UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO DISSOLUÇÃO DA UNIÃO ESTÁVEL E SEUS EFEITOS PATRIMONIAIS NO DIREITO DE FAMÍLIA FERNANDA GRESS Itajaí, junho de 2010 UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO DISSOLUÇÃO DA UNIÃO ESTÁVEL E SEUS EFEITOS PATRIMONIAIS NO DIREITO DE FAMÍLIA FERNANDA GRESS Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito. Orientador: Professora Dra. Cláudia Regina Altroff Figueiredo Itajaí, junho de 2010 AGRADECIMENTO A minha irmã, Katia Gress por estar sempre me incentivando e acreditando na minha força de vontade. Aos amigos que de forma e de outra estiveram no meu lado nesta busca pelo conhecimento e aprimoramento. Aos mestres que com paciência lecionaram durante todos esses anos de academia, fornecendo contribuições a formação acadêmica. DEDICATÓRIA A Deus, que sempre esteve presente em todos os momentos da minha vida e por ter concedido a possibilidade de estar realizando um sonho; Ao meu pai Guido Fuchs, que colaborou para com a minha formação. A minha mãe Nilse Gress, por ter me apoiado em todos os momentos da minha vida, incentivando e fornecendo todos os recursos possíveis para que um sonho se tornasse realidade. A meu noivo Rafael Martins Carrara, por todo o seu companheirismo, paciência, motivação, e incentivo que tem me dado em todos os momentos. Contribuindo para que cada vez mais me aprimorasse, sempre com muito amor e carinho. TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e a Orientadora de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo. Itajaí, junho de 2010 Fernanda Gress Graduanda PÁGINA DE APROVAÇÃO A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Fernanda Gress, sob o título Dissolução da União Estável e os seus efeitos patrimoniais no direito de família, foi submetida em 10 de junho de 2010 à banca examinadora composta pelos seguintes professores: Dra. Cláudia Regina Altroff Figueiredo Presidente da Banca e Dra. Maria Fernanda Girardi examinadora, e aprovada com a nota 10 (Dez). Itajaí, junho de 2010 Professora Dra. Cláudia Regina Altroff Figueiredo Orientadora e Presidente da Banca Professor MSc. Antonio Augusto Lapa Coordenação da Monografia ROL DE CATEGORIAS Rol de categorias que a Autora considera estratégicas à compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais. Casamento Para Silvio Rodrigues1: “[...] é o contrato de direito de família que tem por fim promover a união do homem e da mulher, de conformidade com a lei, a fim de regularem suas relações sexuais, cuidarem da prole comum e se prestarem mútua assistência”. Concubinato Para Carlos Roberto Gonçalves2: “[...] relacionamento amoroso envolvendo pessoas casadas, que infringem o dever de fidelidade, também conhecido como adulterino”. Direito de família Conforme Maria Berenice Dias3: “[...] mais do que uma definição, acaba sendo feita a enumeração dos vários institutos que regulam não só as relações entre pais e filhos, mas também entre cônjuges e conviventes, ou seja, a relação das pessoas ligadas por um vínculo de consangüinidade, afinidade ao afetividade”. Entidade familiar Para Roberto Senise Lisboa4. “[...] é todo grupo de pessoas que constitui uma família”. Família 1 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. 28. ed. São Paulo: Saraiva, 2004. p.20. 2 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 15. 3 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 4. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 33. 4 LISBOA, Roberto Senise. Manual de direito civil: direito de família e sucessões. 3 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. v. 5. p. 44. Para Silvio Rodrigues5: “[...] formada por todas aquelas pessoas ligadas por vínculo de sangue, ou seja, todas aquelas pessoas provindas de um tronco ancestral comum, o que corresponde a incluir dentro da órbita da família todos os parentes consangüíneos. Numa acepção um pouco mais limitada, poder-se-ia compreender a família como abrangendo os consangüíneos em linha reta e os colaterais sucessíveis, isto é, os colaterais até o quarto grau. Num sentido mais restrito, constitui família o conjunto de pessoas compreendido pelos pais e sua prole”. União estável Conforme Sílvio Rodrigues6. “[...] é a união do homem e da mulher, fora do matrimonio, de caráter estável, mais ou menos prolongada, para o fim de satisfação sexual, assistência mutua e dos filhos comuns e que implica uma presumida fidelidade recíproca entre a mulher e o homem”. Efeitos patrimoniais Para Maria Berenice Dias7: “Ainda que a união estável não se confunda com o casamento, gera um quase casamento na identificação de seus efeitos”. 5 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p. 04-05. 6 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p. 259. 7 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p. 154. SUMÁRIO RESUMO .......................................................................................... 10 INTRODUÇÃO ................................................................................. 11 CAPÍTULO 1 .................................................................................... 14 DIREITO DE FAMÍLIA ...................................................................... 14 1.1 NOÇÕES HISTÓRICAS DA FAMÍLIA ............................................................ 14 1.2 CONCEITO DE FAMÍLIA ................................................................................ 18 1.3 PRINCÍPIOS DO DIREITO DE FAMÍLIA ........................................................ 21 1.3.1 Princípio jurídico da afetividade ............................................................... 22 1.3.2 Princípio do respeito à dignidade da pessoa humana............................ 23 1.3.3 Princípio da solidariedade familiar ........................................................... 24 1.3.4 Princípio da igualdade entre os cônjuges ............................................... 25 1.3.5 Princípio da igualdade dos filhos ............................................................. 26 1.3.6 Princípio do pluralismo familiar ................................................................ 27 1.3.7 Princípio da liberdade às relações de família .......................................... 28 1.4 NOVOS PARADIGMAS DO DIREITO DE FAMÍLIA ...................................... 29 CAPÍTULO 2 .................................................................................... 36 SOCIEDADES CONJUGAIS NO DIREITO BRASILEIRO ................ 36 2.1 CASAMENTO ................................................................................................. 36 2.2 CONCEITO DE CASAMENTO ....................................................................... 40 2.3 NATUREZA JURÍDICA................................................................................... 42 2.4 REGIME DE BENS ......................................................................................... 45 2.4.1 Do regime da comunhão parcial ............................................................... 46 2.4.2 Do regime da comunhão universal ........................................................... 49 2.4.3 Do regime da participação final nos aquestos ........................................ 51 2.4.4 Do regime de separação de bens ............................................................. 52 2.5 DA DISSOLUÇÃO DA SOCIEDADE E DO VÍNCULO CONJUGAL .............. 54 2.6 CONCUBINATO E NATUREZA JURÍDICA ................................................... 57 CAPÍTULO 3 .................................................................................... 62 DA UNIÃO ESTÁVEL NO DIREITO DE FAMÍLIA ............................ 62 3.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA ............................................................................... 62 3.2 CONCEITO DA UNIÃO ESTÁVEL E COMPANHEIRO.................................. 66 3.3 CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988...... 69 3.4 CÓDIGO CIVIL DE 2002 – LEI 10.406 ........................................................... 73 3.5 REGIMES DE BENS E CONTRATO DE CONVIVÊNCIA .............................. 75 3.6 CONVERSÃO DA UNIÃO ESTÁVEL EM CASAMENTO............................... 81 3.7 AÇÃO DE RECONHECIMENTO .................................................................... 83 3.8 EFEITOS DA DISSOLUÇÃO .......................................................................... 86 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................. 92 REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS .......................................... 95 ANEXOS........................................................................................... 97 RESUMO A monografia, aborda acerca da união estável, tema este muito em voga, que se caracteriza pela união entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família. Primeiramente estuda a evolução das famílias, sua conceituação, princípios e paradigmas, em seguida trata do casamento, conceituação, natureza jurídica e regime de bens. Contudo, é no segundo capítulo que se inicia o estudo acerca do concubinato, e através desse, chega-se ao terceiro capítulo, o qual nos traz a evolução histórica da união estável, seu conceito. A partir de então de forma mais profunda observou-se que há uma evolução no ordenamento jurídico, estudo que se deu através de leituras nas leis citadas no decorrer da monografia. Por último cabe salientar que a partir de então pode-se observar que quando não há contrato de convivência realizado pelos companheiros, se vale do regime de comunhão parcial de bens. Contudo também foi abordado a conversão da união estável em casamento, ação de reconhecimento e efeitos da dissolução. Cabe ressaltar que o método utilizado foi o indutivo, como base lógica e o cartesiano na fase do tratamento dos dados colhidos. Palavras-chave: Casamento. Concubinato. Entidade familiar. Família. União Estável. INTRODUÇÃO A presente Monografia tem como objeto o estudo dos conhecimentos sobre a União Estável e seus efeitos decorrentes da dissolução no direito de família. Tem como objetivo analisar e identificar os efeitos patrimoniais da união estável, ou seja, ampliar meus conhecimentos na área de direito civil focando no direito de família, e produzir a Monografia para obtenção do Título de Bacharel em Direito - Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI. Como objetivos específicos de estudar a família desde a sua evolução até sua conceituação e atuais formas; o que vem a ser união estável, seus requisitos, dissolução e efeitos patrimoniais. A escolha do tema deve-se pelo motivo da necessidade de uma compreensão mais especifica da União Estável, bem como, seus efeitos patrimoniais. Contudo cabe ressaltar que a união estável, se caracteriza pela união entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família. A presente monografia está composta de três capítulos. Para tanto, principia–se, no Capítulo 1, tratando da evolução histórica da família, sua conceituação, princípios do direito de família e os novos paradigmas do direito de família. No Capítulo 2, tratando do casamento, sua conceituação, natureza jurídica, regimes de bens. Também nesse capítulo será abordado acerca do concubinato e natureza jurídica, assunto o qual da ênfase ao terceiro capítulo. No Capítulo 3, tratar-se-á de evidenciar a união estável, sua evolução histórica, sua conceituação, bem como o regime de bens, contrato de 12 união estável, conversão da união estável em casamento, ação de reconhecimento e efeitos da dissolução. O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões sobre a dissolução da união estável e seus efeitos patrimoniais. Para a presente monografia foram levantadas as seguintes hipóteses: Primeiro problema: O que vem a ser União Estável? Hipótese: A União Estável é uma entidade familiar, tendo como elo o homem e a mulher, em convivência pública e continua imbuídos de constituir uma entidade familiar. Segundo problema: A União Estável é reconhecida como entidade familiar? Hipótese: é reconhecida como entidade familiar a união estável entre homem e mulher. Terceiro problema: Qual a finalidade do reconhecimento da União Estável? Hipótese: O reconhecimento da União Estável se dá pela necessidade do reconhecimento do vínculo entre o homem e a mulher, para a posterior dissolução. Quatro problema: Quais os efeitos patrimoniais da dissolução da União Estável? Hipótese: Observa-se que na União Estável, salvo se houver um contrato entre os companheiros estabelecendo regime diverso da comunhão parcial de bens, aplica-se o regime legal. 13 Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase de Investigação foi utilizado o Método Indutivo, na Fase de Tratamento de Dados o Método Cartesiano, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente Monografia é composto na base lógica Indutiva. Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as Técnicas do Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da Pesquisa Bibliográfica. CAPÍTULO 1 DIREITO DE FAMÍLIA. O primeiro capítulo da presente monografia é dedicado ao direito de família. Seu objetivo é trazer uma contextualização histórica da família, discorrer sobre os princípios de direito de família, fazer ainda uma abordagem panorâmica sobre os novos paradigmas do direito de família. 1.1 NOÇÕES HISTÓRICAS DA FAMÍLIA Inicialmente, cuida-se de fazer uma abordagem sobre as noções históricas da família, assim, pode-se observar que a família brasileira, como hoje é conceituada, sofreu influências da família romana, da família canônica e da família germânica8. Compreende Sebastião José Roque9 sobre a sociedade familiar: Em princípio a sociedade familiar é uma sociedade binária, constituída de marido e mulher. Depois se alarga com o surgimento dos filhos. Sob outros prismas, a família alarga-se ainda mais: ao se casarem, os filhos não rompem o vínculo familiar com seus pais e estes continuam fazendo parte da família; os irmãos não se desgarram, também, e, por seu turno, casam-se e trazem os filhos para o seio familiar. Desta forma o doutrinador concluiu que “a família é uma sociedade natural, formada por pessoas físicas, unidas por laços de sangue ou de afinidade. Os laços de sangue resultam da descendência, ou seja, de pai para 8 WALD, Arnoldo. O novo direito de família. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 09. 9 ROQUE, Sebastião José. Direito de família. São Paulo: Ícone, 1994. p. 15. 15 filho”. Já a afinidade se dá com as pessoas estranhas, ou seja, aquelas que agregam à sociedade familiar pelo casamento, como os cônjuges10. Em relação ao casamento, a noiva, ou seja, a nova “mater famílias” assumia a posição de esposa e o domicilio do marido. Devia-lhe obediência e fidelidade11. A família romana antiga era definida como conjunto de pessoas que estavam sob a patria potestas do ascendente comum vivo. O conceito de família independia assim da consangüinidade. O pater famílias exercia a sua autoridade sobre todos os seus descendentes não emancipados, sobre a sua esposa e sobre as mulheres casadas com manus com os seus descendentes12. Orlando Gomes13 diz ainda que no direito romano antigo, “dividiam-se as pessoas quanto ao estado na família – status familiae – em sui júris e alieni júris. Na primeira categoria situavam-se o pater famílias, na segunda, as pessoas submetidas ao seu poder”. Ou seja, “o poder do pater exercido sobre a mulher, os filhos e os escravos é quase absoluto” 14. Porém, o direito de família era muito complexo, prevendo vários tipos de famílias. Em sentido técnico e restrito, a família era o complexo de pessoas livres, que se encontravam momentaneamente sob o poder do mesmo pater. Era preponderante o poder e a posição do pai, chefe da comunidade doméstica15. Carlos Roberto Gonçalves16 complementa dizendo que “o ascendente comum vivo mais velho era, ao mesmo tempo, chefe político, 10 ROQUE, Sebastião José. Direito de família. p.15. 11 ROQUE, Sebastião José. Direito de família. p.18. 12 WALD, Arnoldo. O novo direito de família. p.09. 13 GOMES, Orlando. Direito de família. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p.39. 14 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. 5. ed. São Paulo: atlas, 2005. v. 5. p. 20. 15 ROQUE, Sebastião José. Direito de família. p.17. 16 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. p.15. 16 sacerdote e juiz. Comandava e oficializava o culto dos deuses domésticos e distribuía a justiça”. É relevante destacar que se caso o pater famílias morresse, o pátrio poder não passava para a mãe nem as filhas, uma vez que o pátrio poder era vedado às mulheres. Assim o filho mais velho passava a ser o “pater famílias” e adquiria o pátrio poder sobre seus filhos17. Arnoldo Wald18 esclarece: A família era então simultaneamente, uma unidade econômica, religiosa, política e jurisdicional. Inicialmente, havia um patrimônio só que pertencia à família, embora administrado pelo pater. Numa fase mais evoluída do direito romano, surgiam patrimônios individuais, como os pecúlios, administrados por pessoas que estavam sob autoridade do pater. Também pode-se dizer que “a família era uma unidade religiosa, pois tinha uma religião própria, a religião doméstica dos antepassados falecidos” 19 .Os membros da família antiga eram unidos por vínculo mais poderoso que o nascimento: a religião doméstica, e o culto dos antepassados. Esse culto era dirigido pelo pater20. Sílvio de Salvo Venosa21 demonstra a importância da família: [...] a família era um grupo de pessoas sob o mesmo lar, que invocava os mesmos antepassados. Por essa razão, havia necessidade de que nunca desaparecesse, sob pena de não mais serem cultuados os antepassados, que cairiam em desgraça. Por isso, era sempre necessário que um descendente homem continuasse o culto familiar. Daí a importância da adoção no velho direito, como a forma de perpetuar o culto, na impossibilidade de assim fazer o filho de sangue. 17 ROQUE, Sebastião José. Direito de família. p.17. 18 WALD, Arnoldo. O novo direito de família. p. 09 19 WALD, Arnoldo. O novo direito de família. p.09. 20 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 20. 21 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 20. 17 No entanto, cabe frisar ainda que “o pater famílias administrava a justiça dentro dos limites da casa e, na primeira fase do direito romano antigo, a família era uma unidade política, constituindo-se o Senado pela reunião dos chefes de famílias” 22. Neste sentido Guilherme Calmon Nogueira da Gama23 destaca: Pode-se dizer, portanto que nos primórdios das civilizações, a família era uma instituição que tinha, essencialmente, bases políticas e religiosas, e na qual refulgia a auctoritas do chefe da família, que a esta representava como um todo integrante da sociedade. Existia em Roma duas espécies de parentesco: a agnação e a cognação. A agnação24 vincula as pessoas que estavam sujeitas ao mesmo pater, mesmo quando não fossem consangüíneos. E a cognação25 era o parentesco pelo sangue que existia entre pessoas que não deviam necessariamente ser agnados uma da outra. A evolução da família romana antiga foi no sentido de se restringir progressivamente a autoridade do pater, dando maior autonomia à mulher e aos filhos26. “Na época do Império, a mulher passa a gozar de autonomia, participando da vida social e política” 27. Com isso, “o casamento com manus que se realizava mediante solenidades especiais, como a confarreatio, a coempitio e o usus, foi sendo substituído pelo casamento sem manus” 28. 22 WALD, Arnoldo. O novo direito de família. p.10. 23 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. O companheirismo uma espécie de família. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998. p.27. 24 WALD, Arnoldo. O novo direito de família. p.10. 25 WALD, Arnoldo. O novo direito de família. p. 10. 26 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. p.15. 27 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. O companheirismo uma espécie de família. p.26. 28 WALD, Arnoldo. O novo direito de família. p.10. 18 Em relação a emancipação do filho, que por outros momentos era considerada como sendo uma pena, passou a ser um favor, conservando o emancipado os seus direitos sucessórios29. A família germânica era do “tipo paternal”, ou seja, o pátrio poder é o poder do pai e não o poder do chefe de família, sendo que a esposa era reservada uma posição moralmente elevada30. Pode-se verificar que a evolução da família vem sendo desde a época do Direito Romano antigo, frente a uma série de influências. Cabe frisar que muitas das modificações estão em andamento, basta lembrar as discussões que vem sendo travadas mundialmente, particularmente no Brasil, quanto a família e as repercussões jurídicas daí decorrentes31. 1.2 CONCEITO DE FAMÍLIA No próprio direito romano antigo a família era empregada em várias acepções, aplicando-se às coisas e às pessoas. Ora significava o conjunto de pessoas sujeitas ao poder do pater famílias, ora o grupo dos parentes unidos pelo vínculo da cognação, ora patrimônio ou a herança32. Guilherme Calmon Nogueira da Gama33 acredita que todos os estudiosos, no entanto, são uníssomos em considerar a família como célula básica da sociedade, razão pela qual a preocupação em conceituá-la e apontar as suas espécies. Caio Mário da Silva Pereira34 compreende que: 29 WALD, Arnoldo. O novo direito de família. p.11. 30 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. O companheirismo uma espécie de família. p.30. 31 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. O companheirismo uma espécie de família. p. 32. 32 GOMES, Orlando. Direito de família. p. 33. 33 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. O companheirismo uma espécie de família. p.32. 34 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. direito de família. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p.19. 19 Em sentido genérico e biológico, considera-se família o conjunto de pessoas que descendem de tronco ancestral comum. Ainda neste plano geral, acrescenta-se o cônjuge, aditam-se os filhos do cônjuge (enteados), os cônjuges dos filhos (genros e noras), os cônjuges dos irmãos e os irmãos do cônjuge (cunhados). Ainda na mesma linha de raciocínio Orlando Gomes35 relata que: Modernamente, perdeu o sentido etnológico de grupo das pessoas que vivem sob o mesmo teto, com economia comum. Emprega-se, no entanto, com diverso significado. Em acepção lata, compreende todas as pessoas descendentes de ancestral comum, unidas pelos laços do parentesco, às quais se ajuntam os afins. Neste sentido, abrange, além dos cônjuges e da prole, os parentes colaterais até certo grau, como tio, sobrinho, primo, e os parentes por afinidade, sogro, genro, nora, cunhado. Stricto sensu, limita-se aos cônjuges e seus descendentes, englobando, também, os cônjuges dos filhos. Designa a palavra família mais estritamente ainda o grupo composto pelos cônjuges e filhos menores. Neste mesmo norte, Sílvio de Salvo Venosa36 conceitua família num conceito amplo como conjunto de pessoas unidas por vínculo jurídico de natureza familiar, onde compreende os ascendentes, descendentes e colaterais de uma linhagem, incluindo-se os ascendentes, descendentes e colaterais do cônjuge, ou seja, parentes por afinidade ou afins. Inclui-se o cônjuge, que não é considerado parente. Num conceito mais restrito, a família compreende somente pelo núcleo formado por pais e filhos que vivem sobre o pátrio poder. Silvio Rodrigues37 conceitua família de forma ampla, numa acepção um pouco mais limitada e num sentido ainda mais restrito: Num conceito mais amplo poder-se-ia definir família como formada por todas aquelas pessoas ligadas por vínculo de sangue, ou seja, todas aquelas pessoas provindas de um tronco ancestral comum, o que corresponde a incluir dentro da órbita da família todos os parentes consangüíneos. Numa acepção um pouco mais limitada, poder-se-ia compreender a família como 35 GOMES, Orlando. Direito de família. p.33. 36 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 18. 37 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p. 04-05. 20 abrangendo os consangüíneos em linha reta e os colaterais sucessíveis, isto é, os colaterais até quarto grau. Num sentido ainda mais restrito, constitui a família o conjunto de pessoas compreendido pelos pais e sua prole. De forma mais precisa Arnoldo Wald38 conceitua família: Família num sentido amplo – conjunto de pessoas ligadas pelo vínculo da consangüinidade, ou seja, os descendentes de um tronco comum -, a família em sentido estrito, abrangendo o casal e seus filhos legítimos, legitimados ou adotivos. Clóvis Beviláqua apud Guilherme Calmon Nogueira da Gama39, entende que a família é o conjunto de pessoas ligadas pelo vínculo da consangüinidade, cuja eficácia estende ora mais larga, ora mais restritamente, segundo as várias legislações; outras vezes, porém, designam-se por família somente os cônjuges e a respectiva progênie. Carlos Roberto Gonçalves40 se manifesta acerca da família constituída por pais e sua prole: Trata-se de instituição jurídica e social, resultante de casamento ou união estável, formada por duas pessoas de sexos diferente com a intenção de estabelecerem uma comunhão de vidas e, via de regra, de terem filhos a quem possam transmitir o seu nome e o seu patrimônio. Diante os conceitos de família, é de suma importância a conceituação de direito de família. Clóvis Beviláqua apud Silvio Salvo Venosa41 definiu de forma perene: Direito de família é o complexo das normas, que regulam a celebração do casamento, sua validade e os efeitos, que dele resultam, as relações pessoais e econômicas da sociedade conjugal, a dissolução desta, as relações entre pais e filhos, o vínculo do parentesco e os institutos complementares da tutela e curatela. 38 WALD, Arnoldo. O novo direito de família. p.05. 39 BEVILÁQUA, Clóvis in GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. O companheirismo uma espécie de família. p. 03. 40 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p.02. 41 BEVILÁQUA, Clóvis in VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 25. 21 Na definição de Clóvis Beviláqua há que se acrescentar, hoje, as normas reguladoras das uniões sem casamento42. Dessa conceituação infere-se que de conformidade com a sua finalidade, tais normas ora regem as relações pessoais entre os cônjuges ou conviventes, entre pais e filhos, entre parentes, como as que tratam dos efeitos pessoais do matrimônio, da filiação, ou as que autorizam o filho a promover a investigação de sua paternidade etc.; ora regulam as relações patrimoniais que surgem [...]; ora disciplinam as relações assistenciais que existem entre os cônjuges ou conviventes, os filhos perante os pais, o tutelado ante o tutor e o interdito em face do curador43. Carlos Roberto Gonçalves44 de forma sucinta conceitua direito de família como sendo “ramo do direito civil que disciplina as relações entre pessoas unidas pelo matrimônio, pela união estável ou pelo parentesco, bem como os institutos complementares da tutela e curatela”. Para Maria Berenice Dias45 conceitua o direito de família como sendo uma enumeração dos vários institutos que regulam não só as relações entre pais e filhos, mas também entre cônjuges e conviventes, ou seja, aquelas ligadas por vinculo de consangüinidade, afinidade ou ainda por afetividade. No passado a referência jurídica da família tinha por base o casamento, é interessante observar que só mais recentemente a família foi observada pelos juristas sob o prisma de instituição, abrangendo tanto as famílias sem casamento quanto as chamadas famílias monoparentais. 46 1.3 PRINCÍPIOS DO DIREITO DE FAMÍLIA Com a evolução social e aos bons costumes obteve-se mudanças legislativas nas últimas décadas, com ampla atualização e 42 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 25. 43 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: Direito de família. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 04. 44 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de Família. p. 03. 45 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.33. 46 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 25. 22 regulamentação dos aspectos essenciais do direito de família, as quais visam a coesão familiar e valores culturais, dessa forma o direito de família segue pelos seguintes princípios. 1.3.1 Princípio jurídico da afetividade O primeiro e o mais importante princípio do novo Direito de Família, conforme Orlando Gomes é o que põe a ratio, o fundamento básico, do matrimônio e da vida conjugal na afeição entre os cônjuges e “a necessidade de que perdure completa comunhão de vida” 47. O Princípio da comunhão plena de vida baseada na afeição entre os cônjuges ou conviventes tem relação com o aspecto espiritual do casamento e com o companheirismo que nele deve existir48. Maria Helena Diniz49 complementa: “vedada a qualquer pessoa jurídica, seja ela de direito público ou privado, a interferência na comunhão da vida instituída pela família”. Orlando Gomes50 entende que: A ratio é, porem, o suporte do casamento e a razão por que essas finalidades se cumprem. O que há de novo é a tendência para fazer da affectio a ratio única de casamento, e com tamanha força que a dissolução do vínculo matrimonial passou a ser admitida em algumas legislações como um efeito do desaparecimento de sua ratio, toda vez que tenha fracassado e não possa ser reconstituído. Maria Berenice Dias51 salienta que o afeto não é fruto da biologia e sim de laços de afeto e solidariedade que derivam da convivência familiar. Tem-se que “o princípio da afetividade na relação entre cônjuges e 47 GOMES, Orlando. Direito de família. p. 23. 48 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. p. 08. 49 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito civil brasileiro: direito de família. p. 18. 50 GOMES, Orlando. Direito de família. p.23. 51 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.68. 23 companheiros incide enquanto houver afetividade real, pois esta é o pressuposto da convivência” 52. Carlos Roberto Gonçalves53 entende que a dissolução da sociedade conjugal pela separação judicial e pelo divórcio tende a ser uma conseqüência da extinção da affectio, e não da culpa de qualquer dos cônjuges. 1.3.2 Princípio do respeito à dignidade da pessoa humana O Princípio da dignidade humana é o maior, fundante do Estado Democrático de Direito, é o mais universal de todos os princípios, um macroprincípio do qual irradiam os demais54. Para Paulo Lôbo55 “a dignidade da pessoa humana é o núcleo existencial que é essencialmente comum a todas as pessoas humanas, como membros iguais do gênero humano, impondo-se um dever geral de respeito, proteção e intocabilidade”. Cabe relembrar que “na família patriarcal, a cidadania plena concentrava-se na pessoa do chefe, dotado de direitos que eram negados aos demais membros, a mulher e o filhos, cuja dignidade humana não podia ser a mesma” 56. Com a evolução pode-se observar que o direito das famílias está umbilicalmente ligado aos direitos humanos e em igual dignidade para todas as entidades familiares, sendo assim indigno dar tratamento diferenciado as várias formas de filiação ou aos vários tipos de família57. Para Maria Helena Diniz58o princípio do respeito a dignidade da pessoa humana “constitui base da comunidade familiar, garantindo o pleno 52 LÔBO, Paulo. Famílias. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 48. 53 GONÇALVES, Carlos Roberto.Direito civil brasileiro: Direito de Família. p.08-09. 54 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.59. 55 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 37. 56 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 37. 57 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.60. 58 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 22. 24 desenvolvimento e a realização de todos os seus membros, principalmente da criança e do adolescente”. O direito de família é o mais humano de todos os ramos do direito59, por isso, os valores coletivos da família, e os pessoais de cada membro devem buscar permanentemente o equilíbrio60. Neste contexto Paulo Lôbo61 complementa: Consumaram-se na ordem jurídica as condições e possibilidades para que as pessoas, no âmbito das relações familiares, realizem e respeitem reciprocamente suas dignidades como pais, filhos, cônjuges, companheiros, parentes, crianças idosos, ainda que a dura realidade da vida nem sempre corresponda a esse desiderato. É de importância asseverar: O Estado não tem apenas o dever de abster-se de praticar atos que atentem contra a dignidade humana, mas também deve promover essa dignidade através de condutas ativas, garantindo o mínimo existencial para cada ser humano do território62. Maria Berenice Dias63 ressalta ainda que “o direito de buscar a separação e o divórcio estão amparados no princípio da dignidade humana, nada justificando a resistência do Estado ao impor prazos ou exigir identificação de causas para pôr fim ao casamento”. 1.3.3 Princípio da solidariedade familiar O princípio da solidariedade familiar, se deve primeiramente a solidariedade que é o que cada um deve ao outro64. Também significa um vínculo de sentimento racionalmente guiado, limitado e autodeterminado que compele à oferta de ajuda65. 59 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. p.06. 60 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 39. 61 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 39. 62 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.60. 63 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.60. 64 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. P. 63. 65 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 39. 25 Tem origem nos vínculos afetivos, dispõe de conteúdo ético, pois contém em suas entranhas o próprio significado da expressão solidariedade, que compreende a fraternidade e a reciprocidade. A pessoa só existe enquanto coexiste66. Portanto, é importante lembrar que “a solidariedade do núcleo familiar deve entender-se como solidariedade recíproca dos cônjuges e companheiros, principalmente quanto à assistência moral e material” 67. 1.3.4 Princípio da igualdade entre os cônjuges Outro princípio é o da paridade dos cônjuges68, também chamada de Princípio da igualdade jurídica dos cônjuges e dos companheiros69 “no que atina aos seus direitos e deveres, que revolucionou o governo da família organizada sobre a base patriarcal” 70. Segundo Orlando Gomes71, “o poder marital desapareceu dos Códigos e a autocracia do chefe de família e cabeça de casal é substituída por um sistema em que as decisões devem ser tomadas de comum acordo pelo marido e pela mulher”. Ou seja, “acaba com o poder marital e com o sistema de encapsulamento da mulher, restrita a tarefas domésticas e à procriação” 72. Orlando Gomes73 contínua a explanação: Abolida, do ponto de vista jurídico, toda distinção com fundamento na diferenciação dos sexos, resta saber, contudo, em que medida repercute na sociedade conjugal a igualdade. Conseqüência lógica e inevitável da paridade é a eliminação do poder marital, não se compreendendo subsista a submissão legal da mulher. Juridicamente o poder do marido deve ser substituído pela autoridade conjunta e indivisa. Nenhuma concepção das relações 66 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.63. 67 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 41. 68 GOMES, Orlando. Direito de família. p. 24. 69 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 18. 70 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 18. 71 GOMES, Orlando. Direito de família. p. 24-25. 72 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. p. 07. 73 GOMES, Orlando. Direito de família. p. 24-25. 26 conjugais “reflete mais fielmente o caráter orgânico do casamento que funde os cônjuges em uma só personalidade”. Há uma equivalência de papéis, de modo que a responsabilidade pela família passa a ser dividida igualmente entre o casal74. O dever de prover à manutenção da família deixou de ser apenas um encargo do marido, incumbindo também à mulher, de acordo com as possibilidades de cada qual75. Paulo Lôbo76 entende: A igualdade e seus consectários não podem apagar ou desconsiderar as diferenças naturais e culturais que há entre as pessoas e entidades. Homem e mulher são diferentes; pais e filhos são diferentes; criança e adulto ou idoso são diferentes; a família matrimonial, união estável, a família monoparental e as demais entidades familiares são diferentes. Todavia, as diferenças não podem legitimar tratamento jurídico assimétrico ou desigual, no que concernir com a base comum dos direitos e deveres, ou com o núcleo intangível da dignidade de cada membro da família. O princípio da igualdade de tratamento exige que a hierarquia entre as gerações seja atenuada77. Por último, pode-se observar que os conflitos oriundos de divergências em torno da solução de problemas de interesse comum do homem e da mulher, hão de ser resolvidos nos tempos presentes, pela autoridade judicial, pois manifestamente superada a concepção autoritária e patriarcal da família.78 1.3.5 Princípio da igualdade dos filhos O princípio da igualdade dos filhos diz respeito à filiação e se traduz na igualdade entre os filhos de toda espécie79. Estabelecendo “absoluta 74 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 19. 75 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de Família. p. 07. 76 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 44. 77 OLIVEIRA, José Lamartine Corrês de; MUNIZ, Francisco José Ferreira. Curso de direito de família. 4. ed. Curitiba: Juruá, 2004. p. 18. 78 GOMES, Orlando. Direito de família. p.26. 79 GOMES, Orlando. Direito de família. p.26. 27 igualdade entre todos os filhos, não admitindo mais retrógrada distinção entre filiação legítima ou ilegítima” 80. Orlando Gomes81 nos traz a seguinte orientação: Nenhuma distinção entre legítimos e filhos simplesmente naturais quanto a nome, pátrio-poder e sucessão; Reconhecimento dos filhos havidos fora do matrimônio, sem limitação alguma quanto aos direitos do filho, inclusive o de sucessão; Proibição de revelar a ilegitimidade simples ou a espuriedade no assento do nascimento. Carlos Roberto Gonçalves82 complementa a idéia trazida por Orlando Gomes: Não admite distinção entre filhos legítimos, naturais e adotivos, quanto ao nome, poder familiar, alimentos e sucessão; permite o reconhecimento, a qualquer tempo, de filhos havidos fora do casamento; proíbe que conte no assento do nascimento qualquer referencia a filiação ilegítima; e veda designações discriminatórias relativas à filiação. Paulo Lôbo83, nos mostra que há situações em que os pais podem adotar medidas diferentes na educação de cada um dos filhos, ou mesmo um dos filhos. Por vezes, a satisfação do princípio da igualdade na filiação impõe o entendimento às diferenças individuais, o respeito ao direito de cada um de ser diferente. Maria Helena Diniz84, contínua o entendimento “de modo que a única diferença entre as categorias de filiação seria o ingresso, ou não, no mundo jurídico, por meio do reconhecimento; logo só se poderia falar em filho didaticamente, matrimonial ou não-matrimonial reconhecido e não reconhecido”. 1.3.6 Principio do pluralismo familiar Num primeiro momento somente o casamento merecia conhecimento e proteção, os demais vínculos familiares não eram reconhecidos. 80 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. p.07. 81 GOMES, Orlando. Direito de família. p.26. 82 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. p.08. 83 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 44. 84 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 21. 28 Quando as uniões matrimonializadas deixam de ser reconhecidas como única base da sociedade, aumenta-se o espectro da família85. Maria Berenice Dias continua dizendo que: Excluir do âmbito da juridicidade entidades familiares que se compõe a partir de um elo de afetividade e que geram comprometimento mútuo e envolvimento pessoal e matrimonial é simplesmente chancelar o enriquecimento injustificado é ser conivente com a injustiça. Dessa forma pode-se observar que o princípio do pluralismo familiar, conforme norma constitucional abrange a família matrimonial e as entidades familiares como união estável e família monoparental86. Neste norte cabe salientar que as uniões extramatrimoniais sendo tratadas como sociedade de fato, não eram consideradas de natureza familiar, e encontravam abrigo somente no direito obrigacional.87. 1.3.7 Princípio da liberdade às relações de família O Direito tem como finalidade assegurar a liberdade, ou seja, coordenar, organizar e limitar as liberdades, justamente para garantir a liberdade individual88, na Constituição brasileira e nas leis atuais o princípio da liberdade apresenta duas vertentes essenciais, a liberdade da entidade familiar diante o Estado e da sociedade, e a liberdade de cada membro diante dos outros membros e da própria entidade familiar89. Paulo Lôbo90 complementa: O princípio da liberdade diz respeito ao livre poder de escolha ou autonomia de constituição, realização e extinção de entidade familiar, sem imposição ou restrições externas de parentes, da sociedade ou do legislador; a livre aquisição e administração do patrimônio familiar; ao livre planejamento familiar; a livre definição 85 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p. 64. 86 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 21. 87 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.64. 88 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p. 60. 89 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 47. 90 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 46. 29 de modelos educacionais, dos valores culturais e religiosos; à livre formação dos filhos, desde que respeitadas suas dignidades como pessoas humanas; à liberdade de agir, assentada no respeito à integridade física, mental e moral. Desta forma, entende-se que “as transformações desse paradigma familiar ampliaram radicalmente o exercício da liberdade para todos os atores, substituindo o autoritarismo da família tradicional por um modelo que realiza com mais intensidade a democracia familiar” 91. Diante este princípio é assegurado o direito de extinguir ou dissolver o casamento e a união estável, bem como o direito de recompor novas estruturas de convívio92. No entanto, o princípio da liberdade diz respeito não somente à criação, manutenção ou extinção dos arranjos familiares, mas também à sua permanente constituição e reivindicação 93. 1.4 NOVOS PARADIGMAS DO DIREITO DE FAMÍLIA Inicialmente, cabe destacar que o Direito de Família está integrado no Direito Civil e tem por objetivo a determinação das condições nas quais se formam, organizam e se extinguem as relações familiares94. Sílvio de Salvo Venosa95 acrescenta que “o direito de família, ramo do direito civil com características peculiares, é integrado pelo conjunto de normas que regulam as relações jurídicas familiares, orientando por elevados interesses morais e bem-estar social”. Enfatiza Orlando Gomes96: 91 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 46. 92 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.61. 93 LÔBO, Paulo. Direito de família. p. 47. 94 OLIVEIRA, José Lamartine Corrês de; MUNIZ, Francisco José Ferreira. Curso de direito de família. p. 17. 95 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 26. 96 GOMES, Orlando. Direito de família. p.36. 30 O quadro dos direitos de família é formado pelas relações pessoais e econômicas que derivam do casamento e do parentesco e se regem por disposições legais articuladas em torno de um núcleo central: a família. Esse grupo social constitui a base sobre a qual se coordenam as regras jurídicas do Direito de Família. Contudo, devido à grande intervenção do Estado no direito de família, juristas há que consideram parte do direito público97. Maria Helena Diniz98 subscreve sobre o assunto: Essa intervenção protetora do Estado é um fato universal, pois o poder público de todas as nações pretende garantir a família, protegendo-a, evitando abusos, propiciando melhores condições de vida às novas gerações, ajudando-a exercer beneficamente seus poderes, criando órgãos sociais que a tutelam [...]. O direito de família, “por ser um direito extrapatrimonial, é, portanto personalíssimo, irrenunciável, intransmissível, não admitindo condição ou termo ou o seu exercício por meio de procurador” 99. Assim no direito de família a regra é o princípio estatutário e a exceção, a autonomia da vontade, porque o interesse individual está sujeito ao da família100. Sílvio de Salvo Venosa101 destaca a importância do direito de família ser caracterizado como direito privado: [...] a pretensão de deslocar a família do direito privado representa um contra-senso. Não se pode conceber nada mais privado, mais profundamente humano do que a família, em cujo seio o homem nasce, vive , ama, sofre e morre. O direito de família visto como direito público prepara o terreno para um intervencionismo intolerável do Estado na vida íntima, como tantos que ocorrem ordinariamente. 97 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 27. 98 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 28. 99 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 26. 100 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 26-27. 101 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 27. 31 Para Maria Berenice Dias102 “a família é tanto estrutura pública como relação privada, pois identifica o individuo como integrante do vínculo familiar e também como participe do contexto social”. Pode-se frisar que ao longo do tempo houve uma grande evolução no que diz respeito à família, o CC/1916, regulava a família do início do século passado, constituída unicamente pelo matrimonio103. Para Sílvio de Salvo Venosa104 a célula básica da família é formada por pais e filhos, nos novos fenômenos sociais não se alterou muito com a sociedade urbana. No entanto, a família atual, difere das formas antigas no que concerne a suas finalidades, composição e papel de pais e mães. Conforme Maria Berenice Dias105, o pluralismo das relações familiares também ocasionou mudanças na própria estrutura da sociedade: Rompeu-se o aprisionamento da família nos moldes restritos do casamento, mudando profundamente o conceito de família. A consagração da igualdade, o reconhecimento da existência de outras estruturas de convívio, a liberdade de reconhecer filhos havidos fora do casamento operam verdadeira transformação na família. Também, instaurou-se a igualdade entre o homem e a mulher e o conceito de família teve um aumento, passando a proteger de forma igualitária todos os seus membros. Com isso, estendeu igual proteção à família constituída pelo casamento, bem como a união estável entre o homem e a mulher e família monoparental que é aquela formada por qualquer dos pais e seus descendentes106. 102 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.29. 103 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.30. 104 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 22. 105 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.39. 106 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.30. 32 Dessa forma, pode-se verificar que as uniões sem casamento passam a ser regularmente aceitas pela sociedade e pela legislação107. Assim, “a unidade familiar, sob o prisma social e jurídico, não tem mais como baluarte exclusivo o matrimonio. A nova família estrutura-se independente das núpcias” 108. Cabe ressaltar que a vida em comum no domicílio conjugal e a assistência mútua entre o homem e a mulher continuam a sustentar a função primordial da criação dos filhos, e diante isto, não há outra instituição substituindoa até hoje na formação do caráter e da personalidade destes 109. Neste viés, ressalta Orlando Gomes110: O papel da família nos dias correntes expande-se pela execução de relevantes atividades à medida que o objetivo do bem-estar se generaliza numa sociedade de abundância, porquanto tornou-se obrigatório o esforço para mandar os filhos à escola, assegurarlhes condições higiênicas de vida, proporcionar-lhes, na doença, cuidados médicos e assistência hospitalar, oferecendo-lhes conforto e condições para ascensão social, numa atmosfera igualitária. Orlando Gomes111 pontua a influência da Escola do Direito Natural: [...] sob influência da Escola do Direito Natural, altera-se profundamente a estrutura tradicional da família. Seu cunho patriarcal e sua finalidade política foram combatidos, proclamando-se a conveniência de organizá-la em bases igualitárias e de se privá-la de qualquer função política. Negou-se o caráter religioso do matrimônio e se pugnou pelo enfraquecimento da autoridade paterna. 107 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 22. 108 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 22. 109 GOMES, Orlando. Direito de família. p.19. 110 GOMES, Orlando. Direito de família. p.19. 111 GOMES, Orlando. Direito de família. p.41. 33 Frente ao modernismo temos que “a religião não mais é ministrada em casa e a multiplicidade de seitas e credos cristãos, desvinculados da fé originais, por vezes oportunistas, não mais permite uma definição homogênea” 112. Outra característica da família é referente a sua atividade produtiva: O grupo familiar produzia praticamente tudo quanto consumia. A casa era o centro da produção doméstica, da qual participavam todos os membros. Dessa função básica resultavam determinadas condições sociais e a execução de certas funções sociais e a execução de certas funções institucionais sob a chefia autocrática, como a proteção, a assistência, a educação e aprendizado da prole113. Depois a “família deixa de ser uma unidade de produção na qual todos trabalhavam sob autoridade de um chefe. O homem vai para a fábrica e a mulher lança-se para o mercado de trabalho” 114. E já “na fase do capitalismo avançado, a organização da família caracteriza-se pela ampliação das tarefas de satisfação das necessidades dos seus membros e pela institucionalização das atividades e da lista de prestações para satisfazê-las” 115. De acordo com Orlando Gomes116 “a família de hoje tem principalmente função de consumo; objetivo do bem-estar se converte em uma necessidade política, todos aspirando à saúde, alimentação, repouso, lazer, instrução, condições toleráveis de trabalho e de vida decente sem controles sociais tradicionais”. 112 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 22. 113 GOMES, Orlando. Direito de família. p.17. 114 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 22. 115 GOMES, Orlando. Direito de família. p.17. 116 GOMES, Orlando. Direito de família. p.18. 34 Com tantas mudanças pode-se observar que houve um crescimento quanto a longevidade decorrente de melhores condições de vida permite que várias gerações diversas convivam117. Outra mudança ocorreu acerca do comportamento dos membros da família “não mais marido tirano, mulher submissa e filhos aterrados. O ambiente familiar descontrai-se e as relações entre marido e mulher e entre pais e filhos travam-se numa atmosfera bem diferente, cada qual destes membros do grupo movendo-se com liberdade” 118. Com isso, “os conflitos sociais gerados pela nova posição social dos cônjuges, as pressões econômicas, a desatenção e o desgaste das religiões tradicionais fazem aumentar o número de divórcios” 119. Maria Berenice Dias120 nos surpreende com o entendimento de que a sociedade concede a todos o direito de buscar a felicidade, independentes de vínculos afetivos que estabeleçam, e ainda pontua como sendo ilusória a idéia de eternidade do casamento. E continua: A separação, apesar de ser um trauma familiar doloroso, é um remédio útil e até necessário, representando muitas vezes, a única chance para se ser feliz. Impor a um dos cônjuges que desnude a intimidade do outro, trazendo a juízo os fatos que tornaram insuportável a vida em comum, fere a privacidade, além de afrontar a dignidade do par do qual quer se desvencilhar. Desta forma, “coube a ciência jurídica acompanhar legislativamente essas transformações sociais, que se fizeram sentir mais acentuadamente em nosso país na segunda metade do século XX, após a Segunda Guerra” 121. 117 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 22. 118 GOMES, Orlando. Direito de família. p.18. 119 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 22. 120 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.32. 121 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 22. 35 Diante disto, pode-se observar que o direito de família evoluiu com o passar do tempo. No direito brasileiro nota-se a influência romana, germânica e canônica. De qualquer forma, a família constitui célula básica da sociedade e o direito pátrio contempla a família matrimonial e as entidades familiares, quais sejam a união estável e a família monoparental. Os princípios fundamentais do direito de família são da ratio e da affectio, não obstante existam outros estabelecidos inclusive na CRFB/1988 e no CC/2002. Como já visto, têmse novos paradigmas a serem discutidos no direito de família e um desses tópicos abordam as sociedades conjugais no direito brasileiro que será exposto no próximo capítulo. CAPÍTULO 2 SOCIEDADES CONJUGAIS NO DIREITO BRASILEIRO O presente capítulo é dedicado as sociedades conjugais no direito brasileiro, para posteriormente tratar-se especificamente da união estável. Importa destacar que o casamento é centro do direito de família, de outro lado tem-se as uniões de fato. Sobre essa temática se dará a narrativa. 2.1 CASAMENTO Há influência do direito canônico, na formação e no desenvolvimento do direito civil, mas principalmente nas relações familiares.122 Importante salientar que a noiva, ou seja, a nova “mater famílias” ao se casar assumia a posição de esposa e o domicilio do marido. Devendo-lhe obediência e fidelidade123. Para Sebastião José Roque124 no direito romano antigo o casamento se fundava em: Um ato solene, formal. A noiva era levada pelo “pater famílias” e entregue ao noivo no templo. Ficava demonstrada a intenção do “pater famílias” em ampliar a família, desmembrando a sua, já que a filha saía de sua pátria potestas. Assim, Sílvio de Salvo Venosa125 complementa que “a mulher, ao se casar, abandonava o culto do lar de seu pai e passava a cultuar os deuses e antepassados do marido, a quem passava a fazer oferendas”. 122 GOMES, Orlando. Direito de família. p. 67. 123 ROQUE, Sebastião José. Direito de família. p. 18. 124 ROQUE, Sebastião José. Direito de família. p.24 125 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 20. 37 Em outro entendimento, Arnoldo Wald126 ao abordar o casamento no direito romano antigo diz: A mulher, ao se casar, podia continuar sob autoridade paterna no casamento sem manus ou entrar na família marital no casamento com manus. O que não se admitia é que uma mesma pessoa pertencesse simultaneamente a duas famílias. Com isso, tem-se a idéia de que o casamento romano antigo é diferente da dominante em nossos dias. Arnoldo Wald127 diz que: Para os romanos a affectio era um elemento necessário para o casamento que não devia existir apenas no momento da celebração do casamento, mas enquanto este perdurasse. O consentimento das partes não devia apenas ser inicial, mas continuado. Assim a ausência de convivência, o desaparecimento da afeição eram por si só, causas necessárias para a dissolução do casamento. Já os canonistas, no entanto, opuseram-se ao divórcio, pois consideravam o casamento, um sacramento, não podendo os homens dissolver a união realizada por Deus128. Dessa forma, é possível reconhecer que “na doutrina canônica, o matrimônio é concebido como sacramento, reconhecendo-se a indissolubilidade do vínculo e só se discutindo o problema do divórcio em relação aos infiéis, cujo casamento não se reveste de caráter sagrado” 129. Assim, cabe mencionar a existência de uma divergência básica entre a concepção católica do casamento e a concepção medieval130: Enquanto a igreja, em principio, o matrimonio depende do simples consenso das partes, a sociedade medieval reconhecia no matrimonio um ato de repercussão econômica e política para o qual devia ser exigido não apenas 126 WALD, Arnoldo. O novo direito de família. p.10. 127 WALD, Arnoldo. O novo direito de família. p.12. 128 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. p.16. 129 WALD, Arnoldo. O novo direito de família. p.13. 130 WALD, Arnoldo. O novo direito de família. p.13. 38 o consenso dos nubentes, mas também o assentimento das famílias a que pertenciam. Sendo o casamento indissolúvel, a doutrina canônica visou a estabelecer um sistema de impedimentos, ou seja, de motivos que impediam a sua realização, justificando a sua nulidade por impedimentos dirimentes absolutos ou a sua anulabilidade que se caracterizava por impedimentos dirimentes relativos131. Cabe ao doutrinador explicar: O direito canônico constitui o quadro dos impedimentos para a realização do casamento abrangendo causas baseadas numa incapacidade (idade, diferença de religião, impotência, casamento anterior), num vício do consentimento (dolo para obter o consentimento matrimonial, coação ou erro quanto à pessoa do outro cônjuge) ou numa relação anterior (parentesco, afinidade)132. E a igreja se limitou a exigir para a validade do casamento o consenso dos nubentes e as relações sexuais voluntárias, relegando para um plano secundário o consentimento paterno133. Orlando Gomes134 acerca da indissolubilidade do vínculo matrimonial: A exigência da consumação e a determinação das finalidades essenciais do matrimonio, mas, sobretudo, seu caráter religioso de sacramento, levam a igreja a considerar a indissolubilidade do vínculo matrimonial como uma das propriedades essenciais do casamento. Arnoldo Wald135 acentua ainda que: A separação do direito canônico se distingue do divórcio romano ou judaico por não importar na dissolução do vínculo e por ser um ato judiciário da autoridade religiosa, enquanto, em Roma e para os hebreus, constituía um ato privado contra o qual a parte prejudicada podia recorrer à autoridade judiciária. 131 WALD, Arnoldo. O novo direito de família. p. 13-14. 132 WALD, Arnoldo. O novo direito de família. p. 14. 133 WALD, Arnoldo. O novo direito de família. p. 14. 134 GOMES, Orlando. Direito de família. p. 69. 135 WALD, Arnoldo. O novo direito de família. p.14-15. 39 Ou seja, no direito romano antigo, o casamento tinha base nitidamente consensual, a sua dissolução se verificava pelo simples desaparecimento de continuar como marido e mulher136. Os efeitos da separação no direito canônico se davam pela extinção do dever de coabitação, havendo entre os separados, os deveres de fornecer alimentos e de fidelidade recíproca, uma vez que no direito canônico não há aceitação da dissolução ainda que extinta de fato 137. Em relação aos protestantes Arnoldo Wald138 ensina: Para os protestantes, a competência, em matéria de direito de família, devia pertencer ao Estado, não se justificando a atribuição de caráter sagrado ao casamento. Tratando-se de um simples ato da vida civil, de um contrato natural, nada impedia que a vontade dos cônjuges dissolvesse o vínculo matrimonial, no entender da religião reformada. Caracterizou-se ainda o casamento como ato solene, devendo ser precedido de publicidade e só se permitido a coabitação dos nubentes após terem recebido a benção nupcial 139 . E deu ênfase em relação ao “sacerdote é considerado como testemunha necessária e não como ministro do sacramento, tendo a obrigação de manter um registro de casamento pelo qual se prova o matrimônio” 140. Assim, pode-se observar que o casamento sofreu por influências tanto romanas quanto canônicas, visto que no direito romano antigo o casamento tinha como elemento necessário a afeição entre os cônjuges. Já os canonistas viam o matrimonio como um sacramento, reconhecendo a indissolubilidade do casamento. 136 CAHALI, Yussef Said. Divórcio e separação. 11. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2005. p. 31. 137 WALD, Arnoldo. O novo direito de família. p.15. 138 WALD, Arnoldo. O novo direito de família. p.15. 139 WALD, Arnoldo. O novo direito de família. p.15. 140 WALD, Arnoldo. O novo direito de família. p.15. 40 2.2 CONCEITO DE CASAMENTO São várias as definições de casamento, na época clássica do direito romano antigo o casamento era a “conjunção do homem e da mulher, que se unem para toda a vida, a comunhão do direito divino e do direito humano” 141 . Pode-se observar que era uma noção tanto que grandiosa e sacramental que com a evolução dos costumes, foi desaparecendo a alusão ao divino142. O Cristianismo elevou o casamento à dignidade de um sacramento, pelo qual um homem e uma mulher selam a sua união sob as bênçãos do céu, transformando numa só entidade física e espiritual143, para a constituição de uma família legítima144. A partir desse conceito depreende-se que o matrimonio não é apenas a formalização da união sexual, mas a conjunção de matéria e espírito de dois seres de sexos diferentes para atingirem a plenitude do desenvolvimento de sua personalidade através do amor e do companheirismo145. Clóvis Beviláqua apud Orlando Gomes conceitua casamento como sendo a “legalização de uma união sexual, o ato pelo qual pessoas de sexo diferente fundam uma família legitima” 146. Lafayette apud Pereira definiu o casamento como um ato solene pelo qual duas pessoas de sexo diferente se unem para sempre, sob promessa recíproca de fidelidade no amor e da mais estreita comunhão de vida147. 141 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p.21-22. 142 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p.22. 143 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. direito de família. p.51-52. 144 GOMES, Orlando. Direito de família. p. 55. 145 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p.36. 146 BEVILÁQUA, Clóvis in GOMES, Orlando. Direito de família. p. 56. 147 LAFAYETTE in PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil: direito de família. 41 Silvio Rodrigues148 por seu turno entende que: Casamento é o contrato de direito de família que tem por fim promover a união do homem e da mulher, de conformidade com a lei, a fim de regularem suas relações sexuais, cuidarem da prole comum e se prestarem mútua assistência. Para Paulo Lôbo149 “o casamento é um ato jurídico negocial solene, público e complexo, mediante o qual um homem e uma mulher constituem família, pela livre manifestação de vontade e pelo reconhecimento do Estado”. E de forma mais precisa, Pontes de Miranda apud Paulo Lôbo150 diz que o casamento é “o contrato de direito de família que regula a união entre marido e mulher”. Yussef Said Cahali151 nos traz ainda a cerca do matrimônio: [...] através do matrimonio que duas pessoas de sexo diferente adquirem o estado familiar de cônjuges, que por sua vez é fonte de direitos e obrigações recíprocas, representados principalmente pela comunhão de vida, moral, espiritual, afetiva e material, o que não coincide necessariamente com os efeitos que resultam das relações pessoais entre os companheiros. Washington de Barros apud Sílvio de Salvo Venosa152 conceitua o matrimonio como sendo “a união permanente entre o homem e a mulher de acordo com a lei, a fim de se reproduzirem, de se ajudarem mutuamente e criarem seus filhos”. Desta forma, pode-se observar que com o matrimonio os cônjuges estão sujeitos a diversos efeitos jurídicos tanto na esfera social, pessoal e patrimonial, uma vez que surgem direitos e obrigações em relação à pessoa e aos bens patrimoniais dos cônjuges153. p.52. 148 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p. 20. 149 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 76. 150 MIRANDA, Pontes de in LÔBO, Paulo. Famílias. p. 76. 151 CAHALI, Yussef Said. Divórcio e separação. p. 23. 152 BARROS, Washington de, in VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 43. 153 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p.149. 42 Por fim, pode-se entender que o casamento se caracteriza pela convivência pública e contínua entre o homem e a mulher com o objetivo de constituir família. Também cabe frisar que a família conjugal implica tanto na comunhão de corpos como de interesses pessoais e ainda por algumas vezes interesses patrimoniais, assim cria-se uma sociedade conjugal e um vínculo jurídico matrimonial submetendo os cônjuges a um complexo de direitos e deveres. 2.3 NATUREZA JURÍDICA Verifica-se que não há um consenso doutrinário, a cerca da natureza jurídica do casamento, no entanto cabe demonstrar quanto as suas diferenças. As divergências doutrinarias são tão acentuadas que ensejaram o surgimento de três correntes: (a) A doutrina individualista, influenciada pelo direito canônico, que vê o casamento como um contrato de vontades convergentes para a obtenção de fins jurídicos; (b) a corrente institucional, que destaca o conjunto de normas imperativas a que aderem os nubentes; e a terceira corrente doutrinaria chamada; (c) eclética, que vê o casamento como ato complexo, um contrato quando de sua formação e uma instituição no que diz respeito ao seu conteúdo154. Dessa forma pode-se verificar o entendimento do Direito Canônico sobre o assunto: [...] o casamento é um sacramento e também um contrato natural, decorrente da natureza humana. Os direitos e deveres que dele derivam estão fixados na natureza e não podem ser alterados nem pelas partes nem pela autoridade, sendo perpétuo e indissolúvel155. A concepção clássica também chamada individualista ou contratualista, a qual foi acolhida pelo código de Napoleão e floresceu no século XIX, considerava o casamento civil um contrato cuja validade e eficácia 154 155 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.140. VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 44. 43 decorreriam exclusivamente da vontade das partes156. Pode-se observar que para essa corrente, “o matrimonio é um contrato civil, regido pelas normas comuns a todos os contratos, ultimando-se e aperfeiçoando-se apenas pelo simples consentimento dos nubentes que há de ser recíproco e manifesto por sinais exteriores” 157. Cabe demonstrar que a doutrina contratual trazia conseqüências importantes, pois, se o casamento representava mero contrato, ele necessariamente poderia dissolver-se por um distrato, dessa forma, a sua dissolução ficaria na dependência do muto consentimento158. Em oposição a tal teoria, surgiu a concepção institucionalista ou supre-individualista, para essa corrente o casamento é uma instituição social, no sentido de que reflete uma situação jurídica cujos parâmetros se acham estabelecidos pelo legislador159. Diante esta teoria Carlos Roberto Gonçalves160 acrescenta: [...] atribuir ao casamento o caráter de instituição significa afirmar que ele constitui um conjunto de regras impostas pelo Estado, eu forma um todo o qual as partes têm apenas a faculdade de aderir, pois, uma vez, dada referida adesão, a vontade dos cônjuges torna-se impotente e os efeitos da instituição produzem-se automaticamente. A concepção institucionalista para Maria Helena Diniz161: A concepção institucionalista vê no matrimonio um estado em que os nubentes ingressam. O casamento é visto como uma grande instituição social, refletindo uma situação jurídica que surge da vontade dos contraentes, as cujas normas, efeitos e forma encontram-se preestabelecidos pela lei. Eduardo dos Santos apud Sílvio de Salvo Venosa162 anota 156 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p. 24. 157 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p.39. 158 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p. 20. 159 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p.25. 160 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p.25. 161 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p.39. 162 SANTOS, Eduardo dos. in. VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 44. 44 que o matrimonio é um: “contrato sui generis de caráter pessoal e social: sendo embora um contrato, o casamento é uma instituição ético-social, que realiza a reprodução e a educação da espécie humana”. No mesmo sentido pode-se observar que o casamento é “uma grande instituição social, que de fato nasce da vontade dos contraentes, mas que, da imutável autoridade da lei, recebe sua forma, suas normas e seus efeitos”.163 Verifica-se que a vontade individual é livre para fazer surgir a relação, mas não pode alterar a disciplina dada pela lei164. No entanto, por mais sedutora que se revele esta concepção, não se pode negar o substrato contratual que se encontra no casamento165. Diante tanta controvérsia, não faltou uma doutrina eclética ou mista, que une o elemento volitivo ao elemento institucional, tornando o casamento como um ato complexo166. Orlando Gomes complementa ainda que “a doutrina mais recente tende para ver no casamento um instituto de natureza hibrida: contrato, na formação e instituição, no conteúdo” 167. Espínola apud Silvio Rodrigues168 entende: O casamento é um contrato que se constitui pelo consentimento livre dos esposos, os quais, por efeito de sua vontade, estabelecem uma sociedade conjugal que, além de determinar o estado civil das pessoas, dá origem às relações de família reguladas, nos pontos essenciais, por normas de ordem pública. Para Silvio Rodrigues169: 163 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p.25. 164 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p.25. 165 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p. 20. 166 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. p.40. 167 GOMES, Orlando. Direito de família. p. 60. 168 ESPÍNOLA in RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p. 21. 169 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p. 22. 45 O casamento assume a feição de um ato complexo, de natureza institucional, que depende da manifestação livre da vontade dos nubentes, o qual, porém, se completa pela celebração, que é ato privativo de representante do Estado. Não há inconveniente, dada a peculiaridade do fenômeno, de chamar ao casamento contrato de direito de família. Pode ser enfatizado como sendo um contrato especial, que se distingue dos demais contratos patrimoniais, pois enquanto estes só giram em torno do interesse econômico, o casamento se prende a elevados interesses morais e pessoais, e de tal forma, uma vez realizado o contrato, produz efeitos desde logo, que não podem mais desaparecer170. Diante essa discussão, Sílvio Salvo Venosa171 nos ensina que “em uma síntese das doutrinas, pode-se afirmar que o casamento – ato é um negócio jurídico; o casamento – estado é uma instituição”. Desta forma pode-se observar que o casamento é tanto um contrato de vontades entre os nubentes quanto uma instituição onde os nubentes aderem normas imperativas, portanto, um ato complexo. 2.4 REGIME DE BENS Quando o Código Civil de 1916 foi editado, a família era exclusivamente a constituída pelo matrimônio. “o casamento era indissolúvel, levando a uma união plena de vida e de patrimônio”.172 Maria Helena Diniz173 aponta acerca do aspecto patrimonial que na realidade se traduz no regime matrimonial de bens: Uma vez realizado o matrimônio, surgem direitos e obrigações em relação à pessoa e aos bens patrimoniais dos cônjuges. A essência das relações econômicas entre consortes reside, indubitavelmente, no regime matrimonial de bens, que está submetido a normas especiais disciplinadoras de seus efeitos. Desta forma pode-se observar que: 170 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. p.25-26. 171 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 45. 172 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.199. 173 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p. 149. 46 [...] o regime matrimonial de bens é o conjunto de normas aplicáveis às relações e interesses econômicos resultantes do casamento. É constituído, portanto, por normas que regem as relações patrimoniais entre marido e mulher, durante o matrimonio. Consiste nas disposições normativas aplicáveis à sociedade conjugal no que concerne aos seus interesses 174 pecuniários . Antes do casamento, durante o processo de habilitação, os nubentes livremente estipularão o regime de bens por meio de pacto antenupcial. Cabe salientar que essa liberdade não é absoluta, haja vista que em determinadas hipóteses a lei impõe o regime obrigatório de separação de bens175. Os regimes de bens regem as relações patrimoniais entre o casal enquanto durar o casamento. São quatro os regimes de bens no casamento: o da comunhão universal, o da comunhão parcial, o da separação e da participação final nos aquestos. 2.4.1 Do regime da comunhão parcial Considerado o regime da comunhão parcial o mais importante regime de bens no direito brasileiro, por ser o regime legal dispositivo, conseqüentemente o mais disseminado na população, aplicado a todos os casamentos que são celebrados sem pacto antenupcial176. O regime da comunhão parcial, ou comunhão de adquiridos, como é conhecido no direito português é a de que os bens adquiridos após o casamento, os aquestos, formam a comunhão de bens do casal, onde cada esposo guarda para si os bens trazidos antes do casamento177. É importante salientar que o Regime de comunhão parcial, vigora na falta de celebração do pacto antenupcial pelos nubentes, dispondo sobre as questões patrimoniais, bem como na falta de manifestação dos noivos, 174 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: p.150. 175 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.216. 176 LÔBO, Paulo. Famílias. p.317. 177 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 365. 47 como na hipótese de ser nulo ou ineficaz o pacto178. Para Silvio Rodrigues179 o Regime de comunhão parcial de bens se dá pela seguinte explanação: [...] é aquele em que basicamente se excluem da comunhão os bens que os cônjuges possuem ao casar ou que venham a adquirir por causa anterior e alheia ao casamento, como as doações e sucessões; e em que entram na comunhão os bens adquiridos posteriormente, em regra, a título oneroso. Trata-se de um regime de separação quanto ao passado e de comunhão quanto ao futuro. Conforme artigo 1.659 do Código Civil de 2002, segue os bens excluídos da comunhão parcial: I - os bens que cada cônjuge possuir ao casar, e os que lhe sobrevierem, na constância do casamento, por doação ou sucessão, e os sub-rogados em seu lugar; II - os bens adquiridos com valores exclusivamente pertencentes a um dos cônjuges em sub-rogação dos bens particulares; III - as obrigações anteriores ao casamento; IV - as obrigações provenientes de atos ilícitos, salvo reversão em proveito do casal; V - os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profissão; VI - os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge; VII - as pensões, meios-soldos, montepios e outras rendas semelhantes. Dessa forma, pode-se observar que esses bens não se comunicam com o outro cônjuge, conservando para cada consorte o que possuía ao se casar, assim tem-se que a comunhão se formará em regra com os bens adquiridos a título oneroso na constância do casamento180. Também, com base no Código Civil de 2002 pode-se ver em seu artigo 1.660 os bens que entram na comunhão parcial: 178 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.218. 179 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p.178. 180 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 366. 48 I - os bens adquiridos na constância do casamento por título oneroso, ainda que só em nome de um dos cônjuges; II - os bens adquiridos por fato eventual, com ou sem o concurso de trabalho ou despesa anterior; III - os bens adquiridos por doação, herança ou legado, em favor de ambos os cônjuges; IV - as benfeitorias em bens particulares de cada cônjuge; V - os frutos dos bens comuns, ou dos particulares de cada cônjuge, percebidos na constância do casamento, ou pendentes ao tempo de cessar a comunhão. Neste norte, sem maior dificuldade de entendimento, cabe ressaltar a importância da “necessidade da descrição minuciosa dos bens móveis no pacto antenupcial, sob pena de serem reputados comuns.” 181 Maria Berenice Dias182 informa ainda a cerca do regime de comunhão parcial: Trata-se de regime que atende a uma certa lógica e dispõe de um componente ético: preserva a titularidade exclusiva dos bens particulares e garante a comunhão do que for adquirido durante o casamento. Nitidamente, busca evitar o enriquecimento sem causa de qualquer dos cônjuges. Paulo Lôbo183ensina acerca do regime de comunhão parcial de bens: O que singulariza o regime, considerado por muitos o mais equitativo, é a separação e convivência entre dois tipos de bens: os comunicáveis, ou comuns, e os não comunicáveis, ou particulares. Resultam três massas patrimoniais distintas, cada uma com seus respectivos ativos e passivos: duas particulares e uma comum. A linha divisória é traçada na data do casamento, ou seja, de sua celebração e não do registro. Até o casamento, os bens adquiridos pelos cônjuges permanecem particulares, inclusive os adquiridos posteriormente com os valores derivados de suas alienações. Após o casamento os bens se comunicam. Há, também, bens particulares posteriores cuja aquisição ocorre após o casamento, principalmente os que são frutos de liberalidade dos alienantes, por doação ou testamento. Os bens 181 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 369. 182 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.218. 183 LÔBO, Paulo. Famílias. p.317. 49 comuns, ou os que são comunicáveis, formam um todo unitário, ou condomínio. Os cônjuges são condôminos de cada bem que o integra, de modo indistinto, como titulares de partes ideais ou meações. Diante as informações de Paulo Lôbo, cabe salientar que “optando o par pela comunhão parcial, é possível firmarem pacto antenupcial para deliberar, entre outras coisas, sobre a administração do acervo patrimonial particular.”184E ainda “podem os cônjuges, submetidos ao regime de comunhão parcial, celebrar contratos de compra e venda de bens entre si, desde que excluídos da comunhão” 185. Assim, pode-se observar que o regime de comunhão parcial é aquele onde a propriedade de bens comuns do casal é adquirida após a data do casamento, ou seja, os bens que o nubente possuía antes de casar contínua sendo dele, não integrando ao patrimônio comum. Também cabe ressaltar que é o regime legal e que em caso de não haver o pacto antenupcial ou se os pactos forem nulos o regime de comunhão parcial vigorará. 2.4.2 Do regime da comunhão universal O regime da comunhão universal é a comunicação de todos os bens presente e futuros dos cônjuges, como também suas dívidas passivas186. Neste caso, “pretendendo os noivos transformar o casamento em uma união não só de vidas, também de bens, é necessário que formalizem pacto antenupcial, optando pelo regime da comunhão universal” 187. Com este regime, segundo Maria Berenice Dias188: [...] ocorre uma fusão entre os acervos trazidos para o matrimônio por qualquer dos nubentes, formando uma única universalidade, à qual se agrega tudo o que vier a ser adquirido a título oneroso, por doação ou herança, por qualquer dos cônjuges, na constância do enlace conjugal. 184 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.219. 185 LÔBO, Paulo. Famílias. p.318. 186 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p.184. 187 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.222. 188 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.222. 50 Acerca do assunto explana Silvio Rodrigues189: Assim, com a exclusão de algumas exceções, que serão a seguir examinados, os patrimônios dos cônjuges se fundem em um só, passando, marido e mulher, a figurar como condôminos daquele patrimônio. Trata-se de condomínio peculiar, pois que insuscetível de divisão antes da dissolução da sociedade conjugal, extinguindo-se inexoravelmente nesse instante. De acordo com o artigo 1.668 do Código Civil de 2002 seguem os bens excluídos da comunhão universal de bens: I - os bens doados ou herdados com a cláusula de incomunicabilidade e os sub-rogados em seu lugar; II - os bens gravados de fideicomisso e o direito do herdeiro fideicomissário, antes de realizada a condição suspensiva; III - as dívidas anteriores ao casamento, salvo se provierem de despesas com seus aprestos, ou reverterem em proveito comum; IV - as doações antenupciais feitas por um dos cônjuges ao outro com a cláusula de incomunicabilidade; V - Os bens referidos nos incisos V a VII do art. 1.659. Também, pode-se observar que “cada consorte é titular da propriedade e posse da metade ideal de todo o patrimônio, constituindo-se um condomínio sobre cada um dos bens, dívidas e encargos” 190. Paulo Lôbo191complementa: Caracteriza-se o regime pela quase total comunhão dos bens adquiridos antes ou após o casamento. O casamento torna comuns os bens particulares de cada cônjuge. Os bens adquiridos por ato de liberdade de terceiros, em doação ou sucessão, também tornam-se comuns, salvo se onerados com cláusula de incomunicabilidade. Os bens ingressam no acervo do casal como se estivessem sido adquiridos igualitariamente pelos cônjuges, permanecendo indivisos na compropriedade. Cada cônjuge tem uma metade ideal sobre os bens móveis e imóveis, denominada meação. Contudo “a comunhão universal, todavia não é absoluta. 189 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p.184. 190 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.222. 191 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 327-328. 51 Ainda que residuais, há relações patrimoniais ativas e passivas que não integram a comunhão, permanecendo na titularidade exclusiva de cada cônjuge”.192Ou seja, os bens atuais e futuros de ambos os cônjuges serão comuns ao casal, salvo as hipóteses do artigo 1.668 do Código Civil de 2002. 2.4.3 Do regime da participação final nos aquestos No regime da participação final nos aquestos, “existem bens particulares, que se constituem dos que cada cônjuge já possuía ao casar, dos adquiridos por sub rogação ou dos recebidos por herança ou a liberalidade”. E também há os bens comuns, que são os adquiridos pelo casal na constância do casamento” 193. O artigo 1.673 do Código Civil de 2002 explica acerca do patrimônio no regime de participação final nos aquestos: Art. 1.673. Integram o patrimônio próprio os bens que cada cônjuge possuía ao casar e os por ele adquiridos, a qualquer título, na constância do casamento. Parágrafo único. A administração desses bens é exclusiva de cada cônjuge, que os poderá livremente alienar, se forem móveis. O Regime da participação final nos aquestos representa para Silvio Rodrigues194: [...] um regime híbrido, ou misto, ao prever a separação de bens na constância do casamento, preservando, cada cônjuge, seu patrimônio pessoal, com a livre administração de seus bens, embora só se possa vender os imóveis com a autorização do outro, ou mediante expressa convenção no pacto dispensado a anuência. Cabe ressaltar que com a dissolução, fica estabelecido o direito à metade dos bens adquiridos a título oneroso pelo casal na constância do casamento195. Além disso, é também de execução complicada, sendo 192 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 328. 193 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p. 225. 194 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p. 194. 195 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p. 194. 52 necessária a mantença de uma minuciosa contabilidade, mesmo durante o casamento, para viabilizar a divisão do patrimônio na eventualidade de sua dissolução” 196. Para Sílvio Salvo Venosa197, o regime trata de uma estrutura complexa: É muito provável que esse regime não se adapte ao gosto de nossa sociedade. Por si só verifica-se que se trata de estrutura complexa, disciplinada por nada menos do que 15 artigos, com inúmeras particularidades. Não se destina, evidentemente, à grande maioria da população brasileira, de baixa renda, e de pouca cultura. Não bastasse isso, embora não seja dado ao jurista raciocinar sobre fraudes, esse regime ficará sujeito a vicissitudes e abrirá campo vasto ao cônjuge de má fé. No entanto, tem-se que os bens do regime da participação final nos aquestos são os adquiridos na vigência do matrimonio, ou seja, cabe a cada cônjuge o direito a metade dos bens adquiridos pelo casal a título oneroso, na constância do casamento. 2.4.4 Do regime de separação de bens Ao celebrar o pacto antenupcial, “os nubentes podem optar pela incomunicabilidade total dos bens, a configurar verdadeira ausência de um regime patrimonial, pois o que existe são acervos separados” 198. A característica desse regime é “a completa distinção do patrimônio dos dois cônjuges, não se comunicando os frutos e aquisições e permanecendo cada qual na propriedade, posse administração de seus bens” 199. O artigo 1.687 do Código Civil de 2002 dispõe: Art. 1.687. Estipulada a separação de bens, estes permanecerão sob a administração exclusiva de cada um dos cônjuges, que os poderá livremente alienar ou gravar de ônus real. Verifica-se a incomunicabilidade dos bens no regime de 196 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.225. 197 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 376. 198 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.227. 199 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 381. 53 separação nas palavras de Maria Berenice Dias200: O casamento não repercute na esfera patrimonial dos cônjuges, podendo cada um livremente alienar e gravar de ônus real o seu patrimônio. O patrimônio passado, presente e futuro não se comunica, nem durante o casamento e tampouco quando de sua dissolução. Cada um conserva, com exclusividade, o domínio, a posse e a administração de seus bens, bem como a responsabilidade pelas suas dívidas anteriores e posteriores ao casamento. Na concepção de Paulo Lôbo201: A separação absoluta é o mais simples dos regimes matrimoniais de bens. Os bens de cada cônjuge, independentemente de sua origem ou da data de sua aquisição, compõe patrimônios particulares e separados, com respectivos ativos e passivos. Não há convivência de patrimônio comum nem participação nos aquestos. Caracteriza-se, justamente, pela ausência de massa comum. O Código Civil de 2002 ampliou o alcance do regime, ao estabelecer que o cônjuge poderá alienar qualquer de seus bens particulares, sem autorização do outro. Cabe ressaltar que há exceções a esta autonomia de escolha de regimes, uma vez que a lei impõe o regime de separação, trata-se de regime obrigatório, imposto a determinadas situações, conforme pode-se observar no disposto do artigo 1.641 do Código Civil de 2002202. Art. 1.641. É obrigatório o regime de separação de bens no casamento: I – das pessoas que o contraírem com inobservância das causas suspensivas da celebração do casamento; II – da pessoa maior de sessenta anos; III – de todos os que dependerem, para casar, de suprimento judicial. Diante de todas as informações elencadas, existem dois patrimônios perfeitamente separados e distintos: o do homem e da mulher. “Há uma incomunicabilidade não só dos bens que cada qual possuía ao se casar, mas também dos que veio a adquirir na constância do casamento, havendo uma 200 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.227. 201 LÔBO, Paulo. Famílias. p.330-331. 202 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 357. 54 completa separação de patrimônio dos cônjuges” 203. Assim, entende-se que o regime de separação de bens se efetiva de duas maneiras, a primeira pela manifestação de vontade dos habilitantes e a segunda pela imposição legal. 2.5 DA DISSOLUÇÃO DA SOCIEDADE E DO VÍNCULO CONJUGAL A sociedade conjugal termina conforme preceitua o disposto no artigo 1.571 do Código Civil de 2002 pela morte de um dos cônjuges, pela nulidade ou anulação do casamento, pela separação judicial e pelo divórcio. Maria Helena Diniz204 nos mostra que “a sociedade conjugal termina, portanto, com a separação judicial, e o vínculo matrimonial com a morte de um dos cônjuges, a invalidade do casamento, divórcio e presunção de óbito do consorte declarado ausente”. Cabe distinguir a sociedade conjugal do casamento: O casamento é, sem dúvida, um instituto mais amplo que a sociedade conjugal, por regular a vida dos consortes, suas relações e suas obrigações recíprocas, tanto as morais como as materiais, e seus deveres para com a sua família e a prole. A sociedade conjugal, embora contida no matrimônio, é um instituto jurídico menor do que o casamento, regendo, apenas, o regime matrimonial de bens dos cônjuges, os frutos civis do trabalho ou indústria de ambos os consortes ou de cada um deles205. Para melhor entendimento Carlos Roberto Gonçalves206 distingue sociedade conjugal do casamento: Sociedade conjugal é o complexo de direitos e obrigações que formam a vida em comum dos cônjuges. O casamento cria a família legítima ou matrimonial, passando os cônjuges os status de casados, como partícipes necessários e exclusivos da sociedade que então se constitui. Tal estado gera direitos e deveres, de conteúdo moral, espiritual e econômico, que se fundam não só nas leis como nas regras da moral, da religião e 203 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p.245-246. 204 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p.246. 205 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. 22. p.246. 206 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p.185. 55 dos bons costumes. Dessa forma, pode-se verificar que “a morte real ou presumida de um dos consortes não dissolve apenas a sociedade conjugal, mas também o vínculo matrimonial, de maneira que o sobrevivente poderá convolar novas núpcias” 207. Já “o falecimento de um dos cônjuges dissolve o vínculo conjugal, passando o sobrevivente ao estado de viuvez. Este estado civil identifica a situação de alguém que foi casado e o cônjuge é falecido” 208. Orlando Gomes209, entende: A dissolução só se dá com a morte real, embora a existência da pessoa natural possa terminar com a declaração de ausência, admitindo-se, portanto, a morte presumida de quem a lei dá como falecido em razão de longo desaparecimento. A morte presumida não dissolve, porém, o casamento. Para esse efeito, não vale a presunção. Possibilidade não há de que, reaparecendo, o ausente encontre o cônjuge validamente casado. Fica a mulher num estado de semiviuvez. Não são, entretanto, adulterinos os filhos que tiver. Em relação a morte presumida do ausente, tem-se que o cônjuge do ausente não precisa aguardar dez anos, para ver seu casamento desfeito e contrair novas núpcias,uma vez que poderá requerer o divórcio direto, com base na separação de fato por mais de 2 (dois) anos, requerendo a citação do ausente por edital210. Nesse sentido a manifestação de Yussef Said Cahali211: Entende-se, assim, que, no sistema ora implantado em nosso direito, a declaração judicial da ausência de um dos cônjuges produz os efeitos de morte real do mesmo no sentido de tornar irreversível a dissolução da sociedade conjugal; o seu retorno a qualquer tempo em nada interfere no novo casamento do outro cônjuge, que tem preservada, assim, a sua plena validade. 207 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p.246. 208 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.273. 209 GOMES, Orlando. Direito de família. p. 208. 210 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p.187. 211 CAHALI, Yussef Said. Divórcio e separação. p. 60. 56 Em relação a nulidade, tem-se que não se configura como sendo uma dissolução da sociedade conjugal, apenas é declarada que tal sociedade nunca existiu212. No casamento nulo não há uma simples dissolução da sociedade conjugal, pois “a sentença de nulidade torna o casamento írrito desde o momento da celebração, e pois uma tal sentença não se pode reputar modo de dissolução da sociedade conjugal; ela não dissolve, declara que nunca existiu”213. No entanto, a nulidade ou a anulação do casamento rompem o vínculo matrimonial, extinguindo a sociedade conjugal e permitindo que os cônjuges se casam novamente214. Em relação a separação judicial Maria Helena Diniz215 ensina: A separação judicial dissolve a sociedade conjugal, mas não conserva íntegro o vínculo, impedindo os cônjuges de convolar novas núpcias, pois o vínculo matrimonial, se válido, só termina com a morte real ou presumida de um deles ou com o divórcio. Já o divórcio, em razão de fatos supervenientes ao casamento válido, dissolve tanto a sociedade conjugal como o vínculo matrimonial, autorizando os consortes a se casar novamente. O divórcio é a dissolução de um casamento válido, ou seja, é a extinção do vínculo matrimonial, que se figura mediante sentença judicial, habilitando as pessoas a contrair novas núpcias216. Paulo Lôbo217 ensina acerca do divórcio: O divórcio é o meio voluntário de dissolução do casamento. O meio não voluntário é a morte de um ou de ambos os cônjuges. O divórcio tem fundamento constitucional que o assegura, facultando 212 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p.246. 213 GOMES, Orlando. Direito de família. p. 208. 214 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p.190. 215 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p.247. 216 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p.321. 217 LÔBO, Paulo. Famílias. p.128/129. 57 duas modalidades, cada uma a partir de uma causa objetiva: a) o divórcio direto, para qual a causa é a separação de fato dos cônjuges há mais de dois anos; b) o divórcio por conversão, cuja causa é exclusivamente o transcurso do prazo de um ano do trânsito em julgado da sentença da separação judicial ou da decisão judicial da separação de corpos. É importante frisar que “a sentença do divórcio, que o homologa ou decreta, possuí eficácia ex nunc, não atingindo os efeitos produzidos pelo casamento antes de seu pronunciamento. A sentença, depois de ser registrada no Registro Público competente produz, no entanto os seguintes efeitos: Dissolve definitivamente o vínculo matrimonial civil e faz cessar os efeitos civis, religioso que estiver transcrito no Registro Público [...] põe fim aos deveres recíprocos dos cônjuges [...] extingue o regime matrimonial de bens, procedendo à partilha conforme o regime [...], faz cessar o direito sucessório dos cônjuges [...], possibilita novo casamento aos que divorciam [...] e não admite reconciliação entre os cônjuges divorciados, de modo que se estes quiserem restabelecer a união conjugal, terão que realizar um novo casamento218. Portando, “percebe-se que pode haver dissolução da sociedade conjugal sem a do vínculo matrimonial, mas todo rompimento acarreta, obrigatoriamente, o da sociedade conjugal” 219. Desta forma, pode-se entender que a sociedade conjugal pode deixar de existir, assim o casamento entre o homem e a mulher pode deixar de existir, contudo só deixará de existir o vínculo matrimonial com a morte ou divórcio. 2.6 CONCUBINATO E NATUREZA JURÍDICA Durante longo período histórico a união entre o homem e a mulher sem casamento foi chamada de concubinato que significava conforme Carlos Roberto Gonçalves220 “vida prolongada em comum, sob o mesmo teto, com aparência de casamento”. 218 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p.334-335. 219 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. p.247. 220 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p.539. 58 Silvio Rodrigues221 ensina: A idéia de concubinato, para os escritores mais antigos, envolvia a presença de alguns requisitos importantes, tais como a continuidade das relações sexuais, a residência dos concubinos sob o mesmo teto, a inexistência de impedimentos matrimoniais, a notoriedade da união e a fidelidade da mulher do amásio. Já o Código Civil de 1916 fazia restrições ao concubinato: O Código Civil de 1916 continha alguns dispositivos que faziam restrições a esse modo de convivência, proibindo por exemplo, doações ou benefícios testamentários do homem casado à concubina, ou a inclusão desta como beneficiaria de contrato de seguro de vida.222 As uniões surgidas sem o selo do matrimônio eram identificadas com o nome de concubinato, como já bem lembrado e quando de seu rompimento, pela separação ou por morte de um dos companheiros, ocorreu que as demandas cresceram no judiciário223. Diante disso, tem-se que na década de 60, houve os primeiros julgados que impulsionaram a construção de uma doutrina 224 concubinária . As soluções encontradas regravam tão-só os efeitos patrimoniais do relacionamento, na tentativa de coibir aberrantes injustiças. Em primeiro momento, nas situações em que a mulher não exercia atividade remunerada e não tinha outra fonte de renda, os tribunais concediam alimentos de forma “camuflada”, sob o nome de indenização por serviços domésticos, talvez em compensação dos serviços de cama e mesa prestados por ela. O fulcro das decisões era a inadmissibilidade do enriquecimento ilícito: o homem que se aproveita do trabalho e da dedicação de uma mulher não pode abandoná-la sem indenização, nem seus herdeiros podem receber herança sem desconto do que corresponderia ao ressarcimento.225 A justiça passou a reconhecer a existência da sociedade de 221 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p. 258-259. 222 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p.541. 223 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.155. 224 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.155. 225 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.155. 59 fato, em face das queixas generalizadas, e mais que justificáveis226. Porém, para ensejar a divisão dos bens adquiridos na constância da união, havia necessidade da prova da contribuição financeira efetiva de cada consorte para a constituição do patrimônio. Ou seja, os companheiros eram considerados sócios, procedendo-se à divisão dos “lucros” a fim de evitar que o acervo adquirido durante a vigência da “sociedade” ficasse somente com um dos sócios, em detrimento, normalmente, da mulher. Essa solução, inclusive, restou sumulada pelo STF. Tais subterfúgios eram utilizados para justificar a participação patrimonial, evitando-se com isso o enriquecimento injustificado de um dos companheiros. Carlos Alberto Menezes apud Maria Berenice Dias227 acrescenta: A jurisprudência chegou mesmo a estabelecer formas criativas de repartição patrimonial, dando relevo ao trabalho do lar, presumindo nos estratos de baixa renda a contribuição da mulher, a comunhão de interesses e de esforços. Todavia, nada mais se cogitava conceder, nem alimentos, nem direito sucessórios. O Código Civil de 2002 conceituou concubinato como sendo “as relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar. “As relações não eventuais são as estáveis, o que o aproxima da união estável, sua finalidade foi estremá-lo da união estável, ou seja dizer que o concubinato não incidem as normas àquela aplicáveis” 228. A doutrina e a jurisprudência, antes mesmo da Constituição, já classificava o concubinato em puro (ou próprio) e impuro (ou impróprio), permitindo ao primeiro a produção de alguns efeitos, como a partilha de bens e reservando ao segundo restrições contidas na legislação229. É de extrema importância demonstrar a diferença entre a união livre e o concubinato adulterino: Da concepção, anterior da Constituição e posterior à Lei do Divórcio de 1977, de concubinato emergiam duas espécies – a 226 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.156. 227 MENEZES, Carlos Alberto. Apud. DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.156. 228 LÔBO, Paulo. Famílias. p.165. 229 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p. 260. 60 união livre e o concubinato adulterino. A união livre entre pessoas solteiras, ou entre pessoas separadas de fato, separadas judicialmente e divorciadas, ou entre uma destas e outra solteira, deixou de qualificar-se como concubinato ao converter-se em união estável. A união deixou de ser livre, na medida em que o direito estabeleceu requisitos, proibições e conseqüências determinadas. Critica-se o paradoxo da regulamentação, pois “regulamentar o concubinato seria praticamente acabar com ele, matá-lo em sua essência, que é exatamente não estar preso às regras do casamento; mas, a não regulamentação não se confunde com a não-proteção do Estado. Restou o concubinato adulterino (uma das pessoas é casada – ou as duas – e mantém o casamento), ou simplesmente, e que o direito brasileiro resiste em considerar entidade familiar, remetendo-o à solução obrigacional pré-constitucional230. Em outras palavras, Carlos Roberto 231 Gonçalves complementa: A expressão “concubinato” é hoje utilizada para designar o relacionamento amoroso envolvendo pessoas casadas, que infringem o dever de fidelidade, também conhecido como adulterino. Configura-se, segundo o novo Código Civil, quando ocorrem “relações não eventuais entre o homem e a mulher , impedidos de casar. Com a evolução, pode-se perceber que a concepção de família, se alargou com a entidade familiar: Com a evolução dos costumes, as uniões extramatrimoniais acabaram merecendo a aceitação da sociedade, levando a Constituição a dar nova dimensão à concepção de família e introduzir um termo generalizante: entidade familiar. Alargou o conceito de família, passando a proteger relacionamentos outros além dos constituídos pelo casamento. Emprestou juridicidade aos enlaces extramatrimoniais até então marginalizados pela lei. Assim o concubinato foi colocado sob o regime de absoluta legalidade. As uniões de fato entre um homem e uma mulher foram reconhecidas como entidade familiar com o nome de união estável232. Carlos Roberto Gonçalves233 acrescenta: 230 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 151. 231 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p.543. 232 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.156. 233 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p.543. 61 O grande passo no entanto, foi dado pela atual Constituição, ao proclamar , no art. 226 §3º: “Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”. A partir daí a relação familiar nascida fora do casamento passou a denominar-se união estável, ganhando novo status dentro do nosso ordenamento jurídico. Desta forma, tendo sido a união livre elevada a condição de entidade familiar, sob a denominação de união estável, restou o concubinato adulterino, o qual se unificou com a denominação de concubinato, como tipo excludente e sem estatuto legal próprio como a união estável234. Por último cabe ressaltar que o concubinato sempre existiu nas sociedades modernas, eram chamados de concubinatos as uniões surgidas sem o selo do matrimonio. Mais tarde veio a classificação do concubinato puro que se caracterizava pela falta de impedimentos para contrair o matrimonio, e o concubinato impuro, que se caracterizava pelas relações não eventuais impedidos de casar. Com a evolução dos costumes as relações extramatrimoniais acabaram merecendo a aceitação da sociedade e com isso surgiu a entidade familiar, alargando o conceito de família, assim as uniões de fato entre homem e a mulher foram reconhecidas como entidade familiar com o nome de união estável, que será objeto do capítulo seguinte. 234 LÔBO, Paulo. Famílias. p.164. CAPÍTULO 3 DA UNIÃO ESTÁVEL NO DIREITO DE FAMÍLIA Este capítulo almeja focalizar a evolução histórica, conceito da união estável, bem como sua conversão em casamento, o contrato de convivência e principalmente os efeitos da dissolução. 3.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA Os vínculos afetivos fora do casamento, ou seja, as uniões livres, ou concubinatos sempre existiram nas sociedades modernas. No Brasil, após 1988, a união de fato foi institucionalizada como união de direito235. Paulo Lôbo236 esclarece: A união estável, inserida na Constituição de 1988, é o epílogo de lenta e tormentosa trajetória de discriminação e desconsideração legal, com as situações existenciais enquadradas sob o conceito depreciativo de concubinato, definido como relações imorais e ilícitas, que desafiavam a sacralidade atribuída ao casamento. A influência da Igreja Católica, inclusive durante o período da República – autoproclamada laica -, impediu as tentativas de projetos de lei em se atribuir alguns efeitos jurídicos ao concubinato, máxime em razão do impedimento legal ao divórcio, que apenas em 1977 ingressou na ordem jurídica brasileira. A ausência do divórcio foi responsável pelo crescimento exponencial das relações concubinárias. Cabe ressaltar que a união estável difere do casamento, pela liberdade de descumprir os deveres a este inerentes. Diante a isto, a doutrina clássica esclarece que o estado de concubinato pode ser rompido a qualquer instante, ou seja, qualquer que seja o tempo de sua duração, sem qualquer indenização ao concubino abandonado237. 235 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 148. 236 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 148-149. 237 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p.540. 63 Diante os mais variados fatos acerca do assunto, alguns direitos da concubina foram sendo reconhecidos, por começar pela legislação previdenciária e após outros direitos foram sendo admitidos, como o direito a meação dos bens adquiridos pelo esforço comum238. A jurisprudência brasileira, tangenciando os óbices legais, procurou construir soluções de justiça para essas situações existenciais, configurando verdadeiro uso alternativo do direito, ante a pressão incontornável da realidade social. A principal vítima foi a mulher, estigmatizada como concubina, tendo em vista a cultura patriarcal que impedia ou inibia seu acesso ao mercado de trabalho, o que a deixava sob a dependência econômica do homem, enquanto merecesse seu afeto. A mulher separada de fato ou solteira que se unia a um homem, com impedimento para casar, além do estigma, era relegada ao mundo dos sem direitos, quando dissolvido o concubinato, pouco importando que derivasse de convivência estável e que perdurasse por décadas, normalmente com filhos. Desconsideravam-se não apenas os aspectos existenciais dessa relação familiar, como criação dos filhos e sua dedicação ao progresso do companheiro, mas os aspectos patrimoniais, para cuja aquisição e manutenção a companheira tinha colaborado, assumindo as responsabilidades familiares e a estabilidade que ele necessitava para desenvolver suas atividades239. Com isso, tem-se que observar uma situação desfavorável para um dos concubinos. A realidade é que o julgador brasileiro passou a compreender que a ruptura de longo concubinato, de forma unilateral ou por mútuo consentimento, acabava criando uma situação extremamente injusta para um dos concubinos, porque em alguns casos, por exemplo, os bens amealhados com o esforço comum haviam sido adquiridos somente em nome do varão. Por outro lado, havia conflito entre o regime de bens que prevalecia em muitos países da Europa, que é o legal da separação, e o da comunhão de bens, vigorante então entre nós, ficando a mulher desprovida de qualquer recurso, em beneficio de parentes afastados do marido, em caso de falecimento de imigrantes.240 Silvio Rodrigues241 complementa a idéia de Paulo Lôbo: 238 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p.540. 239 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 148. 240 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p. 540-541. 241 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p. 260. 64 Freqüentemente os bens resultantes do esforço comum de ambos, ou ganhos com a colaboração da mulher, foram adquiridos em nome do varão, e em caso de separação dos concubinos, ficava aquela sem recurso algum; não raro, em caso de morte do homem, os herdeiros legítimos deste pediam a herança, isto é, tudo o que o casal possuía à época da abertura da sucessão; ainda neste caso, ficava a mulher sem nada. O Supremo Tribunal Federal adotou uma jurisprudência formulada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo que se estendeu aos demais tribunais do País. A posição humana e construtiva do Tribunal de Justiça de São Paulo acabou estendendo-se aos demais tribunais do País, formando uma jurisprudência que acabou sendo adotada pelo Supremo Tribunal Federal, no sentido de que a ruptura de uma ligação more uxório duradoura gerava conseqüências de ordem patrimonial. Essa Corte cristalizou a orientação jurisprudencial na Súmula 380, nestes termos: “Comprovada à existência da sociedade de fato entre concubinos, é cabível a sua dissolução judicial, com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum” 242. A jurisprudência, utilizando-se da Súmula 380 do Supremo Tribunal Federal, considerava que o fundamento da pretensão dos concubinos que se separavam era baseado numa sociedade de fato estabelecida entre eles e a dissolução permitia a divisão do patrimônio pelo esforço comum243. E ainda frente a orientação jurisprudencial, houveram entendimentos controversos acerca da expressão “esforço comum”, contida na jurisprudência: A expressão “esforço comum” ensejava dúvidas de interpretação na jurisprudência. Entendia uma corrente que a concubina só teria direito a participação no patrimônio formado durante a vida em comum se concorrera com seu esforço, trabalhando lado a lado do companheiro na atividade lucrativa. Decisões havia, por outro lado, entendendo que concorria igualmente para o enriquecimento do concubino a mulher que se atinha aos afazeres domésticos, 242 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p.541. 243 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p. 273. 65 propiciando-lhe o necessário suporte de tranqüilidade e segurança para o desempenho de suas atividades profissionais244. Com a evolução da jurisprudência, Silvio Rodrigues245 destaca duas soluções em benefício da concubina tendentes a reparar a injustiça: A primeira foi de atribuir-se à companheira, que por longo período prestou serviços domésticos ao concubino, o direito a salários por aqueles; segunda foi a de dar-lhe participação no patrimônio haurido pelo esforço comum, entendendo-se haver existido, entre os concubinários, uma sociedade de fato que, ao ser dissolvida, implicava o mister de dividir o patrimônio social. Dessa forma cabe observar que no passado os tribunais eram mais rigorosos na exigência da prova do concurso de concubina no ganho do patrimônio adquirido, sendo raras as decisões que lhe reconheciam o direito da concubina de participar daquele acervo sem demonstrar o concurso de trabalho e da pecúnia. Mas a partir de 1988 tornou-se mais freqüente a idéia de serem comuns os bens adquiridos na vigência da união estável, pois a concubina ao gerir a vida caseira, cuidar do lar e filhos, representava o concurso do esforço comum e com isso lhe deferia a partilha do patrimônio adquirido durante a união estável246. Foi longa a escalada para assimilação legal da união estável pelo direito pátrio. A jurisprudência, de inicio, reconheceu direitos obrigacionais no desfazimento da sociedade conjugal concubinária, determinando a divisão entre os cônjuges do patrimônio amealhado pelo esforço comum. Em outras situações, quando isso não era possível, para impedir o desamparo da concubina, os tribunais concediam a ela (ou excepcionalmente a ele) uma indenização por serviços domésticos247. Diante do tema abordado, se faz necessário frisar que a solução mais liberal foi a que se viu no concubinato a existência de uma sociedade de fato estabelecida entre concubinos, que unem seus recursos e 244 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p.541. 245 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p. 260. 246 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p. 275. 247 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 55. 66 esforços na constituição de um patrimônio comum248. E devido a isto, a jurisprudência no sentido de admitir a existência dessa união de fato entre os concubinos, onde a separação envolve o acervo comum, fez com que fosse acolhida basicamente por todas as cortes brasileiras249. 3.2 CONCEITO DA UNIÃO ESTÁVEL E COMPANHEIRO Pode-se conceituar a união estável como uma “entidade familiar constituída por homem e mulher que convivem em posse do estado de casado, ou com aparência de casamento” 250. A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 para efeito da proteção do Estado em seu artigo 226 traz o reconhecimento da união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar a sua conversão em casamento. A conceituação da união estável consta no artigo 1.723 do Código Civil de 2002, verbis: “É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família” 251. Nesse contexto Paulo Lobo explica: “É um estado de fato que se converteu em relação jurídica em virtude de a Constituição e a lei atribuírem-lhe dignidade de entidade familiar própria, com os seus elencos de direitos e deveres”.252 Cabe mencionar que o casamento ainda que seja uma referencia estrutural, é distinta deste, cada entidade dotada de estatuto jurídico próprio, sem hierarquia ou primazia253. 248 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito de família. p. 263. 249 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Direito de família. p. 264. 250 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 148. 251 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p.543. 252 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 148. 253 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 148. 67 Maria Berenice Dias254 esclarece: Nasce a união estável da convivência, simples fato jurídico que evoluiu para a constituição de ato jurídico, em face dos direitos que brotam dessa relação. Por mais que a união estável seja o espaço do não instituído, à medida que é regulamentada vai ganhando contornos de casamento. Sílvio de Salvo Venosa255 aponta que: “na união estável existe a convivência do homem e da mulher sob o mesmo teto ou não, mas more uxório, isto é, convívio como se marido e esposa fossem”. Nesse sentido o doutrinador revela que “a união estável é um fato jurídico, qual seja, um fato social que gera efeitos jurídicos” 256. Silvio Rodrigues257 aponta como um dos elementos para configurar a união estável a fidelidade recíproca: Dentre vários elementos capazes de configurar a união estável, o que, realmente, parece fundamental para esse fim é a presumida fidelidade da mulher ao homem. Aliás, em muitos casos, poder-seia mesmo dizer que o elemento básico caracterizador da relação é a presumida fidelidade recíproca entre os companheiros, pois ela não só revela o propósito de vida em comum e o de investirem-se eles na posse do estado de casados, como cria uma presunção júris tantum de que o filho havido pela mulher foi engendrado por seu companheiro. O doutrinador esclarece ainda que além da fidelidade também é de caráter essencial para a notoriedade da união, a dependência econômica da mulher ao homem e a vida em comum sob o mesmo teto, os quais reforçam a presunção de fidelidade258. Devido a este entendimento Sílvio Rodrigues259 da uma rápida definição acerca do assunto: 254 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das famílias. p.158. 255 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 54-55. 256 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 55. 257 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito de família. p. 264. 258 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito de família. p. 259. 259 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito de família. p. 259. 68 A união estável como a união do homem e da mulher, fora do matrimônio, de caráter estável, mais ou menos prolongada, para o fim de satisfação sexual, assistência mútua e dos filhos comuns e que implica uma presumida fidelidade recíproca entre a mulher e o homem. Sem a preocupação de conceituar, mas apenas de realçar os elementos mais expressivos da união estável, Marco Aurelio S. Viana260 diz que a união estável é a convivência entre o homem e a mulher, alicerçada na vontade dos conviventes, de caráter notório e estável, visando a constituição de família. Francisco José Cahali apud Luiz Augusto Gomes Varjão261 a união estável “é o vínculo afetivo entre o homem e a mulher, como se casados fossem, com as características inerentes ao casamento, e a intenção de permanência de vida em comum”. É de extrema importância demonstrar que os companheiros da união estável são o homem e a mulher sem impedimentos para casar, salvo se casados, mas separados de fato ou judicialmente. O Código Civil de 2002 unificou a denominação companheiro para o parceiro da união estável, dada a variedade de termos antes existente e que propiciava dúvidas de interpretação: companheiros, conviventes, concubinos, parceiros262. “companheiro em união estável” é estado civil autônomo; quem ingressa em união estável deixa de ser solteiro, separado, divorciado, viúvo. Essa qualificação autônoma resulta: a) da tutela constitucional e do Código Civil à união estável como relação diferenciada do estado de casado e do estado de solteiro; b) do vínculo inevitável dos companheiros com entidade familiar, especialmente dos deveres comuns; c) da relação de parentesco por afinidade com os parentes do outro companheiro que gera impedimentos para outra união com estes; d) da proteção dos interesses de terceiros que celebram atos com um dos companheiros, em razão do regime de bens de comunhão parcial desde o início da união263. 260 VIANA, Marco Aurelio S. Da união estável. São Paulo: Saraiva. 1999. p. 29. 261 VARJÂO, Luiz Augusto Gomes. União estável: requisitos e efeitos. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira. 1999. p.73. 262 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 150. 263 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 150. 69 Para Sílvio de Salvo Venosa264 companheira “é a designação elevada que se dá à mulher unida por um longo tempo a um homem, como se fosse sua esposa; mas como não existe laços de casamento civil, é concubina”. 3.3 CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988 Com o passar dos anos pode-se observar que houve uma evolução no que diz respeito a família e com isso obteve-se muitas mudanças positivas ao ordenamento jurídico, Paulo Lôbo sustenta que o caput do artigo 226 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 – CRFB/1988 é cláusula geral de inclusão, não sendo admissível excluir qualquer entidade que preencha os requisitos de afetividade, estabilidade e ostensibilidade265. [...] a Lei Maior inseriu a união estável no capítulo dedicado à família. Considerou-a como entidade familiar, como o fez relativamente à comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes. A família é a base da sociedade, mas independe do casamento. Nesse particular, a orientação da Constituição Federal aparta-se do que se fazia até então no Brasil, porque, desde a Constituição Republicana de 1881, a proteção constitucional era destinada apenas à família dita legítima.266 Silvio Rodrigues267 ensina que a CRFB/1988 determina que “a união estável entre o homem e a mulher está sob proteção do Estado, colocando, assim, o concubinato sob um regime de absoluta legalidade, tirando-o da eventual clandestinidade em que ele, possivelmente, vivia”. Maria Helena Diniz268 foi muito feliz em explicar o entendimento Constitucional acerca da família, reconhecendo como entidade familiar a união estável: 264 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 55. 265 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 151. 266 VIANA, Marco Aurelio S. Da união estável. p. 13. 267 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Direito de família. p. 258. 268 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito de Família. p.253-354. 70 A Constituição Federal, ao conservar a família, fundada no casamento, reconhece como entidade familiar a união estável, a convivência pública, continua e duradoura de um homem com uma mulher, vivendo ou não sob o mesmo teto, sem vínculo matrimonial, estabelecida com o objetivo de constituir família, desde que tenha condições de ser convertida em casamento, por não haver impedimento legal para sua convolação. Como declara o artigo 226 §3º do texto constitucional: “Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento” 269. A Constituição, ao garantir especial proteção à família, citou algumas entidades familiares, as mais freqüentes, mas não as desigualou. Limitou-se a elencá-las, não lhes dispensando tratamento diferenciado. O fato de mencionar primeiro o casamento, depois a união estável e por último a família monoparental não significa qualquer preferência nem revela escala de prioridade entre elas. Ainda que a união estável não se confunda com o casamento, ocorreu a equiparação das entidades familiares, sendo ambas merecedoras da mesma proteção. A Constituição acabou por reconhecer juridicamente ao afeto, ao elevar as uniões constituídas pelo vínculo de afetividade à categoria de entidade familiar270. Silvio Rodrigues271 explica: O fato importante que ressalta do texto constitucional é o reconhecimento de que a ligação, mais ou menos duradoura, entre pessoas de sexo diverso, com o propósito de fazerem vida em comum, adquiriu o status de entidade familiar. Ou seja, o legislador de 1988 tirou a máscara hipócrita de seu colega de 1916, a quem a família ilegítima envergonhava, para proclamar não só a existência da família nascida fora do casamento, sua condição de entidade familiar, como também para dizer que ela se encontra sob a proteção do Estado. Tendo em vista que a união estável é um instituto de natureza diversa do casamento, o fato da CRFB/1988 tela declarado entidade 269 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito de família. p. 271. 270 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das famílias. p.156-157. 271 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito de família. p. 272. 71 familiar não implica que se apliquem todos os seus efeitos272. O advento da CRFB/1988 provocou alguma agitação na doutrina e na jurisprudência, o primeiro problema que se apresentou foi frente à competência das Varas da Família, ou seja, do julgamento das questões derivadas da extinção do concubinato, problema hoje que já foi solucionado273. Com efeito, a Lei n. 9.278/96, em seu artigo 9º determina que toda a matéria relativa à união estável é da competência das Varas de Família, assegurando o segredo de justiça. O Código Civil de 2002, embora silenciando sobre a competência, regulamenta a união estável e confirma a legislação precedente274. A tentativa de equiparação da união estável ao casamento, com base na regra constitucional que reconhecia naquela a condição de entidade familiar, provocou alguns pronunciamentos merecedores de registro, não só pela amplidão que tentaram dar ao texto como também pelo fato de esses julgados terem provocado a reação do legislador, que, oportunamente, procurou suprir as lacunas com a edição de lei sobre o assunto275. Verifica-se que “a sociedade concubinária, produzindo efeitos patrimoniais, com lastro na disciplina das sociedades de fato, do Código Civil, passa ao patamar de união estável, reconhecida constitucionalmente como entidade familiar” 276 . E ainda gozando de proteção do Estado, esta legitimada para sofrer incidências das regras de direito de família, devendo a lei facilitar sua conversão em divórcio. Por fim cabe levar em consideração o texto constitucional, o qual nos trás alguns requisitos no conceito de união estável: o primeiro aqui comentado é o da estabilidade na união entre o homem e a mulher, quer dizer não é qualquer tipo de relacionamento transitório, ou seja, simples relações sexuais reiteradas que irão constituir uma união protegida. O decurso por um 272 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito de família. p. 272. 273 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito de família. p. 272. 274 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito de família p. 273. 275 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito de família. p. 273. 276 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito de família. p. 276. 72 período mais ou menos longo que será o retrato da relação do casal277. Para Marco Aurelio S. Viana278 significa, que deve ser contínua e que se prolongue no tempo, ressalta ainda que não pode tipificar a união estável em circunstancial, momentânea, ou ainda eventual, mas sim que deve ser revestida de estabilidade. Outro requisito citado pela lei é a continuidade, a qual complementa a estabilidade, esse requisito pressupõe que a relação de fato seja contínua, sem interrupções.279 Também se refere à união de homem e mulher, ou seja a diversidade de sexos, pois como no casamento a união estável entre outras finalidades possui a geração de prole, sua educação e assistência280. Cuida-se de união entre homem e mulher, essa exigência constitucional afasta a possibilidade de se inserir o relacionamento entre pessoas do mesmo sexo281. Outro elemento da conceituação legal é a publicidade, a notoriedade da união, diante isto gozará de proteção a união estável, aquela onde o casal se apresenta perante a sociedade como marido e mulher, situação em que se avizinha da posse de estado de casado282,ou seja, é mister que haja a convivência notória, pois a união deve ser reconhecida dentro e fora do circulo doa amigos, ou ainda de pessoas íntima e visinhos283. Para Marco Aurelio S. Viana284 “a comunidade de vida é outro elemento integrante da união estável. Em linha de princípio, a vida comum, sob o mesmo teto, é o que mais evidencia a aparência de casamento”. 277 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 58-59. 278 VIANA, Marco Aurelio S. Da união estável. São Paulo: Saraiva. 1999. p. 25. 279 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 59. 280 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 59. 281 VIANA, Marco Aurelio S. Da união estável. p. 24. 282 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 61. 283 VIANA, Marco Aurelio S. Da união estável. p. 25. 284 VIANA, Marco Aurelio S. Da união estável. p. 26. 73 E por último, o objetivo de constituir família, é base de todos os demais requisitos, não é necessário que o casal tenha filhos em comum, o que se constituiria um elemento mais profundo de entidade familiar, portanto ainda que sem filhos comum a união tutelada é aquela intuitu familiae, que se traduz a uma comunhão de vida e interesses285. 3.4 CÓDIGO CIVIL DE 2002 – LEI 10.406 Avançou o legislador ao estabelecer expressamente a possibilidade de caracterização de união estável se um ou ambos os conviventes forem casados, mas separados de fato, “e deixou consignada a impossibilidade de configuração dessa entidade familiar se verificada a existência de qualquer dos demais impedimentos matrimoniais” 286. É importante ressaltar que na mesma linha do artigo 1º da Lei n. 9.278/96, não foi estabelecido um período mínimo de convivência pelo artigo 1.732 do Código Civil de 2002, diante isto Carlos Roberto Gonçalves287 menciona: Não é, pois, o tempo com determinação de número de anos que deverá caracterizar uma relação como união estável, mas outros elementos expressamente mencionados: “convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família. Também cabe ressaltar que no campo pessoal, o Código Civil de 2002 reitera “os deveres de “lealdade, respeito, e assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos”, como obrigação recíproca entre os conviventes”288. Aproxima e identifica a união estável do casamento tudo o que diz respeito à responsabilidade dos companheiros com relação a prole e a si próprios289. 285 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 61. 286 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito de família. p. 282. 287 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p.545-546. 288 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito de família. p. 282. 289 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 67. 74 Dessa forma, pode-se observar que acerca do artigo 1.723 §1º do Código Civil de 2002: Foi admitida expressamente, no §1º do aludido dispositivo, a união estável entre pessoas que mantiveram seu estado civil de casadas, estando, porém, separadas de fato, nestes termos: “A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521; não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente” 290. Importante demonstrar que embora o artigo 1.723 do Código Civil de 2002 não se refira expressamente à coabitação ou vida em comum sob o mesmo teto, tal elemento constitui uma das mais marcantes características da união estável, como bem acentua Zeno Veloso apud Carlos Roberto Gonçalves291: Essa entidade familiar decorre desse fato, da aparência de casamento, e essa aparência é o elemento objetivo da relação, a mostra, o sinal exterior, a fachada, o fator de demonstração inequívoca da constituição de uma família. De acordo com o Código Civil de 2002, pode-se observar que determina a aplicação, no que couber, do regime de comunhão parcial de bens, quanto aos efeitos patrimoniais, dessa forma, os companheiros passam a partilhar todo o patrimônio adquirido na constância da união, como se casados fossem292. Sílvio de Salvo Venosa293 complementa o entendimento: Conforme o art. 1.725, permite-se que os companheiros contratem acerca de seu regime patrimonial e, na ausência desse negócio, aplicar-se-á, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens. Cuida-se do denominado contrato de convivência, que permite uma série de normas de cunho patrimonial, a exemplo dos pactos antenupciais. Carlos Roberto Gonçalves294 no mesmo sentido de Sílvio 290 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p.546. 291 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p.549. 292 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p. 282. 293 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 67. 294 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p.547. 75 Rodrigues ensina: No tocante aos efeitos patrimoniais, o Código Civil de 2002 determina a aplicação, no que couber, do regime da comunhão parcial de bens, pelo qual haverá comunhão dos aquestos, isto é, dos bens adquiridos na constância da convivência, como se casados fossem, “salvo contrato escrito entre os companheiros”. Ou seja, “passam a integrar o acervo comum, por exemplo, os bens adquiridos por fato eventual, com ou sem concurso de trabalho ou despesa anterior, e o fruto dos bens particulares” 295. Outra inovação foi à questão dos alimentos, a qual veio a ser estabelecida em conjunto com a pensão decorrente do casamento, a qual terá o mesmo tratamento296. Assim, havendo previsão legal para a concessão de alimentos aos companheiros, desde a vigência das leis especiais, não mais se justifica falar em indenização por serviços prestados297. Relevante inovações foram também introduzidas pelo CC/2002 no que se refere o direito sucessório entre os companheiros298. Após tantos anos de luta e evolução doutrinária e jurisprudencial objetivando resguardar os direitos decorrentes da união estável, alcançados na atual legislação vigente, embora, reconheça-se, bem audaz, certamente essa nova fórmula será objeto de significativa hostilidade da comunidade jurídica e da própria sociedade. Por fim, cabe ressaltar que o artigo 1.726 do Código Civil de 2002 estabelece que “a união estável poderá converter-se em casamento, mediante pedido dos companheiros ao juiz e assento no Registro Civil”. 3.5 REGIMES DE BENS E CONTRATO DE CONVIVÊNCIA A partir do início da união estável, o regime de bens para os companheiros é o da comunhão parcial de bens. Regime legal supletivo incidente 295 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p. 282. 296 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p. 283. 297 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p.546. 298 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. p. 283. 76 sobre a união estável quando os companheiros não tiverem adotado regime diferente. Com o inicio da união estável, o bem adquirido por qualquer um dos companheiros ingressa automaticamente na comunhão, pouco importando em que cuja titularidade esteja299. O regime condominial dos bens na união estável decorre da convivência, a qual gera a presunção da comunhão de esforços à sua constituição. Não importa o fato de os bens estarem registrados apenas no nome de um dos companheiros, pois a partilha ocorrerá de forma igualitária. No entanto, há a possibilidade de os conviventes, a qualquer tempo (antes, durante, ou mesmo depois de solvida a união), regularem da forma que lhes aprouver as questões patrimoniais, agregando, inclusive, efeito retroativo às deliberações.300 O Código Civil de 2002 manteve a possibilidade de os companheiros celebrarem contrato escrito prevista anteriormente na Lei n. 9.278/96, que dispunha de forma contrária, afastando o regime de comunhão de bens. Dispõe o artigo 1.725 do Código Civil de 2002: Art. 1725 - Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens. Com base no artigo, Paulo Lôbo nos explica: Aplicam-se à união estável, pois, todas as regras estabelecidas pelo Código Civil ao regime legal de comunhão parcial, atribuído ao casamento. Entram na comunhão todos os bens adquiridos após o inicio até à dissolução (separação de fato) da união estável, exceto os considerados particulares de cada companheiro. Os bens móveis presumem-se adquiridos durante a união, salvo prova em contrario. Ingressam na comunhão as dívidas inadimplidas contraídas em proveito da entidade familiar. Também ingressam na comunhão os valores correspondentes ao pagamento de parcelas de contratos de aquisição de bens mediante crédito ou financiamento, após o início da união estável301. Cabe ressaltar que não cabe na comunhão o passivo patrimonial de cada companheiro, ou seja, as dívidas anteriores à união e as 299 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 159. 300 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das famílias. p.169-170. 301 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 159. 77 dívidas posteriores provenientes de responsabilidade por danos causados a terceiros302. Também é de suma importância destacar que em virtude da expressa adoção do regime de comunhão parcial, há a presunção legal de comunhão, onde os bens adquiridos após o inicio da união, não precisam mais se provar pelo esforço comum303. Qualquer alienação (venda, permuta, doação, dação em pagamento) de bem comum pelo companheiro depende de autorização expressa do outro; a falta de autorização enseja ao prejudicado direito a pretensão à anulação do ato e do respectivo registro público. Terceiros de boa fé, prejudicados pela anulação, em virtude da omissão do estado civil de companheiro em união estável do alienante, tem contra este, além da pretensão à indenização por perdas e danos304. Também cabe reiterar que a proteção legal da comunhão parcial é de tudo semelhante à derivada do casamento. Desta forma, não pode o companheiro prestar aval ou fiança sem expressa autorização do outro, pois a regra do artigo 1.647 do Código Civil de 2002 também aplica-se à união estável, pois incide sobre o regime de comunhão parcial. E ainda, em caso de penhora de bem imóvel adquirido após o inicio da união estável em nome de um dos companheiros, pode o outro por embargos de terceiros, pedir para excluir a meação305. A lei refere à possibilidade de os conviventes disciplinarem o regime de bens, facultando a elaboração de contrato escrito, denota a ampla liberdade que têm os companheiros de estipularem tudo o que quiserem, não só questões de ordem patrimonial, mas também de ordem pessoal. 306 Os companheiros podem, antes ou após o inicio da união estável, estipular regime de bens diferente da comunhão parcial, adotando qualquer um dos previstos para os cônjuges, ou criando um 302 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 159. 303 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 160. 304 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 160. 305 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 160. 306 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.170. 78 próprio. O art. 1.725 do Código Civil faculta aos companheiros celebrarem contrato escrito para tal fim, mediante instrumento particular ou público. O contrato equivalente para o casamento é o pacto antenupcial, que apenas pode ser realizado antes da habilitação para aquele, exclusivamente por escritura pública. Não há exigibilidade legal para registro do contrato no registro imobiliário, para que o contrato possa ser válido e eficaz entre os companheiros; porém, para que o regime diferenciado possa valer perante terceiros, o registro é necessário em virtude da publicidade deste haurida. Se o contrato não for registrado – por exemplo, o que estipule o regime de separação total de bens -, os bens adquiridos após a união por um dos companheiros poderão ser penhorados em razão de dívidas do outro, porque serão presumidos comuns. Se o contrato não registrado puder ser oponível a terceiros, poderá servir de instrumento de fraude contra credores307. Segundo Francisco José Cahali apud Carlos Roberto 308 Gonçalves , contrato de convivência “é o instrumento pelo qual os sujeitos de uma união estável promovem regulamentações quanto aos reflexos da relação por eles constituída”. Maria Berenice Dias complementa que o “pacto informal, pode tanto constar de escrito particular como de escritura pública, ser levado ou não a inscrição, registro ou averbação” 309. Carlos Roberto Gonçalves310 ensina acerca do contrato de convivência: Não reclama forma preestabelecida ou já determinada para sua eficácia, embora se tenha como necessário seja escrito, e não apenas verbal. Assim, poderá revestir-se da roupagem de uma convenção solene, escritura de declaração, instrumento contratual particular levado ou não a registro em Cartório de Títulos e Documentos, documento informal, pacto e, até mesmo, ser apresentado apenas como disposições ou estipulações esparsas, instrumentalizadas em conjunto ou separadamente, desde que contenham a manifestação bilateral da vontade dos companheiros. Francisco Cahali continua dizendo que “pode até mesmo 307 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 160. 308 CAHALI, Francisco José. in GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. p.571. 309 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.170. 310 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p.571. 79 conter disposições ou estipulações esparsas, instrumentalizadas em conjunto ou separadamente em negócios jurídicos diversos, desde que contenha a manifestação bilateral da vontade dos companheiros, identificando o elemento volitivo expresso pelas partes” 311. O contrato para regular o regime de bens tem finalidade exclusivamente patrimonial, não podendo dispor sobre direitos pessoais dos companheiros ou destes em relação aos filhos. A união estável é ato-fato jurídico que independe da vontade das partes, razão por que não pode haver “contrato de união estável” que a constitua ou fixe seu inicio, mas “contrato de regime de bens de união estável. Para os fins outros que não o de definição do regime de bens, o contrato é nulo, por dispor sobre o que é legalmente cogente312. O contrato de convivência e união estável: O contrato de convivência não cria a união estável, pois sua constituição decorre do atendimento dos requisitos legais (CC 1.723), mas é forte indício de sua existência. O contrato de convivência – tal qual o pacto antenupcial – está sujeito a condição suspensiva. Sua eficácia está condicionada à caracterização da união. A convenção não cria a união estável, que se constitui pelo atendimento dos requisitos legais (CC 1.723), e não pela vontade manifestada no contrato. De qualquer forma, marca nem que seja o seu início. O contrato pode ser modificado a qualquer tempo, tal como ocorre com o regime de bens (CC 1.639 § 2º). Também pode ser revogado na constância da conjugalidade, desde que esta seja a vontade expressa de ambos os companheiros. A manifestação unilateral de um dos conviventes não tem o condão de provar nada: nem o começo nem o fim da união estável.313 Diante disto, cabe ressaltar que de nada valerá, o ajuste escrito e solene se não for acompanhado de uma efetiva convivência familiar entre os companheiros314. 311 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das famílias. p.170. 312 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 160-161. 313 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. in DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das famílias. p.170. 314 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p.573. 80 Rolf Madaleno apud Maria Berenice Dias315 sustenta: A renúncia dissimulada por simples contrato escrito de convivência, que afasta a presunção de comunhão parcial, deve ser rejeitada por seu nefasto efeito de enriquecer sem justa causa apenas o companheiro beneficiado pela renúncia do outro e por ser claramente contrária à moral e ao direito, permitindo restrições de ordem material de efeito retroativo. Euclides de Oliveira apud Carlos Roberto Gonçalves316 assinala que a “eficácia do contrato cinge-se ao seu conteúdo adequado, ou seja, sobre os bens adquiridos ou que venham a integrar o patrimônio isolado de um dos companheiros durante a convivência”. Como é necessário que as questões de ordem patrimonial sejam regidas de alguma forma, ao que eventualmente não for regulado no contrato de convivência é de se aplicar subsidiariamente o regime da comunhão parcial, via eleita pelo legislador em caso de omissão dos conviventes317. Sustenta-se que os companheiros podem atribuir ao contrato de regime de bens eficácia retroativa, em virtude do principio da liberdade. Todavia, a retroação dos efeitos do contrato tem como limite a proteção dos interesses de terceiros de boa-fé. Por outro lado, é aplicável analogicamente a regra do art. 1655 do Código Civil, relativamente ao pacto antenupcial, que declara nula cláusula que contrarie disposição absoluta de lei. Não cabe indenização ao companheiro como pode-se observar: Não só nos pactos antenupciais, mas também nos contratos de convivência, é nula a convenção ou cláusula que contravenha disposição absoluta de lei (CC 1.655). Descabido não reconhecer como válida cláusula que estabeleça que um companheiro deve pagar indenização ao outro no fim do relacionamento. A previsão poderá ter por fundamento tanto o simples fato de a separação ser desejada por um dos parceiros quanto o de decorrer por culpa de um deles318. Tanto o contrato de convivência como o distrato da união 315 MADALENO, Rolf. in DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das famílias. p.170. 316 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p.573. 317 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das famílias. p.171. 318 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das famílias. p.171. 81 estável, ou seja, a avença dando por findo o relacionamento, merecem a devida averbação. Impositiva é a aplicação analógica da possibilidade de separação e divórcio extrajudiciais319. Não se aplica à união estável o regime legal obrigatório de separação de bens, previsto no art. 1.641 do Código Civil, porque diz respeito exclusivamente ao casamento320. 3.6 CONVERSÃO DA UNIÃO ESTÁVEL EM CASAMENTO A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, ao elevar a união estável ao status de entidade familiar estabeleceu ao final do §3º o seguinte enunciado: “devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”321. Paulo Lôbo322 ensina que “facilitar a conversão em uma entidade em outra é especificação do princípio da liberdade de constituição de família”. É de suma importância ressaltar acerca da escolha da conversão ou não da união estável em casamento: Se os companheiros desejarem manter a união estável até o fim de suas vidas podem fazê-lo, sem impedimento legal. Serão livres para convertê-la em casamento, se quiserem, sem imposição ou indução legal; da mesma forma que as pessoas casadas podem livremente dissolver seu casamento e constituírem união estável, o que tem ocorrido com certa freqüência com casais divorciados que se reconciliam, mas não desejam retornar à situação anterior323. O Código Civil de 2002, em seu artigo 1.726 apenas exige para a conversão da união estável em casamento o pedido dos companheiros ao 319 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das famílias. p.171. 320 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 161. 321 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 161. 322 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 162. 323 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 162. 82 juiz e assento no Registro Civil324. Ocorre que ao exigir a interferência judicial ao determinar que o pedido seja dirigido ao juiz, devendo ser posteriormente averbado no registro civil, em nada facilita a conversão. Ao contrario, a dificulta. Por isso, a doutrina vem considerando inconstitucional esse dispositivo325. Uma vez que não podem os Tribunais de Justiça, sob a justificativa de regulamentar a matéria, impor exigências formais que contrariam o Código Civil e a Constituição326. A exigência do novel legislador desatende o comando do artigo acima citado, uma vez que deve a lei facilitar a conversão da união estável em casamento, ou seja, estabelecer modos mais ágeis de alcançar semelhante propósito327. De acordo com Paulo Lôbo328, a facilitação da conversão da união estável em casamento diz respeito exclusivamente ao ato jurídico do casamento em si, em especial a celebração. Converte um ato-fato jurídico em ato jurídico, cuja complexidade deve ser reduzida notadamente quanto à simplificação da habilitação e à dispensa da celebração. Francisco Cahali apud Maria Berenice Dias329 ensina acerca do assunto: O sentido prático da transformação da união estável em casamento seria para estabelecer seu termo inicial, possibilitando a fixação de regras patrimoniais com efeito retroativo. Dificultando esse intento, o jeito é firmar contrato de convivência, que pode dispor de eficácia retroativa, incidindo suas previsões sobre situações pretéritas a partir da caracterização da união. 324 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 162. 325 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.174. 326 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 162. 327 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p.122. 328 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 162. 329 CAHALI, Francisco. in DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.174. 83 Paulo Lôbo330 explica que a conversão em casamento não produz efeitos retroativos, assim tem-se que as relações pessoais e patrimoniais da união estável permanecerão com seus efeitos próprios, constituídos do período de sua existência até a conversão. Se caso os cônjuges tiverem optado pelo regime de separação total de bens, mediante pacto antenupcial, os bens adquiridos antes, ou seja, durante a união estável, permanecerão em condomínio. Maria Berenice Dias331 aponta outra solução: A outra solução é casar. Hipótese, além de mais barata, certamente mais romântica. Cabe lembrar que o casamento é gratuito (CF 226§1º), e o procedimento de transformação depende da propositura de demanda judicial, implicando contratação de advogado e pagamento de custas. Ao depois, existe a possibilidade de os noivos firmarem pacto antenupcial, no qual podem, ao seu bel-prazer, fazer o acerto de ordem patrimonial que quiserem, inclusive com efeito retroativo sobre bens particulares. Euclides de Oliveira apud Carlos Roberto Gonçalves332 concorda com Maria Berenice Dias: Em vez de recorrer ao judiciário, mais fácil será simplesmente casar, com observância das formalidades exigidas para a celebração do casamento civil, máxime considerando-se que a referida conversão não produz efeitos pretéritos, valendo apenas a partir da data em que se realizar o ato de seu registro. Não trouxe a lei qualquer regra sobre a forma de operacionalização da transformação da união estável em casamento. Resoluções dos tribunais estaduais regulamentam o procedimento de conversão. Porém continuarão sendo normas sem aplicabilidade, já que não foram eliminadas formalidades nem afastadas burocracias333. 3.7 AÇÃO DE RECONHECIMENTO A união estável é um fato jurídico que nasce, perdura por um 330 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 163. 331 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das famílias. p.174. 332 OLIVEIRA, Euclides de. in GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. p.123. 333 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das famílias. p.174-175. 84 tempo e por muitas vezes acaba. Constitui-se e extingue-se sem a chancela estatal, caso os conviventes retornam à vida em comum, o arrependimento dispõe dos mesmos efeitos da reconciliação334. Tem-se que uma vez reunidos os elementos necessários para a configuração da união estável, seu reconhecimento dependerá da iniciativa dos interessados, tanto conviventes ou herdeiros, matéria que pode ser discutida em ação ajuizada exclusivamente para esse fim ou decidida incidentemente em pedidos de varias naturezas, como a questão dos alimentos, filiação, direitos sucessórios entre outros335. A ação de reconhecimento de união estável dispõe de carga exclusivamente declaratória, limita-se a sentença a reconhecer que a relação existiu, fixando o termo inicial e final do relacionamento. A união estável solve-se da mesma forma que se constitui: sem a interferência do Estado. Assim, rompido o vínculo afetivo, inadequado nominar a ação de dissolução de união estável, pois, quando as partes vêm a juízo, a união já está dissolvida. A sentença somente reconhece que a união existiu e identifica o período de convivência em face dos efeitos patrimoniais, pois os bens adquiridos, durante o tempo de vida em comum, pertencem a ambos, ensejando partição igualitária336. De modo geral, o companheiro socorre-se da via judicial depois de finda a união, reivindicando algum direito: ou partilha de bens, ou alimentos, ou direito sucessórios se o vínculo findou pela morte do parceiro. Podem os companheiros buscar o reconhecimento jurídico da relação, de forma consensual ou litigiosa, por meio de justificação judicial, ou de ação declaratória para ver reconhecida a união, durante sua vigência337. A união estável nasce da informalidade, ou seja, da simples convivência, e não precisa de nenhuma formalidade para se extinguir, ocorre que quando não há entendimento entre os companheiros para uma extinção amigável, pode qualquer deles recorrer à via judicial com pedido de declaração de sua existência e conseqüente dissolução, com partilha dos bens comuns e decisões 334 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das famílias. p.175. 335 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 449. 336 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das famílias. p.175. 337 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das famílias. p.175-176. 85 de outras questões mencionadas338. Maria Berenice Dias339 explica: Na união estável, os companheiros, de forma consensual, podem solver as questões patrimoniais, sendo despicienda a interferência da justiça. A divisão dos bens não necessita de homologação judicial. Todavia havendo litígio, é acionado o judiciário, normalmente por aquele que não está na posse do acervo comum. O objeto da ação é a identificação do período de convívio e a divisão do patrimônio amealhado nesse ínterim assim, é mister que decline o autor os bens alvo de partição e já formule sua proposta de partilha. A sentença, além de extremar o período de vigência da união estável, deve definir e dividir os bens comuns. De todo viciosa a prática que vem se consolidando de delegar à fase de liquidação da sentença a identificação dos bens. Ocorre que muitas vezes, a partilha é relegada à nova ação e com esses desdobramentos praticamente são geradas mais duas demandas, que exigem dilação probatória, o que acaba perpetuando a presença das partes e juízo. Importante salientar que na hipótese de haver consenso sobre a divisão do patrimônio, é possível a partilha extrajudicial340. Diante essa explicação vale complementar que “em caso de litígio entre os companheiros, será necessário o pedido judicial de dissolução, cumulado com a declaração incidental da existência da relação jurídica de união estável, se houver negativa por um deles” 341. Por último de muita importância ressaltar que melhor tende ao interesse de todos é que em única demanda já fiquem solvidas todas as questões quanto a definição do termo inicial e final da vigência da união estável como a identificação do acervo patrimonial comum e sua divisão342. 338 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p.577. 339 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das famílias. p.178. 340 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das famílias. p.178. 341 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 163. 342 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.178. 86 3.8 EFEITOS DA DISSOLUÇÃO É importante iniciar este tópico informando que “ainda que a união estável não se confunda com o casamento, gera um quase casamento na identificação de seus efeitos, dispondo de regras patrimoniais quase idênticas” 343. Paulo Lôbo344 comenta acerca da extinção da união estável: A união estável termina como se inicia, sem qualquer ato jurídico dos companheiros ou decisão judicial. A causa é objetiva, fundada exclusivamente na separação de fato. Portanto, dispensa-se a imputação ou investigação de culpa. Não se dissolve qualquer ato jurídico, como no casamento, mas a convivência more uxório. Maria Berenice Dias345 distingue casamento da união estável: No casamento, os noivos têm a liberdade de escolher o regime de bens (CC 1.658 a 1.688). Por meio de Pacto antenupcial, podem optar entre um dos regimes previamente definidos na lei ou estabelecer o que melhor lhes aprouver, desde que não haja afronta a disposição absoluta da lei (CC 1.655). na união estável, os conviventes têm a faculdade de firmar contrato de convivência (CC 1.725), estipulando o que quiserem. Quedando-se em silêncio tanto os noivos (CC 1.640) como os conviventes (CC 1.725), a escolha é feita pela lei: incide o regime da comunhão parcial de bens (CC 1.658 a 1.666). Como no casamento, a dissolução da união estável pode ser de forma amigável ou litigiosa, a dissolução amigável pode ser exteriorizada por instrumento particular, onde os companheiros, para prevenir um litígio, definem acerca do eventual pagamento de alimentos, da guarda dos filhos e de outros respectivos direitos de convivência como também da partilha de bens comuns.346 Torna mais vantajosa a união estável do que o casamento, quando ambos têm mais de 60 anos. No casamento não gera efeitos patrimoniais para quem casar depois dessa idade, é o que impõe o regime de separação 343 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.166 344 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 163. 345 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.166. 346 LÔBO, Paulo. Famílias. p. 163. 87 obrigatória de bens. No entanto, essa limitação, não existe na união estável, não cabendo interpretação analógica para restringir direitos347. É de dar importância que no regime de comunhão parcial, todos os bens amealhados durante o relacionamento são considerados fruto do trabalho comum, adquiridos por mútua colaboração, passando a pertencer a ambos, em parte iguais. Instala-se um estado de condomínio entre o par tudo há que ser dividido348. Ou seja, os bens adquiridos a título oneroso na constância da união estável pertencem a ambos os companheiros, devendo dessa forma serem partilhados em caso de dissolução conforme as normas que regem o regime de comunhão parcial de bens349. A presunção de propriedade do titular aparente no registro não é mais absoluta, e o companheiro é patrimonialmente equiparado ao cônjuge. Adquirido o bem por um, transforma-se em propriedade comum, devendo ser partilhado por metade na hipótese de dissolução do vínculo350. Portanto, pode-se frisar que quem vive em união estável e adquire algum bem, ainda que em nome próprio, não é o seu titular exclusivo, e ainda o fato de o patrimônio figurar como de propriedade de um não afasta a cotitularidade do outro, pois trata-se de presunção júris et de jure, ou seja, não admite prova em contrário351. Nesse sentido, Sílvio de Salvo Venosa352, ressalta o artigo 5º da Lei n. 9.278/96 o qual coroava esse entendimento, canalizando por longo caminho jurisprudencial: Art. 5° Os bens móveis e imóveis adquiridos por um ou por ambos os conviventes, na constância da união estável e a título oneroso, 347 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.166. 348 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.166. 349 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p.564. 350 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.166. 351 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.167. 352 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 453. 88 são considerados fruto do trabalho e da colaboração comum, passando a pertencer a ambos, em condomínio e em partes iguais, salvo estipulação contrária em contrato escrito. § 1° Cessa a presunção do caput deste artigo se a a quisição patrimonial ocorrer com o produto de bens adquiridos anteriormente ao início da união. § 2° A administração do patrimônio comum dos conviv entes compete a ambos, salvo estipulação contrária em contrato escrito. Salvo as exceções legais de incomunicabilidade previstas nos artigos 1.659 e 1.661 do Código Civil de 2002, quais sejam: bens recebidos por herança, por doação ou mediante sub-rogação legal. Assim ao convivente que quiser livrar da divisão determinado bem adquirido durante o período de convívio cabe a prova de alguma das exceções legais353. Essa compreensão deve persistir no atual código, mesmo não sendo detalhada e de forma expressa, uma vez que não havendo contrato em contrario, ou seja, contrato escrito entre os companheiros deve-se aplicar às relações patrimoniais, no que couber, o regime de comunhão parcial de bens354. Carlos Roberto Gonçalves355 Assim, não celebrando os parceiros contrato escrito estabelecendo regra diversa, aplicar-se-á à união por eles constituída o regime da comunhão de bens abrangendo os aquestos, ou seja, os bens que sobrevieram na constância do casamento, permanecendo como bens particulares de cada qual, os adquiridos anteriormente e os sub-rogados em seu lugar, bem como os adquiridos durante a convivência a título gratuito, por doação ou herança. Diante a presunção de comunicabilidade, incumbe a quem alega comprovar a situação que exclui o patrimônio da partilha. Pois os bens adquiridos a prestação ou através de financiamento durante a vigência da união, devem ser partilhadas, presumem-se adquiridos, durante a vida em comum, os 353 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.167. 354 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de família. p. 453. 355 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p.564. 89 bens móveis existentes à época da dissolução da união, salvo prova em sentido contrário356. Euclides de Oliveira apud Carlos Roberto Gonçalves357: Ainda sem incidência analógica à união estável, por seu caráter restritivo e peculiar ao casamento, a exigência de autorização do companheiro para a alienação dos bens imóveis e outros atos gravosos ao patrimônio comum (art. 1.647), sempre lembrando, nesses casos, a proteção ao terceiro contratante que esteja imbuído de boa-fé. Assim, pode-se observar que mesmo que a união estável gere a co-propriedade dos bens adquiridos, não há qualquer determinação obrigando o respectivo registro em nome dos ambos os conviventes358. Instala-se a co-titularidade patrimonial ainda que somente um dos conviventes tenha adquirido o bem. O direito de propriedade resta fracionado em decorrência do condomínio que exsurge ex vi legis. Logo, não se pode aliená-lo, pois se trata de um bem comum. É necessária a concordância do companheiro. A constituição da união estável leva à perda da disponibilidade dos bens adquiridos, revelando-se dispensável a expressa manifestação de ambos os proprietários para o aperfeiçoamento de todo e qualquer ato de disposição do patrimônio comum. A tendência é reconhecer a ineficácia do ato praticado sem a vênia do par, preservando o patrimônio de quem não firmou o compromisso359. Portanto, se qualquer dos companheiros praticar sozinho algum dos atos elencados como proibidos, mesmo que não se decrete sua nulidade, é de ser resguardada a meação do parceiro. Contudo, o ato dispositivo não atinge a metade do patrimônio comum, tornando-se ineficaz em relação a metade do convivente. No entanto, dispõe o companheiro de legitimidade para opor embargos de terceiro para defender a meação do bem adquirido durante a união. Assim sua meação não se comunica, merecendo ser identificada como bem reservado360. 356 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.167. 357 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p.566. 358 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.167. 359 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.168 360 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.168. 90 Maria Berenice Dias nos ensina acerca da outorga do companheiro: A lei estabelece a necessidade da outorga uxória entre os cônjuges para a prática de atos que possam comprometer o patrimônio comum (CC 1.647). Na união estável, nada é referido. Em face da omissão do legislador, não é exigido o consentimento do companheiro para a alienação do patrimônio imobiliário, concessão de fiança ou aval e para realizar doações. Todavia, em face do reconhecimento da união estável como entidade familiar, é necessário estender-lhe as mesmas limitações, para salvaguardar o patrimônio do casal e proteger de terceiros de boafé361. Já Carlos Roberto Gonçalves362 concluiu que embora aludido e respeitado o entendimento da necessidade da outorga do companheiro para alienação ou oneração imobiliária, há de ser observado o disposto no art. 1.647, inciso I do CC/2002, que trata da aludida autorização, uma vez que a união estável é regida pela comunhão parcial de bens. Zeno Veloso apud Carlos Roberto Gonçalves363: Não é só por analogia que a exigência se impõe, mas principalmente porque, tratando-se de imóvel adquirido por titulo oneroso na Constancia da união estável, ainda que só em nome de um dos companheiros, o bem entra na comunhão, é de propriedade de ambos os companheiros, e não bem próprio, privado, exclusivo, particular. Se um dos companheiros vender tal bem sem participação do negocio do outro companheiro, estará alienando – pelo menos em parte - coisa alheia, perpetrando uma venda a non domino, praticando ato ilícito. O companheiro, no caso, terá de assinar o contrato, nem mesmo porque é necessário seu assentimento, mas, sobretudo, pela razão de que é, também, proprietário, dono do imóvel. Também, o mesmo ocorre com a meação, pois, independente do nome de quem esteja o bem, a meação de cada um dos companheiros responde pelas suas dívidas particulares 364. 361 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.168. 362 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p.566. 363 VELOSO, Zeno. in GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p.566. 364 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.168. 91 Não reconhecida a existência da união estável, mas comprovada a aquisição de algum bem durante o período em que o vínculo afetivo perdurou, dispõe o convivente de direito indenizatório correspondente à metade do seu valor. Basta ter havido convivência de molde a supor embaralhamento de patrimônios. Independentemente do nome de quem tenha adquirido o bem, a divisão se impõe, a não ser que fique comprovada eventual subrogação ou outra causa de incomunicabilidade patrimonial365. Cabe ressaltar que as regras do regime de comunhão parcial de bens, ou seja, sua incidência se dá não só no tocante à partilha dos bens da entidade familiar, mas também no que concerne à administração dos aludidos bens366. É de muita importância salientar, informar que a morte também põe termo a união estável, mas não constitui objeto da pesquisa. Por último é importante mencionar que houve evolução nos direitos e deveres dos companheiros em que vivem em união estável. Antigamente a união estável, ou seja, o concubinato era mal interpretado, uma vez que se referia a qualquer relação fora do casamento. E isso era um problema, pois às vezes os concubinos viviam anos juntos, criando filhos e adquirindo patrimônios em comuns, mas se algum dos concubinos abandonasse a relação não havia nenhum direito para garantir a meação do outro. Diante isto, tem-se que a inserção da união estável na CRFB/88 e demais leis de muito melhorou para a convivência de homens e mulheres que escolheram a união estável com o objetivo de constituir família. 365 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. p.169. 366 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: Direito de família. p.565. CONSIDERAÇÕES FINAIS Teve a presente monografia o objetivo de investigar, à luz da legislação e doutrina, a evolução histórica, conceituação e novos paradigmas do direito de família. Também acerca do casamento sua conceituação e natureza jurídica e seus regimes de bens. A partir do concubinato, para a união estável, onde o grande objetivo se encontrava o de aprender acerca da mais nova entidade familiar, a união estável. No primeiro capítulo, o resultado da pesquisa demonstrou-se de muita importância, tanto a respeito da evolução da família quanto a sua importância para melhor compreensão da união estável Além disso, foi necessário também estudar o casamento, o concubinato e a união estável, diante desse estudo foi observado que no casamento o Estado interfere desde a sua habilitação até a sua celebração. Em relação ao concubinato pode-se observar que há impedimentos matrimoniais e por isso não podem contrair matrimonio. E já a união estável, os companheiros fazem a opção de viverem sem formalidades, entidade a qual basta a relação entre homem e mulher, de forma pública e duradoura sem impedimentos matrimoniais, com o objetivo de constituir família, existindo a possibilidade da união estável ser convertida em casamento se presentes todos os requisitos legais. No decorrer da monografia pode se observado as semelhanças do casamento e da união estável. Contudo há uma diferença principal, e essa diferença se dá no âmbito sucessório, ou seja, com o novo Código Civil de 2002, o companheiro na participação da sucessão do outro, só terá direito a totalidade da herança na existência de parentes sucessíveis, como os descendentes, ascendentes e colaterais até o 4º grau, ficando prejudicado o companheiro, uma vez que a Lei nº 8.971/94 prescrevia que o companheiro ou companheira na ausência de descendentes e ascendentes herdaria a totalidade dos bens. 93 Cabe ressaltar também que o companheiro terá o direito de meação de bens adquiridos de forma onerosa na vigência da união estável, salvo contrato contrario, bem como participara da sucessão do outro conforme condições do Código Civil de 2002. O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões sobre a dissolução da união estável e seus efeitos patrimoniais. A seguir serão transcritos os problemas e hipóteses apresentadas na introdução deste trabalho e analisado as respectivas análises das hipóteses, com base no resultado da pesquisa sintetizado nos três capítulos da monografia. Primeiro problema: O que vem a ser União Estável? Hipótese: A União Estável é uma entidade familiar, tendo como elo o homem e a mulher, em convivência pública e continua e imbuídos de constituir uma entidade familiar. Analise da hipótese: A hipótese restou confirmada. Conforme se demonstrou ao conceituar a união estável no terceiro capítulo. Segundo problema: A União Estável é reconhecida como entidade familiar? Hipótese: é reconhecida como entidade familiar a união estável entre homem e mulher. Analise da hipótese: A hipótese restou confirmada. Conforme artigo 1723 do Código Civil de 2002. Terceiro problema: Qual a finalidade do reconhecimento da União Estável? 94 Hipótese: O reconhecimento da União Estável se dá pela necessidade do reconhecimento do vínculo entre o homem e a mulher, para a posterior dissolução. Analise da hipótese: A hipótese restou confirmada. Uma vez que para haver a dissolução é necessário o reconhecimento da união estável. Quatro problema: Quais os efeitos patrimoniais da dissolução da União Estável? Hipótese: Observa-se que na União Estável, salvo se houver um contrato entre os companheiros estabelecendo regime diverso da comunhão parcial de bens, aplica-se o regime legal. Analise na hipótese: A hipótese restou comprovada. Não havendo contrato de convivência entre os companheiros, aplicar-se-á as relações patrimoniais, no que couber o regime de comunhão parcial de bens, conforme terceiro capitulo. Esta monografia venceu o seu propósito investigatório, analisou cientificamente as hipóteses previstas para os problemas acima mencionados. REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: Texto constitucional promulgado em 5 de outubro de 1988. Brasília: Senado Federal. BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. BRASIL. Lei nº 9.278, de 10 de maio de 1996. CAHALI, Yussef Said. Divórcio e separação. 11. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2005. DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 4 ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: Direito de família. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. O companheirismo uma espécie de família. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998. GOMES, Orlando. Direito de família. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito de família. 5. ed. 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WALD, Arnoldo. O novo direito de família. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. ANEXOS LEI Nº 9.278, DE 10 DE MAIO DE 1996. Mensagem de veto Regula o § 3° do art. 226 da Constituição Federal. O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei: Art. 1º É reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituição de família. Art. 2° São direitos e deveres iguais dos convivent es: I - respeito e consideração mútuos; II - assistência moral e material recíproca; III - guarda, sustento e educação dos filhos comuns. Art. 3° (VETADO) Art. 4° (VETADO) Art. 5° Os bens móveis e imóveis adquiridos por um ou por ambos os conviventes, na constância da união estável e a título oneroso, são considerados fruto do trabalho e da colaboração comum, passando a pertencer a ambos, em condomínio e em partes iguais, salvo estipulação contrária em contrato escrito. § 1° Cessa a presunção do caput deste artigo se a aquisição patrimonial ocorrer com o produto de bens adquiridos anteriormente ao início da união. 98 § 2° A administração do patrimônio comum dos conviv entes compete a ambos, salvo estipulação contrária em contrato escrito. Art. 6° (VETADO) Art. 7° Dissolvida a união estável por rescisão, a assistência material prevista nesta Lei será prestada por um dos conviventes ao que dela necessitar, a título de alimentos. Parágrafo único. Dissolvida a união estável por morte de um dos conviventes, o sobrevivente terá direito real de habitação, enquanto viver ou não constituir nova união ou casamento, relativamente ao imóvel destinado à residência da família. Art. 8° Os conviventes poderão, de comum acordo e a qualquer tempo, requerer a conversão da união estável em casamento, por requerimento ao Oficial do Registro Civil da Circunscrição de seu domicílio. Art. 9° Toda a matéria relativa à união estável é d e competência do juízo da Vara de Família, assegurado o segredo de justiça. Art. 10. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. Art. 11. Revogam-se as disposições em contrário. Brasília, 10 de maio de 1996; 175º da Independência e 108º da República. FERNANDO HENRIQUE CARDOSO Milton Seligman