ENTRE(-)DISCURSOS E VAZIOS: APONTAMENTOS DE UM ESTAGIÁRIO NA DELEGACIA DE DEFESA DA MULHER RESUMO Este trabalho objetiva problematizar, através dos apontamentos acerca de uma situação de estágio em uma Delegacia de Defesa da Mulher, as condições que integram e interagem neste universo e, de outra feita, os impactos e aprendizados obtidos, através de um relato de experiência. Trata-se, portanto, do percurso de um estagiário de Psicologia na Delegacia de Defesa da Mulher do interior do Vale do Paraíba Paulista, enfocando as motivações e dificuldades enfrentadas por um homem no atendimento a mulheres em situação de violência, o impacto das dinâmicas discursivas: proteçãosubjugação da referida instituição, os deslocamentos do Compromisso Social apregoado na formação e, sobretudo os caminhos da esperança de modo que a problematização dessas esferas, se mostra essencial para (re)pensar os impasses dos trabalhos do Psicólogo no campo jurídico e, sobretudo no que se refere à formação acadêmica, visto a atuação do Psicólogo estar, frequentemente, alojada em entre-discursos diversos. A compreensão desses múltiplos discursos favorece uma atuação pautada por uma ética pela e na manutenção dos direitos dos sujeitos envolvidos, de modo a favorecer também uma atuação mais assertiva. Palavras chave: Estágio, Delegacia de Defesa da Mulher, Psicologia Jurídica, Thiago Luis da Silva ENTRE(-)DISCURSOS E VAZIOS: APONTAMENTOS DE UM ESTAGIÁRIO NA DELEGACIA DE DEFESA DA MULHER Orientadora: Profa. Ms. Ana Rita da Fonseca Examinadores: Profa. Dra. Antonia Cristina Peluso de Azevedo Prof. Dr. Conrado Neves Sathler 2010 INTRODUÇÃO Estar entre discursos, apregoados em percursos diferentes - como é o caso das instituições disciplinares -, em que o poder se evidencia e se desloca como elemento de subjugação e controle de subjetividades embora, também de proteção e, o discurso de Compromissos Sociais - a par da formação acadêmica -, em que a práxis é devotada à qualidade de vida das populações, sem que esteja, com isso, eximida de saberes e poderes como a da primeira, coloca o profissional, ou o aspirante em formação, a vagar entre vazios. Vazios alheios, de populações massacradas pelas pressões das ideologias e poderes e, vazios próprios, singulares, de esperanças. Este trabalho pretende problematizar por meio dos apontamentos acerca de uma situação de estágio em uma Delegacia de Defesa da Mulher, as condições que integram e interagem neste universo e, de outra feita, os impactos e aprendizados obtidos, através de um relato de experiência. Trata-se, portanto, do percurso de um estagiário de Psicologia na Delegacia de Defesa da Mulher do interior do Vale do Paraíba Paulista, enfocando as motivações e dificuldades enfrentadas por um homem no atendimento a mulheres em situação de violência, o impacto das dinâmicas discursivas: proteção-subjugação da referida instituição, os deslocamentos do Compromisso Social apregoado na formação e, sobretudo, os caminhos da esperança. Apresentaremos, primeiramente, neste trabalho, alguns apontamentos teóricos essenciais para a manutenção da tecitura a que buscaremos reformular, seguida das condições de estágio e, por fim, os apontamentos acerca da experiência de estágio, com a apresentação de alguns casos atendidos. Salientamos, neste intento, que todos os casos apresentados, respeitando os critérios éticos, foram autorizados mediante consentimento livre e esclarecido e os nomes foram modificados. Assim, a problematização dessas esferas, a nosso ver, é essencial para (re)pensar os impasses dos trabalhos do Psicólogo no campo jurídico e, sobretudo no que se refere à formação acadêmica, visto a atuação do Psicólogo estar, frequentemente, alojada em entre-discursos diversos. A compreensão dessa multiplicidade e heterogeneidade discursiva favorece uma atuação pautada por uma ética pela e na manutenção dos direitos dos sujeitos envolvidos, de modo a favorecer também uma atuação mais assertiva. 1. DAS (EX)PRESSÕES DA VIOLÊNCIA: ENTRE DISCURSOS E VAZIOS Discussões acerca da problemática da Violência, de toda ordem, nunca foram tão emergentes e paradoxais como em nossos dias, as quais tomam dimensões mais ampliadas e se revelam inseridas na tecitura discursiva e no interior de uma dinâmica social como que naturalizada. É emergente porque assola a sociedade, transparecendose assim numa problemática com dimensões sociais, políticas, históricas, econômicas, e, sobretudo, comportamentais, com grandes repercussões na dinâmica dos agrupamentos, sejam eles os macro ou micro-grupais e, é paradoxal, pois estabelece e deixa evidentes os padrões e paradigmas da sociedade atual, que alcançou imensos avanços no que se refere ao saber científico, supondo a melhora da qualidade de vida das pessoas, mas que, por conseqüente, sofre as privações deste avanço sob a forma de medos, ansiedades, num constante retraimento, fechando-se em suas grades, num vazio existencial. Desta forma, pensar as expressões da Violência como uma construção social sem descurar-se, entretanto, dos condicionantes múltiplos que a configuram -, bem como um fenômeno que tem evoluído no espaço e no tempo, tem despertado interesses nas variadas áreas investigativas, o que demonstra seu caráter interdisciplinar. Em se tratando do conceito de violência e sua semântica, evidencia-se um jogo de linguagem e fenômenos aproximados envolvidos em uma trama discursiva, que não deve ser reduzida tão somente ao crime e a violência institucionalizada, mas sua circunscrição como produtora e produto das formas de subjetivação através dos tempos. Minayo e Souza (1999), enfatizam que [...] já é domínio do conhecimento que esse fenômeno faz parte da chamada questão social, sendo uma de suas expressões mais fortes, revelando a exacerbação das relações e dos problemas que podem ser considerados fatores desencadeantes de conflitos, distúrbios, formas de dominação e de opressão (apud CAMARNADO JUNIOR, 2007, p. 12). As expressões da Violência na atualidade vão além da Violência Física, pois abarcam a Violência Psicológica, Social, Política e, até mesmo Econômica. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a Violência manifesta-se pelo [...] uso intencional da força física ou de poder, por ameaça ou real, contra a si próprio ou alguém, ou contra um grupo ou comunidade, que também resulte em/ou tenha uma alta probabilidade de resultar em lesão, morte, dano psicológico, desenvolvimental ou privação (KRUG et al, apud CAMARNADO JUNIOR, 2007, p. 24). Existem, ainda, outras formas de Violência que se revelam em preconceitos raciais, religiosos, econômicos, culturais e de gênero. Este último tem sido alvo de discussões e de atenção do poder público, visto que, principalmente a partir da modernidade, tem tomado uma amplitude muito significativa. Assim, os deslocamentos tão característicos da problemática, o vai-e-vem na díade crime e criminoso, tão bem observada por Foucault em Vigiar e Punir ([1975], 1987) e, por Melman (1996) e Birman (2005; 2006a), apontam para posicionamentos diversos dos quais a Psicologia e, sobretudo, a Psicologia Jurídica, tem admitido em seu campo de trabalho. Na atualidade, ao considerar o comportamento desviante, se presa levar em conta a perspectiva jurídica, em que nem todo ato desviante é delito, embora, no âmbito psicológico se reconheça que nem todo delito é um ato desviante. Dessa forma, a transgressão da norma não define o crime nem o desvio, porque os atos nunca são percebidos do mesmo modo, nem todos os atos anti-normativos são ilegais ou desviantes. Dado que, pelo fato de estarmos inseridos numa realidade social é compreensível que não descartemos as noções sócio-jurídicas e não nos limitemos a constatação do ato, mas antes, atentemos às motivações e ao contexto psicossocial e no qual tal atos se desenvolvem, outrossim, à trama discursiva vigente. Sobretudo, vale ressaltar o sentimento de não pertencimento e de não filiação da atualidade, características da Pós-Modernidade, assim como a falta de referência simbólica (BIRMAN, 2005), que levam os sujeitos de uma sociedade complexa e do vazio, ao trágico cenário do sofrimento, manifestando-se na “[...] criminalização da pobreza, na demonização das drogas, na espetacularização da violência, na criação da figura do inimigo interno e na funcionalidade do fracasso da prisão” (KOLKER, 2004, 157-158). A violência é oferecida como espetáculo diário aos consumidores em busca de entretenimento e adrenalina e a exposição repetida a cenas de violência promovem ao mesmo tempo o terror e a banalização [...] O objetivo é a aprovação da opinião publica a um tratamento maniqueísta da violência de acordo com a classe social da vítima ou a posição social do perpetrador (KOLKER, 2004, 186). A problemática da Violência se configura, desse modo, como inscrição em variados matizes ideológicos, diversos condicionantes sociais, econômicos e políticos e, então, inscrita sob múltiplos discursos, embora, abarcada por vazios substanciais, visto a banalização e naturalização do fenômeno na sociedade atual, bem como os modos de enfrentamento superficiais e insípidos. 2. A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER: ENTRE VAZIOS E DISCURSOS A compreensão dos deslocamentos da mulher ao longo da história, seja em sua posição subjetiva, seja social, é imprescindível para a compreensão da dinâmica entre Violência e Mulher. A Mulher, na história, sempre foi percebida à sombra do homem, ou melhor, sua constituição de ser existente se dava pela e unicamente como atributo da existência do homem. A Mulher parte, enquanto sujeito, do interior de um sistema de vazios: discursivos, ideológicos e sociais, para desembocar, hoje, num entrelaçamento discursivo heterogêneo e diferido. Na Antiguidade, o paradigma do feminino, que teve por base apontamentos de Aristóteles, e desenvolvendo-se definitivamente por Galeno, definiu a existência do modelo masculino como ser único. Aqui, a diferença genital presente nas relações anatômicas, ou seja, a exteriorização do órgão genital masculino projetado para fora e a interiorização do órgão feminino, sendo este invaginado, indicavam uma diferença tanto no nível espacial quanto no posicional e, de outra feita, de caráter subjetivo e social, que ocasionaram a superioridade masculina diante da feminina, em que na figura do homem evidenciava-se a perfeição (símbolo de luminosidade, corroborando em uma posição ativa), enquanto a mulher, ao contrário, atrelada à imperfeição (apontando menor presença do humor quente, estando o corpo feminino mergulhado na obscuridade, marcada pela passividade) indicando, dessa forma, uma hierarquia (BIRMAN, 2006b). Para Geneviève Fraisse e Michelle Perrot, em Historia das Mulheres no Ocidente, o marco mais importante neste percurso se deu no século 19, que se configura no tempo da modernidade “em que se torna possível uma posição de sujeito, indivíduo de corpo inteiro e atriz política, futura cidadã (em que) [...] apesar da extrema codificação da vida feminina, o campo das possibilidades se alarga e a aventura não está tão longe” (FRAISSE; PERROT, 1995, p. 19-20). André Breton (apud ROUDINESCO, 1994) afirma ainda que a histeria, que legitima a transformação da mulher, é a maior descoberta poética do século 19 e, de onde advém a Psicanálise. Sem dúvida, a modernidade inaugura um novo posicionamento para as mulheres, com as conquistas de toda ordem, principalmente como protagonistas no campo social e, seguindo o percurso advindo deste paradigma vivencial, podemos afirmar que a pós-modernidade, também vem inaugurando novas modalidades subjetivas para essas, solicitando redimensionamentos psíquicos e atuações diversificadas na vida cotidiana, que quase sempre são carregadas de tensões. E, são justamente essas tensões ocasionadas por esse cenário conturbado que se deve lançar o olhar para quaisquer considerações acerca do Feminino e Violência. Ab’Sáber (2008, p.142) salienta que a “situação da experiência do feminino hoje é plural, e conhece na vida social, bem como nas possibilidades e tensões, uma série se determinantes e contradições próprias”, o que de certa forma legitima uma possível crise da mulher no cenário atual. As tensões vividas pelas mulheres na atualidade, que por si só podem ser compreendidas como violência, refletem os diversos campos nos quais são inseridas e, assim, ao assumirem-se como protagonistas destes discursos, têm que se (re)dobrarem (à velocidade de produção, características da pós-modernidade), atendendo à demanda do mercado, quase sempre cumprindo cargos equivalentes aos dos homens e sendo valorizadas e gratificadas de modo aquém a estes, sem contudo deixar de cumprir as ditas suas funções de dentro do lar, como esposa e mãe. Maria Rita Kehl define a crise da mulher, na passagem para a modernidade e, podemos estender tal definição para a esteira da pós-modernidade, como “o anseio de tornarem-se sujeitos de um discurso e o seu lugar preestabelecido como objetos do discurso formado pelos ideais de feminilidade de seu tempo” (KEHL, 1998, p. 225). Desta maneira, o percurso do feminino nessa busca de se inscrição subjetiva, é carregada de efeitos de sentidos que são incorporados também pelas mulheres, colocando-as, ainda hoje, no lugar secundário em relação ao homem, de modo que as expressões de Violência contra a Mulher dizem respeito a esse modus vivendi em que a mulher é subjugada subjetivamente em relação ao homem. Tal compreensão de Violência contra a Mulher oferece, ainda, meios de entendimento dessa dinâmica, na qual estão implícitos paradigmas de tempos passados, nos quais a mulher, em sua condição de existência, se dava à par da existência masculina. A Violência contra a Mulher e contra a Criança fomentou a criação de instituições apropriadas de atenção a estes grupos, como a Delegacia de Defesa da Mulher (DDM). Desde a sua criação, nos anos 80, mais do que espaços de investigação e repressão aos crimes de violência de gênero, as DDM`s foram identificadas como “lugares de escuta exclusiva das denúncias das mulheres contra a violência sexual, contra a violência das lesões corporais e contra as ameaças de violência” (MACHADO, apud NOBRE; BARREIRA, 2008, p.141). Nesse sentido, trabalhos interventivos com vistas à mediação psicológica e jurídica aos usuários dos serviços prestados pela DDM que considerem os fatores psicossociais e, sobretudo, de construções subjetivas citados, de modo que ofereçam um suporte psicológico (tanto para os vitimizados quanto para agressores) faz-se necessário e emergente. Essa foi a proposta do estágio em que nos envolvemos e da qual se desdobrou este trabalho. 3. DO LOCAL E CONDIÇÕES DE ESTÁGIO Este relato de experiências é um desdobramento de um projeto de estágio em Psicologia Jurídica, do Curso de Psicologia. Esse projeto objetivou o atendimento e suporte psicológico aos usuários dos serviços da DDM de um município do Vale do Paraíba paulista, numa atitude de mediação psicológica, por meio de plantão psicológico. Tal configuração de atendimentos tinha em vista, por sua vez, o auxilio nos conflitos em casos de Violência contra a Mulher, principalmente, tornando possível a intervenção imediata, seguindo o formato do plantão psicológico, cuja intenção é amparar psicologicamente, juntamente com a orientação jurídica. A estrutura física da Delegacia, muitas vezes, não proporcionava a privacidade adequada aos atendimentos, assim como a postura institucional dos agentes, que, com freqüência, mostram-se preconceituosos e pouco solícitos para com o sofrimento da demanda em questão. Tais vicissitudes acabavam dificultando a execução do trabalho proposto na Instituição. No entanto, os resultados foram considerados satisfatórios, nas possibilidades de acolher as queixas e intervir de maneira a ampliar as dimensões da realidade, que em momentos de crise encontram-se tão rígidas e empobrecidas. Assim como se fossem identificadas necessidades de acompanhamento, eram encaminhados a outros profissionais e Instituições. A Instituição sofre, ainda, de alguns impasses, como a fragilidade emocional dos funcionários, geralmente expressa na dificuldade de agir coerentemente diante das adversidades em sua prática profissional. 4. DESCRIÇÃO DO TRABALHO Os atendimentos realizados seguiram critérios de mediação psicológica, cujos focos principais são o acolhimento ao paciente em situação de emergência, orientações a respeito das especificidades legais e, encaminhamentos para outras Instituições, se houvesse a necessidade. Não se descurou, contudo, de intervenções de caráter terapêutico, visto se tratarem de atendimentos psicológicos. No entanto, devido à própria estrutura física e ideológica da Instituição, bem como os objetivos do projeto, as intervenções foram restritas a dois ou três atendimentos posteriores, de acordo com a necessidade, tomando assim a configuração de estritamente emergenciais. Não é nosso intento aqui apontar os resultados e dados estatísticos do trabalho, visto estes terem sido apresentados em outro trabalho, entretanto, faremos um breve percurso pelos dados quantitativos, para que possam oferecer elementos para uma melhor apreciação do percurso eminentemente qualitativo a que nos propomos aqui. Dos casos atendidos, cerca de 89% estavam inscritos em Violência Doméstica, sobressaindo os casos de Violência contra a Mulher em detrimento aos de Violência contra a Criança e o Adolescente. Dos atendidos, entre agressores e vítimas1, 18% corresponde aos primeiros, sendo que 82% dizem respeito aos segundos. No que se refere aos menores de 18 anos atendidos, os dados percentuais atingem 23%. Importante elencar ainda que, destes, 52% efetuaram a ocorrência e 48% não efetuaram e, 30% dos atendimentos foram encaminhados para outras Instituições do município. Tais dados serão problematizados, posteriormente, a par dos discursos acerca da violência vigentes e, sobretudo, a par das ideologias inerentes à Mulher e DDM. 5. ESTAR ENTRE DISCURSOS E VAZIOS 5.1 A entrada na DDM: impactos e preconceitos 1 Essa caracterização foi somente conceitual, visto que sob a ótica psicológica, os discursos se fundiam, de modos a conceberem os agressores também na situação de vitimizados e vice-versa, como trataremos a seguir. Quando adentramos a Delegacia, ao chegarmos para o primeiro dia de trabalho, logo nos deparamos com um murmurinho, na porta de entrada. Policiais e algumas mulheres conversavam, entre olhares condenatórios e de disfarçado pesar para dentro da sala onde se encontrava uma moça prestando depoimento. Claro que já tínhamos realizado contato prévio e os funcionários da DDM já nos conhecia e sabia que tipo de trabalho se desenvolveria ali, mas, evidentemente, aquele era o primeiro dia. Assim, um dos policiais nos olha e diz: Pronto, chegou quem faltava, o psicólogo. Tratava-se de uma jovem que havia sido estuprada momentos antes. O fenômeno do estupro, evidentemente, causa espanto, entretanto, o curioso foi o modo como trataram aquela mulher ali presente. O atendimento de portas abertas, os olhares condenatórios e de pesar que atravessavam a sala, vindas das outras mulheres e dos policiais, bem como todos os cuidados essenciais menosprezados naquele momento, impactaram-nos com especial assombro e, se tornaram mais incômodos com as palavras do policial a nós dirigidas (mas, não exclusivamente a nós) em termos de: É estupro. Coitada. Estupro sempre é muito ruim. Mas também... é garota de programa... A autorização social para a Violência da Mulher ainda não nos estava tão clara, embora teoricamente atentássemos para esse fato, entretanto, no primeiro dia já nos ser apresentada e, de modo tão violento, foi espantoso. Respondemos, como que também demonstrando nossa indignação ao policial, questionando (a ele, ou a nós mesmos) se prostitutas tinham permissão para serem estupradas. Posteriormente seguimos para o atendimento. Reservaram-nos uma sala para atendê-la2. Uma escrivã nos olhou e disse: Você que vai atender o estupro? Será que vai dar certo um homem atendendo essas mulheres aqui?. E, de súbito estávamos, Luciana3 e o estagiário, ali naquela sala cheia de boletins de ocorrência, intimações e livros de Violência contra a Mulher. Impossível não perceber os elementos transferenciais (ou seriam elementos vivenciais, do trauma sofrido?) já presentes no olhar e atitudes de Luciana, bem como os efeitos da agressão sofrida, nos modos de andar, nos hematomas no corpo e sinais de choque emocional. Sentamos à sua frente, a porta foi fechada e, dissemos-lhe que estávamos ali para ajudá-la. Após uns minutos de silêncio ela diz que sente muito medo e conta o acontecido. Em sua narrativa, momentos de silêncio, entrecortados por choros e fechar de olhos, mostrava o desespero e a dor. O atendimento 2 O que era incomum, pois atendíamos em qualquer lugar disponível, como a cozinha, corredor etc. somente ao fim do estágio é que nos disponibilizaram salas, revezando com as escrivãs. 3 Todos os nomes foram modificados, conforme critérios éticos, já mencionados. seguiu-se aos moldes do plantão psicológico para momentos emergenciais. Oferecemoslhe holding winnicottiano, esclarecimentos acerca dos procedimentos legais, dos cuidados que necessitava (ligados à saúde física e emocional) e Luciana pareceu se sentir-se acolhida e ajudada, entretanto, o impacto daquela experiência permaneceu em nós por um bom tempo (e ainda permanece). Outros três atendimentos se seguiram com Luciana e, posteriormente, foi encaminhada para outros serviços. O caso traz à baila as motivações que nos fizeram escolher o estágio. O contato com situações de Violência é impactante, mas não paralisador. Diante disso, a possibilidade de fazer algo para os que estão, de alguma forma, inscritos sob essa condição, é demasiado importante e, mesmo o assombro e impacto que nos causam, oferecem recursos para nos aproximarmos um tanto mais da condição humana. A entrada na DDM mostra o ideário da mulher na sociedade atual, que carrega ainda as marcas de um passado longínquo, a submissão desta ao ideário do masculino, de modo hierarquizante (cf. BIRMAN, 2006b; FRAISSE; PERROT, 1995) e, de outro modo, a introjeção deste ideário pelas mulheres, que não encontram outro caminho a não ser a busca por se inscreverem enquanto sujeitos femininos, na ordem do discurso acerca de um feminino, construído socialmente. Tal fato aponta ao preconceito ligado ao lugar social da mulher (e da prostituta), bem como a permissão social para a violência dessas. E mostra mais: a DDM, como lócus de amparo e defesa da mulher, como mantenedora de um processo de submissão e manutenção desse ideário. Atender mulheres em uma delegacia é “estar entre-discursos”, atravessado por esses discursos e, ao mesmo tempo, sendo influenciado por eles, mas também na possibilidade de desconstruí-los, ou ser absorvido por eles. 5.2 Quem é vítima e quem é agressor? A estruturação do estágio era, num primeiro momento, de atenção a vitimizados e agressores, conforme a denominação característica do processo jurídico e, sobretudo, à legislação afim, a saber, a Lei Maria da Penha. O grupo era composto por três estagiários que se subdividiriam em uma estagiária atendendo as vítimas, ao que supúnhamos mulheres e crianças e, os outros dois (nos incluímos aqui) atendendo os agressores, que supúnhamos homens. Entretanto, esse tipo de organização logo caiu por terra, diante da necessidade da instituição, visto que o modelo de plantão psicológico assegurava atendimento para quem aparecesse necessitando de ajuda e, mesmo tal classificação não se mostrava assertiva. Eis, portanto, talvez uma primeira divergência entre o discurso jurídico e psicológico. Enquanto o primeiro necessita, para a averiguação dos fatos e constatação nos autos do processo, a categorização vítima e agressor, a segunda, focando nas motivações (inconscientes, às vezes) dos sujeitos envolvidos, enfatiza a impossibilidade de tal denominação. Assim, o sujeito que se apresentava na condição de vitimizado era, quase sempre, dentro da dinâmica a que estava inscrita, também agressor e, vice-versa, associado ao problema do sadismo e do masoquismo, em psicanálise. Para fins de ilustração, nos remeteremos ao caso de Jorge e Maria. Trata-se de um casal que estavam juntos há cerca de 9 anos e, frequentemente se agrediam, verbal e fisicamente. Maria dá entrada na delegacia solicitando realizar um boletim de ocorrência contra Jorge e, no atendimento evidencia raiva do marido que a agrediu fisicamente, bem como certa ambivalência em relação ao relacionamento, de modo que ficou evidente, (mesmo nas relações transferenciais), que a sua dinâmica psíquica e a de seu marido estavam fundadas em elementos ligados ao sado-masoquismo, em que a maneira de se inscrever enquanto sujeito (feminino, portanto) estava na esfera de defender-se na Lei, embora submetesse o marido de modo mais intenso. Jorge, na ocasião do atendimento chega com hematomas pelo corpo devido à briga com a mulher (Maria também lhe agredira fisicamente, machucando-o ainda mais) e ficou evidente que, ainda que, na condição de agressor, é também vítima na dinâmica a que se insere. Tal fenômeno se verificou em 90% dos casos atendidos. Claro que esse modus vivendi apresentado acima se compõe de muitos outros condicionantes, como já apresentado neste trabalho e, mesmo essa distinção se dissolve ante a compreensão da realidade psíquica do sujeito atendido, de modo que trabalhávamos o que o sujeito apreendia e expressava-se, ou melhor, no significante para o sujeito ali presente e, o atendimento se fazia, levando em conta tais peculiaridades. Entretanto a problematização deste fenômeno é importante para a compreensão das cadeias significantes arroladas nos discursos sociais, jurídicos e, também acadêmicos. A demarcação jurídica de vitima/agressor fomenta efeitos de sentidos na esfera social inscrevendo-se na díade cidadão/criminoso, transportando na esfera acadêmica, do mesmo modo, o sentido de orientação de atenção diferenciada para ambos. Assim, a par de tais elucidações, se faz necessário o questionamento acerca da Delegacia de Defesa da Mulher enquanto dispositivo para amparo das mulheres que tem seus objetivos desviados, de modo que, em sua atuação, quase sempre se mostra como dispositivo de exclusão e submissão de mulheres que necessitam de seus serviços. 5.3 O retrato das VIP´s Era de praxe a chegada de algumas mulheres as quais as funcionárias denominavam vip´s ou carteirinhas. Tratava-se de mulheres que tinham registrado algumas ocorrências contra os parceiros e que não levavam adiante o processo, ou aquelas que nem chegavam a registrar a ocorrência, mas que frequentemente se envolviam em situação de violência e se dirigiam à DDM para esclarecimentos ou outros assuntos. Verificava-se certo descaso por parte das funcionárias da DDM por essas mulheres, de modos que, elas eram foco principal das conversas na Instituição e, quando adentravam à DDM, as escrivãs logo passavam para os estagiários a fim de estes fazerem as vip´s desistirem de efetivar a ocorrência, pois entendiam que não dariam em nada, apesar dos infindáveis esclarecimentos do papel do estagiário naquele local. Acompanhamos o caso de Patrícia, 32 anos, que já havia registrado 6 Boletins de Ocorrência (BO) contra o parceiro e desistido de alguns processos. Chega a Delegacia após uma briga com o marido que lhe agride com um pedaço de pau no rosto. Patrícia também afirma tê-lo agredido com um pedaço de pau. Logo quando Patrícia chega, as escrivãs nos pedem para atendê-la e, com vistas à desistência da queixa, contam-nos que já efetivaram seis BO´s e que tal mulher não tem jeito mesmo... Durante o atendimento verifica-se a dinâmica sado-masoquista descrita acima, bem como a ambivalência ante o desamparo, a falta. Patrícia buscava desesperadamente, através da lei jurídica, assegurar (a si mesmo e ao parceiro), a Lei Simbólica, a Lei Edipiana e, simultaneamente, a fantasia de sobrepor-se a esta Lei, de modo a proteger-se também do desamparo, e punir-se, visto que não conseguia ficar sem o parceiro, submetendo-se a violência física para evitar a violência do desamparo. Cabe ainda pensar a ideologia acerca da mulher que se mostra presente também no imaginário das atendidas. O trabalho de intervenção seria, então, no sentido de acolhê-las e, possibilitar apoio egóico nos momentos de crise, orientá-las acerca dos procedimentos jurídicos e desconstruir, junto com elas, as teias discursivas as quais estavam submetidas. Tarefa demasiado difícil, carregada de frustrações, mas que conseguíamos alguns resultados mais imediatos e, outros, em longo prazo, por meio dos encaminhamentos posteriores. 5.4 A (super)visão: (des)construindo paradigmas Detínhamos de encontros semanais com uma supervisora de estágio para refletirmos a atuação, as dificuldades e conquistas encontradas, bem como orientações acerca dos casos e postura de atendimentos. Os encontros de supervisão são essenciais para os trabalhos desse tipo, visto que oferecem recursos para que o profissional não seja absorvido pelo discurso institucional, o que é muito comum quando se integra uma equipe, principalmente em instituições de caráter disciplinar. Possibilitam ainda o aprendizado mútuo com os demais estagiários, repensando a atuação na análise de casos diferentes, bem como oferecendo suporte também para os estagiários, de modo a acolherem suas angústias, referentes aos atendimentos. Uma das reflexões que mais nos detínhamos em supervisão era acerca da atuação profissional em Psicologia Jurídica. Esta, por estar emoldurada nos aportes da Criminologia e do Direito, a par de pressupostos positivistas, notadamente enquadrados nas motivações intrínsecas do delito e, que por tal afastamento, por identificar-se, outrossim, aos paradigmas da Pós-Modernidade, favorece ao estabelecimento de uma auto-ilusão sobre a atuação profissional acerca de sua neutralidade. Ora, uma leitura antropológica e uma leitura sociológica do delito e do sujeito são imprescindíveis para serem associadas a uma leitura psicológica dos mesmos, e também, para o aditamento de medidas interventivas assertivas, assim como a desconstrução de verdades construídas (cf. DERRIDÁ, apud VASCONCELLOS, 2003). É impossível ao profissional manter-se neutro em sua atuação. Seria mesmo contraproducente. O que se busca, ou deveria buscar-se, entretanto, é a operacionalização dos elementos subjetivos que estão implícitos no processo científico-profissional de modo que possam otimizar o trabalho, resultar em progressos para a ciência e principalmente afetar o sujeito de modo a transformar-se, beneficiando-se e, a outrem, à par de sua ciência. Tal fato possibilita uma visão mais ampla (ou uma super-visão) acerca da problemática analisada de modo a nos favorecer a uma atuação mais assertiva. 5.5 Nem tudo são lágrimas... Nesta perspectiva, entretanto, podemos salientar algumas oportunidades de atendimento que nos foram intensamente marcantes, porque positivas. Ressaltaremos três acompanhamentos incomuns dentro desse tipo de trabalho, mas que tivemos envolvidos e que podem promover profundas reflexões acerca do compromisso social da psicologia, sobretudo, no campo jurídico. A primeira diz respeito a uma criança de 7 anos, Jenifer, que foi atendida em quatro encontros, a pedido da mãe que sofrera violência do marido e estava disposta a se separar. Diante da mudança de comportamento da filha, a mãe de Jenifer nos solicita que a acompanhemos. Os encontros foram um manancial de ensinamentos acerca da dinâmica infantil. Jenifer se mostrava profundamente angustiada com a separação dos pais, sentindo-se culpada pelo fato e, mesmo pela agressão sofrida pela mãe. Os encontros foram focados na intervenção lúdica com crianças, com brinquedos e histórias em que Jenifer expressou tais temores e, com o tempo (embora restrito) pode ressignificá-los. O trabalho com essa criança permitiu ainda, uma intervenção de caráter institucional com os agentes, pois a entrada de brinquedos e temas infantis no lócus da DDM causou de imediato um impacto no clima institucional possibilitando abertura para reflexões com as escrivãs, atentando para o desgaste e fragilidade emocional destas, bem como a necessidade de cuidarem-se emocionalmente. Outro atendimento que merece atenção foi a de Matheus, 17 anos que estava sendo ameaçado por um rapaz dois anos mais velho. A mãe procura a DDM para realizar boletim de ocorrência e as escrivãs encaminham-no para atendimento, entretanto, o rapaz não conseguia entrar na Instituição. Tratava-se de um quadro de evento psicótico. O rapaz tinha feito, anos antes, acompanhamento psiquiátrico, mas a família não entendendo o que se passava com Matheus desistiu do acompanhamento. Foram três atendimentos realizados dentro do fusca do avô de Matheus, visto que a presença de policiais o amedrontava e o impossibilitava de adentrar na DDM, em que pudemos perceber a gravidade do caso e orientar a família acerca dos cuidados essenciais para Matheus, bem como os encaminhamentos mais adequados. No final do estágio, após alguns meses do atendimento em que não tivemos mais contato com a família e o adolescente, recebemos um telefonema de Matheus, que agradecia pelos conselhos oferecido a ele, dizendo-se bem melhor. O trabalho com Matheus representa a efetivação acerca do Compromisso Social. E, por fim, apresentaremos o caso de Mário, 63 anos que procura a DDM pedindo orientação, uma vez que estava com problemas com a esposa doente e a filha mais velha grávida, que se desentendiam frequentemente. Mário chega à DDM dizendo que não sabe o que pode ser feito e, como ali era de atenção à Mulher, pedia socorro para a família, devido às ameaças mútuas e agressões verbais entre mãe e filha. Mário, após três semanas de atendimento, em que foi acolhido em sua angústia, foi orientado sobre os procedimentos mais adequados juridicamente, visto que, também ele estava sofrendo violência psicológica. Realizando então encaminhamentos relativos à saúde física e psicológica. O atendimento com Mário permitiu também a abertura para a reflexão com as agentes institucionais acerca do papel de orientação da DDM e de Responsabilidade Social da mesma. CONSIDERAÇÕES FINAIS Evidentemente que o trabalho numa Delegacia de Defesa da Mulher é exaustivo e, quase sempre, muito impactante. A violência apresentada sem máculas e, junto a ela, uma teia discursiva em que estavam presentes muitas ideologias, acerca da Mulher, do poder disciplinar, do Compromisso Social, da nova ordem mundial pós-moderna, bem como efeitos políticoeconômicos, atravessam o profissional e o colocavam no centro de uma problemática que lhe pede posicionamentos, seja em sua atuação, seja em seu caráter vivencial. Estar entre discursos e, simultaneamente, cooptando por muitos deles, quase sempre nos remete ao vazio. A experiência na DDM nos foi impactante, mas demasiadamente importante para a formação profissional, pois reconhecemos as possibilidades de atuação e os limites dela. A Violência contra a Mulher é muito discutida e trabalhos com vistas à minimizá-la são inúmeros, entretanto, preza levar em conta também os discursos que subjazem esta problemática para que possam, efetivamente, ser assertivos. Neste sentido, acreditamos que o contato do profissional com o próprio vazio diante desta atuação é que possibilitará a desconstrução de inúmeras cadeias discursivas eminentemente preconceituosas acerca da mulher, da criança e de qualquer outra área, que coabitam no imaginário social de qualquer cidadão, porque construída no seio da história da sociedade. A busca pela não afetação corresponde integrar-se ao paradigma pós-moderno de estar inerte ao sofrimento humano, entretanto tal afetação deve estar na ordem da atuação profissional para ser mais assertiva, visto que quando não se busca tal posicionamento, corre-se o sério risco de o profissional se transformar em mais um agente de submissão e de violência ao outro. Estar entre discursos e vazios é estar entre-discursos variados, ser afetado por eles e, substancialmente, utilizá-los para a legitimação de uma conduta ética e pautada por princípios de Compromisso Social. REFERÊNCIAS AB’SÁBER, Tales A. M. e cols. Uma lente de aumento sobre o feminino no século XXI – Debate – Malvine Zalcberg, Cristian I. L. Dunker, Silvia Leonor Alonso e Tales A. M. Ab’Sáber. In Percurso: Revista de Psicanálise, São Paulo, n.40, pp. 139-148, jun. 2008. Semestral. BIRMAN, Joel. Mal-estar na atualidade: a psicanálise e as novas formas de subjetivação Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005. 304p. 5ª edição BIRMAN, Joel. Arquivos do Mal-estar e da Resistência. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2006a. 420 p. (Coleção Sujeito e História). BIRMAN, Joel. Genealogia do feminino e da paternidade em psicanálise. Revista Natureza Humana, São Paulo, v. 8, p. 163-180, jan./jun. 2006b. CAMARNADO JUNIOR, Drausio Vicente. As Faces da violência: da conceituação polissênica à sua emergência no campo da saúde. In ROMARO, Rita A.; CAPITÃO, Cláudio G. (orgs). As Faces da Violência: aproximações, pesquisas e reflexões. cap 1, pp 11-31.São Paulo: Vetor, 2007. FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir: Nascimento da Prisão. 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Que é a desconstrução? Revista de Filosofia. n.15, v. 17. Curitiba, 2003, p.73-78. PARECER DO SUPERVISOR INDICANDO O TRABALHO Eu, Ana Rita da Fonseca, supervisora de estágio em Psicologia Jurídica da Ênfase Saúde Mental e Prevenção, acompanhei o estágio realizado pelo aluno Thiago Luis da Silva em uma Delegacia de Defesa da Mulher. Os atendimentos seguiram critérios de mediação psicológica, no formato de plantão psicológico, no ano de 2009. Diante do desempenho e intervenções realizadas pelo aluno nesse espaço, considero este trabalho relevante para pesquisadores e profissionais que nutrem interesse pelo tema. Assim, recomendo-o a participação do prêmio Silvia Lane, promovido pela Associação Brasileira de Ensino de Psicologia (ABEP) na categoria relatório final de estágio – RE como forma de reconhecimento e divulgação do trabalho realizado. Atenciosamente Ana Rita da Fonseca CRP 06/53067-2 BREVE MEMORIAL SOBRE A ESCOLHA DO TEMA A PARTIR DA TRAJETÓRIA COMO ALUNO As motivações que nos fizeram escolher o estágio se fundem com as expectativas acerca da escolha pela Psicologia e, de certo modo, com o desconforto ante o sofrimento alheio, principalmente de mulheres e crianças. Tal desconforto, de caráter eminentemente pessoal carrega consigo, também, um desconforto de um modo de viver de uma coletividade, que, por sua vez desemboca na vontade de cuidar. Cuidar de sujeitos massacrados pelo peso de um discurso que discrimina, estigmatiza e forja modos de pensar e sentir. Diante da compreensão desta problemática, sentimo-nos impelidos a fazer algo. Dessa forma, o contato com situações de Violência é impactante, mas não paralisador, evidenciando a possibilidade de fazer algo para os que estão, de alguma forma inscritos sob essa condição, e, mesmo o assombro e impacto que nos causam, oferecem recursos para nos aproximarmos um tanto mais da condição humana. A escolha pela Delegacia de Defesa da mulher então, se circunscreve nesse percurso, de se compreender para melhor cuidar. Thiago Luis da Silva