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Propaganda
UNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SUL
KERLLIN TAIS PEREIRA
A VOLTA DOS BONS TEMPOS: A NOSTALGIA APLICADA ÀS MARCAS
Caxias do Sul
2016
2
UNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SUL
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS
CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL
HABILITAÇÃO EM PUBLICIDADE E PROPAGANDA
KERLLIN TAIS PEREIRA
A VOLTA DOS BONS TEMPOS: A NOSTALGIA APLICADA ÀS MARCAS
Trabalho de Conclusão de Curso
apresentado ao Comunicação Social Habilitação em Publicidade e Propaganda
da Universidade de Caxias do Sul, como
requisito parcial para a obtenção de título
de Bacharel em Comunicação Social –
Habilitação em Publicidade e Propaganda.
Orientadora: Profa. Dra. Ivana Almeida da
Silva
Caxias do Sul
2016
3
KERLLIN TAIS PEREIRA
A VOLTA DOS BONS TEMPOS: A NOSTALGIA APLICADA ÀS MARCAS
Trabalho de Conclusão de Curso
apresentado como requisito para aprovação
na disciplina de Monografia II, do curso de
Publicidade e Propaganda da Universidade
de Caxias do Sul.
Aprovada em: __/__/__
Banca Examinadora
_________________________________________
Prof. Dra. Ivana Almeida da Silva
Universidade de Caxias do Sul – UCS
_________________________________________
Prof. Me. Maria Goréte do Amaral Gedoz
Universidade de Caxias do Sul – UCS
_________________________________________
Prof. Me. Ronei Teodoro da Silva
Universidade de Caxias do Sul – UCS
Caxias do Sul
2016
4
AGRADECIMENTOS
Agradeço à orientadora, aos professores, aos amigos, à família e ao café.
5
A distinção entre passado, presente e
futuro
é
apenas
uma
ilusão
teimosamente persistente.
Albert Einstein
6
RESUMO
A presente monografia possui como tema a nostalgia aplicada às marcas. O estudo
aborda a utilização do marketing nostálgico como estratégia de comunicação pela
publicidade, apresenta o consumo simbólico do passado centrado na publicidade
emocional, a nova dinâmica de relacionamento entre marcas e consumidores, a
importância da estratégia na comunicação e a utilização da nostalgia como argumento
comercial. Tem como metodologia o estudo de caso múltiplo de caráter explanatório,
descritivo, com abordagem qualitativa, para as análises das marcas Volkswagen,
Netflix e Parmalat e a nostalgia pelas décadas de 1970, 1980 e 1990 como apelo
nostálgico. O estudo conclui que o marketing nostálgico é utilizado pela publicidade
como uma maneira de conectar emocionalmente marcas e consumidores pela
reminiscência de épocas passadas, a partir de elementos e estímulos que resultam
no consumo simbólico do passado, de forma variada e criativa.
Palavras-chave: Nostalgia. Publicidade. Marketing Nostálgico. Marcas. Consumo.
7
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Pokémon Go: aplicativo para dispositivos móveis....................................23
Figura 2 – Montagem com os produtos da linha Brastemp Retrô..............................25
Figura 3 – Linha Vintage Granado.............................................................................26
Figura 4 – Três elementos que diferenciam os conceitos de Publicidade e
Propaganda................................................................................................................42
Figura 5 – Composto de marketing (4 P’s) ................................................................44
Figura 6 – Garrafas Históricas da Coca Cola.............................................................46
Figura 7 – Anúncio das Garrafas Históricas da Coca-Cola........................................47
Figura 8 – Marcas e a nostalgia dos anos 1970, 1980 e 1990..................................49
Figura 9 – Montagem de frames do comercial Brasil 70 Volkswagen........................52
Figura 10 – Montagem com peças da campanha digital do Novo Fusca com
Mussum......................................................................................................................53
Figura 11– Linha de cervejas artesanais Mussum – Brassaria Ampolis....................55
Figura 12 – Linha de cervejas artesanais em lata Mussum – Brassaria Ampolis......56
Figura 13 – Fanpage humorística Mussum Forévis..................................................56
Figura 14 – Pôster promocional da primeira temporada da série Stranger Things....58
Figura 15 – Montagem com capas de livros de Stephen King..................................59
Figura 16 – Captura de tela do site Filmow com a listagem de referências que
aparecem na série Stranger Things...........................................................................60
Figura 17 – Montagem com frames contendo algumas referências à filmes clássicos
dos anos 1980 presentes na série Stranger Things...................................................61
Figura 18 – Montagem com fitas VHS produzidas por fãs da série Stranger
Things.........................................................................................................................62
Figura 19 – Montagem com frames do vídeo promocional de Stranger Things no
Brasil...........................................................................................................................65
Figura 20 – Montagem de anúncios da promoção Mamíferos Parmalat – Versão
1996............................................................................................................................68
Figura 21 – Pelúcias da promoção Mamíferos Parmalat...........................................69
Figura 22 – Montagem com frames do comercial Mamíferos Parmalat – Versão
1996............................................................................................................................69
Figura 23 – Anúncio de revista Mamíferos Parmalat crescidos – Versão 2007........ 70
Figura 24 – Montagem com frames do comercial Mamíferos Parmalat Crescidos –
Versão 2007...............................................................................................................73
8
Figura 25 – Captura de tela do site oficial da Parmalat anunciando o retorno da
marca ao mercado brasileiro......................................................................................74
Figura 26 – Montagem com frames do comercial Mamíferos Parmalat – Versão
2015............................................................................................................................75
9
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO.........................................................................................................10
2 NOSTALGIA E CONSUMO SIMBÓLICO DO PASSADO.......................................13
2.1. Nostalgia no contexto de consumo..................................................................13
2.1.1 Memória e Memória Coletiva...........................................................................16
2.2 CONSUMO SIMBÓLICO DO PASSADO..............................................................18
2.2.1 A saudade idealizada: retrô e vintage.............................................................24
2.3 UM CONSUMIDOR NOSTÁLGICO.......................................................................29
3 MARKETING NOSTÁLGICO E A COMUNICAÇÃO VOLTADA AO PASSADO...........34
3.1 SOBRE O MARKETING NOSTÁLGICO................................................................35
3.2 COMUNICAÇÃO E A NECESSIDADE DA ESTRATÉGIA.....................................41
4 MARCAS E NOSTALGIA........................................................................................48
4.1 Volkswagen: o Novo Fusca direto dos anos 1970............................................49
4.1.2 Netflix: a homenagem aos anos 1980.............................................................57
4.1.2.1 Stranger Things...............................................................................................59
4.1.2.2 Boneca da Xuxa e o mistério dos anos 1980...................................................64
4.1.3 Parmalat: a volta dos anos 1990......................................................................67
4.1.3.1. Mamíferos Crescidos 2007.............................................................................70
4.1.3.2. Mamíferos Parmalat 2015..............................................................................73
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS.....................................................................................77
REFERÊNCIAS..........................................................................................................80
ANEXOS.....................................................................................................................85
10
1 INTRODUÇÃO
Em uma década caracteriza por avanços tecnológicos, algumas marcas
encontram na nostalgia uma ponte de conexão social para alavancar sentimentos
otimistas ao propor conexões entre passado e presente. Diferentes indústrias estão
se apropriando dessa tendência e apostando em estratégias que utilizam o apelo
nostálgico como carro-chefe, buscando atingir o público-alvo com produtos familiares
e memórias culturais positivas e simbólicas.
As representações simbólicas proporcionadas pela manifestação da nostalgia
trazem consigo diferentes significados e discursos de atmosferas passadas. Esses
aspectos estimulam desejos e necessidades, e determinam a intensidade do interesse
e da identificação dos consumidores com os objetos de consumo.
O perfil do consumidor contemporâneo é marcado por indivíduos que se
mostram preocupados com os valores intangíveis dos produtos, fazendo com que as
funções destes sejam tão importantes quanto o atributo emocional a eles conferido. A
transferência de significado para os bens de consumo é um importante papel da
publicidade, que auxilia os consumidores a associarem a significância pessoal e os
benefícios emocionais à marcas, produtos e serviços.
Dessa forma, a utilização da nostalgia como estratégia de marketing
demonstra-se efetiva e ganha cada vez mais espaço, consolidando-se como uma
ferramenta poderosa na aceitação de produtos. O marketing nostálgico, percebido
pela publicidade como um mediador de emoções e recordações do passado, permite
que o consumidor reviva memórias positivas e auxilia no processo de humanização
de marcas, ao evidenciar que o consumidor reage favoravelmente às marcas que
evoquem reminiscência a partir de estímulos nostálgicos.
Sendo assim, o trabalho apresentado se propõe a responder a seguinte
questão: como as marcas utilizam o marketing nostálgico como estratégia de
comunicação? Como objetivos específicos de pesquisa foram propostos:
caracterizar a nostalgia no contexto de consumo; o consumo simbólico do passado e
o marketing nostálgico, apresentar os consumidores com maior propensão à
nostalgia, bem como a comunicação e a necessidade da estratégia, e analisar
campanhas publicitárias que fazem uso do marketing nostálgico.
11
Para alcançar esses objetivos, o trabalho foi divido em três capítulos:
O capítulo 2 “Nostalgia e consumo simbólico do passado” aborda o conceito
de nostalgia no contexto de consumo e sua relação intrínseca com a memória do
consumidor; caracteriza o consumo simbólico do passado centrado na publicidade
emocional, a nova dinâmica de relacionamento entre marcas e consumidores na fase
do hiperconsumo, e a saudade idealizada representada pelo retrô e vintage. Além
disso, apresenta dois tipos de consumidores com maior disposição à nostalgia, os
millennials e os geeks.
O capítulo 3 “Comunicar com o apelo do passado” apresenta o conceito de
marketing e de marketing nostálgico, de comunicação e de publicidade e de
propaganda, os atributos emocionais das marcas, a nostalgia como argumento
comercial, o composto de marketing e a importância da estratégia na comunicação.
Por fim, o capítulo 4 destina-se a realizar a análise da utilização do marketing
nostálgico como estratégia de comunicação pelas marcas Volkswagen, apresentando
o comercial retrô dos anos 1970 e o endosso ao personagem Mussum; Netflix e a
homenagem aos anos 1980 pela série Stranger Things, reforçando o link com o
passado ao trazer Xuxa como ícone representativo da década, e a aposta da Parmalat
em relançar em dois momentos a campanha Mamíferos dos anos 1990, em 2007 e
em 2015.
A metodologia para a realização da presente monografia é o estudo de caso
múltiplo, de caráter explanatório, descritivo, com abordagem qualitativa. Essa
metodologia
foi
selecionada
após
revisões
bibliográficas
prévias
ao
seu
desenvolvimento, que evidenciaram relações entre o fenômeno da nostalgia e a
preferência do consumidor por décadas passadas, expondo como e por quê se dão
tais relações.
Segundo Gil (2002), classificar uma pesquisa utilizando critérios lógicos aos
seus objetivos concede a esta relevância científica. O estudo de caso “consiste no
estudo profundo e exaustivo de um ou poucos objetos, de maneira que permita seu
amplo e detalhado conhecimento” (GIL, 2002, p.54). Ainda segundo o autor, quando
há espaço para interpretação e a busca pelo entendimento geral de uma questão, as
pesquisas qualitativas são adequadas e implicam em interpretar sentidos e
significações do fenômeno estudado.
12
Segundo Yin (2001, p. 19), a metodologia de estudo de caso é uma estratégia
relevante para responder questões científicas do tipo "como" e "por quê", que
beneficia a discussão de relações entre problemas contemporâneos, em contextos da
vida real, com pouca possibilidade de controle pelo pesquisador. Devido a tais
problemas se tratarem muitas vezes de fenômenos psicológicos, sociológicos e
educacionais, em que se busca compreender perspectivas, o estudo de caso com
abordagem qualitativa é adequado, já que a análise está em pessoas e subjetividades.
Dessa forma, para o desenvolvimento deste trabalho, será realizada uma
pesquisa bibliográfica com caráter qualitativo. Para análise, será utilizado o estudo de
caso múltiplo, de caráter explanatório, descritivo, com abordagem qualitativa.
13
2 NOSTALGIA E CONSUMO SIMBÓLICO DO PASSADO
Este capítulo aborda o conceito de nostalgia no contexto de consumo, sua
relação indissociável com a memória do consumidor; caracteriza o consumo simbólico
do passado com a aquisição da emoção nostálgica intrínseca à compra de objetos
que remetam ao passado, exemplificado pelos estilos retrô e vintage, e apresenta dois
tipos de consumidores com maior disposição ao consumo de produtos e serviços que
remetam ao passado, os millennials e os geeks.
2.1 Nostalgia no contexto de consumo
A relação entre o fenômeno da nostalgia e o comportamento de consumo, é
investigada por duas das grandes áreas do conhecimento, as Ciências Humanas e as
Ciências Sociais Aplicadas. As aproximações entre essas áreas tornaram-se
possíveis com a transformação dos paradigmas científicos do final do século XX e
início do século XXI, que desamarraram as fronteiras dogmáticas do pensamento,
favorecendo assim, conexões acadêmicas. (SANTOS, 1988)
As pesquisas sobre a influência da nostalgia ligadas ao consumo foram
realizadas desde o início da década de 1990 e inferem que a mesma tem um forte
efeito nas preferências do consumidor. Dentre os estudos relacionados à nostalgia no
contexto de consumo, destacam-se: Nostalgia and consumption preferences: Some
emerging patterns of consumer tastes1 (HOLBROOK, 1993); Nostalgic bonding:
Exploring the role of nostalgia in the consumption experience2 (HOLBROOK, 2003a);
Death by nostalgia: A diagnosis of context-specific cases3 (BAKER; KENNEDY, 1994),
Echoes of the dear departed past: Some work in progress on nostalgia 4 (HOLBROOK;
SCHINDLER, 1991), The good old days: observations on nostalgia and its role in
consumer behavior5 (HAVLENA; HOLAK, 1991), Nostalgia: An Exploratory Study of
1
Nostalgia e preferências de consumo: Alguns padrões emergentes nos gostos do consumidor
(tradução nossa)
2 Ligação nostálgica: Explorando o papel da nostalgia na experiência de consumo (tradução nossa)
3 Morte por nostalgia: diagnóstico de casos específicos (tradução nossa)
4 Ecos do passado desaparecido: Alguns trabalhos em andamento sobre nostalgia (tradução nossa)
5 Os bons velhos tempos: observações sobre a nostalgia e seu papel no comportamento do
consumidor (tradução nossa)
14
Themes and Emotions in the Nostalgic Experience6 (HOLAK; HAVLENA, 1992),
Nostalgia in Advertising Text: Romancing the Past 7(STERN, 1992).
A nostalgia, vista como uma emoção social, fortalece laços simbólicos e
possui a capacidade de transformar algo do passado momentaneamente em parte do
presente. O sentimento causado pela manifestação da nostalgia está relacionado a
um desejo sentimental de significado duradouro relacionado ao passado. (JUHL et al.,
2010)
A definição comumente utilizada para nostalgia, segundo os estudos iniciais
de Holbrook (1993) sobre o tema, caracterizam o fenômeno como “saudade do
passado ou anseio por ontem” (DAVIS apud HOLBROOK, 1993), um sentimento
nostálgico que tende a evocar boas lembranças de um território remoto.
Baker; Kennedy (1994, p. 70) exemplificam a informação quando apontam
que “nostalgia é a capacidade de lembrar os preços de ontem, esquecendo os salários
de ontem", propondo que os indivíduos tendem a recordar os bons momentos e
ignorar os momentos negativos quando se trata do passado.
Hirsch (apud BAKER; KENNEDY, 1994) mencionou em seu artigo Nostalgia:
A Neuropsychiatric Understanding8, a probabilidade da alta relevância da utilização da
nostalgia como apelo publicitário. Segundo ele, os entrevistados indicavam
insatisfação com o atual momento de suas vidas e indicavam o desejo de voltar ao
passado e a preferência, em geral, por anos anteriores de suas vidas. Segundo o
estudo, o saudosismo dos indivíduos representava um comportamento que apontava
para a repetição nos anos seguintes. Holbrook; Schindler (2003a) destacam, ainda,
que há a necessidade de uma melhor compreensão do fenômeno da nostalgia para
melhor entendimento da influência.
Holbrook; Schindler (1991), em seu estudo exploratório Echoes of the Dear
Departed Past: Some Work in Progress on Nostalgia9, acrescentam a definição de
nostalgia relacionada aos objetos como:
6
Nostalgia: um estudo exploratório de temas e emoções na experiência nostálgica (tradução nossa)
Nostalgia na redação publicitária: Romantizando o passado (tradução nossa)
8 Nostalgia: um entendimento neuropsiquiátrico (tradução nossa)
9 Ecos de um querido passado afastado: alguns trabalhos em andamento em nostalgia. (tradução
nossa)
7
15
Preferência (gosto geral, atitude positiva ou efeito favorável) com relação
a objetos (pessoas, lugares ou coisas) que eram mais comuns (populares,
da moda, ou mais presentes) quando se era mais jovem (na juventude,
adolescência, na infância ou até mesmo antes do nascimento)
(HOLBROOK; SCHINDLER 1991, p. 331).
Treze anos depois, em estudo realizado no ano de 2003, os pesquisadores
acrescentam que a nostalgia pode ser uma “preferência com relação a experiência
com objetos que eram mais comuns quando se era mais jovem” (HOLBROOK;
SCHINDLER, 2003ª), destacando que a nostalgia experienciada por determinados
indivíduos se dava não apenas por meio da preferência por objetos, como também
pela experiência que os mesmos tiveram com esses produtos.
Por sua vez, Holak; Havlena (1998) argumentam em sua investigação que “a
nostalgia não é uma preferência pelo passado, mas um sentimento ou estado que
pode resultar nas preferências por coisas que tendem a produzir reações nostálgicas”
(HOLAK; HAVLENA, 1998, tradução nossa).
Holbrook;
Schindler
(2003a),
apontam
que
existem
determinadas
características e motivações pessoais que induzem os indivíduos a possuir maior
vulnerabilidade e propensão a estimar o que era mais comum no período de sua
juventude. Os autores dizem que há uma boa explicação para esse fenômeno e que
essa reação nostálgica se explica no valor das experiências. Eles afirmam que
ligações são feitas com objetos tangíveis que fazem com que a experiência vivida
naquela época seja evocada pelo objeto, tendo assim uma significância pessoal para
o indivíduo. Essa experiência é associada com um campo agradável na memória do
passado (HOLBROOK; SCHINDLER, 2003a).
Já Holak; Havlena (1992) afirmam que o indivíduo, ao acessar as experiências
nostálgicas, tende a voltar a este período e que, possivelmente, são experiências
seletivas e que se referem à época da vida entre os dez e os dezessete anos.
No mercado de consumo, a nostalgia se mostra uma forte ferramenta
facilitadora de aceitação do produto pelo consumidor, na relação entre sentimento
nostálgico evocado a partir da experiência de vivência de consumo de um produto, ao
evidenciar que o consumidor reage favoravelmente às marcas que evoquem o
sentimento de nostalgia a partir de estímulos nostálgicos.
16
Solomon (2008) propõe em seu livro O comportamento do consumidor
comprando, possuindo e sendo, que a aprendizagem causada pela experiência é uma
importante e poderosa maneira de trabalhar as correlações entre publicidade
(produtos) e recordações (nostalgia) como forma de construção e lealdade a uma
determinada marca, produto ou serviço:
A aprendizagem é uma mudança relativamente permanente no
comportamento causada pela experiência. O aprendiz não precisa ter a
experiência diretamente; nós também podemos aprender através da
observação de eventos que afetam outros. (BARON apud SOLOMON,
2008, p. 73).
Ainda segundo o autor, o relacionamento criado pelos consumidores com
determinados produtos é adquirido através de ligações que podem ser subdivididas
entre: ligações de autoconceito, de nostalgia, de interdependência ou de amor. No
caso de ligações de nostalgia, o produto atua como elo com o eu do passado.
2.1.1 Memória e Memória Coletiva
No início da década, Andreas Huyssen (2000, p. 15), traduziu o fascínio pelo
passado no livro Seduzidos pela Memória: arquitetura, monumentos, mídia, cujo autor
aponta que estamos obcecados com o passado e passamos a viver em uma cultura
da memória “obsessões com a memória e com o passado.”. Ele afirma que essa
obsessão se dá, principalmente, a partir da década de 1980, período significativo em
que “o foco parece ter-se deslocado dos futuros presentes para os passados
presentes”. (HUYSSEN, 2000, p. 9).
O psicólogo Michael Gazzaniga (2005, p. 216), em seu livro Ciência
Psicológica: memória, cérebro e comportamento, define memória como “a capacidade
do sistema nervoso de adquirir e reter habilidades e conhecimentos utilizáveis,
permitindo que os organismos se beneficiem da experiência.”. Para o autor, nossas
lembranças e experiências pessoais – o que entendemos por memória - é o que forma
nosso self. A memória, então, não deve ser pensada como uma câmera de vídeo que
captura fielmente imagens objetivas, mas sim como uma história que pode ser
sutilmente alterada. (GAZZANIGA; HEATHERTON, 2005, p. 217).
17
Bergson (1999, p. 77) diz que a memória é inseparável da percepção e
intercala passado no presente. O autor afirma que a principal função da memória é
“evocar todas as percepções passadas análogas a uma percepção presente,
recordar-nos o que precedeu e o que seguiu, sugerindo-nos assim a decisão mais
útil”. (BERGSON, 1999, p. 266). Assim, Bergson conclui:
A percepção presente vai sempre buscar, no fundo da memória, a
lembrança da percepção anterior que se assemelha: o sentimento do deja
vú viria de uma justa posição ou de uma fusão entre a percepção e a
lembrança (BERGSON, 1999, p. 100).
O teórico Maurice Halbwachs (2006) apresenta em seu livro Memória Coletiva
uma perspectiva sobre esse recorte de memória. Para Halbwachs (2006), a memória
de um indivíduo não é individual, pois suas lembranças não são apenas suas, visto
que as recordações são construídas socialmente. Para ele, são as memórias que
determinam o que é memorável e de que forma essa lembrança será preservada,
definindo-a como construções de grupos sociais.
A lembrança é em larga medida uma reconstrução do passado com a
ajuda de dados emprestados do presente, e além disso, preparada por
outras reconstruções feitas em épocas anteriores e de onde a imagem de
outrora manifestou-se já bem alterada. (HALBWACHS, 2006, p. 71).
Com base nessas investigações, a memória pode ser entendida como um
mecanismo humano que, embora possa ser pessoal, ganha evasão a partir da
interação com o outro, ou seja, se sustenta nas lembranças dos indivíduos enquanto
integrantes de um grupo.
Halbwachs (2006, p. 69) sustenta essa informação ao apontar que “cada
memória individual é um ponto de vista sobre a memória coletiva.”. Ele exemplifica,
ainda, que um acontecimento só se torna um fato histórico algum tempo depois do
ocorrido, portanto somente depois de alguns anos iremos associar algum evento a
alguma fase de nossas vidas. (HALBWACHS, 2006, p. 74).
Entende-se que a constituição de memória de um indivíduo se dá a partir da
combinação de memórias de grupos dos quais ele recebe alguma influência, seja na
esfera escolar, no ambiente familiar, em seu círculo de amigos ou em seu local de
trabalho. Essa relação intrínseca entre memória individual e memória coletiva é
sustentada por Halbwachs (2006, p. 72) que diz que “o funcionamento da memória
18
individual não é possível sem esses instrumentos que são as palavras e as ideias, que
o indivíduo não inventou, mas que toma emprestado de seu ambiente.”. No entanto,
o conjunto de experiências coletivas constituído por lembranças passadas será
memorizado e acessado se o indivíduo se identificar com as memórias.
Para que a nossa memória se aproveite da memória dos outros, não basta
que estes nos apresentem seus testemunhos: também é preciso que ela
não tenha deixado de concordar com as memórias deles e que existam
muitos pontos de contato entre uma e outras para que a lembrança que
nos fazem recordar venha a ser constituída sobre uma base comum.
(HALBWACHS, 2006, p. 39)
Halbwachs (2006) explica que a memória funciona dentro de um modelo
bidimensional, que é composto por uma função global e por uma função grupal, sendo
a principal característica da função global a nostalgia (BELLELLI&AMATULLI apud DA
COSTA, 2014). A função grupal se relaciona com as necessidades e interesses atuais
dos grupos. “A memória coletiva atuaria como uma reconstrução do passado,
adaptando a imagem dos fatos antigos às crenças e necessidades do presente”
(SCHWARTZ apud DA COSTA, 2014, p. 3).
2.2 CONSUMO SIMBÓLICO DO PASSADO
A evolução tecnológica provocou a abundância de produção de dados e novas
informações adventos da internet. Esse fenômeno juntamente com a globalização,
permite a realização de intercâmbios sociais, ideológicos, comerciais, financeiros e
culturais, originando a sociedade de informação. Tal expressão vem sendo utilizada
como substituta do complexo conceito de “sociedade pós-industrial”. Segundo
Castells (2000), a sociedade informacional, como prefere o autor, está ligada a
reestruturação e expansão do capitalismo desde a década de 1980.
Em sua obra intitulada Tempos Hipermodernos, o filósofo francês Gilles
Lipovetsky (2004), corrobora com essa ideia e aponta que estas são algumas
características da hipermodernidade, termo criado pelo autor para definir o momento
atual da sociedade humana, substituindo o conceito de pós-modernidade. Para o
filósofo, o conceito de tempos hipermodernos se dá pelo surgimento de uma nova fase
da modernidade que foi do pós ao hiper, caracterizada por uma cultura de excesso
que ocorre em um ritmo exorbitante e revela o paradoxo da sociedade contemporânea
19
“a pós-modernidade não terá sido mais que um estágio de transição, um momento de
curta duração.” (LIPOVETSKY, 2004, p. 58). Tal conceito de hipermodernidade se
origina a partir da queda do muro de Berlim e do declínio da União Soviética, que
marcam a passagem da economia de produção para a economia de consumo.
Para o sociólogo contemporâneo Zygmunt Bauman (apud GAMBARO, 2012),
esse estágio de transitoriedade para a fase líquida da era moderna é definido como
modernidade líquida:
Nada no mundo se destina a permanecer, muito menos para sempre [...]
nada é necessário de fato, nada é insubstituível [...] tudo deixa a linha de
produção com um prazo de validade afixado [...] A modernidade líquida é
uma civilização do excesso, da superfluidade, do refugo e da sua
remoção. (BAUMAN, apud GAMBARO, 2012).
O consumo hedonista e a busca incessante dos indivíduos pela felicidade e
bem-estar individual são discutidos por Lipovetsky (2007) em sua obra A Felicidade
Paradoxal: Ensaio sobre a sociedade do hiperconsumo. Na obra citada, o autor
apresenta três marcos específicos da evolução do capitalismo de consumo:
a) Fase I, teve início por volta de 1880 e término após o fim da Segunda
Guerra Mundial. A partir do desenvolvimento e facilidade de produção das indústrias,
caracterizou-se como a fase de distribuição.
b) Fase II, se apresentou em torno de 1950 e foi marcada pela economia
fordista. Apresentou-se como modelo da sociedade do consumo de massa.
c) Fase III, desde 1970, a sociedade se encontra atualmente no terceiro ciclo
de consumo, a sociedade do hiperconsumo.
Lipovetsky (2007) aponta que a fase de hiperconsumo (fase III), é emocional
e subjetiva e traz consigo o consumo experiencial, norteado por motivos estéticos e
sensoriais
de
satisfação
emocional
e
corporal,
ou
consumo
emocional.
Diferentemente do argumento da fase anterior que explica o principal motivo de
consumo sob a ótica de diferenciação social, aqui o autor aponta que os objetos são
desejáveis e atrativos por si mesmos.
20
Dessa forma, o principal motivo para a obtenção de bens fundamenta-se nas
escolhas individuais e no consumo cada vez mais individualizado, cuja ideia de
consumo 'para si' ultrapassa a de consumo 'para o outro’. “Espalha-se toda uma
cultura que convida a apreciar os prazeres do instante, a gozar a felicidade aqui e
agora, a viver para si mesmo” (LIPOVETSKY, 2006, p 102). Lipovetsky (2007), então,
define o consumidor como:
Um “colecionador de experiências” sensitivas ou estéticas, lúdicas ou
comunicacionais, mas, em todo caso, fugazes e de movimentos
incessantes, como um jogo que “torna-se por si mesmo sua própria
recompensa. (LIPOVETSKY, 2007, p. 68)
Esse consumidor colecionador de experiências também é o “consumidor rei”
que agora assume uma postura ativa frente ao consumo, ditando o que precisa e o
que deseja e como o quer. Por conseguinte, o mercado que antes funcionava com a
lógica de produção de massa passa a ter que se adaptar para a produção
personalizada de massa, que exige cada vez mais rapidez e estratégias capazes de
suprir a diversificação do público. Esse novo modelo quebra a ideia de produzir para
vender. Atualmente os produtos são criadores de expectativas, sendo anunciados
muitas vezes alguns anos antes de seres produzidos, ou seja, os objetos de consumo
não mais necessitam concretização material para serem consumidos. (LIPOVETSKY,
2007)
De acordo Bauman (apud VIVARTA et al., 2009), escolha e liberdade são
sinônimos na cultura de consumo, pois “só é possível abstrair-se da escolha se, ao
mesmo tempo, subjugar sua liberdade”. Dessa forma, os consumidores podem
escolher a não-fidelização a nenhuma das infinitas opções de marcas, “exceto a opção
de escolher entre uma delas, isto é, a opção que não parece ser uma opção. Ou se
escolhe, ou não se é livre, e sendo livre, está se escolhendo algumas das opções”.
Para ele, os consumidores não percebem que selecionam e classificam produtos e
serviços de acordo com suas necessidades, e que em uma sociedade de consumo a
liberdade está associada ao ato de uma escolha.
21
A propaganda, na verdade, não reflete simplesmente o mundo real como
nós o vivenciamos: o mundo da publicidade funciona ao nível do devaneio,
o que implica uma insatisfação com o mundo real expressa por meio de
representações imaginárias do futuro tal como ele poderia ser: uma
Utopia. (VESTERGAARD; SCHRODER, apud VIVARTA et al., 2009)
Para Solomon (2008), existem três principais fatores que influenciam o
comportamento de compra, sendo estes: fatores psicológicos, fatores socioculturais e
fatores pessoais. Já para Kotler e Armstrong (2007), no livro Princípios do Marketing,
existem determinadas características pessoais que influenciam nas decisões do
comprador que devem ser consideradas:
As decisões do comprador são influenciadas também por suas
características pessoais como idade e estágio no ciclo de vida, ocupação,
situação financeira, estilo de vida, personalidade e autoimagem.
(KOTLER; ARMSTRONG, 2007, p. 120).
O perfil de consumidores contemporâneos é marcado por indivíduos que se
mostram preocupados com os valores intangíveis dos produtos, fazendo com que as
funções dos produtos sejam tão importantes quanto o atributo emocional a eles
conferido. Segundo Kotler (2010), esse período em que os princípios das marcas e a
nova dinâmica de relacionamento entre marcas e consumidores se torna um dos mais
importantes fatores influenciadores de escolha e representa o surgimento de uma
nova maneira de fazer marketing, denominada Marketing 3.0:
Os consumidores estão em busca de soluções para satisfazer seus
anseios de transformar o mundo globalizado em um mundo melhor. Em
mundo confuso, eles buscam empresas que abordem suas mais
profundas necessidades de justiça social, econômica, e ambiental em sua
missão visão e valores. Buscam não apenas satisfação funcional e
emocional, mas também espiritual, nos produtos e serviços que escolhem.
(KOTLER, 2010, p. 4).
Devido as homenagens à memória e ao antigo se mostrarem cada vez mais
frequentes, Lipovetsky (2007), aponta a antiguidade como um argumento comercial,
indicando o êxito de vendas de objetos que possuem tradição e despertam nostalgia
por serem considerados antigos:
22
Embora a mania do antigo comporte uma dimensão nostálgica, ela
também ilustra a intensificação dos desejos individualistas de qualidade
de vida, uma cultura hipermoderna do bem-estar indissociável de critérios
mais qualitativos e sensoriais, mais estéticos e culturais. Subjacentes ao
gosto pelo passado, avançam as paixões hiperindividualistas de conforto
recreativo e conforto existencial (...) (LIPOVETSKY, 2004, p.91).
Haja vista as transformações dos consumidores em relação a aquisição de
bens, compreende-se que um novo tipo de publicidade se faz necessário. Para tal, é
importante implementar estratégias que foquem na ressignificação da marca, não
limitando-as tão somente na funcionalidade dos produtos, mas também na criação de
novos significados e ligações pessoais, como observa Lipovetsky (2007) no seguinte
trecho:
A publicidade passou de uma comunicação construída em torno do
produto e de seus benefícios funcionais a campanhas que difundem
valores e uma visão que enfatiza o espetacular, a emoção, o sentimento
não literal, de todo modo significantes que ultrapassam a realidade
objetiva dos produtos. (LIPOVETSKY, 2007, p. 46)
No artigo publicado na Forbes10, Why Nostalgia Marketing Works So Well With
Millennials, And How Your Brand Can Benefit11, Friedman (2016) alerta que apesar de
que táticas centradas na nostalgia contribuem para a publicidade do século XXI, devese atentar para alguns riscos. Ela evidencia a relevância como principal ameaça às
marcas que tentam empregar estratégias retrô sem conter histórico significativo ou
não atentando a colocar o mundo moderno em contexto, tornando a tática irrelevante.
“A chave é criar um gancho emocional usando a nostalgia e também oferecer algo
novo. A combinação perfeita de passado e presente” (FRIEDMAN, 2016).
Friedman cita o aplicativo para dispositivos móveis, Pokémon Go12, como
exemplo de uma estratégica nostálgica bem-sucedida aliada à tecnologia e aos dias
atuais, afirmando que o fenômeno se dá porque os jovens revivem o passado sem
deixar de lado as ferramentas tecnológicas disponíveis atualmente, nesse caso o
dispositivo móvel, internet e realidade aumentada. “Para muitos, o jogo satisfaz
10
Forbes, a mais conceituada revista de negócios e economia do mundo. (FORBES, 2016)
Porque o Marketing Nostálgico funciona tão bem com Millennials e como sua marca pode se
beneficiar. (tradução nossa)
12 Aplicativo para dispositivos móveis de realidade aumentada, desenvolvido para as plataformas iOS
e Android, em uma colaboração entre a Niantic, Inc., a Nintendo e a The Pokémon Company.
11
23
critérios duplos - felicidade inata e exploração de algo novo e emocionante.”.
(FRIEDMAN, 2016). No estudo realizado pela SurveyMonkey13, presente no artigo de
Friedman (2016), revela-se que 46% dos usuários do aplicativo se encontram entre a
faixa etária de 18 e 29 anos, encaixando-se na geração do milênio.
Figura 1 – Pokémon Go: aplicativo para dispositivos móveis
Fonte: Forbes14
Para Friedman (2016, s.p., tradução nossa), a indústria finalmente encontrou
uma estratégia que funciona, principalmente com os Millennials, após anos de
pesquisas. Segundo ela “as melhores campanhas são oportunas e relevantes, mas
também são autênticas, com um forte gancho emocional para capturar o coração”. E
afirma que a nostalgia está se mostrando uma das tendências mais interessantes no
campo do marketing moderno, pois se mostra mais eficaz para essa geração do que
outras táticas já apresentadas e testadas anteriormente.
13
Companhia baseada em nuvem que oferece uma plataforma para a realização de questionários e
pesquisas online.
14 Disponível em: <http://www.forbes.com/sites/olliebarder/2016/07/10/pokemon-go-shows-that-thefuture-of-gaming-is-ar-not-vr/#1dd3bbf715b5> Acesso em: 14 ago. 2016.
24
2.2.1 A saudade idealizada: retrô e vintage
O sentimento de nostalgia é capaz de criar a ligação emocional entre a marca
e o público-alvo quando utilizado como ferramenta de estratégia na comunicação de
uma mensagem. As representações simbólicas proporcionadas pela manifestação do
retrô trazem consigo diferentes significados e discursos de atmosferas passadas.
Esses aspectos estimulam desejos e necessidades, ao passo que determinam a
intensidade do interesse dos consumidores e de sua identificação com os objetos de
consumo.
A estética retrô ganhou maior popularidade na virada do milênio. (BROWN,
2001). O retrô é caracterizado como um estilo que resgata, enriquece, homenageia e
faz uma releitura nostálgica do passado. Faggiani (apud HERNANDEZ, 2011)
conceitua o retrô como uma estética inspirada em características do estilo do passado,
realizado com processos atuais. A busca pelo retrô, portanto, se trata da
modernização ou atualização de um estilo antigo que é substituído por mais eficazes
e recentes componentes.
Elizabeth Guffey (2006), em seu livro Retro: The Culture of Revival15,
apresenta diversas definições para o retrô. Para a autora, o retrô é mais do que um
simples sinônimo para produtos velhos ou ‘à moda antiga’, e que o termo é ligado ao
atemporal e ao clássico. Essa preferência se deve a uma predisposição cultural e
gosto pessoal relacionados a um passado não muito distante.
O retrô também pode ser descrito como um estilo de vida que engloba sujeitos
conservadores que tendem a possuir predisposição ao tradicional e valores do
passado. De todas as formas e apesar das diferentes formas de representação, o retrô
sugere uma mudança fundamental na relação dos sujeitos com o passado. (GUFFEY
2006, p. 7-11). Outro fator característico desse estilo são as cores características
utilizadas para apresentar novas versões de peças e artigos inspirados em itens
antigos.
Em 2011, a Brastemp pegou carona na tendência e lançou uma linha retrô.
Apresentando ao mercado modelos com traços modernos e clássicos e cores
características do estilo retrô, inspirados na tendência vintage, a linha de geladeiras,
15
Retrô: A cultura do renascimento (tradução nossa)
25
fogões e frigobares, foi disponibilizada nas cores preto Tremendão, amarelo Supimpa
e vermelho Brasa, nomes que remetem a expressões comumente utilizadas nos anos
60 e 70. O logotipo da marca Brastemp presente nos produtos da linha retrô é o
mesmo dos 70.
Figura 2 – Montagem com os produtos da linha Brastemp Retrô
Fonte: Brastemp16
16
http://loja.brastemp.com.br/linhas/retro
26
Por outro lado, o vintage se caracteriza não pela representação de itens
inspirados no passado, mas sim por se tratar das verdadeiras peças de outras épocas.
Melo; Brito (2014) apresentam uma definição das manifestações vintage no livro
Novos Horizontes do Marketing:
As manifestações vintage referem-se a algo do passado, que recebe uma
atribuição de valor importante no presente e funciona como um signo de
distinção. O foco é pôr em evidência a história e trajetória particular de
uma pessoa ou de uma marca, principalmente por meio das
manifestações relacionadas às tradicionais redes de proteção, tais como
a família, a etnia, a nacionalidade, etc. (MELO; BRITO, 2014, n.p.)
A marca Granado Pharmácias, que se intitula “a botica mais antiga do Brasil” é
uma perfumaria fundada em 1890, no Rio de Janeiro. A marca caracteriza-se pelo
aspecto retrô, que cultiva desde a decoração e arquitetura de suas lojas, que remetem
ao passado, até os produtos e embalagens inspirados no design original dos rótulos
(LOBATO, 2016). A linha vintage é um exemplo:
Figura 3 – Linha Vintage Granado17
Fonte: Granado18
17
Lata de metal vintage decorada com rótulos de produtos da Granado. A lata contém cinco
sabonetes da linha Vintage: Alfazol, Um Sonho, Benjoim, Superfino e Salomé.
18 https://www.granado.com.br/loja/linha/granado/vintage
27
De acordo com Solomon (2008), os publicitários evocam memórias e
recordação dos ‘bons e velhos tempos’ almejando que esses sentimentos sejam
transportados para os itens que estão anunciando e por isso o apelo nostálgico tem
se tornado cada vez mais comum nas campanhas atuais. O autor explica que os
produtos também podem ser marcadores de memória:
Os produtos também desempenham um papel como marcadores de
memória; os consumidores usam-nos para recuperar recordações de
experiências passadas (memórias autobiográficas) e com frequência os
valorizamos por sua capacidade de fazer isso. Essa função também
contribui para a utilização da nostalgia em estratégias de marketing.”.
(SOLOMON, 2008, p. 240)
Rokka (apud JUDAR, 2013) diz que as tendências retrô e vintage são bons
exemplos de que a cultura de consumo é muito apegada ao seu passado. No entanto,
o autor enfatiza que o saudosismo não seria a única explicação para a atual onda de
nostalgia, exemplificando que muitos de seus entrevistados não haviam tido
necessariamente algum contato ou experiência real no passado com esses objetos
de consumo. Ele propõe que esse fascínio poderia se dar pela estética que o
analógico oferece.
Para Lipovetsky (2004, p. 88), a valorização do passado é um fenômeno
hipermoderno que ilustra o novo consumidor. O autor aponta que o consumidor está
em busca de emoções instantâneas ao invés de mero status relacionado a produtos.
Esse fenômeno resulta no êxito de objetos retrô e vintage que despertam a nostalgia,
sendo rotulados como “legítimos ou autênticos”.
Segundo Lipovetsky:
A voga do passado se vê ainda no sucesso dos objetos antigos, da caça
a antiguidade do retrô, do vintage, dos produtos rotulados com um ”
legítimo” ou ” autêntico “, que despertam a nostalgia. Cada vez mais, as
empresas fazem referência a seu passado, explorando seu patrimônio
histórico, divulgando- o, lançando produtos de cunho saudosista que
revivem os tempos de antanho. Letreiros comerciais apresentam artigos
oriundos do patrimônio histórico, e muitas marcas oferecem receitas à
moda antiga e produtos inspirados em tradições ancestrais. Na sociedade
hipermoderna, a antiguidade e a nostalgia se tornam argumentos
comerciais, ferramentas mercadológicas (LIPOVETSKY. 2004, p 88-89).
28
Ao identificar fenômenos associados à memória, Huyssen (2000), comenta
que é através de estratégias de rememoração que os indivíduos tentam evitar o
sistema de obsolescência e desaparecimento de produtos. Para o autor, o passado
tem vendido mais que o futuro, e podemos observar esse fenômeno através da
obsessão atual com a representação, repetição, replicação e com a cultura da cópia.
No artigo Tecnologia movida a carvão, publicado na Revista da Cultura e
Tecnologia, Judar (2013) propõe os principais motivos que seduzem as novas
gerações pelo consumo de itens retrô. A autora traz um estudo sobre branding, cultura
e consumo, realizado por Jonas Rokka (apud JUDAR, 2013) que aponta que a
tendência nostálgica se trata de um fenômeno cultural/comportamental que atinge
especialmente jovens da geração Y que preferem a cena alternativa e se interessam
pouco pelo consumo massificado de conteúdo online. Ele enfatiza, ainda, que essa
atração pelo analógico estaria diretamente relacionada à sobrecarga do mundo digital,
fazendo com que esses indivíduos prefiram consumir itens que os façam entrar em
contato com outra realidade ou optem por eles pelo simples desejo de diferenciação.
As mídias analógicas oferecem uma estética particular, não polida, que
pode ser explorada e usada para criar novos significados. Eu diria que se
trata de uma reação às emergentes e massificadas mídias digitais.
(ROKKA apud JUDAR, 2013)
O pesquisador assegura que “as pessoas encontram conforto e aconchego
ao fazer links com o passado em um mundo que se encontra cada vez mais focado
no futuro e se movendo a uma velocidade estonteante.”. (ROKKA apud JUDAR,
2013).
Para Randazzo (1997), a transferência do significado cultural para os bens de
consumo é realizada pelos publicitários, que transformam simples objetos em
instrumentos versáteis e repletos de variedades e riquezas simbólicas. O autor afirma
que é através da publicidade que os consumidores compreendem os benefícios dos
produtos e aprendem a associa-los com seus benefícios emocionais.
Oliveira (2012), ressalta que o principal motivo do consumo de objetos antigos
não é apenas conforto material, mas o valor emotivo ligado ao sentimento nostálgico,
ao evocar o passado. Assim sendo, compreende-se que as emoções são
29
determinantes nas relações dos consumidores com os objetos, bem como no
processo de interação e de como os objetos são percebidos. As emoções, portanto,
resultam em um importante fator de construção de relações simbólicas e valor
simbólico e imaterial de objetos.
2.3 UM CONSUMIDOR NOSTÁLGICO
Em seu livro O tempo das tribos, Michel Maffesoli (2006), explica o fenômeno
das representações coletivas, apontando que o neotribalismo, como define o autor,
pode ser explicado pela constatação empírica de que as pessoas estão se agrupando
em microtribos na busca pelo sentimento de pertencimento por meio do
compartilhamento de emoções em comum, e denomina o fenômeno como cultura de
sentimento (MAFFESOLI, 2006).
Para Maffesoli (1995, p.117), o papel simbólico das representações coletivas
é incontestável, e completa “a nostalgia, o ideal ou a utopia possuem uma eficácia que
a geopolítica racional deveria reconhecer”. A emoção compartilhada das
representações coletivas é tão intensa que os indivíduos pertencentes aos grupos
repletos de multiplicidade, constituem, de alguma forma, sólidos laços sociais, pois
são formadas por formas coletivas de empatia, dando origem a novas organizações
sociais.
No estudo Millennials: a portrait of generation next19, Taylor; Keeter (2010),
apontam que a identidade coletiva das gerações se forma a partir do momento em
que os membros mais antigos saem da adolescência e passam a agir de acordo com
seus valores e suas próprias visões de mundo. (TAYLOR; KEETER; 2010).
Holbrook (1993), realizou um estudo investigatório para verificar os graus de
nostalgia em indivíduos da mesma faixa etária e a influência de estilo de vida que as
levam a maior propensão à nostalgia. Os resultados mostram que existe uma relação
entre a idade dos sujeitos e à propensão ao sentimento nostálgico, apontando para
os millennials como principais consumidores.
19
Millennials: um retrato da geração seguinte. (tradução nossa)
30
Os millennials, também conhecidos como geração do milênio, geração Y ou
geração da internet, é um grupo composto por jovens nascidos entre os anos de 1977
e 1997. Embora não haja um consenso entre autores em relação a data limítrofe dessa
geração, essa é a média simples e variante mais aceitável. (FARRIS; CHONG;
DANNING, 2002). Apesar da divergência de datas entre autores, os mesmos
assentem quanto à característica principal que define a geração: um grupo que
cresceu diante de avanços tecnológicos, abundância econômica e fascínio pela
tecnologia (HERNANDEZ, 2011).
Tapscott (1999) diz que os jovens da geração Y, comparados com gerações
anteriores, consume muito mais. Isso se deve a que essa geração possui interesse
em uma ampla lista de objetos de desejo. O autor aponta que a geração do milênio é
responsável pela criação de culturas digitais. “Eles não apenas observam, mas
também participam. Perguntam, discutem, argumentam, jogam, compram, criticam,
investigam, ridicularizam, fantasiam, procuram e informam.”. (TAPSCOTT, 2010,
p.33). Devido ao fato de haverem crescido com a tecnologia e assimila-la de maneira
mais rápida, avanços tecnológicos não impressionam pois são tratados como algo
cotidiano; o foco é a função.
Taylor e Keeter (2010), acrescentam que essa é a geração mais confiante,
liberal, auto expressiva, alegre e aberta a mudanças dos últimos tempos.
Eles são o grupo mais etnicamente e racialmente diversificado de jovens
na história da nação. [...] Eles estão se mostrando a faixa etária mais
politicamente progressista na história moderna. [...] Eles são a primeira
geração na história humana que consideram comportamentos como
twittar e mensagens de texto, junto com sites como Facebook, YouTube,
Google e Wikipedia, não apenas as inovações mais surpreendentes da
era digital, mas como partes do cotidiano de suas vidas sociais e sua
busca pelo entendimento; [...] Eles são os jovens menos inclinados à
religião (TAYLOR; KEETER, 2010, s.p., tradução nossa)
O estudo de Sedikides; Wildschut; Baden (2004), relata que a nostalgia
geralmente é associada com a ideia de um passado melhor, mas que não significa
que os indivíduos estejam insatisfeitos com o presente ou tenham uma visão
pessimista em relação ao momento atual em que vivem.
31
Segundo os autores, os consumidores mais propensos à nostalgia procuram
satisfazer suas inseguranças em relação ao futuro através de produtos culturais de
outras gerações e possuem maior disposição para consumir produtos que remetam
ao passado de alguma maneira. Os millennials formam a primeira geração a chegar a
vida adulta no novo milênio, e tentam satisfazer suas inseguranças com itens que
remetam ao passado, compreendido como uma época em que se vivia melhor e não
havia tantos problemas como no presente (SEDIKIDES; WILDSCHUT; BADEN,
2004).
Tocci (2007), aponta que os geeks são o público que possuem maior interesse
por itens que despertam a nostalgia. Isso acontece porque ao adquirir itens
nostálgicos, forma-se um ponto de referência comum para uma geração, ao passo
que objetos considerados populares não transmitem o mesmo efeito. O interesse por
objetos geek torna-se maior quando os jovens atingem os 20 anos e têm sua própria
renda disponível. (TOCCI, 2007, p. 18, tradução nossa). O autor explica o fenômeno
no trecho a seguir:
[...] Imagens de mídia associadas à infância podem parecer
inadequadamente geek para os adolescentes que tentam afirmar mais
identidades adultas, mas algumas referências nostálgicas podem ter valor
para os adolescentes, enquanto algumas referências parecem velhas o
suficiente para ser "retro". [...] Além disso, itens nostálgicos e camisas com
piadas evidentes podem ser usadas ironicamente, distanciando o usuário
de uma identificação muito séria com a cultura geek. Mesmo que alguém
realmente se identifique pessoalmente como um fã do assunto de um item
que esteja usando, fazer piada do seu próprio gosto pessoal ou de si
mesmo indica que esse interesse não é levado muito a sério. [...] (TOCCI,
2007, p. 18-19, tradução nossa)
O termo geek, já foi considerado um sinônimo para a definição do termo
nerd20. No entanto, essa tribo ganha destaque pois não possui a aparência clássica
de um nerd. “Segundo esta definição, o geek não necessariamente é antissocial e não
20
A definição atual para o termo nerd, o caracteriza como uma pessoa que nutre alguma obsessão por
um determinado assunto a ponto de pesquisar, colecionar coisas, escrever sobre e não sossegar
enquanto não descobrir como funciona. Geralmente se interessa por computadores e tecnologia
(chamado de Geek), HQ, ficção científica e games. (GALVÃO, 2009, p. 3)
32
possui a chamada aparência clássica; alguns podem ter um visual mais moderno,
retrô ou até mesmo uma aparência desleixada.” (GALVÃO, 2009, p. 2).
Para Galvão (2009), os geeks são a nova versão dos nerds, no entanto o
termo geek não carrega o mesmo negativismo que o termo nerd. A maior diferença
entre ambos se dá pelo fascínio dos geeks, principalmente, por tecnologia, cultura pop
e interesses bem mais diversificados e específicos que os interesses considerados
essenciais pela cultura nerd, como games e o já conhecido fascínio pelos estudos e
boas notas. Tocci (2007), atribui o surgimento desta nova tribo ao mercado de nicho,
que possibilita o consumo de interesses cada vez mais selecionados.
Chris Anderson (2006), explica no best-seller A cauda longa, o fenômeno que
está mudando o mercado de massa para o mercado de nicho. O autor justifica que a
cultura de massa não irá deixar de existir, mas se tornará menos massificada, dando
espaço à cultura de nicho. “[...] a cultura de massa não se transforma em outra massa
diferente, mas em milhões de microculturas, que coexistem e interagem umas com as
outras de maneira extremamente confusa.”. (ANDERSON, 2006, p. 152). Como citado
no trecho a seguir, isso acontece, pois, apesar de compartilhar interesses genéricos,
os indivíduos possuem interesses bastante específicos:
Cada ouvinte, espectador ou leitor em si é, e sempre foi, um conjunto
exclusivo de interesses genéricos e interesses específicos. Embora
muitos desses indivíduos talvez compartilhem interesses genéricos, como
as condições climáticas, a maioria, se não todos, também tem interesses
específicos muito diferentes. E cada indivíduo é um mix verdadeiramente
singular de interesses genéricos e específicos. Até cerca de trinta anos
atrás, o americano médio não tinha acesso a nenhum meio capaz de
satisfazer a cada um de seus interesses específicos. O que todos tinham
era a mídia de massa, capaz de, com algum acesso, atender a muitos de
seus interesses genéricos (ou seja, de “massa”) (ANDERSON, 2006, p.
151).
Anderson (2006) aponta que a ascensão da cultura de nicho transformará o
panorama social. O autor diz que não se trata de um novo comportamento, e aponta
que a tecnologia permite explorar e expressar interesses específicos, dando espaço
à formação de milhares de tribos. “As mesmas forças e tecnologias da Cauda longa,
que estão levando a uma explosão de variedade e de escolha abundante naquilo que
consumimos, também tendem a converter-nos em pequenos redemoinhos ou
contracorrentes tribais.” (ANDERSON, 2006, p. 152)
33
Dessa forma, as conexões de interesses culturais abrem espaço para uma
espécie de microcultura, na qual todos escolhem coisas diferentes e específicas.
“Podemos considerar a cultura hoje, não como um grande cobertor, mas como uma
superposição de muitos fios entrelaçados, cada um dos quais é acessível
individualmente e interliga diferentes grupos de pessoas ao mesmo tempo”
(ANDERSON, 2006, p. 153).
Schindler; Holbrook (1993), evidenciaram que a ligação nostálgica acontece
durante a faixa etária de vinte anos, cujas interações dos indivíduos com produtos
ocorre durante a fase de formação de suas preferências de consumo.
Dessa forma, os produtos mais populares comercializados durante a época
da juventude do sujeito determinam suas preferências ao longo da vida. Isso explica
a preferência do consumidor propenso à nostalgia por objetos de épocas anteriores
no decorrer da vida (HOLBROOK; SCHINDLER, 2003a, 2003b).
Holak; Havlena (1998), apontam que a preferência por objetos que remetam
ao passado não é exclusividade desses grupos, uma vez que os entrevistados em
seus estudos, classificados em diversas faixas etárias, apresentavam, de alguma
forma, algum grau de nostalgia e propensão ao consumo de itens nostálgico. Para os
autores, há uma rede de conexões dos indivíduos formada a partir da associação com
o passado, e são essas as conexões que produzem a propensão à nostalgia e a
resposta ao apelo nostálgico.
34
3 MARKETING NOSTÁLGICO E A COMUNICAÇÃO VOLTADA AO PASSADO
Buscar compreender a dinâmica da comunicação e a evolução do marketing
em uma sociedade altamente globalizada e marcada por avanços tecnológicos se faz
necessária para buscar maneiras mais eficazes no relacionamento entre marcas e o
público. A publicidade possui papel fundamental na estratégia de comunicação que
pauta o relacionamento entre marcas e consumidores. Berger (apud HERNANDEZ,
2011), diz que a publicidade é em sua essência nostálgica, pois suas referências são
tradicionais e retrospectivas: ela precisa vender o passado para o futuro.
A utilização da nostalgia como estratégia de marketing tem se mostrado uma
ferramenta poderosa na aceitação de um produto. O marketing nostálgico permite que
o consumidor reviva memórias positivas do passado e ajuda marcas a construir uma
identidade autêntica através de uma estratégia que demonstra ser efetiva e ganha
cada vez mais espaço.
Nesse cenário, o marketing nostálgico encontra o ambiente ideal para assumir
um importante papel na diferenciação de marcas e nos significados e valores
emocionais fundamentados nos ativos intangíveis. O marketing nostálgico “tenta
transportar os consumidores para o seu passado através de referências culturais ou
simbólicas” (BRAUN-LATOUR apud BARBOSA, 2013).
Este capítulo apresenta o conceito de marketing nostálgico, percebido pela
publicidade como um mediador de emoções e recordações do passado, conceitos de
marketing e de comunicação, elementos que diferenciam os conceitos de publicidade
e propaganda, os atributos emocionais das marcas, a nostalgia como argumento
comercial, o composto de marketing e a importância da estratégia na comunicação.
35
3.1 SOBRE O MARKETING NOSTÁLGICO
Pode-se dizer que a publicidade está diretamente relacionada ao marketing,
servindo como meio de conexão com o público. A AMA,21 em sua mais recente
definição do conceito de marketing, diz que “Marketing é a atividade, conjunto de
instituições e processos para criar, comunicar, oferecer e trocar ofertas que tenham
valor para os consumidores, clientes, parceiros e para a sociedade como um todo”22
(AMA, 2008, p. 1, tradução nossa).
Las Casas (2001), define marketing como:
Marketing é a área do conhecimento que engloba todas as atividades
concernentes às relações de troca, orientadas para a satisfação dos
desejos e necessidades dos consumidores, visando alcançar
determinados objetivos de empresas ou indivíduos e considerando
sempre o meio ambiente de atuação e o impacto que essas relações
causam no bem-estar da sociedade (LAS CASAS, 2001, p. 26)
Nesse contexto, o marketing nostálgico é percebido pela publicidade como
uma forma de atrair consumidores através de recordações e emoções do passado.
Por sua vez, esse fenômeno impulsiona a cultura retrô que ganha mais espaço a cada
dia. Sabendo disso, a indústria de entretenimento tem promovido uma grande
quantidade de materiais com referências de décadas passadas que levam a esse
sentimento, com produções inspiradas em sucessos dos anos 1980 e 1990 que
tomam conta do cotidiano e caracterizam a era atual como a década da cópia original,
na qual os profissionais criativos utilizam a nostalgia para criar fórmulas de sucesso.
Ao contrário de décadas anteriores, a tecnologia permite fácil acesso e inserção em
culturas passadas, de décadas que não necessariamente foram vivenciadas pelos
indivíduos que procuram esse tipo de conteúdo (CARPANEZ; FUJITA, 2016).
21
A American Marketing Association é a maior associação profissional de marketing da América do
Norte, voltada para profissionais envolvidas na prática, ensino e estudo de marketing em todo o
mundo. É também a fonte que os profissionais buscam para aprofundar sua experiência de
marketing, elevar suas carreiras e alcançar melhores resultados.
22 Texto original: “Marketing is the activity, set of institutions, and processes for creating,
communicating, delivering, and exchanging offerings that have value for customers, clients, partners,
and society at large.” Disponível em:
<https://archive.ama.org/archive/AboutAMA/Documents/American%20Marketing%20Association%20
Releases%20New%20Definition%20for%20Marketing.pdf> Acesso em: 01 nov. 2016
36
Randazzo (1997), afirma que a publicidade possui papel fundamental na
relação entre marcas e consumidores e permite que o anunciante desvende o que o
consumidor deseja e estabeleça o posicionamento da marca não apenas no mercado,
mas também na mente do consumidor. Isso se dá no momento em que a publicidade
transmite os benefícios da marca baseados no produto e em seu cunho emocional e
psicológico. Sendo assim, a publicidade permite que os anunciantes criem
importantes ligações emocionais com o público, desempenhando papel fundamental
no processo de posicionamento da marca (RANDAZZO, 1997).
Keller e Machado (2006), acrescentam que as marcas são um meio rápido de
facilitar as decisões de compra. Ao indicar o fabricante do produto, os consumidores
se sentem autorizados a atribuir responsabilidade ao distribuidor. Pinho (1996, p. 11),
aponta que como forma de “atestar a excelência do produto e seu prestígio” já era
hábito indicar o fornecedor e o local de fabricação dos produtos.
Gobé (2002), aponta que é essencial pensar e construir marcas visando a seu
aspecto emocional e a sua identidade:
Produtos bem projetados têm uma personalidade verdadeira, por isso nos
ajudam a identificar a verdadeira pessoa através do que compramos e
colocam algum aspecto de nossas vidas em movimento mais lento, num
mundo que se move cada vez mais rápido (GOBÉ, 2002)
Keller (2003) e Keller; Machado (2006), assinalam que toda marca deve ter
uma personalidade própria, a partir de características e atributos próprios. Segundo
os autores, existem duas funções básicas que se destacam na definição de uma
marca: identificar e distinguir. Keller; Machado (2006), sugerem a separação dos
atributos das marcas em duas categorias, a primeira categoria se refere aos atributos
racionais das marcas e a segunda categoria aos atributos emocionais das marcas.
Dessa forma, os atributos racionais da marca possuem funções de caráter
técnico e desempenham o papel de satisfação de necessidades utilitárias dos
consumidores, a partir de argumentos com fatos empíricos e verificáveis. Por sua vez,
os atributos emocionais da marca criam laços afetivos entre as marcas e os
consumidores, a partir de métodos que visam a satisfação das necessidades
psicológicas dos consumidores. Para os autores, os atributos de marca são
37
importantes para a redução do impacto da concorrência e para a construção de pontos
de acesso com os clientes (KELLER; MACHADO, 2006; BROWN, 1999).
Kotler; Keller (2005), apontam que no momento em que os produtos passam
a ser pautados pelos interesses e necessidades do consumidor e por seu valor, se dá
uma grande mudança no mercado, pois o valor é definido entre o que o cliente recebe
e o que ele dá. “O cliente recebe benefícios e assume custos. Os benefícios incluem
benefícios funcionais e emocionais. Os custos incluem custos monetários, de tempo,
de energia e psicológicos” (KOTLER; KELLER, 2005, p.33).
Para Gobé (2002, p. 129), não são as máquinas que determinam como e o
que será produzido, e sim as pessoas. Para tanto, o segredo para o sucesso é
adequação ao consumidor e individualidade. Essa nova abordagem deve incluir as
ambições, os sonhos e as emoções mais profundas do consumidor. Dessa forma, “o
significado emocional da marca deve evoluir de ‘imposto’ para ‘pessoal’, de ‘impacto’,
para ‘contato’” (GOBÉ, 2002, p. 175).
Kotler (2010), acrescenta que o surgimento do marketing 3.0 se dá a partir do
momento em que os princípios da marca passam a ser fatores influenciadores da
escolha. Essa transformação foi observada quando o atributo emocional da marca
passou a ser tão importante quanto a própria função de um produto, criando, assim,
uma nova dinâmica de relacionamento com o cliente:
Os consumidores estão em busca de soluções para satisfazer seus
anseios de transformar o mundo globalizado em um mundo melhor. Em
mundo confuso, eles buscam empresas que abordem suas mais
profundas necessidades de justiça social, econômica, e ambiental em sua
missão visão e valores. Buscam não apenas satisfação funcional e
emocional, mas também espiritual, nos produtos e serviços que escolhem
(KOTLER, 2010, p. 4).
Surge então a necessidade de uma comunicação mais centrada no
consumidor para que os ativos intangíveis ganhem maior relevância do que os ativos
tangíveis de uma marca. (KOTLER, 2010).
Diversos estudos na área de psicologia sugerem que a nostalgia proporciona
conforto em épocas instáveis. Sedikides (2008), afirma que a ideia de bons e velhos
tempos é capaz de diminuir a ansiedade, reduzir o estresse, melhorar o humor,
38
aumentar a autoestima e proporcionar ligações de conexão social e bons sentimentos
em relação ao futuro.
Em estudo recente, Nostalgia Weakens the Desire for Money23, publicado na
JCR24, Lasaleta (2014), questiona se o efeito da nostalgia é capaz de fazer com que
os consumidores gastem mais quando pensam no passado. Para tanto, a
pesquisadora dividiu dois grupos de participantes, cujo primeiro grupo era convidado
a pensar sobre eventos passados enquanto tomava decisões de compra, enquanto o
segundo grupo pensava sobre memórias atuais ou futuras. A conclusão foi que os
participantes estavam dispostos a investir uma quantia maior em um objeto de
consumo que possibilitasse a rememoração de algum evento nostálgico. Segundo o
estudo, o efeito também aumenta a possibilidade de que esses indivíduos realizem
alguma compra, efetuem doações e até mesmo valorizem mais o dinheiro e o
investimento realizado quando a sensação de conexão social evocada pela nostalgia
estiver presente.
Para Lasaleta (2014), durante os tempos de recessão como o atual, os
consumidores economizam e se mostram mais relutantes em fazer investimentos,
portanto a nostalgia pode ser utilizada para estimular uma economia cada vez menor.
Assim, essa informação se torna útil para marcas que buscam provocar sentimentos
nostálgicos em suas campanhas e linhas de produtos, bem como organizações
políticas e de caridade que procuram angariar fundos.
Descobrimos que quando as pessoas têm níveis mais elevados de
conexão social e sentem que seus desejos e necessidades podem ser
alcançados com a ajuda de outros, sua capacidade de priorizar e manter
o controle sobre seu dinheiro se torna menos urgente (LASALETA, 2014,
tradução nossa).
Segundo Brown; Kozinets; Sherry (2003), o marketing retrô (nostálgico) utiliza
a nostalgia como principal ferramenta de marketing. Os autores explicam que tanto
marcas tradicionais quanto marcas novas estão recorrendo a essa abordagem para
23
Nostalgia enfraquece o desejo por dinheiro (tradução nossa)
Journal of Consumer Research, é uma revista acadêmica bimestral publicada pelas
universidades University of Chicago Press e Oxford University Press, que publica investigações
relacionadas à área de comportamento do consumidor, incluindo psicologia, marketing, sociologia,
economia, antropologia e comunicações.
24
39
fazer relançamentos de serviços e produtos já existentes, geralmente de uma década
anterior ao relançamento, e buscam envolver pela autenticidade e combinação da
estética retrô com as novas tecnologias e inovações disponíveis no presente. Apesar
disso, esses produtos não são obrigatoriamente atualizados de acordo com os
padrões contemporâneos, podem se tratar apenas de um retorno; reviver algo.
(BROWN, 2001, p. 308).
Gobé (2002), explica que a criação de marcas eficazes não depende de
publicidade exagerada, mas sim de relevância cultural e conexão emocional. Para o
autor, a conexão emocional deve ser sincera e percebida entre os consumidores,
transmitindo significado e honestidade. No entanto, o marketing nostálgico não é
exclusivo de marcas tradicionais, e algumas empresas utilizam esse apelo sem força
suficiente para sustentá-lo. (BROWN et al., 2003).
Esse erro se dá porque a maioria das empresas confunde percepção e
conexão emocional. A relação das marcas com os consumidores, é uma relação de
pessoas para pessoas, e não uma relação de fábrica para pessoas. Assim, uma marca
precisa ter personalidade, qualidades humanas e valores emocionais para se
diferenciar no mercado, expressando a cultura da empresa ao passo que seduzem os
consumidores com sua comunicação. Para tanto, a fórmula do sucesso de uma
conexão emocional duradoura é fazer com que os consumidores queiram formar uma
parceria com a marca. (GOBÉ, 2012, p. 377-379)
Gobé (2002, p. 363), aponta que a tendência à nostalgia já está no mercado
e só tende a aumentar. “O retrô-chique futurista, sentimental, individualista, cafona,
charmoso, viciado em internet... Hoje a tendência à nostalgia está a nossa volta”. A
tendência aumenta à medida em que nos movimentamos no novo milênio cada vez
mais tecnológico e menos analógico. Isso faz com que as pessoas queiram revisitar e
buscar no passado coisas que consideram boas para trazer para o presente “muitas
vezes personalizando e misturando essas redescobertas culturais numa sensibilidade
moderna e até futurista.” (GOBÉ, 2002, p. 363)
Gobé (2002), explica o fenômeno de convergência de épocas no seguinte
trecho:
40
[...] Esta tendência trata parcialmente de avaliar a ansiedade; uma
necessidade de confirmar a segurança e a estabilidade, enquanto
seguimos adiante no novo século a um ritmo acelerado para um futuro
incerto. Também trata do sentimento de agitação e de capacitação;
encontrando-nos num lugar de vantagens no tempo, temos a possibilidade
de escolher o melhor de todas as épocas. Ser capaz de conseguir tudo,
faz parte de uma atitude global; com a liberdade de escolher e personalizar
as coisas de todos os tempos, pois há tanta coisa “legal” ainda disponível
(GOBÉ, 2002, p. 363).
Para Gobé (2002, p. 367), uma marca que tenha mais de dez anos de mercado,
que possua uma história interessante para contar sob uma perspectiva histórica, ou
que tenha um forte relacionamento com seus consumidores, pode utilizar o marketing
nostálgico para se beneficiar da tendência. Isso se deve a que “em nossa época de
‘tempo comprimido’, o retrô está se tornando rapidamente ‘pouco tempo atrás’. Dessa
forma, não apenas entidades com um largo histórico cultural podem utilizar esse
apelo, mas também entidades com menos tempo de mercado. O importante é ser fiel
à sua história e atender ao desejo emocional dos consumidores de experimentar e
vivenciar o passado com o presente.
41
3.2 COMUNICAÇÃO E A NECESSIDADE DA ESTRATÉGIA
A comunicação é o momento mais importante de sedução entre marcas e
consumidores. Para que haja comunicação entre empresas e clientes, é necessário
que a mensagem comunicada seja clara e objetiva, informando os principais atributos
dos produtos ou serviços oferecidos, causando o impacto desejado no consumidor.
Para isso, é essencial que empresas e marcas desenvolvam um programa estruturado
e contínuo de marketing, para que seja possível relacionar-se com os consumidores
de maneira eficiente, com base em valores reais.
O sucesso de uma campanha eficiente depende de um conceito integrado de
comunicação e marketing, uma vez que a globalização dos mercados e a mudança
de comportamento dos consumidores exigem que as ferramentas e ações de
comunicação não sejam utilizadas de forma isolada, “torna-se então necessário incluir
todas elas (atividades) [...] em um planejamento orgânico, que coordene os esforços
e as ações empreendidas na busca de um propósito único e adequado ao momento
atual”. (PINHO, 2001, p. 16)
Cobra (2000); Pinho (2001), dizem que a comunicação pode ser informativa,
casual e persuasiva. Na comunicação informativa, o objetivo principal é esclarecer
informações sobre os produtos e serviços oferecidos. Já a comunicação casual trata
apenas de comunicar ocasionalmente sobre os produtos e serviços oferecidos. Por
sua vez, a comunicação persuasiva busca convencer clientes e prospectar novos
consumidores a adquirirem os produtos e serviços ofertados. (COBRA, 2000)
A publicidade é caracterizada principalmente pela comunicação persuasiva e
seu poder de convencimento. Gonçalvez (2009), pontua que embora publicidade e
propaganda sejam comumente confundidos e utilizados como sinônimos, há
determinadas diferenças quanto a definição de cada termo, como é apresentado pelo
autor no seguinte trecho:
42
[...] A publicidade é a arte de tornar público, divulgar um fato ou uma ideia,
já com objetivos comerciais, uma vez que pode despertar o desejo de
compra, levando-o à ação. É um conjunto de técnicas de ação coletiva
com o propósito de tornar conhecido um produto, um serviço, uma marca
promovendo assim uma atividade comercial. É mais ampla que a
propaganda e engloba todas as formas de comunicação, tornando-se uma
técnica comercial de comunicação de massa. [...] A propaganda pode ser
definida como ações de atividades ideológicas que tendem a influenciar o
homem, com objetivo político, cívico ou religioso. É o ato de propagar
ideias, princípios e teorias sem fator comercial. Ou seja, a propaganda é
uma atividade voltada para promover um sistema ideológico, como
doutrinas religiosas ou princípios políticos. [...] (GONÇALVEZ, 2009, p. 78, grifo nosso).
Compreende-se que a principal diferença entre os termos publicidade e
propaganda se dá pelo caráter comercial e ideológico de cada uma, respectivamente.
A figura a seguir, desenvolvida a partir do estudo A Dialética Conceitual da Publicidade
e Propaganda25, e retirada do livro de Gonçalvez (2009), apresenta os três principais
elementos que caracterizam e diferenciam os conceitos de publicidade e propaganda,
como ilustrado na figura a seguir:
Figura 4 – Três elementos que diferenciam os conceitos de Publicidade e Propaganda
Fonte: Publicidade e Propaganda (2009, p. 8).26
Tendo os conceitos de comunicação e publicidade e propaganda definidos, é
importante entender o papel do marketing e das estratégias comunicacionais no
desenvolvimento de uma campanha publicitária. Para Kotler (2000, p. 30), o marketing
é definido como: “um processo social por meio do qual pessoas e grupos de pessoas
25
Trabalho científico e didático que enfoca os três principais elementos que diferenciam,
conceitualizam e condicionam os termos publicidade e propaganda.
26 GONÇALVEZ, M. C. Publicidade e Propaganda. Curitiba: IESDE Brasil S.A., 2009. Disponível em:
<https://books.google.com.br/books?hl=ptBR&lr=&id=mcjMntKor5gC&oi=fnd&pg=PA7&dq=GON%C3%87ALEZ,+M.+C.+Publicidade+e+Propag
anda.&ots=9XervldJ0a&sig=jk2pYkCeQm8q_wSF8njkEoDBpyE#v=onepage&q&f=false> Acesso em:
01 nov. 2016
43
obtêm aquilo de que necessitam e que desejam com a criação, oferta e livre
negociação de produtos e serviços de valor com outros”.
Para que o mercado, os produtos e os consumidores sejam estudados e
compreendidos, o marketing faz uso de algumas ferramentas importantes, como o mix
de marketing. O Marketing Mix, ou Composto de Marketing, é definido como a
combinação de elementos variáveis que compõe as atividades de marketing. Kotler;
Armstrong (1993), definem o composto de marketing como: “o grupo de variáveis
controláveis de marketing que a empresa utiliza para produzir a resposta que deseja
no mercado-alvo [...] conjunto de ações que a empresa pode fazer para direcionar a
demanda para seu produto” (KOTLER; ARMSTRONG, 1993, p. 29).
Posteriormente, Kotler (2000, p. 38), define o composto de marketing como:
“os 4Ps que representam a visão que a empresa vendedora tem das ferramentas de
marketing disponíveis para influenciar compradores”. Esse composto é formado pelos
4p’s do marketing, sendo constituído por produto, preço, praça e promoção. Esse
conceito foi elaborado inicialmente no início dos anos 1960 por Jerome McCarthy,
sendo popularizado posteriormente por Kotler e adotado como o modelo padrão,
tradicionalmente utilizado pela maioria dos educadores e profissionais do campo de
atuação (SILVA et al., 2006).
O composto de marketing deve ser utilizado de maneira estratégica pelas
empresas, para atingir de forma consistente os consumidores. Esses consumidores
representam o público alvo e são a principal razão das ações dos 4 p’s. Para Cobra;
Brezzo (2010), a aplicação dos 4 p’s por uma empresa é essencial para a satisfação
dos consumidores em relação aos seus produtos, de modo que a empresa deve
oferecer produtos e serviços que se encaixem neste composto de marketing. Kotler
(2010, p. 59), acrescenta que “uma vez bem-sucedida, a marca deixa de ser
propriedade da empresa”, indicando que a partir de então, os consumidores passam
a ser os proprietários e o foco principal das empresas passa a ser satisfazer esses
consumidores.
Para melhor compreensão, a seguinte figura apresenta os quatro elementos
do composto de marketing e suas principais funções:
44
Figura 5 – Composto de marketing (4 P’s)
Fonte: Marketing para o Século XXI (KOTLER, 2000) 27
Sandhusen (2003, p. 4), apresenta uma definição dos 4P’s do composto de
marketing. Para o autor, o produto é o principal elemento do marketing mix, uma vez
que é a partir dele que uma empresa irá definir toda sua estratégia e moldar sua
comunicação e necessidades. “O produto é definido como qualquer coisa tangível ou
intangível, oferecida para atenção, aquisição, utilização ou consumo capaz de
satisfazer necessidades".
Já o preço se mostra o mais flexível dos itens do composto de marketing, pois
pode mudar a qualquer momento. Esse item também é o que possui maior influência
sobre as vendas, os lucros e os clientes. (SANDHUSEN, 2003). Kotler (2000),
acrescenta que a principal diferença desse item para os demais é que o preço é o
único elemento que gera receita, enquanto os demais geram custos. A praça, ou canal
de distribuição, é definida por Sandhusen (2003), como o local em que o produto é
disponibilizado no mercado, apontando a importância desse elemento na forma de
distribuição de modo que fique acessível ao público alvo.
27
KOTLER, Philip. Marketing para o século XXI: como criar, conquistar e dominar mercados. Futura,
2000.
45
O item promoção é recomendado quando há a necessidade de aumentar o
faturamento ou volume de vendas, a partir de uma estratégia de promoção de vendas,
geralmente útil para desocupar estoque. Além disso, a promoção costuma ser uma
boa maneira de aumentar o conhecimento da marca, a quantidade e novos espaços
de pontos de vendas e a distribuição dos produtos oferecidos pela empresa.
(SANDHUSEN, 2003). Kotler; Keller (2005, p. 553), acrescentam à definição de
promoção de vendas como “uma variedade de incentivos de curto prazo para
estimular a experimentação ou a compra de um produto”.
Como exemplo recente que contempla o composto de marketing, a Coca-Cola
comemorou os 100 anos do design da garrafa de vidro Contour, criada em 1915, que
se tornou um ícone da marca e vem sendo utilizada desde então, sofrendo poucas
variações. Para celebrar o fato histórico, a empresa lançou em 2015 no Brasil um
pack retrô com a edição limitada de garrafas históricas da marca, em tamanho original,
que inclui um folheto explicativo sobre a trajetória do design da embalagem. A edição
conta com seis modelos de garrafas de vidro dos anos 1899, 1900, 1905, 1913, 1915
e 1923. O preço da edição limitada varia entre R$ 35 e R$ 45. O produto foi distribuído
em pontos de vendas específicos, como mercados regionais, os supermercados:
Walmart, Grupo Pão de Açúcar e Carrefour e em Lojas de Conveniência dos postos:
BR, Ipiranga e Shell. A promoção foi ao ar durante o mês de dezembro de 2015.
46
Figura 6 – Garrafas Históricas da Coca Cola
Fonte: Imagem elaborada pela autora.28
Para promover a ação, foram divulgados anúncios impressos e peças no
Instagram29 oficial da marca, com ilustrações inspiradas no design retrô e vintage. A
referência ao estilo retrô é marcada, inclusive, pela utilização de modelos pin-up30 em
algumas ilustrações, como exemplificado no seguinte anúncio:
28
Fotografias disponíveis em: < http://www.novasalices.com/2016/01/as-garrafas-historicas-da-cocacola.html> Acesso em: 11 nov. 2016
29 Rede social de imagens.
30 Modelos com características sensuais femininas que obtiveram maior destaque principalmente nos
anos 1940 e 1950 e são constantemente utilizadas pela publicidade como forma de retratar o retrô e
o vintage.
47
Figura 7 – Anúncio Impresso - Garrafas Históricas da Coca-Cola
Fonte: Clube de Criação.31
31
Disponível em: http://www.clubedecriacao.com.br/ultimas/campanha-325/> Acesso em: 10 nov.
2016
48
49
4 MARCAS E NOSTALGIA
A obsessão pelo passado no século XXI é um fenômeno crescente que ocorre,
entre demais fatores citados anteriormente, devido a multiplicação e massificação de
oferta cultural que permite a apropriação de obras já existentes e apresenta a arte
como um campo que já não busca apenas novas formas de criar algo desde o zero,
mas formas de adaptar e encontrar maneiras distintas de apresentar o velho, como
algo novo (BOURRIAUD, 2009).
No livro, Pós-produção: como a arte reprograma o mundo contemporâneo,
Nicolas Bourriaud (2009), explica o comportamento como parte de uma tendência de
reciclagem, e aponta que a pergunta artística de ‘qual novidade podemos apresentar?’
está sendo substituída para ‘o que fazer com o que já temos?’ (BOURRIAUD, 2009).
Esse fenômeno não se limita apenas à arte. Diferentes indústrias, inclusive a indústria
de comunicação, vêm se apropriando da tendência à reciclagem e apostando no
marketing nostálgico como carro-chefe, assim como poderá ser observado no
presente capítulo.
Neste capítulo, será analisada a utilização do marketing nostálgico como
estratégia de comunicação pelas marcas Volkswagen, Netflix e Parmalat,
evidenciando a nostalgia presente na atualidade pelas décadas de 1970, 1980 e 1990,
respectivamente. A Volkswagen, apresentando o comercial retrô dos anos 1970 e o
endosso ao personagem Mussum. A Netflix e a homenagem aos anos 1980 pela série
Stranger Things, reforçando o link com o passado ao trazer Xuxa como ícone
representativo da década. E a aposta da Parmalat em relançar em dois momentos a
campanha Mamíferos dos anos 1990, em 2007 e em 2015.
- A década de 1970, representada pelo comercial retrô da Volkswagen, de
2013, apresentando o Novo Fusca ‘direto dos anos 1970’. E o endosso pelo
personagem nostálgico, Mussum.
- A homenagem da Netflix à década de 1980 com um turbilhão de referências
culturais oitentistas na série Stranger Things. E o comercial com a mistério da boneca
da rainha dos baixinhos dos anos 1980, Xuxa.
- A Parmalat e a nostalgia da década de 1990 ao recriar a campanha
Mamíferos de 1996, em 2007 e 2015.
50
A seguinte figura apresenta as marcas, produtos e objetos de análise para
melhor compreensão:
Figura 8 – Marcas e a nostalgia dos anos 1970, 1980 e 1990
Fonte: Imagem elaborada pela autora
4.1.1 Volkswagen: o Novo Fusca direto dos anos 1970
A Volkswagen é uma empresa que pertence ao Grupo Volkswagen, fundada
em 1937, em Wolfsburgo, na Alemanha. O Grupo Volkswagen detém as marcas Audi,
Bentley, Bugatti, Ducati, Lamborghini, Seat, Porsche, Skoda, MAN e Volkswagen
Caminhões, e Scania e é considerada a maior fabricante de automóveis do mundo.
A história da Volkswagen32 no Brasil teve início em 1953, em São Paulo. O
portfólio da marca conta com 22 modelos de carros distribuídos atualmente no Brasil:
Golf, Voyage, Saveiro, Fox, SpaceFox, Crossfox, Passat, Passat Variant, Passat CC,
Sharan, Touareg, Tiguan, Gol, Gol G6, Jetta, Amarok, Up e New Beetle.
32
http://www.vw.com.br/pt/institucional.html
51
O primeiro modelo de carro produzido pela companhia alemã foi o
Volkswagen Sedan (Fusca), também conhecido como Beetle nos Estados Unidos. De
início, o motor traseiro e a forma arredondada causaram estranhamento nos
consumidores, no entanto a Volkswagen investiu no marketing e soube capitalizar o
maior diferencial do Fusca, a resistência. A reputação de ‘indestrutível’ se disseminou
rapidamente e em pouco tempo o Fusca se tornou o carro mais vendido no mundo. O
Volkswagen Sedan foi produzido por 65 anos, de 1938 a 2003.
A Volkswagen apostou em uma reedição do Fusca, o New Beetle, em 1998.
O New Beetle manteve o design do modelo original que tornou o Fusca um ícone do
mercado automotivo. O modelo deixou de ser produzido em 2010, época em que a
Volkswagen anunciou o ‘novo Fusca’, Volkswagen Fusca (A5), como seu sucessor a
partir do ano de 2011.
O modelo de 2013 do ‘novo Fusca’ é inspirado no modelo original do Fusca,
e mantém tanto detalhes internos quanto sua silhueta, que lembra o carro original da
Volkswagen. No entanto, o novo modelo, além de possuir alta tecnologia, é mais
esportivo e ‘descolado’.
Mais que um carro, o Fusca é um ícone da cultura e da indústria
automobilística brasileira. Para a campanha de lançamento do Novo Fusca 2013, a
Volkswagen apostou na tentativa de resgatar a imagem do Fusca como ícone e
patrimônio emocional dos brasileiros, com a campanha intitulada Brasil 70. A proposta
é levar o novo Fusca para a década de 1970, na qual o Fusca era o carro mais popular
do Brasil. A agência responsável pelo comercial é a AlmapBBDO33, sob direção geral
de criação dos premiados publicitários Marcello Serpa e Luiz Sanches. Já a produção
do comercial é assinada pela produtora de filmes e conteúdo publicitário,
ParanoidBR34.
Para tanto, foi realizada uma reconstituição de época do Viaduto do Chá 35,
localizado em São Paulo, nos anos 1970. O piso atualmente liso do Viaduto, composto
na época por pedras portuguesas e mapas do estado de São Paulo foi reconstruído
33
A AlmapBBDO é uma agência de publicidade brasileira fundada em 1954, sob o nome de Alcântara
Machado Publicidade - Almap. A Almap passou a dominar-se AlmapBBDO em 1988 após venda de
ações para a rede de agências BBDO, fusão entre Barton, Durstine & Osborn e Batten Co.
34 http://www.paranoidbr.com/
35 O Viaduto do Chá foi inaugurado em 1892 e é o primeiro viaduto da cidade de São Paulo. É
localizado no Vale do Anhangabaú, na zona central de São Paulo.
52
digitalmente. Entretanto, os carros e ônibus utilizados no comercial são originais da
década de 1970.
O filme de 45’ segundos, intitulado Brasil 70, inicia com imagens aéreas do
Viaduto do Chá, à medida que mostra pedestres curiosos aproximando-se do carro.
Para contextualizar a época, é mostrado um outdoor anunciando um modelo de rádio
toca-fitas “Grave bem. AM. FM. Cassete. Os personagens estão caracterizados com
roupas que remetem ao movimento hippie36, caraterístico da época. No filme, também
aparecem personagens negros com cabelo black power (força negra), movimento afro
que ganhou destaque na década.
Nesse momento, o apresentador Cazé Peçanha se aproxima dos curiosos e
anuncia: “estamos aqui nos anos 70 pra saber a opinião do público sobre o Fusca
2013”, sendo indagado por uma pedestre: “2013? Então o mundo não acaba no ano
2000?”. O apresentador segue informando as novas características presentes no
carro, como “GPS touchscreen, bluetooth, ABS, EBD, ESP”, sendo questionado por
um pedestre: “tem rádio AM?”. Os curiosos demonstram não entender a linguagem do
apresentador ao discursar sobre os recursos tecnológicos do carro e não acreditar no
veículo que lhes está sendo apresentado, como demonstrado por um dos pedestres,
que questiona “pousou aqui?”.
A trilha sonora é composta pela música País Tropical37, do cantor e
compositor brasileiro Jorge Ben Jor, canção de samba-rock que fez muito sucesso
nos anos 1970, marcando a época. A influência do rock também fica clara quando o
apresentador comenta que o carro “tem farol de led”, e um dos pedestres comenta
“curto muito Led”, referindo-se à banda de grande influência na época, Led Zeppelin,
demonstrando a única referência da palavra “led” que seria possível na época.
A tomada seguinte mostra o ator e humorista brasileiro Mussum (1941-1994),
carismático ícone dos anos 1970 que obteve notoriedade ao fazer parte do grupo Os
36
O movimento hippie teve início nos anos 1960, mas só ganhou popularidade no Brasil e outros
países nos anos 1970. Além do comportamento coletivo contracultura, a frase “paz e amor”, o amor
livre e vestimentas largas com aspecto velho ou cores que fazem apologia ao psicodélico, calças
boca-de-sino e camisas floridas são marcas dos hippies. A predileção pelo gênero rock e rock
psicodélico como Pink Floyd, Led Zeppelin, The Beatles, Janis Joplin, etc também é uma forte
característica do movimento, entre outros. A Kombi, automóvel fabricado pela Volkswagen, se tornou
um símbolo do movimento hippie.
37 Canção composta em 1969 pelo cantor de MPB e samba-rock, Jorge Ben Jor. Se tornou o maior
sucesso da carreira do cantor, recebendo diversas versões de outros cantores.
53
Trapalhões38. O personagem de Antônio Carlos Bernardes Gomes, o Mussum,
popularizou-se por utilizar gírias e expressões características do personagem: como
forévis, cacíldis, coraçãozis. A participação do Mussum no comercial é realizada
mediante pós-produção, que realizou a reconstituição digital do personagem. Nesse
momento, Mussum vê o Novo Fusca e exclama: “Cacilds, é o Fusquis”. O narrador
encerra o comercial com a sentença “Fusca 2013, perfeito para o Brasil de 2013”.
Figura 9 – Montagem de Frames do comercial Brasil 70 Volkswagen
Fonte: AlmapBBDO39
38
Programa humorístico brasileiro estrelado pelos integrantes Didi Mocó (Renato Aragão), Dedé
Santana, Mussum e Zacarias. O grupo de atores fez sucesso desde a década de 1960, obtendo seu
auge nos anos 1970 e 1980.
39 Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=QpC8BsyjEC0> Acesso em: 15 nov. 2016
54
O filtro em tom sépia, é utilizado durante o comercial com o intuito de remeter
ao passado. O filtro está presente desde o início do vídeo até os 40 segundos do filme,
momento em que é apresentada uma comparação entre o Fusca original e o Novo
Fusca. A tomada mostra o Fusca em movimento, sendo ultrapassado rapidamente
pelo Novo Fusca, que surge por trás do modelo original. Nesse momento, o filtro em
tom sépia desaparece, marcando a transição do tempo. O narrador anuncia a volta do
carro e assina o comercial: “O carro voltou. Volkswagen, O Carro. Volkswagen é Das
Auto”.
A escolha de Mussum, considerado um ícone dos anos 70, reforça o link com
passado. A Volkswagen lançou ações de mídia digital como parte integrante da
campanha publicitária do Novo Fusca. A participação do Mussum atrai a atenção pela
participação do personagem em peças de mídia divulgadas nas redes sociais e em
diversos portais, destacando a característica de falar do humorista: "Olha quem
voltousis!". Em seu site oficial, a Volkswagen anunciou que a campanha digital do
Novo Fusca com Mussum impactou 28 milhões de pessoas em um único dia.40
Figura 10 – Montagem com peças da campanha digital do Novo Fusca com Mussum
Fonte: Imagem elaborada pela autora41
40
Disponível em: <http://www.vwbr.com.br/ImprensaVW/Release.aspx?id=4df37da3-ae7c-4aad-9cd3e243b33f63b2> Acesso em: 15 nov. 2016
41 Disponível em: < http://www.vwbr.com.br/ImprensaVW/Release.aspx?id=4df37da3-ae7c-4aad9cd3-e243b33f63b2> Acesso em: 15 nov. 2016
55
A campanha Brasil 70 cria uma dimensão de viagem no tempo, em que o
público é apresentado ao carro do futuro. O aspecto retrô da estratégia do Novo Fusca
é baseado na relação afetiva entre o público e o modelo clássico do produto. A
reconstrução de época dos anos 1970, assim como os elementos utilizados no vídeo,
evidenciam a utilização do apelo nostálgico no comercial.
A lembrança da marca Fusca provoca o saudosismo e mostra-se uma forte
influenciadora ao despertar o desejo antigo pelo modelo contemporâneo, fato que
influenciou o mercado brasileiro a lançar o produto sob o nome de Novo Fusca ao
invés de New Beatle. As conexões criadas entre o modelo original e o novo modelo
mostram-se determinantes no sucesso da campanha pelo sentido afetivo, ao elevar a
atenção dos brasileiros para o lançamento de um novo produto da marca histórica
Fusca.
No ano de 2013, além do comercial Brasil 70, o ator Mussum foi homenageado
com o lançamento de uma linha de cervejas artesanais inspirada no personagem. A
linha de cervejas artesanais é composta pelas cervejas: Cacilds, Ditriguis, Birits e a
Edição Especial Limitada Biritis Sem Filtris™.
56
Figura 11– Linha de cervejas artesanais Mussum – Brassaria Ampolis
Fonte: Cerveja Store42
A marca também lançou a linha de cervejas na versão em lata. A cerveja
Forévis, é uma edição especial disponibilizada apenas nessa versão.
42
Disponível em: <http://www.cervejastore.com.br/fotos/grande/7638fg1/pack-cervejas-do-mussum-c4-itens.jpg> Acesso em: 15 nov. 2016
57
Figura 12 – Linha de cervejas artesanais Mussum – Brassaria Ampolis
Fonte: Cervejaria Brassaria Anápolis 43
A relevância do personagem Mussum atualmente também pode ser
observada nas redes sociais, como o Facebook. A fanpage Mussum Forévis, conta
com mais de 2,5 milhões de fãs, que acompanham postagens humorísticas
relacionadas, ou não, com o personagem.
Figura 13 – Fanpage humorística Mussum Forévis
Fonte: Fanpage Mussum Forévis44
43
44
Disponível em: <http://www.brassariaampolis.com.br/forvis/> Acesso em: 15 nov. 2016
Disponível em: <https://www.facebook.com/mussumforeviss> Acesso em: 15 nov. 2016
58
4.1.2 Netflix: a homenagem aos anos 1980
A Netflix45 é uma provedora via streaming46 norte-americana de filmes e séries
para a televisão que revolucionou a maneira de assistir a filmes e séries. A empresa
foi fundada em 1997, e iniciou como um serviço de entrega de DVDs pelo correio. Em
2007, a Netflix iniciou o serviço de transmissão online de seu catálogo de filmes e
séries, permitindo aos assinantes a possibilidade de assistir ao conteúdo
disponibilizado através da plataforma digital. Atualmente, a empresa conta com mais
de 80 milhões de assinantes e está presente em mais de 190 países, consolidandose como a empresa líder no serviço de conteúdo digital.
Desde 2013, a empresa aposta na produção de conteúdo original, que vem
sendo recebida positivamente pelos usuários do serviço. As produções originais
Netflix receberam, até o presente momento, 414 indicações nas maiores premiações
da indústria, incluindo Emmy, Globo de Ouro, British Academy e Grammy Awards,47
tendo vencido 90 prêmios. Entre as séries de maior sucesso da Netflix, são citadas
House of Cards, Orange is the New Black e Stranger Things.
4.1.2.1 Stranger Things
Stranger Things é uma série americana de suspense, ficção científica e
drama, distribuída pela Netflix. A primeira temporada da série, composta por 8
capítulos com média de 50 minutos de duração cada, foi disponibilizada no dia 15 de
julho de 2016.
A série se passa no ano de 1983, e conta a história de um garoto que
desaparece misteriosamente na cidade de Hawkins, Indiana (Estados Unidos). Ao
longo de oito episódios, a família e amigos tentam desvendar o sumiço, enquanto
acontecimentos misteriosos continuam ocorrendo em diversas partes da cidade. O
mistério é relacionado, posteriormente, com a descoberta de experiências secretas
conduzidas pelo governo do país em uma base militar na cidade. O ponto alto da série
acontece após o surgimento de Eleven, uma personagem que possui poderes
especiais.
45
Disponível em: <https://media.netflix.com/pt_br/about-netflix > Acesso em 05 nov. 2016
O streaming, ou fluxo de mídia, é uma maneira de distribuir dados multimídia através da internet.
47 Disponível em:
<https://en.wikipedia.org/wiki/List_of_awards_and_nominations_received_by_Netflix> Acesso em 05
nov. 2016
46
59
Figura 14 – Pôster promocional da primeira temporada da série Stranger Things - Netflix
Fonte: IMDb48
48
Internet Movie Database, IMDb, é a mais popular base de dados de filmes na internet. Disponível
em: <http://www.imdb.com/title/tt4574334/mediaviewer/rm2171737088> Acesso em: 10 nov. 2016
60
A série é altamente ambientada e tematizada por elementos culturais da
década de 1980, apresentando um baú contemporâneo de cultura pop da década, por
meio de referências cinematográficas, estéticas e musicais.
Os criadores da série, irmãos Matt e Ross Duffer, contaram em entrevista ao
site de entretenimento A.V. Club49, que exibiram um vídeo com imagens de 26 filmes
para vender o projeto para a Netflix. Segundo eles, o trailer continha trechos de
clássicos de filmes de terror, como Poltergeist (1982), A Hora do Pesadelo (1984),
Tubarão (1975), Halloween (1978), entre outros. Os irmãos Duffer acrescentam que
as principais inspirações na criação da série foram os mestres do terror e ficção
científica: Steven Spielberg e Stephen King. Há diversas referências claras às obras
dos ícones no decorrer da trama.
A tipografia utilizada na abertura dos capítulos de Stranger Things e no
logotipo da série é a ITC Benguiat50, criada em 1977 pelo designer Edward Benguiat,
utilizada em diversas obras dos anos 1980. O logotipo de Stranger Things criado com
a fonte serifada, característico da época, soa familiar, revelando a propriedade
transcendental do design através do poder histórico da tipografia. A escolha se deu a
partir de referências de livros do escritor de horror e fantasia, Stephen King.
Figura 15 – Montagem com capas de livros de Stephen King
Fonte: The Telegraph51
49
Disponível em: <http://hiddenremote.com/2016/08/01/a-guide-to-all-the-stephen-king-references-instranger-things/> Acesso em: 16 nov. 2016
50 Disponível em: < http://www.myfonts.com/fonts/itc/benguiat/> Acesso em: 10 nov. 2016
51 Disponível em: <http://www.telegraph.co.uk/on-demand/0/stranger-things-meet-the-design-geniusbehind-tvs-most-talked-ab/> Acesso em: 10 nov. 2016
61
A lista de referências utilizadas na série é grande. Os usuários da rede social
de filmes brasileira, o Filmow, realizaram uma compilação contendo as obras
homenageadas e referências diretas e indiretas que aparecem na série, totalizando,
até o momento, 59 filmes. A figura a seguir apresenta uma captura de tela da rede
social, com parte da listagem das referências encontradas na série.
Figura 16 – Captura de tela do site Filmow com a listagem de referências que aparecem na série
Stranger Things
Fonte: Filmow52
A sensação de imersão na década pode ser percebida desde os segundos
inicias até ao decorrer de toda a trama. A utilização de elementos constantemente
presentes em obras dos anos 1980, como experimentos militares secretos, walkietalkies, jogos de RPG, personalidades da época, realidades paralelas, préadolescentes de bicicleta, estão presentes na obra.
52
Disponível em: < https://filmow.com/listas/outras-coisas-estranhas-as-referencias-e-homenagensde-stranger-things-l84802/> Acesso em: 10 nov. 2016
62
A figura a seguir apresenta uma montagem com frames de um vídeo criado
por um fã da série que exibe a comparação entre cenas clássicas que foram refeitas
na série. O vídeo possui até o presente momento mais de 1,3 milhões de acessos.
Figura 17 – Montagem com frames contendo algumas referências à filmes clássicos dos anos 1980
presentes na série Stranger Things
Fonte: Imagem elaborada pela autora53
53:
Disponível em: <https://vimeo.com/175929311> Acesso em: 10 nov. 2016
63
Além disso, a imagem a seguir mostra fitas VHS54 produzidas por fãs da série
e evidencia a cultura participativa na internet por meio do processo de garimpagem
que esse tipo de conteúdo instiga e o entusiasmo dos espectadores ao detectar e
reviver as lembranças nostálgicas proporcionadas pela obra.
Figura 18 – Montagem com fitas VHS produzidas por fãs da série Stranger Things
Fonte: Imagem elaborada pela autora55
Do mesmo modo, as referências à década de 1980 estão presentes em toda
a trilha sonora, que inclui sucessos como Should I Stay or Should I Go, da banda The
Clash (1982) e outros hits de grupos musicais que fizeram sucesso durante a época,
como Joy Division, New Order, entre outros. A Netflix criou uma playlist oficial56
contendo todas as canções presentes na série na plataforma de músicas via
streaming, Spotify.
54
Tipo de mídia de gravação de vídeo que possuiu pico de popularidade nas décadas de 1980 e
1990.
55: Disponível em: < https://www.instagram.com/p/BIHiu5NgcKn/?taken-by=iamsteelberg> Acesso em:
10 nov. 2016
56 Disponível em: <https://open.spotify.com/user/netflixmusic/playlist/2X6z5kU0wMnKoar8i1RN6B>
Acesso em: 10 nov. 2016
64
O elenco infantil, faz referência à elencos infantis de clássicos, como: ET - O
Extraterrestre (1982), Os Goonies (1985), Conta Comigo (1986) e Super 8 (trama
ambientada em 1979, lançado em 2011).
Há uma homenagem a quatro obras de Steven Spielberg: ET – O
Extraterrestre (1982), Tubarão (1975), Poltergeist (1982) e Os Goonies (1985). A
nostalgia proporcionada por Steven Spielberg é evidente, posto que apenas no ano
de 2015 foram realizados dois remakes de clássicos do diretor, a nova versão de
Poltergeist (1982) e a refilmagem de Jurassic Park (1993), – incentivando os cinéfilos
a irem ao cinema para reviver a nostalgia que seus filmes proporcionam.
A nostalgia Spielberguiana foi mencionada pelo jornal britânico The
Guardian57, que define o diretor como um gerador de nostalgia:
A nostalgia Spielberguiana no marketing se mostra funcional, pois antes
mesmo da estreia, já se pode observar que a produção renderia bons
frutos ao levar os expectadores em um turbilhão de nostalgia de Spielberg
(THE GUARDIAN, 2015, tradução nossa).
Seja por razões mercadológicas, por nostalgia ou crise de criativa de material
autoral, os últimos anos do mercado audiovisual têm sido marcados por diversas
refilmagens e homenagens aos clássicos dos anos 80, e 90, principalmente. A fórmula
oferece segurança à indústria cinematográfica ao apresentar um modelo que já obteve
sucesso no passado e mantém uma legião de fãs e adoradores desses clássicos.
Dessa forma, é fazer com que os apreciadores das obras originais assistam por
curiosidade, à medida que as obras conquistam novos fãs, que tiveram ou não contato
com a obra original.
57
Disponível em: https://www.theguardian.com/film/2015/jun/29/jurassic-park-michael-crichton-microdreamworks-adaptation-steven-spielberg> Acesso em: 09 nov. 2016
65
4.1.2.2 Boneca da Xuxa e o mistério dos anos 1980
Para divulgar a série Stranger Things no Brasil, a Netflix divulgou um vídeo
promocional com a boneca da Xuxa, conhecida pelo epíteto de ‘a rainha dos
baixinhos’. Nos anos 1980, a apresentadora, cantora e atriz Maria da Graça "Xuxa"
Meneghel, a Xuxa, consagrou-se como um ícone que se ramificou em todo o Brasil e
América Latina. Somente entre os anos de 1986 e 1992, alcançou o número de 18
milhões de discos vendidos. Além disso, apresentou programas infantis por décadas,
estrelou filmes e lançou diversos produtos relacionados à celebridade, incluindo uma
boneca.
A boneca da Xuxa foi lançada no final da década de 1980, época em que uma
lenda urbana surgiu em torno dela. Naquela época, espalhava-se a lenda de que a
boneca da personagem era possuída e cometia crimes misteriosos. Xuxa também era
associada a outras lendas urbanas, como a de que se poderia ouvir mensagens
satânicas ao tocar seus discos ao contrário, além de outros boatos que atualmente
são satirizados pela apresentadora.
A Netflix resgatou ‘a lenda da boneca demoníaca da Xuxa’ na ação
promocional de Stranger Things no Brasil. A escolha de uma figura icônica da década
de 1980 é uma clara tentativa de provocar a nostalgia oitentista nos espectadores. O
vídeo promocional rapidamente viralizou pelas redes sociais, com mensagens
repletas de nostalgia e comentários satirizando a lenda urbana gerada em torno da
boneca. A ação da Netflix para promover a série no Brasil, funciona como peça
nostálgica e vai de acordo com o que a série promove.
O vídeo inicia com um quarto infantil repleto de elementos típicos da década
representada, como o papel de parede, um rádio de pilha, um aparelho de vinil, uma
televisão retrô, pôsteres de filmes famosos na época, entre outros brinquedos infantis
retrô. O suspense é garantido pela trilha sonora crescente ao fundo, elevando-se ao
ápice à medida em que a câmera se aproxima da boneca. Nesse momento, os olhos
da boneca acendem em uma luz vermelha e a boneca, dublada por Xuxa, chama pela
criatura do Mundo Invertido da série, “Demogorgon”.
Em seguida, exibe-se a mensagem “Nos anos 80, só bastava acreditar”,
referindo-se à lenda urbana criada em torno da boneca, e o vídeo é finalizado com o
66
logo da série exibido em uma televisão retrô. Xuxa anuncia, então, que todos os
episódios da série já estão disponíveis na Netflix.
Figura 19 – Montagem com frames do vídeo promocional de Stranger Things no Brasil
Fonte: Netflix Brasil58
O resgate de elementos de filmes clássicos de terror, suspense e ficção
científica dos anos 80 é apontado como o principal fator do sucesso da série Stranger
Things. Uma breve busca no Google59, evidencia a relação entre a série e a nostalgia,
ao apresentar mais de 1,1 milhão de resultados para os termos “stranger things;
nostalgia”.
58:
59
Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=cBNlhp7fjwc> Acesso em: 10 nov. 2016
Maior buscador online de pesquisas,
67
17 dias após o lançamento do produto na Netflix, Stranger Things alcançou
em média 8,2 milhões60 de espectadores. A recepção do público e aprovação da
crítica especializada foi tão positiva, que no mês seguinte do lançamento, em 31 e
agosto de 2016, a empresa confirmou a produção da segunda temporada da série,
que contará com 9 episódios, com previsão de lançamento para 2017.
A série cativou o público instantaneamente ao proporcionar uma infinidade de
memórias nostálgicas capazes de provocar uma onda satisfatória de saudosismo
proporcionada pela imersão na década de 1980. O público encontra na narrativa uma
sensação constante de já haver visto em algum lugar o que está sendo apresentado,
mesmo que não esteja familiarizado com as referências presentes na obra.
Dessa forma, Stranger Things mostra o antigo de uma maneira nova e
desperta no público, que encontra na série uma maneira de vivenciar a era através de
sua imersão nostálgica, uma resposta positiva e intensa baseada na memória afetiva
e no culto à nostalgia.
60
Disponível em: <https://www.theguardian.com/tv-and-radio/2016/aug/05/netflix-hit-stranger-thingshighlights-tvs-trend-for-nostalgia> Acesso em: 20 nov. 2016
68
4.1.3 Parmalat: a volta dos anos 1990
Porque nós somos mamíferos e crescemos tomando leite.
A Parmalat é uma empresa italiana do segmento alimentício da indústria de
laticínios. Fundada em 1961, por Calisto Tanzi, na cidade de Collecchio, na província
de Parma, a marca obteve notoriedade por patrocinar grandes equipes de futebol e a
equipe Brabham de Fórmula 1. A justiça italiana declarou a falência da marca em
2003, após escândalos e uma crise financeira que a retirou do mercado. A Parmalat
voltou ao mercado brasileiro no ano passado, em 2015, após recuperação judicial,
apostando na releitura da tradicional campanha Mamíferos.
A Parmalat teve seu ponto alto no Brasil em 1996, com a campanha
Mamíferos, sob o slogan: Parmalat, porque nós somos mamíferos. Criada pela
Agência DM9DDB e idealizada pelos publicitários Erh Ray, na época diretor criativo
(de 1994 a 2002), e Nizan Guanaes, a campanha consistia em apresentar crianças da
primeira idade, vestidas com roupas de pelúcia, representando mascotes. Na primeira
fase da campanha, foram oferecidos 12 modelos de mascotes61, e posteriormente
outros 9 modelos de espécies de mamíferos 62 foram acrescentados.
A promoção pedia que os consumidores juntassem 20 códigos de barras de
produtos Parmalat, somados a R$ 8,00. Feito isso, os clientes poderiam realizar a
troca por uma das dezenas de pelúcias da série Mamíferos, que vinham segurando
uma caixinha de leite Parmalat de pelúcia.
61
Os modelos de mascotes oferecidos na primeira fase da campanha, são: vaca, cachorro, porco,
gato, macaco, ovelha, leão, leopardo, elefante, rinoceronte, foca e urso panda.
62 Nove novos modelos de espécies acrescentadas: girafa, leão-marinho, gambá, coelho, gorila,
búfalo, zebra, urso polar e onça, cujos modelos carregavam uma caixa de leite Parmalat, também de
pelúcia.
69
Figura 20 – Montagem de anúncios da promoção Mamíferos Parmalat – Versão 199663
Fonte: Propaganda em Revista
Logo após seu lançamento, a campanha64 tornou-se febre nacional. A
produção inicial contava com 300 mil pelúcias, no entanto, o sucesso da ação fez com
que a Parmalat aumentasse a produção para 15 milhões de unidades distribuídas até
o final da campanha. No dia 05 de maio de 1998, a campanha bateu recorde de 500
mil pelúcias distribuídas, sendo considerada a maior troca de ‘brindes’ já realizada no
país.
Durante a veiculação da campanha, foram distribuídos cerca de 17 milhões
de pelúcias, totalizando 55% do market share65 do segmento. A promoção serviu
como forma de fidelização da marca. A ação promocional aumentou o faturamento da
Parmalat, que lucrava anualmente R$ 38 milhões, passou a faturar a quantia de R$
Montagem dos anúncios de revista da Promoção Mamíferos Parmalat. “Promoção Mamíferos de
Pelúcia Parmalat” veiculado na Revista Nova, em janeiro de 1998; “A maior promoção do Reino
Animal”, veiculado na Revista Cláudia, em dezembro de 2006. Disponíveis em:
<http://www.propagandaemrevista.com.br/pesquisa/anunciante/parmalat/>. Acesso em: 01 nov. 2016
64 Dados retirados do site Propagandas Históricas. Disponível em:
<http://www.propagandashistoricas.com.br/2013/02/mamiferos-parmalat-1996.html > Acesso em: 10
out. 2006
65 O market share se refere à participação de mercado de uma empresa. Também desempenha um
importante papel na avaliação das dificuldades e da força de uma empresa e da aceitação dos seus
produtos.
63
70
1,87 bilhão, fazendo com que a marca se consolidasse como uma das três maiores
empresas de produtos alimentícios do Brasil. (DA COSTA MACHADO, 2010).
Figura 21 – Pelúcias da promoção Mamíferos Parmalat
Fonte: Rebobine66
Figura 22 – Montagem com frames do comercial Mamíferos Parmalat – Versão 1996
Fonte: Propaganda Histórica67
66
Disponível em: <http://www.rebobine.com/objetos/colecoes/item/388-cole%C3%A7%C3%A3oparmalat-bichinhos-de-pel%C3%BAcia.html> Acesso em: 15 out. 2016
67 Disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=mZOKGQZxH2k> Acesso em: 01 nov. 2016
71
4.1.3.1 Mamíferos Crescidos 2007
Em 2007, a Parmalat apostou na nostalgia ao recriar a campanha Mamíferos,
visando evidenciar o crescimento saudável dos mamíferos da versão de 1996 e do
público que também cresceu durante o período.
Figura 23 – Anúncio de revista Mamíferos Parmalat crescidos – Versão 2007
Fonte: Propagandas Históricas68
O filme Mamíferos Crescidos, de 2007, é um remake, também conhecido
como refilmagem, do comercial de 1996. Segundo DRUXMAN (apud CUNHA, 2015)
existem três tipos de remakes: the disguised remake, the direct remake e the nonremake69. O disguised remake, é uma adaptação de caráter livre e não pretende ser
associado ao seu material original. O direct remake, contém elementos que remetem
à obra original, mas admite alterações até mesmo no título. Já o non-remake, utiliza o
mesmo título da obra original, mas possui um enredo completamente novo. O
68
Imagem e comercial disponíveis em:
<http://www.propagandashistoricas.com.br/2014/05/mamiferos-parmalat-crescidos-2007.html>
Acesso em: 01 nov. 2016
69 O remake disfarçado, o remake direto e o não-remake. (tradução nossa)
72
comercial Mamíferos Crescidos utiliza o recurso de direct remake, pois visa
ambientalizar o filme com elementos idênticos ao da obra original.
O comercial consiste em apresentar os atores da versão original da
campanha, dez anos depois, vestindo a fantasia correspondente ao mamífero utilizado
na versão da campanha de 1996, visando provocar a sensação de nostalgia no público
que cresceu nesse período e acompanhou a campanha.
A campanha de evolução dos Mamíferos foi assinada pela Agência Africa,
considerada uma das dez maiores agências de publicidade do Brasil 70, e foi fundada
por Nizan Guanaes, co-criador da campanha original e idealizador da campanha
Mamíferos Crescidos.
Para criar uma atmosfera que remetesse à primeira campanha, manteve-se a
melodia do jingle original, apenas com pequenas adaptações em três estrofes da letra.
Na versão original, o jingle inicia com o seguinte trecho: “"O Elefante é fã de Parmalat
/ O Porco Cor de Rosa e o Macaco também são”. Já na versão de 2007, o trecho é
adaptado para "O Elefante agora está grande / O Porco Cor de Rosa e o Macaco
também estão.” O terceiro trecho que sofreu modificações foi “O Rinoceronte só quer
Leite Parmalat”, tornando-se “O Rinoceronte espichou com Parmalat”. Todas as
adaptações marcam a passagem de tempo. O restante do jingle não é alterado, e se
mantém como na versão original.
Figueiredo (2005, p. 111) diz que “jingles são peças cantadas compostas
especialmente para a marca anunciante. Sua melodia costuma ser simples e
cativante, fácil de ser repetida e cantarolada pelo ouvinte”. O jingle 71 da campanha
apresenta, além das características acima citadas, o uso de rimas72, tornando-o ainda
mais suscetível à fácil memorização. A mensagem musicada se tornou um ícone da
publicidade brasileira, sendo cantado e reconhecido até os dias de hoje.
A refilmagem do filme é composta por um cenário idêntico ao original, recriado
com os mesmos elementos e cores presentes na versão original. O vídeo de 60
segundos, inicia com o já clássico jingle, - adaptado para a passagem de década -
70
Disponível em: <http://www.revistapropaganda.com.br/materia.aspx?m=595>. Acesso em: 04 nov.
2016
71 Mensagem publicitária em formato de áudio ou vídeo, de curta duração, elaborada com o intuito de
ser lembrado com facilidade pelo público.
72 A rima consiste na repetição e coincidência sonora da última vogal tônica de um verso.
73
sendo tocado. No clipe, os mamíferos, agora adolescentes, tentam vestir as
minúsculas fantasias da época em que eram crianças. Entre tomadas, é exibido ao
telespectador cenas do clipe de 1996, cujos mamíferos adolescentes aparecem ao
lado de sua versão infantil, imitando fielmente gestos e falas de quando eram crianças.
Proporcionando a sensação nostálgica no telespectador, mediante comparação entre
as duas versões.
O jingle é interrompido pelo narrador, que anuncia a nova linha de leites
Parmalat, agora sob a assinatura “Longa vida é Parmalat. Parmalat é vida longa.”. O
termo “vida longa” presente no slogan reforça a justificativa de apresentar os
mamíferos agora crescidos: “os mamíferos cresceram, a família de leites Parmalat
também. Tem leite que faz bem para os ossos, para o intestino, para quem tem baixa
tolerância à lactose. Todos em novas embalagens recicláveis. Longa vida é Parmalat,
Parmalat é vida longa.”.
Após isso, o jingle é repetido, enquanto exibem-se cenas dos mamíferos
crescidos, intercaladas com cenas do vídeo de 1996. Entre tomadas73, alguns
personagens apontam para uma tela que exibe cenas do comercial original e emitem
frases como “sou eu” e “olha eu pequeninha”. A última cena do comercial é recriada
exatamente como a cena do comercial original, na qual aparecem os mamíferos
Gambá e Gato, proferindo a ilustre frase que encerrava o comercial original: “tomou?”.
Na linguagem cinematográfica, o termo tomada, ou take, é entendido como “tudo que é registrado
pela câmera desde o momento em que ela é ligada (REC) até o momento em que ela é desligada.
Um mesmo plano pode ser filmado várias vezes, gerando, assim, várias tomadas.”. (GERBASE,
2012)
73
74
Figura 24 – Montagem com frames do comercial Mamíferos Parmalat Crescidos – Versão 2007
Fonte: Mamíferos Parmalat (YouTube)74
4.1.3.1 Mamíferos Parmalat 2015
A Parmalat está de volta, e os mamíferos também.
A Parmalat apostou na premissa “A Parmalat está de volta, e os mamíferos
também” para divulgar sua nova linha de produtos e reposicionar a marca no mercado.
O sucesso da campanha não foi suficiente para sustentar a marca perante os
escândalos e crises financeiras e de imagem que a Parmalat vinha protagonizando,
causando o desaparecimento da marca do mercado brasileiro. Em 2015, o grupo
francês Lactalis iniciou o processo de reestruturação da empresa, anunciando em
maio do referido ano, o retorno da marca ao país, após adquirir fábricas e readquirir
os direitos sobre a marca no Brasil.
Após 20 anos do lançamento da primeira versão da campanha, a Parmalat
apostou novamente nos Mamíferos, com o objetivo de relançar a marca no mercado
74
Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=4gsLhLFnr8Y> Acesso em: 04 nov. 2016
75
brasileiro e redefinir seu posicionamento. A Parmalat, agora em sua nova fase,
apostou no resgate do vínculo emocional com o consumidor, anunciando uma nova
versão da campanha Mamíferos como estratégia principal do retorno da marca ao
país.
Para além de um comercial de 30 segundos para TV e internet, a campanha
de lançamento também é composta por ações nas redes sociais e nos pontos de
venda, mídia impressa e online. Adequando-se a tecnologia, um aplicativo para
dispositivos móveis que simula os mamíferos, chamado Mamificador, é disponibilizado
ao público. Nele, o usuário carrega uma foto e o aplicativo o transforma em um dos
mamíferos da campanha. A concepção da nova campanha ficou sob responsabilidade
do publicitário Ehr Ray, que há 20 anos foi co-criador da campanha original. A agência
de publicidade responsável pela nova versão da campanha Mamíferos é a BETC,
fundada e presidida por Ehr Ray.
Figura 25 – Captura de tela do site oficial anunciando o retorno da marca ao mercado brasileiro.
Fonte: Mamíferos Parmalat75
Após o anúncio de retorno ao mercado brasileiro em 2015, apresentando
novamente os Mamíferos, a empresa marcou sua volta com um filme de 30 segundos,
sustentado pelo slogan “Todo mundo é fã de Parmalat". Na nova aposta da marca,
além dos já conhecidos mamíferos presentes nas campanhas anteriores, são
75
http://mamiferosparmalat.com.br
76
apresentados ao público novos mascotes, agora de espécies típicas do Brasil, como
o bicho-preguiça, lobo-guará, tamanduá, tatu e jaguatirica.
Ray (2015), declarou que a Parmalat procurou o publicitário com o intuito de
relançar a campanha de 1996, utilizando as mesmas imagens reeditadas. A proposta
de relançamento foi refutada, contudo decidiu-se trabalhar em uma nova campanha
baseada no conceito original, adaptada para o momento atual, mas mantendo a
proposta original.
Figura 26 – Montagem com frames do comercial Mamíferos Parmalat – Versão 2015
Fonte: Mamíferos Parmalat (YouTube)76
76
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=TocdxWPMX94 Acesso em: 12 out. 2016
77
O jingle é novamente peça-chave e mantém, assim como nas versões
anteriores, a mesma melodia, alterando apenas partes da letra de acordo com a
versão repaginada.
Assim como na versão original de 1996 do comercial, bem como na
refilmagem de 2015, utiliza-se como enquadramento principal o plano médio,
caracterizado por Gerbase (2012), quando “a câmera está a uma distância média do
objeto, de modo que ele ocupa uma parte considerável do ambiente, mas ainda tem
espaço à sua volta.”.
O cenário e elementos presentes também permanecem iguais ao original. Os
mamíferos fantasiados remetem ao comercial realizado 20 anos atrás, como pode ser
observado através das figuras presentes no trabalho. O filme encerra com a marca
registrada do comercial, “tomou?”.
A ideia de apostar em uma nova versão da campanha foi corroborada através
de uma pesquisa de mercado nas redes sociais, que apontava para a popularidade e
associação da marca Parmalat à campanha Mamíferos. Ehr Ray, afirma “o objetivo é,
em primeiro lugar, mostrar que a antiga Parmalat voltou e reativar o sentimento de
confiança do consumidor”. A aposta da marca pela terceira vez na campanha
evidencia o apelo nostálgico que a Parmalat busca provocar no público.
O imenso sucesso dos Mamíferos Parmalat fez com que a marca recriasse
posteriormente a campanha, em meio à crise que sofria, visando apagar a imagem
ruim perante o mercado.
78
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
“Aquele que controla o passado, controla o futuro.
Aquele que controla o presente, controla o passado”
1984 - George Orwell
Esta monografia buscou responder à seguinte questão: como as marcas
utilizam o marketing nostálgico como estratégia de comunicação? Para
responde-la, foi importante compreender a nostalgia no contexto de consumo, dada
pela preferência de consumidores por adquirir produtos e serviços que remetessem a
épocas passadas. Soube-se que o interesse em reviver o passado, dá-se na relação
entre memória e o presente, expressa pelo fenômeno psicológico da nostalgia.
Entendeu-se também que esta relação é intrínseca à percepção de qualquer ser
humano.
Para tanto, foi apresentado o entendimento de memória coletiva que se
sustenta na constatação de que a memória de um indivíduo não é apenas individual,
visto que as recordações dos sujeitos são construídas socialmente enquanto
integrantes de grupos sociais. “A memória coletiva atuaria como uma reconstrução do
passado, adaptando a imagem dos fatos antigos às crenças e necessidades do presente”
(SCHWARTZ apud DA COSTA, 2014, p. 3).
Constatou-se que a nostalgia possui efeito positivo nos indivíduos, e isso
deve-se as memórias nostálgicas serem usualmente memórias felizes. Ao conectarse com o passado, os indivíduos relatam benefícios psicológicos, como o aumento de
bom humor e autoestima, redução de estresse, sensação de conexão social e
sentimentos positivos e esperançosos relacionados ao futuro. De certa forma, a
nostalgia pode ser comparada como um mecanismo de defesa psicológico, que tira o
foco dos indivíduos de emoções negativas, posto que o elo com o passado é realizado
através da lembrança de épocas mais prazerosas, ainda que ‘os bons tempos’ não
tenham sido, de fato, tão bons.
Nas análises realizadas, observou-se que a publicidade utiliza os valores
simbólicos e o imaginário coletivo de determinada época para acessar a subjetividade
dos consumidores.
79
O primeiro item analisado ‘Volkswagen: o Novo Fusca direto dos anos 1970’,
apresenta o Novo Fusca em um comercial pautado pelo estilo retrô, retratado em uma
dimensão de viagem no tempo, através da reconstrução de época da década de 1970.
A rememoração e o patrimônio histórico e emocional da marca Fusca pode
evidenciar a relação afetiva entre o consumidor brasileiro com o modelo popularmente
visto como clássico. A estratégia de apresentar o Novo Fusca ‘direto dos anos 1970’,
trazendo consigo as boas memorias dessa época, se deve à construção de conexões
emocionais entre o modelo original e o contemporâneo, que mostraram-se
determinantes no sucesso da campanha, pelo sentido afetivo. A utilização de diversos
elementos característicos da década de 1970, como objetos vintage, demostraram-se
influenciadores do despertar do ‘desejo antigo’ para o modelo contemporâneo,
chamando atenção dos consumidores com o apelo nostálgico no comercial.
O segundo item analisado, “Netflix: a homenagem aos anos 1980’, apresenta
a série Stranger Things como um baú contemporâneo de cultura pop da década de
1980. A série foi ambientada e tematizada com dezenas de referências
cinematográficas e elementos culturais, estéticos e musicais da década, além do
resgate de elementos e cenas de filmes clássicos de terror, suspense e ficção
científica dos anos 1980.
A imersão nostálgica foi apontada como o principal fator do sucesso da série
Stranger Things, que rapidamente consagrou-se como um dos produtos de maior
sucesso da Netflix. Stranger Things desperta no público resposta positiva e intensa,
baseada na memória afetiva e no culto à nostalgia ao mostrar o antigo de uma maneira
nova.
Já o terceiro item analisado, “Parmalat: a volta dos anos 1990”, evidenciou o
apelo nostálgico que a Parmalat buscou provocar no público, ao relançar sua
campanha de maior sucesso, Mamíferos Parmalat, vinculada originalmente em 1996,
com nova vinculação nos anos de 2007 e 2015. As campanhas de 2007 e 2015
mantiveram o mesmo cenário, estilos de fantasias e elementos presentes na campanha
de 1996, assim como o histórico jingle, que manteve a mesma melodia nas três versões
da campanha, possuindo alterações apenas em partes da letra, de acordo com a versão
repaginada.
80
Em 2007, sob o nome Mamíferos Crescidos, a Parmalat resgatou os atores
da versão de 1996, já crescidos, visando evidenciar o crescimento saudável das
crianças, provocando a sensação de nostalgia no público que também cresceu durante o
período. Já em 2015, após escândalos de imagem e crises financeiras, a Parmalat
apostou no resgate do vínculo emocional com o consumidor como estratégia principal
para anunciar o retorno da marca ao país, anunciando uma nova versão da campanha
Mamíferos sob a premissa ‘A Parmalat está de volta, e os mamíferos também’, após 20
anos do lançamento da campanha original.
Os exemplos apresentados demonstraram formas em que o marketing
nostálgico
é
utilizado
pela
publicidade
como
uma
maneira
de
conectar
emocionalmente marcas ao passado dos consumidores. A nostalgia permite reviver
memórias criando associações positivas às marcas, que proporcionam, através do
apelo nostálgico, a evocação de boas memórias de um determinado momento do
passado. Sua utilização como ferramenta em campanhas publicitárias, demonstrou
favorecer a aceitação do que é apresentado aos consumidores, pela ativação do
desejo de reviver lembranças através do consumo simbólico do passado.
As táticas centradas na nostalgia fortalecem a publicidade do século XXI, a
conecta com diversas áreas do conhecimento e, contribui na sua relação com a
sociedade, favorecendo seu desenvolvimento social. Entende-se, que a publicidade
transmite os benefícios de marcas e produtos anunciados através de seu cunho
emocional e psicológico, evoca memórias e recordações dos ‘bons tempos’, e ilustra
a valorização contemporânea do passado pelo consumidor hipermoderno, que não
mais se contenta com a mera funcionalidade dos bens de consumo e busca a conexão
emocional e os valores intangíveis dos mesmos.
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