SNPTEE SEMINÁRIO NACIONAL DE PRODUÇÃO E TRANSMISSÃO DE ENERGIA ELÉTRICA GLT - 25 16 a 21 Outubro de 2005 Curitiba - Paraná GRUPO III GRUPO DE ESTUDO DE LINHAS DE TRANSMISSÃO – GLT CAMPOS ELETROMAGNÉTICOS E SAÚDE HUMANA: O FATO E O MITO Roberto Felizardo Moreno CTEEP RESUMO O tema Campos Eletromagnéticos (CEM) vem sendo objeto de intenso debate envolvendo as concessionárias de energia, os Ministérios da Saúde, Meio Ambiente e Energia, o Ministério Público, tanto federal quanto estaduais, bem como os agentes responsáveis pelo licenciamento ambiental destes empreendimentos. Entretanto, apesar deste intenso debate, dos vários congressos e seminários que tiveram o tema “perturbações eletromagnéticas” como diretriz das apresentações e questionamentos, persiste ainda a incerteza em todas as ocasiões nas quais as concessionárias de energia se propõem a implantar ou reconstruir linhas de transmissão de energia. Face às incertezas existentes e, tendo como diretriz primordial contribuir para a ampliação do acervo bibliográfico sobre o assunto, a CTEEP, através do Programa de Pesquisa e Desenvolvimento, propôs, tendo sido aceito pela ANEEL, projeto de pesquisa sobre o tema, intitulado “Avaliação de Efeitos Biológicos em Populações Expostas a Campos Magnéticos de Baixa Freqüência”, o qual consiste de um estudo epidemiológico descritivo, utilizando ferramentas epidemiológicas convencionais, tendo como objetivo principal avaliar hipóteses que estabecem associação entre exposição a campos magnéticos e determinadas patologias. Em síntese, o trabalho parte do geo-referenciamento de casos de leucemia infantil no Município de São Paulo, no período de 1992 a 2003, geo-referenciamento das linhas de transmissão e sub-transmissão inseridas no Município, sendo avaliado, através de métodos estatísticos, se os casos de doenças ocorrem de forma errática ou seguem distribuição espacial que tenham certa dependência das instalações elétricas referenciadas. O trabalho apresenta medição de intensidade de campo magnético nas faixas de segurança das linhas de transmissão, contribuindo assim para a definição do ambiente eletromagnético no Município de São Paulo, tendo sido consideradas as linhas de transmissão pertencentes aos sistemas da CTEEP, Eletropaulo e Furnas. Conduzido em parceria entre a CTEEP, a FDTE-USP e contando com epidemiologistas da FIOCRUZ e UFRJ, o trabalho apresenta e discute aspectos relacionados à avaliação de hipóteses que estabelecem associação entre exposição a campos eletromagnéticos e neoplasias da infância, estabelecimento de valores de referência para exposição de seres humanos aos CEM de baixa freqüência originados pelas linhas de transmissão de energia e criação de Banco de Dados contendo intensidade dos CEM nas linhas de transmissão situadas no Município de São Paulo, tendo sido gerado ainda, como subproduto dos levantamento realizados, o mapeamento georeferenciado das instalações de transmissão situadas na área abrangida pela pesquisa. PALAVRAS-CHAVE Campos Eletromagnéticos, Leucemia Infantil, Risco, Linhas de Transmissão, Meio Ambiente, Saúde Pública Av. Casa Verde, 2408 - CEP 02520-200 – São Paulo - SP - BRASIL Tel.: (011) 3856-4032 - Fax: (011) 3856-4018 - e-mail: [email protected] 2 1.0 - INTRODUÇÃO A preocupação manifestada pela sociedade contemporânea quanto à exposição aos campos eletromagnéticos de freqüência industrial tem, nas últimas duas décadas, se tornado fator adicional a se somar às demais preocupações relativas ao ambiente imediato no qual estamos inseridos. Não bastasse a poluição do ar, da água, do solo e do subsolo, das montanhas de lixo gerado pela sociedade consumista e perdulária, hoje, a maioria das comunidades se vê preocupada pelos eventuais efeitos da radiação eletromagnética, tanto a gerada pelos sistemas de transmissão e distribuição de energia, quanto aquela resultante da telefonia celular. Salienta-se que no caso das radiações eletromagnéticas o cidadão comum se sente mais inseguro, em primeiro lugar pelo desconhecimento do fenômeno e, num segundo momento, em função do mesmo não poder ser percebido pelos órgãos dos sentidos, a não ser em níveis elevados, sendo tais fatores responsáveis, em parte, pela percepção de risco diferenciada, dependendo do nível sócio-econômico, de informação, cultura e, fundamentalmente, das variadas formas de abordagem utilizadas pela mídia. Decorridos mais de vinte e cinco anos desde o aparecimento dos primeiros resultados dos estudos, o posicionamento dos centros de pesquisa mundiais, incluindo-se a Organização Mundial de Saúde (OMS), se caracteriza como não conclusivo, apesar de, conforme publicação do NIEHS, os campos magnéticos de freqüência industrial terem sido classificados como “possivelmente carcinogênicos” (Ref. 1). Nos últimos vinte anos, dezenas de estudos epidemiológicos de extrema seriedade, conduzidos por pesquisadores do mais elevado gabarito, foram publicados em diversos países, apresentando as seguintes conclusões principais: - - - - observam-se resultados contraditórios entre algumas pesquisas, ou seja, enquanto algumas apresentam resultados positivos para a associação CEM x leucemia, outras, não estabelecem qualquer tipo de vínculo, entre os trabalhos que apresentaram resultados positivos, ou seja, tiveram caracterizado o “link” entre CEM e leucemia infantil, a razão de risco (OR) observada é relativamente baixa (entre 1 e 2), quando comparada com os resultados de estudos epidemiológicos elaborados para outras substancias consideradas carcinógenos humanos, tais como o amianto e o tabaco (OR superior a 20), pelo fato da exposição aos CEM ser praticamente onipresente, não existindo, a menos de comunidades indígenas isoladas, serem humanos que não estejam expostos a tais perturbações eletromagnéticas, é extremamente difícil a modelagem de estudos epidemiológicos que reflitam tal condição, dificultando uma clara separação entre indivíduos expostos e não expostos a estes fenômenos, face ao caráter ubíquo da exposição aos CEM, eventuais viéses de pesquisa e fatores de “confundimento” passam a desempenhar papel relevante, uma vez que, na maioria das vezes, não se pode resgatar a totalidade de potenciais agentes lesivos à saúde que possam ter estado presente durante a vida dos indivíduos objeto dos estudos, a dificuldade, senão a impossibilidade, de levantamento da exposição pregressa é fator decisivo na modelagem de estudos epidemiológicos convencionais, a etiologia da doença leucemia infantil ainda apresenta certa dificuldade de entendimento e compreensão pelos profissionais da área médica, embora, nos últimos anos, das batalhas tenham resultado importantes e significativas vitórias e conquistas da medicina, contribuindo desta forma para mitigar o sofrimento de famílias que se vêem atingidas por neoplasias da infância. Estas condições refletem o cenário segundo o qual as concessionárias devem prover com segurança, confiabilidade e disponibilidade crescente, um mercado cada vez mais dependente da energia elétrica, tendo ainda em conta que, tal crescimento, em muitos casos, é conflitante com as restrições sócio-ambientais representadas pelos diversos atores sociais. Tais restrições, ou a possibilidade de materialização das mesmas, podem ser exemplificadas, apenas no Estado de São Paulo, pelo embargo da reconstrução de uma linha de transmissão da AES Eletropaulo em função de ação civil pública impetrada pela comunidade lindeira à faixa de passagem, bem como por dois projetos de lei em tramitação na Câmara dos Vereadores de São Paulo (PL327/01) e na Assembléia Legislativa (PL-427/03), os quais propõem, respectivamente, limites de 5 mG e 10 mG, e 200,00 metros para a largura mínima para as faixas de transmissão. Em 2001, durante o XVI SNPTEE, um trabalho apresentado pela EPTE (Ref. 2), concluía que, embora as concessionárias de energia sejam questionadas publicamente sobre os efeitos e limites seguros de exposição aos CEM, seria dos centros de pesquisas em saúde pública e dos órgãos reguladores que deveriam partir as respostas a estas demandas da sociedade, prevenindo-se eventuais agravos à saúde pública, conciliando esta diretriz com o abastecimento energético requerido pela sociedade. Às concessionárias competiria acatar os regulamentos e normas que viessem à luz em decorrência de estudos, pesquisas e regulamentos aprovados pelas organizações específicas das área de saúde pública, meio ambiente e aquelas relacionadas ao setor elétrico. Em junho de 2003, a Portaria FUNASA 677 instituiu o Grupo de Trabalho – GT de avaliação e recomendação dos aspectos normativos relacionados à exposição humana a campo eletromagnéticos no espectro de 0 a 300 GHz, o qual deveria estabelecer diretrizes para exposição às radiações eletromagnéticas não ionizantes. Divergências no enfoque e na proposição de diretrizes, impediram a conclusão dos trabalhos nos prazos estipulados pela portaria. 3 2.0 - DELINEAMENTO DA PROPOSTA DE TRABALHO Ciente de seu papel como uma das principais transmissoras de energia do Brasil, responsável pela operação de mais de 18.000 quilômetros de circuitos de transmissão, nas classes de tensão de 88, 138, 230, 345 e 440 kV, a CTEEP implementou projeto de pesquisa intitulado “Avaliação de Efeitos Biológicos em Populações Expostas a Campos Magnéticos de Baixa Freqüência” (Ref. 3), o qual teve como objetivo principal avaliar, a partir de estudo epidemiológico, eventual excesso de casos de leucemia infantil em regiões situadas próximas dos corredores de transmissão de energia. O desenho do projeto de pesquisa, tendo como base de análise o Município de São Paulo, conforme Figura 1, se propôs, a partir da modelagem de um estudo ecológico, utilizando ferramentas de epidemiologia descritiva, avaliar a hipótese de que os casos de leucemia infantil, na faixa etária de 0 a 14 anos não se distribuiriam ao acaso, mas sim seriam aderentes aos corredores de transmissão de energia. A opção pela leucemia infantil, como agravo à saúde a ser pesquisado, decorre do fato desta doença ter sido indicada, na maioria dos trabalhos publicados, como sendo associada à exposição a campos magnéticos de freqüência industrial e, a faixa etária pesquisada justifica-se pelo fato das crianças passarem a maior parte do tempo diário na residência ou nas imediações da mesma havendo, em decorrência um maior controle sobre fatores interferentes e viéses de pesquisa que pudessem descaracterizar os resultados das análises efetuadas. fonte: Prefeitura Municipal de São Paulo (www.prefeitura.sp.gov.br) FIGURA 1 - Delimitação da área de desenvolvimento da pesquisa – Município de São Paulo 3.0 - BASES DE DADOS Em linhas gerais, o trabalho desenvolvido utilizou as seguintes bases de dados e cadastros de informações: Cadastro do PRO AIM, órgão da Prefeitura do Município de São Paulo contendo informações sobre mortalidade, contendo dados sobre endereço, CEP, causa morte, data de nascimento, idade, data do óbito, tendo sido selecionados na base de dados apenas os casos de leucemia infantil, de 1992 a 2003 Cadastro do Registro de Câncer de Base Populacional, da Faculdade de Saúde Pública da USP, com dados sobre incidência de leucemia infantil na Cidade de São Paulo Imagens de satélite da Cidade de São Paulo, geo-referenciadas (geo-tiff), tendo as mesmas sido disponibilizadas pela Secretaria de Estado do Meio Ambiente, a partir de acervo de imagens obtidas pelo satélite IKONOS, no ano de 2002 Mapa de Ruas da Cidade de São Paulo disponibilizado pela Multispectral, consistindo de base de dados georeferenciada, contendo informações variadas, tais como parques, ferrovias, metros, limites de bairros e setores censitários, permitindo ainda pesquisa por rua, número do imóvel e CEP Dados do IBGE, selecionados por setores censitários, relativos ao Censo de 2000 4.0 - ETAPAS As etapas do projeto de pesquisa seguiram a seqüência abaixo delineada, lembrando-se que todas as informações utilizadas referem-se ao Município de São Paulo, área delineada para o desenvolvimento dos estudos. A) Geo-referenciamento em campo das residências indicadas pelo PRO AIM, relativas aos casos de óbito por leucemia infantil, no período 1998 – 2003, utilizando-se o equipamento GPS Garmin V. B) Medição de campo magnético no alinhamento das residências e, quando possível, nos fundos do lotes. Para a execução desta etapa foi utilizado equipamento EMDEX II. Todas as residências foram fotografadas, bem como as ruas nas quais as mesmas se situam. A Figura 2 apresenta dois locais de levantamento. 4 C) Geo-referenciamento das linhas de transmissão e sub-transmissão a partir da aplicação do software ARCVIEW, utilizado para manipulação de informações e imagens geo-referenciadas. Nesta etapa se procedeu ao cadastro de todas as instalações pertencentes aos sistemas de transmissão da CTEEP, Eletropaulo e Furnas situadas na Cidade de São Paulo, conforme indicado na Figura 3. D) Geo-referenciamento, através do aplicativo da Multispectral, dos casos de mortalidade por leucemia infantil ocorridos no período de 1992 – 1997 E) Medição da intensidade de campo magnético em corredores de transmissão situados no Município, sendo priorizados locais com elevada densidade demográfica, tendo sido mapeadas as envoltórias em seções transversais típicas das linhas de transmissão. A Figura 4 apresenta locais monitorados durante a pesquisa. FIGURA 2 - Pontos de levantamento de campo FIGURA 3 – Linhas de transmissão instaladas no município de São Paulo 5 FIGURA 4 – Pontos de medição de campo magnético em faixas de transmissão F) Levantamento, por setor censitário, dos casos novos de incidência de leucemia infantil a partir do Cadastro de Câncer de Base Populacional da FSP-USP Além do cadastro geo-referenciado dos imóveis, foram obtidas informações sobre o meio ambiente contíguo às residências. As principais informações cadastradas no desenvolvimento das etapas, foram superpostas em imagem única e, mediante utilização do software ARCVIEW, estabeleceu-se composição da base de dados sobre a qual se procedeu análise estatística de forma a verificar a hipótese admitida no início do trabalho relativa à distribuição espacial dos casos de leucemia infantil. A Figura 5 apresenta a composição das informações relativas aos óbitos, para os períodos 1992-1997 e 1998-2003, superpostas ao sistema de transmissão constituído pelas linhas aéreas. FIGURA 5 - Imagem com superposição dos casos de leucemia ao sistema de transmissão existente 6 5.0 - ANÁLISE EPIDEMIOLÓGICA Para avaliação da hipótese apresentada foram aplicados os recursos de processamento do software Bayes-X, tendo sido quantificadas as variáveis relacionadas à incidência e mortalidade, a partir da análise comparada entre o número de óbitos e de incidência de leucemia, de 0-14 anos, observados entre 1993-2002 versus aqueles esperados no mesmo período, de acordo com as cifras existentes para a população geral do Município de São Paulo. Os setores censitários foram divididos em dois grupos a saber: E – Setores com existência de linhas de transmissão nos seus limites NE – Setores nos quais não existem linhas de transmissão no seu território As Tabelas I e II apresentam valores para razão de risco para os casos de leucemia infantil, respectivamente para mortalidade (1992-2002) e incidência (1997-2003), segundo idade de 0 a 14 anos, de acordo com a localização dos bairros ( E ou NE) nos quais se encontram as residências. TABELA I – Razão de risco de mortalidade por leucemias ajustado por idade, 0-14 anos, bairros do município de São Paulo, 1992-2002 Exposição LTs Óbitos Observados (O) Óbitos Esperados (E) Razão O/E(95% IC) Área Exposta (E) Área não Exposta (NE) 295 116 286 125 1.03 (0.92-1.15) 0.93 (0.77-1.05) Razão de Risco E/NE: 1.03/0.93 = 1.11 (0.90 – 1.36) TABELA II – Razão de risco de incidência de leucemias segundo idade, 0-14 anos, bairros de residências expostos a linhas de transmissão de alta tensão elétrica, município de São Paulo, 1992-2002 Idade (anos) Casos Observados (O) Área Exposta (E) 0–4 5–9 10 – 14 todas (0 – 14) Área não Exposta (NE) 0–4 5–9 10 – 14 todas (0 – 14) Casos Esperados (E) Razão O/E(95% IC) 218 171 167 556 241 194 185 620 0.91 (0.70-1.03) 0.88 (0.75-1.02) 0.90 (0.77-1.04) 0.90 (0.82-0.97) 124 107 98 329 101 84 80 266 1.22 (1.02-1.45) 1.27 (1.04-1502) 1.22 (0.99-1.47) 1.23 (1.10-1.37) Razão de Risco E/NE: 0.90/1.23 = 0.73 (0.64 – 0.84) A razão de risco obtida para a incidência, 0.73, inferior à unidade, revela que o risco de adoecimento por leucemia infantil nas áreas expostas a linhas de transmissão é inferior, cerca de 27%, àquele observado para as regiões sem linhas de transmissão inseridas na área considerada. Resultados similares foram observados na comparação dos casos novos de leucemia observados na faixa etária de 0-14 anos versus aqueles esperados. 6.0 - ANÁLISES COMPLEMENTARES A partir da perspectiva de avaliar a distribuição da mortalidade em função das distâncias das residências às linhas de transmissão, bem como em função da intensidade do campo magnético medido, se realizou análise dos óbitos registrados para o período 1998-2003, sendo apresentados na Figura 6 os gráficos resultantes. CASO S x CAM PO M AG NÉT ICO 100,00 100,00 90,00 80,00 70,00 60,00 50,00 40,00 30,00 20,00 10,00 0,00 90,00 % ACUM ULADA 80,00 70,00 60,00 50,00 40,00 30,00 10000 4000 2000 800 DIST ÂNCIA (m) 1000 600 450 350 250 50 20,00 150 % ACUM ULADA C ASOS x D IS TÂN C IA 10,00 0,00 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 CAM P O M AGNÉTICO (m G) FIGURA 6 – Distribuição de casos de leucemia em função das distâncias às LT´s e da intensidade do campo magnético 13 14 15 7 Constata-se que, dos 189 óbitos por leucemia na infância observados no período de 1998-2003, 6 (3.17%) estavam situados a distâncias inferiores a 50 metros e, cerca de 96% dos domicílios dos óbitos situavam-se a distâncias superiores a 100 metros, distância para a qual os valores de campo magnético resultantes da operação das linhas de transmissão são, na grande maioria, inferiores aos valores de fundo, face à dramática atenuação do campo com a distância. Tais constatações sugerem a necessidade de que seja reavaliado o conceito de “distância segura” entre linhas de transmissão e residências, evitando-se desta forma a adoção de Quanto à distribuição de casos por nível de exposição, observa-se que a maioria das residências, cerca de 80 %, apresentaram níveis de campo magnético inferior a 3,0 mG, podendo-se esperar valores menores para o interior das residências, uma vez que as medições foram realizadas na testada dos lotes, próximos aos circuitos de distribuição instalados nas calçadas. No tocante aos valores de campo magnético nos corredores de passagem das linhas, foram realizadas medições em 15 linhas de transmissão, com tensão variando de 88 a 345 kV, todas elas instaladas na área urbana do município, com ocupação humana de ambos os lados dos corredores de passagem das linhas, sendo observadas intensidade de campo magnético variando de 10 a 70 mG, significativamente superiores àqueles medidos nas residências objeto da pesquisa. Apesar destes locais se caracterizarem como ambientes com nível de perturbação mais elevado, não foram observados, apesar disso, um excesso de casos de leucemia infantil. Pelo contrário, a maioria dos casos observados está situada em locais com baixa perturbação eletromagnética, ou seja, campo magnético inferior a 3,0 mG. A Figura 7 apresenta os resultados de medição de campo magnético realizadas em algumas linhas de transmissão, salientando-se que os valores indicados não são os máximos previstos para as referidas instalações, uma vez que as medidas não foram realizadas em horários de pico de consumo de energia. Ressalta-se que as medições de campo magnético apresentaram, para todas as linhas de transmissão, valores de campo magnético, a um metro de altura, inferior aos 833 mG, referenciados pelo ICNIRP como limite de exposição para ambientes não controlados. Evidentemente, os limites nas laterais das faixas de transmissão devem ser medidos, ou calculados, para as várias alturas, de forma a avaliar criteriosamente a conformidade das linhas em operação, não tendo sido realizada esta avaliação por fugir ao escopo do projeto de pesquisa. LT P IR ITU B A - C AS A V E R D E CA M P O M A GNÉ TICO (m G) CAM P O M A GNÉ TICO (m G) LT LE S TE - TIJU C O P R E TO 100 80 60 40 20 0 0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 100 80 60 40 20 0 0 DIS TÂ NCIA (m ) 5 10 15 20 25 30 DIS TÂ NCIA (m ) FIGURA 7 – Envoltórias de Campo Magnético em faixas de linhas de transmissão (valores medidos) 7.0 - DISCUSSÃO A modelagem adotada para o projeto de pesquisa se mostrou plenamente ajustada aos objetivos delineados, possibilitando estabelecer uma série de resultados importantes para ampliar o horizonte de análise do tema, bem como a necessidade de rever alguns resultados obtidos em estudos anteriores. Por ser tratar de pesquisa inédita, tanto pela delimitação do campo de aplicação, quanto pela abordagem implementada, se caracteriza como um marco nas pesquisas brasileiras sobre o assunto, sendo proposta a continuidade dos estudos, agora sobre bases mais sólidas, ressaltando-se que o debate não deve se circunscrever ao setor elétrico mas, principalmente, deve ser levado aos variados fóruns de discussão, incluindose as casas legislativas, estabelecendo-se diretrizes que contribuam para a proposição de diplomas legais que reflitam, efetivamente, o conhecimento atual, com a certeza, porém, de que ainda há um longo caminho a ser trilhado na busca de compreensão pela medicina dos mecanismos de interação entre os seres vivos e os campos eletromagnéticos. 8.0 - CONCLUSÕES Como fruto do trabalho, entre as principais conclusões podemos citar: a) Tanto a análise a partir dos dados de morbidade quanto aquela avaliada segundo os dados de mortalidade, forneceram resultados negativos para a hipótese apresentada, tendo em vista o caráter aleatório da distribuição dos domicílios dos casos de leucemia infantil em relação a distribuição das linhas de transmissão de alta tensão 8 elétrica, tendo sido obtidos valores próximos da unidade para a razão entre o número de óbitos por leucemias observados versus esperados paras a faixa etária de 0-14 anos nos bairros do Município de São Paulo. b) A análise visual da distribuição de óbitos superpostos ao sistema de transmissão existente na cidade de São Paulo reforça as conclusões acima apresentadas, sendo constatado que os óbitos se distribuem de maneira errática em relação às linhas de transmissão de alta tensão elétrica na área abrangida pelo município. c) Dos 189 domicílios avaliados, relativos ao período 1998-2003, apenas 6 deles estão situados, em relação às linhas de transmissão, a distâncias inferiores a 50 metros. d) Os valores de campo magnético medidos na frente das residências destes 189 casos, apresentaram resultados tais que 80% dos valores mostraram-se inferiores a 3.0 mG. e) Apesar do ambiente no entorno dos corredores de transmissão se caracterizarem como locais com maior nível de perturbação por campos magnéticos, não foram observados excessos de casos de leucemia infantil adjacentes aos mesmos. Pelo contrário, a maioria dos casos observados está situada em locais com limitada perturbação eletromagnética, menor ou igual a 3,0 mG. Evidentemente, as constatações acima não permitem afirmar que os campos magnéticos não são responsáveis pela ocorrência de casos de leucemia infantil, sendo possível concluir, entretanto, que a distribuição dos óbitos não ocorreu de forma aderente aos corredores de passagem das linhas de transmissão, bem como que o ambiente eletromagnético 60 Hz é mais perturbado próximo às faixas de passagem, embora tal aspecto não tenha contribuído para a ocorrência de adensamento de óbitos por leucemia infantil. A iniciativa de implementar este projeto de pesquisa teve como objetivo, em primeiro lugar, permitir uma ampliação do modesto acervo existente sobre o tema no Brasil. Um segundo aspecto, não menos importante que o anterior, refere-se à preocupação da CTEEP quanto ao gerenciamento prudente destes fenômenos sempre e quando tais ações se mostrarem necessárias. Por se tratar de tema relacionado à saúde pública e, tendo em vista as diferentes abordagens possíveis quanto à percepção do mesmo por parte da comunidade, a CTEEP procurou agregar neste projeto de pesquisa, como pesquisadores e entidades parceiras, nome reconhecidos como referências nacionais sobre o assunto. 9.0 - PROPOSTAS PARA APROFUNDAMENTO DOS ESTUDOS Tendo em vista a observação de que cerca de 20% das residências com caso de leucemia terem apresentado valores de campo magnético superiores a 3.0 mG e, considerando ainda que tal valor tem sido considerado na literatura como limiar de separação entre locais com baixa e alta exposição, propõe-se o desenvolvimento de pesquisas adicionais visando avaliar hipóteses que possam contribuir para o esclarecer deste aspecto. Sugere-se ainda a implementação de pesquisas similares à presente, com realização de levantamento complementar de dados dos moradores, incluindo-se medição no interior das residências, entrevistas, informações sobre a vida pregressa dos moradores e exposição a outros fatores depressores da saúde. 10.0 - EQUIPE RESPONSÁVEL PELO DESENVOLVIMENTO DA PESQUISA A equipe responsável pela elaboração da pesquisa contou com participação dos Drs. Sergio Koifman, Rosalina J. Koifman e Ines E. Mattos, pela FIOCRUZ, Dr. Marcelo G. Poirot Land, da UFRJ, e os Engs. Roberto F. Moreno, da CTEEP e Adinan de Souza, pela FDTE-USP. 11.0 - AGRADECIMENTOS O autor gostaria de expressar seus agradecimentos a todos aqueles que contribuíram para a realização deste trabalho, citando-se inicialmente os colegas do Setor de Projetos de linhas de transmissão da CTEEP, os quais viabilizaram a consolidação da base de dados sobre a qual se estruturou o projeto. À direção da CTEEP, pela visão científica e incentivo ao engajamento de uma empresa de energia na área de pesquisa em saúde pública, estabelecendo um novo paradigma no setor elétrico, e aos profissionais da área de Relações Institucionais pelo integral apoio demonstrado durante o transcurso do trabalho. À minha esposa, Cida, e meus filhos, Luiz Carlos, Patricia e Roberto. A existência de vocês é a razão principal de ser grato a Deus pelos companheiros de jornada. E a meus pais, pela dedicação, sabedoria, carinho, ética e caráter sempre demonstrados; ensinamentos que norteiam os caminhos de minha vida. 11.0 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS (1) NATIONAL INSTITUTE OF HEALTH - Health effects from exposure to power-line frequency electric and magnetic fields. NIH Publication N. 99-4493/1999 (2) MORENO, R. F. – Possíveis efeitos sobre a saúde humana decorrentes da exposição a campos elétricos e magnéticos de baixa freqüência - Revisão comentada da literatura. XVI SNPTEE - Campinas - 2001 (3) KOIFMAN, S., LAND, M. G. P., MORENO, R. F., KOIFMAN, R. J., MATTOS, I. E., - Avaliação de Efeitos Biológicos em Populações Expostas a Campos Magnéticos de Baixa Freqüência - Projeto de Pesquisa e Desenvolvimento ANEEL / CTEEP / FDTE - Ciclo 2002/2003