Relação médico e paciente: uma dor pra se curar *Cesar Bortoluzo "Estava agora na presença de [médicos] estranhos, que nada sabiam de mim nem tinham comigo nenhum laço, e para quem eu era apenas mais um caso de hospital, um objeto de curiosidade clínica [.] Eu não existia, era um feixe de sintomas" José Rodrigues Miguéis, “Um homem sorri à morte com meia cara” (4) Todas as atividades humanas exigem maior ou menor intensidade de comunicação entre as pessoas. Possivelmente, o exercício da Medicina seja a ação em que a habilidade de comunicação entre o profissional com o seu cliente tenha uma das maiores importâncias no processo de aproximação entre aquela que precisa ajuda e o que tem os meios de oferecê-la. Médicos são treinados para absorver e gerenciar um absurdo volume de conhecimentos e de tecnologias. Quanto mais complexo e elegante o processo do diagnóstico, mais satisfação pessoal lhe agrega como retorno de seu grande investimento em tempo e dinheiro para aprender e se manter atualizado. Por esse fato, e por força de influências externas como o mercado de informações em saúde disponíveis ao leigo pela televisão, publicações e internet, o paciente, ou cliente, espera dele, médico, que lhe apresente objetivamente uma causa para seu desconforto e uma solução concreta, material e, de preferência, simples, que lhe doa menos do que a doença. Nessa troca de informações e impressões entre os dois, há várias barreiras a criar possibilidades de desencontros e desfechos desagradáveis. A dificuldade da diferença cultural, ou seja, a linguagem popular e os termos nativos e regionais, tribais (no sentido de costumes) e a linguagem técnica não se afinam. Aprender a “língua do povo” é mais fácil para o médico que, apesar de vir geralmente das elites culturais e econômicas, pode e deve se aproximar. Fazer o paciente e sua família entenderem a doença e o tratamento é o mais difícil, porque a escola o ensina a falar e pensar tecnicamente, para ter prestígio entre os pares, mais do que saber se comunicar com seu objeto de atenção, o paciente. A atitude de aproximação humana é muito mais desejável e menos treinada que o clinical approach, a abordagem clínica em tradução rígida. O conhecimento técnico, o registro dos dados com precisão e cuidado são fundamentais para o médico e para a segurança que ele tem que Pró-Saúde Escritório Regional - Telefone: 63 3236-4300 proporcionar ao paciente. A disposição para a proximidade, física e cultural, que deve ser cultivada pelo médico, sem superioridade ou preconceito de qualquer tipo, é fundamental para o paciente doente e sua família. E também fundamental para a busca e obtenção dos resultados positivos de qualquer tratamento. Pessoas nascem, ficam doentes e morrem a todo instante. Acidentes, cânceres, infartos, armas, matam gente a toda hora e continuarão a matar. Médicos, enfermeiros e os demais atores da saúde continuarão estudando e aprendendo com a ciência. Há algo mais que precisa ser entendido, embora já devesse estar aprendido: a aproximação da dor do paciente, mesmo que um pequeno resíduo da dor moral contagie o profissional que se envolve. Nesse contexto, trabalhar a humanização do atendimento, o acolhimento dos pacientes, a receptividade às queixas do doente e da família e o conforto físico decente fazem parte de todos os processos de atenção à saúde, seja nos hospitais ou nos ambulatórios de atenção primária. Estabelecer a sequência do tratamento, mediante registros claros nos prontuários, descrições de atos cirúrgicos, laudos de exames e evolução clínica, o seguimento de cada caso por meio de diretrizes clínicas exequíveis no local de atendimento, a manutenção do paciente em contato com o mesmo médico sempre que possível e o acompanhamento por equipes multidisciplinares com atribuições claras de responsabilidades dentro dos serviços de saúde são as condições que o gestor de saúde deve propiciar e fazer executar no âmbito técnico da assistência prestada à sociedade. Há condições objetivas a serem criadas, mantidas e aperfeiçoadas. Há, acima de tudo, a disposição de servir e a atitude de conseguir mais do que a cura, muitas vezes impossível, chegar ao maior objetivo da arte médica: SEDARE DOLOREM OPUS DIVINUM EST! “Aliviar a dor é obra divina!” *AUTOR: · Médico Urologista graduado pela Faculdade de Medicina da USP; · Especialista em Cirurgia Geral pelo Hospital das Clínicas-FMUSP; · Especialista em Urologia pela Sociedade Brasileira de Urologia; · Especialista em estão de Sistemas de Saúde pela Fundação Getúlio Vargas (MBA); · Coordenador Médico e Responsável Técnico pelo Escritório Central da PróSaúde/TO Pró-Saúde Escritório Regional - Telefone: 63 3236-4300 REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFIAS CAPRARA, Andrea,Anamélia Lins e Silva Franco, A Relação paciente-médico: para uma humanização da prática médica, Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 15(3):647-654, jul-set, 1999 FERNANDES, J. C. L. A Quem Interessa a Relação Médico Paciente, Who Cares How Doctors and Patients Relate ? Cad. Saúde Públ., Rio de Janeiro, 9 (1): 21-27, jan/mar, 1993. SUCUPIRA, Ana Cecília, A importância do ensino da relação médico-paciente e das habilidades de comunicação na formação do profissional de saúde, Interface - Comunic, Saúde, Educ, v.11, n.23, p.619-35, set/dez 2007 CRUZ, A Jorge, relação médico-paciente em algumas obras literárias, Rev. Assoc. Med. Bras. vol.58 no.3 São Paulo May/June 2012 Pró-Saúde Escritório Regional - Telefone: 63 3236-4300