falas dos ACS
ao longo do programa de capacitação,
observa-se uma avaliação positiva quanto à
metodologia utilizada e a importância
atribuída pelos ACS quanto às atividades
práticas.
Estudos
realizados
sobre
a
capacitação de ACS em saúde9 citam que o
treinamento deve munir os ACS de
conhecimentos diversos em torno da questão
do processo de saúde-doença, incorporando,
além da perspectiva biomédica, outros
saberes que o habilitem nesse processo de
interação cotidiana com as famílias e no
reconhecimento de suas necessidades.
Acredita-se que a capacitação em saúde
auditiva para ACS realizada neste estudo
atingiu este objetivo, pois a maioria dos ACS
demonstrou acréscimos no conhecimento
sobre saúde auditiva após a capacitação, bem
como uma avaliação positiva da metodologia
utilizada.
A capacitação realizada neste estudo
propôs aos ACS formas de atuação em saúde
auditiva em relação a aspectos técnicos e
atividades educativas, conforme proposto na
literatura que define o papel da formação
técnica dos ACS9.
Estudo realizado no estado de São
Paulo, para a capacitação de ACS em saúde
auditiva1 abordou temas relativos à audição e
deficiência auditiva; tipos de deficiência
auditiva; prevenção e causas da deficiência
auditiva; técnicas de identificação e
diagnóstico da deficiência auditiva e aspectos
gerais da deficiência auditiva. Nesta
capacitação foi utilizado o material
desenvolvido pela WHO e adaptado e
validado para o português1, sendo avaliado o
conhecimento dos ACS antes e após a
capacitação. Após a capacitação, os autores1,
verificaram que o material proposto pela
WHO para a capacitação dos ACS foi
adequada para o objetivo proposto e
propiciou a formação do ACS em diversos
aspectos da área de saúde auditiva.
A capacitação dos ACS em saúde
auditiva é relevante na atuação dos ACS
como promotores da saúde auditiva por meio
da orientação das famílias sobre a
importância da audição e a prevenção da
deficiência auditiva1.
Um programa de capacitação em
saúde auditiva10 realizado com ACS de um
município paulista que não possuíam
experiência prévia em saúde auditiva utilizou
o material da WHO adaptado e validado para
o português1, foi desenvolvido na forma
47
Urnau, D. L. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 42-49, jul./dez. 2012
presencial (grupo 1) e por meio de
videoconferência (grupo 2). Embora na
condição pré-capacitação o grupo 2 tenha
demonstrado maior conhecimento sobre
saúde auditiva quando comparado ao grupo
1, na condição pós-capacitação esta diferença
não foi estatisticamente significante,
demonstrando que ambos apresentaram
semelhante nível de assimilação do conteúdo
ministrado. Contudo, os autores10 destacaram
que a melhora no conhecimento sobre saúde
auditiva após a capacitação foi mais
expressiva para o grupo presencial, que
manteve o melhor aproveitamento, assim
como se observou na capacitação presencial
desenvolvida no presente estudo, em que os
ACS participantes citam que “as atividades
práticas nos ajudam a entender melhor o que
vocês estão falando”.
Acredita-se que o contexto de
atividades práticas e a participação dos ACS
em atividades dos Serviços de Saúde
Auditiva, são fundamentais para a
assimilação dos conhecimentos desejados
para os ACS na área da saúde auditiva.
O programa de capacitação presencial
em saúde auditiva se mostra eficaz para
ampliar o conhecimento dos ACS na maioria
dos domínios abordados durante os encontros
presencias, exceto o domínio relativo aos
aspectos gerais da deficiência auditiva(10),
equivalente a categoria deficiência auditiva e
suas consequências deste estudo. Neste
estudo, esta categoria foi a que apresentou
pior desempenho dos ACS após a
capacitação, concordando com o exposto na
literatura10.
Em relação à metodologia, o discurso
dos ACS ao relatarem que “isto sim é uma
capacitação” e, “assim a gente realmente
aprende”, vai ao encontro da literatura
especializada que descreve que na
capacitação presencial é possível controlar a
interação entre os participantes, sua
motivação, atenção e interesse, que
representam condições importantes para o
aprendizado10.
Conclusão
O programa de capacitação em saúde
auditiva no formato presencial, aqui
pesquisado, mostrou-se eficaz na capacitação
dos ACS, pois a maioria dos ACS que
participaram
da
pesquisa
apresentou
acréscimo nos conhecimentos sobre saúde
auditiva após a capacitação.
Os resultados comprovaram a eficácia
da capacitação presencial, sendo estas
atividades relevantes para a comunicação
entre os diferentes níveis de atenção à saúde
auditiva: atenção básica; média e alta
complexidade.
Quanto à metodologia empregada,
esta se mostrou adequada, uma vez que os
ACS consideraram que todos os itens
avaliados na metodologia foram alcançados e
relataram que o programa gerou interesse e
participação dos mesmos nas atividades.
A capacitação dos ACS em saúde
auditiva permite que estes atuem como
agentes facilitadores do processo de
adaptação de AASI por usuários com
deficiência auditiva e que, muitas vezes
abandonam o uso do AASI por falta de um
profissional mais próximo a ele que entenda
sobre o uso e manuseio do AASI.
Sugerem-se novas pesquisas, tanto
para avaliar o conhecimento sobre saúde
auditiva que ficou retido pelos ACS que
participaram do programa de capacitação
após seis meses de finalização deste, como
para ampliar o número de ACS com
capacitação em saúde auditiva, utilizando-se
diferentes metodologias: presencial e à
distância.
Para novos estudos, sugere-se a
utilização de indicadores pré e póscapacitação, de forma que seja possível
avaliar a efetividade do programa de
capacitação auditiva por meio da observação
de mudanças na atuação prática dos ACS
após o programa de capacitação.
Outro cuidado relevante para novos
estudos é a aplicação do questionário póscapacitação, pois este pode ter sido
influenciado pelos fatores cansaço e rapidez
(desejo de finalizar a atividade o mais breve
possível).
48
Urnau, D. L. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 42-49, jul./dez. 2012
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.
49
Moreira, L. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 50-60, jul./dez. 2012
MEDICALIZAÇÃO EM SAÚDE MENTAL NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE:
UMA REVISÃO DE LITERATURA [Medicalization in mental health in primary health
care: a review of literature]
Leandro Moreira1; Gabriela Marcellino de Melo Lanzoni2; Caroline Cechinel3.
Resumo: Este estudo trata de uma revisão integrativa de literatura, que busca discutir o
consumo de psicotrópicos na Atenção Primária à Saúde segundo a literatura científica. As
buscas foram realizadas nas bases de dados PUBMED, SCIELO e LILACS, com os
descritores “Mental Health” AND “Primary Health Care”, resultando em 29 estudos. Os
resultados apontaram que estudos sobre a medicalização indiscriminada e promoção a saúde
mental ainda encontram-se incipientes. Conclui-se a importância de investimento em
capacitação profissional na busca de mudar a visão cultural sobre a suposta resolubilidade da
medicalização.
Palavras-chave: Saúde Mental; Atenção Primária à Saúde; Promoção da saúde;
Psicotrópicos.
Abstract: This study is an integrative review of literature, which seeks to discuss the
consumption of psychotropic drugs in Primary Health Care according to scientific literature.
The searches were conducted in the databases Pubmed, Scielo and LILACS with the key
words "Mental Health" AND "Primary Health Care", resulting in 29 studies. The results
indicate that studies of the medicalization indiscriminate and promoting mental health are still
incipient. The conclusion is the importance of investment in professional training in the
pursuit of changing the cultural view of the presumed solvability of medicalization.
Key-words: Mental Health; Primary Health Care; Health Promotion; Psychotropic Drugs.
Introdução
A partir da definição de saúde,
entendida como uma situação de completo
bem estar físico, psicológico e social, o
termo “Qualidade de vida” vem se
posicionando dentre o foco principal da
atuação, no que tange a promoção da saúde1.
Concepções monocausais do processo saúdedoença têm sido ampliadas a outras
dimensões além da biológica, como estilo de
vida, meio ambiente e sistema de saúde. A
medicalização representa uma importante
ferramenta para o alcance do estado de
saúde, entretanto, não suficiente para a
abordagem integral de muitas patologias2.
Estima-se que em 2005, distúrbios
mentais atingiam 450 milhões de pessoas no
mundo. Aproximadamente 10% dos adultos
passam por problemas relacionados a
doenças mentais e 25% das pessoas irá
desenvolvê-las em algum momento de suas
vidas. Associada a mais de 90% dos casos de
suicídios que ocorrem anualmente no mundo,
a depressão é comumente não diagnosticada
a tempo.
____________________________
1
Médico. Especialista em Saúde da Família. Universidade Federal de Santa Catarina.
[email protected]
2
Enfermeira. Doutoranda em Enfermagem. Universidade Federal de Santa Catarina.
[email protected]
3
Enfermeira. Mestranda em Saúde Coletiva. Universidade Federal de Santa Catarina.
[email protected]
50
Moreira, L. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 50-60, jul./dez. 2012
Além disso, pessoas com distúrbios
mentais têm maiores riscos de adoecimento
por diminuição das funções imunes,
condições precárias de saúde, pouca
aderência ao esquema de tratamento além das
dificuldades de muitos pacientes de obterem
acesso adequado aos medicamentos3.
Quando a assistência à saúde mental
está integrada à Atenção Primária em Saúde
(APS), o acesso é aprimorado possibilitando
melhores condições de diagnóstico e
tratamento. Porém, para ser totalmente
efetiva e eficiente, a abordagem da saúde
mental na APS deve ser complementada por
outros níveis de cuidado e com sistema de
referência/contra-referência exitoso para
oferecer suporte e supervisão3.
Entende-se que para uma boa prática
de atenção à saúde mental, é necessário o
funcionamento pleno de todas essas
engrenagens. Em 2001, a qualidade da APS
voltada à saúde mental foi questionada,
quando se identificou que 69 países não
apresentavam sistemas de atenção à
comunidade e em outras 73 nações essa
atenção não estava disponível em nível
primário. Ainda, em 78 países não existia
nenhuma espécie de atenção à saúde mental e
37 nações não possuíam legislação específica
sobre o assunto4.
Fundamentada
na
visão
de
desinstitucionalização italiana, iniciou-se no
Brasil o efetivo do movimento social pelos
direitos dos pacientes psiquiátricos em 19 .
O Movimento dos Trabalhadores em Saúde
Mental (MTSM) denunciou as precárias
condições dos manicômios do país, da
violência praticada contra os pacientes
internados e da visão mercantilizada de seus
gestores. Passou-se, então, a construir
coletivamente uma cr tica ao chamado saber
psiquiátrico e ao modelo hospitalocêntrico na
assistência s pessoas com transtornos
mentais5.
A partir do ano de 1992, os
movimentos sociais conseguem aprovar as
primeiras leis que determinam a substituição
progressiva dos leitos psiquiátricos por uma
rede integrada de atenção saúde mental. A
década de 90 foi marcada pelo compromisso
firmado pelo Brasil na assinatura da
Declaração de Caracas e pela realização da II
Conferência Nacional de Saúde Mental.
Ainda, nesta década entrou em vigor no país
as primeiras normas federais regulamentando
a implantação de serviços de atenção diária,
fundadas nas experiências dos primeiros
Centros de Atenção Psico-social (CAPS),
Núcleos de Atenção Psico-social (NAPS) e
Hospitais-dia, e as primeiras normas para
fiscalização e classificação dos hospitais
psiquiátricos5.
Em
2001,
no
contexto
da
promulgação da lei 10.216 e da realização da
III Conferência Nacional de Saúde Mental, a
Política de Saúde Mental do governo federal,
alinhada com as diretrizes da Reforma
Psiquiátrica, passa a consolidar-se, ganhando
maior sustentação e visibilidade5.
Entretanto,
o
processo
de
desinstitucionalização pode ser analisado sob
três
aspectos,
a
saber:
a
desinstitucionalização
como
desospitalização; a desinstitucionalização
como
desassistência;
e,
a
desinstitucionalização como desconstrução.
Construir uma política de saúde que acolhe
os doentes psiquiátricos do processo de
desinstitucionalização garante a esses
pacientes um tratamento adequado e pleno6.
Porém, o que se observa na prática é
uma atenção restrita de medidas preventivas
e de promoção à saúde mental, onde
predominam práticas abusivas do uso de
psicotrópicos e auto-medicação. Busca-se no
medicamento a esperança de escapar das
pressões sociais, familiares ou do trabalho.
Realidade essa que se estende a diversos
países,
mantendo
os
medicamentos
benzodiazepínicos entre os mais prescritos do
mundo7.
A introdução, na década de 50, de
fármacos relativamente eficazes e seletivos
para
o
tratamento
de
pacientes
esquizofrênicos
e
maníaco-depressivos
incentivou a formulação de conceitos
biológicos sobre a patogenia dessas doenças
mentais
importantes.
Novos
estudos
51
Moreira, L. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 50-60, jul./dez. 2012
possibilitaram
desenvolvimento
de
medicamentos cada vez mais seletivos. A
introdução do clordiazepóxido iniciou a era
dos benzodiazepínicos na década de 60 que
substituiu diversas drogas até então usadas
(barbitúricos, meprobamato, hidrato de
cloral, entre outros) que provocavam sérios
efeitos colaterais, depressão fatal do sistema
nervoso central quando em doses não
controlados8.
O uso crônico de altas doses de
benzodiazepínicos tem sido associado ao
aumento da agitação de base, depressão,
pânico,
paranoia,
mialgia,
tremores
musculares, diminuição da concentração e
memória. É um medicamento que facilmente
está associado a risco de dependência e uso
abusivo. Os sintomas de abstinência podem
se tornar significativos quando utilizado
indiscriminadamente por longos períodos,
uma vez que manifesta intensificação
temporária dos problemas que originalmente
levaram ao seu uso9.
Diante da disposição de estimativas
alarmantes quanto à potencialidade de
comorbidades manifestadas por distúrbios
mentais, entende-se a preocupação de
transformar o amplo debate realizado pela
sociedade em ações preventivas. Entretanto,
o que se observa na prática diária,
intensamente documentada, é o aumento
crescente de pessoas fazendo uso de
psicotrópicos9. Em meio a este contexto,
questiona-se: As equipes de saúde da
Estratégia Saúde da Família têm atuado no
combate
ao
elevado
consumo
de
psicotrópicos? Qual abordagem teórica tem
sido dada ao debate? Assim, este estudo
objetiva verificar como é abordada na
literatura científica o consumo de
psicotrópicos na APS.
Metodologia
Adotou-se a Revisão Integrativa,
visto que ela contribui para sintetizar os
estudos publicados e tirar conclusões sobre o
assunto escolhido. Seguiram-se as etapas,
com base no estabelecimento de critérios
bem definidos sobre a coleta de dados,
análise e apresentação dos resultados desde o
início do estudo, a partir de um protocolo de
pesquisa previamente elaborado pelos
autores e validado10. Na primeira etapa,
realizou-se a seleção da pergunta de
pesquisa: “As equipes de saúde da Estratégia
Saúde da Família têm atuado no combate ao
elevado consumo de psicotrópicos?” e “Qual
abordagem teórica tem sido dada ao
debate?”. Na segunda etapa, critérios de
inclusão de estudos e seleção da amostra
foram definidos, ou seja, artigos nas línguas
inglesa,
espanhola
e
portuguesa
disponibilizados de forma completa e
gratuita, sem limite de tempo. Em seguida, os
estudos foram selecionados nas bases
eletrônicas de dados PUBMED, LILACS e
SCIELO, utilizando os descritores “Mental
Health” AND “Primary Health Care”,
extraídos dos Descritores em Ciências da
Saúde (DeCS). A terceira etapa visou a
representação dos estudos selecionados em
formato de tabelas. A quarta etapa contempla
a
análise
considerando
todas
as
características em comum, análise crítica dos
achados, identificando diferenças e conflitos;
interpretação dos resultados. A sexta etapa,
busca reportar de forma clara a evidência
encontrada. Tais etapas constituíram um
protocolo a ser seguido.
No primeiro levantamento com os
descritores indicados, foram encontrados
2.723 artigos na base PUBMED, 159 artigos
na base SCIELO e 371 artigos na base
LILACS. Todos os resumos foram
submetidos a uma leitura flutuante, a partir
da qual foram selecionados 13 artigos da
base PUBMED, 11 artigos da base SCIELO
e 5 artigos da base LILACS, considerando a
pertinência dos estudos em relação ao
objetivo
deste
estudo.
Não
foram
computados a esses números os artigos
encontrados repetidamente em mais de uma
base, somando, então, um total de 29 estudos
considerados para análise crítica. Os artigos
foram sistematizados em tabelas, sendo
posteriormente submetidos a uma leitura
rigorosa, levando-se em conta o critério de
exaustão e pertinência da coleta dos dados.
52
Moreira, L. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 50-60, jul./dez. 2012
A
partir
dessa
amostra,
as
informações de identificação dos artigos e
que respondiam a pergunta de pesquisa
foram extraídas e inseridas em um
instrumento com os seguintes itens: base de
dados, autores, ano, título, considerações
sobre o estudo. Os achados foram agrupados
de acordo com as semelhanças e diferenças,
sintetizados na forma de narrativas a partir da
análise, bem como, discutidos conforme a
literatura pertinente.
Resultados e Discussão
Os estudos analisados demonstram
um crescente uso de psicotrópicos não só no
Brasil como em diversos outros países da
América Latina, Europa e Estados Unidos,
como ilustra a Figura 1.
Figura 1: Caracterização dos estudos selecionados para análise, 2011.
Ano
Autor
Título
País
2011
Chan, WaiSun; et al.
A multidisciplinary primary care team consultation in
a socio-economically deprived community: An
exploratory reandomised controlled trial
Irlanda
2010
Buszewicz,
Marta; et al
Evaluation of a system of structured, pro-ative care
for chronic depression in primary care: a randomized
controlled trial
Inglaterra
2010
Mykletun,
Arnstein; et
al.
General practitioner`s opinions on how to improve
treatment of mental disorders in primary health care.
Interviews with one hundred Norwegian general
practitioners
Noruega
2010
Mwape,
Lonia; et al.
Integrating mental health into primary health care in
Zambia: a care provider`s perspective
Zambia
2010
Prins, M.A.;
et al
Patient factors associated with guideline-concordant
treatment of anxiety and depression in primary care
Holanda
2010
Jenkins, R.;
et al.
Integration of mental health into primary care in
Kenya
Quenia
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Tendencia del uso de benzodiazepinas en una muestra
de consultantes en atención primaria
Chile
No Chile, a automedicação, o abuso e
a dependência de benzodiazepínicos são
constatados desde a década de 1980. Em
1988, nesse país, estima-se que 58% do uso
de benzodiazepínicos era feito sem
prescrição médica e o uso crônico, definido
no estudo como o uso diário do medicamento
por pelo menos 1 (um) ano, alcançava
5,9%11. Entretanto, identificou-se no Chile
que a maior causa de dependência a
benzodiazepínicos são prescrições médicas
infundadas12. Estudos transcorridos no Brasil
apontam as mulheres acima de 40 anos como
sendo o grupo que mais consomem
benzodiazepínicos. Dentre os sintomas mais
relacionados como motivadores ao uso destes
medicamentos estão o nervosismo e a
insônia. No que tange aos motivos do uso
crônico, o estudo apontou causas como
insônia, efeito calmante do medicamento e a
dependência entre as mais citadas pelos
pacientes13.
O debate lançado pela OMS em 2001
denunciando o despreparo de vários países
em relação à promoção de saúde mental foi
mencionado em alguns trabalhos, em
especial alguns países mais pobres da África,
como Zâmbia e Quênia, culminando em
esforços com os objetivos voltados à maior
integração entre o serviço de saúde mental no
atendimento primário com o atendimento de
nível secundário14,15,16. Apesar disso, dos
países em desenvolvimento que conseguiram
organizar investimentos específicos a área de
saúde mental, cerca de 37% gastam menos de
1% do orçamento do setor saúde com
programas direcionados à reabilitação
psicossocial17.
A Reforma Psiquiátrica propõe
diretrizes de ação em território nacional
visando a descentralização do atendimento e
eliminando a visão hospitalocêntrica e do
modelo biomédico convencional. Apesar do
destaque que recebe a APS como o elementochave no processo de atenção ao coletivo e
não mais ao indivíduo, a reforma encontrou
na estrutura extra-hospitalar uma contradição
à sua proposta. Ainda, configura-se como
uma estrutura despreparada para abrigar um
entendimento de cuidados na área de saúde
mental adequado18.
O medicamento e a condição
patológica que antes eram estigmatizados por
grande parte da população tornaram-se mais
presente no cotidiano atual. Os transtornos
mentais comuns estão cada vez mais
prevalentes e, apesar de sempre mais
associados
a
baixas
condições
socioeconômicas, essa classe social não
correspondia ao grupo que mais fazia uso dos
medicamentos19.
Após reformulações da Saúde Pública
ocorridas nas últimas décadas no Brasil,
aumentou-se a oferta de equipamentos de
saúde em diversos municípios e observou-se
o nivelamento do uso de psicotrópicos entre
as diferentes classes sociais. Esse fator está
embasado na manutenção do caráter
prescritivo e autoritário adotado em muitas
unidades de Estratégia de Saúde da Família
(ESF); despreparo dos profissionais em lidar
com temas relacionados a problemas
psíquicos; dificuldade no estabelecimento
sistemas de referência e contra-referência;
entendimento da cultura populacional sobre a
necessidade de medicalização como fator
primordial para a cura de enfermidades e à
medicalização dos sintomas. Neste sentido,
considerações de vínculo e acolhimento,
além de estratégias de minimização da
medicalização
tornam-se,
portanto,
extremamente
valiosas,
porém
são
relativamente escassas e ainda incipientes17.
A adoção do modelo biopsicossocial
de determinação do processo saúde-doença
propõe que além dos fatores biopsíquicos, os
fatores políticos e sócio-culturais. Estes se
tornam parte do fundamento e análise do
indivíduo. Dessa forma, o tratamento não
seria apenas a medicalização exclusiva, e o
55
Moreira, L. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 50-60, jul./dez. 2012
sujeito receberia uma atenção integral,
juntamente com a sua família e o meio em
que está inserido. Outro aspecto estudado foi
a
controvérsia
sobre
o
modelo
multiprofissional de atuação que constitui
uma estruturação vertical e hierárquica.
Apesar de ampliar a avaliação sobre o
indivíduo, essa análise muitas vezes torna-se
fragmentada, existindo pouca interação entre
os agentes cuidadores.
Um estudo realizado na Irlanda
aborda
exatamente
a
atuação
multiprofissional sobre uma população com
problemas psicossociais. Nesse estudo,
conclui-se que não houve diferença
estatisticamente significativa entre o grupo
estudado quando comparado ao seu controle,
constituído por pessoas que receberam
cuidados usuais de consulta com médicos
generalistas20.
Assim, sugere-se uma atuação de
natureza interdisciplinar, que diferente do
modelo
multiprofissional,
visa
uma
estruturação horizontal primado por princípio
de descentralização e propostas por
participação popular, dando ênfase não só
aos aspectos técnicos como também aos
aspectos éticos. É uma atuação que amplia a
escuta a um entendimento mais vasto,
englobando, além da visão dos profissionais
mais especializados, a percepção da
população na qual estão inseridos. As
equipes de saúde da família trabalhariam
com os conceitos de vigilância à saúde com o
enfoque sobre os riscos, desenvolvendo
atividades preventivas e de promoção à saúde
mental, instigando práticas de cidadania
sobre a população adstrita18.
Alguns estudos avaliaram diversas
estratégias de atuação na tentativa de
prevenir e promover a saúde mental. Um
número considerável de estratégias de
intervenção educacional tem sido associado
ao tratamento da depressão no sistema
primário de saúde. Entretanto, observou que
estratégias educacionais simples e passivas
como palestras e panfletos que orientem
sobre sintomas e tratamento de depressão
tem efeito mínimo sobre os cuidados na
depressão. Em um estudo desenvolvido a
curto prazo mostrou que o serviço de atenção
integrado a saúde mental que envolvam
médicos,
enfermeiros,
psiquiatras
e
psicólogos poderia mostrar uma efetividade
maior agindo diretamente em contato com a
comunidade mas esse efeito desaparece
quando analisados em estudos a longo
prazo21,22,23.
Essas pesquisas sugerem que a
abordagem multiprofissional convencional
poderia despertar curiosidade da população
com relação ao tema, induzindo em principio
a uma avaliação das condições da qualidade
de vida, porém são ineficientes em mudar os
hábitos e costumes já enraizados. O
fornecimento de informações importantes
acerca do tratamento com psicoterápicos aos
pacientes, como vantagens do medicamento,
os efeitos colaterais e a programação sobre o
uso do medicamento como um fator
importante para prevenção de uso abusivo
destes medicamentos24,25.
Evidenciou-se, em um ensaio clínico,
que a farmacoterapia adjunta a monitorização
telefônica, realizadas em nível primário de
assistência,
possibilitava
uma
maior
aderência ao tratamento e diminuição do erro
do uso de medicamentos, inclusive
abuso26,27. Mudanças dos hábitos de vida têm
demonstrado benefícios importantes no
combate a alguns transtornos mentais. Dietas
mais ricas em frutas e verduras, além do
hábito de praticar exercícios físicos regulares
estão associados à melhora nos padrões
sintomáticos da depressão e ansiedade28.
Alguns estudos listaram os fatores
associados à prevalência de transtornos
mentais comuns e identificaram atributos do
indivíduo, do meio familiar e social e em
especial o ambiente de trabalho como um dos
principais colaboradores para o aumento
desse índice. Cabe citar a baixa renda, a
informalidade
e
a
insegurança
do
desemprego alem das altas demandas
psicológicas no trabalho29,30. Evidencia-se
que esse transtorno está presente dentro da
ESF, órgão que deveria estar preparado e que
deveria estar justamente promovendo a saúde
mental Esse estudo apontou que 43% das
agentes comunitária de saúde enquadravam
56
Moreira, L. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 50-60, jul./dez. 2012
no diagnóstico de transtorno mental comum e
84,4% demonstravam sinais de esgotamento
profissional. Uma intervenção no ambiente
de trabalho também se faz necessário,
começando a partir da própria Unidade
Básica de Saúde31.
Dentre os principais obstáculos
apontados nos estudos devemos citar o
despreparo dos profissionais da rede de
atenção primária, não só na questão técnica
de diagnóstico e acompanhamento adequado
do indivíduo, mas também quanto ao
despreparo à abordagem biopsicossocial e
coletiva do assunto. Diversos estudos
transversais inquiriram médicos e outros
profissionais da saúde sobre a dificuldade de
conduzir um paciente com transtorno mental.
A maioria respondeu falta de capacitação
pessoal e profissional e queixou da lacuna
existente entre a atenção primária e as
instituições de referência. O que se percebe,
portanto, é que a incorporação de ações em
saúde mental na atenção básica não é algo
que se efetiva sem o desenvolvimento de
estratégias institucionais como capacitação,
supervisão e financiamento14,15,29,32,33,34,35.
O Ministério da Saúde propôs nesse
sentido, através da Coordenação Geral da
Saúde Mental, o desenvolvimento de
diversos documentos referentes à integração
da saúde mental com a APS: o Apoio
Matricial. Percebeu-se que a Reforma
Psiquiátrica não poderia avançar sem a
incorporação da APS ao processo. O
matriciamento tem por objetivo assegurar à
APS, uma base especializada tanto em nível
assistencial quanto técnico-pedagógico e
cada vez mais os municípios têm aderido a
essa proposta34.
Diversos
CAPS
estão
sendo
instaurados em nível nacional com
mecanismos de indução financeira pelo
Ministério da Saúde. O objetivo é que o
CAPS seja o articulador das demandas de
saúde mental, servindo de retaguarda para as
residências terapêuticas. Entretanto, é
necessário melhorar a integração desse
serviço à ESF, fazendo com que o CAPS se
torne uma entidade cada vez mais
participativa em conjunto com as equipes de
saúde da família através de consultas,
trabalhos em grupo, visitas domiciliares, e
reuniões com a equipe. A importância do
Apoio Matricial está também relacionada à
oferta de capacitações, treinamentos e
palestras aos profissionais de saúde da rede
primária, promovendo encontro de saberes
que estimulem uma atuação mais integral e
menos fragmentada36.
Entretanto, apesar dos princípios
acima apontarem para um cuidado que
ultrapasse o modelo biomédico, ainda faltam
textos oficiais sobre as ações voltadas para o
enfrentamento de problemas relacionados à
saúde mental na APS. Ao mesmo tempo em
que se preconiza que uma equipe de saúde
deva suprir ao menos 85% das necessidades
da população cadastrada, as questões
psicossociais ainda não estão incluídas nas
estratégias de prioridades2.
Considerações Finais
Optou-se por uma análise qualitativa
dos artigos. Muitas práticas ainda se baseiam
na teoria ou na análise de uma subamostragem levantada na maioria dos
estudos, porém o que se percebe é a
congruência ao fato da necessidade de
modificação do entendimento sobre o
cuidado à saúde. A visão biomédica ainda
demonstra força na cultura de formação dos
profissionais de saúde e também na
população em geral.
Valoriza-se a integralidade e o caráter
do olhar profissional baseado no modelo
biopsicossocial da atuação como a
ferramenta realmente efetiva na promoção a
saúde.
Embora este estudo tenha limitações
no que tange o número de idiomas utilizados
e o recorte histórico definido, pode-se
identificar que o desafio atual vai além das
conquistas já alcançadas, como a redução
considerável
do
número
de
leitos
psiquiátricos e a reversão dos gastos públicos
destinados ao pagamento de internações
psiquiátricas para a ampliação da rede de
serviços extra-hospitalares. Uma das etapas
cruciais para melhorar a condição da saúde
57
Moreira, L. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 50-60, jul./dez. 2012
mental no panorama mundial terá como eixo
a atuação dos profissionais da área em
desmitificar a idéia de que só a
medicalização traz a resolutividade. A
Reforma Psiquiátrica não só contribuiu para
os tais fatores supra-citados, mas aproximou
a comunidade ao tema e adjunto a esse fato,
encontrou uma estrutura extra-hospitalar
despreparada para receber e trabalhar de
forma ampla esse aspecto na comunidade.
Desta forma, é indicada para
pesquisas futuras a investigação de técnicas
promotoras
desse
novo
pensamento
terapêutico, a começar entre os próprios
profissionais e gestores de saúde para que
estes possam atuar de forma coerente com o
conceito de promoção a saúde e difundi-lo
entre a população.
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Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 61-70, jul./dez. 2012
INTERVENÇÕES PARA MELHORAR A ADESÃO AO TRATAMENTO DE
DOENÇAS CRÔNICAS [Interventions to improve adherence to treatment of chronic
diseases]
Annelita Almeida Oliveira Reiners1; Priscilla Uiara de Oliveira do Carmo2; Cecília
Victorazzo Louzada3; Joana D’arc Chaves Cardoso4; Rosemeiry Capriata de Souza
Azevedo5.
Resumo: Pesquisa bibliográfica cujo objetivo foi descrever a produção latino-americana
sobre intervenções para melhorar a adesão aos tratamentos da Hipertensão Arterial e Diabetes
Mellitus. Os dados foram coletados na base de dados LILACS com diversos descritores
relacionados a temática. Foram analisados 10 artigos. Os resultados mostraram que as
intervenções propostas pelos autores são principalmente educativas e multiprofissionais. Os
principais métodos empregados para avaliar as intervenções foram questionários, exames e
medida da pressão arterial. Os autores consideraram que as intervenções melhoraram a adesão
dos pacientes.
Palavras chave: Estudos de intervenção. Adesão à medicação. Doença Crônica.
Abstract: Bibliographical research which objective was to describe the Latin American
production about interventions to improve adherence to treatment of Hypertension and
Diabetes Mellitus. Data were collected in the LILACS database with several descriptors
related to the theme. We analyzed 10 articles. The results showed that the interventions
proposed by the authors are primarily educational and multidisciplinary. The major methods
used to evaluate the interventions were questionnaires, tests and blood pressure measurement.
The authors considered that interventions improved patient adherence.
Keywords: Intervention studies. Medication adherence. Chronic Disease.
Introdução
desenvolvimento do país, tanto em termos de
Atualmente, dentre as doenças prevalência, incapacitações, mortalidade
crônicas (DC) mais prevalentes no mundo, prematura e custos envolvidos no controle do
encontram-se a Hipertensão Arterial (HA) e tratamento de suas complicações. Sua
o Diabetes Mellitus (DM). Estas são incidência tem aumentado, entre outros
problemas de saúde pública que representam motivos, devido ao aumento da expectativa
importante causa de morbimortalidade, de vida das pessoas e às mudanças nos estilos
independentemente
do
grau
de de vida da população1,2.
_____________________
1
Docente, Universidade Federal de Mato Grosso – Faculdade de Enfermagem. E-mail:
[email protected]
2
Enfermeira, Universidade Federal de Mato Grosso – Faculdade de Enfermagem Email:
[email protected]
3
Mestranda, Universidade Federal de Mato Grosso – Faculdade de Enfermagem. Rua
República nº 130 – casa 27 – Bairro Coophema – Cuiabá – MT. CEP: 78085-200. E-mail:
[email protected]
4
Docente, Universidade Federal de Mato Grosso – Faculdade de Enfermagem. E-mail:
[email protected]
5
Mestranda, Universidade Federal de Mato Grosso – Faculdade de Enfermagem. E-mail:
[email protected]
61
Reiners,A. A. O. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 61-70, jul./dez. 2012
O
tratamento
dessas
doenças
geralmente envolve medicamentos e medidas
não farmacológicas, como dieta específica,
controle do peso, atividade física, entre
outros, que demandam monitoramento e
gerenciamento de longo prazo. A adesão a
esses tratamentos exige mudança de hábitos
que devem ser integrados à rotina diária dos
portadores dessas enfermidades.
Ainda que o conhecimento sobre as
doenças e seus tratamentos tenha crescido
nas últimas décadas e muitas terapêuticas e
cuidados, em alguma medida, seja hoje
acessível à parte considerável da população
mundial, a baixa ou não adesão aos
tratamentos permanece sendo um problema
que traz prejuízos diversos tanto para os
doentes, quanto para suas famílias, os
serviços de saúde e para o país. Além disso,
prejudica os resultados terapêuticos e traz
consideráveis
perdas
sociais,
psicoemocionais e econômicas na medida em
que contribui para que as pessoas continuem
doentes e/ou morram precocemente.
Muitos profissionais de saúde
enfrentam esse problema no cotidiano da
assistência aos pacientes e inúmeras
investigações sobre adesão ao tratamento têm
sido desenvolvidas com propósitos diversos.
Há estudos que se propõem a analisar os
conceitos e terminologias de adesão/não
adesão, bem como suas formas de medida,
mas, geralmente as pesquisas buscam
identificar a presença desse fenômeno em
determinado grupo de pacientes com
levantamento dos fatores que contribuem
para que isso aconteça.
Em relação a intervenções, os
profissionais de saúde apontam diferentes
formas de lidar com a não adesão aos
tratamentos da HA e DM3. Intervenções para
melhorar o problema da não adesão aos
tratamentos
forneceriam
um
retorno
significativo aos investimentos em prevenção
de problemas de saúde4.
Esses tipos de intervenção têm sido
objeto de investigações e, em pesquisas de
revisão, pesquisadores as têm relatado e
avaliado5,6,7. Entretanto, estudos de revisão
que buscaram e sistematizaram as pesquisas
latino-americanas com o propósito de
mostrar um panorama abrangente e atual
dessas intervenções não foram encontrados
Neste sentido, questiona-se: Quais são as
intervenções que efetivamente têm sido
realizadas em países latino-americanos para
melhorar a adesão ao tratamento de DC?
O objetivo deste estudo foi descrever
a produção bibliográfica latino-americana
existente sobre as intervenções que os
profissionais de saúde realizaram para
melhorar a adesão aos tratamentos da HA e
do DM.
Metodologia
Trata-se de revisão de literatura na
qual foram buscados artigos publicados em
periódicos latino-americanos entre os anos de
2001 a 2011 que tinham como objetivo
descrever as intervenções para melhorar a
adesão ao tratamento da HA e do DM. Foram
excluídas teses e dissertações, além de
estudos de revisão e estudos nos quais os
resumos não estavam claramente descritos.
A coleta dos dados foi realizada no
período de agosto a dezembro de 2011. As
publicações foram obtidas por meio de
buscas na base de dados LILACS, utilizando
os seguintes descritores: intervenção,
estratégia, cooperação do paciente, estudos
de intervenção, recusa do paciente ao
tratamento,
conduta
do
tratamento
medicamentoso, conduta no tratamento
medicamentoso, desistência ao tratamento,
desistência do paciente ao tratamento,
interrupção do tratamento, recusa ao
tratamento, aderência, adesão ao tratamento
medicamentoso, adesão ao tratamento
farmacológico,
educação,
paciente,
participação do paciente , autocuidado,
educação em saúde, promoção da saúde.
A partir das estratégias de busca obteve-se 19
artigos, com a leitura dos títulos e resumos,
bem como da aplicação dos critérios de
inclusão e exclusão, obteve-se 10 textos
(Figura I) que foram lidos na íntegra e seus
dados extraídos, registrados e organizados
em um formulário criado especificamente
para a pesquisa. Depois as informações
62
Reiners,A. A. O. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 61-70, jul./dez. 2012
foram agrupadas em um formulário com os
seguintes itens: tipos de intervenção,
objetivos e focos da intervenção, população
alvo da intervenção, conteúdos, abordagens,
estratégias e recursos utilizados, responsáveis
pela intervenção, forma de avaliação,
resultados alcançados, dificuldades e
facilidades encontradas.
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Figura I Textos encontrados ao final das buscas e aplicação dos critérios de seleção.
Por fim, as informações foram
analisadas e organizadas em categorias e os
resultados discutidos, tendo como base o
referencial de adesão a tratamentos de
problemas crônicos de saúde.
Resultados e discussão
A
quantidade
de
estudos
encontrados na pesquisa mostrou que ainda
são poucas as publicações latino-americanas
existentes sobre intervenções realizadas com
o intuito de melhorar a adesão aos
tratamentos da HÁ e do DM. Os 10 estudos
localizados foram publicados em periódicos
na área multidisciplinar.
A não adesão aos tratamentos, por
ser um problema tão frequente e que
prejudica tanto o paciente quanto sua família,
o serviço de saúde e a sociedade, carecem de
63
Reiners,A. A. O. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 61-70, jul./dez. 2012
maior investimento em pesquisas de
intervenção, cujos resultados possam
contribuir para modificar o panorama das DC
na América Latina e no mundo.
As intervenções foram publicadas
como pesquisa original ou como relato de
experiência. Nas primeiras, os autores
compararam a intervenção proposta com
outro tipo de intervenção (caso-controle) ou
realizaram
apenas
uma
intervenção
confrontando os resultados pós-intervenção
aos da pré-intervenção. Relatos de
experiência são importantes formas de
divulgar intervenções, entretanto, pesquisas
que avaliam intervenções são fundamentais
para munir os profissionais de evidências
cientificamente
comprovadas
de
sua
efetividade ou não.
Tipos de intervenção
Os estudos relatam diferentes tipos
de intervenção, com a finalidade de melhorar
a adesão dos pacientes ao tratamento, a
maioria delas de cunho educativo (Textos 1,
2, 4, 6, 8, 9). Isso é um aspecto importante,
pois atividades de educação em saúde
objetivam desenvolver nas pessoas um
sentido de responsabilidades sobre as
decisões relacionadas à saúde, tanto
individual como coletivamente, além de
reconhecidamente ter potencial para a
redução de custos junto a diversos contextos
da assistência8.
Nas
intervenções
de
cunho
educativo os profissionais de saúde têm a
oportunidade de centrar suas ações nas
pessoas e não somente em procedimentos,
aliando orientação, informação, adequação
dos esquemas terapêuticos ao estilo de vida
do paciente, esclarecimentos, suporte social e
emocional. Eles podem trabalhar junto aos
pacientes
questões
ligadas
ao
reconhecimento e à aceitação de suas
condições de saúde, adaptação a essas
condições e cultivo de hábitos que
promovam a qualidade de vida e
proporcionam o desenvolvimento do
autocuidado9.
Assim, é necessário que os
profissionais de saúde reconheçam a
educação em saúde como uma tarefa inerente
ao seu trabalho e que, por isso, devem fazer
capacitações e treinamentos regularmente. O
processo de educação em saúde exige que os
profissionais de saúde tenham conhecimentos
abrangentes que vão além dos aspectos
clínicos e fisiopatológicos da doença10.
Um dado relevante encontrado nas
intervenções é que, em parte delas, os autores
vincularam ações terapêuticas às educativas
[Textos 1,2,3,4,5,9,10]. Foram atividades
como visitas domiciliares, consultas médicas
e não médicas regularmente agendadas e
mais frequentes; busca de faltosos,
atendimento de fisioterapeuta e terapeuta
ocupacional,
atendimento
médico
preferencial a intercorrências, intervenção
psicológica e fornecimento de vale transporte
e cesta básica.
Atividades educativas aliadas às
atividades clínicas favorecem a adesão, pois
o paciente tem mais condições de expressar
suas dificuldades e angústias em relação ao
tratamento, além de ser possível o
profissional de saúde entender quais são os
obstáculos para que ocorra a adesão efetiva.
A visitação domiciliar é uma
intervenção importante, pois aproxima o
profissional da saúde/ serviço de saúde do
paciente, proporcionando um maior grau de
confiança, além de ser uma categoria de
atenção domiciliar à saúde que possibilita
uma análise da realidade do indivíduo e de
sua família. Funciona como um instrumento
de intervenção essencial na saúde da família
e na continuidade de qualquer forma de
assistência, sendo utilizada com o intuito de
auxiliar nas intervenções ou no planejamento
de ações11.
A consulta de enfermagem não fez
parte das intervenções relatadas. Porém, seria
importante, uma vez que tal atividade é
favorável para exposição de queixas do
paciente,
para
a
identificação
das
necessidades de autocuidado e também para
se realizar atividades educativas. Nessas
atividades, o enfermeiro pode preparar tanto
o indivíduo como a família para o
autocuidado, contribuindo para a promoção,
proteção, recuperação e reabilitação da
64
Reiners,A. A. O. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 61-70, jul./dez. 2012
saúde8, e consequentemente, para a adesão
do tratamento.
Responsáveis pelas intervenções
Devido à complexidade das
condições crônicas e ao fato de que as
pessoas geralmente têm comorbidades,
especialmente os idosos, e também pelo
motivo de a adesão ser um fenômeno
multifatorial, intervenções para melhorá-la
requerem
a
atuação
de
diferentes
profissionais12. A presença de uma equipe
multidisciplinar completa na unidade de
saúde pode contribuir para a compreensão do
paciente sobre sua enfermidade e a
importância da adesão ao tratamento para
obter a cura13.
Quando vários profissionais atuam
de forma interligada, despendendo a mesma
energia
e
com
objetivos
mútuos,
considerando a pessoa do usuário, sua
subjetividade e diversas necessidades, cada
um dando profundidade à sua área de
domínio profissional, as estratégias são mais
efetivas14. Diante da ação da equipe
multiprofissional, o paciente será submetido
a uma gama muito maior de informações
com enfoques diferentes e teremos, então,
com um indivíduo bem orientado, a
possibilidade da incorporação de hábitos
adequados de vida e, quando necessário, do
uso correto dos medicamentos prescritos,
configurando
assim,
a
adesão
ao
tratamento15.
Nesta pesquisa, de modo geral, as
intervenções foram desenvolvidas por
diversos profissionais, incluindo psicólogos,
médicos,
nutricionistas,
fisioterapeuta,
fonoaudiólogo,
auxiliar
administrativo,
assistente social, terapeuta ocupacional e
dentista. Embora tenha sido relatada a
presença da enfermagem na maioria das
intervenções, os autores não descreveram
claramente o papel desempenhado por ela. O
enfermeiro como interventor claramente foi
mencionado em quatro dos estudos [Textos
2,4,6,8].
Mesmo tendo a possibilidade de
estar mais próximo do paciente, ainda se
observa a ausência do profissional
enfermeiro no que se refere a realizações de
intervenções para melhorar a adesão ao
tratamento. E o papel do enfermeiro é
fundamental, pois, sempre que se inclui um
profissional não médico na cadeia de
atendimento ao paciente, observa-se aumento
nos índices de adesão ao tratamento
(comparecimento às consultas, tomada das
medicações, controle da pressão arterial etc.).
A justificativa para isso é que
aparentemente os pacientes preferem relatar
efeitos colaterais, sintomas, encontro de
barreiras situacionais para a adesão ao
tratamento e qualquer outro fator que esteja
interferindo
na
observância
das
recomendações médicas a um profissional
não-médico16.
O enfermeiro pode exercer papel
importante na atenção à saúde de pessoas
com problemas crônicos de saúde,
participando da coordenação e integração das
intervenções, incentivando os membros da
equipe para o oferecimento de assistência
integrada e com qualidade17.
Foco das intervenções
Apesar dos avanços nas concepções
de Educação em Saúde, o modelo biomédico
permanece, em sua base filosófica,
orientando o enfoque dominante das
intervenções. Por isso, o que se pode
constatar nos estudos revisados, é que as
intervenções tinham como foco principal a
doença e o tratamento. No que diz respeito à
doença, os autores preocuparam-se em
fornecer conhecimento aos pacientes sobre a
enfermidade, os fatores de risco e as
complicações. Já em relação ao tratamento, a
ênfase foi na mudança do estilo de vida e na
importância de seguir o tratamento
medicamentoso como prescrito.
Chama à atenção a ênfase que
alguns autores deram ao controle do paciente
sobre a enfermidade, sobre ele mesmo
(autocontrole) e sobre as situações de
estresse [Textos 2,3,5,9], denotando uma
preocupação de alguns profissionais em
capacitar os pacientes para lidar com a
doença e o tratamento de maneira a garantir a
adesão. Isso é importante, pois o foco do
65
Reiners,A. A. O. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 61-70, jul./dez. 2012
tratamento das DC deve ser reorientado para
o paciente e sua família, estimulando-os a
promover sua própria saúde, uma vez que o
gerenciamento dessas condições requer
mudanças no estilo de vida e no
comportamento diário18.
Estratégias e recursos utilizados
A fim de melhor lidar com as
condições crônicas e melhorar a adesão aos
tratamentos, os órgãos governamentais e
organizações de saúde afirmam que as
intervenções que utilizam mais de uma
estratégia têm sido mais eficazes4. E
recomendam que os profissionais de saúde
tenham
habilidades
avançadas
de
comunicação e de aconselhamento, bem
como técnicas de auxílio a mudança de
comportamento.
A principal estratégia empregada
pelos autores nas intervenções foi a de
reuniões em grupo [Textos 1,2,3,5,6,8,9], nas
quais haviam discussões sobre a doença, o
tratamento, nutrição e temas relacionados
com a atenção médica. Essa estratégia tem
caráter informativo, reflexivo e de suporte
com a finalidade de identificar dificuldades,
discutir possíveis soluções para os problemas
que não permitem uma adesão eficaz. As
reuniões em grupo possibilitam que os
pacientes percebam problemas comuns aos
seus, apreendam novos meios de superá-los,
expressem suas ansiedades e também tirem
suas dúvidas. É um ambiente de interação
com o outro, com outros conceitos e valores,
onde é possível construir vínculos, se sentir
acolhido, compartilhar dificuldade, buscar
alternativas para superá-las e encontrar
recursos para lidar com questões do adoecer,
da doença e seus efeitos9.
Além
de
permitir
que
os
profissionais estimulem os pacientes,
contribuindo na motivação que eles precisam
ter para alcançar suas metas de cuidado e
tratamento, as atividades educativas em
grupo criam oportunidade para que as
pessoas formem uma consciência crítica da
sua realidade e suas necessidades,
desenvolvam suas potencialidades e busquem
soluções para seus problemas de saúde de
forma efetiva10.
Um dado relevante que encontramos
foi o fato de que alguns autores incluíram a
família em suas estratégias [Textos 1,2,5,8].
Isso é especialmente importante porque
famílias são essenciais no processo de adesão
do portador de DC ao tratamento e se
constituem em forte pilar para continuar na
luta de enfrentamento de doenças limitantes.
Os cuidados implementados pela
família têm a finalidade de preservar a vida
de seus membros, com a vantagem de serem
realizados de maneira adequada às suas
próprias possibilidades, aos seus padrões
culturais, às necessidades particulares de
cada indivíduo e às condições do meio onde
vive19. Contando com o apoio da família, é
sempre possível viver de forma mais
saudável e ter qualidade de vida20.
Além das reuniões em grupo, os
autores lançaram mão de a visita domiciliar
como estratégia para melhorar a não adesão
ao tratamento dos pacientes hipertensos
[Textos 2,4,]. Nela, os serviços de saúde são
oferecidos ao indivíduo e sua família em suas
residências com o objetivo de promover,
manter ou restaurar a saúde, maximizando o
nível de independência, minimizando os
efeitos das incapacidades ou doenças,
incluindo aquelas sem perspectiva de cura.
A visita domiciliar é uma categoria
da atenção à saúde que prioriza o diagnóstico
da realidade do indivíduo e as ações
educativas. É um instrumento de intervenção
fundamental na saúde da família e na
continuidade de qualquer forma de
assistência e/ ou atenção domiciliar à saúde,
sendo programada e utilizada com o intuito
de subsidiar intervenções ou o planejamento
de ações11.
Também foram utilizadas como
estratégias atividades clínicas de rotina e
mais frequentes, supervisão semanal com
conferência das medicações, busca ativa dos
pacientes faltosos e aerogramas. Nas
entrevistas individuais informativas os
autores buscaram, além de informar, também
compreender os motivos da irregularidade ou
do abandono do tratamento.
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Reiners,A. A. O. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 61-70, jul./dez. 2012
As consultas regulares com médicos
e/ou outros profissionais, assim como a
visitação
domiciliar,
são
estratégias
importantes por possibilitar a aproximação
dos profissionais de saúde ao paciente e sua
família, permitindo maior interação e
consequentemente maior entendimento das
dificuldades de adesão ao tratamento. Além
disso, essa estratégia reduz o tempo entre as
consultas
médicas,
proporciona
um
atendimento diferenciado, possibilitando a
orientação do tratamento e cuidados gerais
com a saúde do paciente e ajuda na
prevenção de um dos fatores de riscos
associados ao abandono do tratamento que é
a rejeição ao serviço de saúde21.
Estratégias criativas foram utilizadas
em duas das intervenções. Uma delas foi a
realização de visitas a lojas de produtos
dietéticos e a supermercados juntamente com
os pacientes [Texto 8]. Essa estratégia é de
grande valia, uma vez que muitos pacientes
portadores de diabetes não têm contato com a
realidade nutricional, seja pela falta de
conhecimento ou por crenças associadas à
patologia. A outra estratégia usada foi o
repasse de mensagens via celular aos
pacientes com estímulo à adesão ao
tratamento, bem como de informações sobre
doença e tratamento [Texto 7]. Isso
demonstra a preocupação dos interventores
em aliar à sua prática os recursos
tecnológicos disponíveis à população,
trazendo um diferencial às suas ações em
saúde.
Em uma das intervenções os autores
lançaram mão de uma estratégia utilizada
pela Secretaria Municipal de Saúde do Rio de
Janeiro, onde se realizou a dispensação de
medicamentos diretamente no domicílio do
paciente diabético previamente selecionado,
juntamente com informações de promoção à
saúde [Texto 10]. Esse tipo de estratégia
mostra a preocupação dos profissionais
acerca do acesso dos pacientes ao tratamento
medicamentoso, combatendo um dos fatores
que predispõe a não adesão. Muitos pacientes
encontram dificuldades diversas para estar no
estabelecimento de saúde onde é fornecido o
medicamento, situação que usualmente leva
ao abandono do tratamento.
Em relação aos recursos utilizados
nas intervenções, nem todos os autores
mencionaram nos estudos os recursos
empregados nas atividades educativas. Foi
referido o uso de materiais audiovisuais
(vídeos, folhetos), flipchart e cartões para
transmitir as informações pretendidas
[Textos 4,6,7,8].
A importância do uso desses
recursos, dentre outros, em atividades
educativas reside na possibilidade de facilitar
a compreensão dos pacientes sobre a
patologia e o tratamento, permitir o
esclarecimento de informações necessárias,
bem como de reafirmar a necessidade de
aderirem ao tratamento.
Local das intervenções
Algumas
intervenções
foram
realizadas nos domicílios dos pacientes
quando foram feitas visitas domiciliares e
outras em ambulatórios hospitalares [Textos
5,9], mas a maioria delas aconteceu em
unidades básicas de saúde. Esses espaços
possibilitam um contato mais próximo e
duradouro com os pacientes e também com
suas famílias, favorecendo o trabalho para
melhorar a adesão ao tratamento. Quanto
maior é a proximidade dos pacientes com os
serviços de saúde, melhor é a interação com
os profissionais e as chances de se ter uma
adesão eficaz aumentam.
Período de realização das intervenções
Nem todos os autores deixaram
claro o período em que as intervenções foram
realizadas, mas podemos dizer que, em
média, elas variaram de 2 meses a 2 anos. A
obtenção de bons resultados em uma
intervenção que visa melhorar a adesão ao
tratamento implica necessariamente em levar
em conta que ela é um comportamento que
necessita de tempo considerável para ser
adotado e que as pessoas terão ritmos
diferentes no processo de vivência da doença
e do tratamento.
Desta forma, ações para melhorar a
adesão requerem períodos prolongados e
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Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 61-70, jul./dez. 2012
contínuos para serem realizadas. Esse
requisito tem um papel fundamental na
adesão ao tratamento, na medida em que
permite vários encontros entre profissionais
de saúde e pacientes nos quais os primeiros
deverão trabalhar para estabelecer um
vínculo com os últimos22, o que não é
possível de se realizar em curtos períodos de
tempo.
População alvo
Participaram dos estudos homens e
mulheres entre 18 e 82 anos de idade
principalmente na faixa da meia-idade e
idosos. Isso é compreensível, pois embora
casos de HA e DM em jovens sejam
relatados,
essas
doenças
acometem
principalmente pessoas na faixa etária acima
dos 40 anos23.
Formas e avaliação da adesão e dos
resultados encontrados
A Organização Mundial da Saúde
diz que não há consenso sobre um método de
aferição da adesão ao tratamento que possa
ser
tomado
como
padrão-ouro,
recomendando, assim, o uso combinado de
métodos para melhorar sua acurácia4.
No caso das intervenções para
melhorar a adesão ao tratamento da HA, a
principal forma de avaliação que utilizaram
foi a medida da pressão arterial. Na maioria
das intervenções para melhorar a adesão ao
tratamento do DM foi utilizado o controle de
taxas pré e pós- intervenção para concluir se
a adesão foi alcançada. Os autores utilizaram
as taxas como a da glicemia capilar, glicemia
de jejum, hemoglobina glicada, colesterol
total, HDL, LDL, triglicérides, além de
medida da PA, da circunferência da cintura,
peso e altura.
Em cinco estudos os autores
avaliaram a adesão por meio de questionários
aplicados antes e depois das intervenções e
acrescentaram outros parâmetros a essas
medidas, o que na certa aumenta a
confiabilidade dos resultados obtidos com a
intervenção
[Textos
2,3,5,6,9].
Os
questionários estruturados são largamente
utilizados para medir a adesão por sua
facilidade operacional e baixo custo, apesar
de, em sua maioria, possuírem baixa
sensibilidade e baixo valor preditivo
positivo24.
Resultados
Em todos os artigos foram relatados
resultados positivos na melhora da adesão.
As reuniões em grupo e as entrevistas
individuais também obtiveram êxito em seu
propósito de melhorar a adesão ao tratamento
após terem proporcionado aos pacientes
momentos de expressão das dificuldades e
posteriormente evidenciado possibilidades de
superação.
Mas, a despeito dos resultados, há
que se considerar que ainda é necessário que
medidas de acompanhamento constante dos
pacientes sejam adotadas, pois a adesão ao
tratamento é um comportamento complexo
sujeito à influência de fatores intrínsecos e
extrínsecos que o modifica ao longo do
tempo.
Dificuldades/facilidades encontradas na sua
realização
Dos 10 estudos revisados, apenas
três relataram as dificuldades/facilidades
encontradas na realização das intervenções
[Textos 1,2,10]. A menção desses seria
interessante para que outros profissionais
pudessem não somente conhecer aspectos
que contribuem para facilitar a realização de
intervenções para melhorar a adesão aos
tratamentos, como também ter informações
sobre os possíveis obstáculos a serem
encontrados.
A disponibilização de infraestrutura
de apoio pelos serviços (fornecimento regular
de
medicação,
padronização
dos
medicamentos e dos exames, atendimento às
intercorrências, sala para os encontros) e o
envolvimento da equipe multiprofissional,
quando existiam, foram mencionados como
facilitadores da intervenção. Da mesma
forma, a ausência deles ou sua existência de
maneira
parcial,
foram
consideradas
dificultadores da intervenção.
68
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Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 61-70, jul./dez. 2012
Igualmente,
a
participação
inadequada dos familiares no grupo, a falta
de referência para atendimento de casos
especiais e mais complexos, as dificuldades
de acesso aos domicílios dos pacientes
devido à questões geográficas, os atrasos na
entrega dos medicamentos, ausência de
controle sobre a ingestão do medicamentos
pelo paciente, e a incipiente parceria com as
unidades de atenção básica e os órgãos da
sociedade civil, foram considerados como
dificultadores da intervenção.
Conclusão
Este estudo de revisão é o primeiro a
apresentar um panorama das publicações
latino americanas sobre intervenções para
melhorar a adesão ao tratamento dos
pacientes portadores de HA e DM dos
últimos 10 anos.
O número de artigos publicados na
América Latina sobre a temática é pequeno.
Nos estudos encontrados, pode-se constatar
que as intervenções propostas pelos autores
são principalmente educativas, utilizando-se
de estratégias diversas e realizadas por
profissionais de várias áreas, inclusive da
enfermagem, em período e locais apropriados
ao trabalho educativo.
Os principais métodos empregados
para avaliar os resultados da intervenção
foram os questionários em conjunto com
exames e medida da pressão arterial. Os
resultados alcançados foram positivos em
relação à melhora da adesão.
Cabe ressaltar que este artigo
limitou-se a produção latino-americana
disponibilizada na base de dado LILACS. No
entanto, essa pesquisa possibilitou conhecer
as intervenções e apreender em que medida
elas podem contribuir para a melhora da
adesão dos pacientes ao tratamento. Da
mesma forma, colabora para fornecer
evidências aos profissionais de saúde do que
tem e o que não tem sido efetivo nas formas
de lidar com a não adesão aos tratamentos.
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Normas de Publicação
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 71-74, jul./dez. 2012
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7. As opiniões emitidas nos trabalhos, bem
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8. A revista classificará os textos
encaminhados de acordo com as
seguintes seções:
8.1
EDITORIAL
–
matéria
de
responsabilidade da Comissão Editorial da
Revista.
8.2
ARTIGOS
ORIGINAIS:
a)
PESQUISA – constará de relatos de
investigações científicas concluídas. b)
REVISÃO – abrangerá revisões de literatura
sobre temas específicos. c) RELATO DE
EXPERIÊNCIA/CASOS CLÍNICO –
incluirá descrições de atividades acadêmicas
assistenciais e de extensão. d) REFLEXÃO
– apresentará materiais de caráter opinativo
e/ou análise de questões que possam
contribuir para o aprofundamento de temas
relacionados à área a que se destina a revista.
8.3 OUTRAS SEÇÕES: a) ENTREVISTA
– espaço destinado a entrevistas de
autoridades / especialistas / pesquisadores. b)
TRABALHO DE CONCLUSÃO DE
CURSO
/
DISSERTAÇÕES
DE
MESTRADO
E
TESES
DE
DOUTORADO
–
RESUMOS
E
ABSTRACT c) PÁGINA DO LEITOR.
9. NORMAS DE APRESENTAÇÃO DE
TRABALHOS
9.1 – FORMATO – O trabalho deverá ser
encaminhado em 02 (duas) vias. Na
digitação deverá ser utilizado espaço 1,5;
com margem esquerda 3 cm; margem direita
(superior e inferior) 2 cm; letra Times New
Roman, tamanho 12, observando a ortografia
oficial, editor Word For Windows. O título
deverá ser em caixa alta, negrito, espaço 1,5
simples e justificado. Os autores deverão
estar abaixo do título do artigo, em negrito,
espaço simples e em caixa baixa. O texto
deverá conter seus respectivos títulos, de
acordo com as características do trabalho
(ex. Artigo de pesquisa: Introdução,
Métodos, Resultados e Discussão, etc.),
formatados em caixa baixa, negrito. É
obrigatório o envio de disquete ou CD-ROM
na primeira etapa do trabalho.
9.2 – PADRÃO DE APRESENTAÇÃO –
a) ARTIGOS ORIGINAIS – redigidos de
acordo com as normas da Revista do CCS
devendo conter no máximo 15 laudas de
texto para artigos originais e 25 para revisões
71
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e observar o que segue:  Título do artigo em
português (caixa alta) e inglês (caixa baixa) e
entre colchetes. Nome(s) completo(s) do(s)
autor(es). Em nota de roda pé a(s)
credencial(is) e local de atividade do(s)
autor(es) (espaço 1,5 cm), email para
correspondência.  Resumo indicativo em
português, de acordo com as normas da
Revista do CCS, com até 100 palavras, em
espaço 1,5.  Palavras-chave - palavras ou
expressões que identifiquem o artigo. Para
determinação das palavras-chave consultar
a lista de “Descritores em Ciências da Saúde
– DECS-LILACS”, elaborada pela IREME
e/ou “Medical Subject Heading –
Comprehensive Medline”. Texto – incluindo
ilustrações (quadros, fotos, modelos, mapas,
desenhos, gravuras, esquemas, gráficos e
tabelas), com seus respectivos títulos e fontes
(quando houver). Exceto gráficos e tabelas,
todas as ilustrações deverão ser designadas
como figuras. As despesas com os fotolitos
de figuras somente coloridas serão de
responsabilidade dos autores  Abstract –
tradução do resumo em inglês, em espaço 1,5
cm.  Keywords – tradução das palavraschave para o inglês.
As referências (Normas de Vancouver) no
texto
deverão
ser
numeradas
consecutivamente de forma crescente e na
ordem que aparecem no texto pela primeira
vez, identificando assim os autores
SOMENTE
POR
NÚMEROS.
A
numeração, no texto, portanto deve ser em
ORDEM
CRESCENTE
e
SOBRESCRITO. NÃO LISTAR OS
NOMES DOS AUTORES NO TEXTO.
No setor de referências: (Normas de
Vancouver)
A
listagem
de
referências deverá seguir a mesma ORDEM
NUMÉRICACRESCENTE do texto. NÃO
COLOCAR OS AUTORES EM ORDEM
ALFABÉTICA.
 EXEMPLOS DE REFERÊNCIAS
A) Artigos de revistas
1. Artigo padrão de revista:
Listar os primeiros seis autores seguido por
et al.
Vega KJ, Pina I, Krevsky B. Heart
transplantation is associated with an
increased risk for pancreatobiliary disease.
Ann Intern Med 1996;124:980-3.
Mais do que seis autores:
Parkin DM, Clayton D, Black RJ, Masuyer
E, Friedl HP, Ivanov E, et al. Childhood-leukaemia in Europe after Chernobyl: 5 year
follow-up. Br J Cancer 1996;73:1006-12.
2. Organização como autor:
The Cardiac Society of Australia and New
Zealand. Clinical exercise stress testing.
Safety and performance guidelines. Med J
Aust 1996;164:282-4.
3. Sem menção de autor:
Cancer in South Africa [editorial]. S Afr
Med J 1994;84:15.
4. Volume com suplemento:
Shen HM, Zhang QF. Risk assessment of
nickel carcinogenicity and occupational lung
cancer. Environ Health Perspect 1994;102
Suppl 1:275-82.
5. Número com suplemento:
Payne DK, Sullivan MD, Massie MJ.
Women's psychological reactions to breast
cancer. Semin Oncol 1996;23(1 Suppl 2):8997.
6. Volume com parte:
Ozben T, Nacitarhan S, Tuncer N. Plasma
and urine sialic acid in non-insulin
dependent diabetes mellitus. Ann Clin
Biochem 1995;32(Pt 3):303-6.
7. Número com parte:
Poole GH, Mills SM. One hundred
consecutive cases of flap lacerations of the
leg in ageing patients. N Z Med J
1994;107(986 Pt 1):377-8.
8. Número sem menção de volume:
Turan I, Wredmark T, Fellander-Tsai L.
Arthroscopic ankle arthrodesis in rheumatoid
arthritis. Clin Orthop 1995;(320):110-4.
9. Sem menção de número nem de
volume:
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Normas de Publicação
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v. 31, n.2, p. 71-74, jul./dez. 2012
Browell DA, Lennard TW. Immunologic
status of the cancer patient and the effects of
blood transfusion on antitumor responses.
Curr Opin Gen Surg 1993:325-33.
10. Paginação em numeração romana:
Fisher GA, Sikic BI. Drug resistance in
clinical
oncology
and
hematology.
Introduction. Hematol Oncol Clin North Am
1995 Apr;9(2):xi-xii.
11. Indicação do tipo de artigo, se
necessário:
Enzensberger W, Fischer PA. Metronome in
Parkinson's
disease
[carta].
Lancet
1996;347:1337. Clement J, De Bock R.
Hematological complications of hantavirus
nephropathy (HVN) [resumo]. Kidney Int
1992;42:1285.
12. Artigo contendo retratação:
Garey CE, Schwarzman AL, Rise ML,
Seyfried TN. Ceruloplasmin gene defect
associated with epilepsy in EL mice
[retractação de Garey CE, Schwarzman AL,
Rise ML, Seyfried TN. In: Nat Genet
1994;6:426-31]. Nat Genet 1995;11:104.
13. Artigo retratado:
Liou GI, Wang M, Matragoon S. Precocious
IRBP gene expression during mouse
development
[retractado
em
Invest
Ophthalmol Vis Sci 1994;35:3127]. Invest
Ophthalmol Vis Sci 1994;35:1083-8.
14. Artigo com erratum publicado:
Hamlin JA, Kahn AM. Herniography in
symptomatic patients following inguinal
hernia repair [erratum publicado encontra-se
em West J Med 1995;162:278]. West J Med
1995;162:28-31.
B- Livros e outras monografias
1. Autor(es) individual:
Ringsven MK, Bond D. Gerontology and
leadership skills for nurses. 2nd ed. Albany
(NY): Delmar Publishers; 1996.
2. Editor(es), compilador, como autor:
Norman IJ, Redfern SJ, editors. Mental
health care for elderly people. New York:
Churchill Livingstone; 1996.
3. Organização como autor e editor:
Institute of Medicine (US). Looking at the
future
of
the
Medicaid
program.
Washington: The Institute; 1992.
4. Capítulo de um livro:
Phillips SJ, Whisnant JP. Hypertension and
stroke. In: Laragh JH, Brenner BM, editors.
Hypertension: pathophysiology, diagnosis,
and management. 2nd ed. New York: Raven
Press; 1995. p. 465-78.
5. Livro de atos de conferência, congresso,
encontro:
Kimura J, Shibasaki H, editors. Recent
advances in clinical neurophysiology.
Proceedings of the 10th International
Congress
of
EMG
and
Clinical
Neurophysiology; 1995 Oct 15-19; Kyoto,
Japan. Amsterdam: Elsevier; 1996.
6. Comunicação em conferência:
Bengtsson S, Solheim BG. Enforcement of
data protection, privacy and security in
medical informatics. In: Lun KC, Degoulet
P, Piemme TE, Rienhoff O, editors.
MEDINFO 92. Proceedings of the 7th World
Congress on Medical Informatics; 1992 Sep
6-10; Geneva, Switzerland. Amsterdam:
North-Holland; 1992. p. 1561-5.
7. Relatório técnico ou científico:
Publicado pela entidade financiadora ou
patrocinadora: Smith P, Golladay K.
Payment for durable medical equipment
billed during skilled nursing facility stays.
Final report. Dallas (TX): Dept. of Health
and Human Services (US), Office of
Evaluation and Inspections; 1994 Oct.
Report
No.:
HHSIGOEI69200860.
Publicado pela entidade executora: Field
MJ, Tranquada RE, Feasley JC, editors.
Health services research: work force and
educational issues. Washington: National
Academy Press; 1995. Contract No.:
AHCPR282942008. Sponsored by the
Agency for Health Care Policy and
Research.
8. Dissertação:
Kaplan SJ. Post-hospital home health care:
the elderly's access and utilization
[dissertação]. St. Louis (MO): Washington
Univ.; 1995.
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9. Patente:
Larsen CE, Trip R, Johnson CR, inventors;
Novoste Corporation, assignee. Methods for
procedures related to the electrophysiology
of the heart. US patent 5,529,067. 1995 Jun
25.
C).Outras publicações
1. Artigo de jornal:
Lee G. Hospitalizations tied to ozone
pollution: study estimates 50,000 admissions
annually. The Washington Post 1996 Jun
21;Sect. A:3 (col. 5).
2. Material audiovisual:
HIV+/AIDS: the facts and the future
[cassette video]. St. Louis (MO): MosbyYear Book; 1995
3. Texto legal:
Legislação publicada Preventive Health
Amendments of 1993, Pub. L. No. 103-183,
107 Stat. 2226 (Dec. 14, 1993). Legislação
não
promulgada:
Medical
Records
Confidentiality Act of 1995, S. 1360, 104th
Cong., 1st Sess. (1995). Code of Federal
Regulations: Informed Consent, 42 C.F.R.
Sect. 441.257 (1995). Audição: Increased
Drug Abuse: the Impact on the Nation's
Emergency Rooms: Hearings Before the
Subcomm. on Human Resources and
Intergovernmental Relations of the House
Comm. on Government Operations, 103rd
Cong., 1st Sess. (May 26, 1993).
4. Mapa:
North Carolina. Tuberculosis rates per
100,000 population, 1990 [demographic
map]. Raleigh: North Carolina Dept. of
Environment, Health, and Natural Resources,
Div. of Epidemiology; 1991.
5. Livro da Bíblia:
The Holy Bible. King James version. Grand
Rapids (MI): Zondervan Publishing House;
1995. Ruth 3:1-18.
6. Dicionário e referências semelhantes:
Stedman's medical dictionary. 26th ed.
Baltimore: Williams & Wilkins; 1995.
Apraxia; p. 119-20.
7. Texto clássico:
The Winter's Tale: act 5, scene 1, lines 1316. The complete works of William
Shakespeare. London: Rex; 1973.
B) Material não publicado
8. Aguardando publicação:
Leshner AI. Molecular mechanisms of
cocaine addiction. N Engl J Med. Em
publicação 1996. Material electrónico
C) Material eletrônico
9. Revista em formato eletrônico:
Morse SS. Factors in the emergence of
infectious diseases. Emerg Infect Dis [serial
online] 1995 Jan-Mar [cited 1996 Jun 5];
1(1):[24 ecrans]. Disponível em: URL:
http://www.cdc.gov/ncidod/EID/eid.htm
10. Monografia em formato eletrônico:
CDI, clinical dermatology illustrated
[monografia em CD-ROM]. Reeves JRT,
Maibach H. CMEA Multimedia Group,
producers. 2nd ed . Version 2.0. San Diego:
CMEA; 1995.
11. Ficheiro de computador:
Hemodynamics III: the ups and downs of
hemodynamics [programa de computador].
Version 2.2. Orlando (FL): Computerized
Educational Systems; 1993.
10.O(s) autores deverão encaminhar o artigo
para análise acompanhado de uma carta com
os seguintes dizeres:
(Cidade, data)
À Comissão Editorial
Revista de Ciências da Saúde
Os autores abaixo assinados transferem come
exclusividade, os direitos de publicação, na
Revista de Ciências da Saúde do artigo
intitulado: (escrever título do artigo) e
garantem que o artigo é inédito e não está
sendo avaliado ou foi publicado por outro
periódico.
(incluir nome completo de todos os autores,
endereço postal, telefone, email, fax, e
assinaturas respectivas).
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