Artigo 04

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Artigo Original
Carcinoma basoescamoso na cidade de Loja, Equador
Basosquamous carcinoma in the city of Loja, Equador
Resumo
Introdução: O Equador encontra-se na latitude 0 grau, 0’0’’,
posição terrestre exposta a maior quantidade de radiação solar
do planeta, especialmente aos raios UVA e UVB que predispõe
a dano solar e aparecimento de câncer de pele. Objetivos:
Nesse contexto, decidimos descrever a presença de carcinoma
basoescamoso em uma cidade ao sul do Equador. Casuística
e Métodos: Realizamos uma revisão de prontuários dos
pacientes com diagnóstico de carcinoma basocelular da
região cérvico-facial submetidos a cirurgia como tratamento,
entre 2009 e 2013 no único hospital oncológico da cidade.
Resultados: Encontramos 186 carcinomas basocelulares e 17
desses tumores eram basoescamosos. A maior porcentagem
desse tipo de tumor afetaram principalmente mulheres; a idade
média foi 54,9 anos. A raça branca foi mais afetada (58,8%),
com elevada taxa relativa de não-brancos (41,2%). Nariz,
lábio e couro cabeludo foram as áreas mais acometidas. Dez
casos apareceram em zona de alto risco (58,8%). A invasão
perineural e angiolinfática esteve presente em mais da metade
dos casos. Nossos resultados mostram uma frequência
superior de carcinomas basoescamosos entre os carcinomas
basocelulares em relação a maior parte das publicações
internacionais. As razões para tal achado são multifatoriais e
podem incluir viés de seleção, distribuição étnica diferenciada
da população equatoriana e maior incidência de radiação solar
nesta região.
Oscar Jaramillo 1,
Johanna Castillo 2
André Bandiera de Oliveira Santos 3
Cláudio Roberto Cernea 4
Lenine Garcia Brandão 5
Abstract
Introduction: Equador is at 0, 0’0’ degrees latitude, therefore
is exposed to a largest amount of solar radiation the planet,
especially to UVA and UVB rays what predisposes to cell damage
and the onset of skin cancer. Objectives: In this context, we
decide to describe the presence of the basosquamous carcinoma
in one city at the south of Equador. Casuistics and Methods:
We realize a review from medical charts of every patient with the
diagnosis of cervicofacial basal cell carcinoma and that went to
surgery for treatment, during the period from 2009 and 2013 at the
only oncological hospital in the city. Results: We found 186 basal
cell carcinomas and 17 of these tumors were basosquamous
carcinomas. The highest percentage of this kind of tumor affected
mostly women, the mean age was 54,9 years. The white people
was the most affected (58,8%), with a relative high rate of nonwhites (41,2%). The nose, lips and scalp were the areas that arise
this tumor. Ten of the cases appear in the high risk zone (58,8%).
Characteristics such as perineural and angiolymphatic were
present in more than half of the patients.
Key words: skin, basal cell carcinoma, basosquamous carcinoma,
treatment.
Palavras-chave: pele, carcinoma basocelular, carcinoma
basoescamoso, tratamento
Introdução
O Equador se encontra na latitude 0 grau, 0’0’’,
posição terrestre exposta a maior quantidade de radiação
solar do planeta (Figura 1). Tal exposição, em especial
aos raios UVA1 e UVB2, predispõe a dano celular e ao
aparecimento de neoplasias cutâneas.
O carcinoma basoescamoso, também conhecido
como metatípico, é um tipo de câncer de pele não
melanoma que reúne características dos carcinomas
basocelulares e espinocelulares3. Foi descrito em 1928
como uma entidade diferente devido a histologia e
comportamento clínico peculiares4, que incluem maior
agressividade local e elevado potencial metastático5,6
1)Cirurgião de Cabeça e Pescoço pela Universidade de São Paulo, Brasil.
2)Residente do Hospital Oncológico SOLCA Loja, Equador.
3)Cirurgião de Cabeça e Pescoço, Médico Assistente Doutor do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (ICESP), Brasil.
4)Professor Livre-Docente. Professor Associado da Disciplina de Cirurgia de Cabeça e Pescoço da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, São Paulo.
5)Livre Docente. Professor Titular - Disciplina de Cirurgia de Cabeça e Pescoço da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
Instituições: Sociedad Oncológica de Lucha Contra el Cancer (SOLCA) e Instituto do Cãncer do Estado de São Paulo - Disciplina de Cirurgia de Cabeça e Pescoço da Faculdade de Medicina da USP.
São Paulo / SP - Brasil
Correspondência: André Bandiera - Av. Dr. Arnaldo, 251 - Cerqueira César - São Paulo - SP - CEP: 01246-000 | Tel.: 11 3893-2000
Artigo recebido em 02/03/2014; aceito para publicação em 16/03/2014; publicado online em 31/03/2014.
Conflito de interesse: não há. Fonte de fomento: não há.
Rev. Bras. Cir. Cabeça Pescoço, v.43, nº 1, p. 17-22, janeiro / fevereiro / março 2014 ––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– 17
Carcinoma basoescamoso na cidade de Loja, Equador.
Jaramillo et al.
Figura 1. Loja, Equador
Figura 2. Microscopia de carcinoma basoescamoso, aumento de 10x.
Observa-se formação de células em paliçada, inferiormente células
com características basalóides e acima parte escamosa com formação
de pérolas córneas
quando comparado a outros subtipos de carcinoma
basocelular. Esse tipo de neoplasia é muito infrequente
e representa de 1,2 a 2,7% de todos os cânceres de pele
não melanocíticos segundo a OMS7. São conhecidos
dois tipos: misto e intermediário. Histologicamente o tipo
misto mostra uma queratinização focal que consiste em
pérolas com centro coloidal e paraqueratótico (Figura
2); já o tipo intermediário mostra dentro de uma rede
uma fila externa de células basais e uma capa interna
de células que aparentam ser maiores, claras e melhor
definidas que as células basais (essa característica
celular é considerada intermediária entre células basais
e escamosas) 8,9.
A ocorrência desse tipo de tumor é mais comum
nas regiões de cabeça e pescoço e menos frequente no
tórax e em extremidades. É encontrada predominância
no sexo masculino e na sétima década de vida10. Assim
como outros tipos de câncer de pele, a incidência é
grande na Austrália, onde a maior parte da população
possui pele clara e não houve grande miscigenação.
Ainda que em menor proporção, essa distribuição parece
também ocorrer em Loja; contudo não há estudos sobre
a frequência de carcinoma basoescamoso nessa cidade
equatoriana.
O objetivo deste estudo é descrever a casuística de
carcinomas basoescamosos na cidade de Loja, Equador.
CAsuÍstICA e mÉtodos
Foi realizada análise retrospectiva dos prontuários
dos pacientes operados por carcinoma basocelular
submetidos a tratamento cirúrgico entre 2009 e
2013 na Sociedad Oncológica de Lucha Contra el
Cancer (SOLCA), na cidade de Loja, Equador. Foram
selecionados para análise os portadores de carcinomas
basoescamosos na região cervicofacial, sendo excluídos
os demais.
Foram anotados os dados referentes a idade, sexo,
raça, localização topográfica, zona de risco, tamanho
tumoral, margens cirúrgicas, subtipos histológicos
associados e a presença de invasão angiolinfática e
perineural.
A região cervicofacial foi dividida conforme estudo
de Andrade et al nas seguintes localizações: cervical,
couro cabeludo, fronte, malar, orelha, pálpebra e
sulco nasogeniano. Para a classificação das zonas
de risco foi utilizada a classificação da NCCN para o
câncer de pele não melanoma11. Por definição, não
há classificação de baixo risco em cabeça e pescoço,
havendo moderado e alto risco. O tamanho tumoral
foi definido como a maior dimensão do tumor definida
pelo patologista quando do exame macroscópico.
Os dados histológicos foram obtidos do exame
anatomopatológico final.
18 –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– Rev. Bras. Cir. Cabeça Pescoço, v.43, nº 1, p. 17-22, janeiro / fevereiro / março 2014
Carcinoma basoescamoso na cidade de Loja, Equador.
Jaramillo et al.
Resultados
Foram obtidos dados de 186 carcinomas
basocelulares operados, sendo 17 basoescamosos,
conforme mostram a Tabela 1 e o Gráfico 1. Onze deles
foram encontrados em pacientes do sexo feminino
(64,7%), incluindo a paciente da Figura 3. A idade média
é de 54,9 (+-8,9) anos.
Foi encontrada maior frequência de pacientes da
raça branca (10 casos, 58,8%) e mestiços (5 casos,
29,4%), havendo 2 pacientes da raça negra (11,8%).
As localizações tumorais mais encontradas estão
representadas na Tabela 2. Nenhum caso foi descrito
nas localizações orelha, malar e sulco nasogeniano.
Dez casos foram encontrados em zona de alto risco
(58,8%) e sete (41,2%) na zona de risco intermediário. O
tamanho médio é 1,48(+- 0,6) cm.
Frequência de carcinomas em Loja,
Equador, n=186
Basocelulares
Basoescamosos
9%
91%
Gráfico 1. Frequência de carcinomas basocelulares e basoescamosos
em Loja, Equador
Gráfico 1. Frequência de carcinomas basocelulares e basoescamosos em Loja, Equad
Foi encontrada maior frequência de pacientes da raça branca (10 casos, 58,8%) e m
(5 casos, 29,4%), havendo 2 pacientes da raça negra(11,8%).
Tabela 1. Frequência de carcinomas basocelulares e Tabela 2. Local do tumor primário entre os basoescamosos.
As localizações tumorais mais encontradas estão representadas na Tabela 2. Nenhu
basoescamosos.
Tumor
Número
Basocelulares
169
Basoescamosos
17
186
Localização
Número
Porcentagem
foi descrito nas localizações orelha, malar e sulco nasogeniano. Dez casos
nariz
5
29,6
encontrados em zona de alto risco (58,8%) e sete (41,2%) na zona de risco intermed
90,9 %
labio
4
23,5
tamanho médio é 1,48(+0,6) cm.
Porcentagem
9,1%
couro cabeludo
3
17,7
100%
fronte
2
11,7
regiao cervical
2
11,7
pálpebra
1
5,8
Associados aos carcinomas basoescamosos, foram observados os subtipos nodu
Total
17
100%
76,4%, além de superficial
e esclerodermiforme
(5,8% cada). Não
foram descritos s
Figura 3. Aspecto clínico de paciente com carcinoma basoescamoso de pálpebra de nossa casuística.
Rev. Bras. Cir. Cabeça Pescoço, v.43, nº 1, p. 17-22, janeiro / fevereiro / março 2014 ––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– 19
Carcinoma basoescamoso na cidade de Loja, Equador.
Jaramillo et al.
Associados aos carcinomas basoescamosos, foram
observados os subtipos nodular em 76,4%, além de
superficial e esclerodermiforme (5,8% cada). Não foram
descritos subtipos histológicos associados em dois
casos. Em todos os casos as margens de ressecção
foram livres.
A frequência de invasão perineural foi 64,7%
enquanto, 58,8% dos casos apresentaram invasão
histológicos associados em dois casos.
angiolinfática, como mostra o Gráfico 2.
multifatoriais e podem incluir viés de seleção, distribuição
étnica diferenciada da população equatoriana e maior
incidência de radiação solar.
As mulheres são o grupo mais afetado no nosso
estudo e em estudos internacionais 13,3, com idade
média de 54 anos. Classicamente associadas a pessoas
de pele clara, olhos claros, cabelos loiros e ruivos, as
neoplasias de pele são os tumores mais incidentes
Em
todos os casos as margens de ressecção for
da raça humana. Foi encontrado, no entanto, entre os
casos de Loja, alta frequência em pessoas não brancas,
livres.
Discussão
chegando a 41%. Isso pode ser explicado, ao menos em
parte, por uma maior proporção de mestiços entre os
Nossos resultados mostram uma frequência superior equatorianos (Figura 4).
de carcinomas basoescamosos entre os carcinomas
Confirmando achados de nosso grupo em
A frequência
de ainvasão
foi recente
64,7%publicação
enquanto
dos casos
apresenta
basocelulares
em relação
maior parteperineural
das publicações
de 58,8%
casos atendidos
em São
12
internacionais . As razões para tal achado são Paulo, Brasil, em que foram notáveis os achados de
invasão angiolinfática, como mostra o gráfico 2.
Invasão Angiolinfática e Perineural
Invasão Perineural
Invasão Angiolinfática
54
56
58
60
62
64
66
Gráfico 2. Frequência (%) de invasão perineural e angiolinfática entre os carcinomas basoescamosos
Gráfico 2. Frequência (%) de invasão perineural entre os carcinomas basoescamosos
Discussão
Nossos resultados mostram uma frequência superior de carcinomas basoescamosos entr
carcinomas basocelulares em relação a maior parte das publicações internacionais 12.
razões para tal achado são multifatoriais e podem incluir viés de seleção, distribuição étn
diferenciada da população equatoriana e maior incidência de radiação solar.
As mulheres são o grupo mais afetado no nosso estudo e em estudos internacionais
com idade média de 54 anos. Classicamente associadas a pessoas de pele clara, ol
claros, cabelos loiros e ruivos, as neoplasias de pele são os tumores mais incidentes da r
humana. Foi encontrado, no entanto, entre os casos de Loja, alta frequência em pessoas
brancas, chegando a 41%. Isso pode ser explicado, ao menos em parte, por uma m
Figura 4. Pintura de homem espanhol e mulher índia com bebê mestiço, autor anônimo, 1770. Domínio
proporção de
mestiços
entre osda população
equatorianos.
público.
A grande miscigenação
equatoriana pode ser um fator importante para a elevada
taxa de não brancos com carcinoma basoescamoso nessa casuística.
Confirmando achados de nosso grupo em recente publicação de casos atendidos em
Paulo, Brasil, em que foram notáveis os achados de carcinomas basoescamosos em m
20 R���������������������������������������������� Rev. Bras. Cir. Cabeça Pescoço, v.43, nº 1, p. 17-22, janeiro / fevereiro / março 2014
Figura 5. Detalhe das alterações observadas no carcinoma basoescamoso. Observa-se na
metade superior da foto, à direita, invasão perineural.
carcinomas basoescamosos em maior proporção na
região cervical e no couro cabeludo14, foi observada
frequência inesperadamente elevada de carcinomas
basoescamosos em região de risco moderado
(classificação NCCN), em especial na localização em
couro cabeludo15. Apesar de ser um subtipo de maior
agressividade local e com características histológicas
de maior malignidade, o carcinoma basoescamoso foi
mais encontrado em zonas de risco moderado do que os
outros carcinomas basocelulares.
A frequência de invasão perineural entre os
carcinomas basocelulares em geral é inferior a 5%.
Entre os basoescamosos são descritas frequências
mais elevadas, como a observada em nosso estudo
(Figura 5). A invasão angiolinfática é ainda mais rara
e sua ocorrência é associada ao desenvolvimento de
metástases linfáticas, em frequência intermediária à
do espinocelular e aos raros casos de metástases de
carcinoma basocelular.
Conclusão
A frequência de carcinomas basoescamosos em
Loja, Equador é de 9% dos carcinomas basocelulares.
Foram encontradas características peculiares como alta
frequência entre não-brancos, localização em couro
cabeludo e zona de risco moderado, assim como altas
taxas de invasão angiolinfática e perineural.
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22 R���������������������������������������������� Rev. Bras. Cir. Cabeça Pescoço, v.43, nº 1, p. 17-22, janeiro / fevereiro / março 2014
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