Jogo mortal

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Disciplina - Ciências -
Jogo mortal
Ciências
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Postado em:09/04/2010
As fêmeas de algumas espécies de aranhas e outros animais se alimentam dos machos após o
coito. Quais serão as vantagens desse canibalismo sexual? Em sua coluna de abril, Jerry Borges
discute esse curioso fenômeno biológico. Por: Jerry Carvalho Borges O hábito bizarro das fêmeas
do louva-a-deus e da aranha viúva-negra de se alimentar dos machos durante a cópula é bastante
conhecido. Recentemente a ciência tem procurado compreender mais profundamente essa forma
extrema de canibalismo que pode ter efeitos significativos sobre o tamanho e a proporção entre
machos e fêmeas das populações afetadas. O canibalismo sexual ocorre quando a fêmeas matam e
se alimentam dos machos de sua espécie antes, durante ou após a cópula. Essa forma de predação
intraespecífica é um evento raro, descrito apenas em alguns crustáceos, moluscos, insetos e em
aranhas e escorpiões, em que ele é bastante comum. Apesar de o canibalismo sexual ser descrito
quase que exclusivamente para as fêmeas, alguns crustáceos são exceções a essa regra. Nessas
espécies os machos, que são maiores, podem predar as fêmeas durante o ato sexual. Os motivos
que fazem um macho se sacrificar durante a cópula podem parecer intrigantes. Esse
comportamento de risco é resultante dos hormônios sexuais que levam os machos a buscar
parceiras durante o período reprodutivo. Um coquetel de feromônios e comportamentos femininos
voltados para atrair parceiros também contribuem para o processo. Para as fêmeas, o canibalismo
sexual pode assegurar a obtenção de nutrientes indispensáveis para a reprodução É preciso ter em
mente que os interesses reprodutivos são diferentes para ambos os sexos. Para as fêmeas, o
canibalismo sexual pode assegurar a obtenção de nutrientes indispensáveis para a reprodução.
Para elas, portanto, os machos, além doadores de esperma, seriam vistos apenas como mais uma
presa. Já para os machos, o envolvimento com as fêmeas pode parecer à primeira vista um ‘jogo
mortal’ – para eles, a predação de que são vítimas seria aparentemente desastrosa. Mas um exame
detalhado desse processo pode indicar que mesmo os machos predados podem ganhar algo: esse
comportamento suicida poderia assegurar a transmissão de seus genes para a prole. Seria, assim,
um investimento parental extremo e uma forma de altruísmo masculino que garantiria o sucesso
reprodutivo da espécie. Deve-se levar em conta também que, em várias espécies, o ato sexual afeta
os órgãos copulatórios masculinos e muitos machos não resistem a esses ferimentos ou tornam-se
estéreis. É o que acontece, por exemplo, com os machos da aranhas Argiope aemula e Latrodectus
hasselti. Por outro lado, machos de outras espécies – como a viúva-negra Latrodectus mactans –
sobrevivem à cópula e podem fertilizar outras fêmeas. Contribuição masculina Pesquisas com duas
espécies de aranhas indicam que machos podem ‘contribuir’ de alguma forma para o seu destino
trágico. Nas duas espécies em questão, a reprodução depende da transferência de esperma por
meio da inserção de um ou de ambos os palpos masculinos no corpo das parceiras. Machos de
Argiope aemula resistem fortemente quando capturados por fêmeas e podem chegar a perder
algumas pernas para se defender. Contudo, vários dos machos sobreviventes se reaproximam da
fêmea para tentar copular novamente e se tornam vítimas de suas parceiras sem opor resistência.
Esse comportamento peculiar pode estar associado com a necessidade desses machos ‘camicases’
de ter um período maior para a sua cópula ou, talvez, com uma tentativa deles de impedir o acesso
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de outros machos às fêmeas. Já machos da Latrodectus hasselti (ou aranha-de-costas-vermelhas,
como é chamada em inglês), por sua vez, dão saltos durante a cópula e acabam posicionando o seu
abdome diretamente sobre as partes bucais das fêmeas que, assim, têm sua tarefa facilitada. Os
machos predados pelas fêmeas não interrompem o processo de fecundação e permanecem no ato
sexual por cerca de 10 a 15 minutos – aproximadamente o dobro de tempo de um macho que não
foi predado. Em algumas aranhas, o canibalismo sexual proporciona um ganho de peso significativo
para as fêmeas Esse curioso ato masculino é vantajoso, pois diminui a probabilidade de novas
cópulas femininas e gera uma proporção maior de ovos fertilizados do que os cruzamentos comuns.
Obviamente, essas vantagens só são obtidas se o canibalismo ocorrer após a transferência do
esperma. Nessas duas espécies, os machos são bem pequenos e possuem apenas cerca de 2% do
peso corporal de fêmeas. Assim, sua predação contribui muito pouco para o ganho de peso feminino
ou para o desenvolvimento dos ovos. Por outro lado, em outras espécies, como nas aranhas de
jardim Araneus diadematus, o canibalismo sexual proporciona um ganho de peso significativo para
as fêmeas. Tamanho e fecundidade A fecundidade das fêmeas de aranhas depende de seu
tamanho e normalmente é determinada pela alimentação obtida durante a fase juvenil. Na espécie
Dolomedes fimbriatus, o canibalismo sexual é realizado principalmente por fêmeas jovens, que
necessitam de nutrientes para seu desenvolvimento. Contudo, essa prática é prejudicial na idade
adulta, pois não contribui para o crescimento e pode fazer com que as fêmeas canibais
permaneçam sem se acasalar. Já o canibalismo sexual antes da cópula tem um significado
totalmente diferente, pois pode impedir a ocorrência de fecundação. Essa modalidade talvez seja
resultado de uma tentativa das fêmeas de evitar o acasalamento. De acordo com essa hipótese, as
fêmeas avaliariam o potencial reprodutivo dos seus parceiros e simplesmente eliminariam aqueles
que não as atraíssem. Vida de aranha macho não é fácil! Vida de aranha macho não é fácil! A
territorialidade também deve ser considerada na análise do canibalismo sexual. As fêmeas de
aranhas canibais, por exemplo, defendem fortemente o seu território. A invasão deste por indivíduos
de ambos os sexos costuma resultar em disputas fatais. Várias estratégias são utilizadas pelos
machos para evitar o canibalismo sexual. Esses indivíduos se aproximam cautelosamente das
fêmeas, tentam copular a uma distância segura e se retiram rapidamente após a cópula. Machos de
viúva-negra, de aranhas-caranguejo (família Thomisidae) e de espécies da família Tetragnathidae
podem prender as fêmeas em suas teias antes da cópula ou imobilizar as suas parceiras durante o
ato sexual. Escorpião e louva-a-deus Escorpiões machos, por sua vez, picam e imobilizam
temporariamente as fêmeas após a cópula. Os machos de aranhas construtoras de teias
(Araneidae) e de aranhas saltadoras se aproximam apenas de fêmeas que estejam em período de
muda – época em que o canibalismo não é possível – ou esperam para copular quando as fêmeas
estejam se alimentando. Nos louva-a-deus, o sucesso da cópula não depende exclusivamente do
canibalismo sexual. Contudo, nesses animais os machos podem copular mesmo depois de
decapitados. Há inclusive indícios de que isso contribua para o sucesso da reprodução por meio da
remoção da inibição neural dos movimentos copulatórios e de um auxílio na liberação de esperma.
Contudo, como os machos de louva-a-deus podem se acasalar diversas vezes durante a vida, o
canibalismo sexual pode afetar a diversidade genética dessa espécie. Machos de louva-a-deus
podem copular mesmo depois de decapitados As fêmeas de louva-a-deus obtêm nutrientes
essenciais para a manutenção de sua prole com a prática do canibalismo dos machos. As fêmeas
da espécie Tenodera aridofolia sinensis, por exemplo, têm até 63% da dieta composta por machos.
Essa dieta faz com que elas produzam cápsulas com ovos (ootecas) maiores e um número de ovos
e prole mais elevados. Uma única ooteca pode atingir cerca de 30-50% do peso da fêmea, o que
representa um tremendo investimento para esses animais. Portanto, o canibalismo sexual parece
envolver um balanço entre diversos fatores, como a agressividade das fêmeas, a qualidade
nutricional e o tamanho dos machos, as estratégias defensivas masculinas e a fecundidade e a
razão sexual nas populações envolvidas. Além disso, a presença e a facilidade de captura de outras
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presas devem também ser consideradas. A contribuição de cada um desses fatores pode variar
sutilmente em cada caso analisado, o que torna a análise deste jogo mortal entre machos e fêmeas
extremamente complexa e sujeita a um intenso debate. Este conteúdo foi publicado em 05/04/2010
do sítio Ciência Hoje . Todas as modificações posteriores são de responsabilidade do autor original
da matéria.
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