Avaliação (in)docente versus ética e deontologia

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Avaliação (in)docente versus ética e deontologia 2015
Avaliação (in)docente versus
*Elisabete Pogere
ética e deontologia

RESUMO: Os professores fazem parte

RESUMEN: Los profesores forman
de uma das profissões que mais têm estado
parte de una de las profesiones que más ha
submetidos
estado sometida a precarias y escasas
a
precárias
e
escassas
condições de trabalho, estando também
condiciones
associados a responsabilidades educativas e
asociados
sociais gigantescas e polivalentes. Sendo os
responsabilidades educativas
professores subestimados pelas políticas do
Dado que los profesores están siendo
governo, é importante refletir a forma como
subestimados por las políticas educativas del
podem
considerados
gobierno, es importante que se reflexione
agentes de mudança, numa sociedade que
sobre la forma en cómo los profesores deben
cada vez mais exige e simultaneamente, os
ser considerados agentes del cambio en una
desvaloriza
políticas
sociedad que cada vez más les exige y
educativas e a avaliação de desempenho
simultaneamente los desvaloriza empezando
docente. Se a ética e a deontologia se
por las políticas educativas y la aplicación de
desenvolvem a um bem comum e, no caso
la evaluación del desempeño docente. Si la
dos professores esse bem comum é a
ética y la deontología se desarrollan hacia un
educação, cabe perguntar-se, onde está o
bien común, y en el caso de los profesores
bem comum da atual avaliação docente onde
ese bien común es la educación, cabe
primam
interesses
cuestionarse, ¿dónde está el bien común de
pessoais frutos de um sistema que os
la actual evaluación docente en la que
originam e os proliferam?.
priman
os
docentes
a
ser
começar
pelas
maioritariamente
os
laborales,
a
estando
gigantescas
mayoritariamente
también
y polivalentes
y sociales.
los
intereses
personales consecuencia de un sistema que
los origina y prolifera?
Palavras-chave:
docente,
professores,
motivação
docente,
avaliação
ética,
deontologia.
 Como citar este artigo:
Pogere, E. (2015). Avaliação (in)docente versus
ética e deontologia. xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx
Palabras
clave:
docente,
profesores,
motivación
evaluación
docente,
ética,
deontología.
*Doutora em Intervenção
Psicosocioeducativa
Ciências da Educação
[email protected]
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Avaliação (in)docente versus ética e deontologia 2015
Em Portugal vivemos em uma conjuntura
do bem (Aristóteles, Ética a Nicómaco, Livro I,
tanto política como económica, social e até
1094-1098) e moral corresponde a realização
cultural que não motiva a escolha da profissão
histórica da ética, é a vontade humana que
docente. Tanto o estado quanto a sociedade ou
determina a qualidade moral da ação (Kant,
os meios de comunicação, olham para a escola e
1995), justificando assim, que ela seja praticada
nomeadamente aos professores, como único ou
por respeito ao dever e não apenas em
principal meio de sanar todos os males sociais
conformidade com o dever como refere Baptista
que os governos não são capazes de enfrentar.
(2011). Salienta também, que deontologia é o
Os professores fazem parte de uma das
universo moral de uma determinada profissão e
profissões existentes em Portugal que mais têm
obedece
sido
universalidade
submetidos
condições
de
a
precárias
trabalho,
e
escassas
estando
também
a
critérios
de
e
racionalidade,
constrangimento,
correspondendo ao caráter de uma profissão
associados a responsabilidades educativas e
funcionando
sociais gigantescas e polivalentes. São exigidos
identitária, bem como responsabilização pública
do professor o cumprimento de um sem fim de
a
objetivos educacionais que a sociedade não
destinatários da respetiva atividade profissional.
fim de
como
orientação
salvaguardar
os
e
coesão
interesses
dos
consegue alcançar e que vai além da sua alçada
A ética distingue-se da moral ao mesmo
como afirmam Ruivo, Sebastião, Rafael, Afonso
tempo que a exige, e o compromisso ético
e Nunes (2008) e Brante (2009). E, sendo os
sempre transcende a esfera de obediência às
professores subestimados pelas políticas do
regras
governo, é importante refletir a forma como
educação um papel fundamental na promoção
podem os docentes ser considerados agentes de
desse compromisso. Deliberar com prudência
mudança, numa sociedade que cada vez mais
significa atender à especificidade de cada
exige e simultaneamente os desvaloriza, a
situação e as finalidades que a configuram.
começar pelas políticas educativas e a avaliação
Assim,
de desempenho docente (Silva, Damásio, Melo e
desenvolvem a um bem comum, no caso dos
Aquino, 2008; Santos Rita, Patrão e Sampaio,
professores esse bem comum é a educação.
2010; Ruivo, 2012).
Então cabe perguntar-se, onde está o bem
(Imbert,
se
a
1993),
ética
e
desempenhando
a
deontologia
à
se
Na vida em sociedade projeta-se as
comum da atual avaliação docente onde primam
exigências pessoais no horizonte da cidadania
maioritariamente os interesses pessoais frutos
com todas as suas mediações interpessoais e
de um sistema que os originam e os proliferam?
intitucionais em torno a valores considerados
Porquê o Ministério de Educação (ME) insiste na
essenciais
autonomia,
primacia do tempo de serviço sobre a formação
dignidade, integridade, respeito, reconhecimento,
académica do professor, se o bem comum é (e
lealdade, responsabilidade, justiça ou lealdade
deveria ser) a qualidade educação? Como pode
(Baptista, 2011). As pessoas ao transmitirem
um professor ser agente de mudança quando é
informações expressam juízos de valor sobre as
sistemáticamente desvalorizado e subestimado
coisas, pessoas ou acontecimentos (Canto-
pelo próprio ME, pela sociedade e por aqueles
Sperber & Ogien, 2004) e é neste quadro, que
diretores e colegas que se mexem por interesses
surgem os termos ética e moral.
individuais?
Se
como
a
a
ética,
liberdade,
segundo
Se
avaliar
eticamente
o
Aristóteles,
desempenho do professor significa procurar
corresponde ao proceso de articulação racional
fazer-lhe justiça como afirma Perrenoud (2009),
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Avaliação (in)docente versus ética e deontologia 2015
porquê o ME tem permitido que os professores
bom professor, se não existem escolas, aulas ou
sejam avaliados por outros colegas chamados
professores neutros, também não existe um
pelo mesmo “relatores ou avaliadores” que
modelo de avaliação do desempenho docente
muitas vezes têm formação académica inferior?
neutro, então onde está o bem comum e a justiça
Dito colega ou “relator/avaliador”, possui uma
no
visão subjetiva e redutora sendo difícil que o
docente?
mesmo possa contribuir para a melhoria do
processo ensino-aprendizagem.
meio
desta
inexistência
deontológica
É importante considerar a necessidade de
educação e formação dos diretivos, a fim de que
O resultado deste processo de “avaliação”
se produza em primeiro lugar, a informação e o
tem provocado até a data, uma absurda
conhecimento, e posteriormente, a toma de
sobrecarga
burocrática,
conflituosas
entre
muitas
relações
consciência necessária para que se proponha a
colegas,
excessivo
intervenção sobre as dimensões psicossociais
desgaste emocional e inúmeras injustiças ao
(Gil-Monte & Moreno-Jiménez, 2007). Segundo
longo e no final deste processo, desviando a
Baptista (2011), se produz injustiça na avaliação
atenção (sobre a avaliação docente em lugar)
do desempenho docente quando se perde o
dos
telos profissional, ou seja seu fim supremo,
os
verdadeiros
problemas
do
sistema
educativo.
quando se esquece o que está sendo realmente
Da mesma forma, os instrumentos de
registo
usados
colegas
descontextualizada e mecánica das normas,
“avaliadores/relatores” nas diferentes dimensões,
quando se fica refém de afecções emocionais ou
com os respetivos indicadores e níveis, assim
de preconceitos, quando se ignora a exigência
como a sua construção influenciada pelas fichas
da triângulação necessária à produção da
de avaliação definidas pelo ME, não possuem
equidade. Na mesma linha, os autores Maslach,
quaisquer base científica nem rigor na sua
Schaufeli e Leiter (2001) referem que uma
aplicação.
transparência
incompatibilidade grave entre a pessoa e o
proporciona a possiblidade de “manipular” a
trabalho ocorre quando não há justiça percebida
atribuição das menções quantitativas com o
no ambiente laboral. Equidade comunica respeito
objetivo de favorecer outros colegas com mais
e confirma a autoestima das pessoas. O respeito
“afinidade” ou obter vantagens pessoais. Em
mútuo entre as pessoas é fundamental para a
alguns casos, e como consequência de tudo isto,
noção comum de comunidade. A injustiça pode
o “avaliador” consegue afirmar que o seu colega
ocorrer quando há desigualdade de carga de
avaliado, não revela nenhum interesse em se
trabalho
atualizar,
académico
avaliações e promoções são manipuladas de
superior ou bem superior ao do avaliador, como
maneira inadequada. Por outra parte, a relação
tem acontecido muitas vezes. E esta é a
avaliado-avaliador é inevitavelmente atingida
realidade escolar na qual vivem os professores
pela lógica do poder, sendo que o poder do
neste
avaliador carece de preparação e regulação ética
Esta
tendo
“jogo
de
pelos
avaliado, quando se procede a uma aplicação
falta
este,
de
um
interesses”
grau
entre
direção-
avaliadores e avaliados onde o próprio processo
Se dentro da cultura profissional docente
existem várias concepções sobre o que é ser um
remuneração
ou
quando
as
com as bençãos do ME.
da avaliação de desempenho docente tem sido
uma das causas da desmotivação do professor.
ou
A implantação deste modelo de avaliação
de
desempenho
posteriores
docente,
ajustes,
com
(Decreto
os
seus
Regulamentar
Nº2/2008 de 10 de janeiro, Nº2/2010 de 23 de
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Avaliação (in)docente versus ética e deontologia 2015
junho e Diário da República, 2.ª Série - N.º 208
de
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
26 de outubro de 2012), carece de
fundamentação e compreensão, passando sobre
a explicitação do porquê e do para quê deste tipo
Aristóteles. (2004). Ética a Nicómaco. Tradução de
Antonio C. Caeiro. Lisboa: Quetzal Editores.
de avaliação, onde os professores devem se
Baptista, I. (2011). Ética, Deontologia e Avaliação
sujeitar a despreparadas medidas subjetivas dos
do Desempenho Docente. Cadernos do
diretivos e avaliadores que, sem formação para
tal,
passaram
a
exercer
a
função
dos
orientadores de estágio pedagógico que no
terrreno prático da realidade escolar, nada mais
tem
sido,
que
formas
de
humilhação
e
manipulação. Se o objetivo desta avaliação
docente
é
reconhecer
a
qualidade
do
desempenho dos docentes para valorização e
progressão na carreira (Artigo 2º do Diário da
República Nº 218 de 26 de outubro de 2012) e
–
CCAP-3
Ministério
da
Brante, G. (2009). Multitasking and synchronous
work:
Complexities
in
teacher
436.
Canto-Sperber,
M.
e
Philosophie
Ogien,
Morale.
R.
(2004).
Paris:
La
Presses
Universitaires de France.
Gil-Monte, P. R. e Moreno-Jiménez, B. (2007). El
vincular dita progressão também à formação
(Burnout). Madrid: Pirámide.
próprio Estatuto da Carreira Docente os divide,
work.
Teaching and Teacher Education, 25, 430–
síndrome
querer valorizar seus professores quando o
-
Professores, 1-60.
melhorar assim, a qualidade do ensino, bastava
académica do professor. Como pode o ME
Educação
Conselho Científico para a Avaliação dos
de
quemarse
por
el
trabajo
Imbert, F. (1993). La Question de L’Éthique dans le
Champ Educatif. Vigneux: Éditons Matrice.
Kant, I. (1995). Fundamentação da metafísica dos
costumes. Tradução de Paulo Quintela.
os discrimina e os desmotiva?
Na escola, assim como na sociedade em
geral, o direito ao reconhecimento se confunde
muitas vezes, com uma luta impune pelo
reconhecimento onde os comportamentos de
desprezo e humilhação social acabam por se
refletir nas organizações e nas comunidades,
afastando assim, o sujeito do bem comum, da
responsabilidade moral. O professor é um dos
pilares fundamentais da educação, porém não
Porto: Porto Editora.
Maslach, C., Schaufeli, W. B. e Leiter, M. P. (2001).
Job burnout. Annual Review Psychology, 52,
397-422.
Ruivo, J. (2012). O Desencanto dos professores.
Castelo Branco: RVJ Editores.
Ruivo, J., Sebastião, J., Rafael, J., Afonso, P. e
Nunes, S. (2008). Ser professor - Satisfação
profissional e papel das organizações de
docentes.
Castelo
Branco:
Instituto
atua sozinho e a qualidade do seu desempenho
Politécnico de Castelo Branco e Associação
depende, dentre muitos fatores, da relação
Nacional de Professores
pedagógica, âncora da cultura ética da escola
enquanto lugar educativo por excelência.
Face às novas exigências do sistema
Santos Rita, J., Patrão, I. e Sampaio, D. (2010).
Burnout, stress profissional e ajustamento
emocional em professores portugueses do
mudanças
ensino básico e secundário. Actas do VII
desejadas, ou seja os profesores, devem ser
Simpósio Nacional de Investigação em
remunerados, reconhecidos e motivados para
Psicologia. Universidade do Minho, Portugal,
essas transformações que tanto pretendem
4 a 6 de Fevereiro.
educativo,
os
protagonistas
das
alterar a sua cultura e o seu modo de agir
profissional.
Silva, J., Damásio, B., Melo, S. e Aquino, T. (2008).
Estresse e burnout em professores. Fórum
Identidades, 2, 75-83.
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