Universidade Estadual de Campinas Faculdade de Engenharia Civil Relatório Final de Atividades BOLSA DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA – PIBIC/CNPq Iconografia dos Conceitos da Psicologia Ambiental Doris C. C. K. Kowaltowski (orientadora) Marília Rondineli Anderson RA: 003216 (bolsista) Julho 2004 RESUMO A psicologia ambiental trata principalmente da percepção humana do ambiente que envolve o indivíduo e os resultantes sentimentos em relação a este mesmo ambiente (GIFFORD, 1997). O meio ambiente exerce uma influência direta no indivíduo, esteja este vivendo em comunidade ou mesmo em um ambiente isolado. A interação do homem com este meio causa efeitos diretos naquele e que irão nortear o seu modo de vida. Este projeto de pesquisa documenta estas relações a fim de ilustrar o comportamento e a função dos elementos arquitetônicos nas mesmas. O arquiteto, para se orientar e fundamentar as suas decisões projetuais, dificilmente encontra iconografias e imagens ilustrativas e didáticas na bibliografia da área. Principalmente nas obras teóricas de arquitetura, há pouca referência direta à psicologia ambiental e a sua inserção no processo criativo em projeto. Sabe-se também que a linguagem do projetista é o desenho, e a iconografia, seja de imagens, fotografias, diagramas e desenho são o material de maior impacto didático no processo criativo. A metodologia, deste projeto, propôs caracterizar em primeiro lugar os grandes temas da psicologia ambiental, tais como: espaço pessoal, territorialidade, segurança psicológica, privacidade e densidade territorial. A partir da pesquisa bibliográfica destes temas, procurou-se caracterizar situações que representem estes temas e documentá-las. As imagens sobre o tema foram captadas através de uma câmera fotográfica em locais previamente analisados e escolhidos da cidade de Campinas. Também foram feitos diagramas e desenhos de comportamento específico observado. 2 INTRODUÇÃO A pesquisa bibliográfica concentrou-se principalmente nos conceitos da psicologia ambiental e nos exemplos que são citados na literatura para cada um destes conceitos. O meio ambiente exerce uma influência direta no indivíduo, esteja este vivendo em comunidade ou mesmo em um ambiente isolado. A interação do homem com este meio causa efeitos diretos naquele e que irão nortear o seu modo de vida. A psicologia ambiental nasce, então, das relações do homem com o meio ambiente que o envolve. É este envoltório que irá determinar as associações físicas com o espaço, irá contextualizar o indivíduo na sociedade, irá qualificar o seu bem estar no ambiente. Ao mesmo tempo, o ambiente físico e social é fértil em possibilidades de transformações, de estímulos, instruindo o homem a ter uma convivência de constantes trocas de informações, ações e reações, e que vai originar o comportamento social, pois tanto o homem exerce suas influências sobre o meio, como este mesmo meio irá exercer fortes influências sobre ele. Gifford (1976) diz que o homem é o grande modelador do ambiente natural na bus ca pelo conforto, mas também é modelado pela sua criação e existe um perigo no resultado do projeto: os usuários não são consultados durante a evolução do processo projetual. Os conceitos de “environmental numbness x environmental awareness” foram criados para demonstrar as possíveis reações dos usuários com estes ambientes. “Environmental numbness”, ou a apatia causada pelo ambiente físico, causa uma espécie de paralização no indivíduo, como em ambientes públicos e semi-públicos onde o usuário raramente exerce alguma atitude em relação às situações desagradáveis como sons indesejáveis, arranjo do mobiliário incompatível com o local; mesmo insatisfeito não considera modificações para o uso adequado e possíveis rearranjos. No “environmental awareness”, ou a percepção ativa do ambiente físico, ocorre o oposto. O ambiente possui atrativos e configurações próprias para a sua 3 manipulação, evoca a percepção do usuário considerando a importância de sua participação para o eficiente funcionamento do espaço seja em suas características de funcionalidade, adequação dos indivíduos no local, conforto ambiental e potencialidade dos elementos arquitetônicos, gerando um comprometimento entre usuário e ambiente. O conceito de consciência (“awareness”) da possibilidade de interferência é precursor da ação ambiental do indivíduo, solucionando problemas em relação ao ambiente no qual ele insere os seus conhecimentos, experiências e as próprias emoções, procurando humanizar o espaço ocupado. Sommer (GIFFORD, 1976) mostra a importância da ação desta consciência. Propõe em seus estudos o estímulo à interação com o ambiente desde a infância como forma de apreciação cognitiva e afetiva com o local vivenciado; a utilização do espaço através de uma ética ambiental de uso; a aplicação de simulações no ambiente educacional motivando a maior participação e integração, estimulando a tomada de decisões e questionamentos acerca do ambiente social. O histórico da psicologia ambiental é bastante recente. Lee (1977) diz que o interesse coletivo pela área de pesquisa começou a partir da década de 60 com a Conferência sobre Psicologia e Psiquiatria Ambiental que aconteceu em Salt Lake City em 1961. O crescimento deu-se com a criação da Pilkington Building Research Unit, na Universidade de Liverpool, e da Building Performance Research Unit, na Universidade de Strathclyde, ambas na Grã-Bretanha. Impulsos significativos ocorreram com as conferências interdisciplinares patrocinadas pela EDRA (Environmental Design Research Association) nos Estados Unidos. Outro fato a salientar é que o psicólogo ambiental é interdisciplinar, envolvendo a antropologia, sociologia, ergonomia, a engenharia e os meios de planejamento, e a arquitetura. O estudo destas relações entre o ambiente construído e o comportamento humano ficou conhecido como RAC (Relação Ambiente Comportamento), pois elas expressam a relação direta do usuário com o ambiente utilizado, fazendo com que o auxílio das ciências sociais e das geociências seja imprescindível, já que as inter-relações ocorrem com o espaço 4 físico, com as variáveis climáticas, com as características biológicas dos indivíduos e com o comportamento humano (SOMMER, 1972). Existem muitas metodologias de observação e análise do ambiente físico relacionado ao comportamento humano. Muitos estudos usam a observação direta, a aplicação de questionários e análises específicas do ambiente. Três métodos merecem destaque: “Behavior setting”, Mapeamento ambiental e Mapas cognitivos A metodologia das “behavior setting”, também conhecidas por cenários comportamentais, classifica o ambiente em categorias de acordo com o tempo de ocupação dos usuários; com o envolvimento e o comprometimento dos ocupantes em relação ao ambiente; com os aspectos comportamentais através da freqüência, duração e intensidade de ações no local e com a variedade de comportamentos possíveis neste cenário. (BARKER, 1964). A metodologia do mapeamento ambiental entende as relações humanas com o ambiente através de observações das ações do homem neste mesmo ambiente e de sua interação com os outros indivíduos. Neste caso, a pesquisa ambiental necessita de um mapeamento do ambiente físico e da maneira como este vai interferir e/ou estimular o comportamento do homem. Geralmente este método adota a exploração de recursos gráficos e audiovisuais. São usadas fotografias do local durante a ocupação, gravações em vídeo, diagramas dos eixos de circulação mais utilizados, simulação de situações novas para o cotidiano do usuário, além de sugestões quanto à configuração arquitetônica para melhores resultados futuros. As entrevistas com vários usuários também têm sua contribuição, já que deve ocorrer a troca de informações entre o pesquisador, o usuário, o projetista original, os responsáveis pelo local, enfim, as pessoas envolvidas com a situação. De acordo com Sanoff (1991), pontos de referência do meio urbano também são importantes para um completo mapeamento ambiental. A atenção para construções vizinhas, arborização local, vias de acesso, presença de grandes avenidas ou parques são contribuintes para a identificação com o local e o 5 reconhecimento visual. Para o homem é importante este posicionamento físico e temporal na assimilação de todo o ambiente envolvido. Características típicas do local ajudam o nosso senso de direção, assim como modificações de marcos essenciais podem nos afetar de forma negativa, como no caso de demolições e interferências no trânsito de automóveis. Nos mapas cognitivos podemos citar novamente Sanoff (1991), que propõe para a pesquisa sobre o ambiente construído a extração de informações através das interpretações cognitivas do indivíduo acerca do ambiente. A cognição está relacionada com a familiaridade e a lembrança que a pessoa possui de um dado espaço (OKAMOTO, 1999). A importância dos mapas cognitivos é que eles mostram o processo de transformação psicológica do indivíduo na assimilação e decodificação do ambiente, determinando a ação individual no espaço ambiental utilizado. Para Downs e Stea (SANOFF, 1991) um mapa cognitivo não é necessariamente um mapa, mas sim uma análise funcional das ações do usuário em seu ambiente de vivência. A fácil visualização de marcos urbanos em uma cidade faz com que esta seja legível, trazendo segurança psicológica às pessoas que por ela transitam. Além disso, os marcos fixam-se na memória das pessoas. Fig. 1 Catedral Metropolitana de Campinas 6 Esta compreensão do ambiente pode ser demonstrada através da observação e de questionários verbais, ou pelas “auto–análises” sobre o ambiente, transformado em informações verbal, escrito ou visual. Um cuidado maior deverá ser despendido nesta segunda forma já que o caráter subjetivo da observação tenderá a prevalecer. O próprio ambiente pode influenciar o modo de aplicação dos mapas cognitivos uma vez que fornece aspectos singulares de suas propriedades espaciais. A intenção de aliar a psicologia à arquitetura deve propiciar a transformação do ambiente habitável em um local adequado às necessidades de conforto e vivência do homem. Por isso, a interação do ambiente com o indivíduo torna-se tão importante tanto em seus aspectos construtivos, quanto na percepção destes aspectos. O estudo da psicologia ambiental entende que o ambiente físico exerce uma série de influências no homem que serão exteriorizadas através do comportamento, das emoções, das percepções e do julgamento que o indivíduo faz acerca do espaço que o envolve. Estes julgamentos aparecem sob a forma de ações que o próprio indivíduo realiza ou da forma como ele apropria-se do espaço, demonstrando a sua satisfação, familiaridade, repulsa ou isolamento em relação ao ambiente. Segundo Okamoto (1999), “não vemos a realidade absoluta, mas uma realidade que é percebida através de 15 sentidos que reagem aos estímulos externos e internos, filtrada por condicionantes físicos, mentais e conceituais”. A percepção do espaço passa também por um processo de regulação de distâncias que podem ser pessoais ou sociais, considerando as influências e regras culturais, a sensação de medo e/ou segurança que o ambiente oferece, a disposição dos elementos arquitetônicos. Estas influências fazem com que o indivíduo crie um “entorno próximo” no qual ele sente que tem completo domínio sobre o que o envolve e no qual ele possui segurança para interagir com o meio. Quatro conceitos são aplicáveis para a caracterização da qualidade do ambiente e 7 a interação do homem com este espaço físico: privacidade; espaço pessoal; espaço territorial e densidade territorial. No conceito de privacidade, cada indivíduo percebe, sente e atua em um ambiente conforme o seu ponto de vista, o que vai originar um espaço ao seu redor no qual ele está apto a agir com naturalidade e confiança. Para que a noção de privacidade seja estabelecida, é preciso reconhecer as seguintes etapas que conformarão o espaço individual: percepção, cognição e comportamento. Na percepção do espaço físico ocorre o acúmulo de informações acerca do ambiente e que são adquiridas através dos sentidos: visão, olfato, sensação táctil e audição. A observação dos objetos e cenas também contribuem para o acúmulo de informações. No processo cognitivo, as informações colhidas durante a percepção já começam a ser processadas e armazenadas. A memória recupera outras informações e influências anteriores como cultura e aspectos familiares, para que novas conexões sejam feitas. Neste momento, sensações como satisfação, conforto, aceitação são apropriadas pelo indivíduo. O estágio comportamental vem como resposta a tudo o que foi “colhido” até este momento. A partir da estrutura cognitiva, o indivíduo toma uma série de ações de controle para converter o esquema existente num esquema ideal (LEE, 1977). Este esquema ideal transforma-se no espaço exclusivamente pessoal, onde qualquer ameaça desagradável pode transformar-se num sentimento de invasão, cuja tendência será, então, a repulsa. O espaço pessoal é um espaço imaginário em torno do indivíduo onde este impõe limites evitando uma aproximação indesejável por parte de outras pessoas. O homem está envolvido pelo meio; então, é natural que ele delimite a sua zona pessoal, ou seja, o seu entorno mais próximo e onde ele tem completo domínio (SOMMER, 1969). Para definir melhor os conceitos acerca do espaço pessoal o antropólogo Edward T. Hall (1977) demonstra em seu livro “A Dimensão Oculta”, como este espaço é utilizado nas diferentes culturas. Para ele, a percepção do espaço é 8 dinâmica, relacionando-se com a ação num dado espaço, em vez de relacionar-se com apenas a visão através da observação passiva. Com isso, coloca o senso espacial do homem em diferentes situações, nas quais este demonstra graduadas reações e personalidades, que abrangem a esfera íntima, pessoal, social e pública. Estas são as quatro zonas de distância descritas por Hall e são definidas como “proxêmica”, ou seja, a ciência que estuda os modos como o espaço é usado enquanto forma de comunicação. É como se existissem fronteiras definindo o modo de agir do indivíduo conforme ele ultrapassa ou não os limites. É onde o alcance dos sentidos irá exercer a maior influência assim como o alcance dos braços na regulação da distância. No espaço territorial, o indivíduo necessita de uma “demarcação” para que ele sinta que pertence ao meio ou, que o meio pertence a ele. Neste caso, não é mais uma relação de proximidade com os outros elementos e sim de possessividade. O sentimento egocêntrico impera e todo movimento é centrado ou realizado ao redor do indivíduo. “O território é uma estruturação do espaço estático (através do qual se movimenta o espaço pessoal) a cujo respeito uma pessoa experimenta um certo sentimento de posse” (LEE, 1977). O ambiente físico é o maior envolvido na questão e a demarcação do território pode ter caráter fixo como a própria residência ou o local de trabalho. A determinação de um território temporário, tal como que é utilizado por indivíduos que estão em trânsito, é feita através da colocação objetos pessoais no ambiente de forma visível. O território temporário pode ter a forma de um acampamento ou até a demarcação do lugar em uma poltrona em uma sala de espera ou restaurante. O espaço físico é um elemento vital para que o indivíduo possa realizar as suas tarefas cotidianas. A demarcação deste espaço mostra as atitudes e características de ocupação, que podem ter um sentido de posse, personalização, defesa ou exclusão de uso. Ao demonstrar a posse o indivíduo usa marcadores para indicar a sua presença: bolsas, revistas ou outros objetos pessoais. Para personalizar o 9 ambiente, ele utiliza elementos de identidade, como crachás, placas sobre a mesa de trabalho ou diante da porta da sala ocupada, bem como a exposição de objetos pessoais como o retrato dos filhos, por exemplo. Nas atitudes de defesa utiliza faixas de segurança não permitindo a passagem (no caso de museus, quando não é permitida a aproximação com o objeto exposto), delimitações de garagens com dizeres ou cores específicas das leis de trânsito. Também na demonstração de exclusão de uso, para dizer que o local já foi desocupado, o indivíduo utiliza-se de alguns “códigos” como guardanapos desordenadamente dobrados sobre a mesa de refeição, por exemplo. No conceito de densidade territorial os índices populacionais também estão relacionados com as questões da proximidade e com as experiências coletivas, influenciando o bem-estar do homem. O comportamento do indivíduo pode sofrer alterações quando este está inserido em grandes massas populares e multidões. O impacto da densidade sobre ele pode causar atitudes positivas, negativas, mudança de caráter e personalidade. A sensação denominada “crowding” talvez seja o maior problema e perturbação que o indivíduo pode sofrer quando as condições individuais de territorialidade e privacidade são violadas. A sensação de sufocamento e fobia podem tornar-se exacerbadas em uma situação pública e a exteriorização deste sentimento pode revelar-se sob a forma de um comportamento influenciado pela multidão ou até a vontade de estar em completo anonimato, o “passar sem ser visto”. A densidade está relacionada com o ambiente físico. Neste aspecto, alguns fatores são condicionantes para o sentimento de crowding: a escala do ambiente versus a taxa de ocupação; a intensidade da iluminação; o arranjo do mobiliário e até a existência de paredes em formas curvas. A verticalização intensa do espaço urbano causa sensações de insegurança e desconhecimento do “mapa urbano”. A falta de privacidade e a diminuição da qualidade de entrosamento com a vizinhança podem causar aumento de “stress” no indivíduo e distúrbios mentais pela sensação de solidão, mesmo estando em um espaço 10 populoso. Estas situações podem levar ao consumo de drogas e aumento da violência (GIFFORD, 1997). Os conceitos que foram apresentados (privacidade, espaço pessoal, territorialidade e densidade) são de grande importância em estudos relacionados com o comportamento humano no ambiente construído. Eles fornecem os subsídios para verificar a eficiência destes espaços nos aspectos sociais, pessoais, de trabalho, produtividade e também no ambiente de aprendizado, a escola. Através deles podemos estudar como a arquitetura está influenciando e satisfazendo ou não, a vivência de cada usuário, fornecendo subsídios de futuros projetos, ou a introdução de melhorias nas edificações existentes. A teoria arquitetônica trata da relação ambiente físico/comportamento humano principalmente através de recomendações projetuais. Textos clássicos e trabalhos em ecologia humana relacionam elementos arquitetônicos com a escala e proporções do ambiente físico. Configurações espaciais específicas como nichos, caminhos, acessos; a distribuição de luz no ambiente, através da relação entre as aberturas e o espaço físico, a intensidade das cores, texturas, e seus respectivos efeitos sobre o usuário e também a simbologia de cada elemento presente na obra são discutidas para uma humanização da arquitetura (KOWALTOWSKI, 1980). Em 1959, Rasmussen dizia em sua obra “Experiencing Architecture”, que a arquitetura deve ser facilmente compreensível para as pessoas já que ela está relacionada com a vida cotidiana do homem. O arquiteto deve buscar formas e elementos que estimulem a relação homem/ambiente. O espaço projetado pode trazer a sensação de conforto ou segurança, ou imprimir uma característica de ambiente social e coletivo ou então individual e íntimo. Através da vivência com os diversos espaços construídos, o homem vai somando as suas experiências individuais e aprende a conviver com o que a arquitetura lhe oferece. Segundo o autor, o arquiteto dispõe de diversos elementos para criar o ambiente apropriado, através da integração de elementos naturais, do emprego dos materiais na obra e até mesmo de sua própria vivência como projetista e diz que “para sentir a arquitetura, é preciso estar consciente de todos estes elementos”. 11 Com relação ao conforto do ambiente e ao espaço habitável, podemos citar Alexander (1977) e seus métodos para o projeto arquitetônico conforme situações que requerem diferentes resoluções. Como exemplo, os espaços pequenos muito densos que podem provocar danos psicológicos e sociais como a falta de privacidade individual ou para casais, a tendência para situações claustrofó bicas, afetando o conforto das pessoas. São situações que representam a preocupação com as proporções da edificação e sua configuração espacial em relação ao bem estar do usuário. A mesma preocupação recai sobre a questão da iluminação no interior de um ambiente e o excesso de iluminamento artificial que as edificações modernas utilizam. A necessidade de luz natural é imprescindível para a manutenção das energias indispensáveis ao corpo humano. Voltando à Rasmussen (1998), ele cita o caso das moradias holandesas e a escassez de espaço no solo para o distanciamento entre as construções. Como a grande parte do território da Holanda deriva de aterros, as casas foram sendo construídas de forma contígua, restando apenas as fachadas frontais e posteriores para a iluminação natural. Daí a necessidade de utilizar toda a extensão da fachada para captar a luz solar. O pé direito próximo dos quatro metros possibilitava o aproveitamento através de dois dispositivos: a parte inferior com janelas de madeira que ficariam abertas durante o dia e em dias ensolarados, e a parte superior com caixilhos de ferro e vidros fixos para iluminar o interior nos dias de chuva e frios. Ao longo da história da arquitetura, vamos conhecendo exemplos que promovem a integração do homem com o meio envolvente e fornecem soluções funcionais, estéticas e conceituais que podem ser incorporadas aos novos projetos desde que contextualizadas com o ambiente em que estará inserido, o entorno envolvente e as necessidades do novo usuário. Este projeto de pesquisa visou documentar uma iconografia deficiente na literatura da Psicologia Ambiental para auxiliar os professores e projetistas no ato de ensinar e de projetar, respectivamente. 12 METODOLOGIA A metodologia constituiu-se da construção de uma tabela que resume e organiza o trabalho teórico, caracteriza o comportamento humano e os elementos arquitetônicos para cada um dos temas e também aborda a pesquisa e a avaliação feita nos ambientes. A partir da tabela, os ambientes que acomodam a lista de comportamentos e elementos arquitetônicos caracterizados foram pesquisados, avaliados e observados. A metodologia adotada utilizou a observação em campo para que a próxima etapa pudesse ser iniciada, ou seja, para que pudessem ser agendadas as observações e registros dos comportamentos em relação aos elementos arquitetônicos em horários estratégicos. Os registros das imagens foram feitos através de uma câmera fotográfica digital em locais públicos da cidade de Campinas como praças, ruas, comércios, e equipamentos urbanos do centro da cidade e também no Parque Portugal Lagoa do Taquaral. Depois de registradas, as imagens foram compiladas e organizadas de maneira que fossem melhor inseridas nos conceitos da Psicologia Ambiental que representam. RESULTADOS A tabela a seguir apresenta a resultante da pesquisa bibliográfica. Ela está dividida por conceitos da psicologia ambiental e fornece suas definições. As iconografias relacionadas às definições estão mais abaixo relacionadas e explicadas. 13 TABELA DAS DEFINIÇÕES DOS CONCEITOS DA PSICOLOGIA AMBIENTAL. CONCEITO PERCEPÇÃO DEFINIÇÕES ? Apreensão do estímulo imediato do ambiente (BETCHEL, 1997). ? A percepção é multisensorial. Ainda que de predominância visual, a percepção tem nos demais sentidos, a confirmação das impressões obtidas pela visão (OKAMOTO, 1999). ? Compreender, sem precisar, necessariamente, de um estímulo externo. São provindos da Cognição: imaginar, aprender, criar, relembrar, pensar (BETCHEL, 1997). COGNIÇÃO ? A cidade tem que ser legível para uma pessoa formar um mapa cognitivo do local e encontrar seu caminho ao redor dele (LYNCH, 1997). ? A cognição está muita associada à maneira de achar o caminho e aos problemas associados a isso, seja utilizando os elementos, estimando distâncias e desenvolvendo estratégias (BETCHEL, 1997). PRIVACIDADE ? Comportamento a partir de uma estrutura cognitiva. Converte o esquema existente num esquema ideal. Perde-se a privacidade quando o espaço pessoal é invadido e então ocorre a repulsa (LEE, 1977). ? Bolha carregada de emoções na qual cada indivíduo é envolvido individualmente (SOMMER, 1972). ESPAÇO PESSOAL ? O espaço pessoal demonstra a importância da distância entre as pessoas, com interação ou não, e como essa distância é influenciada por situações particulares definidas pela cultura, pelo motivo adotado pelo invasor da “bolha” e pela presença ou ausência de outras pessoas (BETCHEL, 1997). ? Diferentes culturas percebem e agem de maneiras diferentes às diversas distâncias que podem ser da esfera íntima, pessoal, social ou pública (HALL, 1977). 14 CONCEITO DENSIDADE DEFINIÇÕES ? Alta densidade: espaço não habitável, no qual não há conforto ambiental (ALEXANDER, 1977). ? Escala do Ambiente X Taxa de Ocupação (GIFFORD, 1976). ? Sensação de apinhamento, falta de espaço para iluminação e conforto. Causa insegurança, falta de privacidade e/ou individualidade e qualidade de vida. Nada estimulante para a relação homem/ambiente (RASMUSSEN, 1998). ? É necessária para uma boa qualidade de vida que o espaço seja facilmente reconhecido e identificado pelo homem (SANOFF, 1991). ? Cenário, cognição, legibilidade. Marco, nó, vias, limites (LYNCH, 1997). ? Está relacionado com a familiaridade e a lembrança que a pessoa possui de um dado espaço – Cognição (OKAMOTO, 1999). SEGURANÇA PSICOLÓGICA ? ? O território é um espaço geográfico existente e fixo que pode ser defendido quando invadido. Ele é sempre marcado por limites que são facilmente percebidos (BETCHEL, 1997). ? “O território é uma estruturação do espaço estático (através do qual se movimenta o espaço pessoal) a cujo respeito uma pessoa experimenta um certo sentimento de posse” (LEE, 1977). ? Há sete tipos de demarcações: primário, secundário, público, interação, do corpo, do objeto, da idéia (HALL, 1977). TERRITORIALIDADE 15 As imagens abaixo relacionadas representam e exemplificam os conceitos da Psicologia Ambiental A figura 2, uma praça pública, é percebida pelos transeuntes como um local de passagem pelo fato de possuir poucos elementos que fixam as pessoas nesses locais, como bancos e árvores. Fig. 2 Praça Visconde de Indaiatuba - Largo do Rosário A grande árvore destacada neste espaço (figura 3) transmite segurança e acolhimento para a pessoa que se senta no banco abaixo dela. Existe uma relação entre a árvore e o banco, mas não houve, nesse caso, um bom estudo da sombra que o elemento natural poderia proporcionar ao elemento construído, o que transmitiria um maior conforto para a pessoa em dias de calor. 16 Fig. 3 Parque Portugal Lagoa do Taquaral A percepção visual do ambiente registrado na figura 4 faz com que as pessoas sintam -se calmas e protegidas pelas boas sombras das árvores. O conjunto árvore, terra e água corrente possuem este potencial. Fig. 4 Parque Portugal Lagoa do Taquaral 17 As grandes árvores agrupadas (figura 5) geram uma agradável sombra para as pessoas sentadas sob suas copas. Há, nesse caso, uma boa relação entre elemento natural e elemento construído. Fig. 5 Parque Portugal Lagoa do Taquaral As árvores altas e muito próximas umas das outras (figura 6) transmitem a sensação de proteção, mas ao mesmo tempo, gera insegurança pelo fato de estarem localizadas em um local afastado do parque público. E a densidade da vegetação dificulta a visibilidade e o controle da área e, assim, há a sensação de criar esconderijos para pessoas mal intencionadas. 18 Fig. 6 Parque Portugal Lagoa do Taquaral O teatro de arena, registrado na figura 7, gera na pessoa um estímulo que faz com que ela imagine ou relembre algo que ali já foi visto ou que possa ainda ver. Fig. 7 Parque Portugal Lagoa do Taquaral 19 As cadeiras dos engraxates de sapatos da figura 8, munidas de guardasóis, proporcionam uma sensação de privacidade aos clientes em plena praça central da cidade. Essa atividade fixada nesse local e na memória das pessoas, pelo fato de ser uma profissão tradicional, também gera segurança psicológica. Fig. 8 Praça do Fórum O amplo espaço público munido de uma boa relação entre elemento natural e elemento construído (figura9) também é capaz de fornecer privacidade ao casal. Fig.9 Parque Portugal Lagoa do Taquaral 20 Nas duas próximas imagens, o espaço ao redor do grande teatro de arena dá privacidade tanto para o homem lendo jornal sozinho (figura 10) quanto para o casal que conversa com tranqüilidade (figura 11). Fig. 10 e 11 Parque Portugal Lagoa do Taquaral A alta poluição visual do calçadão comercial da figura 12 faz com que os transeuntes passem mais rápido por ela, pois gera um maior movimento das pessoas e até uma sensação de anonimato para quem está inserido na multidão de consumidores. Fig. 12 Rua 13 de Maio 21 A figura 13, registrada em um ponto de ônibus, demonstra uma distância regular entre as pessoas. Já a figura 14, com o casal sentado no banco, demonstra uma aproximação de intimidade. Fig. 13 Ponto de ônibus no Centro Fig. 14 Largo do Rosário Na figura 15 é possível visualizar as distâncias entre as pessoas que são desconhecidas, próximas ou íntimas. Além disso, verifica-se um desvio no caminho habitual das pessoas, o que faz com que sintam uma falta de segurança psicológica. Fig. 15 Faixa de pedestres na Avenida Francisco Glicério Nas duas próximas imagens (figuras 16 e 17), o grande teatro de arena está sendo utilizado por uma grande multidão em um evento. Houve neste projeto arquitetônico, uma falta de estudos da insolação e da acústica do formato da “concha”. O palco está mal posicionado em relação ao sol, o que atrapalha a visão 22 da platéia e a sua forma espacial é pouco apropriada para as atividades previstas, pois não direciona o som para o público. Fig. 16 e 17 Parque Portugal Lagoa do Taquaral Os troncos das árvores e os viveiros dos passarinhos da figura 18 protegem o homem no banco (principalmente as costas) da movimentação principal do parque, gerando, além de segurança psicológica, privacidade. Fig. 18 Parque Portugal Lagoa do Taquaral A utilização dos espaços públicos pelo comércio informal faz com que os comerciantes criem maneiras de marcar seu próprio território. Na figura 19, por exemplo, a demarcação foi feita com um guarda-sol. Na figura20, com um 23 carrinho. Os comerciantes se aproveitam de vantagens fornecidas por elementos arquitetônicos com pilares e coberturas. Fig. 19 e 20 Pontos de ônibus do Centro da cidade de Campinas A invasão do território público pode ser visualizada nas figuras 21 e 22. A primeira mostra pessoas acampadas em praça pública. A segunda, um carro da polícia em cima da calçada em frente ao Fórum, o que demonstra que o marco tradicional não é suficiente para manter a ordem, a segurança e o respeito em seu entorno. 24 Fig. 21 Largo do Rosário Fig. 22 Praça do Fórum CONCLUSÕES O estudo, conduzido para investigar possíveis iconografias representativas dos conceitos da Psicologia Ambiental mostrou que há muitos exemplos desses conceitos a serem registrados, compilados e documentados. Os registros deveriam ser feitos nos mais diversificados espaços físicos do mundo e nas mais variadas culturas também, para que um estudo científico mais profundo possa ser feito com essas imagens. Essa iconografia deveria ser transmitida a arquitetos e urbanistas, além de psicólogos ambientais, para que possam enriquecer suas pesquisas e, através delas, possam melhorar os espaços físicos criados. Através dessas imagens, a compreensão desse assunto torna-se simples e prática. A humanização da arquitetura deveria ser mais profundamente estudada pelos profissionais da área para que os espaços físicos interfiram na vida das pessoas de maneira a melhorar sua qualidade. Conclui-se também que os elementos naturais são um dos elementos mais importantes para a humanização da arquitetura 25 Ainda há muita discussão a ser feita sobre esse assunto e essa iconografia pode ajudar nesse aspecto. CONCLUSÃO DE APRENDIZADO PESSOAL A segunda parte da pesquisa foi fundamental para a compreensão dos conceitos da Psicologia Ambiental através das imagens registradas em campo. Sua análise foi essencial para que eu pudesse observar mais especificamente os diversos ambientes e elementos arquitetônicos da cidade de Campinas e pudesse assim, registrar o comportamento das pessoas em relação a esses. Para mim, ficou claro que, com as iconografias, o entendimento dos conceitos da Psicologia Ambiental torna-se mais simples e claro. Acredito que as pesquisas devem continuar a ser complementadas, a partir de mais registros nas mais diversas cidades e culturas do mundo, pois isso ajudaria os profissionais da área a terem uma referência iconográfica para tomarem melhores decisões projetuais. Pessoalmente, a pesquisa acrescentou muito ao meu aprendizado na área de projeto de arquitetura e urbanismo, principalmente na de espaços públicos como praças, ruas e parques. Esse estudo mostrou-me que os arquitetos têm que 26 voltar seus projetos para a humanização da arquitetura, pois ela influencia muito no comportamento dos usuários dos espaços projetados. Vivenciar e observar esses comportamentos e elementos arquitetônicos me fez refletir e me levou a pensar em projeto de uma maneira mais humanizada, não levando em consideração apenas os fatores físicos do espaço, mas os fatores humanos também. BIBLIOGRAFIA Alexander, C. ; Ishikawa, S. ; Silverstin, M., “A Pattern Language”, Oxford University Press, New York, 1977. Barker, R.,Gump, P. V., “Big School, Small School, High Scholl Size and Student Behavior” , Stanford University Press, Stanford, California,1964. Betchel, R. B., “Environment e Behavior: an Introduction”, Sage Publications, Londres, 1997. Cullen, G., “Paisagem Urbana”, Edições 70, Lisboa, 1983. Del Rio, V. e Oliveira, L. (org), “Percepção Ambiental: A experiência brasileira”, Studio Nobel: UFSCar, São Paulo, 1996. Gifford, R., “Environmental Psychology: Principles and Practice”, Allyn and Bacon, Boston, 1997. Hall, E. T., “A dimensão oculta”, Francisco Alves Editora S/A, Rio de Janeiro, 27 1977. Kowaltowski, D.C.C.K., “Humanization in Architecture: Analysis of Themes Through High School Building Problems”, Tese, University of California, Berkeley, 1980. Lee, T., “Psicologia e Meio Ambiente”, Trad. Álvaro Cabral, Zahar Editores, Rio de Janeiro, 1977. Lynch, K., “A imagem da cidade”, Martins Fontes, São Paulo, 1997. Mira, R. G., “Psicologia y Medio Ambiente: Aspectos Psicosociales, Educativos y Metodológicos”, Asociación Galega de Estudios e Investigación Psicosocial A Coruna, Galícia, 2002. Okamoto, Jun, “Percepção Ambiental e Comportamento”, Ipsis Gráfica e Editora S/A, São Paulo, 1999. Ornstein, S. W., Bruna, G. D. e Roméro, M., “Ambiente construído e comportamento: A avaliação pós-ocupação e a qualidade ambiental”, Studio Nobel; FAUUSP; FUPAM, São Paulo, 1995. Rasmussem, S. E., “Arquitetura vivenciada”, Trad. Álvaro Cabral, Martins Fontes, São Paulo, 1998. Sanoff, H., “Visual Research Methods in Design”, Van Nostrand Reinhold, New York, 1991. Sommer, R., “Espaço Pessoal”, EPU, São Paulo, 1973. 28