Aplicabilidade das diretivas antecipadas de vontade

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SILVANA BASTOS COGO
APLICABILIDADE DAS DIRETIVAS ANTECIPADAS DE VONTADE:
NOVO OLHAR ACERCA DA MORTE E DA RELAÇÃO COM A VIDA
RIO GRANDE
2016
1
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE (FURG)
ESCOLA DE ENFERMAGEM
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENFERMAGEM
DOUTORADO EM ENFERMAGEM
APLICABILIDADE DAS DIRETIVAS ANTECIPADAS DE VONTADE:
NOVO OLHAR ACERCA DA MORTE E DA RELAÇÃO COM A VIDA
SILVANA BASTOS COGO
Tese apresentada ao Programa de Pós Graduação
em Enfermagem, da Escola de Enfermagem Universidade Federal do Rio Grande (FURG),
como requisito para obtenção do título de
Doutora em Enfermagem – Área de
Concentração: Enfermagem e Saúde. Linha de
Pesquisa: Ética, Educação e Saúde.
Orientadora: Dra. Valéria Lerch Lunardi
RIO GRANDE
2016
2
3
4
Aos meus filhos, Eduarda e Lucas, que transformaram as
minhas angústias e preocupações em momentos leves e
inspiradores para a construção do pensamento para a
realização da tese. A eles, a força para persistir e
acreditar que tudo é possível quando somos regados
pelo verdadeiro amor.
5
AGRADECIMENTOS
Enumerar os agradecimentos me parece muito complicado, considerando as inúmeras
pessoas que contribuíram para que concluísse o doutorado. No entanto, primeiramente,
gostaria de agradecer aos meus pais que me concederam a vida. Agradeço, sempre, terem me
oportunizado estudar, me apoiarem em minhas escolhas, me incentivarem a acreditar que tudo
é possível quando estamos dispostos a realizar o que desejamos. Agradeço ao exemplo e por
serem atuantes e participativos em minha vida.
Agradeço imensamente a minha orientadora, Dra Valéria Lerch Lunardi, que aceitou
me orientar e incansavelmente dedicou sua atenção na construção da tese. Além de sempre me
ajudar e tranquilizar diante das minhas angústias, inquietações e dúvidas, sempre com uma
palavra de incentivo e motivação. As palavras não traduziriam a imensa gratidão pela
confiança e disponibilidade que dispensou em me auxiliar na construção desse trabalho.
Agradeço aos membros da banca que foram escolhidos pela sua competência,
comprometimento e admiração por suas atuações profissionais. Agradeço as contribuições
realizadas que indispensavelmente foram importantes para a efetivação deste trabalho.
Ao meu esposo Gustavo, pela dedicação e empenho que incansavelmente me
acompanhou, desde as longas viagens semanais, juntamente com nossa filha Eduarda, até as
horas adicionais dedicadas ao cuidado dos nossos filhos. Obrigada por ser meu verdadeiro
companheiro e por ser a pessoa que és.
Aos meus filhos, que nasceram e cresceram com o doutorado, minhas maiores fontes
de inspiração e força para seguir em frente.
Aos meus irmãos. Juliano e Cristiano, agradeço o incentivo e cuidado.
Ao meu sogro, Eduardo, e minha sogra Nanci, agradeço por me incentivarem e me
auxiliarem com palavras de motivação, além do cuidado dispensado aos meus filhos.
Aos meus colegas do doutorado, que me acolheram e sempre me ajudaram.
À Universidade Federal de Rio Grande, pela oportunidade de ser aceita na instituição.
A coordenação do PPGEnf/FURG, pela oportunidade da qualificação profissional.
Aos professores do PPGEnf/FURG, por contribuírem e possibilitarem meu
aperfeiçoamento profissional, a partir das suas contribuições e instigações.
Aos participantes desta pesquisa, que concederam parte de suas experiências e do seu
tempo para participar nessa tese.
6
À Universidade Federal de Santa Maria e aos meus colegas do Departamento de
Ciências da Saúde do Centro de Educação Superior Norte do RS, Campus de Palmeira das
Missões, por me conceder a oportunidade de afastamento à realização do doutoramento.
Ao meu colega e amigo Marcio Rossato Badke, por compartilhar e vivenciar, desde a
graduação, momentos de conquista, além de ser um grande ouvinte das angústias e
preocupações. Agradecida por ser um amigo fiel.
Agradeço imensamente a todos que embora não tenham sido citados contribuíram para
a construção e efetivação desta tese.
7
O dia mais belo? hoje; A coisa mais fácil? errar; O maior obstáculo? o
medo; O maior erro?; o abandono; A raiz de todos os males? o
egoísmo; A distração mais bela? o trabalho; A pior derrota? o
desânimo; Os melhores professores? as crianças; A primeira
necessidade? comunicar-se; O que mais lhe faz feliz? ser útil aos
demais; O maior mistério? a morte; O pior defeito? o mau humor; A
pessoa mais perigosa? a mentirosa; O sentimento mais ruim? o rancor;
O presente mais belo? o perdão; O mais imprescindível? o lar; A rota
mais rápida? o caminho certo; A sensação mais agradável? a paz
interior; A proteção efetiva? o sorriso; O melhor remédio? o otimismo;
A maior satisfação? o dever cumprido; A força mais potente do
mundo? a fé; As pessoas mais necessárias? os pais; A mais bela de
todas as coisas? o amor...
Madre Tereza de Calcutá
8
RESUMO
COGO, Silvana Bastos.Aplicabilidade das diretivas antecipadas de vontade: novo olhar
acerca da morte e da relação com a vida. 2016. 192f. Tese (Doutorado em Enfermagem) Escola de Enfermagem, Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, Universidade Federal
do Rio Grande, Rio Grande.
As diretivas antecipadas de vontade (DAV) constituem o direito do paciente deixar
previamente manifestado os tratamentos a que deseja, ou não, ser submetido diante de sua
incapacidade. Inseridas recentemente no cenário nacional, representam uma alternativa
plausível de manutenção de autonomia do paciente, contribuindo na redução de conflitos
éticos entre profissionais da saúde, familiares e pacientes sobre as decisões que envolvem
tratamentos e cuidados em final de vida. Nessa perspectiva, partindo do pressuposto que
autonomia do paciente é fator determinante na aplicabilidade das DAV, o referencial teórico
que embasa esta tese foi ancorado em Beauchamp e Childress, considerando os conceitos
utilizados na teoria principialista referentesà autonomia, beneficência e não-maleficência.O
objetivo geral desse estudo foi: compreender como enfermeiros, médicos e familiares de
doentes terminais entendem a aplicabilidade das diretivas antecipadas de vontade para as
situações de terminalidade, defendendo-se como tese que a aplicabilidade das diretivas
antecipadas de vontade no ambiente hospitalar requer o seu conhecimento e capacitação pelos
enfermeiros, médicos e cuidadores familiares de doentes terminais, demonstrando o respeito à
autonomia pessoal dos pacientes e familiares. O percurso metodológico adotado foi de uma
pesquisa qualitativa, conduzida pela realização de entrevistas semiestruturadas com oito
enfermeiros, sete médicos residentes e sete cuidadores familiares de doentes terminais, de um
hospital universitário do sul do Brasil. Mediante a análise textual discursiva dos dados,
emergiram sete categorias: conflitos na assistência ao doente terminal: implicações à prática
das DAV; o respaldo dos familiares e dos profissionais mediando o respeito a autonomia do
paciente: vantagens à aplicabilidade das DAV; dificuldades e limitações na implementação
das DAV: desafios à prática hospitalar; o medo das DAV e o respeito a autonomia: desejos
pessoais de cuidado dos profissionais remetidos a doença terminal; desejos dos cuidadores
familiares diante da situação de terminalidade; responsabilidade da família no cuidado ao
doente terminal; e o respeito a autonomia do doente terminal pelos familiares: o medo da
verdade. Os achados permitiram constatar que a aplicabilidade das DAV está intimamente
relacionada ao direito do indivíduo de que sua autonomia seja respeitada. O reconhecimento
desse direito foi enfatizado constantemente, entretanto muitas nuances circulam em torno da
possibilidade de que as DAV possam de fato garantir esse direito, além de que persistem
medos e receios para que efetivamente as manifestações sobre os tratamentos a serem
utilizados numa situação de incapacidade possam ser implementados. Neste contexto, os
achados relacionados a aplicação das DAV suscitam a necessidade dessa temática ser
frequentemente discutida no ambiente de assistência à saúde, enfocando o ser humano que se
encontra em processo de morte, a fim de garantir o respeito à autonomia pessoal e à dignidade
humana.
Descritores: Diretivas antecipadas. Enfermagem. Bioética. Doente terminal. Autonomia
Pessoal.
9
ABSTRACT
COGO, Silvana Bastos. Applicability of advance directives of will: a new look about death
and the relationship with life. 2016. 192 sheets. Thesis (Doctorate in Nursing) - School of
Nursing, Nursing Postgraduation Program, Federal University of Rio Grande, Rio Grande.
The advance directives of will (DAV) are entitled to leave the patient previously expressed
the treatments he wants, or not, to be submitted before his failure. Recently entered the
national scene, represent a plausible alternative for the patient's autonomy maintenance,
contributing to the reduction of ethical conflicts between health professionals, family
members and patients about decisions involving treatment and care at end of life. From this
perspective, assuming that patient autonomy is a determining factor in the applicability of the
DAV, the theoretical framework that supports this thesis was anchored in Beauchamp and
Childress, considering the concepts used in principlism related to autonomy, beneficence and
non-maleficence. The general objective of this study was: understanding how nurses, doctors
and family members of terminally ill understand the applicability of early-willed policies to
the terminal situations if defending a thesis that the applicability of the advance directives of
will in the hospital environment requires their knowledge and training nurses, doctors and
family members of terminally ill caregivers, demonstrating respect for personal autonomy of
patients and families. The methodological approach adopted was a qualitative research,
conducted by carrying out semi-structured interviews with eight nurses and seven medical
residents seven family caregivers of terminally ill patients of a university hospital in southern
Brazil. By discursive textual data analysis, seven categories emerged: conflicts in assisting the
terminally ill: implications to the practice of DAV; the support of family and professional
mediating respect for patient autonomy: advantages to the applicability of the DAV;
difficulties and limitations in implementing the DAV: challenges to hospital practice; fear of
DAV and respect the autonomy: personal desires of care professionals remitted to terminal
illness; the wishes of family caregivers on the terminally ill; family responsibility in the care
to the terminally ill; and respect to the autonomy of the terminally ill by family members: the
fear of the truth. The findings allowed to verify the applicability of the DAV is closely related
to the right of the individual that his autonomy to be respected. The recognition of this right
was emphasized constantly; however many nuances circulate around the possibility that the
DAV can actually guarantee this right, as well as persisting fears and regrets to effectively
demonstrations on the treatments to be used on incapacity can be implemented. In this
context, the findings related to the implementation of DAV raise the need for this theme often
be discussed in the health care environment, focusing on the human being who is in the dying
process, to ensure respect for personal autonomy and human dignity.
Descriptors: Advance Directives; Nursing; Bioethics; Terminally Ill; Personal Autonomy.
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RESUMEN
COGO, Silvana Bastos. Aplicabilidad de las directivas anticipadas de voluntad: nueva
mirada sobre la muerte y la relación con la vida. 2016. 192 hojas. Tesis (Doctorado en
Enfermería) - Escuela de Enfermería, Programa de Postgrado en Enfermería de la Universidad
Federal de Río Grande, Río Grande.
Las directivas anticipadas de voluntad (DAV) tienen derecho a dejar al paciente previamente
expresado los tratamientos que desea o no ser presentada antes de su incapacidad.
Recientemente entró en la escena nacional, representan una alternativa plausible para el
mantenimiento de la autonomía del paciente, lo que contribuye a la reducción de los
conflictos éticos entre los profesionales de salud, familiares y pacientes sobre las decisiones
que implican el tratamiento y la atención al final de la vida. Desde esta perspectiva, en el
supuesto de que la autonomía del paciente es un factor determinante para la aplicabilidad de la
DAV, el marco teórico que apoya esta tesis fue anclado en Beauchamp y Childress, teniendo
en cuenta los conceptos utilizados en principialismo relacionados con la autonomía,
beneficencia y no maleficencia. El objetivo de este estudio fue: para entender cómo los
enfermeros, los médicos y los familiares de los enfermos terminales a entender la
aplicabilidad de las políticas de principios de voluntad a las situaciones terminales, si la
defensa de una tesis de que la aplicación de las directivas anticipadas de voluntad en el
ambiente hospitalario requiere su de conocimiento y de formación enfermeras, médicos y
miembros de la familia de los cuidadores con enfermedades terminales, el respeto que
demuestra por la autonomía personal de los pacientes y las familias. El enfoque metodológico
adoptado fue una investigación cualitativa, llevada a cabo mediante la realización de
entrevistas semi-estructuradas con ocho enfermeras y siete médicos residentes siete
cuidadores familiares de pacientes terminales de un hospital universitario en el sur de Brasil.
Por el análisis de datos textual discursiva, siete categorías emergieron: conflictos en la
asistencia a los enfermos terminales: implicaciones para la práctica de la DAV; El apoyo de la
familia y el respeto de mediación profesional para la autonomía del paciente: ventajas la
aplicabilidad de la DAV; dificultades y limitaciones en la aplicación del DAV: desafíos para
la práctica hospitalaria; miedo de DAV y respetar la autonomía: deseos personales
profesionales del cuidado remitidos a la enfermedad terminal; los deseos de los cuidadores
familiares delante a los enfermos terminales; la responsabilidad de la familia en el cuidado de
enfermos terminales; y respetar la autonomía de los enfermos terminales por miembros de la
familia: el miedo a la verdad. Los resultados permitieron verificar que la aplicabilidad de la
DAV está estrechamente relacionada con el derecho de la persona que se respete su
autonomía. El reconocimiento de este derecho se enfatizó constantemente, sin embargo
muchos matices circulan en torno a la posibilidad de que el DAV realmente puede garantizar
este derecho, así como los temores y pesares persistentes de manera efectiva demostraciones
sobre los tratamientos que se utilizan en la incapacidad puede implementar. En este contexto,
los resultados relacionados con la aplicación de DAV plantean la necesidad de que este tema
suele ser discutido en el entorno de la atención de la salud, centrada en el ser humano que está
en el proceso de la muerte, para garantizar el respeto de la autonomía personal y la dignidad
humana.
Descriptores: Directivas Anticipadas; Enfermería; Bioética; Enfermos Terminales;
Autonomía Personal.
11
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO
12
1 INTRODUÇÃO
14
2 REFERENCIAL TEÓRICO
2.1O SURGIMENTO DA BIOÉTICA
2.2A BIOÉTICA PRINCIPIALISTA
2.2.1 Autonomia
2.2.2 Não-maleficência
2.2.3 Beneficência
2.2.4 Justiça
19
19
22
23
26
31
34
3REVISÃO DE LITERATURA
3.1REVISANDO CONCEITOS
3.1.1 As Diretivas Antecipadas de Vontade / Testamento Vital no contexto
mundial
3.1.2 Conceituando Diretivas Antecipadas de Vontade
3.1.3 Legislação do Conselho Federal de Medicina acerca das Diretivas
Antecipadas de Vontade
3.1.4 Ortotanásia e as Diretivas Antecipadas de Vontade
3.2O RESGATE DA PRODUÇÃO CIENTÍFICA INTERNACIONAL E
NACIONAL DAS DIRETIVAS ANTECIPADAS DE VONTADE
3.2.1 Estudantes e profissionais frente às Diretivas Antecipadas de Vontade
3.2.2 A enfermagem e as diretivas antecipadas de vontade
3.2.3 Receptividade dos pacientes às diretivas antecipadas de vontade
3.2.4 Questões familiares diante das diretivas antecipadas de vontade
36
36
36
4 PERCURSO METODOLÓGICO
4.1 DESENHO DO ESTUDO
4.2 O CENÁRIO DO ESTUDO
4.3 PARTICIPANTES DA PESQUISA
4.4 COLETA DOS DADOS
4.5 ANÁLISE DOS DADOS
4.6 CONSIDERAÇÕES ÉTICAS
66
66
66
68
70
71
74
5 RESULTADOS E DISCUSSÃO
5.1 ARTIGO 1 – Assistência ao doente terminal: vantagens na aplicabilidade das
diretivas antecipadas de vontade no contexto hospitalar
5.2 ARTIGO 2 – Dificuldades e limitações na implementação das diretivas
antecipadas: desafios à prática hospitalar
5.3 ARTIGO 3 – Diretivas antecipadas de vontade: desejos dos profissionais da
saúde e cuidadores familiares quando remetidos a doença terminal
76
77
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
APÊNDICES
ANEXOS
40
42
46
48
48
54
56
62
92
110
130
137
145
151
12
APRESENTAÇÃO
A temática da tese ora apresentada adveio de inquietações oriundas da prática
profissional, além dos resultados obtidos na dissertação de mestrado, concluída em 2008, que
teve como propósito analisar as representações sociais de enfermeiros e médicos, atuantes em
uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI), diante da prática da ortotanásia1 e como essas
representações influenciavam a sua atuação profissional. A prática da ortotanásia havia sido
aprovada, em 2006, por meio de uma Resolução2 do Conselho Federal de Medicina (CFM).
Ao analisar as representações dos enfermeiros e dos médicos, foi possível perceber
dificuldades relacionadas ao reconhecimento da iminência da morte e a possibilidade de
vivenciar esse processo. A construção das representações estava relacionada à possibilidade
de não realizar a reanimação cardiorrespiratória (RCR), como alternativa de exclusão de
sofrimento dos doentes terminais. Contudo, muitas discussões apareciam interpostas, como a
não participação da família nos processos decisórios, discordâncias entre as condutas dos
médicos que repercutiam diretamente na assistência que a enfermagem prestaria ao paciente,
anseios, dúvidas e medos quanto às punições legais frente a limitação de tratamento, e
indefinições de sua aplicabilidade frente ao doente terminal (COGO, 2008).
Ao ingressar no doutorado, optou-se por uma proposta aderente aos anseios da
pesquisadora, e coerente ao desenvolvido nas pesquisas realizadas pelo Núcleo de Estudos e
Pesquisas em Enfermagem e Saúde (NEPES) da Universidade Federal do Rio Grande
(FURG). Assim desenvolveu-se uma pesquisa relacionada à aplicabilidade das Diretivas
Antecipadas de Vontade (DAV), que se trata do direito do paciente exercer sua autonomia,
expondo a quais tratamentos gostaria, ou não, de se submeter, se algum dia estiver incapaz de
manifestar sua vontade, seja por estar inconsciente ou em um estado terminal (BOMTEMPO,
2012).O assunto é recente no Brasil e propõe um novo olhar acerca da morte e sua relação
com a vida, coadunando-se à prática da ortotánasia, além de ser uma temática que traz
preocupações acrescidas à prática da enfermagem, considerando o cumprimento das vontades
manifestas, além das dúvidas relacionadas às questões legais e ao amparo profissional.
Assim, a estrutura da tese apresenta-se da seguinte maneira: introdução, referencial
teórico, revisão de literatura, percurso metodológico, resultados e discussão e considerações
finais, além das referências, apêndices e anexos.
1
A ortotanásia consiste em deixar o paciente morrer naturalmente, sem o uso de aparelhos que prolonguem a
vida artificialmente e propiciem vida puramente vegetativa. Trata-se de não empregar os meios artificiais de
prolongamento inútil da vida humana (NOGUEIRA, 1995).
2
Resolução nº 1805/2006, do CFM que regulamenta e autoriza a prática da ortotanásia (BRASIL, 2006).
13
Na Introdução, primeiro capítulo, apresenta-se a temática das DAV, a
problematização da sua aplicabilidade, justificando sua abordagem nessa tese, além da
descrição da questão de pesquisa, da tese proposta e dos objetivos do estudo. No segundo
capítulo, segue o Referencial teórico fundamentada em Beauchamp e Childress, a partir da
teoria principialista, explorando os conceitos de autonomia, beneficência e não maleficência
que auxiliam na defesa da presente tese.
No terceiro capítulo, a Revisão de literatura abrange as questões conceituais das
DAV e o testamento vital (TV), sua inserção no contexto mundial as legislações existentes
sobre a temática; além do resgate da produção científica internacional e nacional. No quarto
capítulo, Percurso metodológico, descreve-se o desenho e o cenário do estudo, os
participantes da pesquisa, como se procedeu na coleta e análise dos dados, além das
especificações relacionadas às considerações éticas.
No quinto capítulo, Resultados e discussão, constam três artigos oriundos dos
resultados obtidos da tese: o primeiro, denominado “Assistência ao doente terminal:
vantagens na aplicabilidade das diretivas antecipadas de vontade no contexto
hospitalar” objetivou conhecer vantagens relacionadas à aplicabilidade das DAV no contexto
hospitalar, na perspectiva de enfermeiros, médicos residentes e cuidadores familiares. O
segundo artigo intitulado “Dificuldades e limitações na implementação das diretivas
antecipadas: desafios à prática hospitalar” teve como objetivo conhecer dificuldades e
limitações relacionadas à implementação das DAV no contexto hospitalar. O último artigo
objetivou conhecer o entendimento de enfermeiros, médicos e cuidadores familiares quando
remetidos à possibilidade de se tornarem doentes terminais sobre a aplicabilidade das DAV,
intitulado “Diretivas antecipadas de vontade: desejos dos profissionais da saúde e
cuidadores familiares quando remetidos a doença terminal”.
O sexto capítulo, Considerações finais, apresenta-se a síntese dos resultados oriundos
da pesquisa, associada à confirmação da tese proposta, bem como a demonstração da
necessidade de ampliar estudos sobre a temática, encerrando a apresentação dessa pesquisa.
14
1 INTRODUÇÃO
Os recursos tecnológicos avançam com desmedida velocidade e repercutem em
diferentes setores da sociedade. Na área da saúde, pode-se dizer que os tratamentos
disponíveis capazes de curar as diversas enfermidades elevaram a expectativa de vida,
incidindo com o prolongamento do tempo de vida saudável das pessoas. Entretanto, também
aumentaram a busca pelos serviços de saúde, a fim de obter a cura, mesmo quando as
tecnologias disponíveis são ineficazes e as possibilidades curativas já não são mais possíveis.
Desse modo, com a tecnologia disponível, a sensação de que realmente se está fazendo
algo pode ser confundida, assim como há o risco de perder o bom senso perante um doente
terminal, prolongando, assim, seu processo de morrer, em vez de lhe proporcionar mais vida
(NEVES, 2013). Sem dúvida, a união da medicina com a tecnologia trouxe novidades em
nível de opções pela qualidade de vida, mas também implicações éticas, uma vez que a
mesma tecnologia que prolonga a vida de uma pessoa pode simplesmente prolongar o
processo de morrer da outra (PESSINI, BARCHIFONTAINE, 2012).
Na visão de Nunes (2012), a utilização excessiva de tecnologia sofisticada contribuiu
decisivamente para a desumanização da prestação de cuidados de saúde, em virtude da
utilização desproporcional de meios de tratamento em doentes terminais, ou seja, aquilo que
se designa por obstinação terapêutica ou distanásia, uma prática difícil de ser alterada em
virtude da disponibilização abusiva de novas tecnologias biomédicas. Complementa-se, ainda,
o fato de que a cultura medicalizadora da vida impõe que se continue a adiar seu momento
final (BUSSINGUER; BARCELLOS, 2013).
Entretanto, neste contexto, tem-se percebido uma preocupação, tanto por parte de
profissionais da área da saúde, dos operadores do direito, quanto dos cidadãos, com a questão
do morrer (MOREIRA, 2013). Ademais, no futuro, o aumento da amplitude das intervenções
técnico-científicas sobre a vida humana e a doença será uma realidade, mas, ao mesmo tempo,
os doentes e os profissionais de saúde estarão mais conscientes das necessidades de
determinar quando e como essas intervenções são benéficas para as pessoas, considerando o
direito à morte digna, bem como o respeito pela autonomia dos pacientes (NEVES, 2013).
É nessa perspectiva que surgem as DAV3 que, conforme Nunes (2012) permitem uma
3
Será adotado o termo Diretivas Antecipadas de Vontade, considerando a nomenclatura estabelecida pela
Resolução do CFM. No entanto, existem diferentes proliferações vocabulares tratadas como sinônimos, como
por exemplo: manifestação explícita da própria vontade, testamento vital, testamentos em vida, biotestamento,
testamento biológico, diretivas avançadas, vontades antecipadas, declaração prévia da vontade, entre outras.
Ressalta-se que o termo Testamento Vital será citado, pois existem referências que o tratam como sinônimos.
15
pessoa, devidamente esclarecida, recusar determinado tipo de tratamento que no seu quadro
de valores é inaceitável, ou seja, reforçam a possibilidade do exercício da sua liberdade de
autodeterminação, possibilidade que a sociedade vem concedendo progressivamente aos
cidadãos. Além disso, de acordo comPautex, Herrmann e Zulian (2008), as DAV ajudam os
profissionais da saúde a entender os valores e desejos dos pacientes, mas, além disso, atuam
como veículos para discussões aprofundadas e permanentes entre profissionais de saúde,
pacientes e familiares. Assim, as DAV propõem um desafio de reconhecimento da autonomia
dos pacientesnos processos decisórios dos tratamentos querepercutem diretamente nas
relações entre médico e paciente, médico e família dopaciente, e médico com a equipe
assistencial (ALVES; FERNANDES; GOLDIM, 2012).
Face ao exposto e diante de um cenário de ausência normativa jurisprudencial, no
Brasil, o CFM promulgou a Resolução n°1.995/2012 que dispõe, em três artigos, a
possibilidade de aplicação das DAV. É certo que tal Resolução está longe de encerrar as
várias polêmicas que permeiam esse assunto, relacionadas à sua aplicabilidade; à expectativa
que a vontade das pessoas corresponda à decisão final; à inserção do profissional de saúde no
processo das DAV e se esse pode ou tem capacidade para alterar a decisão do paciente, além
de outras dúvidas. Contudo, há que se destacar que essa prática está vigente no Brasil e a
preocupação com os procedimentos médicos a serem realizados no fim da vida ou em
situações de estado terminal fez crescer a procura por testamentos vitais.
Partindo do exposto, o aumento da expectativa de vida no Brasil e, consequentemente,
da ocorrência de doenças incapacitantes e neurodegenerativas, além do maior acesso à
informação, constituem razões significativas para o aumento do interesse pelas DAV. Assim,
Cambricoli (2015) destaca que, segundo levantamento realizado pelo Colégio Notarial do
Brasil – Secção São Paulo (CNB- SP), entre 2009 e 2014, o número de documentos do tipo de
testamento vital registrados em cartório cresceu 2000%. O balanço indicou que em 2009
foram registrados 26 testamentos vitais; em 2011, foram 68; em 2012, o número subiu para
167; em 2013, foram 477 e em 2014 o número passou para 542. O Estado de São Paulo é o
que registrou o maior número de documentos em 2014: 374, seguido de Mato Grosso (MG)
com 86 e Rio Grande do Sul (RS) com 53.
No cenário internacional, onde a prática das DAV é vigente há décadas, constatandose que, embora a temática ainda suscite certas dificuldades de aplicação, ela é bem aceita pela
população, pacientes e profissionais da saúde (BARNES et al., 2007; PAUTEX;
HERRMANN; ZULIAN, 2008; HU et al., 2010; VAN et al., 2010; WILSON; SEYMOUR;
PERKINS, 2010; FRANCO; SILVA; SATURNO, 2011; EVANS et al., 2013; KEAM et al.,
16
2013; CUCALÓN-ARENAL et al., 2013). Entretanto, algumas reservas devem ser feitas ao
generalizar os resultados de países que autorizam a prática das DAV, porque diferenças na
legislação e sistemas de cuidados de saúde, assim como diferenças culturais, podem ter
grande influência sobre os processos de tomada de decisão (RONDEAU; SCHMIDT, 2009).
No cenário brasileiro, as contribuições sobre as DAV, em geral, envolvem análises
teóricas de natureza filosófica e jurídica (RIBEIRO, 2006; PENALVA, 2009; ALVES;
FERNANDES; GOLDIM, 2012; BOMTEMPO, 2012; ALVES, 2013; BUSSINGUER;
BARCELLOS, 2013; DADALTO, 2013a; DADALTO, 2013b; ROCHA et al., 2013), com
apenas uma pequena percentagem de artigos relatando resultados de pesquisas empíricas
realizadas com seres humanos (PICCINI et al., 2011; STOLZ et al., 2011; CAMPOS et al.,
2012; DADALTO; TUPINAMBÁS; GRECO, 2013; CASSOL; QUINTANA; VELHO, 2015;
CHEHUEN NETO, et al., 2015; SILVA, et al., 2015), destacando-se que diversas pessoas,
mesmo do meio científico, ainda não a conhecem. Para Xavier (2013), abordar essa temática
importa tangenciar as mais delicadas crenças e convicções, uma vez que possibilita que as
próprias pessoas realizem escolhas importantes acerca do rumo de suas vidas, ampliando-as
ou as abreviando.
Desse modo, embora se saiba sobre a realidade internacional que, há décadas, realiza
discussões sobre a temática, diferentemente do Brasil, considera-se que é preciso entender
como as DAV são percebidas por uma parcela da população para quem o tema ainda é recente
e gerador de dúvidas, destacando-se a importância de novas investigações para explorar seu
processo de aplicabilidade e aceitabilidade de planejamento. Assim, a fim de implementar
uma prática de diretivas antecipadas com sucesso, supõe-se que seja preciso entender de
forma abrangente atitudes em relação as DAV, além de construir uma estratégia adequada
com base nesses resultados.
Há que se destacar a relevância de explorar pontos de vista dos enfermeiros e médicos
que atuam no contexto hospitalar, além dos familiares de doentes considerados terminais com
relação ao planejamento da assistência, podendo ajudar os profissionais da saúde que atuam
com doentes terminais no planejamento de cuidados ao fim da vida, bem como aos seus
familiares que, por vezes, são os protagonistas nos processos decisórios em fim de vida. A
abordagem em relação à declaração das DAV requer que sejam empreendidas novas ações
que visem à proposta fundamental da própria declaração: a garantia de respeito à vontade do
doente terminal (ROCHA et al., 2013).
Partindo do pressuposto que a autonomia do paciente é fator determinante na
aplicabilidade das DAV, o referencial teórico que embasa essa tese está ancorada nas ideias
17
de Beauchamp e Childress (2002), considerando os conceitos utilizados na teoria
principialista referentesà autonomia, beneficência, não-maleficência e justiça. Para esses
autores, a autonomia requer mais que a obrigação de não intervenção em assuntos pessoais,
porque inclui a obrigação de manter a capacidade de escolha autônoma em pessoas que
estejam com receios e outras condições que debilitam ou interrompam a ação autônoma.
Nessa perspectiva, acredita-se que desvelar o entendimento atribuído pelos
profissionais da saúde às DAV, prioritariamente enfermeiros e médicos, auxiliará na
assistência aos pacientes. A enfermagem, por atuar diretamente com o paciente, e por diversos
momentos ser por eles solicitada, deverá ser conhecedora dessa opção das DAV e, além disso,
assumir o papel de informar, respeitar, acompanhar e cuidar o doente terminal, não podendo
ser alheia ao processo de planeamento, concepção e cumprimento das DAV (NEVES, 2013).
Assim, parte-se do pressuposto de que os benefícios das diretivas antecipadas não são
exclusividade do paciente, que terá sua vontade assegurada, mas também oferecem respaldo
aos profissionais da saúde que disporão de uma maior segurança para agir, uma vez que
amparados na vontade expressa do paciente. Destaca-se, também, a tão almejada resolução de
problemas éticos e morais, perante os quais os profissionais da saúde são submetidos, quando
os pacientes perdem sua capacidade autônoma (RAJÃO, 2013).
Diante dos apontamentos elencados, com a finalidade de sensibilizar os profissionais
da saúde sobre essa temática e contribuir para a reflexão sobre as questões éticas do final de
vida, contribuindo com estudos sobre as DAV com evidências científicas na área da prática
dos cuidados em saúde, justamente por ainda não se possuir regulamentação legal no Brasil, e
pela carência de especificações detalhadas sobre sua aplicabilidade pelos profissionais da
saúde e familiares de doentes terminais, delineou-se como questão de pesquisa: Qual o
entendimento da aplicação das diretivas antecipadas de vontade para os enfermeiros, médicos
e familiares de doentes terminais?
Desse modo, considerando-se que as DAV auxiliam na manutenção da dignidade
humana, da autonomia do paciente, na redução de conflitos éticos dos profissionais da saúde e
familiares diante das situações de terminalidade, buscou-se defender e sustentar a seguinte
tese: a aplicabilidade das diretivas antecipadas de vontade no ambiente hospitalar
requer seu conhecimento pelos enfermeiros, médicos e familiares de doentes terminais,
demonstrando o respeito à autonomia dos pacientes e familiares.
Nessa perspectiva, por ser um tema recente no mundo e principalmente no Brasil e,
portanto, possivelmente ainda pouco debatido, a fim de defender a referida tese, definiu-se o
seguinte objetivo geral para essa pesquisa: compreender como enfermeiros, médicos e
18
familiares de doentes terminais entendem a aplicabilidade das diretivas antecipadas de
vontade para as situações de terminalidade. A fim de complementar, os objetivos específicos
dessa pesquisa incluem:
 Conhecer o entendimento de enfermeiros, médicos e cuidadores familiares quando
remetidos à possibilidade de se tornarem doentes terminais sobre a aplicabilidade das
Diretivas Antecipadas de Vontade.
 Conhecer vantagens, dificuldades e limitações elencadas pelos enfermeiros, médicos e
cuidadores familiares relacionadas a aplicabilidade dasDiretivas Antecipadas de
Vontade no contexto hospitalar.
19
2 REFERENCIAL TEÓRICO
O referencial teórico da presente tese, apresentada neste capítulo, debruça-se nas ideias
compartilhadas por Beauchamp e Childress, a partir da teoria principialista que aborda os
conceitos da beneficência, não-maleficência, autonomia e justiça. Nesta tese, serão exploradas
e direcionadas as discussões aos três primeiros conceitos, considerando serem os que melhor
ilustram a aplicabilidade das DAV. Assim, inicialmente, será apresentada a contextualização
histórica do surgimento da bioética e, logo após, a teoria principialista com seus conceitos.
2.1O SURGIMENTO DA BIOÉTICA
A ética médica foi desenvolvida a partir dos trabalhos de Hipócrates e seus seguidores.
A atitude do médico perante o paciente, desde então, baseava-se no modelo da beneficência,
ou seja, a decisão tanto diagnóstica quanto terapêutica era médica, cabendo, ao paciente,
somente cumprir as decisões. Assim, a autoridade médica, reforçada e legitimada pela
conquista do monopólio profissional, se incorporou aos códigos de ética dos séculos passados,
que tinham em comum a defesa do privilégio e da responsabilidade profissional na arte de
curar. O modelo paternalístico concebia o médico como o maior responsável e como aquele
que, de fato e de direito, decidia pelos pacientes, sendo esses considerados incapazes de
participar das decisões (ALMEIDA, 1999).
O primeiro movimento no sentido de validar a representação moral do paciente na
participação das decisões médicas veio dos tribunais norte-americanos que reconheceram o
direito da pessoa à autodeterminação. No ano de 1957, surgiu o termo "consentimento livre e
esclarecido" que, no ambiente clínico, significou a passagem do modelo da beneficência para
o modelo da autonomia por meio da informação e do consentimento esclarecido. O
deslocamento do modelo médico paternalístico para a representação moral do paciente pode
ser considerado o primeiro passo para o desenvolvimento da bioética (ALMEIDA, 1999).
No final da década de 60 e da de 70, escândalos ocorridos no âmbito da assistência e
da pesquisa biomédica repercutiram nos meios científicos e na mobilização da opinião pública
que assumiu uma forte dimensão moral, exigindo regulamentação ética.Um dos primeiros
dilemas, que impulsionou para um realinhamento de valores no mundo da medicina em 1962,
refere-se ao acontecimento em torno da diálise em Seattle, ou seja, a escolha de pacientes que
participariam do programa de hemodiálise (CALLAHAN, 2012). Em 1966, outra situação
20
escandalosa referente às implicações éticas oriundas da realização de pesquisas biomédicas,
que aconteciam, quase que exclusivamente, com indivíduos vulneráveis como prisioneiros,
doentes mentais, soldados ou minorias étnicas (ALMEIDA, 1999).
Em 1972, se expuseram, publicamente, casos paradigmáticos à necessidade de impor
limites à prática científica. Dentre esses, três, particularmente, marcaram a consciência
pública sobre abusos cometidos pela comunidade científica: considerado uma das maiores
vergonhas da medicina norte-americana, o "Estudo Tuskegee de Sífilis Não-Tratada em
Homens Negros"; o segundo caso tinha por objetivo desenvolver uma vacina para a hepatite B
e os médicos infectaram, propositadamente, com o vírus da hepatite B, cerca de 700 a 800
crianças mentalmente retardadas; no terceiro caso, pesquisadores injetaram células hepáticas
cancerígenas em vinte e dois pacientes idosos e senis (REICH, 2012).
Nesse contexto, formado pelos abusos da ciência e da despersonalização da assistência
médica, terreno sobre o qual a desconfiança nas relações médico-paciente cresceu, surge a
bioética que, de acordo com a origem grega, significa bios (vida) e ética (costumes e valores),
proveniente de dois lugares: em Madison, Wisconsin e em Washington. Quem cunhou o
neologismo "bioética" foi o médico oncologista Van Rensslaer Potter, da Universidade de
Wisconsin, no livro Bioethics: bridge to the future, publicado em 1971; Andre Hellegers, na
Universidade de Georgetown, foi quem primeiro o usou num contexto institucional, para
designar a área de pesquisa ou campo de aprendizagem que hoje se celebra (REICH, 2012).
A proposta de Potter era a de estabelecer uma “ponte” entre as ciências biológicas e os
valores morais, em vista de fundar uma nova ética baseada no escopo da sobrevivência
humana num ambiente saudável. Entretanto, alguns meses após Potter haver introduzido o
novo termo, alguns estudiosos da Georgetown University, tendo o médico obstetra,
fisiologista fetal e demógrafo André Hellegers à frente, utilizaram o mesmo neologismo, mas
com um sentido diferente (REICH, 2012).
A bioética, segundo o "modelo Georgetown", seria um campo interdisciplinar da
própria filosofia moral (e não entre ciência e filosofia como era para Potter), que deveria tratar
de dilemas biomédicos concretos, restritos a três áreas: "a) os direitos e deveres dos pacientes
e dos profissionais de saúde; b) os direitos e deveres na pesquisa envolvendo seres humanos;
e c) a formulação de umguideline para a política pública, o cuidado médico e a pesquisa
biomédica" (REICH, 2012).
Na Universidade de Georgetown, foi criado, em 1971, o Kennedy Institute for Study of
Human Reproduction and Bioethics com o objetivo específico de introduzir eticistas em
laboratórios e em áreas clínicas, onde decisões de vida e de morte seriam realizadas (REICH,
21
2012). A bioética, portanto, nasce de duas concepções, aparentemente inconciliáveis. De um
lado, a concepção de Potter vinculando a duas formas de conhecimento, distintas desde o final
do século XIX por Wilhelm Dilthey, como Ciências Naturais e Ciências do Espírito,
fundando duas tradições disciplinares diferentes e legítimas, cada uma no seu campo de
pertinência e de aplicação específico (CALLAHAN, 2012).
Por outro lado, a concepção do Instituto Kennedy a considerava uma disciplina
pertinente ao campo da filosofia aplicada aos dilemas biomédicos. Com o desenvolvimento da
bioética, foi ficando cada vez mais patente a distinção de abordagem metodológica dessas
duas visões. Enquanto Potter defendia o desenvolvimento de uma ética geral e normativa para
a saúde global, com base nos métodos das ciências naturais, o Instituto Kennedy buscava
inscrever a nova disciplina no campo da filosofia moral, sem recorrer às ferramentas
científicas, mas sim a certos princípios da ética normativa aplicados aos emergentes
problemas da biomedicina (ALMEIDA, 1999).
Vagarosamente, os pesquisadores começaram a perceber e o público começou a exigir
que os estudos deveriam ser conduzidos de tal forma que não levassem em conta somente o
avanço científico, mas protegessem os direitos e o bem estar das pessoas. O congresso
americano criou uma comissão nacional para proteção de questões humanas de pesquisa
biomédica e comportamental, a fim de recomendar regras que guiariam os pesquisadores no
estabelecimento de uma pesquisa ética. Tal comissão, que atuou de 1974 a 1978, procurou
ajuda de uma variedade de especialistas de várias disciplinas, consultando a opinião pública
em muitas questões (CALLAHAN, 2012). Desse modo, foi publicado o Relatório Belmont
(Belmont Report), no qual a comissão propôs três princípios éticos globais que causaram
grande impacto na comunidade médico-científica: o respeito pelas pessoas (autonomia), a
beneficência e a justiça. O relatório inaugurou um novo estilo ético de abordagem
metodológica dos problemas envolvidos na pesquisa em seres humanos (PESSINI, 2002).
No entanto, o Relatório Belmont referia-se somente às questões éticas levantadas pela
pesquisa em seres humanos, sem preocupação com o campo da prática clínica e assistencial.
Assim, muitas das controvérsias da ética biomédica surgiram em torno de doentes terminais e
de pacientes gravemente doentes, emergindo a necessidade de uma estrutura que orientasse as
decisões a respeito dos procedimentos de suporte de vida e da assistência na morte.
Em consequência, conforme Almeida (1999), veio a lume o livro de Tom Beauchamp
e James Childress, Principles of Biomedical Ethics, publicado pela primeira vez em 1977.
Trata-se do documento em bioética mais divulgado no mundo e, ainda hoje, referência central
no debate bioético, em queos autores expõem uma teoria, fundamentada em quatro princípios
22
básicos - não maleficência, beneficência, respeito à autonomia e justiça. Pessini (2002) refere
que Beauchamp e Childress retrabalharam os três princípios do Relatório Belmont em quatro,
distinguindo beneficência de não-maleficência, por entenderem a ética biomédica como uma
ética aplicada aos problemas da prática médico-assistencial.
No início dos anos 80, o movimento da bioética já estava ganhando terreno firme. A
bioéticaera uma criação do tempo. Foi concebida como uma resposta às novas tecnologias em
medicina, mas gestada numa cultura sensível a determinadas dimensões éticas, de modo
especial ao direito dos indivíduos e ao abuso de instituições poderosas. A assistência da saúde
tornou-se uma instituição poderosíssima, com tecnologias igualmente poderosas. As
necessidades e preferências dos pacientes deveriam ser defendidas vigorosamente. A primeira
década da bioética como movimento e disciplina fez justamente isso (CALLAHAN, 2012).
2.2A BIOÉTICA PRINCIPIALISTA
A abordagem bioética dos quatro princípios ou simplesmente principialismo, de
Beauchamp e Childress, partiram do pressuposto de que o caminho para uma ética aplicada às
decisões clínicas não poderia vir, por dedução, de teorias éticas nem ser inferida de situações
clínicas particulares; deveria ser construída desde umamiddle level theory, representada
porum conjunto de princípios éticosprima facie e que funcionasse como modelo a se adaptar
às situações concretas (PESSINI, 2002). Desse modo, conforme o autor supracitado, a origem
da reflexão acerca da ética principialista norte-americana estava na preocupação pública com
o controle social da pesquisa em seres humanos.
Os primeiros bioeticistas encontraram, nos princípios, meios acessíveis para a
resolução dos conflitos éticos, ajudando a clarear questões extremamente difíceis e polêmicas
trazidas pela tecnociência. Assim, o principialismo foi o porto seguro para os médicos durante
o período de profundas mudanças na compreensão ética dos cuidados clínicos assistenciais
nos EUA, e, consequentemente, levando ao fortalecimento do chamado principialismo, que,
sem dúvida, teve grandes méritos e alcançou muito sucesso. Em grande parte, o que é a
bioética nestes poucos anos de existência é principalmente resultado do trabalho de
bioeticistas na perspectiva principialista (PESSINI, 2002).
Na bioética, o principialismo norte-americano é, globalmente, uma das correntes mais
difundidas, considerando o sucesso da proposta no que se refere a sua função prática na
tomada rápida de decisões, que acompanha o fazer médico (CORREA, 2013). Os quatro
princípios procuram subsidiar um ponto de partida para orientar as discussões éticas de como
23
elas podem ser melhor respeitadas em cada caso. Os princípios facilitam e ordenam a análise
dos casos concretos e, a partir de então, se pode necessitar de outros valores para aprofundar a
análise ética. Nesse sentido, na Bioética contemporânea, o principialismo apresenta um
conjunto de postulados básicos que não podem ser ignorados, mesmo que não tenham,
reconhecidamente, um caráter incondicional de princípios (PESSINI, 2002).
O conjunto dos quatro princípios, devido a sua intensa utilização e grande aceitação,
passou a ser chamado de Mantra do Instituto Kennedy de Ética. Partindo do pressuposto que o
principialismo se baseia no uso dos princípios como modelo explicativo para encontrar
soluções aos dilemas e problemas bioéticos inerentes à prática médica, optou-se por esse
referencial teórico a fim de nortear e subsidiar as discussões propostas na presente tese.
Considera-se a sua pertinência na contextualização das DAV, pois essas se respaldam,
principalmente, na possibilidade que o indivíduo tem de escolher como viver os seus últimos
dias como um tributo à sua vida pretérita e um ato ligado ao direito ao corpo e ao livre
desenvolvimento da personalidade, a todos assegurado (FURTADO, 2013).
Importante destacar que os quatro princípios não possuem um caráter absoluto, nem
têm prioridade um sobre o outro, servem como regras gerais para orientar a tomada de decisão
frente aos problemas éticos e para ordenar os argumentos nas discussões de casos
(BEACHAMPS; CHILDRESS, 2002).
2.2.1 Autonomia
As DAV consideram como prioritário o direito do paciente ter os seus desejos, quantos
aos possíveis tratamentos a que quer ou não ser submetido diante de uma situação de
incapacidade, a garantia que sua autonomia seja respeitada, considerando o registro prévio de
suas vontades. Desse modo, embora se reconheça a relevância do principialismo às DAV,
uma das principais motivações dos pacientes para completá-las se refere ao fato de assegurar
sua autonomia (PAUTEX; HERRMANN; ZULIAN, 2008). Assim, as DAV situam-se no
âmbito da autonomia do paciente, considerada neste cenário prima facie4.
A palavra autonomia significa, para Beauchamp e Childress (2002, p. 137), o
“autogoverno, direitos de liberdade, privacidade, escolha individual, liberdade da vontade, ser
o motor do próprio comportamento e pertencer a si mesmo”. Para esses autores, as
manifestações das decisões autônomas que antecedem períodos de incapacidade, devem ser
4
É a obrigação que deve ser cumprida a menos que entre em conflito, numa ocasião particular, com uma
obrigação de importância equivalente ou maior (BEAUCHAMP; CHILDRESS, 2002).
24
consideradas válidas e obrigatórias após se tornar incapaz. Respeitar o paciente autônomo é,
no mínimo, reconhecer seu direito de ter suas opiniões, fazer suas escolhas e agir com base
em seus valores e crenças pessoais.
No cenário brasileiro, a legislação, a partir do Código Civil (BRASIL, 2002),
contempla o respeito à autonomia do paciente, conforme o Art. 13, “salvo por exigência
médica, é defeso o ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição
permanente da integridade física, ou contrariar os bons costumes”. Além disso, o Ministério
da Saúde (MS) editou a Portaria n. 675/GM (Gabinete do Ministro) de 30 de março de 2006
(BRASIL, 2006), aprovando a Carta dos Direitos dos Usuários da Saúde, onde consta o
direito à recusa de procedimentos diagnósticos, preventivos ou terapêuticos, e também de
revogar ou retratar, a qualquer momento, as recusas anteriores, além do direito da indicação
de um representante legal a quem confiará, no futuro, a tomada de decisões para a
eventualidade de tornar-se incapaz de exercer sua autonomia.
A Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos, em seu Art. 5º, expõe que
“a autonomia das pessoas deve ser respeitada, quando possam ser responsáveis por essas
decisões e respeitem a autonomia dos demais. Devem ser tomadas medidas especiais para
proteger direitos e interesses dos indivíduos que não são capazes de exercer autonomia”.
Desse modo,as DAV são exatamente o exercício do direito fundamental à liberdade, uma vez
que é um espaço que o indivíduo tem para tomar decisões pessoais, imunes a interferências
externas, sejam elas dos médicos, da família ou de qualquer pessoa e/ou instituição que
pretenda impor sua própria vontade (DADALTO, 2013a).
No entanto, Beauchamp e Childress (2002) destacam que a ação autônoma não exige o
entendimento pleno ou ausência de influência, pois em geral as decisões são influenciadas
pelos desejos pessoais, pressões familiares, obrigações legais e pressões institucionais. A
autonomia está relacionada à capacidade de aceitar racionalmente, identificar-se com ou de
repudiar um desejo ou preferência a partir do entendimento da informação transmitida que
possibilita fazer um julgamento, visando um resultado e comunicando livremente seu desejo.
Por isso, a necessidade de atentar para a maneira como a informação é apresentada, o que
pode manipular a percepção e a reação do paciente, repercutindo em uma base insatisfatória
para sua tomada de decisões.
Entretanto, existem situações que os pacientes rejeitam receber informações,
delegando a decisão, por terem confiança irrestrita, aos médicos. É oportuno estimular que
processem a informação de modo diferente, minimizando compreensões equivocadas, mesmo
que, por vezes, apresentem uma base de conhecimento limitada e não entendam a informação
25
para avaliar sua relevância de modo suficiente para tomar decisões sobre cuidados médicos
(BEAUCHAMP; CHILDRESS, 2002).
É nesse momento que podem surgir os problemas de autonomia no contexto médico.
Em razão da condição dependente do paciente e da posição de autoridade do profissional, na
medicina, pode haver a intenção de usar a autoridade médica a fim de fomentar a dependência
dos pacientes, em vez de promover sua autonomia. O cumprimento da obrigação de respeitar
a autonomia, entretanto, requer habilitá-lo para superar seu senso de dependência e obter o
maior controle possível ou o controle que deseje (BEAUCHAMP; CHILDRESS, 2002).
Desse modo, os autores supracitados expõem que a escolha prévia do paciente deve
ser honrada, pois, de outro modo, os médicos lhe causariam injúria, contrapondo seu pedido
ou teriam de enganá-lo, não lhe dizendo a verdade. Consequentemente, realizar algo contra a
vontade expressa do paciente é uma violação de sua autonomia, um desrespeito e um insulto à
pessoa, ou seja, significa tratá-lo como um meio, de acordo com os objetivos dos outros, sem
preocupar-se com o que esse indivíduo almeja. Neste sentido, as intervenções contra as
diretivas antecipadas infringem o princípio do respeito à autonomia, embora possam, em
alguns casos, ser justificadas, pois pode haver problemas de interpretação e de determinação
se o agente era capaz, quando formulou as DAV.
No contexto das DAV, as crenças, as escolhas e os consentimentos das pessoas podem
se modificar com o tempo, emergindo problemas morais e interpretativos, pois seria
incoerente a imposição de uma vontade sobre outra ação determinada por uma diretiva
antecipada. Desse modo, é preciso atentar para o julgamento da capacidade 5 do paciente,
distinguindo as decisões autônomas que devem ser respeitadas daquelas decisões que
precisam ser checadas e, talvez, suplantadas por um substituto (BEAUCHAMP;
CHILDRESS, 2002).
Os decisores substitutos tomam as decisões por pacientes incapazes, não autônomos, a
partir de três modelos: o julgamento substituto é o modelo de autonomia fraco, pois se exige
que o decisor substituto “se ponha nas vestes mentais do incapaz”, sendo utilizado para
pacientes que já foram capazes, crendo que a decisão seria a escolhida pelo paciente; o da
pura autonomia que se aplica a pacientes que já foram autônomos e que expressaram suas
5
A palavra capacidade relaciona-se à habilidade de realizar uma tarefa e os critérios das capacidades particulares
variam de contexto para contexto, pois se referem a tarefas específicas, como por exemplo a capacidade para
decidir sobre um tratamento. Quando, a princípio, se revela muito difícil determinar o grau de capacidade, é
conveniente avaliar o entendimento do paciente, sua habilidade deliberativa e sua coerência ao longo do tempo,
fornecendo, concomitantemente, aconselhamento, apoio e informação. Embora as propriedades mais cruciais
para a determinação da capacidade sejam controversas, no contexto biomédico, uma pessoa geralmente é
considerada capaz caso esteja apta a compreender uma terapia ou um procedimento, a deliberar acercade riscos e
benefícios importantes e a tomar uma decisão à luz dessa deliberação (BEAUCHAMP; CHILDRESS, 2002).
26
decisões ou preferências pessoais para a tomada de decisões; e o dos melhores interesses do
paciente em que o decisor deve determinar o maior benefício entre as opções possíveis,
atribuindo diferentes pesos aos interesses que o paciente tem em cada opção e subtraindo os
riscos e os custos inerentes a cada uma (BEAUCHAMP; CHILDRESS, 2002).
Nesse contexto, é importante que os substitutos respeitem os julgamentos autônomos
prévios do paciente ou que ajam de forma responsável como decisores, pois é difícil encontrar
pessoas apropriadas que desejem assumir a tarefa de tutelar para pessoas incapazes, e as
famílias, algumas vezes, tomam decisões que entram em choque com os desejos do paciente.
Nesse sentido, Beauchamp e Childress (2002) expõem que os pacientes anteriormente
capazes, que tenham expressado autonomamente suas preferências na forma de uma DAV,
devem ser tratados segundo o modelo da pura autonomia. O paciente conquistou o poder de
tomar decisões sobre sua saúde e sua vida; de sujeito passivo passou a titular do direito. O
profissional de saúde, de sujeito ativo, passou a titular de uma obrigação. Antes soberano para
tomar decisões, passou a conselheiro, num diálogo franco com o paciente, titular do direito de
tomá-las mediante esclarecimento que lhe é devido pelo profissional (RIBEIRO, 2006).
O princípio de respeito à autonomia tornou-se, nestas últimas décadas, uma das
principais ferramentas conceituais da ética aplicada, sendo utilizado em contraposição ao
assim chamado paternalismo médico. No conjunto dos princípios bioéticosprima facie, (isto é,
que admitem exceções de acordo com as circunstâncias específicas), o de respeito à
autonomia tem relevância no campo biomédico. Em sociedades democráticas e pluralistas,
ninguém teria o direito de impor aos outros seus estilos de vida e suas concepções sobre bem
e mal. Aplicado à prática médica, o princípio de respeito à autonomia vem trazendo dilemas
éticos à prática médica paternalista. Com efeito, os pacientes, amparados por normas e
legislações que buscam garantir o direito à autodeterminação, aceitam cada vez menos
passivamente ordens médicas relacionadas à sua saúde. Nesse sentido, os princípios de
respeito à autonomia e do consentimento livre e esclarecido são os princípios centrais na
análise das mudanças da prática médica contemporânea (ALMEIDA, 1999).
2.2.2 Não-maleficência
No contexto do paradigma principialista, o princípio que respalda a prática das DAV é
a não-maleficência que determina a obrigação de não prejudicar e de não impor riscos ou
dano intencionalmente. Assim, são sancionados os julgamentos sobre a qualidade de vida, ou
seja, que se permite, em determinadas condições, que os pacientes, os decisores e os
27
profissionais de saúde estabeleçam distinções entre a abstenção e a interrupção dos
tratamentos, após ponderaem os custos e os benefícios (BEAUCHAMP; CHILDRESS, 2002).
Os profissionais e membros da família julgam que as decisões de interromper
tratamentos são mais importantes e mais graves que as decisões de não iniciá-los. A ideia é
que essas ações os tornam responsáveis e culpáveis pela morte do paciente, enquanto não são
responsáveis se não derem início ao tratamento. Entretanto, os pacientes e os substitutos,
muitas vezes, ficam menos estressados e sentem-se com mais controle se uma decisão pelo
tratamento puder ser revertida ou modificada depois que houver sido iniciada
(BEAUCHAMP; CHILDRESS, 2002).
A distinção entre a abstenção e a interrupção de um tratamento é moralmente
insustentável, pois as duas opções podem causar a morte de um paciente, e ambas podem ser
exemplos da ação de deixar morrer; contudo, interromper um tratamento particular, incluindo
o de suporte de vida, não envolve necessariamente o abandono do paciente. A interrupção
pode seguir diretrizes do paciente e ser acompanhada e seguida por outras formas de cuidado
(BEAUCHAMP; CHILDRESS, 2002). As decisões sobre os tratamentos devem se basear em
considerações a respeito dos direitos e do bem-estar do paciente, e, portanto, dos custos e
benefícios do tratamento, conforme julgados pelo paciente ou por um substituto.
No contexto da não-maleficência, a limitação de um suporte de vida, especificamente
a recusa à RCR, Beauchamp e Childress (2002) destacam que essa decisão é, muitas vezes,
independente de outras políticas sobre tecnologias de suporte de vida, como respiradores, pois
os profissionais consideram que não fornecer RCR significa abster-se de oferecer tratamento,
e não de interrompê-lo, sendo considerada apropriada aos doentes terminais, de perda
irreversível de consciência e de probabilidade de parada cardíaca ou respiratória que não
possa ser tratada. As decisões acerca de fornecer ou não RCR são problemáticas quando
realizadas sem consulta prévia aos pacientes ou a suas famílias. Nesse sentido, não é
justificável considerar as decisões sobre RCR como diferentes das decisões sobre outras
tecnologias de suporte de vida como, por exemplo, à nutrição e hidratação artificial.
Para Beauchamp e Childress (2002), a nutrição e a hidratação artificiais podem ser
repudiadas como outras tecnologias de suporte de vida, considerando que não se verifica uma
razão para crer que sejam sempre uma parte essencial dos cuidados paliativos6 ou que sempre
constituam, necessariamente, um tratamento médico benéfico. A nutrição e a hidratação
6
Conforme a Organização Mundial da Saúde (OMS, 2002, p.03), os cuidados paliativos compreendem uma
abordagem que aprimora a qualidade de vida, dos pacientes e famílias que enfrentam problemas associados com
doenças ameaçadoras de vida, através da prevenção e alívio do sofrimento, por meio da identificação precoce,
avaliação correta e tratamento da dor e de outros problemas de ordem física, psicossocial e espiritual.
28
remetem ao significado simbólico; ou seja, os profissionais da saúde geralmente consideram
devastador deixar alguém sem alimentação, pois o fornecimento de alimentos e de água
simboliza a essência do cuidado e da compaixão. Entretanto, evidências indicam que
pacientes aos quais se permite morrer sem hidratação artificial morrem mais confortavelmente
que pacientes que receberam hidratação artificial; as desvantagens superam as vantagens, e
ninguém pode privá-los do direito de recusar esse tratamento.
Desse modo, os tratamentos de suporte de vida podem ser benéficos ou maléficos para
os pacientes, sendo preciso tratá-los individualmente. De acordo com Beauchamp e Childress
(2002), os excessos devem ser determinados pela probabilidade dos benefícios em
comparação com as prováveis desvantagens. Se não houver uma esperança razoável de
benefício, então, todo custo, dor ou outra inconveniência serão excessivos, sendo, algumas
vezes, obrigatório não tratar. Se houver uma esperança razoável de benefício, juntamente com
desvantagens consideráveis, o tratamento é opcional. Pacientes capazes tem o direito de tomar
decisões sobre os tratamentos, e, para pacientes incapazes, o tratamento não é obrigatório caso
existam muitas desvantagens. A distinção se reduz ao balanço dos custos e benefícios, e se
fornecem uma boa orientação moral para as decisões por tratamento ou pelo não-tratamento.
Considerando o argumento dos tratamentos de suporte de vida, e os entraves que
circundam essas delimitações, Beauchamp e Childress (2002) propõem uma distinção sobre
os tratamentos obrigatórios e os opcionais, levando em conta as categorias: I. obrigatório
tratar; II. Opcional tratar e III. Obrigatório não tratar. Nesse sentido, em determinadas
circunstâncias, fornecer o tratamento é as vezes desumano e cruel, e, portanto, uma violação
do princípio da não-maleficência.
Várias condições justificam a omissão dos tratamentos, considerando que um
tratamento não é obrigatório quando não oferece benefício ao paciente, por ser inútil ou
despropositado. Nessa perspectiva, qualificar um tratamento como fútil implica determinar
que sua eficácia é altamente improvável e praticamente certo que o resultado será
insatisfatório; com o tratamento mais penoso que benéfico e quando se trata de um caso
completamente especulativo, porque o tratamento nunca foi tentado. Na prática, é difícil se
definir critérios para a determinação da futilidade; com frequência, há divergências na
comunidade médica; além disso, podem surgir conflitos a partir da crença familiar de um
milagre, da insistência de uma tradição religiosa em fazer de tudo o que é possível
(BEAUCHAMP; CHILDRESS, 2002).
Há que se destacar que, por vezes, o fato de um tratamento ser fútil modifica o
relacionamento moral do médico com o paciente ou com seus responsáveis. A conclusão é
29
que um tratamento despropositado ou fútil, no sentido que não tem chance de ser eficaz, pode
ser moralmente opcional; porém, outros tratamentos supostamente fúteis muitas vezes não são
opcionais. Para Beauchamp e Childress (2002), mesmo se o paciente não estiver em estado
terminal, o tratamento de suporte de vida não é obrigatório, caso as desvantagens excedam os
seus benefícios. O tratamento médico para pessoas que não são terminais é às vezes opcional,
embora possa prolongar a vida por um período de tempo indefinido, ainda que o paciente seja
incapaz e não tenha deixado nenhuma diretiva antecipada.
Poucas decisões são mais importantes do que as de recusar ou de interromper um
procedimento médico que sustenta a vida de um paciente. Em alguns casos, porém, é
injustificado que os responsáveis ou os clínicos resolvam iniciar ou dar continuidade à terapia
sabendo que ela irá produzir uma proporção maior de dor e de sofrimento para um paciente
incapaz. Entretanto, é praticamente impossível determinar o que será benéfico para o paciente
sem pressupor algum modelo de qualidade de vida e a noção da vida que irá viver após uma
intervenção médica. Além disso, a qualidade de vida do paciente não pode ser confundida
com os significados dos valores da vida para outros, e os responsáveis por pacientes incapazes
não devem recusar um tratamento contra os interesses destes para poupar fardos às famílias
ou custos à sociedade. Os melhores interesses médicos do paciente incapaz em geral devem
ser o critério decisivo para a decisão de um tutor, mesmo que esses interesses entrem em
choque com os interesses da família (BEAUCHAMP; CHILDRESS, 2002).
No princípio de não-maleficência, embora as DAV estejam fundamentadas mais na
autonomia, é difícil especificar decisões ou parâmetros que antecipem adequadamente toda a
gama de situações médicas que possam ocorrer, o que enfatiza a tendência da designação de
decisores substitutos (BEAUCHAMP; CHILDRESS, 2002).
As DAV protegem os interesses de autonomia e podem reduzir o estresse das famílias
e dos profissionais de saúde que temem tomar a decisão errada, mas também geram
problemas práticos morais. Por exemplo, poucas pessoas redigem um documento ou deixam
instruções explícitas, além de que o responsável designado pode não estar disponível quando
necessário, ou pode ser ou estar incapaz de tomar boas decisões para o paciente ou pode ter
um conflito de interesses, por exemplo, em virtude da perspectiva do recebimento de uma
herança ou do ganho de uma posição melhor nos negócios da família. Ainda, os pacientes
podem modificar suas preferências acerca de tratamentos, sem modificar a tempo suas
instruções, e alguns, ao se tornarem legalmente incapazes, protestam contra as decisões do
responsável designado (BEAUCHAMP; CHILDRESS, 2002).
30
Os responsáveis legais também tomam decisões das quais os médicos discordam
radicalmente, e, em alguns casos, pedem aos médicos que ajam contra suas consciências.
Alguns pacientes não possuem a compreensão adequada do conjunto de decisões que um
profissional ou um responsável podem ter de tomar, e, mesmo com uma compreensão
adequada, com frequência, é difícil antever situações clínicas e possíveis experiências futuras.
Desse modo, as dificuldades quanto às DAV podem ser contornadas com documentos
cuidadosamente redigidos, com um aconselhamento apropriado e com explicações
especializadas sobre as possibilidades médicas e as opções de tratamento; no entanto, alguns
problemas de interpretação permanecerão, a despeito do maior envolvimento dos médicos e
das ferramentas de educação utilizadas. Com certeza, as DAV constituem uma forma
promissora para que as pessoas capazes exerçam sua autonomia; os problemas são
principalmente práticos, e alguns deles podem ser superados pelo emprego de métodos
adequados de implementação (BEAUCHAMP; CHILDRESS, 2002).
Neste contexto, quando o paciente incapaz não deixou as DAV, Beauchamp e
Childress (2002) referem que o papel da família deve ser presumido como o primário em
razão da sua provável identificação com os interesses do paciente, do conhecimento de seus
desejos, da preocupação com ele e do papel tradicional da família na sociedade. Entretanto,
pode acontecer o contrário, ou seja, familiares com conflito de interesse - tanto no bem-estar
como na morte do parente -, mal informados ou serem distantes pessoalmente. Por vezes,
ainda, os familiares renunciam ao papel de responsáveis. Assim, a autoridade da família não é
final ou máxima, e os médicos se sentem obrigados a rejeitar a decisão da família, a tomar a
decisão ou a requerer que ela seja revisada por um comitê de ética.
Partindo do exposto, de acordo com Beauchamp e Childress (2002), os profissionais
de saúde podem auxiliar os familiares a se tornarem bons decisores, protegendo os interesses
e as preferências do paciente, monitorando a qualidade das decisões dos responsáveis.
Contudo, se a decisão dos responsáveis é contestada e as divergências não podem ser
resolvidas, os comitês institucionais de ética podem atuar como um mecanismo que auxilia na
tomada de decisão, possuindo a função de criar e recomendar políticas explícitas para o
gerenciamento de ações como a omissão e a suspensão de tratamentos, além da atuação com
funções educacionais. Contudo, há o argumento de que os comitês são desnecessários no
processo de decisão, pois impõem uma outra etapa de atraso burocrático, caso não sejam
convocados em tempo hábil, e, as vezes, são manipulados por grupos poderosos.
31
2.2.3 Beneficência
De acordo com o princípio da beneficência, a moralidade requer que, além de tratar as
pessoas como autônomas, abstendo-se de prejudicá-las, contribua no sentido de proporcionarlhes o bem-estar, o que potencialmente exige mais que o princípio da não-maleficência, pois
os agentes tem de tomar atitudes positivas para ajudar os outros, e não meramente se abster de
realizar atos nocivos. Nesse sentido, a palavra beneficência significa atos de compaixão,
bondade e caridade, referindo-se a uma ação realizada em benefício de outros, ou seja, a
possibilidade da promoção do bem-estar dos pacientes e não meramente evitar danos
(BEAUCHAMP; CHILDRESS, 2002).
Para Beauchamp e Childress (2002), as obrigações de conceder benefícios, de prevenir
e reparar danos e de pesar e ponderar os possíveis benefícios contra os custos e os danos
causados por uma ação são centrais na ética biomédica. Entretanto, muitas regras de
beneficência obrigatória constituem uma parte importante da moralidade, que incluem:
proteger e defender os direitos dos outros; evitar que outros sofram danos; eliminar as
condições que causarão danos a outros; ajudar pessoas inaptas; e socorrer pessoas em perigo.
As regras de não-maleficência incluem as proibições negativas de ações, que devem
ser obedecidas de modo imparcial e que servem de base a proibições legais de certas formas
de conduta. Em contraposição, as regras da beneficência apresentam exigências positivas de
ação, sendo que nem sempre precisam ser obedecidas de modo imparcial e raramente – ou
nunca – servem de base a punições legais contra quem deixa de aderir a elas. Deixar de agir
de modo não-maleficente para com alguém é (prima facie) imoral, mas deixar de agir de
modo beneficente para com alguém com frequência não é imoral.
Beauchamp e Childress (2002) adotam distinções entre a beneficência específica e a
beneficência geral; na primeira, há a obrigação de ajudar, direcionando-se a indivíduos ou
grupos específicos, tais como as crianças, os amigos e os pacientes, enquanto a beneficência
geral ultrapassa os relacionamentos especiais, direcionando-se a todas as pessoas. Contudo,
quando o paciente contrata um médico para a prestação de serviços, o profissional assume
uma obrigação de fornecer um tratamento benéfico, referente a uma função ou um papel
específico, que não estaria presente caso essa relação não houvesse sido estabelecida.
No contexto das DAV, há que se destacar a possibilidade de que o paternalismo
permeie as questões relacionadas a sua aplicabilidade. Conforme Beauchamp e Childress
(2002), no paternalismo, há conflitos entre a beneficência e autonomia, considerando que a
principal obrigação do médico é a de agir em benefício do paciente, e não a de promover a
32
decisão autônoma. Contudo, os direitos de autonomia tornaram-se tão influentes que é difícil
encontrar defesas claras dos modelos tradicionais da beneficência médica. Se o conteúdo da
obrigação do médico de ser beneficente é definido pelas preferências do paciente, então em
vez da beneficência, triunfa o respeito à autonomia. Desse modo, essa posição traduz que a
beneficência fornece a meta e o fundamento primordiais da medicina e da assistência,
enquanto o respeito à autonomia estabelece os limites morais das ações dos profissionais.
Para Beauchamp e Childress (2002), o paternalismo estabelece um limite à escolha
autônoma, por meio da interferência ou da recusa em aceitar as preferências da pessoa acerca
do seu próprio bem e geralmente envolvem coerção, por um lado, ou mentiras, manipulação
ou ocultação de informações, por outro, com o propósito de evitar danos ou de beneficiá-la.
Devido aos médicos acreditarem que revelar certos tipos de informação e dizer a verdade
causariam danos aos pacientes que estão sob seus cuidados, é que a ética médica os obriga a
não causar esse dano. Nesse sentido, para o bem do paciente, algumas informações devem ser
omitidas ou devem ser reveladas apenas à família, pois podem comprometer o julgamento
clínico e representar uma ameaça à saúde do paciente.
Desse modo, conforme Beauchamp e Childress (2002), se uma intervenção
paternalista não viola a autonomia por não haver uma autonomia substancial, é mais fácil
justificar a intervenção do que no caso de uma preferência ou ação comparável que seja
autônoma. Assim, certas ações autônomas, assim como as não-autônomas, são as vezes
justificavelmente restringidas com base na beneficência.
Partindo desse pressuposto, Beauchamp e Childress (2002) mencionam que há o
paternalismo fraco e o paternalismo forte, ambos com objetivo de beneficência ou nãomaleficência. No primeiro, o agente intervém para prevenir uma conduta substancialmente
não-voluntária e exige que as habilidades do indivíduo estejam de alguma forma
comprometidas. O paternalismo forte, em contraposição, envolve intervenções a despeito do
fato de que as escolhas arriscadas da pessoa sejam informadas, voluntárias e autônomas, ou
seja, há recusa a aceitar os desejos, as escolhas e as ações autônomas de uma pessoa.
Com base no exposto, o antipaternalismo acredita que uma intervenção do tipo
paternalista forte não pode ser justificada, pois viola os direitos individuais e restringe
indevidamente a livre escolha, revelando um desrespeito para com os agentes autônomos, por
não tratá-los como moralmente aptos, mas como algo menos que determinadores
independentes de seu próprio bem. Os antipaternalistas argumentam, também, que os padrões
paternalistas são muito amplos; portanto, se usados como política básica autorizam e
institucionalizam demasiadas intervenções.
33
Para Beauchamp e Childress (2002), na fundamentação do paternalismo, o melhor é
não introduzir as explicaçõesbaseadas na autonomia. A beneficência justifica ações
paternalistas, considerando que o benefício está numa escala com interesses de autonomia, na
qual ambos devem ser ponderados: à medida que aumentarem os interesses na autonomia e
diminuírem os benefícios para a pessoa, assim o paternalismo torna-se menos provável;
inversamente, à medida que aumentam os benefícios para a pessoa e diminuem os interesses
na autonomia, aumenta a plausibilidade de que se justifique um ato de paternalismo. Portanto,
prevenir danos menores ou proporcionar benefícios menores e, ao mesmo tempo, desrespeitar
seriamente a autonomia não possui justificação plausível; por outro lado, prevenir danos
importantes e proporcionar benefícios importantes desrespeitando apenas um pouco a
autonomia tem um embasamentopaternalista altamente plausível.
As ações menores do tipo paternalista forte são comuns em hospitais. Se não houver
uma alternativa razoável ou, por exemplo, se doentes terminais forem poupados de
sofrimentos totalmente inúteis, tais ações são casos de paternalismo forte justificado;
comumente, elas só são apropriadas e justificadas na assistência à saúde, caso as condições
restritivas sejam satisfeitas, ou seja, se o paciente está exposto a um dano significativo e
evitável; se a ação paternalista provavelmente for evitar o dano; se os benefícios esperados da
ação paternalista suplantarem os riscos para o paciente; e se a alternativa adotada, que
assegure os benefícios e reduza os riscos, for a que menos restrinja a autonomia
(BEAUCHAMP; CHILDRESS, 2002).
Há que se destacar, contudo, que sua interpretação e seus limites necessitam de uma
análise mais extensa; além disso, outra condição necessita ser considerada nesse contexto, ou
seja, que a ação paternalista não se restrinja substancialmente à autonomia. Essa condição só
poderia ser satisfeita se não estiverem em jogo interesses de autonomia vitais ou substanciais.
Contudo, alguns raros casos de paternalismo forte justificado cruzam essa linha da violação
mínima. Em geral, à medida que aumenta a ameaça ao bem-estar de um paciente ou a
probabilidade de ocorrer um dano irreversível, aumenta também a probabilidade de se
justificar uma ação paternalista. Uma intervenção paternalista exige pessoas com um bom
julgamento, bem como pessoas com princípios bem desenvolvidos, capazes de enfrentar
conflitos contingentes (BEAUCHAMP; CHILDRESS, 2002).
Os debates sobre o paternalismo enfocam, tipicamente, as intervenções paternalistas
ativas em casos que os pacientes preferem a não-intervenção. Uma forma também
negligenciada de paternalismo aparece na recusa, por parte do profissional, em cumprir as
preferências do paciente por razões paternalistas – um paternalismo passivo. Essas ações
34
comumente são justificadas com mais facilidade que as ações de paternalismo ativo, pois os
médicos em geral não tem a obrigação moral de satisfazer os desejos do paciente quando são
incompatíveis com os padrões aceitos da prática médica ou quando contrários a sua
consciência.
O paternalismo passivo se insere nas discussões sobre a futilidade médica, ou seja, se
o suporte vital é fútil, então é permitido negar as solicitações de tratamento. Desse modo, uma
alegação justificada de que um procedimento médico é fútil retira-o do conjunto de atos
benéficos que os pacientes ou seus responsáveis podem escolher. A alegação geralmente não
é de que uma determinada intervenção irá causar dano ao paciente, mas apenas que não
produzirá o benefício esperado. A obrigação de proporcionar um benefício é de fato cancelada
por uma alegação justificada de futilidade (BEAUCHAMP; CHILDRESS, 2002).
Para Beauchamp e Childress (2002), é apropriado pedir a especificação dos objetivos
em relação aos quais se diz que o procedimento é fútil. Uma inquirição pode revelar que o
benefício que o médico duvida que seja obtido pode não ser o mesmo benefício visado pelo
paciente. Com frequência, se assume, por exemplo, que o objetivo legítimo da RCR é que o
sobrevivente seja liberado do hospital; a RCR é considerada fútil para pacientes nas categorias
que estatisticamente não sobrevivem para receber alta. Contudo, uma sobrevivência curta
pode ser o principal objetivo para o paciente ou para a família. Além disso, alguns atos como
o fornecimento de nutrição e hidratação artificiais podem ter um significado simbólico ao
expressar preocupações de cuidado, ainda que não tragam nenhum outro benefício médico
para o paciente. O debate sobre futilidade é, em última análise, um debate sobre objetivos, e
as discussões a respeito dos objetivos apropriados envolvem conflitos de valores.
Assim, não fornecer um tratamento, sem o consentimento do paciente ou do seu
responsável, é um ato justificável de paternalismo, pois fornecer informações sobre um
procedimento inútil pode ser desorientador e diminuir a autonomia. É preciso, portanto, um
julgamento moral que leve em consideração os diferentes fatores contextuais para decidir se é
apropriado ou obrigatório informar o paciente e a família de que determinada intervenção
não-benéfica não será realizada (BEAUCHAMP; CHILDRESS, 2002).
2.2.4 Justiça
O último princípio, o da justiça, pode ser entendido como a distribuição justa,
equitativa e apropriada na sociedade, de acordo com normas que estruturam os termos da
cooperação social. Uma situação de justiça, de acordo com essa perspectiva, estará presente
35
sempre que uma pessoa receber benefícios ou encargos devidos às suas propriedades ou
circunstâncias particulares. Oprincípio da justiçaestabelece, como condição fundamental, a
equidade, ou seja, a obrigação ética de tratar cada indivíduo conforme o que é moralmente
correto e adequado, de dar a cada um o que lhe é devido. Os profissionais da saúde devem
atuar com imparcialidade, evitando, ao máximo, que aspectos sociais, culturais, religiosos,
financeiros ou outros interfiram na relação com os pacientes e familiares. Além disso, os
recursos devem ser equilibradamente distribuídos, com o objetivo de alcançar, com melhor
eficácia, o maior número de pessoas assistidas (BEAUCHAMP; CHILDRESS, 2002).
Desse modo, considerando o contexto da aplicabilidade das DAV, de acordo com
Beauchamp e Childress (2002), não há como considerar um princípio ou modelo como
prioritário e resolvido de forma simplificada, na prática médica, defendendo-se um princípio
contra o outro ou transformando um princípio em absoluto. Assim, é necessário avaliar as
situações apresentadas no contexto prático a fim de subsidiar as ações de maneira a minimizar
os conflitos que envolvem situações em final de vida.
36
3 REVISÃO DE LITERATURA
A revisão de literatura realizada, para embasar este estudo, ocorreu a partir da busca
pelos temas: As Diretivas Antecipadas de Vontade / Testamento Vital no contexto mundial7
(Anexo I); Conceituando Diretivas Antecipadas de Vontade; a Ortotanásia e as Diretivas
Antecipadas de Vontade e Legislação do Conselho Federal de Medicina acerca das Diretivas
Antecipadas de Vontade. Além disso, foi realizado o resgate da produção científica
internacional e nacional das DAV que resultou na produção de um artigo de revisão
integrativa8 (Anexo II).
3.1REVISANDO CONCEITOS
3.1.1 As Diretivas Antecipadas de Vontade / Testamento Vital no contexto mundial
A menção sobre o direito dos pacientes adultos e capazes, em escolher sobre recusa de
tratamentos que visassem apenas prolongar o processo de morte, quando o estado clínico
fosse irreversível ou em estado vegetativo, foi proposto nos Estados Unidos da América
(EUA), em 1969, por Luis Kutner que cunhou o termo living will (KUTNER, 1969),
usualmente conhecido no Brasil como Testamento Vital (TV)9.
Em 1976, a Califórnia foi o primeiro estado a apresentar um estatuto sobre o TV nos
EUA, por meio do Califórnia Natural Death Acte e, em 1984, a legalizar a figura do
procurador de cuidados de saúde por meio do California Durable Power of Attorney for
Health Care Decisions Act (DPAHC) (NUNES, 2012). O TV foi contemplado, em outros
estatutos, em vários estados dos EUA, com o objetivo de validar legalmente os testamentos.
Considera-se oportuno reconhecer que as discussões referentes aos direitos dos
pacientes, quanto ao seu exercício de autonomia, assumiram proporção significativa, em
virtude de casos expostos na mídia, como o de Karen Ann Quinlan (1985), e Nancy Cruzan
(1990) que permaneceram em estado vegetativo persistente. Seus representantes solicitaram a
retirada dos suportes que prolongavam a vida, impondo um valor decisivo para a criação de
uma lei acerca do tema nos EUA, despertando a necessidade de legislação em outros países.
7
Artigo aceito para publicação na Revista Texto & Contexto.
COGO, S.B; LUNARDI, V. L. Diretivas antecipadas de vontade aos doentes terminais:revisão integrativa.
REBEn, v.68, n. 03, p.464-74, 2015.
9
Há diferenciação conceitual entre as terminologias diretivas antecipadas de vontade e testamento vital, que
serão esclarecidas no próximo capítulo neste estudo.
8
37
Na década de 1990, duas propostas de regulamentação de uma nova perspectiva
surgiram, uma na Europa e outra nos EUA. As Diretivas Antecipadas, denominadas de
Advances Directives, estão previstas pelo Patient Self-Determination Act (PSDA) ou Ato de
Autodeterminação do Paciente, lei norte americana aprovada pelo Congresso dos Estados
Unidos em 1990 (EUA, 1990), vigente a partir de 1º de dezembro de 1991, constituindo-se na
primeira legislação do mundo a tratar sobre as diretivas antecipadas (DADALTO, 2013a), a
fim de promover o uso das DAV.
As diretivas antecipadas, conforme a lei americana, visam garantir o direito à
autonomia do paciente, quando ingressa nos centros de saúde, sendo registradas suas objeções
e opções de tratamento em caso de sua incapacidade quando doente (EUA, 1990). Essas
diretivas antecipadas podem ser realizadas de três maneiras: o living will (testamento em
vida), documento no qual o paciente dispõe, em vida, seu desejo quanto aos tratamentos ou à
sua recusa para quando se tornar incapaz em decorrência de uma doença terminal; o durable
power ofattorney for health care (poder duradouro do representante para cuidados com a
saúde), documento no qual, por meio de um mandato, se estabelece um procurador de saúde
para decidir e tomar providências em relação ao paciente, no caso de sua incapacidade; e o
advanced core medical directive (diretiva do centro médico avançado), que consiste em um
documento mais completo, direcionado ao doente terminal, que reúne as disposições do seu
testamento em vida e do mandato duradouro, ou seja, é a união dos outros dois documentos
(BOMTEMPO, 2012; DADALTO, 2013a).
Sob esse enfoque, as DAV podem ser contempladas em dois subgrupos: o da
afirmação de valor, em que são descritas de maneira geral as preferências e os valores do
paciente em relação aos tratamentos e cuidados médicos, ou seja, não se trata de maneira
específica de tratamento ou enfermidade. Já a segunda modalidade refere-se àinstrução
diretiva expressa, que é a preferência ou recusa por determinado tratamento médico no
contexto de determinada doença (TOLLER; BUDGE, 2006).
Na Europa, em 1997, foi proposta a Convenção de Oviedo sobre Direitos Humanos e
Biomedicina, que já vinha sendo discutida desde 1990. Em ambos os documentos, PSDA e
Oviedo, está previsto que o paciente poderia antecipar a sua decisão sobre procedimentos
assistenciais. Essa manifestação antecipada de vontade, por meio de documentos, deveria ser
considerada pelos médicos e demais profissionais de saúde, na impossibilidade do paciente
poder manifestar sua autorização a procedimentos que lhe são prescritos (ALVES,
FERNANDES, GOLDIM, 2012). O Conselho da Europa reiterou esta posição na Resolução
1859, de janeiro de 2012.
38
Para Wetle (1994), grande parte da defesa para aumentar o envolvimento do paciente
nas decisões de cuidados de saúde, mediante uma aplicação ampla do consentimento e
execução de testamentos e de outras diretivas antecipadas, decorreu da preocupação de que
excessos estavam sendo feitos para os pacientes, principalmente no final da vida. Testamentos
em vida foram desenvolvidos especialmente pela preocupação de que indivíduos poderiam ser
mantidos indefinidamente em "tubos e máquinas"; nesse sentido, uma grande maioria é
executada justamente para limitar ou recusar tratamentos, sob essas circunstâncias.
Nos últimos anos, muitos países europeus aprovaram legislação específica sobre TV.
Na Espanha, em 2002, ocorreu a regulação sobre os direitos e obrigações de pacientes,
usuários e profissionais, bem como de escolas e serviços de saúde, públicos e privados, sobre
a autonomia do paciente, informações clínicas e documentação (ESPANHA, 2002). Em 2002,
na Bélgica, a Lei sobre os Direitos dos Pacientes Belgas (BÉLGICA, 2002). Na Inglaterra, em
2005, houve a aprovação da Lei da capacidade mental, contemplando a possibilidade das
DAV (INGLATERRA, 2005). Já, em 2008, a Lei da vontade antecipada para o Distrito
Federal legalizou, no México, a possibilidade de manifestação prévia (MÉXICO, 2008).
Em 2009, no Uruguai, foi aprovada a Lei da Vontade Antecipada (URUGUAI, 2009).
No mesmo ano, na Alemanha, foi contemplada em sua legislação a base jurídica para as
diretivas antecipadas (ALEMANHA, 2009). Também, em 2009, na Argentina, legislação
sobre o tema estabeleceu os direitos do paciente e sua relação com os profissionais e
instituições de saúde (ARGENTINA, 2009). Em Portugal, a lei que regulamenta as DAV,
designada sob a forma de TV, a nomeação de procurador de cuidados de saúde e a criação do
Registro Nacional do Testamento Vital (Rentev) entraram em vigor em 21 de agosto de 2012
(PORTUGAL, 2012). Na Itália, a temática encontra-se em fase de forte discussão legislativa e
bioética (DADALTO, 2013a). Além desses, em outros países, como Áustria, França,
Holanda, Hungria, Porto Rico, e na União Européia, o tema também foi objeto de legislação.
Em diferentes países, além da aprovação de legislações sobre a temática, vem sendo
realizadas pesquisas sobre a aplicabilidade das DAV aos doentes terminais, destacando-se
Alemanha (SAHM; WILL; HOMMEL, 2005; VAN; SIMON, 2006); Bélgica (BRYON;
CASTERLE; GASTMANS, 2012; EVANS, et al., 2013); Canadá (HUGHES; SINGER,
1992);Colômbia (SARMIENTO-MEDINA et al., 2012); Coréia (KEAM et al., 2013);
Espanha (FRANCO; SILVA; SATURNO, 2011; CUCALÓN-ARENAL et al., 2013; EVANS
et al., 2013); Estados Unidos da América (EUA) (HARE; NELSON, 1991; SOLOMON et al.,
1993; HOFMANN et al., 1997; SULMASY et al., 1998; PIERCE, 1999;HEFFNER;
BARBIERI, 2000; HAPP et al., 2002; BUSS, et al., 2005; DITTO et al., 2006; LEVIN, et al.,
39
2008; O'MAHONY et al.,2010; SCHENKER et al., 2012); Genebra (PAUTEX;
HERRMANN; ZULIAN, 2008);Holanda e Itália (VAN et al., 2010; EVANS, et al.,
2013),Inglaterra (WILSON; SEYMOUR;PERKINS, 2010); Reino Unido (SEYMOUR, et al.,
2004; BARNES et al., 2007); Japão (MASUDA et al., 2003); Tailândia (SITTISOMBUT et
al., 2008; SITTISOMBUT; INTHONG, 2009) e Taiwan (HU et al., 2010).
No cenário brasileiro, a primeira menção sobre a temática foi realizada por Joaquim
Clotet (1993), a partir da denominação “manifestação explícita da própria vontade”. Clotet
destacava que o enfermo ou o futuro paciente, ante a possibilidade de vir a ser um doente
terminal, teria o direito de manifestar antecipadamente sua vontade quanto ao tipo de
tratamento por ele preferido, exercendo o princípio da autonomia relativo aos últimos
cuidados ou ao tratamento final, embasando-se no conteúdo da lei norte-americana, expondo
suas vantagens, desvantagens e possíveis usos questionáveis decorrentes dessa legislação.
Apesar da ausência de legislação especifica, no Brasil, até o surgimento das
Resoluções do CFM, 1.805/2006 e 1.995/12, que tratam respectivamente sobre a prática da
ortotanásia e das DAV, a participação do paciente no processo de decisões sobre seu
tratamento apoiava-se no estabelecido no Código Civil, em seu artigo 15, ao expor que:
“Ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou a
intervenção cirúrgica” (BRASIL, 2002). Da mesma forma, o novo Código de Ética Médica
(CEM) do CFM, aprovado em 2009 (CFM, 2009), também, estabelece, em vários artigos (art.
22,24,28,31,34, 39), o reconhecimentoà autonomia do paciente. Esse processo acerca da
participação do paciente nas tomadas de decisão sobre seu tratamento teve continuidade com
a proposta de garantir a manifestação dos pacientes, por meio das DAV.
Ainda, a suspensão de esforço terapêutico (SET), uma das questões que as DAV
preveem, tem suporte na Constituição Federal (BRASIL, 1988), nos artigos 10 e 50, que
reconhecem a dignidade da pessoa humana como fundamento do estado democrático
brasileiro, estabelecendo expressamente que ninguém será submetido à tortura nem a
tratamento desumano ou degradante; no Código Civil (BRASIL, 2002), que autoriza o
paciente a recusar determinados procedimentos médicos; na Lei Orgânica da Saúde (Lei n.
8.080/90, art. 7.o, III), que reconhece o direito à autonomia do paciente; e no CEM (CFM,
2009) que repete esses mesmos princípios legais, além de proibir o médico de realizar
procedimentos terapêuticos contra a vontade do paciente, fora de um quadro de emergência
médica de salvação, o que não se constitui em caso de quadro irreversível, sem nenhuma
resposta a qualquer tipo de tratamento.
40
Há, ainda, uma lei excepcional sobre esse tema: a Lei dos Direitos dos Usuários dos
Serviços de Saúde do Estado de São Paulo (Lei n.10.241/99), conhecida como Lei Mário
Covas, que assegura em seu art. 2º que: “são direitos dos usuários dos serviços de saúde no
Estado de São Paulo, parágrafo XXIII – recusar tratamentos dolorosos ou extraordinários para
tentar prolongar a vida”.
No cenário brasileiro, o debate sobre o respeito à ortotanásia ganhou mais contornos
após a publicação da Resolução n. 1.805/2006 do CFM. Para Alves (2013), a citada
Resolução passou por questionamento judicial por meio de ação civil pública promovida pelo
Ministério Público Federal (MPF) do Distrito Federal (DF), que foi julgada improcedente pela
Justiça Federal do DF sob os argumentos de que: a) o CFM tem competência para editar a
Resolução, que não versa sobre direito penal, mas, sim, sobre ética médica e consequências
disciplinares; b) a ortotanásia não constitui crime de homicídio, interpretando-se o Código
Penal à luz da Constituição Federal; c) a edição da Resolução não determinou modificação
significativa no dia a dia dos médicos que lidam com doentes terminais, incentivando-os a
descrever os procedimentos que adotam, ou não,
permitindo maior transparência e
possibilitando maior controle da atividade médica.
3.1.2 Conceituando Diretivas Antecipadas de Vontade
No Brasil, a terminologia DAV é a denominação empregada, conforme prevê a
Resolução do CFM 1955/2012 (CFM, 2012). Contudo, salienta-se que existem diversas
maneiras de referenciar essa questão: manifestação explícita da própria vontade, testamento
vital, biotestamento, testamento biológico, diretivas avançadas, vontades antecipadas, além do
termo declaração prévia de vontade proposto por Luciana Dadalto – advogada e pesquisadora
na área do direito, à implementação das diretivas antecipadas no Brasil (PENALVA, 2009).
As diretivas antecipadas (advanced care documents), tradicionalmente, podem
apresentar-se sob dois formatos: o testamento vital (living will) e o mandato duradouro
(durable power attorney) (DADALTO, 2013a; MOREIRA, 2013). Nesse sentido, Dadalto
(2013b) expõe que ambos os documentos poderão ser utilizados quando o paciente não puder
se expressar, livre e conscientemente – ainda que por uma situação transitória –, ou seja, as
diretivas antecipadas não se referem exclusivamente a situações de terminalidade.
O TV constitui-se em um documento no qual uma pessoa capaz pode registrar
instruções acerca de futuros cuidados médicos a que deseja ser submetida, ou não, ante um
diagnóstico de doença terminal e em que esteja incapaz de expressar sua vontade. O TV visa,
41
portanto, assegurar o direito do paciente morrer com dignidade, de acordo com suas
concepções pessoais (DADALTO, 2013c; MOREIRA, 2013). Para Nunes (2012), o TV é um
instrumento ético/jurídico que permite reforçar a autonomia da pessoa, podendo ser
complementado com a nomeação de um procurador de cuidados de saúde ou mesmo com um
conjunto de instruções médicas definidas previamente com o consentimento do doente.
Já o mandato duradouro, a outra espécie das diretivas antecipadas, refere-se à
nomeação de um ou mais procuradores, para tomar decisões em nome do paciente quando
estiver incapacitado – definitiva ou temporariamente – de manifestar sua vontade. Esse
procurador, preferencialmente, deve ser uma pessoa com conhecimento profundo do paciente,
com capacidade de identificar sua vontade (DADALTO, 2013; RAJÃO, 2013). Uma
peculiaridade é que esse documento será válido inclusive em situações de incapacidade
temporária, diferentemente do TV, que só terá eficácia em situações de terminalidade. Além
disso, cabe salientar que poderá haver simultaneidade entre o TV e o mandato duradouro,
apresentados como um único documento (RAJÃO, 2013).
Embora exista uma adaptação conceitual clara das terminologias descritas, por vezes,
critica-se o uso do termo testamento vital– nome pelo qual a diretiva antecipada é conhecida –
devido ao seu sentido de testamento que, no Brasil, é um instrumento que corresponde a um
ato unilateral de vontade, com eficácia apenas pós-morte, não se constituindo, dessa maneira,
em uma nomenclatura correta (BOMTEMPO, 2012; DADALTO, 2013b).
A terminologia TV provém da tradução literal para o português do termo norteamericano Living Will (BOMTEMPO, 2012), Biotestamento ou Testamento Biológico. A
palavra “will” foi utilizada no sentido de vontade, de desejo, de escolha consciente. Nesse
sentido, utilizar a palavra “testamento” pode gerar confusão, pois um testamento é uma
manifestação antecipada, mas que tem a sua eficácia apenas com a morte de quem gerou o
testamento. As DAV, diferentemente, são manifestações de vontades a serem seguidas
quando essa pessoa ainda está viva (ALVES; FERNANDES; GOLDIM, 2012).
No Brasil, a inserção de disposições sobre doação de órgãos, cremação, lugar do
velório no TV desnaturam o instituto até porque a do doente terminal é, por essência, negócio
jurídico, com efeito, inter vivos, cujo principal objeto é garantir a autonomia do sujeito quanto
aos tratamentos a que será submetido em caso de terminalidade da vida (DADALTO, 2013a).
Entretanto, conforme a autora, a doutrina estrangeira admite que as declarações prévias do
doente terminal possam conter disposições acerca de doação de órgãos, considerando que
cada país possui legislação própria sobre esse tema. Diferentemente da realidade brasileira,
42
nos países que já legislaram sobre diretivas antecipadas, a doação de órgãos é uma decisão
personalíssima, que independe da vontade da família.
As DAV tratam especificamente sobre o pedido ou a recusa dos tratamentos futuros, o
qual se denomina Suspensão de Esforço Terapêutico (SET). Como o nome indica, trata-se de
suspensão ou de não iniciar tratamentos – incluindo não RCR nos casos de parada
cardiorrespiratória, não submeter o doente à ventilação mecânica, alimentação e hidratação
artificial contra a sua vontade – que visam apenas adiar a morte, em vez de manter a vida. A
finalidade da SET é afastar um obstáculo para que a morte, naturalmente, se instale; é
suspender a obstinação terapêutica, a distanásia, a insistência tecnológica em vencer o fim,
como se isso fosse possível e atendesse ao melhor interesse do doente (RIBEIRO, 2006).
Face ao exposto, para Holland (2008), as DAV surgem em virtude do
desenvolvimento na área da saúde, que possibilitam aos pacientes que sejam mantidos vivos
além do ponto em que são capazes para consentir sobre as intervenções médicas. As diretivas
asseguram que um paciente capaz conserve sua autonomia e seu direito ao consentimento na
eventualidade de se tornar incapaz para exercê-lo e que essas sejam respeitadas.
3.1.3 Legislação do Conselho Federal de Medicina acerca das Diretivas Antecipadas de
Vontade
O CFM aprovou, em 31 de agosto de 2012, a primeira regulamentação que trata
especificamente sobre as DAV, no Brasil, a Resolução 1.995 (CFM, 2012). Em seu art. 1º,
define DAV como o conjunto de desejos, prévio e expressamente manifestado pelo paciente,
sobre cuidados e tratamentos que quer, ou não, receber no momento em que estiver
incapacitado de expressar, livre e autonomamente, sua vontade (CFM, 2012).
Há que se destacar que a Resolução não especifica que as diretivas antecipadas serão
aplicadas, exclusivamente, ao paciente considerado terminal, mas quando o paciente estiver
impossibilitado de manifestar sua vontade. Assim, trata-se de uma manifestação prévia, livre e
autônoma da vontade do paciente referente ao seu desejo de receber, ou não, determinados
tipos de tratamento, manifestação que deve orientar os profissionais à tomada de decisão no
caso de incapacidade do paciente. Para Dadalto (2013c), a Resolução efetivamente reconhece
o direito do paciente recusar tratamentos fúteis, também conhecidos como extraordinários, ou
seja, aqueles tratamentos que visam apenas prolongar a vida biológica do paciente, sem
garantir a qualidade de vida.
43
Embora a Resolução não explicite seu direcionamento especificamente ao doente
terminal, na exposição de motivos, justifica que a possibilidade das DAV detém-se ao fato de
que os novos recursos tecnológicos permitem a adoção de medidas desproporcionais que
prolongam o sofrimento do paciente em estado terminal, sem lhe trazer benefícios, e que essas
medidas podem ter sido antecipadamente rejeitadas pelo mesmo (CFM, 2012).
Nesse sentido, ao garantir que a autonomia do paciente deve ser respeitada, a
Resolução desmistifica a cultura centrada no poder médico e no paternalismo, que reduz o
indivíduo a um paciente que deve aguardar, resignada e submissamente, que deliberações
acerca de sua vida sejam tomadas por outros, sem que ele possa se manifestar ou decidir
autonomamente como quer ser tratado ou que tipo de práticas de intervenção está disposto a
aceitar (BUSSINGUER; BARCELLOS, 2013).
A Resolução expõe que o médico levará em consideração as DAV nas decisões sobre
cuidados e tratamentos de pacientes incapazes de comunicar-se, ou de expressar, de maneira
livre e independente, suas vontades e, além disso, caso o paciente tenha designado um
representante, que suas informações deverão ser consideradas (CFM, 2012). Entretanto, o
profissional poderá desconsiderar as DAV que, em sua análise, estiverem em desacordo com
os preceitos ditados pelo CEM (CFM, 2012). Essa ressalva garante a adequação do ato
médico em si e tranquilidade para que o profissional se declare impedido de realizar
procedimentos contrários aos pressupostos de adequação da prática médica corrente (ALVES;
FERNANDES; GOLDIM, 2012). Assim, a manifestação de vontade do paciente encontra
limites na objeção de consciência do médico, na proibição de disposições contrárias ao
ordenamento jurídico e em disposições que já estejam superadas pela medicina (DADALTO,
2013b).
A formação do conteúdo decisório pelo paciente requer o conhecimento da situação e
do parecer do médico para que o paciente decida de maneira esclarecida e livre. O médico
aparece, nesse novo contexto inaugurado pela Resolução, como um parceiro do paciente na
formação da decisão sobre a própria morte. A afirmativa de que o médico está subordinado à
decisão do paciente não quer em absoluto dizer que esse seja prescindível ao tratamento.
Muito pelo contrário. O médico detém o conhecimento científico que o paciente não dispõe e,
justamente por isso, é uma figura essencial para o tratamento. No entanto, a decisão acerca de
até onde o tratamento deve seguir cabe ao paciente (BUSSINGUER; BARCELLOS, 2013). O
conjunto de circunstâncias presentes no momento da tomada de decisão deverá ser igualmente
levado em consideração. Mesmo na incapacidade do paciente, a decisão permanece
44
compartilhada. Não é o predomínio de uma vontade sobre a outra, mas sim um balanço
adequado de ambas (ALVES; FERNANDES; GOLDIM, 2012).
A Resolução determina que as DAV prevaleçam sobre qualquer outro parecer não
médico, incluindo os desejos dos familiares (CFM, 2012); ou seja, o ponto central e norteador
da Resolução é a autonomia do paciente, sujeito de sua história e destino (BUSSINGUER;
BARCELLOS, 2013). Assim, se houver conflitos entre a vontade previamente manifestada do
paciente, que se encontra incapaz de tomar decisões, e de seus familiares, prevalece a decisão
antecipada pela própria pessoa. Essa situação pode ser difícil de ser manejada, por parte do
médico, pois quando os membros de uma família não têm consenso sobre como conduzir o
processo de tomada de decisões, o conflito de opiniões pode se estabelecer.
Desse modo, além dos conflitos éticos que poderão fragilizar os efeitos da Resolução,
os profissionais poderão enfrentar conflitos de opiniões, ampliando sua insegurança na
tomada de decisões. Nessas situações, os médicos, diante de possíveis ameaças e riscos de
sofrer ações judiciais, poderão ignorar as DAV do paciente, preferindo seguir as orientações
dos familiares (BUSSINGUER; BARCELLOS, 2013). Assim, a difusão prévia das
preferências do paciente pode ser um importante elemento de argumentação (ALVES;
FERNANDES; GOLDIM, 2012).
Partindo desse pressuposto, o médico deverá registrar, no prontuário, as DAV que lhe
forem diretamente comunicadas pelo paciente (CFM, 2012). Nesse sentido, um aspecto
importante refere-se ao fato que o simples registro no prontuário do paciente, feito pelo
médico que o assiste, deve ser considerado para efeitos legais, já que esse, em razão da
natureza de sua profissão, possui fé pública, não lhe sendo exigida, inclusive, a presença ou
assinatura de testemunhas. É necessário que se deixe claramente registrado que o indivíduo se
encontra lúcido, orientado e plenamente consciente das decisões que toma e dos seus
possíveis desdobramentos. Dessa maneira, não há, obrigatoriamente, a exigência de um
documento escrito e registrado em cartório para que tenham validade as manifestações do
paciente (BUSSINGUER; BARCELLOS, 2013).
Entretanto, não sendo conhecidas as diretivas antecipadas do paciente, nem havendo
representante designado, familiares disponíveis ou na falta de consenso entre esses, o médico
recorrerá ao Comitê de Bioética da instituição, caso exista, ou, na sua falta, à Comissão de
Ética Médica do hospital ou ao Conselho Regional e Federal de Medicina para fundamentar
sua decisão sobre conflitos éticos, quando entender como necessária e conveniente uma
determinada medida (CFM, 2012). Essa possibilidade não é uma delegação para que esses
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órgãos colegiados deliberem sobre a decisão em si, mas, sim, que auxiliem o médico na busca
de justificativas adequadas à sua conduta (ALVES; FERNANDES; GOLDIM, 2012).
Sabe-se, no entanto, que tal documento, apesar de representar a manifestação de
vontade do paciente, interfere sobremaneira na conduta médica e, na maioria das vezes, o
outorgante é tecnicamente vulnerável para fazê-lo, necessitando de informações do médico
(DADALTO; TUPINAMBÁS; GRECO, 2013). Face ao exposto, é importante que não
somente os médicos, mas os outros profissionais da saúde, especialmente profissionais de
enfermagem, orientem o paciente no sentido de que possam compartilhar suas posições sobre
procedimentos e tratamentos com os seus familiares e amigos de confiança, pois essas
informações podem ser úteis no sentido de orientar futuras decisões que tenham que ser
tomadas. É interessante também que os profissionais envolvidos em seu atendimento reiterem
suas restrições em suas evoluções, no sentido de demonstrar que havia voluntariedade
presente quando dessa comunicação.
Entretanto, embora possa se considerar que um passo importante tenha sido
conquistado a fim de garantir a autonomia do paciente em situações de final de vida, a
referida Resolução apresenta diversas lacunas. De acordo com Xavier (2013), destacam-se os
pontos mais sensíveis que emergem da sucinta Resolução: a) falta de exigência de que as
DAV sejam feitas por escrito; b) ausência de criação de um registro nacional para o controle
de tais diretivas; c) falta de um glossário que torne inequívoco o alcance dos termos adotados
na Resolução; d) impossibilidade de nomear mais de um procurador, bem como o que será
feito se os procuradores nomeados apresentarem discordâncias sobre o rumo do tratamento
clínico; e) real limite jurídico do conteúdo das diretivas, visto que a Resolução apenas
estabelece que deva ser respeitado o CEM; f) impossibilidade de menores de idade
emancipados firmarem tais diretivas; e g) indefinição acerca de sanções a que a equipe
médica estaria submetida, em caso de desrespeito às diretivas.
O problema, entretanto, não é simples de ser enfrentado. Enquanto o debate ético
avança no interior da corporação médica, notadamente no CFM, o problema dos limites
jurídicos das Resoluções profissionais parece impor uma preocupação com a legalidade da
submissão à Resolução por parte dos médicos e com os riscos inerentes a possíveis
questionamentos jurídicos relativos a condutas de não intervenção (BUSSINGUER;
BARCELLOS, 2013).
Complementa-se, também, que, de acordo com Dadalto (2013b), a Resolução 1.995/12
(CFM, 2012) representa um avanço nas discussões acerca das diretivas antecipadas no Brasil.
Contudo, ocorre em uma perspectiva localizada, ou seja, no âmbito médico e dos demais
46
profissionais de saúde estudiosos do tema. Assim, é preciso considerar que a Resolução não
esgota o tema; diferentemente, demonstra a necessidade de legislação específica sobre as
DAV, a fim de regulamentar questões, como, por exemplo, a exemplificação de cuidados e
tratamentos que podem, ou não, ser recusados, critérios para sua aceitação e recusa, registro
das diretivas antecipadas e a extensão da participação do médico na sua feitura.
Frente a esses propósitos, é imperioso que se faça uma campanha de conscientização
dos cidadãos brasileiros acerca da importância do respeito à vontade de seus familiares,
objetivando evitar conflitos entre a vontade manifesta nas DAV e a vontade da família. É um
esforço paulatino e para tentar amenizar o conflito de vontades de forma mais imediata, será
necessário que os médicos conversem com as famílias ao informá-las da existência da DAV e
que os hospitais mantenham psicólogos e assistentes sociais com essa habilidade. Em suma,
de acordo com Dadalto, Tupinambás e Greco (2013) de nada adiantará, a utilização das DAV,
se não houver um esforço coletivo em garantir que a vontade nelas manifesta seja cumprida.
A verdade é que não basta garantir o direito de o indivíduo manifestar sua vontade, é preciso
ainda garantir-lhe a certeza de que será cumprida.
3.1.4 Ortotanásia e as Diretivas Antecipadas de Vontade
Anteriormente ao debate sobre as DAV, tem-se a discussão acerca da ortotanásia, que
possui importante conexão com as DAV, na medida em que preconiza a aplicação de
cuidados paliativos, a fim de garantir a qualidade de vida e conforto para o doente terminal,
condenando, assim, o prolongamento da vida, a todo custo, como conduta atrelada à
distanásia. Na ortotanásia, não se busca a manutenção da vida a qualquer custo, com a
realização de medidas extraordinárias e imposição de sofrimento ao paciente no momento em
que a morte se aproxima, mas, sim, que essa ocorra naturalmente, ao seu tempo, na sua hora
(MOREIRA, 2013).
Nesse sentido, a Resolução 1.805 de 9 de novembro de 2006, do CFM, que autoriza a
prática da ortotanásia, já previa a defesa do direito às DAV de maneira implícita. A referida
Resolução determina que, na fase terminal de enfermidades graves incuráveis, é permitido ao
médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente,
garantindo-lhe os cuidados necessários para aliviar os sintomas que levam ao sofrimento, na
perspectiva de uma assistência integral, respeitada a vontade do paciente ou de seu
representante legal (BRASIL, 2006). A Resolução determina, ainda, que o médico deva
esclarecer ao doente ou ao seu representante legal os tipos de terapia apropriados a cada
47
situação. Se houver consentimento de todos, a decisão de limitar ou suspender os
procedimentos e tratamentos deve ser registrada no prontuário do paciente.
Há que se destacar que a ortotanásia não é considerada crime no Brasil, conforme
entendimento judicial resultado da ação civil pública n.2.007.34.00.014809-9. Entretanto, não
existe legislação específica sobre a sua prática, bem como inexiste legislação sobre as DAV.
No entanto, existe um projeto de lei do Senado Brasileiro n. 524/2009, de autoria do senador
Gerson Camata, que visa dispor sobre os direitos dos pacientes em fase terminal de doença
(BRASIL, 2009) que abarca as duas perspectivas: a ortotanásia e as DAV. Essa proposta tem
o objetivo de regulamentar a prática da ortotanásia, via processo legislativo, ampliando a
participação do parlamento brasileiro no assunto (BOMTEMPO, 2012).
O referido projeto basicamente possui os mesmos dispositivos da Resolução n.
1.805/2006 do CFM, porém de forma mais detalhada. No que tange às DAV, o projeto de lei
dispõe sobre características semelhantes à Resolução 1.995/2012 do CFM quanto às questões
relacionadas à manifestação favorável da pessoa em fase terminal de doença ou, na sua
impossibilidade, à manifestação de sua família ou do seu representante legal, sendo permitida
a limitação ou a suspensão, pelo médico assistente, de procedimentos desproporcionais ou
extraordinários destinados a prolongar artificialmente a vida. Além disso, prevê que, na
hipótese de impossibilidade de manifestação de vontade do paciente e caso esse tenha,
anteriormente, quando lúcido, se pronunciado contrariamente à limitação e suspensão de
procedimentos, deverá ser respeitada tal manifestação, sendo registrada no prontuário do
paciente (BRASIL, 2009).
Entretanto, a proliferação vocabular que designa a ortotanásia é permeada por dúvidas
e indefinições de seu conceito e aplicabilidade, com a possibilidade de ser facilmente
deturpada ou confundida com a eutanásia. A partir de uma pesquisa sobre as representações
sociais de médicos e enfermeiros de uma UTI quanto à ortotanásia, foi constatado que a
prática é latente nos discursos, e os profissionais não mencionam diretamente a sua ação em
virtude do estigma impregnado no termo. As representações dos enfermeiros e médicos estão
direcionadas à paliação do sofrimento, sendo sua operacionalização confirmada com os
métodos de não RCR, nos doentes terminais. Contudo, os médicos direcionam sua atenção ao
receio e às angústias que essa decisão provoca frente ao risco da punição jurídica (COGO,
2008).
Como o CFM expressou em nota esclarecedora, a Resolução 1.995 respeita a vontade
do paciente e não possui qualquer relação com a prática de eutanásia. Em verdade, esse
esclarecimento apenas reafirmou o conceito basilar das DAV: não podem conter disposições
48
contrárias ao ordenamento jurídico do país em que são propostas. Nesse sentido, foi grande a
repercussão da citada Resolução em âmbito nacional. Não se estaria autorizando práticas
moralmente repugnantes e até mesmo juridicamente vedadas, como a eutanásia e o suicídio
assistido? Surgiria, em face dessa nova Resolução, um direito à morte? Entende-se que a
Resolução não versa sobre eutanásia nem mesmo sobre suicídio assistido, ou seja, defende-se
a constitucionalidade da Resolução nº. 1.951, com base no direito à morte, o que, de forma
alguma, quer dizer o direito de dispor da própria vida, ou seja, não se trata do direito ao
suicídio (BUSSINGUER; BARCELLOS, 2013).
Face ao exposto, Neves (2013) alega que o caminho a percorrer na temática das DAV
é a ortotanásia, priorizando um fim de vida com um processo de morte humanizado, perante a
singularidade do ser humano. Ajudar os doentes a morrer com dignidade é, pois, um princípio
central em fim de vida. Morrer com dignidade é um direito individual, legitimado pelo direito
à vida. A ortotanásia, conforme Cogo (2008), que se instala no ambiente hospitalar, é
percebida como a possibilidade viável de tratar a morte como um processo irremediável e
constante, contrapondo qualquer tipo de prolongamento do sofrimento humano.
3.2O RESGATE DA PRODUÇÃO CIENTÍFICA INTERNACIONAL E NACIONAL DAS
DIRETIVAS ANTECIPADAS DE VONTADE
3.2.1 Estudantes e profissionais frente às Diretivas Antecipadas de Vontade
Os profissionais da saúde podem exercer influência significativa na assistência aos
pacientes de maneira a lhes propor a prática das DAV, como valioso instrumento e no
contexto de uma relação clínica de confiança recíproca e mutuamente enriquecedora, um
papel de relevo na efetivação do respeito pela dignidade da pessoa humana. Essa é uma das
vertentes de interesse dos profissionais de saúde para que existam as DAV, como suporte na
tomada de decisão (NEVES, 2013).
Nesse sentido, no panorama internacional, há estudos realizados com médicos
(HUGHES; SINGER, 1992; SOLOMON et al., 1993; PIERCE, 1999; MASUDA et al., 2003;
SAHM; WILL; HOMMEL, 2005; BUSS, et al., 2005; VAN; SIMON, 2006; HU et al., 2010;
FRANCO; SILVA; SATURNO, 2011; EVANS et al., 2013; KEAM et al., 2013) enfermeiros
(SOLOMON et al., 1993; PIERCE, 1999; SAHM; WILL; HOMMEL, 2005; HU et al., 2010;
O'MAHONY et al., 2010; FRANCO; SILVA; SATURNO, 2011; BRYON; CASTERLE;
GASTMANS, 2012), profissionais da saúde (WILSON; SEYMOUR; PERKINS, 2010);
49
juízes (VAN; SIMON, 2006) e estudantes universitários (FRANCO; SILVA; SATURNO,
2011; CUCALÓN-ARENAL et al., 2013) que buscaram em suas pesquisas apresentar as
percepções, opiniões e condutas referentes ao uso das diretivas antecipadas aplicadas ao
doente terminal.
Desse modo, face ao exposto e relacionado às percepções dos profissionais da saúde
sobre as DAV, em pesquisa realizada, nos hospitais de Múrcia na Espanha, com 607
profissionais médicos, enfermeiros e graduandos, a maioria dos sujeitos (63,3%) destacou a
importância das preferências do paciente sobre o tratamento e os procedimentos de suporte de
vida em doentes terminais (FRANCO; SILVA; SATURNO, 2011).
Em pesquisa realizada com 300 estudantes da área da saúde da Universidade de
Zaragoza, na Espanha, acerca de seus desejos e opiniões sobre doença terminal e DAV, foi
constatado que 77,6% possuem conhecimento de TV ou diretivas antecipadas; 55,9%
desconhecem a diferença entre a limitação do esforço terapêutico e a eutanásia ativa; 92,6%
desejam obter informações completas de sua doença e 82,9% dos estudantes gostariam de
implementar a diretiva antecipada. Os estudantes gostariam de ser informados das condições
de saúde pelo médico, além de terem possibilidade e disponibilidade para discutir sobre a
doença e seus sentimentos. A pesquisa apontou que eles querem falar sobre a fase final, sobre
seus desejos e acerca da aplicação dos cuidados paliativos no domicílio (CUCALÓNARENAL et al., 2013).
Na Alemanha, os resultados dos inquéritos com médicos e juízes mostram um alto
grau de valorização da diretiva antecipada (VAN; SIMON, 2006). Soma-se ainda, que no
estudo realizado com 303 médicos oncologistas na Coréia do Sul, quanto às atitudes com
relação às diretivas antecipadas, 96,7% dos oncologistas concordaram com a necessidade de
preenchimento das DAV (KEAM et al., 2013).
Com relação as atitudes de 643 médicos de família perante as diretivas antecipadas em
Ontário, no Canadá, Hughes e Singer (1992) constataram na pesquisa que 86% mostraram-se
favoráveis ao seu uso, entretanto somente 19% haviam discutido as diretivas antecipadas com
mais de 10 pacientes. Dos médicos que responderam que experimentaram tal experiência,
mais da metade disse que não seguiu sempre as indicações contidas nas diretivas antecipadas.
Em contrapartida, outras pesquisas internacionais apontam que aproximadamente 90% dos
médicos atenderiam às vontades antecipadas do paciente no momento em que este se encontre
incapaz para participar da decisão (SIMÓN-LORDA; TAMAYO-VELÁZQUEZ; BARRIOCANTALEJO, 2008).
50
No Japão, um estudo que objetivou investigar as atitudes dos médicos acerca dos
testamentos em vida e suas experiências com pacientes que tinham completado um testamento
em vida, vindo a morrer mais tarde, 55% dos 301 médicos participantes da pesquisa
aprovavam o uso das diretivas antecipadas. Desses, 34% tiveram a oportunidade de discutir
obre o TV com os pacientes e/ou familiares, depois de receber o testamento do paciente, mas
não o fizeram, e 69% dos médicos não receberam o TV dos pacientes (MASUDA et al.,
2003). Asim, as diretivas antecipadas servirão de meio hábil para resguardar o médico de
eventual responsabilidades ao fazer, ou não, uso dos tratamentos e cuidados pela escolha
prévia do paciente, quando ainda capaz (BOMTEMPO, 2012).
Uma pesquisa realizada com 282 médicos residentes da Pensilvânia revelou que
tiveram uma média de 6,2 discussões por mês sobre as DAV. Ainda, os médicos se
reconhecem como competentes para discutir sobre a temática com os pacientes, mas não
conseguem se envolver suficientemente a fim de efetivar tais discussões (BUSS et al., 2005).
Assim, as diretivas antecipadas estão baseadas na crença de que os pacientes que perdem a
capacidade de decisão estariam mais propensos a receber os cuidados que escolheram. A
ausência de diretivas pode levar a cuidados agressivos e indesejados, que tem sido associados
a uma redução da qualidade de vida e do cuidado (KEAM et al., 2013).
Entretanto, o estudo de Pierce (1999) realizado nos EUA a fim deverificar as opiniões
de 11 enfermeiros e 10 médicos que cuidavam de pessoas no fim de sua vida revelou que os
médicos nem sempre transmitem claramente aos pacientes suas chances de sobrevivência ou
nem sempre entendem os desejos dos pacientes. Além disso, a incerteza ética dominou a
tomada de decisão de médicos e enfermeiros, quando foram confrontados com a questão da
possibilidade de auxiliar na morte dos pacientes, mesmo diante de diretivas antecipadas. Já
em pesquisa realizada na Alemanha com 100 médicos,foi constatado que 39% deles nunca
mencionaram aos pacientes a possibilidade de escrever suas diretivas antecipadas para
cuidados médicos (SAHM; WILL; HOMMEL, 2005).
Conforme Evans et al (2013), na pesquisa que estimou e comparou a prevalência de
discussões de tratamento e nomeação de decisores substitutos aos pacientes em fim de vida,
na Itália, Espanha, Bélgica e Holanda, foi constatado que as discussões dos médicos e
paciente sobre as preferências de tratamento relacionado ao final da vida tinham ocorrido com
10% de italianos, 7% dos espanhois, 25% dos belgas e 47% dos pacientes holandeses.
No estudo de Solomon et al (1993), que objetivou analisar como 687médicos e 759
enfermeiros, de cinco hospitais dos EUA, avaliavam o cuidado que prestaram aos pacientes
próximo ao final da vida, foi evidenciado que 47% de todos os respondentes relataram ter
51
agido contra a sua consciência no fornecimento dos cuidados para os doentes terminais. O
estudo revelou, ainda, que os médicos e enfermeiras foram perturbados pela influência de
soluções tecnológicas no cuidado, durante os últimos dias de doentes terminais.
Já em pesquisa, realizada no Canadá, que objetivou conhecer a opinião de 643
médicos de quando deveria ser oferecida a oportunidade de preencher as diretivas
antecipadas, 96% dos médicos apontaram pacientes com doenças terminais, 95% para
pacientes com doenças crônicas, 85% para as pessoas com infecção por vírus da
imunodeficiência humana, 77 % para as pessoas com mais de 65 anos de idade, 43% para
todos os adultos, 40% para as pessoas admitidas no hospital em cirurgias eletivas e 33% para
as pessoas admitidas em caráter de emergência (HUGHES; SINGER, 1992).
Em investigação realizada na Alemanha, com médicos e enfermeiros que objetivou
conheceros desejos dos pacientes com câncer sobre tratamento no fim da vida, foi verificado
que os médicos rejeitam a proposta de que deveriam iniciar de modo rotineiro a discussão
sobre DAV com seus pacientes, estando preparados para fazê-lo somente se considerassem
ser apropriado, como resultado de uma situação individual. Preferem delegar essa iniciativa
para outras pessoas, geralmente aos familiares do paciente (SAHM; WILL; HOMMEL,
2005).
Como contraponto, uma maior percepção dos 282 médicos residentes
acerca da
competência para conversar sobre DAV foi significativamente associada com mais anos de
pós-graduação e também ao relato de que as discussões sobre a temática no trabalho foram
úteis para aprender sobre cuidados em final de vida. Nessa direção, o propósito de aumentar a
qualificação profissional pode ser o meio mais promissor de aumentar a capacidade dos
médicos para discutir essas questões com os pacientes (BUSS et al., 2005).
Uma pesquisa realizada por Heffner e Barbieri (2000), em onze estados americanos,
examinou os interesses de 415 pacientes cardíacos sobre sua participação em planejamento
prévio e sua vontade de participar na educação sobre a diretiva antecipada em programas de
reabilitação cardiovascular, constatando quediscussões iniciadas pelo médico sobre diretivas
antecipadas ou cuidados de suporte de vida ocorreram com apenas 5% dos pacientes.
Entretanto, no estudo de Evans et al (2013), os médicos haviam discutido o
diagnóstico com 49% dos italianos, 50 % dos espanhóis, 60% dos belgas e 78% dos pacientes
holandeses. Uma minoria de pacientes de todos os países (10-31 %), com exceção dos Países
Baixos (52%), ou tinham discutido preferências de tratamento ou nomeado um substituto
(EVANS, et al., 2013). Nesse sentido, estudos (HARE; NELSON, 1991; SULMASY et al.,
1998; SEYMOUR et al., 2004; BARNES et al., 2007; CUCALÓN-ARENAL et al., 2013)
52
têm demonstrado que a prática das diretivas antecipadas acontece de maneira efetiva quando
existe adequada comunicação entre os profissionais da saúde e o paciente.
No Brasil, poucas pesquisas abordam as DAV e as percepções dos profissionais da
área da saúde diante dessa temática. As pesquisas realizadas com seres humanos que abordam
esse tema no panaroma nacional foram realizadas nos Estados de Minas Gerais (DADALTO;
TUPINAMBÁS; GRECO, 2013; CHEHUEN NETO et al., 2015), Santa Catarina (PICCINI et
al., 2011; STOLZ et al., 2011; CAMPOS et al., 2012), Rio Grande do Sul (CASSOL;
QUINTANA; VELHO, 2015) e no Estado do Pará (SILVA, et al, ., 2015) commédicos
(STOLZ et al., 2011; PICCINI et al., 2011; CHEHUEN NETO et al., 2015), oncologistas,
intensivistas e geriatras (DADALTO; TUPINAMBÁS; GRECO, 2013), auxiliares e técnicos
em enfermagem (CASSOL; QUINTANA; VELHO, 2015), enfermeiros (CHEHUEN NETO,
et al., 2015; CASSOL; QUINTANA; VELHO, 2015), psicólogos, nutricionista e
fisioterapeutas (CHEHUEN NETO, et al., 2015), estudantes de medicina (SILVA, et al.,
2015; PICCINI et al., 2011), advogados e estudantes do direito (PICCINI et al., 2011).
Esses estudos contribuíram para a compreensão de algumas questões profissionais
ligadas à aplicação das DAV, como o entendimento e compreensão dos sujeitos da área de
enfermagem (CASSOL; QUINTANA; VELHO, 2015; CHEHUEN NETO, et al., 2015),
psicologia, nutrição, fisioterapia (CHEHUEN NETO, et al., 2015), médica (CHEHUEN
NETO, et al., 2015; SILVA, et al., 2015; PICCINI ET et al., 2011) e do direito em relação às
DAV (PICCINI et al., 2011); o respeito às vontades antecipadas do paciente pelos médicos no
momento em que os pacientes estivessem incapacitados de se comunicar e se essa
manifestação constituiu um instrumento válido de inibição da distanásia (STOLZ et al.,
2011); e, por fim, a possibilidade da proposição de um modelo de DAV para o Brasil
(DADALTO; TUPINAMBÁS; GRECO, 2013).
O estudo de Piccini et al (2011) destaca que, dentre um grupo de médicos, advogados,
estudantes de medicina e de Direito, totalizando 209 sujeitos, cerca de 29,2% dos
entrevistados denotaram conhecimento pleno do significado do TV. Já 87,6% dos
entrevistados optariam pela ortotanásia diante de um paciente em fase terminal de vida, ao
não considerar a possibilidade de implementação do TV. Entretanto, diante da possibilidade
de implementação do TV, a opção pela ortotanásia decresceria para 35,9%, enquanto que a
opção pelo estabelecido no TV foi referida por 60,8% dos entrevistados. Já no estudo de Silva
et al (2015), realizado com 238 estudantes de medicina, apenas 8% demonstraram ter uma
noção clara sobre o significado do termo testamento vital. Apesar disso, após ouvirem a
53
definição das diretivas antecipadas de vontade fornecida pelos pesquisadores, 92% deles
declararam que respeitariam o previsto no testamento vital.
Do mesmo modo, outra pesquisa realizada por Stolz et al (2011) com 100 médicos da
atenção básica, unidade de terapia intensiva, emergência e outras especialidades, constatou a
conveniência do registro dos desejos do paciente por meio das DAV e que os médicos a
respeitariam, com pontuação de 7,68 a 8,26 em uma escala de 0 a 10. Ainda, reconhecem essa
declaração como um instrumento útil para a tomada de decisões, com avaliação de 7,57. Tais
resultados, embora limitados do ponto de vista da amostra, sinalizam para uma aceitação das
vontades antecipadas do paciente por parte dos médicos. Do mesmo modo, para Cassol,
Quintana e Velho (2015) em pesquisa realizada com vinte e três profissionais de enfermagem,
há evidências que as diretivas antecipadas se apresentam como algo novo para os
profissionais, dentro do contexto do cuidado.
Em pesquisa recente realizada com enfermeiros, médicos, fisioterapeutas, psicólogos e
nutricionistas, totalizando 351 profissionais, Chehuen Neto et al. (2015), constataram que,
entre os entrevistados, 7,98% declararam saber redigir o testamento vital, 73,79% se sentiriam
mais seguros com sua regulamentação e 61,82% o fariam para si próprios. Assim, a maioria
amostral declarou-se favorável ao documento e à sua regulamentação, apesar de desconhecêlo previamente, o que sugere a necessidade de maior discussão e divulgação sobre o tema na
área de saúde.
Dadalto, Tupinambás e Greco (2013), em investigação realizada com médicos,
perceberam que a Resolução do CFM 1.995/12 não regulamentou de forma satisfatória o
papel do médico na realização das DAV. Além disso, ficou evidenciada a necessidade de o
paciente ser informado pelo médico, de contar com sua ajuda quando fizer o documento,
considerando ser esse profissional o detentor da informação, capaz de legitimar a autonomia
do paciente. Por essa razão, o médico não pode ser passivo nesse processo, não pode apenas
receber as DAV pronta e registrá-la no prontuário. É preciso que ajude-os a fazê-las,
apresentando as informações necessárias de acordo com o que o paciente deseja. É
recomendado, inclusive, que o médico autorize o paciente a mencioná-lo nas DAV, para que a
equipe médica que implementará o previsto no documento, se necessário, possa contatá-lo;
essa menção, no entanto, só pode ser realizada com expressa autorização do médico.
Para Dadalto (2013a), em verdade, a relação médico-paciente, diante de situações de
terminalidade, requer maior proteção. É necessário garantir ao paciente que seus desejos,
expressão máxima do direito à liberdade, serão seguidos em um momento em que ele não
mais puder exprimi-los com discernimento, sendo relevante garantir ao médico que ele não
54
sofrerá qualquer retaliação, seja no âmbito de sua entidade de classe, ou jurídico, ao seguir
expressamente a vontade do paciente. Para tanto, torna-se imperioso que as discussões acerca
das DAV do doente terminal ocorram de forma efetiva, criteriosa e científica.
3.2.2 A enfermagem e as diretivas antecipadas de vontade
As decisões que envolvem o final da vida relacionada a limitar determinados
tratamentos e cuidados não devem ser adotadas sem que ocorra uma decisão multidisciplinar.
A decisão de cada profissional deve considerar o conhecimento científico que sustenta o seu
exercício profissional e a intervenção que vai prestar (DEODATO, 2010); ou seja, o médico e
o enfermeiro decidem as intervenções baseadas, respectivamente, no conhecimento da
medicina e no conhecimento científico da enfermagem amparados por lei de regulamentação
profissional.
Partindo do exposto, a importância da enfermagem participar dessas discussões devese ao fato de que muitas ações não podem ser realizadas somente por um profissional. Os
enfermeiros desempenham ação fundamental no exercício do direito à autodeterminação e
para facilitar a tomada de decisão dos doentes. São profissionais presentes não apenas no
momento da morte, mas em todo o processo em que o doente e seus familiares tomam
decisões de fim de vida (PRZENYCZKA et al., 2012). A presença do enfermeiro, que
permanece várias horas a cada plantão e durante quase todo o tempo de internação do paciente
lhe permite um pensamento contínuo e evolutivo (COGO, 2008).
Nesse sentido, os profissionais de enfermagem devem ser inseridos nas discussão
sobre as DAV, bem como conhecedores dessa opção, pois atuam com o papel de informar,
respeitar, acompanhar e cuidar o doente terminal, não podendo se esquivar em um processo
de planejamento, concepção e cumprimento das DAV (NEVES, 2013). Além disso, de acordo
com oCódigo de Ética dos Profissionais de Enfermagem (COFEN, 2007), os profissionais
devem respeitar, reconhecer e realizar ações que garantam o direito da pessoa ou de seu
representante legal, de tomar decisões sobre sua saúde, tratamento, conforto e bem estar.
A enfermagem é uma profissão comprometida com a saúde e a qualidade de vida da
coletividade, atuando em consonância com preceitos éticos, bioéticos e legais. O profissional
de enfermagem participa dos cuidados em saúde, como integrante da equipe de saúde, e suas
ações necessitam visar a preservação da autonomia das pessoas; ou seja, respeitar a vida, a
dignidade e os direitos humanos, em todas as suas dimensões (COFEN, 2007).
55
Para Deodato (2012), a relevância da enfermagem, frente às questões relacionadas às
DAV, deve-se também a um problema frequente, ou seja, a decisão de não fazer determinado
procedimento, de não prestar um cuidado ou uma intervenção. Essas são sempre as decisões
mais difíceis. Outra questão prende-se à necessária articulação com outros profissionais de
saúde, designadamente, com os médicos. Às vezes, há um conflito face à decisão de cuidado;
entretanto, as decisões de fim de vida devem constituir-se, predominantemente, em uma
decisão de equipe. No entanto, mesmo que a decisão não seja construída em equipe, sua
implementação requer, necessariamente, a intervenção do médico e do enfermeiro, podendo
acontecer que um decida num determinado sentido e outro em sentido inverso.
A partir da pesquisa realizada por Cogo (2008) acerca das representações sociais dos
enfermeiros e médicos sobre a ortotanásia, constatou-se que os enfermeiros se sentem
incomodados por não participarem dos processos decisórios que repercutem diretamente na
assistência ao paciente em final de vida. Soma-se, ainda, que, em algumas situações, os
profissionais enfermeiros não concordavam com as decisões médicas, optando por atuar,
isoladamente e de forma contrária ao solicitado, porém de acordo com suas convicções.
O enfermeiro assume deveres para proteger e salvaguardar os direitos do cidadão a
quem presta cuidados. O Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem prevê que a
enfermagem deve respeitar o pudor, a privacidade e a intimidade do ser humano, em todo seu
ciclo vital, inclusive nas situações de morte e pós-morte, sendo proibida de promover a
eutanásia ou participar em prática destinada a antecipar a morte do paciente (COFEN, 2007).
Ao ser confrontado com uma vontade expressa pelo doente, por vezes, o profissional
de saúde ou cuidador debate-se com situações complexas e questiona-se sobre a forma como
deve agir perante o princípio da autonomia do doente. É necessário um profundo
conhecimento das competências, deveres e obrigações profissionais, de forma a respeitar e
proteger a vida como um direito fundamental das pessoas (NEVES, 2013). Ademais, em
pesquisa realizada no RS com vinte e três profissionais da enfermagem, embora as DAV
sejam reconhecidas como direito do paciente ou de seu familiar, estas podem entrar em
conflito quando são diferentes das práticas da instituição, podendo não serem cumpridas, mas
no sentido de proteger, por não estar de acordo com as práticas habituais dos serviços de
saúde, no intuito de preservar a vida ou de proporcionar conforto ao paciente (CASSOL;
QUINTANA; VELHO, 2015).
O fato de um enfermeiro respeitar ou não a vontade do doente, como nas situações
relacionadas às DAV, depende de uma escolha pessoal. Existem vários fatores, associados à
cultura, história pessoal, experiência, valores, dentre outros, que contribuem para uma tomada
56
de decisão, mas que não excluem seu caráter de liberdade porque o enfermeiro está consciente
das suas possibilidades, destacando-se, aqui, o conhecimento que possui acerca da sua
profissão e da organização do seu trabalho. As suas possibilidades de escolha são diretamente
proporcionais ao conhecimento que detém sobre elas. Se o enfermeiro conhece e reflete sobre
as causas ou determinantes que interferem na sua profissão, poderá exercer influência sobre
elas e mudar o curso de ação (PRZENYCZKA et al., 2012).
Em pesquisa realizada com 139 enfermeiros, em Portugal, para conhecer sua
percepção sobre as DAV, Neves (2013) constatou que cerca de 95% dos enfermeiros não tem
experiência de situações em que o doente pode decidir apoiando-se em suas DAV, nem
vivenciou situações em que o doente tenha sido informado sobre esse direito. Ainda, 72,7%
dos enfermeiros manifestaram-se disponíveis para refletir com o doente a elaboração do
documento de DAV; contudo, 45,3% só o fariam se o doente ou os familiares o solicitassem,
o que, para Neves (2013), faz todo o sentido, quando se pensa na enfermagem, cuja essência é
cuidar do outro com respeito pelos seus valores e crenças, defendendo os seus direitos. Porém,
se os pacientes desconhecessem seu direito às DAV, eles não deveriam informá-los sobre esse
direito? Deveriam ficar aguardando que eles fizessem solicitações? Nesse caso, estariam
defendendo os direitos dos pacientes?
Salienta-se, ainda, que conforme pesquisa realizada por Cassol, Quintana e Velho
(2015), as repercussões relacionadas às DAVdecorrem da desconsideração do seu uso, ao
intenso impacto que causaria na cultura da instituição a sua implantação, além da
compreensão de que o familiar ainda permanece com poder decisório, sobrepondo-se em
relação a possibilidade da DAV manifestada pelo paciente.
3.2.3 Receptividade dos pacientes às diretivas antecipadas de vontade
As DAV são um documento inacabado que, a qualquer momento, pode ser ajustado à
vontade da pessoa. As circunstâncias podem ser modificadas, os valores e opiniões de cada
um também são passíveis de se alterar, o que reforça a importância de rever a organização das
DAV, para que continuem a refletir com precisão a vontade do doente (NEVES, 2013).
Conforme Holland (2008), elaborar as DAV pensando no estado terminal é ser refém do
acaso, em virtude da dificuldade em definir o que é estar em estado terminal. No entanto, o
que se pretende é evitar que os pacientes sejam mantidos vivos num estado atenuado e
incapacitado, sem nenhuma semelhança com sua vida anterior.
57
Já a abordagem de pesquisas internacionais realizadas com pacientes (HARE;
NELSON, 1991; HOFMANN et al., 1997; SULMASY et al., 1998; HEFFNER; BARBIERI,
2000; HAPP et al., 2002; SAHM; WILL; HOMMEL, 2005; BARNES et al., 2007; LEVIN et
al., 2008; PAUTEX; HERRMANN; ZULIAN, 2008; SITTISOMBUT et al., 2008;
SITTISOMBUT; INTHONG, 2009; O'MAHONY et al., 2010; SARMIENTO-MEDINA et
al., 2012; KEAM et al., 2013) e com o público em geral (SEYMOUR, et al., 2004; VAN et
al., 2010; KEAM et al., 2013), direcionando questionamentos à prática da DAV aplicada aos
doentes terminais, revelam respostas que indicaram a viabilidade e aceitabilidade das DAV,
apesar de manifestações de desconforto dos pacientes em aderir a essa prática.
Na Coréia do Sul, os resultados de uma pesquisa realizada com 1242 pacientes com
câncer e 1006 membros do público em geral apontaram que 93% e 94,9%, respectivamente,
concordam com a necessidade de preenchimento das DAV (KEAM et al., 2013). No Reino
Unido, uma pesquisa com 18 pacientes oncológicos que objetivou explorar a aceitabilidade de
um roteiro de entrevista, projetado para incentivar conversas e discussões sobre cuidados
futuros, informar-se sobre a possibilidade de um planejamento antecipado de cuidado e de
completar uma DAV, constatou que a experiência do paciente com câncer provocou
mudanças na maneira como via a vida, de modo que queria viver mais no presente e não se
alongar muito sobre o futuro (BARNES et al., 2007); ou seja, os doentes terminais são muito
mais propensos a renunciar a procedimentos invasivos do que a procedimentos menos
invasivos (SULMAZY, 1998), o que reforça a necessidade do registro das DAV, para que
suas vontades possam ser cumpridas e respeitadas, considerando o que foi expresso.
Nos EUA, a maioria dos 415 pacientes cardíacos que participaram de uma pesquisa
tinham conhecimento do TV (93%) e da competência do procurador de saúde para os
cuidados de saúde (52%). Desses, 41% realizaram um testamento em vida, e 27% nomearam
um procurador responsável por informar suas decisões quando incapazes. A maioria dos
pacientes (86%) respondeu que desejava obter mais informações sobre as diretivas
antecipadas (HEFFNER; BARBIERI, 2000).
Entretanto, sob outro prisma, uma pesquisa em cinco hospitais nos EUA, que explorou
as preferências de 1823 pacientes, com relação à comunicação dos médicos sobre as decisões
de fim de vida, indicou que 23% dos pacientes gravemente doentes tinham discutido suas
preferências sobre RCR com seus médicos. Dos pacientes que não tinham discutido, 58% não
estavam interessados em fazê-lo e, desses, 25% não queria RCR. A propósito, a ausência de
discussões acerca das preferências dos pacientes sobre suas vontades relacionadas à limitação
dos esforços terapêuticos pode resultar em intervenções indesejadas (HOFMANN et al.,
58
1997). Todavia, para Kuhl, Stanbrook e Hébert (2010), os pacientes desejam que a família,
amigos e médicos sejam honestos consigo em todos os aspectos; ou seja, querem a verdade,
além de, efetivamente, discutir o processo da doença e as opções de tratamento.
Na Tailândia, os pacientes e seus substitutos geralmente hesitam em assinar um
documento, preferindo ter suas diretivas comunicadas oralmente uns aos outros. Nessa
direção, uma pesquisa que teve como objetivo identificar as preferências de 152 pacientes
com doenças terminais sobre as decisões dos cuidados de fim de vida e RCR revelou que
houve acordo entre os pacientes e seus substitutos, ou seja, 73,5% concordaram em relação à
decisão sobre o uso de diretivas (SITTISOMBUT et al., 2008). Já na Colômbia, em pesquisa
que descreveu as preferências dos pacientes relacionadas ao final da vida, apenas 14% dos
pacientes, de um total de 513, havia formalizado suas diretivas antecipadas sobre fim da vida
e, ainda, a escolha da morte digna estava relacionada com a rejeição de medidas fúteis e
obstinação terapêutica (SARMIENTO-MEDINA et al., 2012).
Na Espanha, considerando dados coletados com médicos, enfermeiros e estudantes
evidenciou que, nos hospitais nacionais de serviços de saúde da Região de Múrcia, pacientes
podem estar vivenciando sofrimento desnecessário, pois é comum atuarem contra sua
vontade, além de ocorrer aumento dos custos de cuidados de saúde nas medidas de suporte de
vida, inaceitáveis e desnecessárias em muitos casos. Essa condição está relacionada ao fato
que, diante das perguntas efetuadas pelos médicos aos seus pacientes, a respeito de suas
preferências e cuidados em final de vida, 24,5 % disseram que perguntou "quase sempre" e
12% que "sempre" (FRANCO; SILVA; SATURNO, 2011).
Com relação ao respeito às decisões dos pacientes sobre seus desejos em final de vida,
destacam-se os achados de Pautex, Herrmann e Zulian (2008), em pesquisa realizada em
Genebra, cujo objetivo foi caracterizar os pacientes com doença oncológica avançada que
decidiram completar suas diretivas antecipadas e medir o efeito da sua conclusão sobre o
nível de satisfação com os cuidados de fim de vida, tanto dos pacientes como de seus
familiares. A pesquisa realizada com 53 pacientes com câncer avançado demonstrou que as
preferências de fim de vida dos pacientes que formularam suas diretivas antecipadas foram
respeitadas pelos cuidadores. Alia-se a isso o fato de que a maioria dos pacientes morreu na
mesma unidade onde estavam descritas suas manifestações de vontade, e suas intenções não
foram demasiado vagas, resultando de uma discussão aprofundada com os cuidadores.
Na Alemanha, pesquisa realizada com 100 pacientes com câncer que objetivou
investigar seus desejos sobre tratamento no fim da vida, comparando-os com os desejos dos
enfermeiros e médicos, evidenciou que os pacientes preferiam tratamento com antibióticos e,
59
também, infringir tratamentos, como de quimioterapia e diálise, significativamente de modo
mais frequente do que a equipe de enfermagem e médicos. Foram determinantes associados a
esse desejo dos pacientes, a precariedade do seu estado de saúde e a idade avançada (SAHM;
WILL; HOMMEL, 2005).
Na Alemanha, com relação à escolha de quem deveria introduzir o diálogo sobre as
DAV, foi identificado que aproximadamente 75% dos pacientes queriam que seus médicos
iniciassem essa discussão, no momento em que o curso da doença exigisse (SAHM; WILL;
HOMMEL, 2005). Entretanto, em sua maioria, houve menção sobre a incapacidade de prever
com antecedência o que eles iriam querer em uma situação futura (SAHM; WILL;
HOMMEL, 2005; BARNES et al., 2007).
Para Barnes et al (2007), o momento em que ocorre a discussão sobre as DAV é
susceptível de influenciar sua aceitabilidade e efeito. Assim, a discussão pode ser melhor
iniciada após a recorrência da doença ou quando o tratamento falhou e o prognóstico é pobre.
As pessoas que iniciam discussões sobre as DAV devem ser ágeis em resposta e aos sinais de
desconforto do paciente, devendo essas discussões, preferentemente, transcorrer ao longo de
um certo número de encontros, conduzidas por um profissional treinado, com tempo para falar
sobre as questões levantadas, e com conhecimento e habilidade para responder às perguntas,
adaptando-as ao indivíduo, e evitando destruir sua esperança. As decisões de recusar o
tratamento não devem ser o foco da discussão, mas um componente de uma conversa mais
ampla sobre questões de fim de vida. Se o paciente tomar uma decisão antecipada de recusar
certos tratamentos, lhe deve ser dada a oportunidade de mudar sua opinião no futuro.
Sob outro enfoque, nos EUA, pesquisa realizada por Heffner e Barbieri (2000) com
pacientes apresentando comprometimento cardiológico avançado, constatou que eles queriam
realizar suas decisões de fim de vida, considerando suas próprias vontades ou levando em
conta as opiniões dos familiares, em vez de deixar as decisões para médicos e enfermeiros.
Diante de uma doença grave, 72% dos pacientes realizaram suas próprias decisões, 15%
preferiram que suas famílias decidissem, e apenas 8% transfeririam a decisão para os
médicos. Na simulação de uma situação em que o paciente tivesse perdido a capacidade de
decisão, 47% dos pacientes preferiram suas DAV escritas para orientar as decisões, 27%
preferiram ter um substituto nomeado em sua diretiva antecipada para tomar decisões, 22%
preferiram suas famílias para tomar decisões, e 4 % deixariam as decisões aos médicos.
No entanto, uma das principais barreiras percebidas para a conclusão das diretivas
antecipadas, em pesquisa implementada no Reino Unido com 18 pacientes oncológicos e
quatro familiares, foi a de que médicos não introduzem o assunto e a discussão sobre as DAV.
60
Isso destaca a necessidade de os profissionais de saúde serem informados sobre as DAV e
sensibilizarem-se aos sinais do paciente. Desse modo, vários participantes sugeriram que os
enfermeiros seriam os mais apropriados para conduzir essas discussões, em parte, porque
detêm conhecimento suficiente para responder perguntas e fornecer informações, e em parte
por causa do vínculo de confiança que se desenvolve ao longo do tempo nas relações
enfermeiro- paciente. No que se refere às preocupações expressas sobre o direito de uma
pessoa modificar seu pensamento sobre o que está escrito em uma diretiva antecipada, os
pacientes disseram que as opiniões podem mudar à medida que a doença progride ou novos
tratamentos se tornarem disponíveis e, por conseguinte, devem ser oferecidas oportunidades
regulares aos pacientes para atualizarem suas preferências (BARNES et al., 2007).
Nos EUA, uma pesquisa desenvolvida com 415 pacientes cardíacos inscritos em
centros de reabilitação ambulatorial, indicou que apenas 15% dos pacientes havia se
envolvido em discussões com seus médicos sobre diretivas antecipadas e 9% tinham
concluído as discussões sobre as intervenções de sustentação da vida. As discussões sobre as
diretivas antecipadas foram iniciadas mais frequentemente por pacientes (66%), seguidas por
membros da família (29%) e médicos (5%). As discussões sobre os cuidados de suporte de
vida foram mais frequentemente iniciadas por membros da família (51%), seguidos pelos
pacientes (43%) e médicos (6%) (HEFFNER; BARBIERI, 2000).
Na Tailândia, em estudo realizado com 152 sujeitos, quanto as preferências dos
pacientes com doenças terminais sobre as decisões em relação aos cuidados de fim de vida e a
RCR, foi constatado que 57,2% dos pacientes tinha um grande respeito pela autoridade de
seus médicos na tomada de decisões sobre os cuidados de fim de vida, 28,3% transfeririam
suas decisões a familiares e apenas 14,5% optaram pela tomada de decisão compartilhada
entre familiares e os médicos. No entanto, diante da situação de necessidade de uma decisão
para RCR cujos participantes fossem incapazes de tomar essa decisão, 44,1% dos indivíduos
expressaram o desejo de que a família tomasse as decisões em conjunto com os médicos,
33,6% atribuiriam a decisão para a família e apenas 22,4% transfeririam suas decisões aos
médicos (SITTISOMBUT; INTHONG, 2009).
No estudo de Evans et al (2008), feito com 4396 pacientes, 6% dos pacientes italianos,
5% dos espanhóis, 16% dos belgas e 29% dos pacientes holandeses realmente nomearam
(verbalmente ou por escrito) um substituto decisor (EVANS et al., 2013).A partir do estudo
de Sittisombut et al (2008), que procurou verificar a eficácia das diretivas antecipadas, foi
constatado que pacientes e seus substitutos estavam dispostos apenas a expressar suas
preferências, mediante discussão verbal, não através da assinatura de um documento.
61
Com relação às (des) vantagens e motivações à utilização das DAV, de acordo com
Pautex, Herrmann e Zulian (2008), os pacientes que completaram as diretivas apresentaram
menor índice de depressão e ansiedade. As diretivas antecipadas fundamentam-se nos
princípios da autonomia, do respeito às pessoas e à lealdade, trazendo, como benefícios, a
melhoria da relação médico-paciente, e da autoestima do paciente (DADALTO, 2013a).
As principais motivações dos pacientes para completar suas manifestações e desejos
estariam relacionadas à ampliação de sua autonomia; melhora da comunicação com os
cuidadores; medo do tratamento; não ser considerado um fardo; melhora da comunicação com
seus substitutos; certificar-se que suas preferências seriam respeitadas; não ser reanimado;
utilizar altas doses de analgésicos em caso de dor intratável; introduzir a nutrição artificial;
hidratação; antiobióticos; além da transfusão de sangue; desejo de ser transferido para outro
hospital; desejar nova hospitalização (PAUTEX; HERRMANN; ZULIAN, 2008).
Entretanto, os autores supracitados apresentam os motivos para não completar as
DAV, que se referem às dificuldades de antecipar suas vontades, não ter que escrever desejos
e o aparecimento rápido de um delírio ou a piora da condição de saúde. Complementa-se,
também, as dificuldades em organizar uma DAV, tendo que especificar as preferências e/ou
limitações para o tratamento de suporte de vida, além da linguagem que pode se apresentar
vaga e inconsistente para sua implementação (HAPP et al., 2002). Já para Shan, Will e
Hommel (2005). Uma das principais advertências contra o uso de diretivas na tomada de
decisão no fim da vida é que as pessoas podem não ser capazes de compreender o que se
entende por qualquer opção de tratamento sem ser devidamente informadas.
Merece destaque a importância do processo educativo, bem como as instruções
realizadas por profissionais que repercutem em maiores índices de preenchimento das DAV
(HARE; NELSON, 1991). No estudo de O'Mahony et al (2010), realizado com 157 pacientes
atendidos por uma equipe de cuidados paliativos no Centro Médico Montefiore, no Bronx,
Nova York, foi constatado que 33% dos pacientes tinha ordens de não-ressuscitar; no entanto,
após as orientações elucidativas e educativas, esse número ampliou para 83,4%.
Nos EUA, logo após o surgimento da Patient Self-Determination Act (PSDA), foi
realizado um estudo com dois grupos de um total de 167 pacientes adultos de um hospital em
Minesota, em que o primeiro grupo recebeu a demonstração de um folheto com a descrição de
informações sobre as DAV e as intervenções médicas que poderiam ser consideradas
extraordinárias se fossem utilizadas por um doente terminal; o segundo grupo recebeu um
livreto juntamente com discussões realizadas com o médico sobre as DAV. Antes da
realização do estudo, nenhum dos pacientes havia completado um TV. Após as intervenções,
62
dos 83 pacientes que tiveram acesso ao livreto, 84% indicaram que o tinham lido, e desses,
61% haviam discutido com a família sobre os cuidados de saúde que desejariam, ou não,
receber se estivessem em estado terminal. Entretanto, antes do primeiro período de
intervenção, apenas 44% do grupo de participantes tinha indicado que tinham falado aos
familiares sobre tais questões de tratamento. Na intervenção da utilização do livreto e de
discussões com o médico, 70% apresentaram-se interessados para discutir sobre o TV, 23%
mostraram desinteresse e um pouco de resistência e 7% se mostraram totalmente resistentes à
discussão. Nesse sentido, a utilização do livreto e as discussões com o médico se mostraram
eficazes (HARE; NELSON, 1991).
No Brasil, há falta de estudos que pesquisem as perspectivas dos pacientes diante da
prática das DAV. Destaca-se a investigação de Campos et al (2012), desenvolvida com 110
pacientes e 142 acompanhantes, a qual constatou que o conhecimento sobre o termo TV,
numa escala de 0 a 10 pontos, alcançou a média de 0,13 pontos, entre os pacientes. Após
apresentados o significado do termo, a intenção de elaboração das DAV obteve média de
9,56. Além disso, foi identificado que existe uma menor tendência de elaboração do TV em
pacientes de 21 a 30 anos, quando comparada a de outras faixas etárias.
Já com relação a implantação do TV no Brasil, a média de aceitação, entre os
pacientes, foi de 9,56. Em relação ao tempo de adoecimento e a preferência pela decisão, foi
observado que pacientes com mais tempo de doença apresentaram maior vontade de decidir
sobre sua saúde (CAMPOS et al., 2012). Na verdade, conforme Holland (2008), o que as
DAV trazem à tona é que a enfermidade e mesmo o morrer não devem ficar nas mãos,
somente, dos profissionais da saúde, reduzindo o paciente a um incapaz, alheio às decisões
tomadas a seu respeito: o protagonismo do homem sobre sua vida se estende agora ao
momento de sua enfermidade e sua morte.
3.2.4 Questões familiares diante das diretivas antecipadas de vontade
Em se tratando das DAV, de modo que as vontades do paciente e sua dignidade sejam
mantidas, conforme seus ideais, a dependência das decisões dos seus representantes parece
inevitável. Desse modo, internacionalmente, realizando uma associação das DAV com o
doente terminal, as pesquisas indicam que os cuidadores familiares e substitutos
desempenham papel indispensável diante de decisões que envolvem o fim da vida
63
(SULMASY et al., 1998; O'MAHONY et al.,2010; SARMIENTO-MEDINA et al., 2012;
SCHENKER et al., 2012; KEAM et al., 2013).
Os estudos apontam que as diretivas contribuem no sentido de amenizar aflições dos
familiares quanto à responsabilidade de decidir sobre as condutas nas questões relacionadas
ao fim da vida. Assim, Seymour et al (2004), a partir da pesquisa realizada no Reino Unido
com 32 idosos ou acompanhantes, constataram que as declarações antecipadas foram
entendidas, principalmente, em termos de seu potencial para ajudar a integridade pessoal e as
pessoas mais velhas e familiares, reduzindo o percebido 'fardo' de sua tomada de decisão.
Além disso, outro dado corresponde ao fato de que familiares enlutados relataram que a
conclusão de uma diretiva antecipada resultou em menos preocupações dos familiares, com
relação às condutas a serem realizadas, sobre a comunicação com os pacientes, aumentando a
utilização de cuidados paliativos (RONDEAU; SCHMIDT, 2009).
A família desempenha um papel fundamental na tomada de decisão, sob este aspecto,
destaca-se a pesquisa de Keam et al (2013), realizada, na Coréia do Sul, com 1289 cuidadores
familiares, identificando que 92,9 % aprovaram a necessidade de implementação das DAV.
Frequentemente, as decisões no final da vida que envolvem os familiares são motivadas pela
percepção da falta de dignidade, devido à deterioração progressiva, dor mal controlada,
abandono do paciente crônico, crueldade terapêutica e uso desnecessário de medidas que
adiam a morte (SARMIENTO-MEDINA et al., 2012).
Entretanto, uma pesquisa realizada nos EUA, com 30 decisores substitutos,
demonstrou que os familiares, ativamente envolvidos nas decisões de tratamento de suporte
de vida de doentes terminais, experimentam significativo conflito emocional entre o desejo de
agir de acordo com os valores de seu ente querido, não querendo se sentir responsável pela
sua morte, o desejo de perseguir qualquer chance de recuperação e a necessidade de preservar
o bem-estar da família (SCHENKER et al., 2012). Complementa-se, ainda, que, muitas vezes,
há evidências de que substitutos frequentemente não sabem as preferências do paciente.
No entanto, em pesquisa, realizada também nos EUA, com 50 pacientes e os seus
substitutos e 50 pacientes de clínica geral e seus substitutos, a fim de avaliar a precisão das
decisões tomadas pelos decisores substitutos e as preferências dos pacientes para tratamentos
de sustentação da vida, foi constatado que os substitutos fazem previsões corretas em
aproximadamente 66% dos casos, sendo fatores relevantes, associados, o paciente ter falado
com o familiar sobre questões de fim de vida, o paciente ter seguro privado, o nível de
educação do substituto e do paciente. Contudo, a precisão das decisões foi negativamente
associada à crença do paciente de que ele ou ela iria viver mais de 10 anos, experiência com o
64
tratamento de suporte de vida, participação em serviços religiosos e a um diagnóstico de
insuficiência cardíaca (SULMASY et al., 1998).
Esseestudo indicou as estratégias de intervenção que auxiliam nos julgamentos mais
precisos dos substituídos. Por exemplo, os profissionais de saúde podem incitar os pacientes a
conversar com seus entes queridos sobre seus desejos para os cuidados de fim de vida. Ainda,
os julgamentos dos substituídos podem ser melhorados se os médicos têm discussões mais
francas com doentes terminais sobre seus prognósticos (SULMASY et al., 1998).
Além disso, pode ocorrer dos pacientes expressarem suas ordens, mas os familiares
não aceitarem, desconsiderando sua vontade. Sob esse enfoque, ressalta-se que a coexistência
do mandato duradouro e do TV em um único documento, ou em outras palavras, a feitura de
uma DAV aumenta a certeza de que a vontade do paciente será atendida, uma vez que o
substituto poderá decidir pelo paciente quando o TV for omisso e, mais, poderá auxiliar a
equipe médica quando a família se colocar contra a vontade manifesta no TV. Não obstante, o
aspecto vinculante do TV evidenciou, em pesquisa realizada, no Brasil, com médicos, suas
dificuldades em respeitar a vontade do paciente, ainda que escrita, quando a família é
contrária a essa vontade (DADALTO; TUPINAMBÁS; GRECO, 2013).
Nos EUA, as estratégias de enfrentamento incluiram a possibilidade de recordar
discussões anteriores com um ente querido, as decisões de partilha sobre os bens com os
familiares, de atrasar ou adiar uma tomada de decisão, práticas espirituais/religiosas e o relato
de histórias. Os resultados da pesquisa com 30 substitutos, realizada nos EUA, demonstraram
que há uma luta para conciliar as necessidades emocionais individuais e familiares com seus
entes queridos. O estudo sugere estratégias para os médicos melhorarem a tomada de decisão,
incluindo o atendimento às emoções dos substitutos, facilitando as decisões em família. O
aumento da atenção para a experiência negativa de substitutos levou à ampliação de pedidos
para melhorar o apoio generalizado para famílias na UTI (SCHENKER et al., 2012).
Nesse contexto, é primordial, quando o desejo for de registrar as vontades de cuidados
em fim de vida, que essas sejam realizadas. O registro escrito contribui para evitar conflitos
dos interesses pessoais e das vontades dos pacientes, especialmente quando os familiares
divergem sobre as condutas a serem tomadas, repercutindo em dúvidas aos profissionais que
podem vir a atuar conforme o interesse dos familiares e não dos pacientes que, ao registrarem
suas vontades, esperavam que seu direito de autonomia pudesse ser garantido.
A prática de implementação do TV é incipiente no Brasil, praticamente ainda não
utilizada, acrescendo-se que suas disposições específicas ainda exigem interpretação. Nesse
contexto, destaca-se que se os profissionais da saúde continuarem comprometidos com a
65
crença de que a autonomia do paciente não está completamente revogada quando perde sua
capacidade de decisão, resta pouca escolha além de continuar a perguntar a quem conhece o
paciente melhor – o familiar - o que eles acham que o paciente deseja.
A família desempenha papel indispensável na contextualização dos cuidados em final
de vida do doente terminal, principalmente pelo fato que, por vezes, são eles que assumem
responsabilidades quanto a decisões que envolvem limitações dos esforços terapêuticos,
quando seu ente está incapacitado de decidir. Assim, é importante procurar manter o paciente,
se possível, e sua família, informados sobre a situação do doente e a evolução da doença,
considerando que somente com a interação da equipe multiprofissional, paciente e familiar,
será possível estabelecer uma ação diante da situação do paciente, isentando-se de qualquer
tipo de ressentimento ou mágoa por ter sido realizada, ou não, alguma ação (COGO, 2008).
A inclusão das DAV, com a nomeação de um representante apto a responder pelo
doente terminal, constitui-se em uma alternativa a fim de permitir que as vontades dos
pacientes sejam respeitadas pelos seus familiares. Ademais, o TV consiste em uma
possibilidade de evitar ou, mesmo, dirimir problemas éticos e bioéticos entre médicopaciente-familiares em situações extremas como o final da vida (PICCINI et al., 2011).
Ha que se destacar que, no Brasil, não existem estudos sobre como os familiares dos
doentes terminais tratam as questões relacionadas às DAV, exceto a investigação de Campos
et al (2012) que avaliou, mediante métodos quantitativos, a percepção de pacientes
oncológicos e acompanhantes sobre o conhecimento e aceitação do TV. A pesquisa indicou
que o conhecimento do termo “testamento vital” pelos familiares/acompanhantes, foi de 0,41
pontos (de 0 a 10). Posteriormente à explicação dos significados, a intenção de elaboração do
TV obteve média de 9,39 entre os acompanhantes (CAMPOS et al., 2012). Une-se, a isso, o
fato que, com relação a implantação do TV no Brasil, a média de aceitação foi de 9,75 entre
os acompanhantes. Os familiares indicaram, também, considerar como mais apropriado que as
decisões fossem tomadas pelos médicos (8,92) ou pelos médicos juntamente com pacientes
(8,87); ou seja, excluindo sua participação (CAMPOS et al., 2012).
Para Neves (2013), as necessidades de um doente terminal, muitas vezes isolado pela
sociedade, aumentam as exigências quanto a cuidados de conforto que promovam a qualidade
de vida física, intelectual e emocional, sem descurar a vertente familiar e social. As situações
de fim de vida envolvem vários personagens: doentes, familiares, equipe de saúde e
instituição hospitalar, devendo cada uma das partes ser envolvida na tomada de decisão,
sempre tendo em conta os prós e os contras de cada uma das opções.
66
4 PERCURSO METODOLÓGICO
4.1 DESENHO DO ESTUDO
Tratou-se de uma pesquisa pautada na abordagem qualitativa do tipo descritiva e
exploratória. De acordo com Moraes (2003), a pesquisa qualitativa possibilitou que fossem
compreendidos os fenômenos averiguados por meio da análise rigorosa e criteriosa de
materiais textuais, sem a intenção de testar hipóteses para comprová-las ou refutá-las ao seu
final, mas procurando a compreensão.
Neste sentido, de acordo com Polit e Beck (2011), o caráter descritivo permitiu
observar, descrever e documentar as características do fenômeno pesquisado. Já o caráter
exploratório visou proporcionar maior familiaridade com o problema estudado, a fim de
torná-lo explícito, tendo, como objetivo principal, o aprimoramento de ideias e descobertas.
4.2 CENÁRIO DO ESTUDO
O cenário que compreendeu essa pesquisa foi um hospital universitário e público de
grande porte criado em 1970, de uma cidade localizada no centro geográfico do Estado do Rio
Grande do Sul (RS), com aproximadamente 1780Km2e 263.403 habitantes (IBGE, 2010). O
hospital serve de referência secundária e terciária para a região centro-oeste, abrangendo 46
municípios, atendendo, exclusivamente, o Sistema Único de Saúde (SUS) e atua como
hospital-escola, como forma de aprimorar o desenvolvimento e qualificação da assistência à
população, permitindo que as atividades curriculares sejam realizadas em consonância entre a
teoria e a prática (HUSM, 2014).
A estrutura hospitalar é dividida por unidades de clínicas médica, cirúrgica, pediátrica,
obstétrica e ginecológica, intensivismo adulto, pediátrico e neonatal, atendimento
ambulatorial, serviço de Hospital-Dia para portadores do Vírus da Imunodeficiência Humana
(HIV), hemato-oncologia e nefrologia, atendimento domiciliar, pronto-atendimento e outras
especialidades, perfazendo um total de 291 leitos em unidade da internação, 37 leitos em
unidade de terapia intensiva, além das 53 salas de ambulatório, 11 salas para atendimento de
emergência, seis salas do centro cirúrgico e duas salas do centro obstétrico (HUSM, 2014).
Os recursos humanos para atender a demanda compõem-se de funcionários em nível
médio e superior, funcionários terceirizados, docentes das áreas de enfermagem, farmácia,
67
fisioterapia, medicina e odonto-estomatologia e alunos de graduação, estagiários, residentes,
mestrandos e doutorandos (HUSM, 2014).
Desse modo, as unidades do hospital escolhidas para o recrutamento dos participantes
da pesquisa foram a clínica médica II e o serviço de internação domiciliar. Naclínica médica,
constam 24 leitos destinados a diferentes especialidades, a citar: neurologia, pneumologia,
gastrenterologia, cardiologia, gerontologia, infectologia, entre outras. O quadro de
profissionais é composto por sete enfermeiros, 17 técnicos de enfermagem e quatro auxiliares
de enfermagem; além de aproximadamente 20 médicos residentes.
O serviço de internação domiciliar, criado em maio de 2005, assiste pacientes
portadores de enfermidades crônicas, clinicamente estáveis após internação hospitalare que
têm um familiar cuidador que se responsabiliza pelos cuidados no domicílio. O serviço possui
um limite de 30 pacientes, e objetiva manter a continuidade do tratamento dentro do ambiente
familiar; reduzir a média de permanência hospitalar, auxiliando na otimização da ocupação
dos leitos hospitalares; diminuir o risco de complicações como infecções hospitalares e o
desgaste emocional da família e do paciente (HUSM, 2014).
Neste contexto, a fim de proporcionar condições de assistência qualificada aos
pacientes e familiares que participam do serviço, existe uma equipe multidisciplinar composta
por dois enfermeiros, um auxiliar de enfermagem, um fisioterapeuta, um assistente social, um
médico assistente, um médico residente e um nutricionista. Inclui, ainda, um auxiliar
administrativo, que atua secretariando, além de um motorista que complementa as
necessidades para o atendimento. (HUSM, 2014). Inserem-se, também, nesse programa,
acadêmicos dos cursos de Enfermagem, Fisioterapia e Fonoaudiologia, e profissionais da
residência multiprofissional, os quais exercem ações durante as aulas práticas e estágios, sob a
supervisão dos docentes e dos profissionais do serviço (BRONDANI, 2008).
Partindo do exposto, a escolha pelas referidas unidades justificou-se por entender que
se constituíram em locais adequados para essa pesquisa, pois caracterizam-se por atender e
assistir doentes terminais e, consequentemente, ambientes repletos de vivências de situações
conflituosas e de dilemas éticos suscitados pelo processo de terminalidade, relacionados às
questões de suspensão ou não dos tratamentos, bem como situações relacionadas ao
cumprimento das vontades do paciente, ou seja, a manutenção da sua autonomia.
68
4.3 PARTICIPANTES DA PESQUISA
Os participantes da pesquisa compõem uma amostragem intencional, ou seja, foram
escolhidos propositalmente pela pesquisadora, considerando-os adequados a responder as
questões exploradas na pesquisa (POLIT; BECK, 2011). Assim, os critérios de inclusão
foram: enfermeiros e médicos residentes atuantes na unidade de clínica médica e no serviço
de internação domiciliar por pelo menos seis meses, que aceitassem e apresentassem
disponibilidade em participar da pesquisa. No que se refere aos cuidadores familiares, os
critérios foram: maiores de 18 anos que realizassem o cuidado ao paciente considerado doente
terminal em sua residência, familiares designados como responsáveis pelo paciente que
aceitassem participar e responder aos questionamentos da pesquisa.
Os critérios de exclusão dos participantes limitaram-se à ausência dos enfermeiros e
médicos no período destinado à coleta dos dados, em virtude de afastamentos, atestados
médicos e outros. Não foram considerados participantes da pesquisa, os familiares que não
efetuassem o cuidado direto ao paciente; os cuidadores familiares de pacientes que não
possuíssem o diagnóstico de doença terminal e os familiares menores de 18 anos.
Os principais motivos que nortearam a opção pela pesquisa com enfermeiros e
médicos que atuam rotineiramente com pacientes considerados doentes terminais decorreu da
iminência da morte ser precedida, na maioria das vezes, de discussões sobre a recusa ou
suspensão dos tratamentos, o que impõe, à equipe multidisciplinar, decisões que envolvam
problemas éticos, religiosos, culturais e legais (SOARES; TERZI; PIVA, 2007). Além disso,
Costa e Diniz (2004) consideraram que os enfermeiros e médicos são continuamente
confrontados com diferentes escolhas sobre quando, como e onde morrer, preferências
relacionadas aos padrões de vida das pessoas e não apenas a questões de ordem técnica.
Ainda, em algumas situações críticas e terminais, dada a inevitabilidade da morte e o
esgotamento das alternativas curativas ou paliativas, a possibilidade de decidir sobre a própria
morte assume um papel de conforto moral. Um número crescente de pessoas procura auxílio
de médicos e enfermeiras não apenas para tratar doenças, mas para garantir que a experiência
da morte seja também resultado de escolhas individuais (COSTA; DINIZ, 2004).
Os familiares responsáveis e que cuidam dos pacientes foram escolhidos, pois
influenciam diretamente nas decisões; muitas vezes, esse poder lhes é delegado pelo paciente
e pelo fato dos profissionais da saúde recorrerem aos familiares responsáveis para auxílio nas
tomadas de decisões diante do paciente incapacitado. De acordo com Hofmann et al (1997),
69
entretanto, por vezes, os familiares desconhecem as preferências do paciente para os cuidados
de fim de vida, o que sugere que a comunicação sobre essas questões pode ser inadequada.
Assim, participaram do estudo dois enfermeiros e um médico que compõem o quadro
funcional do serviço de internação domiciliar; seis enfermeiros e seis médicos residentes da
unidade de clínica médica II da instituição hospitalar.Dos oito enfermeiros, sete são do sexo
feminino e um masculino, com média de idade de 44 anos; seu tempo de formação em
enfermagem variou de nove a 30 anos, e com tempo médio de atuação profissional nas
unidades pesquisadas de sete anos. Os níveis de aperfeiçoamento mais evidentes foram a
especialização, contudo, apresentaram-se duas enfermeiras com mestrado em andamento,
duas enfermeiras mestres e uma doutora em enfermagem.Já os médicos entrevistados, três do
sexo feminino e quatro masculino, caracterizavam-se por idades entre 25 e 42 anos de idade
com uma média de 29 anos; com tempo de atuação profissional da quase totalidade dos
entrevistados, nas unidades pesquisadas, de um ano.
Os familiares recrutados a participar das entrevistas foram escolhidos conforme
diagnóstico de doente terminal determinado pelo médico do serviço de internação domiciliar,
levando em conta que, nos meses de outubro a dezembro de 2014, obteve-se uma variação de
28 a 30 pacientes submetidos ao serviço e desses, de oito a 10 pacientes considerados
terminais, tendo sido entrevistados sete familiares de pacientes. Dentre os principais
acometimentos dos pacientes considerado terminais, estava o câncer de amígdala, mama,
canal retal com metástases, melanoma metastático, complicações oriundas de acidentes
vasculares recorrentes e esclerose lateral amiotrófica.
A caracterização dos sete familiares entrevistados variou de idades entre 41 e 57 anos,
com uma média de 50 anos, e o tempo de cuidado de dois a três anos. A relação de parentesco
dos cuidadores foi de três maridos e duas esposas, uma filha e uma sobrinha. Quanto à
escolaridade dos entrevistados, dois referiram ter ensino médio incompleto, dois cursaram
ensino fundamental incompleto, um com ensino médio completo, um com formação técnica e
uma entrevistada com curso superior em formação. Ressalta-se que todos os familiares
entrevistados não trabalham, exercendo suas atividades de cuidados aos pacientes em tempo
integral; exceto um dos esposos que atua profissionalmente de forma esporádica.
Desta forma, perfizeram a amostra da pesquisa 22 participantes, sendo que esse
número não foi definido aprioristicamente. Ressalta-se que uma das enfermeiras da clínica
médica se recusou a participar da entrevista, alegando dificuldades pessoais de enfrentamento
da temática. Com os médicos residentes, houve dificuldades referente à coleta de dados em
virtude da reduzida disponibilidade de tempo para participarem das entrevistas, por estarem
70
em horário de trabalho, necessitando em média três (re) agendamentos com cada médico
entrevistado. Já com os cuidadores familiares, foi possível realizar a entrevista com todos os
elencados.
4.4 COLETA DOS DADOS
A coleta dos dados foi realizada, pela autora desta pesquisa, nos meses de outubro a
dezembro de 2014, por meio de entrevistas semiestruturadas (APÊNDICE I) realizadas em
um único encontro com uma duração média de 50 minutos. As entrevistas foram conduzidas
em uma estrutura flexível, com questões abertas que definiam a área a ser explorada, pelos
menos inicialmente, e a partir da qual foi possibilitado ao entrevistador e a pessoa entrevistada
interagir a fim de prosseguir com uma ideia ou resposta em maiores detalhes (POPE; MAYS,
2006). Houve a inclusão de questões fechadas, a fim de obter a caracterização dos
participantes.
Foi possível captar as visões aprofundadas de como os enfermeiros, médicos e
cuidadores familiaresdos doentes terminais entendem a aplicabilidade das DAV nas situações
de terminalidade. Contudo, partindo do pressuposto que o entendimento sobre a terminologia
DAV seria limitado, foi exposto, para aqueles que não apresentaram esse conhecimento, o
conceito determinado pelo CFM, que se refere a um documento organizado pelo paciente com
o médico, ou isoladamente, onde constam os desejos, prévia e expressamente manifestados,
sobre cuidados e tratamentos que quer, ou não, receber no momento em que estiver
incapacitado de expressar, livre e autonomamente, sua vontade (CFM, 2012).
Os participantes da pesquisa - médicos e enfermeiros – primeiramente foram
consultados sobre o interesse em participar da pesquisa e, após, foi realizado o agendamento
das entrevistas. O encontro para a coleta dos dados ocorreu nos seus locais de trabalho em
salas privativas, considerando a manutenção da privacidade e o sigilo, sem prejudicar o
andamento das atividades assistenciais. No entanto, com um dos médicos residentes, a
entrevista ocorreu no domicílio, conforme solicitação do participante. Ressalta-se, ainda, que
aproximadamente dez médicos residentes não apresentaram interessem em participar da
pesquisa, principalmente pelo fato de desconhecimento da temática e em virtude das
ocupações profissionais que impossibilitariam dispender de tempo para participar.
O agendamento da coleta dos dados com os familiares dos pacientes considerados
doentes terminais ocorreu após a realização da aproximação inicial por meio de, no mínimo,
duas visitas realizadas com a equipe de assistência domiciliar da instituição, até que houvesse
71
uma familiarização da pesquisadora com os participantes. Passada essa etapa, foram
realizadas as entrevistas no domicílio, conforme marcação prévia.
Os participantes da pesquisa foram orientados quanto aos objetivos da pesquisa, bem
como a metodologia que seria empregada, além dos riscos e benefícios esperados. Assim, a
fim de captar os dados com melhor fidedignidade, foi utilizado o gravador digital para as
entrevistas, a partir da autorização e assinatura do Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido (TCLE) aos enfermeiros e médicos (APÊNDICE II) e familiares (APÊNDICE
III), em duas vias, ressaltando que seria assegurada a liberdade de participar do estudo, bem
como a possibilidade de se recusar e retirar seu consentimento em qualquer fase da pesquisa,
sem penalização ou prejuízo para si.
4.5 ANÁLISE DOS DADOS
Os dados coletados por meio das entrevistas foram submetidos à análise textual
discursiva que, de acordo com Moraes e Galiazzi (2013), se fundamenta na desconstrução e
reconstrução aprofundada da compreensão de novos entendimentos, a partir de um processo
auto-organizado, que emergem dos fenômenos investigados, considerando o cumprimento de
uma sequência de três etapas: a desconstrução dos textos do corpus, a unitarização; o
estabelecimento de relações entre os elementos unitários, a categorização; e a captação do
novo emergente em que a nova compreensão é comunicada e validada.
A unitarização do corpus da pesquisa constituiu a primeira etapa exigindo a
participação ativa da pesquisadora, examinando detalhadamente as transcrições das
entrevistas realizadas, a fim de fragmentá-las no sentido de atingir unidades de sentido
referentes ao fenômeno; ou seja, um exercício de desconstrução das informações coletadas
(MORAES; GALIAZZI, 2013). A escolha das unidades de sentido é relevante, pois os
resultados da pesquisa são muito sensíveis aos tipos de unidades trabalhadas.
A unitarização propiciou um esforço constante de interpretação e construção de
significados em relação aos significantes do corpus. Essa etapa foi permeada por um trabalho
de reconstrução de significados, considerando que os sentidos não se desprendem do material
analisado e precisam ser reconstruídos. As reconstruções necessariamente sofrem
interferências das concepções teóricas do pesquisador, por sua teoria e visão de mundo
(MORAES; GALIAZZI, 2013). Assim, nessa pesquisa, o referencial teórico de Beauchamp e
Childress, a partir dos conceitos de autonomia, beneficência e não-maleficência, norteou as
discussões e construções dos significados.
72
A prática de unitarização, para ser concretizada, seguiu três etapas distintas, que
incluíram: a fragmentação dos textos e codificação de cada unidade; a reescrita de cada
unidade de modo que assumissem um significado o mais completo possível; e, por último, a
atribuição de um nome a cada unidade produzida (MORAES; GALIAZZI, 2013). Essas
etapas exigiu um intenso contato e impregnação com o material de análise, envolvimento
essencial para a emergência de novas compreensões e para a continuidade do processo
analítico (MORAES, 2003). Na unitarização, os recortes dos textos realizados repercutiram
diretamente na estruturação das categorias, levando em conta que o inventário das unidades
de base constituiu ferramenta indispensável para a categorização, que originou a segunda
etapa da análise textual discursiva (MORAES; GALIAZZI, 2013).
Na etapa da categorização, a construção das categorias aconteceu a partir da
organização, ordenamento e agrupamento de conjuntos de unidades de análise, objetivando
expressar as novas compreensões dos fenômenos investigados que correspondem à síntese
dos elementos que mais se destacaram na investigação (MORAES; GALIAZZI, 2013).
Assim, durante a categorização, ocorreu a identificação das unidades de significado, que
conforme os sentidos, foram agrupadas em categorias iniciais; após, as intermediárias, que
progressivamente foram organizadas e denominadas com maior precisão à medida que
estavam sendo construídas, originando as categorias finais (QUADRO 1).
As categorias constituem os elementos de organização do metatexto, ou seja, é a partir
delas que surgem os textos descritivos e interpretações das novas compreensões sobre a
temática investigada possibilitadas pela análise (MORAES; GALIAZZI, 2013). Há que se
destacar que, na construção das categorias na análise textual discursiva, essas foram
produzidas pelo método indutivo, implicando em construir gradativamente as categorias com
base nas informações contidas no corpus (MORAES; GALIAZZI, 2013).
A terceira etapa relacionada à captação do novo emergente aconteceu por meio da
intensa impregnação dos materiais analisados, desencadeada pelas etapas precedentes,
possibilitando a emergência de uma compreensão renovada sobre a aplicabilidade das DAV
(MORAES; GALIAZZI, 2013), a partir da produção de metatextos oriundos do
corpus.Assim, o ciclo de análise descrito, ainda que composto de elementos racionalizados e
em certa medida planejados, em seu todo, constituiu um processo auto-organizado do qual
emergiram novas compreensões desde o processo de desconstrução do corpus, até a
comunicação dos resultados finais, criativos e originais, ou seja, as novas compreensões,
originando a concretização do emergente (MORAES, 2003).
73
UNIDADES DE SENTIDO
Diferentes condutas
Desrespeito as vontades
Dúvida nas condutas
Deficiência de registros
Deficiência e adaptação na comunicação
Dúvida no diagnóstico
Ciência do diagnóstico
Ocultação do diagnóstico
Cumprimento das vontades do paciente
Reduzir distanásia
Autonomia limitada
Desrespeito às vontades
Segurança
Tranquilidade
Auxilia nas decisões
Amparo legal
Redução do estresse
Redução dos conflitos
Consentimento dos familiares
Ortotanásia
Contestação judicial
Mudança de opinião
Desrespeitos às vontades do paciente
Contestação familiar
Ansiedade
Cultura e escolaridade
Falta de tempo
Rotatividade de profissionais
Difícil implementação
Erros de diagnóstico
Desmotivação profissional
Treinamentos
Protocolo
Capacitação profissional
Diálogo
Registros
Abordagem multiprofissional
Dignidade
Nutrição e hidratação
Respeito
Qualidade de vida
Privacidade
Conhecimento do diagnóstico e
prognóstico
Sinceridade
Investimento total
Crenças e cultura
Desresponsabilização da família
Mudança de opinião
Medo das DAV
Entubação
Não dar trabalho para os familiares
Situação inviável
Mudança de opinião
Sofrimento familiares
Cansaço
Sofrimento
CATEGORIAS
INTERMEDIÁRIAS
CATEGORIAS FINAIS
Conflito de ideias
Interação profissional
Esclarecimentos do
diagnóstico e
prognóstico
Conflitos na assistência ao doente
terminal: implicações à prática das
DAV
Respeito a autonomia
Respaldo profissional
O respaldo dos familiares e dos
profissionais mediando o respeito a
autonomia do paciente: vantagens à
aplicabilidade das DAV
Respaldo aos familiares
Amparo legal
Desrespeito a autonomia
Limitações no
entendimento das DAV
Barreiras profissionais
Dificuldades e limitações na
implementação das DAV: desafios à
prática hospitalar
Divulgação na sociedade
Comprometimento
profissional
Medidas de conforto
Respeito a autonomia
O medo das DAV e respeito à
autonomia: desejos pessoais de
cuidado dos profissionais remetidos a
doença terminal
Aplicação das DAV
Desejos pessoais
Sobrecarga no cuidado
Desejos dos cuidadores familiares
diante da situação de terminalidade
74
Dedicação exclusiva
Desânimo
Culpa
Falta de autocuidado
Doença do cuidador
Angústia
Satisfação
Obrigação
Compromisso
Investimento total
Esperança de melhora
Informação médica do diagnóstico
Confusão de informação
Insegurança quanto ao diagnóstico
(des) conhecimento do diagnóstico
Desejos manifestados
Suposições sobre as vontades do
paciente
Tratamentos
Respeito às vontades
Dúvida
Orientação e estimulação médica
Mudança de opinião
Respaldo familiar
Dúvida no diagnóstico
Autoestima
Medo da verdade
Esperança
Crença
Proteção
Depressão
Medo
Abdicação do
autocuidado para o
cuidar do outro
Responsabilidade de
cuidar
Responsabilidade da família no
cuidado ao doente terminal
Esperança de reversão da
doença
Comunicação
(in)suficiente do
diagnóstico e
prognóstico
Cumprimento das
vontades do paciente
Aplicação das DAV
O respeito à autonomia do doente
terminal pelos familiares: o medo da
verdade
Ocultação do diagnóstico
ao paciente
Quadro 1 – Construção das categorias. Rio Grande, RS, Brasil, 2016.
4.6 CONSIDERAÇÕES ÉTICAS
A realização de pesquisas com seres humanos deve atender aos fundamentos éticos e
científicos desde a sua idealização; assim, depois de concedidas as autorizações institucionais
e o parecer favorável (n. 168/2014) do Comitê de Ética em Pesquisa na Área da Saúde
(CEPAS) da FURG (ANEXO III), conforme o previsto pela Resolução 466/12 do Conselho
Nacional de Saúde (CNS), que normatiza a realização de pesquisa com seres humanos
(BRASIL, 2012), ocorreu o início da coleta dos dados.
Após procedido aos trâmites éticos e institucionais, e cumprindo o compromisso do
rigor científico e respeitando os preceitos éticos em todas as etapas na realização de pesquisa
com seres humanos, bem como a defesa da tese, o relatório final estará disponível para a
comunidade, inclusive a apresentação em encontros científicos e publicação em revistas
especializadas, podendo conter citações literais da entrevista, mas sempre de modo anônimo e
evitando a identificação do informante; assim, foram adotados códigos identificados por letras
75
(enfermeiros: ENF; médicos: MED; familiares: FAM) seguidos de algarismos numéricos para
identificação das falas dos participantes. Ressalta-se que as falas dos entrevistados foram
adaptadas, passando por alterações gramaticais e retirando termos da linguagem coloquial, a
fim de facilitar o entendimento das citações dos entrevistados.Importante ressaltar que foram
respeitados os compromissos éticos firmados, à realização da pesquisa, no que tange: à
obtenção do TCLE; à ponderação entre riscos e benefícios; à previsão de procedimentos que
assegurassem a confidencialidade, privacidade e proteção do (a) participante; ao respeito aos
valores culturais, sociais, morais, religiosos e éticos; o respeito aos hábitos e costumes dos
participantes; à garantia do retorno dos dados e benefícios obtidos com a pesquisa para as
pessoas envolvidas.Conforme previsto na Resolução 466/12, os dados coletados estão
mantidos em arquivo digital, sob a guarda da pesquisadora, por um período de cinco anos,
após o término da pesquisa. Nesse sentido, há o compromisso por parte da pesquisadora
acerca da confidencialidade dos dados coletados, bem como, do anonimato dos participantes.
76
5 RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os resultados e as discussões oriundas da coleta dos dados apresentam-se dispostos em
três artigos científicos, que serão descritos a seguir.
O primeiro artigo, intitulado “Assistência ao doente terminal: vantagens na
aplicabilidade das diretivas antecipadas de vontade no contexto hospitalar”
objetivouconhecer vantagens relacionadas à aplicabilidade das diretivas antecipadas de
vontade no contexto hospitalar, na perspectiva de enfermeiros, médicos residentes e
cuidadores familiares. A organização e elaboração do artigo respeitaram as normas do
periódico científico Revista da Escola de Enfermagem da USP.
O segundo artigo intitulado “Dificuldades e limitações na implementação das
diretivas antecipadas: desafios à prática hospitalar” teve como objetivo conhecer
dificuldades e limitações relacionadas à implementação das diretivas antecipadas de vontade
no contexto hospitalar. Este artigo foi elaborado conforme as normas do periódico científico
Revista Brasileira de Enfermagem.
O terceiro artigo objetivou conhecer o entendimento de enfermeiros, médicos e
cuidadores familiares quando remetidos à possibilidade de se tornarem doentes terminais
sobre a aplicabilidade das diretivas antecipadas de vontade, intitulado “Diretivas antecipadas
de vontade: desejos dos profissionais da saúde e cuidadores familiares quando remetidos
a doença terminal” e foi organizado conforme as normas do periódico científico Revista
Latino-Americana de Enfermagem.
77
5.1 ARTIGO 1
Assistência ao doente terminal: vantagens na aplicabilidade das diretivas antecipadas de
vontade no contexto hospitalar10
Assistance to the terminally ill: advantages in the applicability of the advance directives
of will in hospitals
La asistencia a los enfermos terminales: ventajas en la aplicación de las directivas
anticipadas de voluntad en hospitales
1
Silvana Bastos Cogo1; Valéria Lerch Lunardi2
Silvana Bastos Cogo - Doutoranda em Enfermagem do Programa de Pós-Graduação em
Enfermagem da Universidade Federal de Rio Grande (FURG). Professora Assistente da
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) do curso de Enfermagem Campus Palmeira das
Missões. Endereço: R.Serafim Valandro, 118, Santa Maria (RS).
[email protected]
2
Valéria Lerch Lunardi - Doutora em Enfermagem. Docente do Programa de Pós-Graduação em
Enfermagem da Universidade Federal de Rio Grande (FURG). [email protected]
10
Submissão do artigo para a Revista da Escola de Enfermagem da USP. Normas disponíveis em:
http://www.scielo.br/revistas/reeusp/pinstruc.htm
78
RESUMO
Objetivo:conhecer vantagens relacionadas à aplicabilidade das diretivas antecipadas de
vontade no contexto hospitalar, na perspectiva de enfermeiros, médicos residentes e
cuidadores familiares. Método: estudo qualitativo, descritivo e exploratório. Realizadas
entrevistas semiestruturadas com enfermeiros, médicos residentes e cuidadores familiares de
doentes terminais; após, procedeu-se a análise textual discursiva. Resultados: Emergiram
quatro categorias: Respeito à autonomia do paciente, Respaldo no enfrentamento de conflitos
com e dos familiares, Redução de conflitos na equipe em decisões sobre tratamentos e
condutas, Divulgação e instrumentalização para aplicação das DAV.Conclusão: O respeito a
autonomia do doente terminal permeia as vantagens ao se relacionar as condutas de
tratamentos em final de vida. Com a efetivação das DAV no contexto hospitalar,
discordâncias que envolvem os processos em final de vida estariam amparados pelo desejo do
paciente, além de implicar em redução dos medos dos profissionais em sofrer processos legais
e em respaldo aos familiares.
Descritores: Diretivas antecipadas; Doente terminal; Enfermagem; Autonomia pessoal.
ABSTRACT
Objective: to know advantages related to the applicability of the advance directives of will in
the hospital, from the perspective of nurses, medical residents and family caregivers. Method:
qualitative, descriptive study. Conducted semi-structured interviews with nurses, medical
residents and family caregivers of terminally ill; after, we proceeded to the discursive textual
analysis. Results: Four categories emerged: Respect for patient autonomy, Respaldo in coping
with conflicts and family, reduction of conflicts in team decisions about treatments and
conducts, Disclosure and instrumentation for application of the DAV. Conclusion: Respect
the patient's terminal autonomy pervades the advantages relate to the conduct of treatments at
the end of life. With the conclusion of the DAV in the hospital, disagreements involving the
end of life processes would be supported by the patient's desire, and making in reducing fears
of professional experience in legal process and support to family members.
Key words: Advance Directives; Terminally ill; Nursing; Personal autonomy.
RESUMEN
Objetivo: conocer las ventajas relacionadas con la aplicación de las directivas anticipadas de
voluntad en el hospital, desde la perspectiva de las enfermeras, los médicos residentes y los
cuidadores familiares. Método: Estudio cualitativo, descriptivo. Llevó a cabo entrevistas
semi-estructuradas con enfermeras, médicos residentes y los cuidadores familiares de
enfermos terminales; después, se procedió al análisis textual discursiva. Resultados: Cuatro
categorías emergieron: El respeto a la autonomía del paciente, Respaldo para hacer frente a
los conflictos y la familia, la reducción de los conflictos en las decisiones del equipo acerca de
los tratamientos y conductas, Divulgación e instrumentación para la aplicación de la DAV.
Conclusión: Respetar la autonomía del terminal del paciente impregna las ventajas se
relacionan con la conducta de los tratamientos al final de la vida. Con la conclusión de la
DAV en el hospital, los desacuerdos relacionados con el final de los procesos vitales serían
apoyados por el deseo del paciente, y haciendo en la reducción de los temores de experiencia
profesional en proceso legal y apoyo a miembros de la familia.
Palabras clave: Las directivas anticipadas; Enfermos terminales; Enfermería; La autonomía
personal.
79
Introdução
A possibilidade de prolongar a vida humana artificialmente, em virtude dos avanços
científicos e tecnológicos, impondo às pessoas, por vezes, processos de morte lenta e sofrida,
requer reflexões sobre a limitação das intervenções clínicas, de forma a respeitar o
cumprimento da vontade do doente em fase terminal(1). Em vista disso, a garantia e o avanço
do respeito à autonomia pessoal, bem como a oposição à obstinação terapêutica, destituindo
as pessoas de uma morte digna, por viver-se em uma sociedade que ainda nega a morte(2),
propulsionaram o surgimento das Diretivas Antecipadas de Vontade (DAV), também
conhecidas, no Brasil, como testamento vital.
As DAV surgem da necessidade de humanizar o fim de vida(1) e tratam do direito do
paciente exercer sua autonomia, expondo suas vontades quanto aos tratamentos que gostaria,
ou não, de se submeter, se estiver incapaz de manifestar sua vontade, seja por estar
inconsciente ou em um estado terminal(3), permitindo-lhe preparar-se para a incapacidade de
decidir perante a morte(1). O direito de escolher sobre a recusa, ou não, de tratamentos foi
proposto nos Estados Unidos da América (EUA), em 1969, por Luis Kutner que cunhou o
termo living will. Na década de 1990, as DAV, denominadas de Advances Directives, foram
previstas pelo Patient Self-Determination Act, lei norte americana aprovada pelo Congresso,
constituindo-se na primeira legislação do mundo a tratar sobre as diretivas(4).
Há essencialmente dois tipos de DAV: a primeira, na qual o paciente especifica os
tratamentos médicos que devem, ou não, lhe ser fornecidos em certas situações, também
denominadas de testamento vital; e a segunda, Durable Power of Attorney, traduzida como
mandato duradouro, que consiste na autorização, pelo paciente, de um representante legal,
para decidir em seu nome, quando em situação de incapacidade(5). Nos países como EUA,
Espanha, Inglaterra e México, onde as práticas das DAV são sustentadas por legislações,
apesar de ainda suscitarem dificuldades de aplicação, elas são bem aceitas pela população,
pacientes, cuidadores familiares, representantes legais e profissionais da saúde(6-12)
promovendo a melhoria da relação médico-paciente e da autoestima do paciente(4).
No Brasil, diferentemente, inexiste uma normativa jurisprudencial. Entretanto, a
Resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) 1.995/12 dispõe sobre as DAV, como o
conjunto de desejos, prévia e expressamente manifestados pelo paciente, sobre cuidados e
tratamentos que quer, ou não, receber no momento em que estiver incapacitado de expressar,
livre e autonomamente, sua vontade(13). Ainda, diante da designação de um representante legal
pelo paciente, suas informações devem ser consideradas e as DAV do paciente prevalecerão
sobre o parecer não médico, inclusive sobre os desejos dos familiares(13).
80
O ponto central e norteador da Resolução é a autonomia do paciente, sujeito de sua
história e de seu destino(14), fundamentando-se no respeito às pessoas e à lealdade(4). Frente a
tais considerações, há que se destacar que essa prática já está vigente no Brasil, tendo sido
constatado que, entre 2009 e 2014, o número de documentos do tipo de testamento vital
registrados em cartório cresceu 2000%(15).
No cenário internacional, pesquisas indicam que os cuidadores familiares e
representantes legais desempenham papel indispensável diante da tomada de decisões que
envolvem o fim da vida(10,16-17). Em pesquisa na Coréia do Sul, 92,9% de 1289 cuidadores
familiares aprovaram a necessidade de implementação das DAV(10). Frequentemente, as
decisões no final da vida que envolvem os familiares são motivadas pela percepção da falta de
dignidade, devido à deterioração progressiva, dor mal controlada, abandono do paciente
crônico, crueldade terapêutica e uso desnecessário de medidas que adiam a morte(16).
As manifestações das decisões autônomas, que antecedem períodos de incapacidade,
devem ser consideradas válidas e obrigatórias após a pessoa se tornar incapaz(5). Assim, a
medida em que uma das principais motivações dos pacientes para completar as DAV
relaciona-se à preservação de sua autonomia(12), esta pesquisa apoia-se na teoria
principialista(5), primordialmente, no conceito de autonomia, referente aodireito do
autogoverno, privacidade, escolha individual, liberdade da vontade, de ser o motor do próprio
comportamento(5).
Ante a tais fatos, considera-se que os benefícios das DAV não são exclusividade do
paciente, mas oferecem importante respaldo aos cuidadores familiares e aos profissionais da
saúde que disporão de maior segurança para agir, amparados na vontade expressa do paciente,
além da tão almejada resolução de problemas éticos e morais, perante os quais os
profissionais da saúde são submetidos, quando os pacientes perdem sua capacidade
autônoma(18).
Com a finalidade de sensibilizar os profissionais da saúde, contribuindo para a
reflexão dos estudos sobre as DAV, e pela incipiência de pesquisas empíricas, especialmente
que indiquem, sob o olhar dos profissionais da saúde e cuidadores familiares, as vantagens da
sua aplicabilidade à prática assistencial, delineou-se como objetivo: conhecer as vantagens
relacionadas à aplicabilidade das diretivas antecipadas de vontade no contexto hospitalar, na
perspectiva de enfermeiros, médicos e cuidadores familiares de doentes terminais.
Método
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Trata-se de um estudo de abordagem qualitativa do tipo descritivo e exploratório,
realizado em um hospital universitário, público, de grande porte, localizado no centro
geográfico do Estado do Rio Grande do Sul, com sujeitos selecionados intencionalmente.
Utilizou-se como critérios de inclusão: ser enfermeiros e médicos residentes atuantes
na prática assistencial da clínica médica e do serviço de assistência domiciliar, por um período
mínimo de seis meses e cuidadores familiares, maiores de 18 anos, designados como
responsáveis pelo doente terminal do serviço de internação domiciliar, que aceitassem
participar e responder aos questionamentos da pesquisa.
Participaram, dois enfermeiros e um médico do serviço de internação domiciliar; seis
enfermeiros e seis médicos residentes da unidade de clínica médica e sete cuidadores
familiares, perfazendo uma amostra de 22 participantes, definida pela saturação dos dados(19).
Realizaram-se entrevistas semiestruturadas com uma duração média de 50 minutos, os
quais foram gravadas digitalmente, no período de outubro a dezembro de 2014. Os dados
foram coletados na instituição hospitalar, com os profissionais da saúde e, no domicílio, com
os cuidadores familiares, após, no mínimo, duas visitas prévias para uma aproximação com o
ambiente de cuidado, possibilitando, também, ao entrevistado conhecer a pesquisadora.
Formularam-se questões fechadas para caracterização dos participantes e questões
abertas abordando a autonomia do paciente e as DAV, enfocando sua aplicabilidade no
contexto hospitalar. Em virtude da possibilidade de desconhecimento do termo DAV, a
pesquisadora disponibilizou o conceito do CFM, expresso anteriormente.
Os dados foram submetidos a análise textual discursiva(19). A unitarização, primeira
etapa da análise, exigiu examinar detalhadamente as transcrições das entrevistas,
fragmentando-as, para atingir as unidades constituintes referentes ao fenômeno,
desconstruindo as informações(19). Na etapa da categorização, as unidades de significado
foram agrupadas e progressivamente organizadas e denominadas com maior precisão,
originando as categorias finais. Por fim, a etapa de captação do novo emergente aconteceu por
meio da intensa impregnação dos materiais analisados, possibilitando a emergência de uma
compreensão renovada sobre a aplicabilidade das DAV(19), a partir da produção de
metatextos.
Obteve-se a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa na Área da Saúde da
Universidade Federal de Rio Grande sob o parecer n. 168/2014. Todos os participantes
assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e com o intuito de garantir o
anonimato dos participantes, foram adotados códigos para sua identificação (enfermeiros:
ENF; médicos: MED; cuidadores familiares: FAM) seguidos de algarismos numéricos.
82
Resultados
Dentre os oito enfermeiros entrevistados, sete são do sexo feminino e um masculino,
com idades variando de 33 a 60 anos de idade, com a média de 44 anos. Apresentavam tempo
de formação em enfermagem de nove a 30 anos e uma média de 18 anos de formados. O seu
tempo de atuação profissional na instituição variou de um a 14 anos e média de sete anos.
Os sete médicos entrevistados, três do sexo feminino e quatro masculino,
caracterizavam-se por idades entre 25 e 42 anos com uma média de 29 anos; com tempo de
atuação profissional na instituição de um a nove anos. Dos médicos entrevistados, seis atuam
na residência em medicina interna e um dos profissionais no serviço de internação domiciliar.
Os cuidadores familiares entrevistados tinham uma média de 50 anos e o período,
como cuidadores do doente terminal, de dois a três anos. A relação de parentesco dos
cuidadores foi de três maridos e duas esposas, além de uma filha e uma sobrinha. Ressalta-se
que todos os familiares não tem vínculo empregatício, exercendo suas atividades de cuidados
aos pacientes em tempo integral, exceto um dos esposos que, esporadicamente, atua
profissionalmente.
O processo de análise textual discursiva das falas possibilitou a construção das
categorias: Respeito à autonomia do paciente, Respaldo no enfrentamento de conflitos com e
dos familiares, Redução de conflitos na equipe em decisões sobre tratamentos e condutas,
Divulgação e instrumentalização para aplicação das DAV.
Respeito à autonomia do paciente
O respeito a autonomia, norteador de todas as ações relacionadas às DAV, constitui-se
na principal vantagem da sua aplicabilidade, especialmente no contexto de terminalidade da
doença, para enfermeiros, médicos e cuidadores familiares. As DAV parecem ser a garantia
para que o cumprimento da vontade do paciente esteja assegurado.
Os pacientes inconscientes ou que não conseguem falar sua vontade, a decisão fica
para os familiares e equipe. Com as DAV a gente vai fazer a vontade do paciente que estava
consciente quando decidiu (ENF.5).
As DAV deixam explícito a autonomia do paciente, por que em algum momento ela se
perde e assim vai se respeitar até o final da vida de fato, a vontade do paciente (MED.3).
Se ele tivesse deixado eu acho que eu iria fazer o que ele disse, porque sempre
respeitamos as vontades um do outro, a gente se deu muito bem (FAM.3).
Respaldo no enfrentamento de conflitos com e dos familiares
83
Sob a perspectiva dos enfermeiros e médicos residentes, as DAV minimizariam
desconfortos e conflitos profissionais, oriundos das discordâncias dos familiares, nas decisões
sobre as condutas de tratamento em situações de final de vida.
Quando a família não tem uma relação harmoniosa, aparecem com um certo remorso
e querem que faça tudo. Por isso é bom, o paciente decidir sobre si (ENF.5).
Nos auxiliaria quando o paciente é inconsciente e os familiares ficam dando opiniões
contrárias a opinião do paciente e nos auxiliaria no caso se é paciente terminal (MED.2).
Os enfermeiros e médicos manifestaram que, em situações angustiantes, em que
optariam por restringir tratamentos pelo reconhecimento da incurabilidade, as DAV
auxiliariam a equipe, especialmente, para não iludir os pacientes e demais envolvidos numa
suposta intervenção.
Os profissionais ficariam mais tranquilos e mais seguros em relação às condutas,
porque é angustiante. (...) tu vais reanimar só por que a família está ali e o familiar que está
não entende e se acaba fazendo (ENF.7).
Tu não vais com medo, obviamente que não é só o paciente pedir, mas que esteja em
concordância com a situação, que tu não vai precisar fazer uma medida só de teatro, por
exemplo, que reanimou (MED.5).
Ainda, as DAV reduziriam problemas relacionados aos medos de enfermeiros e
médicos quanto às implicações legais por condutas que, quando não realizadas, poderiam
ocasionar punições, como a não realização da intubação ou da reanimação cardiorrespiratória
(RCR).
Os riscos de processos contra a enfermagem seriam menores, porque muitas vezes por
deficiências de registros e comunicação, ficamos fragilizados legalmente (ENF.2).
As DAV nos dariam amparo e evitariam muita dor de cabeça e ajudariam com
relação a processos médicos, dando base legal. Estaremos respeitando a vontade do paciente
(MED.2).
Para os enfermeiros, médicos e cuidadores familiares, a aplicação das DAV, também,
representa um respaldo aos familiares, que frequentemente não sabem como agir diante das
situações que envolvem a terminalidade, podendo, ainda, reduzir conflitos existentes entre os
familiares e desses com os profissionais sobre as condutas a serem realizadas.
Eu acho uma questão prática e objetiva para família, é um descanso, que a família se
desobriga por um lado de ter que tomar uma decisão dolorosa e difícil (ENF.6).
É importante ter um familiar que tenha esse documento e que vai defender a tua
vontade, é um amparo para esse familiar. (...) se for colocado verbalmente, pode não ser
84
respeitado, mas se existe um documento, ele como responsável se torna mais factível que
realmente a vontade seja respeitada (MED.4).
Eu não sei o que fazer, eu não conversei com ela sobre o que ela gostaria numa
situação dessas. Se tivesse falado ou escrito, eu ficaria mais tranquilo, porque é muito
doloroso decidir se vive ou morre (FAM.3).
Ainda, a partir do respaldo dos cuidadores familiares, os profissionais mencionam que
o consentimento do familiar favorece a assistência dos profissionais em prol do paciente.
Eu me sinto mais tranquilo para conversar sobre as restrições de tratamentos quando
o familiar entende e acata as decisões, porque ele sabe o que está acontecendo e da chance
de morte iminente. Acho que o serviço flui de maneira mais natural e sincera (MED.7).
Redução de conflitos na equipe em decisões sobre tratamentos e condutas
As DAV auxiliariam, também, na redução dos conflitos dos profissionais da saúde
relacionados a indecisões de tratamentos e condutas diferenciadas, muitas vezes, associadas à
alta rotatividade de profissionais.
Eu me sentiria amparada com as DAV (...) trabalhamos com equipes grandes e isso
ajudaria a diminuir o conflito do profissional e consequentemente ajudaria a instituição
(ENF.8).
Quando um decide pelo final da vida e o outro decide por investir, a gente deve
agrupar uma decisão. (...) enquanto estiver alguém querendo investir, eu não tomo como
postura desistir do paciente (MED.2).
As DAV são vistas pelos profissionais como estratégia para propiciar tranquilidade
aos pacientes, considerando que seus desejos serão cumpridos, desobrigando os profissionais
de atuarem obstinadamente no prolongamento de suas vidas, quando reconhecidamente
terminais.
As diretivas beneficiariam os pacientes e seria uma tranquilidade nesse momento que
gera muito estresse. Eles não passariam os últimos momentos da vida na emergência fazendo
procedimentos fúteis (ENF.7).
Com certeza, iria melhorar muito, reduzindo a distanásia (MED.5).
Para a enfermagem, o respaldo profissional incutido na prática das DAV, constitui-se
em possibilidade de maior tranquilidade e garantia de que suas possíveis condutas
relacionadas a limitações de tratamentos não serão questionadas, especialmente diante de uma
comunicação inadequada das decisões médicas à enfermagem, o que dificulta sua tomada de
decisão especialmente na assistência em situações emergenciais.
85
As DAV facilitariam na decisão das condutas, pois as vezes a gente corre atrás do
médico para saber o que era ou não para fazer e a gente tá reanimando e talvez essa não
fosse a vontade do paciente (ENF.1).
É algo para respaldar e tranquilizar a equipe a se sentir mais segura ao tratar o
paciente (ENF.3).
As DAV facilitariam o nosso funcionamento da equipe (MED.5).
Divulgação e instrumentalização para aplicação das DAV
As vantagens elencadas pelos enfermeiros e médicos residentes demonstram que a
aplicabilidade das DAV é importante e coerente à assistência aos doentes, contudo requer
uma prévia instrumentalização para amparar sua introdução no ambiente hospitalar.
Demanda instrumentalização e capacitação sobre o que realmente significa (ENF.4).
Precisamos aprender a usar e fazer o documento; poderia ser implementado, a partir
de um treinamento com os profissionais. Hoje não, porque muitas universidades não tem o
devido preparo (MED.2).
Embora os participantes dessa pesquisa, em quase sua totalidade, não tivessem
conhecimento prévio sobre as DAV, foi possível perceber seu interesse em aderir à prática no
contexto hospitalar, obviamente com a necessidade de treinamentos a fim de capacitá-los.
As DAV vêm no caminho a aumentar a possibilidade de trabalhar essas questões. Eu
não vejo que sejam sempre necessárias, mas a existência da legislação vai aumentar o fórum
de debate. É um caminhar longo, mas que tem que ser trilhado (MED.4).
Para os familiares, faz-se necessário o entendimento das DAV pelos profissionais da
saúde, que devem estar bem informados sobre o tema, de modo a dialogarem e contribuírem
com os demais envolvidos nesse processo, ou seja, com os cuidadores familiares e os
pacientes.
A gente precisa de mais esclarecimentos sobre como pode ser feito e acredito que os
profissionais possam nos ajudar, porque é preciso esclarecimentos específicos da área que a
gente não domina (FAM.7).
Para os cuidadores familiares, a realização da pesquisa alertou para a necessidade de
conversar com os pacientes sobre seus desejos, a fim de que, mesmo que não realizem suas
DAV, possam expressar suas vontades e, se possível, tê-las respeitadas.
Eu nunca me liguei em falar sobre qualquer assunto relacionado a morte com ela,
talvez se eu tivesse falado sobre morte com ela, poderia estar pensando e vivendo esse
momento de outra maneira (FAM.1).
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Tu me alertou para, de repente, numa conversa, eu vou perguntar para ela saber o
que ela pensa. É algo que a gente nunca pensa em perguntar e que é super importante
(FAM.5).
Discussão
A introdução das DAV no contexto hospitalar, para enfermeiros, médicos e cuidadores
familiares entrevistados possibilita enfrentar situações de terminalidade, respaldados e
amparados no respeito do cumprimento das vontades expressas do doente. As DAV se
estabelecem como o exercício do direito à liberdade, uma vez que é um espaço que o
indivíduo tem para tomar decisões pessoais, imunes a interferências externas, sejam elas dos
médicos, da família ou de qualquer pessoa e/ou instituição que pretenda impor sua própria
vontade(4).
Os direitos de autonomia tornaram-se tão influentes que é difícil encontrar defesas
claras dos modelos tradicionais da beneficência médica, ou seja, se o conteúdo da obrigação
do médico de ser beneficente é definido pelas preferências do paciente, então em vez da
beneficência, triunfa o respeito à autonomia. A beneficência fornece a meta e o fundamento
primordiais da medicina e da assistência à saúde, enquanto o respeito à autonomia estabelece
os limites morais das ações dos profissionais, ao buscar essa meta(5).
Desse modo, os dados apresentados indicam que a aplicação das DAV proporcionaria
tranquilidade a garantira do respeito à autonomia dos pacientes, isentando os profissionais da
saúde e familiares da responsabilidade das decisões em fim de vida. É uma possibilidade de
evitar ou, mesmo, de reduzir problemas éticos e bioéticos entre os profissionais da saúde,
pacientes e familiares em situações extremas como o final da vida(20).
No panorama internacional, estudos realizados com médicos(6,8-10), enfermeiros(6,21); e
universitários da saúde(8,11) evidenciaram aceitabilidade e efetividade na aplicação das DAV
na assistência aos doentes terminais. Na Coréia do Sul, pesquisa com 303 médicos
oncologistas evidenciou que 96,7% concordaram com a necessidade de preenchimento das
DAV(10). Outra pesquisa, realizada nos hospitais de Múrcia na Espanha, com 607 médicos,
enfermeiros e graduandos, evidenciou que 63,3% dos sujeitos destacaram a importância das
preferências do paciente sobre o tratamento e os procedimentos de suporte de vida em
situações terminais(8).
Resultados de pesquisa com 30 familiares, nos EUA, demonstraram que há uma luta
para conciliar as necessidades emocionais individuais e familiares com seus entes queridos, o
que fez com que a experiência negativa dos familiares responsáveis pelos pacientes, levasse à
ampliação de pedidos para melhorar o apoio generalizado para famílias pelos profissionais (17).
87
No Brasil, familiares de doentes terminais consideram como mais apropriado que as decisões
fossem tomadas primeiramente pelos médicos ou pelos médicos juntamente com pacientes; ou
seja, excluindo sua participação(22).
Do mesmo modo, a partir dos dados dessa pesquisa, os profissionais destacam as DAV
como possibilidade de isentar os familiares de responsabilidade, bem como de minimizar
conflitos entre profissionais da saúde e familiares, nos processos decisórios que envolvem o
fim de vida. Assim, as DAV, além de protegerem interesses de autonomia, podem reduzir o
estresse das famílias e profissionais de saúde que temem tomar uma decisão errada(5),
evitando dificuldades da equipe de saúde diante do conflito entre as vontades dos familiares e
do paciente(23).
Propiciar ao indivíduo a possibilidade de deixar claro nas DAV quais são os valores e
desejos que devem orientar a tomada de decisões é importante para evitar/ajudar a dirimir
esses conflitos(23). Além disso, indicam uma maneira de opor-se à distanásia, garantindo a
dignidade do doente, tratando-o como pessoa, e não como instrumento de uma terapêutica
inútil e que cause mais dores e sofrimentos(3). A ausência de diretivas pode levar a cuidados
agressivos e indesejados, que tem sido associados a uma redução da qualidade de vida e do
cuidado(10).
Aos profissionais, as DAV forneceriam amparo aos médicos, já que na prática são
realizadas condutas que obrigam o médico a registrar determinados ações restritivas de
tratamento ao doente terminal, no prontuário, com consentimento e assinatura dos familiares.
Assim, seriam uma maneira de respaldá-los e serviriam de meio hábil a resguarda-los de
eventual responsabilização ao fazer ou não fazer uso dos tratamentos e cuidados dispensados
pela escolha prévia do paciente ainda capaz(3).
Ademais, os enfermeiros, também, seriam respaldados, pois inseridos nas discussões e
conhecedores das DAV, atuariam de modo a informar, respeitar, acompanhar e cuidar o
doente, não podendo se esquivar do processo de planejamento, concepção e cumprimento das
DAV(1). A relevância da enfermagem, frente às questões relacionadas às DAV, deve-se a um
problema muito frequente, ou seja, a decisão de não fazer determinado procedimento, de não
prestar um cuidado ou uma intervenção. Outra questão refere-se à necessária articulação com
outros profissionais de saúde, designadamente, com os médicos. Às vezes, há um conflito face
à decisão de cuidado; entretanto, as decisões de fim de vida devem constituir-se em uma
decisão de equipe. No entanto, mesmo que a decisão não seja construída em equipe, sua
implementação requer, necessariamente, a intervenção do médico e do enfermeiro, podendo
acontecer que um decida num determinado sentido e outro em sentido inverso(24).
88
Para a efetividade na implementação das DAV, evidenciou-se, nessa pesquisa, a
necessidade de interação da equipe multiprofissional, especialmente entre os enfermeiros e
médicos que atuam diretamente com os pacientes, assim como com os familiares. Estudos têm
demonstrado que a prática das diretivas antecipadas acontece de maneira efetiva quando
existe adequada comunicação entre os profissionais da saúde, familiares e o paciente(6,11-12).
As DAV se inserem na relação dos profissionais com o paciente como meio para que a
autonomia do paciente, seus desejos de tratamento e cuidados, antes de um possível estado de
incapacidade, possam ser exercidos, assegurando sua dignidade e autodeterminação(3). Assim,
as DAV propõem um desafio de reconhecimento da autonomia dos pacientesnos processos de
tomada de decisão dos tratamentos querepercutem diretamente nas relações entre médico e
paciente, médico e família dopaciente, e médico com a equipe assistencial(25). As DAV
ajudam os profissionais da saúde a entender valores e desejos dos pacientes, atuando como
veículos para discussões aprofundadas e permanentes entre profissionais de saúde, pacientes e
familiares(12), podendo auxiliar a equipe médica quando a família se colocar contra a vontade
manifestada pelo doente(23).
De acordo com o princípio da beneficência, a moralidade requer que, além de tratar as
pessoas como autônomas, contribua para proporcionar-lhes bem-estar; potencialmente, exige
mais que o princípio da não-maleficência, pois requer que atitudes positivas para ajudar os
outros sejam implementadas, não meramente abstendo-se de realizar atos nocivos(5).
As DAV não constituem tarefa fácil a ser implementada, pois suscitam dúvidas de
ordem bioética. Nessa pesquisa, há o enfoque, pelos entrevistados, da necessidade de
capacitações a fim de obter a instrumentalização e futuramente a aplicabilidade prática das
DAV. Nesse sentido, uma campanha de conscientização dos cidadãos brasileiros acerca da
importância do respeito à vontade de seus familiares, objetivando evitar conflito entre sua
vontade manifesta nas DAV e a vontade da família(23), é o principal desafio para auxiliar na
aplicabilidades das DAV.
A utilização das DAV, no Brasil, será efetivamente respeitada, se houver um esforço
coletivo em garantir o direito de o indivíduo manifestar sua vontade, além de que os desejos
previamente manifestados sejam efetivamente cumpridos. Esse é o desafio imposto(23).
Considerações finais
É evidente que o reconhecimento da possibilidade de respeito à autonomia pessoal do
doente terminal permeia as vantagens elencadas pelos enfermeiros, médicos residentes e
cuidadores familiares ao se relacionar às condutas de tratamentos em final de vida. Entretanto,
é necessário frisar que as DAV, por se tratarem de um tema polêmico e com características
89
multifacetadas, e em virtude de no Brasil ainda ser incipiente sua aplicação, requer pesquisas
referentes a sua efetividade no contexto prático. É preciso reconhecer que são necessários
estudos nessa direção, pois sua utilização tem-se mostrado cada vez maior.
O reconhecimento da possibilidade de efetividades das DAV foi destacado pelos
profissionais da saúde, de modo a intermediar os respaldos aos pacientes, familiares e
profissionais. Nesse processo, é importante reconhecer que as vantagens atribuídas possam
contribuir para a qualidade do cuidado a se prestar em situações de final da vida, e que sejam
de fato usadas a serviço da autonomia pessoal em seu processo de morte.
O desejo de respeitar as vontades dos doentes terminais garante, além de tranquilidade
ao paciente, em virtude do cumprimento dos seus desejos, a redução de conflitos éticos e
morais entre profissionais, familiares e paciente, o respaldo das atuações dos profissionais da
saúde e o amparo aos cuidadores familiares que se desresponsabilizarão em interferir em
decisões de tratamento, que não correspondam aos desejos dos pacientes.
Há que se destacar que, com a efetivação das DAV no contexto hospitalar,
discordâncias que envolvem os processos em final de vida, estariam amparados pelo desejo
do paciente, além de implicar em redução dos medos dos profissionais em sofrer processos
legais. A relação e a interação dos profissionais da saúde, familiares e paciente estaria sendo
estabelecida de maneira mais tranquila.
Identificadas as vantagens da aplicabilidade das DAV, apesar da limitação dos
resultados, do ponto de vista da amostra, constatou-se a sinalização para sua aceitação no
contexto hospitalar, pelos enfermeiros, médicos e cuidadores familiares.
Referências
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Neves MEO. Percepção dos Enfermeiros sobre Diretivas Antecipadas de Vontade [dissertação
de mestrado]. Viseu: Escola Superior de Saúde de Viseu; 2013. 135p.
2.
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92
5.2 ARTIGO 2
Dificuldades e limitações na implementação das diretivas antecipadas: desafios
à prática hospitalar11
Difficulties and limitations in the implementation of advance directives of will:
challenges to hospital practice
Dificultades y limitaciones en la aplicación de las directivas anticipadas de
voluntad: desafíos a la práctica hospitalaria
Silvana Bastos Cogo1; Valéria Lerch Lunardi2
1
Silvana Bastos Cogo - Doutoranda em Enfermagem do Programa de Pós-Graduação em
Enfermagem da Universidade Federal de Rio Grande (FURG). Professora Assistente da
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) do curso de Enfermagem Campus Palmeira
das Missões. Endereço: R.Serafim Valandro, 118, Santa Maria (RS).
[email protected]
2
Valéria Lerch Lunardi - Doutora em Enfermagem. Docente do Programa de PósGraduação em Enfermagem da Universidade Federal de Rio Grande (FURG).
[email protected]
11
Submissão do artigo para a Revista Brasileira de Enfermagem. Normas disponíveis em:
http://www.scielo.br/revistas/reben/pinstruc.htm
93
Resumo
Objetivo:Conhecer dificuldades e limitações relacionadas à implementação das
diretivas antecipadas de vontade no contexto hospitalar. Método: estudo qualitativo, do
tipo descritivo e exploratório, mediante entrevista semiestruturada com enfermeiros,
médicos residentes e cuidadores familiares. Os dados foram analisados por meio da
técnica de análise textual discursiva e ancorada no referencial dos princípios da bioética.
Resultados: Emergiram as categorias: A terminalidade como expressão de derrota e a
cura como opção para o cuidado? Receios das implicações legais; Diretivas antecipadas
de vontade requer autonomia do paciente e adequada comunicação. Conclusão: As
limitações e dificuldades atribuídas à prática das DAV, na perspectiva dos participantes,
indicam, além dos inúmeros conflitos e dilemas relacionados às questões em final de
vida, que vivências da iminência da morte não tem possibilitado que os desejos dos
pacientes sejam respeitados.
Descritores: Diretivas antecipadas; Doente terminal; Enfermagem; Autonomia pessoal;
Cuidadores.
Abstract
Objective: To know the difficulties and limitations related to the implementation of
advance directives of will in the hospital setting. Method: qualitative study of
descriptive and exploratory, through semi-structured interviews with nurses, medical
residents and family caregivers. Data were analyzed by means of discursive textual
analysis technique and anchored in the framework of the principles of bioethics.
Results: The following categories emerged: Terminality as defeat of expression and
healing as an option for the care? Fears of legal implications; Advance directives of will
requires patient autonomy and adequate communication. Conclusion: The limitations
and difficulties attributed to the practice of DAV, from the perspective of the
participants, indicate, in addition to numerous conflicts and dilemmas related to the
questions at the end of life, that death imminence of experiences have not enabled that
patients' wishes are respected.
Descriptors: Advance Directives; Terminally Ill; Nursing; Personal Autonomy;
Caregivers.
Resumen
Objetivo: Conocer las dificultades y limitaciones relacionadas con la aplicación de las
directivas anticipadas de voluntad en el ámbito hospitalario. Método: Estudio
cualitativo de descriptivo y exploratorio, a través de entrevistas semi-estructuradas con
enfermeras, médicos residentes y los cuidadores familiares. Los datos fueron analizados
por medio de la técnica de análisis textual y discursiva anclados en el marco de los
principios de la bioética. Resultados: Las siguientes categorías emergieron:
terminalidad como la derrota de expresión y la curación como una opción para el
cuidado? Los temores de consecuencias legales; Las directivas anticipadas de voluntad
requiere la autonomía del paciente y la comunicación adecuada. Conclusión: Las
limitaciones y dificultades atribuidas a la práctica de la DAV, desde la perspectiva de
los participantes, indican, además de numerosos conflictos y dilemas relacionados con
las preguntas al final de la vida, que la inminencia de la muerte de las experiencias no
han permitido que se respeten los deseos de los pacientes.
Descriptores: Directivas Anticipadas; Enfermo Terminal; Enfermería; Autonomía
Personal; Cuidadores.
94
Introdução
Prolongar a vida e adiar o momento da morte tem sido o grande desafio da
humanidade. Com o desenvolvimento da ciência na área da medicina e tecnologia, é
possível, modificar o curso natural da doença, o que conduz a um novo paradigma no
campo da saúde, ou seja, à necessidade de acompanhar e cuidar de doentes em situações
prolongadas, ou não, de doença, vivência, por vezes, acompanhadas de muito
sofrimento(1).
A utilização excessiva de tecnologia sofisticada tem contribuído para a
desumanização na prestação de cuidados de saúde, pelo uso desproporcional de meios
de tratamento em doentes terminais, caracterizada como obstinação terapêutica, uma
prática difícil de ser alterada pela disponibilização abusiva das novas tecnologias
biomédicas(2).
Paralelamente à obsessão da medicina moderna em prolongar a existência,
restringindo a liberdade das pessoas em sua última fase da vida(3), percebe-se o avanço
da autonomia pessoal, nas últimas décadas, conferindo, ao paciente, o direito a ser
informado, a escolher o tratamento, dentre os disponíveis, e a consentir ou a recusar um
procedimento ou terapêutica. Assim, as Diretivas Antecipadas de Vontade (DAV),
usualmente conhecidas no Brasil como Testamento Vital, que tratam sobre os direitos
dos pacientes manifestarem suas vontades, enquanto capazes, emergiram como uma das
discussões de vanguarda da bioética mundial(4).
As DAV possibilitam a uma pessoa, devidamente esclarecida, recusar um
tratamento que considere inaceitável, reforçando o exercício da sua liberdade de
autodeterminação(2). Diante de um cenário de ausência normativa jurisprudencial, no
Brasil, o Conselho Federal de Medicina (CFM) promulgou a Resolução n°1.995/2012
que dispõe sobre a possibilidade de aplicação das DAV(5), entendidas como o conjunto
de desejos, prévio e expressamente manifestado pelo paciente, sobre cuidados e
tratamentos que quer, ou não, receber no momento em que estiver incapacitado de
expressar, livre e autonomamente, sua vontade(5). Trata-se de uma manifestação prévia
do paciente que auxiliará nas orientações aos profissionais, familiares e responsáveis
pelos pacientes à tomada de decisão, no caso de sua incapacidade.
Tal Resolução, entretanto, não encerra várias polêmicas que permeiam esse
assunto, relacionadas à sua aplicabilidade, à expectativa que a vontade das pessoas
corresponda à decisão final, à inserção do profissional de saúde no processo das DAV e
se esse pode ou tem capacidade para alterar a decisão do paciente, além de outras
95
dúvidas(6).Em pesquisa no Brasil, foram apontadas dificuldades dos médicos em
respeitar a vontade do paciente, ainda que escrita, quando a família é contrária a essa
vontade(7).
Contudo, após a aprovação da Resolução, essa prática já está vigente no Brasil,
mesmo que permeada por incertezas. Entre 2009 e 2014, o número de documentos do
tipo de Testamento Vital registrados em cartórios cresceu 2000%, tendo sido registrados
314 em São Paulo, seguido de 86 em Mato Grosso e 53 no Rio Grande do Sul(8).
No cenário internacional, dificuldades de antecipar suas vontades, não desejar
escrever desejos e o aparecimento rápido de um delírio ou a piora da condição de saúde
foram os motivos identificados para não completar as DAV(9) Ressaltam-se, também,
dificuldades em organizar uma DAV, tendo que especificar preferências e/ou limitações
para o tratamento de suporte de vida, além da linguagem que pode se apresentar vaga e
inconsistente para sua implementação(10). Ainda, uma das principais advertências contra
o uso de diretivas na tomada de decisão no fim da vida é que as pessoas podem não ser
capazes de compreender diferentes opções de tratamento, sem ser devidamente
informadas(11).
Entretanto, apesar das dificuldades na aplicabilidade das DAV, tudo indica que
sua utilização será cada vez maior, deslocando-se o foco do debate para seu uso de
maneira efetiva. Assim, é importante que esses documentos devam integrar um processo
que propicie um diálogo aberto entre familiares, profissionais da saúde e paciente, de
modo a refletir as reais necessidades, crenças, valores, metas de cuidado e preferências
do paciente(12). Desse modo, esta pesquisa ancora-se na teoria principialista(13),
prioritariamente, no conceito de autonomia, referente aodireito do autogoverno,
privacidade, escolha individual, liberdade da vontade, de ser o motor do próprio
comportamento(13).
Ante a tais fatos e diante da possibilidade de conhecer as percepções dos
profissionais da saúde, bem como dos cuidadores familiares de doentes terminais diante
das decisões que envolvem as situações em final de vida, relacionadas às dificuldades
na possibilidade de aplicação das DAV, delineou-se como objetivo: conhecer as
dificuldades e limitações relacionadas à implementação das DAV no contexto
hospitalar.
Método
Estudo descritivo e exploratório, de natureza qualitativa, realizado com
enfermeiros, médicos residentes e cuidadores familiares de doentes terminais,
96
escolhidos intencionalmente, vinculados a um hospital universitário da região central do
Rio Grande do Sul, Brasil.
Os critérios de inclusão foram: enfermeiros e médicos residentes atuantes na
assistência da clínica médica e do serviço de assistência domiciliar por, no mínimo, seis
meses e cuidadores familiares dos doentes terminais, maiores de 18 anos, que
realizassem o cuidado ao paciente considerado terminal em sua residência, designados
como responsáveis pelo paciente.
A coleta dos dados foi realizada de outubro a dezembro de 2014, por meio de
entrevista semiestruturada, gravada digitalmente, com duração média de 50 min,
enfocando questões relacionadas à autonomia do doente, implicações do cuidado,
responsabilidades de cuidar e aplicação das DAV. As entrevistas com os profissionais
da saúde foram realizadas na instituição hospitalar e com os cuidadores, no domicílio,
após terem sido realizadas, no mínimo, duas visitas prévias, a fim de familiarizar-se
com o ambiente e possibilitar ao entrevistado, conhecer a pesquisadora.
Após a transcrição, os dados foram submetidos à análise textual discursiva(14)
considerando três etapas: unitarização, quando as transcrições foram analisadas e
fragmentadas em unidades de sentido(14); categorização, quando se reuniram unidades
de significado semelhantes, gerando as categorias de análise; captação do novo
emergente, mediante intensa impregnação dos materiais analisados, possibilitando uma
compreensão renovada sobre a aplicabilidade das DAV(14), a partir da produção de
metatextos oriundos do corpus examinado.
O estudo obteve parecer favorável, sob o n. 168/2014, do Comitê de Ética em
Pesquisa na Área da Saúde da Universidade Federal de Rio Grande. A fim de manter o
anonimato dos entrevistados, foram adotados códigos (ENF: enfermeiros; MED:
médicos; FAM: cuidadores familiares) seguidos de algarismos numéricos para
identificação das falas dos participantes.
Resultados
Os oito enfermeiros entrevistados, sete do sexo feminino e um masculino, com
idades variando de 33 a 60 anos com uma média de 44 anos; com tempo de formação
em enfermagem de nove a 30 anos e média de 18, atuavam na instituição de um a 14
anos, com média de sete anos. Os níveis de aperfeiçoamento mais evidentes foram a
especialização, dois com mestrado em andamento, dois mestres e um doutor em
enfermagem.Os sete médicos entrevistados, três do sexo feminino e quatro masculino,
97
caracterizavam-se por idades entre 25 e 42 anos com uma média de 29 anos; com tempo
de atuação na instituição de um a nove anos.
No período da coleta dos dados, 28 a 30 pacientes faziam parte do serviço de
internação domiciliar, com uma média de oito a dez doentes considerados terminais.
Participaram sete cuidadores familiares, quatro mulheres e três homens, com idades
entre 41 e 57 anos e o tempo como cuidadores de dois a três anos. A relação de
parentesco foi de três maridos, duas esposas, uma filha e uma sobrinha.
Da análise, emergiram as categorias: A terminalidade como expressão de derrota
e a cura como opção para o cuidado? Receios das implicações legais; Diretivas
antecipadas de vontade requer autonomia do paciente e adequada comunicação.
A terminalidade como expressão de derrota e a cura como opção para o cuidado?
Dificuldades e desconfortos vivenciados pelos profissionais ao abordar a
terminalidade parecem justificar sua opção de prosseguir investindo em tratamentos a
pacientes terminais, ao invés de discorrer e dialogar sobre possibilidades de
procedimentos em final de vida.
Nem sempre a gente consegue lidar com a situação de final de vida e de tomar a
decisão de medidas de conforto e de restrições de investimento. A situação mais difícil é
a questão da aceitação da condição terminal, e de conseguir dizer que o paciente não
vai melhorar, aliado à falta de compreensão da família (MED5).
O reconhecimento e aceitação da terminalidade pelos profissionais e,
consequentemente, a comunicação dessa situação aos pacientes e familiares,
constituem-se grandes desafios. Não parece suficiente desejar respeitar as vontades de
pacientes em final de vida se o profissional não aceitar a morte. A sensação de
impotência dos profissionais, especialmente dos médicos, diante da morte, parece
constituir-se em fator limitante à implementação das DAV, além de, também, favorecer
a obstinação terapêutica.
A gente tem certa dificuldade de lidar com pacientes terminais, porque mesmo
que tu saiba que não vai curar, a sensação de impotência é o maior sentimento e fico
triste (MED1).
Nesse sentido, mesmo que os profissionais de saúde não se sintam encorajados a
estimular pacientes a realizar suas DAV, entretanto, estar ciente da situação do paciente
e oportunizar sua realização, informando sua possibilidade e apresentando todos
esclarecimentos necessários para a elaboração desse documento, parece relevante. Além
98
de pacientes e familiares manifestarem interesse em realizar as DAV, mostra-se
necessário o entendimento dos profissionais acerca da implementação desse documento.
Ela quer fazer as DAV, mas a gente vai protelando até não sei que ponto. Os
médicos não falam sobre o testamento e sobre as vontades dela, não manifestam
opinião, não comunicam o que acham melhor (FAM6).
Pode estar sendo criado um problema para o paciente, porque eu dizer
claramente da possibilidade das DAV, o paciente e o familiar ficam assustados,
ansiosos (MED1).
A dificuldade nas DAV é decidir e encarar a situação de morte real (MED5).
A permanente esperança de recuperação do paciente e a busca de recursos de
tratamento, pelos familiares, especialmente, pelo receio de vivenciar sentimentos de
culpa por não terem investido suficientemente na cura do familiar doente, parecem
constituir fatores limitantes a prática das DAV, percebidos pelos profissionais da saúde
e confirmados pelos cuidadores familiares.
Eu vejo que o familiar acha que não fez nada e pensam como irão deixar morrer
sem fazer nada, sem utilizar até o último recurso, o que, as vezes, só vai prolongar o
sofrimento. Uma questão cultural (ENF7).
Soma-se, ainda, que a esperança de cura parece sustentar e motivar o familiar
para o cuidado ao doente, implicando em uma limitação da aplicação das DAV.
Eu acredito na possibilidade dele se recuperar, a gente tem que acreditar, se me
tirar essa esperança vai ficar difícil ter força para lutar. Se não tem mais jeito, eu vou
poder acabar perdendo a vontade de cuidar (FAM2).
Nesse sentido, para os profissionais da saúde, também, a existência das DAV
com manifestações prévias dos pacientes, de desejos de não investimento, poderia
desmotivar a equipe na assistência e no cuidado prestados ao doente.
Me preocupa ele ter pedido que não fosse feito nada e a gente não vai mudar de
decúbito, por que ele pediu que não fosse reanimado, intubado, que não fosse para
UTI. A gente já percebe isso na assistência. Há um descaso pelos profissionais no
cuidado e ele pode ser visto com um olhar diferente (ENF4).
Receios das implicações legais
Receios ligados às implicações legais aparecem como fator determinante e
limitante à prática das DAV pelos enfermeiros, médicos e cuidadores familiares no
contexto hospitalar. Como ainda inexiste legislação específica, o respaldo às DAV cabe
99
à Resolução do CFM, o que, no entendimento dos entrevistados, ainda suscita dúvidas
na sua aplicabilidade.
Eu faria tudo que está dentro da questão legal, eu não iria me expor e responder
um processo. Muitas vezes, eu entendo que as pessoas fazem algo não por convicção,
mas para não se incomodar mesmo (ENF8).
A resolução das DAV, ela é muito vaga, dá margem para interpretações
diferentes. Eu teria medo e na realidade o medo de todo o médico é de um processo
(MED3).
Não tem uma lei, eu tenho medo de chegar com a manifestação e os
profissionais não quererem cumprir, por conta da legislação que não existe (FAM7).
Diferentemente, o cumprimento das DAV pelos profissionais pode ocorrer por
respeito a uma decisão administrativa, eximindo-se de possíveis responsabilidades.
Não vejo como adequado se for tratado administrativamente, como um
documento que não se sabe o motivo e sem ter um corpo de discussão. Se ele assinou,
se ele entendeu o que significa não importa, mas se algo acontecer, eu tenho o meu
respaldo (MED4).
Apesar dos receios legais quanto ao cumprimento das DAV, destaca-se que, na
visão de médicos, as manifestações prévias não podem ser seguidas rigorosa e
prioritariamente, principalmente nos casos onde há dúvidas.
O paciente escreveu que não quer reanimação, mas a reanimação vai ajudar
porque ele não é terminal e isso pode nos limitar. O papel, ele deve ficar em segundo
plano (MED2).
Diretivas antecipadas de vontade requer autonomia do paciente e adequada
comunicação
As DAV fundamentam-se no respeito à autonomia dos pacientes e familiares
cuidadores, requerendo adequada comunicação entre profissionais de saúde, pacientes e
familiares. Assim, uma outra dificuldade identificada pelos cuidadores familiares referese à ocultação do diagnóstico ao doente terminal, pelo receio de que essa informação lhe
seria maléfica, sem lhe trazer benefícios, o que inviabiliza sua adesão à prática das
DAV.
Ela não sabe da situação e a gente acha pior falar, porque não vai adiantar. Ela
tem muita esperança de cura e de vida, tem que viver sem que ela saiba, porque se ela
souber, a esperança dela vai diminuir, vai perder a fé, o ânimo, vai perder tudo
(FAM5).
100
Ainda, para enfermeiros e médicos, o entendimento limitado dos pacientes e
familiares constitui outro fator limitante das DAV. Possíveis limitações quanto à
escolaridade, crenças ou diferenças culturais exigiriam maior disponibilidade de tempo
para a explanação do que consistem as DAV, dentre outras, especialmente pelo risco de
distorções por um entendimento insuficiente ou inadequado, quando comunicada sua
possibilidade.
O povo é muito ignorante e os familiares não tem consciência do que acontece e
distorcem muito o que a gente fala (ENF2).
É complicado de explicar e entenderem, por mais simplório que tu seja e de
confundir com eutanásia, pela questão de escolaridade, cultural e crenças (MED2).
Frente ao receio dos profissionais de saúde de uma comunicação inadequada
sobre as DAV e sua implementação e, consequentemente, do desrespeito à possibilidade
de exercício de autonomia dos pacientes, parece ocorrer o investimento em tratamentos
que ocasionam a obstinação terapêutica, impondo-lhes sofrimento, assim como aos seus
familiares.
Nas divergências dos familiares com relação a decisão das DAV do paciente,
vai ficar complicado se o paciente não pode falar; o profissional vai acabar fazendo
tudo (ENF7).
Eu vejo a postura dos profissionais mais de auto proteção por não conhecer
bem a situação atendida, e acredito que nisso ocasione a obstinação terapêutica
(MED4).
Para enfermeiros e médicos, a implementação das DAV no hospital requereria
maior disponibilidade de tempo do profissional, em virtude da demanda dos serviços
assistenciais, bem como da rotatividade profissional, podendo optar pelo investimento
total no paciente.
Vai ser difícil do pessoal compreender as DAV, vai ter uma resistência e vai ser
difícil por que falta tempo para examinar direito os pacientes, é muita demanda
(MED6).
Não fazer a intubação, tu vai ter mais trabalho com o paciente. Se intubar, ele
fica ali e tu resolve o teu problema; se não, ele fica em maior sofrimento respiratório e
o profissional vai ter que ter maneiras de dar conforto, dando mais envolvimento e as
pessoas não estão preparadas e alguns não querem isso (ENF7).
É menos trabalho tu entubar o paciente do que explicar por que é inadequado,
naquele contexto, proceder com o procedimento. Dependendo do respaldo que tu tens, é
101
complicado fazer valer a vontade de um ou outro numa situação de emergência e como
te portar (MED4).
Nesse ínterim, seria necessário e urgente priorizar o tempo para dialogar sobre as
DAV e focar em maneiras que facilitem seu entendimento, pelos pacientes e familiares,
esclarecendo dúvidas e incertezas referentes a indicações e restrições de tratamentos,
contribuindo na aplicabilidade das DAV.
Eu acredito que a falta de entendimento é a falta de capacidade de tu explicares
e não a falta de capacidade da pessoa entender. Não tem como a pessoa não entender,
tu tens que saber explicar e acho que os profissionais acabam subestimando a
capacidade de entendimento da família e do paciente, por que se comunicar dá
trabalho, então tu tens que te esforçar (MED4).
Discussão
Encarar a morte como uma situação de fracasso da medicina tem conduzido a
práticas de obstinação terapêutica, parecendo ser necessário inverter esse paradigma,
assumindo a morte como um processo natural, no qual o ser humano precisa de apoio.
Ante a tal fato, é que a intenção de prolongar a vida dos doentes terminais ficou
evidente na perspectiva de enfermeiros, médicos e cuidadores familiares dessa pesquisa,
repercutindo em limitações à aplicação das DAV. Sob esse aspecto, é que se confirma a
questão que a cultura medicalizadora da vida impõe que se continue a adiar seu
momento final(15).
Nesta perspectiva e enfatizando os achados da pesquisa, é que surge a questão de
que os médicos parecem ter mais medo de investir pouco do que fazer muito pelos
pacientes e, pacientes, parecem sentir do mesmo modo, sendo susceptíveis de ser gratos
para a realização de testes e exames adicionais. Ainda, médicos encontram-se em
situação de poder em relação a pacientes e cuidadores familiares, que tendem a seguir
suas recomendações(3). Face aos dilemas éticos presentes no tratamento ao doente
terminal, é premente a necessidade de refletir quanto aos limites no prolongamento da
vida, sobre a quem cabe essa decisão e a opção das DAV(1).
Nessa direção, é que, na prática, os estudos indicam que é difícil definir critérios
para a determinação da futilidade; com frequência, há divergências na comunidade
médica, podendo surgir conflitos a partir da crença familiar de um milagre, da
insistência de uma tradição religiosa em fazer de tudo o que é possível(13). A despeito
disso, os pacientes, frequentemente, desejam que a família, amigos e médicos sejam
102
honestos consigo em todos os aspectos; ou seja, querem a verdade, além de,
efetivamente, discutir o processo da doença e as opções de tratamento(16).
Salienta-se, ainda, que, por vezes, o paternalismo médico estabelece um limite à
escolha autônoma, por meio da interferência ou da recusa em aceitar preferências da
pessoa acerca do seu próprio bem, geralmente, envolvendo coerção, por um lado, ou
mentiras, manipulação ou ocultação de informações, por outro, com o propósito de
evitar danos ou de beneficiá-la. Nessa perspectiva, revelar certos tipos de informação e
dizer a verdade poderia causar danos aos pacientes sob seus cuidados e a ética médica
os obriga a não causar esse dano. Assim, para o bem do paciente, algumas informações
devem ser omitidas ou reveladas apenas à família, pois podem comprometer o
julgamento clínico e representar uma ameaça à saúde do paciente(13). Neste sentido, a
pesquisa trouxe a questão do ocultamento do diagnóstico como prática comum, dentre
os envolvidos, considerando que a verdade não traria benefícios ao doente, em virtude
das condições da doença. Todavia, a sinceridade, nessas situações, oportunizaria que os
pacientes manifestassem não somente suas vontades, mas suas dúvidas, angústias e
desejos, auxiliando cuidadores familiares e profissionais da saúde.
Ante tais fatos, a dificuldade na comunicação parece limitar a aplicação das
DAV, sob a perspectiva dos entrevistados. Além de tempo limitado, excesso de trabalho
e alta rotatividade, as alegações dos profissionais parecem tratar-se de receio em
conversar sobre assuntos referentes à morte; abordar as DAV, consequentemente, traria
à tona a possibilidade da terminalidade. Por isso, a necessidade de atentar para a
maneira como a informação é apresentada, o que pode manipular a percepção e a reação
do paciente, repercutindo em uma base insatisfatória para tomar suas decisões(13).
Quando os pacientes não apresentam as DAV, os decisores substitutos,
frequentemente, fazem previsões imprecisas dos desejos dos pacientes ou tomam
decisões que não são consentidas pelos médicos por não estarem em concordância com
os melhores interesses do paciente(17). Ainda, as decisões a serem tomadas sobre
situações de vida mostram que, apesar do planejamento prévio dos desejos de
tratamento, os doentes crônicos, frequentemente, mudam de ideia sobre seu tratamento
médico ao longo do tempo e com o evoluir do seu estado de saúde. Neste sentido, essa
instabilidade acrescenta aos substitutos o desafio de respeitar a autonomia dos
pacientes(17).
Entretanto, quanto ao receio da mudança de opinião decorrente do
preenchimento prévio das DAV, em pesquisa realizada na Holanda em pacientes com
103
bom, moderado e pobre estado de saúde, todos com prévia realização das DAV, foi
constatado que suas percepções sobre a dignidade e seus desejos permaneceram estáveis
durante a trajetória da doença, sugerindo que a compreensão da dignidade não
modificou substancialmente com as alterações do estado de saúde(18).
Partindo do exposto, no contexto das DAV, crenças, escolhas e consentimentos
das pessoas podem se modificar com o tempo, emergindo problemas morais e
interpretativos, pois seria incoerente a imposição de uma vontade sobre outra ação
determinada por uma diretiva antecipada. Desse modo, é preciso atentar para o
julgamento da capacidade do paciente, distinguindo as decisões autônomas que devem
ser respeitadas daquelas decisões que precisam ser checadas e, talvez, suplantadas por
um substituto(13).
Em decisões que envolvem familiares e doentes terminais, tem sido defendido
que decisões dos substitutos devem ser baseadas no conhecimento prévio dos desejos
dos pacientes ou no melhor interesse do paciente(17). Tomar decisões considerando o
que é melhor para o paciente quando esse não consegue comunicar seus desejos é
ocorrência diária e difícil para os médicos. A importância da tomada de decisão
informada e compartilhada pelo profissional de saúde que atende o paciente é essencial
para a qualidade do cuidado e seus resultados. A participação do paciente no tratamento
conduz a melhores resultados, o que vai ao encontro da antiga crença de que, para a
manutenção da sua saúde, a base do cuidado é uma relação boa e confortável entre o
médico e o paciente(12).
Poucas pessoas redigem um documento ou deixam instruções explícitas, além do
que o responsável designado pode não estar disponível quando necessário, ou pode ser
ou estar incapaz de tomar boas decisões para o paciente ou pode ter um conflito de
interesses, por exemplo, em virtude da perspectiva do recebimento de uma herança ou
do ganho de uma posição melhor nos negócios da família. Ainda, os pacientes podem
modificar suas preferências acerca de tratamentos, sem modificar a tempo suas
instruções, e alguns, ao se tornarem legalmente incapazes, protestam contra as decisões
do responsável designado(13).
Pesquisa realizada nos EUA, com 30 decisores substitutos, demonstrou que os
familiares, ativamente envolvidos nas decisões de tratamento de suporte de vida de
doentes terminais, experimentam significativo conflito emocional entre o desejo de agir
de acordo com os valores de seu ente querido, não querendo se sentir responsável pela
sua morte, o desejo de perseguir qualquer chance de recuperação e a necessidade de
104
preservar o bem-estar da família. Complementa-se, ainda, que os substitutos,
frequentemente, não sabem as preferências do paciente(19).
Neste sentindo, algumas das estratégias de enfrentamento dos cuidadores
familiares referiram-se a recordar discussões anteriores sobre os prováveis desejos
diante da situação de terminalidade, atrasar ou adiar a tomada de decisão, além das
práticas espirituais e religiosas, ou seja, a esperança de recuperação considerando as
crenças religiosas(19). Há necessidade dos médicos e profissionais da saúde
identificarem estratégias para melhorar a tomada de decisão, incluindo atendimento às
emoções dos familiares, facilitando a sua tomada de decisões, atentando as suas
necessidades emocionais e espirituais e potenciais conflitos(19).
Os responsáveis legais podem tomar decisões das quais os médicos discordam
radicalmente e, em alguns casos, pedem aos médicos que ajam contra suas consciências.
Alguns pacientes não possuem a compreensão adequada do conjunto de decisões que
um profissional de saúde ou um responsável podem ter de tomar e, mesmo com uma
compreensão adequada, com frequência, é difícil antever situações clínicas e possíveis
experiências futuras(13).
Estudo enfocando a tomada de decisão por substitutos constatou que, além de
dependerem fortemente dos desejos dos pacientes e seus melhores interesses, substitutos
consideram outros fatores como seus próprios desejos, interesses, necessidades
emocionais, crenças religiosas e experiências passadas com os cuidados de saúde.
Tomada de decisão dos substitutos é, portanto, mais complexa que a decisão do próprio
doente; assim, destaca-se a necessidade dos substitutos obterem mais informações sobre
as preferências do paciente para o planejamento da assistência(17).
O consenso da família no processo decisório é importante, porque distribui a
responsabilidade da decisão entre vários indivíduos, implicando na diminuição da culpa
sentida por familiares na tomada de decisão, ajudando a manter a coesão familiar
através do sofrimento. Ainda, faz os substitutos sentirem-se mais confortáveis em seu
papel, podendo alinhar-se com os desejos do paciente na tomada de decisão(17). Quando
as preferências dos pacientes não são conhecidas, os responsáveis podem utilizar os
seus próprios desejos como um guia de tomada de decisão, mas podem também
considerar suas próprias crenças e interesses(17).
As necessidades emocionais dos cuidadores familiares, em particular, a
possibilidade de evitar a culpa, influenciam suas decisões. Nesse sentido, os substitutos
direcionam suas decisões ao paciente a todas as chances possíveis de recuperação, em
105
um esforço para evitar sentimentos de culpa por não tentar todo o possível, ou para
cumprir suas obrigações em relação ao paciente. Isso destaca a necessidade das DAV
para que as decisões de recusar a terapia de suporte de vida não signifique que o
substituto tenha desistido ou que seja pessoalmente responsável por resultados
negativos ou pela morte do paciente(17).
No que se refere aos temores relacionados a punições legais em virtude da
ausência de legislação específica no Brasil, considera-se que as DAV devem ser
constantemente discutidas a fim de propor que o paciente manifeste o que realmente
deseja diante das supostas condições de incapacidade. Desse modo, além dos conflitos
éticos que poderão fragilizar os efeitos da Resolução, os profissionais poderão enfrentar
conflitos de opiniões, ampliando sua insegurança na tomada de decisões. Nessas
situações, os médicos, diante de possíveis ameaças e riscos de sofrer ações judiciais,
poderão ignorar as DAV do paciente, preferindo seguir as orientações dos familiares(15).
Assim, a difusão prévia das preferências do paciente pode ser um importante elemento
de argumentação(20).
O problema, entretanto, não é simples de ser enfrentado. Enquanto o debate ético
avança no interior da corporação médica, notadamente no CFM, o problema dos limites
jurídicos das resoluções profissionais parece impor uma preocupação com a legalidade
da submissão à Resolução por parte dos médicos e com os riscos inerentes a possíveis
questionamentos jurídicos relativos a condutas de não intervenção(15). Em vista disso, é
que recentemente em pesquisa realizada no Brasil, foi constatado que as implicações
legais são as que mais interferem nas ações médicas diante das questões de fim de vida,
fazendo com que deixem de realizar o que acreditam ser o melhor para seus
pacientes(21).
Desse modo, as dificuldades quanto às DAV podem ser contornadas com
documentos cuidadosamente redigidos, com um aconselhamento apropriado e com
explicações especializadas sobre possibilidades médicas e opções de tratamento; no
entanto, alguns problemas de interpretação permanecerão, a despeito do maior
envolvimento dos profissionais da saúde, especialmente médicos e enfermeiros, bem
como das ferramentas de educação utilizadas. Com certeza, as DAV constituem uma
forma promissora para que as pessoas capazes exerçam sua autonomia. Os problemas
são principalmente práticos, e alguns deles podem ser superados pelo emprego de
métodos adequados de implementação(13).
Considerações finais
106
As questões relacionadas ao fim da vida justificam e requerem reflexões e
discussões por parte dos profissionais da saúde e de toda a sociedade. Com a introdução
das DAV, o que se procura é o respeito à autonomia pessoal e à dignidade do ser
humano não somente em vida, mas também no momento da morte, devendo-se
valorizar as necessidades, o sofrimento de cada um e questões relacionadas com o fim
da vida.
As limitações e dificuldades atribuídas à prática das DAV no contexto
hospitalar, a partir da perspectiva dos enfermeiros, médicos e cuidadores familiares dos
doentes terminais, indicam e reforçam a necessidade de trabalhar essa temática no
intuito de destituir conhecimentos errôneos e para que, efetivamente, uma diretiva seja
realizada de maneira voluntária, isenta de interferências externas ao paciente, refletindo
o desejo de ter sua autonomia respeitada em situações de incapacidade e em final de
vida.
A inserção da possibilidade das DAV no contexto da assistência ao paciente,
considerando os inúmeros conflitos e dilemas relacionados às questões em final de vida,
fazem com que a morte seja encarada de maneira diferente e com o intuito de destituir
práticas obstinadas de cura, quando essa já não é mais possível, e como alternativa de
propiciar o cumprimento do respeito às vontades manifestadas pelo indivíduo enquanto
capaz. Entretanto, na realidade brasileira, por vezes, a vivência da iminência da morte
não tem possibilitado que os desejos dos pacientes sejam respeitados, persistindo o
paternalismo médico.
Há que se destacar que é preciso um novo olhar acerca da morte e da sua relação
com a vida. Não basta apenas os doentes serem atendidos por ótimos profissionais da
saúde, é preciso que esses saibam atender as expectativas do doente, o maior interessado
nesse processo. Obviamente, muitas vezes, o paciente encontra-se incapacitado, sendo
importante dar vozes aos familiares que, frequentemente, atuam como cuidadores e são
reconhecidos como os responsáveis. É preciso atender essa parcela da população que,
por diversos momentos, se sente desatendida e com grande responsabilidade de decidir,
literalmente, sobre a vida e a morte.
Pensar sobre a inserção dos profissionais, bem como dos familiares e pacientes
em assuntos referentes à terminalidade, é ganhar tempo a fim de garantir a dignidade e o
cumprimento das vontades previamente manifestadas pelos pacientes, além de
tranquilizar os familiares numa situação estressante; para os profissionais da saúde, é a
possibilidade que as ações que envolvam a assistência em final de vida não sejam
107
desgastantes ao ponto de realizarem condutas obstinadas como modo de evitar
conversas sinceras.
É importante que as dificuldades e limitações atribuídas pelos enfermeiros e
médicos residentes, bem como pelos cuidadores familiares dos doentes terminais, para a
aplicação das DAV, sejam compartilhadas e entendidas, para que esforços sejam
direcionados para saná-las, contribuindo para sua efetivação, e para o respeito à
autonomia pessoal e a qualidade da assistência no final da vida. Ante tais considerações,
destaca-se a necessidade de estudos brasileiros que instiguem essa prática com o intuito
de que as vontades do paciente e o respeito a sua autonomia, que corresponde ao cerne
das DAV, sejam efetivamente cumpridas.
Os resultados desse estudo devem ser interpretados à luz de várias limitações.
Essa pesquisa foi realizada em apenas duas unidades de um hospital na região central do
Rio Grande do Sul, cujas experiências de enfermeiros, médicos e cuidadores familiares
podem diferir, em outros locais e ambientes hospitalares. Entretanto, considera-se que
esses resultados conferem profundidade ao entendimento que as DAV constituem uma
alternativa para proporcionar a autonomia do doente, a partir do cumprimento das suas
vontades, apesar das barreiras que dificultam sua efetivação no contexto hospitalar.
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110
5.3 ARTIGO 3
Diretivas antecipadas de vontade: desejos dos profissionais da saúde e
cuidadores familiares quando remetidos a doença terminal12
Silvana Bastos Cogo; Valéria Lerch Lunardi
Resumo
Objetivo: conhecer o entendimento de enfermeiros, médicos e cuidadores familiares,
quando remetidos à possibilidade de se tornarem doentes terminais, sobre a
aplicabilidade das diretivas antecipadas de vontade. Método: estudo qualitativo, do tipo
descritivo e exploratório. Realizadas entrevistas semiestruturadas com enfermeiros,
médicos residentes e cuidadores familiares de doentes terminais, procedendo-se, após, a
análise textual discursiva. Resultados: Emergiram três categorias:Diretivas antecipadas
de vontade e desejos de profissionais e familiares; Diretivas antecipadas de vontade e
temores de profissionais e familiares; Cuidadores familiares e seus desejos de cuidado.
Conclusão:Apesar de aceitarem a realização das DAV e de manifestarem desejo de
realizá-las, os participantes expressam temores e receios referentes à sua aplicabilidade,
de que suas vontades não sejam posteriormente respeitadas, de que suas vontades
possam se modificar ao se defrontarem com a situação terminal, do seu abandono pelos
profissionais e a sua insegurança quanto aos diagnósticos e prognósticos.
Descritores: Doente terminal; Diretivas antecipadas; Enfermagem; Autonomia pessoal;
Cuidadores.
Descriptors: Advance Directives; Terminally Ill; Nursing;Personal Autonomy;
Caregivers.
Descriptores: Directivas Anticipadas; Enfermo Terminal; Enfermería; Autonomía
PersonalCuidadores.
12
Submissão do artigo para a Revista Latino-americana de Enfermagem. Normas disponíveis
em:http://www.scielo.br/revistas/rlae/pinstruc.htm
111
Introdução
Apesar do avanço da medicina, é impossível afastar a morte, considerando sua
invencibilidade; aceitá-la como um limite, imposto pela vida, auxilia a percorrer, ao
lado dos profissionais da saúde, pacientes e familiares, o caminho da dignidade,
evitando o prolongamento de um sofrimento(1). Assim, a relação com os limites da vida
tem imposto novos instrumentos na delimitação do processo de tomada de decisão aos
doentes terminais, requerendo um olhar diferenciado na vivência do processo de fim de
vida(2).
Nessa direção, é que o Conselho Federal de Medicina (CFM) aprovou a
Resolução 1.995/2012, dispondo sobre as Diretivas Antecipadas de Vontade (DAV),
que trata sobre os desejos previamente manifestado pelo paciente, sobre cuidados e
tratamentos que quer, ou não, receber quando estiver incapacitado de expressar, livre e
autonomamente, sua vontade(3). Poderá ser expresso se deseja, ou não, ser submetido a
ventilação
mecânica,
tratamento
medicamentoso,
cirúrgico,
reanimação
cardiorrespiratória, entre outros(1).
No entanto, em torno da resolução, há diversas polêmicas, como as relacionadas
a sua aplicabilidade, suscitando amplo debate, pois os limites da vida humana não
possuem um rígido contorno, considerando um contexto de avanços que modificam e
ampliam esses mesmos limites(2). A resolução retrata o rápido desenvolvimento da
tecnologia biomédica, que, ao trazer benefícios à longevidade humana, estimula a
reflexão sobre a não mecanização do morrer e a naturalidade do fim da vida(2).
É sobre essa perspectiva que as DAV surgem com o propósito de que as
vontades expressas possam ser respeitadas, considerando a autonomia pessoal e a
dignidade da pessoa humana. A abordagem em relação à declaração das DAV requer
que sejam empreendidas novas ações que visem a proposta fundamental da própria
112
declaração: a garantia de respeito à vontade do doente terminal(4). Mediante o exposto,
esta pesquisa ampara-se na teoria principialista(5), prioritariamente, no conceito de
autonomia, referente aodireito do autogoverno, privacidade, escolha individual,
liberdade da vontade, do sujeito ser o motor do próprio comportamento(5).
Na realidade, como poucos conhecem a possibilidade de realizar suas DAV,
frequentemente, os médicos pedem para os familiares decidirem em nome de seus entes
queridos em situação de terminalidade, esperando que conheçam os desejos de seus
doentes(6), ocorrendo, comumente, o desconhecimento das suas vontades(7). Além disso,
mesmo quando a morte segue uma doença prolongada, as famílias muitas vezes não
estão preparadas e os médicos nem sempre realizam discussões sobre fim de vida com
seus pacientes, quando eles ainda são capazes de decidir(6).
Há que se destacar que há dificuldade dos profissionais da saúde e familiares em
conduzir os cuidados aos doentes terminais. Para os profissionais que, no seu cotidiano,
lidam com situações de sofrimento e dor, tendo a morte como elemento constante e
presente, o sentimento gerado por estas situações, comumente, se traduz em impotência,
frustração e revolta(8). Já aos cuidadores familiares, realizar o cuidado ao doente
terminal demanda tempo, dedicação, abdicação e um sofrimento constante por não
conseguirem atuar na tentativa de reverter a situação apresentada, além de muitas vezes
lhes serem delegadas responsabilidades quanto a decisões de tratamentos que lhes
impõem angústia por não saberem como atuar(7).
Partindo dessas considerações, é que a preocupação em conhecer como os
envolvidos no cuidado de doentes terminais, especificamente enfermeiros, médicos e
cuidadores familiares, atuariam diante da possibilidade de se tornarem terminais,
implica a possibilidade de refletirem no sentido do desempenho de suas ações como
profissionais e cuidadores, confrontando com o cuidado prestado. Nesse sentido, os
113
profissionais de saúde deveriam ser os primeiros a estar bem preparados para os
cuidados do final de vida, além de trabalharem com a hipótese de algum dia vivenciar
situações de incapacidade similares aos seus doentes terminais(9).
Em vista disso, e partindo da hipótese que vir a vivenciar essas situações poderia
modificar a maneira de encarar os cuidados na terminalidade da vida e que os
profissionais da saúde, bem como os cuidadores familiares de doentes terminais, podem
não realizar cuidados que correspondam aos desejos dos pacientes e entes queridos,
objetivou-se conhecer o entendimento de enfermeiros, médicos e cuidadores familiares,
quando remetidos à possibilidade de se tornarem doentes terminais, sobre a
aplicabilidade das DAV.
Método
Trata-se de uma pesquisa de abordagem qualitativa descritiva e exploratória,
realizada em um hospital universitário de uma cidade do centro geográfico do Estado do
Rio Grande do Sul. Os critérios de seleção dos participantes foram: enfermeiros e
médicos residentes atuantes na unidade de clínica médica e no serviço de internação
domiciliar por pelo menos meio ano. No que se refere aos cuidadores, os critérios
foram: familiares maiores de 18 anos, designados como responsáveis, que realizassem o
cuidado ao paciente considerado doente terminal em sua residência.
Participaram da pesquisa oito enfermeiros, sete médicos residentes e sete
cuidadores familiares, perfazendo um total de 22 participantes definido pela saturação
dos dados(10). A coleta dos dados ocorreu de outubro a dezembro de 2014, por meio de
entrevistas semiestruturadas, enfocando questões relacionadas à aplicabilidade das
DAV, o respeito à autonomia, os desejos pessoais de cuidado quando remetidos à
possibilidade de se tornarem doentes terminais.
114
Houve uma aproximação inicial com os profissionais, a fim de conhecê-los e
indagar sobre seu interesse em participar da pesquisa; após, foram agendados dia e hora
para a realização da entrevista. Já com os familiares, ocorreu a realização de visitas
prévias à entrevista, com o intuito de aproximar-se da família. As entrevistas, com
duração média de 50 minutos, foram realizadas em um único encontro no ambiente
hospitalar, em salas privativas, com os profissionais, e nas residências dos cuidadores
familiares.
Os participantes do estudo foram esclarecidos sobre os objetivos e a estratégia
de coleta de dados. Após realizada a leitura e assinatura do Termo de Consentimento
Livre e Esclarecido, as entrevistas foram gravadas digitalmente; feitasua transcrição, as
falas passaram por correções gramaticais. Os dados foram examinados conforme a
análise textual discursiva(10) a unitarização, fragmentando as informações coletadas para
atingir unidades constituintes referentes ao fenômeno(10) a categorização, mediante a
organização, ordenamento e agrupamento dos conjuntos de unidades de análise(10); a
captação do novo emergente por meio da impregnação dos materiais analisados, que
possibilitaram a emergência de uma compreensão renovada sobre a aplicabilidade das
DAV(10), a partir da produção de metatextos oriundos do corpus.
O estudo obteve aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa na Área da Saúde
da Universidade Federal de Rio Grande sob o Parecer de nº168/2014; o anonimato dos
participantes da pesquisa foi preservado, sendo as falas transcritas identificadas por
códigos (ENF: enfermeiro; MED: médico; FAM: cuidadores familiares), seguidos de
número ordinal.
Resultados
Os oito enfermeiros entrevistados, sete do sexo feminino e um masculino, com
uma média de idade de 44 anos, apresentavam um tempo de formação em enfermagem
115
de nove a 30 anos e uma média de atuação profissional de sete anos. Já os sete médicos
entrevistados, três do sexo feminino e quatro masculinos, com uma média de idade de
29 anos, apresentavam um tempo de atuação profissional de aproximadamente um ano,
e um profissional de nove anos.
Os sete cuidadores familiares tinham idade entre 41 e 57 anos e a relação de
parentesco era de três maridos, duas esposas, uma filha e uma sobrinha. O tempo de
cuidado dos familiares aos doentes terminais era de dois a três anos; além disso, os
familiares entrevistados não trabalhavam, exercendo suas atividades de cuidados aos
pacientes em tempo integral; exceto um dos esposos que, esporadicamente, atuava
profissionalmente.
À análise dos dados, emergiram três categorias:Diretivas antecipadas de vontade
e desejos de profissionais e familiares; Diretivas antecipadas de vontade e temores de
profissionais e familiares; Cuidadores familiares e seus desejos de cuidado.
Diretivas antecipadas de vontade e desejos de profissionais e familiares
Os desejos pessoais dos enfermeiros e médicos, quando remetidos à doença
terminal, embasam-se, predominantemente, no respeito a sua autonomia acompanhados
da vontade de realizar as DAV, apesar de seus sentimentos de medo e das dúvidas
quanto a sua aplicabilidade.
Gostaria que os meus desejos fossem respeitados, tratada com respeito, privacidade e se eu
disser que eu estou com dor, é por que estou. Iria brigar muito pelo respeito da minha autonomia
(ENF4).
Respeitar as dores, as crenças e a cultura. Se é para salvar ou para dar o conforto ou,
independente disso, eu acho que a parte humana tem que ser soberana (MED3).
Além de desejar o respeito as suas vontades prévias manifestadas, os
profissionais expõem que desejariam estar permanentemente cientes sobre seu
diagnóstico e prognóstico. Quando doentes, a sinceridade deveria permear sua
116
comunicação com os profissionais que os atendessem, possibilitando o entendimento da
situação, bem como sua efetiva atuação nos processos decisórios de seu tratamento.
Eu gostaria que me explicassem a situação, eu não gostaria que ficassem falando à parte de
mim; isso é muito ruim e a gente faz, chama o familiar e fala no cantinho (MED5).
É evidente que gostaria de fazer a DAV; definindo o meu diagnóstico e prognóstico, eu quero
manifestar o que seja feito ou não, seria algo interessante e bom (MED6).
Os cuidadores familiares que reconhecem, por diversos momentos, omitir os
diagnósticos de doenças terminais aos entes submetidos aos seus cuidados, referem o
desejo de estarem cientes do seu diagnóstico, a fim de participarem das decisões.
Eu acho errado não falar a verdade, mas eu gostaria de saber tudo sobre o que está
acontecendo, para poder dizer o que fazer ou não em mim. Porque tem coisas que não adianta fazer,
acaba só judiando (FAM6).
Os familiares, comumente, são chamados a decidir pelos doentes. Os
profissionais entrevistados, no entanto, identificam dificuldades em vir a autorizar que
seus familiares decidam sobre a condução do seu cuidado, seja pelo usual despreparo da
família, seja pelo sofrimento que esse processo de decisão acomete a quem deve decidir.
Eu considero importante decidir o que eu quero que seja feito. Eu falaria para a família, mas, às
vezes, dependendo da situação, a família não está preparada (ENF7).
Para a família é ótimo, desresponsabiliza da decisão difícil; é uma saia justa (ENF6).
Nessa direção, a realização das DAV auxiliaria em desresponsabilizar os
familiares de decisões consideradas tão difíceis diante das situações de incapacidade e
fim de vida.
A gente não consegue conversar com nossos familiares sobre isso, mas evitaria sofrimento em
decidir os tratamentos que devem ou não ser feitos ou retirados (MED7).
A intenção em realizar as DAV, por enfermeiros e médicos, relaciona-se em
garantir sua qualidade de vida e dignidade. No entanto, seu interesse está na
117
dependência de, primeiramente, haver investimentos enquanto ainda houver
possibilidades de recuperação.
Faria o documento, mas se existisse uma luz no fim do túnel, eu iria querer que fizessem tudo
(ENF5).
Eu gostaria de fazer (DAV). O limite seria a possibilidade de viver com qualidade de vida e
relaciono com a dignidade; se não tem dignidade, eu faria sem dúvida (ENF8).
Eu deixaria (DAV) considerando a questão de prognóstico e qualidade de vida; numa situação
extrema de cuidados paliativos, de estado terminal, eu não gostaria que prolongassem o sofrimento
(MED1).
Os enfermeiros e médicos, atendendo a possibilidade de realizar as DAV,
expõem seus desejos de tratamentos e cuidados diante de uma suposta situação terminal
e de incapacidade.
Eu colocaria nas DAV, o que eles vão respeitar que seria: não intubar, reanimar e
hemodiálise(ENF6).
Não gostaria de diálise, traqueostomia, gastrostomia, sonda nasogástrica e ficar num
respirador(ENF8).
Não iria querer intubação, é uma coisa muito invasiva (MED1).
Os profissionais da saúde enfatizaram a importância da manutenção das medidas
de conforto, como garantia da dignidade.
Não sentir dor, ambiente arejado, perceber o dia e noite e ser tratada com respeito e dignidade
(ENF7).
Gostaria de tudo no sentido de conforto e ser cuidado por um familiar (MED1).
Manter a oxigenação, repouso no leito, ausência de dor, de barulho e higiene (MED2).
Os cuidadores familiares expuseram a possibilidade de virem a manifestar, por
meio das DAV, seus desejos diante de uma suposta condição de incapacidade.
Se tivesse chance de deixar registrada asvontades, eu não iria querer nada, porque já aproveitei
a vida e colocar um objeto ali sendo que outras pessoas tem mais tempo de viver do que eu e precisam
mais (FAM4).
118
O interesse dos cuidadores familiares em realizar as manifestações por meio das
DAV mostra-se bastante associado a não transferir, para seus familiares, a decisão sobre
seus tratamentos, seja pela angústia ora sentida por necessitarem decidir sobre
tratamentos para seus familiares doentes, seja para evitar sofrimento aos seus familiares,
no futuro, seja pelo receio de tomarem decisões diferentes do que seria sua vontade.
Gostaria de manifestar minhas vontades, para não deixar os outros decidirem e não haver
constrangimento e evitar o sofrimento dos outros. E não decidirem uma coisa que eu não
gostaria(FAM6).
Os enfermeiros e médicos referem dificuldades em tratar assuntos que remetam
ao fim da vida, o que, muitas vezes, contribui para que conversas sobre essa temática
não sejam realizadas no ambiente familiar.
Por uma questão de pensar positivo, a gente não fala sobre doença, o que, de certa forma, é
bom e ruim. Bom para não pensar negativo, ruim, pois seria necessária ser discutida, com as pessoas
conscientes (ENF5).
Já tentei falar com minha família sobre as minhas vontades numa situação de incapacidade, mas
minha mãe não quis nem pensar e ficou revoltada. É difícil lidar (MED5).
Diretivas antecipadas de vontade e temores de profissionais e familiares
Os enfermeiros e médicos mencionam seus receios à realização das DAV,
quanto às incertezas dos esclarecimentos dos diagnósticos, considerando que, por vezes,
os pacientes desconhecem por completo sua real condição e prognóstico da doença.
Eu temeria o diagnóstico de terminal por que já vi pacientes que não era para investir e saíram
bem. Se me provassem que é sem volta talvez fizesse as DAV, se não, não (ENF3).
Eu não decidiria (sobre as DAV) se eu não pudesse investigar sobre a doença. Eu ia querer
investimento total. Se fosse uma situação bem informada, eu tenho mais interesse. Mas como é uma
situação limitada de informação, que eu desconheço, eu desinteresso (ENF4).
O esclarecimento do diagnóstico permite que os pacientes decidam diante das
situações de tratamento. Entretanto, embora desejem conhecer seus diagnósticos e
119
prognósticos, reconhecem que a possibilidade de que todos os investimentos sejam
realizados, ou não, dependerá da situação apresentada.
Quero que invistam tudo até o último, não desistam de mim, mesmo sabendo da situação, a não
ser que ficasse uns meses sofrendo sem volta (...) se modifica as DAV, se estiver em condições de
responder (ENF1).
Em termos de decisão de investimento, depende da situação. Talvez eu fosse querer que
investisse, talvez não. Claro, eu só ia saber disso se me explicassem (MED5).
Não gostaria que investissem tudo em caso terminal e sem qualidade de vida (MED1).
As DAV devem ser realizadas enquanto o paciente está lúcido e capaz; contudo,
os profissionais manifestam seu interesse em realizá-las apenas quando estiverem
cientes da irreversibilidade de sua condição de doença. Entretanto, nesse momento, por
vezes, poderão estar impossibilitados de decidir sobre as condutas de cuidados e
tratamentos.
O meu interesse em realizar as DAV seria quando soubesse que não teria retorno. Primeiro, eu
quero que seja feito tudo, depois passado alguns dias na UTI, minha DAV vai ter que ser muito
especificada (ENF4).
No momento não seria necessário por que sou hígida, mas se eu desenvolvesse um câncer que eu
não tivesse mais perspectiva, com certeza, eu faria (MED3).
Em contrapartida, permanece a dúvidasobre o cumprimento das vontades
manifestadas diante de uma situação terminal pelos familiares designados a fazer
cumprir os desejos.
Ao mesmo tempo que eu disse que eu deixaria (DAV), tem a questão de crença, filosofia,
espiritualidade, que não sei se tenho direito de pedir e se vai ser respeitado (ENF6).
Os profissionais enfermeiros e médicos, bem como os cuidadores familiares,
sobre a aplicabilidade das DAV a ser por eles utilizadas, referem receio de possíveis
mudanças de ideia frente ao vivenciado e à impossibilidade de reverter sua escolha, seja
de investir, ou não, em virtude de incapacidade.
120
Eu fico com receio e medo; supondo que eu faça (DAV) e precise usar, e o que eu escrever é o
que vai ser considerado; se acontecer pode ser uma situação diferente e querer mudar a ideia e não
poder (ENF1).
Minha vontade está escrita, hoje tenho uma opinião, mas no hospital, pode ser que eu mude
(MED7).
Posso estar falando alguma coisa hoje e amanhã acontecer e eu mudar de ideia (FAM5).
Medo de mudar de ideia diante da situação acontecer. Eu não quero sofrer como ela, mas tenho
medo de deixar uma coisa escrita e deixarem de cuidar de mim, por que eu pedi para não fazerem tal
coisa (FAM7).
O sofrimento vivenciado pelo familiar no cuidado prestado ao doente terminal,
no entanto, parece garantir que, diante da suposta situação de incapacidade, não
ocorreria mudança de ideia, quanto ao manifestado previamente.
Eu acho que não ia mudar de ideia nunca, sabendo da situação que eu iria passar. Eles
(médicos) procuraram todos os recursos de salvar uma vida, mas quando chega num ponto desses em
que a vida já não vai ser salva, não vai ser reestabelecida, na minha opinião, eu acho que eu não
mudaria as DAV (FAM6).
Entretanto, também surge o receio que cuidados e tratamentos sejam
abandonados diante dos desejos de não investimentos presentes nas DAV.
Se eu tivesse um registro para não me reanimar, eu não sei se numa questão em que eu deveria
ser reanimado, as pessoas imperativamente não reanimariam só por uma coisa que está escrito (MED2).
Cuidadores familiares e seus desejos de cuidado
Os cuidadores familiares de doentes terminais, frequentemente, referem seus
desejos, quando remetidos à possibilidade de se tornarem terminais, similares à maneira
como prestam o cuidado aos seus familiares.
Se eu estivesse numa situação parecida com a dele, gostaria de ser cuidado como ele é cuidado,
mas não sei se me cuidariam, acho muito difícil, por que não é fácil (FAM3).
Eu cuido dele como eu gostaria que cuidassem de mim, tomara que eu tenha a chance de ser
cuidada como eu cuido dele, porque é difícil alguém se dedicar por completo (FAM7).
121
Os cuidadores dos doentes terminais, geralmente, referem desejar, para si, que
não sejam realizados todos investimentos de tratamento que repercutiriam no
prolongamento da sua vida, porém sem qualidade e sem perspectivas de cura, como
acontece com os cuidados prestados aos seus familiares.
Se eu estivesse numa situação semelhante a dela, eu não iria querer que me entubassem ou
ficassem fazendo coisas que não fossem resolver em nada (FAM1).
O dia que eu ficar como ela está, eu vou dar um jeito na minha vida, nem que eu tenha que
tomar um remédio, por que a pessoa fica totalmente inútil. A pessoa fica passando trabalho, na verdade
(FAM4).
O desejo de conhecer seu diagnóstico mostra-se, também, relacionado ao poder
da fé para a recuperação da doença, mesmo que considerada incurável.
Eu gostaria de saber do meu diagnóstico e eu iria lutar muito com Deus; eu aprendi a usar
muito a fé. Eu vejo muito testemunho de pessoas que conseguem se curar através da fé. Então, eu iria
querer saber (FAM5).
Os cuidadores familiares, apesar de cuidarem de seus familiares com dedicação,
abnegação, modificando sua rotina familiar, não desejam que, em situação de
dependência semelhante, também precisassem ser cuidados por outros.
A gente sempre pensa que não quer dar trabalho para os outros. Eu iria fazer o possível para
não criar um ambiente chato. Eu até tinha pensado de me internar num asilo, para não incomodar os
outros (FAM1).
Eu não iria querer que alguém ficasse todo tempo se dedicando a mim, porque acaba não tendo
vida, é só doença e ninguém mais cuida. Eu não iria querer algo só para aumentar o meu sofrimento
(FAM6).
Discussão
Evidentemente, pensar sobre a morte suscita medo, angústia e dúvida, ainda
mais quando pensada para si. Sob esse aspecto,as impressões sobre a morte são
contextuais, sendo impossível serem vistas como fato iminente, pois as manifestações
122
relacionam-se ao que ainda não é concreto; em virtude disso, é difícil prever sobre os
desejos quando estiver morrendo, se tiver tempo e consciência para tal discernimento(9).
Entretanto, embora seja uma proposta difícil de ser explorada, foi possível
constatar o que os profissionais da saúde e os cuidadores familiares pensam sobre os
cuidados e tratamentos a que gostariam de ser submetidos diante de uma situação
similar às encontradas na assistência aos seus doentes terminais, além de pensarem
sobre a intenção de aplicação das DAV.
A garantia que seus desejos e autonomia sejam respeitados, em caso de
incapacidade, mantendo sua dignidade, além de medidas de conforto, constituem fatores
preponderantes aos profissionais da saúde e cuidadores familiares entrevistados, quando
remetidos à possibilidade da presença de uma doença terminal. Nesse sentido, a
autonomia, tão importante em todas as fases da vida, deve ser considerada válida e
obrigatória diante do doente incapaz(8). Respeitar o paciente autônomo é reconhecer o
direito de ter opiniões, fazer escolhas e agir com base em valores e crenças pessoais(5).
Entretanto, embora verbalizem interesse nas DAV, os participantes desse estudo
expressam preocupação referente ao cumprimento dos desejos manifestados, além de
medo ao seguimento de restrições de tratamentos e cuidados, sem sua contextualização
com o comprometimento de doença apresentado. Nesse sentido, os profissionais da
saúde, por serem da área, parecem mostrar-se mais receosos ao pensarem em deixar
registradas as DAV, em virtude de conhecerem a assistência comumente prestada em
final de vida. Sob esse aspecto, desejam que todos os investimentos sejam realizados em
si até a comprovação da inexistência de reversibilidade de cura, repudiando, contudo,
oprolongamento da vida sem dignidade e autonomia. Nesse sentido, os médicos
entrevistados mostram-se bastante serenos quanto aos tratamentos, quando confrontados
com a possibilidade da sua morte, pois sabem o que lhes pode acontecer; além disso,
123
geralmente, querem ter certeza de suas situações, e de que quando chegar a hora de sua
morte, de que não haja medidas heroicas para seu prolongamento artificial(11).
Enfatiza-se que os participantes da pesquisa referenciaram temores frente à
possibilidade de terem suas vidas prolongadas indevidamente, ou seja, acarretando
maior sofrimento sem reversibilidade da doença. Sob este aspecto, o temor de que haja
algo considerado como um super tratamento, acompanhado de dor e sofrimento, está
também presente na população em geral(8), considerando que a ampla disponibilidade de
novas tecnologias e o uso de intervenções clínicas são eventos adversos indesejáveis
que podem gerar sofrimento desnecessário quando a situação é progressiva e
irreversível(12).
Em pesquisa realizada em quatro hospitais no Estado de São Paulo, no Brasil,
com médicos e enfermeiros sobre a possibilidade de aplicação em si das DAV, em caso
de doença terminal, dos 81 participantes, 88,9% gostariam de ter sua vontade respeitada
e sem o prolongamento artificial de vida(1) e nenhum dos questionados referiu preferir
ser submetido a todas as opções de terapêutica para prolongar sua existência. Entretanto,
9% referiram não se sentir preparados para decidir como desejam morrer, em caso de
uma doença terminal; e 72% preferem ter suas vontades respeitadas com base nas
condições que estabeleceram para si mesmos, sem o prolongamento artificial de sua
vida(1).
Soma-se, ainda, o fato que, para oscuidadores familiares do doente terminal que
se deparam com a possibilidade da confirmação e certeza da sua própria terminalidade,
da sua própria morte(13), a tarefa de pensar sobre os desejos constitui tarefa difícil, pois
essa possibilidade parece estar distante de acontecer com si. Desse modo, a pesquisa
demonstrou queo enfrentamento de tornar-se terminal parece ser encarado de modo a
não desejar vivenciar todo sofrimento enfrentado pelos familiares terminais submetidos
124
aos seus cuidados. Sob esse enfoque, a perspectiva e o desejo que o prolongamento da
vida não seja realizado parecem mais evidentes nos cuidadores familiares do que nos
profissionais da saúde, os quais, muitas vezes, apresentam medos relacionados à
possibilidade de reversibilidade da doença, pelo fato de apresentarem conhecimento por
sua atuação na área da saúde.
Há que se destacar, ainda, que as manifestações dos entrevistados, relacionadas
ao desejo de saberem sobre seus diagnósticos e prognósticos, considerando a
possibilidade de vivência de uma doença terminal, constituem fator importante na
intenção em realizar o registro das DAV, diferentemente da omissão e negação, que
comumente adotam com seus pacientes. Sob essa perspectiva, estar ciente do
diagnóstico, das opções de tratamento e prognóstico, é imprescindível para preservar a
dignidade, apropriando-se do direito de realizar decisões em conjunto com a família e a
equipe de saúde, seja quanto a tratamentos, assim como em relação ao local de
permanência até o fim da vida(8).
Em pesquisa realizada no Brasil com 202 médicos, 150 pacientes ambulatoriais
e 150 membros da família, cerca de 92% dos pacientes acreditam que devem saber
sobre seu estado terminal em comparação com 79,2% dos médicos e 74,7% das
famílias. Os pacientes eram mais propensos a apoiar a divulgação de diagnóstico e
terminalidade; além disso, consideravam que esse conhecimento melhoraria sua
qualidade de vida, e sua divulgação não era entendida como estressante. Assim, os
pacientes terminais preferem saber a verdade sobre seu mau prognóstico mais do que
seus médicos e famílias pensam(14). Desse modo, e confrontando com os dados
encontrados na pesquisa, salienta-se que é preciso atentar para que pacientes, familiares
e envolvidos no cuidado estejam cientes dos diagnósticos e prognósticos, a fim de
auxiliarem nas decisões que envolvem a possibilidade de realizar o registro das DAV.
125
Complementa-se, ainda, que, para os cuidadores familiares dessa pesquisa, o
conhecimento sobre a suposta irreversibilidade da doença deve ser conhecido,
acreditando que a fé possa atuar positivamente no enfrentamento da doença com vistas a
sua reversão, mesmo que cientes da sua irreversibilidade. Neste sentido, constata-se
uma ambivalência entre a esperança, com a crença de que um milagre pode acontecer,
ocorrendo a cura da enfermidade, e a descrença de que nada mais pode ser feito, exceto
medidas de conforto, proporcionando uma melhor qualidade de vida na morte(13).
Ainda, foi possível constatar que os entrevistados não desejam delegar as
responsabilidades de decisão aos seus familiares, possivelmente pelas dificuldades, por
eles ora vivenciadas, de ter que decidir, muitas vezes, sem saber ao certo os desejos dos
seus pacientes. Sob esse enfoque, geralmente, as preferências dos pacientes sobre os
cuidados que desejam receber, no momento final de sua vida, são desconhecidas da
equipe assistencial, bem como dos familiares, comumente ainda designados como os
responsáveis pelas decisões de tratamento e cuidados em fim de vida(12). Além disso,
por vezes, as famílias tomam decisões que colidem com os desejos do paciente, que,
anteriormente capazes, manifestaram na forma de uma DAV(5).
Os cuidadores familiares expressaram preferir não precisar de cuidados, em
decorrência de sua incapacidade, contudo, caso necessário, desejariam ser cuidados da
mesma maneira que cuidam de seus familiares doentes. Além disso, os dados da
pesquisa possibilitaram perceber a preocupação dos entrevistados de que sejam
cuidados, tendo sua dignidade e autonomia respeitadas. Pacientes em estágio avançado
da doença buscam alívio e controle da dor e de outros sintomas, desejando assumir o
controle sobre a própria vida, sem ter o sofrimento prolongado, ser sobrecarga para a
família, podendo estreitar laços com pessoas significativas e ter dignidade no fim da
vida, esperando, também, que seus médicos não os abandonem(8).
126
O fato dos entrevistados referirem medo e receio em realizar as DAV, em
virtude das possíveis mudanças de vontades, que podem ocorrer com o passar do tempo
e a vivência de uma doença terminal, é que torna indispensável rever constantemente as
DAV para que não ocorram equívocos, ou que suas vontades não correspondam mais
aos seus anseios atuais. Os pacientes podem modificar suas preferências, sem modificar
a tempo suas instruções(5). Assim, em estudo mediante entrevistas realizadas com
médicos sobre o que pensavam sobre sua própria morte, uma médica geriatra expôs que,
por terregistrado suas DAV, constantemente revê esse documento, pois sempre algo
pode ser modificado, em decorrência de sua experiência profissional, além da mudança
de opiniões aparentemente imutáveis, pelo passar do tempo(9).
Soma-se, ainda, que os enfermeiros e médicos manifestaram resistência em
abordar, com seus familiares, situações de fim de vida, apesar de atuantes na área e
familiarizados com essas vivências. Neste sentido, dialogar precocemente com os entes
queridos, durante o período de isenção de doenças incapacitantes, pode ajudar a
preparar todos para a possibilidade de vivenciar situações terminais e como vivenciálas, assim como incluir um responsável que responda sobre suas vontades(6).
Conclusão
A reflexão sobre a possibilidade de apresentar-se em uma situação terminal não
constitui tarefa fácil a ser pensada pelos profissionais e cuidadores familiares, e
supostamente pela população em geral. Ainda, remeter-se à possibilidade de apresentarse em tal situação não reflete por completo as decisões que seriam tomadas ao vivenciála. Possivelmente, por isso, a aplicabilidade das DAV imponha maiores dificuldades a
sua implementação.
O desejo de realizar as DAV, permeado pelo medo que suas vontades realmente
sejam respeitadas, o receio de que ocorram mudanças de ideia ao se defrontar com a
127
situação terminal, o medo do abandono dos profissionais, a insegurança quanto aos
diagnósticos e prognósticos, constituíram situações que impõem limitações, e
possivelmente resistência, quanto a aplicabilidades das DAV. Contudo, se já é difícil
respeitar ou considerar as DAV, sua ausência incute mais dificuldades, pois o paciente
incapaz estará sendo cuidado desconhecendo-se de fato o que desejaria para si.
O ideal seria que todos pacientes com uma doença grave e incapacitante
pudessem conversar com sua família, amigos e profissionais da saúde, sobre seus
valores e como gostariam de ser considerados, quanto a cuidados e tratamentos, diante
de uma situação de incapacidade. Além disso, a família, que desempenha um papel
fundamental na tomada de decisão, estaria respaldada, reduzindo o seu sofrimento,
possibilitando com antecedência o planejamento da assistência, e, consequentemente,
melhorando a qualidade da sua morte.
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Jan.
130
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A realização dessa tese impôs desafios adicionais, além dos inerentes ao
processo de construção de uma pesquisa, relacionados à dificuldade em discorrer sobre
temas relacionados ao fim de vida. Trata-se de assunto velado, interdito e evitado pelas
pessoas, acreditando-se que seja pelo medo de vivenciar o processo da morte. Contudo,
as dificuldades inerentes ao assunto, instigam e conduzem a provocações constantes a
fim de desvendar, desvelar e se aproximar do assunto dito tão polêmico pensando em
auxiliar na assistência prestada as pessoas envolvidas nessa situação inevitável na vida
de todos. Assim, realizar essa pesquisa permitiu constatar que é necessário muito
empenho dos profissionais da saúde, cuidadores familiares e demais envolvidos para
que a iminência da morte seja encarada com um novo olhar, como forma de estabelecer
uma nova relação com a vida.
Desse modo, a partir do objetivo proposto de “compreender como os
profissionais da saúde e familiares entendem a aplicabilidade das diretivas antecipadas
de vontade para as situações de terminalidade”, ocorreu a apresentação dos três artigos
oriundos dos resultados das sete categorias que elucidam as questões relacionadas a
aplicabilidade das DAV: conflitos na assistência ao doente terminal: implicações à
prática das DAV; o respaldo dos familiares e dos profissionais mediando o respeito a
autonomia do paciente: vantagens à aplicabilidade das DAV; dificuldades e limitações
na implementação das DAV: desafios à prática hospitalar; o medo das DAV e o respeito
a autonomia: desejos pessoais de cuidado dos profissionais remetidos a doença terminal;
desejos dos cuidadores familiares diante da situação de terminalidade; responsabilidade
da família no cuidado ao doente terminal; e o respeito a autonomia do doente terminal
pelos familiares: o medo da verdade.
Os achados permitiram constatar que a aplicabilidade das DAV está intimamente
relacionada ao direito que o indivíduo possui para que sua autonomia seja respeitada. O
reconhecimento desse direito foi enfatizado constantemente, entretanto muitas nuances
circulam em torno da possibilidade de que as DAV possam garantir esse direito, além
da persistência de medos e receios de que efetivamente as manifestações sobre os
tratamentos a serem utilizados numa situação de incapacidade possam ser registrados e
implementados. Neste contexto, os achados relacionados a aplicação das DAV suscitam
a necessidade de serem frequentemente discutidas no ambiente de assistência à saúde,
131
enfocando o ser humano que se encontra em processo de morte, a fim de garantir o
respeito a sua autonomia pessoal edignidade humana.
À aplicabilidade das DAV, é necessário que sua construção seja conduzida pela
sinceridade na relação dos profissionais da saúde, pacientes e familiares, contribuindo
para que a realização dos registros antecipados sobre as vontades em fim de vida,
correspondam efetivamente ao desejado, aliado ao fato que não permaneçam dúvidas
posteriores quanto ao cumprimento das manifestações. Sob esse enfoque, na pesquisa,
foi possível constatar que os conflitos de ideias entre os profissionais da saúde,
especialmente, de enfermeiros e médicos com os pacientes e seus cuidadores familiares,
a interação multiprofissional e o esclarecimento do diagnóstico e prognóstico entre os
envolvidos, repercutem diretamente na possibilidade de realizar ou não as DAV.
Os profissionais da saúde reconhecem que pacientes conscientes de seu
diagnóstico e prognóstico, apresentam maior facilidade na participação nos seus
processos decisórios de tratamentos de investimento ou não. Neste sentido, as DAV se
fazem tão relevantes e indispensáveis a fim de respaldar as condutas profissionais,
decisões dos familiares e, mais importante, que o paciente terá suas vontades
respeitadas. Ademais, as decisões devem ser compartilhadas, não sendo exclusividade
do médico; desta forma, deve haver diálogo entre os profissionais da saúde, familiares e
pacientes para que ocorram as decisões, pois discordâncias de condutas, muitas vezes,
acarretam em investimento total no paciente, até que ocorra um consenso dos
profissionais para uma ação unânime.
Assim, o respeito à autonomia pessoal, considerado a base incentivadora à
aplicação das DAV, prevê o cumprimento das vontades prévias manifestadas sem
desrespeitá-las, minimizando o risco de ocorrer a distanásia, ou seja, a realização de
investimentos heróicos que demandam sofrimento, mesmo sabendo que o paciente não
apresenta mais perspectivas de cura. Ademais, há o respaldo profissional amparado na
ideia da segurança e tranquilidade em atuar, seja em restringir ou não algum tratamento;
o auxílio nas decisões que impõem dilemas éticos de atuação, bem como, servem para
garantir que efetivamente as vontades manifestas pelos pacientes sejam cumpridas pelos
profissionais.
Ao enumerar que o respaldo aos familiares, intermediado pelo seu
consentimento diante das ações realizadas pelos profissionais, constituem uma das
vantagens à aplicabilidade das DAV, incluindo a redução do estresse vivenciado nos
momentos decisórios de restrição ou não de tratamentos aos seus familiares doentes
132
terminais, bem como a redução dos conflitos entre os cuidadores, profissionais e
paciente; a elucidação das dificuldades enfrentadas pelos cuidadores familiares referente
à sobrecarga no cuidado, a abdicação do autocuidado para cuidar do outro, a
responsabilidade de cuidar inteiramente, a esperança de reversão do quadroda doença
além, da comunicação insuficiente dos diagnósticos e prognósticos,são dificuldades que
podem serem amenizadas, ao considerar a contextualização da aplicação das DAV.
Entretanto, há que se considerar que, para a aplicação das DAV no contexto
hospitalar, circulam muitas dúvidas, angústias, anseios e medos relacionados a sua
efetivação, seja pelo fato de tratar de temáticas relacionadas à terminalidade, seja por se
tratar de um documento cuja implementação pode comprometer o exercício
profissional. Neste sentido, é que surgiram questões relacionadas ao amparo legal da
resolução do CFM e à inexistência de legislação especifica sobre o assunto, a fim de
amparar não somente o médico, mas o enfermeiro, que não é legalmente amparado
profissionalmente sobre o cumprimento das DAV. Soma-se, ainda, que o cumprimento
das DAV pode não corresponder exatamente aos desejos do doente, em virtude das
mudanças de opiniões que podem ocorrer no transcorrer da doença, além de poderem
ocorrer contestações familiares sobre o cumprimento ou não dos desejos prévios
manifestados.
Os assuntos relacionados ao fim de vida, frequentemente, despertam anseios
diversos e falar sobre a morte suscitadificuldades. Nesse sentido, a possibilidade de
entendimento das DAV é um atrativo, no sentido de contribuir com os profissionais da
saúde quando se encontrarem em situações que necessitem explicar, aos pacientes e
familiares, a possibilidade de realizar um testamento vital. Além disso, é importante que
considerem e valorizem cultura e escolaridade dos envolvidos para que efetivamente
ocorra a comunicação sobre a temática e a falta de entendimento não seja um fator
dificultador ao pensar em DAV.
Desde a aprovação da resolução das DAV se passaram quase quatro anos;
obviamente, progressos ocorreram no sentido de familiarização com o tema, maior
inserção do assunto nos espaços de saúde e na sociedade, realização de pesquisas a fim
de aprimorar a ideia da sua implantação, a procura em ascendência de registros de
testamentos vitais em cartórios brasileiros. Entretanto, algumas barreiras profissionais,
como a falta de tempo ou a não disponibilidade em introduzir o assunto, a rotatividade
de profissionais que atendem os doentes, especialmente nos hospitais universitários, a
ideia da difícil implementação das DAV no contexto hospitalar, erros de diagnóstico
133
somados à desmotivação profissional parecem dificultar o processo de aplicabilidade
das DAV. Nesse contexto, a ideia do diálogo entre os profissionais, paciente e
familiares, uma abordagem multidisciplinar associada aos registros adequados em
prontuários e documentos específicos devem permear a prática das DAV.
Efetivamente em termos práticos, caso os pacientes em condições de capacidade,
previamente, não tenham manifestado as suas vontades, e para que seja possível aos
doentes manifestarem seus desejos, é imprescindível que saibam de maneira sincera seu
diagnóstico e prognóstico, ancorados em uma relação franca entre os envolvidos e
interessados. Neste sentido, a ocultação das condições de saúde e doença, tão evidente
na pesquisa, faz com que a realização de uma DAV seja impedida. Na maioria das
vezes, essa ocultação, tanto dos profissionais, quanto dos cuidadores familiares,
referenciada como uma maneira de proteção aos pacientes, deve-se ao receio de vir a
interferir na auto-estima do doente, provocando depressão, descrença, destruição de
esperança.
Frente às considerações efetuadas, ao tratar assuntos sobre fim de vida, a partir
das vivências encaradas pelos profissionais e pelos cuidadores familiares, a ideia de
pensar sobre a possibilidade de que situações semelhantes aconteçam em si, faz com
que repensem suas ideias e condutas diante das situações de terminalidade. Nesse
sentido, medidas de conforto, oferecimento de hidratação e nutrição adequadas,
consideradas neste contexto como indispensáveis, a manutenção da privacidade, o
respeito à dignidade e a necessidade de manter a qualidade de vida constituem situações
indispensáveis para os profissionais da saúde, quando remetidos à possibilidade de se
tornarem pacientes terminais. Soma-se, ainda, que o respeito à autonomia é o que
ampara a ideia dos profissionais da saúde manifestarem interesse em realizar as DAV,
muito embora desejam realizá-la quando reconhecidamente terminais.
Entretanto, a aplicação das manifestações prévias é envolta por anseios e
dúvidas quanto pensadas para si, considerando a possibilidade de mudança de opinião e
o medo inerente à terminalidade. Porém, a realização das DAV contribui para a
desresponsabilização dos familiares em decidir por si. Enfim, para os profissionais da
saúde, a aceitabilidade de aplicabilidade das DAV está ancorada no medo de realizá-la,
apesar de enfatizarem sua necessidade, de modo a garantir o respeito a sua autonomia
pessoal.
Já, para os cuidadores familiares, os desejos pessoais quando estimulados a
pensar sobre a possibilidade de se tornarem terminais apresentam-se mais evidentes que
134
para os profissionais, ou seja, os cuidadores parecem desejar mais intensamente realizar
as DAV. Tal manifestação parece basear-se no desejo de que seus cuidadores não
sofram o mesmo que eles ao cuidar do seu familiar, em virtude da demanda de
dedicação; entretanto, permanece de maneira discreta certo receio, também, quanto à
possibilidade de mudança de ideia diante da situação terminal.
Frente ao exposto, foi possível confirmar a tese que: a aplicabilidade das
diretivas antecipadas de vontade no ambiente hospitalar requer o seu
conhecimento e capacitação pelos enfermeiros, médicos e cuidadores familiares de
doentes terminais, demonstrando o respeito à autonomia pessoal dos pacientes e
familiares.
Sob essa perspectiva, as DAV devem ser um tema compartilhado,
contextualizado e objeto de diálogo, demandando tempo e dedicação dos profissionais e
envolvidos, a fim de garantir, ao paciente, o respeito as suas vontades; ao familiar,
maior tranquilidade e, aos profissionais, o respaldo e a certeza do dever cumprido.
Assim, é possível constatar que há necessidades e prioridades que devem permear a
prática dos profissionais da saúde, especialmente dos enfermeiros e médicos, para que
efetivamente ocorram avanços no sentido de que as DAV possam ser implementadas no
contexto da assistência aos doentes terminais. Com isso, uma das grandes questões
refere-se ao fato que deve haver uma interação multiprofissional, ou seja, a
comunicação deve permear as condutas relacionadas ao fim de vida, a fim de evitar
discordâncias de condutas diante de uma situação de limitação ou não de tratamentos.
A aplicação das DAV deve ser amparada pelo diálogo entre os envolvidos, ou
seja, entre os profissionais, familiares e pacientes. Nessas situações, a comunicação com
os familiares e pacientes deve ser o mais acessível possível, a fim de que
desentendimentos não sejam o alvo da falta de interesse na realização das DAV. Com
isso, a preparação, a capacitação sobre as DAV constituem fatores indispensáveis para
que ocorra a implementação, principalmente pelo fato de que, embora se reconheça que
esteja havendo progressos, o desconhecimento sobre a temática ainda é grande. A
disseminação da ideia e de conhecimentos relativos aos cuidados paliativos, por sua vez,
facilitariam a implementação das DAV em virtude da filosofia adotada à sua prática.
Também, a necessidade de legislação específica sobre a aplicação das DAV no
contexto dos profissionais, especialmente dos enfermeiros, que ainda não possuem
amparo em nenhuma resolução, minimizaria possíveis desconfortos relacionados a sua
aplicação por parte destes profissionais. Além disso, os cuidadores familiares e os
135
pacientes estariam ainda mais amparados, pois, na presença de uma legislação
específica, a fidedignidade do cumprimento das vontades, supostamente, seria mais
efetiva.
Frente ao exposto, proporcionar alternativas que garantam espaços à discussão e
reflexão da aplicação prática das DAV, seja na formação de profissionais da saúde, bem
como na informação à população sobre essa possibilidade, contribuiriam no crescimento
e procura da realização das DAV, conduzindo a um novo olhar diante do processo da
morte, além de auxiliar na garantia da autonomia pessoal. Neste sentido, é importante
estimular a inserção dessa temática nos currículos dos cursos da área da saúde, a
exploração de meios para que os serviços de saúde e os profissionais possam estar
cientes dessa possibilidade que se apresenta, bem como o desenvolvimento de pesquisas
relacionadas à aplicação prática das DAV.
Os profissionais de saúde veem a morte do paciente como um fracasso, o que
pode estar associado a deficiências na sua formação profissional, bem como por
questões culturais. Presume-se que os profissionais da saúde, especialmente médicos e
enfermeiros, estejam habituados a lidar com a morte, o que não significa que estão
devidamente preparados para lidar com o que cerca essa situação. Enfim, considerando
a inserção da temática aos profissionais de saúde e a sociedade, é necessário tratar a
situação da iminência da morte com muita compreensão, empatia e solidariedade, a fim
de auxiliar na ideia que não é preciso, que os pacientesvivenciemo processo de morte de
modo solitário.
Indubitavelmente, os dados apresentados nesse estudo não configuram a
realidade do Brasil, tampouco do Rio Grande do Sul, em virtude da parcela de
entrevistados e dos diferentes contextos e situações de assistência à saúde. Entretanto,
constituem mais um passo para que o assunto sobre a terminalidade, dito velado e
interdito, seja aos poucos inserido nos espaços da área da saúde e para que a população
esteja mais ciente dos seus direitos de que suas vontades possam vir a ser cumpridas em
uma situação de incapacidade.
Diante de todas as considerações efetuadas nessa pesquisa, surgem os seguintes
questionamentos: você respeita a autonomia dos doentes terminais? Na assistência aos
pacientes, você cumpre com os desejos prévios manifestados? Qual o valor remetido ao
respeito a autonomia pessoal diante de um doente terminal? É importante cumprir os
desejos manifestados, considerando que o doente está em processo de morte? Você já
pensou em como quer ser cuidado diante de uma situação de doença terminal? Deseja
136
que sua autonomia seja garantida? Tais indagações surgem a fim de que possam instigar
reflexões no sentido que constantemente seja (re) pensada a ideia que o ser humano é
único com suas ideias, vontades, anseios, inquietações, sendo importante que suas
vontades sejam sobrepostas às vontades de quem os assiste, ou seja, os desejos pessoais
dos profissionais não devem ser superiores ao que o paciente pensa e deseja.
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Vontade: Ensaios sobre o direito à autoderteminação. 1. ed. Belo Horizonte:
Letramento, 2013. 281p.
145
APÊNDICE I
INSTRUMENTO DE COLETA DOS DADOS
Entrevistas n. (
)
Identificação dos entrevistados
1. Profissional da saúde: (
) enfermeiro (a)
(
) médico (a)
2. Data de nascimento: ___________________
3. Grau de formação: _______________________
4.Tempo de atuação profissional:_________________________________________
5. Unidade hospitalar que atua:__________________________________________
6. Decisores substitutos:(
)
familiar:
_____________(
)
outros:
_________________
7.Tempo de cuidado ao paciente: ________________________________________
Questões norteadoras
Diretivas antecipadas de vontade é um documento organizado com o médico, ou
isoladamente, onde consta o conjunto de desejos, prévia e expressamente manifestados pelo
paciente, sobre cuidados e tratamentos que quer, ou não, receber no momento em que
estiver incapacitado de expressar, livre e autonomamente, sua vontade (CFM, 2012).
1. Profissionais da saúde (médicos e enfermeiros)
Questões relacionadas na assistência ao paciente

Esclarecimentos aos pacientes e/ou familiares sobre a doença do paciente
(diagnóstico, prognóstico, tratamentos, vantagens e desvantagens);

Respeito à autonomia do paciente (decisões compartilhadas entre os
profissionais da saúde, pacientes e/ou familiares sobre implementação ou não de
tratamentos e cuidados e as decisões delegadas aos responsáveis);

Conhecimento e vivências profissionais sobre a aplicabilidade das DAV
(vantagens, desvantagens, dificuldades e facilidades, situações adotadas);

Orientações
e
comunicação
aos
pacientes
sobre
a
possibilidade
de
preenchimento das DAV (instruções e recomendações para a organização do
documento e a modalidade de pacientes inclusos nesse processo; os mais
indicados para conversar com os pacientes e/ou familiares responsáveis sobre as
DAV);
146

Cumprimento pelos profissionais da saúde das decisões dos pacientes e/ou
decisores substitutos (conflitos para o cumprimento ou não das vontades
manifestadas).
Questões relacionadas aos desejos pessoais sobre as Diretivas Antecipadas de
Vontade

Desejos sobre quem e como gostaria de ser cuidado diante da situação de
incapacidade /terminalidade (preferências de comunicação);

Desejo sobre completar a DAV (razões sobre o interesse ou desinteresse e
impedimentos);

O respeito à autonomia diante da incapacidade.
2. Familiares dos pacientes
Questões relacionadas no cuidado ao paciente

Compreensão do diagnóstico e prognóstico do paciente (comunicação dos
profissionais da saúde; decisões compartilhadas com os profissionais sobre os
possíveis tratamentos);

Desejos previamente manifestados pelo paciente sobre condutas a serem
aplicadas diante da situação ora vivenciada e das preferências sobre quem o
cuidaria (cuidados e tratamentos a serem ou não prestados, cumprimento dos
desejos, facilidades e dificuldades);

Responsabilidades atribuídas aos familiares responsáveis sobre as decisões em
final de vida (dificuldades e vantagens).
Questões relacionadas aos desejos pessoais sobre as Diretivas Antecipadas de
Vontade

Desejos sobre quem e como gostaria de ser cuidado diante da situação de
incapacidade /terminalidade (preferências de comunicação sobre as vontades);

Desejo sobre realização das DAV (razões sobre o interesse ou desinteresse e
impedimentos);
O respeito à autonomia diante da incapacidade.
147
APÊNDICE II
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE ESCLARECIDO
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE - FURG
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENFERMAGEM
DOUTORADO EM ENFERMAGEM
APLICABILIDADE DAS DIRETIVAS ANTECIPADAS DE VONTADE:
NOVO OLHAR ACERCA DA MORTE E DA RELAÇÃO COM A VIDA
Pesquisadora:- Silvana B. Cogo (Doutoranda em Enfermagem/FURG)
Orientadora:- Prof. Drª. Valéria Lerch Lunardi
Eu,________________________________ciente com o presente Consentimento
Livre e Esclarecido e de posse de uma das vias do termo, declaro estar devidamente
informado(a) sobre a intenção da pesquisa intitulada:Aplicabilidade das Diretivas
Antecipadas de Vontade: novo olhar acerca da morte e da relação com a vida, que tem
o objetivo de “Compreender como os profissionais da saúde e familiares entendem a
aplicabilidade das diretivas antecipadas de vontade para as situações de terminalidade”.
Desse modo, a fim de alcançar os objetivos propostos, serão realizadas
entrevistas semiestrutrudas com a utilização de gravador, na Instituição Hospitalar do
estudo e no domicílio dos familiares dos pacientes atendidos no serviço de internação
domiciliar da Instituição. É assegurado que as entrevistas transcritas serão
disponibilizadas aos entrevistados antes de serem analisadas, para certificaram-se do
que realmente será considerado a fala do entrevistado.
Considero preservada minha participação como voluntário (a), sem coerção
pessoal ou institucional, dando minha permissão para ser entrevistado e para estas
entrevistas serem gravadas em áudio e, após a transcrição, serão identificadas por
códigos. Estou ciente que sou livre para recusar a dar respostas a determinadas questões
durante as entrevistas, retirar meu consentimento e terminar minha participação a
qualquer tempo, bem como terei a oportunidade para perguntar sobre qualquer questão
que eu desejar, e que todas deverão ser respondidas pelo pesquisador a meu contento.
Estou ciente que essa pesquisa poderá beneficiar a assistência prestada pelos
profissionais da saúde aos pacientes e familiares, considerando que as Diretivas
Antecipadas de Vontade constituem um artificio garantidor da preservação da
autonomia pessoal do paciente, bem como, auxiliam na redução dos conflitos e dilemas
éticos vivenciados por profissionais e familiares dos pacientes diante de situações de
terminalidade. Entretanto, também tenho a compreensão que poderá não haver
benefícios diretos ou imediatos para mim como participante deste estudo, além disso, a
princípio, não existem riscos prejudiciais à minha integridade, como participante dessa
pesquisa; entretanto, poderei ter ganhos emocionais de poder falar sobre o assunto em
pauta. Dessa forma, caso seja necessário, se eu me sentir alterado(a) emocionalmente,
serei conduzido ao serviço de psicologia do hospital. Estou ciente de que também
poderá não haver benefícios diretos e imediatos para minhas atividades profissionais ou
para a instituição onde trabalho, ou para o cuidado prestado ao paciente no domicilio,
148
mas sei que poderá haver alguma abordagem positiva após outros profissionais e outras
instituições tomarem conhecimento das conclusões desta pesquisa.
A princípio, não existem riscos prejudiciais à integridade aos participantes dessa
pesquisa. Em qualquer etapa do estudo, você terá acesso aos profissionais responsáveis
pela pesquisa para esclarecimento de eventuais dúvidas. O principal investigador é a
Doutoranda Silvana Bastos Cogo, que pode ser encontrada pelo e-mail
[email protected] e pelo telefone (55) 9686 - 3552. Se você tiver
alguma consideração ou dúvida sobre a pesquisa entrar em contato via telefone e/ou por
e-mail.
No tocante as despesas e compensações: não há despesas pessoais para o
participante em qualquer fase do estudo. Também não há compensação financeira
relacionada a sua participação. Se existir qualquer despesa adicional, ela será absorvida
pelo orçamento da pesquisa. Existe o compromisso do pesquisador de utilizar os dados
e o material coletado somente para esta pesquisa e trabalhos científicos a serem
elaborados.
Estou ciente de que estarão garantidas a não invasão de minha privacidade. Sei
que, além do pesquisador, o material coletado na entrevista será de conhecimento da
Professora Orientadora, sendo o meu nome omitido e esta pessoa estará submetida às
normas do sigilo profissional. O relatório final estará disponível para todos quando
estiver concluído o estudo, inclusive para apresentação em encontros científicos e
publicação em revistas especializadas, podendo conter citações literais da entrevista,
mas sempre de modo anônimo e evitando a identificação do participante. Estou ciente
de que serei respeitado (a) quanto a não ter tocados aspectos de foro íntimo, a não ser
quando for de minha concordância em abordá-los.
Estou ciente que serão sustentados os preceitos Éticos e Legais conforme a
Resolução 466/12 da CONEP/MS (Comissão Nacional de Ética em Pesquisa/Ministério
da Saúde) sobre Pesquisa Envolvendo Seres Humanos.
____________________________
Nome do entrevistado
__________________________
Assinatura do entrevistado
____________________________
Nome do pesquisador
__________________________
Assinatura do pesquisador
Este formulário foi lido para ________________________________________em
___/___/___pelo (a) pesquisador (a)___________________________________.
Nota: O presente Termo terá duas vias rubricadas em todas as páginas, uma ficará com a
pesquisadora e a outra via com a participante da pesquisa.
Silvana Bastos Cogo - Doutoranda em Enfermagem FURG
Fone: (55) 96863552. E-mail: [email protected]
Drª Valéria Lerch Lunardi - Professora Orientadora
Fone: (53) 3233-0315. E-mail: [email protected]
149
APÊNDICE III
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE ESCLARECIDO
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE - FURG
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENFERMAGEM
DOUTORADO EM ENFERMAGEM
APLICABILIDADE DAS DIRETIVAS ANTECIPADAS DE VONTADE:
NOVO OLHAR ACERCA DA MORTE E DA RELAÇÃO COM A VIDA
Pesquisadora:- Silvana B. Cogo (Doutoranda em Enfermagem/FURG)
Orientadora:- Prof. Drª. Valéria LerchLunardi
O (a) Senhor (a) está sendo convidado (a) a participar de uma pesquisa. Por
favor, leia este documento com bastante atenção antes de assiná-lo. Caso haja alguma
palavra ou frase que o (a) senhor (a) não consiga entender, o pesquisador responsável
pelo estudo estará disponível para esclarecê-los. A proposta deste termo de
consentimento livre e esclarecido (TCLE) é explicar tudo sobre o estudo e solicitar a sua
permissão para participar do mesmo.
A pesquisa intitulada: Aplicabilidade das Diretivas Antecipadas de Vontade:
novo olhar acerca da morte e da relação com a vida tem o objetivo de “Compreender
como os profissionais da saúde e familiares entendem a aplicabilidade das diretivas
antecipadas de vontade para as situações de terminalidade”.
O (a) Senhor (a) foi escolhido (a) a participar do estudo, pois é importante para a
pesquisa; além disso, o (a) Senhor (a) poderá não participar do estudo, caso seja sua
vontade.
Após entender e concordar em participar, será realizada uma entrevista com a
utilização de gravador e está garantido que as falas serão transcritas e poderão ser lidas
pelos entrevistados antes de serem utilizadas na pesquisa.
Eu,_______________________________________ estou ciente com as
informações deste termo de consentimento livre e esclarecido e de posse de uma das
vias do termo, declaro estar informado (a) sobre a intenção da pesquisa. Considero que a
minha participação é voluntário (a), dando minha permissão para ser entrevistado e para
estas entrevistas serem gravadas em áudio e, após a transcrição, serem identificadas por
códigos. Estou ciente que sou livre para recusar a dar respostas a determinadas
perguntas durante as entrevistas, retirar meu consentimento e terminar minha
participação a qualquer tempo, bem como terei a oportunidade para perguntar sobre
qualquer questão que eu desejar, e que todas questões deverão ser respondidas pelo
pesquisador a meu contento.
Estou ciente que essa pesquisa poderá beneficiar a assistência prestada pelos
profissionais da saúde aos pacientes e familiares, considerando que as Diretivas
Antecipadas de Vontade contribuem para a preservação da autonomia do paciente, bem
como, auxiliam na redução dos conflitos e dilemas éticos vivenciados por profissionais
e familiares dos pacientes diante de situações de terminalidade. Entretanto, também
tenho a compreensão que poderá não haver benefícios diretos ou imediatos, para mim,
como participante deste estudo.
A princípio, não existem riscos prejudiciais à minha integridade, como
participante dessa pesquisa; entretanto, poderei ter ganhos emocionais de poder falar
sobre o assunto em pauta. Dessa forma, caso seja necessário, se eu me sentir alterado(a)
emocionalmente, serei conduzidos ao serviço de psicologia do hospital. Em qualquer
etapa do estudo, eu terei acesso aos profissionais responsáveis pela pesquisa para
150
esclarecimento de eventuais dúvidas. O principal investigador é a Doutoranda Silvana
B. Cogo, que pode ser encontrada pelo e-mail [email protected] e pelo
telefone (55)96863552. Se eu tiver alguma consideração ou dúvida sobre a pesquisa,
posso entrar em contato via telefone e/ou por e-mail.
Quanto as despesas e compensações: não há despesas pessoais para o (a)
participante em qualquer fase do estudo. Também não há compensação financeira
relacionada a minha participação. Se existir qualquer despesa adicional, ela será
absorvida pelo orçamento da pesquisa. Existe o compromisso do pesquisador de utilizar
os dados e o material coletado somente para essa pesquisa e trabalhos científicos a
serem elaborados.
Estou ciente de que estará garantida a não invasão de minha privacidade. Sei
que, além do pesquisador, o material coletado na entrevista será de conhecimento da
Professora Orientadora, sendo o meu nome omitido e essa pessoa estará submetida às
normas do sigilo profissional. O relatório final estará disponível para todos, quando
estiver concluído o estudo, inclusive para apresentação em encontros científicos e
publicação em revistas especializadas, podendo conter citações literais da entrevista,
mas sempre de modo anônimo e evitando a identificação do participante. Estou ciente
de que serei respeitado (a) quanto a não ter tocados aspectos de foro íntimo, a não ser
quando for de minha concordância em abordá-los.
Estou ciente que serão sustentados os preceitos Éticos e Legais conforme a
Resolução 466/12 da CONEP/MS (Comissão Nacional de Ética em Pesquisa/Ministério
da Saúde) sobre Pesquisa Envolvendo Seres Humanos.
____________________________
Nome do entrevistado
__________________________
Assinatura do entrevistado
____________________________
Nome do pesquisador
__________________________
Assinatura do pesquisador
Este
formulário
foi
lido
para
_________________________________________________em ___/___/___pelo (a)
pesquisador (a)______________________________________________.
Nota: O presente Termo terá duas vias rubricadas em todas as páginas, uma ficará com a
pesquisadora e a outra via com a participante da pesquisa.
Silvana Bastos Cogo - Doutoranda em Enfermagem FURG
Fone: (55) 96863552. E-mail: [email protected]
Drª Valéria LerchLunardi - Professora Orientadora
Fone: (53) 3233-0315. E-mail: [email protected]
151
ANEXO I
DIRETIVAS ANTECIPADAS: UMA ANÁLISE DOCUMENTAL NO
CONTEXTO MUNDIAL
ADVANCE DIRECTIVES: A DOCUMENTARY ANALYSIS IN GLOBAL
CONTEXT
DIRECTIVAS ANTICIPADAS: UN ANÁLISIS DOCUMENTAL EN
CONTEXTO GLOBAL
RESUMO: As diretivas antecipadas da vontade ou o testamento vital, nomenclatura
adotada no Brasil, atua na preservação da autonomia do paciente. Com o objetivo de
conhecer as legislações referentes ao testamento vital em diferentes países,
estabelecendo um paralelo com a instituída no Brasil, realizou-se análise documental de
legislações governamentais nacionais e estrangeiros, adotando a análise de conteúdo da
Bardin. Aproximadamente quinze países possuem legislações regulamentadoras do
testamento vital, enquanto que, no Brasil, há apenas uma resolução do Conselho Federal
de Medicina. Conhecer as legislações em diferentes países contribui, no sentido de
subsidiar discussões e avanços legais, no Brasil, para que os profissionais da saúde, que
atuam com pacientes, possam considerar os desejos dos assistidos.
Palavras-chave: Diretivas antecipadas. Testamentos quanto à vida. Legislação como
assunto. Doente terminal.
ABSTRACT:Advance directives will or living will, nomenclature adopted in Brazil,
operates in the preservation of patient autonomy. In order to know the laws regarding
living wills in different countries, establishing a parallel with established in Brazil, there
was documentary analysis of domestic and foreign governmental laws, adopting the
content analysis of Bardin. Approximately fifteen countries have regulatory laws of the
living will, whereas in Brazil there is only one resolution of the Federal Council of
Medicine. Know the laws in different countries contributes, to support discussions and
legal developments in Brazil, so that health professionals who work with patients, may
consider the wishes of the beneficiaries.
Key words:Advance directives.Living will. Legislation as topic. Terminally ill.
RESUMEN: Las directivas anticipadas serán o testamento vital, nomenclatura adoptada
en Brasil, opera en la preservación de la autonomía del paciente. Con el fin de conocer
las leyes relativas a los testamentos vitales en diferentes países, estableciendo un
paralelismo con lo establecido en Brasil, no fue el análisis documental de las leyes
gubernamentales nacionales y extranjeras, adoptando el análisis de contenido de Bardin.
Aproximadamente quince países tienen leyes reguladoras del testamento en vida,
mientras que en Brasil sólo hay una resolución del Consejo Federal de Medicina.
Conozca las leyes de los distintos países contribuye, para apoyar los debates y
desarrollos legales en Brasil, por lo que los profesionales de la salud que trabajan con
los pacientes, pueden considerar los deseos de los beneficiarios.
Palabras-clave: Directivas antecipadas. Volunta em vida. Legislación como assunto.
Enfermo terminal.
152
INTRODUÇÃO
O desenvolvimento das ciências tecnologias biomédicas temprovocado
mudanças significativas na atenção prestada ao paciente, considerando os recursos
disponíveis para o tratamento de doenças antes consideradas incuráveis. No entanto, em
determinados momentos, o aparato tecnológico não é o suficiente para manter a vida em
se tratando dos doentes terminais. A tentativa de curar pode acarretar o prolongamento
artificialda vida, a perda da autonomia pessoal e da dignidade humana, suscitando
discussõesacerca de supostos direitos do paciente em manifestar a sua vontade em
situações de incapacidade.
Nessa direção, diante da possibilidade da construção de um instrumento para a
manifestação dos interesses1 é que surgem as Diretivas Antecipadas de Vontade (DAV),
habitualmente conhecidas no Brasil, como Testamento Vital (TV), que se vinculam à
possibilidade do paciente manifestar previamente sua vontade acerca de quais
tratamentos médicos (diálise, respiradores artificiais, ressuscitação cardiorrespiratória –
RCR, tubo de alimentação), quer ou não, submeter- se caso futuramente esteja em
estado de incapacidade.2
As DAV emergiram nas últimas décadas como uma das principais discussões da
bioética mundial e garantidoras da preservação da autonomia pessoal. Países como
Alemanha, Argentina, Áustria, Bélgica, Estados Unidos da América (EUA), França,
Holanda, Hungria, Inglaterra, México, Porto Rico, Portugal, União Européia e Uruguai
já possuem legislação específica sobre o tema. No Brasil inexiste uma legislação
jurisprudencial sobre o tema, contudo foi editada, recentemente, pelo Conselho Federal
de Medicina (CFM) a Resolução 1.995/12 que trata e autoriza a prática das DAV.3
Partindo desse pressuposto, a DAV está ancorada na ideia de que é um processo
que inclui a noção de paciente ativo que participa na tomada de decisões relativas à sua
saúde4. Em pesquisa realizada no Brasil, com o propósito de identificar a percepção de
pacientes oncológicos e de seus acompanhantes em relação ao TV, foi identificado que
ambos os grupos desconhecem o significado desse termo. A partir da apresentação de
seu significado, constatou-se que pacientes que se encontram em tratamento há mais
tempo apresentam maior desejo de decidir sobre seu processo de morrer; e pacientes
mais jovens são menos propensos à sua preparação. No entanto, as decisões dos
familiares, médicos, pacientes e de pacientes juntamente com seus médicos, são bem
aceitas por ambos os grupos pesquisados. Desse modo, a partir dessa pesquisa, a
153
implantação do TV, no Brasil, parece ser bem acolhida, tanto por pacientes oncológicos
como pelos seus acompanhantes.5
Assim, partindo desse estudo e da crença de que muitos são os entraves e
dilemas relacionados ao exercício da autonomia pelo paciente, existe a necessidade de
fomentar a discussão acerca do TV no Brasil, de modo a contribuir para que os
pacientes tenham respeitadas suas vontades, e para que os profissionais que trabalham
com pacientes terminais tenham respaldadas suas atuações, já que as ações em situações
de terminalidade são, por diversos momentos, permeadas por conflitos éticos. As DAV
são uma via de determinar não apenas o tipo, mas também a intensidade do tratamento
médico que a pessoa pensa querer.6
Considerando a relevância do tema na atualidade, e a possibilidade de o paciente
previamente decidir e registrar como deseja ser cuidado no fim de vida, auxiliando os
profissionais de saúde, bem como os familiares a tomarem decisões, além da
necessidade de empenhar esforços para que se tenham orientações melhor definidas
sobre o TV, delineou-se como questão de pesquisa: Quais as orientações apresentadas
nas legislações de diferentes países sobre o TV e DAV? Assim, objetiva-se neste estudo
conhecer as legislações referentes às DAV e TV em diferentes países, estabelecendo um
paralelo com a vigente no Brasil.
METODOLOGIA
Trata-se de uma pesquisa que adota procedimentos da análise documental, como
um delineamento que permite explanar e esclarecer a questão/problema em
concordância com o objetivo do pesquisador. Um documento é um importante meio de
acesso para a compreensão do contexto social, dos conceitos e para o favorecimento de
uma observação de um passado recente, além de favorecer a observação do processo de
maturação ou de evolução dos indivíduos, grupos, conceitos, conhecimentos,
comportamentos, mentalidades e práticas.7
Na análise documental, primeiramente, é necessário localizar os documentos
pertinentes e avaliar sua credibilidade; desse modo, essa etapa consistiu na localização
das legislações referentes ao TV de diferentes países.7 Recorreu-se ao site especializado
em divulgar o TV no Brasil que disponibiliza as legislações. Após a primeira seleção
realizada no período de setembro a outubro de 2013 e de posse das legislações, optou-se
pela confirmação dos documentos nos endereços referenciados no site dos seguintes
países: EUA, Espanha, Portugal, Argentina, Uruguai, Bélgica, Holanda, Inglaterra,
México, União Européia e Brasil.8
154
Os documentos estrangeiros foram selecionados de acordo com os seguintes
critérios: pertinência do conteúdo ao objetivo do estudo; confiabilidade, por se tratarem
de documentos oficiais elaborados pelos governos; documentos nos idiomas: inglês,
espanhol e português. Os arquivos públicos onde constam os documentos
governamentais, os do estado civil, bem como documentos de natureza notarial ou
jurídica, constituem documentos públicos passíveis de serem pesquisados mediante
análise documental.7 Desse modo, foram desconsiderados, em virtude do idioma, as
legislações da Áustria, França, Alemanha e Hungria, bem como as legislações da
Holanda, Porto Rico e União Européia que não foram localizadas. No Brasil, em virtude
da ausência de legislação sobre TV, recorreu-se, a fim de subsidiar justificativas à
sustentação da prática das DAV, à Constituição Federal9, ao Código Civil10, ao Código
de Ética Médica (CEM)11 e à Resolução 1.995/12.3
Assim, a partir destes documentos foi realizada a análise documental preliminar
de acordo com as cinco dimensões: análise do contexto, autores, autenticidade e
confiabilidade do texto, natureza do texto, conceitos-chave e lógica interna do texto.7
Com relação ao contexto do TV ocorreu, incipientemente nos EUA, em 1967, pela
Sociedade Americana para a Eutanásia, como um documento de cuidados antecipados,
em que o indivíduo poderia deixar registrados seus interesses referentes a interrupções
de tratamento médicos que mantivessem sua vida em situações de terminalidade, além
de contribuir sobre a possibilidade de amenizar conflitos entre profissionais, pacientes
terminais e familiares relacionados às decisões dos tratamentos a que o paciente em
estado de terminalidade deveria ser submetido.12
Partindo do exposto, casos como de Karen Ann Quinlan, Terri Schiavo e Nancy
Cruzan, que permaneceram em estado vegetativo persistente, cujos representantes
solicitaram a retirada dos suportes que prolongavam suas vidas, impuseram valor
decisivo para a criação de lei acerca do tema nos EUA, em 1990, despertando a
necessidade de legislação em outros países.1 No Brasil, após longos anos de discussão,
em 2012, foi aprovada Resolução sobre as DAV pelo CFM.3
No que se refere à autenticidade e confiabilidade do material analisado, os
documentos constituem-se em legislações, ou seja, são documentos jurídicos autênticos
e confiáveis, analisados na íntegra, apresentando instruções referentes à implementação
das DAV e TV nos países. Os documentos analisados ilustram exclusivamente o direito
dos pacientes exercerem sua autonomia diante de uma situação de terminalidade, a
partir das exposições referentes aos procedimentos adotados para organizar um TV. As
155
legislações, e a única resolução analisada, retratam de maneiras bastante similares as
ações diante do TV, não se perdendo no sentido amplo de garantir a dignidade e
autonomia pessoal para o paciente incapaz.
Em seguida, na última etapa, procedeu-se à análise dos documentos quanto a sua
lógica interna, recorrendo-se á análise de conteúdo13 pertinente à analise documental.7
A análise de conteúdo é um conjunto de técnicas de análise das comunicações verbal e
não-verbal que visa, por meio de procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição
do conteúdo das mensagens, obter indicadores, qualitativos ou não, que permitam a
inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção dessas
mensagens. 13
Assim, procedeu-se a pré-análise, a exploração do material e o tratamento dos
resultados.13A pré-análise constituiu a fase de organização dos dados e compreendeu: a
leitura na íntegra respeitando as normas de validade que se referem a: exaustividade;
representatividade; homogeneidade e pertinência. A fim de organizar o material à
análise e a realização da leitura flutuante, foram extraídos dos textos informações
referentes ao país, ano, o que estabelece a legislação, direitos dos pacientes e a dinâmica
de aplicabilidade das DAV.
Na exploração do material que consistiu na operação de codificação utilizou-se
do recorte do texto, o tema, como unidade de registro que originaram as categorias
reunindo um grupo de elementos, sob um título genérico, em razão dos caracteres
comuns.13 E por fim, a última etapa da análise de conteúdo se propôs à inferência nas
interpretações previstas em torno de dimensões teóricas sugeridas pela leitura do
material e foi utilizado referencial da
bioética, e a legislação brasileira, o que
possibilitou refletir sobre as legislações.
Complementa-se, ainda, que esta pesquisa se isenta do Termo de Consentimento
Livre e Esclarecido (TCLE) por seu caráter documental. Como os documentos
analisados nesta pesquisa foram extraídos de sites governamentais e departamentais de
domínio público, os aspectos éticos foram respeitados, considerando que as informações
expostas traduzem o que tratam as legislações encontradas.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Na atualidade, as discussões referentes ao TV e DAV tornam-se relevantes em
virtude de possibilitar aos pacientes o exercício da autonomia, e aos profissionais da
saúde e familiares informações sobre os desejos em situações difíceis, isentando-os da
responsabilidade em decidir sobre condutas que, talvez, fossem repudiadas pelos
156
pacientes. Assim, o quadro 1 ilustra os países, legislações, ano de sua criação e o que
tratam as leis que foram consideradas nessa pesquisa, a fim de propiciar uma discussão
paralelamente ao instituído no Brasil.
Quadro 1. Legislações sobre diretivas antecipadas e testamento vital em diferentes
países
País
Ano
Legislação
Sobre o que estabelece
14
EUA
1991 Patient
Self Direito do paciente à autodeterminação e a
Determination Act fazer uma diretiva antecipada, em suas duas
of 1990
modalidades: testamento vital e mandato
duradouro
15
Espanha
2002 Lei 41/2002 de 14 Direitos e obrigações de pacientes, usuários e
de novembro
profissionais, bem como de escolas e serviços
de saúde, públicos e privados, sobre a
autonomia do paciente, informações clínicas e
documentação.
16
Bélgica
2002 Lei de 22 de Lei sobre os Direitos dos Pacientes Belga
Agosto de 2002
1
Inglaterra 2005 Lei da Capacidade
LEI DA CAPACIDADE MENTAL
7
Mental de 2005
México18
2008 Lei 247/2008 de 7 Lei da Vontade antecipada para o Distrito
de Janeiro
Federal
19
Uruguai
2009 Lei 18.473/09 de Vontade antecipada
03 de abril
2
Argentina 2009 Lei 26.742/12 de Estabelece os Direitos do paciente e sua relação
0
2012 24
de
maio com os profissionais e instituições de saúde
modificação da Lei
26.529/2009 de 21
de outubro
Portugal21 2012 Lei 25/2012 de 16 Regula as DAV, designadamente sob a forma
de junho
de TV, e a nomeação de procurador de
cuidados de saúde, criando o Registro Nacional
do Testamento Vital (Rentev)
Brasil3
2012 Resolução 1995/12 Dispõe sobre as DAV dos pacientes
CFM de 31 de
agosto
Há de se destacar que existe uma proliferação vocabular dos termos referentes as
DAV e o TV, distinta nos diferentes países pesquisados. A declaração antecipada de
vontade é designada nos EUA por “living testament” ou “advance directive”; na
Bélgica16, por “testament biologique”; na Espanha15, “Instrucciones previas”; no
Uruguai19 e México18, “Voluntad anticipada”; em Portugal21 e no Brasil3, “Diretivas
antecipadas de vontade” e, na Argentina20, “Directivas anticipadas”.
Ao realizar a leitura e análise dos conteúdos das legislações dos diferentes
países, foi possível perceber similaridades de orientações das condutas na aplicação das
157
diretivas antecipada, emergindo e constituindo-se duas categorias: diretivas antecipadas;
e o direito ao respeito da autonomia do paciente.
Diretivas antecipadas
As DAV, encontradas no cenário mundial há anos, foram introduzidas
recentemente no cenário nacional. A Resolução 1.995/2012 norteia a conduta médica
em situações de terminalidade, garantindo a autonomia do paciente e a manutenção da
dignidade humana.3 De acordo com a resolução, as DAV constituem-se em um conjunto
de desejos, prévia e expressamente manifestados pelo paciente, que serão considerados,
sobre cuidados e tratamentos que quer, ou não, receber no momento em que estiver
incapacitado de expressar, livre e autonomamente, sua vontade. Além disso, a resolução
no Brasil cogita, a possibilidade do paciente designar um procurador para que as
vontades do paciente sejam respeitadas quando esse não puder mais manifestá-la.3
Nos EUA, primeiro país a apresentar uma legislação sobre a temática, a diretiva
antecipada é uma instrução escrita, como um testamento em vida ou mandato duradouro
do advogado para a saúde, reconhecida pela legislação do Estado e relativo à prestação
de tais cuidados quando o indivíduo está incapacitadoe devem ser documentadas no
prontuário do indivíduo; além disso, os funcionários e a comunidade devem ser
esclarecidos sobre questões relacionadas com as diretivas antecipadas.14
A Espanha, primeiro país europeu a legislar sobre as diretivas antecipadas, trata,
em linhas gerais, que devem conter orientações à equipe médica sobre o desejo de que
não se prolongue artificialmente a vida, a não utilização dos tratamentos
extraordinários, a suspensão do esforço terapêutico e a utilização de medicamentos para
diminuir a dor, entre outras15. Complementa-se, ainda, que as diretivas antecipadas
podem ser revogadas a qualquer momento independentemente do paciente deixar um
registro escrito. Com efeito, a fim de garantir a eficácia das instruções manifestadas
pelos pacientes, na Espanha, foi criado no Ministério da Saúde um Registro Nacional de
instruções a fim de que os pacientes sejam atendidos, de acordo com regras
estabelecidas por acordo regulamentado pelo Conselho Interterritorial de Saúde.15
Na Argentina, em 2009, foi promulgada uma lei que reconhecia o direito de o
paciente dispor sobre suas vontades por meio de diretivas antecipadas; todavia, a lei não
mencionava detalhes sobre o tema. Dessa maneira, em 2012, essa legislação foi
alterada, abordando a temática de maneira direcionada. A legislação na Argentina
determinando que as diretivas antecipadas podem ser realizadas por qualquer pessoa
adulta capaz, podendo consentir ou recusar determinados tratamentos médicos,
158
preventivos ou paliativos, bem como as decisões que envolvem sua saúde. As diretivas
devem ser aceitas pelo médico assistente, exceto as que envolvem o desenvolvimento de
práticas de eutanásia, que serão consideradas como não-existentes. A declaração será
feita, por escrito, podendo ser revogada a qualquer momento.20
No Brasil, a resolução das diretivas prevê que o médico registrará, no prontuário,
as DAV que lhes foram diretamente comunicadas pelo paciente. Não sendo conhecidas
as orientações prévias, nem havendo representante designado, familiares disponíveis ou
consenso entre esses, o médico recorrerá ao Comitê de Bioética da instituição, caso
exista, ou, na sua falta, à Comissão de Ética Médica do hospital ou ao Conselho
Regional e Federal de Medicina para fundamentar sua decisão sobre conflitos éticos,
quando entender essa medida necessária e conveniente.3
Em Portugal, a discussão começou em 2006, com a apresentação do projeto de
lei de autoria da Associação Portuguesa de Bioética. Entretanto, apenas em julho de
2012 foi promulgada a lei que regulamenta as DAV, designadamente sob a forma de
TV, com a nomeação de procurador de cuidados de saúde. Ainda, foi criado o Registro
Nacional do Testamento Vital (RENTEV) que tem por finalidade registrar, organizar e
manter atualizada, quanto aos cidadãos nacionais, estrangeiros e apátridas residentes em
Portugal, a informação e documentação relativas ao documento de DAV e à procuração
de cuidados de saúde.21
Em Portugal as diretivas antecipadas são eficazes por cinco anos e representam
um documento unilateral e livremente revogável e modificável a qualquer momento, no
qual uma pessoa maior de idade e capaz, que não se encontre interdita ou inabilitada por
anomalia psíquica, manifesta antecipadamente a sua vontade consciente, livre e
esclarecida, no que concerne aos cuidados de saúde que deseja receber, ou não deseja
receber, no caso de, por qualquer razão, se encontrar incapaz de expressar a sua vontade
pessoal e autonomamente.21 Já no Brasil, não consta a delimitação de tempo,
entendendo-se que uma vez realizada, se não for suspensa pelo indivíduo, ela valerá por
tempo indeterminado.3
No Uruguai, a legislação prevê o direito de expressar as suas vontades no
sentido de se opor à futura aplicação de tratamentos e procedimentos médicos para
prolongar a vida em detrimento da sua qualidade, caso se encontre em situação de
doença terminal, incurável e irreversível. O diagnóstico de estado terminal de uma
doença incurável e irreversível deverá ser certificado pelo médico assistente e
confirmado por um segundo médico no histórico médico do paciente.19 Além disso, a
159
diretiva antecipada pode ser revogada oralmente ou por escrito, a qualquer momento e,
em todos os casos, o médico deverá registrar essa manifestação no prontuário médico. O
documento deve sempre incluir a nomeação de uma pessoa como representante, maior
de idade, para assegurar o cumprimento dessa vontade, no caso em que o titular se torne
incapaz de tomar decisões por si mesmo.19
Caso o paciente em fase terminal de uma doença incurável e irreversível não
tenha expressado sua vontade e se encontre incapaz de expressá-la, a suspensão dos
tratamentos ou procedimentos será uma decisão do cônjuge ou companheiro de direito
comum ou, na sua falta, de familiar em seu primeiro grau de consanguinidade.19 Assim,
os serviços de saúde públicos e privados devem garantir o cumprimento da diretiva
antecipada do paciente, incorporando-a em seu histórico médico; fornecer programas
educacionais para funcionários e usuários sobre os direitos dos pacientes prescritos na
presente lei, cabendo ao Ministério da Saúde implementar uma ampla distribuição do
processo educacional.19
Na Inglaterra, a Lei da capacidade mental inclui, em um dos seus capítulos, as
decisões relativas às diretivas antecipadas que devem ser realizadas por uma pessoa com
capacidade de consentir com a realização ou continuação do tratamento, podendo retirar
ou alterar a decisão a qualquer momento, enquanto capaz de fazê-lo.17
No México, a lei das diretivas antecipadas é de ordem pública e interesse social.
Possibilita a recusa de submeter-se a meios, tratamentos e / ou procedimentos médicos
que pretendam prolongar desnecessariamente a vida, protegendo a dignidade humana
quando for impossível manter a vida naturalmente. A aplicação das disposições da
presente lei é relativa à ortotanásia, não permitindo abreviar a vida intencionalmente.18
Nessa perspectiva, no Brasil, as diretivas antecipadas, na prática, significam a
realização da ortotanásia que é reconhecida como lícita no Brasil pelo CFM 22 e pela
sentença do processo judicial de número 2007.34.00.014.809-3, ou seja, permite que o
paciente morra naturalmente, pois não existem mais artifícios oriundos da medicina que
possam reverter o quadro; em síntese, nada pode ser feito com o intuito de curá-lo.23
É conveniente destacar que as legislações pesquisadas apresentam nas suas
estruturas menções sobre: o direito à objeção de consciência pelos profissionais da
saúde; a isenção de discriminação no acesso a cuidados de saúde em virtude de ter ou
não um documento de DAV. Ainda, todas as legislações mencionam a possibilidade de
nomear um representante para agir diante das decisões quando os indivíduos tornam-se
incapazes.
160
Direcionando o olhar para o previsto no Brasil, nota-se que a Resolução do
CFM3 também menciona que o médico, caso a declaração prévia de vontade do paciente
terminal vá de encontro aos ditames de sua consciência, poderá recusar-se a
implementá-la, desde que haja outro médico de prontidão, apto e disposto a assumir seu
lugar. Contudo, de maneira alguma, o médico poderá agir de acordo, unicamente, com
sua consciência, prevalecendo a vontade manifestada pelo paciente sobre a do médico.
Direito ao respeito da autonomia do paciente
O direito do paciente em decidir sobre as pretensões futuras dos tratamentos que
deseja ou não ser submetido em situações de incapacidades, é assegurado em todas as
legislações pesquisadas. As diretivas antecipadas tornou-se lei federal em 1991 nos
EUA com a publicação do PatientSelf-Determination Act (PSDA) e prevê o direito do
paciente de participar das decisões que envolvem os cuidados relacionados à sua saúde
e, determina que os prestadores de serviços mantenham políticas e procedimentos para
prestar informações por escrito a cada um dos indivíduos sobre: seus direitos de decidir
sobre a assistência médica, incluindo o direito de aceitar ou recusar tratamento médico
ou cirúrgico e de formular diretivas antecipadas.14 Desse modo, às DAV situam-se no
âmbito da autonomia do paciente, além de ser considerada como uma das principais
motivações dos pacientes para completá-las se refere ao fato de assegurar sua
autonomiae afirmá-la, sobretudo, à eventual obstinação terapêutica.24
A palavra autonomia significa o “autogoverno, direitos de liberdade,
privacidade, escolha individual, liberdade da vontade, ser o motor do próprio
comportamento e pertencer a si mesmo”.25:137 Respeitar o paciente autônomo é, no
mínimo, reconhecer seu direito de ter suas opiniões, fazer suas escolhas e agir com base
em seus valores e crenças pessoais. Neste sentido, o avanço da autonomia humana, nas
últimas décadas, conferiu ao paciente o direito a ser informado, fazer a escolha do
tratamento, dentre os disponíveis, e consentir ou recusar um procedimento ou
terapêutica proposta.5 Assim, o respeito à autonomia do paciente leva em consideração a
maneira própria de o paciente apreender o mundo, de fazer suas escolhas
fundamentadas em valores próprios, agindo de acordo com seus princípios, suas crenças
e sua visão do mundo. Desse modo, os profissionais da saúde devem caminhar lado a
lado com o paciente, ajudando-o em suas decisões, nunca julgando ou decidindo por
ele.27
No Brasil, a vontade do paciente é soberana, pois o CEM11 estabelece que é
vedado ao profissional deixar de garantir ao paciente o exercício do seu direito
161
dedecidir livremente sobre sua pessoa ou seu bem-estar, bem como de exercer sua
autoridade para limitá-lo. Além do direito do paciente ou de seu representantelegal de
decidir sobre a execução de práticas diagnósticasou terapêuticas, salvo em caso de
iminente risco de morte. Dessa maneira, de acordo com a Resolução 1.995/12, o médico
responsável pelo tratamento, ciente da vontade declarada do paciente, deverá registrá-la
no prontuário, para que se possa valer da vontade manifestada previamente.3 Com
efeito, os profissionais médicos deverão cumprir as normativas das resoluções,
conforme estabelece o CEM, determinando que é vedado desobedecer aos acórdãos e às
resoluções dos Conselhos Federal e Regionais de Medicina ou desrespeitá-los, ficando
assim sujeitos às penalidades previstas em lei.11
Na Bélgica, o paciente não tem apenas direito, mas também a responsabilidade
de cooperar com o profissional de saúde, que a partir dessa relação entre o paciente e os
profissionais da saúde seja propiciada a melhora da qualidade de saúde, resumindo os
direitos básicos e as ressalvas para manter os registros de saúde e o acesso a esses
registros. É também possível determinar a pessoa (as pessoas) que pode (m) representar
os pacientes incapazes de exercer seus próprios direitos. Os serviços são prestados
respeitando a dignidade da pessoa humana e da autonomia do paciente, além que o
paciente tem o direito de dar seu consentimento informado, prévio e voluntário, para
qualquer intervenção do profissional de saúde. Se o paciente não quiser receber a
informação, o profissional de saúde deve respeitar o seu desejo, notificando nos
registros de saúde.16
Na Espanha, a dignidade da pessoa humana, o respeito pela autonomia da sua
vontade e sua privacidade servem como orientador de todas as atividades. O paciente
decide livremente depois de receber a informação adequada, em uma linguagem
compreensível e acessível às suas necessidades e a ser ajudado a tomar decisões de
acordo com sua própria vontade, entre as opções clínicas disponíveis. Qualquer
profissional envolvido na atividade de cuidado necessita não só realizar a prestação
adequada de procedimentos, mas a execução dos deveres de informação e de
documentação clínica, além de respeitar as decisões livres e voluntárias do paciente.15
Entretanto, há também o direito ao respeito de não serem informados. Ou seja, o direito
à informação sobre a saúde dos pacientes pode ser limitado pela existência de um estado
de necessidade terapêutica, ou seja, quando o conhecimento da sua situação o possa
prejudicar a sua saúde. Nesse caso, o médico irá gravar as circunstâncias e comunicará a
sua decisão às pessoas relacionadas com o paciente, familiares ou de fato.15 No Uruguai,
162
qualquer pessoa maior de idade e mentalmente capaz, numa base voluntária, consciente
e livre, tem o direito de se opor à aplicação de tratamentos e procedimentos médicos, a
menos que isso afete ou possa afetar a saúde de outros.19
Na Argentina, deve ser assegurado que o paciente, na medida de suas
possibilidades, participe na tomada de decisões ao longo do seu processo de saúde e a
legislação enfatiza o direito à liberdade de escolha, ou seja, o paciente tem o direito de
aceitar ou rejeitar determinadas terapias ou processos médicos ou biológicos, com ou
sem justa causa, bem como revogar posteriormente a sua manifestação de vontade. A
atuação profissional deve respeitar a decisão do paciente e deve proceder os registros.20
O paciente terminal seguramente informado tem o direito de expressar sua vontade
quanto à rejeição de procedimentos cirúrgicos, reanimação artificial ou retirada de
suporte de vida, quando são extraordinários ou desproporcionais em relação à
perspectiva de melhoria, ou quando produzem sofrimento excessivo. Pode também
recusar procedimentos alimentares e hidratação quando ocorrem como o único efeito do
prolongamento do tempo da fase final.20
No que se refere às restrições de hidratação e alimentação artificiais, muitos
caracterizam essa decisão como eutanásia, prática proibida pelo ordenamento jurídico
brasileiro.1 Nesse sentido, a suspensão tem um significado predominantemente
simbólico, ou seja, familiares e profissionais, muitas vezes, diante da suspensão desses
recursos vitais sofre por achar que e o paciente morreu de fome e sede. Embora estudos
comprovem que, em determinados quadros clínicos, o paciente não absorve de forma
satisfatória a hidratação e a nutrição.26
Embora não se disponha legislação brasileira explícita sobre TV no Brasil,
existem além do amparo da Resolução 1.995/123, menções na Constituição Brasileira9
sobre os princípios constitucionais da Dignidade da Pessoa Humana (art. 1, III), da
Autonomia Privada (princípio implícito no art. 5o) e a proibição constitucional de
tratamento desumano (art. 5o, III) que implicam na afirmação de que se reconhece a
manutenção da dignidade humana, da autonomia do ser humano, além do direito a não
ser submetido a um tratamento que não deseja que seja realizado. Assim, as decisões
profissionais médicas, respeitando seus ditames de consciência e as previsões legais,
aceitarão as escolhas de seus pacientes, relativas aos procedimentos diagnósticos e
terapêuticos por eles expressos, desde que adequadas ao caso e cientificamente
reconhecidas.11
163
Partindo do exposto, confirma-se a necessidade de respeitar a autonomia do
paciente, quando na Resolução 1.995/12 está exposto que as DAV do paciente
prevalecerão sobre qualquer outro parecer não médico, inclusive sobre os desejos dos
familiares. Entretanto, o médico deixará de considerar as DAV do paciente ou de seu
representante que, em sua análise, estiverem em desacordo com os preceitos ditados
pelo CEM.3 Além disso, é vedado ao médico deixar de obter consentimento do paciente
ou de seu representante legal, após esclarecê-lo sobre o procedimento a ser realizado,
exceto em caso de risco iminente de morte.
Entretanto, corroborando com o previsto na legislação da Espanha, o CEM, no
Brasil, prevê que é permitido deixar de informar ao paciente o diagnóstico, o
prognóstico, os riscos e os objetivos do tratamento, salvo quando a comunicação direta
possa lhe provocar dano, devendo, nesse caso, ser realizada a comunicação a seu
representante legal.11
Com base na ideia que as diretivas antecipadas no Brasil possibilitam ao
indivíduo dispor sobre sua aceitação ou recusa de tratamentos extraordinários, em caso
de terminalidade da vida, o direito fundamental à liberdade previsto na Constituição
Federal confirma o direito de autonomia do paciente.9 Dessa maneira, a declaração
prévia de vontade do paciente terminal corresponderia à possibilidade do exercício do
direito fundamental à liberdade de forma genuína, uma vez que esse documento nada
mais é do que um espaço que o indivíduo tem para tomar decisões pessoais que são – e
devem continuar a ser – imunes a interferências externas, sejam elas dos médicos, das
famílias, ou de qualquer pessoa e/ou instituição que pretenda impor sua própria
vontade.1
Complementa-se, ainda, que, além da Constituição Federal, o Código Civil
prescreve que ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a
tratamento médico ou intervenção cirúrgica.10 Assim, a DAV do paciente terminal é
instrumento garantidor desse dispositivo legal, uma vez que evita o constrangimento do
paciente ser submetido a tratamentos médicos fúteis, que apenas potencializam o risco
de vida, já que os procedimentos médico-hospitalares sempre representam risco.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A aceitação da morte não é uma tarefa fácil; falar sobre a própria morte estando
saudável é diferente da situação de receber o diagnóstico de que possui apenas alguns
meses de vida. Nesse sentido, se a morte é inevitável, tratá-la como um processo
irreversível auxiliaria a inclusão do morrer bem, já que muitas vezes a morte acontece
164
em situações desumanas. Os novos recursos tecnológicos permitem a adoção de
medidas desproporcionais que podem prolongar o sofrimento do doente terminal, sem
lhe trazer benefícios; e essas medidas podem ter sido antecipadamente por ele
rejeitadas. Assim, os casos de recusa ou rejeição dos procedimentos significam a
interrupção de medidas e ações para o adequado controle e alívio do sofrimento do
paciente.
Conhecer as legislações vigentes em diferentes países corrobora com a discussão
que é imprescindível aderir a essa ferramenta, no sentido de evitar que pessoas que
podem atualmente nem pensar sobre o assunto, futuramente, poderão vir a sofrer
desnecessariamente por não terem deixado decididas suas vontades. Contribui, ainda,
para subsidiar discussões, no Brasil, para que não somente os médicos, que detêm a
prerrogativa do diagnóstico, mas, também, os profissionais da saúde que atuam direta e
intensivamente com os pacientes considerados terminais, possam atuar considerando os
desejos dos pacientes assistidos.
As recomendações propostas na Resolução sobre as diretivas, no Brasil, parecem
generalizáveis sem deter-se em detalhes operacionais de conduta como ocorre nas
legislações dos outros países. Daí fala-se sobre a necessidade da legalização da prática,
a fim de desvincular de ações que poderão se tornar ilegal, em virtude do deficiente
amparo que a Resolução brasileira prevê. Indubitavelmente que é um grande avanço, e
além da resolução atual, é possível considerar que já existem outras determinações,
como a constitucional, a civil, entre outras; no entanto, é preciso deter-se na sua
operacionalização, a fim de proteger os profissionais, familiares e, principalmente, o
paciente para que tenha sua vontade atendida quando não for mais capaz de participar
ativamente das decisões que envolvem sua vida.
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http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010407072013000300009&lng=pt.
167
ANEXO II
DIRETIVAS ANTECIPADAS DE VONTADE AOS DOENTES TERMINAIS:
REVISÃO INTEGRATIVA
ANTICIPATED DIRECTIVES WILL TO THE TERMINAL PATIENTS:
INTEGRATIVE REVIEW
DIRECTIVAS PREVIAS A LOS PACIENTES TERMINALES: REVISIÓN
INTEGRADORA
RESUMO: Objetivo: Caracterizar a produção científica nacional e internacional sobre
as diretivas antecipadas de vontade aplicadas ao doente terminal. Método: A revisão
integrativa foi o método utilizado, considerando os artigos publicados no Portal Capes,
SCIELO, LILACS, MEDLINE, Revista de Bioética e Bioethikos, a partir dos
descritores: Diretivas antecipadas, Testamentos quanto à vida, Advance Directives,
Living Will e Terminally Ill totalizando 44 artigos submetidos à análise de conteúdo.
Resultados: Emergiram três categorias: Estudantes e profissionais frente às diretivas
antecipadas de vontade: percepções, opiniões e condutas; Receptividade dos pacientes
às diretivas antecipadas de vontade; A família diante das diretivas antecipadas de
vontade. Considerações finais: Evidenciou-se a relevância do tema como garantidor do
respeito à dignidade e à autonomia do doente, bem como para a redução dos conflitos
éticos enfrentados pelos familiares e profissionais da saúde frente aos cuidados em final
de vida.
Descritores: Diretivas Antecipadas; Doente Terminal; Testamentos quanto à vida;
Autonomia Pessoal.
ABSTRACT: Objective: characterizing the national and international scientific
literature about the antecipated directives will applied to the terminally ill patient.
Method: the integrative review was the method used, considering the articles published
in Portal Capes, SciELO, LILACS, MEDLINE, Journal of Bioethics and Bioethikos,
with the descriptors: Advanced directives, Wills regarding life and Advance Directives,
Living Will and Terminally Ill, totaling 44 articles submitted to content analysis.
Results: three categories emerged: Students and professionals facing the advance
directives of will: perceptions, opinions and practices; Receptivity of patients to
advanced directives of will; The family facing the advance directives of will. Final
Thoughts: it became evident the relevance of the topic as guarantor of respect for the
dignity and autonomy of the patient, as well as to reduce ethical conflicts faced by
168
families
and
health
professionals
facing
care
at
the
end
of
life.
Descriptors: Advance Directives; Terminally Ill; Living Wills; Personal Autonomy.
RESUMEN: Objetivo: caracterizar la literatura científica nacional e internacional
acerca de las directivas anticipadas de voluntad aplicadas a los enfermos terminales.
Método: la revisión integradora fue el método utilizado, teniendo en cuenta los artículos
publicados en el Portal Capes, SciELO, LILACS, MEDLINE, Revista de Bioética y
Bioethikos, con los descriptores: Directivas anticipadas, Testamentos en cuanto a la
vida y Advance Directives, Living Will e Terminally Ill con 44 artículos sometidos al
análisis de contenido. Resultados: surgieron tres categorías: Estudiantes y profesionales
frente a las directivas anticipadas de voluntad: percepciones, opiniones y conductas; La
receptividad de los pacientes a las directivas anticipadas de voluntad; La familia frente a
las directivas anticipadas de voluntad. Consideraciones finales: era evidente la
importancia del tema como garante del respeto de la dignidad y la autonomía del
paciente, así como para reducir los conflictos éticos que enfrentan las familias y los
profesionales de la salud frente a la atención al final de la vida.Descriptores: Directivas
Anticipadas; Enfermo Terminal; Voluntad em Vida; Autonomía Personal.
INTRODUÇÃO
A capacidade de curar as mais diversas enfermidades elevou a expectativa de
vida da população, em virtude da disponibilidade de recursos que permitem a
reversibilidade de doenças antes consideradas incuráveis, como o câncer, incidindo com
o prolongamento do tempo de vida. Entretanto, aumentou a busca pelos serviços de
saúde a fim de obter a cura, mesmo quando os recursos disponíveis são ineficazes e as
possibilidades curativas já não são mais possíveis(1), repercutindo no prolongamento do
sofrimento humano, no desrespeito à dignidade humana e à autonomia do paciente em
tomada de decisões sobre a vida, especialmente na fase terminal.
O respeito à autonomia(2) implica em conhecer o direito de ter opiniões, fazer as
escolhas e agir com base em valores e crenças pessoais. Já desrespeitar a autonomia de
um indivíduo significa tratá-lo como um meio, de acordo com os objetivos dos outros;
essa atitude constitui-se em uma violação moral, pois os indivíduos autônomos são fins
em si mesmos, capazes de determinar o próprio destino.
Ao considerar esses aspectos, surgem as Diretivas Antecipadas de Vontade
(DAV),que têm recebido diferenciadas denominações, entre elas: testamento biológico,
testamento vital, diretrizes antecipadas de tratamento, declaração antecipada de vontade,
declaração antecipada de tratamento, declaração prévia de vontade do paciente terminal.
169
Algumas dessas expressões são transpostas ou traduzem termos já utilizados em
legislações ou contextos estrangeiros, como é o caso de living wille advance directives
nos Estados Unidos da América (EUA), testamento biológico, na Itália, vontades
antecipadas, na Espanha(3).
Em termos conceituais, as DAV possuem duas espécies: o testamento vital
(também denominado declaração prévia de vontade do paciente terminal) e o mandato
duradouro. O testamento vital é um documento pelo qual uma pessoa capaz pode
registrar, de acordo com sua vontade, a quais tratamentos deseja, ou não, ser submetido
em caso de enfermidade incurável, visando a assegurar o seu direito de morrer com
dignidade, de acordo com suas concepções pessoais(4). O mandato duradouro refere-se à
nomeação de um ou mais procuradores, com conhecimento profundo do paciente, com
capacidade de identificar sua vontade(4,5) quando esse estiver incapacitado de manifestar
sua vontade. Esse documento será válido inclusive em situações de incapacidade
temporária, diferentemente do testamento vital, que só terá validade em situações de
terminalidade. Além disso, cabe salientar que poderá haver simultaneidade entre o
testamento vital e o mandato duradouro, apresentados como um único documento(4).
Partindo do exposto, embora exista uma adaptação conceitual clara das
terminologias descritas, por vezes, critica-se o uso do termo testamento vital –
comumente utilizado no Brasil – devido ao seu sentido de testamento como
instrumento, correspondendo a um ato unilateral de vontade, com eficácia apenas pósmorte(5,6).No Brasil, o termo utilizado aprovado recentemente pelo Conselho Federal de
Medicina (CFM), a partir da Resolução 1.995/12(7), é o das DAV entendidas como o
conjunto de desejos, manifestados previamente pelo paciente, sobre cuidados e
tratamentos que deseja, ou não, receber no momento em que estiver incapacitado de
expressar, livre e autonomamente, sua vontade. A Resolução efetivamente reconhece o
direito do paciente em recusar tratamentos fúteis, também conhecidos como
extraordinários, ou seja, aqueles tratamentos que visam apenas a prolongar sua vida
biológica, sem garantir sua qualidade(8).
Nesse sentido, ao garantir que a autonomia do paciente deve ser respeitada, a
Resolução desmistifica a cultura centrada no poder médico e no paternalismo do
profissional que reduz o indivíduo a um paciente que deve aguardar, resignada e
submissamente, que deliberações acerca de sua vida sejam tomadas por outros, sem que
ele possa se manifestar como quer ser tratado ou que tipo de práticas de intervenção está
disposto a aceitar(9). Desse modo,as DAV representam o exercício do direito à
170
liberdade, uma vez que é um espaço que o indivíduo tem para tomar decisões pessoais,
isentas de interferências, seja dos médicos, família ou de qualquer pessoa e/ou
instituição que pretenda impor sua própria vontade(10).
Assim, ao considerar a relevância do tema na assistência aos doentes terminais,
familiares e profissionais da saúde, especialmente da enfermagem, que auxiliarão na
resolução dos dilemas éticos oriundos das decisões que envolvem a assistência prestada
àqueles que não possuem perspectivas de cura, no cenário brasileiro, há uma inegável
contribuição de estudos internacionais que buscam disseminar publicações, em
particular na área da Saúde, Bioética e Direito, para entender essa temática. Com base
no exposto, a questão norteadora dessa revisão foi: Qual conhecimento está sendo
produzido no Brasil sobre as DAV e qual conhecimento está sendo aplicado aos doentes
terminais no âmbito internacional? Para tanto, teve-se como objetivo analisar a
produção científica sobre as diretivas antecipadas no Brasil e no âmbito internacional
aplicada ao doente terminal.
METODOLOGIA
Para o alcance dos objetivos desse estudo, optou-se pela revisão integrativa da
literatura, que possibilita reunir e sintetizar resultados de múltiplos estudos publicados
sobre delimitada temática de maneira sistemática e ordenada, contribuindo no
aprofundamento do tema investigado, orientada por seis etapas: estabelecimento do
tema e questão de pesquisa; definição dos critérios de inclusão e exclusão para a seleção
da amostra; categorização dos estudos; avaliação dos estudos incluídos; interpretação
dos resultados e apresentação da revisão(11).
A fim de identificar as publicações que comporiam a revisão integrativa deste
estudo, realizou-se uma pesquisa on-line, e as fontes bibliográficas foram a
BibliotecaVirtual em Saúde (BVS), utilizando as bases de dados: Literatura LatinoAmericana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS), Scientific ElectronicLibrary
Online (SciELO), Literature Analysis and RetrievalSystem on-line (MEDLINE)e
IBECS – Espanha; e no Portal de Periódicos da Capes. Na busca das produções no
Brasil sobre o tema, utilizou-se, também revistas específicas sobre bioética; incluindo as
Revistas de Bioética e Bioethikus, pois foram as que apresentaram artigos sobre a
temática das DAV e do testamento vital.
O levantamento dos dados foi realizado em novembro de 2014 de maneiras
distintas; primeiramente, utilizaram-se os descritores “testamentos quanto à vida” e
“diretivas antecipadas” contemplados nos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS) e o
171
termo “testamento vital”, a fim de recrutar artigos produzidos no Brasil. Em um
segundo momento, utilizou-se a combinação dos descritores advance directives
(diretivas antecipadas) andterminally ill (doente terminal) e living will (testamento vital)
and terminally ill , a fim de realizar a seleção de produções científicas em âmbito
internacional.
Após a busca das produções científicas, realizou-se uma primeira análise dos
artigos para verificar sua aproximação com os objetivos propostos. Assim, a fim de
realizar o seu refinamento, foram definidos os seguintes critérios de inclusão: artigos
científicos que explicitassem a trajetória metodológica adotada; redigidos em português,
inglês ou espanhol sem restrição ao ano de publicação e relacionar-se a doentes
terminais/fases finais de vida.Foram excluídos os artigos que contemplassem revisões
de literatura, editoriais e resumos de anais.
A obtenção dos estudos selecionados ocorreu mediante leitura criteriosa do título
e resumo pela primeira autora, constatando sua adequação à questão norteadora e aos
critérios de inclusão. Assim, para responder à questão norteadora, organizou-se um
instrumento para a coleta dos dados: ano de publicação, título do artigo, objetivo da
pesquisa, considerações metodológicas, principais resultados e conclusões. Por fim, os
artigos foram analisados na íntegra, e a produção dos resultados ocorreu de maneira
descritiva, mediante análise de conteúdo fundamentada no modelo de análise
temática(12). A partir de leituras flutuantes e, a seguir, aprofundadas, realizadas por um
pesquisador, identificaram-se as unidades de registro, permitindo a visualização dos
temas mais significativos em cada texto(12). Assim, as informações foram agrupadas por
semelhanças ou estranhamentos e organizadas em categorias temáticas.
RESULTADOS
Na busca dos artigos internacionais, utilizando a combinação dos descritores
advance directives e terminally ill, foram encontrados 226 artigos; desses, foram
excluídos 179 por não apresentarem concordância com os critérios estabelecidos e 21
por apresentarem-se repetidos nas diferentes bases utilizadas; de modo que foram
selecionados 26 artigos. Utilizando os descritores living wills e terminal ill, foram
encontrados 72 artigos; desses, 11 foram excluídos em virtude da repetição nas bases de
dados e 56 desconsiderados, o que resultou na análise de cinco artigos. Assim, nessa
busca de artigos internacionais, foram analisados 31 artigos.
Considerando os descritores “diretivas antecipadas”, “testamentos quanto à
vida” e o termo “testamento vital”, foram encontrados 85 artigos; desses, 58 foram
172
excluídos e 14 estavam repetidos. A busca combinada dos descritores com a utilização
do “doente terminal” foi realizada, contudo não foram encontradas produções nesse
sentido, possivelmente, em virtude da incipiência de estudos sobre a temática no país.
Assim, no cenário brasileiro, foram considerados 13 artigos à análise. Desse modo, a
amostra desta pesquisa está constituída por 44 artigos.
No panorama internacional, foram selecionados 31 artigos(13-43), identificando a
publicação de 06 artigos na década de 1990(13-18), 14 artigos na década de 2000(19-32) e
11 artigos na década de 2010(33-43). As pesquisas foram realizadas na Europa(22,2526,28,30,33-34,37,39,41-42)
, América
do Sul(40), América
do Norte(13-20,24,26,31,36;38) e
Ásia(21,32,35,43). O público alvo das pesquisas incluiu médicos(14-15,18,21,24-25,27,35,37,41,43),
enfermeiros(15,18,25,35-37,39), profissionais da saúde(33); estudantes universitários(37,42),
pacientes(13,16-17,19-20,25,28,30-32,36,40,43),
familiares
e
responsáveis
pelos
doentes
terminais(17,36,38,40,43) e o público em geral(22,34,43).
No cenário nacional, dos 13 artigos analisados, quatro tratam de pesquisas
envolvendo
seres
humanos(44-47),
realizadas
com
médicos(44-45),
oncologistas,
intensivistas e geriatras(47), estudantes de medicina, advogados e estudantes do
direito(44). Destaca-se que um desses estudos apresenta como propósito a organização de
um modelo brasileiro de diretivas antecipadas no Brasil, a partir de uma pesquisa
realizada em Minas Gerais (MG)(47). Os outros três estudos, realizados em Santa
Catarina (SC), visaram a discutir questões sobre o conhecimento e adesão das DAV no
Brasil(44-46). Os nove artigos nacionais restantes tratam questões da área do direito, em
termos de legalidade e praticidade, além da constitucionalidade e aplicabilidade no
cenário brasileiro(3,5-6,9-10,48-51 ). Com relação ao ano de publicação das produções
científicas no Brasil, um foi publicado em 2006(51) e o outro em 2009(50), duas pesquisas
em 2011(44-45), três em 2012(6,46,49) e seis em 2013(3,5,9-10,47,48).
A partir do resgate e análise da produção científica das DAV, emergiram três
categorias temáticas: Estudantes e profissionais frente às DAV: Percepções, opiniões e
condutas; Receptividade dos pacientes às DAV; A família diante das DAV,
apresentadas a seguir.
Estudantes e profissionais frente às Diretivas Antecipadas de Vontade: Percepções,
opiniões e condutas
No panorama internacional, as pesquisas realizadas commédicos, enfermeiros,
outros profissionais da saúde e universitários buscaram apresentar as percepções,
opiniões e condutas referentes ao uso das DAV aplicadas ao doente terminal. Nos
173
hospitais de Múrcia, na Espanha, em pesquisa com 607 profissionais médicos,
enfermeiros e graduandos, 63,3% destacaram a importância das preferências do paciente
sobre o tratamento e os procedimentos de suporte de vida em doentes terminais(37). Na
Coréia do Sul, a pesquisa com 303 médicos oncologistas demonstrou que 96,7%
concordaram com a necessidade de preenchimento das DAV(43).
No Canadá, 86% de 643 médicos mostraram-se favoráveis ao seu uso, entretanto
apenas 19% haviam discutido as DAV com mais de 10 pacientes e mais da metade disse
que não seguiu sempre as indicações contidas nas DAV(14). Em contrapartida, outras
pesquisas apontam que aproximadamente 90% dos médicos atenderiam às vontades
antecipadas do paciente no momento em que esse se encontre incapaz para participar da
decisão(52). No Japão, 55% dos 301 médicos aprovam o uso das DAV; no entanto, 34%
tiveram a oportunidade de discutir sobre o testamento vital com os pacientes e/ou
familiares, após receber esse testamento, mas não o fizeram, e 69% dos médicos não o
receberam(21). Na Pensilvânia, 282 médicos revelaram uma média de 6,2 discussões por
mês sobre as DAV, reconhecendo-se como competentes para discutir com os pacientes,
mas não conseguiam se envolver suficientemente a fim de efetivar tais discussões(24).
Em 1999, nos EUA, estudo para verificar opiniões de 11 enfermeiros e 10
médicos que cuidavam de pessoas no fim de sua vida revelou que os médicos nem
sempre transmitem claramente aos pacientes suas chances de sobrevivência ou nem
sempre entendem seus desejos. Além disso, a incerteza ética dominou a tomada de
decisão de médicos e enfermeiros, quando confrontados com a questão da possibilidade
de auxiliar na morte dos pacientes, mesmo diante de diretivas antecipadas(18).
Já em pesquisa na Alemanha com 100 médicos,39% deles nunca mencionaram
aos pacientes a possibilidade de escrever suas DAV para cuidados médicos(25). No
estudo que estimou e comparou a prevalência de discussões de tratamento e nomeação
de decisores substitutos aos pacientes em fim de vida, na Itália, Espanha, Bélgica e
Holanda, as discussões dos médicos e pacientes sobre as preferências de tratamento
relacionado ao final da vida tinham ocorrido com 10% de italianos, 7% dos espanhois,
25% dos belgas e 47% dos pacientes holandeses(41).
No Canadá, em pesquisa para conhecer a opinião de 643 médicos de quando
deveria ser oferecida a oportunidade de preencher as diretivas antecipadas, 96% dos
médicos apontaram pacientes com doenças terminais, 95% para pacientes com doenças
crônicas, 85% para pessoas com infecção por vírus da imunodeficiência humana, 77 %
para pessoas com mais de 65 anos de idade, 43% para todos adultos, 40% para pessoas
174
admitidas no hospital em cirurgias eletivas e 33% para pessoas admitidas em caráter de
emergência(14).
Na Alemanha, em investigação com médicos e enfermeiros acerca dos desejos
dos pacientes com câncer sobre tratamento no fim da vida, os médicos rejeitam a
proposta deiniciar de modo rotineiro a discussão sobre diretivas antecipadas com seus
pacientes, estando preparados para fazê-lo somente se considerassem ser apropriado,
como resultado de uma situação individual, além de preferirem delegar essa iniciativa
para outras pessoas, geralmente aos familiares do paciente(25). Como contraponto,
conversar sobre DAV está significativamente associado a mais anos de pós-graduação e
também a que discussões sobre a temática no trabalho são úteis para aprender sobre
cuidados em final de vida. Nessa direção, o propósito da qualificação profissional pode
ser o meio de aumentar a capacidade dos médicos para conversar com os pacientes(24).
Uma pesquisa realizada em onze estados americanos examinou os interesses de
415 pacientes cardíacos ambulatoriais sobre sua participação em planejamento prévio e
sua vontade de participar na educação sobre a diretiva antecipada, constatando
quediscussões iniciadas pelo médico ocorreram com 5% dos pacientes(19). Entretanto,
em outro estudo, os médicos haviam discutido o diagnóstico primário com 49% dos
italianos, 50% dos espanhóis, 60% dos belgas e 78% dos pacientes holandeses. Uma
minoria de pacientes de todos os países (10-31%), com exceção dos Países Baixos
(52%), ou tinham discutido preferências de tratamento ou nomeado um substituto
(41)
.
Neste sentido, estudos(13,17,22,28,42) têm demonstrado que a prática das DAV acontece de
maneira efetiva quando existe adequada comunicação entre os profissionais da saúde e o
paciente.
No Brasil, existem poucas pesquisas que abordam as DAV e percepções dos
profissionais da área da saúde diante dessa temática. Os estudos encontrados
contribuíram para o entendimento de questões profissionais ligadas à aplicação das
DAV, como o conhecimento dos sujeitos da área médica e do direito em relação às
DAV(44); o respeito às vontades antecipadas de um paciente pelos médicos quando os
pacientes estivessem incapacitados de se comunicar e se essa manifestação constituiu
um instrumento válido de inibição da distanásia(45); e, por fim, a possibilidade da
proposição de um modelo de DAV para o Brasil(47).
Em estudo realizado com um grupo de médicos, advogados, estudantes de
medicina e do Direito, totalizando 209 sujeitos, cerca de 29,2% dos entrevistados
denotaram conhecimento pleno do significado do testamento vital. Já 87,6% dos
175
entrevistados optariam pela ortotanásia diante de um paciente em fase terminal de vida,
ao não considerar a possibilidade de implementação do testamento vital. Entretanto,
diante da possibilidade de implementação, a opção pela ortotanásia decresceria para
35,9%, enquanto que a opção pelo estabelecido no testamento vital foi apontada por
60,8% dos entrevistados(44).
Do mesmo modo, outra pesquisa recente realizada com 100 médicos da atenção
básica, Unidade de Terapia Intensiva (UTI), emergência e outras especialidades,
constatou a conveniência do registro dos desejos do paciente por meio da declaração de
vontade antecipada e que os médicos a respeitariam, com pontuação de 7,68 a 8,26 em
uma escala de 0 a 10. Ainda, reconhecem essa declaração como um instrumento útil
para a tomada de decisões, com avaliação de 7,57. De fato, tais resultados, embora
bastante limitados do ponto de vista da amostra, sinalizam para uma aceitação das
vontades antecipadas do paciente por parte dos médicos da referida pesquisa(45).
Em investigação realizada com médicos, esses perceberam que a Resolução do
CFM 1.995/12 não regulamentou satisfatoriamente seu papel na elaboração das DAV,
evidenciando a necessidade de não serem passivos nesse processo, disponibilizando sua
ajuda e oferecendo informações ao paciente na elaboração do documento, de modo a
legitimar sua autonomia. É recomendado, inclusive, que o médico autorize o paciente a
mencioná-lo nas DAV, para que a equipe médica, se necessário, possa contatá-lo; essa
menção, no entanto, só pode ser realizada com expressa autorização do médico(47).
Receptividade dos pacientes às Diretivas Antecipadas de Vontade
As DAV podem ser ajustadas a qualquer momento, considerando que
circunstâncias, valores e opiniões podem ser modificados, devendo ser oferecidas
oportunidades regulares aos pacientes para atualizarem suas preferências(28,53). Elaborar
as DAV pensando no estado terminal é ser refém do acaso, em virtude da dificuldade
em definir o que é estar nessa situação. No entanto, o que se pretende é evitar que os
pacientes sejam mantidos vivos num estado atenuado e incapacitado(54).
Na Coréia do Sul, de 1242 pacientes com câncer e 1006 membros do público em
geral, 93% e 94,9%, respectivamente, concordam com a necessidade de preenchimento
das DAV(43). No Reino Unido, pesquisa realizada com 18 pacientes oncológicos
constatou que a experiência do paciente com câncer provocou mudanças na maneira
como via a vida, de modo que queriam viver mais no presente e não se alongar muito
sobre o futuro(28); ou seja, os doentes terminais são mais propensos a renunciar a
procedimentos invasivos do que a procedimentos menos invasivos(17), o que reforça a
176
necessidade do registro das DAV, para que suas vontades possam ser cumpridas e
respeitadas. Na Alemanha, em relação aos desejos de 100 pacientes com câncer, foi
evidenciada sua preferência por tratamento com antibióticos e analgésicos, desejando
infringir tratamentos, como de quimioterapia e diálise, significativamente de modo mais
frequente do que a equipe de enfermagem e médicos(25).
Em Genebra, 53 pacientes com câncer avançado que formularam suas DAV
tiveram as preferências de fim de vida respeitadas pelos cuidadores, aliando-se a que a
maioria dos pacientes morreu na mesma unidade onde estavam descritas suas
manifestações de vontade, e suas intenções não foram demasiado vagas, resultado de
discussão aprofundada com os cuidadores(30). Já na Colômbia, 14% dos pacientes, de
um total de 513, havia formalizado suas DAV sobre fim da vida e suas escolhas
estavam relacionadas à rejeição de medidas fúteis e obstinação terapêutica(40).
Os pacientes desejam que a família, amigos e médicos sejam honestos e,
efetivamente, discutam o processo da doença e as opções de tratamento(55); neste
sentido, cerca de 75% dos pacientes desejam que seus médicos iniciem essa
discussão(25), apesar do anseio sobre a incapacidade de prever, com antecedência, o que
eles iriam querer em uma situação futura(25,28).Sob outro enfoque, nos EUA, pacientes
com comprometimento cardiológico queriam realizar suas decisões de fim de vida,
levando em conta, ou não, as opiniões dos familiares, em vez de deixar as decisões para
médicos e enfermeiros. Diante de uma doença grave e de incapacidade de tomada de
decisão, 47% dos pacientes preferiram suas DAV para orientar as decisões, 27%
preferiram ter um substituto nomeado em sua diretiva antecipada para as decisões, 22%
preferiram suas famílias para tomar decisões, e 4 % deixariam as decisões aos
médicos(19).
No entanto, uma das principais barreiras percebidas para a conclusão das DAV,
em pesquisa com 18 pacientes oncológicos e quatro familiares, no Reino Unido, foi a
constatação de que médicos não introduzem o assunto e a discussão sobre as DAV(28), o
que pode resultar em intervenções indesejadas(16). Isso destaca a necessidade de os
profissionais de saúde serem informados sobre as diretivas antecipadas, sensibilizandose aos sinais do paciente. Vários participantes sugeriram os enfermeiros como os
profissionais mais apropriados para conduzir essas discussões, seja pelo seu
conhecimento para responder perguntas e fornecer informações, seja pelo vínculo de
confiança que se desenvolve ao longo do tempo nas relações enfermeiro- paciente(28).
177
Nos EUA, uma pesquisa desenvolvida com 415 pacientes cardíacos inscritos em
centros de reabilitação ambulatorial, indicou que apenas 15% dos pacientes havia se
envolvido em discussões com seus médicos sobre diretivas antecipadas e 9% tinham
concluído as discussões sobre as intervenções de sustentação da vida. As discussões
sobre as diretivas antecipadas foram iniciadas mais frequentemente por pacientes
(66%), seguidas por membros da família (29%) e médicos (5%). As discussões sobre os
cuidados de suporte de vida foram mais frequentemente iniciadas por membros da
família (51%), seguidas pelos pacientes (43%) e médicos (6%)(19).
Na Tailândia, em estudo com 152 sujeitos quanto às preferências dos pacientes
com doenças terminais sobre as decisões em relação aos cuidados de fim de vida e a
reanimação cardiorespiratória (RCP), foi constatado que 57,2% dos pacientes
respeitavam a autoridade dos seus médicos na tomada de decisões sobre os cuidados de
fim de vida, 28,3% transfeririam suas decisões a familiares e apenas 14,5% optaram
pela tomada de decisão compartilhada entre familiares e os médicos. No entanto, diante
da situação de necessidade de uma decisão para RCP, cujos participantes fossem
incapazes de tomar essa decisão, 44,1% dos indivíduos expressaram o desejo de que a
família tomasse as decisões em conjunto com os médicos, 33,6% atribuiriam a decisão
para a família e apenas 22,4% transfeririam suas decisões aos médicos(32).
No estudo realizado com 4396 pacientes, 6% dos pacientes italianos, 5% dos
espanhóis, 16% dos belgas e 29% dos pacientes holandeses nomeariam um substituto
decisor(41).A partir de outro estudo, que procurou verificar a eficácia das diretivas
antecipadas, foi constatado que pacientes e seus substitutos estavam dispostos apenas a
expressar suas preferências, mediante discussão verbal, não por meio da assinatura de
um documento(29).
Com relação às (des) vantagens e motivações à utilização das DAV, os pacientes
que completaram as DAV apresentaram menor índice de depressão e ansiedade(30). As
motivações dos pacientes para completar as DAV estariam relacionadas à ampliação de
sua autonomia; melhora da comunicação com os cuidadores; medo do tratamento; não
ser considerado um fardo; certificar-se que suas preferências serão respeitadas; não ser
ressuscitado; utilizar altas doses de analgésicos em caso de dor intratável; introduzir
nutrição artificial, hidratação, antiobióticos, além da transfusão de sangue; desejo de ser
transferido para outro hospital e de nova hospitalização(30).
Os principais motivos para não completar as DAV relacionam-se às dificuldades
de antecipar suas vontades, e ao aparecimento rápido de um delírio ou à piora da
178
condição de saúde(30). Complementa-se, também, as dificuldades em organizar uma
DAV, especificando preferências e/ou limitações para o tratamento de suporte de vida,
além da linguagem que pode se apresentar vaga e inconsistente para sua
implementação(20). Uma das principais advertências contra o uso de diretivas
antecipadas nas decisões no fim da vida é que as pessoas podem não ser capazes de
compreender o que se entende por qualquer opção de tratamento sem ser devidamente
informadas(25). O estudo realizado com 157 pacientes atendidos por uma equipe de
Cuidados Paliativos no Bronx, Nova York, constatou que 33% dos pacientes tinham
ordens de não-ressuscitar; no entanto, após as orientações elucidativas e educativas, esse
número ampliou para 83,4%(36).
Nos EUA, logo após o surgimento da Patient Self-Determination Act (PSDA),
foi realizado estudo com dois grupos de um total de 167 pacientes adultos, em que o
primeiro grupo recebeu um folheto com a descrição de informações sobre as DAV e as
intervenções médicas consideradas extraordinárias, se fossem utilizadas por um doente
terminal; o segundo grupo recebeu um livreto juntamente com discussões realizadas
com o médico. Antes da realização do estudo, nenhum dos pacientes havia completado
um testamento vital, mas 44% referiu que tinham falado aos membros da família sobre
questões de tratamento. Após as intervenções, dos 83 pacientes que tiveram acesso ao
livreto, 61% discutiram com a família sobre os cuidados de saúde que desejariam, ou
não, receber se estivessem em estado terminal. Na intervenção da utilização do livreto e
de discussões com o médico, 70% apresentaram-se interessados para discutir sobre o
testamento vital, 23% mostraram desinteresse e um pouco de resistência e 7%
mostraram-se totalmente resistentes. Nesse sentido, a utilização do livreto e as
discussões com o médico se mostraram eficazes(13).
No Brasil, são deficientes as pesquisas sobre perspectivas dos pacientes diante
da prática das DAV. No entanto, em investigação com 110 pacientes, foi constatado que
o conhecimento sobre o termo testamento vital alcançou 0,13 pontos (referência de 0 a
10 pontos)entre os pacientes, aumentando para 9,56 a intenção da elaboração das DAV,
após apresentado seu significado, com menor tendência de elaboração do testamento
vital em pacientes de 21 a 30 anos, quando comparados a de outras faixas etárias(46).
Com relação à implantação do testamento vital no Brasil, a média de aceitação, entre os
pacientes, foi de 9,56. Na verdade, o que as DAV trazem à tona é que a enfermidade e
mesmo o morrer não devem ficar nas mãos, somente, dos profissionais da saúde,
reduzindo o paciente a um incapaz, alheio às decisões tomadas a seu respeito: o
179
protagonismo do homem sobre sua vida estende-se agora ao momento de sua
enfermidade e sua morte (54).
A família diante das Diretivas Antecipadas de Vontade
Frequentemente, as decisões no final da vida que envolvem os familiares são
motivadas pela percepção da falta de dignidade, devido à deterioração progressiva, dor
mal controlada, abandono do paciente, crueldade terapêutica e uso desnecessário de
medidas que adiam a morte(40). Na Coréia do Sul, pesquisa com 1289 cuidadores
familiares, foi identificado que 92,9 % aprovaram a necessidade de implementação das
DAV(43). Nos EUA, pesquisa com 100 pacientes e seus substitutos, constatou que os
substitutos fazem previsões corretas em aproximadamente 66% dos casos, sendo fatores
relevantes, associados, o paciente ter falado com o familiar sobre questões de fim de
vida, ter seguro privado, e o nível de educação do substituto e do paciente(17).
Em contrapartida, há evidências de que substitutos frequentemente desconhecem
as preferências do paciente(17), além de que os familiares de doentes terminais
experimentam conflito emocional entre o desejo de agir conforme os valores de seu ente
querido, não querendo se sentir responsáveis pela sua morte, o desejo de perseguir
qualquer chance de recuperação e a necessidade de preservar o bem-estar da família(38).
Assim, propõem-se estratégias de intervenção que auxiliem a fazer julgamentos mais
precisos dos substituídos, considerando que os profissionais de saúde podem incitar
ativamente os pacientes a conversar com seus entes queridos sobre seus desejos, além
de que os médicos devem ter discussões mais francas com os familiares e doentes
terminais sobre o prognóstico da doença(17).
Além disso, os pacientes podem expressar suas ordens, mas os familiares
desconsiderarem sua vontade. Assim, ressalta-se que a coexistência do mandato
duradouro e do testamento vital em um único documento, ou seja, a realização de uma
DAV aumenta a certeza de que a vontade do paciente será atendida, pois o substituto
poderá decidir pelo paciente quando o testamento vital for omisso, auxiliando a equipe
médica quando a família recusar a vontade manifesta. Não obstante, o aspecto
vinculante do testamento vital evidenciou, em pesquisa com médicos no Brasil, suas
dificuldades em respeitar a vontade do paciente, ainda que escrita, quando a família é
contrária a essa vontade(47).
Nos EUA, estratégias de enfrentamento incluiram a possibilidade de recordar
discussões prévias com um ente querido, decisões de partilha sobre bens com membros
da família, atrasar ou adiar uma tomada de decisão, práticas espirituais/religiosas e
180
relato de histórias. Pesquisa com 30 responsáveis pelos pacientes demonstrou conflitos
para conciliar necessidades emocionais individuais e familiares com seus entes
queridos. Sugeriu, também, estratégias para os médicos melhorarem tomadas de
decisão, incluindo atendimento às emoções dos substitutos, facilitando a tomada de
decisão da família. O aumento da atenção para a experiência negativa dos responsáveis
pelos pacientes intensificou pedidos para melhorar o apoio generalizado para famílias
na UTI(38).
Nesse contexto, é primordial e necessário que as vontades de cuidados em fim
de vida sejam registradas por escrito, para prevenir e enfrentar conflitos, especialmente
quando familiares divergem sobre condutas a serem tomadas, repercutindo em dúvidas
aos profissionais que podem vir a atuar, conforme o interesse dos familiares e não dos
pacientes.
A família desempenha papel indispensável na contextualização dos cuidados em
final de vida, principalmente pelo fato que, por vezes, é ela que assume
responsabilidades em decisões de limitações dos esforços terapêuticos. Assim, é
importante procurar manter o paciente, se possível, e sua família, informados sobre a
situação e evolução da doença, considerando que somente com a interação da equipe
multiprofissional, paciente e familiar, será possível estabelecer uma ação diante da
situação do paciente, isentando-se de qualquer tipo de ressentimento ou mágoa por ter
sido realizada, ou não, alguma ação(57). Desse modo, a inclusão das DAV, com a
nomeação de um representante apto a responder pelo doente terminal, constitui-se em
uma alternativa a fim de permitir que as vontades dos pacientes sejam respeitadas pelos
seus familiares. Ademais, o testamento vital consiste em uma possibilidade de evitar ou,
mesmo, dirimir problemas éticos e bioéticos entre médico-paciente-familiares em
situações extremas como o final da vida(44).
Há que se destacar que, no Brasil, a pesquisa indicou que o conhecimento do
termo testamento vital pelos familiares/acompanhantes, foi de 0,41 pontos (de 0 a 10).
Posteriormente à explicação dos significados, a intenção de elaboração do testamento
vital obteve média de 9,39 entre os acompanhantes e a média de aceitação de
implantação do testamento vital no Brasil foi de 9,75 entre os acompanhantes. Os
familiares indicaram, também, considerar como mais apropriado que as decisões fossem
tomadas pelos médicos (8,92) ou pelos médicos juntamente com pacientes (8,87); ou
seja, excluindo sua participação(46).
181
Assim, as necessidades de um doente terminal, muitas vezes isolado pela
sociedade, aumentam as exigências quanto a cuidados de conforto que promovam a
qualidade de vida física, intelectual e emocional, sem descurar a vertente familiar e
social(53). As situações de fim de vida dizem respeito a vários personagens: doentes,
familiares, equipe de saúde e instituição hospitalar, devendo cada uma das partes ser
envolvida na tomada de qualquer decisão, sempre tendo em conta os prós e os contras
de cada uma das opções.
DISCUSSÃO
As DAV foram projetadas para conservar a autonomia pessoal baseadas na
crença de que os pacientes que perdem a capacidade de decisão estariam propensos a
receber os cuidados que escolheram e sua ausência pode levar a cuidados agressivos e
indesejados, associados a uma redução da qualidade de vida e do cuidado(43). Além
disso, resguardam o médico e profissionais da saúde da responsabilização, seja no
âmbito de sua entidade de classe, seja no jurídico(10) ao fazer, ou não, uso dos
tratamentos e cuidados escolhidos previamente pelo paciente considerado capaz(6).
Assim, a preservação da autonomia e a relação médico-paciente constituem fatores
decisivos para a aplicabilidade das DAV(10,30), representando um avanço na assistência
ao doente terminal, garantindo que nada será realizado contra sua vontade(28,53). Tornase imperioso que as discussões acerca das DAV ocorram de forma efetiva, criteriosa e
científica(10).
Em âmbito internacional, o crescente desenvolvimento de pesquisas vem
constatando maior viabilidade e aceitabilidade(24-25,36-37,43) das diretivas antecipadas,
apesar de ainda ocorrerem manifestações de desconforto dos pacientes em aderir a essa
prática, pelo seu desconhecimento; há uma tendência de que os doentes terminais
prefiram viver com qualidade a ter seu sofrimento prolongado com técnicas heroicas
que não repercutem na cura das doenças(17,25).
A produção científica mais evidente é nos EUA, em virtude das discussões sobre
a temática terem iniciado a partir da PSDA, lei vigente desde 1991 que apresentou três
formas de efetivar as diretivas antecipadas: living will,durable power of attorney
forhealth care e advance care medical directive(3), o que incentivou e contribui nas
discussões e legalização da prática em outros países.
Já a produção científica sobre as DAV, no Brasil, é incipiente, com uma
deficiência de pesquisas empíricas sobre a temática em termos de avaliação e prática, a
fim de sustentar e contribuir com discussões e implementação das DAV.
182
Diferentemente do cenário internacional, onde constam pesquisas com informações,
referentes à efetividade da aplicação das DAV, no cenário nacional, carecem pesquisas
enfocando sua aplicabilidade nos diferentes contextos de saúde e na população.
Contudo, o que se percebeu é que, embora deficientes, houve um aumento em 2013 das
publicações, possivelmente associado ao fato da aprovação da Resolução do CFM sobre
as DAV, em 2012(7). Estudos, no Brasil, apontam para uma tendência de aceitabilidade,
aplicabilidade e implantaçao das DAV(46), apesar das dúvidas que permeiam essa
prática, evidenciando-se profissionais da saúde ausentes desse processo, pela falta de
esclarecimentos da resolução que ampara essa prática, bem como da ausência de
legislação brasileira sobre o tema.
Nas DAV, é necessária a assimilação da situação do diagnóstico e prognóstico
por parte dos familiares e pacientes, pois as pesquisas apontaram dificuldades em aderir
à prática de manifestação da vontade, resultado de uma má comunicação do profissional
com os interessados, dificuldade em prever o que poderá acontecer ou, ainda, pelos
familiares e ou substitutos não saberem como atuar, principalmente, pela inexistência de
comunicação com os pacientes sobre seus desejos, acarretando conflitos(17,38,57); por
isso, a necessidade de conversa prévia para esclarecimentos, aliada a um processo
educativo(13,20,25,28,30). Familiares que conversaram, de modo esclarecedor e sincero com
os pacientes sobre seu prognóstico e opções de tratamento, cumpriram posteriormente
as DAV(30,46,55). Nesse sentido, merece destaque a importância do processo educativo,
bem como as instruções realizadas por profissionais que repercutem em maiores índices
de preenchimento das DAV(13).
A dependência das decisões de limitações de tratamentos pelos representantes e
familiares do doente terminal parece inegável nas DAV. Desse modo, no panorama
internacional, as pesquisas indicam que familiares e substitutos desempenham papel
indispensável diante de decisões que envolvem o fim da vida(17,36,38,40,43) no sentido de
amenizar aflições de familiares quanto à responsabilidade sobre condutas de tratamentos
nos doentes terminais, reduzindo o fardo de sua tomada de decisão(22). Além disso,
familiares enlutados indicam que a conclusão de uma diretiva antecipada lhes resultou
em menos preocupações quanto às condutas a serem realizadas, aumentando a utilização
de cuidados paliativos(56).
Os profissionais da saúde desempenham influência significativa na assistência
aos pacientes, podendo propor a prática das DAV, de maneira contextualizada, mediante
sua interação com familiares e paciente. Destaca-se que estudantes e profissionais da
183
área da saúde (enfermeiros e médicos) valorizam a prática do preenchimento das
DAV(14,21,24,37,43,52). Contudo, por vezes, apresentam resistência à discussão sobre sua
implementação com pacientes e familiares; e em muitos momentos, as vontades
manifestadas não são cumpridas pelos profissionais em virtude dos conflitos éticos
existentes quanto à responsabilização das ações(18).
Partindo deste pressuposto, o momento de discutir sobre as DAV é suscetível de
influenciar sua aceitabilidade e efeito. A discussão pode ser iniciada após a recorrência
da doença ou quando o tratamento falhou e o prognóstico é pobre. Assim, as pessoas
que iniciam discussões sobre as DAV devem ser ágeis em resposta e aos sinais de
desconforto do paciente, devendo essas discussões, preferentemente, transcorrer ao
longo de um certo número de encontros, conduzidas por um profissional treinado, com
tempo suficiente para falar e com conhecimento e habilidades para responder às
perguntas, adaptando-as ao indivíduo, e evitando destruir sua esperança(28).
Há um grande interesse dos profissionais da saúde diante da aplicabilidade da
DAV; entretanto, sua ação parece mascarada pela deficiência de comunicação presente
na relação dos médicos com o paciente e/ou familiar sobre a situação do doente
terminal, inviabilizando o preenchimento das DAV, pela inexistência de entendimento
da situação. Ainda, a inserção obrigatória, rotineira e automática do assunto aos
pacientes não é uma alternativa viável, pois deve ser contextualizada, dialogada,
argumentada, oportunizando-se as condições para que manifestem sua vontade, pois
trata-se de uma decisão pessoal, livre de interferências.
Desse modo, os enfermeiros foram recomendados como os profissionais mais
apropriados para encaminhar as discussões sobre as DAV, pela sua proximidade e
relação de confiança estabelecida com os pacientes e pelos seus conhecimentos para
proceder as informações que se fizerem necessárias(28). Além disso, pacientes preferem
que os médicos iniciem a conversa sobre as DAV(25,28,32); entretanto, pesquisas também
apontam que os pacientes desejam realizar suas decisões, isentos de interferências
externas, ou delegando ao familiar ou médico(19), o que pode ser dificultado pela
inexistência de registro escrito.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir da análise da produção científica nacional e internacional sobre as DAV
aplicada ao doente terminal, constatou-se que, diante dessa prática, tem-se possibilitado
que pacientes tenham atendidos seus desejos em final de vida; que os responsáveis pelas
decisões que envolvem limitações de tratamento, possam garantir o atendimento das
184
vontades do paciente, reduzindo possíveis conflitos oriundos das indecisões de como
atuar diante de determinada situação. Além disso, assegura, aos profissionais da saúde, a
minimização dos dilemas enfrentados nas situações que envolvem os doentes terminais
e questões relacionadas ao final da vida.
A análise dos artigos recrutados para essa revisão permitiu visualizar a
importância das DAV no contexto da assistência ao doente terminal, bem como sua
viabilidade de execução quando contextualizada na relação paciente-familiarprofissional, considerando o respeito à autonomia pessoal e a manutenção da dignidade
humano do paciente. Nesta perspectiva, no Brasil, além da necessidade de maiores
esclarecimentos quanto às disposições previstas na Resolução do CFM, que exigem
interpretações isentas de dúvidas para sua implementação, emerge a necessidade de
investigações sobre a temática, enfocando, mais especificamente, aplicabilidade das
DAV, em virtude da sua prática ser extremamente incipiente. Alia-se, também, ao fato
que, em âmbito internacional, essa prática mostra-se efetiva, principalmente, quando
com abordagem multidisciplinar, participação da família e quando as vontades dos
pacientes são respeitadas.
Nesse contexto, os profissionais da saúde devem estar continuamente
comprometidos com a ideia de que a autonomia pessoal do paciente não está ausente
diante da situação de perda da sua capacidade de decisão. É preciso respeitar suas
escolhas manifestas enquanto capaz, ou abdicar as decisões aos familiares e/ou
responsáveis com conhecimento do paciente, de modo a auxiliar nas condutas,
considerando as vontades do paciente, sua autonomia e dignidade.
A aplicação das DAV, ainda, traria maior respaldo à enfermagem, diante de
situações que lhe impõem dilemas éticos, especialmente, quando as condutas médicas
não estão explicitadas, como, por exemplo, nas ordens de não-reanimação. Assim,
assuntos referentes à terminalidade devem ser inseridos em todos os contextos de ensino
e assistência à saúde, a fim de propor a familiarização com a temática, por vezes, tratada
de maneira velada pelos profissionais da saúde. É preciso atentar para assuntos
referentes às DAV como alternativa de mudança de paradigmas, considerando uma
abordagem diferenciada pelos profissionais à população, com o intuito de provocar a
transformação da vivência da morte em algo a ser vivido e aceito.
Nessa direção, esse estudo destaca, como ponto forte, a demonstração de um
panorama geral das repercussões da aplicação das DAV, em diferentes continentes e
com diferentes populações, no intuito de contribuir com as reflexões no cenário
185
brasileiro. Entretanto, dentre as limitações dessa revisão, além da falta de avaliação da
qualidade dos estudos mediante instrumentos próprios e da limitação de idiomas,
ressalta-se que sua busca não ocorreu em revistas da área do Direito, pela ênfase na
associação das DAV ao doente terminal, como preconizado no Brasil, a partir da
Resolução do CFM. Espera-se, no entanto, que esse estudo contribua em outras
investigações sobre a temática, considerando-se a deficiência de revisões anteriores
sobre a aplicação das DAV.
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191
ANEXO III
PARECER DO COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA NA ÁREA DA SAÚDE DA
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE (FURG)
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