Para o amor e a guerra Conhecidas mundialmente por promover relações interpessoais, as redes sociais se firmam como verdadeiras armas dos consumidores descontentes André Martins “Não levar desaforo para casa”. Este provavelmente é o primeiro mandamento para quem não perde a oportunidade de resolver problemas no calor das situações. Mas na era tecnológica e digital essa expressão possui cada vez menos aplicabilidade na vida dos mais “esquentados”, pois é de casa que tem partido a resposta dos consumidores modernos. Com a Internet, o comportamento de quem compra passou por uma redefinição nunca antes vista – tanto na maneira como se dá a aquisição de um bem, por vezes, virtualmente; como na relação com a empresa selecionada para a transação. As redes sociais também estão no olho desse furacão. Fazer novas amizades e conhecer potenciais parceiros amorosos já não são as únicas utilidades delas. Hoje, mais do que nunca, Orkut, Twitter, Facebook, Youtube são alguns dos meios mais utilizados para a veiculação das vinganças dos consumidores insatisfeitos. Arquitetadas, em muitos casos, com requintes de crueldade e generosas doses de ironia. Não é nada complicado. No Twitter, por exemplo, basta digitar o nome de marca qualquer precedida pelo caractere “#” no campus de busca. Certamente, o leitor se deparará com declarações de contentamento ou impressionantes demonstrações de cólera. Recentemente o administrador Feliciano Abreu teve problemas com duas operadoras de telecomunicações. Acostumado a lidar com números, o diretor do Mercado Mineiro percebeu algo de muito suspeito nas faturas de cobrança que chegaram à caixa de correio nos últimos seis meses. No Facebook e Twitter ele deu vazão ao descontentamento da seguinte forma: “Abrir a conta da (cita operadora) é teste cardíaco! Exatamente, seis meses, ou melhor, seis contas que vêm com valores indevidos. FAMOSO VÊ SE COLA! Liga pro eterno CALLCENTER e falam: ‘Conteste!’. Absurdo! Esse país sem leis e nas mãos de meia dúzia de famílias. Falta de respeito total!”, esbravejou. Em questão de horas, dez amigos conectados à rede engrossaram o coro. E se engana quem pensa que se tratava de “mixaria”. A última fatura vinha com um adicional de, acredite, R$ 320,00. Todas as contas foram contestadas e os erros, geradores de desgaste, reconhecidos pela empresa. Anteriormente, foi o serviço de banda-larga que andou causando desconforto, mas não apenas a Feliciano, e sim a todos os funcionários do Mercado Mineiro. Problemas técnicos na rede impossibilitaram toda a equipe de trabalhar um par de dias. Prejuízo e transtorno que não foram apagados com as simples retratações via telefone. Ainda assim, a empresa, que recebeu a advertância do cliente via Twitter, hoje faz uma espécie de rastramento na rede social do administrador. Caso ele volte a desabafar, a empresa certamente o contactará para evitar que as mensagens repercutam e se disseminem como uma perigosa praga que pode minar a reputação da operadora. “Nas redes sociais nós encontrando pessoas com histórias parecidas ou que passam pelos mesmos problemas, às vezes com a mesmas empresas. Essa rede de reclamações pode gerar resultado, mas é preciso reclamar mesmo e mostrar a cara”, acredita. Rotina De acordo com o consultor e estrategista de marketing Gabriel Rossi, a grande maioria das empresas brasileiras ainda não atentou para as potencialidades de diálogo com o mercado na grande rede. E se estabelecer contato por meio das redes sociais ainda é visto com resistência no meio organizacional, imagine quão deficitários são os planos de contingência quando uma empresa se vê testada dessa forma. “Acreditamos que a maioria das empresas ainda não leva a disciplina de gerenciamento de crise digital tão a sério quanto a sua magnitude exige. Para estes novos tempos, as empresas precisam de um plano de gestão de crise sólido e profissional, pois muitas variáveis estão em jogo. Gestão de crise na web não deixa espaço para amadorismo”, explica Gabriel. O especialista critica ainda a tendência de delegar ou “empurrar” aos jovens inexperientes o atendimento ao público. No livro “Satisfield Customers tell three Friends, Angry Customers tell 3.000” (Clientes Satisfeitos contam para três Amigos, Clientes Furiosos contam para 3.000), o autor Pete Blackshaw sinaliza o caminho para lidar com uma clientela cada vez mais exigente e consciente de seus direitos. O segredo estaria no ouvir e na busca pelo aperfeiçoamento. “Quando mais os consumidores estão no controle, mais eles querem sentir que são respeitados e valorizados (...) Todo mundo tem um desejo emocional de ser ouvido. A empresa que preencher esta necessidade terá a vantagem em relação aos competidores que ignorarem isto”. Conhecer o perfil e as motivações do cliente também é algo que deve ser levado em consideração. Entender quem é a pessoa insatisfeita, a quem ela influencia e a relação dela com os demais amigos da rede, são pontos essenciais para saber lidar com as crises de imagem. “Ouvindo e dando feedback ao consumidor, respeitando as etiquetas das redes sociais e com uma solução plausível em mãos, a empresa é relevante e, muitas vezes, consegue contornar o problema”, acredita o consultor. O direito de reclamar A máxima de que o cliente tem sempre razão se estende também ao universo virtual. De acordo com Luís Felipe Silva Freire, presidente da Comissão de Direito Eletrônico e Crimes Virtuais da OAB/MG, é permitido ao consumidor apontar irregularidades, negligência ou demora por parte das empresas nas soluções dos problemas que competem a elas resolver. “O consumidor tem o direito de se expressar assim como está previsto na própria Constituição Federal”, expõe. Mas a tênue linha que separa fatos reais de exageros, leva muitos a passar de sujeitos de direito a, também, infratores. O clima de vale-tudo na Internet ainda é um problema que gera preocupação. “Em muitos casos, o consumidor acaba cometendo crimes como calúnia (divulgando informações falsas a respeito de uma determinada empresa) e difamação (imputando à empresa um fato ofensivo à sua reputação)”. Para o advogado, o procedimento mais adequado continua sendo a procura pelos órgãos especializados, como o Procon. Sugestão de olho gráfico “Gestão de crise na web não deixa espaço para amadorismo” Gabriel Rossi, consultor e estrategista de marketing Legendas e créditos: Foto 1: Gabriel Rossi acredita que as empresas estão despreparadas para lidar com as crises de imagem na Internet Crédito: Divulgação Foto 2: Há seis meses, Feliciano Abreu tem a paciência testada ao se ver obrigado a ligar para o Callcenter da operadora de telefonia e contestar as faturas enviadas com valores indevidos Foto 3: Segundo o advogado Luís Felipe Silva Freire, o PROCON continua sendo o meio mais prudente e seguro para se fazer reclamações As duas fotos acima são minhas, mas não precisa creditar. Rodrigo, tenho ainda uma montagem com as logos das principais redes sociais, mas perdi o arquivo. Está na minha pasta na faculdade. Segunda-feira (28) disponibilizo para você.