Aula 17

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Lançamento de esgotos: uma ameaça à integridade ecológica e sanitária...
MÓDULO 3 - AULA 17
Aula 17
Lançamento de esgotos: uma ameaça
à integridade ecológica e sanitária
de ecossistemas aquáticos continentais
Objetivos
Esclarecer sobre os efeitos do lançamento de esgotos no metabolismo dos
ecossistemas aquáticos continentais mostrando suas implicações sobre a biota
bem como seus efeitos à sociedade.
1. Introdução
No Brasil, a degradação dos ecossistemas aquáticos continentais por esgotos
é a forma de impacto mais freqüente. Os esgotos podem ter duas origens principais:
as residências (esgoto doméstico) e as indústrias (esgoto industrial). Além da origem, o
esgoto doméstico e o industrial se diferenciam também pela composição química.
Considerando as fontes domésticas e industriais, calcula-se que são lançados,
diariamente, cerca de 10 bilhões de litros de esgotos nos rios, lagoas e represas
brasileiras. Desse total, 92% não sofrem nenhum tipo de tratamento. O restante
(8%) sofre apenas tratamento primário (tratamento mecânico), responsável apenas
pela retirada de materiais grosseiros. Poucos são os casos em que ocorre o tratamento secundário (tratamento biológico), no qual ocorre a redução da concentração de matéria orgânica.
No caso dos esgotos industriais, sua composição é fortemente influenciada
pelo tipo de atividade que os gerou. Em uma indústria de cromagem, por exemplo,
a principal característica será a presença de elevadas concentrações de metais
pesados. Já em uma indústria de beneficiamento de carnes, a elevada concentração
de matéria orgânica ditará a característica do esgoto.
Os esgotos domésticos caracterizam-se pela elevada concentração de
matéria orgânica, composta principalmente por proteínas, carboidratos e gorduras,
entre outros compostos orgânicos. Tanto os esgotos domésticos como os industriais podem causar dois tipos principais de degradação nos ecossistemas aquáticos: a degradação sanitária e a degradação ecológica.
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2. Degradação ecológica (eutrofização artificial)
dos ecossistemas aquáticos continentais por esgotos
Os ecossistemas aquáticos passam por um processo lento e contínuo de
enriquecimento por sais minerais, principalmente nutrientes compostos de fósforo e
nitrogênio. Esse processo pode se estender por milhões de anos. Tal fenômeno é
denominado eutrofização natural.
Assim, ao longo de sua evolução, os ecossistemas aquáticos podem passar da
condição de pobres em nutrientes (oligotróficos) para a condição de concentrações
mais elevadas de nutrientes (eutróficos). Ao longo desse processo, os componentes
abióticos (pH, transparência da água, concentração de oxigênio e sais minerais)
dos ecossistemas sofrem lentas e contínuas alterações, que são acompanhadas por
variações dos componentes bióticos (fitoplâncton, zooplâncton, BENTOS, peixes etc.).
Quando, no entanto, o ecossistema aquático passa a receber nutrientes de
fontes artificiais, suas águas começam a apresentar um processo de degradação
ecológica conhecido por eutrofização artificial.
Essa terminologia é empregada para descrever um amplo e complexo conjunto de alterações químicas, físicas e biológicas, a que os ecossistemas aquáticos
estão submetidos quando passam a receber um aporte adicional de nutrientes
produzidos pelo homem. Esse processo é, na prática, uma adubação artificial.
Na eutrofização artificial, o fósforo e o nitrogênio deixam de atuar como
fatores controladores do crescimento dos produtores primários (algas e plantas
aquáticas superiores); esse nível trófico é alterado na composição, contribuindo
para o desaparecimento de algumas espécies e o surgimento de outras, bem como
de alterações na densidade de espécies. Como numa reação em cadeia, os demais
níveis tróficos (herbívoros e carnívoros) também são alterados qualitativa e
quantitativamente.
Praticada com controle, com o objetivo de aumentar a produção pesqueira,
a eutrofização artificial é desejável. Dela resulta a multiplicação das algas que
servem de alimento para os microcrustáceos, que, por sua vez, constituem o alimento da maioria dos peixes.
As principais causa de eutrofização artificial no Brasil são os esgotos domésticos e industriais, além das águas oriundas de áreas agrícolas que recebem adubos
químicos. Em ambos os casos, compostos de fósforo e nitrogênio em quantidade
suficiente podem ser aportados para os ecossistemas aquáticos, iniciando o
processo de eutrofização artificial. Como você já deve ter percebido, o que estamos
fazendo na prática é a adubação das águas, mencionada no início desta aula.
BENTOS
são todos os
organismos, tanto
vegetais quanto
animais, que vivem
associados ao
sedimento de
ecossistemas aquáticos.
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2.1 Principais características da eutrofização artificial
A eutrofização artificial transforma o ecossistema aquático em um grande
vaso de ações químicas e biológicas, cuja característica principal é a quebra do
EQUILÍBRIO ECOLÓGICO.
Com o estabelecimento da eutrofização artificial, o
ecossistema passa a produzir mais carbono do que é capaz de decompor. A fase de
eutrofização artificial (desequilíbrio ecológico) é caracterizada por profundas alterações no equilíbrio ecológico do ecossistema (veja na Figura 17.1).
EQUILÍBRIO ECOLÓGICO
em um ecossistema pode
ser entendido pelo
equilíbrio entre a
produção e o consumo
de carbono.
Figura 17.1:
Um dos primeiros sinais do início da eutrofização artificial é o aumento da
concentração de compostos de fosfato e de nitrogênio. A conseqüência direta
disso é o aumento da taxas de crescimento e reprodução das algas, denominada
produção primária do fitoplâncton. A conseqüência do aumento da produção
primária é o aumento da concentração de matéria orgânica no ecossistema. Essa
matéria orgânica é decomposta pelas bactérias, resultando portanto, no aumento
da taxa de decomposição, cujo resultado é o aumento da concentração de compostos
de fósforo e nitrogênio. E estes são reutilizados pelo fitoplâncton.
A elevação das taxas de decomposição promove também o aumento do
consumo de oxigênio dissolvido na água. Essa dinâmica resulta, com freqüência,
no estabelecimento de condições anaeróbias, cenário propício à produção de
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gases tóxicos para a maioria dos organismos aquáticos, tais como o gás sulfídrico
e o metano. A mortandade de peixes em ambientes eutrofizados artificialmente pode
ser atribuída, freqüentemente, à presença desses gases na água (veja na Figura 17.2).
Figura 17.2:
Figura 17.3: Comparação
entre um ecossistema
antes (a) e depois (b) da
eutrofização artificial.
Observa-se mudanças na
composição das espécies,
especialmente de algas e
no fluxo de energia.
As modificações do meio resultam em alterações na composição das espécies
vegetais e animais. Como no caso do fitoplâncton, as espécies mais sensíveis às
grandes transformações na concentração de oxigênio tendem a desaparecer nessas
condições; são substituídas por espécies mais tolerantes, como aquelas do grupo das
algas azuis (cianobactérias), que se tornam as algas predominantes nos ecossistemas
que apresentam estágios adiantados do processo de eutrofização artificial.
Durante o processo de eutrofização artificial observa-se, entre as plantas
aquáticas superiores, uma drástica redução do número de espécies dos grupos das
plantas que crescem totalmente submergidas na água e das plantas que crescem
com as folhas fora da água. Tal processo favorece o crescimento de plantas, como
o aguapé, que cresce totalmente na superfície da água.
As profundas alterações no nível trófico dos produtores resulta em mudanças
nos demais níveis tróficos. Em decorrência desse fato, o fluxo de energia do ecossistema
submetido à eutrofização artificial é também alterado (veja na Figura 17.3).
(a)
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(b)
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Especialmente nos estágios finais do processo de eutrofização, apenas uma
pequena quantidade de algas é consumida pelos herbívoros. O restante entra
na cadeia de detritos em que é decomposta. O sabor desagradável, o grande tamanho,
que dificulta a ingestão, e muitas vezes a presença de substâncias tóxicas tornam as
algas presentes nesses estágios pouco predadas pelos herbívoros.
Essa fase pode ser facilmente reconhecida pela ocorrência de grande densidade de algas (especialmente filamentosas), escassez de oxigênio na água e
mortandade freqüente de peixes. Considera-se geralmente que o ecossistema
aquático está em processo de eutrofização artificial quando surgem as primeiras
mortandades de peixes. No entanto, deve ser ressaltado que essa fase representa o
estágio final do processo de degradação ecológica. A reversão desse quadro
somente é possível com o emprego de muita tecnologia e capital. Assim sendo,
torna-se imperiosa a prática de medidas que visem o controle da eutrofização
artificial ainda no início do processo. A intervenção nesse momento tem duas
vantagens fundamentais: baixo custo financeiro e enormes possibilidades de sucesso.
2.2 Implicações socioeconômicas da eutrofização artificial
A eutrofização artificial pode levar um corpo d'água a se tornar inaproveitável
como fonte para abastecimento doméstico, irrigação, geração de energia hidrelétrica, produção de pescado ou área de lazer.
A redução do potencial de uso de um ecossistema devido ao processo de
eutrofização artificial tem, entre outros, reflexos diretos sobre a desvalorização
imobiliária e turística da região na qual esse ecossistema está inserido. Um dos
motivos principais é a redução da qualidade da água, que é conseqüência principalmente da presença de grande quantidade de partículas em suspensão e de
substâncias tóxicas, e da profundidade da coluna d´água, devido ao acúmulo de
matéria orgânica sobre o sedimento natural.
Pesquisas recentes, realizadas em ecossistemas aquáticos brasileiros submetidos à eutrofização artificial, têm demonstrado a presença de algas do grupo
das cianobactérias, que são capazes de produzir substâncias altamente tóxicas
(neurotoxinas e hepatotoxinas) aos animais, inclusive ao homem. De acordo com
essas pesquisas, o homem pode ser afetado diretamente por essas substâncias
através da ingestão de água ou pela inalação. Indiretamente, as toxinas podem
atingir o homem por meio do alimento, especialmente peixes.
No homem, as neurotoxinas afetam diretamente o sistema nervoso central,
paralisando em pouco tempo (dependendo da dose, em minutos) vários órgãos vitais. Por outro lado, as hepatotoxinas atingem o sistema hepático, inclusive o fígado.
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É atribuída à presença dessas substâncias na água a mortandade de peixes em
vários ecossistemas aquáticos eutrofizados artificialmente.
Como você pode observar, as freqüentes mortandades de peixes registradas
em muitas lagoas do Estado do Rio de Janeiro são conseqüência da presença de
gases tóxicos na água, como vimos anteriormente, e a presença de substâncias
tóxicas liberadas por algumas espécies de algas. Muitos cientistas consideram que
a presença desses gases e dessas substâncias é mais importante para causar as
mortandades de peixes do que a própria ausência do oxigênio.
Entre os casos fatais de contaminação por toxinas produzidas por
cianobactérias, destaca-se o chamado "caso de Caruaru". No ano de 1996, em
uma clínica da cidade de Caruaru, Pernambuco, vários pacientes de hemodiálise
(limpeza do sangue com a ajuda de aparelhos) morreram e 116 tiveram sérios
problemas de saúde relacionados a náuseas e vômitos. Investigações mostraram
que a causa das mortes foi a utilização, nesse processo, de água de uma represa
eutrofizada artificialmente (Açude das Tabocas), que apresentava elevadas
concentrações de hepatotoxinas produzidas por cianobactérias.
Resumo
No Brasil, o lançamento de esgotos representa a principal forma
de degradação dos ecossistemas aquáticos continentais, responsável
pela degradação sanitária e ecológica (eutrofização artificial). Ambas
reduzem drasticamente a qualidade da água e eliminam as espécies,
além de inviabilizarem, com freqüência, a possibilidade de uso
desses ecossistemas como área de lazer.
A eutrofização artificial representa o aumento da concentração
de nutrientes, especialmente de compostos de fósforo e de nitrogênio,
que resulta em profundas alterações sobre o ambiente e sobre as
espécies de plantas e animais aquáticos.
As evidências mais claras da eutrofização artificial são a presença de algas filamentosas, que reduzem a qualidade da água pela produção de substâncias tóxicas ou pela grande quantidade, que dificulta o
uso do ecossistema para banho, pesca e a prática de esportes náuticos.
Os estágios finais do processo de eutrofização artificial são caracterizados pelas freqüentes mortandades de peixes devido à presença de
gases tóxicos como o sulfídrico e o metano, pela presença de substâncias tóxicas produzidas por algas e pela ausência de oxigênio na água.
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Perguntas sobre a aula
1. O que é eutrofização e quais suas implicações ecológicas para os ecossistemas
aquáticos?
2. Cite uma das conseqüências nefastas do aumento das taxas de decomposição
devido às maiores quantidades de matéria orgânica geradas pela eutrofização.
3. Quais são os efeitos, para a saúde, das substâncias tóxicas que podem ser geradas
no ambiente eutrofizado?
4. Na sua opinião, qual deve ser a utilização de um corpo d'água: o despejo de
esgoto ou para lazer, esportes ou produção de peixes?
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