VITÓRIA, ES, DOMINGO, 22 DE JUNHO DE 2014 ATRIBUNA 3 Reportagem Especial MOBILIDADE URBANA MUDANÇA DE VIDA Novo endereço e troca de emprego P ara fugir do trânsito intenso, muitas pessoas usam de artifícios como sair mais cedo de casa, evitar pegar o horário de pico, visitar amigos e até ir se exercitar. Mas há quem tenha preferido mudar de emprego ou mesmo de cidade para ficar longe do estresse. O diretor de serviços da Totvs Nilton César Vieira, 45, se mudou para gastar menos tempo no trânsito. “Saí de Vitória para morar em Vila Velha, pois a empresa está se transferindo para lá. Agora, vou conseguir ir trabalhar a pé. Ficava nervoso e estressado, agora terei mais qualidade de vida”, disse. O fisioterapeuta Nelson Mendonça, 34, contou que parou de trabalhar em dois bairros de manhã, pois, mesmo perto, não conseguia mais chegar no horário. “Tive de me adequar por causa da dificuldade de mobilidade de Jardim Camburi e Praia do Canto. O trânsito me irritava.” A psicóloga Josana Deriz Chagas Caversan, 31, contou que ela e o marido, que moram na Serra e trabalham em Vitória, procuram apartamento para comprar na capital. “Meu marido fica nervoso e reclama do trânsito, perdemos muito tempo e por isso queremos nos mudar. Gastamos uma hora para ir e uma para voltar.” Outra tática do casal é visitar algum amigo antes de ir para casa. “Quando vamos embora o trânsito está melhor. Também vamos à igreja antes de voltar para a Serra e ago- ra estamos indo à academia.” A psicóloga e diretora executiva da Lince Psicologia e Gestão Fernanda Carvalho fez uma pesquisa com candidatos a vagas de trabalho, que mostrou que 35% rejeitavam a oferta de emprego pela distância entre a empresa e sua casa. “A distância tem pesado muito. Há quem prefere ganhar menos e trabalhar mais perto para evitar o trânsito e ter mais tempo para si.” O diretor executivo da Argalit, Raphael Cassaro, contou que a empresa fica em Viana. Com isso, dá preferência para contratar profissionais que morem perto da cidade. “Assim, evitamos atrasos e queda de produtividade com o estresse no trânsito, dando mais qualidade de vida a nossos profissionais.” O auxiliar de produção Lucas Paiva, 18, trabalha na Viminas Vidros Especiais, na Serra. “Por gastar pouco tempo para ir de casa para o trabalho tenho mais tempo para me dedicar aos estudos.” A distância tem pesado muito. Há quem prefere ganhar menos e trabalhar mais perto para evitar o trânsito “ ” Fernanda Carvalho, psicóloga e diretora executiva da Lince Psicologia e Gestão ADEMIR RIBEIRO/AT NELSON MENDONÇA, fisioterapeuta, parou de trabalhar em dois bairros de manhã por não conseguir mais chegar no horário. “O trânsito me irritava” ADEMIR RIBEIRO/AT “Voltei a sentir vontade de viver” A empresária Rosaura Turra, 49, gastava duas horas para ir e duas para voltar do trabalho. Ela morava em Vila Velha e trabalha na Serra. “Esse tempo perdido estava me levando à loucura. Comecei a ter problema sério de estresse. Eu per- bam fazendo”, afirmou a presidente da Isma-Brasil, Ana Maria Rossi, doutora em Psicologia Clínica com especialização em estresse. O psicopedagogo clínico e terapeuta de família Cláudio Miranda ressaltou que, em uma situação de estresse, pode-se tomar decisões erradas que a pessoa se arrepen- meu apelido. Chegava morta em casa e só queria dormir. Voltei a sentir vontade de viver, de fazer coisas diferentes. Hoje moro em uma casa, em um condomínio, tenho mais tempo para minha família, meus cães, minhas plantas e para mim mesma.” Fluxo na 3ª Ponte aumentou 57% A sensação de que a Terceira Ponte está com maior tráfego de veículos e ocorrendo mais engarrafamento na via não é apenas uma impressão. De acordo com a Guarda Municipal de Vila Velha, o aumento do fluxo de veículos foi de 57% desde que a cobrança do pedágio foi suspensa, em abril. O subinspetor da Guarda, Jobson Meireles, explicou que a ponte foi feita para o fluxo de 30 mil carros por dia de Vila Velha para Vitória, no período da manhã. Acesso de raiva e agressividade Pesquisa realizada pela IsmaBrasil (associação internacional que se dedica a estudo, pesquisa e prevenção de estresse) mostrou que 47% dos motoristas de São Paulo e Porto Alegre revelam algum tipo de comportamento agressivo. Desses, 18% tendem a ter um acesso de raiva, reagindo de forma agressiva no trânsito. Outra pesquisa, da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego, mostrou que 23% dos motoristas de São Paulo não tinham condições psicológicas de dirigirem. “Há motoristas incapacitados emocionalmente para dirigir. A reação não é apenas dentro do carro, e tem ocorrido com mais frequência. As pessoas estão mais violentas e o carro é o escudo delas. Eventualmente, elas não diriam palavrão, não revidariam a um insulto, mas dentro do carro elas aca- dia o controle no trânsito e fazia de tudo, mesmo que fosse errado, para chegar logo ao destino.” Um ano depois fazendo esse percurso diariamente, ela se mudou para a Serra. “Hoje moro a um minuto e meio do meu trabalho e isso virou até derá depois. “No trânsito, todos estão sujeitos ao mesmo problema. Todos querem chegar ao destino como você. Xingar, brigar, agredir e desdenhar o outro só agrava o problema e deixa à mostra a sua má educação e dificuldade em lidar com uma situação problema”, alertou. DIVULGAÇÃO ANA MARIA ROSSI: “As pessoas estão mais violentas e o carro é o escudo delas. Eventualmente, elas não diriam palavrão, não revidariam a um insulto” Segundo o guarda municipal Fabrício Mendonça, a suspensão do pedágio realmente piorou o fluxo, pois pessoas que não passavam pela ponte devido à tarifa, passaram a fazer esse trajeto. “Era 70 mil a média ao dia de manhã no sentido Vila Velha – Vitória. Hoje são cerca de 110 mil veículos.” Ele explicou que a pista lateral do posto de gasolina na entrada da ponte é usada em sentido único – em direção à ponte – durante o horário de pico de manhã para agilizar o trânsito. ANTONIO MOREIRA/AT TERCEIRA PONTE: mais carros Médicos alertam para riscos de doenças A preocupação excessiva, a ansiedade e o estresse no trânsito podem causar até mesmo doenças cardiovasculares. Médicos alertam que os riscos ocorrem quando o estresse é diário, intenso, sendo mais grave em pacientes com doenças préexistentes ou histórico de problemas cardiovasculares na família. O cardiologista José Geraldo Mill contou que, entre os sinais que os motoristas demonstram estão tiques nervosos, buzinar por qualquer coisa, socar o volante, brigar com quem está ao lado, ficar com as mãos frias e suadas. O clínico geral e gastroenterologista João Evangelista Teixeira explicou que, quando a pessoa fica impaciente e estressada no trânsito, o corpo fica tenso, cansado e a pressão arterial e a frequência cardíaca podem subir. Dá ainda irritabilidade e abaixa a imunidade. No trabalho, pode haver queda de produtividade. “Se a pessoa tem asma, pode ter uma crise. Caso tenha problemas intestinais, o trânsito pode desencadear uma diarreia ou gastrite.” O cardiologista Nabih Amin explicou que o estresse no trânsito leva a descargas de adrenalina no sangue e isso faz com que o coração bata mais rápido e, consequentemente, pode até provocar arritmias e aumento da pressão arterial. “Em casos graves, um estresse ou aborrecimento grande no veículo pode levar até mesmo à morte. É preciso tentar se controlar emocionalmente para não haver essas grandes descargas de adrenalina. Além disso, fazer exercícios físicos e ter uma alimentação saudável ajuda a evitar esses problemas”. orientou o médico.