UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA – UNESP CENTRO DE AQUICULTURA DA UNESP ESTUDO MORFOLÓGICO E HISTOQUÍMICO DO TUBO DIGESTIVO DE ELEUTEROEMBRIÕES E LARVAS DE Leporinus obtusidens (VALENCIENNES, 1836) Renata Alari Chedid Jaboticabal, SP 2012 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA – UNESP CENTRO DE AQUICULTURA DA UNESP ESTUDO MORFOLÓGICO E HISTOQUÍMICO DO TUBO DIGESTIVO DE ELEUTEROEMBRIÕES E LARVAS DE Leporinus obtusidens (VALENCIENNES, 1836) Renata Alari Chedid Orientador: Prof. Dr. Carlos Alberto Vicentini Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Aquicultura do Centro de Aquicultura da UNESP CAUNESP, como parte dos requisitos para obtenção do Título de Mestre. Jaboticabal, SP 2012 C514e Chedid, Renata Alari Estudo Morfológico e Histoquímico do tubo digestivo de eleuteroembriões e larvas de Leporinus obtusidens (Valenciennes, 1836) / Renata Alari Chedid. - - Jaboticabal, 2012 66 f. : il. ; 29 cm Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual Paulista, Centro de Aquicultura, 2012 Orientador: Carlos Alberto Vicentini Banca examinadora: Bruno Cesar Schimming, Maíra Aparecida Stefanini Bibliografia 1. Histologia. 2. Histoquímica. 3. Canal alimentar. 4. Anostomidae. I. Título. II. Jaboticabal-Centro de Aquicultura. CDU 639.31 Ficha catalográfica elaborada pela Seção Técnica de Aquisição e Tratamento da Informação – Serviço Técnico de Biblioteca e Documentação - UNESP, Câmpus de Jaboticabal. e-mail: [email protected] Há momentos na vida em que sentimos tanto a falta de alguém que o que mais queremos é tirar esta pessoa de nossos sonhos e abraçá-la. Sonhe com aquilo que você quiser. Seja o que você quer ser, porque você possui apenas uma vida e nela só se tem uma chance de fazer aquilo que se quer. Tenha felicidade bastante para fazê-la doce. Dificuldades para fazê-la forte. Tristeza para fazê-la humana. E esperança suficiente para fazê-la feliz. As pessoas mais felizes não têm as melhores coisas. Elas sabem fazer o melhor das oportunidades que aparecem em seus caminhos. A felicidade aparece para aqueles que choram. Para aqueles que se machucam. Para aqueles que buscam e tentam sempre. E para aqueles que reconhecem a importância das pessoas que passam por suas vidas. O futuro mais brilhante é baseado num passado intensamente vivido. Você só terá sucesso na vida quando perdoar os erros e as decepções do passado. A vida é curta, mas as emoções que podemos deixar duram uma eternidade. A vida não é de se brincar porque um belo dia se morre. Há Momentos Clarice Lispector Aos meus pais Jorge e Leni pelo amor incondicional e por sempre acreditarem em mim... A minha irmã Daniela Pela amizade e apoio... Aos meus avós Otacílio e Vilma Por manterem nossa família sempre unida... Ao meu noivo Ricardo Pelo amor, amizade e apoio constante. Ofereço e Dedico "O valor das coisas não está no tempo em que elas duram, mas na intensidade com que acontecem. Por isso existem momentos inesquecíveis, coisas inexplicáveis e pessoas incomparáveis". (Fernando Pessoa) AGRADECIMENTO ESPECIAL Ao Prof. Dr. Carlos Alberto Vicentini Pelos ensinamentos transmitidos com segurança, muita paciência e dedicação, essenciais para o desenvolvimento deste trabalho. Pela amizade, apoio e compreensão nos momentos mais difíceis. Agradeço a confiança e atenção. “Talvez meio caminho andado, seja a gente acreditar no que faz. Mas acima de tudo, o que mais nos incentiva, que mais nos valoriza e também mais nos torna conscientes de nossa responsabilidade, é saber que outros crêem em nós. E não há palavras que descrevam o que sentimos ao saber dos sacrifícios a que eles se impõem por crerem não apenas em nós, mas também no que cremos.” (Albert Einstein) AGRADECIMENTOS x A Deus. x Aos meus pais, Jorge Abdo Chedid e Leni Lêda Alari Chedid, por serem meu porto seguro e me apoiarem sempre com amor, carinho, compreensão e sabedoria. x À minha irmã, Daniela Alari Chedid, por estar sempre presente em minha vida, me proporcionando momentos de alegria e descontração. x Aos meus avós, Otacílio Alari e Vilma de Paula Alari, que participaram ativamente da minha educação e me incentivaram a nunca desistir dos meus sonhos. x Aos meus tios, Ivan Márcio Alari, Leila Mariza Alari da Silva, Liana Léia Alari Faria e Ivair José Alari, pelo incentivo e orações. x Ao meu noivo, Ricardo Hideo Mori, pelo incentivo constante, amor e dedicação e por me presentear com a Mayu (minha cachorrinha). x Ao meu orientador Prof. Dr. Carlos Alberto Vicentini, pelos ensinamentos e amizade. x À Profa. Dra. Irene Bastos Franceschini Vicentini, pela grande contribuição científica e conselhos valiosos. x Ao nosso técnico, Antônio Carlos do Amaral, pela atenção dispensada sempre que precisei. x A todos os amigos do Laboratório de Morfologia de Organismos Aquáticos (LAMOA), pela companhia, sugestões e momentos de descontração. x Ao meu orientador da graduação, Prof. Dr. Alexandre Ninhaus Silveira, por me iniciar na vida acadêmica e pela amizade e carinho. x À Profa. Dra. Rosicleire Verissomo Silveira, pela atenção e colaboração. x Ao Laboratório de Ictiologia Neotropical (LINEO), pelo empréstimo das instalações e material de coleta. x Ao Laboratório de Microscopia Eletrônica da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias da UNESP, Campus de Jaboticabal, pelas análises em MEV. x Ao Centro de Microscopia Eletrônica do Instituto de Biociências da UNESP, Campus de Botucatu, pelas análises estereoscópicas. x Ao Centro de Pesquisa e Gestão de Recursos Pesqueiros Continentais – ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), Pirassununga, SP, pelas coletas de embriões. x À Estação de Hidrobiologia e Aqüicultura da Companhia Energética de São Paulo (CESP), Jupiá, SP, pelas coletas de eleuteroembriões e larvas. x Ao Centro de Aquicultura da UNESP (CAUNESP), onde realizei meu mestrado. x A banca examinadora, Prof. Dr. Bruno Cesar Schimming, Prof. Dr. Maíra Aparecida Stefanini e Prof. Dr. Rogério Caetano da Costa, pelo cuidado na correção e excelentes sugestões, enriquecendo esse trabalho. x Ao CNPq, pelo auxílio concedido em forma de bolsa. x A todos os professores da graduação e pós-graduação, por seus ensinamentos x Aos amigos da graduação e pós-graduação, pela companhia. x A um amigo muito especial, cuja participação nesse trabalho foi imprescindível, Claudemir Kuhn Faccioli, muito obrigada por sua amizade. x A todos que contribuíram de alguma forma para realização deste trabalho, meus sinceros agradecimentos. MUITO OBRIGADA! SUMÁRIO RESUMO..............................................................................................................................1 ABSTRACT..........................................................................................................................2 1. INTRODUÇÃO................................................................................................................3 1.1. Importância da larvicultura de peixes........................................................................3 1.2. Embriogênese.............................................................................................................6 1.3. Ontogenia do sistema digestório de peixes................................................................8 1.4. Características da espécie e relevância do estudo....................................................10 4. OBJETIVOS...................................................................................................................13 3. MATERIAL E MÉTODOS...........................................................................................14 3.1. Coleta do material....................................................................................................14 3.2. Análises estereoscópicas..........................................................................................15 3.3. Análises de microscopia eletrônica de varredura.....................................................16 3.4. Análises Histológicas...............................................................................................16 3.5. Análises Histoquímicas............................................................................................17 4. RESULTADOS...............................................................................................................18 4.1. Embriogênese...........................................................................................................18 4.2. Morfologia externa de eleuteroembriões e larvas....................................................25 4.3. Características histológicas e histoquímicas do tubo digestivo...............................30 a) Boca.....................................................................................................................31 b) Esôfago................................................................................................................34 c) Estômago.............................................................................................................37 d) Intestino...............................................................................................................41 e) Glândulas anexas.................................................................................................46 5. DISCUSSÃO...................................................................................................................49 6. CONCLUSÕES..............................................................................................................57 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.........................................................................58 ________________________________R Resumo Dissertação Renata Alari Chedid RESUMO Leporinus obtusidens apresenta características zootécnicas interessantes e promissoras para o cultivo em piscicultura. Na maioria das espécies cultivadas, as larvas, ao iniciarem a alimentação exógena, são organismos cujo desenvolvimento ainda não se completou, razão pela qual os órgãos digestivos não estão totalmente definidos e o conteúdo enzimático ainda é deficiente. As pesquisas com larvas de peixes apontam para a alimentação como o fator de maior importância a ser considerado durante o desenvolvimento inicial, pois os organismos estão na fase de diferenciação estrutural e funcional do sistema digestório. Assim o objetivo deste trabalho foi analisar as características histológicas e histoquímicas do tudo digestivo de Leporinus obtusidens nas fases iniciais do desenvolvimento. As amostras foram fixadas em solução de Karnovsky e processadas para análises histológicas e histoquímicas. A eclosão dos eleuteroembriões de L. obtusidens ocorreu às 15 horas após a fertilização (28°C) e as reservas de vitelo foram observadas até 120 horas após a eclosão (HAE). A boca sofreu modificações na posição, passando de ventral para subterminal. Com relação ao esôfago, foi possível observar as primeiras células caliciformes com 48 HAE e a partir de 64 HAE intensa positividade ao PAS e ao AB. A partir de 30 HAE foi possível observar o primórdio do estômago, caracterizado pela substituição do epitélio esofágico estratificado por epitélio gástrico simples, com presença de poucas células caliciformes. Com 96 HAE foi observada intensa reação ao PAS no epitélio de revestimento do estômago, o que indica funcionalidade do órgão. Quanto ao intestino, foi observado um desenvolvimento lento, as primeiras células caliciformes foram observadas com 96 HAE. Os cecos pilóricos foram evidenciados com 240 HAE. As larvas de L. obtusidens estão morfologicamente prontas para sobreviver com alimentação exógena a partir do quarto dia após a eclosão. Palavras chave: histologia, histoquímica, canal alimentar, Anostomidae. 1 _______________________________A Abstract Dissertação Renata Alari Chedid ABSTRACT Leporinus obtusidens husbandry has characteristics very interesting and promising for cultivation in aquaculture programs. Most of the cultivated species, the larvae begin to feed exogenously, are organisms whose metamorphosis is not complete, which is why the digestive organs are not fully defined and the enzyme content is still deficient. The studies with fish larvae feeding point to as the most important factor to be considered during early development, because the organisms are in the process of structural and functional differentiation of the digestive system. Thus the objective of this study was to analyze the histological and histochemical features of digestive L. obtusidens in all stages of development. Samples were collected in the Hydrobiology and Aquaculture Station of Companhia Energetica de São Paulo (CESP) Jupiá, SP. The samples were fixed in Karnovsky solution, processed for histological and immunohistochemical analysis. The outbreak of eleuteroembryo L. obtusidens occurred approximately 15 hours after fertilization (28 ° C) and the yolk reserves were observed up to 120 HAE. The mouth has undergone successive changes during development, the ventral position to the subterminal position. With regard to the esophagus, it was possible to observe the first goblet cells with 48 HAE and and starting at 64 HAE intense positivity to PAS and AB. From 30 HAE was possible to observe the beginnings of the stomach, characterized only by the substitution of an esophageal epithelium stratified by gastric epithelium simple with cuboidal cells, with little presence of goblet cells. Was observed with 96 HAE intense reaction to PAS in the epithelium lining of the stomach, indicating functionality of the organ. As the intestine, we observed a slow development, the first goblet cells were observed with 96 HAE. The pyloric caeca were seen with 240 HAE. The results showed that larvae of L. obtusidens are morphologically ready to survive on exogenous feeding from the fourth day after hatching. Keywords: histology, histochemistry, alimentary canal, Anostomidae. 2 _________________________1 1. Introdução Dissertação Renata Alari Chedid 1. INTRODUÇÃO 1.1. Importância da Larvicultura de Peixes: A piscicultura tem se destacando nos últimos anos como uma alternativa para o repovoamento de corpos d’água (rios, lagoas, etc.) cuja população natural de peixes reduziuse devido a pesca predatória, bem como pela construção de usinas hidrelétricas e barragens que impedem a piracema, afetando a reprodução e a manutenção das populações de peixes. As consequências geradas pela redução na oferta de peixes, não ficam somente no âmbito ambiental, mas também no social, por excluir as comunidades de pescadores que sobreviviam desta atividade. Segundo Beerli et al. (2004), o Brasil possui grande potencial hídrico e climático, o que possibilita a criação de diversas espécies de peixes. Contudo, a piscicultura ainda apresenta resultados modestos de desenvolvimento, devido aos processos de produção adotados e a falta de informações sobre as espécies nativas com potencial zootécnico. Mesmo com o aprimoramento das técnicas de reprodução, alimentação e manejo na piscicultura, muitos problemas ainda precisam ser resolvidos, principalmente com relação à larvicultura. Diversos fatores interferem na sobrevivência das larvas de peixes, tornando a larvicultura um forte ponto de estrangulamento na produção de grandes quantidades de juvenis. As pesquisas com larvas de peixes apontam para a alimentação como o fator de maior importância a ser considerado durante o desenvolvimento inicial (CESTAROLLI et al., 1997; LUZ e ZANIBONI FILHO, 2001; JOMORI et al., 2003), pois os organismos estão em fase de diferenciação estrutural e funcional do sistema digestório, os quais, na maioria das espécies, passa da alimentação endógena (vitelo) para a alimentação exógena (KAMLER, 1992). A sobrevivência das larvas nesse período depende do desenvolvimento de órgãos necessários à alimentação (PORTER e THEILACKER, 1999), das mudanças no sistema digestório (MAKRAKIS et al., 2005), e da disponibilidade de alimento adequado (SÁNCHEZ3 Dissertação Renata Alari Chedid VELASCO, 1998). De acordo com Wootton (1998), além da diferenciação do tubo digestivo, a posição, a forma e o tamanho da boca estão diretamente relacionados à dieta apresentada pela espécie. Em larvas iniciais de Apareiodon affinis ocorre a migração da boca da posição terminal para inferior, para facilitar a captura do alimento (SANTIN et al., 2004). Na maioria das espécies criadas, as larvas, ao iniciarem a alimentação exógena, são organismos cuja diferenciação ainda não se completou, razão pela qual os órgãos digestivos não estão totalmente definidos e o conteúdo enzimático ainda é deficiente (DABROWSKI, 1984). Alguns autores sugeriram que as larvas utilizariam enzimas da presa ingerida para facilitar seu processo de digestão, enquanto desenvolveriam seu próprio sistema digestório (DABROWSKI, 1984; PERSON-LE RUYET, 1989; GALVÃO et al., 1997a). Posteriormente, outros autores demonstraram que a contribuição de enzimas exógenas no trato digestório de "sea bass", Dicentrarchus labrax (CAHU e ZAMBONINO-INFANTE, 1995) e de Sardinops melanoticus (KUROKAWA et al., 1998) não era significativa. O conhecimento do desenvolvimento do sistema digestório durante as fases iniciais é fundamental para o embasamento e aplicação do manejo alimentar, e para a compreensão das exigências nutricionais dos peixes nas várias fases do ciclo de vida (ZIMMERMANN e JOST, 1998). Segundo Dabrowski (1984), durante o desenvolvimento larval ocorrem mudanças nos processos de digestão, absorção e assimilação dos compostos químicos. As mudanças estruturais do canal alimentar que ocorrem ao longo do tempo, caracterizam diferentes adaptações funcionais às dietas (GOVONI et al., 1986). De acordo com Galvão et al. (1997b), o lento desenvolvimento e a ausência de glândulas gástricas durante a fase larval inicial dificultam a substituição de organismos vivos por dietas artificiais. Portanto, estudos que atentem para a compreensão do desenvolvimento morfofisiológico do sistema digestório de larvas, estão dentre os mais úteis para a aplicação 4 Dissertação Renata Alari Chedid de melhores técnicas para a produção de larvas e de juvenis que, consequentemente, propiciarão maiores chances de sucesso na larvicultura (DABROWSKI, 1984). Ainda, nos estudos que envolvem o desenvolvimento inicial de peixes, não há um consenso sobre a terminologia a ser utilizada para classificar essas primeiras fases de vida dos animais. Uma classificação ainda utilizada é a proposta por Woynarovich e Horváth (1983), onde o período larval compreende o momento a partir da eclosão até a primeira alimentação exógena. Posteriormente, até o início do período juvenil é definido pelos autores como sendo o período de pós-larva. Outra classificação, proposta por Balon (2002), identifica o período larval a partir do início da alimentação exógena. De acordo com o autor, a fase endotrófica denomina-se eleuteroembrião (indivíduos eclodidos e dependentes de nutrição vitelina). Neste caso, a eclosão não deve ser comparada ao parto de mamíferos pois pode ser alterada por estímulos internos e externos do ambiente. Um problema relatado por Gomes et al. (2003), diz respeito a nomenclatura utilizada para a produção e comercialização de indivíduos iniciais de peixes brasileiros. Diante da discordância na classificação inicial de peixes, o autor propôs nomeá-los pelo seu comprimento, fazendo uma adaptação entre o que é biologicamente correto e o que é normalmente utilizado. Diante do exposto, no presente estudo, será utilizada a terminologia proposta por Balon (2002), classificando assim os organismos recém eclodidos como eleuteroembriões, até a primeira alimentação. Após esta etapa os indivíduos serão classificados como larvas. 5 Dissertação 1.2. Renata Alari Chedid Embriogênese Com a entrada do primeiro espermatozóide pela micrópila inicia-se no ovócito uma movimentação citoplasmática intensa em direção à micrópila formando os pólos animal e vegetativo (KIMMEL et al., 1995). Nos ovócitos encontram-se os alvéolos corticais alinhados formando o citoplasma cortical (IWAMATSU, 2004). Eles são ativados após a fertilização e se rompem liberando seu conteúdo entre o córion e a membrana do ovo, num evento denominado reação cortical (HART, 1990). De acordo com Laale (1980) e Iwamatsu (2004) a elevação do córion, iniciada pela reação cortical, forma o espaço perivitelino. Esse espaço aumenta de tamanho principalmente pela absorção da água. Laale (1980) atribuiu ao espaço perivitelino funções de proteção ao embrião, nutrição, regulação osmótica e flutuação, além de prevenir a poliespermia. Após os eventos desencadeados pela fertilização, o ovo passa a sofrer alterações que incluem clivagens, movimentações celulares e formação dos primórdios dos órgãos (GANECO, 2003). A clivagem dos ovos de peixe é do tipo meroblástica ou parcial por ocorrer apenas no pólo animal (BALINSKY, 1970; LAGLER, 1959). A primeira clivagem divide o blastodisco em duas células, de igual tamanho. As clivagens se iniciam do centro para as bordas do blastodisco (SHARDO, 1995) e o número de blastômeros aumenta enquanto seu tamanho diminui (CASTELLANI et al., 1994). A camada sincicial do vitelo possui uma grande importância para o desenvolvimento embrionário dos teleósteos e aparece em diferentes fases do desenvolvimento dependendo da espécie. Ela separa o vitelo do embrião, assim como todos os nutrientes provenientes do vitelo passam através da camada sincicial para atingir a blastoderme (DEVILLERS, 1961; TRINKAUS, 1993). Além disso, serve como “motor” para o movimento de epibolia (movimento da blastoderme unidirecional e progressivo , do pólo animal ao vegetativo) (TRINKAUS, 1993). O periblasto ou “camada sincicial do vitelo” é uma camada 6 Dissertação Renata Alari Chedid citoplasmática contínua localizada entre o blastodisco e o vitelo, formada pela divisão incompleta do citoplasma do blastodisco. Inicialmente tem a forma de um anel ao redor do blastodisco, mas com o desenvolvimento, esta se espalha por baixo de toda a blastoderme (KIMMEL et al., 1995). A fase de gástrula é caracterizada pelos movimentos de epibolia, migração celular e formação dos folhetos germinativos (IWAMATSU, 2004; KIMMEL et al. 1995; SHARDO, 1995). O movimento de epibolia se inicia no final da blástula (SOLNICA-KRESEL e DRIEVER, 1994). Com 50% de epibolia, iniciam-se os movimentos de migração celular, formando duas camadas: a superior ou epiblasto e a inferior ou hipoblasto (WARGA e KIMMEL, 1990; SHARDO, 1995). Ao término da fase de gástrula surgem os tecidos mesodermais que se alongam em ambos os lados da notocorda organizando-se em segmentos denominados somitos (GALMAN e AVTALION, 1989). As regiões do prosencéfalo, mesencéfalo e rombencéfalo são formadas pela expansão do tubo neural como descrito em Brachidanio rerio (KIMMEL et al.,1995). Após estes eventos o embrião se encontra apto a eclodir e então se inicia a fase de eleuteroembrião. As larvas, além de serem morfologicamente muito diferentes dos adultos, apresentam exigências ecológicas distintas, com particularidades quanto ao habitat, alimentação e comportamento (LEIS e TRNSKI, 1989). Além disso, a grande similaridade entre larvas de espécies diferentes e a falta de literatura comparativa dificultam ainda mais os trabalhos dos taxonomistas (SANCHES et al., 2001). 7 Dissertação 1.3. Renata Alari Chedid Ontogenia do Sistema Digestório de Peixes: Durante o processo de desenvolvimento dos peixes, podem ser observadas mudanças em seus hábitos alimentares ou nas suas dietas e adaptações morfológicas no sistema digestório (CAVICCHIOLI e LEONHARDT, 1993). À medida que o animal cresce, acontecem modificações substanciais na estrutura e no comprimento do tubo digestivo. Na maioria das espécies de peixes, após a eclosão, o tubo digestivo apresenta-se indiferenciado, como um tubo simples e reto, como em Prochilodus scrofa (CAVICCHIOLI e LEONHARDT, 1993); Bryconamericus aff. iheringi (BORGES et al., 2006); Hoplias aff. lacerdae e Lophiosilurus alexandri (NEVES, 1996). Contudo, o grau de diferenciação da larva recém-eclodida varia entre as espécies, dependendo do tamanho do ovo (BLAXTER, 1969). Espécies que apresentam ovos pequenos e alta fecundidade têm o desenvolvimento embrionário mais rápido e larvas menos desenvolvidas, enquanto as que apresentam ovos grandes e baixa fecundidade têm desenvolvimento embrionário prolongado e maior grau de desenvolvimento das larvas (SATO et al., 2003). Segundo Baldisserotto (2002), após a eclosão, a digestão é muito rudimentar, sendo que o intestino apresenta-se curto e as células da mucosa intestinal são pouco diferenciadas. Na maioria das larvas, durante a fase de primeira alimentação, o trato digestório apresenta baixa atividade de enzimas digestivas (GORDON e HECHT, 2002). Porém, em larvas de tilápia, Oreochromis niloticus, Tengjaroenkul et al. (2002) detectaram atividade de seis enzimas digestivas antes do início da alimentação exógena, indicando que enterócitos podem produzir enzimas digestivas nesta fase, particularmente peptidase e fosfatase alcalina. Em experimentos realizados sobre o desenvolvimento ontogenético do tubo digestivo de Hoplias aff. lacerdae (trairão), Neves (1996) observou que no primeiro dia pós-eclosão, o esôfago apresenta-se indiferenciado, composto por uma única camada celular, o intestino, 8 Dissertação Renata Alari Chedid compreende um túbulo retilíneo com mucosa desprovida de pregas e aos três dias de vida, a mucosa pregueada do estômago apresenta epitélio prismático simples. Estudos morfológicos demonstraram que o epitélio de revestimento do esôfago é colunar simples em Chelmon rostratus (TAN e TEH, 1974), e Hoplosternum thoracatum (HUEBNER e CHEE, 1978). Entretanto, em larvas de Oreochromis niloticus, o esôfago é revestido por um epitélio pavimentoso estratificado (MORRISON et al., 2001). Segundo Mangetti (2006), o esôfago de larvas de Pseudoplatystoma coruscans apresenta-se revestido por epitélio pavimentoso estratificado, com células secretoras, enquanto que na região onde se inicia o primórdio do estômago ocorre uma abrupta mudança do epitélio pavimentoso estratificado para prismático simples. Petrini (1961) observou no estômago de Plecostomus plecostomus que o epitélio era do tipo pavimentoso simples, tornando-se colunar simples na região pilórica. As invaginações do epitélio formam fossetas gástricas, onde desembocam a secreção das glândulas gástricas (DOMITROVIC e MOREIRA, 1984; MANGETTI, 2006). Em relação ao intestino de peixes existem diferentes critérios e grande discordância na literatura referente aos segmentos intestinais. Alguns estudos estão fundamentados em características anatômicas, outros na histologia, e ainda outros em considerações funcionais (LOGATO, 1995). Segundo critérios histofisiológicos, o intestino pode ser dividido em três segmentos: primeiro segmento ou proximal (60-75% do comprimento total), segundo segmento ou médio (20-25%) e terceiro segmento ou distal (5-15%) (STROBAND e DABROWSKI, 1979). Ainda de acordo com o critério histofisiológico, o primeiro segmento do intestino encontra-se relacionado com a absorção de gorduras (NACHI, 1988). O epitélio colunar simples apresenta-se constituído por células absortivas e células caliciformes (ALHUSSAINI, 1949; MORRISON et al., 2001; MANGETTI, 2006). O segundo segmento é 9 Dissertação Renata Alari Chedid responsável pela absorção de macromoléculas protéicas (STROBAND e KROON, 1981; STROBAND e van der VEEN, 1981). O terceiro segmento encontra-se relacionado com a absorção de água e eletrólitos. Nesse segmento o epitélio difere dos demais por apresentar maior número de células caliciformes (AL-HUSSAINI, 1949). Alguns autores observaram a presença de células caliciformes no intestino médio e no intestino posterior, com diferentes distribuições, de acordo com a espécie estudada: Dicentrarchus labrax (VU, 1980), Pseudoplatystoma coruscans (SANTOS e GODINHO, 1994), Sparus aurata (SARASQUETE et al., 1995), Pseudoplatystoma coruscans (MANGETTI, 2006). As mucossubstâncias digestivas são predominantemente compostas por glicoconjugados e provavelmente estão envolvidas em diversos processos fisiológicos, entre os quais lubrificação, digestão, promoção da absorção macromolecular, tampão de fluido intestinal, prevenção de danos proteolíticos ao epitélio e defesa contra bactérias e outros agentes patogênicos. Assim, a região apical do epitélio gastrointestinal de peixes e seus glicoconjugados secretados têm um papel fundamental na mediação das relações entre o ambiente externo e o corpo (DOMENEGHINI et al., 2005). 1.4. Características da Espécie e Relevância do Estudo: A família Anostomidae, relacionada dentro da ordem dos Characiformes, compreende um grupo de 12 gêneros e apresenta uma ampla distribuição na América do Sul e Central, com representantes em todas as bacias brasileiras. Dentre os gêneros da ordem dos Characiformes, Leporinus apresentam maior número de espécies, com 87 de espécies válidas (GARAVELLO e BRITSKI, 2003). O gênero Leporinus destaca-se ainda pela presença de algumas espécies com grande valor econômico tais como Leporinus elongatus; L. macrocephalus; L. friderici e L. obtusidens (CASTAGNOLLI, 1992). 10 Dissertação Renata Alari Chedid Segundo Reynalte-Tataje et al. (2001), espécies do gênero Leporinus em especial L. elongatus, L. macrocephalus e L. obtusidens, apresentam características zootécnicas bastante interessantes e promissoras para a criação em programas de piscicultura, entre elas a facilidade de reprodução em cativeiro (reprodução induzida), idade e tamanho na maturidade sexual, tolerância ao manejo e fácil aceitação da ração na fase adulta. Porém a larvicultura ainda é rudimentar com alto índice de mortalidade, impossibilitando a produção de alevinos em larga escala. A espécie Leporinus obtusidens é conhecida popularmente como piava, piavuçu, piabaçu, piarauçu, piapara ou boga. Está amplamente distribuída na Colômbia, Guiana, Uruguai e no Brasil, na Amazônia e Rios Araguaia, São Francisco, Paraguai, Paraná, Grande, Pardo, Parnaíba, Tietê e Mogi-Guaçu (GODOY, 1987; NOMURA, 1984). É um peixe de piracema, com período de reprodução entre os meses de outubro e fevereiro. Possui corpo alongado e fusiforme, apresenta coloração prateada com nadadeiras amareladas. Alcançam em média 40 cm de comprimento e 1,5 kg; sendo que indivíduos maiores relatados chegaram a 80 cm e 6 kg. A exemplo das demais espécies do gênero Leporinus, possuem hábito alimentar onívoro, alimentando-se de insetos, restos de peixes e vegetais (SANTOS, 1992). Outros autores, por meio de pesquisas de conteúdo estomacal, classificam esse peixe como onívoro de amplo espectro, o que, do ponto de vista da nutrição, proporciona vantagem no aproveitamento dos alimentos (ANDRIAN, 1994; RIBEIRO, 2001). Das espécies nativas criadas no Brasil, L. obtusidens é amplamente preconizada para pisciculturas, principalmente nos estados da região Sudeste e Sul, pois em cativeiro apresentam bom ganho em peso e boa conversão alimentar, podendo atingir mais de 1,0 kg de peso vivo no período de um ano (MOREIRA, 2001). Além da importância comercial, L. obtusidens vem sendo produzido para fins de repovoamento. 11 Dissertação Renata Alari Chedid Muitos estudos ainda são necessários para fundamentar o sistema de criação de L. obtusidens, principalmente em relação à larvicultura. Dessa forma o objetivo desse trabalho foi proporcionar conhecimentos a respeito do desenvolvimento morfológico inicial, em especial, a estruturação do sistema digestório, visando fornecer referências para melhorar as técnicas de manejo e nutrição de L. obtusidens na fase de larvicultura. 12 ____________________________2 2. Objetivos Dissertação Renata Alari Chedid 2. OBJETIVOS Diante do exposto, o objetivo deste trabalho foi descrever a ontogênese do sistema digestório de Leporinus obtusidens, para alcançar uma melhor compreensão de sua organização e funcionalidade, fornecendo bases para futuros estudos nutricionais em larvicultura. Assim, o presente trabalho analisou: • As características morfológicas externas de embriões, eleuteroembriões e larvas de L. obtusidens, com ênfase na posição, formato e tamanho da boca, narinas, olhos e botões gustativos. • As características histológicas do desenvolvimento dos órgãos do trato digestório e suas modificações estruturais. • As características histoquímicas do tubo digestivo em eleuteroembriões e larvas de L. obtusidens para detecção de mucossubstâncias. 13 _________________3 3. Material e Métodos Dissertação Renata Alari Chedid 3. MATERIAL E MÉTODOS 3.1. Coleta de Material As coletas de embriões, eleuteroembriões e larvas de L. obtusidens, foram realizadas na Estação de Hidrobiologia e Aquicultura da Companhia Energética de São Paulo (CESP), Jupiá, SP (Fig. 1 A), e no Centro de Pesquisa e Gestão de Recursos Pesqueiros Continentais – ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), Pirassununga, SP (Fig. 1 B), durante o período reprodutivo, nos anos de 2009 e 2010. Figura 1. A: Estação de Hidrobiologia e Aquicultura da Companhia Energética de São Paulo (CESP), Jupiá, SP; B: Centro de Pesquisa e Gestão de Recursos Pesqueiros Continentais – ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), Pirassununga, SP. Os reprodutores foram submetidos à fertilização induzida com solução de macerado de hipófise de carpa, Cyprinus carpio, sendo que as fêmeas receberam duas aplicações nas dosagens de 0,5 mg e 5 mg/kg de peso vivo, respectivamente, com um intervalo de 10 horas. Os exemplares machos foram induzidos, com uma única aplicação na dosagem de 1 mg/kg de peso vivo, no momento da segunda aplicação das fêmeas. Após aproximadamente 10 horas da última dosagem indutora, foi efetuada a extrusão dos óvulos e a retirada do sêmen. Para a fertilização foi utilizado o método “a seco”, onde os óvulos foram misturados ao sêmen sem contato com a água. A seguir, foi acrescentada a água para ativação dos 14 Dissertação Renata Alari Chedid espermatozóides e hidratação dos óvulos. Após a lavagem para retirada do excesso de sêmen, os ovos foram incubados em incubadoras horizontais (Fig. 2). Figura 2. Incubadoras horizontais (instalações do CEPTA – ICMBio) As amostras de embriões foram retiradas a cada 15 minutos nas duas primeiras horas de desenvolvimento, posteriormente a cada hora até a eclosão. Após o momento da eclosão as amostras foram colhidas em intervalos de 4 horas até o 11º dia, intervalos de 6 horas até o 18º dia e de 24 horas até 32º dia. Para cada amostra, foram coletados entre dez e quinze exemplares. Os animais foram anestesiados em solução de benzocaína a 0,01% e imediatamente fixados em solução de Karnovsky modificado (10% de glutaraldeido a 25%, 40% de tampão fosfato com pH 7,2 e 0,2M e 50% de paraformaldeido a 8%). Os animais fixados em Karnovsky modificado foram transferidos para a solução de álcool 70% e conservados em geladeira para estudos histológicos, histoquímicos e ultraestruturais. 3.2. Análises estereoscópicas As análises das características morfológicas externas de embriões, eleuteroembriões e larvas foram realizadas com auxílio de estereomicroscópio Olympus, modelo SZX 16, com câmera acoplada Olympus modelo DP 7.2, junto ao Centro de Microscopia Eletrônica do Instituto de Biociências da UNESP, Campus de Botucatu. 15 Dissertação 3.3. Renata Alari Chedid Análises de microscopia eletrônica de varredura Para complementar as análises das características morfológicas externas de eleuteroembriões e larvas, com destaque para a morfologia da cavidade bucal, narinas, olhos e botões gustativos, os animais fixados em Karnovsky modificado, foram desidratados e montados em bases metálicas e, a seguir, metalizados com uma mistura coloidal de ouropaládio em aparelho Balzers MED-010. A análise e documentação do material foi realizada em microscópio eletrônico de varredura Jeol (modelo JSM-5410), do Centro de Microscopia Eletrônica da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias da UNESP, Campus de Jaboticabal. 3.4. Análises Histológicas As amostras fixadas em solução de Karnovsky e mantidos em álcool 70%, foram submetidos à rotina de inclusão em historesina. Para tanto, dois exemplares de cada amostra foram desidratados em séries graduadas de álcool, com três repetições: três banhos em álcool 80% (30 minutos cada), três banhos em álcool 90% (30 minutos cada), três banhos em álcool 95% (30 minutos cada) e três banhos em álcool absoluto (30 minutos cada). Em seguida, foram mantidos por 24 horas em solução de pré-infiltração de resina e álcool absoluto, na proporção 1:1. A seguir, as amostras permaneceram por 24 horas em solução de infiltração de resina para posteriormente serem incluídas em histomoldes contendo resina com solução endurecedora, sendo mantidos por 48 horas em estufa, a 60°C, para completar a polimerização da resina. Secções histológicas de 2-4 μm de espessura foram realizadas com navalhas de vidro, em micrótomo automático Leica RM2265, do Laboratório de Morfologia de Organismos Aquáticos da Faculdade de Ciências da UNESP, Campus de Bauru. Posteriormente, as 16 Dissertação Renata Alari Chedid secções foram submetidas à rotina de coloração com azul de toluidina a 1% (AT) e hematoxilina de Harris e eosina (HE). Após montagem das lâminas, estas foram observadas e fotografadas com auxílio de fotomicroscópio Olympus BX40f4. As imagens foram capturadas com câmera Olympus DP12 para posterior análise e descrição dos resultados. 3.5. Análises histoquímicas Estudos histoquímicos foram realizados por meio de reações de reativo Schiff (PAS) e Alcian Blue pH 2,5 (AB). As reações de PAS permitem evidenciar a presença de mucossubstâncias neutras, que possuem grupo glicol em suas estruturas. As reações com AB permitem visualizar a presença de mucossubstâncias ácidas. Após as reações histoquímicas, as lâminas foram montadas, observadas e imediatamente fotografadas com auxílio de fotomicroscópio Olympus BX40f4 com câmera Olympus DP12 acoplada. 17 Dissertação Renata Alari Chedid __________________________4 4. Resultados Dissertação Renata Alari Chedid 4. RESULTADOS 4.1. Embriogênese O período embrionário do L. obtusidens, da fertilização à eclosão, durou aproximadamente 15 horas a 28ºC (Tab. 1). O desenvolvimento embrionário foi dividido em seis estágios: zigoto, clivagem, gástrula, segmentação, incubação e eclosão. Tabela 1: Descrição temporal do desenvolvimento embrionário Leporinus obtusidens, a temperatura média de 28°C. Tempo Estágio Descrição 20min Zigoto Migração do citoplasma com a formação do pólo animal 35min 2 blastômeros 45min 4 blastômeros 55min 8 blastômeros 1:05h Clivagem 16 blastômeros 1:20h 32 blastômeros 1:35h 64 blastômeros 1:55h mórula inicial 2:05h mórula final 3:05h 25% epibolia 4:05h 50% epibolia 5:05h Gástrula 75% epibolia 6:05h 90% epibolia 7:05h 100% epibolia (tampão vitelino) 8:05h 12 somitos 9:05h Segmentação 18 somitos 10:05h 21 somitos e cauda solta 11:05h 25 somitos ou mais 12:05h as 14:05h 15:05h Incubação Eclosão mais de 30 somitos, larva em crescimento 18 Dissertação Renata Alari Chedid No momento da desova, os ovócitos mostraram-se esféricos e de coloração amarelada. Após a fertilização, observou-se a hidratação do ovo com aumento do espaço perivitelino, fusão dos pró-núcleos e reorganização citoplasmática com estabelecimento dos pólos animal e vegetativo. O pólo animal é constituído pelo citoplasma ativo e um núcleo, podendo ser identificado “in vivo” e em preparações, sob microscopia de luz, por apresentar-se mais translúcido. Já o pólo vegetativo mostrou-se mais denso e com coloração mais clara (Fig. 3). Figura 3. Embriões de Leporinus obtusidens minutos após a fertilização sob estereomicroscópio. Legenda: mc – membrana coriônica. Barras A e B: 500μm Aos 20 minutos após a fertilização, foram observadas as primeiras clivagens. Estas iniciaram do centro para as bordas do blastodisco. As clivagens foram do tipo meroblásticas. Com o decorrer das clivagens os blastômeros aumentam em número e diminuem de tamanho (Figs. 4 A e B), sendo que até a terceira clivagem as células apresentam certa homogeneidade e a partir do quarto plano de clivagem, começam a ocorrer blastômeros heterogêneos. Verificou-se que os glóbulos de vitelo penetram nos blastômeros de forma fragmentada (Figs. 4 C a G). 19 Dissertação Renata Alari Chedid Figura 4. Embriões de L. obtusidens em estágio de clivagem. A: estágio de clivagem com 4 células (sob estereomicroscópio); B: estágio de clivagem com 8 células (sob estereomicroscópio); C, D e E: secção de embrião em estágio de clivagem com 2 blastômeros, visualização da penetração dos glóbulos de vitelo nos blastômeros (HE); F e G: secção de embrião em estágio de clivagem com 8 blastômeros (HE). Legendas: bl – blastômeros; v – vitelo; cabeça de seta - penetração dos glóbulos de vitelo fragmentados. Barras: A: 200Pm; B: 500Pm. 20 Dissertação Renata Alari Chedid A presença de mais de 64 blastômeros caracterizou a fase de “stereoblastula” ou mórula (Figs. 5 A e B). Nesta fase foi possível observar a formação da camada sincicial de vitelo ou periblasto (Fig.5 B e C). Posteriormente observou-se o estágio de blástula (Fig. 5 D), caracterizado pela formação da blastocele (surgimento de espaços irregulares entre os blastômeros). O final desse estágio é marcado pelo início do movimento de epibolia. O estágio de gástrula foi caracterizado pelo movimento de epibolia (Fig. 6 A) e ocorrência dos movimentos morfogenéticos de convergência e involução celular, que produziram os primeiros folhetos e o eixo embrionário. Este estágio termina com o fechamento completo do tampão vitelino pela blastoderme. Durante o processo de epibolia, a camada sincicial de vitelo expande-se junto com o embrião até recobrir toda a massa de vitelo, formando o tampão vitelino (Figs. 6 B e C). No estágio de segmentação ocorreu o desenvolvimento da vesícula óptica, dos somitos, da notocorda, do tubo neural, a delimitação intestinal inicial e alongamento do embrião, principalmente no eixo céfalo-caudal. Seu término foi marcado pelo despregamento da cauda. 21 Dissertação Renata Alari Chedid Figura 5. A, B e C: embrião em estágio de mórula, destaque para a formação da camada sincicial de vitelo e núcleos individualizados (A: foto sob estereomicroscópio; B: AT; C: HE). D: secção de embrião em fase de blástula, mostrando a formação da blastocele (HE). Legendas: v - vitelo; csv - camada sincicial do vitelo; cabeça de seta - penetração dos glóbulos de vitelo nos blastômeros. Barra: A: 200Pm. 22 Dissertação Renata Alari Chedid Figura 6. A: embrião em estágio de gástrula (25% de epibolia) sob estereomicroscópio; B e C: secção de embrião em estágio de gástrula, mostrando fechamento do blastóporo (HE). Legendas: v - vitelo; csv - camada sincicial do vitelo; ba - blastoderme; bt – blastóporo. Barra: A: 200Pm. 23 Dissertação Renata Alari Chedid O estágio de incubação (Fig. 7) foi caracterizado pela presença de cauda livre, aproximadamente 20 somitos, vesícula óptica e ótica bem desenvolvidas, desenvolvimento do intestino posterior e crescimento do embrião. Nesta fase a camada sincicial reveste o intestino primordial. A notocorda se estendeu da região cefálica à caudal. Nos somitos iniciou-se o processo de miogênese para formação dos futuros músculos e o intestino primordial posterior encontrava-se bem definido. No estágio de eclosão os embriões demonstram movimentos bem vigorosos de natação, que são importantes para o rompimento do córion. A eclosão ocorreu 15 horas após fertilização, à temperatura média de 28ºC. Figura 7. Embrião com cerca de 20 somitos (foto sob estereomicroscópio), presença de vesícula óptica e cauda solta. Legendas: seta – vesícula óptica; s – somito; sv – saco vitelino; cs – cauda solta. Barra: 500Pm. 24 Dissertação 4.2. Renata Alari Chedid Morfologia externa de eleuteroembriões e larvas Após a eclosão os eleuteroembriões apresentavam-se transparentes, com coloração mais amarelada no saco vitelino e com comprimento médio de 2,97 ±0,1mm (Comprimento Notocordal - CN). As medidas de comprimento notocordal dos animais apresentaram pouca variação até 120 horas após eclosão (HAE), evidenciando um desenvolvimento inicial bastante regular. Porém, a partir de então, as larvas começaram a apresentar um crescimento variado (Fig. 8). A análise estereoscópica dos eleuteroembriões de L. obtusidens demonstrou pigmentação concentrada (melanóforos) nas extremidades cranial e caudal do saco vitelino e esparsa pigmentação na região ventral dos animais (Fig. 9). Também foram observados alguns pigmentos esparsos na região da cabeça e, com cerca de 18 HAE, observou-se intensa pigmentação do olho. Cabe destacar que ocorreu aumento da pigmentação no decorrer do desenvolvimento (Fig. 8). 25 Dissertação Renata Alari Chedid Figura 8. Vista lateral de Leporinus obtusidens, evidenciando o desenvolvimento de eleuteroembriões e larvas. A: eclosão; B: 12 horas após a eclosão; C: 42 horas após eclosão; D: 96 horas após a eclosão; E: 145 horas após a eclosão; F: 241 horas após a eclosão; G: 337 horas após a eclosão. Barras: A e B: 1000μm; C a F: 2000μm; G: 5000μm. 26 Dissertação Renata Alari Chedid Figura 9. Vista lateral de Leporinus obtusidens, evidenciando a pigmentação melanófora no saco vitelino e início de pigmentação do olho. A: 4 horas após eclosão; B: 8 horas após a eclosão; C: 20 horas após eclosão. Destaque para aumento da pigmentação no olho (cabeça de seta) e pigmentação da região cranial e caudal do saco vitelino (setas). Barras: A: 500μm; B e C: 1000μm. 27 Dissertação Renata Alari Chedid Os estudos ultraestruturais foram desenvolvidos como proposta complementar aos estudos estereoscópicos, e possibilitaram a documentação de algumas características morfológicas externas tais como, o aparecimento do olho, da narina, dos botões gustativos e das características anatômicas da boca de eleuteroembriões e larvas de Leporinus obtusidens. Em eleuteroembriões com cerca de 10 HAE, foi possível observar as células receptoras ciliadas na região das narinas (Figs. 10 A e B) e a partir de 32 HAE foi possível observar um aprofundamento progressivo do epitélio olfativo. Com cerca de 90 HAE, observou-se um estreitamento das paredes laterais na região medial da narina, formando as câmaras anterior e posterior (Figs. 10 C e D). A presença do saco vitelino foi observada até cerca de 120 HAE, em exemplares medindo 5,17 ±0,15mm de comprimento notocordal. Entretanto, mesmo antes da completa absorção da reserva de vitelo, foi possível observar alimento no interior da luz intestinal de larvas de L. obtusidens, com cerca de 96 HAE. Nesta idade o tubo digestivo já apresentava esôfago diferenciado, com células caliciformes, estômago com glândulas gástricas e superfície apical do epitélio de revestimento com secreção de mucossubstâncias. Entretanto, o intestino apresentava-se retilíneo, pouco pregueado e com poucas células caliciformes. 28 Dissertação Renata Alari Chedid Figura 10. Características ultraestruturais de larvas de Leporinus obtusidens. A: eclosão; B e C: 12 horas após a eclosão; D: 409 horas após a eclosão. Destaque para desenvolvimento das narinas (setas) e células receptoras ciliadas (*). Barras: A e D: 100μm; B: 10μm; C: 50μm. 29 Dissertação 4.3. Renata Alari Chedid Características histológicas e histoquímicas do tubo digestivo. A análise das reações histoquímicas de eleuteroembriões e larvas de L. obtusidens permitiu a observação de grande concentração de células caliciformes no epitélio esofágico. Foi possível ainda visualizar a presença de uma camada PAS positiva na superfície apical do epitélio de revestimento do estômago a partir de 96 HAE. No intestino foi observada a presença de poucas células caliciformes PAS e AB positivas. A tabela 2 apresenta um resumo das reações histoquímicas realizadas em eleuteroembriões e larvas L. obtusidens. Tabela 2: Reações histoquímicas em diferentes regiões do canal alimentar de Leporinus obtusidens. 30 Dissertação Renata Alari Chedid a) Boca Os cortes histológicos realizados no início do desenvolvimento do tubo digestivo de eleuteroembriões e larvas de L. obtusidens, evidenciaram as modificações sucessivas na posição da boca, de ventral para a posição subterminal, conforme destacado na Figura 11. Os lábios (Figs. 12 C e D) de L. obtusidens não são pigmentados, apresentam muitas papilas e se dispõem bem próximos aos dentes, contornando-os. O lábio inferior é um pouco mais espesso (Figs. 12 C) e possui maior mobilidade que o superior. Na maxila superior de espécimes jovens de L. obtusidens há dois pares de dentes incisiformes alinhados em uma fileira única, sendo o par medial maior que o par lateral (Fig. 12 A e D). Neuromastos (células receptoras ciliadas) foram visualizados concentrados na cabeça dos animais, principalmente próximo a boca (Figs. B e C). 31 Dissertação Renata Alari Chedid Figura 11. Cortes longitudinais de eleuteroembriões e larvas de Leporinus obtusidens, evidenciando as modificações na posição da boca. A: 24 horas após a eclosão, boca fechada em posição ventral (AT); B e C: 66 horas após a eclosão, boca em posição intermediária (AT); D: 121 horas após a eclosão, boca em posição terminal (AT); E: 840 horas após a eclosão, boca em posição subterminal (PAS + H). Legendas: cabeça de seta - boca; (*) dentes. 32 Dissertação Renata Alari Chedid Figura 12. Características ultraestruturais de Leporinus obtusidens. A: 145 horas após a eclosão B: neuromasto; C: 145 horas após a eclosão; D: 505 horas após a eclosão. Legendas: ls - lábio superior; li – lábio inferior; seta – neuromasto. Barras: A e B: 10μm; C e D: 100μm. 33 Dissertação Renata Alari Chedid b) Esôfago Após a eclosão, não foi possível, nos preparados histológicos, diferenciar o esôfago dos demais componentes do canal alimentar. Somente com a formação da luz intestinal, para formar o intestino anterior, com cerca de 24 HAE, pôde-se observar a região do primórdio do esôfago, conectando a parte caudal do segmento bucofaríngeo à parte cranial do intestino anterior (Fig. 13 A). Com o crescimento dos animais, o esôfago aumentou seu comprimento (Figs.13 C). Nos eleuteroembriões foi possível observar, com cerca de 48 HAE, as primeiras células caliciformes, apresentando secreção metacromática ao azul de toluidina (Fig. 13 B) e a partir de 64 HAE intensa positividade ao PAS e ao AB (Figs. 14 A-F). As células caliciformes aumentaram em número com o desenvolvimento dos animais (Fig.13 E e F). Em relação à concentração das células mucosas, observou-se que estas estão mais concentradas na região posterior do esôfago e desaparecem na região de transição com o estômago (Fig. 13 D). O epitélio esofágico apresenta-se estratificado com alta concentração de células caliciformes. O pólo basal das células epiteliais encontra-se apoiado na lâmina própria, composta por tecido conjuntivo. Com o aumento da idade, a espessura da submucosa também aumenta. A camada muscular foi inicialmente observada com 48 HAE, sendo composta principalmente por musculatura circular. Com o desenvolvimento, o esôfago passou a apresentar a camada muscular composta por fibras estriadas com duas orientações: longitudinal interna e circular externa (Fig. 13 F). 34 Dissertação Renata Alari Chedid Figura 13. Cortes longitudinais de Leporinus obtusidens, evidenciando o desenvolvimento do esôfago (AT). A: 24 horas após a eclosão; B: 48 horas após a eclosão; C: 66 horas após a eclosão; D: 54 horas após a eclosão; E e F: 240 horas após a eclosão. Legendas: bf – bucofaringe; ab – arcos branquiais; es – esôfago; sv – saco vitelino; e – epitélio; sm – sub mucosa; m – camada muscular; et – estômago; c – coração; f – fígado; ml – camada muscular longitudinal; mc – camada muscular circular; seta – boca; cabeça de seta – célula mucosa; (*) – botão gustativo. 35 Dissertação Renata Alari Chedid Figura 14. Cortes longitudinais de esôfago de Leporinus obtusidens, evidenciando os resultados histoquímicos. A: 192 horas após a eclosão (PAS + H); B: 240 horas após a eclosão (AB pH 2,5); C: 600 horas após a eclosção (AB pH 2,50); D: 600 horas após a eclosão (PAS + H); E e F: 720 horas após a eclosão, notar a associação de mucos neutros e ácidos nas células mucosas (*) (AB + PAS). Legendas: bf – bucofaringe; es – esôfago; et – estômago; f – fígado; cabeças de setas – célula mucosa; setas – botão gustativo. 36 Dissertação Renata Alari Chedid c) Estômago A partir de 30 HAE é possível notar o estômago de L. obtusidens como uma extensão do esôfago, sendo caracterizado apenas por conta da substituição do epitélio esofágico estratificado por um epitélio gástrico simples de células cúbicas. Com a diferenciação gástrica, foi evidenciado a presença de glândulas gástricas, em exemplares com apenas 54 HAE (Figs. 15 A e B). Porém somente com 96 HAE foi observada uma região apical PAS positiva no epitélio de revestimento do estômago (Fig. 16 A). Com o crescimento dos animais, o estômago se expandiu e apresentou muitas glândulas gástricas (Figs. 15 B a F) e a superfície apical do epitélio de revestimento apresentou forte reação ao PAS (Figs. 16 B a D). O estômago de L. obtusidens apresenta formato de “U”, podendo ser dividido em três regiões, principalmente pelas características da camada mucosa e pelo espessamento da camada muscular. Assim, o estômago foi dividido nas seguintes regiões: cárdica, com grande concentração de glândulas gástricas e musculatura pouco desenvolvida; fúndica, de transição, com diminuição no número de glândulas gástricas e aumento na espessura da camada muscular; pilórica, sem glândulas gástricas e camada muscular bastante espessa, caracterizando um esfíncter pilórico. A mucosa gástrica é revestida por um epitélio prismático simples, com núcleos basais, que sofre invaginações em direção à lâmina própria, formando as fossetas gástricas. Nestas fossetas desemboca a secreção de glândulas gástricas. Devido a ausência de glândulas gástricas, a região pilórica não apresenta fossetas gástricas, sendo observado uma camada epitelial contínua. Abaixo da camada mucosa, é possível visualizar uma camada submucosa delgada e, externamente a esta, observa-se a camada muscular, composta por uma região interna de fibras orientadas circularmente, e uma camada externa de fibras longitudinais. 37 Dissertação Renata Alari Chedid Fazendo o revestimento externo do estômago observou-se uma fina camada serosa, composta principalmente por um epitélio pavimentoso simples, denominado mesotélio. Figura 15. Cortes longitudinais de Leporinus obtusidens, evidenciando o desenvolvimento do estômago. A e B: 54 horas após a eclosão (AT); C: 240 horas após a eclosão (AT); D: 312 horas após a eclosão (AT); E: 576 horas após a eclosão (HE); F: 840 horas após a eclosão (HE). Legendas: es – esôfago; et – estômago; i – intestino; f – fígado; e – epitélio; gg – glândula gástrica; seta – cripta gástrica. 38 Dissertação Renata Alari Chedid Figura 16. Cortes longitudinais de estômago de Leporinus obtusidens, mostrando os resultados histoquímicos. A: 96 horas após a eclosão (PAS + H); B: 552 horas após a eclosão (PAS + H); C: 720 horas após a eclosão (PAS + H); D: 720 horas após a eclosão (PAS + AB). Legendas: e – epitélio; gg – glândula gástrica; f – fígado; cabeça de seta – superfície apical PAS positiva. 39 Dissertação Renata Alari Chedid d) Intestino Após a eclosão foi possível visualizar o intestino primitivo, formado apenas por um tubo reto (Figs. 17 A, 18 A). Os glóbulos de vitelo eram absorvidos nesse intestino primitivo como o documentado na figura 17. A partir de 32 horas após eclosão, foi possível observar, nos eleuteroembriões de L. obtusidens, a formação de pregas na mucosa do tubo digestivo, concentrando-se principalmente na região posterior. Ao longo do desenvolvimento essas pregas mucosas aumentaram em número e tamanho, formando as pregas intestinais propriamente ditas. Com cerca de 36 HAE, a luz intestinal começou a ampliar-se na região anterior permitindo a visualização de duas regiões: anterior e posterior. A luz do intestino anterior apresentava-se mais ampla em relação ao intestino posterior, porém na região do intestino posterior foi possível observar uma maior quantidade de pregas epiteliais. As primeiras células caliciformes intestinais foram observadas em animais com 96 HAE. O número das células caliciformes aumentou com a idade, mas estas foram observadas em maior concentração no intestino posterior. Em relação às análises histoquímicas, observou-se reações PAS e AB positivas nas células caliciformes (Fig. 19). A partir de 120 HAE foi possível observar quatro regiões intestinais: anterior, com luz ampla e epitélio de revestimento prismático baixo e pequena concentração de células caliciformes (Fig. 18 B); médio, de transição (Fig. 18 C); posterior, com luz estreita, epitélio de revestimento prismático alto e maior concentração de células caliciformes (Fig. 18 C); e reto, com pregas longitudinais e parede mais espessa (Fig. 18 D). O epitélio de revestimento do intestino de L. obtusidens, é prismático simples, formado por células absortivas ou enterócitos e células caliciformes. A camada submucosa é delgada, assim como a camada muscular e serosa. Os cecos pilóricos só foram observados em animais com 240 HAE (Figs. 20). 40 Dissertação Renata Alari Chedid Figura 17. Cortes longitudinais de Leporinus obtusidens, evidenciando a absorção dos glóbulos de vitelo no intestino. A: 12 horas após a eclosão (AB) B: 24 horas após a eclosão (PAS + H); C: 12 horas após a eclosão (AB); D: 24 horas após a eclosão (PAS + H). Legendas: i – intestino; v – vitelo; e – epitélio; cabeça de seta – absorção dos glóbulos de vitelo. 41 Dissertação Renata Alari Chedid Figura 18. Cortes longitudinais de Leporinus obtusidens, evidenciando o desenvolvimento do intestino (AT). A: 48 horas após a eclosão; B e C: 240 horas após a eclosão; D: 312 horas após a eclosão. Legendas: i – intestino; e – epitélio; ia – intestino anterior; im – intestino médio; ip – intestino posterior; pl – prega longitudinal; r – reto. 42 Dissertação Renata Alari Chedid Figura 19. Cortes longitudinais de intestino de Leporinus obtusidens, evidenciando os resultados histoquímicos. A e D: 720 horas após a eclosão (AB pH 2,5); B e C: 768 horas após a eclosão (PAS + H); E: 625 horas após a eclosão (AB pH 2,5); F: 625 horas após a eclosão (PAS + AB). Legendas: e – epitélio; cc – célula caliciforme. 43 Dissertação Renata Alari Chedid Figura 20. Cortes longitudinais de Leporinus obtusidens, evidenciando o aparecimento dos cecos pilóricos. A e B: 624 horas após a eclosão (PAS + H); C e D: 720 horas após a eclosão (HE). Legendas: cp – cecos pilóricos; ia – intestino anterior; f – fígado; e – epitélio; cabeças de setas: células caliciformes. 44 Dissertação Renata Alari Chedid e) Glândulas anexas O fígado e o pâncreas exócrino foram visualizados inicialmente como um aglomerado de células acima da região cranial do saco vitelino e abaixo do primórdio do esôfago. Com a ampliação da luz intestinal, o fígado e o pâncreas passaram a ocupar uma posição cranial ao intestino anterior (Figs. 21 A, B e E). Com a diferenciação dos órgãos do canal alimentar, ocorreu o início da alimentação exógena e neste momento o fígado e o pâncreas já se encontravam bem desenvolvidos. Cabe destacar que o pâncreas exócrino encontrava-se externo ao fígado, caracterizando assim a presença de um pâncreas difuso extra-hepático (Fig. 22 A-D). 45 Dissertação Renata Alari Chedid Figura 21. Cortes longitudinais de Leporinus obtusidens, evidenciando o desenvolvimento do fígado. A: 54 horas após a eclosão (AT); B e C: 120 horas após a eclosão (AT); D: 720 horas após a eclosão (PAS + H); E e F: 720 horas após a eclosão (PAS + AB). Legendas: es – esôfago; et – estômago; f – fígado; p – pâncreas; ia – intestino anterior. 46 Dissertação Renata Alari Chedid Figura 22: Cortes longitudinais de Leporinus obtusidens, evidenciando o pâncreas difuso extra-hepático. A, B, C e D: 54 horas após a eclosão (AT). Legendas: p – pâncreas; f – fígado; et – estômago; (*) – ácinos pancreáticos. 47 5. Discussão ___________________________5 Dissertação Renata Alari Chedid 5. DISCUSSÃO A temperatura utilizada para o desenvolvimento embrionário de Leporinus obtusidens foi de 28ºC em média. Essa temperatura é considerada ótima para o desenvolvimento de peixes tropicais (KIMMEL et al., 1995). Os ovos de peixes são classificados como telolécitos devido à grande quantidade e distribuição de vitelo (RIBEIRO et al., 1999; GANECO, 2003). L. obtusidens apresentam esse tipo de ovo, já que possuem clivagem do tipo meroblástica ou parcial, ocorrendo apenas no pólo animal. O desenvolvimento embrionário rápido apresentado por L. obtusidens parece ser comum a outras espécies com a mesma estratégia reprodutiva como Leporinus friderici (SANCHES et al., 2001). O espaço perivitelino muito amplo observado em L. obtusidens é uma característica comum às espécies migradoras que desovam em ambientes lóticos. Este fato é provavelmente, um mecanismo adaptativo para diminuir a ação de choques mecânicos provocados pela correnteza e, desta maneira, garantir a sobrevivência do embrião. Além de L. obtusidens, esta característica pode ser observada em ovos de outras espécies de peixes migradores, como pintado, Pseudoplatystoma corruscans (CARDOSO et al., 1995) e piau de três pintas, L. friderici (SANCHES et al., 2001). Durante a clivagem observou-se que os blastômeros sofreram divisões mitóticas simétricas e simultâneas, assim como descrito por Sampaio (2006), para quatro espécies de peixes de interesse comercial da Bacia do Rio São Francisco (Brycon orthotaenia, Leporinus obtusidens, Prochilodus argenteus e Salminus brasiliensis). Em L. obtusidens notou-se que os glóbulos de vitelo fragmentam-se penetrando nos blastômeros, o que facilitaria a sua absorção pelas células, tal evento também foi reportado por Ninhaus-Silveira et al. (2006) para Pimelodus lineatus e Buzollo et al. (2011) em estudo com Pimelodus maculatus. 48 Dissertação Renata Alari Chedid De acordo com Kimmel et al. (1995) a camada sincicial do vitelo ou periblasto constitui um órgão encontrado apenas em teleósteos, se posicionando de forma extraembrionária. Portanto, não contribui para formação do embrião, sendo importante na quebra do vitelo, tornando-o viável para o desenvolvimento do embrião. Em Leporinus obtusidens, a formação do periblasto ocorreu na fase de mórula assim como descrito por Long e Ballard (1976) em Catostomus commersoni. Por outro lado Ganeco (2003) e Faustino et al. (2010), observaram a formação do periblasto na fase de blástula em Oryzias latipes e Brycon gouldingi, respectivamente. Com relação à importância da camada sincicial na incorporação do vitelo pelo embrião, as projeções de membrana que se estendiam entre os glóbulos de vitelo, bem como a presença de glóbulos de vitelo na região da camada sincicial próximo da blastoderme em Leporinus obtusidens, indicam que o material vitelino é quebrado por meio de enzimas hidrolíticas como sugerido por Lentz e Trinkaus (1967) e então transferidos para a blastoderme. Pode-se inferir que o material nutritivo passa pela membrana plasmática na forma de pequenas moléculas. Em L. obtusidens foi observada a formação de uma blastocele, na forma de espaços irregulares entre algumas células da blastoderme, como descrito por vários autores (KIMMEL e LAW, 1985; KIMMEL et al., 1995; GANECO, 2003) para outras espécies de teleósteos. O estágio de gástrula se inicia com o começo do movimento de epibolia (LEME dos SANTOS e AZOUBEL, 1996) e se completa com o fechamento do blastóporo pela blastoderme e formação do botão da cauda (KIMMEL et al., 1995). No presente trabalho, esta fase teve início às três horas e cinco minutos do desenvolvimento à temperatura média de 28ºC. Esta fase para Pseudoplatystoma coruscans (CARDOSO et al., 1995) foi observada às seis horas do desenvolvimento, estando à temperatura de incubação entre 23,5 e 25ºC. 49 Dissertação Renata Alari Chedid O início da somitogênese ocorreu após o término da epibolia e fechamento do blastóporo como também descrito em Leporinus piau (BORÇATO et al., 2004) e P. lineatus (NINHAUS-SILVEIRA et al., 2006). No estágio de segmentação observaram-se os somitos, a formação da notocorda, do tubo neural, da delimitação intestinal inicial, o alongamento do embrião (principalmente no eixo céfalo-caudal) vesícula óptica, vesícula ótica, cauda presa, sendo seu término marcado pelo despregamento da cauda. Morrison et al. (2001) encontraram a vesícula de Kupfer nas fases iniciais do estágio de segmentação. Ninhaus-Silveira et al. (2006), observaram essa vesícula em estágio de neurula. Muitos outros autores também relatam o aparecimento da vesícula de Kupfer, porém, neste trabalho não foi possível visualizar-la, sendo necessárias coletas com novos protocolos. Como na maioria das espécies migradoras, os eleuteroembriões de L. obtusidens eclodem com olhos não pigmentados, boca fechada e tubo digestivo indiferenciado. A pigmentação dos olhos e a abertura da boca são eventos que ocorrem após a eclosão e estão diretamente relacionados com o início da alimentação exógena (SANCHES et al., 2001). As larvas recém-eclodidas de Leporinus obtusidens apresentaram maxilas pouco desenvolvidas, olhos sem pigmentação e saco vitelínico grande, essas características são observadas na maioria das larvas de peixes neotropicais de água doce (NAKATANI et al., 2001). O grau de diferenciação da larva recém-eclodida varia entre as espécies, dependendo do tamanho do ovo (BLAXTER, 1969). Espécies que apresentam ovos pequenos e alta fecundidade têm o desenvolvimento embrionário mais rápido e larvas menos desenvolvidas, enquanto as que apresentam ovos grandes e baixa fecundidade têm desenvolvimento embrionário prolongado e maior grau de desenvolvimento das larvas (SATO et al., 2003). Anarhichas lupus apresenta ovos grandes e larvas recém-eclodidas semelhantes aos juvenis, mantendo poucas características larvais como a presença do saco vitelínico (FALK- 50 Dissertação Renata Alari Chedid PETERSEN e HANSEN, 2001), enquanto espécies com larvas pouco desenvolvidas apresentam ovos pequenos, tais como Leporinus macrocephalus (REYNALTE-TATAJE et al., 2001); Leporinus piau (BORÇARTO et al., 2004), Leporinus taeniatus (PADILHA, 2003) e Prochilodus lineatus (SILVEIRA, 2004) . A mudança da alimentação endógena para exógena é uma fase crítica do desenvolvimento inicial, apresentando, freqüentemente, altos índices de mortalidade das larvas. Na maioria das larvas, durante a fase de primeira alimentação, o tubo digestivo é curto, está relativamente indiferenciado e apresenta baixa atividade de enzimas digestivas (GORDON e HECHT, 2002). Na espécie estudada observou-se que o tubo digestivo apresentava-se morfologicamente indiferenciado em indivíduos nos primeiros estágios de vida, esse resultado corrobora estudos feitos com outras espécies do gênero Leporinus (PADILHA, 2003; BORÇARTO et al., 2004). A posição, formato e tamanho da boca estão intimamente relacionados aos hábitos alimentares e à forma de apreensão do alimento (NIKOLSKY, 1963). A boca terminal e subterminal é característica de peixes carnívoros adultos, o que provavelmente facilita a captura das presas (SINHA e MOITRA, 1975). Entretanto, a espécie estudada, L. obtusidens, é considerada onívora e possui boca subterminal. Leporinus reinhardti (MENIN e MINURA, 1991), Brycon orbignyanus (RODRIGUES e MENIN, 2002) e Leporinus friderici (SEIXAS FILHO, 1998) são outros exemplos de peixes onivoros com boca subterminal. Segundo Sampaio (2006), Leporinus obtusidens alimenta-se predominantemente de zooplâncton na fase larval, nesse sentido a boca subterminal observada nas larvas da espécie em estudo, ofereceu vantagens para a captura do alimento na coluna dʼágua. O mesmo foi observado por Borges et al. (2006), em estudo com larvas de Bryconamericus aff. iheringii. Os lábios e estruturas relacionadas apresentam adaptações à natureza do alimento e aos hábitos alimentares (AGRAWAL e MITTAL, 1992). Os lábios de L. obtusidens, em especial o 51 Dissertação Renata Alari Chedid inferior, apresenta-se mais espesso e possui maior mobilidade, auxiliando na captura eficiente de alimento. De acordo com Moshin (1962), nos peixes herbívoros e onívoros, em contraste com os peixes carnívoros, os dentes não são bem desenvolvidos, o que está correlacionado com a natureza da dieta, que consiste em animais de pequeno porte, sementes aquáticas e algas, além de substâncias inertes ingeridas junto com estes itens alimentares. No entanto, L. obtusidens apresenta dentição oral desenvolvida, assim como outras espécies onívoras, como Leporinus friderici (SEIXAS FILHO, 1998) e L. macroceplalus (RODRIGUES et al., 2006). Quanto às características morfológicas do esôfago de eleuteroembriões de L. obtusidens foi possível observar, inicialmente, que este apresentava-se curto e posteriormente, foi aumentando com o desenvolvimento dos animais. Segundo Luizi et al. (1999), a proliferação celular do esôfago é importante para a distensão do órgão durante a deglutição, bem como para aumentar a superfície de contato com o alimento (FERRARIS et al., 1987). De acordo com Kozaric et al. (2008), em Silurus glanis com cinco dias após a eclosão, as células mucosas do epitélio esofágico começaram a secretar mucosubstâncias ácidas e neutras. Em L. obtusidens as reações PAS e AB positivas foram observadas com pouco mais de cinco dias. Segundo Galvão et al. (1997b), a formação das células mucosas indica que o esôfago está pronto para receber alimento exógeno, uma vez que sua secreção protege o epitélio de revestimento contra abrasão e lesão provocada pela passagem do alimento. As primeiras partículas de alimento foram observadas no intestino de L. obtusidens com pouco mais de quatro dias após a eclosão, e neste momento o esôfago já apresentava inúmeras células mucosas e o intestino encontrava-se dividido em uma região anterior e outra posterior, com escassas células caliciformes. O estômago era visto como uma estrutura sacular contendo muitas glândulas gástricas. Contudo, as reservas de vitelo ainda foram 52 Dissertação Renata Alari Chedid observadas até o inicío do quinto dia após a eclosão. Resultados semelhantes foram descritos por Sampaio (2006), trabalhando com larvas da mesma espécie. Considerando que as larvas já estavam ingerindo alimento exógeno, com quatro dias após a eclosão e ainda possuíam reservas de vitelo, pode-se afirmar que estas apresentam um período de alimentação mista (endógena e exógena) com duração de aproximadamente um dia, e a partir de então, dependem exclusivamente de alimento exógeno. No entanto, em larvas de Silurus glanis, a alimentação exógena se inicia no quarto dia após a eclosão e a alimentação endógena termina apenas no sétimo dia após a eclosão, conferindo assim três dias de alimentação mista. (KOZARIC et al. 2008). Segundo Chen et al. 2006, embora as larvas de Seriola lalandi não terem crescido significativamente durante o período de alimentação mista, este período foi considerado crítico para o desenvolvimento de órgãos do tubo digestivo. De acordo com Kozaric et al. (2008), durante o período de alimentação mista, foi observado em Silurus glanis a diferenciação do esôfago, estômago e do intestino. Com 54 HAE é possível observar muitas glândulas gástricas no estômago de L. obtusidens. Segundo Kozaric et al. (2008), o aparecimento de glândulas gástricas indica que as larvas de peixes podem funcional e enzimaticamente digerir alimentos. Segner et al. (2007) demonstraram que a diferenciação do estômago é um acontecimento decisivo na fisiologia nutricional de larvas. Dois dias após a observação das primeiras glândulas gástricas em larvas de L. obtusidens, foi possível observar uma fina camada PAS-positiva na superfície apical do epitélio gástrico, indicativo de mucosubstâncias neutras. A presença destas mucosubstâncias (PAS-positivas) protegem o epitélio gástrico contra a auto-digestão provocada por ácido e enzimas digestivas produzidas pelas glândulas gástricas (GISBERT et al., 2004). Em Paralabraxmaculato fasciatus, o estômago, três dias após a eclosão, apresenta epitélio cúbico simples e células com borda em escova. Porém, não foi observada presença de 53 Dissertação Renata Alari Chedid glândulas gástricas antes do 16° dia após eclosão (PEÑA et al., 2003). Em Solea senegalensis o estômago não se desenvolveu até o 13° dia após a eclosão e as glândulas gástricas só foram observadas 27 dias após a eclosão (RIBEIRO et al., 1999). Nessas espécies o armazenamento, bem como a digestão e a absorção de nutrientes provavelmente ocorre inicialmente no intestino, razão pela qual este órgão apresenta algumas estruturas saculares, como bolsas para armazenar e possibilitar a digestão do alimento. Mai et al. (2005), observaram em Pseudosciaena crocea, que antes do desenvolvimento das glândulas gástricas, esta espécie depende principalmente do pâncreas e do intestino para digestão dos nutrientes. Govoni et al. (1986), propuseram que a pinocitose e digestão intracelular são os principais mecanismos de absorção de proteínas em larvas durante a ausência de um estômago funcional. No presente estudo larvas com apenas quatro dias já apresentavam estômago com muitas glândulas gástricas e reação positiva ao PAS, o que provavelmente indica que esse estômago seja funcional. A ocorrência de células caliciformes é uma característica comum do trato digestório de teleósteos (KAPPOOR et al., 1975). A secreção de mucossubstâncias pelas células caliciformes têm sido correlacionadas com diferentes funções digestivas. Tibbets (1997) observou que as glicoproteínas neutras produzidas pelas células caliciformes são menos viscosas que o muco AB positivo produzido em outras partes do canal alimentar. Carrasson et al. (2006) propôs que as mucossubstâncias ácidas protegem o epitélio intestinal contra degradação pela ação das glicosidases. As mucossubstâncias ácidas ricas em grupamentos sulfatados também são inibidoras das proteases pépticas, previnem infecções bacterianas, protegem as mucosas de ações mecânicas que possam sofrer e podem fornecer co-fatores requeridos para a quebra enzimática do alimento, essencial para uma efetiva absorção e para a ação das enzimas (ULIBARRIE, 1982). Essas mucossubstâncias ácidas, especialmente as sulfatadas no intestino, possivelmente regulam a transferência de proteínas ou de fragmentos, bem como de íons e fluídos (PETRINEC et al., 2005). Os estudos de Ribelles et al. (1995) revelaram que a qualidade das 54 Dissertação Renata Alari Chedid mucossubstâncias do tubo digestivo está diretamente relacionada às condições ambientais, que podem afetar a funcionalidade do sistema digestório. As primeiras células caliciformes intestinais foram observadas com 96 HAE em L. obtusidens. O número de células caliciformes aumentou com a idade e ainda foi possível observar uma maior concentração deste tipo celular no intestino posterior. Kozaric et al. (2008), obtiveram resultados semelhantes em Silurus glanis, observando que as células caliciformes apareceram no quinto dia após a eclosão e que estas aumentaram em número com desenvolvimento das larvas e também são mais abundantes na região posterior do intestino. Com relação às glândulas anexas do tudo digestivo de L. obtusidens, essas começaram a se desenvolver cerca de um dia após a eclosão. O fígado é um órgão constituído de hepatócitos organizados em placas celulares, circundadas por sinusóides, conforme encontrado em muitos teleósteos (KENDALL e HAWKINS, 1975; VICENTINI et al., 2005). Essa organização estrutural é conhecida como “muralha dupla” e foi descrita segundo Bruslè e Anadon (1996), estudando tecido hepático de teleósteos em geral. De acordo com Ober et al. (2003), a diferenciação das células endodérmicas da porção ventral do intestino em hepatócitos requer a interação dessas células com tecidos adjacentes, como o mesoderma cardíaco, através da sinalização de proteínas da família das BMP (Bone Morphogenic Proteins) e membros da família das FGF (Fibroblast Growth Factor). O pâncreas de L. obtusidens é do tipo difuso e extra-hepático. Porém, Siqueira-Bombonato et al., (2007), observaram, em exemplares adultos de L. macrocephalus, presença de tecido pancreático exócrino intra-hepático. 55 __________________________6 6. Conclusões Dissertação Renata Alari Chedid 6. CONCLUSÕES Após a análise dos resultados obtidos neste estudo, bem como a comparação com a literatura, pode-se concluir que: - A delimitação intestinal inicial foi observada no estágio de segmentação. - Os animais apresentam reservas endógenas até cerca de cinco dias após a eclosão. - As larvas de Leporinus obtusidens estão morfologicamente prontas para sobreviverem com alimentação exógena a partir do quarto dia após a eclosão. - O aparecimento das células mucosas esofágicas indica que o esôfago está pronto para receber alimentação exógena a partir do terceiro dia após a eclosão. - O aparecimento de uma superfície apical PAS positiva no epitélio gástrico a partir do quinto dia após a eclosão indica o estado funcional do estômago. - Com cerca de 10 dias após a eclosão, esôfago, estômago, intestino, fígado e pâncreas estão totalmente diferenciados e funcionais, enquanto que os cecos pilóricos aparecem mais tardiamente. 56 ________7 7. Referências Bibliográficas Dissertação Renata Alari Chedid 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AGRAWAL, N.; MITTAL, A.K. Struture and histochemistry of the epithelium of lips and associated strutures of a catfish, Rita rita. Japanese Journal of Icthyology, v.39, n.1, p.93-102, 1992. AL-HUSSAINI, A.H. On the functional morphology of the alimentary tract of some fish in relation to differences in their feeding habits. II. Cytology and physiology. Quaeterly Journal of Microscopical Science, Oxford, v.90, p.323-354, 1949. ANDRIAN, I.F. Espectro alimentar e similaridade da dieta de quatro espécies de Leporinus do Rio Paraná. Revista Unimar, v.16, p.97-107, 1994. BALDISSEROTTO, B. Fisiologia de peixes aplicada à piscicultura. Santa Maria: Ed. UFSM, 2002. BALINSKY, B.L. Introduction to embryology. Philadelphia: Saunders Company. 698p, 1970. BALON, E.K. Epigenetic processes, when natura non facit saltum becomes a myth, and alternative ontogenies a mechanism of evolution. 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