[br - 1] estado/alias/páginas 20/01/13

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O ESTADO DE S. PAULO
DOMINGO, 20 DE JANEIRO DE 2013
Roteiro
Niemeyer
ARREMATE
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A partir de 3 de fevereiro, a cidade de São Paulo
ganha um roteiro especial revisitando a obra do
arquiteto Oscar Niemeyer (1907–2012). Entre
outros pontos, o passeio terá visitas aos
edifícios Copan, Eiffel, Montreal e Triângulo,
no centro (velho e novo) da capital.
DOMINGO, 13 DE JANEIRO
Atração central
São Paulo vai redescobrindo o rico e dinâmico conjunto de espaços públicos e edifícios notáveis do centro
HILDEGARD ROSENTHAL/ ACERVO IMS
dro, que já conta com o Catavento (Museu
da Ciência) no Palácio das Indústrias, passará a dispor do Museu da História de São Paulo, na Casa das Retortas, e de um conjunto
cultural no Quartel do Batalhão de Guardas,
bem junto ao Glicério. A área antes ocupada
pelos edifícios São Vito e Mercúrio receberá
dois equipamentos, um do Sesc e outro do
Senac, voltados à celebração da gastronomia. A derrubada do viaduto Diário de São
Paulo permitirá restabelecer a ligação do
Mercado com o parque, indispensável para
integrar as funções existentes com as que
virão. A remoção do terminal de ônibus e a
demolição do irregular edifício Garagem da
Rua 25 deMarço completariam a reapropriação funcional e paisagística, pela cidade, de
um espaço que já foi, com o Anhangabaú, seu
símbolodeparqueurbanomoderno.Oreforço da vocação comercial da região se daria
pela construção de um grande shopping popular para aliviar a demanda da 25 de março.
Essas ideias, aqui apenas esboçadas, dão
uma perspectiva da transformação em curso
no centro da cidade, já descoberto pelos jovens nas edições da Virada Cultural, que, ao
se tornar a festa da cidade, promoveu uma
reurbanização humana do centro, irrigando
com gente e arte toda essa região.
Praça das Artes
CARLOS AUGUSTO CALIL
O
centro da cidade é
o território comum de todos os
paulistanos. Todo
cidadão tem duas
referências: seu
bairro e o centro
histórico. Com o
abandono do centro,ocorridoapartirdo decêniode1960,seuesvaziamentotornou-se incontornável e não foi totalmente
revertido até hoje, apesar dos esforços de sucessivos governos. O centro virou periferia.
No chamado centro velho, o retorno recente de diversas unidades administrativas
do poder público, nos planos municipal e
estadual, deslocou cerca de 11 mil servidores, estimulando o restabelecimento do comércio e serviços locais. A esse processo podemos chamar de ocupação institucional.
Ela, no entanto, não beneficiou nem o centronovo nem aregião doParque Dom Pedro.
As tentativas têm sido feitas sempre com
ênfase na recuperação da função econômica,defatoindispensável, emvista da infraestrutura ali instalada. Mas a revalorização do
centro não se consumará definitivamente se
não levarmos em conta seu aspecto simbólico, portador de valores culturais, associados
à identidade de São Paulo.
Nossa sociedade, no processo histórico
que tornou obsoleto o centro da cidade,
abriu mão de um rico e dinâmico conjunto
deespaçospúblicoseedifícios notáveis,possuidores de características únicas em sua
qualidade urbanística e arquitetônica. A redescoberta do centro, a partir do aproveitamento desse enorme potencial adormecido,
relança igualmente a própria ideia de espaço
público, fragilizada pela proliferação dos
shoppings centers, dos condomínios murados,dasruasde acessorestritoedasconstruções ilhadas de todo tipo.
A demanda por espaços e usos no centro
seráumadecorrênciadesuaatratividadecultural, em sentido amplo, de significado e representação. Não basta restabelecer o plano
material se não houver estímulo para estar e
permanecer no centro.
Está em curso um movimento de reocupação e reapropriação espontânea do centro
porsegmentosdaclassemédiaculta,queprocuram apartamentos em edifícios com assinatura, caso do Copan, de Oscar Niemeyer.
EscritóriosdearquiteturaescolheramaGaleria Metrópole, depois de lotar a Rua General
Jardim,emtornodapraçadaBibliotecaMonteiro Lobato. Artistas e intelectuais já moravam nas imediações da Praça Roosevelt, antes mesmo de a Prefeitura iniciar sua reforma.Igualmovimentose podeesperarnaPraça da República e na Avenida São Luís, desde
aaberturadalinha4dometrôedarevalorização da Biblioteca Mário de Andrade.
Na Avenida São João um investimento pri- seu de Arte Sacra e Arquivo Histórico Munivado produziu o retrofit de um edifício histó- cipal.Outrospoderiamviraadensaraocuparico na calçada dos Correios. Os apartamen- ção cultural: o restauro do Teatro Taib, a
tos foram vendidos antes que se anunciasse o construção do Memorial da Revolução de
investimentopúblico na construção da Praça 1924 junto ao Quartel da Luz, do Teatro da
das Artes. O restaurante Salve Jorge, da Vila Dança, do anexo da Pinacoteca.
Madalena,abriu filial na Praça AntônioPrado
A terceiraregião tem como ênfasea requae tornou o local um disputado ponto de en- lificação do Anhangabaú e entorno. A imcontro. A reforma feita pela Prefeitura no plantação da Praça das Artes, além de ofereMercado Municipal mudou a função daquele cer condições de trabalho aos artistas e estuedifício, hoje mais procurado pelo lazer gas- dantesdo TeatroMunicipal,restaurouo editronômico que pelas ofertas das bancas de fício do Conservatório e ensejará a adaptasecos e molhados.
ção do Cine Marrocos para teatro, possibiliA requalificação do centro, e de seu entor- tando a transformação do Anhangabaú na
no, pelo vetor cultural deve ser incorporada “Praça da Cidade”. O fato de a Fifa ter escoaos projetos de desenvolvimento urbano, lhido o Anhangabaú para sede de sua Fifa
passando a ser considerada uma das premis- Fan Fest, na Copa de 2014, oferece desde já a
sas de intervenção nas novas Operações Ur- oportunidade de concretizar essa vocação.
banas ou nas revisões que se anunciam em A reabertura da Galeria Formosa, entre a rua
diversas áreas simultaneamente:
de mesmo nome e a Praça Ramos, poderá
1ª) Vila Buarque – Praça Roosevelt – Rua criar um espaço público generoso e acolheNestor Pestana – Avenida Ipiranga – Praça dor, similar à Galeria Prestes Maia.
da República – Avenida São Luís
No Largo do Paiçandu, a reconstrução do
2ª) Campos Elísios – Avenida Duque de Art Palácio como teatro musical vai devolver
Caxias – Luz – Tiradentes – Bom Retiro
à cidade seu mais belo palácio art déco, de
3ª) Anhangabaú – Avenida São João – Lar- autoria do arquiteto Rino Levi. Ponto de engo do Paiçandu
contro da comunidade circense, o Paiçandu
4ª) Mercado Municipal – Parque Dom Pe- poderáreceberumaEscoladeCirconeofutudro – Rua 25 de março – Pátio do Pari.
rista, capaz de modificar o panorama atual
Em cada uma delas, os valores culturais dessa atividade, inibida pela falta de investiatraem diferentemente outros atores, se- mento público. A revitalização do belo edifígundo vocações específicas, conferindo cio de vidro de Roger Szmekhol completará o
umacaracterísticaesperessurgimento da pracial a cada iniciativa.
ça,decisivanavidadaciA revalorização deve
Dessemodo,aprimeidade nos anos 1920.
ra região apresenta a
Seu potencial de reconsiderar o aspecto
combinação de equipanovação foi observado
simbólico do centro
mentos culturais com
no dinamismo trazido
oferta residencial. Nela
pela Galeria Olido, que
para os paulistanos
se inscrevem a reconshoje acolhe múltiplas
truçãodo TeatroCultuatividades(cinema,tearaArtísticaeaconsolidaçãodarenovadaPra- tro, música, circo, dança, exposições de culça Roosevelt como endereço do teatro pau- tura urbana), e consagrado pela Galeria do
listano. A Vila Buarque preservou a Faculda- Rock,comsuadiversidadeculturaledegênede de Filosofia no Centro Maria Antônia e aí ro. O Cine Dom José, na Rua Dom José Gaspromove cursos de extensão universitária e par, aguarda apenas uma oportunidade para
exposições originais de artes visuais. O Sesc realizar seu projeto de tornar-se cine-teatro.
Consolação e seu Teatro Anchieta há anos E o futuro recente reserva uma perspectiva:
garantem uma sólida programação cultural um novo Sesc no edifício da Mesbla, na Rua
de referência.
24 de Maio, moldado pela prancheta de PauVizinho do Mackenzie e da FAU Mara- lo Mendes da Rocha.
nhão, o recém-inaugurado Gabinete do DeO“CinePaissandu”,apesardedescaracterisenho, instalado na restaurada Chácara La- zado, mantém o imenso painel do hall de enne, introduziu um espaço de repouso e refle- trada como trunfo, enquanto espera por uma
xão em meio à agitação estudantil. A sede do nova vocação: repetir o destino do Cine Joia,
IAB na Rua Bento Freitas e os prédios proje- que ressurgiu como casa de shows musicais?
tados por Oswaldo Bratke na Rua Major Ser- Ou se tornar ateliê coletivo de artistas que já
tório são marcos da modernidade paulista- habitam a região?
na dos anos 1940 e 1950. O Copan, com seu
O Cine Ipiranga, apesar de fechado, maninterior tombado, ficará mais protegido de tém preservada sua imponência de palácio
alterações de seu programa original.
docinema epode transformar-seno Cinema
Asegundaregiãoserámarcadapelorestau- Municipal,adaptadoparareceberlançamenro do Palácio dos Campos Elísios, que pode- tos, festivais, mostras e retrospectivas, um
ria abrigar com vantagem a coleção de arte original museu do hábito de ir ao cinema.
do Palácio dos Bandeirantes, numa região Para complementar essa iniciativa, edifícios
que já conta com as estações Júlio Prestes e mistos de escritórios e moradias, e garagens
da Luz, e equipamentos culturais como Sala verticais seriam construídos ou adaptados
SãoPaulo, PinacotecadoEstado, Estação Pi- no entorno.
nacoteca, Museu da Língua Portuguesa, MuPor último, a região do Parque Dom Pe-
Elegância na
terra da garoa.
Avenida São João,
tendo ao fundo
o edifício da
Delegacia Fiscal,
na São Paulo
dos anos 1940
A Praça das Artes, cujo primeiro módulo foi
recentemente inaugurado, surgiu da demanda do Theatro Municipal por espaço
agregado, uma vez que sua construção data
do início do século 20 e não podia prever a
extraordinária expansão de suas atividades. Conta ele hoje com uma estrutura inédita, composta de duas orquestras, duas escolas, dois corais, companhia estável de balé e quarteto de cordas.
A Quadra 27, velha conhecida dos nossos
urbanistas, apresenta rica fachada na face da
praça Ramos de Azevedo, mas ao contornar
a esquina da Rua Conselheiro Crispiniano
sua perspectiva já começa a fraquejar com o
prédio modesto ocupado por uma papelaria.
No perímetro que alcança a Avenida São
João e a Rua Formosa, em pleno Anhangabaú, apenas quatro edifícios se impõem ao
olhar: o do Cine Marrocos, um discreto Niemeyer, a sede do Conservatório Dramático e
Musical e a fachada do antigo Cine Cairo,
que lhe serve de contraponto.
O estudo preliminar da Praça das Artes,
elaborado na Secretaria Municipal de Cultura, já definia o restauro do Conservatório
como âncora do projeto. Em torno da construção histórica se espalham os novos edifícios,quecumpremumprogramadeaglutinação das atividades do Municipal num mesmo espaço, em busca de uma sinergia nunca
antes experimentada.
Espera-se que a convivência de alunos de
música com os de dança, de profissionais
com estudantes de música, de bailarinos do
BalédaCidadecomaspirantes,eoutrascombinações possíveis, venha dinamizar as relações entre os 2 mil beneficiários imediatos
da Praça das Artes.
Opúblico voltaráaobelo Salão do Conservatório, tradicional sala de concertos de câmara, e o Marrocos, com acesso pela rua interna da Praça das Artes, receberá espetáculos de teatro, concertos e balés. Na mesma
face da Avenida São João, do outro lado do
edifício de Niemeyer, está prevista a implantação de um terceiro módulo da Praça das
Artes, visando a abrigar a Discoteca e atender à expansão das escolas de arte.
Nos desdobramentos eventuais dessa experiênciaurbanística,suaexpansãoprevêoutras intervenções, a partir do núcleo irradiador. A Praça das Artes, encravada no coração
do centro novo, poderá se converter no pontodeinflexãonoprocessodereabilitaçãodessaárea.AesquinadaSãoJoãocomoAnhangabaú, ponto estratégico do centro da cidade,
bem que poderia receber um edifício inovador, com uma fachada plasticamente instável, que se imponha na paisagem urbana comomarcoda potênciacriativadaarquitetura
de São Paulo no ingresso do novo século.
A construçãoda Praça das Artes e aiminênciadaCopadoMundotornaminadiáveloprocesso de requalificação do Anhangabaú, último espaço público de porte à espera de uma
nova funcionalidade e ressignificação. Será
preciso reverter sua atual inclinação a passagem fugaz, que não retém a atenção do transeunte nem lhe oferece expectativa de repouso num espaço desolado e pouco amigável.
A Praça das Artes e seu potencial transformadordapaisagemdocentrohistóricodecorrem da solução de um velho problema urbanístico com um belo projeto arquitetônico.
✽
CARLOS A. CALIL, CINEASTA, CRÍTICO, ENSAÍSTA
E PROFESSOR DA ECA-USP, FOI SECRETÁRIO
MUNICIPAL DA CULTURA ENTRE 2005 E 2012
✽
A FOTOGRAFIA DESTA PÁGINA, DE AUTORIA DA
ALEMÃ HILDEGARD ROSENTHAL, PERTENCE AO
ACERVO DO INSTITUTO MOREIRA SALLES, QUE NA
SEXTA-FEIRA 25 ABRIRÁ A EXPOSIÇÃO A SÃO PAULO DE HILDEGARD ROSENTHAL, COM 25 IMAGENS
QUE A ARTISTA FEZ NA CIDADE NOS ANOS 1940
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