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19 • CORREIO BRAZILIENSE • Brasília, terça-feira, 26 de junho de 2012
Descoberta mutação genética
ligada ao câncer de pênis
De acordo com pesquisadores, a alteração torna a doença ainda mais agressiva ao organismo. Estima-se que todo o ano mil órgãos são
amputados devido às complicações do tumor, que, segundo médicos, pode ser evitado com a adoção de hábitos simples de higiene
esquisadores identificaram uma mutação genética relacionada a um
dos tipos de câncer de
pênis mais agressivos. O trabalho realizado por médicos do
Hospital do Câncer A. C. Camargo, em São Paulo, mostrou que
as alterações têm um efeito mais
invasivo ao organismo, causando maior mortalidade de pacientes. Segundo o Instituto Nacional de Câncer (Inca), em
2009, foram detectados 4.637
casos da doença — uma média
de quase 13 por dia. No ano seguinte, 363 morreram da doença no país. Não bastasse os preocupantes dados, como o diagnóstico é normalmente realizado tardiamente, o tratamento
eficaz é a amputação total ou
parcial do órgão. A Sociedade
Brasileira de Urologia (SBU) estima que pelo menos mil pênis
são amputados todos os anos
em decorrência da doença.
De acordo com Isabela Werneck, patologista do hospital e
participante do estudo, existem
vários tipos de tumores que podem acometer o pênis. O mais
comum é o carcinoma espinocelular, que têm muitas variantes, o que confere prognósticos
distintos. Ou seja, indicações diferentes de tratamento. Ela explica que o gene p53 é um gene
supressor de tumor. Em condições normais, ele é capaz de detectar alterações gênicas que levam a célula à morte, impedindo a proliferação da estrutura
defeituosa.
“Quando há alterações nesse
gene e ou em sua proteína, os
defeitos gênicos ocorrem e passam despercebidos com mais
facilidade, contribuindo para o
aparecimento de diversos tipos
de câncer, entre eles, o carcinoma de pênis”, descreve. No estudo, foi avaliada a expressão da
proteína p53, assim como a mutação e as alterações numéricas
do gene por meio de técnicas de
P
sequenciamento e de hibridização in situ — técnica utilizada
para identificar sequências específicas de nucleotídeos em
células ou em cortes histológicos. “Observamos que pacientes
com o tumor que tem um aumento da expressão dessa proteína evoluem pior, têm maior
risco de óbito, uma vez que esses tumores se tornam mais
agressivos”, destaca.
É um problema que causa danos físicos e psicológicos.
Acomete principalmente pacientes com mais de 50 anos,
embora já tenha visto casos de garotos com 20 anos”
Flávio Guimarães, urologista
Alta incidência
Problema cultural
Segundo especialistas, a higienização do pênis é a única
prevenção contra o câncer no órgão. Embora a glande possa estar
sensível, é preciso puxar a pele
para trás, de maneira que permita a retirada de todo o esmegma
— secreção de coloração branca
produzida pelo aparelho reprodutivo. De acordo com Flávio
Guimarães, urologista do Hospital de Base do Distrito Federal,
acredita-se que seja justamente
essa substância a responsável
pelo surgimento da doença. Ela é
resultante de um processo inflamatório crônico no saco prepucial (a pele que reveste o pênis),
causando uma degeneração maligna. O agente cancerígeno em
si ainda não foi identificado.
De acordo com Werneck, o
HPV também é um fator relacionado ao câncer de pênis. Mas
não há provas diretas de que ele
seja um causador do tumor no
órgão, mesmo sua presença sendo identificada em 30% a 70%
dos casos diagnosticados. “Alguns trabalhos apontam para
que a presença do vírus associada à falta de higiene e ao tabagismo possa aumentar o risco
de desenvolvimento do câncer”,
salienta.
Guimarães conta que o câncer
de pênis é raro em países desenvolvidos e mais comum nos subdesenvolvidos e em desenvolvimento. “Para se ter uma ideia, enquanto no Brasil essa doença representa cerca de 2% dos tipos de
câncer, nos Estados Unidos é
O Brasil está entre os países
líderes de incidência de HPV.
São mais de 685 mil pessoas
com o vírus. A estimativa é de
que 10% a 20% dos adultos
sexualmente ativos tenham a
doença. Desses, 1% desenvolve
o condiloma clássico.
Quarenta e seis por cento das
mulheres entre 20 a 30 anos
têm o HPV, número que
diminui de acordo com a
idade. Pesquisa publicada no
ano passado envolvendo
brasileiros, mexicanos e norteamericanos indica incidência
na metade dos homens. São
mais de 200 tipos do vírus,
sendo o oral mais
comum nos homens e o
genital nas mulheres.
pouco menos de 0,4%”, mensura.
Segundo o especialista, os estados brasileiros com maior incidência são o Maranhão, a Bahia e
o Pará. Contudo, Antônio de Pádua, coordenador de urologia do
Hospital Tarquínio Lopes Filho,
no Maranhão, pondera que há
“um problema de notificação de
casos”. “Ainda assim, estamos fazendo um trabalho de conscientização, pois sabemos que essa é
uma doença de cunho social. Um
problema cultural, do homem
rural, cuja incidência de fimose é
maior”, pondera.
Guimarães confirma que a
notificação é um problema nacional. Ele conta que, no Distrito Federal, 60% dos pacientes
atendidos são de outras unidades da Federação. O mesmo
acontece em São Paulo. “O que
se deve saber, no entanto, é que
quanto mais precárias forem as
condições de higiene, maiores
serão as chances de desenvolver
a doença”, ressalta.
Circuncisão
A fimose — estreitamento
do prepúcio — não tratada é
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» REBECA RAMOS
uma das causas mais frequentes do câncer de pênis. Eduardo Pimentel, chefe do Departamento de Urologia do Hospital
Santa Lúcia, explica que a circuncisão é um procedimento
simples e evita o problema.
“Não tem o que temer. Em alguns casos, é realizada com
anestesia local. O pós-operatório é um pouco chato, mas não
é nada muito sofrido. É importante saber que esse tratamento é a prevenção de um problema maior”, alerta.
Nas tradições em que é costume fazer a circuncisão ainda
na primeira infância, como a judaica e a muçulmana, os casos
da doença são raros. “A fimose
muitas vezes atrapalha a limpeza. Por isso, é tão importante
tratá-la, mas muitos homens ficam com medo”, especula Guimarães. A higiene, embora seja
um dos primeiros ensinamentos da infância, é um problema
muitas vezes cultural, destaca o
urologista. “Dependendo da região, fica ainda pior. Imagine
nesses locais castigados pela seca convencer um homem de que
aquela pouca água usada para
beber e cozinhar deve ser usada
para lavar o pênis”, exemplifica.
Há também a questão intelectual. Sentimentos como vergonha, culpa e preconceito podem atrapalhar o indivíduo a fazer o autoexame ou até mesmo
se tocar para fazer uma higiene
eficaz. Guimarães ressalta a importância de perceber as anormalidades o quanto antes, o que
amplia a possibilidade de tratamentos.
Na fase inicial do câncer, é
possível fazer uma ressecção,
excluindo a lesão. Dependendo
do comprometimento da doença, o tratamento pode ser realizado com cirurgia, quimioterapia e radioterapia. “É triste, mas
em 80% dos casos os pacientes
chegam ao hospital com a fase
avançada da doença. Nesses casos, o tratamento é a amputação
parcial ou total”, explica Guimarães. Segundo o urologista, nos
casos de amputação, já existem
boas técnicas de reconstrução,
embora elas sejam estéticas e
não funcionais. “É um problema
que causa danos físicos e psicológicos. Acomete principalmente pacientes com mais de 50
anos, embora já tenha visto casos de garotos com 20 anos”,
conta.
Isabela Werneck explica que
a quimioterapia só faz parte do
tratamento do câncer do pênis
em três casos: com intenção
neoadjuvante (previamente à
cirurgia), adjuvante (após a cirurgia, para evitar a volta do tumor) ou quando há metástase
(como tratamento paliativo).
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