Dinâmica do forrageamento da hemiparasita Struthanthus flexicaulis Mart.(Loranthaceae) e sua influência na estrutura da comunidade vegetal de campos rupestres ferruginosos – MG Fabiana Alves Mourão Orientadora: Profa. Dra. Claudia Maria Jacobi Co-orientador: Prof. Dr. José Eugênio Côrtes Figueira Universidade Federal de Minas Gerais Instituto de Ciências Biológicas Programa de Pós-graduação em Ecologia, Conservação e Manejo da Vida Silvestre Tese de Doutorado Dinâmica do forrageamento da hemiparasita Struthanthus flexicaulis Mart.(Loranthaceae) e sua influência na estrutura da comunidade vegetal de campos rupestres ferruginosos – MG Tese apresentada à Universidade Federal de Minas Gerais, como pré-requisito para a obtenção do título de Doutora em Ecologia. Fabiana Alves Mourão Orientadora: Profa. Dra. Claudia Maria Jacobi Co-orientador: Prof. Dr. José Eugênio Côrtes Figueira Belo Horizonte, fevereiro de 2011 Dedico este trabalho aos meus pais Heliana e Ronaldo e ao Rick, pelo amor incondicional. ii Agradecimentos A Claudia Maria Jacobi, minha orientadora querida e amiga, que me conduziu tão bem e com tanto carinho durante todos estes anos. Obrigada Claudia por ser meu exemplo, aprendi com você muito mais que teorias ecológicas e desenvolvimento de projetos. A José Eugênio Côrtes Figueira (o Zé), meu co-orientador, por ser brilhante, ético, gentil e amigo. Obrigada Zé, por ter me acompanhado desde a graduação, me apoiando sempre e me fazendo acreditar que eu podia chegar lá. Sua amizade, carinho e dedicação foram essenciais durante todos esses anos. Ao prof. Ronald Dickman, por compartilhar gentilmente seus avançados conhecimentos sobre modelos matemáticos e nos permitir conhecer um pouquinho do mundo da física. Obrigada Dickman por suas valiosas aulas particulares e por todo auxilio que recebemos durante a elaboração e desenvolvimento do modelo de simulação. Ao Júlio Cesar Mansur Filho, meu amigo da física, inteligente, gentil, prestativo e paciente. Sua ajuda, dedicação e infinitas explicações foram fundamentais para a elaboração e conclusão do capítulo 2 desta tese. Aos meus queridos estagiários e verdadeiros amigos que tornaram possível a realização deste trabalho: Manuel Gontijo, Rafael Barros, Arthur Dias e Matheus Scarpelli. Agradeço também aos estagiários de finais de semana: Cecília, Juliana, Luiza, Fernando, que abdicaram de alguns sábados para nos ajudar com a coleta de dados. Aos professores membros da banca: Rafael Arruda, Tadeu Guerra, Fernando Vale, Frederico Neves, Maria Auxiliadora Drumond e Clemens Schlindwein, que gentilmente aceitaram avaliar este trabalho. Ao Programa ECMVS pelo apoio recebido nas saídas de campo. À secretaria do curso por resolver pacientemente todas as minhas dificuldades. Aos professores e colegas do curso pelos ensinamentos e amizade. Ao IEF pela licença de coleta, aos funcionários do Parque Estadual da Serra do Rola Moça pelo apoio logístico e ao CNPq pelo auxílio financeiro (Bolsa). iii Aos amigos da Biotrópicos e aos milhões de amigos do ICB e do Parque Estadual da Serra do Rola Moça!!! Aos meus pais Heliana e Ronaldo, e minha avó Terezinha, que não entendem muito bem o que eu faço, mas sempre torceram pelo meu sucesso. Às minhas irmãs Renata e Luciana, por serem motivos de muitas alegrias. A minha afilhadinha Ana Luiza e meu sobrinho Gui, presentes de Deus. Ao meu primo Fernando (In memorian) que sempre torceu por mim e estaria muito feliz por este dia ter chegado! A Rick, minha razão de viver, meu porto seguro nos momentos de maior dificuldade e para quem eu sempre quero voltar para compartilhar a alegria de uma vitória! A todos aqueles que de alguma forma contribuíram para meu crescimento pessoal e profissional e a alguém que eventualmente eu tenha me esquecido de agradecer. OBRIGADA!!! iv APOIO: v SUMÁRIO Resumo 1 Abstract 2 Introdução Geral 3 Relevância deste estudo 5 Referências Bibliográficas 8 Capítulo 1 – Forrageamento direcionado da parasita Struthanthus flexicaulis 13 Resumo 14 Introdução 15 Materiais e Métodos 17 Resultados 21 Discussão 26 Referências bibliográficas 29 Anexo 1 - Diferentes fenofases de Struthanthus flexicaulis (Loranthaceae) 33 Capítulo 2 - Modelagem espacial do espalhamento da parasita Struthanthus flexicaulis em paisagens de afloramentos ferruginosos, Brasil. 34 Resumo 35 Introdução 36 Materiais e Métodos 38 Resultados 47 Discussão 51 Referências bibliográficas 54 vi Capítulo 3 - Alocação de recursos da hemiparasita Struthanthus flexicaulis (Loranthaceae) em condições de estresse hídrico do ambiente. 58 Resumo 59 Introdução 60 Materiais e Métodos 62 Resultados 65 Discussão 70 Referências bibliográficas 74 Capítulo 4 - Efeito top-down da hemiparasita Struthanthus flexicaulis (Loranthaceae) e seu papel chave na estruturação de comunidades vegetais em afloramentos ferruginosos do Quadrilátero Ferrífero, Brasil. 77 Resumo 78 Introdução 79 Materiais e Métodos 81 Resultados 85 Discussão 91 Referências bibliográficas 96 Anexo 2A - Lista das espécies vegetais - área de altas densidades da parasita 102 Anexo 2B - Lista das espécies vegetais - área de baixas densidades da parasita 103 Considerações Finais 104 vii Resumo O objetivo principal do estudo foi investigar a importância da planta hemiparasita Struthanthus flexicaulis (Loranthaceae) na estrutura de comunidades vegetais em afloramentos ferruginosos, por meio de uma abordagem integrando dados de alocação de recursos e de modelagem da sua dispersão. Para isso a tese foi estruturada em quatro capítulos que contemplaram respectivamente os seguintes objetivos específicos: 1) determinar os possíveis fatores que influenciam o espalhamento de S. flexicaulis na comunidade vegetal e verificar se esta hemiparasita apresenta comportamento de forrageamento direcionado; 2) modelar o espalhamento desta hemiparasita usando o modelo de Gás em Rede em uma paisagem com densidade da hospedeira Mimosa calodendron semelhante à encontrada na área de estudos, 3) comparar a alocação de recursos de S. flexicaulis em diferentes condições de estresse hídrico do ambiente; e 4) avaliar os efeitos do parasitismo na comunidade (Top-down e Espécie-chave). A densidade de hospedeiras influenciou o espalhamento de S. flexicaulis nesta comunidade. O sucesso de propagação vegetativa dependeu da altura das hospedeiras, bem como o distanciamento entre suas copas. O forrageamento direcionado dos ramos da hemiparasita foi comprovado, já que alteravam significativamente suas trajetórias de crescimento indo de encontro à nova fonte de recursos. Os resultados da simulação reforçaram a importância da distância entre hospedeiras, e também da dispersão ornitocórica na velocidade de espalhamento da parasita. S. flexicaulis alocou recursos de maneira diferenciada nas estações seca e chuvosa: investiu mais no crescimento vegetativo nos meses secos, em detrimento de estruturas reprodutivas, mais abundantes na chuva. Esta hemiparasita causou um efeito top-down e foi considerada espécie-chave nesta comunidade, pois, embora não tenha modificado a diversidade ou composição de espécies, provocou grande impacto na cobertura vegetal de algumas espécies importantes no afloramento ferruginoso estudado. 1 Abstract The main objective of this study was to establish the importance of the hemiparasitic plant Struthanthus flexicaulis (Loranthaceae) in the structure of plant communities on ironstone outcrops, by means of an approach that integrated data on resource allocation and dispersal modeling. To achieve this, the dissertation was structured in four chapters with the following specific objectives: 1) to determine the possible factors that influence the spread of S. flexicaulis in the plant community and verify of the parasite has an oriented foraging behavior; 2) to model the spatial dispersal of the parasite by means of a lattice gas automata model across a landscape of its main host (Mimosa calodendron) similar to that found in the study area; 3) to compare resource allocation of S. flexicaulis in different environmental water stress conditions, and 4) to evaluate the effects of parasitism in the community (top-down and keystone species). Host density influenced the spread of S. flexicaulis in the community. The vegetative propagation depended on host height as well as distance among hosts. Oriented branch foraging behavior was confirmed, since branches significantly altered their growth trajectories towards new resource points. The simulation results reinforced the importance of distance among hosts as well as ornitochory on the speed of parasite spread. S. flexicaulis allocated resources differentially between the dry and wet seasons: it invested more in vegetative growth during the dry months, in detriment of reproductive structures, more abundant during the rainy period. This parasite caused a negative top-down effect and was considered a keystone species in its community because, although it did not modify diversity or species composition, it exerted a great impact on the percent cover of some important hosts. 2 Introdução geral As plantas parasitas constituem um interessante grupo para estudos ecológicos, pois podem modificar a estrutura e dinâmica da comunidade onde estão inseridas, reduzindo a biomassa e alterando a alocação de recursos das espécies parasitadas (Tennakoon & Pate 1996; Lei 2001, Press & Phoenix 2005, Shen et al. 2006). Elas podem afetar negativamente processos fisiológicos, reprodutivos e ecológicos de suas hospedeiras (Press et al. 1999, Lei 1999, 2001) interferindo no balanço de água e nutrientes, reduzindo as taxas de fotossíntese e respiração e, em algumas situações, podendo levá-las à morte (Aukema 2003). Apesar do efeito negativo nas espécies parasitadas, podem também desempenhar papel benéfico na comunidade por que são utilizadas como fonte de recursos para uma variedade de animais vertebrados, entre eles polinizadores e dispersores de sementes (Watson 2001, Aukema 2003, Kelly et al. 2004). As plantas parasitas podem exercer um efeito top down em suas hospedeiras e permitir a existência de espécies competitivamente subordinadas (Press, 1998), principalmente se as espécies mais parasitadas forem as dominantes. Devido a estes efeitos, já foram consideradas espécies-chave das suas comunidades (Press & Phoenix 2005) e até determinantes da diversidade alfa (Watson 2001). São também apontadas como importantes elementos na paisagem porque aumentam a complexidade estrutural do ambiente (Bennets et al. 1996). Com exceção destas referências recentes, o seu papel e sua conservação têm sido bastante ignorados em diversos estudos de comunidades vegetais (Norton & Reid 1997), e a maioria dos estudos ecológicos são realizados em laboratório ou com espécies consideradas pragas agrícolas, em lugar de comunidades naturais (Pennings e Callaway 2002). A especificidade por hospedeiras é um fator chave no estudo do grupo de plantas parasitas e muitos padrões já foram observados (Norton & De Lange 1999, Arruda et al. 2009). Em ambientes homogêneos como florestas de coníferas (Shaw et al. 2004), a especificidade pode ser vantajosa, pois aumentaria a eficiência na retirada de água e sais minerais da hospedeira. Neste tipo de paisagem a planta parasita teria sua dispersão vegetativa garantida por meio do espalhamento dos ramos, pois todas as hospedeiras (única espécie) poderiam ser facilmente infectadas. Entretanto, ser especialista em ambientes heterogêneos pode ser desvantajoso, pois aumenta a dificuldade – seja por parte da planta ou do agente dispersor – de encontrar o hospedeiro específico, tornando inviável a sobrevivência em um ambiente onde esta hospedeira ocorre em baixas 3 densidades (Norton & Carpenter 1998, Arruda et al. 2006). Foi sugerido que o grau de especificidade está relacionado não somente à abundancia local como também ao grau de constância das hospedeiras no tempo e no espaço (Norton & Carpenter 1998, Norton & De Lange 1999), complementando a hipótese da fragmentação do recurso proposta por Janzen (1981). A facilidade de encontrar hospedeiras é somente um dos fatores que contribuem para a especificidade das parasitas, junto com outros anatômicos e até químicos que promovem o reconhecimento das plantas e a formação de haustórios, raízes altamente especializadas capazes de retirar água e sais minerais de suas hospedeiras (Rodl & Ward 2002, Press & Phoenix 2005, Arruda et al. 2006, Shen et al. 2006). Assim, muitas plantas parasitas são generalistas e atacam um grande número de espécies (Pennings & Callaway 2002), e podem aumentar a infestação do parasitismo em hospedeiras que oferecem maiores condições de sobrevivência e reprodução. As leguminosas são as hospedeiras preferidas devido à capacidade de fixação de nitrogênio (Radomiljac et al.1999, Bowie & Ward 2004). Entre as plantas parasitas melhor conhecidas estão famílias como Loranthaceae e Viscaceae que também ocorrem no Brasil. Os principais dispersores de sementes das mais de suas 1200 espécies são aves, motivo pelo qual são vulgarmente conhecidas como ervas-de-passarinho (Kujt 1969, Barboza 2000, Cazetta & Galetti 2003, Arruda et al. 2012). Muitas espécies destas famílias são hemiparasitas, pois possuem folhas clorofiladas capazes de realizar fotossíntese e retiram água e sais minerais de suas hospedeiras, em lugar de produtos fotoassimilados (Calder & Bernardt 1983). Outras, geralmente aclorofiladas, não são capazes de realizar fotossíntese e são chamadas de holoparasitas. A família Loranthaceae é constituída de 75 gêneros (Calvin & Wilson 2006), distribuídos em todos os continentes, exceto nos pólos (Calder & Bernardt 1983). No Brasil foram descritas cerca de 100 espécies, distribuídas em dez gêneros (Souza & Lorenzi 2005). São consideradas epiparasitas porque infectam os ramos aéreos de suas hospedeiras e a presença de raízes epicorticais que ocorre em todas as espécies do gênero Struthanthus, crescem ao longo dos galhos das hospedeiras formando haustórios espaçadamente, com potencial de crescimento clonal em decorrência da fragmentação dos ramos (Ehleringer et al. 1985, Calvin & Wilson 2006). O interesse primário no estudo de Loranthaceae no Brasil tem sido os aspectos anatômicos e embriológicos da sua relação com hospedeiras (Venturelli 1981, Venturelli 1984, Venturelli & Kraus 4 1989, Mourão 2007, Amaral et al. 2011, Mourão et al.- submetido), enquanto que as interações ecológicas hemiparasita-hospedeiras têm sido comparativamente pouco estudadas. No entanto, sugere-se que representantes desta família sejam generalistas em regiões tropicais, pois usam com sucesso uma grande variedade de espécies hospedeiras (Arruda et al. 2006, Mourão et al. 2006, Mourão 2007, Fadini 2011). Embora diversos aspectos da ecologia das ervas-de-passarinho têm sido estudados em diferentes ecossistemas (Davidar 1983, Sargent 1995), especialmente a dispersão de sementes (Sutton 1951, Davidar 1978, Overton 1994, del Rio et al. 1996, López-deBuen e Ornelas 1999, Aukema & del Rio 2002) e a especificidade de parasitismo (Kuijt 1963, Barlow & Wiens 1977, Thomson & Mahal 1983, Hoffman et al. 1986), ou sua condição fisiológica (Dean et al. 1994, Bickford et al. 2005), ainda há poucos estudos quantitativos sobre a dinâmica populacional das Loranthaceae a qual, obrigatoriamente, está vinculada à distribuição espacial das suas hospedeiras (Shaw et al. 2004, Teodoro et al., dados não publicados). Diante disso, torna necessária uma abordagem de pesquisa em que a paisagem de hospedeiras esteja definida, tanto na composição de espécies quanto nas suas qualidades como recurso para a parasita. Comparados com campos quartzíticos do Quadrilátero Ferrífero (MG), e embora sujeitos a um grau muito maior de degradação devido ao seu interesse comercial (Viana & Lombardi 2007, Mourão & Stehmann 2007) os afloramentos ferruginosos (campos rupestres sobre canga) têm sido muito pouco estudados, seja em levantamentos florísticos ou em estudos ecológicos (Jacobi et al. 2007, Mourão 2007). Neste sentido, o presente estudo fará uso de uma paisagem natural para descrever a densidade de hospedeiras, sua configuração espacial (presença ou ausência de rochas expostas) e frequência de parasitismo (que determina a mortalidade diferencial de hospedeiras) para simular o espalhamento de S. flexicaulis nestes afloramentos ferruginosos (canga). Relevância do estudo O ecossistema escolhido para a realização deste trabalho foi o campo rupestre sobre canga couraçada, também conhecido como afloramento ferruginoso. A canga é um substrato de distribuição restrita, e no Brasil encontra-se principalmente concentrada no Quadrilátero Ferrífero (QF), região de ecótone de dois hotspots brasileiros, o Cerrado e a Mata Atlântica, que têm sido profundamente ameaçados e modificados pelas atividades humanas. A canga vem sofrendo impactos constantes devido à 5 exploração do minério de ferro e à urbanização, com enormes perdas na biodiversidade local e regional (Viana & Lombardi 2007, Jacobi & Carmo 2008). Ao contrário do que se pensava até pouco tempo atrás, as comunidades vegetais dos campos rupestres sobre canga são bastante ricas. Um recente estudo mostrou que em apenas 100 ha foram encontradas 430 espécies de angiospermas pertencentes a 78 famílias, que correspondem a 36% de todas as famílias de angiospermas brasileiras (Jacobi et al. 2007). Devido às ameaças relatadas acima e ao restrito conhecimento sobre os campos rupestres sobre canga, as espécies vegetais ali localizadas são prioritariamente indicadas para o desenvolvimento de estudos ecológicos, incluindo padrões de riqueza e de distribuição das espécies (Jacobi & Carmo, 2008). Este estudo apresenta uma nova abordagem tanto no que se refere à modelagem do espalhamento de uma planta parasita quanto suas interações ecológicas, podendo ser o primeiro a evidenciar o efeito top-down através do parasitismo em plantas como um possível fator estruturador da comunidade vegetal. Estudos recentes têm demonstrado poucas evidências do efeito top-down em comunidades terrestres (Schmitz et al. 2000). A maioria destes estudos procura demonstrar este efeito através da predação (Atlegrim 1989, Chase 1998, Marquis & Whelan 1994, Fonseca 1994, Oliveira 1997, Beckerman et al. 1997, Kneitel & Miller 2002) e alguns poucos através de parasitóides (Gomez & Zamora 1994). O termo top-down surgiu na década de 60 quando Hairston e colaboradores (1960) difundiam a ideia de cascata trófica onde um controle da cadeia poderia ser realizado “de cima para baixo”, ou seja, herbívoros controlando a abundância de plantas. Os conceitos top-down e bottom-up foram utilizados em diversos trabalhos que consideravam dois, três ou mais níveis tróficos. Grande parte dos experimentos envolvendo mais níveis tróficos tem sido realizada em ambientes aquáticos por apresentarem uma composição menos complexa da comunidade ou uma melhor definição da cadeia trófica (Strong 1992). Os experimentos no ambiente terrestre, entretanto, usam cadeias de forma incompleta, dificilmente passam de três níveis tróficos, e geralmente envolvem remoção ou adição de predadores. Além disso, este estudo utiliza o modelo físico de difusão de partículas (Autômatos Celulares) conhecido como de Gás em Rede, para estudar o espalhamento de S. flexicaulis sobre a vegetação. Este modelo tem sido pouco explorado por biólogos, mas alguns trabalhos utilizaram-no para investigar a dinâmica de predadores e suas presas e para estudar a mobilidade de organismos (Satulovsky & Tome 1994, Chen et al. 2006, Rodrigues & Tomé 2008). Este modelo é capaz de incorporar características 6 da paisagem natural e informações sobre os indivíduos, fornecendo padrões espaciais de distribuição de espécies semelhante às observações de campo. Os dados sobre interações em ambientes de afloramentos ferruginosos são escassos e aspectos como o efeito de parasitas na estrutura e funcionamento de comunidades vegetais nesses ecossistemas, por exemplo, são totalmente desconhecidos, dificultando qualquer tentativa de conservação e manejo destas áreas. Neste sentido, através dos resultados gerados neste trabalho, poderão ser elaboradas ações de manejo que visem a conservação das espécies vegetais que vivem sobre a canga. 7 Referências bibliográficas Amaral, M. M. D. & Ceccantini, G. C. T. 2011. The endoparasite Pilostyles ulei (Apodanthaceae Cucurbitales) influences wood structure in three host species of Mimosa. IAWA Journal, 32: 1-13. Arruda, R.; Carvalho, L. N. & Del-Claro, K. 2006. Host specificity of a Brazilian mistletoe, Struthanthus aff. polyanthus (Loranthaceae), in cerrado tropical savanna. Flora, 201: 127-134. Arruda, R.;Fadini, R. F.; Mourão, F. A. ; Jacobi, M. J. & Teodoro, G. S. 2009. Natural History and Ecology of neotropical mistletoe. Encyclopedia of Life Support Systems, UNESCO, 24p. Arruda, R.;Fadini, R. F.; Carvalho, L.; Del-Claro, K.; Mourão, F. A.; Jacobi; C. M.; Teodoro, G. S.; van den Berg, E.; Caires, C. S. & Dettke, G. A. 2012. Ecology of Neotropical mistletoe: an important canopy-dwelling component of Brazilian forests and savannas. Acta Brasília Botânica. Aukema, J. E. 2003. Vectors, viscin, and Viscaceae: mistletoes as parasites, mutualists and resources. Frontiers in Ecology and the Environment, 1: 212-219. Aukema, J. E.; del Rio, C. M. 2002. Where does a fruit-eating bird deposit mistletoe seeds? Seed deposition patterns and an experiment. Ecology, 83: 3489-3496. Atlegrim, O. 1989. Exclusion of birds from bilberry stands: impact on insect larval density and damage to bilberry. Oecologia, 79: 136-139. Barboza, M. A. 2000. Loranthaceae e Viscaceae no bioma cerrado. Dissertação de mestrado Universidade de Brasília, 76 pp. Barlow, B. A. & Wiens, D. 1977. Host-parasite resemblance in Australian mistletoes: the case for cryptic mimicry. Evolution, 31: 69-84 Bennets, R. E., White G. C., Hawksworth F.G. & Severs S. E. 1996. The influence of dwarf mistletoe on bird communities in Colorado ponderosa pine forest. Ecological Applications, 6: 899-909 Bickford, C. P.; Kolb, T. E.; Geils, B. W. 2005. Host physiological condition regulates parasitic plant performance: Arceuthobium vaginatum subsp cryptopodum on Pinus ponderosa. Oecologia, 146: 179-189. Bowie, M. & Ward, D. 2004. Water and nutrient status of the mistletoe Plicosepalus acaciae parasitic on isolated Negev Desert populations of Acacia raddiana differing in level of mortality. Journal of Arid Environments, 56: 487-508. 8 Calder, M. & Bernardt, P. 1983. The biology of mistletoes. M. Calder & Bernardt (eds.) Academic Press, Sydney, 333 pp. Calvin, C. L. & Wilson C. A. 1995. Relationship of the mistletoe Phoradendron macrophyllum (Viscaceae) to the wood of its host. Iawa Journal, 16: 33-45. Calvin, C. L. & Wilson C. A. 2006. Comparative morphology of epicortical roots in Old and New World Loranthaceae with reference to root types, origin, patterns of longitudinal extension and potential for clonal growth. Flora, 201: 345-353. Cazetta, E. & Galetti, M. 2003. Ecologia das ervas-de-passarinho. Ciência Hoje, 33: 7375. Chase, J. 1998. Central place forager effects on the food chain dynamics and special pattern in Northern California meadows. Ecology, 79: 1236-1245. Chen, Q.; Mao, J. & Li, W. 2006. Stability analysis of harvesting strategies in a cellular automata based predator-prey model. Lecture Notes in Computer Science 4173: 268276. Davidar, P. 1978. Dispersal in some Loranthaceae of Nilgiris. Journal Bombay Natural History Society, 75: 943-945. Davidar, P. 1983. Birds and neotropical mistletoes: effects on seedling recruitment. Oecologia, 60: 271-273. Dean, W. R. J.; Midgley, J. J. & Stock, W. D. 1994. The distribution of mistletoes in South-Africa- patterns of species richness and host choice. Journal of Biogeography, 21: 503-510. Del Rio, C. M.; Silva, A.; Medel, R. & Hourdequin, M. 1996. Seed dispersers as disease vectors: bird transmission of mistletoe seeds to plant hosts. Ecology, 77: 912921. Dzerefos, C. M.; Witkowski, E. T. F. & Shackleton, C. M. 2003. Host-preference and density of woodrose-forming mistletoes (Loranthaceae) on savanna vegetation, South Africa. Plant Ecology, 167: 163-177. Ehleringer, J. R., Schulze, E. D., Ziegler, H., Lange, O. L., Farquhar, G. D. & Cowar, I. R. (1985). Xylem-tapping mistletoes: water or nutrients parasites? Science, 227: 1479-1481. Fadini, R. F. 2011. Non-overlap of hosts used by three congeneric and sympatric loranthaceous mistletoes in an Amazonian savanna: host generalization to extreme specialization. Acta Botanica Brasílica, 25: 337-345. 9 Fonseca, C. R. 1994. Herbivory and the long-lived leaves of an Amazonia ant-tree. Journal of Ecology, 82: 833-842. Guerra, T. J. A. 2005. Componentes quantitativos e qualitativos da dispersão de sementes de Struthanthus flexicaulis (Loranthaceae) em uma área de campo rupestre do sudeste brasileiro. Dissertação de mestrado. Universidade Estadual Paulista, 64p. Gomez, J. M. & Zamora, R. 1994. Top-down effects in a tritrophic system: parasitoids enhance plant fitness. Ecology, 75: 1023-1030. Hoffman, A. J. Fuentes, E. R., Cortes, I. Liberona, F. & Costa, V. 1986 Tristerix tetrandrus (Loranthaceae) and its hosts plants in the Chilean matorral: Patterns and mechanisms. Oecologia, 69: 202-206. Jacobi, C. M.; Carmo, F. F.; Vincent, R. C. & Stehmann, J. R. 2007. Plant communities on ironstones outcrops: a diverse and endangered Brazilian ecosystem. Biodiversity and Conservation, 16: 2185-2200. Jacobi, C. M. & Carmo, F. F. 2008. The contribution of ironstone outcrops to plant diversity in the Iron Quadrangle, a threatened Brazilian landscape. Ambio, 37:324– 326. Janzen, D. H. 1981. The peak in North American Ichneumonid species richness lies between 38˚ and 42˚ N. Ecology, 62: 532-537. Kelly, D.; Ladley, J.J.; Robertson, A.W. 2004. Is dispersal easier than pollination? Two tests in new Zealand Loranthaceae. New Zealand Journal of Botany, 42: 89103. Kneitel, J. M. & Miller, T. E. 2002. Resource and top-predator regulation in the pitcher plant (Sarracenia purpurea) inquiline community. Ecology, 83: 680-688. Kuijt, J. 1963. On the ecology and parasites of the Costa Rica Tree Mistletoe, Gaiadendron punctatum (Ruiz and Pavon). Canadian Journal of Botany, 41: 927938. Kuijt, J. 1969. The biology of parasitic plants. University of California Press, Berkeley, 246pp. Lei, S. A. 1999. Age, size and water status of Acacia gregii influencing the infection and reproductive success of Phoradendron californicum. American Midland Naturalist, 141: 358-365. Lei, S. A. 2001. Survival and development of Phoradendron californicum and Acacia greggii during a drought. Western North American Naturalist, 61: 78-84. 10 Marquis, R. J. &Whelan, C. J. 1994.Insectivorous birds increase growth of white oak through consumption of leaf-chewing insects. Ecology, 75: 2007-2014. Mourão, F. A.; Carmo, F. F; Ratton, P.; Jacobi, C. M. 2006. Hospedeiras da hemiparasita Struthanthus flexicaulis (Mart.) Mart. (Loranthaceae) em campos rupestres ferruginosos, Quadrilátero Ferrífero, MG. Lundiana, 7: 103-110. Mourão, F.A. 2007. Padrão de parasitismo de Struthanthus flexicaulis (Mart.) Mart. (Loranthaceae) e seus efeitos na comunidade vegetal de um campo rupestre sobre canga do Quadrilátero Ferrífero (MG). Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte. 64pp. Mourão, F. A.; Vale, F. H. A; Pimenta, M & Jacobi, C. M. Caracterização anatômica e histoquímica do hemiparasitismo de Struthanthus flexicaulis (Mart.) Mart. (Loranthaceae) em diferentes hospedeiras em campos rupestres sobre canga no Parque Estadual da Serra do Rola Moça – MG. Submetido à Revista Brasileira de Botânica. Mourão, A. & Stehmann, J. R. 2007. Levantamento da flora do campo rupestre sobre canga hematítica couraçada remanescente na Mina do Brucutu, Barão de Cocais, Minas Gerais, Brasil. Rodriguésia, 54: 775-786. Norton, D. A. & Carpenter, M. A. 1998. Mistletoes as parasites: host specificity and speciation. Trends in Ecology and Evolution, 13: 101-105. Norton, D. A. & De Lange, P. J. 1999. Host specificity in parasitic mistletoes (Loranthaceae) in New Zealand. Functional Ecology, 13:552-559. Norton, D.A. & Reid, N. 1997. Lessons in ecosystem management from management of threatened and pest loranthaceous mistletoes in New Zealand and Australia. Conservation Biology, 11: 759-769. Oliveira, P. S. 1997. The ecological function of extrafloral nectaries: herbivore deterrence by visiting ants and reproductive output in Caryocar brasilienses (Caryocaraceae). Functional Ecology, 11: 323-330. Overton, J. M. 1994. Dispersal and infection in mistletoe metapopulations. Journal of Ecology, 82: 711-723. Overton, J. M. 1996. Spatial autocorrelation and dispersal in mistletoes: Field and simulation results. Vegetatio, 125: 83-98. Pennings, S. C.; Callaway, R. M. 2002. Parasitic plants: parallels and contrasts with herbivores. Oecologia, 131: 479-489. 11 Press M. C.; Scholes, J. D. & Watling, J. R. 1999. Parasitic plants: physiological e ecological interactions whit their hosts in Press, M. C.; Scholes, J. D. & Barker M. G.; (eds.) Physiological plant Ecology. Blackwell Scientific Oxford, 175-197 pp. Press, M. C. & Graves, J. D. 1995. Parasitic plants. M. C. Press & J. D. Graves (eds.) Chapman & Hall, London, 292pp. Press, M. C. & Phoenix, G. K. 2005. Impacts of parasitic plants on natural communities. New Phytologist, 166: 737-751. Radomiljac, A. M.; McComb, J. A. & Pate, J. S. 1999. Gas exchange and water relations of the root hemiparasite Santalum album L. in association with legume and non-legume hosts. Annals of Botany, 83: 215-224. Rodrigues, A. L. & Tomé, T. 2008. Reaction-diffusion stochastic lattice model for a predator-prey system. Brazilian Journal of Physics, 38: 87-93. Rodl, T. & Ward, D. 2002. Host recognition in a desert mistletoe: early stages of development are influenced by substrate and host origin. Functional Ecology, 16: 128-134. Sargent, S. 1995. Seed fate in a tropical mistletoe: the importance of host twig size. Funtional Ecology, 9: 197-204. Satulovsky, J. E. & Tomé T. 1994. Stochastic lattice gas model for predator-prey system. Physical Review Letters. 49: 50 -73. Schmitz, O. J.; Hamback, P. A. & Beckerman, A. P. 2000. Trophic cascades in terrestrial systems: a review of the effects of carnivore removals on plants. The American Naturalist, 155: 141-153. Shaw, D. C.; Watson, D. M. & Mathiasen, R. L. 2004. Comparison of dwarf mistletoes (Arceuthobium spp., Viscaceae) in the Western United States with mistletoes (Amyema spp., Loranthaceae) in Australia - ecological analogs and reciprocal models for ecosystem management. Australian Journal of Botany, 52: 481-498. Shen, H.; Ye, W.; Hong, L.; Huang, H.; Wang, Z.; Deng, X.; Yang, Q.; Xu, Z. 2006. Progress in parasitic plant biology: Host selection and nutrient transfer. Plant Biology, 8: 175-185. Souza, V. C. & Lorenzi, H. 2005. Botânica sistemática: guia ilustrado para identificação das famílias de Angiospermas da flora brasileira, baseado em APG II. Instituto Plantarum. 12 Strong, D. R. 1992. Are trophic cascades all wet? Differentiation and donor-control in speciose ecosystems. Ecology, 73: 747-754. Sutton, G. M. 1951. Mistletoe dispersal by birds. Wilson Bulletin, 63:235-237. Tennakoon, K. U.; Pate, J. S. 1996. Effects of parasitism by a mistletoe on the structure and functioning of branches of its host. Plant Cell and Environment, 19: 517-528. Thomson, V. E. and Mahal, B. E. 1983. Host specificity by a mistletoe, Phoradendron villosum (Nutt.) Nutt. Subsp villosum, on three oak species in California. Botanical Gazette, 144: 124-131. Venturelli, M. 1981. Estudos sobre Struthanthus vulgaris Mart.: Anatomia do fruto e semente e aspectos de germinação. Revista Brasileira de Botânica, 4: 131-147. Venturelli, M. 1984. Estudos sobre Struthanthus vulgaris Mart.: aspectos anatômicos de raiz adventícia, caule e folha. Revista Brasileira de Botânica, 7: 79-89. Venturelli, M. & Kraus, J. E., 1989. Morphological and anatomical aspects of the primary haustorium of Struthanthus vulgaris Mart. (Loranthaceae) in vitro. Revista Brasileira de Botânica, 12: 17–22. Viana, P. L. & Lombardi, J. A. 2007. Florística e caracterização dos campos rupestres sobre a canga na Serra da Calçada, Minas Gerais, Brasil. Rodriguésia, 58: 159-177. Watson. D. M. 2001. Mistletoe - A keystone resource in forests and woodlands worldwide. Annual Review of Ecology and Systematics, 32: 219-249. 13 CAPÍTULO 1 Forrageamento direcionado da hemiparasita Struthanthus flexicaulis Fabiana Alves Mourão1, Claudia Maria Jacobi1 & José Eugenio Cortes Figueira1 1 Departamento de Biologia Geral, Instituto de Ciências Biológicas, Universidade Federal de Minas Gerais. 13 Resumo As plantas parasitas podem se dispersar vegetativamente e esse tipo de crescimento tem como finalidade colonização de novas áreas ou captação de recursos (forrageamento). Se a busca de uma hospedeira for direcionada, a parasita estaria forrageando. O objetivo desse trabalho foi determinar os possíveis fatores que influenciam a propagação vegetativa da parasita Struthanthus flexicaulis na comunidade vegetal e verificar se apresenta forrageamento direcionado. Foram demarcadas três áreas para a realização das observações. Nas duas menores que apresentavam diferentes densidades de Mimosa calodendron - sua principal hospedeira em afloramentos ferruginosos, foram avaliados os efeitos da densidade dessas plantas na propagação de ramos (contágio). Na maior área foram avaliados: 1) a influência da distância entre copas de hospedeiras nas passagens dos ramos; 2) o sucesso de propagação vegetativa dos ramos e 3) o forrageamento (mudança na direção dos ramos). A área de maior densidade de hospedeiras apresentou uma distância média de borda entre vizinhas mais próximas de 27,8 ± 38,2 cm e na área de menor densidade essa distância foi de 140,7 ±123,7 cm. Quanto menor a distância maior foi a chance de transmissão da parasita. Esta é uma relação exponencial negativa. A propagação vegetativa de ramos ocorreu mais frequentemente na área com maior densidade de mimosas, em que 89% dos ramos da parasita tiveram sucesso ao encontrar uma nova hospedeira. Já na área menos densa apenas 21% conseguiram explorar novas copas. A propagação vegetativa para duas ou três hospedeiras consecutivas foi mais comum na área de maior densidade (30%); na de menor densidade somente cerca de 5% dos ramos passavam para mais de uma hospedeira (χ 2=226,5; gl=1; p<0,001). O efeito combinado da altura de hospedeiras e distância entre copas foi determinante para o sucesso de propagação vegetativa da parasita. A parasita apresentou forrageamento direcionado, pois após o encontro de um de seus ramos com uma nova hospedeira e a formação do primeiro haustório, tanto os ramos laterais quanto os ramos vizinhos alteravam significativamente suas trajetórias de crescimento, indo de encontro à nova fonte de recursos (t=8,788; n=30; p<0,0001). Os ramos parecem receber estímulos que modificam o direcionamento de suas trajetórias visando a captura de recursos. Palavras-chave: busca por recursos, dispersão Loranthaceae, parasitismo. 14 15 Introdução Aspectos importantes em estudos populacionais como recrutamento, sobrevivência e reprodução dos organismos possibilitam compreender o destino de uma espécie na comunidade (Crawley 2007). Estas informações se tornam ainda mais completas se os mecanismos de dispersão dos indivíduos forem estudados. A dispersão é fundamental para os organismos e é particularmente difícil para as plantas parasitas. Esta dificuldade não se resume a apenas atrair o agente dispersor, que em muitos casos são aves (Barlow 1983), mas também suas sementes precisam ser depositadas e fixadas em galhos de hospedeiras compatíveis (Ladley & Kelly 1996). A compatibilidade existe se as hospedeiras não apresentarem defesas efetivas contra os processos de fixação, germinação e a penetração do haustório, que são raízes especializadas em captar nutrientes (Yan 1993; Roxburgh & Nicolson 2005; Calvin & Wilson 2006). As plantas parasitas, cujos haustórios são do tipo epicorticais, podem formar clones por meio da fragmentação quando dispersam vegetativamente (Calvin & Wilson 2006). A dispersão vegetativa tem como finalidade a colonização de novas áreas, como em plantas aquáticas cujos rametes se destacam (Grace 1993) ou a captura de recursos através do forrageamento (de Kroon et al. 2009). Para muitos pesquisadores o forrageamento é de fundamental importância para compreender as interações de uma comunidade, pois pode determinar a dinâmica da competição entre as espécies (Pianka 1981), as relações entre predadores e suas presas (Fryxell & Lundberg 1994, Krivan & Sikder 1999), bem como as interações indiretas entre as espécies (Wootton 1992). O forrageamento em plantas tem sido discutido amplamente por diversos autores (de Kroon & Schieving 1990; Karban 2008; Kembel et al. 2008; de Kroon et al, 2009; McNickle et al. 2009). Segundo de Kroon e colaboradores (2009) o forrageamento em plantas pode ser definido como plasticidade fisiológica ou alterações morfológicas que direta ou indiretamente melhoram a captura de recursos essenciais. Em ambientes heterogêneos as folhas e raízes das plantas são posicionadas de maneira não aleatória, visando captar ativamente os nutrientes essenciais, a água e a luz (Kaban 2008). Esse comportamento remete à teoria de forrageamento ótimo, em que os organismos procuram maximizar a absorção de energia por unidade de tempo. Isso significa que estes organismos devem gastar o mínimo de energia para encontrar, capturar, manipular e consumir uma presa que possa maximizar a eficiência da alimentação. Para alguns autores como Runyon e colaboradores (2006) e Kaban (2008) o forrageamento de 16 plantas parasitas seria semelhante ao de animais, pois enquanto elas localizam suas fontes de alimento através do reconhecimento de compostos químicos liberados por hospedeiras, os animais utilizam a visão para capturar suas presas. Os animais podem assumir comportamentos distintos ora explorando ativamente um habitat em busca de recursos, ora assumindo um comportamento mais passivo de senta e espera; analogamente as plantas podem apresentar diferentes padrões de comportamento sob diferentes condições ambientais devido a sua plasticidade morfológica (de Kroon & Hutchings 1995). Entretanto, os padrões de forrageamento em plantas parecem ser mais complexos que em animais (de Kroon & Schieving 1990). Os animais podem se deslocar de um local com baixa para outro com alta disponibilidade de recursos, gastando certa quantidade energia (Norberg 1997). As plantas, por outro lado, precisam investir em crescimento para alongar suas partes vegetativas na tentativa de escapar de um local pobre em recursos, tais como nutrientes, água e luz (Kroon & Schieving 1990; McNickle et al. 2009). As plantas parasitas, por exemplo, podem responder rapidamente a mudanças na qualidade da hospedeira (Calvin & Wilson 2006), alterando seus padrões de crescimento quando atacam preferencialmente algumas espécies de plantas na tentativa de aumentar a eficiência na aquisição de recursos (Salzman 1985; Slade & Hutchings 1987; Kelly 1990). A Convolvulaceae Cuscuta subinclusa emite ramos exploratórios que se enrolam nos galhos das hospedeiras com a finalidade de reconhecêlas antes de investir na formação de haustórios (Kelly 1990). Além disso, foi comprovado experimentalmente que esta mesma parasita produziu mais haustórios em hospedeiras que ofereciam melhores condições nutricionais (Kelly 1990). Apesar do que foi exposto acima, os padrões de forrageamento de plantas parasitas são pouco estudados e pouco se sabe sobre os mecanismos envolvidos na localização e seleção de hospedeiras (Kelly 1992; Runyon et al. 2006). Como as plantas parasitas dependem dos recursos de outras plantas para sua própria sobrevivência (Runyon et al. 2006), podem afetar negativamente processos fisiológicos, reprodutivos e ecológicos das hospedeiras, causando grande impacto na comunidade (Tennakoon & Pate 1996, Press et al. 1999, Lei 1999, 2001, Press & Phoenix 2005, Shen et al. 2006). Desta maneira, compreender seus padrões de forrageamento significa ter a capacidade de prever a estratégia de busca por recursos, como também determinar possíveis efeitos do parasitismo sobre a comunidade vegetal. 17 O objetivo desse trabalho foi determinar os possíveis fatores que influenciam a propagação vegetativa Struthanthus flexicaulis na comunidade vegetal e verificar se esta parasita apresenta forrageamento direcionado. Para isso as seguintes hipóteses foram testadas: 1) A dispersão da parasita na paisagem depende da densidade de potenciais hospedeiras e seus tamanhos; 2) O crescimento de ramos de S. flexicaulis é afetado pelo encontro com uma nova fonte de recursos. As predições para estas hipóteses foram respectivamente: 1) S. flexicaulis se espalhará mais rapidamente na comunidade vegetal quanto maior a densidade e altura de potenciais hospedeiras e menor a distância entre suas copas; 2) os ramos da parasita mudarão sua trajetória em busca de novas fontes de recursos quando um dos ramos formar haustórios em outras hospedeiras. De acordo com Campbell et al. (1991) o forrageamento em plantas pode ser definido como a habilidade das espécies em proliferar suas raízes em manchas de solo mais ricas nutricionalmente. Este conceito foi tomado como base para avaliar e discutir o forrageamento de S. flexicaulis através do crescimento direcionado de seus ramos. Metodologia Local de estudo O estudo foi desenvolvido numa área protegida do Parque Estadual da Serra do Rola Moça, localizada na porção sul da Cadeia do Espinhaço- Brasil, uma longa cadeia de montanhas paralela ao oceano Atlântico. Esta área é composta por afloramentos ferruginosos e está localizada no Quadrilátero Ferrífero (20° 03’ 60”S, 44° 02’ 00” W, 1300 m). O clima da região é mesotérmico, do tipo Cwa de acordo com a classificação de Köppen (Nimer & Brandão 1989). A precipitação anual é de 1000 a 1500 mm, com uma pronunciada estação seca de abril a setembro, e temperatura média anual de 25°C (Rizzini 1997). Os ventos constantes e altos índices de radiação ultravioleta contribuem para a severidade do ambiente, agravada durante a estação seca. A vegetação é baixa, composta por poucos indivíduos de porte arbóreo, dominada por eudicotiledôneas como Asteraceae, Fabaceae e Myrtaceae, e monocotiledôneas como Poaceae, Cyperaceae e Orchidaceae (Viana & Lombardi 2007, Jacobi et al. 2007). Na área de estudos M. calodendron (Fabaceae) é uma das espécies arbustivas mais abundante (Jacobi et al. 2007) e frequentemente parasitada por Sthuthanthus flexicaulis (Mourão et al. 2009). Espécie-alvo 18 Struthanthus flexicaulis Mart. (Loranthaceae) é uma das parasitas brasileiras mais comuns, com ampla distribuição nas áreas de cerrado do Brasil Central (Rizzini 1980). A espécie generalista e na área de estudos pode parasitar 44 espécies pertencentes a 19 famílias na área de estudos (Mourão et al. 2006). Possui ramos longos e flageliformes. Cada ramo pode dar origem a outros laterais de até segunda ordem. Estes ramos laterais podem algumas vezes crescer mais que o ramo principal. Esta espécie possui folhas oblongo-abovadas, é dióica sendo composta por ramos com flores pequenas (3-4 mm) exclusivamente masculinas e femininas e frutos pequenos (6-7 mm). O pico de frutificação ocorre ao final da estação chuvosa entre os meses de março e abril (F. A. Mourão, obs. pess.). Os frutos são muito consumidos pela guaracava-detopete-uniforme Elaenia cristata (Tyrannidae), seu principal dispersor em algumas áreas da Serra do Espinhaço (Guerra 2005). Métodos Foram demarcadas duas áreas mediram 900 m2 (30 x 30m) e diferiram quanto à densidade de M. calodendron caracterizada pela distância entre copas (N = 281; Z = 8,505; p < 0,0001). Nestas duas áreas foram realizadas observações do efeito da densidade sobre a propagação vegetativa das parasitas. Outra área com aproximadamente 1400m2 (40 x 35m) foi marcada aleatoriamente para observar a influência da distância de hospedeiras no alcance dos ramos e o forrageamento da parasita. As observações do efeito da distância e forrageamento foram realizadas durante quatro dias na estação chuvosa, e as do efeito da densidade foram realizadas durante dois dias na estação seca. Neste estudo, a referência às hospedeiras remete exclusivamente a M. calodendron. Efeito da densidade sobre a propagação vegetativa da parasita Para avaliar o efeito da densidade de plantas na propagação vegetativa de ramos (contágio), foram selecionadas duas áreas: A com alta densidade de M. calodendron e B com baixa densidade. Nessas áreas, foram selecionados visualmente indivíduos de M. calodendron cujas copas estavam totalmente cobertas pelos ramos da hemiparasita. Como estes dados foram coletados durante a estação seca e estas hospedeiras apresentavam sinais nítidos de perda de folhas, foi assumido que os ramos da parasita teriam necessariamente que forragear até encontrar uma nova hospedeira para garantir sua sobrevivência. Em cada indivíduo, os ramos foram acompanhados para verificar se 19 haviam se estabelecido (formação de haustórios) em novos indivíduos de M. calodendron. Em caso afirmativo o número de conexões consecutivas (passagens) era contado. Nas duas áreas, o número de passagens consecutivas de ramos foi comparado pelo teste do Qui-quadrado. Efeito da distância, sucesso de propagação vegetativa e forrageamento dos ramos da parasita Para avaliar a influência da distância entre hospedeiras nas passagens dos ramos da parasita foram selecionados 28 grupos totalizando 259 indivíduos de M. calodendron. Em cada agrupamento foram identificados os indivíduos infectados por S. flexicaulis, cujos ramos poderiam partir das copas e parasitar outras hospedeiras. Estes indivíduos de M. calodendron parasitados foram chamados de “fonte de ramos”. A partir dos indivíduos fonte foram tomadas as seguintes medidas: distância entre as bordas das vizinhas mais próximas e sucesso de propagação vegetativa de ramos (formação de haustórios). O número de passagens bem sucedidas foi contado e distribuído em 12 classes de distâncias que variaram de 10 em 10 cm. Foi feita uma regressão linear após a transformação logarítmica para ambos os eixos. Para avaliar a probabilidade de contágio de novas plantas foram selecionadas 30 M. calodendron parasitadas com alturas que variaram de 60 a 90 centímetros, pois a altura média dessas hospedeiras na área de estudos é de 50 cm. Nessas mimosas, a altura da saída dos ramos da parasita era medida, bem como a distância que estes ramos percorriam até tocar o substrato. Essas medidas foram feitas em três pontos: altura inicial (medida logo após a saída do ramo e onde a distância=0); altura média (onde a metade da distância foi percorrida pelo ramo) e altura final (altura=0 e a distância é a máxima percorrida pelo ramo). Curvas exponenciais negativas foram ajustadas aos pontos de altura máxima e mínima relacionando as alturas às distâncias. As equações dessas curvas permitem determinar uma região onde qualquer copa dentro dos limites máximos e mínimos das curvas poderá ser parasitada, pois elas descrevem dispersão de ramos saindo das alturas máximas e mínimas. Essas equações foram utilizadas para determinar a probabilidade de contágio de outras mimosas situadas a diferentes distâncias da hospedeira de onde partem ramos da parasita, através da relação: (Y(X)máx. – Y(X) min)/79, onde Y(X) máx. = altura dos ramos mais altos; Y(X) min = altura dos ramos mais baixos e 79 é a altura máxima prevista, pelo modelo de regressão, para um ramo ao sair da copa das hospedeiras de 90 cm de altura. Um gráfico de 20 probabilidade foi calculado considerando variações de distância de 0 a 100 cm (intervalos de 5 em 5 cm de distância). Para avaliar forrageamento dos ramos foram selecionados outros 30 indivíduos de M. calodendron parasitados. No centro de suas copas foi colocado um octógono (Fig. 1) dividido em oito setores numerados, onde cada um correspondia a um ângulo de 45 graus. Em todas as copas o setor 1 foi voltado para o norte. Todos os ramos que saíam das copas eram contados e separados por setor. Foi verificado se estes ramos passavam para outras hospedeiras quando houvesse a formação de haustórios. O programa Systat foi usado para representar graficamente a densidade de ramos por setores de 45 graus. A concentração de ramos associados a setores onde a passagem de ramos foi bem sucedidas foi comparada, por teste t pareado, com a concentração nos demais setores. Para verificar se outras variáveis, tais como a posição do sol ou direção dos ventos da região, poderiam interferir no direcionamento, comparou-se a saída do número de ramos em cada setor por meio de análise de variância (ANOVA) cujas variáveis foram: setores (posicionamento) e número de ramos. Fig. 1- Octógono colocado sobre a copa das hospedeiras para quantificar a saída de ramos da parasita. Cada parte colorida (setor) corresponde a um ângulo de 45 graus. As setas brancas indicam os ramos fora das copas (exploratórios). Resultados A densidade de mimosas intensificou a transmissão de ramos (Fig. 2). A área de maior densidade de hospedeiras (2,1 indivíduos/m2; N=201) apresentou uma distância 21 de borda média entre vizinhas mais próximas de 27,8 e desvio padrão de ± 38,2 cm e a mediana foi de 5 cm (n=201). Já na área de menor densidade (0,8 indivíduos/m2; N=81) essa distância foi de 140,7 e desvio padrão de ± 123,7 cm e a mediana de 131 cm (n=81). A propagação vegetativa de ramos para outras hospedeiras ocorreu mais frequentemente na área com maior densidade de mimosas sendo que 89% dos ramos da parasita tiveram sucesso em encontrar uma nova planta e formar haustórios. Nessa área a propagação para duas ou três hospedeiras consecutivas foi mais comum, totalizando mais de 30% das observações. Em contrapartida, na área menos densa apenas 21% conseguiram explorar novas copas e somente cerca de 5% dos ramos passavam para mais de uma hospedeira. Houve diferença significativa no número de passagens de ramos entre duas áreas (χ2=226,5; gl=1; p<0,001). Fig. 2 – Influência da densidade de hospedeiras na propagação vegetativa consecutiva de ramos. Área de maior densidade (distância média entre bordas de hospedeiras vizinhas = 27,8 cm) e Área de menor densidade (distância média entre bordas de hospedeiras vizinhas = 140 cm). A propagação vegetativa de ramos variou negativamente em função da distância entre as bordas das copas das hospedeiras. Dos 265 ramos presentes nos agrupamentos de mimosas, 171 tiveram sucesso na propagação vegetativa para outras hospedeiras. As distâncias entre bordas variaram de 0 a 121 cm. O número de propagação se manteve alto quando as distâncias eram inferiores a 20 cm e diminuiu significativamente a partir deste valor (r2=0,700; n=12; p=0,001) (Fig. 3). 22 Log Propagação vegetativa bem sucedida 100 80 60 40 20 20 40 60 80 100 120140 Log Distância (cm) Fig. 3- Relação entre a distância entre bordas das copas das mimosas e propagação vegetativa de ramos da parasita. Esta relação é descrita pela equação da reta Y= 6,684 – 1,182 X. A probabilidade de propagação vegetativa de ramos variou conforme a altura de sua saída das copas das hospedeiras. As saídas de ramos das alturas máximas e mínimas delimitaram uma região onde qualquer copa situada dentro destes limites tem chance de ser parasitada (Fig. 4). Nesse modelo, a altura máxima de saída dos ramos das copas das hospedeiras foi de 79 cm e a mínima foi de 36 cm. As curvas exponenciais negativas foram descritas em seu limite superior pela equação Y = ln (4,371 – 0,065 * Distância) e por Y = ln (3,585 – 0,059 * Distância), em seu limite inferior (Fig. 4). Estas equações são parecidas, refletindo elasticidade semelhante dos ramos. A altura das hospedeiras influenciou a probabilidade de propagação vegetativa de ramos, pois plantas que se encontravam muito próximas das hospedeiras (distâncias entre bordas das copas menores que 10 cm) a probabilidade de ser atingida variou de 36 a 70%. Estas probabilidades caíram bastante quando a distância entre copas foi superior a 20 cm variando entre 18 e 0,07%. 23 A 80 Altura (cm) 60 40 20 0 0 10 20 30 40 50 Distância (cm) 60 70 B Probabilidade de passagem 80 70 60 50 40 30 20 10 0 0 20 40 60 80 Distância (cm) 100 120 Fig. 4 – Sucesso de propagação vegetativa de ramos. Em A estão representadas as curvas descritas pelas equações que relacionam altura dos ramos com as distancias as bordas da copa e em B a probabilidade de contágio de outras plantas com copas situadas a diferentes alturas e em diferentes distancias. As observações na área de 1400m2 constataram que os ramos apresentaram forrageamento direcionado, pois após o encontro de um ramo com uma nova hospedeira e a formação do primeiro haustório, tanto os ramos laterais quanto os vizinhos alteravam suas trajetórias de crescimento indo de encontro à nova fonte de recursos. 24 Este crescimento não teve nenhuma relação com outras variáveis tais como a posição do sol ou direção dos ventos da região, uma vez que não houve diferenças significativas entre os setores em relação ao número de ramos que saíam das copas das hospedeiras (F=0,8941, gl=72, p=0,52). O estímulo parece ocorrer após a formação do haustório (t=8,788; n=30; p<0,0001) (Fig. 5). Ramos principais conectados às novas hospedeiras desenvolviam vários ramos laterais para o setor onde um dos ramos tinha feito a primeira conexão. O mesmo direcionamento ocorreu com parte dos ramos vizinhos, que parecem receber o mesmo estímulo e mudaram a trajetória de seu crescimento em direção à nova hospedeira. É importante ressaltar que a maioria dos vetores menores, que representam menor número de ramos no setor, indicaram casos em que não houve a formação de haustório (H) (Fig. 5A e B). Entretanto, todos os maiores vetores, representando o maior número de ramos no setor, tiveram a formação de pelo menos um haustório (H) (Fig. 5A e B). Fig. 5A - Crescimento direcionado dos ramos quando há a formação do primeiro haustório (Teste t=8,788; n=30; p<0,0001). 25 Fig. 5B – Detalhe do crescimento direcionado dos ramos quando há a formação do primeiro haustório (representado pela letra H). As letras H corresponderam aos setores onde havia pelo menos uma passagem de ramos (formação de haustório em uma nova hospedeira). 26 Discussão Enquanto a deposição de sementes de plantas parasitas depende quase que exclusivamente do comportamento e das escolhas por poleiros pelas aves dispersoras (Aukema 2003) e está correlacionada à frequência de plantas na paisagem (del Rio et al. 1996), a propagação vegetativa é favorecida pela densidade de hospedeiras (Mourão 2007, Mourão et al. 2009). Isso foi corroborado neste trabalho uma vez que a propagação vegetativa de ramos de mimosas parasitadas para vizinhas foi favorecida pela proximidade entre suas copas. Na área de maior densidade, quase todas as parasitas conseguiram se estender para outras plantas quando suas hospedeiras apresentavam nítidos sinais de caducifolia, garantindo assim a sua sobrevivência. Além da distância entre bordas, a altura das hospedeiras influenciou indiretamente as chances de contágio por ramos da parasita. Os ramos que saiam de copas mais altas percorriam um caminho mais longo até tocar o substrato influenciando o sucesso de sua propagação para outras plantas. No entanto, na área de menor densidade de M. calodendron a propagação de ramos ficou comprometida, e apenas uma pequena fração da população de parasitas conseguiu atingir outras hospedeiras. Como a distância dificulta a propagação dos ramos, os mal sucedidos tendem a permanecer na mesma planta e devem morrer junto com suas hospedeiras. Em paisagens com baixas densidades de plantas, as copas estão mais distantes e a forma de propagação mais eficaz seria a dispersão ornitocórica. Hospedeiras mais altas são as preferidas das aves, pois estas são as mais atrativas como poleiro (Aukema & Del Rio 2002). O efeito combinado da distância e altura de hospedeiras foi determinante para o sucesso de propagação da parasita. A emissão de ramos de S. flexicaulis desde alturas maiores das copas das hospedeiras permite percorrer uma maior distância antes de tocar no chão, favorecendo a propagação vegetativa desses ramos para outras plantas. O tamanho da hospedeira é um ótimo preditor da probabilidade de parasitismo de uma planta (Overton 1994), pois hospedeiras maiores são mais atrativas para as aves e também favoreceriam propagação vegetativa dos ramos para outras plantas. Além disso, copas maiores a seriam alvos mais fáceis para os ramos de S. flexicaulis. Estes resultados remetem ao modelo de metapopulação, em que um conjunto de subpopulações locais interage através da dinâmica do fluxo de indivíduos (Hanski 1991, Teodoro 2010). Assim como no estudo de Overton (1994), que comparou a dispersão da parasita Phrygilanthus sonorae em árvores dos gêneros Bursera e Cytocarpa, e de 27 Teodoro (2010) que comparou a de Psittacanthus robustos em Vochysia thyrsoidea , a propagação de S. flexicaulis pode ser equiparada à dinâmica de uma metapopulação. Essas parasitas são compostas por sub-populações isoladas espacialmente em fragmentos de habitat (hospedeiras) e estão unidas por fluxos biológicos, seja por dispersão vegetativa ou ornitocórica. A dinâmica de ambas depende da distribuição espacial de suas plantas hospedeiras que podem estar isoladas espacialmente numa matriz de habitat desfavorável. O fluxo de plantas parasitas entre as hospedeiras se daria em função da altura e distância entre suas copas (dispersão vegetativa) ou seus tamanhos/altura (especialmente na dispersão ornitocórica, veja Guerra 2005). Quando as hospedeiras morrem, morrem também as suas parasitas, a não ser que seus ramos tenham atingido outras plantas vizinhas por dispersão vegetativa, ou suas sementes tenham sido levadas a plantas mais distantes por aves. A paisagem pode ser vista como uma coleção de manchas temporariamente favoráveis ao parasitismo (hospedeiras vivas, parasitadas ou não) e de manchas favoráveis à propagação da parasita, dispersas numa matriz de solo inóspito (Overton 1994). Apesar de algumas plantas poderem se movimentar e crescer em resposta à luz ou outros estímulos ambientais (Kaban 2008), os ramos de S. flexicaulis não apresentaram este tipo de comportamento, pelo menos no ambiente aberto da canga onde luz não parece ser limitante. Os ramos apresentaram um padrão aleatório de crescimento quando não havia a formação de haustório em uma nova hospedeira. Eles saíam das copas, geralmente em várias direções, indicando uma tentativa de cobrir uma maior área de busca. Como as plantas têm crescimento modular, cada série de unidades repetitivas (módulos) pode simultaneamente ter um comportamento de forrageamento diferente, como proposto por McNickle et al. (2009) para raízes. Este modo de forrageamento foi comparado ao dos insetos sociais, onde a seleção deve favorecer comportamentos que aumentem a aptidão total da colônia, ou, no caso de plantas, de todo o indivíduo, e não de cada unidade modular (McNickle et al. 2009). Diferentemente de outras plantas, que precisam manter uma conexão entre as raízes e o resto, as parasitas podem se multiplicar por fragmentação, após a formação dos haustórios em novas hospedeiras, rompendo sua ligação com o indivíduo que o originou. Após o encontro com uma nova hospedeira e a formação de haustórios, ocorre a proliferação de novos ramos laterais também em direção à hospedeira, apresentando um crescimento direcionado. Esse crescimento aumenta a eficiência na obtenção de recursos, como previsto pela Teoria do Forrageamento Ótimo. Outros ramos vizinhos 28 parecem receber estímulos que modificam o direcionamento de suas trajetórias visando a captura de recursos, crescendo para o mesmo local da formação dos haustórios. Como os haustórios das plantas parasitas respondem às substâncias químicas liberadas por outras espécies, permitindo o reconhecimento e ataque a hospedeiras apropriadas (Kaban 2008), um mecanismo semelhante poderia ser responsável por emitir e captar estímulos de reconhecimento de novas hospedeiras e causar mudanças de trajetória e/ou a proliferação de novos ramos. Com base em evidências empíricas da literatura, de Kroon et al. (2005) argumentam que os comportamentos que envolvem decisões sobre frequência de ramificação de raízes, crescimento dos entrenós e aumento no eixos de raízes, ocorrem em níveis modulares, e as respostas são induzidas por sinais que são percebidos localmente. Da mesma forma, é possível que os ramos de parasita, S. flexicaulis se comuniquem e influenciem o direcionamento de ramos vizinhos. Esta seria uma estratégia eficiente que otimizaria a busca por recursos. No caso de plantas parasitas o encontro com uma nova hospedeira significa usufruir de uma nova fonte de recursos e com isso ampliar a capacidade da sua população crescer, se reproduzir e colonizar novos ambientes. 29 Referências Bibliográficas Aukema, J. E.; del Rio, C. M. 2002. Variation in mistlestoe seed deposition: effects of intra- and interspecific host characteristics. Ecography, 25: 139-144. Aukema, J. E. 2003. Vectors, viscin, and Viscaceae: mistletoes as parasites, mutualists and resources. Frontiers in Ecology and the Environment, 1: 212-219. Barlow, B. A. 1983. Biogeography of Loranthaceae and Viscaceae. In: Calder, M.; Bernhardt, P. (Editors), The Biology of Mistletoes, pp. 19-46. Sydney: Academic Press. Calvin, L. C. & Wilson, C. A. 2006. Comparative morphology of epicortical roots in Old and New World Loranthaceae with reference to root type, origin, patterns of longitudinal extension and potential for clonal growth. Flora, 201: 51-64 Campbell, B. D.; Grime, J. P. & Mackey, J. M. L. 1991. A trade-off between scale and precision in resources foraging. Oecologia 87:532-538. Crawley, M. J. 2007. Plant Ecology, 2 º Ed. 717 p. Ed. Blackwell Science, London. de Kroon, H. & Hutchings, M. J. 1995. Morphological plasticity in clonal plants: The foraging concept reconsidered. Journal of Ecology, 83:143-152. de Kroon, H., Schieving, F. 1990. Resource partitioning in relation to clonal growth strategy. In: Clonal Growth in Plants (eds. Van Groenendael J, de Kroon H). Academic Publishing, The Hague, 426 p. de Kroon, H. & Schieving , F. 1991. Resource allocation patterns as a function of clonal morphology: a general model applied to a foraging clonal plant. Journal of Ecology, 79:519-530. de Kroon, H.; Huber, H.; Stuefer, J. F.; & van Groenemdael, J. M. 2005. A modular concept of phenotypic plasticity in plants. The New Phytologist, 166: 73-82. de Kroon, H.; Visser, E. J. W.; Huber, H.; Mommer, & Hutchings, M. J. 2009. A modular concept of plant foraging behavior: the interplay between local responses and systemic control. Plant Cell and Environment, 32: 704-712. Donohue, K. 1995. The spatial demography of mistletoe parasitism on a Yemeni Acacia. International Journal of Plant Sciences, 156:816-823. Dzerefos, C. M. Witkowski, E. T. F. & Shackleton, C. M. 2003. Host-preference and density of woodrose-forming mistletoes (Loranthaceae) on savanna vegetation, South Africa. Plant Ecology. 167:163-177. 30 Fryxell, J. M. & Lundberg, P. 1994. Diet choice and predator-prey dynamics. Evolutionary Ecology, 8: 407-421. Grace, J. B. 1993. The adaptive significance of clonal reproduction in angiosperms: an aquatic perspective. Aquatic Botany, 44: 159-180. Journal of Ecology, 82: 833-842. Guerra, T. J. A. 2005. Componentes quantitativos e qualitativos da dispersão de sementes de Struthanthus flexicaulis (Loranthaceae) em uma área de campo rupestre do sudeste brasileiro. Dissertação de mestrado. Universidade Estadual Paulista, 64p. Hanski, I. 1991. Single species metapopulation dynamics: concepts. Models and observations. Biological Journal of the Linnean Society, 42: 17-38. Harper, J. L. 1977. Population Biology of plants. Academic Press, London Harper, J. L. 1985. Modules, branches, and the capture of resources. In: Population biology and evolution of clonal organisms (J.B.C. Jackson, L.W. Buss & R. Cook, eds). Yale University Press, New Haven, p.1-34. Jacobi, C. M., F. F. Carmo, R. C. Vincent, and J. R. Stehmann. 2007. Plant communities on ironstones outcrops: a diverse and endangered Brazilian ecosystem. Biodiversity and Conservation, 16: 2185-2200. Kaban, R., 2008. Plant behavior and communication. Ecology Letters, 11:727-739. Kelly, K. C. 1990. Plant foraging: a marginal value model and coiling response in Cuscuta subinclusa. Ecology, 71: 1916-1925. Kelly, K. C. 1992. Resource choice in Cuscuta europaea. Proceedings of National Academy of Sciences, 89: 12194-12197. Kembel SW, de Kroon H, Cahill JF Jr, Mommer L. 2008. Improving the scale and precision of hypotheses to explain root foraging ability. Annals of Botany, 101: 1295–1301. Krivan, V. & Sikder, A. 1999. Optimal foraging and predator-prey dynamics II. Theoretical Population Biology, 55: 111-126. Ladley, J. J. & Kelly, D. 1996. Dispersal, germination and survival of New Zealand mistletoes (Loranthaceae): Dependence on birds. New Zealand Journal of Ecology, 20: 69-79. Lei, S. A. 1999. Age, size and water status of Acacia gregii influencing the infection and reproductive success of Phoradendron californicum. American Midland Naturalist, 141: 358-365. 31 Lei, S. A. 2001. Survival and development of Phoradendron californicum and Acacia greggii during a drought. Western North American Naturalist, 61: 78-84. McNickle, G. G.; St. Clair, C. C & Cahill Jr, J. F. 2009. Focusing the metaphor: plant root foraging behavior. Trends in Ecology and Evolution, 24:419-426. Mourão, F. A.; Carmo, F. F; Ratton, P.; Jacobi, C. M. 2006. Hospedeiras da hemiparasita Struthanthus flexicaulis (Mart.) Mart. (Loranthaceae) em campos rupestres ferruginosos, Quadrilátero Ferrífero, MG. Lundiana, 7:103-110. Mourão, F.A. 2007. Padrão de parasitismo de Struthanthus flexicaulis (Mart.) Mart. (Loranthaceae) e seus efeitos na comunidade vegetal de um campo rupestre sobre canga do Quadrilátero Ferrífero (MG). Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte. 64pp. Mourão, F. A., Jacobi, C. M. Figueira, J. E. C & Batista, E. K. L. 2009. Effects of the parasitism of Struthanthus flexicaulis (Mart.) Mart. (Loranthaceae) on the fitness of Mimosa calodendron Mart. (Fabaceae), an endemic shrub from rupestrian fields over ironstone outcrops, Minas Gerais State, Brazil. Acta botanica brasilica 23: 820-825. Nimer, E. & Brandão, A. M.. 1989. Balanço Hídrico e clima da região dos Cerrados. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Rio de Janeiro, Brazil. Norberg, R. A. 1997. Na ecological theory on foraging time and energetics and choice of optimal food-searching method. Journal of Animal Ecology 46:511-529. Norton, D. A. & Carpenter, M. A. 1998. Mistletoes parasites: host specificity and speciation. Trends in Ecology and Evolution, 13: 101-105. Overton, J.M. 1994. Dispersal and infection in mistletoe metapopulations. Journal of Ecology, 82: 711-723. Pianka, E. R. 1981. Competition and niche theory. In: Theorical Ecology. 2ed p. 167196. Oxford: Blackwell Scientific. Press, M. C. & Phoenix, G. K. 2005. Impacts of parasitic plants on natural communities. New Phytologist, 166: 737-751. Press M. C.; Scholes, J. D. & Watling, J. R. 1999. Parasitic plants: physiological e ecological interactions whit their hosts in Press, M. C.; Scholes, J. D. & Barker M. G.; (eds.) Physiological plant Ecology. Blackwell Scientific Oxford, 175-197 pp. Rizzini, C. T. 1980. Loranthaceae of the central Brazil. Arquivos do Jardim Botânico do Rio de Janeiro, 24: 19-50. Rizzini, C. T. 1997. Tratado de Fitogeografia do Brasil: Aspectos Ecológicos, Sociológicos e Florísticos. 2 º ed. Âmbito Cultural Edições Ltda, Brazil. 32 Roxburgh, L. & Nicolson, S.W. 2005. Patterns of host use in two African mistletoes: the importance of mistletoe-host compatibility and avian disperser behaviour. Functional Ecology, 19: 865-873. Runyon, J. B. Mescher, M. C. & De Moraes, C. M. 2006. Volatile chemical cues guide host location and host selection by parasitic plants. Science, 313: 1964-1967. Salzman, A. G. 1985. Habitat selection in a clonal plants. Science, 228: 603-604. Slade, A. J. & Hutchings, M. J. 1987. The effects of light intensity on foraging in the clonal herb Glechoma hederacea. Journal of Ecology, 75: 639-650. Shen, H.; Ye, W.; Hong, L.; Huang, H.; Wang, Z.; Deng, X.; Yang, Q.; Xu, Z. 2006. Progress in parasitic plant biology: Host selection and nutrient transfer. Plant Biology, 8: 175-185. Tennakoon, K. U. & Pate, J. S. 1996. Effects of parasitism by a mistletoe on the structure and functioning of branches of its host. Plant, Cell and Environment, 19:517-528. Teodoro, G. S. 2010. Estrutura e dinâmica metapopulacional da erva-de-passarinho Psittacamthus robustos Mart. (Loranthaceae) em manchas de habitat em três áreas de Cerrado. Dissertação de mestrado. Universidade Federal de Lavras, 85 p. Viana, P. L. & Lombardi, J. A. 2007. Florística e caracterização dos campos rupestres sobre a canga na Serra da Calçada, Minas Gerais, Brasil. Rodriguésia, 58: 159-177. Wootton, J. T. 1992. Indirect effects, prey susceptibility, and habitat selection: impacts of birds on limpets and algae. Ecology, 73:981-991. Yan, Z. G. 1993. Low water potentials as a deterrent to mistletoes. Haustorium, 27:2. 33 Anexo 1 – Diferentes fenofases de Struthanthus flexicaulis (Mart.) Mart. (Loranthaceae) Retirado de Mourão 2007. A B C D E Fig.1- Struthanthus flexicaulis (Mart.) Mart. A) Ramos longos e flageliformes com folhas verdes oblongo-abovaladas de tamanhos variados; B) Botões e flores; C) Frutos; D) Germinação da semente; E) Apressórios (indicados pela setas). Escala: Barra = 1cm. 34 CAPÍTULO 2 Modelagem espacial do espalhamento da planta parasita Struthanthus flexicaulis (Loranthaceae) em paisagens de afloramentos ferruginosos, Brasil. Fabiana Alves Mourão1, Júlio César Mansur Filho2, Claudia Maria Jacobi1, José Eugênio Côrtes Figueira1 e Ronald Dickman2 1 Departamento de Biologia Geral, Instituto de Ciências Biológicas, Universidade Federal de Minas Gerais. 2 Departamento de Física, Instituto de Ciências Exatas, Universidade Federal de Minas Gerais. 34 Resumo A utilização de modelos matemáticos em estudos ecológicos auxilia na compreensão dos padrões de dispersão de organismos na paisagem. Modelos de simulação de espalhamento de plantas parasitas já têm sido propostos, principalmente para avaliar a dispersão ornitocórica. Este estudo se propõe utilizar do modelo de Gás em Rede na simulação da dinâmica do espalhamento de Struthanthus flexicaulis em uma paisagem virtual com características semelhantes à da área de estudos. A dinâmica da propagação da parasita foi modelada em duas etapas: 1) definição da paisagem para seu espalhamento e 2) escolha dos parâmetros do modelo. Na construção da paisagem foi considerado apenas um tipo de hospedeira. A paisagem gerada manteve as características de densidades e distribuição espacial de hospedeiras semelhante às que foram determinadas em campo. Os parâmetros avaliados foram a velocidade de propagação da parasita e o número de hospedeiras infectadas após a saturação. Os parâmetros demográficos da população de hospedeiras foram desconsiderados. A dispersão ornitocórica foi a principal maneira de infestação na paisagem durante os primeiros 12 meses. As áreas de maiores agrupamentos de hospedeiras foram as que mais recebem ramos através da dispersão vegetativa. Ao final de 192 meses, mimosas isoladas raramente foram parasitadas. Os resultados desta simulação demonstram a importância da agregação de hospedeiras no espalhamento da parasita, sendo a dispersão ornitocórica fundamental para acelerar o processo de espalhamento na paisagem simulada. Palavras-chave: autômatos celulares, densidade de hospedeiras, dispersão vegetativa e ornitocórica, Gás em Rede, parasita. 35 Introdução Os padrões de dispersão de organismos na paisagem possibilitam compreender os aspectos ecológicos e evolutivos de uma espécie e estão relacionados à distribuição, dinâmica e interações com outros organismos (Kareiva 1994). Esses padrões podem ser modelados matematicamente através de duas abordagens: paisagens espacialmente implícitas ou explícitas. Em uma abordagem espacialmente implícita considera-se que todas as manchas (fragmentos de habitat) na paisagem são iguais e igualmente acessíveis para todos os organismos, como no modelo de metapopulações inicialmente proposto por Richard Levins (Levins 1970, Hanski & Simberloff 1997). Já na abordagem espacialmente explícita, as manchas são localizadas em coordenadas geográficas fixas permitindo a avaliação das distâncias de dispersão dos organismos e a relação entre populações dentro de manchas de habitat e outras características da paisagem (Dunning et al. 1995). Um exemplo dessa abordagem são os modelos baseados em indivíduos (MBI) (Huston et al. 1988) que permitem acompanhar o destino de cada indivíduo de uma população separadamente (Caswell & Etter 1993, Mistro & Jacobi 1999, Cumming 2002; Cannas et al. 2003) e por isso adquirem um grau de realismo maior, podendo incorporar características biológicas distintas associadas à idade, tamanho ou estágio de desenvolvimento de cada indivíduo na população. Modelos de simulação de espalhamento de plantas parasitas em que a paisagem é um mapa de diferentes hospedeiras já têm sido propostos, mas principalmente para caracterizar o comportamento das aves que dispersam suas sementes (Overton 1996; Vallauri 1998; Lavorel et al. 1999). Os modelos que consideram populações estruturadas espacialmente ajudaram a entender mecanismos envolvidos na dispersão, por aves, das sementes das Loranthaceae Phrygilanthus sonorae (Overton 1994) e Amyema preissii (Lavorel et al. 1999) entre as árvores de uma floresta real cujos dados coletados em campo foram utilizados para compor uma paisagem simulada. As espécies vegetais não estão presentes no ambiente apenas em decorrência da qualidade do habitat-matriz, mas sim devido a uma distribuição diferenciada de recursos, o que resulta em aproveitamentos diferentes da paisagem. No estudo de estrutura de metacomunidades em um ecossistema aquático, Cottenie e de Meester (2004) destacaram a qualidade dos recursos como o principal fator influenciando a distribuição 36 de fitoplâncton, para justificar o comportamento de dispersão de populações entre fragmentos. De forma semelhante aos resultados encontrados por Cottenie e de Meester (2004), a comunidade vegetal de afloramentos ferruginosos tem sua distribuição limitada pela escassez de água e nutrientes, temperaturas elevadas e reduzida camada de solo, e deve enfrentar o efeito combinado desses e outros fatores estressantes (Silva et al. 1996, Klein 2000, Rosière & Chemale 2000, Vilela et al. 2004). A fina camada de solo, quando existente, é constituída de metais pesados e minério de ferro (Benites et al. 2007) e se acumula em fissuras e reentrâncias da rocha. A vegetação adere-se a essas fissuras (onde a água pode ficar algum tempo retida na estação chuvosa, Silva 1991), crescendo entre as fendas e em pequenos acúmulos de matéria orgânica (Barth 1987). Como as fissuras na rocha aparecem irregularmente na paisagem, permitem a formação de um mosaico onde eventualmente estão presentes ilhas de vegetação (Barth 1987). O solo influencia a sobrevivência das plantas em cada ilha contribuindo para a heterogeneidade fisionômica da comunidade (Vincent 2004). A distribuição de plantas parasitas é menos afetada por condições edáficas, hidrológicas e nutricionais, devido à sua capacidade de retirar água e nutrientes das hospedeiras. Entretanto, suas hospedeiras podem sofrer variações demográficas em larga escala espacial e temporal provenientes da disponibilidade diferencial de recursos, limitando por sua vez a distribuição das parasitas (Ehleringer & Marshall, 1995). Ainda há poucos estudos quantitativos sobre sua dinâmica populacional, que são obrigatoriamente vinculadas à distribuição espacial das suas hospedeiras (Shaw et al. 2004, Teodoro 2010, Arruda & van der Berg dados não publicados). A ecologia das plantas parasitas têm sido estudada em diferentes ecossistemas (Arruda et al. in press.), focando especialmente a dispersão de sementes (Sutton 1951, Davidar 1978, Overton 1994, del Rio et al. 1996, López-de-Buen e Ornelas 1999, Aukema & del Rio 2002, Amico et al. 2009) e a especificidade de parasitismo (Kuijt 1963, Barlow & Wiens 1977, Thomson & Mahal 1983, Hoffman et al. 1986, Mourão et al. 2006, Arruda et al. 2006, Fadini 2011), ou sua condição fisiológica (Dean et al. 1994, Bickford et al. 2005). Muitos modelos propostos na Física têm sido adaptados e usados em sistemas biológicos, pois têm relativa simplicidade e procuram explicar os fenômenos de forma objetiva com elevado rigor matemático (Giacomini 2007). Um exemplo é o modelo de Gás em Rede. Este modelo faz parte de uma família de modelos conhecidos como Autômatos Celulares, que lida com difusão de partículas que se movem em uma rede 37 discreta. Cada partícula pode se propagar para sítios vizinhos, movendo-se através de saltos de um sítio para outro, em um espaço de tempo determinado (Wolf 2002). O modelo de Gás em Rede tem sido utilizado para investigar a dinâmica de predadores e suas presas (Satulovsky & Tome 1994, Chen et al. 2006), e para estudar a mobilidade de organismos (Rodrigues & Tomé 2008). Este modelo é capaz de incorporar padrões espaciais de distribuição de espécies, bem como outras características importantes do sistema estudado (Rodrigues & Tomé 2008), utilizando regras e condições iniciais muito simples, característica que o torna bastante interessante para simular sistemas mais complexos. O objetivo deste trabalho foi construir e utilizar o modelo de Gás em Rede na simulação da dinâmica do espalhamento de S. flexicaulis em uma paisagem virtual com características semelhantes à da área natural, comparando sua dispersão ornitocórica e vegetativa. A principal hipótese é que a dispersão ornitocórica, responsável por novos focos de parasitismo, potencializará a velocidade de espalhamento da parasita, enquanto a dispersão vegetativa será responsável pela colonização dos agrupamentos, levando à saturação do sistema. Material e Métodos A construção do modelo da dinâmica da propagação da parasita S. flexicaulis na paisagem foi feita em duas etapas. A primeira consistiu em definir a paisagem e a segunda em estabelecer os parâmetros do modelo de espalhamento. Na construção da paisagem foi considerado apenas um tipo de hospedeira, Mimosa calodendron (Fabaceae), que é mais abundante e mais parasitada na área de estudo (Mourão et al. 2006; 2009). Esta espécie é endêmica dos afloramentos ferruginosos do Quadrilátero Ferrífero (Barneby 1991; Jacobi & Carmo 2012), apresenta porte arbustivo e suas populações são agregadas, aparecendo como grandes manchas verdes na paisagem (Mourão et al. 2009). Por se tratar de uma leguminosa, M. calodendron possivelmente contribui para o enriquecimento de nitrogênio do solo dos afloramentos que são pobres em nutrientes. Sua copa densa ajuda a reduzir as altas temperaturas do substrato e a aumentar significativamente a formação de solo, através da incorporação de matéria orgânica (Jacobi et al. 2007). Construção da Paisagem para a simulação Para criar a paisagem da simulação foi tirada uma fotografia aérea de uma área de aproximadamente 8200 m2, que depois de impressa foi subdividida em 16 partes onde 38 sobre cada uma foi colocada sob uma rede quadrada (L x M) de 10 x 10 cm2 dividida em intervalos de 0,5 cm (quadrículas)(Fig. 1A). Foram determinados: 1) o número total de quadrículas, representando todos os sítios possíveis para a localização de hospedeiras (N constante = 400 por que todas as partes possuíam tamanhos de rede iguais) e 2) em cada parte, o número das quadrículas que foram preenchidas por 50% ou mais pelas hospedeiras (mimosas). Estas últimas representam os sítios que efetivamente foram encontradas hospedeiras e, portanto são favoráveis à presença da parasita. Para determinar a densidade de M. calodendron (ρ), o número de sítios favoráveis foi dividido pelo total de sítios possíveis (favoráveis e não favoráveis). Para descobrir a fração de pares vizinhos (o grau de agregação das hospedeiras na paisagem) calculou-se o r1,1. Este parâmetro descreve a probabilidade de se ter vizinhos ocupados por hospedeiras (quadrícula esquerda e/ou superior conforme a figura 1B). A B Quadrícula Quadrícula Figura 1 – Representação esquemática da obtenção dos valores de densidade de hospedeiras e de pares de vizinhos em: A) Rede de 6 x 6 cm colocada sobre a foto aérea mostrando a localização de hospedeiras. A barra lateral em amarelo corresponde a 1 cm na figura e o centro de uma quadrícula à outra corresponde a 1 m em escala real. Esta imagem foi quadriculada para estimar sua densidade e probabilidade de se encontrar vizinhas; B) representação esquemática da estratégia utilizada para a contagem do número de hospedeiras vizinhas sem repeti-las. Os sentidos das setas indicam como os pares de vizinhas foram determinados. Cada quadrícula pode ter zero, um ou dois vizinhos ocupados (sítios favoráveis). Após analisar cada quadrícula e determinar o número de vizinhos existentes, calculou-se o número de pares de vizinhos possíveis que é dado por 2LM – (L+M); sendo L = número de quadrículas na vertical e M = número de quadrículas na horizontal. A fração 39 de pares vizinhos (r1,1) foi calculado dividindo-se o número de vizinhos encontrados pelo número de pares de vizinhos possíveis (Fig. 1). Uma vez calculada a densidade de partículas (hospedeiras) e a ocorrência de pares vizinhos, foi utilizado o modelo de difusão de partículas de Gás em Rede, que na sua forma mais simples, possui o número de partículas (hospedeiras) fixo e as interações somente ocorrem entre pares de vizinhos. A paisagem gerada manteve as características de densidades e distribuição espacial de hospedeiras de forma semelhante às que foram determinadas em campo. Neste modelo a interação entre partículas (hospedeiras) pode ser descrita por potenciais repulsivos de curto alcance (repulsão de partículas) com a energia escrita da seguinte forma: Onde σ i,j = 1 ou 0 caso o sítio esteja ocupado ou vazio e σ k,l = posição de cada sítio. Devido a esse tipo de interação, cada sítio (quadrícula) pode conter apenas uma partícula (hospedeira) e o espaçamento de rede representa o raio da mesma. Na paisagem real, o centro de uma quadrícula à outra corresponde a aproximadamente 1 m. Para fins de ilustração pode-se imaginar que o centro de cada hospedeira está situado nos vértices da rede (Fig. 2). O valor da energia do sistema (E) corresponderá à paisagem real, pois leva em consideração a densidade de hospedeiras e a probabilidade de formação de agrupamento (número de pares vizinhos). Um paralelo pode ser traçado entre a energia de repulsão de partículas e o substrato dos afloramentos ferruginoso, em que maior energia de repulsão (valor absoluto) significaria substratos mais compactos (sem fissuras nas rochas e solos, quando existentes, pouco profundos). Como as hospedeiras se estabelecem em fissuras ou fendas no substrato, intuitivamente áreas de menor densidade de hospedeiras e menores probabilidades de formação de agrupamentos devem apresentar maior energia de repulsão de partículas. Figura 2- Ilustração da posição espacial das hospedeiras em uma rede quadrada. 40 A energia de repulsão é influenciada pela Temperatura (T), uma grandeza física que mede a energia cinética de cada uma das partículas de um sistema em equilíbrio. É possível variar a paisagem modificando apenas os valores de temperatura e mantendo os de densidade de partículas (hospedeiras) e número de pares vizinhos (Fig. 3). Este procedimento é necessário para determinar em que temperatura o modelo irá rodar as simulações, já que a paisagem gerada deve se assemelhar à paisagem real. De acordo com o comportamento de partículas de gás na Física quando a temperatura é alta, menor agrupamento de partículas é esperado. Neste estudo isso corresponderia a regiões cada vez menos apropriadas para a propagação vegetativa da parasita, já que as mimosas estariam dispostas de maneira mais isolada na paisagem. Foi usado o teste de Monte Carlo para simular a dinâmica de interação de partículas, e a paisagem foi aceita quando a energia de repulsão de partículas foi menor ou igual à energia gerada com os dados de campo. Para encontrar este parâmetro foram usadas diferentes Temperaturas (T). A implementação do algoritmo computacional do processo foi feito pelo método Markoviano, que é um processo estocástico e tem como propriedade a falta de memória, sendo sua evolução de um tempo tn a tn+1 dependente apenas do seu valor no presente. Neste modelo as N partículas foram distribuídas aleatoriamente numa rede quadrada L x L sítios com condições de contorno periódicos. Isso significa que as partículas localizadas em uma das bordas da rede fazem contato com as outras do lado oposto, de modo que todas as partículas tenham iguais condições de se tornarem contaminadas e de transmitir propágulos da parasita. A configuração final da paisagem foi dada após o tempo de relaxação (estabilização), quando o sistema chega a um estado de equilíbrio de menor energia (Fig. 3). Depois de fixado o valor da densidade, os valores de r1,1 correspondentes ao da paisagem real foram estimados a partir da variação de temperatura para definir qual ou quais deveriam ser usadas no modelo (Fig. 4). Os resultados da variação dos valores de r1,1 estão dentro dos limites da variação encontrada para a paisagem real (Tabela 1). A partir destes resultados definiu-se o tamanho da rede L= 100 que foi usada no modelo e a temperatura de 0,53 e L=50 e temperatura de 0,525 já que apresentaram agrupamentos de partículas melhor distribuídas na paisagem, semelhante à paisagem rea 41 Figura 3 – Paisagens geradas pelo modelo de Gás em Rede em uma rede quadrada L x L sítios com L = 400. A densidade de hospedeiras foi ρ = 0,2. Os padrões para cada temperatura foram gerados após 150.000 permutações do teste de Monte Carlo. As variações de temperatura permitem modificar a agregação das partículas (hospedeiras), sendo mais agregadas em temperaturas menores. Estes padrões podem ser visualizados na sequencia acima, que parte de agregados compactados com bordas suaves até uma total desagregação. 42 Tabela 1 – Valores de r1,1 calculados a partir da variação de temperatura e que se encontra dentro do erro esperado para a paisagem real, para os tamanhos de rede L = 50, L = 100, L = 200 e L = 400. A B Figura 4 – Estimativa dos valores de probabilidade de formação de pares de vizinhos (r1,1) com a variação de temperatura no modelo (T). A legenda representa o tamanho das redes discretas utilizadas. Em A a área destacada mostra a variação dos valores de r 1,1 em função das temperaturas e em B tem-se uma ampliação desta área. Note que os valores de r1,1 escolhidos são próximos ao encontrado para a paisagem real e sua variação está de acordo com o erro encontrado. Figura 4 – Estimativa dos valores de probabilidade de formação de pares de vizinhos (r1,1) com a variação de temperatura no modelo (T). A legenda representa o tamanho das redes discretas utilizadas. Na figura da esquerda a área destacada mostra a variação dos valores de r 1,1 em função das temperaturas e à direita tem-se uma ampliação desta área. Note que os valores de r1,1 escolhidos são próximos ao encontrado para a paisagem real e sua variação está de acordo com o erro encontrado. Parâmetros do modelo de propagação da parasita Após a germinação, as plântulas de S. flexicaulis emitem ramos em forma de flagelos, com pequenas folhas e fixados à planta hospedeira espaçadamente por 43 haustórios, e gradualmente ocupam a copa da hospedeira. A partir das bordas desta copa, os ramos de S. flexicaulis podem alcançar a copa de outra hospedeira, da mesma ou de outra espécie, situada em diferentes distâncias com probabilidades que variam de 70 a 0% (Cap. 1 – figura 4B). Na área de estudo há variações notáveis na densidade de plantas e, portanto, nas chances de crescimento de S. flexicaulis. A chance de passar de uma hospedeira para outra depende do distanciamento de entre copas e quando a distância é superior a 1m pode interromper localmente o crescimento vegetativo (Mourão dados não publicados). Algumas características dos afloramentos ferruginosos e da parasita supostamente influenciam diretamente o processo de expansão deverão obrigatoriamente compor o algoritmo que simulará a expansão de S. flexicaulis. Nesta versão preliminar do modelo foram incluídas as seguintes características 1) agrupamento de hospedeiras; 2) desenvolvimentos de ramos exploratórios; 3) contágio de novas hospedeiras dependente da distância; 4) morte dos ramos ocorrendo quando em contato direto com a superfície do afloramento ferruginoso que, durante o dia, pode atingir temperaturas bastante elevadas; 5) rochas nuas. Futuramente poderão ser incluídos no modelo outros parâmetros tais como: 1) preferências da ave por local de alimentação (altura e agrupamento das hospedeiras); 2) diferentes regras para o contágio de novas hospedeiras que depende: da altura, diâmetro, distância e tipo de hospedeira; 3) modificações na qualidade da matriz através do acréscimo de diferentes porcentagens de rochas nuas e presença de outras plantas; 4) variações na densidade de hospedeiras; 5) morte, nascimento e crescimento de hospedeiras. Uma vez definida a paisagem, o modelo considera sítios saudáveis (Ns) quando há ocorrência de mimosas não infectadas e sítios infectados (Ninf). Em cada iteração, os sítios poderão ser infectados até os terceiros vizinhos (Fig. 5). Figura 5 – Desenho esquemático do número de vizinhos e seu posicionamento na rede. 44 A simulação do espalhamento de S. flexicaulis num mosaico ambiental representando a variedade de hospedeiras de tamanhos iguais e solo nu típicos da área ocorre quando uma hospedeira é sorteada como fonte da parasita (dispersão ornitocórica) e a partir dela ocorrerá a expansão de ramos vegetativamente, iniciando a simulação. O tempo de cada iteração no modelo correspondeu a 1 mês e neste mesmo tempo os ramos da parasita podem atingir um crescimento médio de 20 cm (F. A. Mourão, obs. pess.). A infecção de uma hospedeira pode ocorrer de duas maneiras: 1) propagação por aves, que independe da distância de uma mimosa infectada e assumiu-se que a taxa de dispersão ornitocórica seria de µ=0,005/mês e 2) propagação vegetativa, onde assumindo-se que a taxa seria de λ = 0,1/mês. A taxa de espalhamento (dispersão ornitocórica + vegetativa) foi dada por: R= 4 ctλ Ninf + µ Ns , onde ct= 1 + 1/√2 + ½; Ninf = número de sítios infectados (hospedeiras infectadas) e Ns = número de sítios saudáveis (mimosas que podem ser infectadas). Após a escolha e infecção das hospedeiras (sítios saudáveis), os ramos das hospedeiras infectadas poderão atingir outras plantas (Fig. 6). Caso parte de um ou mais ramos se posicione dentro da copa de outra hospedeira a transmissão terá sido bem sucedida e o processo se reiniciará. Figura 6- Esquema do funcionamento do modelo de propagação. 45 A expansão pode ser interrompida caso a hospedeira já esteja infectada ou os ramos não se posicionem dentro de sítios considerados bons (copas de mimosas). Nesse caso, será investigado como alterações na estrutura da paisagem poderiam afetar a velocidade de espalhamento e o número de plantas virtuais parasitadas. A cada unidade de tempo, a propagação de ramos pode ocorrer na horizontal, vertical e diagonal, e poderá atingir primeiros, segundos e terceiros vizinhos com probabilidades diferenciadas. Essas probabilidades de infecção são maiores para os primeiros vizinhos, sendo 0,7 vezes menor para segundos e 2 vezes menor para terceiros. As regras para a simulação foram: 1) Escolher um dos quatro primeiros vizinhos do sítio infectado e se estiver saudável infecta-lo; 2) Escolher um dos quatro segundos vizinhos e se estiver saudável, infectá-lo; 3) Escolher um dos quatro terceiros vizinhos e se estiver saudável, infectá-lo; 4) Caso exista um sítio saudável entre o sítio central infectado e seu terceiro vizinho, infectá-lo também. 5) Atualizar o tempo. O modelo guardará o número de sítios (hospedeiras) infectados a cada simulação para os padrões gerados usando uma paisagem de L=100, e as taxas µ=0,005/mês e λ=0,1/mês. As simulações foram feitas para tempo t = 12, 24, 36, 48, 60 e 192 meses. No tempo t=0, ocorre o sorteio das quadrículas que serão infectadas por dispersão ornitocórica (deposição de sementes), numa taxa de µ* Ns. Em seguida, os ramos da parasita começam seu desenvolvimento, levando 10 meses para atingir uma vizinha. A cada iteração, novos focos de parasitismo são sorteados. Pelas regras do modelo hospedeiras já infectadas não podem mais ser sorteadas. Esta regra superestima a dispersão ornitocórica já que em uma situação real as aves podem depositar sementes nas mesmas hospedeiras. Este algoritmo poderia ser melhorado se fossem coletados dados de campo para calcular a probabilidade de deposição de sementes na mesma hospedeira, em hospedeiras mortas, em agrupamentos e em plantas isoladas. Para obter a velocidade de expansão foi calculada a média de hospedeiras infectadas de 10 amostras de paisagens diferentes, iniciando a partir de cada uma das 280 mimosas na rede não infectada (ρ*L2) para uma rede quadrada L=50, t=0,525 e ρ = 0,112, mantendo as mesmas características da paisagem real. No final temos ρ(t) calculado para 2800 amostras. As iterações foram até 1000 meses (aproximadamente 83 46 anos). O desvio padrão da média para esta densidade foi da ordem de 10-4 ou menores, deixando a barra de erro insignificante. A taxa de λ = 0,1/mês para a dispersão vegetativa foi mantida fixa durante a simulação, pois a propagação via passagem de ramos deve se manter relativamente constante ao longo do tempo. Mas a dispersão ornitocórica é incerta, pois depende da área de ocorrência das aves, o tamanho de sua população, suas preferencias alimentares, seu comportamento, dentre outros fatores. Assim, variou-se a taxa µ de 0,005/mês, em 10 (0,0005/mês) e em 100 (0,00005/mês) vezes. Nesta simulação foram desconsiderados a mortalidade de hospedeiras infectadas, o recrutamento de novas hospedeiras, seu crescimento ao longo do tempo e seus diferentes tamanhos. Tampouco foram incorporados dados sobre estocasticidade demográfica e ambiental nos cálculos. Por exemplo, sabe-se que a morte da hospedeira pode interromper localmente o crescimento vegetativo, provocando a morte da parasita quando esta não consegue emitir ramos capazes de atingir outra hospedeira. A chance de passar de uma hospedeira para outra depende também do tamanho e da arquitetura de suas copas, já que copas maiores são “alvos” mais fáceis de serem alcançados pelos ramos que copas menores. Entretanto, no modelo todas as mimosas tiveram chances iguais de serem infectadas pelos ramos da parasita, pois não diferem quanto ao tamanho e idade. A passagem dos ramos é interrompida quando a parasita se propaga para um sítio inapropriado, ou seja, que não contém uma mimosa. Resultados Paisagem A paisagem apresentou vários agrupamentos de hospedeiras muito semelhantes aos encontrados na área de estudo. Em uma área de apenas 16 m2 foi possível encontrar até 36 hospedeiras, demonstrando o alto padrão de agregação (Mourão 2007). A densidade média de hospedeiras (ρ) encontrada para a paisagem real foi de 0,112 ± 0,005 e a probabilidade média de agregação (r1,1) foi de 0,061 ± 0,007. A escolha do tamanho da rede de L = 50 e L = 100 foram baseadas no tempo de simulação e disposição das hospedeiras na paisagem virtual (Fig. 7). 47 Figura 7 – Características da paisagem gerada pela temperatura escolhida (T=0,53). O tamanho da rede de L=100 e r1,1 = 0,061±0,002. O agrupamento de hospedeiras (em verde) foi semelhante ao da área de estudo. Simulação Na simulação, durante os primeiros 12 meses a dispersão ornitocórica foi a principal maneira de infestação na paisagem, já que os ramos da parasita levariam 10 meses aproximadamente para atingir o centro de uma quadrícula susceptível à infecção (Fig. 8a). Já após 24 meses ficou evidente que as áreas de maiores densidades de hospedeiras foram as que mais recebem ramos através da dispersão vegetativa (Figs. 8b e c). Essas manchas são completamente tomadas com a passagem do tempo (Figs. 8c-f). Como as hospedeiras continuam recebendo sementes das aves, novos pontos de infestação iniciam-se, elevando a velocidade de espalhamento da parasita e aumentando sua área de atuação. É interessante notar que ao final de 192 meses mimosas isoladas raramente foram infectadas (Fig. 8f). A distância acima de 2 m entre as hospedeiras impediu a passagem de ramos, já que neste modelo foi desconsiderada a existência de outras plantas. Neste caso, estas hospedeiras isoladas só poderiam ser infectadas apenas via dispersão por aves. 48 49 Figura 8 – Paisagens simuladas com propagação da parasita para rede L= 100 e intervalos de tempo t= 12, 24, 36, 48, 60 e 192 meses. Pontos verdes representam mimosas saudáveis, os azuis as mimosas infectadas por pássaros (dispersão ornitocórica) e os vermelhos as mimosas infectadas por passagem de ramos (dispersão vegetativa). Velocidade de espalhamento As curvas de velocidade de espalhamento da parasita são do tipo sigmoide, apresentando-se lento inicialmente, seguido por um rápido aumento exponencial e finalmente estabilizando quando o sistema está saturado. O espalhamento lento ocorreu quando plantas sadias foram infectadas basicamente por deposição de “sementes da parasita” nos galhos das hospedeiras (dispersão ornitocórica), e a duração desta fase dependeu da taxa de dispersão ornitocórica (Fig. 9). Quando essa taxa foi de 0,005/mês, a fase exponencial teve seu fim próximo a 98 meses, mas quando foi reduzida em 100 vezes, teve seu fim em aproximadamente 500 meses. Durante o aumento exponencial as duas dispersões atuaram simultaneamente, acelerando o espalhamento da parasita na paisagem. A saturação do sistema ocorreu quando praticamente todos os agrupamentos foram parasitados (Fig. 8f), limitando a passagem de ramos. (meses) Fig. 9. Densidade média de mimosas infectadas, os valores de λ e µ correspondem às taxas de propagação vegetativa e infecção espontânea (dispersão ornitocórica). As linhas coloridas indicam variações em uma destas taxas. 50 Mantendo as taxas de dispersão vegetativa e ornitocórica propostas para este modelo, em aproximadamente 98 meses a densidade média de hospedeiras infectadas seria de 80% e chegaria a 90% em 500 meses (Fig. 9). Quando a taxa da dispersão ornitocórica foi reduzida em 10 vezes (linha azul marinho da Fig. 9), demorou 200 meses para que a população de mimosas se tornasse 70% infectada e a porcentagem máxima ficou em torno de 78% em 1000 meses. Já quando foi reduzida em 100 vezes (linha verde da Fig. 9), em 500 meses haveria cerca de 50% de mimosas infectadas. Discussão A dispersão ornitocórica foi fundamental para acelerar o processo de espalhamento da parasita na paisagem simulada. O papel da ave dispersora tem grande importância no ciclo de vida destas plantas, pois suas sementes necessitam da remoção do seu exocarpo para germinar (Ladley & Kelly 1996). As aves contribuem para a reprodução sexuada da parasita garantindo o aumento da diversidade gênica na espécie através da propagação de sementes. Como recompensa as aves obtém energia consumindo frutos de S. flexicaulis que são provavelmente ricos em lipídios (Watson 2001, Guerra 2005). Na natureza, a agregação de hospedeiras pode facilitar a localização de manchas na paisagem por aves dispersoras e aumentar as chances de deposição de sementes (dispersão ornitocórica) (Aukema & Martinez del Rio 2002). O comportamento da ave foi de certa maneira retratado no modelo, quando a agregação de partículas aumentou a chance de novos focos de parasitismo iniciar em agrupamentos. A dispersão ornitocórica, que depende exclusivamente do comportamento das aves, pode atingir regiões mais distantes. Sabe-se que a ave Elaenia cristata (Tyrannidae), principal dispersora de S. flexicaulis em um afloramento rupestre no sudeste do Brasil, foi capaz de dispersar sementes desta parasita a uma distância de até 86 metros (Guerra 2005). A atuação das aves depositando sementes a grandes distâncias na paisagem é uma explicação plausível para o acelerado processo de dispersão. Este mesmo fenômeno foi observado por Clark et al. (1998) quando descreveu a importância dos eventos raros de dispersão de sementes quando são carregadas para muito longe da planta-mãe, iniciando novas colonizações e acelerando o processo de migração de árvores após a era glacial. De acordo com este autor, a distância percorrida por estas sementes pode ser descrita 51 por uma curva de cauda longa e estes raros eventos são os responsáveis pelo acelerado avanço da população de plantas na paisagem. O espalhamento de S. flexicaulis em curtas distâncias se deveu principalmente à dispersão vegetativa. Como o crescimento de ramos é limitado, não ultrapassando 1,5 m/ano (F. A. Mourão obs. pes.), esse tipo de dispersão tem curto alcance. A dispersão vegetativa é favorecida quando as copas das hospedeiras estão muito próximas, já que os ramos da parasita podem passar de uma hospedeira à outra dentro de uma mesma mancha. Quando as hospedeiras se encontravam isoladas, a dispersão vegetativa tendeu a zero, sendo a dispersão ornitocórica praticamente o único modo de infecção de plantas na paisagem. Obviamente, pelas regras do modelo, manchas isoladas não transmitem parasitas via dispersão vegetativa e não podem infectar novas hospedeiras localizadas em outras manchas. Isso só foi possível quando as aves depositavam sementes em manchas não infectadas, iniciando o espalhamento em outras áreas. Em uma comunidade real, a permeabilidade da matriz é maior do que a considerada nesta simulação, já que outras plantas fazem parte do ambiente e poderiam ser infectadas ou até mesmo servir como uma “ponte” entre uma mimosa e outra. Os ramos da parasita teriam maior mobilidade de espalhamento, minimizando o efeito do substrato inóspito (Overton 1994), conectando as manchas espacialmente isoladas e acelerando a dispersão. Sabe-se que a altura das hospedeiras tende a ser positivamente correlacionada com a intensidade de infestação (Overton 1994; Aukema 2003; Mourão 2007). Na dispersão vegetativa, hospedeiras mais altas tem maior sucesso na passagem de ramos, pois estes podem atingir plantas vizinhas de diferentes tamanhos e os ramos podem se crescer, tocar o substrato e morrer (F. A. Mourão, dados não publicados). Já na dispersão ornitocórica, a propagação de sementes se dá em função da escolha do poleiro pelas aves, sendo as maiores as preferidas (Aukema & Del Rio 2002). Nesta simulação o modelo não considerou características individuais das hospedeiras como altura, diâmetro e mortalidade. Tampouco variou a densidade e agregação de hospedeiras. Mas por se tratar de um modelo flexível (Lee & Yang 1952, Chen et al. 1992, Romano 2002), tais parâmetros poderiam ser facilmente incorporados ao modelo, o que iria torná-lo mais realístico, embora extremamente complexo. Futuros cenários serão propostos para avaliar como a velocidade de expansão desta parasita pode variar em função destes parâmetros. 52 A simulação utilizando o modelo de Gás em Rede sugere que tanto a dispersão ornitocórica quanto a vegetativa desempenham papeis fundamentais e diferenciados no espalhamento de S. flexicaulis na área estudada. Enquanto a dispersão ornitocórica carrega as sementes da parasita e as deposita em para manchas mais distantes, a dispersão vegetativa garante a colonização da nova área. Referências bibliográficas Amico G. C., Rodríguez-Cabal M. A., Aizen M. A. 2009. The potential key seeddispersing role of the arboreal marsupial Dromiciops gliroides. Acta Oecologica 35: 8–13. Arruda, R.; Carvalho, L. N. & Del-Claro, K. 2006. Host specificity of a Brazilian mistletoe, Struthanthus aff. polyanthus (Loranthaceae), in cerrado tropical savanna. Flora, 201: 127-134. Aukema, J. E.; del Rio, C. M. 2002. Where does a fruit-eating bird deposit mistletoe seeds? Seed deposition patterns and an experiment. Ecology, 83: 3489-3496. Barlow, B. A. & Wiens, D. 1977. Host-parasite resemblance in Australian mistletoes: the case for cryptic mimicry. Evolution, 31: 69-84 Barneby, R. C. 1991. Sensitivae censitae: a description of the genus Mimosa Linneaus (Mimosaceae) in the New World. The New York Bootanical Gardens, New York, 835p. Barth, O. M. 1987. Importância apícola dos campos naturais e rupestres da Serra Norte de Carajás (PA). Boletim do Museu Paraense Emilio Goeldi. Série Botânica, 3: 21-28. Benites, V. M.; Shaefer, C. E. G. K.; Simas, F. N. B. & Santos, H. G. 2007. Soils associated with rock outcrops in the Brazilian mountain ranges Mantiqueira and Espinhaço. Revista Brasileira de Botânica. 4: 569-577. Bickford, C. P.; Kolb, T. E.; Geils, B. W. 2005. Host physiological condition regulates parasitic plant performance: Arceuthobium vaginatum subsp cryptopodum on Pinus ponderosa. Oecologia, 146: 179-189. Cannas, S. A.; Marco, D. E.; Paez, S. A. 2003. Modelling biological invasions: species traits, species interactions, and habitat heterogeneity. Mathematical Biosciences, 183: 93-110. Caswell, H.; Etter, R.J. 1993. Ecological interactions in patchy environments: from patch-occupancy models to cellular automata. IN: Patch Dynamics, S.A. Levin, T. 53 Powell e J. H. Steele eds., Lecture Notes in Biomathematics 96:93-109, SpringerVerlag, Berlin. Chen, H.; Chen, S. & Mattheus, W. H. 1992. Recovery of the Navier-Stokes equations using a lattice-gas Boltzmann method. Physical Review, 45: 5339-5342. Chen, Q.; Mao, J. & Li, W. 2006. Stability analysis of harvesting strategies in a cellular automata based predator-prey model. Lecture Notes in Computer Science 4173: 268276. Clark, J. S.; Fastie, C.; Hurtt, G.; Jackson, S. T.; Johnson, C.; King, G. A.; Lewis, M.; Lynch, J.; Pacala, S.; Prentice, C.; Schupp, E. W.; Webb III, T. & Wyckoff, P. 1998. Reid’s paradox of rapid plant migration. BioScience, 48:13-24. Cottenie, K.; De Meester, L. 2004. Metacommunity structure: Synergy of biotic interactions as selective agents and dispersal as fuel. Ecology, 85:114-119. Cumming, G. 2002. Habitat shape, species invasions, and reserve design: Insights from simple models. Conservation Ecology, 6:245. Davidar, P. 1978. Dispersal in some Loranthaceae of Nilgiris. Journal Bombay Natural History Society, 75: 943-945. Davidar, P. 1983. Birds and Neotropical mistletoes: effects on seedling recruitment. Oecologia, 60: 271-273. Dean, W. R. J.; Midgley, J. J. & Stock, W. D. 1994. The distribution of mistletoes in South-Africa- patterns of species richness and host choice. Journal of Biogeography, 21: 503-510. Del Rio, C. M.; Silva, A.; Medel, R. & Hourdequin, M. 1996. Seed dispersers as disease vectors: bird transmission of mistletoe seeds to plant hosts. Ecology, 77: 912921. Dunning, J. B., Stewart, D. J., Danielson, B. J., Noon, B. R., Root, T. L., Lamberson, R. H. & Stevens, E. E. 1995. Spatially Explicit Population Models: Current forms and future uses. Ecological Applications 5: 3-11. Ehleringer, J. R. & Marshall, J. D. 1995. Water relations. In: Press, M. C. & Grave, J. D. 1995. Eds. Parasitic plants. London: Chapman & Hall, pp.292. Fadini, R. F. 2011. Non-overlap of host used by three congeneric and sympatric loranthaceous mistletoe species in an Amazonian savanna: host generalization to extreme specialization. Acta Botânica Brasílica, 25: 337-345. Giacomini, H. C. 2007. Sete motivações teóricas para o uso de modelagem baseada no indivíduo em ecologia. Acta Amazônica 37: 431-446. 54 Hanski, I. & Simberloff, D. 1997. The metapopulation approach, its history, conceptual domain, and application to conservation. In: Metapopulation Biology. Eds: Hanski, I. A. & Gilpin, M. E. p 5 -26. Academic Press, San Diego, California. Hoffman, A. J. Fuentes, E. R., Cortes, I. Liberona, F. & Costa, V. 1986. Tristerix tetrandrus (Loranthaceae) and its hosts plants in the Chilean matorral: patterns and mechanisms. Oecologia, 69: 202-206. Huston, M. A., DeAngelis, D. & Post, W. 1988. Size bimodality in monospecific populations: a critical review of potential mechanisms. American Naturalist, 129: 678-707. Jacobi, C. M. & Carmo, F. F. (orgs.) 2012. Diversidade florística nas cangas do Quadrilátero Ferrífero (no prelo). Jacobi, C. M.; Carmo, F. F.; Vincent, R. C. & Stehmann, J. R. 2007. Plant communities on ironstones outcrops: a diverse and endangered Brazilian ecosystem. Biodiversity and Conservation, 16: 2185-2200. Kareiva, P. 1994. Special Feature: Space: The Final Frontier for Ecological Theory. Ecology. 75:1. Klein, C. 2000. Geochemistry and Petrology of some Proterozoic Banded IronFormations of the Quadrilátero Ferrífero, Minas Gerais, Brazil. Economic Geology, 95: 405-428. Kuijt, J. 1963. On the ecology and parasites of the Costa Rica Tree Mistletoe, Gaiadendron punctatum (Ruiz and Pavon). Canadian Journal of Botany, 41: 927938. Lavorel, S.; Smith, M.S.; Reid, N. 1999. Spread of mistletoes (Amyema preissii) in fragmented Australian woodlands: a simulation study. Landscape Ecology, 14: 147160. Lee, T. D. & Yang, C. N. 1952. Statistical theory of equations of state and phase transitions lattice-gas and ising model. Physical Review 87: 410-419. Levins, R. 1970.Extinction. Some Mathematical Problems in Biology. Ed. Gestenhaber, M. p 77 -107. American Mathematical Society, Providence, Reino Unido. López-de Buen, L. e Ornelas, J. F. 1999. Frugivorous birds, host selection and the mistletoe Psittacanthus schiedeanus, in central Veracruz, Mexico. Journal of Tropical Ecology, 15: 329-340. Mistro, D. C.; Jacobi, C. M. 1999. Autômatos celulares na dispersão de pólen. IN: IX Congresso Internacional de Biomatemática, Actas, v.1, p. 158-166. 55 Mourão, F. A.; Carmo, F. F; Ratton, P.; Jacobi, C. M. 2006. Hospedeiras da hemiparasita Struthanthus flexicaulis (Mart.) Mart. (Loranthaceae) em campos rupestres ferruginosos, Quadrilátero Ferrífero, MG. Lundiana, 7: 103-110. Mourão, F. A., Jacobi, C. M. Figueira, J. E. C & Batista, E. K. L. 2009. Effects of the parasitism of Struthanthus flexicaulis (Mart.) Mart. (Loranthaceae) on the fitness of Mimosa calodendron Mart. (Fabaceae), an endemic shrub from rupestrian fields over ironstone outcrops, Minas Gerais State, Brazil. Acta botanica brasilica 23: 820-825. Overton, J. M. 1994. Dispersal and infection in mistletoe metapopulations. Journal of Ecology, 82: 711-723. Overton, J. M. 1996. Spatial autocorrelation and dispersal in mistletoes: Field and simulation results. Vegetatio, 125: 83-98. Rodrigues, A. L. & Tomé, T. 2008. Reaction-diffusion stochastic lattice model for a predator-prey system. Brazilian Journal of Physics, 38: 87-93. Romano, S. 2002. Computer simulation study of nematogenic lattice-gas model with fourth-rank interactions. International Journal of Modern Physics B, 19:2901-2915. Sargent, S. 1995. Seed fate in a tropical mistletoe: the importance of host twig size. Functional Ecology, 9: 197-204. Satulovsky, J. E. & Tomé T. 1994. Stochastic lattice gas model for predator-prey system. Physical Review Letters. 49: 50 -73. Shaw, D. C.; Watson, D. M. & Mathiasen, R. L. 2004. Comparison of dwarf mistletoes (Arceuthobium spp., Viscaceae) in the Western United States with mistletoes (Amyema spp., Loranthaceae) in Australia-ecological analogs and reciprocal models for ecosystem management. Australian Journal of Botany, 52: 481-498. Silva, M. F. F.; Secco, R. S. & Lobo, M. G. A. 1996. Aspectos ecológicos da vegetação rupestre da serra dos Carajás, estado do Pará, Brasil. Acta Amazonica, 26: 17-44. Sutton, G. M. 1951. Mistletoe dispersal by birds. Wilson Bulletin, 63:235-237. Teodoro, G. S. 2010. Estrutura e dinâmica da erva-de-passarinho Psittacanthus Robustus Mart. em manchas de habitat em três áreas de cerrado Tese Mestrado em Ecologia Universidade Federal de Lavras, MG (Brazil), 74 p. Thomson, V. E. and Mahal, B. E. 1983. Host specificity by a mistletoe, Phoradendron villosum (Nutt.) Nutt. Subsp villosum, on three oak species in California. Botanical Gazette, 144: 124-131. 56 Vallauri, D. 1998. Parasite dynamics of Viscum album L. in Austrian black pine stands in the Saignon watershed (southwestern Alps). Annales des Sciences Forestieres, 55: 823-835. Viana, P. L. & Lombardi, J. A. 2007. Florística e caracterização dos campos rupestres sobre a canga na Serra da Calçada, Minas Gerais, Brasil. Rodriguésia, 58: 159-177. Vincent, R. C. 2004. Florística, fitossociologia e relações entre a vegetação e o solo em área de campos ferruginosos no Quadrilátero Ferrífero, Minas Gerais. Tese de doutorado. Universidade de São Paulo, São Paulo, 145p. Vilela, R. A.; Melo, R. J.; Costa, T. A. V.; Lagoeiro, L. E. & Varajão, C. A. C. 2004. Petrografia do minério hematita compacta da Mina do Tamanduá (Quadrilátero Ferrífero, MG). Revista Escola de Minas, Ouro Preto, 57: 157-164. Wolf, F.G., 2002. Simulação de Processos de Deslocamento Miscível Utilizando Modelos de Gás em Rede com Mediadores de Campo. Dissertação de Mestrado – Universidade Federal de Santa Catarina. 57 CAPÍTULO 3 Alocação de recursos da hemiparasita Struthanthus flexicaulis (Loranthaceae) em condições de estresse hídrico do ambiente. Fabiana Alves Mourão1, Claudia Maria Jacobi1 & José Eugenio Cortes Figueira1 1 Departamento de Biologia Geral, Instituto de Ciências Biológicas, Universidade Federal de Minas Gerais. 58 Resumo Padrões de alocação de recursos em plantas podem variar em função dos estresses ambientais aos quais estão submetidas. Entretanto, plantas parasitas poderiam não sofrer consequências já que usufruem permanentemente dos nutrientes retirados de suas hospedeiras. O objetivo desse trabalho foi verificar isto, comparando a alocação de recursos da parasita Struthanthus flexicaulis em diferentes condições de estresse hídrico do ambiente. Foram marcados 347 ramos principais que tiveram seu crescimento acompanhado por 9 meses. Estes ramos parasitavam 32 indivíduos de Mimosa calodendron, sua principal hospedeira em afloramentos ferruginosos. Mediu-se o comprimento de cada ramo principal, sua localização (dentro ou fora da copa), o número de ramos laterais, de folhas, de estruturas reprodutivas (botões, flores e frutos) e de ramos danificados por herbivoria ou ressecamento. Além disso, foram comparados ramos que cresciam em hospedeiras com três categorias de infestação. O crescimento de ramos foi maior na estação seca do que na estação chuvosa, contrariamente ao número de folhas. A mortalidade foi semelhante nos dois períodos, mas as causas foram diferentes. A sobrevivência dos ramos exploratórios (fora das copas) foi maior do que a dos internos (dentro das copas). Na estação seca não houve diferença significativa entre o crescimento, número de estruturas reprodutivas e de folhas entre os ramos exploratórios e internos. Já na estação chuvosa os ramos exploratórios cresceram mais e produziram mais estruturas reprodutivas, sem, no entanto, diferir dos ramos internos quanto ao número de folhas. Entre junho e agosto, os ramos em hospedeiras pouco parasitadas apresentaram menor crescimento quando comparados aos de hospedeiras muito parasitadas. O número de folhas seguiu o mesmo padrão e o de estruturas reprodutivas foi semelhante entre as três categorias. Já entre os meses de novembro a janeiro o crescimento não diferiu, mas os ramos que cresciam sobre as mimosas com parasitismo intermediário tiveram maior número de estruturas reprodutivas e de folhas. S. flexicaulis demonstrou sinais de estresse hídrico durante a estação seca, porque, apesar de ter investido mais em crescimento vegetativo, não produziu estruturas reprodutivas que são energicamente mais custosas. A parasita adotou diferentes estratégias para garantir sua sobrevivência quando alocou recursos para realizar diferentes funções durante as estações seca e chuvosa. Palavras-chave: alocação de recursos, disponibilidade de água, seca. 59 Introdução Os padrões de alocação de recursos em plantas influenciam sua habilidade de aquisição de nutrientes (Poorter et al. 1990), interações competitivas (Bazzaz et al. 1987), crescimento vegetativo e reprodução (de Jong & Klinkhamer 2005). Durante o crescimento, a fase vegetativa é o período de maior ganho de biomassa (Shaver & Chapin 1991, Larcher 2006). É nesta etapa que as plantas alongam raízes e partes aéreas e ainda investem em estruturas clonais como, por exemplo, os estolões, bulbos e rametes (Grace 1993, Larcher 2006). O decréscimo no crescimento vegetativo é observado quando se inicia a fase reprodutiva. Isso sugere que os recursos requeridos para a reprodução são os mesmos utilizados para o crescimento (Bazzaz et al. 1987). Essas mudanças na alocação de biomassa afetam a sobrevivência, o crescimento e a reprodução das plantas (McConnaughay & Coleman 1999). A alocação de recursos pode variar em função dos estresses ambientais aos quais as plantas estão submetidas, tais como a falta de água, variações extremas de temperatura e variações nas concentrações de nutrientes (Bloom et al. 1985). O estresse hídrico, que ocorre quando a disponibilidade de água no solo é baixa e a temperatura é capaz de causar perdas contínuas por transpiração ou evaporação (Jaleel et al. 2008), por exemplo, pode provocar a redução das taxas fotossintéticas e de respiração, distúrbios no metabolismo e até mesmo a morte do indivíduo (Jaleel et al. 2008, Farooq et al. 2009). As respostas das plantas ao estresse podem ser rápidas e diretas visando aumentar as chances de sobrevivência imediata (Mooney et al. 1991). O rápido fechamento dos estômatos em resposta à seca pode evitar a perda de água, mas também interfere na assimilação de carbono (Mooney et al. 1991). Em longo prazo, se as condições desfavoráveis persistirem, as plantas passam a realocar os recursos disponíveis para o desenvolvimento de mecanismos complexos envolvendo fenômenos moleculares, bioquímicos e fisiológicos, afetando seu crescimento e reprodução (Razmjoo et al. 2008). Os efeitos do estresse hídrico sobre as plantas parasitas parecem não ser tão acentuados quanto em outras plantas. Elas assumem o controle homeostático de água de suas hospedeiras e intensificam a retirada de recursos (Glatzel & Geils 2009). Muitas parasitas tem a capacidade de realizar fotossíntese e investem mais em crescimento quando retiram grandes quantidades de água e nutrientes do xilema de suas hospedeiras 60 (Aukema 2003). Como o transporte de água e nutrientes ocorre devido a pressões negativas no topo da planta pela evapotranspiração nas folhas (Glatzel & Geils 2009), as hospedeiras sofrem duplamente com a falta de água e podem morrer principalmente durante o período seco. Para que a parasita possa manter as taxas adequadas de seu crescimento sem por em perigo a sobrevivência da hospedeira, é esperado um balanço entre a quantidade de recurso disponível e o que é efetivamente retirado (Tennakoon & Pate 1996). Mas quando a limitação de água e nutrientes é severa as parasitas buscam novas fontes de recursos infectando mais de uma planta (Marvier 1996). Struthanthus flexicaulis (Mart.) Mart. (Loranthaceae) é uma das hemiparasitas brasileiras mais comuns, com ampla distribuição nas áreas de cerrado do Brasil Central (Rizzini 1980). A espécie é generalista e pode parasitar diversas plantas vasculares (Mourão et al. 2006). Seus ramos longos e flageliformes dispersam-se vegetativamente e podem se fragmentar, formando novos rametes. Em fitofisionomias com elevadas densidades de plantas a dispersão vegetativa é tão ou mais importante que a ornitocórica, porque os ramos da parasita são capazes de infectar as copas de plantas vizinhas espalhando-se no ambiente (Mourão et al. 2009), favorecendo a colonização de novas hospedeiras e seu forrageamento. Esta espécie é dióica e possui folhas pequenas, com flores e frutos pequenos (3-4 mm e 6-7 mm respectivamente). O objetivo desse trabalho foi comparar a alocação de recursos de S. flexicaulis em diferentes condições de estresse hídrico do ambiente. Devido à dificuldade de se distinguir indivíduos, optou-se por adotar como unidade amostral os ramos da parasita. As hipóteses que nortearam este trabalho foram: 1) A alocação de recursos dos ramos de S. flexicaulis e sua mortalidade são influenciadas pela disponibilidade de água no ambiente; 2) A alocação de recursos é afetada quando a infestação de parasitas for elevada; 3) A sobrevivência dos ramos varia em função de sua posição com relação às copas (dentro-internos ou fora-exploratórios) e 4) O crescimento de ramos é influenciado por de sua posição com relação às copas (dentro-internos ou foraexploratórios). Acredita-se que na estação chuvosa os ramos de S. flexicaulis crescerão mais, produzirão mais folhas e mais estruturas reprodutivas. A mortalidade deverá ser menor. A alocação para os ramos que crescem sobre as copas de hospedeiras muito parasitadas deverá ser menor, pois é esperada uma competição por recursos disponíveis entre os ramos da parasita. Além disso, a sobrevivência deverá ser maior dentro das copas já que seus ramos ficam menos expostos à predação e danos como quebra de suas 61 extremidades. Os ramos exploratórios (fora das copas) deverão investir mais em crescimento linear porque se supõe que estes estejam à procura de novas hospedeiras. Material e métodos Local de estudo O estudo foi desenvolvido numa área de afloramentos ferruginosos do Parque Estadual da Serra do Rola Moça (20° 03’ 60”S, 44° 02’ 00” W, 1300 m), localizado na porção sul da Cadeia do Espinhaço- Brasil, uma longa cadeia de montanhas paralela ao oceano Atlântico. O clima da região é do tipo mesotérmico, de acordo com a classificação de Köppen, é do tipo Cwa (Nimer & Brandão 1989). A precipitação anual é de 1000 a 1500 mm, com uma pronunciada estação seca de abril a setembro, e temperatura média anual de 25°C (Rizzini 1997). Nos afloramentos, localizados nos topos da serra, os ventos constantes e altos índices de radiação ultravioleta contribuem para a severidade do ambiente, agravada durante a estação seca. A vegetação é baixa, composta por poucos indivíduos de porte arbóreo, e é dominada por eudicotiledôneas como Asteraceae, Fabaceae e Myrtaceae, e monocotiledôneas como Poaceae, Cyperaceae e Orchidaceae (Viana & Lombardi 2007, Jacobi et al. 2007). O solo é do tipo neossolo litólico, ou seja, quando presente é raso (apresentando menos de 5 cm de profundidade), pedregoso e cascalhento,é rico em ferro e apresenta baixos teores de fósforo e micronutrientes (Benites et al. 2007). Na área de estudos Mimosa calodendron (Fabaceae) é uma leguminosa abundante e frequentemente infectada pela hemiparasita S. flexicaulis (Mourão et al. 2009). Acredita-se que M. calodendron seja endêmica dos afloramentos rochosos ferrugíneos do Quadrilátero Ferrífero (Barneby, 1991) e contribua para a estruturação da comunidade vegetal em que se encontra inserida (Jacobi et al., 2007). Esta hospedeira é perene e de porte arbustivo sendo utilizada como poleiro por diversas aves, inclusive as dispersoras de S. flexicaulis. Desenho amostral Para avaliar a alocação de recursos da parasita, foi delimitada uma área de aproximadamente 2500 m2, contendo uma população expressiva de indivíduos de M. calodendron parasitados. Foram marcados 347 ramos principais femininos que parasitavam 32 indivíduos de M. calodendron, cujas alturas variaram de 80 e 120 cm. Estes ramos foram marcados a 10 cm de suas extremidades para padronizar o início das medidas (Fig. 1), que foram tomadas mensalmente durante nove meses, iniciando-se na 62 estação seca (maio) e finalizando na chuvosa (janeiro). Mediu-se o comprimento do ramo principal, o número de ramos laterais, o número de folhas, a localização (dentro ou fora da copa), o número de estruturas reprodutivas (botões, flores e frutos) e o número de ramos danificados por herbivoria ou quebra. Os ramos poderiam apresentar crescimento negativo quando: 1) cresciam sobre o substrato do afloramento ferruginoso cujas temperaturas no verão chegam a 68° (F. F. Carmo com. pess.) e queimavam suas extremidades ou 2) larvas de insetos no interior dos ramos que se rompiam após a eclosão do adulto. B B A Fig. 1- Foto esquemática dos ramos da parasita onde A = ramo principal e B = ramos laterais. Para comparar o crescimento de ramos entre as estações seca e chuvosa, foram considerados o incremento linear entre junho e agosto (estação seca) e entre novembro e janeiro (estação chuvosa). Aplicou-se o teste U de Mann-Whitney, pois os dados não apresentaram distribuição normal. O número de folhas de cada ramo, a partir da marcação feita em maio, foi contado em agosto (estação seca) e janeiro (estação chuvosa), e comparado por análise de covariância ANCOVA (covariável: número de folhas), após a transformação usando log na base 10 para diminuir a variância. Em seguida comparou-se cada reta através da inclinação das tangentes e os valores do intercepto segundo metodologia de Zar (1999). As diferenças entre os valores encontrados, tanto para as tangentes quanto para os interceptos foram comparados com teste t de Student. Os 347 ramos principais foram divididos em dois grupos: 142 ramos internos e 205 exploratórios. Os ramos internos são aqueles que permaneceram dentro das copas e os exploratórios são aqueles que se estendem mais do que 10 cm além da borda da copa. 63 Estes grupos foram analisados quanto a: 1) sobrevivência (taxa de sobrevivência mensal dos ramos principais); 2) porcentagem de ramos principais danificados nas estações seca e chuvosa (morte por ressecamento, morte por herbivoria ou ressecamento, e quebra das extremidades); 3) comprimento; 4) número de folhas/cm da parasita e 5) número de estruturas reprodutivas/cm da parasita. Para calcular a taxa de sobrevivência os ramos foram agrupados em cinco classes de tamanho de intervalos de 20 cm e foi criada uma tabela de vida de todos os ramos marcados no início do experimento e a proporção sobrevivente ao longo do tempo. Foi calculada a taxa de sobrevivência mensal para cada grupo de ramos e comparada pelo teste de Wilcoxon. Para comparar o número de ramos danificados exploratórios e internos foi utilizado um teste t pareado, pois os dados apresentaram distribuição normal. Como ao longo do experimento alguns ramos mudavam de posição para dentro ou fora das copas, para comparar o crescimento, o número de folhas/cm da parasita e de estruturas reprodutivas/cm da parasita em cada estação, considerou-se apenas os ramos que permaneceram no mesmo grupo (somente dentro ou somente fora das copas) após os nove meses de monitoramento. Assim, as análises de crescimento, número de folhas e estruturas reprodutivas em cada estação foram realizadas com 71 ramos internos e 104 exploratórios. Os dados foram analisados pelo teste U de Mann-Whitney uma vez que não apresentaram distribuição normal, mesmo após as transformações. Os danos causados por morte por ressecamento, morte por herbivoria ou ressecamento e quebra das extremidades na chuva e na seca foram expressos em porcentagens e comparados pelo teste do Qui quadrado. Para avaliar se os ramos que cresciam em hospedeiras com diferentes graus de infestação apresentavam diferenças no crescimento linear, número de folhas e estruturas reprodutivas nas estações seca (agosto) e chuvosa (janeiro), cada hospedeira foi classificada em uma das seguintes categorias de parasitismo: 1) pouco parasitadas – até 10 ramos exploratórios; 2) parasitismo intermediário – 20 a 30 ramos exploratórios e; 3) muito parasitadas – mais de 40 ramos exploratórios. Os ramos de cada categoria foram comparados pelo teste não paramétrico Kruskal-Wallis, já que os dados não apresentaram uma distribuição normal mesmo após as transformações. Os dados de precipitação dos anos de 2009 e 2010, utilizados neste estudo, foram extraídos da estação meteorológica do Parque Estadual da Serra do Rola Moça. 64 Resultados Os ramos de S. flexicaulis alocaram os recursos para realizar diferentes funções durante o seu desenvolvimento ao longo dos meses. O crescimento de ramos de S. flexicaulis foi maior na estação seca do que na estação chuvosa (Z= - 9,513; n=175; p<0,0001) (Fig. 2). Entretanto, o número de folhas foi maior durante a estação chuvosa (Fig. 3). Fig. 2 – Crescimento de ramos entre junho e agosto (período seco) e entre novembro e janeiro (período chuvoso). A classe <0 representa os ramos que diminuiram seu comprimento devido aos danos nas suas extremidades. Para a estação seca a reta que descreveu a correlação entre o número de folhas e comprimento dos ramos exploratórios e internos foi y = -0,098 + 0,858x (n = 175; r2=0,860; p<0,001) e para a chuvosa, representada pelo mês de janeiro, foi y = -0,946 + 1,047x (n = 175; r2=0,846; p<0,001) (Fig. 3). Essas retas diferiram quanto a sua inclinação (n=350; t= 4,157; p=0,001), mas não quanto ao intercepto (n=350; t=1,208; p=0,228). A menor quantidade de chuva durante a estação seca não impediu a produção dos primeiros botões em julho, alcançando seu pico em outubro (Fig. 4). Já as primeiras flores surgiram em agosto, e em setembro foi iniciada a produção de frutos. Informações sobre os frutos foram coletados até o mês de janeiro e por esse motivo não 65 foi possível quantificar seu pico de produção, que acontece entre março e abril (Mourão Log Número de folhas obs. pess.). 100 10 1 1 10 100 Log Comprimento (cm) Fig. 3 – Correlação entre o número de folhas e o comprimento dos ramos. Para o período seco (agosto, cinza), e para o período chuvoso (janeiro, pretos). 600 70 500 60 400 50 40 300 30 Rain (mm) Reproductive structures/branches 80 200 20 100 10 Bud Flower 0 M ay n Ju l t Ju Aug Sep Oc Nov Dec 0 Fruit Jan 66 Fig. 4 – Relação entre a quantidade de chuva (mm) e o número total de estruturas reprodutivas por ramo (botões, flores e frutos) durante os meses de maio de 2009 a janeiro de 2010. Quando se considerou a produção de estruturas reprodutivas dos ramos notou-se maior investimento nos meses de setembro a novembro, o que coincidiu com o período de maior disponibilidade de água (Tab. 1). O início da produção de botões se deu no mês de julho (4,26 / ramo) e teve seu pico no mês de outubro (77,36 / ramo). No mês de novembro houve maior produção de flores (13,08 / ramo) e no mês de janeiro a produção de frutos verdes e maduros se destacou com 28,17 / ramo (Tab. 1). Durante a estação chuvosa, houve um maior investimento na produção de botões se comparado às flores e frutos (Tab. 1). A produção de botões é energeticamente menos custosa para a planta porque são menores e mais leves e, além disso, não precisam produzir recompensas como as flores, e nem armazenar nutrientes como os frutos. Tabela 1– Produção de estruturas reprodutivas e crescimento de ramos laterais nos períodos de seca (maio a agosto) e chuva (setembro a janeiro). Botões Meses Número de ramos 0 Maio Flores Número de ramos laterais Frutos Produção total 0 Número de ramos 0 Produção total 0 Número de ramos 0 Produção total 0 58 Junho 0 0 0 0 0 0 199 Julho 105 448 0 0 0 0 460 Agosto 157 2603 11 113 0 0 450 Setembro 218 11960 23 120 1 1 418 Outubro 202 15628 94 916 1 7 530 Novembro 165 6767 160 2093 25 499 452 Dezembro 87 1053 114 903 49 1145 443 Janeiro 16 121 17 118 41 1155 279 A mortalidade de ramos foi semelhante nos dois períodos, sendo de 3,7% na seca e 4,2% na chuvosa. Entre as causas identificadas, a morte por ressecamento foi mais comum durante a estação seca, enquanto a herbivoria ocorreu com maior intensidade durante a estação chuvosa (Tab. 2). A porcentagem de quebra dos ramos principais, sem, no entanto, leva-los à morte, foi maior durante a estação seca (Tab. 2). Entre os meses de junho a agosto, o maior crescimento de ramos foi de 104 cm para um que crescia fora da copa de uma hospedeira vigorosa, destoando fortemente do 67 crescimento médio para este período, que foi de 20,2 ± 17,6 cm, com mediana de 16 cm. Já durante a estação chuvosa, entre os meses de novembro a janeiro, o maior crescimento foi de 68 cm e o crescimento médio de 4,5 ± 19,1 cm e a mediana foi de 1 cm. Tabela 2. Porcentagem de danos e morte dos ramos principais nos períodos seco (de junho a agosto) e chuvoso (novembro a janeiro). SECA CHUVA N=205 N=176 χ2 gl p Morte por ressecamento 19,5 6,1 6,53 1 0,01 Morte por herbivoria 0,5 27,8 27,35 1 0,00001 Quebras 35,5 19,6 4,02 1 0,05 Nestes últimos meses muitos ramos apresentaram crescimento negativo; por exemplo, o que mais decresceu tinha 81 cm em novembro e em janeiro media 15 cm. Quando a mortalidade foi analisada de acordo com posição dos ramos na copa, a quebra foi mais comum nos ramos exploratórios enquanto a morte por ressecamento ou herbivoria foi mais comum nos ramos internos (Tab. 3). Tabela 3. Porcentagem de danos e morte dos ramos internos e exploratórios nos períodos seco (de junho a agosto) e chuvoso (novembro a janeiro). SECA CHUVA Internos Exploratórios Exploratórios Internos N=109 N= 96 N=75 N=106 Morte por ressecamento Morte por herbivoria Quebras 12,6 6,9 3,2 2,9 1 0 14,9 12,9 12,5 23 7,8 11,8 Dos 347 ramos principais marcados, 142 se encontravam inicialmente dentro e 205 fora das copas. Os ramos que cresceram dentro das copas entrelaçaram-se com outros ramos da parasita ou prenderam-se aos galhos da hospedeira. Estes ramos internos tinham maior calibre e folhas maiores, escuras e menos maleáveis, 68 contrastando com os ramos exploratórios que apresentaram características jovens, tais como folhas mais maleáveis, menores e de coloração mais clara. A sobrevivência dos ramos foi maior fora das copas (exploratórios) do que dentro delas (w=44; Z= 2,54; p<0,01), principalmente em janeiro (Fig. 5), mas os ramos exploratórios sofreram mais danos em suas extremidades (t=3,07; n=9; p=0,01), ao longo dos meses de estiagem. Ramos principais danificados produziram mais ramos laterais (χ2=286; gl=1; p<0,01, n=168), que produziam folhas menores, porém mais próximas uma das outras, com distâncias máximas não ultrapassando 1 cm. O período de maior produção de ramos laterais se deu nos meses de julho a dezembro. Na estação seca não houve diferença significativa entre o crescimento (U=1775; Z=-0,12; p=0,89), número de estruturas reprodutivas (U = 1752; Z = - 0,25; p = 0,79) e número de folhas (U=1493 ; Z= - 1,59; p=0,11) de ramos exploratórios e internos. Já na estação chuvosa os ramos exploratórios cresceram mais (U=1284; Z= -2,64; p=0,008) e produziram mais estruturas reprodutivas (U=1197; Z=-3,09; p=0,001), no entanto não apresentaram diferenças quanto ao número de folhas (U= 1545; Z= -1,26; p= 0,20). 1.0 Sobrevivência 0.9 0.8 0.7 Exploratórios 0.6 Internos 0.5 0.4 0.3 Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez Jan MES Fig. 5 Sobrevivência dos ramos exploratórios e internos. Teste de Wilcoxon (w=44; Z=2,54; p<0,01). De uma maneira geral, os ramos analisados em conjunto não apresentaram um crescimento regular e contínuo, sendo muito variável. Entretanto quando foram separados em categorias de parasitismo, na estação seca os que estavam alojados em hospedeiras pouco parasitadas apresentaram menor crescimento do que aqueles em 69 hospedeiras com níveis intermediários de parasitismo e muito parasitadas (H = 14,97; gl = 2; p < 0,0001) (Tab. 4). O número de folhas seguiu o mesmo padrão (H = 17,45; gl = 2; p < 0,001). A produção de estruturas reprodutivas foi semelhante entre as 3 categorias (H = 2,31; gl = 2; p = 0,31). Já na estação chuvosa o crescimento não diferiu entre os grupos (H = 0,41; gl = 2; p = 0,81) (Tab. 4). O número de folhas (H = 3,90; gl = 2; p = 0,11) e de estruturas reprodutivas (H = 4,29; gl = 2; p = 0,14) seguiram o mesmo padrão. Tabela 4. Comparação da alocação de recursos dos ramos da parasita considerando-os crescendo sobre diferentes classes de hospedeiras parasitadas nas estações seca e chuvosa. Seca Pouco Parasitada (N=43) Parasitismo Intermediário (N=55) Muito Parasitada (N=68) Estruturas Comprimento Reprodutivas Número de folhas 28,8 ± 15,4 A 9,5 ± 15,8 A 19,4 ± 13,4 A 40,5 ± 19,1 B 10,1 ± 12,8 A 41,4 ± 17,1 B 13,1 ± 18,5 A 23,8 ± 12,7 B 30,1 ± 14,3 B Kruskal-Wallis Comprimento (H=14,97 gl=2 p<0,0001) Kruskal-Wallis Estrutura Reprodutiva (H=2,31 gl=2 p=0,31) Kruskal-Wallis Número de Folhas (H= 17,45 gl= 2 p<0,0001) Chuva Pouco Parasitada (N=18) Parasitismo Intermediário (N=42) Muito Parasitada (N=49) Estruturas Comprimento Reprodutivas Número de folhas 30,7 ± 21,1 A 10,1 ± 31,8 A 20,8 ± 21,5 A 30 ± 19 A 34 ± 21 A 25,5 ± 18,4 A 29,5 ± 19,3 A 8,2 ± 8,1 A 11,6 ± 23,4 A Kruskal-Wallis Comprimento (H=1,54 gl=2 p=0,46) Kruskal-Wallis Estrutura Reprodutiva (H=4,29 gl=2 p=0,11) Kruskal-Wallis Número de Folhas (H= 3,90 gl= 2 p=0,14) Discussão As condições de estresse hídrico do ambiente influenciaram a alocação de recursos de S. flexicaulis. Durante a estação seca, seus ramos investiram mais no crescimento sem, entretanto, produzir muitas folhas. Isso sugere uma estratégia para buscar novas fontes de recursos (hospedeiras), já que neste período água e nutrientes são fatores limitantes e críticos para a maioria das plantas. Embora as plantas parasitas 70 possam ser quase insensíveis à seca, pois dependem exclusivamente de suas hospedeiras, estas últimas estão sujeitas à falta de água e podem não retirar recursos suficientes nem mesmo para sua própria manutenção. O parasitismo reduz a biomassa e altera a alocação de recursos das espécies parasitadas (Tennakoon & Pate 1996, Lei 2001, Press & Phoenix 2005, Shen et al. 2006), podendo leva-las à morte. Nos afloramentos ferruginosos, cujas temperaturas podem ultrapassar 60° (Carmo, com. pess.), a mortalidade de hospedeiras pode se intensificar durante o período seco devido ao efeito combinado do parasitismo e do estresse hídrico a que estão sujeitas (Mourão et al. 2009). A morte da atual hospedeira, sem que ocorra a dispersão para outra, significa também a morte da parasita, e neste caso, investir em crescimento linear de ramos se torna um ótimo investimento energético. Ao final da estação seca e início da chuvosa, entre os meses de agosto e setembro, os ramos começaram a investir em novas folhas e estruturas reprodutivas. O aumento da disponibilidade de água foi determinante para que a parasita pudesse investir na produção de novas folhas. Com o acréscimo no número de folhas, os ramos aumentaram a superfície fotossinteticamente ativa, o que pode ter elevado a taxa de produção de energia (Larcher 2006). Isto permite o investimento em estruturas reprodutivas, pois sua produção requer um elevado custo energético (de Jong & Klinkhamer 2005). Os padrões de alocação de recursos se tornaram mais claros quando os ramos foram analisados quanto aos diferentes graus de parasitismo. Na estação seca, os ramos que cresciam em hospedeiras mais parasitadas foram os que apresentaram maior crescimento linear. Uma analogia pode ser feita entre o número de haustórios e a ramificação de raízes de plantas durante a seca. Muitas plantas ramificam o sistema radicular para suprir o déficit de água, que pode ser rapidamente perdida por evapotranspiração (Jaleel et al. 2009). Comparativamente, a expansão das raízes aéreas das plantas parasitas, que ocorre através do crescimento linear, teria a finalidade de buscar novas fontes de recursos (colonização) e extrair mais nutrientes de suas hospedeiras (estabelecimento e crescimento). Após o estabelecimento de novos haustórios, os indivíduos captam mais recursos para investir em seu crescimento e reprodução. Estudos afirmam que o número destes haustórios está correlacionado com o crescimento da parasita e seus impactos sobre as hospedeiras (Tennakoon & Pate 1996, Tennakoon et al. 1997, Aukema 2003). Isso sugere que hospedeiras muito parasitadas devem abrigar poucas parasitas que estabelecem múltiplas conexões simultâneas ao longo de seus galhos. Dessa forma, os poucos indivíduos parasitas poderiam desviar 71 maiores quantidades de recursos usados para o seu desenvolvimento. Em contrapartida estas hospedeiras estariam sujeitas aos efeitos mais acentuados do parasitismo. Sabe-se que indivíduos de Mimosa calodendron muito parasitados apresentam de 75 a 95% de redução de sua cobertura foliar (Mourão et al. 2009). Assim, uma redução nas taxas fotossintéticas é esperada e o estabelecimento de ramos de S.flexicaulis em outras plantas seria vital para sua sobrevivência. Na estação chuvosa o crescimento de ramos, número de folhas e estruturas reprodutivas da parasita foi semelhante não importando a categoria de parasitismo. Como a água deixa de ser um recurso limitante para as plantas, é possível que a retirada de nutrientes das hospedeiras atinja seu máximo, permitindo um investimento similar entre as categorias de parasitismo. Além disso, é esperado que o estresse hídrico e nutricional das hospedeiras diminua com a chegada das chuvas, favorecendo a reposição de folhas que foram perdidas durante o período seco, ampliando sua área fotossiteticamente ativa. Como as hospedeiras mais parasitadas perdem mais folhas que as pouco parasitadas (Mourão et al. 2009), o gasto de energia para a reposição desta estrutura deverá ser maior, assim as hospedeiras muito parasitadas poderiam fornecer tantos nutrientes quanto comparadas às pouco parasitadas. Sabe-se que no período seco as plantas crescem pouco, reduzem sua área foliar disponível para fotossíntese (menor tamanho das folhas ou abscisão), além de sofrerem uma série de modificações fisiológicas e morfológicas para sobreviverem a essas condições (Crawley 2007). Ao contrário do que se esperava a mortalidade de ramos não foi maior no período seco. Nesta época a maioria dos ramos morreu devido ao esgotamento de hospedeiras que muitas vezes (15%) não conseguiam sobreviver aos efeitos combinados do parasitismo e escassez de agua. Além disso, a maior mortalidade de ramos internos reforça a necessidade da parasita em investir em ramos que possam buscar por novas fontes de recursos e sua dispersão. Já na estação chuvosa, a mortalidade de ramos ocorreu principalmente pelo ataque de insetos galhadores, pulgões e larvas não identificadas que cresciam no interior de muitos ramos. Os insetos podem causar inúmeros prejuízos às plantas tais como redução no crescimento, aumentando a vulnerabilidade ao ataque de outros insetos e doenças, reduzindo a habilidade competitiva (Crawley 1989). Estes insetos podem ser uma importante fonte reguladora do espalhamento de ramos das parasitas em comunidades naturais. Os ramos atacados por insetos e que não morriam tinham seu crescimento comprometido, pois as larvas se 72 alimentavam de seu interior e o rompiam ao eclodir. Por esse motivo o crescimento vegetativo na estação seca superou o da estação chuvosa. Danos como as quebras da extremidade dos ramos principais, mais comuns nos ramos exploratórios durante a estação seca, estimularam o desenvolvimento de ramos laterais. As gemas danificadas perdem a dominância apical induzindo o crescimento de novas partes (Cline 1997). É comum que plantas invistam no crescimento de novos tecidos e estruturas para compensar as partes que foram perdidas (Harper 1985). Os ramos exploratórios foram os que mais produziram ramos laterais e isso pode favorecer a busca por novas hospedeiras da mesma ou de outras espécies. O comportamento em relação ao crescimento linear, produção de estruturas reprodutivas e folhas dos ramos principais internos e exploratórios foi semelhante nos períodos de seca, sinalizando que a distribuição de recursos é proporcional, não importando a posição de seus ramos na copa das hospedeiras. Já durante a estação chuvosa os ramos exploratórios cresceram mais do que os internos e produziram mais estruturas reprodutivas. Como os organismos clonais podem crescer assimetricamente, priorizando partes do indivíduo que tem melhores condições desenvolvimento (Harper 1981, Harper 1985), é possível que os ramos mais expostos à luz tenham sido beneficiados. Isso ocorre com raízes, por exemplo, que possuem uma diversidade de respostas à heterogeneidade incluindo aumento de ramificações laterais, biomassa e comprimento de raízes bem como a capacidade de retirada de nutrientes do solo (Hodge 2004). Os principais efeitos do estresse hídrico nas plantas são as reduções nas taxas fotossintéticas (Graves et al. 1992), redução na alocação de recursos afetando seu crescimento (Crawley 2007) e diminuição no investimento reprodutivo (Mugabe 1983, de Jong & Klinkhamer 2005). Além disso, os custos energéticos para a reprodução esgotam os recursos necessários para manutenção e crescimento das plantas (Bazzaz et al. 1987, de Jong & Klinkhamer 2005). S. flexicaulis alocou recursos de maneira diferenciada durante as estações, adotando estratégias que favoreceram sua sobrevivência. Como as parasitas assumem o controle homeostático de água das hospedeiras, elas conseguem manter sua eficiência na captação de água e assimilação de carbono (Glatzel & Geils 2009) mesmo durante o período de maior escassez de água. Apesar disso, esta parasita demonstrou sinais de estresse hídrico durante a estação seca, porque mesmo investindo em crescimento linear, não produziu estruturas reprodutivas, que são energicamente mais custosas. Apenas na estação chuvosa, quando a agua não 73 era limitante, a parasita investiu em novas folhas e estruturas reprodutivas. O maior investimento reprodutivo durante a estação chuvosa pode servir para garantir a sobrevivência das hospedeiras. Referências bibliográficas Aukema, J. E. 2003. Vectors, viscin, and Viscaceae: mistletoes as parasites, mutualists and resources. Frontiers in Ecology and the Environment, 1:212-219. Barneby, R. C. 1991. Sensitivae censitae: a description of the genus Mimosa Linneaus (Mimosaceae) in the New World. The New York Bootanical Gardens, New York, 835p. Bazzaz, F. A.; Chiarielo, N. R.; Coley, P. D. & Pitelka, L. F. 1987. Allocation resources to reproduction and defense. BioScience, 37:58-67. Benites, V. M.; Shaefer, C. E. G. K.; Simas, F. N. B. & Santos, H. G. 2007. Soils associated with rock outcrops in the Brazilian mountain ranges Mantiqueira and Espinhaço. Revista Brasileira de Botânica, 4: 569-577. Bloom,A. J.; Chapim III,F. S. & Mooney, H. A. 1985. Resource limitation in plants - an economic analogy. Annual Review of Ecology and Systematics, 16:363-392. Cline, M. G. 1997. Concepts and terminology of apical dominance. American Journal of Botany, 84:1064-1069. Crawley M. J. 1989. Insect herbivores and plant population dynamics. Annual Review of Entomology, 34:531-64. Crawley, M. J. 2007. Plant Ecology, 2 º Ed. 717 p. Ed. Blackwell Science, London. de Jong, T. J., and P. G. L. Klinkhamer. 2005. Evolutionary Ecology of plants Reproductive Strategies. University Press, Cambridge, UK. Farooq, M.; Wahid, A.; Kobayashi, N.; Fujita, D. & Basra, S. M. A. 2009. Plant drought stress: effects, mechanisms and management. Agronomy for Sustainable Development, 29:185-212. Glatzel, G., & Geils, B. W. 2009. Mistletoe ecophysiology host-parasite interactions. Botany, 87: 10-15. Grace, J. B. 1993. The adaptive significance of clonal reproduction in angiosperms: an aquatic perspective. Aquatic Botany. 44: 159-180. Graves J. D., M. C. Press, S. Smith, and G. R. Stewart. 1992. The carbon economy of the association between cowpea and the parasitic angiosperm Striga gesnerioides. Plant, Cell Environmental, 15: 283–288. 74 Harper, J. L. 1981. The concept of population in modular organisms. In: Theoretical ecology: principles and applications, 2 ed. P 53-77. Harper, J. L. 1985. Modules, branches, and the capture of resources. In: Population biology and evolution of clonal organisms (J.B.C. Jackson, L.W. Buss & R. Cook, eds). Yale University Press, New Haven, p.1-34. Hodge, A. 2004. The plastic plant: root responses to heterogeneous supplies of nutrients. New Physiologist, 162:9-24. Jacobi, C. M., F. F. Carmo, R. C. Vincent, and J. R. Stehmann. 2007. Plant communities on ironstones outcrops: a diverse and endangered Brazilian ecosystem. Biodiversity and Conservation, 16: 2185-2200. Jaleel, C. A.; Gopi, R.; Sankar, B.; Gomathinayagam, M. & Panneerselvam, R. 2008. Differential responses in water use efficiency in two varieties of Catharanthus roseus under drought stress. Comptes Rendus Biologies, 1:42-47. Jaleel, C. A.; Manivannan, P.; Wahid, A.; Farooq, M.; Somasundaram, R. & Panneerselvam, R. 2009. Drought stress in plants: A review on morphological characteristics and pigments composition. International Journal of Agriculture & Biology. 11:100-105. Larcher, W. 2006. Ecofisiologia vegetal. São Carlos. 532p. Lei, S. A. 2001. Survival and development of Phoradendron californicum and Acacia greggii during a drought. Western North American Naturalist, 61: 78-84. Marvier, M. A. 1996. Parasitic plant-host interactions: plant performance and indirect effects on parasite-feeding herbivores. Ecology. 77:1398-1409. McConnaughay, K. D. M & Coleman, J. S. 1999. Biomass allocation in plants: ontogeny or optimality? A test along three resource gradients. Ecology, 80:25812593. Mooney, H. A.; Drake, B. G.; Luxmoore, R. J.; Oechel, W. C. & Pitelka, L. F. 1991. Predicting ecosystem responses to elevated CO2 concentrations. BioScience, 41:96104. Mourão, F. A.; Carmo, F. F; Ratton, P.; Jacobi, C. M. 2006. Hospedeiras da hemiparasita Struthanthus flexicaulis (Mart.) Mart. (Loranthaceae) em campos rupestres ferruginosos, Quadrilátero Ferrífero, MG. Lundiana, 7:103-110. Mourão, F. A., Jacobi, C. M. Figueira, J. E. C & Batista, E. K. L. 2009. Effects of the parasitism of Struthanthus flexicaulis (Mart.) Mart. (Loranthaceae) on the fitness of 75 Mimosa calodendron Mart. (Fabaceae), an endemic shrub from rupestrian fields over ironstone outcrops, Minas Gerais State, Brazil. Acta Botânica Brasílica, 23:820-825. Mugabe, N.R. 1983. Effects of Alectra vogelli Benth on cowpea (Vigna unguiculata (L.) Walp). Some aspects on reproduction of cowpea. Zimbabwe. Journal of Agricultural Research, 21:135-147. Nimer, E. & Brandão, A. M.. 1989. Balanço Hídrico e clima da região dos Cerrados. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Rio de Janeiro, Brazil. Poorter, H.; Remkes, C.& Lambers, H. 1990. Carbon and Nitrogen Economy of 24 Wild Species Differing in Relative Growth Rate. Plant Physiology, 94:621-627. Press, M. C. & Phoenix, G. K. 2005. Impacts of parasitic plants on natural communities. New Phytologist, 166:737-751. Razmjoo, K.; Heydarizadeh, P. & Sabzalian, M. R. 2008. Effect of salinity and drought stresses on growth parameters and essential oil contents of Matricaria chamomile. International Journal of Agriculture e Biology 4:451-454. Rizzini, C. T. 1980. Loranthaceae of the central Brazil. Arquivos do Jardim Botânico do Rio de Janeiro,24: 19-50. Rizzini, C. T. 1997. Tratado de Fitogeografia do Brasil: Aspectos Ecológicos, Sociológicos e Florísticos 2 º ed. Âmbito Cultural Edições Ltda, Brazil. Shaver, G. R. and Chapin, F. S., III, 1991: Production: biomass relationships and element cycling in contrasting arctic vegetation types. Ecological Monographs, 61: 1–31 Shen, H.; Ye, W.; Hong, L.; Huang, H.; Wang, Z.; Deng, X.; Yang, Q.; Xu, Z. 2006. Progress in parasitic plant biology: Host selection and nutrient transfer. Plant Biology, 8: 175-185. Silva, M. F. F.; Secco, R. S. & Lobo, M. G. A. 1996. Aspectos ecológicos da vegetação rupestre da serra dos Carajás, estado do Pará, Brasil. Acta Amazonica, 26: 17-44. Tennakoon, K. U. & Pate, J. S. 1996. Effects of parasitism by a mistletoe on the structure and functioning of branches of its host. Plant, Cell and Environment, 19:517-528. Tennakoon, K. U.; Pate, J. S. & Fineran, B. A. 1997. Growth and partitioning of C and fixed N in the shrub legume Acacia litorea in the presence or absence of the root hemiparasite Olux phyllanthus. Journal of Experimental Botany, 48:1047-1060. Zar, J. H. 1999. Biostatistical Analysis. 4th Edition. Prentice-Hall, New York. 76 CAPÍTULO 4 Efeito top-down da hemiparasita Struthanthus flexicaulis (Loranthaceae) e seu papel chave na estruturação de comunidades vegetais em afloramentos ferruginosos do Quadrilátero Ferrífero, Brasil. Fabiana Alves Mourão1, Claudia Maria Jacobi1, José Eugênio Côrtes Figueira1 & Rafael Barros1. 1 Departamento de Biologia Geral, Instituto de Ciências Biológicas, Universidade Federal de Minas Gerais. 77 Resumo As plantas parasitas podem modificar a estrutura e dinâmica da comunidade onde estão inseridas, reduzindo a biomassa e alterando a alocação de recursos das espécies hospedeiras e as interações entre elas. O objetivo deste trabalho foi investigar a importância da parasita Struthanthus flexicaulis (Loranthaceae) na estruturação de uma comunidade vegetal sobre afloramento ferruginoso através do efeito top-down e evidenciar se esta espécie é chave para este sistema. Foi realizado um levantamento de espécies em duas áreas com diferentes densidades da parasita: A) alta (soma do comprimento dos ramos da parasita superior a 180 m) e B) baixa (soma do comprimento dos ramos da parasita inferior a 80 m), onde se mediu a cobertura vegetal de cada indivíduo da comunidade durante a estação chuvosa, entre os meses de fevereiro a abril de 2009. Foram amostradas cinco faixas de vegetação de 250m2 em cada área, onde foi calculado o impacto da parasita (IP) sobre a perda de cobertura foliar e mortalidade de hospedeiras. As densidades da parasita variaram de 3,62 a 6,4 m/m2 na área A e 0,7 a 1,8 /m2 na área B. A composição florística da comunidade foi semelhante entre as áreas, sendo formada por 20 famílias e 39 espécies na área A e 17 famílias e 38 espécies na B. O índice de diversidade de Shannon não apontou diferença entre a comunidade com atuação da parasita e sem atuação da mesma. A leguminosa Mimosa calodendron foi a mais representativa na comunidade, apresentando a maior cobertura vegetal; também foi a espécie que mais perdeu (67%) sua cobertura com a atuação da parasita. O efeito top-down foi negativo, pois o impacto da parasita sobre a cobertura foliar variou de 39 a 66% na área A e 7 a 40% na B. S. flexicaulis foi considerada espécie-chave na comunidade vegetal, apresentando valores de IP muito superiores a 1. Os impactos que as parasitas provocam na comunidade vegetal poderiam ser comparados aos de grandes herbívoros, já que ambos apresentaram elevado índice de importância para as comunidades em que estão inseridos. S. flexicaulis reduziu significativamente a cobertura vegetal de suas hospedeiras sem, entretanto, alterar a diversidade e a composição de espécies. Sugere-se que seu papel chave e o efeito topdown podem variar em função da densidade de plantas na paisagem. Palavras-chave: parasitismo. comunidade vegetal, espécie-chave, interação planta-planta, 78 Introdução Compreender os fatores que determinam a manutenção das populações e a estrutura de comunidades tem sido há várias décadas um dos grandes desafios da ecologia (Chesson 2000). Após a obra clássica de Hairston et al. (1960), vários estudos sobre cascata trófica que demonstraram o papel estruturador dos predadores (top-down) e disponibilidade de recursos (bottom-up) foram publicados (Balciunas & Lawler 1995, Hunter et al. 1997, Baum & Worm 2009). A maior parte desses estudos se concentrou nos ambientes aquáticos porque são considerados habitats relativamente discretos e homogêneos, estratificados e que geralmente mantêm fortes interações interespecíficas (Polis et al. 2000). Em ambientes terrestres poucos estudos têm conseguido demonstrar o efeito top-down (Schmitz et al. 2000, Costa et al. 2008), devido a sua maior heterogeneidade, complexidade estrutural, e às interações entre as espécies serem consideradas muitas vezes fracas e difusas (Strong 1992, Polis et al. 2000, Werner & Peacor 2003). Nesses ambientes experimentos têm sido realizados através de cadeias tróficas incompletas, dificilmente passando de três níveis tróficos e geralmente envolvendo remoção ou adição de predadores (Chase 1998, Kneitel & Miller 2002, Gruner 2004, Schmitz 2006, Nuttle et al. 2011). O efeito top-down em comunidades terrestres têm sido atribuído principalmente à herbivoria, que pode alterar a biomassa (Schmitz & Suttle 2001) e interferir na reprodução das plantas (Amsberry & Maron 2006), bem como modificar a diversidade local (Nuttle et al. 2011). Já outros grupos que poderiam causar este efeito, como os parasitoides (Gomez & Zamora 1994), são raramente mencionados nestes estudos. Um grupo de organismos que poderia ser utilizado para investigar a atuação da força top-down em comunidades vegetais é o das plantas parasitas. Elas podem modificar a estrutura e dinâmica da comunidade onde estão inseridas, reduzindo a biomassa e alterando a alocação de recursos das espécies hospedeiras (Tennakoon & Pate 1996, Lei 2001, Press & Phoenix 2005, Shen et al. 2006). Como a produtividade e a permanência destas parasitas na comunidade são dependentes da “qualidade” dos recursos obtidos, elas são capazes de escolher entre suas potenciais hospedeiras aquelas que ofereçam melhores condições de sobrevivência (Kelly 1992, Pennings & Callaway 2002, Press & Phoenix 2005). Esta escolha pode estar relacionada à abundância de hospedeiras (Norton & Carpenter 1998) e seu tempo de permanência no ambiente (perenes ou anuais) (Kelly et al. 1988), bem como suas concentrações de nitrogênio (Radomiljac et al. 1999) ou por apresentarem sistema vascular facilmente acessível e/ou 79 com pouca capacidade de defesa (Press & Phoenix 2005). As parasitas podem afetar negativamente processos fisiológicos, reprodutivos e ecológicos das plantas infectadas (Press et al. 1999, Lei 1999, 2001, Mourão et al. 2009). Podem também interferir no balanço de água e nutrientes de suas hospedeiras, reduzindo as taxas de fotossíntese e respiração (Glatzel & Geils 2009) e, em algumas situações, podendo levá-las à morte (Aukema 2003). Apesar do efeito negativo nas espécies infectadas, as plantas parasitas podem desempenhar um papel benéfico na comunidade controlando a expansão de algumas espécies e beneficiando outras. O impacto na estrutura da comunidade pode ser grande, principalmente se as espécies mais parasitadas forem as dominantes e o parasitismo permitir a existência de espécies competitivamente subordinadas (Press 1998). As plantas parasitas já foram consideradas espécies-chave em suas comunidades (Press & Phoenix 2005) e até determinantes da diversidade local (Watson 2001). Além disso, as plantas parasitas são utilizadas como fonte de recursos por uma variedade de organismos, entre eles polinizadores e dispersores de sementes (Watson 2001, Aukema 2003, Kelly et al. 2004, Carlo & Aukema 2005, Azpeitia & Lara 2006). Foi sugerido que a parasita Cuscuta salina poderia ser considerada chave na manutenção da diversidade de espécies vegetais em marismas da Califórnia (Pennings & Callaway 1996). Com exceção das referências acima, o papel ecológico das plantas parasitas têm sido bastante ignorados em diversos estudos de comunidades vegetais (Norton & Reid 1997). Sabe-se que as plantas parasitas, com sua pequena biomassa de raízes sugadoras de nutrientes, causam maior efeito em suas hospedeiras que herbívoros (Pennings & Callaway 2002). As plantas parasitas podem alterar a o balanço competitivo entre hospedeiras preferidas e outras plantas na comunidade (Callaway & Pennings 1998), enquanto os herbívoros comumente alteram a composição de espécies (Bryant et al. 1991), podendo também alterar a composição de espécies caso o balanço competitivo seja afetado. O objetivo deste trabalho foi investigar a importância da parasita Struthanthus flexicaulis (Loranthaceae) na estruturação das comunidades vegetais de afloramentos ferruginosos através do efeito top-down e evidenciar se esta espécie pode ser considerada chave nessas comunidades. Para isso foi formulada a seguinte hipótese: S. flexicaulis influencia negativamente a permanência de algumas espécies nos afloramentos ferruginosos, alterando a composição da comunidade. As predições que nortearam este trabalho foram: 1) a parasita exerce efeito top-down significativo na comunidade vegetal 80 provocando a morte de indivíduos dominantes e favorecendo a diversidade; 2) a parasita reduz a cobertura vegetal das hospedeiras, causando um grande impacto na cobertura foliar das hospedeiras, na composição e diversidade de espécies, podendo ser considerada uma espécie-chave. O termo top-down se refere originalmente ao controle dos predadores sobre abundância de suas presas em uma cascata trófica (Hairston 1960). Este controle pode afetar poucas espécies, onde os aumentos na abundância de um predador provocam diminuições de suas presas sem que isso necessariamente afete a comunidade como um todo. Já uma espécie-chave está entre as mais importantes e afeta diretamente a comunidade seja através de mudanças na sua estrutura e diversidade, processos ecológicos e interações (Power et al. 1996). De acordo com a definição original de Paine (1969) espécie-chave refere-se a uma espécie que preferencialmente consome e mantém sob controle outra que poderia dominar o sistema. A definição de espécies-chave abordada neste trabalho está de acordo com Power et al. (1995) que as descreve como sendo aquelas cujos efeitos em suas comunidades ou ecossistemas são muito maiores do que o esperado por suas abundâncias ou biomassas. Material e métodos Local de estudo Os estudos foram realizados em um dos afloramentos ferruginosos da porção sul da Cadeia do Espinhaço localizado no Parque Estadual da Serra do Rola Moça, uma unidade de conservação de proteção integral. Esta área está localizada dentro do Quadrilátero Ferrífero (20o03’60”S, 44o02’00”W, 1300m). Estes afloramentos são caracterizados pela presença de metais pesados, baixa retenção de umidade, altas temperaturas e escassez do solo (Benites et al. 2007). Seu substrato é muito compacto e é composto por minério de ferro, de coloração marrom a negra, com baixíssima erodibilidade, e porosidade e permeabilidade variáveis (Benites et al. 2007). Nessas áreas os ventos são constantes e a radiação ultravioleta atinge altos índices, que agrava durante a estação seca. Sob condições de elevadas temperaturas e baixa capacidade de retenção de água, cresce uma vegetação baixa, composta por poucos indivíduos de porte arbóreo, dominada por eudicotiledôneas como Asteraceae, Fabaceae e Myrtaceae, e monocotiledôneas como Poaceae, Cyperaceae e Orchidaceae (Jacobi et al. 2007, Viana & Lombardi 2007). O clima da região é do tipo mesotérmico, precipitação anual de 1000 a 1500 mm, correspondendo ao tipo Cwa na classificação de Köppen (Nimer & 81 Brandão 1989), com uma pronunciada estação seca de abril a setembro, e temperatura média anual de 25°C (Rizzini 1997). Espécie-alvo Struthanthus flexicaulis pertence à família Loranthaceae e é considerada uma das hemiparasitas brasileiras mais comuns, com ampla distribuição nas áreas de cerrado do Brasil Central (Rizzini 1980). O hemiparasitismo é caracterizado pela capacidade da planta em fabricar açúcares através da fotossíntese, mas depende da retirada de água e nutrientes das hospedeiras por meio de raízes especializadas (haustórios) sendo parcialmente dependentes destas. Esta espécie possui ramos longos, flageliformes, folhas oblongo-abovadas, com flores e frutos pequenos (3-4 mm e 6-7 mm respectivamente). Sua dispersão ocorre de duas maneiras: 1) ornitocoria, em que seus frutos são consumidos pelas aves e as sementes depositadas nos galhos de suas hospedeiras e 2) crescimento vegetativo, através do crescimento de ramos que podem atingir a copa de novas hospedeiras. A parasita se fixa, através de raízes epicorticais caulinares (Calvin & Wilson 2006), em diversas partes das hospedeiras tais como caules, folhas e inflorescências (Mourão et al. 2006). Estes ramos emitidos podem atingir a vizinha mais próxima e, através do contágio, dispersar vegetativamente. Desenho amostral Para avaliar a importância de cada espécie na comunidade e os impactos da parasita sobre elas, foram selecionadas uma área com alta densidade de parasitas (Área A) e uma com baixa densidade (Área B) do mesmo tamanho. Em cada área foram traçados 5 faixas que mediram 1m x 50 m, totalizando 250 m2 e cada faixa foi dividida em parcelas de 1m x 1m. Inicialmente a densidade da parasita foi estimada de modo visual e posteriormente confirmada pela soma do comprimento dos seus ramos dividido pela área da faixa (metros da parasita/250 m2). Para verificar se a densidade da parasita diferia entre as áreas foi aplicado o teste t, uma vez que os dados apresentaram distribuição normal. Em cada parcela das faixas foi registrada a riqueza, abundância de indivíduos para cada espécie, e plantas parasitadas e/ou mortas. Plantas com crescimento clonal como Orquidaceae, Cactaceae e Velloziaceae foram contadas como único indivíduo quando os grupos da mesma espécie se encontravam isolados a uma distância maior que cinco cm, não sendo possível identificar seu número exato. Além disso, as Poaceae e Cyperaceae não foram identificadas, apenas tiveram suas coberturas 82 estimadas. O levantamento de espécies na comunidade foi realizado durante a estação chuvosa, pois durante a seca há o desaparecimento de terófitas e muitas geófitas que perdem suas partes aéreas, dificultando sua identificação. Este levantamento foi realizado nos meses de fevereiro a abril de 2009. Para avaliar a importância de cada espécie na comunidade foi calculada a cobertura vegetal de cada indivíduo, através da projeção de suas copas sobre a superfície do solo. Para as projeções que lembravam círculos foram tomadas medidas de diâmetro máximo, as que lembravam triângulos mediam-se os lados e altura, quadrados e retângulos mediam-se os lados e para formato elíptico mediam-se os diâmetros máximos e mínimos. A determinação da cobertura vegetal de espécies permite representar numericamente as áreas aproximadas ocupadas de cada espécie na comunidade (Braun-Blanquet 1979). Estes valores foram somados para estimar o valor total de área ocupada por cada espécie da comunidade. Foram relacionadas: 1) a abundância das espécies que estiveram representadas por mais de 1% do total de indivíduos na comunidade e o parasitismo; e 2) a cobertura sem a atuação da parasita (CSEM) e cobertura com a atuação da parasita (CCOM) de todas as espécies que tiveram a cobertura vegetal superior a 3% na comunidade. Para estimar a cobertura da parasita foram coletados 10 ramos com o comprimento igual a 1 metro, sendo 1 ramo por faixa e que se localizavam em Mimosa calodendron, espécie mais parasitada em afloramentos ferruginosos. O ramo escolhido possuía o maior diâmetro dentre os que parasitavam a hospedeira. Este procedimento foi necessário para que se estimasse a maior área possível de cobertura da parasita. Estes ramos tiveram suas folhas retiradas e contadas. A maior folha de cada ramo teve sua área calculada, e este valor foi multiplicado pelo número total de folhas encontrado em seu respectivo ramo para estimar a área média das folhas por metro da parasita. Em campo, os ramos de S. flexicaulis foram medidos em seu diâmetro e comprimento. Multiplicando o diâmetro por seu comprimento estimou-se a área ocupada pelo ramo e a cada metro da parasita foi somado o correspondente ao valor médio da área ocupada pelas folhas. Para verificar a magnitude do efeito top-down por S. flexicaulis e se esta é uma espécie-chave no sistema, foi calculado o impacto causado por sua presença sobre a mortalidade de hospedeiras na comunidade fazendo uso da equação matemática proposta por Power et al. (1996), que modelaram as relações predador-presa e os efeitos da retirada da espécie (ou grupo) na estrutura da comunidade. A equação proposta por estes 83 autores é flexível e permite usar tanto a biomassa, a cobertura vegetal das espécies, a abundância, produtividade ou riqueza de espécies, entre outras variáveis que consigam exprimir a proporção da espécie-alvo (S. flexicaulis) em relação à comunidade que estaria afetando. Fazendo uma adaptação da fórmula de Power et al. (1996), foi possível estimar o efeito top-down que S. flexicaulis exerce sobre a comunidade vegetal. A primeira expressão da fórmula multiplicada por 100 mede a porcentagem do impacto causado pela parasita (top-down) (1). Para verificar se a parasita é uma espécie-chave, fazendo uso da fórmula de Power et al. (1996) (2), foi verificado se a proporção de cobertura vegetal de S. flexicaulis é muito menor em relação à cobertura vegetal da comunidade. IP= (CSEM-CCOM) / CSEM * 100 (1) IP= │(CSEM-CCOM) / CSEM│ * [1/pi] (2) Onde: IP = Importância de S. flexicaulis na comunidade CSEM = Comunidade sem a parasita. Em CSEM foi considerada a cobertura vegetal de todos os indivíduos (vivos, parasitados e mortos) presentes na área. CCOM = Comunidade com a parasita. Em CCOM foi considerada a cobertura vegetal dos indivíduos vivos que estavam presentes nas faixas. pi = proporção da cobertura vegetal da parasita na comunidade amostrada. Os valores de cobertura de todas as espécies foram expressos em m2. Se o valor de IP encontrado for igual a 0 (zero) ou tiver um valor próximo a 1 então a parasita não poderá ser considerada chave na comunidade vegetal. Para espécie-chave, de acordo com Power et al. (1996), se a parasita tiver um efeito desproporcional na comunidade então IP deverá ser muito maior que 1. Isto somente ocorrerá se a cobertura vegetal de S. flexicaulis for desproporcionalmente inferior à da comunidade e causar um grande impacto nas coberturas de suas hospedeiras. Neste caso S. flexicaulis poderá ser considerada uma espécie-chave nesta comunidade. Para verificar se a diversidade da comunidade se altera em função do parasitismo foi calculado o índice de diversidade de Shannon H’ para: 1) comunidade com a parasita (CCOM) e 2) comunidade sem a parasita (CSEM) nas áreas A e B. Os valores de H’ foram expressos em nats/indivíduos. Estes valores foram comparados pelo teste t de Hutcheson, que é o único teste recomendado para comparar os valores de H’ entre áreas (Zar 2009). 84 Para comparar a composição de espécies foi calculado o índice de dissimilaridade de Bray-Curtis para CCOM e CSEM nas áreas de maior e menor densidade da parasita, conforme as considerações descritas acima. O índice de Bray-Curtis varia de 0 a 1 e as áreas serão mais similares quanto maior for este valor. Este índice foi calculado para duas variáveis: abundância de espécies e cobertura. Nas análises de abundância as Poaceae e Cyperaceae foram excluídas, pois suas espécies não foram identificadas. Para as famílias Orchidaceae, Cactaceae e Velloziaceae, agrupamentos de indivíduos da mesma espécie isolados uma distância superior 5 cm, foram tratados como um único indivíduo. Já para as análises de cobertura todas as espécies foram incluídas. Resultados Na área A as densidades da parasita variaram de 3,62 a 6,4 m/m2 (média= 4,96 ± 0,97) e a comunidade era composta por muitos arbustos (Tab. 1). Na área B, onde as densidades da parasita variaram de 0,7 a 1,8 m/m2 (média=1,17 ± 0,31), houve predominância de herbáceas e gramíneas, e os arbustos encontravam-se mais espaçados na paisagem. As duas áreas diferiram quanto a densidade de parasitas (t = 7,39; n = 10; p = 0,007). A cobertura total em ambas as áreas, entretanto, foi semelhante (veja adiante Tab. 3) Houve uma correlação positiva entre a densidade de parasitas e arbustos (rs=0,839; n=10; p<0,05). Tabela 1. Densidade de parasitas e arbustos nas áreas A (alta densidade de parasitas) e B (baixa densidade de parasitas) nas 5 faixas de 50 x 1 m2. (*) A densidade média de espécies arbustivas foi calculada levando-se em consideração apenas indivíduos lenhosos com diâmetro máximo de copas acima de 20 cm. Faixas Área A 1 2 3 4 5 Faixas Área B 1 2 3 4 5 S. flexicaulis (m) 181,00 319,73 266,06 267,50 207,39 Densidade (m de S.flexicaulis/m2) 3,62 6,39 5,32 5,35 4,15 62,75 78,20 35,00 46,74 69,80 1,26 1,56 0,70 0,93 1,40 (*) Densidade média de arbustivas/m2 2,4 ± 1,2 2,7 ± 1,5 3,1 ± 1,3 3,3 ± 2,1 2,7 ± 1,5 1,2 1,9 1,7 1,5 1,4 ± ± ± ± ± 1,1 1,1 0,9 1,1 1,1 85 Excluindo-se as gramíneas (Poaceae e Cyperaceae) a composição florística da comunidade foi semelhante entre as áreas, sendo formada por 20 famílias e 39 espécies na área A e 17 famílias e 38 espécies na área B (Anexo 2A e B). Tanto na área A quanto na B, as famílias mais representativas foram Asteraceae com 7 e 8 espécies, Orchidaceae com 4 e 6 espécies, Melastomataceae e Velloziaceae com 4 e 3 espécies respectivamente. Foram encontrados 5.419 indivíduos na área A, sendo as espécies mais abundantes a Orquidaceae Sophronitis cattleya (679), a Euphorbiaceae Microstachys daphnoides (562), a Fabaceae Mimosa calodendron (500) e a Asteraceae Lychnophora pinaster (415). Já na área B foram encontrados 4.871 indivíduos, sendo as espécies mais abundantes S. cattleya (812), M. daphnoides (568), a Melastomataceae Tibouchina heteromalla (400) e L. pinaster (391). Os valores de diversidade de Shannon não apontaram diferenças entre as espécies da comunidade com a parasita (CCOM) e sem a parasita (CSEM) (Tabela 2). Tabela 2 - Valores de diversidade calculados para CSEM (comunidade sem a parasita) e CCOM (com a parasita). S= número de espécies; H’= índice de diversidade de Shannon e E’ = equitabilidade. Os números de 1 a 5 se referem às faixas. Foi usado o teste t de Hutcheson para comparar os valores de diversidade da comunidade CSEM (H’CSEM) com os da comunidade CCOM (H’CCOM). Área A (Alta densidade) 1 2 3 4 5 Área A S 25 22 23 27 25 36 H'CCOM 2,651 2,560 2,539 2,694 2,684 2,792 H'CSEM 2,630 2,521 2,542 2,702 2,676 2,789 ECCOM 0,824 0,828 0,810 0,818 0,834 0,762 E'CSEM 0,817 0,816 0,811 0,820 0,831 0,761 teste t 0,47 0,82 0,08 0,17 0,22 0,19 p 0,6 0,4 0,9 0,9 0,8 0,9 Área B (Baixa densidade) 1 2 3 4 5 Área B S 30 24 27 25 23 36 H'CCOM 2,696 2,413 2,571 2,541 2,483 2,682 H'CSEM 2,658 2,405 2,567 2,536 2,464 2,674 ECCOM 0,793 0,759 0,780 0,789 0,792 0,743 E'CSEM 0,789 0,757 0,779 0,788 0,786 0,746 teste t 0,73 0,17 0,09 0,14 0,36 0,42 p 0,5 0,9 0,9 0,9 0,7 0,7 Considerando as áreas A e B, a espécie mais abundante foi M. daphnoides com 1.130 indivíduos, sendo apenas 39 parasitados. A espécie M. calodendron destacou-se, 86 representada por 858 indivíduos, dos quais mais de 57% estiveram parasitados (Fig. 1). A composição das espécies tampouco variou. O índice de similaridade de Bray-Curtis para CCOM e CSEM calculado com as abundâncias de espécies foi de 0,93 para a área de alta densidade e de 0,97 para a de baixa densidade, e quando foi calculado com a cobertura vegetal das espécies os valores foram 0,80 e 0,89 respectivamente. 60 Mim Parasitismo (%) 50 40 30 20 Lyc 10 Mdap Bre Cm 0 0 Stac Vel Cr Bor Sym 5 Tib 10 15 Abundância (%) 20 25 Fig. 1 – Relação entre o parasitismo e a abundância de 11 espécies na comunidade cuja abundância relativa foi superior a 1%. Mim = Mimosa calodendron; Lyc = Lychnophora pinaster; Mdap = Microstachys daphnoides; Bre = Baccharis reticularia; Stac = Stachytarpheta glabra; Tib = Tibouchina heteromalla; Vel = Vellozia compacta; Sym = Symphyopappus reticulatus; Cr = Croton serratoideus.; Cm = Cromolaena sp.; Bor = Borreria sp. De modo geral, em toda a comunidade (áreas A + B) todas as espécies arbustivas sofreram reduções em suas coberturas vegetais devido à atuação do parasitismo (Fig. 2). A espécie M. calodendron foi a que apresentou maior cobertura e também a que mais sofreu com o parasitismo, pois perdeu 57% de sua cobertura total na comunidade. Esta espécie é perene, fixadora de nitrogênio e muito abundante na área de estudo. Já L. pinaster, representada por 806 e M. daphnoides com 562 indivíduos, tiveram uma redução de 23% e 3,4% de suas coberturas vegetais, respectivamente. 87 Espécie Bor Crom Crot Cyp velab Aci Sym vel Tibo Stac Sop Bret Mdap Poa Lyc Mim 80 70 60 50 40 30 20 10 Cobertura sem atuação da parasita (m²) 0 10 20 30 40 50 60 70 Cobertura com atuação da parasita (m²) 80 Fig. 2 – Atuação do parasitismo sobre a cobertura vegetal das 14 espécies que estiveram representadas por 3m2 ou mais na comunidade. Mim = Mimosa calodendron; Lyc = Lychnophora pinaster; Poa = Poaceae; Mdap= Microstachys daphnoides; Bret = Baccharis reticularia; Sop = Sophronitis cattleya; Stac = Stachytarpheta glabra; Tib = Tibouchina heteromalla; Eri = Eriope macrostachya; vel= Vellozia compacta; Sym = Symphyopappus reticulatus; Aci = Aciantera teres; velab = Vellozia albiflora; Micr = Microlicia sp1.; Bser= Baccharis serrulata. Representantes herbáceas e rasteiras como as Poaceae, Orchidaceae, Velloziaceae e Cyperaceae que eventualmente foram parasitadas, entretanto, não tiveram suas coberturas alteradas. Quando as áreas A e B foram analisadas separadamente notou-se que a identidade e a cobertura das espécies pouco se alteraram (Fig. 3). Entretanto, L. pinaster foi a espécie mais representativa na área B e perdeu menos cobertura que M. calodendron, que possuía a segunda maior cobertura. Na área de maior densidade (A), todas as espécies sofreram reduções em suas coberturas em decorrência da mortalidade pelo parasitismo (Fig. 3A). O mesmo não ocorreu na área de menor densidade (B) em que espécies como T. heteromalla, Symphyopapus brasiliensis, Acianthera teres, S. cattleya quase não sofreram perdas de suas coberturas (Fig. 3B). 88 Sym vel Eri Espécie Stac Bret Sop Mdap Poa Lyc Mim 80 70 60 50 40 30 20 10 Cobertura sem atuação da parasita (m²) 0 10 20 30 40 50 60 70 Cobertura com atuação da parasita 80 0 10 20 30 40 50 60 70 Cobertura com atuação da parasita (m²) 80 Aci Sym vel Espécie Sop Stac Tib Bret Mdap Poa Mim Lyc 80 70 60 50 40 30 20 10 Cobertura sem atuação da parasita (m²) Fig. 3 – Atuação do parasitismo sobre a cobertura vegetal das espécies que estiveram representadas por 3m2 ou mais na comunidade. A) Área de maior densidade da parasita e B) Área de menor densidade da parasita. Aci = Aciantera teres; Bret = Baccharis reticularia; Eri = Eriope macrostachya; Lyc = Lychnophora pinaster; Mdap= Microstachys daphnoides; Mim = Mimosa calodendron; Poa = Poaceae; Sop = Sophronitis cattleya; Stac = Stachytarpheta glabra; Sym = Symphyopappus reticulatus; Tib = Tibouchina heteromalla; vel= Vellozia compacta. O efeito top-down de S. flexicaulis sobre a comunidade vegetal esteve relacionado à densidade de parasitas (Tab. 3). Nas faixas da área B este efeito foi menor, pois a perda de cobertura foliar das espécies da comunidade variou de 7 a 40% e seu valor médio foi de 22%. A faixa 3 foi a que menos sofreu este efeito, pois teve a menor densidade de parasitas (Tab. 1). O contrário ocorreu nas faixas 1 e 2, de maiores densidades de S. flexicaulis, que tiveram os maiores valores de perda de cobertura (Tab. 89 1 e 3). Já na área A o efeito foi maior (Tab. 1 e 3). A perda de cobertura foliar foi 2,3 vezes maior que na área B e variou de 39 a 66%, com média de 50%. Tabela 3- Magnitude do efeito top-down baseada em Power et al. (1996). CSEM representa a cobertura vegetal da comunidade sem a parasita e CCOM representa a cobertura vegetal da comunidade com a parasita. Os números de 1 a 5 se referem às faixas. Área A (Altas densidades) 1 2 3 4 5 Área A CSEM (m2) CCOM (m2) (CSEM-CCOM)/CSEM top-down 13,69 25,43 22,27 29,56 22,24 113,19 19,65 42,18 34,44 41,20 32,65 170,12 -0,44 -0,66 -0,55 -0,39 -0,47 -0,50 -43,54 -65,87 -54,65 -39,38 -46,81 -50,30 Área B (Baixas densidades) 1 2 3 4 5 Área B CSEM (m2) CCOM (m2) (CSEM-CCOM)/CSEM top-down 23,56 18,89 34,62 18,91 22,12 118,1 32,91 26,05 37,11 23,25 24,29 143,61 -0,40 -0,38 -0,07 -0,23 -0,10 -0,22 -39,69 -37,90 -7,19 -22,95 -9,81 -22,00 A parasita S. flexicaulis apresentou valores de IP indicativos de ser espéciechave na comunidade vegetal (Tabela 4). Os valores do IP variaram muito, de 10,85 a 51,94, nas faixas de baixas densidades (área B) de parasitas, sendo que a média para esta área foi de 30. Já para as faixas de maiores densidades (área A) os valores do IP variaram de 11,04 a 17,63 e a média para a área foi de 15,39. A cobertura vegetal da comunidade sem a atuação parasita (CSEM) foi semelhante entre as áreas, mas a cobertura da parasita foi mais de 4 vezes maior em A que em B, resultando em valores de IP menores (Tabela 4). 90 Tabela 4- Resultados da aplicação da equação matemática proposta por Power et al. (1996) para espécie-chave. CSEM = cobertura vegetal da comunidade sem a parasita; CCOM = cobertura vegetal da comunidade com a parasita; Parasita = cobertura vegetal da parasita; pi = proporção da cobertura vegetal da parasita. Os números de 1 a 5 se referem às faixas. Área A CSEM (m2) CCOM (m2) Parasita (m2) pi 1/pi Espécie-chave (IP) 1 2 3 4 5 Total Área A 13,69 25,43 22,27 29,56 22,24 113,19 19,65 42,18 34,44 41,20 32,65 170,12 0,54 0,95 0,79 0,80 0,62 3,7 0,039 0,037 0,035 0,027 0,028 0,033 25,35 26,77 28,19 36,95 35,87 30,59 11,04 17,63 15,41 14,55 16,79 15,39 Área B 1 2 3 4 5 Total Área B 23,56 18,89 34,62 18,91 22,12 118,1 32,91 26,05 37,11 23,25 24,29 143,61 0,18 0,23 0,10 0,14 0,20 0,85 0,008 0,012 0,003 0,007 0,009 0,007 130,89 82,13 346,20 135,07 110,60 138,94 51,94 31,13 24,90 31,00 10,85 30,01 Discussão Os efeitos do parasitismo numa comunidade vegetal são dependentes da densidade de plantas e a preferência da parasita por hospedeiras. Se por um lado a produtividade e a permanência das plantas parasitas são dependentes da “qualidade” dos recursos obtidos (Press & Phoenix 2005), hospedeiras muito parasitadas podem morrer (Aukema 2003). Quando as plantas mais atacadas são competitivamente subordinadas, a diversidade de espécies na comunidade poderá diminuir (Press & Phoenix 2005, Grewell 2008). Por outro lado, se as mais atacadas forem as dominantes, é esperado um aumento na diversidade local (Press 1998, Press & Phoenix 2005). A atuação da parasita Cuscuta salina, por exemplo, modificou negativamente a riqueza e a diversidade de plantas em marismas no norte da Califórnia (Pennings & Callaway 1996). Em teoria S. flexicaulis poderia favorecer o aumento da diversidade local, pois parasita preferencialmente a hospedeira M. calodendron, uma das espécies dominantes dos afloramentos ferruginosos e possivelmente uma forte competidora. Entretanto, a morte desta hospedeira poderia afetar negativamente a composição das espécies na 91 comunidade e até diminuir a diversidade, pois conforme sugerido por Jacobi et al. (2007) M. calodendron seria uma espécie babá e auxiliaria no recrutamento de outras espécies. Após considerar a atuação da parasita, verificou-se que a composição florística da comunidade, tanto na área de maior quanto na de menor densidade da parasita, não foi alterada. S. flexicaulis reduziu significativamente a cobertura vegetal de suas hospedeiras sem que isso afetasse a diversidade de espécies. Embora a comunidade vegetal não tenha sido acompanhada ao longo do tempo, estima-se que as espécies parasitadas tenham morrido no período máximo de 5 anos. Isso por que os vestígios da parasita estavam bastante visíveis e as espécies parasitadas demoram de 2 a 3 anos para morrer (F. A. Mourão, obs. pess.). Dessa forma, seria possível que a comunidade vegetal sofresse mudanças negativas em sua composição e diversidade de espécies no decorrer de vários anos. Mas novos estudos precisam ser realizados para averiguar as possíveis mudanças nesta comunidade. Estudos que analisam o efeito top-down em comunidades terrestres têm enfatizado as causas e consequências das variações de biomassa (Oksanen 1990, Dyer & Letourneau 2003). Uma analogia pode ser feita com o estudo de Mourão e colaboradores (2009) quando confirmaram que hospedeiras muito parasitadas apresentavam de 75 a 95% de redução da cobertura vegetal. Para algumas espécies como L. pinaster e M. calodendron foram nítidas as variações de cobertura vegetal após a atuação da parasita. Esta última espécie foi que mais sofreu com o parasitismo na comunidade. Por ser capaz de fixar nitrogênio, M. calodendron teria uma vantagem competitiva sobre as demais plantas podendo se desenvolver e espalhar em locais com sérias restrições nutricionais, já que as leguminosas são capazes de elevar o pH do solo e favorecer a absorção de nutrientes necessários ao seu desenvolvimento (Nascimento et al. 2003). Entretanto, as populações de M. calodendron são controladas por S. flexicaulis, que reduzem o investimento reprodutivo desta hospedeira (Mourão et al. 2009), afetando o recrutamento de novos indivíduos na população e levando-as morte por parasitismo. Isso porque M. calodendron é, dentre as potenciais hospedeiras, a que mais poderia atender as necessidades nutricionais da parasita, já que o nitrogênio é um recurso limitante para o desenvolvimento de plantas (Crawley 2007). Como há uma relação direta e positiva entre a disponibilidade de nitrogênio e ganho de biomassa (Crawford 1995, Ângre 1985, Cechim & Fumis 2004, Larcher 2006), ao parasitar as leguminosas, S. flexicaulis poderia investir mais em crescimento e estruturas reprodutivas. Outras espécies abundantes, mas pouco parasitadas como M. daphnoides e 92 T. heteromalla, por exemplo, não tiveram uma perda da cobertura vegetal tão significativa. Estes resultados demonstram que a importância do efeito top-down pode ser alterada em função da abundância e a composição de espécies na comunidade, em função das “escolhas” das parasitas. Apesar de este estudo tratar de interações de plantas em apenas dois níveis tróficos, efeitos indiretos em outros níveis não mensurados neste trabalho podem ocorrer. Assim como a adição de animais parasitas em teias tróficas pode aumentar a riqueza de espécies, o número de ligações, os níveis tróficos e comprimento da teia (Thompson et al. 2005), as plantas parasitas podem modificar as interações entre suas hospedeiras e as demais espécies da cadeia trófica, podendo interferir na estabilidade, nas forças de interação e no fluxo de energia (Lafferty et al. 2008). Como as espécies parasitadas perdem cobertura vegetal, as aves que as utilizam como recursos tais como alimento, poleiros e local para nidificação, poderiam se tornar mais vulneráveis à predação. As aves da família Tyranidae Polystictus superciliaris, Elaenia cristata e Embernagra longicauda, por exemplo, que se alimentam de insetos capturados nos troncos de arbustos e constroem seus ninhos em galhos de M. calodendron (Hoffman et al. 2009a, Hoffman et al. 2009b, Hoffmann & Rodrigues 2011) poderiam ser prejudicadas. Por outro lado S. flexicaulis pode servir como fonte de recurso para aves como E. cristata, que também se alimentam de frutos da parasita (Guerra 2005), insetos como as formigas Camponotus crassus (Formicidae), que coletam o visco de sementes da parasita recém-depositadas nos galhos das hospedeiras (Mourão obs. pessoal), e polinizadores. S. flexicaulis foi considerada espécie chave na comunidade estudada, segundo os preceitos de Power e colaboradores (1996). Os valores de IP e de top-down foram evidentes e variaram conforme diferentes densidades de arbustos. Na área A, que teve quase o dobro de espécies arbustivas/m2 em relação à B, fazendo com que as distâncias entre copas vizinhas fossem menores, o que possivelmente favoreceu o contágio de outras plantas, elevando os valores de top-down. Entretanto, como a parasita também apresentou maiores coberturas nestas áreas, os valores para espécie-chave foram menores que em B. Já na área B, as distâncias entre as copas intuitivamente são maiores e a dispersão vegetativa dos ramos da parasita pode ter sido dificultada, reduzindo a importância do efeito top-down. As parasitas que se estabelecem em hospedeiras isoladas, a mais de 20 cm de outras plantas (F. A. Mourão, dados não publicados), dificilmente infectam outras plantas por dispersão vegetativa, pois quanto maior a 93 distância entre copas menor a chance de transmissão de ramos para outras hospedeiras. O mesmo ocorre com a dispersão ornitocórica, pois a proximidade entre arbustos tende a atrair mais aves, intensificando a deposição de sementes na área (Overton 1996). Se este espalhamento for mais abrangente um efeito top-down maior é esperado, pois mais plantas serão atacadas simultaneamente. O efeito top-down variou em função da distribuição espacial de plantas na paisagem, pois a menor distância entre as hospedeiras favorece o espalhamento de S. flexicaulis intensificando seus efeitos sobre a comunidade vegetal. Além disso, a maior cobertura vegetal da parasita garantiu os maiores valores deste efeito. Já a importância da parasita como espécie-chave variou em função da perda de cobertura vegetal em relação à cobertura vegetal da parasita. Ao contrário do efeito top-down, os valores de espécie-chave foram mais elevados onde a pouca cobertura vegetal da parasita causou um grande efeito na cobertura das hospedeiras. Os valores de espécie-chave refletiram bem esta relação uma vez que em áreas de maior densidade de hospedeiras a parasita teve também maiores valores de cobertura. Neste trabalho os valores de IP que caracterizaram os impactos da parasita sobre a vegetação foram até maiores que os valores encontrados por Knapp e colaboradores (1999) para os grandes herbívoros das pradarias Norte Americanas (5 a 25). Eles quantificaram os impactos diretos e indiretos causados por bisões que se alimentavam seletivamente de espécies vegetais. Estes herbívoros alteraram as características físicas e químicas do ambiente, aumentaram a heterogeneidade temporal e espacial da vegetação e afetaram uma variedade de processos ecossistêmicos. Também, diferentemente das parasitas, os bisões foram capazes de modificar a diversidade da comunidade vegetal. Contudo, mesmo que a perda de espécies não tenha sido notada, a parasita suprimiu consideravelmente a cobertura vegetal de plantas dominantes, que pode ter ocorrido devido à constituição peculiar desta comunidade caracterizada por elevada abundância e cobertura de M. calodendron. De maneira semelhante aos bisões, que aumentam a quantidade de nutrientes no ecossistema, a queda acentuada de folhas provocadas pelo parasitismo poderia contribuir para acelerar a entrada de nutrientes no sistema. Isso também ocorreu em florestas temperadas de eucaliptos, cuja parasita Amyema miquelli aumentou o retorno de nutrientes na serapilheira, duplicando as taxas de nitrogênio e quadruplicando as taxas de fósforo (March & Watson 2010). S. flexicaulis também poderia alterar a heterogeneidade espacial da paisagem e reduzir o potencial competitivo de M. calodendron, já que hospedeiras muito infectadas morrem 94 com o passar do tempo. Apesar de S. flexicaulis não ter alterado a diversidade e a composição de espécies, foi capaz de modificar substancialmente a cobertura vegetal da hospedeira dominante, o que sugere modificações espaciais na comunidade a longo prazo. A variação do efeito top-down da parasita sobre a comunidade vegetal dos afloramentos ferruginosos foi dependente da densidade de hospedeiras e contribuiu para sua atuação como espécie-chave. Sua atuação pode contribuir para o aumento da heterogeneidade ambiental, afetar a dinâmica das populações de suas hospedeiras e modificar as interações entre as espécies, interferindo assim no funcionamento da comunidade. 95 Referências bibliográficas Amsberry, L. K. & J. L. Maron. 2006. Effects of herbivore identity on plant fecundity. Plant Ecology, 187:39–48. Ågren, G. I. 1985. Theory for growth of plants derived from the nitrogen productivity concept. Physiologia Plantarum, 64:17–28. Aukema, J. E. 2003. Vectors, viscin, and Viscaceae: mistletoes as parasites, mutualists and resources. Frontiers in Ecology and the Environment, 1:212-219. Azpeitia, F. & Lara, C. 2006. Reproductive biology and pollination of the parasitic plant Psittacanthus calyculatus (Loranthaceae) in central México. Journal of the Torrey Botanical Society, 133:429–438. Balciunas, D. & Lawler, S. P 1995. Effects of basal resources, predation, and alternative prey in microcosm food chains. Ecology, 76:1322-1336. Baum, J. K. & Worm, B. 2009. Cascading top-down of changing oceanic predator abundances. Journal of Animal Ecology, 3:1-16. Benites, V. M.; Shaefer, C. E. G. K.; Simas, F. N. B. & Santos, H. G. 2007. Soils associated with rock outcrops in the Brazilian mountain ranges Mantiqueira and Espinhaço. Revista Brasileira de Botânica, 4:569-577. Braun-Blanquet, J. 1979. Fitosociologia, bases para el estudio de las comunidades vegetales. H. Blume (ed.), Rosario, Madrid, 819 pp. Bryant, J. P.; Provenza, F. D.; Pastor, J.; Reichardt, P. B.; Clausen, T. P. & du Toit, J. T. 1991. Interactions between woody plants and browsing mammals mediated by secondary metabolites. Annual Review Ecological and Systemathics, 22:431-446. Callaway, R. M. & Penning, S. C. 1998. Impact of a parasitic plant on the zonation of two salt marsh perennials. Oecologia, 114:100-105. Calvin, C. L. & Wilson, C. A. 2006. Comparative morphology of epicortical roots in Old and New World Loranthaceae with reference to root types, origin, patterns of longitudinal extension and potential for clonal growth. Flora, 201:345-353. Carlo T. A, Aukema J. E. 2005. Female-directed dispersal and facilitation between a tropical mistletoe and a dioecious host. Ecology 86: 3245–3251. Cechim, I. & Fumis, T. F. 2004. Effect of nitrogen supply on growth and photosynthesis of sunflower plants grown in the greenhouse. Plant Science, 166:1379-1385. Chase, J. 1998. Central place forager effects on the food chain dynamics and special pattern in Northern California meadows. Ecology, 79: 1236-1245. 96 Chesson, P. 2000. Mechanisms of maintenance of species diversity. Annual Review of Ecology and Systematics, 31:343 -366. Crawford, N. M. 1985. Nitrate: nutrient and signal for plant growth. The Plant Cell, Rockville, 7:859-868. Crawley, M. J. 2007. Plant Ecology, 2 º Ed. 717 p. Ed. Blackwell Science, London. de Jong, T. J., & P. G. L. Klinkhamer. 2005. Evolutionary Ecology of Plant Reproductive Strategies. University Press, Cambridge, UK. Dyer, L.A. & Letourneau, D. 2003. Top-down and bottom-up diversity cascades in detrital vs. living food webs. Ecology Letters, 6:60-68. Glatzel, G. & Geils, B. W. 2009. Mistletoe ecophysiology host-parasite interactions. Botany, 87:10-15. Gómez, J. M. & Zamora, R. 1994. Top-down effects in a tritrophic system: Parasitoids enhance plant fitness. Ecology, 75:1023-1030. Grewell, B. J. 2008. Parasite facilitates plants species coexistence in costal wetland. Ecology 89:1481-1488. Gruner, D. S. 2004. Attenuation of top-down and bottom-up forces in a complex terrestrial community. Ecology, 85:3010-3022. Guerra, T. J. A. 2005 Componentes quantitativos e qualitativos da dispersão de sementes de Struthanthus flexicaulis (Loranthaceae) em uma área de campo rupestre do sudeste brasileiro. Dissertação de mestrado Universidade Estadual Paulista, Rio Claro, 64 pp. Hairston, N. G.; Smith, F. E. & Lawrence, B. S. 1960. Community structure, population control and competition. The American Naturalist, 94:421-425. Hoffman, D.; Lopes, L. E. & Vasconcelos, M. F. 2009a. Natural history notes on the Pale-throated Serra-finch (Embernagra longicauda) in eastern Brazil. Ornitologia Neotropical, 20:597-607. Hoffman, D.; Gomes, H. B. & Guerra, T. 2009b. Biologia reprodutiva de Elaenia cristata Pelzeln, 1868 (Passeriformes: Tyrannidae) em duas áreas de campo rupestre de Minas Gerais, Brasil. Revista Brasileira de Ornitologia, 17:102-106. Hoffmann, D.; Vasconcelos, M. F.; Lopes, L. E. & Rodrigues, M. 2007. Comportamento de forrageamento e dieta de Polystictus superciliaris (Aves, Tyrannidae) no sudeste do Brasil. Iheringia Série Zoologia, 97:296-300. Hunter, M. D.; Varley, G. C. & Gradwell, G. R. 1997. Estimating the relative roles of Top-down and Bottom-up forces on insect herbivore population: a classic study 97 revisited. Proceedings of the National Academy of Sciences of the United States of America, 17:9176-9181. Jacobi, C. M.; Carmo, F. F.; Vincent, R. C. & Stehmann, J. R. 2007. Plant communities on ironstones outcrops: a diverse and endangered Brazilian ecosystem. Biodiversity and Conservation, 16: 2185-2200. Kelly, C. K.; Venable, D. L. & Zimmerer, K. 1988. Host specialization in Cuscuta costaricensis. An assessment of use relative to host availability. Oikos, 53: 315320. Kelly, K. C. 1992. Resource choice in Cuscuta europaea. Proceedings of the National Academy of Sciences, 89:12194-12197. Kelly, D.; Ladley, J. J. & Robertson, A. W. 2004. Is dispersal easier than pollination? Two tests in New Zealand Loranthaceae. New Zealand Journal of Botany, 42:89103. Knapp, A. K.; Blair, J. M.; Briggs, J. M.; Collins, S. L.; Hartnett, D. C.; Johnson, L. C. & Towne, E. G. 1999. The keystone role of bison in North American Tallgrass Prairie. Bioscience, 49:39-50. Kneitel, J. M. & Miller, T. E. 2002. Resource and top-predator regulation in the pitcher plant (Sarracenia purpurea) inquiline community. Ecology, 83:680-688. Lafferty, K. D.; Allesina, S.; Arim, M.; Briggs , C. J.; De Leo, G. Dobson, P.; Dunne, J. A.; Johnson,P. T. J.; Kuris, A. M.; Marcogliese, D. J.; Martinex, N. D.; Memmott, J.; Marquet, P. A.; McLaughlin, J. P.; Mordecai, E. A.; Pascual, M.; Poulin, R. & Thieltges, D. W. 2008. Parasites in food webs: the ultimate missing links. Ecology Letters, 11:533-546. Larcher, W. 2006. Ecofisiologia vegetal. São Carlos. 532p. Lei, S. A. 1999. Age, size and water status of Acacia gregii influencing the infection and reproductive success of Phoradendron californicum. American Midland Naturalist, 141: 358-365. Lei, S. A. 2001. Survival and development of Phoradendron californicum and Acacia greggii during a drought. Western North American Naturalist, 61: 78-84. March, W. A. & Watson, D. M. 2010. The contribution of mistletoe to nutrient returns: Evidence for a critical role in nutrient cycling. Austral Ecology, 35:713-721. Mourão, F. A.; Carmo, F. F; Ratton, P.; Jacobi, C. M. 2006. Hospedeiras da hemiparasita Struthanthus flexicaulis (Mart.) Mart. (Loranthaceae) em campos rupestres ferruginosos, Quadrilátero Ferrífero, MG. Lundiana, 7:103-110. 98 Mourão, F. A., Jacobi, C. M. Figueira, J. E. C & Batista, E. K. L. 2009. Effects of the parasitism of Struthanthus flexicaulis (Mart.) Mart. (Loranthaceae) on the fitness of Mimosa calodendron Mart. (Fabaceae), an endemic shrub from rupestrian fields over ironstone outcrops, Minas Gerais State, Brazil. Acta Botânica Brasílica, 23:820-825. Nascimento, J. T.; Silva, I. F.; Santiago, R. D. & Silva Neto, L. F. 2003. Efeito de leguminosas nas características químicas e matéria orgânica de um solo degradado. Revista Brasileira de Engenharia Agrícola Ambiental, 7:457-462. Nimer, E. & Brandão, A. M. 1989. Balanço Hídrico e clima da região dos Cerrados. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Rio de Janeiro, Brasil. Norton, D. A. & Carpenter, M. A. 1998. Mistletoes as parasites: host specificity and speciation. Trends in Ecology and Evolution, 13:101-105. Norton, D.A. & Reid, N. 1997. Lessons in ecosystem management from management of threatened and pest loranthaceous mistletoes in New Zealand and Australia. Conservation Biology, 11:759-769. Nuttle, T; Yerger, E. H.; Stoleson, S. H & Ristau, T. 2011. Legacy of top-down herbivore pressure ricochets back up multiple trophic levels in forest canopies over 30 years. Ecosphere, 2:1-11. Oksanen L. 1990. Predation, herbivory, and plant strategies along gradients of primary productivity. In: Perspectives on plant competition, pp. 445-474. Tilman, D. & Grace, J. (Eds.). Academic Press, New York. Overton, J. M. 1996. Spatial autocorrelation and dispersal in mistletoes: Field and simulation results. Vegetatio, 125: 83-98. Paine, R. T. 1969. A note on trophic complexity and community stability. American Naturalist 103: 91-93. Pennings, S. C. & Callaway, R. M. 1996. Impacts of parasitic plant on the structure and dynamics of salt marsh vegetation. Ecology. 77:1410-1419. Pennings, S. C.; Callaway, R. M. 2002. Parasitic plants: parallels and contrasts with herbivores. Oecologia, 131:479-489. Polis, G.A; Sears, A.L.W.; Huxel, G.R; Strong, D. R & Maron, J. 2000. When is a trophic cascade a trophic cascade? Tree, 15:473-475. Power, M. E. & Mills, L. S. 1995. The keystone cops meet in Hilo. TREE, 10: 182-184. Power, M. E.; Tilman, D.; Estes, J. A.; Menge, B. A.; Bond, W. J.; Scott Mills, L.; Daily, G.; Castilla, J. C.; Lubchenco, J. & Paine, R. T. 1996. Challenges in the quest for keystones. Bioscience, 8: 609-620. 99 Press, M. C. & Phoenix, G. K. 2005. Impacts of parasitic plants on natural communities. New Phytologist, 166: 737-751. Press, M. C. 1998. Dracula or Robin Hood? A functional role for root hemiparasites in nutrient poor ecosystems. Oikos. 82: 609-611. Press M. C., Scholes J. D. & Barker, M. G. 1999. Plant physiological ecology. Oxford, UK: Blackwell Science Ltd. Radomiljac, A. M.; McComb, J. A. & Pate, J. S. 1999. Gas exchange and water relations of the root hemiparasite Santalum album L. in association with legume and non-legume hosts. Annals of Botany, 83: 215-224. Rizzini, C. T. 1980. Loranthaceae of the central Brazil. Arquivos do Jardim Botânico do Rio de Janeiro, 24: 19-50. Rizzini, C. T. 1997. Tratado de Fitogeografia do Brasil: Aspectos Ecológicos, Sociológicos e Florísticos 2 º ed. Âmbito Cultural Edições Ltda, Brazil. Schmitz, O. J.; Hambäck, P. A. & Beckerman, A. P. 2000. Trophic cascade in terrestrial systems: A review of the effects of carnivore removal plants. The American Naturalist 155:141-153. Schmitz, O. J. & Suttle, K. B. 2001. Effects of top predator species on direct and indirect interactions in food web. Ecology 78: 1388-1399. Schmitz, O.J. 2006. Predators have large effects on ecosystem properties by changing plant diversity, not plant biomass. Ecology, 87:1432-1347. Smith, D. 2000. The population dynamics and community ecology of root hemiparasitic plants. American Naturalist 155:13-23. Shen, H.; Ye, W.; Hong, L.; Huang, H.; Wang, Z.; Deng, X.; Yang, Q.; Xu, Z. 2006. Progress in parasitic plant biology: Host selection and nutrient transfer. Plant Biology, 8: 175-185. Strong, D. R. 1992. Are trophic cascades all wet? Differentiation and donor-control in speciose ecosystems. Ecology, 73: 747-754. Tennakoon, K. U.; Pate, J. S. 1996. Effects of parasitism by a mistletoe on the structure and functioning of branches of its host. Plant Cell and Environment, 19: 517-528. Thompson, R. M, Mouritsen, K. N. & Poulin, R. 2005. Importance of parasites and their life cycle characteristics in determining the structure of a large marine food web. Journal Animal Ecology, 74: 77- 85. Viana, P. L. & Lombardi, J. A. 2007. Florística e caracterização dos campos rupestres sobre a canga na Serra da Calçada, Minas Gerais, Brasil. Rodriguésia, 58: 159-177. 100 Watson. D. M. 2001. Mistletoe - A keystone resource in forests and woodlands worldwide. Annual Review of Ecology and Systematics, 32: 219-249. Werner, E.E & Peacor, S.D. 2003. A review of trait-mediated indirect interactions in ecological communities. Ecology, 84: 1083-1100. Zar J. H. 2009. Biostatistical analysis, 5ª ed. Pearson Prentice-Hall, Upper Saddle River, USA. 101 Anexo 2A – Lista das espécies vegetais - área A (Altas densidades da parasita). Anemiacea Apocynaceae Asteraceae Bromeliaceae Cactaceae Celastraceae Cyperaceae Euphorbiaceae Fabaceae Lamiaceae Lauraceae Loranthaceae Melastomataceae Myrtaceae Orquidaceae Phytolaccaceae Piperaceae Poaceae Portulacaceae Rubiaceae Velloziaceae Verbenaceae Anemia sp. Ditassa mucronata Mart. Ageratum fastigiatum (Gardn.) R.M. King & H. Rob. Baccharis serrulata DC. Baccharis reticulariaDC. Cromolaena sp. Lychnophora pinaster Mart. Symphyopapus brasiliensis (Gardner) R. M. King & H. Rob. Trixis vauthieri DC. Dyckia cf. simulans L.B. Sm. Arthrocereus glaziovii (K. Schum.) N.P.Taylor & D.C. Zappi Maytenus gonoclada Mart. Cyperaceae Croton serratoideus Radcl.-Sm. & Govaerts Microstachys daphnoides Mimosa calodendron Mart. Periandra mediterranea Taub Eriope macrostachya Mart. ex Benth. Ocotea tristis (Nees) Mez Struthanthus flexicaulis Mart. Mart. Tripodanthus acutifoliusThieg. Leandra australis (Cham.) Cogn. Microlicia sp. Tibouchina sp1 Tibouchina heteromalla Myrcia mutabilis (O.Berg) N.J.E. Silveira Acianthera teres (Lindl.) Borba Epidendrum Orchidaceae Sophronitis cattleya Microtea paniculataMoq. Peperomia decora Dahlst. Poaceae Portulaca hirsutissima Cambess. Borreria cf. capitata (Ruiz & Pav.) DC. Barbacenia Vellozia albiflora Vellozia graminea Pohl. Vellozia compacta Mart. Lippia sp. Stachytarpheta glabra Cham. 102 Anexo 2B – Lista das espécies vegetais - área B (Baixas densidades da parasita). Alstroemeriaceae Apocynaceae Asteraceae Bromeliaceae Cactaceae Cyperaceae Euphorbiaceae Fabaceae Lamiaceae Loranthaceae Malpighiaceae Melastomataceae Orquidaceae Phytolaccaceae Poaceae Portulacaceae Rubiaceae Velloziaceae Verbenaceae Alstroemeria plantaginea Mart. Ditassa mucronata Mart. Ageratum fastigiatum (Gardn.) R.M. King & H. Rob. Baccharis serrulata DC. Baccharis reticularia DC. Cromolaena sp. Lessingianthus sp. Lychnophora pinaster Mart. Symphyopapus brasiliensis (Gardner) R. M. King & H. Rob. Trixis vauthieri DC. Dyckia cf. simulans L.B. Sm. Vriesea minarum L.B. Sm. Arthrocereus glaziovii (K. Schum.) N.P.Taylor & D.C. Zappi Cyperaceae Croton serratoideus Radcl.-Sm. & Govaerts Microstachys daphnoides Mimosa calodendron Mart. Periandra mediterranea Taub Eriope macrostachya Mart. ex Benth. Struthanthus flexicaulis Mart. Mart. Tripodanthus acutifoliusThieg. Heteropteres sp. Leandra australis (Cham.) Cogn. Microlicia sp. Tibouchina heteromalla Acianthera teres (Lindl.) Borba Epidendrum Oncidium blanquet Orchidaceae Orquidea geófita Sophronitis cattleya Microtea paniculataMoq. Poaceae Portulaca hirsutissima Cambess. Borreria cf. capitata (Ruiz & Pav.) DC. Vellozia albiflora Vellozia graminea Pohl. Vellozia compacta Mart. Lippia Stachytarpheta glabra Cham. 103 Considerações finais Durante a realização deste estudo surgiram novos questionamentos sobre o papel de S. flexicaulis no funcionamento e estruturação da comunidade vegetal dos afloramentos ferruginosos. Uma das perguntas a ser respondida é se a composição vegetal e a riqueza de espécies se alterariam com o tempo de atuação da parasita. Como este trabalho foi realizado dentro de uma unidade de conservação e as áreas foram georeferenciadas, futuramente seria possível fazer um novo levantamento de espécies vegetais. Outra solução seria buscar respostas mais imediatas através da incorporação de novos parâmetros ao modelo matemático que, para esta tese, foram desconsiderados nas simulações. A adição de novos parâmetros como densidade de hospedeiras (não somente M. calodendron), configuração da paisagem considerando espécies herbáceas, demografia das hospedeiras e o tempo que as espécies vegetais associadas ao parasitismo levam para morrer, deverá dar respostas mais precisas sobre o destino desta comunidade vegetal. Futuros estudos deverão investigar como e quando a parasita forrageia. Através de um experimento mais detalhado envolvendo as áreas de fisiologia e anatomia vegetal, química e ecologia seria possível determinar os mecanismos de forrageamento adotados pela parasita para otimizar as estratégias de busca por alimentos e reconhecimento de hospedeiras. Como complemento a esta pergunta, recomenda-se acompanhar a fenologia da parasita em diferentes hospedeiras. Estas respostas ajudariam a compreender os diferentes efeitos do parasitismo por S. flexicaulis sobre cada espécie hospedeira, indicando seu o sucesso e permanência em diferentes comunidades vegetais. Durante o desenvolvimento deste trabalho, alguns funcionários do Parque Estadual da Serra do Rola Moça questionaram a necessidade do manejo de S. flexicaulis na comunidade vegetal, uma vez que ela provoca a morte de indivíduos. Contudo não se recomenda a retirada de S. flexicaulis da comunidade vegetal, uma vez que esta é uma espécie-chave, nativa e não causou nenhuma alteração na composição e na diversidade de espécies. 104