A declaração antecipada de vontade no Brasil (testamento vital) Letícia Franco Maculan Assumpção 2015 Viver e não poder se expressar A DAV é um instrumento para a vida, não para após a morte. Vamos viver mais, pode haver períodos em que percamos a consciência ou em que seja difícil nos expressarmos. A falta de consciência não significa a morte. A cada hora, 400 pessoas entram em coma no Brasil. Nos EUA, 800. 20 em 100 pacientes morrem – até o início dos anos 90, a taxa era de 50%. Dos doentes em coma, hoje 70% conseguem se recuperar. Os 10% restantes evoluem para o chamado coma crônico, ou estado vegetativo. (FONTE: REVISTA VEJA – março/2010) Apesar do foco ser a vida: pela DAV também podemos orientar sobre recusa a tratamentos médicos inúteis, bem como sobre desejos sobre doação de órgãos, velório, enterro ou cremação, entre outros. EUTANÁSIA X ORTOTANÁSIA - É vedada a EUTANÁSIA = abreviação ativa da vida - MAS É POSSÍVEL A ORTOTANÁSIA = morte digna, sem intervenção médica afastando-se a distanásia = uso de terapias e tratamentos inúteis. REPORTAGEM REVISTA VEJA – MARÇO/2010 Hoje a maioria das pessoas consegue sair do coma e os médicos pensam na possibilidade de recuperar pacientes em estado vegetativo Atef Zein Sammour, 15 anos: doze dias em coma e acordou como se tivesse dormido apenas uma noite - Brasil Layla Towsey: a menina de 3 anos que após 5 dias em coma acordou cantando “Mamma Mia” - Inglaterra Terry Wallis: o homem que dormiu por 19 anos - EUA Nova ferramenta Testamento Vital? Por que é melhor não chamar de TESTAMENTO? • Flávio Tartuce: o testamento é “negócio jurídico unilateral, personalíssimo e revogável, pelo qual o testador faz disposições de caráter patrimonial ou não, para depois de sua morte” (grifos aditados). • Já a DAV é ato jurídico que visa à produção de efeitos ainda durante a vida do seu outorgante, podendo também tratar de suas exéquias (velório, enterro ou cremação). • Declaração? Diretrizes? • Declaração Antecipada de Vontade – DAV Fundamentos legais e jurisprudência • Constituição da República: cláusula pétrea = LIBERDADE não apenas as liberdades de expressão, de religião, mas também sobre a saúde, a vida e o próprio corpo. • Fundamentos constitucionais: – – – – – Direito à dignidade: art. 1o, inc. III Direito à vida: art. 5o, caput Direito à liberdade de ação: art. 5o, inc. II Direito à integridade física: art. 5o, inc. III Direito à liberdade de crença ou religião: art. 5o, inc. VI Código Civil • art. 15: “Ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica”. • Art. 1.780. A requerimento do enfermo ou portador de deficiência física, ou, na impossibilidade de fazê-lo, de qualquer das pessoas a que se refere o art. 1.768, dar-se-lhe-á curador para cuidar de todos ou alguns de seus negócios ou bens. Na Lei de Registros Públicos, há regulamentação da cremação: • Art. 77 – [...] • § 2º A cremação de cadáver somente será feita daquele que houver manifestado a vontade de ser incinerado ou no interesse da saúde pública e se o atestado de óbito houver sido firmado por 2 (dois) médicos ou por 1 (um) médico legista e, no caso de morte violenta, depois de autorizada pela autoridade judiciária. Entendimento da Justiça Federal • Conselho de Justiça Federal - V Jornada de Direito Civil - enunciado nº 527: “é válida a declaração de vontade, expressa em documento autêntico, também chamado ‘testamento vital’ em que a pessoa estabelece disposições sobre o tipo de tratamento de saúde, ou não tratamento, que deseja no caso de se encontrar sem condições de manifestar a sua vontade”. Resolução CFM 1931, de 24.09.2009 - CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA Capítulo I PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS • VII - O médico exercerá sua profissão com autonomia, não sendo obrigado a prestar serviços que contrariem os ditames de sua consciência ou a quem não deseje, excetuadas as situações de ausência de outro médico, em caso de urgência ou emergência, ou quando sua recusa possa trazer danos à saúde do paciente. [...] • XXI - No processo de tomada de decisões profissionais, de acordo com seus ditames de consciência e as previsões legais, o médico aceitará as escolhas de seus pacientes, relativas aos procedimentos diagnósticos e terapêuticos por eles expressos, desde que adequadas ao caso e cientificamente reconhecidas. • XXII - Nas situações clínicas irreversíveis e terminais, o médico evitará a realização de procedimentos diagnósticos e terapêuticos desnecessários e propiciará aos pacientes sob sua atenção todos os cuidados paliativos apropriados. CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA - Capítulo IV DIREITOS HUMANOS • É vedado ao médico: • Art. 22. Deixar de obter consentimento do paciente ou de seu representante legal após esclarecê-lo sobre o procedimento a ser realizado, salvo em caso de risco iminente de morte. [...] • Art. 24. Deixar de garantir ao paciente o exercício do direito de decidir livremente sobre sua pessoa ou seu bem-estar, bem como exercer sua autoridade para limitá-lo. [...] • Art. 41. Abreviar a vida do paciente, ainda que a pedido deste ou de seu representante legal. • Parágrafo único. Nos casos de doença incurável e terminal, deve o médico oferecer todos os cuidados paliativos disponíveis sem empreender ações diagnósticas ou terapêuticas inúteis ou obstinadas, levando sempre em consideração a vontade expressa do paciente ou, na sua impossibilidade, a de seu representante legal. DAV - Conceito • Declaração de pessoa, lúcida e consciente, que, considerando a possibilidade de circunstância que impossibilite a manifestação de sua vontade, antecipa diretivas gerais ou específicas sobre... • • • • • • • • o tratamento de saúde (quais aceita/recusa) procedimentos médicos em que hospital prefere se tratar onde deseja passar os últimos dias de vida no caso de doença terminal ou irreversível disposição sobre o próprio corpo (doação de órgãos, entre outras) orientação sobre exéquias (velório e enterro ou cremação) representante para estas diretivas e para outras de caráter ordinário, familiar ou empresarial. NO CÓDIGO DE NORMAS DE MINAS GERAIS DAS DECLARAÇÕES ANTECIPADAS DE VONTADE Art. 259. Poderá ser lavrada por instrumento público a declaração antecipada de vontade de pessoa capaz, também denominada diretrizes antecipadas, que se consubstancia em um conjunto de instruções e vontades a respeito do corpo, da personalidade e da administração familiar e patrimonial para a eventualidade de moléstia grave ou acidente que venha a impedir a pessoa de expressar sua vontade. Art. 260. Pela declaração antecipada de vontade, o declarante poderá orientar os profissionais médicos sobre cuidados e tratamentos que quer, ou não, receber no momento em que estiver incapacitado de expressar, livre e autonomamente, sua vontade. Art. 261. No instrumento público lavrado no Livro de Notas (Livro N) em que for feita a declaração antecipada de vontade, o declarante poderá constituir procuradores para, na eventualidade de não poder expressar sua vontade, administrar seus bens e representá-lo perante médicos e hospitais sobre cuidados e tratamentos a que será submetido, sendo, neste caso, considerados praticados 2 (dois) atos, quais sejam a lavratura de uma escritura pública declaratória e a de uma procuração. Caracteres • Ato personalíssimo: não admite representação • Essencialmente revogável (a pessoa pode mudar de ideia). Cláusulas da DAV • Diretivas médicas • Escolhas relativas aos procedimentos diagnósticos e terapêuticos • Recepção de sangue ou órgãos • Autorização para a ortotanásia ou distanásia • Possibilidade de gravidez/inseminação após a morte • Situações clínicas irreversíveis e terminais • Doação de órgãos • Autoriza a violação de domicílio, com justa causa • Autoriza a liberação do corpo • Exéquias Cláusulas da procuração relacionada à DAV - Diretivas de representação perante médicos e hospitais = Indica pessoas para representar a vontade • Outorga poderes e define limites - Diretivas de representação – Mandato ordinário • Poderes gerais • Poderes especiais – alugar, comprar, receber, dar quitação • Poderes ad judicia - Diretivas de representação – Mandato empresarial • Poderes de representação na sociedade • Disposições sobre a administração da sociedade • Poderes para alienar ou condicionar a participação social • Poderes para receber e dar quitação dos haveres DAVs – Estatística • DAVs : AUMENTO DE 2.000% EM 5 ANOS – 2009 = 26 atos – 2014 = 542 (fonte: ESTADO DE SÃO PAULO – 24/01/2015) DAVs – Futuro Ano / População + 65 anos • 2010 = 13,4 milhões • 2020 = 19 milhões • 2030 = 28,8 milhões (Fonte: IBGE) • “Lembrete Se procurar bem você acaba encontrando. Não a explicação (duvidosa) da vida, Mas a poesia (inexplicável) da vida.” Carlos Drummond de Andrade • O CNB/MG e toda a equipe do Cartório do Barreiro agradecem a sua presença! • O Cartório é de vocês!