OPINIO Revista de Ciências Empresariais, Políticas e Sociais o N 20 - Jan./Jun. 2008 ISSN 1808-964X Presidente Delmar Stahnke Vice-Presidente Emir Schneider Reitor Ruben Eugen Becker Vice-Reitor Leandro Eugênio Becker Pró-Reitor de Administração Pedro Menegat Pró-Reitor de Graduação da Unidade Canoas Nestor Luiz João Beck Pró-Reitor de Graduação das Unidades Externas Osmar Rufatto Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação Edmundo Kanan Marques Pró-Reitor de Assuntos Institucionais e Comunitários Jairo Jorge da Silva Pró-Reitora de Ensino a Distância Sirlei Dias Gomes Capelão Geral Gerhard Grasel Ouvidor Geral Eurilda Dias Roman OPINIO Conselho Editorial Cézar Roberto Bitencourt (PUCRS) Juan José M. Mosquera (PUCRS) Maria Cleci Martins (RF) Maria Emilia Camargo (ULBRA) Oscar Claudino Galli (UFRGS) Paulo Schmidt (UFRGS) Rui Otávio Berdardes de Andrade (CFA) Endereço para submissão Av. Farroupilha, 8001 CEP: 92425-900 - Canoas/RS - Brasil Fone: (51) 3477.9151 - Fax: (51) 3477.1313 E-mail: [email protected] EDITORA DA ULBRA E-mail: [email protected] Diretor: Valter Kuchenbecker Coordenador de periódicos: Roger Kessler Gomes Projeto e capa: Everaldo Manica Ficanha Editoração: Marcos Locatelli Solicita-se permuta. We request exchange. On demande l’échange. Wir erbitten Austausch. Endereço para permuta Universidade Luterana do Brasil Biblioteca Martinho Lutero - Setor de aquisição Av. Farroupilha, 8001 - Prédio 05 - 92425-900 - Canoas/RS E-mail: [email protected] Indexador: LATINDEX Comissão Editorial Ana Regina F. Simão Iria Margarida Garaffa O conteúdo e estilo lingüístico são de responsabilidade exclusiva dos autores. Direitos autorais reservados. Citação parcial permitida, com referência à fonte. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação - CIP O61 Opinio : revista do Centro de Ciências Econômicas, Jurídicas e Sociais / Universidade Luterana do Brasil. N. 1 (jan./jun. 1998). Canoas : Ed. ULBRA, 1998- . v. ; 27 cm. Semestral. ISSN 1808-964X 1. Ciências sociais aplicadas periódicos. 2. Direito. 3. Ciências econômicas. 4. Serviço social. 5. Administração. 6. Ciências políticas. 7. Ciências contábeis. I. Universidade Luterana do Brasil. CDU 65:3(05) Setor de Processamento Técnico da Biblioteca Martinho Lutero Sumário 2 3 Editorial Artigos Revisão conceitual sobre valor percebido e sua importância para a disciplina de marketing Valesca Reichelt 16 Mídias emergentes: um estudo exploratório sobre a evolução da comunicação e o florescimento de novas alternativas potenciais para relacionamento com o consumidor Cristina Gonçalves de Souza 36 Satisfação dos clientes do Banco Volkswagen Guilherme Shoji Araujo, Valesca Persch Reichelt, Gustavo Camossi 62 A questão do assédio ou dano moral dentro das políticas de recursos humanos das organizações Henrique Carvalho Kuhn 79 Comparando o ensino da Administração nas modalidades a Distância e Presencial Flávio Régio Brambilla 97 Estudo sobre a aplicação de métodos participativos no Programa de Capacitação de Agricultores Familiares em Turismo Maria Claudia Rodrigues, Camila Alvares Pasquetti 118 Os drivers do comércio eletrônico na hotelaria brasileira Luciana Maines da Silva, Paula Maines da Silva 135 Globalização social-nacionalista Marco A. Stail Filho, Rafael Klafke 143 Meio ambiente, qualidade, saúde e segurança: plano estratégico e seus elementos para a implantação de um sistema de gestão integrado e seu monitoramento na indústria Marie Cristine Fortes Rocha Normas editoriais Opinio, n.20, jan./jun. 2008 1 Editorial A presente edição da Opinio – Revista de Ciências Empresariais, Políticas e Sociais da ULBRA apresenta ao seu público leitor nove artigos inéditos que refletem uma variedade de abordagens teóricas e metodológicas em pesquisas de ponta sobre questões fundamentais para as áreas empresarial, política e social do país. A seguir são destacados os temas das pesquisas desta edição, com ênfase para aspectos administrativos, estratégicos, comunicacionais e de marketing. O artigo de Valesca Reichelt oferece uma revisão conceitual sobre o valor percebido, destacando sua importância para a disciplina de marketing. Já Cristina Gonçalves de Souza aborda o tema sempre atual das mídias emergentes, num estudo de tipo exploratório acerca da evolução da comunicação e o florescimento de novas alternativas potenciais para o relacionamento com o público consumidor. Guilherme Shoji Araújo, Valesca Persch Reichelt e Gustavo Camossi também avaliam a satisfação dos clientes, numa pesquisa feita junto ao Banco Volkswagen. O texto de Henrique Carvalho Kuhn alerta para a importância de esses profissionais enfrentarem as questões do assédio ou dano moral dentro das políticas de recursos humanos das organizações, enquanto Flávio Régio Brambilla compara o Ensino da Administração nas Modalidades a Distância e Presencial. Por sua vez, Maria Claudia Rodrigues e Camila Alvares Pasquetti oferecem aos leitores um estudo acerca da aplicação de métodos participativos em um programa de capacitação de agricultores familiares em turismo. Os drivers do comércio eletrônico na hotelaria brasileira são examinados por Luciana Maines da Silva e Paula Maines da Silva. Já os autores Marco A. Stail Filho e Rafael Klafke refletem sobre o que chamam de “Globalização Social-Nacionalista”. Finalmente, Marie Cristine Fortes Rocha examina a questão do Meio ambiente, qualidade, saúde e segurança a partir de um plano estratégico e de seus elementos para a implantação de um sistema de gestão integrado, bem como de seu monitoramento na indústria. Comissão Editorial 2 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 Revisão conceitual sobre valor percebido e sua importância para a disciplina de marketing Valesca Reichelt RESUMO Este artigo visa apresentar uma reflexão evolutiva e teórica do conceito de valor percebido, como aparece na literatura nacional e internacional. Como resultado, apresenta a síntese das abordagens dos principais teóricos e pesquisadores, assim como considerações sobre a importância do estudo do valor percebido para a disciplina de Marketing. Para tanto, a metodologia utilizada foi a pesquisa exploratória, através de uma análise qualitativa dos principais livros e artigos científicos disponíveis que abordam o tema valor percebido. O artigo se divide em três partes principais: a importância do estudo do valor percebido para o Marketing, que visa demonstrar as inter-relações deste tema com outros de grande interesse para a disciplina de Marketing; conceitos de valor percebido, visando caracterizar o objeto de estudo; e Tipologias de Valor Percebido, apresentando algumas sugestões de classificação. Palavras-chave: Marketing. Valor para o consumidor. Valor percebido. Conceptual revision about perceived value and its importance to marketing discipline ABSTRACT This article presents an evolutionary and theoretical reflection of the concept perceived value, as it appears in the national and international literature. As a result, presents the synthesis of main theoretical and researchers approaches, such as considerations towards the importance of studying the perceived value to Marketing discipline. To do so, exploratory methodology was used, with qualitative analysis of the main available books and scientific articles about perceived value. The article is divided in three principal parts: the importance of studying perceived value to Marketing; perceived value concepts, to characterize the study object; and Perceived Value Typologies, presenting some classification suggestions. Keywords: Marketing. Value to consumers. Perceived value. 1 INTRODUÇÃO O conceito de valor para o consumidor e valor percebido tem crescido de importância entre os acadêmicos e gestores de marketing nos últimos 20 anos, com Valesca Reichelt é graduada em Administração pela UFRGS, mestre e doutora em Administração pela EAESP/ FGV. Professora da ULBRA Canoas, em cursos de graduação e pós-graduação. E-mail: [email protected] Opinio Canoas p.3-15 Opinio,n.20 n.20, jan./jun. 2008 jan./jun. 2008 3 intensidade crescente. “Ampliar o conhecimento acerca do construto valor percebido – em sua aplicação na prática de negócios como fator estratégico de diferenciação – passa, portanto, a ser altamente relevante tanto para a teoria quanto para a prática gerencial” (PETERS, 2005). Inicialmente, os modelos de valor percebido eram baseados nas ciências econômicas e na relevância do valor monetário nas escolhas do consumidor (HAUSER; URBAN, 1986), para posteriormente evoluírem para a conveniência de compra, o serviço pós-venda e a dependência do fornecedor (SANTOS, 1997). Assim, a teoria sobre valor percebido pretende explicar as razões que permeiam as decisões de compra do consumidor. Segundo Holbrook (1999), valor é uma experiência de preferência relativa interativa, conseqüência da avaliação de algum produto por um indivíduo. São incorporadas características objetivas (características do produto) e subjetivas (envolvimento do indivíduo) na mensuração de valor. O valor é percebido, pois envolve experiências comparativas (entre um produto e outro), pessoais (variando de um indivíduo para outro) e situacionais (variando de acordo com o contexto). Tem-se que o conceito de valor para o consumidor não reside simplesmente no produto adquirido, mas sim na experiência de consumo como um todo. Portanto, o conceito de valor percebido está alinhado com a concepção de uma nova lógica para o Marketing, proposta por Vargo e Lusch (2004). Nesta nova lógica, é salientada a importância de aspectos intangíveis como determinantes da preferência do consumidor. Este artigo procura apresentar uma reflexão evolutiva e teórica do conceito e natureza do valor percebido pelo consumidor, a partir do estudo de diversos autores especializados no tema. Para tanto, o artigo está dividido nos seguintes tópicos: a importância do valor percebido para a disciplina de Marketing, caracterização do conceito de valor percebido e tipologia de valor percebido. A metodologia utilizada foi a pesquisa exploratória, de caráter qualitativo, a partir da análise de materiais elaborados por outros autores, principalmente livros e artigos científicos. Como resultado, é apresentada a síntese das abordagens dos principais teóricos, assim como reflexões da importância e estudo do valor percebido pelo consumidor. 2 A IMPORTÂNCIA DO VALOR PERCEBIDO PARA A DISCIPLINA DE MARKETING O conceito de valor percebido pelo consumidor desempenha um papel extremamente importante na atividade de Marketing e, como tal, merece atenção dos pesquisadores da área (HOLBROOK, 1999). O conceito de Marketing amplamente adotado, concebido por Kotler (2000) está fundamentado na teoria de valor percebido, uma vez que preconiza que “cada parte da transação abre mão de alguma coisa, em 4 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 troca de outra de maior valor”. Albrecht (1992) apud Sweeney e Soutar (2001) afirma que a única coisa que importa no novo mundo da qualidade é entregar valor ao cliente. Segundo Sheth, Gardner e Garrett (1988), a escola de marketing gerencial percebe a atividade de marketing como um processo gerencial preocupado com a facilitação e consumação de trocas. Tendo em vista o conceito de troca descrito no parágrafo anterior, fica evidente a importância do estudo do conceito de valor percebido para a disciplina de Marketing. Muitos acadêmicos de Marketing já perceberam a relevância do tema, o que se evidencia pela edição especial dedicada à mensuração do valor percebido pelo cliente do Journal of the Academy of Marketing Science (WOODRUFF, 1997; Parasuraman, 1997; Slater, 1997) e pelos demais estudos apresentados nos anos posteriores. O conceito de valor é amplamente abordado de forma mais genérica (ex: agregar valor) na literatura empresarial, e pode ser facilmente confundido com o conceito de satisfação (SWEENEY; SOUTAR, 2001). Apesar do conceito de Marketing girar em torno da satisfação dos clientes, o valor percebido pelo cliente como ferramenta estratégica para as organizações ainda é um conceito relativamente recente (SZAFIRGOLDSTEIN; TOLEDO, 2001). Crosby e Stephens (1987) apresentam três dimensões distintas das quais decorrem a satisfação do consumidor em uma interação de serviços. Tendo que, conforme exposto por Vargo e Lush (2004), o conceito de Marketing está evoluindo para uma nova lógica, onde as trocas estão centradas em serviços (bens intangíveis) e relacionamentos com os clientes, estas dimensões poderiam ser ampliadas para diversas situações de troca. As dimensões para a satisfação incluem: a) satisfação com quem se fez o contato; b) o serviço principal, a qualidade e o valor percebido do produto; c) a organização. Assim como Anderson et al. (1994) e Ravald e Grönroos (1996), McDougall e Levesque (2000) também consideram o valor percebido um dos mais importantes determinantes (drivers) para a satisfação do consumidor, assim como as dimensões principal e relacional de qualidade dos serviços. Demonstram ainda que existem conexões diretas entre a satisfação do consumidor e a intenção de comportamento futuro. Portanto, assim como percebemos a importância do valor percebido para o conceito de troca, também para a definição de satisfação do consumidor é importante dimensionar o valor, principalmente sabendo-se que as empresas buscam maior satisfação de seus consumidores, como uma forma de garantir sua retenção. Woodruff (1997) considera que a entrega de valor superior aos clientes é uma estratégia competitiva para a obtenção de satisfação, e conseqüentemente lealdade. A maior satisfação decorrente de um maior valor percebido é consistente com o conceito do homem econômico / racional, no qual o consumidor buscaria maior valor pelo seu dinheiro (MCDOUGALL; LEVESQUE, 2000). Entretanto, salientamos que o valor como antecedente de satisfação é só uma Opinio, n.20, jan./jun. 2008 5 das facetas que podem ser estudadas, pois trata-se de uma avaliação pós-compra e pós-uso. Na realidade, o valor percebido ocorre em diferentes estágios do processo de decisão de compra, como por exemplo a pré-compra (SWEENEY; SOUTAR, 2001; Gardial et al., 1994; Oliver, 1999). Portanto, a percepção de valor pode ocorrer antes do produto ser comprado ou usado, o que não ocorre com a satisfação. Sendo assim, a satisfação acaba sendo tanto um antecedente de valor percebido, quanto um resultado deste (PETERS, 2005). Além disso, satisfação é considerada um construto unidimensional, variando de favorável a desfavorável, enquanto que valor é visto como uma construto multidimensional, como veremos a seguir, no tópico 3 (SWEENEY; SOUTAR, 2001). 3 CARACTERIZAÇÃO DO CONCEITO DE VALOR PERCEBIDO Szafir-Goldstein e Toledo (2001), assim como MacDougall e Levesque (2000), e Sweeney e Soutar (2001) discutem a grande variedade de definições e termos que envolvem o tema Valor Percebido, gerando dificuldades para sua conceituação. Para eles, é importante analisar o conceito tanto sob a ótica interna, do fornecedor, quanto sob a ótica externa, do consumidor, pois em muitas circunstâncias há diferenças entre estas duas óticas. Outros estudos, como os de Peters (2005; 2003), também procuram comparar a visão do valor de fornecedores e compradores. O conceito de valor em si não é novo, sendo utilizado em ciências como a Economia - o valor é o preço do produto, uma conseqüência ora da quantidade de trabalho empregada no bem (MARX, apud SZAFIR-GOLDSTEIN; TOLEDO, 2001), ora da “mão invisível”, ou oscilações de mercado (SMITH, 1974). Entretanto, sob o ponto de vista do cliente, o preço expressa aquilo que ele está disposto a pagar para obter o produto (ROCHA; CHRISTENSEN, 1987). Na Psicologia – o conceito de valor aparece nos valores de julgamento ou juízo de valor (SZAFIR-GOLDSTEIN; TOLEDO, 2001). Em Marketing, por sua vez, o conceito de valor “é considerado um conceito central, examinado no âmbito de troca” (SZAFIR-GOLDSTEIN; TOLEDO, 2001). Apesar do contexto de troca mencionado estar correlacionado com o contexto econômico, em Marketing o valor é estudado a partir da percepção do cliente, diante de escolhas dentro de uma classe de produtos. Ao que parece, o primeiro autor a tratar do conceito de valor para o cliente (ou consumer value) foi Alderson (1957), seguido por Drucker (1973). Em estudos mais recentes, entretanto, esta noção de valor tem aparecido inserida na visão de estratégia da empresa, originando a noção de orientação para o mercado, onde o foco em valor para o cliente é central (WOLDRUFF, 1997; PARASURAMAN, 1997). Em Marketing, a palavra valor é geralmente associada ao contexto de percepção, gerando o termo “valor percebido” (ou perceived value). Este conceito tem sido teorizado por muitos estudiosos de Marketing, como Woldruff (1997), Zeithaml (1998) 6 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 e Gale (1996). Apesar de haver algumas divergências entre os conceitos, este autores concordam que valor percebido: - está vinculado ao uso de algum produto (ou serviço); - é percebido pelo cliente, o que não necessariamente foi definido pelo fornecedor; - é a relação entre o que o cliente recebe, o que chamaremos de ônus (utilidade, benefícios) e o que o cliente entrega para comprar, receber e/ou utilizar este produto ou serviço, o que chamaremos de bônus (preço, custo e sacrifícios) (SZAFIRGOLDSTEIN; TOLEDO, 2001). Para Zeithaml (1988), valor é uma função positiva de qualidade, atributos extrínsecos (como funcionalidade e outros, definidos posteriormente por Holbrook, 1999) e intrínsecos (prazer, valores pessoais e outros, também definidos por Holbrook, 1999) e negativa dos custos, que podem ser tanto monetários quanto não monetários, como o tempo, esforço e desconfortos sensoriais (LOVELOCK; WRIGHT, 2005). Portanto, poderíamos sintetizar o conceito de valor pela fórmula: Valor = ƒ (bônus / ônus) Tanto os bônus (aspectos positivos formadores do valor para o cliente) quanto os ônus (aspectos negativos formadores do valor para o cliente) são percebidos pelos clientes, constituindo-se de avaliações pessoais, idiossincráticas, e que variam bastante de cliente para cliente (MCDOUGALL; LEVESQUE, 2000; HOLBROOK, 1999; ZEITHAML, 1988). Anderson e Narus (1999) e Lapierre (2000) por sua vez concentram-se no estudo do valor para os mercados empresariais, ou seja, quando o cliente, assim como o fornecedor, também é uma empresa. Nestes casos, a mudança no valor para o cliente pode ocorrer de duas formas: variação de custos para o cliente sem alteração no desempenho, ou o oposto – alteração no desempenho com os custos mantidos constantes. Em geral o comprador foca características como flexibilidade, capacidade de resposta, funcionalidade e desempenho, apesar de em algumas circunstâncias a escolha do comprador empresarial poder recair em estética ou gosto, assim como o consumidor final (HOLBROOK, 1999; ANDERSON; NARUS, 1999; LAPIERRE, 2000). Em geral o conceito de valor interage com outros conceitos relevantes para o estudo do Marketing, como satisfação (ZEITHAML, 1988; WOODRUFF, 1997; MCDOUGALL; LEVESQUE, 2000), confiança (ALMEIDA; BOTELHO, 2005), qualidade (CRONIN JR, BRADY; HULT, 2000), lealdade (CASTRO; RIBEIRO, 2005), reclamações (SANTOS; FERNANDES, 2005) entre outros. A partir da necessidade de desenvolvimento de medidas psicométricas para melhor mensurar e compreender o construto do valor para o cliente, apontada por Parasuraman (1997), diversos modelos já foram desenvolvidos de forma a medir valor, bem como a relação Opinio, n.20, jan./jun. 2008 7 entre valor e os conceitos acima mencionados (PETERS, 2003; SANTOS; FERNANDES, 2005; CASTRO; RIBEIRO, 2005; entre outros). Holbrook (1999) define valor percebido como uma experiência de preferência relativa e interativa, onde ocorre a avaliação de um objeto por alguém. Portanto, são ressaltadas quatro facetas do valor percebido, que estão inter-relacionadas entre si: interatividade, relativismo, afetividade e experiência de consumo. Essas quatro características não são mutuamente exclusivas nem tampouco independentes uma das outras. Segue breve descrição de cada uma delas: Interatividade: Como mencionado anteriormente, o valor percebido pressupõe uma interação entre alguém (um sujeito) e algo (um objeto). Tipicamente, este alguém será um consumidor ou cliente, enquanto o objeto será um produto, seja bem tangível, prestação de serviços, idéia, etc. O subjetivismo extremo apontaria que o valor depende exclusivamente da avaliação do sujeito (orientação para o consumidor, conforme LEVITT, 1960), enquanto que o objetivismo extremo concentra-se nas características do objeto, seguindo um referencial comparável ao marxista, onde um objeto é avaliado em termos da quantidade de trabalho investido nele (HOLBROOK, 1999). Ou, do ponto de vista de Levitt (1960), seria a orientação para produto que definiria seu valor. Entretanto, a postura adotada por Holbrook (1999) é intermediária, sugerindo uma interação entre sujeito e objeto. Em outras palavras, o valor percebido depende tanto das características do objeto analisado quanto do envolvimento de algum sujeito que aprecia estas características. Relativismo: Esta característica pode ser compreendida a partir de três perspectivas: comparativa, pessoal e situacional (HOLBROOK, 1999). A perspectiva comparativa pressupõe que um consumidor só poderia definir o valor percebido de um produto em comparação com outro, avaliado pelo mesmo consumidor. A perspectiva pessoal define que o valor varia de pessoa para pessoa, levando em consideração o princípio essencial de Marketing de que as pessoas diferem entre si, o que permite que estratégias de segmentação de mercado sejam adotadas. Por fim, temos que o valor percebido é situacional, ou seja, depende do contexto no qual a avaliação está sendo feita. Contexto seria um conjunto de circunstâncias, dado determinado tempo e local, ou mesmo o momento da avaliação, seja a hora da compra, durante ou após o uso do produto (GARDIAL et al., 1994; OLIVER, 1999). Assim, na compra seria avaliado o valor desejado, e após o uso (ou durante o uso) seria avaliado o valor recebido (SZAFIRGOLDSTEIN; TOLEDO, 2001). Alguns autores relacionam este argumento com o estudo do valor percebido no Marketing Industrial (SZAFIR-GOLDSTEIN; TOLEDO, 2001, ANDERSON; NARUS, 1999), ou no Marketing de Relacionamento (SANTOS; FERNANDES, 2005; CASTRO; RIBEIRO, 2005; RAVALD; GRÖNROOS, 1996; CROSBY; STEPHENS, 1987). Afetividade: O valor percebido envolve um julgamento de preferências, cujo conceito agrega noções de afeto (prazer versus desprazer), atitude (gosta versus não gosta), avaliação (bom versus ruim), predisposição (favorável versus desfavorável), opinião (pró versus contra), tendência de resposta (aceitação versus aversão) e valência (positiva versus 8 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 negativa). Em termos de preferências, é importante fazer a distinção entre valor e valores: valor, no singular, é utilizado no sentido de resultado de um julgamento de avaliação; o termo valores, no plural, está relacionado aos critérios de avaliação, envolvendo normas, regras, padrões, ideais, objetivos,etc. (HOLBROOK, 1999). Experiência de consumo: o valor para o consumidor não deriva do produto comprado ou da marca escolhida, mas sim da experiência de consumo que decorre destes (HOLBROOK, 1999). A seguir, serão apresentadas as diferentes tipologias de valor disponíveis na literatura. 4 TIPOLOGIA DE VALOR PERCEBIDO A importância da distinção de diferentes tipos de valor percebido se dá na percepção de que só é possível compreender um determinado tipo de valor quando é feita a comparação entre ele e outros tipos, aos quais está relacionado (HOLBROOK, 1999). Ou seja, para compreender qualquer um dos tipos específicos de valor, é preciso conhecer a existência dos demais. Trata-se portanto de um construto multidimensional (SHETH et al., 1991; SWEENEY; SOUTAR, 2001). Para Holbrook (1999), há três dimensões de valor para o consumidor: a) Valor Intrínseco versus Extrínseco; b) Valor auto-orientado versus Orientado para os outros; c) Valor Ativo versus Reativo. a) Valor intrínseco versus extrínseco No valor extrínseco, o consumo é relacionado à sua característica funcional, utilitária e instrumental para obtenção de algum propósito ou objetivo. O valor intrínseco, por sua vez, ocorre quando a experiência de consumo é um fim em si mesma, sendo autojustificada e lúdica. b) Valor auto-orientado versus orientado para os outros No valor auto-orientado, a experiência de consumo é orientada egoisticamente, a partir de como o consumidor reage a ela ou qual o efeito desta experiência para o consumidor. No valor orientado para os outros, por sua vez, a experiência de consumo é orientada para como os outros irão reagir, ou para o efeito que este consumo terá sobre os outros. c) Valor ativo versus reativo O valor é considerado ativo quando a experiência de consumo envolve algo feito pelo consumidor, para ou com um produto (por exemplo, montar um quebracabeças). O valor reativo, entretanto, envolve algo feito por um produto, para ou com um consumidor (por exemplo, admirar uma obra de arte). A tipologia de valor proposta por Holbrook (1999), portanto, apresenta uma Opinio, n.20, jan./jun. 2008 9 combinação destas três dimensões de valor para o consumidor, conforme a tabela a seguir: TABELA 1 – Tipologia de valor para o consumidor. Fonte: Holbrook, 1999, p.12. A combinação apresentada na tabela acima sugere a existência de seis tipos diferentes de valor. Abaixo, cada um deles é comentado separadamente. Eficiência: Valor extrínseco que resulta do uso ativo de um produto, como meio de adquirir objetivos auto-orientados. É medida a partir de uma comparação entre inputs (custos envolvidos - ônus) e outputs (benefícios recebidos – bônus). Um dos inputs mais relevantes é o tempo, gerando um caso particular de eficiência ao qual chamamos conveniência. (LECLERC; SCHMITT, 1999). Excelência: Envolve uma apreciação reativa da habilidade potencial de algum objeto ou experiência servir a finalidades pessoais e auto-orientadas. Segundo Oliver (1999), o valor para o consumidor envolve uma avaliação entre o que é recebido (inclusive excelência) em relação aos sacrifícios. O valor de excelência é comparável ao conceito de satisfação, onde o consumidor avalia o desempenho do produto ou serviço em relação às suas expectativas anteriores (ZEITHAML, 1988). Oliver (1999) define satisfação como um estado temporal pós uso decorrente de uma situação de consumo única ou de experiências de consumo repetidas que refletem como um produto atendeu às finalidades pessoais propostas pelo consumidor. Status: Envolve questões como o sucesso e a administração das impressões. Portanto, consiste em uma manipulação ativa do próprio comportamento de consumo como um meio extrínseco para obter respostas favoráveis de outros. Os consumidores escolheriam produtos e experiências de consumo em parte como um conjunto de símbolos com a intenção de obter sucesso na forma de status, na visão dos outros. (SOLOMON, 1999). Estima: Está relacionada com a reputação, materialismo e posses. Status e estima estão intimamente relacionados, sendo que estima é uma contraparte reativa de status, resultando da propriedade passiva de bens, como meio de construir uma reputação perante os outros (RICHINS, 1999). Diversão: está geralmente relacionado a momentos de lazer (no sentido oposto 10 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 ao de trabalho). Trata-se de uma experiência auto-orientada (GRAYSON, 1999). Estética: é uma experiência de consumo com finalidade em si mesma, envolvendo o conceito de beleza e apreciação, de uma perspectiva auto-orientada. Pode aparecer no caso das belas artes, como música, dança, pintura, escultura e poesia (WAGNER, 1999). Ética: Envolve conceitos como virtude, justiça e moral. É fazer algo para o bem dos outros, ou seja, a partir de um discernimento sobre como determinado comportamento de consumo afetará os outros ou como eles reagirão (SMITH, 1999). Espiritualidade: Alguns termos relacionados seriam fé, êxtase, sagrado e mágico. Brown (1999) conceitua o valor de espiritualidade como uma motivação intrínseca de aceitação, adoção, apreciação, admiração ou adoração de outro, quando este outro é constituído de algum poder divino, força cósmica ou entidade mística, e esta experiência de consumo é buscada como um fim em si mesmo. Outra tipologia de valor foi desenvolvida por Sweeney e Soutar (2001). Eles perceberam quatro diferentes dimensões de valor, a saber: social, emocional, de qualidade / performance e de preço / valor pelo dinheiro.1 A intenção dos autores foi acrescentar novas dimensões aos conceitos de qualidade versus preço (ZEITHAML, 1988) e valor pelo dinheiro, especificamente para o caso da decisão de escolha de uma marca específica de algum produto. Sheth, Newman e Gross (1991) também sugeriram cinco diferentes dimensões de valor, que seriam: social, emocional, funcional, epistêmico (idéia de novidade, que geraria curiosidade no consumidor) e condicional, referindo-se especificamente à utilidade percebida de uma escolha, e não à decisão de comprar ou não comprar, ou da escolha específica de um produto ou marca (SWEENEY; SOUTAR, 2001). Por restringir o estudo a este nível de decisão, Sheth et al. (1991) consideraram o valor funcional como o mais importante, envolvendo atributos como confiabilidade, durabilidade e preço.2 Entretanto em outros níveis é provável que as outras dimensões assumam maior influência. Além disso, Sweeney e Soutar (2001) acreditam que as dimensões de valor estão relacionadas entre si, podendo surgir em uma mesma experiência de consumo mais de uma dimensão. O mesmo não é apresentado por Sheth et al. (1991), que acreditam que as dimensões operam de maneira independente. Uma das dimensões de valor apresentadas por Sheth (1991) diz respeito à característica definida como relativismo por Holbrook (1999): o valor condicional. Entretanto, em pesquisa posterior realizada por Sweeney e Soutar (2001), a análise exploratória realizada não identificou esta dimensão. Os autores crêem que isso ocorreu pelo fato de o valor condicional ser um caso específico das demais dimensões de 1 Estes autores criaram escala de medição de valor denominada PERVAL. Sweeney e Soutar (2001) consideram inadequado tratar estes três atributos na mesma dimensão, uma vez que os dois primeiros – confiabilidade e durabilidade – são tradicionalmente vistos como aspectos da qualidade. Qualidade e preço são dimensões opostas de valor percebido, para autores como Zeithaml (1988): qualidade como uma função positiva e preço como uma função negativa. Tratar estes atributos em diferentes dimensões foi a principal contribuição da escala desenvolvida por Sweeney e Soutar (2001). 2 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 11 valor, como funcional e social. Esta dimensão apareceria apenas em situações específicas, como ocasiões sociais ou doença. Portanto, as dimensões de valor propostas por Sweeney e Soutar (2001), que incluem tanto componentes hedônicos quanto utilitários, estão representadas na tabela a seguir: TABELA 2 – Dimensões de valor para o cliente. Fonte: Sweeney e Soutar, 2001, p. 211. 5 CONCLUSÕES Com o presente artigo, a autora pretende contribuir para a melhor compreensão do tema valor percebido entre acadêmicos, auxiliando na realização de novas pesquisas que abordem o mesmo tema. As abordagens e reflexões apresentadas contribuem para o melhor conhecimento do tema, na medida em que: - apontam os relacionamentos existentes entre importantes conceitos de Marketing e o conceito de valor percebido, salientando a importância do estudo de valor pecebido para o avanço acadêmico na disciplina de Marketing; - auxiliam os gestores de Marketing, através da demonstração da importância de se conhecer o valor percebido para a criação e implementação de estratégias mercadológicas de sucesso; - esclarecem os diferentes conceitos de valor percebido presentes na literatura disponível, salientando seus diferentes enfoques e abordagens surgidos em diferentes áreas da ciência e momentos históricos diversos; - buscam a convergência das diferentes visões apresentadas. Portanto, este artigo pode constituir-se como ponto de partida para outros pesquisadores que desenvolvam trabalhos sobre o valor percebido, no âmbito da disciplina de Marketing. 12 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 REFERÊNCIAS ALBRECHT, Karl. The only thing that matters. Executive Excellence, v.9, November 1992. p.7. Apud SWEENEY, Jillian C.; SOUTAR, Geoffrey N. Consumer perceived value: the development of a multiple item scale. Journal of Retailing, v.77, 2001. pp.203– 220. ALDERSON, Wroe. Marketing behavior and Executive Action: a funcionalist approach to marketing theory. Homewood, Illionois: Richard D. Irwin, Inc., 1957. Apud SHETH, Jagdish N.; GARDNER, David M.; GARRETT, Dennis E. Marketing theory: evolution and evaluation. New York: John Wiley & Sons, Inc., 1998. ALMEIDA, Alda R. D.; BOTELHO, Delane. Confiança, qualidade ou valor percebido: o que influencia a satisfação na compra de um imóvel? In: 29º. Encontro da Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Administração – EnANPAD, 2005, Brasília/DF. Anais. Brasília/DF: Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Administração, 2005. ANDERSON, E. W. et al. Customer Satisfaction, Market Share and Profitability: findings from Sweden. Journal of Marketing, v.58, jul. 1994. pp.53–66. ANDERSON, J. C.; NARUS, J. A. Business Marketing Management: understanding, creating and delivering value. New Jersey: Prentice-Hall, 1999. BROWN, Stephen. Devaluing value: the apophatic ethic and the spirit of postmodern consumption. In: HOLBROOK, Morris B. Consumer Value: a framework for analysis and research. New York: Routledge, 1999. CASTRO, Íris; RIBEIRO, Áurea. Do valor à lealdade: escalas para medir níveis de lealdade e os seus antecedentes. 4th International Meeting of the Iberoamerican Academy of Management, Lisboa, 2005. CRONIN JR., J. Joseph; BRADY, Michael K.; HULT, G. Tomas M. Assessing the Effects of Quality, Value, and Customer Satisfaction on Consumer Behavioral Intentions in Service Environments. Journal of Retailing, Vol. 76, Issue 2, Summer 2000. p.193, 24p. CROSBY, Lawrence A.; STEPHENS, Nancy. Effections of Relationship Marketing on satisfaction, retention and prices in the life insurance industry. Journal of Marketing Research, v.24, n.4, nov. 1987. pp.404–411. DRUCKER, P. F. Management: tasks, responsibilities, practices. New York: Harper & Row, 1973. Apud: SZAFIR-GOLDSTEIN, Cláudia; TOLEDO, Geraldo Luciano. Valor percebido: a ótica do cliente e a ótica do fornecedor. São Paulo: V Semead – Seminários em Administração FEA – USP, São Paulo/SP, 2001. GALE, B. T. Gerenciando o Valor do Cliente. São Paulo: Editora Pioneira, 1996. GARDIAL, S. F. et al. Comparing consumers recall of prepurchase and postpurchase product evaluation experiences. Journal of Consumer Research, v.20, n.4, March 1994. pp.548–560. GRAYSON, Kent. The dangers and opportunities of playful consumption. In: HOLBROOK, Morris B. Consumer Value: a framework for analysis and research. New York: Routledge, 1999. HOLBROOK, Morris B. Consumer Value: a framework for analysis and research. Opinio, n.20, jan./jun. 2008 13 New York: Routledge, 1999. KOTLER, Philip. Administração de Marketing. São Paulo: Makron, 2000. LAPIERRE, Jozée. Customer perceived value in industrial contexts. Journal of Business and Industrial Marketing, v.15, n.2/3, 2000. pp.122–140. LECLERC, France; SCHMITT, Bernd H. In: HOLBROOK, Morris B. Consumer Value: a framework for analysis and research. New York: Routledge, 1999. LEVITT, Theodore. Marketing Myopia. Harvard Business Review, jul./ago. 1960. LOVELOCK, Christopher H.; WRIGHT, L. Serviços: Marketing Gestão. São Paulo: Saraiva, 2005. MCDOUGALL, Gordon H. G.; LEVESQUE, Terrence. Customer satisfaction with services: putting perceived value into the equation. Journal of Services Marketing, v.14, n.5, 2000. pp.392–410. OLIVER, Richard L. Value as excellence in the consumpion experience. In: HOLBROOK, Morris B. Consumer Value: a framework for analysis and research. New York: Routledge, 1999. PARASURAMAN, A. Reflections of gaining competitive advantage through customer value. Journal of the Academy of Marketing Science, v.25 (2), 1997. pp.154–161. PETERS FILHO, Theodoro A. Formatação de modelagem de equações estruturais para mensuração de valor percebido e envolvimento do consumidor em serviços. Revista Relações Humanas, n.20, ago. 2003. pp.19-25. ______. Estratégia de serviços e valor para o consumidor em restaurantes finos. Revista Relações Humanas, n.22, out. 2005. pp.36- 45. RAVALD, A.; GRÖNROOS, C. the value concept and relationship marketing. European Journal of Marketing, v.30, n.2, 1996. pp.19–30. RICHINS, Marsha L. Possessions, materialism, and other-directedness in the expression of self. In: HOLBROOK, Morris B. Consumer Value: a framework for analysis and research. New York: Routledge, 1999. SANTOS, Cristiane Pizzutti; FERNANDES, Daniel Von Der Heyde. A Recuperação de serviços como ferramenta de relacionamento: seu impacto na confiança e lealdade dos clientes. In: 29º. Encontro da Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Administração – EnANPAD, 2005, Brasília/DF. Anais. Brasília/DF: Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Administração, 2005. SHETH, J. N.; GARDNER, D. M.; GARRET, D. E. Marketing Theory: Evolution and Evaluation. John Wiley & Sons, 1988. SHETH, Jagdish N.; NEWMAN, Bruce I.; GROSS, Barbara L. Why we buy what we buy: a theory of consumptions values. Journal of Business Research, v.22, March 1991. pp.159–170. SLATER, Stanley F. Developing a Customer value-based theory of the firm. Journal of the Academy of Marketing Science, v.25 (2), 1997. pp.162–167. SMITH, Adam. A Riqueza das Nações. São Paulo: Abril Cultural, 1974. SMITH, N. Craig. Ethics and the tipology of consumer value. In: HOLBROOK, Morris B. Consumer Value: a framework for analysis and research. New York: Routledge, 1999. 14 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 SOLOMON, Michael R. The value of status and the status of value. In: HOLBROOK, Morris B. Consumer Value: a framework for analysis and research. New York: Routledge, 1999. SWEENEY, Jillian C.; SOUTAR, Geoffrey N. Consumer perceived value: the development of a multiple item scale. Journal of Retailing, v.77, 2001. pp.203–220. SZAFIR-GOLDSTEIN, Cláudia; TOLEDO, Geraldo Luciano. Valor percebido: a ótica do cliente e a ótica do fornecedor. São Paulo: V Semead – Seminários em Administração FEA – USP, São Paulo/SP, 2001. VARGO, S. L.; LUSCH, R. Evolving to a New Dominant Logic for Marketing. Journal of Marketing, v.68, January 2004. WAGNER, Janet. Aesthetic value: beauty in the art and fashion. In: HOLBROOK, Morris B. Consumer Value: a framework for analysis and research. New York: Routledge, 1999. WOODRUFF, Robert B. Customer value: the next source for competitive advantage. Journal of the Academy of Marketing Science, v.25 (2), 1997. pp.139–153. ZEITHAML, Valarie A. Consumer perceptions of price, quality and value: a meansend model and synthesis of evidence. Journal of Marketing, v.52, July 1988. pp.2–22. Opinio, n.20, jan./jun. 2008 15 Mídias emergentes: um estudo exploratório sobre a evolução da comunicação e o florescimento de novas alternativas potenciais para relacionamento com o consumidor Cristina Gonçalves de Souza RESUMO O presente trabalho propõe uma análise exploratória da comunicação de marketing no contexto da atualidade. A comunicação de massa passa por um esgotamento, na mesma medida em que a propaganda tradicional tem passado por um momento de transformações com o surgimento das mídias emergentes. A crescente inclusão digital leva a cada dia um número maior de empresas a perceber as vantagens de usar a Internet como uma poderosa ferramenta de marketing. A pesquisa partiu de um levantamento bibliográfico sobre comunicação e mídia digital na atualidade, destacando as novas práticas de relacionamento com o consumidor, com ênfase na moda e na Internet. A metodologia se sustentou em fundamentação teórica e pesquisa exploratória no ambiente virtual. O objetivo final é demonstrar como os novos formatos de mídia podem contribuir para o sucesso das organizações, principalmente no que tange ao seu relacionamento com o consumidor, e como estão influenciando o comportamento da sociedade e do consumidor de forma decisiva. Palavras-chave: Marketing. Mídia digital. Relacionamento com o consumidor. Melissa. Emerging Media: An exploratory study about communication evolution and raising new potential alternatives for building relationships with customers ABSTRACT The present work considers a research analysis of the communication of marketing in the context of the present time. The mass communication is passing for an exhaustion, in the same measure where the traditional propaganda has passed for a moment of transformations with the sprouting of the emergent medias. The increasing digital inclusion has taken to each day a bigger number of companies to perceive the advantages to use the Internet as a powerful tool of marketing. The research left of a bibliographical survey, about communication and digital media in the present time, detaching new the practical ones of relationship with the Cristina Gonçalves de Souza é especialista em Marketing pelo UNIVEM – Centro Universitário Eurípides de Marília. E-mail: [email protected] 16 Opinio Canoas p.16-35 Opinio,n.20 n.20, jan./jun. 2008 jan./jun. 2008 consumer, emphasis in fashion and in the Internet. The methodology if supported in theoretical recital and research in the virtual environment. The final objective is to demonstrate as the new formats of media can contribute for the success of the organizations, mainly in what it refers to its relationship with the consumer, and as they are influencing the behavior of the society and the consumer of decisive form. Keywords: Marketing. Digital media. Consumer relationship. Melissa. 1 INTRODUÇÃO Atualmente as organizações têm competido freneticamente no mercado em busca de uma posição de destaque frente à concorrência, que se mostra cada vez mais exacerbada. Especificamente em relação à comunicação de massa, percebe-se um esgotamento da estratégia ligada a esse esforço, pois a propaganda tradicional tem passado por um momento de transformações. Novas mídias alternativas e canais de comunicação surgem graças ao desenvolvimento da tecnologia. Recursos como catálogos em vídeo, mobile marketing, busdoor, mídia em metrô, anúncios em novas tecnologias e quaisquer outros que venham a estar fora do quadro comum de meios e veículos de comunicação, vem ganhando espaço nestes últimos anos. Assim sendo, a análise descritiva do processo de renovação das estratégias de comunicação das organizações, em especial novos formatos e experiências que surgem a partir da evolução tecnológica, torna-se essencial. Isso se fundamenta na perspectiva de que o comportamento e hábitos da sociedade são influenciados por tais mudanças, de forma que a inovação tecnológica bebe da fonte dos novos anseios da sociedade e a sociedade é moldada conforme a tecnologia lhe apresenta novos produtos. A crescente inclusão digital notada no Brasil, a consolidação das vendas de bens de consumo pela rede e a estabilidade da economia brasileira são pontos positivos que explicam o atual estágio do comércio eletrônico e os números nacionais não ficam devendo aos americanos ou europeus. Transações entre empresas pela Internet movimentaram R$ 133,4 bilhões no primeiro trimestre de 2007, representando um crescimento de 43,5% em relação ao mesmo período de 2006, de acordo com a Câmara Brasileira de Comércio Eletrônico1 . A cada dia um número maior de empresas percebe as grandes vantagens de usar a Internet como ferramenta na realização de suas transações no mundo corporativo; uma tendência irreversível que ganhará um ritmo maior à medida que se ampliam no país as iniciativas de massificação do uso de tecnologias como a certificação digital, que garante um ambiente jurídico seguro para este tipo de transação. 1 A Câmara Brasileira de Comércio Eletrônico, fundada em 07 de maio de 2001, é a principal entidade multissetorial da Economia Digital no Brasil e América Latina, voltada ao comércio eletrônico como fator estratégico de desenvolvimento econômico na era do conhecimento (http://www.camara-e.net). Opinio, n.20, jan./jun. 2008 17 Comprovando o êxito do comércio eletrônico brasileiro, as compras feitas pela Internet de CDs, DVDs, livros e outros bens de consumo, somadas à aquisição de automóveis e serviços ligados ao turismo, somaram R$ 4,4 bilhões no primeiro trimestre de 2007, um crescimento de 57% em relação ao mesmo período do ano anterior. Esta é a principal constatação do Índice de Varejo On Line (VOL), estudo divulgado pela E-Consulting2 e pela Câmara Brasileira de Comércio Eletrônico3 . Ainda no primeiro trimestre de 2007, foram estimados um total de 5,7 milhões de e-compradores, perto de 20% a mais do que em março de 2006. Além de todos os fatores favoráveis já citados, a Internet é um meio de comunicação extremamente atraente, capaz de impulsionar o crescimento de anúncios com soluções de mídia, pois converge imagem, animação, vídeo e som com a vantagem extra da interatividade. O crescimento do uso de Internet e a explosão do comércio eletrônico continuam guiando o forte crescimento da propaganda e promoção on-line, particularmente os microssites, a busca patrocinada, os banners e o vídeo on-line, que está dando uma pequena contribuição para a mudança da publicidade da televisão para a Internet. Conforme previsão do Instituto Enders Analysis4 , a Internet ultrapassará a televisão como o maior meio de propaganda neste ano de 2008 na Inglaterra, com 19% do total gastos em publicidade, com claros sinais de migração dos gastos da TV para a Internet, e acima de tudo uma grande mudança para o meio on-line. Ainda não se tem estabelecido qual o verdadeiro espectro da Internet como veículo de publicidade, promoção de vendas ou comunicação de marketing. Mas é de se esperar outras profundas mudanças no mercado da comunicação, provocadas pela Internet. Há cada vez mais pessoas navegando na internet por mais tempo, e mais empresas procurando novos meios para veicular mensagens publicitárias. O marketing eletrônico vem crescendo vertiginosamente, graças ao volume de investimentos nesta nova e poderosa mídia, que confirma sua força a cada dia. Tendo grande interesse por este momento transitório pelo qual passa a comunicação e a propaganda em âmbito global, o presente trabalho procura discorrer sobre as novas alternativas de comunicação, com ênfase nas possibilidades advindas do avanço tecnológico, em especial a Internet. Há de se ressaltar que, conforme esclarece Shimp (2002), qualquer um que alegue conhecimento definitivo sobre a tecnologia interativa e seus potenciais efeitos na propaganda, deve ser evitado, pois ainda é cedo para ser firmada uma teoria categórica. Embora o assunto seja amplo, o foco essencial estará sustentado no setor de moda, tendo como objeto de estudo a marca Melissa e sua inovadora forma de 2 A E-Consulting® Corp. é uma Boutique de Projetos 100% brasileira, líder em criação, desenvolvimento e implementação de serviços profissionais em TI, Telecom, Mídia, Internet e Contact Center para empresas líderes em seus mercados. 3 http://www.camara-e.net 4 Empresa britânica de consultoria que fornece um serviço de pesquisa aos subscritores nas indústrias de mídia, entretenimento e telecomunicações na Europa, com um foco especial na reação às novas tecnologias e mídias. 18 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 comunicação com o consumidor. Moda e Internet são dois elos que unem consumidores, e a Melissa utiliza este canal de comunicação com proficuidade. Este estudo tem como ponto de partida um levantamento bibliográfico sobre marketing e sua aplicabilidade, com foco em mídias emergentes como a Internet. Para a pesquisa sobre mídias digitais, além da revisão bibliográfica, foi feita uma pesquisa baseada em conteúdos oriundos da Internet, dada a escassez da literatura neste campo e a contemporaneidade do assunto. 2 MARKETING E MIX DE MARKETING Muitos autores procuram definir Marketing aprimorando e discutindo seus conceitos. Atualmente a definição mais aceita e difundida é a de Kotler (2006, p.4), para quem “o marketing é um processo social e gerencial pelo qual indivíduos e grupos obtêm o que necessitam e desejam por meio da criação, da oferta e da livre troca de produtos e serviços de valor com outros”. Cobra (1985) revela que a transição da economia de produção à economia de consumo processou-se através do marketing, que teve o papel de compatibilizar a capacidade de produção com a capacidade de consumo e vice-versa. O marketing envolve trocas, e estas, por sua vez envolvem benefícios. Hoje o marketing está presente nas maiores companhias do mundo, e também tem sido cada vez mais praticado em pequenas empresas, sendo possível afirmar que adquiriu status fundamental dentro de toda e qualquer organização. O mix de marketing é formado pelo próprio produto, juntamente com a maneira como seu preço é estabelecido, como é feita sua distribuição e promoção. Kotler (2006) relata que McMarthy (1996) classificou as ferramentas do mix de marketing em quatro grandes grupos e as denominou de 4Ps do marketing: produto, preço, praça e promoção (adaptados do inglês product, price, place e promotion). Qualquer decisão de marketing que uma organização venha a tomar implica no envolvimento de um dos 4Ps. Seja a alteração de preço, a abertura de um novo canal de venda ou a mudança de uma embalagem, envolve um dos 4Ps. 2.1 Produto “Produto é algo que pode ser oferecido a um mercado para satisfazer uma necessidade ou desejo” (KOTLER, 2006, p.366). Podem ser tangíveis (físico, podem ser tocados) e intangíveis (são os serviços, não podem ser tocados), para organizações e para consumidores. Entre os produtos comercializados estão bens, serviços, experiências, eventos, pessoas, lugares, propriedades, organizações, informações e idéias. O principal objeto de estudo deste artigo é a Melissa, da Grendene. A Grendene Opinio, n.20, jan./jun. 2008 19 nasceu em Farroupilha, no interior do Rio Grande do Sul, em 1971. Era uma pequena fábrica de embalagens plásticas que aos poucos foi se transformando na sede do maior fabricante de calçados do país. Com tecnologia de ponta e fábricas de primeiro mundo, a Grendene tem força total para atuar nos mercados adulto, adolescente, infantil e baby, com as marcas Grendha, Ipanema, Grandene Kids e Rider. A Melissa surgiu em 1979 e nunca parou de se reinventar. Seus lançamentos encantam fashionistas brasileiros, teenagers americanas e consumidores de 5 continentes. Full plastic, ícone de moda e referência de comportamento, a Melissa criou um conceito de vanguarda para o mercado da moda. Divertida, fashion, original. Sempre igual, sempre diferente. E sempre um case de sucesso. Já foi a sandália mais democrática do mercado brasileiro, quando ainda se chamava Melissinha e tinha o público infantil como alvo. Hoje, virou objeto de desejo, desde que passou por uma reformulação que começou em 2000. Com a missão de valorizar o que é moderno, buscar o novo e misturar estilos e opções, a Melissa estabelece parcerias especiais com estilistas, artistas plásticos e arquitetos, que criam os calçados de acordo com sua leitura pessoal. Entre estes profissionais, é justo destacar a veterana estilista Vivienne Westwood, Alexandre Herchcovith (o estilista brasileiro mais famoso no exterior), Tufi Duek (dono da Forum e Triton), Isabela Capeto, Fabia Bercsek, Lorenzo Merlino e J. Maskrey, a designer inglesa de jóias que é parceira da Melissa há várias temporadas. Outra parceria muito frutífera é com os irmãos Campana, designers brasileiros de renome internacional. O design é 100% do criador, e a indústria adapta a idéia para a sua tecnologia. Parte da aceitação do produto deve-se à sua diversificação. A marca produz botas, tênis, sapatilhas, sandálias de salto alto e sandálias rasteiras – além do tradicional modelo “aranha”, com tiras horizontais sobre o peito do pé e salto baixo. Entre os modelos, está uma sapatilha com renda injetada junto com o plástico, graças à tecnologia permite a mistura de materiais ao plástico. Por trás do design e do estilo de cada Melissa, tem um extenso trabalho de tecnologia. A Melissa exalta a inovação, e seu principal desafio é aliar tecnologia de ponta ao design, dando aos seus produtos novas formas, cores e acabamentos. Para isso, hoje a Melissa utiliza o Melflex® em sua fabricação. Esse material é o melhor termomoldável flexível que existe, pois além de resistente, oferece muito mais conforto e suavidade ao toque. Os acabamentos também merecem atenção especial, e o processo 3DB® é hoje empregado na fabricação dos modelos da marca. É isso que torna possível estampar conteúdo na superfície dos diversos produtos da Melissa. E tem o inconfundível aroma das Melissas, outro grande patrimônio da marca, sendo a única empresa de calçados no mundo que aplica aroma no produto. A utilização de personagens pela Melissa também é recorrente. Hello Kitty, Pucca, Mulher Maravilha, Mary Jane, O Pequeno Príncipe, Alice no País das Maravilhas, Sininho e Peter Pan já foram estampados em suas coleções. Parcerias com marcas de sucesso fazem parte de sua estratégia, como Zoomp e Crystal Swarovski. Kotler (2006) 20 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 afirma que as empresas estão descobrindo que precisam de parceiros estratégicos se quiserem ser efetivas, mencionando que uma das alianças de marketing é a de produtos, na qual uma empresa licencia outra para fabricar seu produto. A marca está intrinsecamente ligada ao produto. Na definição da American Marketing Association (AMA), marca é um nome, termo, sinal, símbolo ou design, ou uma combinação de tudo isso, destinada a identificar os produtos ou serviços de um fornecedor para diferenciá-los dos de outros concorrentes. As empresas freqüentemente simbolizam as características de seus produtos por meio dos nomes que dão a eles. O nome deve exprimir a “alma” do produto, sugerir o seu benefício, bem como tocar no íntimo do consumidor. Além de desempenhar funções valiosas para as empresas, como simplificar o rastreamento e manuseio dos produtos, as marcas oferecem proteção jurídica quanto aos recursos ou aspectos exclusivos do produto, segundo Kotler (2006, p.269). O mais interessante é que hoje as marcas representam papéis importantes na vida das pessoas e incrementam o valor financeiro das empresas. Muitas marcas chegam a valer mais do que todos os ativos da empresa. Conforme as marcas têm a capacidade de sinalizar determinado nível de qualidade, os consumidores satisfeitos tendem a optar novamente pelo produto, criando a fidelidade de marca e gerando previsibilidade e segurança à empresa. FIGURA 1 – Logomarca da Melissa. Fonte: Melissa. A marca da Melissa, em tons de magenta, remete ao jovem e ao feminino, com letras de formato arredondado, com volume parecido com o do plástico (Figura 1). As embalagens da Melissa são caixas de papelão com revestimento colorido e um ilhós que permite a ventilação no produto. Junto com o calçado, vem uma bolsa-saco em plástico transparente, para acomodar a Melissa dentro da mala de viagem, ou usar como nécessaire, por exemplo. Também acompanha o produto um folder da referida coleção, com fotos de todos os modelos disponíveis. 2.2 Preço É a expressão monetária do bem ou serviço envolvido em uma troca. Sendo assim, Nickels e Wood (1999, p.222) afirmam que preço é “[...] a quantidade de dinheiro ou algo mais de valor que a empresa pede em troca de um produto”. Existem diversas variáveis que o consumidor busca ou compara em um produto, entre elas qualidade, quantidade, garantia, assistência técnica e serviços. Contudo, o preço provavelmente é o item mais facilmente comparado pelo consumidor no momento da compra, e certamente o principal determinante na decisão de compra do consumidor. O preço é vital para a empresa, capaz de rotular os produtos na mente do consumidor, Opinio, n.20, jan./jun. 2008 21 que tende a considerar um produto mais caro melhor que um mais barato. As empresas também muitas vezes seguem este raciocínio, adotando o preço como estratégia de posicionamento do produto. Para algumas empresas, o preço é uma ferramenta estratégica, pois conhecem o poderoso efeito do preço sobre os resultados. A codificação do preço na mente do consumidor é afetada no sentido da percepção que este tem sobre o ele, fazendo do entendimento da percepção de preço por parte do consumidor, uma prioridade do marketing. Kotler (2006, p.432) afirma que muitos consumidores usam o preço como um indicador de qualidade, e que a determinação de preços com base na imagem é especialmente eficaz com produtos que apelam para a vaidade das pessoas. As consumidoras da marca Melissa entendem que o seu preço vale pela qualidade e originalidade. Todos os preços são definidos pela própria marca e não pelas lojas, por isso é raro encontrar preços diferentes, exceto em caso de ofertas promocionais. Os valores variam entre 70 e 500 reais. 2.3 Praça Depois de produzido e com o seu preço estabelecido, o produto precisa ser distribuído no mercado até os pontos de vendas. A praça ou distribuição de um produto no mercado tem um importante papel no mix de marketing; é a partir da distribuição que o consumidor terá acesso a oferta do produto. Atualmente, a marca Melissa é vendida numa loja-conceitual (Figura 2) na rua Oscar Freire, ponto alto do comércio elegante e corredor fashion da cidade de São Paulo. É impossível passar pela rua Oscar Freire, sem girar a cabeça em alguns ângulos para olhar a galeria Melissa, tamanha é a imponência de sua fachada supercolorida, que com pouco esforço é possível encaixá-la no campo de visão. Também chama a atenção o recuo a partir da calçada, projetado para gerar uma área externa perfeita para festas e lançamentos, que acaba por colocá-la em uma posição especial e convidativa. A Galeria é um espaço que convida, porque quem caminha a pé por ali se sente imediatamente convidado para entrar e descobrir de perto o que é essa espécie de templo do plástico. Quando surgiu, em agosto de 2005, a Galeria Melissa lançou uma novidade e inaugurou o primeiro espaço aberto ao público em que são representados universos tão diferentes e tão próximos como a arquitetura, a fotografia, o design e a moda, em um discurso pop-artístico que é o estilo da Melissa. O espaço organizou exposições, convidou criadores brasileiros para desenvolverem minicoleções exclusivas, fez festa e sediou eventos que conviveram lado a lado com o universo da marca, sempre divertido, moderno, e como pede a moda, obcecado pelo novo. Jovens de todas as idades se encantaram com a idéia. Extrapolando seu lado de loja, a Galeria ganhou as páginas de guias culturais de revistas e foi elogiada por sua personalidade que se transmuta nas mais diferentes roupagens. (GALERIA MELISSA, 2008). 22 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 FIGURA 2 – Espaço interior da Galeria Melissa. Fonte: Galeria Melissa. Apostando surpreender sempre, a Galeria começou com linhas orgânico-futuristas para a primeira fachada e seguiu em várias idéias modernas e autorais, criadas por artistas de linguagem ultra-contemporânea. A Galeria completou seu primeiro e segundo ano com novas invenções, investindo em outras fachadas. Sempre mutante, já estabelecido no cenário paulistano, e também na efervescência da mídia nacional e internacional, o espaço não para de sugerir, criar e recriar, sempre reafirmando o ideal da Melissa: ser única, especial e diferente a cada dia (GALERIA MELISSA, 2008). A sandália de plástico que completou 25 anos em 2005, também pode ser encontrada em lojas multimarcas em todo o país, e na loja virtual da marca Melissa. Se o consumidor preferir, na loja virtual ele tem um espaço para localizar em quais lojas físicas pode encontrar o produto, de forma simples e rápida: apenas fornecendo o número do próprio CEP. A marca Melissa encontra-se forte no exterior, presente em quase 1500 butiques nos cinco continentes, tendo sido registrado um aumento de 100% em vendas do inverno 2007 para o inverno 2008 neste mercado. Prova disto é que a Melissa tem espaço especial em grandes lojas de prestígio como Bloomingdale’s, Nordstrom, Robinson May, Journey’s e Dillard’s, assim como na butique Colette, de Paris, e na Top Shop de Londres, que são duas referências em moda de vanguarda. Opinio, n.20, jan./jun. 2008 23 2.4 Promoção Neste item do mix de marketing, cabem todas as atividades relacionadas à comunicação das informações entre quem vende e quem compra, como propaganda, publicidade, promoção de vendas, patrocínio de marketing e venda pessoal. Enquanto a propaganda oferece uma razão para comprar, a promoção oferece um incentivo. Nickels e Wood (1999) propõem ainda, uma comunicação mais ampla do que a comunicação tradicional de marketing, a comunicação integrada de marketing envolvendo relacionamentos longos e duradouros não só com clientes, mas com os parceiros do canal, empregados e outros grupos de interesse. Para a propaganda tradicional, faz parte da história da Grendene a contratação de grandes nomes nacionais e internacionais para impulsionar suas marcas. Campanhas memoráveis utilizaram a imagem de Sharon Stone, Claudia Schiffer, Gisele Bündchen, Camila Pitanga, Adriane Galisteu, Ivete Sangalo, Xuxa, Fernanda Lima, Jean Paul Gaultier e Alexandre Herchcovitch. O marketing continua nos distribuidores. No mundo inteiro, cada distribuidor que trabalha com os produtos Grendene se compromete a destinar um percentual de seu lucro para ações de marketing. Isso garante visibilidade para a marca e a presença dos produtos em programas de TV, desfiles, mídia espontânea em editoriais de revistas, eventos de moda e de esporte. Tudo para reforçar a identidade de cada produto e impactar o consumidor (GRENDENE, 2008). Há 14 edições como um dos patrocinadores do SPFW, a Melissa manteve o seu lounge, um espaço que costuma ser a atração dos convidados do evento, sempre o mais disputado e o preferido do público. A coleção Secret Gardens foi inspirada em um orientalismo fashion e feminino. Jogando com luzes e tecnologia em contraste com a estética artesanal, criou-se um espaço multicolorido e vibrante com luzes de néon e uma concepção que lembra muito os animes japoneses. Para o lançamento da Coleção Inverno 2008, intitulada “Secret Gardens” serão preparadas duas campanhas publicitárias. No Brasil, será veiculada a “Secret Gardens” e, no exterior, a “Melissa Plastic Dreams”. A percepção do público em relação à marca é diferente nos dois mercados, por isso foram criadas duas campanhas distintas. Nesse lounge da Melissa, o tradicional e o tecnológico se encontram e se integram, com lustres de papel, esteiras rolantes que levam as Melissas e no cruzamento luminoso de néons coloridos e estampas de padronagens milenares. Todo o lounge, do chão ao teto, foi decorado em patchwork de estampas orientais de vários temas e cores. Como em um moderno sushi bar, os modelos da coleção Melissa Secret Gardens desfilam em uma esteira. Dentro do contexto temático, no lounge estava o Pachinko, uma variante oriental do Pinball, que a Melissa criou em versão eletrônica. Os participantes que conseguiam vencer o jogo ganhavam um novíssimo modelo da coleção de verão 2009: Melissa Secret Love, uma sandália tipo flip-flop com estampa de origamis, em versão limitada e exclusiva para o evento. Os convidados especiais do lounge receberam de presente a Melissa Love Li, uma rasteirinha em rosa perolizado. A novidade desta 24 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 temporada foi uma parceria com a Motorola, que disponibilizou conteúdos Melissa – informações dos produtos, fotos de campanha e vídeos – via bluetooth. 3 MARKETING DE RELACIONAMENTO Kotler (2006) afirma que um dos principais objetivos do marketing é, cada vez mais, desenvolver relacionamentos profundos e duradouros com pessoas ou organizações que podem afetar o sucesso das atividades de marketing da empresa. Ao fazer uso do relacionamento com o cliente, a empresa tem melhores condições de atendê-lo com precisão. Para Berry e Parasuraman (1995) o marketing de relacionamento diz respeito à atração, desenvolvimento e retenção dos relacionamentos com os clientes. Portanto, a idéia central é desenvolver e gerenciar relações individuais com clientes individuais. O CRM, sigla de Customer Relationship Management, que em português significa gerência de relacionamento com clientes, foi considerado por Srivastava, Shervani e Fahey (apud REICHELT, 2007, p.85) como um dos três processos de negócios que geram valor para o cliente. Os outros dois seriam a gerência de desenvolvimento de produtos e a gerência da cadeia de suprimentos. O CRM é responsável por todo processo de identificação do consumidor, criação de conhecimento sobre o consumidor, construção de relacionamento com ele e adequação da percepção do consumidor sobre a empresa e seus produtos. As formas mais recentes de marketing de relacionamento são os canais eletrônicos, pois a Internet oferece às empresas e consumidores a oportunidade de interação e individualização. Boletins informativos, folhetos de ofertas e anúncios que antes eram distribuídos para todos os clientes da mesma forma, hoje são enviados eletronicamente com seus conteúdos personalizados. Querendo, o consumidor pode individualizá-lo ainda mais, fornecendo dados que subsidiem a customização do conteúdo. Em muitos casos, a relação não fica restrita entre a empresa e o consumidor, pois muitas lojas virtuais disponibilizam sistemas de recomendações, por meio dos quais os clientes avaliam aquilo que compraram, dão opiniões e participam de rankings com o objetivo de mensurar a qualidade e a satisfação dos produtos adquiridos. Desta forma, é presumível que os consumidores entrem em contato com produtos até então desconhecidos, e estes produtos tendam a entrar no circuito comercial. 3.1 Mídias emergentes, alternativas e interativas “Mídia são os métodos gerais de comunicação que podem transmitir mensagens de propaganda, como a televisão, as revistas, os jornais etc.”, segundo Shimp (2002, p.295). Já os veículos são programas específicos ou materiais impressos nos quais os anúncios são inseridos. Nos últimos anos, houve uma diminuição da crença na Opinio, n.20, jan./jun. 2008 25 propaganda em veículos de massa. Isso não significa que ela não tenha importância ou esteja em processo de extinção. A questão é a adaptação de diferentes métodos de comunicação às particularidades de suas marcas. Métodos diferentes da propaganda na mídia tradicional têm sido percebidos como ferramentas que atendem melhor às necessidades de suas marcas, emergindo no cenário da comunicação. Ao mesmo tempo em que a mídia de massa perde eficiência, os métodos de comunicação altamente dirigidos têm registrado aumento de confiança. Inúmeras marcas investem altas quantias em propaganda e ações especializadas de marketing para aproximar o consumidor de seu produto, criando um vínculo emocional com o cliente. Para atingir seus consumidores desta forma, existem companhias que buscam gerar contato maior e direto entre a marca e o seu público-alvo. Hoje podem ser considerados como “pontos de contato”, qualquer veículo de mensagem que seja capaz de alcançar os clientes desejados de forma favorável ou positivamente impactante. Os pontos de contatos podem assumir uma infinita lista de possibilidades e opções de comunicação. Seus métodos são ecléticos e muitas vezes conseguem oferecer uma experiência cognitiva, sensorial e relacional ao consumidor. Conhecimento e habilidade precisam estar presentes em abordagens alternativas como as que exemplifica Aaker (2002): patrocínio, associação com causas, marketing pessoal direto, clubes de consumidores, Internet, relações públicas, lojas principais, amostragem etc. Shimp (2002) define patrocínio como a prática de promover os interesses de uma empresa e suas marcas ao associar a companhia ou uma de suas marcas a um evento específico. Muitas empresas e marcas vem se beneficiando desta modalidade de comunicação. O elemento essencial para a associação entre uma marca e um evento é a empatia, capaz de facilitar a intensificação da imagem da marca como resultado. Aaker (2002) ressalta que um evento ideal em termos de adequação pode não existir ou estar disponível. A solução pode ser criar um evento e registrar direitos sobre ele. Assim procederam a Skol, promovendo o festival anual de música eletrônica Skol Beats, e a Tim, que promove o Tim Festival para um público seleto, com inúmeros pontos de contato como celular, Internet, jornais, revistas, TV e promoções entre outros. A maior empresa de Internet da América Latina, o Terra, promoveu em 2007 o seu próprio evento musical, no qual DJs nacionais e internacionais se apresentaram em palcos diferentes. Ao acessar o portal, o internauta poderia escolher um entre os quatro sinais ao vivo de vídeos que estiveram disponíveis, em uma transmissão inédita na Internet no Brasil. Além da transmissão ao vivo, um site especial acompanhou em tempo real o evento, trazendo notícias, fotos dos shows e bastidores, vídeos exclusivos e ferramentas interativas que permitiram o envio de conteúdo pelo usuário. Foi uma oportunidade única de apresentar a versatilidade da Internet por meio da sua marca. É fundamental que as empresas compreendam como os patrocínios trabalham para apoiar a marca e como essa idéia pode ser traduzida em patrocínios eficazes, conforme explica Aaker (2002), para quem o patrocínio estende as marcas além dos atributos tangíveis, pois desenvolvem associações e acrescentam profundidade, riqueza e um sentimento contemporâneo em relação à marca e ao seu relacionamento com os clientes. 26 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 Propaganda interativa, segundo Shimp (2002, p.315), são todas as mídias que permitem ao usuário controlar a quantidade ou índice de informações que deseja receber de uma mensagem comercial. A mídia convencional atinge o consumidor de forma passiva. A mídia interativa oferece em nível subvocal, um controle total sobre as informações comerciais que o usuário quer receber ou evitar, constituindo desta forma, sua superioridade comparada às mídias tradicionais. A mídia comercial interativa hoje inclui CD-ROM, realidade virtual, Internet e números 0800. A mídia convencional de propaganda sempre atendeu às necessidades dos anunciantes. Porém, há alguns anos tem se procurado novas formas de mídia, mais baratas e eficazes. Aaker (2002) afirma que a maior parte da propaganda veiculada na mídia tradicional pressupõe que os membros da audiência são alvos passivos da mensagem. Isso significa dizer que não é permitido ao consumidor na propaganda tradicional, qualquer tipo de participação ou experiência. A mais singular característica da Internet enquanto mídia é a interatividade. É essa idéia de reciprocidade que melhor define a natureza da mídia na internet. Neste ambiente, o usuário e a fonte de informação estão engajados em uma troca de informações, não apenas em uma mera transmissão e recepção. A figura do receptor é substituída pela do usuário. Na Web, a empresa deve decidir que recurso de propaganda e comunicação da Internet apresenta maior afinidade com seu público-alvo e que tenha a melhor relação custo-benefício para atingir seus objetivos de marketing. Kotler (2006, p.616) lista estes recursos: banners, patrocínio, microsite, interstitials, anúncios relacionados a busca, propaganda focada em conteúdo, alianças e programas de afiliação. Para que uma empresa faça uma campanha correta por e-mail (e-marketing), é de suma importância que sigam algumas diretrizes propostas por Godin apud Kotler (2006, p.617): dar ao consumidor uma razão para responder; personalizar o conteúdo de seus e-mails; oferecer ao cliente algo que não poderia chegar por mala-direta; facilitar o cancelamento da subscrição. Da mesma forma que ocorre com a mídia tradicional, o desenvolvimento de sistemas acurados de medição é o principal determinante para conhecer os resultados da propaganda na Internet e prever seu índice de crescimento. A Adversiting Research Foundation5 concluiu ainda em 1997 que a Internet seria bem-sucedida como mídia de propaganda apenas se fosse possível avaliar a eficácia. Hoje, este panorama já se encontra mais bem delineado. O IBOPE//NetRatings6 , com o auxílio de um software proprietário, instalado em um painel de internautas representativo da população domiciliar brasileira com acesso à Web, detalha o comportamento dos usuários do meio digital. 5 Organização norte-americana, a ARF (Fundação de Pesquisa da Publicidade) tem a missão de melhorar a indústria através de análises e investigações temáticas e direcionadas para o setor em questão. 6 O IBOPE//NetRatings é uma joint-venture entre o IBOPE e a Nielsen//NetRatings, líder mundial em medição de audiência de Internet. Opinio, n.20, jan./jun. 2008 27 3.2 Marketing e comunicação em moda Moda e cultura estão intrinsecamente ligadas, e as culturas têm símbolos, identidades que representam idéias ou conceitos e são importantes por comunicar idéias complexas com rapidez e facilidade. Assim como nomes e cores possuem significado simbólico, o vestuário também tem um significado simbólico relevante para o consumidor. O conceito de moda pode ser definido de maneira mais ou menos ampla. Restritamente interpretada, moda é identificada com vestuário, trajes e acessórios para o corpo. Numa definição mais ampla, a moda inclui quaisquer produtos que expressam a imagem ou o papel desempenhado por uma pessoa. A moda é dinâmica por natureza na medida em que muda constantemente ao longo do tempo. Não se pode minimizar a importância do valor simbólico da moda. Na realidade, o valor simbólico pode superar qualquer valor utilitário. (MOWEN; MINOR; 2002, p.309) O principal elemento de comunicação da moda é o desfile, o que permite aos jornalistas especializados emitir opiniões sobre aquilo que foi apresentado pelos estilistas e grifes. A publicidade, com seus slogans e filmes comerciais carregados de ressonâncias estéticas, existenciais e emocionais, se encarrega de disseminar as imagens idealizadas em campanhas na mídia. E cada vez mais incluindo a Internet, por força dos blogs, das comunidades no Orkut, portais e sites de consultoras de moda, transmissão ao vivo de desfiles, milhões de fotos e vídeos e uma infinidade de conteúdo relacionado. Desde janeiro de 2001, o maior evento de moda da América Latina é o São Paulo Fashion Week (SPFW), que colocou o Brasil no circuito internacional da moda e atraiu olhares para a moda feita aqui, sendo o principal responsável por dar ao mundo visibilidade na moda brasileira. A publicidade, como a moda, apresenta a novidade e efemeridade, através de múltiplos meios que dão ao consumidor a opção de comprar ou não determinado produto ou serviço. O modelo do conceito de Anderson (2006), através dos nichos, subnichos e da propaganda boca a boca, ou na Internet com a recomendação que pode ser visto nos blogs, onde milhões de pessoas comuns são novos formadores de preferências, produzem o seu conteúdo, seu vídeo, sua música, sua roupa e sua moda. Um blog provê a seu criador um veículo de mídia próprio, que pode conter texto, fotos, áudio e vídeo. A força de influência de um blog começa a se manifestar quando o conteúdo exposto é interessante e os usuários conseguem achá-lo na imensidão de informação da Internet, graças a sistemas eficientes de busca como o Google. Os blogs passaram da fase de simples diários pessoais para ferramentas de comunicação com alta capacidade de ação e retorno. Algumas empresas começam a compreender este mecanismo e utiliza-lo a seu favor como canais de publicidade e relações públicas, 28 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 pois o blog é um veículo importante de captação das reações do consumidor, justamente porque ele pode opinar sobre suas impressões relativas aos seus produtos e serviços. Empresas e agências de publicidade estão aproveitando a capacidade de segmentação de público-alvo nos blogs para fazer exposição de produtos e serviços. Os blogs de conteúdo atrativo têm uma capacidade de expansão viral, por meio da propagação da audiência através da formação de opinião on-line. Rosen apud Kotler (2006, p.548) afirma que o marketing viral é uma forma de “boca-a-boca”. Os blogs de moda, estilo e comportamento se ploriferam na Web de forma incisiva. Seus donos são profissionais de moda, apreciadores de moda, estudantes de moda e outros públicos relacionados. Algumas atuam como indivíduos, outras participam de grupos organizadores em torno de interesses comuns, e ainda outras são simplesmente rebanhos de consumidores monitorados automaticamente por softwares que observam todos os seus comportamentos. Pela primeira vez na história somos capazes de medir os padrões de consumo, as inclinações e as preferências de todo um mercado de consumidores em tempo real e, com a mesma rapidez, ajustar-se a tais condições para melhor atender a esse público. (ANDERSON, 2006, p.105) A Internet é uma mídia singular e democrática. Nela é possível ingressar em redes de relacionamento, como o Orkut, Myspace, Facebook, Sônico e Hi-5. Além destas, ainda existem os blogs, flogs e fotologs. O mais popular site deste tipo no Brasil é o Orkut, com 15,2 milhões de membros e aproximadamente 1,3 milhão de visitantes por dia. As características da moda também estão presentes no Orkut: a individualidade está nas fotos, nos vídeos, nos recados (scraps), e nos depoimentos deixados pelos usuários. A efemeridade fica por conta da mudança das fotos, dos recados enviados, deixados e apagados, na multiplicidade dos usuários, nas comunidades criadas, vídeos compartilhados etc. No Orkut existem mais de 1 mil comunidades criadas com a palavra moda. A que possui mais membros é a comunidade “Minha moda faço eu” com mais de 160 mil participantes. Muitas outras comunidades relacionadas à moda fazem sucesso na rede, como “Calça Jeans Nunca Sai de Moda” com 30 mil participantes, “Amo Moda” com 23 mil participantes, “Estudando Moda”, “Catálogos de Moda”, “História da Moda” etc. Nestas comunidades, os membros anunciam novidades, trocam dicas e experiências, postam diversos assuntos de moda e divulgam eventos relacionados. Também relacionadas ao tema, são encontradas comunidades de marcas nacionais e internacionais. Entre as maiores comunidades de marcas brasileiras estão a “Kipling”, com 102 mil membros, “Ellus” com 60 mil membros, “Arezzo” com 34 mil membros, “Triton”, com mais de 7 mil membros. Entre as internacionais, está a alemã “Adidas”, com 785 mil membros, a italiana “Dolce & Gabanna” com 102 mil e a francesa “Christian Dior” com 68 mil. O Orkut também é utilizado por lojistas para divulgarem suas coleções com a criação de perfil e comunidade onde divulgam mapa de localização, fotos das roupas e de seus clientes. Opinio, n.20, jan./jun. 2008 29 3.3 A mídia digital e o relacionamento com o consumidor Melissa Kotler (2006) aponta a revolução digital como a maior responsável pelas transformações no comportamento do consumidor de hoje. A ferramenta fundamental para executar o marketing de relacionamento na atualidade é a Internet, capaz de viabilizar o diálogo e a interação com pessoas e grupos muito maiores do que no passado. Uma série de novos recursos é fornecida pela Internet às empresas atualmente. As empresas que sabem utilizar as inúmeras soluções que a Internet disponibiliza, tendem a alcançar resultados mais rápidos e precisos. Conforme explica Kotler (2006), as empresas podem operar um novo e poderoso canal de vendas e de informação, a Internet, obtendo um alcance geográfico ampliado para divulgar e promover seus negócios e produtos no mundo todo. Ao instituir seu site, a Melissa pôde divulgar sua história, sua filosofia de negócios, suas oportunidades de trabalho e outras informações que possam interessar os visitantes. E principalmente, expor seus produtos e serviços, numa “vitrine virtual”. Seguindo a tendência do consumidor que interage e cria conteúdo para a marca, a Melissa aliou de maneira estratégica, criativa e oportuna o sucesso dos blogs com sua campanha “Melissa CreateYourself”. A marca convidou quatro blogueiras – donas de blogs muito bem visitados pelo público consumidor do produto – para “criar” os novos modelos das sandálias. Toda semana elas postavam sobre o andamento dos projetos, e ligado a tudo isso foi veiculado um anúncio completamente inusitado na Revista Capricho7 (Figura 3). A revista que veiculava o referido anúncio, trazia um pequeno pacote com diversos adesivos; as leitoras eram convidadas a montar um anúncio à sua maneira, vinculado a uma promoção que ocasionava a possibilidade de enviar o anuncio feito pelas leitoras a um site para que este fosse publicado e concorresse a prêmios. Em uma única veiculação deste anúncio inusitado foram enviados ao site 18 mil anúncios montados pelas leitoras para participar da promoção. FIGURA 3 – Anúncio da Melissa na revista Capricho. Fonte: Blog da Grisè Comunicação. 7 Revista da Editora Abril segmentada a adolescentes e jovens. 30 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 O site da Melissa é atualizado diariamente, anunciando novidades, parcerias, e cumprindo seu papel no relacionamento com o cliente, por meio de conteúdos enviados para usuários cadastrados, e do seu próprio blog. Neste blog, as consumidoras têm liberdade de expressar seus sentimentos, idéias, sugestões, opiniões, críticas etc. Entre as seções do site, são encontradas as fotos da coleção vigente e o making of de sua campanha. A visitante pode acessar também o fotolog Melissa, espaço interativo para as fanáticas por Melissa. No podcast com conteúdo de áudio exclusivo em mp3 – entrevistas e matérias – as usuárias podem deixar suas dicas para outras visitantes. A Rádio Melissa também faz parte do site, com programação musical 24 horas, vinhetas, informações e promoções. O site mantém a revista on-line, o Melissa Word Wide, com conteúdo sobre moda, tendência, design e tecnologia. Desta forma, é institucionalizado um potencial relacionamento cibernético entre a marca e o consumidor. A cada coleção, o site muda seu visual e grafia, utilizando elementos de acordo com o estilo dos modelos lançados. A coleção Primavera/Verão SPFW 2009, a coleção atual, foi inspirada na comemoração dos 100 anos da imigração japonesa e toda a comunicação está em consonância com elementos orientais. O site da Melissa está entre os 10 melhores do Brasil do Prêmio iBest na categoria Excelência em Design, de acordo com o Portal AdNews8 . A premiação especial é concedida aos melhores sites de todo o Brasil que apresentam projetos de design de internet diferenciados, considerando as melhores idéias, concepções e inovações na área. O número de visitas à página da Melissa na Internet vem crescendo. Hoje, são mais de 150 mil acessos por mês. O site também traz um link de acesso para loja virtual da marca, onde é possível comprar os modelos atuais e alguns de coleções passadas, na seção Bazar. Todo o e-commerce da Loja Melissa é voltado para a gestão do relacionamento com o cliente. De acordo com a política de privacidade da loja, as informações pessoais fornecidas pelos clientes são utilizadas com o propósito básico de identificar o público usuário, seu perfil e hábitos de compra, para gestão, administração, atendimento, ampliação e melhorias nos produtos e serviços oferecidos; também para a adequação dos serviços às preferências e gostos dos usuários, para a criação de novos produtos e serviços, para o envio de informações operacionais e comerciais relativas aos produtos e serviços, por meios tradicionais e/ou eletrônicos. Conforme explica Shimp (2002), a Internet está se tornando uma mídia importante para as promoções dirigidas ao consumidor. Programas de continuidade, distribuição de cupons, sorteios e concursos na Internet estão em toda parte. No site da Loja Melissa, existe um programa de milhagem que incentiva a compra por meio do acúmulo de pontos cumulativos. Ao efetuar um cadastro na Loja Melissa.com, o cliente automaticamente passa a fazer parte do Milhagem Melissa. O número de pontos que o cliente ganha é relativo ao preço do produto que ele compra (em reais), correspondente 8 O Portal Adnews é um portal direcionado ao mercado publicitário e voltado à convergência das mídias. Opinio, n.20, jan./jun. 2008 31 a 10 por cento do valor gasto em reais. Para usar os pontos acumulados em uma nova compra, é preciso ter um saldo igual ou superior ao valor do produto que se pretende adquirir. O preço em reais é relativo ao custo em pontos acumulados. A qualquer momento o cliente pode acessar o site da loja, efetuar o seu login e conferir o seu extrato de pontos. O programa é um recurso promocional que a Melissa utiliza como forma de incentivar as vendas on-line e fidelizar seus clientes. De acordo com a e-bit Informação9 , o site da Loja Melissa, desde 14 de abril de 2005, foi avaliado mais de 10.000 vezes por seus consumidores, seja no ato da compra como no pós-venda, e é certificado com medalha Ouro pela e-bit. A medalha Ouro é um selo de certificação dado às lojas que são avaliadas de forma positiva em quesitos como facilidade de comprar, preço, manuseio dos produtos, cumprimento do prazo de entrega, informações dos produtos, entre outros. Para alcançar o critério Ouro, a loja precisa ter, no mínimo 160 pesquisas de avaliação no ato da compra nos últimos 90 dias; ter, no mínimo 20 pesquisas referentes ao serviço de entrega nos últimos 90 dias e nota geral dada pelos seus clientes igual ou superior a 4 (os e-consumidores avaliam cada um dos 10 quesitos com notas de 1 a 5). As informações utilizadas para a qualificação das lojas com medalha Ouro são coletadas e calculadas por meio de pesquisas de satisfação de compra e de pós-venda das lojas conveniadas à e-bit. Uma escala reduzida com quatro dimensões-chave e quatorze itens para a qualidade do serviço on-line, foi desenvolvida por Wolfinbarger e Gilly apud Kotler (2006, p.410). A Figura 4 contempla a escala. FIGURA 4 – Escala para a qualidade do serviço on-line. Fonte: Elaborado pela autora com base em Kotler (2006, p.410). 3.4 O Orkut e o consumidor Melissa A crescente participação das pessoas em sites de relacionamento e, conseqüentemente, de comunidades temáticas, tem chamado a atenção das empresas, 9 A e-bit Informação é uma empresa com informações do comércio eletrônico fundada em 1999, pioneira na realização de pesquisas sobre hábitos e tendências de e-commerce no Brasil. 32 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 pois a Internet desempenha um papel fundamental na construção da reputação de uma empresa hoje em dia. Na Internet, as opiniões emitidas por consumidores costumam ter um forte efeito multiplicador. Outra evidência que revela o quão significativo é o universo dos sites de relacionamento para as empresas, é o mais novo serviço do Ibope/NetRatings, que pretende monitorar a reputação de marcas e produtos no Orkut, o mais significativo site de relacionamento no Brasil, com aproximadamente 54% dos usuários no mundo. Entre os brasileiros, 61% têm entre 18 e 25 anos, e 12% têm entre 26 e 30 anos; justamente o público-alvo da Melissa. No Orkut a Melissa é tema de muitas comunidades. A maior delas se chama “Melissa – The Original” e tem mais de 135 mil membros. “Eu uso Melissa”, tem mais de 57 mil membros. “Amo minha Melissa/Melissinha”, “I love Melissa” e “Loucas por Melissa”, somadas reúnem aproximadamente de 63 mil membros. Existem duas comunidades “Eu amo cheiro de Melissa“, que juntas somam 45 mil participantes. A comunidade “Vou casar de Melissa” tem 20 mil membros, e é baseada nos modelos mais sofisticados da marca, cravejados de cristais. Atestando fidelidade à marca, em “Odeio imitações da Melissa” quase 18 mil participantes discutem sua originalidade e qualidade. Ao todo, são cerca de 400 comunidades no Orkut para a marca Melissa. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS Aos poucos, nota-se que o poder das mídias alternativas, é na verdade resultado de uma conjunção de fatores que evoluíram ao longo do tempo. Fatores como o rápido progresso da tecnologia, o barateamento dos equipamentos de informática em função das economias de escala e da concorrência em nível mundial, o significante aumento no poder aquisitivo, e o esforço pela inclusão digital. Tais fatores em confluência com os valores do consumidor, suas necessidades e desejos, e a intrínseca avidez por novidades que é própria do ser humano, colaboraram para o cenário que hoje se vê. O fato é que a manifestação da influência de comunicação via Internet, seja por meio de sites, blogs, e-mails ou redes de relacionamento, sinaliza uma tendência irreversível de segmentação dos canais de mídia, comprometendo a força de geração de efeitos nas tradicionais escalas massivas. As empresas há muito tempo perceberam que manter o cliente é mais fácil e mais barato do que conquistar outros novos. Sendo assim, a importância do marketing de relacionamento se faz ainda mais essencial, tornando-se uma ferramenta de marketing primordial dentro das organizações. A evolução da tecnologia provê as bases para que esta atitude se manifeste. O fundamental é que empresas fiquem atentas às prováveis mudanças nos paradigmas de gerência da comunicação nos próximos anos. Durante o planejamento de marketing, a empresa precisa considerar a natureza do seu negócio, o perfil do seu consumidor, os objetivos que se pretende atingir, entre outros fatores. Uma ação de comunicação na Internet, quando isolada, produz efeitos Opinio, n.20, jan./jun. 2008 33 proporcionais à dimensão dos objetivos propostos. O uso da Internet independente de outras mídias é interessante para manter contato com o cliente. Mas dependendo da extensão dos objetivos, deve ser ligado com outras mídias, não necessariamente as tradicionais. Hoje existe uma vasta gama de opções de mídia alternativa, que inusitadas, intrigantes e interativas, proporcionam resultados eficazes. Em uma estratégia bem sucedida, uma mídia acaba complementando a outra e conseguindo atingir o seu público, como no caso da Melissa, que deu um retorno admirável em tão pouco tempo. O caso da Melissa é apenas um exemplo de empresa precursora, que teve a audácia de começar a agir de forma inovadora nas suas ações de marketing, propaganda e relacionamento com o cliente. Estes exemplos não têm a pretensão de esgotar o assunto; pelo contrário, tentam cumprir o papel de modelos para que outras empresas renovem seu conceito sobre mídia. Daqui a alguns poucos anos, este estudo terá ficado ultrapassado, na medida em que a tecnologia e a sociedade permanecem em seu curso de evolução. O processo é permanente, e se acelera a cada dia. REFERÊNCIAS AAKER, David; JOACHIMSTHALER, Erich. Como construir marcas líderes: Futura, 2002. ANDERSON, Chris. A cauda longa: do mercado de massa para o mercado de nicho: Campus, 2006. BERRY, L.; PARASURAMAN, A. Serviços de marketing: competindo através da qualidade. São Paulo: Maltese, 1995. COBRA, Marcos. Marketing básico, uma perspectiva brasileira: Atlas, 1985. KOTLER, Philip; KELLER, Kevin. Administração de marketing: Pearson Prentice Hall, 2006. LIPOVETSKY, Gilles. Império do efêmero: a moda e seu destino nas sociedades modernas. Tradução por Maria Lúcia Machado. São Paulo: Companhia das Letras, 1989. MOWEN John C., MINOR Michael. Comportamento do consumidor. Pearson, 2002. MOWEN John C.; MINOR Michael apud SPROLES, George B. Fashion: consumer behavior toward dress. Minneapolis, MN: Burgess, 1979. NICKELS, William G.; WOOD, Marian Burk. Marketing: relacionamento, qualidade, valor. Rio de Janeiro: LTC, 1999. REICHELT, VALESCA P. Valor percebido do cliente: um estudo sobre o relacionamento entre as instituições de Ensino superior e seus alunos. 2007. 372 f. Tese (Doutorado em Administração de Empresas) – Escola de Administração de Empresas da Fundação Getulio Vargas EAESP-FGV. São Paulo, 2007. SCHIFFMAN, Leon G.; KANUK, Leslie Lazar. Comportamento do consumidor, LTC, 1997. SHIMP, Terence A. Propaganda e promoção, Bookman, 2002. 34 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 SOLOMON, MICHAEL R. O Comportamento do Consumidor. Bookman, 2002. Sites consultados AdNews. Internet. Disponível em <http://www.adnews.com.br/internet.php?id=24857>. Acesso em 23 jun. 2008. Adversiting Age. Disponível em <http://adage.com/ >. Acesso em: 19 jun. 2008. e-bit. Disponivel em <http://www.ebit.com.br/lojas_virtuais/html/ rateloja.asp?PnumNumEmpresa=3043>. Acesso em 22 jun. 2008. Galeria Melissa. Disponível em <http://www.melissa.com.br/galeriaonline/>. Acesso em 22 jun. 2008. Grendene, Empresa. Disponível em <http://www.grendene.com.br/www/company/ company.aspx?language=0>. Acesso em: 21 jun. 2008. Ibope. Disponível em <http://www.ibope.com.br/calandraWeb/servlet/ CalandraRedirect?temp=0&proj=PortalIBOPE&pub=T&db=caldb>. Acesso em 22 jun. 2008. Instituto Enders Analysis. Disponível em <http://tecnologia.uol.com.br/ultnot/reuters/ 2008/06/18/ult3949u3929.jhtm >. Acesso em: 18 jun. 2008. Loja Melissa. Disponível em <http://www.lojamelissa.com.br/>. Acesso em: 21 jun. 2008. Melissa. Disponível em http://www.melissa.com.br/blog/>. Acesso em: 21 jun. 2008. Orkut. Disponível em <http://www.orkut.com/Home.aspx>. Acesso em 23 jun. 2008. PublicidAd. Informação para o mercado publicitário. Disponível em <http:// www.revistapublicidad.com/View/Home.aspx>. Acesso em 23 jun. 2008. Rede Mídia. Disponível em <http://www.clicrbs.com.br/blog/jsp/ default.jsp?source=DYNAMIC,blog.BlogDataServer,getBlog&uf=1&local=1&template=39 48.dwt&section=Blogs&post=69127&blog=399&coldir=1&topo=3994.dwt>. Acesso em 18. jun. 2008. Reuters. Internet. Disponível em <http://br.reuters.com/article/internetNews/ idBRN23243520080623>. Acesso em 23 jun. 2008. Opinio, n.20, jan./jun. 2008 35 Satisfação dos clientes do Banco Volkswagen Guilherme Shoji Araujo Valesca Persch Reichelt Gustavo Camossi RESUMO O presente artigo tem como objetivo identificar o nível de satisfação dos clientes da empresa em estudo no processo de comercialização de veículos novos por meio de financiamento automotivo. Na primeira etapa do artigo é apresentada a revisão da literatura e, na segunda etapa, identificados os aspectos considerados mais importantes pelos clientes na aquisição de um financiamento de veículo. A partir dos resultados encontrados, foi realizada pesquisa quantitativa com 96 clientes do Banco Volkswagen, com o objetivo de identificar o nível de satisfação dos clientes da empresa no processo de comercialização de veículos novos por meio de financiamento automotivo. Os dados foram coletados através de um questionário respondido pelos clientes. Os resultados indicam a satisfação dos clientes em relação aos produtos e serviços comercializados. Palavras-chave: Satisfação, clientes, marketing, Banco Volkswagen. Volkswagen Bank’s customers satisfaction ABSTRACT This paper’s objective is to identify consumers satisfaction level considering the company studied, in the process of brand new vehicles commercialization through automotive financing. Paper’s first part presents literature background, and the second one identifies the subjects considered more important by customers in the acquisition of an automotive loan. The results allowed the application of quantitative research with 96 Volkswagen Bank’s customers, with the objective of identifying the customers´ satisfaction level in the process of brand new vehicles commercialization through automotive financing. Data were collected with a questionnaire replied by customers. Results indicate customer’s satisfaction in relation to products and services offered by the company. Keywords: Satisfaction. Customers. Marketing. Volkswagen Bank. Guilherme Shoji Araujo é pós-graduado em Gestão de Marketing pela ULBRA Canoas. E-mail: [email protected] Valesca Persch Reichelt é Doutora em Administração de Marketing pela EAESP/FGV e professora da ULBRA Canoas. E-mail: [email protected] Gustavo Camossi é bacharel em Marketing pela UNIVEM. E-mail: [email protected] 36 Opinio Canoas p.36-61 Opinio,n.20 n.20, jan./jun. 2008 jan./jun. 2008 1 INTRODUÇÃO O mercado atual apresenta um cenário com grande número de participantes e demanda escassa. Tal fato não é diferente no mercado financeiro automotivo, onde há uma grande concentração de marcas de veículos e inúmeras instituições financeiras dispostas a aprovar crédito para que as pessoas possam adquirir veículos. Por isso, as organizações buscam mudar de postura e voltar a empresa para seus clientes, tendo como objetivo a satisfação dos clientes, a partir da identificação dos aspectos que determinam seu nível de satisfação. O relacionamento da empresa com os seus clientes deve ser o mais estreito possível, visto que eles são a razão de existir das organizações. Deste modo, o cliente deve ser tratado da melhor maneira sempre. Os produtos que as empresas comercializam são meios pelos quais os clientes satisfazem seus desejos e necessidades. A fidelidade de um cliente somente será conseguida se as suas necessidades forem plenamente satisfeitas pelos produtos e serviços comercializados pela empresa, assim como os diferenciais oferecidos. Em geral, somente desta forma este consumidor irá se tornar fiel à organização e retornará para efetuar novo negócio. Na primeira parte do trabalho é apresentada a revisão da bibliografia, utilizada para aumentar o conhecimento em relação ao problema proposto. Nesta etapa, o método utilizado foi o levantamento em fontes secundárias. Na segunda etapa, foram identificados os aspectos considerados mais importantes pelos clientes na aquisição de um financiamento de veículo, e a partir dos resultados encontrados, foram aplicados um questionário com o objetivo de identificar o nível de satisfação dos clientes da empresa no processo de comercialização de veículos novos por meio de financiamento automotivo. Ao final, apresentam-se sugestões de melhoria e as considerações finais. 2 HISTÓRICO DO BANCO VOLKSWAGEN Conforme o site da Instituição Financeira1 , desde 1976, o Banco Volkswagen representa garantia, confiança e tradição. Essas três palavras definem a Volkswagen Serviços Financeira, uma empresa que representa um papel fundamental na organização Volkswagen. A empresa é dividida em Banco, Consórcio e Seguros, e a Volkswagen Serviços Financeira procura proporcionar o melhor negócio tanto na aquisição quanto na proteção dos veículos Volkswagen. O sucesso da empresa pode ser confirmado através das novidades lançadas no mercado. Além de implantar uma Central de Atendimento Eletrônico via Internet, o Banco tem criado planos inéditos e premiados de financiamento. A empresa busca as formas adequadas para adequar os produtos e serviços às necessidades apresentadas no mercado pelos consumidores. 1 Disponível em www.bancovw.com.br/bancovw. Acesso em 20/06/2006. Opinio, n.20, jan./jun. 2008 37 Ao todo, são sete filiais com postos de atendimento localizados estrategicamente por todo o território brasileiro, equipados com tecnologia de primeira linha que faz o banco Volkswagen estar presentes em todos os 700 concessionários Volkswagen. Números e fatos que podem comprovar a garantia, confiança e tradição também para o século XXI. Em relação aos objetivos da organização, trabalha para oferecer ao consumidor alternativas para a aquisição de um veículo, facilitando o acesso, prestando um serviço de alta qualidade e honrando a marca Volkswagen. As metas são traçadas, renovadas e alcançadas diariamente graças à parceria duradoura entre a Volkswagen Serviços Financeiros, as suas filiais e as concessionárias. No que diz respeito à missão da empresa, procura contribuir com a Volkswagen na colocação de seus produtos no mercado, através dos serviços financeiros (CDC, Leasing e Consórcio), desenvolvendo programas atraentes, competitivos, confiáveis e bem administrados que resultem na satisfação plena dos clientes e revendedores. Para isso, procura: a) Atender o cliente ou revendedor como se ele fosse único, dedicando cortesia, presteza, atenção, respeito, rapidez e profissionalismo; b) Desenvolver uma linha de trabalho com qualidade, disciplina, seriedade e organização; c) Identificar e implementar melhorias que maximizem a eficiência; d) Conduzir relações de negócios com extrema ética e lisura profissional. 3 CARACTERIZAÇÃO DO AMBIENTE O Banco Volkswagen é uma empresa de atuação nacional, abrangendo todas as concessionárias da bandeira Volkswagen. Para o presente trabalho foi analisado apenas o mercado de Porto Alegre, que dispõe de quatro empresas revendedoras de veículos da marca, considerando o volume de vendas a varejo de carros novos no período de fevereiro a maio de 2006. Foram verificados os índices de vendas por meio de financiamento, índices de vendas à vista e outras modalidades de pagamento. Neste sentido, foi dada maior ênfase às vendas por meio de financiamento, que é efetivamente o negócio do Banco Volkswagen. Em relação ao total de veículos Volkswagen novos vendidos ao varejo, no período de fevereiro a maio de 2006, conforme Relatório Perfil de Vendas do Banco Volkswagen, foi atingida a marca de 2328 unidades. Deste total, 826 unidades foram vendidas à vista, 1430 foram financiadas e 72 tiveram outra modalidade de pagamento. Do total de unidades vendidas por meio de financiamento, 826 foram financiadas 38 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 pelo Banco Volkswagen e 604 foram financiadas pela concorrência. Desta forma, neste período, o Banco Volkswagen obteve uma participação de mercado de 57,8%, frente a 42,2% da concorrência. Se for considerada a penetração de mercado, índice obtido da relação entre veículos vendidos e quantidade de financiamentos, o Banco Volkswagen obteve 35,5%, contra 25,9% dos concorrentes. Em relação ao total de veículos Volkswagen vendidos por meio de financiamento, no período de janeiro a maio de 2006, conforme Relatório Perfil de Vendas do Banco Volkswagen, foi atingida a marca de 1430 unidades. O Banco Volkswagen financiou 826 carros, ao passo que o Banco Safra efetuou 126 financiamentos no período e o Banco Itaú fechou 39 operações. Os Bancos Finasa e Santander realizaram 84 e 79 operações, respectivamente, enquanto o ABN efetivou 95 contratos. Já o Unibanco fechou 53 negócios, o HSBC outros 53, o Banco BV efetuou 11 operações e o Banco Alfa fechou 38 negócios. Outros Bancos conseguiram 26 operações na rede Volkswagen em Porto Alegre no referido período. No que diz respeito à participação de mercado, que é medido pelo resultado obtido pela Instituição Financeira pelo total de operações de financiamento, o Banco Volkswagen teve em fevereiro 56,8 %, contra 8% do banco Finasa, 7,2% do banco HSBC, 6,3% do Banco ABN e 6% do Itaú. Em março, o Banco Volkswagen apresentou 52,2% de participação de mercado, enquanto que o banco Safra possuiu 11,8%, o ABN outros 9%, o Santander teve 6,9% e o Unibanco alcançou 5,4%. Já em abril, o Banco Volkswagen atingiu a marca de 61,8% de market share, ao passo que o Safra alcançou 6,5%, o Finasa 5,5%, o banco Santander 5,2% e o ABN outros 5%. No mês de maio, o Banco Volkswagen obteve uma participação de mercado de 60,5%, enquanto o Banco Safra atingiu 8,2%, o Finasa 6,3%, o ABN 6% e o Santander 5,3%. Desta maneira, é notável a grande participação que o Banco Volkswagen possui na rede de concessionárias da marca Volkswagen, porém vale ressaltar que a entrada cada vez maior de bancos concorrentes nas concessionárias tem dividido este mercado na mesma proporção. Diante dos resultados apresentados, podem ser apontados os principais concorrentes, como os bancos Safra, ABN, Finasa e Santander. Diante desta indicação, a organização poderá traçar novas estratégias de expansão de negócios e retomada do espaço perdido em função das ações e crescimento de participação de mercado de seus concorrentes. 4 REVISÃO DA LITERATURA Neste tópico são apresentados conceitos que visam fundamentar conceitualmente a pesquisa realizada e apresentada neste artigo. 4.1 Marketing De acordo com Boscarioli (2006), o marketing tem como objetivo conhecer o mercado de atuação de seu cliente e oferecer de forma inovadora e criativa produtos e Opinio, n.20, jan./jun. 2008 39 serviços que compreendam suas necessidades, a fim de aumentar o volume de vendas. Para atingir as metas da organização é preciso conhecer as necessidades e desejos do mercado, para depois proporcionar a satisfação esperada, de forma mais eficiente que a concorrência, ou, quem sabe, superando as expectativas do consumidor. Uma das formas de aproximar os clientes da empresa, e com isso conhecer suas carências. 4.1.1 Os 4 pês do marketing A teoria de Jerome McCarthy define o composto de marketing, que é formado pelos 4 pês: produto, preço, praça e promoção (KOTLER, 2003). De acordo com Cobra (1992) os produtos a serem ofertados devem ter boa qualidade, que as características atendam aos gostos dos consumidores, como diversas opções de modelos e estilos, com nome atraente de marca, serviços que proporcionem satisfação ao usuário e retorno financeiro à organização. Com relação ao preço, Gonçalves (1991) refere que deve atender as expectativas do mercado a que se dirige, com isso, o preço competitivo dentro do segmento amplie o número de clientes da organização. No atual momento econômico, preço e qualidade do produto são fatores decisivos na decisão de compra. Segundo Gonçalves (1991), a praça é o posicionamento do produto junto ao mercado consumidor, é o canal de distribuição propriamente dito. No varejo automotivo, os agentes financeiros que atuam dentro das concessionárias exercem papel fundamental e decisivo no processo de comercialização de veículos. A promoção dos produtos, de acordo com Cobra (1992), deve ser utilizada com criatividade, com as ferramentas promocionais como a propaganda, a força de vendas, a promoção de vendas, as relações públicas e o merchandising. 4.1.2 Política de preços No mercado financeiro automotivo, o quesito preço é de fundamental importância. Neste segmento, o preço e no caso em estudo a taxa de juros aplicada, é um diferencial competitivo que pode alavancar negócios para a organização, por isso será dada maior ênfase no item preço em relação aos outros 3 pês de marketing. Conforme Cobra (1992), o preço é o principal fator do composto mercadológico. Tal fato se comprova no mercado financeiro, quando nota-se a disputa por parte dos Bancos em financiar veículos, oferecendo taxas cada vez mais baixas. Desta maneira, o preço acaba sendo um dos responsáveis pelo incremento, ou não, da receita de vendas. Os outros fatores são os custos administrativos e a concorrência. Para Cobra (1992) existem outros dois objetivos igualmente importantes: 40 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 acompanhar ou seguir a concorrência e subordinar preço à diferenciação do produto ou serviço. Dessa forma, seguir a concorrência e praticar preços competitivos pode significar não se marginalizar do mercado. Já diferenciar o produto é uma forma hábil de fugir da guerra de preços e agregar valor. No financiamento de automóveis, a taxa muitas vezes decide um contrato com determinado banco, porém há outros fatores levados em conta pelos consumidores, como qualidade, marca e produto ou serviço oferecido. 4.2 Marketing de relacionamento Segundo Gronroos (1995), o marketing de relacionamento é uma estratégia de marketing de longo prazo, cujo objetivo á o desenvolvimento e a melhoria dos relacionamentos interpessoais cliente-empresa, para que sejam contínuos e duradouros. Existem cinco diferentes níveis de relacionamentos: a) Básico: o cliente apenas compra o produto, não ocorrendo novo contato com o vendedor; b) Reativo: o cliente é estipulado pelo vendedor a procurá-lo se houver alguma reclamação ou dúvida; c) Responsável: o vendedor se preocupa com o cliente, faz contatos posteriores à venda, procura saber e dar informações sobre o produto e o seu uso pelo cliente; d) Proativo: o cliente é contatado pelo telefone para ser informado da chegada de novos produtos ou informações que maximizem o uso de sua compra; e) Parceria: a empresa busca contato mais informal com o cliente a fim de informá-lo de como fazer economias do produto e racionalizar seu uso. Nesta ramificação do marketing moderno, o cliente torna-se o centro de toda a atenção da empresa, em tempo integral. É através do marketing de relacionamento que a empresa pode projetar ações voltadas aos consumidores, buscando a aproximação destes com seu mix de produtos e serviços. O relacionamento é uma forma presente no sistema de comercialização, pois ocorre nas três fases da venda: pré-venda, venda e pós-venda. Conhecer os costumes e hábitos dos clientes são informações precisas para que seja possível oferecer os produtos adequados, ou fazer a manutenção da compra, tornando o processo mais personalizado, mais informal. Conforme Reichheld (1996), um relacionamento forte com o cliente é essencial ao sucesso do negócio e que fazer negócios com pessoas nas quais confiamos e que conhecemos é mais previsível e eficiente e, portanto, mais rentável, do que fazer negócios com estranhos. Opinio, n.20, jan./jun. 2008 41 4.2.1 As relações com o consumidor Conforme Kotler (2002), as empresas estão reconhecendo que é mais importante possuir clientes do que produtos, fábricas ou equipamentos. Em geral, as empresas conseguem ganhar mais dinheiro a curto prazo por meio de vendas forçadas. Para fechar um negócio, muitos vendedores prometem de mais e entregam de menos. Porém essas táticas redundam em decepção para os clientes e problemas para a organização, em aumento da rotatividade de clientes e em altos custos para a conquista de novos clientes. As empresas inteligentes desenvolvem marcas que fazem promessas aos clientes e depois cumprem as promessas. E vão mais longe, buscando continuamente novos valores a serem agregados para facilitar as atividades dos clientes e assim aumentar a satisfação destes clientes. Para Reichheld (1996), um índice de retenção de clientes consistentemente alto pode criar uma enorme vantagem competitiva, elevar o moral dos funcionários, gerar vantagens inesperadas em termos de produtividade e crescimento e até reduzir o custo de capital. Levitt (1990) refere que o relacionamento entre um vendedor e um comprador raramente termina após a venda, pelo contrário, o relacionamento intensifica-se subseqüentemente após a venda, e este relacionamento é administrado quase sempre pelas empresas. Atualmente os clientes não compram apenas produtos, acabam comprando satisfação e desejo, por isso precisam também de serviços: manutenção, auxílio na utilização, atendimento pós-compra. Levitt (1990), afirma que sob a ótica do marketing, a empresa vive mais perto do cliente, penetra seus domínios, a fim de conhecer suas necessidades, desejos, temores, para depois fornecer o produto em todas as suas formas, pois tornou-se um feixe de satisfações de valor. Com esta interdependência cada vez mais crescente, as empresas buscam relacionamentos de longo prazo entre vendedores e compradores, não se tratando apenas de conseguir um cliente e querem mantê-lo. 4.2.2 Fidelização Conforme Barton (1999), se hoje uma empresa deseja constituir uma forte relação com seu cliente, ela deve primeiro identificar em qual estágio ela se encontra na relação com este cliente. Se compararmos a relação cliente-empresa com uma escada, o cliente deverá subi-la degrau por degrau. A partir destas atitudes, até que o cliente se encontre em um estágio de total intimidade com a empresa, pode-se afirmar que o cliente confia e acredita na relação, e com isso torna-se fiel à empresa. Segundo Reichheld (1996), a criação de valor para os clientes constitui o alicerce de qualquer sistema de negócios bem-sucedido, pois a criação de valor para o cliente gera lealdade e essa, por sua vez, gera crescimento, desenvolvimento, lucros e mais valor. 42 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 Tornar um cliente fiel à empresa leva muito tempo, e necessita do acerto de diversos aspectos, qualidade do produto e bom atendimento. Para Kotler (1993), o profissional de marketing quer sempre aumentar sua participação nos negócios de seu cliente. Não basta apenas fornecer um único produto, e sim fornecer tudo aquilo que puder dentro do universo de produtos consumidos pelo cliente. 4.2.3 Valor vitalício dos clientes Para Peppers e Rogers (1994), o valor verdadeiro, atual, de qualquer um dos seus clientes é uma função das compras futuras do cliente, em todas as linhas de produto, marcas e serviços que a empresa oferece. Se fosse possível saber exatamente os produtos e serviços que um cliente irá comprar em determinado período de tempo, seria fácil calcular o valor que esse cliente terá para a empresa ao longo desse período. Porém, estimar o valor vitalício de um cliente não é citá-lo como média do ramo ou da empresa, visto que cada cliente é diferente do outro, e faz compras na empresa de maneiras diferentes, seja no valor gasto, freqüência de compra, quantidade adquirida. Por isso surge a preocupação das empresas em relação ao marketing de relacionamento e a possibilidade da manutenção dos clientes em sua carteira. 4.2.4 Necessidades dos clientes As empresas devem conhecer quais são as reais necessidades de seus clientes. Esta é uma tarefa difícil para o marketing, pois os consumidores possuem necessidades que nem sempre conseguem expressar. Segundo Barwise (2006), as organizações precisam superar a concorrência na hora de proporcionar o que os clientes esperam. O segredo para reter clientes é satisfazêlos, ou mais do que isso, exceder as suas expectativas, fazê-los felizes em comprar na empresa. Para exceder expectativas a empresa deve buscar a diferenciação tanto em seus produtos, mas principalmente em seus serviços. Como um dos aspectos desenvolvidos na pesquisa realizada com clientes do Banco Volkswagen é o nível de satisfação, são abordados a seguir os conceitos teóricos referentes a este tema. 4.2.5 Satisfação De acordo com Kotler (1993), satisfação é o nível de sentimento de uma pessoa, resultante da comparação do desempenho ou resultado de um produto em relação às expectativas do comprador. Satisfazer e atender as expectativas dos clientes não é somente obrigação das organizações atuais. Um serviço bem feito, ou, um produto de excelente qualidade, Opinio, n.20, jan./jun. 2008 43 que supere e exceda as expectativas dos clientes, é um diferencial positivo e competitivo. Conforme Carmello (2006), um dos erros das organizações é o de acreditar que possuir produtos e serviços de boa qualidade irão suprir a necessidade de atender as expectativas e gerenciamento das experiências emocionais e sensoriais dos clientes. Conforme Kon (2004), além de conhecer os índices de satisfação de seus clientes, a empresa precisa também conhecer as causas da evasão dos clientes, para que possa investir em aspectos que realmente sejam positivos, elogiados pelos consumidores. Para as empresas centradas nos seus clientes, a satisfação não é somente uma meta, mas é também um poderosa ferramenta de marketing. No momento em que a empresa alcança altas taxas de satisfação dos clientes, ela passa a ser conhecida e recomendada pelos seus mercados-alvo. 4.2.6 Medida de satisfação do cliente Segundo Berry (1996), existem cinco dimensões utilizadas pelos clientes para avaliar a qualidade dos serviços: a) Confiabilidade: a capacidade de desempenhar os serviços prometidos de forma precisa e confiável; b) Fatores tangíveis: aparência do imóvel e suas instalações, equipamentos e pessoal; c) responsividade: a disposição de ajudar o cliente, prontidão e rapidez na prestação de serviço; d) Previsibilidade: a competência e a cortesia dos funcionários e a sua capacidade de transmitir segurança; e) Empatia: o cuidado e a atenção formal dispensada aos clientes. A dimensão mais importante é a confiabilidade. Ao contrário dos bens de consumo, erros em serviços não podem ser substituídos por outro. Muitos serviços são dependentes de mão-de-obra, o que explica a maior variabilidade no processo produtivo que os processos que são executados por máquinas. Por isso, serviços executados por seres humanos são mais suscetíveis a erros. 4.2.7 Diferenciação Segundo Kotler (1993), um dos principais meios para diferenciar uma empresa de serviços é oferecer qualidade superior a de seus concorrentes. A chave é atingir ou superar as expectativas de qualidade no serviço que os clientes desejam. De acordo com o Instituto Pró-Marketing (s.d.), muitas vezes o mau atendimento 44 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 é resultado de variável de diversos fatores, tais como: desânimo, mau preparo, problemas pessoais, incompatibilidade com a função e falta de empatia. Segundo Kotler (1993), quando uma empresa se dispõe a trabalhar o atendimento como vantagem diferencial, ela inicia um processo de se tornar diferente, de fazer pelo cliente algo que os outros não fazem. De se antecipar aos seus desejos, de se comprometer com seu sucesso e sua satisfação. Neste sentido, os bancos vêm aumentando a sua preocupação com as necessidades do mercado a fim de apresentar o melhor e mais adequado produto à demanda ainda não atendida. Portanto, saber lidar com o comportamento do mercado, tendências e expectativas, é crucial para obter sucesso. Estudar todas as características dos seus clientes, suas necessidades, seus gostos, suas percepções, possibilita a empresa criar uma relação mais forte com seu público. A diferenciação de um produto pode ser feita de diversas formas: tecnologia, preço, aplicação, qualidade, serviço, canais de distribuição, público alvo, clientes específicos e alianças. Porém, Barwise (2006), para que a diferenciação e criação de valor tenham efeito significativo, é necessário que antes a organização faça o básico e fundamental: atender às necessidades de seus clientes. Segundo Ribeiro (2006), quando a empresa vai investir em novos produtos e serviços, é preciso agir pensando em vencer as dificuldades e limites e suplantar a concorrência, Mas para vencer é preciso haver planejamento. 4.2.8 Ouvir o cliente Há várias décadas, havia empresas concentrando suas energias de vendas em modificar a mentalidade do cliente adaptando-a para seus produtos. Ofereciam lemas como “Você pode escolher qualquer cor, desde que seja preto”. Com o desenvolvimento da tecnologia e o aumento da competição, algumas empresas se mostraram mais dispostas a atender as necessidades dos clientes, passando a perguntar: “De que cor você prefere?”. Com tantas empresas oferecendo produtos, a fidelização do cliente seria uma tarefa muito dispendiosa utilizando os métodos convencionais de aumentar o pessoal de vendas ou aumentar o pessoal do marketing. A melhor opção torna-se estabelecer uma real interação empresa – cliente, onde o cliente fala de suas necessidades e assim ajuda a lançar os novos produtos. Conforme Barwise (2006), não é fácil conseguir proporcionar aos consumidores o que eles esperam, por isso, buscar a proximidade com os clientes como meio para que a organização consiga compreender as experiências deles, torna-se uma alternativa para conquistar e manter clientes. Devido ao dinamismo do mercado, neste caso do mercado automotivo, estar voltado ao cliente é essencial. Neste momento, atender as expectativas e necessidades, se possível superá-las pode ser um diferencial competitivo e de sobrevivência. Opinio, n.20, jan./jun. 2008 45 4.3 Posicionamento estratégico Para contextualizar o posicionamento estratégico, tanto da empresa quanto do ponto de vista teórico, são abordados os seguintes tópicos: credibilidade organizacional, posicionamento da empresa e concorrentes intangíveis. 4.3.1 A credibilidade organizacional O mercado financeiro automotivo se depara com crescentes avanços tecnológicos, seja em produtos e serviços ou advento de sistemas informatizados de análise de crédito, por exemplo. Porém o futuro gera uma sensação de insegurança para o mercado, que tenta ganhar segurança num fornecedor confiável, de imagem sólida. Logo a conquista da confiança do mercado é vital para o sucesso. A credibilidade torna-se uma palavra chave. O mercado é movido por uma forte concorrência, que confunde o consumidor. Este, então, procura apoiar-se numa empresa que possa lhe dar conforto, estabilidade e confiança, protegendo-o da gama de informações promocionais e duvidosas. Segundo McKenna (1992), as pessoas procuram ouvir diretamente de outras pessoas, amigos, especialistas e vendedores, suas opiniões sobre o produto. Os potenciais consumidores avaliam seu futuro fornecedor através de: inferência, se está baseada financeiramente por investidores respeitáveis; referência, se conhecidos estão satisfeitos com o produto; e evidências, se podem verificar quantitativamente o desempenho da empresa. 4.3.2 O posicionamento da empresa Segundo McKenna (1992), o que realmente importa para uma empresa é como os possíveis clientes e os já existentes vêem-na em relação às concorrentes. A liderança no mercado pode chamar a atenção de um consumidor e ser um fator importante a ser considerado por ele, mas hoje, existe mais de um único líder em praticamente todos os segmentos do mercado, por isso não basta ser líder. Certificações e prêmios de qualidade também ajudam a formar uma imagem positiva da empresa. Conforme Dal Sasso (2006), não importa o quão grande é a imagem da organização se ela não for valorizada no mercado onde atua. Geralmente as empresas querem ser boas no que fazem antes mesmo de saber o que fazer para ser boa e reconhecida pelo mercado. Para McKenna (1992), conquistar posições singulares no mercado, é uma força poderosa em marketing. No coração de toda boa estratégia de marketing está uma boa estratégia de posicionamento. Posicionamento é o que você faz com seus clientes para definir sua posição no setor. E, em um mundo onde os consumidores têm tantas opções, eles podem ser instáveis. O marketing moderno é uma batalha pela fidelidade do cliente onde o posicionamento é vital ao sucesso. 46 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 Conforme McKenna (1992), o fator mais importante no posicionamento da empresa é o sucesso financeiro. Sem sucesso financeiro, o resto de nada adianta. Uma empresa sem lucros não consegue manter sua posição por muito tempo. Quando o cliente compra um produto complexo, como um automóvel por meio de financiamento, está assumindo um compromisso de longo prazo. Não quer comprar de uma empresa com problemas financeiros ou um futuro incerto. Ao comprar tecnologia e produtos complexos, os consumidores querem comprar de um vencedor e usam o desempenho financeiro como indicador da aceitação e do sucesso do produto da empresa. A condição financeira da empresa é um sinal de estabilidade, ou instabilidade, para o mercado. Pois, quando as empresas perdem dinheiro, reduzem as operações, as linhas de produto e os serviços. Atualmente, a empresa em questão financia os veículos produzidos pela Volkswagen, e tem alguns modelos de carros/produtos-chave, que se enquadram na categoria veículo popular. Embora não sejam os mais baratos, apresentam alta tecnologia de produção e bom valor de revenda. O ideal, portanto, é que as empresas desenvolvam um mix balanceado de produtos. Devem desenvolver e construir uma imagem de liderança tecnológica; porém, para manter o fluxo de capital, devem desenvolver também produtos que ampliem a linha de produtos existentes. Desta maneira, o banco deve ofertar planos de financiamento para clientes potenciais destes produtos, alavancando as vendas da Marca e também de financiamentos. Assim, se uma empresa consegue estabelecer uma posição sólida, ou definir uma personalidade, pode ter muitos benefícios. O posicionamento da empresa tende a ter efeitos duradouros. Dentre os outros benefícios de uma posição sólida para a empresa estão: penetração mais rápida no mercado, os consumidores se sentem seguros quando lidam com líderes do setor; menos obstáculos aos produtos, uma posição sólida permite que uma empresa tenha sucesso em vender produtos mais fracos, bem como os mais fortes; melhor acesso às informações tecnológicas e sobre o mercado, todos querem discutir com eles novas idéias; custos de vendas menores, o mercado aceita seus novos produtos com maior rapidez simplesmente porque levam seu nome; preços mais altos, por terem maior aceitação podem cobrar preços mais altos pelos seus produtos e serviços, muitas vezes, elas determinam os preços no setor; melhor recrutamento, podem recrutar os melhores talentos, pois as pessoas querem trabalhar onde têm projeção; maior lealdade dos funcionários, os funcionários se identificam com seu sucesso; e melhor relação preço/ganhos, os investidores são atraídos por empresas com uma posição sólida no mercado. 4.3.3 Concorrentes intangíveis Segundo McKenna (1992), quando se fala em concorrentes de uma empresa os primeiros nomes que surgem na mente são de outras empresas, que atuam no mesmo segmento que a primeira. Porém, os concorrentes mais poderosos, os verdadeiros Opinio, n.20, jan./jun. 2008 47 concorrentes, são outros. São os chamados concorrentes intangíveis. Esses concorrentes são na verdade formas de pensar e ver o mundo. São obstáculos que se colocam no caminho do sucesso, por exemplo, gerentes de marketing resistindo à mudanças, empreendedores pensando no estilo burocrático, são exemplos de manifestações dessa concorrência invisível. Os concorrentes intangíveis se manifestam principalmente das seguintes maneiras: a) Mudança: a sociedade está em constante evolução. O mercado muda, a empresa muda, tudo muda. O ambiente como um todo permanece em constante transformação. A empresa tem que perceber a mudança assim que ela ocorre. Tem que sempre estar monitorando o mercado para poder captar uma mudança antes mesmo dela ocorrer e se adaptar à nova situação; b) Resistência à mudança: não basta apenas perceber uma mudança. A empresa deve reagir a ela; c) Consumidores bem informados: com um acesso sem precedentes a um número cada vez maior de informações, os consumidores estão cada vez mais desenvolvendo um senso crítico sobre suas relações com os produtos, de forma que as empresas tenham que se tornar mais sensíveis às suas necessidades; d) Mentalidade de pasteurização: produzir produtos homogeneizados é vantajoso do ponto de vista do setor de produção, mas não do marketing. Os consumidores querem cada vez mais produtos personalizados; e) Conceito do produto: ter uma visão ampliada do seu produto faz com que uma empresa possa se posicionar melhor no mercado, percebendo quem são seus concorrentes diretos e indiretos e expandindo suas fronteiras de atuação. Desta maneira, mais uma vez é verificada a necessidade das empresas do mercado financeiro estarem voltadas às necessidades e desejos de seus clientes. Não somente pelo aspecto tecnológico e de qualidade. Os consumidores querem os produtos adequados para si, definem suas necessidades e não mais aceitam imposições das empresas. 4.4 Marketing de serviços Conforme Lovelock (2002), serviço pode ser definido como ato ou desempenho oferecido por uma parte a outra, e embora o processo possa estar ligado a um produto físico, o desempenho é essencialmente intangível e normalmente não resulta em propriedade de nenhum dos fatores de produção, ou ainda, são atividades econômicas que criam valor e fornecem benefícios para clientes em tempos e lugares específicos, como decorrência da realização de uma mudança desejada no, ou em nome do destinatário do serviço. 48 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 O crescimento da área de serviços está sendo verificado nos mercados atuais, decorrendo das diversas mudanças e necessidades dos clientes. Prestar serviço também está fazendo parte da venda de produtos ao cliente. Vender serviço, neste caso agrega valor ao produto, um diferencial positivo e competitivo de vendas. Conforme Cobra (1990), o produto é chamado ampliado quando há a anexação do serviço, podendo facilitar uma venda futura. A satisfação do utilizador é o elemento fundamental da noção de serviço aos clientes, tanto do serviço pré-venda, pós-venda ou ainda de instalação. A satisfação depende de alguns fatores, que podem ser identificados através de alguns critérios, tais como: a) qualidade do produto; b) garantia do produto pelo vendedor; c) adaptação do produto às necessidades do utilizador; d) localização do produto à disposição do cliente; e) boa instalação; f) condições de boa utilização; g) boas condições de funcionamento e manutenção; h) ajuda financeira ao cliente, oferecer condições de aquisição. Atualmente verifica-se a importância dos serviços à medida que produtos de boa qualidade são esquecidos pelo cliente se não houver um serviço de qualidade. O serviço desponta como fator estratégico de diferenciação de negócios, sempre visando a satisfação de clientes e a busca incessante do relacionamento. Deste modo, o marketing de serviços tem como objetivo, conforme Lima Filho2 , investigar a oportunidade de mercado para planejar, organizar e oferecer assistência de serviços de qualidade, a preços razoáveis que possibilitem satisfação dos clientes e remuneração adequada aos profissionais. 4.4.1 Classificação de serviços Conforme Kotler (1993), existem cinco categorias de ofertas que podem ser classificadas: 1) Bem tangível: a oferta consiste em um bem tangível, como um veículo; 2) Bem tangível acompanhado de serviço: a oferta consiste em um bem tangível acompanhado por um ou mais serviços; 3) Híbrido: a oferta consiste em partes iguais de bens e serviços; 4) Serviço principal acompanhado de bens e serviços secundários: a oferta consiste em um serviço principal junto a algum apoio; 5) Serviços: a oferta consiste, principalmente, em um serviço. Exemplo: financiamento de um veículo. 2 Disponível em http://www.portaldomarketing.com.br/Artigos/Marketing%20de%20servicos.htm. Acesso em 10/ 05/2006. Opinio, n.20, jan./jun. 2008 49 4.4.2 Prestação de serviço e excelência Conforme Albrecht (1992), a excelência em serviço é um nível de qualidade de serviço, comparado ao de seus concorrentes, que é suficientemente elevado, do ponto de vista de seus clientes, para lhe permitir cobrar um preço mais alto pelo serviço oferecido, conquistar uma participação de mercado acima do que seria considerado natural, e obter uma margem de lucro maior do que a de seus concorrentes. Com a forte concorrência e a conseqüente queda nas margens de lucro, as empresas buscam ganhar dinheiro com os serviços que fornecem, e procuram fazê-los da melhor maneira possível, buscando a excelência. Às vezes, cobram taxas pelos serviços antes fornecidos gratuitamente com o produto. Em outros casos, estão cobrando mais caro pelos seus serviços. Porém, conforme Berry (2006), uma marca de serviços é tão forte quanto as pessoas que executam o serviço, as atitudes do profissional com o cliente podem transformar em realidade as aspirações da empresa em relação a sua marca, e desta maneira, os profissionais de marketing mais valiosos são os funcionários que executam os serviço. Os serviços são tão intangíveis para os funcionários como para os clientes. Os colaboradores precisam compreender e acreditar na marca para conseguir vendê-la bem aos consumidores. Hoje, os bancos obtêm grande lucro através dos contratos de financiamento e serviços de manutenção. Ainda em outros casos, as empresas de produtos estão criando empresas de serviços separadamente, visto que os negócios que envolvem serviços estão em fase de grande expansão, ao passo que o mercado de produtos está estagnado, podendo citar como exemplo a Volkswagen Montadora de Veículos e a Volkswagen Serviços Financeiros. 4.4.3 Pós-venda Após a venda torna-se necessário o atendimento do cliente para o esclarecimento da operacionalização dos produtos ou serviços. Nesse momento, são prestadas informações e orientações ao cliente para que sejam esclarecidos os aspectos que irão adaptar a expectativa à realidade do consumidor. Um acompanhamento, com a manutenção de contatos é essencial para se conseguir a aproximação e um bom relacionamento com os clientes, o que facilitará a renovação das compras. Conforme Cobra (1992), a empresa deve deixar o cliente perceber que ainda continua interessada nele, mesmo depois de ter fechado um negócio. Conforme Barwise (2006), a organização precisa aproximar-se ao máximo possível no local de prestação do serviço, efetuar visitas e contatos para verificar a existência de anormalidades no serviço prestado. Este tipo de relação estabelece um exemplo dentro da empresa ao enfatizar a extrema importância atribuída ao cliente. 50 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 Resolver os problemas de clientes insatisfeitos é necessário à sobrevivência da empresa. O cliente cujo problema foi resolvido poderá se mostrar mais fiel que o cliente satisfeito com um serviço comum. Em caso de falha, a maioria dos clientes se mostra conformada, pois admitem que nada e nem ninguém são perfeito, e apenas exigem a correção do problema. 5 METODOLOGIA A metodologia da pesquisa apresentada neste artigo compreendeu duas etapas: a primeira de caráter exploratório e a seguinte conclusiva. A primeira parte da pesquisa consistiu em uma etapa exploratória, utilizada para familiarizar e elevar o conhecimento e a compreensão do problema proposto, assim como dispor de maiores informações sobre o problema e ajudar no desenvolvimento de hipóteses explicativas de fatos a serem verificados e analisados a partir dos questionários respondidos pelos os clientes. Nesta etapa exploratória foram utilizadas fontes secundárias como levantamentos bibliográficos e estatísticos, o que possibilitou a elaboração do questionário relacionado aos atributos considerados decisivos no processo de aquisição de veículos novos por meio de financiamento. Em relação ao método de coleta de dados, foram realizadas entrevistas informais com os clientes com a finalidade de levantar os atributos e pontos mais importantes para a consecução da satisfação das necessidades. A primeira aplicação de questionário faz parte da fase exploratória do trabalho, e foi respondida por 25 pessoas no período de 05 de junho de 2006 a 08 de junho de 2006, em três concessionárias da marca Volkswagen na cidade de Porto Alegre. A partir dos resultados obtidos da aplicação do questionário relacionado aos atributos considerados decisivos no processo de aquisição de veículos novos por meio de financiamento, foi possível elaborar o segundo questionário, este, relacionado à satisfação dos clientes do Banco Volkswagen. Na segunda etapa do trabalho foi desenvolvida uma pesquisa descritiva com o propósito de verificar o nível de satisfação das necessidades dos clientes em relação aos serviços prestados pela empresa. Após serem levantados os atributos apontados pelos clientes, foi elaborado um questionário auto-administrado, ou seja, pode ser respondido sem a presença de um entrevistador, para coleta dos dados. Todos os clientes responderam às mesmas questões. O questionário possui 12 questões. Desse modo, a pesquisa foi quantitativa, enfatizou a utilização de dados padronizados, o que possibilitou a elaboração de comparações, generalizações e conclusões a partir dos resultados obtidos da avaliação do nível de satisfação das necessidades dos clientes. O método utilizado consiste em um questionário auto-administrado distribuído a uma amostra de clientes no período de 19 de junho a 20 de julho de 2006, totalizando 96 clientes. A população-alvo da pesquisa foram os clientes que adquirem veículos em concessionárias Volkswagen efetuando financiamento pelo Banco Volkswagen. Opinio, n.20, jan./jun. 2008 51 6 RESULTADOS DA PESQUISA EXPLORATÓRIA Na primeira etapa da pesquisa (fase exploratória) foram entrevistados vinte e cinco clientes do Banco Volkswagen, escolhidos aleatoriamente, que responderam a um questionário auto-administrado envolvendo a escolha de cinco respostas, dentro de um universo de doze opções disponíveis, totalizando 125 respostas. As opções disponibilizadas no primeiro instrumento de coleta de dados são apresentadas no Quadro 1. QUADRO 1 – Atributos listados no questionário. Fonte: Elaborado pelos autores. Os atributos apontados como mais importantes pelos clientes estão no Gráfico 1. GRÁFICO 1 – Atributos mais importantes considerados na hora de adquirir um veículo novo por meio de financiamento. Fonte: Dados da pesquisa. O atributo mais lembrado pelos entrevistados foi a taxa de juros utilizada, que representou 17,60% sobre o total de respostas (22 indicações), o que representa 88% dos entrevistados. O segundo atributo mais citado nesta etapa da pesquisa foi a desburocratização da aprovação de crédito, que representou 12,80% sobre o total de respostas, recebeu 16 indicações e indica que 64% dos entrevistados escolheram também este atributo. Em relação ao terceiro atributo mais importante é a rapidez na aprovação de crédito, que representa 12% do total de respostas e foi indicada por 15 clientes, ou seja, 60% dos entrevistados. 52 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 O quarto atributo mais importante é a necessidade de receber atendimento na concessionária pelo pessoal do banco, que representa 11,20% do total de respostas, foi citada por 14 pessoas, 56% dos entrevistados. Sobre a confiabilidade no banco, é o quinto atributo mais lembrado, presente em 9,60% do total de respostas, ou seja, recebeu 12 indicações. Este valor equivale a 48% dos entrevistados. O fácil atendimento pós-vendas é o sexto atributo mais importante, que representa 8,80% do total de entrevistas, recebeu 11 indicações e foi lembrado por 44% das pessoas. O sétimo atributo mais lembrado é a imagem da marca do banco, que representa 7,20% do total de entrevistas realizadas, foi citada nove vezes e equivale a 36% dos entrevistados. Sobre o oitavo atributo mais importante é o item que se refere às bonificações por pontualidade de pagamento, foi citada por nove entrevistados e do total de entrevistados foi lembrada por 36%, e do total de entrevistas representa 7,20%. Em relação ao nono atributo mais importante, aparece a redução da burocracia quanto à documentação, lembrada por sete entrevistados, o que representa 28% do total de pessoas e 5,60% do total de respostas. O décimo atributo mais importante é a possibilidade e flexibilidade de renegociar dívida, lembrada por seis entrevistados, o que representa 24% do total, e 4,80% do total de respostas. A diversidade na linha de produtos e serviços oferecidos é o décimo primeiro atributo mais lembrado, citada por quatro entrevistados, o que representa 16% do total de pessoas e 3,20% do total de respostas. 6.1 Atributos mais importantes A partir da coleta dos dados da pesquisa exploratória, podemos identificar os cinco atributos, considerados pelos entrevistados como os mais importantes para a compra de um veículo novo, como demonstrado no Quadro 2. QUADRO 2 – Atributos considerados mais importantes. Fonte: Dados da pesquisa. Opinio, n.20, jan./jun. 2008 53 O atributo taxa de juros foi citado por 88% das pessoas e representou 17,60% do total de respostas: de um total de 125 respostas (25 questionários x 5 respostas), foi lembrada 22 vezes. As taxas de juros cobradas são o atributo mais importante quando se trata de adquirir um veículo novo por meio de financiamento. Na pesquisa, 88% dos entrevistados citaram este item, ou seja, 22 pessoas. Comparando-se ao total de respostas, a escolha deste atributo representa 17,60%. O segundo atributo considerado mais importante pelos entrevistados é a desburocratização da aprovação de crédito, que foi citada por 64% dos entrevistados (16 pessoas) e representa 12,80% do total de respostas. O terceiro atributo mais importante segundo a pesquisa é a rapidez na aprovação de crédito, citada por 60% dos entrevistados (15 pessoas), representando 12% do total de respostas. O quarto atributo mais importante revelado na pesquisa é a necessidade de receber atendimento na concessionária pelo pessoal do banco. Este item foi lembrado por 56% dos entrevistados (14 pessoas) e do total de entrevistas representa 11,20%. O quinto atributo considerado pelos entrevistados mais importante na aquisição de um veículo novo por meio de financiamento é a confiabilidade no banco. Este item foi lembrado por 48% dos entrevistados (12 pessoas). Estes valores representam 9,60% do total de respostas. 7 RESULTADOS DA PESQUISA DESCRITIVA Na segunda etapa da pesquisa (fase descritiva) foi aplicado o questionário relacionado à satisfação dos clientes, e foram realizadas doze questões relacionadas aos serviços prestados pelo Banco Volkswagen aos clientes, a partir dos resultados obtidos da aplicação do primeiro questionário. Nesta pesquisa foram entrevistados noventa e seis clientes da empresa. A seguir, serão apresentados os resultados da pesquisa. GRÁFICO 2 – Conhecimento do Pessoal da Empresa sobre os Produtos do Banco Fonte: Dados da Pesquisa Quanto ao conhecimento dos funcionários do Banco Volkswagen sobre os produtos da empresa, e de acordo com os clientes entrevistados, 44% (42 pessoas) 54 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 apontam como ótimo este item (ver gráfico 2). Outros 35% (34 clientes) informam ser bom o conhecimento dos funcionários do Banco Volkswagen sobre os produtos. A minoria restante aponta como regular, 13%, ruim 4% e péssimo/outros 4%. Logo com relação à prestação de informações sobre o contrato de financiamento ao cliente, e 40% dos entrevistados informaram ser bom o nível de informação prestado. Já 31% declaram ser ótimo o nível de informação, enquanto 17% apontam como regular. Informam ser péssimo 8% e ruim 4% a prestação de informações. GRÁFICO 3 – Informações sobre modalidades de pagamento das parcelas. Fonte: Dados da Pesquisa. Quanto a informações prestadas sobre as modalidades de pagamento das parcelas do financiamento, 54% dos clientes entrevistados declaram como boa, conforme o gráfico 3. Já 27% informam ser ótima, ao passo que 11% apontam como regular esta prestação de informações. Os demais 8% indicam como ruim ou péssima. A avaliação dos clientes sobre a taxa de juros aplicada na operação de financiamento, 56% declaram ser boa a taxa; 17% dos entrevistados declaram ser ótima a taxa aplicada; enquanto 19% indicam como regular. A minoria, 8%, aponta como ruim ou péssima a taxa de juros aplicada na operação de financiamento. GRÁFICO 4 – Taxa do Banco Volkswagen em relação à concorrência. Fonte: Dados da pesquisa Em relação às taxas da concorrência, 36% dos clientes entrevistados informam que a taxa de juros do Banco Volkswagen é boa e 25% indicam como ótima, como Opinio, n.20, jan./jun. 2008 55 apontado no gráfico 4. Já 23% dos clientes apontam como regular, e os outros 16% informam que a taxa do banco em relação aos bancos concorrentes é ruim ou péssima. A rapidez na aprovação de crédito foi avaliada como boa e ótima por 88% dos clientes (84 entrevistados). Outros 8% declaram ser regular e 4% apontam como ruim a rapidez do Banco Volkswagen na aprovação de crédito. GRÁFICO 5 – Burocracia e excesso de documentos para a aprovação de crédito. Fonte: Dados da pesquisa. O Gráfico 5 está relacionado à burocracia na aprovação do crédito. Declaram como boa 40% dos entrevistados, e 31% indicam como ótimo o nível de burocracia. Outros 21% indicam como regular e 8% apontam como ruim ou péssima a burocracia existente na aprovação de crédito pelo Banco Volkswagen. A imagem do Banco e a segurança que ela transmite ao cliente são indicadas como ótima por 49% dos clientes e 32% informam ser boa esta segurança. Já 7% apontam como regular, 8% como ruim e 4% como péssima a imagem do Banco. GRÁFICO 6 – Banco e Confiabilidade do Cliente. Fonte: Dados da pesquisa. Para 53% dos clientes entrevistados a confiabilidade que o Banco transmite aos clientes é apontada como ótima e 35% indicam como boa, como demonstra o gráfico 6. Outros 4% informam ser regular e 8% ser péssima esta confiabilidade. O fácil atendimento pós-venda é declarado como ótimo por 36% dos entrevistados e 32% aponta como bom. Por outro lado, 24% dos clientes indicam como regular e 8% indicam como ruim ou péssimo o atendimento pós-venda prestado. 56 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 GRÁFICO 7 – Taxa aplicada pelo Banco Volkswagen maior do que a taxa da concorrência. Fonte: Dados da pesquisa. Em relação ao gráfico 7, 33% dos entrevistados informam que mesmo que a taxa do Banco Volkswagen fosse maior que a taxa de juros cobrada pela concorrência ainda assim negociariam com a empresa. Já 25% dos clientes nem concordam nem discordam. Os demais 42% dos clientes não fechariam negócio com o Banco Volkswagen se a taxa de juros aplicada fosse maior que a taxa cobrada pela concorrência. 8 ANÁLISE DOS RESULTADOS A partir dos resultados obtidos na pesquisa descritiva, é possível verificar que os clientes estão em sua maioria satisfeitos com os serviços prestados pelo Banco Volkswagen. Em apenas um item, o que se refere à intenção do cliente fechar negócio com a empresa mesmo que a taxa de juros fosse maior que a da concorrência, os clientes responderam de forma negativa em maior número que positiva. A avaliação dos respondentes da pesquisa em relação ao conhecimento que o pessoal da empresa possui sobre os produtos do Banco Volkswagen foi considerada boa ou ótima por 79% dos entrevistados, ao passo que 8% declaram como ruim ou péssimo. Nota-se forte tendência nas demais respostas positivas do questionário quando observadas as respostas boas e ótimas na primeira questão. Conforme Cobra (1992), os produtos a serem ofertados devem ter boa qualidade, as características devem atender ao gosto do consumidor, com diversas opções de modelos e estilos, com nome atraente de marca, com serviços que proporcionem satisfação ao usuário. Desta maneira, os funcionários da empresa devem conhecer os produtos e serviços da organização para comercializar o produto ou serviço mais adequado a cada comprador, tendo em vista sua necessidade e desejo e buscando a satisfação deste cliente. As informações prestadas sobre o contrato de financiamento são consideradas boa e ótima por 71% dos clientes, enquanto 12% informam ser ruim ou péssima e Opinio, n.20, jan./jun. 2008 57 17% declaram como regular. Dos clientes que responderam bom ou ótimo, grande parcela informou na primeira questão a mesma resposta, porém, sendo notável o crescimento das respostas daqueles que informaram ruim ou péssimo, pulando de 8 respostas para 12 respostas negativas na segunda questão. Já em relação ao entendimento do contrato, 60% dos clientes entrevistados responderam de maneira positiva, como bom e ótimo, 28% como regular e 12% como ruim ou péssimo. A compra de um veículo por meio de financiamento exige a assinatura de um contrato, que acaba sendo o início do relacionamento do Banco com o cliente, sendo necessário esclarecer as dúvidas e explicar o funcionamento deste serviço. As modalidades de pagamento foram informadas de maneira boa e ótima para 81% dos entrevistados, e 8% consideram ruim ou péssimo. Os clientes que afirmam de forma negativa esta questão, em sua maioria, responderam da mesma maneira às questões anteriores, o mesmo ocorrendo com aqueles de afirmaram positivamente. Atualmente, dispor de diferentes maneiras de pagamento é uma forma da empresa se adequar às necessidades dos clientes e somar valiosos pontos na busca pela satisfação e fidelização. A taxa de juros aplicada foi considerada como boa e ótima por 73% dos respondentes, e 8% apontaram como ruim e péssima. Os outros 19% dos entrevistados indicaram como regular. Quando a taxa de juros cobrada é comparada com a taxa de juros cobrada pelos bancos concorrentes, a parcela de clientes que indica como boa e ótima é 61%, e 16% avaliam como ruim e péssima. Os outros 23% indicam a taxa de juros cobrada como regular. Nota-se que uma parte dos clientes que avaliou como boa e ótima a taxa de juros cobrada indicou como regular, ruim e péssima a taxa de juros cobrada em relação à concorrência. Quando os clientes são questionados em relação à intenção de fechar negócio com o Banco Volkswagen, mesmo que a taxa de juros cobrada seja maior que a da concorrência, 33% responderam positivamente, ou seja, ainda assim negociaram com a empresa. Já 25% apontaram a resposta “nem negociaria nem não negociaria”, dependendo de outros aspectos para a concretização da operação de financiamento. Já 42% dos clientes entrevistados declaram que se a taxa de juros cobrada pela empresa fosse maior que a taxa cobrada pela concorrência, não iriam fechar negócio com o Banco Volkswagen. Por isso, a taxa de juros aplicada é um diferencial competitivo, que pode angariar negócios para a empresa. Segundo Cobra (1992), o preço, e neste caso a taxa de juros, é o principal fator do composto mercadológico. Em relação à rapidez na aprovação de crédito, 88% dos entrevistados consideram como bom e ótimo o tempo necessário. Apenas 4% indicam como ruim e 8% como regular. Já em relação à burocracia ou o excesso de documentos necessários para a aprovação do crédito, 71% dos clientes entrevistados indicam de maneira positiva a solicitação dos documentos, enquanto 21% declaram como regular e 8% como ruim ou péssimo. Nota-se que todos os clientes que declararam como ruim o tempo para aprovação de crédito, 75% declararam como ruim a quantidade de documentos solicitados à aprovação cadastral. Por outro lado, todos os clientes que informaram 58 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 como péssima a quantidade de documentos solicitada, haviam indicado como ótimo o tempo levado para a aprovação do crédito. Em relação à imagem do Banco e a segurança transmitida, é avaliada como boa e ótima por 81% dos clientes entrevistados, 7% indicam como regular e 12% como ruim ou péssima. Já a confiabilidade que o Banco passa ao cliente, é considerada por 88% dos entrevistados como boa e ótima, ao passo que 4% indicam como regular e 8% como péssima. De todos os clientes que responderam como péssima a imagem do banco, 75% responderam da mesma maneira quando questionados sobre a confiabilidade, o que não ocorre com aqueles que indicaram como ruim a imagem, pois 63% responderam positivamente (bom e ótimo) quando questionados sobre a confiabilidade. Conforme Dal Sasso (2006), não importa o quão grande é a imagem da empresa se ela não for valorizada no mercado onde atua. O grande destaque que a empresa obterá se tiver uma boa imagem no mercado irá se refletir em aumento de vendas e da carteira de clientes, alcançando também a confiabilidade dos clientes. O fácil atendimento pós-venda e a busca do relacionamento com o cliente é avaliada como bom e ótimo por 68% dos clientes entrevistados, enquanto 24% indicam como regular e 8% como ruim ou péssimo. Dos clientes que avaliaram como péssima a facilidade do atendimento pós-venda, 50% também indicaram como péssima a confiabilidade no Banco. Já 25% dos clientes que consideraram como ruim a facilidade do atendimento pós-venda, indicaram como péssima a confiabilidade no Banco. 9 CONSIDERAÇÕES FINAIS O presente estudo permitiu verificar a importância de identificar e satisfazer as necessidades e desejos dos clientes. Este trabalho proporcionou um maior conhecimento em relação às maneiras de alcançar a satisfação dos clientes, assim como verificar os aspectos considerados mais importantes por eles na aquisição de um financiamento de veículo, que possibilitaram a formulação de uma proposta de sugestões de melhorias para a organização. O cenário do mercado financeiro automotivo apresenta grande concorrência, com grande diversidade de empresas e produtos, e também taxas de juros cada vez menores, fazendo com que a empresa cada vez mais fidelize os seus compradores e expanda ainda mais sua carteira de clientes, de maneira que identifique, satisfaça e exceda seus desejos, suas necessidades e suas expectativas. Desta maneira, torna-se necessário manter boas relações com o cliente, motivo pelo qual a empresa pode alavancar novos negócios, visto que o cliente satisfeito é a melhor propaganda. De acordo com o estudo realizado, verificou-se que os clientes da empresa estão sua maioria satisfeitos com o Banco Volkswagen em relação ao financiamento de veículo novo que foi negociado. Mas estes índices de satisfação podem ser até mesmo Opinio, n.20, jan./jun. 2008 59 melhorados, pois a opinião do cliente muda conforme o tempo e os acontecimentos. As hipóteses propostas foram confirmadas, visto que no estudo realizado a taxa de juros negociada é fator determinante no fechamento de negócios, sendo considerada mais importante que o atendimento pós-venda e a marca da instituição financeira, além da satisfação da maioria dos clientes da pesquisa com a empresa. Muito embora o estudo tenha indicado que o cliente da empresa está satisfeito, é necessário valorizar e fidelizar o cliente, ou seja, as relações com ele devem ser as melhores. Por outro lado, a parcela de clientes insatisfeitos forçará a empresa a estudar meios de alcançar a satisfação de todos os clientes. Por tudo isso, estar voltado ao cliente é tão fundamental. A empresa deve estar na mente dos clientes com uma imagem positiva, de valorização e de importância com os consumidores, atendendo de forma correta, ofertando o produto ou serviço adequado, identificando necessidades e desejos para a consecução da satisfação e a fidelização dos clientes. REFERÊNCIAS ALBRECHT, Karl. Revolução nos serviços: como as empresas podem revolucionar a maneira de tratar os seus clientes. São Paulo: Pioneira, 1992. ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS FABRICANTES DE VEÍCULOS AUTOMOTORES. ANFAVEA. Relatório anual 2005. Disponível em: www.anfavea.com.br. BANCO VOLKSWAGEN. Disponível em http://www.bancovw.com.br/bancovw, Acesso em 20/06/2006. BARTON, Doug. Quando um não quer, dois não se relacionam. São Paulo: Marketing, 1999. BARWISE, Patrick. O básico é básico. HSM Management, São Paulo, n.56, p.118122, maio/jun. 2006. BERRY, Leonard L. Serviços de satisfação máxima: guia prático de ação. Rio Janeiro: Campus, 1996. ______. Marcas fortes nos serviços. HSM Management, São Paulo, n.49, p.94-99, mar./abr. 2005. BOSCARIOLI, Kelly. Divulgação eficiente e com baixo investimento. Gestão & Negócios, São Paulo, n.6, p.44-45, maio 2006. CARMELLO, Eduardo. Os sete pensamentos equivocados mais comuns na gestão da pequena empresa. Gestão & Negócios, São Paulo, n.6, p.48, maio, 2006. COBRA, Marcos. Administração de Marketing. São Paulo: Atlas, 1990. COBRA, Marcos. Administração de Marketing. São Paulo: Rumo, 1992. DAL SASSO, Sérgio. Missões, sentidos e valores. Gestão & Negócios, São Paulo, n.6, p.46, maio, 2006. GONÇALVES, David. Vendas e Marketing. São Paulo: Atlas, 1991. 60 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 GRONROOS, Christian. Marketing: Gerenciamento e serviços, a competição por serviços na hora. Rio de Janeiro: Campus, 1995. INSTITUTO PRÓ-MARKETING. Acima de tudo o cliente. Cascavel: Igol, s.d. 8p. KON, Martin. Como frear a infidelidade. HSM Management, São Paulo, n.45, p.130135, jul./ago. 2004. KOTLER, Philip. Administração e marketing: análise, planejamento, implementação e controle. 2.ed. São Paulo: Atlas, 1993. ______. Marketing em ação: uma nova abordagem para lucrar crescer e reinventar. Rio de Janeiro: Campus, 2002. LEVITT, Theodore. A imaginação de marketing. 2.ed. São Paulo: Atlas, 1990. LIMA FILHO. Marketing. Disponível em http://www.portaldomarketing.com.br/ Artigos/Marketing%20de%20servicos.htm. Acesso em 10/05/2006. LOVELOCK, Christopher. Serviços: marketing e gestão. São Paulo: Saraiva, 2002. McKENNA, Regis. Marketing de relacionamento. Rio de Janeiro: Campus: 1992. PEPPERS, Don; ROGERS, Martha. Marketing um a um: Marketing individualizado na era do cliente. Rio de Janeiro: Campus, 1994. REICHHELD, Frederick F. A estratégia da lealdade: a força invisível que mantém clientes e funcionários e sustenta crescimento, lucros e valor. Rio de Janeiro: Campus, 1996. RIBEIRO, Júlio. Nas curvas do mercado. Gestão & Negócios, São Paulo, n.6, p.52-53, maio 2006. Opinio, n.20, jan./jun. 2008 61 A questão do assédio ou dano moral dentro das políticas de recursos humanos das organizações Henrique Carvalho Kuhn RESUMO O presente artigo objetiva demonstrar que, diante da competitividade e da complexidade que envolvem as organizações, a adoção de uma boa política de recursos humanos constrói um bom clima organizacional e diminui os riscos de assédio ou dano moral no trabalho, possibilitando à empresa enfrentar os desafios sem desviar o foco de seus objetivos. Para que isso fosse possível, a metodologia utilizada foi a pesquisa bibliográfica, a partir da análise de estudos elaborados por outros autores e publicados em livros e artigos científicos. O artigo ficou dividido em cinco eixos temáticos, a saber: as organizações e o ambiente globalizado: competitividade e complexidade; responsabilidade social empresarial; ética nas organizações; gestão de pessoas e assédio moral no trabalho. Como resultados, são apresentadas diversas considerações sobre a importância dos administradores tratarem a questão do assédio moral dentro da política de recursos humanos das organizações. Palavras-chave: Competitividade. Ética. Pessoas. Assédio moral. The matter of moral beseechingness or damage inside the human resources policies of the organizations ABSTRACT The present article has the objective of demonstrating that in face of competitiveness and of the complexity which involves the organizations, the adoption of a good human resources policy builds a good organizational environment and decreases the risks of beseechingness or moral damage at work, making it possible for the company to face the challenges without diverging the focus of its objectives. So that this was possible, the methodology used was the bibliographic research, from the analysis of studies elaborated by other authors and published in scientific books and articles. The article was divided into five thematic main points, namely: the organizations and the globalized environment: competitiveness and complexity; social entrepreneur responsibility; ethics in the organizations; people managing and moral beseechingness at work. As results, various considerations are presented about the importance of the administrators of dealing with the matter of moral beseechingness inside the policy of human resources of the organizations. Keywords: Competitiveness. Ethics. People. Moral beseechingness. Henrique Carvalho Kuhn é discente do curso de Administração da ULBRA Canoas. Autor do livro Coisas de Gente (Imprensa Livre), também possui textos publicados no Jornal Ibiá, da cidade de Montenegro, nos sites www.mmcontabilidade.com.br e www.rh.com.br - Endereço: Rua Simões Lopes Neto, 440 - Bairro Rui Barbosa – CEP 95780-000 – Montenegro (RS). Telefones: (51) 3632 3234 e (51) 9353 1763. E-mail: [email protected] 62 Opinio Canoas p.62-78 Opinio,n.20 n.20, jan./jun. 2008 jan./jun. 2008 1 INTRODUÇÃO O assédio moral ou agressões, como também é conhecido, é ainda pouco discutido no meio organizacional. Estima-se que somente as grandes empresas discutem e tratam esse assunto dentro de suas políticas de recursos humanos. Conforme Freitas, Heloani e Barreto (2008), a partir do momento que associamos a questão do assédio moral ao ambiente organizacional, percebe-se o descaso de alguns gestores em relação a esse grave problema que, dependendo das circunstâncias, pode levá-los a serem responsabilizados por omissão. Entende-se que a partir do momento em que as discussões sobre o assunto aumentam, passa-se a compreender melhor o que vem a ser o assédio moral no trabalho. Segundo Freitas, Heloani e Barreto, assédio moral é uma conduta abusiva, intencional, freqüente e repetida, que ocorre no ambiente de trabalho e que visa diminuir, humilhar, vexar, constranger, desqualificar e demolir psiquicamente um indivíduo ou um grupo, degradando as suas condições de trabalho, atingindo a sua dignidade e colocando em risco a sua integridade pessoal e profissional. (2008, p.37) Sabe-se que as organizações são complexas, por serem compostas por múltiplos sistemas formados por pessoas, cada qual com seus interesses e objetivos, que podem ser divergentes aos da empresa. Conforme Morin (2002), a organização é um todo e tem de organizar de forma harmoniosa todas as suas partes, representadas por seus subsistemas. O grande desafio dos administradores dentro das organizações é promover a integração desses subsistemas e fazer com que eles funcionem em sinergia, possibilitando atender os objetivos do sistema maior que é a própria organização. A competitividade e a complexidade do mercado globalizado que envolve as organizações, obrigam as mesmas a estabelecerem critérios éticos e rigorosos de gestão que, após serem comunicados de forma clara, objetiva e transparente a todos os envolvidos, possam ajudá-la no desempenho de suas atividades. No entendimento de Moraes et al. apud Silva Filho, Benedicto e Calil (2008) a ética deve servir de base e “nortear” o dia-a-dia das organizações, devendo ser praticada por todos os seus integrantes, como forma de se estabelecer relações de lealdade e comprometimento entre funcionários, clientes e fornecedores. O presente artigo objetiva demonstrar a amplitude e a complexidade que envolve as questões relacionadas à gestão de pessoas e ao assédio moral dentro das organizações, tendo como ponto de partida a pesquisa sobre outros trabalhos e estudos de diversos autores. Desta forma, esse estudo ficou dividido em cinco eixos temáticos, a saber: as organizações e o ambiente globalizado: competitividade e complexidade; responsabilidade social empresarial; ética nas organizações; gestão de pessoas e assédio moral no trabalho. Opinio, n.20, jan./jun. 2008 63 A metodologia utilizada foi a pesquisa bibliográfica, a partir da análise de estudos elaborados por outros autores e publicados em livros e artigos científicos. Como resultados desse artigo, são apresentadas diversas considerações e abordagens sobre os principais temas relacionados a importância dos administradores tratarem a questão do assédio moral dentro da política de recursos humanos das organizações. 2 AS ORGANIZAÇÕES E O AMBIENTE GLOBALIZADO: COMPETITIVIDADE E COMPLEXIDADE Vive-se num mundo onde a competitividade passou a fazer parte do dia-a-dia das organizações e das pessoas, estimulando-as a buscarem constantemente novos conhecimentos que possam aumentar seus valores. Nesse processo, empresas e seus colaboradores inovam e descobrem suas potencialidades. Percebe-se, portanto, as dificuldades e os desafios enfrentados tanto pelas empresas como pelas pessoas que dela fazem parte diante desse contexto. Heloani (2003) entende que as pessoas são gerenciadas de acordo com o padrão de gestão estabelecido pela alta direção da empresa e do modelo industrial e econômico que predomina no momento. A busca constante por resultados leva todos a estabelecerem metas difíceis e audaciosas, muitas vezes impossíveis de serem alcançadas, provocando cobranças de todos os tipos que provocam vários conflitos. Segundo Freitas, Heloani e Barreto diante de tantas exigências as pessoas em sociedade sentem-se insatisfeitas e desorientadas diante dos “valores coletivos” e de sua pequeneza ante as adversidades do momento. Os autores dizem que “a competição generalizada reforça o sentimento de hostilidade, inveja e indiferença ao outro... (2008, p.5),”. Ainda segundo os mesmos autores, a “guerra econômica” mudou a forma de gestão das organizações e consequentemente as relações de trabalho entre empregadores e empregados, por conta de um novo modelo de administrar voltado para combater os concorrentes e não apenas gerar resultados, mas, acima de tudo, garantir a sua permanência no mercado. Eles dizem que “é preciso adequar a estrutura organizacional, transformar as relações produtivas e tecnológicas e modernizar os processos administrativos, produtivos e financeiros de forma a torná-las compatível com o novo paradigma informacional e global. (2008, p.6)”. Conforme Daher (2006), a grande concorrência hoje existente e a busca constante por novos mercados exigem que as empresas obtenham o máximo de resultados com o mínimo de investimentos. Essa nova realidade, cercada de tecnologia, modificou suas relações com os empregados. Da mesma forma sua relação com os clientes, que a cada dia passam a ter novas necessidades, também passou por grandes transformações, exigindo respostas imediatas que resultaram em novos formatos de gestão, como forma de garantir a sua permanência no mercado e a geração de lucros. De acordo com Barreto (2006), a globalização e o avanço da informática vêm provocando mudanças radicais no mundo do trabalho e provocando uma onda de 64 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 aquisições e fusões de empresas, onde todos são postos à prova à medida que é exigido flexibilidade, escala de produção e aprendizado abrangente e continuado, porém, respeitando uma curva descendente de custos. Os vínculos, até então idealizados como duradouros, foram redesenhados e passaram a ser de curto à médio prazos, alinhados com as metas audaciosas e programadas para darem resultados imediatos. “O sucesso passaria a ser medido pela capacidade de ser o melhor e de mudar o mais rapidamente possível (p.8)”. Como conseqüência imediata, nota-se uma redução dos níveis hierárquicos, principalmente nas grandes corporações, onde todos são conclamados a darem o melhor de si e serem melhores do que o outro. Diante desse contexto, percebe-se a complexidade do ambiente onde estão inseridas as pessoas e as organizações, onde o principal objetivo é obter resultados, em âmbito pessoal, profissional e organizacional. Há que se considerar que ao se obter melhores resultados do que os outros, pode-se iniciar um processo de diferenciação devido ao ganho de poder e que, se não compreendido com discernimento e de forma ética, pode resultar em conflitos prejudiciais a todos os envolvidos. 3 RESPONSABILIDADE SOCIAL EMPRESARIAL Em relação ao ambiente onde está instalada, a empresa que pratica a responsabilidade social deve procurar promovê-lo e desenvolvê-lo, como forma de compensar a utilização de sua infra-estrutura, mão-de-obra (mesmo que remunerada) e seus recursos naturais. O desenvolvimento de suas atividades industriais e comerciais não deve afetar nem causar nenhum tipo de impacto à população e ao meio ambiente. Muitas empresas incentivam e proporcionam meios e recursos para que seus funcionários desenvolvam atividades comunitárias voluntárias que possam contribuir para uma melhor condição de vida das pessoas da comunidade. Conforme Macêdo e Araújo (2006), há um novo entendimento do que é construir o bem comum, que deixou de ser responsabilidade apenas do estado para ser transferido para toda a sociedade, principalmente para as organizações. Entende-se que o dever público também é de responsabilidade e interesse da sociedade civil organizada e da iniciativa privada, que percebem a importância de suas ações sociais. O ideal é que essas ações não fossem realizadas de forma isolada, mas, sim, em conjunto com o poder público, o que poderá contribuir para a redução das desigualdades sociais ainda existentes no país. Pode-se dizer que o conceito, amplitude e benefícios da responsabilidade social estão ainda em construção. Segundo Lodi (2000) (apud DAHER, 2006, p.42), a organização que se utiliza de práticas organizacionais diferenciadas e consegue evidenciar com clareza suas ações de responsabilidade social e governança corporativa, tem maiores facilidades de fidelizar seus clientes, atrair e captar investimentos e expandir seus negócios, o que a levará a se consolidar nesse mercado extremamente competitivo. As empresas que demonstram com transparência suas ações sociais adquirem um maior valor no mercado Opinio, n.20, jan./jun. 2008 65 globalizado, à medida que proporcionam à todos os interessados um melhor entendimento de suas atividades, resultando em um diferencial competitivo diante de suas concorrentes. De acordo com Lourenço e Schröder (2003) (apud DAHER, 2006), Archie B. Carroll elaborou a pirâmide de responsabilidade social corporativa, onde apresenta quatro tipos de responsabilidade em que as empresas deveriam focar em relação ao compartilhamento de valores com a comunidade onde está inserida. Em ordem decrescente de prioridade, destaca na base da pirâmide a responsabilidade econômica (relacionada ao lucro que é o objetivo de qualquer negócio), legal (representado pela legislação que rege as empresas), ética (refere-se a postura da empresa) e responsabilidade filantrópica (associada a contribuição social da organização), conforme demonstrado na chamada pirâmide da responsabilidade social corporativa. ` Fonte: Archie B. Carroll (apud DAHER, 2006, p.96). Conforme Benedicto, Silva Filho e Moreira (apud SILVA FILHO; BENEDICTO; CALIL, 2008, p.162), investir em educação também deve fazer parte das ações de responsabilidade social das organizações. Diante da incapacidade do governo em promover ações que atinjam todas as camadas da sociedade, cabe as organizações desenvolver ações efetivas que contribuam não só para acabar com o analfabetismo, mas, para que seus funcionários adquiram novos conhecimentos que possam ser aplicados para a melhoria dos processos e serviços e melhorar o desempenho da empresa. Investimentos em educação direcionados a pesquisas geram o desenvolvimento de novas tecnologias. Conforme Penido et al. (apud SILVA FILHO; BENEDICTO; CALIL, 2008), a responsabilidade social empresarial pode ser definida e compreendida como sendo a relação de troca entre uma determinada organização e a comunidade onde a mesma 66 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 está inserida, através da participação direta em ações sociais diversas que resultem em melhores condições de vida para todos que dela fazem parte. Pode-se também associar a responsabilidade social com a cidadania empresarial, se consideramos que as organizações possuem direitos e deveres com todos os integrantes da comunidade da qual fazem parte, os chamados stakeholders, ou seja, todo o público interno e externo com os quais a empresa se relaciona direta ou indiretamente. Ainda conforme os autores, consideram-se como exemplos de ações que caracterizam a responsabilidade social das organizações: o desenvolvimento da comunidade na qual está inserida, a preservação do meio ambiente, uma comunicação transparente interna e externa, o investimento no ambiente de trabalho, no bem-estar dos funcionários, o retorno aos acionistas, a satisfação dos clientes, os investimentos em educação, saúde e esporte. (p.71) Portanto, a empresa precisa cuidar e preservar o seu valor no mercado, através da adoção de políticas e práticas éticas e socialmente corretas, as quais oportunizam acesso a investimentos e conseqüentemente geram bons resultados financeiros. Isso vai ao encontro do que diz Daher (2006). 4 ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES Sabe-se que estamos na era da economia globalizada, da pesquisa, dos avanços tecnológicos e científicos, da gestão do conhecimento e da informação; transformações acontecem a todo instante. Essa leitura nos leva a analisarmos as relações entre o capital e o trabalho e, conseqüentemente, entre as pessoas. Faz-se necessário que todos os agentes, independentemente do seu grau de importância ou envolvimento, estejam conscientes tanto de suas responsabilidades como de seus direitos. É preciso se fazer valer da moral de cada um dos envolvidos para que se possa criar um ambiente harmonioso, onde estejam estabelecidos padrões mínimos de convivência que possam resultar em um ambiente considerado ético, justo. Conforme Moreira (2002), foi Adam Smith que, já no século XVII, demonstrou que “o lucro não é um acréscimo indevido, mas um vetor de distribuição de renda e de promoção do bem-estar-social. Com isso, logrou expor pela primeira vez a compatibilidade entre ética e atividade lucrativa“ (apud SILVA FILHO; BENEDICTO; CALIL, 2008, p.21). De acordo com Silva Filho, Benedicto e Calil (2008), a partir do momento em que uma empresa opta por se instalar em uma determinada localidade, começa a extrair e usufruir de seus recursos naturais, que vai do uso da terra a utilização de matériaprima, bem como, de seus recursos humanos, através da utilização da força de trabalho. Agindo de forma ética e comprometida com seus funcionários, comunidade e meio Opinio, n.20, jan./jun. 2008 67 ambiente, a empresa cria um ambiente favorável a sua aceitação e tem como retorno o comprometimento e o reconhecimento de todas as pessoas que, direta ou indiretamente, com ela estão envolvidas. Ética está diretamente relacionada à moral, àquilo que pode ser considerado como padrão por ser aceito pela maioria. Ainda de acordo com os mesmos autores, a manutenção de uma postura ética e comprometida com todos, realizando aquilo que fora acordado e em coerência com o que é pregado, além da qualidade de seus produtos e serviços, dará evidência e credibilidade para a organização, facilitando suas ações e contribuindo para a manutenção e crescimento do seu negócio de forma sustentável e duradoura, podendo ainda diferenciá-la de suas concorrentes. A não adoção de uma postura ética resultará numa má imagem da empresa diante de seus funcionários, comunidade, clientes e fornecedores, o que vai prejudicar o bom andamento de suas operações. Seguindo a mesma linha, Pavan de Moraes et al. (apud SILVA FILHO; BENEDICTO; CALIL, 2008) entende que a ética empresarial está relacionada com responsabilidade, representada pela uniformidade e coerência das práticas comerciais e ações sociais que resultem no bem-estar da maioria das pessoas envolvidas com a organização. Cada vez mais a sociedade está atenta às ações praticadas pelas empresas privadas e instituições públicas, por conta da intensa divulgação através de todos os meios de comunicação. As empresas não agem de forma ética somente em decorrência da existência de órgãos fiscalizadores e de proteção como o Código de Defesa do Consumidor, Lei de Proteção dos Mananciais, Código Penal e Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Além de se preocuparem com o meio externo, há uma preocupação em gerenciar a possibilidade real de conflitos entre todos os recursos humanos que fazem parte do dia-a-dia da organização. Por isso muitas empresas adotam mecanismos disciplinares como o Código de Ética ou Conduta para permitir o controle de pessoal e facilitar a gestão da empresa de acordo com seus princípios. De acordo com Aguiar (2004), falar em ética poderia ser antiquado e fora da realidade. Segundo ele, a ética empresarial só é possível a partir da adoção de uma postura ética de seus acionistas, gestores e funcionários. Conforme o autor, para criarem e cultivarem um ambiente ético, as organizações estão direcionando seus esforços para treinar e qualificar seus recursos humanos, proporcionar uma comunicação clara, objetiva e transparente dentro de seu ambiente organizacional, baseada no comprometimento e respeito mútuo. Segundo o autor, a difusão desses princípios tem sido feita através do chamado “código de ética” ou “conduta”, que registra os valores, responsabilidades e os anseios da organização em relação a seus funcionários, clientes, fornecedores, comunidade, estado e seus acionistas. O autor define ética como sendo “um processo diuturno de ações positivas e exemplares. Não buscando culpados e desculpas, mas, sim, soluções e manifestações individuais e coletivas positivas (p.12)”. Entende-se que ética está diretamente relacionada ao bem. Para Machado Filho e Zylberstain (2002) (apud DAHER, 2006), com a 68 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 consolidação da globalização um dos fatores responsáveis pelo sucesso e sobrevivência de uma organização no mercado é o seu valor reputacional, cada vez mais percebido no meio empresarial e acadêmico. Empresas com uma boa reputação se diferenciam das outras e passam a ocupar lugar de destaque nos setores em que atuam. 5 GESTÃO DE PESSOAS Diante da competitividade do mundo sem fronteiras, as organizações estão em constante busca por alternativas diferenciadas de gestão e de desenvolvimento de novos produtos que as tornem competitivas, para então poder atender às expectativas de seus clientes, funcionários e acionistas, obtendo vantagens financeiras em relação a suas concorrentes. Cabe aos administradores conciliar os interesses das organizações com os de seus empregados, clientes e fornecedores. Faz-se necessário que os gestores ofereçam condições de aprendizagem e treinamento contínuo a seus funcionários para que adquiram conhecimento e aumentem seu valor, transformando-se também em fonte de vantagem competitiva para que a empresa possa estar preparada para enfrentar a realidade do mercado diante de seus concorrentes. Para Demo (2008), quando se fazem estudos sobre as organizações, é preciso considerar a questão da competitividade, que está levando as empresas a encontrarem meios cada vez mais arrojados que possam contribuir para o seu desempenho no mercado, onde a gestão de pessoas ocupa lugar de destaque. Ele ressalta que Osborn, Hunt e Schermerhorn (2001) dizem que “o planejamento estratégico de recursos humanos consiste no processo de preparar pessoas para que sejam capazes e estejam motivadas a realizar a missão e as estratégias da organização (p.8)”. Seguindo o mesmo entendimento, Dessler (2002) (apud DEMO, 2008) vê a Gestão de Pessoas como uma das mais importantes funções organizacionais, responsável pela distribuição das pessoas nas diversas funções e sua avaliação, além das questões relacionadas a saúde, segurança, bem-estar e suas relações interpessoais dentro do ambiente organizacional. Conforme Macêdo et al. (2006), o ambiente organizacional e a relação de emprego vêm sofrendo profundas mudanças, levando as pessoas a repensarem seu modo de ver e compreender todas as coisas através do autoconhecimento e na forma como se relacionam no dia-a-dia com seus familiares, amigos e colegas de trabalho em todos os níveis, o que permitirá a atualização e o fortalecimento tanto de sua personalidade como do seu fator emocional. O mesmo autor diz também que o mundo está assistindo ao chamado “choque do futuro” descrito por Tofler (1970), para quem o conhecimento e o computador tornaram-se os grandes ícones da chamada sociedade pós-industrial. Segundo Handy (1996), estruturas mais orgânicas e flexíveis, com menos pessoas, que pensam melhor Opinio, n.20, jan./jun. 2008 69 e se utilizam de sistemas inteligentes agregam muito mais valor ao negócio do que as dezenas de linhas de montagem de trabalhadores “não-pensantes” que prevalecem no modelo mecanicista (p.16). Ele ainda complementa que, seguindo a visão de Handy (1996), as empresas serão “menores e mais jovens”, com grau de hierarquização horizontalizado por causa do menor número de níveis hierárquicos, o que vai demandar muito conhecimento e dedicação, considerando que o tempo de trabalho integral será menor e provavelmente limitado à medida que o funcionário atingir os 50 anos de idade. Essa visão pessimista seria compensada pela oportunidade das pessoas viverem de forma mais saudável ao não se preocuparem com a manutenção do emprego após toda essa vivência. Segundo Moukogiannis (2006), nas organizações que se destacam em relação às outras, os funcionários agem com precisão e de acordo com os interesses da organização, a partir da influência pela liderança de seus gestores a partir de uma ferramenta chamada “propósito moral”, que considera os propósitos da descoberta (o novo), da excelência (o bem), do altruísmo (o prestativo) e do heroísmo (o eficiente). Conforme Salgado et al. (2001), que fala das “prisões psíquicas de Morgan”, as organizações são criadas, constituídas e administradas por homens que, com o passar do tempo, acabam tornando-se prisioneiros de si mesmo através de seus pensamentos, atos e omissões. Isso acontece devido ao poder que a organização legalmente constituída exerce sobre todos que delam fazem parte. Já para Nadler et al. (1994) (apud MACEDO, 2006), os comportamentos dentro das organizações devem ser pautados pelo espírito de partilha, colaboração, confiança e autoridade, fundamentados no conhecimento. No entanto, o autor entende que esse modelo é anulado pela existência dos cargos dentro das empresas, que provocam a impessoalidade e induzem a defesa do território, controle e autoridade. É a busca pelo poder dentro do ambiente organizacional, que contribui para a deterioração do clima organizacional. Ainda segundo o autor, vários estudos revelam a importância da gestão empresarial cooperativa, onde priorizam uma maior participação e autonomia dos integrantes das equipes de trabalho, eliminando as decisões em âmbito gerencial e delegando-as a funcionários técnicos, com conhecimentos mais amplos e específicos para a realização de suas atividades. Conforme Santos (1995) (apud MACEDO, 2006), estudos indicam a importância das organizações compartilharem a gestão das organizações com seus colaboradores, através da delegação de tarefas e tomada de decisão em equipe a partir de funcionários técnicos, treinados e com conhecimento aprofundado sobre os processos em que estão envolvidos. O autor ainda complementa que Maclean (apud CLARKE; MONKHOUSE, 1995) entende que devido à grande competitividade entre as empresas, estas são obrigadas a inovar sob todos os aspectos, como única maneira de permanecer no mercado globalizado. Essa inovação é também quanto à gestão, tornando-se não só uma necessidade, mas, acima de tudo, uma responsabilidade estratégica e operacional. 70 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 Conforme Paz (2004) (apud DEMO, 2008), devido à competitividade, as organizações estão em um processo contínuo de mudanças com o objetivo de se adaptarem às mudanças do mercado e garantirem a sua sobrevivência. O autor entende que, em vista disso, as empresas estão assumindo responsabilidades que até então eram consideradas como sendo do Estado e da família, podendo ser denominadas como sistemas educacionais, de saúde, de segurança e de identidade pessoal de seus recursos humanos. As empresas sentem-se responsáveis pelo sucesso pessoal e profissional de seus colaboradores. De acordo com Rego, Pinha e Cunha e Souto (2007), dentro das organizações existem oportunidades para os empregados realizarem seu trabalho com dedicação e com espírito de cumplicidade e comprometimento com a empresa e com os colegas, a partir de cinco dimensões: sentido de comunidade; alinhamento dos interesses e valores dos funcionários com os da empresa; sentido de desenvolver o trabalho voltado para o outro; alegria no trabalho e oportunidade para a vida interior. Conforme Martiningo Filho e Soares Siqueira (2007), que analisa o assédio moral dando enfoque à área de gestão de pessoas da organização, a empresa deve gerenciar seus recursos humanos com dois grandes objetivos: estimular o empregado a se dedicar ao máximo à organização e formar um ambiente onde haja ajuda mútua para que as diversas áreas da organização trabalhem como um único sistema. Nesse sentido, os autores dizem: o grande desafio para a área de gestão de pessoas parece ser então, a mediação equilibrada das relações entre mercado, organizações e indivíduos, num contexto marcado por paradoxos de diversas naturezas: globalização x cultura local; produção em série x flexibilidade; trabalhador multiqualificado x redução dos postos de trabalho; gestão participativa x concepções ultrapassadas, etc. (p.4) Ainda segundo os autores, a falta de planejamento de algumas organizações, caracterizada pela falta de procedimentos operacionais e administrativos claros, aliada ao despreparo de gestores para lidar com gente, contribui para a formação de um ambiente propício à ocorrência do assédio moral, caso a alta administração não esteja atenta e interfira com rigor. Normalmente as agressões são desencadeadas pela desestruturação proposital das condições de trabalho do funcionário, principalmente aqueles de menor nível hierárquico, resultando em prejuízos para o funcionário, a empresa e a sociedade em geral. De acordo com Freitas, Heloani e Barreto, o assédio moral ocorre porque encontra um terreno fértil e tende a se cristalizar como uma prática porque os seus autores não encontram maiores resistências organizacionais ou reprovações nem nas regras, nem na autoridade, nem na Opinio, n.20, jan./jun. 2008 71 filosofia, nem na cultura da organização, ou seja, não existe aos seus olhos uma instância interditora e punitiva para essas ocorrências perversas. (2008, p.39) 6 ASSÉDIO MORAL NO TRABALHO No contexto atual, as próprias organizações fomentam – mesmo que de forma inconsciente – a competitividade interna, com o objetivo de incentivarem seus funcionários a darem o melhor de si. No entanto, se expõem ao risco de vê-los deixarem a ética de lado nessa busca desenfreada por resultados. Valores como solidariedade, justiça social e trabalho coletivo, são esquecidos e acabam prejudicando o clima organizacional. Lutar de forma desordenada para ser a melhor no mercado e Incentivar a competitividade interna entre seus recursos humanos pode ser um caminho perverso para as organizações. Percebem-se, muitas vezes, divergências de interesses e objetivos entre funcionários e destes com a organização. Um choque de opiniões dentro de um ambiente muito competitivo pode levar os funcionários a verem seus colegas como um ponto de perigo, portanto, alvo de ataques. Forma-se então um ambiente hostil e propício para agressões e humilhações que pode efetivamente resultar em assédio ou dano moral no trabalho, cometido tanto verticalmente quando praticada por superiores hierárquicos, como horizontalmente, cometida por pessoas do mesmo nível hierárquico. O ideal é que exista congruência entre os objetivos e valores dos funcionários e, destes, com as empresas onde trabalham. A inexistência de conformidade aumenta o individualismo e pode provocar uma ruptura de ideais. As cobranças aumentam e a insatisfação toma conta de todos provocando a perda do encantamento que até então existia. Cria-se então um ambiente hostil, onde o medo passa a fazer parte da rotina das pessoas e afeta o clima organizacional da empresa. Nesse momento, num ato de autodefesa, a tendência é submeter os outros a situações de inferioridade, constrangimento e humilhação, considerados atos de agressão ou assédio moral e que não são percebidos por muitas pessoas. Normalmente acontecem de forma silenciosa e podem gerar um processo de corrosão da liberdade e, porque não, da vida das suas vítimas. Estima-se que a questão do assédio moral é desconhecida por muitas empresas, principalmente aquelas de pequeno porte. Além disso, é considerado um tabu, ficando de fora das políticas de recursos humanos da grande maioria. Por isso em algumas empresas, embora aconteçam casos de agressão, os mesmos não são identificados ou então são ignorados por parte dos superiores, direção ou proprietários da empresa. Como na maioria das vezes os casos de agressão não são percebidos pelos outros, normalmente só vem à tona se denunciados pelas próprias vítimas. Como não estão previstos em lei, muitas empresas acabam desprezando até mesmo as denuncias e não tomam nenhuma medida no sentido de evitá-los ou eliminá-los. No entanto, caso acontecerem casos freqüentes e a organização não tomar alguma ação, estará ela própria minando e destruindo seu clima organizacional. Mesmo sem legislação específica e 72 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 com pouca jurisprudência, seus diretores podem ser responsabilizados, desde que comprovada sua omissão, com base no artigo 5º, inciso X da Constituição Federal de 1988, onde dispõe que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurando o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação (BRASIL, 2005, p.15)”. Fiorelli e Malhadas Junior (2007, p.32) transcrevem diversos conceitos de assédio moral relacionado ao trabalho, frutos de estudos de diversos pesquisadores, sendo: - “toda e qualquer conduta abusiva manifestando-se sobretudo por comportamentos, palavras, atos, gestos, escritos que possa trazer dano à personalidade, à dignidade ou a integridade física ou psíquica de uma pessoa, pôr em perigo seu trabalho ou degradar o ambiente de trabalho”, por Marie-France Hirigoyen – francesa. - “a deliberada degradação das condições de trabalho através do estabelecimento de comunicações não éticas (abusivas) que se caracterizam pela repetição por longo tempo de duração de um comportamento hostil que um superior ou colega(s) desenvolve(m) contra um indivíduo que apresenta, como reação, um quadro de miséria física, psicológica e social duradoura”, por Heinz Leymann – alemão. - “a exposição dos trabalhadores e trabalhadoras a situações humilhantes e constrangedoras, repetitivas e prolongadas durante a jornada de trabalho e nos exercício de suas funções, sendo mais comuns em relações hierárquicas autoritárias e assimétricas, em que predominam condutas negativas, relações desumanas e aéticas de longa duração, de um ou mais chefes dirigida a um ou mais subordinado(s), desestabilizando a relação da vítima com o ambiente de trabalho e a organização, forçando-a a desistir do emprego”, por Margarida Barreto, (apud MENDES, 2006). - “o assédio moral é uma forma de coação social, que pode instalar-se em qualquer tipo de hierarquia ou relação social que se sustente pela desigualdade social e autoritarismo. Disso decorre a afirmação de que existe desde os primórdios da civilização humana”, por Mara Vidigal Darcanchy (2006). Conforme Barreto (2003) (apud MARTININGO FILHO; SOARES SIQUEIRA, 2007), assédio moral ou violência no trabalho “é a exposição de trabalhadores a situações vexatórias, constrangedoras e humilhantes durante o exercício de sua função, de forma repetitiva, caracterizando-se atitude desumana, violenta e antiética nas relações de trabalho” (p.3). De acordo com Freitas, Heloani e Barreto, o assédio moral é uma conduta abusiva, intencional, freqüente e repetida, que ocorre no ambiente de trabalho e que visa diminuir, humilhar, vexar, constranger, desqualificar e demolir psiquicamente um indivíduo ou um grupo, degradando as suas condições de trabalho, atingindo a sua dignidade e colocando em risco a sua integridade pessoal e profissional. (2008, p.37) Opinio, n.20, jan./jun. 2008 73 Por isso, deve ser considerado um problema organizacional, por ocorrer dentro do ambiente organizacional envolvendo as pessoas que fazem parte da empresa. Por envolver pessoas e por não ter sido evitado, a empresa é co-responsável por todos os atos que acontecerem dentro de suas instalações. Conforme Macêdo (2006) (apud HIRIGOYEN, 2000), o assédio moral é entendido como a intenção de humilhar ou denegrir uma pessoa ou trabalhador, através de palavras ou atos com o objetivo de por em perigo seu emprego ou ambiente organizacional, provocando sentimentos de angustia, desequilíbrio emocional e estresse, tendo como resultado a destruição do clima organizacional da empresa e vai influir diretamente na produtividade do funcionário agredido. As agressões e ofensas pessoais, quando ignoradas pelo agressor, levam a destruição da pessoa agredida. Freitas, Heloani e Barreto (2008) entendem que a organização, vista somente sob o aspecto econômico, acaba excluindo os direitos dos trabalhadores, à medida que procura sobreviver num mercado extremamente competitivo. Nesse contexto, a pressão no ambiente interno aumenta com a exigência do cumprimento de metas difíceis ou até impossíveis de serem atingidas tanto individual como coletivamente, provocando disputas internas que tendem a provocar medo da perda do emprego, o que resulta em uma espécie de gratidão pelo fato de permanecer empregado. Ainda segundo os mesmos autores, à medida que se convive com esse tipo de ambiente, corre-se o risco de entendê-lo como normal, o que pode contribuir para acabar destruindo as relações de trabalho através da quebra do espírito de equipe e solidariedade, falta de respeito mútuo e outros, o que contribui não só para a destruição do clima organizacional, mas, também, dificultam o relacionamento da organização com todos os agentes externos como clientes, fornecedores e o estado, em todas as suas esferas. É preciso analisar essa violência pela ótica de assédio moral e entendê-la como sendo um problema das organizações, como meio para que se possa ter um ambiente harmonioso, ético e de colaboração entre todos que dela fazem parte. Para Heleno (2008), os casos de assédio moral no trabalho vêm aumentando com o passar dos anos. Segundo ele, esse fenômeno deve-se a grande competitividade instalada entre as empresas, as quais, na ânsia por permanecerem no mercado, imputam aos funcionários metas muitas vezes impossíveis de serem alcançadas e que vão resultar em todo o tipo de pressão para que possam ser atingidas. Conforme Freitas, Heloani e Barreto (2008), todas as organizações, através de sua cultura, possuem seu código de ética ou conduta. Independente do mesmo estar declarado ou subentendido, regras, padrões, hierarquia, delegação, poder e formas de comunicação com clientes internos e externos existem e devem ser observados e avaliados por seus gestores. No entanto, a partir do momento em que o assédio moral é visualizado dentro do contexto das organizações, percebe-se que muitas empresas desprezam esses problemas como riscos à incidência de possíveis agressões, o que não as caracterizam como coniventes, mas, sim, omissas. Ainda segundo os autores, ambientes onde a competitividade interna se faz 74 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 presente de forma continuada devido a estimulação de chefias em geral, são propícios para que comportamentos maliciosos se tornem uma prática comum e com o tempo acabem sendo considerados normais, transformando a competitividade em uma disputa desonesta e passível de desdobramentos prejudiciais para as pessoas e para a própria organização. Seguindo o mesmo entendimento, os poderes que a hierarquia proporciona a esses chefes os tornam superiores a todos e imunes a qualquer tipo de questionamento ou julgamento. Complementando, eles ressaltam que estruturações organizacionais feitas sem transparência e planejamento em relação às pessoas e os cargos envolvidos, resultam em conflitos e mágoas que com o tempo podem se transformar em algum tipo de violência. Da mesma forma, essas situações são passíveis de acontecerem nos casos de fusões e aquisições de novas empresas, quandonde pode haver a duplicação ou eliminação de cargos, o que provoca sentimentos de perda e conflitos. Na mesma linha de entendimento, os autores entendem que a contratação de serviços terceirizados pode provocar um ambiente dividido em duas categorias, a dos funcionários (considerada a elite) e a dos terceirizados, ou a “dos outros” como podem ser classificados aqueles que não são funcionários contratados da empresa. Também enfatizam que as pessoas que trabalham em telemarketing e call centers, se transformam em pessoas máquinas à medida que dão sistematicamente o mesmo atendimento. Além disso, acabam se distanciando do convívio social devido ao isolamento do restante dos funcionários e podem ser vítimas de agressões por parte de colegas, chefias e clientes que se sentem insatisfeitos ou prejudicados. “O assédio moral no trabalho é, ao mesmo tempo, um fenômeno que diz respeito à esfera individual, organizacional e social, sendo os seus impactos e prejuízos arcados ou imputados em diferentes graus sobrepostos” (FREITAS; HELOANI; BARRETO, 2008, p.42). Os autores apontam que em âmbito individual, os prejuízos dizem respeito à vida psicossocial da pessoa que, ao sofrer esse tipo de agressão, sente-se atingida em relação a sua personalidade, identidade e auto-estima. Os autores complementam afirmando que esse tipo de sentimento provoca desequilíbrio em vários aspectos de sua vida, provocando inclusive várias doenças e, em situação extrema, riscos à sua própria vida. No nível organizacional, os impactos estão representados pelo afastamento por doenças e acidentes de trabalho, dificuldade na retenção de pessoal, faltas ao trabalho, aumento dos custos de manutenção devido à falta de atenção e cuidados dos funcionários e redução na produção, fatores que contribuem para gerar outro problema grave, que é a destruição do clima organizacional, que afetará clientes internos e externos. No nível social, os prejudicados não são somente as pessoas acometidas dessas agressões. À medida que se têm pessoas desempregadas, doentes ou incapazes, o Estado e toda a sociedade acabam sendo penalizados. Os gastos com tratamento médico, hospitalização e processos judiciais são enormes e passam a incidir sobre recursos públicos e privados que poderiam estar sendo investidos e aplicados em outras áreas. Opinio, n.20, jan./jun. 2008 75 Eles ressaltam que o novo modelo do trabalho proporciona um ambiente propício a vários tipos de violência, sendo o assédio moral o mais complexo de todos eles, por causa das conseqüências imprevisíveis que provoca. Por estar acontecendo mundialmente, este modelo vêm sendo estudado por pesquisadores de diversas áreas e por entidades representativas e de proteção ao trabalhador. Embora não se possa interferir nos processos de aquisições e fusões de empresas, bem como na inovação tecnológica – ressaltados anteriormente, que provocam a diminuição dos postos de trabalhos nas organizações, é necessário que as fatais demissões que ocorram aconteçam de forma transparente, a fim de não ferir sua dignidade e seus direitos. É preciso se ter a mesma preocupação em relação aos que permanecerem empregados, no sentido de evitar que fiquem com medo de passarem pelo mesmo processo doloroso. Concluindo, os autores defendem também a idéia de que a organização tem o dever “ético-jurídico” de proporcionar um ambiente saudável a seus funcionários, visto pelos aspectos de limpeza e segurança, eliminando a possibilidade de qualquer risco à vida e a saúde das pessoas que dela fazem parte. Essas preocupações devem fazer parte da política de recursos humanos das organizações que deve ser voltada para a formação e manutenção de um bom clima organizacional. Conforme Caran, Cruz Robazzi e Barcellos Dalri (2006), o assédio moral é uma manifestação que acontece sem nenhum tipo de agressão física, de forma silenciosa e imperceptível, o que o torna nocivo às organizações e a saúde do trabalhador. Tal manifestação – mesmo sendo mais abordada e delatada – devido a sua complexidade e, diante da grande competitividade existente no mundo globalizado, demanda estudos mais aprofundados para que possa, primeiramente, ser compreendido, e, posteriormente, eliminado do ambiente organizacional. De acordo com Freitas, Heloani e Barreto, o assédio moral é repleto de danos morais, mas é preciso observar que “apesar de todo assédio moral conter um conjunto de danos morais embutidos em si mesmo, nem todo dano moral constitui, por si só, um assédio moral (2008, p.90)”. 7 CONCLUSÕES Com o presente estudo, pretende-se alertar os administradores para o fato de que diante de toda a competitividade hoje existente, bem como da complexidade que envolve as organizações, é preciso que sejam estabelecidas políticas de recursos humanos compatíveis, capazes de garantir a ampliação e a manutenção do conhecimento tanto da própria empresa como de seus funcionários. Ao se fazer uma leitura do momento atual em que as organizações estão inseridas e discutir temas como responsabilidade social empresarial, ética, gestão de pessoas e assédio moral no trabalho, procurou-se fazer uma abordagem moderadora, afastada de extremismos e dentro da realidade atual, em que a competitividade existente exerce influência significativa na gestão das organizações, e metas e objetivos são redefinidos constantemente. 76 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 Entende-se que as organizações, para melhor suportarem a pressão externa e interna, precisam estabelecer boas práticas de gestão de pessoas, para que possam construir um bom clima organizacional, com pessoal preparado, motivado e com valores congruentes aos da organização. Devido à amplitude das questões relacionadas ao assédio ou dano moral no trabalho, esse grave problema que atinge muitas organizações de forma silenciosa e praticamente imperceptível no dia-a-dia, defende-se que esse estudo possa servir de alerta para os administradores e de estímulo para pesquisas mais aprofundadas e direcionadas sobre o assunto, sob a ótica da Administração. REFERÊNCIAS AGUIAR, Antonio Carlos. Ética Empresarial. Artigo publicado na p.12 da edição de 18 de jul. de 2004 do Diário do Grande ABC de Santo André-SP. ARAÚJO, Gisele Ferreira de; MACEDO, Célia Regina. Manual Empresarial de Responsabilidade Social e Sustentabilidade. São Paulo: Plêiade, 2006. BARRETO, Margarida Maria Silveira. Violência, Saúde e Trabalho: uma jornada de humilhações. São Paulo: EDUC, 2006. BRASIL, Constituição. Senado Federal, 1988. Porto Alegre: Verbo Divino, 2005. CARAN, Vânia Cláudia Spoti; ROBAZZI, Maria Lúcia do Carmo Cruz; DARLI, Maria. DAHER, Wilton de Medeiros. Responsabilidade Social Corporativa: geração de valor reputacional nas organizações internacionalizadas. São Paulo: Saint Paul Editora, 2006. DEMO, Gisela. Políticas de Gestão de Pessoas nas Organizações: papel dos valores pessoais e da justiça Organizacional. 2.ed. São Paulo: Atlas, 2008. FIORELLI, José Osmir; FIORELLI, Maria Rosa; MALHADAS JUNIOR, Marcos Julio Olivé. Assédio Moral: uma visão multidisciplinar. São Paulo: LTr, 2007. FREITAS, Maria Ester de; HELOANI, Roberto; BARRETO, Margarida. Assédio Moral no Trabalho. São Paulo: Cengage Learning, 2008. FREITAS, Maria Ester de. Quem Paga a Conta do Assédio Moral no Trabalho? Publicado na ERA-eletrônica, v.6, n.1, Art. 5, jan./jun.2007. Disponível em: http:// www.rae.com.br/eletronica/index.cfm?fuseaction=artigo&ID=4544&Secao=PENSATA &Volume=6&Numero=1&Ano=2007 Acesso em 20 de mai. 2008. HELENO, Guido. Assédio Moral no Trabalho. Artigo publicado na edição n.62 de jan./fev. 2008 da Revista Brasileira de Administração (RBA) do Conselho Federal de Administração (CFA). MACÊDO, Ivanildo Izaias de. et al. Aspectos Comportamentais da Gestão de Pessoas. 8.ed. Rio de Janeiro: FGV, 2006. MARTININGO FILHO, Antonio; SOARES SIQUEIRA, Marcus Vinicius. Assédio Moral nas Organizações e o Papel da Área de Gestão de Pessoas. Disponível em: <http://anpad.org.br/evento.php> sob o número GPR-A382. Acesso em 24 mar. 2008. MORIN, Edgar. O Método 1: A natureza da natureza. 2. ed. Porto Alegre: Sulina, 2002. MOURKOGIANNIS, Nikos. A força do Propósito Moral. Revista HSM Management, Opinio, n.20, jan./jun. 2008 77 n.56, maio/jun., 2006. REGO, Armênio; PINHA E CUNHA, Miguel; SOUTO, Solange. Espiritualidade nas Organizações e Comprometimento Organizacional. RAE-eletrônica v.6. n.2, Art. 12, jul./dez. 2007. Disponível em <http://www.rae.com.br/eletronica/index.cfm>. Acesso em 19 maio 2008. RESPONSABILIDADE SOCIAL CORPORATIVA E CIDADANIA EMPRESARIAL: uma análise conceitual comparativa. Disponível em: http://www.anpad.org.br/ trabalho_popup.php?cod_edicao_trabalho=4294. Acesso em 24 maio 2008. SALGADO, Alana da Mota et al. As Organizações sob a Metáfora das Prisões Psíquicas. Revista virtual da Universidade da Amazônia (Adcontar, Belém, v.2, n.1, p.7-10, maio 2001). Disponível em: <http://www.nead.unama.br/site/bibdigital/pdf/ artigos_revistas/240.pdf>. Acesso em 25 mai. 2008. SILVA FILHO, Cândido Ferreira da; BENEDICTO, Gideon Carvalho de; CALIL, José Francisco. Ética, Responsabilidade Social e Governança Corporativa. Campinas: Alínea, 2008. 78 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 Comparando o ensino da Administração nas modalidades a Distância e Presencial Flávio Régio Brambilla RESUMO O ensino brasileiro está estruturado mediante dois sistemas diferenciados do ponto de vista metodológico, a sistemática tradicional, e a emergente entrada dos cursos de Educação a Distância (EAD). Em caráter metodológico quantitativo, foi comparada a percepção dos alunos entre as duas modalidades de ensino na Universidade ‘X’, do curso de Administração, em uma mesma disciplina, com o mesmo professor, para identificar as diferenças que possam ser existentes. Os resultados evidenciam que embora exista hoje uma maior aproximação entre os diferentes empregos metodológicos, a EAD ainda apresenta diferenciações, tanto positivas quanto negativas diante dos formatos tradicionais da educação superior. Palavras-chave: Educação. Administração. Ensino. Educação a Distância (EAD). Comparing the Teaching of the Administration in the Distance and Presence Modalities ABSTRACT The Brazilian education is structured by two different systems of the methodological point of view, the traditional systematic, and the emergent entrance of the courses of Distance Education (DE). In quantitative methodological character, the students’ perception was compared among the two teaching modalities in the University ‘X’, of the course of Business Administration, in a same discipline, with the same teacher, to identify the differences that can be existent. The results evidence that although it exist a larger approach today among the different methodological employments, DE still presents differentiations, some positive as others negatives in front of the traditional formats of the superior education. Keywords: Education. Administration. Teaching. Distance Education (DE). 1 INTRODUÇÃO A proposta deste trabalho reside em comparar e discutir a relação entre a educação tradicional e a Educação a Distância (EAD), que configuram pauta de relevância ao Flávio Régio Brambilla é bacharel em Administração e Especialista em Gestão Organizacional (ULBRA Gravataí); especialista em Educação a Distância e Gestão Educacional (SENAC); especialista em Recursos Humanos e Mestre em Administração e Negócios: Marketing (PUCRS); doutorando em Administração (UNISINOS). Professor da Graduação e Pós-Graduação do curso de Administração da ULBRA Gravataí. Contato: [email protected] Opinio Canoas p.79-96 Opinio,n.20 n.20, jan./jun. 2008 jan./jun. 2008 79 estudo das estruturações organizacionais do ensino, e da área da administração como um todo. Para uma maior cobertura empírica da pauta estipulada, se optou por um método estatístico mais avançado, comparando variáveis independentes, o da Regressão Logística ou Análise Discriminante. São comparadas as percepções, através da pesquisa com alunos de um mesmo curso, identificando então as diferenças e semelhanças da educação tradicional e da emergente modalidade da Educação a Distância. A motivação para explorar o tema reside no fato de tanto a modalidade tradicional, quanto a EAD, embora não contemporâneas, apenas na atualidade são desenvolvidos e estudados sob a perspectiva de métodos igualmente válidos. Tentativas brasileiras do passado criaram um estigma negativo para a EAD, que vem sendo reintroduzida no Brasil mediante novos critérios, para resgatar a modalidade como uma alternativa válida de formação superior. As Universidades, como as empresas do setor industrial, estão se organizando em redes de cooperação para aplicação do EAD, o que será discutido de maneira teórica no capítulo seguinte. As redes de EAD proporcionam um maior alcance geográfico da educação, mudando o padrão de ir até uma Universidade aos novos tempos da Universidade chegando ao aluno, em suas casas ou em extensões universitárias. Casos concretos ilustram que a estruturação através de redes é viável para Universidades ampliarem suas fronteiras e obter a parcela dos alunos que não são absorvidos pelo modelo de estudo tradicional, por uma série de fatores, como deslocamento, custos e em especial em função dos aspectos tempo e limitação geográfica muitas vezes uma realidade constituindo barreira ao ensino no país. Outra importante constatação é que, diferente do que o senso comum costuma argüir, a Educação a Distância proporciona resultados tão bons quanto são obtidos na modalidade tradicional, e que apenas, conforme os resultados da etapa quantitativa, o aspecto de interação e o da socialização, são percebidos como inferiores diante da sistemática de ensino tradicional. A adição da estrutura de redes com Educação a Distância parece compor um novo enfoque de competitividade para as organizações. Este trabalho encontra-se dividido através das seções descritas a seguir. Primeiro, uma revisão da literatura das redes de cooperação, seguida de uma breve descrição conceitual da Educação a Distância (EAD). Depois, o estudo quantitativo e comparativo entre modalidades educacionais e seus postulados metodológicos. Por fim, considerações finais, incluindo os resultados principais. 2 CONCEITOS ESSENCIAIS DAS REDES DE COOPERAÇÃO NO PANORAMA DO CONHECIMENTO Knudsen (1996) considera o crescimento econômico como determinante que justifica os motivos para destinar atenção aos trabalhadores como recursos importantes da empresa em função dos conhecimentos e habilidades que impactam nas construções sociais. Complementar é o relato de Samuels (2004) que apresenta as firmas como construções sociais originárias das relações entre diferentes firmas, com mercados e 80 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 governos. O conceito de redes, de modo geral, se refere aos eventos sociais onde firmas interagem, o que é plausível de institucionalização nos arranjos universitários. Do ponto de vista econômico, firmas se unem como uma estratégia para ampliar seu alcance e ainda sobreviver, ou expandem suas unidades para outros locais geograficamente distantes de suas sedes, ou Campus centrais. Em Prahalad (2005), é enfatizada a necessidade da realização da alocação sustentada dos recursos organizacionais, para fins de maximização de resultados. As redes são formas organizacionais que viabilizam firmas de estruturação híbrida, entre hierarquia e mercado. Outro motivador para adoção da estrutura de redes se refere ao conhecimento. Não é este um conceito exclusivo do panorama educacional. Porém, quando se trata de Universidade, a operacionalização em redes, em especial com empresas, emerge como o significado de sua atuação. O propósito deste artigo não é verificar esta relação exterior ao ambiente acadêmico, e sim, como uma instituição de ensino, pode construir sua rede de educação contando com parcerias com outras unidades educacionais, ainda que este tema não seja neste artigo investigado empiricamente. Fiol e Lyles (1985, p.803) conceituam que “aprendizado organizacional significa o processo de melhorar ações através de melhor conhecimento e entendimento”. Dividem fundamentalmente esta geração de conhecimento em duas distintas formas: [1] baixo teor de aprendizagem, ou de giro simples, onde o processo de aprender resulta das associações ou comportamentos, de curta duração e de impacto restrito. Alusiva aos fenômenos de repetições e rotinas, com objetivos particulares, e [2] alto teor de aprendizagem, ou aprendizagem de ciclo duplo, que é a mais importante quanto aos seus resultados, por se tratar de ajustes nas regras e normas gerais, e ter efeitos duradouros, além de impacto na totalidade estrutural. É a aprendizagem concebida através dos processos cognitivos, de maior complexidade, e pode ser notada por processos como a necessidade de desaprender para aprender e por certo nível de instabilidade, o que fundamentalmente está ao encontro dos preceitos de uma Universidade. A adoção da metodologia da EAD, no primeiro momento, é um caso de aprendizagem complexa, de alto teor. Porém, no caso apresentado na próxima seção, está evidenciado como as organizações envolvidas após certo tempo de aprendizagem complexa enfrentam algumas dificuldades com a aprendizagem simples, em especial no caso da organização hegemônica. Como destaca Castells (1999, p.400), “o caçador de hoje é a caça de amanhã”, sentença esta que ilustra a necessidade de constante evolução, seja no conhecimento simples ou complexo. Na estruturação de redes, as organizações ajudam umas às outras, e esta iniciativa de cooperação, mesmo entre competidores, é essencial para a estratégia (AXELROD, 1990). No caso das Instituições de Ensino Superior (IES), ao mesmo tempo em que a matriz coopera com seus pólos, e estes também cooperam entre si, pode a concorrência entre unidades próximas ser uma realidade. No contexto das IES, podem Universidades Opinio, n.20, jan./jun. 2008 81 distintas se unir por propósitos comuns, como pode uma mesma escola superior expandir para novos campi universitários de controle próprio, orientados por uma sede nacional, ou campus central. Cooperar e competir neste tipo de estruturação de redes faz parte da estratégia diante do mercado. O poder da estruturação por redes de trabalho, ou cooperação, é evidente, e atinge diversos níveis sociais. Em Prahalad (2005, p.26), é dito que até os consumidores mais pobres “tiram rapidamente vantagem dos benefícios das redes de informações”, e neste sentido a EAD é caracterizada como uma maneira de democratizar o ensino superior. A estruturação em grupos, ou em redes, impacta diretamente na estruturação social, e converge com a afirmativa de Castells (1999, p.174) de que as “lógicas organizacionais são as bases de ideais para as relações das autoridades institucionalizadas”. O arranjo hierárquico, para Castells, se dá ao natural, o que pode ser detectado em estudos existentes sobre o tema. Diante dos modelos estruturais das redes, Todeva (2006) sintetiza os arranjos das redes em nove categorias. Assim como as estruturas são diferenciadas, também os tipos de gestão assumem diferentes perfis. Os formatos apresentados são: [1] o modelo hegemônico, ou redes egocêntricas, que contam com a característica fundamental da concentração do poder em um ator central (que é o caso encontrado na Universidade ‘X’); [2] redes em árvore, que apresentam uma clara representação hierárquica; [3] estrutura circular de rede, na qual os atores interagem com dois contatos dentro da rede; [4] rede regular, que é uma expansão de atores do formato anteriormente descrito. A rede ainda pode ser: [5] universal, quando sua caracterização se dá por dispersões e conectividade máxima e em todos os sentidos; [6] uma cadeia de valor, quando segue a lógica de um ator de entrada e um subseqüente de saída, e na relação entre estes um fluxo de outros atores; [7] redes em clusters, que são densas e diversificadas quanto aos locais; [8] centradas em periferia, quando atuam mediante interatividade e conectividade distintas entre dois níveis e, finalizando; [9] redes no formato de pequeno mundo, quando integram atores distantes por intermédio de ‘pontes’. Em escopo mais amplo, Jarillo (1993, p.49) caracteriza a sistemática de redes como um sistema organizado naturalmente, ao afirmar que “toda a empresa é, pelo menos, parcialmente integrada”. É do mesmo autor, Jarillo (1988), a apresentação das redes, através do conceito de organização no modelo híbrido. Arranjo este o qual classifica como uma maneira das firmas optarem por alternativas estruturais, combinando da maneira considerada mais significativa, elementos dos modelos organizacionais para mercado e para hierarquia. A designação ‘redes estratégicas’ incorpora a relação paralela perante os fenômenos de cooperar e competir, e que Jarillo (1988, p.32) conceitua como “arranjos por meio de distintos, mas relacionados com organizações que almejam o lucro que permite para estas firmas o ganho ou sustento de uma vantagem competitiva”, diante dos competidores externos. As redes, relevando o contexto analisado, fazem com que a atividade central fique ao cargo da empresa central, atuando na busca constante de especialização na cadeia de valor. Então, fica a cargo da firma central o foco na 82 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 vantagem competitiva, especialização e no negócio central, o core business, e para as demais compete o trabalho de inovar e expandir as mesmas. Os demais membros da cadeia especializam-se nas demais atividades obtendo eficiência, e propagando as estratégias da sede. O arranjo das redes proporciona flexibilidade e viabiliza redução de custos tanto para a empresa central quanto para suas parceiras. Novamente focando Jarillo (1993), é importante enfatizar a existência da relação de competição e cooperação, que efetivamente existe entre os atores da rede. Conhecimento como o foco, em especial quando se trata de entidades educacionais, aparece como um dos elementos centrais das relações das redes, e não apenas como finalidade das instituições, mas como métodos para proceder e atuar diante de outras Universidades ou redes de ensino que também configuram a iniciativa privada educacional no País. Neste sentido, é enfatizado por Ebers (1997) que os recursos e as informações precisam ser compartilhados com confiança, para o benefício de todos os atores da rede. Justamente no caso de pequenas unidades de ensino, a cooperação com a grande Universidade também desponta como significativa maneira de agregar valor, e para a instituição de ensino hegemônica, é uma maneira de expandir suas fronteiras para além de seu espaço físico, e ampliar seu domínio geográfico no território nacional. Em Perrow (1992), ao encontro das idéias de Ebers, e do estudo de caso que segue, as redes são estruturas que favorecem especialmente as uniões de pequenas empresas em detrimento de objetivos comuns, onde acontecem cooperação e competição simultaneamente. Diante das relações de uma rede, Perrow (1992) faz um importante questionamento: a confiança é um resultado de acontecimentos naturais, ou será uma criação, uma abstração gerada por práticas definidas para que esta seja obtida? – independentemente da resposta quanto à confiança, seja ela espontânea ou induzida, é uma importante característica para as relações dentro de uma rede. Embora contratos existam, a confiança é o mais forte parâmetro da rede. É neste detalhe que “um par ou uma rede de firmas pode desenvolver relacionamentos que resultam em vantagem competitiva sustentável” (DYER; SINGH, 1998, p.675). A perspectiva da evolução das firmas também é aspecto central, e pode ser visto em Gulati, Nohria e Zaheer (2000), que consideram as estruturas de redes e demais aspectos deste formato como objetos para futuras pesquisas. O propósito é justamente averiguar as estratégias de relacionamentos em busca de respostas para definição de qual perspectiva é desejável. Para Human e Provan (1997), os resultados da participação em rede aparecem caracterizados em duas tipologias, sendo estas transacionais e transformacionais. A transformação decorrente das redes é referida também em Chesbrough (2003, p.40), e para este autor “não existe uma melhor maneira para inovar”, tampouco a inovação é passível de um controle total. Chesbrough (2003) traz ainda uma comparação entre duas abordagens para inovação, respectivamente fechada e aberta. Não é incomum, como pode ser visto neste estudo, que as organizações alternem momentos de ambos os padrões. Muitas IES também proporcionam disciplinas tanto presenciais quanto a distância, como é o caso investigado da ‘X’. Opinio, n.20, jan./jun. 2008 83 Argumenta Powell (1998) que a competição é uma corrida para detenção dos benefícios da aprendizagem, em que a cooperação entre firmas, que é o caso das redes, acelera a taxa de inovação tecnológica para as empresas que cooperam. Entretanto, em alguns casos, como o da ‘X’, o desenvolvimento tecnológico está concentrado internamente. O que as parceiras ou extensões na verdade absorvem é a maximização da utilização das ferramentas. Pode existir a separação entre a geração tecnológica e a operacionalização das aulas de EAD. Se por um lado é a firma central a detentora das tecnologias, é nos conveniados, ou pólos, que o conhecimento da utilização destas fica retido. Corrobora esta diversidade Powell (1998, p.231), lembrando que “cada parceria de relacionamento e atividade de negócio representa uma distinta forma de relacionamento colaborativo”, já que alternativas válidas e positivas não se limitam em um modelo padrão ou correto diante das possibilidades. Knight (2002) caracteriza estas diversas possibilidades como as diferentes configurações que podem ser verificadas nas redes de aprendizagem. A idéia das ‘redes de aprendizagem’ é configurada por diferentes arranjos no contexto conjunto de organizações em rede, que desenvolvem suas aprendizagens em grupo (KNIGHT, 2002). Como salienta Rothwell (1995, p.38), “as firmas também são atores importantes em influenciar o ambiente no qual operam”, portanto, redes e ambientes exercem impactos mútuos entre si. As redes mudam as configurações dos ambientes, enquanto que os ambientes impactam nas decisões e estratégias adotadas pelas organizações. Um exemplo de sucesso da configuração das empresas em rede é ilustrado por Dyer e Nobeoka (2000, p.347), no qual destacam que “a rede Toyota aparece para ser altamente efetiva na facilitação da transferência de conhecimento entre firmas e pode ser este um modelo para o futuro” da adoção das redes de cooperação. Dolabella e Bitencourt (2006, p.1) referem a “importância que a articulação entre recursos e competências apresenta”. Embora seja um aspecto que predomina ao subjetivo das interações sociais e arranjos de competências na organização, foi possível constatar que este diferencial evidencia que “a competência é construída a partir de recursos”, que no caso das IES configuram elementos estruturais e pessoais, que são refletidos pela qualidade dos profissionais, qualidade da interação social, e a qualidade da combinação entre a estrutura e a força de trabalho em determinadas partes da rede (FERNANDES, 2006, p.31). Mesmo na EAD, o professor é fundamental para a qualidade do curso. Sandberg (1994) caracteriza o homem no trabalho como uma ocorrência contextual, evidenciando por que as unidades de uma mesma rede operam de maneiras distintas. As competências podem derivar da satisfação no trabalho, que é outro indicador da qualidade de difícil mensuração. Assim, diante das múltiplas complexidades, é possível afirmar que “um único recurso não pode constituir uma competência” (FERNANDES, 2006, p.35), e que as múltiplas possibilidades de configuração dificultam determinar exatamente quais os fatores que direcionam ao sucesso, o que é de mais difícil entendimento quando mais de uma organização fazem parte de uma mesma operação, ou quando uma IES incorpora diversas unidades acadêmicas dispersas geograficamente. Não é 84 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 possível então estipular indicadores ou uma metodologia singular que proporcione com segurança “uma forma de descrever o quão bem uma empresa desempenha as atividades necessárias a seu sucesso” (FERNANDES, 2006, p.34). Uma certeza na evolução metodológica da educação é que o professor não poderá ser substituído por tecnologias, e como será evidenciado nos resultados comparativos, são as características humanas as mais complexas, as que requerem maior atenção. Converge esta premissa da incapacidade de suprimir o professor com o que afirma Dutra (2004), porque as pessoas agregam o valor através do que é o conhecimento organizacional. Necessidade de aprimorar as competências na firma central, e assim ampliar suas capacidades dinâmicas (TEECE; PISANO; SHUEN, 1997) é uma necessidade, também é relevante verificar os detalhes que fazem as diferenças entre diferentes unidades de uma mesma organização, seja ela de negócios ou orientada para a formação educacional. A idéia de competências é descrita por Dutra (2004), como a entrega ao coletivo. Trata-se de uma prática sem fundamento se os esforços forem unilaterais. Sandberg e Targama (2007) encontram na colaboração a elaboração das competências coletivas. Afirmam que apenas através desta interação entre indivíduos é que se pode movimentar a organização de maneira aceitável. Passase para o aprofundamento teórico do que é a Educação a Distância (EAD). 3 CARACTERÍSTICAS PRINCIPAIS DA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA O ensino a distância, que remete para os estudos da Educação a Distância (EAD), está tomando uma expansiva fatia do segmento de ensino. Não apenas por redução dos custos, mas por proporcionar aos alunos dos mais diversos locais e classes sociais, concluir sua formação. Desde o ensino fundamental, até os cursos de Pós-Graduação, esta metodologia de trabalho é incentivada e está sendo adotada por instituições de credibilidade em todo território nacional. Define-se que a EAD é uma modalidade de ensino na qual a tecnologia é apenas uma ferramenta que proporciona a adequada relação entre professores e alunos, e não um dos seus resultados em si. A tecnologia não configura um dos objetivos almejados, mas sem ela não é possível delinear um programa eficiente. A conexão entre lugares diferentes, através de contatos interativos, é adequada para um efetivo uso pedagógico, e representa uma qualidade idêntica aos modelos tradicionais de educação. O uso de transmissões em tempo real de aulas via satélite já configura uma realidade em algumas IES brasileiras. Em SENAC (2006, c) relata-se que o processo educacional engloba as situações de aprendizagem, situação através da qual o ser humano é elevado em direção à consciência de seus deveres e direitos. Através deste entendimento, tem-se como justificar a importância da EAD, já que ela, como é o caso da educação tradicional – são sistemas responsáveis para a existência de um ambiente propício para a aprendizagem, e não modalidades excludentes. Opinio, n.20, jan./jun. 2008 85 A educação tradicional, embora significativa e ainda hoje potencial para o processo de ensino-aprendizagem, não é a única modalidade válida ao processo formal de educação. Não é difícil de entender por que as pessoas reagem negativamente aos demais métodos viáveis, ao menos em princípio, evidenciando uma percepção de risco e desconfiança. Conforme relatado em SENAC (2006, b, p.5), “a sala de aula da maioria das escolas que conhecemos reproduz um modelo próprio da época do Renascimento”, o que ilustra o quanto de vínculo existe com o modelo tradicional, que é o modelo histórico da educação. Apenas após a revolução das tecnologias, informações e comunicações presenciadas no dia de hoje, é que o modelo tradicional começa a ser utilizado em paralelo com outras metodologias educacionais, iniciando uma nova fase, onde o método presencial não é mais visto como a única opção. Consta em SENAC (2006, a, p.6) que “a revolução tecnológica do setor produtivo trouxe profundas transformações para as relações sociais”. Para Santos (2006, p.78), “a atividade educativa tende a ser cada vez mais ampla e diversificada, em processo de constante transformação”, e complementa mencionando que “a educação tende a ocupar espaços cada vez mais importantes fora da escola, fora daquele que era o seu espaço exclusivo”. Estes princípios relatados pelos autores demonstram que as barreiras geográficas não são mais um impedimento para a realização de estudos formais. Em especial a modalidade EAD proporciona uma enorme diversidade de interações entre as pessoas, onde a metodologia de trabalho pode ser colocada em prática através de uma infinidade de aparatos tecnológicos e modelos de sistemas, nos quais existem interações em tempo real ou em tempos diferentes. A interação virtual é uma evolução na educação e nas relações humanas. Tempos sincronizados ou em horários diferenciados aumentam a possibilidade para mais pessoas se qualificarem. Uma definição única de EAD é improvável, em virtude da constante mutação tecnológica e elaboração de novas ferramentas. Em SENAC (2006, a) percebe-se que as informações históricas referentes aos princípios e origens da EAD, e demais preceitos, encontram-se dispersos e sem concisão dentre grande parte das bibliografias referentes ao assunto. A justificativa do surgimento da EAD é apresentada por SENAC (2006, a, p.14) como uma solução educacional que “surge como uma das modalidades alternativas para superar as limitações de atendimento do ensino regular”, que não atende a demanda nacional. Além das superações geográficas e de acesso, tem-se outras vantagens que são oriundas da EAD. Em SENAC (2006, a, p.15) consta que “as estratégias de ensinoaprendizagem à distância possibilitam atender não apenas ao ritmo pessoal de aprendizagem, como também às demandas diversificadas de estudo”. Isso em virtude das mais variadas motivações e circunstâncias. Nem sempre o indivíduo pode cursar uma educação continuada, independente do nível escolar. A redução de custos para as IES e seus alunos também são fatores críticos. Os investimentos em EAD, e a aposta dos organismos responsáveis pela educação no Brasil e também das instituições de ensino, são oriundos de uma visão da EAD como um tipo de solução paralela, utilizada para ofertar uma capacidade educacional compatível com a realidade. Ainda que os objetivos e resultados da EAD sejam 86 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 semelhantes aos da educação tradicional, a modalidade apresenta peculiaridades. Para Benício (2006, p.2), existem atores tradicionais que fazem parte dos processos próprios da EAD, e que diferem do modelo convencional da educação. Basicamente os atores tradicionais da EAD são: coordenador, administrador, o responsável por conteúdos, tutor e aluno, conforme Figura 1. FIGURA 1 – Atores tradicionais da EAD. Fonte: Benício (2006, p.2). Por se tratar de uma idealização até certo ponto nova, em SENAC (2006, a, p.25) é dito que “a EAD aparece, nas sociedades contemporâneas, como uma modalidade de educação bastante adequada às novas demandas educacionais e profissionais”. Também em SENAC (2006, a) existe uma justificativa conceitual da EAD, como uma metodologia educacional para distribuição de conhecimentos, habilidades e atitudes, que pode atender um maior número de estudantes em diferentes lugares. Benício (2006, p.1), diz que, “nos cursos a distância o foco muda para as necessidades dos aprendizes e, portanto, toda a engenharia de EAD deve ser orientada para a implementação e implantação do processo de aprendizagem”. A educação na modalidade EAD tem por propósito o mesmo que é desejado da educação tradicional. Pode-se considerar, ao seu tempo, a escola tradicional como uma tecnologia. Assim sendo, podemos tratar a educação presencial como uma tecnologia, ou uma técnica que proporciona a existência da relação ensinoaprendizagem. Este ponto de vista é suportado por SENAC (2006, b, p.10) quando da afirmação de que a EAD é “uma solução para a necessidade de proporcionar educação”. No contexto atual, SENAC (2006, a, p.7) destaca a existência de “uma demanda por conhecimento tecnológico e habilidades inovadoras”, as quais são necessárias para os modelos evolutivos da sociedade atual. Opinio, n.20, jan./jun. 2008 87 Ramal (2001, p.14) afirma que ainda “está nas mãos dos professores a criação do espaço para o diálogo amigo, a discussão coletiva, a partilha dos sentidos”. Demonstra-se com esta citação que, o professor, dentro do processo de EAD, permanece como de importância para o ensino, como já evidenciado neste artigo. E como única desvantagem da EAD diante do modelo tradicional, justamente a reduzida interação social dos alunos entre si e com os professores, como indicam os resultados deste estudo. Apesar deste aspecto desfavorável, a EAD é uma modalidade educacional que precisa como no caso do modelo tradicional, ser constantemente aprimorada para suprir as demandas educacionais e sociais do País, mas que já demonstrou sua validade. Como em todo e qualquer método, existem limitações próprias. A mais importante das mudanças ocorridas é aquela em que o professor, de mero transmissor de saberes, torna-se focado no favorecer competências, atuando de maneira que os próprios alunos aprendam como absorver conhecimentos (SANTOS, 2006). Incluindo nesta criação de conhecimentos o senso crítico individual e o incentivo à criação coletiva. Como fechamento desta relação efetiva entre alunos e professores, torna-se pertinente apresentar as idéias dos autores Mehlecke e Tarouco (2003) que, citam quatro elementos fundamentais aos programas de EAD. São estes os alunos (o centro do processo educativo), o docente (que é o motivador da aprendizagem), a comunicação (que se refere aos meios de transmissão dos conhecimentos) e, a estrutura organizacional (de materiais utilizados, processos de comunicação e avaliação, e também o próprio programa de EAD proposto). Apresentados os conceitos fundamentais da EAD, será abaixo desenvolvida uma comparação entre os modelos educacionais através da EAD e do tradicional ensino presencial. A coleta dos dados de natureza quantitativa deste artigo foi realizada em um mesmo curso de uma Universidade, que por motivo de sigilo denominamos Universidade X, que é fornecido através da EAD e do modelo tradicional. As questões foram elaboradas justamente para fazer a comparação entre as percepções do ensino tradicional e virtual, e foram obtidas através de questionários para alunos de ambas as modalidades de ensino. 4 COMPARANDO PERCEPÇÕES ENTRE O MODELO TRADICIONAL DE EDUCAÇÃO E EAD Para apuração dos resultados empíricos do estudo, fazendo a comparação entre EAD e educação presencial, a técnica utilizada foi a da Regressão Logística, ou análise discriminante, técnicas que se confundem diante das suas similaridades. Basicamente a comparação entre as modalidades educacionais foi desenvolvida relevando sete competências, presentes na parte de metodologia deste artigo. Foram coletados no total 65 formulários de pesquisa distribuídos entre alunos das modalidades EAD e tradicional. Destes, 3 foram eliminados em virtude de problemas de preenchimento, restando 62 casos utilizados na etapa de análise. Como codificação das variáveis dependentes, foram usados como valoração original 1 EAD, e 2 presencial. Como 88 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 referencial de valores internos, 1 EAD foi representado como 0 (zero) e 2 presencial como 1. Na codificação das variáveis categóricas, foram estas separadas por sexo. Para feminino foi utilizada a notação 1,00 e como parâmetro de código 1,000. Para masculino a notação adotada foi 2,00 e como parâmetro de código ,000 foi o numerário. Diante da amostra considerada, composta por 62 casos, a freqüência apresentou 37 mulheres e 25 homens como respondentes. Para uma adequada comparação, a disciplina considerada para os testes estatísticos entre EAD e presencial, bem como programa de aula e professor foram os mesmos. Os pressupostos e testes estatísticos necessários para a técnica utilizada foram respeitados. Em função de objetividade, nem todos os outputs do SPSS© estão apresentados. Na Tabela 1, estão todas as variáveis do estudo, representadas pelas letras de A até G, conforme podem ser verificadas em figura do método. Nota-se a maior diferença de indicadores na variável D, que se refere ao aspecto de interação e trabalho em grupo diante da comparação entre as metodologias de ensino. A conclusão mais importante neste ponto é a central do estudo, e reside na afirmativa de que a interação entre as pessoas na modalidade EAD não é semelhante ao que ocorre no modelo tradicional. Embora a EAD esteja em franco desenvolvimento, o aspecto interatividade é bem mais disseminado no ensino tradicional. O desafio aos planejadores da EAD é justamente criar os mecanismos para reduzir esta grande diferença no aspecto interação entre os modelos educativos, buscando alternativas para desenvolver a interatividade no trabalho em grupos na EAD. É possível afirmar, através dos resultados obtidos, que é o professor o agente principal do processo educacional, não como um indivíduo hierarquicamente superior, mas como um agente de interação e incentivo junto aos alunos. A variável humana, como em todos os fenômenos sociais, ocupa o principal panorama, porque é na qualidade das interações sociais que existe a evolução técnica e comportamental. TABELA 1 – Variáveis independentes não equacionadas, classificadas de A até G. Fonte: Análise da coleta de dados para a comparação entre ensino tradicional e EAD, 2007. Opinio, n.20, jan./jun. 2008 89 Como pode ser visto no output da Tabela 2, além da variável D, que apresenta grande diferença entre as modalidades educacionais, também é pertinente, mas em ordem bem menor de variabilidade, verificar a variável C. Esta se refere ao processo de análise dos dados de pesquisa na disciplina averiguada, e é a variável mais próxima em natureza da letra D. Diante destes resultados, o que fica evidente é a falta de interação entre os atores na EAD diante da idéia de dinamismo. Ainda que a interação em EAD seja feita através de chats, e-mails e outras ferramentas de contato viáveis é a interação direta entre indivíduos, o fenômeno que a educação conectada ainda não consegue suprir com mesma intensidade que na modalidade de ensino tradicional. Com o advento das possibilidades de comunicação simultânea e as ferramentas de voz e vídeo em constante melhoria, pode ser esta a alternativa para que os entusiastas da EAD reduzam as diferenças negativas enfrentadas no quesito interação. Conforme já mencionado, são as variáveis C, e em proporção bastante mais elevada a D, que diferenciam as modalidades educacionais comparadas. Para fins de expressar estas diferenças através de números, segue a Tabela 2. No passo inicial da análise equacionada, se verifica a variável de maior diferenciação D, com valor Beta bastante elevado. No segundo passo, entra juntamente com a variável D, a variável C, porém, com carga de Beta bem abaixo de D. Por fim, no terceiro passo, novamente D aparece como a variável diferenciada, e as variáveis C e Disciplinas aparecem com valor Beta bastante inferior. Beta é o indicador que evidencia a significância de cada variável. Para tanto, os números expressos nas tabelas ilustram poder de explicação e de significância, o que aumenta o poder estatístico e explicativo encontrado neste estudo. Pode-se afirmar, de fato, que as modalidades educacionais testadas apresentam diferenças (Modelo Tradicional x EAD). TABELA 2 – Variáveis apresentadas na equação, com destaque para a variável D e suas cargas. Fonte: Análise da coleta de dados para a comparação entre ensino tradicional e EAD, 2007. Diante dos resultados da Tabela 2, fica evidente que a variável diferenciada entre os modelos educacionais, e que expressa uma grande diferença entre ensinos tradicional e a EAD é justamente a variável D, ilustrando o aspecto importante da interação direta para o processo de aprendizagem. Como o foco do estudo está na concepção e análise de uma rede de ensino na modalidade EAD, é possível afirmar 90 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 que a metodologia precisa desenvolver ferramentas e estratégias de trabalho que possibilitem o aumento da interatividade entre os alunos. Para fins de análise geral da comparação entre EAD e modalidade tradicional, segue a Figura 2. FIGURA 2 – Representação gráfica das variáveis, suas semelhanças e diferenças. Fonte: Análise da coleta de dados para a comparação entre ensino tradicional e EAD, 2007. Como pode ser visto na Figura 2, que apresenta os tópicos comparativos entre os tipos de ensino EAD e Presencial, todos os resultados encontram convergência nas variáveis e desvios padrão relativamente equiparados, com exceção da variável D, que além de apresentar resultados que não convergem, ainda apresentam desvio padrão desproporcional. O que está ilustrado na Figura 2 é justamente a diferença de percepção entre alunos das modalidades de ensino, demonstrando que a capacidade de interatividade é o diferencial que ainda favorece o modelo tradicional da educação. Porém, a tendência é que esta última diferenciação da educação tradicional seja alcançada pela EAD, que já é favorável aos estudantes em função de alguns fatores como, por exemplo, flexibilidade de horário, redução de deslocamento e custos inferiores. Apresentados os resultados do estudo, segue sua estruturação metodológica. Opinio, n.20, jan./jun. 2008 91 5 METODOLOGIA DO ESTUDO COMPARATIVO DESENVOLVIDO Zaltman (1997) menciona que o desenvolvimento de uma metodologia deve ser guiado pelo conhecimento sobre a natureza do fenômeno e, por isso, a revisão teórica apresentada anteriormente se fez fundamental. No estudo realizado, esta sistemática de trabalho foi adotada para que os indicadores adotados configurassem elementos relevantes para a investigação em campo. Para Bruggen, Lilien e Kacker (2002, p.469) “os pesquisadores coletam informações sobre as variáveis organizacionais através de respostas dos informantes em face de dois importantes assuntos processuais: [1] como determinar o número de informantes, e [2] como desenvolver uma maneira de agregar dados de resposta se estes forem coletados através de múltiplos informantes”. Para a execução da etapa quantitativa, foi utilizado instrumento de coleta dos dados composto por escala tipo Likert de sete pontos, além de duas questões de cunho qualitativo, destinadas para o respondente manifestar sua opinião perante os pontos positivos e a segunda para a apresentação dos principais pontos negativos. A pesquisa foi destinada aos alunos da disciplina de Pesquisa Mercadológica, da universidade ‘X’. Abaixo, encontra-se a escala destinada para auto-avaliação dos alunos, diante de algumas competências. Trata-se de sete competências para avaliação em uma escala de intensidade composta de sete pontos, de competência não desenvolvida até competência plenamente desenvolvida (vide Figura 3, abaixo ilustrada). FIGURA 3 – Escala de competências do instrumento utilizado na coleta dos dados. Fonte: Instrumento para coleta de dados, 2007. 92 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 Para verificação dos dados, foi utilizada a técnica da Regressão Logística, ou Análise Discriminante, operada através da utilização do software estatístico SPSS©. Os dados comparando os ensinos EAD e Presencial foram obtidos mediante tabulação da escala acima. Como destacado por Hair et al. (2005, a, p.319), “a maioria dos problemas em administração envolvem muitas variáveis”. A avaliação das competências adotadas configura diversas dimensões e seus desempenhos, os quais precisam ser avaliados. A avaliação dos serviços educacionais, neste caso comparando EAD e Presencial, é semelhante ao processo dos clientes diante da avaliação de características de um produto que desejam comprar. O emprego de sete variáveis justifica a decisão pela técnica multivariada utilizada no estudo. As variáveis foram analisadas em conjunto, em busca de sentido aos tópicos investigados, e assim, os testes de adequação do modelo foram empregados considerando o grupo de itens. Justificando a técnica, pode ser esta ideal já que “os objetos recaem em grupos, e é desejado que a pertinência a um grupo possa ser prevista ou explicada por um conjunto de variáveis independentes selecionadas pelo pesquisador” (HAIR et al., 2005, b, p.206). Ou seja, os atributos representados por cada uma das variáveis, as devidas capacidades, podem proporcionar a análise onde as diferenças de cada tipo de aplicação educacional se tornam evidentes. Diante das sete competências selecionadas, a interatividade é a mais heterogênea na comparação entre os modelos EAD e Presencial, apresentando o maior desvio padrão. A justificativa da separação entre as modalidades EAD e Presencial também vai ao encontro das propostas de Hair et al. (2005, b, p.208), quando referenciado que “em muitos casos, a variável dependente consiste em dois grupos ou classificações”, que é a realidade em questão. Como etapa final do presente artigo, considerações finais acerca do estudo. 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS Os resultados principais deste trabalho podem ser divididos em dois fundamentos. O primeiro é a confirmação da estruturação em redes de cooperação da educação na modalidade EAD como uma alternativa para a ampliação da oferta destes serviços, o que está desenvolvido em caráter teórico. O segundo parâmetro, o mais importante, aparece como uma atenção necessária aos idealizadores da EAD. É preciso destinar pesquisa e recursos em busca da melhoria na interação entre os diversos atores que configuram a referida modalidade de ensino. Resolvida esta competência desfavorável, a oferta dos cursos de EAD contará com condições de equilíbrio diante dos atributos essenciais presentes na educação tradicional, e ainda, a EAD poderá ser favorecida pelas vantagens de custos e deslocamento, em especial. A maior limitação da EAD hoje é sua difícil aceitação na sociedade de modo geral, além da necessidade de romper as barreiras de interação. Esta prerrogativa de desconfiança é a herança de gerações passadas que administraram de maneira inadequada os recursos e viabilidades desta categoria de educação formal. É preciso que os idealizadores dos cursos EAD destinem atenção na busca da redução destes Opinio, n.20, jan./jun. 2008 93 limitadores de relacionamento entre os integrantes da rede e façam uso desta capacidade ampliada pela cooperação. Embora possam parecer tópicos distintos, a modalidade EAD e a estruturação em redes são fundamentais para o futuro das estruturas educacionais alternativas. Novos estudos são necessários, em especial aqueles de natureza empírica que investiguem simultaneamente as estruturas organizacionais das IES e a implantação dos formatos educacionais EAD, para cursos de diferentes níveis de formação. Uma contribuição do presente artigo reside no fato do método empregado para análise empírica não ser trivial, proporcionando maior poder de explicação do que o emprego da simples estatística descritiva. Apesar do estudo direcionado ao curso de Administração, pode ser expandido para outras áreas de conhecimento, como por exemplo, psicologia, sociologia e outras disciplinas. REFERÊNCIAS AXELROD, Robert. The Evolution of Cooperation. London: Penguin Books, 1990. BENÍCIO, Haroldo Lima. Educação a Distância (EAD) e o Software Livre. Periódico: Guia EAD – Guia Brasileiro de Educação a Distância, p.01-03, 2006. Disponível em: <http://www.guiaead.com.br/guiaead/secao.asp?tipo=artigos&id=103>. Acesso em: 12/ 09/2006. BRUGGEN, Gerrit H. Van; LILIEN, Gary L.; KACKER, Manish. Informants in Organizational Marketing Research: Why Use Multiple Informants and How to Aggregate Responses. Journal of Marketing Research, v.39, p.469-478, 2002. CASTELLS, Manuel. O Poder da Identidade. 6.ed. São Paulo: Paz e Terra, 1999. CHESBROUGH, Henry W. The Era of Open Innovation. MIT Sloan Management Review, v.44, n.3, p.33-41, 2003. DOLABELLA, R.; BITENCOURT, C. C. A Consolidação das Competências Organizacionais na Vitivinicultura Brasileira: Estudo de Caso Vinícola Miolo. ENANPAD: 30, p.1-16, 2006. DUTRA, Joel Souza. Competências: Conceitos e Instrumentos para a Gestão de Pessoas na Empresa Moderna. São Paulo: Atlas, 2004. DYER, J.; NABEOKA, Kentaro. Creating and Managing a High-Performance Knowledge-Charing Network: Toyota Case. Strategic Management Journal, v.21, p.345367, 2000. DYER, J.; SINGH, H. The Relational View: Cooperative Strategy Sources Interorganizational Competitive Advantage. Academy of Management Review, v.23, n.4, p.660-679, 1998. EBERS, Mark. The Formation of Inter-Organizational Networks. Oxford: Oxford, 1997. FERNANDES, B. Competências e Desempenho Organizacional. São Paulo: Saraiva, 2006. FIOL, C. Marlene; LYLES, Marjorie A. Organizational Learning. Academy of Management Review, v.10, n.4, p.803-813, 1985. 94 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 GULATI, Ranjay; NOHRIA, Nitin; ZAHEER, Akbar. Strategic Networks. Strategic Management Journal, v.21, n.3, p.203-215, 2000. (a) HAIR, Jr. Joseph F.; BABIN, Barry; MONEY, Arthur H.; SAMOUEL, Phillip. Fundamentos de Métodos de Pesquisa em Administração. Porto Alegre: Bookman, 2005. (b) HAIR, Jr. Joseph F.; ANDERSON, Rolph E.; TATHAM, Ronald L.; BLACK, William C. Análise Multivariada de Dados. 5.ed. Porto Alegre: Bookman, 2005. HUMAN, S; PROVAN, K. Emergent Theory Structure and Outcomes in SmallFirm Strategic Manufacturing Network. Academy of Management Journal, v.40, n.2, p.368403, 1997. JARILLO, Carlos. Strategic Networks. Oxford: Butterworth-Heinemann, 1993. JARILLO, J. C. On Strategic Networks. Strategic Management Journal, v.9, p.31-41, 1988. KNIGHT, Louise. Network Learning: Exploring Learning by Interorganizational Networks. Human Relations, v.55, n.4, p.427-454, 2002. KNUDSEN, Christian. The Competence Perspective: A Historical View. Towards a Competence Theory of the Firm, (FOSS, Nicolai J. & KNUDSEN, Christian), 1996. MEHLECKE, Querte Teresinha Conzi; TAROUCO, Liane Margarida Rockenbach. Ambientes de Suporte para Educação a Distância: A Mediação para Aprendizagem Cooperativa. Novas Tecnologias na Educação CINTED-UFRGS, v.01, 01, p.1-13, 2003. PERROW, Charles. Small-Firm Networks. In: Nohria, N.; Eccles, R. Networks and Organizations: Structure, Form and Action. Boston: Harvard Business School, 1992. POWELL, W. Learning from Collaboration: Knowledge and Networks in the Biotechnology and Pharmaceutical Industries. California Management Review, v.40, p. 228-240, 1998. PRAHALAD, C. K. A Riqueza na Base da Pirâmide. Porto Alegre: Bookman, 2005. RAMAL, A. C. Educação a Distância: Mitos e Desafios. R. Pátio, v.05, 18, p.12-16, 2001. ROTHWELL, Roy. Industrial Innovation: Success, Strategy, Trends. In: Dodgson, M.; Rothwell, Roy. The handbook of industrial innovation. Cheltenham: Edward Elgar, 1995. SAMUELS, W. J. Markets Social Construction. Social Research, v.71, n.2, p.357-370, 2004. SANDBERG, Jörgen. Human Competence at Work. Sweden: BAS, 1994. SANDBERG, Jörgen; TARGAMA, Axel. Managing Understanding in Organizations. London: Sage Publications, 2007. SANTOS, Nilton Bahlis dos. A Educação à Distância, a Internet e a Educação Formal. Liinc em Revista, v.02, 01, p.66-85, 2006. SENAC. Cenário Atual da EAD. SENAC: Educação a Distância (Material Didático do Curso de Especialização em Educação a Distância) – Unidade-01, p.1-82, 2006, a. SENAC. Mídias e Tecnologias na Educação. SENAC: Educação a Distância (Material Didático do Curso de Especialização em Educação a Distância) – Unidade-02, p.1113, 2006, b. Opinio, n.20, jan./jun. 2008 95 SENAC. Aprendizagem e Tutoria. SENAC: Educação a Distância (Material Didático do Curso de Especialização em Educação a Distância) – Unidade-03, p.1-110, 2006, c. TEECE, D. J.; PISANO, G.; SHUEN, A. Dynamic Capabilities and Strategic Management. Strategic Management Journal, v.18, n.7, p.509-533, 1997. TODEVA, E. Business Networks: Strategy and Structure. London: Toutledge, 2006. UNOPAR em Revista. Notícias da Universidade Norte do Paraná. UNOPAR 35 anos: Trajetória de Sucesso. Tiragem: 20.000 exemplares, nº.008, p.1-48, 2007. ZALTMAN, Gerald. Rethinking Research: Putting People Back In. Journal of Marketing Research, v.34, p.424-437, 1997. 96 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 Estudo sobre a aplicação de métodos participativos no Programa de Capacitação de Agricultores Familiares em Turismo Maria Claudia Rodrigues Camila Alvares Pasquetti RESUMO O presente estudo apresenta os resultados das experiências em gestão de Métodos Participativos na capacitação para o desenvolvimento de atividades turísticas em comunidades rurais. O uso de Métodos Participativos vem sendo aplicado pela Cooperativa de Formação e Desenvolvimento do Produto Turístico – COODESTUR através do Programa de Capacitação de Agricultores Familiares – Turismo e Agroecologia no Alto Uruguai, com famílias de agricultores de onze municípios de Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Este estudo visa aprofundar as discussões sobre metodologias de trabalho na formação do turismo rural com foco na ecologia e participação das comunidades. Neste trabalho analisaram-se os dados qualitativos e quantitativos resultantes de um roteiro de entrevista com participantes, instrutores e coordenadores do Programa. Palavras-chave: Turismo. Métodos participativos. Módulos de aprendizagem prática. A study of the application of participative methods in Tourism Capacitation Program for Family Farmers ABSTRACT This study presents the results of experiences with the management of participative methods in preparing rural communities for the development of tourism. The use of participative methods has been applied by COODESTUR – Cooperativa de Formação e Desenvolvimento do Produto Turístico – through the Tourism and Agroecology Program form Familiar Families in Alto Uruguai, with families of farmers from eleven towns in the states of Rio Grande do Sul and Santa Catarina, Brazil. This study aims at contributing to the discussion about the methods used in the formation of an ecological and participative rural tourism. In this work there were analyzed the quantitative and qualitative results of interviews with participants, instructors and coordenators of the Program in order to check the level of success of this specific method. Keywords: Tourism. Participative methods. Practical learning modules. Maria Claudia Rodrigues é turismóloga. Pós-graduada em Informadores Turísticos pela Universidad Rey Juan Carlo. Pós-graduada em Gestão Empresarial. Professora dos cursos de Gestão Tecnológica e Ensino a Distância (EAD). Universidade Luterana do Brasil (ULBRA). Cooperada da COODESTUR [email protected] Camila Alvares Pasquetti é turismóloga. Mestre em letras pela Universidade Federal de Santa Catarina. Cooperada da COODESTUR. Opinio Canoas Opinio,n.20 n.20, jan./jun. p.97-117 2008 jan./jun. 2008 97 1 INTRODUÇÃO Este estudo é parte integrante e complementar do artigo Experiências em gestão de métodos participativos como instrumento para o desenvolvimento de atividades turísticas responsáveis, publicado na revista Opinio n.18, no primeiro semestre de 2007. O primeiro estudo tratou sobre a aplicação de métodos participativos em cursos de capacitação em turismo e agroecologia nas comunidades de agricultores familiares, revisou a bibliografia a respeito e a se aprofundou sobre uma inovadora proposta de trabalho que incentivou os sujeitos locais a tornarem-se agentes do processo de desenvolvimento do turismo local. Já o presente artigo vem a complementar as informações iniciais através da análise dos níveis de satisfação e eficácia da aplicação deste método, itens a serem observados na elaboração de novos trabalhos. Como contextualização, cabe aqui uma descrição sucinta do Programa de Capacitação de Agricultores Familiares – Turismo e Agroecologia no Alto Uruguai, desenvolvido pela Cooperativa de Desenvolvimento do Produto Turístico – COODESTUR – através de sua aprovação em edital do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA). Para a estruturação deste Programa foram cumpridas as seguintes etapas: contato com representantes das comunidades e das cidades envolvidas, mapeamento e diagnóstico do turismo e da produção agroecológica da região, capacitação dos instrutores na aplicação de metodologias participativas e a construção e realização dos Módulos de Aprendizagem Prática. Os chamados Módulos de Aprendizagem Prática (apelidados de “MAP”) foram criados pela COODESTUR especialmente para este Programa com o objetivo de promover a agricultura ecológica familiar através do turismo. Os MAPs também têm por objetivo oportunizar os indivíduos a refletirem a respeito de si, seu trabalho como produtores rurais agroecológicos, suas potencialidades e necessidades e, sobretudo, oportunizar que estes sejam atuantes e possam ter opções de trabalhar direta ou indiretamente com o turismo. O turismo, neste Programa, é visto como complementar à agricultura, possibilitando às famílias a agregar valor à sua atividade original. A região do Alto Uruguai, situada às margens do Rio Uruguai entre os estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul tem população predominantemente rural, com diversas famílias de pequenos agricultores que buscam preservar o meio ambiente e os conhecimentos tradicionais sobre o cultivo de variadas espécies de plantas e alimentos. Algumas destas famílias de agricultores se interessaram em participar dos Módulos de Aprendizagem Prática em Turismo e Agroecologia e assim o fizeram, algumas vezes designando diferentes membros das famílias para participar de cada módulo. Também participaram dos MAPs algumas lideranças locais e membros de instituições como a Secretaria de Agricultora de Concórdia, técnicos da EPAGRI (Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina) e EMATER (Associação Riograndense de Empreendimentos de Assistência Técnica e Extensão Rural. Este artigo apresenta os resultados obtidos com a pesquisa aplicada aos participantes, instrutores e coordenadores do Programa em questão, medindo seus 98 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 níveis de satisfação com relação aos chamados métodos participativos aplicados através dos Módulos de Aprendizagem Prática. Debate, com base nesta pesquisa, a eficácia deste método para o empoderamento das comunidades e sua participação nos processos de desenvolvimento do turismo local. No primeiro capítulo é apresentada a metodologia adotada para esta pesquisa e em seguida são expostos e analisados os resultados das entrevistas e da observação participativa dos pesquisadores. 2 METODOLOGIA ADOTADA A metodologia empregada para alcançar o objetivo deste trabalho foi a observação participativa e entrevista estruturada com abordagem quantitativa e qualitativa. A amostra de participantes pesquisados contou com integrantes das famílias de agricultores inscritos nos três primeiros Módulos de Aprendizagem Prática – MAPs, instrutores e coordenadores do projeto, por sua vez, técnicos da COODESTUR. Das 50 famílias cadastradas pelo projeto, buscou-se selecionar aleatoriamente 15 famílias participantes dos três primeiros módulos entre os dois estados, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Dos técnicos, foram selecionados para esta entrevista os 5 instrutores, entre eles 2 coordenadores que atuaram nos três primeiros MAPs. Durante as etapas de desenvolvimento dos três primeiros MAPs, os pesquisadores acompanharam o método aplicado pela entidade proponente através da observação participativa como colaboradores no projeto. Citemos Teresa Maria F. Haguette para elucidar quais as características desse método: a observação participativa é amplamente utilizada por alguns sociólogos: a definição de Schwartz e Schwartz, a mais completa aceita não só a presença constante do observador no contexto observado como a interação face a face como pré-requisitos da observação participante (...). (1987, p.63) Ainda segundo Haguette, para estes autores a observação participativa tem quatro características: 1– tem como finalidade a coleta de dados; 2– o papel do observador pode ser revelado ou encoberto; formal ou informal, partir de dentro ou de fora da estrutura social; 3– devem ser feitas referências sobre tempo necessário da observação; 4- o observador tem papel ativo enquanto modificador do contexto podendo tanto influenciar como ser influenciado. A observação participativa pode influenciar o pesquisador ou o objeto pesquisado, podendo alterar os resultados. O contrário também pode ocorrer, pois ao estar sendo Opinio, n.20, jan./jun. 2008 99 formalmente entrevistado, o sujeito pode não agir com a mesma naturalidade que agiria junto ao grupo em uma situação de observação participativa. Consideramos positivo, neste estudo, o fato de termos vivenciado a rotina diária dos observados a ponto de, inclusive, nos hospedarmos em suas casas durante a seqüência dos encontros. De acordo com as características mencionadas, o estilo de observação participativa foi o informal, onde os proponentes e instrutores também participaram enquanto observadores. O período de observação foi longo: o acompanhamento do projeto ocorreu desde os primeiros trabalhos de escritura, capacitação dos instrutores até a realização dos Módulos de Aprendizagem Prática I ao III nas comunidades, de 2006 a 2007. Este tempo possibilitou uma aproximação afetiva dos participantes entre si e com os proponentes. O instrumento aplicado nesta pesquisa também contou com dois Roteiros de Entrevista. Um aplicado aos participantes, outro aos instrutores e coordenadores do projeto. A elaboração deste roteiro aconteceu de forma colaborativa entre os proponentes do Programa. O Roteiro de Entrevista com Participantes constituiu-se de: a. Dados sociodemográficos (nome do participante, local de residência, contato, ocupação, idade e escolaridade); b. Questionário com perguntas fechadas e abertas (incluem-se duas questões com alternativas sim ou não e três com respostas abertas); c. Escala de Satisfação (a escala de satisfação conta com 16 afirmativas, com alternativas “muito satisfeito”, “satisfeito”, “pouco satisfeito” e “insatisfeito”). O Roteiro de Entrevista a Instrutores e Coordenadores consta de: a. Dados sociodemográficos (sexo, idade e escolaridade); b. Questionário com perguntas fechadas e abertas (fazem parte três questões estruturadas, com alternativas e seis questões estruturadas abertas). A coleta de dados do Roteiro de Entrevista foi realizada através de entrevistas por telefone, e-mail e pessoalmente, no mês de dezembro de 2007. A observação participativa foi realizada durante a investigação dos pesquisadores em oficinas, cursos de capacitação dos beneficiários e instrutores e em conversas informais com as famílias de agricultores, instrutores e coordenadores. A análise de relatórios, atas e diário de classe foi feita mediante agendamento com a coordenação do Programa. 3 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS Os resultados apresentados nesta pesquisa referentes à avaliação das variáveis investigadas no método aplicado pelo Programa são provenientes do grau de satisfação 100 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 percebido, da análise das respostas às questões abertas e fechadas (coletadas conforme os Roteiros de Entrevista) e da observação participativa do pesquisador. Estes resultados são frutos da coleta, tabulação e análise de dados, tendo como fatores e variáveis contidos nos Roteiros de Entrevista que será abordado a seguir através de tabelas, descrição das respostas dos entrevistados e considerações oriundas da observação participativa. 3.1 Dados sociodemográficos A amostra de participantes dos agricultores familiares, contou com a participação de 15 respondentes, 9 do estado de Santa Catarina e 6 do Rio Grande do Sul. Os respondentes participaram dos três primeiros Módulos de Aprendizagem Prática: Turismo e Agroecologia; Acolhida na Agricultura Familiar; Monitor Local e Formação de Roteiros. Com relação ao gênero da amostra de entrevistados, 40% destes representam o público feminino e 60% o publico masculino. Segundo a observação participativa, notamos que muitos têm origem na imigração italiana e alemã, em especial em Santa Catarina, enquanto outras famílias apresentam na sua origem a mistura racial, e muitas vezes são chamados “brasileiros” pelos agricultores alemães. Com relação ao grau de escolaridade temos: TABELA 1 – Escolaridade dos respondentes. Fonte: Dados da pesquisa, 2007. Pode-se constatar, na Tabela 1, que 68% dos respondentes têm o segundo grau completo ou incompleto, e 20% possuem o primeiro grau incompleto, sendo que apenas 7% (uma pessoa da amostra) têm curso superior completo. É possível que este dado se deva a dificuldade no acesso às universidades, que ficam longe do local de residência, sendo que as escolas locais formam, em geral, até o ensino médio. Um dos respondentes, com curso superior incompleto precisou mudar-se de sua cidade para uma que possuía universidade. Isto para um agricultor pode representar menos mão-de-obra para família e pode contribuir para a diminuição do orçamento familiar e aumento dos gastos Opinio, n.20, jan./jun. 2008 101 (transporte, alimentação, estadia, entre outros). Se considerarmos “jovens”, a escala de idade dos 18 a 23 anos e dos 23 aos 28 anos podemos concluir que o Programa atingiu 40% do público prioritário previsto pelo projeto, como visto na tabela a seguir: TABELA 2 – Idade dos respondentes. Fonte: Dados da pesquisa, 2007 3.1.1 Questões abertas Quanto aos resultados das questões abertas, estas foram divididas com relação às perguntas: Q1-Você já participou de capacitações anteriores ao Programa de Capacitação de Agricultores – Turismo e Agroecologia no Alto Uruguai? De que tipo? Dos respondentes, 80% participaram de capacitações anteriores ao Programa. Entre os cursos dos quais participaram, forma citados: cursos na área da saúde, alimentação, gestão, agricultura, entre outros. As entidades referenciadas foram: EPAGRI, EMATER, CAPA, SENAI, SEBRAE, REDETRAF. A maioria destas entidades possui programas e técnicos de extensão rural, ou possui uma sede próxima como apoio ao agricultor. Pode-se ressaltar aqui que a COODESTUR tem sua sede em Porto Alegre, ao contrário das outras entidades, se situando longe da região. Q 2-O que você entende por Método Participativo? Quando questionados sobre o método aplicado pelos técnicos da COODESTUR, a maioria dos respondentes tem a compreensão do seu significado como o ato de participar de algo em grupo. Dos 15 entrevistados, em 12 respostas utilizou-se a palavra participar e seus derivados. Podemos ver detalhes no Quadro a seguir: 102 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 QUADRO 1– O que você entende por Método Participativo? Fonte: Dados da pesquisa, 2007. Como associações a expressão “métodos participativos” surgiram ações como: trabalhar em grupo, opinar, se envolver, aprender, integrar-se, debater. Q5 – Você colocou em prática, na sua propriedade os conteúdos aprendidos durante a capacitação? Dos respondentes, 80% afirmaram que sim, colocaram em prática os conteúdos aprendidos durante o Programa. Os participantes afirmam ter organizado espaços das propriedades como: jardins, espaços de memória e de lazer da família, separação de lixo, construção de composteira, caminhos e trilhas, demonstrando o uso responsável da unidade agrícola e melhorias na sinalização. Dos conteúdos citados pelos respondentes da amostra, os mais aproveitados foram: MAP I – Turismo e Agroecologia: · Cooperação e Associativismo · A relação com meio ambiente · Importância da produção agroecológica Map II – Acolhida na Agricultura Familiar · Ambientação da propriedade Opinio, n.20, jan./jun. 2008 103 · Necessidades de infra-estrutura · Acessibilidade MAP III – Monitor Local e Formação de Roteiros · Acolhida de grupos · Impacto ambiental 3.1.2 Questões estruturadas em escala As questões foram estruturadas em escala de satisfação: muito satisfeito, satisfeito, pouco satisfeito e insatisfeito com as atividades dos MAPs. TABELA 3 – Afirmativas de 3.1 a 3.7 do Bloco 3 – O que pensa em relação aos métodos utilizados pelos instrutores durante os MAPs. Fonte: Dados da pesquisa, 2007. A Tabela 3 corresponde aos dados referentes à pesquisa de satisfação do Bloco 3 – “O que pensa em relação aos métodos utilizados pelos instrutores durante os MAPs” e distribuíram-se em sete tópicos. Em relação às dinâmicas de grupo realizadas durante as capacitações, 100% dos respondentes estão muito satisfeitos e satisfeitos. Este dado comprova que o método resultou satisfatório em relação às dinâmicas de grupo. O item 3.2 “Atividade Prática Feita na Propriedade” recebeu 87 % de muito satisfeito e satisfeito. No entanto, 13% dos respondentes consideraram-se pouco satisfeitos com a proposta. Este dado deve-se ao fato de dois respondentes terem interesse em aprofundar as questões mais técnicas relacionadas a agroecologia durante a prática na propriedade. Para um deles é necessário “trabalhar a parte da Agroecologia, avançando mais, em cima de experiências que já existem na propriedade”. Nesta mesma 104 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 linha, o outro entrevistado acredita que os conteúdos técnicos sobre o tema Agroecologia, no Módulo I – Turismo e Agroecologia, deveriam ter sido aprofundados. A falta de esclarecimento dos objetivos e conteúdos dos Módulos pode ter sido o motivo desta insatisfação. Este fato poderia ter criado expectativas em relação ao nome do Módulo, Turismo e Agroecologia. No entanto, o conteúdo do Módulo está direcionado para o Turismo e menciona a Agroecologia como diferencial agregador de valor para o desenvolvimento de atividades Turísticas Responsáveis. Por outro lado, nossa observação participativa aponta resultados como o uso destes conhecimentos repassados às escolas, igrejas e vizinhos dos participantes do MAP I. O item 3.3 “Conteúdo trabalhado em grupo” obteve 66% de satisfação dos entrevistados e 27 % de “muito satisfeitos”. Os entrevistados aprovaram a forma de trabalho e não tiveram grandes dificuldades de se relacionar com os colegas do grupo. Em relação ao item 3.4 “Apresentação oral dos trabalhos em grupo”, 7% dos respondentes disseram que estão pouco satisfeitos com a sua própria atuação por não estarem acostumados a falar em público, e que demoraram a se adaptar a essa técnica: “não eram todos que participavam, uns falavam menos, outros mais”. Já 66% consideraram-se satisfeitos e 27 % muito satisfeitos em relação a este item. Esse indicador está relacionado com a aplicação do método, que é diferente da formação tradicional. No Método Participativo estimula-se o diálogo e possibilita-se o espaço para o agricultor dar a sua opinião e falar ao grupo. Em métodos tradicionais os participantes apenas escutam e fazem questões, na maioria das vezes, ao final do discurso do instrutor. O que demonstra o estranhamento, pelos respondentes quanto ao método aplicado durante as capacitações Módulo de Aprendizagem Prática. Dos entrevistados, 100% consideram-se muito satisfeitos e satisfeitos com o item 3.5, “Atividade de integração”. Estas atividades ocorreram entre as aulas, momento em que o grupo organizava-se para a alimentação, comentava sobre o que foi aprendido, fazia trocas e interagia. Cada participante levava um alimento de sua propriedade para compor a mesa. A mesa era composta, de forma coletiva, pelos alimentos de cada propriedade, o que reforçou a valorização dos produtos, estimulou a troca de alimentos, a cooperação, a solidariedade e o trabalho coletivo. Os locais destinados às capacitações foram prioritariamente os espaços comunitários e das propriedades, cedidos pelos participantes do Programa. No entanto teve-se o cuidado, pela equipe do projeto, em delimitar o ambiente das atividades de capacitação, levando-se em consideração a iluminação, as condições climáticas e a infra-estrutura. No momento das atividades de integração, as famílias se distribuíam na organização do local, dividindo funções, as quais seguiam normalmente o caráter de gênero. Os homens mostravam a propriedade enquanto as mulheres preparavam o alimento no espaço da cozinha. Algumas vezes, os instrutores interviam, estimulando a troca de papéis. Como por exemplo: os homens foram designados a organizar a mesa ou lavar a louça. Mas prevaleceu a rotina a qual culturalmente estavam Opinio, n.20, jan./jun. 2008 105 acostumados: mulheres na cozinha e homens do lado de fora da casa. Observou-se que os donos da casa sentiam-se satisfeitos e valorizados ao receberem o grupo em sua propriedade. A prática de realizar o curso em diferentes propriedades oportunizou aos agricultores apreciar o seu local de moradia e de seus vizinhos, mostrar a cultura local e os produtos da terra. Esta foi uma forma de exercitar a prática da acolhida a visitantes junto às famílias. A maioria dos entrevistados disse estar satisfeita com a prática da “Atividade de integração”. Segundo eles, este era um momento de falar sobre o que se tinha aprendido, trocar idéias, integrar-se com os demais. Para um dos participantes este momento representou “a hora de conversar sobre o que deu em aula, troca do que se entendeu da matéria”. Com relação ao item 3.6, “Avaliação Oral em Grupo”, 100% dos respondentes estão muito satisfeitos e satisfeitos em relação ao método. A avaliação foi feita no final de cada Módulo e objetivou avaliar os conteúdos, atividades práticas entre participantes e instrutores, e construir propostas e encaminhamentos para os próximos encontros. A disposição dos participantes e instrutores em círculo permitiu que estes pudessem ver a todo o grupo e se sentir estimulados a falar e contribuir. No item 3.7, “Visitas Técnicas”, 83 % dos respondentes estão muito satisfeitos e satisfeitos com a atividade. As visitas técnicas, tinham o objetivo de levar os agricultores a propriedades que já recebem visitantes e entrar em contato com diferentes experiências relacionadas ao Turismo e Agroecologia. Um dos respondentes ficou insatisfeito, pois não pôde participar das visitas, que coincidiram com datas de estudo ou trabalho. Este fato demonstra a importância do trabalho de campo na formação do grupo para os participantes. A Tabela 4 traz os dados referentes à satisfação dos respondentes em relação aos materiais didáticos utilizados durante os MAPs. TABELA 4 – Afirmativas de 4.1 a 4.5 do Bloco 4 – O que você pensa em relação a materiais didáticos utilizados nos MAPs. Fonte: Dados da pesquisa, 2007 106 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 Os agricultores, na sua maioria, ficaram satisfeitos ou muito satisfeitos com os materiais didáticos utilizados. Vejamos a seguir as opiniões sobre cada material: – Cartilha Dos respondentes, 100% ficaram muito satisfeitos ou satisfeitos com o conteúdo e linguagem da cartilha. Para os respondentes, a cartilha utilizada tem uma linguagem de fácil compreensão e entendimento por toda a família. De fato, a equipe da COODESTUR, preocupou-se em construir um conteúdo com linguagem direcionada ao público alvo do programa. A aproximação da coordenação com o público em trabalhos anteriores facilitou no diagnóstico e no planejamento da proposta da cartilha, que contou com desenhos feitos à mão, fotos das atividades realizadas e espaços para serem ocupados pelos participantes conforme as reflexões surgidas nos Módulos. – Materiais de apoio e textos de apoio Nestes dois itens 73 % dos respondentes afirmaram estar muito satisfeitos. No entanto, 27% ficaram pouco satisfeitos, pois acreditam que poderia ter mais quantidade de materiais. Segundo os instrutores, no entanto, estes materiais de apoio (revistas, livros, panfletos) constaram em todos os módulos avaliados, acompanhando os temas desenvolvidos durante a capacitação. A falta do hábito de leitura dos entrevistados pode ter resultado neste indicador. – Métodos de visualização 87% dos respondentes estão satisfeitos e muito satisfeitos com a exposição dos painéis, objetos, artesanatos e produtos das propriedades. Em contrapartida 13% estão pouco satisfeitos em relação aos colegas do grupo e consigo mesmo. Estes respondentes acreditam que deveriam ter se esforçado mais e mostrado seus produtos. “Deveríamos ter exposto mais produtos, em bancas separadas, mesmo sem selo”, afirmou um participante. Outro respondente acredita que: “todos deveriam expor os objetos, foi falta de tempo, de educação, falta dos participantes se organizarem para isso. Os painéis utilizados como métodos de visualização foram importantes ferramentas para que a participação ocorresse também na construção da teoria. Os participantes colocavam seus conceitos a respeito de agroecologia e turismo, por exemplo, através de fichas com suas próprias letras nos painéis, e a partir deles eram levados pelos instrutores a ensinar aos outros o que sabiam, gerando o debate e o aprendizado. Assim a visão sobre os objetos discutidos partia dos participantes, e não dos instrutores, como em métodos tradicionais de ensino. Durante os módulos também foi destinado um espaço para a exposição de Opinio, n.20, jan./jun. 2008 107 produtos das propriedades. Este momento estava previsto nos planos de aula. Como por exemplo, no Módulo de Aprendizagem Prática II – Acolhida na Agricultura Familiar, que contou com atividade prática, na qual cada participante ajudou a compor uma cesta com produtos das propriedades. Nesta atividade, buscou-se a abertura para qualquer tipo de produto, in natura ou processado, que representasse a propriedade, objetivando-se conhecer para valorizar os produtos das famílias e a agricultura agroecológica. Na Tabela 5 estão os dados referentes a satisfação dos respondentes em relação a atuação dos instrutores TABELA 5 – Afirmativas de 6.1 a 6.3 do Bloco 6 – Como você avalia a atuação dos instrutores. Fonte: Dados da pesquisa, 2007. Todos os respondentes ficaram satisfeitos ou muito satisfeitos com a atuação dos instrutores (Tabela 5). Isso indica que os instrutores estavam preparados para a aplicação do método. Utilizaram uma linguagem simples, proporcionaram um bom relacionamento com o grupo e planejaram satisfatoriamente suas aulas. No entanto, o item “Planejamento e Organização das Aulas”, não foi o aspecto mais forte do Programa, apesar dos beneficiários não terem acreditado que foi pouco satisfeito. Alguns participantes mencionaram a dificuldade em cumprir determinadas tarefas cujo prazo era muito curto. 3.3 Roteiro de entrevista aos instrutores e coordenadores 3.3.1 Dados sociodemográficos da amostra Para fins deste estudo foram selecionados os instrutores e coordenadores que participaram dos três primeiros Módulos de Aprendizagem Prática. O sexo feminino corresponde 75 % da amostra, prevalecendo o gênero feminino na entidade proponente que executou o programa. 108 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 Quanto ao grau de escolaridade (Tabela 6), todos os entrevistados possuem curso superior de Bacharelado em Turismo e 100% dos respondentes possuem cursos em metodologias participativas. Todos os respondentes foram capacitados pelo projeto em cursos de métodos participativos através de oficinas. TABELA 6 – Grau de escolaridade. Fonte: Dados da pesquisa, 2007. Além dos cursos realizados pelo projeto, 100% dos entrevistados participaram de outros cursos sendo um deles o de “Técnicas para Aprendizagem e Ação Participativa – DRP”, promovido pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário, através do Departamento de Assistência Técnica e Extensão Rural da Secretária de Agricultura Familiar. Um dos entrevistados possui mestrado em Gestão Pública de Destinos Turísticos, e outro em Letras. Os outros dois possuem especialização em Gestão Pública e em Planejamento de Marketing. Afirmaram possuir outros cursos relacionados ao projeto: Introdução à Permacultura com o SEED International; Vivência em Ecovilas na Findhorn Foundation; Curso de Formação de Multiplicadores de Empreendimentos Solidários. TABELA 7 – Etapas de participação no programa. Fonte: Dados da pesquisa, 2007. Cem por cento dos instrutores e coordenadores participaram das Etapas de Participação no Programa (Tabela 7). Mas apenas 50% envolveram-se com a elaboração do projeto e das oficinas. É relevante salientar que as propostas elaboradas seguiram os princípios da organização: conservar o meio ambiente, incentivar a cooperação e auxiliar no crescimento econômico local. Opinio, n.20, jan./jun. 2008 109 A construção do projeto foi realizada por uma equipe que já vinha desenvolvendo ações junto a comunidades do Alto Uruguai. Os demais instrutores iniciaram sua participação nas etapas seguintes onde realizaram cursos de Capacitação em Métodos Participativos, reuniões com a coordenação e demais instrutores para que se familiarizassem aos objetivos da proposta de trabalho e perfil do público. Foi relevante a participação dos técnicos em encontros anteriores às capacitações com os agricultores, a fim de construir materiais didáticos, planos de aula e técnicas a serem aplicadas. 3.3.2 Resultado das questões abertas Q1 – Qual o significado de Método Participativo? Os respondentes afirmaram estar familiarizados com o Método Participativo. Estavam seguros quanto à proposta de capacitação, acreditando que as técnicas de dinâmicas aplicadas ao processo estimulam um espaço para a construção e troca coletiva do conhecimento. Neste espaço oportunizaram-se as relações sociais entre os membros do grupo, fortalecendo os elementos culturais da comunidade. Segundo um dos instrutores, Método Participativo significa “propor um espaço onde os alunos participantes tragam ao grupo elementos de sua cultura e do seu cotidiano, onde possam refletir sobre si e melhor se posicionar perante os demais, seja nas relações sociais, nas suas atividades ou empreendimentos” 1 . Para a especialista em Gestão Pública, este é “um meio para construção do conhecimento a partir dos saberes e fazeres locais, estimulador da auto-estima e do empoderamento das comunidades”2 . A coordenadora do projeto enfatizou a importância, por parte do instrutor, de se criar um ambiente de confiança para que os indivíduos pudessem se expressar. Para ela é preciso: “buscar maneiras para que os temas e conteúdos sejam absorvidos por todo o grupo, mesmo que em diferentes níveis. Para isto é preciso criar um ambiente de confiança onde cada um possa expressar sua própria experiência/vivência, facilitando assim a compreensão e o questionamento dos elementos apresentados”3. Q2 – Que técnicas utilizou durante as etapas de que participou no programa? Os respondentes utilizaram técnicas similares durante as etapas de processo do 1 Fabiano Pavoni Nogueira – coordenador do projeto Turismo e Agroecologia no Alto Uruguai e vice-presidente da COODESTUR. Turismólogo, formado pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul e especialista em Planejamento Territorial e Marketing. 2 Eneida Brasil – instrutora do Programa de Capacitação de Agricultores – Turismo e Agroecologia no Alto Uruguai. Turismóloga, formada pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, especialista em Gestão Pública. Técnica da COODESTUR. 3 Luciane Lima Dresher – coordenadora do projeto Turismo e Agroecologia no Alto Uruguai.Turismóloga, formada pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Mestre em Gestão Pública de Destinos Turísticos na Espanha. 110 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 Programa, visto que receberam cursos de capacitação direcionados a metodologia e planejaram as atividades didáticas em equipe. Entre as técnicas planejadas foram utilizadas, com mais ênfase, as seguintes: – Comunicação visual A comunicação visual foi realizada através de fichas, painéis, cartazes, imagens, fotografias, vídeos, exposição de produtos da propriedade, jornais, textos, revistas, folders, entre outros. As fichas, painéis e cartazes tomavam forma à medida que os temas eram desenvolvidos e o conteúdo trabalhado coletivamente com o grupo de participantes. No final de cada etapa, os agricultores podiam visualizar o todo construído por eles e refletir sobre cada etapa transcorrida. – Trabalho em grupo Priorizou-se o trabalho em pequenos grupos, possibilitando uma maior integração entre os participantes. Os grupos foram definidos pelos instrutores e compostos por indivíduos de diferentes famílias. Com este método a integração entre pessoas foi facilitada, pois proporcionou-se aos participantes desempenhar papéis diferentes daqueles aos quais estavam acostumados ou condicionados na família. Durante o trabalho com os grupos, exercitou-se a gestão através de tarefas específicas. Os instrutores estimularam a prática da cooperação, da auto-gestão, da criatividade no trabalho em grupo. Através de questões específicas exercitou-se o diálogo e o debate sobre o conteúdo proposto. Para moderar o diálogo eram utilizadas técnicas como, por exemplo, a das sementes. Nesta técnica cada participante recebe o mesmo número de sementes e toda vez que emitir opinião deixa a semente posta sob a mesa (ou põe num chapéu de palha que circula entre os participantes), assim que terminar o número de sementes também o tempo de fala encerra-se para este participante. Esta técnica estimula o saber ouvir o outro, planejar e ponderar o que se vai ser dito. Assim, se criou um espaço democrático para que todos tivessem a mesma oportunidade de fala. – Leitura de cartilha, jornais, livros e revistas A cartilha foi utilizada como guia base para os conteúdos desenvolvidos na capacitação. Os princípios objetivos do uso das cartilhas foram: o resgate da história local, modos de vida do agricultor ecológico e dicas para trabalhar com turismo receptivo de maneira responsável. Os agricultores podiam levá-la para casa e compartilhar seus assuntos com seus familiares. A cartilha foi construída com o cuidado de que todos da família de agricultores pudessem ter acesso aos conteúdos, e completarem-nas conforme os Opinio, n.20, jan./jun. 2008 111 debates. É difícil precisar o número de pessoas que leram a cartilha, pois segundo comentários feitos durante as capacitações, os alunos as mostraram para vizinhos, professores e amigos. Este é um dado importante, pois o alcance deste material foi além dos participantes das capacitações. Com as leituras de artigos, textos, relatos de experiências e reportagens buscavase ampliar o foco de estudo e reforçar o conteúdo da cartilha. Os livros, revistas e jornais foram selecionados com antecedência e emprestados aos interessados. Alguns dos temas destes materiais foram: a história dos agrotóxicos, a agricultura ecológica como alternativa de produção, lazer, turismo rural, propagandas de espaços turísticos já consolidados, entre outros. – Atividades práticas Durante todo o processo de capacitação, o plano de aula contou com técnicas, dinâmicas, jogos e vitalizadores que reforçaram a atividade teórica, assim como os exercícios práticos que eram feitos nas propriedades dos participantes. Q3 – De que forma planejou os conteúdos para os módulos? Os planos de aula foram construídos a partir de uma capacitação direcionada aos instrutores, com duração de 24 horas, feitos com o auxilio um profissional externo. O processo de montagem dos planos e escolha das técnicas a serem utilizadas foi desenvolvido na época da capacitação dos instrutores. Foi um processo feito em pequenos grupos em uma imersão da equipe de instrutores e coordenadores, que durou cerca de 60 dias. No entanto, o plano foi revisado e adaptado conforme o público pelos instrutores, pois as comunidades continham características distintas nos dois estados Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Segundo um dos coordenadores, “junto aos colegas, elaborávamos o plano de aula, que era revisado sempre no dia anterior. Levamos em consideração o número e perfil dos participantes, combinando com os objetivos propostos no Programa e as necessidades identificadas por nós, enquanto consultores.4 A coordenação do projeto foi importante por apoiar os instrutores, estando sempre presente junto às atividades de capacitação e à comunidade local. Isto facilitou na hora de identificar o perfil e adequar o plano de aula as necessidades dos participantes. Q4 – Cite elementos fundamentais para o bom desempenho do trabalho em grupo. Entre os elementos fundamentais para o bom desempenho do trabalho em grupo, os respondentes listaram: 4 Luciane Lima Dresher – coordenadora do Projeto Turismo e Agroecologia no Alto Uruguai. 112 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 · esclarecer os objetivos do projeto e módulos; · atenção na escuta, compreensão e fala objetiva e clara · habilidade para trabalho com grupos e em parceria com outro instrutor; · habilidade de identificar as características comuns do grupo; · conhecimento e habilidade para aplicar dinâmicas, técnicas, jogos de envolvimento com o conteúdo; · conhecimento em técnicas visuais e habilidade para auxiliar na construção visual coletiva dos conteúdos; · retomada os conteúdos e os objetivos do trabalho; · conhecimento sobre acordos ou contratos de convivência; · busca constante de consensos; · avaliação dos conteúdos de forma aberta (face a face); · planejamento prévio; · estímulo para a comunicação de todos no grupo; Outros: · apoio das secretarias, órgãos e instituições interessadas; · apoio dos agricultores que acreditaram na proposta; · contrapartida das prefeituras e participantes do programa em relação a transporte, alimentação e espaço de desenvolvimento dos módulos. Q5 – De que forma foi feita a avaliação de aprendizagem dos participantes dos MAPs? A avaliação da aprendizagem dos participantes foi um processo contínuo, que se realizou durante o desenvolvimento das aulas. “Aproximadamente 70% dos exercícios apresentavam problemas e tarefas a serem elaboradas pelo grupo, o que possibilitou a visualização imediata do grau de aprendizagem dos alunos.”5 Ao final de cada aula os participantes eram questionados sobre o grau de satisfação em relação ao dia de trabalho. As ferramentas utilizadas para avaliação foram o Painel de Satisfação6e através de plenária foram expostos os pontos fortes e fracos e sugestões para os próximos dias. 5 Luciane Lima Dresher-Coordenadora do projeto Turismo e Agroecologia no Alto Uruguai. O Painel de Satisfação é uma pesquisa feita diariamente com os participantes dos módulos. Serve para ver como está o andamento dos trabalhos e levantar os objetivos ou as expectativas para os próximos dias. 6 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 113 Q6 – Qual o diferencial dos MAPs em relação a experiências anteriores com outras capacitações? Ao serem questionados a respeito do diferencial entre os Módulos de Aprendizagem Prática e experiências em capacitações anteriores um dos respondentes afirmou que o diferencial está na integração do aluno durante o processo de aprendizagem: “o aluno é o protagonista do conhecimento no entendimento do conteúdo e da realidade. Diferentemente do método expositivo onde o aluno é receptor passivo do conhecimento transmitido”.7 Para uma das instrutoras, o uso da metodologia faz parte de sua experiência profissional. Afirma: “sempre utilizei metodologias participativas construídas a partir de experiências com educação popular. Os MAPs agruparam metodologias e instrumentos já utilizados desde a década de 70 pelo movimento popular, sistematilizálo enquanto experiência deve considerar experiências anteriores. O diferencial se aplica exatamente em resgatar os saberes e fazeres locais e a partir disto construir e reconstruir conceitos”8 4 CONCLUSÃO Chegamos à conclusão, mas não ao final do trabalho, por acreditarmos que o tema de estudo não se esgota com este artigo e merece a atenção e o olhar de outros pesquisadores. A continuidade de pesquisas sobre Métodos Participativos torna-se necessária para que estes métodos sejam cada vez mais utilizados em cursos de capacitação, substituindo os métodos expositivos onde os alunos/participantes recebem, ao invés de compartilhar os conhecimentos. Lembramos também que a política de Assistência Técnica e Extensão Rural (ATER), do Ministério de Desenvolvimento Agrário (MDA), em 2003 já apontava para esta necessidade, recomendando a adoção de “uma abordagem multidisciplinar e interdisciplinar, estimulando a adoção de novos enfoques metodológicos participativos e de um paradigma tecnológico baseado nos princípios da Agroecologia” (Política Nacional de assistência Técnica e Extensão Rural, 2003, p.07). De modo geral os resultados do estudo em questão nos fazem refletir sobre a importância da pesquisa (tanto a observação participativa quanto os roteiros de entrevista) na busca de se conhecer sobre a satisfação dos participantes quanto a este método de ensino que foca o sujeito enquanto transformador do processo. Constatou-se que o resultado positivo em relação à aplicação da metodologia deve-se a fatores que estão intrinsecamente relacionados: o diagnóstico dos interesses locais com relação ao turismo e a agroecologia, a construção participativa do Programa, 7 Fabiano Pavoni Nogueira -Coordenador do projeto Turismo e Agroecologia no Alto Uruguai. Eneida Brasil – Instrutora do Programa de Capacitação de Agricultores – Turismo e Agroecologia no Alto Uruguai. 8 114 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 os objetivos e propostas de trabalho que foram construídos também de forma coletiva. O fato de a entidade proponente possuir trabalhos anteriores na região contribuiu para o conhecimento da realidade local, o desenho dos objetivos e a formação das propostas do Programa. Outro aspecto importante a salientar foi o cuidado que a coordenação do Programa teve em fazer uma capacitação sobre métodos participativos com os instrutores. A imersão para construção coletiva das cartilhas, textos e planos de aula foi importante para a familiarização dos instrutores entre si e com os objetivos do Programa, conteúdos das capacitações e público participante. O acompanhamento dos coordenadores durante as capacitações dos agricultores e a revisão diária dos planos de aula trouxe liberdade para que os instrutores adaptassem o conteúdo dos Módulos e as dinâmicas utilizadas ao perfil do grupo capacitado. A parceria entre instrutores na aplicação dos módulos pode ser favorável, pois assim se trabalham visões diferentes de um mesmo tema. No entanto, a parceria também pode trazer aspectos negativos caso os dois não souberem dividir tempo e espaço, ou competirem entre si. E o participante pode ficar confuso quanto a quem é realmente o instrutor. Foi positiva também a co-autoria dos instrutores, pois estes contribuíram para a que a realização do Programa fosse focada na realidade e nas necessidades do local. Com suas diferentes visões, ajudaram a identificar e atender as demandas da comunidade. A distância entre a sede da cooperativa (e moradia dos instrutores) e o local onde o Programa foi desenvolvido é um fator que pode ter acarretado em desvantagens na aplicação deste método, pois foi levantada entre os participantes a necessidade de algum representante do Programa estar mais próximo à comunidade para esclarecer dúvidas e acompanhar de perto o processo. É importante observar que cada Módulo teve duração de uma a duas semanas, o que demandou a agenda flexível dos instrutores e coordenadores. As datas dos Módulos foram algumas vezes alteradas por questões de articulação com as comunidades em função dos seus compromissos de trabalho e religiosos. A comunicação entre os integrantes do Programa e os participantes se deu via telefone, recados repassados oralmente nos encontros comunitários e bilhetes repassados pelas prefeituras às famílias. Alguns participantes, porém, relataram a falta de contato por parte dos instrutores e coordenadores, o que demonstra a necessidade de maior comunicação entre as partes. As lideranças locais foram fundamentais neste longo processo de instrumentalização para a continuidade das ações, especialmente no chamado MAP IV, o “Módulo de Aprendizagem Prática 4: Formação de Rede de Cooperação”. Nossa pesquisa não abrangeu os níveis de satisfação com relação a este Módulo, porém, em nossa observação participativa apontamos que os Métodos Participativos utilizados nos MAPS, se não realizaram algumas das propostas do Programa como a diminuição do êxodo rural (após o término do programa, os jovens de algumas Opinio, n.20, jan./jun. 2008 115 famílias, por falta de recursos, ao invés de investir em atividades de turismo, saíram para trabalhar em indústria de alimentos), levaram alguns participantes a tomar posicionamento e se inserir nas ações de turismo com maior autonomia e autogestão. Este é o exemplo de uma família no município de Severiano de Almeida, que constituiu um restaurante típico e de uma família de Concórdia que se identificou com o trabalho no turismo através dos Módulos e investiu em cicloturismo em outro município. As associações de agricultores, prefeituras e entidades ligadas ao meio rural e à educação foram fundamentais no processo de aprendizagem e capacitação, pois fizeram o elo entre as famílias e o Programa. Estes devem estar presentes quando da aplicação de métodos participativos e comunidades rurais, pois funcionam como conselheiros e apoiadores destas iniciativas, além de promover o contato entre famílias que possuem objetivos em comum. Para próximas experiências, a presença das universidades ligadas à região pode ser fundamental para a continuidade de ações de aproximação entre o conhecimento acadêmico e as práticas rurais. O diferencial dos métodos participativos em relação aos aqui chamados tradicionais está na total liberdade de se criar e adaptar as atividades, em se ocupar e valorizar os espaços existentes (centros comunitários, esportivos, casas particulares, ao ar livre, passeios na horta, propriedades), no material especificamente criado para as comunidades, e no deslocamento do foco dos instrutores para os atores sociais. A observação participativa realizada para esta pesquisa proporcionou aos pesquisadores e aos participantes a vivência e imersão no cotidiano das famílias. O lado positivo desta metodologia se deve à experimentação, exercício e práticas que extrapolam o espaço de convivência formal. O caráter subjetivo é aqui entendido como positivo por não estarmos tratando de um fato exato, mas de um processo de amadurecimento através da convivência. É importante salientar, no entanto, que a observação participativa expressa o olhar dos pesquisadores sobre as impressões dos participantes, e não o contrário. Este artigo, em suma, pretendeu contribuir para a reflexão e para futuras construções de metodologias para programas como este em meios rurais (e porque não, urbanos) de modo a salientar a importância da participação entre os atores nos processos de fortalecimento econômico e social das comunidades. AGRADECIMENTOS Agradecemos a acolhida das famílias de agricultores da região do Alto Uruguai e seu envolvimento com este trabalho 116 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 REFERÊNCIAS BROSE, Markus. Metodologia Participativa: uma introdução a 29 instrumentos/Markus Brose (org.). Porto Alegre: Tomo Editorial, 2001. CENTRO DE APOIO AO AGRICULTOR – CAPA. A Prática Agroecológica no CAPA. Porto alegre: CAPA, 2005. HAGUETTE, T. M. F. Metodologias qualitativas na sociologia. Petrópolis, Vozes, 1987. MACHADO, Álvaro. Ecoturismo, um produto viável: a experiência do Rio Grande do Sul. Rio de janeiro: ed. Senac nacional, 2005. MANUAL DE MELHORES PRÁTICAS PARA O ECOTURISMO – Programa MPE, 2004. MORIN, Edgar; Anne Briggitte. Terra-Pátria. Porto Alegre: Sulina, 2000. POLÍTICA NACIONAL DA ATER. Ministério do Desenvolvimento Agrário. Oficina Nacional para Elaboração da Política Pública Nacional de ATER. Brasília, 24 e 25/09/ 2003. RELATÓRIO PROJETO TURISMO E AGROECOLOGIA NO ALTO URUGUAI. COODESTUR – Cooperativa de Formação e Desenvolvimento do Produto Turístico. Porto Alegre, 2006. RUSCHMANN, Doris Van de Meene. Turismo e Planejamento Sustentável: a proteção do meio ambiente. Campinas, São Paulo. Papirus, 1997. VERDEJO, Miguel Expósito. Diagnóstico Rural Participativo: Guia Prático DRP. Brasília: MDA/Secretária da Agricultura Familiar, 2006. Sites consultados http:// www.coodestur.com.br http://www.capa.org.br http://contactoresponsable.com Opinio, n.20, jan./jun. 2008 117 Os drivers do comércio eletrônico na hotelaria brasileira Luciana Maines da Silva Paula Maines da Silva RESUMO A utilização da Internet como ferramenta de divulgação e mesmo de concretização de negócios é realidade para empresas em todos os segmentos. Uma pesquisa realizada nos Estados Unidos e Europa buscou identificar os diferentes drivers que determinam as vantagens competitivas na utilização de novas Tecnologias da Informação (TI). Os drivers não são comuns a todo o tipo de negócio, alguns servindo para um determinado setor e não para outros, quais sejam: distribuição digital; intensidade informacional; personalização; agregabilidade; localização; atualidade; tangibilidade; efeitos da rede; estandarização; dependência. O setor hoteleiro utiliza a Internet para oferecer aos seus clientes atuais, ou futuros, informações sobre seus empreendimentos (produtos e serviços), assim como preços, condições de pagamento e mesmo oferecer opções de reservas on-line. A presente pesquisa analisa os sites das dez maiores redes em operação no país levando em consideração o número de apartamentos, buscando identificar em quais drivers essas redes se encaixam. Será apresentado ainda referencial teórico onde conceitos fundamentais de turismo, hotelaria, e-business e e-commerce serão abordados. Palavras-chave: Turismo. Hotelaria. Negócios eletrônicos. Comércio eletrônico. The drivers of e-commerce at the hostelling in Brazil ABSTRACT The use of the Internet as a tool to disseminate and implement the business is reality for companies in all segments. A survey conducted in the United States and Europe identify the different drivers that determine the competitive advantages in the use of new Information Technology (IT). The drivers are not common to all kinds of business, some serving for a particular sector and not for others, which are: electronic deliverability; information intensity; customizability; aggregation effects; search costs; real-time interface; contracting risk; network effects; standardization benefits; missing competencies. The hospitality uses the Internet to offer its customers current, or future, information about your business (products and services) as well as prices, terms of payment and even offer options for online bookings. This study examines the sites of the ten largest chains operating in the country taking into account the number of apartments, seeking to identify which drivers such networks fit. It will be presented still theoretical reference where fundamental concepts of tourism, hotels, e-business and e-commerce will be addressed. Keywords: Tourism. Hostelling. E-business. E-commerce. Luciana Maines da Silva é administradora pela Faculdade São Judas Tadeu, especialista em Finanças pela PUC-RS, especialista em Controladoria pela UFRGS e Mestre em Administração pela UNISINOS. Docente na Faculdade de Tecnologia SENAC/RS e na Universidade de Caxias do Sul (UCS) no curso de Administração. Paula Maines da Silva é turismóloga pela PUCRS e especialista em Marketing pela ULBRA. Coordenadora do curso Tecnológico em Gestão de Turismo e docente nos cursos tecnológicos na ULBRA e gerente administrativa da Versare Rede de Hotéis. 118 Opinio Canoas Opinio,n.20 n.20, jan./jun.p.118-134 2008 jan./jun. 2008 1 INTRODUÇÃO A sociedade vive uma era tecnológica, onde cada vez mais o ser humano está conectado na Internet, seja para expandir conhecimentos, relacionar-se com outras pessoas ou comprar produtos com a comodidade de não sair de casa. Segundo uma pesquisa da E-commerce (www.e-commerce.org.br) sobre a Internet e o comércio eletrônico, o Brasil ocupa o décimo lugar no ranking de países com maior número de internautas. Estes internautas têm gasto em média R$ 493 por ano em bens como cd´s, livros, computadores, eletrônicos e vídeos. A procura por automóveis, bens de consumo e turismo não aparecem na preferência dos usuários, mas apresenta um crescimento considerável em faturamento de 2002 a 2005. Uma pesquisa (ANDAL-ANCION et al., 2003) realizada nos Estados Unidos e Europa buscou identificar os diferentes drivers que determinam as vantagens competitivas na utilização de novas Tecnologias da Informação (TI). Os drivers não são comuns a todo o tipo de negócio, alguns servindo para um determinado setor e não para outros, quais sejam: distribuição digital; intensidade informacional; personalização; agregabilidade; localização; atualidade; tangibilidade; efeitos da rede; estandarização; dependência. Tendo em vista que a utilização da Internet para gerar negócios é uma realidade para empresas de pequeno, médio e grande porte no Brasil, é que este trabalho será desenvolvido, buscando identificar os drivers do comércio eletrônico na hotelaria brasileira. Serão analisados os sites das dez maiores redes em operação no país levando em consideração o número de apartamentos (Hotel Virtual – Raio X da Hotelaria, 2007). O trabalho está dividido em referencial teórico, onde conceitos fundamentais de turismo, hotelaria, e-business e e-commerce serão abordados, e posteriormente realizado um estudo de casos múltiplos das principais redes hoteleiras brasileiras em relação à utilização dos drivers do e-commerce. 2 REFERENCIAL TEÓRICO O referencial teórico tem como objetivo apresentar os assuntos Turismo, Hotelaria, Negócios Eletrônicos (e-business) e Comércio Eletrônico (e-commerce). Turismo e hotelaria Atualmente, comenta-se muito sobre turismo, não apenas como uma atividade econômica que está em pleno desenvolvimento, mas também como sinônimo de viagem e lazer. Vale lembrar que o turismo passou a ser atividade econômica somente a partir do século XIX com o desenvolvimento dos transportes, da hotelaria e o surgimento das agências de viagens. A primeira definição de cunho técnico sobre turismo de que se tem referência Opinio, n.20, jan./jun. 2008 119 foi a do austríaco Hermann Von Schullern Schattenhofen: “conceito que compreende todos os processos, especialmente os econômicos, que se manifestam na chegada, na permanência e na saída do turista de um determinado município, país ou estado” (FUSTER, 1974, p.21). Um dos membros essenciais do turismo é a hotelaria, que deriva de hospitalidade, que emana da palavra francesa hospice (asilo, albergue), que significa dar ajuda ou abrigo aos visitantes. O mais famoso hospice ficava na região da Borgonha e se chamava Beaune, também conhecido como Hotel Dieu ou a Casa de Deus. Ele foi fundado em 1443 por Nicolas Rolin, chanceler da Borgonha, como uma casa de caridade, um abrigo para os pobres. Na Antiguidade, os viajantes eram obrigados, pela lentidão das viagens e das longas e árduas jornadas, a contar com a hospitalidade dos habitantes das regiões por onde passavam. E, com o desenvolvimento do comércio e o aumento das viagens, surgiram estalagens e tavernas hospedando mercadores, estudiosos e atores, que dormiam sobre o feno, aproveitando o calor dos animais. Com a queda do Império Romano, as viagens passaram a ter um cunho religioso. Os missionários, padres e peregrinos que seguiam para os templos e lugares sagrados não estavam interessados em se hospedar nas primitivas acomodações oferecidas pelas estalagens da beira de estrada, e sim nas acomodações simples, administradas, muitas vezes, pelos escravos dos padres ou pelos religiosos dos templos. Na Idade Média, o número de viagens e viajantes foi-se multiplicando, ocasionando conseqüentemente o aumento do número de estalagens à beira das estradas. Walker (2002, p.6) comenta que “os hóspedes freqüentemente dormiam em colchões espalhados sobre o que hoje chamaríamos de saguão; cada pessoa comia o que tivesse trazido consigo ou o que pudesse comprar da casa”. Durante esse período, foi construído um dos primeiros hotéis europeus, o Hotel Henrique IV, em 1788, a um custo de 17.500 dólares, soma considerada muito alta na época para comportar apenas sessenta camas, tidas como as melhores da Europa. As carruagens passaram a revolucionar a hospitalidade nas estradas, pois, com as longas viagens e intempéries da natureza, era bem-vindo o descanso para os viajantes, nascendo assim os hotéis de carruagem (stagecoach inn). Walker comenta que: Nas cidades, os viajantes mais privilegiados, que viajavam no lombo de seu próprio cavalo ou dentro de seu coche particular, não pousavam nos mesmos lugares freqüentados pelas carruagens públicas e seus passageiros. Os viajantes mais pobres, que tinham de pegar a estrada a pé, sofriam para encontrar nessa época quaisquer tipos de acomodações que lhes servissem. (2002, p.9) E, cada vez mais, a estrutura de hospitalidade foi-se desenvolvendo para atender 120 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 às necessidades dos clientes. Uma pessoa que contribuiu consideravelmente para esse desenvolvimento foi César Ritz, considerado o “pai” da moderna hotelaria: Desde muito jovem Ritz ocupou todos os cargos possíveis em um hotel, até que foi nomeado gerente do Grande Hotel Nacional de Lucerna, um dos melhores de sua época. Ritz melhorou todos os serviços do hotel, do restaurante aos aposentos, onde incorporou seu correspondente banheiro, modernizou suas instalações e criou um novo conceito da administração e de serviço hoteleiro. (BALANZÁ; NADAL, 2003, p.19) A história da hotelaria acompanha a história do desenvolvimento do turismo, pois o turismo é uma atividade que depende do inter-relacionamento de diversos setores. E, também no Brasil, a evolução da hotelaria acompanhou o crescimento dessa grandiosa atividade econômica. No Brasil, durante o colonialismo, os viajantes se hospedavam nas casas-grandes de fazendas e engenhos, nos casarões das cidades, nos conventos e, principalmente, nos ranchos que existiam à beira das estradas. Era comum, também nessa época, famílias receberem hóspedes em suas residências, havendo, em muitas delas, um quarto destinado aos visitantes. Os jesuítas e outras ordens recebiam personalidades ilustres nos conventos, além de outros hóspedes. O mosteiro de São Bento, construído na segunda metade do século XVIII, no Rio de Janeiro, possuía um edifício exclusivo para hospedaria. A partir do século XVIII, no Rio de Janeiro, começaram a surgir estalagens ou casas de pastos, que eram locais que inicialmente ofereciam refeições a preço fixo, mas que passaram também a dispor de quartos para dormir. Uma grande demanda por alojamentos iniciou-se no momento em que a corte portuguesa chegou ao Rio de Janeiro em 1808, pois, com a abertura dos portos, o fluxo de estrangeiros para exercer funções diplomáticas, científicas e comerciais cresceu. Em virtude disso, os proprietários das casas de pensão, hospedarias e tavernas passaram a denominar seus estabelecimentos de hotel, com a intenção de melhorar o conceito da casa, independente da quantidade de quartos e do padrão dos serviços oferecidos. A escassez de hotéis no Rio de Janeiro, em meados do século XIX e no século XX, levou o governo a criar um decreto de isenção de impostos municipais para os cinco primeiros grandes empreendimentos hoteleiros que se instalassem na cidade. Com isso, surgiu o Hotel Avenida, o maior do Brasil em 1908, com 220 quartos. Na década de 1930, começaram a surgir hotéis, nas capitais, nas estâncias minerais e nas áreas de apelo paisagístico, que eram ocupados por pessoas que freqüentavam os cassinos que funcionavam nesses locais. Com a proibição dos jogos de azar, em 1946, os cassinos fecharam e os hotéis tiveram que ser fechados, como o hotel Opinio, n.20, jan./jun. 2008 121 Quitandinha, em Petrópolis, no estado do Rio de Janeiro. Com a criação da Embratur (Empresa Brasileira de Turismo), em 1966, surgiu o Fungetur (Fundo Geral de Turismo) que atuava, por meio de incentivos fiscais, na implantação de hotéis cinco estrelas. Nos anos 1960 e 1970, as redes hoteleiras internacionais começaram a chegar ao Brasil e trouxeram novos padrões de serviços e preços. A partir desse momento, a hotelaria brasileira começou a entrar numa nova etapa, na qual a concorrência se tornou cada vez mais acirrada com a oferta de serviços e valores cobrados muito similares, fazendo com que o cliente escolhesse determinado empreendimento pela satisfação de suas necessidades. Principais redes hoteleiras O mercado hoteleiro no Brasil cresceu de forma expressiva. Em 2006 existiam 18 mil meios de hospedagens; gerando cerca de um milhão de empregos, entre diretos e indiretos; possuindo uma receita bruta em torno de U$2 bilhões e um patrimônio imobilizado em torno de U$10 bilhões; e a arrecadação em impostos e taxas foi de mais de U$400 milhões (Associação Brasileira de Indústrias e Hotéis). A hotelaria nacional representa 80% da oferta de unidades habitacionais enquanto a hotelaria internacional que atua no país representa 20% (Hotel Virtual). Em dezembro de 2006, as dez maiores redes em operação no país levando em consideração o número de apartamentos eram: TABELA 1 – Dez maiores redes no Brasil. Fonte: Hotel Virtual – Estudo Raio X da Hotelaria (2007). A Internet, como fonte de informação ao hóspede ou de comercialização dos produtos hoteleiros, há muito vem sendo utilizada pelas redes nacionais e internacionais. 122 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 E-business e comércio eletrônico A TIC (tecnologia da informação e comunicação) transformou o modo de se fazer negócio. Tanto os gestores como colaboradores precisaram se adaptar à nova realidade que agora abrange todos os segmentos: a utilização de novas tecnologias para armazenagem, disponibilização e envio de informações. Mesmo após essa mudança, uma nova ferramenta veio revolucionar a empresa: a Internet. E com ela uma série de novas aplicações que possibilitaram maior agilidade e abrangência. Criou-se o conceito de e-business, definido como a conexão de tradicionais sistemas, como o sistema de vendas da empresa, e tecnologias de informação de uma empresa à Internet. Em 1996, durante uma apresentação em Wall Street (GERSTNER, 2003), alguns executivos da IBM divulgaram o conceito de e-business como: [...] uma forma segura, flexível e integrada de fornecer um valor diferenciado na gestão administrativa pela combinação de sistemas e processos para a administração e funcionamento de operações centrais, de forma simples e eficiente, alavancada pela aplicação de tecnologia da Internet. (apud FRANCO JR, 2001, p.16) O conceito de e-business, para a IBM “Tratava-se de algo que reformularia todos os tipos relevantes de relacionamento e de interação entre os negócios e pessoas” (GERSTNER, 2003, p.184). Muitos autores consideram e-business e e-commerce (comércio eletrônico) da mesma forma, entretanto, enquanto o e-commerce trata com maior detalhe as funções de “compra e venda de produtos, serviços e informações via rede de computadores, basicamente pela Internet (TURBAN et al. 2003, p.544)”, o e-business trata dos ciclos cronológicos, velocidade, globalização, aumento de produtividade, obtenção de novos clientes e compartilhamento de conhecimentos entre instituições para obter uma vantagem competitiva (GERSTNER, 2003). O e-business encontra-se agora em um terceiro estágio. O primeiro estágio referiase basicamente a publicações eletrônicas de informações institucionais. O segundo estágio já oferecia serviços. O terceiro estágio dedica-se aos relacionamentos negociais efetivos (BARBIERI, 2001). Contudo, há um caminho básico para a utilização do e-business, que deve ser traçado para as empresas na obtenção de sucesso na implementação. A análise das oportunidades, definição do modelo de negócios, definição do projeto do site, definição do plano de tecnologia para e-business, projeto e desenvolvimento do projeto e-business e implantação devem ter o envolvimento pleno das diversas áreas da empresa, como marketing, vendas, produção e informática (BARBIERI, 2001). O e-business tem papel fundamental para a disponibilização de informações, ou Opinio, n.20, jan./jun. 2008 123 utilização de recursos (sistemas) internos. Sistemas como SCM (Supply Chain Management) – gerenciamento da rede de fornecedores; e-procurement – sistema de procura de itens para fornecimento; CRM (Customer Relationship Management) – sistema de gerenciamento do relacionamento com o cliente; e o próprio e-commerce, já descrito como a compra e venda de produtos e serviços, podem ser utilizados através da Internet, possibilitando maior mobilidade e agilidade de informações. Com o aumento de usuários da Internet diversos negócios, até então tradicionais em sua forma de operação, estavam migrando para a Era da Informação (DAVENPORT, 1998). É possível realizar operações nos mais diversos segmentos como e-auction, ou leilões eletrônicos. O grande diferencial da Internet nesse negócio é que assim como se mantêm os leilões do tipo “quem dá mais”, há também os do tipo “quem oferece por menos”, também conhecido como leilão reverso, ou seja, o consumidor consulta o produto ou serviço que deseja, buscando a aquisição pelo menor preço. Agora o concorrente está a apenas “um clique” de distância. A relação com os bancos também foi modificada no momento em que quase todas as operações podem ser realizadas via Internet. Sucessor direto do Home Banking, a Internet possibilita que as mesmas operações sejam realizadas, sem, no entanto ser necessária a conexão via modem, e de qualquer lugar onde o cliente tenha acesso a Internet. O e-banking possibilitou o afastamento quase total do cliente com a agência, sendo necessário somente para saque de valores, o que também será reduzido no futuro, com a ampliação de negócios via cartões de crédito e débito. As facilidades da Internet alcançam também a consulta a endereços e telefones. O e-directories elimina a consulta física a listas telefônicas. A partir de sites de busca, como o Yahoo, ou mesmo dos sites das operadoras de telefonia como o www.listasdaqui.com.br da Brasil Telecom, é possível localizar fornecedores ou pessoas em segundos. A busca por endereços e telefones em outras cidades e países agora se tornou possível mesmo em casa ou no escritório. Diversos outros produtos e serviços estão disponíveis na Internet como e-trade (negociação de ações), e-drugs (venda e informação sobre medicamentos) e ehealthcare (venda e informações sobre planos de saúde, convênios, cooperativas, hospitais, etc.). Além dos citados, diversos novos segmentos irão estabelecer-se virtualmente em breve. Com relação ao Comércio Eletrônico, as empresas já estão se habituando e adaptando para as novas realidades da economia. Mercados extremamente competitivos e globalizados exigem que as empresas possuam estratégias focadas para sua manutenção. Também em virtude da globalização, os consumidores foram expostos a todo o tipo de produtos e serviços, tornando-se mais exigentes, requerendo não somente promoções e atendimento personalizado, mas produtos e serviços voltados as suas necessidades e preferências. Tem fim a fase da produção em massa para a personalização em massa, onde se irá produzir uma grande quantidade de itens para atender as preferências dos consumidores. 124 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 Portanto, as empresas vêm oferecendo aos seus clientes opções de relacionamento. Atualmente não é só o contato direto e pessoal que pode gerar negócios. Com a Internet também surgiu uma nova forma de comércio: o comércio eletrônico, ou e-commerce. O comércio eletrônico pode ser definido como um conceito de muitas facetas abrangendo o intercâmbio de produtos, serviços, informações ou dinheiro com suporte de computadores e redes (TURBAN et al., 2003). Segundo Albertin (1999, p.15), o comércio eletrônico “é a realização de toda a cadeia de valor dos processos de negócio num ambiente eletrônico, por meio da aplicação intensa das tecnologias de comunicação e informação, atendendo aos objetivos de negócio”. A opção da empresa em tomar parte dessa nova economia dá-se por dois aspectos: (1) os clientes dão preferência a esse tipo de negócio; e (2) a empresa tem a chance em reduzir os custos de comercialização drasticamente. A redução de custo se dá pelo fato da empresa não precisar de instalações físicas para o atendimento ao cliente, já que a negociação se dará em ambiente virtual. Em alguns casos necessita somente de local para armazenar os itens. Entretanto, há empresas que simplesmente agregam o serviço de e-commerce, oferecendo mais uma alternativa de relação com o cliente. Um dos diversos benefícios do e-commerce para a empresa é a possibilidade de conhecer as preferências dos clientes, mesmo que esses não venham a comprar. O acesso do cliente junto ao site pode ser monitorado, além de coletar dados relevantes de maneira não-intrusiva. John Walsh (in DAVENPORT et al., 2004) sugere que, com base nas informações colhidas na primeira visita do cliente, as futuras visitas ao site sejam personalizadas. Com isso, será possível apresentar no primeiro momento, as informações que são mais pertinentes ao cliente. Mesmo que esse não efetue nenhuma compra, suas preferências e curiosidades ficaram registradas, tornando possível cruzamento com informações de outros clientes, o que proporciona ao gestor a informação necessária para estar sempre atualizado perante as preferências do consumidor. A relação entre o comércio eletrônico e o cliente Por conta de diversas empresas puramente virtuais que enfraqueceram a confiança depositada pelos clientes, empresas sólidas e preocupadas com o consumidor acabaram tendo sua imagem virtual muitas vezes questionada. O risco de não recebimento do produto ou serviço adquirido, assim como medo quanto à forma de pagamento (clonagem de cartão de crédito, por exemplo), levaram os consumidores a procurar empresas que possuam localização física, mesmo que comprem através de sites. Assim sentem-se seguros no momento de efetuar uma troca ou reclamação. Mas construir a confiança junto ao consumidor, mesmo para empresas novas no ambiente virtual, não é tarefa impossível. Sites projetados com destaque para a homogeneidade cultural do cliente (por exemplo, utilizando a mesma língua), referências à adesão às regulamentações e práticas comerciais locais e campanhas promocionais projetadas Opinio, n.20, jan./jun. 2008 125 para estimular negócios repetidos são técnicas que podem estimular a formação da confiança (WALSH in DAVENPORT et al., 2004). Outra prática muito utilizada é a personalização do acesso. Obtidas informações não-intrusivas básicas (nome, idade, sexo, preferências, faixa de renda) na primeira visita do cliente ao site, o mesmo pode se deparar com informações e produtos voltados às suas preferências nas próximas visitas. Pela diversidade de produtos e serviços negociados na Internet, verifica-se que há fatores diferenciadores entre as empresas que disponibilizam o comércio eletrônico como canal de venda. Esses fatores não são comuns a todas as empresas. Os 10 drivers do e-commerce Uma pesquisa (ANDAL-ANCION et al., 2003) realizada nos Estados Unidos e Europa buscou identificar os diferentes drivers que determinam as vantagens competitivas na utilização de novas Tecnologias da Informação (TI). Os drivers não são comuns a todo o tipo de negócio, alguns servindo para um determinado setor e não para outros. A seguir será analisado cada um deles: 1) Distribuição digital Diversos produtos são disponibilizados via web, porém verifica-se que alguns deles não são comercializados. O consumidor teme em adquirir um carro, por exemplo, via Internet. Entretanto, CDs, livros e revistas, além de eletroeletrônicos, como o DVD player são os itens mais vendidos no Brasil, conforme pesquisa realizada em 2005 pela e – bit, empresa de pesquisa e marketing on-line, em parceria com a Câmara Brasileira de Comércio Eletrônico. Outra pesquisa, realizada pela Câmara Brasileira de Comércio Eletrônico e a consultoria E-Consulting, divulgou que em 2005 o índice de varejo on-line (VOL) no mercado brasileiro totalizou R$ 9,9 bilhões – valor 32% maior do que o movimentado no ano de 2004, que foi de R$ 7,5 bilhões, e correspondente a 3,43% do varejo total no país – dados estimados a partir do índice-base do IBGE. As vendas relativas a turismo (passagens aéreas, reservas de hotéis, pacotes turísticos, etc.) foram responsáveis por 18,9% (R$ 1,87 bilhões) do total do índice e a venda de bens de consumo foi responsável por 29,1% (R$ 2,88 bilhões). A venda de automóveis foi responsável por 52% (R$ 5,14 bilhões), sendo realizada por montadoras e revendedoras de veículos, confirmando a preferência dos consumidores em adquirir produtos de baixo valor agregado (Quadro 1). O indicador VOL (VAREJO ON-LINE) é calculado a partir do faturamento dos principais representantes do Varejo on-line no Brasil em cada um dos segmentos analisados. 126 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 QUADRO 1 – Evolução do faturamento do varejo on-line por segmentos. Pesquisa E-Consulting (R$ milhões). Fonte: Câmara Brasileira de Comércio Eletrônico, 2006. Acesso em http://www.camara-e.net/interna.asp?tipo=1&valor=3505, em 24 maio 2006. 2) Intensidade informacional Com o advento das novas tecnologias, torna-se possível às empresas ampliar o conteúdo das informações referentes aos seus produtos e serviços. Assim, informações que antes estariam contidas em manuais, muitas vezes de difícil consulta pelos consumidores, podem estar disponibilizadas on-line, tornando a consulta mais acessível e ágil; 3) Personalização Com as novas tecnologias da informação, é possível disponibilizar aos clientes produtos e serviços personalizados. Softwares sofisticados como sistemas de gerenciamento de cadeia de suprimentos possibilitam a empresa essa personalização. Um dos principais exemplos é a Dell Computers, onde o consumidor, através do site da empresa, monta seu próprio equipamento, com as configurações que desejar; 4) Agregabilidade Através das novas tecnologias da informação as empresas podem oferecer aos seus clientes outros serviços além de seu principal produto. Instituições financeiras podem, a partir da utilização dessas tecnologias, oferecer seguros, assim como sites de comércio eletrônico podem expandir a variedade de produtos; 5) Localização Atualmente é possível efetuar cotações de preços de produtos e serviços via Internet. O facilitador para o consumidor é a grande variedade de fornecedores para os itens, proporcionando a possibilidade da melhor compra. O poder de negociação junto aos fornecedores também é fortificado em função das novas tecnologias da Opinio, n.20, jan./jun. 2008 127 informação, pois o consumidor pode adquirir determinado bem ou serviço de uma empresa próxima a sua residência ou escritório ou em outro continente; 6) Atualidade Em alguns serviços prestados via web é fundamental oferecer ao cliente informações atualizadas permanentemente. A compra e venda de ações, transferências bancárias e compras de livros são exemplos da necessidade de atualização constante dessas informações, pois são determinantes da tomada de decisão do consumidor naquele momento; 7) Tangibilidade Muitos consumidores costumam comprar diversos produtos via web. Contudo, esses produtos, em sua maioria são de baixo valor, pois o cliente assume o risco em comprar um objeto que possa não ser exatamente o que ele imaginava. Um livro, por exemplo. Entretanto, produtos onde há maiores especificações são, em sua maioria, somente alvo de consulta, não de compra. Neste caso, a exemplo da compra de um carro, requer muito mais riscos do que o consumidor está disposto a correr em uma compra virtual; 8) Efeitos da rede A nova economia da informação é movida pela economia de redes, onde o valor de ligar-se a uma rede depende do número de pessoas já conectadas a ela (DAVENPORT, 1998). Desta forma, quanto mais um produto ou serviço é utilizado, mais ele o será. Esse conceito é denominado de feedback positivo, formando um círculo virtuoso (SHAPIRO; VARIAN, 1999). Entretanto, o oposto também é verdadeiro, ou seja, quanto menos um produto ou serviço é utilizado, menos ele será. Assim, pode-se considerar o Macintosh, da Apple, durante a década de 1980, como um produto em fase de feedback negativo, enquanto que o sistema operacional Windows, da Microsoft, estava em fase de feedback positivo; 9) Estandardização As novas tecnologias da informação têm propiciado às empresas sincronizar e padronizar certos processos, resultando em grande eficiência em transações businessto-business (B2B) assim como para os consumidores; 10) Dependência O último drive refere-se à possibilidade de empresas terem parte de sua operação efetuada por outra(s) empresa(s). Pode-se usar como exemplo o arquivo externo dos 128 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 dados de um sistema de gestão da empresa, ou mesmo partes de um sistema como a folha de pagamento. As rotinas pertinentes à segurança, controle e manutenção dos dados são de responsabilidade da empresa contratada, enquanto que a empresa contratante pode utilizar seus recursos focados na atividade fim da mesma. Os drivers podem ser agrupados considerando algumas características, conforme demonstrado na Tabela 2. TABELA 2 – Tipos de drivers Fonte: Andal-Ancion et al., 2003. Os drivers determinam o tipo de acesso de intervenção onde é mais bem sucedido um setor em particular. Há três tipos de estratégias relacionadas aos drivers (ver Tabela 3): a estratégia de Desintervenção Clássica é afetada principalmente pelos drivers com características inerentes ao produto ou serviço; a estratégia de Remediação é utilizada quanto há benefícios em combinar produtos e serviços e onde empresas que utilizam as novas tecnologias da informação trabalham mais perto de seus parceiros intermediários, construindo uma relação forte e progressiva; e a estratégia de Mediação baseada em Rede é mais utilizada na interação entre empresas e seus parceiros ou concorrentes, proporcionando a execução de produtos e serviços por um elo onde a realização seja mais efetiva. TABELA 3 – Os drivers e as estratégias de intervenção. Negrito = drivers dominantes ( ) = favorável somente se a intermediação exerce uma função. Fonte: Andal-Ancion et al., 2003. Opinio, n.20, jan./jun. 2008 129 O setor hoteleiro é um dos setores que já utilizam o e-commerce como canal de vendas, pois possibilita o conhecimento do empreendimento, assim como tarifas e serviços. Possibilita, também, a reserva antecipada. O e-commerce no setor hoteleiro Os precursores da Internet que comercializavam os hotéis foram os sistemas que surgiram para fazer inicialmente as reservas de passagens aéreas. Conhecidos como Sistemas de Distribuição Global – GDSs (Global Distribution System), compreende os sistemas Amadeus, Galileo, Sabre e Worldspan. Middleton (2002, p.333) afirma que os “GDSs estão totalmente integrados às opções de informações e e-commerce”. A partir da década de 1990 os GDSs passaram a ter acordos com sites especializados em reservas para não perder uma fatia de mercado que começa a utilizar a Internet como forma de reservar hotéis. Em relação a esta nova situação, Middleton (2003, p.332) comenta que: ...Os desenvolvimentos da Internet – que traz vantagens particulares para grandes e pequenas empresas no atendimento a clientes “leais” ou que fazem compras repetidas em suas próprias casas. Em resposta a isso, todos os principais GDSs agora possuem acordos com os maiores sites do ramo da Internet, como o Travelocity (Sabre) e o Expedia (Worldspan). Paralelamente à utilização de sistemas e sites específicos de reservas, a hotelaria buscou aprimorar seus próprios sites, como mais uma alternativa de comercialização dos empreendimentos. 3 METODOLOGIA DE PESQUISA O método utilizado foi de Estudo de Caso Múltiplo, comparando as semelhanças e diferenças entre as 10 maiores redes hoteleiras do Brasil, no que se refere aos drivers no e-commerce, propostos por Andal-Ancion et al. Yin (2001, p.254) afirma que no “enfoque das semelhanças, examinam-se tendências que estão presumivelmente afetando a todos. Enquanto as diferenças são exploradas com o fim de construir teoria”. O estudo de caso permite examinar acontecimentos atuais através da observação direta. Visa responder perguntas do tipo “como” e “por que” sobre um conjunto contemporâneo de acontecimentos sobre o qual o pesquisador tem pouco ou nenhum controle (YIN, 2001, p.28). Assim, o presente estudo foi realizado através da observação dos sites das dez principais redes hoteleiras em operação no Brasil, buscando verificar em quais drivers cada rede se enquadra. 130 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 4 ESTUDO DE CASO O estudo de caso foi realizado através da análise dos sites das principais redes hoteleiras do Brasil, verificando em quais drivers do e-commerce essas redes se enquadram. As redes analisadas foram: 1) Rede Accor; 2) Rede Atlântica; 3) Rede Blue Tree; 4) Rede Sol Meliá; 5) Rede Othon; 6) Rede Intercontinental; 7) Rede Nacional Inn; 8) Rede Bristol; 9) Rede Transamérica Flats; 10) Rede Versare. Nas Tabelas 4 e 5, verifica-se em quais drivers cada rede se enquadra. TABELA 4 – Resumo análise sites das redes hoteleiras x drivers do e-commerce Fonte: as autoras. TABELA 5 – Resumo da análise dos sites das redes hoteleiras x drivers do e-commerce (continuação). Fonte: as autoras. A partir da análise dos sites percebe-se que todas as redes possuem um site Opinio, n.20, jan./jun. 2008 131 atualizado (Atualidade) e explicativo dos produtos (Intensidade informacional) comercializados por ela bem como a possibilidade do cliente solicitar sua reserva online (Distribuição digital). A Personalização através do site para comercialização de empreendimentos hoteleiros ocorre quando o cliente, através da gama de ofertas que cada rede oferece, escolhe o hotel que mais corresponde com a necessidade que possui, seja por localização ou tipo de apartamento. Em relação à Agregabilidade das redes analisadas, apenas a rede Nacional Inn possui em seu site a divulgação de um parceiro, o parque temático Walter World. No item Localização analisou-se as formas que o cliente possui para se comunicar com a empresa e todas as redes possuem um fale conosco e/ou e-mail e/ou um telefone 0800. Em relação ao serviço, a Tangibilidade não se aplica, mas percebe-se que ainda muitas pessoas procuram os meios tradicionais como telefone para solicitar suas reservas, pois muitos clientes ainda têm restrições quanto a utilizar a Internet como meio de efetivação de transações (reservas). Os itens Efeitos da rede, Estandarização e Dependência não puderam ser analisados apenas acessando o site das redes. Através da análise dos sites somente é possível analisar as características inerentes aos produtos e serviços (Tabela 2), que contemplam os drives Distribuição digital, Intensidade informacional, Personalização e Agregabilidade. Também foi verificada a interação entre empresas e consumidores, através dos drivers Localização, Atualidade e Tangibilidade. Pela impossibilidade de verificar os drivers Efeitos da rede, Estandarização e Dependência, não é possível verificar a interação entre empresas e seus parceiros ou concorrentes. Ainda através dos drivers é possível estabelecer qual a estratégia de intervenção aplicada pelas redes, conforme supra verificado na Tabela 3. Todos os drivers encontrados na análise referem-se a Desintervenção Clássica. Essa estratégia é corroborada uma vez que a pesquisa se deu somente através da análise dos sites. Aliado a isso, o objetivo dos sites para o setor hoteleiro é exatamente de apresentar seus produtos ou serviços aos clientes ou potenciais clientes. 5 CONCLUSÕES A utilização da Internet como ferramenta de divulgação e mesmo de concretização de negócios é realidade para empresas em todos os segmentos. O setor hoteleiro utiliza essa ferramenta para oferecer aos seus clientes atuais, ou futuros, informações sobre seus empreendimentos (produtos e serviços), assim como preços, condições de pagamento e mesmo oferecer opções de reservas on-line. Através desse estudo verificou-se que as dez maiores redes hoteleiras que operam no Brasil utilizam ferramentas de e-commerce como suporte a outras ferramentas de marketing e vendas. A conclusão da pesquisa não deveria ser diferente, uma vez que o volume de operações comerciais on-line vem aumentando ano a ano no Brasil, graças 132 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 principalmente a seriedade com que as empresas tratam seus clientes, seja pessoalmente, seja em ambiente virtual. Mas essa análise não foi integralmente exaurida nesse estudo. Diversos outros estudos podem ser desenvolvidos através de pesquisas diretas junto às redes hoteleiras visando aprofundar o uso do e-commerce com seus fornecedores e concorrentes, assim como estudos em outros segmentos. REFERÊNCIAS ABIH. Disponível em: <www.abih.com.br/site.php>. Acesso em: 3 jul. 2008. ALBERTIN, Alberto Luiz. Comércio eletrônico: modelo, aspectos e contribuições de sua aplicação. 4.ed. São Paulo: Atlas, 2002. 292p. ANDAL-ANCION, Ângela; CARTWRIGHT, Phillip A.; YIP, George S. The Digital Transformation of the traditional businesses. MIT Sloan Management Review, v.44, n.4, p.34-41, Summer 2003. BALANZÁ, Isabel Milio; NADAL, Mônica Cabo. Marketing e Comercialização de Produtos Turísticos. Tradução Miguel Cabrera; revisão técnica Gleice Regina Guerra. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2003. 222p. BARBIERI, Carlos. BI – Business Intelligence: modelagem & tecnologia. Rio de Janeiro: Axcel Books, 2001. 424p. CAMARA-e.NET. Bases de dados. Disponível em: <http://www.camara-e.net/ interna.asp?tipo=1&valor=3505>. Acesso em: 24 maio 2006. DAVENPORT, Thomas H.; PRUSAK, Laurence. Ecologia da informação: por que só a tecnologia não basta para o sucesso na era da informação. São Paulo: Futura, 1998. 316p. FRANCO JR, Carlos F. E-business: tecnologia da informação e negócios da Internet. São Paulo: Atlas, 2001. 359p. FUSTER, Fernandez. Teoria y técnica del Turismo. 4.ed. Madrid: Nacional, 1974. Tomo I e II. E-Commerce. Disponível em:<www.e-commerce.org.br>. Acesso em: 8 jul. 2008. GERSTNER, Louis V. Jr. Quem disse que os elefantes não dançam? Rio de Janeiro: Elsevier, 2003. 336p. HOTEL VIRTUAL. Disponível em: <www.hotelvirtual.com.br/mostratexto.asp?ID=2057&GR=Estatísticas%20Setoriais – 20k>. Acesso em: 3 jul. 2008. MIDDLETON, Victor T. C. Marketing de Turismo: Teoria e prática. 2.ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2002.534p. SHAPIRO, Carl; VARIAN, Hal R. A economia da informação: como os princípios econômicos se aplicam a era da Internet. Rio de Janeiro: Campus, 1999. 397p. STAKE, Robert E. Investigación con estudio de casos. Madrid: Morata, 1998. 159p. TURBAN, Efraim; RAINER, R. Kelly, Jr.; POTTER, Richard E. Administração de tecnologia da informação. 3.ed. Rio de Janeiro: Elsevier. 2003. 618p. WALKER, John R. Introdução à hospitalidade. Tradução Élcio de Gusmão Verçosa Opinio, n.20, jan./jun. 2008 133 Filho. Barueri, SP: Manole, 2002. YIN, Robert K. Estudo de caso: planejamento e métodos. 2.ed. Porto Alegre: Bookman, 2001-2004. 205p. 134 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 Globalização social-nacionalista Marco A. Stail Filho Rafael Klafke RESUMO Este artigo aborda características positivas e negativas a respeito da desregulamentação do Estado. Assim, pretende-se discutir a viabilidade de resgate do nacionalismo econômico, cada vez mais presente em muitos países europeus e, mais recentemente, nos latino-americanos. Esta discussão é pautada pelas definições de economia de mercado, nacionalismo e intervencionismo, bem como pela abordagem de como alguns países adotaram práticas capitalistas, sem abolir por completo a participação do Estado. Palavras-chave: Intervencionismo. Livre mercado. Capitalismo coordenado. Arranjo econômico. Nacionalismo. Social-nationalist globalization ABSTRACT This article approaches the positive and negative characteristics regarding the State downsizing. Therefore, it intends to discuss the economical nationalism rescue availability, which has become usual in European countries, and more recent, in the Latin-American ones. This discussion is based on descriptions of open market, nationalism and interventionism and also matched by the approaching of how some countries could adopt capitalist practices without the complete State participation abolishment. Keywords: Interventionism. Open market. Coordinated capitalism. Economical arranges. Nationalism. 1 INTRODUÇÃO A queda do muro de Berlim, em 1989, além de sinalizar a sucumbência do modelo socialista e o fim da bipolaridade, marcou o início de uma nova ordem mundial, em que o capitalismo liberal pregado pelos Estados Unidos é proposto aos demais países, principalmente aqueles cuja economia e desenvolvimento tecnológico são mais precários, como única alternativa para obter estabilidade econômica e melhores performances de crescimento. Este modelo, em essência, propõe a diminuição das funções do Estado, bem como das barreiras comerciais internacionais, partindo do pressuposto de autoMarco A. Stail Filho é administrador de Empresas com habilitação em Comércio Exterior, pela FARGS/RS; especialista em Planejamento e Gestão e professor do curso de Administração na ULBRA Canoas/RS. E-mail: [email protected] Rafael Klafke é graduado em Relações Públicas pela UNISINOS/RS e especialista em Planejamento e Gestão pela ULBRA/RS. Opinio Canoas Opinio,n.20 n.20, jan./jun.p.135-142 2008 jan./jun. 2008 135 regulação do mercado. Contudo, o que se identifica é que nenhum Estado deixou de interferir nos fatores da economia, independentemente do grau de intervenção e dos mecanismos utilizados para tal. Buscar-se-á exemplificar os diferentes níveis de influência do Estado e avaliar a viabilidade de práticas nacionalistas no cenário atual. Neste sentido, o presente ensaio tem por objetivo propor uma reflexão sobre as características positivas e negativas a respeito da desregulamentação do Estado, tendo por base a opinião e as teorias propostas por diversos autores especializados no tema. A metodologia adotada para desenvolver este estudo foi a pesquisa exploratória de cunho qualitativo, a partir da análise de materiais elaborados por outros autores, principalmente artigos científicos e compêndios de seminários e fóruns sobre economia e política. Como resultado, apresentam-se ponderações sobre a economia de mercado, definições sobre nacionalismo e constatações sobre a sua origem e sua relação com outras ideologias, bem como avaliação de casos de um Estado interventor e considerações finais sobre a possibilidade de conjugação destes modelos, até então considerados antagônicos entre si. 2 ECONOMIA DE MERCADO Em uma economia de livre mercado, o preço é determinado pela oferta e procura. Segundo Bertoluci (2006, p.220), “a liberdade econômica pode ser definida como a ausência de coerção ou de restrições por parte do Estado na produção, distribuição e consumo de bens e serviços, além do que seja estritamente necessário para o cidadão ter protegida a sua própria liberdade”. Além disso, vale destacar que, ao Estado, nos países economicamente livres, cabe um papel mínimo e fundamental, que potencializa suas forças para garantir que as instituições trabalhem em favor da geração de riquezas, respeitando a economia de mercado (BERTOLUCI, 2006). Em contrapartida, países com alto grau de intervencionismo, impõem inúmeras restrições à atividade econômica, as quais acabam por distorcer iniciativas que visam o crescimento de produção e de consumo. Perante os dados expostos nas tabelas 1 e 2, é possível relacionar o mau posicionamento do Brasil em ambos os rankings a fatores como a histórica influência do Estado nos fatores produtivos, o que inibe uma postura empreendedora mais arrojada por parte da iniciativa privada e, por conseqüência, o desenvolvimento sócioeconômico. Além disso, repetidos casos de corrupção no meio político fazem com que o foco de trabalho dos governantes seja a investigação dos envolvidos nestes eventos, ao invés de atuar na busca de soluções para os problemas estruturais do país. Classificado como país predominantemente sem liberdade (90ª posição mundial no ranking de liberdade econômica divulgado pela The Heritage Foundation, em 2005), a influência do Estado no Brasil é facilmente identificada quando se analisa, por exemplo, a burocracia para se abrir um novo negócio (em média 152 dias e 17 136 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 procedimentos diferentes), ou a quantidade de encargos sociais vigentes a partir da consolidação das leis trabalhistas (encargos equivalem a até 100% do salário do colaborador), ou ainda a taxa básica de juros, que descontada a inflação, beira os 14% (uma das mais altas do mundo). Assim, depara-se com uma situação onde a intervenção do Estado vai além dos campos que são de sua competência, como neste caso o crescimento econômico (BARBOSA, 2006). Contrapondo-se ao caso do Brasil, na América Latina, marcada atualmente pela eleição de governantes nacionalistas, tem-se o exemplo do Chile. Com um crescimento sustentado em práticas liberais, os resultados econômicos colocam o país andino em um patamar bastante diferente de outros países latino-americanos como Bolívia, Venezuela e, inclusive, o próprio Brasil (BARBOSA, 2006). Entre as diversas medidas adotadas pelo país, através de reformas iniciadas ainda durante o seu regime militar na década de 70, a conseqüência mais significativa provavelmente seja a diminuição da corrupção, já que a tributação passou a ser homogênea para todas as companhias, excluindo, assim, a possibilidade de obtenção de vantagens das companhias com o governo. Segundo Barbosa (2006), estas práticas acabam por gerar resultados bastante representativos, se comparadas com o resto do continente, como: inflação de 2,4% e juros de 1,75% ao ano, risco país na casa dos 70 pontos e crescimento médio anual de 5,7% por mais de duas décadas. Além disso, no âmbito social, o país se destaca ao ter seus índices de miséria reduzidos de 21% para 4% da população, e também por ter praticamente eliminado o analfabetismo. Os dados apresentados acima mostram que uma economia de mercado pode ser benéfica para a sociedade. Pode-se fazer a mesma constatação ao comparar os dados de dois estudos bastante importantes publicados em 2005 (NONOHAY, 2006): o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), publicado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e o índice de Liberdade Econômica, publicado pela The Heritage Foundation/Wall Street Journal. Considerando-se os vinte países melhores classificados em ambos os estudos abaixo, observa-se que 75% deles lideram as duas listas, permitindo constatar que, apesar de estes estudos terem objetivos e características distintas, é possível relacionar a liberdade econômica de um país com o desenvolvimento humano de sua população. Opinio, n.20, jan./jun. 2008 137 TABELA 1 – Índice de Desenvolvimento Humano. TABELA 2 – Ranking de Liberdade Econômica. Fonte: PNUD, 2005. Fonte: The Heritage Foundation, 2005. *Países que lideram tanto o ranking de Desenvolvimento Humano como o de Liberdade Econômica. 3 NACIONALISMO Ainda que apresente um forte cunho popular, o nacionalismo é fruto da revolução capitalista, a qual também foi propulsora de outras ideologias: o liberalismo, o socialismo (origem na classe trabalhadora), o eficientismo (classe média profissional) e o ambientalismo (classe média em geral). A liberdade de expressão, pensamento e economia (lessez-faire) e os ataques radicais ao Estado absolutista, característicos da ideologia liberal, com o passar do tempo se tornaram a base do conservadorismo moderno. Pode-se dizer que o socialismo é a ideologia da justiça social. Mesmo que sua proposta de organização da sociedade e dos meios produtivos não tenha se concretizado, ela foi oportunamente incorporada aos sistemas jurídicos, com vistas a garantir a igualdade entre os seres humanos, independentemente de etnia, credo e condição sócioeconômica. A ideologia da eficiência, como o próprio nome diz, atua na definição do meio mais adequado ou menos custoso para se atingir o fim visado. Enquanto isso, o ambientalismo, nasce, ao final do século XX, da percepção de que a sociedade industrial operava de maneira “insustentável” no que se refere principalmente aos recursos naturais e meio ambiente. Por sua vez, o nacionalismo é a ideologia da autonomia, da segurança e do 138 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 desenvolvimento econômico nacional. Formado, essencialmente, pela coesão de uma sociedade razoavelmente homogênea, disposta e em condições de construir um Estadonação (unidade político territorial em que está dividida politicamente a humanidade no capitalismo). Mesmo que algumas das ideologias citadas acima sejam consideradas antagônicas entre si, é possível vincular o ideal nacionalista às demais. Esta relação não se dá somente pelo fato de todas serem originárias do capitalismo. Identifica-se que a aplicação de algumas teorias defendidas pelo liberalismo, socialismo, eficientismo e o ambientalismo podem trazer importantes contribuições para o fortalecimento de uma nação focada no seu próprio desenvolvimento. O nacionalismo é uma ideologia originalmente burguesa, mas com uma conotação popular, já que só faz sentido quando capitalistas, trabalhadores e classe profissional superam de alguma forma seus conflitos internos, partilham um destino comum e se solidarizam na competição com os demais países. (BRESSER PEREIRA, 2008, p.2) 4 INTERVENCIONISMO Segundo Mises (In: NONOHAY, 2006, p.114), “intervenção é uma ordem isolada emitida pela autoridade que representa o aparato de poder”. Obriga os detentores dos meios de produção a empregar estes meios de maneira diferente da que empregariam se agissem apenas pelo que lhes determina o mercado. Neste sentido, ela se faz necessária, para assegurar a preservação do bem-estar social e, do ponto de vista fiscal, para ajustar as contas do orçamento público. Entretanto, à medida que a intervenção avança para o campo econômico, não está necessariamente contribuindo para o desenvolvimento do país. A imposição de barreiras à entrada de produtos importados com preços competitivos, por exemplo, pode representar inicialmente um artifício nacionalista de proteção à indústria. Porém, no médio prazo, medidas protecionistas como estas podem resultar na acomodação por parte da iniciativa privada, que não terá motivação para buscar melhoria constante do seu processo produtivo, já que a autoridade interventora ajuda a encobrir suas deficiências. Para Guimarães (2006), ao se analisar o exemplo da Alemanha, que no pósguerra adotou o capitalismo coordenado ou socialmente organizado, nota-se uma atuação do Estado que difere do modelo capitalista liberal, praticado por Estados Unidos e Reino Unido, mas que também não pode ser classificado como intervencionismo ortodoxo. Apesar da sua limitação territorial, nas décadas de 1950 e 1960 a Alemanha apresentou taxas anuais de crescimento de 8,2% (CROATES, 2000) e tornou-se o maior exportador do mundo, apresentando competitividade em vários setores e uma pauta muito diversificada. Associada à prosperidade econômica, Opinio, n.20, jan./jun. 2008 139 apresentaram indicadores sociais muito positivos: salários elevados, distribuição de renda entre as melhores do mundo desenvolvido, baixos índices de pobreza e criminalidade e desemprego praticamente nulos. Entre as particularidades da economia alemã neste período, destaca-se a formação de governos de coalizão (comprometidos com o planejamento estabelecido e avessos a mudanças radicais); o alto grau de autonomia do Banco Central e do Departamento de Cartéis (não suscetíveis à influência política); o incentivo e proteção às pequenas e médias empresas; o estreito relacionamento entre bancos e empresas, o que possibilitava fornecimento de recursos “pacientes” (investimentos de longo prazo) e eliminava o impacto das flutuações do mercado. Apesar de auto declarar-se não-intervencionista, o ponto vital do êxito do modelo alemão estava no incentivo às regulamentações via networks, exemplificadas na harmoniosa relação entre sindicatos e associações empresarias, proporcionando uma política salarial e trabalhista diferenciada, através das relações industriais; ou na constante troca de informações e compartilhamento de pesquisas e estudos tecnológicos entre empresas nacionais do mesmo setor, gerando expertise; ou ainda na intensa capacitação da mão-de-obra, com a finalidade de torná-la cada vez mais especializada e, principalmente, comprometida com o negócio da empresa. O Estado atuava protegendo a indústria nacional de aquisições indesejadas; garantindo a previsibilidade de cenários, o que assegurava e incentivava investimentos de longo prazo, propiciando, assim, o amplo engajamento das partes (empresas, bancos, sindicatos e empregados) em prol do desenvolvimento econômico. Ou seja, não se identifica a influência direta nos fatores da economia, mas fica evidente o papel do Estado de prover o bem-estar social e, sobretudo, de coordenar as condições necessárias para que as regulamentações via networks fluíssem conforme o esperado, o que caracteriza uma forma de intervenção, ainda que limitada e não-arbitrária. Segundo Guimarães (2006), a partir da década de 1970, o capitalismo coordenado alemão começa a ser abalado pelos reflexos da sua baixa flexibilidade e pelo acirramento da competição japonesa (produção enxuta e com custos menores). Identifica-se novamente a interferência do Estado fazendo os ajustes necessários, como na redução da carga tributária e dos encargos trabalhistas, ou na alteração da política de proteção contra demissões, entre outras medidas. Tudo isso, no entanto, sem pôr em risco os fundamentos do arranjo e sem desregulamentar as instituições. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Apesar da recente reestruturação do capitalismo pregar a liberalização no sentido mais amplo da palavra, não se identifica nenhuma economia que seja totalmente isenta da intervenção do Estado. Entretanto, é pertinente refletir sobre até que ponto a participação do Estado pode ser benéfica ou prejudicial ao sistema. Pode-se verificar que, entre as principais ideologias, mesmo aquelas que 140 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 historicamente são antagônicas, como o liberalismo e o socialismo, muitas delas têm suas origens derivadas da revolução capitalista. O modelo nacionalista não é diferente e tem na diversidade das características das demais teorias de origem burguesa um importante aliado para tornar o Estado-nação ainda mais consistente. Esta ideologia tem por objetivo pontencializar o desenvolvimento da nação que a adota, promovendo a melhora nas condições da sua sociedade, mas, por outro lado, acirra a competitividade com os demais países. Logo, o nacionalismo praticado de maneira radical pode incorrer em desgaste no relacionamento soberano e perdas no campo político e econômico. Constata-se que esta ideologia também é passível de ser implementada em conjunturas onde a “mão invisível” dá as cartas, ainda que seja mais comum em países cujo governo tenha um perfil mais atuante. Ao longo deste estudo, pôde-se identificar que, tanto a aderência a um modelo totalmente interventor, como a outro totalmente liberal são ineficientes na consolidação do desenvolvimento sustentado de um país. Ao passo que um governo com alto poder de intervenção pode afetar o desenvolvimento econômico, além de ser mais suscetível à corrupção e à influência política, um governo de características neoliberais ortodoxas pode incorrer na falta de regulamentação dos agentes econômicos, sobretudo no que tange a preservação do Welfare State. Para Bresser Pereira (2005), um capitalismo diferente do adotado pelos Estados Unidos é viável, a partir de mudanças estruturais da gestão pública, que abrangem basicamente reforma fiscal e rigoroso controle do orçamento público, ao invés de cortes sociais. A Alemanha, que atualmente enfrenta altos índices de desemprego, está fazendo, ainda que tardiamente, os ajustes necessários, mas sem abandonar o capitalismo socialmente organizado. Exemplos como Holanda e países escandinavos atestam que é possível realizar tais reformas preservando o Estado social e a competitividade da sua economia. Neste sentido, nota-se que os países que não seguiram a risca o modelo liberal norte-americano, evitando a ampla abertura financeira e a dependência total de capitais externos, têm apresentado as melhores performances de crescimento. Casos como o da China e da Índia, economias de mercado conjugadas com a intervenção do Estado nos campos que efetivamente são de sua responsabilidade e amparadas numa postura nacionalista que visa amenizar a dependência do cenário externo e, ao mesmo tempo, proteger e fortalecer a indústria local, aumentando a sua competitividade na concorrência global, permitem concluir que o resgate do nacionalismo econômico, ainda que em proporções distintas de outrora, representa uma ferramenta de grande valia na consolidação do desenvolvimento sustentado de uma nação. REFERÊNCIAS BARBOSA, Gabriel Rodrigues. Menor atuação do Estado – Case de Sucesso. O Dever do Estado, Porto Alegre, v.10, p.79-90. 2006. BERTOLUCI, Marília. Os Estados ao redor do mundo na ótica da liberdade. O Dever Opinio, n.20, jan./jun. 2008 141 do Estado, Porto Alegre, v.10, p.217-238. 2006. BRESSER PEREIRA, Luiz Carlos. Um outro capitalismo. Folha de São Paulo, 17/10/ 2005. Disponível em <http://www.bresserpereira.org.br/ver_file.asp?id=1625>, acessado em 10/06/2006. BRESSER PEREIRA, Luiz Carlos. Nacionalismo no centro e na periferia do capitalismo. Revista Estudos Avançados, 22 62, janeiro-abril 2008 171-194, no dossiê “Nação e Nacionalismo”. Instituto de Estudos Avançados da USP. Disponível em http:/ /www.bresserpereira.org.br/view.asp?cod=2527. Acesso em 08/07/2008. COATES, David. Models of capitalism: Growth and stagnation in the modern era. Oxford: Polity Press, 304p., 2000, ISBN 0-7456-2058-2. GUIMARÃES, Alexandre Queiroz. O capitalismo coordenado alemão: do boom do pós-guerra à Agenda 2010. Revista Lua Nova, São Paulo, 66: 23-56, 2006. Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script =sci_arttext&pid=S0102644520 06000100003 &lng=pt&nrm=&tlng=pt-114k>, acessado em 08/06/2006. NONOHAY, Gustavo Guedes de. Custos de um Estado interventor. o dever do Estado. Porto Alegre, v.10, p.113-132. 2006. 142 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 Meio ambiente, qualidade, saúde e segurança: plano estratégico e seus elementos para a implantação de um sistema de gestão integrado e seu monitoramento na indústria Marie Cristine Fortes Rocha RESUMO Devido às mudanças estratégicas do mercado, ao aumento das exigências dos clientes, acionistas e da sociedade com relação aos impactos ambientais, riscos e perigos ocupacionais, oriundos dos processos de fabricação, este estudo tem o intuito de apresentar os elementos básicos necessários para a implantação de um Sistema de Gestão Integrado partindo de um Plano Estratégico de Negócios: meio ambiente, qualidade, saúde e segurança e o seu monitoramento em uma indústria metalúrgica que já possui um Sistema de Gestão da Qualidade implementado. Palavras-chave: Plano Estratégico de Negócios. Sistema de Gestão Integrado (SGI). Sistema de Gestão Ambiental (SGA). Sistema de Gestão da Qualidade (SGQ). Sistema de Gestão de Saúde e Segurança OHSAS 18001. Environment, quality, health and security: Strategic plan and its elements for the implantation of an integrated management system and its control in the industry ABSTRACT Due to the significant strategically market changes, the increase in demands of the shareholders, customers and people in general related to the to environmental impacts and risks provided to our welfare by the manufacturing processes, this study intends to present the necessary and basic elements to implement an integrated management system, starting a Strategic Business Plan: environmental quality, health and safety, and the monitoring of use of these systems in a metallurgical company have already a management quality system. Keywords: Strategic Business Plan. Integrated Management System (SGI). Environmental Management System (SGA). Quality Management System (SGQ). Occupational Health and Safety Assessment Series OHSAS 18001. Marie Cristine Fortes Rocha é bacharel em Administradora de Empresas, Mestre em Engenharia com foco em Ambiente, pelo PPGEAM/ ULBRA Canoas/RS, aluna do Doutorado - PPGEP da Ufrgs e Professora do Curso de Graduação e Pós-Graduação de Administração ULBRA Canoas/RS. E-mail [email protected] Opinio Canoas Opinio,n.20 n.20, jan./jun.p.143-160 2008 jan./jun. 2008 143 1 INTRODUÇÃO O assunto Meio Ambiente está em questão. Aspectos sociais, políticos, culturais e humanos de preservação estão despertando interesse desde ambientalistas até políticos. Nas últimas décadas, têm ocorrido mudanças no sistema em que as empresas operam. As empresas, que eram vistas apenas como instituições econômicas com responsabilidades referentes a resolver os problemas econômicos fundamentais (o que produzir, como produzir e para quem produzir), têm presenciado o surgimento de novos papéis que devem ser desempenhados, como resultado das alterações no ambiente em que operam. Essa mudança baseia-se na assertiva de que, apesar do visível sucesso obtido pelo sistema capitalista, em conseqüência de uma eficiente combinação de ciência e tecnologia, quando se confrontam seus resultados econômicos e monetários com outros resultados sociais, tais como redução da pobreza, degradação das áreas urbanas, controle da poluição, diminuição da iniqüidade social, entre outros, verifica-se que ainda há muito a ser conseguido. O papel da indústria tem sido cada vez maior neste processo, devido à geração de impactos significativos provenientes de suas operações e o tratamento e destinação final de seus resíduos. Com a necessidade de demonstrar mais interesse e comprometimento com o meio ambiente e a saúde do trabalhador, a indústria vem investindo em melhorias de processo que possam fazer eficazmente a ligação entre os critérios adotados pelas diferentes áreas: Meio Ambiente, Qualidade, Saúde e Segurança, levando em conta normas regulamentares, legislação, requisitos organizacionais e dos clientes. As diretrizes e os direcionamentos de ações voltadas ao Sistema Integrado de Gestão já devem ser determinadas quando da elaboração do Plano de Negócios, em que a organização faz a análise de viabilidades deste processo de implementação. Neste momento são analisadas as fraquezas, oportunidades, ameaças, e tendências do mercado com relação às novas estratégias que serão incorporadas na organização. As estratégias devem emergir em passos curtos à medida que a organização se adapta ou aprende (MINTZBERG; AHISTRAND; LAMPEL, 2002). A boa saúde ocupacional dos funcionários pode estar vinculada a impactos ambientais, situações de emergência, riscos e perigos ocasionados por processos de produção. O interesse em saber identificar os reais aspectos e impactos dentro de um Sistema de Gestão Ambiental foi levantado, por se entender que este requisito da Norma ISO14000 é fundamental para que o meio ambiente e os processos que a ele se integram possam criar uma harmonia entre si e, também, proporcionar segurança e saúde a quem neles interage. As próprias normas ABNT, NBR, NR, ISO 14001, ISO 9001 e ISO/TS 16949 já estão contemplando a integração do Sistema de Gestão Ambiental 144 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 com o Sistema de Gestão da Qualidade, onde os processos interagem entre si e harmonizam-se num único Sistema, gerenciado através de processos e ações tratadas da mesma forma e com mesmo grau de importância. Este estudo surgiu, portanto, da necessidade de acompanhar a melhoria dos sistemas de gestão, que as normas e legislações vêm aprimorando, sugerindo um Sistema de Gestão Integrado, tornando mais eficiente, produtivo e aceito por todas as partes envolvidas: empresa, comunidade, funcionário e governo, partindo do pressuposto que a organização já possui um Sistema de Gestão da Qualidade estruturado atendendo já a todos os requisitos específicos de seus clientes. Do Plano de Negócio disparam táticas de estratégias e planejamento de recursos que deverão ser liberados, para o atendimento das metas, que são desdobrados até o chão de fábrica, designando responsabilidades e ações que serão distribuídas pertinentemente por cada nível hierárquico da organização. O objetivo deste estudo é apresentar os elementos básicos necessários para a implantação de um Sistema de Gestão Integrado: Qualidade, Meio Ambiente, Saúde e Segurança e o seu monitoramento numa indústria metalúrgica, partindo do pressuposto de que a empresa já apresenta uma estrutura organizada, baseado em requisitos da ISO9000 atrelado com definições do Plano Estratégico de Negócios. A intenção do estudo também é propor uma metodologia para implantação de um SGI em uma indústria metalúrgica e identificar métodos de avaliação e monitoramento do SGI. - Apresentar breve histórico sobre a criação e evolução das normas de Qualidade: ISO 9001, Meio Ambiente: ISO 14001 e Segurança e Saúde: OHSAS 18001; - Estruturar a implantação e gerenciamento de um Sistema de Gestão Integrado (SGI) e - Fornecer elementos a serem considerados na implantação do SGI 2 A EVOLUÇÃO DAS NORMAS 2.1 ISO 9001, ISO 14001 e ISO/TS 16949: histórico Desde os anos 50, dá-se início às normalizações em sistema. Até o final dos anos 70, os especialistas em qualidade preocupavam-se com a qualidade intrínseca do produto e os clientes foram de certa forma deixados para segundo plano. A qualidade começa a evoluir com suas ferramentas e metodologias, culminando no ano de 1987, com a emissão da série ISO 9000. Em 1996, a emissão de série ISO 14000. E em 1997, dava-se início às conversações entre as montadoras com aprovação do projeto ISO/TS e em 1999 foi emitida a ISO/TS 16949 1º edição. Em 2000 a série ISO 9000 sofre revisão e consequentemente em 2002 a ISO/ TS 16949 passa para sua 2º edição (baseada na “nova” série ISO 9000:2000). Opinio, n.20, jan./jun. 2008 145 A criação de padrões de controle de qualidade evidenciou-se como necessária durante a Guerra Mundial, quando os aliados viram-se em situações adversas, possuindo munições e canhões no mesmo local, mas que, por diferentes origens, não podiam ser usados. Cabeda (2003) revela que a partir deste fato surge um dos primeiros padrões internacionais: o calibre das armas de fogo. A partir dos anos 90, começa a haver um amadurecimento com relação à consciência ambiental, e firma-se um posicionamento político em defesa da busca de um equilíbrio entre as áreas econômica, social e ambiental (CABEDA, 2003). Conforme o autor, o termo “qualidade ambiental” passou a ser parte integrante do dia-a-dia das pessoas. O cotidiano mostrava, gradativamente, a preocupação das empresas com a racionalização de energia e de matéria-prima, buscando formas de reaproveitamento, nascendo então uma nova tendência. Em 1992 ocorreu a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, também conhecida como Rio 92 ou ECO 92, na cidade do Rio de Janeiro. Moura (2002) coloca que neste momento foram esclarecidas várias questões que estavam em debate e que deu origem a dois documentos importantes: a “Declaração do Rio sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento” e a “Agenda 21”. O conceito de Gestão se forma a partir do momento em que a questão da qualidade dos processos, produtos e ambiental se tornam uma realidade passando a ser considerados dentro do plano de negócio das empresas do governo e da cultura da sociedade. A questão ambiental deixou de ser assunto de ambientalistas para se converter em SGA (Sistema de Gestão Ambiental), PGA (Programa de Gestão Ambiental) e ISO 14001. O Sistema de Gestão não se trata de um tardio despertar de consciência de qualidade e ecológica dos empresários e gerentes, mas uma estratégia de negócio, por que pode significar vantagens competitivas ao promover a melhoria contínua dos resultados da empresa; atendimento dos requisitos específicos dos clientes e da organização; minimizar impactos ambientais resultante de suas atividades; tornar gradativamente suas operações ecologicamente corretas e promover a melhoria contínua dos processos de fabricação e serviços (Sistema de Gestão, 2004). Em 1996, surgem as normas da Série ISO 14000 apresentando padrões de gerenciamento ambiental, que podem ser utilizados para estruturar um Sistema de Gestão Ambiental, atendendo às necessidades da empresa, proporcionando uma base comum para o gerenciamento de seus aspectos ambientais. Para La Rovere (2002), entre as principais características ou benefícios operacionais da implementação de um Sistema de Gestão Ambiental para as empresas, pode-se destacar a redução da utilização de matéria-prima e demais recursos produtivos, a redução de geração de resíduos e de custos utilizados para a disposição dos mesmos, além do aumento da utilização de recursos renováveis ou recicláveis. Entretanto, convém esclarecer que a aplicação dos vários elementos do sistema de gestão pode variar em função dos diferentes propósitos e das diversas partes 146 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 interessadas. Enquanto os sistemas de gestão da qualidade tratam das necessidades dos clientes, os sistemas de gestão ambiental atendem às necessidades de um vasto conjunto de partes interessadas e às crescentes necessidades da sociedade sobre proteção ambiental. Para Gilbert (1996), pode-se avaliar a interação entre as normas, observando-se a ampla utilização das Ferramentas da Qualidade nas etapas do planejamento, desenvolvimento, avaliação e melhorias, tanto na Gestão da Qualidade quanto na Gestão Ambiental, através de várias técnicas de controle de desempenho, como, por exemplo, o PDCA, conhecido mundialmente, tendo amplas aplicações estratégicas, operacionais e de processos para acompanhar o ciclo do Planejamento (P), Fazer (D), Checar (C) e Agir (A). A utilização de um sistema integrado de normas pode ser aplicada, desde que se respeitem as particularidades e características próprias e divergentes de cada uma. Tanto a política ambiental quanto os objetivos e metas de uma organização devem ser baseados no conhecimento dos aspectos e impactos ambientais relevantes, associados às suas atividades, produtos ou serviços, pois são estes os critérios fundamentais para a implantação de um SGA. A ISO TS 16949 está baseada na nova ISO 9001:2000 com ênfase também na eficiência do sistema de gestão da qualidade visando às necessidades do ramo automotivo. O objetivo da ISO TS 16949, norma que especifica requisitos para um Sistema de Gestão da Qualidade, é ser utilizada quando uma organização possui a necessidade de demonstrar sua capacidade em fornecer de forma coerente produtos que atendam aos requisitos do cliente e aos requisitos regulamentares aplicáveis e quando uma organização pretende aumentar a satisfação do cliente por meio da efetiva aplicação do sistema, incluindo processos para melhoria contínua do sistema. O estabelecimento de objetivos mensuráveis e medição da eficiência e eficácia do desempenho de processos passou a fazer parte da estratégia de negócios. A etapa de revisão dos objetivos também dá ênfase à introdução de requisitos para análise e uso dos dados para definir oportunidades de melhoria, o uso de terminologia de mais fácil entendimento para todos os setores, a formalização do conceito de melhoria do sistema de gestão da qualidade e a análise de riscos (viabilidade de fabricação). A melhoria contínua da eficácia do sistema de gestão da qualidade mediante a comunicação à organização da importância em atender aos requisitos dos clientes, como também aos requisitos regulamentares e estatutários. 2.2 OHSAS 18001 As especificações OHSAS 18001 são compatíveis com as normas para sistemas de gestão ISO 9001:1994 (Qualidade) e ISO 14001:1996 (Meio Ambiente), facilitando Opinio, n.20, jan./jun. 2008 147 a integração dos Sistemas de Gestão Ambiental, da Qualidade e de Saúde Ocupacional e segurança no caso da organização desejar. As diretrizes OHSAS 18002 foram estruturadas para fornecer os requisitos específicos da OHSAS 18001 com as orientações relevantes. A numeração das cláusulas apresentadas na diretriz OHSAS 18002 é equivalente à da especificação OHSAS 18001 o que garante que todos os requisitos e diretrizes sejam cumpridos. 3 ESTRUTURA PARA A IMPLANTAÇÃO E O GERENCIAMENTO DO SISTEMA DE GESTÃO INTEGRADO 3.1 Estrutura da implantação do sistema de gestão integrado Viterbo (1998) coloca que o início de qualquer programa de melhoria ou de mudanças culturais na organização deve se dar, de preferência, através do planejamento estratégico da organização, ou seja, a partir da visão da empresa (o ponto futuro desejado) ou do planejamento a longo prazo, com o desdobramento de objetivos, metas, programas e atividades. À medida que o tempo passa, as organizações precisam buscar diferenciais para competirem fortemente no mercado de trabalho, novos desafios, normas, estratégias e ações nascem à medida que o mundo globalizado gera novas necessidades aos seres humanos. Ansoff, Declerck Et Hayes (1973), já descrevem no Livro Transformação da Atitude Estratégica que, muitas empresas pioneiras e numerosas empresas de consultoria, trabalhando independentemente, convergiam seus esforços para elaboração de um novo método, lá pelos fins dos anos cinqüenta. O resultado disso, conseguido através de tentativas e erros e de trocas de experiência, tornou-se conhecido como administração estratégica. Adotar ações estratégicas, num Sistema de Gestão Integrado nos dias de hoje, é considerada uma atitude desafiante, pois não existem muitos históricos para se fazer uma análise de riscos e oportunidades, mas a certeza de que algo novo pode nascer e desabrochar a saúde física e mental da organização, onde todos terão um papel a cumprir e a ser considerado e isso vem de encontro ao espírito empreendedor de negocio. 3.2 Gerenciamento do sistema de gestão integrado Segundo a BS 8800 (1996), as organizações não atuam isoladamente. Diversos setores podem ter um interesse legítimo na abordagem adotada por uma organização para com Segurança e Saúde Ocupacional (S&SO) incluindo: empregados, consumidores, clientes, fornecedores, a comunidade, os acionistas, os empreiteiros, os seguradores, assim como as agências governamentais encarregadas de zelar pelo cumprimento dos regulamentos e leis. Esses interesses precisam ser reconhecidos. 148 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 As orientações da BS 8800 têm por base os princípios gerais da boa gerência e foram concebidas para capacitar a integração do gerenciamento de S&SO com o sistema de gerência geral. A utilização de uma abordagem alternativa tem o objetivo de atender às organizações que pretendem fundamentar os seus sistemas de gerenciamento de S&SO na ISO 14001, a norma para sistemas ambientais e, como tal, identificar as áreas comuns em ambos os sistemas de gerenciamento. Quando os sistemas são integrados, o SGA tem menos probabilidade de ser visto como um “programa” que é principalmente de responsabilidade do departamento ambiental. Do ponto de vista operacional, um sistema completamente integrado funciona como um guarda-chuva que cobre todos os aspectos da empresa, desde a qualidade do produto e o atendimento ao cliente até a manutenção de operações de forma segura e ambientalmente aceitável Viterbo (1998). Algumas empresas acham que o lado negativo da integração completa seria a possibilidade de se comprometer a certificação ISO 9001 durante uma auditoria, devido a um desempenho inadequado na parte ambiental, ou vice-versa. Uma outra preocupação quanto à integração completa diz respeito à diferença entre os clientes principais dos dois sistemas de gestão. Os clientes principais de um sistema de gestão da qualidade são os compradores dos produtos e serviços oferecidos pela empresa que está implementando o sistema. Os clientes principais de um sistema de gestão ambiental são aqueles afetados pelos impactos ambientais produzidos pelas operações e atividades da empresa que está implementando o sistema. Um sistema completamente integrado abordará os interesses de ambos os grupos de partes interessadas. Para Cicco (2004), certificadas ou não segundo a ISO 9000, empresas em todo o mundo estão descobrindo que seus sistemas de gestão da qualidade também podem ser utilizados como base para o tratamento eficaz das questões relativas ao meio ambiente e à Segurança e Saúde no Trabalho (SST). Afinal, com a publicação da norma internacional ISO 14001 para Sistemas de Gestão Ambiental, e da especificação OHSAS 18001 para Sistemas de Gestão da SST, essa utilização do Sistema de Gestão da Qualidade está bastante facilitada. Ainda, segundo o autor: Hoje em dia, está cada vez mais difícil e dispendioso manter 3 sistemas separados (Qualidade, Meio Ambiente e SST), tanto para uma empresa com 35 funcionários como para uma grande multinacional. Além disso, está ficando cada vez mais evidente que não faz muito sentido ter procedimentos similares para os processos de planejamento, treinamento, controle de documentos e dados, aquisição auditorias internas e análise crítica. (CICCO, p.1, 2004) O principal argumento que tem convencido as empresas a integrarem os processos de qualidade, meio ambiente e segurança no trabalho é o efeito positivo que um Sistema de Gestão Integrado pode ter sobre os funcionários. Opinio, n.20, jan./jun. 2008 149 As metas de produtividade, progressivamente mais desafiadoras, requerem que as organizações maximizem sua eficiência. Múltiplos Sistemas de Gestão, onde somente um bastaria, são ineficientes, difíceis de administrar e difíceis de obter efetivo envolvimento das pessoas, que invariavelmente questionam “ou nós damos prioridade à produção, ou nos envolvemos com todos esses sistemas”. Dessa forma, é muito mais simples obter a cooperação dos funcionários para um único sistema do que para 3 sistemas separados. A OHSAS 18001 estabelece critérios para atender a um Sistema de Gestão Integrado, e o motivo pelo qual as empresas vêm adotando esse sistema é por apresentar uma série de benefícios operacionais e de gestão. A medida que as exigências de mercado vão aumentado a organização precisa aprender a se adaptar a novos processos, a fim de acompanhar o crescimento e desenvolvimento de um mundo com foco global, onde as necessidades da empresa precisam interagir com a necessidade de seus funcionários, o que também vem de encontro ao SGI. Já em sua Tese de Doutorado, sobre Planejamento Estratégico, Sistema de avaliações de desempenho e gerenciamento de Processos, Muller disse que: As empresas buscam a competitividade no intuito de sustentação e sobrevivência no longo prazo. Competitividade é atender simultaneamente os requisitos de mercado/clientes – fatores competitivos – e os requisitos da empresa – objetivos estratégicos. Na gestão empresarial atual, não é mais suficiente gerenciar a empresa como um objeto específico é preciso gerenciar o negócio da empresa, envolvendo fatores, influências, recursos e variáveis externas e internas. (p.17, 2003) No livro Safári de Estratégia, Mintzberg, Ahistrand e Lampel (2002) já definiam, dentro da Escola Empreendedora, que a geração de estratégia na empresa empreendedora é caracterizada por grandes saltos para frente, face à incerteza. A estratégia move-se para adiante na organização empreendedora pela tomada de grandes decisões – os “golpes ousados”. O executivo principal procura condições de incerteza, em que a organização pode obter consideráveis ganhos. 3.3 Comprometimento do funcionário com o SGI: importância, entendimento e envolvimento Um aspecto fundamental para o entendimento do que é um Sistema de Gestão Integrado é a realização de treinamentos, desenvolvendo habilidades para os funcionários, pois quem faz a diferença no desempenho dos processos dentro de um sistema são as pessoas. Segundo Donaire (1999), na América Latina as prioridades dizem respeito às políticas de desenvolvimento e à luta contra o subdesenvolvimento e suas 150 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 manifestações. Tudo o que se relaciona com os recursos naturais e a qualidade do meio ambiente é considerado como mero dado, epifenômeno (que acompanha um outro termo e é considerado causado por ele) da realidade socioeconômica. Esse erro de enfoque tem agravado os problemas ambientais e comprometido seriamente o próprio processo de desenvolvimento econômico e social. O desempenho de uma organização está fortemente associado à qualidade de seus recursos humanos. Se uma empresa pretende implantar um Sistema de Gestão Integrado em sua estrutura organizacional, deve ter em mente que seu pessoal pode transformar-se na maior ameaça ou no maior potencial para que os resultados esperados sejam alcançados. Se os trabalhadores não estiverem engajados no objetivo, o resultado será medíocre. Se a força de trabalho estiver comprometida e mentalizada para a idéia da gestão ambiental, haverá uma melhora contínua nos índices de qualidade ambiental da empresa. (DONAIRE, p.102, 1999) No aspecto técnico, o treinamento dos gerentes em gestão integrada, deve incluir as questões de qualidade, meio ambiente, saúde e segurança no processo de tomada de decisão, de modo que eles sejam encorajados a formular e implementar ações considerando suas conseqüências e repercussão junto à comunidade. Deve, ao mesmo tempo, apoiar e auxiliar os gerentes em sua comunicação com seus subordinados, no sentido de enfatizar as questões de qualidade, meio ambiente, saúde e segurança, juntamente com os aspectos relacionados às economias de energia e de custo. Na escola do Aprendizado do livro Safári de Estratégia já mostra como as organizações conseguem atingir níveis altos de bom desempeno, oportunizando seus funcionários a fazerem parte da construção de um novo Sistema. A organização que aprende é a antítese das antigas organizações burocráticas: ela é descentralizadas, encoraja comunicações abertas e encoraja as pessoas a trabalhar em equipes. A colaboração substitui a hierarquia e os valores predominantes são de aceitação de riscos, honestidade e confiança. (LAMPEL, p.160, 2002) Se a empresa possui algum tipo de atividade de melhoria em grupo como o Kaizen (são equipes multifuncionais que dominam o conceito de ferramentas de produção enxuta), 6 Sigma (um processo disciplinado de melhoria contínua, focado na satisfação do cliente, na redução de variações de custo e aumento da produtividade) e 5’S (método de trabalho prático, desenvolvido no Japão, que visa à obtenção de um local de trabalho limpo, ordenado e saudável), um procedimento deve prever uma sistemática de comunicação interna para divulgação dos resultados oriundos dessas ferramentas estratégicas para o negócio. O sistema de gestão da organização Opinio, n.20, jan./jun. 2008 151 pode ganhar muito ao receber e tratar as sugestões vindas dos funcionários conforme Darvin (1992). 3.4 Gerenciamento de um SGI através da tecnologia da informação A era da globalização, com as normas internacionais ISO 9001 e ISO 14001 e com a OHSAS 18001, mostra que a integração dos sistemas é irreversível para milhares de empresas européias, norte-americanas e também brasileiras. Viterbo (1998) coloca como uma sugestão complementar, caso a empresa esteja disposta a realizar um pequeno investimento, vale a pena estudar a aquisição, logo no início dos trabalhos, de um “software” gerenciador do processo de adequação à ISO 14001. Existem produtos no mercado, como por exemplo, o “software” INTELEX, porém deve ser tomado muito cuidado com a compatibilidade entre os sistemas existentes na empresa e aquele utilizado pelo “software” em questão, já que às vezes o custo de conversão/atualização dos bancos de dados suplantaria em muito o custo de aquisição do programa. Teixeira (2004) diz que devido à rapidez com que a tecnologia e a informação acontecem no mundo, os sistemas devem estar cada vez mais integrados para garantir que a revisão de um, automaticamente, implique atualizações de todos que estão interligados. Por esse motivo, as tecnologias de informações facilitam o desenvolvimento dos sistemas integrados de gestão, aos quais permitem um melhor fluxo de informações na forma digital, também estimula as organizações a buscarem o emprego e uso eficiente destes recursos, frente às exigências de eficiência e eficácia, sobretudo na tomada de decisões. A Tecnologia da Informação é um fator de extrema importância para que os Sistemas Integrados tenham eficiência e possam, facilmente, ser implementados e acessados. Também se pode considerar que a Tecnologia da Informação é um recurso que, estando em sintonia com as necessidades e objetivos dos usuários, possibilita maior eficiência e eficácia no relacionamento interno e externo das organizações, evidenciando agilidade e qualidade no processo de tomada de decisão. Segundo Viterbo (1998), existe uma forte tendência da utilização do correio eletrônico (por exemplo: Lotus Notes) como ferramenta para automatização das rotinas administrativas, inclusive comunicação. Com esse software, é possível desenvolver “workflows” e automatizar a maior parte do sistema de gestão, como, por exemplo, o sistema de tratamento de reclamações de clientes, o de treinamento, o de nãoconformidades e ações corretivas, o de auditorias internas, possibilitando uma agilidade e economia impossível de se obter quando se trabalha com papel. Dessa forma, evitase a quantidade de papéis circulando por toda a organização e agiliza-se o controle e o andamento das tarefas. 152 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 4 ELEMENTOS A SEREM CONSIDERADOS NA IMPLANTAÇÃO DO SGI 4.1 Procedimento para implantação do sistema de gestão integrado Com base nas diretrizes das OHSAS 18001, ISO 9001:2000 e ISO 14001, a metodologia adotada pela empresa para a implementação de um SGI foi composta por etapas enumeradas abaixo, considerando que a organização já possui um Sistema de Gestão da Qualidade e Ambiental, adequadamente estruturado: - Indicação, pelo principal executivo da empresa, de um coordenador que irá acompanhar e supervisionar todos os trabalhos relativos à implantação do SGI; - Realização de uma análise crítica inicial da Gestão Ambiental e da Segurança e Saúde no Trabalho, baseada nas normas ISO 14001 e OHSAS 18001; - Elaboração de um plano de implementação do SGI, a partir da análise crítica inicial realizada, com o respectivo cronograma de desenvolvimento das ações discriminadas; - Oficialização do plano de implantação do SGI: - Formalizar a estrutura de funcionamento e divulgar o plano para as pessoas que estarão diretamente envolvidas na implementação do mesmo e - Gerar material de divulgação do plano para todos os funcionários (jornal interno, circulares, avisos e e-mails). - Realização de treinamentos: - Palestra de 1 hora sobre o SGI, para os membros da alta direção da empresa; - Curso de 24 horas para o comitê executivo de implantação do SGI, discutindo cada elemento da ISO 14001 e da OHSAS 18001, integrado à ISO 9001; - Curso de formação de auditores internos do Sistema de Gestão Integrado, com 40 horas de duração e - Palestra de motivação e disseminação do SGI para toda a empresa, com 1 a 2 horas de duração cada. - Análise de perigos, riscos e impactos ambientais: - Identificar e avaliar os aspectos e impactos ambientais significativos; Opinio, n.20, jan./jun. 2008 153 - Identificar e avaliar os perigos e riscos à segurança e saúde dos trabalhadores; - Analisar e comparar com a legislação pertinente e com outros requisitos e - Adotar providências para o gerenciamento integrado. - Política e Manual: - Revisar e reciclar a Política unificada de Gestão da Qualidade, Ambiental e da Segurança e Saúde no Trabalho; - Adequar a estrutura organizacional/matriz de responsabilidades ao SGI e - Definir os objetivos, metas e indicadores do Sistema. - Elaboração da Documentação do SGI: - Definir o modelo do Sistema (quais serão os documentos); - Designar grupos de trabalho para a elaboração ou adequação de cada documento e - Realizar análises críticas com o comitê de implementação antes da homologação dos documentos. - Implementação dos Documentos: - Montar cronograma de implantação para cada área e documento aplicável e - Revisar todos os documentos existentes e verificar possibilidade de adaptação. - Auditorias de Sistema: - Realizar o planejamento de auditorias internas e/ou externas e definir freqüências. - Ajuste do Sistema: - Realizar a Análise Crítica pela Direção; - Adotar as ações corretivas necessárias para o Sistema operar de forma completa e - Definir a estrutura necessária para a manutenção do sistema. - Certificação: - Solicitar a um organismo certificador independente (caso seja de interesse da empresa), a certificação do SGI, conforme as ISO 9001, ISO 14001 e OHSAS 18001. 154 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 4.2 Avaliação de riscos e perigos, aspectos e impactos ambientais com a utilização de uma planilha integrada Aspecto é o elemento das atividades, produtos e serviços de uma organização que pode interagir com o meio ambiente, a segurança e a saúde das pessoas. O impacto é qualquer conseqüência adversa ou benéfica ao meio ambiente, à segurança ou a saúde das pessoas, que resulte no todo ou em parte das atividades, produtos ou serviços de uma organização. Os aspectos e impactos devem ser avaliados quanto ao Tipo, Situação, Incidência, Classe e Temporalidade (diretrizes OHSAS 18001, 2007). 4.3 Avaliação da importância dos impactos de segurança, meio ambiente e saúde Para que se possa realizar avaliação da Importância dos impactos deve se considerar critérios referentes à Severidade (S) e à Freqüência (F) / Probabilidade (P), conceitos e critérios que são utilizados para atendimento dos requisitos de gestão da norma OHSAS18001 (diretrizes OHSAS 18001, 2007). a) Severidade (Sever) A Severidade (S) representa a magnitude ou a gravidade do impacto, considerando ainda a sua abrangência espacial e reversibilidade, devendo ser pontuada conforme critério estabelecido pela organização para severidades de porte baixa, média ou alta. b) Freqüência (Freq.)/Probabilidade (Prob.) A organização deve definir os critérios para pontuação da Freqüência (F), e para os casos de situações previsíveis e da Probabilidade (P), para os casos de situação de Risco. Podendo também estabelecer critérios para Freqüências e Probabilidades, classificando como: Baixas, Médias ou Alta. As pontuações referentes à severidade dos impactos e à freqüência/probabilidade de ocorrência dos aspectos associados são registradas nas colunas correspondentes da Planilha Integrada (Figura 1). Na avaliação de probabilidade para situações de risco é importante considerar o registro do histórico dos impactos. FIGURA 1 – Sugestão de planilha integrada. Fonte: Baseado nos requisitos da norma OHSAS 18001, 2007. Opinio, n.20, jan./jun. 2008 155 c) Importância (I) A pontuação da Importância (I), é o somatório das colunas severidade e freqüência/probabilidade. I = Sever . + Freq.ou Prob. Para a avaliação do impacto deve-se considerar o seu resultado, classificando a pontuação e estabelecendo critérios para que o impacto seja considerado desprezível e para os não desprezíveis deve-se levar em conta a significância Os impactos com Importância I = 2 podem ser desprezados, desde que não sejam cumulativos. Assim, não poderão ser desprezados os impactos/aspectos que, isoladamente, ou na somatória de impactos/aspectos similares, apresentem magnitude considerável. Caso a situação de desprezibilidade seja satisfeita, a avaliação do impacto e respectivo aspecto é interrompida e o mesmo é registrado como “Impacto desprezível” na coluna “Comentário” da Planilha ilustrada na figura 1. Para os impactos que apresentem importância superior a 2 (I > 2), deve ser feita a avaliação de significância. 4.4 Avaliação da significância dos aspectos de segurança, meio ambiente e saúde Aspectos significativos: são aqueles que necessitam de um controle. Estes itens são passíveis de análise e inclusão nos objetivos e metas ambientais, sendo que as pendências legais associadas devem, obrigatoriamente, serem tratadas. A definição dos itens a serem priorizados para inclusão nos objetivos e metas do ciclo vigente poderá ser orientada pelo potencial de redução de custos, severidade ou pelos benefícios incorporados, julgados pelas áreas, considerando-se sempre o recurso disponível. Além da potencial definição de objetivos e metas para estes itens, todos requerem a adoção de controle, combinando um ou mais métodos. Aspectos não significativos: são os demais aspectos não enquadrados nos critérios definidos acima. A avaliação da significância dos impactos se dá através dos Filtros de Significância definidos pela SIG (diretrizes OHSAS 18001, 2007). 4.4.1 Filtros de significância Um impacto pode ser considerado “significativo” quando for aplicável ao mesmo pelo menos alguns requisitos, denominados “Filtros de Significância” como, por exemplo: - Requisitos legais das áreas de meio ambiente, saúde e segurança; - Partes interessadas; - Importância/Severidade altas. 156 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 Nas colunas correspondentes aos filtros de significância acima descritos são assinalados aqueles que se aplicam a cada impacto avaliado. 4.5 Considerações para situações de risco Os impactos associados a situações de risco podem apresentar grau de importâncias consideradas desprezíveis, conforme critério de pontuação. IR = 2, são desprezados sendo efetuado o registro “impacto desprezível” na Planilha de levantamento (Figura 1) na coluna de situação. Os impactos associados às situações de risco relevantes e que apresentam importância com pontuações altas, podem ser consideradas inaceitáveis (diretrizes OHSAS 18001, 2007). 4.6 Gerenciamento dos aspectos significativos de segurança, meio ambiente e saúde 4.6.1 Situações previsíveis Para tarefas cuja Avaliação de Aspectos e Impactos resultar importância com pontuação alta, devem necessariamente ser estabelecidos objetivos e metas de meio ambiente (MA) e/ou saúde e segurança e ocupacional (SSO), qual seja uma ação concreta no sentido de reduzir impactos ambientais ou riscos a eles associados a um nível aceitável. Para tarefas cujos impactos não forem considerados desprezíveis e cuja Avaliação de Aspectos e Impactos resultar em importância com pontuação baixa, deve ser avaliada a necessidade de se estabelecer para as mesmas, objetivos e metas de segurança, meio ambiente e saúde, e/ou elaboração/revisão de padrões de execução (PE) em função da avaliação da significância. Os registros da necessidade de objetivos e metas e também da elaboração/revisão de padrões de execução (PE) podem ser registrados na Planilha (diretrizes OHSAS 18001, 2007). 4.6.2 Situações de risco As tarefas correspondentes aos impactos em situações de emergência que forem consideradas “inaceitáveis” (pontuações altas) devem ser paralisadas e tomadas medidas imediatas para tornar o risco aceitável. Após a realização de tais medidas, a tarefa deve ser novamente submetida à Avaliação de Aspectos e Impactos de Segurança, Meio Ambiente e Saúde para avaliação de risco remanescente. Para tarefas cujos impactos apresentarem severidade alta, deverá ser verificada a existência de recursos para a aplicação de ações/medidas mitigadoras, a curto prazo, Opinio, n.20, jan./jun. 2008 157 em um plano de contingência (P.C.). Caso não existam os recursos, deverão ser estabelecidos objetivos e metas para a sua providência. No P.C. devem ser descritas as ações corretivas e mitigadoras (diretrizes OHSAS 18001, 2007). Como resultado desta metodologia proposta para identificação e avaliação de elementos para implantação de um Sistema de Gestão Integrado, tem-se a planilha integrada (citado na Figura 1); servindo como instrumento para análise, controle e determinação de ações prioritárias. A planilha deve ser analisada e atualizada, periodicamente, a cada alteração de engenharia considerando projetos novos ou apenas modificações de um produto ou processo de fabricação. 5 CONCLUSÃO As empresas estão buscando a Integração dos Sistemas de Gestão como uma excelente oportunidade para reduzir custos com o desenvolvimento e manutenção de sistemas separados, ou de inúmeros programas e ações que, na maioria das vezes, se superpõem e acarretam gastos desnecessários. Um Plano Estratégico de Negócio bem definido e elaborado, deve ser o pilar para que a empresa saiba os caminhos a serem percorridos, na busca de um novo universo de rotinas, as metas e táticas a serem adotadas para atingir o objetivo de implementação de um SGI devem ser disseminadas e implementadas por todos os níveis da organização. O resultado positivo oriundo de um objetivo desafiador de uma empresa pode estar relacionado com o seu espírito perspicaz de inovar e aceitar correr o risco, como citado por Hart no livro Safári de Estratégias (1991:121) “empresas de alto desempenho parecem capazes de misturar quadros de referência concorrentes na formulação da estratégia. Elas são ao mesmo tempo, engenhosas e incrementais, diretivas e participativas, controladoras e delegadoras, visionárias e detalhadas”. É difícil e dispendioso manter três sistemas separados (Qualidade, Meio Ambiente e SST), tanto para uma empresa com 35 funcionários como para uma de grande porte ou multinacional. Além disso, não faz sentido ter procedimentos similares para os processos de planejamento, treinamento, controle de documentos e dados, aquisição, auditorias internas e análise crítica. É importante deixar claro para uma empresa que tem interesse de implementar um sistema de gestão integrado que, o processo de análise de impactos e riscos deveria começar pela Engenharia, na fase de análise crítica de viabilidade de um projeto, para que não corra riscos ou comecem aparecer surpresas durante o processo já instalado. O que também ajuda bastante o processo de análise de identificação e avaliação de impactos e risco é a utilização de uma ferramenta onde se consiga analisar todos os aspectos do SGI, relacionados a um projeto em um único documento: modelo planilha integrada (Figura 1). Garantindo, assim, que nada fique para trás com relação à análise 158 Opinio, n.20, jan./jun. 2008 de aspectos ambientais e de saúde e segurança, podendo, após esta análise, dar-se seguimento a outras etapas do projeto. É necessário que as empresas nunca deixem de investir na área de pesquisa e desenvolvimento de novos produtos ou processos que não agridam os funcionários e o meio ambiente. A engenharia de produto e engenharia de processo são dois campos que trazem resultados para as empresas e que não estão sendo devidamente tratados no Brasil (BRILHANTE; CALDAS, 1999). As organizações devem permanecer atentas a todos os movimentos que estão acontecendo no mundo e que afetam a sua competitividade, trazendo para dentro do ambiente e dos processos internos as ferramentas e técnicas adequadas, buscando continuamente o desenvolvimento sustentável, conceito que deve guiar a estratégia corporativa. Como resultado da implementação de um Sistema de Gestão Integrado com certificação da OHSAS 18001, pode-se identificar benefícios como a avaliação de todas as áreas antes de modificações ou implementação de um novo projeto; a minimização dos riscos legais, tanto para a organização como para seus gestores; segurança para o capital; por meio da minimização da possibilidade de geração de passivos trabalhistas e cíveis, bem como pela minimização da probabilidade de ocorrência de acidentes que possam comprometer o negócio; melhora a imagem da organização perante o mercado, comunidade e trabalhadores; facilita o acesso a mercados com elevada conscientização de segurança; otimização dos recursos e facilidade na implementação e certificação na norma SA 8000 – Responsabilidade Social. Para isso, o sistema de gestão não deve acarretar aumento de preços dos produtos, pois preço é uma função do mercado, devendo as organizações se adequar aos níveis praticados internacionalmente. Preços diferenciados são conseguidos normalmente para as inovações tecnológicas, ou produtos inovadores cuja tendência é que seu preço venha a cair no momento em que o mercado aumenta as oferta em função da demanda, oferecendo as empresas opções de escolha por produtos similares de mesma qualidade e menor preço. Para futuros trabalhos, sugere-se o estudo dos retornos financeiros relacionados com o desempenho da qualidade, ambiental e de segurança e saúde ocupacional que o SGI proporciona, a longo prazo, nas empresas que estão investindo nesse processo, que ainda é recente e sofre constantes adequações. E também seria interessante que futuros trabalhos, optassem por explorar a interação dos sistemas de qualidade, meio ambiente, saúde e segurança com a norma de Responsabilidade Social – SA8000, 2008. REFERÊNCIAS ANSOFF, H. Igor; DECLERCK, Roger P.; HAYES, Robert. Transformação da Atitude Estratégica. Ringbok, 1969. Opinio, n.20, jan./jun. 2008 159 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR ISO 14001. Sistemas de Gestão Ambiental – especificação e diretrizes para uso. Rio de Janeiro: 1996. BRILHANTE, Ogenis; CALDAS, Luiz Querino. Gestão e avaliação de riscos em saúde ambiental. Rio de Janeiro: Fiocruz, 1999. BS 8800. Diretrizes para Sistemas de Gerenciamento de Segurança e Saúde Ocupacional. 1996. CABEDA, Marcelo. Sistema de gestão ambiental. Apostila PAP-CREA/RS. Porto Alegre: 2003. CICCO de Francesco. Agregando valor aos sistemas ISO 9000. Disponível em: <http:/ /www.qsp.com.br>. Acesso em: 15 jun. 2004. DANA INDÚSTRIA. Sistema de Gestão Integrado. Apresentação eletrônica de treinamento. Gravataí: 2004. DARVIN, David. Gerenciando a qualidade: a visão estratégica e competitiva. Rio de Janeiro: Qualitymark, 1992. DONAIRE, Denis. Gestão ambiental na empresa. São Paulo: Atlas, 1999. GILBERT, Michael. ISO 14001/BS7750: Sistema de gerenciamento ambiental. São Paulo: IMAM, 1996. LA ROVERE, Emílio Lèbre (coord.). Manual de auditoria ambiental. 2.ed. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2002. MINTZBERG, Henri; HALSTRAND, Bruce; LAMPEL, Joseph. Safári de Estratégias. Porto Alegre: Bookman, 2000. MULLER, Claudio José. Planejamento Estratégico, Sistemas de Avaliação de Desempenho e Gerenciamento de Processos – Ufrgs, 2003. OCCUPATION HEALTH AND SAFETY ASSESSMENT SERIES. OHSAS 18001.2007. SISTEMA DE GESTÃO editorial. Global Engenharia S/C Ltda. Disponível em: <http:/ / www.globaleng.com.br > Acesso em: 30 agosto. 2004. TEIXEIRA, Elisete Antunes; MENDONÇA, Fabrício Molica et al. As tecnologias de informações e os sistemas de gestão integrados. Disponível em: <http:// www.3m.com> Acesso em: 30 maio 2004. VITERBO, Ênio Junior. Sistema integrado de gestão ambiental. São Paulo: Aquariana, 1998. 160 Opinio, n.20, jan./jun. 2008