A MÚSICA E A ESCOLA NA PERSPECTIVA DOS JOVENS DE

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DUARTE, K. R. P.; MURARO, A. M.; FUGIMOTO, T.; PEREIRA, B. P.; BENI, L. T..
A música e a escola na perspectiva dos jovens de ontem.
A MÚSICA E A ESCOLA NA PERSPECTIVA DOS JOVENS DE
ONTEM
Karine Rayara Peres Duarte
Amanda Muniz Muraro
Tatiane Fugimoto
Beatriz Paulino Pereira
Letícia Tiene Beni
Universidade Estadual de Maringá (UEM)
RESUMO
O objetivo desta comunicação é analisar a perspectiva dos jovens de ontem em relação à música e a
educação escolar da sua juventude. O texto contém uma reflexão acerca da influência da música e
da educação para com a juventude de ontem. Para a análise de dados dessa pesquisa utilizamos
entrevistas feitas pelas autoras com pessoas acima de 45 anos. Foi possível perceber como o
contexto sociopolítico e a educação escolar da época influenciaram na escolha musical desses
jovens de ontem, como também a presença da música em suas vidas, nos bailes, festas, rádios,
manifestações e nas escolas. Diante da perspectiva dos participantes da pesquisa pudemos
reconhecer relações entre a juventude de ontem para com a juventude de hoje e, analisar as reações
que música causou em suas vidas, dentre elas o desejo de “mudar o mundo” e de “curtir a vida”.
Palavras-chave: música; educação escolar; jovens de ontem.
DUARTE, K. R. P.; MURARO, A. M.; FUGIMOTO, T.; PEREIRA, B. P.; BENI, L. T.. A música e a escola na perspectiva dos jovens de ontem. In: V EPEM, ENCONTRO DE PESQUISA EM MÚSICA 2016, Maringá­PR. Anais do V EPEM, Encontro de Pesquisa em Música 2016. Maringá­PR: Universidade Estadual de Maringá, 2016. p. 131­141.
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A música e a escola na perspectiva dos jovens de ontem.
1. Introdução.
Ao estudar sobre música, juventude e escola, alunas da disciplina Educação Musical II, do
2° ano do curso de Música na Universidade Estadual de Maringá – UEM, realizaram uma entrevista
com pessoas com idade acima de 45 anos. As entrevistas fizeram parte de um trabalho que buscou
conhecer os enlaces da música e da escola na juventude dos entrevistados.
Um grupo de alunas, autoras deste texto, a fim de aprofundar seus estudos, se reuniu para
analisar o material das entrevistas, ampliando a pesquisa ao realizar uma revisão de literatura nas
revistas da ABEM e fundamentando as análises nos textos estudados na disciplina. Para tanto, o
objetivo desta comunicação é analisar a perspectiva dos jovens de ontem1 em relação à música e a
educação escolar da sua juventude.
No texto apresentamos uma revisão de literatura acerca da juventude, em seu âmbito geral, a
música e a escola; o roteiro utilizado para as entrevistas, bem como as categorias escolhidas para as
análises dos dados: as manifestações musicais e o contexto sociopolítico, educação escolar, jovens
de ontem X jovens de hoje, bailes, festas e as considerações a respeito do estudo. A ordem com a
qual descrevemos os temas tem o intuito de possibilitar o conhecimento do contexto social e a
educação, facilitando o entendimento sobre os jovens de ontem e como suas ações foram
influenciadas pelos mesmos.
2. Juventude, música e escola.
Ao pesquisar trabalhos que se aproximavam das temáticas dessa pesquisa buscamos
publicações que contemplassem: a música, a educação escolar e os jovens. Para esta busca foram
utilizadas as Revistas da ABEM de 2008 a 2015, os 4 volumes da MEB (Música na Educação
Básica) e alguns textos trabalhados em sala de aula da disciplina de Educação Musical II, do curso
de Licenciatura em Educação Musical.
O que é juventude? Considerando o período da vida do ser humano entre a infância e o
desenvolvimento pleno de seu organismo, os sujeitos da pesquisa a definiram como a idade entre 13
e 18 anos. Já para Dayrell, “nas representações correntes, trata-se a juventude como uma unidade
1 Nesse trabalho utilizamos o termo jovens de ontem. Essa expressão foi escolhida para retratar os jovens de meados
da década de 60 até 80, período em que os entrevistados desse estudo passaram a sua juventude.
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social, um grupo dotado de interesses comuns, os quais se referem a uma determinada faixa etária”
(DAYRELL, 2001, p. 5). Visto isso compreendemos que para afirmar ou definir o que é juventude
é preciso tomar conhecimento do contexto e do grupo social em que o jovem está inserido. Como
afirma Urnau, juventude é uma “condição marcada por diferenças e desigualdades que se produzem
nos diversos contextos ou outros” (URNAU, 2008, p. 9).
Juventude, segundo Santos (2012), é o período que ocorre entre as funções sociais da
infância e as funções sociais do adulto. Este é o momento de aprendizagem e descoberta da
identidade do sujeito e, de acordo com a autora, é papel da educação fazer parte da formação do
jovem como indivíduo na sociedade.
A respeito das particularidades da juventude, percebe-se a educação e sua presença junto ao
ato de trabalhar. Reconhece-se que, para muitos, esta era uma função comum na Juventude de
Ontem. Sobre isso Dayrell (2007) afirma que tudo depende da época e da condição dos jovens:
[...] as relações entre o trabalho e o estudo são variadas e complexas e não se
esgotam na oposição entre os termos. Para os jovens, a escola e o trabalho
são projetos que se superpõem ou poderão sofrer ênfases diversas, de acordo
com o momento do ciclo de vida e as condições sociais que lhes permitam
viver a condição juvenil (DAYRELL, 2007, p. 1109).
De acordo com Dayrell, a condição da juventude expressa as mudanças no processo de
socialização, espaço e tempo. Isto significa que a sociedade “produz” os indivíduos à medida que o
jovem expõe o que ele vive e o meio em que ele está, principalmente no meio educacional.
Enfatizando os escritos de Dayrell, “aliada ao espaço, a condição juvenil expressa uma forma
própria de viver o tempo” (DAYRELL, 2007, p. 1112).
Com a expansão da década de 1990, pôde-se perceber, através de estudos de Dayrell que,
por meio de um contexto de uma sociedade desigual, a educação passou a ter um ambiente mais
heterogêneo, conquistando novos horizontes possíveis de ação dos jovens na sua relação com a
escola. Com essa diversidade nas instituições, a escola se caracteriza pela vida juvenil, com seus
looks, pelas grifes, constituindo-se como um espaço também para os amores, as amizades, gostos e
distinções de todo tipo, onde torna-se não apenas um ambiente de estudo, mas também de
socialização e relacionamento. Para Targas e Joly (2009), essa socialização também influencia a
convivência com as demais pessoas fora do âmbito escolar, podendo tornar as pessoas mais
humanizadas e capazes de humanizar.
Além da importância educacional, salientada neste estudo, também ressalta-se a interação
dos jovens com as músicas. Targas e Joly, ao estudarem sobre a busca de uma prática escolar
humanizadora através de processos educativos decorrentes da convivência em grupo, concordam
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com Penna (1999) sobre “o fazer musical está ligado à percepção de mundo, variando conforme o
momento histórico e o espaço social onde vivem as pessoas que estão envolvidas em processos do
fazer artístico, seja ele composto por apreciadores, iniciantes, amadores ou profissionais"
(TARGAS, JOLY, 2009, p. 114). Acreditamos que isso gera uma relação entre as diferentes práticas
culturais, artísticas e musicais, fundamental para o crescimento de todos, presentes em variados
contextos e situações: nas vivências cotidianas, por meio das mídias tecnológicas, nos contextos
escolares, entre outros.
Segundo Arroyo (2013), a curiosidade acadêmica pela interação juvenil com a música
começou a partir de 1960 por meio de um cenário internacional. Já no Brasil, um número crescente
de publicações surgiu na década de 1990. Dentre estas publicações, foi possível constatar que a
música, não é apenas um meio significativo ou comunicativo e assim, Arroyo concorda com
DeNora (2000) ao dizer que a música:
faz muito mais do que exprimir através de meios não verbais. No nível da
vida diária, a música tem poder. Ela implica em muitas dimensões do
agenciamento social, isto é, articula sentimento, percepção, cognição e
consciência, identidade, energia, incorporação (ARROYO, 2013, p. 10).
Percebe-se que a música vem se tornando cada vez mais presente na vida dos jovens, ao
ouvir música por meio de rádios, TVs, CDs, computadores e outros meios midiáticos. Para Souza e
Torres (2009), ouvimos de inúmeras maneiras e cada uma expressa um tipo de sentimento: o ouvir
motoricamente (ouvir, dançar); a função compensatória (substituição de algo ou sentimento); o
ouvir relacionado ao sistema vegetativo (música como relaxamento); o ouvir difuso (para distração
ou ajuda em alguma função); o ouvir emocional (expressar sentimentos); o ouvir associativo
(utilização da música em segundo plano, ex.: comerciais); o ouvir analítico e combinado com outros
sentidos (exposição dos tipos de música pelas mídias). Enfim, a música está presente na vida dos
jovens em seu cotidiano, pois a maioria destes necessita da música não apenas como fundo musical,
mas sim, como elemento do cotidiano vivido.
Ainda em relação a música e juventude, Feixa compreende que o nascimento das culturas
juvenis “está estreitamente associada ao nascimento do rock’n’roll, a primeira grande música
geracional” (FEIXA, 2006, p. 122 apud ARROYO, 2013, p.13-14) e, a partir dele, seguem-se novas
práticas musicais, empreendidas pelos jovens. Para Münch (1998, p. 394 apud SOUZA e TORRES,
2009, p. 50-51), os jovens aproveitam e utilizam a música de diferentes maneiras, independente dos
grupos ouvirem a mesma música e de acordo do contexto social em que estão. Como exemplo, o
surgimento do rock’n’roll nos Estados Unidos no início da década de 50, que através das mídias
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mostrou que a mesma música leva a abordar diferentes conflitos de sociedades e que ela possui
diferentes funções sociais.
Com relação a importância da formação dos educadores musicais no que se refere à
juventude, compreende-se que na educação o professor deve gerar um ambiente promotor de
autonomia e conhecimento, e o mesmo pode interferir neste papel conforme as situações de ensino
proporcionadas pelos alunos. Para que isto aconteça, vê-se a importância de conhecer as
particularidades da juventude.
Para tanto, a partir dos textos estudados e incorporados na revisão de literatura, é possível
considerar que os jovens utilizam a música para expressar seu contexto social, a liberdade de
expressão e suas vivências. Com isso, verificamos que tais fatores, não se restringem apenas aos
jovens, mas a qualquer indivíduo que explora e vive o meio musical; pois segundo Torres e Souza
(2009) a música está em todas as gerações, sendo que todos escutam a música e através dela são
estimulados à criação tanto musical quanto em seu modo de viver.
3. Entrevistas e análise de dados.
A técnica de entrevista propiciou obter informações qualitativas através de perguntas diretas,
possibilitando o registro das expressões orais. Segundo Menga e André (1986, p. 34), a entrevista é
um meio de captação rápida de informações, por meio do contato direto do pesquisador com o
sujeito da pesquisa. Definimos ainda uma entrevista semi-estruturada, possibilitando ao entrevistado
a exploração do tema abordado, o que não é possível em uma entrevista estruturada, em que se
limitam as respostas dos sujeitos em respostas objetivas.
Para tanto, no presente trabalho foram realizadas quatro entrevistas; amigos e familiares das
autoras do texto foram entrevistados. Os entrevistados residem nas cidades paranaenses: Curitiba,
Mandaguari, Ourizona e Tuneiras do Oeste, e têm idade entre 46 e 65 anos, sendo esses
aposentados, cabeleireiro, donas de casa e luthier.
Diante do tema proposto elaboramos as seguintes perguntas: “1) Você teve acesso à escola?
Qual foi a influência dessa vivência para sua vida hoje?; 2) Que visão você tinha da escola durante
sua juventude, além de fonte de conhecimento?; 3) Qual era a relação entre alunos e professores
desse período?; 4) Quais as roupas e estilos de roupas que os adolescentes de diferentes grupos
gostavam de usar?; 5) Você fazia uso de símbolos materiais para fazer parte de algum grupo de
pessoas?; 6) Alguma vez já alterou seu estilo ou comportamento para se inserir a algum grupo?; 7)
Como eram as festas da época de sua juventude? E como era uma reunião de amigos?; 8) Quais as
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gírias que usavam no período de sua adolescência?; 9) Quais foram as atividades apreciadas por
você entre 13 e 18 anos? E quanto elas lhe influenciaram depois de adulto?; 10) Quais as formas de
manifestação artística que você participou na adolescência? Teve alguma? Ainda participa?; Quais
as mudanças sociais que presenciou? E como isso afetou sua vida?; 12) Teve de trabalhar e estudar
ao mesmo tempo? Se positiva a resposta, houve influência em seu desenvolvimento?; 13) Como foi
a sua escolha profissional? Sua profissão hoje está muito diferente das ideias que tinha na
adolescência sobre este assunto?; 14) Como você analisa sua juventude comparando com a
juventude atual?; 15) Que estilos musicais que você ouvia/tocava na sua juventude? 16) Como a
música da sua juventude te influenciou na sua forma de pensar ou no seu comportamento?”.
Com a autorização dos entrevistados, as entrevistas foram gravadas em arquivos de áudios e
após finalizadas, transcritas de forma literal. Fato este que demandou dedicação e tempo hábil, já
que nossa maior dificuldade foi o exercício das transcrições. As entrevistas ocorreram entre os dias
3 de junho até o dia 3 de outubro, com duração de aproximadamente 7 a 45 minutos.
Selecionamos os temas para análise dos dados das entrevistas de acordo com as respostas
obtidas pelos sujeitos da pesquisa que convergiam com os objetivos do estudo. Ao serem
questionados sobre suas vidas, os participantes da pesquisa, relataram como era o contexto social, a
educação escolar, as festas e diversões. Esses temas se alinham com o objetivo do texto, pois
acreditamos que a vivência do jovem influencia suas ações e escolhas musicais.
Utilizamos quatro nomes fictícios para os entrevistados, são eles: Sustenido; Bemol;
Bequadro e Semibreve. Esses nomes são utilizados na música para nomear figuras musicais e
mudanças de notas no decorrer da peça. Empregamos esses nomes pois, como se trata de um artigo
que fala sobre jovens e suas interações com música, acreditamos ser cabível usar nomenclaturas
musicais.
3.1. As manifestações musicais e o contexto sociopolítico .
A respeito do contexto sociopolítico nos referimos à situação política e econômica em que o
Brasil se encontrava da década de sessenta até oitenta, e também para exemplificar o contexto social
dos jovens de ontem. Ao nos depararmos com as respostas dos entrevistados percebemos que a
época em que viveram influenciou em suas ações. Os sujeitos da pesquisa não viveram exatamente
no mesmo contexto sociopolítico, alguns foram jovens na década de sessenta, setenta e outros em
oitenta, mas todos têm em comum recordações do período da ditadura militar. Por meio das
respostas entendemos que o que mais influenciava na vida e no modo de pensar foi o autoritarismo
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militar, nele, segundo os sujeitos da pesquisa, havia repressão por parte do governo, censura da arte,
patriotismo e repressão na educação.
A mulher sem voz ativa também foi citada. Segundo Sustenido “os direitos dos homens e
das mulheres eram diferentes”. O receio de guerras também estava presente, pois, alguns
presenciaram a guerra fria e tinham medo de suas famílias ficarem a mercê da sociedade, conforme
afirma Sustenido “falavam que os pais da gente ia ter que deixar a gente pra ir pra guerra” e o
entrevistado Bemol afirma que “naquela época a todo momento a gente achava que o mundo ia se
acabar com bomba atômica e tudo”, por este motivo, esses jovens justificaram a necessidade de sair
e “curtir a vida”.
Para os entrevistados a censura da arte também influenciou na letra das músicas. Segundo
Heredia, “durante a ditadura militar brasileira, a censura às diversões públicas foi um importante
mecanismo de controle utilizado pelo Estado Autoritário” (HEREDIA, 2015, p. 12). Essa influência
levava os jovens a ouvirem canções de protesto, bandas como The Beatles e, mais tarde, o rock
nacional; segundo os sujeitos da pesquisa essas músicas serviam como revolta ao cenário político
do momento.
Por outro lado, haviam aqueles que viviam na zona rural, e essa vivência os trazia uma
cultura um pouco diferente, segundo Sustenido “era forró, era tudo música assim de sanfona, de
violão” eles ouviam músicas sertanejas como Liu e Léo, Jovem Guarda como Roberto Carlos e
Brega Romântico como Agnaldo Timóteo2. Segundo a entrevistada Bequadro “a gente ouvia porque
era bom pra cabeça”.
Percebe-se assim que o repertório apreciado pelos jovens de ontem era diverso, porém, todos
os entrevistados tinham em comum a forma de ouvir, que era pelo rádio ou nas festas e, como
afirma Bemol, a música “era pra dançar coladinho”. Em todos esses pontos vemos a música como
um lazer e/ou uma tentativa de se libertar dos problemas sociais, pois, como cita a autora Arroyo
“as práticas musicais participam ativamente das constituições juvenis ao mesmo tempo em que
novas estéticas musicais são criadas a partir das ações dos jovens” (ARROYO, 2013, p. 13). Vemos
isso claramente quando Semibreve afirma que “era através da música que eu acho que ainda tem
uma influência muito grande em cima de mim”.
3.2. Educação escolar.
De acordo com os entrevistados a escola foi uma instituição importante que contribuiu para
2
Um dos entrevistados classificou o estilo do cantor Agnaldo Timóteo como Sertanejo.
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a formação como indivíduos e cidadãos. Na escola eles aprenderam desde “coisas” cotidianas como
ver o horário, a ler e escrever, socializar-se, respeitar o professor e como ser um cidadão. Segundo
Bequadro, na escola “aprendia a ser quem é” e para Sustenido aprendia-se “como ser cidadã, como
ser gentil com as pessoas e como tratar a sociedade”. Vale lembrar que todos os entrevistados
atentaram para o fato de que a educação naquela época era diferente de hoje. Para tanto, Bemol
afirma que na escola “era um pouco mais rígido que hoje”.
A autoridade do professor também foi algo explorado pelos entrevistados, para eles os
docentes tinham a capacidade de mudar a “cabeça do aluno”. Figueiredo (2014) afirma que o
docente não transmite apenas habilidades técnicas, mas ele influencia de uma maneira ou de outra
nos gostos e valores. Segundo Semibreve o professor “tinha a capacidade de poder mudar até
muitas cabeças”.
O entrevistado Sustenido atenta para os castigos na escola, disse que isso foi uma boa
influência em sua vida, as punições eram em “tampinhas de guaraná, grãozinhos de milho e
reguadas na mão”, e segundo ele “aquilo lá foi uma influência muito boa pra gente”. Porém, Bemol
afirma que todas essas características da educação levaram a um distanciamento da relação entre
professor e aluno que até hoje existe, segundo ele “eu acho que é muito parecido como é hoje, assim
né, essa relação”.
Todos estavam na escola no período militar, mas, neste regime era escasso o uso de música
na educação desses jovens, pois segundo Bemol havia apenas o Hino Nacional. Ele acrescenta que
“em algumas escolas nós cantávamos o Hino Nacional duas vezes até, uma de manhã cedo e outra
no meio do... da tarde no recreio...”. Sendo assim, parece-nos que a escola não foi uma difusora de
gostos musicais, os jovens fizeram suas escolhas de acordo com o contexto social em que estavam
inseridos. Podemos dizer que a instituição escolar faz parte desse contexto do aluno, mas não é o
único meio que influencia suas vivências musicais.
3.3. Jovens de ontem X jovens de hoje.
Em algumas respostas, os entrevistados compararam a sua juventude de ontem com a atual,
retratando-a como sendo mais sólida. O assunto mais citado foi o relacionamento interpessoal entre
os jovens. Feixa destaca que “o impacto cultural das novas tecnologias: desde muito pequenos,
esses jovens estão rodeados pelos instrumentos eletrônicos [...] que têm configurado suas visões da
vida e do mundo” (FEIXA, 2006, p. 56). Na juventude dos entrevistados, as pessoas precisavam
ligar ou até mesmo se encontrar pessoalmente para dar algum recado ou conversar. Atualmente com
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as redes sociais “as pessoas hoje, elas podem se esconder mais né, elas podem mostrar algo que elas
não são”, diz Semibreve.
Outro assunto citado por eles foi a diversão. A juventude de ontem se divertia com coisas
simples, tudo se tornava divertido, não havia malícia nas brincadeiras, as coisas eram difíceis de ser
conquistadas, os tempos eram outros, uma juventude que sonhava muito, lutava pelo que queria,
obedecia aos mais velhos.
Contudo, Corti e Souza afirmam que para entender a juventude é preciso fazer uma
“descronologização, ou seja, a dissolução das referências cronológicas para a definição desse ciclo
de vida” (CORTI; SOUZA, 2004, p. 19). Vemos, em todas as entrevistas, um grande enfoque em
relação aos tempos de juventude dos entrevistados, tendo ele como “melhor” que atualmente. De
acordo com os estudos de Corti e Souza, essa “descronologização” busca entender a juventude atual
sem ter como base os tempos mais antigos, descartando essa comparação frequente dos jovens de
ontem com os jovens de hoje.
3.4. Bailes, festas, curtir a vida.
Os jovens de ontem, pelo contexto histórico que viveram, dizem ter aproveitado mais a vida.
Todavia, têm clareza da privação de certas coisas ou situações por repressão do regime militar.
Curtiram como puderam, seja nos bailes, nas reuniões de amigos ou “brincadeiras dançantes” como
mencionaram. Como afirma Dayrell, “o mundo da cultura aparece como um espaço privilegiado de
práticas, representações, símbolos e rituais no qual os jovens buscam demarcar uma identidade
juvenil” (DAYRELL, 2007, p. 1110). Por viverem em um período de guerras, buscavam aproveitar
cada momento por medo da guerra acabar com o mundo.
Para os participantes da pesquisa as festas da época eram mais inocentes, tudo era mais
escondido. Alguns citaram não haver drogas e bebidas, outros diziam haver, mas sendo algo mais
oculto; houve citação de que as “malícias eram inocentes” e as “paqueras eram mais ingênuas”
afirma Bemol. Os bailes eram uma forma de encontrar os amigos, não só como uma diversão, mas
como um relacionamento entre pares. “Ah! As festas eram bacanas né?! A gente fazia brincadeira
dançante nas casas, na garagem, em todos os lugares, montava tudo simples e aquilo divertia; era o
momento que a gente tinha”, diz Bemol.
Nessas festas, a música era o que os animava, descontraia. Para alguns, era a única forma de
ouvir. Dentre os estilos citados, o mais comum era o romântico, a música “lenta”, em que dançavam
colados, paqueravam, fazendo desses momentos sua diversão. Foi uma juventude marcada pela
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simplicidade, onde o pouco se tornava muito.
4. Considerações.
Em sua maioria, os sujeitos da pesquisa expuseram que por conta de sua juventude ter sido
marcada pelo período da ditadura militar, as discussões de vários assuntos eram proibidas. Novas
experiências eram temas latentes no mundo jovem e temidos pelos adultos. Por conta disso,
segundo os entrevistados, os jovens adquiriam maturidade mais cedo e buscavam aproveitar cada
momento da melhor forma, acreditando hoje em dia, ter se formados adultos mais responsáveis e
felizes.
Sobre esse aspecto Meirelles (2013) escreve que “atualmente, estamos vivenciando uma
infantilização da juventude, pois a maturidade parece chegar cada vez mais tarde” (MEIRELLES,
2013, p.1). Sustenido ressalta “eu comparo minha juventude a uma juventude sólida”. Todavia,
Sustenido, assim como os demais participantes da pesquisa, percebem muitos ganhos na juventude
atual como, por exemplo, a voz ativa das mulheres. Ao mesmo tempo, os entrevistados ponderam
que a juventude de hoje tende a ser mais exigida do que a juventude de ontem pela urgência social
de decisões profissionais, por vezes, sobrecarregando os jovens.
Além disso, através das entrevistas foi possível perceber as diferenças de hábitos, ideais e
opiniões referente a juventude de ontem, o que nos exige, enquanto futuras educadoras musicais,
estudar as particularidades do nosso público de alunos, sejam crianças, jovens, adultos, idosos.
Além disso, percebemos que caracterizar o indivíduo por meio dos seus comportamentos,
predileções musicais, formas de se vestir e pensar não é apenas uma determinação da faixa etária; já
que acreditamos que cada pessoa é única e carrega consigo suas histórias de vida.
Por isso, foi preciso, ao buscar analisar a perspectiva dos jovens de ontem em relação à
música e a educação escolar da sua juventude, ampliar nosso olhar em relação as categorias
estudadas. Pois reconhecemos o papel que a música obteve na vida dos jovens de ontem,
influenciando em seus modos de pensar e na vida em geral. Foi preciso analisar o contexto
sociopolítico, a forma que cada sujeito via a instituição escolar e se via nela, bem como a
participação e experiências nas festas e bailes.
Deste modo, foi possível perceber a presença da música dos jovens de ontem nos bailes, nos
rádios, nos protestos, nas paqueras, nos hinos patrióticos cantados na escola. Essas músicas eram
usadas como meio de se expressarem na tentativa de “mudar o mundo”, de realizar uma tarefa
institucional e também, de se sentirem melhor.
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A música e a escola na perspectiva dos jovens de ontem.
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