Assembleia do Rio tem símbolos que podem ser da Roma Antiga ou

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Assembleia
do
Rio
tem
símbolos que podem ser da
Roma Antiga ou referência ao
fascismo
Em postes, calçadas e adornos do Palácio Tiradentes e entorno,
é possível observar desenhos do regime do italiano Mussolini.
O símbolo, com uma referência à lei (“lex”, em latim), junto à
escadaria da Alerj – Fernando Quevedo / Agência O Globo
No ano em que a cidade comemora seus quatro séculos e meio, o
Centro Histórico ainda guarda segredos. Conhecido por seu
autoritarismo, o político italiano Benito Mussolini, que
liderou o Partido Nacional Fascista, pode não ter pisado em
terras fluminenses, mas o Rio teria possíveis símbolos do
fascismo em postes, calçadas e adornos. Entre a Assembleia
Legislativa do Rio (Alerj) e o Paço Imperial, 17 postes de
bronze têm, segundo estudiosos, o que seria a principal marca
do regime: um feixe de madeira (que significava união e força
do povo) envolvendo uma machadinha, com uma águia no topo (que
representava o poder).
Referências ao fascismo podem estar ainda em instalações do
Legislativo fluminense. No Palácio Tiradentes, sede da Alerj,
onde objetos são testemunhas de momentos que marcaram a
história política do Rio e do país, é possível ver, logo no
hall, ao lado da escadaria principal, duas urnas com as mesmas
marcas. Junto a elas, a inscrição “lex” (“lei” em latim). Nas
galerias do plenário, o feixe de madeira envolvendo a
machadinha aparece em oito desenhos. A ilustração também se
repete em frente ao prédio histórico, no piso de pedras
portuguesas.
Arquitetura grandiosa
A mesma marca observada na escadaria pode
ser vista também na calçada – Antonio
Scorza / Agência O Globo
O geógrafo João Baptista Ferreira de Mello, coordenador dos
Roteiros Geográficos do Rio — passeios guiados pela cidade —,
acredita que os desenhos em frente à Alerj e os símbolos nos
postes se devam à admiração do presidente Getúlio Vargas por
Mussolini. Ele observa ainda que o mesmo sentimento norteou a
construção de alguns prédios no Centro da cidade.
— A arquitetura dos prédios da Central do Brasil e do Palácio
Duque de Caxias, antigo Ministério da Guerra e atual sede do
Comando Militar do Leste, tem uma grandiosidade que também
remete ao fascismo. Era uma ideia de Estado projetada nas
formas dessas construções imponentes. Com isso, Vargas
mostrava o poder do Estado e sua simpatia pelo projeto
fascista — comenta Mello.
Estudioso de urbanismo e preservação do patrimônio cultural, o
arquiteto Augusto Ivan diz que os símbolos podem, sim, ter
inspiração no fascismo.
— O prédio tem estilo eclético e uma grande influência da
arquitetura clássica. Os símbolos, aliás, são representativos
do Império Romano. Nas construções do Estado Novo (posterior
ao prédio da Alerj), o estilo é brutalista e representa o
poder do Estado, com uma forte conotação fascista. Prédios de
ministérios construídos na época de Getúlio são exemplos
disso. Não é estranho haver a representação de uma águia num
edifício público, mas realmente as machadinhas são um mistério
— diz o especialista.
Ele ressalta que houve uma série de prédios construídos nesse
estilo monumental, como os dos ministérios do Trabalho e da
Fazenda, no Castelo:
— Eles têm algo pesado, da cultura fascista. A própria Avenida
Presidente Vargas (inaugurada em 1944) é uma via é bem
característica do regime. Os postes são anteriores a Getúlio,
mas seu desenho pode ter sido influenciado pelo movimento
político (fascismo).
Já para Pedro Henrique Pedreira, historiador da Universidade
Federal Rural do Rio (UFRRJ), os símbolos teriam influência
romana. Ele não descarta, porém, uma relação com o fascismo.
— Em 1926, quando o prédio onde hoje funciona a Alerj foi
inaugurado, Mussolini estava no poder havia quatro anos. Será
que, nesse intervalo de tempo, ele teria tido a capacidade de
provocar uma admiração pelo fascismo fora da Itália? —
pergunta o historiador, levantando dúvida acerca da origem dos
símbolos.
Segundo Pedreira, apenas quando Hitler subiu ao poder na
Alemanha, em 1933, é que os movimentos fascistas ganharam
força suficiente para influenciar outros países:
— No Brasil, foi formada a Ação Integralista Brasileira, o
principal grupo fascista do país. Isso porque Hitler
conseguiu, de uma forma muito habilidosa, propagandear esse
movimento. O que não vejo na década anterior, já que o
fascismo, depois que Mussolini assumiu o poder na Itália, não
era uma movimento de escala global.
Historiador: faltam provas
O historiador Marcus Dezemoni, da Uerj, concorda que há bons
argumentos dos dois lados:
— Uma cidade como o Rio ser influenciada pela arquitetura
romana não é novidade. Washington, a capital americana, é toda
nesse molde. Assim como o Arco do Triunfo, construído em Paris
— lembra.
Sobre a possibilidade de os símbolos serem uma alusão ao
fascismo, Dezemoni acredita ser uma especulação, pois não há
documentos comprobatórios.
— Até acredito que possam ser marcas do movimento político, já
que a simbologia é muito forte. Mas dois dos meus alunos já
pesquisaram o assunto e não encontraram qualquer documento
para comprovar que sejam referência ao fascismo de Mussolini —
afirma.
Já o antropólogo Marco Antônio da Silva Mello não acredita em
alusão ao movimento político italiano. Para ele, trata-se de
marcas da arquitetura romana antiga, espalhadas por vários
países:
— O fascismo pode ter escolhido esses símbolos, mas eles são
romanos.
Inaugurado em 1926 para sediar a Câmara Federal, com projeto
dos arquitetos Arquimedes Memória e Francisque Cuchet, o
prédio da Alerj é anterior ao governo de Getúlio Vargas, que
assumiu o poder em 1930. Mas os estudiosos não descartam a
influência do regime italiano.
Já a coordenadora das visitas guiadas na Assembleia
Legislativa, Priscila Moita, afirma que a versão oficial é que
a simbologia existente na construção veio da Roma Antiga. É o
que diz, por exemplo, o texto de um informativo da Alerj: “O
machado na ponta simboliza a maneira como era aplicada a lei
na Roma Antiga. Mais tarde, o fascismo iria se apropriar desse
símbolo. Seu uso nos postes que rodeiam o Palácio Tiradentes
serve para mostrar que ali é uma casa de leis”.
Além da Câmara, o prédio abrigou também o Departamento de
Imprensa e Propaganda (DIP), durante a ditadura do Estado
Novo, e a Assembleia Legislativa do Estado da Guanabara
(Aleg), até 1975.
Por Rodrigo Bertolucci e Renan França
Fonte original da notícia: O Globo
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