biossegurança: do conhecimento à prática entre profissionais de

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BIOSSEGURANÇA: DO CONHECIMENTO À PRÁTICA ENTRE
PROFISSIONAIS DE ENFERMAGEM
Geovane Resende Silva - Enfermeiro, Especialização em Vigilância Sanitária pela
Universidade Católica de Goiás / IFAR – Turma 9. E-mail: [email protected]
Dr. Pedro Canisio Binsfeld – Orientador, Pós-Doutor em Biotecnologia e Biossegurança.
Docente do Programa de Pós-Graduação em Vigilância Sanitária pelo Instituto de Estudos
Farmacêuticos e Universidade Católica de Goiás, GO. E-mail: [email protected]
RESUMO
Com o presente estudo realizou-se o levantamento da produção científica em Enfermagem relacionada à
biossegurança, visando conhecer os riscos a que os profissionais de Enfermagem estão expostos, assim como,
identificar o nível de conhecimento de biossegurança, as práticas adotadas no exercício profissional e os
principais acidentes ocupacionais. A partir da análise dos artigos, destacam-se os seguintes indicadores: (i)
Principais riscos biológicos para profissionais de Enfermagem, (ii) Nível de conhecimento em biossegurança de
profissionais de Enfermagem, (iii) Práticas de biossegurança adotadas entre os profissionais de Enfermagem e
(iv) Principais acidentes com material biológico entre profissionais de Enfermagem. Concluiu-se que os
profissionais de Enfermagem estão expostos a diversos agentes, inclusive biológicos; no tocante ao
conhecimento de Biossegurança, a maior parte da produção científica está relacionada à exposição a agentes
biológicos; não há abrangência suficiente do conteúdo sobre biossegurança nos currículos de formação destes
profissionais e são frequentes acidentes biológicos com a categoria, principalmente percutâneos. Sugere-se que a
biossegurança deve ser objeto de políticas públicas mais intensas; as instituições de saúde devem trabalhar com
programas de prevenção e educação permanente; e que o tema seja obrigatoriamente incorporado aos currículos
de graduação e cursos técnicos de Enfermagem e haja desenvolvimento de novos estudos na área.
Palavras-chave: Risco biológico, unidades de saúde, profissionais da saúde, agentes de risco
ABSTRACT
This paper examines the scientific output in Nursing related to biosecurity, aiming to learn the risks to which
Nursing professionals are exposed, as well as to identify the biosecurity knowledge level, the adopted techniques
in the professional practice an the most common work accidents. The following indicators can be pointed out
from the analysis of the papers: (i) Main bilological risks for Nursing professionals, (ii) Biosecurity knowledge
of Nursing professionals, (iii) Biosecurity practices adopted by Nursing professionals and (iv) Most common
biological material accidents of Nursing professionals. The study shows that Nursing professionals are exposed
to various agents, among them biological ones; with regard to biosecurity knowledge, most of the scientific
output addresses biological agent exposure; the curricula of Nursing courses do not address the issue of
biosecurity in the necessary depth and there are frequent biological accidents among nurses, especially of the
percutaneous type. It is suggested that more focused public policies should deal with the issue, that health
institutions should have permanent prevention and training programs in place, that biosecurity should necessarily
be part of the curricula of Bachelor and technical degree courses in Nursing and that new studies dealing with
biosecurity should be encouraged.
Keywords: Biological risk, health care units, health professionals, risk agents
1. INTRODUÇÃO
A necessidade de biossegurança ficou mais evidente a partir do recrudescimento das
doenças transmissíveis e com a preocupação inicial voltada aos profissionais de saúde, em
especial aos profissionais de laboratórios, sendo que esse enfoque no risco biológico de
laboratórios é uma lógica que perdura até os dias atuais (Andrade; Sanna, 2007).
Biossegurança é uma expressão resultante da junção de bio+segurança que denota
segurança biológica. Segundo o Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, biossegurança é
definida como: o conjunto de estudos e procedimentos que visam a evitar ou controlar os
eventuais problemas suscitados por pesquisas biológicas ou por suas aplicações. Já, para a
Comissão de Biossegurança em Saúde (CBS) do Ministério da Saúde (MS), biossegurança é
um conjunto de medidas e procedimentos técnicos necessários para a manipulação de
agentes e materiais biológicos capazes de prevenir, reduzir, controlar ou eliminar riscos
inerentes às atividades que possam comprometer a saúde humana, animal, vegetal e o meio
ambiente (Brasil, 2010).
A área da biossegurança é relativamente nova e vem ganhando espaço no cenário da
saúde, com o advento de epidemias causadas pela Síndrome de Imunodeficiência Adquirida
(AIDS), na década de 80, e a ocorrência de contaminações pelo vírus do HIV devido
acidentes de trabalho, a partir dos quais houve maior preocupação sobre a necessidade de se
evitar riscos aos trabalhadores, e adotar práticas de biossegurança (Vieira; Padilha, 2008).
Na década de 80, foram implementadas pelo CDC (Center for Disease Control and
Prevention) ações profiláticas para trabalhadores da saúde, expostos ao material biológico
(Garcia; Zanetti-Ramos, 2004). As orientações constituíram-se as Precauções Universais
(Andrade; Sanna, 2007). Mais tarde, baseado em considerações do CDC, as Precauções
Padrão incorporaram as Precauções Universais e o Isolamento para substâncias corpóreas,
ampliando-as. Também surgiram as precauções baseadas na transmissão: Precauções aéreas,
Precauções por gotículas e Precauções por contato. Estas constituem medidas adicionais às
Precauções Padrão e são aplicadas quando existem indivíduos infectados ou suspeitos com
patógenos altamente transmissíveis ou epidemiologicamente importantes (Nichiata et al,
2004).
No Brasil, a biossegurança tem seu respaldo legal na Lei 11.105/2005 (Brasil, 2005),
que trata sobre normas e mecanismos de segurança relacionados aos organismos
geneticamente modificados (OGMs). Porém, a biossegurança tem abrangência muito mais
ampla, envolvendo além dos OGMs todos os organismos não geneticamente modificados e as
relações com a promoção de saúde nos ambientes ou unidades de saúde, no meio ambiente e
na comunidade (Garcia; Zanetti-Ramos, 2004).
Na área da saúde, pode-se observar um grande número de riscos ocupacionais,
principalmente ao considerar-se que o hospital é o principal meio de trabalho dos
profissionais que atuam nessa área. Assim, a adoção de normas de biossegurança no trabalho
em saúde é condição fundamental para a segurança dos trabalhadores (Andrade; Sanna,
2007).
Quanto aos profissionais da saúde, a equipe de Enfermagem é uma das principais
categorias sujeitas a exposições a material biológico (Nichiata et al, 2004). A elevada
exposição relaciona-se com o fato de ser o maior grupo nos serviços de saúde e ter mais
contato direto na assistência aos clientes, e também com o tipo e a frequência de
procedimentos realizados (Pinheiro; Zeitoune, 2008).
Os profissionais de Enfermagem no seu ambiente laboral podem expor-se a inúmeros
patógenos. Em meio a um verdadeiro “campo minado de riscos”, pode-se citar os vírus das
hepatites B e C, HIV, HTLV (Vírus Linfotrópico da Célula Humana), príons, vírus da
influenza e Mycobacterium tuberculosis. Além de elementos radioativos e uma variedade de
substâncias
químicas,
como
antineoplásicos,
antimicrobianos,
imussopressores
e
desinfetantes.
Com este intuito, desenvolveu-se este estudo visando compreender a atuação dos
profissionais de Enfermagem frente à biossegurança. O trabalho se justifica pela convivência
permanente dos profissionais de Enfermagem com diversos riscos no ambiente de trabalho e a
necessidade de aprofundar a temática por meio de pesquisas. Dessa forma, este artigo poderá
contribuir na medida em que compila relevantes informações que podem subsidiar ações
práticas para a melhora da qualidade de trabalho da categoria profissional e,
consequentemente, contribuir para a melhoria dos resultados dos serviços prestados por estes
profissionais e, ainda, identificar lacunas para futuros estudos. Assim, o principal objetivo foi
analisar informações sobre diversos indicadores que estudiosos publicaram relacionados às
práticas de biossegurança nas atividades dos profissionais de Enfermagem, assim como,
compilar e dar conhecimentos sobre os riscos a que os profissionais de Enfermagem estão
expostos; o nível de conhecimento em biossegurança; as práticas de biossegurança adotadas e
os principais acidentes com material biológico entre os profissionais de Enfermagem.
2. METODOLOGIA
O presente trabalho consiste em um estudo de revisão bibliográfica de artigos
publicados em revistas científicas cujo objetivo é analisar a atuação dos profissionais de
Enfermagem em relação à biossegurança.
A pesquisa foi realizada no período de janeiro a agosto de 2012, nas seguintes bases
de dados: LILACS (Literatura Latino-americana e do Caribe em Ciências da Saúde),
MEDLINE (Sistema Online de Busca e Análise de Literatura Médica) e SciELO (Biblioteca
Científica Eletrônica em Linha). Para isso se utilizou as palavras chaves “biossegurança e
Enfermagem” e “atuação profissional em Enfermagem” associado às outras palavras.
A partir desta primeira fase foram encontradas 34 produções científicas.
Posteriormente, procedeu-se a leitura do resumo dos artigos dos quais selecionou-se para a
pesquisa 23 artigos que contemplavam de maneira direta a atuação dos profissionais de
Enfermagem (enfermeiros, técnicos de Enfermagem ou auxiliares de Enfermagem) frente à
biossegurança.
A partir da leitura e análise dos artigos, agrupou-se por semelhança e contextualização
os seguintes indicadores: (i) Principais riscos biológicos para profissionais de Enfermagem,
(ii) Nível de conhecimento em biossegurança de profissionais de Enfermagem, (iii) Práticas
de biossegurança adotadas entre os profissionais de Enfermagem e (iv) Principais acidentes
com material biológico entre profissionais de Enfermagem.
3. RESULTADOS E DISCUSSÕES
O conhecimento, a análise e a identificação dos riscos biológicos envolvidos em
unidades de saúde permitem aos profissionais a adoção de técnicas e práticas como medidas
de contenção proporcionando ambientes mais saudáveis para profissionais e pacientes. Sob
esta ótica estão apresentadas as subunidades na qual se discute a biossegurança desde a
percepção dos riscos às efetivas ações práticas dos profissionais de Enfermagem.
3.1. Principais riscos biológicos para profissionais da Enfermagem
Os profissionais da área de Enfermagem estão expostos a diversos riscos, entre os
quais citam-se: químicos, físicos, ergonômicos, psicossociais e, acrescidos daqueles,
representados por agentes biológicos, uma vez que se expõe constantemente ao contato
com sangue e outros fluídos orgânicos contaminados por uma variedade imensa de patógenos
causadores de enfermidades ou doenças ocupacionais (Andrade; Sanna, 2007; Valle et al,
2008).
A preocupação com riscos biológicos surgiu a partir da constatação dos agravos à
saúde dos profissionais que exerciam atividades em laboratórios onde se manipulava
microrganismos e material clínico desde o início dos anos 40. Para profissionais que atuam
na área clínica, entretanto, somente a partir da epidemia da AIDS, nos anos 80, que as práticas
e regras de biossegurança começaram a ser entendidas como necessárias para a segurança do
paciente e do profissional nas unidades de saúde (Andrade; Sanna, 2007; Valle et al, 2008).
Estudos apontam que a maioria dos casos de contaminação pelo HIV no mundo por
acidente de trabalho (mais de 70% dos casos comprovados e 43% dos prováveis), envolveram
a categoria de Enfermagem e dos profissionais dos laboratórios de análises clínicas. Estes
profissionais são responsáveis por grande parte dos procedimentos que envolvem material
perfurocortante nos serviços de saúde (Andrade; Sanna, 2007; Valle et al, 2008).
Os artigos pesquisados no presente trabalho, em sua maioria, apresentam os riscos
biológicos a que a equipe de Enfermagem está exposta, relacionados aos agentes biológicos
com potencial patogênico, principalmente associado ao vírus do HIV e da hepatite B.
Entretanto, há vários outros agentes de importância primária que representam riscos aos
profissionais da saúde, como se pode observar na Tabela 1 (Andrade; Sanna, 2007; Valle et
al, 2008).
Em diversas publicações observa-se a alta incidência de profissionais da Enfermagem
envolvidos com acidentes ocupacionais como, por exemplo, na publicação do Boletim
Epidemiológico do Estado de São Paulo, segundo o qual foram notificados 5.391 acidentes
ocupacionais com material biológico entre janeiro/1999 e outubro/2003, dos quais 60,6%
envolviam profissionais de Enfermagem, seguidos dos profissionais da limpeza (8,9%) e dos
médicos (6,8%), além de outros profissionais em percentagens menores (Andrade; Sanna,
2007).
Estudo realizado na macrorregião de Florianópolis sobre acidentes de trabalho com
exposição a material biológico também confirma que a categoria mais afetada é a dos
profissionais de Enfermagem, com aproximadamente 50% dos acidentes registrados. Dentre
estes profissionais, 38,26% eram técnicos de enfermagem, 7,83% auxiliares de enfermagem e
3,48% enfermeiros (Vieira; Padilha; Pinheiro, 2011).
Tabela 1. Síntese dos principais patógenos ou agravos para a saúde presentes nas atividades
do dia-a-dia dos profissionais de Enfermagem.
Patógenos/Agravo
HIV/AIDS
Hepatite B
Hepatite C
Vírus da Influenza
Tuberculose
Outros
Características/Preocupações
O relatório global sobre HIV/AIDS de 2012, indica que 34,2 milhões de
pessoas vivem com HIV no mundo, e com mais de 7 mil novas infecções por
dia, motivo pelo qual há grandes preocupações entre os profissionais da
Enfermagem.
O risco de contaminação com o vírus da hepatite B é aproximadamente 100
vezes maior do que o risco de soroconversão pelo HIV e 10 vezes maior do
que o risco para o vírus da Hepatite C.
Mais de 180 milhões de pessoas no mundo são portadores crônicos do vírus
da hepatite C. E o risco de transmissão do vírus ocorre em exposições
percutâneas ou mucosas envolvendo sangue ou qualquer outro material
biológico contendo sangue. O risco estimado após exposições percutâneas é
de 1,8 a 3%.
Os vírus da influenza são altamente transmissíveis e podem sofrer mutações.
São conhecidos três tipos de vírus da influenza: A, B e C. O tipo A é o mais
mutável entre os três. As epidemias e as pandemias geralmente estão
associadas ao vírus do tipo A. Os profissionais estão muito expostos.
No Brasil é elevado o número de casos de tuberculose notificados o que
propicia um contato frequente dos profissionais da área de saúde com a
doença. Em diversos estudos nacionais foi evidenciada uma elevada
prevalência de infecção tuberculosa entre os profissionais de saúde, superior
à da população geral.
O Brasil por ser um país continental possui inúmeros agentes biológicos de
importância para a saúde e que evidencia a necessidade de condições de
biossegurança. Estes agentes foram classificados em publicação do
Ministério da Saúde, denominada “Classificação de risco dos agentes
biológico, Brasil, 2010a”.
Fonte: Brasil., 2010a e UNAIDS, 2012.
Dados dos EUA apontam que 1.200 profissionais que trabalham na área de saúde são
infectados por ano (Pinheiro; Zeitoune, 2008). Observa-se também que a incidência de
Hepatite B, por exemplo, é muito mais comum em profissionais de saúde do que na
população em geral (Pinheiro; Zeitoune, 2008; Soriano et al, 2008).
Já em relação ao vírus do HIV, o risco de contaminação está sempre presente, e gira
em torno de 0,3% após exposição percutânea ao sangue contaminado, podendo chegar a 1 ou
2% no caso dos cirurgiões e trabalhadores de serviços de emergência. A situação é ainda mais
alarmante no caso da hepatite B, pois o risco da aquisição do vírus é estimado em até 30%,
quando nenhuma medida profilática é adotada (Gir et al, 2004).
Pesquisas revelam que a exposição do profissional de Enfermagem a riscos biológicos,
abrange desde a atenção básica (Farias; Gollner, 2005) até a assistência em uma unidade de
terapia intensiva (Rabelo; Vieira; Silva, 2002; Correa; Donato, 2007). Apesar da variedade
imensa de patógenos desencadeadores de doença, as principais são: AIDS, Hepatites B e C,
vírus da influenza e tuberculose; todas tendo como meio de contaminação o contato do
indivíduo com o sangue e secreções através de acidentes com perfurocortantes ou por
respingos do líquido contaminado em mucosas ou pele lesadas ou ainda particulados.
3.2. Nível de conhecimento em biossegurança de profissionais de Enfermagem
O conhecimento em biossegurança mede-se também pela produção científica na área.
Neste sentido, uma análise para avaliar a produção científica de Enfermagem na área de
biossegurança, na base de dados LILACS, demonstrou que exposição a agentes biológicos
(56%), acidentes de trabalho (26%), Saúde do trabalhador (26%) e Enfermagem do trabalho
(26%), são os temas sobre os quais mais se publica, servindo como indicador de interesse e
conhecimento, sendo estes seguidos por riscos ocupacionais, profissionais de saúde,
equipamentos de proteção e prevenção de acidentes, sendo estes os 8 temas principais sobre
os quais tem maior número de publicações relacionadas à biossegurança em Enfermagem
(Figura 1). A base de dados LILACS é uma base de dados que é sinônimo de qualidade e
credibilidade na área de saúde.
Figura 1. Representação diagramática dos assuntos de biossegurança com maior número de
publicações na área de Enfermagem (modificado a partir de Gomes, 2011).
Do ponto de vista de formação de recursos humanos, a educação formal em
biossegurança não está (de forma geral) inserida nas grades curriculares de formação dos
profissionais de Enfermagem. Como consequência, apesar dos esforços pontuais para inclusão
deste tema no nível superior, ainda existe um grande abismo entre a magnitude do problema e
a formação e capacitação de recursos humanos para a prática profissional segura (Andrade;
Sanna, 2007).
Essa lacuna de formação do profissional implica consequentemente em deficiência nas
ações do enfermeiro, no que tange a sua sensibilização para medidas de biossegurança na
prática. Pois, a deficiência nos currículos dos cursos de graduação em Enfermagem a este
conteúdo é comum, sendo em sua maioria, o assunto somente abordado de forma sucinta, em
programas e cargas horárias diferentes, resultando em conhecimento limitado e por vezes
desconexo (Vieira; Padilha; Pinheiro, 2011).
A formação do profissional de saúde ainda é especialmente voltada somente para
cuidados dirigidos aos pacientes, enquanto que o autocuidado é ainda em muitos casos
negligenciado ou não há a percepção apropriada para este aspecto (Pinheiro; Zeitoune, 2008).
Há muitos esforços em promover atualizações em matérias de biossegurança. Acredita-se que
muitos profissionais com muitos anos de formação não têm ou não tiveram acesso a
informações necessárias para a atuação de forma que os mesmos estejam protegidos e também
protejam o paciente (Gryschek et al, 2000).
Este cenário pode ser verificado em um estudo realizado em um hospital do município
do Rio de Janeiro sobre conhecimentos e medidas de biossegurança e a saúde do trabalhador
de Enfermagem relacionada à Hepatite B, o qual revelou que a maioria dos profissionais de
Enfermagem desconhece as formas de transmissão da hepatite B; outro grupo significativo de
profissionais de Enfermagem não havia recebido treinamento de como proceder caso
houvesse um acidente com material perfurocortante; o conhecimento das medidas de
biossegurança não estava presente em toda equipe, e, por desconhecer, não usavam as
medidas de forma rotineira. Neste caso, os profissionais são vulneráveis e expostos ao risco
de contrair a hepatite B caso ocorra acidente com material perfurocortante (Pinheiro;
Zeitoune, 2008).
Estudos sobre o conhecimento dos trabalhadores de saúde relativo aos riscos à sua
saúde pelo exercício de suas atividades mostra apenas um conhecimento genérico. Além
disso, verifica-se que o conhecimento demonstrado é fruto da prática cotidiana, e não oriundo
da existência de uma orientação ou serviço de saúde ocupacional na instituição. Este
conhecimento, entretanto, não se transforma numa ação segura de prevenção de acidentes e
doenças ocupacionais (Pinheiro; Zeitoune, 2008).
Quando se trata de HIV, um estudo aponta que as necessidades de qualificação da
equipe de Enfermagem são a biossegurança, preparo e administração de medicamentos
específicos e assistência de Enfermagem aos pacientes com HIV/AIDS (Gryschek et al,
2000).
Interessante destacar que os estudos são unânimes e apontam em primeiro lugar a
necessidade de ter um conhecimento mais sólido em relação às medidas de biossegurança que
tanto protegem os pacientes quanto os profissionais de saúde envolvidos nas unidades de
saúde que tratam pacientes portadores ou aidéticos. Numa primeira análise, sem um maior
aprofundamento, há evidências claras que o processo educação-trabalho-saúde, deve suportar
ações pedagógicas no campo da educação profissional, especificamente no que se refere ao
ensino da biossegurança em cursos de Enfermagem, onde o profissional seja capaz de ter uma
postura crítica-reflexiva do seu ambiente ocupacional. A tal ponto que no exercício de suas
funções possa adotar as práticas de biossegurança que protejam pacientes e os próprios
profissionais.
3.3. Práticas de biossegurança adotadas entre os profissionais de Enfermagem
Os profissionais de Enfermagem teoricamente não são refratários a normas de
biossegurança, no entanto, o conhecimento relativo às práticas não é uma constante no dia-adia com a mesma intensidade da concordância da necessidade de se adotar medidas práticas.
Em outras palavras, há sim por parte dos profissionais um desejo de implementar práticas de
biossegurança que promovam maior biossegurança.
Apesar disso, um estudo realizado com instituições de saúde no estado de São Paulo
identificou diferentes práticas, muitas vezes, distintas das recomendações emitidas pelas
instituições governamentais responsáveis pela normatização do controle da infecção
hospitalar (Soriano et al, 2008).
Dentre os fatores que estariam colaborando para a prática inadequada, estão:
a) Falta de precisão das normas e recomendações sobre a prática de precauções;
b) Ausência de normas de rotinas nas instituições e intra-institucionais;
c) Ausência ou limitada supervisão das atividades dos profissionais da área de
Enfermagem;
d) Insuficiência de programas de educação continuada ou treinamentos sobre práticas
de biossegurança;
e) Falta de recursos humanos, materiais e financeiros para implementar práticas de
biossegurança nas unidades de saúde;
f) Infraestrutura precária das unidades de saúde.
Além dos fatores apontados acima, contribuem também fatores individuais, inerentes
ao profissional, dentre eles a ausência da percepção de vulnerabilidade à infecção entre os
membros da equipe de Enfermagem, em especial entre aqueles com longa experiência
profissional.
Muitas vezes os profissionais da Enfermagem apresentam conduta ambivalente frente
à situação de risco de contaminação por agentes biológicos, ora priorizando a auto-proteção,
ora valorizando os cuidados de enfermagem ao paciente, em detrimento das normas de
biossegurança e, consequentemente, negligenciando a si próprio. Ambas as situações devem
ser tratadas com a biossegurança exigida (Gir et al, 2004).
Os profissionais que trabalham em instituição hospitalar entram na rotina em suas
atividades e a confiança em relação às situações de risco nas áreas aumenta com o tempo.
Com frequência descuidam-se de procedimentos elementares como a lavagem das mãos e o
uso de luvas (Andrade; Sanna, 2007). Como exemplo, tem-se o estudo citado anteriormente
sobre Hepatite B, que revelou que apenas 68,2% da equipe de Enfermagem utiliza
equipamentos de proteção individual (EPI) quando necessário. Dentre os riscos que ficam
expostos, evidenciam-se os biológicos, que podem ser a gênese de várias doenças graves,
muitas delas citadas neste trabalho (Pinheiro; Zeitoune, 2008). Em outra pesquisa, que
envolvia profissionais de Enfermagem e outras categorias que trabalham com material
biológico, 26% dos profissionais responderam não estar utilizando EPI (Vieira; Padilha;
Pinheiro, 2011).
No Rio Grande do Sul, um estudo revelou que a cobertura vacinal contra hepatite B
(HBV) dos trabalhadores da saúde envolvidos com acidentes estava em torno de
aproximadamente 73%, evidenciando o risco de infecção pelo HBV em aproximadamente
27% dos trabalhadores que não haviam completado o esquema vacinal (Gallas; Fontana,
2010).
Um estudo avaliando profissionais sobre a adoção de práticas de biossegurança em
suas atividades demonstrou que há um posicionamento contraditório, isto é, os profissionais,
ao mesmo tempo em que reconhecem a importância e o valor das práticas e normas de
biossegurança, muitas vezes absorvem apenas parcialmente o que determinam os programas
de Prevenção e Controle de Infecção Hospitalar relacionado com a biossegurança (Valle et al,
2008).
O Brasil possui várias regulamentações que incentivam e, muitas vezes, geram
obrigações quanto à adoção de práticas que promovam a biossegurança. A Norma
Regulamentadora NR 6 (Brasil, 1978), por exemplo, dispõe sobre EPI e afirma que a empresa
é obrigada a fornecer aos empregados, gratuitamente, EPI adequado ao risco, em perfeito
estado de conservação e funcionamento.
A NR 32 (Brasil, 2005b) traz várias recomendações para os serviços de saúde. Dentre
elas, está o direito de todo trabalhador dos serviços de saúde receber, gratuitamente, programa
de imunização ativa contra tétano, difteria e hepatite B. Na mesma norma, também fica
vedado o reencape e desconexão manual de agulhas, práticas tão comuns e executadas
inadvertidamente no cotidiano laboral dos profissionais de Enfermagem.
Ademais, a Portaria n° 2.616 do Ministério da Saúde de 1998 destaca que a lavagem
de mãos é, isoladamente, a ação mais importante para a prevenção e controle das infecções
hospitalares. O profissional de Enfermagem que adotar com rigor esta prática colabora para a
segurança de sua saúde e dos pacientes (Brasil, 1998).
A tabela abaixo traz importantes instrumentos normativos sobre a Biossegurança no
país.
Tabela 2. Instrumentos de regulamentação sobre a Biossegurança no Brasil
Resolução CONAMA n° 05
de 1993 (CONAMA, 1993)
Resolução CONAMA n° 283
de 2001 (CONAMA, 2001)
Lei 11.105/2005 (Brasil,
2005a)
NR 32 do Ministério do
Trabalho e Emprego (Brasil,
2005b)
RDC n° 306 de 2004
(ANVISA, 2004)
Resolução CONAMA n° 358
de 2005 (CONAMA, 2005)
Lei nº 12.305, de 2 de agosto
de 2010 (Brasil, 2010b)
Dispõe sobre o gerenciamento de resíduos sólidos gerados nos portos,
aeroportos e fronteiras. Ela também tratava de estabelecimentos de saúde, mas
esta parte foi revogada pela Resolução n° 358/2005.
Foi revogada pela Resolução n° 358/2005 e dispunha sobre o tratamento e a
disposição final dos resíduos dos serviços de saúde.
Trata sobre normas e mecanismos de segurança relacionados aos OGMs.
Trata sobre a segurança e saúde no trabalho em ambientes de saúde. Foi
publicada em 2005.
Dispõe sobre o Regulamento Técnico para o gerenciamento de resíduos de
serviços da saúde. Substitui a Resolução RDC 33/2003 (ANVISA, 2003).
Dispõe sobre o tratamento e a disposição final dos resíduos de saúde; revogou
a Resolução n° 283 de 2001 e parte das disposições da Resolução n° 05 de
1993 que tratam dos resíduos sólidos oriundos dos serviços de saúde.
Institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos. É um de seus princípios a
visão sistêmica, na gestão dos resíduos sólidos, considerando as variáveis
ambiental, social, cultural, econômica, tecnológica e de saúde pública. Está
entre seus objetivos, a proteção da saúde pública e da qualidade ambiental.
3.4. Principais acidentes com material biológico entre profissionais de Enfermagem
Os acidentes com material biológico são bastante frequentes entre os profissionais de
Enfermagem, o que ocasiona constante risco de contaminação por agentes infecciosos
(Pinheiro; Zeitoune, 2008).
A manipulação de materiais contaminados com todos os tipos de secreções é inerente
às atividades da equipe de Enfermagem. O grande problema é que esses profissionais muitas
vezes os manipulam de forma inadequada, aumentando o risco dos acidentes (Pinheiro;
Zeitoune, 2008).
Um estudo sobre acidentes ocupacionais com material biológico na equipe de
Enfermagem revelou que a maioria dos acidentes foi percutâneo (85,7%) e em 67,8% das
exposições a agulha oca foi o objeto causador mais envolvido. As situações mais frequentes
de ocorrência foram punção vascular (26,8%) e administração de medicamentos (13,3%)
(Gomes et al, 2009).
Um estudo que abrangeu profissionais de Enfermagem e outros profissionais que
trabalham em contato com material biológico demonstrou as circunstâncias dos acidentes
conforme a Tabela 3 (Vieira; Padilha; Pinheiro, 2011).
Tabela 3. Circunstâncias dos acidentes com material biológico entre trabalhadores
PROCEDIMENTOS
FREQUENCIA (%)
Procedimentos cirúrgicos, odontológicos e laboratoriais
32,20%
Administração de medicamentos por via endovenosa
16,95%
Descarte inadequado do material contaminado
10,16%
No momento do reencape da agulha
5,93%
Outros
22,03%
Estudo realizado em um hospital geral do Município do Rio de Janeiro verifica o
potencial de risco com material perfurocortante. Evidenciou-se como causas para os
acidentes: falta de atenção, má condição de trabalho e uso de técnicas inadequadas. Os
profissionais de Enfermagem pesquisados consideram a Enfermagem uma profissão de
altíssimo risco e o seu trabalho de baixo risco, desde que sejam observadas as normas de
biossegurança e o autocuidado na prestação da assistência (Alves; Passos; Tocantins, 2009).
A exposição aos riscos começa durante a formação profissional. Uma pesquisa
realizada com estudantes de Enfermagem revelou que 63% deles não utilizava EPI adequados
quando prestavam assistência a pacientes com diagnóstico de tuberculose. Reconhece-se que
grande parte dos riscos poderia ser evitada com programas preventivos de saúde e de
segurança no trabalho, bem como com medidas coletivas e individuais de proteção (Pinheiro;
Zeitoune, 2008).
Em síntese, para atenuar riscos relacionados a agentes patogênicos faz-se necessário
conhecer as reais necessidades das atividades a serem realizadas, quais agentes de risco e tipo
de procedimentos a serem executados. A partir deste cenário, define-se a orientação e o
treinamento dos profissionais de Enfermagem e também de outras categorias expostas a estes
riscos, visando mitigar os acidentes e possíveis agravos entre os profissionais envolvidos.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os profissionais de Enfermagem estão expostos a diversos agentes, inclusive
biológicos. O fato de serem os profissionais de saúde que mais lidam com material
perfurocortante, além do cuidado próximo ao paciente, inerente à profissão, somados a adoção
de práticas inadequadas faz da Enfermagem a categoria mais exposta aos acidentes
ocupacionais dentro da área da saúde.
No tocante ao conhecimento de Biossegurança na área de Enfermagem, a maior parte
da produção científica está relacionada à exposição a agentes biológicos (56%). Evidencia-se
que não há abrangência suficiente do conteúdo sobre biossegurança nos currículos de
formação destes profissionais, o que pode levar ao comprometimento da segurança dos
próprios profissionais e dos pacientes atendidos. Mesmo com o conhecimento teórico
adquirido, muitos profissionais não adotam as práticas recomendadas que têm como fatores
causadores os externos, como a insuficiência de programas de educação permanentes, e os
internos, como a ausência da percepção de vulnerabilidade à infecção.
Considerando os resultados apresentados neste artigo, ratifica-se que a biossegurança
deve ser objeto de políticas governamentais mais intensas, considerando-se essencial
desenvolver um sistema organizacional objetivando a garantia das precauções aos
profissionais, aos pacientes e outros indivíduos que possam estar envolvidos e expostos aos
riscos, como visitantes de hospitais.
Deve haver medidas de prevenção para acidentes ocupacionais nas instituições em
conformidade com a legislação vigente num trabalho conjunto entre os trabalhadores
operacionais e os gestores. Ademais, educação permanente focada em fatores causadores é
essencial para a segurança dos profissionais e pacientes.
O tema biossegurança deve ser necessariamente incorporado aos currículos de
graduação e cursos técnicos da área de Enfermagem. Estreitar as relações entre instituições de
ensino, inclusive universidades, e as instituições de saúde são desejáveis para o intercâmbio
de conhecimento e prática cotidiana que possam colaborar para a proteção dos trabalhadores.
Trabalhar com a desconstrução de percepções equivocadas como a invulnerabilidade a
infecções. Além disso, conscientizar que a prática adequada não depende somente dos
supervisores, mas de todos os membros da equipe de Enfermagem. O exercício do
profissional de Enfermagem implica na necessidade de uma conduta ética, pois pode colocar
em risco, além de si mesmo, o paciente – objeto de cuidado.
Por fim, faz-se necessária e recomenda-se a realização de novos estudos que
contemplem, por exemplo, a contaminação biológica (HIV, Hepatites B e C, Tuberculose,
entre outras) por profissionais de Enfermagem nas diversas instituições de saúde no Brasil.
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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fiscalização de atividades que envolvam organismos geneticamente modificados – OGM e
seus derivados, cria o Conselho Nacional de Biossegurança – CNBS, reestrutura a Comissão
Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio, dispõe sobre a Política Nacional de
Biossegurança – PNB, revoga a Lei no 8.974, de 5 de janeiro de 1995, e a Medida Provisória
no 2.191-9, de 23 de agosto de 2001, e os arts. 5o, 6o, 7o, 8o, 9o, 10 e 16 da Lei no 10.814, de
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