Detecção RESUMO de Potyviridae EXPANDIDO em espécies de Dieffenbachia. DETECÇÃO DE POTYVIRIDAE EM ESPÉCIES DE DIEFFENBACHIA E.B. Rivas1, S.R. Galleti1, L.M.L. Duarte1, M.A.V. Alexandre1*, A.Cilli1*, M.E.M. Estelita2 Instituto Biológico, Centro de Pesquisa e Desenvolvimento de Sanidade Vegetal, Av. Cons. Rodrigues Alves, 1252, CEP 04014-002, São Paulo, SP, Brasil. E-mail: [email protected] 1 RESUMO Em três amostras de Dieffenbachia (Araceae), planta cultivada como folhagem ornamental, foram observadas ao microscópio eletrônico de transmissão partículas alongado-flexuosas. Como o DsMV (Dasheen mosaic virus, Potyvirus) é o vírus mais comumente detectado em aráceas, foram realizados testes serológicos com antissoros contra essa e outras espécies de Potyvirus. Paralelamente, foram realizados ensaios moleculares com “primers” específicos para Potyviridae, observando-se padrões eletroforéticos diferentes. A partir desses resultados, sugere-se a ocorrência de, pelo menos, duas espécies distintas de Potyviridae, uma relacionada serologicamente ao DsMV (A75) e outras duas não relacionadas (A67 e A69). PALAVRAS-CHAVE: ELISA, RT-PCR, microscopia eletrônica de transmissão. ABSTRACT DETECTION OF POTYVIRIDAE IN DIEFFENBACHIA SPECIES. From three samples of the ornamental foliage Dieffenbachia (Araceae), elongated, flexuous virus particles were observed by way of electron microscopy. Since DsMV (Dasheen mosaic virus, Potyviridae) is the most common virus affecting araceous plants, serological tests were performed against it and other potyviruses. Simultaneously, molecular tests were made using specific primers for Potyviridae, resulting in different eletrophoretic patterns. From such results it is suggested that at least two distinct Potyviridae species were present in those samples. One of them (sample A75) is serologically related and the remaining two (samples A67 and A69) unrelated to DsMV. KEY WORDS: ELISA, RT-PCR, transmission electron microscopy INTRODUÇÃO A família Potyviridae, a qual possui membros com partículas filamentosas com comprimento de 650-900 nm e genoma de RNA de fita simples e senso positivo, compreende 106 espécies definitivas e 90 prováveis espécies classificadas em 6 gêneros: Potyvirus (maior gênero), Ipomovirus, Macluravirus, Rymovirus, Tritimovirus e Bymovirus, que podem ser distinguidos com base na organização do genoma, no tipo de vetor responsável pela transmissão e na susceptibilidade da hospedeira (Berger et al., 2000). Essa família representa cerca de 30% de todos os vírus que infectam plantas, os quais são cosmopolitas e, do ponto de vista econômico, os mais importantes, por infectarem mais de 2000 espécies em 550 gêneros de dicotiledôneas e monocotiledôneas (Brunt et al., 1997), abrangendo grande número de culturas de regiões temperadas e tropicais (Shukla et al., 1994). O objetivo deste trabalho foi detectar e identificar os vírus presentes em amostras de aráceas ornamentais pertencentes ao gênero Dieffenbachia (Araceae). MATERIAL E MÉTODOS Material. Amostras de Dieffenbachia pertencentes às espécies D. amoena, sob número de amostragem A67e A75, e Dieffenbachia sp., número A69, apresentando manchas cloróticas acrescidas de anéis cloróticos concêntricos com contorno avermelhado, pontos necróticos e faixas de nervuras, respectivamente. As amostras foram coletadas em regiões produtoras do Estado de São Paulo. Microscopia eletrônica de transmissão. Fragmentos foliares das amostras foram triturados em tampão fosfato de sódio e potássio (TF) 0,1 M, pH 7,0 e processados para contrastação negativa (Chrys- Universidade de São Paulo, Instituto de Biociências, Departamento de Botânica, São Paulo, SP, Brasil. *Bolsistas do CNPq. 2 Arq. Inst. Biol., São Paulo, v.70, suplemento 3, p.85-87, 2003 85 86 E.B. Rivas et al. tie, 1996). Preparações semi-purificadas e antissoro contra DsMV (Dasheen mosaic virus), diluído a 1/50, foram utilizados em imunomicroscopia (Dijkstra & De Jager, 1998). Testes serológicos. Extratos de folhas infectadas de Dieffenbachia, assim como de folhas sadias, foram submetidos ao ELISA indireto, de acordo com Koenig (1981), utilizando-se antissoros contra as espécies de Potyvirus: BCMV (Bean common mosaic virus), BYMV (Bean yellow mosaic virus), DsMV, TEV (Tobacco etch virus) e PVY (Potato virus Y). Os extratos foliares foram preparados na proporção de 1 g/5 mL de tampão e os antissoros diluídos a 1/1000. Transmissão mecânica. Fragmentos de folhas ou de epiderme foliar foram triturados em TF 0,01 M pH 7,3 + 0,04 M de Na2SO3 e mecanicamente inoculados em espécies das famílias: Aizoaceae, Amaranthaceae, Araceae, Balsaminaceae, Chenopodiaceae, Cucurbitaceae e Solanaceae. Semi-purificação. Folhas de Dieffenbachia de cada uma das amostras foram pulverizadas com nitrogênio líquido, individualmente, homogeineizadas em presença de TF 0,5 M pH 7,3 + 0,75% Na2SO3 + 0,01 M Na2EDTA e processadas de acordo com técnica descrita por Abo El-Nil et al. (1977). Extração do RNA viral. Fragmentos foliares das amostras pulverizados em nitrogênio líquido e 250 μL de cada uma das preparações semi-purificadas foram utilizados para a extração dos RNAs virais com 750 μL de TRIzolTM, de acordo com recomendações do fabricante. RT-PCR. A reação de transcrição reversa (cDNA) e a posterior amplificação enzimática foram realizadas utilizando-se “primers” específicos para a ORF da capa protéica viral de Potyviridae, utilizando as condições descritas por Gibbs & MacKenzie (1997). Como controle positivo para a reação utilizou-se DsMV previamente caracterizado. Os produtos da PCR (“amplicons”) foram submetidos à eletroforese em gel de agarose 2% e os fragmentos de DNA amplificados foram corados com brometo de etídeo e visualizados sob luz ultravioleta. RESULTADOS E DISCUSSÃO Preparações de contrastação negativa revelaram a presença de partículas alongado-flexuosas, em concentrações variáveis, em todas as amostras. Dados de literatura mostram que o vírus mais frequentemente encontrado em aráceas cultivadas é o DsMV, além do BYMV em Dieffenbachia (Mokrá & Götzová, 1994). Testes de imuno-microscopia (“decoração”) realizados nas amostras revelaram ausência de reação antígeno-anticorpo quando antissoro contra BYMV foi utilizado. Quando antissoro contra DsMV foi empregado, observou-se reação positiva apenas para o vírus da amostra A75 (Fig. 1). Já os testes realizados com antissoros contra vírus distantemente relacionados ao DsMV, ou seja, BCMV e TEV (Zettler et al., 1978; Brunt et al., 1997), e PVY foram negativos para todas as amostras. Esses dados serológicos indicam que havia, pelo menos, duas espécies distintas de Potyviridae: uma serologicamente relacionada ao DsMV (A75) e outra sem relacionamento serológico com DsMV (A67 e A69). Todas as amostras foram mecanicamente inoculadas em 22 espécies e cultivares de 7 famílias botânicas, mas apenas o vírus da amostra A75 foi mecanicamente transmitido. Esse vírus induziu, sistemicamente, áreas cloróticas em Caladium humboldtii (Araceae), a única hospedeira experimental. Além disso, os sintomas, tanto nas espécies naturalmente infectadas como na hospedeira experimental, desapareciam dependendo das condições de temperatura e fotoperíodo, deixando as plantas com aspecto sadio por vários meses e, independente da presença de sintomas, a concentração de vírus nessas plantas apresentava-se extremamente baixa. Como ocorre com muitas espécies da família Potyviridae, o círculo de hospedeiros pode estar restrito a uma única família de monocotiledônea, como nos gêneros Bymovirus, Potyvirus (por exemplo, DsMV da amostra A75), Rymovirus e Tritimovirus (Shukla et al., 1994; Berger et al., 2000). Assim, dentre os seis gêneros que compõem a família Potyviridae pode-se, com base no círculo de hospedeiros, descartar a possibilidade das amostras A67 e A69 estarem infectadas por Bymovirus, Rymovirus e Tritimovirus, pelo fato desses gêneros infectarem apenas gramíneas (Berger et al., 2000). Desse modo, sugere-se que as espécies de Potyviridae das amostras estudadas devam pertencer ao gênero Potyvirus ou, menos provavelmente, aos gêneros Ipomovirus e Macluravirus. Convém destacar que dentre as culturas de importância econômica, que possuem como fator de restrição a sua comercialização, infecções por Potyvirus, está a de plantas ornamentais como Dieffenbachia (Cohen, 1995). RT-PCR realizadas a partir de RNAs extraídos de fragmentos foliares infectados não resultaram em produtos detectáveis, talvez devido à presença de metabólitos secundários presentes na preparação. Quando a RT-PCR foi realizada com RNAs extraídos de preparações semipurificadas, produtos de diferentes tamanhos foram obtidos (Fig. 2). Analisando-se os produtos das 3 amostras, em gel de agarose, verificaram-se diferentes padrões eletroforéticos, indicando assim uma diversidade genômica, ou seja, a presença de mais de uma espécie de Potyviridae. Matthews et al. (1996) utilizando um par de “primers”, diferente do usado neste trabalho, observaram que TFMoV (Taro feathery mottle virus, Potyvirus) possuía um produto de PCR com padrão eletroforético diferente de DsMV, o qual eles atribuíram a uma diversidade genômica entre eles. Arq. Inst. Biol., São Paulo, v.70, suplemento 3, p.85-87, 2003 Detecção de Potyviridae em espécies de Dieffenbachia. Fig. 1 – A- “Decoração” de partícula alongado-flexuosa, presente em A75, com antissoro contra DsMV. B- Partícula alongado-flexuosa não “decorada” com antissoro contra DsMV, presente em A67. Barras = 150 nm. CONCLUSÃO Neste trabalho foi constatada a infecção por vírus da família Potyviridae em espécies de Dieffenbachia por meio de ensaios de transmissibilidade, observação de partículas alongado-flexuosas, imuno-microscopia e RT-PCR. Análise de dados moleculares mostrou tratar-se de espécies distintas de Potyviridae, tendo uma delas (A75) relacionamento serológico e padrão eletroforético dos “amplicons” semelhante ao DsMV. Referências Bibliográficas Abo El-Nil, M.M.; Zettler, F.W.; Hiebert, E. Purification, serology, and some physical properties of dasheen mosaic virus. Phytopath., v.67, p.1445-1450, 1977. 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