Jornal: O Estado de São Paulo 01 e 02/07/2006 Caderno: Feminino/Ciência CIÊNCIA Gestação programada A investigação genética pode ajudar mulheres com gravidez de risco a gerar filhos saudáveis Denise Berto ESPECIAL PARA O SF Seja para saber logo nas primeiras semanas de gravidez se o feto tem alguma anomalia ou para realizar com maior segurança a fertilização artificial, o exame genético - ou estudo cromossômico, como chamam alguns especialistas – tem sido um grande parceiro dos médicos na busca de soluções para problemas de reprodução humana. Para a publicitária Márcia Corazza, de 37 anos, casada há 13 com o engenheiro Frederico Corazza, de 38 anos , a batalha para conceber um filho saudável foi longa e dolorosa. “ Descobrimos, na Clínica Diason, de São Paulo, que nosso problema não era desta ordem. Na verdade, meu marido tinha baixo índice de esperma.” A solução foi a fertilização artificial. Após tomar vários medicamentos, que estimularam a hiperovulação, Márcia foi à clínica retirar óvulos para a fecundação. O embrião implantado em seu útero gerou Felipe, hoje, com 1 ano e 3 meses. O sucesso foi tão animador que mãe resolveu repetir a dose. Há alguns meses, voltou à mesma clínica para “encomendar” mais um filho. Só que, dessa vez, com uma segurança ainda maior. Segundo a diretora da clínica Diason, Mariângela Maluf – ginecologista, obstetra e especialista em reprodução humana, para aumentar as chances de sucesso da fertilização em Márcia, seu tratamento inclui o novo Diagnóstico Genético PréImplantacional, um exame genético de ponta. A médica explica que este diagnóstico tem sido um grande aliado dos principais laboratórios do mundo para a identificação de problemas genéticos. Especialmente porque o exame é feito antes da transferência do embrião para o útero, o que permite rastrear anomalias que podem afetar a criança, tais como retardo mental, entre várias outras. Além disso, também diminui o risco de aborto. Segundo a especialista, este exame consiste em captar os óvulos que são fertilizados com 72 horas de vida. Eles têm, em média, oito células. Para investigá-las, é necessário abrir um buraquinho na “casca” do embrião para que seja retirada uma célula. Nela, o núcleo é fixado com sondas especiais e levado ao microscópio, onde são analisados os cromossomos. Toda célula possui 46 cromossomos (23 pares). Portanto, explica a médica, é verificado se aquela célula possui pares corretos. São investigados, principalmente, os cromossomos 13,21,18 ( nos quais é mais comum a presença de anomalias, como Síndrome de Down) e mais os X e Y, que definem o sexo. Um número incorreto de cromossomos pode levar a síndromes genéticas. Neste caso, o embrião é descartado, analisando-se outro. Só são transferidos para o útero da mulher os embriões saudáveis. PRECAUÇÃO No caso de gravidez espontânea, no terceiro mês de gestação, é feito o estudo cromossômico, quando é retirada uma amostra de vilocorial (são retiradas células da placenta). Para verificar se o feto tem algum problema genético. No segundo mês de gestação de seu segundo filho, Márcia declara: não podemos brincar de Deus, mas devemos utilizar todos os avanços da ciência para garantir um filho saudável.” Já a administradora de empresas Maria Cristina Kherlakian, de 40 anos, mesmo depois de vários abortos espontâneos, não quis se submeter à inseminação artificial. “Minha idade já me enquadrava como gestante de risco. Fiz inúmeros tratamentos, exames a perder de vista, inclusive o genético, que constatou não haver qualquer problema deste tipo.” Ela conta que estava quase desistindo de ter filhos quando uma conhecida indicou o médico geneticista Thomaz Rafael Gollop, diretor do Instituto de Medicina Fetal e Genética Humana de São Paulo e professor de genética médica da Universidade de São Paulo (USP). Depois de mais uma batelada de exames, ele descobriu o obstáculo: uma hipercoagulação. A parir daí, remédios, hormônios, etc. após dois meses, engravidou naturalmente. Para evitar novo aborto, tomou injeção anticoagulantes subcutâneas todos os dias durante a gestação, aplicadas pelo marido, o empresário Arivaldo orlando, de 46 anos. “ Nossa filhinha nasceu perfeita”, comemora ele. FACA DE DOIS GUMES Os casais que podem pagar pelos altos custos dos exames e procedimentos genéticos, nem sempre, tem resultados felizes. De acordo com o geneticista Thomaz Rafael Gollop, existe um enorme descompasso entre o avanço da ciência e a adequação da lei. “Hoje, o casal que optar por não manter a gestação de um feto diagnosticado com doença grave, só tem uma saída: interrompe-la de maneira ilegal.” A Justiça permite o aborto em situações de doenças incompatíveis com a vida. È o caso, por exemplo, do bebê sem cérebro. No entanto, para doenças degenerativas, mas compatíveis com a vida, a interrupção da gravidez é crime. Nesses casos, diz Gollop, a função do médico é informar ao casal todos os aspectos da doença, assessora-lo psicologicamente, pois o impacto é muito forte. Já a decisão é de foro íntimo. A diretora do centro de Estudos do Genoma Humano da Universidade de São Paulo (USP), Mayana Zatz, alerta que, muitas vezes, o fato de ter casos de doenças degenerativas na família não significa que a mulher possa gerar filhos com a mesma doença.” É importante não se precipitar e fazer todos os exames antes de tomar qualquer decisão.” Ela destaca que, entre os diversos exames de investigação genética disponíveis no Centro que dirige, o diagnóstico pré-natal (aquele em que é tirada uma amostra da placenta) é um dos mais sofisticados e vem salvando vidas há anos. CUSTOS ELEVADOS Na clínica diason, o valor do diagnóstico Genético Pré-Implantacional é de R$ 1 mil para cada embrião investigado. Em média, são investigados de três a quatro. O tratamento todo da fertilização artificial custa cerca de R$ 12 mil. O geneticista Thomaz Rafael Gollop esclarece que muitos exames não podem ser realizados no Brasil.”Quanto mais rara a doença, mais oneroso é o exame.”. Seu parceiro Eduardo Motta, diretor da clínica Huntington, especializada em ginecologia e reprodução humana, diz que, no caso de doenças como síndrome de Huntington, é necessário enviar o embrião para Detroit (EUA). Nesses casos, os exames são acrescidos de R$ 3 mil. A fertilização in vitro, realizada na Clínica Huntington, custa R$ 8 mil, se acrescida do exame pré-implantacional , R$ 11 mil. O diagnóstico pré-natal, no Centro de Estudos de Genoma Humano da USP, varia de R$ 300 a R$ 500. O casal Márcia e Frederico Corazza teve de desembolsar R15 mil para o tratamento de seu segundo filho. Já Maria Cristina Kherlakian gastou algo em torno de R$ 6,5 mil. SERVIÇOS: Prof. Dr. Thomaz Rafael Gollop Rua Félix de Souza, 321 Telefone: 5093.0809 Clínica Huntington (Dr.Eduardo Motta) Av. República do Líbano, 529 Telefone: 3059.6100 Clínica Diason (Dra. Mariângela Maluf) Rua Pará, 50-12º andar Telefone: 3257.2758 Centro de Estudos do Genoma Humano (Dra. Mayana Zatz) Rua do Matão, travessa 13,nº 106, Cidade Universitária Telefone: 3091.7966